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a crise actual

e as respostas da
economia solidária
Dezembro 2010
Direcção Editorial
Director Rogério Roque Amaro

Director Adjunto
Artur Filipe Veiga Martins

Conselho de Redacção
Artur Filipe Veiga Martins
Catarina T. Ferreira Pacheco Borges
João da Ponte

Secretária de Redacção
Marisa Silveira

Tradução
Claro – Centro de Traduções
e Competências Interculturais

Conselho Editorial
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Universidade de Cabo Verde

Gualter Manuel Medeiros do Couto


Universidade dos Açores

Jean-Louis Laville
Laboratoire Interdisciplinaire pour la Sociologie Économique

Jordi Estivill Pascual


Universidade de Barcelona

José Fialho Feliciano


Instituto Superior de Ciências de Trabalho e da Empresa

José Manuel Henriques


Instituto Superior de Ciências de Trabalho e da Empresa

Leão Lopes
Atelier Mar – Cabo Verde

Paul Israel Singer


Universidade de São Paulo

Pedro Hespanha
Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra
FICHA TÉCNICA
Rogério Roque Amaro
Instituto Superior de Ciências de Trabalho e da Empresa
Edição Victor Pestoff
ACEESA Mid Sweden University

N.o de registo na ERC Comissão Científica


125724 António David Cattani
Design Gráfico Artur Filipe Veiga Martins
Júlia Garcia Eusebia Nuez Garcia
Criações Periféricas Jean-Louis Laville
Jordi Estivill Pascual
Impressão Luiz Inacio Germany Gaiger
Coingra Maria Rosário Alegra Baptista
ISSN Rogério Roque Amaro

1647-5968
Depósito Legal
293560/09
Tiragem
500 exemplares

Dezembro de 2010
Índice

09 Nota do Director
Rogério Roque Amaro
o
~Bloco temático
13 la economia social y solidaria como
L estrategia de desarrollo en el contexto
d de la integración Latinoamericana
J José luis Coraggio

25 La economia solidaria:
J sustento y esperanza
Jordi Garcia Jané

57 la crisis alimentaria mundial


J Fred Madorf

83 Crise, Economia Social e Solidária


e <Integração Económica> na
Acção Contra a Pobreza
José Manuel Henriques

~Contribuição
115 Trocas por cá — Mercados
Solidários pela voz de um prossumidor
Mario Montez

~Nota de leitura
Jordi Estivill
133 «Maneiras cooperativas
A de pensar e de agir.
Contributo para uma historia
do cooperativismo em Portugal »
Hipólito Santos

145 Notícia

146 Normas Editoriais


Nota do Director Rogério Roque Amaro 9

Nota do Director
Rogério Roque Amaro

A crise económica e financeira, supostamente desencadeada em


2008 no contexto do descalabro do mercado dos valores mobili-
ários e consequentes dificuldades e brechas nos sistemas ban-
cário e financeiro, surge como um «pano de fundo» constrange-
dor e omnipresente para as sociedades actuais, sendo apontado
como o principal, senão mesmo decisivo, factor condicionante
das dificuldades económicas e sociais que nelas se verificam.
Contudo, o seu entendimento e compreensão está longe de
ser consensual, havendo interpretações que a situam num qua-
dro explicativo mais amplo e estrutural e… previsível (ver, por
exemplo, o artigo de José Manuel Henriques neste número).
Nesse sentido, a crise poderá ter origens mais remotas
(provavelmente desde os anos 60, quiçá com uma manifes-
tação já visível no Maio de 1968 em França) e características
mais profundas, sendo a crise económica e financeira dos úl-
timos 2/3 anos, uma das suas expressões mais recentes.
É objectivo (editorial) desta Revista tentar (também) con-
tribuir para a análise e explicação destes processos de crise,
mais recentes ou mais longínquos, bem como para a elucida-
ção do papel da Economia Solidária neles ou face a eles.
Nota do Director Rogério Roque Amaro 10 11

Daí a opção (editorial) por se privilegiar, nestes próxi- Como foi, desde início, intenção (editorial) desta Revis-
mos números, o enfoque nas relações entre a crise e a Eco- ta, publica-se ainda, sobre a forma de artigo, um dos traba-
nomia Solidária, sem prejuízo de mobilizar outras aborda- lhos de mestrado, seleccionados para este efeito, valorizan-
gens actuais e pertinentes. do, deste modo, o esforço de investigação que, nesse quadro,
Foi com esse objectivo que foi designado o Prof. Jordi Es- é desenvolvido por mestrandos(as) ou doutorandos(as), de
tivill, membro da Comissão Científica e do Conselho Edito- várias instituições académicas, onde se promovam e enqua-
rial da Revista de Economia Solidária, para coordenar este drem trabalhos científicos nos domínios cobertos por esta
número, centrado na problemática da crise, embora admi- Revista. Neste caso, trata-se de um trabalho realizado pelo
tindo outras análises. mestrando (Mário Montez) de Desenvolvimento, Diversida-
É, neste quadro, que se juntam, neste número, contri- des Locais e Desafios Mundiais (ISCTE-IUL), sobre os mer-
buições de quatro autores, provenientes de três zonas geo- cados solidários, sendo a responsabilidade da sua selecção
gráficas (América do Sul, América do Norte e Europa), ilus- do responsável deste número (Jordi Estivill) e do director
trando a preocupação de se dar expressão a uma lógica de da Revista (e que assina esta nota editorial).
abordagens diversificadas científica e culturalmente. Além destes cinco artigos, este número inclui uma nota de
No artigo de José Luís Coraggio, procura-se reflectir o leitura, da responsabilidade do seu coordenador (Jordi Estivill),
papel da Economia Social e Solidária nos processos de inte- sobre o livro «Maneiras cooperativas de pensar e agir – contri-
gração da América Latina, no quadro dos caminhos que as buto para uma História do Cooperativismo em Portugal», da
economias alternativas têm aberto nesse subcontinente. autoria do cooperativista português, Hipólito Santos.
A contribuição de Jordi Garcia, por seu turno, analisa os Esperamos, com este número, enriquecer o debate sobre
desafios e as respostas da Economia Solidária face à crise a crise actual e sobre os caminhos que a Economia Solidá-
actual, tendo em conta a sua evolução histórica e as propos- ria vem propondo, esclarecendo que ela não deve ser vista
tas e esperanças que tem aberto. apenas como uma resposta à crise, face às falhas do merca-
No texto de Fred Magdof, liga-se a crise actual a outra do (causadoras da crise) e do Estado (acentuadoras ou não
crise, de uma amplitude temporal e geográfica desde início resolutivas da crise), mas antes como uma reconfiguração
maior, que é a dos alimentos, à escala mundial, tratando-se do «económico» e do papel da Economia e da Ciência Econó-
de uma questão que põe em risco direitos fundamentais de mica («Economics») na viragem para o século XXI, que vale
dignidade e sobrevivência humana. por si própria, e não como compensação das falhas das ou-
Por último, José Manuel Henriques, propõe uma refle- tras duas lógicas económicas.
xão sobre o conceito de «Integração Económica», no contex-
to da crise actual e do papel da Economia Social e Solidá-
ria, tendo como referência a Acção contra a Pobreza, como
um dos objectivos prioritários das sociedades contemporâ-
neas, tendo particularmente em conta as experiências e os
ensinamentos que os projectos da Iniciativa Comunitária
EQUAL possibilitaram.
Bloco temático
Abstract Re sumo

La Economía social y
Trocas por
solidaria como estrategia
cá — Mercados
de desarrollo en el
Solidários pela voz
contexto de la integración
de um prossumidor r
regional latinoamericana 1
Mario Montez
José Luis Coraggio

Social and Solidarity


Economy as a strategy for
developing the regional
integration of Latin America
Admitting the existence of a mixed Aceptando la existencia de una
and hybrid economy (capitalist, economia mixta e hibridada
public and popular), the question (capitalista, publica y popular),
we raise is how to build a transition se plantea como construir una
that has no model and that cannot transición que no tiene modelo ni
be carried out as an engineering puede hacerse como un ejercicio
exercise. Taking the historical de ingenieria civil. Afirmando la
specificity of Latin America into especificidad historica de America
account we present ten possible Latina se presentan diez lineas
1
Reconstrucción de una parte de la ponencia presentada en el 3er Encuentro
Latinoamericano de Economía Solidaria y Comercio Justo organizado por RIPESS guidelines for international posibles en el marco de la actual
en Montevideo, 22-24 octubre 2008. integration. integración internacional.
Bloco temático José Luis Coraggio 14 15

Otro desarrollo, otra economía Sentidos para una posible estrategia


Para encarar el tema que nos han propuesto podemos co- Se planteó en el titulo de este panel el término «estrategia».
menzar aclarando que, si vamos a usar el término «desar- Esto implica ir mas allá de la reacción ante el problema in-
rollo» será en el sentido que le han impreso los pueblos ori- mediato, por vital que este sea, poder ver el sistema que
ginarios: el bien vivir de todos y todas. Desarrollarnos está detrás del caos que genera el capitalismo y sus con-
es ampliar y efectivizar nuestras capacidades como socie- tradicciones, poder pensar sistémicamente también cuando
dades para construir e institucionalizar una economía don- proponemos alternativas. Por ejemplo, advertir que aunque
de quepan todos, una economía de lo suficiente, una eco- logremos que el precio de un dado bien sea justo, es impo-
nomía solidaria que dé respuesta material a los deseos sible lógicamente llegar por agregación a obtener un siste-
legitimados de todos sus ciudadanos miembros. Esto nos ma de precios justos coherentes según las reglas del merca-
diferencia de la búsqueda del bienestar, concepto propio de do. Que la justicia social no se logrará sólo por esta vía, que
la modernidad occidental que terminó definiendo la riqueza hace falta la redistribucion por medio de la producción de
como la masa de mercancías que se generan y distribuyen, bienes públicos, reconocer y promover producciones y dis-
y el bienestar individual como la cuota de esa riqueza de tribuciones fuera del mercado y del dinero. Que es parte de
que se podía obtener. nuestra plataforma no sólo la lucha por el acceso a escue-
Por eso la Otra Economía, sea que la propongamos dis- las y universidades sino por otra escuela y otras universi-
cursivamente o a través de nuestras prácticas, debe ser so- dades, desmercantilizadas y comprometidas con el proyecto
cial, porque no sólo debe producir y distribuir bienes y ser- de una ESS, una reconstrucción que llevará décadas.
vicios materiales sino también generar y posibilitar otras Una estrategia de desarrollo en el sentido antes propues-
relaciones sociales, otras relaciones con la naturaleza, otros to debe proponerse ampliar las opciones de vida de todas y
modos de reproducción, otras opciones de vida en sociedad todos los individuos y comunidades y de las sociedades como
diversas del paradigma del capitalismo posesivo individu- un todo (autodeterminación). Se trata, de hecho, de generar
alista. Como consecuencia, tampoco tenemos como indica- las bases materiales de una libertad efectiva. Esa estrate-
dor de desarrollo el crecimiento económico medido por el gia debe incluir, por supuesto, una redistribución del ingre-
Producto Nacional Neto anual ni presuponemos que cuán- so monetario generado en estas sociedades en que el merca-
to más se produzca mejor (maximización). Porque el famoso do y el dinero se han vuelto tan determinantes, pero esto es
derrame por arte del mercado ha mostrado ser, antes bien, no sólo insuficiente sino que puede ser funcional a la repro-
un proceso de concentración en pocas manos de la riqueza, ducción del mismo sistema que polariza la sociedad, que alie-
como medio para la explotación o simplemente la exclusión na y excluye a las mayorías (como cuando el ingreso popular
de los trabajadores. Y porque el crecimiento industrial ca- fluye a las mismas estructuras monopólicas de comercializa-
pitalista y estatal-socialista ha mostrado que su lógica in- ción minorista, o se deposita en los bancos que concentran el
manente de la ilimitación ha llevado a trasponer umbra- poder económico). Se trata en realidad de transformar la es-
les que generan desequilibrios ecológicos posiblemente ya tructura de la economía misma y no sólo la distribución de
irreversibles. sus resultados. Se trata de transformar el modo de organizar
socialmente el trabajo para la producción, la distribución, las
formas de propiedad, de circulación y de consumo.
Bloco temático José Luis Coraggio 16 17

Esto no puede hacerse como un ejercicio de ingeniería ci- El punto de partida y la transición
vil. No estamos hablando de construir un puente. Esa nue- Partimos de una economía mixta e hibridada. Mixta en tan-
va construcción implica deconstruir el edificio economicis- to puede ser analizada como la combinación de un sector
ta capitalista, exacerbado en su negatividad por los treinta de economía empresarial capitalista, orientado por la
horrorosos años de neoliberalismo. Implica confrontación acumulación ilimitada, un sector de economía pública,
de intereses, de visiones del mundo, implica una lucha con- orientado por una combinación variable de sentidos (como
tra el dominio o, lo que es más difícil, contra la hegemo- podemos advertir comparando hoy los sentidos de las po-
nía manifestada en buena medida en el sentido común le- líticas de los distintos gobiernos nacionales en la región):
gitimador del sistema de mercado capitalista. Esa lucha la acumulación de poder político, la gobernabilidad, el bien
implica que los sujetos populares deberán construir un común; y un sector de economía popular cuyo sentido es
«nosotros» para enfrentar los proyectos de las clases hege- la reproducción ampliada (es decir: en condiciones siempre
mónicas en los espacios democráticos, ensanchados y ra- mejores, orientados por la concepción -siempre en construc-
dicalizados, e incluso tener que confrontar la violencia de ción- del bien vivir) de la vida de individuos, grupos y comu-
quienes se resistan defendiendo sus intereses particulares. nidades. Hibridada en tanto hay diversas relaciones de pro-
La ESS no puede ser un nicho dentro de un sistema capi- ducción -desde las capitalistas hasta la de los productores
talista, como no lo pudo ser el cooperativismo sin volverse autogestionados pasando por las formas de producción es-
indiferente a la misión original como proyecto de emanci- tatal de bienes públicos, mercantiles o no mercantiles-, de
pación de los trabajadores. No alcanza con que emerja un distribución y consumo, más o menos articuladas, dentro de
emprendimiento donde no lo había, su sostenibilidad y po- jerarquías de hecho o institucionalizdas jurídicamente (por
sibilidades de desarrollo no dependen meramente de su efi- ejemplo, una parte enorme del trabajo y de la economía es
ciencia y competitividad, sino de que se cambie su propio ilegalizada, o ignorada, sumergida, para la definición oficial
contexto societal. e incluso popular de qué es «economía»).
Las estrategias tienen sujeto. Considero que el sujeto de La transición hacia Otra Economía, mediante las prác-
la ESS no es ni una clase ni un segmento de la sociedad ticas que llamamos «economía social y solidaria», no pue-
civil, ni siquiera los autodenominados movimientos por la de limitarse a procurar la integración de los excluídos (a esa
ESS. El sujeto de otra economía irá configurándose como la misma economía oficial que los excluyó) a través de la pro-
convergencia flexible de múltiples movimientos de liberaci- ducción y mercadeo de bienes y servicios y el cumplimiento
ón, de resistencia, de reconstrucción orientada por la críti- de las reglas del mercado idealizado (la competitividad como
ca a este sistema que hoy se globaliza en medio de severas prueba de legitimidad). Está claro que nuestros criterios in-
contradicciones, y por los aprendizajes aún dispersos de la cluyen valorar actividades que generan condiciones favora-
diversidad de experiencias populares en marcha. bles para la asociación libre de individuos, unidades domés-
ticas, comunidades, en la reconstrucción de un metabolismo
socio-natural basado en relaciones de reciprocidad entre los
seres humanos y con la naturaleza. Pero aún esto no es su-
ficiente. Es imperioso evitar que el principio de mercado sea
Bloco temático José Luis Coraggio 18 19

el que sobreconforme los otros principios en que se basa la economía y la sociedad (…) incluye al conjunto de activida-
institucionalización inevitable de los sistemas económicos: des y organizaciones de carácter comunitario, asociativo,
el ya mencionado de reciprocidad, basado en el don desin- cooperativo, mutualista y demás formas colectivas crea-
teresado o «interesado» (doy para construir una comunidad/ das para responder a las necesidades de empleo y de bie-
sociedad que me proteja), el de redistribución, de impor- nestar de los pueblos, así como a movimientos ciudadanos
tancia crucial en esta transición a partir de un desequilibrio orientados a democratizar y transformar la economía».
enorme en el acceso a los recursos productivos y sus resul-
Nuestras prácticas tienen así múltiples contenidos y pro-
tados, el de planificación conciente de acciones y previsión
pósitos inmediatos (generar ingresos es sólo uno de ellos).
de efectos sobre individuos, grupos y sociedades enteras, su-
Pero uno fundamental es el de activar las capacidades de
perando el inmediatismo reinante, y el extraordinariamen-
autoorganización y cooperación de los trabajadores para re-
te importante principio de autarquía, de la autosuficiencia
solver sus propias necesidades y, por elevación, las de todos.
y la autodeterminación (soberanía) no sólo alimentaria sino
Esto incluye múltiples formas de inserción en la economía,
de todos los bienes y servicios básicos para la vida.
la producción para el autoconsumo (autarquía), para el co-
Queremos una sociedad con mercado pero no de merca-
mercio (intercambio), para el tejido de lazos sociales frater-
do. Esto implica que el paradigma de la empresa eficien-
nales (reciprocidad), como participantes de sistemas de re-
te y del mercado autoregulado no puede orientar nuestras
distribución justos que dan acceso a recursos productivos y
prácticas socioeconómicas. Ya hemos experimentado que el
medios de vida, y de coordinación consciente – directa o con
funcionamiento de acuerdo al principio de mercado, parti-
autoridad pero no autoritaria – de las iniciativas, cuidando
cularmente con fuerzas globales operando, genera un de-
el orden de la naturaleza. Otro sentido que puede proponer-
sarrollo desigual, excluye, vulnerabiliza la vida humana,
se como común va más allá de las prácticas de reproducción
mercantiliza la política, fragmenta las comunidades loca-
inmediata de personas o grupos particulares: es la desmer-
les y las sociedades y produce desastres ecológicos a escala
cantilización de lo que Polanyi llamaría mercancías «ficti-
planetaria. Nuestro objetivo no puede ser meramente inte-
cias»: el trabajo, la naturaleza, el dinero y el conocimiento.
grar a ese mundo a los ahora excluidos.
Y la lucha contra las múltiples formas de explotación del
trabajo, con especial atención al trabajo infantil y a las for-
Muchas definiciones, un mismo sentido
mas de discriminación adicionales a las de clase.
Hay muchas definiciones de economía alternativa: popu-
Múltiples son las formas de organización que va toman-
lar, del trabajo, social, solidaria, social y solidaria, comu-
do la ESS: emprendimientos familiares, comunitarios, li-
nitaria, para la vida, etc. etc. El documento Lima +10 nos
bremente asociados, cooperativos, asociaciones, redes de
provee un marco suficiente para compartirlo sin entrar en
ayuda mutua, de comercialización o abastecimiento conjun-
preciosismos:
to, de efectivización de derechos (a la tierra – y en algunos
«la economía social y solidaria está basada en valores hu- casos mucho más que eso: al territorio, al agua, a la edu-
manos y principios de solidaridad, que propugnan el re- cación, a la vivienda, al habitat saludable, a la ciudad, a
conocimiento de la otra persona como fundamento de la la energía, a la salud, a la seguridad social y la protección,
acción humana y eje de la renovación de la política, la etc.), las monedas sociales, las redes de comercio justo, las
Bloco temático José Luis Coraggio 20 21

finanzas solidarias, los procesos de recuperación de recur- validación del trabajo que no sean los del mercado, en que
sos de las empresas de capital o del Estado (equipamientos el valor de las cosas está mal representado por su valor mo-
de fábricas, empresas en general, tierras, edificios, vivien- netario o que la valoración de un trabajo está mal represen-
das, etc.) y todo movimiento o acción colectiva que procura tada por la competitividad de su producto en el mercado.
transformar la economía con los valores y sentidos arriba No tenemos un modelo, ni dos ni tres. Ni la cooperativa
definidos (movimientos ecologistas, feministas, étnicos, ju- ni el trabajo asalariado digno. Ni la organización ni la red.
veniles, etc.). Valores de solidaridad y una moral económi- Sabemos que queremos otro mundo, pero no hay modelos,
ca que incluye el consumo responsable y también la produc- menos aún un sistema alternativo llave en mano. Tenemos
ción responsable son impulsados no sólo discursivamente que experimentar, y hacerlo responsablemente con la vida
sino en la práctica misma. humana y la naturaleza. En cambio, el neoliberalismo ha
Se trata de ir construyendo un entramado mesosocioeco- experimentado con nosotros, y ha tenido el desparpajo de
nómico desde las regiones urbanas y rurales, que supere el contar vidas, de calcular y valorar que la libertad de mer-
nivel de emprendimiento singular, generando un conjunto cado valía el precio que había que pagar en vidas humanas,
complementario, y crecientemente orgánico y autogenera- en culturas y biodiversidades desaparecidas.
do de actividades económicas, con grados crecientes de au-
tosuficiencia y reflexibilidad, con sujetos que se van confi-
gurando en los encuentros y convergencias entre múltiples La E SS y los procesos de integración
actores e identidades. Ese proceso necesita como orientaci- Ante la compleja cuestión planteada a este panel, apenas esbozo
ón tanto la crítica activa al sistema existente como la pers- 10 referencias a cómo desde la ESS podemos privilegiar accio-
pectiva de una utopía realista, de la idea fundamentada en nes a realizar en el marco de los procesos de integración inter-
las posibilidades atisbadas desde la multiplicidad de inicia- nacional que existen y los posibles desarrollos de los mismos:
tivas populares, una economía centrada en el trabajo auto-
nomizado de estructuras de dominio, de la hegemonía capi- 1. Contribuir a parar y/o revertir los tratados de comercio
talista, de mecanismos de explotación, una economía cuyo lesivos para el bien común de nuestras sociedades, lo que re-
sentido sea la reproducción en condiciones cada vez mejo- quiere luchar contra los proyectos de subordinación nacio-
res de la vida de todos. Un mundo que, más allá de la con- nal a los poderes económicos centrales y sus instituciones.
trahegemonía, podamos pensar sin hegemonías. 2. Introducir en la agenda de los gobiernos y organismos
Por ahora, la inevitable lucha contrahegemónica impli- de integración regional la ESS como parte de la econo-
ca encarar el hecho de que, mientras estamos proponien- mía que se quiere integrar, potenciando sus criterios de
to el trabajo autoorganizado, en el imaginario popular ur- jerarquización de los principios de institucionalización
bano un trabajo «digno», o incluso un trabajo «genuino», es de la economía.
un trabajo con patrón. Que nos encontramos inmersos en 3. Acompañar las convergencias de los movimientos sociales
una cultura del trabajo, de lo productivo, que es propia de en las luchas por otra integración de nuestras sociedades.
la modernidad occidental y de su definición de riqueza an- 4. Trabajar por la ESS con especial atención a la especific-
tes mencionada. Que – desde la perspectiva de una econo- dad de las fronteras vivas entre nuestros países, en muchos
mía para la vida- debemos pugnar por otros criterios de casos expresión de la economía popular mercantilizada,
subordinada y trasnacionalizada de nuestras sociedades.
Bloco temático José Luis Coraggio 22 23

5. Trabajar por la ESS con especial atención en las zonas sociedad industrial en muchos de nuestros países fue des-
de concentración de poblaciones desplazadas por las mantelado por dictaduras y democracias neoliberales con-
guerras o los cataclismos. dicionadas por los organismos internacionales controlada-
6. Trabajar por el reconocimiento de la integralidad cultu- dos desde el Norte y por la deuda ilegítima y usuraria que
ral y económica de los territorios supranacionales de los se impuso a nuestros pueblos; por lo que la pobreza estruc-
pueblos originarios. tural – rural y urbana – no pudo ser erradicada en la mayo-
7. Plantear la protección nacional de productos de la economía ría de nuestros países y a ella se sumó el empobrecimiento
popular y de la ESS, frente al dumping social del comercio masivo de la mitad de la población, porque grandes mayor-
internacional y el proteccionismo de los estados centrales. ías de nuestros ciudadanos siguieron apelando a formas no
8. Plantear las instancias regionales como fronteras de de- capitalistas de producción para la supervivencia, manifes-
fensa de la penetración por el comercio de los productos tado en la pervivencia de formas campesinas y en el gran
transgénicos, sus tecnologías y los poderes que dominan sector informal urbano. Nuestro desafío es, sin embargo,
esos mercados globales. no limitar nuestras prácticas a los sectores indigentes, sino
9. Exigir de las instancias regionales que demanden una convocar a comunidades locales heterogéneas a participar
ampliación de las políticas migratorias de los países cen- en la pugna por otro desarrollo.
trales y evitar el uso de esas políticas como forma de dis- Porque aquí, habiendo sido por siglos colonia de Europa
criminación intraregional. y patio trasero del Imperio, resurgen con rebeldía y fuerza
10. Difundir y propiciar las prácticas de emisión autoges- extraordinaria los pueblos originarios y sus cosmovisiones,
tionada de monedas sociales y facilitar su reconocimiento que son crecientemente asumidas como propias por organi-
entre emprendimientos de distintos países de la región. zaciones políticas y movimientos sociales.
Porque aquí germinó y se desarrolló la Teología de la Li-
La especificidad histórica beración, que si para algunos fue derrotada por los pode-
de la ESS en América Latina res jerárquicos de la Iglesia, está viva en las prácticas de
Dado que hay compañeros solidarios de sociedades del Nor- la ESS. Porque aquí surgió la Pedagogía de la Liberación,
te, tal vez valga reiterar que este continente, abierto al in- cuyas reglas de construcción de saber y democratización del
tercambuio fraterno, más que en la búsqueda de definicio- poder están encarnadas en casi toda práctica de ESS.
nes y modelos para adoptar, está en un proceso de creación Porque este es un continente revolucionario, que busca
de una pluralidad de formas de economía alternativa, y que su propia definición de socialismo, que incluye tanto el Co-
al hacerlo tiene un piso firme y fértil basado en nuestra operativismo y Mutualismo originarios como el amplio es-
propia historia para avanzar por los caminos objetivamen- pectro que va desde la Revolución Cubana hasta la Revolu-
te necesarios de construcción de otra economia. ción en Libertad del Chile de la Unidad Popular, pasando
Porque aquí, periferia expoliada de Occidente, el Esta- por la particular Revolución Sandinista en Nicaragua, y
do desarrollista (la versión para América Latina del Estado con la viva experiencia actual de la Revolución Bolivariana
de Bienestar de los «gloriosos treinta años» de posguerra) en Venezuela, de la Revolución Ciudadana en Ecuador y del
nunca pudo completar su tarea, y lo que avanzó hacia una profundo proceso revolucionario de Bolivia.
Bloco temático

Abstract Re sumo

La economia solidaria:
sustento y esperanza
Jordi Garcia Jané
Solidarity Economy: A partir de una descripción de
Hope and Support las debilidades y fuerzas de la
By recognising the current economia solidaria en el contexto
weaknesses and strengths of actual, se intenta establecer una
solidarity economy we are trying to estrategia, en la que se avance con
establish a «two-legged» strategy: dos piernas una dentro del sistema
one leg on the capitalist system capitalista y otra que contribuya a
and the other on the creation of a crear una sociedad postcapitalista.
post-capitalist society. To do so, we Para ello, se propone: Mejorar la
suggest improving the management gestión de las empresas solidarias,
of solidarity enterprises, fostering potenciar el surgimiento de todo
all kinds of solidarity economy tipo de iniciativas de la economia
initiatives, becoming a civic solidaria, erigirse en la empresa
enterprise, generalising responsible ciudadana, generalizar las practicas
consumption practices and ethical de consumo responsable y de ahorro
saving, promoting cooperation in etico, promover la inter cooperación
order to create social markets, hasta crear mercados sociales,
supporting the ecological and social abanderar los sectores ecologico y
work sectors and finally achieving de servicios sociales, y conseguir
more active public policies. politicas publicas mas activas.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 26 27

