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A QUESTÃO JUDAICA NA PALESTINA NOS DIAS DE HOJE

POSIÇÃO DA IGREJA ATRAVÉS DO PAPA SÃO PIO X

Em 26 de janeiro de 1904, Theodor Herzl foi recebido em audiência pelo


Papa São Pio X no Vaticano, a fim de procurar apoio para a causa sionista de
estabelecer um estado judaico na Palestina. Ele anotou seu relato do encontro
em seu diário. Fonte: Raphael Patai,The Complete Diaries of Theodor Herzl,
traduzido por Harry Zohn (New York/London: Herzl Press, Thomas Yoseloff,
1960), 1601-1605.
Ontem estive com o Papa. O itinerário já era familiar, já que eu o havia
repassado com Lippay várias vezes.
Passadas a guarda suíça, que pareciam clérigos, e clérigos que pareciam
guardas, os secretários e a corte papal.
Cheguei 10 minutos mais cedo e sequer tive que esperar.
Fui conduzido por numerosas salas até o Papa.
Ele me recebeu de pé, estendendo sua mão, a qual não beijei.
Lippay dissera-me que o fizesse, mas não o fiz.
Creio desagradei ao Papa por isso, pois todos que o visitam se ajoelham
e ao menos beijam sua mão.
Esse beijo causou-me muita preocupação. Alegrei-me quando,
finalmente, ficou para trás no caminho.
Ele se sentou em uma poltrona, um trono para ocasiões menores. E
depois, convidou-me a sentar próximo a ele, sorrindo em amigável antecipação.
Comecei:
“Ringrazio Vostra Santità per il favore di m’aver accordato quest’udienza”
[Agradeço a Vossa Santidade pela delicadeza de me haver concedido esta
audiência]”.
“È un piacere [É um prazer],” disse ele com uma gentil desaprovação.
Pedi desculpas por meu pobre italiano, porém, ele afirmou:
“No, parla molto bene, signor Commendatore [Não, comendador, falas
muito bem]”.
Pois eu havia colocado pela primeira vez – a conselho de Lippay – minha
fita da Ordem de Medjidié, consequentemente, o Papa sempre se dirigia a mim
como Comendador.
Ele é um grosseiro bom padre de aldeia, a quem o cristianismo permanece
algo vivo mesmo no Vaticano.
Coloquei brevemente meu pedido a ele. No entanto, possivelmente
contrariado com minha recusa de lhe beijar a mão, respondeu rígida e
resolutamente:
“Noi non possiamo favorire questo movimento. Non potremo impedire gli
Ebrei di andare a Gerusalemme—ma favorire non possiamo mai. La terra di
Gerusalemme se non era sempre santa, è santificata per la vita di Jesu Christo
(ele não pronuncia Gesu, mas Yesu, com sotaque veneziano). Io come capo
della chiesa non posso dirle altra cosa. Gli Ebrei non hanno riconosciuto nostro
Signore, perciò non possiamo riconoscere il popolo ebreo [Nós não podemos
aprovar este movimento. Não podemos impedir os judeus de irem a Jerusalém
– mas nunca poderemos favorecê-lo. A terra de Jerusalém, se não foi sempre
santa, foi santificada pela vida de Jesus Cristo. Eu, como chefe da Igreja, não

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posso dizer outra coisa. Os judeus não reconheceram Nosso Senhor, por isso
não podemos reconhecer o povo judeu].
Logo, o conflito entre Roma, representada por ele, e Jerusalém,
representada por mim, estava novamente aberto.
No início, de fato, tentei ser conciliador. Recitei minha pequena nota sobre
a extraterritorialização, res sacrae extra commercium [os lugares santos fora de
negócio]. Não fez mais que uma impressão. Gerusalemme, disse ele, não deve
cair nas mãos dos judeus.
“E o estado atual, Santo Padre?”
“Eu sei, não agrada ver os turcos na posse dos Lugares Santos. Nós
simplesmente temos que nos conformar com isso. Mas apoiar os judeus na
conquista dos Lugares Santos, isso não podemos”.
Disse que nosso ponto de partida fora somente o sofrimento os judeus e
que desejávamos evitar as questões religiosas.
“Sim, mas nós, e eu, como chefe da Igreja, não podemos fazer isso. Há
duas possibilidades. Ou os judeus se agarrarão a sua fé e continuarão a esperar
o Messias que, para nós, já chegou. Neste caso, eles estarão negando a
divindade de Jesus e nós não podemos ajudá-los. Ou eles irão para lá sem
qualquer religião e, então, muito menos ainda poderemos favorecê-los.
“A religião judaica foi o fundamento da nossa; mas ela foi substituída pelos
ensinamentos de Cristo e nós não podemos lhe conceder qualquer validade. Os
judeus, que deveriam ter sido os primeiros a reconhecer Jesus Cristo, não o
fizeram até hoje”.
Estava na ponta da minha língua para dizer, “É o que acontece em toda
família. Ninguém acredita em seus próprios parentes”, mas, pelo contrário, disse:
“O terror e a perseguição podem não ter sido os melhores meios para esclarecer
os judeus”.
Mas ele respondeu, e dessa vez ele foi grandioso em sua simplicidade:
“Nosso Senhor veio sem poder. Era povero [era pobre]. Veio in pace [em
paz]. Ele não perseguiu ninguém, antes, foi perseguido.
Ele foi abbandonato [abandonado] até por seus apóstolos. Somente
depois ele cresceu em estatura. Foram três séculos para a Igreja desabrochar.
Os judeus, portanto, tiveram tempo para reconhecer sua divindade sem qualquer
pressão. Mas eles não o fizeram até hoje”.
“Mas, Santo Padre, os judeus estão em terríveis apuros. Não sei se Vossa
Santidade tem ciência de toda a extensão dessa triste situação. Precisamos de
uma terra para essas pessoas perseguidas”.
“E tem que ser Gerusalemme?”
“Não estamos pedindo por Jerusalém, mas pela Palestina – apenas a terra
secular”.
“Não podemos ser favoráveis a isso”.
“Vossa Santidade conhece a situação dos judeus?”
“Sim, da minha época em Mântua. Há judeus vivendo lá. E eu sempre tive
boas relações com judeus. Há apenas algumas noites dois judeus estavam aqui
para me visitar. No fim das contas, há outros vínculos além dos da religião:
cortesia e filantropia. Isso nós não negamos aos judeus. De fato, nós também
rezamos por eles: que suas mentes sejam esclarecidas. Hoje mesmo a Igreja
está celebrando a festa de um incrédulo que, a caminho de Damasco, converteu-
se miraculosamente à verdadeira fé. Então, se fores a Jerusalém e

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estabeleceres teu povo ali, teremos igrejas e padres prontos para batizar todos
vós”.

ESTADO DE ISRAEL: A CAUSA DA


REVOLTA MUÇULMANA E PALESTINA?

Mais uma vez a questão Palestina se acentua com a guerra decretada


entre as duas partes: judeus e palestinos. Centenas de foguetes e bombas caem
de lado a lado. E as nações assistem perplexas dois povos confrontando-se
numa guerra insana.
Desde o ano 70 de nossa Era, quando Jerusalém foi destruída pelos
romanos, os judeus ficaram dispersos pelo mundo. Esta dispersão e destruição
de Jerusalém estão previstas em várias profecias, inclusive do próprio Nosso
Senhor Jesus Cristo. É a famosa diáspora judaica que perdura até os dias atuais.
No decorrer de quase 2 mil anos os judeus ficaram dispersos pelo mundo sem
terra onde pudessem se estabelecer politicamente no concerto das nações.
Foi o judeu Theodor Herzl que lançou o “movimento sionista”, visando
criar o Estado de Israel. Em 1904, Herzl obteve uma audiência com o Papa São
Pio X, do qual obteve a seguinte resposta ao pedido de apoio ao seu movimento:
“De duas uma: ou os judeus guardarão sua antiga fé e continuarão a esperar
pelo Messias, que nós cristãos cremos já ter vindo à terra, - e nesse caso
negarão a divindade de Cristo, e não poderemos ajudá-los; ou então irão para a
Palestina não professando nenhuma religião, e nesse caso nada teremos a ver
com eles”.
Mais adiante, São Pio X acrescenta: “A fé judaica foi o fundamento de
nossa própria fé, mas foi ultrapassada pelo ensinamento de Cristo e não
podemos admitir que ela tenha qualquer validade hoje em dia. Os judeus, que
deviam ser os primeiros a reconhecer Jesus Cristo, não o fizeram ainda”.

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Herzl argumentou que o povo judeu vivia errante e precisava de uma terra,
ao que o Papa retrucou: “Tem que ser Jerusalém?”. O judeu respondeu que não
estava pedindo Jerusalém, mas a Palestina. Mesmo assim o Papa não
concordou: “Não nos podemos declarar a favor desse projeto”.
No decorrer do século XX, de uma forma misteriosa (principalmente
durante o Nazismo), começou a haver uma ignominiosa perseguição aos judeus
dispersos pelo mundo e alguns milhões deles foram mortos. Isso causou nas
Nações Unidas um sentimento de pena (um tanto artificial) deste povo, fazendo
com que após a Segunda Guerra a ONU reunida tivesse aprovado a concessão
de um território para ele. Escolheram a Palestina, região onde surgiram os
judeus, mas ocupada há séculos por muçulmanos, árabes ou não. Para que os
judeus ocupassem o terreno doado arbitrariamente pela ONU teriam que
expulsar os atuais ocupantes, e para isto tiveram que mover uma guerra, a
primeira de uma série delas...
É bem verdade que, logo após a proclamação de seu Estado, Israel foi
implacavelmente atacado por países muçulmanos, alguns com regimes
islâmicos (Egito, Líbano, Síria, Iraque, etc.), os quais não reconheciam o novo
país naquela área, pois temiam o que veio ocorrer depois: a expulsão dos
palestinos. Dentro de poucos dias, Israel (auxiliado inclusive por tropas
francesas e inglesas) já era dono de área superior àquela preceituada pela ONU,
expulsando inapelavelmente a população civil de suas propriedades para serem
ocupadas pelos judeus imigrantes.
Consta de um “Petit Guide de Terre Sainte”, escrito em 1964 pelo padre
franciscano Paulin Lamaire, as seguintes observações: “No momento em que
extinguiu o Mandato Britânico sobre a Palestina (1947), ali existia uma população
de 2.260.000 habitantes, dos quais 1.140.000 eram muçulmanos, vivendo ao
lado de cerca de 775.000 judeus, 145.000 cristãos e 15.000 outros. Atualmente,
segundo o recenseamento de 1960, existem em Israel 2.140.000 habitantes, dos
quais apenas 240.000 não são judeus. Os cristãos são agora perto de 45.000,
os muçulmanos, próximo de 135.000 e os druzos, 17.000”. Em 1948, o Estado
de Israel tinha 12.000 km2, aumentando para 21.000 km2 a partir de 1967. Sua
população total, hoje, supera os 8 milhões de habitantes, a maioria composta de
judeus (cerca de 7 milhões). Segundo o censo de 2012 vivem por lá cerca de 1,6
milhão de árabes e alguns milhares de cristãos. Inicialmente, escolheram como
capital a cidade Tel Aviv, mas a partir de 1980 o parlamento israelense (Knesset)
proclamou Jerusalém como capital, embora houvesse resolução da ONU em
contrário.
De 1948 até nossos dias o Estado de Israel não teve um só dia de paz.
Depois da guerra de 1948, veio a de 1956 (em 29 de outubro, a “campanha do
Sinai), apoiados por forças anglo-francesas, e a grande guerra dos seis dias em
1967. A ONU tem procurado sempre estar favorável a Israel, e nunca suas
resoluções foram cumpridas, porque aquela organização tem se mostrado
inteiramente incapaz de solucionar os conflitos internacionais. Vejamos, por
exemplo, como as coisas, no âmbito da ONU, ocorrem:
- Em data de 29 de novembro de 1947 (apenas dois anos depois da
formal criação da ONU), foi aprovada a resolução n. 181, que decide pela divisão
do território palestino em dois Estados, um judeu e outro composto pelos atuais
ocupantes da região. O Estado judeu foi criado logo no ano seguinte, por decisão
e imposição dos mesmos, mas o palestino nunca o foi até nossos dias;

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- Resolução n. 303, de 9 de dezembro de 1949, determina que a cidade
de Jerusalém tenha “status” internacional e seja administrada pela ONU. Hoje,
os judeus mandam na cidade, embora ainda tolerem algumas áreas cristãs e
muçulmanas;

- Após a guerra dos seis dias, a 22 de novembro de 1967, resolução n.


242 do Conselho de Segurança da ONU determina que Israel se retire dos
territórios ocupados naquela guerra. Nada se cumpriu até o momento;

- Resolução n. 3379, de 10.11.75, qualifica o sionismo como uma forma


de racismo e de discriminação racial. Mas tudo no papel, nada na prática, pois
nenhum país ousou pôr em uso contra o sionismo as leis que eles criaram contra
o nazismo e outras formas de racismo;

- Em março de 1978 são aprovadas duas resoluções, de n. 425 e


426, exigindo o fim das ações bélicas de Israel contra o Líbano e decide criar
uma força internacional da ONU na região. Em parte, isto foi cumprido, mas após
terrível massacre dos judeus contra palestinos em Sabra e Chatilla;

- Em 14 de dezembro de 1978, a resolução 33/71 da Assembléia Geral


da ONU proíbe seus integrantes de cooperação bélica com Israel e de lhe
fornecer qualquer equipamento militar. Sabe-se que os Estados Unidos até hoje
mantêm forte cooperação e ajuda militar a Israel, sem qualquer censura do
inócuo organismo da ONU;

- Mais uma resolução é feita, em 30 de junho de 1980, a de n. 476,


determinando que Israel se retire dos territórios ocupados na guerra de 1967. Tal
resolução, como as demais, foi ignorada por Israel;

- Com violência inaudita, o exército de Israel lança tanques de guerra


contra loucos atiradores de pedras, forçando mais uma resolução do Conselho
de Segurança da ONU, em 07 de outubro de 2000, a de n. 1322, que condena
tais ações bélicas. Israel continua surdo ao que determina o máximo organismo
internacional de paz entre as nações.

