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Santa Verônica Giuliani

“Eu me propus ir sempre contra a corrente”

Com seu zelo, baseado no agir contra. o mosteiro sob


seu governo floresceu e nele brilhavam as virtudes e
multiplicavam-se os milagres.
─ “Enquanto se rezava a Missa, vi São Francisco Xavier
com uma cruz. Este me deu a conhecer que ela significava
o cargo de Abadessa e que seria colocada sobre meus
ombros.
─ Estais louca? replicou o confessor. Abadessa, uma tonta
como vós? Governar um mosteiro, se não sois capaz nem
de governar as galinhas? São extravagâncias que vos
passam pela cabeça”.
Quem seria essa religiosa, de quem o confessor teria, pelo
menos na aparência, um conceito tão desfavorável?

Nascida em Mercatello (Itália) ─ localidade distante 18


milhas de Cittá di Castello ─, ainda dentro dos
imponderáveis natalinos, no dia 27 de dezembro de 1660,
Úrsula Giuliani, manteve sempre dentro de si o grande
significado da festa máxima da Cristandade: a alegria pelo
nascimento dAquele que seria crucificado para redimir os
homens.
Essa filha do casal Francisco Giuliani e Benta
Mancini, desde a mais tenra idade, osculava as
imagens de Nossa Senhora e do Menino Jesus. E
quando sua mãe e as irmãs comungavam, não
conseguia afastar-se delas para estar perto de Nosso
Senhor. No dia de sua Primeira Comunhão confessa
que sentia um calor tão grande que a inflamava inteira,
especialmente o coração.
Isso não a impedia de levar uma vida como as demais
crianças de sua idade, e até em condições de luxo, com
servidores e domésticos, em vista da boa situação social e
econômica de seu pai, que era Duque.
Porém, nem os presentes e o carinho que aquele lhe
devotava, pois a tinha por filha predileta, nem o prazer que
sentia naquela vida agradável e sem problemas, impediram
que aos 15 anos pedisse a Jesus que lhe desse Seu
Coração para ser a morada de sua alma, e Suas penas
para viver crucificada como Ele.

Na via de um profundo desprendimento


Em 1677, aos 16 anos de idade, tornou-se religiosa,
entrando como noviça no convento de freiras clarissas em
Cittá di Castello, tomando o nome de Verônica. Ela
confessa que, em vista de suas apetências naturais para
uma vida confortável, todas as coisas no convento se lhe
tornavam difíceis. E como não sabia qual a origem dessas
dificuldades, percebendo que elas se opunham à sua
vocação, decidiu adotar o grande princípio de vida
espiritual, o agere contra, e fazer sempre o contrário do que
suas apetências naturais pediam: “Eu me propus ir
sempre contra a corrente, tanto em matéria de
alimentação, como no vestuário e em todas as ações”.
Quando ela pensava que devia agir sempre por amor de
Deus, tudo tomava sentido. Jesus crucificado deveria ser
seu livro e seu guia:
“O lado humano chorava e o espiritual se alegrava no
meio das cruzes. Algumas vezes, devido às rebeliões
da natureza humana, ficava dias sem saber o que fazia:
o hábito, as paredes, tudo que via causavam-me
melancolia. Para vencer-me, osculava as paredes, o
hábito e tudo aquilo pelo que sentia aversão”.
A fidelidade ao agere contra a levou a repudiar sua própria
vontade para poder fazer somente o que Deus queria. “Tu
nada és e nada fazes”, disse-lhe Ele; “desprenda-te de
tudo em tudo e então experimentarás os efeitos da
minha graça divina”.
Sendo fiel à especial vocação para qual Nosso Senhor
a chamava, chegou a receber os estigmas da Paixão e
a Coroa de Espinhos.

Diante da calúnia de estar possessa pelo demônio: paz


de alma
No caminho do sofrimento, Verônica percebeu que as
cruzes, as tentações, as desolações, os abandonos e todas
as contrariedades constituem a porta e a luz que conduzem
a Deus. Incendiada pelo amor à cruz, sentiu desejo ardente
de salvar a todos. Fazer penitência para a conversão das
almas passou a ser seu lema.
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Quantas vezes sentiu tentações contra a fé, quanto
tempo passou na aridez e na desolação! Quantas vezes
chamou por Nosso Senhor e não ouviu Sua resposta!
Mas uma aspiração permanecia constante em sua
alma: o desejo de salvar os pecadores custasse o que
custasse.
Assim, recebeu acusações, por parte de Irmãs
malevolentes e caluniadoras, de estar possessa pelo
demônio. E outras, menos furiosas, diziam que seus
“estados anormais” (leia-se fenômenos místicos com que
era favorecida a Santa) vinham de seu desejo de se fazer
notar. Apesar das perseguições que sofria em seu
convento, diretamente do demônio ou de suas irmãs de
hábito, mantinha-se inalterável na paz interior própria a
quem estava abrasada pelo amor de Deus.