A pesar de que el capitalismo es el modo de producción con la crisis económica de finales de los 70, que provoca el
dominante en todo el planeta, tal día como hoy centenares nacimiento de un cooperativismo básicamente industrial,
de millones de personas trabajan, obtienen créditos o con- a menudo de reconversión, que aportará savia nueva a un
siguen a bajo precio productos de primera necesidad orga- sector cooperativo histórico, envejecido y marginal, que ha-
nizándose al margen del mismo, bajo formas que llamamos bía logrado sobrevivir a la dictadura franquista. La segun-
de economía social o solidaria. da oleada parte de los años 80 en forma de nuevas familias
Podemos definir la economía solidaria como el conjunto dentro del sector – sociedades laborales, asociaciones de in-
de prácticas económicas, es decir, de actos de producción, tervención social, empresas de inserción... – y de cooperati-
comercialización, consumo y crédito que persiguen la satis- vas vinculadas también a la gestión de servicios sociales. La
facción de necesidades en vez del lucro y que se rigen por última oleada – por el momento – parte de mediados de los
los valores de cooperación, solidaridad, democracia, igual- 90 y llega a mediados del 2000, y se caracteriza por la mul-
dad y sostenibilidad. Por lo tanto, estamos hablando de tiplicación de las sociedades laborales y las asociaciones, así
producción entre iguales, de comercio justo (respecto al Sur como por el surgimiento de iniciativas económicas vincula-
y entre el Norte), de consumo responsable, de finanzas éti- das a los movimientos sociales transformadores (movimien-
cas, así como la generación y preservación de bienes comu- to altermundialista, ecologista, okupa...), que dan lugar a
nes (el denominado procomún). grupos de compra y cooperativas de consumo agroecológico,
Muchas de estas prácticas se han formalizado en empresas a tiendas de comercio justo, a instrumentos de banca ética,
cooperativas de todo tipo, sociedades laborales, empresas de a medios de comunicación alternativos, etc.
inserción, fundaciones y asociaciones de intervención social,
mientras que otras adoptan la forma de trabajo autónomo, Fortalezas y debilidades
así como de trabajo voluntario, redes de trueque entre parti- La economía solidaria mejora las condiciones de vida de sus
culares o entre empresas (algunos con moneda social), huer- participantes y sus entornos: proporciona alimentos a bajo
tos comunitarios, microeconomías comunitarias vinculadas a precio o más sanos; crea puestos de trabajo, y además de
grupos neorurales, el movimiento de software libre, etc. calidad; reduce el impacto ambiental de muchas activida-
Si bien el origen moderno de la economía solidaria data des humanas; fija la población al medio rural; combate la
del primer tercio del siglo XIX y se sitúa en países como pobreza y la exclusión social; permite una mejor asisten-
Francia, Inglaterra o Cataluña mediante la creación de las cia sanitaria; contribuye al desarrollo local; ofrece activida-
primeras cooperativas de consumo y de trabajo, podemos des culturales y educativas; facilita viviendas a precios más
considerar que dichas iniciativas han cobrado fuerza por asequibles que el mercado; etc.
todo el mundo a partir de la década de 1980 y han adquiri- Además, la multiplicación de las prácticas de economía
do carta de movimiento social a partir de los foros sociales solidaria contribuye a socializar los valores de democracia,
mundiales de principios de este siglo. igualdad, trabajo emancipado, responsabilidad y solidari-
En el Estado español, la economía social o solidaria con- dad; aumenta la cohesión social creando comunidad, y de-
temporánea aparece como fruto de la amalgama de proyec- muestra que otra economía más justa, democrática y soste-
tos surgidos en tres oleadas diferentes. La primera arranca nible es posible, e inspira modelos económicos alternativos.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 28 29

Algunas de estas prácticas de economía solidaria son es- A estas debilidades de las organizaciones de economía so-
porádicas: la colaboración, productiva pero voluntaria, en lidaria, es preciso sumar otra gran flaqueza, propia de aque-
un proyecto de software libre por la red, por ejemplo; una llas prácticas esporádicas de producción, consumo y crédito
acción de compra responsable, que puede devenir hábito; solidarios de que hablábamos anteriormente, y que son rea-
alguna aportación económica a una entidad de finanzas lizadas tanto por personas individuales, como por empresas,
éticas; la participación estrictamente como consumidor en entidades y, en alguna ocasión, incluso por administraciones.
una cooperativa de consumo, etc. Otras prácticas cristali- Se trata de su carácter efímero. Es decir, hoy en día existe
zan en organizaciones formales de tipo empresarial, lo que un amplio número de personas, físicas o jurídicas, que, en
en principio permite su continuidad. su quehacer cotidiano, realizan algún acto de producción en-
Si nos ceñimos ahora a analizar las organizaciones de la tre iguales, consumo responsable o finanzas éticas, pero es-
economía solidaria observaremos cómo sus fortalezas estruc- tos actos constituyen tan sólo una gota de agua en un océano
turales dimanan precisamente de lo que las caracteriza: pro- de producción, consumo y de ahorro irresponsables por parte
piedad colectiva por parte de quienes trabajan en ellas, orga- de esos mismos sujetos, a veces por la dificultad de cambiar
nización democrática y compromiso social. Las dos primeras los hábitos, en otras ocasiones porque aún no existen alter-
características favorecen la implicación de los trabajadores nativas de economía solidaria para satisfacer la mayoría de
en la empresa, lo que conlleva mayor productividad, calidad necesidades y deseos de esas personas (hoy por hoy, no exis-
y creatividad, y menor absentismo y despilfarro; mientras te ni electricidad verde, ni viviendas baratas, comunitarias
que su vocación de servicio y su compromiso con la colecti- y sostenibles, ni la posibilidad de abrir en una entidad de fi-
vidad puede decantar a los clientes (personas, otras empre- nanzas éticas una cuenta de ahorro con la que operar diaria-
sas, administraciones) a comprar sus bienes y servicios. mente), y en los pocos casos en que sí existe una teórica al-
Por el lado opuesto, casi todas las debilidades de dichas ternativa, realizarla suele implicar pagar un alto coste en
organizaciones provienen, directa o indirectamente, de que dinero o en tiempo para llevarla a cabo.
son empresas que han de existir en medio de una sociedad Más adelante, propondré siete líneas estratégicas que,
capitalista, regida, pues, por valores y mecanismos contra- en mi opinión, podrían contribuir a minimizar estos proble-
rios a la economía solidaria. A nuestro juicio, las flaquezas mas y a desarrollar la economía solidaria.
más relevantes son de seis clases. La primera son los défi-
cits de gestión. La segunda, las conductas no cooperativas Enfoques sobre la economía solidaria
de una parte de sus miembros, como el individualismo. La Antes de hablar sobre estas posibles líneas estratégicas, es
tercera, la estrechez económica: capital propio exiguo, ma- importante contextualizar en qué sentido queremos desa-
yor dificultad para encontrar financiación que las empresas rrollar la economía solidaria, cuál debería ser su función en
capitalistas y, en algunos campos de actividad y sobre todo el mundo de hoy.
entre asociaciones y fundaciones, una excesiva dependen- Grosso modo, existen tres formas de mirar la economía so-
cia financiera de las administraciones públicas. La cuarta, cial o solidaria: el enfoque neoliberal, el socialdemócrata y el
la baja autoestima y la escasa conciencia de constituir una postcapitalista. El enfoque neoliberal considera la economía
alternativa económico-empresarial. La quinta, el escaso co- solidaria una especie de subeconomía paliativa, en donde los
nocimiento que tiene la sociedad del sector. Y la sexta, su
poca integración económica y sociopolítica.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 30 31

inadaptados al mercado recuperan su empleabilidad convir- para nuestra especie debido a la crisis socioecológica. Pero
tiéndose en empresarios de ellos mismos a la espera de que en segundo lugar, el postcapitalismo implica también la con-
la mano invisible, una vez liberada de las rigideces impues- vicción de que resulta factible una economía no capitalista,
tas por el Estado intervencionista, vuelva a proporcionarles que garantice un nivel aceptable de bienestar para todos los
un trabajo asalariado en las empresas capitalistas, las únicas seres humanos presentes y para las generaciones futuras.
eficientes. Ahora bien, cuando la economía solidaria adquiere Desde los años 80, muchos pensadores han desarrollado
más fuerza, entonces los neoliberales claman al cielo y exigen propuestas para una economía no capitalista: Alex Callini-
a los administraciones que recorten las ayudas al sector o que cos (socialismo de planificación democràtica), Heinz Diete-
supriman los apoyos fiscales, tal como pretende actualmente rich (Economía Equivalente), Michael Albert (Parecon), Ta-
la Comisión Europea respecto a las cooperativas. kis Fotopoulos (Democracia Inclusiva), David Schweickart
Desde un punto de vista socialdemócrata, la economía so- (Democracia Económica) y otros más, algunas muy detalla-
lidaria ha de ser un aliado del Estado para corregir las des- das y pragmáticas. Todas ellas propugnan un socialismo,
igualdades que ocasiona el sector privado capitalista, algo bien de mercado, bien libertario, bien ecosocialista, distinto
así como los daños colaterales producidos en su díscola ca- del estatismo, un socialismo que siempre es democrático y
rrera por generar riqueza para la sociedad. A la economía participativo. Dicho modelo tiene visos de funcionar mejor
solidaria se le confía reabsorber parte del desempleo provo- que cualquier capitalismo, sea liberal o keynesiano.
cado por el primer sector y, ante las estrecheces presupues- Para ilustrar un poco mejor de qué socialismo estamos
tarias del Estado, posibilitar el mantenimiento de los servi- hablando, tomemos como base la propuesta presentada por
cios sociales cubriéndolos a un coste inferior al de prestarlos Schweickart,1 y que él bautiza como Democracia Económi-
a través de la administración. ca. Éstas podrían ser las características básicas de un sis-
Existe un tercer enfoque, al que personalmente me ads- tema económico postcapitalista, inspirándonos libremente
cribo, que podríamos denominar postcapitalista, y es éste so- en su propuesta:
bre todo el que se plantea la pregunta con la que empezába-
1. Propiedad pública de las medianas y grandes empresas,
mos este apartado: ¿Puede contribuir la economía solidaria a
y propiedad privada de las pequeñas. Las normas de uso
edificar un sistema económico distinto al capitalismo, que sea
(derechos y deberes o limitaciones) de los distintos regí-
más justo, democrático y sostenible?
menes de propiedad son reguladas democráticamente.
El postcapitalismo es, en primer lugar, un anticapitalis-
2. Gestión democrática de la economía: a nivel macroeconó-
mo. Como tal, no confía en que el capitalismo sea capaz de
mico por sistemas de gobernanza entre los representan-
satisfacer las necesidades básicas de todas las personas y, al
tes políticos y los agentes sociales; a nivel de cada me-
mismo tiempo, preservar las condiciones biofísicas de super-
diana y gran empresa por los trabajadores en régimen
vivencia de la especie humana sobre la Tierra; por eso mis-
de cooperativa de derecho de uso; a nivel de pequeña em-
mo quiere sustituirlo por otro modo de producción más jus-
presa por los trabajadores, si es cooperativa, o por éstos
to, democrático y sostenible antes de que se recrudezca la
junto con el empresario, en régimen de cogestión, si el
guerra por los recursos cada vez más escasos entre clases so-
capital pertenece a éste.
ciales y entre pueblos, en un mundo cada día más inhóspito
Bloco temático Jordi Garcia Jané 32 33

3. Mercado, con las regulaciones correctoras precisas, para La segunda: redistribuir la renta a favor de los traba-
las materias primas y los bienes de consumo. jadores, instituyendo una renta básica universal para todos
4. Control social de las nuevas inversiones: el fondo de in- los ciudadanos, que combinara un ingreso monetario con el
versiones pertenece a la colectividad, se genera por me- acceso gratuito a muchos bienes básicos. En la misma línea,
dio de impuestos y se distribuye, una parte de acuer- debería existir también una renta máxima, que evitara las
do con un plan elaborado democráticamente, y otra me- obscenas diferencias de ingresos entre, por ejemplo, los altos
diante el mercado. directivos y la mayoría de trabajadores de las empresas.
5. Derecho al trabajo garantizado por las Administraciones La tercera: reconvertir en un sentido ecológico la pro-
públicas, si no es en las empresas que operan en el mer- ducción, el trabajo y el consumo. Así pues, hay que migrar
cado, en tareas de interés público (trabajo cívico).2 hacia fuentes de energías limpias, favorecer la relocaliza-
ción de las actividades económicas y detener la expansión
A estas características deberíamos añadirle algunas
material continua, restringiendo severamente esa fábrica
más, propias de una economía sostenible que, siguiendo a
constante de nuevos deseos que es la publicidad.
Riechmann, serían fundamentalmente: estado estacionario
Y la cuarta, naturalmente: desarrollar la economía
en términos biofísicos (final del crecimiento material de la
solidaria o solidaria; de la manera como llevarlo a cabo tra-
economía o, más bien, me permito matizar, decrecimiento
ta este artículo.
de bienes materiales en los países del Norte), energías re-
novables y cierre de ciclos de materiales,3 con lo que podría-
Potencialidades de la economía solidaria
mos hablar de ecosocialismo.
En la búsqueda de alternativas económicas al capitalismo,
Probablemente, un sistema de este tipo no eliminaría
de sujetos interesados en una sociedad postcapitalista y de
del todo la desigualdad social y seguiría conteniendo grados
prácticas que nos acerquen a ella, algunos nos fijamos en
de autoritarismo y de arbitrariedad, pero parece razonable
las iniciativas de la economía solidaria, pues detectamos
creer que funcionaría de un modo sustancialmente mejor
una serie de potencias o capacidades transformadoras que
que el actual.
hacen valioso el sector para el cambio social en la medi-
Algunas líneas estratégicas que, a mi entender, podrían
da que se orienta hacia la satisfacción de necesidades hu-
acercarnos desde la situación actual hasta una economía
manas y no a la maximización de beneficios, y que lo hace
postcapitalista de este tipo serían las cuatro siguientes.
de forma democrática y sostenible. Para resumirlas dire-
La primera: obtener más poder para la sociedad y las
mos que la economía solidaria cumple, tendencialmente y
administraciones públicas sobre la economía; por ejemplo,
en proceso, los papeles de embrión, escuela, creador de su-
instituyendo por ley la presencia de representantes de los
jeto, laboratorio social, escaparate e inspirador de una eco-
trabajadores en los órganos de gobierno de las empresas,
nomía postcapitalista. Analicémoslo con más detalle.
nacionalizando el sistema financiero, aumentando las re-
En primer lugar, muchas prácticas del sector, en concre-
gulaciones medioambientales en las industrias, y planifi-
to las que han cristalizado en organizaciones empresariales,
cando desde el gobierno, y aprobando en el Parlamento, las
podrían constituir el embrión de la futura economía postca-
líneas maestras de la economía: las políticas energética,
pitalista. Los principios, valores y formas de funcionamiento
alimentaria, de servicios sociales, etc.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 34 35

del sector prefiguran cómo podrían ser la mayoría de empre- clases populares. Por el momento, en algunos territorios de
sas de una hipotética sociedad ecosocialista. Y ello por cua- América Latina medio autonomizados de los estados (los te-
tro razones: porque las empresas de la economía solidaria rritorios aymaras, los asentamientos del MST, los Caracoles
funcionan de manera democrática, porque el grado de des- en Chiapas, algunos emprendimientos piqueteros argenti-
igualdad entre sus miembros suele ser inexistente o míni- nos...) se está conformando ya este nuevo sujeto emancipa-
mo, porque son ecológicamente más sostenibles que las capi- dor. Una de las muchas conclusiones del Primer Mapeo Na-
talistas y porque producen bienes y servicios de modo tan o cional de la economía solidaria en Brasil, que entre 2003 y
más eficaz que las empresas capitalistas, tal como demues- 2007 analizó 22.000 experiencias, es precisamente que dicho
tran la mayoría de estudios que las han comparado. sector promueve una nueva identidad para el trabajador.5
En segundo lugar, la economía solidaria ejerce de escue- En cuarto lugar, las empresas del sector funcionan como
la de ciudadanía activa y crea comunidad. Las empresas un laboratorio riquísimo donde ensayar respuestas a los
solidarias son espacios de aprendizaje transformador, don- problemas que la nueva economía deberá resolver: las di-
de las personas aprenden a producir, consumir, invertir y mensiones apropiadas de las empresas democráticas, el pa-
organizarse de forma no capitalista. Con su práctica diaria, pel de los incentivos individuales en los proyectos colecti-
estas iniciativas educan en muchos de los valores que de- vos, la reconversión ecológica de las empresas, etc.
berían animar las personas e instituciones de la futura so- En quinto lugar, la mera existencia de empresas democrá-
ciedad, como son la democracia, la igualdad, la autoorgani- ticas y sociales se convierte en un buen escaparate del tipo de
zación, la responsabilidad y la solidaridad. Lo demuestran, economía que anhelamos: nos abre la mente a imaginar que
por ejemplo, las conclusiones que arroja el estudio reali- es posible otra economía, lo que ayuda a reconstruir la volun-
zado en la ciudad de Plywood (EEUU) por Greenberg, en tad de las mayorías en favor de la transformación social. En
1986, comparando el comportamiento de trabajadores de efecto, si estas empresas de la economía solidaria son tan efi-
cooperativas con el de trabajadores asalariados. El estudio cientes o más que las compañías capitalistas y, encima, son
reveló que los cooperativistas participaban más en la vida más ecológicas y, claramente, más democráticas, no hay ra-
colectiva de la localidad que los segundos. Un estudio pos- zón técnica para no cooperativizar todas las empresas.
terior de 2002 lo confirmó.4 En sexto lugar, la economía solidaria es fuente de inspi-
En tercer lugar, y relacionado con lo anterior, la actividad ración para todos aquellos que investigan cómo reformar el
del sector, al producir valores contrahegemónicos, ayuda a capitalismo para «civilizarlo» o bien cómo substituirlo por
conformar un nuevo sujeto interesado en el cambio social. otro modo de producción mejor. Entre los primeros citemos a
La constitución de la economía solidaria se esta troquelan- Joseph Stiglitz, para quien «la llave del éxito es un sistema
do a partir de la convergencia de varias generaciones, con económico plural, con un sector privado tradicional, un sec-
pertenencias y orígenes sociales variados y culturas mili- tor público eficaz y un sector creciente de economía social y
tantes diversas. La vivencia de nuevas relaciones de traba- cooperativa. Este último es un sector fundamental que favo-
jo, sumada a las demás vivencias liberadoras gestadas en rece el equilibrio económico.»6 Entre los segundos, además
otros espacios (el movimiento social, el barrio en lucha...), de Schweickart, a quien ya nos hemos referido, podríamos
ya están resocializando cientos de miles de personas de las mencionar a Naomi Klein, quien considera que «el sueño
que surge una y otra vez es el ideal de cooperativismo».7
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Desde mi punto de vista, es preciso articular la econo- Lejos de encerrarnos en el falso dilema entre reforma y
mía solidaria con las demás economías críticas, en especial revolución, se trataría, pues, de apostar por un reformismo
con la economía ecológica y la economía feminista, así como fuerte, o por reformas revolucionarias, por decirlo a la ma-
con el cuerpo crítico heredado anterior, sobre todo de proce- nera de André Gorz, es decir, luchar por reformas del sis-
dencia marxista. tema capitalista que faciliten formas de sociabilidad no ca-
pitalistas y otorguen más poder a los grupos subalternos.
Una estrategia de avance con las dos piernas Para ello es preciso cimentar amplias alianzas sociales ca-
Partiendo, pues, de este enfoque postcapitalista me atre- paces de desbordar en cada momento el poder instituido,9
vo a proponer siete líneas estratégicas de actuación que, a con lo que la mayoría de líneas maestras de desarrollo de la
mi entender, ayudarían a desplegar mejor las capacidades economía solidaria que a continuación expondré pueden in-
transformadoras de la economía solidaria y que cabría in- teresar tanto a quienes partan de un enfoque socialdemó-
corporar a cualquier programa más general de desarrollo crata como postcapitalista.
del sector por parte de las organizaciones que lo represen-
tan y lo impulsan en el Estado español. Mejorar la gestión de las empresas solidarias
La propuesta intenta diseñar una estrategia que, par- Las empresas de la economía solidaria adolecen a menudo
tiendo de la difícil situación actual (recorte continuo de de- de poca gestión o de mala gestión, lo que es igualmente nega-
rechos sociales, baja movilización y ausencia de perspecti- tivo. La poca gestión se manifiesta de múltiples formas, des-
vas de cambio social), pero al mismo tiempo aprovechando de la carencia de conocimientos económico-financieros hasta
el descrédito del neoliberalismo debido a la crisis, así como la falta de visión estratégica, pasando por la escasa familia-
la necesidad de las clases populares de defenderse de la rización con el propio mercado, la ausencia de planes de ac-
misma,8 no reste anclada en la sociedad capitalista, sino ción comercial, de mejora de la calidad o de diversificación de
que nos permita migrar progresivamente hacia la sociedad los recursos económicos (básico para las entidades que pres-
postcapitalista que el sector mismo, junto con otros actores, tan servicios personales por cuenta de la administración).
ya está fundando muy embrionariamente en los márgenes La mala gestión proviene, sobre todo, de aplicar formas
del modo de producción capitalista. de gestión calcadas de la empresa capitalista, lo que condu-
Por utilizar otro símil, equivaldría a hacer progresar el sec- ce a dilapidar los puntos fuertes de las empresas solidarias
tor utilizando las dos piernas, cada una andando por uno de (propiedad colectiva, organización democracia y compromi-
los bordes de la línea que separa la economía capitalista de so social) y a plantar la semilla de su crisis posterior. Es
aquello que ya es otra cosa. Es decir, una pierna moviéndose preciso, pues, que sea el sector mismo el que impulse la for-
dentro de la sociedad actual en donde por ahora el sector no mación en gestión de sus miembros y la oriente hacia com-
tiene más remedio que sobrevivir, mientras que activamos la partir criterios y herramientas de gestión congruentes con
otra, hoy adormecida, y avanzamos también por el otro borde, las finalidades, valores y lógicas de funcionamiento de la
contribuyendo a crear sociedad postcapitalista, la única que economía solidaria. La asunción acrítica de determinadas
permitirá al sector devenir hegemónico el día de mañana. Y categorías y metodologías internaliza el paradigma que se
las dos piernas moviéndose de la forma más armónica posible, pretende combatir.
de suerte que eviten hacerse mutuamente la zancadilla.
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En estos momentos observamos cómo una parte de las Ante esta situación, que pone en peligro la viabilidad de
organizaciones de la economía solidaria asimilan la necesi- muchas empresas solidarias como tales y la identidad del
dad de mejorar la gestión con ponerla en manos de una tec- sector, es imprescindible desplegar iniciativas que profun-
nocracia (lo que se conoce como profesionalizar la gestión), dicen la democracia en las mismas, aumentando la partici-
para que ésta tome la mayoría de decisiones. Desafortuna- pación directa de todos los trabajadores en la configuración
da respuesta, a mi entender, ya que esta delegación de fun- permanente del proyecto colectivo (finalidades y objetivos
ciones va laminando progresivamente la participación y la estratégicos), en las decisiones importantes (planes de ges-
democracia, precisamente el principal punto fuerte de este tión, planes de inversión...), en el proceso de innovación y
tipo de organizaciones. Sucede entonces un fenómeno pa- en la destinación de los excedentes, así como concediendo la
recido al de las democracias representativas contemporá- máxima autonomía en el puesto de trabajo, tanto a las per-
neas: la opinión del ciudadano, del trabajador en este caso, sonas como a los equipos de trabajo.
sólo es tenida en cuenta esporádicamente (sea en las elec- De alguna manera el reto consiste en pasar de una demo-
ciones, sea en la asamblea anual) y se retrocede al autori- cracia representativa cada vez más anquilosada, limitada a
tarismo laboral y a las relaciones patrón-empleados, provo- la asistencia a una asamblea general anual para aprobar las
cando en éstos desafección y desmotivación. propuestas de la dirección, a una democracia participativa, en
Los procesos de «degeneración burocrática» de algunas que el poder se dispersa por toda la organización, lo que cons-
empresas de la economía solidaria constituye un fenómeno tituye la mejor forma de movilizar las energías de todos sus
observado y analizado por doquier. Laville y de França Filho miembros y ponerlas al servicio de las finalidades comunes.
se refieren al mismo en las conclusiones del estudio colectivo
sobre la acción pública y la economía solidaria en el mundo, Potenciar el surgimiento de todo tipo
y lo correlacionan con la falta de participación de los trabaja- de iniciativas de economía solidaria
dores en las condiciones y la organización del trabajo.10 Como dijo Charles Gide, uno de los más importantes impul-
Por otra parte, el nacimiento de una capa tecnocrática, sores del cooperativismo francés de finales del siglo XIX y pri-
concentrada sobre todo en las medianas y grandes empre- mer tercio del XX, la continuidad de la idea cooperativa no se
sas de la economía solidaria, arrastra consigo un aumento basa en que las cooperativas concretas vivan para siempre
de la desigualdad retributiva, cuando la equidad constitu- sino en que continuamente nazcan otras nuevas. En efecto,
ye otra de las grandes fortalezas del sector. Es verdad que existe un ciclo de vida de las organizaciones de la economía so-
un cierto nivel de desigualdad interna suele ser asumido lidaria, como de otras muchas organizaciones: la primera eta-
colectivamente en muchas empresas solidarias y justifica- pa es de fundación y consolidación (priman los valores, la so-
do por la diferente aportación al proyecto común y la pre- lidaridad sentida, el entusiasmo colectivo...); la segunda es de
sión del mercado laboral; pero más allá de cierto umbral la crecimiento (se enfatiza la importancia de la eficacia, la soli-
desigualdad quiebra la comunidad moral en que se asienta daridad se institucionaliza, la gestión se burocratiza...), y lue-
la empresa, erosiona la democracia y genera intereses dis- go sucede una etapa de crisis (conflictos internos entre «esen-
tintos entre dirigentes y dirigidos. cialistas» y «pragmáticos»), que desemboca, más tarde o más
temprano, bien en una refundación, bien en una transforma-
ción societaria, bien en la disolución de la organización.11
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Más que el número de empresas de la economía solida- del cooperativismo nos muestra como los periodos de máxi-
ria, o la gran dimensión de algunas de ellas (en facturación, ma creación de nuevas cooperativas han coincidido con los
beneficios, inversiones o trabajadores), lo que cuenta es su momentos de efervescencia de algún movimiento social, que
calidad así como su diversidad y los vínculos que se estable- las ha incubado o alentado: el movimiento obrero en el caso
cen entre ellas. Es esto lo que convertirá al sector en más de muchas cooperativas de consumo, el movimiento cam-
resistente a las amenazas, tal como sucede con los ecosiste- pesino para muchas cooperativas de crédito, los movimien-
mas naturales, y le dotará de mayor capacidad para experi- tos de liberación nacional, tanto en países periféricos (In-
mentar y para transformar la economía. dia, Mozambique) como centrales (Quebec, País Vasco), etc.
Mientras que aparecen muchas iniciativas de economía Se trata de la transformación de la energía emancipadora
solidaria en América Latina, Asia o algunos estados euro- de la que habla Hirschman, que comienza bajo la forma de
peos, en otras partes del mundo, como por ejemplo el Estado movimientos sociales y se convierte en iniciativas económi-
español se vive una cierta ralentización en su ritmo de na- cas solidarias y viceversa.
cimiento, sobre todo de uno de sus tipos principales, las coo- Así pues, la economía solidaria es parte de la sociedad civil
perativas. En parte, ello obedece, tal como suele explicarse, y necesita al resto de sus componentes para aflorar. En la me-
a la reducción de las ventajas legales por ser cooperativa en dida que nuestras sociedades sean cada vez más individua-
comparación con otras fórmulas empresariales; pero a mi listas, que las personas vivan más desvinculadas del entorno
entender se debe también a un par de razones más. local, que se creen menos entidades culturales, recreativas,
La primera es que, en aquellas épocas en que resulta fácil sociales y políticas, que las personas cultiven poco sus capaci-
encontrar empleo en las administraciones públicas o en las dades cooperativas y organizativas, se reducirán también los
grandes corporaciones, como desde mediados de los 90 hasta proyectos de emprendeduría colectiva y, por tanto, se crearán
la crisis de 2008, las nuevas generaciones, con pocas capaci- menos empresas de economía solidaria. Algo de esto parece
dades de emprendeduría colectiva y acuciadas por la necesi- ocurrir en nuestras sociedades más «desarrolladas». Varios
dad de emanciparse y acceder a una vivienda a precios pro- estudios indican que en Europa y Estados Unidos la parti-
hibitivos, se inclinan por estos empleos que perciben como cipación en las actividades comunitarias ha disminuido de
más seguros, en vez de arriesgarse a fundar una empresa. forma considerable en estos últimos 50 años, como también la
En este sentido, la reciente crisis económica puede bloquear confianza para con los demás y el sentido de comunidad. Por
aquella salida y servir de acicate para que surja una cuarta ejemplo, a mediados de siglo XX, más de la mitad de los es-
oleada de empresas solidarias en el Estado español. tadounidenses creían que las personas «tenían principios y
La segunda razón, más de fondo, es que las empresas eran honestas»; hacia el año 2000 la proporción se había re-
de la economía solidaria son, antes que nada, comunidades ducido un poco por encima de la cuarta parte.
humanas emprendedoras; surgen porque un grupo de per- Para invertir dicha situación, es preciso promover la em-
sonas que se conocen y confían entre sí, se sienten con vo- prendeduría colectiva, tanto desde las instituciones repre-
luntad y capacidad para alcanzar una finalidad compartida sentativas del sector como desde las administraciones pú-
poniendo para ello en común esfuerzo personal y recursos blicas. No olvidemos que, a las competencias básicas de
económicos, y asumiendo riesgos. Un repaso a la historia cualquier persona emprendedora (tenacidad, capacidad de
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asumir riesgos, de análisis, de identificar las tendencias y transforman el entorno que les rodea, según la definición de
oportunidades del mercado, de liderazgo...), hay que añadir Bornstein,14 también denominados empresarios sociales, o
en el sector que nos ocupa otras específicas del emprende- sea, personas que combinan «algo que, según la lógica en vi-
dor social o colectivo, tales como la capacidad de compartir gor de las sociedades funcionalmente diferenciadas, parece
el liderazgo, de trabajar en equipo, la exigencia ética, la vo- excluirse: la pericia y el arte del empresario, en el sentido
luntad de sentirse parte y partícipe de un colectivo de igua- pleno de la palabra, se emplean para fines sociales y de uti-
les, etc. Estas capacidades, hoy por hoy, se aprenden tan lidad común», según Beck,15 porque profundizarían el com-
sólo participando en proyectos colectivos del tipo que sean; promiso social de la economía solidaria.
si éstos no abundan, tampoco abundarán los proyectos de Sin duda, la incorporación de estos tres grupos renovaría
empresa solidaria. el sector y multiplicaría tanto su capacidad interna como su
El fomento de la emprendería colectiva entronca con proyección externa.
otra línea a desarrollar: procurar que aumente el núme-
ro de personas que fundan o se integran en una empre- Erigirse en la empresa ciudadana por excelencia
sa solidaria no sólo debido a la necesidad de sustento, sino La economía solidaria es poco conocida y aún menos recono-
también por preferencia ideológica, aun cuando se muestre cida. Contrariamente, hay que lograr que la sociedad per-
poco elaborada: para no depender de un patrón ni querer ciba que la economía solidaria es un tipo mejor de empre-
ejercer de él, para sentirse útil a la sociedad, para montar sa para consumir, para trabajar y para financiar. Para ello
una empresa con la gente con que se siente uno bien, para cabe seguir varios caminos complementarios. En primer lu-
trabajar en algo coherente con los propios principios, por- gar, el sector debe abanderar las prácticas de responsabili-
que apetece trabajar no sólo por dinero… dad social tanto externa (sostenibilidad ecológica, apoyo a
Estas motivaciones son las propias de un segmento social iniciativas sociales) como interna (buenas condiciones la-
minoritario pero importante. Lo integran activistas, creati- borales para socios y trabajadores) e implantar instrumen-
vos culturales y emprendedores sociales, tres grupos a los tos para verificarlas. Frente a la estrategia neoliberal de
que sería estratégico atraer hacia la economía solidaria. convertir la responsabilidad social empresarial o corporati-
A los activistas, para estrechar los lazos con los movimien- va en un nuevo caballo de Troya para desmantelar el Esta-
tos transformadores y aprovechar su cultura organizativa do social, la economía solidaria, pionera de la responsabi-
a fin de mejorar la gestión de las empresas del sector.12 A los lidad social mucho antes de que se inventara incluso dicha
denominados creativos culturales, profesionales cualifica- expresión, debe conectarla con las exigencias éticas de de-
dos (científicos, educadores, abogados, periodistas, etc.) que mocratizar y socializar la economía y abogar por que sus
buscan un trabajo creativo, más interesados en disfrutar de instrumentos de verificación, como el balance social y las
su trabajo que en el estatus o el dinero, por su capacidad de etiquetas ecosociales, acaben siendo obligatorios por ley y
influencia social.13 Finalmente, a los llamados emprende- regulados por las administraciones públicas.16 Aclaremos
dores sociales, o sea, personas con nuevas ideas sobre cómo que por balance social entendemos los informes que valo-
mejorar las condiciones de vida, la ecología, la educación, ran las aportaciones laborales, sociales y ecológicas de la
la salud o la cultura, que, con iniciativa y perseverancia, empresa a los demás actores sociales,17 mientras que las
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etiquetas ecosociales son los distintivos que algunas em- Generalizar las prácticas de
presas incorporan a sus productos certificando que han sido consumo responsable y de ahorro ético
fabricados respetando unos determinados estándares ecoló- La extensión de las prácticas de consumo responsable y de
gicos y sociales. Pues bien, la economía solidaria tiene que ahorro ético entre la sociedad haría crecer el sector de la
emplear dichos instrumentos para visibilizar socialmente producción responsable. Sólo con que los miles y miles de
su compromiso social y mejorar internamente. personas que trabajan en empresas solidarias trataran en
Asimismo, es necesario fortalecer la vertiente sociopolí- su vida cotidiana de comprar, en tanto en cuanto les fuera
tica y cultural del sector. Existen muchas empresas de eco- posible, bienes y servicios producidos por empresas como
nomía solidaria pero poco movimiento de economía solida- la propia, pertenecientes a la economía solidaria, y deposi-
ria. Complementar la vertiente empresarial de la economía tar los ahorros en entidades de finanzas éticas, la inciden-
solidaria con la vertiente sociopolítica y cultural constituye cia del sector se multiplicaría. Para hacernos una idea, to-
otro objetivo clave, si ésta quiere convertirse hoy en referen- memos tan sólo la cifra de cooperativistas. Se estima que
te y mañana en alternativa. Hace falta tejer vínculos estra- en mundo existen 800 millones de personas que pertenecen
tégicos con los movimientos sociales transformadores, rea- a alguna cooperativa, lo que representa nada menos que
lizando proyectos comunes, atrayendo a los activistas como el 12% de la población mundial. ¿No cambiaría significati-
consumidores, participando en actividades sociales, canali- vamente el mundo si estas personas se comportaran como
zando hacia estos movimientos el compromiso social de las cooperativistas las 24 horas del día: trabajaran en coope-
empresas solidarias, etc. El contacto permanente de las em- rativas u otras empresas de economía solidaria, consumie-
presas del sector con colectivos sociales (compartiendo espa- ran de modo responsable comprando a empresas del mismo
cios o actividades) ayudaría a contrarrestar su deriva gra- sector siempre que pudieran, y ahorraran e invirtieran me-
dual hacia posiciones economicistas y de egoísmo de grupo. diante entidades de finanzas éticas?
Desarrollar la vertiente cultural del sector es, así mismo,
una de las vías para producir un imaginario propio, el sen- Promover la intercooperación
tido común del sector, junto con una cultura de gestión más hasta crear mercados sociales
arraigada en las finalidades, valores y principios propios.18 Como apunta Boaventura de S. Santos, «el éxito de las al-
Para ello deben multiplicarse las conferencias, los talleres, ternativas de producción depende de su inserción en redes
las jornadas, las exposiciones, las ferias, la presencia en los de colaboración y de apoyo mutuo».19 Efectivamente, las ini-
medios de comunicación, etc. La apertura de centros socia- ciativas de la economía solidaria necesitan cooperar entre sí
les de la economía solidaria en las grandes ciudades permi- para consolidarse y desarrollarse en medio de unos merca-
tiría realizar muchas de estas actividades, además de con- dos cada vez mayores y más desregulados. Antes que nada,
tribuir a visualizar y cohesionar al sector. intercooperar significa algo tan básico como comprarse mu-
tuamente, una actividad comercial no siempre practica-
da por las empresas que conforman el sector; dicho de otro
modo, se trata de procurar escoger como proveedora, tanto
como sea posible, a una empresa de la economía solidaria.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 46 47