Como esperar, pois, que Israel atenda hoje ao pedido da ONU para cessar
fogo?
A impressão que se tem é que o judaísmo, infiltrado e poderoso em vários
setores chaves dos postos de mando (ONU, Estados Unidos, etc), consegue
“abafar” normas que possam impedir o crescimento do Estado judaico. Mas de
outro lado, quanto mais este Estado cresce, mais aumenta o ódio de seus
vizinhos contra ele. Assim, aquilo que poderia ser tido como um desafio ao
próprio Deus, que lhes amaldiçoou com a dispersão pelo mundo por causa do
deicídio praticado em Jesus Cristo, trouxe aos judeus amargos frutos, uma
convivência difícil com vizinhos inconformados e justamente revoltados, a ponto
talvez de provocar, ou melhor suscitar, um sentimento de repúdio entre eles para
com o Ocidente Cristão e a deflagração de uma Revolução islâmica universal.
Pior ainda, suscitou entre eles a formação de redes terroristas capazes de
horríveis ataques suicidas, com bombas atadas ao próprio corpo do atacante, e
com a morte de inúmeras vítimas civis inocentes.

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O problema da Palestina é tão importante para a revolução islâmica que
todos os terroristas e dirigentes muçulmanos em geral o alegam como principal
ódio que mantêm contra a América do Norte. Quando Israel os guerreia, os
combate com seu exército, com seus tanques e bombas “legais”, está
diretamente lhes açulando o ódio contra os Estados Unidos e contra todo o
Ocidente cristão. Pesquisa publicada pelo jornal “Al Watan” (em abril de 2002),
da família real da Arábia Saudita, constatou que 60% dos sauditas odeiam os
EUA. Perante a pergunta “Você odeia o Ocidente em geral?”, 49% responderam
que sim, 30% não, e o restante se manteve indiferente. Perguntados qual a razão
deste ódio, 75% responderam que era por causa do apoio logístico que os
americanos davam aos judeus no conflito israelo-palestino.
E assim, tanto Israel quanto o Próprio EUA e a ONU ficam num impasse:
precisam acalmar os beligerantes palestinos islâmicos e lhes prometem criar um
Estado, um País onde possam viver; mas como manter este povo na fronteira de
Israel com perigo constante para seu território? Mais cedo ou mais tarde, estando
a Palestina estruturada como País e com assento na ONU, o Estado de Israel
correria perigo. Da mesma forma os judeus não abrem mão de seu território,
conquistado a ferro e fogo. Como sair do impasse? Aparentemente como as
coisas andam no momento, não há saída. O impasse continua, as guerras
continuam e Israel terá que conviver sem paz...
A solução para o problema encontra-se por enquanto nas elucubrações
teóricas utópicas: todos os judeus se tornarem muçulmanos ou então todos
muçulmanos tornarem-se judeus, ou, mais difícil ainda, quase impossível,
muçulmanos e judeus tornarem-se cristãos. Provavelmente, será a única
solução para a Palestina, embora hoje pareça utópica e irrealizável. Para que
haja paz é necessário que a doutrina praticada entre aqueles povos seja a de
um amor fraterno verdadeiro, e isso só existe entre cristãos, especialmente os
católicos. Um religioso franciscano que dirige uma escola em Israel declarou
recentemente que os católicos por lá são vistos como seres de outro planeta, e
isso porque praticam uma coisa inusitada: a capacidade de perdoar; Sim, judeus
e islamitas não sabem o que é perdoar, e por isso odeiam-se tanto.
Há uma outra questão. A imposição de um poder pela força nunca foi
estratégia segura e duradoura. A forma usada por Israel de impor seu estado
laico pela força das armas nunca vai conseguir trazer paz a seu povo. Isso só
ocorrerá no dia em que seus líderes levarem em conta a noção cristão de perdão
e compreensão humana de seus adversários. Se nada disso ocorrer continuarão
se degladiando infinitamente.

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O JUDAÍSMO, SEITA UNIVERSAL?

Veremos abaixo no que consistia o judaísmo, corrente religiosa e política


que pode ser definida como uma verdadeira seita universal. Abordamos aqui o
judaísmo como se encontrava naqueles remotos tempos, quando Nosso Senhor
Jesus Cristo veio ao mundo. Não confundir com o movimento sionista, fundado
por Theodor Herzl e condenado por São Pio X, o qual preconizava a fundação
do Estado de Israel, ou mesmo com o judaísmo moderno, em algo semelhante
mas não inteiramente fiel ao daquela época. Quanto ao judaísmo moderno no
sentido religioso seria necessário estudo mais detalhado por envolver muitos
aspecto religiosos e políticos do mundo moderno, e não é sobre ele que fazemos
os comentários a seguir.

O judeu
O nome judeu vem do hebraico “yehudi”, ou do aramaico “yehud’y”, que
se aplicava originalmente aos habitantes do reino de Judá e, mais tarde, aos
hebreus ou israelitas que imigraram para a província pérsica da Judéia,
ampliando a significação estrita e etimológica para “filhos da tribo de Judá”.
Assim, naquele tempo nem todo israelita era judeu como se presume hoje em
dia.
Inicialmente, portanto, só eram judeus a parte do povo israelita que
formava a Judéia, ou o reino de Judá, uma das doze tribos de Israel. Quando
surgiu o cisma de Samaria, depois da morte de Salomão, os hebreus ficaram
divididos em dois reinos: o da Judéia, ou de Judá, com capital em Jerusalém,
composto das tribos de Judá e Benjamim, e o de Israel, composto pelas outras
dez tribos, com sede na cidade Samaria. No tempo de Nosso Senhor Jesus
Cristo os judeus eram, principalmente, os que mandavam nas sinagogas ou na
organização sectária que as controlava, quase não havia mais o predomínio
tribal como nos tempos de Salomão e David, com todas as tribos dispersas pelo
mundo.
Naquele tempo, os judeus também eram todos aqueles que formavam
uma minoria que urdia uma conjuração, faziam parte de um complô, tramavam
entre si o império do mundo, para tanto se constituindo numa seita. Tornaram-
se, desta forma, os principais inimigos de Nosso Senhor Jesus Cristo, que

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pregava principalmente um reino espiritual. São João, em seu Evangelho, os
chama simplesmente de “judeus”, enquanto os outros evangelistas só os
nomeiam quando Pilatos mandou fazer a tabuleta INRI, e no restante de seus
evangelhos referem-se a eles como “príncipes dos sacerdotes”, fariseus ou
“anciãos do povo”, talvez na falta de um qualificativo mais adequado.
Enquanto São João, não; fala deles como um grupo estranho ao povo de
Israel, dizendo que faziam festas diferentes como a “festa dos judeus” (Jo 5, 1),
e falando coisas diferentes quando escreveu “os judeus diziam” (Jo 5, 10), ou
até mesmo na hora em que decidiram eliminar o Messias: “os judeus queriam
matá-Lo” (Jo 5, 18). São João deixa bem claro que havia tal distinção, pois o
termo “judeu” é bastante utilizado como se referindo aos membros dessa
conspiração sectária: “ninguém, contudo, ousava falar dele livremente, com
medo dos judeus” (Jo 7, 15); (os judeus) “estavam maravilhados, mas queriam
matá-lo” (Jo 7, 20-21 e 35); “diziam pois os judeus” (Jo 8,22); eram “judeus que
creram nele” (Jo 8,37); “responderam os judeus” (Jo 9,22); “dissensão entre os
judeus” (Jo 10,19); “rodearam-no os judeus” (Jo 10, 24), etc. Até mesmo a festa
da Páscoa é chamada por São João de “Páscoa dos judeus” (Jo 2,20), coisa
muito estranha pois não existia outra páscoa a não ser a de Israel. O fato de
haver uma “páscoa dos judeus” significa que era algo diferente da tradição.
Já os galileus, também israelitas, eram citados como pessoas
desprezadas pelos judeus, mas formando uma comunidade importante. Daí
Roma ter dividido o reino de Judá (ou o que restava dele naquele tempo) com
um governador na Judéia e outro na Galiléia, região em que Nosso
Senhor andava mais porque, na Judéia, “os judeus O queriam matar” (Jo 7, 1-
2). Ora, se os galileus fossem também judeus, diria São João de modo diferente.
No entanto, embora tais judeus fossem tidos por muitos como um grupo
de conjurados, ninguém tinha coragem de enfrentá-los, pois a maioria via como
mal maior a presença do invasor romano. Mas tinham muito medo desses
judeus, isto é, dos membros da seita judaica citada por São João (Jo 7, 13).
A conjuração judaica, de que falamos acima, não se circunscrevia ao
plano meramente político, destinava-se primordialmente à construção de um
reino messiânico universal, mas completamente naturalista e gnóstico,
desprovido de tudo o que fosse sobrenatural e divino. Faltava apenas o tão
esperado Messias para que os conduzisse à meta final de seus ideais.

Os próprios discípulos que eram judeus O traíram


Dos doze Apóstolos, 10 eram galileus, e apenas Judas Iscariotis, o traidor,
e provavelmente São Mateus (supõe-se que era judeu por causa do nome Levi)
eram judeus (de nascimento, isto é, da tribo mas não pertencentes à seita
judaica). A maior parte dos Apóstolos eram originários das aldeias que
rodeavam o Lago da Galiléia, como Betsaída, Tiberíades e Caná. Fato que fez
São Mateus se referir assim ao que disse Isaías (Is 9, 1-2): “Terra de Zabulon e
terra de Neftali, a qual confina com o mar, (país) além do Jordão, Galiléia dos
gentios: este povo, que jazia nas trevas, viu uma grande luz; e uma luz levantou-
se para os que jaziam na região e na sombra da morte” (Mt 4, 15-16). Zabulon
era uma aldeia de Judá, enquanto que Neftali era samaritana, estando a Galiléia,
pois, na confluência dos reinos passados (Judá e Israel).
Os outros simples discípulos de Jesus, que eram judeus de nascimento,
mesmo ficando maravilhados com Sua doutrina, logo se arrependiam e “queriam
matá-Lo” (Jo 7,20 e 35). Dos dez leprosos que foram curados por Nosso Senhor,

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apenas um não era judeu (Lc 17, 11-19) e foi o único que voltou para dar glórias
a Ele pela grande graça recebida, enquanto os nove restantes foram iludidos
pelos sacerdotes sectários.
Depois que Nosso Senhor ressuscitou, o Anjo se dirige aos Apóstolos
dizendo “varões galileus, que estais olhando para os céus?” (At 1, 11). Por que
o Anjo não falou “varões de Judá” ou “judeus”? Ou, provavelmente, o Apóstolo
que escreveu o Evangelho tenha entendido assim porque supunha que todos ali
eram galileus, não havendo nenhum judeu entre eles. Ou se havia, talvez São
Mateus, não era motivo para ser mencionada esta particularidade por causa do
grande mal que os judeus haviam praticado.
Mesmo depois que Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na Cruz essa seita
continuou a perseguição aos Seus seguidores. Os que se amotinaram contra
Santo Estêvão eram judeus dessa organização sectária que conjurava a morte
de todos os cristãos (At. 6, 8-15), pertenciam a um grupo chamado de
“libertos”. São Paulo, que fora membro dessa organização e ajudou a matar
Santo Estevão, chama de “judeus” (Rom 2, 17-29) os membros dessa seita em
oposição ao verdadeiro hebreu. E continua (Rom 3, 1-8), referindo-se agora a
toda a população (Rom 3, 9-20), que ele chama de “povo de Israel’ (Rom 8, 31;
10,19; 11. 1-2, etc.).
Mas, se os judeus constituíam uma minoria conspiradora, também era
minoria os verdadeiros fiéis a Deus. Em várias oportunidades, os verdadeiros
israelitas sempre foram citados como uma minoria na Bíblia. No Antigo
Testamento o povo fiel é chamado comumente de “resto”. E apenas um
“resto” em Judá será encontrado fiel (Zac 8, 11-13) e salvo por Deus. Depois,
o mesmo “resto” de que fala a Sagrada Escritura virá de fora (Zac 8, 7-8). Basta
verificarmos que no tempo de Ester os judeus ainda eram os verdadeiros
israelitas que permaneciam fiéis no cativeiro da Babilônia e não aderiam à
idolatria lá reinante (Ester 9, 15-20), mas que era uma minoria. O Profeta Isaías
também fala desse “resto”: “Estenderá segunda vez o Senhor a sua mão para
possuir o resto de seu povo” (Is 11, 11).

