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DISCIPULADO BÍBLICO

TEORIA E PRÁTICA

Ericson L. Martins

Goiânia

2014
Ficha Técnica

DISCIPULADO BÍBLICO, Teoria e Prática

Design didático e Revisão linguística

Débora Duran

Diagramação

Ana Bandeira

Revisão linguística

Jéferson de Oliveira Del’Arco

Capa

Ericson Martins
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação na (CIP)

M379d

Martins, Ericson L.

Discipulado Bíblico: teoria e prática / Ericson L. Martins

Goiânia: [s. n.], 2014.

172 p.; 138 x 210 mm

ISBN: 978-85-916464-0-1

1. Vida Cristã. 2. Teologia Pastoral. 3. Bíblia. I.

Martins, Ericson L. II. Título

CDU: 25
As citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Atualizada
(ARA) traduzida para a Língua Portuguesa por João Ferreira de Almeida, por
manuscritos em línguas originais disponíveis no Século XVII, revisada e
atualizada por mais de uma década a partir da descoberta de outros
manuscritos bíblicos em 1993. Publicada pela Sociedade Bíblica do Brasil.

Publicação em acordo com as orientações do Novo Acordo Ortográfico da


Língua Portuguesa, em vigor desde janeiro de 2009.

Goiânia-GO, março de 2014

Facebook:

www.facebook.com/ericsonmartins

Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida


por qualquer meio: eletrônico, mecânico, xerográfico, etc, sem a
devida permissão do autor.
Dedicatória

Àqueles que anseiam servir a Deus na missão de evangelizar e discipular


outras pessoas durante a jornada da vida cristã até que Jesus volte!
Agradecimento especial

À minha esposa Andréa Liberato, pelo insubstituível e constante auxílio


no ministério que o Senhor me confiou. Ao casal Fábio Negrão e Débora
Duran, pelo significativo envolvimento com a minha vida e apoio sempre
presente. Ao presbítero da Primeira Igreja Presbiteriana de
Goiânia, Jéferson de Oliveira Del’Arco, por sua dedicação nesta obra e por
seu companheirismo.
Prefácio

Um dos textos do Novo Testamento que, classicamente, mais se usa para


incentivar o trabalho missionário tem, como seu ponto central, o discipulado.
Trata-se de Mateus 28:18-20. Fazer discípulos de Cristo entre os seres
humanos, ao redor de todo o mundo, pode ser considerado como um dos
temas principais do Evangelho de Mateus e, consequentemente, implica em
uma ação ativa que nos leva sempre à missão. Em outras palavras, a missão
deve ser vista e definida claramente como “fazer discípulos”.

Infelizmente a palavra “discipulado” sofreu excessivo desgaste nos últimos


anos, passando a significar processos, programas e relacionamentos que já se
distanciaram do seu sentido bíblico, levando muitos cristãos a uma
experiência superficial de ensino e vivência bíblicas, bem como de
dependência e de manipulações. Torna-se urgente, portanto, um resgate do
conceito bíblico de discipulado que produza cristãos fortemente
fundamentados na palavra de Deus, que mantenham uma comunhão sadia e
edificante com os demais irmãos, e que se consagrem ao serviço e à
missão redentora de Cristo, no mundo.

O autor deste livro se propõe a nos apresentar um modelo de discipulado e,


mais do que isso, dispõe sobre um conceito de discipulado derivado das
sagradas Escrituras. Para tanto, analisa diversos temas pertinentes ao conceito
do discipulado no teor de várias passagens bíblicas, fundamentando-o
e estabelecendo uma base sólida para o programa proposto à igreja local.

Nossas igrejas, não restam dúvidas, necessitam lançar fortemente suas raízes
no ensino comprometido da palavra de Deus para exercer com sabedoria e
verdadeiro amor sua missão neste mundo. Sigamos, portanto, o árduo e
frutífero caminho do discipulado cristão.
Um bom trabalho a todos e todas!

Rev. Carlos del Pino

Mestre em Missiologia pelo C.E.M., Mestre e Doutor (Ph.D.) em Teologia Prática pela
Universidad Pontificia de Salamanca (Espanha). Pastor da Igreja Presbiteriana do Brasil,
atualmente é coordenador da Base Europa da APMT em Torrelodones (Madri), onde
trabalha juntamente com sua esposa Rosa no estabelecimento de uma nova igreja
presbiteriana na Espanha.
Introdução

Este livro surgiu naturalmente diante da necessidade de se desenvolver um


pastoreio estratégico no contexto da igreja local, na qual sirvo ao
Senhor como pastor. Também é resultado da análise sobre várias experiências
ministeriais frustrantes, tanto no Brasil como no exterior, e de persistentes
questionamentos saudáveis. Tais razões me fizeram orar mais e estudar a
Palavra de Deus em busca de respostas que orientassem eficazmente o
ministério que Ele me confiou. Antes e sobretudo, é também resultado da
minha humilde tentativa de compartilhar as respostas que descobri ao longo
desse caminho.

O objetivo deste livro é apresentar um modelo orgânico do discipulado, tendo


em vista o cumprimento da ordem de Jesus – “fazer” discípulos – com
base em quatro premissas bíblicas demonstradas na metodologia denominada
“Cruz do Discipulado”. Seus pressupostos centralizam-se nos conceitos
essenciais da fé, do caráter, das motivações do coração e do serviço, de
acordo com o modelo de Jesus na formação dos seus discípulos. O processo
de tal formação aplica-se hoje a todos os que se encontram ávidos por uma
vida cristã profunda, quer sejam antigos ou novos crentes, pois se trata da sua
necessária santificação até que Jesus volte. Do mesmo modo, destina-se ao
processo de formação de novos líderes comprometidos com a verdade bíblica
e a missão de Jesus no mundo.
Quero encorajá-lo a ler cada página deste livro com a mente e o coração
abertos para compreender os princípios bíblicos do discipulado em sua
própria vida, mas também para se envolver com a causa de discipular outros,
como Jesus ensinou. Minha oração é para que a edificação resultante da
leitura deste livro possa desafiá-lo a cumprir a missão de ensinar outros a
guardarem todas as coisas que Jesus já ensinou.

Deus nos abençoe nesses passos!

Ericson Martins

Goiânia-GO
PRESSUPOSTOS DO DISCIPULADO BÍBLICO

1.1 . INTRODUÇÃO

O plano que Deus estabeleceu por meio do seu Filho já foi concluído. Agora,
sob a ação do Espírito Santo, somos chamados para andar nos mesmos passos
de Jesus, como verdadeiros discípulos. Ele mesmo disse: “Siga-me” (Mt
16:24).

Seguir a Jesus é percorrer o caminho da obediência a Deus. Ele disse: “Ide,


portanto, fazei discípulos de todas as nações...” (Mt 28:19). O discipulado
diz respeito à tarefa de compartilhar o testemunho de Jesus Cristo com todo o
mundo!

A palavra discipulado, no contexto atual, pode significar programas,


disciplinas ou até mesmo cursos doutrinários dominicais intensivos. Tudo
isso, obviamente, pode fazer parte do discipulado, mas o conceito central
apresentado no Antigo e Novo Testamento, bem como suas implicações
práticas, revelam que o sentido do termo é bem mais amplo.

O discipulado foi, sem dúvida, a maior prioridade no ministério de Jesus


quanto ao seu relacionamento com os discípulos. E entender o que a
Bíblia diz sobre esse tema é essencialmente importante para a Igreja
protestante.
Neste capítulo apresentaremos a base do discipulado bíblico a partir do
Antigo Testamento, pois os conceitos que o fundamentam são
identificados ao longo da história redentora de Deus. O discipulado foi uma
prática extremamente viva no curso histórico do povo de Israel, comprovada
também pelas narrativas do Novo Testamento, como continuidade do plano
de Deus na restauração do homem. Com essa base bíblica, também iremos
apresentar alguns objetivos eclesiais que se justificam pela necessidade de
ampliar a ação pastoral e o relacionamento entre os crentes, com a
finalidade de melhor cumprirmos a missão que o Senhor Jesus nos confiou, a
saber: fazer discípulos de todas as nações!

1.2 . ORIENTAÇÃO BÍBLICA

Quando ouvimos a palavra “discipulado”, em que pensamos?

Com o imediatismo que caracteriza o momen to histórico que ora


atravessamos e a ansiedade por resultados de curto prazo, o sentido
dessa palavra tende a perder o seu foco bíblico original.

Biblicamente, o discipulado não é um programa, mas um processo de


santificação que nos torna semelhantes a Cristo. Nesse sentido, o
discipulado é um percurso para toda a vida.

O que a Bíblia diz acerca desse assunto?

Antigo Testamento
De acordo com o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, discipulado é um
substantivo originado do latim discipulatus e designa “um conjunto de alunos
ou estudantes”. Esses alunos são descritos como “discípulos” e o mestre ou
professor como “discipulador”. Como se pode notar, ambos os termos dizem
respeito à relação ensino-aprendizagem, razão pela qual podemos afirmar que
estão vinculados à educação.

A palavra hebraica que traduz a palavra discípulo corresponde à


palavra grega mathete (aprendiz). O termo mathete (do gr.
υανθανω) aparece apenas 5 vezes na tradução grega do Antigo
Testamento, a Septuaginta: Odes 5:9, Sabedoria de Salomão 6:1 e em
Isaías 1:17, 26:9 e 28:19.

No Antigo Testamento o discipulado é compreendido basicamente em dois


níveis, a saber:

• Coletivo/social: Deus esperava que seu povo seguisse seus conselhos


(Gn 18:19) e fosse santo como Ele é (Lv 20:7).

• Individual/pessoal: Para esse fim a obediência a tais conselhos era


uma exigência de Deus para cada pessoa. Nesse mesmo nível
conhecemos a história de muitos personagens como Moisés, um
discípulo-mestre que discipulou Josué, seu sucessor (Dt 31:23; Js 3:7).

O discipulado no nível coletivo/social (nacional, no caso de Israel)


Assim como Jesus chamou homens para deixarem tudo e segui-lo (Mc 8:34-
35), Deus também chamou homens no Antigo Testamento para segui-lo.

Deus disse à Abrão:

Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra
que te mostrarei; de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te
engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção! Abençoarei os que te
abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão
benditas todas as famílias da terra. (Gn 12:1-3)

Jesus disse:

Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e
siga-me. Quem quiser, pois, salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder
a vida por causa de mim e do evangelho salvá-la-á. (Mc 8:34-35)

Assim como Jesus expressou o interesse de seus discípulos serem como ele
na nova aliança (Lc 6:46-49; Rm 8:29; Gl 4:19), Deus, o Pai, expressou seu
interesse em que Israel fosse como ele na antiga aliança (Lv 11:44-45, 19:2).
O discípulo não está acima do seu mestre, mas todo aquele que é
bem instruído será como aquele que o instrui (Lc 6:40).

Note que o mesmo padrão de discipulado compreendido no Novo Testamento


corrobora com o que se compreende no Antigo Testamento:

• Deus inicia um novo relacionamento com o homem caído, pecador,


chamando-o do pecado para a obediência. As respostas esperadas do
homem ao chamado de Deus são o arrependimento e a fé, o
compromisso de abandonar o pecado e segui-lo pela obediência a sua
Palavra revelada.

• O fato de Deus desejar e exigir que Israel atente para os seus conselhos
e ande em seus caminhos é visto em muitas passagens no contexto de
idolatria de Israel (Dt 13:1-4).

• A ideia é a mesma no Novo Testamento: "seguir após” ou “andar


depois de”, isto aplicado a Deus como referência e não outros deuses ou
interesses pessoais (1 Rs 3:6-14).

O discipulado no nível individual/pessoal

Uma nação só será santa se as pessoas buscarem uma vida de santidade. A


exemplo de homens que decidiram por uma relação pessoal e de obediência a
Deus, temos Josué e Calebe. Esses homens foram separados por Deus, dentre
os demais espias, porque perseveraram em confiar na palavra de
Deus. Quando todo o restante do povo desejou voltar para o Egito, ou seja,
para o regime da escravidão, Josué e Calebe resolveram permanecer no
caminho indicado por Deus.

Certamente, os varões que subiram do Egito, de vinte anos para cima,


não verão a terra que prometi com juramento a Abraão, a Isaque e
a Jacó, porquanto não perseveraram em seguir-me, exceto Calebe, filho
de Jefoné, o quenezeu, e Josué, filho de Num, porque perseveraram em
seguir ao SENHOR. (Nm 32:11-12)

Davi é outro bom exemplo de homem que “seguiu” ao Senhor com todo o
seu coração e andou nos seus caminhos, submetendo-se e obedecendo à sua
Palavra (1 Rs 14:7-9). Durante o tempo de apostasia após o reinado do rei
Salomão, Ezequias (2 Rs 18:1-6) e Josias (2 Rs 23:3) se destacaram dos
demais reis porque se empenharam em seguir a Deus e obedecer a Sua
Palavra.

Deus havia chamado a nação para Si para que fosse santa como Ele é Santo.
No entanto, para que isso fosse possível cada pessoa deveria perseverar no
caminho do Senhor comprometidamente, com obediência sincera aos seus
conselhos. O Antigo Testamento observa o discipulado não apenas entre
pessoas e Deus, mas também entre as próprias pessoas. Moisés teve Josué
como seu auxiliar, um verdadeiro discípulo (Êx 17-33); Elias foi
chamado por Deus para ensinar e treinar Eliseu para ser seu auxiliar e depois
seu sucessor como profeta em Israel (1 Rs 17; 2 Rs 10); e Jeremias teve
Baruque (Jr 32-45) como auxiliar, na realidade, um discípulo.

Novo Testamento

O discipulado, com base no entendimento apresentado pelo Novo


Testamento, baseia-se na vida e na autoridade de Jesus Cristo. Ele mesmo
disse aos seus discípulos:
Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi
dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as
nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo;
ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis
que estou convosco todos os dias até à consumação do século. (Mt
28:18-20 - grifo nosso)

No Novo Testamento, assim como no Antigo, a palavra discípulo significa


um aprendiz ou aluno sob a tutela de alguém capaz de ensinar e proteger.

Jesus usou a palavra como verbo imperativo, aoristo e ativo para afirmar
que o discípulo é o resultado de uma ação ordenada ( fazei), a qual
envolve outros três verbos particípios.

O primeiro é “tendo ido”1, usado para comunicar uma ação coordenada,


propositiva e ativa para com todas as nações. Na mente do autor do
evangelho de Mateus, a palavra de Jesus aos discípulos poderia ser
parafraseada como: “tendo ido, façam discípulos”. Como toda ação possui
uma proposição, batizando-os e ensinando-os são particípios de meios, ou
seja, demonstram como a ação de fazer discípulos deve ser realizada:

1:Πορεθεντες. verbo, particípio aoristo, passivo, nominativo, masculino,


plural de πορεουαι

Usando o verbo particípio presente batizando2, Jesus indicou o princípio


ativo do discipulado. O batismo é a evidência externa de uma realidade
interna, é o sinal externo da regeneração e princípio da participação no Corpo
de Cristo. O Evangelho é a mensagem mais relevante que uma pessoa pode
receber nesta vida. Ao recebê-lo, crendo, todos devem ser batizados (Mc
16:16).

2:ΒαπτιΖοντεζ. verbo, particípio presente, ativo, nominativo, masculino,


plural de Βαπτιζω

Nos dias de João Batista, de Jesus e dos apóstolos, as pessoas eram


batizadas somente depois de ouvirem a pregação do Evangelho e se
arrependerem. Assim, a ação de pregar o Evangelho implica
o direcionamento de pessoas arrependidas ao batismo como princípio de
uma nova vida em comunhão com Deus.

Usando o verbo particípio presente ensinando3 (treinar, catequizar, instruir


em tudo) Jesus indicou o meio contínuo do discipulado que tem a educação
como ação principal, pois, ao ensinar o que Jesus ensinou, a Igreja se torna
uma extensão do seu ministério na terra.

3:διδασκοντεζ. verbo, particípio presente, ativo, nominativo, masculino,


plural de διδασκε

Assim, a ordem de Jesus, em seu aspecto geral, pode ser definida da seguinte
maneira:

Evangelizar os perdidos e ensinar os alcançados.


Esse entendimento é claro, não apenas nesta passagem (Mt 28:18-20), mas
também nos demais Evangelhos e no Livro de Atos (Mc 16:15-16; Lc 24:44-
49; Jo 20:21-23 e At 1:3-8).

Estratégia ministerial de Jesus

Jesus dedicou especial atenção, em seu ministério, aos discípulos. Ele se


tornou muito popular, mas não foi persuadido pela popularidade ou
admiração momentânea dos homens, ou seja, não perdeu e nem tampouco
negociou o foco da sua missão. Ele se concentrou na cruz e, no caminho,
ensinou lições para que seus discípulos fossem capazes de fazer as mesmas
obras que ele fez (Jo 14:12).

Jesus esperava que seus seguidores realizassem (Jo 15:16) as mesmas obras
que fez sob infl uência do Espírito Santo (Lc 12:12 e Jo 14:26). Ele os
ensinou para que pudessem conduzir outras pessoas no caminho da vida. Para
Jesus, o discipulado foi necessário também para perpetuar seus interesses no
mundo.

Estratégia ministerial da Igreja nos primeiros séculos

O discipulado que os apóstolos, posteriormente, investiram suas vidas, não


foi mera demonstração teórica. Ao contrário do que estamos acostumados a
encontrar atualmente, eles revelaram vívido e genuíno testemunho como
discipuladores. Eles acreditavam que a ordem de Jesus deveria ser obedecida
nas ações cotidianas, isto é, a teoria deveria ser revelada nas práticas.
Um exemplo claro se encontra na instrução dada por Paulo ao jovem pastor
Timóteo:

E o que de minha parte ouviste através de muitas testemunhas, isso


mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a
outros. (2 Tm 2:2)

Jesus ensinou a Paulo suas ordenanças e ele, por sua vez, entendeu que seria
igualmente necessário ensinar a Timóteo, de modo que fosse capaz de ensinar
aos outros aquilo que havia sido originalmente ensinado por Jesus. Timóteo
foi instruído por Paulo a ensinar o que lhe fora ensinado com fidelidade (isso
mesmo) a homens fieis para que, da mesma forma, legassem tais ensinos a
outros. Foi isso o que Jesus ensinou a Paulo, que por sua vez ensinou a
Timóteo para que, enfim, pudesse também ensinar a outros (outras gerações).

O discipulado cristão deve ser um processo natural para aqueles que


decidirem seguir a Jesus Cristo. Já que uma pessoa nasce de novo por meio
da obra redentiva de Deus, ela necessita crescer no conhecimento da sã
doutrina bíblica e no testemunho que a evidencia.

O discípulo é aquele que não apenas acredita em verdades bíblicas e


aceita as orientações de quem o discipula, mas aquele que é convertido
dos seus maus caminhos, por Cristo, e segue seus ensinamentos.

No Novo Testamento os discípulos de Jesus foram os alunos da sua doutrina


e também da sua vida:
(a) Ouvindo o que deveriam saber (Mt 5-7);

(b) Observando o que deveriam praticar (Mt 8-9);

(c) Praticando sob supervisão (Mt 10-20);

(d) Tornando-se testemunhas (Mt 21-27) e

(e) Enviados a fazer (Mt 28).

Ouvir e observar - O

Praticar - P

Tornar-se - T

Enviar - E

O discipulado, na perspectiva dos evangelhos, produz coerência entre o


ensino e a vida, o conhecimento e a prática, o entendimento e o
procedimento. Ele é o alicerce sobre o qual a Igreja deve se desenvolver
espiritualmente, crescer com autenticidade e ser preservada das
artimanhas malignas e mundanas.

O discipulado fornece a base para o crente construir uma firme confissão de


fé bíblica, santidade pessoal e obediência vocacional que só podem
ser fundamentadas no vivo testemunho que as Escrituras fornecem acerca de
Jesus Cristo.
Aspectos gerais do discipulado bíblico

Relação pessoal e direta

O chamado de Jesus aos discípulos estabeleceu uma relação pessoal e


propositiva consigo: “Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de
homens” (Mt 4:19, 11:28).

No Evangelho de Marcos está escrito:

Depois, subiu ao monte e chamou os que ele mesmo quis, e vieram para
junto dele. Então, designou doze para estarem com ele e para os enviar
a pregar e a exercer a autoridade de expelir demônios. (Mc 3:14-15)

Assim, a proposta do discipulado, de acordo com o testemunho de Jesus, é


uma relação pessoal de duas ou mais pessoas com o propósito de ajudar uns
aos outros no amadurecimento da fé em Deus.

O apóstolo Paulo, em 1 Tessalonicenses 5:11, diz:

Consolai-vos, pois, uns aos outros e edificai-vos reciprocamente,


como também estais fazendo.

Por ser uma relação pessoal e propositiva de amadurecimento da fé, o


discipulado deve considerar como prioritários os seguintes aspectos:
PRINCIPAIS

As pessoas, em suas necessidades e carências espirituais e morais

Amadurecimento da fé, de caráter qualitativo

Princípios bíblicos

SECUNDÁRIOS

Aquilo que podem oferecer para satisfazer as necessidades institucionais

Interesses estatísticos ou relatórios de caráter quantitativo

Metodologias pragmáticas

Tais prioridades só podem ser devidamente reconhecidas e atendidas


mediante o estabelecimento de propósitos claros e de relacionamento
pessoal entre discipulador e discípulos (Lc 6:40; Jo 13:14-17; 1 Co 1:19,
11:1; 2 Co 3:18; Fl 3:8-11).

