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Aula 01: Um olhar para a

violência que há em nós

UM OLHAR PARA A
VIOLÊNCIA QUE HÁ EM
NÓS
A gente começa bem nesse ponto porque sabemos que ao
chegar nesse curso, é urgente que você dialogue com toda
essa culpa aí que você carrega. A culpa sobre as tantas
desconexões, os descontroles, as palavras mal colocadas, os
gritos, aquilo que um dia te disseram e que você jurou que
não ia nunca mais repetir...

Então...

A primeira pergunta que eu quero que você se faça é: “Por


que eu me comunico assim?”.
E ofereço-lhe companhia na busca dessa resposta potente,
capaz de ajudar você a aproveitar esse curso plenamente,
entendendo que a forma como você se comunica hoje foi
aprendida e tem uma função na sua vida.

Logo, para se comunicar de outra forma é necessário


aprender essa outra forma e dar nova função ao seu
processo de falar e ouvir. Mas antes de continuarmos esse
papo que vai se estender por esse módulo inteiro...

Quero lhe contar uma história que não é a sua, mas bem
que poderia ser.

Na próxima aula, vamos começar a entender os processos


que nos levam a um padrão de comunicação violenta.

Aula 02: Sobre a educação que


recebemos
SOBRE A EDUCAÇÃO QUE
RECEBEMOS
Salvo raras exceções, a forma como fomos educados não
permitiu que nos conhecêssemos internamente e
aprendêssemos a lidar com sentimentos, necessidades e
limites que fazem parte de nós.

Com isso, crescemos desconectados de nós mesmos, sem o


autoconhecimento necessário para criarmos
relacionamentos saudáveis conosco mesmos e com os
outros. Crescemos despreparados para a vida e seus
desafios e a cada crise nos sentimos menores e mais
perdidos.

Foi assim comigo. Foi assim com a Ana, a moça da história


que abriu esse curso. E acredito que em algum ponto da
sua vida, pelo menos, já foi assim também com você.

E quando me dei conta que a educação que recebi falhou


comigo nesse sentido – e que também havia falhado com
todos os que estavam ao meu redor - entendi que
precisamos urgentemente encontrar meios de abrir um
diálogo interno sincero, que nos permita encontrar a
melhor versão de nós mesmos. Especialmente, quando os
adultos que nos tornamos estão ocupando o papel mais
especial de suas vidas: são mães ou pais e não querem que
suas histórias terminem como a da Ana.

A boa notícia é que não precisa terminar. Chegou a hora de


buscarmos novos caminhos e ressignificarmos a nossa
forma de entregarmos ao mundo quem somos nós.

E estou aqui, junto com vocês, para apoiá-los a desvendar a


Comunicação Não-Violenta como uma forma saudável de
quebrarmos esse ciclo e escrevermos novas histórias, nas
quais as crianças que criamos, que educamos de alguma
forma, possam crescer aprendendo tudo aquilo que não
aprendemos antes, mas que felizmente estamos nos
abrindo e buscando aprender agora.

Vamos entender, então, o que é essa tal de Comunicação


Não-Violenta (CNV).
COMUNICAÇÃO VIOLENTA x
COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA
Eu quero explicar para você o que é a Comunicação Não-
Violenta, caso ainda não tenha entrado em contato com o
conceito. Mas não quero fazer isso com teorias (ou pelo
menos não só com elas!). Então, tenho uma proposta.
Vamos fazer um exercício de empatia com a Ana. Isso
mesmo, a moça da história que abriu esse curso.

Eu quero que nesse momento você pense na Ana criança,


na filha, na irmã, na estudante, na profissional, na mulher,
na esposa, na mãe. Pense em Ana como ser integral que ela
é e responda:

Do que ela precisa? Quais são as necessidades dela em


cada um dos papeis que ela ocupa? Faça uma lista que
represente a sua resposta, ok?

Faça isso daí, que estou fazendo também daqui e vou


compartilhar com vocês a minha resposta.

Só avance quando tiver completado essa lista.


O que você respondeu?

Eu respondi que Ana precisa de amor, escuta, acolhimento,


reconhecimento. Ana precisa ser valorizada, abraçada,
entendida. Ana precisa aprender o que ainda não sabe. Ana
precisa de ajuda.

Agora responda: Você – que não é a Ana e não vive a


mesma história – consegue perceber que o que ela precisa
é o mesmo que você também precisa para se sentir feliz e
em paz? Veja a sua resposta e pense: essas também não
são necessidades minhas?

Pois bem. Segundo Marshall Rosemberg, quando falamos


em comunicação não-violenta levamos em consideração
que todos nós temos necessidades humanas básicas e
Universais. Isso mesmo: eu, você e aquela pessoa que
sequer sabemos que existe precisamos basicamente das
mesmas coisas.

E mais: cada uma das nossas ações, cada coisa que fazemos
é uma estratégia para atender a uma ou mais dessas
necessidades. E isso inclui a forma como nos comunicamos.
E essa comunicação – que é a estratégia para eu conseguir
o que eu quero - pode ser violenta ou não-violenta. Simples
assim.

Mentira, não é simples. Eu sei, é bastante complexo. Mas


vou dar um exemplo para que você entenda melhor.

Ilustrando...
Vamos voltar para a história da Ana. Vou te contar um dia
da vida dela.

O que houve com Ana e a filha?


A necessidade da Ana era receber amor da filha, ser
reconhecida pelo esforço que fez de sair do trabalho cedo
para estar com ela. Ao ter essa necessidade não atendida,
Ana se frustrou e para dar vazão a essa frustração falou:

- Você vai para casa comigo agora! Sem mais brincadeiras,


por hoje! Onde já se viu? Eu saí mais cedo do trabalho para
você me responder desse jeito?
E conseguiu o que queria? Não... porque a forma que usou
foi violenta. E violência não gera conexão. Por isso as duas
foram para casa emburradas. As duas desconectadas.
Digo que a forma que ela usou foi violenta porque aqui
vamos admitir o seguinte: há violência sempre que eu – ao
me comunicar – apenas dou vazão a um sentimento
negativo ao invés de dar voz às minhas necessidades não
atendidas, aos pedidos que preciso fazer, à conexão que eu
quero gerar para me sentir bem, amado(a), em paz.

"Embora possamos não considerar violenta a maneira de


falarmos, nossas palavras não raro induzem à mágoas e à
dor, seja para os outros, seja para nós mesmos” (Marshall
Rosemberg).

E trazendo de volta a pergunta que do início, podemos


questionar em coro: Por que eu me comunico assim? Por
que nos comportamos dessa forma? A resposta é bem
simples: porque foi assim que aprendemos.

A Comunicação Não-Violenta nos ajuda a refletir sobre


esses padrões que aprendemos e repetimos para a partir
daí buscarmos reformular a maneira pela qual ouvimos os
outros e falamos.

Em outras palavras: aprendemos dessa forma, por isso nos


comunicamos assim. Necessário, então, se faz questionar
essa forma de se comunicar e ir substituindo velhos
padrões por novos, mais saudáveis, mais alinhados com a
forma como você gostaria de se relacionar consigo
mesmo(a) e com o mundo.

E se ficou difícil imaginar, então, como Ana poderia ter


comunicado a sua necessidade ao invés de apenas dar voz
à sua frustração, vamos pensar em alternativas...

PARA DIALOGAR E DESCONSTRUIR A


VIOLÊNCIA QUE HÁ EM NÓS
Para ter a sua necessidade atendida, Ana poderia falar algo
como:

- Filha, eu saí mais cedo do trabalho porque queria muito


passar um tempo com você (necessidade). Será que a
brincadeira com a sua amiga pode ficar para amanhã?
(pedido) É que hoje é muito importante para mim passarmos
mais tempo juntas. (necessidade)

Pronto. Necessidade identificada e comunicada de forma


não violenta. Pedido feito para que o outro possa ter a
oportunidade de entender como você precisa ser atendida.
Oportunidade de conexão estabelecida.

