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2022
Brasília
2ª edição
ISBN 978-65-5701-029-7
ORGANIZADO POR CP IURIS

DIREITO INTERNACIONAL
SOBRE O AUTOR

PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA. Graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais – PUC Minas. Especializações em Direito Internacional e Estudos Diplomáticos pelo Centro de Direito
Internacional e Faculdades Milton Campos. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Pará – UFPA.
Doutorando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Juiz Federal do Tribunal Regional
Federal da 1ª Região. Professor universitário na Faculdade Estácio-Doca em Belém/PA.
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SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 - ASPECTOS INTRODUTÓRIOS ............................................................................................................... 7
1. NOÇÕES HISTÓRICAS ............................................................................................................................................. 8
2. CONCEITO DE DIREITO INTERNACIONAL ...................................................................................................................... 8
3. SOCIEDADE OU COMUNIDADE INTERNACIONAL? ..........................................................................................................10
4. QUAIS AS CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL? .........................................................................................11
5. O DIREITO INTERNACIONAL É UM FENÔMENO JURÍDICO?...............................................................................................11
6. DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO ............................................................................13
7. RELAÇÕES ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E OS DIREITOS ESTATAIS ..................................................................13
7.1. As teses dualistas/pluralistas de Triepel e Santi Romano .........................................................................13
7.2. As teses monistas ...................................................................................................................................15
7.3. Posição brasileira ...................................................................................................................................18
8. FUNDAMENTO DO DIREITO INTERNACIONAL ...............................................................................................................21
8.1. Teorias voluntaristas ..............................................................................................................................21
8.2. Teorias objetivistas ou não voluntaristas ................................................................................................23
CAPÍTULO 2 - FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL ...............................................................................................26
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1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................................27
1.1. O rol do artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça ..............................................................27
2. COSTUME INTERNACIONAL ....................................................................................................................................29
2.1. Elementos do costume internacional ......................................................................................................30
2.2. Classificações dos costumes internacionais .............................................................................................30
2.3. Ausência de hierarquia entre costumes e tratados internacionais ...........................................................31
2.4. Prova dos costumes................................................................................................................................31
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2.5. Derrogação dos costumes internacionais ................................................................................................32


2.6. Novos Estados e os costumes internacionais ...........................................................................................32
2.7. Teoria do objetor persistente ..................................................................................................................33
2.8. Aplicabilidade do costume internacional em âmbito interno ...................................................................33
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3. PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO ...............................................................................................................................35


4. A JURISPRUDÊNCIA INTERNACIONAL .........................................................................................................................37
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5. A DOUTRINA ......................................................................................................................................................38
6. ATOS UNILATERAIS ..............................................................................................................................................39
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7. ATOS/DECISÕES/RESOLUÇÕES DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS ...............................................................................40


8. TRATADOS INTERNACIONAIS ...................................................................................................................................42
8.1. Conceito .................................................................................................................................................43
8.2. Terminologia: espécies de tratados.........................................................................................................45
8.3. Classificação ..........................................................................................................................................46
8.4. Condições de validade ............................................................................................................................47
8.5. Reservas ................................................................................................................................................53
8.6. Processo de elaboração dos tratados ......................................................................................................56
8.7. Vigência dos tratados .............................................................................................................................62
8.8. Aplicação dos tratados à terceiros Estados .............................................................................................63
8.9. Interpretação dos tratados .....................................................................................................................65
8.10. Alteração dos tratados .........................................................................................................................68
8.11. Suspensão e fim dos tratados ...............................................................................................................69
8.12. Conflito entre tratados .........................................................................................................................75
8.13. Conflito entre tratados e normas de direto interno................................................................................77
9. AS NORMAS DE JUS COGENS ...................................................................................................................................82
9.1. Conceito e previsão convencional ...........................................................................................................82
9.2. Características e efeitos..........................................................................................................................83
9.3. Normas de jus cogens e obrigações erga omnes .....................................................................................83
9.4. Fonte formal ou conteúdo normativo? ....................................................................................................83
9.5. Elementos das normas de jus cogens ......................................................................................................84
9.6. O reconhecimento das normas de jus cogens pelos Tribunais Internacionais ...........................................85
10. O SOFT LAW .....................................................................................................................................................86
CAPÍTULO 3 - SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL .............................................................................................88

1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................................89
1.1. As diversas posições sobre a personalidade jurídica internacional ...........................................................89
1.2. A funcionalidade como critério definidor da personalidade jurídica internacional (funcionalist approach)90
1.3. Classificações dos sujeitos do Direito Internacional .................................................................................92
2. ESTADOS ...........................................................................................................................................................93
2.1. Elementos constitutivos do Estado..........................................................................................................93
2.2. Classificação dos Estados .......................................................................................................................96
2.3. Nascimento do Estado ............................................................................................................................98
2.4. Reconhecimento de Estado e reconhecimento de governo ......................................................................99
2.5. Direitos e deveres dos Estados .............................................................................................................. 101
2.6. Transformações dos Estados ................................................................................................................ 106
2.7. A extinção e sucessão/continuidade de Estados .................................................................................... 107
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2.8. As dimensões territoriais dos Estados ................................................................................................... 111


2.9. Nacionalidade ...................................................................................................................................... 119
2.10. Relações diplomáticas ........................................................................................................................ 135
2.11. Relações consulares ........................................................................................................................... 142
2.12. Responsabilidade internacional do Estado .......................................................................................... 149
3. SANTA SÉ E ESTADO DA CIDADE DO VATICANO ......................................................................................................... 162
4. BELIGERANTES, INSURGENTES E MOVIMENTOS DE LIBERTAÇÃO NACIONAL ........................................................................ 163
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5. ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS .......................................................................................................................... 164


5.1. Teoria geral.......................................................................................................................................... 164
5.2. Organização das Nações Unidas ........................................................................................................... 170
5.3. Organização dos Estados Americanos ................................................................................................... 182
6. AS ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS............................................................................................................ 194
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7. CORPORAÇÕES OU EMPRESAS TRANSNACIONAIS ........................................................................................................ 195


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8. INDIVÍDUOS ..................................................................................................................................................... 196


8.1. A afirmação da personalidade jurídica internacional dos indivíduos ...................................................... 196
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8.2. A evolução normativa de proteção e responsabilidade penal dos indivíduos .......................................... 197
8.3. As debilidades da proteção individual em âmbito internacional ............................................................ 198
8.4. Condição jurídica do estrangeiro/migrante ........................................................................................... 199
8.5. Extradição ............................................................................................................................................ 211
8.6. Transferência de execução de pena e transferência de pessoa condenada ............................................ 224
8.7. Entrega ................................................................................................................................................ 226
8.8. Direitos de asilo e refúgio ..................................................................................................................... 227
CAPÍTULO 4 - DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO.................................................................................................234

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 235


2. FONTES .......................................................................................................................................................... 236
3. CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO .............................................................................................................................. 237
4. ESTRUTURA DA NORMA DE DIREITO INTERNACIONAL .................................................................................................. 238
4.1. Conexões pessoais................................................................................................................................ 239
4.2. Conexões reais ..................................................................................................................................... 241
4.3. Conexões delituais................................................................................................................................ 242
4.4. Conexões voluntárias ........................................................................................................................... 242
4.5. Conexões normativas ........................................................................................................................... 245
4.6. Outros elementos ................................................................................................................................. 245
5. PRECEITOS BÁSICOS DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO .......................................................................................... 245
5.1. Ordem pública...................................................................................................................................... 245
5.2. Qualificação ......................................................................................................................................... 246
5.3. Reenvio ou retorno ............................................................................................................................... 246
5.4. Direito adquirido .................................................................................................................................. 247
6. DIREITO PROCESSUAL CIVIL INTERNACIONAL ............................................................................................................ 251
6.1. Introdução ........................................................................................................................................... 251
6.2. Aplicação do Direito Estrangeiro ........................................................................................................... 252
6.3. A prova dos fatos ocorridos no exterior................................................................................................. 254
6.4. Competência internacional ................................................................................................................... 254
7. A COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL ............................................................................................................... 259
7.1. Introdução ........................................................................................................................................... 259
7.2. Objeto da cooperação internacional ..................................................................................................... 260
7.3. Auxílio-direto ....................................................................................................................................... 260
7.4. Carta rogatória .................................................................................................................................... 261
7.5. Homologação de sentença estrangeira ................................................................................................. 267
GABARITO ...........................................................................................................................................................279
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................................281


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1
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA

ASPECTOS INTRODUTÓRIOS

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ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

1. NOÇÕES HISTÓRICAS

Sem pretensões de dissertar profundamente sobre a história do Direito Internacional, por não ser o
escopo deste escrito, fato é que, desde que a humanidade passou a se organizar politicamente, em tribos,
clãs, polis etc., houve uma distinção entre os internos e os externos a essas organizações.
Portanto, é possível dizer que concomitantemente ao surgimento de uma organização social interna
está a convivência entre grupos sociais. O desenvolvimento das regras de convivência entre os grupos sociais
é a gênese do Direito Internacional, não obstante alguns doutrinadores não concordem, como Valerio de
Oliveira Mazzuoli (2020).
Se o surgimento do Direito Internacional é imemorial, o chamado Direito Internacional moderno tem
data de nascimento em 24 de outubro de 1648. Trata-se da data de assinatura da Paz de Westfália (ou
Vestfália), que pôs fim à Guerra dos 30 anos. Foram assinados dois tratados: o Tratado de Münster, pelos
Estados católicos, e o Tratado de Osnabrück, pelos Estados protestantes.
Nos Tratados de Westfália (ou Vestfália), os signatários reconheceram os chamados elementos do
Estado moderno: território, povo e soberania. A soberania, por sua vez, sendo dividida em monopólio da
produção do direito e uso de força, em âmbito interno, e, em dimensão externa, a igualdade entre os Estados.
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O sistema vestfaliano gera efeitos até os dias de hoje e, por isso, é o principal marco do Direito
Internacional. Não obstante, merecem destaque: a tentativa frustrada de manutenção da paz, com a criação
da Sociedade das Nações, em 1919ꓼ o surgimento do Sistema Onusiano, após a Segunda Guerra Mundial,
com a criação das Nações Unidas, em 1945ꓼ e o último marco digno de nota, a criação do Tribunal Penal
Internacional, em 2002.

QUESTÃO DE CONCURSO
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1. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo - Consultor Legislativo Área
XVIII) O direito internacional público surgiu na Idade Moderna, como disciplina jurídica subsidiária ao poder
absolutista dos soberanos europeus e do Estado nacional moderno, a partir de estudos sobre direitos
referentes à guerra e à paz entre as nações.
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2. CONCEITO DE DIREITO INTERNACIONAL


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O termo Direito Internacional foi cunhado por Jeremy Bentham, em 1780, na obra “Introduction to
the Principles of Morals and Legislation”. Antes disso, os termos mais utilizados eram “Direito das Gentes”,
cunhado por Francisco de Vitória no século XVI, e “Direito entre as Nações”, de Richard Zouch, Chanceler
d’Aguesseau, em 1650, ambos como traduções do termo ius gentium do direito romano1.
A definição do que vem a ser Direito Internacional não é um consenso na doutrina. Jorge Miranda
(2009, p. 16) identifica cinco critérios normalmente utilizados para a conceituação da disciplina, conforme
veremos a seguir.
O primeiro é o que restringe as normas do Direito Internacional à regulação das relações entre os
Estados. Francisco Rezek (2018, p. 27) é adepto dessa corrente, definindo o Direito Internacional como “o
sistema jurídico autônomo, onde se ordena as relações entre Estados Soberanos”2.
A crítica feita por Jorge Miranda (2009, p. 17) a essa forma de conceituação é a existência de outros
entes, além dos Estados, que compõem a “vida jurídica internacional, o atual reconhecimento da
personalidade jurídica internacional aos indivíduos e, em algumas relações, às pessoas jurídicas”.

1Vide: DINH; DAILLIER; PELLET, 2003, p. 30.


2No mesmo sentido: SHAW, 2018, p. 2; CUNHA; PEREIRA, 2004, p. 25; CONFORTI, 2015, p. 3; Focarelli, 2008, p. 1; AMARAL JÚNIOR,
2012, p. 75.

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

Uma segunda forma de definição é a que parte dos sujeitos do Direito Internacional. Hildebrando
Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella adotam esse critério, definindo o Direito
Internacional nos seguintes termos:

o conjunto de normas jurídicas que rege a comunidade internacional, determina direitos e


obrigações dos sujeitos, especialmente nas relações mútuas entre os estados e destes com
os demais sujeitos de direito internacional – como determinadas organizações
internacionais e os indivíduos (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p. 26).

André Gonçalves Pereira e Fausto Quadros (2011, p. 28) destacam que a definição do Direito
Internacional a partir de seus sujeitos acaba por importar em um círculo vicioso. Afinal, se compete ao Direito
Internacional definir quem são seus sujeitos, eles não poderiam compor seu próprio conceito.
O terceiro critério utilizado para a definição do Direito Internacional refere-se ao objeto ou à
natureza fática da relação regulada de suas normas. O Direito Internacional seria o conjunto de normas que
regulam as matérias de natureza internacional. Celso de Albuquerque Mello, ao adotar esse critério, define
o Direito Internacional como “o conjunto de normas que regula as relações externas dos atores que
compõem a sociedade internacional” (MELLO, 2002, p. 77).
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Cabe destacar que a grande falha desse critério é a impossibilidade de delimitação a priori do que e
quais seriam as matérias internacionais em contraposição às matérias internas (MIRANDA, 2009, p. 18).
Ademais, é importante destacar que as normas do Direito Internacional não regulam apenas matérias
externas aos Estados.
O quarto critério utilizado para definir a disciplina diz respeito ao processo de formação das normas.
Assim, o Direito Internacional seria o conjunto de normas resultante de um processo de formação específico,
distinto das normas produzidas no Direito interno. Jorge Miranda (2009, p. 18) explica que tal critério se
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mostra demasiadamente formal para abarcar a noção do Direito Internacional, não sendo capaz de
demonstrar seu sentido e alcance.
O quinto e último critério refere-se à fonte de produção normativa (a comunidade internacional).
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O Direito Internacional seria a expressão jurídica da existência de uma comunidade internacional, enquanto
o direito interno seria organizado pelo Estado.
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A principal crítica a esse critério é desconsiderar que atos internos também são fontes dos Direito
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Internacional (atos unilaterais) reconhecidas pela doutrina e pelas Cortes Internacionais (MAZZUOLI, 2020,
p. 21). Jorge Miranda, por sua vez, aponta a existência de não apenas uma comunidade internacional, mas
de várias, entre as quais regionais, setoriais etc., ressaltando, também, que o próprio conceito de
comunidade é uma visão ideológica ou metajurídica (MIRANDA, 2009, p. 19).
Por entender que os cinco critérios isoladamente são insuficientes para uma definição completa da
disciplina, alguns doutrinadores nacionais tendem a utilizar mais de um deles. Sidney Guerra (2019, p. 85),
por exemplo, conceitua o Direito Internacional como sendo o “conjunto de normas (regras e princípios) que
regem os sujeitos e demais atores internacionais no âmbito da sociedade internacional e que tem por escopo
a busca da manutenção da paz, da justiça internacional, bem como promover o desenvolvimento dos povos”.
Outra definição da disciplina que merece destaque é a de direito internacional como processo, de
James Crawford, representando a escola de New Haven. Para o autor, ex-juiz da Corte Internacional de
Justiça, falecido em 2021, o direito internacional “é o produto de um processo de demandas e
contrademandas, ações e reações, por governos como representante dos estados e por outros atores em
nível internacional” (CRAWFORD, 2014, p. 21).

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

Nesse cenário de múltiplas concepções, Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p.
29) preferem uma definição genérica ou sintética conceituando o Direito Internacional como “direito da
sociedade internacional”3.
Concordando com as críticas aos critérios de definição citados e para não incorrer em limitações
indevidas quanto aos intervenientes, ao conteúdo ou à finalidade, um conceito genérico da disciplina mostra-
se menos problemático. Assim sendo, conceitua-se o Direito Internacional como o conjunto de normas
jurídicas que rege as relações da sociedade internacional.

3. SOCIEDADE OU COMUNIDADE INTERNACIONAL?

Uma vez conceituada a disciplina, é necessário analisar seus elementos e eventuais polêmicas que
deles possam surgir. A primeira delas é a discussão doutrinária acerca da existência de uma comunidade
internacional.
O termo comunidade internacional é utilizado, por exemplo, pela Convenção de Viena sobre
Tratados, de 1969 (artigo 53), enquanto o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos utiliza
comunidade das nações (artigo 15). A Carta das Nações Unidas, em seu preâmbulo, utiliza o termo povos das
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nações unidas.
Há quem entenda que os termos “sociedade internacional” e “comunidade internacional” funcionam
como sinônimos, a exemplo de Umberto Leanza e Ida Caracciolo. Contudo, parte da doutrina aponta a
diferenciação entre os termos, proveniente de seus vocábulos no alemão.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 36) explica que uma comunidade (Gemeinschaft) se
funda em vínculos espontâneos e de caráter subjetivo. Envolve fatores como identidade, laços culturais,
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emocionais, históricos, sociais, religiosos e familiares comuns de seus membros. Caracteriza-se, portanto,
pela ausência de dominação, pela cumplicidade e pela identificação entre seus membros em uma convivência
harmônica.
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Já a sociedade (Gesellschaft) apoia-se no interesse de seus integrantes. Seus membros, por um ato
volitivo, buscaram se associar para atingir objetivos comuns. É marcada, portanto, pelo papel decisivo da
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vontade como elemento que promove a aproximação entre seus membros e pela existência de fins que o
grupo pretende alcançar (PORTELA, 2015).
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Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020), aderindo aos ensinamentos de Ferdinand Tönnies, destaca que,
em uma comunidade, os membros permanecem unidos apesar de fatores buscarem sua separação; por outro
lado, em uma sociedade, os membros permanecem essencialmente separados, não obstante os fatores
tenderem à sua unificação.
Portanto, correta a conclusão de Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 32)
quando dizem que a heterogeneidade dos Estados atualmente é incompatível com a ideia de comunidade.
Talvez o melhor exemplo a ser dado é a atuação dos Estados no combate à pandemia da COVID-19, quando
boa parte deles não buscou atuações conjuntas e coordenadas de enfretamento ao caos que se instalava.

ATENÇÃO!
Em provas de concurso, não foram encontradas questões objetivas que explorassem a diferenciação
entre os termos. Uma explicação possível é a divergência doutrinária sobre os significados. No entanto,
questões dissertativas e em arguições orais, principalmente, saber diferenciar os termos é um fator

3 No mesmo sentido: BROTÓNS, 2010; RONZITTI, 2013; LEANZA; CARACCIOLO, 2008.

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

importante. A depender do grau de exigência do examinador, confundir a terminologia ou não saber sua
distinção pode acarretar diminuição da nota.

4. QUAIS AS CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE INTERNACIONAL?

Francisco Rezek (2018, p. 25) destaca que — ao contrário do âmbito interno, no qual existe um ente
detentor do monopólio do uso da força de produção do Direito (que é o Estado) — a sociedade internacional
é descentralizada, sendo organizada pelos Estados de forma horizontal.
Nesse contexto, a sociedade internacional é tida como paritária, pois inexiste um ente superior no
plano internacional, devendo ser compatibilizada, portanto, a soberania de cada um de seus membros
(GUERRA, 2019, p. 64).
A sociedade internacional, segundo Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 36), é universal e
heterogênea, pois abrange todo o globo, ainda que sejam distintos os níveis de interação de seus membros,
que, por sua vez, são diferentes dos pontos de vista econômica, social, cultural etc.
Sidney Guerra (2019, p. 62), ponderando sobre o assunto, aponta ainda que a sociedade
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internacional é aberta, considerando que não há um número determinado de atores que intervêm nas
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relações internacionais.

Sociedade internacional

Descentralizada Paritária Universal Heterogênea Aberta


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Seus membros são Não há um número


Ausente um ente Não há hierarquia Abrange todo o globo diferentes do ponto predefinido de
central detentor do entre seus membros terrestre de vista econômico, membros
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poder
social e cultural
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5. O DIREITO INTERNACIONAL É UM FENÔMENO JURÍDICO?


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O filósofo inglês Jon Austin, em sua obra The Province of Jurisprudence Determined, defendia a
existência do Direito pela existência de uma autoridade soberana com poderes absolutos em um território.
Dessa forma, não havendo na sociedade internacional um ente dotado de poder soberano sobre os demais
membros, para o autor inglês, o Direito Internacional seria um fenômeno moral e não jurídico.
Thomas Hobbes, por meio de um fundamento jusnaturalista radical (CUNHA; PEREIRA, 2004, p. 20),
defendeu que os reis, em seu estado de natureza, são isentos de subordinação a qualquer poder superior,
em constante rivalidade e em uma atitude de guerra. Em razão disso, conclui que “onde não há poder
comum, não há lei; onde não há lei, não há injustiça” (HOBBES, 2020, ebook, p. 152).
Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira (2004, p. 20) citam parte da doutrina,
de natureza neo-hegeliana, como Adolf Lasson, que, por considerar o Estado a forma suprema de organização
humana, reduz o Direito Internacional a uma expressão política, composta por um conjunto de fórmulas
decorrentes das relações entre os Estados.
Os autores citam Ernst Zitelmann, que considera o Direito Internacional um direito imperfeito em
razão das seguintes características: ter um objeto reduzidoꓼ ser composto de preceitos insegurosꓼ com grande

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

número de cláusulas de restrição de sua aplicaçãoꓼ admitir o direito de represáliaꓼ e considerar a guerra como
processo de proteção e defesa dos interesses dos Estados (CUNHA e PEREIRA, 2004, p. 21).
Autores filiados ao realismo jurídico também tendem a negar a normatividade do direito
internacional. Nas relações internacionais a ideia de poder, principalmente militar, acabaria por relegar o
direito a um “papel epifenomenal”, no sentido de que os Estados só obedecem ao direito internacional
quando têm interesse (CRAWFORD, 2014, p. 29). O exemplo recente que ilustra essa corrente é a Segunda
Guerra do Iraque, em que os Estados Unidos e seus aliados invadiram o Iraque sem qualquer justificativa
legal válida.
James Crawford (2014, p. 30) reconhece a atração intelectual e emocional das correntes que negam
a normatividade do direito internacional, em especial o realismo, principalmente por sua propensão a
simplificar fatos complexos e parecer revelar “motivações ocultas” dos atores internacionais. Contudo, o
autor busca responder à crítica negativista por três grandes argumentos: o histórico; o empírico; e o
“processual”.
Pelo argumento histórico ou historiográfico, o autor aponta que a ideia de normas internacionais
regendo as relações entre Estados (não no sentido de Estado-moderno) já existia na Grécia antiga, sendo
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ainda superior na época de Roma.


Do ponto de vista empírico, James Crawford ressalta a ampliação das organizações internacionais
com atividades cada vez mais especializadas, consolidando uma gama maior de direitos em âmbito
internacional. Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 27)
destacam, no mesmo sentido, que os Estados, em suas relações internacionais, reconhecem como
obrigatórias normas que acabam por limitar sua soberania nacional. Não há de se falar, assim, em expressão
moral ou política do Direito Internacional.
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Já em um viés processual, James Crawford aponta que o número de conflitos internacionais reduziu
drasticamente após a proibição do uso da força em âmbito internacional. Ademais, após o Protocolo de
Montreal sobre a Proteção da Camada de Ozônio a emissão de cloro-flúor-carbono também teve uma
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redução considerável. Em outros termos, a produção de normas internacionais tem se mostrado um efetivo
instrumento de regulamentação das relações internacionais.
Marceli souza

Ademais, ao longo dos anos, foram desenvolvidos mecanismos de solução de controvérsia entre os
Marceli

membros da sociedade internacional, inclusive com a criação de tribunais internacionais permanentes ou ad


hoc com competência para julgar não apenas Estados, mas, também, indivíduos por violação a normas do
Direito Internacional. Já, em âmbito interno, normas internacionais são cada vez mais utilizadas para a
resolução de conflitos.
Daí, correta a ponderação de Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira (2004, p.
22) que, para além do chamado direito de subordinação, próprio do Direito Interno, há o direito criado por
cooperação entre os membros de uma sociedade, isto é, um direito de coordenação, característico da
sociedade internacional, revelando a normatividade do direito internacional.

QUESTÃO
2. (ESAF - 2003 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) A ausência de um Poder
Legislativo universal, bem assim de um Judiciário internacional com jurisdição compulsória, são alguns dos
argumentos
utilizados pelos negadores do direito internacional para falar da ausência de caráter jurídico do direito das
gentes.

12
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

6. DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

A origem da distinção entre direito internacional público e o direito internacional privado, segundo
Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 30), decorre da publicação da obra “Traité de droit
international privé”, de Jean Jacques Gaspard Foelix, em 1843, também denominada “De conflit des lois de
différentes nations en matière de droit privé”.
A distinção clássica entre as disciplinas se dá pelo fato de que o direito internacional público regularia
as relações entre os Estados, enquanto o direito internacional privado, as relações entre particulares.
Tal distinção não é isenta de críticas. Afinal, se o elemento distintivo entre direito público e direito
privado é a presença do Estado em um dos polos da relação jurídica, considerando que as normas de Direito
Internacional Privado se referem à definição da ordem jurídica (nacional ou estrangeira) a ser aplicável em
uma lide, em razão de um conflito de leis, não haveria nessa escolha a presença de um particular nessa
relação, isto é, na escolha. Em outros termos, as normas de Direito Internacional Privado têm natureza de
ordem pública.
Ademais, compete à legislação interna, a priori, a definição de qual lei (ordenamento) aplicável no
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caso concreto. Portanto, de regra, não se trata de normas internacionais (CONFORTI, 2015, p. 4), ainda que,
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em determinadas situações, seja possível tratado internacional versando sobre o tema.


Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira (2004, p. 26), por sua vez, defendem a
distinção entre as disciplinas, mas por outro fundamento. Para os autores, tanto o Direito Internacional
Público quanto o Direito Internacional Privado regulam relações entre Estados. Enquanto o DIP regularia
relações imediatas, o DIPr regularia relações mediatas.
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7. RELAÇÕES ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E OS DIREITOS


ESTATAIS

Uma das questões mais antigas e polêmicas do direito internacional refere-se à sua relação com o
souza -- CPF:

direito interno dos Estados-nações.


Marceli souza

Como bem destaca Valerio Oliveira Mazzuoli (2020, p. 31), a discussão desse problema vai além de
tergiversações doutrinárias, apresentando aspectos teóricos tanto a respeito de eventual hierarquia entre o
Marceli

Direito Internacional e o Direito Interno quanto relacionados à solução de eventuais antinomias entre normas
de âmbitos distintos.
Para responder a essas questões, na Alemanha do século XIX, surgiu o famoso debate entre Hans
Kelsen, com sua teoria monista, e Karl Heinrich Triepel, com sua teoria dualista. Breno Baía Magalhães (2015,
p. 30) ressalta que, originariamente, os autores estavam preocupados com as tensões relacionadas à
soberania, vontade e obrigação jurídica perante os Estados.
O autor destaca ainda que, no âmbito interno, muitos doutrinadores acabam por confundir aspectos
descritivos das teorias com teses de incorporação de normas internacionais.

7.1. As teses dualistas/pluralistas de Triepel e Santi Romano

Karl Heinrich Triepel, na construção de sua teoria dualista, parte do pressuposto de que o direito
internacional e o direito interno são sistemas jurídicos distintos, em razão de dois critérios: as relações
sociais e as fontes jurídicas.
Acerca das relações sociais, Triepel (1966, p. 8) defende que o direito interno regula apenas as
relações sociais das pessoas (físicas ou jurídicas) sujeitas à soberania de um Estado, enquanto o direito

13
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

internacional rege as relações entre os Estados soberanos. Para o autor, o indivíduo, no ordenamento
internacional, não tem direitos ou deveres, sendo apenas objeto de direitos e deveres internacionais
(TRIEPEL, 1966, p. 12).
Em relação às fontes jurídicas, o autor aponta que, no direito interno, as normas jurídicas derivam
da vontade do Estado, enquanto, no direito internacional, as normas derivam da “vontade coletiva”
(Vereinbarung) dos Estados que compõem a sociedade internacional (ibid., p. 14). O autor busca apontar,
ilustrativamente, a distinção entre os ordenamentos interno e internacional como “círculos em íntimo
contato, mas que jamais se sobrepõem” (ibid., p. 16).
Segundo a teoria dualista de Triepel, nunca haverá um conflito entre normas do direito internacional
e do direito interno, considerando que, ainda que o conteúdo da primeira seja incorporado ao ordenamento
interno, a natureza da obrigação é distinta (ibid., p. 17).
Os dois últimos parágrafos sintetizam a fonte das confusões internas, e, por isso, necessitam de uma
pequena digressão. A melhor ilustração da teoria dualista de Triepel são duas retas paralelas: uma seria o
ordenamento interno, e a outra, a ordem internacional. Enquanto na ordem interna compete ao Estado ser
o autor das normas e, eventualmente, o seu destinatário; no âmbito internacional, a fonte de produção
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normativa é a vontade geral dos Estados, sendo os Estados, individualmente, seus destinatários.
Sujeitos:
ORDENAMENTO INTERNACIONAL Estados nacionais

Fonte material:
vontade coletiva
dos Estados
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Sujeitos:
pessoas naturais e
ORDENAMENTO NACIONAL jurídicas
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Fonte material:
o Estado
Marceli

Se as ordens não se tocam, não poderia um sujeito, no âmbito interno, buscar a aplicação de uma
norma de âmbito internacional. É nesse contexto, portanto, impossível falar em conflito de normas de
ordenamentos distintos.
Na prática, em uma demanda interna, o ordenamento nacional, independentemente de seu
conteúdo, sempre prevalece em face de uma norma internacional, sendo a recíproca verdadeira. Em uma
demanda internacional, não seria possível a um Estado opor uma norma de âmbito interno para se eximir de
uma obrigação proveniente de uma norma do direito internacional.
Outra tese de mesma natureza é o pluralismo institucionalista de Santi Romano, escrito na obra “O
ordenamento jurídico”, de 1949. Em síntese, o autor admite a existência de múltiplos ordenamentos jurídicos
que se interrelacionam. Porém, quanto à relação entre ordenamento interno e internacional, o autor destaca
que é “sempre o Estado que determina o conteúdo do próprio ordenamento” (ROMANO, 2008, p. 182).
Observe, então, que o direito internacional não integraria um ordenamento interno, seja em razão
de seu conteúdo, seja em função dos destinatários, ainda que o Estado fizesse um “reenvio” de uma norma
internacional ao seu próprio ordenamento (ibid., p. 183).

14
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

Ambas as teorias, apesar de importantes de um ponto de vista histórico, são defasadas em relação
aos dias atuais:

• primeiro porque a sociedade internacional não é composta apenas por Estados, mas, também,
por organizações internacionais e, principalmente indivíduos, com direitos e deveres surgidos de
normas do direito internacional;
• segundo porque normas internas podem ser fontes do Direito Internacional (atos unilaterais dos
Estados), e normas internacionais podem ser invocadas para a resolução de conflitos internos.

7.2. As teses monistas

Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 96) explicam que a premissa básica das
teorias monistas é a de que o mundo jurídico é unitário. Porém, se há um único ordenamento com várias
fontes de produção normativa (nacionais e internacionais), é possível haver uma antinomia entre as normas.
Daí a doutrina divide-se em três correntes: monismo nacionalista, monismo internacionalista e monismo
moderado/dialógico.
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Os monistas nacionalistas, inspirados na noção hegeliana de Estado como personificação do máximo


ético, defendem que a vontade do Estado prepondera sobre as normas do direito internacional. Adepto dessa
corrente, Francisco Rezek defende que:

posto o primado da constituição em confronto com a norma pacta sunt servanda, é corrente
que se preserve a autoridade da lei fundamental do Estado, ainda que isto signifique a
prática de um ilícito pelo qual, no plano externo, deve aquele responder (REZEK, 2018, p.
98).
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Monismo nacionalista
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Direito
Marceli souza

nacional
Marceli

Direito
internacional

Os monistas internacionalistas, como os do direito natural (Hersch Lauterpacht), sociológicos


(George Scelle) ou estritamente jurídicos (Hans Kelsen), defendem, por diversos fundamentos, a prevalência
do direito internacional em face do direito interno.
Das teorias monistas internacionalistas, a de Hans Kelsen merece maior destaque. Para o autor, de
um ponto de vista lógico, as teorias dualistas/pluralistas não se sustentam, em razão da impossibilidade de
coexistência de normas mutuamente válidas em um mesmo espaço e tempo (KELSEN, 2000, p. 516).
Para Kelsen, de um ponto de vista lógico, uma norma é válida quando derivada de uma norma
fundamental. A norma que fundamenta todos os ordenamentos nacionais, segundo o autor, é o princípio da
eficácia, que, por sua vez, é um princípio do direito internacional.

15
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

[...] a primeira constituição histórica é válida porque a ordem coercitiva erigida com base
nela é eficaz como um todo. Desse modo, a ordem jurídica internacional, por meio do
princípio da eficácia, determina não apenas a esfera de validade, mas também o
fundamento de validade das ordens jurídicas nacionais. Como as normas fundamentais
das ordens jurídicas nacionais são determinadas por uma norma de Direito Internacional,
elas são fundamentais apenas num sentido relativo. A norma fundamental da ordem
jurídica internacional também é fundamento último da validade das ordens jurídicas
nacionais (KELSEN, 2000, p. 523, destaque nosso).

Em suma, para Kelsen, o princípio da eficácia identifica os elementos dos Estados modernos,
atribuindo-lhes parcela de território para que eles possam exercer sua soberania. Já a norma fundamental
do direito internacional, ainda segundo o autor, ao contrário do que defendido por alguns doutrinadores,
não é o princípio da pacta sunt servanda, mas a norma que aprova o costume internacional como fato
criador de normas jurídicas cogentes aos Estados (ibid., p. 525).
Kelsen admite a possibilidade de conflito entre normas do direito internacional e do direito interno,
porém, ao contrário do que muitos apontam, ele confere às constituições a escolha sobre a prevalência da
norma (interna ou internacional) (ibid., p. 539). Trata-se de uma questão política que não impedirá a
responsabilização pelo eventual descumprimento da norma internacional.
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Ainda para o referido autor, a supremacia do direito internacional é uma questão de conteúdo
normativo e não de soberania (ibid., p. 546).

Monismo internacionalista
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Direito
internacional
souza -- CPF:
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Direito interno
Marceli

Jorge Miranda (2009, p. 136) aponta que, para além dessas teorias monistas radicais, existe a teoria
monista mitigada ou moderada, em que a relação entre direito interno e internacional não se limita à de
validade normativa apriorística de uma sobre a outra, mas leva em consideração o conteúdo normativo:

A relação do Direito Internacional comum com o direito interno tende a ser, um pouco por
toda a parte, uniforme e constante; e o primado do primeiro – mormente, do jus cogens –
traduz, afinal, o primado do bem comum universal. Em contrapartida, a relação do Direito
Internacional convencional e do Direito das organizações internacionais e de entidades afins
com o Direito interno tem-se revelado bastante diversificada – diversificada por causa do
conteúdo e dos objetivos das próprias normas internacionais e diversificada por causa das
legítimas opções constitucionais dos vários Estados (MIRANDA, 2009, p. 138, destaque
nosso).

Antônio Augusto Cançado Trindade (1997, p. 435) destaca que, em relação às normas do Direito
Internacional dos Direitos Humanos, as chamadas cláusulas de comunicabilidade ou abertura (MALISKA,
2013, p. 117), presentes na maioria das constituições latino-americanas e, também, nos tratados

16
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

internacionais de direitos humanos, mitigariam as discussões de prevalência entre as teorias monistas e


dualistas.
O art. 5º, § 2º, da Constituição seria o exemplo da chamada cláusula de abertura no ordenamento
interno, enquanto o artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos seria a cláusula de
comunicabilidade do Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Por meio do princípio pro homine ou pro
persona, ambos os textos normativos determinam a prevalência da norma que contenha a disposição mais
favorável à vítima.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 45) defende uma posição monista internacionalista dialógica.
Em princípio, caberiam às normas do direito internacional prevalecerem sobre a ordem interna. Contudo,
considerando a teoria do diálogo das fontes de Erik Jayme e a possibilidade formal prevista nos tratados de
direitos humanos, num caso concreto, em função do princípio pro homine, seria possível a norma nacional
prevalecer, exatamente por melhor proteger o ser humano:

[...] a aplicação de uma lei doméstica (quando mais benéfica) em detrimento de um tratado
de direitos humanos não deixa de respeitar ao princípio da hierarquia, pois proveio
justamente de uma norma de interpretação do tratado (que consagra o “princípio da
primazia da norma mais favorável ao ser humano”, ou “princípio internacional pro homine”)
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que lhe é hierarquicamente superior. Aqui se trata de uma hierarquia de valores, ou seja,
substancial ou material, em contraposição à ultrapassada hierarquia meramente formal, de
cunho intransigente. Em suma, o monismo internacionalista ainda continua a prevalecer
nessa hipótese, mas com dialogismo. Daí a nossa proposta de um monismo
internacionalista dialógico, quando o conflito entre as normas internacionais e internas diz
respeito ao tema dos “direitos humanos” (MAZZUOLI, 2020, p. 47).

Monismo moderado/mitigado/dialógico
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Cláusulas de
abertura
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Direito Direito
Marceli souza

Interno Internacional
Marceli

Cláusulas de
abertura

Antes de adentrar na posição adotada no ordenamento pátrio, mostram-se necessárias algumas


breves ponderações sobre o tema. Normalmente, por trás das discussões sobre o monismo e dualismo, o
que se pretende é saber “quem dá a última palavra”. Em outros termos, discute-se qual o órgão
(normalmente jurisdicional) com o poder de decidir por último.
Na prática, a adoção de uma teoria dualista ou monista nacionalista tem o mesmo efeito, que é
colocar o Estado e seus órgãos internos como protagonistas da criação e aplicação do Direito, ou seja, dizer
que as normas internas prevalecem sobre as internacionais equivale dizer que as cortes constitucionais
prevalecem sobre os órgãos internacionais.
A questão pouco debatida, no entanto, refere-se à posição ideológica que antecede a adoção da
teoria monista nacionalista. Admite-se a experiência jurídica como única (um único ordenamento) e o centro

17
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

dessa ordem é o direito nacional. Um Estado que adota tal posição tem a pretensão de se colocar,
literalmente, no centro do mundo, ou, melhor dizendo, no ápice da ordem jurídica global.
Nessa visão, trata-se de uma posição imperialista (extremada), pautada em uma concepção forte de
soberania, que, historicamente, justificou guerras e atrocidades contra a humanidade. Ademais, quando mais
de um Estado adota a mesma teoria (monista nacionalista), eles, em conjunto, contrariam a premissa da
unidade jurídica, retornando, na prática, à corrente dualista/pluralista.
Portanto, a teoria monista internacionalista moderada, mitigada ou dialógica é a posição que melhor
se coaduna com o contexto fático, de interdependência dos atores na sociedade internacional, e jurídico, de
imposição de limites à soberania estatal, principalmente em matérias relacionadas aos direitos humanos.

7.3. Posição brasileira

Há textos normativos internos que demonstram a adoção da posição do monismo moderado


internacionalista no sistema brasileiro. Entre eles, pode-se citar o Código Tributário Nacional (CTN), em seu
art. 98, que dispõe o seguinte:
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Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação


tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.

No mesmo sentido, o art. 85-A da Lei n.º 8.212/1991, incluído pela Lei n.º 9.876/1999, que assim diz:

Art. 85-A. Os tratados, convenções e outros acordos internacionais de que Estado


estrangeiro ou organismo internacional e o Brasil sejam partes, e que versem sobre matéria
previdenciária, serão interpretados como lei especial. (Incluído pela Lei n.º 9.876, de 1999)

Já a Convenção de Viena sobre Tratados, internalizada pelo Decreto n.º 7.030/2009, adota uma teoria
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internacionalista radical:

Artigo 27. Direito Interno e Observância de Tratados


Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o
souza -- CPF:

inadimplemento de um tratado. Esta regra não prejudica o artigo 46.

A jurisprudência pátria, por sua vez, enfrenta grandes divergências. No que se refere aos tratados
Marceli souza

relativos ao Direito Tributário, estes são interpretados como norma especial, prevalecendo sobre a norma
Marceli

posterior, revelando uma posição monista internacionalista moderada:

3. Os tratados e convenções internacionais em matéria tributária são leis especiais (cf. art.
2º, § 2º da LICC), de modo que revogam a lei geral (lei interna) quanto ao objeto da
convenção, e são observados pela legislação interna (lei geral) que lhes sobrevenha. (STJ,
REsp 1025542/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, segunda turma, julgado em 01/12/2009,
DJe 14/12/2009)

Contudo, em uma verdadeira confusão entre a incorporação dos tratados ao ordenamento e o


arcabouço teórico descrito, o ministro Celso de Mello, no julgamento da ADI 1.480-MC, concluiu que o Brasil
adota uma teoria dualista moderada. Para o ministro relator (p. 244), o procedimento complexo de
ratificação interna de um tratado para a vigência interna de um tratado internacional no país — com a
necessidade de manifestação do Congresso Nacional e do presidente da República, por meio de decreto
executivo — importaria na adoção da teoria dualista.
Para melhor debatermos esse entendimento, algumas considerações devem ser feitas acerca do
julgado:

• da leitura do voto do ministro Celso de Mello, afere-se a intenção primordial de afirmação da


supremacia da Constituição em relação aos tradados internacionais (próprio da teoria monista

18
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

nacionalista) para possibilitar o controle de constitucionalidade do ato internacional. Após uma


digressão (e verdadeira confusão) sobre ratificação, incorporação normativa e status formal dos
tratados internacionais, o relator concluiu pela adoção da teoria dualista moderada;
• dos ministros que participaram do julgamento, apenas o relator min. Celso de Mello apontou, em
obiter dicta, a adoção da teoria dualista moderada. Os demais ministros discutiram, nas 153
páginas do acórdão, basicamente qual o status formal do tratado internacional (Convenção n.º
158 da OIT) no ordenamento interno, tendo em vista que o art. 7º, I, da Constituição previu que
as normas deveriam ser tratadas por lei complementar. Em suma, o cerne da discussão era se um
tratado internacional teria status formal de lei ordinária e, com isso, não teria o condão de
regulamentar a CF/88 art. 7º, I, que determina a reserva de lei complementar, ou, se, ao ser
internalizado, o que importaria seria o conteúdo do tratado e não sua forma, sendo possível a
internalização com status de lei complementar;
• o resultado do julgamento foi a interpretação conforme a Constituição para que Convenção n.º
158 da OIT fosse considerada uma norma não autoexecutória, dependendo de manifestação
legislativa posterior para sua implementação, considerando o disposto no artigo 10 do tratado.
Em outros termos, no final do julgamento, o Supremo Tribunal Federal evitou discutir o status
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formal do tratado e a eventual adoção das teorias monistas e dualistas.

Além do referido julgado, ganha destaque a discussão do status formal normativo dos tratados de
direitos humanos no ordenamento brasileiro, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a partir
do julgamento do RE 349.703. Isso porque, ao considerar que os tratados internacionais de direitos humanos
anteriores à EC n.º 45/2004 são de status normativo supralegal — isto é, abaixo da Constituição, mas
superiores às demais normas do ordenamento —, adota-se uma teoria monista nacionalista moderada.
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No Superior Tribunal de Justiça, por outro lado, há julgado adotando expressamente a teoria do
monismo moderado:

Também os Tratados e Convenções internacionais, que, segundo a teoria do Monismo


souza -- CPF:

Moderado, ingressam no Direito Brasileiro com status de lei ordinária, veiculam diversas
normas de combate ao trabalho em condições degradantes. Em rol exemplificativo, deve-
Marceli souza

se registrar a Convenção sobre a Escravatura (Decreto 58.562/1966) e as Convenções da


Organização Internacional do Trabalho números 29 (Trabalho Forçado e Obrigatório) e 105
Marceli

(Abolição do Trabalho Forçado), ambas ratificadas pelo Brasil (Decreto 41.721/1957 e


Decreto-Lei 58.882/1966, respectivamente). (STJ, MS 14.017/DF, Rel. Ministro Herman
Benjamin, primeira seção, julgado em 27/05/2009, DJe 01/07/2009)

CUIDADO!
Para fins de concurso, deve-se estar atento à forma de redação das questões objetivas, pois ora se
questiona o conteúdo das teorias, ora a eventual adoção de uma delas pelo Brasil. Nessa última
possibilidade, a atenção deve ser redobrada. Se a temática se relaciona à proteção dos direitos humanos,
é provável que a resposta correta seja a adoção do monismo internacionalista mitigado/moderado/
dialógico.
Porém, se a questão for genérica ou a banca examinadora for o Cebraspe, é possível que a resposta
a ser considerada correta seja dualismo moderado. Isso porque, ao adotar a literalidade do voto do min.
Celso de Mello na ADI 1.480/MC, em uma questão objetiva, o Cebraspe considerou errada a assertiva que
previa a adoção de um monismo moderado no Brasil.

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

QUESTÕES
3. (CESPE/CEBRASPE - 2011 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal) O Estado regulamenta a convivência social
em seu território por meio de legislação nacional, e a comunidade internacional também cria regras, que
podem conflitar com as nacionais. A respeito das correntes doutrinárias que procuram proporcionar
solução para o conflito entre as normas internas e as internacionais, assinale a opção correta.
a) A corrente monista e a dualista apresentam as mesmas respostas para o conflito entre as normas internas
e as internacionais
b) Nenhum país adota a corrente doutrinária monista.
c) Consoante a corrente monista, o ato de ratificação de tratado gera efeitos no âmbito nacional.
d) De acordo com a corrente dualista, o direito interno e o direito internacional convivem em uma única
ordem jurídica.
e) De acordo com a corrente monista, a norma interna sempre prevalece sobre a internacional.
4. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - ANAC - Analista Administrativo) De acordo com o dualismo, as normas
de direito internacional e de direito interno existem separadamente e não afetam umas às outras. No Brasil,
a teoria adotada é o monismo, de acordo com a qual há unidade do ordenamento jurídico, ora
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prevalecendo as normas de direito internacional sobre as de direito interno, ora prevalecendo estas sobre
aquelas.
5. (VUNESP - 2017 - DPE-RO - Defensor Público Substituto) Assinale a alternativa que contém o critério
que deve ser adotado no conflito entre a Constituição Federal e determinado tratado internacional de
proteção de direitos humanos.
a) Não há critério pré-estipulado, ficando a cargo do julgador a análise sobre qual das normas melhor se
adequa ao caso concreto.
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b) Dada a supremacia da Constituição Federal no ordenamento jurídico interno, a regra nela prevista
prevalece sobre a norma prescrita no tratado internacional de proteção de direitos humanos.
c) Prevalece a norma mais benéfica ao indivíduo, titular do direito (princípio pro homine).
souza -- CPF:

d) Lei posterior revoga lei anterior com ela incompatível.


e) Por possuir hierarquia supraconstitucional, prevalece a norma do tratado internacional de proteção de
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direitos humanos.
Marceli

6. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Um problema perene que
envolve discussões teóricas e práticas é a coexistência de normas internacionais com normas nacionais. A
esse respeito, assinale a opção correta.
a) As correntes teóricas que estabelecem critérios para justificar a solução de conflitos normativos entre as
normas internacionais e as normas internas prescindem dos ordenamentos jurídicos nacionais.
b) O fato de um Estado não poder invocar uma norma jurídica doméstica para se escusar de uma obrigação
internacional significa que o direito internacional ignora o direito interno.
c) Na hipótese de conflito entre uma norma constitucional e uma norma internacional, prevalecerá a
primeira, pois apregoa-se a obrigatoriedade do direito internacional às regras do direito interno, em
decorrência de uma percepção teórica de um monismo do tipo internacionalista.
d) As correntes teóricas dualistas, ainda que moderadas, apregoam uma visão que engloba de forma
indistinta tratados internacionais, costumes e princípios gerais de direito.
e) Considera-se o monismo do tipo internacionalista dialógico uma corrente adequada para tratar de
conflitos normativos que envolvam direitos humanos, visto que poderia haver a aplicação da norma de
direito interno em detrimento da de direito internacional ou vice-versa.

20
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

7. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Ao defender a independência do direito


internacional em relação ao direito nacional, os dualistas o fazem levando em consideração exclusivamente
as hipóteses de conflito entre um tratado e uma norma de direito interno.
8. (FCC - 2018 - Câmara Legislativa do Distrito Federal - Consultor Legislativo) Para os dualistas, tais
como Alfred von Verdross e Dionísio Anzilotti, no tocante à incorporação de tratados de direitos humanos
à ordem jurídica interna:
a) o direito internacional aplica-se na ordem jurídica dos Estados, independentemente da sua
transformação em norma interna.
b) em caso de conflito, prevalece o ordenamento jurídico interno.
c) em caso de conflito, prevalece o ordenamento jurídico internacional.
d) apresentando os dois ordenamentos jurídicos nas diferentes esferas de atuação, não poderia haver
nenhum tipo de conflito entre os dois e nem o que se falar de supremacia de um sobre o outro.
e) perde a eficácia o ordenamento jurídico internacional em caso de arbítrio de um Estado estrangeiro
sobre nosso País.

8. FUNDAMENTO DO DIREITO INTERNACIONAL


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Outro ponto bastante polêmico do direito internacional, intimamente ligado à discussão de sua
relação com o direito interno, refere-se ao seu fundamento. Não por acaso, Hildebrando Accioly, Geraldo
Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016) consideram o estudo do fundamento do direito
internacional como o problema mais complexo da matéria, pois a formulação das normas internacionais
poderá variar conforme a posição apriorística adotada. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020) destaca que saber
qual o fundamento do direito internacional público significa encontrar sua legitimidade e obrigatoriedade.
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O cerne da questão é saber como impor obrigações a Estados soberanos, que, no âmbito interno,
teriam o monopólio da produção do direito e uso da força e, em âmbito internacional, são independentes
dos demais Estados.
souza -- CPF:

As correntes doutrinárias dividem-se em dois grandes grupos: voluntaristas e objetivistas. O


voluntarismo jurídico defende que as regras do direito internacional dependem da vontade (individual ou
Marceli souza

coletiva) dos Estados soberanos. Já os objetivistas retiram a vontade do Estado da equação de legitimidade
Marceli

e obrigatoriedade das normas do Direito Internacional.

8.1. Teorias voluntaristas

Segundo Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet, o voluntarismo jurídico baseia-se na
afirmação fundamental de que as normas do Direito são produto da vontade humana, “existem para esta
vontade e por esta vontade” (DINH; DAILLIER; PELLET, 2003, p. 89).
Trata-se de posição que decorre do positivismo dos séculos XIX e XX, que definem o Direito através
dos institutos da “estadualidade e coercibilidade” (MIRANDA, 2009, p. 29), inspirados nas ideias de Hegel.
Hegel defendia que o direito internacional seria o “resultado entre Estados independentes” (HEGEL,
1997, p. 301), ou seja, o fruto da vontade dos Estados calcada na sua autonomia da vontade, e não em uma
vontade geral:

O fundamento do direito dos povos como direito universal que entre os Estado é válido em
si e para si e que é diferente do conteúdo particular dos contratos reside no dever de se
respeitarem os contratos, pois neles se fundam as obrigações dos Estados uns para com
os outros. Como, porém, a relação entre eles tem por princípio a sua soberania, daí resulta
que se encontram uns perante os outros num estado de natureza e os seus direitos não

21
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

consistem numa vontade universal constituída num poder que lhes é superior, mas obtêm
a realidade das suas recíprocas relações na sua vontade particular (HEGEL, 1997, p. 303).

Nesse ínterim, Georg Jellinek desenvolve a chamada teoria da autolimitação do Estado. Para o autor,
formalmente, o direito internacional funda-se na vontade particular dos Estados que criarão as normas e
as sanções jurídicas por seu descumprimento, ainda que, materialmente, elas correspondam a algo que
ultrapassa os limites da vontade de um Estado particular (JELLINEK, 2000, p. 355).
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella explicam que, pela
teoria da autolimitação, o Estado, fundado em um argumento metafísico de poder absoluto, “obriga-se para
consigo próprio” (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p. 131).
A Corte Permanente de Justiça Internacional (criada no seio da Liga das Nações), no julgamento do
Caso (navio) S.S. Lótus, em 1927, utilizou o fundamento da autolimitação estatal, ante a influência do então
presidente da corte Dionisio Anzilotti (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p. 131):

(O) Direito Internacional rege a relação entre Estados Independentes. Tais regras jurídicas
vinculantes aos Estados emanam de sua livre vontade expressa em convenções ou por
usos gerais aceitos como expressões de princípios jurídicos e estabelecidos de modo a
regular a relação entre essas comunidades independentes coexistentes ou em vista a
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alcançar objetivos comuns. Restrições em face de Estados independentes não podem ser
presumidas. (CPJI, Caso do SS. Lotus, Series A. nº 10, 1927) (tradução nossa)

Para Anzilotti, a pacta sunt servanda é a norma suprema que fundamenta o ordenamento
internacional:

O que distingue o ordenamento internacional é que o princípio da pacta sunt servanda não
repousa, como no direito interno, em uma norma superiorꓼ é ele mesmo a norma
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suprema. A regra segundo a qual “os Estados devem respeitar os pactos concluídos por
eles” constitui, portanto o critério formal, que distingue as normas das quais falamos
(normas fundamentais dos ordenamentos internos) de outras e lhes dá unidade.
(ANZILOTTI, 1964, p. 45) (tradução nossa)

Karl Heinrich Triepel, por sua vez, desenvolve a teoria da vontade coletiva como fundamento do
souza -- CPF:

direito internacional. O autor invoca o termo Vereinbarung, que, no alemão, designa as verdadeiras uniões
Marceli souza

de vontade, contrapondo-o à ideia de um contrato (ínsito do princípio da pacta sunt servanda), tendo em
vista que neste há uma declaração de vontades de conteúdos opostos (TRIEPEL, 1966, p. 16).
Marceli

Paulo Henrique Gonçalves Portela cita, ainda, como desdobramentos da teoria voluntarista duas
outras teorias.

• a primeira, defendida por Max Wenzel, fundamenta as normas do direito internacional nos
ordenamentos nacionais, tornando-o um delegatário do direito interno, ou seja, um direito
estatal externo (PORTELA, 2015, p. 43);
• a segunda, defendida por William Edward Hall e Lassa Oppenheim, fundamenta o direito
internacional no consentimento das nações. Por ela, as normas internacionais são fundadas na
vontade da maioria dos Estados, sem que seja necessária a exigência de unanimidade.

Modernamente, quem se aventurou na análise do tema foi Ronald Dworkin, no artigo intitulado A
New Philosophy for International Law, publicado postumamente na revista Philosophy & Public Affairs, no
ano de 2013.
Dworkin afasta-se da ideia de autolimitação do Estado e, com isso, do princípio pacta sunt servanda
como base do direito internacional. Para o autor, é necessário que o sistema internacional seja baseado não

22
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

apenas na soberania dos Estados, mas, também, na legitimidade — dos Estados e do próprio sistema
(DWORKIN, 2013, p. 10).
Para o referido autor, cada Estado tem o dever de mitigar as falhas e os riscos do sistema da soberania
estatal. Para tanto, devem respeitar um princípio geral, estruturante e interpretativo denominado princípio
da proeminência (Principle of Salience):

[...] se um grande número de Estados, compostos de uma população significante,


desenvolverem e acordarem um código de práticas, seja por tratado ou por outra forma de
coordenação, então outros Estados terão, pelo menos prima facie, o dever de aceitar essa
prática, com a ressalva de que tal dever só não lhe será imposto se uma prática ainda mais
geral em outro sentido melhoraria a legitimidade do Estado que não a aceitou e da
sociedade internacional como um todo (DWORKIN, 2013, p. 19).

Em suma, apesar de se afastar da teoria da autolimitação do Estado, Ronald Dworkin apresenta uma
teoria baseada na vontade comum, de Triepel, ou no consentimento das nações, de Oppenheim.
Para Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 92), as teses voluntaristas são
criticáveis do pronto de vista teórico e prático. No âmbito teórico, a justificação do direito internacional por
meio da autolimitação ao se assentar no interesse do Estado acaba por condicionar a validade do direito
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internacional à manutenção do consentimento.


Em outros termos, para não ser responsabilizado internacionalmente, caberia ao Estado apenas
renunciar o consentimento anteriormente dado. Já a teoria de Triepel não consegue demonstrar a proibição
de retirada de um Estado de uma Vereinbarung.
Ambas as teorias estariam ainda em contradição à existência de normas de direito internacional,
como as normas de jus cogens, em que é difícil aferir uma adesão voluntária de reconhecimento tácita.
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Em relação à busca de uma norma superior, tal como faz Anzilotti, os autores apontam o seu caráter
indemonstrável (DINH; DAILLIER; PELLET, 2003, p. 92). Daí, como afirmam Hildebrando Accioly, Geraldo
Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella, se o fundamento do direito internacional é algo que não
souza -- CPF:

pode ser demonstrado, ele “passa a ser uma questão de fé, não de conhecimento” (ACCIOLY; SILVA; CASELLA,
2016, p. 132).
Marceli souza

Do ponto de vista prático, a adesão das teorias voluntaristas entregaria ao Estado, no âmbito
Marceli

internacional, poderes absolutos. Afinal, se um Estado não concordar em se autolimitar, tudo lhe é permitido
(DINH; DAILLIER; PELLET, 2003, p. 93).

8.2. Teorias objetivistas ou não voluntaristas

Ao lado das teorias voluntaristas, parte da doutrina busca assentar o fundamento do Direito
Internacional em princípios ou normas superiores aos ordenamentos nacionais, que independem da vontade
dos Estados. Jorge Miranda sintetiza as diversas correntes não voluntaristas nos seguintes termos:
a. teses normativistas, de Kelsen e da sua escola, as quais reconduzem o sistema de Direito
Internacional não à vontade, mas a uma norma —a uma norma fundamental pressuposta, seja a
pacta sunt servanda, seja (num momento ulterior do pensamento kelseniano) a consuetudo est
servanda;
b. teses solidaristas, de Duguit, Scelle e Politis, surgidas sob influência do positivismo sociológico e
que fundamentam o direito internacional (assim como o direito interno) na solidariedade entre
os indivíduos, sendo, portanto, fatores sociológicos que explicam as normas jurídicas;
c. teses institucionalistas, de Santi Romano e da sua escola, que consideram o Direito Internacional
o ordenamento da comunidade internacional tomada esta como uma instituição a se;

23
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

d. teses jusnaturalistas (de diferentes origens e matizes) de, entre tantos, Le Fur, Brierly, Verdross,
Miaja de la Muela e, em Portugal, Afonso Queiró, Silva Cunha, André Gonçalves Pereira e outros,
para os quais o direito internacional (como todo o Direito) assenta-se em valores suprapositivos,
em critérios éticos de obrigatoriedade e em princípios jurídicos transcendentes (embora com
eventuais adequações e diferentes concretizações). (MIRANDA, Curso de Direito Internacional
Público – 3. ed., p. 32)
Entre as teorias jusnaturalistas, ganha relevo a de Hugo Grócio, para quem o direito natural não se
baseia na vontade divina, tendo um valor próprio racional (est dictatum rectae rationis).
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 130)
explicam que, pela recta ratio, uma ação é moralmente honesta segundo sua conformidade com uma
natureza razoável e sociável.
Portanto, os autores defendem que o direito internacional verdadeiramente universal não pode ser
visto sob a ótica do Estado, mas, sim, da humanidade. Cabe, portanto, a recta ratio “reconhecer os limites
do estado, a partir da ótica da humanidade” (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p. 130).
Antônio Augusto Cançado Trindade (1997, p. 29) é outro doutrinador brasileiro a adotar a teoria
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jusnaturalista da recta ratio como fundamento do direito internacional. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020,
p. 58), por seu turno, adota uma teoria objetivista temperada, reconhecendo princípios jurídicos supremos
à vontade dos Estados, sem desconsiderá-la totalmente no âmbito convencional. Daí defender como regra
objetiva superior o princípio pacta sunt servanda.
Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 98), por sua vez, partindo da observação
da realidade, destacam que a pretensão de globalidade das correntes voluntaristas e não voluntaristas viciam
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sua própria credibilidade.


Em sentido similar, Jorge Miranda (2009, p. 33) aponta que o direito internacional clássico, pautado
na coordenação e reciprocidade, é distinto do direito internacional atual, que é também um direito de
coordenação e subordinação.
souza -- CPF:

Em outros termos, nenhuma teoria é satisfatória, isenta de críticas e lacunas. Compreensível,


Marceli souza

portanto, a conclusão de Hebert. L. A. Hart, de que a própria necessidade de se encontrar um fundamento


para o Direito Internacional é inócua:
Marceli

Há algo de cômico nos esforços para encontrar uma norma fundamental nas formas mais
simples de estrutura social, que existem sem necessitar dela. É como se afirmássemos com
insistência que um selvagem nu na realidade está vestido como um tipo invisível de roupa
moderna. Infelizmente, também existe aqui uma possibilidade permanente de confusão.
Podemos ser persuadidos a tratar como norma fundamental algo que consiste numa
repetição vazia do mero fato de que a sociedade em questão (seja ela composta de
indivíduos, seja de Estados) segue certos padrões de conduta como normas obrigatórias. É
certamente este o caráter da estranha norma fundamental que tem sido sugerida para o
Direito Internacional: “os Estados devem se comportar como têm feito costumeiramente”.
Pois esta não diz nada além de que aqueles que aceitam certas normas devem também
obedecer a uma norma que estipula que as normas devem ser obedecidas. Essa é uma
simples reafirmação inútil do fato de que um conjunto de normas é aceito pelos Estados
como normas vinculantes (HART, 2009. p. 304).

QUESTÕES
9. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A corrente
voluntarista considera que a obrigatoriedade do direito internacional deve basear-se no consentimento dos
cidadãos.

24
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA ASPECTOS INTRODUTÓRIOS • 1

10. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) O consentimento
perceptivo da corrente objetivista significa que a normatividade jurídica do direito internacional nasce da
pura vontade dos Estados.
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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA

FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL

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FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

1. INTRODUÇÃO

No direito internacional, assim como na teoria geral do Direito, falar na expressão fontes do Direito
nos remete à distinção básica entre fontes materiais e fontes formais.

• Fontes materiais (fontes criadoras, fontes reais ou profundas): são as causas de ordem social
que determinam a necessidade da norma jurídica (CUNHA; PEREIRA, 2004, p. 211).
• Fontes formais: procedimentos, forma de produção e exteriorização das normas na vida social
(MAZZUOLI, 2020, p. 64).

CUIDADO!
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 142), citando
Karl Wolff, fazem uma distinção que, com o devido acato, é equivocada, pois afirmam que os princípios
gerais do direito seriam fontes materiais do Direito Internacional, enquanto os tratados e o costume seriam
fontes formais. Como destaca Jorge Miranda (2009, p. 40), essa classificação confunde fonte do Direito e
normas do Direito.
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As fontes materiais das normas internacionais é objeto de estudo atinente à Ciência das Relações
Internacionais, uma vez que se referem às condições políticas e sociais que condicionam a criação normativa
propriamente dita. Em uma analogia à terminologia de Ferdinand Lassalle, são os “fatores reais de poder”
presentes na sociedade internacional. As fontes formais, por sua vez, são o resultado das tensões e dos
consensos desses fatores reais de poder. Portanto, assim como em âmbito interno, a fonte material antecede
a fonte formal.
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Há de se destacar ainda que o estudo das fontes do direito internacional é intimamente ligado à
temática do fundamento da disciplina. Afinal, adotar uma teoria voluntarista (da autolimitação, por exemplo)
é afirmar que apenas os Estados podem criar as fontes formais do direito internacional. Por outro lado, a
adoção de uma teoria jusnaturalista como fundamento da disciplina equivale dizer que o direito preexiste à
souza -- CPF:

positivação normativa. Logo, tratados declarariam direitos que sempre existiram.


Portanto, é exatamente na aplicabilidade prática, em especial no estudo das fontes formais, que as
Marceli souza

incompletudes das teorias relacionadas ao fundamento do Direito Internacional são expostas. As teorias
Marceli

voluntaristas não são capazes de demonstrar o porquê algumas normas independerem da anuência dos
Estados, enquanto as não voluntaristas esbarram em questões como a historicidade dos direitos, o caráter
constitutivo dos tratados e a possibilidade de não oponibilidade de algumas normas aos Estados por ausência
de anuência.

1.1. O rol do artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça

As fontes do direito internacional surgiram ao longo da história e foram sendo consolidadas no


Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI), firmado no âmbito da Liga das Nações.
Posteriormente, essa corte foi substituída pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), que, no artigo 38 de seu
estatuto, elencou as seguintes fontes formais:

Artigo 38.
1. A Corte, cuja função é decidir de acordo com o direito internacional as controvérsias que
lhe forem submetidas, aplicará:
a) as convenções internacionais, quer gerais, quer especiais que estabeleçam regras
expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;
b) o costume internacional, como prova de uma prática geral aceita como sendo o direito;
c) os princípios gerais de direito, reconhecidos pelas Nações civilizadas;

27
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

d) sob ressalva da disposição do artigo 59, as decisões judiciárias e a doutrina dos juristas
mais qualificados das diferentes Nações, como meio auxiliar para a determinação das regras
de direito.
2. A presente disposição não prejudicará a faculdade da Corte de decidir uma questão ex
aequo et bono, se as partes com isto concordarem.

Jorge Miranda (2009, p. 40) destaca que, da disposição convencional, a classificação mais fácil de ser
observada é entre as fontes primárias, também chamadas de principais, e as fontes secundárias ou auxiliares.
As fontes primárias inovariam no mundo jurídico através de obrigações, vedações e permissões aos seus
destinatários. Já as fontes auxiliares ajudariam a interpretar as fontes primárias.
No entanto, corretas as observações de Malcom N. Shaw (2018), quando diz que, atualmente, as
diferentes funções atribuídas a essa classificação acabam por se sobrepor. Tratados, muitas vezes, nada mais
fazem do que reiterar normas costumeiras enquanto as decisões dos tribunais internacionais acabam por
criar obrigações aos sujeitos do direito internacional, de modo parecido ao que ocorre nos judiciários locais.
Outra classificação decorrente do dispositivo é entre as fontes convencionais e não convencionais.
Fontes convencionais são fruto da vontade do Estado mediante tratados ou costumes (PORTELA, 2015, p.
64). Já as fontes não convencionais, ou extraconvencionais, seriam aquelas originadas da evolução da
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realidade internacional, como os atos unilaterais dos Estados, a jurisprudência dos tribunais internacionais
e as decisões das organizações internacionais.
O dispositivo, que é fortemente influenciado pela teoria da autolimitação do Estado, está defasado
historicamente, trazendo uma enumeração exemplificativa das fontes formais do direito internacional.
Atualmente, os atos unilaterais dos Estados e as decisões das Organizações Internacionais são comumente
citados como fontes formais.
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Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 63) aponta que os contratos internacionais e a lex
mercatoria podem ser considerados fontes de direito internacional privado, mas não de direito
internacional público.
Uma questão extremamente importante acerca do disposto é a inexistência de hierarquia entre as
souza -- CPF:

fontes formais do direito internacional. Como bem destacam Nguyen Quoc Dinh, Patrick Daillier e Alain
Marceli souza

Pellet (2003, p. 114), não há hierarquia entre as fontes do direito internacional, ainda que possa haver
hierarquia entre normas jurídicas internacionais.
Marceli

Jorge Miranda (2009, p. 41) aponta a infeliz terminologia da alínea “c” do artigo 38ª ao se referir ao
reconhecimento de princípios gerais de direito pelas “nações civilizadas”. Tal termo indicaria uma distinção
qualitativa entre os Estados (e não nações) que são soberanos. Ademais, princípios são normas que podem
ser encontradas tanto em tratados quanto em costumes ou em outras fontes do direito internacional.
Trata-se de equívoco similar ao feito na alínea “d”, que traz a equidade (ex aequo et bono) como
fonte de Direito. Como destacam André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 275) a equidade
não se trata de uma fonte, mas um critério de decisão no caso concreto. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020,
p. 90) explica que tanto a analogia quanto a equidade não são fontes do direito internacional, propriamente,
mas formas de complementação sistêmica nas hipóteses de falta de normas.

ATENÇÃO!
Para fins de concursos é sempre importante distinguir as etapas do certame. As considerações
críticas são úteis para fases dissertativas e oral. Em etapas objetivas, é recorrente a cobrança do artigo 38
do Estatuto da Corte Internacional de Justiça de forma literal. Algumas “pegadinhas” sobre o tema são
comuns: a questão da hierarquia entre as fontesꓼ a obrigatoriedade da equidade como fonte formalꓼ a

28
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

confusão entre os termos princípios gerais de Direito e princípios do Direito Internacional, na alínea “c”ꓼ a
ausência de “taxatividade” do rol.

QUESTÕES
11. (CESPE/CEBRASPE - 2002 – AGU) Ainda hoje, o rol das fontes indicado no Estatuto da Corte
Internacional de Justiça é taxativo.
12. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) O Estatuto da CIJ
estabelece que as decisões proferidas pelas organizações internacionais sejam consideradas fontes do
direito internacional público.
13. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) O princípio da equidade,
referido no Estatuto da Corte Internacional de Justiça, constitui fonte incondicionada de direito
internacional público.
14. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Atos unilaterais dos Estados, tais como
o protesto e o reconhecimento de Estado, apesar de serem frequentes nas relações internacionais e de
criarem efeitos jurídicos, não são considerados pela CIJ na decisão de controvérsias, já que não constam da
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lista do artigo 38 do referido estatuto.


15. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata, adaptada) De acordo com o Estatuto
da Corte de Haia, a equidade constitui, apesar de seu caráter impreciso, fonte recorrente e prevista como
obrigatória na resolução judicial de contenciosos internacionais.
16. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Aos juízes de Haia, autorizados pelo
estatuto da Corte Internacional de Justiça, é conferido o poder de aplicar, de forma automática, tanto
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normas escritas quanto normas não escritas, além de costume, de equidade e de princípios gerais do
direito.
17. (CESPE/CEBRASPE - 2007 - DPU - Defensor Público Federal) Os costumes internacionais e os
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princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas não são considerados como fontes
extraconvencionais de expressão do direito internacional.
Marceli souza

18. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Atos unilaterais de Estados
Marceli

são modernamente admitidos como fontes extraconvencionais de expressão do direito internacional,


embora não estejam previstos como tal no Estatuto da Corte Internacional de Justiça.

2. COSTUME INTERNACIONAL

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 70) aponta que o costume internacional é a fonte mais antiga
do Direito Internacional. Não havendo um “legislativo universal”, a prática reiterada de atos pelos Estados,
reconhecida como juridicamente vinculante, forjou os primórdios das relações entre os Estados e ainda
desempenha importante papel para o desenvolvimento do direito internacional.
Jorge Miranda (2009, p. 45) destaca que há, ainda, algumas matérias — como a responsabilidade
internacional e as imunidades dos Estados — que são reguladas primordialmente por costumes
internacionais.
O movimento de institucionalização das normas internacionais não impede, também, a formação de
novas normas consuetudinárias, principalmente pela dinamicidade de seu estabelecimento.
Sidney Guerra (2019, p. 125) elenca quatro teorias que fundamentam o surgimento dos costumes
internacionais:

29
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

• teoria do consentimento: o costume surge mediante um pacto tácito entre os Estados. O seu uso
inicial é oferecido por uma parte e aceito pela outra;
• teoria da submissão: as normas costumeiras surgem com o passar do tempo e são consagradas
pela convicção de sua efetividade obrigatória em uma perspectiva jurídica;
• teoria da origem unilateral: o costume surge da prática de um Estado isoladamente que,
posteriormente, é confirmada por outros Estados, que concordam, expressa ou tacitamente, com
ela;
• teoria objetiva: o costume é a expressão de uma norma objetiva, situada, portanto, acima da
vontade de um Estado.

2.1. Elementos do costume internacional

Para a caracterização do costume, são necessários dois elementos:

• elemento objetivo, material ou inveterata consuetudo: trata-se do uso reiterado e uniforme de


uma ação pelos sujeitos do direito internacional;
• elemento subjetivo, imaterial, espiritual, psicológico ou opinio iuris: é a crença de que a conduta
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desempenhada é juridicamente vinculante.

Jorge Miranda (2009, p. 47) destaca que o uso exige a repetição do comportamento de uma
determinada natureza no tempo, não sendo possível fixar critérios rígidos de apuração. Malcolm N. Shaw
(2018, p. 54), inclusive, defende que, em razão das contingências da vida moderna, é possível a criação de
“costumes instantâneos”, desde que presentes circunstâncias que prescrevam regras válidas, sem que seja
necessário um longo período para sua criação.
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Já a convicção de obrigatoriedade (opinio iuris) não deve ser considerada como algo relacionado a
qualquer tipo de psicologia coletiva, mas, sim, ter em conta a interpretação funcional e normativa da
manifestação e da vontade do sujeito do direito internacional ou de seus órgãos. “Depreende-se, antes de
souza -- CPF:

mais, da consideração objetiva dos atos praticados ou deixados de praticar por esses sujeitos (entre os quais
o reconhecimento, o protesto e a notificação” (MIRANDA, 2009, p. 47).
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A Corte Internacional de Justiça tem célebre passagem sobre o tema no julgamento do caso da
Marceli

Plataforma Continental do Mar do Norte, de 1969:

77. [...] Não apenas os atos necessitam quantificar uma prática sedimentada, mas eles
devem também ser, ou serem, capaz de indicar o sentido, de evidenciar a crença de que tal
prática é obrigatória pela existência de uma regra jurídica que a requeria. A necessidade
dessa crença, isto é, a existência de um elemento subjetivo, é implícita na noção da opinio
juris sive necessitatis. Os Estados envolvidos devem sentir que eles estão em conformidade
com o que equivale a uma obrigação jurídica. A frequência, ou mesmo o caráter habitual de
tais atos, não é suficiente em si (CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA, 1969, p. 45, tradução
livre).

2.2. Classificações dos costumes internacionais

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2018, p. 166)
identificam três dimensões para os costumes internacionais, tendo como critério os intervenientes da relação
jurídica:

• dimensão intergovernamental ou diplomática: quando praticados pelos Estadosꓼ

30
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

• dimensão transgovernamental ou paradiplomática pública: praticados por organizações


internacionaisꓼ
• dimensão transnacional ou paradiplomática privada: praticados por seres humanos e,
principalmente, por empresas privadas transnacionais.

Tal distinção é importante porque, normalmente, o estudo dos costumes nos manuais jurídicos
resume-se aos costumes intergovernamentais.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 75), por sua vez, classifica os costumes em relação à sua
extensão geográfica em:

• costume internacional universal: aquele que atinge à toda sociedade internacional,


independentemente de o sujeito ter participado de sua formaçãoꓼ
• costume internacional particular: atinge um número restrito de sujeitos, podendo ser:
▪ costume internacional regional: aquele que atinge um grupo determinado de Estados ou
organismo internacional em contexto regionalꓼ
▪ costume internacional local: atinente a relações bilaterais.
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2.3. Ausência de hierarquia entre costumes e tratados internacionais

Como já mencionado, não há hierarquia entre costumes e tratados internacionais. Dessa premissa
decorre a possibilidade de um tratado ser derrogado por um costume superveniente (como quando o tratado
deixa de ser aplicado, sendo substituído por uma norma costumeira), sendo a recíproca verdadeira, isto é,
um costume ser derrogado por um tratado.
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Jorge Miranda (2009, p. 48) destaca que as normas consuetudinárias também estão subordinadas ao
jus cogens.
As normas de jus cogens são o conjunto de normas que incorporam os valores "supremos"(CASSESE,
souza -- CPF:

2013, p. 215), "essenciais" (RAMOS, 2103, p. 47) ou "fundamentais" da sociedade internacional, que
recebem, em razão de seu conteúdo, uma posição hierárquica superior frente às demais normas do direito
Marceli souza

internacional.
Marceli

Para Jorge Miranda (2009, p. 48), uma norma de jus cogens não pode ser modificada ou afetada
(derrogada) por normas consuetudinárias. Ademais, ambos seriam distintos pelo fato de um costume sempre
postular uma prática, enquanto a norma de jus cogens deve sempre ser observada, ainda quando não haja
prática no sentido de seu cumprimento.
Tais observações, no entanto, devem ser compreendidas com temperamentos. A relação entre
costume e as normas de jus cogens é de conteúdo e não de forma. Afinal, uma norma de jus cogens pode ser
revogada ou alterada, desde que por outra de mesma natureza, a exemplo do que dispõe o artigo 64 da
Convenção de Viena sobre Tratados.

2.4. Prova dos costumes

Da dicção do artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça, o costume, para ser utilizado
em um caso perante o tribunal, necessita de ser provado pela parte que o suscita.
Malcolm N. Shaw (2018, p. 60) indica exemplos de fontes de comprovação de um determinado
costume: atos administrativos, legislação, decisões judiciais domésticas ou atividades internacionais como as
do mercado internacional. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 76) indica ainda a troca de correspondências

31
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

diplomáticas, as declarações conjuntas e os comunicados à imprensa como forma de comprovação de um


costume.
No caso da Plataforma Continental do Mar do Norte, de 1969, a Corte Internacional de Justiça
reconheceu como prova da existência do costume internacional uma convenção multilateral não ratificada.
Não obstante isso, Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016,
p. 152) destacam o dissenso doutrinários sobre o tema.
Em verdade, nem todos os tratados multilaterais não ratificados podem ser considerados costumes.
Além disso, há normas internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos dos Homens, que, apesar de
formalmente não vincularem seus signatários, têm reconhecimento por parte da doutrina, a exemplo de
Eugênio José Guilherme de Aragão (2009, p. 8), como sendo uma norma costumeira.

2.5. Derrogação dos costumes internacionais

Sidney Guerra (2019, p. 121) aponta que um costume pode ser derrogado de duas formas:

• inobservância contínua: os Estados deixam de praticar os atos prescritos no costume em


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decorrência de razões de natureza jurídica. Em outros termos, o costume deixa de ser seguido
pelo fim da opinio iuris;
• surgimento de uma norma oposta: outra norma surge, supervenientemente, em sentido oposto
ao costume. Tal norma pode ser um outro costume ou um tratado internacional.

