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ARTIGO ARTICLE
Redes cooperativas de pesquisa em saúde:
descrição e análise do uso de um instrumento de coordenação
em um instituto público de pesquisa em biomedicina

Cooperative health research networks: a description and analysis


of a coordination tool in a public biomedical research institute

Márcia de Oliveira Teixeira 1


Carlos José Saldanha Machado 2
Ana Tereza Pinto Filipecki 1
Bianca Antunes Cortes 1
Helena Espellet Klein 2

Abstract The purpose of this article is to describe Resumo O objetivo deste artigo é descrever e anali-
and analyze the dynamics of cooperative public sar a dinâmica de redes cooperativas de pesquisa
health research networks, and their utilization em saúde como principal instrumento de coorde-
as the principal coordination instrument for a nação de um programa de desenvolvimento tecno-
technological development program in a public lógico em saúde em uma instituição pública de
health research institution. It begins with a few pesquisa. Iniciamos com algumas considerações
methodological considerations in regard to car- metodológicas sobre as técnicas utilizadas no levan-
rying out surveys and systemizing and analyzing tamento, sistematização e análise dos dados. Em
data. Next a brief conceptual explanation of co- seguida fazemos uma breve exposição conceitual
operative networks is made along with the char- sobre as redes cooperativas, acompanhada da ca-
acteristics of the program. Then the cooperative racterização do programa. Descrevemos e analisa-
networks are described and analyzed, observing mos posteriormente as redes cooperativas, obser-
the relationships between the various actors that vando as relações entre os diferentes atores que
dynamize the program, the presence of IT and dinamizam o programa, a presença de ferramen-
communications tools, and the sharing of the tech- tas de tecnologia da informação e comunicação e o
no-scientific base among the projects of coopera- compartilhamento da base técnico-científica en-
tive networks. The article concludes by interlac- tre os projetos das redes cooperativas. Concluímos
ing some considerations about the local appro- o artigo tecendo algumas considerações sobre a
priation of a conceptual techno-scientific orga- apropriação local do modelo conceitual de organi-
1
Programa de Vocação
nizational model – the cooperative networks. The zação da pesquisa técnico-científica – as redes coo-
Científica, Laboratório de
Iniciação Científica, Escola creation of a data bank of empirical data, and of perativas. Consideramos que a constituição de um
Politécnica de Saúde local concepts and categories for analyses are con- acervo de dados empíricos, de conceitos e de cate-
Joaquim Venâncio,
sidered to be decisive factors for increasing the gorias locais de análise contribuirá, decisivamen-
Fundação Oswaldo Cruz. Av.
Brasil 4365, Manguinhos. knowledge acquired through sociology and an- te, para a ampliação do conhecimento gerado pela
21045-900 Rio de Janeiro thropology about research best practices and ad- sociologia e pela antropologia sobre as práticas de
RJ. marciat@fiocruz.br
2
ministration of biomedical research. pesquisa e gestão da pesquisa em biomedicina.
Laboratório de Pesquisa
em Ciência, Tecnologia e Key words Cooperative research networks, Tech- Palavras-chave Redes cooperativas de pesquisa,
Inovação em Saúde, nological development, Public research institu- Desenvolvimento tecnológico em saúde, Institui-
Instituto de Comunicação e
tion, Collaborative research, Biomedicine ção pública de pesquisa, Pesquisa colaborativa,
Informação Científica e
Tecnológica em Saúde, Biomedicina
Fundação Oswaldo Cruz.
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Teixeira MO et al.