E com isso a criança ia dizer sim e sair sorrindo, feliz para


casa? Não sabemos. Afinal de contas, nessa situação ela
teria duas opções: conectar-se com o pedido da mãe e ir
para casa com ela ou olhar para a sua própria necessidade –
que era brincar um pouco – e comunicá-la. E se o fizesse, a
conversa continuaria.
Voltamos à estaca zero, talvez você pense. E é aí que
engana-se redondamente. Comunicar-se de forma não-
violenta tem a ver com entender que a comunicação nada
mais é do que uma oportunidade de se conectar com as
pessoas, de buscar acordos, de sairmos daquele padrão do
“se eu ganhar, o outro perde”. CNV é respeito mútuo,
compaixão e cooperação.

ENTÃO, REPETINDO E
COMPLEMENTANDO...
Na aula seguinte, conduzirei uma atividade biográfica para
que o que estudamos aqui possa fazer ainda mais sentido
para vocês.

Aula 03: Uma atividade para


desconstrução

UMA ATIVIDADE PARA


DESCONSTRUÇÃO
Agora que você já sabe o que é comunicação não-violenta,
quero que avancemos um pouco mais na busca da resposta
para: “Por que eu me comunico assim?”

Para isso, vou conduzir uma atividade biográfica com você...

Trabalhar com a biografia humana consiste em buscar


respostas para nossas inquietações e conflitos internos
usando como base um resgate de memórias sobre a nossa
própria história.

É um caminho saudável de reconexão com a nossa essência.


Um mergulho no passado para ressignificá-lo, mas também
para projetar o futuro.

Uma das formas de conduzir um resgate biográfico é pedir


a cada pessoa para resgatar acontecimentos e histórias de
vida de forma guiada. E é o que farei com vocês agora.

Cada um tem um tempo para resgatar essas memórias. A


ideia é você realizar essa atividade num ambiente em que
não seja interrompido (a) e que faça com bastante calma.

A cada conjunto de questões você deverá pausar o vídeo e


só seguir em frente depois de ter encontrado as respostas.

Há pessoas que têm muita dificuldade de resgatar


lembranças. Se esse for o seu caso, não ultrapasse o seu
limite interno e permita-se entrar em contato consigo
mesmo (a) o mais que possa.

Pegue papel e caneta e veja no vídeo a seguir as


orientações para essa atividade.
Espero que entrar em contato com essas questões tenha
resultado não só num momento muito potente de
autoconhecimento que te preparou para receber o próximo
módulo que vai cuidar da sua comunicação com seus filhos,
mas também que tenha sido útil para você se livrar de
culpas e encontrar possíveis novos caminhos para uma
comunicação não-violenta. Afinal de contas...

Eu me comunico assim porque foi a única forma que


aprendi. E agora que estou aqui fazendo uma imersão
numa outra alternativa de me relacionar que faz muito mais
sentido para mim, tenho condições de entender como
cheguei até aqui e... deixar de ocupar esse lugar.

Sigamos em frente.

Semana que vem, teremos conteúdo novo!

Aula 01: O que fazer quando a


criança estiver descontrolada
emocionalmente
O QUE FAZER NAS SITUAÇÕES
COTIDIANAS?
O que fazer quando.... é o começo de pergunta que mais
ouço os atendimentos. A gente estuda, lê, pesquisa, mas
chega a hora da prática e tudo parece ainda mais
complicado

Pensando nisso, nessa semana vou apresentar para você o


que fazer em diversas situações cotidianas. No final, ainda
vou fazer um resumo bem completo de algumas ações e
hábitos que fazem total diferença quando o assunto é
educar sem violência.
AULA 01: O QUE FAZER QUANDO A
CRIANÇA ESTIVER DESCONTROLADA
EMOCIONALMENTE
Ela chora, grita, xinga, bate, morde (muitas vezes você!), ela
está descontrolada. O que fazer?

Vamos começar narrando 3 cenas bem cotidianas.

Cena 1:

Criança: Eu não gosto da minha avó. Grita a criança. Na


frente da avó, claro.
Adulto: Claro que gosta! Não repita isso nunca mais.

Cena 2:

Criança: Eu vou morrer se você não me der isso. Ela diz entre
choros e soluços.
Adulto: Vai morrer nada! Não vou dar e acabou.

Cena 3:

Criança: Não quero ir. Estou com vergonha. Ela diz, se


escondendo atrás de você.
Adulto: Vergonha de quê? Não tem motivo nenhum para
sentir vergonha.

Já passou por algo parecido com seu filho?

Agora responda: O que as três cenas têm em comum?


Uma criança com seus sentimentos descontrolados,
experimentando emoções negativas, você pode me dizer.
Sim, é isso. Mas não só.

As cenas têm em comum também a negação dos


sentimentos da criança pelo adulto. E é sobre isso que
vamos conversar agora. Mas, como de costume, o nosso
ponto de partida é a sua história, a sua educação. E não a
educação dos seus filhos.

Vamos admitir, então, que você cresceu negando boa parte


dos seus sentimentos ao invés de entrar em contato com
eles e resolvê-los?

• Rompeu o relacionamento? Já foi tarde, não está


doendo não.

• Foi mandado embora do trabalho que amava? Nem


ligo. É o meu chefe quem está perdendo.

• Está com uma raiva absurda do mundo? É só uma


irritação, talvez TPM. Daqui a pouco passa.

Reconheceu-se?
Minimizamos comumente os nossos próprios sentimentos.
Fomos educados a estarmos sempre bem, felizes. As fases
difíceis devem ser camufladas, nos disseram sempre. É
necessário estar sempre sorrindo. Seguir sempre em frente,
mesmo quando tudo o que precisamos é parar. E assim
vamos levando a vida: colocando lindas fotos nas redes
sociais.

Nos nossos atendimentos costumamos dar a seguinte


orientação aos nossos clientes quando passam por uma
fase difícil:

Por favor, sofra. Permita-se sofrer. Essa é a melhor coisa que


você pode fazer por si mesmo, nesse momento. Depois de ter
encarado de frente o sofrimento, entrado em contato com
tudo o que ele te trouxe, você estará pronto(a) para seguir
em frente.

E é realmente assim que acreditamos ser. E é realmente


assim que vejo dia após dia nossos clientes sofrerem e,
depois, florescerem, mais empoderados(as) de si
mesmos(as).

Pense, então, no seguinte:

Se faço isso o tempo inteiro comigo mesmo(a),


provavelmente devo estar estimulando os meus filhos a
também negarem cada coisa que sentem.
Faz sentido para você?

Se sim, mude a rota, levando em consideração que quanto


mais você ajudar os seus filhos a identificarem, nomearem e
entrarem em contato com seus sentimentos, mais
fortalecidos eles estarão para se relacionarem de forma
saudável consigo mesmos, com você e com os outros.

Vamos ver um diálogo possível para as cenas que abriram


essa aula, levando em consideração os sentimentos da
criança?

PREPARE-SE PARA DESFAZER O NÓ


Cena 1:

Criança: Eu não gosto da minha avó.


Adulto: Puxa, você hoje sente que não gosta da sua avó?
Criança: Não gosto mesmo. Ela nunca vem aqui em casa!
Adulto: Entendi. Você está, então, frustrado porque gostaria
que a sua avó viesse aqui mais vezes?
Criança: Sim. Ela precisa vir aqui mais vezes!
Adulto: Vamos voltar para a sala e dizer para ela, então, que
você está com muitas saudades e gostaria que ela viesse
aqui mais vezes?
Criança: Ebaaaaa! Vamos!

Cena 2:

Criança: Eu vou morrer se você não me der isso.


Adulto: Filho, entendi que é muito importante para você
ter isso agora.
Criança: Sim! Eu preciso!
Adulto: Nesse momento, eu não posso te dar, mas entendi
que você gostaria muito de ter e que se você ganhasse
hoje estaria muito feliz.
Criança: É! Fiquei triste.
Adulto: Eu sinto muito, querido.
Cena 3:

Criança: Não quero ir. Estou com vergonha.


