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Revista de Jovens e Adultos da

Convenção Batista Fluminense


Edição 79

Corpoe Um estudo
de Josué,

Unidade
Juízes e Rute

Cartas de Paulo aos Coríntios


Pr. Valtair Miranda

Pr. Fabio
Martins
Revista evangélica trimestral da Convenção Batista
Fluminense.
O intuito desta revista é servir de material de edu-
cação cristã acerca do que é ensinado na Palavra
de Deus, pela leitura e interpretação dos escrito-
res destas lições.
Esta revista não é um manual para a vida cristã,
mas um material de auxílio educacional. Antes de
tudo leia a Bíblia, que é a Palavra de Deus.

Publicada pela Convenção Batista Fluminense,


produzida pelo Departamento de Educação Cristã,
juntamente com o Departamento de Comunicação.

(21) 9 9600-6132 | contato@batistafluminense.org.br


Rodovia BR-101, KM 267 - Praça Cruzeiro, Rio Bonito/RJ
(CEP 28.800-000)
Sumário
10 Primeiras Palavras

15 Palavra do Redator

17 Apresentação

21 Lição 1 Introdução e Saudação

31 Lição 2 A Luta pela Comunhão

40 Lição 3 Imoralidade e Mundanismo na Igreja

49 Lição 4 Questões Sobre o Casamento Cristão

58 Lição 5 Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis

68 Lição 6 A Respeito da Adoração Cristã

79 Lição 7 Onde Está, Morte, a Sua Vitória?

88 Lição 8 A Assistência Social

97 Lição 9 Consolação e Consolo

105 Lição 10 A Defesa do Ministério

115 Lição 11 A Busca Pelo Discernimento Espiritual

125 Lição 12 Reconciliação e Oferta

135 Lição 13 Uma Carta de Lágrimas

144 Ficha Técnica


O que estamos
preparando para 20
as próximas
edições 23
1° Trimestre 2023
Chamados Para Ser Santos
Um Estudo em Romanos
Pr. Danilo Azevedo Aguiar

2° Trimestre 2023
Os Reis e Os Profetas de Israel
Pr. Alonso Colares

3° Trimestre 2023
Fé, Fidelidade & Força
Um Estudo de Josué, Juízes e Rute
Pr. Fabio Martins

4° Trimestre 2023
Corpo e Unidade ← Você está
nesta edição
Cartas de Paulo aos Coríntios
Pr. Valtair Miranda
PrimeirasPrimeiras
PalavrasPalavras

Pr. Amilton Ribeiro Vargas


Diretor Executivo da CBF
Ovelha do Pr. Jônatas
Soares

Tempo de entender
a vontade de Deus e
agradecer!
“Tudo tem o seu tempo determinado, e há
tempo para todo o propósito debaixo do céu.”
(Eclesiastes 3:1)
O tempo de Deus não é igual ao nosso! Não
podemos conceber a ideia de tempo de modo
meramente cronológico, pois a percepção divina
não alcança apenas o passado e o presente, mas
também o futuro está na pré-ciência do Criador.
Como desejo entender o tempo de Deus para
a minha vida, em cada fase, em cada desafio, em

10
Primeiras Palavras

cada lugar, em cada propósito, ministério ou em-


preendimento, pois o tempo de Deus é perfeito,
assim como é a Sua soberana e bendita vontade!
Quantas vezes andamos em descompasso com
o tempo de Deus. Precisamos orar mais para não
perder as realizações de Deus no tempo opor-
tuno para o cumprimento de suas promessas e
propósitos.
Deus tem sido tão bom para conosco, pois mes-
mo diante de tantas lutas, Ele é por nós! Nunca
nos abandonou e jamais nos abandonará!
De modo especial na minha vida e de minha fa-
mília, esse tempo é uma grande oportunidade de
dizer a Deus e a todos os meus amigos e irmãos:
Muito obrigado pelo que fizeram e fazem como
instrumentos de Deus para abençoar o meu mi-
nistério, o de meus colegas e especialmente a
vida daqueles que alcançaram ou precisam de
salvação!
Obrigado pelas orações e pelo que desejaram
fazer, mas não tiveram oportunidade! Deus conti-
nue abençoando muito suas vidas, famílias e mi-
nistérios!
Muito obrigado às minhas filhas Rayanne e
Lorraine e minha querida Venância!
11
Palavra do Redator
Palavra do Redator

Pr. Samuel Pinheiro


Diretor do Departamento
de Educação Cristã da
CBF e Coordenador
Acadêmico da FABERJ

“Que a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor


de Deus e a comunhão do Espírito Santo sejam
com todos vós.” (2 Coríntios 13:13)
Amados irmãos em Cristo,
Com a bênção e a orientação divina, estamos
felizes em compartilhar com vocês a próxima edi-
ção da nossa revista trimestral. Neste trimestre
que se inicia, temos a honra de explorar profun-
damente as verdades e sabedoria contidas nas
Epístolas aos Coríntios, uma carta que ressoa com
significado e direção para nossas vidas.
Nossos corações transbordam de gratidão ao
Pastor Valtair Miranda, que com humildade e dili-
gência, mergulhou nas profundezas dessa epís-
tola, trazendo à luz suas lições atemporais e apli-
15
Palavra do Redator

cações para nossa caminhada espiritual. Que seu


trabalho inspire em nós uma busca ainda mais
profunda pela compreensão das Escrituras e pelo
fortalecimento de nossa fé.
Enquanto nos preparamos para embarcar nes-
sa nova jornada, não podemos deixar de agra-
decer ao Pastor Fábio Martins, autor da edição
anterior, que nos guiou por Josué, Juízes e Rute.
Suas palavras foram uma fonte de inspiração, tra-
zendo luz e entendimento aos textos bíblicos.
É com uma sensação de entusiasmo que convi-
damos cada um de vocês nessa exploração dos
ensinamentos e princípios da Epístola de Paulo
aos Coríntios. Que essa jornada nos conduza a
um entendimento mais profundo da mensagem
de Paulo, e que a sabedoria ali contida transfor-
me nossas vidas e nossas igrejas.
Nosso agradecimento também se estende à
dedicada equipe que torna possível a realização
desta revista, através de sua colaboração incan-
sável e paixão pelo serviço. Que Deus abençoe
cada um de vocês por sua contribuição.
Com amor e expectativa pelo que está por vir,
Pr. Samuel Pinheiro
16
Apresentação
Apresentação

Quem escreveu

Pr. Valtair Miranda


Valtair Afonso Miranda tem Pós-doutorado em
Cognição e Linguagem (UENF), Doutorado
em História (UFRJ), Doutorado em Ciências da
Religião (UMESP), Mestrado em Ciências da
Religião (UMESP), Mestrado em Teologia (STBSB),
Graduação em História (UNIVERSO) e Graduação
em Teologia (FTSA/STBSB). É Diretor Acadêmico
da Faculdade Batista do Rio de Janeiro, Professor
Externo no Programa de Pós-graduação em
Cognição e Linguagem da Universidade Estadual
do Norte Fluminense, e Pesquisador Associado do
Programa de Estudos Medievais da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Atualmente desenvolve
pesquisas sobre: Religião, Identidade e Sociedade
na Antiguidade e Medievo; Cognição e Linguagem
na educação e saúde.

17
Introdução e Saudação – Lição 1

Lição 1
Texto Base: 1Coríntios 1.1-9

Introdução e
Saudação
Paulo iniciou suas viagens missionárias para
pregar o evangelho, e enquanto isso acontecia,
ele organizava os convertidos em congregações
locais. Paulo foi então um pregador e plantador de
igrejas. Os dois papéis aparecem de forma inten-
sa em suas viagens missionárias. Exatamente por
Leitura Diária isso, estas viagens não
SEG Atos 17.1-14
tiveram a mesma dura-
TER Atos 17.15-34 ção. Não havia um pa-
QUA Atos 18.1-23 drão estabelecido. Isso
QUI Atos 18.24-28 porque eventualmen-
SEX 1Coríntios 1.1-3 te ele precisava passar
SÁB 1Coríntios 1.4-9 mais tempo numa cida-
DOM Efésios 4.1-16
de, em vez de continu-
21
Voltar para o sumário
Introdução e Saudação – Lição 1

ar a viagem.
O capítulo 18 de Atos narra o momento em
que Paulo sai de Atenas e chega a Corinto, na
sua segunda viagem missionária. Ele passará en-
tão um bom tempo naquela enorme cidade do
Peloponeso, com cerca de 250 mil habitantes.
Desta parada, surgiu então a igreja de Corinto,
marcada por polêmicas, crises, disputas e emba-
tes. As cartas que iremos estudar nesta Revista
se dedicarão, então, a pastorear e ministrar às
situações concretas desta igreja dos primórdios
da fé.

1. Dois conceitos fundamentais


Os dois conceitos mais fundamentais nestes
primeiros versículos de 1Corintios são “apóstolo”
e “igreja”. O primeiro termo, “apóstolo”, começou
a ser usado pelos escritores gregos. Não era uma
expressão técnica, e sim uma característica, um
adjetivo, um atributo de alguém que foi enviado.
Para os judeus do período pós-exílico, apósto-
los eram os rabinos comissionados que visita-
vam os judeus residentes fora da Palestina, na
22
Introdução e Saudação – Lição 1

diáspora, para coletar dinheiro para o templo de


Jerusalém ou para supervisionar as comunidades.
Nesse sentido, o jovem rabino Saulo que saiu de
Jerusalém levando nas mãos uma carta autori-
zando-o a perseguir os cristãos em Damasco era
um apóstolo do sumo-sacerdote (At 9.1-2). No uso
das primeiras igrejas e na maior parte do Novo
Testamento, a palavra apóstolo distanciou-se do
uso inicial helênico e se aproximou da maneira
como os judeus a usavam, recebendo carga ain-
da maior de novas ideias, por causa da origem
do comissionamento, que normalmente era fei-
to por Deus ou pelo próprio Cristo. Isso significa
que, ao ser enviado, o apóstolo recebia poder e
autorização para representar Jesus, bem como a
obrigação de prestar contas a ele. Os apóstolos
eram testemunhas oculares (At 1.21, 22; 1Co 9.1);
tinham poderes sobrenaturais ou miraculosos (Mt
10.1; At 5.15,16; Ef 2.2); e recebiam um serviço ou
missão definida durante o tempo de suas vidas
(Mt 19.28).
O termo Igreja é uma tradução do grego eccle-
sia. Este substantivo é formado por uma preposi-
23
Introdução e Saudação – Lição 1

ção (de dentro para fora) com um verbo (chamar


ou convocar). Etimologicamente, “igreja” signifi-
ca “alguém que é chamado para fora”. A literatu-
ra mais antiga refere-se a “ecclesia” como uma
convocação de pessoas para a guerra. No flo-
rescer da civilização grega, a partir do século V
a.C., “ecclesia” passou a representar a convoca-
ção de cidadãos efetivos de uma cidade (polis)
para reuniões populares. Dessa forma, seu signi-
ficado tornou-se dinâmico, ligado ao ajuntamento
de pessoas e não para um determinado local ou
edifício, ou mesmo para rituais religiosos. Igreja é
o conjunto das pessoas, e não o local ou o prédio
em que se reúnem. A igreja de Corinto era o con-
junto de crentes regerenados em Cristo que se
reunia na cidade de Corinto. O espaço onde eles
se reuniam não faz muita diferença neste caso,
pois o mais importante no conceito é a ideia de
corpo e unidade de missão.
24
Introdução e Saudação – Lição 1

2. O autor e o destinatário de 1
Coríntios (1Co 1.1-3)
Os versículos estudados nesta lição formam
uma espécie de prefácio epistolar a 1 Co. Nela,
Paulo se apresenta com uma série de afirmações
identitárias. Ele se denomina Apóstolo de Cristo
Jesus, pela vontade de Deus. O termo “apósto-
lo”, como já tratado no tópico anterior, eram bem
conhecido daqueles crentes. Ao usá-lo, Paulo se
declara enviado, comissionado, para uma deter-
minada tarefa. Quem o comissionou foi o próprio
Cristo, o Messias enviado por Deus.
Isso indica que sua identidade pessoal foi trans-
formada no dia em que foi encontrado por Jesus
no caminho de Damasco. Naquele dia ele foi
demudado em outra pessoa. Tudo o que era ou
possuía antes daquele evento deixou de fazer
sentido, e o que ele ouviu naquela hora mudou
sua vida. Ali ele foi chamado para ser discípulo
de Jesus e pregador das boas novas da ressur-
reição.
Esta perspectiva pessoal dá o tom das orienta-
25
Introdução e Saudação – Lição 1

ções que Paulo escreverá na carta. Tudo o que


ele vai escrever está baseado na sua comissão
no caminho de Damasco, na certeza de que é
um enviado de Jesus e na convicção de que ele
apenas cumpre a vontade de Deus.
Apesar de ainda inserir o irmão Sóstenes na
saudação, é consenso entre os estudiosos que
esta carta é de autoria única e exclusiva do após-
tolo dos gentios.
Após se apresentar, ele descreve seus leitores
por meio de três atributos:
- Igreja de Deus que está em Corinto;
- Santificados em Cristo Jesus;
- Chamados para ser santos.
Estes atributos são curiosos se tivermos em
mente o restante da carta. Boa parte dela será
usada para descrever os problemas da igreja. A
igreja de Corinto era cheia de dificuldades. Mas
ainda assim, apesar de tudo, eles foram salvos
por Cristo, santificados nele e chamados para vi-
ver uma vida santa. É como se Paulo conseguis-
se fazer uma separação entre o status espiritual
26
Introdução e Saudação – Lição 1

daqueles crentes diante de Deus (salvos e santi-


ficados em Cristo), e a dura realidade da luta con-
tra o pecado e a velha natureza.

3. Gratidão a Deus
A seção que começa em 1Co 1.4 descreve a ex-
periência de oração do Apóstolo. Paulo diz que
sempre agradece a Deus pela vida dos irmãos
de Corinto. Aqueles crentes, mesmo os intransi-
gentes, são alvos contínuos de oração. É possí-
vel ver aqui então um exemplo de líder que ora
por todos os seus liderados, m esmo por aqueles
que dão mais trabalho.
No momento de explicar as razões que o le-
vam a continuamente orar por suas vidas, Paulo
nos apresenta o verdadeiro status espiritual da-
queles irmãos de Corinto:
- Eles são ricamente abençoados pela graça
de Cristo por meio da palavra e do conhecimen-
to. Eles conhecem a Cristo, que foi pregado na-
quela igreja de forma plena. Paulo não apresen-
tou pela metade o Salvador, de forma que não
dá para dizer que falta algo do conhecimento de
27
Introdução e Saudação – Lição 1

Cristo entre eles.


- Eles são testemunhas do que Deus pode fa-
zer na vida de uma pessoa. A mensagem não foi
apenas pregada na cidade, mas confirmada por
sinais do poder do Evangelho.
Eles são cheios de dons espirituais. Apesar das
crises de relacionamento entre Paulo e a igreja,
nela havia realmente manifestações dos dons e
talentos que o Espírito Santo outorga aos cren-
tes.
- Eles aguardam a volta de Jesus, olhando para
o dia em que as dificuldades do mundo termina-
rão e o Senhor apontar nos ares.
- Eles foram justificados por Deus, que os man-
tem salvos, ao ponto de serem guardados “irre-
preensíveis no dia do nosso Senhor”. Aqueles a
quem Jesus salvou, certamente continuarão em
sua fé e viverão com Deus para sempre. Não é o
caso que não possam errar ou cair, mas, em últi-
ma análise, eles perseverarão em sua fé devido
à capacitação divina.
- Deus é fiel, o que significa que toda as suas
28
Introdução e Saudação – Lição 1

promessas serão cumpridas. É somente baseado


em sua fidelidade que é possível afirmar o dom
da vida eterna para os salvos.

Conclusão
Paulo conclui esta seção de Corinto com uma
oração de ação de graças (1 Co 1.4-9). Nesta ora-
ção, ele reforça o status espiritual dos crentes
(ricos em Cristo, abundantes no Espírito) e apre-
senta o seu alvo para aquela igreja:
- Irrepreensíveis no dia da volta de Jesus;
- Uma vida de comunhão através de Jesus.
Estes alvos fornecem as metas da caminhada
para aquela igreja. Certamente eles não eram ir-
repreensíveis e nem possuíam comunhão, mas o
alvo estava estipulado. O papel da igreja era olhar
diariamente para estes alvos, avaliar-se continua-
mente para verificar o estágio em que se encon-
trava e continuar a caminhada.
Que estes alvos possam ser igualmente os nos-
sos, para que sirvam de impulso e estímulo du-
rante a vida cristã.
29
Introdução e Saudação – Lição 1

Para pensar e agir


1. Nos dias atuais seria possível apontar os mi-
nistérios da igreja que exercem a função apostó-
lica de pregar e plantar igrejas?