Domínio perfeito do caráter colérico


Verônica foi eleita abadessa em 5 de abril de 1716, aos 56
anos de idade e 40 de vida religiosa, por unanimidade.
Sinal de que mesmo suas adversárias no convento a
consideravam perfeitamente digna e capaz de ocupar o
elevado cargo.
Mandou então colocar uma imagem de Nossa Senhora
sobre o trono abacial, apresentando-A como a nova
abadessa: “Sois Vós a abadessa; seguirei Vossas
ordens”, declarou. Deste modo deu prosseguimento a
um hábito que lhe era familiar desde a mais tenra
idade: voltar-se para Maria.
Nossa Senhora ─ que era a Abadessa de fato ─
aconselhou-a que governasse com amor e pelo amor, mas
sem amor próprio e respeito humano. E que tivesse a regra
na mão para ver tudo; no coração para penetrar tudo e
impressa em si mesma para que fosse observada por
todas.
Viveu com temor e tremor de que o cargo resultasse na
perdição de sua alma. No entanto, segundo um
testemunho, era a abadessa ideal, capaz de pôr ordem no
mundo inteiro. Tinha essa arte dificílima de se fazer amar e,
ao mesmo tempo, incutir um temor filial. Considerava-se
mãe amorosa, tratando a todos com a mesma afabilidade,
cortesia e benquerença.
Embora se dissesse ter caráter colérico, exercia um tal
domínio sobre si que isto nunca transparecia. Quando
admoestava, corrigia ou dava penitência, jamais irritava as
religiosas sobre quem recaíam suas advertências, pois
todas sabiam que era para seu próprio bem e faziam
prontamente qualquer coisa que mandasse. Com esta
atitude conseguiu erradicar a mania que algumas tinham de
procurar informar-se de tudo o que se passava fora,
levando os assuntos mundanos para as conversas
internas, com grave prejuízo para a seriedade que deveria
reinar no convento.
O mosteiro floresceu e tornou-se um espelho de todas
as virtudes. E com a virtude reinava a união e a paz.
Verônica era o sol radiante, a chama que não se apaga,
o Anjo que conduz ao Paraíso.

Penetração dos corações e milagres em vida


Verônica penetrava no interior das almas; via suas aflições,
seus pensamentos, as graças de que necessitavam.
Certa vez, em meio a uma reunião com as noviças,
levantou-se de repente e saiu correndo rumo à cela de uma
religiosa. Esta última, talvez por desequilíbrio mental, havia
chegado a agredir Verônica pouco tempo antes. Ao chegar
à cela, abriu com dificuldade a porta e encontrou a religiosa
fora de si, desvairada, querendo matar-se. Verônica a
consola, fala de Deus, do inferno, e acaba por devolver a
calma a um coração agitado pelo remorso e pelo
desespero.
A par do conhecimento das almas, tinha ela também o dom
dos milagres, havendo realizado muitos ainda em vida.
Certo dia, um incêndio ameaçava destruir toda a igreja.
Verônica, desde o coro, invoca Nossa Senhora e,
fazendo um sinal da cruz, faz cessar imediatamente o
perigo.
Em outra ocasião, um número incalculável de
bichinhos roíam as raízes das hortaliças. Por ordem do
confessor, Verônica fez um grande sinal da cruz e
todos vieram à superfície. “Ide ao galinheiro”, ordenou
a santa e todos para lá se dirigiram a alimentar as
galinhas, que tiveram nesse dia uma lauta refeição. Foi
uma cena de fazer arrepiar muitos partidários da ecologia
festiva.
Multiplicou muitas vezes alimentos como queijo, ovos,
azeite, frutas e peixe quando eram insuficientes para a
pobre mesa do claustro.
Ela mesma declara que todos os dias presenciava milagres
da santa obediência. E os via realizados em si mesma,
tantas foram as curas inexplicáveis que teve de muitas
dores e doenças.

