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ISBN 978-65-5701-089-1

DIREITO AMBIENTAL
SISTEMATIZADO

4ª edição
Brasília
2023
SOBRE O AUTOR

RAFAEL ROCHA. Procurador Federal em exercício no Núcleo de Atuação Prioritária


em Improbidade Administrativa da Procuradoria-Regional Federal da 1ª Região. Ex-
Promotor de Justiça do MPBA.
SUMÁRIO

CAPÍTULO 1. MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL ..................................... 7


......................................................................................................................................... 19
SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE — SISNAMA .................................................. 19
1.1. CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE O MEIO AMBIENTE HUMANO E CRIAÇÃO DO SISNAMA
................................................................................................................... 20
1.2. ESTRUTURA DO SISNAMA ............................................................................................ 21
1.2.2. Órgão Consultivo e Deliberativo ................................................................... 23
1.2.3. Órgão Central .............................................................................................. 27
1.2.4. Órgãos Executores ....................................................................................... 27
1.2.5. Órgãos Seccionais ........................................................................................ 28
1.2.6. Órgãos Locais............................................................................................... 29
1.3. POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE .......................................................................... 29
1.3.1. Criação e diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente ......................... 30
1.3.2. Constitucionalização da Tutela Ambiental e da Política Nacional do Meio
Ambiente .............................................................................................. 38
1.4. OBJETIVOS ................................................................................................................. 49
1.5. INSTRUMENTOS ........................................................................................................... 52
1.5.1. Licenciamento ambiental ............................................................................. 54
1.5.2. Avaliações de Impacto Ambiental ................................................................ 84
1.5.3. Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente — Sinima — e
Cadastro Ambiental Rural — CAR.......................................................... 91
1.5.4. Cadastro Técnico Federal ............................................................................. 95
SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA ........................... 99
2.1. CRIAÇÃO DO SNUC.................................................................................................... 102
2.5.1. Unidades de Conservação da Natureza ...................................................... 113
2.5.2. Zonas de Amortecimento ........................................................................... 134
DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS - DETEPS .................... 136
2.2.2. Delimitação das Áreas de Reserva Legal .................................................... 167
SISTEMA NACIONAL E GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS - SNGRH ................. 185
2.2.1. Conselho Nacional de Recursos Hídricos ..................................................... 192
2.3. POLÍTICA NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS ................................................................... 201
2.4. OBJETIVOS ............................................................................................................... 207
2.5. INSTRUMENTOS ......................................................................................................... 208
2.5.1. Outorgas.................................................................................................... 210
2.5.2. Cobrança pelos Usos dos Recursos Hídricos ................................................ 217
SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS...................................... 221
1. RELEMBRANDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL — MTA......... 222
2.1. CRIAÇÃO DO SISRESPIA E DEFINIÇÃO DA TRÍPLICE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS . 225
2.2. RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA E EVOLUÇÃO HISTÓRICA ............................................. 228
2.2.1. Teoria Geral da Responsabilidade Administrativa ...................................... 231
2.3. RESPONSABILIDADE CIVIL E TUTELA PROCESSUAL............................................................... 248
2.3.1. Responsabilidade Objetiva ......................................................................... 251
2.3.2. Responsabilidade Solidária......................................................................... 256
2.3.3. Responsabilidade Imprescritível ................................................................. 262
2.3.4. Inversão do Ônus da Prova......................................................................... 264
2.3.5. Desconsideração da Personalidade Jurídica ............................................... 267
2.3.6. Dano Moral Coletivo .................................................................................. 268
2.3.7. Obrigação de Fazer, de Não Fazer e de Indenizar ....................................... 270
2.4. RESPONSABILIDADE PENAL ........................................................................................... 271
GABARITO ...................................................................................................................... 273
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................... 275
RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

1 MICROSSISTEMA JURÍDICO DE
TUTELA AMBIENTAL

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

1. COMPREENDENDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE


TUTELA AMBIENTAL

É cada vez mais urgente e necessária a correta e completa compreensão do


Direito Ambiental no Brasil, porquanto se trata do ramo do Direito que disciplina
um dos maiores e mais importantes conflitos mundiais da atualidade e do futuro:
A necessidade de desenvolvimento econômico para a prosperidade das nações com
a adequada e suficiente preservação ambiental do planeta.

A centralidade desse polêmico conflito é constatada diariamente com as


notícias veiculadas pelos órgãos de imprensa, revelando calorosas discussões e
guerras de narrativas sobre o acerto ou o desacerto das políticas públicas
ambientais no Brasil e no mundo.

Os noticiários demonstram, por exemplo, que países ricos e desenvolvidos


fazem exigências ambientais ao Brasil como condições para a manutenção e o
estabelecimento de importantes acordos comerciais internacionais, sobretudo
envolvendo os Estados Unidos da América, a União Europeia e o Mercosul.
Empresas multinacionais, bancos internacionais e portentosos fundos financeiros
também esperam a comprovação da eficácia das políticas públicas ambientais
voltadas à redução de desmatamentos e dos níveis de gases amplificadores do
efeito estufa como condição para a manutenção ou a realização de investimentos
em negócios no Brasil, com potencial para elevar os níveis de emprego e de renda
em nossa sociedade.

Para além disso, o Brasil possui uma das maiores florestas do mundo, e a
maior área agriculturável do planeta (com potencial), por isso, há extrema
importância de analisar influência do efeito estufa e conquistar mercados
internacionais do agronegócio hoje pertencentes às Nações ricas, como a França e
os Estados Unidos.

Internamente, as consequências dos maiores desastres ambientais da


humanidade, como o que ocorreu na cidade de Brumadinho, em Minas Gerais,
impulsionam debates para tornar a legislação ambiental ainda mais rigorosa, o que
conflita com interesses de grupos que detêm poder político e econômico.

Esse cenário demonstra a essencialidade da compreensão deste ramo do


Direito no Brasil.

Em razão disso, o adequado conhecimento do Direito Ambiental é cada vez


mais exigido nas várias fases e etapas dos concursos públicos, sobretudo das

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

carreiras jurídicas, com o consequente aumento do número de questões objetivas,


a exploração desses temas em questões dissertativas e em peças prático-
profissionais, bem como a apresentação de aprofundados questionamentos em
fases orais.

Porém, a compreensão dessa disciplina não é nada fácil, diante da ausência


de um Código Ambiental que pudesse organizar, sistematizar e consolidar as
dezenas de leis federais, estaduais e municipais — algumas até pré-constitucionais
—, decretos, resoluções e até mesmo posicionamentos extraídos de acórdãos e de
súmulas dos Tribunais.

Apenas para exemplificar a complexidade dessa disciplina, sua correta


compreensão exige uma adequada interpretação, por exemplo, das seguintes leis
e atos normativos:

• Constituição da República;

• Lei Federal n.º 5.197/67: Lei de Proteção à Fauna;

• Lei Federal n.º 6.938/81: instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente;

• Lei Federal n.º 7.643/87: criminalização da pesca de cetáceos;

• Lei Federal n.º 7.661/88: instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento


Costeiro;

• Resoluções do Conama: resoluções 1/86, 9/87, 237/97 etc. (mais de 500


resoluções do CONAMA);

• Lei Federal n.º 9.795/99: instituiu a Política Nacional de Educação


Ambiental;

• Lei Federal n.º 10.650/03: disciplinou o acesso público aos dados e


informações ambientais;

• Lei Federal n.º 11.428/06: Lei de proteção à Mata Atlântica;

• Lei Federal n.º 11.794/08: disciplinou o uso de animais em experimentos


científicos;

• Lei Federal n.º 12.114/09: instituiu o Fundo Nacional sobre Mudança do


Clima;

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

• Lei Federal n.º 12.187/09: instituiu a Política Nacional sobre Mudança


do Clima;

• Lei Federal n.º 12.533/11: Dia de Conscientização Sobre as Mudanças


Climáticas;

• Lei Complementar Federal n.º 140/11: definiu as competências


ambientais das entidades políticas;

• Decreto Federal n.º 8.437/15: ampliou a competência federal para o


licenciamento ambiental;

• Lei Federal n.º 9.985/00: instituiu o Sistema Nacional das Unidades de


Conservação da Natureza;

• Lei Federal n.º 13.668/18: aprovou o novo marco legal das unidades de
conservação da natureza;

• Lei Federal n.º 11.284/06: Lei de gestão de florestas públicas;

• Lei Federal n.º 12.651/12: instituiu o novo Código Florestal;

• Lei Federal n.º 14.119/21: instituiu a Política Nacional de Pagamento por


Serviços Florestais;

• Lei Federal n.º 9.433/97: instituiu a Política Nacional de Recursos


Hídricos;

• Lei Federal n.º 12.334/10: instituiu a Política Nacional de Segurança de


Barragens;

• Lei Federal n.º 11.445/07: instituiu a Política de Saneamento Básico;

• Decreto Federal n.º 10.588/20: regulamentou a Política de Saneamento


Básico;

• Lei Federal n.º 12.305/10: instituiu a Política Nacional de Resíduos


Sólidos;

• Decreto Federal n.º 10.240/20: regulamentou a Política Nacional de


Resíduos Sólidos;

• Decreto Federal n.º 10.388/20: regulamentou a Política Nacional de


Resíduos Sólidos;

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• Lei Federal n.º 9.605/98: disciplinou os crimes e infrações ambientais;

• Lei Federal n.º 13.731/18: disciplinou a destinação de parte dos valores


das multas ambientais;

• Decreto Federal n.º 6.514/08: instituiu um verdadeiro código federal de


infrações ambientais.

Logo, não é possível se compreender adequadamente desse vastíssimo


conjunto de normas, que estão unidas por princípios e lógica jurídica comuns, senão
como um legítimo microssistema jurídico próprio, no qual deve haver um diálogo
entre suas diversas fontes normativas, de forma coordenada, para garantir
harmônica e correta aplicação e interpretação dos seus diversos institutos jurídicos,
que devem ser aplicados reciprocamente, afastando-se assim possíveis antinomias
e suprindo-se lacunas aparentes.

Portanto, as diversas normas ambientais só podem ser adequadamente


compreendidas como elementos integrantes desse genuíno Microssistema Jurídico
De Tutela Ambiental (MTA), constituído por princípios jurídicos próprios e
específicos, e que propicia a utilização de institutos previstos isoladamente em leis
específicas na interpretação, aplicação e integração de todas as demais leis do
microssistema.

Veja-se, por exemplo, que a correta e completa aplicação das infrações


administrativo-ambientais exige a interpretação harmônica de, ao menos, 3 (três)
normas do MTA. Isso se dá porque as sanções administrativas por ilícitos
ambientais estão definidas no art. 72 da Lei Federal n.º 9.605/98. Todavia, esse
diploma legal não estabeleceu o rol das infrações administrativo-ambientais, que
restou instituído pelo Decreto Federal n.º 6.514/08. Porém o Decreto não
estabeleceu quais são os órgãos ambientais competentes para lavrar autos de
infração e aplicar multas ambientais.

Daí porque deve-se utilizar o art. 6º da Lei Federal n.º 6.938/81 para a
definição desses órgãos ambientais (IBAMA, ICMBio, órgãos seccionais etc.), apesar
dessa norma não prever quais são as autoridades competentes (dos órgãos
ambientais) legitimadas a aplicar sanções administrativas decorrentes de ilícitos
ambientais, cabendo ao art. 70, §1º da Lei Federal n.º 9.605/98 a indicação das
autoridades competentes (servidores designados para as atividades de
fiscalização), e a definição do fundamento legal para a tipificação das infrações
ambientais em decreto.

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

Um outro exemplo que aponta para existência do Microssistema Jurídico


de Tutela Ambiental – MTA – refere-se à necessidade da interpretação harmônica
de, ao menos, 4 (quatro) normas do MTA para a correta e completa aplicação do
instituto do licenciamento ambiental.

Essa regra se dá porque, muito embora a exigência nacional do prévio


licenciamento ambiental tenha sido instituída pelo art. 10 da Lei Federal n.º
6.938/81, seu conceito legal e as regras sobre a distribuição das competências para
o licenciamento ambiental estão definidas nos arts. 2º, 7º, 8º e 9º (dentre outros)
da Lei Complementar n.º 140/11. Além disso, exceções à exigência do prévio
licenciamento estão contempladas no art. 8º, §3º e art. 52, caput da Lei Federal n.º
12.651/12, e as regras sobre os tipos de licenças ambientais e seus prazos de
validades foram definidas na Resolução n.º 273/97 – CONAMA.

Portanto, ocorre aqui o mesmo fenômeno existente entre as diversas


normas que compõem o microssistema jurídico de tutela coletiva (Lei da ação civil
pública, Lei da ação popular, título III do código de defesa do consumidor etc.).

Esses são os motivos do porquê, à semelhança do que ocorre com o


microssistema de tutelas coletivas, é utilizado o diálogo entre suas fontes para sua
correta e completa interpretação e aplicação, existindo aqui, também, o mesmo
fenômeno a fundamentar a existência de um novo microssistema jurídica, desta vez
de tutela ambiental.

Logo, somente com esse diálogo entre as diversas fontes, é que será
possível a adequada compreensão e interpretação das diversas normas ambientais,
razão pela qual há de se reconhecer a existência deste Microssistema Jurídico de
Tutela Ambiental.

Contudo, não é preciso se preocupar em tentar compreender agora as


interpretações apontadas acima, haja vista que isso só será possível mais a frente,
com uma visão teórica de todos os institutos.

Neste momento é preciso compreender apenas a estrutura básica deste


Microssistema Jurídico, sob uma ótica mais prática, para se entender que ele é
basicamente formado por quatro sistemas principais:

• Sisnama: Sistema Nacional do Meio Ambiente;

• SNUC: Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza;

• SINGRH: Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

• Sisrespia: Sistema de Responsabilização por Ilícitos Ambientais.

Portanto, na prática, o MTA estrutura-se fundamentalmente apenas com


esses quatro sistemas principais que, se bem compreendidos, conduzirão ao
correto raciocínio jurídico necessário para a harmônica e coordenada intepretação
das diversas leis ambientais, conforme imagem a seguir:

Desse modo, com o estudo adequado do primeiro sistema integrante do


MTA (o Sistema Nacional do Meio Ambiente – Sisnama) será possível
compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para as ações de preservação, fiscalização e recuperação
do meio ambiente no Brasil. Será possível se apreender a composição e
as atribuições desses órgãos/entidades ambientais (IBAMA, CONAMA
etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do Sisnama. Será possível se apreender a Política Nacional do Meio
Ambiente – PNMA e outras associadas (Política Nacional sobre Mudança
do Clima – PNMC, por exemplo), estudando-se os:

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

a) Objetivos: da PNMA e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos
e entidades componentes da estrutura do Sisnama;

b) Instrumentos: da PNMA e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do Sisnama, para propiciar o
cumprimento dos objetivos da própria PNMA e das demais políticas
ambientais associadas.

Assim, por exemplo, o IBAMA (entidade da estrutura do Sisnama) poderá


se utilizar do licenciamento ambiental (um dos instrumentos da PNMA) para
compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente
(um dos objetivos da PNMA) através do estabelecimento de condições
(condicionantes) para a autorização do funcionamento de empreendimento
causador de degradação ambiental, propiciando, com isso, a implementação da
própria Política Nacional do Meio Ambiente.

Em seguida, compreendidas as lições iniciais relativas ao Sisnama, será


estudado o segundo sistema integrante do MTA, o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC), para se compreender os seguintes pontos
principais:

• Sua estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para administrar, preservar e fiscalizar as unidades de
conservação da natureza (parques nacionais, por exemplo) no Brasil.
Será possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (ICMBIO etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SNUC. Será possível se apreender a Política Nacional de Unidades de
Conservação – PNUC – e outras associadas, estudando-se os:

a) Objetivos: da PNUC, e do próprio SNUC, a serem cumpridos, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC;

b) Instrumentos: instituídos pela Lei da PNUC, e pelas demais políticas


ambientais associadas (pelo código florestal, por exemplo), que se

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

constituem em genuínas ferramentas jurídicas disponibilizadas


principalmente para os órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC, para propiciar o cumprimento dos seus
objetivos e da PNUC.

Assim, por exemplo, o ICMBIO (entidade da estrutura do SNUC) poderá se


utilizar da zona de amortecimento (lídimo instrumento instituído pela Lei da PNUC)
para ampliar a proteção de paisagens naturais existentes em unidades de
conservação (um dos objetivos do SNUC) através do estabelecimento de restrições
ao uso de recursos naturais no entorno das unidades de conservação, propiciando,
com isso, a implementação da própria Política Nacional de Unidades de
Conservação.

Em seguida, compreendidas também as lições relativas às unidades de


conservação da natureza e aos demais espaços territoriais especialmente
protegidos instituídos pelo novo código florestal, será estudado o terceiro sistema
integrante do MTA, o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(SINGRH), para se compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para a preservar e fiscalizar as águas no Brasil. Será
possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (Agência Nacional de Águas e Saneamento
Básico (ANA), CNRH, Comitês de Bacias Hidrográficas etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SINGRH. Será possível se apreender a Política Nacional de Recursos
Hídricos – PNRH – e outras associadas (Política Nacional de Segurança
de Barragens, Política Nacional de Saneamento Básico e Política
Nacional de Resíduos Sólidos, por exemplo), estudando-se os:

a) Objetivos: da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos
e entidades componentes da estrutura do SINGRH;

b) Instrumentos: da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do SINGRH, para propiciar o

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RAFAEL ROCHA MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA AMBIENTAL • 1

cumprimento dos objetivos da própria PNRH e das demais políticas


ambientais associadas.

Assim, por exemplo, a ANA (entidade da estrutura do SINGRH) poderá se


utilizar da outorga (um dos instrumentos da PNRH) para assegurar à atual e às
futuras gerações a necessária disponibilidade de água (um dos objetivos da PNRH)
através do controle do uso da água para consumo humano, irrigação etc.,
propiciando a implementação da própria Política Nacional Recursos Hídricos.

Eis o raciocínio que deve prevalecer para se compreender os três primeiros


sistemas.

Finalmente, após compreendidas todas as lições relativas ao SISNAMA,


SNUC e SINGRH, será estudado o quarto sistema integrante do MTA, o Sistema de
Responsabilização por Ilícitos Ambientais (Sisrespia), que incidirá sobre aqueles
que descumprirem as regras ambientais estudadas nos três primeiros sistemas,
para se compreender os seguintes pontos principais:

• A tríplice responsabilização: cível, administrativa e criminal dos


infratores da legislação ambiental;

• Tutela processual ambiental: administrativa, cível e criminal decorrente


da prática de ilícitos ambientais, inclusive com a adequada compreensão
dos precedentes e das súmulas do e. STJ e c. STF sobre o meio ambiente;

• Os princípios ambientais: uma revisão dos princípios tipicamente


ambientais, com sua aplicação prática, para proporcionar sua adequada
compreensão.

Assim, por exemplo, no Sisrespia serão estudadas todas as características


da responsabilidade civil ambiental (objetiva, solidária, imprescritível, com
inversão do ônus da prova, com desconsideração da personalidade jurídica, com
dano moral coletivo, com obrigação de fazer, de não fazer e de indenizar etc.)
atribuídas pela jurisprudência do e pelo STJ, além de uma completa análise das
infrações administrativo-ambientais e dos crimes ambientais.

Dessa forma, compreendendo-se adequadamente cada um dos sistemas


integrantes do Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental (MTA) será possível a
adequada compreensão e interpretação das seguintes normas ambientais:

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E assim se estabelecerá o necessário raciocínio jurídico sobre o Direito


Ambiental.

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SISTEMA NACIONAL DO MEIO


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AMBIENTE — SISNAMA

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

1. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE

1.1. Conferência das Nações Unidas sobre o Meio


Ambiente Humano e Criação do SISNAMA

Em junho de 1972, na cidade de Estocolmo, Suécia, foi realizada a


Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente Humano (CNUMAH), primeira
reunião global para se discutir os problemas ambientais causados pela degradação
do meio ambiente no mundo, na qual se reuniram representantes de cerca de 112
(cento e doze) Países, inclusive do nosso Brasil.

Também conhecida como Conferência de Estocolmo, a CNUMAH aprovou


o primeiro documento internacional relevante contendo diretrizes mundiais de
melhoria e preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, a
Declaração sobre o Meio Ambiente. Trata-se de documento sem força jurídica
vinculante.

Embora sem força jurídica vinculante, o documento inspirou a criação do


Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), instituído em
dezembro de 1972 como agência da ONU (órgão do sistema ONU), responsável pela
promoção da conservação ambiental no mundo.

Isto é, foi por proposta do Pnuma que se criou a importante Comissão


Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento da ONU (Cmed),
responsável, por exemplo, pela publicação do famoso Relatório Brundtland —
denominado Nosso Futuro Comum — em 1987, considerando a fonte do conceito
de desenvolvimento sustentável no mundo: É o desenvolvimento que atende as

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

necessidades atuais sem comprometer a habilidade das futuras gerações de


atender suas próprias necessidades.

QUESTÃO

1. (Analista Judiciário do TRF 3. FCC — 2019) (adaptada). O conceito de


desenvolvimento sustentável, tal como tratado no Relatório Brundtland, elaborado
pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento criada pela
Assembleia das Nações Unidas, predica que: se deve satisfazer as necessidades
presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas
próprias necessidades.

( ) Certo ( ) Errado

Além disso, a Declaração sobre o Meio Ambiente também se tornou fonte


de inspiração para a instituição e mudanças de marcos legais ambientais dos Países.

Exemplo: no Brasil, a Declaração sobre o Meio Ambiente inspirou a criação


da antiga Secretaria Especial do Meio Ambiente, vinculada ao Ministério do Interior
e aprovada pelo Decreto Federal n.º 73.030/73, primeiro órgão da Administração
Pública Federal com função específica de promover a conservação do meio
ambiente e o uso racional dos recursos naturais, razão pela qual é considerado o
embrião do atual Sisnama.

A Declaração também se constituiu em fonte de inspiração para a


aprovação da Lei Federal n.º 6.938/81, que finalmente instituiu o Sistema Nacional
do Meio Ambiente (SISNAMA), constituído pelo conjunto de órgãos e entidades
públicas responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental do Brasil,
tendo como seu órgão central a antiga Secretaria Especial do Meio Ambiente,
posteriormente convertida no atual Ministério do Meio Ambiente, através da Lei
Federal n.º 8.490/92.

1.2. Estrutura do SISNAMA

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A estrutura do Sisnama é composta pelos órgãos e entidades da União, dos


Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as
fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da
qualidade ambiental no Brasil.

QUESTÃO
1. (Juiz Federal do TRF3. Cebraspe – 2011). Considerando a Lei n.º
6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente e o Sistema
Nacional do Meio Ambiente, é correto afirmar que o Sistema Nacional do Meio
Ambiente é constituído pelos órgãos e entidades da União, dos estados, do DF e
dos municípios, bem como pelas fundações instituídas pelo poder público,
responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.

( ) Certo ( ) Errado

Assim, todos os órgãos e entidades municipais, estaduais e federais


destinados à conservação ambiental integram estes sisnama, razão pela qual
devem atuar de forma coordenada, observando-se as diretrizes emanadas pelo seu
órgão central e todas as resoluções aprovadas pelo órgão consultivo e deliberativo,
consoante veremos mais abaixo.

Trata-se de estrutura funcionalmente particionada, conforme imagem a


seguir:

É importante destacar que os órgãos são classificados em categorias bem


definidas, cada um deles com sua composição e atribuições próprias, conforme se
observará nos tópicos seguintes.

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

2. (Juiz do TJSC. Cebraspe – 2019). O Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina


(IMA/SC) é o órgão ambiental da esfera estadual catarinense responsável pela
execução de programas e projetos de proteção ambiental, bem como pelo controle
e pela fiscalização de atividades potencialmente causadoras de degradação
ambiental. De acordo com a Lei n.º 6.938/81, o IMA/SC compõe o Sistema Nacional
do Meio Ambiente (SISNAMA) na qualidade de

A) órgão superior.

B) órgão supervisor.

C) órgão local.

D) órgão seccional.

E) órgão consultivo e deliberativo.

1.2.1. Órgão Superior

O órgão superior da estrutura do Sisnama é o Conselho de Governo,


presidido pelo Presidente da República ou, de acordo com sua determinação, pelo
Vice-Presidente da República, e integrado pelos Ministros de Estado e pelo Chefe
de Gabinete do Presidente da República, cuja função é assessorar o Presidente na
formulação da política nacional e diretrizes para a preservação do meio ambiente.

Pode funcionar de forma plenária ou através de Câmaras temáticas


instituídas pelo Poder Executivo Federal.

1.2.2. Órgão Consultivo e Deliberativo

O órgão consultivo e deliberativo do Sisnama é o Conselho Nacional do


Meio Ambiente (CONAMA), órgão colegiado que integra a estrutura administrativa
do Ministério do Meio Ambiente, e que detém a competência normativa para
aprovar resoluções regulamentares à legislação ambiental de observância
obrigatória por todos os demais órgãos do Sisnama.

Ou seja, os órgãos ambientais federais, estaduais, distritais e municipais são


obrigados a cumprir e respeitar as normas ambientais emanadas pelo Conama. Daí
porque é o Conama, sem dúvida, o órgão mais importante da estrutura do Sisnama.

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Assim, por exemplo, apesar de se tratar de autarquia estadual, o Instituto


do Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (Inema) está obrigado a seguir os
procedimentos da Resolução n.º 237/97 do Conama nos processos de
licenciamento ambiental de sua competência estadual, sob pena de nulidade, em
respeito ao poder normativo conferido ao Conama.

Registre-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem confirmado esse


poder normativo do Conama até mesmo quanto a normas que inovam no
ordenamento jurídico, desde que promovam ampliação da proteção ambiental já
estabelecida em leis, conforme se observa na decisão unânime de plenário que
referendou medida cautelar concedida nas ADPFs 747, 748 e 749 para suspender
os efeitos da Resolução n.º 500/20 do Conama que revogara suas Resoluções n.º
284/01, 302/02 e 303/02 responsáveis, respectivamente, pela exigência de
licenciamento ambiental em empreendimentos de irrigação, pela definição de
limites em áreas de preservação permanente em reservatórios artificiais e pelo
estabelecimento de proteção em áreas de dunas, manguezais e restingas, mesmo
ciente de que os temas objeto destas três últimas resoluções foram totalmente
disciplinados em lei (no código florestal) de forma diversa do que previsto nas
antigas resoluções do Conama.

Diante das relevantíssimas funções exercidas pelo Conama é importante se


perquirir sobre sua composição.

Deveras, ele é presidido pelo Ministro do Meio Ambiente e conta com a


composição definida pelo Decreto Federal n.º 99.274/90, haja vista que fora
concedida medida cautelar nos autos da ADPF 623 para suspender os efeitos do
Decreto Federal n.º 9.806/19, que havia reduzido a composição do Conama para
apenas 23 (vinte e três) participantes, conforme abaixo:

• redução de 11 (onze) para 4 (quatro) representantes de entidades


ambientalistas com assento no Conselho;

• redução do mandato das entidades ambientalistas de 2 (dois)


anos para 1 (um) ano, passando a ser vedada a recondução;

• substituição do método de escolha das entidades


representantes desse setor, que se fazia por processo eleitoral
dentre as organizações cadastradas perante o Ministério do
Meio Ambiente, pelo método de sorteio;

24
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• elegibilidade para o assento no Conselho apenas das


entidades ambientalistas ditas de âmbito nacional;

• perda de assento no Conselho de órgãos de ligação


estreita com o meio ambiente, como o Instituto Chico Mendes
da Biodiversidade (ICMBio) e a Agência Nacional de Águas
(ANA), bem como do Ministério da Saúde e de entidades ligadas à
questão indígena;

• redução de assentos para os Estados, que tinham


direito a indicar um representante cada, para apenas cinco,
sendo um para cada região geográfica;

• redução dos assentos dos Municípios de oito para


apenas duas vagas, restritas às capitais (o que desconsidera os
Municípios do interior);

• extinção dos cargos de conselheiros sem direito a


voto, que eram ocupados por representantes do Ministério
Público Federal, dos Ministérios Públicos estaduais e da
Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da
Câmara dos Deputados.

QUESTÃO
3. (Promotor de Justiça do MPTO. Cebraspe – 2012). A respeito do SISNAMA,
assinale a opção correta.
a) Somente o governo federal possui direito a voto na plenária do CONAMA.
b) Não compõem o SISNAMA as secretarias de meio ambiente dos municípios.
c) O CONAMA, órgão colegiado do SISNAMA, possui funções consultivas e
deliberativas.
d) O IBAMA não é mais o órgão executor do SISNAMA desde a criação do
ICMBio.
e) A presidência do CONAMA é exercida pelo ministro chefe da Casa Civil.

Outrossim, além de exercer a importante função normativa, o Conama foi


instituído com a finalidade de:

• Assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo, diretrizes de


políticas governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais;

25
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões


compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e
essencial à sadia qualidade de vida;

Também é de competência do CONAMA:

• Estabelecer normas e critérios para o licenciamento ambiental de


atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, mediante proposta do
IBAMA;

• Determinar a perda ou a restrição de benefícios fiscais, concedidos em


caráter geral ou condicional, e a perda ou suspensão de participação em
linhas de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito,
mediante representação do IBAMA (como forma de punição por ilícitos
ambientais);

• Estabelecer, privativamente, normas e padrões nacionais de controle


de poluição por veículos automotores, aeronaves e embarcações,
mediante audiência dos Ministérios competentes;

• Estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à


manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional
dos recursos ambientais, principalmente os hídricos;

• Determinar, quando julgar necessário, a realização de estudos das


alternativas e das possíveis consequências ambientais de projetos
públicos ou privados, requisitando aos órgãos federais, estaduais e
municipais, bem assim a entidades privadas, as informações
indispensáveis para apreciação dos estudos de impacto ambiental, e
respectivos relatórios, no caso de obras ou atividades de significativa
degradação ambiental, especialmente nas áreas consideradas
patrimônio nacional.

QUESTÃO

4. (Juiz do TJPA. Cebraspe – 2019). O CONAMA faz parte do SISNAMA.


Considerando-se a composição do SISNAMA e as suas atribuições, é correto afirmar
que o CONAMA

a) tem como finalidade deliberar, no âmbito de sua competência, sobre


normas e padrões compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado
e essencial à sadia qualidade de vida.

26
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

b) tem a função de assessorar o presidente da República na formulação da


política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os
recursos ambientais.

c) tem a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como


órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio
ambiente.

d) é órgão federal que detém a responsabilidade de fazer executar a política


e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente.

e) é órgão interestadual que detém a responsabilidade de executar programas


e projetos e controlar e fiscalizar atividades capazes de provocar degradação
ambiental.

1.2.3. Órgão Central

Compete ao Ministério do Meio Ambiente o exercício das funções de órgão


central do SISNAMA, com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e
controlar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais
fixadas para o meio ambiente.

Observação: vale destacar que a pasta do Meio Ambiente fora elevada à


condição de Ministério ainda em 1992, nos termos do art. 21 da Lei Federal n.º
8.490, que transformou a antiga Secretaria do Meio Ambiente no atual Ministério
do Meio Ambiente.

Portanto, compete ao Ministério do Meio Ambiente coordenar e


supervisionar a Política Nacional do Meio Ambiente.

1.2.4. Órgãos Executores

São considerados órgãos executores do SISNAMA as duas autarquias


ambientais federais vinculadas ao Ministério do Meio Ambiente:

• O Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais


Renováveis – IBAMA;

• O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBIO.

27
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Foram instituídas com a finalidade de executar e fazer executar a política e


as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente, de acordo com as
respectivas competências.

O IBAMA tem como competências:

• O exercício do poder de polícia ambiental federal: Fiscalizando


atividades e lavrando autos de infrações ambientais;

• O licenciamento ambiental cuja competência pertença à União:


Concedendo licenças ambientais para o exercício de atividades
potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais.

Por outro lado, o ICMBIO, que foi instituído em 2007, faz a gestão das
unidades de conservação da natureza federais, a exemplo dos parques nacionais.

1.2.5. Órgãos Seccionais

São considerados órgãos seccionais do SISNAMA todos os órgãos e


entidades ambientais estaduais e distritais: Conselhos Estaduais do Meio
Ambiente, Secretarias Estaduais do Meio Ambiente, Autarquias Estaduais do
Meio Ambiente etc.

São responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e


fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental.

Na prática, em cada Estado da Federação e no Distrito Federal há um


Conselho Estadual do Meio Ambiente, que também exerce o poder normativo
ambiental no âmbito estadual/distrital e cujas resoluções são de observância
obrigatória por todos os órgãos ambientais do Estado e dos respectivos Municípios.

Trata-se dos órgãos e entidades ambientais instituídos pela legislação


estadual para exercer, ao menos, duas competências:

• O exercício do poder de polícia ambiental estadual: fiscalizando


atividades e lavrando autos de infrações ambientais;

• O licenciamento ambiental cuja competência pertença ao respectivo


estado: concedendo licenças ambientais para o exercício de atividades
potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais.

28
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

5. (Juiz do TJSC. Cebraspe – 2019). O Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina


(IMA/SC) é o órgão ambiental da esfera estadual catarinense responsável pela
execução de programas e projetos de proteção ambiental, bem como pelo controle
e pela fiscalização de atividades potencialmente causadoras de degradação
ambiental. De acordo com a Lei n.º 6.938/1981, o IMA/SC compõe o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) na qualidade de

a) órgão superior.

b) órgão supervisor.

c) órgão local.

d) órgão seccional.

e) órgão consultivo e deliberativo.

1.2.6. Órgãos Locais

São considerados órgãos locais do SISNAMA todos os órgãos e entidades


ambientais municipais: Conselhos Municipais do Meio Ambiente, Secretarias
Municipais do Meio Ambiente, Autarquias Municipais do Meio Ambiente etc.

Consoante expressamente previsto no art. 6º da Lei da PNMA (Lei n.º


6.389/1981), esses órgãos são responsáveis pelo controle e fiscalização das
atividades ambientais, em suas respectivas jurisdições.

Trata-se dos órgãos e entidades ambientais instituídos pela legislação


municipal para exercer, ao menos, duas competências:

• O exercício do poder de polícia ambiental municipal: fiscalizando


atividades e lavrando autos de infrações ambientais;

• O licenciamento ambiental cuja competência pertença ao respectivo


município: concedendo licenças ambientais para o exercício de
atividades potencialmente poluidoras ou utilizadoras de recursos
ambientais.

1.3. Política Nacional do Meio Ambiente

29
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

1.3.1. Criação e diretrizes da P olítica Nacional do


Meio Ambiente

A Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) foi instituída pela Lei Federal
n.º 6.938/81 com a finalidade geral de preservação, melhoria e recuperação do
meio ambiente propício à vida, para assegurar, no Brasil, as condições
necessárias:

• Ao desenvolvimento socioeconômico;

• Aos interesses da segurança nacional;

• À proteção da dignidade da vida humana.

Com ela foram estabelecidos princípios (diretrizes), objetivos e


instrumentos jurídicos necessários à adequada fiscalização, ao controle e à
conservação dos recursos naturais no Brasil. Ou seja, com a instituição da PNMA,
os órgãos e entidades ambientais foram reestruturados e passaram a contar com
um conjunto de ferramentas jurídicas destinadas a propiciar uma efetiva
preservação ambiental no Brasil.

Assim, cabe aos órgãos e entidades integrantes da estrutura do SISNAMA a


implementação da PNMA no país, respeitando-se o conjunto de princípios
(diretrizes) por ela instituídos como orientadores da atuação governamental (art.
2º da Lei Federal n.º 6.938/81), conforme abaixo:

• Racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar;

• Planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais;

30
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas


representativas;

• Controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente


poluidoras;

• Incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso


racional e a proteção dos recursos ambientais;

• Acompanhamento do estado da qualidade ambiental;

• Recuperação de áreas degradadas;

• Proteção de áreas ameaçadas de degradação;

• Ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico,


considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser
necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo;

• Educação ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação


da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na
defesa do meio ambiente.

Todavia, vale ressaltar que os princípios definidos pela PNMA, em verdade,


se constituem em diretrizes para atuação estatal, razão pela qual não são
considerados e não podem ser confundidos com os princípios tipicamente
ambientais que serão estudados posteriormente (da prevenção, precaução,
poluidor-pagador etc.).

QUESTÃO

6. (Juiz do TJPR. Cebraspe – 2019). Os princípios expressos na Lei n.º 6.938/1981


— Política Nacional do Meio Ambiente — incluem

A) o estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental e de


normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais.

B) a racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar e a recuperação


de áreas degradadas.

C) o desenvolvimento sustentável e o poluidor pagador.

D) o desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para


o uso racional de recursos ambientais.

31
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Conforme apontado acima, um dos princípios orientadores da ação


governamental da PNMA é a promoção da educação ambiental em todos os níveis
de ensino, posteriormente constitucionalizado como um dos deveres do Poder
Público, nos termos do art. 225, §1º, inciso VI da Constituição da República:

Art. 225.
[...]
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao
Poder Público:
[...]
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de
ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente;

Após a constitucionalização desta diretriz, foi instituída ainda, nos termos


da Lei Federal n.º 9.795/99, uma Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA),
finalmente definindo o que se entende por educação ambiental:

Art. 1º Entendem-se por educação ambiental os processos por


meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores
sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências
voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso
comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua
sustentabilidade.

Logo, seja como um dos princípios (diretrizes) da PNMA, seja como dever
constitucional do Poder Público, a educação ambiental, voltada para a construção
de valores para a conservação do meio ambiente, deve ser implementada como um
componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar
presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo
educativo, em caráter formal e não-formal.

Apesar disso, contudo, a educação ambiental não compõe disciplina


específica no currículo de ensino, salvo quanto aos cursos de pós-graduação e
extensão, quando então será facultada a criação de disciplina específica, nos
termos da Lei Federal n.º 9.795/99:

Art. 10.
[...]
§ 1º A educação ambiental não deve ser implantada como
disciplina específica no currículo de ensino.
§ 2º Nos cursos de pós-graduação, extensão e nas áreas
voltadas ao aspecto metodológico da educação ambiental,

32
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

quando se fizer necessário, é facultada a criação de disciplina


específica.

QUESTÕES

7. (Juiz de Direito do TJMT. Vunesp – 2018) (adaptada). A respeito da Política


Nacional de Educação Ambiental, pode se afirmar que a educação ambiental deve
ser implementada como disciplina específica no currículo da educação básica.

( ) Certo ( ) Errado

8. (Promotor de Justiça do MPSC. 2016). Segundo recente alteração da Lei n.


9.795/99, a educação ambiental será desenvolvida como uma prática educativa
integrada, contínua e temporânea em todos os níveis e modalidades do ensino
formal, devendo ser implantada como disciplina específica no currículo de ensino.

( ) Certo ( ) Errado

Ela será desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e


permanente em todos os níveis e modalidades do ensino formal. Deveras, as
atividades vinculadas à Política Nacional de Educação Ambiental devem ser
desenvolvidas na educação em geral e na educação escolar, por meio das seguintes
linhas de atuação inter-relacionadas:

• Capacitação de recursos humanos;

• Desenvolvimento de estudos, pesquisas e experimentações;

• Produção e divulgação de material educativo;

• Acompanhamento e avaliação.

Observação: vale ressaltar que a dimensão ambiental deve constar dos


currículos de formação de professores, em todos os níveis e em todas as disciplinas.

Registre-se, ainda, que a PNEA deve ser executada, dentre outros, pelos
órgãos do SISNAMA, nos termos do art. 1º do Decreto Federal n.º 4.281/02:

Art. 1o A Política Nacional de Educação Ambiental será


executada pelos órgãos e entidades integrantes do Sistema
Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, pelas instituições
educacionais públicas e privadas dos sistemas de ensino, pelos
órgãos públicos da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, envolvendo entidades não governamentais,

33
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

entidades de classe, meios de comunicação e demais


segmentos da sociedade. [grifo nosso]

Por fim, é importante apontar os objetivos fundamentais da educação


ambiental definidos pela PNEA:

• O desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio ambiente


em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos
ecológicos, psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos,
científicos, culturais e éticos;

• A garantia de democratização das informações ambientais;

• O estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a


problemática ambiental e social;

• O incentivo à participação individual e coletiva, permanente e


responsável, na preservação do equilíbrio do meio ambiente,
entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor
inseparável do exercício da cidadania;

• O estímulo à cooperação entre as diversas regiões do País, em níveis


micro e macrorregionais, com vistas à construção de uma sociedade
ambientalmente equilibrada, fundada nos princípios da liberdade,
igualdade, solidariedade, democracia, justiça social, responsabilidade e
sustentabilidade;

• O fomento e o fortalecimento da integração com a ciência e a


tecnologia;

• O fortalecimento da cidadania, autodeterminação dos povos e


solidariedade como fundamentos para o futuro da humanidade.

Portanto, além de ser em um dos princípios (diretrizes) da PNMA, a


educação ambiental se constitui em dever constitucional do Poder Público e deve
ser executada através da implementação de sua Política Nacional própria, a PNEA.

Além disso, a PNMA ainda estabelece importantes conceitos legais que


devem ser utilizados para a correta interpretação e aplicação das diversas normas
ambientais do Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental, a exemplo do conceito
do Meio Ambiente, conforme abaixo:

Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

34
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

I - meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e


interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas as suas formas;

Em verdade, nos termos da jurisprudência do STF, a defesa do meio


ambiente deve contemplar não só o meio ambiente natural ou físico (os recursos
naturais, como a fauna, flora, recursos hídricos etc.), mas também o meio ambiente
cultural (relativo ao patrimônio cultural definido nos arts. 215 e 216 da CF), o meio
ambiente artificial (decorrente da ação humana, conforme estabelecido pela
política urbana prevista no art. 182 da CF) e o meio ambiente do trabalho ou
laboral (relativo à saúde e a segurança nos locais de trabalho, conforme previsto
no art. 200, inciso VIII da CF):

[...] A incolumidade do meio ambiente não pode ser


comprometida por interesses empresariais nem ficar
dependente de motivações de índole meramente econômica,
ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica,
considerada a disciplina constitucional que a rege, está
subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que
privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que
traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio
ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio
ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente
laboral. [...] (ADI 3540 MC, Relator(a): CELSO DE MELLO,
Tribunal Pleno, julgado em 01/09/2005, DJ 03-02-2006 PP-
00014 EMENT VOL-02219-03 PP-00528).

QUESTÕES

9. (Juiz de Direito do TJBA. Cebraspe – 2019) De acordo com a jurisprudência do


STF, o conceito de meio ambiente inclui as noções de meio ambiente

a) artificial, histórico, natural e do trabalho.

b) cultural, artificial, natural e do trabalho.

c) natural, histórico e biológico.

d) natural, histórico, artificial e do trabalho.

e) cultural, natural e biológico.

35
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A PNMA ainda estabelece os seguintes conceitos legais que também devem


ser utilizados em todo o Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental:

• Degradação ambiental: a alteração adversa das características do meio


ambiente;

• Poluição: a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades


que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da


população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e


econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio


ambiente;

e) lancem matérias ou energia em desacordo com os


padrões ambientais estabelecidos;

• Recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e


subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os
elementos da biosfera, a fauna e a flora;

• Poluidor: a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado,


responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de
degradação ambiental.

QUESTÃO

10. (Promotor de Justiça do MPSP. 2013) Para os fins da Lei n.º 6.938, de 31 de
agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, entende-
se por

I. meio ambiente o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem


física, química, estética, urbana e paisagística que permite, abriga e rege a vida em
todas as suas formas;

II. poluidor a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,


direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;

36
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

III. poluição a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que


direta ou indiretamente, entre outras, prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-
estar da população e criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

IV. degradação da qualidade ambiental a alteração, adversa ou não, das


características do meio ambiente;

V. recursos ambientais a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas,


os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna
e a flora.

Está CORRETO somente o contido nos itens

a) I, II e IV.

b) III, IV e V.

c) II, III e V.

d) II, III e IV.

e) I, IV e V.

Consoante acima, o conceito legal de poluidor é alargado para alcançar


qualquer pessoa, natural ou jurídica, de direito público ou privado, que seja
responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação
ambiental.

Exemplo: se o órgão ambiental municipal (órgão local) concede, por meio


de conluio e fraude, uma licença ambiental inválida (por falta de competência), e o
beneficiário – de posse dessa licença ambiental – promove o desmatamento de
grande área de vegetação nativa, ambos serão considerados poluidores. O
beneficiário da licença, sem dúvida, será o poluidor direto, ao posso que o
município será o poluidor indireto. Desse modo, ambos poderão figurar no polo
passivo de uma ação civil pública movida para condená-los na obrigação de reparar
e indenizar os danos ambientais causados.

Desse exemplo é possível se extrair a relevantíssima função do conceito


alargado de poluidor, que também permitirá a responsabilização daqueles que
contribuírem apenas indiretamente para a poluição ou degradação do meio
ambiente.

37
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

11. (Promotor de Justiça do MPMT. FCC – 2019). Segundo prevê o art. 225 da
Constituição Federal “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações”. Nesse caso,

A) degradação ambiental e poluição são expressões que se equivalem.

B) como cabe ao Poder Público o dever de defender o meio ambiente, jamais


poderá ser responsabilizado por sua degradação.

C) o poluidor será sempre a pessoa física ou jurídica de direito privado,


responsável, direta ou indiretamente, pela degradação ambiental.

D) o poluidor será a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado,


responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação
ambiental.

E) a poluição será sempre ilícita.

1.3.2. Constitucionalização da Tutela Ambiental e da


Política Nacional do Meio Ambiente

Apesar dos importantes avanços no sistema de proteção ambiental


promovidos com a aprovação da Lei Federal n.º 6.938/81, que instituiu o SISNAMA
e o PNMA, é certo que a tutela do meio ambiente somente restou
constitucionalizada com a aprovação do art. 225 da Constituição da República atual,
em 1988, que elevou o meio ambiente ecologicamente equilibrado à condição de
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, passando a ser
esse o fundamento constitucional da proteção ambiental em nosso ordenamento
jurídico:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente


equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
presentes e futuras gerações. [grifo nosso]

Dessa forma, o meio ambiente ecologicamente equilibrado passou à


condição de direito fundamental de terceira geração com o advento da atual

38
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Constituição da República, inspirada nos princípios firmados pela Declaração sobre


o Meio Ambiente aprovada na Conferência de Estocolmo de 1972. Esta é a razão
do porquê não se poderia, por exemplo, simplesmente extinguir ou revogar a
PNMA, sob pena de se violar os comandos constitucionais de proteção ambiental.

Além disso, o Constituinte originário elevou à condição de Patrimônio


Nacional os seguintes biomas brasileiros:

• Floresta Amazônica;

• Mata Atlântica;

• Serra do Mar;

• Pantanal Mato-Grossense;

• Zona Costeira.

Com isso, esses biomas passaram a ostentar proteção constitucional


especial, razão pela qual sua exploração está sujeita a regras mais rigorosas
estabelecidas pela legislação ambiental infraconstitucional. Sua exploração só
poderá ocorrer dentro de condições que assegurem a preservação dos seus
recursos naturais:

Art. 225.
[...]
§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra
do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são
patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei,
dentro de condições que assegurem a preservação do meio
ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

Assim, por exemplo, a Lei Federal n.º 11.428/06 (Lei da Mata Atlântica),
como regra, proíbe a supressão de vegetação primária e secundária em estágio
avançado e médio de regeneração na Mata Atlântica, cuja intervenção somente
será excepcionalmente permitida nos casos de utilidade pública, de pesquisas e de
práticas preservacionistas, sob pena da caracterização crime ambiental (art. 38-A
da Lei Federal n.º 9.605/98):

Art. 20. O corte e a supressão da vegetação primária do Bioma


Mata Atlântica somente serão autorizados em caráter
excepcional, quando necessários à realização de obras,
projetos ou atividades de utilidade pública, pesquisas
científicas e práticas preservacionistas.