A miscigenação
A Providência, no entanto, permitiu e parece até ter inspirado certa
miscigenação entre os hebreus, apesar de rigorosas prescrições legais que
proibiam o casamento com “gentios”. Um exemplo vemos na região chamada
Decápole, uma reunião de 10 cidades que se estendia a leste do Jordão, de
Damasco, ao norte, até Filadélfia, ao sul. Foram fundadas e confederadas por
soldados gregos de ocupação, após a morte de Alexandre Magno. Depois da
conquista romana, Pompeu formou a liga de Decápole. As cidades mais
importantes eram Damasco e Gerasa, esta última onde ocorreu o exorcismo em
que os demônios foram precipitados na manada de porco.
Haviam muitas outras cidades formadas por gentios entre os hebreus,
como Cesaréia, Tiberíades, Herodiádes, etc. Isto ocorreu em parte porque outros
povos aderiam ao judaísmo, como se vê em Ester no cativeiro da
Babilônia; “muitos de outras nações e seitas abraçavam a sua religião” (Ester 8,
17). Na Fenícia, berço dos cananeus, havia cidades famosas como Tiro e Sidon,
formadas por povos semitas e muito visitadas por Nosso Senhor onde fez
milagres e exorcismos. A própria Galiléia, de onde saíram os 11 Apóstolos fiéis,
e cujo povo simples era odiado pelos judeus (Jo 7, 52) era o ponto de atração e
encontro dos gentios de diversas partes do mundo e onde deve ter havido maior

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miscigenação. Era então o refúgio escolhido por Nosso Senhor para enganar
seus perseguidores.
Seguindo prescrições do tempo de Moisés, o povo hebreu, porém, tinha
uma consciência muito forte de sua descendência, por isso conservando-se
isolados dos outros com suas divisões tribais. Guardavam rigorosamente os
registros de suas origens, dos antepassados de todas as 12 tribos. Por exemplo,
Nosso Senhor tem sua descendência descrita por São Lucas porque Sua família
possuía tais registros. No entanto, com o tempo suas tribos foram se espalhando
pelo mundo e ocasionando muitas miscigenações com os outros povos, os
chamados gentios, que deram sua contribuição ao Povo Eleito. Por exemplo, o
rei de Tiro, Hiram, ajudou Salomão na construção do Templo, embora não fosse
israelita de nascimento. A própria Rute, ancestral do rei David, não era israelita,
mas moabita.

A diáspora
Desde suas mais remotas origens os hebreus sempre viveram
espalhados pelo mundo. Abrahão veio da Caldéia para viver na Terra Prometida
e lá dá origem ao seu povo. Mas este cresceu e se desenvolveu no Egito.
Quando voltou para a Palestina, conseguiu firmar-se certo tempo e até crescer
politicamente com sua própria monarquia teocrática. Mas, após o cisma de
Samaria vieram os degredos e as escravidões em povos estrangeiros. Vieram
as invasões gregas e romanas quando os dois reinos israelitas já estavam
arruinados e quase extintos, levando muitos deles para as capitais ou cidades
mais importantes desses impérios.
Assim, quando Nosso Senhor Jesus Cristo veio ao mundo os hebreus
tinham comunidades espalhadas por toda a terra. Estavam eles em Cirene, em
Sardes e Éfeso, em Mazoca ou em Tarso, em Antioquia ou em Alepo, até mesmo
na distante Capadócia, em Haram e Tapasso, ali perto em Damasco ou mesmo
na distante Mesopotâmia, nas cidades de Nisibus, Nínive, Kalacha, Assur e
Nepur, ou até mesmo na Média, em Ecbátana e Susa, ou principalmente nas
cidades de Alexandria, Tebas, Heliópolis e Roma. Na capital do império romano,
os judeus eram calculados entre 20 e 30 mil.
Em Listra, pequena cidade do interior da Ásia, São Paulo encontrou uma
família da diáspora, de onde saiu o famoso Timóteo. De outra cidade, chamada
Iconio, vinham judeus conjurados para atiçar o povo de Listra contra São Paulo
e São Barnabé, tudo indicando que eram dirigidos pelos chefes sectários de
Jerusalém.
Atenas era considerada a principal cidade religiosa do mundo pagão
porque estes eram maioria, mas Jerusalém detinha maior poder sobre as
comunidades judaicas espalhadas pelo mundo, com maior poder religioso e
riqueza. Outra cidade grega, Corinto, mantinha uma das mais influentes
comunidades judaicas da Grécia.

A universalidade do judaísmo
E o judaísmo era também uma religião que, por causa da miscigenação,
acolhia estrangeiros de toda parte. Mesmo com as severas proibições da Lei
Mosaica a exogamia logo se tornou entre eles uma realidade. São Lucas mostra
nos Atos que “os judeus eram homens religiosos de todas as nações que há
debaixo do céu”. “Partos, medos, elamitas, os que habitam a Mesopotâmia, a
Judéia, a Capadócia, o Ponto, a Ásia, a Frísia e a Panfília, o Egito e várias partes

10
da Líbia, que é vizinha de Cirene, e os vindos de Roma, tanto judeus quanto
prosélitos, cretenses e árabes”. (At. 2, 5-10).
De outro lado, a História do povo hebreu é rica em mostrar qualidades de
liderança para os outros povos. José do Egito tornou-se o homem mais
importante de seu tempo, salvando aquele povo de uma grande calamidade.
Vários outros hebreus tornaram-se conselheiros de reis, como Moisés, o Profeta
Daniel e seus companheiros, Mardoqueu citado no livro de Ester, etc.
Tal universalidade, com comunidades e sinagogas espalhadas em todo o
mundo, não impedia que houvesse unidade no judaísmo. E tal unidade era dada
pela centralização do poder religioso em Jerusalém, de onde partiam as ordens
para a diáspora como também para onde convergiam os ricos donativos. Havia
uma rede de sinagogas que seguiam as ordens da de Jerusalém. Quando
Herodes mandou reconstruir o templo, na verdade estava fazendo um “grande
negócio”, pois recebeu vultuosos donativos dessa rede, já que Jerusalém, por si,
não possuía recursos para realizar tão grande obra. No advento do Cristianismo,
essa rede foi acionada para mover-lhe perseguição.
É preciso não confundir, pois, judaísmo com hebraísmo ou religião de
Israel. Até mesmo as regras, os rituais e normas criados por Moisés já não são
seguidos há muitos séculos.

Diferença entre o Reino de Israel e o de Judá


No entanto, a casa real de Judá tinha sua legalidade, adquirida pela
Tradição de sucessores legítimos, destronados na invasão romana do tempo de
Jesus Cristo. Nesse tempo quem reinava era um estrangeiro, Herodes.
Na Saudação à Nossa Senhora, São Gabriel disse: "Não temas Maria,
pois encontraste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um
filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-se-á Filho do
Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará
eternamente na casa de Jacó e o seu reino não terá fim." (Lc 1, 30-34)
Vê-se que o Anjo fala em “casa de Jacó”, mas o patriarca teve seu nome
mudado por um Anjo para Israel (Gên 32, 28). Poderia ter dito “casa de Israel”,
mas na linguagem corrente entre os hebreus o nome Jacó estava ligado à
descendência real através da tribo de Judá (poder temporal), enquanto Israel
tinha sentido mais espiritual e divino. O Anjo, portanto, falava claramente
também numa descendência real terrena. É como se estivesse definido aí a
diferença entre o poder temporal e o espiritual, que, no entanto, devem reger
unidos.
O Profeta Isaías também chama a dinastia que dominava os hebreus de
“Casa de Jacó” e não “Casa de Israel”, indicando um reinado meramente terreno:
“Casa de Jacó, vinde e caminhemos à luz do Senhor. Pois tu (ó Senhor)
rejeitaste o teu povo, a casa de Jacó, porque eles se encheram (de superstições)
como noutro tempo tiveram agoureiros como os filisteus, e se uniram aos filhos
dos estranhos” (Is 2, 5-6). Note-se que quando o Profeta fala “rejeitaste o teu
povo”, logo a seguir completa, “a casa de Jacó”, quer dizer, Deus recusou os
dirigentes, os filhos de Judá, (hoje conhecidos como judeus), e não o povo
israelita. . Mais adiante, o Profeta dá a entender essa distinção entre governantes
e o povo quando diz: “Agora, pois habitantes de Jerusalém, e homens de Judá,
sede vós os juízes entre mim e a minha vinha” (Is 5, 3). Habitantes de Jerusalém
eram apenas os que moravam na capital, dominada por duas tribos, Benjamin e

11
Judá, e “homens de Judá”, claramente, eram os dirigentes, os príncipes e reis
que lá dominavam.
Quando o Profeta se refere à “casa de Jacó” sempre dá a entender que
está falando dos reis, da dinastia real, e não do povo eleito em geral, como
nestes textos: “E acontecerá isto naquele dia: Os que tiverem ficado de Israel e
os da casa de Jacó, que se tiverem salvado, não se apoiarão mais sobre aquele
que os fere; mas apoiar-se-ão sinceramente sobre o Senhor, o Santo de Israel”
(Is 10, 20-21). Em seguida o profeta fala que se converterão apenas “as
relíquias”, isto é, uma pequena porção, tanto da “casa de Jacó” quanto do povo
em geral.
Em outra passagem, diz: “Apesar dos que investem com ímpeto contra
Jacó, Israel florescerá” (Is 27-6), deixando bem claro a diferença entre o poder
temporal (Jacó) e o espiritual (Israel), indicando que mesmo que as elites
recusem o poder divino, este terminará por prevalecer.
Em outra parte vemos: “Por esta causa, o Senhor, que resgatou Abraão,
diz isto à casa de Jacó: Agora não será confundido Jacó, nem agora se
envergonhará o seu rosto; mas, quando vir no meio dele os seus filhos, obra das
minhas mãos, dar glória ao seu nome, também eles santificarão o Santo de Jacó
e glorificarão o Deus de Israel” (Is 29, 22-23). O “Santo de Jacó” é, pois, Jesus
Cristo, descendente da “casa de Jacó” (do poder temporal)e o “Deus de Israel”
nem precisa dizer Quem é, representando aí o poder espiritual.
E, no entanto, as profecias diziam “E tu Belém de Efrata, tu és pequenina
entre as milhares de Judá; mas de ti é que há de sair aquele que há de reinar
em Israel”. (Miq 5, 2). Há, portanto, dois significados nos títulos reais dados a
Jesus Cristo: o terreno e o divino, sendo rei da “casa de Jacó” o faz com o título
meramente terreno, mas como “Rei de Israel” (nome com que o Anjo mudou o
nome de Jacó) ele reina sobre todos os homens, pois este título é divino.
Estão bem definidos aí os poderes temporal e espiritual, cujas
características comportam todo o Reino de Cristo.

ALÁ ERA UM DEUS PERTENCENTE AO


ANTIGO POLITEÍSMO ARÁBICO?
Alá era apenas um deus pertencente ao antigo politeísmo árabe?

Esta é uma pergunta que não se tenta responder nos dias atuais, muitos com
receio da perseguição islâmica. De outro lado, considerar o deus deles como
uma simples entidade idolátrica do politeísmo pode ser entendido, inclusive,
como uma ofensa à religião islâmica e não como uma verdade histórica.

1. Situação do politeísmo na península arábica antes do Islamismo:

Merece destaque a descrição feita pela revista “”Aventuras na História”, edição


de julho de 2013, página 45:
“Por volta do século 5, os habitantes da região do Mediterrâneo tinham se
convertido ao cristianismo. O panteão dos deuses da Grécia e de Roma era só

12
lembrança do passado. E, pelo jeito, os velhos deuses estavam mesmo na hora
de se aposentar. O historiador Plutarco, sacerdote do templo de Delfos,
lamentava-se, no século 2, que Apolo se calara: não respondia mais às consultas
oraculares feitas por ele. Até os cultos de deuses “importados”, como o da
egípcia Isis[1] e do persa Mitra, estavam em baixa. Em 394, um pequeno grupo
de devoto de Isis fez a última procissão em homenagem à deusa pelas ruas de
Roma.
As religiões pagãs tinham sido varridas do mapa? Não. No século V, na
Península Arábica, os deuses Greco-romanos sobreviviam. Em Failaka (no atual
Kuwait), festivais populares eram organizados em devoção ao deus Poseidon (o
Netuno dos romanos) e à deusa Artemis (Diana). A deusa Minerva (Al-lat)[2]
tinha adoradores na Arábia, na Síria e na Palestina. “Até o século 4, quase todos
os habitantes da Arábia eram politeístas”, diz o professor de Oxford Robert G.
Hoyland, autor de “Arabia and the Arabs – From the Bronze Age to the Coming
of Islam” (Arábia e os Árabes – Da Era do Bronze á Vinda do Islã). “Al-‘Uzza
(Afrodite) era cultuada no Sinai e na Arábia”, diz James E. Montgomery,
professor de História Árabe da Universidade de Cambridge, autor de “Arabic
Thelogy, Arabic Philosophy: From the Many to ghe One” (Teologia Árabe,
Filosofia Árabe: do Múltiplo ao Uno).[3]
Como aconteceu essa assimilação? Bem, não foi só da Grécia e de Roma
que os árabes pegaram deuses emprestados. “Hoje se acredita que as
divindades árabes eram formas locais, adaptadas, das divindades do mundo
antigo do Mediterrâneo”, registrou Timothy Winter, da Universidade de
Cambridge, na Inglaterra, no ciclo de palestras “A Crash Course in Islamic
History” (Breve Curso de História Islâmica). Os árabes assimilaram os deuses
dos povos vizinhos, adaptando-os à sua religião[4]. A deusa Al-Lat, como vimos,
era Minerva (nome romano da grega Atena) sob disfarce, mas nem tão
disfarçada assim: em Cartago, a mesma deusa usava o nome de Allatu. “Muitas
das divindades da Antiguidade ocidental poderiam ser facilmente
intercambiáveis”, diz a historiadora Mary Beard, autora de “Religions of Romne”
(Religiões de Roma). No século 5 a. C., isso já tinha despertado a atenção de
Heródoto. Em seu périplo por terras árabes, o historiador observou um pacto
entre dois chefes tribais feito em nome de Dionísio (o Baco romano). “Os árabes
chamam Dionísio de Orotal”, escreveu Heródoto nas “Histórias” (430 a.C.).
Um caso ilustrativo é fornecido pelas observações do general romano
Aelius Gallus. Em 26 a.C. ele foi enviado ao sul da Arábia para costurar acordos
comerciais com os reinos da região (chamada de “Arabia Felix”, Arábia Feliz).
Os romanos cobiçavam o incenso e as especiarias[5]. Gallus, em seu diário, ao
deixou de notar a semelhança entre os deuses locais e o panteão romano. “O
nosso Júpiter aqui é Dhu’Shara”, espantou-se”.
2. Quais eram os deuses da Caaba?
Na mesma edição da citada revista, comenta-se sobre as divindades que
eram adoradas na Caaba de Meca[6]:
“O panteão árabe era bem pobre em termos de causos mitológicos[7]. A
origem da religião, ou religiões, da Arábia pré-islâmica está envolta em um manto
de obscuridade[8]. “Nós praticamente não possuímos informações sobre os
mitos e narrativas que decodificariam a religião da Arábia pré-islâmica”, diz
Hoyland. “Muitos autores Greco-romanos escreveram tratados sobre a Arábia e
as coisas dos árabes, mas infelizmente eles foram perdidos, ou deles só
sobraram fragmentos”. Os dados completos disponíveis são provenientes da