Estabilizar esta intercooperación creando conjuntos econó- económicos complementarios, irán tramando un denso en-
micos interrelacionados en red, para ir transitando de lo ce- jambre de relaciones económicas, hasta alcanzar lo que ya
lular a la red, de la red a lo meso y de lo meso a lo global. podremos denominar mercados sociales.
Otro peldaño de la intercooperación consiste en crear Por mercado social entiendo una red de redes cuyos nodos
nuevos proyectos socioeconómicos compartiendo exceden- serían las empresas solidarias y los consumidores y ahorra-
tes y recursos mediante cooperativas de segundo grado y dores responsables (personas, entidades, empresas e insti-
grupos cooperativos. Existen multitud de iniciativas de in- tuciones) y cuyos flujos serían los intercambios regulares de
tercooperación de este tipo; muchas, además, orientadas bienes y servicios en un territorio determinado, producidos
precisamente a cubrir los puntos débiles del sector, tales con criterios democráticos, equitativos, ecológicos y solida-
como los problemas de financiación o de formación. rios, que permitieran cubrir una parte significativa de las
Pero, además de las relaciones de cooperación entre va- necesidades de los nodos, desconectándose parcialmente de
rias entidades de economía solidaria, la multiplicación de la economía capitalista.
las relaciones de intercooperación puede alcanzar una den- El empleo de una moneda social propia, que recupere la
sidad tan importante que la mayor parte de los actos econó- capacidad de la sociedad de dotarse de un circulante que
micos del sector termine efectuándose dentro del mismo. una trabajo y necesidad, podría ayudar al proceso en la
En efecto, en estos momentos la economía solidaria ya se medida que facilitaría el flujo de crédito hacia estas expe-
halla presente en todas las fases del ciclo económico. En la pro- riencias y solidificaría las relaciones económicas entre los
ducción, mediante cooperativas agrarias, del mar, de trabajo actores de la economía solidaria. Constituyen ejemplos ins-
asociado, sociedades laborales, entidades de acción social, re- piradores la aplicación del sistema LETS (Local Exchange
des de intercambio, etc. En la comercialización o distribución and Trade Systems) en la ciudad de Ithaca, en el estado de
mediante cooperativas de consumo y grupos de compra colec- Nueva York; el sistema de Intecambio de Bienes y Servicios
tiva, cooperativas de servicios, tiendas de comercio justo, tien- (IBS) utilizado entre 500 empresas de la ciudad mejicana de
das de segunda mano, mercados locales, ferias de intercambio, Guadalajara o un sistema parecido de moneda social prac-
etc. En el consumo, mediante la práctica del consumo respon- ticado en Toronto (Canadá), que tiene la interesante parti-
sable por parte de los agentes económicos (personas, adminis- cularidad de que los fondos convencionales de algunas enti-
traciones y empresas), que rescaten la figura del ciudadano dades de crédito populares convalidan la moneda social, la
por encima de la del comprador, manifestación suprema de la cual, en caso de no encontrar mercado local, puede descon-
expresión monetaria del individualismo. Por último, en el cré- tarse de dichos fondos, aunque con una penalización.
dito, a través de las finanzas éticas y solidarias: cooperativas La construcción de mercados sociales constituye un obje-
de crédito, secciones de crédito de las cooperativas agrarias, tivo que ya no es de nivel celular o micro (la cooperativa, el
cooperativas de servicios financieros, bonos solidarios, etc. consumidor responsable...), sino meso, dotado, por tanto, de
A medida que estas prácticas de intercooperación, tanto una escala y de una cierta complejidad. Crear mercados so-
desde las empresas solidarias como desde sus miembros, se ciales en el seno de la sociedad capitalista podría represen-
multipliquen, integren circuitos de producción-comerciali- tar para el postcapitalismo lo que supusieron las repúbli-
zación-consumo-crédito y se colmen los vacíos productivos cas urbanas italianas, hanseáticas o flamencas durante la
siguiendo una estrategia concertada de fomentar circuitos Edad Media para el nacimiento del capitalismo.20
Bloco temático Jordi Garcia Jané 48 49

Abanderar los sectores Por consiguiente, ante la crisis ecológica en ciernes, la


ecológico y de servicios sociales economía solidaria debe acentuar esta preocupación por re-
Dos son los grandes campos de actividad que la economía cuperar la sostenibilidad. El campo que se le abre para ello
social y solidaria debe aprovechar en el futuro inmediato: es muy amplio: crear empresas que tengan la ecología como
el ecológico y el de los servicios sociales. En los años venide- campo de actividad, orientar o reorientar la producción ha-
ros será preciso dedicar muchos recursos y esfuerzos para cia bienes socialmente útiles, modificar sus procesos de pro-
transitar de la economía capitalista a una economía soste- ducción hasta hacerlos limpios así como promover la cultu-
nible, capaz de satisfacer tanto las necesidades humanas ra de sostenibilidad entre sus miembros y sus entornos.
como las del planeta del que dependemos. Por lo que respecta a producir bienes y servicios para sa-
La economía solidaria debe volcarse en este campo, en tisfacer necesidades básicas en vez de contribuir a la econo-
primer lugar en tanto que empresa ética, pero también mía de las cosas inútiles, se trata de abandonar la crematís-
porque avanzándose a los cambios que será imprescindi- tica para volver a la finalidad originaria de la economía (del
ble adoptar, estará mejor posicionada para competir con las griego oikos, casa, y gnomos, conocimiento, cuidado: «cuida-
empresas capitalistas. do de la casa»), que es satisfacer las necesidades humanas
Se trata de potenciar unas características que, ya de por fundamentales (alimentación, vivienda, salud...) para con-
sí, son propias de las empresas de la economía solidaria. En tribuir al bienestar de los seres humanos.
efecto, éstas contaminan menos el entorno local puesto que Progresar en los procesos de producción limpia consiste
viven en él (los propietarios-trabajadores de las empresas en disminuir las emisiones tóxicas, la contaminación por re-
solidarias residen en la comarca); no son intrínsecamen- siduos y el consumo de recursos y de energía. Con todo, sería
te expansivas (pues no existen incentivos al crecimiento: a erróneo ceñir la reconversión ecológica a los procesos pro-
mayor crecimiento, mayor número de propietarios-trabaja- ductivos de las empresas agrarias o industriales; las buenas
dores entre quienes repartir el beneficio resultante), y su prácticas ambientales deben aplicarse también a los servi-
gestión democrática facilita la aparición de otras racionali- cios: reducción de material de oficina, reciclaje de residuos,
dades distintas a la de buscar el máximo beneficio o salario, disminución del consumo de agua y energía, política de pro-
o recuperar la inversión en el menor tiempo posible, como veedores que tome en cuenta criterios ecosociales, etc.
pueden ser la reducción de la jornada laboral o la coheren- Por último, las empresas solidarias tienen que contri-
cia con los principios éticos de preservación de la naturale- buir al cambio cultural necesario para evitar el desastre
za y de autocontención de necesidades y deseos. ecológico. La empresa es uno de los principales grupos hu-
Asimismo, la trayectoria de la economía solidaria demues- manos a los que pertenecen la mayoría de personas. Dado
tra con múltiples ejemplos esta preocupación por la sostenibili- que los cambios individuales son más fáciles de realizar si
dad. Las cooperativas de consumo son pioneras en la introduc- son compartidos con otras personas, las empresas pueden
ción de productos ecológicos y de comercio justo, así como en la y deben ser lugares para promover proyectos colectivos de
educación ambiental. Muchas iniciativas empresariales en el cambios hacia la sostenibilidad personal.
campo de la ecología, a menudo procedentes del movimiento
ecologista, han adoptado formas cooperativas o similares.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 50 51

Un segundo campo de actividad igualmente estratégi- Conseguir políticas públicas más activas
co para la economía solidaria en particular y para la socie- Ningún sector económico puede funcionar correctamente
dad en general es el de los servicios sociales. A diferencia sin disponer de un marco institucional adecuado. Esta es
de otros países como Italia o Quebec, en donde la economía una de las principales razones por las que la economía soli-
solidaria constituye el principal actor en el campo de los daria siempre será un sector minoritario dentro del sistema
servicios sociales, en el Estado español la tendencia pare- capitalista. Sin embargo, ello no obsta para que el sector
ce que es cederlos a grandes empresas capitalistas de servi- deba exigir a las administraciones el mejor trato posible.
cios, muchas vinculadas a entidades financieras y construc- Así lo ha entendido siempre la economía social o solidaria,
toras. El futuro del sector se juega durante los próximos que ha reclamado tanto medidas públicas de promoción y
diez años en que deberá desplegarse la Ley de Dependen- fomento, como participar en el diseño de las políticas públi-
cia, lo que, según parece, implicará generar unos 500.000 cas que, directa o indirectamente, le afectan, evitando así
empleos. La especificidad de este tipo de actividades, como ser objetos y no sujetos de dichas políticas.
de todos los servicios de proximidad en general, viene defi- Con tal de fomentar las cooperativas y, en general, la
nida por «la imposibilidad de una estandarización sobre un economía solidaria, desde principios de la década de 1980
modelo industrial, la necesidad de ajustes interpersonales se han ido implantando muy diversas medidas legislativas,
para integrar su dimensión relacional y afectiva, la consi- administrativas y fiscales para estimular el nacimiento de
guiente exigencia de competencias y cualificaciones socia- nuevas empresas y fortalecer las existentes: exenciones o
les que generen confianza por parte de los usuarios»,21 lo bonificaciones fiscales, capitalización del seguro de desem-
que unido a ser un campo de actividad muy intensivo en pleo para asociarse a una cooperativa de trabajo o sociedad
trabajo y poco intensivo en capital, le convierte en un mer- laboral, ayudas económicas a la formación, a la innovación
cado natural para la economía solidaria. tecnológica, a la capitalización, a la internacionalización, a
La economía solidaria debe aliarse con otros actores so- la incorporación de socios y trabajadores, ejercer de avalis-
ciales a fin de presionar a la administración y evitar que el ta en operaciones de tesorería para afrontar la crisis actual
sector termine en manos de grandes empresas de capital, y las restricciones crediticias, etc.
cuya principal finalidad es obtener el máximo beneficio eco- Dentro del sector existe unanimidad en que tales ayudas
nómico. Para hacerles frente, el sector tiene que aumentar son necesarias pero insuficientes: el importe por trabajador
su capacidad operativa, intercooperando o fusionándose. suele ser inferior al que reciben las grandes empresas ca-
pitalistas por instalarse o permanecer en un territorio de-
terminado (aunque luego se deslocalicen cuando les plaz-
ca). También se pide que se simplifiquen los procesos de
constitución de nuevas cooperativas, que aumenten el vo-
lumen y las facilidades para acceder a préstamos blandos
institucionales orientados a iniciar proyectos de economía
solidaria intensivos en capital, que se estimule a las enti-
dades financieras a reducir las garantías exigidas y que las
Bloco temático Jordi Garcia Jané 52 53

entidades representativas del sector sean convocadas siste- De hecho, la mayoría de políticas públicas influyen por
máticamente al diálogo social, que actualmente sólo tiene activa o por pasiva en el sector, favoreciéndolo o marginán-
lugar entre la Administración, la patronal y los dos sindica- dolo: desde la comunicación hasta la política laboral, desde
tos mayoritarios. la investigación hasta el urbanismo pasando por la política
El sector educativo y el de los medios de comunicación de compras públicas. Una política gubernamental que apo-
son otros ámbitos fundamentales para el fomento de la eco- ye en general todas aquellas actividades económicas que fa-
nomía solidaria. Debe potenciarse el estudio del sector en vorezcan la protección del medio ambiente, el desarrollo de
los planes educativos en los distintos niveles de la educa- base comunitaria, endógena y local, el bienestar de los colec-
ción pública, y especialmente en la formación profesional y tivos más vulnerables, la mejora de las condiciones labora-
en las universidades. Es cierto que en estos últimos años les, la regulación de la economía y, en especial, del sistema
empiezan a abundar los másters y postgrados relaciona- financiero, y la democratización empresarial, estará contri-
dos con la economía solidaria, pero no basta con ello. Den- buyendo igualmente a desarrollar la economía solidaria, sin
tro de los currículos de carreras como Económicas, Empre- necesidad de orientarse explícitamente hacia la misma.
sariales, Graduado Social o Derecho debe incluir el estudio Por lo mismo, cualquier política de tipo social, educativo,
del sector. Además, ha de impulsarse el trabajo cooperati- urbanístico, cultural, etc., que contribuya, directa o indi-
vo escolar a fin de desarrollar desde la infancia las capaci- rectamente, a fomentar el asociacionismo y la capacidad de
dades de emprendeduría colectiva, así como la cultura del iniciativa tanto de las personas como de los grupos, a gene-
consumo responsable. rar proximidad y confianza entre los ciudadanos, es decir,
La divulgación y la sensibilización en torno a la econo- todo cuanto favorezca la formación del llamado capital so-
mía solidaria en los medios de comunicación resulta también cial, estará abonando el terreno para que después, espontá-
crucial. Se trata de divulgar y estimular el trabajo cooperati- neamente, surjan nuevos proyectos de economía solidaria.
vo, el consumo responsable y la inversión ética y solidaria.. Finalmente, en el periodo de crisis en que nos encontra-
Otra actuación importante tiene que consistir en la ge- mos sumidos resulta particularmente importante que las
neralización de las cláusulas sociales en las compras y los administraciones públicas den todo tipo de facilidades a los
concursos públicos a fin de favorecer aquellas empresas que trabajadores para que recuperen empresas en crisis o aque-
sean democráticas y actúen con responsabilidad social. No llas en que el empresario desea liquidar por el motivo que
puede ser que a la administración pública de un estado de- sea (deslocalización, jubilación...), y las conviertan en coo-
mocrático y social le sea indiferente que quienes la proveen perativas de trabajo o sociedades laborales.
de bienes y servicios funcionen de modo democrático o bien
autoritario, persigan dar el mejor servicio a la sociedad o
lograr el máximo beneficio económico. El impacto que ten-
dría que las administraciones practicaran la compra públi-
ca responsable sistemáticamente sería muy importante; se
estima que la contratación del sector público representa el
16% del PIB de la Unión Europea.
Bloco temático Jordi Garcia Jané 54 55
Notas

10
En el capítulo de Conclusión,
pág. 367, de Action publique et écono-
1
D. Schweickart, 1993. mie solidaire. Une perspective interna-
Más allá del capitalismo. Santander, cional. Bajo la dirección de
Epílogo J.-L. Laville, J.-P. Magnen,
Ed. Sal Terrae
No hay que tomar los deseos por la realidad. La economía David Schweickart, 2002. c. Genauto, França Filho y
A. Medeiros. Editions Érès, 2005,
solidaria, en su doble vertiente de sector socioeconómico y After capitalism. USA, Rowman
Ramonville Saint-Agne.
& Littlefield Publishers coooperativestreball.coop/ y acto segui-
de movimiento social, todavía es minoritaria. Pero, hoy por do ir a «Comunicació» y «Les nostres
J. Brazda, R. Schediwy, 2001.
hoy, ya está aportando dos cosas muy importantes: susten-
11
2
U. Beck et al., 2007. publicacions».
Un nuevo mundo feliz. «Preconditions for Succesful
to y esperanza. Sustento en la medida que millones de per- Barcelona, Ed. Paidós, p. 76 Co-operative Ventures in the Light 17
Como ejemplos de balance social, ver
sonas en el mundo tienen un trabajo digno, pueden acceder of Historical Evidence», el propuesto por REAS, en L’auditoría
ICA Review, núm. 1 social i l’economia solidària. Carlos
a créditos y abastecerse de productos de primera necesidad J. Riechmann, 2006.
3

Biomímesis. Madrid, La Catarata, p. 77 Ballesteros, Enrique del Río,


a bajo precio gracias a las empresas solidarias. Eso ya era 12
Ver «L’empresa dels moviments REAS, Fundación Deixalles, Palma
socials». Jordi Garcia Jané,
así antes de esta crisis, y sigue siéndolo ahora. 4
J. Gordon Nembhard. de Mallorca, 2004, y el de la Xarxa
«Non-Traditional Analyses of junio de 2000. Nexe 6, Federació de d’Economia Solidària, en Cataluña,
Pero además de sustento, la economía solidaria propor- Co-operative Economic Impacts: Cooperatives de Treball de Catalunya, www.xarxaecosol.org.
ciona esperanza. Con su quehacer diario, está transmitien- Preliminary Indicators and a Case Barcelona
Study», ICA Review
18
Como recuerda Aníbal Quijano,
do a la sociedad la esperanza de que hay alternativas a la 13
Tras treinta años de investiga- «ninguna forma determinada de exis-
economía capitalista, de que otra economía más justa, de- 5
L. I. Gaiger, 2008. ción sobre los valores de la sociedad tencia social podría desarrollarse y re-
«Brasil: un retrato de la norteamericana, Paul Ray y Sherry producirse en el largo plazo históri-
mocrática y sostenible, no sólo es necesaria, es que es posi- lucha emancipatoria de los pobres», Anderson han constatado la existen- co, sin que esa correspondencia tienda
ble, tan posible que, embrionariamente, ya existe. Otra economía, Vol. II, nº 2 cia de una subcultura integrada por a reproducirse no sólo en la materiali-
1º semestre miles de profesionales de este tipo, tal dad, sino también en la conciencia res-
vez hasta un 25 o un 30% de los tra- pectiva, y sin que ésta se convierta en
6
(Fragmento del discurso pronunciado bajadores de los países centrales. Por ‹sentido común›». En «Solidaridad’ y
por Joseph Stiglitz el 24 de otra parte, según el estudio de la es- capitalismo colonial/moderno»,
setiembre de 2008, en el congreso de cuela de negocios EADA (Escuela de Otra economía, Vol. II, num. 2,
la Confederación Empresarial Alta Dirección y Administración) de 1º semestre de 2008.
Española de la Economía Social Barcelona, sobre los emprendedores,
(CEPES), en Sevilla. revela que el principal motivo para em- 19
Tesis 2, Producir para viver.
prender un negocio propio es realizar Os caminhos da produçao não
7
N. Klein, 2007. Entrevista pu- una idea personal (63%), mientras que capitalista, Boaventura de
blicada en Barcelona Metròpolis ganar más dinero sólo es respondido Sousa Santos, Civilização
Mediterrània, Ayuntamiento de por un 16% de los encuestados. Brasileira, Rio de Janeiro, 2002, p. 66
Barcelona, núm. 73, otoño
14
D. Bornstein, 2005. Cómo cam- 20
Para profundizar sobre las caracte-
8
De hecho, uno de los factores am- biar el mundo. Los emprendedores so- rísticas que debieran tener los mer-
bientales citados por los estudio- ciales y el poder de la nuevas ideas. cados sociales, puede leerse el capítu-
sos para explicar las oleadas de nue- Ed. Debate, Barcelona lo VII del libro Cap a la democràcia
vas cooperativas desde el siglo xix es econòmica, T. Comín y
precisamente el advenimiento de cri-
15
U. Beck, 2007. Un nuevo mundo fe- L. Gervasoni, Ed. Fundació
sis económicas. Véase Brazda, liz. Ed. Paidós, Barcelona, p. 181 Segle xxi, Barcelona, 2009
Johann, Schediwy, Robert.
«Preconditions for Succesful
16
Sobre el particular, puede leerse 21
L. Gardin, J.-L. Laville,
Co-operative Ventures in the Light «De la responsabilitat social de les em- E. Roussel, 2005.
of Historical Evidence», ICA Review, preses a l’economia social i cooperati- «L’économie sociale et solidaire dans la
núm. 1, 2001 va», Antoni Comín i Oliveres, région Nord-Pas-de Calais»,
Nexe, quaderns d’autogestió i eco- p. 273. Action publique et économie
9
T. Villasante, 2006. nomia cooperativa, nº 16, Federació solidaire. Une perspective internacio-
Desbordes creativos. Estilos y estrate- de Cooperatives de Treball de nal. Bajo la dirección de
gias para la transformación social. Catalunya, Barcelona, Junio de 2005. J.-L. Laville, J.-P. Magnen,
Los libros de la Catarata, Madrid, Puede consultarse en «http://www. França Filho y A. Medeiros.
p. 171 y 419. coooperativestreball.coop/» www. Editions Érès, Ramonville Saint-Agne.
Bloco temático

Abstract Re sumo

La crisis alimentaria
mundial
Fred Magdoff

Este articulo atrae la atención


The World Food Crisis sobre la gravedad de la nueva crisis
This article is centred on the alimentaria que esta afectando al
seriousness of the food crisis mundo desde 2008. El aumento
affecting the world since 2008. del hambre y de la malnutrición
The increase in hunger and contrastan con los recursos que
malnutrition contrasts with soil tiene la tierra y con las medidas que
resources and the measures being se estan tomando en la perspectiva
undertaken in order to create a safe de que un sistema alimentario
and sustainable food system, which sostenible y seguro implica unas
implies a different and much more relaciones distintas y mucho mas
just relationship between people. equitativas entre las personas.
Bloco temático Fred Magdoff 58 59

