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Atividade larvicida de Operculina macrocarpa sobre Haemonchus contortus

Natanael Aguiar Braga Medeiros1, Gabriela Maria Schwinden2, Iara Tersia Freitas
Macedo3, José Vilemar de Araújo Filho4, Weibson Paz Pinheiro André5, Lorena Mayana
Beserra de Oliveira6

¹Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: gabriela.schwinden@hotmail.com


2
Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: negreirosnatan@gmail.com
3
Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: iaratersia@gmail.com
4
Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: vilemar_filho@hotmail.com
5
Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: weibsonpaz@hotmail.com
6
Universidade Estadual do Ceará, Faculdade de Veterinária, e-mail: lorena.mayana@uece.br

RESUMO. Para avaliar a atividade larvicida de Operculina hamiltonii sobre


Haemonchus contortus foram obtidos o extrato etanólico do farelo do seu tubérculo e
a sua fração metanólica. Os metabólitos secundários presentes nesses produtos foram
determinados por testes fitoquímicos. Posteriormente, os produtos foram avaliados no
teste de desenvolvimento larvar de H. contortus. A prospecção fitoquímica indicou
taninos condensados, alcaloides e saponinas no EEOM e saponinas e alcaloides na
fração. O efeito larvicida dos dois produtos foi dose-dependente. As CE50 do EEOM
e da sua fração metanólica foram 46,9 e 226,66 mg/mL, respectivamente. Os
resultados obtidos não foram promissores, pois foi necessária uma alta concentração
dessas substâncias para a atividade larvicida ser observada.
Palavras-chave: Fitoterapia. Anti-helmíntico. Fracionamento bio-guiado.

1. INTRODUÇÃO
O parasitismo por nematoides gastrintestinais (NGI) é um dos maiores problemas
sanitários da ovinocaprinocultura, causando grandes perdas econômicas, baixa produtividade e
até a morte dos animais (KATIKI et al., 2019). Os ovinos e caprinos podem albergar diversos
NGI, como Haemonchus contortus (FONSECA et al., 2013), um nematoide de alta prevalência
em pequenos ruminantes. Esse parasito possui elevada patogenicidade devido ao seu hábito
hematófago, causando lesões na mucosa do abomaso e anemia (PINHEIRO et al., 2000).
O controle das infecções por NGI baseia-se na administração de anti-helmínticos
sintéticos (MELO et al., 2015). Contudo, a falta de orientação adequada e a facilidade de acesso
aos anti-helmínticos levaram ao uso indiscriminado desses medicamentos. Consequentemente,
os rebanhos de ovinos e caprinos apresentam populações de parasitos resistentes à maioria dos
compostos químicos disponíveis (ALBUQUERQUE et al., 2017). Por esse motivo, métodos de
controle eficazes e ambientalmente aceitáveis devem ser pesquisados.
O uso de produtos derivados de plantas como extratos, óleos essenciais e
fitoconstituintes tem se destacado. Isso se deve a imensa biodiversidade vegetal e, portanto, de
substâncias passíveis de serem testadas (ALI-SHTAYEH et al., 2016). Espécies do gênero
Operculina (Convolvulaceae) estão sendo alvo de interesse em estudos etnobotânicos como
possíveis recursos terapêuticos para o tratamento de doenças parasitárias (BITU et al., 2017).
As espécies Operculina hamiltoniii e Operculina macrocarpa estão amplamente distribuídas
no nordeste brasileiro, são conhecidas popularmente como batata-de-purga e utilizadas como
laxativas, purgativas, anti-inflamatórias e no tratamento de doenças reumáticas (AGRA et al.,
2007). Experimentos realizados in vitro e in vivo indicaram que o farelo do tubérculo de O.
hamiltoniii e seu extrato etanólico possuem atividade anti-helmíntica sobre nematoides
gastrintestinais de pequenos ruminantes (ALMEIDA et al., 2007; GOMES et al., 2010).
Contudo, o potencial anti-helmíntico de O. macrocarpa ainda não foi determinado. Por esse
motivo, o objetivo desse trabalho foi avaliar o efeito de O. macrocarpa sobre H. contortus.