13
historiografia islâmica, posterior.[9] Tal como os primeiros autores cristãos
(Eusébio de Cesaréia, Santo Agostinho, Tertuliano), os muçulmanos viram o
passado pagão[10] – romano ou árabe – sob o prisma da religião nascente. Reza
a lenda (exposta no Livro do Gênesis, na Bíblia), que os árabes descenderiam
de Ismael, o filho de Abraão com a concubina Hagar, a serva egípcia de sua
esposa, Sara. Quando Sara deu à luz Isaac, obrigou o marido a expulsar a serva
e o primogênito. Hagar e o menino erraram pelo deserto, até chegarem ao árido
vale de Meca, onde se estabeleceram.[11]
A religião original da Arábia seria estritamente monoteísta, baseada na
crença no Deus Uno, ensinada por Abraão e Ismael. Segundo a história islâmica,
a Caaba – “A Casa de Deus”[12], prédio de forma cúbica no coração de Meca –
teria sido construída por Abraão e Ismael [13]. Na obra “O Livro dos Ídolos”, do
século 9, que trata do politeísmo árabe, é dito que o primeiro descendente de
Ismael a adulterar a religião de Abraão foi um certo Al-Harith, guardião da Caaba.
Ele retornou a Meca com um ídolo de pedra e pediu sua intercessão junto a
Deus. Com o tempo, a presença de Deus tornou-se tênue no imaginário local, e
os ídolos, que antes serviam de ponte entre os homens e Deus, usurparam a
posição divina. Viraram deuses, no plural. No século 3, segundo Al-Azraqi, autor
das “Crônicas de Meca”, 400 ídolos de pedra haviam sido erigidos ao redor da
Caaba, homenagem aos mais diversos deuses da Arábia e dos povos vizinhos.
Essa é a versão dos historiadores muçulmanos, que enfatizaram, em suas
narrativas, um monoteísmo mítico em Meca. Os vestígios arqueológicos, no
resto da Arábia, apontam à interioridade das religiões politeístas na região”.

3. Comentários sobre a possível verdade histórica:


Vê-se, pelo texto acima, que o povo árabe era descendente de Ismael,
filho de Abraão. Até aí tudo coincide com os dados da Sagrada Escritura e,
possivelmente, com a realidade dos fatos. Ismael, como filho de Abraão, era um
Patriarca que deu origem a uma estirpe, a uma grande etnia ou nação. São os
árabes ou ismaelitas que povoaram aquela península. No entanto, a maioria
muçulmana não é árabe, pois não é árabe, por exemplo, o povo do Iraque, da
Turquia, do Afeganistão, do Marrocos, e tantos outros que formam o islã. Como
era filho de Abraão, com quem conviveu, Ismael pode ter sido monoteísta, pelo
menos enquanto estava na companhia do pai, mas não há nada que o diga ou o
comprove, ou mesmo que o foi até o fim de sua vida. Da mesma forma, não há
qualquer indício de que Maomé venerasse o Deus de Abraão. As noticias que
falam sobre isso vieram pelos filósofos abaixo citados: as fontes que falam sobre
a vida de Maomé apenas o citam como um esperto comerciante e nada mais.
Em seguida, vemos agora a comprovação histórica de que aquela região
ficou infestada de deuses pagãos, cerca de 360 ídolos, segundo alguns
historiadores. E isso ocorreu, mais ou menos, em concomitância com o
surgimento do Cristianismo que varreu o paganismo do Império Romano e da
Grécia. Quer dizer, os deuses pagãos mudaram de lugar e passaram a ter outros
nomes, embora com a mesma finalidade.
O Cristianismo chegou a predominar por algum tempo na península
arábica, e nesta ocasião, certamente, foi reavivada a crença no Deus de Abraão.
Não foi, porém, este o ideal de Maomé (reavivar a antiga religião hebraica) mas,
sim, impor a todos uma religião qualquer que ele abraçaria, alegando ser a de
um só deus para tentar seduzir os povos da localidade, uma mistura de
monoteístas, ex-cristãos e politeístas. Esperto como era, não deixou de enfatizar

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a tradição existente na crença do Deus de Abraão, mas não tão firme naquela
população cheia de religiões pagãs.
Segundo historiadores escrevem no compêndio de história da Time-Life,
intitulado “História em Revista”, no volume “A Marcha do Islã” (Pág. 30 e
seguintes), tudo indica que Alá era um dos deuses adorados dentre os mais de
360 da região de Meca, sendo o nome dele imposto por Maomé, que mandou
destruir todos os demais. A certa altura, o fundador do Islamismo mandou
destruir todos os ídolos, mantendo, porém, o de Allah.
Como é que atualmente não há nenhuma representação dessa entidade
idolátrica? A partir da estruturação do islamismo por seus filósofos, séculos X e
XI, o termo Alá passou a ser usado como sinônimo de Deus entre os árabes,
Deus único como é chamado o Deus verdadeiro, adorado por Cristãos. Não
ficaria bem para a seita a existência de alguma estátua ou representação
idolátrica; foi quando surgiram várias seitas, como a dos sufistas, cujo objetivo
era unicamente destruir todos os símbolos, estátuas ou, até mesmo, algo que
representasse qualquer traço cultural. Elas se encarregaram de tirar a estátua
de Alá para que o mesmo adquirisse o epíteto de Deus verdadeiro, que é puro
espírito. Da mesma forma não há qualquer desenho, pintura ou estátua de
Maomé, e isso é para que se acredite na ortodoxia dos sufistas.

4. A filosofia islã
O termo islã, em árabe, quer dizer "obediência a Alá". Mas essa
“obediência” precisa ser melhor esclarecida, pois vem da crença de que o destino
do homem é imposto arbitrariamente pela vontade de Deus, sendo impossível
opor-lhe a nossa vontade. O termo “islã” é usado, também, com o significado de
abandono e resignação na vontade de Alá. Como se vê, uma “resignação”
inteiramente fatalista.
Como já vimos, antes do maometanismo, os árabes e outros povos
daquela região (principalmente Meca e Medina, onde nasceu o movimento)
mantinham pálidas tradições antigas de crença em Deus e em um Patriarca do
Antigo Testamento, Abraão, de quem descendem através de Agar e Ismael.
Criaram um santuário, chamado Caaba, onde as diversas tribos adoravam seus
ídolos pagãos. Não se sabe se nesta época o termo Alá já era designado como
Deus, supondo-se que era apenas um dos ídolos ali adorados. É provável que
em tempos bem remotos aquele povo adorava o verdadeiro Deus, mas aos
poucos a idolatria pagã misturou seu culto com os demais. Há historiadores que
afirmam que havia naquele santuário mais de 360 ídolos, dentre eles
supostamente o do próprio Alá, Allah ou Al-Lat. O ídolo principal no tempo de
Maomé, chamava-se Hubal e era venerado também na Caaba.
A verdade histórica seria que Maomé fez-se passar por profeta de um
único Deus e o impôs pela força das armas. Para adquirir maior credibilidade
inventou uma história de que o Anjo Gabriel havia lhe aparecido com uma
mensagem, a qual foi inteiramente apoiada pela sua rica esposa, Kadija. A
“mensagem” dizia que só deveria ser venerado ali um único deus, ou deusa, e
que somente Maomé seria o profeta dele, uma exclusividade imposta pela força
e não pelo convencimento de alguma realidade. O que não concorda com as
habituais aparições de São Gabriel é que o local da suposta “aparição” ficou
marcado com um “sinal”, isto é, um meteorito provocado pela “descida” do anjo
à terra, guardado misteriosamente dentro da Caaba. Não, não há um só anjo

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bom que tenha deixado tais “sinais”, mas, ao contrário, isso é muito mais
apropriado a “aparições” de anjos maus.
Mas, o que não falam é que o misterioso personagem angélico lhe
mandou fazer guerra contra as outras religiões, o que também discorda
completamente com qualquer princípio de uma religião de Deus. Dizia a seus
partidários: “Fazei guerra aos que não crêem em Alá, nem no seu profeta; fazei-
lhes guerra até que paguem tributo e sejam humilhados”. Por isso, a chamada
“guerra santa” é quase um dogma entre eles. Pelas armas Maomé impôs sua
religião aos povos daquela região, começando por massacrar os habitantes de
Meca e Medina que o rejeitaram no início. Depois, foi pelas armas que o
islamismo foi se impondo aos outros povos, até invadir a própria Europa no
século VIII, dominando toda a Península Ibérica.
Sendo assim, em sua origem o islamismo não era monoteísta, no sentido
de um só Deus verdadeiro como crê o Cristianismo. Poderíamos dizer que era
"monodeísta", isto é, Maomé mandou destruir todos os outros falsos deuses que
haviam em Medina, erigindo um deles como o único, que era Alá. Então, Alá era
um deus pagão escolhido como entidade venerativa e adorativa pelos
maometanos. Depois que o islamismo dominava vários países e crescia no
mundo, tornou-se necessário criar seu primeiro "dogma", afirmando que o deus
Alá seria um ser supremo e único, infinitamente perfeito, criador do universo e
juiz soberano dos homens. Com o tempo a palavra Alá passou a significar
"Deus", assim como se com o tempo algum povo que adorasse Júpiter ou Diana
fizesse com que o nome de um desses deuses passasse a significar o termo
"Deus". As mesquitas muçulmanos não expõem imagens ou qualquer figura que
represente Alá. Nem sequer Maomé tem sua figura representada em alguma
estátua ou pintura. Mas dizem que Alá é o único deus verdadeiro. Isso se deve,
porém, aos sufistas que, ao longo dos anos, pregaram a simplicidade como
método de vida e mandaram destruir tudo o que era símbolo e representação
cultural – eles odeiam a cultura.
Quando criaram tais "dogmas”? Foi, mais ou menos, a partir do século X,
quatro séculos depois do surgimento do movimento, que os seus filósofos
idealizaram as suas normas que hoje predominam, inclusive o "dogma" acima,
em parte copiado do Cristianismo, mas tido como reflexo de estudos da filosofia
aristotélica. Estes filósofos foram, especialmente, Alfarabi, Avicena, e Averrós.
Mas se estes idealizaram a "estrutura" filosófica e, digamos assim, "teológica"
do islamismo, era necessário alguém criar os rituais, as leis, etc. E foi aí que
surgiu o sufismo, o islamismo na prática.
Ao longo dos anos foram então criados cinco códigos legais, ou cinco atos
pelos quais o muçulmano manifesta sua fidelidade ao seu ideal religioso. O
primeiro é uma espécie de profissão de fé, pelo qual ele se obriga a crer que Alá
é o único deus que existe no mundo. Não é que ele seja Deus, mas o único deus.
No mesmo código o fiel é obrigado a declarar que o único profeta deste deus é
Maomé. Sua prece (ou "Salat") tem que ser feita virada para a cidade de Meca,
umas cinco vezes ao dia, num conjunto de prosternações (com mãos no chão e
de quadris para cima) e fazendo abluções. O fiel é também obrigado a cumprir o
preceito de fazer uma peregrinação a Meca pelo menos uma vez na vida (o
"hajdj'). No mês chamado de "ramadã" ele é obrigado a fazer o jejum, que é
apenas diurno. Há também a obrigatoriedade da esmola legal ("zakat"), costume
que hoje não existe mais. Antigamente existia o dízimo, que era direcionado
unicamente para a guerra santa, ou "jihad".

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Não existe um clero muçulmano propriamente dito, mas informalmente se
formam o que se chama de "marabutos" ou dervixes, espécies de faquires, com
rigorosas práticas de asceses através de jejuns rigorosos e vestimentas de
andrajos. O livro principal deles, chamado "corão" ou "alcorão", é apenas um
amontoado de frases e conselhos supostamente ditados por Maomé, mas que
alguns autores supõem que foram inventados por seus seguidores. Algumas
destas frases foram copiadas de outras religiões ou filosofias.