Una grave crisis alimentaria ha afectado al mundo en 2008. Debido a la escasez de alimentos, los adultos de más de 12
Esta crisis viene a sumarse a la crisis agrícola y alimenta- millones de familias no podían seguir una dieta equilibra-
ria a más largo plazo que ha traído ya el hambre y la mal- da, y en más de 7 millones de familias había quien comía
nutrición a miles de millones de personas. Para comprender raciones más exiguas o se saltaba alguna de las comidas.
todas las nefastas implicaciones de lo que está sucediendo En casi 5 millones de familias, los niños no comían lo bas-
en la actualidad es necesario atender a la interacción en- tante al menos en algunos periodos del año.
tre esas dos crisis a corto y largo plazo. Ambas surgen bá- También en los países pobres no deja de ser normal la exis-
sicamente de la producción lucrativa de alimentos, fibras tencia de enormes partidas de alimentos desperdiciadas o mal
y ahora, además, biocombustibles, y de la escisión que eso repartidas en medio del hambre generalizada y persistente.
inevitablemente provoca entre, por un lado, las personas y, Hace pocos años, un artículo del New York Times titulaba
por otro, la producción de alimentos. así la noticia: «Los pobres de la India se mueren de hambre
mientras los excedentes de trigo se pudren» (2 de diciembre
Hambre «rutinaria» antes de la crisis actual de 2002). En 2004, un titular del Wall Street Journal rezaba:
De los más de 6.000 millones de personas que pueblan el «Escasez en la abundancia, la paradoja de la India: cosechas
mundo en la actualidad, las Naciones Unidas calculan que récord y hambre creciente» (25 de junio de 2004).
cerca de 1.000 millones padecen inanición crónica. Sin em-
bargo, esa cifra, que no es más que una tosca estimación, no Sin «derecho a comida»
incluye a las personas aquejadas de déficits nutricionales y El hambre y la malnutrición son síntomas por lo general
vitamínicos, así como otras formas de malnutrición. El nú- de un problema subyacente de mayores dimensiones: la po-
mero total de personas que sufren inseguridad alimenticia y breza en un sistema económico que, en palabras de Rachel
están mal nutridas o carecen de nutrientes esenciales es pro- Carson, no reconoce más dioses que las ganancias y la pro-
bable que esté más próximo a los 3.000 millones, lo que re- ducción. En la mayoría de los países del mundo la comida
presenta casi la mitad de la humanidad. La gravedad de la recibe el mismo tratamiento que cualquier otro bien de con-
situación queda patente en la estimación realizada en 2007 sumo, igual que la ropa, los automóviles, los lápices, los li-
por Naciones Unidas, según la cual unos 18.000 niños falle- bros, la joyas con diamantes, etc. No se considera que la gen-
cen diariamente como consecuencia directa o indirecta de la te tenga derecho a adquirir ningún bien en particular y no
malnutrición (Associated Press, 18 de febrero de 2007). se establece distinción alguna a dicho respecto entre lujos
Rara vez la causa de que la gente pase hambre es la y necesidades. Las personas ricas pueden permitirse com-
escasez en la producción de alimentos. Eso se aprecia cla- prar cuanto deseen, mientras que los pobres con frecuencia
ramente en los Estados Unidos, donde, a pesar de que la no pueden procurarse ni siquiera las necesidades básicas.
producción supera las necesidades de la población, el ham- Bajo las relaciones capitalistas, la gente no tiene derecho a
bre continúa siendo un problema acuciante. Según el De- una dieta, un hogar y una atención médica adecuados. Tal
partamento de Agricultura estadounidense, en 2006 más y como ocurre con otros bienes de consumo, la gente que ca-
de 35 millones de personas vivían en hogares aquejados de rece de lo que los economistas denominan «demanda efecti-
inseguridad alimenticia, entre ellas 13 millones de niños. va» no puede comprar suficientes alimentos nutritivos. Por
Bloco temático Fred Magdoff 60 61

supuesto, lo que la carencia de «demanda efectiva» signifi- Una crisis aguda y creciente:
ca en este caso es que los pobres no tienen el dinero necesa- la Gran Hambruna de 2008
rio para comprar la comida que necesitan. En este preciso momento de la historia, además del hambre
Para los humanos, la comida es una «necesidad bioló- rutinaria de la que tratábamos más arriba, existen dos cri-
gica»: todos necesitamos alimentos, igual que el agua y el sis alimentarias globales distintas que se están producien-
aire, para seguir viviendo. Es un hecho sistemático en la so- do simultáneamente. Trataremos en primer lugar de la gra-
ciedad capitalista que muchas personas queden excluidas ve y aguda crisis iniciada hacia 2006 y que empeora cada
de la plena satisfacción de dicha necesidad biológica. Aun- día que pasa. Es imposible exagerar la gravedad de la cri-
que es cierto que algunos países ricos, sobre todo los paí- sis actual. Esta ha hecho aumentar rápidamente la canti-
ses europeos, contribuyen efectivamente a la alimentación dad de personas en todo el mundo que padecen malnutri-
de los pobres, la forma misma de funcionar del capitalis- ción. Aunque aún no disponemos de estadísticas relativas
mo conlleva inherentemente la creación de un estrato so- al incremento experimentado por el hambre en 2007-2008,
cial inferior que a menudo carece de los elementos básicos está claro que serán muchas las personas que fallecerán
para la existencia humana. En los Estados Unidos existe prematuramente o sufrirán otros perjuicios. Como es habi-
una diversidad de iniciativas gubernamentales para la ali- tual, serán las personas más jóvenes, los ancianos y los en-
mentación de los pobres, como, por ejemplo, los vales de ali- fermos los que experimentarán las peores consecuencias de
mentos y los programas de suministro de comida en las es- la Gran Hambruna de 2008. El rápido aumento simultáneo
cuelas. Aun así, los fondos destinados a dichos programas de los precios de todos los cultivos básicos (maíz, trigo, soja,
están lejos de satisfacer las necesidades de los pobres y di- arroz y aceites de uso culinario), así como de muchos otros
versas organizaciones caritativas libran una ardua batalla cultivos, está teniendo efectos devastadores sobre una par-
para compensar esa diferencia. te cada vez mayor de la humanidad.
En la época actual es relativamente poca la gente que fa- El aumento de los precios en el mercado mundial en los
llece de inanición, si exceptuamos las severas hambrunas últimos años ha sido poco menos que prodigioso. Los precios
que ocasionan las guerras y los desplazamientos de pobla- de los sesenta productos agrícolas presentes en el mercado
ción. Lo normal es más bien que la mayoría de los afectados mundial subieron un 37% en 2007, y un 14% en 2006 (New
por el hambre sufran de malnutrición crónica y, posterior- York Times, 19 de enero de 2008). El precio del maíz empezó
mente, se vean aquejados de diversas enfermedades que a aumentar a principios del otoño de 2006 y, en un periodo
les acortan la vida o incrementan su miseria. El azote de la de meses, había crecido un 70% aproximadamente. Los pre-
malnutrición daña el desarrollo mental y físico de los niños cios del trigo y la soja también se dispararon en ese periodo
y los lastima para el resto de sus vidas. y, en la actualidad, siguen en niveles históricos. Los precios
de los aceites de uso culinario (fundamentalmente de soja y
de palma, y alimento esencial en muchos países pobres) es-
tán igualmente por las nubes. También el precio del arroz
ha crecido más de un 100% en el periodo 2007-2008 («La
fuerte subida del precio del arroz genera temores de agita-
ción en Asia», New York Times, 29 de marzo de 2008).
Bloco temático Fred Magdoff 62 63

Los motivos de esa fuerte alza del precio de los alimentos ese mismo periodo. En los países en desarrollo, el ritmo de
están bastante claros. En primer lugar están ciertas cues- aumento fue dos veces más rápido, y el consumo se ha do-
tiones directa o indirectamente relacionadas con el aumen- blado tan solo en los veinte últimos años (New York Times,
to de los precios del petróleo. En los Estados Unidos, Eu- 27 de enero de 2008). Alimentar con grano a una crecien-
ropa y muchos otros países, eso ha llevado a potenciar los te cantidad de animales es incrementar la presión sobre las
cultivos que pueden utilizarse para la producción de com- reservas de grano. Utilizar el grano para producir carne es
bustibles conocidos como biocombustibles (o agrocombus- una forma altamente ineficiente de suministrar tanto calo-
tibles). Así pues, el cultivo de maíz para la producción de rías como proteínas a las personas. Resulta especialmente
etanol, o de aceites de soja y de palma para fabricar com- derrochador en el caso de animales como las vacas (con sis-
bustible diesel, está en competencia directa con la utiliza- temas digestivos capaces de generar energía a partir de la
ción de dichos cultivos con fines alimentarios. En 2007, un celulosa), ya que estas pueden satisfacer todas sus necesi-
20% de la totalidad de la cosecha de maíz de los Estados dades nutritivas con los pastos y crecen bien sin grano, aun-
Unidos se empleó para producir etanol, un proceso que no que con mayor lentitud. Las vacas no son eficientes en la
genera mucha más energía adicional de la que se utiliza en conversión del maíz o la soja en carne: para producir un kilo
su producción. (Se calcula que en la próxima década un ter- de carne, las vacas necesitan ocho kilos de maíz; los cerdos,
cio aproximado de la cosecha de maíz estadounidense se de- cinco; y los pollos, tres (Baron’s, 4 de marzo de 2008).
dicará a la producción de etanol [Bloomberg, 21 de febre- Una tercera razón para el fuerte aumento de los precios
ro de 2008].) Además, muchos de los factores de producción alimentarios en el mundo es que unos cuantos países clave
[insumos] de la agricultura comercial de gran escala depen- que eran autosuficientes (es decir, que no importaban ali-
den del petróleo y el gas natural, desde la construcción y la mentos, a pesar de que gran cantidad de personas pade-
operación de tractores y equipos agrícolas, hasta la produc- cían hambre), importan ahora ingentes cantidades de ali-
ción de fertilizantes y pesticidas, pasando por el secado de mentos. Como explica un analista agrícola de Nueva Delhi:
las cosechas para su almacenamiento. El precio del fertili- «Cuando países como la India empiezan a importar alimen-
zante de nitrógeno, el más utilizado en todo el mundo, está tos, los precios mundiales se disparan […] Si la India y Chi-
directamente vinculado al precio de la energía debido a la na se convierten ambas en mayores importadores y abando-
gran cantidad de esta que requiere su producción. nan la autosuficiencia alimentaria, como hemos observado
Una segunda causa del encarecimiento del maíz, la soja recientemente en la India, entonces es seguro que los pre-
y el aceite de soja para uso culinario es el incremento de la cios globales van a crecer todavía más, lo que supondrá el
demanda de carne de las clases medias latinoamericanas fin definitivo de la era de alimentación barata» (VOA News,
y asiáticas, sobre todo de China. El empleo de maíz y soja 21 de febrero de 2008). Parte de la razón de las presiones
para la alimentación de reses, cerdos y aves ha crecido rá- que está experimentando el precio del arroz es la pérdida
pidamente para satisfacer dicha demanda. En 1961, el su- de terrenos agrícolas a favor de otros usos, tales como pla-
ministro total de carne en el mundo fue de 71 millones de nes diversos de desarrollo: 7 millones de acres en China y
toneladas. En 2007, se calcula que fue de 284 millones de 700.000 acres en Vietnam. Además, la tasa de producción
toneladas. El consumo per cápita se ha más que doblado en por acre en Asia se ha estancado, y no ha experimentado
Bloco temático Fred Magdoff 64 65

ningún aumento en diez años ni se espera que lo haga en a la fabricación de comidas diversas y a la venta minorista
un futuro próximo (Rice Today, enero-marzo de 2008). de bienes alimentarios están obteniendo resultados excep-
Algunas de las razones del incremento de los precios cionales. Las ganancias empresariales suelen prosperar en
del trigo y el arroz guardan relación con la climatología. épocas de escasez y aumento de los precios.
La sequía que afecta a Australia, uno de los grandes paí- Aunque no sea causa del aumento del precio de otros ali-
ses exportadores de trigo, y la baja producción de algunos mentos, el encarecimiento del pescado marino ha supuesto
otros países exportadores han afectado enormemente a los una carga añadida para los países pobres y rayanos en la
precios del trigo. En 2007, un ciclón destruyó en Bangla pobreza. La sobreexplotación de muchas especies marinas
Desh cosechas de arroz por valor de 600 millones de dóla- está suprimiendo esa valiosa fuente de proteínas de la die-
res, lo que produjo un aumento del precio del arroz del 70% ta de un gran porcentaje de la población mundial.
aproximadamente (The Daily Star [Bangla Desh], 11 de fe- La respuesta a la crisis ha adoptado la forma de manifes-
brero de 2008). La sequía del año 2007 en la China central- taciones y revueltas, así como de cambios en las políticas de
septentrional, en combinación con el frío y la nieve excep- los Gobiernos. En los meses finales de 2007 y comienzos de
cionales del invierno, es probable que lleve al Gobierno a 2008 se produjeron protestas y disturbios por el aumento de
incrementar la compra de alimentos en los mercados inter- los precios de los alimentos en numerosos países: Pakistán,
nacionales, lo que mantendrá la presión sobre los precios. Guinea, Mauritania, Marruecos, México, Senegal, Uzbekis-
También la especulación en el mercado de futuros y el tán y Yemen, entre otros. China ha instaurado el control de
acaparamiento en el plano local desempeñan ciertamente los precios de los alimentos básicos, y Rusia ha congelado el
su papel en el encarecimiento de los alimentos en esta si- precio de la leche, el pan, los huevos y el aceite de uso cu-
tuación de crisis. Con la agudización y la extensión de la cri- linario durante seis meses. Egipto, la India y Vietnam han
sis financiera estadounidense en el invierno de 2008, los es- prohibido la exportación de arroz, o han establecido rígidos
peculadores empezaron a colocar más dinero en alimentos controles sobre esta, para que sus propias poblaciones dis-
y metales para sacar provecho de lo que se ha denomina- pongan de alimentos suficientes. Egipto, el mayor importa-
do el «superciclo de las materias primas». (El descenso del dor de trigo del mundo, ha ampliado el número de personas
dólar en relación a otras monedas estimula la «inversión» cualificadas para recibir ayuda alimentaria hasta superar
en bienes tangibles.) Aunque sería un error ver en este as- los 10 millones de personas. Muchos países han rebajado
pecto, por despreciable e inhumano que sea, la causa de la sus aranceles proteccionistas para disminuir el impacto del
crisis, sí que está claro que viene a incrementar la miseria drástico aumento de los precios de los alimentos importa-
aprovechándose de la escasez de los mercados. Es verdad dos. Los países fuertemente dependientes de la importación
que es posible que la burbuja de las materias primas estalle de alimentos, como las Filipinas, el mayor importador de
y eso haga que los precios de los alimentos desciendan leve- arroz del mundo, están bregando por alcanzar acuerdos que
mente. Sin embargo, la especulación y el acaparamiento lo- les permitan obtener las importaciones que necesitan. Aun
cal seguirán ejerciendo una presión alcista en el precio de así, los efectos sobre el problema de todas esas diversas me-
los alimentos. Por supuesto, las corporaciones transnacio- didas provisionales son básicamente marginales. Casi to-
nales dedicadas al procesamiento de productos agrícolas, das las personas se han visto obligadas a rebajar su nivel de
Bloco temático Fred Magdoff 66 67

vida, mientras las clases medias son cada vez más cuida- Las «galletas» también contienen algo de margarina vege-
dosas con la comida que compran. Quienes estaban próxi- tal y sal. Hacia el final del artículo se explica lo siguiente:
mos a la pobreza han sucumbido a ella, y los que ya eran
«Marie Noel, de 40 años, vende las galletas en un merca-
pobres han caído en la verdadera indigencia, acompañada
do para mantener a sus siete hijos. Su familia también
de un gran padecimiento. Los efectos se han dejado sentir
las come. «Espero algún día tener bastante comida para
en todo el mundo y en todas las clases sociales, si exceptua-
alimentarme y poder dejar de comer esto», dijo. «Sé que
mos a los verdaderamente ricos. Tal y como dijo en febre-
no es bueno para mí».
ro de 2008 la directora ejecutiva del Programa Mundial de
Alimentos de Naciones Unidas, Josette Sheeran: « Este es Muchos países de África y Asia se han visto fuertemen-
el nuevo rostro del hambre […] Hay comida en las estante- te golpeados por la crisis y el hambre se ha extendido am-
rías, pero los precios han expulsado a la gente del mercado. pliamente, pero todas las naciones se han visto afectadas
Existe vulnerabilidad en áreas urbanas en las que nunca en una u otra medida. En los Estados Unidos, donde en
anteriormente había existido. Hay disturbios por los ali- 2007 los huevos se encarecieron un 38%, la leche un 30%, la
mentos en países en los que nunca antes se había visto tal lechuga un 16% y el pan integral un 12%, son muchas las
cosa» (The Guardian, 26 de febrero de 2008). personas que están empezando a comprar alimentos de me-
Aunque hace años que Haití es un país muy pobre (el nor precio. «La subida del precio de los alimentos empieza
80% de la población intenta subsistir con menos de lo que a apretar a los consumidores», titulaba el Wall Street Jour-
se puede comprar por dos dólares al día en los Estados Uni- nal (3 de enero de 2008).
dos), la reciente situación ha llevado al país a nuevas simas Deberíamos señalar aquí que, mientras que el precio del
de desesperación. Dos tazas de arroz, que costaban 30 cen- trigo se encuentra en máximos históricos y el precio de los
tavos un año antes, valían 60 centavos a mediados de 2008. productos elaborados con trigo es seguro que aumentará en
La descripción que aparecía a principios de ese año en un los Estados Unidos, el coste del trigo representa tan solo
artículo de Associated Press (19 de enero de 2008) es espe- una pequeña parte del precio de venta minorista de la ba-
cialmente dolorosa en los detalles: rra de pan. Cuando el precio del trigo se dobla, como ya ha
sucedido, el precio de una barra de pan puede que aumente
«Era la hora de comer en uno de los barros más pobres
un 10%, tal vez de 3 a 3,30 dólares. Sin embargo, los efectos
de Haití y Charlene Dumas comía barro. Con el aumen-
de que se doble el precio del maíz, del trigo, de la soja y del
to de los precios de la comida, los más pobres de Haití
arroz son devastadores para los pobres del Tercer Mundo,
ni siquiera se pueden permitir un plato de arroz al día,
que compran el producto básicamente sin elaborar.
y algunos toman medidas desesperadas para llenarse el
Con los centros de reparto de alimentos y los comedo-
estómago. Charlene, de 16 años y con un hijo de un mes
res de beneficencia funcionando al límite de su capacidad,
de edad, ha acabado dependiendo de un remedio tradi-
el padecimiento de los pobres estadounidenses es ahora
cional en Haití para los retortijones del hambre: galletas
más agudo. En general, en los Estados Unidos los pobres
hechas de tierra seca de la meseta central del país.»
tienden a pagar antes el alquiler, la calefacción, la gasoli-
na (para poder ir al trabajo) y la electricidad. Eso hace que
Bloco temático Fred Magdoff 68 69

la comida sea uno de los pocos gastos «flexibles» del presu- comida procedente de bancos de alimentos abastece a 400
puesto. En la zona central del estado de Vermont, en el que familias, el doble que el año anterior. Según el director del
resido, en el último año el recurso a la comida procedente centro, «tengo que rechazar a gente […]; ha habido veces
de los bancos de alimentos (es decir, a programas de asis- que me he ido a casa con ganas de llorar» (New York Times,
tencia alimentaria de organizaciones caritativas que repar- 23 de diciembre de 2007). Un profesor de la Universidad de
ten comestibles directamente a las personas necesitadas) Cornell dedicado al estudio de los programas estadouniden-
ha aumentado un 133% entre todos los tipos de usuarios, ses de ayuda alimentaria ha resumido así la situación: «Se
¡y un 180% entre los trabajadores pobres! (Hal Cohen, del está gestando una crisis incipiente […] La demanda de ayu-
Consejo de Acción Comunitaria de Vermont Centro, en co- da a los bancos de alimentos está creciendo rápidamente en
municación personal el 20 de febrero de 2008). un momento en que los recursos están fallando estrepitosa-
La recesión económica está empezando a dejarse notar mente porque los dólares no dan para todo» (Wall Street Jo-
en muchas zonas de los Estados Unidos, un hecho que se urnal, 20 de marzo de 2008).
suma al aumento de las peticiones de ayuda a los diversos
programas de asistencia alimentaria del Gobierno («Con la La crisis alimentaria de largo plazo
desaparición de empleos y el aumento de precios, el uso de Por grave que sea la crisis alimentaria a corto plazo, que
vales de comida roza cifras récord», New York Times, 31 exige inmediata atención internacional y dentro de cada
de marzo de 2008). Sin embargo, lo más frecuente es que país, la crisis estructural de largo plazo es aún más impor-
los usuarios de los mal dotados programas públicos de ayu- tante. Esta última tiene décadas de existencia y contribu-
da agoten la comida en casa hacia finales de mes, lo que ye a agudizar la crisis alimentaria actual a la vez que se ve
provoca que justo en ese momento se produzca un enorme reforzada por esta. En realidad, es la crisis estructural sub-
aumento de la demanda en los centros de reparto de ali- yacente de la agricultura y la alimentación en las socieda-
mentos y los comedores de beneficencia. Y mientras cre- des del Tercer Mundo la que constituye la verdadera razón
ce la demanda de alimentos, las donaciones de comida han de que la crisis alimentaria inmediata sea tan aguda y tan
disminuido de hecho y las donaciones del Gobierno federal difícil de superar dentro del sistema.
han experimentado un fuerte descenso (debido al alza de En el Tercer Mundo ha habido una fuerte migración de
precios, hay menos productos «excedentes» de los progra- personas del campo a las ciudades. Las personas han aban-
mas agrícolas, así que en 2007 los bancos de alimentos re- donado el campo por carecer de acceso a la tierra. A menu-
cibieron comestibles por valor de 58 millones de dólares, do, esta les ha sido robada directamente como consecuen-
frente a los 242 millones de cinco años atrás). cia del avance de las agroindustrias, pero en muchos casos
Los supermercados han encontrado formas de ganar di- la gente también se ha visto forzada a abandonar sus tie-
nero con los productos deteriorados o caducados que antes rras debido a los bajos precios que históricamente han reci-
donaban a las organizaciones caritativas. En Connecticut, bido por sus productos, así como por las amenazas vertidas
la demanda de alimentos ha experimentado un repenti- contra la vida de los campesinos. Las personas han acudido
no aumento, mientras que la provisión de estos ni siquie- a las ciudades en busca de una vida mejor, pero lo que han
ra logra mantenerse. En Stamford, un centro de reparto de encontrado ha sido una existencia harto difícil: una vida en
Bloco temático Fred Magdoff 70 71

los suburbios con tasas extremadamente elevadas de des- Por lo que respecta a la agricultura, los Gobiernos debe-
empleo y subempleo. La mayoría de esas personas intentan rían dejar de subvencionar a los agricultores para la com-
salir adelante en la economía «informal» adquiriendo cosas pra de fertilizantes; deberían dejar de participar en el al-
que luego venden en pequeñas cantidades. De la mitad de macenamiento y transporte de alimentos; y deberían dejar
la humanidad que reside en las ciudades (3.000 millones de en paz a los agricultores y los alimentos que producen. El
personas), 1.000 millones viven en barrios degradados, lo mismo enfoque sostiene también que los Gobiernos debe-
que representa un tercio del total de la población urbana. rían dejar de subvencionar la comida de los pobres para que
El concejal de un distrito de Lagos, en Nigeria, describía la sea el mercado recién desfrenado quien se ocupe de todo. La
situación de la forma siguiente: «Tenemos un aumento ma- presencia de esa mentalidad era manifiesta cuando empe-
sivo de población con una economía estancada o en contrac- zó a desarrollarse la crisis alimentaria de Haití a finales de
ción. Imaginaos esta ciudad dentro de diez o veinte años. 2007. Según el ministro de Industria y Comercio haitiano,
Estos no son los pobres urbanos, son los nuevos indigentes «no podemos intervenir y fijar precios porque tenemos que
urbanos». Un extenso artículo del New Yorker sobre Lagos cumplir con las normas del libre mercado» (Reuters, 9 de di-
finalizaba con una nota de extremo pesimismo: «Lo real- ciembre de 2007). Fue esa la misma medida que adoptó la
mente inquietante de las personas que rebuscan en las ba- Gran Bretaña colonial para responder a la hambruna de la
suras y los vendedores ambulantes de Lagos es que su vida patata en Irlanda, así como a las hambrunas de la India a
no tiene nada que ver en esencia con la nuestra. Escarban finales del siglo xix. Y a pesar de todo, esa misma forma de
para sobrevivir fuera de los límites de la macroeconomía. pensar la han hecho suya ahora muchos dirigentes de paí-
Son, en los términos más despiadados de la globalización, ses «independientes» de la periferia.
superfluos» (13 de noviembre de 2006). Está claro que dicha ideología carece de base alguna en
Uno de los principales factores que promueven esa emi- la realidad: el llamado mercado libre no es en absoluto ne-
gración masiva y sostenida a las ciudades, además del he- cesariamente eficiente. Además, es absolutamente incapaz
cho de carecer de tierras o de verse expulsado de ellas, es de servir como mecanismo para poner fin a la pobreza y el
la dificultad para ganarse la vida como pequeño agricultor. hambre. No deberíamos olvidar que la ideología neoliberal
Vivir como pequeño agricultor se ha vuelto especialmente propone exactamente lo contrario de lo que los países del
difícil cuando los países han practicado las políticas «neo- centro capitalista han hecho en el pasado y lo que en rea-
liberales» recomendadas o impuestas por el FMI, el Banco lidad están haciendo hoy en día. Por ejemplo, el Gobierno
Mundial e, incluso, algunas de las ONG occidentales que nacional estadounidense hace más de un siglo que presta
operan en los países pobres del Tercer Mundo. Según la ayuda a los agricultores de múltiples maneras. Lo ha hecho
ideología neoliberal, lo que hay que hacer es dejar que el mediante programas gubernamentales de investigación y
llamado mercado libre opere su magia. Se nos dice que, gra- expansión, arrebatándoles las tierras a los indios y entre-
cias a las benignas sanciones que impone su «mano invisi- gándoselas a granjeros de origen europeo, a través de sub-
ble», la economía funcionará de forma más eficiente y será venciones directas a los agricultores con toda una diversi-
altamente productiva. Así pues, para que el mercado sea dad de programas, entre ellos programas de créditos a bajo
«libre», los Gobiernos deben dejar de interferir. coste, y estimulando la exportación de cosechas. Deberíamos
Bloco temático Fred Magdoff 72 73

señalar también que tanto Estados Unidos como Europa y la compra de fertilizantes y semillas. Los agricultores utili-
Japón desarrollaron sus economías industriales con políti- zaron más fertilizantes, las cosechas aumentaron y la situa-
cas proteccionistas, a las que se sumaba toda una variedad ción alimentaria del país mejoró enormemente (New York
de programas de ayuda directa a la industria. Times, 2 de diciembre de 2007). De hecho, incluso pudieron
Lo que el fin de las ayudas de los Gobiernos del Tercer exportar algunos alimentos a Zimbabwe, aunque hay quien
Mundo a sus pequeños granjeros y consumidores ha conlle- piensa en Malawi que dichas exportaciones han hecho dis-
vado ha sido el endurecimiento de la vida de los pobres en minuir en exceso el propio abastecimiento.
dichos países. En palabras de un informe independiente en- Otro problema se plantea cuando los agricultores capi-
cargado por el Banco Mundial: «En la mayoría de países en talistas de algunos países pobres de la periferia entran en
proceso de reforma, el sector privado no ha venido a llenar los mercados internacionales. Mientras que los agricultores
el vacío dejado por la retirada del sector público» (New York de subsistencia venden únicamente una pequeña parte de
Times, 15 de octubre de 2007). Por ejemplo, muchos Gobier- la cosecha y utilizan la mayor parte de esta para consumo
nos africanos, presionados por las políticas económicas neo- familiar, los agricultores capitalistas son aquellos que co-
liberales fomentadas por el Banco Mundial, el FMI y los paí- mercializan la totalidad o una gran parte de lo que produ-
ses ricos del centro del sistema, pusieron fin a la subvención cen. Es frecuente que estos últimos amplíen su producción
del uso de fertilizantes en los cultivos. Aunque es cierto que y se hagan con las tierras de los agricultores más peque-
los fertilizantes importados son muy caros, los suelos afri- ños, con o sin compensación, para después emplear a me-
canos suelen tener baja fertilidad y las cosechas son escasas nos personas de las que antes trabajaban en una parcela de
cuando no se usan fertilizantes sintéticos ni orgánicos. Con tierra dada debido a las técnicas de producción mecaniza-
el descenso de la producción después de que los Gobiernos das. En Brasil, el «Rey de la Soja» controla bastante más de
dejaran de subsidiar la compra de fertilizantes y de ofrecer un cuarto de millón de acres (100.000 hectáreas) y utiliza
otros tipos de ayudas, aumentó el número de agricultores enormes tractores y máquinas cosechadoras para trabajar
que no lograba sobrevivir y emigraba a los suburbios de las la tierra. En China, los cargos corruptos de ciudades y pue-
ciudades. Jeffrey Sachs, antiguo prescriptor de terapias li- blos suelen vender «terrenos comunes» a promotores inmo-
brecambistas de choque ahora parcialmente recuperado, ha biliarios sin compensar adecuadamente a los agricultores y,
reconsiderado sus ideas. Según Sachs, «todo se basaba en la en ocasiones, sin ninguna compensación en absoluto.
idea de que, si a los más pobres de entre los pobres se les re- Así pues, las duras condiciones de los agricultores, pro-
tira la protección del Gobierno, de alguna forma los merca- vocadas por diversos factores y acuciadas por la práctica de
dos resolverán los problemas […] Pero los mercados no pue- la ideología del libre mercado, han generado una corrien-
den intervenir, y no intervienen, cuando la gente no tiene te humana continua de personas que abandonan el cam-
nada. Y si uno les retira las ayudas, lo que hace es dejarlos po para ir a vivir a unas ciudades en las que no hay trabajo
morir» (New York Times, 15 de octubre de 2007). para ellas. Ahora todas esas personas que viven en los su-
En el año 2007 un país africano, Malawi, decidió ir con- burbios y que carecen de acceso a la tierra para cultivar su
tracorriente y oponerse a todas las recomendaciones que propia comida están a merced de los precios internaciona-
había recibido. El Gobierno reintrodujo las subvenciones a les de los alimentos.
Bloco temático Fred Magdoff 74 75