2. Como relacionar o status espiritual dos cren-


tes como simultaneamente santos e pecadores?

3. Como aplicar o exemplo paulino de oração


por todos os crentes, independente do grau de
relacionamento?

30
A Luta pela Comunhão – Lição 2

Lição 2
Texto Base: 1Co 1.10-4.21

A Luta pela
Comunhão
Conflitos são inevitáveis em qualquer relacio-
namento interpessoal. Onde tiver mais de uma
pessoa, conflitos surgirão por causa da nature-
za própria dos relacionamentos, o que provoca
a necessidade de aprendermos a conviver com
eles. Entre irmãos, casais, colegas e amigos, con-
flito é parte da existên-
Leitura Diária cia humana desde que o
SEG 1Co 1.10-30 pecado entrou no mun-
TER 1Co 2.1-16 do. Como sobreviver aos
QUA 1Co 3.1-23 conflitos e transformá-los
QUI 1Co 4.1-5
em crescimento em vez
SEX 1Co 4.6-21
de enfermidades para os
SÁB Rm 1.8-17
relacionamentos? Paulo
DOM Rm 12.3-8
vai trabalhar esta questão
31
Voltar para o sumário
A Luta pela Comunhão – Lição 2

nesta seção de 1 Coríntios, em função do acen-


tuado grau de distúrbios interpessoais daquela
igreja.

1. A busca pela unidade do corpo


de Cristo
Os versículos de 1 Co 1.10-13 estão na forma de
um pedido paulino. Paulo anseia pela comunhão
dos crentes da igreja. Ele espera que as diferen-
ças entre eles não deem lugar a grupos e parti-
dos dentro de um mesmo corpo. Com isso, ele
apresenta o princípio da unidade do corpo de
Cristo, que está baseada na própria pessoa que
a instituiu: Jesus Cristo.
Como a Igreja é o corpo de Cristo, e Cristo não
está dividido, sua Igreja não pode se multiplicar
em partidos relacionados com fases distintas de
sua história. Mesmo que seja possível dividir a bio-
grafia de uma igreja em períodos, com diferentes
responsáveis pela primeira pregação, discipula-
do, batismo, organização e crescimento, ainda
assim, acima de todos, está apenas um Senhor,
o verdadeiro dono da obra, que é Jesus.
A Igreja é um organismo vivo. Não é somente
32
A Luta pela Comunhão – Lição 2

uma instituição histórica, ou uma organização so-


cial. Seus membros são cristãos nascidos de novo,
cujos nomes estão inscritos no livro da vida, não
necessariamente no rol de membros da secreta-
ria. É isso que será registrado posteriormente na
carta aos Efésios 4:15-16 (leia).
Desta forma, a Igreja é o corpo de Cristo no
mundo, sua manifestação concreta diante da so-
ciedade. As pessoas verão a Cristo por meio do
seu corpo, a Igreja. Por isso, é importante que
este corpo se manifeste em comunhão. Esta co-
munhão é a expressão da vida da Igreja, quando
pessoas diferentes em tudo conseguem conver-
gir em comunhão. Este corpo de Cristo é, metafo-
ricamente, formado por pernas, braços, cabeça,
tronco, dedos, joelho, com funções e papéis di-
ferentes, mas que trabalham todos para o bene-
fício do corpo. Não é um ajuntamento de órgãos,
mas uma unidade de diferentes.
Algumas igrejas se tornam apenas organiza-
ções históricas, ou instituições humanas, quando
reúnem seus membros em bancos enfileirados,
ou em grupos geograficamente arrumados, mas
não possuem conhecimento mútuo, comunhão
de propósito, amor ao próximo. Aproximam-se
33
A Luta pela Comunhão – Lição 2

assim de um clube social, e poderiam muito bem


ser substituídas pelo clube de futebol da cidade
que não faria muita diferença na vida daquelas
pessoas.

2. A natureza da pregação: a
mensagem da cruz
Um dos elementos essenciais na busca pela
unidade é o conteúdo da mensagem da igreja
(1Co 1.18-2.16). As pessoas podem divergir so-
bre vários aspectos, mas devem buscar unidade
na pregação. Qual é o tipo de mensagem desta
igreja constituída por Jesus?
Uma mensagem em torno da cruz. Os judeus
divergiam sobre o perfil do Messias que haveria
de vir, e consequentemente, sobre a forma como
ele iria trazer o reino de Deus. Alguns insistiam
no caminho da guerra, como Davi, outros da Lei,
como Moisés. Jesus, entretanto, anunciou o ca-
minho do Servo Sofredor de Isaías 53. Com isso,
Ele deu o tom do seu ministério. Sua mensagem
focaria na cruz, no sacrifício, no sangue derrama-
do, em vez da força ou da violência. Como seu
mestre, em vez da sabedoria do mundo, a igreja
34
A Luta pela Comunhão – Lição 2

deve pregar a mensagem da cruz.


Uma mensagem de humildade. O mundo valo-
riza o poder e a força dos argumentos. Valoriza o
conhecimento e os diplomas. Valoriza a riqueza e
a glória. Valoriza o status e o poder. Curiosamente,
Deus inverte a lógica do mundo e promove o fra-
co, o humilde, o simples, o pobre, o desprovido
e o doente. Nos termos de Paulo, ele “escolheu
as coisas loucas do mundo para envergonhar
os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo
para envergonhar as fortes.” (1 Co 1.28). A igreja,
enquanto corpo de Cristo, precisa buscar estes
mesmos valores.
Uma mensagem espiritual. A base de nossa fé
está no poder de Deus, naquilo que os olhos não
podem ver, nas coisas que procedem do Alto.
Com isso, nosso alvo deve ser buscar a mente
de Cristo (1 Co 2.16) e crescermos na estatura do
varão perfeito (leia Ef 4.13).
Uma mensagem bíblica. A revelação bíblica é
o fundamento da pregação da igreja. Ela prega o
que Deus inspirou aos profetas, revelou aos sal-
mistas, entregou aos apóstolos, falou através do
Filho encarnado (1Co 3.11,12).
35
A Luta pela Comunhão – Lição 2

Uma mensagem para a eternidade. A mensa-


gem da Igreja não mudará. Ela é a mesma ontem,
hoje e amanhã. Quer nos tempos medievais, ou
no mundo contemporâneo, a mensagem de amor
de Deus nunca será ultrapassada pelo tempo (1Co
2.7).
Uma mensagem Cristocêntrica. Podemos falar
de muita coisa durante nossa pregação, mas tudo
o que viermos a falar precisa de alguma forma gi-
rar em torno de Cristo (1Co 2.2). Ele é o centro de
nosso culto, de nossos projetos e nossa prega-
ção. Como dizia Lutero, se não revelar Cristo, a
mensagem não passa de “palha”: “A Bíblia é uma
manjedoura, na qual está contido Jesus. Se não
o encontrarmos, só temos palha”.
Uma mensagem poderosa. O evangelho da
cruz é a mensagem que opera a salvação dos
homens e mulheres (1Co 1.18-24). Curiosamente,
apesar de poderosa, essa palavra é escândalo
para a sociedade. Ela é considerada loucura por
alguns, fraqueza para outros, mas para aqueles
que creem, ela é o poder de Deus em ação.
36
A Luta pela Comunhão – Lição 2

3. Crescimento como corpo


saudável
Paulo escreveu que “nem o que planta é algu-
ma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o
crescimento” (1Co 3:7). Com isso ele introduz o
tema do crescimento do corpo (1Co 3.1-4.21). Todo
pai quer ver o filho crescer. Filho que não cres-
ce está doente. Igualmente, todo crente quer ver
sua igreja crescer. E como no desenvolvimento
humano, a falta de crescimento indica algum tipo
de enfermidade.
É verdade que os crescimentos não são iguais.
Algumas igrejas crescem mais e outras menos.
Algumas crescem mais rápido, outras mais lenta-
mente. Além disso, há tipos diferentes de cresci-
mento: numérico, espiritual, biológico, por meio
do evangelismo, financeiro etc.
Entendemos, entretanto, que a base para qual-
quer tipo de crescimento é o desenvolvimento
espiritual, justamente porque o crescimento nu-
mérico ou o financeiro, por sua vez desprovido
do espiritual, é apenas inchaço do corpo, é de-
formidade. Deformidade é uma perna ser maior
do que a outra; uma mão ter mais dedos do que a
37
A Luta pela Comunhão – Lição 2

outra. Todos crescem quando há saúde. Quando


uma parte apenas cresce é sinal de enfermidade.
Ainda segundo a orientação paulina nesta se-
ção, quando a igreja entende que ela é proprie-
dade exclusiva de Deus, e se rende à sua ação, o
desenvolvimento se torna natural, como a árvore
que cresce às margens de um rio tranquilo.
A mais importante tarefa de uma igreja que cres-
ce é exaltar Jesus Cristo como Senhor. Isto sig-
nifica entregar as chaves da Igreja para Jesus e
deixar bem claro, na fala e na prática, que Ele é o
dono da igreja. Nenhum homem ou mulher pode
tomar o lugar de Jesus como proprietário da igre-
ja. Devemos ser uma igreja que cresce submeti-
da a Jesus, fazendo a sua vontade e anunciando
com coragem a Palavra.

Conclusão
Na sua oração, o apóstolo Paulo pediu unida-
de, e não padronização. Não precisamos ter to-
dos a mesma cara nem a mesma forma de servir
a Deus, mas devemos todos proclamar a mesma
mensagem do evangelho. Semelhança de forma
é padronização. Unidade é ter propósito e teste-
38
A Luta pela Comunhão – Lição 2

munho em comum.

Esse foi o conteúdo da oração de Jesus por


sua futura igreja: “Minha oração não é apenas
por eles. Rogo também por aqueles que crerão
em mim, por intermédio da sua palavra; da men-
sagem deles, para que todos sejam um; como tu
estás em mim e eu em ti. Que eles também este-
jam em nós; para que o mundo creia que tu me
enviaste.” (Jo 17.20-21)

Para pensar e agir

1. Como trabalhar a unidade da igreja em um


tempo tão conflituoso?

2. O que acontece com a igreja quando ela


perde o foco na sua missão e razão de ser no
mundo?

3. Como promover a pregação da cruz numa


sociedade cada vez mais hedonista?
39
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

Lição 3
Texto Base: 1Co 5 e 6

Imoralidade e
Mundanismo na
Igreja
Paulo recebeu notícias muito ruins oriundas da
Igreja de Corinto. A cidade era conhecida pelo
grau de imoralidade. Os crentes trouxeram para
dentro da igreja muito da imoralidade presente
Leitura Diária na cidade. Os capítulos 5
SEG 1Co 5.1-13 e 6 da carta parecem di-
TER 1Co 6.1-11
vidir o assunto em ques-
QUA 1Co 6.12-20
QUI Cl 1.3-23 tões ligadas ao adultério,
SEX Ef 2.1-10 problemas com litígio e a
SÁB Ef 2.11-22
prostituição.
DOM 1Pe 2.1-10

40
Voltar para o sumário
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

1. Problemas de imoralidade
O primeiro tema tratado é o da indecência (1Co
5.1-13). O versículo inicial usa a palavra grega “por-
neia” para descrever o tipo de imoralidade que
chegou aos ouvidos do apóstolo Paulo. A palavra
dá origem ao termo “pornografia” em língua por-
tuguesa. Porneia foi traduzido por “fornicação” na
versão Revista e Atualizada da Bíblia. Para não
deixar dúvida da gravidade do caso, o apóstolo
explicita: há uma pessoa que “abusa da mulher
de seu pai” (1Co 5.1). Apesar do texto não esclare-
cer, muito provavelmente o caso era de adultério
de um rapaz com a própria madrasta.
Pior do que a tipificação da imoralidade, para
o apóstolo, era o fato de que a igreja não fazia
nada a respeito. Provavelmente estavam tão en-
volvidos com suas dissensões que não davam a
devida atenção à impureza moral dos seus mem-
bros. O pecado daquele crente era pior do que
muitos atos de pessoas pagãs de Corinto.
Diante da situação, Paulo invoca sua autorida-
de como apóstolo de Jesus para julgar a ação
41
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

daquele crente. A disciplina para tal ato de imo-


ralidade deveria ser a exclusão da igreja. Este é
o significado da expressão “entregue a Satanás”
do versículo 5.
O contexto da reprimenda paulina é de discipli-
na eclesiástica. Um dos membros da comunidade
cristã cometeu e vive em grande erro, sem qual-
quer manifestação de arrependimento. A sensi-
bilidade de Paulo não vê alternativa senão exigir
da igreja que o entregue a Satanás. Em outras
palavras, que fosse expulso da comunhão ecle-
siástica.
Percebe-se nessa passagem a visão do mundo
como a esfera de ação de Satanás (Cl 1.13; Ef 2.12).
Sendo assim, expulsar alguém da comunidade
cristã é o mesmo que entrega-lo ao mundo, sob
o controle de Satanás. Destaca-se, entretanto, o
propósito final da disciplina: a salvação do espíri-
to no dia do Senhor. Como esse “dia do Senhor”
é uma referência à volta de Cristo, Paulo indica
que a disciplina iria promover a restauração do
adúltero.
Uma pergunta que pode ser levantada é como
42
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

uma exclusão eclesiástica poderia destruir a car-


ne. Possivelmente, Paulo aqui usa a expressão
“carne” como corpo físico, indicando que conse-
quências físicas, como doenças ou morte, podem
também surgir de problemas espirituais. A mesma
ideia aparece em 1Co 11.30, quando o assunto é
a ceia do Senhor. Naquele contexto, pessoas da
igreja estavam adoecendo porque estavam par-
ticipando de maneira inapropriada da mesa da
comunhão.

2. Problemas com processos


judiciais
A carnalidade da igreja de Corinto se manifes-
tou também por meio de litígio entre os crentes,
considerado por Paulo como uma derrota com-
pleta (1Co 6.1-11). Afinal, com isso a igreja estava
confessando que não conseguia resolver seus
próprios problemas: “na verdade já é uma com-
pleta derrota para vós o terdes demandas uns
contra os outros. Por que não sofreis antes a in-
justiça? Por que não sofreis antes a fraude?” (1Co
6.7).
43
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

Aqueles irmãos buscaram ajuda dos magistra-


dos romanos a fim de dar resolução legal às suas
questões, o que provoca a pergunta retórica de
Paulo: “Será que não há entre vós sequer um sá-
bio, que possa julgar entre seus irmãos?” (1Co 6.5).
Paulo baseia sua orientação nesta questão do
litígio nos seguintes aspectos:
- Qualquer tipo de conflito entre os crentes é
desgastante, mas ele está seguro de que a igreja
não precisa de orientação externa para resolver
estas questões. Julgar o mérito da questão é um
dever e uma responsabilidade da igreja;
- Paulo compreende a Igreja como um agente
com poder para exercer a disciplina em relação
aos seus membros, o que viabiliza a análise das
disputas entre seus membros;
- Para Deus, é mais importante o crente preocu-
par-se com o melhor para o próximo do que para
si mesmo. O outro deveria vir em primeiro lugar.
Assim, nossos direitos ficam em segundo plano
em relação ao benefício do irmão. Desta forma,
mesmo levando algum tipo de prejuízo material,
44
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

o próprio Deus nos recompensará. Um prejuízo


momentâneo pode significar uma bênção mais
excelente numa próxima oportunidade;
- A fonte de todo litígio na igreja é o coração
cheio de orgulho. Este sentimento fecha as por-
tas de qualquer acordo e mina os relacionamen-
tos interpessoais. Se almejamos o título de paci-
ficadores (Mt 5.9), enchamos nosso coração de
humildade. A modéstia promove a paz e a con-
córdia;
- Que cada crente busque honrar seus com-
promissos assumidos diante do próximo como se
fosse para o próprio Deus. Se empenhou a pala-
vra, que ela seja cumprida. Se pegou empresta-
do, que devolva. Se retirou do lugar, que coloque
de volta. Se quebrou, que concerte. Se agendou
um compromisso, cumpra-o pontualmente. Desta
forma a igreja revela o caráter de Cristo ao mun-
do;
- Os crentes de Corinto foram transformados
por Cristo no momento da conversão. Por isso não
deveriam mais agir como agiam antes, ou como
as pessoas à volta deles agiam normalmente. Os
45
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

pagãos se comportavam daquela maneira, mas


os crentes deveriam buscar agir de forma dife-
rente;
- Aqueles casos seriam resolvidos facilmente
caso os crentes fossem submissos à liderança da
igreja. Mas numa igreja cheia de partidos, a sub-
missão à autoridade era uma coisa rara. Para não
levar os conflitos para o magistrado da cidade, os
crentes deveriam respeitar a decisão do colégio
de presbíteros (epíscopos e diáconos) daquela
igreja. Eles é que deveriam ser os homens e mu-
lheres sábios da igreja, capazes de administrar
os litígios entre os irmãos, certamente ampara-
dos pelas orientações das Escrituras e guiados
pelo Espírito Santo.