Alguns exemplos no Novo Testamento:

• Amar uns aos outros (Jo 13:34-35; Rm 12:10; 1 Ts 4:9; 1 Pd 1:22);

• Não promover ofensas entre os irmãos (Atos 7:26);


• Ter o mesmo sentimento uns para com os outros (Rm 12:16);

• Não dever nada além do amor (Rm 13:8);

• Não julgar (14:13);

• Acolher uns aos outros, como também Cristo nos acolheu (Rm 15:7);

• Admoestar uns aos outros (Rm 15:14);

• Saudar uns aos outros (Rm 16:16; 1 Co 16:20; 2 Co 13:12; 1 Pd 5:14);

• Preservar uns aos outros (Gl 5:15);

• Rejeitar a inveja (Gl 5:26);

• Suportar os outros em amor (Ef 4:2);

• Agir com benignidade, compaixão e perdão (Ef 4:32);

• Sujeitar uns aos outros no temor de Cristo (Ef 5:21);

• Não mentir (Cl 3:9);

• Perdoar (Cl 3:13);

• Consolar (1 Ts 4:18);

• Edificar (1 Ts 5:11);
• Consideração mútua para estimular as boas obras (Hb 10:24);

• Confessar pecados uns aos outros e orar uns pelos outros (Tg 5:16);

• Servir (1 Pd 4:10);

• Submeter-se aos mais velhos e humildes para com os demais (1 Pd


5:5).

Responsabilidade de todos os crentes

Jesus é o grande sumo Sacerdote (Jo 1:29; 1 Tm 2:5; Hb 2:17, 3:1, 4:14, 5:5-
10, 6:20, 7:24-27, 9:12 e 26, 10:12) e, ao mesmo tempo, oferta e
sacrifício. Entretanto, Ele permitiu que crentes verdadeiros participassem
desta função sacerdotal, por seus exclusivos méritos, com o fim de
suplicarem por outros o favor de Deus. Essa responsabilidade é intransferível
porque fora dada unicamente à Igreja e só é viável pela obediência à Palavra
de Deus. O sacerdócio universal dos crentes foi um dos mais importantes
temas debatidos no período da Reforma Protestante, no Século XVI,
defendido especialmente por Martinho Lutero e João Calvino.
MARTINHO LUTERO (1486-1546)

foi um sacerdote católico agostiniano e professor de Teologia.


Lutero revelou-se como figura central da Reforma Protestante e a
apresentação das suas 95 teses, em 1517, deu início a um debate vigoroso
com a Igreja Católica. O teólogo alemão contestou o ensino católico sobre a
natureza da penitência, a autoridade do papa e a utilidade das indulgências.
JOÃO CALVINO (1509-1564)

foi um teólogo cristão francês. Tornou-se o grande expoente da


Reforma Protestante, responsável pela sistematização doutrinária e pela
expansão do protestantismo reformado. O calvinismo é também chamado
de Tradição Reformada, Fé Reformada ou Teologia Reformada.

Essa defesa consistiu na verdade bíblica de que o povo de Deus é chamado ao


sacerdócio (Êx 19:5-6; Is 61:6; 1 Pd 2:5 e 9; Ap 1:5-6, 5:9-10), podendo ler e
interpretar corretamente as Escrituras para pregar, dedicar-se à solidariedade
cristã e orar uns pelos outros.

A Igreja, como corpo de Cristo, está no mundo para “servir” (do grego
leitourgia) a Deus e aos seus membros.

Nesse mesmo sentido, todo crente é chamado ao serviço cristão, seja na


esfera pessoal ou comunitária. Isto implica dizer que tal chamado envolve
a pregação do Evangelho ao mundo e o serviço, com base no sacerdócio de
Cristo, de auxiliar outros a crescerem na graça e no conhecimento
transformador das Escrituras.
1.3 . JUSTIFICATIVAS MINISTERIAIS

Aprimoramento da ação pastoral

Embora muitas igrejas reformadas tenham adotado, como sistema de


governo, o princípio representativo e congregacional, a atividade pastoral
funciona de modo semelhante ao sistema de governo episcopal, pois a
responsabilidade pastoral concentra-se numa pessoa (pastor) ou num pequeno
grupo de liderança. Não raro, esse modo de pastoreio inibe ou enfraquece a
consciência em cada crente de que ele é, também, chamado ao serviço.
Uma evidência desse problema é a expectativa que muitos crentes têm de
serem atendidos pelo serviço de outros, mais que o interesse genuíno em
servir. Em outras palavras, não querem servir, mas serem servidos. Esperam
que unicamente o “pastor” atenda sempre às suas necessidades, bem como as
de seus entes mais próximos. Por esse motivo, a liderança sofre uma
sobrecarga de responsabilidades e acaba exercendo sua função pastoral com
muita fragilidade devido às próprias limitações.

O discipulado deve preparar e encorajar o crente ao serviço cristão,


ampliando assim, a necessária ação pastoral: expor as Escrituras, evangelizar
pessoas, aconselhar, visitar enfermos, dentre outras.

Aprimoramento da comunicação

A comunicação entre pessoas é fundamental para os relacionamentos.


Quando há boa comunicação entre elas, seus relacionamentos tendem a se
aprofundar. Mas à medida que a comunicação diminui, os relacionamentos
também tendem a diminuir. Do mesmo modo, se o contato pessoal entre as
pessoas for superficial, os relacionamentos também serão.

A comunicação pode fortalecer – ou não – os relacionamentos. Sendo assim,


a comunicação define o nível de relacionamento que uma família ou igreja
local pode experimentar. É justamente por esse motivo que as igrejas
pequenas, por causa do maior contato pessoal entre seus membros, tendem a
ser mais acolhedoras e atenciosas enquanto a comunhão cresce. Já nas igrejas
grandes, em que o contato pessoal é mais restrito a certos grupos, os
relacionamentos tendem a ser superficiais.

A seguir, para ilustrar a condição e possibilidade dos relacionamentos


crescerem a partir da comunicação, apresentaremos uma simples dinâmica:
duas pessoas possuem duas linhas de comunicações entre elas, assim como
quatro pessoas possuem doze, dez pessoas noventa, vinte pessoas trezentos e
oitenta e assim por diante.

Se desejar descobrir quantas linhas de comunicação existem em sua família,


siga estas instruções: multiplique o número de membros pelo mesmo
número, e subtraia do resultado o mesmo número membros.

Exemplo de uma família formada por 4 membros:


Agora faça o mesmo cálculo com o número de membros que frequentam a
sua igreja local para descobrir que possibilidade há para fortalecer
os relacionamentos com base numa boa comunicação.

Qualquer que seja a resposta, você saberá o quanto a comunhão tem sido
afetada.

Essa é uma das razões que justificam a necessidade de uma dinâmica


ministerial orientada para aumentar o nível de comunicação entre os
membros da igreja. Pelo aprimoramento da comunicação entre os irmãos,
poderá haver maior crescimento espiritual e maior comunhão a favor da
missão que a Igreja tem no mundo.

Aprimoramento do relacionamento em pequenos grupos

A Igreja primitiva estava ciente da visão missionária universal (At 1:8).


Apesar das perseguições, nossos primeiros irmãos obedeceram rigorosamente
ao ide de Jesus. Os textos de At 2:42-47 e 4:32-35 se completam e mostram
as origens da igreja de Jerusalém. Era uma igreja que se caracterizava pela
perseverança na doutrina apostólica, na comunhão, na mútua solidariedade,
no testemunho público da fé e na adoração sob o poder atuante do Espírito
Santo. Tais características foram e ainda são indispensáveis na vida da Igreja,
independentemente da época, localização geográfica ou de diferenças
socioculturais.

Sob perseguição político-religiosa, a igreja, naquela época, se reunia nos lares


e testemunhava Deus acrescentando os que iam sendo salvos a cada dia (At
2:47 cf. 9:31). Isso não ocorreu por causa da reunião nos lares, mas pelos
princípios vividos intensamente sob a graça de Deus. Os lares foram
reduto de crescimento bíblico, conforto, mútuo encorajamento e
solidariedade, ou seja, apenas um meio e não um fim em si mesmo. A igreja
primitiva cresceu sem se sentir sufocada por metodologias institucionais,
porque o instinto pela sobrevivência espiritual latejava na alma de cada
crente. Essa experiência da igreja primitiva nos encoraja ao mesmo tempo em
que nos desafia.
O contexto filosófico e cultural tem mudado rapidamente em decorrência das
novas tecnologias da informação e comunicação, do individualismo, do
materialismo, do cientificismo e do relativismo proposto pelo pós-
modernismo. Por vias distintas e muitas vezes contraditórias, vivemos,
atualmente, num mundo em que se aprofunda a crença na ciência ao
mesmo tempo em que verdades absolutas são terminantemente rejeitadas.
Nesse contexto, nos deparamos com o enfraquecimento dos relacionamentos
mais profundos com Deus e entre as pessoas, o que tem tornado os cristãos
apáticos, solitários e viciados numa rotina que neutraliza a disposição de
servir os interesses do reino de Deus no mundo.

O discipulado, além do crescimento bíblico, quando realizado em pequenos


grupos, pode promover maior comunicação e fortalecer os
relacionamentos. Contudo, é importante esclarecer que pequenos grupos não
podem interpretados ou tratados como doutrina bíblica, como se faz com o
discipulado.

Pequenos grupos são, sobretudo, um método de organização para


dinamizar a prática de princípios bíblicos na vida da Igreja.

Possíveis vantagens relacionadas ao desenvolvimento do discipulado em


pequenos grupos:

• Estudar juntos a Bíblia, compartilhando dúvidas e respostas;

• Evangelizar amigos e vizinhos;


• Criar amizades saudáveis;

• Alegrar pela salvação de novos crentes;

• Perceber faltas corrigi-las com amor;

• Descobrir juntos meios de servir a cidade;

• Exercitar a oração: receber e fazer;

• Desenvolver vocações, dons e talentos.

A experiência da Igreja primitiva nos ensina que o crescimento da igreja pode


ser avaliado sob a operosidade do Espírito Santo, pelo crescimento individual
de cada crente no seu relacionamento com Deus. Portanto, não se trata da
medição de um produto com base em parâmetros quantitativos, mas na
avaliação de um processo de caráter qualitativo.

1.4 . OBJETIVOS DO DISCIPULADO BÍBLICO

Orientar a vida cristã e vivenciá-la intensamente

O discipulado desenvolvido em pequenos grupos permite que o ensino seja


compreendido pessoalmente a fim de que as práticas sejam melhor
orientadas. Em razão disso, objetiva-se promover diálogo aberto sobre os
temas bíblicos examinados, exercícios práticos durante a semana,
oportunidade para exposição de alegrias e dilemas pessoais visando
à comunhão e à oração, confraternização semestral de aniversariantes, ação
conjunta de serviço cristão através da igreja local, dentre outros.

Promover evangelização urbana sistemática

O contexto da reunião em pequeno grupo aproxima muito mais as pessoas


umas das outras que em um ambiente de grande aglomeração, onde as
reuniões são, por necessidade, mais formais e impessoais.

A evangelização é uma ação fundamental da Igreja no mundo. Objetiva-se


também, por meio do discipulado, que a evangelização por
relacionamentos seja uma das suas principais orientações. O responsável pelo
grupo poderá estimular a evangelização de parentes, amigos e vizinhos, mas
também fornecer preparação dos crentes para alcançá-los e estimular sua
prática.

Viabilizar o Crescimento por Batismo e Profissão de Fé

Uma vez evangelizados, os novos convertidos poderão ser orientados a


participarem da Escola Bíblica Dominical. A maioria das igrejas locais
oferece preparações para o batismo e/ou pública Profissão de Fé, bem como
estudos específicos sobre a importância da igreja local.

Por que crianças recém-nascidas não foram batizadas com a permissão


de pais crentes?

Por que crentes já ensinados biblicamente procrastinam o batismo ou a


profissão de fé?
Por que crentes frequentam meses a igreja local e não manifestam
interesse de serem definitivamente recebidos como membros
oficialmente?

Essas e outras perguntas carecem de respostas urgentes. Objetiva-se,


portanto, por meio do discipulado, conduzir pessoas evangelizadas ao
batismo e a pública profissão de fé, assim como foi ordenado pelo Senhor
Jesus; e regularizar sua membresia na igreja local. Nesse caso, o grupo
de discipulado é um importante auxílio no acompanhamento do recém-
convertido e do crente que sofre com dúvidas a respeito deste tema.

Criar uma cultura de pastoreio

Crentes maduros na fé têm o dever cristão de fortalecerem os mais novos.


Nesse sentido, objetiva-se criar uma cultura de pastoreio mútuo, caracterizada
pela disposição de visitar, aconselhar biblicamente, orar, exortar em amor,
prestar contas e reportar aqueles casos que envolvem maiores
responsabilidades ao conselho da igreja local, visando, sobretudo, o
fortalecimento da fé e restauração.

Formar novos líderes

A cada geração percebe-se que mais e mais pessoas demonstram indisposição


para servir às necessidades eclesiais, isso sem considerar o crescimento da
apatia espiritual quanto ao desapego das Escrituras e da oração, do fervor
missionário individual, dentre outros.
Nos dias atuais os líderes cristãos estão cada vez mais sobrecarregados para
atender às intensas demandas do ministério cristão.

Podemos então nos perguntar:

Qual será a realidade da Igreja nas gerações futuras se a Igreja atual não
investir seriamente na formação de líderes comprometidos com a
pregação do Evangelho?

É urgente que algo seja feito no nível do discipulado para que o amor leal e o
serviço fiel a Deus não sejam características apenas de alguns, mas de toda a
Igreja. Por essa razão, objetiva-se com o discipulado detectar vocações e
orientá-las para saberem como efetivamente poderão desenvolver a liderança
cristã e madura no pastoreio da Igreja.

1.5 . SÍNTESE

Em nosso tempo surgem, a cada instante, diferentes interpretações do mundo


que relativizam princípios morais e credos tradicionais da fé. Por essa razão,
novas linguagens, relacionamentos interpessoais e exigências intelectuais
impõem à Igreja novos desafios.

Sem dúvidas, a Igreja necessita preservar a centralidade e a base da Palavra


de Deus, especialmente no esforço necessário de sempre atualizar a
sua comunicação ao mundo. Contudo, nesse necessário esforço de
contextualizar a comunicação da verdade de Deus, a Igreja corre o sério risco
de se perder em metodologias ministeriais pouco relevantes à sociedade.

Encerramos este capítulo com a segurança suficiente quanto à base bíblica e


reconhecimento da necessidade do discipulado, assim como a Bíblia
nos apresenta. Também compreendemos o quanto os conceitos bíblicos
(teóricos) exigem uma resposta efetiva na vida da igreja (prática).

Nos próximos capítulos ampliaremos nosso estudo com base na reflexão


sobre o desenvolvimento do discipulado e numa proposta metodológica
capaz de evidenciar verdades bíblicas a todos aqueles que desejam percorrer
a jornada da vida cristã.
GÊNESE E DESENVOLVIMENTODO
DISCIPULADO BÍBLICO

2.1 . INTRODUÇÃO

Neste primeiro capítulo temos como principal objetivo explicar o conceito de


discipulado bíblico e o seu processo de desenvolvimento. Como Igreja,
desejamos crescer com solidez bíblica. Entretanto, percebemos o quanto nos
falta entendimento acerca desse tão desejado crescimento. Uma das
maiores evidências dessa falta de entendimento é a nossa tolerância para com
aquilo que contradiz nossos interesses mais genuínos quanto a esse
crescimento.

A esse respeito, notamos que mesmo as Escrituras nos instruindo, permitimos


que pessoas exerçam liderança não sendo realmente discípulos de
Jesus. Embora afirmem com os lábios, se recusam a “tomar a cruz” para
segui-Lo, negando a si mesmos, ou seja, despojando-se completamente do
esforço para ocupar “o primeiro lugar”. Outro caso comum diz respeito
àqueles que não exercem liderança oficial na Igreja. Grande parte conforma-
se em apenas assistir cultos e avaliá-los, mas não assumem para si o encargo
de fazerem discípulos onde se encontram, com base numa consciência
bíblica, assim como Jesus instruiu. Para ambos, líderes e oficiais – ou não –,
o discipulado exige renúncias pessoais para servir, honrar e submeter-se a
Cristo, humilhando-se para crescer (Mt 18:4 e 23:12).
O discipulado é fundamental para a Igreja!

O discipulado não é:

- Apenas uma experiência docente em uma sala de aula;

- Só um aconselhamento esporádico;

- Uma relação hierárquica,mecânica e impessoal. Quando isso ocorre, o


líder deixa

de ser discipulador para se tornar um gerente organizacional.

A gênese do discipulado é um forte vínculo entre duas ou mais pessoas,


discípulos e discipuladores. Desse modo, o ponto de partida para o
discipulado é o vínculo entre pessoas, aliança, comprometimento bilateral
para andar no caminho da santa vontade de Deus.

O discípulo de Jesus é alguém ensinável, destemido para enfrentar seus


pecados, disposto a crescer e ser restaurado por Deus em seus aspectos
sociais, morais e espirituais; acompanhado por um discipulador com as
mesmas características, e que por maturidade cristã, é capaz de auxiliar o
crescimento de outros. Esse discipulado é relacional e baseia-se no
compromisso entre o discípulo e discipulador de crescerem juntos.

2.2 . TIPOS DE DISCÍPULOS

A palavra discípulo, no contexto do Cristianismo, é normalmente utilizada


para identificar aqueles que creem em Jesus. Nesse sentido, muitos podem
crer nele e serem, ao mesmo tempo, meros crentes nominais quanto à fé.
Assim, são discípulos de Jesus, por crerem, mas não por segui-lo.

Durante seu ministério terreno Jesus entrou em contato com pelo menos três
grupos de pessoas que o seguiam: as multidões, os religiosos ocasionais e os
discípulos. Ainda hoje esses grupos estão presentes em nossas igrejas: os
observadores (multidões), os pessimistas ou consumistas (religiosos
ocasionais) e os comprometidos ou agentes de transformação (discípulos).

Discípulos observadores

Em Mateus 4:25, 8:1 e 14:13 lemos que as “multidões o seguiam”. Elas


também se maravilhavam da sua doutrina (Mt 7:28), glorificavam a Deus (Mt
9:8), apresentavam a Jesus seus enfermos (Mt 15:30) e até confessavam que
ele era o profeta (Mt 21:11). Jesus as ensinou (Mt 22:33 e 23:1), as curou (Mt
14:14 e 19:2) e se compadeceu delas (Mt 9:36). Ele não desprezou seus
observadores nem negligenciou tais multidões; mas também não as priorizou.

O nível de comprometimento dessas multidões com as verdades que Jesus


ensinava era quase irrelevante. Em João 6:2 lemos: “Seguia-o
numerosa multidão, porque tinham visto os sinais que ele fazia na cura dos
enfermos”.

As multidões seguiam a Jesus mais pela busca de sinais e curas, que em


busca pelo genuíno relacionamento com Ele.
As motivações desses grupos eram questionáveis, razão porque não eram
confiáveis. Confira o que diz João 2:23-25:

Estando ele em Jerusalém, durante a Festa da Páscoa, muitos, vendo os


sinais que ele fazia, creram no seu nome; mas o próprio Jesus não se
confiava a eles, porque os conhecia a todos. E não precisava de que
alguém lhe desse testemunho a respeito do homem, porque ele mesmo
sabia o que era a natureza humana.

As motivações das multidões são muito inseguras. Meros observadores vão


atrás de sinais, de ídolos, procuram o delírio de pregadores, e por isso vão
e vem, já que não querem vínculos comprometedores. Na hora da crise, da
pressão, procuram rapidamente outro lugar que seja capaz de alimentar seus
desejos íntimos e expectativas individualistas.

Para se manterem no anonimato, muitos fazem parte da multidão por causa


da decepção com estruturas organizacionais e líderes eclesiásticos. Do
mesmo modo, não são poucos aqueles que:

• Tem vida espiritual rasa;

• São conformados apenas com a salvação;

• Não tem interesse pelo serviço.

Com a indicação de tais problemas não estamos afirmando que tais pessoas
devem ser desprezadas e negligenciadas, mas consumir energia demasiada a
favor delas pode não ser o melhor caminho para discipuladores que possuem
metas e compromisso com elas.

Discípulos pessimistas ou consumistas

Jesus também lidou com o grupo dos pessimistas ou consumistas, dos


religiosos legalistas, que era constituído relativamente por escribas, fariseus
e saduceus. Além dos invejosos líderes do Judaísmo, lê-se, por exemplo, a
história de Nicodemos (líder da Sinagoga) em João 3. Esse homem
procurou Jesus na madrugada porque tinha medo de confessar publicamente
sua fé (cf. Jo 12:42). Há, ainda, outros exemplos, tais como: a história de José
de Arimatéia em João 19:39, o qual foi descrito como “discípulo oculto” (Jo
19:38) e o caso do jovem rico (Mt 19:16-30; Mc 10:17-31 e Lc 18:18-3).
Com respeito à Lei ele disse a Jesus: “Tudo isto tenho observado; que me
falta ainda?”. Ele não pertencia ao grupo dos observadores, pois procurou
maior aproximação de Jesus, porém, quando confrontado em
sua superficialidade religiosa, “retirou-se triste”.

Diante do exposto, notamos as características que melhor representam o


papel dos “pessimistas” ou “consumistas”. Eles procuram conselheiros e
pregadores que falam o que querem, porém, quando confrontadas em seus
pecados “retiram-se”. Seus relacionamentos são superficiais, enquanto
suas críticas são profundas. Suas cobranças são lógicas, importantes e até
necessárias, mas seus compromissos são eventuais e suas condutas pessoais
imaturas. Cobram muito, mas não aceitam ser cobrados. Querem ser
independentes, mas não abrem mão de serem ouvidos. O relacionamento
desse grupo é mais próximo do que o do grupo dos observadores, e por serem
“de casa” até criticam a falta de compromisso dos demais. São presentes e
atuantes até quando são atendidos em suas preferências e opiniões. Quando
recebem cargos e atenção andam firmes, mas quando começam a ser
questionados ou exortados se escandalizam, ficam melindrados e radicalizam
suas decisões do tipo: “aqui não fico mais!”, como fez o jovem rico com todo
o seu conhecimento da Lei do Senhor.