39
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

[...]
Art. 21. O corte, a supressão e a exploração da vegetação
secundária em estágio avançado de regeneração do Bioma
Mata Atlântica somente serão autorizados:
I - em caráter excepcional, quando necessários à execução de
obras, atividades ou projetos de utilidade pública, pesquisa
científica e práticas preservacionistas;
[...]
Art. 23. O corte, a supressão e a exploração da vegetação
secundária em estágio médio de regeneração do Bioma Mata
Atlântica somente serão autorizados:
I - em caráter excepcional, quando necessários à execução de
obras, atividades ou projetos de utilidade pública ou de
interesse social, pesquisa científica e práticas preservacionistas;

Outro exemplo é o art. 10 da Lei Federal n.º 12.651/12 (novo código


florestal) que restringe novas supressões da vegetação nativa nos pantanais e
planícies pantaneiras, situadas sobretudo no Pantanal Mato-Grossense,
consoante será estudado em tópico futuro:

Art. 10. Nos pantanais e planícies pantaneiras, é permitida a


exploração ecologicamente sustentável, devendo-se
considerar as recomendações técnicas dos órgãos oficiais de
pesquisa, ficando novas supressões de vegetação nativa para
uso alternativo do solo condicionadas à autorização do órgão
estadual do meio ambiente, com base nas recomendações
mencionadas neste artigo.

A Lei Federal n.º 7.661/881 também disciplina a utilização racional dos


recursos da Zona Costeira, que deve observar as disposições do Plano Nacional de
Gerenciamento Costeiro – PNGC:

Art. 3º. O PNGC deverá prever o zoneamento de usos e


atividades na Zona Costeira e dar prioridade à conservação e
proteção, entre outros, dos seguintes bens:
I - recursos naturais, renováveis e não renováveis; recifes,
parcéis e bancos de algas; ilhas costeiras e oceânicas; sistemas
fluviais, estuarinos e lagunares, baías e enseadas; praias;
promontórios, costões e grutas marinhas; restingas e dunas;
florestas litorâneas, manguezais e pradarias submersas;
II - sítios ecológicos de relevância cultural e demais unidades
naturais de preservação permanente;

1 Regulamentada pelo Decreto Federal n.º 5.300/04.

40
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

III - monumentos que integrem o patrimônio natural, histórico,


paleontológico, espeleológico, arqueológico, étnico, cultural e
paisagístico.
[...]
Art. 5º. O PNGC será elaborado e executado observando
normas, critérios e padrões relativos ao controle e à
manutenção da qualidade do meio ambiente, estabelecidos
pelo CONAMA, que contemplem, entre outros, os seguintes
aspectos: urbanização; ocupação e uso do solo, do subsolo e
das águas; parcelamento e remembramento do solo; sistema
viário e de transporte; sistema de produção, transmissão e
distribuição de energia; habitação e saneamento básico;
turismo, recreação e lazer; patrimônio natural, histórico,
étnico, cultural e paisagístico.
§ 1º Os Estados e Municípios poderão instituir, através de lei,
os respectivos Planos Estaduais ou Municipais de
Gerenciamento Costeiro, observadas as normas e diretrizes do
Plano Nacional e o disposto nesta lei, e designar os órgãos
competentes para a execução desses Planos.
§ 2º Normas e diretrizes sobre o uso do solo, do subsolo e das
águas, bem como limitações à utilização de imóveis, poderão
ser estabelecidas nos Planos de Gerenciamento Costeiro,
Nacional, Estadual e Municipal, prevalecendo sempre as
disposições de natureza mais restritiva.

Não obstante isso, não há que se confundir Patrimônio Nacional com bem
federal ou da União, haja vista que aquela locução revela proclamação de defesa
de interesses do Brasil diante de eventuais ingerências estrangeiras, apenas isso,
conforme assentado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Portanto,
esses biomas constitucionalmente considerados como patrimônio nacional não
constituem patrimônio da União, mas sim pertencem aos respectivos Estados e
Municípios onde estão situados.

Logo, as infrações decorrentes de violação da vegetação desses biomas


tidos como patrimônio nacional, por si sós, não são de competência da Justiça
Federal, conforme será estudado no Sisrespia.

E frise-se: Os relevantíssimos biomas cerrado e caatinga, que ocupam


grande parte do território do Brasil, não são considerados patrimônio nacional
pela Constituição da República, por um verdadeiro lapso do Constituinte
originário de 1988.

41
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

12. (Juiz de Direito do TJAC. Vunesp – 2019) (adaptada). Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (Caput do artigo 225
da CF/88)

Nesse sentido, é correto afirmar que a Floresta Amazônica brasileira, a


Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense, o Cerrado, a Zona da
Mata e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á na forma
da lei.

( ) Certo ( ) Errado

Ainda é importante ressaltar que, com a constitucionalização da tutela


ambiental, os animais passaram a ostentar proteção contra práticas cureis, que
foram vedadas pelo Constituinte originários, nos seguintes termos:

Art. 225.
[...]
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as
práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a
crueldade.

Daí porque a proibição da caça de animais prevista no art. 2º da Lei Federal


n.º 5.197/67 e a proibição da pesca de cetáceos (baleias e golfinhos) tipificada como
crime no art. 2º da Lei Federal n.º 7.643/87 foram recepcionadas pela Constituição
da República de 1988, haja vista que se constituem em práticas cruéis.

Assim, somente se admite a caça de controle, haja vista que propicia o


reequilíbrio do ecossistema contra o aumento desproporcional de certos animais
predadores em determinadas localidades, com fundamento em estudos
ambientais, e a caça científica, consoante decidido no julgamento da ADI n.º 5977
pelo c. STF e previsto na Lei Federal n.º 5.197/67:

Art. 2º.
[...]
§ 2º Será permitida mediante licença da autoridade
competente, a apanha de ovos, lavras e filhotes que se
destinem aos estabelecimentos acima referidos, bem como a

42
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

destruição de animais silvestres considerados nocivos à


agricultura ou à saúde pública.
[...]
Art. 14. Poderá ser concedida a cientistas, pertencentes a
instituições científicas, oficiais ou oficializadas, ou por estas
indicadas, licença especial para a coleta de material destinado
a fins científicos, em qualquer época.

Assim, práticas conhecidas como “farra do boi”, “briga ou rinha de galos”,


caça profissional (causadora de extinção de espécies), esportiva ou amadorística
(TRF4, EI na AC n.º 2004.71.00.021481-2/RS), e a vaquejada, regulamentadas em
leis estaduais, são proibidas e foram consideradas inconstitucionais pelo Supremo
Tribunal Federal ante a proteção constitucional dos animais insculpida no art.
225, §1º, inciso VII da CR/88 (ex.: ADI n.º 4983).

QUESTÃO

13. (Procurador do Município da PGM/Inhapi-AL. Copeve/Ufal – 2015). A respeito


do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado previsto na Constituição
Federal de 1988 e das regras estabelecidas para proteção da fauna e da flora
brasileiras, é correto afirmar:

A) embora a Constituição de 1988 restrinja a prática de atividades que


impliquem maus-tratos contra animais, a legislação penal em vigor tipifica como
crime apenas o ato praticado contra animais silvestres nativos.

B) o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado impede qualquer


forma de violência ou prática de ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animal
silvestre, ressalvadas as práticas autorizadas na lei complementar em vigor.

C) as regras voltadas à proteção do meio ambiente, na Constituição Federal


de 1988, têm estatura de direito fundamental, tipificando como ilícitas quaisquer
atividades econômicas que impliquem a emissão de poluentes tóxicos e
degradação do meio ambiente natural.

D) a Constituição de 1988 traz regra expressa que veda práticas que


submetam os animais a crueldade e, já serviu de fundamento para que o STF se
pronunciasse sobre a inconstitucionalidade da prática de “briga de galo” e da
manifestação conhecida como “farra do boi”.

43
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

E) para assegurar o direito ao meio ambiente equilibrado, a Constituição de


1988 veda a exploração de recursos minerais que implique degradação do meio
ambiente natural, devendo ser responsabilizada criminalmente pessoa física ou
jurídica que desenvolva a atividade.

Também em razão da tutela constitucional dos animais, o art. 32 da Lei


Federal n.º 9.605/98 tipificou como crime as práticas que lhes causem maus-
tratos.2

Registre-se que o depósito e a guarda de animais silvestres, consistentes


naqueles que vivem naturalmente fora do cativeiro (considerados propriedade do
Poder Público3), a exemplo dos micos, papagaios etc., só se legitimam com a prévia
autorização dos órgãos do Sisnama4, sob pena de se caracterizar a prática de crime
ambiental5.

Outras práticas cruéis certamente também serão proibidas, como a prova


bulldog em rodeios, que utiliza bezerros e que já deixou um animal tetraplégico na
festa do peão de Barretos/SP, em 2011, e a produção e comercialização de foie
gras, que consiste no patê de fígado de gansos submetidos a uma vida confinada e
com alimentação forçada para que o órgão do animal fique hiperdesenvolvido.6

Portanto, como visto, em nosso ordenamento jurídico há uma destacada


preocupação com o bem-estar dos animais, razão pela qual — dentre as
concepções filosóficas e ético-ambientais abaixo — considera-se que a Constituição
da República adotou o antropocentrismo moderado (ADI n.º 4983) ou com doses
do biocentrismo, porquanto conferiu especial proteção aos animais,
independentemente dos interesses do homem:

• Antropocentrismo (clássico): A proteção ambiental tem como única


finalidade servir ao homem;

• Ecocentrismo: Valor não instrumental dos ecossistemas, que devem ser


considerados em si mesmos, independentemente de qualquer interesse
humano, podendo ser defendidos até mesmo contra os seres humanos.

2 Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos;
3 Prevalece que são de propriedade da União.
4 Nos termos da Resolução n.º 457/13.
5 Art. 29 da Lei Federal n.º 9.605/98.
6 Será apreciado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 1.030.732.

44
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Foi a opção adotada, por exemplo, pelo art. 72 da Constituição da


República do Equador de 2008 (a natureza com sujeito de direitos);

• Biocentrismo: Valor intrínseco dos demais animais,


independentemente da existência do homem, em especial dos
mamíferos, que são seres sencientes (percepção de dor e prazer). Foi a
opção adotada pelo projeto de lei da Câmara 27/2018 que passa a
considerar os animais não humanos com natureza jurídica sui generis e
como sujeitos com direitos despersonificados, vedando seu tratamento
como coisa (já aprovado na Câmara e no Senado, aguardando a revisão
pela Câmara);

45
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

14. (Juiz de Direito do TJSP. Vunesp – 2017) (adaptada). Considere a reflexão de


Michel Serres em O contrato natural: “O retorno à natureza! O que implica
acrescentar ao contrato exclusivamente social a celebração de um contrato natural
de simbiose e de reciprocidade em que a nossa relação com as coisas permitiria o
domínio e a possessão pela escuta admirativa, a reciprocidade, a contemplação e o
respeito, em que o conhecimento não suporia já a propriedade nem a ação o
domínio, nem estes os seus resultados ou condições estercorárias. Um contrato de
armistício na guerra objetiva um contrato de simbiose: o simbiota admite o direito
do hospedeiro, enquanto o parasita – o nosso atual estatuto – condena à morte
aquele que pilha e o habita sem ter consciência de que, a prazo, se condena a si
mesmo ao desaparecimento. O parasita agarra tudo e não dá nada; o hospedeiro
dá tudo e não agarra nada. O direito de dominação e de propriedade reduz-se ao
parasitismo. Pelo contrário, o direito de simbiose define-se pela reciprocidade:
aquilo que a natureza dá ao homem é o que este lhe deve dar a ela, tornada sujeito
de direito.”

Pode-se afirmar que, nessa reflexão, o autor propõe

A) que os fundamentos filosóficos do direito ambiental devem se fundar numa


ética antropocêntrica clássica, e não numa defesa ingênua do meio ambiente, que
não existe como uma esfera desvinculada das ações, ambições e necessidades
humanas.

B) a predominância do humano deve implicar uma ética utilitarista sobre a


natureza, uma vez que é situado ele em padrão mais elevado entre os seres do
mundo, e ser ela essencial para satisfação de suas necessidades.

C) uma alteração no eixo metodológico e paradigmático do direito ambiental


do antropocentrismo clássico para um biocentrismo moderado em que a natureza,
pelos valores que representa em si mesma, venha receber proteção e, por seu
próprio fundamento, missão jurídica e ética do Homem.

D) que os fundamentos éticos e filosóficos do direito ambiental devem ter em


consideração a visão humanística – razão cartesiana centrada no sujeito (ser
humano) cindido do objeto (natureza) – da qual decorre a circunstância de que a
dimensão do humano deve ser a medida sob todo o mundo natural.

46
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Por fim, é importante ressaltar que – aparentemente – essa dose de


biocentrismo adotada pelo Constituinte originário quando estabeleceu relevante
tutela constitucional aos animais, ao vedar práticas cruéis contra eles, restou
mitigada com a aprovação da emenda constitucional n.º 96/17, pela qual o
Congresso Nacional, em verdadeira reação do Poder Legislativo (efeito backlash) à
decisão do STF na ADI n.º 4983 (inconstitucionalidade de lei estadual que autorizava
a vaquejada), buscou readmitir a prática da vaquejada no país, desde que seja
considerada prática desportiva e manifestação cultural tida como bem de natureza
imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro:

Art. 225.
§1º [...]
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as
práticas que coloquem em risco sua função ecológica,
provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a
crueldade. [...]

§ 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º


deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas
que utilizem animais, desde que sejam manifestações
culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição
Federal, registradas como bem de natureza imaterial
integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser
regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar
dos animais envolvidos. (Incluído pela Emenda Constitucional
n.º 96, de 2017)

E a Lei Federal n.º 13.364/16 já havia declarado a vaquejada, o rodeio e o


laço (o laço foi incluído pela Lei Federal n.º 13.873/19) como manifestações
culturais nacionais elevadas à condição de bens de natureza imaterial integrantes
do patrimônio cultural brasileiro, de modo a torná-las práticas constitucionais,
agora à luz da emenda constitucional n.º 96/17. A Lei ainda delegou às respectivas
associações responsáveis pela promoção dessas práticas a competência para
aprovar regulamentos que assegurem o bem-estar dos animais, transferindo a
elas – portanto – o exercício do poder de polícia ambiental, pasmem!

Art. 2º O rodeio, a vaquejada e o laço, bem como as respectivas


expressões artísticas e esportivas, são reconhecidos como
manifestações culturais nacionais e elevados à condição de
bens de natureza imaterial integrantes do patrimônio cultural
brasileiro, enquanto atividades intrinsecamente ligadas à vida,
à identidade, à ação e à memória de grupos formadores da

47
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

sociedade brasileira. (Redação dada pela Lei n.º 13.873, de


2019)

Art. 3º-B. Serão aprovados regulamentos específicos para o


rodeio, a vaquejada, o laço e as modalidades esportivas
equestres por suas respectivas associações ou entidades legais
reconhecidas pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento. (Incluído pela Lei n.º 13.873, de 2019)
§ 1º Os regulamentos referidos no caput deste artigo devem
estabelecer regras que assegurem a proteção ao bem-estar
animal e prever sanções para os casos de descumprimento.

Vale ressaltar que, apesar de a Lei Federal n.º 13.364/16 ter sido aprovada
antes da EC 96/17, eventual alegação de inconstitucionalidade originária, diante
da vedação à constitucionalidade superveniente (conforme a jurisprudência do c.
STF), resta afastada, haja vista que a mencionada lei foi quase que integralmente
alterada e reafirmada pela Lei Federal n.º 13.873/19, portanto já na égide do novo
texto constitucional.

Por fim, cabe destacar que a prática de rodeio também se encontra


regulamentada na Lei Federal n.º 10.519/02, que veda o uso de apetrechos que
possam causar injúrias ou ferimentos aos animais, sobretudo de esporas com
rosetas pontiagudas e de aparelhos de choques elétricos, sob pena de multa de
até R$ 5.320,00, além de advertência ou suspensão das atividades.

QUESTÃO

15. (Procurador do Estado da PGE/PI. Cebraspe – 2014). Na Festa da Farra do Boi,


realizada em Santa Catarina, tradicionalmente, populares se divertem com o fato
de submeter animais bovinos a sofrimentos físicos de naturezas diversas. O STF, ao
julgar a polêmica que envolve essa festividade, manifestou-se, por maioria, pela
proibição de sua realização. A respeito desse assunto, assinale a opção correta.

A) A apreciação do tema em tela envolve a análise de dois bens


constitucionalmente protegidos e contidos no conceito de meio ambiente: as
manifestações culturais e a fauna nacional.

B) A caracterização da Festa da Farra do Boi como manifestação cultural não


tem relevância na análise do referido tema, uma vez que, havendo conflito entre
normas de proteção ao meio ambiente e normas de proteção ao patrimônio
cultural, prevalecem as primeiras.

48
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

C) A crueldade contra animais é um conceito subjetivo, de sorte que só se


considera cruel a prática que submeta o animal a dor extrema.

D) A proibição de realização da referida festividade encontra respaldo no


princípio constitucional da função ecológica da propriedade.

E) A CF, ao proibir práticas que submetam animais a crueldade, contraria a


visão antropocêntrica do direito ambiental e passa a considerar os animais, ao lado
dos seres humanos, como titulares de direitos.

1.4. Objetivos

Os órgãos que compõem a estrutura do Sisnama são responsáveis pela


implementação da Política Nacional do Meio Ambiente — PNMA — e, por isso,
devem buscar o cumprimento dos seus objetivos específicos.

São objetivos específicos da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA:

49
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A compatibilização do desenvolvimento econômico social com a


preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico indica que se
deve buscar o desenvolvimento sustentável do País, conformando a prosperidade
da Nação através do desenvolvimento da economia (com avanços tecnológicos e
industriais etc.) com o respeito à preservação ambiental, tal qual idealizado no
Relatório Brundtland, Nosso Futuro Comum, elaborado pela Comissão Mundial
sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento da ONU – CMED – e publicado em
1987.

O estabelecimento de critérios e padrões da qualidade ambiental e de


normas relativas ao uso e manejo de recursos ambientais se constitui em
relevantíssimo objetivo da PNMA. Conforme visto linhas atrás, a PNMA considera
como poluição a degradação da qualidade ambiental, ou seja, qualquer atividade
que – direta ou indiretamente – promova alterações adversas nas características
do meio ambiente. Desse modo, pelo amplíssimo conceito legal acima destacado,
qualquer atividade humana causa poluição. O simples sair de casa dirigindo seu
veículo, movido a gasolina, já promoverá alterações adversas nas características
do meio ambiente com os gases emitidos pela queima do combustível fóssil.

Assim, deve-se distinguir a poluição admissível ou minimamente


necessária para a vida, da poluição inadmissível e que constitui, por isso, infração
às normas ambientais. Esse processo de distinção se constitui justamente no
estabelecimento de critérios e padrões de qualidade ambiental, um dos objetivos
buscados pela PNMA.

O desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para


o uso racional de recursos ambientais e difusão de tecnologias de manejo do meio
ambiente, divulgação de dados e informações ambientais e formação de uma
consciência pública sobre a necessidade de preservação da qualidade ambiental e
do equilíbrio ecológico estabelece que o Poder Público deve fomentar a criação e
distribuição de equipamentos tecnológicos cada vez mais avançados que possam
contribuir para a conservação do meio ambiente através do uso mais eficiente dos
recursos naturais e da diminuição da poluição.

A preservação e restauração dos recursos ambientais com vistas à sua


utilização racional e disponibilidade permanente, concorrendo para a manutenção
do equilíbrio ecológico propício à vida determina objetivo nuclear da PNMA,
instituído com a finalidade central de buscar a preservação do meio ambiente e de
seus recursos naturais, sendo – por isso – necessária a conscientização de que esses
recursos são esgotáveis, razão pela qual devem ser utilizados de forma eficiente e

50
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

racional para se manter sua disponibilidade permanente, inclusive para as futuras


gerações, além de se buscar sua reparação e restauração se eventualmente
sofrerem algum tipo de degradação.

A imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou


indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de
recursos ambientais com fins econômicos estabelece um dos objetivos mais
relevante da PNMA, haja vista que busca garantir a um só tempo a
responsabilização do poluidor pelos danos ambientais causados e sua obrigação de
efetivamente reparar esses danos ou, quando impossível sua reparação, indenizá-
los (princípio ambiental do poluidor-pagador). Esse objetivo ainda estabelece que
também os usuários de recursos ambientais, extraídos de forma lícita e regular,
sejam obrigados a contribuir por sua utilização, daí porque esses bens ambientais
passam a ser dotados de valor econômico para induzir e conscientizar seu uso
racional e se evitar desperdícios (princípio ambiental do usuário-pagador).

Por fim, a definição de áreas prioritárias de ação governamental relativa à


qualidade e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos
Estados, do Distrito Federal, do Territórios e dos Municípios visa a fomentar o
estabelecimento de áreas que receberão especial ação do Poder Público quanto à
manutenção, a preservação e a recuperação da qualidade ambiental e do equilíbrio
ecológico, ou seja, o estabelecimento de espaços territoriais que receberão
especial ação e proteção do Poder Público, como por exemplo a instituição de
parques e áreas de proteção ambiental, o que será estudado no segundo sistema,
no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC.

QUESTÃO

16. (Juiz de Direito do TJSP. Vunesp – 2014). Não é objetivo da Política Nacional do
Meio Ambiente (PNMA):

A) desenvolvimento de pesquisas e de tecnologias nacionais orientadas para


o uso racional dos recursos ambientais.

B) promoção da proteção do patrimônio cultural local, observada a ação


fiscalizadora municipal e estadual.

C) a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a


preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.

51
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

D) definição das áreas prioritárias de ação governamental relativa à qualidade


e ao equilíbrio ecológico, atendendo aos interesses da União, dos Estados, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios.

1.5. Instrumentos

Os órgãos e entidades que compõem a estrutura do Sisnama devem


implementar a Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA –, cumprindo seus
objetivos. Para isso, se utilizarão do conjunto de instrumentos ambientais que
foram disponibilizados pela Lei da PNMA, consistentes em verdadeiras ferramentas
jurídicas.

Assim, por exemplo, o IBAMA (entidade da estrutura do Sisnama) poderá


se utilizar do licenciamento ambiental (um dos instrumentos da PNMA) para
compatibilizar o desenvolvimento econômico com a preservação do meio
ambiente (um dos objetivos da PNMA) através do estabelecimento de condições
(condicionantes) para a autorização do funcionamento de empreendimento que
é causador de degradação ambiental, propiciando — com isso — a
implementação da própria Política Nacional do Meio Ambiente.

São instrumentos da PNMA, a serem utilizados pelos órgãos e entidades do


Sisnama:

• O estabelecimento de padrões de qualidade ambiental;

• O zoneamento ambiental;

• As avaliações de impactos ambientais;

• O licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente


poluidoras;

52
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou


absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade
ambiental;

• A criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder


Público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção
ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas;

• O sistema nacional de informações sobre o meio ambiente;

• O Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumento de Defesa


Ambiental;

• As penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento


das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação
ambiental.

• A instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente, a ser


divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA;

• A garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente,


obrigando-se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes;

• O Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras


e/ou utilizadoras dos recursos ambientais;

• Os instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão


ambiental, seguro ambiental e outros.

É importante ressaltar que as penalidades disciplinares se constituem em


um dos mais importantes instrumentos da PNMA, porém somente serão estudadas
no Sisrespia.

QUESTÃO

17. (Promotor de Justiça do MPTO. Cebraspe – 2012). Os instrumentos da Política


Nacional do Meio Ambiente incluem o

A) licenciamento ambiental, o zoneamento ecológico e o plano de manejo


econômico das florestas.

53
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

B) estudo de impacto ambiental e o manejo seletivo das espécies endêmicas.

C) relatório de impacto ambiental e o desenvolvimento de pesquisas


biotecnológicas.

D) zoneamento ambiental e o projeto de desenvolvimento de pesquisa


biomarinha.

E) licenciamento ambiental e o zoneamento ambiental.

Vamos estudar os seguintes instrumentos, considerados mais relevantes:

1.5.1. Licenciamento ambiental

O licenciamento ambiental se constitui, sem dúvida, no mais importante


e notório instrumento da PNMA, ferramenta jurídica à disposição dos órgãos do
Sisnama para que possam viabilizar a implementação dessa Política Nacional e o
cumprimento dos seus objetivos.

Trata-se de procedimento administrativo destinado a autorizar ou não


atividades e empreendimentos que sejam utilizadores de recursos ambientais,

54
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar


degradação ambiental.

Assim, a construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento de


estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou
potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar
degradação ambiental dependerão e somente poderão funcionar com o prévio
licenciamento ambiental promovido pelos órgãos da estrutura do SISNAMA, sob
pena de crime ambiental7, de multa e de embargo da atividade, nos termos do
art. 10, caput da Lei Federal n.º 6.938/81:

Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento


de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos
ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes,
sob qualquer forma, de causar degradação ambiental
dependerão de prévio licenciamento ambiental.

Em verdade, o licenciamento ambiental se constitui em legítimo exercício


do poder de polícia administrativo-ambiental exercido pelos órgãos do Sisnama,
que poderão, com fundamento na legislação ambiental, restringir direitos
individuais para fazer preponderar o respeito aos interesses de toda coletividade
relativos à preservação do meio ambiente, nos termos do art. 78 do Código
Tributário Nacional:

[...]
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da
administração pública que, limitando ou disciplinando direito,
interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de
fato, em razão de intêresse público concernente à segurança,
à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes
de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade
pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais
ou coletivos. (Redação dada pelo Ato Complementar n.º 31, de
1966)

Por meio dele, busca-se prevenir graves danos ao meio ambiente, ou


mitigá-las por meio de exigências condicionantes à expedição das licenças
ambientais.

7 Art. 60 da Lei Federal n.º 9.605/98.

55
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Daí porque, por exemplo, se determinada rede de supermercados


pretender instalar uma nova unidade em imóvel urbano com vegetação nativa
situado na cidade de Presidente Dutra/BA (Capital mundial da pinha), somente
poderá fazê-lo após se submeter ao procedimento de licenciamento ambiental
perante o órgão competente do Sisnama. Da mesma forma, se uma empresa do
agronegócio pretender implantar um projeto de irrigação para cultivo de mangas e
uvas em extensa área situada na zona rural de Juazeiro/BA também dependerá de
prévio procedimento de licenciamento ambiental.

E isso demonstra a relevância desse instrumento da PNMA, com potencial


para impactar em quase todas as atividades e empreendimentos a serem
implementados no Brasil.

Além disso, todos os casos de pedidos de licenciamento ambiental, sua


renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial, bem como
em periódico regional ou local de grande circulação, ou em meio eletrônico de
comunicação mantido pelo órgão ambiental competente.

Também é importante destacar que, como sabido, pela prestação de


serviços administrativos é possível se instituir e cobrar um tributo: A taxa de
serviço, nos termos do art. 145, inciso II da Constituição da República c/c art. 77
do Código Tributário Nacional, respectivamente in verbis:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


poderão instituir os seguintes tributos: [...] II - taxas, em razão
do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou
potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis,
prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição;

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo


Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas
respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício
regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou
potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao
contribuinte ou posto à sua disposição.

Com esse fundamento, e para remunerar os serviços de licenciamento


ambiental federal exercidos pelo IBAMA (órgão executor do Sisnama),
especialmente quanto às despesas administrativas decorrentes das atividades
extraordinárias que são realizadas nos processos de licenciamento ambiental, a
União instituiu a cobrança de taxa de serviço, nos termos do art. 17-A da Lei
Federal n.º 6.938/81:

56
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Art. 17-A. São estabelecidos os preços dos serviços e produtos


do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis - Ibama, a serem aplicados em âmbito
nacional, conforme Anexo a esta Lei.

Os serviços, considerados fatos geradores deste tributo, estão relacionados


no Anexo da respectiva lei (licenciamento para transporte nacional e exportação da
fauna silvestre, licenciamento ambiental geral, autorização de supressão vegetal
etc.).

Registre-se, ainda, que os valores das taxas de licenciamento ambiental


devem guardar relação de proporcionalidade com o custo e a complexidade do
serviço prestado, nos termos do art. 13, §3º da Lei Complementar Federal n.º
140/11:

Art. 13.
[...]
§ 3º Os valores alusivos às taxas de licenciamento ambiental e
outros serviços afins devem guardar relação de
proporcionalidade com o custo e a complexidade do serviço
prestado pelo ente federativo.

E assim como a União instituiu sua taxa de serviço para remunerar os


serviços federais de licenciamento ambiental, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios também poderão fazê-lo nos termos de sua respectiva legislação, para
remunerar os serviços de licenciamento ambiental de sua competência, haja vista
que a competência constitucional para instituição de taxas é comum.

Por fim, é importante destacar a existência de quatro situações nas quais


a legislação federal dispensou o prévio licenciamento ambiental para o
desenvolvimento de certas atividades potencialmente poluidoras:

• Atividades de segurança nacional: Por exemplo, a construção de bases


militares em localidades estratégicas para a segurança nacional, ainda
que em área de floresta, desde que caracterizada a urgência
decorrente, por exemplo, de situação de risco ou de agressão ao
território nacional;

• Atividades e empreendimentos previstos no preparo e emprego das


Forças Armadas: Definidos em ato do Poder Executivo;

• Obras de defesa civil destinadas à prevenção e mitigação de acidentes


em áreas urbanas: Desde que esteja caracterizada a urgência, como Por

57
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

exemplo, a realização de obras de contenção de encostas e de morros


para se evitar mais deslizamentos decorrentes de fortes chuvas, e se
prevenir acidente;

• Atividades eventuais ou de baixo impacto ambiental em pequenas


propriedades rurais familiares (até 4 módulos fiscais): Dependerão
apenas de simples declaração ao órgão ambiental, como por exemplo a
abertura de pequenas vias de acesso e construção de pontes e
pontilhões necessários à travessia de cursos d’água ou acesso a eles, em
área de preservação permanentes ou em reservas legais.

Além das situações acima, previstas na legislação federal, poderiam os


Estados, o Distrito Federal e os Municípios aprovar leis dispensando o prévio
licenciamento ambiental em novos casos?

Para se responder a essa questão primeiro deve-se compreender as regras


de competência constitucional para se legislar sobre o meio ambiente e, por
conseguinte, sobre licenciamento ambiental.

A Constituição da República estabelece que a competência para se legislar


sobre o meio ambiente é concorrente entre a União e os Estados-Membros:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal


legislar concorrentemente sobre: [...] VI - florestas, caça, pesca,
fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos
naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
[...]
VIII - responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao
consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico;

Desse modo, a competência legislativa concorrente criou verdadeiro


“condomínio legislativo” entre a União, os Estados e o Distrito Federal, cabendo
à União a aprovação de normas gerais sobre o meio ambiente (conceitos,
princípios, procedimentos etc.) e aos Estados-Membros o exercício da
competência complementar quando já existente norma geral sobre o meio
ambiente, ou a competência legislativa plena (supletiva) quando inexistente
norma federal de caráter geral.

Portanto, considerando-se que a União já estabeleceu a norma geral


sobre a exigência de prévio licenciamento ambiental gravada no art. 10 da Lei
Federal n.º 6.938/81, a complementação da legislação federal por Estados-

58
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Membros para atendimento de interesses regionais não permite a dispensa da


exigência de prévio licenciamento ambiental para atividades potencialmente
poluidoras, sob pena de se caracterizar patente inconstitucionalidade formal pela
violação da norma constitucional que distribui a competência legislativa entre os
Entes da Federação (ADI 5312).

Os Estados-Membros poderão editar normas ambientais mais protetivas


ao meio ambiente para atender suas peculiaridades regionais, no exercício de sua
competência constitucional concorrente para complementar as normas federais,
haja vista que a sobreposição de opções políticas por graus variáveis de proteção
ambiental constitui circunstância própria do estabelecimento de competência
concorrente sobre a matéria, consoante assentado, à unanimidade, pelo plenário
do Supremo Tribunal Federal em verdadeira virada jurisprudencial no julgamento
da ADI 5996.

Vale ressaltar também que a ampliação indiscriminada dos casos de


dispensa de prévio licenciamento ambiental implicaria em proteção deficiente ao
direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, razão pela qual
poder-se-ia configurar gravíssima inconstitucionalidade material.

Quanto aos Municípios, vige a mesma restrição, haja vista que possuem
competência constitucional apenas para legislar sobre assuntos de interesse local
e suplementar a legislação federal e a estadual, no que couber.

Portanto, os Municípios poderão suplementar a legislação estadual e


federal no limite do seu interesse local, desde que esse regramento seja harmônico
com a disciplina estabelecida pelos demais Entes Federados, sob pena de afrontar
a norma inserta no art. 24, VI da Constituição da República (RE 586.224/SP).

E esse raciocínio jurídico deve ser aplicado em quaisquer situações em


que se constate antinomia entre normas ambientais da União e dos demais Entes
Federados, conforme se observa das conclusões abaixo:

• É formalmente inconstitucional lei estadual que autoriza supressão de


vegetal em Área de Preservação Permanente para a realização de
construções, pois o Código Florestal (lei federal que prevê as normas
gerais sobre o tema, nos termos do art. 24, § 1º, da Constituição da
República) não permite edificação recreativa em área de preservação
permanente (ADI 4988/TO);

59
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• É formalmente inconstitucional lei municipal que reduz o tamanho da


Área de Preservação Permanente em cursos d’água, pois o Código
Florestal (lei federal que prevê as normas gerais sobre o tema, nos
termos do art. 24, § 1º, da Constituição da República) já estabeleceu o
tamanho mínimo (AREsp 1312435/RJ. STJ);

• É formalmente inconstitucional lei municipal que proíbe a queima da


palha da cana-de-açúcar e o uso do fogo em atividades agrícolas, pois o
Código Florestal (lei federal que prevê as normas gerais sobre o tema,
nos termos do art. 24, § 1º, da Constituição da República) já disciplinou
a questão (RE 586.224/SP).

Por fim, é importante destacar que compete privativamente à União


legislar sobre águas, energia, jazidas, minas e recursos minerais, e atividades
nucleares, razão pela qual o raciocínio jurídico acima destacado não se aplica a
estes casos.

QUESTÃO

18. (Juiz Federal do TRF3. 2016). Assinale a alternativa correta. Acerca da


competência de legislar em matéria ambiental prevista na Constituição:

A) É de competência concorrente entre União, Estados e Municípios a edição


de normas gerais acerca de proteção do meio ambiente e controle de poluição.

B) Inexiste competência da União para legislar sobre proteção ambiental em


porção territorial limitada a um Estado ou que não tenha alcance em todo o
território nacional, como, por exemplo, a vedação de pesca em um único estado da
federação.

C) Segundo posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, viola a


Constituição Federal a edição de norma estadual que vise a suprimir requisito legal
previsto em lei federal mais restritivo para determinada modalidade de
licenciamento ambiental, sem justificada peculiaridade local.

D) É de competência concorrente entre União, Estados e Municípios a edição


de normas de responsabilidade por danos ao meio ambiente.

E) Todas as alternativas anteriores estão corretas.

1.5.1.1. Competência no Licenciamento Ambiental

60
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Neste tópico estudaremos os cinco importantes aspectos da competência


relativa aos processos de licenciamento e de fiscalização ambientais.

1.5.1.1.1. Competência no Processo de Licenciamento


Ambiental

Para se compreender corretamente a competência no processo de


licenciamento ambiental deve-se estudar a competência constitucional material
sobre o meio ambiente.

Deveras, a competência constitucional material para a proteção do meio


ambiente é comum, razão pela qual não só a União, mas todos os demais Entes
Federados (Estados, DF e Municípios) devem promover ações concretas de
fiscalização e preservação ambiental, nos termos do art. 23 da Constituição da
República:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do


Distrito Federal e dos Municípios: [...] VI - proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;
VII - preservar as florestas, a fauna e a flora;

Daí porque os Estados, o DF e os Municípios não devem apenas esperar as


ações dos órgãos ambientais federais, mas sim promover ações concretas de
preservação ambiental em seus respectivos territórios.

Para organizar a distribuição cooperativa dessas competências


constitucionais materiais, relativas à preservação ambiental, evitando-se
possíveis conflitos federativos entre os Entes Políticos, o Constituinte estabeleceu

61
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

a necessidade de aprovação de Leis Complementares para a fixação de normas de


federalismo cooperativo em matéria ambiental:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do


Distrito Federal e dos Municípios: [...] Parágrafo único. Leis
complementares fixarão normas para a cooperação entre a
União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo
em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em
âmbito nacional.

Sobreveio então a aprovação da Lei Complementar Federal n.º 140/11,


que promoveu a correta distribuição das competências constitucionais materiais
relativas à preservação do meio ambiente entre todos os Entes Federados:

Art. 1º Esta Lei Complementar fixa normas, nos termos dos


incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da
Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações
administrativas decorrentes do exercício da competência
comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis,
à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em
qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da
fauna e da flora.

Desse modo, a mencionada lei complementar federal promoveu a


distribuição das competências para o licenciamento ambiental entre os Entes da
Federação, que serão exercidas exclusivamente pelos órgãos e entidades do
Sisnama, afastando assim possíveis conflitos de atribuições que, aliás, ocorriam
frequentemente quando essa distribuição era regida apenas pela Resolução n.º
237/97 – Conama.

Na distribuição levou-se em consideração basicamente a conjugação


gradual de três critérios:

• Dominialidade do bem público que será afetado: Por esse critério, o


licenciamento ambiental caberia ao Ente da Federação detentor do bem
afetado, como por exemplo, no caso de atividades que possam afetar
terras indígenas cujas propriedade e competência são da União;

• Da dimensão do impacto ou dano ambiental: Por esse critério, as


atividades causadoras de mero impacto local seriam licenciadas pelos
Municípios; as causadoras de impacto regional, pelos Estados; e as
causadoras de impacto nacional, pela União;

62
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Do Ente da Federação instituidor da unidade de conservação: Por esse


critério, o licenciamento ambiental caberia ao Ente da Federação
responsável pela criação da unidade de conservação da natureza.

Assim, conforme estabelecido no art. 7º, inciso XIV, da Lei Complementar


Federal n.º 140/11, compete à União, através do seu órgão executor do Sisnama, o
IBAMA, promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades:

• localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país


limítrofe;

• localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma


continental ou na zona econômica exclusiva;

• localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;

• localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação da natureza


federais (salvo se a unidade for classificada como Área de Proteção
Ambiental – APA);

• localizados ou desenvolvidos em dois ou mais Estados;

• de caráter militar;

• destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar,


armazenar e dispor material radioativo ou que utilizem energia nuclear
em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da
Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN); ou

• relativas à implantação, regularização e manutenção de rodovias


federais ou pavimentação e ampliação de sua capacidade se a rodovia
federal possuir extensão igual ou superior a 200 quilômetros;

• relativas à implantação, ampliação da capacidade e regularização de


ferrovias federais;

• relativas à implantação e ampliação da capacidade de hidrovias federais


cujo somatório dos trechos de intervenções seja igual ou superior a 200
quilômetros de extensão;

• relativas a usinas hidrelétricas e termelétricas com capacidade igual ou


superior a 300 megawatt, e eólicas nos casos offshore e zona de
transição terra-mar;

63
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• relativas a portos organizados, terminais de uso privado e a exploração


e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos,
nas hipóteses definidas no Decreto Federal n.º 8.437/158.

8 [...] IV - portos organizados, exceto as instalações portuárias que movimentem carga em volume
inferior a 450.000 TEU/ano ou a 15.000.000 ton/ano; V - terminais de uso privado e instalações
portuárias que movimentem carga em volume superior a 450.000 TEU /ano ou a 15.000.000
ton/ano; VI - exploração e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos nas
seguintes hipóteses: a) exploração e avaliação de jazidas, compreendendo as atividades de aquisição
sísmica, coleta de dados de fundo (piston core), perfuração de poços e teste de longa duração
quando realizadas no ambiente marinho e em zona de transição terra-mar (offshore); b) produção,
compreendendo as atividades de perfuração de poços, implantação de sistemas de produção e
escoamento, quando realizada no ambiente marinho e em zona de transição terra-mar (offshore); e
c) produção, quando realizada a partir de recurso não convencional de petróleo e gás natural, em
ambiente marinho e em zona de transição terra-mar (offshore) ou terrestre (onshore),
compreendendo as atividades de perfuração de poços, fraturamento hidráulico e implantação de
sistemas de produção e escoamento;

64
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

QUESTÃO

19. (Promotor de Justiça do MPSC. 2016). De acordo com a Lei Complementar n.


140/11 (Licenciamento Ambiental), encontram-se entre as ações administrativas da
União, promover o licenciamento ambiental de: empreendimentos e atividades
localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;
localizados ou desenvolvidos em terras indígenas; localizados ou desenvolvidos em
unidades de conservação instituídas pela União, inclusive em Áreas de Proteção
Ambiental (APAs).

( ) Certo ( ) Errado

Resposta: errado.

20. (Delegado de Polícia da PCPE. Cebraspe – 2016). Determinada sociedade


empresária pretende realizar, no mar territorial que banha o município de Recife-
PE, atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental.
Nessa situação, de acordo com a Lei Complementar n.º 140/2011, o licenciamento
ambiental dessa atividade será promovido pelo(a)

a) município de Recife ou, caso ele não possua órgão ambiental capacitado
para promover esse licenciamento, pelo estado de Pernambuco.

b) União.

c) município de Recife.

d) estado de Pernambuco.

e) estado de Pernambuco ou, caso ele não possua conselho de meio


ambiente, pela União.

Trata-se de rol taxativo, que somente pode ser ampliado com alterações
no Decreto Federal n.º 8.437/15, após proposição da Comissão Tripartite Nacional
(formada paritariamente por representantes dos Poderes Executivos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios), considerados os critérios de porte,
potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento.

Registre, por importante, que, além da exigência de prévio licenciamento


ambiental federal para a implantação de Usinas nucleares, sua localização deve ser
aprovada por lei federal, sem o que não poderão ser instaladas (art. 225, § 6º da
CR/88).

65
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Aos Municípios, nos termos do art. 9º, inciso XIV, da Lei Complementar
Federal n.º 140/11, foram reservados apenas dois casos nos quais seus órgãos e
entidades ambientais locais, integrantes do Sisnama, promoverão o licenciamento
ambiental de empreendimentos e atividades potencialmente poluidores ou
utilizadores de recursos ambientais, quais sejam:

• Atividades que possam causar impacto ambiental de âmbito local,


conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de
Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor
e natureza da atividade: Frise-se que a definição das atividades
causadoras de mero impacto ambiental local é da competência dos
Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, órgão colegiado, razão pela
qual eventual classificação promovida por Decreto Estadual será
inválida;

• Empreendimentos localizados ou desenvolvidos em unidades de


conservação da natureza municipais (salvo se a unidade for classificada
como Área de Proteção Ambiental — APA).

Assim, nos termos do art. 8º, inciso XIV, da Lei Complementar Federal n.º
140/11, compete aos Estados-Membros, através dos seus órgãos e entidades
seccionais, integrantes do Sisnama, promover o licenciamento ambiental
residualmente, ou seja, de todos os demais empreendimentos e atividades
potencialmente poluidores cuja competência não tenha sido expressamente
distribuída à União e aos Municípios, podendo se destacar ainda a competência
para:

• Aprovar o funcionamento de criadouros da fauna silvestre;

• Aprovar o licenciamento ambiental de atividades localizadas ou


desenvolvidos em unidades de conservação da natureza estaduais
(salvo se a unidade for classificada como Área de Proteção Ambiental —
APA).

Por fim, nos termos do art. 10 da Lei Complementar Federal n.º 140/11,
compete ao Distrito Federal, através dos seus órgãos e entidades seccionais,
integrantes do Sisnama, promover o licenciamento ambiental de todas as
atividades de competência dos Estados-Membros e dos Municípios, porquanto o
DF não é dividido em Municípios.

66
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Com essa rígida distribuição de competências, não deve haver sobreposição


nos processos de licenciamento ambiental, haja vista que os empreendimentos e
atividades são licenciados ou autorizados ambientalmente por um único ente
federativo, em conformidade com a distribuição das competências acima
demonstrada (art. 13, caput da Lei Complementar Federal n.º 140/11).

Todavia, admite-se que os demais entes federativos interessados possam


se manifestar ao órgão competente pelo licenciamento, de maneira não vinculante,
respeitados os prazos e procedimentos do licenciamento.

É importante destacar ainda que, quando decorrente de licenciamentos


ambientais, a supressão de vegetação (desmatamento lícito), que ocorre, por
exemplo, quando o órgão ambiental autoriza o desmatamento de determinada
área para a implantação de um projeto de irrigação ou para a implantação de uma
rodovia, é autorizada pelo próprio ente federativo licenciador, que expedirá, além
da licença ambiental para aquela atividade, um outro documento denominado
Autorização de Supressão Vegetal — ASV.

Concluindo o estudo das competências para licenciamento ambiental, resta


a definição quanto às atividades que possam impactar ambientalmente as
Unidades de Conservação da Natureza do tipo Área de Proteção Ambiental — APA
(serão estudadas no próximo sistema — SNUC).

Neste caso, não deve prevalecer o critério do Ente da Federação instituidor


da Unidade, mas sim o critério do grau do impacto ambiental conjugado com outros
elementos, independentemente, portanto, de se tratar de APA federal, estadual ou
municipal:

• Competência municipal: Atividades e empreendimentos que possam


causar mero impacto local em APAs municipais, estaduais ou federais,
desde que fora dos casos relacionados no próximo item;

• Competência federal: Atividades e empreendimentos que possam


impactar em APAs municipais, estaduais ou federais, desde que sejam:

a) Desenvolvidos no Brasil e em país limítrofe;

b) Desenvolvidos na zona econômica exclusiva, no mar territorial e na


plataforma continental;

c) Desenvolvidos em dois ou mais Estados;

d) Com caráter militar;

67
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Competência estadual: Em todos os demais casos (residual).

Assim, por exemplo, o licenciamento ambiental de empreendimento


desenvolvido em dois ou mais Estados que possa impactar em Área de Proteção
Ambiental municipal será de competência federal (do IBAMA), e não municipal.

QUESTÃO

21. (Promotor de Justiça do MPPI. Cebraspe – 2019). Uma empresa que utiliza
recursos ambientais efetivamente poluidores pretende construir um
empreendimento em uma unidade de conservação do tipo área de proteção
ambiental, criada por decreto estadual e localizada no mar territorial. Nessa
situação, para o desenvolvimento de suas atividades, a empresa deverá requerer o
licenciamento ambiental

A) no IBAMA.

B) na Secretaria Estadual de Meio Ambiente.

C) na Secretaria Municipal de Meio Ambiente.

D) no Ministério do Meio Ambiente.

E) no Instituto Chico Mendes de Biodiversidade.

1.5.1.1.2. Competência para Fiscalização e Aplicação


de Multas Ambientais

Trata-se da prerrogativa legal que possuem os órgãos e entidades da


estrutura do Sisnama para lavratura de autos de infração com aplicação de sanções

68
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

administrativo-ambientais, também como manifestação do poder de polícia


ambiental.

Esta prerrogativa não segue a rígida distribuição de competências para o


licenciamento ambiental, uma vez que aqui a competência para se exercer a
fiscalização ambiental é comum, de modo que todos os órgãos e entidades da
estrutura do Sisnama poderão exercê-la livremente, em benefício de uma efetiva
proteção ambiental.

Assim, por exemplo, um órgão ambiental municipal poderá exercer


fiscalização e até mesmo aplicar multas a uma determinada empresa responsável
por obra pública federal que tenha sido licenciada pelo IBAMA, se restar
caracterizada infração à legislação ambiental. Da mesma forma, o IBAMA poderá
exercer fiscalização em atividades licenciadas por qualquer Estado ou Município.