Introdução local do modelo conceitual de organização da


pesquisa técnico-científica – as redes cooperati-
Nos últimos sete anos, a necessidade de conectar vas. Consideramos que a constituição de um acer-
a discussão da ciência e da tecnologia (C&T) à vo de dados empíricos, de conceitos e de catego-
política nacional de saúde ganhou expressão no rias locais de análise contribuirá para a amplia-
setor saúde, revertendo, assim, a sua posição se- ção do conhecimento gerado pela sociologia e
cundária no processo da reforma sanitária – pela antropologia sobre as práticas e a gestão da
embora a ciência e a tecnologia figurem como pesquisa em biomedicina.
componentes da política nacional de saúde1,2.
Neste sentido, o objetivo deste artigo é descrever
e analisar a dinâmica de redes cooperativas de Conceituação
pesquisa em saúde utilizadas como instrumento e contextualização das redes cooperativas
de coordenação por um programa institucional
de fomento ao desenvolvimento tecnológico em A emergência das redes cooperativas, dos con-
saúde em uma instituição pública de pesquisa sórcios de pesquisa, das alianças estratégicas, dos
(IPP). Interessa-nos reunir elementos sobre o centros de excelência e das plataformas tecnológi-
modo de apropriação local de um modelo con- cas se dá no contexto da disseminação da pesqui-
ceitual de organização da pesquisa experimental sa científica colaborativa nos últimos trinta anos3,5-
7
e da colaboração praticado entre equipes de pes- . Na literatura, a intensificação da pesquisa cola-
quisa e instituições internacionalmente. Assim, borativa relaciona-se com a multiplicação de pro-
selecionamos uma instituição (Fundação Oswal- jetos que requerem grandes volumes de recursos
do Cruz) que, em sua área de atuação, é a única e a expertise em múltiplas áreas de conhecimento,
com abrangência nacional; e um programa (Pro- além de instrumentações complexas e diversifica-
grama de Desenvolvimento Tecnológico em In- das, incorporadas ou não a equipamentos5,6. A
sumos em Saúde) afinado com os princípios con- colaboração entre dois parceiros cede lugar à co-
temporâneos da organização da C&T3,4, isto é, laboração entre grandes equipes (teamwork).
com a pesquisa científica colaborativa, a indução Donald Beaver8,9 considera que “teamwork or gi-
de áreas e temas de pesquisa, além do uso de ant collaborations, represents a new paradigm for
redes como modo de coordenação da pesquisa. the organizational structure of research”8. Outro
O artigo está dividido em cinco partes. Inici- aspecto salientado pela literatura especializada é a
amos com uma breve exposição conceitual sobre dispersão de colaborações entre diferentes insti-
as redes cooperativas como dispositivos de co- tuições3,10, constituindo colaborações multi-ins-
ordenação da pesquisa científica colaborativa. titucionais entre duas ou mais instituições5. Nos
Em seguida, fazemos algumas considerações últimos trinta anos, as colaborações multi-insti-
metodológicas sobre as técnicas utilizadas no le- tucionais ou não se revestem ainda de uma outra
vantamento, sistematização e análise dos dados. característica, isto é, o envolvimento de duas ou
Na terceira seção, após uma descrição resumida mais disciplinas – colaborações multidisciplina-
da Fundação Oswaldo Cruz, caracterizamos o res10. Para muitos autores, as colaborações mul-
programa privilegiando seus objetivos, a fonte tidisciplinares e multi-institucionais estão na base
de financiamento, as áreas temáticas escolhidas, de novos campos do conhecimento e das discipli-
os critérios de seleção dos projetos, as redes cons- nas científicas6,10,11.
tituídas, os projetos apoiados, as unidades da A expansão dessa forma de pesquisa colabo-
Fiocruz envolvidas, além do mecanismo de co- rativa deve-se em grande parte à ação de orga-
ordenação interna do programa. Na quarta se- nismos como o National Science Foundation
ção, à luz da discussão conceitual, descrevemos e (NSF) e a União Europeia3,10. Cummings e Kies-
analisamos as redes cooperativas, observando as ler10 lembram como as colaborações multidisci-
relações entre os diferentes atores que dinami- plinares e multi-institucionais são, em geral, as-
zam o programa, a presença de ferramentas de sociadas ao aumento da probabilidade de pro-
tecnologia da informação e comunicação, além dução de inovações técnico-científicas; e como
do compartilhamento da base técnico-científica essa relação está na base da intensificação e da
entre os projetos das redes cooperativas. Nessa dispersão geográfica das colaborações. Diane
etapa, utilizamos basicamente o material siste- Sonnenwald12 entende a colaboração científica
matizado a partir das entrevistas e da observa- como uma forma de produção de conhecimen-
ção empírica in loco. Concluímos o artigo tecen- tos técnico-científicos que suporta interações ori-
do algumas considerações sobre a apropriação entadas para áreas e objetivos comuns, enquan-
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to Pirró e Longo e Oliveira7 destacam como os gia e Inovação de 2001 e de 2005; atas da Câmara
projetos multi-institucionais apresentam objeti- Técnica de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnoló-
vos, prazos e metas bem definidos. Beaver8 enu- gico de 2001 a 2005; o Relatório da Conferência
mera, entre as vantagens da colaboração científi- de C&T em Saúde (2004), com destaque para a
ca envolvendo grandes equipes de trabalho, o Agenda de Pesquisa do Ministério da Saúde; a Lei
aumento da produtividade por meio do proces- da Inovação e os decretos que a regulamentam;
samento paralelo e do desenvolvimento de vá- atas de reunião das redes do PDTIS; relatórios de
rios projetos simultaneamente, além da forma- avaliação do PDTIS; planejamento anual do PD-
ção de novos pesquisadores. TIS; Manual de Organização do PDTIS de 2003 e
As colaborações multidisciplinares e multi- 2004.
institucionais lançam mão de outros instrumen- A partir da análise das atas da Câmara Téc-
tos de coordenação além da organização em rede. nica de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico
Vários autores5,10,12 citam reuniões, cursos, su- e do Relatório do Congresso Interno da Fiocruz
pervisão de pós-doutorado, workshops ou con- de 2002, compusemos uma primeira listagem de
ferências, além de uma variedade de ferramentas atores da pesquisa para a realização de entrevis-
de tecnologias da informação e comunicação, tas abertas semiestruturadas. Nela figuram o
como e-mail, mensagens instantâneas, telefone e coordenador do PDTIS, gestores da Vice-Presi-
videoconferência10. A magnitude da colaboração5 dência de Pesquisa e Desenvolvimento Tecnoló-
implica mudanças nos instrumentos de coorde- gico (VPPDT), diretores das unidades de produ-
nação e na intensificação da associação de mais ção de vacinas e medicamentos da Fiocruz e pes-
de um instrumento10. Esses instrumentos cons- quisadores que participaram das discussões pre-
tituem-se em variáveis recorrentes nas análises liminares e do processo de implantação do PD-
das colaborações científicas3,5,8,10. TIS. Outros atores foram posteriormente iden-
Recorre-se ao conceito de rede para descrever tificados e selecionados a partir da realização das
a implementação de formas de coordenação primeiras entrevistas.
apropriadas entre os atores e para analisar a Uma segunda rodada de entrevistas concen-
mecânica complexa das interações entre atores trou-se nos coordenadores das redes cooperati-
heterogêneos (laboratórios de pesquisa, firmas, vas e nos gerentes de projetos do PDTIS. Realiza-
consumidores). No Brasil, as redes cooperativas mos um total de 32 entrevistas com duração de
constituíram-se em um dispositivo da política 45 a 120 minutos. As informações levantadas fo-
de ciência e tecnologia praticada pelos atores que ram complementadas com observações das reu-
integram o Sistema Nacional de Ciência, Tecno- niões de avaliação anual do programa, ocorridas
logia e Inovação7. em 2007 e no primeiro semestre de 2008 e organi-
zadas por redes cooperativas. A escolha deve-se
ao fato de a literatura sobre pesquisa científica
Metodologia colaborativa considerar as reuniões de avaliação
como um dos mecanismos de coordenação3-5,10,14.
O estudo de natureza qualitativa foi realizado de Para a realização das entrevistas e das obser-
julho de 2006 a junho de 2008 com base em dife- vações, consideramos um conjunto de variáveis
rentes técnicas, tais como entrevistas abertas não identificadas a partir da revisão de literatu-
diretivas, análise de documentos diversos e ob- ra3,5,6,8,10. Assim, demos ênfase: (1) às relações
servação etnográfica de reuniões do Programa entre as diferentes instâncias da estrutura do
de Desenvolvimento Tecnológico em Insumos em PDTIS (coordenação geral, coordenadores de
Saúde (PDTIS)13. rede e gerentes de projetos); (2) às formas e aos
A identificação, o levantamento e a análise de mecanismos de interação entre as equipes de pes-
documentos estenderam-se por todo o período quisa de uma determinada rede; (3) à presença
de realização da pesquisa e tomaram como fonte de ferramentas de tecnologia da informação e
secundária relatórios dos congressos internos da comunicação que intensificam a colaboração no
Fiocruz de 2002 e 2005; os Planos Quadrienais da interior de uma rede ou entre as redes cooperati-
Fiocruz de 2001 a 2005 e de 2005 a 2009, bem vas do PDTIS; (4) ao compartilhamento da base
como a revisão realizada em agosto de 2007; os técnico-científica no interior de uma rede especí-
relatórios das Conferências de Ciência, Tecnolo- fica ou entre as redes cooperativas do PDTIS.
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Teixeira MO et al.