O sufismo, modelo de vida para os que praticam o islamismo


Que é o sufismo? Trata-se de regras e práticas ascéticas e místicas de
um conjunto de escolas, de seitas e de confrarias muçulmanas. Em geral, a
prática consiste em se despir de tudo o que é cultura, tudo o que é conforto, tudo
o que leva o homem a se elevar em busca de aspirações mais altas para a alma,
e se entregar inteiramente a uma vida de misérias, de fome, de quase completa
inanição e indolência espiritual, em busca de uma suposta "perfeição". Com esta
prática de vida, tais "monges" adquirem uma aura de "santidade" entre os
crentes de sua seita e podem assim se impor em suas comunidades como
verdadeiros conselheiros, pajés, feiticeiros, xamãs, guias espirituais, gurus, etc.
Além disso, eles são um exemplo vivo da prática de sua religião a ser seguido
pelos crentes.
Os sufistas sempre combateram os filósofos e "teólogos" do islamismo,
criando uma imagem material do fundador de sua religião. As primeiras escolas
do sufismo foram criadas no século IX em Bagdá. A partir do século XIII se
espalharam várias confrarias (chamadas de "Tariqas"), onde os seus membros
(denominados de "murid") se colocavam em busca de uma identificação com o
seu deus, Alá, guiados por um espécie de guru, chamado de "cheilich" ou
"murchid", praticando uma técnica chamada "dhikr", o elemento central do ritual
sufista. Assim, surgiram várias organizações ou confrarias sufistas: os
"quadiriyya" em Bagdá (séc. XII), os dervixes mawlawis (séc. XIII), os
"naqchbandiyya", na Ásia central (séc. XIV), os "sanusiyya" no Magreb (séc.
XIX). Da mesma forma, os marabutos do Norte da África pertencem à mesma
confraria.
Quando os muçulmanos dominavam a Península Ibérica, a partir do
século XI começaram a surgir as primeiras confrarias de inspiração sufista, como
a que foi adotada pela dinastia dos Almorávidas. Provinham do continente
africano, mas logo invadiram a Andaluzia e se tornaram um dos piores perigos
para o domínio do resto da Europa. De onde vieram? Como surgiram?
Em 1039, o faquir Abdállah Ben Yássin (Abd Allah ibn Yasin), da tribo de
Jazula, no Magreb, começou a reislamizar as tribos nômades do Saara. Seus
primeiros adeptos passaram a se chamar “almorávidas” (al-morabetin) porque
estavam ligados com voto especial para fazer guerra santa em “la rábida” (ou
castelo fronteiriço) que o faquir havia fundado numa ilha do rio Níger. Na
realidade, o castelo era uma espécie de “convento”, onde os discípulos do faquir
eram recrutados entre os berberes saarianos para serem ali treinados, com
formação religiosa e militar.
Abdállah levou seus discípulos à guerra santa contra os que não
escutavam sua pregação, islamizando rapidamente a região do Saara. Entre as
70 cabildas irmãs da grande tribo de Sanhaja que pastoreavam seus camelos
através do deserto, a dos Lantunas se distinguiu pelo zelo religioso, assim que
Abdallah a escolheu e selecionou dentro dela os primeiros emires, completando

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a conquista do Saara e indo depois em busca do Sudão. O emir principal guiava
os almorávidas na guerra, porém Abdallah era o verdadeiro soberano, pois era
quem mandava no emir, sobre cujas costelas desnudas descarregava o açoite
da penitência quando tinha que repreendê-lo por alguma falta cometida. Vê-se
bem que há uma dupla dominando a tribo, representando o poder civil e religioso,
mas é o faquir, detentor do poder religioso, quem manda realmente. Em alguns
casos, como ocorre com as tribos de índios americanos, o próprio faquir é quem
governa, absorvendo ele os dois poderes.
Estes primeiros almorávidas eram rigorosamente fiéis aos princípios
islâmicos e moviam atroz perseguição religiosa nas terras por eles conquistadas.
Impunham as leis mais absurdas, como a do matrimônio polígamo, queimavam
as tendas que vendiam vinho, destruíam instrumentos musicais que julgavam
corruptores dos costumes, aboliam todos os impostos que não estavam
previstos no alcorão, permitindo só cobrar os dízimos e as esmolas dos
muçulmanos, os tributos devidos pelos fiéis de outras religiões e o quinto do
botim de guerra, isto é, da guerra santa. É exatamente desta forma que os
muçulmanos agem hoje no Sudão e em alguns países onde imperam estas
confrarias sufistas e fiéis aos princípios maometanos até suas últimas
conseqüências. Nessa sanha destruidora e contrária a qualquer surto de
civilização, destruíram toda e qualquer representação de Alá ou Maomé que por
acaso existisse em forma de estátuas.

Qual a distinção entre árabe e muçulmano?


É comum confundir-se o termo "muçulmano" com "árabe", ou até mesmo
com a palavra "Islã". Na realidade, o Islã é todo o conjunto de povos que praticam
a religião muçulmana, e o termo é usado também como o movimento político de
expansão do maometanismo; muçulmano é todo indivíduo que pratica aquela
religião, seja árabe, turco ou marroquino. Agora, árabe é apenas aquele que
nasceu na península arábica, a famosa Arábia, formada pelos países Arábia
Saudita, Iêmen, Omã, Emirados Árabes, e os principados de Catar, Barein e
Kuwait. Podem ser chamados de árabes todos os povos que falam o idioma
árabe, mas também o termo significa todos aqueles que descendem dos
ismaelitas, povo semita de origem comum com os israelitas. Então, o sujeito
pode ser árabe quanto à raça, quanto à língua e quanto ao país onde nasceu,
mas nem todo muçulmano é árabe quanto à nação nem quanto à língua. A maior
parte das populações muçulmanas, atualmente, não é árabe nem quanto à
língua nem quanto à raça.
Além dos países acima citados, temos de língua árabe os que formam o
Magreb, Argélia, Tunísia e Marrocos, além da Jordânia, Líbano e Síria . Numa
população mundial superior a 700 milhões de seguidores (onde a maioria vive
na Ásia, com mais de 400 milhões, e em segundo lugar na África), a maior
população muçulmana do mundo é a da Indonésia, 85% de seus duzentos
milhões de habitantes, mas nem falam árabe nem são de origem árabe. Em
seguida, temos os muçulmanos oriundos do poder otomano no Egito e na
Turquia, porém nem são árabes quanto ao idioma ou quanto à raça. Na Europa
oriental, no Iraque, no Afeganistão, na Índia e em diversos outros países é a
mesma coisa, em alguns inclusive eles são minoria.
São Tomás de Aquino diz o seguinte sobre o Islamismo:
Maomé seduziu os povos prometendo-lhes deleites carnais. .... Introduziu entre
as poucas coisas verdadeiras que ensinou muitas fábulas e falsíssimas

18
doutrinas. Não aduziu prodígios sobrenaturais, único testemunho adequado da
inspiração divina.
Afirmou que era enviado pelas armas, sinais estes que não faltam a
ladrões e tiranos. Desde o início, não acreditaram nele os homens sábios nas
coisas divinas e experimentados nestas e nas humanas, mas pessoas incultas,
habitantes do deserto, ignorantes de toda doutrina divina. E só mediante a
multidão destes, obrigou os demais, pela violência das armas, a aceitar a sua lei.
Nenhum oráculo divino dos profetas que o precederam dá testemunho dele; ao
contrário, ele desfigura totalmente o Antigo e Novo Testamento, tornando-os um
relato fantasioso, como o pode confirmar quem examina seus escritos.
Por isso, proibiu astutamente a seus sequazes a leitura do Antigo e Novo
Testamento, para que não percebessem a falsidade dele.
(“Summa contra Gentiles”, L. I, c. 6. )

NOTAS:
[1] A vidente Beata Ana Catalina Emmerich conta que, tanto o Patriarca
José como a esposa Asenet eram tidos como deuses pelos egípcios, a ponto de
terem criado duas divindades baseadas na fama deles, que foram Isis e Osiris:
“Tenho visto, por exemplo, que os deuses Isis e Osiris não eram outra coisa que
José (vice-rei do Egito) e Asenet (sua esposa), que os astrólogos do Egito
haviam predito a raiz de visões diabólicas, e que eles haviam colocado entre
seus deuses. Quando chegaram, foram venerados como deuses. Tenho visto
que Asenet se lamentava e chorava por isso, e até escreveu contra o culto que
se lhe tributava”. Quanto a Mitra, pertencia às mitologias persa, indiana e greco-
romana.
[2] Seria esta que deu origem ao termo Al-lah, Allah ou Alá, que passou a
significar “deus” para eles?. Lembremos que toda palavra árabe começada pela
partícula “al” (artigo “o” ou “a”) é sempre anteposta a algum título de honra. Na
Espanha, a partícula “al” mudou para “el”, dando origem a termos como “el-rei”
(o rei) e o famoso El Cid (O Senhor).
[3] No Alcorão são mencionados 99 atributos humanos a Alá, todos eles
iniciados com a partícula “al”., "O Clemente" (Al-Rahmān), "O Querido" (Al-'Azīz),
"O Criador" (Al-Khāliq), entre outros. O conjunto desses atributos recebe em
árabe o nome de al-asmā' al-husnà ("os melhores nomes") – o centésimo atributo
seria o próprio Allah.
[4] O articulista deveria dizer “religiões”, pois eram várias delas que havia
por lá.
[5] Há historiadores que afirmam a queda do uso de incensos por causa
do cristianismo, causando prejuízos aos mercadores árabes, daí suscitando a
Maomé sua guerra para impor sua religião.
[6] O próprio lugarejo chamado Meca não passava de um amontoado de
casas, com pouco mais de 3 mil habitantes, mas situada numa passagem
obrigatória de caravanas de negociantes para o Ocidente
[7] A afirmação não confere com a de outros historiadores que afirmam
que havia lá mais de 300 deuses!.
[8] Será que tal “obscuridade” não é proposital para esconder alguns
aspectos sombrios do islamismo?

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[9] É fato histórico que o islamismo foi “estruturado” com o surgimento do Alcorão
e outras fontes, a partir do século X ou XI, quando surgiram alguns filósofos da
seita.
[10] O autor confunde aqui o termo “pagão” somente usado pelos judeus
e cristãos aos que não são de ambas as religiões. Quer dizer, esconde que o
islamismo é um tipo de paganismo. Eles adoram um deus pagão.
[11] Já aqui as lendas podem ter sido inventadas pelos filósofos que
estruturaram o islamismo a fim de lhes conferir credibilidade, pois não há
qualquer fonte que confirme que Ismael morou em Meca, principalmente porque,
como reconhece o autor, era uma região árida...
[12] A casa de “deus” ou de um deus pagão chamado Alá, Alah ou Al-Lat,
que era venerado antes ao lado de centenas de outros ídolos.
[13] Versão fantasiosa e inverossímil com relação a Abraão, o qual viveu
em regiões distantes, longínquas da Arábia...

"IRMALDADE" MUÇULMANA
É comum os órgãos de comunicação referir-se à religião muçulmana
como uma das grandes religiões monoteístas do mundo, ao lado da cristã e judia.
No entanto, nunca se esclareceu devidamente de onde provém este suposto
monoteísmo. A religião cristã acredita que há um só Deus verdadeiro; o mesmo
ocorre com a judia. No entanto, não é o mesmo caso da muçulmana, pois eles
não acreditam no mesmo Deus, mas num outro por eles chamado de Alá.
Segundo consta na História, Maomé encontrou vários deuses sendo adorados
por aquela gente de seu tempo, eram dezenas deles que se prestavam cultos
em Medina e Meca (cidades de onde surgiu o islamismo). Um deles chamava-
se Alá. O que Maomé fez foi mandar destruir todos os outros ídolos e impor a
adoração a um daqueles falsos deuses. Com o passar dos anos o termo "Alá"
foi confundido com o de Deus, quando na realidade tratava-se do nome de um
deus pagão. Deus (o verdadeiro) não tem nome. Aliás, é fato notório que toda
essa religião se expandiu sempre pela força, por guerras e por imposição de
férreas ditaduras patriarcais e tribais. Muitas vozes saem por aí a dizer que o
islamismo não é tão ruim assim, que aqueles terroristas que praticam atentados
suicidas é uma exceção e que o fundamento da religião é, em si mesmo, bom,
pelo simples fato de acreditar num só deus. Mas a realidade histórica não
registra isso, pelo contrário, mostra que a o ponto capital daquela religião, é a
imposição da mesma pela força, pelo terrorismo. Foram eles que introduziram a
escravidão na Europa, quando o Cristianismo já o tinha extirpado há séculos.
Foram eles que introduziram a prática de sequestros com exigência de resgates
em dinheiro. Foram eles que introduziram a prática (hoje comum) de atentados
suicidas contra os inimigos.
Agora, na rabada de uma revolução denominada de "primavera árabe",
que a mídia carimbou como algo de espontâneo, popular, feita para derrubar
ditaduras e impor uma "democracia" por lá, surge uma organização
muçulmana poderosa contando já com poderes suficientes para governar em
diversos países. Pelo menos, por enquanto, governa no Egito. Talvez essa nova

20
fase do islamismo de estado venha suplantar outros movimentos antes liderados
pelo Irã, mas, na essência, ele nada mais representa do que o velho islamismo.
Eles têm como lema "Alá é o único objetivo. Maomé o único líder. O Corão a
única lei. A guerra santa (Jihad), o único caminho. E, por fim, morrer pela guerra
santa é a única esperança". Que bondade pode haver numa mensagem dessa?
Não pode ser outra a explicação de um fanatismo letal que espalha atentados
suicidas a toda hora, fora as leis desumanas e cruéis que disciplinam alguns dos
países governados pelo Corão.
O Ocidente, com líderes cheios de erros da Revolução Francesa e de
falsos princípios democráticos, fica bafejando essa revolução da irmandade do
mal, tentando inutilmente implantar regimes que dizem ter representatividade
popular, como se entre muçulmanos fosse fácil esse tipo de política.
Sinceramente, não devemos acreditar que tal tipo de regime funcione a contento
naquela gente. Possuindo uma estrutura meio tribal, característica imposta pelo
sistema religioso do islamismo, com recusa formal do progresso e das leis mais
humanas do Ocidente, os povos árabes que abraçaram a religião muçulmana
nunca conseguirão ter um regime politico que satisfaça tais requisitos de
representatividade democrática. Tanto no Egito como no Iraque ou em qualquer
outro país.
Enquanto isso, a "irmaldade" muçulmana continua matando cristãos em
diversos países onde reina o Corão, com o únco objetivo de impor pela força e
pelo terror sua própria religião. E, também ao mesmo tempo, vão continuar os
atentados terroristas no Iraque e alhures, desferidos estes contra as autoridades
que pretendam seguir uma orientação favorável á cultura ocidental.
Até quando? Só Deus o sabe. Talvez até o dia em que a religião verdadeira seja
abraçada por todos aqueles povos e a bondade cristã reine entre eles.