Questão interessante ocorre quando um determinado infrator é autuado


simultaneamente pelos órgãos ambientais municipal, estadual e federal em razão
de um mesmo ato, o que poderia inclusive caracterizar bis in idem.

Aliás, isso foi o que ocorreu no caso do rompimento da barragem de rejeitos


de famosa mineradora ocorrido na cidade de Brumadinho/MG, quando foram
lavrados autos de infrações pelos órgãos ambientais do Sisnama de todos os Entes
Federados envolvidos, da seguinte forma:

• IBAMA: Aplicou multas no importe de R$ 250.000.000,00;

• Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável


de Minas Gerais – Semad: Aplicou multas de mais de R$ 99.000.000,00;

• Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do


Município de Brumadinho/MG – Sema: Aplicou multas de mais de R$
108.000.000,00;

• Secretaria de Meio Ambiente de Juatuba/MG (Município vizinho


impactado): Aplicou multas de mais de R$ 50.000.000,00.

Partindo-se do pressuposto do que todas as multas foram lavradas em


razão do mesmo fato, seria legítimo se exigir da famosa mineradora autuada o
pagamento de todas as multas?

Neste caso, não, haja vista que ninguém pode ser punido mais de uma vez
em razão do mesmo ato ilícito, sob pena de se caracterizar o odioso bis in idem.

69
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Em casos como esse deve prevalecer apenas o auto de infração lavrado


pelo órgão ambiental do Ente da Federação originalmente competente para o
licenciamento ambiental, nos termos da Lei Complementar Federal n.º 140/11:

Art. 17.
[...]
§ 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício
pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização
da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou
potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais
com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de
infração ambiental lavrado por órgão que detenha a
atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o
caput.

Assim, sempre que houver a lavratura simultânea de autos de infração


por órgãos ambientais municipais, estaduais e federais deve-se apurar qual deles
tinha a competência privativa para o licenciamento ambiental, pois prevalecerá o
auto de infração lavrado por ele, independentemente do valor da multa aplicada
ou de quando o auto de infração fora lavrado.

QUESTÃO

22. (Juiz de Direito do TJPR. Cebraspe – 2019). Dentro de um parque municipal que
consiste em unidade de conservação criada por decreto municipal, o IBAMA
constatou a existência de habitações particulares licenciadas pelo estado no qual o
município se encontra inserido. Tanto o IBAMA quanto a secretaria de meio
ambiente do município lavraram seus respectivos autos de infração.

Nessa situação hipotética, no que se refere à competência para a autuação,

A) o auto de infração do IBAMA deve prevalecer sobre o municipal.

B) o auto de infração do município deve prevalecer sobre o do IBAMA.

C) nenhum dos autos de infração é válido.

D) ambos os autos de infração são válidos e exigíveis.

Todavia, é importante ressaltar que não há na legislação solução jurídica


para a seguinte situação: Suponhamos que, no exemplo do caso de

70
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Brumadinho/MG, os autos de infração tenham sido lavrados apenas pelo IBAMA


e pela Sema (Secretaria do Meio Ambiente do Município), não obstante a
competência para o licenciamento ambiental seja da Semad (Secretária do Meio
Ambiente do Estado de Minas). Portanto, neste caso não teria havido a lavratura
de auto de infração pelo órgão ambiental que seria originalmente competente
para o licenciamento, por entender, por exemplo, que não teria havido infração,
razão pela qual não seria possível a aplicação da regra inserta no art. 17, § 3º, in
fine da Lei Complementar Federal n.º 140/11.

Assim, questiona-se: No caso proposto, qual auto de infração prevaleceria?


Aquele lavrado pelo IBAMA ou pela Sema?

Como dito, não há resposta para tais questionamentos na Lei


Complementar Federal n.º 140/11. Creio que, em casos como esse, deve ser
utilizado o critério do porte, potencial poluidor e natureza da atividade para se
definir qual auto de infração deve prevalecer, haja vista que esse foi o critério
residual utilizado em várias passagens na Lei Complementar Federal n.º 140/11
(art. 7º, inciso XIV, alínea “h”, in fine e parágrafo único, in fine; art. 9º, inciso XIV,
alínea “a”, in fine). Desse modo, no caso proposto, se da infração ambiental
decorresse apenas dano ambiental de pequeno porte, local, deveria prevalecer o
auto de infração lavrado pela Sema, ao passo que, se o dano fosse de grande porte
e com grande potencial poluidor, então deveria prevalecer o auto de infração
lavrado pelo IBAMA.

Questão também importante e que deve ser esclarecida é a parcial


antinomia existente entre o art. 17, § 3º, in fine da Lei Complementar Federal n.º
140/11 e o art. 76, caput da Lei Federal n.º 9.605/98, respectivamente in verbis:

Art. 17.
[...]
§ 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício
pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização
da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou
potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais
com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de
infração ambiental lavrado por órgão que detenha a
atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o
caput.

Art. 76. O pagamento de multa imposta pelos Estados,


Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa
federal na mesma hipótese de incidência.

71
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Segundo a regra inserta no art. 76, caput, da Lei Federal n.º 9.605/98,
quando houver aplicação simultânea de multa por órgão ambiental municipal ou
estadual e órgão ambiental federal, relativamente ao mesmo fato, o pagamento
da multa imposta por Estados ou Municípios substituirá a multa federal.

Ocorre que esta regra fora derrogada pelo art. 17, § 3º, in fine da Lei
Complementar Federal n.º 140/11 que estabeleceu nova sistemática para os casos
de lavratura simultânea de autos de infração por órgãos ambientais municipais,
estaduais e federais, determinando novo critério definidor do auto de infração
prevalecente. Ora, a norma posterior revoga a anterior quando seja com ela
incompatível, nos termos do art. 2º, §1º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro — LINDB:

Art. 2º
[...]
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o
declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule
inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

Assim, parece-me que, a partir da entrada em vigor do art. 17, § 3º, in fine
da Lei Complementar Federal n.º 140/11, o pagamento das multas ambientais
aplicadas por Estados ou Municípios não deve substituir multa ambiental aplicada
pelo órgão ambiental federal, sobretudo quando o licenciamento ambiental da
respectiva atividade também for de competência federal.

Registre-se, desde já, que a solução adotada pelo c. STJ no REsp


1.132.682/RJ, publicado em 12/03/2020, não afasta a derrogação aqui defendida e
nem a nova sistemática adotada pela nova lei, haja vista que o caso objeto do
mencionado julgamento ocorreu ainda no ano de 2002, portanto antes mesmo da
aprovação da Lei Complementar Federal n.º 140/11, sendo certo que em casos de
infração deve-se aplicar a lei então vigente em respeito ao princípio do tempus regit
actum.

Vale ressaltar ainda que qualquer pessoa identificada, ao constatar


infração ambiental, pode dirigir representação aos órgãos e entidades da
estrutura do Sisnama para efeito do exercício de seu poder de polícia.

Além disso, nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da


qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá
determinar medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando
imediatamente ao órgão competente para as providências cabíveis.

72
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

1.5.1.1.3. Competência ou Ação Supletiva

Consoante visto linhas atrás, a Lei Complementar Federal n.º 140/11


promoveu a distribuição das competências para o licenciamento ambiental entre
os Entes da Federação de modo a se evitar eventuais conflitos de atribuições,
razão pela qual os empreendimentos e atividades são licenciados
ambientalmente por um único ente federativo.

Não obstante isso, podem surgir situações nas quais os Entes da


Federação, originalmente competentes, não possam conduzir processos de
licenciamento ambiental, como por exemplo quando a competência para se
licenciar determinada atividade for de um determinado Município que ainda não
instituiu seu órgão ambiental local, da estrutura do Sisnama. Frise-se, cabe aos
órgãos do Sisnama a competência para o licenciamento ambiental, razão pela
qual sem eles não será possível a concessão de licenças ambientais.

O que fazer em situações como essa?

A própria Lei Complementar Federal n.º 140/11 estabeleceu importante


mecanismo para afastar eventuais crises, denominado: ação ou competência
supletiva para o licenciamento ambiental.

A ação ou competência supletiva consiste na ação do Ente da Federação


que substitui o Ente Federativo originariamente competente para o
licenciamento ambiental, nas hipóteses autorizadas pela Lei Complementar
Federal n.º 140/11.

73
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Assim, os Entes Federados devem atuar em caráter supletivo


(substituição) nas ações administrativas de licenciamento e de autorização
ambiental, nos seguintes casos (art. 15 da Lei Complementar Federal n.º 140/11):

• Inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente


no Estado ou no Distrito Federal, a União deve desempenhar as ações
administrativas estaduais ou distritais até a sua criação;

• Inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente


no Município, o Estado deve desempenhar as ações administrativas
municipais até a sua criação;

• Inexistindo órgão ambiental capacitado ou conselho de meio ambiente


no Estado e no Município, a União deve desempenhar as ações
administrativas até a sua criação em um daqueles entes federativos;

• Quando o órgão ambiental do Ente da Federação originalmente


competente descumpre os prazos para a conclusão do processo de
licenciamento ambiental.

Portanto, nos casos acima, a legislação autoriza a atuação supletiva em


substituição ao Ente da Federação originalmente competente, para garantir que
os interessados possam obter o licenciamento ambiental de que necessitam para
o início de suas atividades.

Quanto à última hipótese de competência supletiva, quando o Ente da


Federação originalmente competente descumpre os prazos para a conclusão do
licenciamento ambiental, é importante ressaltar que estes prazos estão definidos
na Resolução n.º 237/97 — Conama.

Em verdade, o Conama estabeleceu prazos máximos, razão pela qual o


órgão ambiental competente poderá estabelecer prazos de análise diferenciados
para cada modalidade de licenças, em função das peculiaridades da atividade ou
empreendimento a ser licenciado, conforme abaixo:

• Regra geral: Em regra, os órgãos ambientais devem concluir os


processos de licenciamento ambientais em até 6 (seis) meses;

• Regra especial: O prazo será de até 12 (doze) meses nos casos de


licenciamento de atividades que possam causar significativa
degradação ambiental, que exigirá estudo prévio de impacto

74
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

ambiental com seu respectivo relatório impacto sobre o meio ambiente


(EIA/RIMA).

Assim, os órgãos ambientais licenciadores devem observar os prazos


estabelecidos pelo Conama para a tramitação dos processos de licenciamento (art.
14 da Lei Complementar Federal n.º 140/11), sob pena de se instaurar a
competência supletiva do órgão ambiental do Ente da Federação mais abrangente,
conforme visto acima.

Todavia, as exigências de complementação de informações, de


documentos ou de estudos — que devem ser comunicadas de uma única vez ao
empreendedor, ressalvadas aquelas decorrentes de fatos novos –, feitas pela
autoridade licenciadora, suspendem o prazo para tramitação dos processos de
licenciamento, que continua a fluir após o seu atendimento integral pelo
empreendedor

Desse modo, o decurso dos prazos de licenciamento, sem a emissão da


licença ambiental, não implica emissão tácita nem autoriza a prática de ato que
dela dependa ou decorra. Nesse caso, como visto acima, surge a competência
supletiva pela qual Ente da Federação diverso substituirá o Ente Federativo
originariamente competente para o licenciamento ambiental. Também será
possível a impetração de mandado de segurança buscando provimento judicial
que determine ao órgão ambiental competente a apreciação do pedido
administrativo de licenciamento ambiental no prazo estabelecido pela legislação.

Registre-se, ainda, que o órgão ambiental somente será considerado


capacitado para conduzir processos de licenciamento ambiental quando possuir
técnicos próprios ou em consórcio público, devidamente habilitados e em número
compatível com a demanda das ações administrativas de sua competência (art.
5º, parágrafo único, da Lei Complementar Federal n.º 140/11).

Daí porque os Entes da Federação não devem apenas simular a existência


de órgãos ambientais capacitados, os instituindo sem nenhuma estrutura
administrativa, sem quadro próprio de servidores que possuam adequada
qualificação técnica e tenha número suficiente para atender as demandas, sem a
definição de protocolos estabelecendo procedimentos etc., sob pena de
perderem suas competências ambientais definidas na Lei Complementar Federal
n.º 140/11 e de nulificarem os licenciamentos ambientais daí decorrentes.

75
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

É por isso que a existência de órgão ambiental capacitado e de conselho


do meio ambiente são condições sine qua non para o exercício das competências
estabelecidas na Lei Complementar Federal n.º 140/11.

1.5.1.1.4. Competência ou Ação Subsidiária

Como dito, consoante visto linhas atrás, a Lei Complementar Federal n.º
140/11 promoveu a distribuição das competências para o licenciamento
ambiental entre os Entes da Federação de modo a se evitar eventuais conflitos de
atribuições, razão pela qual os empreendimentos e atividades são licenciados
ambientalmente por um único ente federativo.

Porém, isso não quer dizer que os Entes da Federação não possam
cooperar entre si para viabilizar o adequado licenciamento ambiental de suas
competências. Ao contrário, essa cooperação é expressamente prevista na
legislação como ação ou competência subsidiária.

Trata-se do apoio técnico, científico, administrativo, financeiro ou por


outras formas de cooperação fornecido por órgão ambiental de outros Entes
Federados após a solicitação do órgão ambiental do Ente da Federação
originalmente competente para licenciamento ambiental.

Ou seja, a ação ou competência subsidiária se constitui na ação do Ente


da Federação que visa a auxiliar no desempenho de atribuições ambientais
quando solicitado pelo Ente Federativo originariamente detentor da competência
para o licenciamento ambiental.

Assim, por exemplo, o órgão ambiental local do Município de Irecê/BA,


originalmente competente para o licenciamento ambiental de um

76
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

empreendimento que funcionará em um dos seus parques municipais (unidade


de conservação da natureza municipal), pode solicitar apoio técnico, científico,
administrativo ou financeiro ao órgão ambiental seccional do Estado da Bahia ou
ao IBAMA (órgão executor da estrutura do Sisnama, da União) de forma a
viabilizar o licenciamento ambiental demandado.

QUESTÃO

23. (Promotor de Justiça do MPSC. 2016). De acordo com a Lei Complementar n.


140/11, para seus fins, consideram-se: atuação subsidiária: ação do ente da
Federação que se substitui ao ente federativo originariamente detentor das
atribuições, nas hipóteses definidas nesta Lei Complementar; atuação supletiva:
ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições
decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo
originariamente detentor das atribuições definidas nesta Lei Complementar.

( ) Certo ( ) Errado

1.5.1.1.5. Delegação de Competência

Concluindo o estudo de todos os aspectos da competência sobre os


processos de controle, licenciamento e fiscalização ambiental, faremos agora uma
análise sobre a possibilidade de delegação das competências ambientais previstas
na Lei Complementar Federal n.º 140/11.

Apesar da rígida distribuição, entre os Entes da Federação, das


competências para o licenciamento ambiental estabelecida na Lei Complementar
Federal n.º 140/11, é certo que eles podem delegar entre si suas competências
ambientais originais através de convênios que, inclusive, poderão ser firmados

77
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

por prazo indeterminado (art. 5º, parágrafo único, da Lei Complementar Federal
n.º 140/11).

É dizer: O Ente federativo poderá delegar, mediante convênio firmado


com outro Ente Federado, a execução de ações administrativas e competências
para licenciamento ambiental a ele atribuídas.

Todavia, para isso, o Ente Federativo destinatário da delegação


(delegatário) deve comprovar a existência de:

• Órgão ambiental capacitado (que possui técnicos próprios ou em


consórcio público, devidamente habilitados e em número compatível
com a demanda das ações administrativas a serem delegadas);

• Conselho de Meio Ambiente (órgão colegiado com poder normativo


municipal).

Assim, por exemplo, o órgão ambiental local do Município de Ipirá/BA


poderá receber, através de convênio, delegação das competências para o
licenciamento ambiental pertencentes ao IBAMA (órgão executor do Sisnama, da
União), podendo — por isso — passar a conduzir os processos de licenciamento
ambiental federais, desde que comprove a existência de órgão ambiental
municipal capacitado e de conselho municipal de meio ambiente, sob pena de
serem tidos como inválidos os licenciamentos ambientais concedidos.

1.5.1.2. Licenças Ambientais

Após compreendidas todas as lições importantes sobre o procedimento de


licenciamento ambiental (procedimento administrativo), finalmente passaremos
ao estudo de todos os aspectos relevantes relativos à licença ambiental, ato
administrativo expedido ao final dos processos de licenciamento ambiental, e que
materializa a autorização da implementação de atividades potencialmente
poluidoras ou utilizadoras de recursos ambientais.

Neste tópico, portanto, estudaremos os três importantes aspectos relativos


às licenças ambientais.

78
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A licença ambiental é conceituada como ato administrativo pelo qual o


órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de
controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física
ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou
atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou
potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar
degradação ambiental.

A definição de sua natureza jurídica, porém, ainda é divergente,


formando-se duas correntes doutrinárias.

Uma primeira corrente a considera com natureza jurídica de licença


administrativa, sendo por isso vinculada e não precária. Por outro lado, uma
segunda corrente a considera como mera autorização administrativa, por isso
discricionária e precária.

Ora, se considerarmos que a licença ambiental possui natureza jurídica de


licença administrativa, então – para sua concessão – o interessado só precisará
comprovar o preenchimento dos requisitos legais, sendo certo que ela não
poderia ser posteriormente suspensa sem a comprovação da prática de alguma
infração ambiental, após o devido processo legal.

Por outro lado, se a considerarmos como mera autorização, então sua


concessão seria discricionária, razão pela qual os órgãos ambientais poderiam
avaliar a conveniência e a oportunidade para sua concessão. Além disso, mesmo
concedida, poderia vir a ser suspensa por razões de interesse público, porque
precária.

Trata-se de questão relevantíssima, pois poderá afetar o princípio da


segurança jurídica e, por isso, influenciar a tomada de decisões quanto a
investimentos vultosos relativos a empreendimentos que podem gerar grandes
benefícios à população (criação de empregos, elevação da renda, geração de
tributos, sustentabilidade ambiental etc.).

79
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Imagine a seguinte situação: Uma grande empresa multinacional pretende


fazer um investimento de 5 bilhões de reais na implantação de grande
empreendimento na região do semiárido (sertão) baiano, com potencial para
impulsionar a economia de 10 municípios e gerar benefícios diretos e indiretos para
uma população de cerca de 500 mil pessoas. Para a implantação do
empreendimento, como sabemos, exigir-se-á prévio licenciamento ambiental.

A grande empresa multinacional assumiria o risco desse empreendimento


se a licença ambiental tivesse natureza jurídica apenas de autorização? É dizer:
mesmo ciente de que, a qualquer momento, por mera conveniência e
oportunidade, o órgão ambiental poderia sustar sua licença, a multinacional
promoveria o empreendimento?

É uma pergunta reflexiva apenas para se demostrar que não se trata de


mera discussão acadêmica, mas sim de importante questão, com repercussões
práticas.

Tenho que a licença ambiental possui natureza jurídica de licença


administrativa sui generis, haja vista que – apesar de vinculada, o que assegura
sua concessão se cumpridos os requisitos da legislação ambiental – é precária, e
por isso poderá ser suspensa ou cancelada supervenientemente por razões de
interessa ambiental, consoante prevê o art. 19, inciso III, da Resolução n.º 237/97
do Conama:

Art. 19. O órgão ambiental competente, mediante decisão


motivada, poderá modificar os condicionantes e as medidas de
controle e adequação, suspender ou cancelar uma licença
expedida, quando ocorrer:
I - violação ou inadequação de quaisquer condicionantes ou
normas legais;
II - omissão ou falsa descrição de informações relevantes que
subsidiaram a expedição da licença;
III - superveniência de graves riscos ambientais e de saúde.

Esclarecida a questão, ainda devemos conhecer os tipos ou modalidades


de licenças ambientas previstas na legislação, com seus respectivos prazos de
vigência.

As licenças ambientais estão classificadas na legislação ambiental conforme


os tipos, funções e prazos que passaremos a estudar.

Em regra, o licenciamento ambiental segue procedimento trifásico, com a


expedição sucessiva de três licenças distintas.

80
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Na primeira etapa, será expedida a Licença Prévia (LP). Por essa licença o
órgão ambiental competente aprova a localização e concepção do
empreendimento, atividade ou obra que se encontra na fase preliminar do
planejamento, atestando a sua viabilidade ambiental, estabelecendo os
requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua
implantação, bem como suprindo o requerente com parâmetros para lançamento
de efluentes líquidos e gasosos, resíduos sólidos, emissões sonoras, além de exigir
a apresentação de propostas de medidas de controle ambiental em função dos
possíveis impactos ambientais a serem gerados.

Seu prazo de validade é de, no mínimo, o estabelecido pelo cronograma


de elaboração dos planos, programas e projetos relativos ao empreendimento,
sendo certo que não poderá ultrapassar o máximo de 5 (cinco) anos.

Na segunda etapa, será expedida a Licença de Instalação (LI). Por essa


licença o órgão ambiental competente autoriza a instalação do empreendimento,
atividade ou obra de acordo com as especificações constantes dos planos,
programas e projetos aprovados, fixando cronograma para execução das medidas
mitigadoras e da implantação dos sistemas de controle ambiental.

Seu prazo de validade é de, no mínimo, o estabelecido pelo cronograma


de instalação do empreendimento, sendo certo que não poderá ultrapassar o
máximo de 6 (seis) anos.

Na terceira e última etapa do licenciamento, será expedida a Licença de


Operação (LO). Por essa licença o órgão ambiental competente finalmente
autoriza a operação (funcionamento) da atividade, obra ou empreendimento,
após a verificação do efetivo cumprimento das medidas de controle ambiental e
condicionantes determinadas nas licenças anteriores.

Seu prazo de validade é de, no mínimo, 4 (quatro) anos e, no máximo, 10


(dez) anos.

Essas são as licenças ambientais mais comuns. Todavia, ainda encontramos


na legislação ambiental outras importantes licenças.

A Licença de Alteração geralmente está condicionada à existência de


Licença de Instalação (LI) ou Licença de Operação (LO), concedida quando
porventura ocorrer modificação no contrato social do empreendimento,
atividade ou obra, ou qualificação de pessoa física. Nesses casos o interessado
deverá providenciar a licença de alteração para modificar as licenças de instalação
ou de operação em seu benefício.

81
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A Licença de Ampliação poderá ser concedida para a realização de


ampliações ou ajustes em empreendimento ou atividade já implantados e
licenciados.

Há também a Licença de Instalação e de Operação (LIO) que substitui os


procedimentos administrativos do licenciamento de instalação e do
licenciamento de operação ordinários, unificando-os.

Através da LIO o órgão ambiental autoriza, em uma única fase, a


instalação e a operação de atividade ou empreendimento. Deve ser solicitada
antes de iniciar-se a implantação do empreendimento ou atividade, estando sua
concessão condicionada às medidas e condições de controle ambiental
estabelecidas pelo órgão ambiental.

Também existe a previsão da Licença Prévia e de Instalação (LPI) que,


agora, substitui os procedimentos administrativos do licenciamento prévio e do
licenciamento de instalação ordinários, unificando-os. Antes de iniciar-se a
implantação do empreendimento ou atividade, em uma única fase o órgão
ambiental atesta a viabilidade ambiental e autoriza a instalação da atividade ou
empreendimento, estabelecendo as condições e medidas de controle ambiental
necessárias. Geralmente será concedida quando a análise de viabilidade
ambiental não depender de estudos ambientais, podendo ocorrer
simultaneamente à análise dos projetos de implantação.

Por fim, também é muito comum a existência de Licença Ambiental


Simplificada (LAS), concedida antes de iniciar-se a implantação do
empreendimento ou atividade e, em uma única fase, atesta a viabilidade
ambiental, aprova a localização e autoriza a implantação e a operação de
empreendimento ou atividade, estabelecendo as condições e medidas de
controle ambiental que deverão ser atendidas. A concessão da LAS geralmente
está associada à classificação do empreendimento quanto ao grau de impacto
ambiental gerado, sendo aplicada a empreendimentos ou atividades de pequeno
ou micro porte e baixo potencial poluidor. A Licença Única (LU) substitui os
procedimentos administrativos ordinários do licenciamento prévio, de instalação
e operação do empreendimento ou atividade, unificando-os na emissão de uma
única licença, exigindo-se as devidas condições e medidas de controle ambiental.

O fundamento para o estabelecimento dessas diversas licenças ambientais


encontra-se na famosa Resolução n.º 237/97 do Conama.

Portanto, esses são os tipos de licenças ambientais previstos na legislação.

82
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Concluindo o estudo das questões importantes relativas à licença


ambiental, é importante ressaltar a disciplina legal de sua renovação e de sua
prorrogação automática.

A Lei Complementar Federal n.º 140/11 determina que, se a renovação das


licenças ambientais for requerida com antecedência mínima de 120 (cento e vinte)
dias da expiração de seu prazo de validade, fixado na respectiva licença, sua
validade prorrogar-se-á automaticamente até a decisão definitiva do órgão
ambiental competente, ainda que essa decisão só ocorra após o fim do prazo
original.

Trata-se da instituição da prorrogação tácita de licenças ambientais já


emitidas, desde que o requerente solicite sua renovação com antecedência
mínima de 120 dias do fim do prazo original, de modo a manter a continuidade
das atividades e empreendimentos já regularmente em funcionamento.

Por fim, ressaltamos que os órgãos ambientais condicionarão a expedição


de licenças ambientais ao atendimento de certas restrições e medidas de
controle, de modo a viabilizar a tutela preventiva do meio ambiente, condições
essas conhecidas como condicionantes ambientais. São, geralmente, medidas:

• Preventivas: Que buscam evitar o dano ambiental, quando possível;

• Mitigadoras: Que buscam atenuar esses danos ambientais, quando não


for possível evitá-los;

• Compensatórias: Decorrentes dos impactos negativos ao meio


ambiente.

Assim, as licenças ambientais somente serão expedidas se o interessado


conseguir comprovar o cumprimento de todas as condicionantes ambientais
exigidas pelo órgão ambiental competente.

QUESTÕES

24. (Delegado de Polícia da PCGO. UEG – 2018). A empresa “BC Industrial” funciona
regularmente licenciada há dez anos e está com sua licença de operação vencida
desde 31 de janeiro de 2017. Munido dos documentos técnicos legalmente
exigidos, o empreendedor requereu, em 1º de outubro de 2016, a renovação da
licença perante o órgão estadual de meio ambiente. Não houve, entretanto,
resposta sobre esse pleito. Neste caso,

83
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

A) verifica-se a prática de infração administrativa ambiental, pois a licença de


operação encontra-se vencida há mais de 120 (cento e vinte) dias

B) o pleito de renovação deverá ser negado pelo órgão ambiental, pois deveria
haver sido requerido com a antecedência mínima de 120 (cento e vinte) dias úteis
do vencimento da licença.

C) a empresa estará em situação regular enquanto o órgão ambiental não se


pronuncie sobre o pedido de renovação da licença de operação.

D) há direito líquido e certo do empreendedor à renovação da licença de


operação, já que comprovou, perante o órgão ambiental, atender a todos os
requisitos técnicos para o funcionamento da atividade.

E) deve-se protocolar novo requerimento perante o órgão ambiental, diante


da prescrição intercorrente que se operou no processo, que está sem decisão há
mais de 1 (um) ano.

25. (Juiz de Direito do TJRO. Vunesp – 2019). A construção, instalação, ampliação


e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos
ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma,
de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento ambiental.
Acerca do tema, pode-se afirmar que

A) as atividades que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito


local são licenciadas pelo IBAMA.

B) compete ao Município licenciar atividades localizadas em Áreas de


Proteção Ambiental (APAS) instituídas pelo Município.

C) o decurso dos prazos de licenciamento, sem a emissão da licença


ambiental, implica sua emissão tácita e autoriza a prática de ato que dela dependa
ou decorra.

D) a União é competente para promover o licenciamento ambiental de


empreendimentos e atividades localizados em terras indígenas.

E) a licença de localização caracteriza a fase preliminar do processo de


licenciamento, da qual se segue a licença de operação.

1.5.2. Avaliações de Impacto Ambiental

84
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Passamos agora ao estudo do segundo instrumento da Política Nacional


do Meio Ambiente — PNMA —, as avaliações de impactos ambientais — AIAs.

As avaliações de impactos ambientais constituem os estudos relativos aos


aspectos ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação
de atividade ou empreendimento, apresentados como subsídios para a análise da
licença requerida.

Portanto, a AIA é um gênero do qual são espécies: estudo prévio de


impacto ambiental, relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental,
relatório ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de
recuperação de área degradada e análise preliminar de risco, relatório de impacto
ambiental etc.

Em verdade, as avaliações de impactos ambientais se constituem em um


dos requisitos para a obtenção de licenças ambientais, haja vista que é através
delas que os órgãos ambientais poderão mensurar os impactos ambientais que
serão causados pelo empreendimento a ser licenciado.

Considera-se impacto ambiental qualquer alteração das propriedades


físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de
matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou
indiretamente, afetem a qualidade dos recursos ambientais.

85
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Assim, por exemplo, se determinada empresa desejar implantar projeto


de irrigação para cultivo de manga palmer em uma área de 100 Hectares com
vegetação nativa na zona rural da cidade de Uibaí/BA, deverá apresentar um dos
tipos de Avaliação de Impacto Ambiental exigidos pelo órgão ambiental
licenciador como condição para a obtenção do licenciamento ambiental desta
atividade. Essa Avaliação de Impacto Ambiental deverá demonstrar, por exemplo,
que naquela área não há espécimes raras da fauna ou da flora, não há nascentes
ou olhos d’água ou não há paisagens naturais pouco alteradas de notável beleza
cênica.

Daí porque essas Avaliações de Impactos Ambientais são tão necessárias,


pois sem elas não seria possível mensurar os impactos ambientais da atividade que
se busca licenciar.

A realização da AIA e seus custos são de responsabilidade exclusiva do


empreendedor interessado que deverá, após concluída, submetê-la ao órgão
ambiental competente para análise. Geralmente são contratadas empresas
especializadas em consultoria ambiental, devidamente inscritas no Cadastro
Técnico Federal, que serão responsáveis técnica e solidariamente pelas
conclusões da AIA, podendo inclusive ser responsabilizadas criminalmente10 pela
eventual inserção de dados falsos no documento.

É relevantíssimo observar que existe um tipo especial de Avaliação de


Impacto Ambiental denominada Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EIA ou
Epia.

Trata-se de um tipo especial de avaliação de impacto ambiental porque é o


único exigido pela própria Constituição da República, daí porque não poderá ser
dispensada por ato infraconstitucional em hipótese alguma:

Art. 225:
[...]
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do
meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se
dará publicidade;

10 Art. 69-A da Lei Federal n.º 9.605/98.

86
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Todavia, ela somente será exigida nos casos de atividade consideradas


potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, cabendo à
legislação ambiental definir o alcance dessa expressão.

Em verdade, significativa degradação ambiental indica que haverá uma


portentosa degradação ao meio ambiente. Podemos encontrar na Resolução n.º
1/86 do Conama um rol exemplificativo de atividades consideradas
potencialmente causadoras de significativa degradação ambiental, razão pela
qual nesses casos a AIA exigida será necessariamente o EIA.

Demais disso, para todo EIA exigir-se-á também um Relatório de Impacto


Ambiental – RIMA –, por isso essa avaliação de impacto ambiental sempre é
indicada pela abreviação EIA/RIMA, nos termos da Resolução n.º 1/86 do
Conama:

Art. 2º Dependerá de elaboração de estudo de impacto


ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental –
RIMA[...]

O RIMA, na verdade, se constitui em documento que traduz as


informações do EIA em linguagem acessível, ilustrada por mapas, cartas, quadros,
gráficos e demais técnicas de comunicação visual, de modo que se possam
entender as vantagens e desvantagens do projeto, bem como todas as
consequências ambientais de sua implementação:

[...] Art. 9º O relatório de impacto ambiental - RIMA refletirá


as conclusões do estudo de impacto ambiental e conterá, no
mínimo:

Vale ressaltar que, nos termos da Lei Federal n.º 10.650/03, os registros
de protocolo, de aprovação e de rejeição do EIA devem ser permanentemente
publicados:

Art. 4o Deverão ser publicados em Diário Oficial e ficar


disponíveis, no respectivo órgão, em local de fácil acesso ao
público, listagens e relações contendo os dados referentes aos
seguintes assuntos:
[...]
VII - registro de apresentação de estudos de impacto
ambiental e sua aprovação ou rejeição.

87
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Por fim, é importante destacar ainda que a legislação ambiental


estabelece casos nos quais exigir-se-á a realização de audiência pública para
apresentação das conclusões do EIA/RIMA à sociedade.

88
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Resolução n.º 237/97 do Conama:


Art. 3º A licença ambiental para empreendimentos e atividades
consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de
significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo
de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre
o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade,
garantida a realização de audiências públicas, quando couber,
de acordo com a regulamentação.

Resolução n.º 1/86 do Conama:


Art. 11.
[...]
§ 2º Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental
e apresentação do RIMA, o órgão estadual competente ou a
SEMA ou, quando couber o Município, determinará o prazo
para recebimento dos comentários a serem feitos pelos órgãos
públicos e demais interessados e, sempre que julgar necessário,
promoverá a realização de audiência pública para informação
sobre o projeto e seus impactos ambientais e discussão do
RIMA.

Resolução n.º 9/87 do Conama:


Art. 1º A Audiência Pública referida na Resolução Conama n.º
1/86, tem por finalidade expor aos interessados o conteúdo do
produto em análise e do seu referido RIMA, dirimindo dúvidas
e recolhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito.

A realização de audiência pública para apresentar as conclusões do


EIA/RIMA será obrigatória nos seguintes casos, nos termos da Resolução n.º 9/87
do Conama:

• Por determinação do órgão ambiental licenciador;

• Por solicitação do Ministério Público;

• Por solicitação de entidade civil;

• Por solicitação de 50 ou mais cidadãos.

Trata-se de exigência cuja inobservância nulificará todo o procedimento


de licenciamento ambiental:

Resolução n.º 9/87 do Conama:


Art. 2º
[...]

89
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

§ 2º No caso de haver solicitação de audiência pública e na


hipótese do Órgão Estadual não realizá-la, a licença concedida
não terá validade.

QUESTÕES

2. (Juiz de Direito do TJMS. FCC – 2020). O Ministério Público ajuizou uma


ação civil pública visando à declaração de nulidade de licenciamento ambiental
conduzido por estudo ambiental diverso do Estudo de Impacto Ambiental e
Respectivo Relatório (EIA-RIMA). O Magistrado deverá

A) julgar, de forma antecipada, a ação procedente, uma vez que o EIA-RIMA é


obrigatório no licenciamento ambiental.

B) julgar, de forma antecipada, a ação improcedente, diante da presunção de


legalidade do ato administrativo.

C) determinar a produção de prova pericial para aferir a necessidade de


elaboração do EIA-RIMA no licenciamento ambiental.

D) determinar a produção de prova testemunhal para aferir a necessidade de


elaboração do EIA-RIMA.

E) extinguir o processo, sem resolução de mérito, por verificar a ausência de


interesse processual.

3. (Juiz de Direito do TJRJ. Vunesp – 2019). A audiência pública tem por fim
expor aos interessados o conteúdo do projeto ou empreendimento em exame e do
seu respectivo RIMA. Sobre essa temática, é correto afirmar que

A) é realizada quando o órgão de meio ambiente licenciador julgar necessário


ou quando solicitado por 40 ou mais cidadãos.

B) o fator político não influi no processo de tomada de decisão.

C) havendo sua solicitação e, na hipótese do órgão estadual não realizá-la, a


licença concedida não terá validade.

D) a participação popular é vinculante e condicionante da decisão


administrativa.

E) a ata da audiência pública vincula o parecer final do licenciador quanto à


admissibilidade do exame do projeto.

90
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Com isso, concluímos o estudo deste segundo instrumento da PNMA.

1.5.3. Sistema Nacional de Informações sobre o Meio


Ambiente — Sinima — e Cadastro Ambiental Rural —
CAR

Passamos agora ao estudo do quarto instrumento da Política Nacional do


Meio Ambiente — PNMA —, o Sistema Nacional de Informações sobre o Meio
Ambiente — Sinima.

Trata-se de relevante instrumento da PNMA consistente em plataforma,


instituída e coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente, que reúne, consolida
e faz a gestão de todas as informações ambientais existentes nos órgãos e
entidades da estrutura do Sisnama, para garantir o adequado uso dessas
informações pelos próprios órgãos ambientais, melhorando assim a gestão do
meio ambiente, bem como para permitir seu pleno acesso público.

O Sinima deverá reunir, entre outras, as seguintes informações


ambientais11:

11 Lei Federal n.º 10.650/03

91
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão;

• Pedidos e licenças para supressão de vegetação;

• Autos de infrações e respectivas penalidades impostas pelos órgãos


ambientais;

• Lavratura de termos de compromisso de ajustamento de conduta;

• Reincidências em infrações ambientais;

• Recursos interpostos em processo administrativo ambiental e


respectivas decisões;

• Registro de apresentação de estudos de impacto ambiental e sua


aprovação ou rejeição;

• Demais informações ambientais relativas à gestão florestal, a resíduos


sólidos etc.

Esse sistema nacional é organizado e mantido pela União com a


colaboração dos Estados-Membros e dos Municípios, que também deverão
instituir, respectivamente, seus sistemas estaduais e sistemas municipais de
informações sobre o meio ambiente.

Também faz parte do Sinima o Cadastro Ambiental Rural – CAR12 –, que


se constitui em registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para
todos os imóveis rurais, e que foi instituído pelo Código Florestal (art. 29 da Lei
Federal n.º 12.651/12).

O CAR tem a finalidade de integrar as informações ambientais das


propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle,
monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao
desmatamento.

Assim, a inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR – é obrigatória para


todas as propriedades e posses rurais. Sua inscrição, atualmente, é por prazo
indeterminado nos termos da Lei Federal n.º 13.887/19 que revogou o prazo final
anteriormente fixado em 31/12/2017 prorrogado até 31/12/2018.

12O Sistema do Cadastro Ambiental Rural — SICAR é regulamentado pelo Decreto Federal n.º
7.830/12.

92
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

Desse modo, não haverá consequências jurídicas diretas pela não


inscrição dos imóveis rurais no CAR, haja vista que não há mais prazo definido.
Contudo, é importante esclarecer que a inscrição dos imóveis rurais no CAR
passou a se constituir em requisito exigido em diversos procedimentos com
repercussões ambientais (licenciamento ambiental, regularização ambiental,
registro da reserva legal, acesso a programas de apoio governamental, obtenção
de autorização de supressão vegetal, instituição de servidão ambiental, acesso a
crédito agrícola e a financiamentos em instituições financeiras oficiais etc.).

A inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR – não será considerada


título para fins de reconhecimento do direito de propriedade ou posse e não
elimina a obrigatoriedade de inscrição do imóvel no Cadastro Nacional de Imóveis
Rurais – CNIR – previsto na Lei Federal n.º 5.868/72 e gerido pelo Instituto
Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA – e pela Secretaria da Receita
Federal – SRF.

É importante ressaltar, ainda, que a inscrição deve ser realizada


preferencialmente nos órgãos ambientais municipais e estaduais, e que foi
instituído procedimento simplificado13 para a inscrição de pequenas propriedades
rurais familiares14, assim consideradas aquelas exploradas mediante o trabalho
pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural e com área de até
quatro módulos fiscais.

Por fim, registre-se que os proprietários e possuidores dos imóveis rurais


que os inscreveram no CAR até 31 de dezembro de 2020 passaram a ter o direito
à adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) previsto no novo código
florestal. Além disso, após 31 de dezembro de 2017, as instituições financeiras só
concederão crédito agrícola, em qualquer de suas modalidades, para
proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no CAR (Regra declarada
constitucional pelo STF na ADC n.º 42) (art. 78-A da Lei Federal n.º 12.651/12).

QUESTÃO

4. (Promotor de Justiça do MPSC. 2016). Sobre o Cadastro Ambiental Rural


(CAR), a Lei n. 12.651/12 estabelece que a inscrição do imóvel rural no CAR deverá

13 Obrigatória apenas a apresentação de documento de identificação do proprietário ou possuidor


rural e comprovação da propriedade ou posse, além de croqui indicando o perímetro do imóvel, as
Áreas de Preservação Permanente e os remanescentes que formam a Reserva Legal.
14 Art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.

93
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

ser feita, preferencialmente, no IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e


dos Recursos Naturais Renováveis), que, nos termos do regulamento, exigirá do
proprietário ou possuidor rural, entre outras questões, a identificação do
proprietário ou possuidor rural e a comprovação da propriedade ou posse.

( ) Certo ( ) Errado

94
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

1.5.4. Cadastro Técnico Federal

Passamos agora ao estudo do sexto instrumento da Política Nacional do


Meio Ambiente — PNMA —, o Cadastro Técnico Federal — CTF.

Trata-se de um cadastro público eletrônico instituído pelo IBAMA, órgão


executor do Sisnama, para registro obrigatório de todos aqueles que atuam com
atividades e instrumentos de defesa ambiental ou que sejam potencialmente
poluidores ou utilizadores de recursos ambientais.

Para melhor gestão das informações, esse Cadastro Técnico Federal foi
dividido em dois (art. 17 da Lei Federal n.º 6.938/81):

• CTF de Atividades e Instrumento de Defesa Ambiental – CTF/AIDA15:


Para registro obrigatório, por exemplo, de empresas de consultoria
ambiental, de gerenciamento de resíduos sólidos ou de indústrias de
equipamentos de controle da poluição ambiental;

15 Resolução n.º 01/88 do Conama e Instrução Normativa n.º 10/2013 do Ibama.

95
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• CTF de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos


recursos ambientais – CTF/APP16: Para registro obrigatório, por
exemplo, de empresas com atividades de extração, produção,
transporte e comercialização de produtos potencialmente perigosos ao
meio ambiente ou de produtos da fauna e da flora (são mais de 400 mil
empresas cadastradas no Brasil).

As pessoas naturais e jurídicas que estejam enquadradas nos anexos das


Instruções Normativas n.º 10/2013 e n.º 06/2013 do IBAMA e que não se inscrevem
no CTF respectivo incorrerão em infração ambiental punível com multa de:

• R$ 50,00 (cinquenta reais), se pessoa física;

• R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), se microempresa;

• R$ 900,00 (novecentos reais), se empresa de pequeno porte;

• R$ 1.800,00 (mil e oitocentos reais), se empresa de médio porte;

• R$ 9.000,00 (nove mil reais), se empresa de grande porte.

É por isso que até mesmo as floriculturas são obrigadas a registro no CTF,
haja vista que o comércio interno de plantas vivas e outros produtos oriundos da
flora nativa dependerá da inscrição no Cadastro Técnico Federal de Atividades
Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais, além da
respectiva licença ambiental a ser emitida pelo órgão estadual do Sisnama. Para
exportação de plantas vivas e outros produtos da flora exigir-se-á licença do órgão
federal do Sisnama (art. 37 da Lei Federal n.º 12.651/12).

Por fim, é importante destacar que também são obrigados a registro no


Cadastro Técnico Federal os estabelecimentos comerciais responsáveis pela
comercialização de motosserras e aqueles que as adquirirem. Para porte e uso de
motosserras17 exigir-se-á a respectiva licença, que será renovada a cada 2 anos.18

QUESTÃO

5. (Juiz de Direito do TJBA. Cebraspe – 2019).

16Instrução Normativa n.º 06/2013 do Ibama.


17 Art. 69 da Lei Federal n.º 12.651/12 (Novo Código Florestal).
18 Disciplinado no art. 45 do código ambiental de 1965 (Lei Federal n.º 4.771/65).

96
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE • 2

• Víctor é doutor em fauna aquática e pretende trabalhar como consultor em


estudos para licenciamentos ambientais.

• Uma empresa pretende extrair minérios e, para isso, solicitou o licenciamento


ambiental ao órgão estadual competente.

Considerando essas situações hipotéticas, assinale a opção correta, acerca do CTF,


previsto na Política Nacional de Meio Ambiente — Lei n.º 6.938/1981.

A) Víctor e a empresa deverão ter CTFs das respectivas atividades para


concretizarem suas pretensões.

B) Apenas Víctor deverá ter CTF, pois não se exige esse instrumento de pessoa
jurídica.

C) Apenas a empresa deverá ter CTF, pois não se exige esse instrumento de
pessoa física.

D) Nem de Víctor nem da empresa é exigido CTF para concretizarem suas


pretensões, mas ambos deverão estar inscritos no SINIMA.

E) Apenas a empresa deverá ter CTF; para Víctor, o CTF poderá ser dispensado
e substituído pela inscrição da atividade no SINIMA.

Com isso, concluímos o estudo dos instrumentos mais relevantes da PNMA.

97
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES


3
DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA

99
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

1. RELEMBRANDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA


AMBIENTAL — MTA

Estamos estudando o Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental — MTA


—, que, sob uma ótica mais prática, é basicamente formado por quatro sistemas
principais:

Com o adequado estudo do Sistema Nacional do Meio Ambiente —


Sisnama — foi possível compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: Constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para as ações de preservação, fiscalização e recuperação
do meio ambiente no Brasil. Foi possível se apreender a composição e
as atribuições desses órgãos/entidades ambientais (IBAMA, Conama
etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: Que deverão ser implementadas,


total ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do Sisnama. Foi possível se apreender a Política Nacional do
Meio Ambiente – PNMA – e outras associadas, estudando-se os:

• Objetivos: Da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do Sisnama;

100
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Instrumentos: Da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do Sisnama, para propiciar o cumprimento
dos objetivos da própria PNMA e das demais políticas ambientais
associadas.

Agora passaremos a estudar o segundo sistema integrante do MTA, o


Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza — SNUC —, para se
compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: Constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para administrar, preservar e fiscalizar as unidades de
conservação da natureza (parques nacionais, por exemplo) no Brasil.
Será possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (ICMBIO etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: Que deverão ser implementadas,


total ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC. Será possível se apreender a Política Nacional de
Unidades de Conservação – PNUC – e outras associadas, estudando-se
os:

o Objetivos: Da PNUC, e do próprio SNUC, a serem


cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do SNUC;

o Instrumentos: Instituídos pela Lei da PNUC, e pelas


demais políticas ambientais associadas (pelo código
florestal, por exemplo), que se constituem em
genuínas ferramentas jurídicas disponibilizadas
principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do SNUC, para propiciar o
cumprimento dos seus objetivos e da PNUC.

2. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA


NATUREZA

101
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.1. Criação do SNUC

A instituição de Unidades de Conservação da Natureza, como espaços


especialmente protegidos, atualmente disciplinada pela Lei do SNUC, não é
novidade, haja vista que estava prevista em nossos dois primeiros códigos
florestais, aprovados respectivamente pelo Decreto Federal n.º 23.793/3419 e pela
Lei Federal n.º 4.771/6520. Sua criação também foi prevista como um dos
instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA:

Art. 9º - São Instrumentos da Política Nacional do Meio


Ambiente: [...] VI - a criação de espaços territoriais
especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual
e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de
relevante interesse ecológico e reservas extrativistas;

Posteriormente, foi inserida na Constituição da República de 1988 como


uma obrigação do Poder Público:

Art. 225.
[...]
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao
Poder Público: [...] III - definir, em todas as unidades da
Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos [...]

Todavia, foi somente em 05 de junho de 1992, em meio às discussões da


Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento –
Cnumad – (Eco 92 ou Cúpula da Terra), ocorrida no Rio de Janeiro/RJ, que o

19 Primeiro código florestal brasileiro: Arts. 5º e 9º.


20 Segundo código florestal brasileiro: Art. 5º.

102
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Presidente da República encaminhou à Câmara dos Deputados o projeto de lei n.º


2.892/92 para a instituição de um Sistema Nacional de Unidades de Conservação
da Natureza, o SNUC.