3. As questões relacionadas com o


corpo
Paulo traz à lembrança aqui que os corpos dos
crentes são tabernáculo do Espírito Santo, e, as-
sim, pertencem à Deus (1Co 6.12-20). Uma pes-
soa regenerada deve “usar” seu corpo como um
bom mordomo, fugindo de pecados como gluto-
46
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

naria, preguiça, fornicação, prostituição, embria-


guez, drogadição ou adicção.
Já que o Espírito vive no crente, ele deve fugir
dos pecados da carne, da mesma forma que José
fugiu da esposa de Potifar (Gn 39.9). A liberdade
recebida através de Cristo não deve dar lugar à
libertinagem. É o que João Crisóstomo (347-407)
escreveu em seu comentário a esta passagem:
“Paulo quis dizer que se nós somos livres para es-
colher, então nós deveríamos permanecer livres
e não nos tornarmos escravos de qualquer dese-
jo particular. Qualquer pessoa que controla seus
desejos permanece mestre deles, mas quando
se deixa levar pelos desejos, perde o controle
sobre a própria liberdade, e se torna escravo dos
desejos”.

Conclusão
Mesmo em um núcleo tão especial como a fa-
mília podem existir brigas e violências às vezes
inimagináveis. O ser humano tem dificuldade para
viver em grupo. Pois foi justamente para viver em
um que cada crente foi salvo por Jesus. Seria mui-
47
Imoralidade e Mundanismo na Igreja – Lição 3

to mais fácil se ele nos salvasse e em seguida


nos levasse para o alto da montanha, longe de
tudo e de todos. Mas ele nos salvou para convi-
ver com outras pessoas. Naturalmente, não sa-
bemos como exercitar este tipo de convivência.
Mas Deus quer que aprendamos.

Para pensar e agir


1. À luz do ensino de Paulo sobre imoralidade,
como buscar uma mente e coração puros?
2. Por que as lutas e conflitos interpessoais con-
tinuam existindo dentro da igreja?
3. Como o conceito de tabernáculo do Espírito
Santo pode nos ajudar a sermos melhores mor-
domos de Cristo no mundo?

48
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

Lição 4
Texto Base: 1Co 7.1-40

Questões Sobre o
Casamento Cristão
Aqui no capítulo 7 de 1Coríntios começa uma se-
ção da carta em que Paulo responde a perguntas
levantadas pela própria igreja. Estas perguntas
chegaram até ele, e aqui ele se propõe a respon-
der. Com isso, ele cumpre o seu papel apostólico,
Leitura Diária que é não apenas plantar
SEG 1Co 7.1-7 uma igreja, mas também
TER 1Co 7.8-16
QUA 1Co 7.17-31 orientá-la na doutrina e
QUI 1Co 7.32-40 no conhecimento apro-
SEX Gn 2.18-25
priado a umdiscípulo de
SÁB Hb 13.1-6
DOM Mt 19.1-12 Jesus.
49
Voltar para o sumário
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

1. Orientações quanto ao
casamento
A frase “bom seria que o homem não tocasse
em mulher” (1Co 7.1) é uma expressão idiomática
que significa concretamente o seguinte: “bom se-
ria que o homem não se casasse”. Não é possí-
vel, entretanto, usar tal expressão para estigmati-
zar a mulher na igreja, como se ela fosse impura,
e o simples toque em uma mulher contaminasse
o homem. Tanto mulheres quanto homens foram
lavados pelo sangue de Jesus e não são mais
fonte de contaminação espiritual. O que conta-
mina é o pecado, e ele não guarda gênero, po-
dendo surgir no coração de um ou outro.
Outro destaque a se fazer aqui é que esta pas-
sagem paulina também não pode ser usada para
estigmatizar o casamento. Afinal, é o próprio tex-
to sagrado que afirma a sua origem divina. Foi o
próprio Deus que fez o primeiro matrimônio, ain-
da no Éden, entre Adão e Eva (Gn 2.18). O mesmo
texto de Gênesis diz ainda que “não é bom que o
homem permaneça sozinho”. O Novo Testamento
também esclarece que o casamento é uma coisa
50
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

abençoada: “Venerado entre todos o matrimônio


é o leito sem mácula” (Hb 13.4).
Isso então levanta a pergunta: se o casamento
não é algo ruim, por que Paulo diz que seria bom
que alguém não se casasse? Para entendermos
isso precisamos lembrar do contexto histórico da
igreja de Corinto. Aqueles crentes estavam cer-
cados pela tentação sexual. Diante desta enor-
me pressão, Paulo trabalha aqui a questão: se al-
guém deveria permanecer casado ou se alguém
já casado deveria praticar o celibato.
Aparentemente, alguns membros daquela igre-
ja estavam pregando a abstinência total dentro
do casamento em função de uma compreensão
equivocada a respeito da sexualidade. Eles en-
tendiam que as relações sexuais eram pecamino-
sas em si. Outros, partindo do mesmo equívoco,
propunham o divórcio como saída para perma-
necerem puros diante de Deus.
Diante dessa situação, Paulo fornece algumas
orientações. O versículo primeiro deste capítulo
precisa ser somado ao 27, quando ele fala “da
angustiosa situação do presente”. O presente do
51
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

apóstolo e de seus discípulos realmente não era


fácil. Ser discípulo de Cristo naquele tempo en-
volvia a possibilidade eventual de perseguição e
morte. Num contexto de tal dificuldade, o solteiro
teria certa vantagem sobre o casado, que preci-
saria enfrentar as provações com sua família. Mas
fica claro pela leitura do texto que ele deixa ape-
nas um conselho, não uma determinação. Não há
nesta passagem mandamento para o casado se
separar, ou a obrigatoriedade do celibato. Paulo
exalta a abstinência sexual, mas em duas situa-
ções concretas: primeiramente, se o celibato for
um dom dado pelo próprio Deus. Estes, então,
deveriam exercê-lo com alegria. Em segundo lu-
gar, caso o casal, circunstancialmente, pratique a
abstinência em comum acordo para algum pro-
pósito de oração.
Sobre o casamento, o apóstolo deixou outros
princípios que podem ser apropriados pelos cris-
tãos de qualquer tempo:
- Uma pessoa casada pertence ao seu cônju-
ge, o que significa que o propósito da vida de um
é promover a felicidade do outro;
52
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

- Dentro do casamento, a prática do sexo é uma


dádiva dada pelo próprio Deus. A sexualidade faz
parte da constituição humana, sendo parte cons-
titutiva dos homens e mulheres;
- Uma pessoa casada que se torna cristã não
deve usar a conversão ou o seu seguimento de
Cristo como desculpa para se separar do seu côn-
juge não-convertido;
- O casamento deve ser usado pelo cristão
como espaço de atuação de Cristo, sendo uma
extensão da própria igreja;
- O casamento, entretanto, não deve impedir
um cristão de devotar sua fidelidade maior ao
Senhor Jesus Cristo.

2. A felicidade está em viver para o


serviço de Deus
Aqui nesta passagem da carta aos Coríntios não
encontramos subsídios nem para obrigar e nem
para proibir o casamento. As pessoas não são
obrigadas a se casarem. Mas também não são
obrigadas a ficarem solteiras. O que é melhor?
53
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

Para Paulo, naquele contexto histórico específi-


co, ser solteiro era uma melhor opção em fun-
ção dos perigos enfrentados pelos convertidos.
Na atualidade, vai depender da escolha de cada
pessoa.
Da mesma forma como os casamentos não são
feitos no céu, não há uma determinação divina
neste sentido. Se alguém resolveu ficar solteiro,
deve honrar a Deus com sua solteirice. Não preci-
sa se sentir uma pessoa menor num mundo cheio
de pessoas casadas. Mas precisa entender que
este estado é um dom de Deus. É preciso enten-
der como servir a Deus melhor desta forma. É im-
portante buscar oportunidades de serviço cristão
que esta pessoa dificilmente teria caso fosse ca-
sada. É possível mencionar, por exemplo, o caso
de missionários e missionárias que decidem ser-
vir a Deus como solteiros por entenderem que
isso facilita sua missão. Eles podem atuar em al-
guns contextos que uma família não conseguiria.
Mas se alguém resolveu se casar, que busque
fazer do seu casamento uma arena de culto e
serviço ao Senhor. Sirva ao seu cônjuge como
54
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

ao Senhor. Procure servir a Deus de forma com-


partilhada. Isso vale mesmo se o cônjuge não for
convertido ao Senhor. Isso faz com que o cristão
tenha uma missão de ainda maior envergadura,
já que sua casa é o seu campo missionário. Da
mesma forma como ele ora e busca a conversão
dos perdidos do Brasil e do mundo, também ora-
rá e buscará a conversão daqueles que compar-
tilham dos laços familiares.
Os versículos 10-12 deste capítulo têm produzi-
do bastante dúvida durante a história de sua in-
terpretação: “ora, aos casados, ordeno, não eu,
mas o Senhor, que a mulher não se separe do
marido (se, porém, ela vier a separar-se, que não
se case ou que se reconcilie com seu marido); e
que o marido não se aparte de sua mulher. Aos
mais digo eu, não o Senhor: se algum irmão tem
mulher incrédula, e esta consente em morar com
ele, não a abandone”. A dificuldade aqui é com
a relação à frase “digo eu” em relação a “diz o
Senhor”. O apóstolo coloca em contraponto os
ensinos transmitidos diretamente por Jesus du-
rante seu ministério terreno, e os ensinos que ele
55
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

mesmo transmite. Seria possível ver aqui a cria-


ção de dois níveis de inspiração bíblica? As pala-
vras de Jesus teriam um peso em detrimento das
palavras do apóstolo Paulo? Eventualmente uma
ou outra pessoa entende desta forma, mas não
precisa ser assim. Afinal, o apóstolo afirmou logo
no início que ele é um enviado de Cristo. Suas
palavras foram por Ele comissionadas no cami-
nho de Damasco. As orientações paulinas são,
desta forma, também orientações de Cristo.
Portanto, isso significa dizer que a grande men-
sagem destes versículos é que o status espiritu-
al do cônjuge não pode mesmo ser usado como
desculpa para o divórcio. Apesar da dificuldade
de um lar dividido na fé, o cônjuge convertido
“santifica” o lar. O cônjuge que serve ao Senhor
será o sacerdote de sua casa.

Conclusão
Não é o casamento que manterá duas pesso-
as juntas. O que as une não é um par de alianças,
ou mesmo uma cerimônia nupcial. O que mantem
duas pessoas juntas é o compromisso que am-
56
Questões Sobre o Casamento Cristão – Lição 4

bos têm diante de Deus de permanecerem uni-


dos. É este compromisso diante do Senhor que
capacita o casal a enfrentar dificuldades de toda
e qualquer natureza: crise financeira, desempre-
go, doença, pressões no trabalho e na vizinhan-
ça, tentações sexuais, depressão. Juntos diante
de Deus eles são mais fortes.

Para pensar e agir


1. Qual é o lugar do matrimônio na vida do cren-
te em Jesus Cristo?
2. O que é possível dizer para quem argumen-
ta que Paulo ordenou o celibato como a maior
expressão de espiritualidade cristã?
3. É possível usar o capítulo 7 de 1Corintios como
base para opor Paulo e Jesus no que tange ao
casamento dos crentes?

57
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

Lição 5
Texto Base: 1Co 8.1-11.1

Liberdade Cristã e
Crentes Vulneráveis
Na cidade de Corinto, a maior parte da carne
vendida nos mercados procedia de sacrifícios de
animais em templos espalhados pela cidade ou
arredores. Isso provocou a curiosa pergunta dos
crentes: se eles deveriam ou não comer carne.
Não era uma questão
Leitura Diária
SEG 1Co 8.1-13 nutricional, mas de pro-
TER 1Co 9.1-27 funda implicação espiri-
QUA 1Co 10.1-13
tual. É a resposta a esta
QUI 1Co 10.14-22
SEX 1Co 10.23-11.1 pergunta que provocou
SÁB 1Tm 4.1-5 os capítulos estudados
DOM Mt 22.34-40
nesta lição.
58
Voltar para o sumário
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

1. Qual é a relação entre a idolatria


e o açougue?
A comunidade cristã de Corinto foi fundada por
Paulo (At 18) um pouco depois dele ter passado
por Tessalônica e Atenas. Seus membros eram,
na maior parte, provenientes do paganismo. Ela
recebeu alguns judeus, passando a ser constituí-
da, então, de uma maioria gentílica e de uma mi-
noria judaica (1Co 12.2 e 7.18).
Por trás das questões dos cristãos de Corinto,
havia uma crise sobre os ídolos. Como muitos
membros da comunidade eram neófitos, haviam
deixado a idolatria não fazia muito tempo. A ques-
tão era se o cristão poderia comer carne do mer-
cado ou se deveria evitar esse tipo de alimento.
Quando se trazia alguma oferenda a uma divin-
dade, as partes não comestíveis eram queimadas
no fogo, junto com outras porções do animal, uma
parte era consumida num banquete ritual em ho-
menagem à divindade e o restante era oferecido
no mercado público. Esta era a principal fonte de
carne para os açougues da época.
59
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

Paulo aborda o problema diretamente em 1Co


8.5-6. Seguindo a argumentação, como só há um
Deus, e esse é o Deus de Israel, os ídolos não
possuem existência real. Não são vivos. Há mui-
tos que se chamam deuses, quer no céu ou so-
bre a terra, ou seja, há muitos seres imaginados
pelas pessoas como deuses, com moradas nos
céus ou na terra, mas todos só existem na imagi-
nação do adorador.
Apesar da primeira parte do argumento de
Paulo apresentar os ídolos como coisas inocen-
tes, num segundo momento ele reafirma sua pre-
ocupação: “Antes, digo que as coisas que eles
sacrificam, é a demônios que as sacrificam e não
a Deus; e eu não quero que vos torneis associa-
dos aos demônios. Não podeis beber o cálice do
Senhor e o cálice dos demônios; não podeis ser
participantes da mesa do Senhor e da mesa dos
demônios” (1Co 10.20-21).
A questão continua sendo o comer a carne ou
não. Os ídolos continuam sendo nada, mas por
trás de cada ídolo Paulo vê demônios (Dt 32.17).
Eram os seres demoníacos quem recebiam o cul-
60
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

to prestado aos ídolos. Sendo assim, a idolatria


não era simplesmente uma atividade neutra.
Os demônios se aproveitavam da inclinação
idólatra humana para receber o sacrifício. Logo,
não se deve participar da ceia do Senhor e da
ceia de demônios, ou seja, comer da comida de
ídolos. Como o mundo pagão estava imerso na
idolatria, os não-cristãos estão sob poderio de
seres celestiais, demônios. A palavra “demônio”
é raramente usada por Paulo, e, além daqui, só
voltará a ocorrer em 1Tm 4.1.
No fim, nesta questão curiosa sobre comer ou
não comer carne está um significativo argumento
do apóstolo. O problema não está realmente em
comer comida sacrificada a ídolo, mas na consci-
ência do irmão mais fraco, que ainda vê o ídolo
como algo real, o que provocaria o escândalo. A
discussão sobre as carnes se torna então um en-
sino importante sobre o que tem realmente valor
na comunidade: as pessoas. Qualquer tradição
ou ensino que as coloque em segundo plano é
legalismo e egoísmo.
61
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

2. A participação na obra de Deus


No capítulo 9, o apóstolo insere no meio da ar-
gumentação a respeito da idolatria uma reflexão
sobre o direito dos apóstolos e a forma como se
dá a participação na obra de Deus.
O apóstolo sentia um grau enorme de satis-
fação por pregar o Evangelho, de tal forma que
aplausos não faziam falta, ou mesmo lhe importa-
va. O seu prazer era promover o Reino de Jesus.
Quando ele deixava de pregar, não era mais um
apóstolo e deixava de ser ele mesmo. A prega-
ção se transformou num elemento de identidade
pessoal.
Ele cumpria sua missão com alegria e prazer.
Sua missão era difícil e perigosa, mas ele a de-
senvolvia de livre vontade porque havia nele a
convicção de que o que fazia não era para agra-
dar aos homens, mas a Deus. Mesmo diante da
falta de gratidão dos crentes, ou da presença de
violência dos incrédulos, ele tocava seu trabalho
com a certeza de que a única pessoa que ele
precisava agradar era a Deus.
62
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

A única forma de não receber críticas é não fa-


zer nada. As pessoas que mais as recebem são
aquelas que mais trabalham na obra. É sensato
então seguir o exemplo paulino e colocarmos o
foco na satisfação do Senhor Jesus.
É esta perspectiva que fez com que Paulo se
fizesse judeu para os judeus, escravo para os es-
cravos, livre para os livres, grego para os gregos.
Ele possuía uma enorme capacidade de se adap-
tar às mais diferentes circunstâncias em função,
sem se apegar a detalhes, justamente porque ele
sabia exatamente o que era importante e essen-
cial na pregação do Evangelho.
Paulo não escolhia público, e com muita frequ-
ência o encontramos procurando justamente as
pessoas mais difíceis para serem sua audiência.
É confortável pregar para um auditório amigo e
para pessoas que concordam com tudo o que
falamos. Mas, é muito complicado ministrar para
pessoas que não querem ouvir o que precisamos
falar. Entendamos que evangelizar no interior da
igreja é fácil; difícil mesmo é abrir a boca num lu-
gar cheio de pessoas adversas. Estas pessoas
63
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

que não gostam de igreja, ou da mensagem do


Reino, são justamente aquelas que se tornaram
o alvo da carreira do apóstolo Paulo.