Discípulos comprometidos ou agentes de transformação

O terceiro grupo com o qual Jesus lidou foi o grupo dos discípulos
comprometidos. Na perspectiva de Jesus, eles seriam os agentes de
transformação que ele mesmo iniciou na terra, confrontando as trevas com a
luz, o ódio com o amor, o egoísmo com a generosidade, a perseguição com a
oração.

Nesse nível de relacionamento com Jesus o discípulo aprende o que significa


“tomar a cruz”, o que significa doar-se para que outros sejam “salvos”.
Nele, Jesus criou vínculos fortes em torno de um propósito claro:
transformação de vidas. Seu interesse não foi apenas transmitir
conhecimento, não procurou apenas companhia em suas andanças na
Palestina, não quis cercar-se de “guarda-costas” para protegê-Lo das
hostilidades dos judeus e samaritanos, bem como não quis apenas ser
admirado. Antes e sobretudo, trabalhou para que seus discípulos
vivessem como ele viveu.

Esse grupo precisou discernir a diferença entre o mestre (representado pelos


fariseus que ostentavam religiosidade por posições, vestes talares e
legalismo), e o discipulador (representado por Jesus que demonstrou a
grandeza de servir e dar a sua vida por resgate de muitos). Ambos
foram dedicados ao ensino, mas a diferença estava no nível de
relacionamento transformador e interesse pela vida de quem era ensinado.
Em Mateus 4:23 lemos que Jesus ensinava nas sinagogas. Ele exerceu um
ministério de ensino público, mas com seus discípulos ele agiu como um
discipulador. No mesmo livro podemos ainda encontrar o seguinte versículo:

Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome


do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as
coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias
até à consumação do século. (Mt 28:19-20)

O mestre ensina, porém, apenas o discipulador ensina a guardar todas as


coisas. O ensino público atinge todas as pessoas e é importante no
exercício ministerial da Igreja, assim como foi para o exercício ministerial de
Jesus. Entretanto, o ensino público e impessoal não é tão eficaz quanto o
discipulado orientado por relacionamentos pessoais. Jesus entendia isso,
razão pela qual ensinou multidões, mas dedicou-se mais profundamente aos
discípulos que deixaram tudo para segui-Lo (Mc 10:28).
Os discípulos de Jesus são pessoas profundamente relacionadas com ele, e tal
relacionamento se evidencia no compromisso com seus ensinamentos. São
submissos, ensináveis, suas motivações são confiáveis e transparentes, são
orientados por princípios e não por circunstâncias ou pressões, não temem
se humilhar para que outros sejam exaltados, não procuram os “primeiros
lugares”, e estão sempre prontos para atender ao chamado do serviço
altruísta.

2.3 . PADRÃO DE DISCIPULADOR: JESUS

Na Bíblia encontramos diversos exemplos de discipuladores, mas nenhum se


compara a Jesus. Portanto, relacionamos abaixo alguns princípios
fundamentais do discipulado praticados por ele:

• Andar "junto" com os discípulos

• Ser honesto no relacionamento

• Dar testemunho por obras

• Escolher quem será discipulado

Andar “junto” com os discípulos

Nos últimos anos temos observado uma crescente decepção de crentes com
igrejas cristãs. Parte desta decepção é resultado de igrejas que transformaram
o discipulado num meio de manipulação de pessoas que, por disposições
genuínas de crescimento pessoal na fé, submeteram-se. Violadas em sua
privacidade, sentindo-se sufocadas por exigências metodológicas e pelas
constantes tentativas de controle e supervisão, muitas pessoas desenvolveram
resistências para serem novamente acompanhadas. A proposta apresentada
aqui não compartilha desse pensamento, pelo contrário, o rejeita.

Ao descartarmos a manipulação “justificada” pela prática do discipulado em


algumas igrejas, faz-se necessário destacar o princípio do acompanhamento
no discipulado. Lendo os Evangelhos qualquer leitor perceberá a intenção e o
interesse de Jesus em estar junto dos seus discípulos, mesmo quando eles se
distraíam.

Depois, subiu ao monte e chamou os que ele mesmo quis, e vieram para
junto dele. Então, designou doze para estarem com ele e para os enviar
a pregar e a exercer a autoridade de expelir demônios. (Mc 3:13-15)

Note que por duas vezes o texto enfatiza a aproximação dos discípulos
pela designação de Jesus. Ter os discípulos juntos dele, numa relação de
intimidade e compartilhamento, era um princípio fundamental
de transformação da vida.

Assim, a influência de Jesus e as oportunidades para reparar erros eram


sempre diretas e precisas. Os discípulos estavam sempre sob a
observação cautelosa do seu mestre, nada lhe escapava e nada deixava de ser
tratado por causa desta aproximação (Mt 15:12, 23, 17:1-7, 19, 18:21). Do
mesmo modo, Jesus vê as multidões, mas ensina seus discípulos, tendo-os
próximos dele (Mt 5:1).

Em momentos muito particulares, Jesus envolveu os discípulos Pedro, Tiago


e João para que fossem ensinados mais particularmente (Mt 17:1-7 e Mc 9:2-
8, 13:1-27). Em um momento de profunda angústia no Getsêmane, Jesus não
se permitiu estar só, envolveu todos os seus discípulos (Mt 26:36-37).

Geralmente nos fechamos quando vivemos angústias pessoais no exercício da


liderança. Também, discretamente, queremos provar para as pessoas que
somos imbatíveis escondendo nossas fraquezas. Tentamos ser extraordinários
aos olhos daqueles que nos cercam e essa tentativa produz hipocrisia e
grandes frustrações. Porém, quando andamos juntos, expressamos melhor
nossas realidades mais profundas. A confiança, fruto de
relacionamentos sólidos, permite-nos expressar melhor quem somos, bem
como nossas fraquezas e potenciais. Também nos permite, como
discipuladores, perceber melhor quando os discípulos estão aflitos por
algummotivo e, assim, saber como melhor ajudá-los a encontrar respostas ou
soluções. Como Jesus, discipuladores e discípulos devem andar juntos,
criar vínculos maduros e enfrentar lutas e vitórias no caminho da cruz.

Ser honesto no relacionamento

Jesus não foi parcial no relacionamento com seus discípulos. Ele poderia ser
tendencioso para preservar a aproximação e admiração dos discípulos,
mas não foi. Soube equilibrar expectativas com promessas sólidas (Jo 16:5-
13). Não escondeu os privilégios, mas também não omitiu as aflições (Jo
16:33).

O conceito do reino de Deus é superior ao conceito dos reinos mundanos.


Quanto mais você cresce, mais o mundo questiona e exige respostas. A
maior tentação é querer responder tudo manipulando a verdade simples e
objetiva do Evangelho para atrair pessoas a si. Isso é um engano! As pessoas
devem se aproximar do Evangelho pelos motivos que ele declara e não pelas
expectativas carnais que elas possuem.

Arrependimento de pecados é humilhante para o mundo, mas para Deus


é exaltação.

Não tente dar um “jeitinho” para não causar constrangimento nas pessoas.
Ninguém chegará aos privilégios eternos por atalhos, para evitar o caminho
da cruz; não adianta mudar as palavras porque ninguém poderá mudar a
verdade.

As pessoas evitam sacrifício, querem sempre o caminho mais fácil. Porém,


sem entenderem o sacrifício e tomarem, cada um, a sua cruz, negando-se a si
mesmas, não poderão ser discípulos verdadeiros de Jesus.

Dar testemunho por obras

Um bom testemunho não é aquele que se conforma às opiniões ou


conveniências das pessoas, e sim aquele que se conforma com a medida da
estatura da plenitude de Cristo (Ef 4:13-16), ou seja, com o padrão de Deus: o
caráter de Cristo.

Tiago aprendeu que fé não se testemunha com discursos apenas, já que ele
reivindicou que as obras devem testemunhá-la, mesmo quando não há
palavras (Tg 1:22-25, 2:18). Quando João esteve preso e enviou seus
discípulos para perguntarem a Jesus se ele era o Messias esperado, em
resposta Jesus pediu que anunciassem a ele o que haviam ouvido e visto (Mt
11:2-6). Ele deu testemunho da verdade pelas obras, pois a fé bíblica também
apresenta uma dimensão subjetiva. Quando as obras são um meio que a
evidencia, tornam-se provas concretas da espiritualidade do cristão. Nesse
sentido, as pessoas são persuadidas muito mais pela demonstração
de verdades espirituais na prática que meramente pela elucidação filosófica
ou erudição.

Escolher quem será discipulado

O autor do Evangelho de Marcos disse que Jesus “chamou os que ele mesmo
quis... Então, designou” (Mc 3:13-14). Um dos princípios no
discipulado praticado por Jesus está no fato dele ter escolhido os discípulos, e
não o contrário. O princípio aqui é abordar pessoas, chamando-as para uma
relação intencional de crescimento mútuo. Esta iniciativa pesa mais sobre o
discipulador, pois se relaciona com a sua maturidade cristã.
O discipulador necessita entender, portanto, duas orientações básicas:

Para que as pessoas aceitem o compromisso de serem discipuladas com


base numa abordagem pessoal, antes, a maturidade e testemunho do
discipulador devem ser reconhecidos. Isso demanda sacrifício, amor,
zelo, autoridade de vida, seja publicamente, seja privativamente.

Se as pessoas que abordar se recusarem andar com você, não insista.


Focalize aquelas que apresentam disposição. Ninguém deve ser forçado
ao discipulado, como Jesus nunca coagiu pessoas a segui-Lo.

Fique atento àquelas que lhe respondem, esse pode ser um bom sinal de
pessoas que serão bem discipuladas por você. Os demais poderão ser
discipulados por outros discipuladores. Como um lavrador que foca os frutos
maduros, concentre-se naqueles que demonstram interesse de crescer no
relacionamento e intimidade com Cristo.

2.4 . FASES DA MATURIDADE CRISTÃ


Todo ser vivo recebeu da parte de Deus potencial para crescer e
se multiplicar. Se o crente cresce, mas não se multiplica é porque algo
está enfermo em sua própriacondição de vida. Assim como no ciclo
natural da vida, a vida cristã também percorre fases importantes para o
seu amadurecimento.

A fé (conversão) dá ao crente condição para afirmála (amadurecimento),


e à medida em que cresce, cresce também o dever de demonstrá-la ao
mundo (serviço).

Nas Escrituras a eleição está sempre relacionada à vocação. Uma não


nega a outra, uma não omite a outra, elas se combinam como sendo a
vocação ao serviço.

Abaixo alguns textos que demonstram isso:

...de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o


nome. Sê tu uma bênção! [eleição] Abençoarei os que te
abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão
benditas todas as famílias da terra [vocação]. (Gn 12:2-3)

Seja Deus gracioso para conosco, e nos abençoe, e faça


resplandecer sobre nós o rosto [eleição]; para que se conheça na
terra o teu caminho e, em todas as nações, a tua salvação [vocação].
(Sl 67:1-2)

Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós;
é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie [eleição].
Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as
quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas
[vocação]. (Ef 2:8-10)

Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de
propriedade exclusiva de Deus [eleição], a fim de proclamardes as
virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa
luz [vocação]. (1 Pd 2:9)

Visto como, pelo seu divino poder, nos têm sido doadas todas as
coisas que conduzem à vida e à piedade, pelo conhecimento
completo daquele que nos chamou para a sua própria glória e
virtude, pelas quais nos têm sido doadas as suas preciosas e mui
grandes promessas, para que por elas vos torneis co-participantes
da natureza divina, livrando-vos da corrupção das paixões que há
no mundo, por isso mesmo, vós, reunindo toda a vossa diligência,
associai com a vossa fé a virtude; com a virtude, o conhecimento;
com o conhecimento, o domínio próprio; com o domínio próprio, a
perseverança; com a perseverança, a piedade; com a piedade, a
fraternidade; com a fraternidade, o amor. Porque estas coisas,
existindo em vós e em vós aumentando, fazem com que não sejais
nem inativos, nem infrutuosos no pleno conhecimento de nosso
Senhor Jesus Cristo. Pois aquele a quem estas coisas não estão
presentes é cego, vendo só o que está perto, esquecido da
purificação dos seus pecados de outrora. Por isso, irmãos, procurai,
com diligência cada vez maior, confirmar a vossa vocação e
eleição; porquanto, procedendo assim, não tropeçareis em
tempo algum. (2 Pd 1:3-10)

Crentes saudáveis em Jesus crescem e se multiplicam por meio do caráter e


do serviço. Eles não salvam perdidos, mas edificam os alcançados. Eles agem
assim por submissão, obediência e honra ao Senhor das suas vidas. Portanto,
é inaceitável que crentes sejam irresponsáveis em relação aos interesses de
Deus no mundo (Mt 28:19-20 e Mc 16:15); esses, certamente, carecem de
imediata cura naquilo que é essencial em seu relacionamento com Deus.
Perplexo com a imaturidade de crentes antigos, e pela apática vida cristã dos
hebreus quanto ao serviço, o autor da epístola escreveu:

A esse respeito temos muitas coisas que dizer e difíceis de explicar,


porquanto vos tendes tornado tardios em ouvir. Pois, com
efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido,
tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de
novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus; assim,
vos tornastes como necessitados de leite e não de alimento sólido.
Ora, todo aquele que se alimenta de leite é inexperiente na palavra da
justiça, porque é criança. Mas o alimento sólido é para os adultos,
para aqueles que, pela prática, têm as suas faculdades exercitadas para
discernir não somente o bem, mas também o mal. (Hb 5:11-14)

Um dos mais claros propósitos do discipulado é ensinar (teoria) a guardar


(praticar) tudo o que Jesus ensinou guardando (Mt 28:20). É fazer com que
crentes imaturos e dependentes amadureçam a ponto de serem capazes de
discipular outros no caminho de Cristo.

2.5 . O PAPEL DO DISCIPULADO NA DINÂMICA DA IGREJA

Em nossos dias o termo “igreja” associa-se quase que diretamente ao aspecto


físico (templo) e organizacional (estruturas funcionais constituídas por cargos
e salários). Essa interpretação não define bíblica e essencialmente a Igreja,
ainda que ela seja uma entidade religiosa do ponto de vista social e jurídico, e
como tal tenha a necessidade de prédios, cargos e salários.

Contudo, ao examinarmos mais profundamente as Escrituras, descobrimos


que essa interpretação de Igreja se mistura com conceitos eclesiásticos
veterotestamentários centrais: o templo, o sábado e o clero. É fato que grande
parte dos crentes de hoje possuem raízes aprofundadas nesses conceitos, isso
se justifica no tradicionalismo da Igreja Católica Romana e costumes
herdados por igrejas protestantes no curso da história.
O Templo

O modelo de “igreja” no Antigo Testamento contemplava o Templo


como lugar único de culto a Deus, com cerimônias e ritos que deveriam
ser cumpridos. Atualmente muitos crentes acreditam que o lar, as ruas, o
local de trabalho, academias de estudo, a caminhada, as negociações, as
discussões, as decisões simples e complexas, dentre outros, não são
meios de prestação de culto a Deus, somente no “templo” por meiode
um ato cerimonial. Admitem com relativa paz de consciência, pela
frequência ao templo, serem crentes fiéis; porém, durante a semana se
comportam como se não fossem.

O Sábado

O sábado (domingo como sétimo dia para grande parte da Igreja


ocidental), que era o dia para se descansar, guardar, santificar, tornou-se
o dia em que se centraliza o culto e o serviço no “templo” como ápice da
experiência espiritual durante a semana, de modo que ir ao templo
significa estar salvo, não ir estar perdido. Essa centralização geográfica
atribuída à presença de Deus (Santo dos Santos, Templo, Jerusalém,
Israel) foi dissolvida a partir da nova aliança e os discípulos
deveriam entender que, ao invés de esperar pelas nações, deveriam
agora ir até elas: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações...”
(Mt 28:19a).
O Clero

O clero, representado pela ordem levítica, era a figura do intercessor do


povo, aquele que administrava os sacrifícios e culto a Deus. Toda esta
atividade concentrava-se nele. Não é de se espantar que ainda hoje haja
expectativa do povo sobre o pastor para que ele faça o serviço só.
Muitos não compreendem que o pastor (oficial ou não) é um moderador
de funções dos membros e por isto, esperam e exigem que ele faça o
serviço - já que é pago para tal - enquanto se acomodam nos bancos das
igrejas como expectadores e críticos dos poucos que trabalham.

No Novo Testamento uma das metáforas mais importantes atribuídas à Igreja


é a do “corpo”, um organismo dinâmico pelas funções dos seus membros (1
Co 10:32, 11:22, 12:28; Ef 4:11-16, 5:30; Cl 1:18-22, 2:19, 3:15).

A palavra “igreja” tem origem na palavra grega ekklesia (gr. ek +


kaleo): “chamado para fora”.

Nesse sentido a Igreja é um organismo espiritual composto de pessoas


regeneradas pela graça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo e dotados
de funções que, sob a atuação do Espírito Santo, expressam vida de todo o
corpo.

Assim sendo, cada membro possui uma função comprometida pelo serviço no
reino de Deus, e não apenas a liderança oficial da igreja em sua estrutura
organizacional. A Igreja não pode restringir seu potencial a programas,
eventos e na atuação de um pequeno grupo de líderes, como se nisso
estivesse sua missão.

Apresentaremos a seguir nossa proposta para viabilizar maiores


oportunidades no uso dos dons de cada membro.

2.6 . DISCIPULADO EM PEQUENOS GRUPOS

Percebemos que a maioria das igrejas evangélicas começou a canalizar


esforços ministeriais com base no trabalho com pequenos grupos, sem antes
definir propósitos bíblicos claros para tal. De fato, certas igrejas,
especialmente estrangeiras, experimentaram um crescimento exponencial por
meio desta metodologia, em curto prazo, e isso despertou e inspirou inúmeras
lideranças brasileiras (principalmente a partir da década de 90), que
precipitadamente, seguiram os mesmos passos. Não demorou muito e
surgiram questionamentos doutrinários, dissensões entre irmãos e fracassos
ministeriais os quais geraram profundas frustrações.

Ainda há uma tendência pragmática atual na Igreja evangélica brasileira de


agregar a si experiências positivas de outras, sem uma avaliação
missiológica de critérios bíblicos, porque os números (reuniões cheias e
aumento das contribuições) passaram a dar maior sentido a ela; razão porque
sua vida e o desempenho de pastores, em geral, são medidos pelo tamanho da
assistência dominical e da contribuição. Nessa direção, muitas igrejas
iniciaram o ministério em pequenos grupos simplesmente porque se tornaram
populares (“todo mundo está fazendo”) ou porque viabilizam crescimento em
curto prazo. Essas tendências atuais não fornecem à Igreja bases sólidas para
fundamentar ministérios sólidos.

Um ministério em Pequenos Grupos não será eficaz se não existir para


atingir propósitos claramente bíblicos. Por falta destes muitos
fracassaram. Outros são prejudicados pela falta de
recursos contextualizados (orientações, manuais, estudos bíblicos, etc.).
Não é exagero dizer que os livros mais populares relacionados à área
dão maior ênfase à Psicologia Moderna e Sociologia do que em
minuciosa Teologia Bíblica.

Mesmo considerando tais ressalvas e preocupações, ainda assim o trabalho


com pequenos grupos revela-se como metodologia compatível com os
propósitos do discipulado bíblico. Isso porque as Escrituras ressaltam que
comunhão combina fé bíblica, relacionamento e adoração; e missão
que combina evangelização e discipulado. Esses “pilares” da Igreja
expressam vida e vida em Cristo.
Se houver danos à comunhão, a missão será diretamente afetada. Essa sempre
foi uma preocupação pessoal na preparação de equipes missionárias ao longo
do nosso ministério. Sempre pensamos que se as equipes desenvolvessem boa
comunhão antes das viagens missionárias, o trabalho que elas realizariam
teria a força da sua coletividade. Esse princípio envolve a vida da Igreja, pois
se ela crescer na comunhão, estará unida na missão e o impacto no mundo
será relevante.

De acordo com os dados do IGBE (2010) representamos como Igreja


protestante no Brasil, uma significativa população: 42,3 milhões de
evangélicos (22,2% da população brasileira), mas ainda não influenciamos
determinantemente transformações sociais no país, certamente porque somos
desunidos.

Comunhão genuína é prática. Por isso, o planejamento do discipulado em


pequenos grupos visa a comunhão por meio da qual os
relacionamentos possam se desenvolver cada vez mais. Tal crescimento é
fundamental para a missão da Igreja.

Um pequeno grupo de crentes reunido semanalmente favorece:

• O ensino bíblico por meio da exposição bíblica das Escrituras, a


discussão sobre o tema e a elucidação de dúvidas, para o fortalecimento
da fé bíblica. Como o grupo é menor, é possível todos participarem,
questionarem e crescerem sob a observação de um líder pastoralmente
zeloso;

• O desenvolvimento de relacionamentos saudáveis, cuidado mútuo das


necessidades pessoais e intimidade, em nível que permite preocupar-
se, socorrer e orar uns com os outros, além de participar de momentos
pessoais significativos;

• A constante santificação. Crentes nominais, meros religiosos, apenas


cantam, mas somente crentes redimidos cantam e adoram. A adoração é
gratidão consciente, reconhecimento verdadeiro, consagração,
testemunho honroso, vida como oferta, compromisso sacrificial e
rendição.