Adulto: Você sente vergonha de que exatamente?
Criança: De todo mundo!
Adulto: Mas você conhece todos os que estarão lá. O que
mudou para você se sentir assim?
Criança: Da última vez que fui lá, caí no chão e todo
mundo riu.
Adulto: Ah, querida. Você ficou com vergonha dos seus
amiguinhos. Ficou magoada também por eles ficarem rindo?
Criança: Fiquei. Ninguém nem me ajudou a levantar. Não
são mais meus amigos!
Adulto: Você está com vergonha e magoada com seus
amigos, por isso não quer voltar lá. Entendi. Mas precisamos
ir porque tenho um compromisso. E não tenho com quem
deixar você. Acha que podemos ir juntas e você ficar do meu
lado até se sentir mais confortável para fazer as pazes com
seus amiguinhos?
Criança: Acho que posso fazer isso. Quero brincar com a
Joana.
EXPLICAÇÕES SOBRE AS CENAS
Vamos começar pela cena 1.

CENA 1

A criança diz que não gosta de alguém que ela deveria


gostar. E aí? O que fazer? A primeira coisa é ajudar a criança
a entender que ela se sente daquela forma naquele dia,
naquele momento. Que essa não precisa ser uma realidade
imutável. E você faz isso, repetindo a fala dela e inserindo
palavras como: hoje, agora, nesse momento etc.

- Puxa, você hoje sente que não gosta da sua avó?

Depois, vamos abrindo espaço para que ela explique


porque está se sentindo daquela forma naquele momento.
Há sempre algo por trás, a ser desvendado, reconhecido. E
os pais ajudam muito quando não reagem mal e
simplesmente negam os sentimentos da criança.

Na cena em questão, ficou muito claro que o menino, na


verdade estava frustrado e que gostaria que a avó passasse
mais tempo com ele. Perfeito. Nomeia-se a frustração.
Nomeia-se também o sentimento chamado saudade.
Toma-se uma atitude para resolver esses sentimentos, para
transformá-los em algo positivo: ligar para a avó.

Com isso, você ajuda a criança a ir experimentando e


interiorizando uma outra forma de reagir ao que sente. Aos
poucos quando se sentir com saudades, por exemplo, ela já
tenderá a simplesmente procurar a pessoa ao invés de
negá-la, de dizer que não gosta dela porque aprendeu que
quando sentimos saudades podemos dar um telefonema e
resolver isso, por exemplo.

É um super aprendizado para os pequenos. E também para


nós.

CENA 2

Na cena 2, nós temos uma criança lidando com o temido


NÃO. Acontece. E ela vai ficar com raiva, triste, frustrada.
Também acontece. É importante deixar que ela experimente
tais sentimentos. Não ter algo que queremos muito é ruim
mesmo. Nosso papel é mostrarmos que entendemos a
necessidade da criança, que não estamos deixando de dar
porque não a ouvimos ou porque não entendemos o quão
importante era para ela receber aquilo. Não é porque não
nos importamos: é porque o NÃO faz parte da vida.

- Filho, entendi que é muito importante para você ter isso


agora. Nesse momento, eu não posso te dar, mas entendi
que você gostaria muito de ter e que se você ganhasse
hoje estaria muito feliz.

Outra coisa que podemos fazer é ficarmos ao lado,


ajudando a criança a lidar com os sentimentos que ela
experimentar por simplesmente não poder ter. É
expressarmos que não gostamos de vê-la triste.

- Sinto muito que esteja triste, querido.

Daqui a pouco, uma outra necessidade é atendida e a


criança supera essa falta.
CENA 3

Na cena 3, a criança já consegue dizer o que sente.

- Estou com vergonha.

Resta-nos ajudar a criança a entender porque se sente


assim e o que fazer a respeito.

- Você sente vergonha de que exatamente?

- Ah, querida. Você ficou com vergonha dos seus


amiguinhos.

Há algum outro sentimento envolvido? Quanto mais espaço


você der para a criança falar, mais os outros sentimentos
irão surgir.

- Ficou magoada também por eles ficarem rindo?

Com as situações expostas, fica mais fácil você ajudar a


criança a lidar com esses sentimentos, apoiando-a.

- Acha que podemos ir juntas e você ficar do meu lado até se


sentir mais confortável para fazer as pazes com seus
amiguinhos?
E, apoiada, a criança começa a ver a situação também por
outros ângulos e vai buscando esse conforto que precisa
para acolher os seus próprios sentimentos.

- Acho que posso fazer isso. Quero brincar com a Joana.

PARA AJUDAR
Para você chegar a essa comunicação, o mais importante é
você conseguir identificar o sentimento da criança, o que
está por trás do comportamento. Vamos pedir, então, para
você treinar essa observação durante toda essa semana
realizando a seguinte atividade:

Pegue um caderno que você possa fazer anotações e deixe


sempre perto de você. Escolha um sentimento seu (ou uma
sensação) que costuma ser o estopim para você se
desconectar dos seus filhos e não praticar uma
comunicação não-violenta. Irritação, por exemplo.

Agora durante toda essa semana quando se sentir


irritado(a) com algo que o seu filho disser ou fizer,
pergunte-se:
Com qual sentimento ele não está sabendo lidar para agir
desse jeito que me irrita?

Faça uma lista desses sentimentos no seu caderno. Veja se


ao entender esses sentimentos do seu filho, a sua irritação
não é cuidada de alguma forma, por esse exercício de
empatia, por entender que a reação dele não tem a ver com
você, mas com suas próprias dificuldades de criança
descobrindo o mundo.

Agora o desafio é fazer a empatia ser uma super ferramenta


de conexão entre você e o seu filho.

Aula 02: O que fazer quando a


criança estiver na fase de mentir
e/ou omitir
O QUE FAZER QUANDO A CRIANÇA
ESTIVER NA FASE DE MENTIR E/OU
OMITIR
Vamos começar com 3 cenas cotidianas...

Cena 1:

Criança: Não quero andar mais. O meu pé está doendo.


Adulto: Nós não andamos tanto assim.
Criança: Mas está doendo.
Adulto: Temos que continuar andando. Faça um esforço, não
deve ser tão ruim assim.
Criança: Eu prefiro sair com a vovó!

Cena 2:

Adulto: A professora disse que você conversa mais do que


estuda, na escola.
Criança: Não é verdade!
Adulto: Vai desmentir a sua professora?
Criança: Você nunca acredita em mim!
Cena 3:

Criança: O Tobi (cachorro) sumiu com meu sapato.


Adulto: O Tobi, né? Não é você que nunca sabe onde coloca
as coisas?
Criança: Eu deixei na porta ontem, juro!
Adulto: Não jure em vão, menino!

Agora responda: O que as três cenas têm em comum?

A desconfiança. O pressuposto de que a criança sempre


estará escondendo algo e que nós, adultos, temos que
pressioná-las até dizerem a verdade.
A boa notícia é que há formas mais amorosas e empáticas
de estimularmos os pequenos a nos contarem a verdade. E
quanto mais empatia movimentamos, melhores resultados
conseguimos ter, pela seguinte razão...

CRIANÇAS, EM GERAL, MENTEM PELOS


SEGUINTES MOTIVOS...
• Medo da punição (apanhar, ficar de castigo etc).

• Dificuldade em lidar com a culpa e suas


consequências.

• Vergonha.

• Não querer decepcionar os pais.

Percebe que – guardadas as devidas proporções – os


motivos que levam as crianças a mentir não são muito
diferentes dos que fazem você mentir também?

Quer ver? Acompanhe aqui o meu raciocínio.

MEDO DA PUNIÇÃO:

Você chega atrasado(a) no trabalho e não quer ser punido:

“Nossa, um trânsito terrível! Imagina se eu não tivesse saído


de casa com meia hora de antecedência, hein”.

Se não mentisse, o que você acha que poderia acontecer?

“Você se atrasou porque teve insônia e precisou dormir um


pouco mais? Isso é muito errado. Vou descontar do seu
salário”.
DIFICULDADE EM LIDAR COM A CULPA E SUAS
CONSEQUÊNCIAS

Perdeu a conta que precisava pagar e não quer que a sua


mulher saiba?

“Amor, não chegou a fatura. Vou pedir uma segunda via. Um


absurdo isso. E ainda vamos pagar juros pela incompetência
deles!”.

Se não mentisse, o que você acha que poderia acontecer?

“Perdeu a conta de novo? Nossa... não posso mesmo confiar


em você”.