Ele não se escondia no interior de uma comuni-


dade de fé, lamentando que o mundo não queria
ouvir o evangelho. Antes se atirava no meio das
praças e esquinas em busca das pessoas que
precisavam de salvação.

Há algumas pessoas que, esquecendo o alvo


do seu trabalho, tornam-se inflexíveis, aproprian-
do-se de uma inadequada ideia: “se o trabalho
não for feito do ‘meu jeito’, também não o farei de
‘jeito nenhum’”. Como ensina o apóstolo em sua
comparação final no versículo 25, o envolvimen-
to na vida da Igreja implica em aprendizagem,
que nos leva a mudar o que pode ser mudado.
Se a mensagem para o mundo não muda, o mun-
do em torno da mensagem muda. Se queremos
mudar o mundo, precisamos mudar a forma de o
alcançar.
64
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

3. Buscando o bem-estar do outro


Nós não somos mais donos do próprio nariz
depois de aceitarmos o senhorio de Cristo (1 Co
10:1-11:1). A partir deste momento, vivemos em fun-
ção daquele que Jesus chamou de “próximo” (Mt
22.37-39). O outro define os meus limites, pois o
meu amor molda o meu comportamento. Comerei
verdura com os vegetarianos, e churrasco com
os carnívoros. Porque enquanto procuro o bem-
-estar do próximo, eu glorifico a Deus, o criador
de todos nós.
O versículo 10.27 nos lembra que é preciso
ter algum tipo de associação com os incrédulos
para evangelizar. Quando vivemos para a glória
de Deus aprendemos a chegar ao coração das
pessoas com amor de Cristo. Um pouco antes
de chegar a Corinto, Paulo pregou no centro de
Atenas, numa região cheia de estátuas de deu-
ses. De repente ele percebe que havia uma que
não tinha nome. Ele aproveitou essa oportunida-
de e disse: “Pois, passando e observando os ob-
jetos do vosso culto, encontrei até um altar no
qual está inscrito: AO DEUS DESCONHECIDO.
65
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

Ora, esse que adorais sem conhecer, é precisa-


mente aquele que eu vos anuncio” (At 17.23). O
que Paulo fez? Em vez de dizer que tudo aquilo
em que acreditavam os atenienses era bobagem
ou besteira, ele aproveitou uma parte da própria
fé deles para fazer a ponte com o Evangelho de
Jesus Cristo que ele, Paulo, estava trazendo.
Paulo não menosprezava os incrédulos. Ele os
amou profundamente e pensava o tempo todo
numa forma de alcançá-los com o Evangelho. Ele
pagava o preço que fosse para salvar uma vida,
mesmo que para isso tivesse que “engolir sapos”
e deixar seus direitos de lado. O outro vinha sem-
pre em primeiro lugar.

Conclusão
O princípio que guiará cada decisão do cristão
é o amor. Uma pessoa que ama a Deus e ao pró-
ximo como a si mesmo conseguirá encontrar ma-
neiras apropriadas de responder a todas as ques-
tões de conduta moral. Nos tempos de Paulo, os
pagãos tinham muitos deuses falsos, mas os cris-
tãos sabiam que havia somente um Deus, o cria-
66
Liberdade Cristã e Crentes Vulneráveis – Lição 5

dor de todas as coisas, e que as sustentava até


então. Ele era o Senhor de suas vidas, e amava
profundamente o mundo. Em função deste amor,
os crentes entendiam que podiam realmente to-
das as coisas, mas nem todas eram convenien-
tes.

Para pensar e agir


1. Você já parou para pensar que a polêmica
da carne na Igreja de Corinto se reproduz na atu-
alidade todas as vezes que surge a questão de
até onde é possível participar da sociedade se-
cular?
2. Como relacionar a liberdade dada pelo
Espírito Santo com a necessidade de limites para
nossas ações a fim de não escandalizarmos de-
terminadas pessoas?
3. É possível amar quem não gosta de nós?

67
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

Lição 6
Texto Base: 1Co 11.2-14.40

A Respeito da
Adoração Cristã
Os capítulos 11 a 14 de 1Corinto são aqueles que

mais provocam debates, pelo menos em tempos

mais recentes. O motivo é que aqui Paulo tra-

balhará algumas questões ligadas ao culto e à

Leitura Diária adoração, justamente os


SEG 1Co 11.2-16
TER 1Co 11.17-34 temas com maior poten-
QUA 1Co 12.1-11
1Co 12.12-31
cial para controvérsias no
QUI
SEX 1Co 13.1-13
meio evangélico.
SÁB 1Co 14.1-19
DOM 1Co 14.20-40

68
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A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

1. O comportamento durante o
culto cristão
Esta seção se concentra principalmente em
atitudes e condutas adequadas na adoração, no
interior do culto da comunidade de fé, não no
relacionamento matrimonial ou no papel das mu-
lheres na igreja (1Co 11.2-16). Embora as instruções
específicas de Paulo possam ser culturais, como
a questão de a mulher cobrir a cabeça durante o
culto, os princípios por trás de suas instruções es-
pecíficas são atemporais, pois instruem os cren-
tes a mostrar respeito pelo irmão que adora no
banco ao lado, e a ter um comportamento reve-
rente na adoração. Se as ações de um crente
ofendem os membros da igreja, isso terá efeito
negativo na saúde do corpo, dividindo o grupo.
A reflexão aqui é sobre liturgia, mas tem como
pano de fundo ainda a busca pela unidade da
igreja. Paulo disse às mulheres que não estavam
usando coberturas para a cabeça para usá-las,
não porque fosse um mandamento bíblico, mas
porque isso impedia a congregação de buscar
em unidade a adoração. Era uma questão mes-
69
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

quinha que tirava o foco das pessoas de Cristo.


Para entender o papel do véu neste texto é
possível lembrar o contexto pagão que cercava
a igreja, e a forma como as demais mulheres da
cidade se vestiam. Mas, este aspecto histórico
não é necessariamente levantado pelo apósto-
lo. Ele prefere indicar para a igreja que o espaço
de culto é diferenciado. Eles não estão sozinhos
enquanto celebram. Há seres espirituais naquele
lugar. Daí sua referência aos anjos no versículo
11.10.
Enquanto adora, a igreja se torna um espaço
diferenciado no mundo. Naquele específico lugar
em que se reúnem os crentes, Deus é adorado, o
Cordeiro é celebrado, o mundo celestial se reúne
em prostração. A melhor imagem de uma igreja
reunida em adoração, assim, parece ser a cena
descrita em Ap 4 e 5. Durante o culto, o povo de
Deus na terra e os anjos no céu celebram a Deus
o Criador e a Jesus o Salvador. Neste lugar, com
temor e tremor, nos comportamos, nos vestimos
e falamos de forma diferenciada. Este agir de for-
ma diferenciada se traduz também nas roupas
70
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

que trajamos, trajadas ali de forma a não desviar


a atenção de qualquer um dos pequeninos (Mt
25.40) para a única razão daquele encontro: o
culto e a celebração.
Assim eles deveriam agir também com relação
à Ceia do Senhor. Um ato instaurado por Jesus
para lembrar sua morte e ressurreição foi trans-
formado pela igreja de Corinto num espaço de
glutonaria e embriaguez. Nada poderia estar mais
errado do que aquela forma de Ceia. Aquilo não
era digno do sacrifício de Jesus. Comer e beber
eles poderiam fazer em casa. Ali, reunidos como
igreja, aquela Ceia deveria ser um ato de adora-
ção a Jesus.

2. Questões sobre os dons


espirituais
O apóstolo agora ilumina alguns assuntos re-
ferentes aos dons espirituais, ou carismas, que
seria uma outra forma de falar de favores extra-
ordinários dados pelo próprio Deus através do
Espírito Santo à igreja com a missão de edificá-la.
Por meio de Sua graça universal, Deus dá talen-
71
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

tos a todas as pessoas para as mais diferentes


obras humanas. Entretanto, quando o assunto é
igreja ou atividade espiritual, essa graça se mani-
festa especificamente aos crentes regenerados
por meio de dons espirituais. É possível dizer, as-
sim, que qualquer pessoa tem talento, mas ape-
nas os crentes possuem dons espirituais recebi-
dos no momento específico de sua conversão.
Em termos esquemáticos, é possível dizer ain-
da sobre os dons:
- São as manifestações do Espírito, não do ta-
lento humano (1Co. 12.7);
- São dados pelo Espírito, não merecidos (1Co.
12.7);
- Pelo menos um dom é dado a cada crente
(1Co. 12.7);
- São dados para o proveito comum, não para
o benefício pessoal (1Co. 12.7);
- O Espírito Santo dá os dons segundo Sua von-
tade, à luz das necessidades da Igreja (1Co. 12.11);
- As listas dos dons na Bíblia são representati-
vas, não exaustivas.
72
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

- O crente não escolhe os dons que recebe, pois


são oriundos da ação soberana do Espírito Santo.
Todavia, Paulo exortou os crentes de Corinto a
procurar os dons que conduzem a edificação, e
não os dons milagrosos, porque eles são secun-
dários.

3. Administrando os conflitos
domésticos
A presente seção (1 Co 13) foi construída por
Paulo para tratar do amor entre os crentes da igre-
ja, em especial no contexto litúrgico. O amor era
o caminho para que as picuinhas (comida e vesti-
menta) perdessem o sentido e eles conseguissem
caminhar como igreja de Cristo. Entretanto, não é
difícil perceber que estes versículos servem com
muita tranquilidade também para ensinar meios
e maneiras para administrar conflitos familiares,
em especial, entre cônjuges. As ideias a seguir
saíram de um texto muito interessante produzido
pelo pastor Israel Belo de Azevedo, que com sua
costumeira objetividade, levantou alguns princí-
pios para a boa convivência doméstica.
73
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

1º princípio: cuidado com a irritação. Em 1Co


13.5 há a expressão: “não se exaspera, não se
ressente do mal”. Outra versão traduz assim: “O
amor não é irritadiço, nem melindroso.” É conhe-
cida a expressão: “fulano tem pavio curto”. Que
é uma forma de dizer que “fulano explode por
qualquer coisinha”. Pois no contexto doméstico,
usando a mesma analogia, administrar os confli-
tos significa “estender o pavio”. Pavio curto no lar
não é boa coisa. Na verdade, em nenhum lugar,
mas especialmente em casa, pessoas de pavio
curto explodem não apenas a relação, mas toda
a família. Por isso a orientação paulina: quem ama
demora para explodir. É verdade que ainda assim
é possível que haja a explosão, mas ela vai demo-
rar para chegar, dando tempo para que as pesso-
as encontrem abrigo, ou solução, para o conflito.
Quem pode dizer que nunca se irou? A raiva é um
sentimento universal, quase um instinto de defe-
sa. Quando o texto diz que o amor não se irrita
facilmente, não quer dizer que o amor não sente
raiva, porque algumas vezes o amor fica irado.
Algumas vezes, o certo que o amor precisa fa-
74
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

zer é ficar zangado. Isso pode acontecer quando


você sabe que a pessoa que ama está cometen-
do um erro, mas ela se recusa a ouvir. Se é impos-
sível não sentir eventualmente a raiva, o que pre-
cisamos fazer é administrá-la. Relacionamentos
bem-sucedidos não são aqueles em que a raiva
e os conflitos não existem, e sim aqueles em que
se aprende a administrar a raiva e os conflitos. A
maioria dos relacionamentos que deram errado
teriam dado certo se as pessoas aprendessem a
administrar seus momentos de ira. Como admi-
nistramos a raiva? Talvez a melhor ilustração seja
uma explosão sob controle. Um prédio cair é de-
sastre na certa. Mas se ele cai com a ajuda de
uma equipe de profissionais, não causa dano al-
gum. Ele cai no lugar no certo, na hora certa, sem
ferir ninguém, com toda a segurança possível.
2º princípio: a busca pela verdade. O texto diz
que o “amor se alegra com a verdade.” (v. 6). O
amor deseja a verdade. A desonestidade des-
trói os relacionamentos. A consequência de es-
conder a verdade é a superficialidade nos rela-
cionamentos. Você não pode ser íntimo de uma
75
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

pessoa escondendo a verdade. Mas é importan-


te não usar a verdade como uma arma. Fale com
mansidão. Algumas vezes a verdade fere, mas a
longo prazo é benéfica. Em outras vezes, pode
ser a verdade, mas se não for para edificar, não
fale. É importante lembrar que há várias maneiras
de falar a mesma coisa.
3º princípio: Combata a inveja. Algumas pesso-
as parecem ter o prazer de jogar lama nos outros.
Em 1Co 13.4 encontramos: “o amor não é invejoso”
ou “o amor não arde em ciúmes”. O que é inveja?
Inveja é diferente de ciúme. A inveja causa todo
tipo de conflito e disputa, incita ressentimentos,
causa amargura, faz da vida uma existência mi-
serável. A inveja é para a alma como o câncer é
para o corpo. Ela vai crescendo e crescendo até
você ficar obcecado com a competição.
4º princípio: Ame sem orgulho. O orgulho pro-
voca cegueira. O orgulho nos cega para com as
nossas faltas. Quando tenho orgulho em minha
vida, não consigo enxergar meus defeitos, e as-
sim não vou poder ajudá-lo com os seus. O or-
gulho distancia as pessoas. O orgulho me faz ser
76
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

indiferente, superficial. O medo da rejeição que


não nos deixa ser íntimos. O orgulho adia a re-
conciliação.
5º princípio: Combata a grosseria. Não há es-
paço para a rudeza num coração que ama. O
que é grosseria? É falta de respeito para com os
outros. A grosseria significa que não me importo
com você. Eu penso só em mim mesmo. Não im-
porta o que os outros pensem; se magoa ou não.
Você pode resumir grosseria numa só palavra:
egoísmo.

Conclusão
Os dons espirituais se tornaram símbolos de
poder espiritual, causando rivalidades na igreja.
Algumas pessoas pensavam que eram mais “es-
pirituais” do que outras em função do que pode-
riam fazer dentro do culto. Este foi um terrível uso
dos dons espirituais. O papel deles é ajudar a
igreja a funcionar melhor, não a dividir. Como em
outras seções, Paulo nos ensina que devemos
usar os dons e talentos que Deus nos deu com
sensibilidade para as necessidades do próximo
77
A Respeito da Adoração Cristã – Lição 6

e da coletividade do corpo de Cristo.

Para pensar e agir

1. O culto comunitário, quando o crente se reú-


ne com seus irmãos, é o espaço privilegiado para
a edificação mútua. Quais seriam as causas de
conflitos e disputas que eventualmente nele se
manifestam?

2. Os eventuais conflitos nas igrejas produzi-


ram um fenômeno conhecido atualmente como
“desigrejados”, ou seja, pessoas que entendem
que é melhor viver a vida cristã fora de comuni-
dades eclesiásticas. Que respostas poderíamos
dar para estas pessoas retornarem para a comu-
nhão de uma igreja local?