2.6. Novos Estados e os costumes internacionais


CPF: 073.496.444-77

A questão a ser respondida é a seguinte: um Estado recém-formado está vinculado a um costume


anterior à sua criação? A resposta a essa pergunta tem íntima ligação com a teoria do fundamento do direito
internacional e com a teoria acerca do fundamento da criação dos costumes, a ser adotada por quem busca
respondê-la.
souza -- CPF:

Afinal, a adoção da teoria da autolimitação do Estado, de forma radical, e, consequentemente, da


Marceli souza

teoria do consentimento responde a essa pergunta de forma negativa. Sendo o novo Estado soberano, ele
não estaria vinculado a uma norma da qual não anuiu.
Marceli

Já as teorias da vontade coletiva e as de base não voluntaristas responderiam afirmativamente à


pergunta, ainda que por fundamentos distintos. A adoção das teorias da vontade coletiva e do
consentimento das nações tem ligação com a teoria da submissão dos costumes. Logo, um novo Estado
estaria submetido ao costume anteriormente formado, tendo em vista a opinio iuris “geral”.
Por sua vez, a adoção das teorias não voluntaristas, por defenderem fundamentos superiores à
vontade do Estado, acabariam por retirar dos novos Estados a possibilidade de descumprir um costume
internacional anterior ao seu próprio nascimento.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 79) defende que o Estado tem o direito de escolha do
cumprimento de um costume já formado, desde que seu descumprimento afronte uma norma de jus cogens.

ATENÇÃO!
Para fins de provas objetivas, é necessário destacar que o Cebraspe já adotou posição de
oponibilidade de costumes internacionais anteriores ao surgimento de novos Estados, não fazendo
qualquer ressalva em relação ao conteúdo do costume.

32
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

2.7. Teoria do objetor persistente

Segundo a teoria do objetor persistente (persistente objector), um Estado pode não se desvincular
de um costume internacional vigente caso, de forma persistente e inequívoca, oponha-se ao seu conteúdo
desde o momento de sua formação. Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba
Casella (2018, p. 170) apontam ainda três características da objeção persistente:

• tempestividade: a manifestação do Estado objetor deve ser feita logo que a prática comece a se
estruturar, potencialmente, como um costumeꓼ
• persistência: a objeção deve ser reiterada no tempo, isto é, habitualꓼ
• consistente: a objeção deve ser fundamentada em argumentos jurídicos (opinio non iuris).

A Corte Internacional de Justiça, no caso da pesca (entre Grã-Bretanha e Noruega), de 1951, não
reconheceu a possibilidade de oponibilidade à Noruega da “regra de 10 milhas” para a delimitação das
“linhas-base” como critério de fixação da zona de pesca. Para o tribunal, essa regra não poderia ser aplicada
à Noruega, pois o Estado sempre se opôs a ela (CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA, 1951, p. 131).
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Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 80) defende que tal teoria, por se apoiar em uma posição
voluntarista e em uma ideia superada de necessidade de consentimento unânime dos Estados para a
formação dos costumes, não tem mais razão de ser atualmente. Ademais, para o autor, a adoção dessa teoria
seria injusta com novos Estados, pois apenas os Estados mais antigos, que se opunham ao costume desde
sua formação, poderiam ser beneficiados.

ATENÇÃO!
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Para fins de provas objetivas, é comum a aceitação da teoria, em especial pelo fato de ela já ter sido
aplicada pela Corte Internacional de Justiça. Porém, é sempre necessário atentar-se ao comando da
questão, considerando a ausência de consenso doutrinário sobre o tema.
souza -- CPF:

2.8. Aplicabilidade do costume internacional em âmbito interno


Marceli souza

O Supremo Tribunal Federal tem diversos precedentes admitindo a aplicabilidade direta dos
Marceli

costumes internacionais em âmbito interno, sendo o primeiro a AC 9.705, de 1987, de relatoria do Min.
Moreira Alves.
Em um olhar crítico, vê-se que a simples adoção de aplicabilidade de um costume internacional de
forma direta é contraditória com a ideia de uma teoria dualista do Direito, principalmente de cunho mitigado,
que confunde a incorporação com a existência de ordens jurídicas distintas e independentes.
Dos julgados, ganha destaque o RE 578.543, de relatoria da min. Ellen Gracie, de 2009, que
reconheceu a norma costumeira de imunidade de jurisdição e execução em face das organizações
internacionais.
Recentemente, porém, no julgamento da Ext. 1362, em 2016, o Min. Edson Fachin (acompanhado
pelos ministros Carmem Lúcia, Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski) chegou a reconhecer a
imprescritibilidade dos crimes de lesa humanidade como um costume internacional. Contudo, a maioria do
tribunal, capitaneada pelo min. Teori Zavascki, considerou prescritos os delitos de homicídio qualificado,
sequestro e associação criminosa, praticado por pretenso integrante do grupo terrorista "Triple A" nos anos
de 1973 e 1975, ainda que aos delitos tenha sido imputada a qualificação de crimes de lesa humanidade.
Para os ministros, como o Brasil não ratificou a Convenção sobre a Imprescritibilidade de Crimes de
Guerra e dos Crimes contra a Humanidade, caberia ser analisada a prescrição da pretensão punitiva. Outro

33
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

argumento utilizado pela corte foi o de que as normas de Direito Internacional Público, entre elas o Estatuto
de Roma, são de status supralegal e, por isso, aplica-se ao caso o art. 5º, XV, da Constituição, que veda a
irretroatividade da lei penal, exceto para o benefício do réu.

ATENÇÃO!
Para fins de prova, são corretas as afirmações de que o Supremo admite ou já admitiu a aplicação
direta dos costumes internacionais em âmbito interno

QUESTÕES
19. CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) O Estatuto da CIJ
enumera um rol de fontes que a Corte pode utilizar para cumprir sua função de decidir as controvérsias
que lhe forem submetidas, mas não, do ponto de vista doutrinário, um rol de fontes para o direito
internacional.
20. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A opinio juris do
costume internacional representa uma atividade estatal que é normativamente obrigatória, de forma que,
conforme já decidido pela CIJ, pode-se inferir que há uma norma proibitiva de determinado agir quando os
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Estados não agirem de determinada forma.


21. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Conforme já
decidido pela CIJ, a norma consuetudinária será absorvida ou revogada pela norma de tratado internacional
se ambas regularem o mesmo conteúdo.
22. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - DPU - Defensor Público Federal) Opinio juris é um dos elementos
constitutivos da norma costumeira internacional.
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23. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Admite-se a escusa
de obrigatoriedade de um costume internacional se o Estado provar de forma efetiva que se opôs ao seu
conteúdo desde a sua formação.
souza -- CPF:

24. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata, adaptada) A expressão não escrita do
Marceli souza

direito das gentes conforma o costume internacional como prática reiterada e uniforme de conduta, que,
incorporada com convicção jurídica, distingue-se de meros usos ou mesmo de práticas de cortesia
Marceli

internacional.
25. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - AGU - Procurador Federal) Costumes podem revogar tratados e tratados
podem revogar costumes.
26. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - Instituto Rio Branco - Diplomata) O costume, fonte do direito
internacional público, extingue-se pelo desuso, pela adoção de um novo costume ou por sua substituição
por tratado internacional.
27. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - AGU - Advogado da União) Diferentemente dos tratados, os costumes
internacionais reconhecidos pelo Estado brasileiro dispensam, para serem aplicados no país, qualquer
mecanismo ou rito de internalização ao sistema jurídico pátrio.
28. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - AGU - Procurador Federal) O princípio do objetor persistente refere-se a
não vinculação de um Estado para com determinado costume internacional.
29. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - AGU - Advogado da União) O elemento objetivo que caracteriza o
costume internacional é a prática reiterada, não havendo necessidade de que o respeito a ela seja uma
prática necessária (opinio juris necessitatis).

34
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

30. (CESPE/CEBRASPE - 2003 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A República Federativa Lilliputiana deve
obediência aos costumes internacionais gerais que eram vigentes no momento em que ela adquiriu
personalidade jurídica de direito internacional, não obstante essas regras terem sido estabelecidas antes
do próprio surgimento desse Estado.
31. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Uma vez que a existência de um
costume internacional é reconhecida mediante a comprovação de uma "prática geral aceita como sendo o
direito", um Estado pode lograr obstar a aplicação de um costume por meio de atos que manifestem sua
"objeção persistente" à formação da regra costumeira, a menos que esta tenha caráter imperativo (ius
cogens).
32. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Os tratados são as fontes
por excelência do direito internacional público e impõem-se hierarquicamente sobre todas as demais
formas escritas e não escritas de expressão do direito internacional.
33. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) A prática reiterada e
uniforme adotada com convicção jurídica, denominada direito costumeiro, possui no direito internacional
hierarquia inferior às normas de direito escrito. Logo, no direito das gentes, tratados não podem ser
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revogados por direito consuetudinário.


34. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) A Declaração Universal dos
Direitos do Homem, elaborada pela Organização das Nações Unidas (ONU), é classificada como fonte
codificada do direito internacional e, portanto, está prevista no Estatuto da Corte Internacional de Justiça
como ato de organização internacional.

3. PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO


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Como já aludido, o artigo 38 do ECIJ traz os princípios gerais de direito “reconhecidos pelas Nações
civilizadas” como uma fonte formal do Direito Internacional.
souza -- CPF:

A primeira crítica sobre tal disposição trata-se da confusão entre forma (tratados, costumes, atos
unilaterais, jurisprudência) e conteúdo (regras e princípios) normativos. Princípios, assim como regras, são
Marceli souza

espécies normativas que podem estar previstos/inseridos tanto em tratados quanto em costumes
Marceli

internacionais.
A segunda consideração a ser feita sobre o dispositivo refere-se à expressão “nações civilizadas”.
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella apontam que tal expressão
remonta ao período anterior à Primeira Guerra Mundial, pois é uma cópia do Estatuto da Corte Permanente
de Justiça Internacional, ilustrando uma visão eurocêntrica do Direito Internacional, com pretensões
civilizatórias do resto do mundo:

Mais do que isso, a construção deixa claro o estadocentrismo na própria concepção de


princípios gerais do direito como fontes do direito internacional. Nesse sentido, ser
civilizado não seria – apenas – reger-se por padrões morais europeus, mas por padrões
jurídico-políticos europeus: o estado moderno centralizado como a forma de organização
aceitável como estável entre os povos (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p. 191).

Os autores destacam também que, historicamente, a intenção do Comitê de Juristas que elaborou o
Estatuto da CPJI era outra. Para não ocorrer um non liquet em um caso concreto, por ausência de norma em
um tratado ou costume internacionais, caberia à Corte Permanente de Justiça Internacional buscar, nos
ordenamentos internos dos Estados, quais princípios jurídicos eram aceitos, tendo em vista que os tribunais
domésticos fazem uso dos princípios gerais do direito diuturnamente (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2016, p.

35
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

192). Portanto, a ideia do dispositivo é a de informar o Direito Internacional a partir do “diálogo” dos
princípios dos ordenamentos internos.
Há quem diga que não existem princípios idênticos em sistemas normativos opostos, como o
capitalista e o socialista, a exemplo do soviético Grigory Tunkin (apud. MAZZUOLI, 2020, p. 82). Porém, tal
afirmação contradiz a existência de princípios, tais como o de boa-fé, pacta sunt servada, naeme laedere,
presentes senão em todos os ordenamentos internos, em sua grande maioria.
Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira (2004, p. 323) ressaltam que, diante das
múltiplas naturezas dos sistemas jurídicos, como os da família romano-germânica, dos países da common
law e dos sistemas de conotação religiosa como os islâmicos, para ser considerado um princípio geral, é
necessário o preenchimento de dois requisitos:

• a consagração em vários sistemas: em que a aferição deverá ser feita através dos métodos do
direito comparadoꓼ
• possibilidade de transposição ao plano internacional: trata-se da possibilidade de
enquadramento do princípio em análise ao “espírito da vida internacional” (CUNHA; PEREIRA,
2004, p. 323).
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Os autores trazem como exemplo de uma norma prevista em diversos ordenamentos internos que
não pode ser transferida ao plano internacional a usucapião como forma de aquisição originária da
propriedade. Não obstante a maioria dos sistemas admitirem tal forma de aquisição, no plano internacional,
um Estado não poderia se valer desse meio para aquisições territoriais.
Benedetto Conforti (2015, p. 51), por sua vez, não aponta a possibilidade de transposição como
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requisito para a configuração dos princípios gerais de direito, mas a opinio iuris de que tais princípios, de
âmbito interno, geram obrigações também de um ponto de vista do Direito Internacional.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 83) faz uma distinção entre princípios gerais de direito e
princípios gerais do direito, relacionando-os à origem da norma:
souza -- CPF:

• princípios gerais de direito: surgem dos sistemas nacionais, sendo alçados ao campo
Marceli souza

internacional;
Marceli

• princípios gerais do direito: nascem originariamente no plano internacional.

Para o autor, a ausência de menção no artigo 38 do ECIJ se dá pelo fato de eles nascerem diretamente
na ordem internacional, sendo sua aplicação pelo tribunal imediata (MAZZUOLI, 2020, p. 83).
Essa classificação não é unanime, alguns autores — como Sidney Guerra, Joaquim da Silva Cunha,
Maria da Assunção do Vale Pereira, Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba
Casella — não fazem qualquer distinção entre os termos.
A utilização dos princípios gerais de direito pode ser aferida, por exemplo, nos julgamentos do
Tribunal Criminal ad hoc de Ruanda, quando os julgadores se valeram dos princípios gerais do cross
examination (Simon Bikindi v. Ministério Público, 2010), do ônus da prova (Protais Zigiranyirazo v. Ministério
Público, 2009) e da presunção de inocência (Aloys Simba v. Ministério Público, 2007) em seus julgamentos.

QUESTÕES
35. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Não há previsão
expressa de princípios gerais do direito internacional no Estatuto da CIJ.

36
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

36. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - AGU - Procurador Federal) Princípios e regras provenientes de ordens
jurídicas nacionais poderão ser aplicados pelo Tribunal Permanente de Arbitragem nos seus procedimentos
de arbitragem internacional.
37. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Pacta sunt servanda e res iudicata são
princípios gerais de direito aceitos pela CIJ e discutidos em casos a ela submetidos.

4. A JURISPRUDÊNCIA INTERNACIONAL

Pela literalidade do artigo 38 do ECIJ, as decisões judiciárias seriam fontes auxiliares do Direito
Internacional. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 86) destaca que as decisões referidas no dispositivo se
restringem às da própria Corte Internacional de Justiça, sendo essa conclusão extraída da leitura conjunta
dos artigos 94.1 da Carta da ONU (em que os Estados se comprometem a conformar-se com a decisão do
tribunal nas demandas que forem parte) e 59 do ECIJ, que prevê a vinculação das decisões da corte às partes
litigantes.
Ian Brownlie (1997, p 32) ressalta que o Comitê de Juristas que elaborou o ECIJ buscou afastar a
criação de um sistema de precedentes obrigatórios. O artigo 59, portanto, tinha a finalidade de conferir
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efeitos inter partes aos julgamentos da CIJ. Talvez por isso alguns doutrinadores, como Valerio de Oliveira
Mazzuoli, Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira, afirmam que a jurisprudência não
cria o Direito.
Porém, há uma distância considerável entre a posição doutrinária e a prática. Como bem destaca
Malcom N. Shaw (2018, p. 81), assim como um juiz inglês cria o direito no processo de sua interpretação, os
juízes da Corte Internacional de Justiça nada mais fazem que o determinar, utilizando seus próprios
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precedentes. Isso ocorre não apenas com a CIJ, mas, também, com os demais tribunais internacionais como
a Corte Interamericana de Direitos Humanos ou a Tribunal Europeu de Direitos Humanos.
O Brasil, por exemplo, foi condenado duas vezes pela Corte Interamericana de Direitos Humanos
(Corte-IDH) com base na, já consolidada, jurisprudência do tribunal acerca da incompatibilidade das leis de
souza -- CPF:

anistias em face da CADH. Em ambas as condenações, o Tribunal Internacional nada mais fez que reiterar
Marceli souza

suas decisões anteriores.


Marceli

Ademais, os tribunais internacionais não utilizam apenas suas próprias decisões, mas, também, a de
outros, configurando o chamado diálogo judicial (BURGORBUE-LARSEN; CESPEDES, 2014, p. 205) também
denominado de diálogo entre cortes (CONCI, 2015).
Laurence Burgorgue-Larsen e Nicolás Montóya Cespedes destacam que o diálogo judicial entre o
Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) e a Corte-IDH foi importante para a proteção dos direitos
humanos em ambas as cortes.
A título de exemplo, o TEDH fez uso da vasta jurisprudência da Corte-IDH relacionada ao
desaparecimento forçado para responsabilização internacional do Estado, no caso Timurtas vs. Turquia,
julgado em 13 de junho de 2000. Ademais, como bem destacam os autores, a jurisprudência da Corte-IDH,
quando citada, é inserida atualmente na seção dedicada ao “direito internacional relevante”.
Portanto, não obstante a previsão literal do artigo 38 do ECIJ de a jurisprudência ser uma fonte
auxiliar do Direito Internacional, na prática, ela desempenha um papel de verdadeira fonte primária ao
atribuir função criativa de efeitos gerais.

37
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

ATENÇÃO!
Para fins de concurso, há de se ter atenção com a fase do certame e o perfil da banca examinadora.
Não obstante a jurisprudência internacional não ser um tema recorrente, em provas objetivas, é provável
que seja considerado correto apenas a literalidade do ECIJ, em razão da tendência textualista de boa parte
das bancas de concurso.

Em fases posteriores, é possível uma maior digressão sobre o tema, sempre conciliando prática e
posição doutrinária.

QUESTÃO
38. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata, adaptada) Em face do caráter difuso
da sociedade internacional, bem como da proliferação de tribunais internacionais, verifica-se, no direito
internacional, crescente invocação de decisões judiciais antecedentes, arroladas como opinio juris, ainda
que não previstas no Estatuto da CIJ.

5. A DOUTRINA
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A doutrina também está prevista no artigo 38 do ECIJ como uma fonte auxiliar do Direito
Internacional. Como bem destacam André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 273), a doutrina
acaba por ter um papel de relevo na interpretação das fontes formais, desempenhando papel na constatação,
delimitação e interpretação das normas jurídicas (GUERRA, 2019, p. 130).
Não obstante o papel de relevo, é sempre bom evidenciar que a doutrina não detém carga normativa
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(MAZZUOLI, 2020, p. 89). Portanto, os estudos e as posições doutrinárias não vinculam os sujeitos de Direito
Internacional.
Ademais, como bem destaca Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 90), a doutrina não é,
tecnicamente, uma fonte do Direito Internacional, exatamente por não ter o condão de inovar no mundo
souza -- CPF:

jurídico.
Marceli souza

ATENÇÃO!
Marceli

Mais uma vez chama-se a atenção para o fato de que, em provas objetivas, deve-se ter em mente a
tendência textualista das bancas de concurso. Logo, é correta a assertiva de a doutrina ser fonte auxiliar do
Direito Internacional.
Ademais, caso a questão insira a assertiva que a doutrina é fonte do DIP, apesar de incompleta, ela
também não estará incorreta.

QUESTÕES
39. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - Polícia Federal – Delegado) É fonte de direito internacional reconhecida
a doutrina dos juristas mais qualificados das diferentes nações.
40. (ESAF - 2003 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) A doutrina, meio auxiliar para a
determinação das regras de direito internacional público, tem como funções fornecer a prova do conteúdo
do direito e influir no seu desenvolvimento.
41. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Na teoria das fontes, a
doutrina tem mais peso em direito internacional que em direito interno, tendo em vista o maior conteúdo
político das normas de direito das gentes. Nesse sentido, a doutrina atua como elaboradora do significado
e do alcance de regras imprecisas, comuns no direito internacional.

38
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

6. ATOS UNILATERAIS

Ato unilateral é, segundo Sidney Guerra (2019, p. 133), “aquele em que a manifestação de vontade
de um sujeito de direito é suficiente para produzir efeitos jurídicos e geralmente surgem naqueles espaços
não regulamentos pelo direito.” Apesar de serem objeto de estudo por parte da doutrina, inclusive pela
Comissão de Direito Internacional da ONU, os atos unilaterais não são objeto de nenhum tratado.
Os requisitos para a configuração do ato unilateral são:

• autonomia: André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 266) ressaltam que os atos
unilaterais, para serem considerados fontes autônomas do Direito Internacional, não devem ter
uma relação de dependência com outra fonte. Assim sendo, a adesão e a denúncia de um tratado
não devem ser consideradas como atos unilaterais (fontes autônomas), pois a existência desses
atos depende do próprio tratado;
• unilateralidade: o ato deve ter sido praticado por apenas um sujeito de Direito. Em outros termos,
apenas um Estado ou uma Organização Internacional;
• internacionalidade: o ato deve ser apto para gerar efeitos jurídicos externos à sua fonte de
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produção, isto é, internacionais.

Não se exige qualquer formalidade para a configuração de um ato unilateral. Por isso, admitem-se
atos unilaterais expressos ou tácitos/implícitos (PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 268). Valerio de Oliveira
Mazzuoli (2020, p. 94) ressalva, no entanto, que, independentemente da sua forma, o ato deve conter uma
manifestação clara e específica de vontade, com objeto determinado e ser externado publicamente pela
autoridade competente.
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Os atos unilaterais não necessitam ser registrados, tal qual o artigo 102 da Carta das Nações Unidas
exige para os tratados internacionais. Porém, isso não significa que o autor do ato não possa buscar seu
registro junto à ONU, como fez o Egito, em 1957, em relação ao Canal de Suez.
souza -- CPF:

Os atos unilaterais expressos são elencados, de forma explicativa, por André Gonçalves Pereira e
Fausto de Quadros (2011, p. 267):
Marceli souza

• protesto: ato em que um Estado não considera uma posição conforme o Direitoꓼ
Marceli

• notificação: ato pelo qual o Estado leva um determinado fato ao conhecimento de outro sujeito
do direito internacionalꓼ
• promessa: ato pelo qual o Estado assume um compromisso futuroꓼ
• renúncia: ato pelo qual o Estado, de forma irrevogável, considere extinto um direito seu. Nesse
caso, há de se destacar que a renúncia só será considerada fonte autônoma se não depender da
anuência de outro ente;
• reconhecimento: ato pelo qual um Estado afirma que um determinado fato está de acordo com
o Direito. Trata-se do inverso do protesto.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 95) classifica ainda os atos unilaterais considerando seus efeitos
jurídicos:

• atos autonormativos: geram efeitos jurídicos aos Estados que o manifestaramꓼ


• atos heteronormativos: atribuem direitos ou prerrogativas a outros sujeitos do direito
internacional.

39
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

No plano jurisprudencial, é possível citar a utilização dos atos unilaterais como fontes do Direito
Internacional desde o caso do Status jurídico da Groelândia Oriental, de 1933, ainda no seio da Corte
Permanente de Justiça Internacional. A Noruega, após enviar notas ao reino da Dinamarca renunciando
qualquer pretensão de anexação de parte do território da Groelândia, buscou a aquisição do território, por
ocupação, alegando ser ele terra nullum. A CPIJ entendeu que a Noruega, ao renunciar ao território e ainda
reconhecer a soberania da Dinamarca sobre ele anteriormente, agira de forma contrária ao Direito em sua
ocupação posterior.
No âmbito da CIJ, o julgado mais famoso é o caso dos testes nucleares, julgado em dezembro de
1974. A França, após prometer não fazer mais testes nucleares no Pacífico, por meio de correspondências
diplomáticas, de 1973, à Austrália e declarações de suas mais altas autoridades, como o presidente da
República, anunciou novos testes a partir de 1974. A CIJ expediu medidas provisórias para que a França se
abstivesse de realizar os testes. No julgamento final, o tribunal não chegou a se pronunciar sobre a questão
de fundo, ante o comunicado francês de que não realizaria mais os testes. Em sua sentença, a CIJ reiterou
que um Estado deve vincular-se ao conteúdo de um ato unilateral formado com o objetivo de vinculá-lo.

QUESTÕES
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42. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Dada sua soberania,
os Estados podem, no que se refere aos atos unilaterais autonormativos, voltar atrás quanto a declarações
ou manifestações formuladas expressamente, não havendo de se falar em vinculação ao conteúdo daquilo
que formalmente expressaram.
43. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - BACEN – Procurador) Em relação a atos unilaterais, assinale a opção
correta.
CPF: 073.496.444-77

a) São aplicados pela Corte Internacional de Justiça como fontes do direito internacional, conforme disposto
em seu estatuto.
b) Criam apenas obrigações morais para os Estados.
c) Esses atos são conhecidos também como estoppel.
souza -- CPF:

d) A Comissão de Direito Internacional da ONU se dedicou a estudar tais atos.


e) O Estado brasileiro mantém-se em oposição persistente ao costume que prescreve a existência desses
Marceli souza

atos.
Marceli

44. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Os atos unilaterais dos Estados, como
as leis e os decretos em que se determinam, observados os limites próprios, a extensão do mar territorial
e da sua zona econômica exclusiva ou o regime de portos, são considerados fontes do direito internacional
público, sobre as quais dispõe expressamente o Estatuto da Corte Internacional de Justiça.
45. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - Instituto Rio Branco) Em 2016, entrou em vigor a convenção das Nações
Unidas sobre atos unilaterais dos Estados, fruto de projeto elaborado pela Comissão de Direito
Internacional

7. ATOS/DECISÕES/RESOLUÇÕES DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

Em vocábulos terminológicos, alguns doutrinadores utilizam “decisões” (MAZZUOLI, 2020), enquanto


outros, “atos” (PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 269), tendo ainda os que preferem “resoluções” (ACCIOLY;
SILVA; CASELLA, 2016, p. 206) das Organizações Internacionais.
Joaquim da Silva Cunha e Maria da Assunção do Vale Pereira (2004, p. 337), concordam com a
terminologia ato e os distinguem em atos institucionais e atos comunitários. Os atos institucionais seriam
praticados por organizações internacionais de caráter clássico e não teriam força vinculante, enquanto os

40
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

atos comunitários seriam praticados por organizações supranacionais sendo, de regra, vinculantes aos
Estados-membros.
Os elementos distintivos dos atos das organizações internacionais e dos atos unilaterais dos Estados
como fontes autônomas do direito internacional, segundo André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros
(2011, p. 269), são:

• ter como fundamento o tratado constitutivo da respectiva Organizaçãoꓼ


• serem autônomos ao tratado constitutivo, que não prevê o seu conteúdo propriamente ditoꓼ
• apresentarem maior diversidade de conteúdo e forma dos atos unilaterais dos Estados.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 99) ressalta ainda que os atos das organizações internacionais
são institucionais, tendo em vista que os Estados não participam diretamente de sua elaboração, podendo,
no entanto, ter uma participação indireta mediante votação em algum deles, como nas resoluções da
Assembleia Geral da ONU.
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 270) apresentam uma classificação dos atos
das organizações internacionais, considerando seu conteúdo, em:
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• atos jurisdicionais: são as decisões dos órgãos jurisdicionais vinculados às organizações


internacionais, como a CIJ, a Corte-IDH ou o Tribunal do Marꓼ
• atos de pura administração interna: referentes à gestão de pessoal ou aos atos de caráter
processualꓼ
• atos de funcionamento da Organização: que, por sua vez, subdividem-se em:
▪ concernentes às relações internas do organismoꓼ
CPF: 073.496.444-77

▪ destinados às relações entre a organização e seus Estados-membrosꓼ


▪ relativos aos Estados-membros entre siꓼ
▪ relacionados a indivíduos, quando a Organização detenha competência para tanto.
souza -- CPF:

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 72) classifica os atos em relação ao seu caráter
Marceli souza

vinculante:
Marceli

• atos obrigatórios ou impositivos: eles criam obrigações aos Estados-membros da organização.


São exemplos as resoluções do Conselho de Segurança da ONU ou as recomendações da OIT.
• atos facultativos: possuem apenas força moral ou política, não tendo caráter jurídico
propriamente dito. Umberto Leanza e Ida Caracciolo (2008, p. 249) ressaltam que parte da
doutrina utiliza os termos soft law ou droit mou de forma genérica, como um ato lato sensu de
conteúdo exortativo ou programático. Daí, adotada essa corrente, as decisões dos órgãos
internacionais sem conteúdo vinculativo seriam espécies de soft law.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 103) observa, corretamente, que a forma de saber o caráter
vinculante ou não do ato da organização internacional é analisando seu tratado constitutivo, o que, em última
análise, é afirmar que a vinculação ou não decorre da vontade do Estado em aderir ao tratado.
Por fim, dos atos das organizações internacionais de caráter vinculante, merecem destaque as
decisões do Conselho de Segurança da ONU. Historicamente, o Brasil as executa por decreto executivo,
como, por exemplo, o caso da Resolução n.º 1.373/2001, de combate ao terrorismo, internalizada pelo
Decreto n.º 3.976/2001.
Recentemente, sobre o tema de combate ao terrorismo, foi publicada a Lei n.º 13.810/2019,
prevendo a executoriedade imediata das resoluções, sem prejuízo de publicação em língua portuguesa, para

41
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

fins de publicidade de seus extratos no Diário Oficial da União, pelo Ministério das Relações Exteriores (art.
7º).
A lei prevê ainda a figura do auxílio direto judicial, em que a União ingressará, sem demora, com
pedido junto ao judiciário para a indisponibilidade de ativos ou bens em solo nacional. Segundo o art. 14 da
Lei n.º 13.810/2019, cabe ao juiz, no prazo de 24 horas, contado do recebimento dos autos, determinar as
medidas pertinentes ao cumprimento da sanção, sem a oitiva prévia do requerido.
O artigo 15, § 1º, dessa mesma lei traz ainda as possibilidades de defesa do requerido, em verdadeiro
juízo de delibação limitada do magistrado nacional:

Art. 15. O juiz ordenará a citação do requerido para, caso deseje, impugnar a determinação
no prazo de 15 (quinze) dias, contado da data da citação.
§ 1º A impugnação de que trata o caput deste artigo não terá efeito suspensivo e versará
somente sobre:
I - homonímia;
II - erro na identificação do requerido ou dos ativos que sejam objeto de sanção;
III - exclusão do requerido da lista de sanções, por força de resolução proferida pelo
Conselho de Segurança das Nações Unidas ou por designação de seus comitês de sanções;
IV - expiração do prazo de vigência do regime de sanções.
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§ 2º A União será ouvida sobre a impugnação no prazo de 15 (quinze) dias, contado da data
da intimação.

QUESTÕES
46. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - Instituto Rio Branco – Diplomata) As decisões das organizações
internacionais contemporâneas, proferidas na forma de resoluções, recomendações, declarações e
diretrizes, apenas obrigam os seus membros quando adotadas por votação unânime em plenário, em
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qualquer hipótese.
47. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco) Embora a Constituição Federal seja silente sobre o
assunto, resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas no Brasil incorporam-se ao direito
interno mediante decreto, com prévia anuência do Congresso Nacional .
souza -- CPF:
Marceli souza

8. TRATADOS INTERNACIONAIS
Marceli

Os tratados internacionais são considerados por muitos doutrinadores, entre eles Sidney Guerra
(2019, p. 99), a principal fonte do direito internacional moderno. Antônio Augusto Cançado Trindade (2017,
p. 72) destaca o crescimento do United Nations Treaty Series (UNTS) como um atestado da importância dos
tratados na prática internacional.
Entre 1945 e 1955, o UNTS continha 3.633 tratados registrados e publicados em 225 volumes. Em
meados de 1963, a coleção já continha 7.420 tratados registrados, atingindo 470 volumes. Em pesquisa
realizada em 7 de janeiro de 2021 no site da ONU, o último tratado registrado fora em 3 de setembro de
2020, entre Egito e Grécia, com o número de registro 56.237.
A sua importância é tamanha que para sua real compreensão é necessário estudar o chamado direito
dos tratados, que pode ser conceituado como “o conjunto de normas internacionais e internas que regem
os tratados desde sua formação até seu término, passando por todos seus efeitos e alterações” (BROTÓNS,
2010, p. 236).
A principal fonte de estudo do direito dos tratados são as Convenções de Viena sobre direito dos
tratados, assinadas em 1969 e 1986.

42
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

• A convenção de 1969, também denominada de Lei dos Tratados, Código dos Tratados ou Tratados
dos Tratados (MAZZUOLI, 2020, p. 123), entrou em vigor em 1980, tendo sido ratificada pelo Brasil
pelo Decreto n.º 7.030/2009, e tem por objeto regulamentar os tratados firmados entre Estados.
Importante destacar que o Brasil, ao promulgar a Convenção de Viena de 1969, fez reservas aos
artigos 25 e 66, que serão analisadas oportunamente.
• Já a Convenção de 1986, que ainda não alcançou o número mínimo de ratificações para entrar em
vigência, regula os tratados entre Estados e Organizações Internacionais.

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 172)
destacam que a convenção é um documento quase perfeito, pois codificou normas consuetudinárias sobre
o tema. Portanto, o presente tópico buscará estudar não apenas o tratado enquanto fonte, mas abarcar o
direito dos tratados tanto do âmbito internacional quanto no âmbito interno.

QUESTÃO
48. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados,
concluída em 23 de maio de 1969, somente foi promulgada sem reservas, no Brasil, em 14 de dezembro de
2009 pelo Decreto n° 7.030.
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8.1. Conceito

Não há consenso na doutrina sobre o conceito de tratado. Em uma definição ampla, é possível
conceituá-lo como acordo de vontade entre sujeitos de Direito Internacional regidos pelas normas do Direito
Internacional (MIRANDA, 2009, p. 57).
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Outros autores, como Paulo Henrique Gonçalves Portela e Sidney Guerra, preferem inserir outros
elementos definidores no conceito de tratados:

Os tratados são acordos escritos, firmados por Estados e organizações internacionais dentro
dos parâmetros estabelecidos pelo Direito Internacional, com o objetivo de produzir efeitos
souza -- CPF:

jurídicos no tocante a temas de interesse comum (PORTELA, 2015, p. 85).


Marceli souza

Tratado é um termo genérico que pode servir para designar um acordo entre dois ou mais
Estados para regular um assunto, determinar seus direitos e obrigações, assim como as
Marceli

regras de conduta que devem seguir, mas em nenhum caso é aplicável a um acordo entre
um Estado e uma pessoa privada (GUERRA, 2019, p. 100).

A Convenção de Viena de 1969 traz, em seu artigo 2.1, apresenta um conceito próprio de tratado:

Artigo 2
Expressões Empregadas
1. Para os fins da presente Convenção:
a) "tratado" significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido
pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais
instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica;

Do ponto de vista doutrinário, Jorge Miranda (2009, p. 58) explica que o conceito de tratado tem os
seguintes elementos:

• é um acordo de vontades. Necessita que seus signatários sejam sujeitos de direito internacional
agindo nessa qualidadeꓼ
• que o instrumento produza efeitos nas relações internacionais, ainda que possa também gerar
efeitos em âmbito interno.

43
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Por outro lado, o professor português destaca que, do conceito doutrinário, não é possível dizer que:

• os signatários de um tratado sejam apenas Estados: há tratados assinados por outros sujeitos de
direitos que não os Estados, com previsão, inclusive, na carta da ONU, e objeto de convenção
própria (de 1986). Em um primeiro momento, seria correto dizer que as disposições da Convenção
de Viena de 1969 não alcançariam os tratados assinados por outros sujeitos do direito
internacional. Porém, como já aludido, as normas da Convenção nada mais são que reprodução
de normas consuetudinárias e, nesse sentido, comprovariam a opinio iuris daquilo que deve ser
aplicado aos demais tratados (BROTÓNS, 2010, p. 237) ꓼ
• que o acordo deve ser necessariamente escrito: Malcolm N. Shaw (2018, p. 686) explica que não
há exigências formais específicas no Direito Internacional para a existência de um tratado. Assim
sendo, apesar de raros nos tempos modernos, existem tratados não escritos (ACCIOLY, SILVA;
CASELLA, 2016, p. 176). A própria Convenção de 1969 prevê, em seu artigo 3, que ela não
prejudicará os acordos que não foram concluídos por escrito;
• que o acordo, quando escrito, não se resuma a um único instrumento: além da própria definição
da Convenção de 1969 prever essa característica, Jorge Miranda (2009, p. 58) explica que o acordo
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pode ser feito através de troca de notas, por exemplo.

Ainda em relação ao conceito de tratados, Malcom N. Shaw (2018, p. 686) aponta que, para que seja
configurado um tratado, é necessário que as partes tenham a intenção de criar relações jurídicas entre si.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 128) explica que um acordo sem o animus contrahendi teria um sentido
moral ou político. Para saber se um ato tem a intenção de criar relações jurídicas, é necessário analisar sua
linguagem e o contexto de sua criação (SHAW, 2018, p. 687).
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No caso das delimitações marítimas e questões territoriais entre Qatar e Bahrein, a CIJ analisando
o conteúdo das Minutas assinadas entre Arábia Saudita, Qatar e Bahrein, que enumeravam diversos
compromissos entre as partes, seria um documento vinculante e, por isso, foi considerado um tratado.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 86) destaca ainda que, por serem regidos pelo Direito
souza -- CPF:

Internacional, o conteúdo dos tratados não poderá contrariar normas de jus cogens, às quais a sociedade
Marceli souza

internacional atribuiu hierarquia superior.


Marceli

QUESTÕES
49. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata, adaptada) As convenções
internacionais, que podem ser registradas ou não pela escrita, são consideradas, independentemente de
sua denominação, fontes por excelência, previstas originariamente no Estatuto da CIJ.
50. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Diferentemente da
Convenção de Havana sobre Tratados, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados não traz qualquer
definição do termo tratado.
51. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A Convenção de
Viena sobre Direito dos Tratados, de 1969, conceitua como tratado o acordo internacional concluído por
escrito entre Estados e regido em conformidade com o direito internacional, desde que sua denominação
se inicie por um dos seguintes termos: tratado, acordo ou pacto.
52. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) A necessidade de forma escrita
está expressa na definição de tratado presente na Convenção de Viena.

44
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

8.2. Terminologia: espécies de tratados

Os tratados podem ter várias denominações, o que não lhes retira a característica como fonte do
direito internacional. Nesse sentido, a própria Convenção de Viena de 1969, no final do artigo 2.1, aponta
que suas normas vinculam todos os instrumentos, independentemente da denominação adotada.
A doutrina, no entanto, elenca uma série de espécies de tratados, cada uma com denominação
própria:

• ato internacional: Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 88) aponta que a denominação
“ato internacional” é sinônima de tratado, sendo adotada pelo Ministério das Relações
Exteriores);
• convenção: o termo é normalmente utilizado para denominar acordos multilaterais que visam
estabelecer normas gerais de direito internacional;
• acordo: é o termo utilizado para designar tratados de conteúdo econômico, financeiro, cultural
ou comercial;
• pacto: a designação pacto refere-se a tratados de grande importância, mas com matéria mais
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específica. Ademais, é um termo muito utilizado em tratados de Direitos Humanos. Ex.: Pacto de
São José da Costa Rica;
• protocolo: trata-se de regra de atos complementares ou interpretativos (MAZZUOLI, 2020, p.
139). Pode também aludir ao extrato da ata de uma reunião internacional. A doutrina acaba
classificá-los por protocolos:
▪ protocolo-conferência: são as atas de conferências internacionaisꓼ
▪ protocolo-acordo: são aqueles que criam obrigações jurídicas (GUERRA, 2019, p. 102)ꓼ
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▪ protocolo de intenções: são pré-compromissos em que os signatários sinalizam a


possibilidade de um acordo futuro, estabelecendo as bases da negociação (PORTELA, 2015,
p. 88);
• ato: Sidney Guerra (2019, p. 102) explica que ato é um tratado que estabelece regras de direito;
souza -- CPF:

• ajuste (ou acordo) complementar: o termo visa nomear os tratados com o fim de detalhar ou
Marceli souza

executar outro de escopo mais amplo;


• carta: é o tipo de tratado que cria organizações internacionais, estabelecendo seus objetivos,
Marceli

órgãos e modo de funcionamento, como a Carta das Nações Unidas (Carta da ONU);
• estatuto: o estatuto também é um ato internacional constitutivo, de regra reservado à criação de
tribunais internacionais;
• memorando de entendimento: Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 88) cita o termo como
o ato internacional voltado a registrar princípios gerais que orientarão as relações entre os
signatários;
• convênio: não há consenso na doutrina sobre a utilização do termo. Sidney Guerra (2019, p. 102)
aponta como um tratado de matéria cultural ou de transporte; Paulo Henrique Gonçalves Portela
(2015, p. 88), como ato destinado a regulamentar a cooperação bilateral ou multilateral de
natureza econômica, comercial, cultural, jurídica, científica e técnica, normalmente em áreas mais
específicas, como a exemplo do Convênio de Cooperação Educativa Brasil-Argentina (1997). Já
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 141) entende o convênio como sendo ajustes de menor
importância ou instrumentos contratuais de âmbito interno, que não poderão ser chamados de
tratados;
• declaração: a declaração é usada para consagrar princípios ou afirmar a posição política comum
de seus signatários. Algumas declarações não têm a intenção de vincular juridicamente as partes;

45
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

outras, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, embora não tenham a intenção de
configurar um tratado no momento de sua elaboração, acabaram sendo consideradas de força
cogente, oponíveis aos Estados independentemente de sua vontade (MAZZUOLI, 2020, p. 140);
• concordata: é um tratado internacional firmado com a Santa Sé e, por isso, tem como objeto
assuntos de cunho religioso;
• troca de notas: acordos de regra com matéria de natureza administrativa. Paulo Henrique
Gonçalves Portela (2015, p. 87) explica que sua formação ocorre por uma nota diplomática do
proponente e por uma nota de respostas;
• modus vivendi: trata-se, segundo Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 140), de um instrumento
de menor importância e de vigência temporária, normalmente de ordem econômica.
• acordo de cavalheiros (Gentlemen’s agreements): trata-se de acordo celebrado não por Estados,
mas por suas autoridades de maior nível (PORTELA, 2015, p. 88). Estabelecem uma linha política
a ser adotada pelas partes, sendo fundado na moral e na honra entre eles. Valerio de Oliveira
Mazzuoli (2020, p. 138) explica que, por se tratar de compromissos de natureza moral, os acordos
de cavalheiros não podem ser considerados tratados.
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QUESTÃO
53. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - SEFAZ-ES - Auditor Fiscal da Receita Estadual, adaptada) A Convenção de
Viena sobre Direitos dos Tratados distingue os conceitos de tratado e de acordo internacional.

8.3. Classificação

A doutrina indica diversas classificações dos tratados internacionais, sendo as mais relevantes as
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seguintes.

• Quanto à quantidade de signatários:


▪ bilaterais: celebrados por duas partes;
souza -- CPF:

▪ multilaterais ou plurilaterais: quando concluídos por três ou mais partes.


• Quanto ao procedimento de conclusão: o caráter distintivo diz respeito às etapas de elaboração
Marceli souza

e, sobretudo, à complexidade no processo de apuração do consentimento das partes (PORTELA,


Marceli

2015, p. 89):
▪ solene: é mais comum, pelo que os instrumentos que seguem seu modelo também são
chamados de tratados em sentido estrito (stricto sensu ou bifásicos) (MAZZUOLI, 2020, p.
147). São celebrados em várias etapas de verificação da vontade do Estado e necessitam
sempre de ratificação (PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 185) ꓼ
▪ acordos simplificados, abreviados, unifásicos ou breves: requerem menos etapas de
expressão do consentimento, não necessitando de ratificação (PEREIRA; QUADROS, 2011, p.
185). Os tratados que adotam esse procedimento são também chamados de acordo
executivos e executive agreements.

O Brasil adota, predominantemente, a forma solene, permitindo o modo simplificado apenas quando
o ato não implicar em compromissos gravosos ao país (CF/88, art. 49, I).
Francisco Rezek (2018, p. 54) destaca que um tratado pode ser simplificado para apenas uma das
partes, sendo necessário o preenchimento das fases internacional e interna para outro signatário.

• Quanto à generalidade de suas disposições:

46
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

▪ convenções gerais/convenções-quadro/convenções guarda-chuva: estabelecem normas e


princípios gerais a serem detalhados em acordos posteriores, por meio de protocolos
adicionais ou pela legislação interna (ACCIOLY; SILVA; CASELLA, 2019, p. 175);
▪ convenções específicas: esgotam o regulamento do tema em seu próprio corpo.
• Quanto à execução:
▪ tratados transitórios: criam situações que perduram no tempo, mas sua execução é imediata
(MAZZUOLI, 2020, p. 153)
▪ tratados permanentes: são aqueles cuja execução se consuma durante o período em que
estão vigentes.
• Quanto à natureza das normas:
▪ tratados-contratos: visam conciliar interesses divergentes entre as partes. Não surge uma
norma geral de Direito do acerto entre as partes, mas prestações recíprocas entre os
signatários;
▪ tratados-lei ou tratados-normativos: estabelecem normas gerais de Direito Internacional a
partir da vontade convergente dos signatários (PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 182).
• Quanto aos efeitos:
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▪ tratados de efeitos restritos: geram efeitos apenas às partes signatárias (PORTELA, 2015, p.
92);
▪ tratados de efeitos ultra partes: geram efeitos a Estados que não os celebraram,
independentemente de seu consentimento. Ex.: a Carta das Nações Unidas, cujas normas de
manutenção da paz e da segurança internacional atingem Estados que representam ameaça
à estabilidade regional ou mundial, ainda que eles não sejam membros da ONU.
• Quanto à possibilidade de adesão:
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▪ tratados abertos: permitem a adesão posterior de Estados que não participaram de sua
conclusão. Podem ser limitados, estando abertos apenas de um grupo de Estados, como o
tratado do Mercosul, ou a qualquer Estado, como a Carta da ONU;
▪ tratados fechados: não permitem adesão posterior.
souza -- CPF:

• Quanto à estrutura da execução:


Marceli souza

▪ tratados mutalizáveis: tratados multilaterais que a inadimplência de um membro não impede


a execução do acordo aos demais (MAZZUOLI, 2020, p. 154);
Marceli

▪ tratados não mutalizáveis: são os tratados de execução conjunta. Se uma das partes os
descumpre, as demais deixariam de executá-los. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 154)
cita como exemplo o Tratado da Antártica.

8.4. Condições de validade

Sidney Guerra (2019, p. 102) explica que a produção de efeitos em um tratado internacional deve
observar:

• a capacidade das partesꓼ


• a habilitação dos agentes signatáriosꓼ
• o consentimento mútuoꓼ
• o objeto lícito e possível.

47
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

8.4.1. Capacidade das partes

Em regra, a conclusão dos tratados internacionais está restrita aos Estados e às organizações
internacionais. Os Estados são os sujeitos de Direito Internacional plenos, tendo capacidade para celebrar
tratados internacionais.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 94) ressalta que os Estados-membros das federações,
como a brasileira, não podem celebrar tratados. Não há de se confundir a autonomia dos entes federados
com a capacidade internacional.
No Brasil, a Constituição estabelece que a União é o ente federativo com competência exclusiva para
manter relações internacionais, cabendo-lhe a conclusão de tratados, e manter relações com Estados
estrangeiros, participando também de organizações internacionais:

Art. 21. Compete à União:


I - manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais;

A autoridade competente para celebrar tratados em nome do Brasil é o presidente da República, nos
termos do art. 84, VII e VIII, da Constituição:
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Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:


(...)
VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes
diplomáticos;
VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso
Nacional;

A intervenção do Poder Legislativo mostra-se presente na resolução dos tratados gravosos ao


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patrimônio nacional:

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:


I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
souza -- CPF:

No tocante aos atos celebrados entre entidades internacionais de financiamento e fomento, como
Marceli souza

o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD) e Estados-membros ou Municípios


brasileiros, tais atos são contratos, que dependem da União, pois têm por pressuposto a participação do
Marceli

Brasil na entidade e de um acordo de garantia, pelo qual a República Federativa do Brasil assume a obrigação
de garantir o pagamento da dívida relativa à operação (PORTELA, 2015, p. 96).
Ademais, as operações de crédito necessitam de aprovação do Senado Federal, nos termos do art.
52, V, da CF/88:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:


(...)
V - autorizar operações externas de natureza financeira, de interesse da União, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios;

CUIDADO!
Não há de se confundir a representação da República Federativa do Brasil, feita pela União, com a
personalidade jurídica internacional. Ao contrário do que afirma Pedro Lenza (2020, p. 497), a União não
tem dupla personalidade. A União é ente autônomo, pessoa jurídica de direito público interno. Ela apenas
representa a República Federativa do Brasil, sujeito do Direito Internacional.

48
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

As Organizações Internacionais (OI) não foram imediatamente reconhecidas como sujeitos de


Direito Internacional e, por isso, não foram elencadas como entes capazes de firmar tratados na Convenção
de Viena de 1969.
Posteriormente, a prática internacional evidenciou a possibilidade de as Organizações Internacionais
serem signatárias de tratados, gerando a elaboração da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados
entre Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais, de 1986.
Os organismos internacionais podem concluir tratados independentemente de seus membros e,
inclusive, contra a vontade de alguns deles. Eles podem celebrar tratados com seus próprios membros, com
outros Estados ou com outras organizações internacionais.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 95) diz que a capacidade das organizações internacionais
de elaborar tratados apresenta peculiaridades e restringe-se ao objeto da OI. Trata-se, pois, de capacidade
parcial, decorrente de seu próprio estatuto constitutivo.
A capacidade dessas entidades de concluir tratados é, portanto, derivada. Resulta da vontade inicial
dos Estados de criarem a organização delimitando seu campo de atuação. Destaca-se, ainda, que as
organizações internacionais concluem tratados internacionais, mas não os ratificam, sendo esse ato privativo
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dos Estados.
Há divergência doutrinária sobre a possibilidade de acordos entre Estados e pessoas jurídicas
(empresas) ou pessoas naturais serem considerados tratados internacionais. Paulo Henrique Gonçalves
Portela (2015, p. 93) destaca que, ainda que se admita a personalidade de entes como o indivíduo, empresas
e ONGs, estes não contam com capacidade para celebrar tratados.
Já André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 176) apontam que, não obstante a
CPF: 073.496.444-77

Convenção de Viena se restringir aos acordos firmados entre os Estados, isso não quer dizer que as avenças
firmadas com pessoas privadas estrangeiras (naturais ou jurídicas) não estejam fora do alcance do direito
internacional, chamando-os de “quase-tratados”.
Os autores citam como regras do Direito Internacional atinentes ao tema a Resolução n.º 1.803/62
souza -- CPF:

da Assembleia-Geral da ONU, bem como a Convenção do Banco Mundial sobre a Resolução de Diferenças
Marceli souza

Relativas aos Investimentos entre Estados e Nacionais de outros Estados, de 1966.


Marceli

No âmbito do Mercosul, o artigo 9 do Protocolo de Colonia para Proteção e Promoção Recíproca de


Investimentos no MERCOSUL prevê a possibilidade de arbitragem internacional ou remessa a órgão
permanente criado no quadro do Tratado de Assunção, entre investidores e os Estados-partes do bloco.

ATENÇÃO!

Admite-se que outros sujeitos de Direito Internacional, como a Santa Sé, beligerantes,
insurgentes e o Comitê Internacional da Cruz Vermelha concluam, excepcionalmente, tratados.

8.4.2. Habilitação dos agentes

Para a conclusão de um tratado, não basta a capacidade da parte, sendo ainda necessário que o
agente encarregado de representar o sujeito de Direito Internacional tenha o chamado poder de celebrar
tratados (treaty making power).
Trata-se de competência interna corporis dos Estados e das organizações internacionais a definição
de quem poderá negociar e assinar os tratados internacionais, firmando compromissos em seu nome. A
maioria dos Estados estabelece interlocutores similares, como os chefes de Estado e de Governo e os agentes
diplomáticos.

49
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

A Convenção de Viena fixa o rol dos agentes estatais capazes de celebrar tratados
independentemente de comprovação de reunirem poderes para tanto:

Artigo 7 (...)
2. Em virtude de suas funções e independentemente da apresentação de plenos poderes,
são considerados representantes do seu Estado:
a) os Chefes de Estado, os Chefes de Governo e os Ministros das Relações Exteriores, para
a realização de todos os atos relativos à conclusão de um tratado;
b) os Chefes de missão diplomática, para a adoção do texto de um tratado entre o Estado
acreditante e o Estado junto ao qual estão acreditados;
c) os representantes acreditados pelos Estados perante uma conferência ou organização
internacional ou um de seus órgãos, para a adoção do texto de um tratado em tal
conferência, organização ou órgão.

Além das pessoas mencionadas no artigo 7 da Convenção, poderá representar um Estado em uma
negociação quem tiver investido de plenos poderes, sendo, portanto, plenipotenciário.
A carta de plenos poderes é o documento expedido pela autoridade competente de um Estado a
uma ou mais pessoas designadas a representá-lo em uma negociação, na adoção ou autenticação do texto
de um tratado ou para manifestar o consentimento estatal perante os termos de um tratado. Sua previsão
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expressa está no artigo 7.1 da Convenção de Viena, de 1969:

Artigo 7. Plenos Poderes


1. Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a adoção ou autenticação
do texto de um tratado ou para expressar o consentimento do Estado em obrigar-se por um
tratado se:
a) apresentar plenos poderes apropriados; ou
b) a prática dos Estados interessados ou outras circunstâncias indicarem que a intenção do
Estado era considerar essa pessoa seu representante para esses fins e dispensar os plenos
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poderes.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 157) aponta que os chefes de Estado e, em alguns Estados, em
decorrência do sistema de governo adotado, os chefes de Governo têm competência originária ou de
souza -- CPF:

primeiro grau para celebrar tratados, que decorre de suas próprias constituições. Já os Ministros das
Relações Exteriores e chefes de Missão Diplomática têm competência derivada, pois recebem poderes
Marceli souza

delegados dos Chefes de Estado ou de Governo.


Marceli

Os chefes das missões diplomáticas e os representantes acreditados são plenipotenciários apenas do


Estado ou da organização internacional que estão acreditados.
Caso a conclusão de um tratado seja feita por uma pessoa sem plenos poderes, de regra, ele não
vinculará o Estado. Admite-se, no entanto, a vinculação do Estado que, posteriormente, manifeste sua
vontade para tanto:

Artigo 8. Confirmação Posterior de um Ato Praticado sem Autorização


Um ato relativo à conclusão de um tratado praticado por uma pessoa que, nos termos do
artigo 7, não pode ser considerada representante de um Estado para esse fim não produz
efeitos jurídicos, a não ser que seja confirmado, posteriormente, por esse Estado.

8.4.3. Objeto lícito e possível

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 99) aponta que o objeto do tratado deve ser lícito e
possível. Nesse sentido, não devem violar normas internacionais já existentes, podendo, no entanto,
substituí-las por outras, desde que não violem normas de jus cogens, que serão tratadas oportunamente.

50
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

O autor ressalta também que tratados regionais não devem se chocar com normas gerais, como, por
exemplo, no caso do Mercosul em relação às normas da OMC. Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do
Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 179) citam ainda como tratados ilícitos:

• o Tratado de Munique de 1938, que tinha por objeto a ocupação alemã da região dos Sudetos,
até então, parte da Tchecoslováquia, sem a presença da Tchecoslováquia nas negociações do
acordoꓼ
• os tratados que tenham por objeto a Lua e outros corpos celestes, declarados patrimônio comum
da humanidade.

8.4.4. Consentimento regular

Sendo o tratado um acordo de vontades, a adoção do seu texto se dá quando os signatários


expressam sua vontade de forma livre e desimpedida.
Paulo Henrique Gonçalves Portela explica que os vícios do consentimento capazes de invalidar um
tratado internacional são os expostos a seguir.
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• Erro: ocorre quando há falta de informação sobre o objeto do tratado ou quando a informação
sobre o objeto é inverídica (PORTELA, 2015, p. 99). Para que o erro invalide o acordo, ele deve ser
essencial, isto é, estar relacionado à razão fundamental do Estado celebrar o acordo:

Artigo 48. Erro


1. Um Estado pode invocar erro no tratado como tendo invalidado o seu consentimento em
obrigar-se pelo tratado se o erro se referir a um fato ou situação que esse Estado supunha
CPF: 073.496.444-77

existir no momento em que o tratado foi concluído e que constituía uma base essencial de
seu consentimento em obrigar-se pelo tratado.
2. O parágrafo 1 não se aplica se o referido Estado contribui para tal erro pela sua conduta
ou se as circunstâncias foram tais que o Estado devia ter-se apercebido da possibilidade de
erro.
souza -- CPF:

3. Um erro relativo à redação do texto de um tratado não prejudicará sua validade; neste
caso, aplicar-se-á o artigo 79.
Marceli souza

• Dolo: trata-se do ardil e da má-fé dirigidos a induzir uma das partes a ratificar de forma errônea
Marceli

(GUERRA, 2019, p. 105). O prejudicado pode invocar a fraude como motivo para desobrigar-se do
tratado:

Artigo 49. Dolo


Se um Estado foi levado a concluir um tratado pela conduta fraudulenta de outro Estado
negociador, o Estado pode invocar a fraude como tendo invalidado o seu consentimento
em obrigar-se pelo tratado.

• Corrupção do representante: que pode ser fruto da ação direta ou indireta de outro Estado
negociador.

Artigo 50. Corrupção de Representante de um Estado


Se a manifestação do consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado foi obtida
por meio da corrupção de seu representante, pela ação direta ou indireta de outro Estado
negociador, o Estado pode alegar tal corrupção como tendo invalidado o seu consentimento
em obrigar-se pelo tratado.

51
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

• Coação: ocorre quando o tratado é concluído graças ao emprego de força, de ameaças ou de


pressões e imposições contra os negociadores ou ao Estado, que afetem diretamente a expressão
de vontade (PORTELA, 2015, p. 99):

Artigo 51. Coação de Representante de um Estado


Não produzirá qualquer efeito jurídico a manifestação do consentimento de um Estado em
obrigar-se por um tratado que tenha sido obtida pela coação de seu representante, por
meio de atos ou ameaças dirigidas contra ele.

Artigo 52. Coação de um Estado pela Ameaça ou Emprego da Força


É nulo um tratado cuja conclusão foi obtida pela ameaça ou o emprego da força em violação
dos princípios de Direito Internacional incorporados na Carta das Nações Unidas.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 227) explica que os vícios de consentimento podem gerar a
nulidade ou a anulabilidade do tratado. A diferença básica entre ambos é que a anulabilidade gera efeitos ex
nunc, enquanto a nulidade gera efeitos retroativos ou ex tunc.
São hipótese de anulabilidade: erro, dolo e corrupção do representante. Já a hipótese de coação do
representante do Estado seria uma hipótese de nulidade. O autor destaca que a coação de um Estado sobre
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o outro não invalidaria o consentimento do Estado, mas o tratado em si.


O autor explica que, nas hipóteses de anulabilidade, somente o Estado ou a organização internacional
vítima da coação pode invocar o vício, por se tratar de um interesse particular (MAZZUOLI, 2020, p. 228).
Havendo a coação de um Estado ou o desrespeito a uma norma de jus cogens, nos termos dos artigos 52 (já
citado) e 53, o tratado é nulo, não podendo gerar efeitos jurídicos:

Artigo 53. Tratado em Conflito com uma Norma Imperativa de Direito Internacional Geral
CPF: 073.496.444-77

(jus cogens)
É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa
de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa
de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade
internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é
souza -- CPF:

permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da
mesma natureza.
Marceli souza

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 229) destaca que a nulidade relacionada à coação do
Marceli

representante do Estado atinge a manifestação do consentimento; logo, apenas as partes envolvidas. Já a


coação a um Estado, pelo emprego do uso da força, atinge o próprio tratado, sendo de oponibilidade erga
omnes.
O autor ressalta, ainda, que as hipóteses dos artigos 51 a 53 invalidam todo o tratado, considerando
a impossibilidade de divisão das disposições de um tratado, por força do artigo 44, 5, da Convenção de Viena:

Artigo 44. Divisibilidade das Disposições de um Tratado


(...)
5. Nos casos previstos nos artigos 51, 52 e 53 a divisão das disposições de um tratado não é
permitida.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 100) aponta que relacionado ao tema está a chamada
ratificação imperfeita ou irregular, que se refere à possibilidade de um Estado invocar o direito interno como
causa de invalidade de um tratado internacional.
De regra, uma norma nacional não pode ser invocada como justificativa para descumprimento dos
tratados internacionais. Contudo, o artigo 46 da Convenção de Viena dispõe o seguinte:

Artigo 46. Disposições do Direito Interno sobre Competência para Concluir Tratados

52
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

1. Um Estado não pode invocar o fato de que seu consentimento em obrigar-se por um
tratado foi expresso em violação de uma disposição de seu direito interno sobre
competência para concluir tratados, a não ser que essa violação fosse manifesta e dissesse
respeito a uma norma de seu direito interno de importância fundamental.
2. Uma violação é manifesta se for objetivamente evidente para qualquer Estado que
proceda, na matéria, de conformidade com a prática normal e de boa fé.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 241) explica que o dispositivo convencional adotou a teoria da
inconstitucionalidade extrínseca ou formal dos tratados. Apenas as normas constitucionais relacionadas à
competência para a conclusão dos tratados podem fundamentar alegação de vício do consentimento estatal.

QUESTÕES
54. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) A regra que veda ao Estado invocar o fato de que
seu consentimento em obrigar-se por um tratado foi expresso em violação de uma disposição de seu direito
interno sobre competência para concluir tratados não admite exceção.
55. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Admite-se excepcionalmente que um
Estado possa invocar as disposições de seu direito interno para o fim de justificar o inadimplemento de um
tratado.
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56. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Instituto Rio Branco) Ato relativo à conclusão de tratado praticado por
pessoa que não pode ser considerada representante de Estado ou de organização internacional para esse
fim é eivado de nulidade absoluta, não comportando confirmação ou convalidação.
57. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Um ato relativo à
conclusão de um tratado por pessoa que não possa ser considerada representante de um Estado gera
nulidade insanável no instrumento.
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58. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Como regra, um
Estado não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um
tratado, salvo na hipótese de violação manifesta a norma de direito interno de importância fundamental
souza -- CPF:

sobre competência para concluir tratados


Marceli souza

8.5. Reservas
Marceli

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 114) aponta que, em razão da heterogeneidade da
sociedade internacional, é difícil que os Estados obtenham consenso em todas as matérias. Diante disso, os
sujeitos do direito internacional optam pela possibilidade de que um ator, para ratificar um tratado, deixe de
se obrigar a todas as disposições do acordo.
Essa exceção se dá por meio da reserva, também chamada de salvaguarda, de um signatário a uma
ou mais disposições do tratado. A Convenção de Viena conceitua a reserva nos seguintes termos:

Artigo 2º (...)
d) “reserva” significa uma declaração unilateral, qualquer que seja a sua redação ou
denominação, feita por um Estado ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a
ele aderir, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do
tratado em sua aplicação a esse Estado;

Por uma questão de lógica, as reservas se aplicam apenas a tratados multilaterais, em que se busca
a convergência de muitos atores. Mesmo assim, nos termos do artigo 19 da Convenção de Viena, as reservas
têm seus limites:

53
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Artigo 19. Formulação de Reservas


Um Estado pode, ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, ou a ele aderir,
formular uma reserva, a não ser que:
a) a reserva seja proibida pelo tratado;
b) o tratado disponha que só possam ser formuladas determinadas reservas, entre as quais
não figure a reserva em questão; ou
c) nos casos não previstos nas alíneas a e b, a reserva seja incompatível com o objeto e a
finalidade do tratado.

Apesar de a própria convenção conceituar a reserva como ato unilateral, ela mesma prevê a
possibilidade de exceções a normas, permitindo que a reserva exija a anuência outras partes contratantes:

Artigo 20. Aceitação de Reservas e Objeções às Reservas


1. Uma reserva expressamente autorizada por um tratado não requer qualquer aceitação
posterior pelos outros Estados contratantes, a não ser que o tratado assim disponha.
2. Quando se infere do número limitado dos Estados negociadores, assim como do objeto
e da finalidade do tratado, que a aplicação do tratado na íntegra entre todas as partes é
condição essencial para o consentimento de cada uma delas em obrigar-se pelo tratado,
uma reserva requer a aceitação de todas as partes.
3. Quando o tratado é um ato constitutivo de uma organização internacional, a reserva
exige a aceitação do órgão competente da organização, a não ser que o tratado disponha
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diversamente.
4. Nos casos não previstos nos parágrafos precedentes e a menos que o tratado disponha
de outra forma:
a) a aceitação de uma reserva por outro Estado contratante torna o Estado autor da reserva
parte no tratado em relação àquele outro Estado, se o tratado está em vigor ou quando
entrar em vigor para esses Estados;
b) a objeção feita a uma reserva por outro Estado contratante não impede que o tratado
entre em vigor entre o Estado que formulou a objeção e o Estado autor da reserva, a não
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ser que uma intenção contrária tenha sido expressamente manifestada pelo Estado que
formulou a objeção;
c) um ato que manifestar o consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado e
que contiver uma reserva produzirá efeito logo que pelo menos outro Estado contratante
aceitar a reserva.
souza -- CPF:

5. Para os fins dos parágrafos 2 e 4, a não ser que o tratado disponha diversamente, uma
reserva é tida como aceita por um Estado se este não formulou objeção à reserva quer no
Marceli souza

decurso do prazo de doze meses que se seguir à data em que recebeu a notificação, quer
na data em que manifestou o seu consentimento em obrigar-se pelo tratado, se esta for
Marceli

posterior.

CUIDADO!
Apesar de a Convenção de Viena descrever a reserva como um ato unilateral, não se deve confundir
o sentido do termo com a espécie de fonte formal do direito internacional.
Nos termos propostos acima, um ato unilateral é fonte formal do direito internacional quando não
depende de nenhuma outra fonte. A reserva depende do tratado, não se enquadrando, portanto, nessa
definição.
Há autores que fazem tal confusão, mas, normalmente, não delimitam conceitualmente os atos
unilaterais como aqui proposto.
Em provas de concurso, há de se ter cuidado com a assertiva da questão. Lembrando que a tendência
textualista das bancas pode considerar como correta a afirmação de que a reserva é um ato unilateral,
principalmente se o tema de fundo da questão for a Convenção de Viena.
Os efeitos da reserva estão dispostos no artigo 21 da Convenção de Viena:

Artigo 21. Efeitos Jurídicos das Reservas e das Objeções às Reservas


1. Uma reserva estabelecida em relação a outra parte, de conformidade com os artigos 19,
20 e 23:

54
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

a) modifica para o autor da reserva, em suas relações com a outra parte, as disposições do
tratado sobre as quais incide a reserva, na medida prevista por esta; e
b) modifica essas disposições, na mesma medida, quanto a essa outra parte, em suas
relações com o Estado autor da reserva.
2. A reserva não modifica as disposições do tratado quanto às demais partes no tratado em
suas relações inter se.
3. Quando um Estado que formulou objeção a uma reserva não se opôs à entrada em vigor
do tratado entre ele próprio e o Estado autor da reserva, as disposições a que se refere a
reserva não se aplicam entre os dois Estados, na medida prevista pela reserva.

Destaca-se que a reserva não modifica as condições estabelecidas aos demais signatários.
Ademais, tanto a reserva quanto sua aceitação ou objeção devem ser feitas por escrito, nos termos
do artigo 23 da Convenção de Viena:

Artigo 23. Processo Relativo às Reservas


1. A reserva, a aceitação expressa de uma reserva e a objeção a uma reserva devem ser
formuladas por escrito e comunicadas aos Estados contratantes e aos outros Estados que
tenham o direito de se tornar partes no tratado.
2. Uma reserva formulada quando da assinatura do tratado sob reserva de ratificação,
aceitação ou aprovação, deve ser formalmente confirmada pelo Estado que a formulou no
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momento em que manifestar o seu consentimento em obrigar-se pelo tratado. Nesse caso,
a reserva considerar-se-á feita na data de sua confirmação.
3. Uma aceitação expressa de uma reserva, ou objeção a uma reserva, feita antes da
confirmação da reserva não requer confirmação.
4. A retirada de uma reserva ou de uma objeção a uma reserva deve ser formulada por
escrito.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 113) destaca que, além das reservas exclusivas, que
excepcionam a aplicabilidade de parte do tratado a um Estado, há ainda as reservas interpretativas, pelas
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quais um Estado estatui explicitamente como o dispositivo objeto deverá ser aplicado a seu respeito.
Em âmbito interno, a competência para a apresentação de reservas é concorrente entre o Congresso
Nacional e o presidente da República.
souza -- CPF:

QUESTÕES
Marceli souza

59. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) A formulação de reservas é, via de regra, facultada
Marceli

ao Estado que assina, ratifica, aceita, aprova ou adere a um tratado, mas o próprio tratado pode proibi-las.
Exemplifica tal vedação o Estatuto de Roma, que criou o Tribunal Penal Internacional.
60. (CESPE/CEBRASPE - 2004 – DPU) Tratados internacionais relativos a direitos humanos podem conter
autorização expressa para formulação de quaisquer reservas que o Estado-parte considere apropriadas,
desde que tais reservas não sejam incompatíveis com o objeto e o fim do tratado, não estando sujeitas à
aceitação ulterior dos demais Estados contratantes.
61. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Reserva é uma declaração unilateral feita
expressamente com essa denominação por um Estado no momento da assinatura, ratificação, aceitação ou
aprovação de um tratado, ou da adesão a determinado tratado, com o objetivo de excluir ou modificar o
efeito jurídico de certas disposições do tratado no que se refere a sua aplicação a esse Estado.
62. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco) Reservas e declarações interpretativas somente
podem ser apresentadas, se possível a sua formulação, no momento da assinatura, ratificação, aceitação
ou aprovação de tratado ou de adesão a tratado.
63. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A reserva significa
uma declaração unilateral feita por um Estado, ao assinar, ratificar, aceitar ou aprovar um tratado, com o
objetivo de excluir ou modificar efeito jurídico de certas disposições de um tratado multilateral ou bilateral.

55
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

64. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) Se o tratado nada dispuser sobre
o assunto, entende-se que as reservas a um tratado internacional são possíveis, a não ser que seja
incompatível com seu objeto e sua finalidade.
65. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) Caso o tratado seja assinado com
reservas, o Congresso Nacional não tem poderes para adotar o tratado em sua íntegra.
66. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) Caso o tratado admita reservas,
essas podem ser feitas pelo Congresso Nacional, mesmo que não tenham sido feitas pelo presidente da
República (ou outro plenipotenciário) no momento da assinatura.

8.6. Processo de elaboração dos tratados

Um tratado solene é composto de duas grandes fases, uma internacional e a outra nacional. A
validade do tratado está condicionada à observância das etapas tanto internas quanto internacionais.
Cada ordenamento nacional regulamenta sua fase interna, enquanto a fase internacional é
subdividida entre as negociações, a assinatura, o registro e a troca de notas. É possível sistematizar as fases
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de criação de um tratado internacional nos seguintes termos:

Fase Fase Fase nacional Fase


internacional internacional internacional

•Negociação •Assinatura •Ratificação •Registro ou


troca de notas
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8.6.1. Negociação
souza -- CPF:

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 102) conceitua a negociação como sendo a fase inicial do
Marceli souza

processo de elaboração dos tratados, dentro da qual as partes discutem e estabelecem os termos do ato
internacional. Trata-se de competência geralmente de membros do Poder Executivo (MAZZUOLI, 2020, p.
Marceli

160), que, no Brasil, restringe-se ao Executivo federal, nos termos do art. 84, VII e VIII, da Constituição.
A negociação tem lugar em reuniões ou em séries de reuniões denominadas “rodadas de negociação”
ou, simplesmente, “rodadas” (PORTELA, 2015, p. 102).
Sidney Guerra (2019, p. 110) ressalta que as negociações podem ser feitas tanto de governo a
governo quanto pelos plenipotenciários, culminando na redação final do tratado internacional.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 102) destaca que cada vez mais técnicos e especialistas
são levados nas delegações de negociadores ou nas reuniões prévias às rodadas de negociação. Ademais,
tendo em vista a crescente democratização e interesse sobre os assuntos internacionais, outros atores, como
ONGs, empresários e acadêmicos, buscam participar das rodadas de negociação.

8.6.2. Assinatura

A assinatura é o ato pelo qual os negociadores expressam a concordância com o texto final de um
tratado internacional. O artigo 10 da Convenção de Viena de 1969 traz disposição sobre o tema:

Artigo 10. Autenticação do Texto


O texto de um tratado é considerado autêntico e definitivo:

56
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

a) mediante o processo previsto no texto ou acordado pelos Estados que participam da sua
elaboração; ou
b) na ausência de tal processo, pela assinatura, assinatura ad referendum ou rubrica, pelos
representantes desses Estados, do texto do tratado ou da Ata Final da Conferência que
incorporar o referido texto.

Em regra, a assinatura dos tratados não importa na exigibilidade do ato internacional. Paulo Henrique
Gonçalves Portela (2015, p. 103) explica que, nos acordos solenes, a assinatura gera os seguintes efeitos:

• o encerramento das negociações;


• a expressa concordância dos negociadores com o teor do acordo;
• a adoção e a autenticação do texto e o encaminhamento para ratificação.

Sidney Guerra (2019, p. 112) destaca ainda que, além da assinatura imediata, há ainda a assinatura
diferida, ocorrida em data posterior por uma Estado que não participou das negociações. A diferença entre
ambas está relacionada aos seus efeitos jurídicos.
A assinatura não obriga ao Estado ratificar um tratado internacional, porém, nos termos do artigo 18
da Convenção de Viena, o Estado não pode praticar atos contrários ao objeto do tratado:
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Artigo 18. Obrigação de Não Frustrar o Objeto e Finalidade de um Tratado antes de sua
Entrada em Vigor
Um Estado é obrigado a abster-se da prática de atos que frustrariam o objeto e a finalidade
de um tratado, quando:
a) tiver assinado ou trocado instrumentos constitutivos do tratado, sob reserva de
ratificação, aceitação ou aprovação, enquanto não tiver manifestado sua intenção de não
se tornar parte no tratado.
b) tiver expressado seu consentimento em obrigar-se pelo tratado no período que precede
CPF: 073.496.444-77

a entrada em vigor do tratado e com a condição de esta não ser indevidamente retardada.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 168) explica que o dispositivo convencional tem por finalidade
impedir que o Estado frustre as expectativas dos demais signatários do acordo, devendo agir com boa-fé.
souza -- CPF:

Já nos tratados simplificados, as partes se obrigam apenas com a assinatura, nos termos do artigo 12
da Convenção de Viena:
Marceli souza

Artigo 12. Consentimento em Obrigar-se por um Tratado Manifestado pela Assinatura


Marceli

1. O consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado manifesta-se pela


assinatura do representante desse Estado:
a) quando o tratado dispõe que a assinatura terá esse efeito;
b) quando se estabeleça, de outra forma, que os Estados negociadores acordaram em dar
à assinatura esse efeito; ou
c) quando a intenção do Estado interessado em dar esse efeito à assinatura decorra dos
plenos poderes de seu representante ou tenha sido manifestada durante a negociação.
2. Para os efeitos do parágrafo 1:
a) a rubrica de um texto tem o valor de assinatura do tratado, quando ficar estabelecido
que os Estados negociadores nisso concordaram;
b) a assinatura ad referendum de um tratado pelo representante de um Estado, quando
confirmada por esse Estado, vale como assinatura definitiva do tratado.

QUESTÕES
67. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Na hipótese de um
tratado não ter entrado em vigor, um Estado signatário pode praticar atos que acarretem a inviabilidade
prática de aplicação do ato internacional.

57
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

68. (CESPE / CEBRASPE - 2013 - Polícia Federal – Delegado) A Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados estabelece que o Estado que tenha assinado um tratado, ainda que não o tenha ratificado, está
obrigado a não frustrar seu objeto e finalidade antes de sua entrada em vigor.
69. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - DPU - Defensor Público Federal) Segundo a Convenção de Viena sobre
Direitos dos Tratados, o Estado é obrigado a abster-se de atos que frustrem o objeto e a finalidade do
tratado, quando houver trocado instrumentos constitutivos do tratado, sob reserva de aceitação.
70. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) O postulado da aplicabilidade
imediata vale no Brasil, para os tratados internacionais, a partir do momento da aposição da
assinatura do presidente da República.

8.6.3. Ratificação

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 182)
conceituam a ratificação como “ato administrativo mediante o qual o chefe de Estado confirma tratado
firmado em seu nome ou em nome do Estado, declarando que se submeterão ao regime jurídico ali disposto”
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Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 104) aponta que, apesar de a ratificação ser um ato de
relações internacionais, são os ordenamentos internos que regularão a sua prática.
No Brasil, a ratificação é ato privativo do presidente da República, nos termos dos arts. 84, VII e VIII,
da CF/88:

Art. 84 (...)
VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes
diplomáticos;
CPF: 073.496.444-77

VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso


Nacional;

A ratificação é ato discricionário do chefe do Poder Executivo, que, em tratados que acarretem
souza -- CPF:

encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional, está condicionado à autorização prévia do


Congresso Nacional:
Marceli souza

Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:


Marceli

I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem


encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;

É possível concluir, portanto, que, em regra, a ratificação no sistema brasileiro é um ato complexo,
pois necessita da manifestação de dois órgãos distintos para sua perfectibilização. A autorização da
ratificação ocorre mediante decreto-legislativo, enquanto a ratificação se dá por decreto do presidente da
República.

É na Constituição da República - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas


e dualistas - que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos
atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro. O exame da vigente
Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua
incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um
ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas:
a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo,
sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da
República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84,
VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-
los mediante decreto. O iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais -
superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação
congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo

58
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são
inerentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto;
e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular
e a obrigar no plano do direito positivo interno (ADI 1480 MC, Relator(a): Min. CELSO DE
MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 04/09/1997, DJ 18-05-2001 PP-00429 EMENT VOL-
02031-02 PP-00213) .

Destaca-se que a necessidade de decreto do presidente da República no procedimento de ratificação


não está prevista na Constituição, configurando-se, portanto, verdadeira norma costumeira interna.
No que concerne ao processo legislativo, a casa iniciadora no Congresso Nacional será a Câmara dos
Deputados, sendo a casa revisora o Senado Federal. Tratando-se de ato internacional, não é possível a
apresentação de emendas parlamentares com o intuito de alteração do tratado, ainda que se admita ao
Congresso aprovar o texto com ressalvas (reservas).
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 105) explica que uma Organização Internacional ratifica
um tratado pelo ato de confirmação formal feito de acordo com os procedimentos estabelecidos pelas
próprias regras da organização.

CUIDADO
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A Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de


Intolerância é um tratado internacional de direitos humanos aprovado no Congresso Nacional (Decreto-
legislativo nº 1/21, de 18 de fevereiro de 2021) nos termos do art. 5º, § 3º da Constituição, tendo, portanto,
força equivalente à emenda constitucional.
No dia 12 de maio de 2021 o Presidente da República, por meio de notícia da Agência Brasil4 divulgou
a assinatura do decreto executivo de ratificação do tratado. Ocorre que não há nem no Diário Oficial da
União5, nem no site do Planalto, nas sessões dos tratados ratificados nos termos do art. 5º, § 3º da
CPF: 073.496.444-77

Constituição, ou de decretos executivos, qualquer decreto ratificando o tratado.