Uno de los motivos de la creciente concentración de la La crisis prolongada se está intensificando


propiedad de la tierra y la expulsión de los agricultores de Parece lógico pensar que, con los precios de los alimentos más
subsistencia es la penetración de las corporaciones agríco- elevados, los agricultores deberían obtener más ganancias y
las multinacionales en los países de la periferia. Desde la producir más para satisfacer la «demanda» que indica el mer-
venta de semillas, fertilizantes y pesticidas hasta el proce- cado. En cierta medida, así es, sobre todo para los agriculto-
samiento de los productos agrícolas en bruto para su expor- res que pueden sacar provecho de todas las ventajas físicas y
tación o su venta en nuevos y grandes supermercados, las monetarias de la producción a gran escala. Sin embargo, tam-
corporaciones de la agroindustria están teniendo efectos bién han aumentado los costes de casi todos los factores de
devastadores sobre los pequeños agricultores. El colapso de producción agrícolas, por lo que las ganancias de los agriculto-
los sistemas de extensión agraria que ayudaban a los agri- res no son tantas como podría esperarse. Este es un problema
cultores a ahorrar semillas y la disolución de las empresas particularmente grave para los granjeros que crían animales
públicas de semillas ha allanado el camino a la gran pene- alimentados cada vez más con grano de elevado precio.
tración de las empresas multinacionales de semillas. Además, las cosas no están necesariamente bien para
Gigantes transnacionales como Cargill y Monsanto es- los pequeños agricultores y los agricultores de subsistencia.
tán presentes en la actualidad en la mayoría de países del Muchos están tan endeudados que les cuesta salir adelan-
Tercer Mundo, donde venden semillas, fertilizantes, pes- te. Se calcula que unos 25.000 granjeros indios se suicida-
ticidas y piensos, y compran y procesan productos agríco- ron en 2007 al no encontrar otra salida a sus dificultades.
las en bruto. En el proceso, asisten a los grandes granjeros (El Gobierno indio ha propuesto una partida presupuesta-
para lograr «mayor eficiencia», o sea, para que cultiven ex- ria que incluya la exoneración de los créditos concedidos
tensiones cada vez mayores. La principal ventaja de las se- por los bancos a los pequeños granjeros. Aun así, si la me-
millas de organismos genéticamente modificados (OGM) es dida se hace efectiva, los millones que han recibido présta-
que contribuyen a simplificar el proceso de cultivo y permi- mos de usureros locales no se beneficiarán de ella.) La con-
ten que enormes superficies sean gestionadas por una úni- centración de la propiedad de la tierra y la exclusión de la
ca entidad, una gran granja o corporación, que no deja es- tierra de los pequeños granjeros y braceros sin tierras se ha
pacio a los pequeños agricultores. visto exacerbada por los excepcionales aumentos del precio
También se están haciendo sentir los efectos negativos de las cosechas en los últimos pocos años.
de la penetración de las grandes cadenas de supermerca- El aumento de los precios de las cosechas ha provocado
dos. Tal y como rezaba un titular del New York Times en el aumento también del precio de los terrenos agrícolas, so-
2004, «Los supermercados gigantes aplastan a los granje- bre todo de los campos de grandes dimensiones que pueden
ros de Centroamérica» (28 de diciembre de 2004). Los gran- cultivarse con maquinaria de gran escala. Eso es lo que está
des supermercados prefieren tratar con unos pocos granje- sucediendo en los Estados Unidos y en ciertos países de la
ros con cultivos de gran escala que con un gran número de periferia. Por ejemplo, Global Ag Investments, empresa con
pequeños granjeros. Y la apertura de grandes supermerca- sede en Texas, posee y explota 34.000 acres de tierras de cul-
dos acaba con los mercados tradicionales que utilizan los tivo en Brasil. En una de sus granjas, un solo campo de soja
pequeños agricultores. ocupa 1.600 acres: ¡6,5 km2! Una empresa neozelandesa ha
Bloco temático Fred Magdoff 76 77

adquirido unos 100.000 acres en Uruguay y ha contratado a Acabar con el hambre en el mundo
gestores para dirigir granjas lecheras en sus tierras. Acabar con el hambre en el mundo es algo conceptualmente
Empresas de capital de inversión están comprando terre- bastante simple. Sin embargo, ponerlo en práctica y hacer-
nos agrícolas en los Estados Unidos (Associated Press, 7 de lo realidad dista mucho de ser sencillo. En primer lugar, es
mayo de 2007) y en el extranjero. Una empresa estadouni- necesario reconocer que el acceso a una dieta sana y variada
dense se ha asociado con inversores brasileños y japoneses es un derecho humano fundamental. Los Gobiernos deben
para adquirir 997 km2 de tierras en Brasil, aproximadamen- comprometerse a terminar con el hambre que afecta a sus
te un cuarto de millón de acres. Las mismas iniciativas está gentes y deben adoptar medidas contundentes para cumplir
tomando el capital sudamericano: un fondo de inversión bra- dicho compromiso. En muchos países, incluso en la actua-
sileño, Investimento em Participacoe, va a adquirir una par- lidad, se produce suficiente comida como para alimentar a
ticipación minoritaria en un productor de soja argentino que toda la población con un alto nivel nutricional. Por supuesto,
posee casi 400.000 acres de tierras en Uruguay y Argentina. este es manifiestamente el caso de los Estados Unidos, don-
El aumento del precio de las cosechas ha provocado tam- de tanta comida se produce. Es nada menos que un crimen
bién la aceleración de la deforestación en la cuenca amazó- que tantos pobres pasen hambre y estén mal nutridos en Es-
nica: 2.000 km2 (el tamaño aproximado de Rhode Island) tados Unidos, o que no sepan cómo van a conseguir la próxi-
en los últimos cinco meses de 2007. Además, enormes áreas ma comida (algo que, por sí mismo, supone ya una carga psi-
de terreno agrícola han pasado a ser utilizadas para el de- cológica), cuando existe en realidad comida abundante.
sarrollo inmobiliario, con usos en algunos casos dudosos, A corto plazo, la situación de emergencia que representa
como la edificación de barrios residenciales de casas indivi- el aumento del hambre y la malnutrición debe atajarse con
duales y la construcción de campos de golf para gente rica. todos los recursos de que disponga un país. Aunque la dis-
En China, en el periodo 2000-2005, hubo una perdida me- tribución en masa de grandes cantidades de grano o leche
dia anual de terreno agrícola de 2,6 millones de acres, que en polvo puede tener su papel, los países deberían plantear-
pasaron a usos inmobiliarios. El país se está acercando con se seguir la innovación venezolana de establecer centros de
rapidez al mínimo de terreno agrícola cultivable que necesi- alimentación en todos los barrios pobres. Cuando la gente
ta según sus propios parámetros (unos 120 millones de hec- cree que el Gobierno intenta realmente ayudarla, y cuan-
táreas aproximadamente), y lo más probable es que la canti- do tiene la potestad de buscar o contribuir a la solución de
dad de suelo agrícola continúe disminuyendo. Como parte de sus propios problemas, el resultado es una oleada de entu-
los esfuerzos para acceder a la producción agrícola extranje- siasmo y voluntariado. Por ejemplo, aunque los alimentos
ra, una empresa china ha alcanzado un acuerdo para arren- de los programas venezolanos de alimentación los aporta el
dar casi 2,5 millones de acres de terreno en las Filipinas para Gobierno, las comidas para los niños, ancianos y enfermos
cultivar arroz, maíz y azúcar, lo que ha desencadenado en ese pobres se preparan en las propias casas de la población y
país enérgicas protestas, que han paralizado temporalmente se distribuyen desde estas gracias a una considerable can-
el proyecto (Bloomberg, 21 de febrero de 2008). Como decía tidad de trabajo voluntario. Además, Venezuela ha desarro-
un agricultor: «el Gobierno [filipino] y los chinos dicen que es llado una red de tiendas que venden los alimentos básicos
un partenariado, pero eso solo significa que los chinos serán con importantes descuentos con respecto a los precios que
ahora nuestros señores y nosotros seremos sus esclavos». cobran los mercados privados.
Bloco temático Fred Magdoff 78 79

En 2003, Brasil lanzó un programa destinado a aliviar fundamental para la lucha contra el hambre y la malnu-
las condiciones de la población más pobre. Aproximadamen- trición, así como para apoyar un desarrollo sostenible y
te una cuarta parte de la población brasileña recibe apor- la reducción de la pobreza (All-Africa Global Media, 19
taciones directas del Gobierno de la nación con el progra- de febrero de 2008).
ma Bolsa Família de lucha contra la pobreza. Según dicho
Casi todos los países del mundo cuentan con recursos de
programa, una familia cuya renta diaria per cápita esté por
suelo, agua y clima para cultivar alimentos suficientes para
debajo de los 2 dólares por persona y día recibe una pres-
que toda su población tenga una dieta saludable. Además,
tación de hasta 53 dólares al mes por persona (The Econo-
en la mayoría de países ya están presentes también los cono-
mist, 7 de febrero de 2008). Esa inyección de dinero está
cimientos y las variedades de cultivos adecuados, por lo que,
condicionada a que los hijos de la familia asistan a la es-
si los agricultores reciben la ayuda conveniente, lograrán ob-
cuela y participen en el programa nacional de vacunación.
tener un rendimiento razonablemente alto de los cultivos.
Está claro que la iniciativa está teniendo efectos positivos
Aunque es esencial aumentar la producción agrícola, en
en la vida y la nutrición de las personas. Sin embargo, el
el pasado el acento ha recaído en la producción de cosechas
sistema no tiene el mismo efecto que los programas venezo-
para la exportación. Por mucho que estas contribuyan a ni-
lanos, que movilizan a la gente para trabajar codo con codo
velar la balanza de pagos de un país, la agricultura dirigida
por su propio bien y el de la comunidad.
a la exportación no garantiza que exista suficiente comida
En Cuba y en otros países se han usado con éxito los huer-
para todos ni fomenta un entorno rural saludable. Además
tos urbanos tanto para abastecer de comida a los habitantes
de productos básicos como la soja, la agricultura dirigida
de las ciudades como para dotarlos de una fuente de ingre-
a la exportación también promueve la producción de culti-
sos. Estos deberían fomentarse con determinación y dar un
vos lujosos de elevado valor demandados por los mercados
uso creativo al espacio disponible en los entornos urbanos.
de exportación (lujosos desde el punto de vista de las nece-
La agricultura debe ser una de las prioridades esencia-
sidades alimentarias básicas de los países pobres del Tercer
les en el Tercer Mundo. Hasta el Banco Mundial está empe-
Mundo) en lugar de los cultivos de subsistencia de bajo va-
zando a resaltar la importancia de que los Gobiernos ayuden
lor necesarios para satisfacer las necesidades de la pobla-
a la agricultura en sus países. Como ha declarado el doctor
ción nacional. La producción de cantidades suficientes del
Ngozi Okonjo-Iweala, director ejecutivo del Banco Mundial:
tipo correcto de alimentos dentro de las fronteras de cada
Hoy en día la atención en todo el mundo de los respon- país, por parte de pequeños agricultores que trabajan en
sables de diseñar políticas está centrada en el problema régimen cooperativo o por cuenta propia y utilizan técnicas
de las subprime y la crisis financiera. Sin embargo, la sostenibles, constituye la mejor forma de alcanzar la meta
verdadera crisis es la del hambre y la malnutrición […] de la «seguridad alimentaria». De esa forma, la población
Ese es el verdadero problema que debería captar la aten- queda aislada, al menos parcialmente, de las fluctuaciones
ción internacional. Sabemos que el 75% de los pobres de los precios en el mercado mundial. Todo ello implica tam-
del mundo viven en entornos rurales y que la mayoría bién, por supuesto, que no se resten terrenos a la produc-
de ellos dependen de la agricultura para vivir. La agri- ción de alimentos para dedicarlos a cultivos para el merca-
cultura es hoy en día, más que nunca, un instrumento do de biocombustibles.
Bloco temático Fred Magdoff 80 81

Una de las formas de llevar a cabo dicha iniciativa y, a Conclusión


la vez, contribuir a solucionar el problema de la concentra- La alimentación es un derecho humano y los Gobiernos tie-
ción de tantas personas en los suburbios urbanos (la po- nen la responsabilidad de velar por que su población esté
blación más expuesta al incremento de los precios de los bien alimentada. Además, hay formas conocidas de aca-
alimentos), es distribuir tierras mediante reformas agra- bar con el hambre, entre las que se cuentan las medidas
rias coherentes. Pero la tierra por sí sola no es suficien- de emergencia para combatir la crítica situación actual, los
te. Los agricultores que empiezan o que retornan al campo huertos urbanos, la reforma agraria acompañada de un sis-
necesitan apoyo técnico y financiero para producir alimen- tema de apoyo integral a los agricultores y de técnicas de
tos. Además, hay que desarrollar sistemas de apoyo social, agricultura sostenible que mejoran el medioambiente. La
tales como cooperativas y consejos comunitarios, que con- comida de la que actualmente disponen las personas es
tribuyan a fomentar la camaradería y solidificar las nue- el reflejo de unas relaciones de poder económico y político
vas comunidades que se desarrollen. Tal vez sea necesario fuertemente desiguales, tanto entre países como dentro de
«sembrar» dichas comunidades con unos cuantos abnega- estos. Un sistema alimentario sostenible y seguro requiere
dos activistas. Igualmente, hacen falta viviendas, electrici- unas relaciones distintas y mucho más equitativas entre las
dad, agua y sistemas de alcantarillado para que a la gen- personas. Cuanto más se incluya a los pobres y a los agri-
te le resulte atractivo ir a vivir al campo. Otra forma de cultores mismos en todos los aspectos de los esfuerzos por
fomentar que las personas vayan al campo y se convier- alcanzar la seguridad alimentaria, y cuanto más se los ani-
tan en agricultores es apelar al patriotismo e infundirles la me en el proceso, mayores serán las posibilidades de lograr
idea de que son auténticos pioneros en el establecimiento una seguridad alimentaria duradera. Como ha dicho Hugo
de un nuevo sistema alimentario que ayuda a sus países a Chávez, presidente de Venezuela, un país que tanto ha he-
lograr la autosuficiencia alimentaria, es decir, la indepen- cho para atajar los problemas de la pobreza y el hambre:
dencia frente a las corporaciones agrarias transnacionales, «Sí, es muy importante acabar con la pobreza, acabar con
así como a abastecer a toda la población nacional de comi- la miseria, pero lo más importante es darles el poder a
da sana. Esos agricultores pioneros deben contemplarse a los pobres para que puedan luchar por sí mismos».
sí mismos, al igual que deben contemplarlos el resto de la
sociedad y el Gobierno, como personas cruciales para el fu-
turo de su país y para el bienestar de la población. Se los
debe tratar con el gran respeto que merecen.

Este artículo fue publicado en


castellano por Editorial Hacer en
septiembre de 2009 como Capítulo 1
del título La debacle de Wall Street
y la crisis del capitalismo global,
2007-2009, nº10 de la revista Monthly
Review. Selecciones en castellano.
Fred Magdoff es profesor emérito de
ciencias de las plantas y el suelo en la
Universidad de Vermont en Burlington
(USA) y uno de los directores de la
Fundación Monthly Review.
Bloco temático

Abstract Re sumo

Crisis, Social and


Solidarity Economy, A crise do sistema financeiro
«Economical Integration» internacional tem vindo a
and fight against Poverty contribuir para tornar mais
The crisis of the international evidente a ausência, insuficiência ou
financial system has been desadequação das medidas correntes
evidencing the absence, insufficiency de política pública no domínio do
or inadequacy of the current public combate à pobreza. Mas a criação
policies on poverty. However, the de novas formas de resposta implica
Crise, Economia Social creation of new solutions entails uma profunda reestruturação
e Solidária e «Integração a deep conceptual restructuration conceptual em torno da dimensão
around the «economical» dimension «económica» da acção concreta.
Económica» na Acção of the action against poverty itself. A reestruturação conceptual
Therefore, this conceptual em causa pressupõe a crítica dos
Contra a Pobreza restructuration implies revising fundamentos das respostas correntes
the foundations of the current e a procura de apoio em perspectivas
José Manuel Henriques
solutions and searching for support alternativas. Com base nos valores e
in alternative perspectives. Based em perspectivas teorico-conceptuais
on the values and theoretical com origem na «Economia Social
and conceptual perspectives of e Solidária», mostrou-se possível
«Solidarity and Social Economy», construir o sentido de formas
it has been possible to create new alternativas de conceber o conteúdo
alternatives to the «economical» da dimensão «económica» da acção
dimension of fight against poverty contra a pobreza: não reduzindo
by not reducing the notion o «económico» ao «mercado»,
of «economy» to «market», by privilegiando a acção colectiva e
privileging collective action and a «intencionalidade» humana e
human «intentionality» as well as by propondo a reconstrução das relações
proposing the reconstruction of the entre o «económico» e o «social».
relationship between «economical» À luz dessas perspectivas foram
and «social». analisados alguns contributos
In light of these perspectives, da Iniciativa Comunitária Equal
some contributions of the (2000-2010) para a concretização
communitarian initiative Equal da acção. Mostra-se como se podem
(2000-2010) were analysed. It is abrir novos caminhos para a
then shown how to open new paths reconfiguração das políticas públicas
for public policies in these areas. contemporâneas neste domínio.
Bloco temático José Manuel Henriques 84 85

1. Contexto A reestruturação conceptual em causa pressupõe a crí-


A crise do sistema financeiro internacional tem vindo a influen- tica dos fundamentos das respostas correntes e a procura
ciar negativamente a evolução do emprego na Europa e a co- de apoio em perspectivas alternativas. Com base em pers-
locar uma pressão crescente junto dos Estados para a conten- pectivas teorico-conceptuais com origem na «Economia So-
ção da despesa pública. A sua expressão mais recente começou cial e Solidária», mostrou-se possível construir novas for-
a desenhar-se em 2008 e tem vindo a contribuir também para mas de entender o conteúdo da dimensão «económica» da
acentuar a complexidade dos problemas contemporâneos de acção contra a pobreza.
pobreza. Com a crise torna-se cada vez mais evidente a ausên- À luz dessa perspectiva foram analisados alguns contri-
cia, insuficiência ou desadequação das medidas correntes butos da Iniciativa Comunitária Equal (2000-2010) para a
de política pública neste domínio, em particular, no que se re- concretização da acção. Mostra-se como se podem abrir no-
laciona com a dimensão «económica» da acção. vos caminhos para a reconfiguração das políticas públicas.
Entretanto, tendo em atenção a escala que esses proble- Torna-se possível alargar perspectivas para a relação entre
mas assumem, as medidas existentes podem tornar-se finan- o Estado e a sociedade valorizando a acção colectiva e asse-
ceiramente insustentáveis. E como problemas financeiros gurando outra qualidade à acção pública (animação territo-
traduzem, no essencial, o desajustamento entre a natureza rial, etc.) e o envolvimento diversificado de formas organi-
dos problemas a resolver e os métodos e formas organizati- zativas de qualidade solidária e democrática (e não apenas
vas previstas para os resolver (Matzner, 1978, p.134), tor- por empresas privadas ou a administração pública).
na-se mais evidente e urgente a necessidade de «inova- Os contributos da Economia Social e Solidária mostram
ção social». Esta necessidade vem sendo reconhecida desde como se abrem novas oportunidades concretas de acção quan-
o início da década de 80 e já justificou diversas iniciativas do as relações sociais e a «intencionalidade» fazem parte do
das instituições de âmbito europeu através do lançamen- esforço de conceptualização da existência humana em socie-
to de programas experimentais orientados para a inovação dade e se procura a construção de novas formas de acção que
nas políticas públicas. assentem nesse tipo de pressupostos.
A «inovação social» associada à criação de novas formas
de resposta no combate à pobreza implica uma profunda re- 2. A crise contemporânea
estruturação conceptual em torno da respectiva dimensão A crise tem causas profundas conforme Joseph Stiglitz re-
«económica». Por exemplo, implica redefinir o emprego não lembra num livro recente (Stiglitz 2010). As suas causas
como um fim em si mas como meio para o acesso a recur- situam-se para além de comportamentos menos regulares
sos monetários, para a criação e preservação de relações de de responsáveis por organizações bancárias, de falhas de
interdependência social significativa e para facilitar a rea- reguladores ou da eventual desadequação de políticas mo-
lização de direitos sociais. Implica recentrar o «económico» netárias. Stiglitz responsabiliza os mercados financeiros e
nas condições bloqueadoras, ou facilitadoras, da satisfação suas instituições (op. cit., p. 17). Assim, considera que a úni-
de necessidades humanas. ca surpresa com a crise económica de 2008 é que ela tenha
sido considerada uma surpresa para tantos. A crise era pre-
visível e foi prevista (op. cit., p. 1).
Bloco temático José Manuel Henriques 86 87

Com efeito, basta evocar o contributo de David Harvey muitos emprego do crescimento já vinham configurando essa possi-
anos antes (Harvey, 1989, p.194). Analisando os riscos pro- bilidade ao longo das últimas décadas. Tudo parece concor-
venientes da autonomização relativa do sistema financeiro e rer para que se torne mais difícil a situação existencial das
ao procurar soluções financeiras para o problema da sobrea- pessoas em situação de maior vulnerabilidade à pobreza.
cumulação no capitalismo contemporâneo, Harvey escrevia: Todavia será útil não esquecer que desemprego não
implica necessariamente pobreza. A protecção social, por
«It is tempting, of course, to see this all as some prelu-
exemplo, pode contribuir para a prevenção da pobreza. A
de to a financial crash that would make 1929 look like a
relevância social da perda de emprego ou da perda de ren-
footnote in history».
dimento não é independente do papel que pode ser desem-
Stiglitz defende então que «saír» da crise pressupõe a penhado pela protecção social (subsídeo de desemprego,
reforma da economia com base num novo reconhecimento assistência social, serviços públicos, etc.). Por outro lado,
da centralidade da acção colectiva e do papel do Estado no o acesso ao emprego não conduz automaticamente à mu-
exercício da regulação. Stiglitz alerta para o facto de que a dança de situações de pobreza. Emprego não precário e re-
reforma da economia não poderá deixar de começar pela re- muneração adequada não estão associados a qualquer for-
forma da Ciência Económica (op. cit., p. 238). Stiglitz dis- ma de emprego. Emprego sem protecção social dificilmente
cute alguns dos seus pressupostos, analisa o modo como a pode assegurar uma mudança em situações de pobreza. Po-
economia tem vindo a influenciar negativamente a socie- de-se estar empregado e permanecer pobre (baixos salários,
dade e indivíduos e sublinha (op. cit., p. 289): forte dependência mercantil na satisfação de necessidades,
«The model of rugged individualism combined with mar- etc.) e socialmente excluído (relações socio-familiares vul-
ket fundamentalism has altered not just how individu- neráveis, isolamento social, formas precárias de emprego,
als think of themselves and their preferences but how etc.). Emprego dificilmente pode contribuir para mudan-
they relate to each other. In a world of rugged individ- ças em situações de pobreza se permanecer isolado de for-
ualism, there is little need for community and no need mas de protecção social (serviços sociais, educação e forma-
for trust». ção profissional, habitação, acesso a cuidados médicos, etc.),
rendimento suficiente e realização de direitos sociais.
Será difícil antecipar com rigor todas as implicações eco- É necessário manter presente o sentido deste tipo de in-
nómicas e sociais do actual contexto de crise do sistema fi- terdependências. A actual situação de crise vai tornar
nanceiro internacional. A evolução recente das dificuldades mais claros os limites das respostas correntes de política
de acesso ao crédito por parte das empresas, da diminui- pública na resposta ao desemprego e na acção contra a po-
ção da procura local como efeito da recessão e do aumen- breza. Tornar-se-á cada vez mais evidente que no contex-
to da concorrência internacional permitem admitir a acen- to contemporâneo, a dimensão «económica» da acção se terá
tuação de dificuldades crescentes junto das empresas. Será que situar inevitavelmente para além da reinserção indivi-
de admitir que a Europa venha a conviver de forma prolon- dual no sistema formal de emprego.
gada com elevados níveis de desemprego. A desaceleração
do crescimento económico e a diminuição da componente
Bloco temático José Manuel Henriques 88 89

3. Pobreza, instatisfação se situa. A materialidade, ou não materialidade, de recursos


de necessidades básicas e <integração relevantes para a superação de situações de pobreza não é
económica> na acção contra a pobreza independente da natureza dos propósitos a prosseguir.
As condições contemporâneas justificam um esforço apro- Por outro lado, a pobreza foi definida como pobreza ab-
fundado de conceptualização sobre a realidade da pobreza soluta uma vez que o que estava em jogo era a conceptu-
e sobre os modos de ser combatida. Trata-se de condições alização da acção visando a mudança da vida de pessoas
propícias a repensar os valores, conceitos e teorias em que em situação de pobreza e não objectivos de natureza ana-
se baseia a acção corrente. Não raramente os discursos do- lítica. Pobreza foi definida como uma situação de insatis-
minantes concorrem para a ocultação de distinções concep- fação de necessidades básicas (ausência de saúde e de au-
tuais fundamentais como é o caso da distinção entre os con- tonomia) como resultado de um processo através do qual
ceitos de privação e de pobreza. Repensar os fundamentos necessidades «intermédias» (alimentação, habitação, cuida-
permite clarificar a diferença entre privação e pobreza, dis- dos médicos, etc.) podem ser relacionados com a insuficiên-
cutir a centralidade do conceito de recurso e a autonomia cia de recursos, materiais, ou não-materiais, num determi-
na satisfação de necessidades básicas como razão de ser e nado contexto discursivo e organizativo.
sentido da mudança a promover. Assim, entendida como pobreza absoluta, a pobreza pode
Entendida como dimensão «económica» da acção, a «in- ser entendida como incapacidade de mobilizar meios mate-
tegração económica» torna-se central. Um contributo para riais, e não-materiais, para criar modos de satisfazer ne-
esse esforço já foi desenvolvido noutras circunstâncias cessidades «intermédias» e evitar a ausência de saúde e a au-
(Henriques 2006). Alguns aspectos podem ser recordados sência de autonomia (insatisfação de necessidades básicas).
de forma sucinta. Esta incapacidade resulta na impossibilidade de consti-
tuir a capacidade de realização de propósitos num contexto
3.1 Privação, pobreza relacional marcado por um campo discursivo hegemónico e
e instatisfação de necessidades por um campo organizativo caracterizado pela incapacidade
A pobreza foi definida ali como um estado de privação resul- organização da acção colectiva («organisational outflanking»)
tante da insuficiência de recursos num determinado contexto das pessoas em situação de pobreza. É por essa razão que os
discursivo e organizativo. A focalização nos recursos traça a discursos institucionais sobre a pobreza se tornam tão rele-
fronteira decisiva entre os conceitos de privação e de recursos. vantes. São os discursos institucionais de não-pobres que
Mas, como os recursos são funcionais para a realização de estabelecem as condições com base nos quais os pobres po-
propósitos humanos, é a capacidade de realizar propósitos dem exprimir os problemas existenciais que os não-pobres
que transforma em recurso qualquer entidade social. Re- definem como problemas de pobreza. Por outro lado, as pes-
curso será tudo aquilo a que se «recorre» para realizar um soas que experimentam situações deste tipo não constituem
propósito. A constituição de propósitos humanos depende um colectivo com interesses específicos nem vivem condições
dos conceitos com base nos quais a realidade é percepciona- facilitadoras da reconstituição discursiva das situações que
da. A relevância e sentido dos recursos torna-se, assim, de- vivem. A diferenciação e a heterogeneidade das situa-
pendente dos conceitos e contextos em que a acção humana ções contribuem para a acentuação desta dificuldade.
Bloco temático José Manuel Henriques 90 91