3. Por que Paulo conclui a seção dos dons es-


pirituais com uma descrição do papel do amor na
vida cristã?
78
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

Lição 7
Texto Base: 1Co 15.1-58

Onde Está, Morte, a


Sua Vitória?
A grande esperança da igreja é a volta de
Jesus. Todo crente anseia vê-lo retornar no céu
para buscar seus filhos e filhas. Desde o Antigo
Testamento o povo de Deus espera pelo momen-
to em que todo o mal será derrotado e a morte
será destruída. Isso levou
Leitura Diária
SEG 1Co 15.1-11 Paulo a escrever em uma
TER 1Co 15.12-19 de suas cartas a seguin-
QUA 1Co 15.20-28
te pergunta: “Onde está,
QUI 1Co 15.29-34
SEX 1Co 15.35-49 morte, a sua vitória?” (Rm
SÁB 1Co 15.50-58 7.13), algo que hoje canta-
DOM 1Ts 4.13-18
mos em lindos hinos.
79
Voltar para o sumário
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

1. Esperança judaica versus


expectativa grega
Ao observarmos a estrutura desta carta aos
Coríntios vamos perceber uma curiosa ênfase: o
corpo. Vejamos:
- Apresentação (1.1-9)
- Divisões na igreja (1.10-4.21)
- Problemas de imoralidade (5.1-13)
- Problemas com processos judiciais (6.1-11)
- As questões relacionadas com o corpo (6.12-
20).
- As questões em torno do casamento cristão
(7.1-40)
- A liberdade cristã e a questão da comida (8.1.-
11.1)
- As questões em torno do culto (roupa e comi-
da) (11.2-14.40)
- A ressurreição dos mortos (15.1-58)
- A coleta para os necessitados (16.1-4)
- Conclusão da carta (16.5-24)
Seria exagero dizer que a maior parte da carta
80
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

trata de questões em torno do corpo? Parece que


não. Por isso, não é surpresa que Paulo gaste 58
versículos para discutir exatamente a temática da
ressurreição do corpo.
Como já falamos antes, Paulo trabalhou na cida-
de de Corinto após sua passagem pelo Areópago
de Atenas (At 17). Começando pelo Deus des-
conhecido, o apóstolo pregou para um público
ateniense sua mensagem. Eles o ouviram aten-
tamente até o momento em que ele falou da res-
surreição dos mortos (At 17.31). Segundo a narrati-
va bíblica, assim que Paulo tocou neste assunto,
ele perdeu seu auditório. Eles logo começaram a
caçoar dele, deixando bem claro que sobre isso
eles não estavam nem um pouco dispostos a ou-
vir (At 17.32).
Usemos essa reação dos atenienses à mensa-
gem da ressurreição como exemplo do que esta-
va acontecendo também em Corinto. Os gregos
não gostavam deste assunto. A cultura grega ti-
nha diversas expressões dualistas, e a de Platão
é a mais conhecida, que menosprezava o corpo
em detrimento do espírito. É um dualismo que re-
jeita o corpóreo, que o entende como inferior e
81
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

mal. O corpo era considerado mesmo uma prisão


do espírito. O desejo de pelo menos uma parce-
la destes gregos era escapar do corpo e libertar
o espírito.
Envolvidos por esta atmosfera helenista, os
crentes de Corinto colocaram em dúvida a ressur-
reição escatológica dos crentes, tema que Paulo
tem em sua pregação desde o início de sua mis-
são apostólica, como a leitura das duas cartas de
Tessalonicenses pode demonstrar.
Ao contrário dos gregos, os judeus não tinham
a mesma perspectiva quanto ao corpo. Suas
Escrituras apresentam uma antropologia que dá
considerável importância para os aspectos cor-
póreos da humanidade. Afinal, Deus fez Adão já
com corpo (Gn 1-2). Não havia nada de errado
com este primeiro ser criado. Ele foi feito perfei-
to, sem defeito de fabricação. Não há em Adão
uma oposição entre corpo e espírito, entre uma
parte boa e uma parte má, porque ambas as par-
tes procedem do mesmo Deus. Após criar o pri-
meiro casal, com corpo e tudo, o Criador emitiu
sua avaliação: “e eis que era muito bom” (Gn 1.31).
82
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

Por isso, a esperança de salvação que se ma-


nifesta nas Escrituras judaicas tem lugar para o
corpo. Para os gregos, a alma era o alvo da sal-
vação. Para os judeus, não há salvação sem o
corpo. Portanto, o clímax desta escatologia ve-
terotestamentária pode ser encontrada na gran-
de esperança de Daniel 12.2: “E muitos dos que
dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para
vida eterna, e outros para vergonha e desprezo
eterno”.

2. Um corpo como o de Jesus


É preciso entender que não há uma doutrina de
salvação exclusiva da alma nas tradições judaicas
justamente porque para os leitores de Moisés e
os Profetas, a existência corporal é essencial (Is
25.8). Já que corporeidade é essencial à vida hu-
mana, a salvação significa salvar o homem intei-
ro, como o próprio Paulo escreverá com muita
clareza em sua carta aos Filipenses: “a nossa ci-
dade está nos céus, donde também esperamos
o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transfor-
mará o nosso corpo abatido, para ser conforme o
seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder
83
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

de sujeitar também a si todas as coisas” (Fl 3.20-


21).
Volte a essa passagem novamente e perceba
que Paulo fala de uma transformação do corpo
“abatido” (este corpo) para que ele seja segundo
o corpo glorioso (de Jesus). Se os judeus (com
exceção dos saduceus) acreditavam na ressur-
reição escatológica a partir exclusivamente das
Escrituras judaicas, o apóstolo tem um elemen-
to de ainda mais magnitude: a ressurreição de
Jesus. A ressurreição de Jesus não foi uma res-
suscitação, como foi o caso da viúva de Naim ou
seu amigo Lázaro. Estes morreram novamente.
Jesus, não. Ele se levantou da morte porque ele
a derrotou. Sua ressurreição é a glorificação es-
catológica esperada por Daniel, mas antecipada
prolepticamente para aquele Domingo de Páscoa.
Suas aparições posteriores, assim, são semelhan-
tes às teofanias dos tempos dos patriarcas, ou
ao fogo da sarça ardente. Jesus aparece e desa-
parece quando quer. Ele entra sem precisar abrir
a porta, pois seu corpo é agora “corpo glorifica-
do”. Ele pode partir o pão com os discípulos de
Emaús, pode assar alguns peixes para Pedro à
84
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

beira do Mar da Galileia, pode pedir para Tomé


tocar nas marcas em suas mãos e lateral, mas só
porque deseja. Quando quer, também pode eva-
porar diante de seus olhos ou flutuar na direção
das nuvens. E foi assim que Paulo o viu no cami-
nho de Damasco, em brilho e glória.
A ressurreição de Jesus foi inteira, com o corpo
também, para um estado de glorificação. Dessa
ressurreição de Jesus, é possível apontar:
• Jesus preservou sua identidade. Ele era o
mesmo que foi crucificado;
• continuidade: Jesus se levantou sem um cor-
po físico que poderia atuar sobre a matéria. Paulo
insiste na natureza corporal da ressurreição;
• Descontinuidade: era uma forma corporal, mas
não o mesmo corpo, já que ele foi transformado
por novos poderes e habilidades.
O que Paulo argumenta em 1Co 15 é que a res-
surreição de Jesus é o início da ressurreição es-
catológica. É a primeira de uma série. Seus dis-
cípulos ressuscitarão como ele. Além disso, a
ressurreição de Jesus é a garantia da ressurrei-
ção de seus discípulos (1Co 15.14-18). Negar a res-
85
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

surreição dos discípulos seria então negar a res-


surreição de Jesus. Quem adotasse tal caminho
era, para Paulo, o mais miserável dos homens (1Co
15.19), pois se “Cristo não ressuscitou, é vã a nos-
sa pregação, e é vã a vossa fé” (v. 14).
Para Paulo, há diferentes tipos de corpos (corpo
humano, corpo de uma estrela). Ele também usa a
ilustração da semente, que após semeada, mor-
re para dar origem à árvore (1Co 42-43). Semeia-
se corpo físico, nasce corpo espiritual (1Co 15.44).
Paulo usa duas expressões em contraste: “soma
psyche” e “soma pneumatiche”. No primeiro caso,
ele fala de um corpo (soma) animado e feito para
a vida (psyche). No segundo caso, ele fala de um
corpo (soma) animado e feito para o espírito. Não
é um corpo feito de espírito, mas um corpo trans-
formado por e adaptado para a nova vida espiri-
tual.
Mas, acima de tudo, o corpo da ressurreição
será como o corpo ressurreto de Jesus: impere-
cível, glorioso, perfeito.
86
Onde Está, Morte, a Sua Vitória? – Lição 7

Conclusão
O embate entre expectativa judaica e grega
não terminou nos tempos paulinos. Até os dias
de hoje ainda encontramos um dilema parecido
em uma falsa dicotomia que eventualmente surge
entre os crentes a respeito da relação entre corpo
e espírito. Uma igreja que nega o corpo despre-
za uma das principais esperanças do evangelho
de Jesus: há um lugar para o corpo no plano de
Deus para cada um de nós.

Para pensar e agir


1. Quais seriam as razões para Paulo gastar tan-
to espaço nesta carta para o tema da Ressurreição
dos mortos?
2. Por que negar a ressurreição escatológica
dos mortos é igualmente negar a ressurreição
histórica de Jesus?
3. Qual é o papel do corpo no plano da reden-
ção de Deus?
87
A Assistência Social – Lição 8

Lição 8
Texto Base: 1Co 16.1-24

A Assistência Social
Paulo acabara de dizer que nenhuma boa ação
é em vão (1Co 15.58). Neste capítulo, ele menciona
então algumas ações práticas que têm valor para
todos os cristãos. Os irmãos de Corinto são con-
vidados a se juntar aos crentes em outras áreas
para apoiar a igreja em Jerusalém. Paulo dificil-
mente poderia encontrar
Leitura Diária
1Co 16.1-4
um exemplo mais prático
SEG
TER 1Co 16.5-9 da unidade do corpo de
QUA 1Co 16.10-14
Cristo do que este proje-
QUI 1Co 16.15-24
SEX Rm 15.1-33 to de todas as igrejas do-
SÁB 1Tm 4.6-16 arem para ajudar os ca-
DOM 1Tm 5.1-16
rentes de Jerusalém.
88
Voltar para o sumário
A Assistência Social – Lição 8

1. A oferta como manifestação do


amor cristão
Envolvidos por pressões de todos os tipos, os
crentes de Jerusalém vivem numa situação de
extrema pobreza. A história de Ananias e Safira
(Atos 5) evidencia uma prática muito peculiar. Os
novos convertidos vendiam seus bens e davam
para a cesta comum da igreja administrar. É pro-
vável que esta prática dos crentes de Jerusalém
não tenha sido replicada nas demais igrejas do
Novo Testamento, já que não encontramos sinais
desta ação nas demais igrejas mencionadas no
Novo Testamento. Não se sabe se eles agiam
assim em função de seu caráter predominante-
mente judaico, ou mesmo em função da exacer-
bação da expectativa da volta iminente de Jesus.
De qualquer forma, a bolsa em comum em algum
momento esvaziou, deixando muitos membros
da igreja numa situação de penúria acentuada.
Isso contextualiza o último capítulo de 1Coríntios.
Nele encontramos uma longa exposição dos de-
sejos sinceros de Paulo em levantar uma oferta
para ajudar os pobres da primeira igreja. Neste
89
A Assistência Social – Lição 8

período, Paulo demanda das igrejas que fundou,


igrejas formadas predominantemente por gen-
tios, ajuda para os irmãos de Jerusalém.
Paulo faz menção disso em mais de uma epís-
tola (Gl 2.10; 2Co 8-9; Rm 15.26-31). Ele entendia
que esta ação era uma demonstração pública da
unidade dos crentes, uma forma de dizer que a
igreja estava unida, independente de sua com-
posição judaica ou gentílica.
Os crentes de Corinto ouviram falar do levanta-
mento desta oferta e se perguntaram como pode-
riam ajudar. Paulo lhes dá então instruções muito
parecidas com as que ele dá às igrejas da Galácia
(1Co 16.1-2): que no primeiro dia da semana eles
separem uma oferta, segundo a capacidade de
cada um para contribuir.
É bonito perceber que a expressão «no primei-
ro dia da semana» indica que aqueles irmãos, há
mais de dois mil anos, já se reuniam num dia de
domingo para cultuar. O que a igreja faz nos dias
atuais, eles já faziam naqueles dias longínquos
em que os romanos ainda eram os senhores do
Mar Mediterrâneo.
90
A Assistência Social – Lição 8

Em seguida, a igreja deveria eleger algumas


pessoas para levar as ofertas diretamente para
Jerusalém. Paulo não exigia que ele mesmo o fi-
zesse. O que ele mais deseja é que a igreja de
forma voluntária participasse, para que os cren-
tes de Jerusalém percebessem que irmãos de
longe, independentemente de língua ou cultura,
se interessavam pelo seu bem-estar. O importan-
te aqui não é a quantidade do dinheiro levanta-
do, mas o coração e o amor pelo próximo que se
concretiza na oferta.
Um aspecto digno de reflexão é que nós ten-
demos a pensar na generosidade como doação
espontânea e eventual. Mas a generosidade é
demonstrada especialmente pelo compromisso
de dar regularmente aos necessitados. Certos
projetos podem exigir um único ato. Um grupo de
crentes em dificuldades pode precisar de ajuda
temporária e emergencial. Outras vezes, é preci-
so manter a ajuda por meses ou anos. Pastores,
missionários e outros servos de Deus que traba-
lham no campo só podem fazê-lo quando outros
crentes sustentam seus ministérios.
91
A Assistência Social – Lição 8

2. Paulo, Timóteo e Apolo (16.10-12)


Segundo 1Co 4.17, Paulo já enviara Timóteo até
a igreja de Corinto com uma determinada missão.
Timóteo é novamente mencionado aqui em 1Co
16.10. O apóstolo orienta os crentes a receberem
o jovem discípulo como se fosse o próprio Paulo,
porque ambos estão dedicados ao cumprimento
da mesma obra. Esse pedido implica que a igreja
não estava dando o devido valor a Timóteo, em
função de sua juventude. Eles não queriam uma
pessoa tão jovem na liderança. Eles desejavam
o retorno de Apolo. Este, por sua vez, não estava
tão interessado em retornar à igreja, pelo menos
naquele momento. Paulo não se importava em
enviar Apolo, mas este querido companheiro de
ministério possivelmente estava temeroso de que
sua presença fortalecesse determinado partido
da igreja que tinha preferência pelo seu nome e
por sua capacidade na oratória. Corinto preferia
Apolo, mas Paulo entende que é de Timóteo que
eles precisam.
Nestes dois pequenos versículos, percebemos
algumas lições muito significativas para as igrejas
92
A Assistência Social – Lição 8

de outros tempos. Em especial, idade não é do-


cumento. Juventude não é sinal de incapacida-
de, da mesma forma que cabelos brancos não é
sinal de capacidade. A capacidade para dirigir a
casa de Deus não guarda relação com o número
de anos de nossa biografia. O mundo prefere os
braços fortes para alguns trabalhos, e a experi-
ência para outros. Talvez você conheça o ditado
que diz: “cachorro novo late correndo, cachorro
velho late sentado”. É senso comum que qual-
quer cachorro pode latir, independentemente da
idade. No caso específico da liderança da igreja,
o determinante é a vocação espiritual. Os traços
que a igreja precisa buscar no líder não são sua
capacidade para falar, ou seus diplomas acumu-
lados, mas as evidências de ser um obreiro cha-
mado para o ministério.

3. Verdadeiras e falsas doutrinas


(16.13-24)
As partes finais desta carta servem como des-
pedida sim, mas também como um resumo dos
principais aspectos da carta como um todo. Os
93
A Assistência Social – Lição 8

crentes da cidade de Corinto devem tomar cui-


dado com as influências perniciosas do contexto
em torno do qual viviam. O meio ambiente daque-
la igreja era predominantemente perigoso. Não
seria fácil conservar puro o evangelho, em fun-
ção de todas as pressões pagãs. Essas pressões
estavam produzindo uma forte divisão na igreja.
Para enfrentá-las, Paulo propõe o amor como a
pedra angular para a sobrevivência da igreja.
Paulo termina com palavras de saudação de
alguns companheiros mais próximos do seu mi-
nistério. Ou seja, são crentes de Éfeso saudando
os crentes de Corinto. As igrejas de Jesus Cristo
podem estar separadas geograficamente, mas
elas ainda fazem parte de um mesmo rebanho,
cujo pastor é Jesus Cristo.

Conclusão
Misericórdia é uma disposição interior para
ajudar o próximo. Ela é parte do caráter cristão
construído em nós pelo Espírito Santo. Não há
desculpa para não ajudar. Mesmo assim, elas são
levantadas. Estas apontadas abaixo são algumas
94
A Assistência Social – Lição 8

que eventualmente podem surgir:


Os pobres não merecem ajuda. Eles caíram na
pobreza por conta própria. Podem sair de lá so-
zinhos.
Não conheço nenhuma pessoa que precisa de
ajuda.
Eu tenho minhas próprias necessidades. Sou
eu que preciso de ajuda.
Qualquer quantia que eu der para estas organi-
zações será desperdiçada, roubada ou gasta em
outras coisas. Eu não confio em ninguém para
gerenciar estas ofertas, por isso prefiro não con-
tribuir.
Não sei como ajudar, e não tenho tempo para
descobrir.
Minha ajuda fará falta no meu orçamento, e eu
sou uma pessoa muito cuidadosa com meu di-
nheiro.
Em vez de dar desculpas esfarrapadas, deve-
mos nos envolver com todas as forças na missão
de promover uma vida melhor para aqueles que
estão à nossa volta, especialmente os irmãos na
95
A Assistência Social – Lição 8

fé.