VERGONHA

Acabou de tirar a carteira de motorista, quando vai colocar


o carro na garagem arranha uma parte da porta e:

“Pai, você não vai acreditar: arranharam o seu carro no


estacionamento! Cheguei e ó... todo arranhado!”

Se não mentisse, o que você acha que poderia acontecer?

“Eu não devia mesmo ter emprestado o meu carro para você!
Quanta irresponsabilidade!”

NÃO QUERER DECEPCIONAR AQUELES QUE AMA

Não ganha aquela promoção que disse que ganharia e


quando chega em casa:
“Na empresa me valorizam muito mesmo, o aumento vai ser
bem modesto, mas ganhei aquela promoção que me batalhei
por anos. Estão orgulhosos de mim?”

Se não mentisse, o que você acha que poderia acontecer?

“E você não falou nada quando deram a promoção para


outro? Vai morrer sem ser reconhecido mesmo! Você não se
movimenta!”.

COMO QUEBRAR ESSE CICLO DE


DESCONFIANÇA E MENTIRA:

• Acolhendo os sentimentos da pessoa que erra.

• Criando em sua relação um espaço seguro para que o


erro possa ser visto como algo que faz parte da vida.

• Apoiando o outro a corrigir o seu erro.


Não há uma fórmula secreta e infalível para isso. É na
construção da sua relação de confiança com seus filhos que
você vai testando, experimentando e vendo o que faz
sentido para vocês, o que funciona para vocês...

A nossa orientação fundamental é que você observe o seu


filho e faça sempre um exercício de empatia quando achar
que ele está mentindo. Algo como:

“Eu imagino que ele está mentindo. Se está fazendo isso é


porque precisa de alguma atitude minha para se sentir
seguro e falar a verdade. Como posso fazer isso?”

E lembre-se:

“Você está mentindo, eu sei!”. Nunca vai ajudar. Você pode


obter a verdade naquela hora, mas não a confiança
necessária para o seu filho lhe contar sempre a verdade.

Agora vamos recontar as cenas iniciais, dessa vez usando a


comunicação não-violenta.

PREPARE-SE PARA DESFAZER O NÓ


Cena 1:

Criança: O meu pé está doendo.


Adulto: Será que você está tão cansado de andar que o seu
pé começou a doer por isso?
Criança: O meu pé não está doendo, mãe. É que a escola é
longe. E eu não quero mais andar. Todos os meus amigos vão
de carro!
Adulto: Filho, entendi que você não quer mais ir a pé para a
escola porque isso deixa você cansado. Quando você chegar
em casa, vamos conversar e ver o que dá para fazer:
pegarmos ônibus, algum colega te dar carona. Tudo bem?
Mas hoje precisamos chegar na sua escola, então preciso que
faça um esforço.
Criança: Eba!!! Eu vou correndo na frente!

Cena 2:

Adulto: Filha, você gosta muito de conversar durante as


aulas?
Criança: Eu gosto de conversar com a Camila!
Adulto: Eu conheci a Camila. Ela é mesmo uma menina
muito legal.
Criança: É sim!
Adulto: Sua professora me disse que essas conversas às vezes
atrapalham você na aula. Você acha que pode ser isso
mesmo?
Criança: Às vezes eu não ouço mesmo o que a professora
fala.
Adulto: Hummm... vamos conversar sobre isso?

Cena 3:

Criança: O Tobi (cachorro) sumiu com meu sapato.


Adulto: O seu sapato sumiu e você acha que foi o Tobi?
Criança: Sim. Não consigo achar!
Adulto: Vou ajudar você.

Encontram o sapato...

Adulto: Filho, você acha que existe a possibilidade de você


mesmo ter perdido o sapato e não do Tobi ter pego?
Criança: Eu perdi mesmo, pai. Só estava com medo de levar
bronca de não encontrasse. Desculpe!
EXPLICAÇÕES SOBRE AS CENAS
Vamos começar pela cena 1.

CENA 1

A criança não quer andar até a escola. Como acha que


apenas não querer andar não é motivo suficiente para ter a
sua necessidade de ir de ônibus ou carro atendida, inventa
uma mentira sobre algo que, teoricamente, poderia ser um
bom motivo para parar de andar. Afinal de contas, quem
não se comoveria com um pé machucado, não?

- O meu pé está doendo.

A ideia aqui é mostrar para a criança que você se importa


com o cansaço dela, com a falta de vontade de andar.

- Será que você está tão cansado de andar que o seu pé


começou a doer por isso?

A criança começa a sentir segurança para dizer o real


motivo. E, consequentemente, para que vocês
possam resolver a questão. Veja bem: resolver a questão.
Quando uma criança traz uma necessidade, a ideia não é
diminui-la, mas tentar atendê-la, sempre que possível.
Quando não for possível, comunicar respeitosamente
porque não pode ser daquela forma. Só assim conseguimos
sair do modelo do:

“É assim porque eu mandei e pronto”.

Para o...

“Eu escuto você e, por isso, sei do que precisa”.

Mais segura, a criança fala a verdade...

- O meu pé não está doendo, mãe. É que a escola é longe. E


eu não quero mais andar. Todos os meus amigos vão de
carro!

O primeiro ímpeto talvez seja responder algo como: “Se a


gente tivesse carro, você também ia. Agora anda!”. Mas a
proposta aqui é outra: é entender e aceitar que o seu filho
pode, sim, não ter vontade de andar.

E que se houver uma solução para isso, vocês encontrarão.

- Filho, entendi que você não quer mais ir a pé para a escola


porque isso deixa você cansado. Quando você chegar em
casa, vamos conversar e ver o que dá para fazer: pegarmos
ônibus, algum colega te dar carona. Tudo bem? Mas hoje
precisamos chegar na sua escola, então preciso que faça um
esforço.

Assim...

O pé logo para de doer.

- Eba!!! Eu vou correndo na frente!


CENA 2

Na cena 2, a mãe recebeu uma queixa da filha. Precisa


conversar sobre isso com ela, sem gerar medo, sem que a
criança se sinta atacada, diminuída. A melhor forma de
abordar é... perguntar:

- Filha, você gosta muito de conversar durante as aulas?

Se a criança se sentir segura, vai responder a verdade.

- Eu gosto de conversar com a Camila!

Quando ela responder, a proposta é não dizer o “Ahá!!!


Então a senhorita passa a aula inteira conversando com a
Camila, sua espertinha!”. E sim fazer um exercício de
empatia: quem nunca deixou de prestar atenção na aula
porque tinha outra coisa que parecia mais interessante para
fazer naquela hora? Pois é. Acontece.

- Eu conheci a Camila. Ela é mesmo uma menina muito


legal.

Mas o problema precisa ser falado...


- Sua professora me disse que essas conversas às vezes
atrapalham você na aula.

Perguntar se a criança vê a situação da mesma forma que a


professora também é bastante respeitoso:

- Você acha que pode ser isso mesmo?

- Às vezes eu não ouço mesmo o que a professora fala.

A partir daí uma conversa franca, com as duas partes


“desarmadas” poderá começar.

- Hummm... vamos conversar sobre isso?

CENA 3

Na cena 3...

A criança não consegue admitir a sua própria dificuldade e


coloca a culpa em outra pessoa (nesse caso, no pobre do
cachorro!).

- O Tobi (cachorro) sumiu com meu sapato.


Se o adulto logo percebe que há uma mentira ali, o ideal é
focar apenas no problema que precisa ser resolvido.

- O seu sapato sumiu?

- Não consigo achar!

E apoiar a criança na solução do problema...

- Vou ajudar você.

Com o problema resolvido, a criança estará mais receptiva


ao diálogo. Com o apoio que recebeu, se sentirá mais
segura para admitir as suas dificuldades e pedir ajuda.

- Filho, você acha que existe a possibilidade de você mesmo


ter perdido o sapato e não do Tobi ter pego?

- Eu perdi mesmo, pai. Só estava com medo de levar bronca


de não encontrasse. Eu sempre perco as minhas coisas!

PARA AJUDAR
Para você treinar a sua habilidade de criar um ambiente
seguro no qual o seu filho se sinta confortável para dizer a
verdade, vamos sugerir uma atividade.