Como Igreja Reformada, compreendemos biblicamente a salvação através da


chamada “Ordem da Salvação” que, segundo Berkhof (2007, p.383),
“descreve o processo pelo qual a obra de salvação, realizada em Cristo, é
concretizada subjetivamente nos corações e vidas dos pecadores”. Antes da
santificação, Deus, pela obra consumada de Cristo, justifica os culpados e os
declara justos. A justificação trata da posição do homem diante do Juiz. A
santificação, por outro lado, refere-se à nova prática de vida do justificado. É,
portanto, o processo contínuo de educação e libertação das infl uências
pecaminosas, assemelhando-se cada vez mais com o caráter de Jesus.

É importante compreender que a justificação é imediata enquanto a


santificação é gradual. O crente redimido nunca será mais justificado do que
é, porque a justificação é um ato completo e eterno de Deus. Mas pela sua
graça o crente se torna cada vez mais santificado pela operação do Espírito
Santo. Nessa operação determinada pelo Espírito, o crente participa do
processo de transformação como ser moral e responsável. Sendo assim, uma
vez redimidos pela justiça de Deus em Cristo, os justos devem submeter-se à
santificação do Espírito Santo. A justificação relaciona-se à evangelização, e
a santificação ao discipulado; a evangelização alcança os perdidos e o
discipulado educa os alcançados.

Discipular é cooperar com a santificação de pecadores justificados.

2.7. SÍNTESE

Em suma, pequenos grupos só servirão à causa do discipulado se forem


fundamentados na sã doutrina e visualizados por um propósito claro e
bíblico.

A proposta do discipulado em pequenos grupos aqui apresentada não reflete o


conceito celular utilizado por muitas igrejas atualmente, em que a igreja local
é totalmente organizada em “células”; pelo contrário, se traduz como um
Ministério entre outros na igreja local.

O pequeno grupo é uma reunião da igreja que se realiza semanalmente para


compartilhar vida e apoiar um ao outro. A vida cristã é cercada por tentações
e dificuldades pessoais e não deve ser vivida isoladamente.
No pequeno grupo as pessoas que não são cristãs se adaptam mais facilmente
pelos laços de amizade e pelo ambiente informal; assim, devem ser auxiliados
a ouvir e experimentar as boas novas de Jesus de maneira profunda e
racional. Do mesmo modo, o recém-convertido deve ser pessoalmente
recebido e perceber que está cercado por pessoas que realmente se importam
com ele. Nos pequenos grupos somos estimulados e desafiados mutuamente
no caminho do Senhor Jesus.

O pequeno grupo existe para dinamizar a interação dos membros e propiciar


maior comunhão, com vistas na missão que a Igreja tem no mundo:
evangelizar e fazer discípulos para Jesus Cristo entre todas as nações da
Terra.
O DISCIPULADO E O DISCÍPULO

3.1 . INTRODUÇÃO

Para a Bíblia, regeneração e santificação estão incluídas na salvação; porém,


são distintas em vários aspectos. Enquanto a regeneração é um ato, a
santificação é um processo. Uma vez regenerado o homem é feito filho de
Deus e é convertido mediante a fé e o arrependimento. A partir desse ato
divino no homem, inicia-se a sua santificação, pela qual é educado a viver de
acordo com a ética do reino de Deus e restaurado, progressivamente, das
influências do pecado que ainda operam na sua natureza. O discipulado,
portanto, considera a santificação daqueles que ouvem e creem no
testemunho de Cristo.
As informações bíblicas fornecem subsídios suficientes para ações
ministeriais eficazes. Contudo, inúmeras igrejas e pessoas sabem o que
devem fazer, mas poucas sabem como devem fazer. Por esse motivo, neste
capítulo, apresentaremos algumas noções práticas que efetivam o conceito do
discipulado bíblico pela prática.

Essas noções serão limitadas a uma metodologia que envolverá quatro


dimensões da formação de um discípulo (conhecimento, caráter, coração
e serviço), currículo, dinâmicas práticas, organização dos encontros de
discipulado, evangelização e a importante missão de preparar novos líderes.

A finalidade deste capítulo é auxiliar aqueles que desejam efetivar o conceito


bíblico de discipulado em sua igreja, mas ainda não sabem como fazê-lo de
acordo com as teorias até aqui apresentadas.

3.2 . METODOLOGIA: “CRUZ DO DISCIPULADO”

A palavra “método” é de origem grega e formada pelas palavras: υετα, meta


(prep. “atrás”, “em seguida”, “junto de”, “com”) + οδος, hódos
(substantivo “caminho”).

Etimologicamente a palavra “método” salienta como se faz o que deve


ser feito.

O método segue o caminho, mas não é o caminho. O método serve a missão,


mas a missão não serve o método, o que seria pragmatismo absoluto.
Pensando nisso, a metodologia proposta neste livro não pretende apresentar-
se como:

• uma forma autoritária de se empreender o discipulado proposto;

• um modelo empresarial a partir de experiências extrangeiras no Brasil;

• nem mesmo uma pretenciosa fórmula de resultados positivos.

Pelo contrário, é uma proposta flexível sobre como desenvolver a iniciativa


do discipulado na igreja local (contexto urbano), simples e sujeita a
adequações.

Ao desenvolver esta metodologia, pensamos sobre como tornar o discipulado


abrangente em sua efetivação, considerando o máximo de implicações que o
discipulado bíblico envolve. A essa metodologia demos o nome de: “Cruz do
Discipulado”.

Jesus disse ao intérprete da Lei que o grande mandamento da Lei é:

Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e
de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O
segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti
mesmo. (Mt 22:37-39)
Amarás o Senhor, teu Deus é o relacionamento vertical e amarás o
teu próximo como a ti mesmo é o relacionamento horizontal. Note que
esses relacionamentos despertam no imaginário a figura de uma cruz.

Jesus disse aos seus discípulos:

Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e
siga-me. (Mt 16:24)

Certamente Ele não estava se referindo literalmente a uma cruz de madeira


pela qual “perderiam suas vidas” (Mt 16:25), e sim, “negar a si mesmo”
pela causa de Cristo, cuja consequência envolveria a disposição para
enfrentar até mesmo a vergonha e humilhação, semelhante àquelas que
sofriam os que eram condenados a pagar por seus pecados com a morte na
cruz romana. Portanto, seguir a Jesus implica viver como ele viveu a
humildade e o serviço em obediência a Deus.

Tendo em vista essas implicações profundas de relacionamento com Deus e


com o próximo, a metodologia denominada “Cruz do Discipulado”
contempla tais dimensões com base em quatro verbos:

De acordo com a perspectiva bíblica, a vida cristã requer crescimento nessas


quatro áreas da maturidade espiritual. Essa metodologia não se restringe a
uma linguagem impessoal, típica da docência formal, já que os verbos
apresentados devem ser combinados a cada encontro e a cada
abordagem pastoral de maneira integrada e integradora, já que não são
paralelos, mas relacionáveis. A cada semana há uma combinação de todos
eles, mas com ênfase específica num verbo, por uma razão didática.

O ensino bíblico que fundamenta o discipulado não pode ser visto como uma
escada ou escalonamento de níveis ou status espiritual cuja premiação é
um diploma, certificado ou ainda cargos elevados na hierarquia do poder
eclesiástico. Não podemos separar os verbos saber, ser, sentir e servir na
jornada do discipulado. Aprende-se e se vive cada um, ao mesmo tempo, e
por toda a vida!

SABER

Temas relacionados à Teologia Sistemática, os quais enfatizam o


conhecimento das principais doutrinas reformadas. O objetivo é
fortalecer a convicção pessoal na fé bíblica e prepará-la para o seu firme
testemunho no mundo.

SER

Temas relacionados ao caráter cristão. O pecado corrompeu o homem


feito à imagem de Deus, tornando-o distante da santidade e justiças
divinas. O objetivo é auxiliar no amadurecimento do caráter, de modo
que o discípulo viva segundo o exemplo de Cristo.

SENTIR

Temas relacionados ao coração (sentimentos e motivações). O homem


foi constituído, também, por emoções, as quais, por causa do pecado,
desorganizaram-se, dando lugar à cobiça, ira, ansiedade, estresse etc. O
objetivo é orientar a conduta cristã com base nas Escrituras.

SERVIR

Temas relacionados ao serviço cristão, como legítimo testemunho da fé.


Sem comprometimento prático com verdades bíblicas apreendidas, a fé
é morta. O objetivo é estimular o testemunho público da fé, a
responsabilidade social e o pastoreio de outras pessoas.
3.3 . CURRÍCULO E DURAÇÃO

Currículo

O currículo indicado possui estreita relação com os verbos no método “A


Cruz do Discipulado”, os quais devem ser abordados durante cada mês,
gerando assim um equilíbrio dos assuntos que envolvem o discipulado
cristão.

Este currículo possui sessenta e quatro temas:


Duração

Ao todo, o discipulado prevê dois anos de duração, dividindo-se em quatro


quadrimestres.

A reunião do grupo de discipulado deve ter duração máxima de duas horas,


podendo ser reduzido o tempo de cada parte, de acordo com a necessidade. A
reunião pode ser assim organizada:

:15 quinze minutos

RELATÓRIO E ORAÇÃO

Momento dedicado para receber a devocional semanal, escrita e


relacionada ao estudo da semana anterior. Também para relatar
a aplicação prática orientada. Este primeiro momento é concluído com
oração.

:45 quarenta e cinco minutos

ESTUDO BÍBLICO

Momento dedicado para exposição e interação com os temas previstos


para cada semana, assim organizado:

:25 vinte e cinco minutos


EXPOSIÇÃO DO ESTUDO

O ensino é responsabilidade do discipulador. Ele faz uso exclusivo de


material, preparado especificamente, para atender cada tema.

:10 dez minutos

REVISÃO

Cada estudo apresenta duas ou três perguntas preparadas para provocar


discussão sobre o tema estudado, a fim de enfatizar seus argumentos
centrais e provocar a participação.

:10 dez minutos

PERGUNTAS

Tempo dedicado para exposição de dúvidas e oportunidade para


encontrar possíveis respostas.

:15 quinze minutos

COMPARTILHAMENTO

Momento dedicado para as pessoas exporem suas experiências


cotidianas, suas alegrias e aflições.

:15 quinze minutos

INTERCESSÃO MISSIONÁRIA
Momento dedicado para interceder uns pelos outros, pelos visitantes,
familiares, missionários, cidade local etc.

:30 trinta minutos

CONFRATERNIZAÇÃO

Momento dedicado para bate-papo acompanhado de lanche, para


fortalecer os relacionamentos.
3.4 . ESTUDO: PRINCÍPIOS E MODELO DE ESTUDO

Princípios

Antes de apresentar um modelo de estudo faz-se necessário apresentar


algumas dicas sobre administração do tempo e linguagem do ensino.
Nesse sentido, gostaríamos de refletir sobre a abordagem do líder para com as
pessoas que se encontrarão no pequeno grupo de discipulado.

O momento do ensino é o momento central da reunião. Esse momento é que


faz dela um grupo de discipulado bíblico. Devemos nos lembrar de que tal
momento é antecedido pela recepção e ambiente do local e, por esse motivo,
ao acolhermos bem as pessoas e promovermos um ambiente amigável,
especialmente para os visitantes, estaremos preparando-as para a mensagem
que será discutida na ocasião.

As conversas da recepção, os cânticos e as orações não podem rivalizar com


a profundidade e a intenção da mensagem que irá compartilhar na reunião.
Tais cuidados são fundamentais, já que devemos organizar a reunião e nos
preparar com a devida antecedência.

O momento que mais exige habilidade do líder é o momento da discussão do


tema proposto. Por isto, queremos compartilhar quatro orientações que
costumamos aplicar em nossas próprias oportunidades de ensino e que podem
ajudá-lo nesse processo:
MANTENHA SUA MENTE FOCADA NO OBJETIVO DO
ENSINO BÍBLICO E NA SUA APLICAÇÃO

A cultura ocidental é caracterizada pela distração. Temos uma enorme


dificuldade para manter-nos concentrados no que pretendemos falar,
tanto quanto manter-nos concentrados ao que devemos ouvir. Diálogos
que poderiam ser de cinco minutos desdobram-se em trinta com
facilidade por causa de assuntos secundários ao propósito da conversa.
É necessário que o discipulador do pequeno grupo assuma o
compromisso de conduzir as pessoas ao propósito do estudo. Do
contrário, o tempo e a oportunidade serão utilizados para
discussões polêmicas e até ofensivas à comunhão, meros debates de
ideias, exposições de repetidas histórias e piadas, dentre outros assuntos.

FAÇA PERGUNTAS ESTRATÉGICAS

Desenvolver boas perguntas é um trabalho difícil. Por isso, o


discipulador deve se preparar cuidadosamente, com antecedência e ter
condições de refletir como expor o assunto dentro do tempo previsto,
sem, é claro, desprezar a necessidade das pessoas. Nesse sentido, deve
ainda considerar o contexto das pessoas no seu grupo. Boas perguntas
promovem interação com o estudo e sua aplicação pessoal.

Um princípio básico da didática, aplicável por qualquer pessoa, e


extremamente útil na exposição do estudo, envolve a organização com base
em três elementos básicos: observação, interpretação e a aplicação.

OBSERVAÇÃO

“Quais são os fatos?” Por exemplo: Que detalhes que o autor menciona?
Qual é o ponto principal? Quais são as palavras-chave ou ideias?

INTERPRETAÇÃO

“O que isto significa?” Por exemplo: O que o autor está tentando dizer
ao povo a quem ele escreveu? Por que ele escreveu isso? Como você
resumiria o propósito do autor? O objetivo da interpretação é simples:
entender o que o autor queria comunicar ao seu público original. Vários
materiais de estudo de hoje ignoram a “intenção original”, e tentam
direcionar os leitores a se concentrarem no que o texto bíblico significa
para eles. Essa é uma abordagem que devemos rejeitar categoricamente.

APLICAÇÃO

“O que farei disto?” Por exemplo: A partir do estudo bíblico, como você
deve ser afetado em sua vida pessoal? O que pretende fazer a partir deste
momento?

Esse é o aspecto mais desafiador para o discipulador do Pequeno Grupo,


o qual é responsável pela direção do estudo bíblico. Porque a
informação por si só é insuficiente, pois a transformação de vida é
igualmente necessária. Demonstrar saber, mas sem ser alterado por ela é
um engano.

Mas aquele que está sendo instruído na palavra faça participante


de todas as coisas boas aquele que o instrui. (Gl 6:6)

Necessitamos responder ao ensino recebido, bem como aplicá-lo.


Necessitamos nos comprometer com ele. Pelo poder do Espírito Santo e para
a glória de Deus, necessitamos mudar (santificar). O pecado que ainda habita
em nós e que se manifesta pelas inclinações da nossa carne necessita ser
superado pela graça de Deus que nos instrui.

Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza,


paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria; por estas
coisas é que vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência. Ora,
nessas mesmas coisas andastes vós também, noutro tempo, quando
vivíeis nelas. Agora, porém, despojai-vos, igualmente, de tudo isto: ira,
indignação, maldade, maledicência, linguagem obscena do vosso falar.
Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem
com os seus feitos e vos revestistes do novo homem que se refaz para o
pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou... (Cl 3:5-
10)
MODELO DE ESTUDO

SEMANA 1

Ênfase didática: Saber

Tema: As Características e a Importância da Bíblia

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a


repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que
o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa
obra. (2 Tm 3:16-17)

ESTUDO

As Escrituras são de origem divina. Considere a estrutura que possuem: elas


são compostas por 66 livros, os quais se dividem em Antigo Testamento (39
livros) e Novo Testamento (27 livros), escritos por cerca de 40 autores que
utilizaram 3 línguas (hebraico, aramaico e grego) ao longo de 15 séculos.
Esses homens viveram em lugares diferentes sob vários governos (Assírio,
Babilônico, Medo-Persa, Grego e Romano). Quando os escritos
desses homens tão distintos são colocados juntos, descobre-se uma unidade
espantosa! Temas, fatos e princípios indicam que uma “mente” estava coo-
denando seus registros com a intenção de estabelecer unidade. Por exemplo:
Jesus. Toda a Escritura concentra-se nele, ele é o elo da sua unidade, o
“espírito” da profecia (Ap 19:10). Cada livro da Escritura tem algo
relacionado a ele. Deus quis que tudo fosse convergido no Seu Filho (Gl 4:4;
Ef 1:9-10).

A Bíblia é a autoridade final para orientar e limitar a liberdade cristã (Dt


18:18-22; Jr 1:9; 2 Tm 3:16; 2 Pd 3:16), pois contém a verdade (Jo 17:17).
Outros argumentos como confiabilidade histórica e arqueológica, unidade ou
harmonia interna, cumprimento das profecias, influência transformadora
sobre pessoas em todos os tempos e sabedoria elevada apenas reafirmam sua
autoridade e inspiração divina.

Sua mensagem central é clara. É fato que algumas partes das Escrituras não
são de fácil entendimento; porém, aquilo que é necessário para a conversão
de um incrédulo à fé e obediência é de simples compreensão. (Sl 19:7 e
119:130). Vale destacar que o entendimento verdadeiro sofre influência da
condição espiritual de quem a examina, sendo loucura para uns e sabedoria
para outros (1 Co 2:12-16). Embora ordene muitos deveres específicos, o
foco bíblico está no amor redentivo de Deus ao homem, por meio de Jesus
Cristo.

Elas são necessárias para a salvação. As Escrituras constituem a única fonte


segura para a conversão do incrédulo, para que o crente viva e cresça
na compreensão e na obediência da vontade de Deus (Rm 10:14-17).
Portanto, é necessário lê-la. A vida cristã começa com ela, cresce nela,
frutifica por causa dela e sobrevive por ela. Negligenciá-la é negligenciar a
sua relação com Deus (Sl 119:1 e 1 Jo 5:3-5). Portanto, as Escrituras são
fundamentais, devem ser o centro das nossas convicções e atos.

PARA DISCUSSÃO:

• Quais são as características principais da Bíblia?

• A Bíblia é a fonte verdadeira da revelação de Deus, mas por


que muitos discordam dela?

• Se a Bíblia é a autoridade final para orientar, por que ela é


atendida parcialmente?

APLICAÇÕES DESTE ESTUDO:

a . Devocional para a semana: João 15:1-8

b . Prática da semana:
3.5 . DINÂMICAS PRÁTICAS SEMANAIS

As dinâmicas semanais constituem um elemento fundamental no processo


deste discipulado. O discipulador deve se empenhar com esmero nesta tarefa,
pois é de sua responsabilidade orientar e acompanhar sua prática.

O discipulado não pode ser reduzido a estudos bíblicos, oferecidos nos


encontros semanais. Ele requer orientações que dinamizem tanto o
ensino quanto a sua aplicação. Portanto, com base em cada estudo, o
discipulando é orientado a:

Devocional

Para cada estudo deve ser feita uma devocional semanal. É o momento
pessoal de devoção a Deus, mas também de revisão daquilo que se
aprendeu no encontro do discipulado.

A agenda devocional é fornecida juntamente com os estudos previstos para


cada semana. Essas devocionais serão feitas com base em textos
bíblicos relacionados com o tema estudado na semana. Além de reforçar o
aprendizado recebido no grupo, é ainda um momento em que cada pessoa
reserva para ler a Bíblia e orar privativamente.

Ler a Bíblia e orar são exercícios básicos de todo cristão interessado em


amadurecer sua fé e o serviço para Deus.A periodicidade da devocional
deve ser uma vez por semana, podendo aumentar para duas vezes se o
discipulador perceber que o grupo está entendendo e obedecendo
gradativamente. O importante inicialmente é criar a disciplina.

Tais devocionais devem ser acompanhadas amorosamente. No período do


discipulado, as pessoas precisam aprender a praticar vida devocional. O
discipulador, nesse caso, necessita acompanhar este processo com firmeza e
estímulo.

Por que ler a Bíblia e orar é algo tão importante para cada cristão?

Bem, a resposta mais óbvia e direta é que precisamos cultivar relacionamento


com Deus, e estes meios são os mais importantes. A leitura da Bíblia e a
oração nos aproximam de Deus, pelos méritos de Cristo e a ação do Espírito
Santo, transforma nossos corações e revela a vontade de Deus para cada
circunstância do dia-a-dia.
Mas há outras razões que precisam ser consideradas: a Bíblia é
importantíssima, é única fonte da revelação especial de Deus, é o fundamento
confiável em que a nossa fé é edificada. E a oração é o meio de comunicação
com Deus pelo qual expressamos adoração, confissão de pecados,
petições pessoais e intercessão a favor de outros.

É fato que muitas vezes ignoramos a importância de uma vida devocional


regular. Estamos demasiadamente ocupados com outras necessidades e
deixamos passar na rotina um tempo a sós com o Deus de nossas vidas.
Lembre-se que ser um cristão inclui ter relação sincera e comprometida com
Cristo.

Para se ter relacionamento com alguém é preciso gastar tempo com ele.
Assim, se você quer crescer no relacionamento com Deus, precisa considerar
a importância da devocional bíblica e da oração.

Para realizar sua devocional, ore pedindo a Deus que ilumine seu coração,
dando-lhe compreensão espiritual e quebrantamento; depois, responda
às questões que facilitarão sua devocional:

IDENTIFICAR

Identifique qual é o ensino central da passagem bíblica. Dê atenção ao


contexto, estrutura do texto, verbos, repetições de palavras,
ênfases, imperativos, etc. Sua explicação deve ser justificada com
observações no próprio texto. Em síntese: resuma o texto lido e
examinado em uma frase.