Um crucifixo a chamava para aconselhá-la


Nossa Senhora a chamava de “coração de meu
coração; alma de minha alma”. Ela lhe aparecia,
abraçava, dava conselhos, confortava, andava com a
fisionomia de Verônica no meio das religiosas, e lhe
prometia uma proteção contínua na vida e na morte.
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No Santo Natal, a imagem do Menino Jesus, em seus
braços, tomava forma humana. Um crucifixo do
mosteiro a chamava para dar conselhos. Os Santos, os
Anjos a visitavam. Numa das renovações da profissão
dos votos, que fazia uma ou mais vezes ao ano, foi
assistida pela Virgem Maria, Santa Clara, São
Francisco, São Felipe Néri.

Pediu ao confessor licença para morrer…


Um ano antes de sua morte, como acontecera durante
quase toda a vida, conta que estava na obscuridade de
espírito, nas trevas e em um mar de tentações, mas
sempre obedecendo a Deus.
O despojamento de sua vontade, substituída pela de Deus
a levou a ser obediente até para morrer, pedindo permissão
ao confessor para passar para a outra vida; obtido o
consentimento, no mesmo instante voou para a eternidade.
Isto ocorreu em 9 de julho de 1727, no convento onde era
abadessa, em Cittá di Castello.
A notícia de sua morte se espalhou sem que se soubesse
como, e uma multidão de damas, nobres, cavaleiros e
pessoas do povo dirigiu-se ao mosteiro.
Encontrando-o fechado, golpearam a porta gritando:
“Queremos ver a nossa Santa! Abri!”
Tomadas algumas precauções, o Bispo mandou colocar o
corpo na porta da igreja, mas foi tal a desordem causada
pelo desejo de tocar, conseguir uma relíquia, ou pelo
menos olhar pela última vez aquela que foi a mãe querida,
a irmã insubstituível, a grande protetora de todos, que o
Prelado mandou fechar a porta e enterrar logo o corpo.
Os benefícios de sua virtude e a fama de sua santidade
espalharam-se por toda a península italiana. Reis,
Príncipes e grandes da Terra pediam sua intercessão junto
a Deus para atender suas necessidades ou as de seus
súditos.
Monges, sacerdotes e leigos, atingidos por doenças
incuráveis em fase terminal, recuperaram
instantaneamente a saúde ao simples contato de uma
relíquia sua, ou por ter implorado sua ajuda.
Vinte milagres foram arrolados nos processos diocesano e
apostólico para sua canonização, a qual se deu mais de
cem anos após sua morte.
Pio VII beatificou-a, na presença da Arquiduquesa Maria da
Áustria e do Rei Carlos Emanuel da Sardenha, no dia 7 de
junho de 1802. E Gregório XVI canonizou-a solenemente
em 29 de maio de 1839, festa da Santíssima Trindade.
Eis as palavras do Santo Padre o Papa Bento XVI sobre
essa admirável esposa de Nosso Salvador e Senhor Jesus
Cristo:
“Santa Verônica possui uma espiritualidade
marcadamente cristológico-esponsal: é a experiência
de ser amada por Cristo, Esposo fiel e sincero, e de
desejar corresponder com um amor sempre mais
envolvido e apaixonado. Nela, tudo é interpretado através
da chave do amor, e essa lhe dá uma profunda serenidade.
Cada coisa é vivida em união com Cristo, por amor seu, e
com a alegria de poder demonstrar a Ele todo o amor do
qual é capaz uma criatura.
O Cristo ao qual Verônica está profundamente unida é
aquele sofredor, da paixão, morte e ressurreição; é
Jesus no ato da oferta ao Pai para salvar-nos. Dessa
experiência, deriva também o amor intenso e sofredor pela
Igreja, na dupla forma da oração e da oferta. A Santa vive
nesta óptica: ora, sofre, busca a “pobreza santa”, como
expropriação, perda de si, propriamente para ser como
Cristo, que doou tudo de si mesmo.

Reflexão
Santa Verônica Giuliani convida-nos a fazer crescer, na
nossa vida cristã, a união com o Senhor no ser pelos
outros, abandonando-nos à Sua vontade com confiança
completa e total, e a união com a Igreja, Esposa de Cristo;
convida-nos a participar do amor sofredor de Jesus
Crucificado pela salvação de todos os pecadores; convida-
nos a ter o olhar fixo no Paraíso, meta do nosso caminho
terreno, onde viveremos junto a tantos irmãos e irmãs a
alegria da comunhão plena com Deus; convida-nos a nutrir-
nos cotidianamente da Palavra de Deus para aquecer o
nosso coração e orientar nossa vida. As últimas palavras
da Santa podem ser consideradas a síntese da sua
apaixonada experiência mística: “Encontrei o Amor, o Amor
deixou-Se contemplar!” Santa Verônica Giuliani, rogai por
nós. Amém”

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