Destaca-se ainda que o Presidente da República enviou uma carta de ratificação à OEA, datada de
12 de maio de 2021.
souza -- CPF:

Esse procedimento “pitoresco” definitivamente gera mais dúvidas do que respostas. Afinal, o envio
de carta de ratificação à OEA induz, em âmbito internacional, que a ratificação interna ocorreu de forma
Marceli souza

devida. Logo, dificilmente seria possível aduzir eventual erro formal na ratificação em situação de
responsabilização decorrente da convenção. Por outro lado, em âmbito interno, a ausência do decreto
Marceli

executivo abala o costume constitucional na necessidade da dupla manifestação. Cabendo, portanto, aos
tribunais resolverem se a carta de ratificação supriria a ausência do decreto executivo ou se há um vício
formal na ratificação impedindo sua validade interna.

QUESTÕES
71. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Polícia Federal - Delegado de Polícia Federal) A Convenção de Palermo,
um instrumento internacional multilateral e solene, foi promulgada pelo Congresso Nacional brasileiro e
ratificada, no âmbito interno, por decreto.
72. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Admite-se que, por
ocasião da aprovação do texto convencional de tratado, o Congresso Nacional do Estado efetue emendas
a esse tratado, de modo que a ratificação seja realizada com reservas.

4 Vide: https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2021-05/bolsonaro-ratifica-convencao-interamericana-contra-o-racismo
5 Busca realizada entre 1º a 31 de maio no site: https://www.in.gov.br/servicos/diario-oficial-da-uniao

59
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

73. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A expedição de
decreto presidencial executório de tratado internacional, após sua ratificação, pelo presidente da
República, junto ao depositário, é expressamente prevista na Constituição Federal de 1988.
74. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) A publicação do acordo
executivo é a garantia da introdução, no ordenamento jurídico nacional, dos acordos celebrados no molde
executivo, sem que haja a manifestação típica do Congresso Nacional.
75. (IADES - 2019 - Instituto Rio Branco - Diplomata) De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro,
é de competência privativa do presidente da República assinar tratados e convenções internacionais, sendo
possível, nesse momento, o oferecimento de reservas ao conteúdo do tratado quando por ele previsto.
76. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) O presidente da República pode
promulgar um tratado internacional sem que tenha havido apreciação do Congresso Nacional, caso se
verifiquem os requisitos de relevância e urgência no referido tratado.
77. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) É exclusividade do Congresso
Nacional a resolução definitiva de questões controvertidas que tratem de tratados internacionais que
acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional.
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78. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal) A respeito da incorporação do direito
internacional ao direito brasileiro, assinale a opção correta.
a) A Casa iniciadora, no que diz respeito a projetos de decreto legislativo de aprovação de tratados, é o
Senado Federal.
b) A ratificação de tratado pelo presidente da República é ato discricionário.
c) Diferentemente dos tratados-lei, tratados-contrato não necessitam de aprovação do Congresso Nacional
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para passar a integrar o ordenamento jurídico nacional.


d) Tratados de direitos humanos ratificados antes ou depois da CF incorporam-se ao direito pátrio com
força de emenda constitucional.
e) É proibido ao Congresso Nacional aprovar os tratados com ressalvas.
souza -- CPF:

8.6.4. Expressão do consentimento


Marceli souza
Marceli

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 183)
explicam que não é a ratificação propriamente dita que dá vigor a um tratado, mas a expressão do
consentimento do Estado, por meio da carta de ratificação. Trata-se da “comunicação formal que uma parte
faz à outra de que aceitou obrigar-se definitivamente” (MAZZUOLI, 2020, p. 177).
A vigência do tratado ocorre após a chamada troca de notas (em tratados bilaterais) ou do depósito
(normalmente em tratados multilaterais). A troca de notas é o envio da carta de ratificação por um Estado,
com o recebimento da carta da outra parte. Já o depósito é o envio da carta de ratificação ao depositário do
tratado, previamente escolhido pelas partes:

Artigo 15. Consentimento em Obrigar-se por um Tratado Manifestado pela Adesão


O consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado manifesta-se pela adesão:
a) quando esse tratado disponha que tal consentimento pode ser manifestado, por esse
Estado, pela adesão;
b) quando, por outra forma, se estabeleça que os Estados negociadores acordaram em que
tal consentimento pode ser manifestado, por esse Estado, pela adesão; ou
c) quando todas as partes acordaram posteriormente em que tal consentimento pode ser
manifestado, por esse Estado, pela adesão.

60
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Artigo 16. Troca ou Depósito dos Instrumentos de Ratificação, Aceitação, Aprovação ou


Adesão
A não ser que o tratado disponha diversamente, os instrumentos de ratificação, aceitação,
aprovação ou adesão estabelecem o consentimento de um Estado em obrigar-se por um
tratado por ocasião:
a) da sua troca entre os Estados contratantes;
b) do seu depósito junto ao depositário; ou
c) da sua notificação aos Estados contratantes ou ao depositário, se assim for
convencionado.

QUESTÕES
79. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - Instituto Rio Branco) Não há vedação, conforme a Convenção de Viena
sobre o Direito dos Tratados, de 1969, para que dois ou mais Estados sejam depositários de um mesmo
tratado.
80. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco) A menos que o tratado ou os Estados contratantes
disponham de forma diversa, é função do depositário examinar se a assinatura de instrumento está em boa
forma e, se necessário, chamar a atenção do Estado em causa sobre a questão.
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81. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) É vedado que mais
de dois Estados sejam depositários de um mesmo tratado.
82. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) A adesão somente é possível
quando expressamente disposta no tratado.

8.6.5. Registro
CPF: 073.496.444-77

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 106) destaca que o art. 102 da Carta da ONU dispõe que
um tratado não registrado perante as Nações Unidas não pode invocado perante qualquer dos órgãos da
ONU em caso de controvérsia:
souza -- CPF:

Artigo 102
1. Todo tratado e todo acordo internacional, concluídos por qualquer Membro das Nações
Marceli souza

Unidas depois da entrada em vigor da presente Carta, deverão, dentro do mais breve prazo
possível, ser registrados e publicados pelo Secretariado.
Marceli

2. Nenhuma parte em qualquer tratado ou acordo internacional que não tenha sido
registrado de conformidade com as disposições do parágrafo 1º deste Artigo poderá invocar
tal tratado ou acordo perante qualquer órgão das Nações Unidas.

A Convenção de Viena de 1969 prevê em seu artigo 80 a necessidade de remessa dos tratados às
Nações Unidas:

Artigo 80. Registro e Publicação de Tratados


1. Após sua entrada em vigor, os tratados serão remetidos ao Secretariado das Nações
Unidas para fins de registro ou de classificação e catalogação, conforme o caso, bem como
de publicação
2. A designação de um depositário constitui autorização para este praticar os atos previstos
no parágrafo anterior.

O registro não é uma condição de validade do tratado. Ao contrário do que dispunha o artigo 18 do
Pacto da Sociedade das Nações de 1919, que condicionava a vigência do tratado ao seu registro na SdN, a
Carta da ONU retira apenas a possibilidade de invocação do instrumento perante seus órgãos, entre os quais
se destaca a Corte Internacional de Justiça.

61
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

QUESTÃO
83. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Para que um tratado
internacional entre em vigor, é necessário que ele seja registrado na Secretaria das Nações Unidas.

8.7. Vigência dos tratados

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 108) aponta que não há uma regra geral de direito
internacional relativa à duração dos tratados, cabendo aos signatários estabelecer seu período de vigência,
conforme seus interesses.
De regra, compete ao tratado estabelecer o início de sua vigência:

Artigo 24. Entrada em vigor


1. Um tratado entra em vigor na forma e na data previstas no tratado ou acordadas pelos
Estados negociadores.

Por isso é possível que tratados multilaterais disponham de cláusula prevendo um número mínimo
de ratificações ou um prazo (vacatio legis) para ele entrar em vigência. A própria Convenção de Viena traz
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um artigo nesse sentido:

Artigo 84. Entrada em Vigor


1. A presente Convenção entrará em vigor no trigésimo dia que se seguir à data do depósito
do trigésimo quinto instrumento de ratificação ou adesão.

No silêncio do instrumento, a Convenção de Viena aponta que o tratado se considera vigente quando
for comprovado o consentimento dos Estados negociadores.
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Artigo 24. Entrada em vigor


2. Na ausência de tal disposição ou acordo, um tratado entra em vigor tão logo o
consentimento em obrigar-se pelo tratado seja manifestado por todos os Estados
negociadores.
souza -- CPF:

Nas hipóteses de tratados abertos, a vigência do instrumento se inicia para um Estado aderente, da
data do consentimento, exceto quando o próprio tratado disponha de forma diversa:
Marceli souza

Artigo 24. Entrada em vigor


Marceli

3. Quando o consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado for manifestado


após sua entrada em vigor, o tratado entrará em vigor em relação a esse Estado nessa data,
a não ser que o tratado disponha de outra forma.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 203) destaca que, em regra, os tratados têm eficácia ex nunc,
isto é, prospectiva ou para o futuro, cabendo à doutrina diferenciar o início da vigência em:

• vigência contemporânea: ocorre quando o tratado entra em vigor assim que manifestado o
consentimento definitivo de ambas as partes ou, nos atos multilaterais, do número mínimo de
ratificações;
• vigência diferida: se dá nas hipóteses em que o tratado estipula prazo para o início de sua
vigência, contado da expressão final de vontade dos signatários.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 109) aponta ser possível que um tratado entre em vigor
de maneira escalonada, ou seja, em momentos diferentes para alguns dos signatários.
A Convenção de Viena prevê também a possibilidade de aplicação provisória de um tratado. O ato
poderia ser aplicado formalmente antes de sua perfectibilização:

Artigo 25. Aplicação Provisória

62
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

1. Um tratado ou uma parte do tratado aplica-se provisoriamente enquanto não entra em


vigor, se:
a) o próprio tratado assim dispuser; ou
b) os Estados negociadores assim acordarem por outra forma.
2. A não ser que o tratado disponha ou os Estados negociadores acordem de outra forma,
a aplicação provisória de um tratado ou parte de um tratado, em relação a um Estado,
termina se esse Estado notificar aos outros Estados, entre os quais o tratado é aplicado
provisoriamente, sua intenção de não se tornar parte no tratado.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 203) aponta que a possibilidade de aplicação provisória de um
tratado não lhe retira a qualidade de ser um instrumento solene, isto é, não o torna um tratado simplificado.
Trata-se de hipótese em que a urgência, analisada pelos próprios negociadores, imponha a aplicação
imediata do texto.
No Brasil, considerando o disposto no art. 49, I, da Constituição, não seria possível a um
plenipotenciário comprometer-se à eventual aplicação provisória, ante a ausência de anuência do Congresso
Nacional.
Os tratados podem ter prazo determinado ou indeterminado. A distinção entre ambos é a fixação de
prazo para sua vigência.
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Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 109) defende que, havendo a previsão de uma condição
resolutória no texto, que não a temporal, o tratado deve ser considerado de prazo indeterminado. Porém,
não obstante à afirmação do autor, o que determinará a classificação é a natureza do texto do acordo e não
a presença de uma condição que, por definição, é um evento futuro e incerto.

QUESTÕES
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84. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) O Estado brasileiro reconhece a


possibilidade de aplicação provisória de um tratado enquanto ele não entrar em vigor, desde que o próprio
tratado assim disponha ou desde que os Estados negociadores assim tenham acordado por outra forma.
85. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - PC-MA - Delegado de Polícia Civil) De acordo com a Convenção de Viena,
souza -- CPF:

a submissão de um Estado a determinado tratado manifesta-se pela adesão quando:


Marceli souza

a) os Estados negociadores tiverem acordado que a ratificação seja exigida.


b) o tratado estiver sujeito à ratificação e o representante do referido Estado o tiver assinado.
Marceli

c) a intenção do Estado de assinar o tratado sob reserva de ratificação decorrer dos plenos poderes de seu
representante ou tiver sido manifestada durante a negociação.
d) todas as partes acordarem, posteriormente, que tal consentimento possa ser manifestado, pelo referido
Estado, mediante adesão.
e) esse tratado dispuser que esse consentimento se manifeste pela ratificação.
86. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Admite-se que a
entrada em vigor de um tratado ocorra a partir do implemento de uma condição, como, por exemplo, o
depósito junto ao secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
87. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco, adaptada) A definição de Estado contratante na
Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, abrange apenas os Estados que consentiram
em se obrigar pelo tratado quando este tenha entrado em vigor.

8.8. Aplicação dos tratados à terceiros Estados

De regra, a aplicabilidade de um tratado cinge-se aos seus signatários:

63
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Artigo 34. Regra Geral com Relação a Terceiros Estados


Um tratado não cria obrigações nem direitos para um terceiro Estado sem o seu
consentimento.

Contudo, Francisco Rezek (2018, p. 112) aponta que alguns tratados repercutem sobre terceiros,
como fatos, criando normas jurídicas ou conferindo-lhes direitos. Assim sendo, o autor classifica os tratados
nos termos a seguir.

• De efeitos difusos (de reconhecimento de situação jurídica objetiva): são aqueles que criam
situações jurídicas objetivas oponíveis a todos os Estados. Ex.: um tratado bilateral que altera a
delimitação da fronteira entre os Estados signatários gera efeitos a toda comunidade
internacional.
• De efeito aparente: um Estado acaba sendo beneficiado pelas cláusulas de um tratado, de regra
bilateral, posterior, em razão de norma prevista em tratado anterior que vincula os signatários. O
exemplo mais citado na doutrina é a da cláusula da nação mais favorecida.

EXEMPLO
Os Estados A e B firmaram um tratado fixando a alíquota de imposto de importação de determinado
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bem em 0,5%.
O mesmo tratado traz disposição no sentido de que, se uma das partes fixar outra norma com
alíquota menor, ela deverá ser estendida ao outro signatário.
Caso A firme um tratado com o Estado C, com a alíquota de imposto de importação em 0,4%, o índice
deve ser aplicado não apenas à C, como também à B (em razão do primeiro tratado firmado).
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 222) chama essa hipótese de “efeito de fato de repercussão
CPF: 073.496.444-77

sobre terceiro Estado das consequências de um tratado”. O autor explica que o acordo posterior atinge o
terceiro Estado não como uma norma jurídica, mas sim como um simples fato (ou fato-condição) previsto
anteriormente entre os signatários.
souza -- CPF:

• De efeitos jurídicos na atribuição de obrigações a terceiros: é possível que um tratado seja feito
para conferir obrigação a terceiros. Contudo, um terceiro Estado só será de fato obrigado às
Marceli souza

disposições do tratado quando manifestar de forma expressa e formal, isto é, por escrito, seu
Marceli

consentimento. Trata-se do chamado sistema de garantia, cuja previsão remonta à Convenção


de Havana sobre Tratados (MAZZUOLI, 2020, p. 223):

Artigo 35. Tratados que Criam Obrigações para Terceiros Estados


Uma obrigação nasce para um terceiro Estado de uma disposição de um tratado se as partes
no tratado tiverem a intenção de criar a obrigação por meio dessa disposição e o terceiro
Estado aceitar expressamente, por escrito, essa obrigação.

Uma obrigação nascida para um terceiro Estado só poderá ser revogada ou modificada com o
consentimento das partes do tratado e do próprio (terceiro) Estado. A exceção se dá quando o acordo original
já preveja eventual fim da obrigação:

Artigo 37. Revogação ou Modificação de Obrigações ou Direitos de Terceiros Estados


1. Qualquer obrigação que tiver nascido para um terceiro Estado nos termos do artigo 35
só poderá ser revogada ou modificada com o consentimento das partes no tratado e do
terceiro Estado, salvo se ficar estabelecido que elas haviam acordado diversamente.

• De efeitos jurídicos na concessão de direitos a terceiros: ocorre quando as partes de um tratado


acordem conferir um direito ou privilégio a terceiros. A Convenção de Viena prevê que, nessa

64
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

hipótese, compete ao beneficiário expressamente se opor ao direito; caso contrário, presume-se


seu consentimento:

Artigo 36. Tratados que Criam Direitos para Terceiros Estados


1. Um direito nasce para um terceiro Estado de uma disposição de um tratado se as partes
no tratado tiverem a intenção de conferir, por meio dessa disposição, esse direito quer a
um terceiro Estado, quer a um grupo de Estados a que pertença, quer a todos os Estados, e
o terceiro Estado nisso consentir. Presume-se o seu consentimento até indicação em
contrário, a menos que o tratado disponha diversamente.
2. Um Estado que exerce um direito nos termos do parágrafo 1 deve respeitar, para o
exercício desse direito, as condições previstas no tratado ou estabelecidas de acordo com
o tratado.

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 180)
explicam que o terceiro beneficiário não adquire, de fato, o direito de exigir a execução do contrato pelas
partes contratantes, que poderão modificar ou extingui-lo. A exceção ocorre quando o próprio tratado exija
a anuência do beneficiário para a revogação ou modificação do direito/privilégio:

Artigo 37. Revogação ou Modificação de Obrigações ou Direitos de Terceiros Estados


(...)
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2. Qualquer direito que tiver nascido para um terceiro Estado nos termos do artigo 36 não
poderá ser revogado ou modificado pelas partes, se ficar estabelecido ter havido a intenção
de que o direito não fosse revogável ou sujeito a modificação sem o consentimento do
terceiro Estado.

QUESTÃO
88. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Um tratado somente
CPF: 073.496.444-77

pode criar obrigações para um terceiro Estado que dele não faça parte se este consentiu expressamente,
por escrito, nesse sentido.

8.9. Interpretação dos tratados


souza -- CPF:

André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 240) destacam que a interpretação dos
Marceli souza

tratados, em especial os multilaterais, suscita questões difíceis, debatidas desde a obra de Hugo Grócio De
Marceli

jure belii ac pacis.


O próprio objeto da interpretação se mostra controverso na doutrina. Enquanto alguns defendem
que o objeto da interpretação do tratado consiste na averiguação da vontade real das partes contratantes
(PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 240), há quem entenda ser o texto do acordo (MAZZUOLI, 2020, p. 213).
Interessante destacar que, em termos de interpretação dos tratados, a doutrina internacionalista
está longe dos ensinamentos de hermenêutica constitucional. É comum encontrar afirmações de cunho
“legalistas”, formalistas ou positivistas como “in claris non fit interpretatio” (REZEK, 2018, p. 122ꓼ ACCIOLY,
SILVA; CASELLA, 2019, p. 185ꓼ MAZZUOLI, 2020, p. 213ꓼ GUERRA, 2019, p. 117).
Nesse contexto, a ideia majoritária da doutrina, portanto, é a de que o intérprete do tratado desvela,
descobre um significado pré-existente do enunciado normativo e não que ele atribua sentido ao texto
conforme o contexto da interpretação.

CUIDADO!
Nas provas há de se ter cuidado para não confundir as técnicas de hermenêutica constitucional com
a interpretação dos tratados. Em questões objetivas, deve-se privilegiar o estudo da literalidade da
Convenção de Viena sobre o tema. Em caso de dúvidas na alternativa, provavelmente a banca adotará uma
interpretação clássica ou jurídica com base nos ensinamentos de Savigny.

65
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

O tema é tratado nos artigos 31 a 33 da Convenção de Viena, sendo o princípio geral de interpretação
dos tratados o da boa-fé:

Artigo 31
1. Um tratado deve ser interpretado de boa-fé segundo o sentido comum atribuível aos
termos do tratado em seu contexto e à luz de seu objetivo e finalidade.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 214) explica que o princípio da boa-fé é um corolário da pacta
sunt servanda. Isso porque deve-se respeitar a vontade das partes contratantes no momento da expressão
de seu consentimento.
Decorre do princípio da boa-fé o princípio do efeito útil (effet utile) pelo qual o tratado não deve ser
interpretado de forma a retirar seu efeito prático (PEREIRA; QUADROS, 2011, p. 241).
O sentido dos termos do tratado deve ser, como regra, o sentido comum, isto é, o usual (MAZZUOLI,
2020, p. 214), exceto quando o próprio acordo atribua sentido distinto:

Artigo 31 (...)
4. Um termo será entendido em sentido especial se estiver estabelecido que essa era a
intenção das partes.
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Ademais, Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 111) aponta que o sentido comum deve ser
atribuível segundo o contexto à época da elaboração do tratado. Integram o contexto do tratado: o
preâmbulo e outros acordos que tenham conexão com a conclusão do trabalho:

Artigo 31 (...)
2. Para os fins de interpretação de um tratado, o contexto compreenderá, além do texto,
seu preâmbulo e anexos:
a) qualquer acordo relativo ao tratado e feito entre todas as partes em conexão com a
CPF: 073.496.444-77

conclusão do tratado;
b) qualquer instrumento estabelecido por uma ou várias partes em conexão com a
conclusão do tratado e aceito pelas outras partes como instrumento relativo ao tratado.

Deverão ser considerados para a interpretação dos tratados os acordos e as práticas posteriores
souza -- CPF:

entre as partes relativos à interpretação do tratado em análise, bem como as regras de Direito Internacional:
Marceli souza

Artigo 31 (...)
3. Serão levados em consideração, juntamente com o contexto:
Marceli

a) qualquer acordo posterior entre as partes relativo à interpretação do tratado ou à


aplicação de suas disposições;
b) qualquer prática seguida posteriormente na aplicação do tratado, pela qual se estabeleça
o acordo das partes relativo à sua interpretação;
c) quaisquer regras pertinentes de Direito Internacional aplicáveis às relações entre as
partes.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 122) explica que o dispositivo faz alusão à chamada
interpretação autêntica dos tratados, além de normas consuetudinárias.
A Convenção de Viena faz alusão ainda aos chamados meios suplementares de interpretação,
cabendo ao intérprete utilizar inclusive os trabalhos preparatórios (travaux préparatoires) e as circunstâncias
da conclusão do acordo:

Artigo 32. Meios Suplementares de Interpretação


Pode-se recorrer a meios suplementares de interpretação, inclusive aos trabalhos
preparatórios do tratado e às circunstâncias de sua conclusão, a fim de confirmar o sentido
resultante da aplicação do artigo 31 ou de determinar o sentido quando a interpretação, de
conformidade com o artigo 31:
a) deixa o sentido ambíguo ou obscuro; ou
b) conduz a um resultado que é manifestamente absurdo ou desarrazoado.

66
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Outro ponto controvertido, regulamentado pela Convenção de Viena, é o da tradução dos tratados.
Nos termos do acordo, todas as versões autênticas têm fé e são iguais, presumindo-se que todas têm o
mesmo sentido:

Artigo 33. Interpretação de Tratados Autenticados em Duas ou Mais Línguas


1. Quando um tratado foi autenticado em duas ou mais línguas, seu texto faz igualmente fé
em cada uma delas, a não ser que o tratado disponha ou as partes concordem que, em caso
de divergência, prevaleça um texto determinado.
2. Uma versão do tratado em língua diversa daquelas em que o texto foi autenticado só será
considerada texto autêntico se o tratado o previr ou as partes nisso concordarem.
3. Presume-se que os termos do tratado têm o mesmo sentido nos diversos textos
autênticos.

Porém, caso haja dúvida quanto ao termo adotado em uma das versões, deve-se escolher entre os
textos autênticos aquele que coaduna com o objetivo e a finalidade dos signatários:

Artigo 33 (...)
4. Salvo o caso em que um determinado texto prevalece nos termos do parágrafo 1, quando
a comparação dos textos autênticos revela uma diferença de sentido que a aplicação dos
artigos 31 e 32 não elimina, adotar-se-á o sentido que, tendo em conta o objeto e a
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finalidade do tratado, melhor conciliar os textos.

QUESTÕES
89. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Instituto Rio Branco, adaptada) A Convenção de Viena sobre Tratados,
de 1969, estabelece, em sua regra geral de interpretação, que os termos de um tratado devem ser
interpretados em seu contexto, o qual inclui, entre outros, o texto, o preâmbulo, os eventuais anexos, os
acordos subsequentes e os trabalhos preparatórios.
CPF: 073.496.444-77

90. (FCC - 2018 - DPE-AM - Analista Jurídico de Defensoria) Segundo a regra geral prevista na Convenção
de Viena sobre o Direito dos Tratados, um tratado internacional de direitos humanos deve ser interpretado
a) de boa-fé segundo o sentido comum atribuível aos termos do tratado em seu contexto e à luz de seu
objetivo e finalidade.
souza -- CPF:

b) em seu sentido literal, conforme o significado técnico atribuível a seus termos pelo Direito Internacional
Marceli souza

e pelas Comissões de monitoramento de sua implementação.


c) de forma integrativa, sistêmica e diacrônica, buscando sua harmonização com os demais documentos
Marceli

internacionais, especialmente a Declaração Universal dos Direitos Humanos.


d) conforme seu grau de efetividade concreta na transformação da realidade dos sujeitos beneficiados com
suas regras.
e) a partir do padrão de incorporação de seus termos à legislação interna dos Estados-partes que os
ratificaram.
91. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Não se admite que
se considere o preâmbulo do tratado para fins de interpretar o contexto desse mesmo tratado.
92. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) Na regra geral de interpretação
dos tratados, está previsto o recurso aos trabalhos preparatórios.
93. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Instituto Rio Branco – Diplomata) O princípio da efetividade (effet utile)
— segundo o qual um tratado deve ser interpretado de modo a atribuir efeito e significado a todos os seus
termos — não é explicitamente previsto na referida Convenção, mas seu uso é disseminado na
jurisprudência internacional.

67
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

8.10. Alteração dos tratados

Jorge Miranda (2009, p. 86) destaca que a modificação dos tratados é um tema que deve ser visto
considerando-se a estrutura da sociedade internacional e das relações internacionais em geral.
Antes de 1945, entendia-se que, para a alteração de um tratado, todos os Estados signatários
deveriam expressar seu consentimento, gerando grandes dificuldades em tratados multilaterais.
Atualmente, o tema acaba por ter tratamento distinto, em razão de seu objeto. Tratados de
alterações de fronteiras tendem a ser rígidos e, atualmente, não são modificados. Outros tratados, como a
Convenção do Direito do Mar, trazem uma cláusula temporal de inalterabilidade.
A Convenção de Viena de 1969 traz duas regras básicas sobre as modificações dos tratados: a vontade
dos signatários e os termos do instrumento:

Artigo 39. Regra Geral Relativa à Emenda de Tratados


Um tratado poderá ser emendado por acordo entre as partes. As regras estabelecidas na
parte II aplicar-se-ão a tal acordo, salvo na medida em que o tratado dispuser diversamente.

Artigo 40. Emenda de Tratados Multilaterais


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1. A não ser que o tratado disponha diversamente, a emenda de tratados multilaterais


reger-se-á pelos parágrafos seguintes.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 113) destaca que a “emenda é o meio pelo qual o teor
dos atos internacionais é revisto, levando ao acréscimo, à alteração ou à supressão de conteúdo normativo”.
Segundo a Convenção de Viena, a emenda só vinculará o Estado que concordar com seu teor.
Portanto, caso um dos Estados signatários não concordem com a alteração, ser-lhe-á aplicada a redação
CPF: 073.496.444-77

originária, exceto se o próprio texto original previr norma em sentido contrário:

Artigo 40. Emenda de Tratados Multilaterais


(...)
2. Qualquer proposta para emendar um tratado multilateral entre todas as partes deverá
souza -- CPF:

ser notificada a todos os Estados contratantes, cada um dos quais terá o direito de
participar:
Marceli souza

a) na decisão quanto à ação a ser tomada sobre essa proposta;


b) na negociação e conclusão de qualquer acordo para a emenda do tratado.
Marceli

3. Todo Estado que possa ser parte no tratado poderá igualmente ser parte no tratado
emendado.
4. O acordo de emenda não vincula os Estados que já são partes no tratado e que não se
tornaram partes no acordo de emenda; em relação a esses Estados, aplicar-se-á o artigo 30,
parágrafo 4 (b).

A adesão de um novo Estado ao tratado em momento posterior à emenda pressupõe sua aceitação
ao texto alterado e não à norma originária, exceto quando manifeste intenção diferente:

Artigo 40 (...)
5. Qualquer Estado que se torne parte no tratado após a entrada em vigor do acordo de
emenda será considerado, a menos que manifeste intenção diferente:
a) parte no tratado emendado; e
b) parte no tratado não emendado em relação às partes no tratado não vinculadas pelo
acordo de emenda.

No Brasil, a emenda, se implicar em compromissos gravosos, deve ser submetida ao Congresso


Nacional antes de sua ratificação (MAZZUOLI, 2020, p. 201). Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 113)
defende que modificações não substanciais do tratado não necessitam de autorização do Congresso para sua
ratificação.

68
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

8.11. Suspensão e fim dos tratados

Os tratados internacionais podem deixar de viger de forma temporária ou definitiva.

8.11.1. Extinção

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 116) conceitua a extinção do tratado como “o
desaparecimento do acordo do ordenamento jurídico, deixando seus preceitos de gerar efeitos jurídicos em
caráter permanente”. Jorge Miranda aponta as hipóteses de extinção nos seguintes termos:

• cessação por vontade das partes:


▪ ab-rogação (art. 54º, alínea b, da Convenção de Viena) ꓼ
▪ celebração de tratado ulterior sobre a mesma matéria (art. 59º, da Convenção de Viena) ꓼ
• cessação por caducidade:
▪ decurso do prazo de vigência do tratado (termo final);
▪ execução do próprio tratadoꓼ
▪ alteração fundamental de circunstâncias ou cláusula rebus sic stantibus (art. 62º, da
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Convenção de Viena) ꓼ
• impossibilidade superveniente de execução (art. 61º, da Convenção de Viena).

Sidney Guerra (2018, p. 117) menciona ainda a hipótese de guerra.


Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 251) traz outra classificação sobre as hipóteses de extinção dos
tratados, cujo critério distintivo relacionam-se ao momento da manifestação da vontade das partes. Para o
CPF: 073.496.444-77

autor, extinção e ab-rogação dos tratados são termos sinônimos:

• predeterminada: ocorre nas hipóteses de:


▪ termo certoꓼ
▪ condição resolutivaꓼ
souza -- CPF:

▪ execução integralꓼ
Marceli souza

• superveniente:
▪ pela vontade unânime das partesꓼ
Marceli

▪ por causas extrínsecas ao tratado.

Não obstante as classificações doutrinárias, as normas de extinção e suspensão dos tratados estão
previstas na Seção 3 (artigos 54 e seguintes) da Convenção de Viena de 1969.
O artigo 54 da Convenção aponta que, como regra, a extinção do tratado se dá pela vontade das
partes ou pela incidência de alguma hipótese prevista no próprio texto:

Artigo 54. Extinção ou Retirada de um Tratado em Virtude de suas disposições ou por


consentimento das partes
A extinção de um tratado ou a retirada de uma das partes pode ter lugar:
a) de conformidade com as disposições do tratado; ou
b) a qualquer momento, pelo consentimento de todas as partes, após consulta com os
outros Estados contratantes.

Ambas as hipóteses previstas no artigo 54 da Convenção de Viena reportam-se à vontade comum


das partes. A diferença entre elas é o momento de manifestação da vontade, a primeira na realização integral
do acordo, com a inserção de cláusula limitativa de vigência ou condição resolutiva, e a segunda no decorrer
de seu cumprimento.

69
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 116) ressalta que a violação do tratado não é, por si, uma
causa de extinção, ensejando apenas a responsabilização internacional do ente que o violou. Contudo, tal
fato pode motivar a(s) parte(s) prejudicada(s) a negociar a extinção ou suspensão do acordo.
A violação substancial do tratado pode gerar a extinção ou a suspensão do tratado, nos termos do
artigo 60 da Convenção de Viena:

Artigo 60. Extinção ou Suspensão da Execução de um tratado em consequência de sua


violação
1. Uma violação substancial de um tratado bilateral por uma das partes autoriza a outra
parte a invocar a violação como causa de extinção ou suspensão da execução de tratado,
no todo ou em parte.
2. Uma violação substancial de um tratado multilateral por uma das partes autoriza:
a) as outras partes, por consentimento unânime, a suspenderem a execução do tratado, no
todo ou em parte, ou a extinguirem o tratado, quer:
i) nas relações entre elas e o Estado faltoso;
ii) entre todas as partes;
b) uma parte especialmente prejudicada pela violação a invocá-la como causa para
suspender a execução do tratado, no todo ou em parte, nas relações entre ela e o Estado
faltoso;
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c) qualquer parte que não seja o Estado faltoso a invocar a violação como causa para
suspender a execução do tratado, no todo ou em parte, no que lhe diga respeito, se o
tratado for de tal natureza que uma violação substancial de suas disposições por parte
modifique radicalmente a situação de cada uma das partes quanto ao cumprimento
posterior de suas obrigações decorrentes do tratado.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 254) explica que a violação substancial ou grave do tratado é
aquela injustificada que não extingue imediatamente a avença. O próprio artigo 60 da Convenção traz a
CPF: 073.496.444-77

conceituação de violação substancial nos seguintes termos:

Artigo 60. Extinção ou Suspensão da Execução de um tratado em consequência de sua


violação
(...)
souza -- CPF:

3. Uma violação substancial de um tratado, para os fins deste artigo, consiste:


a) numa rejeição do tratado não sancionada pela presente Convenção; ou
Marceli souza

b) na violação de uma disposição essencial para a consecução do objeto ou da finalidade do


tratado.
Marceli

Apesar de ser possível a extinção ou suspensão do tratado pela violação grave de seus termos, essa
hipótese não isenta de responsabilidade o Estado detrator:

Artigo 60. Extinção ou Suspensão da Execução de um tratado em consequência de sua


violação
(...)
4. Os parágrafos anteriores não prejudicam qualquer disposição do tratado aplicável em
caso de violação.

Ademais, a Convenção de Viena impede que a violação grave seja uma justificativa lícita para a
extinção de tratados de caráter humanitário ou de proteção aos direitos humanos:

Artigo 60. Extinção ou Suspensão da Execução de um tratado em consequência de sua


violação
(...)
5. Os parágrafos 1 a 3 não se aplicam às disposições sobre a proteção da pessoa humana
contidas em tratados de caráter humanitário, especialmente às disposições que proíbem
qualquer forma de represália contra pessoas protegidas por tais tratados.

Importante destacar que, nos termos da Convenção de Viena, o rompimento de relações


diplomáticas entre as partes de um tratado não gera, como regra, a extinção do acordo:

70
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Artigo 63. Rompimento de Relações Diplomáticas e Consulares


O rompimento de relações diplomáticas ou consulares entre partes em um tratado não
afetará as relações jurídicas estabelecidas entre elas pelo tratado, salvo na medida em que
a existência de relações diplomáticas ou consulares for indispensável à aplicação do tratado.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 118) explica que a norma parte do pressuposto de que
não há relação entre a celebração de tratados e a manutenção de relações diplomáticas.
A Convenção de Viena aponta ainda como forma extintiva de um tratado o surgimento de norma de
jus cogens em sentido contrário ao acordo:

Artigo 64. Superveniência de uma Nova Norma Imperativa de Direito Internacional Geral
(jus cogens)
Se sobrevier uma nova norma imperativa de Direito Internacional geral, qualquer tratado
existente que estiver em conflito com essa norma torna-se nulo e extingue-se.

A impossibilidade superveniente do tratado pode ocorrer, nos termos do artigo 61 da Convenção de


Viena, por questões físicas (destruição do objeto do tratado) ou jurídicas (incompatibilidade de execução em
função de outro tratado ou antagonismo com normas gerais de Direito Internacional) (MAZZUOLI, 2020, p.
255):
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Artigo 61. Impossibilidade Superveniente de Cumprimento


1. Uma parte pode invocar a impossibilidade de cumprir um tratado como causa para
extinguir o tratado ou dele retirar-se, se esta possibilidade resultar da destruição ou do
desaparecimento definitivo de um objeto indispensável ao cumprimento do tratado. Se a
impossibilidade for temporária, pode ser invocada somente como causa para suspender a
execução do tratado.
2. A impossibilidade de cumprimento não pode ser invocada por uma das partes como causa
para extinguir um tratado, dele retirar-se, ou suspender a execução dele, se a
CPF: 073.496.444-77

impossibilidade resultar de uma violação, por essa parte, quer de uma obrigação decorrente
do tratado, quer de qualquer outra obrigação internacional em relação a qualquer outra
parte no tratado.

Caso a impossibilidade superveniente seja temporária, trata-se de hipótese de suspensão do tratado


souza -- CPF:

e não extinção.
Marceli souza

O artigo 62 da Convenção de Viena aponta que, de regra, a mudança fundamental das circunstâncias
da época da conclusão de um tratado não pode ser invocada para a sua extinção. Excepcionalmente, admite-
Marceli

se a utilização da cláusula rebus sic stantibus para a extinção quando:

• a circunstância tiver sido expressamente inserida como essencial no momento da conclusão do


tratadoꓼ ou
• as obrigações ainda pendentes do acordo serem substancialmente alteradas em função da
mudança das circunstâncias.

Artigo 62. Mudança Fundamental de Circunstâncias


1. Uma mudança fundamental de circunstâncias, ocorrida em relação às existentes no
momento da conclusão de um tratado, e não prevista pelas partes, não pode ser invocada
como causa para extinguir um tratado ou dele retirar-se, salvo se:
a) a existência dessas circunstâncias tiver constituído uma condição essencial do
consentimento das partes em obrigarem-se pelo tratado; e
b) essa mudança tiver por efeito a modificação radical do alcance das obrigações ainda
pendentes de cumprimento em virtude do tratado.
2. Uma mudança fundamental de circunstâncias não pode ser invocada pela parte como
causa para extinguir um tratado ou dele retirar-se:
a) se o tratado estabelecer limites; ou

71
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

b) se a mudança fundamental resultar de violação, pela parte que a invoca, seja de uma
obrigação decorrente do tratado, seja de qualquer outra obrigação internacional em
relação a qualquer outra parte no tratado.
3. Se, nos termos dos parágrafos anteriores, uma parte pode invocar uma mudança
fundamental de circunstâncias como causa para extinguir um tratado ou dele retirar-se,
pode também invocá-la como causa para suspender a execução do tratado.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 258) explica que o estado de guerra é, de regra, ligado a uma
situação de suspensão da execução de tratados e não de sua extinção. Ademais, há tratados que não perdem
vigência durante o período de beligerância. Porém, a guerra, apesar de um ilícito internacional, acaba por
extinguir eventuais tratados bilaterais entre os Estados beligerantes.
Tratados multilaterais tendem a serem suspensos durante as agressões entre os Estados inimigos,
mas são mantidos em relação aos demais Estados.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 118) aponta ainda que o desuso do tratado por longo
período pode gerar sua extinção por caducidade.

QUESTÕES
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94. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Extingue-se um tratado por ab-rogação
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sempre que a vontade de o terminar for comum às partes coobrigadas.


95. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) É vedada a extinção
de um tratado multilateral em virtude de violação substancial de suas disposições por uma das partes.
96. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) A mudança fundamental de
circunstâncias é causa de nulidade de um tratado.
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8.11.2. Denúncia

Paulo Henrique Gonçalves Portela conceitua a denúncia nos seguintes termos:


souza -- CPF:

(...) ato unilateral pelo qual uma parte em um tratado anuncia sua intenção de se
desvincular de um compromisso internacional de que faça parte, desobrigando-se de
Marceli souza

cumprir as obrigações estabelecidas em seu bojo sem que isso enseje a possibilidade de
responsabilização internacional (PORTELA, 2015, p. 119).
Marceli

A rigor, a denúncia pode ser uma forma de extinção de tratados, desde que sejam eles bilaterais. Nas
hipóteses de tratados multilaterais, o efeito da denúncia restringe-se à retirada do Estado que a fez,
mantendo os termos do acordo para os demais signatários.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 259) ressalta que a denúncia atinge todo o tratado e não apenas
parcela do instrumento, aplicando a regra da indivisibilidade ou integralidade dos tratados internacionais,
prevista no artigo 44 da Convenção.
A denúncia tem efeitos ex nunc, não excluindo as obrigações anteriores ao ato.
A Convenção de Viena, no que diz respeito à denúncia, dispõe o seguinte:

Artigo 56. Denúncia, ou Retirada, de um Tratado que não Contém Disposições sobre
Extinção, Denúncia ou Retirada
1. Um tratado que não contém disposição relativa à sua extinção, e que não prevê denúncia
ou retirada, não é suscetível de denúncia ou retirada, a não ser que:
a) se estabeleça terem as partes tencionado admitir a possibilidade da denúncia ou retirada;
ou
b) um direito de denúncia ou retirada possa ser deduzido da natureza do tratado.

72
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Alguns tratados não admitem denúncia, como os que fixam as fronteiras entre os Estados, tratando-
se dos chamados tratados reais ou dispositivos (MAZZUOLI, 2020, p. 260).
A denúncia deve ser formalizada por escrito com um prazo de pelo menos 12 meses de sua
efetivação, trata-se do chamado prazo de acomodação (MAZZUOLI, 2020, p. 262):

Artigo 56. Denúncia, ou Retirada, de um Tratado que não contém disposições sobre
extinção, denúncia ou retirada
(...)
2. Uma parte deverá notificar, com pelo menos doze meses de antecedência, a sua intenção
de denunciar ou de se retirar de um tratado, nos termos do parágrafo 1.

Ademais, admite-se a retratação da denúncia, desde que no prazo de acomodação, isto é, desde que
ela ainda não tenha gerado seus efeitos jurídicos. Em âmbito interno, discute-se qual o procedimento a ser
adotado para a denúncia de um tratado ratificado pelo Brasil. A divergência central refere-se à necessidade
de manifestação prévia do Poder Legislativo.
Na doutrina pátria, Clóvis Bevilaqua compreendia que a competência para denunciar um tratado era
apenas do presidente da República. Trata-se de posição defendida por Francisco Rezek (2019, p. 151) e Paulo
Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 120).
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Pontes de Miranda, por sua vez, defendia que, se na ratificação é necessária a manifestação do Poder
Legislativo, o mesmo deve ocorrer no momento da denúncia. Trata-se de posição defendia por Valerio de
Oliveira Mazzuoli (2020, p. 267).
Considerando-se os termos do art. 49, I, da Constituição, que prevê a necessidade de manifestação
prévia do Congresso Nacional nas hipóteses de encargos ou compromissos gravosos para o país, não resta
dúvidas de que, nas situações em que a denúncia seja condicionada, causando encargos ou compromissos
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gravoso ao país, é necessária a manifestação prévia do Poder Legislativo.


Por outro lado, caso a denúncia não acarrete efeitos gravosos, a questão cinge-se à interpretação do
termo “resolver definitivamente”. Afinal, se coube ao Congresso Nacional decidir pela aceitação dos
souza -- CPF:

compromissos previstos no tratado, a interpretação sistemática da Constituição levaria à necessidade de


nova manifestação para a retirada do Estado. Por fim, acordos que não necessitam de manifestação do
Marceli souza

Congresso para serem ratificados também não necessitariam de sua manifestação para a denúncia.
Marceli

O tema encontra-se sob judice (ADI 1.625-DF), tendo por objeto a denúncia feita pelo presidente da
República à Convenção 158 da OIT. Até o momento, a votação está em 3 a 1 no sentido da necessidade de
participação do Poder Legislativo para a denúncia do tratado. Para maiores informações, vide os
informativos nº 323 e 549 do Supremo Tribunal Federal. A data prevista para a retomada do julgamento do
feito, segundo o site do STF, é 17/03/2021.
Ainda relacionado ao tema, há quem entenda que o Congresso Nacional teria a competência para
denunciar um tratado através de lei ordinária (REZEK, 2018, p. 152; MAZZUOLI, 2020, p. 267). Tal posição
trata-se de uma contradição em relação à ideia de denúncia como um ato privativo do presidente da
República e até mesmo em relação à necessidade de manifestação dos dois poderes. Afinal, ao se entender
que a ratificação é um ato complexo e a denúncia também (pelo princípio da paridade), não poderia apenas
o Poder Legislativo denunciar o tratado, sem a anuência do presidente da República.

ATENÇÃO!
O tema já foi objeto de questão de concurso da ESAF, tendo sido adotado o entendimento da
desnecessidade de manifestação do Congresso Nacional para se fazer a denúncia de um tratado.

73
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

QUESTÕES
97. (ESAF - 2016 - ANAC - Especialista em Regulação de Aviação Civil) Considerando o regramento dos
tratados internacionais na Convenção de Viena, assinale a opção correta.
a) Reserva é um ato bilateral ou multilateral pelo qual se expressa a objeção em relação a certo dispositivo
de um tratado internacional.
b) Denúncia é a expressão de objeção de um Estado a certo dispositivo de um tratado internacional.
c) Denúncia é a expressão de consentimento de um Estado a um tratado internacional.
d) Reserva é a declaração unilateral do Estado para excluir ou modificar o efeito jurídico, em relação a esse
mesmo Estado, de certas disposições de um tratado internacional.
e) Denúncia é um dos tipos de vício do consentimento estatal capaz de gerar a anulação da expressão de
sua vontade.
98. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) A concordância do Congresso
Nacional é essencial para que o Brasil denuncie um tratado internacional, desvinculando-se das obrigações
nele estabelecidas.
99. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - SEFAZ-ES - Auditor Fiscal da Receita Estadual, adaptada) A Convenção de
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Viena sobre Direitos dos Tratados reconhece a mudança fundamental de circunstâncias como causa de
extinção de tratados.
100. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) É possível a aplicação de tratado
internacional já denunciado, desde que mediante decreto legislativo que o revigore.

8.11.3. Suspensão
CPF: 073.496.444-77

A suspensão do tratado é o ato pelo qual uma das partes busca a paralização temporária dos efeitos
jurídicos do acordo. Ela está regulada nos artigos 57 e 58 da Convenção de Viena:

Artigo 57. Suspensão da Execução de um Tratado em Virtude de suas disposições ou pelo


souza -- CPF:

consentimento das Partes


A execução de um tratado em relação a todas as partes ou a uma parte determinada pode
Marceli souza

ser suspensa:
a) de conformidade com as disposições do tratado; ou
Marceli

b) a qualquer momento, pelo consentimento de todas as partes, após consulta com os


outros Estados contratantes

Artigo 58. Suspensão da Execução de Tratado Multilateral por Acordo apenas entre
Algumas da Partes
1. Duas ou mais partes num tratado multilateral podem concluir um acordo para suspender
temporariamente, e somente entre si, a execução das disposições de um tratado se:
a) a possibilidade de tal suspensão estiver prevista pelo tratado; ou
b) essa suspensão não for proibida pelo tratado e:
i) não prejudicar o gozo, pelas outras partes, dos seus direitos decorrentes do tratado nem
o cumprimento de suas obrigações
ii) não for incompatível com o objeto e a finalidade do tratado.
2. Salvo se, num caso previsto no parágrafo 1 (a), o tratado dispuser diversamente, as partes
em questão notificarão às outras partes sua intenção de concluir o acordo e as disposições
do tratado cuja execução pretendem suspender.

A suspensão do tratado pode estar prevista e regulada previamente no tratado ou ser objeto de
avença posterior. Nos tratados multilaterais, a suspensão pode depender da concordância de um número
mínimo de signatários.

74
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

A guerra e a mudança fundamental de circunstâncias podem ser causas ensejadoras da suspensão


do tratado, assim como a impossibilidade temporária de seu cumprimento.

QUESTÕES
101. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco, adaptada) Consta expressamente na Convenção
de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, que as disposições sobre suspensão são inaplicáveis aos
tratados que contêm obrigações erga omnes partes.
102. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - SEFAZ-ES - Auditor Fiscal da Receita Estadual, adaptada) A Convenção de
Viena sobre Direitos dos Tratados determina que o rompimento de relações diplomáticas gera, ipso facto,
a suspensão de tratados comerciais.
103. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) O rompimento de relações
diplomáticas gera, por si só, a suspensão da execução de um tratado.

8.12. Conflito entre tratados

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 187)
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apontam que a aplicação de tratados sucessivos sobre a mesma matéria é um dos problemas mais complexos
da área.
A primeira solução trazida pela Convenção de Viena refere-se à eventual relação de dependência
entre tratados. Portanto, caso um tratado contenha uma cláusula de subordinação a outro tratado, este
último deverá prevalecer:

Artigo 30. Aplicação de Tratados Sucessivos sobre o Mesmo Assunto


CPF: 073.496.444-77

(...)
2. Quando um tratado estipular que está subordinado a um tratado anterior ou posterior
ou que não deve ser considerado incompatível com esse outro tratado, as disposições deste
último prevalecerão.
souza -- CPF:

Do ponto de vista subjetivo, em relação aos tratados bilaterais entre as mesmas partes (identidade
de fontes normativas), não há um conflito propriamente dito, afinal pelo critério cronológico, lex posterior
Marceli souza

derogat priori. Esse é o sentido do artigo 30.3 da Convenção de Viena:


Marceli

Artigo 30. Aplicação de Tratados Sucessivos sobre o Mesmo Assunto


(...)
3. Quando todas as partes no tratado anterior são igualmente partes no tratado posterior,
sem que o tratado anterior tenha cessado de vigorar ou sem que a sua aplicação tenha sido
suspensa nos termos do artigo 59, o tratado anterior só se aplica na medida em que as suas
disposições sejam compatíveis com as do tratado posterior.

Francisco Rezek (2018, p. 126) aponta que, independentemente da ordem cronológica, caso um
tratado trate de norma especial e o outro tenha alcance geral, também não haveria conflito, ante o princípio
da especialidade (lex specialis derogat generali).
A questão muda de figura quando não há coincidência entre as partes do tratado. Havendo conflito
entre o tratado multilateral anterior com tratado (bilateral ou multilateral) posterior, sem a presença de
todos os signatários do primeiro tratado, haverá respostas distintas.
Às relações entre os Estados signatários de ambos os tratados se aplica o critério cronológico, isto é,
o tratado posterior; por sua vez, aplica-se apenas aquele que ele é signatário às relações com o Estado que
esteja presente em apenas um dos tratados

75
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Artigo 30. Aplicação de Tratados Sucessivos sobre o Mesmo Assunto


(...)
4. Quando as partes no tratado posterior não incluem todas as partes no tratado anterior:
a) nas relações entre os Estados partes nos dois tratados, aplica-se o disposto no parágrafo
3;
b) nas relações entre um Estado parte nos dois tratados e um Estado parte apenas em um
desses tratados, o tratado em que os dois Estados são partes rege os seus direitos e
obrigações recíprocos.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 249) aponta outra solução em relação à coexistência de tratado
multilateral e tratado bilateral. Para o autor, aplica-se a norma particular, desde que o tratado coletivo assim
o permita, isto é, não preveja cláusula impedindo acordos incompatíveis.
Há de se destacar que a aplicabilidade de um tratado em detrimento de outro não importa,
necessariamente, na extinção do tratado preterido. Ademais, a prevalência de um tratado sobre outro
poderá ensejar, inclusive, a responsabilidade internacional do Estado:

Artigo 30. Aplicação de Tratados Sucessivos sobre o Mesmo Assunto


(...)
5. O parágrafo 4 aplica-se sem prejuízo do artigo 41, ou de qualquer questão relativa à
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extinção ou suspensão da execução de um tratado nos termos do artigo 60 ou de qualquer


questão de responsabilidade que possa surgir para um Estado da conclusão ou da aplicação
de um tratado cujas disposições sejam incompatíveis com suas obrigações em relação a
outro Estado nos termos de outro tratado.

Além das soluções relacionadas às partes dos tratados, há de se destacar ainda a aplicação do
princípio da hierarquia para a solução de eventuais conflitos. A própria Convenção de Viena prevê a
prevalência da Carta da ONU em relação aos tratados de mesma natureza:
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Artigo 30. Aplicação de Tratados Sucessivos sobre o Mesmo Assunto


1. Sem prejuízo das disposições do artigo 103 da Carta das Nações Unidas, os direitos e
obrigações dos Estados partes em tratados sucessivos sobre o mesmo assunto serão
determinados de conformidade com os parágrafos seguintes.
souza -- CPF:

Trata-se de solução idêntica à trazida pela Carta das Nações Unidas: Artigo 103. No caso de
conflito entre as obrigações dos Membros das Nações Unidas, em virtude da presente Carta
Marceli souza

e as obrigações resultantes de qualquer outro acordo internacional, prevalecerão as


obrigações assumidas em virtude da presente Carta.
Marceli

Ademais, um tratado não prevalece sobre uma norma de jus cogens. Logo, tratado posterior em
conflito com uma norma de jus cogens é nulo. Tratado anterior ao surgimento da norma de jus cogens em
sentido contrário é considerado extinto.

Artigo 53 da Convenção de Viena


Tratado em Conflito com uma Norma Imperativa de Direito Internacional Geral (jus cogens)
É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa
de Direito Internacional geral. (...)

Artigo 64 da Convenção de Viena


Superveniência de uma Nova Norma Imperativa de Direito Internacional Geral (jus cogens)
Se sobrevier uma nova norma imperativa de Direito Internacional geral, qualquer tratado
existente que estiver em conflito com essa norma torna-se nulo e extingue-se.

QUESTÕES
104. (ESAF - 2016 - ANAC - Especialista em Regulação de Aviação Civil) A respeito de tratados
internacionais, assinale a opção correta.

76
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

a) Havendo conflito entre tratados de um mesmo tema e provenientes de uma mesma fonte de produção
normativa (bilateral entre os mesmos Estados ou de uma mesma organização internacional), prevalece o
texto mais recente.
b) Havendo conflito entre tratados de um mesmo tema e provenientes de diferentes fontes de produção
normativa, a regra de Direito Internacional impõe a aplicação do texto mais recente.
c) Havendo conflito entre tratados de diferentes fontes de produção normativa, a regra de Direito
Internacional impõe a prevalência do texto multilateral sobre o bilateral.
d) Havendo conflito entre tratados de mesma fonte de produção normativa, prevalece o texto mais antigo
por ser a expressão originária do consentimento internacional.
e) Havendo conflito entre lei ordinária anterior e tratado posterior, a prevalência é da lei ordinária.
105. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal) Considerando a jurisprudência atual do
STF, assinale a opção correta quanto à relação entre tratado e norma de direito interno.
a) O STF apregoa o primado do direito internacional em face do ordenamento nacional brasileiro.
b) Tratados e convenções guardam estrita relação de paridade normativa com as leis delegadas editadas
pelo Poder Executivo.
c) Há sempre a primazia dos tratados internacionais de comércio exterior sobre as normas internas
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aduaneiras.
d) O Decreto-lei n.º 911/1969, que permite a prisão civil do devedor-fiduciante, foi revogado pelo Pacto de
San José da Costa Rica.
e) Para decidir conflito entre tratado e norma de direito interno, além do critério da lex posterior derogat
priori, o STF aplica, ainda, um outro, qual seja, o da lex posterior generalis non derogat legi priori speciali.
106. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) A superveniência de
CPF: 073.496.444-77

uma norma de jus cogens que esteja em conflito com um tratado acarretará a suspensão temporária das
disposições ajustadas até que haja modificação do que tiver sido pactuado.
107. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - SEFAZ-ES - Auditor Fiscal da Receita Estadual, adaptada) A Convenção de
Viena sobre Direitos dos Tratados dispõe que o órgão de solução de controvérsias da OMC tem jurisdição
souza -- CPF:

compulsória sobre tratados comerciais.


Marceli souza

108. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - SEFAZ-ES - Auditor Fiscal da Receita Estadual, adaptada) A Convenção de
Marceli

Viena sobre Direitos dos Tratados estabelece a prioridade dos tratados de direitos humanos sobre os
tratados de comércio internacional, em caso de conflito entre ambos.

8.13. Conflito entre tratados e normas de direto interno

O tema sobre eventual antinomia entre tratado internacional e o direito interno já foi mencionado
quando do estudo das teorias monistas e dualistas do Direito.
Do ponto de vista internacional, o artigo 27 da Convenção de Viena aponta uma posição monista
internacionalista, em que as normas do direito interno não poderão, como regra, serem invocadas para o
descumprimento de um tratado, exceto na situação de violação manifesta de norma de importância
fundamental de um Estado, ou seja, de inconstitucionalidade formal:

Artigo 27. Direito Interno e Observância de Tratados


Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o
inadimplemento de um tratado. Esta regra não prejudica o artigo 46.

Não obstante a clareza da convenção, do ponto de vista interno, adota-se a posição monista
nacionalista moderada, em que um tratado, a depender de sua natureza, poderá ou não prevalecer sobre
uma norma interna.

77
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

O Supremo Tribunal Federal, a partir do julgamento do RE 349.703, firmou o entendimento de que


tratados internacionais de direitos humanos anteriores à EC n° 45/04 e que não foram ratificados nos termos
do art. 5º, § 3º, da Constituição têm status supralegal. Como consequência, eles podem ser objeto de
controle de constitucionalidade, pois são hierarquicamente inferiores à Constituição, mas eles, em razão de
sua eficácia paralisante, retiram a validade do restante da legislação ordinária.
Já os tratados internacionais de direitos humanos ratificados nos termos do art. 5º, § 3º, da
Constituição têm força equivalente às emendas constitucionais. Logo, eles também podem ser objeto de
controle de constitucionalidade (assim como as emendas constitucionais), mas são ainda parâmetro de
controle, integrando o chamado “bloco de constitucionalidade” brasileiro.
Os tratados de direito tributário seguem as regras do art. 98 do CTN:

Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação


tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.

Para a doutrina tributarista, o critério a ser adotado não é o hierárquico, mas sim o da especialidade.
Como destaca Luciano Amaro (2010, p. 203), o aparente conflito normativo se resolve pela aplicação do
preceito do tratado, que, no caso, está para a lei interna assim como a norma especial está para a norma
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geral.
Ademais, os tratados internacionais de natureza tributária não têm o condão de criar tributos, mas
apenas de gerar um “efeito negativo”, delimitando as pretensões tributárias dos Estados (AMARO, 2010, p.
203). Caso ocorra a denúncia do tratado, as normas gerais voltam a incidir.
No sentido do raciocínio exposto, o art. 85-A da Lei n.º 8.212/1991 dispõe:

Art. 85-A. Os tratados, convenções e outros acordos internacionais de que Estado


CPF: 073.496.444-77

estrangeiro ou organismo internacional e o Brasil sejam partes, e que versem sobre matéria
previdenciária, serão interpretados como lei especial. (Incluído pela Lei n.° 9.876, de 1999)

As 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça têm posição consolidada de acordo com o sentido
souza -- CPF:

esposado:

5. A jurisprudência desta Corte Superior orienta que as disposições dos Tratados


Marceli souza

Internacionais Tributários prevalecem sobre as normas de Direito Interno, em razão da sua


especificidade. Inteligência do art. 98 do CTN. Precedente: (RESP 1.161.467-RS, Rel. Min.
Marceli

CASTRO MEIRA, DJe 01.06.2012).


6. O art. VII do Modelo de Acordo Tributário sobre a Renda e o Capital da OCDE utilizado
pela maioria dos Países ocidentais, inclusive pelo Brasil, conforme Tratados Internacionais
Tributários celebrados com a Bélgica (Decreto 72.542/73), a Dinamarca (Decreto 75.106/74)
e o Principado de Luxemburgo (Decreto 85.051/80), disciplina que os lucros de uma
empresa de um Estado contratante só são tributáveis nesse mesmo Estado, a não ser que a
empresa exerça sua atividade no outro Estado Contratante, por meio de um
estabelecimento permanente ali situado (dependência, sucursal ou filial); ademais, impõe
a Convenção de Viena que uma parte não pode invocar as disposições de seu direito
interno para justificar o inadimplemento de um tratado (art. 27), em reverência ao
princípio basilar da boa-fé.
7. No caso de empresa controlada, dotada de personalidade jurídica própria e distinta da
controladora, nos termos dos Tratados Internacionais, os lucros por ela auferidos são lucros
próprios e assim tributados somente no País do seu domicílio; a sistemática adotada pela
legislação fiscal nacional de adicioná-los ao lucro da empresa controladora brasileira
termina por ferir os Pactos Internacionais Tributários e infringir o princípio da boa-fé na
relações exteriores, a que o Direito Internacional não confere abono. (REsp 1325709/RJ,
Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014,
DJe 20/05/2014)

78
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

7. A antinomia supostamente existente entre a norma da convenção e o direito tributário


interno resolve-se pela regra da especialidade, ainda que a normatização interna seja
posterior à internacional.
8. O art. 98 do CTN deve ser interpretado à luz do princípio lex specialis derrogat generalis,
não havendo, propriamente, revogação ou derrogação da norma interna pelo regramento
internacional, mas apenas suspensão de eficácia que atinge, tão só, as situações envolvendo
os sujeitos e os elementos de estraneidade descritos na norma da convenção.
9. A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua
existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma "revogação
funcional", na expressão cunhada por HELENO TORRES, o que torna as normas internas
relativamente inaplicáveis àquelas situações previstas no tratado internacional, envolvendo
determinadas pessoas, situações e relações jurídicas específicas, mas não acarreta a
revogação, stricto sensu, da norma para as demais situações jurídicas a envolver elementos
não relacionadas aos Estados contratantes.
10. No caso, o art. VII das Convenções Brasil-Alemanha e Brasil-Canadá deve prevalecer
sobre a regra inserta no art. 7º da Lei 9.779/99, já que a norma internacional é especial e se
aplica, exclusivamente, para evitar a bitributação entre o Brasil e os dois outros países
signatários. Às demais relações jurídicas não abarcadas pelas Convenções, aplica-se,
integralmente e sem ressalvas, a norma interna, que determina a tributação pela fonte
pagadora a ser realizada no Brasil. (REsp. 1161467/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA,
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SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2012, DJe 01/06/2012)


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Ainda no âmbito tributário, é necessário destacar que o Brasil é signatário do Acordo Geral sobre
Tarifas e Comércio – GATT. O tratado prevê a equivalência de tratamento entre o produto importado, quando
este ingressa no território nacional, e o produto similar nacional (trata-se da regra do tratamento nacional).
Eventual isenção concedida por lei ao produto nacional deve ser, portanto, aplicada a todas as mercadorias
estrangeiras de mesma natureza, exceto as expressamente ressalvadas pelo tratado.
A regra tem fundamento constitucional no art. 152, que assim dispõe:
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Art. 152. É vedado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer diferença
tributária entre bens e serviços, de qualquer natureza, em razão de sua procedência ou
destino.
souza -- CPF:

Havia na doutrina discussão acerca da aplicabilidade da regra sobre o tratamento nacional em face
do art. 111 do CTN que preceitua:
Marceli souza

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:


Marceli

I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;


II - outorga de isenção;
III - dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.

Para parte da doutrina, não seria possível estender eventual isenção às mercadorias estrangeiras por
falta de previsão legal.
A questão restou pacificada no Superior Tribunal de justiça quando a min. Eliana Calmon prolatou
seu voto no REsp. n° 460.165, nos seguintes termos:

(...) Dentro deste enfoque, doutrinário e jurisprudencial, é que, aplicando o art. 98 do CTN,
afasto a incidência do art. 111 do CTN, por entender que deve prevalecer a legislação de
âmbito internacional, de maior abrangência, e concluo que, sendo o salmão importado do
Chile, País signatário do GATT, enquanto não sofrer processo de industrialização, deve ser
isento do ICMS quando da sua internação no País. (REsp. 434.703/SP, Rel. Ministra ELIANA
CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/08/2002, DJ 30/09/2002 p. 251)

Seguindo esse entendimento, foram publicadas pelo STJ as seguintes súmulas:

Súmula nº 20 do STJ: A mercadoria importada de país signatário do GATT e isenta do ICM,


quando contemplado com esse favor o similar nacional.

79
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Súmula nº 71 do STJ: O bacalhau importado de país signatário do GATT e isento do ICM.

O STF, por sua vez, reconheceu a repercussão geral do tema, estando o RE 627.280 pendente de
julgamento. O tribunal tem súmula no mesmo sentido do STJ, publicada em 1976, de seguinte teor:

Súmula nº 575 do STF: À mercadoria importada de país signatário do (GATT), ou membro


da (ALALC), estende-se a isenção do imposto de circulação de mercadorias concedida a
similar nacional.

QUESTÕES
109. (CESPE/CEBRASPE - 2003 – PG-DF) Os tratados internacionais se incorporam ao ordenamento
jurídico brasileiro com o status de emenda constitucional.
110. (FCC - 2019 - DPE-SP - Defensor Público) Segundo alguns parlamentares, que querem acabar com as
audiências de custódia, “pessoas que cometem crimes são apresentadas ao juiz e são soltas em menos de
quatro horas. Essas audiências são necessárias, mas foram desvirtuadas. Elas só prejudicam os policiais que
fizeram a prisão e servem para soltar bandidos”. No projeto de Decreto Legislativo (PDC 39/19),
apresentado por parlamentares, a Resolução n.º 213, do Conselho Nacional de Justiça, que trata das
audiências de custódia seria suspensa. Na justificativa, afirmam que a competência para legislar em matéria
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de direito penal e processual é exclusiva do Poder Legislativo. Caso o projeto seja aprovado, é correto
afirmar que:
a) irá de fato suspender as audiências de custódia, pois, embora elas estejam previstas no Pacto de São
José da Costa Rica (art. 7º, nº 5), que ingressou em nosso ordenamento em 1992, os Tratados que cuidam
de Direitos Humanos têm posição hierárquica inferior à legislação ordinária.
b) não irá de fato suspender as audiências de custódia, pois, já que previstas no Pacto de São José da Costa
CPF: 073.496.444-77

Rica (art. 7º, nº 5), que ingressou em nosso ordenamento em 1992, a alteração deveria se dar por ato do
presidente da República.
c) não irá de fato suspender as audiências de custódia, uma vez que elas estão previstas no Pacto de São
José da Costa Rica (art. 7º, nº 5), que ingressou em nosso ordenamento em 1992, sendo que, em razão
souza -- CPF:

disso, a sua previsão está em patamar superior à legislação ordinária.


d) irá de fato suspender as audiências de custódia, já que o Conselho Nacional de Justiça extrapolou as suas
Marceli souza

funções ao regulamentar o tema, o que só poderia ser feito por lei.


Marceli

e) irá de fato suspender as audiências de custódia, pois, embora elas estejam previstas no Pacto de São
José da Costa Rica (art. 7º, nº 5), que ingressou em nosso ordenamento em 1992, esse tratado tem natureza
de norma programática, não obrigando o Estado Brasileiro.
111. (FGV - 2019 - DPE-RJ - Técnico Superior Jurídico) A Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo foram aprovados em cada Casa do Congresso Nacional,
em dois turnos, por três quintos dos votos de seus respectivos membros, no ano de 2008. No âmbito da
hierarquia das leis no Brasil, a Convenção de Direitos Humanos tem o status de:
a) decreto legislativo.
b) lei ordinária.
c) norma supralegal, mas infraconstitucional.
d) norma constitucional.
e) norma supraconstitucional.
112. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - AGU - Advogado da União) Os tratados incorporados ao sistema jurídico
brasileiro, dependendo da matéria a que se refiram e do rito observado no Congresso Nacional para a sua
aprovação, podem ocupar três diferentes níveis hierárquicos: hierarquia equivalente à das leis ordinárias
federais; hierarquia supralegal; ou hierarquia equivalente à das emendas constitucionais.

80
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

113. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Instituto Rio Branco) Os tratados e as convenções internacionais


genericamente considerados terão status constitucional se forem aprovados pelo processo legislativo
previsto para a votação de emendas à CF.
114. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - DPU - Defensor Público Federal) De acordo com a jurisprudência do STF,
os tratados de direitos humanos e os tratados sobre direito ambiental possuem estatura supralegal.
115. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Conforme entendimento
do Supremo Tribunal Federal (STF), a eficácia paralisante das normas supralegais pressupõe que essas não
serão aplicadas enquanto não houver uma norma regulamentadora.
116. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Em regra, os tratados
internacionais aprovados pelo Congresso Nacional possuem o estatuto de lei complementar.
117. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) A Constituição estipula que
equivalem às emendas constitucionais todos os tratados internacionais que forem aprovados em cada Casa
do Congresso Nacional em dois turnos e por três quintos dos votos dos respectivos membros.
118. (CESPE / CEBRASPE - 2016 - Instituto Rio Branco) O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido que,
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para efeitos de atos praticados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil,
a Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas tem status supralegal.
119. (FCC - 2014 - TRT - 18ª Região (GO) - Juiz do Trabalho) Considere os seguintes tratados internacionais:
CPF: 073.496.444-77
souza -- CPF:
Marceli souza

De acordo com a jurisprudência do STF:


Marceli

a) em se tratando de matéria de Direitos Humanos, as normas de I são recepcionadas pela Constituição


Federal no nível das normas supraconstitucionais, por força do art. 5º, § 2º, CF.
b) as normas de II sempre foram consideradas pelo STF como tendo status constitucional, por força do art.
5º, § 2º, CF.
c) reformando sua orientação jurisprudencial anterior, a partir de 2008, o STF passou a considerar II como
tendo status supralegal, porém subordinado à Constituição.
d) III foi aprovado pelo Congresso Nacional, de acordo com o art. 5º, § 3º, e, por isso, tem status supralegal,
não tendo, portanto, o condão de reformar a Constituição naquilo que com ela conflitar.
e) em todos os casos, a contrariedade com a Constituição Federal se resolve com a revogação da norma
convencional, prevalecendo sempre a disposição constitucional.
120. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) Os tratados internacionais,
ainda que devidamente internalizados, não se aplicam aos estados e municípios.
121. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) Lei posterior e contrária a
tratado internacional devidamente internalizado tem como consequência a revogação formal e imediata
do tratado.

81
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

122. (FCC - 2014 - TRT - 1ª REGIÃO (RJ) - Juiz do Trabalho Substituto) A respeito do tema dos tratados
internacionais, é correto afirmar que:
a) o decreto-legislativo corresponde ao instrumento normativo que internaliza definitivamente as
disposições de um tratado no ordenamento jurídico brasileiro.
b) o tratado é um instrumento imemorial de expressão da concórdia entre os atores tradicionais do plano
internacional, razão pela qual apenas Estados podem celebrar tais atos jurídicos.
c) a construção jurisprudencial teve um papel fundamental na experiência jurídica brasileira recente no
tocante à redefinição do status normativo dos dispositivos que internalizavam certo tipo de compromissos
internacionais.
d) dada a relevância dos efeitos produzidos por um tratado internacional, o rol taxativo de agentes que
podem negociar compromissos desta ordem é composto por: chefes de Estado, chefes de governo e
ministros das Relações Exteriores.
e) desde a Emenda Constitucional n.° 45/2004, estabeleceu-se que tratados e convenções internacionais
que versassem sobre temas de direitos humanos pertenceriam ao bloco de constitucionalidade, desde que
fossem aprovados pelo procedimento de dupla votação nas duas casas do Congresso Nacional e com
quórum de maioria absoluta dos votos.
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9. AS NORMAS DE JUS COGENS

9.1. Conceito e previsão convencional

As normas de jus cogens podem ser conceituadas como o conjunto de normas que incorporam os
valores "supremos"(CASSESE, 2013, p. 215), "essenciais" (RAMOS, 2103, p. 47) ou "fundamentais" da
CPF: 073.496.444-77

sociedade internacional, sendo consideradas ainda como "super normas" (BRONWLIE, 1997, p. 536), tendo
em vista sua posição hierárquica frente às demais normas do direito internacional.
A Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados prevê a existência de tais normas em seus arts.
53 e 64, nos seguintes termos:
souza -- CPF:

Artigo 53. Tratado em Conflito com uma Norma Imperativa de Direito Internacional Geral
Marceli souza

(jus cogens)
É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa
Marceli

de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa
de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade
internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é
permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da
mesma natureza.

Artigo 64. Superveniência de uma Nova Norma Imperativa de Direito Internacional Geral
(jus cogens)
Se sobrevier uma nova norma imperativa de Direito Internacional geral, qualquer tratado
existente que estiver em conflito com essa norma torna-se nulo e extingue-se.

Os dispositivos da Convenção sofrem duras críticas por parte da doutrina, sendo adjetivados como
vazios (LINERFALK, 2013, p. 370) ou tautológicos (GIOIA, 2015, p. 11). Em verdade, os artigos não conceituam
propriamente as normas de jus cogens, mas sim delineiam suas principais características (imperatividade e a
inderrogabilidade) e efeitos (nulidade de tratado de direito internacional geral derrogatório superveniente e
extinção de tratado de direito internacional geral pré-existente).

82
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

9.2. Características e efeitos

A imperatividade das normas de jus cogens decorre de uma base objetiva. A própria expressão jus
cogens tem por fim afastar-se de um jus dispositivm. Jorge Miranda (2009, p. 117) explica que as normas de
jus cogens têm força jurídica própria, com os inerentes efeitos na subsistência de normas e atos contrários.
Elas desvirtuam a concepção clássica voluntarista do direito internacional e, por isso, há quem seja contrário
à sua própria existência.
Já por inderrogabilidade entende-se a impossibilidade de os Estados, por meio de acordo, afastarem
o conteúdo de uma norma de jus cogens. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 111) ressalta que, desde o
direito romano, existiam normas que não poderiam ser alteradas pela liberalidade das partes: jus publicum
privatorum pactis mutari non potest (D. 2.14.38).
O autor explica que o termo jus publicum equivale ao atual direito cogente, sendo a gênese das
chamadas normas de ordem pública. Nisso, percebe-se, portanto, que a inderrogabilidade das normas de jus
cogens decorre da imperatividade objetiva da norma e não o contrário, como defende Valerio de Oliveira
Mazuoli.
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Já os principais efeitos de uma norma de jus cogens podem ser resumidos como de óbice de vigência
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de normas de direito internacional geral, que versam em sentido contrário. Nesse sentido, o artigo 64 da
Convenção de Viena sanciona com nulidade os tratados de direito internacional geral, cujo objetivo seja
derrogar uma norma de jus cogens, determinando ainda a extinção de tratados de jus dispositivm, caso uma
norma de direito internacional cogente surja supervenientemente.

9.3. Normas de jus cogens e obrigações erga omnes


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Antonio Cassese (2013, p. 25) ensina que as obrigações erga omnes são normas que protegem os
valores fundamentais da sociedade internacional como um todo. Elas são obrigações de natureza solidária,
em que cada membro da sociedade internacional é destinatário autônomo. A titularidade de uma obrigação
souza -- CPF:

erga omnes é da sociedade internacional, sendo que sua tutela poderá ser exercida em seu nome por
qualquer de seus membros.
Marceli souza

Em virtude das características explicitadas, André de Carvalho Ramos (2019, p. 49) ensina que as
Marceli

normas de jus cogens são obrigações erga omnes, mas nem todas as obrigações erga omnes são de jus
cogens.
O tema foi mencionado em obter dicta pela Corte Internacional de Justiça no caso Barcelona
Traction, em 1970:

33. Quando um Estado admite em seu território investimentos estrangeiros ou


estrangeiros, sejam pessoas naturais ou jurídicas, ele é obrigado a estender-lhes a proteção
da lei e assumir as obrigações concernentes ao tratamento a ser a eles dispensado. Essas
obrigações, todavia, não são absolutas ou ilimitadas. Em particular, uma distinção essencial
que deve ser feita entre as obrigações de um Estado relacionada a comunidade
internacional em seu todo, e aquelas surgidas vis-à-vis a Estados em matéria de proteção
diplomática. Por sua natureza as primeiras são concernentes a todos os Estados. Em virtude
da importância os direitos envolvidos, todos os Estados podem ser considerados como
interessados legais em sua proteção; elas são obrigações erga omnes (tradução nossa).

9.4. Fonte formal ou conteúdo normativo?

Não há consenso entre a doutrina se a norma de jus cogens é uma fonte autônoma de direito
internacional ou se corresponde a parte de alguma(s) fonte(s) preexistente(s).

83
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Antônio Augusto Cançado Trindade (2012, p. 19) ressalta que o jus cogens é identificado como um
princípio geral de direito de ordem material, servindo aos interesses superiores da comunidade internacional
como um todo, e surge como pilar de um novo jus gentium, a qual denomina de direito internacional para a
humanidade.
No mesmo sentido, Ian Brownlie (1997, p. 539) não apenas aponta as normas imperativas como
princípios fundamentais do direito internacional, como refuta a possibilidade de seu desenvolvimento por
meio do direito consuetudinário.
Malcom N. Shaw (2019, p. 99), por sua vez, aduz que as normas de jus cogens são regras de direito
consuetudinário que não podem ser afastadas por tratado ou aquiescência, mas apenas pela formação de
uma regra consuetudinária em sentido contrário. Posição compartilhada por Andrea Gioia (2015, p. 11), para
quem o desvelamento da norma só é possível por meio do costume internacional, tendo em vista que apenas
essa fonte do direito pode produzir normas flexíveis ou cogentes.
Nguyen Quoc Digh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 208), por outro lado, afirmam que a redação
do art. 53 da CVDT não deixa dúvidas de que as normas imperativas podem ser de origem costumeira ou
convencional.
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Por fim, Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 111), em posição ampliada, aponta que as normas de
jus cogens podem ser provenientes do direito convencional, do costume internacional ou de princípios gerais
do direito internacional.
Não obstante as posições citadas, o reconhecimento de uma norma independe da fonte de sua
produção. Texto e norma não se confundem. Afinal, um conjunto de atos unilaterais dos Estados
convergentes em um mesmo sentido pode veicular uma norma a ser reconhecida como imperativa, em
CPF: 073.496.444-77

função da posição hierárquica que lhe foi atribuída.


Portanto, a relação das normas de jus cogens com as fontes do direito internacional é a de que, por
meio do reconhecimento de uma posição hierárquica superior de uma das fontes, decorrente de seu
conteúdo, surge a imperatividade da norma e os efeitos dela decorrente.
souza -- CPF:

ATENÇÃO!
Marceli souza

O Cebraspe já considerou correta assertiva que admitiu que o reconhecimento de norma de jus
cogens possa ser fundamentado em convenções ou tratados internacionais.
Marceli

9.5. Elementos das normas de jus cogens

Considerando o disposto no artigo 53 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969,
os elementos para a configuração de uma norma como de jus cogens são os seguintes.

• Opinio juris: trata-se não apenas do reconhecimento de uma norma como obrigatória, mas ainda
como em um status superior às normas do direito internacional geral. Não há consenso
doutrinário sobre quais as normas seriam de status qualificado. Jorge Miranda (2009, p. 123), por
exemplo, faz uma extensa lista de matérias, digna de citação, por abarcar quase a totalidade da
lista dos doutrinadores que utilizam desse método:

(...) à luz de outros textos, da doutrina e da jurisprudência, propomos o seguinte quadro de


princípios de jus cogens:
Princípios atinentes à comunidade internacional como um todo:
- Princípio da cooperação;
- Princípio da resolução pacífica de conflitos;
- Princípio do acesso aos benefícios do património comum da humanidade;

84
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

- Princípio da liberdade dos mares.