Caracterização da Fiocruz e do programa parasitárias de impacto na saúde pública nacio-


nal: tuberculose, hanseníase, Aids, dengue e febre
A análise dos documentos subsidiou a caracteri- amarela, malária, infecções virais (respiratórios
zação da Fiocruz e do programa, sendo que al- e outras), hepatites, infecções bacterianas, doen-
gumas informações foram complementadas por ças de Chagas, leishmaniose, filariose, leptospi-
meio das entrevistas realizadas com os gestores. rose. O PDTIS nasceu alinhado à política da Or-
A Fiocruz é a maior IPP em saúde do Brasil ganização Mundial da Saúde (OMS) de fomento
atuando na pesquisa científica e no desenvolvi- à pesquisa de tecnologias com doenças negligen-
mento tecnológico nas áreas da biomedicina e ciadas pela grande indústria farmacêutica e para
das ciências sociais e humanas em saúde com as quais não se dispõe de estratégias e insumos
ênfase na pesquisa em doenças infectoparasitá- eficientes e eficazes para controle e tratamento;
rias e em saúde pública. Ela congrega um con- bem como à própria tradição da Fiocruz na pes-
junto de quinze unidades distribuídas por seis quisa com doenças infectoparasitárias22.
cidades em cinco regiões: Rio de Janeiro (RJ), Belo Em 2002, a VPPDT enviou cartas-convites
Horizonte (MG), Curitiba (PR), Salvador (BA), para grupos de pesquisa da Fiocruz, com proje-
Recife (PE) e Manaus (AM). tos em diferentes estágios de desenvolvimento,
Desde 2001 a Fiocruz promove redireciona- para participarem de workshops sobre desenvol-
mentos em sua política de pesquisa e de desen- vimento tecnológico de vacinas, medicamentos,
volvimento tecnológico. Entre outras iniciativas, genômica e proteômica e insumos diagnósticos
estruturou em 2002 o Programa de Desenvolvi- – temas que originaram as quatro redes coope-
mento Tecnológico em Insumos (PDTIS)15. O rativas do PDTIS. Em seguida, lançou editais para
intuito era fortalecer a tecnologia e introduzir a a submissão de cartas de intenção a uma das
inovação como componente dessa política por quatro redes cooperativas. Os editais estabelece-
meio do reordenamento da organização da pes- ram as áreas e os temas induzidos pelo PDTIS.
quisa até então fortemente centrada no padrão Esse processo ocorreu entre os meses de abril
acadêmico para uma comprometida com as pri- (workshop) e maio (cartas de intenção). A imple-
oridades do MS e as necessidades técnico-cientí- mentação dos projetos ocorreu em junho, após
ficas do setor produtivo em saúde 15-19. Essas assinatura de carta-compromisso pelo gerente
medidas guardam uma estreita relação com o do projeto.
contexto nacional nos últimos 15 anos no tocan- As redes cooperativas estão distribuídas pe-
te à ciência e tecnologia e às atividades de pesqui- los campi da Fiocruz no Rio de Janeiro, em Belo
sa e desenvolvimento tecnológico, marcado pela Horizonte, Curitiba, Salvador e Recife. Na Tabe-
emergência das noções de inovação e de sistema la 1, apresentamos a distribuição dos projetos
nacional de inovação18. entre as unidades técnico-científicas da Fiocruz.
O PDTIS tem por objetivo estimular a pes- Adotamos aqui o mesmo critério definido pelo
quisa aplicada e o desenvolvimento tecnológico de PDTIS, qual seja: o projeto é vinculado à unidade
produtos e processos com impacto na saúde públi- do seu gerente.
ca e no controle de doenças infecto-parasitárias, Quanto à natureza administrativa das uni-
como vacinas, kits para o diagnóstico, fármacos, dades participantes, temos, além das técnico-cien-
medicamentos e produtos para o controle de veto- tíficas dedicadas à pesquisa em biomedicina, as
res20. Entre seus objetivos, estabelece a formação duas unidades de produção (Bio-Manguinhos e
de redes cooperativas para otimização de recur- Farmanguinhos) e uma das duas unidades da
sos e articulação das etapas que compõem o Desen- Fiocruz dedicadas à pesquisa e à assistência em
volvimento Tecnológico através da interação das saúde (Ipec). A Rede de Insumos Diagnósticos é
equipes de diferentes unidades21. Para tanto, pre- a que apresenta melhor distribuição entre as uni-
tende favorecer-se da existência de duas plantas dades. Nas demais redes há uma concentração
industriais no interior da Fiocruz dedicadas à de projetos no IOC (27). Ele e o CPqRR são as
produção de insumos em saúde. únicas unidades com participação em todas as
O documento15 lançado pela VPPDT, respon- redes. O IOC é a primeira das unidades organi-
sável pela estruturação e coordenação do pro- zacionais da Fundação Oswaldo Cruz e foi res-
grama, definiu três áreas estratégicas a partir das ponsável em 2007 por 48% da produção científi-
quais redes cooperativas deveriam ser formadas ca da Fiocruz publicada em periódicos nacionais
– (1) Pró-Insumos; (2) Genoma Funcional; (3) e internacionais indexados20.
Modelos Biológicos e de Triagem – e considerou O acompanhamento dos projetos ocorre por
como prioritárias as seguintes doenças infecto- meio de reuniões anuais organizadas pela Ge-
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Tabela 1. Número de projetos por rede cooperativa e por unidade da Fiocruz.