Pegue o mesmo caderno que usou para a atividade do nó


anterior e tente pensar nas 3 últimas vezes que o seu filho
mentiu. Relembre os detalhes e se pergunte:

• Quais eram os sentimentos dele, naquele momento?


• Como você pensa que poderia acolher esses sentimentos
para que ele se sentisse confortável para dizer a
verdade?

E por último, pergunte-se:

Como posso criar um ambiente no qual sempre possamos


falar sobre tudo uns com os outros?

A resposta certamente incluirá repensar o papel das


punições. Para você aprofundar a sua análise sobre isso, o
próximo nó falará sobre as ameaças que fazemos. E, claro,
alternativas a elas.

Até lá!

Aula 03: O que fazer quando a


criança se recusa a fazer algo que
realmente precisa ser feito

O QUE FAZER QUANDO A CRIANÇA


SE RECUSA A FAZER ALGO QUE
REALMENTE PRECISA SER FEITO
Num dia típico qualquer...
Cena 1:

Adulto: Se você não descer daí agora, vai levar um tapa!


Criança cai no chão.
Adulto: Eu avisei!

Cena 2:

Adulto: Se você não fizer o dever de casa, não vai brincar lá


fora.
Criança: Mas mãe!
Adulto: Sem mas!

Cena 3:

Criança: Eu não vou tomar banho!


Adulto: Se não tomar banho, vai ficar de castigo!

Agora responda: O que as três cenas têm em comum?

Uma criança sendo ameaçada para fazer algo que precisa


ser feito. E, obviamente, um adulto que não sabe agir
diferente para ser atendido. Certo?
Nós, adultos, somos responsáveis pelas crianças. E
naturalmente quando elas não se mostram cooperativas
para o que precisa ser feito para elas estarem seguras e
saudáveis, repetimos um padrão que aprendemos desde
cedo: o de ameaçarmos para sermos atendidos
prontamente. Até hoje somos movidos por ameaças. Pense
no seguinte:

Você sempre paga as suas contas sempre em dia para evitar


os juros ou porque é um valor seu realizar pagamentos no
prazo? Isso significa pensar no seguinte: se os juros não
existissem, você continuaria a pagá-las no mesmo dia, todo
mês, até naquele que você fez uma super compra extra?

Você sempre dirige na velocidade permitida da via para


cuidar de si mesmo e das pessoas ao seu redor, evitando
acidentes ou para evitar levar uma multa de trânsito? Isso
significa pensar no seguinte: se as multas não existissem,
você avalia que sempre conseguiria dirigir numa velocidade
segura, mesmo quando estivesse atrasado para pegar as
crianças na escola?

É claro que pagar contas em dia ou dirigir de forma segura


podem ser valores para você. Mas o que quero dizer aqui é
que se fôssemos educados para nos responsabilizarmos
pelas coisas por vermos sentido e valor em nos
responsabilizarmos não precisaríamos de tantas punições.
Percebe?

E é essa reflexão que quero trazer para a criação dos seus


filhos: quando eles fazem as coisas porque são ameaçados
podem até estar fazendo essas coisas enquanto estão sob
vigilância, digamos assim, mas será que estão aprendendo,
de fato, a se responsabilizar pelo que precisam fazer?

A comunicação não-violenta nos oferece uma outra opção


para as crianças entenderem e fazerem o que precisa ser
feito.

Vamos recontar as cenas, agora levando isso em


consideração.

PREPARE-SE PARA DESFAZER O NÓ


Cena 1:

Adulto: Esse lugar é alto demais! Estou preocupada. Desça ou


segure a minha mão.
Criança se apoia na sua mão.
Cena 2:

Adulto: O dever de casa ainda não foi feito.


Criança: Vou fazer depois.
Adulto: Ok. Antes ou depois do jantar? Porque se fizer depois
pode não dar tempo de você brincar lá fora antes de dormir.
Criança: Vou fazer logo, então!

Cena 3:

Criança: Eu não vou tomar banho!


Adulto: Todo mundo precisa tomar banho todos os dias para
não ficar sujo e nem doente.
Criança: Eu não me importo de ficar sujo!
Adulto: Mas eu me importo. Não quero que fique doente e
nem suje o lençol. Você ajuda a mamãe a mantê-los limpos?
Criança: Não!!!
Adulto: Querido, banho (apontando para o banheiro).

EXPLICAÇÕES SOBRE AS CENAS


CENA 1

Na cena 1...
• Damos informação à criança sobre o perigo, apenas
descrevendo.

• Falamos sobre como nos sentimos.

• Oferecemos apoio.

- Esse lugar é alto demais! Estou preocupada. Desça ou


segure a minha mão.

Se até aqui fizemos mais exercícios nos quais nós


exercitamos a empatia para gerar conexão, aqui damos
também ao nosso filho a oportunidade de movimentar a
sua empatia conosco, de nos acolher.

- Estou preocupada.

Quando você diz a frase seguinte: “Desça ou segure na


minha mão”, você dá ao seu filho uma instrução de como
acolher a sua preocupação e...

A criança se apoia na sua mão.

Percebe a mudança gritante na forma de se relacionar?


Antes você simplesmente ameaça a criança para que ela
faça o que você precisa. Aqui você contribui para a criança
entender que você, enquanto responsável por ela, fará
alguns pedidos que garantam que está cuidando bem dela.

Vou tentar ser mais clara, com mais exemplos. Pense que o
seu filho não está com frio, embora esteja ventando bem
forte. Você insiste para ele colocar o casaco. Ele recusa. E
um desentendimento começa. Para resolvê-lo, comumente
você usa uma ameaça: “Coloque o casaco ou vamos para a
casa”.

Agora pense no seguinte: quando você soluciona esse


problema está interagindo com uma necessidade sua, que é
a de cuidar bem do seu filho, de garantir que a saúde dele
seja preservada, que ele não adoeça. E está punindo ele por
não atender uma necessidade sua.

Exatamente. Essa é uma necessidade sua. A necessidade do


seu filho, naquele momento, é apenas brincar e usar o
casaco se sentir frio. Ele não está com frio, logo não quer
usar o casaco. Para se comunicar de forma não-violenta,
então, nossa orientação é clara: não perca de vista que você
deve falar sobre uma necessidade sua!

É o desafio de se colocar de forma vulnerável diante do


filho. O responsável por ele também sente medo,
preocupação, culpa, também precisa dizer não às vezes
simplesmente por não ter certeza se dizer sim o colocaria
em risco. E por aí vai.

No caso do casaco, então, a proposta é comunicar a sua


necessidade:

“Filho, eu sei que você não está com frio agora, mas preciso
que coloque o casaco porque não estou conseguindo relaxar
pensando que esse vento todo pode fazer você ficar gripado.
Eu quero muito relaxar com meus amigos. Pode colocar o
casaco?”

Assim você estimula a cooperação. E o melhor: não precisa


ameaçar o seu filho para que ele te atenda!

CENA 2

Na cena 2, há um trabalho de casa não feito, motivo que


costuma levar a muito desentendimento e ameaças para
que a tarefa seja cumprida. Nossa orientação para
comunicar às crianças que suas responsabilidades precisam
ser feitas e ainda não foram é apenas descrever o fato:

- O dever de casa ainda não foi feito.

Note bem: apenas descrever, sem julgamentos. Diga


simplesmente o que você está vendo.

A criança pode nesse momento já ser cooperativa e fazer o


que precisa ser feito ou... protelar.

- Vou fazer depois.

E aí você diz para a gente: “Ô, pessoal da TeApoio, ela não


vai fazer depois, eu já vi esse filme”.

Nós também. Então, a ideia é você concordar e dar duas (ou


mais!) opções para a criança já se apropriar de escolhas,
mas fazer o que precisa ser feito. Ajude a ela a pensar em
qual decisão pode ser melhor.
- Ok. Antes ou depois do jantar? Porque se fizer depois pode
não dar tempo de você brincar lá fora antes de dormir.

Assim, ela decide:

- Vou fazer logo, então!

Movimente aqui muita empatia e respeito ao seu filho.


Estamos dizendo isso pela seguinte razão: essa não é uma
proposta de manipulação. A ideia não é você encontrar mil
formas de fazer a criança atender você o tempo inteiro, mas
sim de você se conectar com ela e trabalhar valores
importantes como responsabilidade e autonomia.