DESCOBRIR

Descubra como este ensino relaciona-se com Jesus Cristo. Essa questão
é importante porque ele é centro da história e da mensagem de toda a
Bíblia. Responda como o ensino central da passagem bíblica se
relaciona com ele.

PERGUNTAR

Pergunte como este mesmo ensino se relaciona com você. Essa questão
aponta para o seu compromisso diante do ensino bíblico exposto. Use
sempre pronomes em primeira pessoa do singular: eu, me, mim ou
comigo.

ESCREVER

Escreva uma curta oração descrevendo sua experiência com a


devocional. Por exemplo: peça perdão, suplique pela graça divina,
agradeça, confesse sua dependência de Deus ou outra necessidade
pessoal. Os textos devocionais indicados terão relação com os estudos
semanais e serão informados neles.
Abaixo uma tabela sugestiva, com temas para adoração e para intercessão,
que servirá para desenvolver uma disciplina diária de oração. Aos
poucos poderá ser melhor adaptada ao seu contexto:
Orientação Prática

De acordo com cada estudo, uma devocional semanal deverá ser feita, assim
uma aplicação prática também. O discipulador é responsável pela orientação
desta prática do ensino bíblico oferecido, a qual deve ser cumprida até o
próximo encontro. Essas orientações práticas seguem basicamente a
orientação de Tiago 1:21-25:

Portanto, despojando-vos de toda impureza e acúmulo de maldade,


acolhei, com mansidão, a palavra em vós implantada, a qual é poderosa
para salvar a vossa alma. Tornai-vos, pois, praticantes da palavra e não
somente ouvintes, enganando-vos a vós mesmos. Porque, se alguém é
ouvinte da palavra e não praticante, assemelha-se ao homem que
contempla, num espelho, o seu rosto natural; pois a si mesmo se
contempla, e se retira, e para logo se esquece de como era a sua
aparência. Mas aquele que considera, atentamente, na lei perfeita, lei da
liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte negligente, mas operoso
praticante, esse será bem-aventurado no que realizar.

Tais orientações são também úteis para confrontar o coração indiferente ao


ensino bíblico, servem como processo de cura do caráter pela demonstração
de obediência, humildade e crescimento espiritual. Assim, o discipulador
saberá como lidar especificamente com cada um dos discipulandos
no caminho do Senhor.
Se o estudo da semana for “perdão”, o discipulador poderá distribuir uma
folha em branco e pedir para as pessoas anotarem os nomes daqueles que
foram ofendidos por elas, ou se encontram ofendidos na família, no trabalho
ou no centro acadêmico, antes mesmo do estudo ser ministrado. Ao final,
poderá solicitar ao discipulando que procure, durante a semana, cada pessoa
nomeada para confessar a sua falta e pedir-lhe o perdão. Na reunião seguinte,
poderá dar uma breve oportunidade a cada um para saber como foi a
experiência. Assim, o discipulador saberá como melhoracompanhar
pessoalmente aquele que encontrou dificuldades, seja com uma visita, seja
com o aconselhamento privativo.

O acompanhamento encoraja e ajuda cada pessoa do grupo de discipulado a


praticar o que estiver sendo ensinado, para que, sob a ação do Espírito Santo
possa ser melhor pastoreada.

O discipulador deve preparar a orientação prática para cada estudo


antecipadamente, avaliando com cuidadoo contexto do grupo para não
exigir das pessoas além do que podem cumprir, nem menos que
isso. Sem essas orientações práticas, o ensino e propósito do discipulado
ficam deficientes e acomodam as pessoas apenas a ouvir e não a
praticara Palavra de Deus.

3.6 . EVANGELIZAÇÃO POR RELACIONAMENTO

A evangelização por relacionamento é a atividade natural do crescimento e


desenvolvimento espiritual do cristão. Outros métodos de evangelização
como a pregação pelo púlpito, redes sociais, impactos públicos, palestras em
universidades, dentre outras opções, podem ser utilizados e são realmente
úteis, porém, a evangelização por relacionamentos tem se mostrado mais
eficaz. Para esse fim nossas vidas devem ser como um “livro aberto” (2 Co
3:2-3). Isso é desafiador, mas também motivador.

A evangelização por relacionamento nos coloca onde devemos estar no


cumprimento da nossa missão: fora dos portões da igreja local, onde
podemos ser sal e luz do mundo (Mt 5:13-16) e, humildemente, demonstrar
melhor qualidade de vida por causa de Cristo.

A grande maioria dos crentes em Jesus sofre a pressão de se afastar das


suas relações nada cristãs, após a conversão. Por que isso ocorre?

• Por causa de uma confusão doutrinária - falta de instrução;

• Por causa da rasa espiritualidade: medo de ser persuadido pelas


tentações e retornar à velha vida.

Como parte do povo redimido de Deus, afastamo-nos do mundo e, por outro


lado, somos ordenados por Jesus a ir ao mundo pregar as boas-novas
de salvação. Ao permanecermos no mundo como crentes temos o propósito
de, no relacionamento com ele, plantar a semente do Evangelho. Muitos
cristãos têm amigos, colegas, familiares, assinantes de redes sociais
(“amigos”), vizinhos e outros conhecidos que, apesar de não serem cristãos,
representam uma enorme oportunidade para um envolvimento intencional de
evangelização.

Considerando que há determinado nível de relacionamento já


conquistado, como efetivar a evangelização por relacionamento?

“Evangelize!”. Não são poucas as pessoas que, ao ouvirem este chamamento


bíblico, são tomadas pela insegurança e pelo desânimo. Fato é que nem
sempre essas reações podem ser explicadas pelo imediato argumento da
rebeldia ou da decadente vida cristã. A falta de uma clara orientação prática,
além de uma eficaz instrução teológica e do importante envolvimento da
liderança, é uma das principais razões porque tantas pessoas se sentem
intimi dadas para a tarefa da evangelização pessoal.

Por esse motivo, compartilhamos abaixo uma orientação, relacionada ao


grupo de discipulado, que poderá ser observada como princípio dessa
responsabilidade.

• Inclua a pessoa a ser evangelizada em suas orações diárias.


Ore nominalmente por ela, especificamente por sua salvação. Faça isso antes
de qualquer abordagem pessoal e por um tempo limitado.
• Ainda em oração, depois do tempo determinado, fortaleça o relacionamento
com ela por contatos regulares. O objetivo aqui é conquistar a sua confiança
por testemunho e companheirismo.

• Ainda em oração, depois de conquistada a confiança, convide -a para o seu


Grupo de Discipulado a partir da atividade “ponte”, programada para facilitar
a integração de novas pessoas.

• Ainda em oração, depois de integrada ao Grupo de Discipulado, esclareça a


oferta da salvação de Deus em Cristo, aplicada pelo Espírito Santo. Faça isso
através da Bíblia. O Grupo de Discipulado será um amparo significante nesta
etapa e na sua relação com a igreja local.
3.7 . FORMAÇÃO DE NOVOS LÍDERES

As organizações não gostam de pessoas novas. Pessoas novas não gostam de


organizações. Esse confl ito existe porque, geralmente, uma organização não
aprende a lidar com pessoas novas, razão porque elas também não
aprenderam a lidar com a organização. A seguir são apresentados
alguns princípios que ajudam a entender a necessidade de prepararmos novas
lideranças.

Toda organização, seja ela religiosa ou não, experimenta basicamente


quatro etapas, as quais constituem seu ciclo de vida:

• Empolgação;

• Estruturação;

• Expansão e

• Renovação ou morte.

A fase chamada de empolgação é a fase inicial, período em que todos os


ânimos encontram-se concentrados para fundamentar, concretizar o que
se idealizou. É nessa fase que as pessoas, envolvendo fortes emoções,
sonham alto, se comprometem e agem com disposição impressionante. Tudo
nessa fase cria expectativa positiva e as pessoas se envolvem e contribuem no
limite de suas forças.
Já na fase da estruturação o cenário começa a mudar, pois nela se percebe
que a empolgação foi útil para dar o primeiro passo, mas não foi
suficiente para dar segurança a médio e longo prazos. Como as pessoas
gastam muita energia na primeira fase, na segunda elas demonstram o
cansaço pela indisposição por terem oferecido excessivo esforço no início, e
com críticas inadequadas por não se sentirem recompensadas em relação às
suas próprias expectativas. “É hora de estruturar.” É justamente nessa fase
que se faz necessário selecionar pessoas para determinadas áreas, pois é
racionalizando energias e concentrando-as nas prioridades que alguns se
tornam íntimos da missão local e se apegam com mais compromisso pessoal;
enquanto outros se afastam discretamente. Nessa fase é que se criam as
regras, que os padrões de funcionamento são definidos, os ministérios são
melhor organizados, as estratégias de relacionamentos são desenvolvidas, os
cargos e as suas funções criadas e oficialmente definidas e tudo isso contribui
para a segurança e a vitalidade da organização, em particular, da igreja.

A terceira fase (expansão) é resultado da primeira e da segunda. É a fase que


mais se experimenta crescimento sólido, porque há consciência
amadurecida da missão e da função de cada um, tudo funciona dentro de uma
estrutura organizada para a utilização do potencial dos seus membros. Nessa
fase de crescimento, de expansão, enquanto a alegria dos resultados domina
os envolvidos, silenciosamente um perigo cerca a igreja: a
institucionalização dos relacionamentos, evidenciada pelo ativismo.
É impressionante notar como igrejas organizadas cresceram
maravilhosamente no curso da sua história e hoje se encontram apáticas e
desmotivadas, sob a direção de líderes acomodados e sem visão. Muitas
dessas igrejas se viciaram na rotina e passaram a confiar mais na estrutura
ministerial que no Espírito Santo. Agem como se a Igreja fosse apenas uma
instituição religiosa que funciona e cresce através do cumprimento de
métodos e bons empregados. Por causa do ativismo, que é resultado de
agenda mal organizada frente a uma demanda frenética de atividades, os
membros não encontram momentos significativos para oração e estudo
devocional da Bíblia, para o cultivo de relacionamentos pessoais e profundos,
e para períodos de descanso físico e emocional. Esqueceram-se de que a
Igreja é um organismo espiritual e vivo e absolutamente dependente do
Espírito Santo.

A última fase é determinante. É a fase da reavaliação honesta e periódica de


si mesma. Nessa fase é possível diagnosticar os declínios na espiritualidade e
na ação da igreja, permitindo agir antecipadamente aos prejuízos
eminentemente mais graves. É uma medida de precaução rever os princípios
de vida praticados inicialmente, em meio a tantas tentações organizacionais.

Nessa fase faz-se necessário:

• Ajustar novas pessoas às funções novas;

• Abandonar tradições cegas ("parasitas" - preferências pessoais que


surgem com o passar do tempo como regras absolutas);

• Substituir líderes apáticos e acomodados por líderes diligentes e


motivados;

• Repensar funções estratégicas por considerar as constantes mudanças


sociais;

• Criar atividades novas que pulsem o ânimo para “cima”, renovando


expectativas.

A igreja que evita essa fase impede o processo de renovação positiva e


necessária. Tal decisão pode conduzir ao que chamamos “morte”, assim
como na lei da natureza. A árvore que não é podada no devido tempo adoece
e pode “morrer”. Essas igrejas que evitam a chamada “revitalização” se
tornam tão frias nos relacionamentos quanto na espiritualidade, tão legalistas
e críticas, que nos faz mal participar do ambiente que sustentam dentro delas.
Não há vida contagiante, persuasão bíblica, amor solidário, alegria no serviço
cristão e nem tampouco força de vontade para crescer, como uma criança
saudável cresce. Os crentes não oram por salvação dos perdidos e não
possuem visão ministerial estrategicamente inovadora. E
porque negligenciam a renovação das suas forças, caem pelo caminho,
exaustas!

As quatro etapas apresentadas revelam, de modo simples, o quanto devemos


estar atentos a esse tema: formação de novos líderes. Se omitirmos a quarta
etapa, legaremos à Igreja danos profundos em relação às novas lideranças (os
futuros oficiais, missionários, líderes ministeriais e discipuladores) que, por
serem mal preparadas espiritualmente, se preocuparão mais com seus cargos
e salários, ou com suas posições de influência,que com o discipulado bíblico,
o qual visa promover o crescimento de outros na fé por meio de um pastoreio
intencional e persistente.

Hans Finzel comenta que a única forma de garantir a vida das


pessoas numa organização é sempre renovando os líderes, os quais ele
chama de “sangue novo”.

FINZEL, Hans. Dez erros que os líderes não podem cometer. São Paulo:
Vida Nova, 1997.

Todo líder deve se preocupar e se preparar para treinar alguém que possa dar
continuidade na missão de discipular. Se falhar, futuras gerações sofrerão a
repercussão de tal falha, assim como sucedeu na história de Israel narrada
pelo Livro dos Juízes (Jz 2:6-19).

Se nossa liderança no processo de discipulado não for movida por intenções


honestas no que diz respeito à preparação de pessoas que possam
nos substituir em outros grupos ou gerações, então falharemos na missão de
discipular.

Discipular em si é o processo de multiplicar liderança espiritual!


No Novo Testamento vemos Jesus preparando seus discípulos por todo o
período do seu ministério terreno. Em seguida ele ordenou para que estes
saíssem ao mundo fazendo outros discípulos. Entre estes novos discípulos
encontramos Barnabé (At 11:22-30) que discipulou Paulo (At 9:26-30, 11:19-
26) e João Marcos (At 13:5, 15:36-42). Paulo discipulou Priscila e Áquila (At
18:1-4) e auxiliou na fundamentação da Igreja de Antioquia, a qual se tornou
uma base missionária importantíssima para a expansão do Evangelho entre os
gentios (At 11:25-30, 13:1-3, 14:21-28 e 15:30-35). Discipulou também
Timóteo (At 16:1-5; 1 e 2 Timóteo) e Tito (Tt1-3). Priscila e Áquila,
preparados por Paulo, discipularam Apolo (At 18:24-28) o qual discipulou a
cidade de Acaia (At 18:27-28). Timóteo, por sua vez, discipulou homens fiéis
na Igreja de Éfeso (1 Tm 1:3; 2 Tm 2:21), a qual se tornou uma referência
para a Ásia Menor (Ap 2-3). Essa é apenas uma breve síntese do fenômeno
do discipulado bem-sucedido, este que tem como fundamento o testemunho
de Cristo e a intenção de formar novos líderes.
Novos líderes são o elo entre gerações.

A Escritura ensina que as igrejas são como rebanhos de ovelhas em cujo meio
Deus designou pastores para assisti-las. Esses pastores são instruídos por
Deus para pastorearem espontaneamente segundo a sua vontade, tornando-se
modelos para o rebanho (1 Pd 5:1-4). Mesmo em pequenas igrejas, essa é
uma imensa e árdua responsabilidade para uma pessoa só cumprir, ou até
mesmo para algumas pessoas que constituem o Conselho. Moisés descobriu
isso quando tentou sozinho resolver os problemas de uns poucos milhões de
israelitas durante a sua caminhada com o povo no deserto.

O sogro de Moisés, porém, lhe disse: Não é bom o que fazes. Sem
dúvida, desfalecerás, tanto tu como este povo que está contigo; pois isto
é pesado demais para ti; tu só não o podes fazer. Ouve, pois, as minhas
palavras; eu te aconselharei, e Deus seja contigo; representa o
povo perante Deus, leva as suas causas a Deus, ensina-lhes os estatutos
e as leis e faze-lhes saber o caminho em que devem andar e a obra que
devem fazer. Procura dentre o povo homens capazes, tementes a Deus,
homens de verdade, que aborreçam a avareza; põe-nos sobre eles por
chefes de mil, chefes de cem, chefes de cinquenta e chefes de dez; para
que julguem este povo em todo tempo. Toda causa grave trarão a ti, mas
toda causa pequena eles mesmos julgarão; será assim mais fácil para ti,
e eles levarão a carga contigo. Se isto fizeres, e assim Deus to mandar,
poderás, então, suportar; e assim também todo este povo tornará em
paz ao seu lugar. (Êx 18:17-23)

É da vontade de Deus que cada pastor identifique pessoas tementes e


vocacionadas, prepare-as e invista nessa direção com autoridadee
responsabilidade. Como na história de Moisés e na história da igreja
primitiva, isso é feitode forma mais eficaz com base em pequenos grupos,
pois viabilizam maior relacionamento dos membros entre si, e a oportunidade
para exercitar liderança e o compromisso cristão, no mundo.

3.8 . SÍNTESE

Você não encontrará líderes prontos. Eles precisam ser formados. Quando
Jesus se encontrou pela primeira vez com aqueles que seriam seus discípulos,
eles eram homens muito simples que não possuíam grandes ambições na vida
e não revelavam nenhuma infl uência em sua própria época. Em poucos anos
ao lado de Jesus, e sendo ensinados por Ele,seus olhos foram abertos e então
se tornaram grandes líderes, ao ponto de alguns ficarem admirados dizendo:

Ao verem a intrepidez de Pedro e João, sabendo que eram homens


iletrados e incultos, admiraram-se; e reconheceram que haviam estado
com Jesus. (At 4:13)

Antes que os discípulos pudessem anunciar ao mundo o Evangelho, Jesus


havia encontrado neles tal potencial. O discipulado determinou que
esse potencial fosse revelado, desenvolvido e utilizado para a glória de Deus.
Cada crente verdadeiro possui potencial para dar testemunho de Cristo. O
discipulado bíblico, quando é bem feito, desperta este potencial, o desenvolve
e o amadurece pelo exercício dos dons no corpo de Cristo.

Os discipuladores precisam identificar essas pessoas e investir para que se


tornem outros discipuladores. Alguns sinais ajudam nesta
identificação: crescente amadurecimento da fé e visível compromisso naquilo
que é instruído. A identificação dessa combinação é um indício revelador das
pessoas com grande potencial para serem bons líderes espirituais.
O DISCIPULADO E O DISCIPULADOR

4.1 . INTRODUÇÃO

O fato de ter alguém para nos orientar e acompanhar torna a nossa vida cristã
mais objetiva quanto ao alcance do conhecimento e da sua prática.
É indiscutível, portanto, a importância de se ter um discipulador ao nosso
lado, pronto para nos instruir biblicamente e nos corrigir em amor.

O discipulador é aquele que nos faz descobrir os segredos da sabedoria nas


experiências mais simples da vida. Ele pode nos ajudar a viver uma vida mais
coerente, além de nos conduzir pelo caminho que agrada a Deus, combinando
entendimento e compromisso. Sua missão é auxiliar-nos a crescer, a sairmos
do estado de apatia espiritual para uma vida cristã ativa e frutífera.

Infelizmente, muitos consideram ser humilhante ter um discipulador, muitas


vezes por causa do orgulho e da própria ignorância. Por orgulho, pensam de
si mesmos além do que convém (Rm 12:3), e por ignorância esperam
aprender apenas com Deus, com a sua Palavra, sem considerarem que o que
Deus ensinou, ensinou a homens para que estes ensinem a outros. A Bíblia
diz: “Quem anda com os sábios será sábio, mas o companheiro dos insensatos
se tornará mau” (Pv 13:20). Todos nós necessitamos andar com os sábios,
adquirir a sabedoria com aqueles que são aptos para transmiti-la (Pv 4:7-9).

Neste capítulo observaremos as qualificações de um bom discipulador e


algumas características que o desqualifica. Também abordaremos alguns
princípios que devem nortear aquele que ensina, sugestões sobre como lidar
com conflitos e os perigos que rondam a sua vida. O principal objetivo é
discutir os cuidados que um discipulador deve ter consigo e para com o grupo
de discipulado que estiver pastoreando.
4.2 . QUALIFICAÇÕES ESSENCIAIS DO BOM DISCIPULADOR

O discipulador ensina as ovelhas para seguirem o Supremo Pastor: Jesus! (Jo


10:2-4). Como já vimos, o discípulo é um aprendiz, um aluno, ou seja,
aquele que segue o ensino de alguém. É por isso que algumas versões da
Bíblia traduzem o que é conhecido como “A Grande Comissão”.

Em Mateus 28:19 podemos encontrar a seguinte ordem de Jesus:

A mesma raiz da palavra discípulo (do grego matheteuo) é usada em forma


verbal como ensino. A palavra correspondente ao discipulador, no
Novo Testamento, é a palavra grega didaskalos que significa mestre,
professor.

15 ocorrências no Novo Testamento:

Mateus 9:11, 10:25, 17:24, 23:8, 26:18

Marcos 14:14

Lucas 6:40, 22:11


João 3:2, 10, 11:28, 13:13-14

1 Timóteo 2:7

2 Timóteo 1:11

De acordo com Mateus 28:20, o discipulador deve ensinar novos discípulos


a guardar todas as coisas que Jesus ordenou.

τηρεω, teréo = guardar

Essa palavra possui 70 ocorrências no Novo Testamento e 38 na


Septuaginta e pode significar:

(a) observar cuidadosamente

(At 16:23; Mt 27:36);

(b) conservar (Jo 2:10, 12:7; 2 Pd 2:4);

(c) preservar inculpável, ileso (1 Co 7:37; 1 Tm 5:22; 1 Ts 5:23).

Em Mateus 28:20, está relacionada à palavra “discípulo” e significa uma


ética praticada em acordo com o que fora ensinado por Jesus (Mt 19:17;
Mc 7:9; Jo 9:16; 1 Co 7:19; Tg 2:10), sendo necessário, portanto,
observar cuidadosamente seu ensino.

No livro de Apocalipse a palavra está relacionada a logos (palavra),


entolē (mandamento) e pistis (fé) e tem o sentido de conservar com
firmeza uma confissão, seja para enfrentar uma falsa doutrina, seja para
enfrentar a morte de mártir (2:26, 3:3, 8, 10, 12:17, 14:12)

[Bible Works 9; DITNT pp. 925-930].