Princípios atinentes a obrigações dos sujeitos de Direito Internacional;
- Princípio do livre consentimento;
- Princípio da reciprocidade de interesses e da equivalência das relações contratuais;
- Princípio da publicidade dos tratados;
- Princípio da pacta sunt servanda;
- Princípio da boa-fé;
- Princípio da responsabilidade por atos ilícitos.
Princípios atinentes às relações entre os Estados:
- Princípio da igualdade jurídica dos Estados;
- Princípio do respeito da integridade territorial;
- Princípio da não-interferência nos assuntos internos dos outros Estados;
- Princípio da legítima defesa contra a agressão;
- Princípio da continuidade do Estado.
Princípios atinentes à pessoa humana:
- Princípio da igual dignidade de todos os homens e mulheres;
- Princípio da proibição da escravatura, do tráfico de seres humanos e de práticas
semelhantes;
- Princípio da proibição do racismo;
- Princípio da proteção das vítimas de guerras e conflitos;
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- Princípio da garantia dos direitos "inderrogáveis" enunciados no art. 4ª do Pacto


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Internacional de Direitos Civis e Políticos (direito à vida, integridade física e moral de


pessoas, reconhecimento da personalidade jurídica, liberdade de pensamento, consciência
de religião, não retroatividade de lei penal, proibição da prisão perpétua), sem embargo das
dificuldades e contradições que ainda subsistem (MIRANDA, 2009, p. 123).

• Prática estatal: trata-se, segundo a dicção de André de Carvalho Ramos (2019, p. 50),
compartilhada pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, do consenso
CPF: 073.496.444-77

qualificado, nascido entre os representantes essenciais da comunidade internacional.

Nguyen Quoc Digh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 207), reconhecendo a ambiguidade do
termo “representantes essenciais”, defendem que o número de Estados a reconhecer uma norma como de
souza -- CPF:

jus cogens deve ser grande e incluir todos os grupos de Estados, de modo que a objeção persistente de um
Estado particular ou de alguns não impeça nem o reconhecimento desse caráter imperativo nem a
Marceli souza

oponibilidade da regra em relação aos objetores (ao contrário do que ocorre com as normas
consuetudinárias).
Marceli

9.6. O reconhecimento das normas de jus cogens pelos Tribunais


Internacionais

No sistema regional interamericano, o termo jus cogens foi utilizado pela Corte-IDH pela primeira vez
em 1993, no caso Aloeboetoe e outros vs. Surinam. A Corte, em obter dicta, manifestou-se no sentido de
que, caso o acordo celebrado entre a Holanda e os Saramaca fosse um tratado internacional, ele seria nulo
em razão da superveniência de normas de jus cogens, tendo em vista que se, por um lado, reconheceu a
autoridade local dos Saramaca em seu próprio território, por outro, obrigou-lhes a capturar escravos que
tivessem desertado e entregá-los ao Governo do Suriname, facultando-lhes ainda vender seus prisioneiros
como escravos.
Sobre a proibição da tortura como uma norma de jus cogens, vários tribunais se manifestaram sobre
o tema. Em janeiro de 1998, no caso Blake vs. Guatemala, a Corte-IDH volta a utilizar o termo jus cogens, e
em voto do juiz brasileiro Antônio Augusto Cançado Trindade, reconhecendo a vedação da tortura como
norma de jus cogens.

85
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

Em dezembro do mesmo ano, o Tribunal Penal Internacional ad hoc para a ex-Iugoslávia, no caso
Furundžija, manifestou-se também em relação ao status de jus cogens da proibição à tortura.
A Corte Europeia de Direitos Humanos, por sua vez, manifestou-se a primeira vez sobre a proibição
da tortura como norma de jus cogens em 2001 no caso Al-Adsani vs. Reino Unido. Por fim, a Corte
Internacional de Justiça só se manifestou em 2012 no caso Questões relativas à obrigação de processar ou
extraditar (Bélgica v. Senegal).

QUESTÕES
123. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Jus cogens são
normas imperativas de direito internacional geral, aceitas e reconhecidas pela comunidade internacional
dos Estados como um todo, que não podem ser derrogadas ou modificadas, salvo por norma ulterior de
direito internacional geral da mesma natureza, e que podem ter fundamento tanto convencional quanto
consuetudinário.
124. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata, adaptada) Ainda que não prevista em
tratado ou no Estatuto da CIJ, a invocação crescente de normas imperativas confere ao jus cogens manifesta
qualidade de fonte da disciplina, a par de atos de organizações internacionais, como resoluções da ONU.
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125. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A noção de jus cogens, como a de
normas imperativas a priori, embora não unanimemente reconhecida em doutrina, é invocada com
referência tanto em jurisprudência quanto em direito internacional positivo.
126. (MPF – 2013 – Procurador da República) As normas de direito internacional peremptório (jus
cogens):
a) podem ser derrogadas por tratado.
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b) só podem ser derrogadas por costume internacional.


c) pressupõem uma ordem pública internacional não disponível para os Estados individualmente.
d) não guardam qualquer relação com o conceito de obrigações erga omnes.
souza -- CPF:

127. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - DPU - Defensor Público Federal) Normas jus cogens não podem ser
revogadas por normas positivas de direito internacional.
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10. O SOFT LAW

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 107) aponta que as chamadas “normas de soft law” são um
produto recente do direito internacional, cujas características principais são a flexibilidade e a não
obrigatoriedade. A rigor, por não criarem obrigações, vedações ou permissões, seria um equívoco chamar a
soft law de normas jurídicas.
O termo tem outras denominações, tais como non-binding agreements, gentlemen’s agreements,
códigos de conduta, memorandos de entendimento, declarações conjuntas, declarações de princípios,
agendas (MAZZUOLI, 2020, p. 117).
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 161)
apontam a importância do soft law no processo de formação do costume internacional. Não seriam atos
jurídicos, mas de conteúdo moral ou político.
A utilização desse tipo de acordo é comum em matéria ambiental e no campo dos direitos humanos,
feitos como um compromisso programático dos signatários de eventual acordo.

86
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA FONTES DO DIREITO INTERNACIONAL • 2

QUESTÕES
128. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A denominada soft law, de utilização
polêmica pela índole programática que comporta, embora desprovida de conteúdo imperativo, é utilizada
de forma flagrante em direito internacional do meio ambiente.
129. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - BACEN – Procurador) Essas normas não têm o mesmo grau de atribuição
de capacidades nem são tão importantes quanto as normas restritivas, mas os Estados comprometem-se a
cooperar e a respeitar os acordos realizados, sem submeter-se, no entanto, a obrigações jurídicas. O
fragmento de texto citado acima refere-se a:
a) costumes.
b) soft norms.
c) princípios gerais de direito.
d) umbrella conventions.
e) tratados.
130. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) A Convenção de Viena
sobre Direito dos Tratados admite que normas peremptórias ou imperativas de direito internacional geral
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se imponham de forma cogente como fontes de direito internacional, superiores a tratados em caso de
conflito.
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Marceli
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3
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA

SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL

88
SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

1. INTRODUÇÃO

1.1. As diversas posições sobre a personalidade jurídica internacional

O tema da personalidade jurídica no Direito Internacional é bastante polêmico e, porque não dizer,
tormentoso, tanto na doutrina quanto na própria jurisprudência internacional. Roland Portmann (2010, p.
13) aponta cinco grandes posições sobre o tema:
1ª. Positivistas: para os partidários da teoria positivista radical a sociedade internacional é uma
sociedade interestatal, e, dessa forma o “corolário de personalidade é sinônimo daqueles que são
Estados” (PORTMANN, 2010, p. 13) Benedetto Conforti (2015, p. 11), por exemplo, é defensor
dessa corrente. Para o autor apenas Estados criam e são destinatários finais das normas do Direito
Internacional. Os indivíduos, por exemplo, ainda que com direitos e deveres, estariam ligados a
um ordenamento particular de uma organização internacional, distinto, por tanto, do
ordenamento da “comunidade” internacional” (CONFORTI, 2015, p. 25)
2ª. Reconhecimento: essa posição confere aos Estados o status de pessoa do Direito Internacional
originária. Contudo, outros entes adquiriram personalidade internacional, denominada de
derivada ou secundária. O reconhecimento estatal poderá ser implícito ou explicito, conferindo
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aos demais entes direitos e deveres em âmbito internacional, bem como capacidade jurídica
análoga aos Estados (PORTMANN, 2010, p. 13).
3ª. Individualista: apenas os indivíduos seriam sujeitos do Direito Internacional, por serem, sempre
os destinatários finais das normas. A consequência dessa posição é permitir a responsabilização
internacional dos indivíduos por seus atos particulares e no desempenho de funções públicas
(PORTMANN, 2010, p. 13). Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 664) citam
CPF: 073.496.444-77

os realistas franceses, em especial Georges Scelle, como partidários dessa corrente, para quem a
sociedade internacional é uma sociedade de indivíduos, sendo o Direito Internacional aplicado a
eles diretamente.
4ª. Formal: por essa posição o Direito Internacional é um sistema aberto, não havendo uma
souza -- CPF:

presunção de quem teria personalidade jurídica. Logo, a personalidade vivia em um momento


posterior: “cada entidade é uma pessoa internacional que de acordo com princípios gerais de
Marceli souza

interpretação é destinatário de normas do Direito Internacional” (PORTMANN, 2010, p. 13).


Marceli

5ª. Atores: tal posição rejeita o conceito de personalidade internacional, estipulando uma presunção
de que todos os atores efetivos das relações internacionais seriam relevantes para o sistema.
Seriam os direitos e deveres de um ator em particular seriam determinantes à sua atuação
internacional.
Roland Portmann (2010, p. 19) destaca que a adoção de um desses conceitos tem ligação direta a
quatro problemas jurídicos:
1. A possibilidade de aplicação direita de tratados internacionais aos indivíduosꓼ
2. A possibilidade de responsabilização internacional de organizações internacionaisꓼ
3. A existência de direitos e deveres a atores não estatais decorrentes de costumes internacionaisꓼ
4. A aplicabilidade legal dos chamados contratos estatais.

Adotar o primeiro conceito é a base de uma teoria dualista. Afinal, tal qual evidenciado pelas teorias
de Triepel e Santi Romano, haveriam ordenamentos distintos com sujeitos distintos. Logo, sendo os Estados
os sujeitos de Direito Internacional, as normas internacionais só seriam aplicáveis a eles e entre eles. Essa
concepção já foi considerada no final do Século XVIII como o triunfo do positivismo (SILVA, 2019, p. 196), mas
é ultrapassada desde a Opinião Consultiva sobre a Reparação por Danos sofridos à serviço das Nações Unidas,

89
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

de 11 de abril de 1949, em que a Corte Internacional de Justiça reconheceu a personalidade internacional


das organizações internacionais.
A segunda concepção seria uma espécie de positivismo moderno (SILVA, 2020, p. 534) e tem íntima
ligação com a teoria voluntarista do Direito Internacional. Por ela só são pessoas jurídicas de Direito
Internacional os atores reconhecidos pelo Estado como tal. Francisco Rezek (2018, p. 191) adota essa
concepção, negando a personalidade jurídica dos indivíduos e afirmando que as organizações internacionais
detêm personalidade jurídica resultante da vontade conjugada de um grupo de Estados. Essa concepção
acaba por ser menos problemática que a primeira, pois afinal consegue identificar a distinção de atuações
dos Estados em relação às organizações internacionais, porém, também é ultrapassada, afinal não abarca
toda a realidade das relações jurídicas internacionais. Não consegue explicar a possibilidade de
responsabilização individual no plano internacional, como no Tribunal Penal Internacional ou mesmo a
capacidade dos indivíduos de acesso a órgãos internacionais independentemente da interveniência de um
Estado.
A terceira concepção, tem duas grandes correntes. A primeira tem origem em concepções de direito
natural, como em Francisco de Vitória, e a segunda de natureza sociológica, também chamada de realista,
de Georges Scelle e León Duguit, que também não se mostram adequadas. Em uma analogia ao estudo da
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personalidade jurídica no plano interno, elas se assemelham à teoria da ficção de Savigny, que tem como
consequência impedir a responsabilização da pessoa jurídica por atos contrários ao Direito, sendo esta
aplicável apenas aos indivíduos (AMARAL JÚNIOR, 2015, p. 170).
A quarta posição, formalista, é a majoritária na doutrina. Primeiro porque parte de pressupostos
jurídicos para o reconhecimento da personalidade jurídica internacional. Segundo porque reconhece a
existência de um sistema aberto de pessoas, ou melhor dizendo, uma perspectiva dinâmica da subjetividade
internacional (MIRANDA, 2009), mantendo um discrímen entre sujeitos que atuam apenas em âmbito interno
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daqueles que serão considerados sujeitos do Direito Internacional.


Por fim, a última posição, que nega a existência diferenciada de personalidade jurídica de Direito
Internacional, é mais atinente às ciências das relações internacionais do que do Direito, propriamente dito.
souza -- CPF:

1.2. A funcionalidade como critério definidor da personalidade jurídica


internacional (functionalist approach)
Marceli souza
Marceli

Se a posição formalista é a amplamente majoritária entre os internacionalistas para a definição da


personalidade jurídica internacional, é de se destacar a inexistência de um único critério para se chegar a tal
delimitação.
Malcolm N. Shaw (2017, p. 156) aponta que são levados em consideração para a definição da
personalidade jurídica internacional as relações entre direitos e deveres advindos do sistema internacional,
bem como a capacidade de exercício desses direitos em âmbito internacional. Ian Brownlie (1997, p. 72), por
sua vez, critica esse tipo de conceituação, por entendê-la cíclica. Para o autor essa definição traz elementos
que dependem da existência da pessoa jurídica, assim sendo, ele insere como requisitos da personalidade
jurídica internacional a capacidade de celebrar tratados válidos no plano internacional e ainda a detenção de
privilégios e imunidades nas jurisdições nacionais. Roberto Luiz Silva (2020, p. 196), aponta como
característica para a definição da personalidade jurídica, a posição de destinatários das normas do Direito
Internacional.
A opinião consultiva da Corte Internacional de Justiça, de 1949, Reparação de danos sofridos à
serviço das Nações Unidas pode ser considerado o ponto de partida para se encontrar os critérios formais
de uma definição de personalidade jurídica internacional segura.
A opinião consultiva é consequência do assassinato do Conde Folke Bernadotte, mediador da ONU
na Palestina e outros membros da Missão da ONU na Palestina. A Assembleia Geral da ONU fez a consulta

90
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

ao tribunal para saber se poderia buscar a responsabilização internacional do Estado para a reparação dos
danos causados à organização e às vítimas.
A CIJ entendeu que “os sujeitos do Direito, em qualquer sistema legal não são necessariamente
idênticos e sua natureza ou na extensão de seus direitos” (CIJ, 1949, p. 7). Além disso, destacou que os
direitos dependem das necessidades da comunidade.
No caso das Nações Unidas, seu documento constitutivo (Carta da ONU) não faz previsão expressa
sobre sua personalidade jurídica, motivo pelo qual a CIJ passou a analisar se a ONU desempenharia funções
distintas os seus membros, que lhe geraram direitos e obrigações no plano internacional. Em sua conclusão
o tribunal entendeu o seguinte:

Na opinião da Corte, a Organização [das Nações Unidas] deveria exercer e gozar, e de fato
exerce e goza, funções e direitos que só podem ser explicadas com bases na aquisição de
uma personalidade internacional e a capacidade de operar no plano internacional. É
atualmente uma forma suprema de organização internacional, e não poderia realizar as
intenções de seus fundadores, caso fosse desprovida de personalidade internacional. Há de
ser reconhecido que seus Membros, ao confiar-lhes certas funções, com deveres e
responsabilidades, acobertaram lhe com coma competência necessária para a consecução
dessas funções seu exercício eficaz. (CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA, 1949, p. 8)
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(tradução nossa).
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A partir do julgado William Thomas Worster (2016, p. 208) aponta que o critério utilizado para a
definição de sujeitos do Direito Internacional não-estatais é sua funcionalidade. Em outros temos, um ator
não-estatal só terá personalidade jurídica de Direito Internacional quando funciona, isto é, atua no plano
jurídico internacional (2016, p. 208).
Fixado o critério da funcionalidade como base, pode-se chegar às seguintes conclusões:
CPF: 073.496.444-77

• A personalidade internacional pode não coincidir com a personalidade jurídica internaꓼ


• A aquisição da personalidade internacional está diretamente ligada à vinculação do ente com as
normas do Direito Internacionalꓼ
• A personalidade jurídica não se confunde com a capacidade jurídica internacional, que poderá
souza -- CPF:

variar de acordo com a pessoa em análise.


Marceli souza

Mesmo com a definição desse critério, implícita ou explicitamente por boa parte da doutrina, ainda
Marceli

assim não há consenso sobre quais seriam os sujeitos do Direito Internacional. A maioria da doutrina entende
que o Estado, as Organizações Internacionais e os indivíduos são detentores de personalidade internacional.
Há situações especiais como os beligerantes, a Santa Sé, a Ordem de Malta, Moimentos de Libertação
Nacional que são objeto de estudo por boa parte dos doutrinadores. Por fim, há ainda posições mais
controversas, como as das pessoas jurídicas (privadas) e Organizações não Governamentais (ONGs), que são
por muitos rechaçados, sem que, muitas vezes, os pressupostos iniciais (da funcionalidade) sejam revisitados
ou reexaminados, gerando uma incoerência analítica em relação a eles.

ATENÇÃO!
Para fins de concurso público, em especial provas objetivas, é bastante provável a adoção do
entendimento de que apenas Estados, Organizações Internacionais e Indivíduos sejam sujeitos do Direito
Internacional. Excepcionalmente pode ser cobrada uma posição mais ampla, como já o fez a Fundação
Getúlio Vargas (em 2008). Nesse caso, a interpretação da questão levará o candidato a perceber a adoção
dessa posição ampliada.

91
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
131. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo - Consultor Legislativo Área
XVIII) O antológico Caso Bernadotte, julgado pela Corte Internacional de Justiça, contribuiu para a
construção da jurisprudência definitiva sobre o direito de autodeterminação dos povos.
132. (ESAF - 2003 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional, adaptada) As organizações internacionais
exprimem vontade própria - distinta da de seus Estados- membros - ao agir nos domínios em que
desenvolve sua ação. Tal se dá tanto nas relações com seus membros, quanto no relacionamento com
outros sujeitos do direito internacional.
133. (FGV - 2008 - Senado Federal – Advogado) Os sujeitos de Direito Internacional são:
a) Estados, Organizações Governamentais Internacionais, Organizações Não-Governamentais, blocos
regionais.
b) Estados, Organizações Governamentais Internacionais, Organizações Não-Governamentais, pessoas
jurídicas e indivíduos.
c) Estados, Organizações Governamentais Internacionais, Organizações Não-Governamentais, pessoas
jurídicas, indivíduos e blocos regionais.
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d) Estados, Organizações Governamentais Internacionais, Organizações Não-Governamentais, pessoas


jurídicas e blocos regionais.
e) Estados, Organizações Governamentais Internacionais, pessoas jurídicas, indivíduos e blocos regionais.

1.3. Classificações dos sujeitos do Direito Internacional

A doutrina fornece algumas classificações dos sujeitos do Direito Internacional considerando sua
CPF: 073.496.444-77

origem, capacidade jurídica, base territorial, natureza jurídica, finalidades, reconhecimento e posição nas
relações jurídicas internacionais:

• Quanto à natureza:
souza -- CPF:

▪ Estadosꓼ
▪ Sujeitos não estatais: que para a maioria da doutrina serão as organizações internacionais e
Marceli souza

os indivíduos, além dos casos dos beligerantes, movimentos de libertação nacional etc.
Marceli

• Quanto à origem:
▪ Sujeitos originários: que, segundo a maioria dos doutrinadores se restringe aos Estados;
▪ Sujeitos derivados: são os demais sujeitos reconhecidos pelos Estados como pessoas
jurídicas do Direito Internacional.
• Quanto à capacidade jurídica:
▪ Sujeitos de capacidade jurídica plena: trata-se dos Estados que poderão atuar de forma
irrestrita em âmbito internacional;
▪ Sujeitos de capacidade jurídica restrita: são os demais sujeitos que terão limitações na
atuação internacional, seja em razão de sua finalidade (organizações internacionais), seja em
função do acesso aos foros internacionais na tutela direta de seus direitos (indivíduos).
• Quanto à base territorial:
▪ Com base territorial: Estados, beligerantes, estados semissoberanos e Associações de
Estados (como as confederações e a União Europeia);
▪ Sem base territorial: seriam os casos especiais (PEREIRA e QUADROS, 2011, p. 303)
o De interesses espirituais: a Santa Sé e a Ordem de Malta etc.;
o De interesses políticos: Povos, Nações, Movimentos nacionais, Governo em exílio.
• Quanto à posição na relação jurídica internacional:

92
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

▪ Sujeitos ativos: detentores de direitos no plano internacionalꓼ


▪ Sujeitos passivos: detentores de obrigações internacionais.
• Quanto ao reconhecimento:
▪ De reconhecimento geral: são reconhecidos pela generalidade dos Estados (MIRANDA, 2009,
p. 190);
▪ De reconhecimento restrito: sendo reconhecido apenas por alguns Estados, como a Ordem
de Malta e beligerantes.
• Quanto à estabilidade:
▪ Sujeitos permanentes: vocacionados à estabilidade, isto é, com duração temporal sem
limites (MIRANDA, 2009, p. 190);
▪ Sujeitos não permanentes: são os que tendem a desaparecer, como os beligerantes, os
movimentos de libertação nacional, que têm uma existência, em tese, transitória.

2. ESTADOS

O Estado é o principal sujeito de Direito Internacional (PEREIRA e QUADROS, 2011, P. 327) ou, como
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apontam Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 243) o
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sujeito do Direito Internacional por excelência.


Valerio de Oliveira Mazzuoli conceitua juridicamente o Estado nos seguintes termos:

ente jurídico, dotado de personalidade internacional, formado de uma reunião


(comunidade) de indivíduos estabelecidos de maneira permanente em um território
determinado, sob a autoridade de um governo independente e com a finalidade precípua
de zelar pelo bem comum daqueles que o habitam (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 377).
CPF: 073.496.444-77

2.1. Elementos constitutivos do Estado

Segundo a Teoria Geral do Estado, desenvolvida por Georg Jellinek (2000) são: território, povo e
soberania.
souza -- CPF:

O território, elemento objetivo do Estado, é a delimitação geográfica em que o Estado exerce sua
Marceli souza

soberania de forma exclusiva.


Segundo Georg Jellinek, o território tem um sentido positivo e outro negativo. O sentido negativo
Marceli

refere-se à proibição de qualquer outro poder atuar no território sem autorização expressa por parte do
Estado. Em seu sentido positivo, refere-se à submissão das pessoas que habitam no território ao poder do
Estado (JELLINEK, 2000, p. 368).
Celso D. de Mello Albuquerque (2002, p. 1.071) explica que o território tem duas características:

• Delimitação: trata-se dos contornos geográficos do exercício do poder estatalꓼ


• Estabilidade: a população é sedentária nos limites, não se alterando com frequência (MELLO,
2002, p. 1.071).

A população, elemento subjetivo do Estado, trata-se da coletividade humana que habita o território
de um Estado em um determinado período histórico.

ATENÇÃO!
Não há de se confundir povo, Estado e nação.
Nação, de um ponto de vista subjetivo, é o conjunto de indivíduos reunidos em razão da vontade
de viver juntos. Já do ponto de vista objetivo, é uma comunidade de pessoas reunidas em razão de um
vínculo cultural comum — língua, etnia, religião etc. (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 420).

93
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Povo, em Direito Internacional, tende a ser tratado como termo sinônimo de nação, principalmente
quando ligado à expressão “autodeterminação dos povos” (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 421).
Já em Direito Constitucional é comum inserir o povo como elemento constitutivo do Estado,
conceituando-o como conjunto de pessoas ligadas ao Estado por meio da nacionalidade.
Em provas de concurso, há de se ter bastante cuidado com o contexto da questão, principalmente
objetiva.

A soberania ou, para alguns autores, Governo é o elemento político do Estado que, por sua vez,
divide-se em duas dimensões, uma interna e a outra externa/internacional. Segundo sua noção clássica, do
ponto de vista interno, a soberania refere-se ao monopólio do exercício legítimo da força e da produção do
Direito. Já em âmbito internacional, a soberania diz respeito à ausência de hierarquia entre os Estados na
sociedade internacional, isto é, os Estados são juridicamente independentes.
Jorge Miranda (2009, p. 193) explica que decorrem da soberania externa/internacional três poderes
ou direitos do Estado:

• Jus tractum: poder de celebrar tratadosꓼ


• Jus legationis: poder de enviar e receber representantes diplomáticosꓼ e
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• Jus belli: poder de fazer guerra. Considerando a proibição da guerra pelo artigo 2º da Carta da
ONU, esse poder restringe-se ao direito de legítima defesa, individual ou coletiva.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 385), afastando-se da teoria clássica do Estado, elenca
ainda a finalidade como elemento social do Estado. Para o autor, a finalidade, do ponto de vista objetivo,
refere-se ao papel do Estado de desenvolvimento de sua própria história e da humanidade. Já do ponto de
vista subjetivo, diz respeito ao fato de o Estado ser um meio para que os indivíduos alcancem interesses
CPF: 073.496.444-77

próprios.
Elementos do Estado
souza -- CPF:

Território
Marceli souza

População/povo*
Marceli

Interna

Estado Soberania

Internacional

Objetiva

Finalidade*

Subjetiva

* Sem consenso doutrinário


A Convenção Pan-americana sobre Direitos e Deveres dos Estados, de 1933, traz um rol de elementos
constitutivos do Estado parcialmente distinto do explicado. Ao invés de soberania, o tratado traz como
requisito o Governo; omite, como a maioria da doutrina o faz, a finalidade como elemento constitutivo; e,
por fim, aponta a capacidade de entrar em relações com outros Estados como um dos requisitos:

94
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 1. O Estado como pessoa de Direito Internacional deve reunir os seguintes requisitos.
I. População permanente.
II. Território determinado.
III. Governo.
IV. Capacidade de entrar em relações com os demais Estados.

ESTADOS FALIDOS E ESTADOS COLAPSADOS


Antonio Cassese (2013, p. 61) denomina de Estado falido (failed State) aquele que tenha perdido o
controle de seu território e o monopólio do uso da força, ou os que deixam de desenvolver o governo de
fato em razão da pobreza extrema ou de bandos armados de caráter criminal, dando como exemplo as
FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Já na situação de ausência total do aparato de governo em um território, para o autor, estar-se-á
diante da hipótese de um Estado colapsado (collapsed State), que seria o caso de Serra Leoa.
O autor destaca que, nesses casos extremos, a sociedade internacional busca “salvar” os Estados
por meio de operações de paz (peacebuilding), tendo em vista que eles representam um risco ao equilíbrio
mundial por serem locais de guarita a grupos criminosos e terroristas. São exemplos de operações de paz
— que, inclusive, o Brasil fez parte — as realizadas no Timor-leste e em Honduras.
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QUESTÕES
134. (CESPE - 2007 - MPE-AM - Promotor de Justiça) Sobre o Estado, relembraremos apenas o que dizem
os manuais:
“Estado é uma nação politicamente organizada, conceito sintético que demandaria desdobramentos
esclarecedores, pelo menos quanto aos chamados elementos constitutivos do Estado e, principalmente,
sobre o modo como, em seu interior, se exerce a violência física legítima, cujo monopólio Max Weber
considera necessário à própria existência do Estado Moderno”. (MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO.
CPF: 073.496.444-77

Inocêncio Mártires e BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva,
2007).
a) A idéia de Estado de Direito, desde os primórdios da construção desse conceito, está associada à de
contenção dos cidadãos pelo Estado.
souza -- CPF:

b) A soberania do Estado, no plano interno, traduz-se no monopólio da edição do direito positivo pelo Estado
Marceli souza

e no monopólio da coação física legítima, para impor a efetividade das suas regulações e dos seus comandos.
c) Os tradicionais elementos apontados como constitutivos do Estado são: o povo, a uniformidade lingüística
Marceli

e o governo.
d) Os fenômenos globalização, internacionalização e integração interestatal puseram em franca ascendência
o modelo de Estado como unidade política soberana.
e) O vocábulo nação é bastante adequado para expressar tanto o sentido de povo, quanto o de Estado.
135. (CONSULPAM - 2015 - Prefeitura de Nova Olinda - CE – Procurador) Para o reconhecimento do
Estado perfeito se faz necessário a presença de três elementos constitutivos. NÃO é um deles:
a) Povo.
b) Território.
c) Liderança.
d) Soberania.
136. (VUNESP - 2017 - DPE-RO - Defensor Público Substituto) Atualmente entende-se que:
a) os elementos constitutivos do Estado são o governo, o território, a população e a finalidade.
b) não existe Estado sem território.
c) nação é uma ordem jurídica soberana, que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado
território.

95
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

d) os conceitos de Estado e nação são coincidentes, já que ambos representam uma comunidade com vínculo
jurídico entre seus componentes.
e) Estado é uma comunidade exclusivamente de base histórico-cultural.
137. (CESPE - 2012 - DPE-RO - Defensor Público, adaptada) O conceito de povo, um dos elementos
constitutivos do Estado, está relacionado ao conjunto de brasileiros e estrangeiros que se encontrem em
território nacional, ainda que transitoriamente.
138. (TRT 15R - 2007 - TRT - 15ª Região - Juiz do Trabalho, adaptada) No bojo das Constituições devem
estar inseridos os elementos constitutivos do Estado, a saber: soberania, finalidade, povo e território.

2.2. Classificação dos Estados

A doutrina classifica os Estados nos seguintes termos:

• Quanto à concentração de poder:


▪ Estado unitário/simples: o poder é concentrado em um único ente, que poderá delegar (e
avocar) parte dele a entes parcelares. Daí é possível ter:
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o Estado unitário puro: em que não há delegação de poderꓼ


o Estado unitário com descentralização administrativa: em que a execução das decisões
políticas do ente central são delegadasꓼ e
o Estado unitário com descentralização político-administrativa: permite-se à população
eleger representantes com delegação de decisões políticas setorizadas, além da execução
das decisões centrais e locais.
▪ Estado composto: em que o poder é necessariamente descentralizado:
CPF: 073.496.444-77

o Estado composto por coordenação:


• Federação ou Estado Federal: trata-se da reunião de entes autônomos, em que a
divisão do poder se dá em pelo menos duas esferas, uma de nível central
souza -- CPF:

denominada União e, pelo menos uma de nível regional, denominada Estado-


membro. Em alguns casos, como no Brasil, há ainda os entes de nível local
Marceli souza

(Municípios). As características principais das federações são a autonomia dos entes


federados, a descentralização do poder, o princípio da participação (os entes
Marceli

federados participam do exercício da soberania por meio de uma casa no legislativo


federal) e a indissolvibilidade da federação (impossibilidade de saída de um dos entes
federados);
• Confederação: uma confederação é a reunião de Estados soberanos para o
desempenho de um fim externo comum. Ao contrário de uma federação, a
confederação permite a secessão de seus membros. De regra, a confederação tem
personalidade jurídica própria. Seu órgão central é denominado “dieta”, sendo suas
deliberações tomadas por unanimidade ou maioria qualificada (GUERRA, 2019, p.
151).
• União de Estados: trata-se de uma forma de associação de Estados monárquicos em
que um só monarca reina em dois ou mais Estados, que, por sua vez, mantêm sua
personalidade jurídica própria (SILVA, 2020, p. 210). Trata-se de uma União Pessoal
ou União real (GUERRA, 2020, p. 151), pois decorre de um fato acidental no qual o
soberano de um Estado acaba por se tornar o de outro. Um exemplo a União Ibérica,
quando Felipe II, reio da Espanha que, em 1581 se tornou também rei de Portugal,
até sua morte em 1598.

96
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

o Estados compostos por subordinação: são caracterizados por um vínculo hierárquico de


poder:
• Estados vassalos: são Estados em situação intermediária entre a subordinação
completa e a independência (GUERRA, 2020, p. 151). Eles tinham certa autonomia,
mas deviam pagar tributos e prestar auxílio ao Império. O Império Otomano utilizava
essa forma de divisão de poder. Os Estados vassalos mantinham personalidade
jurídica própria do Estado suserano.
• Protetorados: são formados através de tratados internacionais em que um Estado se
submete à proteção de outro, que recebe, em contrapartida, a faculdade de direção
e gestão das relações internacionais (e, em alguns casos, a própria política interna)
do Estado protegido (SILVA, 2020, p. 211).
• Estados clientes: Trata-se de um fenômeno surgido na América Central em que os
Estados entregaram a administração da alfândega, exército ou outro negócio ou
interesse aos Estados Unidos da América, mantendo sua personalidade jurídica e
soberania interna plena. Já que a soberania externa era parcialmente tutelada pelos
Estados Unidos da América. São exemplos: Panamá (1904) e Haiti (1915).
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• Estados satélites: com situação semelhante aos Estados clientes, só que em relação
à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) (SILVA, 2020, p. 212).
• Estados exíguos: são Estados que, em razão de sua dimensão geográfica diminuta,
não podem exercer todos os aspectos de sua soberania, subordinando-se a um
Estado, de regra, limítrofe (SILVA, 2020, p. 212). São exemplos: Mônaco, San Marino,
Liechtenstein.
• Estados associados: são aqueles que, apesar de atingir sua independência, não tem
CPF: 073.496.444-77

condições de mantê-la e, por isso, estão subordinados a outros (SILVA, 2020, p. 212).
São exemplos: Porto Rico e Estados Unidos, Ilhas Cook e Austrália.
• Estados divididos ou ocupados: trata-se de Estados que, em situação de guerra ou
outro vício, encontram-se sujeitos a outras formas de limitação política (MIRANDA,
souza -- CPF:

2009, p. 195).
Marceli souza

• Quanto à capacidade jurídica:


▪ Estado soberanos: são os Estados que não detêm qualquer restrição no exercício de seus
Marceli

poderes no âmbito interno ou internacionalꓼ


▪ Estados com soberania limitada: são os Estados vassalos, clientes, protegidos etc. com
soberania parcialmente ou totalmente tutelada por outro.
▪ Estados não soberanos: são os entes parcelares das federações e uniões reais (MIRANDA,
2009, p. 197).

97
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

A COMMONWEALTH
A Comunidade Britânica não é uma forma de Estado, mas a reunião de ex-colônias, ou protetorados
britânicos (a exceção de Moçambique e Ruanda, que foram colônias portuguesa e belga, respectivamente).
Seus membros são Estados soberanos, com representação na Grã-Bretanha, por meio de um alto-
comissionário escolhido internamente, assim como os governadores gerais de cada um dos Estados.
A união não detém personalidade jurídica própria e seus assuntos comuns são tratados por meio de
conferências periódicas.

2.3. Nascimento do Estado

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 385) explica que o nascimento, surgimento ou formação
dos Estados fogem, em princípio, do universo das regras jurídicas, sendo ligado às questões históricas e
sociológicas. Na história, várias foram as ondas de surgimento de novos Estados, como na descolonização da
América (nos séculos XVIII e XIX), da Ásia e da África (preponderantemente após a Segunda Guerra Mundial)
e com o fim da União Soviética.
Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 261)
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explicam que o Estado nasce com a reunião de seus elementos constitutivos, independentemente do
reconhecimento por outros Estados. Nesse sentido, a Carta da OEA dispõe:

Artigo 13. A existência política do Estado é independente do seu reconhecimento pelos


outros Estados. Mesmo antes de ser reconhecido, o Estado tem o direito de defender a sua
integridade e independência, de promover a sua conservação e prosperidade, e, por
conseguinte, de se organizar como melhor entender, de legislar sobre os seus interesses,
de administrar os seus serviços e de determinar a jurisdição e a competência dos seus
tribunais. O exercício desses direitos não tem outros limites senão o do exercício dos
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direitos de outros Estados, conforme o direito internacional.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 386) explica que, em uma primeira classificação da
formação dos Estados, estariam os processos primários e secundários:
souza -- CPF:

• Processo primário: ocorre mediante o estabelecimento e a conquista de territórioꓼ


Marceli souza

• Processo secundário: surge da emancipação, secessão e fusão entre Estados.


Marceli

O autor ressalta que, do ponto de vista histórico, os Estados formaram-se das seguintes formas:

• Formação direta: ocorre mediante a ocupação de um território sem dono (terra nullius ou res
nullius) que institui um governo permanente (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 386) ꓼ
• Emancipação: trata-se da aquisição de personalidade jurídica de um território (como as colônias)
sob o julgo de um Estado estrangeiro.
• Separação ou desmembramento: ocorre com a divisão de um Estado, sendo mantida a
personalidade jurídica do Estado originário. É, atualmente, a forma mais comum de surgimento
de novos Estados.
• Fusão: ocorre com a reunião de Estados e o desaparecimento dos entes originários, como nos
casos de unificação da Itália e da Alemanha.
• Cisão: ocorre com a separação de um Estado e o surgimento de novos entes. O exemplo histórico
é a cisão da Tchecoslováquia e o surgimento da República Tcheca e a Eslováquia. Boa parte da
doutrina entende que, nessa situação, houve um desmembramento e não a cisão.

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.4. Reconhecimento de Estado e reconhecimento de governo

Segundo Malcom N. Shaw (2017, p. 154) reconhecimento é um “método pelo qual situações fáticas
são aceitas e revestidas de significado jurídico”.
Sidney Guerra (2019, p. 155) explica que, para a teoria constitutiva, um Estado só passa a ter
personalidade jurídica internacional após o seu reconhecimento por outros Estados. Já na teoria
declaratória, o surgimento de um Estado ocorre com a reunião de seus elementos constitutivos, sendo o
reconhecimento pelos outros mera aceitação, pelos Estados existentes, para a realização de atos
internacionais. Roberto Luiz Silva (2020, p. 226) cita ainda a chamada teoria mista de Hersch Lauterpacht,
para quem o reconhecimento consta como um fato, mas que, uma vez feito estabelece uma relação de
direitos e deveres entre os entes.
Não obstante alguns autores nacionais adotarem a teoria constitutiva, Antonio Cassese (2013, p. 62),
adepto da teoria declaratória — que é majoritária —, traz os principais argumentos que justificam tal posição:

• A posição constitutiva contradiz o princípio da efetividade, no qual as situações de fato são


consideradas legítimas do ponto de vista do Direito Internacional (CASSESE, 2013, p. 62) ꓼ
• Tal posição também é contrária ao princípio da igualdade da soberania entre os Estados,
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considerando que os Estados pré-existentes exerceriam um “poder de admissão” de novos


membros na sociedade internacional. Trata-se de posição própria dos países europeus do Século
XIX, que entendiam ter o direito de decidir quais Estados fariam parte da “família das nações”
(CASSESE, 2013, p. 63) ꓼ
• Por fim, de um ponto de vista lógico-jurídico, a teoria do reconhecimento constitutivo pode gerar
distorções inconciliáveis, como a hipótese de um Estado ser considerado uma pessoa jurídica do
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Direito Internacional para um punhado de Estados enquanto para outros, não.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 389) destaca que o reconhecimento é um direito do
Estado, quando revestido de seus elementos constitutivos e, ao mesmo tempo, um dever dos demais
souza -- CPF:

membros da sociedade internacional, de íntima ligação com o princípio da coexistência pacífica e harmônica
da sociedade internacional.
Marceli souza

Segundo a doutrina de Stimson, o reconhecimento de um Estado pode ser recusado quando seu
Marceli

surgimento seja proveniente de violação de normas internacionais, decorrente do uso da força (contrariando
o Pacto de Briand-Kellog) (PEREIRA e QUADROS, 2013, p. 310).
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 310) apontam, ainda, que a recusa do
reconhecimento pode ocorrer na hipótese do Estado ter nascido na dependência de outro, gerando dúvidas
quanto a sua própria independência. Há exemplos históricos relacionados à União Soviética e à África do Sul
nesse sentido.
Outra hipótese aventada pelos autores ocorre quando o nascimento do Estado não se dá pela
autodeterminação do povo, mas, sim, de forma contrária à vontade popular. O exemplo dado foi o da
Rodésia, que não foi reconhecida pelo Reino Unido após a declaração unilateral de independência feita pela
minoria branca, liderada por Ian Smith, em 1971.

ATENÇÃO!
A instituição de um regime democrático não é um elemento constitutivo de nascimento de um
Estado.

Além da recusa, recentemente países europeus buscaram condicionar o reconhecimento de alguns


Estados após a fragmentação da União Soviética e, mais recentemente, da Iugoslávia. As condicionantes

99
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

relacionavam-se à proteção dos direitos humanos, à Carta da ONU, à não agressão, ao respeito das minorias,
entre outras coisas.
Antonio Cassese (2013, p. 64) chama atenção, ainda, para o reconhecimento prematuro que ocorre
antes que as condições necessárias para a aquisição da personalidade jurídica tenham sido reunidas. Nesse
caso, seria uma situação de afronta ou ingerência nos assuntos internos do Estado interessado. O autor traz
como exemplo o reconhecimento da Croácia que, à época do ato não detinha o controle de seu território,
pela Suíça e pela Áustria.
Sendo o reconhecimento irrevogável (GUERRA, 2019, p. 159), um de seus efeitos, destacado por
Antonio Cassese (2013, p. 63), é o da preclusão. Logo, uma vez que um Estado reconhece outro, ele não
poderá mais contestar a situação de fato reconhecida ou negar a personalidade jurídica internacional desse
ente. O autor aponta ainda que não é possível que um Estado conclua tratados com outro que não tenha
reconhecido. Porém, isso não quer dizer que, mesmo negando o reconhecimento, o Estado não esteja
obrigado a respeitar as normas consuetudinárias relacionadas ao direito marítimo, da soberania do território
ou da independência política.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 394) classifica o reconhecimento da seguinte forma:

• Quanto à autoria:
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▪ Reconhecimento individual: feito de forma unilateral por um Estado;


▪ Reconhecimento coletivo: feito em um único instrumento diplomático por um conjunto de
Estados;
▪ Não reconhecimento coletivo: ocorre atualmente no âmbito das Nações Unidas, em que,
por Resolução do Conselho de Segurança, declara-se uma situação violadora do Direito
Internacional, como na invasão do Kuwait pelo Iraque;
CPF: 073.496.444-77

• Quanto à “revogabilidade”:
▪ Reconhecimento de direito: quando feito por declaração expressa, sendo definitivo e
irrevogável;
▪ Reconhecimento de fato: feito por meio de atos que indiquem o reconhecimento, mas sem
souza -- CPF:

a sua declaração expressa. Segundo Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 395), essa
modalidade seria provisória e revogável, dando como exemplo o caso do Reino Unido,
Marceli souza

inicialmente, não reconhecer de forma pública o Império Brasileiro, mas aceitar seus
Marceli

representantes em Londres, enviando ainda diplomatas ao Rio de Janeiro;


• Quanto à forma:
▪ Reconhecimento expresso: feito por um documento escrito, unilateral ou não, como
tratado, declaração, nota diplomática etc.;
▪ Reconhecimento tácito: ocorre quando o Estado pratica atos incompatíveis com uma
declaração de não reconhecimento, como manutenção e relações diplomáticas, celebração
de tratado internacional com o novo Estado etc.;
• Quanto à condicionalidade:
▪ Reconhecimento condicionado: quando os Estados emissores da declaração de
reconhecimento elencam condições a serem respeitadas pelo novo Estado, de regra, a
normas gerais do Direito Internacional;
▪ Reconhecimento incondicionado: quando feita de forma simples, sem a imposição de
condições.

Ao lado do reconhecimento do Estado há, ainda, o reconhecimento de governo, que ocorre quando
um Estado afirma que a autoridade política de outro alçou ao poder de forma ilegítima ou ilegal. Valerio de

100
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 399) ressalta que, nessa situação, o papel do Direito Internacional deixa
de ser o de espectador para ser regente da nova situação política ocorrida no Estado.
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 313) explicam que há duas posições sobre o
reconhecimento de governo:

• Doutrina de efetividade: um governo deve ser reconhecido desde que exerça efetivamente a
soberania no território e tenha condições de cumprir com as obrigações internacionais do Estado.
Essa posição é também denominada de doutrina Estrada, em homenagem ao Ministro das
Relações Exteriores do México, em 1930;
• Doutrina da legitimidade: em seu surgimento (1815) buscava-se, por meio do princípio da
legitimidade, decorrente da Santa Aliança, reconhecer que o poder pertencia de direito aos
membros das casas reinantes, não se reconhecendo governos de origem distinta. Já no Século XX,
houve uma transformação, passando-se à ideia de legitimidade democrática. Dessa forma, um
governo só seria reconhecido quando resultante da expressão democrática de um povo. Essa nova
roupagem é também chamada de doutrina Tobar, nome do Ministro dos Negócios estrangeiros
do Equador, que defendia o não reconhecimento de governos resultantes de insurreições
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antidemocráticas. Essa posição é também conhecida como doutrina Wilson, em razão da recusa
do presidente americano em reconhecer um governo mexicano não resultante da expressão
popular.

Em relação aos efeitos do reconhecimento de governo, os autores apontam que, em âmbito


internacional, permite-se descobrir o verdadeiro titular da função de representação do Estado nas relações
interestatais, bem como na própria responsabilização do Estado. Já em âmbito interno dos Estados, o
CPF: 073.496.444-77

reconhecimento permite a acreditação dos representantes (do Estado reconhecido) como agentes
diplomáticos.

2.5. Direitos e deveres dos Estados


souza -- CPF:

Jorge Miranda (2009, p. 217) aponta que o Direito Internacional busca definir direitos e deveres
Marceli souza

“fundamentais” dos Estados em um sentido diferente do que faz o Direito Constitucional, pois resume a
assunção em direitos negativos e positivos.
Marceli

Os direitos e deveres (fundamentais) dos Estados são consagrados em tratados e em normas


costumeiras, sendo a soberania seu principal fundamento.
Por isso, André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 330) separam os direitos e deveres
em competência interna e internacional.
Do ponto de vista interno, a competência dividir-se-ia em competência territorial e competência
pessoal:

• Competência territorial: refere-se à exclusividade de um Estado soberano exercer atos de


autoridade em seu território (jus excludendi alios), conforme os ensinamentos de Antonio Cassese
(2013, p. 71);
• Competência pessoal: diz respeito à fixação da nacionalidade e as consequências desse atributo.

Os artigos 8 e 9 da Convenção de Montevidéu sobre Direitos e Deveres dos Estados de 1933 dispõe
sobre o tema:

Artigo 8. Nenhum Estado possui o direito de intervir em assuntos internos ou externos de


outro.

101
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 9. A jurisdição dos Estados, dentro dos limites do território nacional, aplica-se a todos
os habitantes. Os nacionais e estrangeiros encontram-se sob a mesma proteção da
legislação e das autoridades nacionais e os estrangeiros não poderão pretender direitos
diferentes, nem mais extensos que os dos nacionais.

Do ponto de vista internacional, ou dimensão externa, a soberania equivale à independência dos


Estados.
Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 439) explicam que vários são os direitos
que decorrem da independência dos Estados, sendo o primeiro o da igualdade formal, previsto nos artigos
1 e 2 da Carta da ONU:

Artigo 1. Os propósitos das Nações unidas são: (...)


2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de
igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas
apropriadas ao fortalecimento da paz universal;

Artigo 2. A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados no


Artigo 1, agirão de acordo com os seguintes Princípios:
1. A Organização é baseada no princípio da igualdade de todos os seus Membros.
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Jorge Miranda (2009, p. 219) ressalta que a igualdade entre os Estados, no plano internacional, é
homóloga ao princípio da igualdade perante a lei, em âmbito interno. No mesmo sentido, Nguyen Quoc Dinh,
Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 439) destacam que o Direito Internacional é “redutor e negador das
diferenças reais dos Estados”.
Essa contradição entre discurso e prática pode ser facilmente constatada na própria ONU. Afinal, não
obstante o princípio da igualdade fundamentar o voto igual dos membros na Assembleia Geral, coexiste, na
organização, o poder de veto de China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia no Conselho de
CPF: 073.496.444-77

Segurança do órgão.
Ainda em decorrência da independência, há a vedação de ingerência em assuntos internos de
outros. Neste ponto, a dúvida é saber a conceituação de “assuntos internos”, sendo que, no desenvolvimento
do Direito Internacional, violação de direitos humanos já foi excluído desses limites. Decorrem dessa vedação
souza -- CPF:

as proibições de presença de tropas estrangeiras em um Estados soberano sem seu consentimento e de


Marceli souza

assistência aos rebeldes.


Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 77) aponta, ainda, o direito de existência dos Estados,
Marceli

independentemente de reconhecimento, previsto no artigo 3 da Convenção de Montevidéu sobre Direitos e


Deveres dos Estados de 1933:

Artigo 3. A existência política do Estado é independente do seu reconhecimento pelos


demais Estados. Ainda antes de reconhecido, tem o Estado o direito de defender sua
integridade e independência, prover a sua conservação e prosperidade, e
conseguintemente, organizar-se como achar conveniente, legislar sobre seus interesses,
administrar seus serviços e determinar a jurisdição e competência dos seus tribunais.
O exercício destes direitos não tem outros limites além do exercício dos direitos de outros
Estados de acordo com o Direito Internacional.

Antonio Cassese (2013, p. 72) destaca que o Direito Internacional atribui aos Estados o direito de
exigir uns dos outros a imunidade de jurisdição civil em relação a seus atos de império.
Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já decidiram sobre a
imunidade de jurisdição:

CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL PROMOVIDA PELA


UNIÃO CONTRA ESTADO ESTRANGEIRO. CONVENÇÕES DE VIENA DE 1961 E 1963.
1. Litígio entre o Estado brasileiro e Estado estrangeiro: observância da imunidade de
jurisdição, tendo em consideração as Convenções de Viena de 1961 e 1963.

102
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Precedentes do Supremo Tribunal Federal: ACO 522-AgR/SP e ACO 634-AgR/SP, rel. Min.
Ilmar Galvão, Plenário, 16.9.98 e 25.9.2002, DJ de 23.10.98 e 31.10.2002; ACO 527-AgR/SP,
rel. Min. Nelson Jobim, Plenário, 30.9.98, DJ de 10.12.99; ACO 524 AgR/SP, rel. Min. Carlos
Velloso, Plenário, DJ de 09.05.2003.
3. Agravo não provido.
(ACO 633 AgR, Relator(a): ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 11/04/2007, DJe-042
DIVULG 21-06-2007 PUBLIC 22-06-2007 DJ 22-06-2007 PP-00016 EMENT VOL-02281-01
PP-00001 LEXSTF v. 29, n. 343, 2007, p. 5-31 RDDT n. 143, 2007, p. 219-220 RDDP n. 55,
2007, p. 141-152)

Imunidade de jurisdição. Execução fiscal movida pela União contra a República da Coréia.
É da jurisprudência do Supremo Tribunal que, salvo renúncia, é absoluta a imunidade do
Estado estrangeiro à jurisdição executória: orientação mantida por maioria de votos.
Precedentes: ACO 524-AgR, Velloso, DJ 9.5.2003; ACO 522-AgR e 634-AgR, Ilmar Galvão, DJ
23.10.98 e 31.10.2002; ACO 527-AgR, Jobim, DJ 10.12.99; ACO 645, Gilmar Mendes, DJ
17.3.2003.
(ACO 543 AgR, Relator(a): SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2006,
DJ 24-11-2006 PP-00061 EMENT VOL-02257-01 PP-00044 RDDT n. 138, 2007, p. 135-150)

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO. ART. 105, II, C, DA CF/88.


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EXECUÇÃO FISCAL AJUIZADA POR MUNICÍPIO EM FACE DE ESTADO ESTRANGEIRO. TAXA DE


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COLETA DOMICILIAR DE LIXO (TCDL). IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. AUSÊNCIA DE RENÚNCIA.


PRECEDENTES DO STJ E DO STF.
1. Tanto o STJ quanto o STF se orientam no sentido de que os Estados estrangeiros gozam
de imunidade de jurisdição em matéria tributária, salvo expressa renúncia. Precedentes: STJ
- RO 185/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2017 e RO 142/RJ,
Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 24/11/2016; STF - ACO 623 AgR, Rel.
Ministro Edson Fachin, Primeira Turma, DJe 24/11/2015.
2. Na espécie, não tendo havido renúncia expressa da República da Argélia no tocante à
CPF: 073.496.444-77

imunidade da jurisdição executória, correta a sentença recorrida que extinguiu a execução


fiscal.
3. Recurso ordinário a que se nega provimento.
(RO 179/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/08/2018, DJe
28/08/2018)
souza -- CPF:

Importante caso julgado pelo Supremo Tribunal Federal, sobre o tema é o Caso Changrui-lá, que
Marceli souza

versa sobre a imunidade de jurisdição da Alemanha por violações aos direitos humanos ocorridas durante a
2ª Guerra.
Marceli

Em julho de 1943, durante a II Guerra Mundial, o submarino alemão U-199, afundou o pesqueiro
Changri-lá, no mar territorial brasileiro, nas proximidades da cidade de Cabo Frio. Os netos e viúvas dos netos
de um dos tripulantes, ingressaram com ação de responsabilização por danos materiais e morais em face da
Alemanha, junto à Justiça Federal do Rio de Janeiro.
O juiz federal extinguiu o feito sem a resolução do mérito, tendo sido interporto recurso ordinário ao
Superior Tribunal de Justiça. O relator negou seguimento ao recurso, em razão da jurisprudência consolidada
do tribunal, no sentido de que os atos de império dos Estado são submetidos à imunidade jurisdicional
absoluta, Interposto Agravo de Instrumento, a 4ª Turma do Tribunal, mantendo a decisão do relator, negou
provimento ao recurso:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO. DIREITO INTERNACIONAL. AÇÃO DE


INDENIZAÇÃO CONTRA ESTADO ESTRANGEIRO. NAUFRÁGIO DE EMBARCAÇÃO BRASILEIRA
POR SUBMARINHO ALEMÃO. ATO PRATICADO DURANTE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL.
IMUNIDADE ABSOLUTA.
1. Embora contrário ao entendimento pessoal deste relator, apresentado quando do
julgamento do RO 60/RJ, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no
sentido de que a República Federal da Alemanha não se submete à jurisdição nacional,
para responder à ação de indenização por danos morais e materiais, decorrentes de

103
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

ofensiva militar realizada durante a Segunda Guerra Mundial, em razão de a imunidade


acta iure imperii revestir-se de caráter absoluto.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no RO 109/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
20/10/2016, DJe 04/11/2016)

O Supremo Tribunal Federal, por maioria, fixou a tese que “Os atos ilícitos praticados por Estados
estrangeiros em violação a direitos humanos não gozam de imunidade de jurisdição”, relativizando a
imunidade jurisdicional da Alemanha por violações aos direitos humanos. O ministro Édson Fachin relator do
acórdão entendeu que a imunidade decorrente de um ato de império deve ceder face da proteção dos
direitos humanos. O relator ainda reconheceu que a Corte Internacional de Justiça, no caso Imunidades, entre
Itália e Alemanha, manteve a imunidade absoluta do Estado em caso de atos de império, porém, não
refutando os argumentos da decisão, preferiu afastar sua incidência com base no artigo 59 do Estatuto da
Corte, relacionado aos efeitos subjetivos da decisão da CIJ:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITOS HUMANOS.


DIREITO INTERNACIONAL. ESTADO ESTRANGEIRO. ATOS DE IMPÉRIO. PERÍODO DE GUERRA.
CASO CHANGRI-LÁ. DELITO CONTRA O DIREITO INTERNACIONAL DA PESSOA HUMANA. ATO
ILÍCITO E ILEGÍTIMO. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. RELATIVIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. ACESSO
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À JUSTIÇA. PREVALÊNCIA DOS DIREITOS HUMANOS. ART. 4º, II, DA CONSTITUIÇÃO DA


REPÚBLICA.
1. Controvérsia inédita no âmbito desta Suprema Corte, estando em questão a
derrotabilidade de regra imunizante de jurisdição em relação a atos de império praticados
por Estado soberano, por conta de graves delitos ocorridos em confronto à proteção
internacional da pessoa natural , nos termos do art. 4º, II e V, do Texto Constitucional.
2. A imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro no direito brasileiro é regida pelo direito
costumeiro. A jurisprudência do STF reconhece a divisão em atos de gestão e atos de
império, sendo os primeiros passíveis de cognoscibilidade pelo Poder Judiciário e, mantida,
CPF: 073.496.444-77

sempre, a imunidade executória, à luz da Convenção de Viena sobre as Relações


Diplomáticas (Dec. 56.435/1965). Precedentes.
3. O artigo 6, “b”, do Estatuto do Tribunal Militar Internacional de Nuremberg, reconhece
como “crimes de guerra” as violações das leis e costumes de guerra, entre as quais, o
souza -- CPF:

assassinato de civis, inclusive aqueles em alto-mar. Violação ao direito humano à vida,


incluído no artigo 6, do Pacto sobre Direitos Civis e Políticos. Assim, os atos praticados em
Marceli souza

períodos de guerra contra civis em território nacional, ainda que sejam atos de império, são
ilícitos e ilegítimos.
Marceli

4. O caráter absoluto da regra de imunidade da jurisdição estatal é questão persistente na


ordem do dia do direito internacional, havendo notícias de diplomas no direito comparado
e de cortes nacionais que afastaram ou mitigaram a imunidade em casos de atos militares
ilícitos.
5. A Corte Internacional de Justiça, por sua vez, no julgamento do caso das imunidades
jurisdicionais do Estado (Alemanha Vs. Itália), manteve a doutrina clássica, reafirmando sua
natureza absoluta quando se trata de atos jure imperii. Decisão, no entanto, sem eficácia
erga omnes e vinculante, conforme dispõe o artigo 59, do Estatuto da própria Corte, e
distinta por assentar-se na reparação global.
6. Nos casos em que há violação à direitos humanos, ao negar às vítimas e seus familiares a
possibilidade de responsabilização do agressor, a imunidade estatal obsta o acesso à justiça,
direito com guarida no art. 5º, XXXV, da CRFB; nos arts. 8 e 10, da Declaração Universal; e
no art. 1, do Pacto sobre Direitos Civis e Políticos.
7. Diante da prescrição constitucional que confere prevalência aos direitos humanos como
princípio que rege o Estado brasileiro nas suas relações internacionais (art. 4º, II), devem
prevalecer os direitos humanos - à vida, à verdade e ao acesso à justiça -, afastada a
imunidade de jurisdição no caso.
8. Possibilidade de relativização da imunidade de jurisdição estatal em caso de atos ilícitos
praticados no território do foro em violação à direitos humanos.
9. Fixação de tese jurídica ao Tema 944 da sistemática da repercussão geral: “Os atos ilícitos
praticados por Estados estrangeiros em violação a direitos humanos não gozam de
imunidade de jurisdição.”

104
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

10. Recurso extraordinário com agravo a que se dá provimento. (ARE 954858, Relator(a):
EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/08/2021, PROCESSO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-191 DIVULG 23-09-2021 PUBLIC 24-09-2021)

ATENÇÃO!
A decisão do STF no caso Changri-lá é importantíssima e deverá ser amplamente cobrada em
concursos públicos. Maiores digressões sobre o caso seriam impossíveis, em virtude das pretensões desse
escrito. Contudo, a leitura pelo menos do voto condutor é interessante para a preparação, sendo necessário
ter atenção ainda com o caso da CIJ e a divergência de entendimento do STF com o tribunal internacional.

Em relação aos atos privados (atos de gestão), em especial questões relacionadas às dívidas
trabalhistas, o Supremo Tribunal Federal tem julgado relativizando a imunidade de jurisdição:

AGRAVO DE INSTRUMENTO - ESTADO ESTRANGEIRO - RECLAMAÇÃO TRABALHISTA


AJUIZADA POR EMPREGADOS DE EMBAIXADA - IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO - CARÁTER
RELATIVO - RECONHECIMENTO DA JURISDIÇÃO DOMÉSTICA DOS JUÍZES E TRIBUNAIS
BRASILEIROS - AGRAVO IMPROVIDO. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. CONTROVÉRSIA DE
NATUREZA TRABALHISTA. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS.
- A imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro, quando se tratar de litígios trabalhistas,
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revestir-se-á de caráter meramente relativo e, em consequência, não impedira que os juízes


e Tribunais brasileiros conheçam de tais controvérsias e sobre elas exerçam o poder
jurisdicional que lhes e inerente.
ATUAÇÃO DO ESTADO ESTRANGEIRO EM MATÉRIA DE ORDEM PRIVADA. INCIDÊNCIA DA
TEORIA DA IMUNIDADE JURISDICIONAL RELATIVA OU LIMITADA.
- O novo quadro normativo que se delineou no plano do direito internacional, e também no
âmbito do direito comparado, permitiu - ante a realidade do sistema de direito positivo dele
emergente - que se construísse a teoria da imunidade jurisdicional relativa dos Estados
soberanos, tendo-se presente, para esse especifico efeito, a natureza do ato motivador da
CPF: 073.496.444-77

instauração da causa em juízo, de tal modo que deixa de prevalecer, ainda que
excepcionalmente, a prerrogativa institucional da imunidade de jurisdição, sempre que o
Estado estrangeiro, atuando em matéria de ordem estritamente privada, intervier em
domínio estranho aquele em que se praticam os atos jure imperii. Doutrina. Legislação
souza -- CPF:

comparada. Precedente do STF. A teoria da imunidade limitada ou restrita objetiva


institucionalizar solução jurídica que concilie o postulado básico da imunidade
jurisdicional do Estado estrangeiro com a necessidade de fazer prevalecer, por decisão do
Marceli souza

Tribunal do foro, o legitimo direito do particular ao ressarcimento dos prejuízos que venha
Marceli

a sofrer em decorrência de comportamento imputável a agentes diplomáticos, que,


agindo ilicitamente, tenham atuado more privatorum em nome do País que representam
perante o Estado acreditado (o Brasil, no caso). Não se revela viável impor aos súditos
brasileiros, ou a pessoas com domicílio no território nacional, o ônus de litigarem, em torno
de questões meramente laborais, mercantis, empresariais ou civis, perante tribunais
alienígenas, desde que o fato gerador da controvérsia judicial - necessariamente estranho
ao especifico domínio dos acta jure imperii - tenha decorrido da estrita atuação more
privatorum do Estado estrangeiro. (...) (AI 139671 AgR/DF. Primeira Turma. Relator: Min.
Celso de Mello. Julgamento: 20/06/1995. Publicação: 29/03/1996)

Outro dever dos Estados é o da solução pacífica das controvérsias. Trata-se de uma limitação ao
direito de fazer guerra (ius belli), que remonta ao Pacto de Briand-Kellog, de 1928, reforçada atualmente
pelo artigo 2 da Carta das Nações Unidas:

Artigo 2. A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados no


Artigo 1, agirão de acordo com os seguintes Princípios: (...)
3. Todos os Membros deverão resolver suas controvérsias internacionais por meios
pacíficos, de modo que não sejam ameaçadas a paz, a segurança e a justiça internacionais.
4. Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da
força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou
qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas.

105
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
139. (TRF - 2ª Região - 2018 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Sobre a imunidade de jurisdição
e de execução do Estado estrangeiro e de seus bens e de organismos internacionais, marque a alternativa
correta:
a) Não há imunidade de execução de bens de Estado estrangeiro para cumprimento de dívidas trabalhistas.
b) A imunidade absoluta de jurisdição de Estado estrangeiro em matéria trabalhista vigorou no Brasil até a
promulgação da Constituição de 1988, sendo flexibilizada somente pelo art. 114, que estabeleceu a
competência da Justiça do Trabalho para ações trabalhistas envolvendo entes de direito público externo.
c) A imunidade de jurisdição de Estado estrangeiro em matéria trabalhista foi flexibilizada no Brasil em
função da evolução do costume internacional sobre a matéria.
d) Organismos internacionais gozam de imunidade de jurisdição em igualdade de condições com Estados
estrangeiros.
e) As imunidades dos organismos internacionais independem dos tratados que os criaram.
140. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Conforme entendimento do Superior
Tribunal de Justiça, não é possível a responsabilização, em território brasileiro, de Estado estrangeiro por
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ato de guerra, por tratar-se de manifestação de ato de império.

141. (FCC - 2015 - TRT - 23ª REGIÃO (MT) - Juiz do Trabalho Substituto) Durante a 2ª Guerra Mundial, um
submarino alemão (U-199) bombardeou uma embarcação pesqueira no litoral brasileiro de Cabo Frio − RJ,
ocasionando a morte de uma pessoa, cujos herdeiros propuseram no Brasil ação em face da República
Federal da Alemanha, por ato de guerra, visando o ressarcimento de danos. A responsabilização da
República Federal da Alemanha por ato de guerra, de acordo com a atual jurisprudência do Superior
CPF: 073.496.444-77

Tribunal de Justiça,
a) é possível, por se tratar de ato tipicamente de império, excluindo-se a imunidade de jurisdição.
b) não é possível, por se tratar de ato tipicamente de império, prevalecendo a imunidade de jurisdição.
c) é possível, por se tratar de ato tipicamente de gestão, excluindo-se a imunidade de jurisdição.
souza -- CPF:

d) não é possível, por ser inadmissível qualquer hipótese de julgamento de Estado estrangeiro pelo Poder
Judiciário nacional.
Marceli souza

e) não é possível, por se tratar de ato tipicamente de gestão, prevalecendo a imunidade de jurisdição.
Marceli

142. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) A execução forçada de eventual sentença
condenatória trabalhista contra Estado estrangeiro somente será possível se existirem, no território
brasileiro, bens do executado estranhos à representação diplomática ou consular.

2.6. Transformações dos Estados

André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 333) explicam que as categorias mais
importantes de transformações nos Estados são as mutações territoriais (com perda ou acréscimo de
território) e a transformação política, em especial, em rupturas institucionais violentas.
As mutações territoriais, atualmente, ocorrem pela emancipação de territórios submissos (colônias
ou protetorados) em novos Estados. Já a anexação pode ocorrer em hipóteses como a fusão das Alemanhas,
na década de 90.
A transformação política é, de regra, fora do âmbito do Direito Internacional, exceção feita às
rupturas institucionais, que ganham relevo internacional por meio do instituto do reconhecimento de
governo.

106
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.7. A extinção e sucessão/continuidade de Estados

Malcom M. Shaw (2017, p. 155) destaca que a extinção de um Estado pode ocorrer nas hipóteses de
fusão, absorção ou anexação. Além das hipóteses descritas pelo autor, é possível citar a cisão, como ocorreu
na Tchecoslováquia (para o autor, essa é uma hipótese de desmembramento).

O CASO DE TUVALU
Malcom M. Shaw (2017, p. 155) chama atenção para uma hipótese de extinção de um Estado, até
então inimaginável. Trata-se do desaparecimento geográfico do território de um Estado. O exemplo, ainda
em andamento, é Tuvalu, um conjunto de ilhas na Polinésia, que corre risco de desaparecer em razão do
aumento do nível dos oceanos. Como as ilhas não têm mais de 7 metros acima do nível do mar, o
derretimento das calotas polares e o decorrente aumento do nível das águas poderão, literalmente,
extinguir o Estado pelo desaparecimento do território.

A extinção do Estado é uma hipótese de sucessão total do Estado (CASSESE, 2013, p. 76). Há, ainda,
as hipóteses de sucessão ou continuidade parcial (BROWNLIE, 1997, p. 94), decorrentes da perda parcial do
território (cessão territorial), seja para um novo Estado ou para um Estado preexistente.
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O Direito Internacional não reconhece a extinção de um Estado pelo uso ilegal da força, como, por
exemplo, ocorreu na invasão do Iraque ao Kuwait, em 1990.
Antonio Cassese (2013, p. 77) explica que a extinção de um Estado ocorre quando há uma mudança
relevante em todos os três elementos constitutivos. Nos demais casos em que há uma alteração da soberania
haveria uma hipótese de continuação do Estado. Para o autor, um critério a ser seguido é o da modificação
das dimensões territoriais e da população submetida a um governo.
CPF: 073.496.444-77

Malcom M. Shaw (2017, p. 156) cita o caso da Rússia que, para a sociedade internacional, foi
considerada uma continuação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), inclusive sucedendo-a
como membro permanente no Conselho de Segurança da ONU.
Já no caso da República Federal Socialista da Iugoslávia, a pretensão de sucessão pela República
souza -- CPF:

Federal da Iugoslávia (Sérvia e Montenegro) não foi aceita pelos demais Estados (Croácia, Eslovênia, Bósnia
e Herzegovina). O resultado foi a consideração, na Resolução 777 do Conselho de Segurança da ONU (1992),
Marceli souza

de que a República Federal Socialista da Iugoslávia havia deixado de existir. Em novembro de 2000, a então
Marceli

República Federal da Iugoslávia é recebida nas Nações Unidas como um novo membro da organização
internacional.
Em relação às obrigações advindas de tratados internacionais, em 1978 foi elaborada a Convenção
de Viena sobre Sucessão de Estados em Matéria de Tratados, ratificada pelo Brasil pelo Decreto nº
10.214/2020. O artigo 11 da Convenção traz expressamente que os tratados relativos às fronteiras dos Estado
não serão afetados em razão da sucessão de Estados. Além desse dispositivo, merece destaque o artigo 16
da Convenção que dispõe:

Artigo 16. Posição a respeito dos tratados do Estado predecessor


Um Estado de independência recente não estará obrigado a manter em vigor um tratado
nem a tornar-se parte dele unicamente por razão de, na data da sucessão de Estados, o
tratado estar em vigor relativamente ao território a que se refere essa sucessão de Estados.

A Convenção traz, ainda, disposições referentes a tratados multilaterais. Destaca-se que um Estado
recém independente não está vinculado à vontade do Estado predecessor, podendo, inclusive, apresentar
reservas (aos termos do tratado) ou retirar seu consentimento assim que conquistada a soberania:

Artigo 17. Participação em tratados vigentes na data da sucessão de Estados


1. Condicionado aos parágrafos 2 e 3, um Estado de independência recente poderá,
mediante uma notificação de sucessão, constituir-se como parte em qualquer tratado

107
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

multilateral que, na data da sucessão de Estados, estivesse em vigor relativamente ao


território a que se refere essa sucessão de Estados.
2. O parágrafo 1 não se aplicará se depreender-se do tratado ou constar de outro modo que
a aplicação do tratado relativamente ao Estado de independência recente seja incompatível
com o objeto e o propósito do tratado ou venha a alterar radicalmente as condições da sua
execução.
3. Quando, em função dos termos do tratado ou em razão do número limitado de Estados
negociadores e do objeto e do propósito do tratado, a participação de qualquer outro
Estado nesse tratado deva ser considerada sujeita ao consentimento de todas as demais
partes, o Estado de independência recente poderá constituir-se como parte somente com
tal consentimento.

Artigo 20. Reservas


1. Quando um Estado de independência recente se faça constituir como parte ou como
Estado contratante num tratado multilateral, mediante uma notificação de sucessão, com
base nos artigos 17 ou 18, considerar-se-á que mantém as mesmas reservas a esse tratado
que fossem aplicáveis, na data da sucessão, relativamente ao território a que se refere essa
sucessão de Estados, a menos que, ao fazer a notificação de sucessão, expresse intenção
contrária ou formule uma reserva a respeito da mesma matéria à qual aquela reserva se
referia.
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2. Ao fazer uma notificação de sucessão qualificando-se como parte ou como Estado


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contratante num tratado multilateral, com base nos artigos 17 ou 18, um Estado de
independência recente poderá formular uma reserva, a menos que esta seja uma daquelas
cuja formulação ficaria excluída pelas provisões das alíneas (a), (b) ou (c) do artigo 19 da
Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.
3. Quando um Estado de independência recente formula uma reserva em conformidade
com o parágrafo 2, aplicam-se as normas enunciadas nos artigos 20 a 23 da Convenção de
Viena sobre o Direito dos Tratados relativamente a essa reserva.
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Artigo 21. Consentimento em obrigar-se por parte de um tratado e opção entre disposições
divergentes
1. Ao fazer uma notificação de sucessão com base nos artigos 17 ou 18 qualificando-se como
parte ou como Estado contratante num tratado multilateral, um Estado de independência
recente poderá, se o tratado permitir, manifestar o seu consentimento em obrigar-se por
souza -- CPF:

parte do tratado ou optar entre disposições divergentes, nas condições estabelecidas no


tratado para manifestar tal consentimento ou exercer tal opção.
Marceli souza

2. Um Estado de independência recente também poderá exercer, nas mesmas condições


das demais partes ou dos demais Estados contratantes, qualquer direito previsto no tratado
Marceli

de retirar ou modificar qualquer consentimento ou opção feita ele mesmo ou feita pelo
Estado predecessor relativamente ao território a que essa sucessão de Estados se refere.
3. Se o Estado de independência recente não manifestar o seu consentimento nem exercer
nenhuma opção em conformidade com o parágrafo 1, ou se não retirar ou modificar o
consentimento à opção do Estado predecessor em conformidade com o parágrafo 2,
considerar-se-á que mantém:
a) o consentimento, em conformidade com o tratado, em obrigar-se por uma parte desse
tratado, expresso pelo Estado predecessor relativamente ao território a que se refere essa
sucessão de Estados; ou
b) a opção entre disposições divergentes, em conformidade com o tratado, em relação à
aplicação desse tratado, exercida pelo Estado predecessor relativamente ao território a que
se refere essa sucessão de Estados.

Por fim, há de se destacar que, ao contrário do que dispõe a Convenção de Viena sobre direitos dos
tratados, a Convenção de Viena sobre Sucessão de Estados em Matéria de Tratado, cuidou dos efeitos dos
tratados em caso da separação de Estados:

Artigo 34. Sucessão de Estados em caso de separação de partes de um Estado


1. Quando uma parte ou partes do território de um Estado se separam para formar um ou
vários Estados, continue ou não a existir Estado predecessor:

108
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) Todo tratado que estivesse em vigor na data da sucessão de Estados relativamente à


totalidade do Estado predecessor continuará em vigor relativamente a cada Estado sucessor
assim formado;
b) Todo tratado que estivesse em vigor na data da sucessão do Estado relativamente apenas
àquela parte do território do Estado predecessor que tenha passado a ser o Estado sucessor
continuará em vigor relativamente a esse Estado sucessor somente.
2. O parágrafo 1 não se aplicará:
a) Se os Estados interessados convencionarem de outra forma;
b) Se resultar do tratado ou se for estabelecido de outra forma que a aplicação do tratado
relativamente ao Estado sucessor venha a ser incompatível com o objeto e o propósito do
tratado ou venha a alterar radicalmente as condições da sua execução.

A sucessão dos bens públicos normalmente é fruto de acordo entre o Estado predecessor e o
sucessor. Não havendo consenso, cabem ao Estado sucessor os bens (móveis ou imóveis) que permaneçam
em seu território. Os bens situados no exterior deverão, de regra, ser divididos de forma equitativa. Em caso
de fusão, os bens dos Estados predecessores passam a pertencer ao novo ente estatal.
No que se refere às dívidas, a regra é a divisão mediante o mútuo acordo entre os Estados. Em caso
de dissenso, a sucessão reger-se-á pelo princípio da repartição ponderada da dívida, no qual o critério de
responsabilização será a destinação do produto do endividamento (REZEK, 2018, p. 363). Caso o Estado
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sucessor seja o único beneficiado, ele deverá arcar com a totalidade da dívida.
Francisco Rezek (2018, p. 362) aponta que se deve distinguir os arquivos de gestão, relacionados à
matéria administrativa, dos arquivos de soberania, também chamados de arquivos públicos. No caso de
sucessão por descolonização, para o autor, apenas os arquivos de gestão devem ser entregues,
permanecendo com o Estado predecessor os arquivos públicos. Porém, de forma genérica, a resposta
consuetudinária é a de que, caso não ocorra acordo entre as partes, cada Estado ficará com os arquivos que
lhe digam respeito (PORTELA, 2015, p. 182).
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Em relação aos direitos adquiridos, o entendimento foi alterado após a descolonização, tendo em
vista o desequilíbrio encontrado na sociedade dos novos Estados. A princípio, deve-se buscar uma
composição amigável. Para Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015), o respeito aos direitos adquiridos é um
dos valores que melhor se compatibilizam com a segurança jurídica e a estabilidade das relações
souza -- CPF:

internacionais.
Marceli souza

Quanto à nacionalidade das pessoas, no caso de fusão, todos receberão a nacionalidade proveniente
do novo Estado. Por outro lado, quando há a extinção do Estado, descarta-se a manutenção da nacionalidade.
Marceli

Em caso de desmembramento, Francisco Rezek (2018, p. 360) aponta que o comum é que os habitantes do
novo Estado percam a nacionalidade antecedente e adquiram a nova, sendo possível, eventualmente, o
direito de opção (exemplo: cisão da Tchecoslováquia).

QUESTÕES
143. (UFPR - 2011 - ITAIPU BINACIONAL – Advogado) Não cabe ao direito internacional o poder de criar
o Estado, mas tão somente de definir os critérios que permitem detectar a existência de um Estado, bem
como as competências dos Estados. O direito internacional apreende, portanto, os processos de formação e
de transformação dos Estados. Não obstante, o reconhecimento tanto do Estado quanto de seu governo
desempenha papel importante na dinâmica do Estado. Com relação a esses fatos, considere as seguintes
afirmativas:
1. O estado do Rio Grande do Sul, que já acolheu intenções de se desmembrar do Estado brasileiro, reúne os
elementos constitutivos para ser reconhecido internacionalmente como um Estado soberano, vez que possui
um território, uma população e um governo permanente.