2. METODOLOGIA
2.1. Coleta e identificação do material vegetal
Partes aéreas de Operculina spp. foram coletadas no município de Quixadá, Ceará, para
confecção de exsicata e posterior identificação no Herbário Prisco Bezerra da Universidade
Federal do Ceará. Após a identificação botânica, o tubérculo da batata de purga foi coletado,
lavado com água corrente, triturado e pesado.
2.2.Obtenção e fracionamento do extrato vegetal
Um total de 4.336,5 gramas do farelo do tubérculo da batata de purga foi imerso em
etanol (70%), deixando-se em repouso por 7 dias. Em seguida, foi realizada filtração e o etanol
foi eliminado por rotaevaporação obtendo-se o extrato etanólico. Esse extrato foi submetido ao
fracionamento em coluna cromatográfica de sílica gel utilizando hexano, clorofórmio, acetato
de etila e metanol. Os solventes foram eliminados por rotaevaporação.
2.3.Análise fitoquímica
A análise fitoquímica foi realizada para determinar as principais classes de metabólitos
secundários presentes no extrato etanólico do farelo do tubérculo da batata de purga e nas suas
frações (MATOS, 2009). Estes testes basearam-se na observação visual da alteração da
coloração e formação de precipitado após a adição de reagentes específicos.
2.4.Teste de desenvolvimento larvar (TDL)
O projeto foi aprovado pelo CEUA/UECE (Protocolo: 3915755/2018). Foram coletados
20-30 g de fezes de um ovino portador de infecção monoespecífica por H. contortus para
recuperação dos ovos desse nematoide (HUBERT & KERBOEUF, 1992). Os ovos foram
incubados por 24 h a 37ºC para obtenção de larvas de primeiro estágio (L1). Alíquotas de 500
μl, contendo aproximadamente 250 L1, foram incubadas durante 6 dias com 500 μl de soluções
de diferentes concentrações do extrato etanólico do farelo do tubérculo de Operculina spp. ou
das suas frações, em recipientes contendo 1 g de fezes do ovino livre de nematoides
gastrintestinais. As concentrações testadas foram 64; 32; 16; 8 e 4 mg/mL. Após esse período,
as larvas de terceiro estágio (L3) foram recuperadas e contabilizadas ao microscópio. O controle
negativo foi constituído pelos diluentes do extrato ou das frações e o controle positivo foi a
ivermectina (0,008 mg/mL). Foram realizadas 2 repetições com 5 réplicas para cada tratamento.
2.5. Análise Estatística
Os resultados foram expressos em % de eficácia da inibição do desenvolvimento larvar.
Os resultados foram submetidos à ANOVA e comparados pelo teste Tukey (p<0,05) no
programa Graph Pad Prism 6.0. A eficácia de cada tratamento foi calculada pela fórmula: [(L3
grupo controle negativo - L3 grupo tratado) / L3 grupo controle negativo] x 100. A concentração
efetiva para inibir 50% do desenvolvimento larvar (CE50) foi calculada no SPSS 8.0.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A identificação botânica indicou que a espécie coletada era Operculina macrocarpa. As
exsicatas foram depositadas no herbário (n° 62403). Foi obtido um total de 135 g do extrato
etanólico do farelo do tubérculo de O. macrocarpa (EEOM). O rendimento do extrato foi de
3,11%. Quanto às frações: 0,0182 g de fração hexânica (rendimento: 0,06%); 2,1935 g de fração
clorofórmica (rendimento: 7,31%); 1,0165 g de fração acetato de etila (rendimento: 3,38%) e
12,5432 g de fração metanólica (rendimento: 41,81%). O baixo rendimento das frações
hexânica, clorofórmica e acetato de etila inviabilizou a avaliação da atividade anti-helmíntica.
Dessa forma, o TDL foi realizado apenas com o EEOM e a sua fração metanólica.
A prospecção fitoquímica do EEOM revelou a presença de taninos condensados,
alcaloides e saponinas. Na prospecção fitoquímica das frações do EEOM foram obtidos os
seguintes resultados: na fração de acetato de etila foram detectados fenóis, flavonas,
flavononóis, xantonas e esteroides; na fração clorofórmica existia fenóis, flavononóis,
xantonas, flavonas, saponinas, esteroides e alcaloides; na fração metanólica foram encontrados
saponinas e alcaloides. Não foi possível realizar os testes fitoquímicos na fração hexânica
devido ao baixo rendimento desse produto vegetal. O fracionamento tem por objetivo
identificar as frações mais ativas quanto à atividade anti-helmíntica para posterior identificação
e quantificação das substâncias ativas. Muitos metabólitos secundários estão implicados nos
efeitos anti-helmínticos de plantas, tais como saponinas, alcaloides, glicosídeos, terpenos,
taninos e outros polifenóis (GITHIORI et al., 2006).
A tabela 1 apresenta o resultado do TDL. Foi possível observar que apenas as duas
maiores concentrações testadas (64 e 32 mg/mL) do EEOM apresentaram percentuais de
eficácia estatisticamente diferentes (superiores) ao do controle negativo. Entretanto, esses
percentuais também foram estatisticamente diferentes (inferiores) do controle positivo
(ivermectina). O efeito observado foi dose-dependente. A CE50 do EEOM foi 46,9 mg/mL.
Os resultados do TDL realizado com a fração metanólica do EEOM demonstraram que
apenas a maior concentração testada (64 mg/mL) apresentou efeito larvicida estatisticamente
diferente (superior) ao do controle negativo. Entretanto, o percentual encontrado também foi
estatisticamente diferente (inferior) ao do controle positivo (ivermectina). As outras
concentrações testadas (32, 16, 8 e 4 mg/mL) não causaram redução significativa no
desenvolvimento larvar de H. contortus. O efeito observado também foi dose-dependente. A
CE50 da fração foi 226,66 mg/mL.