Unidade Campus Genômica e Insumos Medicamentos Vacinas


Proteômica diagnósticos
Aplicada
Instituto de Tecnologia de Rio de 0 3 0 3
Imunobiológicos (Bio- Janeiro
Manguinhos)
Centro de Pesquisas Aggeu Recife 0 1 0 1
Magalhães (CPqAM)
Centro de Pesquisas Gonçalo Salvador 0 1 2 0
Muniz (CPqGM)
Centro de Pesquisas Leônidas e Manaus 0 1 0 0
Maria Deane (CPqLMD)
Centro de Pesquisas René Belo 1 2 1 2
Rachou (CPqRR) Horizonte
Instituto de Tecnologia em Rio de 0 0 11 0
Fármacos (Farmanguinhos) Janeiro
Instituto de Biologia Molecular Curitiba 0 2 0 0
do Paraná (IBMP)
Instituto Oswaldo Cruz (IOC) Rio de 8 8 3 8
Janeiro
Instituto de Pesquisa Clínica Rio de 0 1 0 1
Evandro Chagas (Ipec) Janeiro

Fonte: VPPDT, 2006.

rência Geral do PDTIS em torno de cada uma


Tabela 2. Número de projetos por rede cooperativa
das redes. As reuniões contam com a participa- em 2007.
ção dos coordenadores da rede, da Coordena-
ção Geral do PDTIS, dos gestores da VPPDT e de Redes Número de
consultores externos à Fiocruz responsáveis pela projetos
análise técnico-científica do desenvolvimento dos Genômica e Proteômica Aplicada 09
projetos. Conforme estabelecido na carta-com- Insumos Diagnósticos 22
promisso e no Manual de organização do PD- Medicamentos 18
TIS23, no final da avaliação o projeto pode ser Vacinas 17
desligado do programa. Os dados listados na Total 66
Tabela 2 não contemplam projetos descontinua- Fonte: Relatório de Gestão da Fiocruz, 2007.
dos após a realização das reuniões de avaliação
das redes cooperativas entre agosto e novembro
de 2007.
Quanto à estrutura organizacional, o PDTIS das redes cooperativas em que estejam inseridos23.
possui duas instâncias: o Núcleo Gestor e a Co- A Coordenação Geral visa coordenar e viabilizar
ordenação de Redes Cooperativas, representa- a implantação e a implementação das ações do
das na Figura 1. Núcleo Gestor, enquanto à Gerência Geral cabe
Em 200323, integravam o Núcleo Gestor a estruturar, implementar ações entre as redes coo-
Coordenação Geral, os consultores externos à perativas e estabelecer procedimentos visando à
Fiocruz, o Apoio Administrativo e as seguintes organização das redes em concordância com os re-
gerências: Geral; Técnico-Científica; Proprieda- quisitos de qualidade23.
de Intelectual e Parcerias; Planejamento Estraté- Em 200624, a composição do Núcleo Gestor
gico; Orçamentária. Em termos de atribuições e foi alterada. Identificamos a inclusão dos coor-
competências, cabe ao Núcleo Gestor analisar, denadores das redes cooperativas e da rede de
selecionar e acompanhar técnica e economicamen- plataformas tecnológicas, assessores da VPPDT,
te todos os projetos, gerando procedimentos que além de três consultores técnico-científicos da
permitam sua implementação e o gerenciamento Fiocruz, dos quais dois são vinculados às unida-
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Teixeira MO et al.

Núcleo Gestor
Coordenação Geral

Gerência Gerência Gerência de Gerência de Gerência Apoio


Geral Técnico- Propriedade Planejamento Orçamentária administrativo
científica Intelectual e Estratégico
Parcerias

Consultores
técnicos

Coordenadores
das Redes

Gerente
Responsável técnico

Figura 1. Organograma do PDTIS.

Fonte: Manual de organização do PDTIS23.