RESUMINDO

o discipulador é aquele que ensina outros para seguirem Jesus pela fé


demonstrada em obras, não a si mesmo, pois o referencial é sempre
Cristo (1 Co 11:1).

Sujeição à autoridade em Cristo

Este é um assunto que deve ser compreendido por qualquer pessoa que atua
em qualquer ministério, especialmente quando se trata de discipulado.
Facilmente esse ministério de pastoreio se torna um problema – e não uma
facilitação de crescimento espiritual e ético – quando o discipulador
não compreende o princípio da autoridade, tornando-se a própria autoridade
sobre a vida dos discípulos de Jesus.

A autoridade pertence e vem de Cristo por sua Palavra (Mt 28:18). Antes de
enviar os onze discípulos para cumprirem a missão de discipular,
Jesus declarou o princípio da autoridade. Era necessário àqueles discípulos
compreenderem a Pessoa dele como a fonte da autoridade, antes de
exercerem qualquer ministério.

Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: - Toda a autoridade me foi


dada no céu e na terra. (Mt 28:18)
NOTE

Ele não disse que a autoridade foi dada aos discípulos para discipularem. A
autoridade foi dada a ele pelo Pai, e como fonte desta autoridade ele enviou
os discípulos como seus representantes a “todas as nações”.

O poder e a autoridade com que Jesus deu aos doze, em Lucas 9:1-2 foi:
“sobre todos os demônios, e para efetuarem curas. Também os enviou a
pregar o reino de Deus e a curar os enfermos”. Nos exorcismos e nas curas
os discípulos testificavam a chegada do reino de Deus trazendo libertação. Na
pregação os discípulos testificavam a chegada do Rei deste reino, o Salvador.
Tudo sempre esteve sujeito a Deus em Cristo (1 Co 15:25-28).

Por que discipuladores deveriam sujeitar pessoas na forma de seus


próprios discípulos?

A responsabilidade do discipulador, mesmo que seja cuidar das pessoas, não


é para “se assenhorear delas”, mas para ajudá-las a se submeterem ao
senhorio de Cristo, pois ele é quem tem “toda autoridade” (Mc 10:42-44).

Se Jesus exerceu sua autoridade pela servidão, por que os


discipuladores deveriam usar argumentos e manobras de manipulação e
centralização a si?

A autoridade do discipulador está em Cristo na forma de seguir o Seu ensino


e exemplo, pois fora deles ele não possui autoridade para ensinar em nome de
Cristo (Mt 7:15-29). Nesse sentido, a autoridade é expressa no exercício
daquilo que foi ensinado por Cristo, e não pela ocupação de uma posição
ou cargo. É vida, exemplo, demonstração e sujeição!

Lealdade ao ensino de Cristo

A autoridade, além de ter sua fonte na Pessoa de Jesus, encontra-se na


revelação de Deus: a Bíblia, e não no discipulador em si (2 Tm 3:16-17).
Portanto, como mestre ou professor, o discipulador, como canal de
comunicação, tem a responsabilidade de ser leal ao ensino de Cristo.

Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em


nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar
todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos
os dias até à consumação do século. (Mt 28:19-20)

O trabalho de um discipulador é ensinar as pessoas sobre como serem


obedientes a Deus conforme o ensino de Cristo e pelo ensino de Cristo.
Ensinar o que a Palavra comunica e pela Palavra (suficiência) é tarefa árdua e
só é aprovado aquele que lhe for leal (2 Tm 2:15), quem não barganha o que
nela está escrito, não combina versos bíblicos indevidamente para defender
interesses carnais e não omite a verdade pelo medo de perder “apoio” ou ser
rejeitado. Ele ensina a Palavra confiado na ação do Espírito Santo, e não em
sua inteligência ou nas opiniões ou conveniências das pessoas.

A Palavra é o que une as pessoas em sujeição a Cristo (1 Co 3:10), não o


discipulador. Como 1 Coríntios 3:7 diz: “De modo que nem o que planta
é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá
o crescimento”. Sendo assim, ao discipular, o discipulador leal ao ensino
da Palavra de Deus orientará as pessoas a se comprometerem muito mais
com uma Pessoa (Jesus), do que com um programa. Só Ele pode
produzir verdadeiro crescimento.

Se elas não compreenderem corretamente o propósito da Palavra de Deus,


não conseguirão se submeterem a Cristo mais que ao discipulador. O
discipulador é simplesmente um guia, um ministro da Palavra (1 Co 3:18 a
4:2). Como 1 Coríntios 3 sugere, ele simplesmente fornece as condições
propícias para o crescimento (cf. 1 Co 3:10-11) - “mas Deus que dá o
crescimento ” (v.7).

Discipulado diz respeito a Cristo e não ao discipulador, que é apenas um


servo do Supremo Pastor. Quando essa ênfase no “homem” desvia ou retira
a centralidade de Cristo pela revelação da Palavra, o Corpo se divide, tal
como ocorreu na igreja de Corinto (1 Co 1:10-13, 30-31, 3:4-9).
4.3 . CARACTERÍSTICAS QUE DESQUALIFICAM UM
DISCIPULADOR

Ser neófito, um recém convertido por Jesus

O novo convertido não está em condições de discipular mais do que ser


discipulado. O discipulador, sendo discípulo e em processo de discipulado,
é alguém que já alcançou maturidade suficiente para conduzir outros na fé
com segurança. Isso não tem nada a ver com idade cronológica ou anos de
vida cristã, mas em viver a ética do reino que Cristo ensinou a viver.

Não ter um coração ensinável

Para discipular é necessário ser discipulado. Quem não está apto para ser
liderado não está apto para liderar, da mesma maneira que, se não estiver
pronto para ser ensinado, com atitude humilde, não está pronto para ensinar.
Se o ensino que deseja comunicar não puder ser aplicado primeiramente a si,
como esperar que seja aplicado a outros?

Falta de habilidade para desenvolver relacionamentos positivamente

O discipulador é um pacificador, um conciliador, porque tem de lidar com


pessoas indisciplinadas na sua espiritualidade e relacionamentos.

Sem habilidade para administrar relacionamentos ele não conseguirá cumprir


a missão de induzir pessoas a se submeterem a Cristo, por Seu ensino.
Preferir falar a ouvir, dar conselhos a receber

O princípio aqui é: se não tem o que receber, não tem o que dar. Quem fala
mais do que ouve se precipita, julga parcialmente, é inexato em seus
conselhos e desperdiça oportunidades. Nenhum juiz no tribunal toma uma
decisão antes de ouvir a acusação e a defesa, as testemunhas, de analisar os
autos e interpretar as leis. Porque pelo ouvir o juízo adquire lucidez. Saber
ouvir mais do que falar é característica de pessoas maduras e, sem
maturidade mínima, o discipulador deve mais é ser discipulado que
discipular.
4.4 . SEIS ATITUDES REQUERIDAS DE QUEM ENSINA

O discipulador é um educador. Jesus disse aos discípulos para fazerem


discípulos, “ensinando-os a guardar todas as coisas” (Mt 28:20).

A missão dos discípulos no discipulado de outros deve ter,


inseparavelmente, dois propósitos: a evangelização: alcançar
os perdidos e a educação: ensinar os alcançados, auxiliando-os no
crescimento espiritual, de modo que pratiquem (“guardar todas as
coisas”) o ensino de Jesus (“que vos tenho ordenado”).

A transformação de vidas deve ser o foco dos discipuladores, tendo o ensino


de Jesus como fundamento desta ação. Não existe discipulado cristão sem a
suficiência e a autoridade da Palavra de Deus como instrumento. Psicologias
modernas, tendências culturais, preferências pessoais, literaturas seculares,
filosofias de religiões sincretistas, adágios populares, tradições familiares,
etc, podem tentar interferir, porém, o discipulador deve cuidar para garantir
que a Palavra de Deus seja preservada como instrumento e fundamento único
do ensino.

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a


repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o
homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa
obra. (2 Tm 3:16-17)
O discipulador, como discípulo de Cristo, tem a responsabilidade de educar
biblicamente aqueles que foram alcançados, mas que ainda não
foram discipulados.

Fidelidade à verdade

Como Igreja temos inúmeras necessidades e interesses, mas nenhuma se


compara ao valor da maturidade espiritual, deixando-nos de pensar e
agir como meninos na fé, dependentes e doentes. O único caminho para a
cura da nossa natureza é a confrontação dos nossos pecados pela obra
de Cristo. Confrontar pecados é algo perturbador e causa intranquilidade
porque trata nossa realidade mais terrível. Mesmo sendo salvos, somos
egoístas, rebeldes, avarentos, preguiçosos, desconfiados de Deus, imorais,
mentirosos, odiosos, arrogantes, etc.

A exposição e tratamento dessa nossa realidade produz humilhação, mas


também redenção.

Hoje em dia boa parte da Igreja evangélica tem buscado segurança no mundo
ao priorizar riquezas terrenas como grandes e suntuosos templos, além de
mercadejar a fé. Há pastores que a si mesmos se apascentam, ostentando
títulos acadêmicos e posições na hierarquia do poder eclesiástico de
organizações religiosas. Do mesmo modo, há crentes que tentam obter
favores espirituais com chantagens e barganhas, dentre outras situações. Tais
pessoas agem como se as promessas de Deus estivessem envelhecidas e
caducas, como se a verdade bíblica fosse um conceito relativo e questionável
e a autoridade dos que lideram fosse desnecessária. O mundo é caracterizado
por morte e morte espiritual, pratica a loucura e está entregue às suas
paixões infames por terem desprezado o conhecimento de Deus, de acordo
com Romanos 1:18-32.

No texto anterior a essa referência bíblica Paulo disse:

Pois não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus


para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do
grego; visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé,
como está escrito: O justo viverá por fé. (Rm 1:16-17)

O apóstolo tinha uma percepção real do mundo à sua volta, aparentemente


pessimista. Entretanto, afirmava não se envergonhar do Evangelho “porque é
o poder de Deus para a salvação”. Ele compreendia que no Evangelho, e
somente por ele, haveria salvação de homens mergulhados naquele contexto
pecaminoso (Rm 1:18-32), já que a “justiça de Deus se revela no evangelho”.

O discipulador deve reivindicar destemidamente para si a responsabilidade de


despenseiro (1 Co 9:16-17), pregando com fidelidade a verdade de Deus
contra o pecado, chamando as pessoas ao arrependimento para viverem
obedientemente na presença de Deus. Se o pecado não for tratado,
os discípulos permanecerão desobedientes a Cristo e a função do discipulador
não satisfará a missão de ensiná-los a viver uma vida de obediência (2
Pd 2:20-22).

A Palavra de Deus é santa, o homem é pecador. Não é possível pregar a


Palavra de Deus sem que o homem seja constrangido em
sua pecaminosidade e estimulado à santidade. É verdadeira, exata,
absoluta e única. Qualquer alteração é dissimulação. Pregue a
verdade de Deus, sem acréscimo e sem decréscimo, pois ela é como
lâmpada para os pés daqueles que estão nas trevas e luz para os
seus caminhos (Sl 119:105).

Como discipulador, você deve ter a leal atitude de ensinar com fidelidade o
interesse central da Palavra de Deus.

Preparação

Um discipulador zeloso terá o cuidado de se preparar sempre antes do


encontro com o grupo de discipulado. Mais do que as pessoas envolvidas,
ele deve ter o cuidado de se preparar porque é o maior responsável pelo
ensino e o aprendizado na reunião.

Se o preparo for fraco, os resultados também serão.

O preparo adequado permite que o discipulador possa explorar melhor os


recursos do ensino, enquanto a sua falta pode provocar uma má compreensão
da Palavra de Deus e induzir as pessoas ao erro.

É “imperdoável” que o discipulador vá para a reunião do grupo sem antes ter


se preparado adequadamente, revisado o conteúdo e avaliado as melhores
estratégias de ensino de determinado tema. Tal negligência pessoal prejudica
a muitos.

Coerência entre o ensino e a prática

Cuide para que sua atitude como discipulador não crie uma expectativa irreal
em relação ao mundo. Há pregadores, por exemplo, que pregam com muita
profundidade, mas as pessoas continuam sem o entendimento sobre como
aplicar tal sabedoria nas tarefas diárias, nos relacionamentos e sentimentos.

Seu ensino pode ser profundo, didático e bem preparado, mas a falta de
aplicação bem pensada e coerente implicará no menosprezo ao propósito
do ensino bíblico.

O ensino bíblico carece da sua devida articulação ao contexto das pessoas.


Do contrário, o discipulador perderá a oportunidade de relacionar ensino
e prática cuja unidade indissolúvel é necessária para uma sólida vida cristã.

Demonstração pessoal

A Palavra de Deus é a verdade, e quem a comunica interfere na sua recepção.


Ninguém dá crédito à verdade comunicada por alguém cujo caráter
e procedimentos estão em descrédito, sob suspeita.

A verdade da Palavra de Deus não diminui em nada, mas a atenção que lhe é
devida sim.
Por essa razão, o discipulador deve cuidar do seu testemunho, suas ações
e reações devem ser cuidadosamente vigiadas, em cooperação com o
Evangelho.

Se você almeja que as pessoas sejam discípulos de Cristo, demonstre


compromisso com o que ensina e espera dele. Assim, será instrumento
inspirador e encorajador dos mais fracos, isto é atitude de um discipulador
responsável. Ele cobra aquilo que ensina e pratica, ao contrário do legalista
que cobra o que não ensinou e não demonstra.

O discipulador é um líder espiritual, deve dar o primeiro passo se deseja que


outros o sigam pelo caminho que acredita!

Coração ensinável

O discipulador deve demonstrar coração ensinável, pois no processo do


ensino ambos crescem, discipulador e discípulos. Em outras palavras, os
discípulos crescem porque o discipulador cresce ao lado deles e vice-versa.

Assim como o discípulo, o discipulador é um discípulo, não alcançou a


perfeição e inevitavelmente será alvo de maior observação que os
demais. Deve ter humildade para reconhecer suas fraquezas e
aprender com outros.

Todos nós necessitamos de uma liderança que nos ensine, mas que também
nos cobre para não nos tornarmos ainda mais arrogantes e/ou acomodados. O
discipulador deve ser bem preparado, acompanhado e, quando necessário,
cobrado e exortado amorosamente. Sem um coração ensinável, não poderá se
submeter à liderança e não poderá ajudar outros a entender o princípio de
autoridade estabe lecido por Deus.

Exercício de autoridade

Um dos maiores prejuízos que temos hoje como Igreja é o extremo do abuso
de autoridade, de um lado, e a ausência dela, do outro. Acreditamos que a
culpa dos problemas que sofremos como Igreja evangélica brasileira decorre
do mal uso do princípio de autoridade. Algumas pessoas sofrem
pela exploração arbitrária da autoridade, enquanto outras sofrem pela omissão
dela, por parte de líderes eclesiásticos, incluindo os discipuladores. A
omissão é negligência, pois a autoridade lhes foi dada por Deus para
corrigirem aqueles que vivem no pecado.

Como discipulador você necessita discernir a extensão da sua autoridade


e exercê-la com firmeza. Tanto para derribar o que deve ser derribado,
como para edificar o que deve ser edificado por você como líder
espiritual.

Sua segurança para exercer autoridade não deve se sustentar na sua


moralidade, como fazem os fariseus modernos, mas na Palavra de Deus, que
é a fonte dela.

Não titubeie diante da pressão quando necessitar exercer sua autoridade.


Coloque ordem nas situações, ensine com precisão bíblica, exorte,
conforte, direcione e conduza as pessoas que Deus lhe confiou com
fidelidade vocacional.
4.5 . MODOS DE TRANSMISSÃO DO CONHECIMENTO

O que se fala

A oralidade é a modalidade mais antiga de comunicação e a forma mais


comum de ensino. É utilizada em púlpitos, salas dominicais e nos lares
tratados como locais de reuniões cristãs. Quando utilizada com base no
modelo clássico de comunicação (emissor-receptor) não há diálogo ou o
questionamento daquilo que é dito, pois unilateralidade é sua
maior característica. O orador tem melhores condições para expor seus
pensamentos e explicar metodicamente temas mais complexos. As pessoas
ouvem e aprendem, embora a relação entre quem ensina e quem é ensinado
seja semelhante a de um professor e aluno numa escola tradicional.

Ainda que seja importante, tal prática não é suficiente no processo de


discipulado, uma vez que apenas a transmissão de informações não garante a
plena compreensão e aplicação dos princípios bíblicos. Portanto, o
acompanhamento pastoral fundamentado no diálogo que envolve fala e
escuta é fundamental.

O que se faz do que se fala

O discipulador que demonstra esforço e inteligência para organizar sua


agenda a fim de se dedicar com excelência às tarefas que lhe foram
confiadas se torna exemplo para que outros façam o mesmo. Se, como Jesus,
não se conforma com crentes meramente informados do Evangelho e deseja
que sejam crentes praticantes, será necessário demonstrar, por meio do seu
testemunho pessoal, como eles podem usar informações verdadeiras para
se tornarem crentes fiéis, conhecedores e comprometidos com o reino de
Deus.

O que é por trás do que se fala e faz

O discipulador não pode ter vida dupla. O que ele fala e faz devem ser
resultado do que ele é. Essa atitude é a de quem anda na luz (Ef 5:13). Suas
palavras devem ser sempre verdadeiras e coerentes com o que ele vive, suas
iniciativas não devem possuir intenções ambíguas, seu caráter deve ser
inspirador e confiável, testificado pelos membros da sua família. Quem anda
assim, ensina com autoridade e inspira a transformação daqueles que andam
com ele.
4.6 . SOLUCIONANDO CRISES INTERNAS

Crises são inevitáveis

Quando reunimos pessoas que são pecadoras promovemos a possibilidade de


haver comentários indevidos, críticas precipitadas, piadas carnais, reações
exageradas, autodepreciação injusta, etc. Onde isso pode acontecer? Em
qualquer lugar! Porém, são mais prováveis em relacionamentos íntimos ou
em convívios contínuos como, por exemplo, no pequeno grupo de
discipulado no qual os relacionamentos são cultivados bem de perto.

Há uma diferença entre discórdia e crise que necessitamos entender. A


discórdia é ocasional, a crise é a sua persistência. É provável que essa
experiência, mais cedo ou mais tarde, ocorra, porque as pessoas são
diferentes no modo de pensar e interpretar uma mesma situação.

Aja rapidamente

Uma coisa é certa: enquanto nos relacionamos de maneira mais próxima um


do outro, certamente teremos de lidar com crises. Entretanto, apenas ter
a certeza de que crises virão não é suficiente, já que isso é algo que todos
sabem e esperam. Temos responsabilidades, como crentes maduros, de
tentar resolvê-las sabiamente (Gl 6:1-5). Ao evitarmos a solução de crises
construímos uma barreira entre pessoas, sustentando relacionamentos mal
compreendidos, amargurados, ressentidos e sem perdão. Crises são como
sementes que começam com pequenas insatisfações, crescem sutilmente pela
agregação de adeptos e, então, produzem frutos, numa comunidade com
dissensões, influências insurgentes, fofocas, pessimismos, maledicências,
críticas excessivas, etc.

Grandes incêndios surgem normalmente por não sermos ligeiros para


conter a faísca.

Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira. (Ef.
4:26)

A discórdia nem sempre leva a uma crise, mas a crise é sempre fruto da
discórdia, da insatisfação egoísta. Sabendo que crises virão, esteja atento e
pronto para tratá-las rapidamente quando surgir qualquer indício, para
preservar de seus danos o grupo em discipulado e, consequentemente, a igreja
local.

Evite a crise

Tivemos, no passado, um pastor que ensinava repetidamente o seguinte:


“Ericson, é sempre melhor o tratamento preventivo que o tratamento
curativo”. Isso é especialmente verdade quando se trata de nossos
relacionamentos. Nosso primeiro cuidado é discernir os sinais de crises nos
relacionamentos e sermos diligentes no tratamento preventivo.

Evite tratar assuntos potencialmente capazes de gerar desacordo e que


não fortalecem os elementos básicos da fé bíblica.

Assuntos dessa natureza devem ser abordados, mas privativamente e não no


grupo onde a polêmica pode desviar o propósito da reunião. Essa é uma
estratégia simples, mas que requer habilidade do discipulador.

Evite a omissão

Esperando que os problemas desapareçam naturalmente, muitos evitam tratá-


los de forma objetiva e rápida. Agem muitas vezes assim por medo
dos efeitos, de constrangimento com a pessoa, ou falta de autoridade, ou
imaturidade pessoal quanto ao assunto ou timidez. Todos esses esforços
ignoram perigos reais. Quanto mais o tempo passa, mais as crises reais
aumentam. Fazer “vista grossa” do problema não evita a crise, evita a
solução!

Evite generalizações e superficialidades na comunicação

Uma maneira simples e eficaz é evitar a comunicação demagoga, formal e


dissimulada. Esse tipo de comunicação não inspira confiança e cria
uma enorme distância entre a realidade do discipulador e a do discípulo de
Cristo. Você fala e eles ouvem; porém, não convence e eles não são
transformados em áreas profundas das suas vidas. Um bom princípio para se
evitar a crise é adotar a comunicação marcada pela honestidade, humildade e
transparência com as pessoas. Esse esforço constrói relacionamentos
profundos e de boa qualidade, e te preserva junto ao grupo, onde ninguém é
perfeito, inclusive você.

Agindo na crise

As crises podem envolver meras diferenças ou ofensas reais, como já foi dito.
Compreender a distinção é fundamental! Seja o que for, o processo a seguir
poderá ajudá-lo a encontrar a solução.

Antes de tudo avalie a situação. Uma pergunta que deve ser feita é: a
situação envolve algum pecado definido biblicamente ou é apenas
um desacordo de ideias pessoais?