ISLAMISMO, MAIOR RELIGIÃO DO


MUNDO?
Qual a religião que tem mais adeptos no mundo?
Pela informação tendenciosa da BBC de Londres é o islamismo, pois,
segundo a notícia, há mais muçulmanos do que católicos no mundo. Reza assim
a notícia: "O número de muçulmanos superou, pela primeira vez, o de católicos,
fazendo com que o Islamismo seja a religião com maior número de adeptos no
mundo, de acordo com o Vaticano".
Informação tendenciosa e parcial: a quantidade de islamitas deveria ser
comparada com a dos cristãos, considerando todas as dissidências da Igreja
como o protestantismo, a grega, a russa, etc, e não somente com os católicos
que, aliás, antes eram maioria. Segundo o Cardeal Formenti, que deu os dados
para a imprensa, o número de cristãos no mundo é de 33% da população
mundial, isto é, mais de 2 bilhões, enquanto que os muçulmanos não passam de
19%.
Considerando que os muçulmanos estão divididos, na maioria, entre xiitas
e sunitas, os católicos superam em número qualquer uma destas facções. O
Anuário diz que a proporção da população de católicos do mundo é

21
razoavelmente estável, mas a porcentagem de muçulmanos vem aumentando
por causa da alta taxa de natalidade neste grupo, o que é bastante razoável.
No ano de 2004, a Agência Fides apresentou algumas estatísticas de
modo a oferecer um quadro panorâmico da Igreja no mundo até o ano anterior.
Os quadros foram extraídos do último «Anuário Estatístico da Igreja» (atualizado
em 31 de dezembro de 2003) e dizem respeito aos membros da Igreja, às suas
estruturas pastorais, às atividades no campo da saúde, da assistência e da
educação. Em 31 de dezembro de 2003 a população mundial era de
6.301.377.000 pessoas, com um aumento de 79.483.000 em relação ao ano
precedente. Na mesma data, o número de católicos era 1.085.557.000, com um
aumento de 15.242.000 em relação ao ano precedente, assim repartido por
continentes: África +6.231.000; América +6.678.000; Ásia +2.434.000; Oceania
+113.000. A única diminuição, também este ano, se registra na Europa com -
214.000.
No ano seguinte (2005), a Santa Sé divulgou os números do catolicismo
no mundo, que revelam um aumento significativo de batizados entre 1978 e
2004, ao mesmo tempo que diminuía o número de padres. No último quarto de
século, o número de católicos havia aumentado 45%, passando de 757 milhões
para 1,098 bilhão (mais 341 milhões). Uma análise cuidadosa dos números
confirma a crescente importância da África para a Igreja, continente em que o
número de católicos batizados quase triplicou, passando de 54,7 milhões para
149 milhões.
Segundo os últimos dados disponíveis, de 2004 a 2005 os católicos no
mundo passaram de algo mais de 1,098 bilhão a cerca de 1,115 bilhão, um
aumento de 1,5%. Este crescimento relativo ficou muito próximo ao da população
mundial (1,2%), de modo que a presença dos católicos no mundo permanece
essencialmente sem variação (17% naquele ano, mais ou menos o percentual
de hoje).
Não foram divulgadas, na notícia dada BBC, informações sobre o número
de religiosos. Anteriormente, a porcentagem de sacerdotes por continente
revelava pouco crescimento em algumas áreas e decréscimo em outras. O único
continente que experimentou uma diminuição nesta porcentagem foi a Europa:
em 2004, seus 199.978 sacerdotes representavam quase 49,3% do total do
mundo, enquanto que um ano depois haviam diminuído para 48,8%.O número
dos estudantes de Filosofia e Teologia nos seminários diocesanos ou nos
religiosos passou de 113.044, em 2004, a 114.439, em 2005, com o aumento de
1,23%. Em 2005, de cada 100 candidatos ao sacerdócio de todo o mundo, 32
eram americanos, 26 asiáticos, 21 africanos, 20 europeus e 1 da Oceania.
Considerando, pois, os números globais, a maior religião em adeptos
continua sendo o Cristianismo, e, dentre os cristãos, a maioria é
esmagadoramente católica.

CRISTIANISMO, ISLÃ E IDADE MÉDIA

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Ainda perdura na cabeça de muitos certos mitos a respeito da Idade
Média. Outros mitos também referem-se a certa credibilidade da cultura islâmica
e de seus benefícios. A propósito do tema, transcrevo abaixo a tradução do artigo
escrito por Harry W. Croker III, publicado originalmente em "Inside Catholic"
"Que se pode esperar do Islã “reformado”? Há que se reformar o Islã?
Não. A menos que se considere benéfica uma dose extra de puritanismo ou se
queira estimular a destruição de altares, cristais de cores e outras formas de
“idolatria”, ou se queira incentivar a proibição de festividades desenfreadas como
o Natal e a Páscoa e aumentar apoio para as escolas islâmicas fundamentalistas
que se empenham em aferrar-se à doutrina de “só o Corão e a Suna”.
Com efeito, daria a impressão de que o Islã já teve seus reformadores
Luteros islâmicos modernos – como o defunto Ayatollah Khomeini, o troglodita
Osama Bin Laden, porta-voz do novo Islã, os Talibãs (talibã significa literalmente
“estudantes islâmicos”) – que se passam dizendo disparates contra a corrupção
do Ocidente (chamemos-lhe “Roma” para abreviar) o mesmo que a seita puritana
Wahabi da Arábia Saudita que, não cabe a menor dúvida, é moderna já que foi
fundada no século 18, o Século das Luzes.
Que caminho nebuloso lhe conduziria uma Reforma no Islã? Os
calvinistas impuseram severas penas aos que infringiam os códigos de
vestimenta e conduta, porém ditas disposições não superam a rigidez da lei da
sharia na Arábia Saudita. Lutero negava o direito divino do papa e manifestava
publicamente o direito divino dos príncipes (unindo à Igreja e ao estado, que
estavam anteriormente separados), porém esta doutrina já forma parte integral
do Islã, na qual está escrito que a mesquita e o estado devem estar unidos. Os
reformadores protestantes repudiaram a Igreja Católica por simpatizar demais
com os pensadores clássicos e os artistas decadentes (como Rafael); muitos
deles condenaram a doutrina católica do livre arbítrio (crendo, como crêem os
muçulmanos, numa espécie de fatalismo) condenando também aos católicos por
fazer demasiado finca-pé na lógica e na razão tomista e por não dar suficiente
ênfase à interpretação das Sagradas Escrituras.
Ninguém acusa o Islã por cometer esses erros. Mesmo se se tratasse de
restituí-lo a sua forma pura, não corrupta como o encarna o mesmo Profeta
Maomé – um líder polígamo, promotor de guerras santas, que aprovava o
assassinato – seria difícil superar a Bin Laden e seus correligionários reformistas.
Concordo, o Ocidente já não é o que uma vez foi. No lugar de ver a Michelangelo
enquanto pinta a Capela Sixtina, temos Andrés Serrano e seu infame Piss Christ
(um crucifixo imerso em urinas) No lugar do otimismo do Renascimento, temos
o pessimismo moderno (pagão) que acredita ver os deuses da natureza
vingando-se da superpopulação e contaminação causadas pelos seres
humanos. Num lugar de um Ocidente positivo que aproveita sua missão imperial
de propagar a paz, o comércio e a caridade e moralidade cristãs, o Ocidente de
hoje desenvolve uma ambivalência incompreensível, muitas vezes falhando em
reafirmar seus próprios valores. Até existem indivíduos ocidentais – incluindo
alguns convertidos do Islã – que pensam que as duras restrições dos
maometanos contra o aborto, a homossexualidade e o secularismo (para não
falar contra o judaísmo, o cristianismo, o hinduísmo, e outros) lhes outorga uma
certa superioridade moral. Nisso não são diferentes de certos liberais da Holanda
e outros lugares.
Sem embargo, isto segue sendo, espero, a visão de uma minoria. Porém,
digamos em poucas palavras que evidentemente o Islã não necessita de uma

23
Reforma. Se a imprensa, como se diz amiúde, avivou a revolta protestante contra
o cristianismo unido, a Internet tem exacerbado seguramente a revolta islâmica
contra o Ocidente. Tem havido bastante jihadistas que divulgam suas teses na
Internet. Porém, se bem ao islã não lhe faz falta uma Reforma não há dúvida que
se beneficiaria de uma contra-reforma. Vale a pena ter isto em conta. Não seria
maravilhoso se Kabul se convertesse num centro de arte barroca, se as esquinas
das ruas de Teerã estivessem salpicadas de grupos corais que cantassem os
hinos de Palestrina, se o efervescente bairro dos artistas – Islamabad – estivesse
cheio de pintores expondo suas experiências com os estilos de Rubens,
Caravaggio e Poussin?
Ah, sim! Oxalá sucedesse algo assim. Porém, lamentavelmente, poucos
esperam que isto aconteça durante nossas vidas, se é que ocorra. Apesar das
supostas glórias do passado islâmico, diz-se que o combativo Islã encontra-se
atualmente na Idade Média. Porém o Islã não está nem na Idade Média, nem no
Renascimento, nem na Contra-Reforma. Como escreveu Charles Moore, o
biógrafo oficial de Margareth Thatcher (convertido ao catolicismo), “A palavra
medieval não deveria ser sinônimo de “bárbaro”. A Catedral de Ely e o juízo com
jurado e Giotto são medievais”. O mesmo que a Carta Magna, Chaucer e Dante.
Também o são as ordens monásticas, a criação das universidades e o
desenvolvimento da ciência. Também o cavalheirismo, o capitalismo e o conceito
de progresso. Não associamos nenhuma destas coisas com o Islã histórico.
Concordo, a Idade Média representa milênios de história, e os primeiros
tempos da mesma (aproximadamente do ano 500 a 1000 d.C.), algumas vezes
conhecida como a Idade das Trevas, sem dúvida teve seus claro-escuros. As
violentas excursões dos vikings não tiveram uma aceitação que digamos
universal. Um papa que vivesse entre os decadentes tempos do século IX ao
século XI tinha uma possibilidade entre três de ser assassinado durante seu
mandato e os que sobreviviam podiam ser desterrados ou depostos. E além de
uma diversidade de bárbaros, magiares e mongóis, haviam os muçulmanos que
durante este período encetaram uma guerra santa contra meia cristandade, até
que o valoroso Carlos Martel os derrotou na Batalha de Poitiers (e em outras
batalhas posteriores) impedindo-os de arrasarem completamente o Ocidente.
Porém o claro-escuro é tanto luz quanto obscuridade, e houve suficiente
luz nos primórdios da Idade Média. Brilhou com mais intensidade nos mosteiros,
que não somente – e gloriosamente – preservaram o saber clássico senão que
também contribuíram para que o Ocidente levasse a termo importantes
inovações agrícolas, tecnológicas e comerciais. A Igreja implantou escolas,
organizações de beneficência e as razões teológicas para abolir a escravidão (já
que foi proscrita no Ocidente medieval, enquanto crescia no Islã, que na época
estava gozando sua suposta “Idade de Ouro”). Por ser romana, a Igreja também
assumiu muitas funções da administração pública de Roma. Os enganos da
“Idade das Trevas” foram monumentais. Como asssinalou o historiador
Christopher Dawson, “Na realidade essa idade foi testemunho de mudanças tão
transcendentais como qualquer outro da históra da civilização européia; com
efeito – como sugiro em minha obra [The Making of Europe] – foi a idade mais
criativa de todas, já que concebeu não esta ou aquela manifestação da cultura,
senão a mesmíssima cultura – a raiz e o terreno de todos os enganos culturais
[sobre a Europa]”.
Neste caso, como acrescenta Dawson, o hisoriador católico leva
vantagem porque ele pode compreender melhor que esta “foi tanto a idade das