des de produção e um ao futuro Centro de De- sultados; garantir o cumprimento das normas
senvolvimento Tecnológico (CDTS), e a exclusão de qualidade em todas as fases do projeto; solici-
dos consultores externos. Um ano depois, a com- tar avaliação dos consultores técnicos; (b) à ge-
posição do Núcleo Gestor é alterada novamente rência do projeto, o cumprimento das metas es-
com a saída dos assessores da VPPDT. tabelecidas, o acompanhamento do cronogra-
A Coordenação das Redes Cooperativas não ma físico-financeiro; é responsável pela elabora-
sofreu mudanças desde 2002, com a forte presen- ção e guarda da documentação e dos registros de
ça do IOC na coordenação das Redes de Insumos qualidade21.
Diagnósticos e de Genômica Aplicada e Proteô-
mica e das Unidades de Produção nas Redes de
Vacinas e de Medicamentos e Bioinseticidas. Dinâmica das redes cooperativas
Quanto à organização das redes, cada uma
conta com um coordenador, um gerente por pro- O que se segue é fruto da sistematização e análise
jeto e um ou no máximo dois responsáveis técni- dos dados obtidos por meio das entrevistas com
cos. As atribuições dos coordenadores de rede, gestores do PDTIS, coordenadores de rede e, so-
gerentes e responsáveis técnicos foram estabele- bretudo, gerentes de projetos, além da observa-
cidas na primeira versão do Manual de organiza- ção das reuniões e da análise documental. Identi-
ção do PDTIS em 200323, o qual prescreve todo o ficamos duas formas de agrupamentos dos ato-
funcionamento do programa. Em 200421, houve res da pesquisa: (1) as reuniões do Núcleo Ges-
pequenas correções na forma, mas sem mudan- tor, relacionadas à gestão do programa; (2) as
ças de conteúdo. Utilizaremos a versão de 2004 reuniões de avaliação. As redes cooperativas não
como referência para o restante do artigo. É im- promoveram, até junho de 2008, nenhuma for-
portante registrar que desde 2006 o Manual está ma de interação entre os pesquisadores.
em revisão e foi retirado do sítio da VPPDT. No intuito de conhecer e caracterizar a dinâ-
Quanto às atribuições, compete: (1) ao coor- mica das redes cooperativas do PDTIS, privilegia-
denador de rede, realizar reuniões periódicas com mos as seguintes variáveis estruturantes da des-
os gerentes dos projetos para avaliação dos re- crição e análise: (1) as relações entre as diferentes
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instâncias da estrutura do PDTIS; (2) as formas vessem as responsabilidades e as atribuições das
e os mecanismos de interação entre as equipes de diferentes instâncias do PDTIS, os entrevistados,
pesquisa de uma determinada rede; (3) a presen- em sua maioria, apresentaram dificuldades em
ça de ferramentas de tecnologia da informação e fazê-lo. Os gerentes de projetos, em especial, en-
comunicação que intensificam a colaboração no contravam dificuldades em descrever com preci-
interior de uma rede ou entre as redes cooperati- são o fluxo de informações e a cadeia de tomada
vas; (4) o compartilhamento da base técnico-ci- de decisão do programa. Os entrevistados des-
entífica no interior de uma rede ou entre as redes creviam com mais facilidade as atribuições da
cooperativas. Coordenação Geral do PDTIS, indicada como
Em 2002 as redes cooperativas foram toma- espaço das decisões sobre a gestão tecnológica do
das como modelo de organização da pesquisa programa, seleção de consultores, abertura de
tecnológica que permite a colaboração “entre os novos editais para seleção de projetos, desconti-
participantes de forma não competitiva” e a con- nuidade de apoio a projetos, além de aprovação e
vivência de iniciativas de pesquisa tecnológica em remanejamento de orçamento. Nesse sentido,
“quaisquer das etapas previstas no desenvolvi- quando concentramos nossa análise nos depoi-
mento tecnológico” de insumos em saúde15. Qua- mentos, as atribuições da Coordenação Geral
tro anos depois, lemos que o modelo adotado de parecem se confundir com as do Núcleo Gestor.
estruturação em redes cooperativas visa aproxi- É importante observar que o Manual coloca
mar pesquisadores para trabalhar de forma coope- o coordenador de rede frequentemente nas posi-
rativa em torno de objetivos comuns e de tecnolo- ções de mediador (solicita informações ao ge-
gias similares e otimizar recursos humanos e fi- rente e encaminha ao Núcleo Gestor) e de execu-
nanceiros24. O propósito das redes cooperativas tor das decisões tomadas pelo Núcleo Gestor.
é promover: (1) o intercâmbio de protocolos e Uma responsabilidade central e, segundo o
de procedimentos técnicos; (2) o treinamento e a Manual, exclusiva do coordenador de rede é o
interação entre os grupos ativos na Fiocruz; (3) acompanhamento técnico dos projetos. Entretan-
o suprimento de infraestrutura e apoio técnico21. to, durante a observação das reuniões de avalia-
As quatro redes do PDTIS (Vacinas, Medica- ção, constatamos problemas nesse acompanha-
mentos e Bioinseticida, Genômica e Proteômica, mento. Os relatórios técnicos só são solicitados
Insumos Diagnósticos) foram constituídas a par- no momento da reunião de avaliação, quando os
tir da análise das cartas de intenção enviadas por gerentes são interpelados pelos consultores exter-
equipes de pesquisa das unidades da Fiocruz. Em nos. Os gerentes entrevistados não discutiam os
2002, parte expressiva das cartas originou-se de problemas e relatórios técnicos com os coorde-
projetos em desenvolvimento, alguns financia- nadores de rede fora das reuniões de avaliação.
dos por agências nacionais, como o Conselho Durante nossa observação das reuniões de avali-
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tec- ação, registramos que alguns coordenadores não
nológico (CNPq). Em 2006, o programa lançou detinham informações atualizadas dos projetos
editais para submissão de novas propostas para de sua rede. Não raro, os gerentes apresentavam
as Redes de Insumos para Diagnóstico, de Medi- problemas ou soluções tomadas nos últimos
camentos e Bioinseticidas e de Vacinas. meses desconhecidas dos coordenadores de rede.
Para compreendermos a dinâmica das redes, Quanto à diversidade de interações caracte-
recorremos ao Manual de organização do PD- rísticas3,8 das equipes de pesquisa organizadas em
TIS21,23 e às entrevistas com os coordenadores, redes (colaborações, permuta de insumos, uso
gerentes e responsáveis técnicos. O Manual esta- compartilhado de equipamentos), constatamos,
belece os fluxos de informações, define os níveis nas entrevistas e durante a observação das reu-
de competências para tomada de decisão e as niões de avaliação, que são tímidas. Até o mo-
rotinas gerenciais para as diferentes instâncias mento, não identificamos colaborações técnico-
da estrutura organizacional do PDTIS. científicas expressivas entre as equipes de pesqui-
O Quadro 1 retrata uma estrutura hierarqui- sa de uma mesma rede. Como as redes abrigam
zada, com decisões centralizadas no Núcleo Ges- projetos anteriores a sua criação e equipes de pes-
tor e com um alto volume de informes, pareceres, quisa já estabelecidas, grande parte das colabora-
solicitações, relatórios técnicos e autorizações. ções técnico-científicas identificadas já existia. Al-
Todavia, nas entrevistas com os coordenadores gumas, inclusive, em torno de projetos financia-
de redes e com os gerentes de projetos, as atribui- dos por agências de fomento à pesquisa. Há exce-
ções e responsabilidades não apareceram com a ções, mas até onde conseguimos apurar, poucas
mesma clareza. Quando solicitamos que descre- colaborações surgiram como efeito das redes.
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Teixeira MO et al.

Quadro 1. Responsabilidades do Núcleo Gestor, dos coordenadores de rede e dos gerentes.

Núcleo Gestor Coordenadores de rede Gerente de projeto


Aprovar os recursos orçamentários Acompanhar tecnicamente o projeto através dos Coordenar, através dos
que serão repassados aos projetos. relatórios técnicos enviados pelo gerente de responsáveis técnicos, a atividade
projeto. proposta.

Acompanhar tecnicamente e Fazer questionamentos ao gerente de projeto sobre Acompanhar tecnicamente o


administrativamente o projeto. a execução do projeto sempre que as informações projeto.
presentes no relatório técnico não se apresentarem
suficientes, ou em qualquer outra situação em que
tais esclarecimentos se fizerem necessários.