Em Tiago 1:19 temos a seguinte orientação:

Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja
pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar.

Princípios:

Ouvir é o primeiro princípio desta avaliação. Faça o trabalho


investigativo de maneira respeitosa, imparcial e preserve a privacidade
dos envolvidos.

O segundo princípio é cuidar para não chegar a uma conclusão


precipitada, sem ouvir ambas as partes. Isto inclui o entendimento sobre
as questões de ambos, numa perspectiva tanto objetiva (o que aconteceu)
como subjetiva (como isto afetou os corações) para saber que conclusão
deve ser aplicada.

O terceiro princípio é tratar cada questão por vez. Ajude-os encontrar a


solução para as suas próprias dificuldades, considerando as motivações
que os perturbaram. Lembre-se de que todo esforço nessa etapa é para
“ganhar o irmão” (Mt 18:15). Portanto, fale somente o que contribui
para a solução e não para alimentar a discussão. Não acuse, não
desabafe sua indignação pessoal precipitadamente (Ef 4:29).

Compartilhe sua dificuldade

O apóstolo Paulo em Gálatas 6:1-5 escreveu para orientar a igreja sobre como
tratar irmãos que foram surpreendidos em relação a alguma falta. Nessa
orientação ele usou duas metáforas para falar de responsabilidade: cargas
(v.2) e fardos (v.5). As cargas são carregadas coletivamente, porém o fardo
individualmente. É importante perceber quando se deve ajudar e quando se
deve ser ajudado no tratamento contra o pecado. Da mesma forma, quando se
deve ajudar o faltoso (Mt 18:15) e quando se deve compartilhar este esforço
com outros, em busca da solução (Mt 18:16-20).

Crises que receberam os esforços anteriormente citados por parte do


discipulador e não foram solucionadas devem ser tratadas com o auxílio
do responsável pela coordenação dos grupos de discipulado.

O coordenador saberá como conduzir as etapas seguintes, orientando o


discipulador do grupo, lidando com o faltoso e encaminhando ao Conselho da
igreja local somente os casos que envolvem disciplina eclesiástica, de acordo
com o que prevê o Código de Disciplina da sua igreja.

4.7 . PERIGOS QUE CERCAM O DISCIPULADOR

Acertar é difícil, mas errar é fácil. Dentre os muitos perigos que podem cercar
o discipulador, merecem destaque os que se seguem:

Autossuficiência

O discipulado é uma função árdua porque tem de lidar com pessoas. É uma
atividade espiritualmente orgânica e não funcionalmente mecânica sob as leis
físicas de ação e reação. Isso significa que exige muito tempo de
investimento em vida para poucos resultados; no caso da formação de
pessoas cristãs maduras.

O discipulador é tentado a não confiar em pessoas novas na fé. É tentado a


pensar que elas não fazem o trabalho como ele faria, não reagem como ele
reagiria, não falam como ele falaria, não organizam como ele organizaria e,
portanto, não aceita compartilhar as responsabilidades com elas.
Então, decide fazer o trabalho só, centralizando o grupo em si e inibindo a
formação de novos líderes. Isso ocorre por causa do egoísmo, mas
principalmente por causa da insegurança pessoal. Esses sinais indicam um
discipulador enfermo de coração e perdido no propósito do discipulado.

Escapismo
Os pequenos grupos de discipulado podem ser um ótimo refúgio para pessoas
insatisfeitas com a liderança da igreja local. Ao invés de comungarem
de propósitos comuns com ela, discipuladores podem se render à tentação de
manipular opiniões do grupo, expondo suas insatisfações com a igreja
local e/ou seus oficiais, com intuito de ter o seu “grupo de opinião”. Essa
atitude, além de alimentar crises na sua espiritualidade, gera divisões e perda
de identidade. Discipuladores, como qualquer pessoa, amarguram-se e se
frustram, razão porque também devem ser pastoreados e suas atividades
supervisionadas, pois o grupo de discipulado jamais deve gerar oportunidade
para falatórios indevidos ou fofocas. Lembre-se de que seu propósito é
justamente combater tais sinais de enfermidade.

O discipulador deve compartilhar suas frustrações ou crises mais profundas


com o pastor responsável pela coordenação dos grupos, ou com algum
membro do Conselho da igreja local, habilitado para ajudá-lo pastoralmente,
mas nunca envolver pessoas em fase de discipulado em problemas dessa
natureza. Ele deve fazer uso de todos os esforços para construir nos membros
do grupo de discipulado, lealdade à sua liderança, mas não somente a ela,
e sim à liderança da igreja.

Responder a tudo

O discipulador pode tornar uma reunião bastante motivada, como pode


arruiná-la expondo seu conhecimento geral da Bíblia ou exaustiva teologia,
conhecimento histórico, curiosidades e falando demais o tempo todo. Essa
atitude intimida as pessoas do grupo com pouco conhecimento, impedindo-as
de expor suas perguntas, dúvidas mais simples ou a participar de um assunto
em questão por medo da gafe. Quando surgir uma pergunta, não tente
respondê-la rapidamente, espere para ver se alguém irá respondê-la ou
pergunte ao grupo o que ele pensa. Somente após essa etapa direcione a
argumentação para a resposta correta, caso alguém não o faça.

O grupo está reunido para aprender, e o discipulador é responsável pelo


ensino, mas isso não lhe dá o direito de monopolizar a reunião em torno do
seu conhecimento. Se o discipulador não sabe a resposta a uma pergunta,
peça a ajuda do grupo ou apenas diga: “não sei”.

Ativismo

O discipulador deve esforçar-se para conhecer seu grupo, saber se deve


empurrá-lo ou se deve puxá -lo quanto ao compromisso com o discipulado e
o cumprimento de atividades. Para ambos os casos existe o perigo do
ativismo. Ativismo é fazer muitas coisas sem concentração em prioridades.
Um grupo saudável cresce e frutifica ao contrário do grupo enfermo. Nesse
sentido o discipulador deve ficar atento a sua realidade e trabalhar focado
nos pontos cruciais para o fortalecimento espiritual daqueles que pastoreia.

A seguir algumas armadilhas potenciais que se armam contra o discipulador:

Focar a frequência da pessoa no grupo e não no seu discipulado.


Preocupar-se com o número e não com a solidez da sua santidade.
Valorizar o cumprimento de tarefas mais que a transformação de
caráter. Uma reunião cheia não representa propósitos bíblicos
claramente alcançados, razão porque a Igreja pode ser numericamente
expressiva num país e ao mesmo tempo irrelevante na
sua transformação. A questão crucial não é a quantidade de pessoas
reunidas, mas a qualidade do seu pastoreio. Isto que é determinante
para igrejas sérias, para o crescimento e a influência transformadora do
reino de Deus no mundo.
Criar regras e expectativas que ninguém consegue alcançá-las,
gerando frustração e confusão quanto ao que significa
relacionamento com Deus.

Ao tornar o grupo num esquema de regras e não de princípios, o


fracasso será inevitável, porque estará impondo um ritmo inadequado e a
graça de Deus estará sendo negligenciada na vida das
pessoas. Discipulado é investimento em vida muito além que estrutura
eclesiástica.

Ultrapassar os limites de liderança na igreja local.

O discipulador não substitui o pastor da igreja local, muito menos o seu


Conselho. Entretanto, sua conduta como liderança exerce infl uência
direta sobre a vida do grupo de discipulado por causa do convívio e do
pastoreio. Isso deve motivá-lo, sob a graça de Deus, no seu responsável
papel como líder-servo. O perigo está no fato de agir independente das
orientações gerais da igreja local, resistindo, inclusive, à intervenção do
pastor com mudanças que ele julgar necessárias para preservar a
saudável relação do grupo com a igreja local, e corrigir algum desvio
de conduta do discipulador. O pequeno grupo de discipulado é parte da
igreja, e não a igreja. A igreja tem um corpo de liderança instituída por
Deus e a ele o discipulador deve estar sujeito, bem como o grupo que
discipula. Isso deve estar claro para o discipulador e para o grupo
constantemente.

4.8 . AGENDA DA IGREJA LOCAL

A agenda representa uma parte muito importante na vida de um pequeno


grupo, tanto para o discipulador como para os membros do grupo de
discipulado. Saber organizá-la é uma necessidade da qual precisamos tratar.

Nossos compromissos mais comuns se dividem em pelo menos três


categorias:

• Prioritárias

• Secundárias

• Eventuais

Procure estar informado sobre a agenda da igreja local e, com base em sua
organização, defina a agenda do grupo de discipulado, tomando sempre os
seguintes cuidados:

Primeiro cuidado: não agende atividades paralelas que irão prejudicar a


participação na atividade da igreja ou do grupo. Isso pode ferir o
princípio da unidade.

Segundo cuidado: agende somente atividades que são prioridades para


o grupo. Estas atividades envolvem tanto o dia da reunião quanto as que
se fizerem necessárias como estratégias de ensino e crescimento.
Exemplo: eventos-ponte, ação social, visita a uma Organização
Missionária, confraternização em algum lugar incomum, etc.

Tente fazer com que grupo de discipulado seja orientado pelo interesse maior
da igreja e não apenas do grupo em si. Se permitir que as pessoas tenham
mais interesse de estarem no grupo do que na igreja, certamente terá
problemas para lidar depois, porque a reunião do grupo não pode ser
autossuficiente. Uma ótima maneira de cuidado é programar atividades
ligadas às atividades da igreja desde o início do grupo. Objetive pontos de
pregação, congregações, missionários no campo, acampamentos, picnics, etc,
como locais para realização de determinadas atividades em conjunto com a
igreja local.

O discipulador precisa ter em mente o objetivo de conduzir todos os


membros do grupo para participarem das atividades da igreja. Alguns, por
estarem sendo evangelizados e outros por serem novos na fé, podem ter
algumas dificuldades para aceitarem no início, mas devem ser
constantemente ensinados para entenderem a função do pequeno grupo em
relação a igreja local, que é a união de todos os crentes no culto a Deus e na
comunhão.

4.9 . SÍNTESE

O discipulador é uma figura-chave na prática do discipulado. Sua conduta


pessoal, bem como as suas orientações podem desanimar aqueles
que estiverem sendo discipulados, como podem sobrecarregá-los. Desanimá-
los por não estarem sendo elevados à excelência da vida cristã, encorajados
e explorados adequadamente em seus dons, como sobrecarregados pelo
excesso de exigências e insensibilidade pastoral.

Por isso, os princípios apresentados neste capítulo podem ser interpretados


pelo leitor de modo variado. Sim, podem ser interpretados por uma
perspectiva idealista ou até mesmo legalista, razão pela qual reiteramos a
necessidade que tem o discipulador de compreender e cuidar de si mesmo
antes de intentar cuidar de outros. Sua vida deve estar alinhada com a ética
exigida por Deus, mesmo que ela lhe pareça utopia, porque a Sua graça
acompanha tal exigência (Hb 13:20-21).

Os discípulos de Cristo, nos cuidados de um discipulador, carecem de um


referencial cristão comprometido com o conhecimento da Palavra de
Deus, mas também com os valores, princípios e a própria ética do Seu reino!
O DISCIPULADO E O GRUPO

5.1 . INTRODUÇÃO

O grupo de discipulado é uma pequena congregação de pessoas que possui


um objetivo comum: amadurecer na fé e no seu compromisso prático.
A participação nesse tipo de grupo constitui-se numa oportunidade notável de
envolvimento com o propósito do discipulado. A dinâmica dos
encontros viabiliza maior comunicação entre os membros, fortalece a
comunhão e articula o uso dos dons individuais a favor do serviço cristão.
Por tal motivo, inúmeras igrejas evangélicas têm utilizado os pequenos
grupos como estratégia de crescimento espiritual pelo ensino bíblico e de
crescimento numérico pela evangelização.

Líderes que amam a igreja se esforçam incansavelmente no exercício do


pastoreio. Eles trabalham para impedir que a igreja perca sua vitalidade
missionária pela perda da espiritualidade bíblica. Por isso, ao reconhecerem o
valor e eficácia de um pequeno grupo, organizado para promover o
discipulado eficaz, se preparam e incluem esta estratégia no plano ministerial
da igreja.

Contudo, infelizmente, não são poucos os testemunhos frustrantes de líderes


que, tomados pela ansiedade, apesar de bem intencionados, não se preparam
nem tiveram iniciativas adequadas quanto ao tempo e ao modo de agirem no
contexto de suas igrejas. Outros que, seduzidos pelos métodos manipulativos
de marketing e pela obsessão por números, induziram igrejas a uma frenética
busca por resultados e artificializaram o real crescimento das igrejas que, por
isso, perderam a sua essência bíblica.

Neste capítulo, portanto, observaremos alguns perigos e cuidados preventivos


que são necessários na implementação dos pequenos grupos em uma igreja
local. Também, uma proposta de organização e condução desses grupos. Por
fim, algumas breves noções sobre as atribuições do coordenador
desse ministério, a importância dos relatórios e dos encontros para formação
continuada dos discipuladores.

5.2 . QUANDO OS PEQUENOS GRUPOS NÃO COOPERAM?

Pequenos grupos tornaram-se a ambição de muitas igrejas e pastores ávidos


pelo crescimento numérico da igreja local. Algumas experiências deram certo
e, outras, para não dizer a grande parte, fracassaram. Não somos especialistas
no assunto, mas já participamos, minha esposa e eu, de diversos cursos na
área e temos acompanhado o crescimento de muitas pessoas durante os anos
do nosso ministério como missionários no Brasil e no exterior. Em função de
nosso conhecimento e experiência, gostaríamos de expor algumas percepções
na tentativa de responder a essa pergunta.

Quando não consideram princípios missiológicos responsáveis

O trabalho com pequenos grupos não é uma experiência para todas as igrejas,
em todo tempo e em qualquer lugar. Por falta de bom senso, diversas igrejas
atropelam boas tradições locais; comprometem ministérios saudáveis; geram
expectativas irreais e frustram os envolvidos; negligenciam o sistema de
governo da igreja numa atitude de clara deslealdade institucional e acabam se
perdendo no caminho, fingindo o tempo todo que está tudo bem.
Contemplam experiências de mega igrejas americanas, australianas, coreanas
e latinas e importam seus projetos acreditando que se percorrerem os mesmos
passos o crescimento será semelhante. Sem sensibilidade cultural, não
consideram as características da educação familiar brasileira, sua rotina
diária, sua formação religiosa, condição econômica do país, dentre outros
fatores.

O caminho parece ser fácil de ser percorrido, bastando apenas executar o


projeto e pronto: os resultados estarão garantidos! Porém, além
dessa interpretação ingênua, tais projetos de pequenos grupos executados por
outros países, fora dos seus contextos originais e ainda administrados por
pessoas, cuja formação, perspectiva de mundo e disciplina de vida são bem
diferentes, não garantem e jamais poderão garantir os mesmos resultados
de agregação numérica. Quando isso ocorre, pequenos grupos não cooperam,
só consomem desnecessariamente a energia dos membros fazendo-os andar
em círculo.

Quando são testes “laboratoriais”

Outras igrejas, por falta de identidade, saem procurando um modelo


ministerial que mais lhe atraiam. Começam testando um modelo, mas se não
gostarem ou não verificar resultados no tempo que esperam, abandonam e
recomeçam a busca de outra novidade até encontrarem uma que funcione.

Essas igrejas querem mudanças, mas não sabem quais e como fazê-las
responsavelmente, pois são perturbadas por líderes ansiosos,
emocionalmente enfermos. Já fomos testemunhas de igrejas saudáveis
adoecerem em consequência de mudanças ministeriais “espetaculares” sem
transformações efetivas, porque não avaliaram mais profundamente o
contexto e exigências de tais mudanças. Quando isso ocorre, os pequenos
grupos não cooperam porque são incapazes de dar identidade a uma
ministerial a uma igreja.

Quando não se fundamentam na boa eclesiologia bíblica

Novas definições quanto ao significado da igreja, sua natureza e missão


surgem a todo instante sob a justificativa de uma linguagem contemporânea
necessária que atraia mais e mais pessoas. De fato, tal linguagem carece ser
acomodada, mas jamais negociado o conteúdo do Evangelho, práticas
litúrgicas e ministeriais sustentadas por seu propósito. Do contrário, qualquer
proposta adicional, voltada para o crescimento da igreja, contemplará mais a
promoção humana que a glória de Deus.

Ao redefinir a linguagem como meio, muitas igrejas estão redefinindo


também o conteúdo do Evangelho como sendo o fundamento da sua fé e
práticas cristãs. Outras estão mudando liturgias que se apresentam, de fato,
como cultos santos a Deus, pois se vê neles desde artes cênicas a comércios
de produtos e excessivos apelos financeiros. Em vez de retirarem esses
elementos, retiram-se a contrição pelo pecado, enfatiza-se a música,
descentraliza-se a pregação e sacramentos e torna-se superficial a exposição
bíblica pela interpretação alegórica, intuitiva e ênfases nas experiências
pessoais de seus pregadores. Ademais, além dessas mudanças cada vez mais
frequentes em nosso tempo, igrejas diversas realizam mudanças ministeriais
sob as mesmas justificativas, como por exemplo, extinguir a tradicional
Escola Bíblica Dominical como momento de estudo sistemático da doutrina
bíblica.

Os encontros dos pequenos grupos, nesse contexto, surgem com forte ênfase
no relacionamento, na amizade. Tornam-se oportunidade de
convivência, entretenimento, festas e banquetes, mas sem foco no
aprendizado da Bíblia e na evangelização.
Os pequenos grupos favorecem a construção de amizades, mas essa
experiência não deve ser o ponto principal dos encontros.

Podemos construir relacionamentos em uma quadra de esportes, num


berçário, shopping, evento, fila de banco, escola, universidade, cursos livres e
academias, dentre outros. A questão é que os relacionamentos não são o
ponto principal de pequenos grupos, eles são um resultado e não finalidade.

Crises teológicas geram igrejas sem identidade bíblica, como líderes apáticos
e permissivos, e tudopassa ser relativo. O resultado é que valores mundanos
passam a determinar o que a Igreja devecomunicar e fazer, e não o contrário.
Todo este cenário demonstra o quanto a igreja se enfraquece espiritualmente
na base de doutrinas sólidas. Neste sentido, pequenos grupos não cooperam
porque eles não existirão e não serão sustentados por propósitos bíblicos.

Quando se baseiam em resultados numéricos

O crescimento numérico da Igreja, como já foi dito, não representa o seu


crescimento espiritual. Os números são incapazes de medir a ação do Espírito
Santo na vida de crentes verdadeiros, já que a maior preocupação deve estar
na santificação das pessoas mais do que na soma delas. Com isso
não estamos afirmando que não devemos ter metas de agregação, mas que o
ministério de uma igreja não deve ser avaliado com base nos resultados
numéricos, como se eles fossem determinantes para julgar a fidelidade do seu
serviço a Deus.
Deus não nos julga por nossos resultados, mas por nossa lealdade!

Ambicionados pelo rápido crescimento numérico de igrejas, muitos líderes


têm adotado a proposta dos pequenos grupos como foco estratégico
de evangelismo. Infelizmente, estiveram e estão focalizados nos números de
membros e na crescente arrecadação dos dízimos e ofertas. É certo
que muitos tomaram esta iniciativa pelas motivações sinceras e biblicamente
legítimas de tirar a igreja local do estado de apatia e acomodação,
mas infelizmente não são poucos os exemplos de lideranças que se
permitiram seduzir pelo status de poder eclesiástico, necessidade de controle,
segurança financeira e ainda, pela conquista de respeito por outras lideranças
na cidade.

Neste sentido, pequenos grupos não cooperam, porque fazem parte de um


sistema empresarial baseado em resultados numéricos. Os relacionamentos
são mecânicos e funcionais, e não orgânicos e afetuosos. Os resultados têm
mais valor que pessoas. Nestes pequenos grupos as pessoas não são filhos,
são empregados.

Quando são o único meio de discipulado

É necessário distinguir pequenos grupos de discipulado. Os pequenos grupos


são encontros em que o discipulado pode ser realizado, mas o
discipulado pode acontecer sem um pequeno grupo. Discipulado pode ser
realizado entre duas pessoas, em umgrande grupo reunido na igreja local, em
um ambiente familiar com poucas pessoas e até sozinho com a Bíblia em
mãos (como foi meu caso). As pessoas não têm que participar de um pequeno
grupo para serem discípulos de Cristo. Ele ajuda, mas não é o único local e
ambiente necessário para a realização do discipulado.

Sejamos honestos! Os pequenos grupos surgiram no Brasil principalmente no


fim da década de 80 com a Rede Ministerial (fizemos um curso em 1990).
A Igreja brasileira nunca dependeu de pequenos grupos para discipular
pessoas nas décadas anteriores e ainda não depende. Eles se tornaram meios
mais eficazes de aproximação e relacionamento, mas nunca foram a causa do
discipulado na história da Igreja.

Pequenos grupos são meios de se realizar o discipulado de pessoas, mas não é


o único meio. Igrejas que pensam assim extinguem os demais ministérios e
converge toda a ação ministerial no pequeno grupo porque acreditam que
esse é o único caminho de se cultivar a vida cristã. Nesse sentido,
adotar pequenos grupos para a realização do discipulado poderá ser frustrante
porque eles são apenas meios. Se eles, como meios não estiverem servindo a
causa, devem ser questionados e não o contrário.

Leia o que Jesus disse a Pedro e André em Mateus 4:18-20:

Caminhando junto ao mar da Galiléia, viu dois irmãos, Simão, chamado


Pedro, e André, que lançavam as redes ao mar, porque eram pescadores.
E disse-lhes: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens.
Então, eles deixaram imediatamente as redes e o seguiram.