Naquele momento havia muitas preocupações com a aceleração do ritmo


de extinção de espécies vitais ao planeta, especialmente na década anterior. Daí
porque se buscou o estabelecimento de uma rede de áreas naturais protegidas.

Tratava-se de uma responsabilidade assumida pelo Estado brasileiro


perante a Nação e à comunidade internacional, de preservar seu imenso
patrimônio genético e sua biodiversidade.

Na elaboração do projeto, desenvolveu-se o trabalho de audiências de


vários setores da sociedade e do Conselho Nacional do Meio Ambiente –
CONAMA –, que aprovou a minuta do projeto em sua 24ª Reunião Ordinária.

Assim, após longos 7 anos de tramitação no Congresso Nacional, finalmente


foi aprovada e sancionada a Lei Federal n.º 9.985/00 que instituiu o Sistema
Nacional de Unidades de Conservação da Natureza — SNUC —, ora objeto de nosso
estudo.

2.2 Estrutura do SNUC

O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza — SNUC —


é constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais,
distritais e municipais.

Assim, com a entrada em vigor da Lei Federal n.º 9.985/00, todas as


unidades de conservação municipais, estaduais, distritais e federais passaram a
integrar o SNUC, razão pela qual todas as unidades de conservação e áreas

103
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

protegidas que haviam sido criadas com base na legislação anterior tiveram que
ser reavaliadas, no prazo de 2 anos, com o objetivo de definir sua nova
classificação. Essa reavaliação teria de ser realizada por ato normativo do mesmo
nível hierárquico que criou as unidades, proposto pelo respectivo órgão executor.

O SNUC é gerido por um conjunto de órgãos e entidades com estrutura


funcionalmente particionada, conforme imagem a seguir:

É importante destacar que os órgãos são classificados em categorias bem


definidas, cada um deles com sua composição e atribuições próprias, conforme
veremos nos tópicos abaixo.

2.2.1. Órgão Consultivo e Deliberativo

O órgão consultivo e deliberativo do SNUC é o Conselho Nacional do Meio


Ambiente — CONAMA —, órgão colegiado que integra a estrutura administrativa
do Ministério do Meio Ambiente, e que detém a competência normativa para
aprovar resoluções regulamentares à legislação ambiental, de observância
obrigatória por todos os demais órgãos do SNUC.

Ou seja, os órgãos ambientais estaduais, distritais e municipais são


obrigados a cumprir e respeitar as normas ambientais emanadas pelo Conama. Daí
porque é o Conama, sem dúvida, o órgão mais importante da estrutura do SNUC.

Trata-se de órgão com atribuições para acompanhar a implementação do


Sistema.

104
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Sua composição e suas funções já foram amplamente estudadas no capítulo


do Sisnama.

2.2.2. Órgão Central

Compete ao Ministério do Meio Ambiente as funções de órgão central do


SNUC, com a finalidade de coordenar o sistema.

Também deve organizar e manter o Cadastro Nacional de Unidades de


Conservação da Natureza, com a colaboração do IBAMA e dos órgãos estaduais e
municipais competentes.

O Cadastro Nacional de Unidades de Conservação da Natureza conterá os


dados principais de cada unidade de conservação, incluindo, dentre outras
características relevantes, informações sobre espécies ameaçadas de extinção,
situação fundiária, recursos hídricos, clima, solos e aspectos socioculturais e
antropológicos.

O Ministério do Meio Ambiente divulgará e colocará à disposição do


público interessado os dados constantes do Cadastro.

2.2.3. Órgãos Executores

São considerados órgãos executores do SNUC as duas autarquias


ambientais federais vinculadas ao Ministério do Meio Ambiente: O Instituto
Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA – e o
Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – Icmbio.

O Icmbio foi instituído em 200721 com as funções de implementar o SNUC,


subsidiar as propostas de criação e administrar as unidades de conservação
federais. Portanto, ele é responsável pela gestão das unidades de conservação da
natureza federais, como por exemplo os parques nacionais.

Por outro lado, o IBAMA atua apenas em caráter supletivo no SNUC.

Ainda são considerados órgãos executores todos os órgãos e entidades


ambientais estaduais, distritais e municipais com as funções de implementar o
SNUC, subsidiar as propostas de criação e administrar as unidades de conservação
estaduais e municipais, nas respectivas esferas de atuação.

21 Lei Federal n.º 11.516/07.

105
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.3. Política Nacional de Unidades de Conservação —


PNUC

A Política Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – PNUC – se


constitui em importante política pública ambiental instituída pela Lei Federal n.º
9.985/00 com a finalidade geral de regular os procedimentos de criação e de
classificação das unidades de conservação de todas as esferas da Federação.

Ela definiu importantes diretrizes que devem reger o SNUC (art. 5º da Lei
Federal n.º 9.985/00):

• Assegurar que, no conjunto das unidades de conservação, estejam


representadas amostras significativas e ecologicamente viáveis das
diferentes populações, habitats e ecossistemas do território nacional e
das águas jurisdicionais, salvaguardando o patrimônio biológico
existente;

• Assegurar os mecanismos e procedimentos necessários ao


envolvimento da sociedade no estabelecimento e na revisão da política
nacional de unidades de conservação;

• Assegurar a participação efetiva das populações locais na criação,


implantação e gestão das unidades de conservação;

• Buscar o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de


organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de
estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental,
atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento,
manutenção e outras atividades de gestão das unidades de
conservação;

106
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Incentivar as populações locais e as organizações privadas a


estabelecerem e administrarem unidades de conservação dentro do
sistema nacional;

• Assegurar, nos casos possíveis, a sustentabilidade econômica das


unidades de conservação;

• Permitir o uso das unidades de conservação para a conservação in situ


de populações das variantes genéticas selvagens dos animais e plantas
domesticados e recursos genéticos silvestres: A conservação in situ é a
conservação de ecossistemas e habitats naturais e a manutenção e
recuperação de populações viáveis de espécies em seus meios naturais
e, no caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde
tenham desenvolvido suas propriedades características;

• Assegurar que o processo de criação e gestão das unidades de


conservação sejam feitos de forma integrada com as políticas de
administração das terras e águas circundantes, considerando as
condições e necessidades sociais e econômicas locais;

• Considerar as condições e necessidades das populações locais no


desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável
dos recursos naturais;

• Garantir às populações tradicionais cuja subsistência dependa da


utilização de recursos naturais existentes no interior das unidades de
conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização
pelos recursos perdidos: A população tradicional é aquela que já residia
na unidade antes de sua criação e que se mantinha através da
exploração de recursos naturais por gerações;

• Garantir uma alocação adequada dos recursos financeiros necessários


para que, uma vez criadas, as unidades de conservação possam ser
geridas de forma eficaz e atender aos seus objetivos;

• Buscar conferir às unidades de conservação, nos casos possíveis e


respeitadas as conveniências da administração, autonomia
administrativa e financeira;

• Buscar proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de


unidades de conservação de diferentes categorias, próximas ou
contíguas, integrando as diferentes atividades de preservação da

107
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

natureza, uso sustentável dos recursos naturais e restauração e


recuperação dos ecossistemas.

Por fim, vale destacar que o Poder Público deve realizar o levantamento
nacional das terras devolutas com o objetivo de definir áreas destinadas à
conservação da natureza.

2.4. Objetivos do SNUC

Os órgãos responsáveis pela gestão do SNUC devem implementá-lo,


inclusive observando-se as diretrizes da Política Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza – PNUC –, buscando o cumprimento dos objetivos do
sistema.

São objetivos do SNUC, que devem ser perseguidos por seus órgãos
gestores (art. 4º da Lei Federal n.º 9.985/00):

108
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Vamos estudar cada um deles.

O primeiro objetivo do SNUC é contribuir para a manutenção da


diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas
jurisdicionais.

Considera-se diversidade biológica a variabilidade de organismos vivos de


todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres,
marinhos e outros ecossistemas aquáticos, e os complexos ecológicos de que
fazem parte, compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre
espécies e de ecossistemas.

Trata-se da razão principal que justificou a aprovação da lei do SNUC, haja


vista que existiam muitas preocupações com a aceleração do ritmo de extinção
de espécies vitais ao planeta.

Daí porque também se constitui em objetivo do SNUC a proteção das


espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional.

109
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Em razão disso, as espécies da fauna e da flora ameaçadas de extinção


constarão de relação revista e atualizada periodicamente que será elaborada e
divulgada pelo IBAMA, órgão executor do SNUC. Os órgãos ambientais estaduais
e municipais serão incentivados pelo IBAMA a elaborem suas relações regionais
e locais.

Além disso, sem prejuízo da criação de unidades de conservação da


natureza, para proteção das florestas e de outras formas de vegetação o Poder
Público federal, estadual e municipal poderá:

• Proibir ou limitar o corte das espécies da flora raras, endêmicas, em


perigo ou ameaçadas de extinção, bem como das espécies necessárias
à subsistência das populações tradicionais, delimitando as áreas
compreendidas no ato, fazendo depender de autorização prévia,
nessas áreas, o corte de outras espécies: Espécies endêmicas são
aquelas encontradas somente em uma determinada área ou região,
sendo, portanto, exclusivas daquele local;

• Declarar qualquer árvore imune de corte por motivo de sua localização,


raridade, beleza ou condição de porta-sementes;

• Estabelecer exigências administrativas sobre o registro e outras formas


de controle de pessoas físicas ou jurídicas que se dedicam à extração,
indústria ou comércio de produtos ou subprodutos florestais.

Também em razão do objetivo do SNUC apontado acima, somente


excepcionalmente o IBAMA poderá permitir a captura de exemplares de espécies
ameaçadas de extinção, destinadas a programas de criação em cativeiro ou
formação de coleções científicas.

É também por isso que o SNUC visa a contribuir para a preservação e a


restauração da diversidade de ecossistemas naturais e a valorizar econômica e
socialmente a diversidade biológica.

A promoção do desenvolvimento sustentável foi também alçada a


objetivo do SNUC, como forma de se buscar o desenvolvimento sustentável do
País com respeito à preservação ambiental, tal qual idealizado no Relatório
Brundtland, Nosso Futuro Comum, elaborado pela Comissão Mundial sobre o
Meio Ambiente e o Desenvolvimento da ONU – CMED – e publicado em 1987.

A proteção das paisagens naturais e pouco alteradas, de notável beleza


cênica, consta como importante objetivo do SNUC com a finalidade de preservar

110
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

também sítios e locais de rara beleza natural, os quais poderão contribuir para a
promoção da educação e interpretação ambiental, da recreação em contato com a
natureza e do turismo ecológico que também se constitui em objetivo do SNUC.

O SNUC previu ainda como objetivo a proteção e recuperação dos


recursos hídricos e edáficos. Fatores edáficos são aqueles que regulam o solo e
que influenciam a distribuição e abundância da flora e fauna.

Esse sistema nacional não pode se descuidar do dever de proteção dos


recursos naturais necessários à subsistência de populações tradicionais,
respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-as
social e economicamente, haja vista que esse também é um dos seus objetivos.

A população tradicional é aquela que já residia na área da unidade de


conservação antes de sua criação e que se mantinha através da exploração de
recursos naturais, por gerações.

Por fim, são também objetivos do SNUC a proteção das características


relevantes de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica,
paleontológica e cultural, e a recuperação e restauração dos ecossistemas
degradados.

111
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

QUESTÃO

6. (Promotor de Justiça do MPES. Vunesp – 2013). É objetivo do Sistema


Nacional de Unidades de Conservação, conforme Lei n.º 9.985/2000.

A) proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica.

B) buscar proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de


unidades de conservação de diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas
respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos, integrando as
diferentes atividades de preservação da natureza, uso sustentável dos recursos
naturais e restauração e recuperação dos ecossistemas.

C) buscar conferir às unidades de conservação, nos casos possíveis e


respeitadas as conveniências da administração, autonomia administrativa e
financeira.

D) oferecer apoio e a cooperação de organizações não governamentais, de


organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos,
pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de
turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das
unidades de conservação.

E) assegurar a participação efetiva das populações locais na criação,


implantação e gestão das unidades de conservação.

2.5. Instrumentos do SNUC

Os órgãos e entidades responsáveis pela gestão do SNUC devem


implementar a Política Nacional de Unidades de Conservação – PNUC – e, para isso,

112
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

se utilizarão do conjunto de instrumentos ambientais que foram disponibilizados,


ou seja, conjunto de ferramentas jurídicas que foram institucionalizadas pela lei do
SNUC para propiciar a consecução de seus objetivos.

Assim, por exemplo, o Icmbio (entidade da estrutura do SNUC) poderá se


utilizar da zona de amortecimento (genuíno instrumento instituído pela Lei da
PNUC) para ampliar a proteção de paisagens naturais existentes em unidades de
conservação (um dos objetivos do SNUC) através do estabelecimento de restrições
ao uso de recursos naturais no entorno das unidades de conservação, propiciando
– com isso – a implementação da própria Política Nacional de Unidades de
Conservação.

Serão estudados os seguintes institutos jurídicos, verdadeiras ferramentas


jurídicas da PNUC, que devem ser utilizadas pelos órgãos e entidades do SNUC:

Apesar de não classificados expressamente como instrumentos, na


prática todos esses institutos jurídicos são instrumentos dessa Política Pública
Ambiental, porquanto são eles que propiciam a implementação do SNUC e da
PNUC.

Vamos estudar cada um deles nos tópicos seguintes.

2.5.1. Unidades de Conservação da Natureza

113
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

A lei da PNUC define Unidade de Conservação como sendo espaço


territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com
características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.

Assim, as Unidades de Conservação da Natureza possuem natureza jurídica


de espaços territoriais especialmente protegidos, onde as atividades humanas
(plantação, construção, desmatamento etc.) sofrem restrições decorrentes da
legislação ambiental.

São bons exemplos de unidades de conservação os conhecidos Parques


Nacionais da Chapada Diamantina, na Bahia, e da Chapada dos Veadeiros, no Goiás.

Portanto, as Unidades de Conservação são espécies do gênero espaços


territoriais especialmente protegidos. Outras espécies de espaços territoriais
especialmente protegidos são as áreas de reserva legal, as áreas de preservação
permanentes etc. (serão estudadas mais a frente).

Deveras, a criação de espaços territoriais especialmente protegidos se


constitui em obrigação constitucional de todas os Entes da Federação:

Art. 225.
[...]
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos [...]

Daí porque não só a União, mas também os Estados, o Distrito Federal e os


Municípios devem instituir unidades de conservação da natureza em seus
territórios.

Por fim, vale ressaltar que os mapas e cartas oficiais devem indicar as
áreas que compõem unidades de conservação da natureza integrantes do SNUC,
sendo certo que o Poder Executivo Federal submeterá à apreciação do Congresso
Nacional, a cada dois anos, um relatório de avaliação global da situação das
unidades de conservação federais do País.

Após a correta compreensão da natureza jurídica das unidades de


conservação, vamos estudar:

114
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.5.1.1. Formas de Criação

Os órgãos executores responsáveis pela gestão do SNUC poderão propor


a criação de unidades de conservação, que somente poderão ser instituídas por
ato do Poder Público, nos termos da Lei da PNUC:

Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do


Poder Público.

Todavia, a lei não definiu quais atos do Poder Público (decreto, portaria,
resolução etc.) poderiam instituir unidades de conservação da natureza. Apesar
disso, entende-se que as unidades de conservação somente podem ser criadas por
decretos dos Chefes dos Poderes Executivos ou por lei formal.

Desse modo, por exemplo, com a publicação de decreto de Chefe do Poder


Executivo se aperfeiçoa a criação da unidade de conservação, uma vez que nele são
definidos os limites territoriais da unidade, sua finalidade (objeto), o órgão
responsável por sua administração, sua denominação e as restrições às quais
estarão sujeitas as atividades nos seus limites territoriais.

Apesar de aperfeiçoada a criação da unidade com a publicação do seu ato


de instituição (decreto ou lei), por vezes restarão pendentes relevantes
providências sem as quais a plena proteção dos recursos naturais da unidade nem
sempre estará assegurada. A providência relevante, comumente pendente nesses
casos, é a regularização fundiária.

É que as propriedades privadas que ficarem inseridas dentro das unidades


de conservação de posse e domínio público devem ser, em regra, desapropriadas
com prévia e justa indenização em dinheiro. Porém, o Poder Público nem sempre
possuirá recursos financeiros suficientes para promover as indenizações
necessárias às desapropriações, de modo que a regularização fundiária dessas
áreas pode ficar pendente por anos.

115
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Já a denominação de cada unidade de conservação deverá basear-se,


preferencialmente, em sua característica natural mais significativa, ou em sua
denominação mais antiga, dando-se prioridade, neste último caso, às designações
indígenas ancestrais.

Vale ressaltar que o subsolo e o espaço aéreo, sempre que influírem na


estabilidade do ecossistema, integram os limites das unidades de conservação.

Por fim, é importante destacar que, excepcionalmente, apenas uma


categoria de unidade de conservação da natureza poderá ser criada por simples
termo de compromisso firmado perante o órgão ambiental, e não por decreto ou
lei. É a Reserva Particular do Patrimônio Natural, que será estudada mais à frente.
O termo firmado dever ser averbado na margem da inscrição do respectivo imóvel
no registro público de imóveis competente.

2.5.1.2. Requisitos para Criação

A criação ou ampliação de uma unidade de conservação deve ser precedida


de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a
dimensão e os limites mais adequados para a unidade (art. 22, § 2º da Lei Federal
n.º 9.985/00).

Os estudos técnicos se constituem nas análises científicas conduzidas por


profissionais capacitados, com a finalidade de fundamentar e motivar o surgimento
de uma nova unidade de conservação em determinada área.

Compete ao órgão executor do SNUC proponente da criação da nova


unidade de conservação elaborar os estudos técnicos preliminares. Para garantir a
realização desses estudos, o Poder Público poderá decretar limitações
administrativas provisórias ao exercício de atividades e empreendimentos efetiva
ou potencialmente causadores de degradação ambiental, quando, a critério do

116
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

órgão ambiental competente, houver risco de dano grave aos recursos naturais ali
existentes.

Ficam ressalvadas da limitação administrativa provisória apenas as


atividades agropecuárias, outras atividades econômicas em andamento e as obras
públicas licenciadas. Porém, mesmo assim, na área submetida a limitação
administrativa provisória, não serão permitidas atividades que importem em
exploração a corte raso da floresta e demais formas de vegetação nativa.
Considera-se exploração a corte raso o desmatamento e limpeza total da área.

A destinação final da área submetida a limitação administrativa provisória


deve ser definida no prazo de 7 (sete) meses, improrrogáveis, findo o qual ficará
extinta a limitação.

Além disso, a consulta pública deve fornecer as informações adequadas e


inteligíveis (compreensíveis e acessíveis) à população local e a outras partes
interessadas, tendo como finalidade subsidiar a definição da localização, da
dimensão e dos limites mais adequados para a unidade. Ela consiste em reunião
pública ou, a critério do órgão ambiental competente, outras formas de oitiva da
população local e de outras partes interessadas.

Daí porque o órgão executor competente para a realização da consulta


pública deve indicar, de modo claro e em linguagem acessível, as implicações e
restrições que incidirão sobre a população residente da área que ficará no interior
e no entorno da unidade da conservação proposta. Cabe ao órgão executor
proponente de nova unidade de conservação realizar a consulta pública. Registre-
se que, mesmo para ampliação dos limites de unidade de conservação, a consulta
pública não pode ser substituída por parecer emitido por conselho consultivo da
unidade (MS n.º 24.184/STF).

É importante ressaltar que, excepcionalmente, a consulta pública não será


obrigatória apenas na criação de duas categorias de unidades de conservação. A
estação ecológica e a reserva biológica, que serão estudadas mais à frente.

Por fim, a ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem


modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, pode ser
feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a
unidade, desde que realizados os estudos técnicos e a consulta pública.

QUESTÃO

117
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

7. (Juiz de Direito do TJPR. Cebraspe – 2019). Conforme a Lei n.º 9.985/2000,


que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC),
os requisitos necessários à criação de uma unidade de conservação, exceto no caso
de estação ecológica ou reserva biológica, são

A) a publicação de lei autorizadora, a realização de estudos técnicos para


identificação da localização, da dimensão e dos limites adequados da unidade, e a
elaboração de licenciamento ambiental.

B) a edição de ato autorizador do Poder Executivo e a realização de estudos


técnicos e de consulta pública para a identificação da localização, da dimensão e
dos limites adequados da unidade.

C) a edição de ato autorizador do Poder Executivo, a elaboração de


licenciamento ambiental, a realização de consulta pública e a verificação da
existência de população tradicional residente no local.

D) a publicação de lei autorizadora, a elaboração de licenciamento ambiental,


a identificação da dimensão e dos limites da unidade e a verificação da existência
de população tradicional residente no local.

2.5.1.3. Formas de Alteração e de Extinção

A extinção, supressão ou qualquer alteração que reduza os limites


(tamanho da área) ou a proteção de unidades de conservação exigirá aprovação de
lei específica, ainda que a unidade tenha sido criada por decreto.

Logo, não se aplica aqui o princípio do paralelismo das formas, consoante


assentado no texto constitucional e na lei da PNUC, respectivamente in verbis:

Art. 225.
[...]

118
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços


territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas
somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção;

Lei Federal n.º 9.985/00:


Art. 22.
[...]
§ 7o A desafetação ou redução dos limites de uma unidade de
conservação só pode ser feita mediante lei específica.

Assim, por exemplo, apesar de ter sido criado pelo Decreto Federal
1.713/37, o parque nacional de Itatiaia (primeira unidade de conservação criada no
Brasil), não poderá ter seus limites reduzidos por outro decreto federal.

Por fim, é importante destacar que, por unanimidade, o plenário do


Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4717, decidiu que é
inconstitucional a diminuição, por meio de medida provisória, de espaços
territoriais especialmente protegidos.

Desse modo, nem mesmo por medida provisória (com força de lei) será
possível se restringir os limites ou a proteção de unidades de conservação da
natureza, ainda que tenham sido criadas por meros decretos.

QUESTÃO

8. (Juiz de Direito do TJPR. Cebraspe – 2019). Considere que, em 1999, a


União tenha criado, por decreto presidencial, determinada unidade de
conservação. Nessa situação, de acordo com a CF, a União

A) poderá alterá-la por meio de decreto.

B) poderá suprimi-la por meio de decreto.

C) somente poderá alterá-la ou suprimi-la por meio de lei.

D) poderá alterá-la por meio de portaria do Ministério do Meio Ambiente.

E) terá cometido ato nulo, já que o ato de criação dessa unidade deveria ter
sido a lei.

119
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.5.1.4. Classificação das Unidades de Conserv ação

As unidades de conservação da natureza integrantes do SNUC dividem-se


em dois grupos com características específicas: Unidades de Proteção Integral e
Unidades de Uso Sustentável. Além disso, há ainda um modelo adotado
internacionalmente.

Em regra, as unidades de ambos os grupos necessitarão de plano de


manejo, consistente no documento técnico mediante o qual, com fundamento
nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu
zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos
recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à
gestão da unidade. Deve ser elaborado em até 5 anos e abranger inclusive a zona
de amortecimento e os corredores ecológicos.

O Plano de Manejo aprovado deve estar disponível para consulta pública


na sede da unidade de conservação e no centro de documentação do respectivo
órgão executor gestor do SNUC.

As unidades do grupo de proteção integral possuem as seguintes


características gerais:

• Proteção integral: Consiste na manutenção dos ecossistemas livres de


alterações causadas por interferência humana, admitido apenas o uso
indireto dos seus atributos naturais: O uso indireto consiste naquele que
não envolve consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais;

• Objetivo básico: Preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso


indireto dos seus recursos naturais;

• Conselho Consultivo: Cada unidade de conservação de Proteção


Integral disporá de um Conselho Consultivo, presidido pelo órgão

120
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

responsável por sua administração e constituído por representantes de


órgãos públicos e de organizações da sociedade civil, além de, quando
for o caso, representantes de proprietários de terras localizadas na
unidade e das populações tradicionais residentes, conforme se dispuser
em regulamento e no ato de criação da unidade;

• Taxa de visitação: Os recursos obtidos pelas unidades de conservação


do Grupo de Proteção Integral mediante a cobrança de taxa de visitação
e outras rendas decorrentes de arrecadação, serviços e atividades da
própria unidade serão destinados à manutenção da unidade, à
regularização fundiária e à manutenção de outras unidades de
proteção integral;

• Natureza jurídica da área: A área de uma unidade de conservação do


Grupo de Proteção Integral é considerada zona rural para todos os
efeitos legais. Sua zona de amortecimento não pode ser transformada
em zona urbana, conforme estudaremos mais à frente;

• Categorias: São 5 categorias (Estação Ecológica, Reserva Biológica,


Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio da Vida Silvestre).
Serão estudadas logo mais.

QUESTÃO

9. (Procurador Jurídico da Prefeitura de Planalto da Serra/MT. 2019)


(adaptada). É CORRETO afirmar que o uso indireto é aquele que não envolve
consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais.

( ) Certo ( ) Errado

Por outro lado, as unidades do grupo de uso sustentável possuem as


seguintes características gerais:

• Uso sustentável: Consiste na exploração do ambiente de maneira a


garantir a perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos
processos ecológicos, mantendo a biodiversidade e os demais atributos
ecológicos, de forma socialmente justa e economicamente viável:
Admite-se o uso direto de parcela dos recursos, consistente naquele
que envolve coleta e uso, comercial ou não, dos recursos naturais

121
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Objetivo básico: Compatibilizar a conservação da natureza com o uso


sustentável de parcela dos seus recursos naturais;

• Categorias: São 7 categorias (Área de Proteção Ambiental, Área de


Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista,
Reserva da Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva
Particular do Patrimônio Natural). Serão estudadas logo mais.

Vale ressaltar que as unidades de conservação do grupo de Uso


Sustentável podem ser transformadas, total ou parcialmente, em unidades do
grupo de Proteção Integral por instrumento normativo do mesmo nível
hierárquico daquele que criou a unidade, desde que realizados os estudos
técnicos e a consulta pública.

Também é importante apontar que, em regra, as unidades de


conservação são geridas e administradas por órgão executor do SNUC (Icmbio,
órgãos ambientais estaduais etc.). Assim, o órgão gestor do SNUC poderá receber
recursos ou doações de qualquer natureza, nacionais ou internacionais, com ou
sem encargos, provenientes de organizações privadas ou públicas ou de pessoas
físicas que desejarem colaborar com a sua conservação, ficando responsável pela
administração dos recursos obtidos, que serão utilizados exclusivamente na sua
implantação, gestão e manutenção da unidade.

Todavia, as unidades também poderão ser geridas por organizações da


sociedade civil de interesse público — Oscips — com objetivos afins aos da
unidade,22 mediante instrumento a ser firmado com o órgão responsável por sua
gestão (termo de parceria). A Oscip deve encaminhar anualmente relatórios de suas
atividades para apreciação do órgão executor e do conselho da unidade.

Cada categoria de unidades de conservação integrantes do SNUC será


objeto de regulamento específico.

Por fim, é relevante ressaltar que, em regra, é proibida a introdução nas


unidades de conservação de espécies não autóctones (não nativas ou naturais da
região que habita).

22 Lei Federal n.º 9.790/99.

122
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.5.1.4.1. Unidades de Proteção Integral

Compreendidas as regras gerais sobre as unidades de conservação,


passaremos ao exame específico de cada uma delas, a começar pelas cinco
categorias de unidades de conservação da natureza do grupo de proteção integral.

O exame dessas unidades envolve basicamente três critérios: Domínio da


área, possibilidade de pesquisas científicas e possibilidade de visitação pública.

A Estação Ecológica (Esec) tem como objetivo a preservação da natureza e


a realização de pesquisas científicas. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares


incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

• Pesquisa científica: A pesquisa científica depende de autorização


prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está
sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como
àquelas previstas em regulamento;

• Visitação pública: É proibida a visitação pública, exceto quando com


objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o plano de manejo
da unidade ou regulamento específico;

• Só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de:


Medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados; manejo
de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica; coleta de
componentes dos ecossistemas com finalidades científicas; pesquisas
científicas cujo impacto sobre o ambiente seja maior do que aquele
causado pela simples observação ou pela coleta controlada de
componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no

123
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de


um mil e quinhentos hectares.

QUESTÃO

10. (Analista do SLU/DF. Cebraspe – 2019). Estações ecológicas são unidades


de posse e de domínio público, porém é vedada a desapropriação de áreas
particulares que estejam dentro dos limites territoriais de uma estação ecológica
se tais áreas forem preexistentes à criação dessa unidade de conservação.

( ) Certo ( ) Errado

A Reserva Biológica (ReBio) tem como objetivo a preservação integral da


biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência
humana direta ou modificações ambientais. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares


incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

• Pesquisa científica: A pesquisa científica depende de autorização


prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está
sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como
àquelas previstas em regulamento;

• Visitação pública: É proibida a visitação pública, exceto aquela com


objetivo educacional, de acordo com regulamento específico;

• Permite, de forma excepcional, interferência humana direta ou


modificações ambientais, para adoção das medidas de recuperação de
seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para
recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os
processos ecológicos naturais.

O Parque Nacional (PN) tem como objetivo básico a preservação de


ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica. Ele possui as
seguintes características:

• Domínio: É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares


incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

• Pesquisa científica: A pesquisa científica é possível, dependendo de


autorização prévia do órgão responsável pela administração da

124
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

unidade, e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas,


bem como àquelas previstas em regulamento;

• Visitação pública: A visitação pública é possível, inclusive com


desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental,
de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico,
estando sujeita às normas e restrições estabelecidas no plano de
manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por
sua administração, e àquelas previstas em regulamento;

• Quando criadas pelo Estado ou Município, serão denominadas,


respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal.

QUESTÃO

11. (Analista do SLU/DF. Cebraspe – 2019). Estações ecológicas são unidades


de posse e de domínio público, porém é vedada a desapropriação de áreas
particulares que estejam dentro dos limites territoriais de uma estação ecológica
se tais áreas forem preexistentes à criação dessa unidade de conservação.

( ) Certo ( ) Errado

O Monumento Natural (Monat) tem como objetivo básico preservar sítios


naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica. Ele possui as seguintes
características:

• Domínio: Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja
possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra
e dos recursos naturais do local pelos proprietários. Havendo
incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas
ou não havendo concordância do proprietário às condições propostas
pelo órgão responsável pela administração da unidade para a
coexistência do Monumento Natural com o uso da propriedade, a área
deve ser desapropriada;

• Pesquisa científica: Não há proibição expressa para pesquisas


científicas;

• Visitação pública: A visitação pública é possível, estando sujeita às


condições e restrições estabelecidas no plano de manejo da unidade, às

125
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração e


àquelas previstas em regulamento.

QUESTÃO

12. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). A categoria de unidade


de conservação de proteção integral, denominada Monumento Natural, não pode
ser constituída por áreas particulares.

( ) Certo ( ) Errado

O Refúgio De Vida Silvestre (Rvs) tem como objetivo proteger ambientes


naturais onde se assegurem condições para a existência ou reprodução de espécies
ou comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória. Ele possui as
seguintes características:

• Domínio: Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja
possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra
e dos recursos naturais do local pelos proprietários. Havendo
incompatibilidade entre os objetivos da área e as atividades privadas
ou não havendo concordância do proprietário às condições propostas
pelo órgão responsável pela administração da unidade para a
coexistência do Refúgio de Vida Silvestre com o uso da propriedade, a
área deve ser desapropriada;

• Pesquisa científica: A pesquisa científica depende de autorização


prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está
sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como
àquelas previstas em regulamento;

• Visitação pública: A visitação pública é possível, estando sujeita às


condições e restrições estabelecidas no plano de manejo da unidade, às
normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração e
àquelas previstas em regulamento.

Com isso, concluímos o estudo das características mais relevantes das


unidades de conservação do grupo de proteção integral.

2.5.1.4.2. Unidades de Uso Sustentável

126
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

Agora passaremos ao exame das sete categorias de unidades de


conservação da natureza do grupo de uso sustentável:

O exame dessas unidades envolve basicamente três critérios: Domínio da


área, possibilidade de pesquisas científicas e possibilidade de visitação pública.

A Área De Proteção Ambiental (Apa) tem como objetivos básicos proteger


a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a
sustentabilidade do uso dos recursos naturais. Ela possui as seguintes
características:

• Domínio: É constituída por terras públicas ou privadas. Respeitados os


limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e restrições
para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área
de Proteção Ambiental;

• Pesquisa científica: As condições para a realização de pesquisa científica


nas áreas sob domínio público serão estabelecidas pelo órgão gestor da
unidade. Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário
estabelecer as condições, observadas as exigências e restrições legais;

• Visitação pública: As condições para a realização de visitação pública


nas áreas sob domínio público serão estabelecidas pelo órgão gestor da
unidade. Nas áreas sob propriedade privada, cabe ao proprietário
estabelecer as condições, observadas as exigências e restrições legais;

• Conselho: Disporá de um Conselho presidido pelo órgão responsável


por sua administração e constituído por representantes dos órgãos
públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente;

• É uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana,


dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais

127
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das


populações humanas.

QUESTÃO

13. (Perito Criminal Federal do DPF. Cebraspe – 2013). Acerca de legislação


ambiental aplicada à geologia, julgue o item subsequente. Entre as unidades de uso
sustentável, a área de proteção ambiental é, em geral, extensa, com certo grau de
ocupação humana e dotada de atributos abióticos, bióticos e estéticos; a área de
relevante interesse ecológico é, em geral, de pequena extensão, com pouca ou
nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias.

( ) Certo ( ) Errado

A Área De Relevante Interesse Ecológico (Arie) tem como objetivo manter


os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível
dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da
natureza. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: É constituída por terras públicas ou privadas. Respeitados os


limites constitucionais, podem ser estabelecidas normas e restrições
para a utilização de uma propriedade privada localizada em uma Área
de Relevante Interesse Ecológico;

• Pesquisa científica: Não há proibição expressa para pesquisas


científicas;

• Visitação pública: Não há proibição expressa para visitação pública;

• É uma área em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma


ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que
abriga exemplares raros da biota regional.

A Floresta Nacional (Flona) tem como objetivo básico o uso múltiplo


sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos
para exploração sustentável de florestas nativas. Ela possui as seguintes
características:

• Domínio: É de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares


incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

128
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Pesquisa científica: É permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia


autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às
condições e restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em
regulamento;

• Visitação pública: É permitida, condicionada às normas estabelecidas


para o manejo da unidade pelo órgão responsável por sua
administração;

• Conselho: Disporá de um Conselho Consultivo presidido pelo órgão


responsável por sua administração e constituído por representantes dos
órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população
residente;

• Populações tradicionais: É admitida a permanência de populações


tradicionais que a habitavam quando de sua criação, em conformidade
com o disposto em regulamento e no plano de manejo da unidade;

• É uma área com cobertura florestal de espécies predominantemente


nativas;

• Quando criada pelo Estado ou Município, será denominada,


respectivamente, Floresta Estadual e Floresta Municipal.

QUESTÃO

14. (Advogado da União da AGU. Cebraspe – 2015). Acerca da criação e da


gestão de florestas públicas nacionais, julgue o item subsequente. A floresta
nacional é unidade de conservação de uso sustentável, de posse e de domínio
públicos, cuja criação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública
que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados
para a unidade, com vistas ao seu objetivo básico de uso múltiplo sustentável dos
recursos florestais e pesquisa científica.

( ) Certo ( ) Errado

A Reserva Extrativista (Resex) tem como objetivos básicos proteger os


meios de vida e a cultura dessas populações, e assegurar o uso sustentável dos
recursos naturais da unidade. Ela possui as seguintes características:

129
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Domínio: é de domínio público, com uso concedido às populações


extrativistas tradicionais através de contrato, sendo que as áreas
particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

• Pesquisa científica: É permitida e incentivada, sujeitando-se à prévia


autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às
condições e restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em
regulamento;

• Visitação pública: É permitida, desde que compatível com os interesses


locais e de acordo com o disposto no plano de manejo da área;

• Conselho: Disporá de um Conselho Deliberativo presidido pelo órgão


responsável por sua administração e constituído por representantes dos
órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população
residente, sendo responsável pela aprovação do plano de manejo;

• Populações extrativistas: É admitida a permanência de populações


tradicionais que a habitavam quando de sua criação, em conformidade
com o disposto em regulamento e no plano de manejo da unidade;

• É uma área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja


subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na
agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte.
São proibidas a exploração de recursos minerais e a caça amadorística
ou profissional;

• A exploração comercial de recursos madeireiros só será admitida em


bases sustentáveis e em situações especiais e complementares às
demais atividades desenvolvidas na Reserva Extrativista, conforme o
disposto em regulamento e no plano de manejo da unidade.

A Reserva Da Fauna (Refau) é uma área natural com populações animais


de espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas
para estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos
faunísticos. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares


incluídas em seus limites devem ser desapropriadas;

• Pesquisa científica: não há proibição expressa para pesquisas


científicas. A comercialização dos produtos e subprodutos resultantes

130
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

das pesquisas obedecerá ao disposto nas leis sobre fauna e


regulamentos;

• Visitação pública: pode ser permitida, desde que compatível com o


manejo da unidade e de acordo com as normas estabelecidas pelo órgão
responsável por sua administração;

• É proibida a caça amadorística ou profissional;

A Reserva De Desenvolvimento Sustentável (RDS) tem como objetivo


básico preservar a natureza e, ao mesmo tempo, assegurar as condições e os meios
necessários para a reprodução e a melhoria dos modos e da qualidade de vida e
exploração dos recursos naturais das populações tradicionais, bem como valorizar,
conservar e aperfeiçoar o conhecimento e as técnicas de manejo do ambiente,
desenvolvido por estas populações. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: é de domínio público, com uso concedido às populações


tradicionais através de contrato, sendo que as áreas particulares
incluídas em seus limites serão, quando necessário, desapropriadas;

• Pesquisa científica: é permitida e incentivada, sendo voltada à


conservação da natureza, à melhor relação das populações residentes
com seu meio e à educação ambiental, sujeitando-se à prévia
autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às
condições e restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em
regulamento;

• Visitação pública: é permitida e incentivada, desde que compatível com


os interesses locais e de acordo com o disposto no plano de manejo da
área;

• Conselho: disporá de um Conselho Deliberativo presidido pelo órgão


responsável por sua administração e constituído por representantes dos
órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população
residente, sendo responsável pela aprovação do plano de manejo que
deve as zonas de proteção integral, de uso sustentável e de
amortecimento e corredores ecológicos;

• É admitida a exploração de componentes dos ecossistemas naturais


em regime de manejo sustentável e a substituição da cobertura vegetal
por espécies cultiváveis, desde que sujeitas ao zoneamento, às
limitações legais e ao Plano de Manejo da área;

131
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• É uma área natural que abriga populações tradicionais, cuja existência


baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos
naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições
ecológicas locais e que desempenham um papel fundamental na
proteção da natureza e na manutenção da diversidade biológica.

A Reserva Particular Do Patrimônio Natural (RPPN) tem como o objetivo


conservar a diversidade biológica. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: é uma área privada, gravada com perpetuidade;

• Pesquisa científica: permitida, nos termos do regulamento;

• Visitação pública: permitida com objetivos turísticos, recreativos e


educacionais, nos termos do regulamento;

• Criação: é a única unidade que pode ser criada por simples ato do órgão
competente do SISNAMA. A perpetuidade constará de termo de
compromisso assinado perante o órgão ambiental, que verificará a
existência de interesse público, e será averbado à margem da inscrição
no Registro Público de Imóveis. No âmbito federal, cabe ao IBAMA.

QUESTÃO

15. (Promotor de Justiça do MPGO. 2019) (adaptada). Segundo as disposições


da Lei Federal n.º 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de
Conservação da Natureza - SNUC, é incorreto afirmar que, na Reserva Particular do
Patrimônio Natural, conforme se dispuser em regulamento, somente serão
permitidas a pesquisa científica e a visitação com objetivos turísticos, recreativos e
educacionais.

( ) Certo ( ) Errado

Com isso, é concluído o estudo das características mais relevantes das


unidades de conservação do grupo de uso sustentável.

132
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

2.5.1.4.3. Modelo Internacional

Por fim, além das unidades de conservação dos grupos de proteção integral
e de uso sustentável, há ainda uma categoria especial classificada como Reserva da
Biosfera, não sendo encaixada em nenhum dos grupos.

A Reserva Da Biosfera (Rebio) consiste em modelo adotado


internacionalmente de gestão integrada, participativa e sustentável dos recursos
naturais, com os objetivos básicos de preservação da diversidade biológica, o
desenvolvimento de atividades de pesquisa, o monitoramento ambiental, a
educação ambiental, o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de
vida das populações.

A Rebio é reconhecida pelo Programa Intergovernamental "O Homem e a


Biosfera — MAB", estabelecido pela Unesco, organização da qual o Brasil é
membro. Ela possui as seguintes características:

• Domínio: é constituída por terras públicas ou privadas;

• Pesquisa científica: não há proibição expressa para pesquisas


científicas. O desenvolvimento de atividades de pesquisa é um dos
objetivos básicos da Rebio;

• Visitação pública: não há proibição expressa para visitações. A educação


ambiental é um dos objetivos básicos da Rebio e pode ser promovida
com visitações;

• Conselho: disporá de um Conselho Deliberativo constituído por


representantes de instituições públicas, de organizações da sociedade
civil e da população residente;

133
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

• Pode ser integrada por unidades de conservação já criadas pelo Poder


Público, respeitadas as normas legais que disciplinam o manejo de cada
categoria específica.

Vale ressaltar que a finalidade do Programa "O Homem e a Biosfera —


MAB" é fomentar a criação de espaços territoriais especialmente protegidos em
vários países do mundo.

Por fim, após o estudo específico de todas as modalidades de unidades de


conservação, é importante destacar que a exploração comercial de produtos,
subprodutos ou serviços obtidos ou desenvolvidos a partir dos recursos naturais,
biológicos, cênicos ou culturais ou da exploração da imagem de unidade de
conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do
Patrimônio Natural, dependerá de prévia autorização e sujeitará o explorador a
pagamento.

Vale ressaltar ainda que as populações tradicionais residentes em unidades


de conservação nas quais sua permanência não seja permitida serão indenizadas
ou compensadas pelas benfeitorias existentes e devidamente realocadas pelo
Poder Público em local e condições acordados entre as partes.

QUESTÃO

16. (Procurador do Estado da PGE/AM. Cebraspe – 2016). Acerca de


competências ambientais legislativas, ação popular e espaços territoriais
especialmente protegidos, julgue o item a seguir. Segundo o SNUC, a reserva da
biosfera é constituída por áreas de domínio público ou privado.

( ) Certo ( ) Errado

2.5.2. Zonas de Amortecimento

134
RAFAEL ROCHA. SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA • 3

A zona de amortecimento é conceituada como o entorno de uma Unidade


de Conservação (UC), onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e
restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre
a unidade (art. 2º, inciso XVIII da Lei Federal n.º 9.985/00).

Zona de Amortecimento

UC

Seus limites são geralmente definidos no próprio ato de criação da


respectiva unidade. Também poderão ser definidos posteriormente por ato do
órgão do SNUC, gestor da unidade.

Vale ressaltar que o órgão responsável pela administração da unidade


estabelecerá normas específicas regulamentando a ocupação e o uso dos recursos
da zona de amortecimento, sendo certo que o plano de manejo da unidade de
conservação deve abranger sua zona de amortecimento.

Por fim, com exceção da APA e da RPPN, todas as demais unidades de


conservação devem possuir uma zona de amortecimento para minimizar os
impactos negativos sobre a unidade (art. 25 da Lei Federal n.º 9.985/00).

QUESTÃO

17. (AGU. Cebraspe – 2013). Com base na Lei n° 9.985/2000, que instituiu o
Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), julgue o item
seguinte: As unidades de conservação da natureza, em especial as áreas de
proteção ambiental e as reservas particulares do patrimônio natural, devem possuir
uma zona de amortecimento e corredores ecológicos, cujos limites físicos, uso e
ocupação serão definidos no ato de criação da unidade.

( ) Certo ( ) Errado

135
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS


4 ESPECIALMENTE PROTEGIDOS -
DETEPS

136
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

1. RELEMBRANDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA


AMBIENTAL — MTA

Está sendo estudado o Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental (MTA),


que, sob uma ótica mais prática, é basicamente formado por quatro sistemas
principais:

Com o adequado estudo do SISNAMA, foi possível compreender os


seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para as ações de preservação, fiscalização e recuperação
do meio ambiente no Brasil. Foi possível se apreender a composição e
as atribuições desses órgãos/entidades ambientais (IBAMA, CONAMA
etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SISNAMA. Foi possível se apreender a Política Nacional do Meio
Ambiente – PNMA e outras associadas, estudando-se os:

a) Objetivos: da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos
e entidades componentes da estrutura do SISNAMA;

137
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

b) Instrumentos: Da PNMA, e das demais políticas nacionais


ambientais associadas, que se constituem em genuínas ferramentas
jurídicas disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do SISNAMA, para propiciar o
cumprimento dos objetivos da própria PNMA e das demais políticas
ambientais associadas.

Também foi estudado o segundo sistema integrante do MTA, o Sistema


Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), no qual foi possível a
compreensão dos seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para administrar, preservar e fiscalizar as unidades de
conservação da natureza (parques nacionais, por exemplo) no Brasil. Foi
possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (ICMBIO etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SNUC. Foi possível se apreender a Política Nacional de Unidades de
Conservação – PNUC – e outras associadas, estudando-se os:

a) Objetivos: da PNUC, e do próprio SNUC, a serem cumpridos, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC;

b) Instrumentos: instituídos pela Lei da PNUC, e pelas demais políticas


ambientais associadas (pelo código florestal, por exemplo), que se
constituem em genuínas ferramentas jurídicas disponibilizadas
principalmente para os órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC, para propiciar o cumprimento dos seus
objetivos e da PNUC.

Todavia, apesar da análise completa de todos os aspectos relevantes do


SNUC, ainda se faz necessário o estudo dos Demais Espaços Territoriais
Especialmente Protegidos (DETEPs), que não estão previstos na Lei do SNUC, mas,
sim, na Lei Federal n.º 12.651/12 (novo código florestal).

Esses espaços territoriais especialmente protegidos (Eteps) que ora serão


estudados, apesar de previstos no novo Código Florestal (CFLO), também seguem
as mesmas regras gerais para criação, alteração, supressão e extinção dos espaços

138
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

territoriais protegidos previstos na Lei do SNUC, daí porque os estudaremos neste


capítulo, após compreendidas as regras gerais da PNUC.

2. DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE


PROTEGIDOS — DETEPS

Antes da análise específica dos espaços territoriais especialmente


protegidos previstos no novo Código Florestal (CFLO), é importante destacar suas
normas gerais sobre a proteção da vegetação, as áreas de Preservação
Permanente, as áreas de Reserva Legal, o controle dos incêndios florestais, e seus
instrumentos econômicos e financeiros.

Esse novo código florestal tem como objetivo central o fomento ao


desenvolvimento sustentável, reafirmando, portanto, objetivos e diretrizes já
estudados na Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA) e na Política Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza (PNUC), buscando atender aos seguintes
princípios (diretrizes) (art. 1º-A da Lei Federal n.º 12.651/12):

• Afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das


suas florestas e demais formas de vegetação nativa, bem como da
biodiversidade, do solo, dos recursos hídricos e da integridade do
sistema climático, para o bem-estar das gerações presentes e futuras;

• Reafirmação da importância da função estratégica da atividade


agropecuária e do papel das florestas e demais formas de vegetação
nativa na sustentabilidade, no crescimento econômico, na melhoria da
qualidade de vida da população brasileira e na presença do País nos
mercados nacional e internacional de alimentos e bioenergia;

• Ação governamental de proteção e uso sustentável de florestas,


consagrando o compromisso do País com a compatibilização e
harmonização entre o uso produtivo da terra e a preservação da água,
do solo e da vegetação;

• Responsabilidade comum da União, Estados, Distrito Federal e


Municípios, em colaboração com a sociedade civil, na criação de
políticas para a preservação e restauração da vegetação nativa e de suas
funções ecológicas e sociais nas áreas urbanas e rurais;

139
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Fomento à pesquisa científica e tecnológica na busca da inovação para


o uso sustentável do solo e da água, a recuperação e a preservação das
florestas e demais formas de vegetação nativa;

• Criação e mobilização de incentivos econômicos para fomentar a


preservação e a recuperação da vegetação nativa e para promover o
desenvolvimento de atividades produtivas sustentáveis.