Solicitar ao coordenador de rede o Encaminhar os relatórios técnicos, juntamente Solicitar de cada responsável
cumprimento dos objetivos, metas com seu parecer sobre a execução do projeto, ao técnico o cumprimento de
e prazos estabelecidos no projeto. Núcleo Gestor. objetivos, metas e prazos
estabelecidos no projeto.

Decidir sobre a interrupção da Responder, perante o Núcleo Gestor, pelo Zelar pelo atendimento às Boas
execução do projeto. cumprimento das normas de qualidade em todas Práticas de Laboratório.
as fases de execução do projeto.

Decidir, no momento oportuno, Solicitar do gerente de projeto o cumprimento dos Zelar pela manutenção de sigilo
sobre a estratégia e a forma de objetivos, metas e prazos estabelecidos no projeto. sobre as informações e resultados
proteção e exploração dos das atividades desenvolvidas.
resultados obtidos pela execução
do projeto.

Deliberar quanto à possibilidade e Informar ao Núcleo Gestor sobre todas as parcerias Fazer o levantamento e informar
condições de divulgação das vinculadas à execução do projeto já existentes quando ao coordenador de rede sobre
informações confidenciais. da celebração da carta-compromisso, formalizadas todas as parcerias vinculadas à
ou não, quando assim lhe for solicitado. execução do projeto já existentes
quando da celebração da carta-
compromisso.

Solicitar ao coordenador de rede Analisar e encaminhar, com seu parecer sobre o Não estabelecer ou autorizar a
informações sobre todas as assunto, ao Núcleo Gestor a solicitação do gerente celebração de novas parcerias para
parcerias vinculadas à execução do de projeto do estabelecimento de qualquer nova a execução do projeto sem a
projeto já existentes, formalizadas parceria a ser celebrada para a execução do projeto. devida formalização e aprovação
ou não, quando da celebração da do coordenador de rede, a qual
carta-compromisso. deverá ser solicitada através de
manifestação que aponte as
vantagens, o interesse e a
necessidade da celebração delas.

Deliberar e autorizar ao Autorizar o gerente de projeto a estabelecer novas Não enviar nem permitir o envio
coordenador de rede deliberar parcerias a serem celebradas para a execução do ou o recebimento de qualquer
sobre a possibilidade e as projeto, caso aprovado pelo Núcleo Gestor e nas amostra de material biológico sem
condições do estabelecimento de condições por ele estabelecidas. a devida formalização e aprovação
qualquer nova parceria do coordenador de rede, a qual
estabelecida para a execução do deverá ser solicitada através de
projeto, a ser celebrada após a manifestação que aponte sobre
assinatura da carta-compromisso. razões, o interesse e a necessidade
da realização do envio.
continua
1843

Ciência & Saúde Coletiva, 16(3):1835-1847, 2011


Quadro 1. continuação

Núcleo Gestor Coordenadores de rede Gerente de projeto


Deliberar e autorizar ao Analisar e encaminhar, com seu parecer sobre o Coordenar a elaboração de
coordenador de rede deliberar assunto, ao Núcleo Gestor a solicitação do gerente relatórios técnicos periódicos e
sobre a possibilidade e as de projeto de autorização do envio de material detalhados a respeito do
condições de envio de material biológico a ser realizado em razão da execução do andamento das ações previstas,
biológico efetivado após a projeto. conforme estabelecido no projeto,
celebração da carta-compromisso, e enviar ao coordenador de rede.
quando realizado em razão da
execução do projeto.

Solicitar ao gerente de projeto o Autorizar o gerente de projeto para a realização do O atendimento do cronograma
cumprimento do cronograma envio de material biológico, a ser procedido em físico-financeiro e a prestação de
físico-financeiro. decorrência da execução do projeto, caso aprovado contas ao Núcleo Gestor.
pelo Núcleo Gestor e nas condições por ele
estabelecidas.

Informar ao coordenador da rede Solicitar a avaliação de consultores técnicos para Solicitar, através do coordenador
sobre o cumprimento do auxiliar no alcance dos objetivos do projeto e no de rede ao Núcleo Gestor, a
cronograma físico-financeiro do atendimento das normas de qualidade, se entender alteração quantitativa dos recursos
projeto. necessário. destinados ao projeto pelo PDTIS.

Fiscalizar a adequação do Analisar a solicitação de alteração quantitativa dos


cronograma físico-financeiro ao recursos destinados ao projeto realizada pelo
destino efetivo dos recursos gerente de projeto e encaminhá-la ao Núcleo
disponibilizados pelo PDTIS para Gestor para apreciação.
execução do projeto.

Fonte: Manual de organização do PDTIS23.

Quanto às colaborações externas à Fiocruz, prestação de serviços tecnológicos aos projetos e


o Manual de organização21 estabelece restrições foram recomendadas pelos consultores.
sem que antes haja a aprovação do coordenador A metodologia dessas reuniões reforça a timi-
de rede e do Núcleo Gestor. É importante salien- dez das interações entre as equipes de pesquisa no
tar que nas unidades de pesquisa da Fiocruz, in- interior das redes cooperativas. Em 2007, houve
clusive naquelas que participam das redes coo- uma mudança na metodologia das reuniões. An-
perativas, o estabelecimento de parcerias formais tes, os gerentes e responsáveis técnicos assistiam a
intra e extramuros é uma atribuição do chefe de análise de todos os projetos da rede. A partir de
laboratório, com baixíssima regulação. 2007, os consultores, coordenadores de rede e
Outra frente são as colaborações com o setor membros do Núcleo Gestor (Coordenação Ge-
produtivo da saúde. Segundo os relatórios de ati- ral, Gerência Geral) passaram a se reunir separa-
vidades do PDTIS20,24, algumas equipes de pes- damente com cada equipe de projeto. Alguns ge-
quisa estabeleceram parcerias com indústrias pri- rentes entrevistados aprovaram a nova metodo-
vadas e públicas interessadas no repasse de tec- logia, destacando o maior tempo para aprofun-
nologias ou para a prestação de serviços tecnoló- darem o diálogo com os consultores e a maior
gicos. Nas entrevistas com a Coordenação e a privacidade. Outros mencionaram desconforto
Gerência do PDTIS, essas parcerias foram consi- com a discussão de seus projetos diante de todos
deradas por ambas como o primeiro fruto da os gerentes de projetos e, em alguns casos, dos
gestão tecnológica do programa. Observamos, responsáveis técnicos. Um ponto recorrente nas
todavia, que os relatórios nem sempre deixam falas é que na metodologia anterior não ocorria,
claro o objeto da parceria. Durante as reuniões de em geral, a participação ativa dos demais gerentes
avaliação, constatamos que muitas se destinam à e/ou responsáveis técnicos na discussão dos pro-
1844
Teixeira MO et al.