Para pensar e agir


1. Minha igreja tem programas que ajudam os
necessitados? Como posso me voluntariar para
trabalhar em uma instituição de ajuda humanitá-
ria?
2. Como trabalhar na igreja os conflitos entre as
gerações que colocam em lados opostos a força
da juventude e a experiência dos mais vividos?
3. Ajudar ao próximo foi uma das marcas das
igrejas dos primórdios, o que incluía, eventual-
mente, até ajuda funeral para aqueles que não
tinham lugar para serem enterrados. Esta dispo-
sição para praticar o amor era manifestada tanto
para os membros da comunidade quanto para
aqueles que estavam fora dela, o que veio a se
tornar um importante instrumento de evangeli-
zação do Cristianismo antigo. Precisamos refletir
sobre a ajuda ao próximo também como um me-
canismo de evangelização.
96
Consolação e Consolo – Lição 9

Lição 9
Texto Base: 2Co 1.1-2.17

Consolação e
Consolo
Nas lições anteriores, nos debruçamos sobre
a Primeira carta aos Coríntios. Depois de tudo o
que escreveu, Paulo poderia imaginar que tudo
se resolveu em Corinto. Mas não aconteceu as-
sim. Os crentes de lá continuaram a manifestar
comportamentos pouco saudáveis na vida cristã.
Leitura Diária
Além disso, eles reagiram
SEG 2Co 1.1-2
negativamente às tenta-
TER 2Co 1.3-11 tivas de aconselhamen-
QUA 2Co 1.12-14 to de Paulo. Alguns, de
QUI 2Co 1.15-2.4 maneira agressiva, che-
SEX 2Co 2.5-13 garam a atacar a pessoa
SÁB 2Co 2.14-17
do Apóstolo e, junto, sua
DOM Gl 2.1-10
mensagem.
97
Voltar para o sumário
Consolação e Consolo – Lição 9

Foi nesse momento que as palavras da Segunda


carta aos Coríntios foram escritas. Isso explica o
tom de defesa desta segunda carta. Paulo não
apenas defende o seu ministério, mas a mensa-
gem de salvação que estava ao redor de sua vida
e testemunho.

1. O contexto histórico de
2Coríntios
Depois de ter escrito aos crentes de Corinto a
carta que conhecemos como 1Coríntios, Paulo foi
surpreendido com a rebeldia persistente daque-
les crentes. Eles não só relutavam em seguir suas
orientações, mas também começaram a duvidar
de sua idoneidade como ministro do Evangelho
de Cristo.
Ao tomar conhecimento disso, Paulo reage com
energia. Ele hesita em ir até Corinto pessoalmen-
te, com medo de ferir os crentes com uma repri-
menda muito severa. Para abordar esse proble-
ma, ele escreve a Segunda Carta aos Coríntios.
Nela, há momentos suaves, mas também momen-
tos mais contundentes, principalmente após o ca-
98
Consolação e Consolo – Lição 9

pítulo 10. A razão para isso pode ser atribuída a


duas situações diferentes. Ele teria escrito os ca-
pítulos de 1 a 9 em um momento e os capítulos
subsequentes em outra oportunidade. A mudan-
ça de tom entre essas duas partes de 2Co pode
ser explicada como resultado de dois momentos
distintos.
Entre as cartas de 1Co e 2Co, ocorreram uma
série de eventos. O principal deles foi uma visita
que Paulo fez à igreja, na qual foi duramente in-
sultado por um membro da comunidade (2Co 2.1;
12.14; 13.1). Depois de retornar a Éfeso, ele escre-
veu o conteúdo que provavelmente encontramos
em 2Co 10.13. É uma seção enérgica de Paulo,
com palavras fortes, em tom de defesa de seu
próprio ministério. Esta carta teria sido enviada a
Corinto por meio de Tito.
Essa carta (2Co 10.13) provavelmente é a “car-
ta de lágrimas” mencionada por Paulo em 2Co
2.4. Ou seja, essa carta escrita em meio a “muita
tribulação e angústia do coração”, com “muitas
lágrimas”, não seria a nossa 1Co canônica, mas a
parte final de 2Co 10 a 13.
99
Consolação e Consolo – Lição 9

Depois que Tito visitou a igreja e trouxe boas


notícias, Paulo escreveu uma carta de reconci-
liação em tom muito mais ameno, que compõe a
parte inicial de 2Co 1 a 9. Não se sabe ao certo
o motivo da fusão das duas cartas em um único
documento, ou mesmo quem inverteu a ordem,
mas isso não seria difícil em uma época em que
os documentos eram preservados em rolos ma-
nuscritos. Não há dúvida, entretanto, de que am-
bos os textos paulinos foram escritos no mesmo
ano, separados apenas pela ida e volta de seu
jovem discípulo.

2. O Deus de toda a consolação


Após a saudação inicial, a carta dá lugar a uma
belíssima bênção. Nela, Paulo introduz o tema do
consolo. Deus é o Deus de toda consolação, que
nos conforta em toda tribulação e nos impulsiona
a consolar os outros aflitos com o mesmo confor-
to que recebemos (2Co 1.4).
O termo “consolar” em grego não se refere
apenas a animar alguém, mas também a conce-
der energia. Paulo utiliza a metáfora de dar parti-
100
Consolação e Consolo – Lição 9

da em um carro com bateria descarregada para


explicar esse conceito. Assim como um motorista
amigo energiza a bateria descarregada de outro
carro, o crente, fortalecido por Deus, comparti-
lha esse fortalecimento com aqueles que neces-
sitam. Isso reflete o consolo esperado por Paulo,
onde aqueles que receberam fortalecimento di-
vino podem fortalecer outros.
Há uma conexão intrínseca entre sofrimentos e
consolo. Deus não permite que seus filhos enfren-
tem mais do que podem suportar (1Co 10.13). Paulo
também escreverá em outro lugar: “Sabemos que
todas as coisas cooperam para o bem daqueles
que amam a Deus, daqueles que são chamados
segundo o seu propósito.” (Rm 8.28).
Paulo se referirá em 2Co 8 a uma aflição es-
pecífica que enfrentou na província romana da
Ásia, possivelmente na cidade de Éfeso. Embora
ele não dê detalhes, é tradicionalmente entendi-
do como uma enfermidade grave que o apóstolo
enfrentou, chegando ao ponto de temer por sua
vida. No v. 9, ele aponta que a razão para essa
experiência quase fatal foi a providência divina:
101
Consolação e Consolo – Lição 9

“a fim de que não confiássemos em nós mesmos,


mas em Deus, que ressuscita os mortos.”

3. Os dois lados do Evangelho


A seção que se inicia em 2Co 1.12 se estende
até o final do capítulo 2. Nela, Paulo explica por
que demorou a visitar a Igreja de Corinto, contan-
do eventos que ocorreram durante sua viagem.
No versículo 2.14, ele utiliza a imagem de uma
entrada triunfal militar em Roma para ilustrar os
frutos de seu ministério. Essas paradas eram rea-
lizadas após uma guerra, onde o vencedor era o
destaque. Na analogia de Paulo, Deus é o gene-
ral vitorioso e os crentes são o despojo da guer-
ra, sendo conduzidos triunfantemente diante do
mundo.
Paulo adota essa imagem para enfatizar que
os crentes de Cristo não podem passar desper-
cebidos, assim como uma procissão triunfal era
impossível de ser ignorada. Da mesma forma, os
crentes devem levar o aroma do conhecimento
de Cristo a todos ao seu redor: “Porque nós so-
mos para Deus o aroma de Cristo entre os que
102
Consolação e Consolo – Lição 9

estão sendo salvos e os que estão perecendo”


(2Co 2.15).
A parada triunfal romana era festiva para os
vencedores, mas indesejável para os derrotados,
como os judeus levados por Tito para Roma após
a guerra judaico-romana do ano 70. Para o impe-
rador, era uma representação de vitória; para os
judeus, era um sinal de morte. Paulo esclarece
que o evangelho não agrada a todos: “Para com
estes, cheiro de morte para morte; para com aque-
les, aroma de vida para vida. E para estas coisas,
quem está à altura?” (2Co 2.16). Para os crentes,
o evangelho é vida eterna; para os incrédulos, é
condenação e morte.

Conclusão
Assim como na primeira carta e em grande par-
te de suas obras, Paulo se apresenta como um
apóstolo comissionado diretamente por Deus.
Timóteo, agora co-autor, era conhecido na igre-
ja, tendo apoiado Paulo durante a plantação da
Igreja de Corinto. Paulo e Timóteo enviam “gra-
ça” e “paz” aos destinatários da carta. “Graça” era
103
Consolação e Consolo – Lição 9

uma saudação comum entre os gregos, enquan-


to “paz” era comum entre os judeus. Ao combinar
essas duas expressões, o apóstolo reforça que
a Igreja está acima de uma cultura específica. A
igreja não é grega nem judaica; ela é universal,
pluriétnica, composta por povos de todas as ra-
ças, tribos, línguas e nações.

Para pensar e agir


1. Se Deus é capaz de ressuscitar os mortos,
por que Ele não seria capaz de curar alguém de
uma doença? Deus tem poder sobre a vida e a
morte, sobre a doença e a saúde. Não há adver-
sário que Ele não possa vencer, nem inimigo que
possa resistir. No entanto, é importante compre-
ender que a vontade de Deus prevalecerá.
2. Como você compreende a antipatia que a
pregação do Evangelho pode gerar em certos
contextos?
3. Devido à presença de Cristo na vida do cren-
te, é possível ser um cristão de maneira oculta?
104
A Defesa do Ministério – Lição 10

Lição 10
Texto Base: 2Co 3.1-4.18

A Defesa do
Ministério
Esta seção de 2Co faz parte da autodefesa de
Paulo. O leitor precisa ter em mente que esse
tipo de texto é uma espécie de diálogo com um
público imaginário. O autor bíblico antecipa como
as pessoas reagirão às suas palavras e responde
antecipadamente a essas questões. São passa-
Leitura Diária
gens fortes e vigorosas,
SEG 2Co 3.1-11
quase como um debate.
TER 2Co 3.12-18 O apóstolo entende que
QUA 2Co 4.1-6 precisa apresentar essas
QUI 2Co 4.7-15 palavras de defesa por-
SEX 2Co 4.16-18 que o evangelho que ele
SÁB 2Tm 2.1-13
pregou estava associado
DOM Cl 3.1-17
à sua vocação. Questionar
105
Voltar para o sumário
A Defesa do Ministério – Lição 10

sua pessoa era também questionar a palavra que


ele pregou.

1. As credenciais do apóstolo Paulo


Paulo realmente possui credenciais. Sua “carta
de recomendação” estava escrita nos corações
dos crentes fiéis de Corinto. Essa carta é muito
mais permanente do que qualquer documento
de papel e tinta. A vida transformada daqueles ir-
mãos era a prova de seu apostolado e comissão:
“Vós sois a nossa carta, escrita em nosso cora-
ção, conhecida e lida por todos os homens” (2Co
3.2). O que poderiam os falsos profetas mostrar?
Como as credenciais escritas em papiro que eles
carregavam poderiam se comparar com as reco-
mendações vivas de Paulo? Paulo não reivindica
a autoria dessa carta escrita no coração, porque
não foi ele quem a escreveu. Ele era apenas o
instrumento que Cristo usou para redigi-la.
De qualquer forma, ela era a evidência neces-
sária para demonstrar que ele realmente havia
sido vocacionado por Jesus para aquela missão.
Onde quer que o evangelho de Cristo seja pro-
106
A Defesa do Ministério – Lição 10

clamado, as vidas transformadas são a prova do


seu poder. Os frutos da pregação são uma carta
cujo autor é o próprio Cristo, divulgada para que
todos possam ler. Os pregadores não passam,
então, de instrumentos empunhados pelo Espírito
Santo.
Após levantar os testemunhos das vidas trans-
formadas como evidência do seu apostolado,
Paulo declara a fonte de sua autoridade: “A nos-
sa suficiência vem de Deus” (2Co 3.5). Isso era
algo que seus adversários da igreja não podiam
afirmar. Afinal, nenhum deles havia se encon-
trado com o Cristo ressurrecto pessoalmente.
Percebemos que o apóstolo baseia tudo o que
ensinou aos crentes naquele encontro no cami-
nho de Damasco, quando Jesus “nos habilitou
para sermos ministros de uma nova aliança” (2Co
3.6).

2. Cegos para a luz do Evangelho


A partir do versículo 6, a epístola inicia uma série
de oposições entre carne e espírito, pedra e co-
ração, glória humana e glória divina. O contexto é
107
A Defesa do Ministério – Lição 10

o contraste feito por Paulo entre Lei e Evangelho.


No monte Sinai, a Lei foi escrita em tábuas de pe-
dra (Ex 31.18), mas o próprio texto antigo já anun-
ciava que esse meio de escrita (pedra) era transi-
tório. Jeremias profetizou a respeito de uma lei a
ser escrita nos corações (Jr 31.33). Ezequiel falou
na substituição de corações empedernidos por
corações de carne (Ez 11.19).
Paulo entende que esse tempo já chegou, e só
não o vê quem tem os olhos cegos por um “véu”
(2Co 3.14-16). Por isso os compatriotas judeus não
aceitaram Jesus como seu Messias, apesar da in-
sistência de Paulo em visitar suas sinagogas em
cada cidade por onde passasse. Paulo ora pela
conversão de seus irmãos, para que esse véu fi-
nalmente caia de seus olhos.
Foi o Espírito Santo de Deus que operou nos
corações dos crentes para abrir seus olhos e re-
generar seus corações. A partir daí, o legalismo
e a idolatria são deixados para trás, pois o impor-
tante é seguir a vontade de Deus e servi-lo ao
longo da vida. Esse novo crente agora cumpre
a vontade de Deus não porque não tem outra
108
A Defesa do Ministério – Lição 10

opção, não porque é obrigado, não porque está


sendo vigiado, mas porque deseja de todo o co-
ração.
A principal implicação da natureza espiritual da
Bíblia pode ser demonstrada claramente através
de passagens bíblicas como 1Co 2.14 e 2Co 4.3-4
(leia as passagens). Nestes textos, a Bíblia ensina
claramente a incapacidade do indivíduo não-re-
generado por Cristo de compreender a revelação
de Deus. A razão dessa incapacidade é a ceguei-
ra espiritual em que se encontra como resultado
da queda. A cura dessa cegueira não é intelectu-
al, mas espiritual. Somente o Espírito Santo pode
fazer resplandecer a luz do Evangelho em um co-
ração nas trevas.
Isso demonstra o caráter espiritual envolvido
na interpretação das Escrituras. O apóstolo Paulo
explica que os judeus tinham como que um véu
embotando seus olhos espirituais, de modo que
não podiam compreender o significado do que
liam, por causa da incredulidade. Como esse véu
poderia ser retirado? Pela conversão, responde
o apóstolo Paulo. Essa mesma verdade é aplica-
109
A Defesa do Ministério – Lição 10

da a todas as pessoas sem Cristo em passagens


como Ef 4.17-18.
A ação iluminadora do Espírito Santo é, portan-
to, indispensável na interpretação e compreen-
são do ensino das Escrituras. Mesmo o indivíduo
já salvo por Cristo precisa da ação iluminadora
contínua do Espírito Santo para progredir na com-
preensão das Escrituras. Seu coração não está
obscurecido como o das pessoas não salvas, mas
ainda há muito a compreender; e essa ação do
Espírito Santo permanece indispensável.
Por isso, em vários lugares das Escrituras, o fi-
lho de Deus é exortado a pedir sabedoria e ilu-
minação espiritual para compreender as coisas
espirituais (Ef 1.16-19).

3. O paradoxo do ministério
apostólico
As realidades celestiais nas cartas aos Coríntios
são exaltadas em detrimento das terrenas. Paulo
recomenda uma existência nesta vida com os
olhos voltados para outra dimensão, fazendo refe-
rência ao céu e às realidades celestiais que exis-
110
A Defesa do Ministério – Lição 10

tem, apesar de não serem vistas: “não fixando os


olhos nas coisas que se veem, mas nas que não
se veem; pois as coisas que se veem são tempo-
rais, enquanto as que não se veem são eternas”
(2Co 4.18).
É esse tipo de jornada que faz com que toda
a tribulação suportada pelos cristãos se torne in-
significante diante das realidades celestiais, que
pertencem a eles em Cristo. Para Paulo, o que
os olhos humanos enxergam é transitório e frágil
diante das realidades celestiais, não vistas ago-
ra, mas a serem reveladas na volta gloriosa de
Cristo. O que não é visto agora será visto no fu-
turo; o que é visto agora deixará de existir no fu-
turo.
É digno de nota que as realidades celestiais
existem, apesar de não serem vistas. Não é o
caso de elas virem à existência, mas sim de se-
rem contempladas no futuro por todos.
A resposta de Paulo à incredulidade de muitos
diante da pregação apostólica é “o deus deste
mundo”, fazendo referência a Satanás. De algu-
ma forma, esse ser celestial impedia as pesso-
111
A Defesa do Ministério – Lição 10

as de entenderem o que o apóstolo pregava. O


problema não estava em Paulo, nem no evange-
lho, mas sim na cegueira das pessoas que ele
provocava: “[...] se o nosso evangelho ainda está
encoberto, é para os que se perdem que está
encoberto, nos quais o deus deste século cegou
o entendimento dos incrédulos [...].” (2Co 4.3-4)
Como consequência, tudo o que este mundo
gera é loucura diante de Deus, como a sabedoria
mundana (2Co 1.12). Essa sabedoria é insuficiente
para que o ser humano conheça a Deus, tornan-
do necessária a loucura da pregação. O próprio
Deus escolheu envergonhar os sábios do mundo
ao decidir realizar sua vontade através das coi-
sas que as pessoas consideram fracas.
Por estar em rebelião contra Deus, a aparência
do mundo é passageira. O mundo usa uma más-
cara, um esquema, um sistema, uma ordem, que,
como tal, deve ser encarado pelos cristãos como
insignificante. Como rebelde, o estado do mundo
é condenado diante de Deus, condenação essa
que já se manifesta no tempo presente, apesar
do resultado definitivo ser esperado para a volta
112
A Defesa do Ministério – Lição 10

de Cristo. Enquanto isso não acontece, o próprio


mundo caído é alvo do amor de Deus, através da
reconciliação promovida por seu Filho (2Co 5.19).