Tabela 1. Percentual de eficácia (média ± desvio padrão) do extrato etanólico de Operculina


macrocarpa (EEOM) e da sua fração metanólica sobre a eclosão de larvas de Haemonchus
contortus.
Concentração (mg/mL) EEOM Fração Metanólica
64 73,19 ± 12,04b 21,47 ± 13,37b
32 22,66 ± 8,04c 11,55 ± 16,07bc
16 1,11 ± 2,94d 4,87 ± 9,97c
8 1,27 ± 2,82d 2,39 ± 5,55c
4 10,09 ± 1430d 4,44 ± 9,11c
Controle positivo 99,34 ± 0,98a 99,97 ± 0,06a
Controle negativo 1,08 ± 6,64d 4,32 ± 5,52c
Letras diferentes indicam valores significativamente diferentes entre linhas (p<0,05).

A partir da comparação entre as CE50 foi possível observar que o efeito da fração foi
inferior ao do EEOM. Quando comparada com a CE50 do extrato, pode-se perceber que CE50
da fração é de aproximadamente 5 vezes maior. Esse fato pode ser atribuído a ausência de
taninos condensados na fração. De acordo com Bahuaud et al. (2006), os taninos condensados
apresentam efeito anti-helmíntico promissor sobre nematoides gastrintestinais de pequenos
ruminantes.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O EEOM e a sua fração metanólica inibem o desenvolvimento larvar de H. contortus.
Porém, os resultados não foram promissores, pois foi necessária uma alta concentração dessas
substâncias para a atividade larvicida ser observada. Entretanto, é necessária a utilização de
outros solventes para a obtenção de extratos de O. macrocarpa e a realização de outros testes
para determinação do seu efeito anti-helmíntico antes de não recomendar a utilização dessa
planta para o controle de nematoides gastrintestinais de pequenos ruminantes.

REFERÊNCIAS
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