Assim, a expansão da pobreza por dificuldade no acesso Esta formulação da «integração económica» assenta no
a recursos monetários não nos deverá levar a negligenciar reconhecimento da dimensão relacional da existência dos
outras dimensões subjacentes à insatisfação de necessida- humanos em sociedade, do papel central dos agregados do-
des básicas. Relações interpessoais precárias ou isolamento mésticos na construção de estratégias de sobrevivência das
social poderão tornar recursos monetários inúteis na pre- pessoas em situação de pobreza e do modo particular como
venção de danos sérios ou irreparáveis. Comportamentos através dos agregados domésticos se estabelece a relação
individuais exclusivamente orientados para o consumo em entre a produção de valores de uso e de valores de tro-
conjugação com a incapacidade de identificar necessidades ca na reconstituição total do encastramento territorial da
básicas ou com a incapacidade de identificar formas colecti- economia «real» local. Esta perspectiva relaciona-se direc-
vas e individuais de assegurar a satisfação de necessidades tamente com os trabalhos de John Friedmann em torno da
«intermédias» (acção colectiva, luta política, etc.) podem até sua reflexão em torno das noções de «barrio economy» (Frie-
concorrer para a acentuação de formas de pobreza. dmann 1988) e «whole economy model» (Friedmann 1992).
A formulação apresentada para a noção de «integração eco-
3.2 Acção contra a pobreza nómica» associou o alargamento de possibilidades de diminui-
e a <integração económica> ção da dependência do mercado na satisfação de necessidades e
Nas sociedades capitalistas contemporâneas acentua-se a de- de acesso ao rendimento com acção pró-activa na promoção de
pendência mercantil da satisfação de necessidades e a inter- «percursos de inserção» ou animando a criação de novas formas
pretação subjectiva de acção para a superação da insatisfa- organizativas (microempresas, empresas sociais, etc.). A «não-
ção como consumo. Trata-se de uma construção histórica e, probabilidade» da emergência espontânea destas formas orga-
portanto, com mudança possível. nizativas, a insuficiência da acção exclusivamente orientada
Neste contexto, a dimensão «económica» da acção contra para o acesso ao capital e a reformulação conceptual necessária
a pobreza foi designada como «integração económica». Foi à construção de estratégias adequadas («empresa», «concorrên-
definida, genericamente, como acção visando a máxima au- cia e competitividade», «mercados», etc.) são aspectos especifica-
tonomia na satisfação de necessidades humanas. Mais con- mente analisados no que respeita à criação de microempresas.
cretamente, «integração económica» foi definida como acção Devido ao encastramento territorial dos agregados do-
orientada para a relação a construir entre processos de pro- mésticos, estabeleceu-se a relação entre a mudança persis-
dução de conhecimento sobre condições materiais da insa- tente em situações de pobreza e o desenvolvimento local. A
tisfação de necessidades básicas e o tipo de transformação não-emergência espontânea de iniciativas e capacidade
material que possa contribuir para mudanças efectivas em organizativa visando o desenvolvimento local coloca a «in-
situações de pobreza alargando possibilidades de diminuição tegração económica» em relação directa com a «animação
da dependência mercantil na satisfação de necessidades «in- territorial» (Henriques, 2007, 2009).
termédias» e alargando possibilidades de geração de rendi- Mas tal formulação de «integração económica» não se en-
mento através do trabalho por conta de outrem ou através da quadra na interpretação do «económico» que se pode encontrar
mobilização do potencial de empreendedor através de formas subjacente à acção pública corrente. Contudo, à luz de contri-
organizativas individuais ou colectivas (microempresas, em- butos de natureza teorico-conceptual com origem na Econo-
presas sociais, etc.). mia Social e Solidária ganha um sentido mais abrangente.
Bloco temático José Manuel Henriques 92 93

4. O paradigma dominante da Ciência 4.2 O <Homo Economicus>


Económica e a <integração económica> e a <integração económica>
na acção contra a pobreza A dimensão relacional desempenha um papel central nas es-
Como se viu, no contexto da acção contra a pobreza, a «inte- tratégias de sobrevivência das pessoas em situação de pobreza.
gração económica» envolve auto-suficiência no que respeita Mas os pressupostos em que assenta o paradigma dominan-
a recursos tendo em vista a capacidade acrescida de satis- te relativamente à existência humana em sociedade, corren-
fazer necessidades humanas. Alargar o espaço da «não-de- temente referenciados como «Homo Ecomomicus», correspon-
pendência» mercantil e alargar as possibilidades de acesso dem a uma redução da totalidade do ser humano, a «pessoa»,
ao rendimento trabalhando por conta de outrem ou organi- a motivações relacionadas com o «interesse individual».
zando formas individuais ou colectivas de mobilização de O «Homo Economicus» não tem correspondência com um
potencial empreendedor (microempresas, empresas coope- humano vivo. Teria que se admitir uma estrutura psicológica
rativas, pequena sociedade por cotas, etc.) foram identifica- imatura, «infantil» (Bauer 1981, 1985) e «patológica» (Henri-
das como formas possíveis de concretização. ques 1989). O «Homo Economicus» não conhece relações in-
terpessoais nem pertença (Kraemer e Roberts 1996). O seu
4.1 A satisfação de necessidades comportamento é egocêntrico e não conhece pertença nem
humana e a <integração económica> reciprocidade. Longe da maturidade afectiva, emocional e in-
O paradigma dominante constitui um obstáculo sério ao telectual de um humano adulto, o seu comportamento é rí-
aprofundamento da análise centrada na satisfação das ne- gido e mecânico na reacção a estímulos externos (mudanças
cessidades humanas já que assume a identidade entre «in- em preços, etc.). Este tipo de pressupostos não encontra legi-
tensidade da procura», nível de utilidade e a satisfação po- timação científica em outras ciências sociais (Psicologia, So-
tencial de necessidades. ciologia, Antropologia).
Este tipo de raciocínio impede a possibilidade de identificar
necessidades que não possam ser satisfeitas através de consu- 5. A Economia <real>, a Economia
mo e, portanto, não se podem manifestar em mercado sob a for- Social e a Economia Solidária
ma de procura. Legitima a desigualdade social no consumo e Diferentes perspectivas sobre as noções de Economia Social e
legitima a contribuição potencial de mecanismos institucionais de Economia Solidária tornam difícil a referenciação a concei-
para a interpretação subjectiva de insatisfação de necessidades tos não ambíguos na reflexão que se mostra aqui necessária.
como ausência de consumo. Os mesmos mecanismos podem Nas condições contemporâneas, em contexto de desem-
contribuir para a inibição da consciência relativa a necessida- prego persistente a níveis muito elevados, torna-se mais cla-
des que não sejam passíveis de satisfação através de consumo. ro como a dimensão «económica» da acção contra a pobreza,
Finalmente, legitima o facto de os mesmos mecanismos a «integração económica» não pode ocorrer simplesmente
poderem contribuir para a mercantilização da sociedade e através de uma focalização exclusiva da acção na promoção
para a dependência crescente de recursos monetários mes- do acesso ao emprego. Não só por ser cada vez mais difícil
mo se isso ocorra num contexto de desemprego crescente e pelas vias convencionais (colocação, formação profissional,
protecção social mais limitada como vem ocorrendo nas so- etc.) como por ser cada vez mais insuficiente.
ciedades europeias contemporâneas.
Bloco temático José Manuel Henriques 94 95

5.1 Contributos da Economia Social e Solidária respeita a actividades económicas que correspondem à orga-
As noções de Economia Social ou de Economia Solidária nização de pessoas que buscam a democracia económica as-
como outras noções emergentes (Economia Plural, Economia sociada à utilidade social (Defourny, 2009, pp. 156-158).
Popular, Economia Feminista, Economia Heterodoxa, etc.) Neste sentido não se trata de nada de novo. Remontam ao
inscrevem-se num movimento alargado de reconstrução do século xix as formas de maior expressão contemporânea (as-
pensamento económico e de construção de «outra» Economia sociações, cooperativas e mutualidades) com forte associação
como resposta às reconhecidas insuficiências do paradigma com a emergência de formas de socialismo associacionista.
dominante da ciência económica. Expressões como «Sector O interesse crescente a partir de finais do século xx deve-se
Autónomo» (Matzner 1982), «Economia Subterrânea» (Autó- ao crescimento da importância relativa de empresas e orga-
noma e Oculta) (Rosanvallon 1980) ou «Economia Social» po- nizações que combinam modos de criação e de gestão priva-
larizaram a reflexão europeia logo no início dos anos 80. dos e colectivos com finalidades não centradas no lucro.
Também a noção de «económico» atrás introduzida vem Defourny propõe dois modos de organizar a análise deste
ao encontro de uma definição substantiva, e não formal, do tipo de organizações no início do século xxi. Poderão ser or-
«económico» e inscreve-se em perspectivas diversificadas ganizadas a partir das respectivas formas jurídicas e insti-
com origem nos contributos da Economia Multidimensio- tucionais (empresas de tipo cooperativo, sociedades de tipo
nal (Bartoli 1991), Economia Institucionalista (Bauer 1985, mutualista, organizações associativas e fundações), ou or-
1986; Bauer e Mathis, 1988; Hodgson, 1988, 1993, 2004), da ganizadas em função dos traços comuns das empresas e or-
Economia Humanista (Ekins 1986; Ekins e Max-Neef 1992; ganizações envolvidas (finalidades da actividade, modos de
Lutz e Lux 1988; Schumacher 1973) e da Economia Realista organização). Podem tomar-se como referência quatro prin-
(Lawson, 1997, 2003, 2004). cípios comuns a estas organizações: finalidade de prestação
As noções em causa têm vindo a emergir e a generalizar- de serviços aos membros ou à colectividade, sendo o lucro
se a partir de contextos geográficos e históricos particula- secundário; autonomia de gestão; controlo democrático pe-
res pelo que persiste uma assinalável ambiguidade no modo los membros; e primazia das pessoas e do objecto social so-
como essas noções são utilizadas. bre o capital na distribuição dos excedentes.
Mas esta reflexão permaneceu relativamente marginal.
As oportunidades e possibilidades de novas formas de orga- Economia Solidária
nização económica e as experiências concretas ilustrativas A Economia Solidária tem vindo a conhecer uma expres-
dessas oportunidades foram activamente tornadas invisí- são significativamente crescente nas abordagens que a to-
veis como efeito de modelos teorico-conceptuais que as não mam como referência. Basta citar autores como Jean Louis
podem considerar (Henriques 1985). Laville (J.-L. Laville, 2009a, 2009b, 2009c, 1994), Jordi Es-
tivill (Estivill 2009), Paul Singer (Singer, 2003) ou Rogério
Economia Social Roque Amaro, (Amaro, 2009).
A Economia Social tem vindo a suscitar reflexões muito di- Como destaca, Jean-Louis Laville (2009a), a Economia
versificadas desde o início dos anos 80. É o caso de traba- Solidária é um conceito utilizado em vários continentes
lhos de autores como Jacques Defourny (Defourny, 2009, De- com sentidos diversos mas tendo como referência a ideia de
fourny et al, 2000). De uma forma geral, a Economia Social
Bloco temático José Manuel Henriques 96 97

solidariedade em contraste com o individualismo utilitaris- Ao assumir a reconstrução de pressupostos fundamentais


ta que caracteriza o comportamento económico predomi- e ao acolher a conjugação entre intencionalidade humana e
nante nas sociedades de mercado. a respectiva dimensão relacional, os diversos contributos da
O termo emerge na década de 1990 quando começaram Economia Social e Solidária tornam-se mais adequados à
a surgir iniciativas de cidadãos produtores e consumido- análise da economia «real» e à identificação das condições
res organizados de acordo com princípios como cooperação, das quais poderá depender a construção de novas formas de
autonomia e gestão democrática (autogestão de empresas resposta aos problemas contemporâneos. Por um lado, par-
em falência em moldes cooperativos, «empreendedorismo tilham pressupostos comuns relativos à acção colectiva, à
inclusivo», moeda local, comércio justo, cantinas sociais, fi- centralidade das relações sociais e à complexidade que se
nança ética, etc.). Nos países periféricos, em particular na encontra subjacente à «intencionalidade» humana. Por ou-
América Latina, os trabalhos de análise da Economia Po- tro, partilham pressupostos relativos à não identificação en-
pular já vinham salientando formas de organização econó- tre economia e mercado e à não partilha de pressupostos re-
mica ancoradas em laços de reciprocidade como fundamen- lativos à capacidade de auto-regulação dos mercados.
to de «estratégias de sobrevivência» de pessoas em situação A intencionalidade humana não é redutível a qualquer
de pobreza. No Norte, trata-se de iniciativas suscitadas pela forma de racionalidade individual «meios-fins». A intencio-
crise do Estado-providência, pela desadequação das formas nalidade humana também é constituída por esperança, va-
de protecção social ou pela criação de formas de resposta à lores e visualizações de futuros possíveis não dependentes
pobreza e à exclusão social a partir de formas solidárias de de realidades observáveis e é inevitavelmente dependente
organização colectiva. dos conceitos com base nos quais a realidade é apercebida
(Sayer 1984). A inovação social pressupõe exactamente a
5.2 Perspectivas transversais capacidade de construir realidades (ainda) não existentes
Dada a diversidade de abordagens consistentes já referen- com base na conjugação entre acção intencional e identi-
ciáveis, para efeitos do argumento que aqui se desenvolve, ficação de possibilidades não redutíveis às estruturas con-
utilizar-se-á a noção de «Economia Social e Solidária» como ceptuais convencionais.
forma de delimitar o conjunto daqueles contributos. Ao pro- Por outro lado, os humanos ‹tornam-se pessoas› (Caldei-
curar identificar perspectivas e linhas transversais de sus- ra 1979; Rogers 1972) através de processos de socialização em
tentação da reflexão, destacam-se algumas perspectivas co- que se conjugam as dimensões individual e colectiva da exis-
muns unindo as várias abordagens. Trata-se no essencial tência humana em sociedade e na natureza. Nem os humanos
dos temas centrais já identificados no passado por Jean- são exclusivamente individuais nem o comportamento huma-
Louis Laville, no cruzamento entre a reconstrução da Eco- no é redutível às suas dimensões cognitivas (racionais).
nomia com base na reciprocidade e com base nas relações A interdependência e a indissociabilidade entre as
entre Economia e a Democracia. Trata-se, afinal, da recom- dimensões individual e colectiva da existência humana e
posição teórica das relações entre o «económico» e o «social» entre as dimensões cognitiva, emocional e afectiva do com-
conduzindo, necessariamente, à redefinição destes mesmos portamento humano abrem perspectivas para o aprofun-
termos (Laville 1994, p. 312). damento teórico sobre as possibilidades da inovação social,
Bloco temático José Manuel Henriques 98 99

nomeadamente, através da identificação de novas oportuni- O projecto Aim@Te, em particular, criou uma proposta de
dades para a criação de novas formas organizativas e para acção com base na experimentação desenvolvida que ilustra:
a concretização de soluções no plano económico.
•Como é possível contrariar a «não-emergência» espontâ-
Na sequência dos trabalhos de Karl Polanyi, as perspec-
nea de iniciativa e capacidade organizativa para alcançar
tivas convergem também no entendimento de que o «eco-
mudanças nos contextos territoriais facilitadoras de «in-
nómico» da sociedade não se restringe ao «mercado» e que
tegração económica» de pessoas em situação de pobreza
se verificam efeitos indesejáveis quando tal acontece (Po-
e como poderá ser concretizada a «animação territorial»
lanyi 1977; Stiglitz 2010). Por outro lado, contrariamente à
orientada para a obtenção desse efeito;
perspectiva neo-clássica e vindo ao encontro da perspectiva
•Como é possível atribuir conteúdos substantivos às dife-
deixada por Keynes, não se pressupõe a capacidade de au-
rentes dimensões da acção orientada para a «integração
to-regulação automática dos mercados. Pelo contrário, só a
económica» de pessoas em situação de pobreza.
acção colectiva poderá evitar que se autodestruam.
As ilustrações em causa, reenviam, naturalmente, para
6. Os Contributos da Iniciativa Comunitária o reconhecimento da imprescindibilidade de posturas pró-
Equal à luz da Economia Social e Solidária activas por parte de entidades concretas no sentido da «ani-
A Iniciativa Comunitária Equal foi uma iniciativa comunitária mação territorial». As ilustrações organizam-se em torno de
financiada pelo Fundo Social Europeu, que è semelhança de três dimensões centrais: «novas formas de governança» e
outras iniciativas (Pobreza I, II, III, Leader, Urban, Emprego acção de base territorial, estratégias de animação e estraté-
& Adapt, etc.), teve por missão a experimentação para a ino- gias de mobilização de conhecimentos, aprendizagem e de-
vação nas políticas públicas. Promoveu experimentação alar- senvolvimento de competências.
gada no domínio do aperfeiçoamento das respostas no comba-
te à discriminação e à desigualdade no acesso ao emprego. 6.1 «Novas formas de governança»
A partir da Rede Temática «Animação Territorial», da 2ª e acção de base territorial
fase do desenvolvimento da Iniciativa Comunitária Equal O enfoque em torno «governança» reflecte a transição entre
em Portugal, o Projecto Anim@Te experimentou um mode- um modelo de regulação social assente no papel central do
lo de disseminação e mainstreaming com base nos resulta- Estado («governação») para um modelo assente em parce-
dos dos projectos envolvidos nessa rede temática (Henri- rias ou outras formas de associação entre organizações go-
ques 2008, 2009). Mostrou que é possível conceber a acção vernamentais e não-governamentais em que o Estado man-
para a «integração económica» em moldes não convencio- tem tarefas de coordenação.
nais, mostrou como é possível concretizá-la e como é possí- Os projectos Equal da Rede Temática 5 mostraram como
vel contribuir para a capacitação de organizações concretas é possível promover a integração territorial de políticas atra-
(Câmaras Municipais, Agências de Desenvolvimento Local, vés de maior coordenação interinstitucional, como é possível
etc.) quando se trata de superar «deficits de competências» promover activamente a cidadania (facilitação da capacida-
para dar expressão real à «inovação social» que se reconhe- de de iniciativa e organização, etc.) através de formas inova-
ce como necessária mas que envolve um esforço de recon- doras de participação social para a definição de prioridades
ceptualização da acção.
Bloco temático José Manuel Henriques 100 101

colectivas na afectação de recursos públicos (orçamento par- satisfação envolvendo de forma complementar a promoção
ticipativo, etc.), e mostraram como é possível partir de par- da autodeterminação selectiva, «percursos integrados» de
cerias locais «formais» («Parcerias para o Desenvolvimen- acesso ao emprego, «empreendedorismo inclusivo», adensa-
to», etc.) e evoluir para formas efectivas de governança local mento da espesssura institucional local ou identidade terri-
com base em «parcerias de acção» (grupos de trabalho in- torial para a diferenciação competitiva.
terinstitucionais, interorganizacionais e interdisciplanres
centrados em aspectos específicos da acção, etc.). 6.3 Estratégias de mobilização
de conhecimentos, aprendizagem
6.2 Estratégias de animação e produção de competências
Em estratégias de animação, trata-se da criação de novas A animação pressupõe um desempenho pro-activo, simulta-
formas organizativas e de condições de auto-sustentação da neamente informado por antecipação estratégica e um pro-
acção visando a animação comunitária (animação de gru- jecto de mudança possível. Trata-se de um domínio de acção
pos, funções de acompanhamento e de consultoria, organi- exigente para as equipas técnicas.
zação de interesses, etc.). Os projectos representados pelo projecto Anim@Te mos-
Tal pressupõe a possibilidade de construir um «projecto- traram como é possível agir de modo a reconhecer, valo-
esperança» para a mobilização colectiva a partir de imagens rizar e mobilizar todas as formas de conhecimento cons-
de futuro sem recurso a memórias colectivas de passados par- truindo os procedimentos adequados ao efeito. Os projectos
tilhados e a possibilidade de que formas de organização locais mostraram ainda como é possível partir de diferentes for-
possam assegurar a continuidade da acção. Pressupõe a cons- mas de conhecimento e como é possível promover o diálogo
trução da esperança e da confiança a partir de relações in- entre essas formas de conhecimento como via para a mobi-
terpessoais, ou seja, equipas técnicas com competências espe- lização integral de recursos locais para o desenvolvimen-
cíficas e genéricas e com presença física local continuada. to. O projecto «Prometrur» ilustra de forma detalhada como
Os projectos Equal da Rede Temática 5 mostraram como esta perspectiva pode ser aprofundada. O projecto mostrou
é possível associar a animação para a cidadania à inova- como é possível agir de modo a promover esse tipo de diálo-
ção nas formas organizacionais criando condições para a go a partir da escola e como por essa via é possível reencon-
superação da ausência de condições para a acção colecti- trar um novo papel activo para os contributos das criancas,
va e para a mobilização de recursos em torno de um projec- dos jovens e dos mais velhos enquanto agentes de desenvol-
to de mudança colectivamente assumido. Mostraram ainda vimento não convencionais. Os projectos mostraram tam-
como é possível agir para criação de uma identidade ter- bém como é possível agir de modo a desenvolver competên-
ritorial positiva e para a capacitação individual e colecti- cias em moldes não convencionais. O projecto «Florestar»,
va a partir das unidades territoriais de intervenção. Mos- por exemplo, agiu para a promoção do empreendedorismo
traram como a promoção do acesso ao emprego no âmbito entre os pequenos proprietários florestais. Ao criar um si-
mais alargado da promoção do acesso à cidadania, coloca a mulador de gestão com acesso pela internet mostrou como
necessidade de situar o contributo do emprego para a sa- é possível criar condições para a produção de competências
tisfação de necessidades humanas num contexto global em por vias não estritamente dependentes do sistema formal
que se acentua a crescente dependência mercantil da sua de educação e formação.
Bloco temático José Manuel Henriques 102 103

7. Estratégias de animação Os projectos Equal do projecto Anim@Te mostraram


para a integração económica como é possível agir para a concretização da diminuição da
A diminuição da dependência do mercado na satisfação de dependência mercantil na satisfação de necessidades hu-
necessidades pode ser conjugada com a organização indivi- manas e como é possível associar soluções nesse domínio
dual e colectiva que vise o alargamento de possibilidade de a formas organizativas facilitadoras do reforço da interde-
acesso ao emprego, ao rendimento e à realização de direitos pendência social e da cidadania. Ao promover a animação
sociais. Como se viu torna-se necessária uma visão integra- para a cidadania (orçamento participativo) e ao estimular a
da das respectivas interdependências assim como qua- organização da produção para auto-consumo e para a orga-
dros de acção não convencionais. nização de transacções para a comercialização local de exce-
Entretanto, e conforme já foi possível analisar ao longo dentes («clubes de trocas» com emissão de moeda local, rede
da década de 1990, tem vindo a acentuar-se do peso relati- de voluntariado, encontros temáticos) o projecto «São Brás
vo do emprego em PME (Henriques e Madruga, 1996). Po- Solidário» experimentou com formas diversificadas de con-
rém, esse peso crescente de microempresas e pequenas em- tribuir para o reforço da autodeterminação territorial.
presas no emprego não ocorre por crescimento homogéneo
no conjunto das empresas. Apenas poucas empresas se ex- Animação de <percursos integrados>
pandem de forma significativa contribuindo para um saldo A colocação e a formação profissional não constituem res-
global positivo e criando a ilusão de um crescimento homo- postas suficientes na facilitação do acesso ao emprego por
géneo. Mas, como também já era então verificável, o princi- conta de outrém no contexto contemporâneo. A abordagem
pal contributo para a criação de emprego verificava-se não por «percursos integrados» na facilitação do acesso ao em-
através da expansão do emprego nas empresas existentes prego conhece já algum consenso no contexto Europeu.
já existente, mas através da nova iniciativa empresarial. A identificação prévia das oportunidades efectivas de em-
prego (identificação das empresas locais e não locais com po-
Autodeterminação selectiva tencial efectivo de criação de emprego, identificação de poten-
e animação económica <total> cial de expansão do emprego em estabelecimentos existentes
Criar condições facilitadoras de uma maior autonomia face ou em constituição, etc.) e a combinação de acções de desen-
a consumos que se possam tornar evitáveis pode merecer volvimento pessoal, «conscientização» e formação profissiona-
atenção prioritária. A produção agrícola para auto-consu- lizante mostram-se necessárias face a situações concretas.
mo, a auto-construção, o trabalho voluntário em associações Os projectos representados na rede temática «Percursos In-
locais ou a organização colectiva para a guarda de crianças, tegrados de Formação-Inserção-Emprego» (1ª fase) (Henriques,
são exemplos da concretização possível dessa perspectiva. J.M., 2005) e os projectos representados no projecto Anim@Te
A relevância da produção de valores de uso no «econó- mostraram como é possível concretizar a facilitação do acesso
mico» local não é perceptível através de abordagens mais ao emprego através de abordagens por «percursos integrados»
convencionais (Friedmann, 1992; Weaver, 1984; Wheelock, envolvendo directamente as empresas potencialmente empre-
1992). No entanto, pode desempenhar um contributo rele- gadoras e facilitando relações directas entre potenciais empre-
vante na reconstituição de condições facilitadoras da «inte- gadores e os candidatos às oportunidades criadas.
gração económica».
Bloco temático José Manuel Henriques 104 105

Animação do <empreendedorismo inclusivo> Será interessante recordar que já foi possível mostrar
Conforme já assinalado, cada vez mais o acesso ao emprego como o sucesso económico das Iniciativas Locais de Empre-
se torna dependente de novo emprego e cada vez mais novo go (ILE) depende claramente de factores não estritamente
emprego depende da nova iniciativa empresarial (e menos «económicos» no sentido convencional (Henriques, Baptis-
da expansão do emprego nas empresas existentes). O auto- ta e Lopes 1991). O sucesso mostrou-se claramente associa-
emprego e a criação de microiniciativas empresariais cons- do à qualidade das relações interpessoais, à possibilidade
tituem uma oportunidade a explorar. de existência de empréstimos de familiares, de entreajuda
Porém, face à realidade de pessoas em situação de de- no seio dos agregados domésticos ou da experiência profis-
semprego, ou precariedade no emprego, não é de esperar a sional de familiares e amigos. Nas estratégias empresariais
emergência espontânea e generalizada de iniciativas em- prosseguidas foi possível evidenciar a relevância de facto-
presariais formais. Antes do acesso ao financiamento colo- res independentes do preço no comportamento dos clientes
cam-se questões a merecer atenção prévia. (simpatia, confiança, solidariedade).
A animação da mudança de atitudes e comportamento, a
adequação das estratégias empresariais e a organização da Animação económica local
comercialização são alguns dos domínios críticos que reque- e adensamento da espessura económica local
rem a pre-existência de organizações específicas e a ade- O processo contemporâneo de globalização exprime-se de
quada conceptualização da acção. Abordagens mais conven- forma diferente e única em cada contexto territorial. Tra-
cionais não são suficientes. O microcrédito tem polarizado a duz-se sempre por formas diversas de reestruturação pro-
atenção em torno desta temática. Porém, apenas constitui dutiva e organizativa. É o caso dos processos de desintegra-
uma das dimensões de acção necessária (Sirolli, 1999). ção vertical e de sub-contratação em cadeia.
A partir da sistematização de resultados dos projectos da Os projectos representados no projecto Anim@Te Equal
Iniciativa Comunitária Equal a nível europeu, foi criada uma mostraram como é possível agir de modo a criar formas de
«comunidade de prática» para o «empreendedorismo inclusi- maior interdependência entre as organizações locais e de
vo». O acesso ao financiamento é a quarta de um conjunto de adensamento da espessura das relações económicas intra-
dimensões a ter em conta: cultura e condições, apoio ao arran- locais de modo e alargar oportunidades de acesso ao empre-
que, consolidação e crescimento e acesso a financiamento. go e de estimulação do empreendedorismo.
Os projectos representados no projecto Anim@Te Equal A redefinição do «económico» local na animação para o
mostraram como é possível agir de forma a concretizar pro- rendimento, o emprego e a cidadania, obriga a centrar a
jectos empresariais para quem não tem alternativas de atenção nas relações de interdependência e de fronteira.
emprego no sistema formal de emprego envolvendo acção Trata-se menos de centrar exclusivamente a atenção nas
específica para a atitude empreendedora, apoio ao arran- empresas ou nos desempregados, ou entre os sectores for-
que, apoio à inovação e consolidação de estratégias empre- mal e informal. Trata-se de analisar os modos de articula-
sariais adequadas e acesso ao financiamento. ção entre as diversas formas de organização da actividade
económica e as relações sociais em torno das quais se mate-
rializam as interdependências (agregados domésticos, asso-
ciações, empresas, etc.).
Bloco temático José Manuel Henriques 106 107

Identidade territorial Ao propôr uma atenção privilegiada à reconstrução das re-


para a diferenciação competitiva lações entre Estado e sociedade e entre o «económico» e o «so-
A criação de novas oportunidades colectivas poderá surgir cial», e ao valorizar a qualidade das relações interpessoais como
beneficiada pela existência de uma identidade territorial condição para a constituição da acção colectiva e ao associar-se
facilitadora do esforço de mobilização colectiva. a formas organizativas diversas de natureza solidária e demo-
Os projectos representados no projecto Anim@Te mos- crática, a Economia Social e Solidária permite abrir perspecti-
traram como é possível agir de modo a construir uma iden- vas para as políticas públicas nas condições contemporâneas.
tidade territorial positiva e diferenciadora para a afirma- Por outro lado, ao abordar o «económico» numa perspec-
ção de vantagens competitivas de base local. O projecto tiva plural não o reduzindo ao «mercado», ao afirmar a im-
«Parques com Vida», por exemplo, mostra como é possível prescindibilidade da acção colectiva na regulação mercan-
agir para a valorização da identidade territorial, para a sua til e ao afirmar o carácter incontornável do Estado nas suas
incoporação na construção de vantagens competitivas por funções de capacitação, redistribuição e realização de direi-
parte das empresas locais e nas formas organizativas asso- tos, a Economia Social e Solidária oferece um quadro alar-
ciadas à gestão de uma «marca» associada à promoção des- gado de possibilidades de concretização na forma de respon-
sa identidade (Associação Parques com Vida). der aos problemas contemporâneos.
As experiências de projectos da IC Equal facilitam uma re-
8. A Economia Social e Solidária, flexão sobre as potencialidades dos contributos da Economia
políticas públicas e a <inovação social> Social e Solidária na acção contra a contra a pobreza nas con-
para a <integração económica> dições contemporâneas. As relações sociais, os valores e as
As políticas públicas constituem a concretização da acção «ideias agregadoras» desempenham um papel decisivo na cons-
estatal. Contêm implícito um entendimento sobre o papel do trução de soluções. Estão em jogo mudanças de comportamen-
Estado na regulação económica e, em geral, um modo parti- tos e atitudes em função de «projectos‑esperança» referencia-
cular de entender as relações entre o Estado e a sociedade. dores da acção. Foi possível obter comportamentos e atitudes
O contributo da Economia Social e Solidária para a inova- individuais não exclusivamente dominados pelo egocentrismo
ção nas políticas públicas situa-se, exactamente, na possibi- individual.
lidade que oferece para reconfigurar o papel do Estado para
garantir a coesão e a protecção social com base em novas for- Modelos organizativos e condições para a acção
mas de solidariedade face à crise contemporânea do welfare- A construção de novas formas de governança envolvendo a
state. Ao privilegiar o primado da acção colectiva com base integração territorial das políticas para uma maior coorde-
na qualidade de relações interpessoais e a existência de pro- nação interinstitucional, envolvendo parcerias locais «for-
jectos-esperança referenciadores da mobilização colectiva, e mais» para o aprofundamento do trabalho colectivo em tor-
ao privilegiar a «intencionalidade» humana em alternativa à no de «parcerias de acção» e envolvendo formas inovadoras
estrita racionalidade individual pressuposta no paradigma de participação social para a definição colectiva de priorida-
dominante da Ciência Económica, a Economia Social e Soli- des são exemplos de domínios que ganham nova projecção à
dária abre novos horizontes para a «inovação social», em ge- luz da Economia Social e Solidária.
ral, e para a inovação possível nas políticas públicas.
Bloco temático José Manuel Henriques 108 109