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trevas como a idade do despertar, já que foi testemunho da conversão do
Ocidente, a fundação da civilização cristã e a criação da carte e liturgia cristãs”.
O resultado foi que a Europa alcançou sua plenitude na metade e fins da Idade
Média (do ano 1000 a 1500). Se disseminaram a riqueza e o saber, e onde
estavam as ruínas de Roma o homem medieval criou uma sociedade que foi
muito mais humana, muito mais respeitosa das mulheres, muito mais
humanizadora dos indivíduos, muito mais burguesa, quer dizer, com uma classe
média mais importante e muito mais inventiva que as gloriosas civilizações do
Mundo Clássico.
A Idade Média constituiu uma maravilhosa época de frescura e vigor ainda
antes de alcançar sua plenitude no Renascimento. O Islã, deverá se ter muito
claro, não foi estancado em nenhuma versão anterior do Ocidente e, sem a
menor dúvida, não ficou na Idade Média, a “Era da Fé” católica, durante a qual
monges, sacerdotes, agricultores, mercadores, reis, bispos e cavaleiros criaram
uma civilização dinâmica – a soma da cultura clássica, católica e germânica – ou
seja, Ocidente. Mesmo em seu estado mais humilde, como camponês, o homem
medieval não foi um talibã. Suas crenças eram totalmente diferentes. Acreditava
no sofrimento de Cristo que chegou ao mundo como uma indefesa criatura e
morreu na Cruz, em lugar de crer num profeta conquistador, o qual considerava
uma blasfêmia acreditar que Deus se rebaixaria a essas indignidades.
O homem medieval acreditava na honra de Deus e em divertir-se e pouco
lhe importava as coisas deste mundo, parafraseando o poeta (e sacerdote)
William Dunbar, “el Caucer de Escocia”. Se bem que o homem medieval era
amante dos festins, das celebrações, das cores alegres e dos torneios, também
acreditava no serviço, o trabalho e o comércio eram honrosos; que o intento de
superar-se como pessoa e o progresso eram possíveis e que Deus havia criado
um mundo que cada ser humano podia entender através da razão, para que todo
agricultor comum e corrente – sem ter em conta sua posição de subordinação a
seu senhor feudal – pudesse encontrar caminhos para melhorar suas técnicas
agrícolas, lograr melhoras que o beneficiassem, o mesmo que a seu senhor,
porque cada homem tinha direito de receber a parte que lhe correspondia de seu
trabalho. Ele era, como o somos nós, um homem ocidental, com tudo o que isso
supõe. Como o expressou o popular erudito medieval – o Bispo Morris – ainda
hoje (ou em 1958, quando escrevia): “Um agricultor das terras altas da
Macedônia, um pastor das montanhas do Auvergne, leva uma vida mais
medieval que o homem moderno.
Um pioneiro americano do século passado, que saía com um carro de
bois, um machado, um arado e uma pá para abrir espaço para um sítio no meio
do bosque, estava mais próximo da Idade Média que dos tempos modernos. Se
auto-abastecia, curava-se a si mesmo e a sua família com ervas, cultivava seu
próprio alimento, moía seus próprios grãos, fazia trocas com mercadores
estranhos, divertia-se em ocasionais bailes festejados em celeiros parecidos aos
bailes em ronda medievais”. O pioneiro norte-americano o camponês medieval
eram nós e nós éramos eles e nenhum dos dois é muçulmano. E para alguns de
nós, a idéia de conversar com um homem da Idade Média (ou da fronteira norte-
americana) é uma perspectiva muito mais interessante que a idéia de conversar
com um jovem de vinte e tantos anos que envia mensagens de textos atrelados
a um iPod, cuja vida transcorre no que acertadamente se chama de “biogosfera”.
O mito de uma Idade Média bárbara é parte da ignorância de nossa época.
No princípio, os protestantes propuseram o mito, os laicos o têm fomentado: hoje

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os fatos o desmentem. De modo que saiamos blandindo nossas lanças como os
cavaleiros medievais para acabar com cinco dos principais mitos relacionados
com a Idade Média.

Primeiro mito – O Cristianismo medieval era bárbaro enquanto que o Islã era
refinado
Dado que estamos falando dos muçulmanos, comecemos com o mito de
que na Idade Média o cristianismo era bárbaro, enquanto que o Islã era refinado.
Eis aqui uma prova simples: Alguma vez tem escutado e desfrutado os cantos
gregorianos? Com um pouco de sorte, aí não há ficado a coisa; na realidade
temos escutado a obra de compositores medievais executada em instrumentos
da época.
Tanto a música quanto os instrumentos são evidentemente nossos.
Estende uma ponte natural para o que a maioria das pessoas de maneira
genérica denomina “música clássica”. Nosso sistema de notação musical data
da Idade Média, o qual teve sua origem nos mosteiros, muito especialmente
através da obra do monge beneditino do século onze Guido D’Arezzo. Por outro
lado, Maomé, como seus seguidores talibãs, proibiu a música. Afirmava que Alá
havia lhe ordenado que suprimisse os instrumentos musicais, advertindo-os que
“Alá derramará chumbo derretido nos ouvidos de quem quer que se preste a
escutar uma cantora” – ou, demais está dizê-lo – um trovador medieval.
Graças aos caricaturistas europeus, todos conhecemos bastante bem o
que pensam os muçulmanos sobre pintar uma imagem de Alá ou seu Profeta.
Sem embargo, o mesmo profeta na realidade proibiu a seu povo toda arte visual
que representasse alguma forma da fauna, desde homens até gado, o que de
alguma maneira impede a liberdade artística; liberdade da qual todos no
Ocidente desfrutavam durante a Idade Média, sem mencionar o Renascimento.
Se bem que a arquitetura islâmica é mais atrativa – pelo menos, para meu gosto
– com frequência não se adverte que se inspirou em Bizâncio e em alguns casos
até foi construída por trabalhadores bizantinos. A literatura islâmica – aparte as
Mil e Uma Noites e um punhado de outros poemas ou contos – é pobre em
comparação com a ocidental e a diferença desta é sumamente a obra de
dissidentes e hereges. Aparentemente, os literatos muçulmanos sempre têm
mostrado uma tendência a julgar o papel de Salman Rushdie para os imãs de
plantão.
Quanto à ciência, as matemáticas e a tecnologia, os muçulmanos foram
bastante competentes em preservar e adotar a herança clássica dos cristãos (e
os logros dos persas zoroastras e hindus) aos quais conquistaram. Não foram
tão competentes em superá-la, o que constitui uma razão muito importante pela
qual o Ocidente progrediu e o Islã não. Outro motivo importante é que enquanto
os clérigos ocidentais ensinavam a lei natural e que Deus havia criado um
universo racional e ordenado, os teólogos islâmicos contra-atacavam que nada
– por suposto nem a razão – podia limitar o poder de Alá; estava mais além de
toda restrição semelhante, sendo os líderes muçulmanos contemporâneos dos
ocidentais.
No século doze, os filósofos muçulmanos se declararam de forma
contundente contra os clássicos pagãos. Por outra parte, o homem ocidental
sensato, não estava interessado na religião muçulmana, porém sem dúvida
estava disposto a aceitar e fomentar o saber islâmico, tal como aceitou e
fomentou o saber clássico. A adoção por parte do Ocidente dos números

26
arábicos (e o zero, que os muçulmanos receberam dos hindus) é magnífico
exemplo. Outra é quando o filósofo Arrevois escreveu suas glosas sobre
Aristóteles, estas tinham mais influência no Ocidente que no mundo islâmico. E
os tão vilipendiados cruzados não eram fanáticos: adotaram sem problemas
comidas, aparatos e as práticas comerciais do Oriente.
Não foi o homem medieval cuja civilização enfrentou um milênio de
marcha para obscuridade, foi o muçulmano. Pelo fim da Idade das Trevas, “A
Idade do Ouro” do Islã já quase havia acabado. Como escreveu Norman Cantor,
o célebre erudito especializado na Idade Média, “O mundo islâmico porém não
havia começado sua profunda decadência no ano 1050... mas em linhas gerais,
os dias de máximo esplendor do Islã haviam chegado ao seu fim... No ano 1050,
em cada um dos países da Europa ocidental, havia grupos de pessoas
envolvidas em algum tipo de empresa duvidosa. A Europa já não andava a
reboque de Bizâncio e do Islã em nenhum aspecto e em algum sentido havia
superado os erros mais importantes dos duas civilizações com as quais os povos
que falavam latim agora competiam pela hegemonia do Mediterrâneo”.
O Ocidente sempre foi inventivo mesmo durante a Idade das Trevas. Isso
forma parte de nosso espírito, assim como a supremacia do Corão e somente o
Corão por sobre todas as coisas forma parte do Islã. Já então como na
atualidade, os colégios islâmicos fundamentalistas lhes inculcavam o Corão a
seus alunos para que o aprendessem de memória. Os colégios católicos, então
como agora, ensinavam religião, filosofia, matemáticas (desde contabilidade até
matemáticas superiores) e latim, entre outras matérias. Os protestantes somente
atacavam aos católicos o fato de que não conhecerem as Sagradas Escrituras.
Não se pode fazer a mesma acusação a um muçulmano numa madrassa
[1] que tem que se aprender o Corão de memória e a quem se lhe proíbe
explicitamente interpretá-lo. É verdade que na Idade Média a maioria dos
católicos conheciam as Escrituras pelo que ouviam na igreja ou viam
representado nas janelas de vitrais coloridos, ou então que liam – ou ouviam
recitar – de livros tais como The Heliand, o Evangelho Saxão, em que Cristo, o
Paladino, ingressa no Forte Jerusalém para a última celebração no salão de
festas com seus companheiros de combate. Porém aceitavam o ensino e a
autoridade de sua Igreja e se mantinham ocupados construindo fábricas de
cerveja, preparando bebidas alcoólicas, abrindo estradas, erigindo cidades e
inventando e produzindo em série: o estribo, os arneses para cavalos e o moinho
de água (ou estritamente falando) aperfeiçoando o moinho de água que foi
inventado pelos romanos, que apenas o usaram e começou a ser valorizado
durante a Idade Média. Também criaram uma revolução agrícola com uma
rotação de cultivo para três campos e melhoraram as ferramentas e a tecnologia
agrícola, a especialização em produtos, o transporte terrestre e marítimo e a
dedicação exclusiva ao comércio.
O único avanço que alguém poderia atribuir ao Islã sobre o Ocidente é a
invenção do harém. Não obstante, até o homem mais machista poderia pensar
que o harém não é muito justo com as mulheres. O racionalista poderia
acrescentar que podem dá origem a pressões sociais que são bastante malsãs
(deixando por todas as partes homens indisciplinados e sem compromissos). Os
clérigos poderiam acrescentar razoavelmente que os monges, freiras e
sacerdotes celibatários têm feito um melhor uso de seu sacrifício sexual do que
os eunucos que protegiam os haréns.

27
Um proprietário ocidental de casa de modas suspeitaria que o burka [2]
foi inventado para ocultar alguns dos defeitos (segundo os critérios ocidentais)
das odaliscas. E, por último, os monarcas medievais, como o homem ocidental
moderno, sempre podia evitar o ensino da Igreja, praticando a hipocrisia em série
em lugar de fazer ajuntamento de mulheres em habitações preparadas para
tanto. Esta prática monárquica se tem filtrado na administração de empresas
onde os depósitos abarrotados (haréns) têm dado lugar ao “inventário de justo a
tempo” (monogamia em série), outro tributo à eficiência ocidental.

Segundo mito – As mulheres medievais eram oprimidas


Se bem que estamos tratando do tema do belo sexo, prescindamos da
idéia feminista de que a Idade Média católica foi uma época de opressão contra
as mulheres. Isso, aparentemente, resulta difícil de conciliar com a devoção
medieval à Virgem Maria; a invenção medieval do amor cortês e romântico, a
prática do cavalheirismo e a existência de rainhas e princesas. Em cada caso,
encontramos homens que prometem lealdade, fidelidade, honra e proteção às
damas; mulheres, poder-se-ia apontar, com poder e favores, já seja que
pertencentes à realeza ou mulheres românticas ou divinas.
O Novo Testamento tem muito mais estima pelo sexo feminino que o
Corão. Jesus permanentemente trata as mulheres com respeito. Os cristãos,
desde o início, fizeram o mesmo. O conceito da mulher como “objeto sexual” é
profundamente contrário ao cristianismo de uma forma que se diferencia
ostensivamente do paganismo e do islamismo. O cristianismo não faz alarde de
ter prostitutas de templos ou haréns, nem trata de brancas ou huris [3]. O Novo
Testamento nunca recomenda açoitar as mulheres, nem as compara com um
campo para ara (como o faz o Corão).
Segundo a lei islâmica o divórcio é uma questão de quatro palavras (“Me
divorcio de ti”); as mulheres são propriedades privadas e têm basicamente duas
finalidades (o leitor pode imaginar quais). No Ocidente medieval, tanto a
poligamia como o divórcio eram ilegais. As mulheres podiam governar em tronos
ou pontificar em bibliotecas de conventos de monjas e levar a batuta de um lar
de classe média tal como o tem feito qualquer outra ama de casa ocidental
durante os últimos dois mil anos. As mulheres eram livres de vestir-se como
queriam e podiam ir à taverna – até fabricar cerveja – se quisessem. Tinham
emprego e aprendiam ofícios e profissões.
Se eram camponesas, trabalhavam a terra com seus esposos. Podiam
ser canonizadas ou conduzir os homens à batalha (como Joana D’Arc).
Especialmente se pertenciam a ordens religiosas, destacavam-se na educação
primária, enfermaria e outras “profissões de cunho social” como as chamariam
hoje em dia. Se pertenciam à nobreza, herdavam e dirigiam propriedades e
recebiam todas as obrigações feudais devidas, acompanhavam a seus esposos
em caçadas ou nas Cruzadas, assistiam as escolas cortesãs onde aprendiam
arte, etiquetas e como dirigir um lar (de medicina a enologia, de costura a
contabilidade, de jardinagem a como tratar os empregados. Também eram
mecenas.
Se as mulheres eram excluídas das escolas e universidades clássicas, o
que ocorria era menos por motivos cristãos, falando com propriedade, que por
motivos clássicos – pela interpretação aristotélica de que as mulheres são do
sexo subordinado. O grau de “subordinação” das mulheres poderia observar-se
na impudica – e bem “libertária” - esposa de Bath nos Contos de Canterbury de

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Chaucer [4]. Ela poderia deitar por terra qualquer idéia de que as mulheres
medievais eram oprimidas. A esposa de Bath, depois de tudo, escolhe seus
esposos – cinco no total – guiando-se pelo caudaloso potencial de noivos (jacta-
se de haver deixado os primeiros três sem um centavo antes de morrerem) ou
por seus atributos viris, inclusive um dos carregadores do féretro de seu quarto
marido. Encontra a felicidade com o quinto esposo (seu favorito) no momento de
convencê-lo – a golpes de punho – dos direitos que a ela lhe correspondem. A
disputa começa quando ela, enfadada, arranca uma página do “The Wicked
Wives”, o livro que ele estava lendo em voz alta. Em tudo isto cita as Sagradas
Escrituras, observando que “Direito tenho sobre seu corpo e sua vida e não ele.
Como bem disse o Apóstolo: que o esposo deve dar à esposa o amor que por
direito lhe cabe”. Sua história é bastante mais divertida e escandalosa que o
permitiria o atual Islã “medieval”. Sem embargo, na Idade Média do Ocidente era
um estereótipo comum como o seria hoje mesmo se aparecesse de chofre no
sofá de nossa sala.