CENA 3

A cena 3 traz a grande encrenca que a hora do banho às


vezes se torna.

- Eu não vou tomar banho!

Quando a criança se negar a fazer algo que precisa ser feito,


uma das formas de você interagir é dando informação.
Talvez ela ainda não entenda tão bem porque precisa tomar
banho todos os dias, mesmo quando não tem vontade.
- Todo mundo precisa tomar banho todos os dias para não
ficar sujo e nem doente.

Isso pode ser suficiente. Ou não...

- Eu não me importo de ficar sujo!

Nesse momento, é importante que você pratique o que


falamos lá na cena 1: diga ao seu filho porque você precisa
que ele tome banho. Ter o seu filho limpinho e de banho
tomado é uma necessidade sua. E faça um pedido.

- Mas eu me importo. Não quero que fique doente e nem suje


o lençol. Você ajuda a mamãe a mantê-los limpos?

Isso costuma funcionar muito bem para estimular a


cooperação, mas nem sempre. A criança pode
simplesmente dizer...

- Não!!!

E aí, eu faço o quê? Você mantém o seu pedido usando


menos palavras possíveis. A ideia é você continuar a se
comunicar de forma não-violenta e ser assertivo. Uma coisa
não exclui a outra.

- Querido, banho (apontando para o banheiro)

PARA AJUDAR
Como de costume, quero dizer a você o que achamos
fundamental para que você consiga colocar em prática o
que acabou de aprender aqui.
É importante que você entenda quais são as suas
necessidades, enquanto responsável por uma criança e
perceba que comumente quando um conflito de interesses
começa a aparecer você precisa expressar a SUA
necessidade e ajudar o seu filho a ter empatia por você, a
entender como se sente. E para que ele consiga fazer isso,
você precisa dizer a ele como se sente e do que precisa.

Vamos pegar o caderno que você separou para as


atividades? Maravilha.

Pense nas 3 situações de conflito nas quais você costuma


ameaçar o seu filho (bater, colocar de castigo etc). Agora
responda:

Como eu me sinto quando ele faz isso? Do que eu preciso?

E por último:

Como eu posso comunicar isso a ele?


Aula 04: O que fazer quando você
estiver decepcionado(a) com o
comportamento da criança

O QUE FAZER QUANDO VOCÊ


ESTIVER DECEPCIONADO(A) COM O
COMPORTAMENTO DA CRIANÇA
Como de costume, lá vamos nós para 3 cenas cotidianas.

Cena 1:

Adulto: Eu não acredito que você quebrou meu batom


preferido!
Criança: Foi sem querer, mãe.
Adulto: Estou muito aborrecida com você!

Cena 2:

Adulto: Recebi o seu boletim hoje. Estou muito desapontado!


Criança: Mas eu fui bem em matemática.
Adulto: Só em matemática mesmo. Não é para isso que me
mato de trabalhar para pagar escola para você.

Cena 3:

Adulto: Eu não esperava isso de você.


Criança: Ele me provocou!
Adulto: Não criei filho para ficar brigando na rua, batendo
nos outros.
Agora responda: O que as três cenas têm em comum?

As cenas têm em comum um adulto desapontado. Algo


que, naturalmente, vai acontecer em qualquer relação entre
pais e filhos.

Você se dedica. Espera os resultados. Eles não chegam.


Você se desaponta. Você comunica isso à criança.

Maravilha. Sentimentos realmente precisam ser


identificados e comunicados, mas vamos refletir juntos
sobre a sua própria experiência quando está do lado
oposto, ou seja, daquele que desapontou alguém.

Você já deve ter ouvido frases como:

• Seu chefe diz: “O seu desempenho ficou muito aquém


do esperado”.

• Seu(ua) parceiro(a) diz: “Você não é mais como era


antes”.

• Sua mãe diz: “Você não fez direito, por isso não ficou
bom”.

• Seu amigo diz: “Francamente... você me decepcionou”.

E quais são os pensamentos mais automáticos que você


tem quando ouve frases como essas?

• “Eu sou mesmo um fracasso”.

• “Nunca vou conseguir”.

• “Sou mesmo uma grande decepção”.


São frases que costumam encabeçar o topo das listas.

Agora pense: o que poderia ajudar você a não se sentir


dessa forma? Vamos ver se você percebe a diferença entre a
forma de comunicação anterior e essa aqui:

• Seu chefe diz: “O seu desempenho ficou muito aquém


do esperado. Gostaria que você fizesse um curso de
reciclagem porque considero você um bom profissional,
imagino que só falta mesmo se atualizar sobre novas
tendências para o seu desempenho melhorar muito”.

• Seu(ua) parceiro(a) diz: “Você não é mais como era


antes. Sinto falta de tirarmos um tempo só para a gente
porque eu me sentia mais cuidada e amada quando
tínhamos mais tempo para conversarmos e estarmos
juntos”.

• Sua mãe diz: “Você não fez direito, por isso não ficou
bom. Vamos refazer isso juntas?”.

• Seu amigo diz: “Francamente... você me decepcionou.


Da próxima vez não desista. Eu sei que você pode
conseguir. E se não conseguir sozinho, me pede ajuda.
Só não desista, por favor”.
O que tem de diferente?

A comunicação não para na expressão do sentimento de


desapontamento, de decepção. É uma comunicação bem
mais amorosa e saudável porque oferece ao outro
caminhos e escolhas para que ele possa corrigir o que não
está tão bom, sob o nosso ponto de vista.

Os pensamentos automáticos, nesse caso, costumam ser


outros:

• “Ele acredita em mim, vou melhorar”.

• “Eu posso fazer isso para consertar”.

• “Ufa, que bom. Nem tudo está perdido”.

Essa forma de comunicação gera ação e não culpa.

Vamos experimentar com nossas crianças? Vejamos as


cenas reescritas usando a comunicação não-violenta.

PREPARE-SE PARA DESFAZER O NÓ


Cena 1:
Adulto: Você quebrou meu batom preferido!
Criança: Foi sem querer, mãe.
Adulto: Estou muito aborrecida com você. Espero que
encontre um jeito de me dar um batom novo.
Criança: Não precisa me dar mesada esse mês, mãe! Nem no
outro. Quero mesmo comprar um novo batom para você.

Cena 2:

Adulto: Recebi o seu boletim hoje. As suas notas foram bem


mais baixas do que as do último bimestre.
Criança: Mas eu fui bem em matemática.
Adulto: Em matemática você foi bem, é verdade. Parabéns.
Do que você precisa para ir bem nas outras matérias tanto
quanto em matemática?
Criança: Acho que preciso estudar mais.
Adulto: Eu ficaria muito feliz se você estudasse mais. As suas
notas precisam mesmo melhorar. Você precisa de ajuda com
as tarefas de casa?
Criança: Um professor particular poderia ajudar.
Adulto: Filho, nesse momento não podemos pagar um
professor particular, pois nossas finanças com a sua educação
já estão todas comprometidas com a mensalidade da sua
escola. Você tem outra solução?
Criança: O Paulo é um dos melhores alunos da sala. Posso
pedir para ele me ajudar.
Adulto: Ótimo. Acredito em você, filho. Era só dessa ajuda
que você precisava para melhorar suas notas.
Cena 3:

Adulto: Você bateu no Iuri.


Criança: Ele me provocou!
Adulto: Você pode resolver as suas questões com diálogo.
Com violência, nunca. Eu fico muito triste quando você faz
esse tipo de escolha. Como podemos consertar isso e mostrar
para o Iuri que aqui em casa não apoiamos violência?
Criança: Eu poderia pedir desculpas. Mas ele teria que se
desculpar também porque ele me bateu primeiro!
Adulto: Tudo bem. Parece justo. Vou ligar para a mãe dele e
vamos pedir para eles virem aqui para que vocês possam se
desculpar e conversar para resolver o que deixou vocês
irritados com diálogo.

EXPLICAÇÕES SOBRE AS CENAS


CENA 1

Na cena 1...

Quando algo nos desagrada, para buscarmos uma


comunicação não-violenta, podemos simplesmente
descrever o motivo do nosso desapontamento:
- Você quebrou meu batom preferido!

