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A SAÚDE DO CORTADOR DE CANA-DE-AÇÚCAR NUMA USINA DA REGIÃO DE

UBERABA-MG
ARAGÃO, Ailton de Souza1;
FERRIANI, Maria das Graças Carvalho2;
PAIVA, Fernanda Silva3.

Resumo

A pesquisa se justificou pela necessidade de investigarmos não somente o intenso fluxo


migratório de trabalhadores da cana de outras regiões do estado de Minas Gerais para o
Triângulo Mineiro, mas, sobretudo, compreender as condições de trabalho dos cortadores de
cana-de-açúcar de uma usina na região de Uberaba-MG.
Um dos objetivos da pesquisa foi conhecer e avaliar os fatores epidemiológicos que
concorrem para que esses trabalhadores tenham sua saúde reduzida ou mesmo preservada. E,
ao mesmo tempo, refletir o processo saúde-doença e repensar os procedimentos adotados até
o momento no sentido de promover a saúde desses trabalhadores.
Historicamente, o trabalhador brasileiro passou a ter acesso aos serviços de saúde por meio da
Previdência, ou seja, contribuindo com um sistema gerador de receita para ser utilizada – em
tese – na cura de doenças ou em situações emergenciais. Essa iniciativa refletiu a hegemonia
do paradigma biomédico de compreensão do processo saúde-doença e resultou na formulação
de políticas sociais de cunho individual e fragmentado.
Inúmeros debates internacionais nas últimas décadas do século XX, dentre os quais as
Conferências de Alma-Ata (URSS-1978) e de Ottawa (Canadá-1986), resultaram em
documentos norteadores que fundamentaram, no Brasil, as reivindicações sociais na 8ª
Conferência Nacional de Saúde, de 1986. Seus resultados exigiam não apenas uma
transformação na forma de acesso ao sistema de saúde, mas uma mudança na elaboração das
políticas públicas, voltadas para a seguridade social e a compreensão dos determinantes
sociais de saúde. Esses novos fundamentos promoveram impactos na forma de compreender e
agir sobre a saúde, em geral, e do trabalhador, em especifico, cujo fundamento reside na
promoção da saúde como meio de prevenir acidentes de trabalho. Para muitos estudiosos o

1
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-EERP-USP; Universidade Federal do Triangulo Mineiro-UFTM
(Uberaba-MG); ailton_aragao@terra.com.br .
2
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-EERP-USP
3
Enfermagem. Universidade de Uberaba-UNIUBE (Uberaba-MG)
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corte da cana ocuparia, em geral, pessoas que não passaram pelo ensino formal, ou ainda, que
não o concluíra; e ainda, pessoas com alguma escolaridade e em situação de desemprego nas
áreas urbanas. Cenários que justificariam a submissão a atividades degradantes, uma vez que
exige um intenso dispêndio de força física.
As informações foram obtidas por meio de 44 entrevistas estruturadas com os cortadores de
cana, selecionados aleatoriamente nos arquivos do Sindicato Rural e que, em seguida, foram
sistematizados em categorias, o grupo fora composto por 34 homens e 10 mulheres. Sobre as
entrevistas, verificamos que a análise do discurso permitiu ampliarmos os contornos que os
dados nem sempre revelam.
Na relação sexo/idade, 70,45% ocupavam a faixa dos 19 aos 30 anos, dos quais 67,65% eram
homens e 80% eram mulheres; já a faixa dos 31 a 45 anos, 32,35% eram homens e 20% eram
mulheres. Quando relacionamos sexo/escolaridade observamos que 36,36% nunca haviam
estudado, dentre os quais, 35,29% eram homens e 40% mulheres, entre os que estudaram (1º
grau incompleto e 2º grau incompleto), os homens somaram 64,70% e entre as mulheres esse
número chegou a 60,00%. Esses dados revelam o desalento relacionado ao acesso à educação
formal para os jovens, sobretudo para as mulheres, e recoloca o dilema sobre a continuidade
dos estudos nas regiões onde se corta cana.
Os depoimentos revelaram, ainda, que os rendimentos estavam associados à quantidade de
horas trabalhadas por dia, logo, os trabalhadores estariam mais expostos aos riscos de
acidentes, pois o cansaço era visível. Todos os trabalhadores afirmaram que a Usina oferecia
os EPI´s e que consideravam importante o uso dos mesmos. Diante desse quadro, indagamos:
quando o homem ou a mulher cortadores de cana se cansavam em demasia, os EPI´s
comprometeriam a produtividade, refletindo-se nos ganhos, logo, a dispensa de EPI´s soa
como estratégia de manutenção ou aumento dos ganhos. Um dilema se apresentou aos sujeitos
da pesquisa: a mecanização do corte da cana aliada a não notificação de dores ou acidentes
leves evidenciam o receio de perder o emprego, mesmo temporário. Por sua vez, notificar
acidentes implicaria em “sujar a ficha”, pois dificultaria encontrar um novo emprego na
região, conduzindo-os, portanto, à resignação. Uma realidade que expõe os trabalhadores da
Usina ao risco contínuo de acidentes e desafia a efetivação do direito à saúde e sua promoção
por meio de políticas públicas e os mantêm como “cidadãos de segunda categoria”.

Palavras-chave: Saúde do trabalhador; Condições de trabalho; Promoção da saúde; Ciências


sociais e saúde
Grupo apresentado: Tecnologia e Produção Rural
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