jetos. Cada equipe manifestava-se apenas quan- culdades. Os equipamentos utilizados pelos pro-
do seu projeto estava em foco. Não houve men- jetos foram adquiridos por um mix de recursos.
ção, por parte dos gerentes e coordenadores, do Parte foi financiada por projetos de pesquisa in-
uso de estratégias para estimular maior partici- dividuais, parte com recursos orçamentários da
pação de todos os presentes. No entanto, como unidade (à qual pertence o grupo de pesquisa) e
os gerentes e os responsáveis técnicos não têm uma parte pelo PDTIS. Ou seja, além dos equi-
acesso a todos os relatórios técnicos, conheciam pamentos adquiridos para a Rede de Platafor-
pouco sobre os demais projetos da sua rede. mas, o PDTIS financiou a aquisição de equipa-
A Rede de Genômica e Proteômica Aplicada, mentos específicos para os projetos. Encontra-
por sua vez, manteve a metodologia anterior. mos o mesmo mecanismo para a aquisição de
Realizamos uma observação durante a reunião insumos (soluções, reagentes e kits para experi-
de 2007. Destacamos a seguir alguns pontos que mentos). Constatamos nas entrevistas e ao lon-
corroboram os depoimentos anteriores: (1) em- go da observação das reuniões que o comparti-
bora a presença de todos fosse não apenas per- lhamento de equipamentos e reagentes ocorre
mitida, mas desejada, alguns gerentes não com- entre equipes que já mantinham colaboração
pareceram; (2) alguns gerentes e responsáveis anterior ao PDTIS. No entanto, não identifica-
técnicos saíram assim que a discussão de seus mos em nenhuma instância (Coordenação Ge-
projetos foi concluída; apenas uma gerente par- ral, Gerência Geral, coordenações de redes) o uso
ticipou ativamente de todas as discussões; (3) de ferramentas de tecnologia da informação e
somente a equipe se manifestava enquanto o con- comunicação (TIC) para agilizar ou criar fluxos
sultor externo analisava o projeto; (4) a Coorde- de informação e comunicação entre as redes, ca-
nação da Rede de Plataformas, responsável pelo paz de facilitar o uso compartilhado de um insu-
gerenciamento de muitos equipamentos utiliza- mo, permutas e empréstimos de equipamento e
dos pelos projetos em discussão, não participou reagentes. Não identificamos listagens de insu-
de toda a reunião. mos de uso comum ou registro de sobras de in-
Um ponto considerado positivo pela coorde- sumos disponíveis para consulta de gerentes ou
nação geral do PDTIS e pela VPPDT é a sua pro- dos coordenadores de rede; o mesmo em relação
ximidade com os institutos de produção da Fio- aos equipamentos que não pertencem à Rede de
cruz de imunobiológicos e de medicamentos. Até Plataformas. As listagens de equipamentos e,
o final do século XX, as relações de colaboração sobretudo, as de insumos comuns não estão aces-
entre as unidades de produção e as unidades de síveis aos coordenadores de rede em razão da
pesquisa técnico-científica da Fiocruz eram for- forma como o orçamento do programa é elabo-
tuitas. Maior aproximação é registrada nos últi- rado. O orçamento não é elaborado e discutido
mos sete anos, em especial na área de insumos coletivamente no interior da rede cooperativa;
diagnósticos em saúde. No entanto, até o mo- cada gerente elabora seu orçamento, encaminha
mento as interações das redes cooperativas repe- ao coordenador para pré-análise e ao núcleo ges-
tem o padrão observado para as demais equipes tor. As compras autorizadas são realizadas em
de pesquisa, ou seja, as mais intensas são anteri- parte pela gerência orçamentária do PDTIS e, em
ores à existência das redes. Identificamos quatro parte, pelas unidades da Fiocruz. Assim, o orça-
formas de participação das unidades de produ- mento e as compras não são consolidados por
ção nas redes: (1) projetos desenvolvidos por rede cooperativa, mas por projeto25.
equipes de pesquisa dos institutos de produção; O Manual de organização21 define como res-
(2) projetos desenvolvidos por equipes de pes- ponsabilidade do Núcleo Gestor a aprovação dos
quisa com as quais os institutos mantêm cola- recursos orçamentários, além do exercício de fis-
borações; (3) participação na coordenação das calização da sua posterior execução. Nas entre-
redes de Vacinas e Medicamentos; (4) participa- vistas realizadas com os coordenadores de rede,
ção nas reuniões de avaliação da Rede de Insu- essa responsabilidade foi deslocada para a Co-
mos Diagnósticos. É interessante frisar que na ordenação Geral, havendo, portanto, uma coor-
situação “2” a maioria das colaborações analisa- denação centralizada. Os coordenadores de rede
das foi constituída antes do PDTIS. apreciam as solicitações, são consultados sobre
Quando observarmos a infraestrutura que eventuais cortes, mas a decisão cabe ao Coorde-
está associada a cada uma das redes, constata- nador Geral, principal interlocutor da gerência
mos que o compartilhamento de equipamentos, orçamentária e da Presidência da Fiocruz. Entre
insumos e equipes de pesquisa pelos projetos os gerentes de projetos entrevistados, havia pou-
organizados em uma mesma rede enfrenta difi- ca clareza a respeito dos critérios utilizados e das
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Ciência & Saúde Coletiva, 16(3):1835-1847, 2011