109
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Após o golpe de Estado ocorrido em Honduras, no decorrer da primeira metade de 2009, o Brasil não
reconheceu o governo de Micheletti. O não reconhecimento do governo acarretou, como consequência, o
não reconhecimento do Estado hondurenho.
3. A mudança de governo ocorrida em Honduras no ano de 2009, com a queda do Presidente Manuel Zelaya,
desencadeou o fenômeno da sucessão de Estado.
4. Kosovo declarou sua independência da Sérvia em 17 de fevereiro de 2008, muito embora a Organização
das Nações Unidas ainda não o tenha aceitado como Estado-membro da Organização. O Brasil, sendo Estado-
membro da ONU, não pode reconhecer Kosovo como Estado soberano e com ele manter relações
diplomáticas.
5. Após o desmembramento da ex-Iugoslávia, no início da década de noventa, o Brasil reconheceu
formalmente a Croácia e a Eslovênia como Estados soberanos em 1993. Não obstante, o estabelecimento de
relações diplomáticas entre os países não pressupõe esse reconhecimento formal.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afirmativas 1, 2 e 5 são verdadeiras.
b) Somente as afirmativas 1 e 3 são verdadeiras.
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c) Somente as afirmativas 3 e 4 são verdadeiras.


d) Somente as afirmativas 1, 2, 3 e 5 são verdadeiras.
e) Somente a afirmativa 5 é verdadeira.
144. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) A doutrina Tobar, com
referência a Carlos Tobar, ministro das relações exteriores do Equador, surgiu em 1907 e pautava-se no
princípio da não intervenção.
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145. (IADES - 2016 - Ceitec S.A - Analista Administrativo e Operacional – Advogado, adaptada) No que
se refere à condição do Estado como sujeito de direito internacional, é correto afirmar que a doutrina
Estrada, a despeito de não negar a obrigação de a nação devedora reconhecer as próprias dívidas e procurar
souza -- CPF:

pagá-las, repudiava a sua cobrança como coerção, que poderia levar à absorção das nações mais pobres pelas
nações mais ricas.
Marceli souza

146. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - Instituto Rio Branco - Diplomata) Em 14/6/2008, o Governo brasileiro
Marceli

respondeu à carta do ministro dos Negócios Estrangeiros da República de Montenegro, acusando


recebimento de notícia acerca do resultado de referendo favorável ao status daquele país como Estado
independente, após desmembramento da União de Estados da Sérvia e Montenegro. Na carta, o Brasil
“reconhece, a partir da data de hoje, a independência da República de Montenegro, país com o qual o Brasil
tenciona, oportunamente, iniciar processo com vistas ao estabelecimento de relações diplomáticas”. Acerca
desse tema, assinale a opção correta.
a) A eventual recusa do reconhecimento por parte do Governo brasileiro impediria que Montenegro se
constituísse como verdadeiro Estado, sujeito de direito internacional, e que se tornasse membro das Nações
Unidas.
b) O Governo brasileiro poderia ter optado por não reconhecer formalmente a independência de
Montenegro e poderia ter simplesmente estabelecido relações diplomáticas com aquele país, o que teria
produzido o mesmo efeito jurídico do reconhecimento.
c) É costume do Governo brasileiro, além de reconhecer Estados, proceder igualmente ao reconhecimento
formal de novos governos, quando oriundos de revolução ou golpe de Estado, exprimindo juízo de valor
acerca da legitimidade do novo regime.
d) Antes do reconhecimento de Montenegro, o Governo brasileiro deve ter considerado, em sua avaliação
das circunstâncias locais, se a nova entidade possuía território definido, população permanente, governo

110
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

soberano e efetivo, e se havia comprometimento de Montenegro em estabelecer missão diplomática em


Brasília.
e) Ao Governo brasileiro caberá a última palavra na destinação a ser dada aos bens (embaixada, terrenos)
que eram anteriormente pertencentes à União dos Estados da Sérvia e Montenegro e que se encontram em
território brasileiro.
147. (CESPE/CEBRASPE - 2002 - AGU) Quando soarem as doze badaladas da meia-noite do dia 19 de maio
de 2002, o mundo acolherá com satisfação o Timor Leste na família das nações. Será um momento histórico
para o Timor Leste e para as Nações Unidas. Um povo orgulhoso e tenaz realizará o sonho comum a todos os
povos de viver como homens e mulheres livres sob um governo que eles mesmos escolheram. Kofi Annan. O
mundo não pode abandonar o Timor Leste. In: Folha de S. Paulo, 19/5/2002, A-29 (com adaptações). A partir
do texto acima, julgue o item que se segue.
Para satisfazer a condição de Estado, tal como prescreve o direito internacional público, o Timor Leste deve
possuir: território, população, governo, independência na condução das suas relações externas e
reconhecimento dos demais atores que compõem a sociedade internacional.

2.8. As dimensões territoriais dos Estados


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2.8.1. Introdução

Ian Brownlie (1997, p. 122) aponta que o Direito Internacional reconhece quatro tipos de regimes
relacionados aos espaços:

• A soberania territorial ou domínio terrestre: engloba as dimensões do território terrestre e mar


CPF: 073.496.444-77

territorial (incluído os fundos marinhos);


• O território não sujeito à soberania de qualquer Estado, por ter estatuto próprio: como no caso
da Antártica, regulado pelo Tratado da Antártica, de 1959, ratificado pelo Brasil em 1975;
• A res nullius (terra de ninguém): trata-se do objetivo suscetível de aquisição por estados, mas
souza -- CPF:

que ainda não se encontra sob a soberania territorial de nenhum. Francisco Rezek (2018, p. 204)
Marceli souza

aponta, ainda, a terra derelicta, isto é, terra abandonada, que tem o mesmo regime jurídico da
res nullius;
Marceli

• A res communis: trata-se de espaços como o alto mar e o espaço extra-atmosférico, que não são
suscetíveis de serem colocados sob a soberania de nenhum Estado.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 428) destaca que, em seu território, o Estado exerce a
jurisdição de forma geral e exclusiva. Como explica Francisco Rezek (2018, p. 202), o termo jurisdição,
preferido pela doutrina anglo-saxã, é o conjunto de competências entregues ao Estado em razão de sua
autoridade. Portanto, dentro do território, exerce as competências legislativa, administrativa e jurisdicional
sem a concorrência de outra soberania.

2.8.2. Domínio terrestre e suas fronteiras

O território do Estado é classificado por Roberto Luiz Silva (2020, p. 214) em:

• Território íntegro, compacto ou contínuo (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 428): porção da superfície
terrestre, tal qual a maioria do território brasileiro;
• Território desmembrado, dividido ou descontínuo: porção da superfície terrestre que apresenta
partes isoladas, mas que o Estado exerce sua soberania. Exemplo, o território dos Estados Unidos

111
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

que é integrado pelo Alasca e pelo Havaí. No caso brasileiro, há um prolongamento relacionado à
ilha de Fernando de Noronha.
• Território encravado: é o território cercado interinamente por outro Estado sem saída para o mar.
São exemplos: a cidade do Vaticano, San Marino e Liechtenstein.

A fronteira de um Estado nada mais é que a linha que delimita o território, ou, como conceituam
Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 476) “a linha separando espaços territoriais onde
se exercem duas soberanias diferentes”. Os limites estatais podem ser naturais ou artificiais. Os naturais
correspondem a acidentes geográficos como rios, lagos, montanhas etc., que servem de marco visível para a
delimitação (exemplo: o Rio Paraná, na fronteira com o Paraguai). Já os limites artificiais podem ser
intelectuais (MAZZUOLI, 2020, p. 429). São as linhas geodésicas, traçadas por convenções entre os Estados,
fixadas por marcos físicos (materiais); linhas astronômicas, como um meridiano ou paralelo (astronômicos);
formas geométricas (retas, arcos etc.) sem qualquer correspondência com um marco astronômico, ou
convencionais, quando fixados por traços de forma arbitrariamente escolhidos.
Francisco Rezek (2018, p. 204) explica que a forma de aquisição de território, à época da ocupação
europeia nas Américas, ocorria pela “descoberta”, considerando-se os territórios americanos (ainda que
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habitados) como terra nullius. De modo subsidiário, era aplicado o princípio da contiguidade — enquanto o
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conquistador avançasse pelo território sem encontrar resistência, estava mantida a pretensão dominial. A
dimensão do território só cessava quando contraposta em pretensões opostas (de outra potência europeia).
No caso brasileiro, a dimensão territorial foi formada até que portugueses encontrassem oposição
espanhola.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 433) aponta que, atualmente, as formas de aquisição
do território são:
CPF: 073.496.444-77

• Ocupação: trata-se da apropriação de uma terra nullius ou terra derelicta (que não se confunde
com a abstenção momentânea do território, com a intenção de retorno);
• Acessão: trata-se de acréscimo de território em razão de um evento da natureza (acessão natural)
souza -- CPF:

ou por meio da ação humana (acessão artificial);


• Cessão: trata-se da transferência de parcela de um Estado a outro de forma gratuita
Marceli souza

(normalmente decorrente de acordos de paz, pela parte derrotada) ou onerosa (como no caso do
Marceli

Acre, adquirido da Bolívia, em 1903, por 2 milhões de libras esterlinas). Lembrando que,
atualmente, um tratado de cessão forçada (como o ocorrido entre a Alemanha e a
Tchecoslováquia para a cessão da região dos Sudetos), é considerado nulo, nos termos da
Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados;
• Prescrição aquisitiva: trata-se da situação similar à usucapião. Um Estado adquire o território
através da permanência duradoura, com animus domini, sobre um território (MAZZUOLI, 2020,
ebook, p. 437). Para Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 437), a diferença entre a
prescrição aquisitiva e a ocupação efetiva é a de que essa ocorre quando não há exercício
simultânea por duas soberanias em um território, tratando-se de um substitutivo do título;
• Conquista: a conquista, ou debellatio, é o resultado de uma guerra de conquista. Atualmente, é
vedada pelo Pacto Briand-Kellog, de 1928;
• Anexação: também é o resultado de uma guerra, com a extinção do Estado vencido e a
apropriação distintiva do território pelo Estado vencedor.

112
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.8.3. Subsolo, espaço aéreo e águas interiores

Ian Brownlie (1997, p. 132) aponta que, em relação ao subsolo, a regra universal é que ele pertence
ao Estado que possui soberania sobre a superfície.
Em relação ao espaço aéreo, ele pertence ao Estado em seu território, abrangido o espaço terrestre,
as águas interiores e o mar territorial. O espaço aéreo inclui, também, o extra-atmosférico (SILVA, 2020, p.
217). É importante destacar que, ao contrário do mar, não existe direito de passagem inocente de aeronaves
no espaço aéreo estatal. A aviação civil deve ser precedida de autorização contínua ou avulsa. Já a aviação
militar, de regra, necessita de autorização prévia sob pena de violação do espaço aéreo, sendo permitido,
inclusive o abate.
No que tange às águas interiores, elas são compostas pelos rios e lagos situados no interior do
Estado, bem como as águas no interior das linhas de base, calculadas sob a extensão do mar territorial
(BROWNLIE, 1997, p. 133). Nesse caso, aplica-se o regime da soberania territorial. Em relação aos rios
nacionais, o Estado não tem a obrigação de conceder o direito de passagem inocente às embarcações
estrangeiras (SILVA, 2020, p. 217).
Os rios internacionais podem ser sucessivos ou contínuos. Os rios sucessivos são aqueles cujo leito
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atravessa mais de um Estado (como o Rio Amazonas), já os contínuos estabelecem a fronteira entre dois ou
mais Estados (como os Rios Paraná, Madeira e Mamoré). Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 431)
explica que, em rios navegáveis, a regra é que a fronteira deve passar pelo talweg (parte mais profunda do
leito do rio). Em rios não navegáveis, o critério geral é a linha da meia distância (critério da equidistância).
No caso de pontes sobre o rio contíguo, considera-se o limite o meio da ponte, independentemente do
talweg.
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2.8.4. Domínio marítimo

Em relação ao domínio marítimo, o tema é objeto da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito
do Mar, celebrada em 1982 em Montego Bay, entrando em vigência em 1994.
souza -- CPF:

Em âmbito nacional, a Convenção de Mongeto Bay foi ratificada pelo Decreto n.º 99.165/1990, mas
é também objeto da Lei n.º 8.617/1993.
Marceli souza

O mar territorial é extensão de 12 milhas náuticas da linha base da costa (correspondente à maré
Marceli

baixa). Nessa faixa, aplica-se o regime de soberania territorial do Estado, excepcionado o direito de passagem
inocente, desde contínua e rápida.

Mar territorial
Estado A
12 milhas náuticas

Caso a distância entre dois Estados seja menor que 12 milhas náuticas, aplica-se o critério da
equidistância.

Mar territorial Mar territorial


Estado A Estado A Estado B Estado B
12 milhas náuticas

Após o mar territorial, em uma extensão de até mais 12 milhas náuticas, encontra-se a zona
contígua, em que o Estado exercerá a soberania referente à fiscalização sanitária, alfandegária e de
imigração.

113
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Mar territorial Zona contígua


Estado A
12 milhas náuticas Até 24 milhas náuticas

Em uma faixa de até 200 milhas náuticas da linha base, encontra-se a zona econômica exclusiva, na
qual o Estado detém soberania para exploração, conservação aproveitamento e gestão de recursos naturais.

Mar Zona
Zona Econômica Exclusiva Alto mar
territorial contígua
Estado A 12 milhas + 12 milhas Após 200
náuticas náuticas Até 200 milhas náuticas milhas
náuticas

Do ponto de vista geológico, o leito e subsolo (fundo) do mar é denominado plataforma continental.

Conceito geológico

Mar territorial
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Estado A
12 milhas náuticas

Plataforma continental

Ocorre que, nos termos da Convenção de Montego Bay (artigo 76.1), o conceito legal de plataforma
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continental compreende a extensão do fundo do mar após o mar territorial até a grande abissal (borda
exterior do continente). Na prática, nos casos em que a abissal é inferior ao tamanho do mar territorial,
considera-se esse o tamanho da plataforma continental.
souza -- CPF:

Conceito legal
Marceli souza

Mar Zona
Zona Econômica Exclusiva Alto mar
Marceli

territorial contígua
Estado A 12 milhas + 12 milhas Após 200
náuticas náuticas Até 200 milhas náuticas milhas
náuticas

Plataforma continental

Nos termos da Convenção, a regra é que a plataforma continental corresponda à extensão natural.
Ocorre que, em alguns Estados, o solo marinho afunda lentamente, tendo a convenção limitado o tamanho
da plataforma: em regra, até 200 milhas náuticas.

114
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Regra de limitação

Mar Zona
Zona Econômica Exclusiva Alto mar
territorial contígua
Estado A 12 milhas + 12 milhas Após 200
náuticas náuticas Até 200 milhas náuticas milhas
náuticas

Plataforma continental

Há uma exceção prevista nos §§ 5º e 6º do artigo 76 da Convenção de Montego Bay, em que a


plataforma continental poderá atingir o limite máximo de 350 milhas náuticas, e, com isso, exceder os limites
da Zona Econômica Exclusiva.

Limites máximos da plataforma continental


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Mar Zona
Zona Econômica Exclusiva Alto mar
territorial contígua
Estado A 12 milhas + 12 Após 200 milhas
náuticas milhas Até 200 milhas náuticas náuticas
náuticas

Plataforma continental
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Até 350 milhas náuticas

Caso dois Estados tenham costas adjacentes ou contrapostas, a Corte Internacional de Justiça (CIJ)
decidiu, no caso Delimitação da fronteira marítima na região do golfo do Maine, de 1984, que nenhuma
souza -- CPF:

delimitação marítima entre Estados deve ser feita de forma unilateral, devendo-se, inicialmente, buscar o
acordo entre as partes.
Marceli souza

Anteriormente, no caso Plataforma Continental do Mar do Norte, de 1967, a CIJ já apontara que o
Marceli

princípio da equidistância não seria uma regra costumeira internacional, nem mesmo uma norma primária
de fixação da plataforma, devendo o critério natural ser utilizado inicialmente.
Posteriormente, no caso Delimitação da fronteira marítima na região do golfo do Maine, o Tribunal
apontou que o princípio da distribuição equitativa deveria prevalecer sobre o critério natural, ou seja, o
critério natural não deveria ser uma condição sine qua non para a delimitação da plataforma, principalmente
em situações de Estados com território sucessivo.
Para fins práticos, os limites da zona econômica exclusiva referem-se à exploração dos recursos
naturais marinhos (pescados), enquanto os limites da plataforma continental dizem respeito à exploração do
solo e subsolo (como as reservas de petróleo do pré-sal).
Do ponto de vista constitucional, o art. 20, IV e V, da Constituição aponta que os recursos naturais
da zona econômica exclusiva e da plataforma continental são bens da União, assegurada a participação no
resultado da exploração do petróleo, gás natural e recursos minerais, aos Estados e Municípios, nos termos
do art. 20, § 1º:

Art. 20. São bens da União:


(...)
V - os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva;
VI - o mar territorial;

115
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;


VIII - os potenciais de energia hidráulica;
IX - os recursos minerais, inclusive os do subsolo;
(...)
§ 1º É assegurada, nos termos da lei, à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos
Municípios a participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de
recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no
respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva,
ou compensação financeira por essa exploração. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 102, de 2019)

Após os limites da zona econômica exclusiva encontra-se o alto-mar. Nenhum Estado tem domínio
exclusivo sobre o alto-mar (SILVA, 2020, p. 221). Logo, pelo princípio da liberdade dos mares, que remontam
ao debate Grotius-Selden, o alto-mar é uma res communis (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 1.219), nos
termos do artigo 87 da Convenção de Montego Bay:

Artigo 87. Liberdade do alto mar


1. O alto mar está aberto a todos os Estados, quer costeiros quer sem litoral. A liberdade do
alto mar é exercida nas condições estabelecidas na presente Convenção e nas demais
normas de direito internacional. Compreende, inter alia, para os Estados quer costeiros
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quer sem litoral:


a) liberdade de navegação;
b) liberdade de sobrevôo;
c) liberdade de colocar cabos e dutos submarinos nos termos da PARTE VI;
d) liberdade de construir ilhas artificiais e outras instalações permitidas pelo direito
internacional, nos termos da parte VI;
e) Liberdade de pesca nos termos das condições enunciadas na seção 2;
f) liberdade de investigação científica, nos termos das Partes VI e XIII.
2. Tais liberdades devem ser exercidas por todos os Estados, tendo em devida conta os
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interesses de outros Estados no seu exercício da liberdade do alto mar, bem como os
direitos relativos às atividades na Área previstos na presente Convenção.

Considerando a ausência de autoridade supranacional, Roberto Luiz Silva (2020, p. 221) aponta que
souza -- CPF:

compete aos Estados em alto-mar:


Marceli souza

Direito de perseguição (pursuit continue) de navios privados, e o aprisionamento de seus


tripulantes, desde que a perseguição tenha se iniciado em suas águas territoriais e não tenha
Marceli

sido interrompida;
• Direito de visita e busca (right of visit and search): trata-se da parada para a verificação de
documentos e inspeção de carga de navios mercantes, ainda que em alto-marꓼ
• Direito de verificação do pavilhão (right of approach): é a faculdade de verificação de
documentos comprobatórios da nacionalidade do navio.

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 1.225) ainda preveem a possibilidade de
os Estados efetuarem o desvio, a apreensão e imobilização, o confisco e a destruição de navios (nesse último
caso, quando haver risco ao ambiente marinho).
O fundo marinho após a extensão da plataforma continental é denominado “a Área”, sendo
considerado patrimônio comum da humanidade, pelo artigo 136 da Convenção de Montego Bay, estando
fora da jurisdição e domínio dos Estados, nos termos do artigo 137 da Convenção:

Artigo 137. Regime jurídico da Área e dos seus recursos


1. Nenhum estado pode reivindicar ou exercer soberania ou direitos de soberania sobre
qualquer parte da Área ou seus recursos; nenhum Estado ou pessoa física ou jurídica pode
apropriar-se de qualquer parte da Área ou dos seus recursos. Não serão reconhecidos tal
reivindicação ou exercício de soberania ou direitos de soberania nem tal apropriação.

116
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Todos os direitos sobre os recursos da Área pertencem à humanidade em geral, em cujo


nome, atuará a Autoridade. Esses recursos são inalienáveis. No entanto, os minerais
extraídos da Área só poderão ser alienados de conformidade com a presente Parte e com
as normas, regulamentos e procedimentos da Autoridade.
3. Nenhum Estado ou pessoa física ou jurídica poderá reivindicar, adquirir ou exercer
direitos relativos aos minerais extraídos da Área, a não ser de conformidade com a presente
Parte. De outro modo, não serão reconhecidos tal reivindicação, aquisição ou exercício de
direitos.

QUESTÕES
148. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) Segundo a CNUDM, todo Estado tem o dever de
fixar a largura do seu mar territorial em 12 milhas marítimas, medidas a partir de linhas de base determinadas
em conformidade com a CNUDM.
149. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) A área e seus recursos, nela compreendidos ainda
os recursos genéticos decorrentes da biodiversidade marinha para além dos limites de jurisdição nacional,
são considerados patrimônio comum da humanidade em conformidade com o art. 136 da CNUDM.
150. (MPF – 2013 – Procurador da República) Segundo a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar
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(UNCLOS Ou Convenção de Montego Bay) de 1982


a) as ilhas e os Estados arquipelágicos dispõem de zona econômica exclusiva de, no máximo, 12 milhas;
b) a zona econômica exclusiva coincide com a plataforma continental, ambas com limite extremo de 200
milhas;
c) Estados podem reivindicar soberania parcial sobre recursos do alto-mar, dependendo de acordo
multilateral;
d) a chamada zona contígua, de 12 milhas adjacentes ao mar territorial, coincide parcialmente com a zona
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econômica exclusiva que tem extensão de até 200 milhas a partir do limite do mar territorial.
151. (CESGRANRIO - 2018 – Transpetro) A denominada zona contígua compreende uma faixa, em milhas,
contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial. Essa faixa se estende
souza -- CPF:

das doze às:


a) quatorze milhas marítimas.
Marceli souza

b) dezoito milhas marítimas.


c) vinte milhas marítimas.
Marceli

d) vinte e quatro milhas marítimas.


e) vinte e oito milhas marítimas.
152. (CESGRANRIO - 2018 – Transpetro) Na Zona Econômica Exclusiva, a jurisdição brasileira abrange a
exploração prioritária das(os)
a) linhas de navegação.
b) coordenadas de sobrevoo.
c) recursos naturais.
d) dutos submarinos.
e) cabos aquáticos.
153. (CESPE/CEBRASPE - 2013 – ANP) A zona econômica exclusiva é situada além do mar territorial e a
este adjacente, não se estendendo além de 200 milhas marítimas das linhas de base, a partir das quais se
mede a extensão do mar territorial.
154. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados – Analista) A extensão do mar territorial,
excetuando-se o espaço aéreo sobrejacente, o seu leito e o subsolo, está compreendida na faixa de doze

117
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

milhas marítimas de largura, a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular que forma o mar
territorial brasileiro.
155. (FUMARC - 2009 - DPE-MG - Defensor Público) A soberania brasileira, em seu mar territorial, possui
as seguintes características:
I - Assegura o direito de pesca.
II - Permite a proteção da fauna e flora marítimas.
III - Estabelece marco de 18 milhas, para exclusividade de seu mar territorial.
IV - Assegura o direito à prospecção de petróleo.
Estão CORRETAS:
a) apenas I, II e III.
b) apenas II, III e IV.
c) apenas I, II e IV.
d) apenas I e III.
e) I, II, III, IV.

156. (TRF - 3ª REGIÃO - 2016 - TRF - 3ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Dadas as assertivas abaixo,
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assinale a alternativa correta. São bens da União:


I – O mar territorial, entendido como uma faixa de doze milhas marítimas de largura, medidas a partir da
linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala,
reconhecidas oficialmente no Brasil.
II – Os recursos naturais da plataforma continental, entendida como o subsolo das áreas submarinas que se
estendem além do seu mar territorial, em toda a extensão do prolongamento natural de seu território
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terrestre, até o bordo exterior da margem continental, ou até uma distância de cento e cinquenta milhas
marítimas das linhas de base, a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o
bordo exterior da margem continental não atinja essa distância.
III – Os recursos naturais da zona econômica exclusiva, entendida como uma faixa que se estende das doze
souza -- CPF:

às duzentas milhas marítimas, contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar
Marceli souza

territorial.
a) Estão corretas:
Marceli

b) I, II e III.
c) I e III.
d) II e III.
e) Apenas III.

157. (FEC - 2010 - MPA - Analista) A faixa que se estende das 12 (doze) às 200 (duzentas) milhas marítimas,
contadas a partir das linhas de base que servem para medir a largura do mar territorial, é denominada:
a) alto-mar.
b) zona econômica exclusiva.
c) mar territorial
d) plataforma continental.
e) bacia marinha.

158. (IDECAN - 2016 - Prefeitura de Cariacica) A Convenção de Montenegro Bay delimita três regiões
sobre as quais o país tem direitos: mar territorial, zona contígua e zona econômica exclusiva. De acordo com
o exposto, relacione adequadamente as regiões às suas respectivas características.
1. Mar territorial.

118
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Zona contígua.
3. Zona econômica exclusiva.
(...) Compreende uma faixa que se estende até 200 milhas náuticas, a partir do litoral, em que o Brasil exerce
soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, das águas
do mar e subsolo, para fins econômicos e de investigação científica.
(...) Compreende uma faixa de 12 milhas náuticas de largura, a partir do litoral continental e insular. O Brasil
tem soberania sobre essa faixa oceânica e o espaço aéreo correspondente, que são acrescidos ao território
continental.
(...) Abrange uma faixa de mais de 12 milhas a partir do limite do mar territorial. Nela, o país pode fiscalizar
navios e reprimir infrações cometidas de acordo com as leis brasileiras.
A sequência está correta em
a) 3, 2, 1.
b) 3, 1, 2.
c) 2, 1, 3.
d) 1, 2, 3.
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159. (CESPE/CEBRASPE - 2004 – DPU) O mar territorial é bem público de uso comum, de propriedade da
União, que compreende faixa de 200 milhas marítimas de largura a partir do litoral.

2.9. Nacionalidade

O tópico da nacionalidade é atinente tanto ao Direito Internacional quanto ao Direito Constitucional.


Em concursos públicos, a incidência maior é relacionada às normas constitucionais e nacionais sobre o tema,
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não obstante normas gerais (próprias do Direito Internacional) possam ser objeto de cobrança. Por esse
motivo, o presente tópico abrangerá de forma integrada as normas internacionais, constitucionais e
infraconstitucionais sobre o tema.
souza -- CPF:

2.9.1. Conceito
Marceli souza

Segundo Gilmar Ferreira Mendes (2020, p. 783), a nacionalidade configura vínculo político e pessoal
Marceli

que se estabelece entre o Estado e o indivíduo, fazendo com que este integre uma dada comunidade política
(povo).
A CIJ, no Caso Nottebohm, de 1953, trouxe conceituação análoga explicitando a necessidade de
ligação efetiva (que para alguns decorre do princípio da efetividade) para atribuição da nacionalidade pelo
Estado (MIRANDA, 2009, p. 220):

De acordo com as práticas dos Estados, de decisões arbitrais e judiciais e na opinião da


doutrina, nacionalidade é o vínculo legal que tem por base um fato social de ligação, com
uma conexão genuína da existência, interesses e sentimentos, junto com a existência
recíproca de direitos e deveres. Pode-se dizer que constitui a expressão jurídica do fato de
um indivíduo, a quem o vínculo é conferido, seja pelo Direito ou como resultado de um ato
de autoridade, ser de fato conectado intimamente com a população do Estado que a
conferiu do que de qualquer outro. (CIJ, 1955, p. 23) (tradução nossa)

Francisco Rezek (2018, p. 220) destaca que a própria definição do Estado é indissociável da ideia de
nacionalidade. Não se pode compreender a existência de um Estado cuja dimensão pessoal fosse composta
apenas por estrangeiros.

119
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.9.2. Espécies de nacionalidade

A doutrina distingue em duas espécies a nacionalidade, podendo ela ser primária ou secundária:

• Primária (originária, de origem, involuntária, de 1º grau, nata): imposta de forma unilateral pelo
Estado, no momento do nascimento. Cada Estado adota o critério que melhor lhe convir para a
outorga da nacionalidade. O indivíduo a adquire independentemente de sua vontade.
• Secundária (adquirida, voluntária, por aquisição, de 2º grau, por naturalização): é aquela
adquirida por um ato volitivo do agente, após o nascimento, através da naturalização, que poderá
ser requerida tanto por estrangeiros quanto pelos heimatlos (apátridas ou anacionais), isto é, os
indivíduos que não têm pátria (trata-se de um conflito negativo de nacionalidade). Pode ser
dividida nas seguintes hipóteses:
▪ ordinária: trata-se de uma faculdade do Estado concedente e não um direito público
subjetivo do pleiteante; por mais que o naturalizando preencha os requisitos, o ato será
discricionário. No Brasil, esta nacionalidade pode ser adquirida, nos termos da Constituição
de 1988, nas seguintes hipóteses:
o todos os estrangeiros, com exceção dos originários de países de língua portuguesa;
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o todos os originários de países de língua portuguesa;


o hipóteses legais (naturalizações especiais e provisória nos termos da Lei 13.445/17 –
Lei da Migração).
▪ extraordinária: trata-se de um direito público subjetivo do requerente. Preenchidos os
requisitos, ele terá direito à naturalização, que estará condicionada apenas ao seu pedido.
Essa espécie de nacionalidade é também denominada de “nacionalidade potestativa”.
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ATENÇÃO!
É comum, mas tecnicamente incorreto, o estudo da situação dos portugueses residentes no país
como uma espécie de nacionalidade secundária. Contudo, como se verá, não se trata de nacionalidade
souza -- CPF:

naturalizada, nem mesmo impossibilita o pedido de naturalização por parte do português.


Marceli souza

A Constituição brasileira manteve o modelo de enunciar separadamente as hipóteses de aquisição


da nacionalidade primária (CF/88, art. 12, I) da secundária (CF/88, art. 12, II).
Marceli

CUIDADO!
A polipatria ou multinacionalidade (popularmente chamada de dupla nacionalidade) é, de regra, a
concomitância de nacionalidades primárias. Mais de um Estado, adotando critérios distintos, reconhecem
a nacionalidade originária de um mesmo indivíduo

2.9.3. Nacionalidade originária

Francisco Rezek (2018, p. 225) explica que, em princípio, os Estados têm liberdade para determinar,
por meio de seu direito interno, os critérios para a definição de seus nacionais. Porém, esse status só poderá
ser oponível aos demais Estados quando houver um mínimo de efetividade nessa definição (como
nascimento, filiação, tempo de residência ou vínculo familiar superveniente). Ademais, a mesma filiação veda
a subtração e nacionalidade da mulher em razão de eventual mudança de nacionalidade do marido ou como
consequência de contrair núpcias com um estrangeiro.
Os critérios de atribuição de nacionalidade originária são, basicamente dois, o jus (ius) soli e o jus
(ius) sanguinis.

120
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Jus sanguinis: o que interessa para a aquisição da nacionalidade é o sangue, a filiação, a


ascendência, pouco importando o local onde o indivíduo nasceu (hereditariedade);
• Jus soli: também chamado de critério da territorialidade, o que importa para a definição e
aquisição da nacionalidade é o local de nascimento, e não a ascendência.

A Constituição da República adotou o jus soli como critério base. Contudo, a regra é atenuada ou
temperada em diversas situações, adotando-se o critério do jus sanguinis acrescido de um ou mais requisitos.
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 241) destaca que as hipóteses de aquisição da nacionalidade
originária na Constituição da República estão previstas de forma exaustiva:

Art. 12. São brasileiros:


I - natos:
a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que
estes não estejam a serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles
esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam
registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República
Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela
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nacionalidade brasileira; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 54, de 2007)

No art. 12, I, a, da CF/88, o constituinte adotou critério tradicional no ordenamento constitucional


brasileiro, qual seja o ius solis ou critério da territorialidade.
Por isso, afirma Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 241), para ser brasileiro nato basta ter nascido
no território brasileiro, independentemente da nacionalidade dos pais ou ascendentes.
A única exceção à aplicabilidade do critério da territorialidade, que exclui a nacionalidade brasileira
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originária da criança, refere-se a ela ser filha de pais estrangeiros que estejam a serviço de seu país. Jorge
Miranda (2009, p. 220) explica que, nessa situação, a exclusão da nacionalidade se dá em função da ausência
de ligação efetiva do Estado do território com os agentes públicos a serviço de seu Estado estrangeiro.
Como bem aponta Alexandre de Morais (2020, ebook, p. 242), a Constituição não adotou pura e
souza -- CPF:

simplesmente o critério do ius sanguinis para exclusão da nacionalidade brasileira, mas da conjugação de
dois requisitos:
Marceli souza

• Ambos os ascendentes serem estrangeiros;


Marceli

• Pelo menos um deles estar a serviço de seu país de origem. Não basta, portanto, espécie de
serviço particular ou serviço público para um terceiro país.

Caso sejam cumpridas as condicionantes, é possível afirmar que a criança não será brasileira nata.
Isso não quer dizer, no entanto, que é possível aferir se ele será da nacionalidade de seus ascendentes, pois
depende dos critérios escolhidos pelo Estado de origem.

CUIDADO!
Gilmar Ferreira Mendes (2018, p. 758) aponta que o texto constitucional não teria abarcado
situações como o nascimento em espaços hídricos, aéreos ou terrestres não submetidos à soberania do
Estado brasileiro. Daí, o autor parece adotar a posição de Pontes de Miranda que considerava brasileiros
natos os nascidos a bordo de navios ou aeronave de bandeira brasileira quando estiverem em espaço
neutro. Francisco Rezek (2018, p. 228), Bernardo Gonçalves Fernandes (2017, p. 741), Pedro Lenza (2020,
p. 1.373) e Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 242), adotando a mesma linha de entendimento,
consideram como território nacional:
• terras delimitadas pelas fronteiras;

121
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• navios e as aeronaves de guerra brasileiros, onde quer que se encontrem;


• navios mercantes brasileiros em alto mar ou de passagem em mar territorial estrangeiro;
• as aeronaves civis brasileiras em voo sobre o alto mar ou de passagem sobre águas territoriais
ou espaços aéreos estrangeiros.
Não obstante a posição dos ilustres doutrinadores (excluindo Gilmar Mendes, que suprimiu essa
passagem na versão 2020 de seu manual), como já mencionado acima, navios de guerra ou mercantes além
dos limites do mar territorial brasileiro não fazem parte do território do Estado. Portanto, não há de se
confundir a extraterritorialidade da lei penal, o estatuto jurídico de determinados espaços (como as
embaixadas, que se verá a seguir) com o território do Estado.
Ademais, como destacam Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 510) um Estado
pode até estender suas leis para fora de seu território, contudo, os outros Estados devem admitir a
aplicação dessas leis em seu território, isto é, os Estados podem opor-se a aplicação dessas normas.
Do ponto de vista constitucional é sempre bom lembrar que é a legislação infraconstitucional deve
ser lida conforme à Constituição e não o contrário, a Constituição, portanto, não deve “ser lida conforme o
Código Penal”.
Logo, caso alguém nasça em um navio de pavilhão brasileiro, em alto-mar, ele terá nascido no
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exterior, podendo ser a criança brasileira nata com base nas alíneas “b” ou “c” do inciso I, do art. 12 da
Constituição, mas não com base na alínea “a”.
Em concursos públicos, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, na prova para Juiz do Trabalho
de 2012 considerou correta a alternativa que espelhava a opinião majoritária dos constitucionalistas citados
acima. Portanto, há de se ter cuidado em relação ao tema. Caso ocorra uma nova incidência, há de se
distinguir se a prova é de direito constitucional ou de direito internacional. Em caso de dúvida, adotar a
posição majoritária, principalmente em direito constitucional.
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Art. 12. São brasileiros:


I - natos: (...)
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles
esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
souza -- CPF:

Na hipótese da alínea “b” do art. 12, I, há a eleição pelo critério do ius sanguinis de forma temperada,
Marceli souza

uma vez que há a necessidade de outro requisito específico, ou critério funcional — denominação dada por
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 242), qual seja, a necessidade do pai ou de mãe brasileiros (natos ou
Marceli

naturalizados) estarem a serviço do Brasil.


A expressão “a serviço da República Federativa do Brasil” deve ser entendida de forma ampla,
abarcando qualquer função relacionada às pessoas jurídicas de direito público da União, Estados e
Municípios.
Para Francisco Rezek (2018, p. 230), a norma constitucional deve ser interpretada de forma
ampliativa, abarcando o serviço prestado à organização internacional de que o Brasil faça parte,
independentemente de o agente ter sido designado ou não pelos órgãos governamentais brasileiros.

Art. 12. São brasileiros:


I - natos: (...)
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam
registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República
Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela
nacionalidade brasileira; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 54, de 2007)

O art. 12, I, “c”, abarca duas hipóteses de nacionalidade originária:


1ª. Os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileiros, desde que registrados em repartição
competenteꓼ ou

122
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2ª. Os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileiros que não tenham sido registrados em
repartição competente, mas venham residir no Brasil e optem pela nacionalidade brasileira a
qualquer tempo, após atingida a maioridade (nacionalidade postestativa), segundo Alexandre
de Moraes (2020, ebook, p. 243).

O assento de nacionalidade lavrado no exterior possui a mesma eficácia jurídica daqueles


formalizados no Brasil por oficiais do registro civil das pessoas naturais, não havendo necessidade de
qualquer opção a posteriori. Para Gilmar Mendes (2020, p. 761), a EC n.º 54/07 restabeleceu, de forma
expressa, um modelo procedimental indispensável para dar consistência ao sistema jus sanguinis consagrado
na teoria do Direito Constitucional brasileiro.
A EC n.º 54/07, em relação à matéria, trouxe norma temporária para regulamentar as situações
ocorridas entre 7 de junho de 1994 e 20 de setembro de 2007, acrescentando o artigo 95 ao ADCT. Os
nascidos no estrangeiro nesse período, filhos de pai brasileiro ou mãe brasileira, poderão ser registrados em
repartição diplomática ou consular brasileira competente ou em ofício de registro, se vierem a residir na
República Federativa do Brasil.
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 247) afirma que, em relação àqueles nascidos nesse período
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e que vierem a residir no Brasil, há hipótese excepcional e temporária diferente da nacionalidade potestativa,
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pois não se exige a opção. Dessa forma, essa hipótese exige os seguintes requisitos:

• Nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou mãe brasileira (ius sanguinis);


• Pai brasileiro ou mãe brasileira que não estivessem a serviço do Brasil;
• Período de nascimento compreendido entre 7 de junho de 1994 e 20 de setembro de 2007;
• Fixação de residência a qualquer tempo;
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• Registro em ofício de registro, não havendo a necessidade de opção.

Quanto à nacionalidade postestativa, na vigência da Constituição de 1967/696, havia a previsão para


sua aquisição aos nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira, embora não a serviço do país, devendo,
souza -- CPF:

contudo, serem supridos os seguintes requisitos:


Marceli souza

• Nascidos de pai brasileiro ou mãe brasileira;


• Que nenhum dos pais estivesse a serviço do Brasil;
Marceli

• Inocorrência do registro na repartição competente;


• Fixação de residência antes da maioridade;
• Realização da opção até quatro anos após a aquisição da maioridade.

A Constituição de 1988, em sua redação original, deixou de fixar prazo para a realização da opção.
Assim, condicionou-se à aquisição da nacionalidade originária aos seguintes requisitos:

• Nascidos de pai brasileiro ou mãe brasileira;


• Que nenhum dos pais estivesse a serviço do Brasil;
• Inocorrência do registro na repartição competente;
• Fixação de residência antes da maioridade;
• Realização da opção a qualquer tempo.

6 Como há divergência doutrinária sobre a natureza jurídica da Emenda Constitucional n.º 1/69, recomenda-se a utilização do termo
“1967/69” para se evitar polêmicas desnecessárias em provas subjetivas.

123
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Com a Emenda Constitucional de Revisão n.º 3, houve nova alteração, deixando-se de exigir prazo
para a fixação de residência no Brasil. Assim, restaram como requisitos:

• Nascidos de pai brasileiro ou mãe brasileira;


• Que nenhum dos pais estivesse a serviço do Brasil;
• Inocorrência do registro na repartição competente;
• Fixação de residência a qualquer tempo;
• Realização da opção a qualquer tempo.

Finalmente, com a Emenda Constitucional n.º 54/07, o texto constitucional passou a fixar o termo
inicial para a realização da opção. Assim, atualmente os requisitos são:

• Nascidos de pai brasileiro ou mãe brasileira;


• Que nenhum dos pais estivesse a serviço do Brasil;
• Inocorrência do registro na repartição competente;
• Fixação de residência a qualquer tempo;
• Realização da opção, após a maioridade, a qualquer tempo.
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Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 244) define opção como a declaração unilateral de vontade
de conservar a nacionalidade brasileira primária. Segundo o autor, a criança ao fixar residência adquiriria a
nacionalidade brasileira de forma provisória, que seria condicionada com a opção feita a partir da
maioridade.

2.9.4. Nacionalidade secundária


CPF: 073.496.444-77

O brasileiro naturalizado é aquele que adquire a nacionalidade brasileira de forma secundária, ou


seja, não pela ocorrência de um fato natural, mas por um ato voluntário.
Segundo destaca Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 247), a naturalização é o único meio derivado
souza -- CPF:

de aquisição de nacionalidade, permitindo-se ao estrangeiro (que detém outra nacionalidade, ou apátrida)


Marceli souza

assumir a nacionalidade do país em que se encontra, mediante a satisfação de requisitos constitucionais


legais.
Marceli

A naturalização deve ser requerida pelo interessado em petição dirigida ao Ministro da Justiça,
apresentada no caso o Departamento de Polícia Federal competente, que procederá a sindicância sobre a
vida pregressa do naturalizando e opinará quanto à conveniência da naturalização. Os requisitos da petição,
bem como os requisitos da naturalização estão previstos no artigo 65 e seguintes da Lei n.º 13.445/2017 (Lei
de Migração). Ao final, o Ministro da Justiça emitirá portaria para a concessão da nacionalidade brasileira ao
estrangeiro. Da decisão que nega o pedido, caberá apenas pedido de reconsideração.
A portaria de naturalização gerará a emissão, pelo Ministério da Justiça, de certificado de
naturalização, o qual será entregue em solenidade na (1ª Vara, se houver) da (sub)seção judiciária da Justiça
Federal que abranja o domicílio do interessado.
A naturalização perderá efeito, porém, se o certificado não for solicitado pelo interessado no prazo
de doze meses, contados da data da publicação do ato, salvo por motivo de força maior, devidamente
comprovado.
A naturalização é personalíssima, não gerando efeitos aos seus familiares, não alterando, ainda, sua
situação jurídica no Brasil.
Importante destacar que a naturalização não extingue a responsabilidade civil ou penal do
naturalizado em outro Estado, inclusive o de origem.

124
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.9.4.1 Espécies de naturalização

Destaca Alexandre de Moraes que doutrinariamente a naturalização pode ser dividida em tácita ou
expressa, sendo esta última subdividida em ordinária ou extraordinária.
A naturalização tácita foi prevista na Constituição de 1891, que em seu artigo 69, § 4º, previu que os
estrangeiros que se encontravam no Brasil na data da Proclamação da República teriam seis meses para
declarar que não desejavam a nacionalidade brasileira.
Segundo Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 248), a tradição constitucional foi mantida nos textos
constitucionais posteriores até ser suprimida pelo constituinte de 1988. O autor destaca, ainda, que o citado
dispositivo, quando aplicado aos pais, estendia-se igualmente aos filhos menores em sua companhia.
Atualmente é possível afirmar que no Brasil existe apenas a naturalização expressa, isto é, a que
depende de requerimento (escrito) do interessado, demonstrando sua vontade em adquirir a nacionalidade
brasileira. A naturalização expressa é dividida em ordinária, extraordinária, especial e provisória:

Art. 64. A naturalização pode ser:


I - ordinária;
II - extraordinária;
III - especial; ou
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IV - provisória.

A lei subdivide a naturalização ordinária em duas hipóteses:

• Estrangeiros, excluídos os ordinários de língua portuguesa e os apátridas;


• Estrangeiros originários de países de língua portuguesa.

Em relação aos estrangeiros, excluídos os ordinários de língua portuguesa e os apátridas, o artigo 65


CPF: 073.496.444-77

da Lei de Migração prevê os seguintes requisitos:

Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes
condições:
souza -- CPF:

I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira;


II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos;
Marceli souza

III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e


IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.
Marceli

A Constituição, em seu art. 12, II, “a”, dispõe que para os estrangeiros provenientes de países de
língua portuguesa o prazo de residência no Brasil será de 1 ano, exigindo-se, ainda, idoneidade moral.
Ademais, Alexandre de Morais (2020, ebook, p. 250) entende ser necessário o cumprimento do requisito
implícito da capacidade civil, pois a aquisição da nacionalidade secundária decorre de um ato de vontade.
A Lei de Migrações (Lei n.º 13.445/2017), por sua vez, também reduz o prazo de residência nas
hipóteses previstas no artigo 66:

Art. 66. O prazo de residência fixado no inciso II do caput do art. 65 será reduzido para, no
mínimo, 1 (um) ano se o naturalizando preencher quaisquer das seguintes condições:
I - (VETADO);
II - ter filho brasileiro;
III - ter cônjuge ou companheiro brasileiro e não estar dele separado legalmente ou de fato
no momento de concessão da naturalização;
IV - (VETADO);
V - haver prestado ou poder prestar serviço relevante ao Brasil; ou
VI - recomendar-se por sua capacidade profissional, científica ou artística.
Parágrafo único. O preenchimento das condições previstas nos incisos V e VI do caput será
avaliado na forma disposta em regulamento.

125
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Importante destacar novamente que a satisfação dos requisitos não assegura a nacionalização do
estrangeiro, uma vez que a concessão da nacionalidade é ato discricionário do Poder Executivo.
A naturalização especial poderá ser concedida ao estrangeiro que se encontre em uma das seguintes
situações previstas no art. 68 da Lei n.º 13.445/2017, cumpridos os requisitos do art. 69 da lei:

Art. 68. A naturalização especial poderá ser concedida ao estrangeiro que se encontre em
uma das seguintes situações:
I - seja cônjuge ou companheiro, há mais de 5 (cinco) anos, de integrante do Serviço Exterior
Brasileiro em atividade ou de pessoa a serviço do Estado brasileiro no exterior; ou
II - seja ou tenha sido empregado em missão diplomática ou em repartição consular do
Brasil por mais de 10 (dez) anos ininterruptos.

Art. 69. São requisitos para a concessão da naturalização especial:


I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira;
II - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e
III - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.

A Lei de Migração prevê ainda a naturalização provisória, na seguinte hipótese:

Art. 70. A naturalização provisória poderá ser concedida ao migrante criança ou


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adolescente que tenha fixado residência em território nacional antes de completar 10 (dez)
anos de idade e deverá ser requerida por intermédio de seu representante legal.
Parágrafo único. A naturalização prevista no caput será convertida em definitiva se o
naturalizando expressamente assim o requerer no prazo de 2 (dois) anos após atingir a
maioridade.

Pedro Lenza (2020, p. 1.378) destaca que a naturalização provisória substituiu a radicação precoce
prevista na Constituição de 1967/69 e no revogado Estatuto do Estrangeiro, com a diferença de que no texto
anterior a idade era de até 5 anos de idade e não 10 anos como o atual texto legal.
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Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 251) explica que a previsão da naturalização extraordinária
foi uma inovação na ordem constitucional brasileira trazida pelo constituinte de 1988. Para o autor, o poder
constituinte criou um direito subjetivo ao estrangeiro que cumprir as exigências constitucionais ao prever o
souza -- CPF:

termo “desde que requeiram” para a aquisição da naturalização, além de presentes os requisitos. No mesmo
sentido, Celso Bastos, José Afonso da Sila, João Grandino Rodas e Jacob Dolinger afirmam a criação de uma
Marceli souza

nova figura de naturalização, independentemente do poder discricionário do Estado.


Marceli

Em sua redação originária, a CF/88 previa que seriam considerados brasileiros naturalizados os
estrangeiros residentes no país há mais de 30 anos, sem condenação penal, desde que fizessem o
requerimento. A Emenda Constitucional de Revisão n.º 3 diminuiu o prazo do art. 12, II, “c” da Constituição
de 30 para 15 anos de residência ininterrupta.
A ausência temporária do estrangeiro do território brasileiro durante esse período não significa a
ruptura da residência.

2.9.4.2. A quase-nacionalidade (os portugueses equiparados)

A Constituição garante aos portugueses a aquisição da nacionalidade brasileira, exigindo apenas os


requisitos de residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral (conforme regra geral do art. 12, II, ‘a’).
Porém, além da possibilidade de naturalização, o art. 12, § 1º da Constituição, prevê aos portugueses
com residência permanente no país, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros residentes em
Portugal, serem atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro naturalizado:

Art. 12 (...)
§ 1º Aos portugueses com residência permanente no País, se houver reciprocidade em favor
de brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvo os casos previstos
nesta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 1994)

126
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Assim, há duas hipóteses previstas para os portugueses:

1ª. A aquisição da nacionalidade derivada: seguindo o procedimento e requisitos para os estrangeiros


originários de língua portuguesa; e
2ª. Aquisição da equiparação com brasileiro naturalizado, sem que ocorra a perda da nacionalidade
portuguesa, também denominada de quase nacionalidade.

Na segunda hipótese, é importante destacar a condição/cláusula de reciprocidade (cláusula do ut


des) em favor de brasileiros. Só serão atribuídos, aos portugueses com residência permanente no Brasil, “os
mesmos direitos inerentes aos brasileiros naturalizados” se os brasileiros residentes em Portugal tiverem
mesmo tratamento.

UM PORTUGUÊS EQUIPARADO PODE PROPOR UMA AÇÃO POPULAR?


Não, considerando-se que não há em Portugal a possibilidade de um brasileiro propor uma ação de
mesma natureza. Portanto, a negativa não está no exercício dos direitos políticos, mas, sim, pela ausência
de reciprocidade.
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Ademais, esse status não é adquirido de forma automática, sendo necessário procedimento
administrativo próprio em que o Estado brasileiro manifesta sua aquiescência, reconhecendo que o
pleiteante cumpriu todos os requisitos letais para tanto.
A Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses, firmada em
7/9/1971, foi substituída por novo tratado bilateral que entrou em vigor em 2001 (Decreto n.º 3.927/2001).
Importante observar que não se trata de uma dupla cidadania ou uma cidadania comum luso-
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brasileira. Os portugueses no Brasil continuam portugueses e os brasileiros em Portugal, brasileiros.


O benefício da igualdade só será extinto no caso de expulsão ou de perda da nacionalidade
portuguesa. Verificada a perda de direitos políticos em Portugal haverá igualmente a perda desses direitos
no Brasil.
souza -- CPF:

2.9.5. Tratamento diferenciado entre brasileiro nato e naturalizado


Marceli souza

A Constituição da República, em virtude do princípio da igualdade, determina que a lei não poderá
Marceli

estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, exceto nas hipóteses previstas na Constituição:
cargos, função, extradição e propriedade de empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de sons e
imagens.
Em relação à expulsão, o art. 5º, LI, da Constituição dispõe que:

Art. 5º (...)
LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum,
praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, na forma da lei;

Do dispositivo constitucional pode-se chegar as seguintes conclusões:

• O brasileiro nato nunca será extraditado;


• O brasileiro naturalizado somente poderá ser extraditado quando:
▪ Praticou crime comum antes da naturalização; ou
▪ Restou comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na
forma da lei, não importando o momento da prática do ato.

127
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Como bem aponta Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 102), o português abarcado pelo Tratado
de Cooperação, Amizade e Consulta Brasil/Portugal, por ter, em regra, todos os direitos dos brasileiros
naturalizados, poderá ser extraditado nas hipóteses previstas no art. 5º, LI, para Portugal.

ATENÇÃO!
As medidas de expulsão e deportação são tomadas por um Estado em relação a estrangeiros.
A expulsão é a retirada compulsória do estrangeiro do território de um Estado em razão da entrada
ou permanência irregular, ou em função da prática de um ato atentatório à ordem pública do país. Já a
deportação é a devolução do estrangeiro ao exterior, sem que ele tenha praticado um delito no território
do Estado.
O brasileiro naturalizado não é estrangeiro e, por isso, não poderá ser expulso ou deportado do Brasil,
mesmo porque a expulsão de um brasileiro equivaleria ao seu banimento, que é expressamente vedado no
art. 5º, XLVII, “d”, da CF/88.

A Constituição prevê ainda em seu art. 12, § 3º, os cargos privativos de brasileiros natos:

Art. 12 (...)
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§ 3º São privativos de brasileiro nato os cargos:


I - de Presidente e Vice-Presidente da República;
II - de Presidente da Câmara dos Deputados;
III - de Presidente do Senado Federal;
IV - de Ministro do Supremo Tribunal Federal;
V - da carreira diplomática;
VI - de oficial das Forças Armadas.
VII - de Ministro de Estado da Defesa. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)
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As distinções do art. 12, § 3º, têm como justificativa a linha sucessória do Presidente da República e
a segurança nacional (MORAES, 2020, ebook, p. 254).
No que diz respeito à linha sucessória, os arts. 79 e 80 da CF/88 preveem que substituirão o
Presidente, no caso de impedimento, e sucederão, na hipótese de vaga, o Vice-Presidente, o presidente da
souza -- CPF:

Câmara dos Deputados, o presidente do Senado Federal e o presidente do Supremo Tribunal Federal (cuja
presidência pode ser ocupada por qualquer dos Ministros).
Marceli souza

No que tange à segurança nacional, vedou-se aos brasileiros naturalizados as funções exercidas pelos
Marceli

diplomatas (e não de chancelaria), oficiais das Forças Armadas e de Ministro da Defesa, que, em virtude de
suas posições estratégicas nos negócios do Estado, mereceram maior atenção por parte do legislador
constituinte.
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 254) ressalta que, apesar de a Constituição ressalvar a carreira
diplomática, não há impedimento em relação a um brasileiro naturalizado ocupar o cargo de Ministro das
Relações Exteriores.
O rol do art. 12, § 3º, da Constituição é taxativo, não sendo possível sua ampliação por meio de
normas infraconstitucionais.
A Constituição Federal, em seu art. 89, VII, prevê que apenas brasileiros natos poderão exercer a
função de conselheiros do Presidente da República no Conselho da República, órgão consultivo que se
manifesta de forma opinativa nas hipóteses de intervenção federal, estado de sítio, estado de defesa ou
questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas.
Pela redação originária da Constituição de 1988, a propriedade de empresa jornalística e de
radiodifusão e de sons e imagens era, por regra geral, privativa de pessoas físicas (brasileiros natos ou
naturalizados há mais de 10 anos), vedando-se a participação de pessoa jurídica no capital social da empresa.
Com a redação da EC n.º 36/02, a Constituição dispõe que a propriedade de empresa jornalística e de
radiodifusão sonora e de sons e imagens é privativa:

128
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• de brasileiros natos;
• de brasileiros naturalizados há mais de 10 anos; ou
• de pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede no País.

2.9.6. Perda e reaquisição da nacionalidade

As hipóteses de perda da nacionalidade estão taxativamente dispostas nos incisos I e II do § 4º, art.
12 da CF/88, sendo absolutamente vedada ao legislador ordinário sua ampliação:

Art. 12 (...)
§ 4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva
ao interesse nacional;
II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: (Redação dada pela Emenda
Constitucional de Revisão nº 3, de 1994)
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira; (Incluído pela
Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 1994)
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado
estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de
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direitos civis; (Incluído pela Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 1994)

A hipótese do art. 12, § 4º, I, é também denominada de perda-punição. Tem por pressuposto o
cancelamento da naturalização pela prática de atividade nociva ao interesse nacional.
A forma pela qual a perda ocorrerá será por sentença judicial transitada em julgado.
O procedimento da denominada ação de cancelamento de naturalização era disposto nos arts. 24 a
34 da Lei n.º 818/1949, revogada pela Lei de Migração. A nova lei não traz o procedimento da ação, que
CPF: 073.496.444-77

deverá ser proposta pelo Ministério Público Federal, imputando ao brasileiro naturalizado a prática de
atividade nociva ao interesse nacional.
Os efeitos da sentença judicial que decreta a perda da nacionalidade são ex nunc, ou seja,
prospectivos ou pro futuro, somente atingindo a relação jurídica indivíduo-Estado, após o trânsito em
souza -- CPF:

julgado.
Nos termos do art. 75, parágrafo único, da Lei de Migração, o risco de apatridia deve ser levado em
Marceli souza

consideração no momento da prolação da sentença:


Marceli

Art. 75. O naturalizado perderá a nacionalidade em razão de condenação transitada em


julgado por atividade nociva ao interesse nacional, nos termos do inciso I do § 4º do art. 12
da Constituição Federal.
Parágrafo único. O risco de geração de situação de apatridia será levado em consideração
antes da efetivação da perda da nacionalidade.

Uma vez perdida a nacionalidade, somente é possível readquiri-la por meio de ação rescisória e
nunca por novo procedimento de naturalização, pois, segundo Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 257),
estar-se-ia burlando a previsão constitucional.
A segunda hipótese de perda da nacionalidade é chamada de perda-mudança. Ela ocorre quando o
brasileiro (nato ou naturalizado) voluntariamente adquire outra nacionalidade.
Ao contrário do cancelamento da naturalização, que ocorrerá em processo judicial, a perda da
nacionalidade, em decorrência da aquisição de outra, dar-se-á por decreto do Presidente da República, após
procedimento administrativo (assegurada a ampla defesa).
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 258) destaca que os requisitos previstos na Constituição para
que seja levada a termo são:

• Voluntariedade da conduta;

129
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Capacidade civil do interessado;


• Aquisição da nacionalidade estrangeira.

Gilmar Ferreira Mendes (2020, p. 787) destaca que a perda da nacionalidade brasileira, em razão da
obtenção de outra, só ocorrerá na hipótese de uma conduta ativa e específica por parte do brasileiro, não
podendo decorrer de simples reconhecimento da nacionalidade originária pela lei estrangeira. Por essa
razão, a CF/88 — após a redação dada ao art. 12, § 4º, II, pela ECR n.º 3/94 — estabeleceu duas hipóteses
em que a aquisição de outra nacionalidade (dupla nacionalidade) não implicará a perda da brasileira:
• Reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira: ou seja, aquela adquirida com
o nascimento;
• Imposição de naturalização pela norma estrangeira: o brasileiro residente em Estado estrangeiro
e que, como condição para sua permanência naquele país, ou para o exercício de direitos civis,
tiver que se naturalizar.
Para Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 258), os efeitos do Decreto Presidencial que estabelece
a perda da nacionalidade são ex nunc, ou seja, não são retroativos, atingindo somente a relação jurídica
indivíduo-Estado, após sua edição. Gilmar Ferreira Mendes (2020, p. 787), por sua vez, coaduna com o
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entendimento de Francisco Rezek (2018, p. 230) e destaca que o ato do Presidente da República que declara
a perda da nacionalidade é meramente declaratório, pois a perda se deu com a própria naturalização. O
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MS 33.864, adotou a segunda posição.
Alexandre de Moraes (2020, ebook, p. 258) ressalta que, mesmo na hipótese do brasileiro nato que
se vê privado da nacionalidade originária, tornando-se, pois, estrangeiro, somente poderá haver a
reaquisição sob forma derivada, mediante processo de naturalização, tornando-se brasileiro naturalizado.
O art. 76 da Lei de Migração dispôs o seguinte sobre o assunto:
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Art. 76. O brasileiro que, em razão do previsto no inciso II do § 4º do art. 12 da Constituição


Federal, houver perdido a nacionalidade, uma vez cessada a causa, poderá readquiri-la ou
ter o ato que declarou a perda revogado, na forma definida pelo órgão competente do
Poder Executivo.
souza -- CPF:

Ocorre que o Decreto n.º 9.199/2017 inseriu, em seu art. 254, § 7º, que a reaquisição da
Marceli souza

nacionalidade geraria o retorno da nacionalidade originária:


Marceli

Art. 254. O brasileiro que houver perdido a nacionalidade, em razão do disposto no inciso
II do § 4º do art. 12 da Constituição, poderá, se cessada a causa, readquiri-la ou ter revogado
o ato que declarou a sua perda. (...)
§ 7º O deferimento do requerimento de reaquisição ou a revogação da perda importará no
restabelecimento da nacionalidade originária brasileira.

É importante destacar que o referido decreto inova no mundo jurídico, pois prevê um direito que
não foi previsto pela Lei de Migração e muito menos pela Constituição. Conferir o status de brasileiro nato é
retroagir todos os direitos ao momento do nascimento do solicitante, o que seria incompatível com a própria
hipótese de perda da nacionalidade.

CASO PARADIGMÁTICO
Quando do julgamento do MS 33.864, a imprensa nacional noticiou que o STF teria decidido pela
extradição de uma “brasileira nata”. Ocorre que, no caso concreto, considerou-se que a extraditanda não
era mais brasileira, pois perdera a nacionalidade em razão de sua naturalização voluntária. Logo, ao
contrário do noticiado, o Supremo Tribunal Federal extraditou uma americana e não uma brasileira:
Brasileira naturalizada americana. Acusação de homicídio no exterior. Fuga para o Brasil. Perda de nacionalidade
originária em procedimento administrativo regular. Hipótese constitucionalmente prevista. Não ocorrência de

130
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

ilegalidade ou abuso de poder. (...) A CF, ao cuidar da perda da nacionalidade brasileira, estabelece duas hipóteses: (i)
o cancelamento judicial da naturalização (art. 12, § 4º, I); e (ii) a aquisição de outra nacionalidade. Nesta última
hipótese, a nacionalidade brasileira só não será perdida em duas situações que constituem exceção à regra: (i)
reconhecimento de outra nacionalidade originária (art. 12, § 4º, II, a); e (ii) ter sido a outra nacionalidade imposta pelo
Estado estrangeiro como condição de permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis (art. 12, § 4º,
II, b). No caso sob exame, a situação da impetrante não se subsume a qualquer das exceções constitucionalmente
previstas para a aquisição de outra nacionalidade, sem perda da nacionalidade brasileira. [MS 33.864, rel. min.
Roberto Barroso, j. 19-4-2016, 1ª T, DJE de 20-9-2016.]

QUESTÕES
160. (VUNESP - 2019 - TJ-RJ - Juiz Substituto) No tocante à extradição de brasileiros, a Carta Magna
estabelece que
a) é vedada para os natos e permitida para os naturalizados, independentemente do crime, desde que
praticado antes da naturalização.
b) é vedada para os natos e naturalizados, independentemente do crime praticado.
c) é permitida para os natos, por comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, na forma da lei, e para os naturalizados, por crimes comuns praticados antes da naturalização.
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d) é vedada para os natos e permitida para os naturalizados por crimes comuns, praticados antes da
naturalização ou por comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma
da lei.
e) é vedada para os natos e permitida para os naturalizados por crimes comuns e por comprovado
envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei, desde que praticados antes
da naturalização.
CPF: 073.496.444-77

161. (UEG - 2018 - PC-GO - Delegado de Polícia, adaptada) É possível, segundo a Constituição (CRFB) e o
Supremo Tribunal Federal (STF) a extradição de brasileiro naturalizado em caso de crime comum, praticado
depois da naturalização, mas o estrangeiro não será extraditado por crime político ou de opinião.
162. (UEG - 2018 - PC-GO - Delegado de Polícia, adaptada) É possível, segundo a Constituição (CRFB) e o
souza -- CPF:

Supremo Tribunal Federal (STF) a extradição de brasileiro naturalizado em caso de crime comum, praticado
Marceli souza

antes da naturalização, mas o brasileiro nato nunca poderá ser entregue pelo Brasil a outro país.
Marceli

163. (FUMARC - 2018 - PC-MG - Delegado de Polícia Substituto) NÃO constitui cargo privativo de brasileiro
nato:
a) Ministro de Estado da Defesa.
b) Oficial das Forças Armadas.
c) Presidente da Câmara dos Deputados.
d) Senador da República.
164. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - PJC-MT - Delegado de Polícia Substituto) O boliviano Juan e a argentina
Margarita são casados e residiram, por alguns anos, em território brasileiro. Durante esse período, nasceu,
em território nacional, Pablo, o filho deles. Nessa situação hipotética, de acordo com a CF, Pablo será
considerado brasileiro
a) naturalizado, não podendo vir a ser ministro de Estado da Justiça.
b) nato e poderá vir a ser ministro de Estado da Defesa.
c) nato, mas não poderá vir a ser presidente do Senado Federal.
d) naturalizado, não podendo vir a ser presidente da Câmara dos Deputados.
e) naturalizado e poderá vir a ocupar cargo da carreira diplomática.

131
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

165. (TRF - 2ª Região - 2017 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Analise as assertivas abaixo e, ao
final, assinale a opção correta:
I — Incorre em causa de perda de nacionalidade o brasileiro nato que, já sendo milionário e exclusivamente
por ter se apaixonado pelos céus de Paris, obtém a nacionalidade francesa, por naturalização;
II — Incorre em causa de perda de nacionalidade o brasileiro que tiver reconhecida outra nacionalidade
originária por Estado estrangeiro;
III - Sujeito nascido no estrangeiro, filho de mãe brasileira e de pai estrangeiro, que veio a residir no território
brasileiro e aqui, após a maioridade, optou e adquiriu a nacionalidade brasileira pode, oportunamente,
candidatar-se e ser eleito Presidente da República.
a) Todas as assertivas são corretas.
b) Apenas a assertiva I está correta.
c) Apenas as assertivas I e III estão corretas.
d) Apenas as assertivas II e III estão corretas.
e) Apenas as assertivas I e II estão corretas.
166. (FUNCAB - 2016 - PC-PA - Delegado de Polícia Civil) “Os elementos clássicos de um Estado são seu
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território, sua soberania e seu povo. Para a formação deste último, é necessário que se estabeleça um vínculo
político e pessoal entre o Estado e o indivíduo. É a nacionalidade que efetiva tal conexão e faz com que uma
pessoa integre dada comunidade política. Portanto, é natural e necessário que o Estado distinga o nacional
do estrangeiro para diversos fins". (MENDES, 2016) Assinale a assertiva correta de acordo com o direito de
nacionalidade.
a) O brasileiro nato nunca poderá perder a nacionalidade.
b) A nacionalidade pode ser adquirida de forma originária ou secundária.
CPF: 073.496.444-77

c) Os estrangeiros dispõem de direitos políticos.


d) O brasileiro nato pode ser extraditado caso pratique tráfico internacional de entorpecentes e drogas afins.
e) Pelo critério de determinação jus sanguinis, o indivíduo é nacional se nascido em território específico.
souza -- CPF:

167. (CESPE/CEBRASPE - 2016 - PC-PE - Delegado de Polícia, adaptada) Será considerado brasileiro nato o
indivíduo nascido no estrangeiro, filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, que for registrado em repartição
Marceli souza

brasileira competente ou que venha a residir no Brasil e opte, em qualquer tempo, depois de atingida a
maioridade, pela nacionalidade brasileira.
Marceli

168. (TRF - 3ª REGIÃO - 2016 - TRF - 3ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Só o brasileiro nato pode ser:
a) Deputado Federal ou Senador da República.
b) Ministro de Tribunal Superior.
c) Chefe do Estado Maior das Forças Armadas.
d) Presidente do Banco Central da República.
169. (VUNESP - 2015 - TJ-MS - Juiz Substituto) Considerando as normas da Constituição Federal que tratam
da extradição, assinale a alternativa correta.
a) O estrangeiro pode ser extraditado, havendo vedação apenas em relação aos crimes político e de opinião,
ressalvas estas que não são incompatíveis com a situação de asilado político do estrangeiro no país.
b) O brasileiro naturalizado pode ser extraditado pela prática de crime comum antes da naturalização, sendo
necessário, porém, para esse fim, que haja anulação da naturalização.
c) O cidadão português não pode ser extraditado por crime de terrorismo, independentemente de quando
foi cometido, uma vez que o Supremo Tribunal Federal já assentou que este se equipara ao crime político.
d) O brasileiro nato não pode ser extraditado, exceto se tiver nacionalidade primária do país no qual o crime
foi cometido e se houver reciprocidade estabelecida em tratado internacional.
e) Os crimes que podem ensejar a extradição de estrangeiro não se sujeitam à prescrição.

132
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

170. (FCC - 2015 - TRT - 1ª REGIÃO (RJ) - Juiz do Trabalho Substituto) São cargos privativos de brasileiros
natos, EXCETO:
a) Presidência da República.
b) Presidência da Câmara dos Deputados.
c) Presidência do Senado Federal.
d) Ministro do Tribunal Superior do Trabalho.
e) Ministro de Estado da Defesa.
171. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Os cargos de ministro
de Estado da Defesa e o de ministro das Relações Exteriores, entre outros, são privativos de brasileiros natos.
172. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Considera-se
brasileiro nato o indivíduo nascido no estrangeiro e registrado em repartição brasileira competente, desde
que seja filho de pai brasileiro ou de mãe brasileira, ainda que seus pais não estejam a serviço da República
Federativa do Brasil.
173. (FCC - 2008 - TJ-RR - Juiz de Direito Substituto) Nascido em dezembro de 2007, na França, filho de pai
brasileiro e mãe argelina, João é registrado em repartição consular brasileira sediada naquele país. Nessa
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hipótese, nos termos da Constituição da República, João


a) é considerado brasileiro nato.
b) será considerado brasileiro nato se vier a residir no Brasil e optar, a qualquer tempo, pela nacionalidade
brasileira.
c) será considerado brasileiro naturalizado, desde que venha a residir por quinze anos ininterruptos no Brasil
e não sofra condenação penal.
d) será considerado brasileiro naturalizado se, na forma da lei, vier a adquirir nacionalidade brasileira.
CPF: 073.496.444-77

e) não será considerado brasileiro.


174. (TRF - 2ª Região - 2014 - Juiz Federal Substituto) Pablo nasceu no estrangeiro, filho de mãe brasileira
e de pai mexicano, e veio a residir no Brasil pouco antes de completar 15 anos. Atingida a maioridade, optou
souza -- CPF:

pela nacionalidade brasileira, através de processo que tramitou na Justiça Federal. Pablo tem, agora, 30 anos
de idade. Assinale a opção correta:
Marceli souza

a) Ele pode, em tese e imediatamente, ser nomeado Ministro do Supremo Tribunal Federal.
Marceli

b) Sua naturalização pode ser cancelada, também por sentença judicial, se vier a praticar atividade nociva
ao interesse nacional.
c) Em tese, Pablo poderá ser titular, dentro de alguns anos, de qualquer cargo privativo de brasileiro nato.
d) Pablo não poderá, a qualquer tempo, ser nomeado para o cargo de Ministro de Estado da Defesa.
e) Pablo não poderá, a qualquer tempo, ser eleito para o cargo de Vice-Presidente da República.
175. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - PC-BA - Delegado de Polícia) O brasileiro nato que cometer crime no
exterior, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode ser extraditado pelo Brasil
a pedido de governo estrangeiro.
176. (TRT - 2ª REGIÃO - 2012 - Juiz do Trabalho) Observe as proposições seguintes e ao final responda.
I. São brasileiros natos os nascidos no Brasil, ainda que de pais estrangeiros, mesmo que estejam a serviço
de seu país.
II. São brasileiros natos os nascidos a bordo de navios de guerra brasileiros, ainda que o navio se encontre
ancorado em porto estrangeiro.
III. São brasileiros natos os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira, desde que ambos estejam a
serviço do Brasil.

133
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

IV. São brasileiros natos os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que registrados
em repartição brasileira ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo,
depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira.
V. Para que o filho de brasileiro ou de mãe brasileira, nascido no exterior, seja considerado brasileiro nato,
há necessidade que tenha residido no Brasil, quando ainda menor, como condição permissiva da opção.
Estão corretas apenas as proposições:
a) I e V.
b) I e II.
c) II e III.
d) III e IV.
e) II e IV.

2.9.7. Relações do Estado com seus nacionais no Exterior

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 510) explicam que, em razão da
nacionalidade, o Direito Internacional autoriza ao Estado “seguir” seus nacionais em algumas circunstâncias,
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quando eles se encontrarem em território estrangeiro.


Decorrem desse postulado geral dois institutos: o jus avocandi e a proteção diplomática.
Roberto Luiz Silva (2020, p. 264) explica que o jus avocandi é o direito de o Estado convocar seus
nacionais que estão no estrangeiro, de volta ao seu território em razão de três motivos:

• Prestação de serviço militar obrigatórioꓼ


• Defesa da pátria em caso de conflitoꓼ e
CPF: 073.496.444-77

• Prática de ato delituoso no exterior.

CUIDADO!
Quando o delito é praticado no Brasil e o nacional foge para o exterior, a atuação nacional se dá por
souza -- CPF:

pedido de extradição e não pelo jus avocandi.


Marceli souza

O jus avocandi, na hipótese de delito praticado no exterior, tem fundamento na universalidade de


Marceli

jurisdição. O Código Penal, em seu art. 7º, I e II, “b”, delimita tal possibilidade em âmbito interno:

Extraterritorialidade
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território,
de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação
instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
II - os crimes: (...)
b) praticados por brasileiro; (...)
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido
ou condenado no estrangeiro.
§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes
condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;

134
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a
punibilidade, segundo a lei mais favorável.

Outro instituto relacionado ao tema é o da proteção diplomática. Trata-se do direito e dever do


Estado proteger seus nacionais no exterior (SILVA, 2020, p. 264). Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick
Daillier (2003, p. 512) apontam que a ação diplomática consiste em diligências junto aos órgãos
administrativos e políticos do Estado estrangeiro e, em caso de fracasso, na “substituição processual” para a
busca de responsabilização do Estado em âmbito internacional.
A proteção diplomática só poderá ser prestada por um Estado a seus nacionais, sejam eles pessoas
físicas ou jurídicas.
Segundo a jurisprudência da CIJ, pautada no princípio da ligação efetiva, a nacionalidade das pessoas
jurídicas é aferida de acordo com o país de sua instituição, tal qual decidido no caso Barcelona Traction,
Light and Power Company Limited, de 1970. Portanto, ainda que uma empresa tenha a maioria de acionistas
em uma nacionalidade distinta do local de sua instituição, a proteção diplomática caberá apenas ao Estado
em que a pessoa jurídica foi constituída.
O tribunal internacional, no caso Nottebohm, decidiu também que, em casos de múltiplas
nacionalidades, para fins de proteção diplomática, deve-se considerar apenas o Estado que tenha uma
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ligação efetiva com o indivíduo.


Quando o Estado concede a proteção diplomática, ele o faz por meio do endosso.

2.10. Relações diplomáticas

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 753) destacam que as relações diplomáticas
antecedem o Direito Internacional, que teve a função de organizá-las. Para os autores, o aspecto jurídico
CPF: 073.496.444-77

mais importante das relações diplomáticas diz respeito à concorrência de competências de dois Estados em
um mesmo território. Portanto, quando um Estado estabelece uma missão diplomática, prestando um
serviço público a um nacional seu, ele funciona em território de outro Estado, excepcionando a primazia da
soberania deste último.
souza -- CPF:

O chamado direito de legação (jus legationis) pode ser classificado em duas espécies:
Marceli souza

• Direito de legação ativo: trata-se do envio de representantes diplomáticos a Estados estrangeiros;


Marceli

• Direito de legação passivo: é o recebimento de representantes diplomáticos em solo nacional.

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 754) explicam que o Estado que envia seus
representantes é chamado Estado acreditante, enquanto o que recebe os representantes acreditados é
chamado de Estado acreditado.
Além de atividades entre Estados, é possível o envio e recebimento de missões diplomáticas em
organizações internacionais.
O direito de legação é reconhecido, ainda, para os movimentos de libertação nacional, bem como
para a Santa Sé, em que os chefes de missão são denominados núncios ou internúncios.
Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 755) ensinam que, até 1815, as normas
sobre as relações diplomáticas eram de natureza consuetudinária, tendo ocorrido nesse ano, em Viena, uma
convenção com o intuito de codificar o tema. Da convenção surgiu apenas um texto sobre a hierarquia dos
diplomatas.
Sob os auspícios da Sociedade das Nações tentou-se, mais uma vez, sem sucesso, a elaboração de
um tratado sobre o tema.
Apenas após a Segunda Guerra Mundial, em 1959, a Assembleia Geral das Nações Unidas conseguiu
votar uma resolução convocando os Estados-membros para uma Conferência de Codificação, a ser realizada

135
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

em Viena (em homenagem ao encontro de 1815), tendo sido elaborada a Convenção de Viena acerca das
relações diplomáticas em 1961 (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 756), ratificada pelo Brasil por meio do
Decreto n.º 56.435/1965.

2.10.1. Princípio do mútuo consentimento

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 756) ensinam que a base do direito de
legação é consentimento mútuo entre as partes, positivado no artigo 2 da Convenção de Viena de 1961:

Artigo 2. O estabelecimento de relações diplomáticas entre Estados e o envio de Missões


diplomáticas permanentes efetua-se por consentimento mútuo.

Trata-se de um desdobramento da autolimitação da soberania Estatal, que tem como requisito a


aceitação do Estado acreditado.
Se o início das relações diplomáticas depende de aceitação mútua, a ruptura das relações
diplomáticas é um ato unilateral, discricionário do Estado, que impõe a mesma decisão por parte do Estado
estrangeiro, em razão do princípio da reciprocidade (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 758).
Em caso de guerra, a ruptura é considerada automática, mas nas situações de paz, normalmente,
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ocorrem em resposta a um ato grave entre as partes ou forma de pressão diplomática.

2.10.2. Modalidades de relações diplomáticas

As missões diplomáticas, em relação ao tempo, podem ser classificadas em:

• Permanentes: quando instaladas junto ao Estado acreditado sem prazo definido.


CPF: 073.496.444-77

• Especiais ou diplomacia ad hoc: são missões enviadas a um Estado com finalidade limitada,
temporal ou relacionada à tarefa a ser cumprida.

O artigo 3 da Convenção de Viena de 1961 traz as funções das missões diplomáticas permanentes:
souza -- CPF:

Artigo 3. As funções de uma Missão diplomática consistem, entre outras, em:


Marceli souza

a) representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado;


b) proteger no Estado acreditado os interesses do Estado acreditante e de seus nacionais,
Marceli

dentro dos limites permitidos pelo direito internacional;


c) negociar com o Governo do Estado acreditado;
d) inteirar-se por todos os meios lícitos das condições existentes e da evolução dos
acontecimentos no Estado acreditado e informar a esse respeito o Governo do Estado
acreditante;
e) promover relações amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e
científicas entre o Estado acreditante e o Estado acreditado.
2. Nenhuma disposição da presente Convenção poderá ser interpretada como impedindo o
exercício de funções consulares pela Missão diplomática.

O chefe da missão diplomática só poderá exercer suas funções em um Estado estrangeiro quando
ambos chegam a um acordo prévio chamado agrément. No momento de sua chegada, ele deve apresentar
sua carta de credenciais junto ao Estado acreditado.
De regra, os membros da missão diplomática são da nacionalidade do Estado acreditante, podendo,
excepcionalmente, com a anuência do Estado acreditado, serem da nacionalidade do país de recebimento,
conforme determina a mesma Convenção:

Artigo 8
1. Os membros do pessoal diplomático da Missão deverão, em princípio, ter a nacionalidade
do Estado acreditante.

136
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Os membros do pessoal diplomático da Missão não poderão ser nomeados dentre


pessoas que tenham a nacionalidade do Estado acreditado, exceto com o consentimento
do referido Estado, que poderá retirá-lo em qualquer momento.
3. O Estado acreditado poderá exercer o mesmo direito com relação a nacionais de terceiro
Estado que não sejam igualmente nacionais do Estado acreditante.

O fim do exercício das funções diplomáticas em um Estado pode ocorrer quando o Estado acreditado
declara persona non grata alguém do membro do corpo diplomático, exigindo sua retirada:

Artigo 9
1. O Estado acreditado poderá a qualquer momento, e sem ser obrigado a justificar a sua
decisão, notificar ao Estado acreditante que o Chefe da Missão ou qualquer membro do
pessoal diplomático da Missão é persona non grata ou que outro membro do pessoal da
Missão não é aceitável. O Estado acreditante, conforme o caso, retirará a pessoa em
questão ou dará por terminadas as suas funções na Missão. Uma Pessoa poderá ser
declarada non grata ou não aceitável mesmo antes de chegar ao território do Estado
acreditado.
2. Se o Estado acreditante se recusar a cumprir, ou não cumpre dentro de um prazo
razoável, as obrigações que lhe incumbem, nos termos do parágrafo 1 deste artigo, o Estado
acreditado poderá recusar-se a reconhecer tal pessoa como membro da Missão.
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Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 759) ressaltam a possibilidade de
acreditação dupla ou múltipla, quando uma mesma missão diplomática é acreditada em vários Estados. Os
autores destacam que, nessa hipótese, o Estado acreditado deve concordar com essa modalidade de
representação, lembrando que a Santa Sé, por exemplo, não aceita que um representante junto ao Vaticano
seja também acreditado à Itália.