A realidade do desenvolvimento de grupos de trabalho in- contexto relacional (agregado doméstico, relações familia-
terinstitucionais, interorganizacionais, interdisciplinares ou res e de parentesco, relações de vizinhança, etc.) em que se
multiculturais centrados em aspectos específicos da acção, situa o potencial empresário. As mudanças em causa pres-
concretiza-se através da qualidade da relação interpessoal supõem a confiança pessoal em quem desenvolve a acção
que possa ser construída entre representantes formais das de animação. As estratégias empresarias não podem deixar
organizações envolvidas. A qualidade da relação interpesso- de contar com acompanhamento técnico e contemplar facto-
al pressupõe tempo para a construção da confiança sem a res independentes do preço na transacção dos produtos (co-
qual o diálogo e a acção colectiva não são possíveis. nhecimento interpessoal entre produtor e consumidor, etc.)
e na organização da comercialização (centralização da co-
Estratégias de intervenção mercialização, etc.). A concretização do «empreendedoris-
A animação para a «integração económica» no âmbito da ac- mo inclusivo» depende necessariamente do contexto rela-
ção contra a pobreza, envolve domínios diversificados quando cional em que se situa a da qualidade da postura pró-activa
o «económico» é redefinido e deixa de se restringir à reinserção de quem o promove.
individual no sistema formal de emprego (colocação, formação As organizações da Economia Social e Solidária podem
profissional, etc.). A economia não se restringe ao mercado, a contribuir para contrariar a não-emergência de capaci-
satisfação de necessidades não se restringe à procura em mer- dade organização de acção colectiva para a «integração eco-
cado, a produção de riqueza não se restringe à produção de va- nómica» para além da prestação directa de apoio na priva-
lores de troca e pode também envolver a produção de valores ção. Estas organizações podem contribuir para a promover
de uso, a consciência crítica no consumo ganha um novo sen- a concretização do envolvimento de todos os domínios das
tido, o apoio aos agregados domésticos pode ser perspectivado políticas públicas relevantes e estimular o envolvimento
na construção de «estratégias de sobrevivência» (combinando alargado dos agentes sociais em estratégias de desen-
a produção de valores de uso e de troca) e alarga-se o horizon- volvimento de base territorial (desenvolvimento local), com
te de possíveis formas organizativas para além das empresas base na percepção explícita da respectiva interdependên-
capitalistas (empresas sociais, etc.) e do Estado. cia e com base na percepção relativa à diversidade espa-
Também o domínio da acção no acesso ao rendimento cial e à especificidade local das possibilidades de acção.
e ao emprego se alarga. A construção de «percursos inte- A cooperação de base territorial entre Municípios e or-
grados» envolve a identificação prévia de oportunidades, os ganizações da Economia Social e Solidária na mobiliza-
empresários são convidados a implicar-se directamente na ção das comunidades locais para a «integração económica»
definição de necessidades de formação e os potenciais can- (atribuições, competências e recursos das Câmaras Muni-
didatos são envolvidos em processos de qualificação orien- cipais, promoção da inovação neste domínio, etc.) ganha
tados para as possibilidades identificadas. um novo sentido e uma nova projecção potencial. Assim se
A animação para o empreendedorismo também se alar- poderá contribuir, por exemplo, para criar condições para
ga através da percepção de que a acção não se pode restrin- que organizações da sociedade civil (associações de de-
gir ao potencial empresário «individual» nem a criação de senvolvimento local, associações empresariais, etc.) pos-
emprego por essa via se reduz ao acesso a capital. A mu- sam conhecer condições de auto-sustentação da sua ac-
dança de atitude e comportamento ou a facilitação da con- ção a partir do reconhecimento da imprescindibilidade do
cretização de ideias de projecto pressupõe a percepção do seu contributo em funções socio-económicas de animação
Bloco temático José Manuel Henriques 110 111

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with Economics, London, Anthem Press Vol. VII , p.16 Harvard Business School Press (acedido em 30 de Maio 2010)
Contribuição

Abstract Re sumo

Trocas por cá — Mercados


Solidários pela voz
de um prossumidor
Os mercados solidários são uma
Mario Montez Solidarity Markets prática de economia solidária que
by a prosumer se estreia timidamente em Portugal
Solidarity markets are a solidarity mas que surgem na vanguarda
economy practise timidly beginning do quadro da «outra economia».
in Portugal but arising at the A partir das experiências de duas
forefront of «the other economy». organizações precursoras desta
From the experience of two pioneer prática apresentam-se os princípios
organizations, we present the e as acções inerentes aos mercados
principles and actions that are solidários. Do contacto pessoal com
inherent to solidarity markets. os mercados solidários reflecte-
Personal contact with solidarity se em torno das práticas, dos
markets is reflected on practices, sucessos e dos constrangimentos,
successes and constraints on the no contexto da economia solidária,
context of solidarity economy, da animação sociocultural, da luta
socio-cultural animation, fight contra a pobreza e da exclusão
against poverty, social exclusion, social, da educação, e da sua
education and its importance as a importância enquanto metodologia
local development methodology. To de desenvolvimento local. Em
conclude, the importance and the conclusão explica-se a importância
advantages of a solidarity based e oportunidades de uma prática
economy are explained, taking the económica baseada na solidariedade,
present crisis into account. no quadro da crise actual.
Contribuição Mario Montez 116 117

Introdução A economia solidária é geradora de inclusão social e de


Não é difícil, logo num primeiro momento, compreender como identidade territorial porque é «estimulada por meio do en-
a prática de trocas de produtos, que aqui se apresentam como gajamento cidadão em questões de interesse comum, o que
mercados solidários, se inscreve no campo da economia solidá- a conduz à criação de espaços públicos de proximidade»
ria. Nem como a economia solidária é um importante contri- (Laville, 2009, p.162). Espaços esses que contribuem para
buto para o desenvolvimento local e para a erradicação da po- sedimentar as bases de um modelo social democrático e
breza e da exclusão social. São estas dimensões que conferem participativo, representado em quatro espaços físicos e sim-
um especial interesse científico, político e social a esta forma bólicos: doméstico, mercantil, público e solidário (Estivill,
de economia integrada no âmbito da «outra economia1». 2008, p. 6). A economia solidária surge como revitalizadora
Esta consideração carece de esclarecimento para não se da democracia porque supõe novas formas de participação
perder numa afirmação infundamentada. É precisamente e de projecção política (Estivill, 2008, p. 4). As diversas for-
a clarificação desta prática e das suas múltiplas vertentes mas de economia solidária apresentam sempre um campo
socioeconómicas que este artigo apresenta, através da ex- de relações directas e de estabelecimento de redes entre as
periência pessoal e das vozes participantes2 em mercados pessoas, o que lhes confere um carácter humano. As pesso-
solidários. as são levadas a participar na manutenção e monitorização,
ou se quiser, na gestão, de qualquer uma das formas que re-
Os mercados solidários e a economia solidária presentam a economia solidária.
Falar de mercados solidários obriga a falar de economia Observa-se nesta participação uma transformação no
solidária. Este conceito alude a uma economia que existe modo como as pessoas se relacionam com o seu meio socioe-
para além das formas dominantes da economia de merca- conómico e ambiental tornando-se um dos atributos mais in-
do, orientadas para o lucro. Neste contexto, Jordi Estivill teressantes e revolucionários desta forma de economia. Pois
dá-nos conhecimento de várias economias. Uma economia é nesta dinâmica que as pessoas deixam de lado a sua con-
capitalista de mercado baseada na acumulação de riqueza, dição de pessoa consumidora para se apresentarem enquan-
uma economia pública, baseada na redistribuição, uma eco- to pessoa participante 4. Esta característica da economia so-
nomia doméstica centrada na dádiva e uma «otra economía lidária, só por si revolucionária, tem uma importância vital
articulada en torno de la solidaridad» (Estivill, 2008, p. 4). na vida e no desenvolvimento das comunidades. É por isso
Com efeito, a economia solidária ou a economia da solidarie- que a economia solidária se tem tornando uma estratégia de
dade3 (Razeto, 1993 p. 39) emerge do conceito e do sentimento animação sociocultural, instrumentalizada por vezes para
de solidarização que confere um significado especial a este sis- gerar mobilização numa comunidade. Por todas estas razões
tema económico. Trata-se de um conjunto de actividades que a economia solidária qualifica-se, para Laville, como um ac-
têm em comum a priorização da solidariedade sobre o interes- tor da «solidariedade democrática» (Laville, 2009, p.166).
se individual e o ganho material, manifestando-se através da Os mercados solidários surgem deste quadro de alterna-
socialização dos recursos produtivos e de critérios igualitários. tivas à estrangulante economia capitalista e aos seus in-
A economia solidária é «uma forma solidária de economia que felizes resultados (que presenciamos na actual conjuntura
aposta na produção de bem-estar colectivo, em detrimento da de crise económica e social) no âmbito da igualdade e da
acumulação de riqueza em poucas mãos» (Soares, 2008, p. 35).
Contribuição Mario Montez 118 119

justiça social. Visam uma prática de trocas quase directas Não gerar especulação
entre produtos, assente em princípios e orientações de ín- Não se aplica a lei da oferta e da procura nos mercados so-
dole solidária nas quais as pessoas tomam parte e acção. lidários. Por isso os preços definidos mantêm-se. Este factor
atribui a este sistema de troca um carácter realmente soli-
Os Mercados Solidários, pelas experiências dário, uma vez que não se baseia na maximização do lucro e
da Granja do Ulmeiro e de São Braz de Alportel tem como objectivo o escoamento dos produtos em direcção
Formalmente e originalmente constituídos como clubes de a quem necessita, evitando também a acumulação, quer de
trocas com recurso a moeda social, (Soares, 2008) os mer- produtos, quer da moeda social.
cados solidários são espaços e momentos de troca de produ- Ser Prossumidor
tos e de serviços com recurso a uma moeda «cunhada» pela O princípio que em muito contribui para a diferenciação des-
comunidade cujo valor de referência é definido pelas pesso- te sistema inscreve-se no conceito de prossumidor. Qualquer
as que dela fazem parte. Trocando produtos com recurso a pessoa que deseje ser consumidora neste tipo de mercados
uma outra moeda as pessoas podem aceder a bens e servi- terá de ser ela também produtora. Este princípio não só tor-
ços que não estariam ao seu alcance e podem utilizar o di- na as pessoas participantes como equilibra os pratos da ba-
nheiro oficial para outras finalidades. lança do consumo e da produção, contrariando a realidade
Três princípios básicos presidem a este sistema de trocas: económica tradicional que assenta fundamentalmente no
Moeda Social consumo e que tem demonstrado resultados desastrosos, do
A moeda social não tem valor igual à moeda oficial por esta ponto de vista social. Assim, os mercados apresentam uma
se encontrar associada ao valor do barril do petróleo e às grande diversidade de produtos e de serviços, tornam-se ex-
suas condicionantes oscilações no mercado internacional. A periências pedagógicas, de desenvolvimento pessoal e pro-
moeda social é valorizada tendo por referência um outro va- porcionam também momentos de convívio e de participação
lor, atribuído pela comunidade participante nos mercados. da comunidade.
A partir deste valor de referência estabelecem-se os preços A preparação e a realização dos mercados solidários exi-
dos produtos existentes no mercado. A moeda social é ofere- ge uma organização atenta e militante. Os princípios fun-
cida a todas as pessoas participantes desde o momento em damentais dos clubes de troca com moeda social não podem
que se inscrevem e identificam os produtos que terão dispo- nunca ser esquecidos e têm de ser conscientizados 5 pelos
níveis para troca. Cada comunidade participante define re- participantes.
gras em torno da reserva de moeda social de um mercado Para organizar um mercado social é necessário, à parti-
para outro. No entanto a acumulação de moeda é desenco- da, um grupo diversificado de pessoas interessadas em tro-
rajada, a fim de garantir que a moeda social circule e seja car bens e serviços entre si. Para além deste pressuposto
utilizada na troca de produtos. De outra forma estaríamos inicial é exigida uma multiplicidade de tarefas:
a enveredar por um caminho de economia marcada pelas •Levantamento dos produtos ou serviços oferecidos;
regras do capitalismo. •Escolha de um espaço com boas condições;
•Marcação de datas e horários para funcionamento
do mercado;
Contribuição Mario Montez 120 121

• Criação de áreas para exposição dos produtos ou para de Faro) a In Loco, organizadora, até hoje, de sete merca-
prestação dos serviços; dos solidários, refere a importância da prospecção inicial,
• Criação e preparação da moeda social; percebendo o que as pessoas podem oferecer como produ-
• Constituição de uma equipa de organização e apoio ao tos ou serviços. Já depois de inscritas as pessoas interessa-
funcionamento do mercado e dos prossumidores ; das e identificados os produtos de oferta e as expectativas
• Definição de uma estratégia de animação que condu- de procura, foi escolhido, no Algarve, o nome da moeda so-
za pedagógica e atractivamente a realização do mercado, cial como «Solidários». Independentemente do nome a im-
desde a sua abertura ao seu término, passando por um portância está no facto de que a moeda social e o seu valor
momento de avaliação; são atribuídos pela comunidade que participa no mercado.
• Elaboração de um jornal onde conste informação sobre A participação das pessoas neste e noutros processos dos
o mercado, os produtos e serviços, e seus prossumidores; mercados solidários confere a esta prática económica uma
• Realização de um encontro prévio com as pessoas in- dimensão própria no quadro do desenvolvimento comunitá-
teressadas para partilha dos princípios e definição de al- rio por deixar que sejam as pessoas as protagonistas, acto-
gumas essenciais ao mercado, assim como do nome e va- res e actrizes, de um caminho de mudança.
lor de referências da moeda social; Contudo, por vezes a novidade da actividade intimida
• Criação de um banco central que disponibiliza a moe- muita gente mas «os receios face ao inédito dissipam-se na
da social aos prossumidores inscritos, no início do merca- acção e as respostas só podem ser encontradas à medida que
do, e a recolhe no final. (Soares, 2008, p. 35-40). se percorre o caminho» (Soares, 2008, p. 41). Esta dificulda-
de na mobilização inicial das pessoas pode-se até prolongar
Este elenco de tarefas é fundamental na realização de
se as mesmas não entenderem os princípios e as vantagens
mercados solidários. Delas depende o sucesso do mercado
dos mercados solidários. Por isso, não querendo desvirtuar
e a compreensão que os participantes terão desta forma de
a natureza etnográfica destas práticas, a In Loco preferiu
trocas de bens e serviços, assim como a sustentabilidade
confiar na capacidade para conquistar as pessoas à medida
dos mesmos.
que ia realizando futuros mercados solidários. Envolveu, as-
Os mercados solidários contemplam uma componente de
sim, pessoas da comunidade, de organizações locais e tam-
animação sociocultural e uma componente pedagógica.
bém do corpo docente da escola secundária. Uma curta dra-
Os testemunhos das organizadoras e organizadores de mer-
matização foi apresentada com vista a explicar a «função
cados solidários da AJPaz e da IN Loco conduzem a esta
do dinheiro enquanto instrumento facilitador das trocas e a
conclusão com exemplos das suas práticas. Adoptando uma
funcionar como um momento lúdico de abertura do Merca-
moeda social denominada «Granjas» os mercados realiza-
do» (Soares, 2008, p. 42). O objectivo não era apenas reali-
dos pela AJPaz na Granja do Ulmeiro (no concelho de Sou-
zar mas principalmente envolver as pessoas enquanto agen-
re e a 20 Km de Coimbra) têm contado com actividades cul-
tes de desenvolvimento local, compreendendo a natureza e
turais como a actuação de ranchos folclóricos, oficinas de
potencialidades deste sistema de trocas. Da avaliação feita
animação para crianças, merendas sociais, jantares de con-
com as pessoas no final do mercado foi reconhecido o poten-
vívio, ilusionismo, fados e contos de estórias. Na Serra Al-
cial e o interesse em prosseguir com novas edições.
garvia, em São Braz de Alportel (cerca de 15 Km a norte
Contribuição Mario Montez 122 123

A avaliação e a reflexão sobre os mercados são obrigatoria- a In Loco tem protagonizado um papel essencial na disse-
mente uma constante preocupação. A avaliação, que se pro- minação desta prática, promovendo a aprendizagem sobre
cessa após o término de cada mercado, deve ter também um mercados solidários através da formação de futuros agentes
carácter lúdico. Geralmente recorre-se a técnicas de anima- educativos. Deste trabalho, realizado em parceria com es-
ção e à arte e criatividade dos organizadores para que con- colas de educação do ensino politécnico e universitário, tem
cebam uma forma de avaliação simples mas credível, séria resultado não só a experimentação, reflexão e realização pe-
mas descontraída. Uma avaliação em que as pessoas partici- riódica de mercados solidários por todo o país, como tam-
pem e façam ver o sucesso ou insucesso de cada mercado. bém a promoção de práticas a eles associadas. Exemplo dis-
Também a reflexão prévia sobre a organização de cada to é o início da produção e do ensino prático de agricultura
mercado e dos futuros mercados é um aspecto importante. biológica na Escola Superior Agrária de Santarém.
Com esta preocupação os mercados da Granja do Ulmeiro Ao longo de quatro anos, e sete edições diferentes de mer-
têm sido antecedidos pela realização de encontros que «ser- cados solidários, a In Loco aprendeu que, realmente, o ca-
vem para debater e construir comunitariamente a metodo- minho de uma iniciativa desta natureza é feito pelas pesso-
logia de trabalho e começar a introduzir processos de mu- as e que a aprendizagem é contínua. Os momentos menos
dança» (Frade, 2008, p. 112). Nestes momentos as pessoas felizes foram marcados pelo cruzamento de práticas clássi-
colocam questões, levantam problemas, apresentam possí- cas capitalistas, como a reserva de produtos que condicio-
veis soluções, tecem observações críticas e dialogam, de for- nou a dinâmica do mercado, e pela vontade de alguns par-
ma interessada, sobre o futuro dos seus mercados. ticipantes em acumular moeda social de um mercado para
A realização de mercados solidários na Granja do Ulmei- o outro. No entanto, as experiências de convívio transpuse-
ro e também dos que a AJPaz iniciou em Coles de Samuel ram estas e outras dificuldades e tornaram os mercados so-
(concelho de Soure) é, actualmente, uma realidade para a lidários de São Brás de Alportel num acontecimento colec-
população de ambas as localidades, da qual fazem parte tivo embebido de grande uma diversidade de actores locais
como organizadores. Desde 2006 a AJPaz esteve envolvida que promovem o desenvolvimento comunitário.
na realização e/ou apoio a vinte mercados solidários em di-
versas localidades da região Centro de Portugal. «Ao lon- Reflexões em torno das práticas
go deste processo, o Mercado Solidário foi identificado como Se o contacto próximo com a organização de mercados soli-
um espaço alternativo de encontro entre as pessoas, de tro- dários é, em si, memorável, maior significado têm as expe-
ca de experiências, algo nunca visto, permitindo estar em riências como prossumidor. É esta condição que permite a
comunidade» (Frade, 2008, p.115). A moeda social na Gran- participação activa num clube de trocas como os mercados
ja tem agora um valor muito maior para as pessoas do que solidários. A participação como prossumidor pode-se dar em
apenas o que lhe é atribuído nos mercados e fortaleceu o duas vertentes: disponibilizando um produto ou disponibili-
sentimento de pertença à comunidade. «Ao mesmo tempo zando um serviço.
começam a perceber que a moeda «Granjas» lhes dá a opor- Os produtos podem ser diversificados, desde artesana-
tunidade de ter outros bens e serviços e, como tal, precisam to a produtos da terra. É possível levar para um merca-
de trazer mais produtos» (Frade, 2008, p. 115). Por seu lado do cerca de três ou quatro quilos de azeitonas e trocar por
Contribuição Mario Montez 124 125

uma série de produtos de artesanato, fruta e legumes, bo- convívio e de animação que caracterizou cada um dos mer-
los para saciar a fome, prendas para o Natal ou por um ser- cados. Na ESEC a escola encheu-se de um clima festivo e
viço de medição da tensão. de uma ansiedade geral antes do começo do mercado. Os
Os serviços são variadíssimos, desde massagens e medi- inícios dos mercados foram marcados por momentos de ani-
da da tenção a serviços fruto da criatividade de cada pes- mação na qual, uma das vezes, foi dramatizada uma conhe-
soa como um serviço de ideias e soluções para apoio à reso- cida estória sobre o ciclo de uma nota de dinheiro que, afi-
lução de problemas pessoais e académicos, como foi o caso nal, era falsa6. Nestas alturas houve sempre a preocupação
de uma experiência ocorrida num mercado da ESEC. Neste de passar uma mensagem pedagógica e ideológica orienta-
caso consistia em apoiar outros prossumidores a encontrar da para a educação para o consumo. Este momento de ani-
ideias ou soluções para problemas académicos ou pessoais. mação agregou os participantes no mercado de forma a se
Pedindo-lhes que escrevessem o seu problema, avançava-se encontrarem, a partilharem um momento e uma mensagem
depois com ideias em torno de uma possível resolução, tor- em comum. Foi um meio de as pessoas se conhecerem antes
nando-se a certa altura um processo conjunto entre o clien- de se tornarem prossumidoras em actividade.
te e o fornecedor do serviço. Descrevo esta experiência por Esta dimensão comunitária dos mercados solidários con-
permitir ilustrar um exemplo de um serviço simples que fa- templa também as assembleias comunitárias. São espaços
cilmente poderá ser adaptado a outras realidades e dispo- de partilha de informação, avaliação e de reflexão sobre os
nibilizado noutros clubes de troca com recurso a moeda so- mercados solidários realizados ou a realizar naquele con-
cial. Criando o seu próprio serviço torna-se relativamente texto territorial. Nesses momentos são igualmente repen-
fácil a participação de qualquer pessoa num mercado soli- sadas e reformuladas regras para que as mesmas se ade-
dário. E, quem sabe, responde-se assim a uma necessidade quassem à comunidade participante. É um momento em
sentida por outras pessoas. que cada participante pode partilhar a sua opinião e pro-
As trocas que se efectuam nos mercados solidários per- por alterações tomadas como convenientes ao melhor fun-
mitem o escoamento de excedentes e a troca de saberes. cionamento dos mercados, adaptando-se ao contexto social
E acontece num quadro alternativo à tradicional compra e de cada comunidade.
venda em vez de ambos os intervenientes na troca têm de Nestas experiências, o final dos mercados solidários foi
gastar dinheiro a adquirir o produto ou o serviço. Esta troca marcado com a realização de um momento cultural que as-
com moeda social contribui claramente para a diminuição sinalasse o culminar da actividade de trocas e que prolon-
dos gastos financeiros, sentido de forma muito significati- gue o convívio entre as pessoas. Mas se o carácter festivo
va em famílias com rendimentos reduzidos. Neste sentido dos mercados solidários é um marco significativo, pode-
os mercados solidários são ferramentas na luta contra a po- rá, por outro lado, contribuir para o desvirtuar da repre-
breza e na promoção da inclusão social, traduzido no facto sentação da comunidade face a esta prática solidária. Na
de uma pessoa poder ter acesso a serviços que à partida não avaliação e na reflexão sobre as práticas este factor foi evi-
tem acesso devido às suas condições económicas. denciado, gerando no entanto, uma preocupação que recai
Nas experiências que de participação em mercados soli- sobre a representação folclórica que os participantes pos-
dários aqui reportadas foi notório o ambiente de festa, de sam ter destas práticas, em oposição à vertente educativa
Contribuição Mario Montez 126 127

de consciência económica que se pretende que os mesmos Conclusões —  A fechar o mercado solidário
adquiram. Põe-se então a pertinente questão: serão os mer- Vimos como os mercados solidários são uma prática que se
cados solidários sentidos como folclore ou como recurso? estreia em Portugal e como as suas potencialidades lhe atri-
O perigo da folclorização7 de uma prática alternativa buem dimensões diferentes e complementares. Recordemos: a
desta natureza é uma constante. Tendo em conta o carácter dimensão da luta contra a pobreza e exclusão social; da anima-
contra-natura de uma economia baseada na solidarieda- ção sociocultural e do desenvolvimento local; a dimensão co-
de, inserida num contexto macro de uma sociedade capita- munitária e da participação; e a dimensão educativa. Os mer-
lista, as pessoas encaram esta prática de economia solidá- cados solidários apresentam ainda potencialidades que vão ao
ria como um momento de lazer. Não se pode esperar que encontro do desenvolvimento pessoal e da construção de redes
as pessoas, habituadas às práticas e lógicas capitalistas, sociais. São estas dimensões que reforçam o carácter alterna-
se rendam facilmente aos princípios da economia solidária tivo da economia solidária na procura de uma economia mais
(Leão, 2007, p.35). humanizada, perante a actual crise que atravessamos.
Esta é uma realidade absoluta e notória nas assembleias Segundo George Soros, no Fórum Económico Mundial de
de mercado ou nas conversam colaterais. E, principalmen- 2010, em Davos, refere que «a actual crise é uma super bo-
te, em algumas acções instintivas e tentações de subverter lha, gerada pelo próprio sistema ao fim de 25 anos a gerar
os princípios dos mercados solidários em actos rentáveis. bolhas menores sem ser capaz de as combater com eficá-
Exemplo disto são as tendências de acumulação de moe- cia.»8 Soros refere-se às facilitações da banca face a emprés-
da social e de subida de valor dos produtos conforme a es- timos e a negócios de alto risco, à demasiada confiança na
cassez do mesmo. Aspectos que merecem toda a atenção de economia de mercado e a uma cegueira por uma «ideologia
quem se aventura por esta outra economia e que não mui- fundamentalista de mercado que os levou a pensar que os
to dificilmente podem ser corrigidos, com uma atitude edu- mercados devem ser operados com pouca rigidez.»9
cativa e positiva. Efectivamente, a crise proveniente da banca e do terre-
Mas há também quem compreenda já a utilidade de um no da finança gerou uma crise à escala mundial que apro-
mercado solidário e que o aproveite para adquirir produtos funda a divisão entre as oportunidades para pessoas e po-
ou serviços que habitualmente não possuam ou aos quais não vos ricos, e para pessoas e povos pobres. Com isto dá-se o
tenham acesso, que precisam ou que lhe dão satisfação. alastramento da pobreza e das «exclusões sociais» (Cos-
O carácter comunitário dos mercados solidários é uma ta, 2007) produtoras, elas próprias, de novas formas de po-
realidade e com ele surge, evidentemente, um lado festi- breza e de exclusão, consoante os diversos cenários sociais.
vo e popular, muito necessário à congregação das pessoas Neste quadro têm surgido preocupações que incitam a uma
em torno de uma nova e diferente acção. É à educação que política de luta contra a pobreza e de promoção da inclu-
cabe o desafio de equilibrar o folclore atractivo dos merca- são social mais participativa, assente na tomada de decisão
dos com dimensão socioeconómica séria e de alternativa à a nível local. Tem sido referido, a este respeito, a necessá-
economia capitalista (Leão, 2007, p. 38). Um desafio cen- ria «ingerência neste campo de uma outra série de dinâmi-
trado numa educação e numa aprendizagem conjunta que cas resultantes de uma acção cívica e solidária com origem
conferem aos mercados solidários uma outra dimensão, e num processo ascendente, da sociedade civil para o Estado»
responsabilidade.
Contribuição Mario Montez 128 129