interações entre as diferentes instâncias para a res ao PDTIS e à formação das redes. Portanto,
deliberação do orçamento. as entrevistas complementadas com a observa-
ção empírica das reuniões de avaliação nos per-
mitem afirmar que o programa ainda não lo-
Conclusão grou a construção do trabalho cooperativo en-
tre equipes associadas em redes.
Não obstante o desmesurado sucesso no Brasil Segundo a literatura6,7,9,14,27, a transferência de
das redes cooperativas como instrumento de co- tecnologia entre as equipes de pesquisa é respon-
ordenação da pesquisa científica e tecnológica sável em grande medida pela disseminação das
junto às agências de fomento, carecemos de es- colaborações. Por intermédio das observações em-
tudos empíricos sobre a apropriação desse ins- píricas, concluímos que a dinâmica das redes não
trumento em diferentes contextos sócio-históri- favorece o compartilhamento de soluções técni-
cos de produção de conhecimentos técnico-cien- cas, coibindo a transferência de tecnologia. A di-
tíficos, particularmente no campo da saúde. nâmica das reuniões de avaliação exemplifica a
Nossa contribuição consistiu em compreender o falta de articulação e a inexistência de problemáti-
uso das redes cooperativas em uma instituição ca ou tecnologia7 comum à rede. A reunião privi-
pública de pesquisa em saúde (Fiocruz) toman- legia objetivos e metas individuais, demonstran-
do o PDTIS como referência empírica. A síntese do que no PDTIS estamos diante de um discurso
apresentada a seguir tem caráter exploratório, novo de gestão de C&T, mas sem enraizamento
de primeira confrontação do material empírico no corpo social dos pesquisadores, e de uma prá-
com a literatura internacional especializada nas tica tradicional de coordenação da pesquisa, efe-
redes de pesquisa cooperativa3,5-10,12,14,21,23,26,27. tivamente enraizada na instituição.
Confrontando a literatura3,5,6,10 com as en- O financiamento também é centrado na aná-
trevistas realizadas, em especial com os gerentes lise dos projetos individuais, enquanto nos casos
de projetos, e com as observações das reuniões analisados pela literatura os recursos são distri-
de avaliação, tomamos o PDTIS como progra- buídos a partir da divisão de trabalho entre as
ma de indução que utiliza instrumentos relacio- equipes7,14,27.
nados à pesquisa colaborativa (redes, reuniões As redes cooperativas, em geral, são associa-
de avaliação, consultores externos e relatório de das às estruturas flexíveis e horizontais3,4. Entre-
acompanhamento), mas não como indução à tanto, Shrum et al.3 registram a associação de
pesquisa colaborativa. redes cooperativas com estruturas verticais e hi-
Segundo a literatura5,6,10,14, a pesquisa cola- erarquizadas. Todavia, no caso do PDTIS o des-
borativa ocorre entre multi-instituições e envol- conhecimento das regras e da dinâmica entre as
ve atores agindo de forma multi e interdiscipli- diferentes instâncias, manifestado nas entrevis-
nar. Katz e Martin14 incluem as colaborações en- tas com gerentes de projeto, termina por com-
tre departamentos de uma instituição (colabo- prometer o fortalecimento da capacidade de co-
ração intra-institucional6,14). Mas um ponto co- ordenação associada às redes cooperativas.
mum à literatura é o centramento das colabora- A literatura aponta as ferramentas de comu-
ções em um tema ou objeto em torno do qual se nicação e informação como essenciais à divisão
estruturam as redes cooperativas 5,6,8-10,12,14,27. de trabalho entre equipes e ao acompanhamento
Também enfatiza-se a divisão de trabalho entre de metas7,8,10. Ao longo das entrevistas e da ob-
as equipes de pesquisa de uma mesma rede ou servação empírica, não identificamos no PDTIS
programa para caracterizar a pesquisa colabo- a presença de ferramentas para comunicação e
rativa5,6,8,9,12,14. A divisão de trabalho distingue a gestão da informação entre equipes dos proje-
pesquisa colaborativa de interações pontuais en- tos, apenas instrumentos para gestão da infor-
tre equipes8,27, mesmo nas colaborações intra- mação pela Coordenação Geral, Gerência e con-
institucionais6,14. sultores. Isso reforça a inexistência de divisão de
Constatamos, a partir da entrevistas, que os trabalho entre as equipes de uma mesma rede.
projetos no PDTIS não estão articulados entre si. Em síntese, as redes cooperativas do PDTIS
Logo, não há divisão de trabalho entre equipes. convivem com um modo de organização da pes-
Outro elemento relacionado à formação de co- quisa centrado em projetos individuais. Elas são
laborações pela literatura5,6,8-10,12,14, o comparti- utilizadas para a coordenação de projetos indivi-
lhamento de equipamentos e de expertise técni- duais, em lugar de equipes em diferentes ativida-
co-científica, não pode ser facilmente relaciona- des de um projeto comum ou nos seus subproje-
do às redes. Os casos identificados eram anterio- tos, o que as torna, assim, um estudo de caso
1846
Teixeira MO et al.

singular na constelação analisada pela literatura


internacional. Porém, desempenharam uma po-
sição relevante no processo de organização da
pesquisa, reunindo equipes de pesquisa e proje-
tos individuais antes dispersos pelas unidades da
Fiocruz.
Aspectos fundamentais para os objetivos do
PDTIS, como o aumento da regulação de parce-
rias, a sistemática de avaliação de projetos e o
diálogo entre unidades de pesquisa e produção,
prescindiram da ação das redes. Trata-se de um
conjunto de ações em processo de implantação,
realizadas por outras instâncias do programa
(Coordenação Geral, Gerência Geral e Gestão
Tecnológica).

Colaboradores

MO Teixeira, CJS Machado, ATP Filipecki, BA


Cortes e HE Klein participaram igualmente de
todas as etapas da pesquisa e da elaboração do
artigo.

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Ci-


entífico e Tecnológico (CNPq) o apoio para a
realização da pesquisa Inovação em Saúde Públi-
ca: estudo de caso do processo de construção social,
coletivo e local da Rede Vacinas Recombinantes e
DNA da Fundação Oswaldo Cruz, que resultou
neste artigo.
1847

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