Artigo 12. O Estado acreditado não poderá, sem o consentimento expresso e prévio do
Estado acreditado, instalar escritórios que façam parte da Missão em localidades distintas
CPF: 073.496.444-77

daquela em que a Missão tem a sua sede.

Há, ainda, previsão na Convenção de Viena de 1961 da representação comum, em que vários Estados
acreditam a mesma pessoa como chefe de missão diplomática:
souza -- CPF:

Artigo 6. Dois ou mais Estados poderão acreditar a mesma pessoa como Chefe de Missão
perante outro Estado, a não ser que o Estado acreditado a isso se oponha.
Marceli souza

CUIDADO!
Marceli

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 760) explicam que a representação comum
é distinta da hipótese em que um Estado concede a outro o poder de representação de seus interesses e
de seus nacionais. Nesse caso, o chefe da missão diplomática não será acreditado mais de uma vez.

No caso do Brasil, é sempre bom lembrar que, nos termos do art. 12, § 3º, V, da Constituição de 1988,
os membros da carreira diplomática devem ser brasileiros natos, dificultando a representação comum.

2.10.3. Chefia da missão diplomática

A Convenção de Viena de 1961 suprimiu a hierarquia entre os chefes de missão diplomática (DINH,
PELLET e DAILLIER, 2003, p. 760), dividindo-os, no entanto, em três classes:

Artigo 14
1. Os Chefes de Missão dividem-se em três classes:
a) Embaixadores ou Núncios acreditados perante Chefes de Estado, e outros Chefes de
Missão de categoria equivalente;
b) Enviados, Ministros ou Internúncios, acreditados perante Chefes de Estado;
c) Encarregados de Negócios, acreditados perante Ministros das Relações Exteriores.

137
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Salvo em questões de precedência e etiqueta, não se fará nenhuma distinção entre


Chefes de Missão em razão de sua classe.

2.10.4. Imunidades

Malcolm N. Shaw (2018, p. 551) aponta que os privilégios e imunidades que protegem os agentes
diplomáticos e os locais das missões são consequência da imunidade soberana e da igualdade dos Estados.
Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 762) fazem uma distinção entre imunidades
e privilégios, no seguinte sentido: imunidades decorrem das normas do Direito Internacional, limitando os
aspectos da soberania do Estado acreditado; os privilégios, por sua vez, dependem única e exclusivamente
da vontade do Estado acreditado. Há quem entenda, no entanto, que não há distinção entre imunidades e
privilégios, fundamentando ambos no Direito Internacional.
Os autores destacam três correntes que justificam as imunidades e privilégios:

• Extraterritorialidade: o agente diplomático não abandona o território do Estado. Portanto, no


exercício de suas funções, ele estaria em território do Estado acreditante. O mesmo ocorreria,
portanto, nos locais das missões diplomáticas. Essa teoria, além de criticada, foi abandonada em
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razão de disfunções de sua aplicação;


• Caráter representativo: o agente diplomático e a missão diplomática representam o Estado
acreditante e, nessa qualidade, necessitam de imunidades em razão de sua dignidade e
independência (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 763). Essa teoria gera um dever ao Estado
acreditado, em razão da igualdade entre os Estados, bem como um direito de reciprocidade;
• Concepção funcional: os privilégios e imunidades decorrem das funções exercidas pelos agentes
e missão diplomática (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 763). A teoria gera a possibilidade de
CPF: 073.496.444-77

limitação das imunidades por parte do Estado acreditado.

O preâmbulo da Convenção de Viena de 1961 parece adotar a teoria funcional, não obstante Nguyen
Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 763) defenderem a adoção das duas últimas teorias “(...)
souza -- CPF:

Reconhecendo que a finalidade de tais privilégios e imunidades não é beneficiar indivíduos, mas, sim, a de
Marceli souza

garantir o eficaz desempenho das funções das Missões diplomáticas, em seu caráter de representantes dos
Estados".
Marceli

Apesar de a Corte Internacional de Justiça, no caso Pessoal Diplomático dos Estados Unidos em
Teerã, ter mencionado tanto o caráter representativo quanto a correlação das imunidades com as funções
desenvolvidas, em despacho de 1979 (CIJ, 1979, p. 16), na sentença do caso, a CIJ reforçou seu caráter
funcional (CIJ, 1980, p. 40).
As imunidades podem ser classificadas em:

• Liberdade de comunicação: em que impede o Estado acreditado de interceptar a comunicação


oficial da missão diplomática e de seus agentes. Essa imunidade se desdobra em:
▪ Inviolabilidade da mala diplomática: a mala diplomática não pode ser aberta ou retida em
qualquer hipótese, em razão do princípio do segredo e inviolabilidade da correspondência
oficial da missão. É necessária a identificação da mala diplomática, não havendo critérios
sobre seu tamanho, mas apenas quanto ao seu conteúdo, que deve ser restrito a
documentos:

Artigo 27
1. O Estado acreditado permitirá e protegerá a livre comunicação da Missão para todos os
fins oficiais. Para comunicar-se com o Governo e demais Missões e Consulados do Estado
acreditante, onde quer que se encontrem, a Missão poderá empregar todos os meios de

138
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

comunicação adequados, inclusive correios diplomáticos e mensagens em códigos ou cifra.


Não obstante, a Missão só poderá instalar e usar uma emissora de rádio com o
consentimento do Estado acreditado.
2. A correspondência oficial da Missão é inviolável. Por correspondência oficial entende-se
toda correspondência concernente à Missão e suas funções.
3. A mala diplomática não poderá ser aberta ou retida.
4. Os volumes que constituam a mala diplomática deverão conter sinais exteriores visíveis
que indiquem o seu caráter e só poderão conter documentos diplomáticos e objetos
destinados a uso oficial.
5. O correio diplomático, que deverá estar munido de um documento oficial que indique
sua condição e o número de volumes que constituam a mala diplomática, será, no
desempenho das suas funções, protegido pelo Estado acreditado.
6. O Estado acreditante ou a Missão poderão designar correios diplomáticos " ad hoc ". Em
tal caso, aplicar-se-ão as disposições do parágrafo 5 deste artigo, mas as imunidades nele
mencionadas deixarão de se aplicar, desde que o referido correio tenha entregado ao
destinatário a mala diplomática que lhe fora confiada.
7. A mala diplomática poderá ser confiada ao comandante de uma aeronave comercial que
tenha de aterrissar num aeroporto de entrada autorizada. O comandante será munido de
um documento oficial que indique o número de volumes que constituam a mala, mas não
será considerado correio diplomático. A Missão poderá enviar um de seus membros para
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receber a mala diplomática, direta e livremente, das mãos do comandante da aeronave.


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▪ Demais meios de comunicação: a missão diplomática está autorizada ao emprego de outros


meios de comunicação, contudo, a Convenção de Viena não faz menção a questões
relacionadas à instalação ou outros dados técnicos sobre esses meios. A regra costumeira é
a de sua inviolabilidade, mas Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 764)
destacam que tal compromisso deve ocorrer através do consentimento do Estado
acreditado.
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• Inviolabilidade dos locais das missões: o Estado acreditado não poderá adentrar nas
dependências da missão sem a permissão do Estado acreditante. No julgamento do caso Pessoal
Diplomático dos Estados Unidos em Teerã, a CIJ decidiu que decorre da inviolabilidade da missão
souza -- CPF:

a obrigação do Estado acreditado proteger o local de ofensas que por ventura sejam produzidas
Marceli souza

contra ela.
Marceli

▪ Os bens móveis, arquivos e documentos da missão também são invioláveis, não podendo
ser objeto de apreensão ou outra medida de constrição.

Artigo 22
1. Os locais da Missão são invioláveis. Os Agentes do Estado acreditado não poderão neles
penetrar sem o consentimento do Chefe da Missão.
2. O Estado acreditado tem a obrigação especial de adotar todas as medidas apropriadas
para proteger os locais da Missão contra qualquer intrusão ou dano e evitar perturbações
à tranquilidade da Missão ou ofensas à sua dignidade.
3. Os locais da Missão, sem mobiliário e demais bens neles situados, assim como os meios
de transporte da Missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida
de execução.

• Imunidade pessoal: o chefe da missão e os membros do corpo diplomático são invioláveis. Dessa
regra geral decorrem as seguintes:
▪ Imunidade de jurisdição: o agente diplomático tem imunidade penal absoluta, esteja ele ou
não no exercício de suas funções. Em relação a processos cíveis e administrativos, a
imunidade é excepcionada no caso do objeto do processo ser imóvel situado sobre terreno
do Estado acreditado, em caso de sucessão ou em consequência de atividade fora do

139
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

exercício de suas funções. Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 766)
destacam que essa imunidade abrange a execução e dívidas.

Artigo 26. Salvo o disposto nas leis e regulamentos relativos a zonas cujo acesso é proibido
ou regulamentado por motivos de segurança nacional, o Estado acreditado garantirá a
todos os membros da Missão a liberdade de circulação e trânsito em seu território.

Artigo 29. A pessoa do agente diplomático é inviolável. Não poderá ser objeto de nenhuma
forma de detenção ou prisão. O Estado acreditado tratá-lo-á com o devido respeito e
adotará todas as medidas adequadas para impedir qualquer ofensa à sua pessoa, liberdade
ou dignidade.

Artigo 31
1. O agente diplomático gozará de imunidade de jurisdição penal do Estado acreditado.
Gozará também da imunidade de jurisdição civil e administrativa, a não ser que se trate de:
a) uma ação real sobre imóvel privado situado no território do Estado acreditado, salvo se
o agente diplomático o possuir por conta do Estado acreditado para os fins da missão.
b) uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a título privado e não em nome
do Estado, como executor testamentário, administrador, herdeiro ou legatário.
c) uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo
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agente diplomático no Estado acreditado fora de suas funções oficiais.


2. O agente diplomático não é obrigado a prestar depoimento como testemunha.
3. O agente diplomático não está sujeito a nenhuma medida de execução a não ser nos
casos previstos nas alíneas " a ", " b " e " c " do parágrafo 1 deste artigo e desde que a
execução possa realizar-se sem afetar a inviolabilidade de sua pessoa ou residência.
4. A imunidade de jurisdição de um agente diplomático no Estado acreditado não o isenta
da jurisdição do Estado acreditante.

ATENÇÃO!
CPF: 073.496.444-77

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do AI 139671 AgR/DF, excepcionou a imunidade de


jurisdição em caso de dívidas trabalhistas (vide ementa acima, p. 101).

▪ Isenção fiscal: de regra, o agente diplomático não é contribuinte do Estado acreditado,


souza -- CPF:

exceto impostos indiretos (IPI, ICMS e ISS), impostos territoriais sobre seus imóveis privados
Marceli souza

(IPTU e ITR) e rendimentos privados cuja fonte seja no Estado acreditado (IR):
Marceli

Artigo 34
O agente diplomático gozará de isenção de todos os impostos e taxas, pessoais ou reais,
nacionais, regionais ou municipais, com as exceções seguintes:
a) os impostos indiretos que estejam normalmente incluídos no preço das mercadorias ou
dos serviços;
b) os impostos e taxas sobre bens imóveis privados situados no território do Estado
acreditado, a não ser que o agente diplomático os possua em nome do Estado acreditante
e para os fins da missão;
c) os direitos de sucessão percebidos pelo Estado acreditado, salvo o disposto no parágrafo
4 do artigo 39;
d) os impostos e taxas sobre rendimentos privados que tenham a sua origem no Estado
acreditado e os impostos sobre o capital referentes a investimentos em empresas
comerciais no Estado acreditado.
e) os impostos e taxas que incidem sobre a remuneração relativa a serviços específicos;
f) os direitos de registro, de hipoteca, custas judiciais e imposto de selo relativos a bens
imóveis, salvo o disposto no artigo 23.

CUIDADO!
Os termos do tratado internacional não se confundem com a terminologia tributária. Logo,
contribuições indiretas também estão excepcionadas de tributação. Ademais, o próprio termo imunidade

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

deve ser lido como não-incidência, considerando a ausência de previsão constitucional da limitação
tributária.

• Imunidades “reflexas”: os membros da família dos diplomatas têm as mesmas imunidades


pessoais destes, exceto se forem nacionais do Estado acreditado.

Artigo 37
1. Os membros da família de um agente diplomático que com êle vivam gozarão dos
privilégios e imunidades mencionados nos artigos 29 e 36, desde que não sejam nacionais
do estado acreditado.

• Imunidades aos demais membros do pessoal da missão: aqui há de se distinguir a função entre
eles:
▪ Pessoal administrativo e técnico: têm a mesma imunidade dos membros das famílias dos
diplomatas, exceto a imunidade de jurisdição por atos fora do exercício de suas funções.
▪ Pessoal de serviço: só terão imunidade quando no exercício de suas funções;
▪ Empregados domésticos privados: estão isentos de impostos sobre seus salários e prestação
de serviços.
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Artigo 37. (...)


2. Os membros do pessoal administrativo e técnico da missão, assim como os membros de
suas famílias que com eles vivam, desde que não sejam nacionais do estado acreditado nem
nele tenham residência permanente, gozarão dos privilégios e imunidades mencionados
nos artigos 29 a 35, com ressalva de que a imunidade de jurisdição civil e administrativa do
estado acreditado, mencionado no parágrafo 1 do artigo 31, não se estenderá aos atos por
eles praticados fora do exercício de suas funções; gozarão também dos privilégios
CPF: 073.496.444-77

mencionados no parágrafo 1 do artigo 36, no que respeita aos objetos importados para a
primeira instalação.
3. Os membros do pessoal de serviço da Missão, que não sejam nacionais do Estado
acreditado nem nele tenham residência permanente, gozarão de imunidades quanto aos
atos praticados no exercício de suas funções, de isenção de impostos e taxas sobre os
souza -- CPF:

salários que perceberem pelos seus serviços e da isenção prevista no artigo 33.
4. Os criados particulares dos membros da Missão, que não sejam nacionais do Estado
Marceli souza

acreditado nem nele tenham residência permanente, estão isentos de impostos e taxas
sobre os salários que perceberem pelos seus serviços. Nos demais casos, só gozarão de
Marceli

privilégios e imunidades na medida reconhecida pelo referido Estado. Todavia, o Estado


acreditado deverá exercer a sua jurisdição sobre tais pessoas de modo a não interferir
demasiadamente com o desempenho das funções da Missão.

As imunidades podem ser objeto de renúncia do Estado acreditante, devendo, no entanto, ser ela
expressa:

Artigo 32
1. O Estado acreditante pode renunciar à imunidade de jurisdição dos seus agentes
diplomáticos e das pessoas que gozam de imunidade nos termos do artigo 37.
2. A renúncia será sempre expressa.
3. Se um agente diplomático ou uma pessoa que goza de imunidade de jurisdição nos
termos do artigo 37 inicia uma ação judicial, não lhe será permitido invocar a imunidade de
jurisdição no tocante a uma reconvenção ligada à ação principal.
4. A renúncia à imunidade de jurisdição no tocante às ações civis ou administrativas não
implica renúncia a imunidade quanto as medidas de execução da sentença, para as quais
nova renúncia é necessária.

141
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2.11. Relações consulares

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 772) ensinam que, enquanto as relações
diplomáticas são costumes positivados pela Convenção de Viena de 1961, as relações consulares nasceram
de tratados bilaterais entre os Estados que foram posteriormente reunidas em um tratado multilateral
(Convenção de Viena sobre Relações Consulares, de 1963, ratificada pelo Brasil através do Decreto n.º
61.078/1967).
Assim como nas relações diplomáticas, o estabelecimento de relações consulares necessita do mútuo
consentimento entre os Estados.
É importante destacar que o estabelecimento de relações consulares independe de relações
diplomáticas, assim como a ruptura das relações diplomáticas não importa na ruptura das relações
consulares (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p. 772). Porém, ao se iniciarem as relações diplomáticas,
presume-se o consentimento para o início de relações consulares:

Artigo 2º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Estabelecimento das Relações Consulares
1. O estabelecimento de relações consulares entre Estados far-se-á por consentimento
mútuo.
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

2. O consentimento dado para o estabelecimento de relações diplomáticas entre os dois


Estados implicará, salvo indicação em contrário, no consentimento para o estabelecimento
de relações consulares.
3. A ruptura das relações diplomáticas não acarretará ipso facto a ruptura das relações
consulares.

O chefe da repartição consular deverá apresentar sua “carta patente” (ou carta de provisão) ao
Estado receptor. Após a aceitação, denominada mandato executório, ele iniciará suas funções.
CPF: 073.496.444-77

Artigo 11º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Carta-patente ou notificação da nomeação
1. O chefe da repartição consular será munido, pelo Estado que envia, de um documento,
sob a forma de carta-patente ou instrumento similar, feito para cada nomeação, que ateste
souza -- CPF:

sua qualidade e que indique, como regra geral, seu nome completo, sua classe e categoria,
a jurisdição consular e a sede da repartição consular.
Marceli souza

2. O Estado que envia transmitirá a carta-patente ou instrumento similar, por via


diplomática ou outra via apropriada, ao Governo do Estado em cujo território o chefe da
Marceli

repartição consular irá exercer suas funções.


3. Se o Estado receptor o aceitar, o Estado que envia poderá substituir a carta-patente ou
instrumento similar por uma notificação que contenha as indicações referidas no parágrafo
1 do presente artigo.

As funções dos cônsules (de regra administrativas e para a promoção de interesses comerciais) estão
previstas no artigo 5º da Convenção de Viena de 1963:

Artigo 5º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Funções Consulares
As funções consulares consistem em:
a) proteger, no Estado receptor, os interesses do Estado que envia e de seus nacionais,
pessoas físicas ou jurídicas, dentro dos limites permitidos pelo direito internacional;
b) fomentar o desenvolvimento das relações comerciais, econômicas, culturais e científicas
entre o Estado que envia o Estado receptor e promover ainda relações amistosas entre eles,
de conformidade com as disposições da presente Convenção;
c) informar-se, por todos os meios lícitos, das condições e da evolução da vida comercial,
econômica, cultural e científica do Estado receptor, informar a respeito o governo do Estado
que envia e fornecer dados às pessoas interessadas;
d) expedir passaporte e documentos de viagem aos nacionais do Estado que envia, bem
como visto e documentos apropriados às pessoas que desejarem viajar para o referido
Estado;

142
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

e) prestar ajuda e assistência aos nacionais, pessoas físicas ou jurídicas, do Estado que envia;
f) agir na qualidade de notário e oficial de registro civil, exercer funções similares, assim
como outras de caráter administrativo, sempre que não contrariem as leis e regulamentos
do Estado receptor;
g) resguardar, de acordo com as leis e regulamentos do Estado receptor, os interesses dos
nacionais do Estado que envia, pessoas físicas ou jurídicas, nos casos de sucessão por morte
verificada no território do Estado receptor;
h) resguardar, nos limites fixados pelas leis e regulamentos do Estado receptor, os
interesses dos menores e dos incapazes, nacionais do país que envia, particularmente
quando para eles for requerida a instituição de tutela ou curatela;
i) representar os nacionais do país que envia e tomar as medidas convenientes para sua
representação perante os tribunais e outras autoridades do Estado receptor, de
conformidade com a prática e os procedimentos em vigor neste último, visando conseguir,
de acordo com as leis e regulamentos do mesmo, a adoção de medidas provisórias para a
salvaguarda dos direitos e interesses destes nacionais, quando, por estarem ausentes ou
por qualquer outra causa, não possam os mesmos defendê-los em tempo útil;
j) comunicar decisões judiciais e extrajudiciais e executar comissões rogatórias de
conformidade com os acordos internacionais em vigor, ou, em sua falta, de qualquer outra
maneira compatível com as leis e regulamentos do Estado receptor;
k) exercer, de conformidade com as leis e regulamentos do Estado que envia, os direitos de
marceliangel@hotmail·com

controle e de inspeção sobre as embarcações que tenham a nacionalidade do Estado que


073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

envia, e sobre as aeronaves nele matriculadas, bem como sobre suas tripulações;
l) prestar assistência às embarcações e aeronaves a que se refere a alínea k do presente
artigo e também às tripulações; receber as declarações sobre as viagens dessas
embarcações examinar e visar os documentos de bordo e, sem prejuízo dos poderes das
autoridades do Estado receptor, abrir inquéritos sobre os incidentes ocorridos durante a
travessia e resolver todo tipo de litígio que possa surgir entre o capitão, os oficiais e os
marinheiros, sempre que autorizado pelas leis e regulamentos do Estado que envia;
m) exercer todas as demais funções confiadas à repartição consular pelo Estado que envia,
CPF: 073.496.444-77

as quais não sejam proibidas pelas leis e regulamentos do Estado receptor, ou às quais este
não se oponha, ou ainda as que lhe sejam atribuídas pelos acordos internacionais em vigor
entre o Estado que envia e o Estado receptor.

Em relação às imunidades e privilégios, adotada a teoria funcional elas dificilmente são absolutas:
souza -- CPF:

• Inviolabilidade dos locais consulares: aplica-se apenas ao local do exercício da função,


Marceli souza

excepcionando, portanto, a residência do chefe da repartição consular:


Marceli

Artigo 31º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Inviolabilidade dos locais consulares
1. Os locais consulares serão invioláveis na medida do previsto pelo presente artigo.
2. As autoridades do Estado receptor não poderão penetrar na parte dos locais consulares
que a repartição consular utilizar exclusivamente para as necessidades de seu trabalho, a
não ser com o consentimento do chefe da repartição consular, da pessoa por ele designada
ou do chefe da missão diplomática do Estado que envia. Todavia, o consentimento do chefe
da repartição consular poderá ser presumido em caso de incêndio ou outro sinistro que
exija medidas de proteção imediata.
3. Sem prejuízo das disposições do parágrafo 2 do presente artigo, o Estado receptor terá a
obrigação especial de tomar as medidas apropriadas para proteger os locais consulares
contra qualquer invasão ou dano, bem como para impedir que se perturbe a tranqüilidade
da repartição consular ou se atente contra sua dignidade.
4. Os locais consulares, seus móveis, os bens da repartição consular e seus meios de
transporte não poderão ser objeto de qualquer forma de requisição para fins de defesa
nacional ou de utilidade pública.
5. Se, para tais fins, for necessária a desapropriação, tomar-se-ão as medidas apropriadas
para que não se perturbe o exercício das funções consulares, e pagar-se-á ao Estado que
envia uma indenização rápida, adequada e efetiva.

143
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Inviolabilidade de comunicações: a proteção da mala consular é semelhante à da mala


diplomática, porém o Estado, havendo sérios motivos para acreditar que seu conteúdo não seja
oficial, poderá mandar abri-la:

Artigo 35º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Liberdade de comunicação
1. O Estado receptor permitirá e protegerá a liberdade de comunicação da repartição
consular para todos os fins oficiais. Ao se comunicar com o Governo, com as missões
diplomáticas e outras repartições consulares do Estado que envia, onde quer que estejam,
a repartição consular poderá empregar todos os meios de comunicação, apropriados,
inclusive correios diplomáticos e consulares, malas diplomáticas e consulares e mensagens
em código ou cifra. Todavia, a repartição consular só poderá instalar e usar uma emissora
de rádio com o consentimento do Estado receptor.
2. A correspondência oficial da repartição consular é inviolável. Pela expressão
"correspondência oficial" entender-se-á qualquer correspondência relativa à repartição
consular e suas funções.
3. A mala consultar não poderá ser aberta ou retirada. Todavia, se as autoridades
competentes do Estado receptor tiverem razões sérias para acreditar que a mala contém
algo além da correspondência, documentos ou objetos mencionados no parágrafo 4º do
presente artigo, poderão pedir que a mala seja aberta em sua presença por representante
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

autorizado do Estado que envia. Se o pedido fôr recusado pelas autoridades do Estado que
envia, a mala será devolvida ao lugar de origem.
4. Os volumes que constituírem a mala consultar deverão ser providos de sinais exteriores
visíveis, indicadores de seu caráter, e só poderão conter correspondência e documentos
oficiais ou objetos destinados exclusivamente a uso oficial.
5. O correio consultar deverá estar munido de documento oficial que ateste sua qualidade
e que especifique o número de volumes que constituem a mala diplomática. Exceto com o
consentimento do Estado receptor, o correio não poderá ser nacional do Estado receptor
nem, salvo se for nacional do Estado que envia, residente permanente no Estado receptor.
CPF: 073.496.444-77

No exercício de suas funções, o correio será protegido pelo Estado receptor. Gozará de
inviolabilidade pessoal e não poderá ser objeto de nenhuma forma de prisão ou detenção.
6. O Estado que envia, suas missões diplomáticas e suas repartições consulares poderão
nomear correios consulares ad hoc Neste caso, aplicar-se-ão as disposições do parágrafo 5
souza -- CPF:

do presente artigo, sob a reserva de que as imunidades mencionadas deixarão de ser


aplicáveis no momento em que o correio tiver entregue ao destinatário a mala pela qual é
Marceli souza

responsável.
7. A mala consular poderá ser confiada ao comandante de um navio ou aeronave comercial,
Marceli

que deverá chegar a um ponto de entrada autorizado. Tal comandante terá um documento
oficial em que conste o número de volumes que constituem a mala, mas não será
considerado correio consular. Mediante prévio acordo com as autoridades locais
competentes, a repartição consular poderá enviar um de seus membros para tomar posse
da mala direta e livremente, das mãos do comandante do navio ou aeronave.

• Imunidade fiscal: a imunidade fiscal prevista na Convenção de 1963 é restrita aos impostos
patrimoniais do local onde o consulado foi instalado, bem como da residência do chefe da
repartição:

Artigo 32º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Isenção fiscal dos locais consulares
1. Os locais consulares e a residência do chefe da repartição consular de carreira de que for
proprietário o Estado que envia ou pessoa que atue em seu nome, estarão isentos de
quaisquer impostos e taxas nacionais, regionais e municipais, excetuadas as taxas cobradas
em pagamento de serviços específicos prestados.
2. A isenção fiscal prevista no parágrafo 1 do presente artigo não se aplica aos mesmos
impostos e taxas que, de acordo com as leis e regulamentos do Estado receptor, devam ser
pagos pela pessoa que contratou com o Estado que envia ou com a pessoa que atue em seu
nome.

144
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Imunidades pessoais: aqui também estão diminuídas.


▪ Imunidade de jurisdição: está restrita aos atos praticados no exercício da função:

Artigo 43º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Imunidade de Jurisdição
1. Os funcionários consulares e os empregados consulares não estão sujeitos à Jurisdição
das autoridades judiciárias e administrativas do Estado receptor pelos atos realizados no
exercício das funções consulares.
2. As disposições do parágrafo 1 do presente artigo não se aplicarão entretanto no caso de
ação civil:
a) que resulte de contrato que o funcionário ou empregado consular não tiver realizado
implícita ou explicitamente como agente do Estado que envia; ou
b) que seja proposta por terceiro como consequência de danos causados por acidente de
veículo, navio ou aeronave, ocorrido no Estado receptor.

▪ Inviolabilidade pessoal: o pessoal e funcionários da repartição consular poderão ser presos


preventivamente em casos de crimes graves:

Artigo 41º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


marceliangel@hotmail·com

Inviolabilidade pessoal dos funcionários consulares


073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

1. Os funcionários consulares não poderão ser detidos ou presos preventivamente, exceto


em caso de crime grave e em decorrência de decisão de autoridade judiciária competente.
2. Exceto no caso previsto no parágrafo 1 do presente artigo, os funcionários consulares
não podem ser presos nem submetidos a qualquer outra forma de limitação de sua
liberdade pessoal, senão em decorrência de sentença judiciária definitiva.
3. Quando se instaurar processo penal contra um funcionário consular, este será obrigado
a comparecer perante as autoridades competentes. Todavia, as diligências serão
conduzidas com as deferências devidas à sua posição oficial e, exceto no caso previsto no
CPF: 073.496.444-77

parágrafo 1 deste artigo, de maneira a que perturbe o menos possível o exercício das
funções consulares. Quando, nas circunstâncias previstas no parágrafo 1 deste artigo, for
necessário decretar a prisão preventiva de um funcionário consular, o processo
correspondente deverá iniciar-se sem a menor demora.
souza -- CPF:

Dois outros pontos merecem destaque em relação às relações consulares. Trata-se da obrigação da
comunicação à repartição consular sobre a prisão e a morte de um nacional:
Marceli souza

Artigo 36º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Marceli

Comunicação com os nacionais do Estado que envia


1. A fim de facilitar o exercício das funções consulares relativas aos nacionais do Estado que
envia:
a) os funcionários consulares terão liberdade de se comunicar com os nacionais do Estado
que envia e visitá-los. Os nacionais do Estado que envia terão a mesma liberdade de se
comunicarem com os funcionários consulares e de visitá-los;
b) se o interessado lhes solicitar, as autoridades competentes do Estado receptor deverão,
sem tardar, informar à repartição consular competente quando, em sua jurisdição, um
nacional do Estado que envia for preso, encarcerado, posto em prisão preventiva ou detido
de qualquer outra maneira.
Qualquer comunicação endereçada à repartição consular pela pessoa detida, encarcerada
ou presa preventivamente deve igualmente ser transmitida sem tardar pelas referidas
autoridades. Estas deverão imediatamente informar o interessado de seus direitos nos
termos do presente subparágrafo;
c) os funcionários consulares terão direito de visitar o nacional do Estado que envia, o qual
estiver detido, encarcerado ou preso preventivamente, conversar e corresponder-se com
ele, e providenciar sua defesa perante os tribunais. Terão igualmente o direito de visitar
qualquer nacional do Estado que envia encarcerado, preso ou detido em sua jurisdição em
virtude de execução de uma sentença, todavia, os funcionários consulares deverão abster-
se de intervir em favor de um nacional encarcerado, preso ou detido preventivamente,
sempre que o interessado a isso se opuser expressamente.

145
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. As prerrogativas a que se refere o parágrafo 1 do presente artigo serão exercidas de


acordo com as leis e regulamentos do Estado receptor, devendo, contudo, entender-se que
tais leis e regulamentos não poderão impedir o pleno efeito dos direitos reconhecidos pelo
presente artigo.

Artigo 37º da Convenção de Viena sobre Relações Consulares


Informações em casos de morte, tutela, curatela, naufrágio e acidente aéreo
Quando as autoridades competentes do Estado receptor possuírem as informações
correspondentes, estarão obrigadas a:
a) em caso de morte de um nacional do Estado que envia, informar sem demora a repartição
consular em cuja jurisdição a morte ocorreu;
b) notificar, sem demora, à repartição consular competente, todos os casos em que for
necessária a nomeação de tutor ou curador para um menor ou incapaz, nacional do Estado
que envia. O fornecimento dessa informação, todavia, não prejudicará a aplicação das leis
e regulamentos do Estado receptor, relativas a essas nomeações;
c) informar sem demora à repartição consular mais próxima do lugar do sinistro, quando
um navio, que tiver a nacionalidade do Estado que envia, naufragar ou encalhar no mar
territorial ou nas águas internas do Estado receptor, ou quando uma aeronave matriculada
no Estado que envia sofrer acidente no território do Estado receptor.

O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RHC 71.835, não conheceu a nulidade da prisão pela
marceliangel@hotmail·com
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falta de comunicação da prisão ao consulado, decidindo que tal ato é uma faculdade do preso:

2. Não há ilegalidade decorrente da ausência de notificação do consulado japonês acerca


da prisão do recorrente. A Corte estadual destacou ser desnecessária, haja vista que "o
paciente entende perfeitamente a língua portuguesa" e teve seus direitos legais garantidos,
bem como todos os meios de defesa. Ademais, nos termos do art. 36 da Convenção de
Viena sobre Relações Consulares, a comunicação à repartição consular competente deve se
dar "se o interessado lhes solicitar". E não há qualquer notícia de ter sido requerida tal
CPF: 073.496.444-77

providência pelo recorrente.


3. Não se constata constrangimento ilegal se "não há comprovação nos autos de que o
advogado do paciente teve seu acesso negado aos autos de prisão". A Defesa, para
sustentar tal tese, faz menção a um depoimento testemunhal que não foi levado a
conhecimento da Corte de origem, vedada a supressão de instância.
souza -- CPF:

4. Recurso ordinário parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (RHC


71.835/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
Marceli souza

20/09/2016, DJe 30/09/2016)


Marceli

Tal posição contradiz com decisão monocrática do Min. Celso de Melo, no pedido de prisão
preventiva em processo de extradição nº 726:

A notificação consular em questão, tal como delineada no Artigo 36 da Convenção de Viena


sobre Relações Consulares, em razão de qualificar-se como ato bifronte, mostra-se
impregnada, quanto aos seus destinatários, de dupla subjetividade, eis que dirigida ao
agente consular (que tem a liberdade de comunicar-se e de visitar os respectivos nacionais,
mesmo quando presos) e ao estrangeiro sob custódia do Estado receptor (que tem o direito
de solicitar às autoridades nacionais a cientificação de sua prisão à repartição consular
competente, bem assim a faculdade de avistar-se com o agente consular de seu próprio
país).
No contexto ora em exame, os Estados Unidos da América qualificam-se, para efeito de
aplicação da referida Convenção de Viena, como sendo o Estado que envia (“État d’envoi”)
e o Brasil, como o Estado que recebe ou Estado receptor (“État d’accueil”).
Essa notificação consular – é importante dizê-lo – reveste-se de grande importância, pois
constitui prerrogativa jurídica, de caráter fundamental, que hoje compõe, notadamente
para os estrangeiros que se achem presos no exterior, o universo conceitual dos direitos
básicos da pessoa humana, para empregar feliz expressão que o Professor CANÇADO
TRINDADE, quando Juiz da Corte Interamericana de Direitos Humanos, utilizou na resposta
dada aos Estados Unidos Mexicanos em decorrência de solicitação formulada no contexto
da Opinião Consultiva nº 16, de 1º/10/1999, que versou a questão pertinente ao direito à

146
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

informação sobre a assistência consular e a sua relação com as garantias mínimas do devido
processo legal.
O fato é que o estrangeiro preso no Brasil tem direito de ser cientificado, pelas autoridades
brasileiras (policiais ou judiciárias), de que lhe assiste a faculdade de comunicar-se com o
respectivo agente consular, bem assim dispõe da prerrogativa de ver notificado o seu
próprio Consulado, “without delay”, de que se acha submetido a prisão em nosso País. (PPE
726/DF. Relator: Min. Celso de Melo. Julgamento: 27/05/2015. Publicação: DJe 29/05/2015)

QUESTÕES
177. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Em razão da instrumentalidade das formas,
admite-se a presunção da renúncia da imunidade de jurisdição pelo Estado na fase de execução de um
processo judicial, quando houver o ato expresso de renúncia na fase de conhecimento do mesmo processo.
178. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Cônsul de Estado estrangeiro poderá ser
processado e julgado pelo Poder Judiciário brasileiro no caso de praticar crime não relacionado a atos de
ofício em território brasileiro.
179. (CESPE/CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) Estado soberano estrangeiro possui
imunidade de jurisdição em matéria tributária, situação que impede a cobrança de imposto sobre a
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

importação de bebidas alcoólicas para consumo na respectiva embaixada.


180. (MPT - 2017 - MPT - Procurador do Trabalho) No regime da Convenção de Viena de 1961, é
INCORRETO afirmar que:
a) Exceto no caso de renúncia expressa, é inadmissível a instauração de processo de execução em face do
Estado estrangeiro.
b) A renúncia à imunidade de jurisdição no tocante às ações civis ou administrativas não implica renúncia
CPF: 073.496.444-77

à imunidade quanto às medidas de execução de sentença, para as quais nova renúncia é necessária.
c) Os locais da missão diplomática gozam do privilégio da inviolabilidade e o Estado acreditado tem o dever
de protegê-los de qualquer perturbação.
d) O Estado acreditante pode renunciar à imunidade de jurisdição dos seus agentes diplomáticos.
souza -- CPF:

181. (COPEVE-UFAL - 2012 - MPE-AL - Analista do Ministério Público - Área Jurídica) Possui imunidade
Marceli souza

de jurisdição por força de tratado em que o Brasil é parte:


I. O embaixador aqui acreditado.
Marceli

II. A embaixatriz de nacionalidade brasileira.


III. Os Chefes de Estado.
IV. As pessoas jurídicas estrangeiras.
Verifica-se que está(ão) correta(s):
a) II, III e IV, apenas.
b) I e III, apenas.
c) I, II e III, apenas.
d) I, II, III e IV.
e) I, apenas.
182. (FCC - 2015 - TRT - 15ª Região - Juiz do Trabalho Substituto, adaptada) A prática brasileira de admitir
reclamações trabalhistas movidas por empregados de Missões Diplomáticas estrangeiras no Brasil é uma
violação do direito internacional, que entende que a contratação de funcionários para suas Missões no
exterior é um ato de império e, portanto, abrangida pela imunidade de jurisdição.
183. (FCC - 2015 - TRT - 15ª Região - Juiz do Trabalho Substituto, adaptada) Se o edifício onde funciona a
Missão Diplomática de um País estrangeiro no Brasil for de propriedade desse Estado estrangeiro, é possível

147
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a penhora do edifício para execução de eventual condenação em reclamação trabalhista movida por ex-
empregado da Missão.
184. (FCC - 2015 - TRT - 15ª Região - Juiz do Trabalho Substituto, adaptada) Nos casos em que, segundo
o art. 31 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, não se beneficiar o agente diplomático da
imunidade em relação à jurisdição civil e administrativa do Estado acreditado, eventual execução da sentença
pode incidir sobre qualquer bem do seu patrimônio, inclusive os localizados em sua residência, desde que
respeitada sua inviolabilidade pessoal.
185. (CESPE / CEBRASPE - 2013 - Polícia Federal – Delegado) Diferentemente dos arquivos diplomáticos,
os arquivos consulares podem ser violados em caso de fundada suspeita de atentado contra a incolumidade
do Estado receptor.
186. (FCC - 2015 - TRT - 1ª REGIÃO (RJ) - Juiz do Trabalho Substituto) Segundo a Convenção de Viena
sobre Relações Consulares, o nome dado a “toda pessoa empregada no serviço doméstico de uma repartição
consular” é:
a) funcionário consular.
b) empregado consular.
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

c) membro do pessoal de serviço.


d) membro do pessoal privado.
e) adido consular.
187. (FCC - 2015 - TRT - 1ª REGIÃO (RJ) - Juiz do Trabalho Substituto) A respeito do agente diplomático,
relativamente ao previsto na Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, é correto afirmar:
a) O agente diplomático é obrigado a prestar depoimento como testemunha quando se tratar de ação
penal.
CPF: 073.496.444-77

b) O agente diplomático poderá renunciar à imunidade de jurisdição.


c) O agente diplomático não gozará de imunidade civil relativamente à ação real sobre imóvel privado
situado no território do Estado acreditado, mesmo nas hipóteses em que o agente diplomático o possuir por
souza -- CPF:

conta do Estado acreditado para os fins da missão.


d) A renúncia à imunidade de jurisdição, no tocante às ações civis ou administrativas, não implica renúncia
Marceli souza

à imunidade quanto às medidas de execução da sentença, para as quais nova renúncia é necessária.
Marceli

e) Se um agente diplomático inicia uma ação judicial, ser-lhe-á permitido invocar a imunidade de jurisdição
no tocante a uma reconvenção.
188. (MPU - 2015 - PGR - Procurador da República) O diplomata, de acordo com a Convenção de Viena
sobre Relações Diplomáticas, pode renunciar a própria inviolabilidade, uma vez que se trata de direito
personalíssimo outorgado pelo Direito Internacional.
189. (MPU - 2015 - PGR - Procurador da República) Os cônsules não podem ser obrigados a depor sobre
fatos relacionados com o exercício de suas funções, nem a exibir correspondência e documentos oficiais que
a elas se refiram.
190. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) A renúncia de imunidade de
jurisdição por um Estado estrangeiro implica a impossibilidade de se invocar a impenhorabilidade de bens
desse Estado por ocasião do processo de execução.
191. (FCC - 2015 - TRT - 6ª Região (PE) - Juiz do Trabalho Substituto) Segundo a Convenção de Viena sobre
Relações Diplomáticas - CVRD, é INCORRETO afirmar que:
a) um Estado só pode nomear um Chefe de Missão após assegurar-se do consentimento do Estado
acreditado.

148
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

b) os familiares dos membros do pessoal técnico e administrativo da Missão, que com eles vivam, também
gozam de algumas imunidades previstas na CVRD, desde que não sejam nacionais do Estado acreditado nem
nele tenham residência permanente.
c) os membros do corpo Administrativo e Técnico da Missão têm as mesmas imunidades perante a
jurisdição civil e administrativa do Estado local de que gozam os agentes diplomáticos.
d) o Estado pode renunciar às suas imunidades e privilégios decorrentes da CVRD.
e) a mala de viagem do diplomata pode ser inspecionada em alguns casos, não sendo inviolável de forma
absoluta.
192. (FCC - 2014 - TRT - 24ª REGIÃO (MS) - Juiz do Trabalho Substituto) Com relação aos órgãos das
relações entre os Estados e a imunidade de jurisdição dos Estados é INCORRETO afirmar:
a) No Brasil, não estão abrangidos pela imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro os bens deste que
não estejam afetados à sua representação diplomática e consular, podendo sobre eles recair medida
executória de sentença proferida pela Justiça do Trabalho.
b) As imunidades dos funcionários de repartições consulares são extensíveis a seu cônjuge e seus familiares
que com ele residam.
c) A imunidade de jurisdição do agente diplomático não se aplica em ações sucessórias nas quais ele figurar
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como herdeiro ou legatário.


d) A renúncia, por parte do Estado acreditante, à imunidade de jurisdição do agente diplomático para o
processo de conhecimento não implica a renúncia à imunidade em relação ao processo de execução de
eventual sentença condenatória.
e) A distinção entre atos de império e atos de gestão, de origem consuetudinária, permite afastar a
imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro em reclamação trabalhista movida no Brasil por funcionário
de Missão Diplomática estrangeira aqui contratado, mas não quando a reclamação é movida contra
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Organização Intergovernamental.

2.12. Responsabilidade internacional do Estado


souza -- CPF:

2.12.1. Conceito de responsabilidade internacional


Marceli souza

Jorge Miranda (2012, p. 344) destaca que quando um sujeito de direito internacional viola uma
Marceli

norma em relação a outro, causando-lhe prejuízo, ele incorrerá em responsabilidade em face da vítima.
Antonio Cassese (2013, p. 361), por sua vez, destaca que, quando um ilícito internacional é cometido, é
instaurada uma relação jurídica entre Estado ofensor e Estado lesado/vítima. O conteúdo dessa relação,
denomina-se regime de responsabilidade internacional que pode ser resumido pelo conjunto de obrigações
impostas ao Estado autor, de um lado, e o conjunto de direitos, faculdades e obrigações do Estado vítima, de
outro.
Para a aferição da responsabilização internacional é necessário analisar, tal como no direito interno,
a conduta, o dano e o nexo de causalidade. Sendo que as normas da responsabilização internacional foram
formadas consuetudinariamente e reconhecidas com base na prática dos tribunais arbitrais internacionais,
passando, posteriormente à prática dos tribunais internacionais.
A Comissão de Direito Internacional da ONU, desde os anos 50, trabalha na codificação das normas
de reponsabilidade civil, tendo sido publicado em 2001, um projeto de artigos sobre a responsabilidade
internacional7.

7Há uma versão do Projeto de Artigos sobre a responsabilização internacional da CDI, traduzida para o português pelo Prof. Aziz Tuffi
Saliba, que será utilizada nesse material, no site https://iusgentium.ufsc.br/wp-content/uploads/2015/09/Projeto-da-CDI-sobre-
Responsabilidade-Internacional-dos-Estados.pdf.

149
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

ATENÇÃO!
O projeto de artigos sobre responsabilidade internacional da CDI não é um tratado internacional,
não obstante codificar normas consuetudinárias. Logo, trata-se de soft law, não sendo um documento
formalmente vinculante aos Estados.

2.12.2. A disciplina tradicional

As normas da responsabilidade internacional, como aludido, foram desenvolvidas inicialmente pelas


práticas dos tribunais arbitrais internacionais, sendo parcas as disposições convencionais sobre o tema.
Em seu desenvolvimento inicial, para a responsabilização internacional, para a imputação da prática
de um ato ilícito a um Estado, aplicava-se a teoria do órgão. Assim sendo, quando o órgão de um Estado viola
uma norma do direito internacional, tal ato é imputado ao Estado e não ao indivíduo/agente estatal.
A caracterização do ilícito internacional ocorria quando um Estado ou seu agente agia
intencionalmente na prática de um ato contrário às normas do Direito Internacional. Logo, era necessária a
presença de dolo ou culpa grave por parte do agente estatal (CASSESE, 2013, p. 344).
Estabelecida a prática de um ato ilícito, o direito tradicional determinava que o Estado autor era
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obrigado a reparar a vítima, sem qualquer preferência entre os meios: restituição em forma específica,
ressarcimento em dinheiro ou satisfações, isto é, pedido de desculpas oficiais (no caso de violações contra a
honra do Estado).
A relação de responsabilização na disciplina tradicional era de natureza eminentemente bilateral
entre o Estado autor e o Estado vítima do ilícito internacional.
Competiria ao Estado lesado a faculdade de recorrer à autotutela, sendo que os mecanismos de
solução de controvérsia necessitavam de consentimento mútuo.
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No Direito Internacional tradicional, a responsabilidade internacional dos Estados estava conectada


ao tratamento de estrangeiros. Antonio Cassese (2013, p. 345) ressalta que as normas consuetudinárias do
direito tradicional eram associadas à forma como os Estados (normalmente não industrializados) tratavam
os cidadãos de outros Estados (europeus) e seus bens.
souza -- CPF:

As exceções da teoria do órgão na responsabilidade internacional (na disciplina clássica, em que era
possível a responsabilização dos indivíduos) eram a pirataria, desde o final do século XVIII, e os crimes de
Marceli souza

guerra, a partir do século XIX.


Marceli

2.12.2. A disciplina atual

Jorge Miranda (2012, p. 348) destaca que a matéria de responsabilidade internacional sofreu diversas
mutações com o tempo, que podem ser elencadas nos seguintes termos:

• A responsabilidade internacional pode atualmente ser imputada não apenas aos Estados, como
também às organizações internacionais;
• Os Estados deixam de responder apenas perante outros Estados e passam a ser
responsabilizados perante organizações internacionais e indivíduos;
• Há a quebra da quase exclusividade da responsabilidade coletiva (aplicação da teoria do órgão)
e civil internacional, permitindo-se a responsabilidade individual e criminal;
• É possível a responsabilização internacional objetiva, permitindo a responsabilização por atos
lícitos, e não apenas ilícitos;
• Passa-se à proibição do uso da força como represália à responsabilização internacional, cabendo
ao Conselho de Segurança da ONU permiti-la, ou na incidência de legítima defesa;

150
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

•A responsabilização deixa de ser exclusivamente uma relação bilateral, sendo desenvolvida a


ideia de responsabilidade para a comunidade internacional em seu conjunto, como nas hipóteses
de crime contra humanidade ou de danos ambientais;
• Surge a ideia de responsabilidade agravada ao lado da responsabilidade ordinária. Na primeira,
há a violação de uma norma de jus cogens, enquanto na última às demais normas do direito
internacional.
Antonio Cassese (2013, p. 346) destaca também que atualmente há uma distinção entre as normas
primárias das normas secundárias. As normas primárias são o conjunto de normas que versam sobre
obrigações de natureza substancial aos Estados. Já as normas secundárias são as normas que estabelecem
as condições de verificação da conduta ilícita, bem como as consequências jurídicas decorrentes de eventual
violação.

2.12.3. Elementos da responsabilidade internacional

Não há consenso doutrinário acerca da forma de análise dos elementos da responsabilização


internacional. A doutrina italiana, como Antonio Cassase (2013, p. 348) e Andrea Gioia (2015, p. 431),
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identifica dois elementos: elemento subjetivo (que é a imputabilidade de uma conduta ao Estado); e
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elemento objetivo, que seria a reunião da conduta contrária ao Direito Internacional, o dano e a ausência de
causa justificadora da conduta. Jorge Miranda (2012, p. 349), por sua vez identifica quatro elementos:
comportamento; imputabilidade; dano; e nexo de causalidade. Já, na doutrina pátria, Valerio de Oliveira
Mazzuoli (2020, ebook, p. 501) e Paulo Henrique Gonçalves Portela (2021, p. 479) identificam como
elementos: conduta, imputabilidade (nexo de causalidade) e dano.

ATENÇÃO!
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Em se tratando de responsabilidade internacional, a imputabilidade é separada da conduta em razão


da possibilidade de o Estado ser responsabilizado por atos que não foram praticados por seus agentes.
Portanto, não confundir com a temática das teorias de responsabilização civil de âmbito interno.
souza -- CPF:

2.12.3.1 Conduta
Marceli souza

Trata-se do ato comissivo ou omissivo contrário a uma obrigação advinda de uma norma do direito
Marceli

internacional.

Art. 12. Existência de uma violação de uma obrigação internacional.


Há uma violação de uma obrigação internacional por um Estado quando um ato deste
Estado não está em conformidade com o que lhe é requerido pela obrigação, seja qual for
a origem ou natureza dela8.

Antonio Cassese (2013, p. 354) destaca que a obrigação deve ser proveniente de uma norma vigente,
em respeito ao princípio do tempus commissi delicti:

Art. 13. Obrigação internacional em vigor para um Estado Um ato de um Estado não
constitui uma violação de uma obrigação, a menos que o Estado esteja vinculado pela
obrigação em questão no momento em que o ato ocorre9.

Quanto ao tempo, a conduta pode ser instantânea ou continuada (contínua):

Art. 14. Extensão no tempo de uma violação de uma obrigação internacional

8 Artigo do Projeto de Artigos sobre a Responsabilidade Internacional dos Estados por Atos Internacionalmente Ilícitos de 2001,
elaborado pela Comissão de Direito Internacional da ONU.
9 Idem.

151
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

1. A violação de uma obrigação por um ato de um Estado que não tenha caráter contínuo
ocorre no momento em que o ato é realizado, mesmo que seus efeitos perdurem.
2. A violação de uma obrigação internacional por um ato de um Estado que tenha caráter
contínuo se estende por todo o período durante o qual o ato continua e permanece em
desacordo com a obrigação internacional.
3. A violação de uma obrigação internacional que exija do Estado a prevenção de um certo
acontecimento produzir-se-á no momento em que começa esse acontecimento e se
estende por todo o período em que o evento continua e permanece em desacordo com
aquela obrigação10.

A CDI previu ainda a possibilidade de uma série de violações serem tomados em conjunto, formando
um ato composto:

Art. 15. Violação proveniente de um ato composto


1. A violação de uma obrigação internacional por um Estado por meio de uma série de ações
ou omissões definidas em conjunto como ilícitas, ocorre quando a ação ou omissão que,
tomada com as outras ações ou omissões, é suficiente para constituir o ato ilícito.
2. Em tal caso, a violação se estende por todo o período começando com a primeira das
ações ou omissões da série e se prolongando, enquanto as ações ou omissões forem
repetidas e permanecerem em desacordo com a obrigação internacional.
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É importante destacar que, sendo a conduta considerada ilícita do ponto de vista do direito
internacional, a responsabilização do Estado independente da ilicitude do ato em âmbito interno. Em outros
termos, um Estado não poderá opor suas normas internas para impedir a configuração da ilicitude
internacional da conduta:

Art. 3º Caracterização de um ato de um Estado como internacionalmente ilícito.


A caracterização de um ato de um Estado, como internacionalmente ilícito, é regida pelo
Direito Internacional. Tal caracterização não é afetada pela caracterização do mesmo ato
CPF: 073.496.444-77

como lícito pelo direito interno.

Excepcionalmente, um Estado pode ser responsabilizado por uma conduta lícita, em razão da
aplicação da teoria do risco, desde que haja prévia previsão normativa nesse sentido, como nas seguintes
souza -- CPF:

hipóteses:
Marceli souza

• Convenção sobre Responsabilidade de Operadores de Navios Nucleares, de 1962;


• Convenção sobre Responsabilidade Civil por Danos Causados por Poluição por Óleo, de 1969;
Marceli

• Convenção sobre Danos Causados por Objetos Espaciais, de 1972;


• Convenção do Direito do Mar, de 1982;
• Protocolo sobre Responsabilidade e indenização por Danos Resultantes dos Movimentos
Transfronteiriços de Resíduos Perigosos e sua Eliminação, de 1999.

2.12.3.2. Imputabilidade:

Antonio Cassese (2013, p. 349) ensina que, como o Estado age no plano internacional por meio de
indivíduos, é necessário, para a sua responsabilização, estabelecer em quais hipóteses uma conduta poderá
ser atribuída a um Estado. Paulo Henrique Gonçalves Portela (2021, p. 480) ressalta, portanto, a necessidade
de estabelecimento do vínculo entre a conduta violada e seu responsável.

ATENÇÃO!
Valeiro de Oliveira Mazzuoli (2020, p. 501) utiliza o termo imputabilidade como sinônimo de nexo de
causalidade. Trata-se de uma “concepção subjetiva do nexo causal”, isto é, entre ato e responsável. Algo

10 Idem.

152
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

distinto do nexo de causalidade entre ato e dano, adotado pela maioria da doutrina como elemento da
responsabilização.

Como regra, adota-se a teoria do órgão para imputação de um ato a um Estado. Atribui-se ao Estado
os atos praticados por seus órgãos, segundo o direito interno. Antonio Cassese (2013, p. 349) ressalta que a
ideia de órgão é compreendida de forma ampla, isto é, inclui os órgãos de poder central, como o Executivo,
Legislativo e Judiciário, e órgãos de poder derivado, como um Estado federado ou, no caso brasileiro,
município. Nessa última hipótese, quando o Estado de Roraima age para impedir a entrada de refugiados
venezuelanos no Brasil, em contrariedade ao princípio do non-refoulement (não-devolução), tal ato pode ser
atribuído à República Federativa do Brasil, para sua responsabilização internacional.

Art. 4º Conduta dos órgãos de um Estado


1. Considerar-se-á ato do Estado, segundo o Direito Internacional, a conduta de qualquer
órgão do Estado que exerça função legislativa, executiva, judicial ou outra qualquer que seja
sua posição na organização do Estado -, e independentemente de se tratar de órgão do
governo central ou de unidade territorial do Estado.
2. Incluir-se-á como órgão qualquer pessoa ou entidade que tenha tal status de acordo com
o direito interno do Estado11.
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Jorge Miranda (2012, p. 351) destaca, ainda, que eventual incompetência para a prática do ato não
tem o condão de isentar o Estado de sua responsabilização, não obstante possa ter efeitos em âmbito
interno. Da mesma forma, um ato será atribuído ao Estado se seu órgão exerce um ato em desacordo com
as instruções por ele recebida. Trata-se, pois, das hipóteses de atos ultra vires.
Um ato também pode ser atribuído a um Estado quando o agente que o pratica desenvolve um papel
importante no exercício de funções públicas, ainda que não seja, formalmente, um órgão do Estado.
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Art. 5º Conduta de pessoas ou entidades exercendo atribuições do poder público


Considerar-se-á ato do Estado, segundo o Direito Internacional, a conduta de uma pessoa
ou entidade que não seja um órgão do Estado, consoante o artigo 4º, que, de acordo com
a legislação daquele Estado, possa exercer atribuições do poder público, sempre que a
pessoa ou entidade esteja agindo naquela qualidade na situação particular.
souza -- CPF:

Antonio Cassese (2013, p.350) ressalta a possibilidade de atribuição de uma conduta ao Estado,
Marceli souza

quando o ato ilícito é praticado por órgãos de fato. Trata-se da hipótese de indivíduos que não detém
vinculação formal com o Estado, mas agem em seu nome. A CIJ, no caso Aplicação da Convenção sobre
Marceli

genocídio (Bósnia v. Sérvia), utilizou o teste de dependência completa (complete dependence test) como
critério de aferição de responsabilidade do Estado.
Quando indivíduos agem com base em instruções ou direção do Estado, ainda que não sejam
formalmente seus agentes, tais ações poderão ser imputadas ao Estado, com base no teste do controle
efetivo, desenvolvido pela CIJ no caso Atividades militares e paramilitares a favor e contra a Nicarágua
(Nicarágua v. Estados Unidos). No julgado, a Corte definiu que o controle efetivo do Estados em ações de
indivíduos é identificado quando: a) os indivíduos são financiados pelo Estado ou pagos por ele; b) sua
conduta é coordenada diretamente pelo Estado; e c) a conduta foi feita com base em instruções do Estado.
Tais situações foram descritas no art. 8º do Projeto de Artigos da CDI:

Art. 8º Conduta dirigida ou controlada por um Estado


Considerar-se-á ato do Estado, segundo o Direito Internacional, a conduta de uma pessoa
ou grupo de pessoas se esta pessoa ou grupo de pessoas estiver de fato agindo por instrução
ou sob a direção ou controle daquele Estado, ao executar a conduta.

11 Artigo do Projeto de Artigos sobre a Responsabilidade Internacional dos Estados por Atos Internacionalmente Ilícitos de 2001,
elaborado pela Comissão de Direito Internacional da ONU.

153
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Um Estado pode ser responsabilizado internacionalmente quando deixar de tomar as devidas


diligências (due diligence) para prevenir ou reprimir a prática de ilícitos internacionais. Trata-se, portanto, da
responsabilização por omissão, como no caso da invasão da embaixada americana em Teerã, em 1979, ou o
assaltado da embaixada da Espanha em Lisboa, em 1975.

Art. 9º Conduta realizada na falta ou ausência de autoridades oficiais


Considerar-se-á ato do Estado, segundo o Direito Internacional, a conduta de uma pessoa
ou grupo de pessoas se a pessoa ou grupo de pessoas estiver de fato exercendo atribuições
do poder público na falta ou ausência de autoridades oficiais e em circunstâncias tais que
requeiram o exercício daquelas atribuições.

Jorge Miranda (2012, p. 351) destaca que, em casos de rebelião ou insurreição, o Estado responde
por danos provocados por seus agentes e pelos rebeldes ou insurretos. Vencedor ou não, o Estado mantém
a obrigação de reparar os danos, excetuada a hipótese de reconhecimento do estatuto de beligerantes:

Art. 10. Conduta de um movimento de insurreição ou outro


1. Considerar-se-á ato do Estado, segundo o Direito Internacional, a conduta de um
movimento de insurreição que se torne o novo governo daquele Estado.
2. A conduta de um movimento de insurreição ou outro que for bem-sucedido em
estabelecer um novo Estado em parte do território de um Estado preexistente ou em um
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território sob sua administração será considerado um ato do novo Estado, e acordo com o
Direito Internacional.
3. Este artigo não é prejudicado pela atribuição a um Estado de qualquer conduta, seja qual
for sua relação com o movimento em questão, a qual deva ser considerada um ato daquele
Estado em virtude dos artigos 4º ao 9º.

2.12.3.3. Dano
CPF: 073.496.444-77

O dano pode ser material, quando revela um prejuízo patrimonial/econômico, ou moral ou imaterial,
quando acarreta prejuízo à dignidade e à honra do Estado.
É importante ressalvar que o dano não está previsto como um dos elementos constitutivos da
responsabilidade segundo os Artigos da CDI. Para Antonio Cassese (2013, p. 354), os membros da CDI
souza -- CPF:

partiram do pressuposto de que uma violação a uma norma internacional será sempre um dano de tipo
Marceli souza

jurídico (legal injury), do titular do direito violado.


Marceli

2.12.3.4. Nexo de causalidade e as causas excludentes de ilicitude

Em âmbito interno, conceitua-se o nexo de causalidade como o limite entre a conduta e o dano. Logo,
a legislação prevê hipóteses de quebra do nexo de causalidade como caso fortuito, força maior, culpa
exclusiva da vítima ou culpa exclusiva de terceiro. Tais hipóteses interrompem a ligação entre a conduta
atribuída a um agente do dano causado.
Em âmbito internacional, por ser o dano presumido, como regra e em função do elemento da
imputabilidade, a doutrina não prevê hipóteses da quebra do nexo causal, mas de exclusão da ilicitude do
ato. Isso é importante porque tais hipóteses não isentam o dever de indenizar, tendo em vista razões de
justiça, igualdade e segurança internacional (MIRANDA, 2012, p. 352).
A primeira das causas de exclusão da ilicitude é o consenso. Se um Estado permite a prática do ato
de outro Estado, não há de se falar em ilicitude. Antonio Cassese (2013, p. 356) destaca, no entanto, que as
condições para o consenso são que:

• tenha sido dado de forma válida, aplicando aqui as mesmas normas de validade dos tratados;
• tenha sido claramente acertado entre as partes, não sendo, portanto, presumido. É possível a
manifestação expressa ou implícita por parte dos Estados;

154
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• tenha sido proferido pelos órgãos com competência internacional para fazê-lo;
• seja antecedente à prática do ato, tendo em vista que a manifestação posterior é uma forma
de renúncia ou aquiescência, que impede o direito de invocar a responsabilização.

As contramedidas são medidas de autotutela tomadas pelo Estado lesado, de natureza distinta do
uso da força. Antonio Cassese (2013, p. 357) ensina que as contramedidas importam na violação de um
direito subjetivo do Estado acusado da prática de um ilícito internacional, como uma medida do Estado
lesado. Essa medida, ainda que consista na violação a um direito, será considerada lícita. As contramedidas
devem ser proporcionais à violação do Estado infrator, não podendo atingir normas de jus cogens. Elas devem
cessar quando o Estado infrator cumpre sua obrigação de reparar:

Art. 49. Objeto e limites das contramedidas


1. Um Estado lesado somente pode adotar contra-medidas contra um Estado que seja
responsável por um ato internacionalmente ilícito com o objetivo de induzi-lo a cumprir
com suas respectivas obrigações dispostas na Parte Dois.
2. As contramedidas são limitadas ao não cumprimento temporal de obrigações
internacionais do Estado que adota as medidas em relação ao Estado responsável.
3. As contramedidas deverão, na medida do possível, ser tomadas de tal modo a permitir a
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retomada da realização das obrigações em questão.

Art. 50. Obrigações não afetadas pelas contramedidas


1. As contramedidas não deverão afetar:
a) a obrigação de abster-se da ameaça ou uso de força como disposto na Carta da ONU;
b) obrigações estabelecidas para a proteção de direitos humanos fundamentais;
c) obrigações de caráter humanitário proibindo represálias;
d) outras obrigações consoante as normas imperativas de Direito Internacional geral.
2. Um Estado que realize as contramedidas não está isento de cumprir com suas obrigações:
CPF: 073.496.444-77

a) de acordo com qualquer procedimento de solução de controvérsias aplicável a ele e ao


Estado responsável;
b) de respeitar a inviolabilidade de agentes diplomáticos e consulares, locais, arquivos e
documentos.
souza -- CPF:

Art. 51. Proporcionalidade As contramedidas devem ser estabelecidas de acordo com o


prejuízo sofrido, levando em consideração a gravidade do ato internacionalmente ilícito e
Marceli souza

os direitos em questão.
Marceli

Art. 53. Término das contramedidas


As contramedidas deverão cessar tão logo o Estado responsável cumpra com suas
obrigações em relação ao ato internacionalmente ilícito consoante a Parte Dois.

ATENÇÃO!
Antonio Cassese (2013, p. 371) ensina que as contramedidas não podem ser confundidas com as
retorções. Uma retorção é um comportamento não amigável de um Estado em relação a outro, que não
pode ser considerado como violação ao direito internacional, como a ruptura das relações diplomáticas, ou
suspensão do comércio. As retorções devem respeitar duas condições: proporcionalidade da medida a que
se reage e interrupção com o fim da conduta questionada.

Também exclui a ilicitude a ocorrência de força maior, definida no projeto de artigos da CDI de forma
ampla, abarcando hipóteses de força maior (evento da natureza) ou caso fortuito (evento imprevisível de
natureza humana):

Art. 23. Força maior


1. A ilicitude de um ato de um Estado em desacordo com uma obrigação internacional
daquele Estado será excluída se o ato se der em razão de força maior, entendida como a
ocorrência de uma força irresistível ou de um acontecimento imprevisível, além do controle

155
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

do Estado, tornando materialmente impossível, nesta circunstância, a realização da


obrigação.
2. O parágrafo 1º não se aplica se:
a) a situação de força maior é devida, por si só ou em combinação com outros fatores, à
conduta do Estado que a invoca; ou
b) o Estado assumiu o risco daquela situação ocorrida.

O perigo extremo (distress) trata-se de situação que o agente do ato não pode agir de outra forma
em razão de uma causa que põe em risco sua vida ou de pessoa colocada à sua tutela. São exemplos trazidos
pela doutrina, o ingresso não autorizado de navio militar em porto estrangeiro em uma tempestade, ou o
pouso não autorizado de aeronave, em solo estrangeiro, para salvar os passageiros (CASSESE, 2013, p. 358).
Antônio Cassese (2013, p. 358) destaca que o perigo extremo se restringe às hipóteses de perigo à vida e não
à integridade física do agente ou de terceiros:

Art. 24. Perigo extremo


1. A ilicitude de um ato de um Estado em desacordo com uma obrigação internacional
daquele Estado se extingue se o autor do ato em questão não tem nenhuma alternativa
razoável, em uma situação de perigo extremo, de salvar a vida do autor ou vidas de outras
pessoas confiadas aos cuidados do autor.
2. O parágrafo 1º não se aplica se:
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a) a situação de perigo extremo é devida unicamente, ou em combinação com outros


fatores, à conduta do Estado que a invoque; ou
b) for provável que o ato em questão crie um perigo comparável ou maior.

O estado de necessidade é considerado excludente de ilicitude quando o ato é praticado em caso de


perigo à existência do Estado em si, e não à vida de seus órgãos ou de terceiros:

Art. 25. Estado de necessidade


CPF: 073.496.444-77

1. Nenhum Estado pode invocar o estado de necessidade como causa de exclusão de


ilicitude de um ato em desacordo com uma obrigação internacional daquele Estado, a
menos que o ato:
a) seja o único modo para o Estado preservar um interesse essencial contra um perigo grave
e iminente; e
souza -- CPF:

b) não afete gravemente a um interesse essencial do Estado ou Estados em relação aos


quais exista a obrigação, ou da comunidade internacional como um todo.
Marceli souza

2. Em nenhum caso pode o Estado invocar o estado de necessidade como causa de exclusão
de ilicitude se:
Marceli

a) a obrigação internacional em questão exclui a possibilidade de invocar a necessidade, ou


b) o Estado contribuiu para a ocorrência do estado de necessidade.

Antonio Cassese (2013, p. 359) exemplifica a utilização do estado de necessidade no caso Torrey
Canyon, de 1967, em que um navio petroleiro liberiano estava à deriva em alto mar na costa britânica. Para
evitar danos às costas britânica e francesa, decorrentes do possível naufrágio causado pelo mar agitado, o
Reino Unido bombardeou a embarcação para que o petróleo se incendiasse. O Reino Unido invocou o estado
de necessidade, que não sofreu objeções pelos demais Estados.
A última causa de exclusão de ilicitude é a legitima defesa, conceituada como uma reação com o uso
da força a um ato de agressão armada:

Art. 21. Legítima defesa


A ilicitude de um ato de um Estado é excluída se o ato constitui uma medida lícita de legítima
defesa tomada em conformidade com a Carta das Nações Unidas.

A legítima defesa tem previsão ainda no artigo 51 da Carta da ONU:

Artigo 51. Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa
individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações
Unidas, até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a
manutenção da paz e da segurança internacionais. As medidas tomadas pelos Membros no

156
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho


de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a responsabilidade que
a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em qualquer tempo, a ação que
julgar necessária à manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança
internacionais.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 516) explica que a legítima defesa é uma resposta
imediata do Estado a uma agressão armada injusta. Tal resposta deve ser adequada e proporcional ao ataque
ou ao perigo iminente. Portanto, a ação do Estado deve cessar quando o ataque tiver sido reprimido. Assim
sendo, não será permitido ao Estado agredido avançar em direção ao Estado agressor tendo como
fundamento a legítima defesa.
Configurada uma hipótese de exclusão de ilicitude, o Estado que a invoca não estará isento do dever
de reparação:

Art. 27. Conseqüências de invocação de uma circunstância extinguindo a ilicitude


A invocação de uma circunstância que exclua a ilicitude, de acordo com este Capítulo, não
prejudica:
a) o cumprimento da obrigação em questão, se e na medida em que a circunstância
excludente da ilicitude não mais exista;
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b) a questão da indenização por qualquer perda material causada pelo ato em questão.

Antonio Cassese (2013, p. 360) destaca que, não obstante a redação do art. 27 do Projeto de Artigos
da CDI, há hipóteses em que o Estado estaria isento do dever de reparar: legítima defesa, contramedidas e o
consenso. Quanto à legitima defesa, há consenso doutrinário na isenção da reparação. Porém, para o autor,
as contramedidas são atos adotados como reação a um outro ilícito, não sendo razoável que o Estado que as
tome seja obrigado a reparar eventuais prejuízo. No consenso, por outro lado, há a aquiescência entre os
Estados, não havendo que se falar, portanto, em reparações.
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2.12.3.5. A inexistência do elemento volitivo/psicológico

Na responsabilização internacional, como regra, não se analisa eventual culpa do Estado ofensor,
souza -- CPF:

como elemento configurador da responsabilização. Não obstante a isso, é possível que o Estado se defenda,
Marceli souza

alegando ausência de culpa, em decorrência, por exemplo, da incidência de força maior (CASSESE, 2013, p.
353).
Marceli

Tratando-se, portanto, da aplicação da teoria da responsabilização objetiva do Estado, a culpa pode


ser levada em consideração no momento da fixação da reparação, tal como aponta o art. 39 do Projeto de
Artigos da CDI:

Art. 39. Contribuição para o prejuízo


Na determinação da reparação, deve ser levada em conta a contribuição para o prejuízo por
ação ou omissão, intencional ou negligente, do Estado lesado ou de qualquer pessoa ou
entidade em relação a qual se busca a reparação.

2.12.4. Procedimento de apuração da responsabilização internacional:

Quando um Estado entende que foi lesado por outro, ele deve notificar o pretenso Estado-autor de
sua pretensão, especificando a conduta que violou a norma do Direito Internacional, a conduta que deveria
ter sido adotada pelo Estado-autor e, por fim, a forma de reparação que entende necessária:

Art. 43. Notificação de uma reclamação por um Estado lesado


1. Um Estado lesado que invoca a responsabilidade de outro Estado deverá notificá-lo da
reclamação.
2. O Estado lesado poderá especificar, particularmente:

157
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) A conduta que o Estado responsável deveria observar para cessar o ato ilícito, se ele
continua;
b) a forma de reparação que deveria tomar de acordo com as disposições da Parte Dois.

Caso o Estado-lesado não tenha sucesso em seus pedidos, ele deve buscar um meio de resolução
pacífica de controvérsias.
Apenas se infrutíferas as tentativas da resolução pacífica de controvérsias, o Estado-lesado poderá
tomar contramedidas:

Art. 52. Condições relativas a recorrer a contramedidas


1. Antes de tomar as contramedidas, um Estado lesado deverá:
a) requerer ao Estado responsável, de acordo com o artigo 43, que cumpra com suas
obrigações em conformidade com a Parte Dois;

As principais obrigações do Estado-autor são cessar a conduta ilícita, fornecer garantias de que a
conduta não se repetirá no futuro e promover a plena reparação dos danos causados:

Art. 30. Cessação ou não-repetição


O Estado responsável pelo ato internacionalmente ilícito tem a obrigação de:
a) cessar aquele ato, se ele continua;
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b) oferecer segurança e garantias apropriadas de não-repetição, se as circunstâncias o


exigirem.

Art. 31. Reparação


1. O Estado responsável tem obrigação de reparar integralmente o prejuízo causado pelo
ato internacionalmente ilícito.
2. O prejuízo compreende qualquer dano, material ou moral, causado pelo ato
internacionalmente ilícito de um Estado.
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O Estado-autor reparar integralmente os prejuízos sofridos pelo Estado-lesado. Antes de tudo, deve
buscar a restituição, consistente no retorno da situação ao status quo ante. Não sendo isso possível, deverá
adotar medidas de satisfação ou indenização:
souza -- CPF:

Art. 34. Formas de reparação


A reparação integral do prejuízo causado pelo ato internacionalmente ilícito deverá ser em
forma de restituição, indenização e satisfação, individualmente ou em combinação, de
Marceli souza

acordo com as previsões deste Capítulo.


Marceli

Art. 35. Restituição


Um Estado responsável por um ato internacionalmente ilícito tem a obrigação de restituir,
ou seja, de reestabelecer a situação que existia antes que o ato ilícito fosse cometido, desde
que e na medida que a restituição:
a) não seja materialmente impossível;
b) não acarrete um ônus totalmente desproporcional com relação ao benefício que
derivaria de restituição em vez dada indenização.

Art. 36. Indenização


1. O Estado responsável por um ato internacionalmente ilícito tem obrigação de indenizar
pelo dano causado por este, desde que tal dano não seja reparado pela restituição.
2. A indenização deverá cobrir qualquer dano susceptível de mensuração financeira,
incluindo lucros cessantes, na medida de sua comprovação.

Art. 37. Satisfação


1. O Estado responsável por um ato internacionalmente ilícito tem a obrigação de dar
satisfação pelo prejuízo causado por aquele ato desde que ele não possa ser reparado pela
restituição ou indenização.
2. A satisfação pode consistir em um reconhecimento da violação, uma expressão de
arrependimento, uma desculpa formal ou outra modalidade apropriada.

158
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

3. A satisfação não deverá ser desproporcional ao prejuízo e não pode ser humilhante para
o Estado responsável.

Antonio Cassese (2013, p. 362) explica que as medidas de satisfação são aquelas de natureza não
material, relacionadas à honra e à dignidade do Estado-lesado. Um exemplo de medida de satisfação é o
pedido de desculpas oficial. A punição dos autores materiais do ilícito também é medida de satisfação que
pode ser adotada pelo Estado-autor.

QUESTÕES
193. (CESPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Tendo em vista a soberania e a supremacia
constitucional, um Estado pode se eximir de eventual responsabilidade internacional perante outro Estado
sob o argumento de defesa de suas normas constitucionais.
194. (CESPE - 2018 - ABIN - Oficial de Inteligência) Na hipótese de um agente estatal, durante
procedimento de investigação, exorbitar de suas funções, praticando atos que configurem tanto ilícitos
internacionais quanto nacionais, admite-se a responsabilidade internacional do Estado.
195. (CESPE - 2018 - DPE-PE - Defensor Público) A respeito da responsabilização internacional do Estado,
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julgue os itens a seguir.


I. Para que a responsabilidade internacional do Estado seja arguida, basta a presença de fato considerado
ilícito, sendo despicienda a verificação do nexo causal.
II. O Estado não será responsabilizado internacionalmente por ato abusivo ou arbitrário praticado
exclusivamente por seus agentes ou funcionários.
III. O Estado poderá ser responsabilizado pela conduta de particulares se falhar em prevenir ou em responder
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adequadamente pelo desaparecimento de pessoas.


Assinale a opção correta.
a) Apenas o item I está certo.
souza -- CPF:

b) Apenas o item II está certo.


Marceli souza

c) Apenas o item III está certo.


Marceli

d) Apenas os itens I e II estão certos.


e) Apenas os itens II e III estão certos.
196. (MPF - 2015 - PGR - Procurador da República, adaptada) De acordo com a teoria geral da
responsabilidade internacional, o Estado lesado pelo descumprimento prévio de obrigação internacional tem
inteira discricionariedade para impor o conteúdo de sanções unilaterais, não devendo obediência, em nome
de sua soberania, a nenhum limite ou restrição.
197. (ESAF - 2007 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional) A respeito de responsabilidade internacional,
considere as asserções abaixo e, em seguida, assinale a opção correta.
I. Uma decisão do Poder Judiciário brasileiro pode levar à responsabilidade internacional do Brasil, caso a
decisão viole compromissos jurídico-internacionais assumidos pelo país.
II. Uma lei de um dos Estados da federação não pode dar ensejo à responsabilidade internacional do Brasil
porque, no âmbito nacional, os compromissos são assumidos pela União Federal.
III. A responsabilidade internacional do Estado deve ter sempre por base uma ação. Uma omissão não pode
dar ensejo à responsabilização do Estado no plano internacional.

159
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

IV. A responsabilidade internacional do Estado apenas existe se há a violação de um tratado internacional. O


desrespeito a um costume internacional, por exemplo, não é suficiente para dar ensejo à responsabilidade
do Estado.
V. A despeito de terem personalidade jurídica internacional, as organizações internacionais não podem ser
responsabilizadas juridicamente na ordem internacional.
a) Apenas a asserção I está correta.
b) Apenas as asserções I e II estão corretas
c) Apenas as asserções I, II e III estão corretas
d) Apenas a asserção V está incorreta.
e) Todas as asserções estão incorretas.
198. (TRF - 4ª REGIÃO - 2012 - TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal) Assinale a alternativa correta:
a) A responsabilidade dos Estados em matéria de proteção internacional do meio ambiente é comum,
porém, diferenciada.
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b) O Supremo Tribunal Federal é o órgão competente para apreciar o recurso interposto por pessoa jurídica
de direito privado domiciliada no Brasil contra decisão que lhe foi desfavorável, quando o litígio envolver
organismo internacional.
c) O português equiparado ao brasileiro não pode exercer direitos políticos no Brasil, porque é exigível,
para esse fim, a condição de brasileiro nato ou naturalizado.
d) O estrangeiro deportado do Brasil somente poderá retornar ao país depois de transcorridos cinco anos
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da data da decisão que determina a deportação.


e) As medidas repressivas ou sancionatórias que visam à implementação das obrigações internacionais dos
Estados podem consistir em: a) transferência de recursos financeiros, para compensar custos de
souza -- CPF:

implementação de obrigações ou aquisição de tecnologia; b) transferência de tecnologia; ou c) troca de


experiências, intercâmbios de profissionais, custeio de pesquisas.
Marceli souza

199. (CESPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal) Considere que o Estado A tenha adentrado o espaço
Marceli

aéreo do Estado B sem a sua autorização e que, após tratativas diplomáticas, ele tenha reconhecido que
cometera uma violação ao direito do Estado B, tendo apresentado pedido formal de desculpa pelo ocorrido.
Nessa situação, de acordo com os artigos da Comissão de Direito Internacional da ONU sobre
Responsabilidade Internacional dos Estados, o reconhecimento da violação e o pedido de desculpas realizado
pelo Estado A caracterizam a forma de reparação denominada
a) danos morais.
b) garantia de não repetição.
c) restituição.
d) compensação.
e) satisfação.
200. (MPF - 2013 - PGR - Procurador da República) No tocante à aplicabilidade, à proteção internacional
de direitos humanos, dos Draft Articles on Responsibility of States for Internationally Wrongful Acts (Esboço
de artigos sobre a responsabilidade de Estados por atos ilícitos internacionais) de 2001, da Comissão de
Direito Internacional da ONU, é correto dizer que:

160
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) O documento é completamente inaplicável, pois trata de responsabilidade decorrente de ilícitos


praticados na relação entre Estados e não na relação entre um Estado e seus jurisdicionados;
b) O documento é parcialmente aplicável, pois pelo menos parte das obrigações decorrentes do direito
internacional dos direitos humanos são erga partes ou erga omnes e, por isso, são oponíveis por Estados vis
à vis a outros;
c) O documento é aplicável em todos os seus termos, pois não existem obrigações de Estados vis à vis seus
jurisdicionados no direito internacional;
d) O documento é completamente inaplicável, pois o regime de proteção internacional dos direitos
humanos não tem qualquer relação com a responsabilidade internacional dos Estados.
201. (CESPE - 2012 - AGU - Advogado da União) De acordo com o projeto da Comissão de Direito
Internacional da ONU sobre responsabilidade internacional dos Estados, as garantias de não repetição são
consequências possíveis de um ilícito internacional.
202. (CESPE - 2012 - AGU - Advogado da União) O texto final do projeto sobre responsabilidade
internacional dos Estados, aprovado pela Comissão de Direito Internacional da ONU, prevê um sistema
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agravado de responsabilidade, por violação de normas peremptórias de direito internacional geral.