Depois, comunicar o sentimento:

- Estou muito aborrecida com você!

É muito comum quando estudamos CNV acharmos que não


podemos nos irritar, ficar aborrecidos e isso não é verdade.
Somos humanos e esses sentimentos irão nos invadir
muitas vezes.

A proposta da comunicação não-violenta é justamente


entrarmos em contato com esses sentimentos e comunicá-
los de forma que possamos resolvê-los e não apenas
extravasá-los. Por essa razão, o diálogo não termina
no “Estou muito aborrecida com você”. A mãe vai além e faz
um pedido. Dá à criança uma chance de reparar o seu erro
e ainda diz o que espera que ela faça:

- Espero que encontre um jeito de me dar um batom novo.

E aí ela tem muito mais condições de encontrar essa


solução, de reparar o seu erro.

- Não precisa me dar mesada esse mês, mãe! Nem no outro.


Quero mesmo comprar um novo batom para você.
Cuide para que o pedido que você fará à criança seja algo
que esteja ao alcance dela resolver. No exemplo que
acabamos de estudar, por exemplo, de nada adiantaria
pedir um batom novo para uma criança menor, que não
recebe mesada.

CENA 2

Na cena 2...

Descreva o que motivou o seu desapontamento, sem


julgamentos:

- Recebi o seu boletim hoje. As suas notas foram bem mais


baixas do que as do último bimestre.

(Bem diferente de: “Suas notas estão horríveis!”, concorda?)

A criança tende a se justificar.

- Mas eu fui bem em matemática.

Acolha a justificativa. Pense que para ela esse momento


também é difícil e ela está encontrando razões para
justificar que apesar das notas baixas ainda consegue fazer
algo bem.

- Em matemática você foi bem, é verdade. Parabéns.

E prossiga partindo para a solução do problema. Perceba


que não é você quem soluciona. Você entrega a questão
para o seu filho refletir e fica por ali, apoiando. Essa é a
melhor coisa que você pode fazer por ele: deixar que ele
pense em como pode corrigir seus erros. Ou melhor:
entender que mesmo quando as coisas vão mal, ele pode ir
em busca de melhorias.

- Do que você precisa para ir bem nas outras matérias tanto


quanto em matemática?

É bem melhor que a criança mesmo dê a solução de


estudar. Se você diz a ela: “Você precisa estudar” essa vira
uma imposição e não uma solução que ela mesma
encontrou para o problema.

- Acho que preciso estudar mais.

Incentive. Diga quais seriam os sentimentos envolvidos se a


criança buscasse aquela solução.
- Eu ficaria muito feliz se você estudasse mais. As suas notas
precisam mesmo melhorar.

Dê apoio.

- Você precisa de ajuda com as tarefas de casa?


- Um professor particular poderia ajudar.

As soluções dadas pelas crianças nem sempre nos atendem.


Essa costuma ser a parte que os pais assumem o controle e
dizem algo como: “sua escola já é cara demais. Você
precisará estudar sozinho”, desconsiderando que a criança é
capaz de encontrar uma outra solução na qual todos
possam ser atendidos e que quanto mais ela pratica essa
forma de comunicação, mais ela se sente segura e
empoderada para... solucionar.

Persista, então, no seu posicionamento de deixar a criança


protagonizar a solução do problema:

- Filho, nesse momento não podemos pagar um professor


particular, pois nossas finanças com a sua educação já estão
todas comprometidas com a mensalidade da sua escola.
Você tem outra solução?

E a solução vem:

- O Paulo é um dos melhores alunos da sala. Posso pedir


para ele me ajudar.

Incentive. Incentivos sinceros nunca são demais.

- Ótimo. Acredito em você, filho. Era só dessa ajuda que você


precisava para melhorar suas notas.
CENA 3

Na cena 3...

A mesma proposta: descrever o que houve, sem


julgamentos.

- Você bateu no Iuri.

(Bem diferente de: “Você, como bom encrenqueiro que é, se


meteu em mais uma briga!”)

A criança vai interagir e, naturalmente, dar uma justificativa.

- Ele me provocou!

Você acolhe a justificativa e dá uma informação, coloca um


limite.

- Deve ter sido muito ruim ter sido provocado por ele. Mas
você pode resolver as suas questões com diálogo. Com
violência, nunca.

Fale sobre os seus sentimentos e conversem sobre uma


solução.

- Eu fico muito triste quando você faz esse tipo de escolha.


Como podemos consertar isso e mostrar para o Iuri que aqui
em casa não apoiamos violência?

A criança se posicionará. Às vezes, colocará


algumas “regras” para fazer a sua parte. É natural... ela está
encontrando as necessidades dela para se sentir satisfeita
com a solução do problema também.
- Eu poderia pedir desculpas. Mas ele teria que se desculpar
também porque ele me bateu primeiro!

Dê apoio.

- Tudo bem. Parece justo. Vou ligar para a mãe dele e vamos
pedir para eles virem aqui para que vocês possam se
desculpar e conversar para resolver o que deixou vocês
irritados com diálogo.

Perceberam que essa aula não só falou um pouco sobre


como comunicar os seus sentimentos, mas também sobre
alternativas a castigos?

Não parece bem mais eficaz, por exemplo, promover uma


conversa entre duas crianças que brigaram do que
simplesmente mandá-las para o quarto?

Experimente.

PARA AJUDAR
Pense nas últimas vezes em que você ficou desapontado (a)
com seu filho. Relembre como você reagiu e o que disse a
ele. Escreva. Em seguida, reescreva, agora sob o ponto de
vista do que tratamos aqui.

Leia as duas formas de comunicação em voz alta. Perceba a


diferença. E celebre essa nova forma de se relacionar.

Aula 05: O que fazer quando a


criança parece desafiar você
O QUE FAZER QUANDO A CRIANÇA
PARECE DESAFIAR VOCÊ
Prepare-se para as 3 cenas cotidianas. Vamos lá.

Cena 1:

Adulto: Você não consegue fazer isso.


Criança: Consigo sim.
Adulto: Vai brincar com outra coisa. Agora.

Cena 2:

Adulto: Eu sei que você prefere essa roupa, mas a outra fica
melhor.
Criança: Ah mãe...
Adulto: Anda logo. Vista a roupa que escolhi porque não
podemos nos atrasar.

Cena 3:

Adulto: Vai fazer a lição de casa. Agora!


Criança: Eu quero brincar!
Adulto: Primeiro a obrigação.

Agora responda: O que as três cenas têm em comum?

Dois seres humanos com desejos ou percepções diferentes


de algo. Por acaso, um desses seres humanos é adulto e o
outro, criança. Um, então, manda. Ao outro resta obedecer.
E por essa razão, eu já adianto que o nosso “papo” de agora
girará em torno do tema RESPEITO.

Quando você era criança, especialmente, o que foi ensinado


a você sobre respeito? Será que disseram a você coisas
como:

• É necessário impor respeito.

• Criança tem que obedecer para mostrar que tem


respeito pelos mais velhos.

• Contradizer um adulto é uma baita falta de respeito.

• Adultos sabem o que é melhor para crianças.

• Criança não tem querer.

Provavelmente sim. E qual é o impacto dessas crenças


enraizadas em você? É em torno da busca dessa resposta
que as suas reflexões sobre essa aula deverão girar.

Pense em tudo o que você faz para ser respeitado no seu


trabalho, na sua família, no trânsito, no comércio, nos
grupos que faz parte. O quanto de violência você
movimenta para conseguir esse tal de respeito?
“Na sua origem em latim, a palavra respeito significava
"olhar outra vez". Assim, algo que merece um segundo olhar
é algo digno de respeito. Por esse motivo, respeito também
pode ser uma forma de veneração, de prestar culto ou fazer
uma homenagem a alguém, como indica a expressão
"apresentar os seus respeitos".

Como será que saímos de uma origem tão bonita e


significativa para esse respeito que só se consegue quando
exerço poder sobre alguém?

E por falar em poder...

Antes de continuarmos eu quero que você faça uma


reflexão sobre a sua família. Se vocês fossem uma empresa,
haveria hierarquia na qual quem está no poder dita as
regras e um grupo somente as executa?