Observe como Jesus iniciou seu pequeno grupo. Ele não chamou
aqueles discípulos para lhe fazerem companhia durante os anos do
seu ministério na Galiléia. Ele os chamou para serem feitos
pescadores de homens.

Jesus chamou os discípulos para uma vida completamente nova. Ele disse:
“Vinde após mim” para que eles fizessem parte de um grupo que estava
sendo formado, por meio do qual, seriam feitos “pescadores de homens”.
Este era o propósito central de Jesus: transformar-lhes a vida e equipá-los
para fazerem o mesmo posteriormente (Mt 28:19-20). O grupo não fez isto
com os discípulos, mas Cristo fez através do discipulado.

5.3 . PRINCÍPIO DE AUTORIDADE: SERVIR

Vance Packard foi um importante escritor e jornalista americano entre as


décadas de 50 e 90, e destacou-se por sua capacidade de persuasão e
crítica social. Ele definiu liderança assim:

Liderar é conseguir fazer que outros desejem fazer aquilo que você está
convencido que deve ser feito.

Liderança é uma parte fundamental no processo de edificação de uma igreja


(Ef 4:11-14). É necessário, entretanto, distinguir liderança de autoridade.
Muitos podem alcançar status de liderança eclesiástica e ao mesmo tempo
não terem autoridade. Isso porque liderança relaciona-se com a posição,
enquanto a autoridade com a vida, e vida semelhante a de Cristo.

Nos reinos do mundo, a liderança pode ser alcançada:

• por nascimento, como a dinástica, transferida por tradições familiares;

• por nomeação oficial de autoridades superiores (via burocrática) e

• por carisma, cuja força se encontra em atributos de personalidade


pessoais.

Quando uma dessas lideranças não se apoia na aceitação social, ela se torna
uma ditadura, que é a imposição autoritária do seu exercício. No reino de
Deus é bem diferente, porque nenhuma pessoa deveria receber liderança sem
antes ter autoridade de vida (At 6:3; 1 Tm 3:1-13; Tt 1:5-9).
Nenhuma liderança é legitimamente bíblica pelo simples fato de ter sido
empossada por tradições ou pressões familiares, do mesmo modo que aquela
que se fundamenta em êxitos acadêmicos, cargos, tempo de vida cristã,
histórica participação na plantação da igreja, poder econômico, status na
sociedade ou carisma como meio de se alcançar autoridade.

Em Marcos 10:35-45 lemos a história dos discípulos de Jesus, Tiago e João,


ansiosos pelo tempo em que Jesus se assentaria no trono de glória para
reinar e, desejando ocupar posições de poder ao lado do Rei, pediram a ele
que lhes concedesse vantagens sobre os outros (10:37 e 41). Eles usaram
como referência o sistema de governo e liderança dos gentios (10:42) que
exerciam poder coercitivo “sobre” seus súditos. Esse texto revela a
oportunidade favorável em que Jesus ensinou os discípulos o que realmente
envolve a liderança espiritual no Seu reino. Eles compreendiam que o
princípio de autoridade para exercício de governo fundamentava-se em
posição “sobre” os outros, assim como os verbos e pronomes no verso 42
indicam.

Jesus ensinou que o princípio de autoridade aplicado à liderança em Seu


reino não se compreende num sistema hierárquico determinado pela
preposição “sobre”, mas pela proposição “entre” seus cidadãos como um
serviçal” (diákonos) ou um “servo” (doulos) (v.44; e.g. Mt 8:9).

Ao contrário do modelo de liderança mundano, baseado no qual ocupa


posição de poder sobrejacente, Jesus ensina que aqueles que têm
autoridade para liderar no Seu reino assumem a forma de servos. Devem,
pois, servirem invés de serem servidos, e estão até dispostos a darem a
própria vida em benefício dos outros. Para convencê-los deste ensino, Jesus
apresentou-se como modelo de autoridade e liderança ao dizer:

Pois o próprio Filho do Homem não veio para ser servido, mas para
servir e dar a sua vida em resgate por muitos. (Mc 10:45)

A conjunção de coordenação (“pois”, “porque”) sugere à


argumentação que o motivo central para liderar (v.44) deve ser
o exemplo do Filho de Deus. Esta conjunção enfatiza a supremacia
de Jesus como fonte de autoridade daqueles que pretendem liderar.
Parafraseando, se Jesus como Filho de Deus serviu (Fl 2:7), muito
mais os discípulos devem exercer liderança pela autoridade de um
servo.

No grupo de discipulado esta perspectiva deve ser exaustivamente ensinada


se quisermos formar líderes segundo a perspectiva bíblica. Líderes, no
reino de Deus, são servos, são pessoas capazes de reunir todas as suas forças
para promover o crescimento dos outros e mais do que de si mesmos. São
aqueles que consideram mais importante a função do que o cargo, não
esperam ser mandados porque veem a necessidade e atendem, seus relatórios
são mais qualitativos do que quantitativos, não buscam reconhecimento
público, não esperam recompensas dos homens como motivação para liderar
porque possuem a consciência de que são servos de Deus!

Vós, servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne, não


servindo só na aparência, como para agradar aos homens, mas em
simplicidade de coração, temendo a Deus. E tudo quanto fizerdes, fazei-
o de todo o coração, como ao Senhor, e não aos homens, sabendo que
recebereis do Senhor o galardão da herança, porque a Cristo, o Senhor,
servis. Mas quem fizer agravo receberá o agravo que fizer; pois não há
acepção de pessoas. (Cl 3:22-25)

No reino de Deus a liderança que exerce tal autoridade não encontra empatia
do sistema de liderança mundano. Assim como foi com Jesus, é questionada,
desprezada, julgada às categorias supostamente menosprezíveis da sociedade,
perseguida e ignorada. Porém, nenhuma liderança é mais benéfica ao mundo,
santa e transformadora que aquela que tem como fonte de autoridade Cristo,
bem como Seu testemunho como inspiração.

O discipulador deve ser servo e servir seu grupo de discipulado. Doar-se por
ele. Dedicar-se, criar expectativas reais com seu amadurecimento cristão,
investir seus dons para a edificação e evangelização daqueles que estiverem
sob seus cuidados pastorais.

5.4 . ORGANIZAÇÃO: DA REUNIÃO E DO LOCAL

Organização da reunião

Como já foi dito, a reunião possui uma estrutura organizada que centraliza o
estudo bíblico, mas que contempla momentos de oração, cânticos, intercessão
e confraternização.

É muito bom iniciar o momento devocional com todos ou a maioria reunida,


melhor ainda é quando começa no horário. Este talvez seja um dos maiores
desafios do discipulador: administrar a reunião considerando o equilíbrio
utilizado por cada parte e as necessidades da família que recebe o grupo
em sua casa. Esperar todos chegarem é bom, mas não pode ser uma regra. As
pessoas precisam aprender a respeitar horários numa reunião como esta, visto
que é realizada no ambiente de uma família que tem seus compromissos no
dia seguinte, assim como qualquer outra.

O discipulador deve cuidar para que a reunião comece no horário e


dirigir cada parte observando o tempo previsto a cada uma.

Se valorizar demais a oração, irá prejudicar o estudo bíblico, intercessão e


confraternização. Se valorizar o tempo acima daquilo que foi planejado
para o estudo, prejudicará também o tempo dedicado às demais necessidades,
e assim por diante. Nesse sentido, é importante aprender desde o início
agir com concentração à organização da reunião para evitar os problemas
citados acima e não prolongar demais o tempo do grupo no lar que o recebe.

A reunião do Grupo de Discipulado, segundo proposto aqui, deve ter duração


máxima de duas horas, cujo período poderá ser organizado assim:

:15 quinze minutos

RELATÓRIO E ORAÇÃO

momento dedicado para receber a devocional se manal, escrita e


relacionada ao estudo da semana anterior. Também para relatar a
aplicação prática orientada. Este primeiro momento é concluído com
oração.

:45 quarenta e cinco minutos

ESTUDO BÍBLICO
momento dedicado para exposição e interação com os temas previstos
para cada semana, assim organizado:

:25 vinte e cinco minutos

EXPOSIÇÃO DO ESTUDO

O ensino é responsabilidade do discipulador. Ele faz uso exclusivo de


material,preparado especificamente, para atender cada tema.

:10 dez minutos

REVISÃO

Cada estudo apresenta duas ou três perguntas preparadas para provocar


discussão sobre o tema estudado, a fim de enfatizar seus argumentos
centrais e provocar a participação.

:10 dez minutos

PERGUNTAS

Tempo dedicado para exposição de dúvidas e oportunidade para


encontrar possíveis respostas.

:15 quinze minutos

COMPARTILHAMENTO
Momento dedicado para as pessoas exporem suas experiências
cotidianas, suas alegrias e aflições.

:15 quinze minutos

INTERCESSÃO MISSIONÁRIA

Momento dedicado para interceder uns pelos outros, pelos visitantes,


familiares, missionários, cidade local, etc.

:30 trinta minutos

CONFRATERNIZAÇÃO

Momento dedicado para bate-papo acompanhado de lanche, para


fortalecer os relacionamentos.
Organização do local

É importante considerar que a reunião não começa quando todos fazem


silêncio e alguém resolve fazer a primeira oração. Ela começa quando as
pessoas se encontram. Entender isto é fundamentalmente importante para o
propósito da reunião.

Ao chegarem, o discipulador e os donos da casa devem estar no local para


receberem afetuosamente cada pessoa, dando atenção especial aos visitantes
que não estão familiarizados com os relacionamentos.

Se as pessoas forem recebidas com indiferença em um ambiente


desorganizado para aquela ocasião e propósito, fatalmente sofrerá aquela
terrível sensação de inadequação e a reunião não será tão atrativa como
deveria ser.

Outro cuidado importante relaciona-se com os assuntos tratados antes da


oração e estudo bíblico. Tais assuntos precisam fazer parte da atenção do
discipulador, cuja responsabilidade não é apenas dirigir o estudo bíblico, mas
tudo o que envolve a reunião, especialmente as pessoas envolvidas no
discipulado. Fofocas, críticas depreciativas ou precipitadas quanto a igreja
local e sua liderança, piadas de mal gosto, brincadeiras maliciosas, etc,
devem ser coibidas, antes e depois do momento devocional.

O discipulador deve cuidar para não permitir que alguém fique calado do
início ao final da reunião, sem oportunidade para expor suas opiniões e
necessidades. O mesmo deve ser aplicado aos que falam demais, tentando
controlar a reunião com opiniões pessoais supervalorizadas, pois prejudicam
a participação coletiva. O discipulador é o dirigente da reunião e moderador
das participações, promovendo equilíbrio e crescimento mútuo.

Organizar o ambiente é igualmente necessário. Uma boa maneira de fazer isto


é organizar as cadeiras em forma de um círculo, para que, uma vez
acomodados, todos possam se ver e serem ouvidos.

5.5 . RELATÓRIOS: FORMAL E INFORMAL

Relatórios são aliados e não inimigos. Com ele o discipulador pode ter as
suas ações melhor direcionadas, além de avançar naquilo que tenha
planejado para o grupo de discipulado a que estiver dirigindo.

Os relatórios ajudam:

• A falar aquilo que sem eles você não falaria;

• A discernir melhor a realidade, visto que temos a tendência de “forçar


a barra” para causar boas impressões a nosso respeito. Nesse sentido, o
relatório pode funcionar como um espelho que não manipula o que está
diante dele, simplesmente reflete o que é e não o que poderia ser;

• A registrar informações para que não se percam na memória. Tais


informações marcam a história, com seus declínios e progressos, para
servirem gerações futuras.

Mas também relatórios podem ser mal utilizados, quando:

• Valorizam mais números, resultados, tarefas, que pessoas em seus


contextos e necessidades complexas;

• Tornam-se o centro das atenções do discipulador que age como


empresário em busca de resultados quantitativos mais que a qualidade
de um discipulado relacional;

• Tornam-se meras convenções burocráticas, apenas para satisfação de


tarefas cumpridas, e não servem pelo propósito preventivo frente a
problemas eminentes.

O que podemos, então, concluir? Relatórios são necessários!

Relatório formal

Este relatório formal é um documento impresso que cada discipulador deve


preencher e entregar bimestralmente ao coordenador dos grupos
de discipulado, em ocasião das reuniões para reavaliações e reciclagem.

Relatório informal

Independente destas reuniões bimestrais, o discipulador terá acesso direto ao


coordenador para expor questões pessoais e do grupo que são privadas.
Por outro lado, os discipuladores serão procurados periodicamente pelo
coordenador para se informar e orientar a vida e o ministério do discipulador
quando necessário. Esta relação deve ser transparente e sustentada pela
motivação pastoral.
5.6 LIMITE DE PARTICIPAÇÃO E TEMPO

Não é recomendável que o limite de participação em um grupo exceda a


média de dez pessoas. Por quê?

PRIMEIRO

Acima de dez pessoas o discipulador encontra grande dificuldade para


acompanhar pastoralmente cada um, mesmo tendo alguém
em preparação para sucedê-lo quando o grupo for multiplicado.

SEGUNDO

A comunicação entre os membros sofre maiores dificuldades e os


problemas de grandes aglomerados são transferidos para o grupo:
pessoas omitidas pelas limitações da liderança quanto ao pastoreio
eficaz, deficiência na supervisão e auxílio pessoal no processo de
amadurecimento da vida cristã, e maiores restrições na participação dos
estudos bíblicos por falta de tempo suficiente para exposição de dúvidas
e suas elucidações.

TERCEIRO

Perda do propósito missionário. O grupo deve nascer visualizando


crescimento espiritual, mas também crescimento numérico pela
evangelização por relacionamento e batismo daqueles que forem
alcançados. Nesse sentido, o discipulador deve cuidar para que o grupo
não fique cheio de crentes a ponto de receber outros por meio da
evangelização por relacionamento, o que tornaria a reunião
insustentável. Acima de dez crentes reunidos (dependendo do espaço
disponível deve ser menos) o discipulador precisa orientar membros da
igreja local interessados para buscarem outros grupos.

QUARTO

A prioridade não é tornar o grupo de discipulado uma Congregação,


ainda que seja possível tal propósito para casos específicos e
devidamente planejados para este fim. A prioridade é investir no
discipulado de poucos para fortalecer a maturidade da fé e condutas
cristãs. Grupos grandes dissolvem ou tornam superficiais
re lacionamentos profundos, viciam rapidamente pela perda do interesse
evangelístico e criam nichos, “panelas”. Nada disso contribui para
a saúde da igreja como um todo.

O tempo de investimento do discipulador no grupo de discipulado não deve


ultrapassar o tempo de dois anos. Andar sem meta é como andar sem mapa,
não se sabe de onde veio, onde está e para onde vai. Os grupos de discipulado
possuem metas e elas não podem ser ignoradas. Contempla-se o amadureci
mento espiritual dos crentes, evangelização, batismo e formação de novos
líderes para que se envolvam com a crescente demanda do pastoreio.
5.7 . PROCESSO DE MULTIPLICAÇÃO DOS GRUPOS DE
DISCIPULADO

Até o término de dois anos o grupo necessita estar preparado amplamente


para se multiplicar em dois grupos. Por isso o discipulador deve trabalhar e
trabalhar com perseverança, tendo ações intencionalmente conduzidas por
metas.

Esta experiência pode ocorrer após, no mínimo, um ano de investimento sério


sob as seguintes condições:

O grupo estar reunindo constantemente entre quinze e vinte pessoas;


Constatada maturidade para preservar a vitalidade do atual e do novo
grupo após a multiplicação;

Um membro deste grupo ter sido preparado pelo discipulador para


assumir o discipulado do novo grupo com o mesmo afinco;

Todo o progresso do grupo ter sido acompanhado pelo coordenador,


verificado as condições e motivações aprovadas;

A redistribuição dos membros entre os dois grupos ser avaliada pelo


coordenador e o discipulador, com preparo prévio para que seja
um momento de alegria e não de desmotivação.
5.8 COORDENAÇÃO DOS GRUPOS DE DISCIPULADO

O coordenador dos Grupos de Discipulado deve ser, de preferência, um


pastor ou obreiro maduro, designado pelo Conselho, com as seguintes
responsabilidades:

• Orientar e acompanhar o uso dos estudos bíblicos e a direção dos


encontros de discipulado;

• Promover a formação para novos discipuladores;

• Atender em aconselhamento os disipuladores e auxiliá-los para


solucionar dificuldades persistentes encontradas que não se veem
capazes de lidar sozinhos;

• Zelar para que as orientações sejam devidamente cumpridas;

• Solicitar relatórios periódicos dos discipuladores e acompanhá-los


pessoalmente;

• Incentivar os discipuladores no exercício de suas funções;

• Encaminhar ao Conselho da igreja local relatórios periódicos;

• Atender as orientações do Conselho da igreja local que visam o


fortalecimento e crescimento dos Grupos de Discipulado.
5.9 . REUNIÕES PARA REAVALIAÇÕES E FORMAÇÃO
CONTINUADA

As reuniões para reavaliações e formação continuada são reuniões bimestrais


dos discipuladores e seus auxiliares, convocadas previamente, dirigidas
pelo coordenador, e possuem as seguintes finalidades:

Reuniões para reavaliações:

• Combinar e alinhar a realidade dos grupos, preservando a identidade


de trabalho;

• Colher informações das alegrias vividar e dificuldades comuns


enfrentadas;

• Compartilhar experiências na direção dos grupos e orar uns pelos


outros;

• Rever estratégias de trabalho;

• Encorajar discipuladores desanimados e ajudá-los a vencer a


acomodação;

• Receber relatórios formais;

• Oferecer sugestões quanto ao cuidado da agenda pessoal,


espiritualidade e liderança, tendo em vista o propósito do discipulado e
realidade de que cada grupo.
REUNIÕES PARA FORMAÇÃO CONTINUADA

Pastorear discipuladores;

Expor temas bíblicos pertinentes à vida cristã do discipulador;

Estudar princípios de liderança espiritual e considerar aplicações


práticas para o contexto do discipulador;

Rever o conteúdo recebido nos encontros preparatórios, objetivos do


discipulado e metas do grupo.

5.10 . SÍNTESE

Conforme o que estudamos neste capítulo, pequenos grupos são importantes


meios para a viabilização do crescimento da igreja, tanto na
quantidade quanto na qualidade desse crescimento. Eles facilitam a vivência
cristã entre os membros e proporcionam, por esse motivo, maior
compromisso com a missão de Deus no mundo.

A experiência será frustrante apenas quando os líderes responsáveis pelas


igrejas ou pelos pequenos grupos de discipulado não compreenderem
com clareza os seus próprios alvos e os do grupo, isto é, quando não
estiverem baseados nas motivações bíblicas. Isso também poderá ocorrer se
os discipuladores não forem devidamente acompanhados em suas
necessidades ministeriais e pessoais mais próximas. Por essa razão, a atenção
pastoral sobre a igreja é um fator preponderante.

As orientações até aqui analisadas cumpriram o propósito de refletir sobre as


motivações e também fornecer sugestões quanto à condução de um grupo de
discipulado. Os potenciais de cada crente, uma vez harmonizados
pastoralmente, formam uma dinâmica essencial para que a igreja desenvolva
as suas qualidades conceituais, orgânicas, diaconais e numéricas,
biblicamente.

SÍNTESE GERAL

O discipulado, como processo de santificação do homem caído, é um dos


temas centrais na Bíblia.

Aqueles que ouvem a voz de Deus são justificados por Jesus Cristo e
recebem uma nova vida pelo Espírito Santo. Esses passam a viver de acordo
com uma nova identidade, uma nova agenda, uma nova missão na vida,
buscam novos propósitos nos relacionamentos e toda orientação dessa nova
vida é fundamentada constantemente na Bíblia, que é a revelação da vontade
de Deus. Por ela o discípulo anda a passos firmes na fé e na obediência do
Senhor, porque o Espírito Santo é o seu guia em toda a verdade (Jo 16:13).

A finalidade do discipulado hoje é o mesmo no Antigo Testamento (Lv 19:2)


e no Novo Testamento (Lc 6:40): Deus quer que os homens o sigam
em submissão e obediência a fim de serem conforme o seu Filho, em caráter
e conduta (Rm 8:29). Essa é a essência do discipulado. A Bíblia é a rica fonte
do entendimento sobre esse tema e também de material para a sua prática.

Apresentamos este livro com o propósito de aju dá-lo entender a


profundidade do relacionamento com Deus e as suas naturais
responsabilidades para com o próximo. Do mesmo modo, buscamos fornecer
orientações práticas que possam servi-lo na missão de “fazer discípulos”,
conforme Jesus nos ordenou.

No capítulo 1, nos concentramos em apresentar as bases bíblicas e propósitos


centrais do discipulado. No capítulo 2, a intenção foi tratar o discipulado em
si, alguns princípios demonstrados por Jesus, o papel do discipulado na vida
cristã e a viabilização dos pequenos grupos aos propósitos que o
próprio discipulado exige. Já no capítulo 3, o objetivo foi assegurar que as
teorias do discipulado são praticáveis, apresentando uma metodologia
biblicamente abrangente, desenvolvida com a finalidade de combinar o
ensino e a prática. No capítulo 4, preocupamo-nos com a pessoa do
discipulador, as qualificações que devem ser fortalecidas e perigos que o
rodeiam, pela importância que tem com aqueles que estão sob seus cuidados
pastorais. Por fim, no capítulo 5, dedicamo-nos mais especificamente ao tema
dos pequenos grupos, expondo diversas orientações quanto a sua importância
para um discipulado eficaz, bem como sugestões sobre a condução de um
encontro e princípios de ensino.

Nossa sincera expectativa é que este livro tenha sido útil ao seu crescimento e
amadurecimento, para a frutificação que glorifica o nosso Deus!
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