203. (CESPE - 2011 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal) A colocação de satélites no espaço sideral e a chegada
do homem à Lua na década de 60 do século passado ensejaram a criação de normas internacionais sobre o
espaço extra-atmosférico. Entre tais normas, destaca-se o tratado sobre os princípios aplicáveis à exploração
e uso do espaço extra-atmosférico, assinado em 1967 e, posteriormente, a convenção sobre a
responsabilidade internacional por danos causados por objetos espaciais, em 1972. Com base nessas normas
e nos princípios internacionais, assinale a opção correta.
CPF: 073.496.444-77

a) Se um satélite alemão adentrar a atmosfera e atingir avião da companhia Air France, haverá
responsabilização internacional.
b) Há identidade entre as normas internacionais sobre o espaço aéreo e o extra-atmosférico.
souza -- CPF:

c) É permitida a colocação em órbita de objeto portador de armas nucleares, desde que autorizada pela
Marceli souza

ONU.
Marceli

d) Permite-se a instalação de base lunar militar para a proteção do planeta Terra.


e) Se um satélite americano cair sobre uma casa brasileira, haverá causa excludente de ilicitude, o que
impede a indenização.
204. (MPF - 2011 - PGR - Procurador da República) Segundo o esboço de artigos sobre Responsabilidade de
Estados por atos ilícitos internacionais da Comissão de Direito Internacional da ONU ("DRAFT ARTICLES"), na
versão de 2001:
a) as obrigações secundárias substituem as primárias, na hipótese de violação destas últimas:
b) as obrigações secundárias serão sempre impostas por contramedidas;
c) as obrigações secundárias se justapõem às primárias;
d) a responsabilidade internacional do Estado só pode ser imputada a este quando o ato ilícito for praticado
por seu agente.

161
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

3. SANTA SÉ E ESTADO DA CIDADE DO VATICANO

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 158) destaca que Santa Sé e Vaticano são dois entes
distintos, que têm em comum sua vinculação à Igreja Católica Apostólica Romana.
A Santa Sé é a cúpula religiosa da Igreja Católica, chefiada pelo Papa e composta pela Cúria Romana,
tendo a missão de direção dos católicos apostólicos romanos. A Santa Sé é sediada na Cidade-Estado do
Vaticano, e seu poder não é limitado por nenhum outro Estado (PORTELA, 2015, p. 158).
A Santa Sé é um sujeito de Direito Internacional, membro fundador da comunidade internacional,
segundo Jorge Miranda (2009, p. 211), com status adquirido em decorrência da grande influência na vida
mundial, por meio dos Estados Pontifícios e da importância histórica do Papa para resolução de conflitos
internacionais, principalmente por arbitragem.
Jorge Miranda (2009, p. 211) explica que a Santa Sé tem basicamente a capacidade de envio de
representantes diplomáticos (jus legationis) a outros Estados e Organizações Internacionais (é observador da
ONU, do Conselho da Europa, da OIT etc.), por meio de seus núncios ou internúncios, e, ainda, de celebrar
tratados (jus tractuum), denominados de concordatas quando têm por objeto temas relacionados à religião.
Em busca no website do Ministério das Relações Exteriores, verificou-se a presença de três
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concordatas firmadas entre o Brasil e a Santa Sé. A primeira, de 1862, é Convenção entre o Império do Brasil
e a Santa Sé para a Organização das Missões Apostólicas no Brasil, de vigência expirada. A segunda é o Acordo
entre a República Federativa do Brasil e a Santa Sé sobre Assistência Religiosa às Forças Armadas, firmado
em 1989 e ainda vigente. A última, ratificada, através do Decreto n.º 7.107/1010, foi o Estatuto Jurídico da
Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de novembro de 2008.
A personalidade internacional da Santa Sé chegou a ser contestada com a incorporação do território
dos Estados Pontifícios à Itália. Contudo, a partir do Tratado de Latrão, em que a Itália renunciou o exercício
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da jurisdição no território do Vaticano, em 1929, a polêmica diminuiu.


O Vaticano é um Estado e, por isso, dotado de personalidade jurídica de Direito Internacional. Seu
território tem 0,44 km², e seus nacionais são governados pelo Papa. Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015,
p. 159) explica que o principal papel do Vaticano é dar suporte material para o exercício das funções da Santa
souza -- CPF:

Sé.
Antonio Cassese (2013, p. 184) destaca que, enquanto sujeito de Direito Internacional equiparado ao
Marceli souza

Estado, a Santa Sé e seus órgãos se beneficiam da mesma imunidade de jurisdição dos Estados. Tanto que a
Marceli

Corte de cassação Italiana, no caso Marcinkus et al., extinguiu o processo sem resolução do mérito sob o
fundamento de que os dirigentes do Banco do vaticano, por atuarem na qualidade de agentes oficiais e não
como pessoas privadas, não poderiam ser processados pela Itália.
Jorge Miranda (2009, p. 211) aponta que outras religiões buscam o reconhecimento de subjetividade
jurídica internacional, como a comunidade Shia Imami Ismaili, uma das maiores vertentes do islamismo.

QUESTÕES
205. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Instituto Rio Branco – Diplomata) Apesar de ter personalidade jurídica
internacional, enviar núncios e celebrar concordatas, a Santa Sé é considerada entidade estatal anômala, em
razão da exiguidade territorial da Cidade Estado do Vaticano.
206. (CESPE - 2017 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A fim de manter a sua neutralidade, a Santa Sé
não é parte de convenções multilaterais no âmbito das Nações Unidas, como convenções sobre direitos
humanos

162
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

4. BELIGERANTES, INSURGENTES E MOVIMENTOS DE LIBERTAÇÃO


NACIONAL

Jorge Miranda (2009, p. 197) reúne como “entidades pró-estatais” ou “quase-Estados” os


insurgentes, os beligerantes e os movimentos de libertação nacional. Todos são entes transitórios que
buscam assumir total ou parcialmente o status de um Estado.
Os insurgentes e os beligerantes, do ponto de vista conceitual, têm em comum a existência de uma
rebelião no interior de um Estado.
Os insurgentes, de regra, não são considerados pessoa do Direito Internacional. Porém, alguns
Estados acabam por reconhecê-los como tal para colocá-los sob a proteção das normas do Direito
Internacional Humanitário.
Quando os insurgentes passam a controlar efetivamente parte do território e detêm um aparato
organizativo responsável da organização de seus membros (CASSESE, 2013, p. 170), isto é, um verdadeiro
governo de fato (PEREIRA e QUADROS, 2011, p. 319), alguns Estados tendem a reconhecer seu status como
beligerantes.
Os beligerantes são considerados sujeitos do Direito Internacional. André Gonçalves Pereira e
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Fausto de Quadros (2011, p. 319) explicam que o reconhecimento dos rebeldes como beligerantes gera os
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seguintes efeitos:
• A sujeição das partes do conflito às normas do Direito Internacional da Guerra, tendo em vista
que o conflito passa a ser visto como uma guerra internacional;
• A exclusão da responsabilização internacional do Estado, por danos causados pelos beligerantes,
caso ele próprio tenha reconhecido tal status;
• A capacidade de celebrar tratados.
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O reconhecimento de insurgentes ou beligerantes é sempre transitório, considerando que os


rebeldes poderão vencer o conflito, substituindo o Governo de um Estado (ou criando um Estado no território
sob seu domínio), ou serem derrotados pelo Governo oficial, gerando a caducidade de seu reconhecimento.
souza -- CPF:

Antonio Cassese (2013, p. 177) aponta que a diferença entre os chamados movimentos de libertação
nacional e as demais rebeliões (insurgentes e beligerantes) é sua legitimidade frente ao Direito
Marceli souza

Internacional, considerando que eles surgem do princípio da autodeterminação dos povos.


Marceli

André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 321) destacam que os requisitos para o
reconhecimento dos movimentos de libertação nacional são:

• A representatividade de seus membros como agentes do povo que invoca a libertação; e


• O exercício do controle político.

Ao contrário dos beligerantes, aos movimentos de libertação nacional não é necessário o controle
de parte do território que se invoca a liberdade.
Para os autores, a consequência do primeiro requisito é impedir que se reconheçam dois movimentos
como representantes do mesmo povo. Já o segundo requisito permite o reconhecimento dos representantes
do povo, ainda que eles não detenham o controle de um território (como no caso da Organização da
Libertação da Palestina, o mais famoso caso de movimento de libertação nacional).

QUESTÕES
207. (CESPE - 2013 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal, adaptada) Aos grupos nacionais beligerantes que se
rebelarem contra o governo constituído com vistas à criação de um novo Estado não será reconhecida a
personalidade jurídica internacional.

163
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

208. (CESPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Os grupos beligerantes que se organizam
politicamente com o intuito de desmembramento ou de mudança de governo ou de regime vigente, devido
ao seu caráter temporário, não se sujeitam às normas do direito internacional em matéria de conflito bélico,
mas sim ao ordenamento jurídico doméstico.

5. ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS

5.1. Teoria geral

5.1.1. Conceito e elementos

Jorge Miranda conceitua as organizações internacionais como:

(a) Agrupamentos de sujeitos de Direito Internacional (b) criados, ordinariamente, por


tratado, (c) para a prossecução de determinados fins internacionalmente relevantes, (d)
com duração mais ou menos longa, (e) com órgãos próprios (distintos dos Estados), (f)
dotada de personalidade jurídica internacional, (g) com capacidade correspondente aos
seus fins (MIRANDA, 2009, p. 241).
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Mônica Herz e Andrea Ribeiro Hoffmann (2004, p. 17) destacam que as Organizações
Intergovernamentais (OIGs) são formadas por Estados (como regra), distinguindo-se das Organizações Não-
Governamentais (ONGs), de natureza privada, e são institucionalizadas para a realização da cooperação
internacional.
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 412) destacam que, do ponto de vista
conceitual, as organizações internacionais têm dois elementos essenciais: a permanência, ou estabilidade, e
a amplitude internacional.
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Por ser organizada de forma estável, isto é, permanente, as Organizações Internacionais são
autônomas aos seus Estados-membros. Ademais, essa característica afasta do status de organização
internacional as relações acidentais, surgidas, normalmente, por tratados (PEREIRA e QUADROS, 2011, p.
souza -- CPF:

412).
Sendo permanentes, presume-se que as organizações internacionais têm sede própria, localizada em
Marceli souza

um ou mais Estados-membros, que regularão suas atividades em seu território interno por meio dos acordos
Marceli

de instalação ou accords de siège.


André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 413) explicam que o elemento internacional
decorre da criação das organizações internacionais através de instrumentos do Direito Internacional, de
regra um tratado (o que não impede a criação de uma organização por resolução da Assembleia Geral da
ONU, por exemplo, tal como na criação do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
Roberto Luiz Silva, citando o Yearbook of International Organizations, define como critérios para a
caracterização de uma Organização internacional:

• Ter pelo menos três Estados com direito a voto;


• Ter estrutura formal;
• Os funcionários não devem ter a mesma nacionalidade;
• Pelo menos três Estados devem contribuir substancialmente para a sociedade; e
• Ter objetivo internacional (SILVA, 2020, p. 434).

5.1.2. Evolução histórica

Sidney Guerra (2019, p. 249) apresenta três fases históricas da formação das organizações
internacionais:

164
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

1ª. Desenvolvimento da diplomacia multilateral: Tem seu início com o Congresso de Viena, tendo
como principais avanços o reconhecimento da unidade da Alemanha e da Itália, a criação dos
Países Baixos e a neutralidade da Suíça. Segundo o autor, nessa primeira fase não há uma
estrutura institucionalizada de forma permanente, mas, sim, uma periodicidade dos encontros.

ATENÇÃO!
Antônio Cassese (2013, p. 140) aponta que as primeiras organizações internacionais, surgidas nessa
primeira fase, tinham caráter eminentemente técnico, como a União Postal Universal, de 1875, a União
para a Proteção da Propriedade Industrial, de 1883, e o Instituto Internacional de Agricultura, de 1905.

2ª. A criação da Liga das Nações: a partir do fim da Primeira Guerra Mundial, buscou-se a criação de
organizações com competência mais ampla, como A Liga das Nações, a Organização Internacional
do Trabalho, acentuando a vocação universalista e a estruturação orgânica para a resolução de
conflitos entre os Estados-membros.

ATENÇÃO!
Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 588) ressaltam que, além da vocação
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universalista consubstanciada na criação da Liga das Nações, nesse período iniciaram-se também as
pretensões regionalistas. Ainda que essa vontade não tenha se concretizado na Europa, nas Américas houve
um reforço da União Pan-americana.

3ª. Pós-Segunda Guerra: ao final da Segunda Guerra Mundial, ocorre uma proliferação de criação de
organizações internacionais, de âmbito global e regional, que vão do campo político (ONU, OEA
etc.), militar (OTAN), de cooperação econômica (FMI), comercial (MERCOSUL, OMC etc.), social
CPF: 073.496.444-77

(FAO) e cultural (UNESCO) (CASSESE, 2013, p. 140).

5.1.3. Personalidade jurídica internacional


souza -- CPF:

Antonio Cassese (2013, p. 140) destaca que, desde o surgimento da Liga das Nações, a questão da
personalidade jurídica internacional se colocou em voga, principalmente pelo fato de que, até então, os
Marceli souza

Estados tinham criado organismos com competência bastante limitada. Após a Segunda Guerra Mundial,
Marceli

com a difusão de novas organizações internacionais, a questão de sua personalidade foi colocada em maior
evidência.
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 414) destacam que a autonomia da vontade
das organizações internacionais, em relação aos seus Estados membros, bem como sua atuação no plano
internacional, tem por consequência sua personalidade jurídica internacional. Ian Brownlie, por sua vez,
define os seguintes critérios para a aferição da personalidade jurídica internacional de uma Organização
Internacional:
1. [Ser] uma associação permanente de estados, que prossegue fins lícitos, dotadas de
órgãos próprios;
2. [Ter] uma distinção, em termos de poderes e fins jurídicos, entre a organização e seus
Estados-membros;
3. A existência de poderes jurídicos que possam ser exercidos no plano internacional e não
unicamente no âmbito dos sistemas nacionais de um ou mais Estados (BROWNLIE, 1997, p.
709).

William Thomas Worster (2016, p. 215) destaca que, se atualmente não há muitos que rejeitam a
personalidade jurídica internacional das organizações internacionais, ainda restariam duas dúvidas: tal
atributo estaria restrito aos Estados-membros da organização ou a toda sociedade internacional? A

165
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

personalidade jurídica internacional da organização internacional depende de previsão expressa em seu


tratado constitutivo?
Em sua opinião consultiva Reparação de danos sofridos à serviço das Nações Unidas, a Corte
Internacional de Justiça parece ter respondido ambas as dúvidas, considerando que reconheceu o atributo
da personalidade jurídica internacional da Organização das Nações Unidas, independentemente de previsão
expressa em seu estatuto, que pode ser oponível inclusive a Estados não-membros da ONU.

5.1.4. Classificação das organizações internacionais

Roberto Luiz Silva (2020, p. 435) aponta que, em relação à sua natureza, as organizações
internacionais podem ser:

• Políticas: buscam gerir conflitos e agir preventivamente para a manutenção da paz e segurança
internacionais. São exemplos a ONU e a OEA.
• Técnicas: objetivam a cooperação técnica em uma área específica, como a OIT.
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 418) destacam que, quanto ao seu objeto,
as organizações internacionais são classificadas em:
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• Organizações com finalidade gerais: sendo predominantemente políticas e detêm uma


multiplicidade de fins. O principal exemplo é a ONU.
• Organizações com finalidades especiais: são aquelas que detêm um objetivo predeterminado,
subdividindo-se em:
▪ Organizações de cooperação política: são mais raras pois, em sua maioria, as organizações
políticas têm finalidades gerais, mas os autores citam como exemplo o Conselho da Europa;
CPF: 073.496.444-77

▪ Organizações de cooperação econômica: buscam o fomento e desenvolvimento econômico


dos Estados-membros, tais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI)
ou o Acordo Geral sobre pautas Aduaneiras e Comércio (GATT);
souza -- CPF:

▪ Organizações de cooperação militar: tem a finalidade específica de manutenção da paz e da


segurança dentro da área de seus Estados-membros, como a Organização do Tratado do
Marceli souza

Atlântico Norte (OTAN);


▪ Organizações de cooperação social e humanitária: têm como finalidade a defesa dos
Marceli

indivíduos ou grupos sociais, por meio da defesa de seus direitos ou pela promoção do bem-
estar social. São exemplos a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização
Internacional para a Alimentação e Agricultura (FAO);
▪ Organizações de finalidades culturais, científicas e técnicas: buscam fomentar a cooperação
entre os Estados no campo científico, cultural ou de assistência técnica. Um exemplo é a
Organização das Nações Unidas para a Educação e a Ciência (UNESCO).

Quanto ao seu alcance ou âmbito de atuação ou base territorial, as organizações internacionais


podem ser:

• Universais ou globais: buscam abranger o maior número de Estados-membros possíveis, sem


qualquer restrição geográfica (SILVA, 2020, p. 435).
• Regionais: são constituídas em razão de um critério de identificação geográfica de seus membros,
como o MERCOSUL, a OEA etc.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 539) classifica as organizações internacionais, quanto à
participação dos Estados, em:

166
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Abertas ilimitadamente: são as que permitem qualquer Estado ingressar, quem que haja
nenhuma restrição, tal qual a ONU;
• Abertas limitadamente: são as que permitem o ingresso de novos membros, mas fazem uma
restrição (normalmente geográfica) que limita o número de possíveis candidatos, como, por
exemplo, a União Europeia ou a OEA;
• Fechadas: são as organizações que não permitem a entrada de novos membros.
Roberto Luiz Silva (2020, p. 435) em relação ao seu objetivo, classifica as organizações internacionais
em:
• De cooperação: que buscam a aproximação de políticas dos Estados, que, por sua vez, não
perdem o poder de conduzi-las. O exemplo trazido é a Organização de Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE);
• De integração: são organizações que desenvolvem políticas e objetivos comuns, geridas por seus
próprios membros, como a União Europeia;
André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros (2011, p. 421) classificam as organizações
internacionais, em relação à sua estrutura jurídica, em:
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• Organizações intergovernamentais ou clássicas: caracterizada pela relação horizontal de


coordenação das soberanias estatais;
• Organizações supranacionais: fundam-se no princípio da limitação da soberania dos Estados-
membros. Aqui há uma relação de subordinação entre a Organização e os Estados-membros.

5.1.5. Estatuto jurídico


CPF: 073.496.444-77

Por serem dotadas de personalidade jurídica internacional, as organizações internacionais têm


direitos e deveres provenientes das normas (consuetudinárias e convencionais) do DIP. Tais direitos, segundo
Jorge Miranda (2009, p. 247), são de conteúdo variável e exercício de diversas intensidades, pois têm relação
souza -- CPF:

ao tratado constitutivo da organização. Contudo, é possível identificar um conteúdo mínimo.


O primeiro direito é a capacidade de concluir tratados, limitada, no entanto, ao objeto da
Marceli souza

organização. O tema é objeto da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados entre Estados e
Marceli

Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais, assinado em 1986, mas ainda pendente
de vigência internacional (sem a ratificação do Brasil, até o momento), que, no seu artigo 6º, dispõe o
seguinte:

Artigo 6º. Capacidade das organizações internacionais para concluir tratados


A capacidade de uma organização internacional para concluir tratados é regida pelas regras
da organização.

Alguns tratados firmados pelas organizações internacionais são: acordos de sede; convenções sobre
privilégios e imunidades de seus funcionários; acordos relacionados ao exercício de suas funções, como
assistência técnica etc. (CASSESE, 2013, p. 143).
Antonio Cassese (2013, p. 143) destaca também que as organizações internacionais têm o direito de
imunidade de jurisdição estatal no exercício de suas funções. A ideia é impedir que os Estados-membros
possam interferir no êxito da organização internacional em alcançar seus objetivos.
É importante destacar que, em relação a seus membros, a imunidade de jurisdição das organizações
internacionais não decorre de um costume internacional, mas de seu estatuto constitutivo. Essa é a posição
consolidada no Supremo Tribunal Federal:

DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO. DIREITO CONSTITUCIONAL. IMUNIDADE DE


JURISDIÇÃO. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). PROGRAMA DAS NAÇÕES

167
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (ONU/PNUD). RECLAMAÇÃO TRABALHISTA.


CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS NAÇÕES UNIDAS (DECRETO
27.784/1950). APLICAÇÃO.
1. Segundo estabelece a “Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas”,
promulgada no Brasil pelo Decreto 27.784, de 16 de fevereiro de 1950, “A Organização das
Nações Unidas, seus bens e haveres, qualquer que seja seu detentor, gozarão de imunidade
de jurisdição, salvo na medida em que a Organização a ela tiver renunciado em determinado
caso. Fica, todavia, entendido que a renúncia não pode compreender medidas executivas”.
2. Esse preceito normativo, que no direito interno tem natureza equivalente a das leis
ordinárias, aplica-se também às demandas de natureza trabalhista.
3. Recurso extraordinário provido. (RE 597368, Relator(a): ELLEN GRACIE, Relator(a) p/
Acórdão: TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 15/05/2013, DJe-100 DIVULG 26-05-
2014 PUBLIC 27-05-2014 EMENT VOL-02732-01 PP-00105)

Lembrando, inclusive, que o tema já foi julgado com repercussão geral:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ORGANISMO INTERNACIONAL. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES


UNIDAS ONU. PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO PNUD.
CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS NAÇÕES UNIDAS DECRETO
27.784/1950. CONVENÇÃO SOBRE PRIVILÉGIOS E IMUNIDADES DAS AGÊNCIAS
ESPECIALIZADAS DAS NAÇÕES UNIDAS DECRETO 52.288/1963. ACORDO BÁSICO DE
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ASSISTÊNCIA TÉCNICA COM AS NAÇÕES UNIDAS E SUAS AGÊNCIAS ESPECIALIZADAS


DECRETO 59.308/1966. IMPOSSIBILIDADE DE O ORGANISMO INTERNACIONAL VIR A SER
DEMANDADO EM JUÍZO, SALVO EM CASO DE RENÚNCIA EXPRESSA À IMUNIDADE DE
JURISDIÇÃO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO EM PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. CONTROVÉRSIA CONSTITUCIONAL DOTADA DE REPERCUSSÃO GERAL.
REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. (RE 1034840 RG, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado
em 05/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-143 DIVULG
CPF: 073.496.444-77

29-06-2017 PUBLIC 30-06-2017)

Sidney Guerra (2019, p. 268) aponta como direitos correlatos às imunidades os de isenção fiscal,
inviolabilidade das comunicações, dos locais afetos às Organizações Internacionais e de seus arquivos.
Roberto Luiz Silva (2020, p. 437) aponta, ainda, o direito de legação das organizações internacionais,
souza -- CPF:

que poderão enviar representantes aos Estados para o desempenho de suas atividades.
Os Estados, por sua vez, têm o dever de proteção dos funcionários das Organizações Internacionais
Marceli souza

no exercício de suas funções. Em caso de descumprimento, surge o direito de reparação pelos Estados à
Marceli

Organização, em caso de danos aos seus bens e agentes. Ambos os direitos foram objeto da opinião
consultiva Reparação de danos sofridos à serviço das Nações Unidas, da Corte Internacional de Justiça, de
1949. Nesse caso, a CIJ entendeu que a Organização Internacional, e não o Estado de sua nacionalidade, que
ofereceria a proteção diplomática para o ressarcimento dos danos.
Antonio Cassese (2013, p. 144) destaca o direito de atuação coercitiva das Organizações
Internacionais em caso de descumprimento dos Estados de suas obrigações. Essa atuação pode ser, quando
possível, por meio do acesso direito à Cortes Internacionais ou atuando internamente, com medidas previstas
em seus normativos internos, como a possibilidade de impedir que um Estado-parte tenha direito ao voto
nos órgãos da organização enquanto mantida sua inadimplência.
Sidney Guerra (2019, p. 271) destaca que as Organizações Internacionais podem ser
responsabilizadas internacionalmente em razão da atuação de seus órgãos ou pela atuação de seus
agentes, como no caso das indenizações pagas pela ONU aos estrangeiros no Congo decorrentes da atuação
de suas forças especiais (SILVA, 2020, p. 436).

5.1.6. Sucessão das organizações internacionais

168
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 615) destacam que, assim como nos
Estados, a questão da sucessão das organizações internacionais é um problema a ser enfrentado. Sidney
Guerra (2019, p. 279) explica que a extinção de uma organização internacional pode ser um ato instantâneo
ou sucessivo, consequente de um caso fortuito ou pela vontade de seus membros.
O autor aponta, ainda, que a extinção de uma Organização Internacional tem como efeitos (GUERRA,
2019, p. 279):

• Fim da vigência de seus atos;


• Fim do vínculo com os funcionários e estrutura;
• Impossibilidade de prática de atos na vida internacional.

Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 615) ressaltam que, na prática, dificilmente
uma organização sofre uma liquidação total, sendo mais comum a entrega de seu patrimônio a uma
organização preexistente ou a criação de outra, tal como ocorrido nos casos da Sociedade das Nações e a
ONU e da CPJI (Corte Permanente de Justiça Internacional) e a CIJ (Corte Internacional de Justiça).

QUESTÕES
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209. (CESPE/CEBRASPE - 2003 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A República de Utopia e o Reino de
Lilliput são dois Estados nacionais vizinhos cuja relação tornou-se conflituosa nos últimos anos devido à
existência de sérios indícios de que Lilliput estaria prestes a desenvolver tecnologia suficiente para a
fabricação de armamentos nucleares, fato que Utopia entendia como uma ameaça direta a sua segurança.
Após várias tentativas frustradas de fazer cessar o programa nuclear lilliputiano, a República de Utopia
promoveu uma invasão armada a Lilliput em dezembro de 2001 e, após uma guerra que durou três meses,
CPF: 073.496.444-77

depôs o rei e promoveu a convocação da Assembléia Nacional Constituinte, que outorgou a Lilliput sua
atual constituição. Nessa constituição, que é democrática e republicana, as antigas províncias foram
convertidas em estados e foi instituído, no lugar do antigo Reino de Lilliput, a atual República Federativa
Lilliputiana. A partir dessa situação hipotética, julgue o item a seguir
souza -- CPF:

O direito internacional não consagra o princípio de que a República Federativa Lilliputiana teria direito a
Marceli souza

substituir o Reino de Lilliput nas organizações internacionais de que este reino fizesse parte.
Marceli

210. (TRF - 4ª REGIÃO - 2012 - TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal) Assinale a alternativa correta.
a) No âmbito da Organização das Nações Unidas, as decisões da Assembleia Geral, em questões
importantes, serão tomadas por maioria de três quintos dos membros presentes e votantes.
b) De acordo com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica),
excepcionalmente, admite-se a expulsão coletiva de estrangeiros.
c) São organizações internacionais com vocação universal e atuação especializada: a Organização
Internacional do Trabalho, a Organização Mundial de Saúde, a Organização para a Alimentação e
Agricultura, o Fundo Monetário Internacional e a Anistia Internacional.
d) A estrutura da Organização Internacional do Trabalho compreende uma Conferência Geral e um
Conselho de Administração, ambos compostos por representantes dos Estados-membros, cujas
deliberações são tomadas por maioria absoluta.
e) As organizações internacionais diferenciam-se das organizações não governamentais, porque estas, em
geral, são regidas em sua constituição pelo direito interno do país, ou dos países, em que estão constituídas
e registradas e têm suas sedes legais.

169
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

5.2. Organização das Nações Unidas

5.2.1. Propósitos

A Organização das Nações Unidas é uma organização internacional, de vocação universal, que tem
por finalidade expressa a manutenção da paz e da segurança internacionais, a cooperação entre os Estados
e o desenvolvimento das relações amistosas entre eles:

Carta das Nações Unidas


Artigo 1. Os propósitos das Nações unidas são:
1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente,
medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer
ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça
e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que
possam levar a uma perturbação da paz;
2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de
igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas
apropriadas ao fortalecimento da paz universal;
3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de
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caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito


aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo,
língua ou religião; e
4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses
objetivos comuns.

5.2.2. História
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Não obstante a assinatura da Carta da ONU ter ocorrido em 26 de junho de 1945, seu surgimento
ocorre durante o período final da Segunda Guerra Mundial:

• 14 de agosto de 1941: Franklin Delano Roosevelt e Winston Churchill, após reunião secreta no
souza -- CPF:

navio HMS Prince of Wales, emitiram uma declaração de princípios conhecida como “Carta do
Atlântico” (GUERRA, 2019, p. 291) ou “Carta Atlântica” (SILVA, 2020, p. 443), contendo oito
Marceli souza

pontos em busca da paz mundial;


• 1º de janeiro de 1942: com a entrada dos Estados Unidos e da União Soviética na guerra, foi
Marceli

realizada a Conferência de Washington, em que foi elaborada a Declaração das Nações Unidas,
com a assinatura de 24 países, formando uma aliança militar contra o Eixo;
• 30 de outubro de 1943: representantes da China, URSS, Reino Unido e Estados Unidos realizam a
Conferência de Moscou, da qual é publicada a Declaração de Moscou, que tinha como objeto
anunciar a necessidade de criação de um organismo internacional com o intuito de garantir a paz
mundial após o fim da guerra;
• 21 de agosto a 28 de setembro de 1944: os quatro Estados se reúnem na Conferência de
Dumbarton Oaks (EUA) e elaboram um protocolo de intenções sobre a futura organização
internacional;
• 3 a 11 de janeiro de 1945: os quatro Estados se reúnem novamente na Conferência de Yalta
(URSS), cujo objeto foi o sistema de votação do Conselho de Segurança e a escolha do local da
Conferência das Nações Unidas;
• 25 de abril a 26 de julho de 1945: Representantes de 50 países se reúnem na Conferência de São
Francisco, elaborando a Carta das Nações Unidas e as normas atinentes à Corte Internacional de
Justiça, sendo o tratado aberto à ratificação;

170
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• 24 de outubro de 1945: é a data de vigência da Carta da ONU, ocorrida após o depósito da


ratificação dos membros do Conselho de Segurança e a maioria dos demais signatários.

5.2.3. Membros da organização

Os membros da ONU podem ser classificados em:

• Membros originários: são os que participaram da Conferência de São Francisco e os que, mesmo
não tendo participado, assinaram a Declaração das Nações Unidas, como a Polônia (SILVA, 2020,
p. 445). O Brasil é um membro originário da ONU.

Artigo 3 da Carta da ONU.


Os Membros originais das Nações Unidas serão os Estados que, tendo participado da
Conferência das Nações Unidas sobre a Organização Internacional, realizada em São
Francisco, ou, tendo assinado previamente a Declaração das Nações Unidas, de 1 de janeiro
de 1942, assinarem a presente Carta, e a ratificarem, de acordo com o Artigo 110.

• Membros admitidos ou eleitos: são os Estados que ingressaram na organização após a


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apresentação de sua candidatura, com recomendação favorável do Conselho de Segurança e


decisão da Assembleia Geral.

As condições e procedimentos de admissão dos membros eleitos estão previstas no artigo 4, da Carta
da ONU:

Artigo 4.
1. A admissão como Membro das Nações Unidas fica aberta a todos os Estados amantes da
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paz que aceitarem as obrigações contidas na presente Carta e que, a juízo da Organização,
estiverem aptos e dispostos a cumprir tais obrigações.
2. A admissão de qualquer desses Estados como Membros das Nações Unidas será efetuada
por decisão da Assembleia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança.
souza -- CPF:

Sidney Guerra (2019, p. 297) destaca que não há diferenças de tratamento entre os membros
originários e eleitos, tendo a nomenclatura a função de identificação dos Estados-membros que deram
Marceli souza

origem à ONU.
Nos termos dos artigos 5 e 6 da Carta da ONU, um membro da organização poderá ser suspenso ou
Marceli

expulso da ONU. Em ambas as hipóteses, será necessária a recomendação do Conselho de Segurança e


decisão da Assembleia Geral. A distinção é que, na hipótese de suspensão, o Estado-membro é objeto de
uma ação preventiva ou coercitiva por parte do Conselho de Segurança, enquanto na expulsão, o Estado-
membro deve ter violado persistentemente os princípios da Carta:

Artigo 5.
O Membro das Nações Unidas, contra o qual for levada a efeito ação preventiva ou
coercitiva por parte do Conselho de Segurança, poderá ser suspenso do exercício dos
direitos e privilégios de Membro pela Assembleia Geral, mediante recomendação do
Conselho de Segurança. O exercício desses direitos e privilégios poderá ser restabelecido
pelo conselho de Segurança.

Artigo 6.
O Membro das Nações Unidas que houver violado persistentemente os Princípios contidos
na presente Carta, poderá ser expulso da Organização pela Assembleia Geral mediante
recomendação do Conselho de Segurança.

Tais decisões (de suspensão de privilégios e exclusão) necessitam de um quórum de dois terços dos
membros presentes e votantes, nos termos do artigo 18.2 da Carta:

171
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 18. (...)


2. As decisões da Assembleia Geral, em questões importantes, serão tomadas por maioria
de dois terços dos Membros presentes e votantes. Essas questões compreenderão:
recomendações relativas à manutenção da paz e da segurança internacionais; à eleição dos
Membros não permanentes do Conselho de Segurança; à eleição dos Membros do Conselho
Econômico e Social; à eleição dos Membros do Conselho de Tutela, de acordo como
parágrafo 1 (c) do Artigo 86; à admissão de novos Membros das Nações Unidas; à suspensão
dos direitos e privilégios de Membros; à expulsão dos Membros; questões referentes o
funcionamento do sistema de tutela e questões orçamentárias.

5.2.4. Idiomas

A Organização das Nações Unidas tem seis idiomas oficiais:

• Árabe;
• Chinês;
• Espanhol;
• Francês;

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Inglês; e
• Russo.

Seus órgãos especializados, normalmente, não trabalham com todos os idiomas. A CIJ, por exemplo,
trabalha apenas com o inglês e o francês. Já o Conselho Econômico e Social, com o inglês, francês e espanhol.

5.2.5. Conselho de Segurança


CPF: 073.496.444-77

Os órgãos principais da ONU são:


• O Conselho de Segurança;
• A Assembleia Geral;
souza -- CPF:

• O Secretariado;
• A Corte Internacional de Justiça;
Marceli souza

• O Conselho Econômico e Social;


• O Conselho de Tutela.
Marceli

O Conselho de Segurança da ONU tem a função de manutenção da paz e da segurança


internacionais, com previsão nos artigos 23 a 54 da Carta. Segundo Malcolm N. Shaw (2018, p. 893), o órgão
foi criado para atuar como um órgão executivo eficiente e de funcionamento contínuo, com a participação
direta de apenas alguns Estados-membros da organização.
Ele é formado por 15 membros, sendo 5 permanentes (China, Estados Unidos, França, Reino Unido
e Rússia) e outros 10 rotativos, com mandato de 2 anos, vedada sua recondução ao biênio imediatamente
subsequente. Os membros rotativos deverão representar de forma equitativa:

172
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Europa Ocidental
e outros Estados
Europa Oriental

América Latina e
Caribe
África e Ásia

• Europa Ocidental e outros Estados: 2 lugares;


• Europa Oriental: 1 lugar;
• América Latina e Caribe: 2 lugares;
• África e Ásia: 5 lugares.

Em 2022, o Brasil ocupará pela 11ª vez um assento no Conselho de Segurança.


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CONSELHO DE SEGURANÇA
Composição
Artigo 23.
1. O Conselho de Segurança será composto de quinze Membros das Nações Unidas. A
República da China, a França, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, o Reino Unido
da Grã-Bretanha e Irlanda do norte e os Estados unidos da América serão membros
permanentes do Conselho de Segurança. A Assembleia Geral elegerá dez outros Membros
CPF: 073.496.444-77

das Nações Unidas para Membros não permanentes do Conselho de Segurança, tendo
especialmente em vista, em primeiro lugar, a contribuição dos Membros das Nações Unidas
para a manutenção da paz e da segurança internacionais e para os outros propósitos da
Organização e também a distribuição geográfica equitativa.
2. Os membros não permanentes do Conselho de Segurança serão eleitos por um período
souza -- CPF:

de dois anos. Na primeira eleição dos Membros não permanentes do Conselho de


Segurança, que se celebre depois de haver-se aumentado de onze para quinze o número de
Marceli souza

membros do Conselho de Segurança, dois dos quatro membros novos serão eleitos por um
período de um ano. Nenhum membro que termine seu mandato poderá ser reeleito para o
Marceli

período imediato.
3. Cada Membro do Conselho de Segurança terá um representante.

A presidência do Conselho de Segurança é rotativa, por ordem alfabética, por um período de um


mês. O Conselho tem reuniões periódicas, que podem ser feitas fora da sede da organização.
Cada membro do Conselho tem direito a um voto. Contudo, o sistema de votação é distinto, segundo
a natureza da deliberação. As questões processuais necessitam de 9 votos afirmativos. Já os outros assuntos
(questões substantivas ou materiais) necessitam, além dos 9 votos afirmativos, que não haja nenhum voto
negativo de um dos membros permanentes, surgindo o chamado poder de veto:

Votação
Artigo 27, da Carta da ONU.
1. Cada membro do Conselho de Segurança terá um voto.
2. As decisões do conselho de Segurança, em questões processuais, serão tomadas pelo
voto afirmativo de nove Membros.
3. As decisões do Conselho de Segurança, em todos os outros assuntos, serão tomadas pelo
voto afirmativo de nove membros, inclusive os votos afirmativos de todos os membros
permanentes, ficando estabelecido que, nas decisões previstas no Capítulo VI e no
parágrafo 3 do Artigo 52, aquele que for parte em uma controvérsia se absterá de votar.

173
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Considerando-se que a Carta da ONU é silente quanto a quais seriam as questões processuais, na
prática, compete ao próprio Conselho de Segurança decidir.
A abstenção ou ausência de um dos membros permanentes do Conselho de Segurança em uma
deliberação não é considerada voto negativo.
As resoluções do Conselho de Segurança são obrigatórias, nos termos do artigo 25 da Carta:

Artigo 25. Os Membros das Nações Unidas concordam em aceitar e executar as decisões do
Conselho de Segurança, de acordo com a presente Carta.

Se, anteriormente, as decisões do órgão, para sua executoriedade, dependiam de decreto executivo,
atualmente, em razão da Lei n.º 13.810/2019, há previsão expressa para a executoriedade imediata das
resoluções do Conselho de Segurança, sem prejuízo de publicação em língua portuguesa, para fins de
publicidade de seus extratos no diário oficial da União, pelo Ministério das Relações Exteriores:

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o cumprimento de sanções impostas por resoluções do
Conselho de Segurança das Nações Unidas, incluída a indisponibilidade de ativos de pessoas
naturais e jurídicas e de entidades, e a designação nacional de pessoas investigadas ou
acusadas de terrorismo, de seu financiamento ou de atos a ele correlacionados. (...)
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073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Art. 6º As resoluções sancionatórias do Conselho de Segurança das Nações Unidas e as


designações de seus comitês de sanções são dotadas de executoriedade imediata na
República Federativa do Brasil. (...)

Art. 7º Sem prejuízo da obrigação de cumprimento imediato das resoluções sancionatórias


do Conselho de Segurança das Nações Unidas e das designações de seus comitês de
sanções, as resoluções e as designações de que trata este Capítulo, ou seus extratos, serão
publicadas no Diário Oficial da União pelo Ministério das Relações Exteriores, em língua
portuguesa, para fins de publicidade.
CPF: 073.496.444-77

5.2.6. Assembleia Geral

A Assembleia Geral da ONU é um órgão colegiado das Nações Unidas, composta por todos os
souza -- CPF:

Estados-membros, cabendo um voto a cada um deles. Cada Estado poderá ser representado por cinco
membros.
Marceli souza

A Assembleia Geral se reúne em sessões ordinárias uma vez ao ano e em sessões extraordinárias
Marceli

quantas vezes forem necessárias.


O sistema de votação é de maioria simples, para questões simples, e maioria qualificada de dois
terços para questões importantes. Ao contrário do que acontece no Conselho de Segurança, a Carta da ONU
traz o rol de decisões tidas por importantes:

Artigo 18.
1. Cada Membro da Assembleia Geral terá um voto.
2. As decisões da Assembleia Geral, em questões importantes, serão tomadas por maioria
de dois terços dos Membros presentes e votantes. Essas questões compreenderão:
recomendações relativas à manutenção da paz e da segurança internacionais; à eleição dos
Membros não permanentes do Conselho de Segurança; à eleição dos Membros do Conselho
Econômico e Social; à eleição dos Membros do Conselho de Tutela, de acordo como
parágrafo 1 (c) do Artigo 86; à admissão de novos Membros das Nações Unidas; à suspensão
dos direitos e privilégios de Membros; à expulsão dos Membros; questões referentes o
funcionamento do sistema de tutela e questões orçamentárias.
3. As decisões sobre outras questões, inclusive a determinação de categoria adicionais de
assuntos a serem debatidos por uma maioria dos membros presentes e que votem.

A Assembleia Geral tem competência ampla, podendo discutir quaisquer assuntos correlatos às
finalidades da Carta da ONU ou dos órgãos da organização:

174
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 10.
A Assembleia Geral poderá discutir quaisquer questões ou assuntos que estiverem dentro
das finalidades da presente Carta ou que se relacionarem com as atribuições e funções de
qualquer dos órgãos nela previstos e, com exceção do estipulado no Artigo 12, poderá fazer
recomendações aos Membros das Nações Unidas ou ao Conselho de Segurança ou a este e
àqueles, conjuntamente, com referência a qualquer daquelas questões ou assuntos.

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 402)
explicam que a Assembleia Geral tem atribuições obrigatórias e facultativas:

• Atribuições obrigatórias: são privativas do órgão, sendo elas:


▪ a consideração e aprovação do orçamento da organização (artigo 17);
▪ a eleição dos membros não permanentes do Conselho de Segurança (artigo 23.1), dos
membros do Conselho Econômico e Social (artigo 61.1) e do Conselho de Tutela (artigo
86.1.c);
▪ a admissão de novos membros na organização (artigo 4.2);
▪ a suspensão e a expulsão destes (artigos 5 e 6);
▪ a nomeação do Secretário-Geral das Nações Unidas (artigo. 97);
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▪ a eleição, simultaneamente com o Conselho de Segurança, dos juízes da Corte Internacional


de Justiça (ECIJ, artigo 4);
▪ a adoção de regras para as nomeações, pelo Secretário-Geral, do pessoal do secretariado das
Nações Unidas (artigo. 101.1);
▪ o exame dos relatórios anuais do Conselho de Segurança (artigo 15.1), bem como dos
relatórios dos outros órgãos das Nações Unidas (artigo 15.2);
▪ o estudo dos meios de promover a cooperação internacional, no terreno político, e a sua
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codificação, bem como dos meios de promover a cooperação internacional nos terrenos
econômico, social, cultural, educacional e sanitário, e de favorecer o pleno gozo dos direitos
humanos e das liberdades fundamentais, por parte de todos os povos, sem distinção de raça,
sexo, língua ou religião (artigo 13.1).
souza -- CPF:

• Atribuições facultativas: são as que permitem a concorrência com a competência de outros


Marceli souza

órgãos, tais como:


▪ Fazer recomendações a qualquer membro ou ao Conselho de Segurança sobre quaisquer
Marceli

questões ou assuntos que estejam no âmbito das finalidades da Carta das Nações Unidas ou
que se relacionem com as atribuições e funções de qualquer dos órgãos nela previstos (artigo
10);
▪ Fazer recomendações a qualquer membro e/ou ao Conselho de Segurança, considerando os
princípios gerais de cooperação na manutenção da paz e da segurança internacionais (artigo
11.1) — excluída a hipótese de o Conselho de Segurança exercer, em relação a qualquer
controvérsia ou situação, as funções que lhe competem;
▪ discutir quaisquer questões relativas à manutenção da paz e da segurança internacionais que
lhe forem submetidas por qualquer membro das Nações Unidas, ou pelo Conselho de
Segurança, ou por um Estado que não seja membro da ONU (artigo 11.2);
▪ solicitar a atenção do Conselho de Segurança para situações que possam constituir ameaça
à paz e à segurança internacionais (artigo 11.3).

Para o exercício de suas atribuições, a Assembleia Geral conta com o auxílio de seis comissões:

• 1º Comitê: Desarmamento e segurança internacional;


• 2º Comitê: Econômico e financeiro;

175
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• 3º Comitê: Social, humanitário e cultural;


• 4º Comitê: Político especial e descolonização;
• 5º Comitê: Administrativo e orçamentário; e
• 6º Comitê: Jurídico.

Além disso, podem ser criados órgãos subsidiários como painéis, (outros) comitês, comissões,
conselhos e grupos de trabalho, para o harmonizar as diversas abordagens na consecução dos objetivos do
órgão.

5.2.7. Conselho Econômico e Social

O Conselho Econômico e Social é um órgão formado por 54 membros, eleitos pela Assembleia Geral,
para um mandato de três anos, renováveis, tendo sua composição formada conforme critérios geopolíticos:

• 14 Estados africanos;
• 11 Estados asiáticos;
• 10 Estados latino-americanos;
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• 6 Estados do leste europeu;


• 13 Estados da Europa Ocidental e “demais” Estados.

Conselho Econômico e Social


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Estados africanos

Estados asiáticos
souza -- CPF:

Estados latino-americanos
Marceli souza

Estados do leste europeu


Marceli

Estados da Europa Ocidental


e “demais” Estados

As atribuições do Conselho Econômico e Social estão previstas no artigo 62 da Carta da ONU:

Artigo 62.
1. O Conselho Econômico e Social fará ou iniciará estudos e relatórios a respeito de assuntos
internacionais de caráter econômico, social, cultural, educacional, sanitário e conexos e
poderá fazer recomendações a respeito de tais assuntos à Assembleia Geral, aos Membros
das Nações Unidas e às entidades especializadas interessadas.
2. Poderá, igualmente, fazer recomendações destinadas a promover o respeito e a
observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para todos.
3. Poderá preparar projetos de convenções a serem submetidos à Assembleia Geral, sobre
assuntos de sua competência.
4. Poderá convocar, de acordo com as regras estipuladas pelas Nações Unidas, conferências
internacionais sobre assuntos de sua competência.

176
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

As decisões do órgão exigem o quórum de aprovação de maioria simples, tendo, cada um dos seus
membros, o direito a um voto:

Votação
Artigo 67.
1. Cada Membro do Conselho Econômico e Social terá um voto.
2. As decisões do Conselho Econômico e Social serão tomadas por maioria dos membros
presentes e votantes.

5.2.8. Conselho de Tutela

O Conselho de Tutela era um órgão das Nações Unidas, encarregado da condução dos povos sob o
regime de tutela à sua independência, considerando-se o princípio da autodeterminação dos povos.
Não obstante estar previsto nos artigos 86 a 91 da Carta da ONU, suas operações foram suspensas
em 1º/11/1994.

5.2.9. Secretariado
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O Secretariado da ONU é um órgão permanente da organização, com funções administrativas e de


registro e publicação dos tratados internacionais.
O Secretário-Geral da ONU é indicado pela Assembleia Geral, após recomendação do Conselho de
Segurança, para um mandato de cinco anos, permitida uma recondução.

Artigo 97. O Secretariado será composto de um Secretário-Geral e do pessoal exigido pela


Organização. O Secretário-Geral será indicado pela Assembleia Geral mediante a
recomendação do Conselho de Segurança. Será o principal funcionário administrativo da
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Organização.

A nomeação do restante do pessoal do órgão compete ao Secretário-Geral, respeitadas as regras


estabelecidas pela Assembleia Geral e a Carta da ONU.
O Secretário-Geral participará das reuniões dos órgãos principais da ONU, podendo, ainda, chamar a
souza -- CPF:

atenção ao Conselho de Segurança de assuntos que possam pôr em risco a manutenção da paz e da
Marceli souza

segurança internacionais:
Marceli

Artigo 98. O Secretário-Geral atuará neste caráter em todas as reuniões da Assembleia


Geral, do Conselho de Segurança, do Conselho Econômico e Social e do Conselho de Tutela
e desempenhará outras funções que lhe forem atribuídas por estes órgãos. O Secretário-
Geral fará um relatório anual à Assembleia Geral sobre os trabalhos da Organização.

Artigo 99. O Secretário-Geral poderá chamar a atenção do Conselho de Segurança para


qualquer assunto que em sua opinião possa ameaçar a manutenção da paz e da segurança
internacionais.

Uma das principais funções do Secretário-Geral é a de “bons ofícios”, na tentativa de resolução


pacífica de controvérsias envolvendo os Estados-membros da ONU.

5.2.10. Corte Internacional de Justiça

A Corte Internacional de Justiça (CIJ) sucedeu a Corte Permanente de Justiça Internacional, sendo o
principal — e não o único — órgão jurisdicional da Organização das Nações Unidas, cujo estatuto encontra-
se anexo à Carta da ONU, tendo sido elaborado com base no estatuto da CPIJ:

177
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 92. A Corte Internacional de Justiça será o principal órgão judiciário das Nações
Unidas. Funcionará de acordo com o Estatuto anexo, que é baseado no Estatuto da Corte
Permanente de Justiça Internacional e faz parte integrante da presente Carta.

A CIJ é uma instituição jurisdicional permanente (BRANT, 2005, p. 55), tendo iniciado suas funções
em 22 de maio de 1947.
O tribunal é composto por 15 (quinze) membros, eleitos pela Assembleia Geral e pelo Conselho de
segurança, sendo vedada a presença de dois membros de mesma nacionalidade:

Artigo 3.
1. A Corte será composta de quinze membros, não podendo configurar entre eles dois
nacionais do mesmo Estado.
2. A pessoa que possa ser considerada nacional de mais de um Estado será, para efeito de
sua inclusão como membro da Corte, considerada nacional do Estado em que exercer
ordinariamente seus direitos civis e políticos.

A escolha dos magistrados é feita para um mandato de 9 anos, com base na distribuição geográfica
equitativa, sendo permitida uma reeleição.

Artigo 9. Em cada eleição, os eleitores devem ter presente não só que as pessoas a serem
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eleitas possuam individualmente as condições exigidas, mas também que, no conjunto


dêsse órgão judiciário, seja assegurada a representação das mais altas formas da civilização
e dos principais sistemas jurídicos do mundo. (...)

Artigo 13 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. Os membros da Corte serão eleitos por nove anos e poderão ser reeleitos; fica
estabelecido, entretanto, que, dos juízes eleitos na primeira eleição, cinco terminarão suas
funções no fim de um período de três anos, e outros cinco no fim de um período de seis
anos.
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Leonardo Nemer Caldeira Brant (2005, p. 59) explica que, por costume, entre os membros da CIJ
encontra-se um representante de cada um dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança
(China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia). Assim sendo, só existem 10 (dez) vagas a serem
souza -- CPF:

preenchidas, de fato, pelos demais Estados considerando a seguinte proporção:


Marceli souza

• América-latina: 2 juízes;
• África: 3 juízes;
Marceli

• Ásia: 3 juízes;
• Europa Oriental: 2 juízes;
• Europa Ocidental e demais Estados: 5 juízes.

CURIOSIDADE!
Em 2017, o Reino Unido não conseguiu eleger um novo membro, sendo Christopher Greenwood
preterido pelo indiano Dalveer Bhandari, com o apoio de 22 Estados-membros da União Europeia (incluindo
a França). Roberto Luiz Silva (2020, p. 452) aponta que a ausência de um membro Reino Unido, desde a
criação da CIJ, é um efeito do BREXIT, isto é, a saída do Reino Unido da União Europeia.

O Brasil tem tradição em compor a CIJ. Antônio Augusto Cançado Trindade é membro da corte desde
2009. Também integraram o tribunal: Francisco Rezek (1996-2006), José Sette Câmara (1979-88), Levi
Fernandes Carneiro (1951-1955) e José Philadelpho de Barros e Azevedo (1946-51). Rui Barbosa chegou a ser
eleito para a Corte Permanente de Justiça Internacional para o mandato de 1921-30, mas, por falecer em
1923, não chegou a participar de nenhuma sessão da Corte, sendo substituído por Epitácio Pessoa, com
mandato de 1923 a 1930, após exercer o cargo de Presidente da República (SILVA, 2020, p. 452).

178
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

A CIJ exerce competência consultiva e contenciosa.


Em sua competência contenciosa, adotou-se o sistema de jurisdição facultativa como regra, isto é,
a Corte só decidirá quando ambas as partes concordarem em enviar o caso a julgamento.
É possível, ainda, que um tratado internacional preveja a cláusula de jurisdição contenciosa
compulsória ou que o Estado emita declaração aceitando a jurisdição obrigatória do tribunal, denominada
de cláusula facultativa de jurisdição obrigatória.
Apenas Estados têm acesso à jurisdição contenciosa da Corte, ainda que eles não sejam membros
da ONU.

Artigo 34 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. Só os Estados poderão ser partes em questões perante a Corte.
2. Sobre as questões que lhe forem submetidas, a Corte, nas condições prescritas por seu
Regulamento, poderá solicitar Informação, de organizações públicas internacionais, e
receberá as informações que lhe forem prestadas, por iniciativa própria, pelas referidas
organizações.
3. Sempre que, no Julgamento. de uma questão perante a Corte, for discutida a
interpretação de instrumento constitutivo de uma organização pública internacional ou de
uma convenção internacional adotada em virtude do mesmo, o Escrivão dará conhecimento
disso à organização pública internacional interessada e lhe encaminhará cópias de todo o
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expediente escrito.

Artigo 35 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. A Corte estará aberta aos Estados que são parte no presente Estatuto.
2. As condições pelas quais a Corte estará aberta a outros Estados serão determinadas, pelo
Conselho de Segurança, ressalvadas as disposições especiais dos tratados vigentes; em
nenhum caso, porém, tais condições colocarão as partes em posição de desigualdade
perante a Corte.
CPF: 073.496.444-77

3. Quando um Estado que não é Membro das Nações Unidas for parte numa questão, a
Corte fixará a importância com que ele deverá, contribuir para as despesas da Corte. Esta
disposição não será aplicada, se tal Estado já contribuir para as referidas despesas.

A competência ratione materiae da CIJ é ampla, compreendendo todas as questões relacionadas ao


souza -- CPF:

Direito Internacional, em especial previstas na Carta da ONU:


Marceli souza

Artigo 36 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. A competência da Corte abrange todas as questões que as partes lhe submetam, bem
Marceli

como todos os assuntos especialmente previstos na Carta das Nações Unidas ou em


tratados e convenções em vigor.
2. Os Estados partes no presente Estatuto poderão, em qualquer momento, declarar que
reconhecem como obrigatória, ipso facto e sem acordo especial, em relação a qualquer
outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição da Corte em todas as controvérsias
de ordem jurídica que tenham por objeto:
a) a interpretação de um tratado;
b) qualquer ponto de direito internacional;
c) a existência de qualquer fato que, se verificado, constituiria a violação de um
compromisso internacional;
d) a natureza ou a extensão da reparação devida pela rutura de um compromisso
internacional.
3. As declarações acima mencionadas poderão ser feitas pura e simplesmente ou sob
condição de reciprocidade da parte de vários ou de certos Estados, ou por prazo
determinado.
4. Tais declarações serão depositadas junto ao Secretário Geral das Nações Unidas, que as
transmitirá, por cópia, às partes contratantes do presente Estatuto e ao Escrivão da Côrte.
5. Nas relações entre as partes contratantes do presente Estatuto, as declarações feitas de
acordo com o artigo 36 do Estatuto da Corte Permanente de Justiça Internacional e que
ainda estejam em vigor serão consideradas como importando na aceitação da jurisdição
obrigatória da Corte Internacional de Justiça pelo período em que ainda devem vigorar e de
conformidade com os seus termos.

179
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

No curso do processo, a CIJ pode proferir medidas provisórias (equivalentes às medidas cautelares),
a fim de preservar os direitos das partes:

Artigo 41 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. A Corte terá a faculdade de indicar, se julgar que as circunstâncias o exigem, quaisquer
medidas provisórias que devem ser tomadas para preservar os direitos de cada parte.
2. Antes que a sentença seja proferida, as partes e o Conselho de Segurança deverão ser
informados imediatamente das medidas sugeridas.

As sentenças da CIJ são irrecorríveis e oponíveis apenas às partes do processo:

Artigo 59 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945). A decisão da Corte só será


obrigatória para as partes litigantes e a respeito do caso em questão.

Artigo 60 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945). A sentença é definitiva e


inapelável. Em caso de controvérsia quanto ao sentido e ao alcance da sentença, caberá à
Corte interpretá-la a pedido de qualquer das partes.

O Estatuto da Corte Internacional de Justiça (ECJI) prevê a possibilidade de revisão das sentenças, em
caso de fato superveniente que pudesse influenciar de forma decisiva na decisão, quando de sua prolação.
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Ademais, tal fato não pode ter sido omitido por negligência do interessado. O prazo de revisão da decisão é
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de 10 (dez) anos da publicação da sentença:

Artigo 61 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça (1945).


1. O pedido de revisão de uma sentença só poderá ser feito em razão do descobrimento de
algum fato suscetível de exercer influência decisiva, o qual, na ocasião de ser proferida a
sentença, era desconhecido da Corte e também da parte que solicita a revisão, contanto
que tal desconhecimento não tenha sido devido à negligência.
2. O processo de revisão será aberto por uma sentença da Corte, na qual se consignará
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expressamente a existência do fato novo, com o reconhecimento do caráter que determina


a abertura da revisão e a declaração de que é cabível a solicitação nesse sentido.
3. A Corte poderá subordinar a abertura do processo de revisão à prévia execução da
sentença.
4. O pedido de revisão deverá ser feito no prazo máximo de seis meses a partir do
souza -- CPF:

descobrimento do fato novo.


5. Nenhum pedido de revisão poderá ser feito depois de transcorridos 10 anos da data da
Marceli souza

sentença.
Marceli

Em sua competência consultiva, a Corte é acessada pela Assembleia Geral, pelo Conselho de
Segurança, ou qualquer órgão das Nações Unidas, desde que autorizados pela Assembleia Geral, nos termos
do artigo 96 da Carta da ONU:

Artigo 96.
1. A Assembleia Geral ou o Conselho de Segurança poderá solicitar parecer consultivo da
Corte Internacional de Justiça, sobre qualquer questão de ordem jurídica.
2. Outros órgãos das Nações Unidas e entidades especializadas, que forem em qualquer
época devidamente autorizados pela Assembleia Geral, poderão também solicitar
pareceres consultivos da Corte sobre questões jurídicas surgidas dentro da esfera de suas
atividades.

Pela interpretação do dispositivo, é possível afirmar que a Assembleia Geral e o Conselho de


Segurança têm legitimidade universal, enquanto os órgãos especializados, além de ter autorização da
Assembleia Geral, devem demonstrar pertinência temática de sua consulta com suas atividades.

180
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
211. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco – Diplomata) O Brasil participou das negociações que levaram à
criação da ONU e à adoção de sua Carta. Membros da delegação brasileira defenderam, com êxito, a inclusão,
na Carta, dos princípios da não intervenção e da igualdade de direitos dos homens e das mulheres.
212. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco – Diplomata) O Brasil foi o primeiro país latino-americano a
ocupar assento não permanente bienal no Conselho de Segurança (1946-1947). Hoje, integra o G-4
(juntamente com a Alemanha, a Índia e o Japão), que defende a expansão do Conselho de Segurança na
categoria de membros permanentes, mantendo inalterado o número de membros não permanentes do
órgão.
213. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A Corte Internacional de Justiça (CIJ), cujo estatuto
é parte integrante da Carta da ONU, é o principal órgão judiciário da ONU e delibera a respeito de conflitos
jurídicos entre Estados, além de preparar pareceres consultivos. Atualmente, a Corte conta um juiz brasileiro
entre seus 15 membros.
214. (CESPE/CEBRASPE - 2012 - Instituto Rio Branco – Diplomata) O Brasil, que consagra
constitucionalmente o princípio da igualdade das nações, é membro da ONU, órgão em cujas decisões esse
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princípio nem sempre é adotado.


215. (MPF – 2018 – Procurador da República) Dentre os enunciados abaixo, somente estão corretos:
I - A admissão como membro da Organização das Nações Unidas é aberta a todos os estados amantes da paz
que aceitarem as obrigações, contidas na Carta de São Francisco, e que, a juízo da organização, estiverem
aptos e dispostos a cumprir tais obrigações.
II - A admissão de qualquer Estado como Membro da Organização das Nações Unidas será efetuada por
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decisão da Assembleia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança, não se admitindo, neste
último órgão, o uso do veto por parte de seus membros permanentes.
III - Todos os povos têm o direito à autodeterminação, que se constitui hoje em norma imperativa do Direito
souza -- CPF:

Internacional.
IV - Os Estados são juridicamente iguais, desfrutam de iguais direitos e de igual capacidade para exercê-los.
Marceli souza

Os direitos de cada um não dependem do poder de que dispõem para assegurar o seu exercício, mas sim da
Marceli

sua existência como sujeito do direito internacional.


a) apenas III.
b) I e IV.
c) I, III e IV.
d) todos estão corretos.
216. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal) Considerando que a Assembleia-Geral da
ONU tenha solicitado parecer consultivo à Corte Internacional de Justiça a respeito da utilização de armas
químicas em conflitos internacionais, assinale a opção correta.
a) O parecer consultivo da Corte será obrigatório para todos os membros da ONU.
b) Somente o Conselho de Segurança das Nações Unidas tem competência para solicitar parecer consultivo
envolvendo conflitos internacionais.
c) Parecer consultivo sobre a mesma temática pode ser solicitado diretamente por membro da ONU.
d) Estados podem ser admitidos a comparecer no procedimento perante a Corte e apresentar exposições
escritas e orais.
e) O procedimento para apreciação de pareceres consultivos difere caso seja solicitado pela Assembleia-
Geral ou pelo Conselho de Segurança.

181
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

217. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - AGU - Advogado da União) Na Carta das Nações Unidas (Carta de São
Francisco), admite-se que qualquer litígio seja resolvido por meio de conflitos armados, desde que
autorizado pelo Conselho de Segurança da ONU.
218. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - AGU - Advogado da União) A ONU deve exercer papel relevante na
resolução de conflitos, podendo, inclusive, praticar ação coercitiva para a busca da paz.
219. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - Instituto Rio Branco) Ao tornar-se signatário da Carta de São Francisco, o
Estado coobriga-se, também, à jurisdição da Corte Internacional de Justiça.
220. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - Instituto Rio Branco) As decisões da Assembleia Geral da ONU devem,
obrigatoriamente, ser acatadas por todos os membros da comunidade internacional.
221. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - Instituto Rio Branco) Conforme a Carta da ONU, respaldada pela
jurisprudência internacional, as resoluções do Conselho de Segurança acerca de questões destinadas à
manutenção da paz e ao seu restabelecimento são de caráter vinculante.
222. (CESPE/CEBRASPE - 2013 - Instituto Rio Branco) À Corte Internacional de Justiça faculta-se julgar
casos que lhe sejam submetidos também por equidade, se as partes com isto concordarem.
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223. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) O Conselho de Segurança
da Organização das Nações Unidas (ONU), principal órgão dessa entidade, é o único que pode determinar
a aplicação de sanções.
224. (IADES - 2019 - Instituto Rio Branco – Diplomata) A sentença da Corte é definitiva e inapelável. Não
obstante, pode ser objeto de revisão e interpretação.
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5.3. Organização dos Estados Americanos

5.3.1. Pan-americanismo e a criação da OEA


souza -- CPF:

Os antecedentes da criação da Organização dos Estados Americanos confundem-se com as correntes


do panamericanismo: a bolivariana e o monroísmo.
Marceli souza

Em 1826, no Congresso do Panamá, sob os auspícios de Simón Bolivar, iniciaram-se os estudos para
Marceli

a criação de uma Conferência Latino-Americana de Estados. Desse encontro surgiram:

• O “Tratado de União Liga e Confederação Perpétua” entre Colômbia (que englobava também os
Venezuela, Panamá e o Equador), Peru, México, a então República Centro-americana.
• O estabelecimento de uma cota que caberia a cada país para a organização de uma força militar
de 60.000 (sessenta mil) homens para a defesa comum do hemisfério;
• A adoção do princípio do arbitramento na solução dos desacordos interamericanos;
• O compromisso de preservar a paz continental;
• A abolição da escravidão.

O bolivarianismo buscava defender o continente da ameaça de colonialismo europeu. Os Estados


Unidos, apesar de terem enviados emissários à convenção, eram contrários a essa política, por terem suas
próprias pretensões expansionistas no continente. Já o Brasil, por ser um Império à época, também era
contrário à formação dessa Confederação.
A resposta à corrente bolivariana se deu por meio da Doutrina Monroe (“América para os
americanos"), criada pelo presidente americano James Monroe. Sob a sua perspectiva, foi realizada, em
Washington, de outubro de 1889 a 1890, a Primeira Conferência Internacional Americana, com a participação
de 18 Estados.

182
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Da convenção, os Estados chegaram às seguintes decisões:

• condenar a guerra e afirmar a nulidade de cessões territoriais decorrentes de operações de


conquista ou sob ameaça de guerra;
• aprovar o recurso ao arbitramento para solução de eventuais divergências interamericanas;
• aprovar a criação de um órgão coordenador das relações comerciais (União Internacional das
Repúblicas Americanas — com sede em Washington, que mais tarde tornou-se União Pan-
Americana).

Os Estados americanos passaram a se reunir em sessões com intervalos variáveis, denominadas


Conferências Interamericanas. Além desses encontros, havia, também, reuniões de Ministros das Relações
Exteriores e reuniões especiais.
Durante essas reuniões foram produzidos vários tratados internacionais, dos quais se destaca o
Código Bustamante de Direito Internacional Privado, de 1928.
Uma Corte Interamericana de Justiça foi proposta em 1923, mas nunca se materializou.
A Conferência Interamericana sobre Problemas da Guerra e da Paz foi realizada na Cidade do México,
em 1945, com o objetivo de discutir atividades conjuntas a serem realizadas pelos Estados americanos no
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âmbito da Organização das Nações Unidas.


Dessa atuação conjunta decorreram os direitos de legítima defesa (coletiva) e a prioridade de solução
pacífica por meios regionais antes de se recorrer ao Conselho de segurança.
A Conferência Interamericana para Manutenção da Paz e Segurança no Continente foi realizada no
Rio de Janeiro, em 1947, em que se adotou o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) como
meio de defesa coletiva em caso de ataque de potência estrangeira de fora da região e decidir ações
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conjuntas no caso de um conflito entre dois Estados partes do tratado.

CURIOSIDADE!
O TIAR foi acionado duas vezes. A primeira, pela Argentina na Guerra das Malvinas; a segunda, pelos
Estados Unidos, após os atentados de 11 de setembro.
souza -- CPF:

Em ambos os casos, os demais Estados que ratificaram o tratado se negaram a cumpri-lo. No caso da
Marceli souza

Guerra das Malvinas, a Argentina foi considerada a agressora. No caso dos Estados Unidos, a maioria dos
países do tratado não apoiaram a invasão do Iraque.
Marceli

Em 2002, o México denunciou o tratado por discordar da Guerra no Iraque. Já, em 2012, os países
bolivarianos (Bolívia, Equador, Nicarágua e Venezuela) fizeram o mesmo.

Em 1948, na 9ª Conferência Interamericana, realizada em Bogotá, foram aprovadas a Carta da


Organização dos Estados Americanos – OEA (também chamada de Carta de Bogotá) e a Declaração
Americana de Direitos Humanos.
A Carta da OEA foi reformada em quatro oportunidades:
• em 1967, com o Protocolo de Buenos Aires;
• em 1985, no Protocolo de Cartagena das Índias;
• em 1992, pelo Protocolo de Washington; e
• em 1993, com o Protocolo de Manágua.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 591) destaca que apenas o texto original de 1948 foi
ratificado por todos os membros da organização. Portanto, há a aplicação de textos diferentes entre os
Estados-membros da OEA.

5.3.2. Membros da organização

183
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Os membros da OEA são os Estados americanos que ratificarem a Carta da OEA. Inicialmente, 21
(vinte e um) Estados ratificaram o tratado, sendo que, atualmente, a organização conta com 35 Estados-
membros.

Artigo 4. São membros da Organização todos os Estados americanos que ratificarem a


presente Carta.

A Carta da OEA permite a admissão de novos Estados, desde que (i) pertencentes ao continente
americano e que (ii) emitam nota ao Secretário-Geral com declaração de que estão dispostos a assinar e
ratificar o tratado, além de aceitar as obrigações inerentes à condição de membro, em especial, as previstas
nos artigos 28 e 29.
Após recomendação do Conselho Permanente da Organização, competirá à Assembleia Geral
deliberar pela inclusão, sendo que o quórum de aprovação de ambas as votações é de dois terços.

Artigo 5. Na Organização será admitida toda nova entidade política que nasça da união de
seus Estados membros e que, como tal, ratifique esta Carta. O ingresso da nova entidade
política na Organização redundará para cada um dos Estados que a constituam em perda
da qualidade de membro da Organização.
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Artigo 6. Qualquer outro Estado americano independente que queira ser membro da
Organização deverá manifestá-lo mediante nota dirigida ao Secretário-Geral, na qual seja
consignado que está disposto a assinar e ratificar a Carta da Organização, bem como a
aceitar todas as obrigações inerentes à condição de membro, em especial as referentes à
segurança coletiva, mencionadas expressamente nos artigos 28 e 29.

Artigo 7. A Assembleia Geral, após recomendação do Conselho Permanente da


Organização, determinará se é procedente autorizar o Secretário-Geral a permitir que o
Estado solicitante assine a Carta e a aceitar o depósito do respectivo instrumento de
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ratificação. Tanto a recomendação do Conselho Permanente como a decisão da Assembleia


Geral requererão o voto afirmativo de dois terços dos Estados membros.

Artigo 8. A condição de membro da Organização estará restringida aos Estados


souza -- CPF:

independentes do Continente que, em 10 de dezembro de 1985, forem membros das


Nações Unidas e aos territórios não-autônomos mencionados no documento OEA/Ser.P,
AG/doc.1939/85, de 5 de novembro de 1985, quando alcançarem a sua independência.
Marceli souza

A Carta da OEA não prevê a possibilidade de expulsão de um dos membros, porém, o artigo 9 traz a
Marceli

hipótese de suspensão quando um governo democrático for deposto à força, através do voto de dois terços
dos membros, em sessão extraordinária da Assembleia Geral, após a tentativa de resolução do problema por
meios diplomáticos:

Artigo 9. Um membro da Organização, cujo governo democraticamente constituído seja


deposto pela força, poderá ser suspenso do exercício do direito de participação nas sessões
da Assembleia Geral, da Reunião de Consulta, dos Conselhos da Organização e das
Conferências Especializadas, bem como das comissões, grupos de trabalho e demais órgãos
que tenham sido criados.
a) A faculdade de suspensão somente será exercida quando tenham sido infrutíferas as
gestões diplomáticas que a Organização houver empreendido a fim de propiciar o
restabelecimento da democracia representativa no Estado membro afetado;
b) A decisão sobre a suspensão deverá ser adotada em um período extraordinário de
sessões da Assembleia Geral, pelo voto afirmativo de dois terços dos Estados membros;
c) A suspensão entrará em vigor imediatamente após sua aprovação pela Assembleia Geral;
d) Não obstante a medida de suspensão, a Organização procurará empreender novas
gestões diplomáticas destinadas a coadjuvar o restabelecimento da democracia
representativa no Estado membro afetado;
e) O membro que tiver sido objeto de suspensão deverá continuar observando o
cumprimento de suas obrigações com a Organização;

184
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

f) A Assembleia Geral poderá levantar a suspensão mediante decisão adotada com a


aprovação de dois terços dos Estados membros; e
g) As atribuições a que se refere este artigo se exercerão de conformidade com a presente
Carta.

Se não há hipótese de suspensão, é importante destacar que os Estados podem denunciar o tratado,
retirando-se da organização voluntariamente. O prazo de entrada em vigor da denúncia é de 2 anos, deixando
a Carta da OEA de surtir efeitos ao Estado denunciante após esse prazo:

Artigo 143. Esta Carta vigorará indefinidamente, mas poderá ser denunciada por qualquer
dos Estados membros, mediante uma notificação escrita à Secretaria-Geral, a qual
comunicará em cada caso a todos os outros Estados as notificações de denúncia que
receber. Transcorridos dois anos a partir da data em que a Secretaria-Geral receber uma
notificação de denúncia, a presente Carta cessará seus efeitos em relação ao dito Estado
denunciante e este ficará desligado da Organização, depois de ter cumprido as obrigações
oriundas da presente Carta.

5.3.3. Propósitos e princípios

O artigo 2 da Carta da OEA traz os objetivos (propósitos essenciais) a serem alcançados pela
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organização:

Artigo 2. Para realizar os princípios em que se baseia e para cumprir com suas obrigações
regionais, de acordo com a Carta das Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos
estabelece como propósitos essenciais os seguintes:
a) Garantir a paz e a segurança continentais;
b) Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não-
intervenção;
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c) Prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica das


controvérsias que surjam entre seus membros;
d) Organizar a ação solidária destes em caso de agressão;
e) Procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos que surgirem entre
os Estados membros;
souza -- CPF:

f) Promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e


cultural;
Marceli souza

g) Erradicar a pobreza crítica, que constitui um obstáculo ao pleno desenvolvimento


democrático dos povos do Hemisfério; e
Marceli

h) Alcançar uma efetiva limitação de armamentos convencionais que permita dedicar a


maior soma de recursos ao desenvolvimento econômico-social dos Estados membros.

Já o artigo 3 da Carta traz os princípios a serem seguidos por seus membros:

Artigo 3. Os Estados americanos reafirmam os seguintes princípios:


a) O direito internacional é a norma de conduta dos Estados em suas relações recíprocas;
b) A ordem internacional é constituída essencialmente pelo respeito à personalidade,
soberania e independência dos Estados e pelo cumprimento fiel das obrigações emanadas
dos tratados e de outras fontes do direito internacional;
c) A boa-fé deve reger as relações dos Estados entre si;
d) A solidariedade dos Estados americanos e os altos fins a que ela visa requerem a
organização política dos mesmos, com base no exercício efetivo da democracia
representativa;
e) Todo Estado tem o direito de escolher, sem ingerências externas, seu sistema político,
econômico e social, bem como de organizar-se da maneira que mais lhe convenha, e tem o
dever de não intervir nos assuntos de outro Estado. Sujeitos ao acima disposto, os Estados
americanos cooperarão amplamente entre si, independentemente da natureza de seus
sistemas políticos, econômicos e sociais;
f) A eliminação da pobreza crítica é parte essencial da promoção e consolidação da
democracia representativa e constitui responsabilidade comum e compartilhada dos
Estados americanos;

185
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

g) Os Estados americanos condenam a guerra de agressão: a vitória não dá direitos;


h) A agressão a um Estado americano constitui uma agressão a todos os demais Estados
americanos;
i) As controvérsias de caráter internacional, que surgirem entre dois ou mais Estados
americanos, deverão ser resolvidas por meio de processos pacíficos;
j) A justiça e a segurança sociais são bases de uma paz duradoura;
k) A cooperação econômica é essencial para o bem-estar e para a prosperidade comuns dos
povos do Continente;
l) Os Estados americanos proclamam os direitos fundamentais da pessoa humana, sem fazer
distinção de raça, nacionalidade, credo ou sexo;
m) A unidade espiritual do Continente baseia-se no respeito à personalidade cultural dos
países americanos e exige a sua estreita colaboração para as altas finalidades da cultura
humana;
n) A educação dos povos deve orientar-se para a justiça, a liberdade e a paz.

Não há menção expressa da proteção ou promoção dos direitos humanos na Carta da OEA. Há,
porém, remissões ao termo “direitos fundamentais da pessoa humana” no preâmbulo, no artigo 3, “l”, e no
artigo 17 do tratado.