Conclusão
A letra é a Lei. Ela foi escrita em tábuas de pe-
dra e condena o homem por sua falha. Ela aponta
o pecado, a falta de obediência aos seus manda-
mentos. Na presença dela, o pecado abunda. A
Lei faz questão de iluminar o salário do pecado:
a morte.
O Evangelho, por sua vez, está escrito no cora-
ção dos crentes. Ele reconhece as falhas huma-
nas. Reconhece a dificuldade em obedecer, reco-
nhece que o salário do pecado é a morte, mas faz
questão de iluminar a solução de Deus, que é “a
vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm
6.23). Não podemos apenas apontar o erro das
pessoas; também indicamos a solução. Dizemos
que elas estão no pecado, mas a solução é o per-
dão de Deus. Uma igreja que só aponta o erro é
uma igreja legalista. Devemos tanto diagnosticar
a doença quanto prescrever o remédio.
113
A Defesa do Ministério – Lição 10

Para pensar e agir


1. Como o conceito paulino de “cegueira espi-
ritual” pode explicar a relutância de muitas pes-
soas em se converterem a Cristo?
2. Como é possível afirmar simultaneamente
que o crente em Jesus tem a vida eterna e ao
mesmo tempo testemunhar sua morte dentro da
história?
3. É possível atribuir papéis diferentes às pesso-
as da Trindade na salvação humana? Nesse caso,
qual seria o papel de Jesus, do Espírito Santo e
do Pai?

114
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

Lição 11
Texto Base: 2Co 5.1-7.1

A Busca Pelo
Discernimento
Espiritual
Paulo aborda o tema da tribulação, mas aqui
levada às últimas consequências (2Co 5.1-10).
Diante desta realidade, o crente reage com fé. O
cristão verdadeiro sabe que a morte não é o fim
de tudo. Ele vive pela fé
Leitura Diária
e sonha com o céu. Deus
SEG 2Co 5.1-10
está nos preparando para
TER 2Co 5.11-17
QUA 2Co 5.18-6.3 a vida celestial e nos deu
QUI 2Co 6.4-13 o Espírito Santo como ga-
SEX 2Co 6.14-7.1 rantia. Por isso, o crente
SÁB Fl 1.12-26
não pode reagir com blas-
DOM Fl 2.1-18
fêmia ou incredulidade.
115
Voltar para o sumário
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

Diante da tribulação, é necessário ainda cora-


gem, produzida pela fé no coração do cristão.
No versículo 6, ele pediu bom ânimo, e no 8 re-
petiu o apelo. Com isso, ele coloca diante de nós
o desafio de enfrentar as lutas e não recuar um
passo sequer. As lutas da vida não deveriam ser
motivos para nos afastar de Deus. Pelo contrário,
deveriam nos aproximar ainda mais de seu gran-
de amor.

1. O ponto de vista divino


Paulo afirma que teme o Senhor e persuade os
homens: “E assim, conhecendo o temor do Senhor,
persuadimos os homens e somos cabalmente
conhecidos por Deus” (2Co 5.11). “Cabalmente” é
uma maneira de dizer completamente ou irrestri-
tamente. Não havia um só espaço do seu corpo,
da sua cabeça ou do seu coração que não fosse
conhecido por Deus. Uma pergunta que precisa-
mos fazer, então, é sobre as consequências des-
se conhecimento cabal sobre a vida do crente:
Se Deus me conhece completamente, não pre-
ciso e nem tenho como esconder nada dele. Ele é
116
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

o único que vê todos os meus atos e ainda todos


os meus pensamentos. Ele me vê quando estou
sozinho, quando acho que não tem ninguém me
vendo, quando penso que posso fazer algo de
errado, pois ninguém saberá.
Se Deus me conhece completamente, ele é o
único que me conhece de verdade. Se uso más-
caras para esconder quem realmente sou para
as outras pessoas, diante de Deus estou nu.
Fingimento diante dele não adianta.
Se Deus me conhece completamente, ele co-
nhece os meus problemas e como resolvê-los.
Sendo assim, somente ele sabe o que é melhor
para mim. O melhor dos médicos não precisa de
exames para ver dentro do paciente. Ele sabe o
que é melhor para mim, conhece a minha doença,
os meus vícios, as minhas fraquezas e fortalezas.
Se Deus me conhece completamente, ele não
me julga pela aparência, pois somente ele sabe
as reais causas de todos os meus atos. Deus olha
o coração e não vê como o homem vê (1Sm 16.7).
Essa passagem também indica que os cami-
117
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

nhos de Deus raramente são os nossos caminhos.


Exatamente por isso, quem resolve segui-lo é tido
como louco e ignorante. Afinal, os valores são in-
vertidos. Aquilo que é divertido para o mundo não
o é para Deus; aquilo que é forte para o mundo
não o é para Deus; aquilo que é belo para o mun-
do não o é para Deus; aquilo que é permanente
para o mundo não o é para Deus; aquilo que é
importante para o mundo não o é para Deus.
Se de repente, nações muito fortes e podero-
sas nos invadissem e recebêssemos a responsa-
bilidade de dirigir um esforço de libertação, pos-
sivelmente começaríamos tentando conseguir o
apoio dos outros países na mesma situação, ou
então, de outros em condições melhores. Esse
apoio viria através de armas ou homens que nos
ajudariam na batalha pela nossa independência
contra o adversário muito mais forte.
Mas não é assim que Deus age. Quando os mi-
dianitas e amalequitas se uniram para oprimir os
hebreus (Jz 6-7), Deus chamou um homem tími-
do que se escondia entre as rochas. Seu nome
era Gideão. Para que finalmente acreditasse em
118
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

sua vocação, ele testou Deus várias vezes por


meio do episódio que ficou conhecido como “a lã
de Gideão”. Esse homem convocou o povo para
a guerra. Trinta e dois mil homens responderam
à convocação, formando um exército razoável,
embora ainda pequeno diante dos adversários.
Quando Deus decidiu testar esse grupo, após
duas provas, Gideão viu seu exército reduzido
a apenas trezentos combatentes. Em situações
como essa, lutar da maneira convencional não
seria eficaz. Teria que ser do jeito de Deus. Os
soldados de Gideão tocaram as trombetas, que-
braram os vasos e seguraram as tochas colocadas
no topo da colina. Não foi necessário um golpe
sequer, pois os próprios adversários se mataram
com suas armas.
Ainda poderíamos mencionar a tomada de
Jericó ou a travessia do Mar Vermelho. A Bíblia
está cheia de histórias como essas, que nos mos-
tram que Deus age de maneira incompreensível
aos olhos humanos. A principal delas, no entan-
to, está registrada nos Evangelhos: Deus enviou
Seu filho para nascer numa estrebaria e morrer
119
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

numa cruz. O plano de Deus é verdadeiramente


insensato aos olhos humanos!
As palavras de Paulo servem como advertên-
cia àqueles que prestam mais atenção às apa-
rências do que ao coração. As coisas antigas que
desaparecem são as antigas maneiras de enxer-
gar as outras pessoas. Quando alguém é salvo
de forma genuína, não vê mais as pessoas como
antes. Agora, só enxerga dois tipos de pessoas:
as salvas e as perdidas. Ama e deseja ter comu-
nhão com as primeiras, ama e quer compartilhar
a salvação com as demais.
Paulo se refere à crítica dos adversários, que o
imaginavam ou o acusavam de loucura. Realmente,
perante o mundo, os cristãos são considerados
loucos. Afinal, nossa fé é absurda dentro dos pa-
drões racionais do mundo. Nesse sentido, quem
não quiser ser chamado de louco não pode ser
cristão.
Os versículos 17 e 18 enumeram uma série de
verbos que descrevem a ação de Deus em rela-
ção à humanidade. Ele nos reconciliou consigo
mesmo, deu aos cristãos o ministério da recon-
120
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

ciliação, reconciliou o mundo por meio de Cristo,


não imputou aos seres humanos suas transgres-
sões e confiou aos cristãos a pregação da recon-
ciliação. É importante destacar que toda a inicia-
tiva da reconciliação é de Deus. Ele não apenas
providencia o caminho da reconciliação, mas
também lidera o convite para que isso aconteça
por meio de seus ministros. Ser reconciliado com
Deus é sair do estado de inimizade e se tornar
alguém amado.

2. Comunhão e amor fraterno


Após tratar da reconciliação divina com a huma-
nidade, Paulo relembra o perigo da imoralidade
na igreja de Corinto. Ele abordou extensivamen-
te esse assunto em sua primeira carta e aqui faz
um breve retorno à questão do relacionamento
dos crentes com os incrédulos e da comunhão
da igreja com a sociedade. Ou, como Paulo colo-
ca, “Que harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou
que união, do crente com o incrédulo? (2Coríntios
6.15)”
A palavra traduzida neste versículo como
121
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

“Maligno” é “Belial”. Esta passagem está inseri-


da na discussão sobre pureza ética. Nas tradi-
ções de Israel, especialmente as encontradas
nos Manuscritos do Mar Morto (Qumran), Belial é
o nome dado ao chefe dos demônios, Satanás.
O termo “Belial” aparece 27 vezes no Antigo
Testamento e apenas aqui no Novo Testamento.
Não devemos ver nele muito mais do que outra
maneira de se referir ao mesmo ser.
A questão subjacente é a relação do cristão
com os ídolos, que não têm significado, mas cujo
culto pagão pode ser influenciado por figuras de-
moníacas. Essa expressão funciona mais como
uma cláusula retórica para enfatizar que o crente
deve ter cuidado para que seus relacionamentos
significativos sejam com pessoas que comparti-
lham o mesmo senhorio de Jesus Cristo.

Conclusão
A Escritura usa a figura da morte e ressurreição
para falar da salvação. O homem sem Cristo está
morto, é um cadáver. Ele está morto em delitos e
pecados (Ef 2.1s). Como um morto, é frio, não se
122
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

comunica, não ouve, não se relaciona com Deus.


As pessoas sem Cristo se acham vivas, mas estão
mortas; se acham livres, mas são escravas. Não
conseguem fazer o que querem, mas apenas o
que o pecado incita a fazer. Todos nós andamos
assim até que Deus nos salvou através de Cristo.
Como Cristo foi ressuscitado por Deus, nós tam-
bém fomos ressuscitados. Recebemos uma vida
nova, eterna e perfeita, que continuará no lar ce-
lestial, mas que já se manifesta aqui. Por isso, é
impossível que um desses mortos ressuscite e
continue a viver como um morto. Não é possível
um vivo imitar um morto ou continuar comportan-
do-se como tal. A vida plena não pode ficar ocul-
ta.

Para pensar e agir


1. A história de Eliseu e seu servo em 2Rs 6.8-
24 o apresenta cercado pelo exército Sírio. Seu
servo fica desesperado ao ver a casa cercada pe-
los inimigos. Diante disso, Eliseu pede que Deus
abra os olhos do servo para que ele veja também
o exército celestial ao redor. É este tipo de dis-
123
A Busca Pelo Discernimento Espiritual – Lição 11

cernimento espiritual que Paulo quer ensinar aos


crentes através de sua carta. Você já orou pedin-
do para que Deus abra seus olhos?
2. Como as ideias bíblicas de morte espiritual e
vida espiritual podem nos ajudar a compreender
o mundo ao nosso redor?
3. Ser sábio diante do mundo não é a mesma
coisa que ser sábio diante de Deus. A busca do
crente é por um tipo de sabedoria que transcen-
de os livros universitários. Como podemos de-
senvolver esta sabedoria em nossa vida?

124
Reconciliação e Oferta – Lição 12

Lição 12
Texto Base: 2Co 7.2-9.15

Reconciliação e
Oferta
O fato de Paulo retomar a história sobre seus
planos de viagem recentes (7.5) depois de havê-
-los mencionado ainda no início da carta (2:13) pa-
rece ser sinal de que ele não escreveu esta carta
em um único momento. É bem provável que ele
tenha escrito um pedaço num dia e outro pedaço
noutro, até decidir enviar
Leitura Diária
o manuscrito para a igre-
SEG 2Co 7.2-16
TER 2Co 8.1-15
ja. Isso poderia acontecer
QUA 2Co 8.16-24 quando finalmente o men-
QUI 2Co 9.1-5 sageiro estivesse pronto
SEX 2Co 9.6-15 para seguir viagem.
SÁB Lc 21.1-4
Ainda lembro dos meus
DOM At 20.17-35
tempos de seminarista, na
125
Voltar para o sumário
Reconciliação e Oferta – Lição 12

década de 1990. Minha esposa e eu ainda éra-


mos noivos. Ela morava em Minas, e eu no inter-
nato do Seminário do Sul. Num tempo em que a
internet ainda não existia para nós, nossa comu-
nicação se dava por cartas. Era muito comum eu
escrever as minhas durante alguns dias. Era qua-
se como um diário. No fim de uma semana, eu
postava no correio. Essa passagem temporal cla-
ramente aparecia marcada no conteúdo da carta.
De forma semelhante, não precisamos nos pre-
ocupar ao notar essas passagens abruptas em
uma carta paulina. Os capítulos 7 a 9 parecem
mesmo ser resultado de um outro “estado de es-
pírito” do apóstolo. É quase um parêntese dentro
da carta. Aqui ele volta a falar da oferta aos cren-
tes de Jerusalém. O conteúdo é menos teológico
e mais prático.

1. Finalmente, boas notícias


Imagine como é uma reunião familiar em datas
significativas como o Natal, casamento ou aniver-
sário. Abraços apertados, sorrisos, lembranças
amistosas, agradáveis surpresas, tudo isso apa-
126
Reconciliação e Oferta – Lição 12

rece recorrentemente nestes encontros. Alegria


costuma ser o tom de um momento como este,
especialmente se alguém surge com uma novi-
dade, como a aprovação no vestibular, uma gra-
videz ou um emprego novo.
O texto de 2Co 7.2-16 descreve o encontro de
Paulo com Tito. Após enfrentar um momento di-
fícil na região da Macedônia, entre os gregos,
Paulo recebeu sua visita, e isso o encheu de con-
tentamento. Com o jovem discípulo Tito veio um
conjunto de boas notícias de Corinto. Os cren-
tes estavam crescendo na fé e finalmente resol-
veram enfrentar abertamente alguns dos proble-
mas mais difíceis da igreja. Saber que a igreja de
Corinto estava amadurecendo e promovendo a
causa do evangelho era a melhor coisa que Paulo
poderia esperar.
Paulo gastou um bom espaço desta carta até
agora preocupado com as acusações contra sua
autoridade e seu ministério que circulavam em
Corinto. Do início da carta até 7.1 ele se explica e
defende sua vocação no caminho de Damasco.
Na parte final desta defesa, ele apela aos corín-
127
Reconciliação e Oferta – Lição 12

tios para não apenas se reconciliarem com Deus,


mas também se reconciliarem com ele como o
pregador do Evangelho de Cristo.
Exatamente por isso, as notícias trazidas por
Tito o deixaram tão feliz. Parecia realmente que
os crentes estavam prontos para abaixar as crí-
ticas e aceitar sua autoridade apostólica. Paulo
ficou confiante neste sentido, especialmente ao
saber que os coríntios lamentavam o infeliz in-
cidente ocorrido em sua última visita e deseja-
vam que ele os visitasse novamente (2Co 7.7). Era
apropriado, portanto, que Paulo descrevesse seu
encontro com Tito, após seu apelo aos coríntios
para dar lugar a ele em seus corações.