QUESTÃO

18. (Juiz de Direito do TJPA. Vunesp – 2014). Em relação aos princípios


aplicáveis à Lei n.º 12.651/2012, que estabelece normas gerais sobre a proteção da
vegetação, áreas de preservação permanente e áreas de reserva legal, bem como
a exploração florestal, o suprimento de matéria-prima florestal, o controle da
origem dos produtos florestais e o controle e prevenção de incêndios florestais, e
prevê instrumentos econômicos e financeiros para o alcance de seus objetivos, é
correto afirmar que a lei atenderá, entre outros, ao princípio

A) das responsabilidades comuns mais diferenciadas da União, Estados,


Distrito Federal e Municípios, em colaboração com a sociedade civil, na criação de
políticas somente voltadas para a preservação da vegetação nativa e de suas
funções ecológicas e sociais nas áreas rurais, urbanas e urbanizáveis.

B) do fomento à pesquisa científica e inovação tecnológica na busca de novas


soluções para o uso sustentável do solo, da água e do ar, bem como a preservação
das florestas e demais formas de vegetação, além de incentivos econômicos para a
recuperação da vegetação de forma integrada.

C) da afirmação da função socioambiental da atividade agropecuária e do


papel das florestas e demais formas de vegetação nativa na sustentabilidade, no
crescimento econômico, na melhoria da qualidade de vida da população brasileira
e na presença do Brasil especificamente no mercado internacional de alimentos.

D) da ação governamental de proteção e uso sustentável das florestas e


demais formas de vegetação, de forma que o País assuma o compromisso de
harmonização entre o uso produtivo da terra e a preservação da água, do solo e da
vegetação de forma ampla, buscando atingir o ideal de sustentabilidade.

E) da afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das


suas florestas e demais formas de vegetação nativa, bem como da biodiversidade,
do solo, dos recursos hídricos e da integridade do sistema climático, para o bem-
estar das gerações presentes e futuras.

140
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Daí porque, para contribuir com esses princípios (diretrizes), os órgãos


central e executores do SISNAMA (Ministério do Meio Ambiente, IBAMA e ICMBIO)
criarão e implementarão, com a participação dos órgãos estaduais, indicadores de
sustentabilidade, a serem publicados semestralmente, com vistas a aferir a
evolução do desenvolvimento sustentável.

Registre-se, desde já, que o CFLO autorizou a Câmara de Comércio Exterior


(Camex) a adotar medidas de restrição às importações de bens de origem
agropecuária ou florestal produzidos em países que não observem normas e
padrões de proteção do meio ambiente compatíveis com as estabelecidas pela
legislação brasileira, de modo que a legislação ambiental do Brasil é exemplo para
o mundo, conforme veremos.

Assim, compreendidas essas normas gerais do CFLO, será passado a estudar


os Demais Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (DETEPs) consistentes nas
Áreas de Preservação Permanente (APPs), Áreas de Reserva Legal (RLs) e Áreas de
Uso Restrito (AURs), além da correta compreensão das Áreas de Uso Alternativo do
Solo (Auas) e das Áreas Consolidadas (ACs) conforme imagem abaixo:

2.1. Áreas de Preservação Permanente — APP

Neste tópico será abordado os três importantes aspectos das áreas de


preservação permanente — APPs.

141
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

2.1.1. Conceito e Natureza Jurídica

São consideradas APPs aquelas protegidas, cobertas ou não por vegetação


nativa (natural), com função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de
fauna e da flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

QUESTÃO

19. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). A Lei Federal n.


12.651/2012, conhecida como Código Florestal, define como área de preservação
permanente somente a coberta por vegetação nativa, com a função ambiental de
preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a
biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar
o bem-estar das populações humanas.

( ) Certo ( ) Errado

Esses Eteps foram originalmente definidos pelo antigo código florestal de


23
1965 , no qual atualmente estão contemplados em nosso novo código e,
consoante apontado linhas atrás.

Em verdade, são espaços territoriais protegidos em si, mas com finalidade


ecológica específica de proteção de certas áreas ambientais adjacentes.

Exemplo: as faixas das margens de rios são consideradas APPs, pois têm a
função ambiental de evitar o assoreamento (acúmulo de terra) dos leitos dos rios
(função de preservar recursos hídricos).

23 Lei Federal n.º 4.771/65.

142
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Mata ciliar24

Da mesma forma, são também consideradas APPs as encostas com


declividade superior a 45, pois têm a importante função de manter a estabilidade
geológica para se evitar deslizamentos de terras causadores de acidentes graves.

Encosta25
Portanto, cada APP foi instituída com função ambiental protetiva
específica, conforme será visto pela frente.

Elas se constituem em limitações administrativas restritivas e genéricas do


exercício do direito de propriedade, fundadas em sua função socioambiental, razão
pela qual essas limitações são impostas a todos os proprietários de imóveis,
urbanos e rurais, nos quais existam essas áreas especialmente protegidas, sem
gerar nenhum direito à indenização26.

25 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-
dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.
25 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-

dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.


26 Recurso Especial n.º 1.233.257.

143
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Consequentemente, o CFLO estabeleceu que as florestas existentes no


território nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de
utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os
habitantes do País, de modo que os direitos de propriedade são exercidos com as
limitações que a legislação em geral e o próprio código estabelecem:

• De manter, preservar e recuperar a vegetação nativa da APP;

• De não realização de construções, plantações e mineração, ou qualquer


outro tipo de intervenção e supressão da vegetação da APP.

E o CFLO definiu que estas e outras obrigações ambientais, por ele


impostas, são propter rem, ou seja, possuem natureza real, razão pela qual se
aderem ao próprio imóvel e, por isso, são transmitidas ao sucessor no caso de
transferência de domínio ou posse da área, de modo que eventuais intervenções
ou desmatamentos promovidos pelo atual proprietário passarão à
responsabilidade do novo proprietário, adquirente da área a qualquer título, sobre
quem recairão as obrigações (propter rem) de recuperação da vegetação, de
mantê-la e preservá-la.

Por fim, registre-se que as APPs, como espaços territoriais especialmente


protegidos que são, podem ser criadas ou instituídas por lei (ope legis) ou por
decreto dos chefes dos Poderes Executivos federal, estaduais, distrital e municipais,
sendo certo que somente poderão ser extintas por lei em sentido estrito, ainda
que tenham sido criadas por decreto, em respeito ao disposto no art. 225, §1º,
inciso III, da Constituição da República:

Art. 225.
[...]
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas
somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção;

Com isso, é concluída a análise das regras gerais sobre as APPs. Será
estudado agora cada um desses espaços especialmente protegidos.

2.1.2. Tipos de Áreas de Preservação Permanente –


APPs

144
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

O novo CFLO incorporou, com alterações, o rol de APPs existente no Código


Florestal de 1965, na Lei Federal n.º 7.511/86, na Lei Federal n.º 7.803/89 e na
medida provisória n.º 2.166-67/01, definindo as seguintes áreas como de
preservação permanente:

145
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

O primeiro tipo de APP definido pelo CFLO é mais conhecido como mata
ciliar, consistindo nas faixas marginais de qualquer curso d’água natural, perene27
e intermitente28, excluídos os efêmeros29, desde a borda da calha do leito regular.
Ela possui as seguintes características:

Mata ciliar30

• Largura mínima de:

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez)


metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10


(dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50


(cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200


(duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura


superior a 600 (seiscentos) metros;

27 Corpo de água lótico que possui naturalmente escoamento superficial durante todo o período do
ano.
28 Corpo de água lótico que naturalmente não apresenta escoamento superficial por períodos do

ano.
29 Corpo de água lótico que possui escoamento superficial apenas durante ou imediatamente após

períodos de precipitação.
30 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-

dos-recursos-hidricos-dos-ecossistemas-aquaticos.html>. Acessado em: 18/12/2020.

146
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Prática de aquicultura: nos imóveis rurais com até 15 (quinze) módulos


fiscais31, é admitida a prática da aquicultura e a infraestrutura física
diretamente a ela associada, inclusive na APP tida como mata ciliar e no
entorno de lagos e lagoas naturais, desde que não implique em novas
supressões da vegetação nativa e se adote práticas sustentáveis de
manejo (regra declarada constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• Agricultura de vazante: é admitido, para a pequena propriedade ou


posse rural familiar32, o plantio de culturas temporárias e sazonais de
vazante de ciclo curto na faixa de terra 33 que fica exposta no período de
vazante dos rios ou lagos, desde que não implique supressão de novas
áreas de vegetação nativa, seja conservada a qualidade da água e do
solo e seja protegida a fauna silvestre (Regra declarada constitucional
pelo STF na ADC n.º 42).

O segundo tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas no entorno


dos lagos e lagoas naturais, com as seguintes características:

• Largura mínima de:

a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com
até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50
(cinquenta) metros;

b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas;

• Acumulações com superfície inferior a 1 hectare: Nos entornos de


acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1
(um) hectare, não há APP. Contudo, somente será permitida nova
supressão de áreas de vegetação nativa com autorização do órgão
ambiental competente do SISNAMA (Regra declarada constitucional
pelo STF na ADC n.º 42).

O terceiro tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas no entorno dos
reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de

31 Módulo fiscal é uma unidade de medida, em hectares, cujo valor é fixado pelo Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária — Incra — para cada município.
32 Aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar

rural e com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.
33 Áreas marginais a cursos d’água sujeitas a enchentes e inundações periódicas (várzea de

inundação ou planície de inundação).

147
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento,


com as seguintes características:

• Largura mínima: definida no licenciamento ambiental;

• Acumulações com superfície inferior a 1 hectare: nos entornos de


acumulações naturais ou artificiais de água com superfície inferior a 1
(um) hectare, não há APP. Contudo, somente será permitida nova
supressão de áreas de vegetação nativa com autorização do órgão
ambiental competente do SISNAMA (Regra declarada constitucional
pelo STF na ADC n.º 42);

• Reservatório artificial para geração de energia ou abastecimento


público: na implantação de reservatório d’água artificial destinado a
geração de energia ou abastecimento público, o empreendedor é
obrigado a adquirir, desapropriar ou instituir servidão administrativa
nas áreas de preservação permanente criadas em seu entorno,
conforme estabelecido no licenciamento ambiental, observando-se a:

a) Faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros,


em áreas rurais;

b) Faixa mínima de 15 (metros) metros e máxima de 30 (trinta) metros,


em áreas urbanas;

• Plano ambiental de conservação e uso do entorno do reservatório 34:


na implantação de reservatórios artificiais, o empreendedor, no âmbito
do licenciamento ambiental, elaborará Plano Ambiental de Conservação
e Uso do Entorno do Reservatório, em conformidade com o termo de
referência expedido pelo órgão competente do SISNAMA, não podendo
o uso dessa área exceder a 10% (dez por cento) do total da APP. Deverá
ser apresentado ao órgão ambiental concomitantemente com o Plano
Básico Ambiental35 e aprovado até o início da operação do
empreendimento, não constituindo a sua ausência impedimento para

34 Conjunto de diretrizes e proposições com o objetivo de disciplinar a conservação, recuperação, o


uso e ocupação do entorno do reservatório artificial, respeitados os parâmetros estabelecidos nesta
Resolução e em outras normas aplicáveis. Disciplinado na Resolução n.º 302/02 do Conama.
35 Trata-se de estudo ambiental exigido pelos órgãos do Sisnama nos procedimentos de

licenciamento, geralmente exigido para a liberação da Licença de Instalação. Também conhecido


como Projeto Básico Ambiental (PBA), deve apresentar, de forma detalhada, as medidas de controle
e os programas ambientais propostos. Previsto, por exemplo, na Resolução n.º 06/87 do Conama.

148
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

a expedição da licença de instalação (Regra declarada constitucional


pelo STF na ADC n.º 42);

• Reservatórios artificiais não decorrentes de represamento de curso


naturais: não há APP no entorno de reservatórios artificiais de água que
não decorram de barramento ou represamento de cursos d’água
naturais (Regra declarada constitucional pelo STF na ADC n.º 42).

O quarto tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas no entorno das
nascentes36 e dos olhos d’água37 perenes, qualquer que seja sua situação
topográfica. Todavia, no julgamento conjunto da ADC 42 e ADIN 4903 o Supremo
Tribunal Federal promoveu interpretação conforme ao dispositivo para reconhecer
que também as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água intermitentes
são APPs. Elas possuem a seguinte característica:

• Tamanho: raio mínimo de 50 (cinquenta) metros.

QUESTÃO

20. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). De acordo com decisão


proferida pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n. 4.903, foi
reconhecida a caracterização das nascentes e olhos d'água intermitentes como
áreas de preservação permanente, de modo que, atualmente, a proteção do
entorno destas áreas abrange o raio mínimo de 50 (cinquenta) metros no entorno
das nascentes e dos olhos d’água perenes e intermitentes, nos termos do art. 4º,
IV, da Lei Federal n. 12.651/2012.

( ) Certo ( ) Errado

O quinto tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas de encostas ou


partes destas com declividade superior a 45º (quarenta e cinco graus), com a
seguinte característica:

36 Afloramento natural do lençol freático que apresenta perenidade e dá início a um curso d’água.
37 Afloramento natural do lençol freático, mesmo que intermitente.

149
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Encosta38

• Tamanho: equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior


declive.

O sexto tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às restingas, como


fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues, com as seguintes características:

Restinga de Jurubatiba, Macaé/RJ39

• Tamanho: toda extensão;

• Conceito: é o depósito arenoso paralelo à linha da costa, de forma


geralmente alongada, produzido por processos de sedimentação, onde
se encontram diferentes comunidades que recebem influência marinha,
com cobertura vegetal em mosaico, encontrada em praias, cordões
arenosos, dunas e depressões, apresentando, de acordo com o estágio
sucessional, estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais
interiorizado;

38 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-
dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.
39 Fonte: <https://www.ICMBio.gov.br/portal/ultimas-noticias/4-destaques/4857-ICMBio-inaugura-

complexo-de-visitacao-do-parque-da-restinga-de-jurubatiba>. Acessado em: 18/12/2020.

150
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Resoluções do CONAMA: o STF deferiu, à unanimidade, medida cautelar


para suspender os efeitos da Resolução n.º 500/20 – CONAMA, com a
imediata restauração da vigência e eficácia da anteriormente revogada
Resolução n.º 303/2002 – CONAMA que estabelece parâmetros,
definições e limites para APPs em restingas, em faixa mínima de
trezentos metros, medidos a partir da linha de preamar máxima.

O sétimo tipo de APP definido pelo CFLO refere-se aos manguezais, com as
seguintes características:

Manguezal40

• Tamanho: Toda extensão;

• Conceito: É o ecossistema litorâneo que ocorre em terrenos baixos,


sujeitos à ação das marés, formado por vasas lodosas recentes ou
arenosas, às quais se associa, predominantemente, a vegetação natural
conhecida como mangue, com influência fluviomarinha, típica de solos
limosos de regiões estuarinas e com dispersão descontínua ao longo da
costa brasileira, entre os Estados do Amapá e de Santa Catarina;

• Resoluções do CONAMA: O STF deferiu, à unanimidade, medida


cautelar para suspender os efeitos da Resolução n.º 500/20 – CONAMA,
com a imediata restauração da vigência e eficácia da anteriormente
revogada Resolução n.º 303/2002 – CONAMA que estabelece
parâmetros, definições e limites para APPs em manguezais.

O oitavo tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às bordas dos tabuleiros
ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, com as seguintes características:

40Fonte: <https://geodireito.com.br/index.php/2018/04/21/ICMBio-lanca-atlas-dos-manguezais-do-
brasil/>. Acessado em: 18/12/2020.

151
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Borda de tabuleiro ou chapada41

• Tamanho: em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções


horizontais;

• Conceito: paisagem topográfica plana, com declividade média inferior a


dez por cento, aproximadamente seis graus e superfície superior a 10
(dez) hectares, terminada de forma abrupta em escarpa, e
caracterizando-se por grandes superfícies a mais de 600 (seiscentos)
metros de altitude;

• Resoluções do CONAMA: o STF deferiu, à unanimidade, medida cautelar


para suspender os efeitos da Resolução n.º 500/20 – CONAMA, com a
imediata restauração da vigência e eficácia da anteriormente revogada
Resolução n.º 303/2002 – CONAMA que estabelece parâmetros,
definições e limites para APPs em chapadas.

O nono tipo de APP definido pelo CFLO refere-se ao topo de morros,


montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação
média maior que 25º, com a seguinte característica:

41Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-
dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.

152
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Topo de morros, montes, montanhas e serras42

• Tamanho: equivalente às áreas delimitadas a partir da curva de nível


correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação
sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal
determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos
ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação. Ou
seja, correspondente ao terço superior da elevação.

O décimo tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas em altitude


superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação, com a
seguinte característica:

Áreas em altas altitudes43

• Tamanho: Toda extensão.

42 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-
dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.
43 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-

dos-solos-manutencao-da-recarga-hidrica.html>. Acessado em: 18/12/2020.

153
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

O último tipo de APP definido pelo CFLO refere-se às áreas em veredas e


adjacências, com as seguintes características:

Veredas44

• Tamanho: A faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima


de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso
e encharcado;

• Conceito: Espaço brejoso ou encharcado, que contém nascentes ou


cabeceiras de cursos d`água, onde há ocorrência de solos hidromórficos,
caracterizado predominantemente por renques de buritis do brejo
(Mauritia flexuosa) e outras formas de vegetação típica;

• Resoluções do CONAMA: O STF deferiu, à unanimidade, medida


cautelar para suspender os efeitos da Resolução n.º 500/20 – CONAMA,
com a imediata restauração da vigência e eficácia da anteriormente
revogada Resolução n.º 303/2002 – CONAMA que estabelece
parâmetros, definições e limites para APPs em veredas.

44Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/APP-localizacao-e-limites_protecao-conservacao-
dos-recursos-hidricos-dos-ecossistemas-aquaticos.html>. Acessado em: 18/12/2020.

154
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

21. (Promotor de Justiça do MPPI. CEBRASPE – 2019). De acordo com o Código


Florestal, considera-se área de preservação permanente

A) a faixa marginal de curso d’água efêmero, desde a borda da calha do leito


maior, em largura mínima de 30 metros, para os cursos d’água de menos de 10
metros de largura.

B) a faixa marginal de curso d’água perene, desde a borda da calha do leito


maior, em largura mínima de 10 metros, para os cursos d’água de menos de 30
metros de largura.

C) os manguezais, até o limite de 200 metros, contados da borda da calha do


leito maior do curso d’água.

D) a área no entorno das nascentes, intermitentes ou perenes, qualquer que


seja a sua situação topográfica, em um raio mínimo de 50 metros.

E) as bordas dos tabuleiros ou chapadas, em toda a sua extensão.

É importante destacar ainda que são passíveis de indenização as restrições


impostas com a instituição de APPs declaradas de interesse social por ato dos
chefes dos Poderes Executivos que inviabilizem o usufruto da propriedade
particular. O CFLO autoriza a criação dessas APPs exclusivamente com as seguintes
finalidades:

• Conter a erosão do solo e mitigar riscos de enchentes e deslizamentos


de terra e de rocha;

• Proteger as restingas ou veredas;

• Proteger várzeas: São áreas marginais a cursos d’água sujeitas a


enchentes e inundações periódicas;

• Abrigar exemplares da fauna ou da flora ameaçados de extinção;

• Proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico, cultural ou


histórico;

• Formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;

• Assegurar condições de bem-estar público;

155
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Auxiliar a defesa do território nacional, a critério das autoridades


militares.

• Proteger áreas úmidas, especialmente as de importância internacional:


São os pantanais e as superfícies terrestres cobertas de forma periódica
por águas, cobertas originalmente por florestas ou outras formas de
vegetação adaptadas à inundação.

Registre-se, por fim, que as APPs são isentas do Imposto Territorial Rural
(ITR), nos termos do art. 10, §1º, inciso II, alínea “a”, da Lei Federal n.º 9.393/96.

Assim, concluímos o estudo dos aspectos relevantes relativos a cada uma


das áreas de preservação permanente.

2.1.3. Intervenção e Supressão em Áreas de


Preservação Permanente — APPs

A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação


Permanente (APP), por se tratar de espaço territorial especialmente protegido, só
pode ocorrer nas excepcionais hipóteses autorizadas pelo próprio CFLO, após
prévio licenciamento ambiental45, promovido por órgão competente do SISNAMA.

Em suma, a realização de construções, plantações, atividades


agropecuárias etc., com a consequente supressão da vegetação nativa em APPs,
somente serão permitidas nas seguintes situações previstas no CFLO:

• Casos de Utilidade Pública: previstos no CFLO, desde que se comprove


a inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade
proposta mediante processo administrativo próprio, nos termos da
interpretação conforme à Constituição determinada no julgamento da
ADC n.º 42 pelo STF. Assim, além da necessidade de que a atividade ou

45 Resolução n.º 369/06 do Conama c/c decisão da ADC 42.

156
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

empreendimento propostos estejam previstos no rol das hipóteses de


utilidade pública estabelecidas no CFLO, o interessado deve comprovar
que não existe uma alternativa técnica ou de localização para a
atividade pretendida, como condição para a obtenção do licenciamento
ambiental necessário à intervenção na APP;

• Casos de Interesse Social: previstos no CFLO, desde que se comprove a


inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta
mediante processo administrativo próprio, nos termos da interpretação
conforme à Constituição determinada no julgamento da ADC n.º 42 pelo
STF. Assim, além da necessidade de que a atividade ou empreendimento
propostos estejam previstos no rol das hipóteses de utilidade pública
estabelecidas no CFLO, o interessado deve comprovar que não existe
uma alternativa técnica ou de localização para a atividade pretendida,
como condição para a obtenção do licenciamento ambiental necessário
à intervenção na APP;

• Casos de Baixo Impacto Ambiental.

QUESTÃO

22. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). Como regra geral, a Lei
Federal n. 12.651/2012 somente admite a intervenção ou a supressão de vegetação
nativa em Área de Preservação Permanente nas hipóteses de utilidade pública e de
baixo impacto ambiental por esta previstas.

( ) Certo ( ) Errado

São casos de utilidade pública que permitem, excepcionalmente e com


prévio licenciamento ambiental, a supressão da vegetação nativa em APPs:

• As atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

• As obras de infraestrutura destinadas às concessões e aos serviços


públicos de transporte, sistema viário, inclusive aquele necessário aos
parcelamentos de solo urbano aprovados pelos Municípios,
saneamento, energia, telecomunicações, radiodifusão, bem como
mineração, exceto, neste último caso, a extração de areia, argila, saibro
e cascalho;

• Atividades e obras de defesa civil;

157
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Atividades que comprovadamente proporcionem melhorias na


proteção das funções ambientais das APPs.

• Ampliação dos casos: outras atividades similares devidamente


caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio,
quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento
proposto, definidas em ato do chefe do Poder Executivo federal.

Portanto, consoante acima, além do rol taxativo, há uma autorização legal


ao Presidente da República para ampliação dos casos de utilidade pública
permissivos de supressão da vegetação em APPs via decreto federal e cuja
constitucionalidade restou declarada no julgamento da ADI 4903 pelo STF.

Observação: vale ressaltar que a supressão de vegetação nativa protetora


de nascentes, dunas e restingas em APPs somente poderá ser autorizada e
licenciada nesses casos de utilidade pública. Logo, não poderá ocorrer nos casos
de interesse social ou de baixo impacto ambiental.

Por outro lado, os casos de interesse social que permitem,


excepcionalmente e com prévio licenciamento ambiental, a supressão da
vegetação nativa em APPs estão abaixo relacionados:

• As atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação


nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da
erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies
nativas;

• A exploração agroflorestal sustentável praticada na pequena


propriedade ou posse rural familiar ou por povos e comunidades
tradicionais, desde que não descaracterize a cobertura vegetal
existente e não prejudique a função ambiental da área;

• A implantação de infraestrutura pública destinada a esportes, lazer e


atividades educacionais e culturais ao ar livre em áreas urbanas e rurais
consolidadas;

• A regularização fundiária de assentamentos humanos ocupados


predominantemente por população de baixa renda em áreas urbanas
consolidadas, observadas as condições estabelecidas na Lei n.º 11.977,
de 7 de julho de 2009;

158
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Implantação de instalações necessárias à captação e condução de água


e de efluentes tratados para projetos cujos recursos hídricos são partes
integrantes e essenciais da atividade;

• As atividades de pesquisa e extração de areia, argila, saibro e cascalho,


outorgadas pela autoridade competente;

• Ampliação dos casos: outras atividades similares devidamente


caracterizadas e motivadas em procedimento administrativo próprio,
quando inexistir alternativa técnica e locacional à atividade proposta,
definidas em ato do chefe do Poder Executivo federal.

Outrossim, aqui também há autorização legal ao Presidente da República


para ampliação dos casos de interesse social permissivos de supressão da
vegetação em APPs, via decreto federal e cuja constitucionalidade restou declarada
no julgamento da ADI 4903 pelo STF.

Por fim, são casos de baixo impacto ambiental que permitem,


excepcionalmente e com prévio licenciamento ambiental, a supressão da
vegetação nativa em APPs:

• Abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e


pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso d’água, ao
acesso de pessoas e animais para a obtenção de água ou à retirada de
produtos oriundos das atividades de manejo agroflorestal sustentável;

• Implantação de instalações necessárias à captação e condução de água


e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso
da água, quando couber;

• Implantação de trilhas para o desenvolvimento do ecoturismo;

• Construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno


ancoradouro;

• Construção de moradia de agricultores familiares, remanescentes de


comunidades quilombolas e outras populações extrativistas e
tradicionais em áreas rurais, onde o abastecimento de água se dê pelo
esforço próprio dos moradores;

• Construção e manutenção de cercas na propriedade;

159
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Pesquisa científica relativa a recursos ambientais, respeitados outros


requisitos previstos na legislação aplicável;

• Coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e


produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a
legislação específica de acesso a recursos genéticos;

• Plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas


e outros produtos vegetais, desde que não implique supressão da
vegetação existente nem prejudique a função ambiental da área;

• Exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e


familiar, incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros,
desde que não descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente
nem prejudiquem a função ambiental da área;

• Ampliação dos casos: outras ações ou atividades similares,


reconhecidas como eventuais e de baixo impacto ambiental em ato do
Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA ou dos Conselhos
Estaduais de Meio Ambiente.

Novamente houve uma autorização legal para ampliação dos casos de


intervenção, desta vez nos casos de baixo impacto ambiental permissivos de
supressão da vegetação em APPs, porém (neste caso) através de ato do CONAMA
ou dos Conselhos de Meio Ambiente Estaduais, que poderão aprovar resoluções
estabelecendo novos casos.

Observação: é importante apontar que o CFLO autoriza o acesso de pessoas


e animais às Áreas de Preservação Permanente para obtenção de água e para
realização de atividades de baixo impacto ambiental (art. 9º do CFLO). Apesar do
lapso do legislador, considera-se que, mesmo nesses casos, exigir-se-á o prévio
licenciamento ambiental para se autorizar tais atividades, com fundamento na
exigência nacional prevista no art. 10 da Lei Federal n.º 6.938/81.

Com isso, é finalizado o estudo do extenso rol de casos que permitem a


supressão da vegetação nativa em APPs.

Contudo, é importante destacar que essas excepcionais hipóteses de


supressão da vegetação em APP previstas no CFLO não podem ser ampliadas por
leis estaduais, sob pena de serem declaradas formalmente inconstitucionais por
violação da regra que determina a competência legislativa concorrente entre União
e Estados-Membros para se legislar sobre o meio ambiente inserta no art. 24 da

160
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Constituição da República, definidora do denominado “condomínio legislativo”,


consoante assentado pelo STF (ADI 4988/TO).

Vale ressaltar que, como exceção da exceção, o novo código florestal


autoriza a intervenção e supressão da vegetação nativa em APPs sem a necessidade
de prévio licenciamento ambiental, nos seguintes casos:

• Para a execução, em caráter de urgência, de atividades de segurança


nacional e obras de interesse da defesa civil destinadas à prevenção e
mitigação de acidentes em áreas urbanas;

• A realização de atividades de baixo impacto ambiental46 promovidas


nas pequenas propriedades e posses familiares47, que dependerão de
simples declaração ao órgão ambiental competente, desde que esteja o
imóvel devidamente inscrito no CAR.

Por fim, o CFLO também autoriza a intervenção ou a supressão de


vegetação nativa em restingas e manguezais para execução de obras habitacionais
e de urbanização, inseridas em projetos de regularização fundiária de interesse
social, em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda,
desde que em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida.

2.2. Áreas de Reserva Legal – RL

46 Ressalvados os casos de implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e


efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber, e de
pesquisa científica relativa a recursos ambientais, que necessariamente dependerão de prévio
licenciamento ambiental.
47 Aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar

rural e com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.

161
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Conforme apontado linhas atrás, além dos espaços territoriais


especialmente protegidos estudados no SNUC, a Lei Federal n.º 12.651/12 (novo
CFLO) definiu outros Eteps de igual relevância.

Esses Demais Espaços Territoriais Especialmente Protegidos – DETEPs –,


apesar de previsto pelo novo CFLO, também seguem as mesmas regras gerais para
criação, alteração, supressão e extinção dos espaços territoriais protegidos
previstos na Lei do SNUC, daí porque iniciamos seu estudo no tópico anterior, após
a compreensão das regras gerais da PNUC.

Já concluímos a análise dos aspectos relevantes das APPs, primeiro tipo de


Espaços Territoriais Especialmente Protegidos (ETEP) instituído pelo novo Código
Florestal.

Agora serão abordadas as áreas de Reserva Legal (RLs), que são impostas a
todos os imóveis rurais do Brasil e que seguem regras específicas estabelecidas pelo
CFLO.

Portanto, neste tópico estudaremos os três importantes aspectos das áreas


de Reserva Legal:

2.2.1. Conceito e Natureza Jurídica

São consideradas RLs aquelas localizadas no interior de propriedades ou


posses rurais, delimitadas nos termos do CFLO, com a função de:

• Assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais


do imóvel rural;

• Auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos;

• Promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a


proteção de fauna silvestre e da flora nativa.

162
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Esses ETEPs foram originalmente definidos pelo antigo Código Florestal de


1965 e atualmente estão contemplados no novo Código, consoante apontado
linhas atrás.

Em verdade, são espaços territoriais protegidos em si, mas com função


ecológica geral de contribuir para a manutenção do meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo, por isso visando:

• Ao uso econômico sustentável dos recursos;

• À conservação e reabilitação dos processos ecológicos;

• À conservação da biodiversidade;

• À proteção da fauna silvestre e da flora nativa.

As RLs se constituem em limitações administrativas restritivas e genéricas


do exercício do direito de propriedade, fundadas em sua função socioambiental
(art. 186, inciso II da CR/88), razão pela qual essa limitação foi imposta a todos os
proprietários de imóveis rurais, que são obrigados a reservar parte de suas
propriedades para preservar a vegetação nativa, sem direito a nenhuma
indenização por isso49.

Daí porque o CFLO estabeleceu que as florestas existentes no território


nacional e as demais formas de vegetação nativa, reconhecidas de utilidade às
terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do país,
de modo que os direitos de propriedade são exercidos com as limitações que a
legislação em geral e o próprio código estabelecem.

Assim, aos proprietários, aos possuidores e até mesmo aos meros


ocupantes, pessoas naturais ou jurídicas, de direito público ou privado, de imóveis
rurais são impostas as obrigações de manter e preservar a vegetação nativa dessas
áreas, não podendo promover nelas nenhum tipo de desmatamento. A imagem
abaixo mostra como a RL deve ser mantida:

49 Recurso Especial n.º 1.240.122.

163
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Reserva Legal50

É por isso que existem pequenas áreas com florestas naturais preservadas
em imensas áreas com pastos ou plantações (milho, soja, algodão etc.), muitas
vezes no meio das plantações, conforme se observa facilmente ao longo de algumas
rodovias do Brasil. Elas são RLs, conforme mostra a imagem abaixo:

Reserva Legal51

O CFLO definiu que estas e outras obrigações ambientais, por ele impostas
(manter e preservar a vegetação nativa nas RLs), são propter rem, ou seja, têm
natureza real, razão pela qual se aderem ao próprio imóvel e são transmitidas ao
sucessor no caso de transferência de domínio ou posse da área, de modo que
eventuais intervenções ou desmatamentos promovidos pelo atual proprietário
passarão à responsabilidade do novo proprietário, adquirente da área a qualquer

50 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/reserva-legal_qual-deve-ser-o-tamanho-da-
reserva-legal.html>. Acessado em: 20/12/2020.
51 Fonte: <http://www.mpgo.mp.br/portal/noticia/liminares-determinam-regularizacao-de-areas-

de-protecao-ambiental-em-propriedades-rurais-de-rio-verde#.X98vuthKiUl>. Acessado em:


20/12/2020.

164
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

título, sobre quem recairão as obrigações (propter rem) de recuperação da


vegetação, de mantê-la e preservá-la.

Logo, a vegetação da RL não pode ser suprimida ou desmatada.

Registre-se que as RLs, como espaços territoriais especialmente protegidos


que são, podem ser criadas ou ampliadas por lei (ope legis) ou por ato do poder
público federal, sendo certo que somente poderão ser extintas por lei em sentido
estrito, ainda que tenham sido criadas por decreto, em respeito disposto no art.
225, §1º, inciso III, da Constituição da República:

Art. 225.
[...]
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas
somente através de lei, vedada qualquer utilização que
comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua
proteção;

Observação: por fim, é importante destacar que, diferentemente do que


ocorre nas áreas de preservação permanente (APPs), onde não se admite nenhum
tipo de exploração, o CFLO autorizou a exploração florestal econômica em áreas de
reserva legal – RL.

Desse modo, apesar de a RL não poder ser suprimida, ela poderá ser
utilizada para exploração econômica dos seus produtos florestais, desde que se
observe as seguintes regras:

• Cobertura vegetal: vedadas a descaracterização da cobertura vegetal e


a adoção de práticas que prejudiquem a conservação da vegetação
nativa, devendo-se assegurar a manutenção da diversidade das
espécies;

• Exploração comercial: exige-se prévia aprovação de plano de manejo


florestal sustentável – PMFS52 – por órgão ambiental competente do
SISNAMA para exploração florestal comercial da RL. Os órgãos do
SISNAMA deverão estabelecer procedimentos simplificado53 de

52 Conduzir o manejo de espécies exóticas com a adoção de medidas que favoreçam a regeneração
de espécies nativas.
53 Obrigatória apenas a apresentação de documento de identificação do proprietário ou possuidor

rural e comprovação da propriedade ou posse, além de croqui indicando a área a ser objeto do

165
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

elaboração, análise e aprovação dos PMFS para exploração madeireira


comercial nas pequenas propriedades ou posses rurais familiares54;

• Exploração eventual não comercial para consumo no próprio imóvel


(todas as propriedades): independe de autorização dos órgãos
competentes, devendo apenas ser declarados previamente ao órgão
ambiental a motivação da exploração e o volume explorado, limitada a
exploração anual a 20 (vinte) metros cúbicos;

• Coleta de produtos não madeireiros: é livre a coleta de produtos


florestais não madeireiros, tais como frutos, cipós, folhas e sementes
etc.,55 observando-se os períodos de coleta e os volumes definidos em
regulamento, a época da maturação dos frutos e sementes e as técnicas
que não coloquem em risco as espécies coletadas;

• Pequenas propriedades ou posses rurais familiares56(Apenas as


pequenas propriedades): a exploração florestal eventual, sem propósito
comercial direto ou indireto, para consumo no próprio imóvel (o
suprimento, para uso no próprio imóvel, de lenha ou madeira serrada
destinada a benfeitorias e uso energético nas propriedades e posses
rurais), limitada a retirada anual de material lenhoso a 2 (dois) metros
cúbicos por hectare, não necessita de autorização e nem de prévia
declaração ao órgão ambiental57;

• Suspensão imediata das atividades: é obrigatória a suspensão imediata


das atividades de exploração em RLs desmatadas irregularmente,
consoante assentado pelo STF (ADC 42).

manejo seletivo, estimativa do volume de produtos e subprodutos florestais a serem obtidos com o
manejo seletivo, indicação da sua destinação e cronograma de execução previsto.
54 Aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar

rural e com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.
55 Técnicas que não coloquem em risco a sobrevivência de indivíduos e da espécie coletada no caso

de coleta de flores, folhas, cascas, óleos, resinas, cipós, bulbos, bambus e raízes.
56 Aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar

rural e com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.
57 Não podendo comprometer mais de 15% (quinze por cento) da biomassa da Reserva Legal, nem

ser superior a 15 (quinze) metros cúbicos de lenha para uso doméstico e uso energético, por
propriedade ou posse rural, por ano, salvo no caso de posse coletiva de populações tradicionais ou
de agricultura familiar, cujos limites serão adotados por unidade familiar.

166
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

23. (Advogado da União da AGU. Cebraspe – 2015). De acordo com o Código


Florestal, julgue o próximo item, referente à proteção de florestas e às
competências em matéria ambiental, previstas na Lei Complementar n.º 140/2011.

A regularidade da reserva legal envolve a conservação de sua vegetação nativa, de


modo que a exploração econômica dessa área deve ser feita mediante plano de
manejo sustentável previamente aprovado pelo órgão ambiental competente do
SISNAMA, sem prejuízo da observância das demais normas ambientais pertinentes.

( ) Certo ( ) Errado

Como exceção da exceção, o novo Código Florestal autoriza intervenção e


supressão da vegetação nativa em áreas de RL sem a necessidade de prévio
licenciamento ambiental, para:

• A realização de atividades de baixo impacto ambiental58 (estudadas


linhas atrás) promovidas em pequenas propriedades e posses
familiares,59 que dependerão apenas de simples declaração ao órgão
ambiental competente, desde que o imóvel esteja devidamente inscrito
no CAR.

Com isso, acaba a análise das regras gerais sobre as RLs. Agora será tratado
o tamanho desses espaços especialmente protegidos.

2.2.2. Delimitação das Áreas de Reserva Legal

58 Ressalvados os casos de implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e


efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber, e de
pesquisa científica relativa a recursos ambientais, que necessariamente dependerão de prévio
licenciamento ambiental.
59 Aquela explorada mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar

rural e com área de até quatro módulos fiscais, nos termos do art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.

167
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

O novo CFLO incorporou, com alterações, as regras sobre as áreas de RL


existentes no código florestal de 1965, na Lei Federal n.º 7.803/89 e na medida
provisória n.º 2.166-67/01.

Os tamanhos das RLs foram definidos pelo novo CFLO através do


estabelecimento de percentuais que devem incidir sobre o tamanho total da área
dos imóveis rurais.

Esses percentuais variarão conforme o tipo de bioma e a localização dos


imóveis rurais.

Assim, para imóveis rurais situados fora da Amazônia legal, o percentual de


reserva legal corresponde a 20% (vinte por cento) da sua área total,
independentemente do tipo de bioma.

Reserva Legal de 20%60

Exemplo: os imóveis ruais situados nos Estados da região sul e sudeste,


bem como aqueles situados no Distrito Federal e na região nordeste (salvo parte
do Maranhão), devem reservar 20% (vinte por cento) de sua área para manter e
preservar a vegetação nativa, de modo que nessas áreas resta vedado qualquer tipo
de desmatamento.

Por outro lado, para imóveis rurais situados na Amazônia legal, os


percentuais de reserva legal variam com tipo de bioma da seguinte forma:

• 80% (oitenta por cento): para áreas com florestas;

• 35% (trinta e cinco por cento): para áreas com cerrado;

60Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/reserva-legal_qual-deve-ser-o-tamanho-da-
reserva-legal.html>. Acessado em: 20/12/2020.

168
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• 20% (vinte por cento): para áreas com campos gerais.

Considera-se Amazônia Legal as áreas dos Estados do Acre, Pará,


Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao
norte do paralelo 13º S, dos Estados de Tocantins e Goiás, e ao oeste do meridiano
de 44º W, do Estado do Maranhão.

Amazônia Legal61

É importante ressaltar que os tamanhos das reservas legais – RL – em


imóvel situado em área de formações florestais, de cerrado ou de campos gerais na
Amazônia legal serão definidos considerando-se separadamente os respectivos
percentuais definidos.

Assim, por exemplo, para a definição da reserva legal – RL – de um imóvel


rural situado no Município Porto Velho/RO em que haja os três tipos de bioma
(floresta, cerrado e campos gerais), os percentuais incidirão separadamente em
cada um deles, de modo que neste imóvel a RL equivalerá a 80% da sua área com
floresta, 35% da sua área com cerrado e 20% da sua área com campos gerais.

61Fonte:<https://ambientes.ambientebrasil.com.br/amazonia/floresta_amazonica/floresta_amazoni

ca_-_localizacao.html>. Acessado em: 17/01/2023.

169
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

24. (Juiz de Direito do TJPA. Cebraspe – 2019). Rafael é proprietário de um


imóvel rural com vegetação de floresta no estado do Pará. Esse imóvel deixou de
ter área de reserva legal porque o proprietário anterior a suprimiu. Nessa situação,
Rafael

A) não tem obrigação de reflorestar a referida área, porque não foi ele quem
causou a degradação.

B) deve reflorestar 50% de sua propriedade.

C) deve reflorestar 30% de sua propriedade.

D) deve reflorestar 80% de sua propriedade.

E) deve reflorestar 20% de sua propriedade.

Isto posto, serão abordados os seis aspectos importantes relativos à RL:

O primeiro deles refere-se ao seu registro. A área de RL deve ser averbada


na matrícula do imóvel, no respectivo cartório de registro imobiliário competente
e com gratuidade, sendo certo que essa averbação ficará dispensada quando a RL
for registrada no Cadastro Ambiental Rural – CAR. O registro deve observar ainda:

170
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• A necessária indicação das coordenadas geográficas da RL, com pelo


menos um ponto de amarração, mediante apresentação de planta e
memoria descritivo;

• No caso de posse do imóvel, sem comprovação de propriedade, a RL é


assegurada por termo de compromisso, com força de título executivo
extrajudicial, firmado entre o possuidor e o órgão do SISNAMA, devendo
constar, no mínimo, sua localização e as obrigações assumidas, sendo
certo que a eventual transferência da posse implica a sub-rogação das
obrigações assumidas;

• Para o registro da RL no CAR de pequenas propriedades rurais


familiares,62 assim consideradas aquelas exploradas mediante o
trabalho pessoal do agricultor familiar e empreendedor familiar rural e
com área de até quatro módulos fiscais, o responsável apresentará os
dados identificando a área proposta de RL, cabendo aos órgãos
competentes do SISNAMA, ou instituição por ele habilitada, realizar a
captação das respectivas coordenadas geográficas, sendo gratuito o
registro, que deve ser realizado com apoio técnico e jurídico do Poder
Público.

O segundo aspecto importante refere-se à localização da RL dentro do


imóvel rural, cuja definição caberá ao órgão estadual do SISNAMA, ou instituição
por ele habilitada, após a inscrição do imóvel no CAR.63 A definição da localização
deve observar ainda:

• A possibilidade de formação de corredores ecológicos com outras RLs,


com APPs, com unidades de conservação da natureza e com demais
espaços protegidos;

• A existência de zoneamento ecológico-econômico;

• O plano de bacia hidrográfica;

• As áreas de fragilidade ambiental e aquelas de maior importância para


a biodiversidade;

62Art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.


63Protocolada a documentação exigida para a análise da localização da área de reserva legal, ao
proprietário ou possuidor rural não poderá ser imputada sanção administrativa, inclusive restrição a
direitos, por qualquer órgão ambiental competente integrante do Sisnama, em razão da não
formalização da área de reserva legal.

171
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

O terceiro aspecto relevante refere-se à impossibilidade de alteração da


destinação da área de RL, mesmo quando houver o desmembramento do imóvel
ou sua transmissão a qualquer título.

O quarto aspecto que é preciso destacar refere-se à possibilidade de


diminuição do tamanho das RLs. O CFLO estabelece três possibilidades de redução
do tamanho da RL, que foi originalmente fixada em 80% (oitenta por cento) para
áreas de floresta em imóveis situados na Amazônia legal:

• Redução pelo Município: de 80% (oitenta por cento) para até 50%
(cinquenta por cento) — o Poder Público poderá promover essa
redução, para fins de recomposição, quando o Município tiver mais de
50% (cinquenta por cento) da área ocupada por unidades de
conservação da natureza de domínio público e por terras indígenas
homologadas (Regra declarada constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• Redução pelo Estado-Membro: de 80% (oitenta por cento) para até 50%
(cinquenta por cento) — o Poder Público Estadual, ouvido o Conselho
Estadual do Meio Ambiente, poderá promover essa redução, quando o
Estado tiver Zoneamento Ecológico-Econômico – ZEE – aprovado e tiver
mais de 65% (sessenta e cinco por cento) do seu território ocupado por
unidades de conservação da natureza de domínio público, devidamente
regularizadas, e por terras indígenas homologadas (Regra declarada
constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• Redução pela União: De 80% (oitenta por cento) para até 50%
(cinquenta por cento) — quando indicado pelo Zoneamento Ecológico-
Econômico (ZEE) estadual, realizado segundo metodologia unificada, o
Poder Público Federal poderá promover essa redução em imóveis 64 com
área rural consolidada, exclusivamente para fins de regularização,
mediante recomposição, regeneração ou compensação da RL, excluídas
as áreas prioritárias para conservação da biodiversidade e dos recursos
hídricos e os corredores ecológicos.

O quinto aspecto que é preciso se salientar refere-se à possibilidade de


aumento do tamanho das áreas das RLs. O CFLO dispõe que, quando indicado pelo
Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE) estadual, realizado segundo metodologia

64Neste caso o proprietário ou possuidor de imóvel rural que resolver manter reserva legal — RL —
conservada e averbada em área superior aos novos percentuais reduzidos, evidentemente poderá
instituir servidão ambiental sobre a área excedente e solicitar a emissão de cota de reserva
Ambiental.

172
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

unificada, o Poder Público Federal poderá ampliar as áreas de RL, em qualquer


parte do país, em até 50% (cinquenta por cento) dos percentuais normais, para
cumprimento de metas nacionais de proteção à biodiversidade ou de redução de
emissão de gases de efeito estufa (redução de GEE em respeito aos compromissos
assumidos no Protocolo de Kyoto e no Acordo de Paris).

Por fim, o último aspecto refere-se à possibilidade de se computar as APPs


no cálculo das RLs nos imóveis já registrados no CAR. Esse cômputo não alterará o
regime original de restrições das APPs.

Exemplo: se em um determinado imóvel rural situado na cidade de Morro


do Chapéu/BA, com área total de 100 (cem) hectares, houver uma APP equivalente
a 10 (dez) hectares, decorrente das margens de um rio adjacente à propriedade,
será possível computá-la para alcançar os 20 hectares de RL exigidos pelo CFLO
(vinte por cento da área total do imóvel fora da Amazônia Legal). Desse modo, a RL
de 20 (vinte) hectares será constituída por 10 (dez) hectares de área de reserva
legal propriamente dita e 10 (dez) hectares relativos à APP da margem do rio
adjacente.