(Monteiro, 2004, p. 61) protagonizada pelos actores sociais As trocas que por cá se fazem são assim, ainda tímidas mas
e organizações locais da economia social. Realmente, es- repletas de entusiasmo e de reflexões, ambicionando uma tro-
tas têm-se afirmado e sido reconhecidas como potências do ca ainda maior e mais arrojada. Uma mudança de paradigma
desenvolvimento local, tornando-se parceiras de projectos económico e social onde se cambie o actual modelo por um mo-
de desenvolvimento integrado que visam a sustentabilida- delo de economia plural11 onde outras economias possam existir
de económica, ambiental e social. Medidas desta nature- e conviver. Simplesmente, uma troca em que todos ganham.
za participativa são já visíveis em iniciativas políticas que
tendem a atenuar o centralismo e a fortalecer as acções de
base local10. Por isso é possível prever um cenário propício
à criação de alternativas à economia capitalista através da
acção das organizações da economia social, da educação dos
actores locais e da animação sociocultural dos territórios.
Neste sentido pode-se afirmar que a crise actual reforça os
mercados solidários porque são forçosamente necessárias
alternativas criativas para a sobrevivência das populações
mais pobres e mais afectadas.
Através de aspectos das experiências levadas a cabo por
duas organizações não lucrativas e de desenvolvimento lo-
cal compreendemos como se caracterizam os mercados soli-
dários e o que é necessário à sua implementação. Compreen-
demos também as dificuldades e os resultados conseguidos.
Pretendeu-se abrir a reflexão sobre aspectos críticos e de
sucesso que contornam os mercados solidários e como se fa-
zem estas trocas por cá, nas terras portuguesas.
Para além de tudo o que poderá representar um merca-
do solidário numa pequena ou grande comunidade, eles são,
essencialmente, um instrumento educativo, e de animação
territorial, de mudança de mentalidade em relação à forma
de vida contemporânea baseada no consumo exacerbado. Os
mercados solidários conferem uma nova forma de estar so-
cial e comunitária e são uma aposta de desenvolvimento.
«As pessoas envolvidas ajudam-se mutuamente, procuram
uma justa distribuição do lucro e promovem a participação
activa de todos os elementos, com vista a um funcionamento
social solidário e democrático» (Soares, 2008, p.35).
Contribuição Mario Montez 130 131

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Solidária, resultante da vertente social et all, Dicionário Internacional da Outra
envolvente. Educação Popular», M. Gadotti,
do Projecto São Brás Solidário. Economia, Coimbra, Almedina
2
Os primeiros contactos com os F. GUTIÉRREZ (org), Educação
www.solidariedadecidada.org «La Dame de Condé». Estória da nota
mercados solidários experienciados 6

pelo autor aconteceram em 2007 falsa de André-Jacques Holbecq in: Un Comunitária e Economia Popular,
3
Este termo é utilizado pelo filósofo Jordi Estivill, 2008.
e 2008, enquanto docente na Escola
chileno Luís Razeto no início dos anos
regard citoyen sur l'économie. Sortir Col. Questões da Nossa Época,
Superior de Educação de Coimbra de la «pensée unique». Edições Yves «Espacios Publico y Provados,
90 na obra «Educação Comunitária São Paulo, Cortez Editora
(ESEC). Inicialmente numa iniciativa Michel, 2002, ISBN 2 913492 11 8. Construyendo Diálogos en Torno
e Educação Popular» organizada por
curricular dinamizada pela colega
Moacir Gadotti e Francisco Gutiérrez. a la Economia Solidária»,
Teresa Cunha, e apoiada pela Acção 7
Esta ideia e preocupação foi M. P. Soares, 2008.
Jovem para a Paz, e depois numa encontrada durante as reflexões sobre Lisboa, ISCTE-IUL
4
A «escada da participação» de Sherry Animação Cidadã para a Acção
parceria com a associação In Loco Arnestei baseia-se num modelo de 8 as práticas de mercados solidários na R. Campos Franco, 2005.
no projecto Solidariedade Cidadã. ESEC e foi explorada no relatório de Solidária. São Brás de Alportel,
graus de participação que evoluem O Sector Não Lucrativo Português numa São Brás Solidário
AJPaz – Acção Jovem para a Paz é uma em sentido ascendente, desde a estágio das alunas Ana Ponce de Leão e
associação sediada na Granja Manipulação ao Controle Cidadão, Maria Luísa Carvalho, actuais técnicas Perspectiva Comparada. EUA / Portugal,
do Ulmeiro (concelho de Soure, região quanto maior poder de decisão têm as superiores de Animação Socioeducativa. Jonhs Hopkins University e
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T. Santos, c. Cunha, (Org), 2008.
populações ou os «cidadãos sem-nada». Universidade Católica Portuguesa
nacional e internacional. Tem por Inspirado nesta tipologia e em outras line no site do projecto Solidariedade «Das Raízes da Participação – Reflexões
objecto «a construção da Paz, da teorias da participação fui observando Cidadã. www.solidariedadecidada.org/ Caminhantes». AJP, Granja do Ulmeiro
Democracia, da Justiça e da Igualdade que o exercício da cidadania na documentos/documento15.pdf P. Hespanha, 1999.
de Oportunidades entre Homens condição de pessoa participante «Em torno do papel providencial da
e Mulheres, envolvendo como forças
8
Exame Expresso. http://aeiou.expresso.
acontece após o exercício da cidadania
especialmente actuantes a juventude, pt/crise-actual-e-resultado-de-uma- sociedade portuguesa», Cadernos Referências Internet
da pessoa enquanto consumidora, num
as mulheres, as comunidades locais quadro ideológico, espiritual e social,
super-bolha-diz-george-soros=f560645. de Política Social, nº 1, p. 15-42
e outras populações desfavorecidas» 28 Janeiro 2010. Ajpaz.
e não apenas material. Só depois de
www.ajpaz.org.pt. In Loco – associação consumir é que os actores sociais têm 9
Idem. J.-L. Laville, L. I. Gaier, 2009. http://www.ajpaz.org.pt/.
de desenvolvimento local sediada em condições para tomar parte e ter acção
São Brás de Alportel (Algarve) que tem sobre o seu contexto social. 10
Por exemplo, o Projecto Solidariedade
«Economia Solidária», Dicionário Exame Expresso
por missão valorizar as pessoas Internacional da Outra Economia,
Cidadã e o Projecto São Brás Solidário
e as organizações, qualificar o território 5
Conscientização é um termo http://aeiou.expresso.pt/crise-actual-
foram desenvolvidos no âmbito da Coimbra, Almedina
de forma sustentável, promover a utilizado pelo pedagogo brasileiro e-resultado-de-uma-super-bolha-diz-
iniciativa Equal.
cidadania, apoiar o empreendedorismo Paulo Freire, conceito central na
e a iniciativa local e produzir sua filosofia da educação. Remete
george-soros=f560645. 28 Janeiro 2010.
11
Co-existência de diversos sistemas A. P. Leão, M. L Carvalho, 2007.
conhecimento de apoio à intervenção. para uma consciência crítica activa económicos. Ideia que tem sido referida
www.in-loco.pt. Solidariedade
ESECidadã, Relatório Final de Estágio In Loco
e para um conhecimento activo que e defendida pelo Professor Doutor
Cidadã – Projecto desenvolvido se vai desvendando gradualmente Rogério Roque Amaro. do curso superior de Animação Socio- http://www.in-loco.pt/site/index.php
Nota de leitura Jordi Estivill 132 133

Nota de leitura
Jordi Estivill

Esta nota de lectura no puede ser mas que heterodoxa. Des-


de otra periferia ibérica, el autor de la misma comparte tan-
tas ideas, tantos esfuerzos, tantas vicisitudes con José Hi-
pólito Santos que este comentario a su obra, solo puede ser
hecho desde una cierta complicidad. Por lo tanto tiene mas
de presentación, acompañamiento y reflexión posterior, que
de una nota de lectura distanciada y convencional.

El porque del libro


El punto de partida de Santos se encuentra en los inicios de
la segunda parte de su libro cuando constata que en los años
cincuenta del siglo pasado, existía «un buraco negro», un va-
cío, un desconocimiento profundo de la historia reciente del
cooperativismo en Portugal.
Este agujero negro parece tener una alarmante continui-
dad puesto que el mismo sostiene «Quando me envolví no
movimento coperativo, em 1955, não sabia nada do que aca-
ba de ser referido nas páginas precedentes, mas também
não o sabia até há bem pouco tempo (2006 / 2007)». Es de-
cir, que si bien en los años cincuenta se podía justificar, en
medio de la represión Salazarista y de la autocensura que
José Hipólito Santos
«Maneiras cooperativas de pensar e agir.
Contributo para história do Cooperativismo»
Ediçoes Universitarias Lusófonas. Lisboa, 2009.

Nota de leitura Jordi Estivill 134 135

fuera difícil conocer los orígenes de los movimientos sociales, Sant Denis de Paris. Alli constata el anquilosamiento uni-
ya es menos explicable que estas «histórias de velhos» sigan versitario y de las cooperativas francesas cada vez mas in-
siendo ignoradas en los tiempos actuales. ¿será que la pe- teresadas solo por la gestión empresarial y la eficiencia
sada losa y el silencio impuesto en las transiciones políticas económica. Se encuentra involucrado en el Mayo Francés
ibéricas siguen estando presentes? aunque como el mismo dice «As cooperativas, duma manei-
En cualquier caso, hacer presente la historia es el prin- ra geral passaram por cima e ao lado dos acontecimentos».
cipal objetivo de este estimulante libro que narra las prin- Conoce bien el mundo cooperativo de producción y el mu-
cipales acontecimientos que el movimiento cooperativo por- tualista francés y se especializa en las dinámicas participa-
tugués ha vivido desde los años treinta del siglo pasado tivas y sus consecuencias organizativas al trabajar en va-
hasta prácticamente nuestros días. rias agencias de servicios y de asesoramiento.
Con la Revolución de los Claveles puede volver a Portu-
El autor y su itinerario gal y desde 1975 es elegido presidente de la Asociación dos
Ya me perdonará el autor, al que no tengo el honor de co- Inquilinos Lisbonenses que va a alcanzar la cifra de 45.000
nocer personalmente, si cometo la osadía de resumir su bio- socios. Los esfuerzos de esta Asociación se dirigen, bajo la
grafía haciendo algún error e infidelidad. Ha sido a través presidencia de Santos, a continuar defendiendo los intere-
de su libro y de otras informaciones complementarias que la ses jurídicos de los inquilinos, la ocupación de casas vacías,
he ido reconstituyendo. De todas ellas se deduce que Santos la critica razonada de la legislación de la época, el apoyo a
nació en Porto en 1932, que trabajando, estudió economía y las organizaciones populares y a las comisiones de morado-
sociología y que a los veinte dos años empezó a integrarse en res, la promoción de consultas colectivas y la celebración de
la oposición política y en el movimiento cooperativo. Congresos y Seminarios.
Fue redactor de Seara Nova y de Cadernos de Circunstân- En 1980, empieza otro ciclo de su vida profesional, pues-
cia. Participó activamente en el Ateneo Cooperativo (1955), to que es invitado a promover un programa de la F.A.O.,
en la Asociación Inquilinos Lisbonenses, cooperativa crea- Agencia de las Naciones Unidas, de cooperativismo rural en
da en 1924 que defendía los intereses de los inquilinos, y Mozambique. Inicia así un periodo de trabajo que le lleva a
en las diferentes tentativas de coordinación y federaliza- Nicaragua, Mauritania y Méjico. Santos explica que en to-
ción del mundo cooperativo en las décadas de los años 50 y dos estos países, a pesar de las dificultades institucionales,
60. Fue detenido y encarcelado y al ser puesto en libertad y externas e internas, su trabajo se fundamenta en la auto-
ser expulsado de su trabajo se exilió a Argelia (1963), país nomía de las personas, sus potencialidades y limites, para
que se había independizado, iniciaba experiencias autoges- ir construyendo desde abajo, una conciencia colectiva y una
tionarias durante el gobierno de Ben Bella y acogía refugia- capacidad critica que se proyecta en organizaciones coope-
dos políticos de muchos países. rativas participadas. A menudo pone en cuestión los gran-
Empezaba así una vida nómada que le lleva, después del dilocuentes discursos políticos, por muy revolucionarios que
golpe de estado militar contra Ben Bella, a Francia, don- se auto califiquen, confiando en la formación liberadora, en
de colabora con el Collège Coopératif» (Desroches, Vienney, una rigurosa gestión y en la promoción de los recursos loca-
Maister) y es profesor en las universidades de Vincennes y les, construyendo así, una «nova ingeniería social».

Nota de leitura Jordi Estivill 136 137

Esta nueva ingeniería social, acumulación de experien- La estructura del libro


cias personales y colectivas, va a caracterizar a la Coope- «As maneiras cooperativas de pensar e agir» es una contri-
rativa SEIES que Santos contribuye a crear en 1980 en bución a la historia, poco conocida, del cooperativismo en
Portugal. Quizás valga la pena sintetizar sus principios: Portugal desde los años treinta del siglo pasado hasta nues-
Autogestión de los miembros-trabajadores que deciden la tros días. El libro empieza con una pequeña introducción,
naturaleza de los trabajos y su orientación, creación de es- en la que el autor explica como entró en contacto y se em-
trategias, metodologías e instrumentos para intervenciones pezó a implicar con la oposición antifascista y con el movi-
dirigidas a personas, especialmente las mas vulnerables, miento cooperativo en la década de los años cincuenta.
trabajo en equipo que conjuga estudio, reflexión y experi- La primera parte del libro se dedica a relatar la evolución
mentación, rentabilidad de esta empresa – cooperativa que del movimiento cooperativo desde su implicación hasta los
opera con salarios de mercado aunque limita estos a nivel años cincuenta. Se puede reseguir así el itinerario que va del
interno para financiar la inversión formativa y poder inter- cooperativismo de «barrio» a las esperanzas generadas por
venir con grupos de personas desfavorecidas, dedicación de la victoria de los aliados en la segunda guerra mundial. En
recursos internos para el estudio y los contactos con otras estos años son varias las tentativas de aglutinamiento del
iniciativas parecidas nacionales y extranjeras. movimiento cooperativo portugués (Fraternidade Operária,
Estos principios dicen mucho de la cultura política de Conselho Central de Cooperativas de Lisboa e Arredores,
Santos. Espíritu independiente, critico, se opone a los sec- Junta de Compras do Norte. UNICOOPE...). Las persona-
tarismos y dogmatismos tan abundantes, como el mismo re- lidades de António Sérgio y José de Sousa parecen marcar
lata, en las diferentes familias de la oposición portuguesa. este periodo, lleno de encarcelamientos y represión.
Sus numerosas citas de su admirado maestro Antonio Ser- La segunda parte de la publicación acoge los principa-
gio, le llevan hacia posiciones entroncadas con el socialismo les acontecimientos hasta el 25 de Abril. Si en la prime-
reformista, otros comentarios suyos le conectan mas con el ra, el autor ha debido acudir a archivos, memorias y docu-
socialismo libertario. Por todos los poros de este libro salen mentación, en esta, la principal fuente de información es el
aromas de libertad, de participación democrática, de solida- mismo, su propio testimonio. En esta etapa, toma especial
ridad, de respeto a las personas y sus valores. Seguramente relieve el Ateneo Cooperativo, centro de reflexión, estudio,
no es un azar que en las ultimas paginas, el autor explicite formación, divulgación y apoyo al movimiento cooperativo.
su colaboración en Seminarios de Economía Solidaria y Mu- Este se afirma y se diversifica en aquellos años: Boletines,
jer y en el Centro de Ciudadanía activa de Palmela y Setubal. cursos, grupos de teatro, editorial, librería, coloquios, viajes
Como el sostiene en el ultimo párrafo de su libro: y visitas a cooperativas, planos de actividades, cooperativas
culturales, asociaciones de moradores e inquilinos, contac-
«Devagar, mas seguramente, que temos pressa.
tos internacionales... Pero al mismo tiempo siguen las pug-
Assim, um outro mundo será possível!»
nas internas, las practicas autoritarias, las tentativas de
control político, las dificultades financieras y de gestión, la
fragilidad de las iniciativas confrontadas a una represión
institucional y policial.

Nota de leitura Jordi Estivill 138 139

En la tercera parte de este libro se presentan aquellas Conocer la historia, para interpretar
experiencias de fuera de Portugal en las que intervino el el presente y mejorar el futuro
autor. Su exilio le lleva a Argelia, Francia, Mozambique y Uno de los valores añadidos de este libro, además del co-
Nicaragua. El relato se hace mas personal, mas vivido a par- nocimiento que aporta para ir constituyendo una memoria
tir de su cotidaniedad como experto internacional que cola- viva, es la de poder reflexionar sobre un conjunto de temáti-
bora en la promoción del cooperativismo. En los tres países cas transversales que atraviesan el pasado y que constitu-
del Sur, aparecen las contradicciones entre los discursos po- yen un patrimonio de potencialidades, interrogantes, limi-
líticos y las realidades concretas, entre las intenciones de las tes y progresos que hacen entrar a la historia en el presente.
Agencias Internacionales y los limites de su papel de consul- ¿Como entender a éste, sin conocer aquella?
tor. No deja de ser significativo que Santos en su empeño por Incluso es posible establecer lecciones paralelas que van
trabajar en el terreno deba constatar algunos de los graves mas allá de Portugal y que se prolongan hacia el conjunto de
problemas que surgen con la ola de promoción «del coopera- la península Ibérica y aun se extienden por otros países, tal
tivismo desde arriba» que va a producir un fracaso conside- como Santos invita a hacer en la tercera parte de su obra.
rable en bastantes de los países del Sur de aquellos años. Siguiendo pues, la doble invitación de Santos, la de no olvi-
El libro se cierra con un epilogo esperanzador. Pasada dar a la historia y aprender de ella y la de la prolongación te-
la etapa de euforia post-revolucionaria de después del 25 rritorial internacional, puede ser estimulante, trazar algunos
de Abril, Santos reflexiona a partir de la lectura de Marcu- rasgos transversales que derivan de la lectura de su trabajo.
se, Barho y Castoriadis, sobre la falta de articulación entre El primer rasgo seria el de la persistencia de los valo-
los conocimientos teóricos y las propuestas practicas. En res y los esfuerzos de muchas personas comprometidas con
consecuencia, se decide por «encender uma vela...», crean- ellos, aun y a pesar de defenderlos en las peores condicio-
do junto a otras personas la cooperativa SEIES (Sociedade nes. No hay ninguno de los protagonistas de este libro que
de Estudos e de Intervenção em Engenharia Social). Lo que no haya estado en la cárcel, exiliado, expulsado de su tra-
le permite intentar aplicar las enseñanzas aprendidas, a lo bajo y que no haya padecido las criticas e incomprensiones
largo de todos estos años en Portugal y fuera de el. que duelen mas, porque han sido formuladas por los que es-
Merece ser señalado en este resumen, la impresionante tán a su lado. A pesar de ello, los actores de esta historia no
lista de catorce biografías de personas que jugaron un papel se cansan. Vuelven a empezar en función de unos ideales
importante en las dos décadas ,de 1940 a 1960, en el coope- que quieren plasmar en la realidad para transformarla.
rativismo Portugués. Son pistas abiertas que invitan a se- Solidaridad y al mismo tiempo individualismo; respeto por
guir investigando sobre las crónicas individuales y colecti- las personas y al mismo tiempo manipulación y falsas acu-
vas de este movimiento. saciones; participación y voluntad democrática de base y al
mismo tiempo burocracia y posiciones autoritarias; voluntad
de federalización cooperativa y al mismo tiempo corporatis-
mos internos; iniciativas de transparencia y eficiencia en la
gestión y al mismo tiempo fallos e incapacidades en la orga-
nización financiera, productiva, comercial son algunas de las
contradicciones que aparecen y reaparecen periódicamente.

Nota de leitura Jordi Estivill 140 141

¿Son todas ellas explicables y adjudicables en función de de los setenta, con motivaciones sociales y culturales (auto-
la confrontación con el Salazarismo? Si y no. Puesto que por nomía, confianza colectiva, calidad en el trabajo, critica a
un lado, las interferencias de la policía secreta de la PIDE otros modelos empresariales...).
y la represión directa son constantes y la semi clandesti- Siguiendo a Santos, es interesante constatar como en la
nidad comporta opacidades y un clima propenso a la des- década de los treinta del siglo pasado, anarquistas y comu-
confianza y a la manipulación partidaria que también se nistas se disputaban el control de las organizaciones de re-
encuentran en la historia de la lucha del cooperativismo de- presentación mientras conducían un trabajo de oposición
mocrático contra el control del aparato del estado franquis- radical, mientras los socialistas tenían posiciones «posibi-
ta en el vecino país. Por otro lado, el mismo Santos expli- listas». Al mismo tiempo la propaganda en favor del coope-
ca que en la ebullición post 25 de Abril se abren márgenes, rativismo era intensa y el Régimen Salazarista endurecía
aparecen nuevas esperanzas, la relación de fuerzas deja de sus posiciones (Ley Garrote de 1934).
ser tan desfavorable., pero no desaparecen muchas de las Este endurecimiento se acentúa en los inicios de los años
contradicciones anteriores como lo muestra el episodio de cuarenta, en el marco de un fascismo ascendente (victoria
la Asociación de Inquilinos de Lisboa de 1979. Una lección de Franco en la guerra civil, Mussolini en Italia, Hitler en
posible seria que algunas de estas contradicciones no de- Alemania), La dictadura de Salazar intensificó su estructu-
penden únicamente del régimen o de la coyuntura política ración vertical (sindicatos verticales, corporativismo, Mo-
sino que también tienen factores internos explicativos. cedades...). Ahora bien, la victoria de los aliados abre es-
Un tercer rasgo de este libro es que abarca el largo pla- peranzas y nuevas iniciativas al igual que sucede con la
zo. Mas de setenta años, son muchos años. Los ciclos lar- oposición democrática española. Pero estas se cierran con
gos permiten reflexionar sobre las ondulaciones históricas, los inicios de la guerra fría. El telón de acero no solo cae en-
sobre las fases ascendentes y las descendentes de los mo- tre los países del Oeste y del Este Europeo sino que tam-
vimientos sociales y sus causalidades económicas, sociales, bién se extiende internamente: el dogmatismo (gobierno de
políticas y culturales. Pero Santos introduce poco los fac- vigilancia), las acusaciones y descalificaciones partidarias,
tores y los ciclos económicos o los culturales y pone mas el sectarismo. Como mas clandestino y minoritario se hace
el acento sobre las dimensiones políticas. Lo que es una el movimiento mas aparece la necesidad de controlar los ór-
lastima porque si lo hubiera hecho, ello hubiera permiti- ganos de expresión y de representación y mas aparecen las
do profundizar en una interesante discusión acerca de si en polémicas internas. «Havia muitos sapos para engolir» ad-
los momentos recesivos de la economía es cuando se crean jetiva Santos. Esta podría ser otra lección de este periodo.
mas cooperativas y al revés si es en los periodos de expan- Los grises años cincuenta son difíciles y pasan lentamen-
sión cuando decrece su numero o se estabiliza. En una in- te. Solo a partir de su segunda mitad se aprecian signos de
vestigación realizada en Catalunya se constataba que des- renovación: se incorporan nuevas generaciones, se editan
de fines de los años setenta se creaban anualmente mas pequeñas publicaciones, el boletín cooperativista y alguna
cooperativas que días tiene el año, pero que en aquellos mo- propaganda, se crea el Ateneo... Pero la guerra fría no deja
mentos se juntaban causas ligadas a la creación de empleo respirar al movimiento cooperativo.
y por lo tanto en relación con las consecuencias de la crisis

Nota de leitura Jordi Estivill 142 143

Hay que esperar a la década siguiente para que nuevos —La precariedad y fragilidad de muchas iniciativas a las
aires renueven su panorama. La represión aumenta, pero que les cuesta mucho permanecer y sostenerse en el tiempo
pese a ello hay una nueva dinámica del movimiento coope- —La capacidad creativa y de dar respuesta a las diferentes
rativo portugués: nuevos dirigentes, algunos de matriz necesidades económicas, sociales, políticas y culturales
católica, apertura del Ateneo y del boletín cooperativista, —Las grandes dificultades de mancomunar esfuerzos co-
actividades de estudio y propaganda, libros, cooperativas lectivos, de crear organismos de coordinación y federali-
culturales, planes y programas (Plan AMES), incremento zacion unitarios
de las relaciones internacionales... en un contexto en el que —La frecuencia de la búsqueda de formulas democrati-
la sociedad y la economía portuguesa continuaban relati- zantes y participativas que se enfrentan con el burocra-
vamente cerradas y debían afrontar las luchas coloniales. tismo, el autoritarismo, con la conservación y reproduc-
Mientras que en el Estado Español se abrían las puertas. ción de los poderes constituidos, tanto los internos como
La entrada masiva de turistas, las inversiones extranjeras los exteriores
y las remesas de los inmigrantes constituyen las bases de —El carácter político del movimiento, continuamente
su crecimiento económico de aquellos años y de su integra- atravesado por los combates partidarios que intentan
ción al capitalismo europeo industrializante. ¿Será que en controlarlo en función de sus intereses
esta década se encuentran las razones de la diferenciación —La confrontación con un estado que hasta 1974 es una
entre las dos economías? dictadura represora y al que luego se quiere transformar
En cualquier caso, esta pregunta se proyecta sobre los —La constante necesidad de mejorar la capacidad produc-
años setenta. ¿Hasta que punto la eclosión de experiencias tiva, distributiva, de gestión y financiera de las cooperati-
participativas y el crecimiento del numero de cooperativas vas así como los niveles de calificación de sus dirigentes
y del movimiento asociativo que se da en ambos países, es —De forma intermitente aparecen las diferencias terri-
el resultado de una respuesta popular a la crisis económica toriales, sus especificidades y sus posiciones no siempre
o a la apertura democrática? convergentes. El Norte, con Porto, Lisboa y sus alrededo-
Cuestión importante por dilucidar por cuanto para unos res, el Sur tienen, a veces, criterios y dinámicas distintos
autores, las cooperativas y las empresas sociales tienen
Por fin cabe señalar que este libro de Santos permite no
sentido como instrumento contra el desempleo, creado por
solo conocer una historia que empieza a desvelarse, sino
las crisis, mientras que para otros seria la dimensión polí-
también reflexionar sobre las múltiples facetas del movi-
tica (cambio de modelo, democracia económica...) la que les
miento cooperativo portugués. El aprendizaje que supone su
da su valor añadido.
lectura, sobre sus aciertos y sus errores da pistas para que
El cuarto comentario transversal es el de la recurren-
en un futuro se refuercen los primeros y se corrijan los se-
cia de los temas y problemas que recorren este itinerario
gundos. Se trata por lo tanto, de una publicación altamente
del cooperativismo portugués. Quizás pueda ser interesan-
recomendable para los que se interesan por el pasado, pero
te hacer una lista de ellos, porque al mismo tiempo que es
sobretodo para los quieren construir un futuro mejor.
un recordatorio podría ser una agenda de futuro. A grandes
rasgos son los siguientes:
144 145

Notícia

Seminário
Internacional –
Coesão, Território
e Economia

A ACEESA realizou nos dias 4


a 6 de Novembro do corrente ano, que a perspectiva da competiti-
um Congresso, cujo tema passa vidade e da coesão se articulem
pela Competitividade global e co- na definição das políticas terri-
esão económica, social e territo- toriais de desenvolvimento, en-
rial. Interligação entre as dife- globando as dimensões da econo-
rentes dimensões na promoção mia pública, privada e social, da
da inclusão social nas Regiões. cultura e do ambiente na preven-
Considerando que, os Aço- ção das assimetrias e na luta con-
res constituem uma das regiões tra a pobreza e exclusão social.
de Portugal onde melhor se pro- O objectivo deste Congres-
move a integração da lógica ter- so passa por fomentar o deba-
ritorial nas políticas sociais, te sobre o desenvolvimento local,
devido à sua condição de arqui- e como o promover, em parti-
pélago, propõe-se com a propos- cular nas regiões ultraperiféri-
ta de realização deste Congres- cas por intermédio de aborda-
so que os Açores desenvolvam, gens territoriais de promoção
num contexto experimental ao da competitividade e coesão ten-
nível da União Europeia, a im- do por base parcerias de nível lo-
plementação de um projecto em cal, regional, nacional e europeu.
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Jeanne Marie PENVENNE, 1995. African Workers and Colonial Racism. In the case of articles or contributions in collective books, the title must be
Mozambican strategies and struggles in Lourenço Marques, 1877-1962. mentioned between low commas, followed by the name of the journal or the
Johannesburg Witwatersrand University Press. collective book, in italic; and indicating the volume and number of the journal,
or the place and publisher of the book, as well as the corresponding pages of
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contribuição deve vir entre aspas baixas, seguido da indicação em itálico da
revista ou titulo da obra colectiva, da indicação do volume e número da revista Alan K. SMITH, 1973. «The peoples of Southern Mozambique: an historical
– ou local de edição e editora da obra –, e das páginas correspondentes ao artigo survey», Journal of African History, vol. XIV, (4), London, Cambridge
ou contribuição citada: University Press, pp. 565:580.

Alan K. SMITH, 1973. «The peoples of Southern Mozambique: an historical The articles must be preceded by a short abstract of 1 000 characters or
survey», Journal of African History, vol. XIV, (4), London, Cambridge shorter, in English.
University Press, pp. 565:580.
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