2. A oferta de amor e comunhão


Façamos um pequeno exercício de memória
neste momento e lembrar das últimas vezes que
recebeu algum pedido por dinheiro. Muito prova-
velmente foram muitas ocorrências. Recebemos
pedidos assim por telefone, e-mail, redes sociais,
rádio, televisão. Ouvimos pedidos deste tipo nos
sinais de trânsito, na fila do supermercado, no ôni-
128
Reconciliação e Oferta – Lição 12

bus ou no metrô. São tantos pedidos que acaba-


mos nos acostumando com eles, e eles param
de mexer com nossos corações. Chega a um mo-
mento em que os pedidos simplesmente inco-
modam, e gostaríamos de pedir que os pedintes
parem de pedir.
É claro que isso também pode ocorrer no con-
texto eclesiástico. É provável que você ouça pe-
didos por contribuição com alguma frequência
em sua igreja. Este espaço é sustentado exclusi-
vamente com ofertas e dízimos dos seus mem-
bros. Apesar de alguns países do mundo ainda
terem dízimos recolhidos no contracheque dos
trabalhadores vinculados à igreja do Estado, isso
não existe no Brasil. Aqui isso é de competência
exclusiva dos membros voluntários das igrejas.
Na igreja, você ouve pedidos para ajudar crian-
ças abandonadas, jovens viciados, adolescentes
grávidas, moradores de rua, idosos desampara-
dos, desabrigados pelas chuvas, doentes sem re-
médio... a lista é gigante. Ela é gigante porque a
necessidade é gigante, coisa que não é exclusi-
va do presente, mas acompanhou a igreja desde
129
Reconciliação e Oferta – Lição 12

os seus primórdios. Não é surpresa, então, que


Paulo gaste dois capítulos para fazer um apelo
por dinheiro, como já havia feito na carta de 1Co.
O capítulo 8 de 2Coríntios nos fornece um gran-
de texto bíblico para o ensino de mordomia hoje.
Embora alguns dos coríntios estivessem ques-
tionando sua autoridade, Paulo pediu dinheiro
para os pobres cristãos de Jerusalém. Cerca de
um ano antes da escrita de 2Co, os crentes em
Corinto começaram a arrecadar dinheiro para
os pobres em Jerusalém. Na outra carta, Paulo
instruiu os membros da igreja a separar dinheiro
toda semana para a oferta (1Co 16.1-4). Mas pare-
ce que essa coleta não teve êxito (2Co 8.10-11).
Provavelmente pregadores gananciosos e via-
jantes sugeriram que o apóstolo havia inventado
a coleta para extorquir dinheiro da congregação.
Eles fizeram essa acusação apesar de Paulo não
ter recebido qualquer contribuição dos coríntios
para sustentar seu próprio ministério. Ele havia
se sustentado como fazedor de tendas quando
estava em Corinto (At 18:1-4).
De qualquer forma, um dos propósitos de 2Co
130
Reconciliação e Oferta – Lição 12

era encorajar os coríntios a terminar a coleta ini-


ciada há um ano. Paulo estava enviando Tito como
seu representante oficial para liderar esses esfor-
ços (2Co 8:16-17). A habilidade de Paulo em apre-
sentar com tato a necessidade e como os corín-
tios poderiam atendê-la é um exemplo de como
pedir ajuda financeira de maneira apropriada. Foi
somente depois de explicar minuciosamente seu
ministério aos coríntios que ele entrou no assun-
to do dinheiro. Ele já havia defendido sua hones-
tidade e integridade (2Co 1.12-14), explicado sua
vocação e a natureza de sua pregação aos gen-
tios (2Co 3.7-18), descrito as dificuldades e sofri-
mentos que suportou por causa de sua devoção
a Cristo (2Co 4.7-9).
Somente então ele apelou aos crentes para
que imitassem o exemplo dos macedônios, que
deram de sua pobreza. Eles deram por sua devo-
ção a Cristo e até imploraram a Paulo pela opor-
tunidade de dar.
Paulo também deu uma explicação detalhada
das precauções que havia tomado para garantir
que o dinheiro não fosse mal administrado. Dois
131
Reconciliação e Oferta – Lição 12

representantes das igrejas acompanhariam Tito


a Corinto para garantir que o dinheiro chegasse
aos destinatários pretendidos. Esses represen-
tantes até acompanhariam Paulo quando ele en-
tregasse o dinheiro à igreja de Jerusalém.
Pelo que lemos em Rm 15.25-27, estes esforços
de arrecadação de fundos foram bem-sucedidos,
pois Paulo falou sobre a coleta para Jerusalém. Ele
explicou aos crentes de Roma que a coleta não
era apenas uma expressão de amor cristão, mas
também uma expressão de gratidão aos cristãos
judeus que sofreram perseguições para pregar a
Boa Nova da salvação a eles. No fim, Paulo esta-
va mais preocupado com a unidade da igreja, se
os judeus aceitariam a igreja dos gentios, do que
com qualquer quantia específica de dinheiro.
O capítulo nove lembra aos coríntios seu entu-
siasmo inicial pela coleta de Jerusalém. Paulo está
alegre porque Deus estava usando os crentes de
Corinto para ajudar outros crentes de Jerusalém.
Outras pessoas ouviram falar dessa missão de
misericórdia e também responderam com entu-
siasmo ao apelo por dinheiro.
132
Reconciliação e Oferta – Lição 12

Era preciso, entretanto, que o entusiasmo não


cessasse. Na obra de Deus, não é possível parti-
cipar a contragosto. Neste tipo de trabalho, não
é o tamanho da contribuição que importa, mas o
coração de quem contribui. Ajudar ao próximo é
um privilégio.

Conclusão
Deus poderia fazer as coisas de outra forma,
mas ele decidiu fazer com nossa participação,
como cooperadores dele na sua obra de aben-
çoar as pessoas. Deus quer doadores alegres e
participantes da obra entusiasmados (2Co 9.7).
Por isso, a moedinha de uma viúva pobre tem
tanto valor quanto o ouro de um rico. Deus pres-
cinde de doadores egoístas e descontentes.

Para pensar e agir


1. A doutrina bíblica da mordomia nos ensina
que tudo o que possuímos vem de Deus. Neste
sentido, não somos proprietários ou donos de
nada. Deus nos entrega para administrar. Como
essa doutrina deveria nos incitar à prática da par-
133
Reconciliação e Oferta – Lição 12

tilha e ajuda ao próximo?


2. A doação precisa ser com alegria. Uma doa-
ção forçada não faz sentido no contexto cristão.
O mesmo poderia ser dito sobre o tamanho da
oferta. O importante é participar.
3. Como distinguir a questão da ajuda aos ir-
mãos necessitados desta passagem com outras
que tratam do dízimo (Ml 3.10)? Oferta e dízimos
são a mesma coisa neste contexto?

134
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

Lição 13
Texto Base: 2Co 10-13

Uma Carta de
Lágrimas
Nem tudo são flores no ministério ou no serviço
do Senhor. A história do Cristianismo está cheia de
mártires. Foi contra esse contexto que Tertuliano
de Cartago escreveu na parte final do século II:
“Torture-nos, atormente-nos, condene-nos, es-
mague-nos, porque o sangue dos cristãos é a se-
mente do Cristianismo”.
Leitura Diária
SEG 2Co 10.1-12 O grito do antigo apo-
TER 2Co 10.13-18 logista é um desafio para
QUA 2Co 11.1-6 os adversários da igreja.
QUI 2Co 11.7-33 Segundo ele, quanto mais
SEX 2Co 12.1-10 os cristãos eram perse-
SÁB 2Co 12.11-21
guidos, mais se manifes-
DOM 2Co 13.1-13
tava sua fé. A persegui-
135
Voltar para o sumário
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

ção externa é realmente dolorosa, mas nada fere


mais do que a perseguição doméstica, quando
pessoas de dentro da igreja maltratam, estigma-
tizam e atacam os servos de Deus.

1. Uma carta de lágrimas


2Co 10 a 13 é com alguma probabilidade a “carta
de lágrimas” mencionada pelo apóstolo em 2Co
2.4: “Porque, no meio de muitos sofrimentos e
angústias de coração, vos escrevi, com muitas lá-
grimas, não para que ficásseis entristecidos, mas
para que conhecêsseis o amor que vos consagro
em grande medida”. Ou seja, esta carta escrita em
meio a “muita tribulação e angústia do coração”,
com “muitas lágrimas”, não seria a nossa 1Co ca-
nônica, mas a parte final de 2Co (10 a 13).
O capítulo 10, assim, é a inflexão de tom na car-
ta: de conciliador para severo. Nos primeiros nove
capítulos, Paulo teve o cuidado de parabenizar
os coríntios por sua obediência às suas últimas
diretrizes (2.5-11; 7:2-15). Os últimos quatro capítu-
los, no entanto, advertem os coríntios a reforma-
rem seus caminhos (10.6; 13:2). A primeira meta-
136
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

de da carta usa linguagem diplomática (3.1; 5.12),


enquanto a segunda metade contém sarcasmo e
ironia (11.19).
Essa sugestão de estrutura para 2Co, entretan-
to, é apenas uma ferramenta para interpretar a
carta. A relação entre Paulo e a igreja de Corinto
foi bem conflituosa, e não temos conhecimento
certo sobre todos os detalhes históricos. Mesmo
não adotando essa hipótese da carta de lágri-
mas, o leitor precisará ter em mente a mudança
de tom nestes capítulos finais da carta.

2. Mestres falsos x mestres


verdadeiros
Como os coríntios se impressionavam facilmen-
te com currículos (2Co 11.21-23), oradores pode-
rosos e persuasivos, e demonstrações de poder
carismático, eles foram enganados por um grupo
de falsos mestres. Jesus já havia advertido seus
discípulos de que pessoas profetizariam, exorci-
zariam e fariam milagres em Seu nome, pessoas
com as quais Ele definitivamente não tinha qual-
quer relacionamento (Mt 7.22-23). Isso significa
137
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

que a estratégia da igreja de Corinto de escolher


seus líderes estava equivocada. Currículos e si-
nais manifestos de carisma não eram necessaria-
mente sinais de vocação, e, com isso, eles caíam
facilmente em ciladas dos falsos líderes.
Esse grupo de mestres arrogantes minou a au-
toridade de Paulo em Corinto com críticas e acu-
sações falsas. O apóstolo se sentiu então obri-
gado a responder às críticas, ponto por ponto,
especialmente a partir de 2Co 11.21:
Se eles eram judeus, ele também o era;
Se eles eram descendentes de Abraão, ele tam-
bém o era;
Se eles eram ministros de Cristo, ele era ainda
mais, pois foi chamado pessoalmente pelo Cristo
glorificado no Caminho de Damasco.

3. O encontro com Jesus é a base


da autoridade
Paulo parece se sentir desconfortável com a
necessidade de apresentar seu extenso currículo
de trabalho na obra de Deus. Ele usa expressões
138
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

como “falo como se estivesse fora de mim” (2Co


11.23), “com insensatez afirmo” (2Co 11.21), “ainda
que eu mesmo não valha a pena” (2Co 12.1). E
essa última linha em seu currículo é certamente
única. O capítulo 12 descreve uma experiência
visionária de Paulo.
Numa passagem autobiográfica, Paulo fala do
terceiro céu: “Conheço um homem em Cristo que,
há catorze anos, foi arrebatado até ao terceiro
céu (se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus
o sabe)” (2Co 12.2). A expressão “terceiro céu” é
uma referência ao espaço celestial visitado por
Paulo em sua visão. Dentro desse contexto de
apologia de seu próprio ministério, ele começa
a falar de visões especiais recebidas de Deus,
usando o artifício literário de referir-se a si mes-
mo na terceira pessoa.
O conteúdo das visões do Apóstolo não é im-
portante em si, pois nem é descrito. Com isso,
Paulo confirma seu desejo de não usá-las para
ganhar importância. Para não se orgulhar dessa
revelação, foi-lhe dado um espinho na carne, um
mensageiro de satanás (em grego “anjos sata-
139
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

nás”). O termo “espinho” aqui foi usado de modo


figurado para indicar algo que causa problemas
ou dor.
Como os termos “espinho” e “anjo” estão rela-
cionados, a frase “anjo de satanás” é um atribu-
to do espinho, representando uma característica
que esse espinho possuía. Independentemente
do que possa ter sido, ele foi colocado pelo pró-
prio Deus em Paulo. Isso transparece na forma
verbal passiva e no propósito expresso na fra-
se “para que eu não me exalte” (v. 7). A estrutu-
ra da questão levantada por Paulo seria: o espi-
nho, como o objeto direto da dor, Satanás por
trás do objeto, e Deus permitindo a ação de dor,
como uma reedição da história de Jó no Antigo
Testamento.
Paulo pediu insistentemente para que o espinho
fosse afastado, e não obteve sucesso. O próprio
Deus o confortou com a afirmação de que isso
era necessário para mantê-lo humilde (2Co 12.7-
9). Com a presente construção, revela-se a visão
paulina da soberania completa de Deus sobre
suas dores, dores essas usadas por Deus para
140
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

produzir crescimento em Paulo. São dores que


acabaram resultando em benefícios.

Deus concedeu a Paulo uma visão celestial.


Paulo ouviu palavras que não podiam ser repe-
tidas e viu cenas que não podiam ser contadas.
Com certeza ele tinha nas mãos uma grande arma
para submeter as pessoas à sua autoridade. Mas
ele entendia que isso não era necessário, por-
que para Deus, seus seguidores são mais fortes
quando são fracos, o que significa dizer que o
poder de Deus ressoa mais de uma boca que as-
sumiu não ter poder nenhum e é completamente
dependente de Cristo.

Por causa dessa experiência celestial, Deus


deu a ele um “espinho”, uma fraqueza que conti-
nuamente o lembrava de sua total dependência
de Deus. Paulo havia experimentado o que ou-
tros nunca experimentariam nesta vida. Em vez
de se gabar disso, ele se resignou a sentir a dor
resultante da experiência.
141
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

Conclusão

Paulo experimentava as dificuldades de sua


missão por “amor a Cristo” (12.10). Isso significa
que o reino sobre o qual Cristo governa foi promo-
vido pelas circunstâncias que o apóstolo encon-
trou. Embora as dificuldades e fracassos diários
não sejam facilmente digeridos por nós como re-
alizações pessoais, eles não são desperdiçados.
É como a parte inferior de uma tapeçaria feita à
mão. Os elaborados fios da face de cima do teci-
do produzem uma obra de arte segundo os de-
sejos do tecelão. O lado que não será visto, no
entanto, é um emaranhado de linhas, fios e nós.
Assim é a nossa vida. Deus usa o que parecem
ser circunstâncias aleatórias, caóticas e destitu-
ídas de sentido para construir, no final, um belo
tapete. Apesar de todas as dificuldades, vamos
tentar vivenciar as dores da vida como a estraté-
gia não revelada do tecelão celestial.
142
Uma Carta de Lágrimas – Lição 13

Para pensar e agir


1. O ministério pastoral nem sempre é tranqui-
lo. Há dias muito difíceis, em especial diante de
conflitos com as ovelhas. Há dias para o consolo
e outros para a disciplina. Em uma situação de
conflito, tente se colocar no lugar das ovelhas.
Agora, de forma contrária, coloque-se no lugar
do pastor. Consegue verbalizar a distinção entre
esses dois momentos de reflexão?
2. O “espinho na carne” de Paulo é uma mani-
festação da soberania de Deus para trabalhar a
humildade na vida do apóstolo. Você consegue
descrever alguma situação de “espinho na car-
ne” em sua própria vida?
3. Uma excelente característica a ser desen-
volvida na vida é a capacidade de não guardar
mágoa ou rancor após uma discussão. Isso é fun-
damental em qualquer grupo ou vivência comu-
nitária. Você poderia destacar como isso pode
ser desenvolvido em sua vida?
143
Ficha Técnica
Ficha Técnica

Revista de Educação Cristã da Convenção


Batista Fluminense
Autor: Pr. Valtair Miranda
Redator: Pr. Samuel Pinheiro
Revisão Bíblico Doutrinária:
Pr. Flávio da Silva Chaves
Pr. Isaac Vieira de Araújo
Pr. Ronaldo Gomes de Souza
Pr. Antônio Carlos Mageschi
Pr. Osvaldo Reis do Amaral Barros
Pr. Manoel Lincoln de Jesus Meneses
Pr. Erick Ramos de Castro
Revisão e Copidesque:
Ir. Elen Priscila Ribeiro Barbosa
Diagramação e Design: Davi Silveira

Todas as imagens nesta edição foram criadas com


o auxílio de Inteligência Artificial.
As ferramentas de IA possuem uma dificuldade
característica ao gerar imagens de criaturas vivas,
em especial seres-humanos.
Essa característica nos leva ao tema da revista.
Nas cartas aos coríntios aprendemos que corpo
e unidade devem ser uma realidade genuína com

144
Ficha Técnica

Cristo. Se somos criados conforme Sua semelhan-


ça, devemos transparecer Cristo em nossas vidas,
e não imagens criadas artificialmente.

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Batista Fluminense
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