Esse cômputo deve observar os seguintes requisitos:

• Esse benefício não pode implicar na conversão de novas áreas para o


uso alternativo do solo, ou seja, não pode autorizar novos
desmatamentos de vegetação nativa, salvo quando a soma das APPs
com as demais florestas e outras formas de vegetação nativa existentes
no imóvel ultrapassarem 80% (oitenta por cento) área total localizada
em áreas de floresta na Amazônia Legal;

• A APP a ser computada65 deve estar conservada ou em processo de


recuperação, conforme comprovação perante o órgão estadual do
SISNAMA;

• O cômputo das APPs em RLs teve sua constitucionalidade declarada pelo


STF no julgamento da ADC n.º 42.

65O cômputo de APPs nas RLs aplica-se a todas as modalidades de cumprimento da reserva legal,
abrangendo a regeneração, a recomposição e a compensação.

173
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

25. (Promotor de Justiça do MPSC. 2016). De acordo com a Lei n. 12.651/12,


será admitido o cômputo da Reserva Legal do imóvel no cálculo do percentual da
Área de Preservação Permanente, desde que: o benefício previsto neste artigo não
implique a conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo; a área a ser
computada esteja conservada ou em processo de recuperação, conforme
comprovação do proprietário ao órgão estadual integrante do Sisnama; o
proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro
Ambiental Rural (CAR), nos termos da referida Lei.

( ) Certo ( ) Errado

Ainda é importante apontar que o CFLO instituiu a denominada Reserva


Legal em Condomínio ou Coletiva, que consiste na possibilidade do
estabelecimento de uma grande área formada pela soma e unificação de diversas
áreas de reserva legal adjacentes vinculadas a vários imóveis rurais, que deve
corresponder ao total de reserva legal exigido de todos os imóveis rurais
participantes.

Exemplo: se os imóveis rurais adjacentes “A”, “B”, “C” e “D”, situados no


Município de Casa Nova/BA, cada um deles com área total de 10 (dez) hectares,
formarem uma Reserva Legal em Condomínio com área total 8 (oito) hectares, será
indiferente se os imóveis “A” ou “B”, por exemplo, reservarem uma área de apenas
10% (dez por cento) (um hectare) para reserva legal, haja vista que a reserva legal
coletiva de 8 (oito) hectares representa exatamente a soma dos 2 (dois) hectares
de reserva legal devidos por cada um deles, de modo que a Reserva Legal Coletiva
compensará as obrigações ambientais de todos.

Por fim, é relevante esclarecer o que se entende por “Reserva Legal”


Excedente, que consiste na manutenção facultativa de área de vegetação nativa
(natural) com tamanho superior a reserva legal mínima exigida. Neste caso, a área
excedente poderá ser utilizada pelo proprietário para criação de servidão ambiental
e até mesmo emissão de Cotas de Reserva Ambiental (CRA) que poderão ser
comercializadas com terceiros para compensar sua RL mínima, conforme já
estudado no tópico das servidões ambientais.

Excepcionalmente, as pequenas propriedades rurais familiares,66 assim


consideradas aquelas exploradas mediante o trabalho pessoal do agricultor familiar

66 Art. 3º da Lei Federal n.º 11.326/06.

174
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

e empreendedor familiar rural e com área de até quatro módulos fiscais, poderão
cumprir a manutenção da área de RJ, não apenas com vegetação nativa (natural),
mas, também, com os plantios de árvores frutíferas, ornamentais ou industriais,
compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio
com espécies nativas da região em sistemas agroflorestais.

2.2.3. Casos de Dispensa da Reserva Legal

O novo CFLO dispensa a obrigação de instituição de áreas de reserva legal


em imóveis rurais em alguns casos, nos quais (excepcionalmente) será possível
explorar e até desmatar a integralidade da vegetação da área do imóvel, sempre
mediante prévia autorização do órgão ambiental competente.

Logo, a instituição de área de reserva legal – RL – restou dispensada em três


casos:

• Em imóveis rurais adquiridos para a implantação de empreendimentos


de abastecimento público de água e tratamento de esgoto (regra
declarada constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• Em imóveis rurais adquiridos ou desapropriados por detentor de


concessão, permissão ou autorização para exploração de potencial de
energia hidráulica, nos quais funcionem empreendimentos de geração
de energia elétrica, subestações ou sejam instaladas linhas de
transmissão e de distribuição de energia elétrica (regra declarada
constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• Em imóveis rurais adquiridos ou desapropriados com o objetivo de


implantação e ampliação de capacidade de rodovias e ferrovias (regra
declarada constitucional pelo STF na ADC n.º 42).

175
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO
26. (Procurador do Estado do Amazonas. Cebraspe – 2016). No que diz
respeito à PNRH, à proteção da vegetação nativa (Lei n.º 12.651/2012) e à
gestão de florestas públicas (Lei n.º 11.284/2006), julgue o item que se
segue.
A manutenção de área com cobertura vegetal nativa, a título de reserva
legal, não é obrigatória para imóveis rurais desapropriados com a finalidade
de exploração de potencial de energia hidráulica (geração de energia
elétrica) e de ampliação de capacidade de rodovias.
( ) Certo ( ) Errado

Portanto, nesses casos a área total (cem por cento) dos imóveis rurais
poderão ser exploradas e desmatadas, sempre com autorização dos órgãos
ambientais, sem a necessidade de constituição de uma RL mínima.

Observação: é importante ressaltar que a inserção do imóvel rural em


perímetro urbano definido mediante lei municipal não desobriga o proprietário ou
possuidor da manutenção da área de RL, que só será extinta concomitantemente
com o registro do parcelamento do solo para fins urbanos, aprovado segundo a
legislação específica e consoante as diretrizes do plano diretor do Município.

Assim, ainda que o Município aprove uma lei ampliando os limites de sua
área urbana para incorporar imóveis que, até então, ficavam em sua área rural,
esses imóveis permaneceram obrigados a manter e preservar a vegetação nativa
em suas RLs, pelo menos até que haja alteração de sua destinação com a aprovação
e o registro de projeto de loteamento urbano nos termos da Lei Federal n.º
6.766/79.

176
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

27. (Juiz de Direito do TJPR. PUC-PR – 2014). O novo Código Florestal (Lei
12.651/2012) traz diversas disposições concernentes à Área de Reserva Legal,
sendo CORRETO afirmar que:

A) Os proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão


de vegetação nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pela
legislação em vigor à época em que ocorreu a supressão são obrigados a promover
a recomposição, compensação ou regeneração para os percentuais exigidos na
nova Lei.

B) A Reserva Legal deve ser conservada com cobertura de vegetação nativa


pelo proprietário do imóvel rural, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa
física ou jurídica, de direito público ou privado, não sendo admitida sua exploração
econômica.

C) A inserção do imóvel rural em perímetro urbano definido mediante lei


municipal desobriga o proprietário ou posseiro na manutenção da área de Reserva
Legal.

D) Todo imóvel rural, localizado em qualquer região do País, deve manter área
com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da
aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os
percentuais mínimos em relação à área do imóvel e excetuados os casos
expressamente previstos na Lei.

Essas áreas de RL são isentas do Imposto Territorial Rural (ITR), nos termos
do art. 10, §1º, inciso II, alínea “a”, da Lei Federal n.º 9.393/96.

2.3. Áreas de Uso Alternativo do Solo – AUAS

177
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Até aqui foi concluída a análise dos aspectos relevantes das áreas de
preservação permanentes – APPs –, das áreas de reserva legal – RLs – e das
chamadas áreas de uso restrito – AURs, todas elas previstas no novo Código
Florestal.

Agora, em conclusão, serão analisadas as áreas de uso alternativo do solo


(AUAS), ressaltando os seguintes aspectos:

2.3.1. Conceito e Regras Gerais

O primeiro aspecto importante a ser estudado refere-se ao conceito da


AUAS, que consiste na área remanescente após descontados todas os ETEPs
eventualmente existentes no imóvel, urbano ou rural, tais coma as APPs, RLs e as
AURs etc.

Portanto, excluídas as APPs, a RL e qualquer outro espaço territorial


protegido, todo o restante da área do imóvel é considerado de uso alternativo do
solo, conforme imagem abaixo:

Área de uso alternativo do solo

APP

Reserva Legal

É nessa AUAS que pode haver a substituição de vegetação nativa por


outras coberturas do solo, como atividades agropecuárias, industriais, de geração
e transmissão de energia, de mineração e de transporte, assentamentos urbanos
ou outras formas de ocupação humana.

178
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Assim, na AUAS o proprietário efetivamente poderá promover livre


exploração, plantando, construindo, minerando etc., portanto, sendo passível de
desmatamento lícito, com prévia autorização do órgão competente do SISNAMA
mediante expedição de Autorização de Supressão Vegetal – ASV.

QUESTÃO

28. (Promotor de Justiça do MPRS. 2016) (adaptada). Assinale a alternativa


que NÃO está de acordo com o disposto na Lei Federal n.º 12.651/2012 do Código
Florestal.

A) Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por


vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a
paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas.

B) Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse


urbana com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos
recursos naturais do imóvel, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos
ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a
proteção de fauna silvestre e da flora nativa.

C) Uso Alternativo do Solo: substituição de vegetação nativa e formações


sucessoras por outras coberturas do solo, como atividades agropecuárias,
industriais, de geração e transmissão de energia, de mineração e de transporte,
assentamentos urbanos ou outras formas de ocupação humana.

D) Manejo Sustentável: administração da vegetação natural para a obtenção


de benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de
sustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa ou
alternativamente, a utilização de múltiplas espécies madeireiras ou não, de
múltiplos produtos e subprodutos da flora, bem como a utilização de outros bens e
serviços.

E) Área Verde Urbana: espaços, públicos ou privados, com predomínio de


vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, previstos no Plano
Diretor, nas Leis de Zoneamento Urbano e Uso do Solo do Município, indisponíveis
para construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer,
melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos,
manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais.

179
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Exemplo: imagina-se a existência de um imóvel rural situado no município


de Luís Eduardo Magalhães/BA, com área total de 10 (dez) hectares, na qual exista
uma APP correspondente à um hectare e uma RL também correspondente à um
hectare. Após a exclusão das áreas relativas à APP e à RL remanescerão 8 (oito)
hectares que corresponderão à área de uso alternativo do solo. Logo, nesses 8 (oito)
hectares remanescentes o proprietário do imóvel poderá promover o
desmatamento lícito da vegetação nativa para a implantação, por exemplo, de
cultivo de soja, milho, algodão etc.

Área que possui APP e RL 67

Apesar de ser livre a exploração, a supressão de vegetação nativa em área


de uso alternativo do solo, pública ou privada, dependerá do cumprimento dos
seguintes requisitos:

• CAR: comprovação do registro do imóvel no cadastro ambiental rural –


CAR;

• ASV: prévia expedição de Autorização de Supressão Vegetal (ASV), a ser


emitida pelo órgão estadual competente do SISNAMA, salvo quando a
supressão for decorrente de procedimento de licenciamento ambiental
para a implementação de determinada atividade, quando então caberá
ao próprio órgão licenciador competente do SISNAMA 68 (federal,
estadual, distrital ou municipal) a concessão da autorização de
supressão;

67 Fonte: <http://www.ciflorestas.com.br/cartilha/reserva-legal_qual-deve-ser-o-tamanho-da-
reserva-legal.html>. Acessado em: 20/12/2020.
68 Art. 13, §2º da Lei Complementar Federal n.º 140/11.

180
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

• Espécies ameaçadas: a supressão de vegetação que abrigue espécie da


flora ou da fauna ameaçada de extinção, segundo lista oficial publicada
pelos órgãos federais, estaduais, distritais ou municipais do SISNAMA,
ou espécies migratórias, dependerá da adoção de medidas
compensatórias e mitigadoras que assegurem a conservação da
espécie;

• Reposição florestal: as pessoas físicas ou jurídicas que detenham


autorização para supressão de vegetação nativa – ASV – também são
obrigadas a promover uma reposição florestal, consoante já estudado.

QUESTÃO

29. (Juiz de Direito do TJSP. Vunesp – 2013). A supressão de vegetação nativa


para uso alternativo do solo depende de

A) autorização do órgão municipal e cadastramento do imóvel no CAR.

B) autorização do órgão federal e cadastramento do imóvel no CAR.

C) autorização do órgão estadual e cadastramento do imóvel no CAR.

D) domínio exclusivamente privado, autorização do órgão federal e


cadastramento do imóvel no CAR.

Especificamente quanto a este último requisito, consoante já estudado,


trata-se da aplicação prática do princípio ambiental do usuário-pagador, segundo o
qual aqueles que se utilizam dos recursos naturais, ainda que licitamente, devem
pagar por sua utilização, haja vista que não são infinitos. Essa ideia fora extraída de
interpretação evolutiva do princípio 16 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento, aprovada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) (Eco 92 ou Cúpula da Terra), aliás
conforme positivado no art. 4º da Lei da PNMA (Lei Federal n.º 6.938/81):

Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará:


[...]
VII - à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de
recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de
contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins
econômicos.

Isso porque a supressão da vegetação nativa com base em Autorização de


Supressão Vegetal (ASV) tem como consequência o desmatamento da área, que se

181
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

destinará ao uso alternativo do solo — AUAS — para plantações, construções etc.,


promovendo uma eliminação de toda e qualquer vegetação existente no local. Esse
é o motivo de se exigir a reposição florestal nesse caso.

Assim, a reposição florestal deve consistir na compensação do volume de


matéria-prima extraído de vegetação natural pelo volume de replantio de espécies
nativas, para geração de estoque ou recuperação de cobertura florestal.

Exemplo: se determinada pessoa, após a emissão de ASV, promover o


desmatamento a corte raso de área de uso alternativo do solo equivalente a 80
(oitenta) hectares, com vegetação nativa esparsa cujo volume equivale a 15
(quinze) hectares, não necessariamente deverá promover uma reposição florestal
de 80 (oitenta) hectares, mas sim uma reposição equivalente ao volume da
vegetação extraída, relativo à 15 (quinze) hectares.

Na reposição florestal deverão ser priorizados projetos que contemplem a


utilização de espécies nativas do mesmo bioma de onde ocorreu a supressão da
vegetação nativa e de deve ser efetivada no Estado-Membro de origem, conforme
determinações do órgão competente do SISNAMA.

É por isso que muitas vezes, ao longo das rodovias do Brasil, podemos
constatar grandes florestas plantadas, sobretudo de eucaliptos, que se destinam à
reposição florestal obrigatória.

Floresta de eucaliptos69

69Fonte:<https://conexaoplaneta.com.br/blog/florestas-do-amapa-correm-risco-de-serem-
dizimadas-por-plantacoes-de-soja-e-eucalipto/>. Acessado em: 17/01/2023.

182
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

Observação: somente a supressão de vegetação nativa (natural, não


plantada pelo homem) é que gerará a obrigação de reposição florestal, daí porque
eventual desmatamento de florestas plantadas não impõe a reposição.

É importante ressaltar que o detentor da ASV (dono da área rural) fica


desonerado da obrigação da reposição florestal, desde que tenha sido promovida
por aquele que comprar e utilizar, como matéria-prima, a madeira e demais
produtos florestais extraídos da vegetação nativa licitamente desmatada.

Registre-se que o requerimento de autorização para supressão vegetal


deve consignar:

• A localização do imóvel, das APPs, da RL e das AURs, por coordenada


geográfica, com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do
imóvel: No caso de supressão da vegetação em APPs, não autorizada
(desmatamento ilícito) e ocorrida após 22 de julho de 2008, é vedada a
concessão de autorização de supressão vegetal – ASV – para área de uso
alternativo do solo – AUAS –, enquanto não for efetivamente promovida
a recomposição da vegetação da APP violada (Regra declarada
constitucional pelo STF na ADC n.º 42);

• A reposição ou compensação florestal: Equivalente ao volume de


madeira e demais produtos que serão extraídos;

• A comprovação da utilização efetiva e sustentável das áreas que já


foram convertidas, ou seja, a comprovação de que as áreas desmatadas
já estão sendo utilizadas para plantação, construção etc.;

• A destinação da área de uso alternativo a ser desmatada: Para


plantação, construção etc.

Por fim, o CFLO proíbe a conversão (desmatamento) de vegetação nativa


para uso alternativo do solo no imóvel rural que possuir áreas abandonadas.
Assim, se no imóvel já houver áreas desmatadas não utilizadas para nenhuma
finalidade, portanto, abandonadas, o órgão ambiental não poderá autorizar novos
desmatamentos na área de uso alternativo do solo (regra declarada constitucional
pelo STF na ADC n.º 42).

183
RAFAEL ROCHA DEMAIS ESPAÇOS TERRITORIAIS ESPECIALMENTE PROTEGIDOS • 4

QUESTÃO

30. (Promotor de Justiça do MPGO. 2019) (adaptada). Segundo o disposto na


Lei Federal n. 12.651/2012 (Código Florestal), é incorreto afirmar que não é
permitida a conversão de vegetação nativa para uso alternativo do solo no imóvel
rural que possuir área abandonada.

( ) Certo ( ) Errado

2.3.2. Áreas de Uso Alternativo do Solo e Controle do


Desmatamento

O segundo aspecto relevante a ser estudo diz respeito ao controle do


desmatamento, definido no CFLO.

Conforme apontado, o desmatamento da vegetação nativa em AUAS só se


legitima mediante prévia expedição de ASV, observando-se as demais condições
legais, sob pena de se caracterizar desmatamento ilegal.

Assim, cabe aos órgãos ambientais do SISNAMA o controle do


desmatamento ambiental, e o embargo de obras e atividades implementadas
através de desmatamentos ilícito e uso do solo de forma irregular, como medida
administrativa voltada a impedir a continuidade do dano ambiental, a propiciar a
regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada.

Vale ressaltar que o embargo deve restringir-se aos locais onde


efetivamente ocorreram desmatamentos ilegais, portanto não alcançando as
atividades de subsistência ou as demais atividades realizadas no imóvel não
relacionadas com a infração.

Por fim, consoante já estudado, as informações sobre o imóvel embargado,


caracterizando o exato local da área embargada e informando em que estágio se
encontra o respectivo procedimento administrativo, devem ser publicadas,
inclusive, por meio da internet e no sistema nacional de informações sobre o meio
ambiente (Sinima), resguardados os dados protegidos pela legislação. O
interessado poderá solicitar ao órgão ambiental a emissão de certidão em que
conste a atividade, a obra e a parte da área do imóvel objetos do embargo.

184
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

SISTEMA NACIONAL E GERENCIAMENTO


5 DE RECURSOS HÍDRICOS - SNGRH

185
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

1. RELEMBRANDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE TUTELA


AMBIENTAL (MTA)

Está sendo estudado o Microssistema Jurídico de Tutela Ambiental (MTA),


que, sob uma ótica mais prática, é basicamente formado por quatro sistemas
principais:

Com o adequado estudo do Sistema Nacional do Meio Ambiente


(SISNAMA) foi possível compreender os seguintes pontos principais:

• Estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para as ações de preservação, fiscalização e recuperação
do meio ambiente no Brasil. Foi possível se apreender a composição e
as atribuições desses órgãos/entidades ambientais (IBAMA, CONAMA
etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SISNAMA. Foi possível se apreender a Política Nacional do Meio
Ambiente (PNMA) e outras associadas, estudando-se os:

• Objetivos: da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do SISNAMA;

• Instrumentos: da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas

186
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades


componentes da estrutura do SISNAMA, para propiciar o cumprimento
dos objetivos da própria PNMA e das demais políticas ambientais
associadas.

Também foi o segundo sistema integrante do MTA: o Sistema Nacional de


Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), no qual foi possível a compreensão
dos seguintes pontos principais:

• Estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para administrar, preservar e fiscalizar as unidades de
conservação da natureza (parques nacionais, por exemplo) no Brasil. Foi
possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (ICMBIO etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SNUC. Foi possível se apreender a Política Nacional de Unidades de
Conservação (PNUC) e outras associadas, estudando-se os:

• Objetivos: da PNUC, e do próprio SNUC, a serem cumpridos, total ou


parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura do
SNUC;

• Instrumentos: instituídos pela Lei da PNUC, e pelas demais políticas


ambientais associadas (pelo código florestal, por exemplo), que se
constituem em genuínas ferramentas jurídicas disponibilizadas
principalmente para os órgãos e entidades componentes da estrutura
do SNUC, para propiciar o cumprimento dos seus objetivos e da PNUC.

Além disso, também foram estudados os Demais Espaços Territoriais


Especialmente Protegidos (DETEPs) (APPs, RLs, AURs, AUAS etc.) previstos na Lei
Federal n.º 12.651/12 (novo código florestal), mas que também seguem as mesmas
regras gerais para criação, alteração, supressão e extinção dos espaços territoriais
protegidos previstos na Lei do SNUC, com as especificidades definidas pelo CFLO.

Agora será analisado o terceiro sistema integrante do MTA — o Sistema


Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH), para se compreender
os seguintes pontos principais:

• Estrutura: constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para a preservar e fiscalizar as águas no Brasil. Será

187
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

possível se apreender a composição e as atribuições desses


órgãos/entidades ambientais (Agência Nacional de Águas e Saneamento
Básico (ANA), CNRH, Comitês de Bacias Hidrográficas etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: deverão ser implementadas, total


ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura
do SINGRH. Será possível se apreender a Política Nacional de Recursos
Hídricos (PNRH) e outras associadas, estudando-se os:

• Objetivos: da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do SINGRH;

• Instrumentos: da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do SINGRH, para propiciar o cumprimento
dos objetivos da própria PNRH e das demais políticas ambientais
associadas.

2. SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS


HÍDRICOS

2.1. Criação do SINGRH

A gestão, classificação e uso das águas foram originalmente disciplinados


pelo nosso código de águas, aprovado pelo vetusto Decreto Federal n.º 24.643/34,
bem como pelo antigo código de águas minerais, aprovado pela Decreto-Lei n.º

188
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

7.841/45, em grande parte não recepcionados pela Constituição da República atual


e, também em grande parte, derrogados pela Lei Federal n.º 9.433/97 e por outras
leis mais recentes, razão pela qual não serão objeto de nosso estudo.

O uso racional dos recursos hídricos foi originalmente previsto como um


dos princípios (diretrizes) da Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA – definida
na Lei Federal n.º 6.938/81 já estudada:

Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo


a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental
propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao
desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança
nacional e à proteção da dignidade da vida humana, atendidos
os seguintes princípios:
[...]
II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar;

Posteriormente, a Constituição da República de 1988 atribuiu à União a


competência para a instituir o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos (SINGRH), atribuindo também a este ente a competência privativa para
legislar sobre águas:

Art. 21. Compete à União:


[...]
XIX - instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos
hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso.

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:


[...]
IV - águas, energia, informática, telecomunicações e
radiodifusão;

Além disso, a propriedade das águas também restou disciplinada na


Constituição da República de 1988:

Art. 20. São bens da União:


[...]
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos
de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de
limites com outros países, ou se estendam a território
estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos
marginais e as praias fluviais;

Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas


superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em

189
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as


decorrentes de obras da União;

Apesar disso, ainda restava pendente sua regulamentação


infraconstitucional. Assim, somente em 14 de dezembro de 1991, poucos meses
antes do início da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento — CNUMAD (Eco 92 ou Cúpula da Terra) –, ocorrida no Rio de
Janeiro/RJ, o Presidente da República encaminhou à Câmara dos Deputados o
projeto de Lei n.º 2.249/91, para a instituição e regulamentação do Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, o SINGRH, em cumprimento ao
desejo do Constituinte de 1988.

O projeto visava a assegurar o uso integrado e harmônico dos recursos


hídricos, considerando a sua crescente importância estratégica para o País, bem
como a eliminar ou, ao menos, minimizar os conflitos existentes quanto ao seu
aproveitamento, o que demandava a criação deste sistema nacional.

A redação final do projeto foi aprovada pelo grupo de trabalho instituído


pelo Decreto Federal n.º 99.400/90, propondo medidas visando ao
estabelecimento da Política Nacional de Recursos Hídricos e a instituição do
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Assim, após longos 6 (seis) anos de tramitação no Congresso Nacional,


finalmente foi aprovada e sancionada a Lei Federal n.º 9.433/97, que instituiu o
Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH) e respectiva
Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH).

Registre-se, por fim, que a Lei Federal n.º 9.433/97 incorporou diversos
princípios básicos para gestão da água previstos na Declaração de Dublin, aprovada
na Conferência Internacional sobre Água e Meio Ambiente realizada em Dublin, na
Irlanda, em janeiro de 1992.

2.2. Estrutura do SINGRH

190
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

O Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH) é


composto pelo conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios responsáveis pela coordenação e gestão integrada das
águas do Brasil.

A estrutura do SINGRH tem a seguinte composição:

Conforme será visto, são esses os órgãos e entidades que promovem a


administração de todas as águas federais e estaduais do Brasil, para manter sua
disponibilidade, sua qualidade e seu uso múltiplo.

Assim, todos os órgãos e entidades municipais, distritais, estaduais e


federais com função de gestão dos recursos hídricos integram a estrutura deste

191
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH), razão pela qual


devem atuar de forma harmônica para:

• Coordenar a gestão integrada das águas;

• Arbitrar administrativamente os conflitos relacionados com os recursos


hídricos;

• Implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos;

• Planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos


recursos hídricos;

• Promover a cobrança pelo uso de recursos hídricos.

Por isso, a partir de agora, será abordada a composição e as atribuições de


cada um desses órgãos e entidades do SINGRH, nos tópicos seguintes.

2.2.1. Conselho Nacional de Recursos Hídricos

O Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) se constitui em órgão


colegiado, consultivo e deliberativo, que atualmente integra a estrutura
administrativa do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR)70 e que detém a
competência normativa para estabelecer diretrizes complementares para a
implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), de observância
obrigatória por todos os demais órgãos do SINGRH.

Exemplo: apesar de se tratar de autarquia estadual, o Instituto do Meio


Ambiente e Recursos Hídricos da Bahia (INEMA) está obrigado a seguir as diretrizes
e critérios gerais para fixação de usos de recursos hídricos considerados
insignificantes estabelecidos na Resolução n.º 184/2016 do CNRH, haja vista que os
atos normativos do Conselho Nacional são de observância obrigatória por todos os
demais órgãos e entidades do SINGRH, ainda que estaduais ou municipais.

Daí porque é o CNRH, sem dúvida, um dos órgãos mais importantes da


estrutura do SINGRH.

Logo, diante das relevantíssimas funções exercidas pelo CNRH, é


importante se perquirir sobre sua composição.

70 Art. 30, inciso IV da Lei Federal n.º 13.844/19.

192
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Ele é presidido pelo Ministro de Estado do Desenvolvimento Regional e


conta com a composição definida pelo Decreto Federal n.º 10.000/19 na seguinte
proporção (mandato de quatro anos)

• 19 (dezenove) representantes dos diversos Ministérios do Poder


Executivo Federal;

• 9 (nove) representantes indicados pelos Conselhos Estaduais de


Recursos Hídricos;

• 6 (seis) representantes dos usuários71 dos recursos hídricos;

• 3 (três) representantes das Organizações Civis de recursos hídricos72:


São os consórcios ou associações de usuários de recursos hídricos,
organizações técnicas e de ensino e pesquisa em recursos hídricos,
organizações não governamentais da área de recursos hídricos ou
outras reconhecidas pelos Conselhos de Recursos Hídricos.

O número de representantes do Poder Executivo Federal não poderá


exceder à metade mais um do total dos membros do Conselho Nacional de
Recursos Hídricos, sendo certo que seu Secretário-Executivo será o titular do órgão
integrante da estrutura do Ministério do Desenvolvimento Regional, responsável
pela gestão dos recursos hídricos (Departamento de Recursos Hídricos e de
Revitalização de Bacias Hidrográficas).

Além de exercer a importante função normativa do sistema, quanto aos


recursos hídricos, o CNRH ainda exerce as seguintes atribuições:

• Promover a articulação do planejamento de recursos hídricos com os


planejamentos nacional, regional, estaduais e dos setores usuários;

• Arbitrar, em última instância administrativa, os conflitos existentes


entre Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos;

• Deliberar sobre os projetos de aproveitamento de recursos hídricos


cujas repercussões extrapolem o âmbito dos Estados em que serão
implantados;

71 A Resolução n.º 126/11 — CNRH — instituiu o Cadastro de Usuários de Recursos Hídricos (COREH)
para fins de habilitação para atuação no Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH).
72 A Resolução n.º 106/10 — CNRH — instituiu o Cadastro de Organizações Civis de Recursos

Hídricos (COREH) para fins de conhecimento da demanda pelo uso da água.

193
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Deliberar sobre as questões que lhe tenham sido encaminhadas pelos


Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos ou pelos Comitês de Bacia
Hidrográfica;

• Analisar propostas de alteração da legislação pertinente a recursos


hídricos e à Política Nacional de Recursos Hídricos;

• Estabelecer diretrizes complementares para implementação da Política


Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), aplicação de seus instrumentos
e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
(SINGRH);

• Aprovar propostas de instituição dos Comitês de Bacia Hidrográfica e


estabelecer critérios gerais para a elaboração de seus regimentos: Após
a aprovação da proposta de decreto de criação pelo CNRH, a instituição
de Comitês de Bacia Hidrográfica em rios de domínio da União será
efetivada por ato do Presidente da República;

• Acompanhar a execução e aprovar o Plano Nacional de Recursos


Hídricos e determinar as providências necessárias ao cumprimento de
suas metas;

• Estabelecer critérios gerais para a outorga de direitos de uso de


recursos hídricos e para a cobrança por seu uso.

Por fim, vale destacar que a Secretária-Executiva deve prestar apoio


administrativo, técnico e financeiro ao CNRH e instruir os expedientes originários
dos Conselhos Estaduais e dos Comitês de Bacia Hidrográficas, além de elaborar seu
programa de trabalho e respectiva proposta orçamentária anual a ser submetida à
aprovação do CNRH.

Portanto, o CNRH consiste em um dos órgãos mais relevantes do SINGRH.

2.2.2. Agência Nacional de Águas e Saneamento


Básico

A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) consiste em


autarquia federal sob regime especial, com certa autonomia administrativa e
financeira, vinculada atualmente ao Ministério do Desenvolvimento Regional

194
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

(MDR)73 e responsável pela implementação, no âmbito de suas competências, da


Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH).

Ela é dirigida por uma Diretoria Colegiada composta por 5 (cinco) membros
nomeados pelo Presidente da República, após aprovação do Senado Federal, para
mandatos não coincidentes de 5 (cinco) anos, vedada a recondução, sendo um
deles o Diretor-Presidente, e terá em sua estrutura uma Procuradoria (da
Procuradoria-Geral Federal, vinculada à Advocacia-Geral da União), uma Ouvidoria
e uma Auditoria.

A atuação da ANA obedecerá aos fundamentos, objetivos, diretrizes e


instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e será desenvolvida
em articulação com órgãos e entidades públicas e privadas integrantes do Sistema
Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGRH).

Registre-se, por fim, que a ANA poderá delegar ou atribuir a agências de


água ou de bacia hidrográfica a execução de atividades de sua competência.

2.2.3. Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos

Os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos (CONERH) devem ser


instituídos pelos respectivos Estados-Membros, com a composição e as atribuições
definidas pela legislação local.

Da Lei Federal n.º 9.433/97 é possível se extrair as seguintes atribuições


mínimas dos Conselhos Estaduais:

• Instância recursal de decisões dos Comitês de Bacia Hidrográfica


estaduais;

• Indicar representantes para o CNRH;

• Definir captações e lançamentos insignificantes em águas estaduais;

• Autorizar a criação de agências de águas em bacias estaduais;

• Demais atribuições fixadas pela legislação estadual.

Portanto, as atribuições desses Conselhos Estaduais serão definidas pela


legislação estadual.

73 Art. 66 da Lei Federal n.º 13.844/19.

195
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

2.2.4. Comitês de Bacias Hidrográficas

Os Comitês de Bacia Hidrográfica são órgãos colegiados com atribuições


normativos, deliberativas e consultivas sobre a respectiva bacia hidrográfica74 cuja
criação dependerá de aprovação do respectivo Conselho de Recursos Hídricos a
quem deve se reportar diretamente.

Esses Comitês terão como área de atuação:

• A totalidade de uma bacia hidrográfica;

• A sub-bacia hidrográfica de tributário do curso de água principal da


bacia, ou de tributário desse tributário;

• O grupo de bacias ou sub-bacias hidrográficas contíguas.

Relembre-se que a bacia hidrográfica ou bacia de drenagem é a área por


onde a água da chuva escorre para um rio principal e seus afluentes, em razão do
relevo e da geografia local. A geografia da região da bacia conduz a água por
riachos e rios menores que seguirão para um rio principal situado no ponto mais
baixo do relevo.

Daí porque a bacia hidrográfica é formada, muitas vezes, por rios federais
e rios pertencentes a mais de um Estado-Membro. Assim, é importante destacar
que somente os Comitês de Bacias Hidrográficas, cujos cursos de água principais
sejam de domínio da União, serão vinculados ao Conselho Nacional de Recursos
Hídricos.

A Resolução n.º 32/03 – CNRH – instituiu a Divisão Hidrográfica Nacional


para estabelecer uma base organizacional que contemple bacias hidrográficas
como unidade do gerenciamento de recursos hídricos para a implementação da
Política Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos. Considera-se como região hidrográfica o espaço territorial
brasileiro compreendido por uma bacia, grupo de bacias ou sub-bacias
hidrográficas contíguas com características naturais, sociais e econômicas
homogêneas ou similares, com vistas a orientar o planejamento e gerenciamento
dos recursos hídricos:

74 Resolução n.º 5/00 — CNRH

196
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Divisões das bacias hidrográficas nacionais (colocar rodapé)

Os Comitês de Bacia Hidrográfica possuem a seguinte composição:

• Representantes da União: em bacias compostas por rios fronteiriços e


transfronteiriços de gestão compartilhada a representação da União
deverá incluir um representante do Ministério da Relações Exteriores.
A participação da União nos Comitês de Bacia Hidrográfica de atuação
restrita a rios estaduais dar-se-á na forma estabelecida nos respectivos
regimentos;

• Representantes dos Estados e do Distrito Federal em cujos territórios se


situem, ainda que parcialmente, suas respectivas áreas de atuação;

• Representantes dos Municípios situados, no todo ou em parte, em sua


área de atuação;

• Representantes dos usuários das águas de sua área de atuação;

• Representantes das entidades civis de recursos hídricos com atuação


comprovada na bacia;

197
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Representantes da Fundação Nacional do Índio – FUNAI – (como parte


da representação da União) e das comunidades indígenas ali residentes
ou com interesse na bacia, nos Comitês cujos territórios das bacias
abranjam terras indígenas.

QUESTÃO

31. (Procurador do Estado da PGE/BA. Cebraspe – 2014). Os comitês de bacia


hidrográfica são constituídos por usuários das águas e por entidades civis de
recursos hídricos com atuação comprovada na bacia, entre outros membros,
conforme dispõe a Lei n.º 9.433/1997.

( ) Certo ( ) Errado

É importante destacar que os Comitês de Bacia Hidrográfica serão dirigidos


por um Presidente e um Secretário eleitos por seus membros.

Registre-se, ainda, que o número de representantes de cada setor e os


critérios para sua indicação serão estabelecidos nos regimentos dos comitês,
limitada a representação dos Poderes Executivos da União, Estados, Distrito Federal
e Municípios à metade do total de membros.

As competências dos Comitês de Bacia estão definidas na própria Lei


Federal n.º 9.433/97:

• Promover o debate das questões relacionadas a recursos hídricos e


articular a atuação das entidades intervenientes;

• Arbitrar, em primeira instância administrativa, os conflitos


relacionados aos recursos hídricos;

• Aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia;

• Acompanhar a execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e


sugerir as providências necessárias ao cumprimento de suas metas;

• Propor ao Conselho Nacional e aos Conselhos Estaduais de Recursos


Hídricos as acumulações, derivações, captações e lançamentos de pouca
expressão, para efeito de isenção da obrigatoriedade de outorga de
direitos de uso de recursos hídricos, de acordo com os domínios destes;

• Estabelecer os mecanismos de cobrança pelo uso de recursos hídricos


e sugerir os valores a serem cobrados;

198
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Estabelecer critérios e promover o rateio de custo das obras de uso


múltiplo, de interesse comum ou coletivo.

Por fim, é relevante destacar que, das decisões dos Comitês de Bacia
Hidrográfica75 caberá recurso ao Conselho Nacional ou aos Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos, de acordo com sua esfera de competência.

QUESTÃO

32. (Juiz Federal do TRF5. Cebraspe – 2017).

Os comitês de bacias hidrográficas são

A) competentes para implantar e gerir o Sistema Nacional de Informações


sobre Segurança de Barragens.

B) competentes para outorgar o direito de uso de recursos hídricos em corpos


de água de domínio da União, mediante permissão.

C) incompetentes para aprovar o Plano de Recursos Hídricos da bacia.

D) incompetentes para arbitrar administrativamente conflitos relacionados a


recursos hídricos.

E) incompetentes para o exercício do poder de polícia.

2.2.5. Órgãos dos Poderes Públicos Federal,


Estaduais, do Distrito Federal e Municipais de
Gestão de Recursos Hídricos

Todos os órgãos e entidades estaduais, distritais e municipais cujas


competências se relacionem com a gestão de recursos hídricos também integram
o SINGRH, razão pela qual também devem se submeter às normas emanadas do
Conselho Nacional de Recursos Hídricos.

2.2.6. Agências de Água

As Agências de Água são órgãos que exercem as funções administrativas de


secretaria-executiva do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica
cuja criação dependerá de aprovação do Conselho Nacional de Recursos Hídricos

75Os Comitês de Bacia Hidrográfica cujo curso de água principal seja de domínio da União serão
vinculados ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos, nos termos do art. 1º, §2º da Resolução n.º
05/00 — CNRH.

199
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

ou dos respectivos Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, mediante solicitação


de um ou mais Comitês de Bacia Hidrográfica.

Portanto, são órgãos que se reportam diretamente aos Comitês de Bacia


Hidrográfica. Sua criação depende da comprovação de viabilidade financeira
assegurada pela cobrança do uso dos recursos hídricos em sua área de atuação, e
da prévia existência do respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica que
serão secretariados.

Consoante apontado no art. 44 da Lei Federal n.º 9.433/97, compete às


Agências de Água:

• Manter balanço atualizado da disponibilidade de recursos hídricos em


sua área de atuação;

• Manter o cadastro de usuários de recursos hídricos;

• Efetuar, mediante delegação do outorgante, a cobrança pelo uso de


recursos hídricos;

• Analisar e emitir pareceres sobre os projetos e obras a serem


financiados com recursos gerados pela cobrança pelo uso de Recursos
Hídricos e encaminhá-los à instituição financeira responsável pela
administração desses recursos;

• Acompanhar a administração financeira dos recursos arrecadados com


a cobrança pelo uso de recursos hídricos em sua área de atuação;

• Gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos em sua área de


atuação;

• Celebrar convênios e contratar financiamentos e serviços para a


execução de suas competências;

• Elaborar a sua proposta orçamentária e submetê-la à apreciação do


respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica;

• Promover os estudos necessários para a gestão dos recursos hídricos


em sua área de atuação;

• Elaborar o Plano de Recursos Hídricos para apreciação do respectivo


Comitê de Bacia Hidrográfica;

• Propor ao respectivo ou respectivos Comitês de Bacia Hidrográfica:

200
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

a) o enquadramento dos corpos de água nas classes de uso, para


encaminhamento ao respectivo Conselho Nacional ou Conselhos
Estaduais de Recursos Hídricos, de acordo com o domínio destes;

b) os valores a serem cobrados pelo uso de recursos hídricos;

c) o plano de aplicação dos recursos arrecadados com a cobrança pelo


uso de recursos hídricos;

d) o rateio de custo das obras de uso múltiplo, de interesse comum ou


coletivo.

Por fim, destaca-se que, enquanto não estiverem constituídas as Agências


de Água, o Conselho Nacional de Recursos Hídricos e os Conselhos Estaduais de
Recursos Hídricos poderão delegar o exercício das funções de competência das
Agências às organizações civis de recursos hídricos, por prazo determinado.77

2.3. Política Nacional de Recursos Hídricos

A Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH – foi instituída pela Lei


Federal n.º 9.433/97 com as finalidades gerais de assegurar o uso integrado e
harmônico dos recursos hídricos, considerando a sua crescente importância
estratégica para o País, e de eliminar ou, ao menos, minimizar os conflitos
existentes quanto ao seu aproveitamento.

77Exemplo: Resolução n.º 38/04 — CNRH — que delegou atribuições que seriam da agência de água
da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul à Associação Pró-Gestão das Águas da Bacia Hidrográfica
do Rio Paraíba do Sul, pelo prazo de 2 anos.

201
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Ela deve ser implementada pelos órgãos e entidades que compõem a


estrutura do SINGRH, e se baseia em relevantes fundamentos:

O primeiro fundamento da PNRH refere-se à dominialidade das águas, que


são totalmente públicas desde a Constituição da República de 1988. A água,
portanto, é um bem de domínio público, partilhado entre a União e os Estados-
Membros, nos termos da Constituição da República:

Art. 20. São bens da União:


[...]
III - os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos
de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de
limites com outros países, ou se estendam a território
estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos
marginais e as praias fluviais;

Art. 26. Incluem-se entre os bens dos Estados: I - as águas


superficiais ou subterrâneas, fluentes, emergentes e em
depósito, ressalvadas, neste caso, na forma da lei, as
decorrentes de obras da União;

Deveras, os rios, lagos e lagoas são bens públicos desde a Constituição da


República de 1934, nos termos do seu art. 20, incisos I e II, e do seu art. 21, inciso
I, c/c art. 29 do Decreto n.º 24.643/34 (código de águas). Contudo, somente com a
Constituição da República atual houve a expressa publicização das águas

202
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

subterrâneas (aquíferos), das nascentes (águas emergentes) e das águas em


depósito.

Registre-se que os Municípios não possuem domínio sobre as águas


nacionais, que são de propriedade da União e dos Estados-Membros, consoante
apontado acima.

É importante ressaltar que pertencem à União os potenciais de energia


hidráulica (gerada por usinas hidrelétricas), que se destaca da propriedade das
águas em si, ainda que situados em rios estaduais, nos termos do art. 20 da
Constituição da República:

Art. 20. São bens da União:


[...]
VIII - os potenciais de energia hidráulica;

Daí porque compete à União a concessão de potenciais de energia


hidráulicas para geração de energia elétrica em qualquer curso d’água do Brasil,
ainda que de propriedade dos Estados-Membros.

O segundo fundamento da PNRH refere-se à água como recurso natural


limitado e dotado de valor econômico. Logo, em se tratando de recurso limitado,
seu uso deve ser racional de modo a manter o nível de sua disponibilidade para as
atuais e futuras gerações. Daí porque também deve ser dotada de valor econômico,
pois isso seguramente induzirá o uso sem desperdícios.

Lembremos aqui que apenas 2,5% da água existente na Terra é doce, e


somente cerca de 0,7% está disponível para o abastecimento das cidades e
atendimento dos animais.78

Portanto, com base neste importante fundamento, a PNRH deve promover


a conscientização da população sobre a necessidade do uso eficiente dos recursos
hídricos, e propiciar a efetiva cobrança pelo seu uso, conforme veremos mais à
frente.

O terceiro fundamento da PNRH refere-se aos usos prioritários dos recursos


hídricos em casos de escassez, quais sejam: O consumo humano e a dessedentação
de animais (saciar a sede dos animais).

78Fonte: <https://conselhonacionaldaagua.weebly.com/aacutegua-no-planeta-terra.html>.
Acessado em: 17/01/2023.

203
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Assim, a PNRH deve ser implementada de tal forma que garanta o uso
prioritário das águas para consumo humano e dessedentação de animais, se
constatada situação de escassez de água.

Daí porque, nesses casos (escassez), os demais usos dos recursos hídricos
destinados a contemplar atividades industriais, de irrigação, de navegabilidade, de
geração de energia elétrica etc., podem ser suspensos para garantir os usos
prioritários (consumo humano e dessedentação de animais).

QUESTÃO

33. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2016).

A Lei Federal n. 9.433/1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos,


prevê o uso prioritário das águas para fins energéticos.

( ) Certo ( ) Errado

O quarto fundamento da PNRH estabelece que a gestão dos recursos


hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas, ou seja, deve
propiciar os diversos usos das águas para o consumo humano, para saciar os
animais, para atender a demanda do setor industrial, para as irrigações do setor
agrícola, para usos recreativos, para a navegabilidade etc.

QUESTÃO

34. (Procurador do Estado da PGE/AM. Cebraspe – 2016). No que diz respeito


à PNRH, à proteção da vegetação nativa (Lei n.º 12.651/2012) e à gestão de
florestas públicas (Lei n.º 11.284/2006), julgue o item que se segue. Conforme os
fundamentos da PNRH, a gestão de tais recursos deve sempre proporcionar o uso
múltiplo das águas.

( ) Certo ( ) Errado

Demais disso, o quinto fundamento da PNRH refere-se à bacia hidrográfica


como unidade territorial básica para implementação desta Política Nacional e
atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGRH.

204
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Logo, os Municípios não são considerados unidade territorial básica para a


implementação da PNRH, e sim a bacia hidrográfica.

QUESTÃO

35. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). Dentre os


fundamentos em que a Política Nacional de Recursos Hídricos se baseia, está
definida a bacia hidrográfica como a unidade territorial para implementação da
Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos.

( ) Certo ( ) Errado

Relembre-se que a bacia hidrográfica ou bacia de drenagem é a área por


onde a água da chuva escorre para um rio principal e seus afluentes, em razão do
relevo e da geografia local. A geografia da região da bacia conduz a água por riachos
e rios menores que seguirão para um rio principal situado no ponto mais baixo do
relevo.

A gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a


participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades, sendo este o
último fundamento da PNRH. É exatamente por isso que os órgãos colegiados
(Conselhos de Recursos Hídricos, Comitês de Bacia etc.) são compostos por
representantes do Poder Público, dos usuários e de organizações civis de recursos
hídricos, conforme já estudamos na estrutura do SINGRH.

Assim, na implementação da PNRH e considerando os fundamentos


apontados acima, compete ao Poder Executivo federal:

• Tomar as providências necessárias à implementação e ao


funcionamento do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos – SINGRH;

• Outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e


fiscalizar os usos, na sua esfera de competência: Em rios federais;

• Implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em


âmbito nacional;

205
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão


ambiental.

Aos Poderes Executivos estaduais e do Distrito Federal, na implementação


da PNRH em suas respectivas esferas de competência e à semelhança do que ocorre
com o Poder Executivo Federal, compete:

• Outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e


fiscalizar os seus usos: Em rios estaduais;

• Realizar o controle técnico das obras de oferta hídrica;

• Implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em


âmbito estadual e do Distrito Federal;

• Promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão


ambiental.

Vale ressaltar que os Municípios também participam da implementação


da PNRH promovendo, com os Poderes Executivos estaduais, a integração das
políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e
de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos.

Logo, os Municípios deverão integrar suas políticas urbanas de saneamento


básico, de ocupação do solo (plano diretor) e de meio ambiente às políticas federal
e estaduais de uso da água.

Em conclusão, é importante ressaltar que devem ser observadas as


seguintes diretrizes gerais de ação para a implementação da PNRH:

• A gestão sistemática dos recursos hídricos, sem dissociação dos


aspectos de quantidade e qualidade;

• A adequação da gestão de recursos hídricos às diversidades físicas,


bióticas, demográficas, econômicas, sociais e culturais das diversas
regiões do País;

• A integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental;

• A articulação do planejamento de recursos hídricos com o dos setores


usuários e com os planejamentos regional, estadual e nacional;

• A articulação da gestão de recursos hídricos com a do uso do solo;

206
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• A integração da gestão das bacias hidrográficas com a dos sistemas


estuarinos e zonas costeiras.