Se você respondeu que não, maravilha. Se respondeu que


sim, eu quero convidar você a perceber, sentir e construir a
sua base familiar de outra forma, se isso fizer tanto sentido
para você quanto faz para mim até o final dessa aula, ok?

E para começarmos a fazer isso...


PREPARE-SE PARA DESFAZER O NÓ
Cena 1:

Adulto: Posso ajudar você a fazer isso? Parece difícil.


Criança: Não. Eu consigo.
Adulto: Tudo bem. Vou ficar aqui perto, se precisar de mim.
Criança: Não vou precisar.
Adulto: Tá bom. Só vou ficar porque nesse momento eu é que
me sinto preocupado de você se machucar e ficar aqui me
deixa mais tranquilo.
Criança: Ah, tudo bem.

Cena 2:

Adulto: Essa é a sua roupa preferida, eu sei. Mas está


ventando e você precisa vestir algo mais quente.
Criança: Ah mãe...eu queria ir com ela.
Adulto: Você poderá usá-la num dia de sol. Mas agora pode
escolher qualquer outra que tenha mangas compridas. Qual
vai ser?
Criança: A vermelha!

Cena 3:

Adulto: Filho, você vai fazer a lição de casa agora ou depois


do jantar?
Criança: Agora eu vou brincar, mãe! Eu estudei o dia inteiro!
Adulto: Tudo bem. Depois do jantar, você estará mais
relaxado e feliz para fazer a lição.
EXPLICAÇÕES SOBRE AS CENAS
CENA 1

Na cena 1...

O adulto percebe que a criança está com dificuldade e


reconhece isso, se disponibilizando a ajudar.

- “Posso ajudar você a fazer isso? Parece difícil”.

Isso é importante porque comumente falamos para as


crianças coisas como: “isso é moleza para você”, “você vai
conseguir”, “você é o melhor nisso” e coisas do tipo, com a
genuína intenção de animá-las e estimulá-las a darem o seu
melhor, mas quero ressaltar o quanto isso pode contribuir
para a criança ficar ansiosa e não saber avaliar bem o grau
de dificuldade do que está fazendo.

Se ela vai tomar uma injeção, por exemplo, é importante


dizer a ela que vai doer, que pode ser que ela tenha
vontade de chorar, mas que vai passar rapidinho (o
momento da injeção, a dor somente ela, pessoa única que
é, poderá avaliar) e que você estará lá para apoiá-la. Dizer
que ela é uma criança corajosa e não vai doer nada cria
uma expectativa irreal, percebe? A criança conclui que
tomar injeção não deveria ser algo tão difícil, mas para ela é
e que não consegue atender à expectativa dos pais de ser
corajosa.

Mas voltando para cena... ao reconhecer que aquela


atividade é difícil e se colocar à disposição, a criança poderá
responder sim ou não. E muitas vezes, ela vai dizer...

- “Eu consigo”.

E isso é maravilhoso. Estamos estimulando a autonomia!

Se a criança estiver em perigo de alguma forma, podemos


oferecer nosso apoio...

- Tudo bem. Vou ficar aqui perto, se precisar de mim.

E...

Ela pode recusar! (Risos...)

- Não vou precisar.

Nesse momento, precisamos entender que a criança se


sente pronta e avaliarmos se ela pode lidar com aquela
experiência sozinha ou não. Se avaliarmos que não, é
bastante respeitoso não impor a nossa presença, mas sim
contarmos à criança os motivos que nos fazem ficar por ali.

- Tá bom. Só vou ficar porque nesse momento eu é que me


sinto preocupado de você se machucar e ficar aqui me deixa
mais tranquilo.

A tendência é a criança acolher você.


- Ah, tudo bem.

CENA 2

Na cena 2...

Temos o já conhecido conflito da escolha da roupa. Para


não precisar impor a sua escolha, é importante que você
mostre para a criança que você entende que ela gostaria de
usar aquela roupa, mas que ela não é adequada para o
momento.

- Essa é a sua roupa preferida, eu sei. Mas está ventando e


você precisa vestir algo mais quente.

E mostrar que, ainda assim, ela tem opções. Ela pode


decidir, desde que consiga escolher algo adequado ao
clima.

- Você poderá usá-la num dia de sol. Mas agora pode


escolher qualquer outra que tenha mangas compridas. Qual
vai ser?

E ela escolhe...
- A vermelha!

Essa questão da escolha de um conjunto de opções


possíveis é importante no que diz respeito a quebrarmos
esse paradigma de que a criança tem que nos obedecer. E
também para escaparmos da permissividade. Isso significa
dizer que a criança pode escolher, mas que nós é que
temos o papel de dar a ela um conjunto de opções que
sejam seguras para ela. Não se trata de apenas dizer o que
a criança deve vestir, mas de orientá-la amorosamente nas
escolhas.

CENA 3

Na cena 3...

Trazemos novamente a questão da escolha. Não se trata da


criança escolher entre fazer a lição ou não, mas sim do
momento em que ela se sentirá melhor para fazer isso.

- Filho, você vai fazer a lição de casa agora ou depois do


jantar?

Ao ter opções, a criança nos aponta as suas necessidades.


No exemplo da cena, dá para movimentar bastante empatia
pela criança que passou o dia no colégio pensando em
brincar com seu brinquedo preferido quando chegasse em
casa. Fazer mais tarefas naquele momento poderia
sobrecarregá-lo.

- Agora eu vou brincar, mãe! Eu estudei o dia inteiro!

Mostre que você entende as necessidades do seu filho.

- Tudo bem. Depois do jantar, você estará mais relaxado e


feliz para fazer a lição.

Agora vamos voltar para as questões que abriram essa aula.


Será que agora você consegue experimentar uma outra
forma de ser respeitado que não se apoie numa estrutura
de poder, mas sim no diálogo, na empatia e na autonomia?

Tomara que sim!

Aula 06: O que fazer para educar


sem violência - Um resumo geral

O QUE FAZER PARA EDUCAR


SEM VIOLÊNCIA: UM RESUMO
GERAL
Você acabou de estudar o que consideramos importante
para você passar pelas situações cotidianas educando as
crianças sem violência. Mas sabemos que há muitos outros
desafios envolvidos quando queremos acolher e nos
conectar com os filhos. Pensando nisso preparamos essa
aula, na qual apresentaremos algumas ferramentas que
serão úteis para nos relacionarmos de forma não-violenta
com as crianças em todas as situações cotidianas.

Ressaltamos que a nossa intenção não é fornecer uma


“receita de bolo”, pois nesse ponto do seu estudo você já
deve ter percebido que a comunicação não-violenta para
nós é uma filosofia de vida, um modo de se relacionar
consigo mesmo, com os outros e com o mundo. Ainda
assim, acreditamos no papel didático de apresentar técnicas
que nos permitam transitar entre o paradigma de
comunicação que conhecemos e o que estamos
construindo juntos.

E PODEMOS RESUMIR TUDO ISSO COM...


Os quatro componentes da Comunicação não-violenta, que
são:

• Observação

• Sentimento

• Necessidades

• Pedido

Observe o que está acontecendo, mas sem julgar ou avaliar.


A ideia é você apenas pensar no seguinte:

“O que me agrada ou desagrada nisso que estou


observando?”
Quando chegar a essa resposta, identifique quais são os
sentimentos envolvidos em relação ao que está observando.
Depois, pense assim:

“Eu sinto isso porque preciso de algo que não estou tendo”.

E pergunte-se:

“Do que eu preciso?”.

Por fim, transforme essa necessidade num pedido.

Exemplo:

Quando grito com você, filho, me sinto péssima e muito


frustrada porque essa não é a forma como quero me
relacionar com ele. Você pode me desculpar?

Ou...

Filha, quando você não escova os dentes eu fico


preocupada porque cáries são muito dolorosas e quero
garantir que você não as tenha. Pode ir escová-los agora,
por favor?
E se ao chegar até aqui tudo está parecendo muito bonito,
mas bem difícil de aplicar no dia a dia, vamos cuidar disso
no próximo módulo trazendo algumas histórias inspiradoras
de pessoas como você.

Até lá!

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