Terceiro mito – a cultura medieval era grosseira e ignorante


Chaucer nos coloca cara a cara com a cultura medieval e longe de ser
grosseira e ignorante, a consideramos uma parte inteligente e iluminada de
nossa herança literária. Se os castelos e catedrais, a arte, os ofícios e a música
medieval não são suficientes; se Beowlf [5], a Canção de Rolando, o Cantar de
Mio Cid e a Morte de Artur não lhe dizem nada, se Boesius, Boccacio, Dante,
Petrarca e Maquiavel não significam nada; se você não tem nenhuma
consideração por Santo Anselmo, São Francisco e São Tomás de Aquino, para
escolher simplesmente um punhado de riquezas literárias da época, então não
há muito mais que dizer.

Quarto mito – a politica medieval era despótica


Do mesmo modo, a política medieval não era nem grosseira nem
ignorante, nem totalitária ou despótica. Pelo contrário; a Idade Média – desde o
início – praticava a separação e muitas vezes o conflito entre a Igreja e o Estado.
Foi a Reforma, o desejo do estado em absorver a Igreja, o que integrou à Igreja
o Estado ao precipitar a criação da igreja estatal. A política medieval apoiava
uma ampla dispersão de poder, que é o que propunha o feudalismo e a razão
pela qual os nobres da Inglaterra – encabeçados pelo Arcebispo Católico de
Canterbury, Stephen Langton – puderam pôr limites à Coroa com a Carta Magna.
O homem medieval acreditava na grande hierarquia da sociedade, na qual
tanto o homem como a mulher tenha direitos e obrigações e fosse
individualmente responsável ante Deus. O homem medieval nunca foi ameaçado
pelo totalitarismo. Um estado totalitário nem sequer era possível até que a
Reforma tirou da Igreja o que servia de freio ao poder estatal. De fato, o
feudalismo preservava uma forma extrema de federalismo, onde prosperavam
cidades estados (como as repúblicas dos mercadores da Itália).
Na Idade Média, um mercador não só podia fundar sua própria empresa,
mas até os adolescentes entusiastas podiam empreender sua própria Cruzada
(a Cruzada dos Meninos) e um cruzado fracassado como São Francisco podia
lançar seu próprio movimento religioso. É provável que a Idade Média tenha
estado dilacerada pelas guerras, conquistas, rivalidades políticas, contendas
entre cavaleiros e as guerras contra os hereges albigenses ou os infiéis
muçulmanos. Porém do ponto de vista político, a Idade Média foi, em todo caso,

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uma época em que a dispersão do poder secular estava mais perto da anarquia
que do despotismo e a Igreja estava geralmente do lado do liberalismo político –
se não religioso – com o objetivo de proteger-se da ambição de monarcas e
príncipes.

Quinto mito – a Idade Média foi excepcionalmente violenta


Indubitavelmente, a Idade Média foi muito violenta, porém não tiveram
um Hitler, um Stalin, um Mao. A Idade Média efetivamente teve seus
inquisidores, porém os diversos mitos que rodeiam a inquisição hoje em dia têm
sido praticamente demolidos e quem quer que o deseje pode inteirar-se
estudando os registros históricos sérios e pertinentes. Os tribunais inquisitórios
da Idade Média não infundiam terror às pessoas da Europa ocidental. Seu
alcance era limitado, seus processos judiciais e castigos eram mais benévolos
que os de seus homônimos leigos. O castigo da Inquisição consistia amiúde
numa penitência e em grande parte da Europa a Inquisição nunca existiu. Não
foi uma organização característica ou de fundamental importância durante a
Idade Média. Sua implantação data do século XII quando foi criada para
contrarrestar a heresia albigense.
A Inquisição espanhola – a inquisição de “pior reputação”, atuava sob
cédula real e não papal. A história destes tribunais se estende durante um
período de aproximadamente seiscentos anos, expirando na Espanha de
princípios do século XIX. Nos trezentos e cinquenta anos da Inquisição
espanhola, da qual se tem preservado meticulosamente todos os documentos,
o total de sentenciados à morte é de aproximadamente uns quatro mil. O total de
executados é menor. Quando se trata do inventário de vítimas, os mil anos da
Idade Média nem se aproximam das hecatombes do progressista século XX.
Se as guerras da Idade Média em prol da Fé são consideradas como um
escândalo que desacredita o cristianismo, então que devemos pensar dos
genocídios[6] autorizados pelo estado, os assassinatos em massa e os
extermínios perpetrados pelos nazistas pagãos e comunistas ateus? Estes
últimos conseguiram nos últimos setenta anos – apenas ao longo de uma só vida
– assassinar muitíssima mais pessoas que o inquisidor medieval mais eficiente
houvesse podido matar com as armas à sua disposição nesses tempos. Houve
muitas lutas durante a Idade Média. Houve atrocidades no campo de batalha,
assassinatos em catedrais e massacres em cidades. Porém o homem moderno
não é a pessoa indicada para se por a julgar ao homem medieval como se fosse
moralmente superior.
Na Idade Média, os nazistas seriam denunciados como hereges, se
haveria organizado contra eles uma cruzada papal e hoje estaríamos lendo livros
progressistas descrevendo como a Igreja Católica suprimiu de forma violenta e
injusta – através da Inquisição e uma Cruzada – um movimento “herege” alemão
que somente queria usar calças curtas, sair em excursões pelos bosques, cantar
canções pagãs, libertar o povo da superstição, fomentar o ensino e ciências
laicas e desarticular o poder político e religioso de Roma.
Já temos escutado muitas vezes esse conto, por exemplo com a
idealização dos cátaros. O homem medieval tem sofrido muitas difamações
deste tipo: os propagandistas anticatólicos do século XX o acusaram de inventar
que o globo era plano. E hoje temos o mito de que os terroristas homicidas do
Islã “ficaram na Idade Média” em vez de fazer parte do Islã do século XXI. A
Idade Média foi mais gloriosa e encomiável do que muitos parecem reconhecer.

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O homem medieval merece um efusivo brinde de nossa parte; melhor um homem
medieval que o rap ou as notícias do al-Jazira.
(Referencias H. W. Crocker III publicou recentemente Triumph: The
Power and the Glory of the Catholic Church: A 2,000-Year History. Sua novela
cómica The Old Limey e seu livro Robert E. Lee on Leadership estão disponíveis
em edição rústica. Seu último livro é Don't Tread on Me: A 400-Year History of
America at War, from Indian-Fighting to Terrorist-Hunting.)
[1] Escola de ensino sunita ou todo edifício muçulmano destinado às
ciências.
[2] Véu com que as mulheres islâmicas cobrem o rosto
[3] Huris – No Corão (III, 20), virgem prometida na outra vida aos que
ganharem o Paraíso. O Autor do artigo está aplicando o termo, porém, no sentido
de preto: o termo também significa o campo preto ou branco dos olhos quando
são muito pronunciados..
[4] Geoffrey Chaucer (1340-1400), autor de “Lendas das mulheres
exemplares” no livro “Contos de Caterbury”
[5] Poema épico anglo-saxão do século X.
[6] O termo “genocídio” é um neologismo surgido após os morticínios de
povos inteiros promovidos pelo Comunismo no século XX

O DIÁLOGO DEVE SEMPRE


FAVORECER O ISLAMISMO?

A “Folha On Line” divulga um texto sobre o lançamento do livro "O


diálogo desarmando o choque de civilizações", de Jaime
Spitzcovsky. Segundo o comentário do primeiro parágrafo, há quase empate no
número de católicos e muçulmanos. É preciso esclarecer: o número de cristãos
é quase o dobro de muçulmanos (dois bilhões e pouco de cristãos para pouco
mais de 1 bilhão de muçulmanos). Divididos, os cristãos têm os católicos como
esmagadora maioria. No entanto, a informação não divide as facções
muçulmanas para fazer a comparação: eles têm xiitas, sunitas e outras facções:
qual o percentual que cada grupo desses têm em relação ao total da religião
muçulmana? Aí, então, seria interessante fazer a comparação: quem é maioria,
sunitas, xiitas ou católicos? Na hora de comparar a maioria, eles não colocam
cristãos frente a muçulmanos, mas sim católicos. E aí, dizem melancolicamente,
que “há empate”. Será verdade?
Outra correção: O texto reza assim - "Basta, porém, espelhar-se no
multiculturalismo que floresceu na península Ibérica durante os quase nove
séculos de influência árabe e muçulmana (a partir de 711), entre outros
exemplos, para compreender que tolerância e islamismo são compatíveis".
Não é verdade. Havia uma certa tolerância nos chamados “moçárabes”, tão
sincretistas quanto os umbandistas de nossa querida Bahia e do candomblé
brasileiro. No entanto, no cerne da filosofia islâmica, herdada do próprio Maomé
e seguidores, sempre predominou a intolerância e perseguição a toda e qualquer
religião que lhe fosse contrária. Na região a que o Autor se refere, a península
Ibérica, os muçulmanos não suportavam (e ainda não suportam) que alguém

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fosse católico, havia uma perseguição sistemática aos cristãos. Até hoje essa
intolerância predomina na região onde o islamismo nasceu: na Arábia Saudita,
por exemplo, qualquer pessoa adepta de outra religião pode ser condenado à
morte por motivos religiosos. E a Arábia Saudita, apesar do apoio militar
americano por causa do petróleo, é o país em que mais se persegue o
cristianismo no mundo. Lá moram mais de quatrocentos mil católicos, mas as
autoridades não permitem que tenham, por exemplo, um sacerdote, uma capela,
sequer uma bíblia. Os próprios soldados americanos que servem na Arábia
Saudita, sede do islamismo, se forem pegos com uma bíblia ou algum símbolo
cristão podem ser punidos. Já houve casos de padres serem condenados à
morte por serem encontrados rezando a missa. Isso é tolerância, como diz o
autor?
Outra questão duvidosa está no texto seguinte: “Os muçulmanos crêem
num único Deus (Allah, termo usado também por árabes cristãos), onipotente,
que criou a natureza por meio de um ato de misericórdia. Consciente da
debilidade moral da humanidade, Deus enviou profetas à Terra. Adão foi o
primeiro e recebeu o perdão divino --o islamismo não aceita a doutrina do pecado
original”.
Ora, o que se sabe é que Alá tornou-se ao longo dos tempos o significado
de “Deus” para os muçulmanos, mas no tempo de Maomé não passava de um
dos vários deuses pagãos que eram adorados em Medina e Meca. O esperto
comerciante e aventureiro, Maomé, apenas escolheu um daqueles deuses para
ser o porta-voz de sua religião. Então, não é verdade que os cristãos usam o
mesmo termo, pois Alá é o nome de um deus pagão, e os cristãos não veneram
ou adoram um Deus com nome específico, apenas adoram Deus verdadeiro...
A “Folha de São Paulo”, um dos jornais de maior circulação no Brasil, confessa,
nesse artigo, sua simpatia pelo islamismo. E confessa também, pelo que se
deduz do texto em seu parágrafo final, sua intenção de desfazer a verdadeira
idéia, o verdadeiro sentido que as populações têm do islamismo: uma religião
que gera ódio e não o que dizem seus propagadores. Este negócio de dizer que
há discriminação contra os muçulmanos não passa de uma estratégia de
marketing para amenizar o impacto negativo que a filosofia islâmica causa nas
populações do ocidente. Diz o texto no final:
"Nesse sentido, esta obra se propõe a lançar luz sobre as origens do
islamismo, suas fontes sagradas, profetas e divisões políticas. Os avanços
científicos e culturais que acompanharam sua evolução histórica, os conflitos
atuais, inclusive a questão palestina e a crise no Afeganistão, além da presença
muçulmana no Brasil, explicam-se em capítulos específicos. A intenção é
despertar o interesse do leitor, como um primeiro passo para compreender o Islã
e evitar discriminações, não críticas".
Vejam o texto integral, extraído da “Folha On Line”

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