Por fim, a União deve se articular com os Estados-Membros para o


gerenciamento dos recursos hídricos de interesse comum.

2.4. Objetivos

Os órgãos e entidades que compõem a estrutura do SINGRH devem


implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH –, respeitando seus
fundamentos e suas diretrizes gerais de ação, para a consecução dos 4 (quatro)
objetivos elegidos pelo art. 2º da Lei Federal n.º 9.433/97, consistentes em:

207
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

O primeiro objetivo da PNRH visa a assegurar à atual e às futuras gerações


a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos
respectivos usos, razão pela qual os órgãos da estrutura do SINGRH devem adotar
todas as medidas de conscientização, fiscalização e controle dos recursos hídricos
previstas na Lei Federal n.º 9.433/97 para garantir níveis permanentes de águas
com qualidade suficiente para os diversos usos.

Trata-se do objetivo fundamental da PNRH, razão pela qual o Constituinte


originário determinou a instituição do SINGRH.

Daí porque também se constitui em objetivo da PNRH a prevenção e a


defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do
uso inadequado dos recursos naturais, com o propósito de manter a perene
disponibilidade dos recursos hídricos a longíssimo prazo para atender as demandas
da sociedade e dos animais, mesmo diante de eventos hidrológicos críticos (secas
prolongadas etc.).

Também foi por isso que a Lei Federal n.º 13.501/17 incluiu entre os
objetivos da PNRH o incentivo e a promoção da captação, da preservação e do
aproveitamento de águas pluviais, de modo a fomentar e financiar ações que
propiciem às pessoas o depósito das águas das chuvas, para diminuir a pressão de
demanda das águas dos rios, lagos, lagoas e aquíferos.

Por fim, a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo


o transporte aquaviário, com vistas ao desenvolvimento sustentável é também
objetivo da PNRH, novamente com o propósito de manter a disponibilidade da
água de forma permanente, inclusive para a navegação.

2.5. Instrumentos

208
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Consoante vimos, os órgãos e entidades que compõem a estrutura do


SINGRH devem implementar a Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH – e
cumprir seus objetivos.

Para isso, esses órgãos do SINGRH deverão se utilizar do conjunto de


instrumentos ambientais que foram disponibilizados pela Lei Federal n.º 9.433/97
para propiciar o efetivo cumprimentos desses objetivos. Portanto, esses
instrumentos ambientais se constituem em verdadeiras ferramentas jurídicas
fundamentais para a efetiva implementação da PNRH e dos seus objetivos.

Daí porque a correta compreensão desses instrumentos é essencial para se


estabelecer o adequado raciocínio jurídico-ambiental sobre o tema dos recursos
hídricos.

Assim, por exemplo, a ANA (entidade da estrutura do SINGRH) poderá se


utilizar da outorga (um dos instrumentos da PNRH) para assegurar à atual e às
futuras gerações a necessária disponibilidade de água (um dos objetivos da PNRH)
através do controle do uso da água para consumo humano, irrigação etc.,
propiciando – com isso – a implementação da própria PNRH.

Portanto, por essas razões passaremos ao estudo dos seguintes


instrumentos da PNRH:

Registre, desde já, que a compensação a Municípios, embora prevista no


rol de instrumentos da PNRH, restou vetada no art. 24 da Lei Federal n.º 9.433/97,
razão pela qual não está disponível.

209
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

QUESTÃO

36. (Juiz Federal do TRF2. 2018). De acordo a Lei n. 9.433/97, são instrumentos
da Política Nacional de Recursos Hídricos:

A) a compensação a Estados membros da Federação.

B) a outorga dos direitos de disposição de recursos hídricos.

C) a cessão gratuita pelo uso de recursos hídricos.

D) a gestão centralizada dos recursos hídricos.

E) os Planos de Recursos Hídricos.

Vamos ver cada um dos instrumentos nos tópicos seguintes.

2.5.1. Outorgas

Consoante vimos linhas atrás, as águas são totalmente públicas desde a


Constituição da República de 1988, sendo, portanto, bens de domínio público
pertencentes à União e aos Estados-Membros.

Assim, sendo bens públicos, as águas só podem ser utilizadas com prévia
autorização do seu respectivo Ente Federado proprietário.

Essa prévia autorização estatal traduz-se na outorga dos direitos de uso de


recursos hídricos, instrumento da PNRH consistente em ato administrativo de
consentimento estatal necessário para a utilização dos recursos hídricos e que
confere ao seu beneficiário o simples direito de seu uso, por tempo determinado.

Logo, a outorga não acarreta a alienação, total ou parcial das águas, que
são inalienáveis, mas o simples direito de seu uso, condicionado à disponibilidade
hídrica e a eventual regime de racionamento. Seu prazo de validade não pode
exceder a 35 (trinta e cinco) anos, renováveis, contados da data da publicação do
respectivo ato administrativo que confere a outorga, respeitados os seguintes
limites de prazo79 parciais (intermediários):

79Os prazos de vigência das outorgas de direito de uso de recursos hídricos serão fixados em função
da natureza e do porte do empreendimento, levando-se em consideração, quando for o caso, o
período de retorno do investimento.

210
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Até dois anos, para início da implantação do empreendimento objeto


da outorga;

• Até seis anos, para conclusão da implantação do empreendimento


projetado.

O outorgado interessado em renovar sua outorga deverá apresentar


requerimento, com antecedência mínima de 90 (noventa) dias da data de término
da outorga, que ficará automaticamente prorrogada até que ocorra deferimento
ou indeferimento do referido pedido.

É importante ressaltar que a outorga do direito de uso das águas conferida


originalmente ao outorgado comporta transferência a terceiros, por alienação ou
cessão, conservando-se as mesmas características e condições da outorga original,
podendo ser feita, total ou parcialmente, quando aprovada pela autoridade
outorgante, que providenciará novo ato administrativo indicando o novo titular.

Frise-se que o regime de outorga de direitos de uso de recursos hídricos


tem como objetivos assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos das
águas e do seu efetivo exercício dos direitos de acesso a ela, e deve preservar seus
usos múltiplos.

Assim, estão sujeitos a prévia outorga pelo Poder Público os direitos dos
seguintes usos de recursos hídricos, atendidos sempre os critérios gerais previsto
na Resolução n.º 16/01 – CNRH:

• Derivação ou captação de parcela da água existente em um corpo de


água para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo
de processo produtivo: Derivar significa desviar a água do seu curso
original através da ação humana;

• Extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou


insumo de processo produtivo: Portanto, mesmo para a perfuração de
poços artesianos se faz necessária a outorga do Poder Público;

• Lançamento em corpo de água de esgotos e demais resíduos líquidos


ou gasosos, tratados ou não, com o fim de sua diluição, transporte ou
disposição final: O lançamento de esgoto em corpos de água deve
observar as condições e os padrões definidos pelas Resoluções n.º
357/05 e n.º 430/11 do Conama;

211
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Aproveitamento dos potenciais hidrelétricos: Neste caso a outorga


estará subordinada ao Plano Nacional de Recursos Hídricos, estudado
mais à frente. Além disso, para licitar a concessão ou autorizar o uso de
potencial de energia hidráulica, a Agência Nacional de Energia Elétrica –
ANEEL – deverá promover, junto à autoridade outorgante competente,
a prévia obtenção de declaração de reserva de disponibilidade
hídrica;80

• Outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água


existente em um corpo de água: A construção de eclusa ou de outro
dispositivo de transposição hidroviária de níveis em corpo de água de
domínio da União serão precedidas de declaração de reserva de
disponibilidade hídrica81 a ser requerida pelo Ministério dos Transportes
ou pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ –,
conforme o caso. Quando o corpo de água for de domínio dos Estados
ou do Distrito Federal, a declaração de reserva de disponibilidade hídrica
será obtida em articulação com a respectiva unidade gestora de
recursos hídricos, conforme a legislação do Estado-Membro.

Além disso, a concessão da outorga deverá observar os planos de recursos


hídricos e, em especial:

• As prioridades de uso estabelecidas;

• A classe em que o corpo de água estiver enquadrado, em consonância


com a legislação ambiental;

• A preservação dos usos múltiplos previstos;

• A manutenção das condições adequadas ao transporte aquaviário,


quando couber.

Vale ressaltar que a outorga de direito de uso de recursos hídricos para


concessionárias e autorizadas de serviços públicos e de geração de energia
hidrelétrica, bem como suas prorrogações, vigorará por prazo coincidente com o

80 Nos termos do art. 11, §1º da Resolução n.º 16/01 — CNRH — a declaração de reserva de
disponibilidade hídrica será transformada, pela respectiva autoridade outorgante, em outorga de
direito de uso de recursos hídricos à entidade que receber da ANEEL a concessão ou a autorização
de uso do potencial de energia hidráulica.
81 A declaração de reserva de disponibilidade hídrica será transformada automaticamente pelo

respectivo poder outorgante em outorga de direito de uso de recursos hídricos à instituição ou


empresa que for responsável pela construção e operação de eclusa ou de outro dispositivo de
transposição hidroviária de níveis.

212
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

do correspondente contrato de concessão ou ato administrativo de autorização,


sendo ela uma condição para o licenciamento ambiental destas atividades.

Portanto, é relevantíssimo destacar que, sempre que se tratar de atividades


ou empreendimentos potencialmente poluidores e que também se utilizarão de
recursos hídricos (Projetos agropecuários com irrigação, abertura de canais para
navegação, barragens hidrelétricas etc. 82), serão necessários o prévio licenciamento
ambiental e a outorga de usos de água, sendo certo que a outorga se constituirá
em uma das condições para o licenciamento ambiental destas atividades .83

Por fim, a outorga efetivar-se-á por ato da autoridade competente do Poder


Executivo Federal, dos Estados ou do Distrito Federal, observando-se que o Poder
Executivo Federal indicará, por decreto, a autoridade responsável pela efetivação
de outorgas de direito de uso dos recursos hídricos sob domínio da União, conforme
abaixo:

• Competência da União: A Agência Nacional de Águas e Saneamento


Básico – ANA – exercerá essa competência, dará publicidade aos
pedidos de outorga de direito de uso de recursos hídricos federais por
meio de publicação em seu sítio eletrônico, e publicará os atos
administrativos que deles resultarem no Diário Oficial da União e em site
eletrônico. Serão considerados, nos casos de bacias hidrográficas
compartilhadas com outros países, os respectivos acordos e tratados
internacionais;

• Competência dos Estados-Membros: Exercida pelo órgão gestor dos


recursos hídricos definido pela legislação do respectivo Estado-Membro.

O Poder Executivo Federal poderá delegar 84 aos Estados e ao Distrito


Federal a competência para concessão de outorga de direito de uso de recurso
hídrico de domínio da União.

A legislação da ANA ainda estabelece a possibilidade de concessão de


outorgas preventivas de uso de recursos hídricos, que não confere o imediato

82 Art. 2º, inciso VII da Resolução n.º 001/86 — Conama.


83 Art. 10, §1º da Resolução n.º 273/97 — Conama: No procedimento de licenciamento ambiental
deverá constar, obrigatoriamente, a certidão da Prefeitura Municipal, declarando que o local e o
tipo de empreendimento ou atividade estão em conformidade com a legislação aplicável ao uso e
ocupação do solo e, quando for o caso, a autorização para supressão de vegetação e a outorga para
o uso da água, emitidas pelos órgãos competentes.
84 A ANA poderá delegar ou atribuir a agências de água ou de bacia hidrográfica a execução de

atividades de sua competência.

213
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

direito de uso desses recursos, mas tem a finalidade de declarar a disponibilidade


de água e reservar a vazão passível de outorga, possibilitando, aos investidores, o
planejamento de empreendimentos que necessitem desses recursos. O prazo de
validade da outorga preventiva será fixado levando-se em conta a complexidade
do planejamento do empreendimento, limitando-se ao máximo de três anos.

Além disso, é importante destacar que a Lei Federal n.º 9.433/97


estabeleceu casos de uso de recursos hídricos que independem de outorga pelo
Poder Público, a serem definidos em regulamento, quais sejam:

• O uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de


pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural;

• As derivações, captações, acumulações e lançamentos considerados


insignificantes:

QUESTÃO
37. (Analista da CODHAB/DF. Quadrix – 2018). No que diz respeito ao regime
de outorga de direitos de uso de recursos hídricos, julgue o item subsequente. Estão
sujeitos à outorga pelo Poder Público os direitos dos seguintes usos de recursos
hídricos: extração de água de aquífero subterrâneo para consumo final ou insumo
de processo produtivo; utilização da água para a satisfação das necessidades de
pequenos núcleos populacionais distribuídos no meio rural; e aproveitamento dos
potenciais hidrelétricos.

( ) Certo ( ) Errado

Os critérios específicos de vazões ou acumulações de volumes de água


consideradas insignificantes, para fins de dispensa da outorga, serão estabelecidos
nos planos de recursos hídricos, por proposta dos Comitês de Bacia Hidrográfica.
Para rios federais, a Resolução n.º 1.940/17 – ANA definiu os usos insignificantes
que independem, portanto, de outorga, ressalvados os casos deliberados de forma
diversa pelo CNRH.

Por fim, a definição da natureza jurídica da outorga, porém, ainda é


divergente, formando-se duas correntes doutrinárias. Uma primeira corrente a
considera com natureza jurídica de licença administrativa, sendo por isso vinculada
e não precária. Por outro lado, uma segunda corrente a considera como mera
autorização administrativa, por isso discricionária e precária.

214
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

Tenho que a outorga possui natureza jurídica de licença administrativa sui


generis, haja vista que – apesar de vinculada, o que impõe sua concessão a todos
que cumprirem os requisitos da legislação ambiental – é precária porque poderá
ser suspensa, parcial ou totalmente, em definitivo ou por prazo determinado, sem
gerar qualquer direito de indenização ao usuário, nas seguintes circunstâncias:

• Não cumprimento, pelo outorgado, dos termos da outorga;

• Ausência de uso por três anos consecutivos;

• Necessidade premente de água para atender a situações de


calamidade, inclusive as decorrentes de condições climáticas adversas;

• Necessidade de se prevenir ou reverter grave degradação ambiental;

• Necessidade de se atender a usos prioritários, de interesse coletivo,


para os quais não se disponha de fontes alternativas;

• Necessidade de serem mantidas as características de navegabilidade do


corpo de água.

A suspensão da outorga só poderá ser efetivada se devidamente


fundamentada em estudos técnicos que comprovem a necessidade do ato, e
implica automaticamente no corte ou na redução dos usos outorgados, nos termos
da Resolução n.º 16/01 – CNRH.

A outorga de direito de uso de recursos hídricos extingue-se, sem


qualquer direito de indenização ao usuário, nas seguintes circunstâncias:

• Morte do usuário, se pessoa física;

• Liquidação judicial ou extrajudicial do usuário, se pessoa jurídica;

• Término do prazo de validade de outorga sem que tenha havido


tempestivo pedido de renovação.

No caso de morte, os herdeiros ou inventariantes do usuário outorgado,


se interessados em prosseguir com a utilização da outorga, deverão solicitar, em
até 180 (cento e oitenta) dias da data do óbito, a retificação do ato administrativo
da portaria, que manterá seu prazo e condições originais e, posteriormente, será
emitida nova portaria em nome dos herdeiros.

QUESTÃO

215
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

38. (Juiz Federal do TRF2. 2017). Quanto à outorga de direito de uso de


recursos hídricos, assinale a opção correta:
A) A outorga é de competência exclusiva da Agência Nacional de Águas.
B) Em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos deve ser
destinado ao consumo humano e à dessedentação de animais e, em seguida, às
prioridades de uso estabelecidas no Plano de Recursos Hídricos aplicável a cada
corpo hídrico.
C) A outorga só será suspensa nos casos de não cumprimento, pelo outorgado,
dos termos estabelecidos ou de necessidade premente de água para atender a
situações de calamidade, sempre mediante processo administrativo em que se
assegure ampla defesa.
D) A outorga deverá observar o uso específico para o qual o corpo hídrico tiver
sido destinado, vedado o seu uso múltiplo.
E) Desde que respeite a classe em que o corpo de água estiver enquadrado, a
outorga não fica condicionada às prioridades de uso.

216
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

2.5.2. Cobrança pelos Usos dos Recursos Hídricos

Consoante estudamos no tópico anterior, o uso de recursos hídricos


pressupõe a prévia outorga do Poder Público. Além disso, o uso desse recurso
ambiental também exige a correspondente contraprestação financeira do seu
beneficiário, em respeito ao princípio ambiental do usuário-pagador, segundo o
qual aqueles que se utilizam dos recursos naturais, ainda que licitamente, devem
pagar por sua utilização, haja vista que não são infinitos. Essa ideia fora extraída de
interpretação evolutiva do princípio 16 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento, aprovada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento – CNUMAD – (Eco 92 ou Cúpula da Terra), aliás,
conforme positivado no art. 4º da Lei da PNMA (Lei Federal n.º 6.938/81):

Art. 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: [...] VII -


à imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de
recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de
contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins
econômicos.

Essa contraprestação é exigida através da cobrança pelos usos dos


recursos hídricos, que se constitui em mais um dos instrumentos da PNRH, com
os seguintes objetivos:

• Reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma


indicação de seu real valor;

• Incentivar a racionalização do uso da água;

217
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

• Obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e


intervenções contemplados nos planos de recursos hídricos.

Portanto, todos os usos de recursos hídricos que estão sujeitos à outorga


serão cobrados pelos Entes da Federação detentores do respectivo corpo d’água.
Essa cobrança, por óbvio, não tem natureza jurídica de tributo, mas sim de tarifa,
sendo certo que, na fixação dos valores a serem cobrados, devem ser observados
os seguintes critérios:

• Nas derivações, captações e extrações de água, o volume retirado e seu


regime de variação;

• Nos lançamentos de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, o


volume lançado e seu regime de variação e as características físico-
químicas, biológicas e de toxidade do afluente.

Vale ressaltar que a Lei Federal n.º 9.433/97 estabelece destinação para a
aplicação dos valores arrecadados com a cobrança pelos usos de recursos
hídricos, que deverão ser aplicados prioritariamente na bacia hidrográfica em que
foram gerados, e serão utilizados:

• No financiamento de estudos, programas, projetos e obras incluídos nos


Planos de Recursos Hídricos;

• No pagamento de despesas de implantação e custeio administrativo


dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGRH: Neste caso, a aplicação
dos recursos fica limitada à 7,5% (sete e meio por cento) do total
arrecadado.

QUESTÕES

39. (Procurador Municipal de Manaus/AM. Cebraspe – 2018) (adaptada).


Julgue o próximo item, relativo a recursos hídricos e florestais. Valores arrecadados
com a cobrança pelo uso de recursos hídricos podem ser aplicados em bacia
hidrográfica distinta daquela em que forem gerados tais valores.

( ) Certo ( ) Errado

218
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

40. (Técnico da Embasa. Cebraspe – 2013). Acerca da Lei n.º 9.433/1997, que
institui a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), julgue o item seguinte.
Serão utilizados no pagamento de despesas de implantação e custeio
administrativo dos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional de
Gerenciamento de Recursos Hídricos os valores arrecadados com a cobrança pelo
uso de recursos hídricos, limitados a 7,5% do total arrecadado.

( ) Certo ( ) Errado

Além disso, os valores arrecadados com a cobrança pelos usos dos recursos
hídricos ainda poderão ser aplicados, a fundo perdido (não reembolsáveis), em
projetos e obras que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a
qualidade, a quantidade e o regime de vazão de um corpo de água.

Por fim, é importante ressaltar que a cobrança pelos uso dos recursos
hídricos para o aproveitamento dos seus potenciais hidrelétricos ocorre através dos
mecanismos de participação no resultado de sua exploração, ou por compensação
financeira, nos termos do art. 20, §1º da Constituição da República:

Art. 20. São bens da União:


[...]
§ 1º É assegurada, nos termos da lei, à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos Municípios a participação no resultado da
exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos
para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos
minerais no respectivo território, plataforma continental, mar
territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação
financeira por essa exploração.

Logo, a participação no resultado da exploração, ou sua respectiva


compensação financeira, são asseguradas inclusive para os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios, mesmo não sendo eles os detentores dos potenciais
hidrelétricos, e será de 7% (sete por cento) sobre o valor da energia elétrica
produzida, a ser paga por titular de concessão ou autorização para exploração de
potencial hidráulico aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios em cujos
territórios se localizarem instalações destinadas à produção de energia elétrica, ou
que tenham áreas invadidas por águas dos respectivos reservatórios, e a órgãos da
administração direta da União, com a seguinte distribuição:

• 6,25% (seis inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do valor da


energia produzida serão distribuídos entre os Estados, Municípios e

219
RAFAEL ROCHA SISTEMA NACIONAL DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS • 5

órgãos da administração direta da União, nos termos do art. 1º da Lei


no 8.001/90;

• 0,75% (setenta e cinco centésimos por cento) do valor da energia


produzida serão destinados ao Ministério do Meio Ambiente, para
aplicação na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos
e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, nos
termos do art. 22 da Lei no 9.433/97.

Por fim, registre-se que esta última parcela de 0,75% (setenta e cinco
centésimos por cento) do valor da energia produzida se constitui no pagamento
pelo uso de recursos hídricos, razão pela qual deve ser aplicada nos termos do art.
22 da Lei Federal n.º 9.433/97 (aplicação prioritariamente na bacia hidrográfica em
que foram gerados e para financiamento dos programas previstos nos Planos de
Recursos Hídricos e de despesas para integração e custeio dos órgãos do SINGRH).

220
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO
6
POR ILÍCITOS AMBIENTAIS

221
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

1. RELEMBRANDO O MICROSSISTEMA JURÍDICO DE


TUTELA AMBIENTAL — MTA

Estamos concluindo o estudo do Microssistema Jurídico de Tutela


Ambiental – MTA –, que, sob uma ótica mais prática, é basicamente formado por
quatro sistemas principais:

Com o adequado estudo do Sistema Nacional do Meio Ambiente –


Sisnama – foi possível compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: Constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para as ações de preservação, fiscalização e recuperação
do meio ambiente no Brasil. Foi possível se apreender a composição e
as atribuições desses órgãos/entidades ambientais (IBAMA, Conama
etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: Que deverão ser implementadas,


total ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do Sisnama. Foi possível se apreender a PNMA – e outras
associadas, estudando-se os:

• Objetivos: Da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do Sisnama;

222
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

• Instrumentos: Da PNMA, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do Sisnama, para propiciar o cumprimento
dos objetivos da própria PNMA e das demais políticas ambientais
associadas.

Também estudamos o segundo sistema integrante do MTA, o Sistema


Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC –, no qual foi possível
a compreensão dos seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: Constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para administrar, preservar e fiscalizar as unidades de
conservação da natureza (parques nacionais, por exemplo) no Brasil. Foi
possível se apreender a composição e as atribuições desses
órgãos/entidades ambientais (ICMBIO etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: Que deverão ser implementadas,


total ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do SNUC. Foi possível se apreender a Política Nacional de
Unidades de Conservação – PNUC – e outras associadas, estudando-se
os:

• Objetivos: Da PNUC, e do próprio SNUC, a serem cumpridos, total ou


parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da estrutura do
SNUC;

• Instrumentos: Instituídos pela Lei da PNUC, e pelas demais políticas


ambientais associadas (pelo código florestal, por exemplo), que se
constituem em genuínas ferramentas jurídicas disponibilizadas
principalmente para os órgãos e entidades componentes da estrutura
do SNUC, para propiciar o cumprimento dos seus objetivos e da PNUC.

Também foram estudados os Demais Espaços Territoriais Especialmente


Protegidos – Deteps – (APPs, RLs, AURs, AUAS etc.) previstos na Lei Federal n.º
12.651/12 (novo código florestal), mas que também seguem as mesmas regras
gerais para criação, alteração, supressão e extinção dos espaços territoriais
protegidos previstos na Lei do SNUC, com as especificidades definidas pelo CFLO.

223
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Além disso, fizemos uma completa análise do terceiro sistema integrante


do MTA, Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SINGRH –, para
se compreender os seguintes pontos principais:

• Sua estrutura: Constituída pelo conjunto de órgãos e entidades públicas


competentes para a preservar e fiscalizar as águas no Brasil. Foi possível
se apreender a composição e as atribuições desses órgãos/entidades
ambientais (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico – ANA –,
CNRH, Comitês de Bacias Hidrográficas etc.);

• Políticas nacionais correlacionadas: Que deverão ser implementadas,


total ou parcialmente, pelos órgãos e entidades componentes da
estrutura do SINGRH. Foi possível se apreender a Política Nacional de
Recursos Hídricos – PNRH – e outras associadas, estudando-se os:

• Objetivos: Da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, a serem cumpridos, total ou parcialmente, pelos órgãos e
entidades componentes da estrutura do SINGRH;

• Instrumentos: Da PNRH, e das demais políticas nacionais ambientais


associadas, que se constituem em genuínas ferramentas jurídicas
disponibilizadas principalmente para os órgãos e entidades
componentes da estrutura do SINGRH, para propiciar o cumprimento
dos objetivos da própria PNRH e das demais políticas ambientais
associadas.

Finalmente, após compreendidas todas as lições relativas ao Sisnama,


SNUC e SINGRH, será estudado o quarto sistema integrante do MTA, o Sistema de
Responsabilização por Ilícitos Ambientais – Sisrespia –, que incidirá sobre aqueles
que descumprirem as regras ambientais estudadas nos três primeiros sistemas,
para se compreender os seguintes pontos principais:

• A tríplice responsabilização: Cível, administrativa e criminal dos


infratores da legislação ambiental;

• Tutela processual ambiental: Administrativa, cível e criminal decorrente


da prática de ilícitos ambientais, inclusive com a adequada compreensão
dos precedentes e das súmulas do e. STJ e c. STF sobre o meio ambiente;

• Os princípios ambientais: Revisão dos princípios tipicamente


ambientais, com sua aplicação prática, para proporcionar sua adequada
compreensão.

224
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS


AMBIENTAIS

2.1. Criação do Sisrespia e Definição da Tríplice


Responsabilização por Ilícitos Ambientais

Agora que já compreendemos as regras gerais sobre o meio ambiente


disciplinadoras da proteção ambiental no Brasil, podemos estudar o Sistema de
Responsabilização que recairá sobre aqueles que as violarem e cometerem ilícitos
ambientais.

Esse Sistema de Responsabilização por Ilícitos Ambientais – Sisrespia –


surgiu, de forma muito tímida, no antigo código florestal de 1965, pois — apesar da
tipificação de contravenções penais85 para punir criminalmente aqueles que
descumprissem suas regras ambientais — não havia a estruturação de órgãos para
o exercício do poder de polícia ambiental, nem tampouco existia uma adequada
caracterização da figura do poluidor. Também não havia ampla definição de
infrações administrativo-ambientais.86

Posteriormente, seguindo-se a lógica do código florestal de 1965, foram


tipificadas originalmente contravenções penais87 no “código” da fauna (Lei Federal
n.º 5.197/67), e crimes ambientais no código da pesca88 (Decreto-Lei n.º 221/67),
também com a intenção de punir criminalmente aqueles que descumprissem suas
regras ambientais.

85 Revogadas pelo novo CFLO.


86 Existia
uma única previsão de infração administrativa passível de multa ambiental para empresas
industriais grande consumidoras de matéria prima florestal que não mantivessem plantio de árvores
para seu consumo (revogada pelo novo CFLO).
87 Em grande parte derrogadas pelas regras gerais e pelo Capítulo V, seção I da Lei Federal n.º

9.605/98.
88 Quase que integralmente revogado pela Lei Federal n.º 11.959/09.

225
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Assim, somente com a publicação da Lei Federal n.º 6.938/81 (Lei da


Política Nacional do Meio Ambiente – PNMA) é possível se afirmar que de fato
surgiu um verdadeiro Sistema de Responsabilização por Ilícitos Ambientais –
Sisrespia –, haja vista que finalmente houve a estruturação de órgãos ambientais
para o exercício do poder de polícia ambiental fiscalizador (órgãos e entidades da
estrutura do Sisnama), a adequada caracterização da figura do poluidor e a
necessária previsão da tríplice responsabilização administrativa, cível e criminal
para aqueles que descumprissem as medidas necessárias à preservação ambiental.

Logo, a constituição do Sisrespia decorreu da definição:

• De Órgãos com Poder de Polícia Ambiental (órgãos e entidades da


estrutura do Sisnama);

• Da Tríplice Responsabilização por Ilícitos Ambientais;

• Da Adequada Caracterização da Figura do Poluidor.

Isto posto, com a publicação da Lei Federal n.º 6.938/81 (PNMA), além da
clara definição e estruturação de órgãos ambientais para o efetivo exercício do
poder de polícia ambiental, finalmente foi instituído, como instrumento da PNMA,
um regime de Tríplice Responsabilização administrativa, cível e criminal para
aqueles que descumprissem as medidas necessárias à preservação ambiental,
especialmente nos termos do seu art. 14, in verbis:

Art. 9º - São instrumentos da Política Nacional do Meio


Ambiente: [...]
IX - as penalidades disciplinares ou compensatórias ao não
cumprimento das medidas necessárias à preservação ou
correção da degradação ambiental.

Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação


federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas
necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e
danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores:
I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no
mínimo, a 10 (dez) e, no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações
Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos
de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento,
vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo
Estado, Distrito Federal, Territórios ou pelos Municípios;
II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais
concedidos pelo Poder Público;

226
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

III - à perda ou suspensão de participação em linhas de


financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;
IV - à suspensão de sua atividade.
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste
artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados
ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O
Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade
para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos
causados ao meio ambiente.

Desse modo, com a entrada em vigor da Lei da Política Nacional do Meio


Ambiente – PNMA – (já estudada) as condutas consistentes em ilícitos ambientais
passaram a ficar sujeitas simultaneamente a uma Tríplice Responsabilização, com
sanções administrativas (multas, perda de incentivos fiscais e creditícios e
suspensão de atividades) e criminais previstas na legislação ambiental, além da
responsabilização cível com a imposição da obrigação de indenizar e/ou reparar os
danos causados.

Esse regime de Tríplice Responsabilização do poluidor infrator fora


constitucionalizado nos termos do art. 225, §3º da Constituição da República de
1988:

Art. 225.
[...]
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados.

Assim, por exemplo, aquele que, à época, destruísse a vegetação nativa em


áreas de preservação permanente deveria ser responsabilizado:

• Administrativamente: Com sanções de multas, perda de incentivos


fiscais e creditícios e suspensão de atividades, nos termos do art. 14 da
Lei Federal n.º 6.938/81 c/c art. 36 do revogado Decreto Federal n.º
88.351/83;

• Civilmente: Com a obrigação de indenizar e/ou reparar os danos


ambientais causados, nos termos do art. 14, §1º da Lei Federal n.º
6.938/81;

• Criminalmente: Com sanções de prisão simples ou multa, nos termos do


art. 26, “a” da revogada Lei Federal n.º 4.771/65 (antigo CFLO).

227
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Logo, a partir da publicação da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente –


PNMA –, todos que cometerem ilícitos ambientais devem sofrer a incidência do
Sisrespia e, por isso, ficam sujeitos à Tríplice Responsabilização administrativa, cível
e penal.

Além disso, a Lei da PNMA passou a conceituar adequadamente a figura do


poluidor, o considerando como qualquer pessoa, natural ou jurídica, de direito
público ou privado, que seja responsável, direta ou indiretamente, pela causação
de degradação ao meio ambiente.

Daí porque até mesmo as pessoas jurídicas, inclusive de direito público,


poderão ser responsabilizadas pela prática de ilícitos ambientais, conforme
estudaremos nos tópicos seguintes.

2.2. Responsabilidade Administrativa e Evolução


Histórica

Consoante vimos, as regras sobre a Responsabilidade Administrativa


decorrente de ilícitos ambientais somente foram definidas, de forma ampla, com a
publicação da Lei Federal n.º 6.938/81 (PNMA), que definiu a Tríplice
Responsabilização (administrativa, cível e penal) do poluidor infrator e estabeleceu
as espécies de sanções administrativas aplicáveis, nos termos do seu art. 14, in
verbis:

Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação


federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas
necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e
danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores:
I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no
mínimo, a 10 (dez) e, no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações
Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos

228
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento,


vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo
Estado, Distrito Federal, Territórios ou pelos Municípios;
II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais
concedidos pelo Poder Público;
III - à perda ou suspensão de participação em linhas de
financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;
IV - à suspensão de sua atividade.

Além disso, o caput do art. 14 da Lei da PNMA também definiu, de forma


genérica, o que se entende por infração administrativo-ambiental: Considera-se
como infração ambiental o não cumprimento das medidas necessárias à
preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da
qualidade ambiental:

Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação


federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas
necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e
danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores:

Com isso, definidas as sanções administrativas e estabelecido o tipo


administrativo genérico de infrações ao meio ambiente, firmou-se o fundamento
legal para a responsabilização administrativa dos infratores às normas ambientais.

Todavia, por se tratar de definição genérica, ainda faltavam os elementos


mínimos necessários para a correta caracterização e tipificação das infrações
administrativo-ambientais, com suas respectivas sanções, em respeito à
previsibilidade e à segurança jurídica.

Sobreveio então o Decreto Federal n.º 88.351/83, regulamentando o art.


14, caput e incisos da Lei Federal n.º 6.938/81, para finalmente assentar e tipificar
as infrações administrativo-ambientais com suas respectivas sanções, definindo em
seu Título III o rol de situações caracterizadoras de ilícitos administrativo-
ambientais.

Posteriormente, o Decreto Federal n.º 88.351/83 fora integralmente


revogado pelo Decreto Federal n.º 99.274/90 que, em verdadeira continuidade
normativo-típica administrativa, continuou tipificando, nos termos dos seus arts.
33 a 36, as mesmas infrações administrativo-ambientais previstas no decreto
revogado, regulamentando novamente o art. 14 da Lei Federal n.º 6.938/81
(PNMA).

229
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Alguns anos depois sobreveio a publicação da Lei Federal n.º 9.605/98


(conhecida como lei dos crimes ambientais) estabelecendo um novo fundamento
legal para a responsabilização administrativa dos infratores às normas ambientais,
haja vista que trouxe nova definição genérica das infrações administrativo-
ambientais, atualizou e ampliou as espécies de sanções administrativas aplicáveis e
regulamentou os prazos dos processos administrativos sancionadores, nos termos
dos seus arts. 70 a 76.

Com isso as novas regras previstas nos arts. 70 a 76 da Lei Federal n.º
9.605/98 derrogaram o art. 14, caput, in fine, e incisos, da Lei Federal n.º 6.938/81,
nos termos do art. 2º, §2º, in fine da Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro – LINDB –, haja vista que a lei posterior revoga a anterior quando regule
inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

Logo, os arts. 70 a 76 da Lei Federal n.º 9.605/98 substituíram o art. 14,


caput, in fine, e incisos, da Lei Federal n.º 6.938/81, e se tornaram o novo
fundamento legal para a responsabilização administrativa dos infratores
ambientais.

Todavia, a nova definição legal das infrações ambientais estabelecida na Lei


Federal n.º 9.605/98 também foi genérica, de modo que faltavam os elementos
mínimos necessários para a correta caracterização e tipificação das infrações
administrativo-ambientais, com suas respectivas sanções, em respeito à
previsibilidade e à segurança jurídica.

Sobreveio então o Decreto Federal n.º 3.179/99, constituindo-se em


verdadeiro código federal de infrações administrativo-ambientais ao regulamentar
os arts. 70 a 76 da novel Lei Federal n.º 9.605/98 para tipificar as novas infrações
administrativo-ambientais, com suas respectivas sanções, classificadas nos
seguintes grupos:

• Das Infrações contra a Fauna;

• Das Infrações contra a Flora;

• Das Infrações relativas à Poluição e a Outras Infrações Ambientais;

• Das Infrações contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural;

• Das Infrações Administrativas Contra a Administração Ambiental.

Por fim, o Decreto Federal n.º 3.179/99 fora integralmente revogado pelo
Decreto Federal n.º 6.514/08 que, em verdadeira continuidade normativo-típica

230
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

administrativa, continuou tipificando as infrações administrativo-ambientais


anteriormente previstas, e se constitui atualmente no código federal das infrações
ambientais em vigor, conforme veremos.

É importante ressaltar que essa tipificação das infrações administrativo-


ambientais apenas em decreto, ato infralegal, não viola o princípio constitucional
da legalidade, haja vista que esse regulamento encontra toda sustentação legal
necessária nos arts. 70 a 76 da Lei Federal n.º 9.605/98, que estabelecem as
condutas genéricas violadoras das normas ambientais e suas respectivas sanções
possíveis, consoante apontado linhas atrás, nos termos da reiterada jurisprudência
do e. STJ:

[...] 5. A Lei 9.605/1998, embora conhecida, popular e


imprecisamente, por Lei dos Crimes contra o Meio Ambiente,
em rigor trata, de maneira simultânea e em partes diferentes
do seu texto, de infrações penais e infrações administrativas.
No campo dos ilícitos administrativos, exige-se do legislador
ordinário que estabeleça tão só as condutas genéricas
proibidas (= tipos genéricos), bem como o rol e limites das
sanções cabíveis, deixando a especificação daquelas e destas
para a regulamentação, por meio de decreto. [...] (REsp
1260813/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 23/08/2016, DJe 07/08/2020)

Portanto, compreendidas as difíceis lições gerais sobre a perspectiva


histórica e a sucessão legislativas da responsabilidade administrativa decorrente de
ilícitos ambientais, que certamente contribuirão para o deslinde de casos
intertemporais (tempus regit actum e novatio legis in mellius administrativa),
passaremos agora ao estudo das regras atualmente vigentes previstas na Lei
Federal n.º 9.605/98 e em seu Decreto Federal n.º 6.514/08 regulamentador.

2.2.1. Teoria Geral da Responsabilidade


Administrativa

231
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Conforme visto, a Responsabilidade Administrativa decorrente de ilícitos


ambientais está atualmente fundamentada nos arts. 70 a 76 da Lei Federal n.º
9.605/98, haja vista que esses dispositivos definiram:

• O novo tipo genérico das infrações administrativo-ambientais;

• As novas espécies de sanções administrativas para as infrações


ambientais;

• Os prazos dos processos administrativos sancionadores;

• As autoridades competentes para lavratura de autos de infração e


aplicação de sanções administrativas.

A partir desse fundamento legal, o rol das infrações administrativo-


ambientais federais e suas regras gerais de incidência foram estabelecidas no
Decreto Federal n.º 6.514/08, considerado como verdadeiro código federal das
infrações administrativo-ambientais, como o é o código penal para as infrações
penais.

Vale destacar que, além desse código federal de infrações ambientais, os


Estados-Membros também possuem competência constitucional para a definição
de infrações administrativo-ambientais estaduais, haja vista que a competência
para se legislar sobre o meio ambiente é concorrente entre União e Estados-
Membros nos termos do art. 24 da Constituição da República:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal


legislar concorrentemente sobre: [...] VI - florestas, caça, pesca,
fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos
naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

Assim, a competência legislativa concorrente criou verdadeiro “condomínio


legislativo” entre a União, os Estados e o Distrito Federal, cabendo à União a

232
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

aprovação de normas gerais sobre o meio ambiente (conceitos, princípios,


procedimentos etc.) e aos Estados-Membros o exercício da competência
complementar, quando já existente norma geral sobre o meio ambiente, ou a
competência legislativa plena (supletiva), quando inexistente a norma federal de
caráter geral.

Desse modo, considerando-se que a União já estabeleceu as normas gerais


sobre a responsabilidade administrativa por ilícitos ambientais nos termos dos arts.
70 a 76 da Lei Federal n.º 9.605/98, os Estados-Membros somente poderão editar
normas relativas às infrações administrativo-ambientais que sejam mais protetivas
ao meio ambiente e para atender suas peculiaridades regionais, no exercício de sua
competência constitucional concorrente para complementar as normas federais,
haja vista que a sobreposição de opções políticas por graus variáveis de proteção
ambiental constitui circunstância própria do estabelecimento de competência
concorrente sobre a matéria, consoante assentado, à unanimidade, pelo plenário
do Supremo Tribunal Federal em verdadeira virada jurisprudencial no julgamento
da ADI 5996.

Daí porque, exercendo essa competência constitucional, por exemplo, o


Estado da Bahia aprovou suas normas específicas sobre infrações administrativo-
ambientais nos arts. 176 a 196 da Lei Estadual Baiana n.º 10.431/06, e estabeleceu
verdadeiro código estadual de infrações ambientais no título V do Decreto Estadual
n.º 14.024/12.

Vale ressaltar ainda que os Municípios possuem competência


constitucional para legislar sobre assuntos de interesse local, e suplementar a
legislação federal e a estadual no que couber, razão pela qual também poderão
instituir verdadeiros códigos municipais de infrações ambientais, nos termos do
art. 30 da Constituição da República:

Art. 30. Compete aos Municípios:


I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

Assim, os Municípios poderão suplementar a legislação estadual e federal


no limite do seu interesse local, desde que esse regramento seja harmônico com a
disciplina estabelecida pelos demais Entes Federados, sob pena de afrontar a
norma inserta no art. 24, VI da Constituição da República (RE 586.224/SP).

Com esse fundamento constitucional, por exemplo, o Município de


Salvador/BA aprovou suas normas específicas sobre infrações administrativo-

233
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

ambientais nos arts. 136 a 176 da Lei Municipal n.º 8.915/15, e estabeleceu
verdadeiro código municipal de infrações ambientais.

Logo, é relevantíssimo destacar que, além do código federal das infrações


administrativo-ambientais previsto no Decreto Federal n.º 6.514/08, podem existir
e coexistir códigos estaduais e municipais de infrações administrativo-ambientais,
desde que não contrariem as regras federais.

Isto posto, agora passaremos a estudar as regras gerais federais que


definem os aspectos mais relevantes da responsabilidade administrativa por ilícitos
ambientais, destacando-se os seguintes pontos:

2.2.1.1. Autoridades Competentes

Consoante já estudamos, a competência material para o exercício da


fiscalização ambiental, com lavratura de autos de infração e aplicação de sanções
administrativo-ambientais, é comum entre os Entes Federativos, razão pela qual os
órgãos ambientais da União, dos Estados-Membros e dos Municípios podem
fiscalizar ambientalmente quaisquer atividades e empreendimentos
potencialmente poluidores e/ou utilizadores de recursos ambientais.

Assim, por exemplo, um órgão ambiental municipal poderá exercer


fiscalização e até mesmo aplicar multas a uma determinada empresa responsável
por obra pública federal que tenha sido licenciada pelo IBAMA, se restar

234
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

caracterizada infração à legislação ambiental. Da mesma forma, o IBAMA poderá


exercer fiscalização em atividades licenciadas por qualquer Estado ou Município.

Apesar dessa competência comum, é importante destacar que somente são


consideradas autoridades competentes para lavrar autos de infração ambiental e
instaurar processos administrativos sancionadores os servidores de órgãos
ambientais integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente – Sisnama –
(IBAMA, ICMBIO, órgãos seccionais e órgãos locais etc.) que tenham sido
previamente designados para as atividades de fiscalização, bem como os agentes
das Capitanias dos Portos, da Marinha.

Desse modo, autos de infração e multas ambientais só podem ser lavradas


por servidores dos órgãos do Sisnama que tenham sido previamente designados
para as atividades de fiscalização, sob pena de nulidade do auto de infração por
falta de competência, nos termos da jurisprudência do e. STJ:

[...] 2. A prévia designação para a atividade fiscalizatória é


condição para que possa o servidor lotado em órgãos
ambientais lavrar autos de infração e instaurar processos
administrativos, podendo a designação ocorrer por simples ato
normativo interno. Precedente. [...] (REsp 1166487/MG, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em
17/08/2010, DJe 26/04/2011)

QUESTÃO

41. (Delegado de Polícia da PCPA. Funcab – 2016) (adaptada). Acerca das


infrações administrativas ambientais, é correto afirmar que são autoridades
competentes para lavar auto de infração ambiental e instaurar processo
administrativo, com exclusividade, os funcionários de órgãos ambientais
integrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA, designados para as
atividades de fiscalização.

( ) Certo ( ) Errado

Questão interessante ocorre quando determinado infrator é autuado


simultaneamente por órgãos ambientais do Sisnama das esferas municipal,
estadual e federal em razão de um mesmo ato ilícito, o que poderia inclusive
caracterizar bis in idem.

235
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Aliás, isso foi o que ocorreu no caso do rompimento da barragem de rejeitos


de famosa mineradora ocorrido na cidade de Brumadinho/MG em janeiro de 2019,
quando foram lavrados autos de infrações pelos órgãos ambientais do Sisnama de
todos os Entes Federados envolvidos, da seguinte forma:

• IBAMA: Aplicou multas no importe de R$ 250.000.000,00;

• Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável


de Minas Gerais – Semad: Aplicou multas de mais de R$ 99.000.000,00;

• Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do


Município de Brumadinho/MG – Sema: Aplicou multas de mais de R$
108.000.000,00;

• Secretaria de Meio Ambiente de Juatuba/MG (Município vizinho


impactado): Aplicou multas de mais de R$ 50.000.000,00.

Partindo-se do pressuposto do que todas as multas foram lavradas em


razão do mesmo fato, seria legítimo se exigir da famosa mineradora autuada o
pagamento de todas as multas?

Neste caso, não, haja vista que ninguém pode ser punido mais de uma vez
em razão do mesmo fato ilícito, sob pena de se caracterizar o odioso bis in idem.

Em casos como este, deve prevalecer apenas o auto de infração lavrado


pelo órgão ambiental do Ente da Federação originalmente competente para o
licenciamento ambiental, nos termos da Lei Complementar Federal n.º 140/11:

Art. 17.
[...]
§ 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício
pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização
da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou
potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais
com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de
infração ambiental lavrado por órgão que detenha a
atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o
caput.

Assim, sempre que houver a lavratura simultânea de autos de infração por


órgãos ambientais municipais, estaduais e federais deve-se apurar qual deles tinha
a competência privativa para o licenciamento ambiental, pois prevalecerá o autor
de infração lavrado por ele, independentemente do valor da multa aplicada ou de
quando o auto de infração fora lavrado.

236
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

QUESTÃO

42. (Procurador de Estado da PGE/SP. Vunesp – 2018). A Polícia Militar


Ambiental do Estado de São Paulo lavrou auto de infração ambiental em face de
infrator, por suprimir vegetação sem autorização do órgão competente, em um
imóvel rural particular não inserido em área qualificada como Unidade de
Conservação. Ato contínuo, enquanto o infrator se preparava para sair do local,
fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
– IBAMA – lavraram auto de infração em razão dos mesmos fatos. A sanção
cominada, por ambos os entes, foi exclusivamente a de multa. Diante dessa
situação, assinale a alternativa correta.

a) Os dois autos de infração ambiental são inválidos, pois a competência para


lavratura é municipal, tratando-se de vício sanável.

b) Deve prevalecer o auto de infração ambiental lavrado pelo Estado.

c) Os dois autos de infração devem ser mantidos, inclusive com as sanções daí
decorrentes, que serão concorrentes e admitirão a futura cobrança das multas
respectivas.

d) Deve prevalecer o auto de infração ambiental lavrado pelo IBAMA.

e) Os dois autos de infração ambiental são inválidos, pois a competência para


lavratura é municipal, tratando-se de vício insanável.

Todavia, é importante ressaltar que não há na legislação solução jurídica


para a seguinte situação: Suponhamos que, no exemplo do caso de
Brumadinho/MG, os autos de infração tenham sido lavrados apenas pelo IBAMA e
pela Secretaria do Meio Ambiente do Município — Sema, não obstante a
competência para o licenciamento ambiental seja da Secretária do Meio Ambiente
do Estado de Minas — Semad. Portanto, neste caso, não teria havido a lavratura de
auto de infração pelo órgão ambiental que seria originalmente competente para o
licenciamento (por entender, por exemplo, que não teria havido infração), razão
pela qual não seria possível a aplicação da regra inserta no art. 17, §3º, in fine da
Lei Complementar Federal n.º 140/11.

Assim, questiona-se: No caso proposto, qual auto de infração prevaleceria?


Aquele lavrado pelo IBAMA ou pela Sema?

237
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Como dito, não há resposta para tais questionamentos na Lei


Complementar Federal n.º 140/11. Creio que, em casos como esse, deve ser
utilizado o critério do porte, potencial poluidor e natureza da atividade para se
definir qual auto de infração deve prevalecer, haja vista que esse foi o critério
residual utilizado em várias passagens na Lei Complementar Federal n.º 140/11 (art.
7º, inciso XIV, alínea “h”, in fine e parágrafo único, in fine; art. 9º, inciso XIV, alínea
“a”, in fine). Desse modo, no caso proposto, se da infração ambiental decorresse
apenas dano ambiental de pequeno porte, local, deveria prevalecer o auto de
infração lavrado pela Sema, ao passo que, se o dano fosse de grande porte e com
grande potencial poluidor, então deveria prevalecer o autor de infração lavrado
pelo IBAMA.

Questão também importante e que deve ser esclarecida é a parcial


antinomia existente entre o art. 17, §3º, in fine da Lei Complementar Federal n.º
140/11 e o art. 76, caput da Lei Federal n.º 9.605/98, respectivamente in verbis:

Art. 17.
[...]
§ 3º O disposto no caput deste artigo não impede o exercício
pelos entes federativos da atribuição comum de fiscalização
da conformidade de empreendimentos e atividades efetiva ou
potencialmente poluidores ou utilizadores de recursos naturais
com a legislação ambiental em vigor, prevalecendo o auto de
infração ambiental lavrado por órgão que detenha a
atribuição de licenciamento ou autorização a que se refere o
caput.

Art. 76. O pagamento de multa imposta pelos Estados,


Municípios, Distrito Federal ou Territórios substitui a multa
federal na mesma hipótese de incidência.

Segundo a regra inserta no art. 76, caput, da Lei Federal n.º 9.605/98,
quando houver aplicação simultânea de multa por órgão ambiental municipal ou
estadual e órgão ambiental federal, relativamente ao mesmo fato, o pagamento da
multa imposta por Estados ou Municípios substituirá a multa federal.

Ocorre que esta regra fora derrogada pelo art. 17, §3º, in fine da Lei
Complementar Federal n.º 140/11, que estabeleceu nova sistemática para os casos
de lavratura simultânea de autos de infração por órgãos ambientais municipais,
estaduais e federais, determinando novo critério definidor do auto de infração
prevalecente. Ora, a norma posterior revoga a anterior quando seja com ela

238
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

incompatível, nos termos do art. 2º, §1º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro — LINDB:

Art. 2º
[...]
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o
declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule
inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

Registre-se, desde já, que a solução adotada pelo c. STJ no REsp


1.132.682/RJ, publicado em 12/03/2020, não afasta a derrogação aqui defendida e
nem a nova sistemática adotada pela nova lei complementar, haja vista que o caso
objeto do mencionado julgamento ocorreu ainda no ano de 2002, portanto, antes
mesmo da aprovação da Lei Complementar Federal n.º 140/11, sendo certo que,
em casos de infração, deve-se aplicar a lei então vigente em respeito ao princípio
do tempus regit actum.

Por fim, cabe destacar que qualquer pessoa identificada, ao constatar


infração ambiental, pode dirigir representação aos órgãos e entidades da estrutura
do Sisnama para efeito do exercício de seu poder de polícia.

Desse modo, nos casos de iminência ou ocorrência de degradação da


qualidade ambiental, o ente federativo que tiver conhecimento do fato deverá
determinar medidas para evitá-la, fazer cessá-la ou mitigá-la, comunicando
imediatamente ao órgão competente para as providências cabíveis.

2.2.1.2. Responsabilidade Administrativa Subjetiva

239
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

A natureza jurídica da responsabilidade administrativa por ilícitos


ambientais é subjetiva, por isso pressupõe a demonstração da voluntariedade da
conduta caracterizada pela existência de dolo ou culpa, tal qual ocorre com a
responsabilidade penal.

Portanto, deve obedecer a teoria da culpabilidade, que requer — como


pressupostos para a aplicação de penalidades administrativas — a demonstração
da conduta do transgressor com seu elemento subjetivo (dolo ou culpa), além do
nexo causal entre a conduta e o dano (quando se tratar de infrações administrativo-
ambientais materiais).

Daí porque não se pode sancionar administrativamente aquele que praticar


infração ambiental sob coação física irresistível ou de forma inconsciente (em
estado de sonambulismo, hipnose, desmaio, crise epiléptica, estado de coma etc.),
haja vista a inexistência de conduta nesses casos ante a falta de elemento subjetivo
(dolo ou culpa).

Nesse sentido, superando histórica divergência doutrinária e


jurisprudencial, se firmou a jurisprudência do c. STJ a partir de 08/05/19 com o
julgamento de embargos de divergência por sua e. Primeira Seção (reunião da
primeira e segunda turmas) cuja ementa colacionamos abaixo in verbis:

240
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

[...] 3. Ocorre que, conforme assentado pela Segunda Turma no


julgamento do REsp 1.251.697/PR, de minha relatoria, DJe de
17/4/2012), "a aplicação de penalidades administrativas não
obedece à lógica da responsabilidade objetiva da esfera cível
(para reparação dos danos causados), mas deve obedecer à
sistemática da teoria da culpabilidade, ou seja, a conduta deve
ser cometida pelo alegado transgressor, com demonstração de
seu elemento subjetivo, e com demonstração do nexo causal
entre a conduta e o dano". [...] (EREsp 1318051/RJ, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 08/05/2019, DJe 12/06/2019)

241
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

QUESTÃO

43. (Juiz de Direito do TJRO. Vunesp – 2019). Segundo o artigo 225, § 3°, da
Constituição Federal, as condutas e atividades consideradas lesivas ao Meio
Ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas e jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Acerca da tríplice responsabilidade ambiental, assinale a alternativa correta.

A) A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o


entendimento de que a responsabilidade administrativa ambiental é subjetiva.

B) A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou o


entendimento de que a responsabilidade administrativa ambiental é objetiva.

C) A responsabilidade civil não admite a condenação simultânea e cumulativa


das obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar na reparação integral do meio
ambiente.

D) Segundo o entendimento atualizado do STF, a responsabilidade penal da


pessoa jurídica por crimes ambientais é condicionada à simultânea persecução
penal da pessoa física, em tese, responsável no âmbito da empresa.

E) Os responsáveis pela degradação ambiental são coobrigados solidários,


formando-se, em regra, nas ações civis públicas ou coletivas, litisconsórcio
necessário.

Ademais, é importante ressaltar que — em respeito ao princípio


constitucional da intranscendência das penas (art. 5º, inciso XLV CR/88) —,
aplicável não só ao âmbito penal, mas também ao direito administrativo
sancionador, as sanções administrativo-ambientais aplicadas ao transgressor não
podem ser transmitidas ao sucessor da respectiva propriedade, seja por alienação,
por doação ou por sucessão hereditária.

Desse modo, por exemplo, não é possível se ajuizar execução fiscal em face
do filho herdeiro para cobrar multas ambientais aplicadas em face de condutas
imputáveis a seu falecido pai.

Ainda é importante destacar que as pessoas jurídicas serão


responsabilizadas administrativamente sempre que a infração ambiental seja

242
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão


colegiado, em seu interesse ou benefício.89

Vale ressaltar, por fim, que são passíveis de punição as condutas comissivas
ou omissivas, com fundamento na teoria da equivalência das condições causais
assentada no art. 2º da Lei Federal n.º 9.605/98 e que deve se aplicar também as
infrações administrativas, porquanto prevista nas disposições gerais da lei:

Art. 2º Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos


crimes previstos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas,
na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o
administrador, o membro de conselho e de órgão técnico, o
auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa
jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar
de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.

Daí porque as autoridades competentes de órgãos ambientais que se


omitirem no dever de fiscalização também poderão ser responsabilizadas
administrativamente pela prática dos ilícitos ambientais que deveriam reprimir, nos
termos do art. 70, §3º da Lei Federal n.º 9.605/98:

Art. 70.
[...]
§ 3º A autoridade ambiental que tiver conhecimento de
infração ambiental é obrigada a promover a sua apuração
imediata, mediante processo administrativo próprio, sob pena
de corresponsabilidade.

Portanto, as autoridades poderão passar à condição de corresponsáveis


pelas infrações.

89 Art. 3º, caput da Lei Federal n.º 9.605/98.

243
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.2.1.3. Prescrição

Nos termos do art. 1º da Lei Federal n.º 9.873/99, a ação punitiva da


Administração Pública Federal, no exercício do seu poder de polícia administrativo,
prescreve em 5 (cinco) anos:

Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da


Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício
do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação
em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de
infração permanente ou continuada, do dia em que tiver
cessado.

Assim, tal prazo prescricional também se aplica, por óbvio, às sanções


administrativo-ambientais federais, consoante previsto no art. 21 do Decreto
Federal n.º 6.514/08:

Art. 21. Prescreve em cinco anos a ação da administração


objetivando apurar a prática de infrações contra o meio
ambiente, contada da data da prática do ato, ou, no caso de
infração permanente ou continuada, do dia em que esta tiver
cessado.

244
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Todavia, quando o fato objeto da infração também constituir infração


penal, a prescrição vai se regular pelos prazos da legislação penal, especialmente
aqueles previstos no art. 109 do Código Penal.

Demais disso, é importante ressaltar os seguintes marcos interruptivos da


prescrição da pretensão punitiva estatal:

• Pelo recebimento do auto de infração ou pela cientificação do infrator


por qualquer outro meio, inclusive por edital;

• Por qualquer ato inequívoco da administração que importe apuração


do fato: Aqueles que impliquem instrução do processo;

• Pela decisão condenatória recorrível.

Por fim, por outro lado, a pretensão da execução das multas ambientais
aplicadas definitivamente prescreve em 5 (anos), a contar do término do processo
administrativo sancionador, nos termos da súmula 467 do c. STJ:

Prescreve em cinco anos, contados do término do processo


administrativo, a pretensão da Administração Pública de
promover a execução da multa por infração ambiental.
(SÚMULA 467, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/10/2010, DJe
25/10/2010)

Com isso, concluímos a análise da prescrição da pretensão punitiva e da


prescrição da pretensão executória relativamente às infrações ambientais federais.

QUESTÃO

44. (Juiz Federal do TRF2. 2018). Em matéria de prescrição da pretensão da


Administração Pública em promover a execução de multa por infração
administrativa no Direito Ambiental, assinale a alternativa correta:

A) o prazo é de cinco anos, a contar da notificação no processo administrativo.

B) o prazo é de três anos, iniciando-se do término do processo administrativo.

C) o prazo é de três anos, a contar da notificação no processo judicial.

D) o prazo é de três anos, contados da portaria de instauração do processo


administrativo.

245
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

E) o prazo é de cinco anos, contados do encerramento do processo


administrativo.

246
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.2.1.4. Destinação dos Valores das Multas


Ambientais

2.2.1.7. Tipos de Infrações Administrativas e


Procedimento Administrativo Sancionador

247
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Conforme vimos, o Decreto Federal n.º 6.514/08 instituiu um verdadeiro


código federal de infrações administrativo-ambientais, no qual as infrações foram
classificadas em seis grupos:

• Das Infrações contra a Fauna;

• Das Infrações contra a Flora;

• Das Infrações relativas à Poluição e a Outras Infrações Ambientais;

• Das Infrações contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural;

• Das Infrações Administrativas Contra a Administração Ambiental;

• Das Infrações cometidas Exclusivamente em Unidades de Conservação


da Natureza.

Todavia, além das infrações previstas no Decreto Federal n.º 6.514/08, há


previsão de outras infrações administrativo-ambientais em leis federais esparsas,
como por exemplo na Lei Federal n.º 9.433/97 (recursos hídricos) e na Lei Federal
n.º 11.105/05 (lei de biossegurança) etc.

São mais de 70 (setenta) infrações administrativo-ambientais que poderão


ser compreendidas com uma simples leitura, razão pela qual não se faz necessária
a análise de cada uma delas nesta obra.

Assim, concluímos o estudo da Responsabilidade Administrativa por ilícitos


ambientais.

2.3. Responsabilidade Civil e Tutela Processual

Consoante vimos, foi a Lei Federal n.º 6.938/81 que instituiu um verdadeiro
Sistema de Responsabilização por Ilícitos Ambientais (Sisrespia), haja vista que
estruturou órgãos para o exercício do poder de polícia ambiental fiscalizador

248
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

(órgãos e entidades do Sisnama), conceituou adequadamente a figura do poluidor


e estabeleceu a tríplice responsabilização (administrativa, cível e criminal) para
aqueles que descumpram as medidas necessárias à preservação ambiental.

Assim, coube à Lei da PNMA instituir expressamente a responsabilidade


civil do poluidor, finalmente lhe impondo o dever de indenização e/ou reparação
dos danos ambientais causados. Além disso, definiu a legitimidade do Ministério
Público para a propositura das respectivas ações de responsabilidade, nos termos
dos seus arts. 4º, inciso VII e 14, §1º, respectivamente in verbis:

Art 4º - A Política Nacional do Meio Ambiente visará: [...] VII - à


imposição, ao poluidor e ao predador, da obrigação de
recuperar e/ou indenizar os danos causados e, ao usuário, da
contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins
econômicos.

Art. 14
[...]
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste
artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados
ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O
Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade
para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por
danos causados ao meio ambiente.

Portanto, esse é o fundamento jurídico da responsabilidade civil do


poluidor ambiental.

Demais disso, é importante ressaltar que a redação original do art. 5º da Lei


Federal n.º 7.347/85 (Lei das ações civis públicas — LACP) estendeu a legitimidade
do Ministério Público para a União, Estados-Membros, Municípios, entidades
autárquicas, empresas públicas, sociedades de economia mista e associações,
definindo novo rol amplo de legitimados para as ações de responsabilidade civil por
danos ambientais.

Após isso, finalmente sobreveio a constitucionalização do instituto da


responsabilidade civil do poluidor, nos termos do seu art. 225, §3º da Constituição
da República vigente:

Art. 225.
[...]
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,

249
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

a sanções penais e administrativas, independentemente da


obrigação de reparar os danos causados.

Logo, o Constituinte originário estabeleceu um dever constitucional de


reparação ambiental aos poluidores, independentemente de sanções penais e
administrativas, elevando-se a responsabilidade civil ambiental ao status
constitucional.

Além disso, o Constituinte originário ainda estendeu a todos os cidadãos e


cidadãs, a legitimidade ativa para a propositura de ações populares para anulação
de atos lesivos ao meio ambiente, inclusive com isenção de custas e dos ônus de
sucumbência, nos termos do seu art. 5º, inciso LXXIII:

Art. 5º
[...]
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação
popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou
de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e
cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de
custas judiciais e do ônus da sucumbência;

Portanto, a partir da Carta Constitucional vigente, a ação popular


disciplinada na Lei Federal n.º 4.717/65 também se tornou um instrumento eficaz
para a responsabilização civil dos poluidores ambientais, ampliando por
consequência a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Esses, portanto, são os fundamentos constitucionais e legais para a


imposição, ao poluidor, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos
causados ao meio ambiente.

Assim, após a compreensão da evolução histórica do instituto, passaremos


a estudar seus aspectos mais relevantes à luz da jurisprudência do e. STJ que
moldou a responsabilidade civil por danos ambientais com as seguintes
características:

250
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.3.1. Responsabilidade Objetiva

Consoante previsto no art. 927 do Código Civil vigente, aquele que, por ato
ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Assim, pela regra geral da responsabilidade civil, a obrigação de reparar


pressupõe a existência de ato ilícito. E o próprio código civil, em seu art. 186, define
como ato ilícito a conduta de alguém que, por ação ou omissão, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral.

O seu art. 187 vai além para também considerar que comete ato ilícito o
titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos
pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Por fim, o código define hipóteses de excludentes da ilicitude previstas no


seu art. 188:

• Os atos praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um


direito reconhecido;

• A deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim


de remover perigo iminente. Neste caso o ato será legítimo somente

251
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não


excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

Logo, a regra geral do código civil estabelece uma responsabilidade civil


subjetiva, pois pressupõe a existência de ato ilícito doloso ou culposo. Ademais,
essa responsabilidade subjetiva admite hipóteses de excludentes, inclusive
decorrentes de caso fortuito ou de força maior.

Todavia, em se tratando de danos ambientais, não incidem as regras gerais


do código civil, mas sim a norma inserta no art. 14, §1º da Lei Federal n.º 6.938/8190
que determina uma responsabilidade civil objetiva do poluidor ambiental, portanto
independentemente da existência de culpa; aliás, consoante o princípio do
poluidor-pagador que foi posteriormente assentado como o princípio 16 na
Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento aprovada
na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento —
CNUMAD:

Art. 14
[...]
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste
artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados
ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.

Em verdade, essa responsabilidade civil objetiva se constitui na exceção


contemplada pelo Código Civil, que prevê a responsabilidade independentemente
da existência de culpa excepcionalmente nos casos especificados em lei, consoante
seu art. 927, parágrafo único:

Art. 927.
[...]
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei,
ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem.

Assim, conforme previsão específica do art. 14, §1º da Lei Federal n.º
6.938/81, o poluidor ambiental será obrigado a reparar e/ou indenizar os danos
ambientais decorrentes de suas atividades independentemente da existência de

90É importante destacar que a responsabilidade civil objetiva por danos nucleares foi instituída no
art. 4º da Lei Federal n.º 6.453/77.

252
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

culpa, razão pela qual, para a incidência dessa responsabilidade civil, é bastante a
demonstração do dano ambiental e do nexo de causalidade entre ele e a conduta
do poluidor, sendo despicienda a presença de ato ilícito, doloso ou culposo.

Daí porque a responsabilidade civil objetiva recairá até mesmo sobre


poluidores que não tenham praticado ato ilícito algum, muito menos doloso ou
culposo.

Contudo, apesar de ser irrelevante a presença de ato ilícito, doloso ou


culposo, a demonstração do nexo causal entre a conduta do poluidor e o dano é
imprescindível para a imposição do dever de reparação e/ou indenização,
consoante decisões do e. STJ:

[...] 4. Em que pese a responsabilidade por dano ambiental seja


objetiva (e lastreada pela teoria do risco integral), faz-se
imprescindível, para a configuração do dever de indenizar, a
demonstração da existência de nexo de causalidade apto a
vincular o resultado lesivo efetivamente verificado ao
comportamento (comissivo ou omissivo) daquele a quem se
repute a condição de agente causador. [...] (REsp 1596081/PR,
Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, SEGUNDA SEÇÃO,
julgado em 25/10/2017, DJe 22/11/2017)

Registre-se ainda que o poluidor ambiental responderá civil e


objetivamente inclusive pelos prejuízos causados individualmente à terceiros por
força dos danos ambientais, nos termos do art. 14, §1º, in fine da Lei Federal n.º
6.938/81 secundado pela jurisprudência do e. STJ:

Art. 14
[...]
§ 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste
artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da
existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados
ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.

[...] 3. A simples manutenção de construção em área de


preservação permanente "impede sua regeneração,
comportamento de que emerge obrigação propter rem de
restaurar na sua plenitude e indenizar o meio ambiente
degradado e terceiros afetados, sob o regime de
responsabilidade civil objetiva" (REsp 1.454.281/MG, Rel. Min.
[...] (AgInt no REsp 1545177/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES,
SEGUNDA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 22/11/2018)

253
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Além disso, é importante ressaltar que a responsabilidade civil objetiva se


funda na Teoria do Risco Integral, haja vista que o poluidor ambiental deve assumir
todos os riscos decorrentes de suas atividades, razão pela qual não se admite
nenhum tipo de excludente de nexo causal, nem mesmo o caso fortuito ou a força
maior. O poluidor será obrigado a reparar e indenizar os danos ambientais ainda
que sua conduta seja plenamente lícita, pois reponde por todos os riscos inerentes
à sua atividade.

Trata-se da responsabilidade civil objetiva agravada ou extremada,


consoante assentado na jurisprudência do e. STJ:

[...] 2. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que, nos


danos ambientais, incide a teoria do risco integral, advindo daí
o caráter objetivo da responsabilidade, com expressa previsão
constitucional (art. 225, § 3º, da CF) e legal (art. 14, § 1º, da Lei
n. 6.938/1981), sendo, por conseguinte, descabida a alegação
de excludentes de responsabilidade, bastando, para tanto, a
ocorrência de resultado prejudicial ao homem e ao ambiente
advindo de uma ação ou omissão do responsável. Precedentes.
[...] (AgInt no AREsp 1515490/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE
SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe
04/02/2020)

Daí porque, por exemplo, no caso do rompimento da barragem de rejeitos


de minérios ocorrido em Brumadinho/MG, ainda que a empresa mineradora
estivesse cumprindo todas as normas ambientais sem, portanto, incorrer em ato
ilícito, doloso ou culposo, e o rompimento tivesse como causa a queda de um raio
(fenômeno da natureza – caso fortuito ou força maior), a ela deveria ser imposto o
dever de indenizar e reparar os danos ambientais e a terceiros causados, haja vista
que sua responsabilidade civil é objetiva com base na teoria do risco integral que,
como vimos, não admite nenhum tipo de excludente de nexo causal.

QUESTÃO

45. (Juiz de Direito do TJBA. Cebraspe – 2019). Por equívoco de um de seus


empregados, uma empresa alimentícia deixou vazar acidentalmente parte de seu
insumo em um rio, o que causou a morte de 5t de peixes. Nessa situação hipotética,
relativamente à responsabilidade civil ambiental, a empresa

A) não responderá pelo dano ambiental, por ser uma pessoa jurídica.

254
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

B) não responderá pelo dano, visto que não houve dolo na morte dos peixes.

C) responderá pelo dano, uma vez que a responsabilidade civil ambiental é


objetiva e pautada na teoria do risco administrativo, não sendo admitida a
responsabilização do empregado para responder culposamente pelo dano.

D) responderá pelo dano, porque a responsabilidade civil ambiental é objetiva


e pautada na teoria do risco integral.

E) responderá pelo dano, pois a responsabilidade civil ambiental é objetiva e


pautada na teoria do risco administrativo, admitindo-se, ainda, a responsabilização
do empregado para responder culposamente pelo dano.

Por fim, é relevantíssimo destacar que a Constituição da República


vigente ainda definiu, de forma expressa, a responsabilidade civil dos
mineradores, que ficam submetidos à solução técnica exigida pelo órgão
ambiental competente para a recuperação do meio ambiente degradado:

Art. 225.
[...]
§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a
recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução
técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

Trata-se também de responsabilidade civil objetiva agravada ou extremada,


pois que também se funda na teoria do risco integral.

255
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.3.2. Responsabilidade Solidária

Além de objetiva e fundada na teoria do risco integral, a responsabilidade


civil por danos ambientais é solidária entre todos os poluidores diretos e indiretos,
como decorrência do conceito legal amplíssimo de poluidor previsto no art. 3, inciso
IV da Lei da PNMA:

Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:


[...]
IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou
privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade
causadora de degradação ambiental;

Assim, todos aqueles, pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou


privado, que contribuírem, direta ou indiretamente, para a causação do dano
ambiental serão responsáveis solidários, razão pela qual todos ou qualquer um
deles poderão ser demandados judicialmente, em litisconsórcio facultativo ou não,
nos termos da pacífica jurisprudência do e. STJ:

[...] 2. É firme nesta Corte Superior a compreensão de que "a


responsabilidade por danos ambientais é solidária entre o
poluidor direto e o indireto, o que permite que a ação seja
ajuizada contra qualquer um deles, sendo facultativo o

256
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

litisconsórcio. Tal conclusão decorre da análise do inciso IV do


art. 3º da Lei 6.938/1981, que considera 'poluidor, a pessoa
física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável,
direta ou indiretamente, por atividade causadora de
degradação ambiental'" (AgInt no AREsp 839.492/SP, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
15/12/2016, DJe 06/03/2017). [...] (AgInt no AREsp
1250031/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA
TURMA, julgado em 28/09/2020, DJe 30/09/2020)

Assim, por exemplo, se a Petrobrás contratar a empresa Transpetro para o


transporte marítimo de seu combustível e um dos navios da Transpetro naufragar
causando grave dano ambiental no mar brasileiro, ambas as empresas responderão
solidariamente pelos danos causados. A Transpetro será a poluidora direta,
enquanto a Petrobrás a poluidora indireta.

Essa compreensão restou reforçada com o disposto no art. 2º, §2º da Lei
Federal n.º 12.651/12 (CFLO) ao definir a natureza jurídica das obrigações
ambientais como propter rem, de modo que — uma vez violadas — seu
restabelecimento poderá ser exigido do proprietário/possuidor atual beneficiado
com a violação dos deveres ambientais e/ou dos anteriores responsáveis pela
degradação do meio ambiente, consoante também secundado na súmula 623 do e.
STJ:

Art. 2º
[...]
§ 2º As obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são
transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de
transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
Súmula 623-STJ: As obrigações ambientais possuem natureza
propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou
possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor. STJ.
1ª Seção. Aprovada em 12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Daí porque, por exemplo, se áreas de preservação permanente forem


desmatadas em determinado imóvel e seu proprietário o alienar a terceiro, ambos
responderão civilmente por este dano ambiental e serão obrigados a recuperá-lo,
pois a manutenção das áreas de preservação permanente se constitui em obrigação
ambiental real (propter rem) e, por isso, é transferida com a alienação da respectiva
propriedade ao novo proprietário.

Portanto, todos que contribuírem, direta ou indiretamente, para o dano


ambiental serão responsáveis solidários por ele.

257
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

QUESTÃO

46. (Juiz Federal do TRF2. 2017). No que se refere à responsabilidade


ambiental decorrente do dano relativo à degradação ambiental, assinale a
alternativa correta:

A) a responsabilidade civil por dano ambiental é subjetiva, informada pela


teoria do risco integral, sendo possível seu afastamento em razão de excludentes
de responsabilidade civil.

B) os responsáveis civis pela degradação ambiental têm obrigação divisível e


não solidária e, por isso, devem integrar o litisconsórcio passivo necessário na ação
civil pública.

C) a responsabilidade civil por dano ambiental é objetiva, fundada na teoria


do risco administrativo, com a possibilidade da sua descaracterização quando
houver excludente de responsabilidade civil.

D) a obrigação de recuperar a degradação ambiental é do proprietário do bem


imóvel, mesmo que não tenha contribuído para a deflagração do dano, devido à
sua natureza propter rem.

E) a obrigação de reparar o dano é exclusiva do titular da propriedade do


imóvel na época da sua causação, não se estendendo ao novo proprietário que não
contribuiu para sua ocorrência.

Por isso é importante ressaltar que as instituições financeiras também


poderão ser consideradas poluidoras indiretas das atividades e empreendimentos
ambientais por elas financiados, e responsáveis solidárias pelos danos ambientais
daí decorrentes, em razão das obrigações ambientais impostas pelo art. 12 da Lei
da PNMA e pela Resolução n.º 4.327/14 do Banco Central do Brasil,
respectivamente in verbis:

Art. 12. As entidades e órgãos de financiamento e incentivos


governamentais condicionarão a aprovação de projetos
habilitados a esses benefícios ao licenciamento, na forma desta
Lei, e ao cumprimento das normas, dos critérios e dos padrões
expedidos pelo Conama.
Parágrafo único. As entidades e órgãos referidos no caput deste
artigo deverão fazer constar dos projetos a realização de obras

258
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

e aquisição de equipamentos destinados ao controle de


degradação ambiental e a melhoria da qualidade do meio
ambiente.

Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre as diretrizes que,


considerados os princípios de relevância e proporcionalidade,
devem ser observadas no estabelecimento e na implementação
da Política de Responsabilidade Socioambiental (PRSA) pelas
instituições financeiras e demais instituições autorizadas a
funcionar pelo Banco Central do Brasil.

Assim, as instituições financeiras devem exigir a comprovação do estrito


cumprimento das obrigações ambientais dos interessados como condição para o
financiamento de atividades e empreendimentos ambientais, sob pena de se
tornarem responsáveis solidárias pelos danos ao meio ambiente daí decorrentes.

Em alguns casos, as instituições financeiras exigem dos interessados até


mesmo a contratação de seguros ambientais ou sua adesão a fundos privados de
reparação ambiental para garantir o ressarcimento de eventuais danos ambientais
causados, como condição para a liberação de crédito e financiamentos, aliás
consoante já previsto na Lei da PNMA e da Lei da PNRS respectivamente in verbis:

Art. 9º - São Instrumentos da Política Nacional do Meio


Ambiente:
[...]
XIII - instrumentos econômicos, como concessão florestal,
servidão ambiental, seguro ambiental e outros.

Art. 40. No licenciamento ambiental de empreendimentos ou


atividades que operem com resíduos perigosos, o órgão
licenciador do Sisnama pode exigir a contratação de seguro de
responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente
ou à saúde pública, observadas as regras sobre cobertura e os
limites máximos de contratação fixados em regulamento.

Por fim, é relevante destacar que também as pessoas jurídicas de direito


público interno serão consideradas poluidoras indiretas e, por isso, poderão
responder solidária e objetivamente pelos danos ambientais causados por
terceiros, em decorrência de sua omissão no dever de controle e fiscalização
ambiental, consoante entendimento pacífico do e. STJ:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. MEIO AMBIENTE.


RESPONSABILIDADE DO PODER PÚBLICO ESTADUAL. [...] 2. O
acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento

259
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

do STJ, de que a responsabilidade civil pelo dano ambiental é


objetiva e solidária, mormente quando há omissão do dever
de controle e de fiscalização por parte do ente público, como
ocorreu no caso dos autos. [...] (REsp 1726432/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
03/05/2018, DJe 23/11/2018)

QUESTÃO

47. (Juiz de Direito do TJPA. Cebraspe – 2019) (adaptada). Com base na


jurisprudência do STJ, é correto afirmar que, em matéria de proteção ambiental,
em que se verifiquem omissão no cumprimento de fiscalizar, por falta de recursos,
e, em consequência, o agravamento do dano causado, o Estado poderá ser
civilmente responsabilizado, em razão da sua omissão no dever de fiscalizar.

( ) Certo ( ) Errado

Todavia, apesar de serem consideradas poluidoras indiretas e responsáveis


solidárias nos casos de omissão na fiscalização ambiental, as pessoas jurídicas de
direito público interno se submetem a um regime de execução subsidiária, de modo
que primeiro deve-se promover a execução sobre o patrimônio do poluidor direto,
conforme apontado na didática ementa do julgado abaixo colacionado:

[...] 13. A Administração é solidária, objetiva e ilimitadamente


responsável, nos termos da Lei 6.938/1981, por danos
urbanístico-ambientais decorrentes da omissão do seu dever
de controlar e fiscalizar, na medida em que contribua, direta
ou indiretamente, tanto para a degradação ambiental em si
mesma, como para o seu agravamento, consolidação ou
perpetuação, tudo sem prejuízo da adoção, contra o agente
público relapso ou desidioso, de medidas disciplinares, penais,
civis e no campo da improbidade administrativa.
14. No caso de omissão de dever de controle e fiscalização, a
responsabilidade ambiental solidária da Administração é de
execução subsidiária (ou com ordem de preferência).
15. A responsabilidade solidária e de execução subsidiária
significa que o Estado integra o título executivo sob a condição
de, como devedor-reserva, só ser convocado a quitar a dívida
se o degradador original, direto ou material (= devedor
principal) não o fizer, seja por total ou parcial exaurimento
patrimonial ou insolvência, seja por impossibilidade ou
incapacidade, inclusive técnica, de cumprimento da prestação

260
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

judicialmente imposta, assegurado, sempre, o direito de


regresso (art. 934 do Código Civil), com a desconsideração da
personalidade jurídica (art. 50 do Código Civil). [...] (REsp
1071741/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA
TURMA, julgado em 24/03/2009, DJe 16/12/2010)

Portanto, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público


interno por omissão no seu dever de fiscalização ambiental é objetiva, solidária e
de execução subsidiária.

261
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.3.3. Responsabilidade Imprescritível

A responsabilidade civil por danos ambientais, além de objetiva e solidária,


é imprescritível, haja vista que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é
essencial à sadia qualidade de vida e, por isso, ostenta natureza jurídica de direito
fundamental de terceira geração.

Em verdade, consoante assentado pelo e. STJ, em matéria de prescrição,


deve-se perquirir a natureza jurídica do bem jurídico tutelado: se eminentemente
privado seguem-se os prazos prescricionais normais estabelecidos para as ações
indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos
os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer,
considera-se imprescritível o direito à reparação.

Assim, considerando-se que o meio ambiente ecologicamente equilibrado


se inclui dentre os direitos indisponíveis, ele está dentre os poucos acobertados
pelo manto da imprescritibilidade quanto às ações que visam sua reparação:

CONSTITUCIONAL. DANO AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE


OBJETIVA. PROPTER REM. IMPRESCRITIBILIDADE DA
PRETENSÃO REPARATÓRIA DE DANO AMBIENTAL. [...] 2.
Corretamente, o Tribunal de origem afirma que a
jurisprudência do STJ primeiro reconhece a imprescritibilidade

262
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

da pretensão reparatória de dano ao meio ambiente, e,


segundo, atribui, sob o influxo da teoria do risco integral,
natureza objetiva, solidária e propter rem à responsabilidade
civil ambiental, considerando irrelevante, portanto, qualquer
indagação acerca de caso fortuito ou força maior, assim como
sobre a boa ou a má-fé do titular atual do bem imóvel ou móvel
em que recaiu a degradação. [...] (REsp 1644195/SC, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
27/04/2017, DJe 08/05/2017)

Logo, não há prazo para o ajuizamento de ações de reparação civil por


danos ao meio ambiente.

QUESTÃO

48. (Juiz de Direito do TJRJ. Vunesp – 2013). A propositura de ação civil pública
visando à reparação de dano ambiental causado à comunidade e cometido por
empresa pública rege-se pela seguinte regra:

A) subordina-se ao prazo de prescrição referente às pretensões de reparação


de responsabilidade civil.

B) subordina-se ao prazo de prescrição relativo às pretensões perante a


administração pública.

C) a pretensão é imprescritível.

D) subordina-se ao prazo de prescrição ordinária.

Também como consequência da essencialidade do direto ao meio


ambiente ecologicamente equilibrado, reconhecido como pressuposto de todos os
demais, não se admite a consolidação e manutenção de situações que gerem
prejuízos ao meio ambiente, em razão do decurso do tempo, haja vista que inexiste
direito adquirido à poluição ou degradação do meio ambiente.

Assim, por exemplo, o particular que construiu imóvel em área de


preservação permanente, em desacordo com a legislação ambiental e sem o
necessário licenciamento ambiental nos excepcionais casos permitidos, terá que
demoli-lo e promover a recomposição da área, consoante assentado na
jurisprudência do e. STJ:

263
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

[...] IV - Não há falar em direito adquirido à manutenção de


situação que gere prejuízo ao meio ambiente, bem como de
que, nos termos da Súmula n. 613/STJ, não se admite a
aplicação da teoria do fato consumado em tema de Direito
Ambiental. [...] (AgInt no REsp 1676609/SP, Rel. Ministra
REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
08/06/2020, DJe 12/06/2020)

Logo, não se admite a aplicação da teoria do fato consumado em matéria


ambiental, nos exatos termos da súmula 613 do e. STJ:

Súmula 613-STJ: Não se admite a aplicação da teoria do fato


consumado em tema de Direito Ambiental. Aprovada em
09/05/2018, DJe 14/05/2018.

Por isso, inadmite-se a manutenção de situações que agridem o meio


ambiente, ainda que supostamente tenham se consolidado no tempo.

2.3.4. Inversão do Ônus da Prova

A responsabilidade civil por danos ambientais, além de objetiva, solidária


e imprescritível, ainda conta com a garantia processual da inversão do ônus da
prova pela qual se transfere ao empreendedor da atividade potencialmente
poluidora o ônus de demonstrar a segurança do seu empreendimento.

264
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Trata-se de compreensão extraída da interpretação do art. 6º, VIII da Lei


Federal n.º 8.078/1990 (CDC) c/c o art. 21 da Lei Federal n.º 7.347/1985 (LACP),
promovida pelo e. STJ, que os reconhece como aplicáveis ao microssistema jurídico
de tutela processual ambiental, respectivamente in verbis:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...] VIII - a


facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão
do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a
critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos,


coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do
Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do
Consumidor.

Nesse sentido se firmou a jurisprudência do e. STJ, inclusive com a


aprovação de sua súmula 618:

[...] IV - Consoante o teor da Súmula n. 618/STJ, em


homenagem ao princípio da precaução, impõe-se a inversão do
ônus da prova nas ações civis ambientais, de modo a atribuir
ao empreendedor a prova de que o meio ambiente permanece
hígido, mesmo com o desenvolvimento de sua atividade. Na
espécie, não se extrai dos autos nenhuma comprovação, pelo
Agravante, de que sua atividade não causaria a degradação
apontada na ação civil pública, constatando-se, na verdade, a
iminente ameaça de severos danos ambientais, bem como à
saúde pública de um sem-número de pessoas, mormente pelo
risco concreto de contaminação do rio Paraíba do Sul. [...]
(AgInt no TP 2.476/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA,
PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/09/2020, DJe 02/10/2020)
Súmula 618-STJ: A inversão do ônus da prova aplica-se às ações
de degradação ambiental. STJ. Corte Especial. Aprovada em
24/10/2018, DJe 30/10/2018.

Essa interpretação decorre da aplicação do princípio ambiental do in dubio


pro natura, e do princípio ambiental da precaução que restou aprovado como o
princípio 15 da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
aprovada na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento — CNUMAD.

QUESTÃO

265
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

49. (Promotor de Justiça do MPSC. Consulplan – 2019). A inversão do ônus da


prova não se aplica às ações de degradação ambiental.

( ) Certo ( ) Errado

266
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

2.3.5. Desconsideração da Personalidade Jurídica

Nos termos do art. 4º da Lei Federal n.º 9.605/98, a personalidade jurídica


do poluidor ambiental poderá ser desconsiderada sempre que se tornar um
obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados ao meio ambiente, conforme in
verbis:

Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre


que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de
prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

Trata-se da aplicação da chamada teoria menor da desconsideração para


propiciar a efetiva responsabilização civil do poluidor ambiental, haja vista que —
com base nela — será bastante a demonstração de que a personalidade jurídica do
poluidor se tornou um obstáculo à efetiva reparação/indenização dos danos
ambientais causados, sendo despiciente, portanto, a investigação sobre a
existência ou não de abuso da personalidade jurídica com desvio de finalidade ou
confusão patrimonial, pressupostos exigidos apenas quando se tratar de aplicação
da teoria maior da desconsideração, consoante entendimento jurisprudencial do e.
STJ:

[...] 3. À luz do princípio poluidor-pagador e do princípio da


reparação in integrum, inadmissível que a personalidade
jurídica funcione como muro intransponível para execução de

267
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

obrigação ambiental do degradador. Com base no acervo


probatório dos autos, o Tribunal a quo constatou a insuficiência
patrimonial da empresa, a natureza ambiental da dívida e a
necessidade da aplicação da desconsideração da
personalidade jurídica sob pena de se frustrar a execução. O
reexame de matéria fática é defeso ao STJ pelo óbice da Súmula
7/STJ. [...] (AgRg no AREsp 324.781/ES, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2016, DJe
28/08/2020)

Assim, por exemplo, se determinada empresa condenada a reparar danos


ambientais se tornar insolvente e, portanto, sem patrimônio para propiciar sua
responsabilização civil, sua personalidade jurídica deve ser afastada para alcançar
o patrimônio dos sócios e viabilizar a efetiva reparação/indenização pelos danos ao
meio ambiente.

Portanto, a responsabilidade civil por danos ambientais também conta com


a garantia da aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica,
atualmente considerado pelo novo código de processo civil como uma das espécies
de intervenção de terceiros.

2.3.6. Dano Moral Coletivo

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Consoante vimos, a responsabilidade civil por danos ambientais objetiva,


solidária e imprescritível, determina ao poluidor a obrigação de reparar e indenizar
os danos causados ao meio ambiente.

Essa obrigação de indenizar refere-se aos danos patrimoniais/materiais e


extrapatrimoniais/morais, conforme expressamente previsto no art. 1º, caput e
inciso I da Lei Federal n.º 7.347/85, com a redação conferida pela Lei Federal n.º
8.884/94, in verbis:

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da


ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente;

Portanto, desde 11 de junho de 1994 (publicação da Lei Federal n.º


8.884/94) a legislação brasileira prevê expressamente a figura do dano moral
ambiental, uma vez que disciplinou as ações de responsabilidade por danos morais
causados ao meio ambiente.

Trata-se do reconhecimento de que a ofensa ao direito fundamental difuso


ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida,
viola também valores da pessoa humana, porém dispensando-se a tradicional
caracterização de dor ou padecimento para a imposição do dever de indenização
pelo dano moral coletivo, nos termos da jurisprudência do e. STJ:

[...] 3. Quanto à possibilidade de arbitramento de danos morais


coletivos, o acórdão estadual está de acordo com a
jurisprudência do STJ, que reconhece o seu cabimento, sem
necessidade de avaliação individual ou coletiva de sofrimento.
"O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de
personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a
demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a
indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado." (REsp
1269494/MG, Rel.Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe
01/10/2013). Em casos de desmatamento, é correto que o juiz
utilize, no arbitramento do dano moral coletivo, critério de
metro quadrado ou hectare degradado (conforme o modo de
comercialização de imóveis na área, p. ex., terrenos urbanos ou
rurais) para, em seguida, após a totalização, chegar ao valor
final a ser fixado. [...] (REsp 1555220/MT, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
20/10/2016, DJe 20/08/2020)

269
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

Logo, confirma-se a existência do dano moral coletivo em razão de ofensa


a direitos coletivos ou difusos de caráter extrapatrimonial —consumidor,
ambiental, ordem urbanística, entre outros. O dano moral coletivo,
compreendido como o resultado de lesão à esfera extrapatrimonial de
determinada comunidade, dá-se quando a conduta agride, de modo ilegal ou
intolerável, os valores normativos fundamentais da sociedade em si considerada,
a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva.

2.3.7. Obrigação de Fazer, de Não Fazer e de


Indenizar

Com fundamento no princípio da reparação integral do dano ambiental


(reparação in integrum), o poluidor deve ser responsabilizado civilmente por todos
os efeitos negativos decorrentes dos danos causados ao meio ambiente, razão pela
qual permite-se uma cumulação das obrigações de fazer (reparar o dano), de não
fazer (cessar a lesão) e de indenizar material e moralmente, consoante assentado
na jurisprudência do e. STJ:

[...] III - Nesse diapasão, o entendimento perfilhado pelo


acórdão objurgado se encontra em dissonância com a
jurisprudência consolidada desta Corte, segundo a qual, a
necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio
ambiente autoriza a cumulação das condenações postuladas,
porquanto, além de devido o pleito cominatório - a fim de
restaurar a área degradada, a indenização in casu não

270
RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

corresponde ao dano a ser reparado, mas aos seus efeitos


remanescentes, reflexos ou transitórios. Violação dos citados
dispositivos da Lei n. 6.938/1981 caracterizada. [...] (REsp
1862873/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA
TURMA, julgado em 20/10/2020, DJe 22/10/2020)
[...] 2. Com efeito, a cumulação de obrigação de fazer, não fazer
e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização não
é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus
efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque
para a privação temporária da fruição do bem de uso comum
do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como
o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos
ilegalmente auferidos. [...] (AgInt no REsp 1770219/MG, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
23/05/2019, DJe 19/06/2019)

Daí porque o e. STJ aprovou a súmula 629, in verbis:

Súmula 629: Quanto ao dano ambiental, é admitida a


condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer
cumulada com a de indenizar. STJ. 1ª Seção. Aprovada em
12/12/2018, DJe 17/12/2018.

Portanto, o regime de responsabilidade civil por danos ambientais permite


a condenação do poluidor de forma cumulativa, conforme abaixo:

• Obrigação de fazer: Imposição da adoção de medidas para reparar o


dano ambiental causado, como, por exemplo a determinação de
reflorestamento de áreas desmatadas de forma ilícita;

• Obrigação de não fazer: Para obstar a continuidade da lesão ao meio


ambiente;

• Obrigação de indenizar: Dever de indenizar os efeitos remanescentes,


reflexos ou transitórios do dano ambiental, para além do dano
ambiental especificamente já reparado.

Assim, é legítima a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não


fazer cumulada com a de indenizar.

2.4. Responsabilidade Penal

É de notório conhecimento que, assim como a responsabilidade


administrativa por ilícitos ambientais, a responsabilidade penal pela prática de

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RAFAEL ROCHA. SISTEMA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ILÍCITOS AMBIENTAIS • 6

crimes ambientais só pode ser subjetiva, haja vista que pressupõe a necessária
comprovação de condutas dolosas ou culposas, à luz da teoria finalista da ação de
Hans Welzel.

Deveras, apenas com a publicação da Lei Federal n.º 9.605/98, conhecida


como a Lei dos Crimes Ambientais (LCA), foi possível se estabelecer, com
racionalidade, as regras gerais sobre a responsabilidade penal ambiental e ordenar
os crimes ambientais por categorias de bens jurídicos violados. A Lei tipificou
diversos crimes ambientais dolosos e culposos.

Trata-se de norma infraconstitucional que regulamenta o mandado


constitucional expresso de criminalização das infrações ao meio ambiente
estabelecido no art. 225, §3º da Constituição da República:

Art. 225.
[...]
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio
ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados.

Registre-se ainda que a Lei n.º 9.605/98 finalmente disciplinou as regras


especiais sobre os crimes ambientais relativas aos sujeitos ativos das infrações, à
aplicação de penas, à ação penal, à suspensão condicional da pena, à suspensão
condicional do processo, à transação penal, à prova emprestada e aos critérios
adicionais para fixação da pena base e relacionados às causas atenuantes e
agravantes específicas.

Daí porque as regras gerais do código penal, do código de processo penal


e da Lei Federal n.º 9.099/95 se aplicam apenas subsidiariamente91 aos crimes
ambientais.

91Art. 79. Aplicam-se subsidiariamente a esta Lei as disposições do Código Penal e do Código de
Processo Penal.

272
GABARITO
1. Certo 25. C

2. Certo 26. D

3. D 27. C

4. C 28. C

5. A 29. Errado

6. D 30. A

7. B 31. A

8. Errado 32. B

9. Errado 33. C

10. B 34. Certo

11. C 35. Errado

12. D 36. Errado

13. Errado 37. Errado

14. C 38. Certo

15. C 39. Certo

16. A 40. Errado

17. B 41. Certo

18. E 42. Errado

19. C 43. E

20. Errado 44. Errado

21. B 45. Certo

22. A 46. D

23. B 47. Errado

24. Errado 48. Certo

273
49. D 74. Errado

50. Errado

51. Certo

52. D

53. B

54. C

55. Errado

56. Certo

57. E

58. Errado

59. Certo

60. Certo

61. E

62. Errado

63. B

64. Certo

65. Certo

66. Errado

67. B

68. A

69. E

70. D

71. D

72. Certo

73. C

274
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMADO, Frederico. Curso de Direito e Prática Ambiental. Salvador: Ed.


JusPodivm, 2018.

CAVALCANTE, Márcio. Buscador Dizer o Direito. Disponível em:


<https://www.buscadordizerodireito.com.br/>.

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo:


Malheiros, 2018.

ROCHA, Rafael Manual De Direito Ambiental 2º ed. (2023).

SILVA, Romeu Faria Thomé da. Manual de Direito Ambiental. Salvador: Ed.
JusPodivm, 2018.

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