5.3.4. Direitos e deveres dos Estados


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Ao contrário da Carta da ONU, a Carta da OEA traz, em seus artigos 10 a 23, um rol de direitos e
deveres dos Estados: direito à igualdade (artigo 10), respeito recíproco (artigo 11), direito de
irrestringibilidade de seus direitos fundamentais (artigo 12), direito de existência independentemente de
reconhecimento (artigo 13), princípio da limitação recíproca da soberania (artigo 13, parte final), direito de
proteção à sua existência (artigo 15), direito do monopólio da jurisdição interna (artigo 16), direito ao
desenvolvimento (artigo 17), dever de respeito à pacta sunt servanda (artigo 18), dever de não intervenção
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(artigo 19), vedação à aplicação de medidas coercitivas indevidas (artigo 20); direito de inviolabilidade do
território (artigo 21), vedação do uso da força (artigo 22) e dever de observância da paz no continente (artigo
23):
souza -- CPF:

DIREITOS DEVERES
Marceli souza

Artigo 10 Artigo 18
Os Estados são juridicamente iguais, desfrutam de O respeito e a observância fiel dos tratados constituem
Marceli

iguais direitos e de igual capacidade para exercê-los, norma para o desenvolvimento das relações pacíficas entre
e têm deveres iguais. Os direitos de cada um não os Estados. Os tratados e acordos internacionais devem ser
dependem do poder de que dispõem para assegurar públicos.
o seu exercício, mas sim do simples fato da sua
existência como personalidade jurídica internacional. Artigo 19
Nenhum Estado ou grupo de Estados tem o direito de
Artigo 11 intervir, direta ou indiretamente, seja qual for o motivo, nos
Todo Estado americano tem o dever de respeitar os assuntos internos ou externos de qualquer outro. Este
direitos dos demais Estados de acordo com o direito princípio exclui não somente a força armada, mas também
internacional. qualquer outra forma de interferência ou de tendência
atentatória à personalidade do Estado e dos elementos
Artigo 12 políticos, econômicos e culturais que o constituem.
Os direitos fundamentais dos Estados não podem ser
restringidos de maneira alguma. Artigo 20
Nenhum Estado poderá aplicar ou estimular medidas
Artigo 13 coercivas de caráter econômico e político, para forçar a
A existência política do Estado é independente do seu vontade soberana de outro Estado e obter deste vantagens
reconhecimento pelos outros Estados. Mesmo antes de qualquer natureza.
de ser reconhecido, o Estado tem o direito de
defender a sua integridade e independência, de Artigo 22
promover a sua conservação e prosperidade, e, por

186
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

conseguinte, de se organizar como melhor entender, Os Estados americanos se comprometem, em suas relações
de legislar sobre os seus interesses, de administrar os internacionais, a não recorrer ao uso da força, salvo em caso
seus serviços e de determinar a jurisdição e a de legítima defesa, em conformidade com os tratados
competência dos seus tribunais. O exercício desses vigentes, ou em cumprimento dos mesmos tratados.
direitos não tem outros limites senão o do exercício
dos direitos de outros Estados, conforme o direito Artigo 23
internacional. As medidas adotadas para a manutenção da paz e da
segurança, de acordo com os tratados vigentes, não
Artigo 14 constituem violação aos princípios enunciados nos artigos 19
O reconhecimento significa que o Estado que o e 21.
outorga aceita a personalidade do novo Estado com
todos os direitos e deveres que, para um e outro,
determina o direito internacional.

Artigo 15
O direito que tem o Estado de proteger e desenvolver
a sua existência não o autoriza a praticar atos injustos
contra outro Estado.

Artigo 16
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A jurisdição dos Estados nos limites do território


nacional exerce-se igualmente sobre todos os
habitantes, quer sejam nacionais ou estrangeiros.

Artigo 17
Cada Estado tem o direito de desenvolver, livre e
espontaneamente, a sua vida cultural, política e
econômica. No seu livre desenvolvimento, o Estado
CPF: 073.496.444-77

respeitará os direitos da pessoa humana e os


princípios da moral universal.

Artigo 21
O território de um Estado é inviolável; não pode ser
souza -- CPF:

objeto de ocupação militar, nem de outras medidas


de força tomadas por outro Estado, direta ou
Marceli souza

indiretamente, qualquer que seja o motivo, embora


de maneira temporária. Não se reconhecerão as
Marceli

aquisições territoriais ou as vantagens especiais


obtidas pela força ou por qualquer outro meio de
coação.

5.3.5. Assembleia Geral

Os órgãos da OEA estão previstos no artigo 53 da Carta.

Artigo 53. A Organização dos Estados Americanos realiza os seus fins por intermédio:
a) Da Assembleia Geral;
b) Da Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores;
c) Dos Conselhos;
d) Da Comissão Jurídica Interamericana;
e) Da Comissão Interamericana de Direitos Humanos;
f) Da Secretaria-Geral;
g) Das Conferências Especializadas; e
h) Dos Organismos Especializados.
Poderão ser criados, além dos previstos na Carta e de acordo com suas disposições, os
órgãos subsidiários, organismos e outras entidades que forem julgados necessários.

187
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

A Assembleia Geral é o órgão superior da organização (ACCIOLY, SILVA e CASELLA, 2016, p. 447) e se
reúne anualmente, em sede escolhida conforme o princípio da rotatividade, (GUERRA, 2019, p. 364), tendo
cada Estado-membro o direito de se fazer representar e a um voto, tendo se reunido a primeira vez em 1971.

Artigo 54. A Assembleia Geral é o órgão supremo da Organização dos Estados Americanos.
Tem por principais atribuições, além das outras que lhe confere a Carta, as seguintes:
a) Decidir a ação e a política gerais da Organização, determinar a estrutura e funções de
seus órgãos e considerar qualquer assunto relativo à convivência dos Estados americanos;
b) Estabelecer normas para a coordenação das atividades dos órgãos, organismos e
entidades da Organização entre si e de tais atividades com as das outras instituições do
Sistema Interamericano;
c) Fortalecer e harmonizar a cooperação com as Nações Unidas e seus organismos
especializados;
d) Promover a colaboração, especialmente nos setores econômico, social e cultural, com
outras organizações internacionais cujos objetivos sejam análogos aos da Organização dos
Estados Americanos;
e) Aprovar o orçamento-programa da Organização e fixar as quotas dos Estados membros;
f) Considerar os relatórios da Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores e
as observações e recomendações que, a respeito dos relatórios que deverem ser
apresentados pelos demais órgãos e entidades, lhe sejam submetidas pelo Conselho
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Permanente, conforme o disposto na alínea f, do artigo 91, bem como os relatórios de


qualquer órgão que a própria Assembleia Geral requeira;
g) Adotar as normas gerais que devem reger o funcionamento da Secretaria-Geral; e
h) Aprovar seu regulamento e, pelo voto de dois terços, sua agenda.
A Assembleia Geral exercerá suas atribuições de acordo com o disposto na Carta e em
outros tratados interamericanos.

Artigo 56. Todos os Estados membros têm direito a fazer-se representar na Assembleia
Geral. Cada Estado tem direito a um voto.
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Artigo 57. A Assembleia Geral reunir-se-á anualmente na época que determinar o


regulamento e em sede escolhida consoante o princípio do rodízio. Em cada período
ordinário de sessões serão determinadas, de acordo com o regulamento, a data e a sede do
souza -- CPF:

período ordinário seguinte.


Se, por qualquer motivo, a Assembleia Geral não se puder reunir na sede escolhida, reunir-
Marceli souza

se-á na Secretaria-Geral, sem prejuízo de que, se algum dos Estados membros oferecer
oportunamente sede em seu território, possa o Conselho Permanente da Organização
Marceli

acordar que a Assembleia Geral se reúna nessa sede.

As decisões da Assembleia Geral são, de regra, tomadas pela maioria absoluta dos Estados-
membros:

Artigo 59. As decisões da Assembleia Geral serão adotadas pelo voto da maioria absoluta
dos Estados membros, salvo nos casos em que é exigido o voto de dois terços, de acordo
com o disposto na Carta, ou naqueles que determinar a Assembleia Geral, pelos processos
regulamentares.

Em algumas situações, a Carta prevê quórum qualificado de dois terços dos votos:

• Admissão de novo membro: artigo 7;


• Suspensão de um membro: artigo 9, b;
• Fim da suspensão de um membro: artigo 9, f;
• Aprovação de seu regulamento: artigo 54, h;
• Aprovação de assuntos orçamentários: artigo 55;
• Aprovação de período extraordinário de reunião da Assembleia Legislativa: artigo 58;
• Designação de estudos técnicos ou relatórios sobre temas específicos à Comissão Consultiva de
Defesa: artigo 69; e

188
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

• Destituição do Secretário-Geral ou do Secretário-Geral Adjunto da organização: artigo 116;

5.3.6. Conselhos

O artigo 68 do Protocolo de Buenos Aires (Decreto Legislativo n.º 2/1968) prevê os seguintes
conselhos:

• Conselho Permanente;
• Conselho Interamericano Econômico e Social; e
• Conselho Interamericano de Educação, Ciência e Cultura.

O dispositivo altera a redação originária da Carta da OEA que prevê, além do Conselho Permanente,
apenas o extinto Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral:

Protocolo de Buenos Aires Carta da OEA


Artigo 68 Artigo 70
O Conselho Permanente da Organização, o Conselho O Conselho Permanente da Organização e o Conselho
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Interamericano Econômico e Social e o Conselho Interamericano de Desenvolvimento Integral dependem


Interamericano de Educação, Ciência e Cultura diretamente da Assembleia Geral e têm a competência
dependem diretamente da Assembleia Geral e têm a conferida a cada um deles pela Carta e por outros
competência conferida a cada um deles pela Carta e instrumentos interamericanos, bem como as funções que
por outros instrumentos interamericanos, bem como lhes forem confiadas pela Assembleia Geral e pela Reunião
as funções que lhes forem confiadas pela Assembleia de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores.
Geral e pela Reunião de Consulta dos Ministros das
Relações Exteriores.
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O Conselho Permanente é composto por um representante de cada Estado-membro, com direito a


um voto. Os representantes dos Estados devem ser nomeados com a categoria de embaixador. A presidência
do Conselho não é eletiva, mas rotativa, considerando-se como critério a ordem alfabética do nome do
Estado-membro em espanhol:
souza -- CPF:

Protocolo de Buenos Aires


Marceli souza

Artigo 78. O Conselho Permanente da Organização compõe-se de um representante de


cada Estado Membro, nomeado especialmente pelo respectivo Governo, com a categoria
Marceli

de embaixador. Cada Governo poderá acreditar um representante interino, bem como os


suplentes e assessores que julgar conveniente.

Artigo 79. A Presidência do Conselho Permanente será exercida sucessivamente pelos


representantes, na ordem alfabética dos nomes em espanhol de seus respectivos países, e
a Vice-Presidência, de modo idêntico, seguida a ordem alfabética inversa.
O Presidente e o vice-presidente exercerão suas funções por um período não superior a seis
meses que será determinado pelo estatuto.

O Conselho Permanente tem a função de zelar pela manutenção das relações amistosas entre os
Estados, servindo como órgão consultivo provisoriamente, em caso de conflito armado; ou de agir como
órgão prestador de bons ofícios, quando poderá estabelecer comissões ad hoc e investigações dos fatos
relacionados ao conflito, desde que com anuência das partes, emitindo, ao final, recomendações sobre a sua
solução:

Protocolo de Buenos Aires


Artigo 82. O Conselho Permanente velará pela manutenção das relações de amizade entre
os Estados-Membros e, com tal objetivo, ajudá-los-á de maneira efetiva na solução pacífica
de suas controvérsias, de acordo com as disposições que se seguem.

Carta da OEA

189
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 83. O Conselho Permanente agirá provisoriamente como Órgão de Consulta,


conforme o estabelecido no tratado especial sobre a matéria.

Artigo 84. O Conselho Permanente velará pela manutenção das relações de amizade entre
os Estados membros e, com tal objetivo, ajudá-los-á de maneira efetiva na solução pacífica
de suas controvérsias, de acordo com as disposições que se seguem.

Artigo 85. De acordo com as disposições da Carta, qualquer parte numa controvérsia, no
tocante à qual não esteja em tramitação qualquer dos processos pacíficos previstos na
Carta, poderá recorrer ao Conselho Permanente, para obter seus bons ofícios. O Conselho,
de acordo com o disposto no artigo anterior, assistirá as partes e recomendará os processos
que considerar adequados para a solução pacífica da controvérsia.

Artigo 86. O Conselho Permanente, no exercício de suas funções, com a anuência das partes
na controvérsia, poderá estabelecer comissões ad hoc.
As comissões ad hoc terão a composição e o mandato que em cada caso decidir o Conselho
Permanente, com o consentimento das partes na controvérsia.

Artigo 87. O Conselho Permanente poderá também, pelo meio que considerar conveniente,
investigar os fatos relacionados com a controvérsia, inclusive no território de qualquer das
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partes, após consentimento do respectivo governo.


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Artigo 88. Se o processo de solução pacífica de controvérsias recomendado pelo Conselho


Permanente, ou sugerido pela respectiva comissão ad hoc nos termos de seu mandato, não
for aceito por uma das partes, ou qualquer destas declarar que o processo não resolveu a
controvérsia, o Conselho Permanente informará a Assembleia Geral, sem prejuízo de que
leve a cabo gestões para o entendimento entre as partes ou para o reatamento das relações
entre elas.
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Além das funções trazidas pela Carta da OEA, o protocolo de Buenos Aires ainda atribui ao Conselho
Permanente as seguintes funções:

Artigo 91. Compete também ao Conselho Permanente:


a) Executar as decisões da Assembleia Geral ou da Reunião de Consulta dos Ministros das
souza -- CPF:

Relações Exteriores cujo cumprimento não haja sido confiado a nenhuma outra entidade;
b) Velar pela observância das normas que regulam o funcionamento da Secretaria Geral e,
Marceli souza

quando a Assembleia Geral não estiver reunida, adotar as disposições de natureza


regulamentar que habilitem a Secretaria Geral para o cumprimento de suas funções
Marceli

administrativas;
c) Atuar como Comissão Preparatória da Assembleia Geral nas condições estabelecidas pelo
art. 58 da Carta, a não ser que a Assembleia Geral decida de maneira diferente;
d) Preparar, a pedido dos Estados Membros e com a cooperação dos órgãos pertinentes da
Organização, projetos de acordos destinados a promover e facilitar a colaboração entre a
Organização dos Estados Americanos e as Nações Unidas, ou entre a Organização e outros
organismos americanos de reconhecida autoridade internacional. Esses projetos serão
submetidos â aprovação da Assembleia Geral;
e) Formular recomendações à Assembleia Geral sobre o funcionamento da Organização e
sobre a coordenação dos seus órgãos subsidiários, organismos e comissões;
f) Apresentar observações à Assembleia Geral, se julgar conveniente, sobre os relatórios da
Comissão Jurídica Interamericana e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos; e
g) Exercer as demais funções que lhe atribui a Carta.

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2019, p. 448)
explicam que o Protocolo de Buenos Aires dotou autonomia não prevista na Carta de Bogotá aos Conselho
Interamericano Econômico e Social e Conselho de Educação, Ciência e Cultura, sendo ambos compostos
pelas autoridades de maior hierarquia de cada um dos Estados-membros. Ambos os Conselhos devem se
reunir pelo menos uma vez no ano, em nível ministerial, tendo suas funções e competências dispostas nos
artigos 93 a 103 do Protocolo de Buenos Aires.

190
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

5.3.7. Comissão jurídica interamericana

Com sede no Rio de Janeiro, a Comissão Jurídica Americana tem a função de órgão consultivo em
assuntos jurídicos da Organização, bem como no desenvolvimento da codificação do Direito Internacional
em âmbito regional.

Carta da OEA
Artigo 99. A Comissão Jurídica Interamericana tem por finalidade servir de corpo consultivo
da Organização em assuntos jurídicos; promover o desenvolvimento progressivo e a
codificação do direito internacional; e estudar os problemas jurídicos referentes à
integração dos países em desenvolvimento do Continente, bem como a possibilidade de
uniformizar suas legislações no que parecer conveniente.

5.3.8. Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH)

O artigo 106 da Carta da OEA prevê a criação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, bem
como da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH):

Artigo 106. Haverá uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos que terá por
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principal função promover o respeito e a defesa dos direitos humanos e servir como órgão
consultivo da Organização em tal matéria.
Uma convenção interamericana sobre direitos humanos estabelecerá a estrutura, a
competência e as normas de funcionamento da referida Comissão, bem como as dos outros
órgãos encarregados de tal matéria.

O órgão foi criado em 1959 pela Resolução VIII na V Reunião de Consulta dos Ministros das Relações
Exteriores. A CIDH tem sede em Washington e é composta por sete membros, que deverão ser pessoas de
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alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria de direitos humanos.


A eleição dos membros é feita para um mandato de quatro anos, com possibilidade de uma reeleição.
O mandato é incompatível com o exercício de atividade que possa afetar sua independência e imparcialidade,
bem como com a dignidade ou prestígio de seu cargo na Comissão.
souza -- CPF:

Só em 1965, por meio da Resolução XXII, da II Conferência Interamericana do Rio de Janeiro, a CIDH
passou a ter competência para receber petições ou comunicações de direitos humanos.
Marceli souza

A Comissão é um órgão principal da OEA, mas autônomo. Seus membros atuam com independência
Marceli

e imparcialidade, não representando o Estado de origem. A CIDH tem a promoção e averiguação do respeito
e a garantia dos direitos humanos como função precípua.
É importante destacar que a CIDH funciona em dois sistemas regionais de proteção de direitos
humanos: o da Carta da OEA e o da Convenção Americana de Direitos Humanos.
Pelo sistema da Carta da OEA, as decisões são recomendações. Já pelo sistema da CADH, a CIDH tem
papel de destaque por recepcionar as petições na primeira fase do mecanismo, podendo admitir o caso e
levá-lo à Corte Interamericana de Direitos Humanos (que não é um órgão da OEA), ou à Assembleia Geral da
OEA.
A CIDH se reúne em quatros reuniões regulares de três semanas por ano e em uma ou duas sessões
curtas especiais.

5.3.9. Secretaria Geral

A Secretaria Geral é um órgão permanente da OEA com a funções previstas ao longo da Carta da
OEA, bem como no artigo 118 do Protocolo de Buenos Aires:

Artigo 118. A Secretaria-Geral desempenha também as seguintes funções:

191
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) Encaminhar ex officio aos Estados-Membros a convocatória da Assembleia-Geral, da


Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, do Conselho Interamericano
Econômico e Social, do Conselho Interamericano de Educação, Ciência e Cultura e das
Conferências Especializadas;
b) Assessorar os outros órgãos, quando cabível, na elaboração das agendas e regulamentos;
c) Preparar o projeto de orçamento-programa da Organização, com base nos programas
aprovados pelos Conselhos, organismos e entidades cujas despesas devam ser incluídas no
orçamento-programa e, após consulta com esses Conselhos ou suas Comissões
Permanentes, submetê-lo â Comissão Preparatória da Assembleia-Geral e em seguida à
própria Assembleia;
d) Proporcionar a Assembleia-Geral e aos demais órgãos, serviços de secretaria
permanentes e adequados, bem como dar cumprimento a seus mandatos e encargos.
Dentro de suas possibilidades, atender as outras reuniões da Organização;
e) Custodiar os documentos e arquivos das Conferências Interamericanas, da Assembleia-
Geral, das Reuniões de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, dos Conselhos e das
Conferências Especializadas;
f) Servir de depositária dos tratados e acordos interamericanos, bem como dos
instrumentos de ratificação dos mesmos;
g) Apresentar à Assembleia-Geral, em cada período ordinário de sessões, um relatório anual
sobre as atividades e a situação financeira da Organização;
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h) Estabelecer relações de cooperação consoante o que for decidido pela Assembleia-Geral


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ou pelos Conselhos, com os Organismos Especializados e com outros organismos nacionais


e internacionais.

O Secretário Geral da OEA, por sua vez, tem um mandato de cinco anos, com possibilidade de uma
renovação. Ele será escolhido pela Assembleia Geral sendo substituído ou sucedido (até nova eleição) pelo
Secretário Geral Adjunto:

Protocolo De Buenos Aires


CPF: 073.496.444-77

Artigo 114. O Secretário Geral da Organização será eleito pela Assembleia Geral para um
período de cinco anos e não poderá ser reeleito mais de uma vez, nem poderá suceder-lhe
pessoa da mesma nacionalidade. Vagando o cargo de Secretário Geral, o Secretário Geral
Adjunto assumirá as funções daquele até que a Assembleia Geral proceda a eleição de novo
titular para um período completo.
souza -- CPF:

O Secretário Geral é o responsável por representar a OEA em âmbito internacional, tendo


Marceli souza

internamente, direito de voz nas reuniões da organização.


Marceli

QUESTÕES
225. (UECE-CEV - 2017 - SEAS – CE) Leia atentamente os excertos a seguir:
“[...] é um dos órgãos da OEA dedicados à proteção dos direitos humanos nas Américas. É sediada na cidade
de Washington, capital dos EUA, e tem suas atividades reguladas pelo Pacto de São José [...]”;
“[...] não é órgão jurisdicional, assemelhando-se, nesse sentido, aos órgãos de tratados da ONU. É composta
por sete membros, que deverão ser pessoas de alta autoridade moral e de reconhecido saber em matéria
de direitos humanos, eleitos pela Assembleia-Geral da OEA para um mandato de quatro anos, com direito
a uma reeleição subsequente”.
a) O órgão pertencente à Organização dos Estados Americanos — OEA —, a que os trechos acima se
referem, é denominado
b) Corte Interamericana de Direitos Humanos.
c) Conselho de Direitos Humanos da OEA.
d) Alto Comissariado da OEA para os Direitos Humanos.
e) Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

192
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

226. (FEPESE - 2017 - PC-SC - Agente de Polícia Civil) A Organização dos Estados Americanos tem como
princípios:
1. A boa-fé deve reger as relações dos Estados entre si.
2. A educação dos povos deve orientar-se para a justiça, a liberdade e a paz.
3. Toda agressão armada deverá ser repelida na mesma medida e esforço.
4. A justiça e a segurança demandam a eliminação de focos de dissidência.
Assinale a alternativa que indica todas as afirmativas corretas.
a) São corretas apenas as afirmativas 1 e 2.
b) São corretas apenas as afirmativas 2 e 4.
c) São corretas apenas as afirmativas 3 e 4.
d) São corretas apenas as afirmativas 1, 2 e 3.
e) São corretas apenas as afirmativas 1, 3 e 4.
227. (FEPESE - 2017 - PC-SC - Escrivão de Polícia Civil) A Organização dos Estados Americanos estabeleceu
como propósitos essenciais:
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1. Promover e consolidar o desenvolvimento agrário regional, como fonte de subsistência.


2. Promover e consolidar a democracia parlamentarista, respeitado o princípio da supremacia legislativa.
3. Promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural.
4. Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não intervenção.
Assinale a alternativa que indica todas as afirmativas corretas.
CPF: 073.496.444-77

a) São corretas apenas as afirmativas 1 e 2.


b) São corretas apenas as afirmativas 3 e 4.
c) São corretas apenas as afirmativas 1, 2 e 4.
d) São corretas apenas as afirmativas 1, 3 e 4.
souza -- CPF:

e) São corretas apenas as afirmativas 2, 3 e 4.


Marceli souza

228. (IADES - 2018 - APEX Brasil - Analista - Prospecção de Mercados) A respeito da Organização dos
Marceli

Estados Americanos (OEA), é correto afirmar que


a) tem como principais pilares a democracia, os direitos humanos, a segurança e o desenvolvimento.
b) tem como principal objetivo o desenvolvimento do comércio internacional no continente americano.
c) não permite a existência de Estado observador permanente, isto é, países que não são do continente
americano não podem acompanhar as atividades da Organização.
d) todos os respectivos Estados-membros possuem representação da Organização no país.
e) a respectiva Assembleia Geral realiza quatro sessões por ano, com o objetivo de acompanhar os
trabalhos realizados pelos Grupos de Trabalho.
229. (PGT - 2009 - MPT - Procurador do Trabalho) Assinale a alternativa INCORRETA:
a) Sobre os mecanismos de implementação dos Direitos Humanos no âmbito da Organização dos Estados
Americanos, pode-se afirmar:
b) Após a Segunda Guerra Mundial surgiu à necessidade de reorganizar o sistema interamericano de
relações, quando se realizou a primeira Conferência Internacional de Estados Americanos.
c) Na Conferência de Bogotá foi elaborada a Carta da Organização dos Estados Americanos, tendo como
principal função promover a observância e a proteção dos direitos humanos na América.

193
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

d) O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos tem como principal instrumento a
Convenção Americana de Direitos Humanos, que estabelece a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos e a Corte Interamericana.
e) A competência da Comissão Interamericana de Direitos Humanos alcança todos os Estados-partes da
Convenção Americana, em relação aos direitos humanos nela consagrados. Alcança ainda todos os Estados-
membros da Organização dos Estados Americanos, em relação aos direitos consagrados na Declaração
Americana de 1948.

6. AS ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 160) conceitua as organizações não-governamentais


(ONGs) como entidades privadas, sem fins lucrativos, que atuam em áreas de interesse público, inclusive
em típicas funções estatais. Já Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier têm uma conceituação mais
abrangente:

Uma organização não governamental, ou uma associação internacional, é uma instituição


criada por uma iniciativa privada – ou mista – com exclusão de todo e qualquer acordo
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intergovernamental, associando pessoas privadas ou públicas, físicas ou morais de diversas


nacionalidades.
Para ser qualificada de transnacional e merecer a definição de associação internacional,
uma associação deve funcionar segundo estatutos que respeitem vários critérios formais.
Em primeiro lugar, associar enquanto aderentes “diretos” pessoas físicas de nacionalidade
diferentes. Em segundo lugar, é necessário que estes aderentes sejam submetidos ao
vínculo associativo numa base puramente voluntária. (DINH, PELLET e DAILLIER, 2003, p.
660).
CPF: 073.496.444-77

As organizações não governamentais podem ser criadas por normas domésticas ou internacionais.
William Thomas Worster (2016, p. 241) relembra que a Universidade para a Paz, por exemplo, foi criada por
uma resolução da Assembleia Geral da ONU e, posteriormente, por tratado. O autor explica que a
universidade, após o tratado de sede com a Costa Rica, é reconhecida como uma “instituição internacional”,
souza -- CPF:

sendo detentora, inclusive, de imunidades.


O autor ainda aponta que algumas ONGs, mesmo sendo instituídas por normas internas, não
Marceli souza

perderiam o status de sujeito de Direito Internacional, exatamente por exercerem suas atividades em âmbito
Marceli

internacional. O exemplo trazido pelo autor é a Aliança Global para Vacinas e Imunização (Global Alliance for
Vaccines and Immunization – GAVI).
Para Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e Patrick Daillier (2003, p. 660), a organização não
governamental de maior importância no Direito Internacional, que tem independência total para negociar
com Estados e Organizações Internacionais e prestando verdadeiros serviços públicos internacionais, é o
Comitê Internacional da Cruz Vermelha, sendo conhecida como “guardião do Direito Internacional
Humanitários” (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 367).
A maioria da doutrina não nega a personalidade jurídica internacional do Comitê Internacional da
Cruz vermelha, mas é bastante temerosa em relação às demais ONGs, tendo em vista a impossibilidade de
celebrar tratados, ou atuar em âmbito internacional. Daí a conclusão de Nguyen Quoc Dinh, Alain Pellet e
Patrick Daillier (2003, p. 661) de que as peculiaridades de seu regime jurídico, associadas às relações com os
demais sujeitos do Direito Internacional, caracterizam a personalidade jurídica internacional das ONGs como
derivada, funcional e relativa.

194
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
230. (CESPE/CEBRASPE - 2011 - Instituto Rio Branco) Com características políticas e jurídicas de ONG e
desprovido de atributos de personalidade jurídica internacional, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha é
sujeito apenas aparente de direito internacional público.
231. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo - Consultor Legislativo)
Somente Estados soberanos, entes assemelhados e organizações não governamentais internacionais são
sujeitos de direito internacional.
232. (CESPE/CEBRASPE - 2011 - Instituto Rio Branco) As ONGs que obtiveram reconhecimento da opinião
pública mundial após a Segunda Guerra Mundial adquiriram personalidade jurídica de direito internacional
público.
233. (CESPE/CEBRASPE - 2011 - Instituto Rio Branco) Não obstante suas peculiaridades jurídicas, o
Greenpeace, além de ter atuado como parte nas negociações do Protocolo de Quioto, firmou e ratificou o
referido tratado.
234. (CESPE/CEBRASPE - 2012 – ANAC) A doutrina clássica aponta como sujeitos de direito internacional
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os Estados, as organizações internacionais (intergovernamentais e não governamentais) e os indivíduos.

7. CORPORAÇÕES OU EMPRESAS TRANSNACIONAIS

Atualmente, a candidatura mais controversa à sujeito do Direito Internacional é o das corporações


privadas ou empresas multinacionais ou transnacionais.
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 374) nega-lhes a personalidade jurídica internacional,
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remetendo-as ao papel de atores das relações internacionais, tendo em vista a impossibilidade de conclusão
de tratados, a finalidade lucrativa e seus objetivos exclusivamente particulares.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 161), por sua vez, entende que paulatinamente as
empresas estão recebendo o status de pessoa jurídica de Direito Internacional. O autor destaca que, além da
souza -- CPF:

notória importância no cenário internacional, as empresas transnacionais são beneficiárias diretas de normas
internacionais (como as que facilitam o comércio internacional), devem observar padrões internacionais
Marceli souza

mínimos estabelecidos em tratados e, em alguns casos, têm acesso a mecanismos internacionais de solução
Marceli

de controvérsias (como na OMC e no Mercosul). Por fim, o autor aponta que as empresas não podem concluir
tratados, mas apenas contratos, como aqueles celebrados internamente entre entes privados e o Estado.
Considerando o critério da funcionalidade, as pessoas jurídicas já são detentoras de direitos e
obrigações provenientes de normas internacionais, tendo, ainda, acesso a instrumentos para a proteção de
seus direitos — em especial, relacionados a investimentos — não havendo meios de sua responsabilização
internacional, no entanto.
Ocorre que o Tribunal Especial para o Líbano — criado pela Resolução 1757/2007 do Conselho de
Segurança da ONU para a julgar as pessoas acusadas do ataque terrorista de 14/2/2005, que matou 22
pessoas, incluindo o primeiro-ministro libanês Rafik Hariri, através do critério da funcionalidade —
reconheceu a personalidade jurídica internacional da Al Jadeed TV, julgando-a no caso Al Jadeed S.A.L. & Ms
Khayat (STL-14-05).
Portanto, como já aludido, com base no critério da funcionalidade, é possível encontrar indícios da
personalidade jurídica internacional das corporações transnacionais, ainda que falte um tribunal
internacional para seu jus standi e, também, responsabilização internacional.

195
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

ATENÇÃO!
Repete-se que, para fins de concurso, de regra, as bancas têm o entendimento de que empresas
transnacionais não são pessoas jurídicas do Direito Internacional, sendo, no máximo, atores das relações
internacionais, tal como defendido por Valerio de Oliveira Mazzuoli.

QUESTÕES
235. (CESPE/CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Empresas multinacionais
não dispõem de personalidade jurídica internacional, mesmo que elas sejam empresas públicas
transnacionais contraentes de obrigações com Estados soberanos.
236. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto, adaptada) Eventual acordo de
concessão entre a multinacional General Motors e o Estado brasileiro será regido pelo direito dos tratados,
haja vista a constatação de personalidade jurídica internacional das empresas multinacionais.

8. INDIVÍDUOS

8.1. A afirmação da personalidade jurídica internacional dos indivíduos


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Como já aludido, a caracterização do indivíduo enquanto sujeito de Direito Internacional é tema de


antigo debate. Antônio Augusto Cançado Trindade (2003, p. 450) faz uma síntese sobre o debate.
Francisco de Vitória, em sua obra De Indis (1538), defendida a ideia de que, assim como o
ordenamento jurídico nacional obriga a todos (governantes e governados), em âmbito internacional, a
mesma linha de pensamento deveria ser seguida; portanto, as normas de direito internacional deveriam ser
destinadas à comunidade internacional (totus orbis) e a cada Estado individual. Na ótica do autor, a
CPF: 073.496.444-77

comunidade internacional é constituída pelos seres humanos organizados em Estados e a própria


humanidade (CANÇADO TRINDADE, 2003, p. 450).
Francisco Suárez, por sua vez, em De Legibus ac Deo Legislatore (1612), defendia que o direito
souza -- CPF:

internacional revelaria a unidade e universalidade dos seres humanos, tendo o Estado a necessidade de
regulamentar suas relações enquanto membros da sociedade universal (CANÇADO TRINDADE, 2003, p. 450).
Marceli souza

Hugo Grotius, em De Jure Belli ac Pacis (1625), entende que toda norma jurídica (interna ou internacional)
Marceli

cria direitos e obrigações aos seus destinatários, o que possibilitaria a proteção internacional dos direitos
humanos inclusive contra o próprio Estado (CANÇADO TRINDADE, 2003, p. 451).
A contraposição das correntes jusnaturalistas se deu com a ascensão do positivismo jurídico, que,
personificando o Estado, dotou-o de vontade própria, criadora do Direito Internacional. Inspirada na filosofia
de Hegel, a compreensão da sociedade internacional como um locus interestatal ganha força com as teorias
de Triepel, Anzilotti, Strupp e outros, rebaixando os homens a objeto do Direito Internacional, assim como
navios e aeronaves (SILVA, 2020, p. 534).
Uma resposta posterior, de cunho sociológico, foi sustentada por León Duguit e Georges Scelle, de
que, assim como em âmbito interno, em última análise, apenas os indivíduos são destinatários das normas
jurídicas, e por isso, os únicos sujeitos do Direito Internacional.
Em verdade, dos debates citados, por muitos anos prevaleceu a posição positivista (radical), que
inicialmente considerava apenas os Estados como sujeitos de Direito Internacional e, posteriormente, a
positivista “moderna”, considerando como sujeitos do DIP os Estados e as Organizações Internacionais.
A própria abordagem histórica dos tratados internacionais — que, para muitos autores, fundamenta
a concepção de personalidade jurídica internacional dos seres humanos — é variável.
Antonio Cassese (2013, p. 194), por exemplo, explica que, até o final da Segunda Guerra Mundial, as
convenções internacionais do direito dos conflitos armados, de abolição da escravidão e de tratamento das

196
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

minorias nacionais (estipuladas após o fim da Primeira Guerra Mundial) tinham uma conotação de estipular
deveres aos Estados e não propriamente direitos aos indivíduos. Antônio Augusto Cançado Trindade (2003,
p. 457), por sua vez, vê a gênese da positivação nas Convenções de Direito Internacional Humanitário do
século XIX, ao reconhecer obrigações convencionais aos Estados, beneficiando os indivíduos.
Adotando o critério da funcionalidade, é possível aferir-se a progressiva aquisição da personalidade
jurídica internacional pelos indivíduos, quando lhe foram, inicialmente, conferidos deveres (vedação à
pirataria); posteriormente direitos (como a vedação à escravidão); sua responsabilização internacional
individual (iniciada pelos julgamentos de Nuremberg e concluídas com a criação do Tribunal Penal
Internacional); e, por fim, com a criação de sistemas de atuação internacional independentemente de
proteção diplomática (jus standi).
Atualmente, portanto, é posição majoritária que os indivíduos deixaram de ser apenas objeto do
Direito Internacional para serem detentores de personalidade jurídica internacional, não obstante alguns
doutrinadores discordarem sob o argumento que os indivíduos não têm a capacidade de concluir tratados.
Como bem destaca Antonio Augusto Cançado Trindade (2003, p. 458), em âmbito interno, nem todo
indivíduo participa, direta ou indiretamente, do processo legiferante, e nem por isso ele deixa de ser um
sujeito de direito.
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Claro que o reconhecimento da personalidade jurídica internacional dos indivíduos não lhes confere
capacidade plena em âmbito internacional, um atributo que atualmente é restrito aos Estados. Mas, como
já aludido, uma coisa é a capacidade jurídica e outra é a personalidade em si.

8.2. A evolução normativa de proteção e responsabilidade penal dos


indivíduos
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Hans Kelsen (2000, p. 490) já identificava normas do Direito Internacional — como a vedação da
pirataria, o confisco de carga nos casos de quebra de bloqueio e contrabando de guerra — que não são
destinadas a Estados, mas aos indivíduos, ainda que na legislação nacional não houvesse norma
correspondente.
souza -- CPF:

Além de deveres internacionais, Kelsen (2000, p. 494) apontou que os indivíduos poderiam ser ainda
parte no Tribunal Internacional de Presas Marítimas ou em Tribunais de Arbitragem, ligados à Primeira
Marceli souza

Guerra Mundial, e também na Convenção Germano-Polonesa, de 1922, referente à Alta Silésia.


Marceli

Antonio Cassese (2013, p. 198) relembra ainda da Corte de Justicia Centroamericana (integrada por
Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua), que, de 1908 a 1918, permitia o acesso individual
contra Estados.
Porém, como aponta o autor, são os julgamentos de Nuremberg, ao final da Segunda Guerra
Mundial, que revolucionaram o papel dos indivíduos em âmbito internacional (CASSESE, 2013, p. 195).
Para ele, foi fruto da noção de crimes contra a humanidade e da filosofia revolucionária que a
Assembleia Geral da ONU concebeu os indivíduos nas relações internacionais, dotando-os deveres — com a
Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio, de 9 de dezembro de 1948 — e direitos,
com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948 (CASSESE, 2013, p. 195).

CUIDADO!
É importante destacar-se que, em sua criação, apenas a Convenção seria formalmente vinculante aos
Estados, por ser um tratado internacional, ao passo que a DUDH, sendo uma resolução da Assembleia Geral,
não teria caráter vinculativo.

Se a DUDH, no momento de sua criação, era considerada uma norma de soft law, sua importância
acabou por transcender seu status formal, pois influenciou as novas Constituições, redigidas no pós-Segunda

197
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Guerra Mundial. Ademais, tratou-se do ponto de partida para a elaboração de novos tratados internacionais
que permitiram ao indivíduo recorrer a fóruns internacionais para a garantia de seus direitos — como a
Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial, de 1965, o Pacto
Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional sobre os direitos econômicos, sociais
e culturais, de 1966, a Convenção para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, de 1979, a Convenção
sobre os direitos da criança, de 1989.
Em âmbito regional, merecem destaque a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, de 1950, a
Convenção Interamericana de Direitos Humanos, de 1969, e a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos
Povos, de 1981.
Em relação à responsabilidade penal, após os julgamentos de Nuremberg, o impulso renovador da
responsabilização penal por crimes contra os direitos humanos e humanitário foram os Tribunais Penais ad
hoc para Ruanda e para a ex-Iugoslávia (CASSESE, 2013, p. 197), culminando na criação do Tribunal Penal
Internacional em 1998.

8.3. As debilidades da proteção individual em âmbito internacional

Antonio Cassese (2013, p. 200) aponta que, apesar da importância da proteção internacional ao
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indivíduo, as normas atuais são imperfeitas, gerando alguns limites ao alcance de sua finalidade.
Em primeiro lugar, trata-se de um direito de tipo processual, no sentido de que a possibilidade de se
recorrer a um órgão internacional estaria limitada ao direito material previsto no tratado constitutivo, e não
a todas as normas do Direito Internacional.
Ademais, mesmo com uma decisão favorável, não há em âmbito internacional meios para a execução
coercitiva da decisão. Assim sendo, o indivíduo acaba por depender da atuação do Estado condenado em
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cumprir a decisão.
Em boa parte dos tratados internacionais, o Estado tem a faculdade de responder perante as
instâncias internacionais. Tem-se como exemplo o artigo 62 da CADH:

Artigo 62
souza -- CPF:

1. Toda Estado-Parte, pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação


desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que
Marceli souza

reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da


Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção.
Marceli

2. A declaração pode ser feita incondicionalmente, ou sob condição de reciprocidade, por


prazo determinado ou para casos específicos. Deverá ser apresentada ao Secretário-Geral
da Organização, que encaminhará cópias da mesma aos outros Estados-Membros da
Organização e ao Secretário da Corte.
3. A Corte tem competência para conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e
aplicação das disposições desta Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados-
Partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência, seja por
declaração especial, como prevêem os incisos anteriores, seja por convenção especial.

Ademais, como aponta Antonio Cassese (2013, p. 201), as normas do processo internacional ainda
são rudimentares, principalmente em relação à obtenção das provas. André de Carvalho Ramos (2019, p.
238) ressalta, ao apontar a impossibilidade de recurso do indivíduo da decisão de não admissibilidade da
CIDH, a disparidade entre Estado e vítima no sistema de peticionamento da Convenção Interamericana de
Direitos Humanos.
Por fim, Antonio Cassese (2013, p. 201) ressalva que a proteção internacional do indivíduo é precária,
na medida em que os Estados podem denunciar os tratados e deixar de serem responsabilizados.

198
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
237. (CESPE/CEBRASPE - 2003 - Instituto Rio Branco) Desde o início do século XX, consolidou-se na prática
internacional a aceitação de que todo indivíduo tem personalidade jurídica de direito internacional, fato que
é corroborado por haver cortes internacionais que julgam indivíduos que cometeram crimes de guerra e
também por haver tribunais internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos do Homem, que
admitem a possibilidade de indivíduos atuarem como partes nos processos por elas julgados.
238. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - AGU - Advogado da União) No Direito Internacional, há muito tempo,
existem as cortes que atuam para a solução de conflitos entre os Estados, como é o caso da Corte
Internacional de Justiça. Entretanto, há fato inédito, no Direito Internacional, quanto à criminalização
supranacional de determinadas condutas, com a criação do TPI, tribunal ad hoc destinado à punição de
pessoas que pratiquem, em período de paz ou de guerra, qualquer crime contra indivíduos.

8.4. Condição jurídica do estrangeiro/migrante

8.4.1. Alteração legislativa e terminológica – do estrangeiro ao migrante


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Ao escolher os critérios de vínculo jurídico-político com determinados indivíduos, por meio da


nacionalidade, o Estado faz uma distinção automática entre seus nacionais e os estrangeiros. Daí dizer que o
conceito de estrangeiro se dá por exclusão, sendo a pessoa presente no território de um Estado que não é
um nacional (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 646).
Os estrangeiros podem estar em um determinado Estado de forma permanente ou transitória, por
diversos motivos, como a busca de condições melhores ou mesmo a fuga de seu país de origem por razões
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econômicas, naturais ou perseguições de diversas espécies.


No Brasil, o conjunto de normas relacionadas à situação dos migrantes era regulado pelo chamado
Estatuto do Estrangeiro (Lei n.º 6.815/1980) — considerado, pela doutrina, de viés autoritário, retrógrado e
preconceituoso (MOREIRA, 2019, p. 456) — até a promulgação da Lei de Migração (Lei n.º 13.445/2017) que,
souza -- CPF:

adequando-se aos ditames constitucionais e internacionais, passa a ver o fenômeno migratório com base
humanista e não como um assunto de segurança nacional (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 646).
Marceli souza

Roberto Luiz Silva (2020, p. 270), por exemplo, aponta que a primeira grande mudança da legislação
Marceli

foi a substituição do termo estrangeiro, presente em documentos internacionais, pelo termo migrante, tendo
em vista a conotação muitas vezes pejorativa, discriminatória e criminalizante empregada aos imigrantes
presentes no país (MOREIRA, 2019, p. 463).
A Lei de Migração, regulamenta pelo Decreto nº 9.199/2017, traz em art. 1º, definições importantes
e inéditas (como a do residente fronteiriço):

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre os direitos e os deveres do migrante e do visitante, regula a
sua entrada e estada no País e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas
para o emigrante.
§ 1º Para os fins desta Lei, considera-se:
I - (VETADO);
II - imigrante: pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou reside e se
estabelece temporária ou definitivamente no Brasil;
III - emigrante: brasileiro que se estabelece temporária ou definitivamente no exterior;
IV - residente fronteiriço: pessoa nacional de país limítrofe ou apátrida que conserva a sua
residência habitual em município fronteiriço de país vizinho;
V - visitante: pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao Brasil para estadas de
curta duração, sem pretensão de se estabelecer temporária ou definitivamente no território
nacional;
VI - apátrida: pessoa que não seja considerada como nacional por nenhum Estado, segundo
a sua legislação, nos termos da Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954,

199
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

promulgada pelo Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002, ou assim reconhecida pelo


Estado brasileiro.

Sidney Guerra (2019, p. 418) explica que migrante é a pessoa que se transfere de seu lugar habitual
para outro Estado. Logo, o termo migrante é gênero, dos quais são espécies os imigrantes, os emigrantes e
os refugiados.
Os imigrantes são os que se transferem de um Estado a outro por vontade própria e com animus
definitivo. Já os refugiados são os que se transferem de um Estado a outro, em caráter temporário ou
definitivo, mas por motivos alheios à sua vontade.
O emigrante é o nacional, isto é, o brasileiro, que sai do país com destino ao exterior, em caráter
temporário ou definitivo.
Os apátridas ou heimatlos são as pessoas que não se enquadram nos padrões de nacionalidade do
local onde nasceram ou em nenhuma outra legislação.
Já os visitantes são as pessoas que, em caráter temporário e de curta duração, buscam adentar no
Brasil por motivos diversos como lazer, turismo, trabalho etc.
Por fim, de forma inédita, a Lei de Migração traz o conceito do residente fronteiriço, que é o
estrangeiro que reside em país vizinho ao Brasil, mas que aqui desenvolve suas atividades ou realiza atos
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da vida civil no território nacional (GUERRA, 2019, p. 420). A lei, ao inserir os residentes fronteiriços,
reconheceu inicialmente o grande fluxo de pessoas entre os países vizinhos do Brasil e buscou
desburocratizar o exercício de direitos em solo nacional.

8.4.2. Princípios e diretrizes da política migratória

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 464) aponta que, de forma inédita o legislador brasileiro inseriu na
CPF: 073.496.444-77

Lei de Migração um rol de princípios e diretrizes para nortear a política migratória nacional. Os ditames do
art. 3º devem servir como parâmetros hermenêuticos para a aplicação da legislação vigente, dispondo o
seguinte:
souza -- CPF:

Art. 3º A política migratória brasileira rege-se pelos seguintes princípios e diretrizes:


I - universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos humanos;
II - repúdio e prevenção à xenofobia, ao racismo e a quaisquer formas de discriminação;
Marceli souza

III - não criminalização da migração;


Marceli

IV - não discriminação em razão dos critérios ou dos procedimentos pelos quais a pessoa
foi admitida em território nacional;
V - promoção de entrada regular e de regularização documental;
VI - acolhida humanitária;
VII - desenvolvimento econômico, turístico, social, cultural, esportivo, científico e
tecnológico do Brasil;
VIII - garantia do direito à reunião familiar;
IX - igualdade de tratamento e de oportunidade ao migrante e a seus familiares;
X - inclusão social, laboral e produtiva do migrante por meio de políticas públicas;
XI - acesso igualitário e livre do migrante a serviços, programas e benefícios sociais, bens
públicos, educação, assistência jurídica integral pública, trabalho, moradia, serviço bancário
e seguridade social;
XII - promoção e difusão de direitos, liberdades, garantias e obrigações do migrante;
XIII - diálogo social na formulação, na execução e na avaliação de políticas migratórias e
promoção da participação cidadã do migrante;
XIV - fortalecimento da integração econômica, política, social e cultural dos povos da
América Latina, mediante constituição de espaços de cidadania e de livre circulação de
pessoas;
XV - cooperação internacional com Estados de origem, de trânsito e de destino de
movimentos migratórios, a fim de garantir efetiva proteção aos direitos humanos do
migrante;

200
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

XVI - integração e desenvolvimento das regiões de fronteira e articulação de políticas


públicas regionais capazes de garantir efetividade aos direitos do residente fronteiriço;
XVII - proteção integral e atenção ao superior interesse da criança e do adolescente
migrante;
XVIII - observância ao disposto em tratado;
XIX - proteção ao brasileiro no exterior;
XX - migração e desenvolvimento humano no local de origem, como direitos inalienáveis de
todas as pessoas;
XXI - promoção do reconhecimento acadêmico e do exercício profissional no Brasil, nos
termos da lei; e
XXII - repúdio a práticas de expulsão ou de deportação coletivas.

O art. 4º da Lei de Migração inova ao trazer, ainda, um rol de direitos aos migrantes. Como destaca
Sidney Guerra (2019, p. 424), a nova legislação, em cumprimento aos ditames constitucionais, trata os
migrantes como sujeitos de direito, afastando tratamento discriminatório e xenofóbico, assegurando-lhes
tratamento igualitários.
Isadora Meneghel Begnini e Fábio Aristimunho Vargas (2018, p. 430) destacam que a legislação é
inovadora ainda de um ponto de vista topográfico, considerando que o antigo Estatuto do Estrangeiro previa
direitos ao estrangeiro atrelados a deveres, ao final da lei, ao passo que agora há uma cisão entre eles, tendo
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os direitos sido inseridos no início da legislação:

Art. 4º Ao migrante é garantida no território nacional, em condição de igualdade com os


nacionais, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, bem como são assegurados:
I - direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicos;
II - direito à liberdade de circulação em território nacional;
III - direito à reunião familiar do migrante com seu cônjuge ou companheiro e seus filhos,
familiares e dependentes;
CPF: 073.496.444-77

IV - medidas de proteção a vítimas e testemunhas de crimes e de violações de direitos;


V - direito de transferir recursos decorrentes de sua renda e economias pessoais a outro
país, observada a legislação aplicável;
VI - direito de reunião para fins pacíficos;
souza -- CPF:

VII - direito de associação, inclusive sindical, para fins lícitos;


VIII - acesso a serviços públicos de saúde e de assistência social e à previdência social, nos
Marceli souza

termos da lei, sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória;


IX - amplo acesso à justiça e à assistência jurídica integral gratuita aos que comprovarem
Marceli

insuficiência de recursos;
X - direito à educação pública, vedada a discriminação em razão da nacionalidade e da
condição migratória;
XI - garantia de cumprimento de obrigações legais e contratuais trabalhistas e de aplicação
das normas de proteção ao trabalhador, sem discriminação em razão da nacionalidade e da
condição migratória;
XII - isenção das taxas de que trata esta Lei, mediante declaração de hipossuficiência
econômica, na forma de regulamento;
XIII - direito de acesso à informação e garantia de confidencialidade quanto aos dados
pessoais do migrante, nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011;
XIV - direito a abertura de conta bancária;
XV - direito de sair, de permanecer e de reingressar em território nacional, mesmo
enquanto pendente pedido de autorização de residência, de prorrogação de estada ou de
transformação de visto em autorização de residência; e
XVI - direito do imigrante de ser informado sobre as garantias que lhe são asseguradas para
fins de regularização migratória.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 465) destaca que o dispositivo legal traz um rol exemplificativo de
direitos, considerando a cláusula de abertura do art. 4º, § 1º, bem como os ditames constitucionais e
internacionais sobre o tema:

201
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Art. 4º (...)
§ 1º Os direitos e as garantias previstos nesta Lei serão exercidos em observância ao
disposto na Constituição Federal, independentemente da situação migratória, observado o
disposto no § 4º deste artigo, e não excluem outros decorrentes de tratado de que o Brasil
seja parte.

8.4.3. Documentos de viagem

A admissão de um estrangeiro é um ato discricionários do Estado (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 647).


O art. 5º da Lei de Migração traz os documentos de viagem, que devem ser verificados antes da
entrada do estrangeiro no país:

Art. 5º São documentos de viagem:


I - passaporte;
II - laissez-passer;
III - autorização de retorno;
IV - salvo-conduto;
V - carteira de identidade de marítimo;
VI - carteira de matrícula consular;
VII - documento de identidade civil ou documento estrangeiro equivalente, quando
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admitidos em tratado;
VIII - certificado de membro de tripulação de transporte aéreo; e
IX - outros que vierem a ser reconhecidos pelo Estado brasileiro em regulamento.

O passaporte é, segundo Roberto Luzi Silva (2020, p. 281), o documento policial destinado à garantia
de livre passagem de um ponto a outro entre Estados que mantêm relações diplomáticas.
Já o laissez-passer é um documento expedido, pelo Estado brasileiro, aos estrangeiros portadores de
documentos de Estados não reconhecidos pelo Governo Brasileiro ou com documentos que não sejam
CPF: 073.496.444-77

válidos para o Brasil (SILVA, 2020, p. 285).


A autorização de retorno é o documento expedido pela União, para as pessoas regressarem a seu
território nacional, sem terem preenchido os requisitos para a expedição de passaportes ou lassaiz-passer,
souza -- CPF:

bem como para a pessoa, que na condição de extraditando para o Brasil, não possua documento de viagem
válido (SILVA, 2020, p. 286).
Marceli souza

O salvo-conduto é o documento expedido para que o asilado diplomático possa sair do território
rumo ao país de concessão do asilo (territorial).
Marceli

A cédula de identidade civil é o documento substitutivo do passaporte, em razão de previsão


convencional entre dois ou mais Estados (como entre os membros do Mercosul).
O certificado de membro de tripulação de transporte aéreo e a carteira de marítimo são
documentos substitutivos do passaporte, para fins de embarque ou desembarque em território nacional, de
previsão convencional aos tripulantes de navios ou aeronaves (SILVA, 2020, p. 286).
Já a carteira de matrícula consular é documento expedido, de acordo com as regras da Organização
da Aviação Civil Internacional (OACI), por missões diplomáticas ou consulares, ao cidadão brasileiro
domiciliado no exterior, com a finalidade de prover um documento brasileiro de identificação em língua local.

8.4.4. Sistema de vistos

O visto é um documento que gera a expectativa de direito ao seu portador, de ingresso em território
nacional. De regra, o visto é concedido no exterior, sendo excepcionalmente concedido em solo nacional:

Art. 6º O visto é o documento que dá a seu titular expectativa de ingresso em território


nacional.
Parágrafo único. (VETADO).

202
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Art. 7º O visto será concedido por embaixadas, consulados-gerais, consulados, vice-


consulados e, quando habilitados pelo órgão competente do Poder Executivo, por
escritórios comerciais e de representação do Brasil no exterior.
Parágrafo único. Excepcionalmente, os vistos diplomático, oficial e de cortesia poderão ser
concedidos no Brasil.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 466) ressalta que a Lei de Migração, ao contrário do Estatuto do
Estrangeiro, restringiu a possibilidade de negativa de vistos em razão de critérios subjetivos, como a
nocividade à ordem pública, tendo o artigo 10 inserido critérios objetivos para a não concessão:

Art. 10. Não se concederá visto:


I - a quem não preencher os requisitos para o tipo de visto pleiteado;
II - a quem comprovadamente ocultar condição impeditiva de concessão de visto ou de
ingresso no País; ou
III - a menor de 18 (dezoito) anos desacompanhado ou sem autorização de viagem por
escrito dos responsáveis legais ou de autoridade competente.

O art. 12 da Lei traz as espécies de vistos:

Art. 12. Ao solicitante que pretenda ingressar ou permanecer em território nacional poderá
ser concedido visto:
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I - de visita;
II - temporário;
III - diplomático;
IV - oficial;
V - de cortesia.

O visto de visita tem a ausência de estabelecimento de residência pelo estrangeiro como


característica principal. Sua vinda ao Brasil é de curta duração, podendo ser por motivo de turismo, negócios,
CPF: 073.496.444-77

trânsito ou o desenvolvimento de atividades artísticas ou desportivas, sendo-lhe vedado o exercício de


atividade remunerada:

Art. 13. O visto de visita poderá ser concedido ao visitante que venha ao Brasil para estada
de curta duração, sem intenção de estabelecer residência, nos seguintes casos:
souza -- CPF:

I - turismo;
II - negócios;
Marceli souza

III - trânsito;
IV - atividades artísticas ou desportivas; e
Marceli

V - outras hipóteses definidas em regulamento.


§ 1º É vedado ao beneficiário de visto de visita exercer atividade remunerada no Brasil.
§ 2º O beneficiário de visto de visita poderá receber pagamento do governo, de empregador
brasileiro ou de entidade privada a título de diária, ajuda de custo, cachê, pró-labore ou
outras despesas com a viagem, bem como concorrer a prêmios, inclusive em dinheiro, em
competições desportivas ou em concursos artísticos ou culturais.
§ 3º O visto de visita não será exigido em caso de escala ou conexão em território nacional,
desde que o visitante não deixe a área de trânsito internacional.

Nos termos do art. 15 do regulamento, o prazo de validade do visto de visita é de um ano, podendo
ser estendido por até 10 (dez) anos em caso de reciprocidade (Decreto n.º 9.199/2017, art. 15, § 2º).
Já o prazo de estada em território nacional é de até 90 dias, com possibilidade de renovação por
mais noventa, não podendo ultrapassar 180 dias a cada ano (Decreto nº 9.199/2017, art. 20).
O visto temporário é o concedido ao imigrante que tem o intuito de estabelecer residência no Brasil
por prazo determinado, por um dos motivos previstos no art. 14 da Lei:

Art. 14. O visto temporário poderá ser concedido ao imigrante que venha ao Brasil com o
intuito de estabelecer residência por tempo determinado e que se enquadre em pelo menos
uma das seguintes hipóteses:
I - o visto temporário tenha como finalidade:

203
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) pesquisa, ensino ou extensão acadêmica;


b) tratamento de saúde;
c) acolhida humanitária;
d) estudo;
e) trabalho;
f) férias-trabalho;
g) prática de atividade religiosa ou serviço voluntário;
h) realização de investimento ou de atividade com relevância econômica, social, científica,
tecnológica ou cultural;
i) reunião familiar;
j) atividades artísticas ou desportivas com contrato por prazo determinado;
II - o imigrante seja beneficiário de tratado em matéria de vistos;
III - outras hipóteses definidas em regulamento.

O prazo de validade do visto é de um ano, não se confundindo com o prazo de autorização de


residência (Decreto n.º 9.199/2017, art. 16, parágrafo único). Durante o prazo de validade, é possível ao seu
portador vários ingressos no país (Decreto n.º 9.199/2017, art. 16).
Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 467) destaca a flexibilização legislativa que possibilitou a concessão
do visto temporário para o trabalho com a comprovação da oferta de emprego e não a perfectibilização do
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contrato de trabalho:
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Art. 14 (...)
§ 5º Observadas as hipóteses previstas em regulamento, o visto temporário para trabalho
poderá ser concedido ao imigrante que venha exercer atividade laboral, com ou sem vínculo
empregatício no Brasil, desde que comprove oferta de trabalho formalizada por pessoa
jurídica em atividade no País, dispensada esta exigência se o imigrante comprovar titulação
em curso de ensino superior ou equivalente.
CPF: 073.496.444-77

Ocorre que o Decreto n.º 9.199/2017, ao regular o dispositivo legal, inovou indevidamente no mundo
jurídico, ao exigir a comprovação de vínculo empregatício:

Art. 38. O visto temporário para trabalho poderá ser concedido ao imigrante que venha
exercer atividade laboral com ou sem vínculo empregatício no País.
souza -- CPF:

§ 1º O visto temporário para trabalho com vínculo empregatício será concedido por meio
da comprovação de oferta de trabalho no País, observado o seguinte:
Marceli souza

I - a oferta de trabalho é caracterizada por meio de contrato individual de trabalho ou de


contrato de prestação de serviços; e
Marceli

Em relação ao visto temporário para a reunião familiar, tem previsão expressa na Lei de Refúgio (Lei
n.º 9.474/1997):

Art. 21. Recebida a solicitação de refúgio, o Departamento de Polícia Federal emitirá


protocolo em favor do solicitante e de seu grupo familiar que se encontre no território
nacional, o qual autorizará a estada até a decisão final do processo.

O tratamento da Lei de Migração ampliou a proteção do instituto (MOREIRA, 2019, p. 469), pois, se
antes era aplicada apenas aos familiares do indivíduo considerado refugiado, agora é também estendida ao
apátrida (Lei n.º 13.445/2017, art. 26, § 11) e aos beneficiários do art. 37 da Lei de Migração:

Art. 37. O visto ou a autorização de residência para fins de reunião familiar será concedido
ao imigrante:
I - cônjuge ou companheiro, sem discriminação alguma;
II - filho de imigrante beneficiário de autorização de residência, ou que tenha filho brasileiro
ou imigrante beneficiário de autorização de residência;
III - ascendente, descendente até o segundo grau ou irmão de brasileiro ou de imigrante
beneficiário de autorização de residência; ou
IV - que tenha brasileiro sob sua tutela ou guarda.

204
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

O visto temporário para a acolhida humanitária é, segundo os ensinamentos de Thiago Oliveira


Moreira (2019, p. 469), uma forma de proteção subsidiária oferecida aos estrangeiros forçados a saírem de
seus países, mas que não se enquadram como refugiados. Sua aplicação prática, segundo o autor, refere-se
aos imigrantes haitianos e venezuelanos que não tiveram reconhecida a condição de refugiados.

Art. 14 (...)
§ 3º O visto temporário para acolhida humanitária poderá ser concedido ao apátrida ou ao
nacional de qualquer país em situação de grave ou iminente instabilidade institucional, de
conflito armado, de calamidade de grande proporção, de desastre ambiental ou de grave
violação de direitos humanos ou de direito internacional humanitário, ou em outras
hipóteses, na forma de regulamento.

O visto diplomático é aquele concedido às autoridades diplomáticas estrangeiras, aos funcionários


do corpo diplomático e aos chefes de escritórios de organismos internacionais, sendo a benesse estendida a
seus cônjuges e filhos menores de 18 anos. O visto oficial é concedido aos demais estrangeiros em missão
oficial ou funcionários de organizações internacionais, diplomáticas ou consulares e a seus dependentes,
desde que não detenham o visto diplomático, nos termos do art. 53 do Decreto nº 9.199/2017:

Art. 53. Os vistos diplomático e oficial poderão ser concedidos a autoridades e funcionários
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estrangeiros que viajem ao País em missão oficial de caráter transitório ou permanente e


representem Estado estrangeiro ou organismo internacional reconhecido.
(...)
§ 2º Os vistos diplomático e oficial poderão ser estendidos aos dependentes das
autoridades mencionadas no caput, conforme o disposto em ato do Ministro de Estado das
Relações Exteriores.

Os titulares dos vistos diplomáticos e oficiais não poderão exercer atividade remunerada no Brasil
que não a do Estado ou Organismo Internacional acreditante, excepcionando-se a regra por disposição
CPF: 073.496.444-77

expressa em tratado de reciprocidade:

Art. 54. O titular de visto diplomático ou oficial somente poderá ser remunerado por Estado
estrangeiro ou organismo internacional, ressalvado o disposto no art. 55 ou em tratado que
souza -- CPF:

contenha cláusula específica sobre o assunto.


Parágrafo único. Na hipótese de tratado com cláusula específica, os termos do referido
Marceli souza

tratado prevalecerão sobre o disposto no art. 55.

Já os dependentes dos titulares do visto diplomático ou oficial podem exercer atividade remunerada
Marceli

no país, desde que mediante reciprocidade do Estado acreditante, ao nacional brasileiro, nos termos do art.
55 do Decreto n.º 9.199/2017:

Art. 55. O dependente de titular de visto diplomático ou oficial poderá exercer atividade
remunerada no País, observada a legislação trabalhista brasileira, desde que haja
reciprocidade de tratamento em relação ao nacional brasileiro.

O visto de cortesia é concedido aos empregados domésticos estrangeiros dos chefes de missão de
funcionários diplomáticos ou consulares acreditados no país, bem como às pessoas previstas no art. 57 do
Decreto n.º 9.199/2017:

Art. 57. O visto de cortesia poderá ser concedido:


I - às personalidades e às autoridades estrangeiras em viagem não oficial ao País;
II - aos companheiros, aos dependentes e aos familiares em linha direta que não sejam
beneficiários do visto de que trata o § 2º do art. 53;
III - aos empregados particulares de beneficiário de visto diplomático, oficial ou de cortesia;
IV - aos trabalhadores domésticos de missão estrangeira sediada no País;
V - aos artistas e aos desportistas estrangeiros que venham ao País para evento gratuito, de
caráter eminentemente cultural, sem percepção de honorários no território brasileiro, sob
requisição formal de missão diplomática estrangeira ou de organização internacional de que
o País seja parte;

205
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

VI - excepcionalmente, a critério do Ministério das Relações Exteriores, a outras pessoas


não elencadas nas demais hipóteses previstas neste artigo.

De regra, para o ingresso no Brasil é necessário o visto válido, não sendo a posse ou propriedade de
bem no país motivo que confira direito subjetivo de concessão de visto ou autorização de residência ao
estrangeiro, como dispõe a Lei de Migração:

Art. 35. A posse ou a propriedade de bem no Brasil não confere o direito de obter visto ou
autorização de residência em território nacional, sem prejuízo do disposto sobre visto para
realização de investimento.

A lei possibilitou, no entanto, a entrada de pessoa que não possua visto ou que, apesar de titular, seu
visto tenha sido emitido com erro ou omissão, bem como nos casos de perda da condição de residente ou
de criança ou adolescente desacompanhados:

Art. 40. Poderá ser autorizada a admissão excepcional no País de pessoa que se encontre
em uma das seguintes condições, desde que esteja de posse de documento de viagem
válido:
I - não possua visto;
II - seja titular de visto emitido com erro ou omissão;
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III - tenha perdido a condição de residente por ter permanecido ausente do País na forma
especificada em regulamento e detenha as condições objetivas para a concessão de nova
autorização de residência;
IV - (VETADO); ou
V - seja criança ou adolescente desacompanhado de responsável legal e sem autorização
expressa para viajar desacompanhado, independentemente do documento de viagem que
portar, hipótese em que haverá imediato encaminhamento ao Conselho Tutelar ou, em
caso de necessidade, a instituição indicada pela autoridade competente.
Parágrafo único. Regulamento poderá dispor sobre outras hipóteses excepcionais de
CPF: 073.496.444-77

admissão, observados os princípios e as diretrizes desta Lei.

Art. 41. A entrada condicional, em território nacional, de pessoa que não preencha os
requisitos de admissão poderá ser autorizada mediante a assinatura, pelo transportador ou
por seu agente, de termo de compromisso de custear as despesas com a permanência e
souza -- CPF:

com as providências para a repatriação do viajante.


Marceli souza

8.4.5. Autorização de residência


Marceli

Outra inovação legislativa é a possibilidade de autorização de residência aos imigrantes, residentes


fronteiriços ou mesmo visitantes, desde que cumpridas as disposições do art. 30 da Lei:

Art. 30. A residência poderá ser autorizada, mediante registro, ao imigrante, ao residente
fronteiriço ou ao visitante que se enquadre em uma das seguintes hipóteses:
I - a residência tenha como finalidade:
a) pesquisa, ensino ou extensão acadêmica;
b) tratamento de saúde;
c) acolhida humanitária;
d) estudo;
e) trabalho;
f) férias-trabalho;
g) prática de atividade religiosa ou serviço voluntário;
h) realização de investimento ou de atividade com relevância econômica, social, científica,
tecnológica ou cultural;
i) reunião familiar;
II - a pessoa:
a) seja beneficiária de tratado em matéria de residência e livre circulação;
b) seja detentora de oferta de trabalho;

206
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

c) já tenha possuído a nacionalidade brasileira e não deseje ou não reúna os requisitos para
readquiri-la;
d) (VETADO);
e) seja beneficiária de refúgio, de asilo ou de proteção ao apátrida;
f) seja menor nacional de outro país ou apátrida, desacompanhado ou abandonado, que se
encontre nas fronteiras brasileiras ou em território nacional;
g) tenha sido vítima de tráfico de pessoas, de trabalho escravo ou de violação de direito
agravada por sua condição migratória;
h) esteja em liberdade provisória ou em cumprimento de pena no Brasil;
III - outras hipóteses definidas em regulamento.
§ 1º Não se concederá a autorização de residência a pessoa condenada criminalmente no
Brasil ou no exterior por sentença transitada em julgado, desde que a conduta esteja
tipificada na legislação penal brasileira, ressalvados os casos em que:
I - a conduta caracterize infração de menor potencial ofensivo;
II - (VETADO); ou
III - a pessoa se enquadre nas hipóteses previstas nas alíneas “b”, “c” e “i” do inciso I e na
alínea “a” do inciso II do caput deste artigo.
§ 2º O disposto no § 1º não obsta progressão de regime de cumprimento de pena, nos
termos da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, ficando a pessoa autorizada a trabalhar
quando assim exigido pelo novo regime de cumprimento de pena.
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§ 3º Nos procedimentos conducentes ao cancelamento de autorização de residência e no


073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

recurso contra a negativa de concessão de autorização de residência devem ser respeitados


o contraditório e a ampla defesa.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 473) destaca que a inovação do art. 30, II, g, da Lei de Migração é
um grande avanço da legislação pátria, pois permite às vítimas dos crimes de tráfico de pessoas ou trabalho
análogo ao de escravo denunciar os delitos sem o temor de serem deportados.

8.4.6. Impedimento de ingresso


CPF: 073.496.444-77

O art. 45 da Lei de Migração traz as hipóteses de impedimento de ingresso no território nacional.


Como bem destaca Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 475), em sua grande maioria, as situações estão
souza -- CPF:

relacionadas com expulsão anterior, fraude na documentação de ingresso ou compromissos internacionais


assumidos pelo Brasil:
Marceli souza

Art. 45. Poderá ser impedida de ingressar no País, após entrevista individual e mediante ato
Marceli

fundamentado, a pessoa:
I - anteriormente expulsa do País, enquanto os efeitos da expulsão vigorarem;
II - condenada ou respondendo a processo por ato de terrorismo ou por crime de genocídio,
crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão, nos termos definidos
pelo Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998, promulgado pelo Decreto
nº 4.388, de 25 de setembro de 2002;
III - condenada ou respondendo a processo em outro país por crime doloso passível de
extradição segundo a lei brasileira;
IV - que tenha o nome incluído em lista de restrições por ordem judicial ou por compromisso
assumido pelo Brasil perante organismo internacional;
V - que apresente documento de viagem que:
a) não seja válido para o Brasil;
b) esteja com o prazo de validade vencido; ou
c) esteja com rasura ou indício de falsificação;
VI - que não apresente documento de viagem ou documento de identidade, quando
admitido;
VII - cuja razão da viagem não seja condizente com o visto ou com o motivo alegado para a
isenção de visto;
VIII - que tenha, comprovadamente, fraudado documentação ou prestado informação falsa
por ocasião da solicitação de visto; ou
IX - que tenha praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição
Federal.

207
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Parágrafo único. Ninguém será impedido de ingressar no País por motivo de raça, religião,
nacionalidade, pertinência a grupo social ou opinião política.

O autor aponta ainda que o parágrafo único do art. 45 traz previsão expressa de norma de jus cogens
do princípio da não discriminação (MOREIRA, 2019, p. 476), sendo intimamente ligado ao princípio do non-
refoulement (não devolução).

8.4.7. Repatriação

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 476) conceitua medidas de retirada compulsória, o conjunto de
atos pelo qual o Estado determina a saída do estrangeiro de seu território. Elas podem ser classificadas em
medidas de retirada compulsória administrativas e medidas de retirada cooperacional.
As medidas de retirada administrativa são feitas por procedimentos administrativos, com
possibilidade de controle jurisdicional, sendo elas: repatriação; deportação; e expulsão. Já as medidas de
caráter cooperacional são a extradição e a entrega.
A primeira medida administrativa é a repatriação, na qual a Polícia Federal devolve a pessoa em
situação de impedimento de ingresso no país ao Estado de procedência ou de sua nacionalidade:
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073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Art. 49. A repatriação consiste em medida administrativa de devolução de pessoa em


situação de impedimento ao país de procedência ou de nacionalidade.

Trata-se de medida administrativa que deverá ser motivada, oportunizando-se a defesa do


estrangeiro por meio de notificação à autoridade consular do país de procedência ou de sua nacionalidade,
bem como à Defensoria Pública:

Art. 49. (...)


CPF: 073.496.444-77

§ 1º Será feita imediata comunicação do ato fundamentado de repatriação à empresa


transportadora e à autoridade consular do país de procedência ou de nacionalidade do
migrante ou do visitante, ou a quem o representa.
§ 2º A Defensoria Pública da União será notificada, preferencialmente por via eletrônica, no
caso do § 4º deste artigo ou quando a repatriação imediata não seja possível.
souza -- CPF:

§ 3º Condições específicas de repatriação podem ser definidas por regulamento ou tratado,


observados os princípios e as garantias previstos nesta Lei.
Marceli souza

A repatriação é vedada nas hipóteses de a pessoa estar em situação de refúgio ou ser apátrida, ou,
Marceli

ainda, aos menores de 18 anos desacompanhados ou separados de sua família, em mais uma aplicação do
princípio do non-refoulement:

Art. 49. (...)


§ 4º Não será aplicada medida de repatriação à pessoa em situação de refúgio ou de
apatridia, de fato ou de direito, ao menor de 18 (dezoito) anos desacompanhado ou
separado de sua família, exceto nos casos em que se demonstrar favorável para a garantia
de seus direitos ou para a reintegração a sua família de origem, ou a quem necessite de
acolhimento humanitário, nem, em qualquer caso, medida de devolução para país ou região
que possa apresentar risco à vida, à integridade pessoal ou à liberdade da pessoa.

8.4.8. Deportação

A deportação é medida administrativa de retirada compulsória do estrangeiro que ingressou ou


permanece de forma irregular no país. Ao contrário da retirada, a pessoa já deve ter ingressado no país para
ser deportada (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 657).

Art. 50. A deportação é medida decorrente de procedimento administrativo que consiste


na retirada compulsória de pessoa que se encontre em situação migratória irregular em
território nacional.

208
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Ao contrário da legislação anterior, que previa o prazo de 3 a 8 dias para a execução da medida, a Lei
fixou o prazo mínimo de 60 dias após a notificação do deportando, prorrogáveis por igual período:

Art. 50 (...)
§ 1º A deportação será precedida de notificação pessoal ao deportando, da qual constem,
expressamente, as irregularidades verificadas e prazo para a regularização não inferior a 60
(sessenta) dias, podendo ser prorrogado, por igual período, por despacho fundamentado e
mediante compromisso de a pessoa manter atualizadas suas informações domiciliares.

Ao deportando são garantidos a livre circulação em território nacional durante o procedimento, os


direitos de contraditório, ampla defesa e recursos com efeito suspensivo:

Art. 50 (...)
§ 2º A notificação prevista no § 1º não impede a livre circulação em território nacional,
devendo o deportando informar seu domicílio e suas atividades. (...)
§ 4º A deportação não exclui eventuais direitos adquiridos em relações contratuais ou
decorrentes da lei brasileira.

Art. 51. Os procedimentos conducentes à deportação devem respeitar o contraditório e a


ampla defesa e a garantia de recurso com efeito suspensivo.
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§ 1º A Defensoria Pública da União deverá ser notificada, preferencialmente por meio


073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

eletrônico, para prestação de assistência ao deportando em todos os procedimentos


administrativos de deportação.
§ 2º A ausência de manifestação da Defensoria Pública da União, desde que prévia e
devidamente notificada, não impedirá a efetivação da medida de deportação.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 479) destaca que a Lei de Migração em momento algum se refere
ao deportando como imigrante ilegal, reconhecendo apenas a situação de irregularidade migratória.
Ademais, em caso de irregularidade, a medida só será executada quando, decorrido o prazo, o
CPF: 073.496.444-77

migrante não regularizar sua situação:

Art. 50 (...)
§ 3º Vencido o prazo do § 1º sem que se regularize a situação migratória, a deportação
souza -- CPF:

poderá ser executada.

Em atenção ao princípio do non-refoulement, a deportação do apátrida depende de autorização da


Marceli souza

autoridade competente, sendo vedada nos casos de proibição da extradição:


Marceli

Art. 52. Em se tratando de apátrida, o procedimento de deportação dependerá de prévia


autorização da autoridade competente.

Art. 53. Não se procederá à deportação se a medida configurar extradição não admitida
pela legislação brasileira.

O deportando, uma vez regularizada a sua situação, poderá reingressar no país, considerando-se que
a deportação não é uma medida punitiva, mas administrativa (MAZZUOLI, 2020, ebook, p. 658).

8.4.9. Expulsão

A expulsão é a medida administrativa de retirada compulsória do migrante ou visitante, com a


impossibilidade de reingresso no território nacional por prazo determinado, em razão da prática de crimes
previstos taxativamente na lei, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória:

Art. 54. A expulsão consiste em medida administrativa de retirada compulsória de migrante


ou visitante do território nacional, conjugada com o impedimento de reingresso por prazo
determinado.
§ 1º Poderá dar causa à expulsão a condenação com sentença transitada em julgado relativa
à prática de:

209
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

I - crime de genocídio, crime contra a humanidade, crime de guerra ou crime de agressão,


nos termos definidos pelo Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, de 1998,
promulgado pelo Decreto nº 4.388, de 25 de setembro de 2002; ou
II - crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a gravidade
e as possibilidades de ressocialização em território nacional.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 450) explica que a nova legislação diminuiu a margem de
discricionariedade administrativa para a expulsão, mantendo-se na valoração do que seria um crime grave.
Contudo, excluiu a possibilidade da expulsão em crimes culposos, com condenação a penas de multa e
restritivas de direito (considerando que essas permitem a ressocialização do apenado em território nacional).
Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 660) aponta que a expulsão não é uma pena, em sentido
criminal, mas medida administrativa discricionária. O autor aponta ainda que, além do pedido de
reconsideração previsto no art. 58, § 1º da Lei de Migração, o expulsando poderá valer-se de habeas corpus
para trancar o procedimento administrativo.
Um ponto de destaque refere-se ao prazo de impedimento de reingresso em território nacional. O
art. 54, § 4º da Lei dispõe o seguinte:

Art. 54 (...)
§ 4º O prazo de vigência da medida de impedimento vinculada aos efeitos da expulsão será
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proporcional ao prazo total da pena aplicada e nunca será superior ao dobro de seu tempo.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 481) defende que o prazo de impedimento de reingresso não
poderá ser superior a 30 (trinta) anos, sob pena de que a medida adquira a natureza de pena de caráter
perpétua, vedada pela Constituição em seu art. 5º, XLVII.
Sidney Guerra (2019, p. 436) aponta, ainda, as chamadas causas de inexpulsabilidade:

Art. 55. Não se procederá à expulsão quando:


CPF: 073.496.444-77

I - a medida configurar extradição inadmitida pela legislação brasileira;


II - o expulsando:
a) tiver filho brasileiro que esteja sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva
ou tiver pessoa brasileira sob sua tutela;
souza -- CPF:

b) tiver cônjuge ou companheiro residente no Brasil, sem discriminação alguma,


reconhecido judicial ou legalmente;
c) tiver ingressado no Brasil até os 12 (doze) anos de idade, residindo desde então no País;
Marceli souza

d) for pessoa com mais de 70 (setenta) anos que resida no País há mais de 10 (dez) anos,
Marceli

considerados a gravidade e o fundamento da expulsão;

O procedimento de expulsão não impede a progressão de regime no cumprimento da pena ou as


benesses da legislação penal, como indulto ou comutação de pena:

Art. 54 (...)
§ 3º O processamento da expulsão em caso de crime comum não prejudicará a progressão
de regime, o cumprimento da pena, a suspensão condicional do processo, a comutação da
pena ou a concessão de pena alternativa, de indulto coletivo ou individual, de anistia ou de
quaisquer benefícios concedidos em igualdade de condições ao nacional brasileiro.

Ademais, em sintonia com o princípio do non-refoulement, é vedada a expulsão da pessoa a Estado


em que esteja em risco sua vida ou integridade pessoal:

Art. 62. Não se procederá à repatriação, à deportação ou à expulsão de nenhum indivíduo


quando subsistirem razões para acreditar que a medida poderá colocar em risco a vida ou
a integridade pessoal.

210
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

QUESTÕES
239. (IADES - 2021 - Instituto Rio Branco - Diplomata) O fato de o direito a ter uma nacionalidade estar
consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 logrou praticamente a extinção do
fenômeno da apatridia no século 21.
240. (FCC - 2011 - INFRAERO – Advogado) Quando a entrada do estrangeiro no País depender da
concessão de visto, a posse ou a propriedade de bens no Brasil, por si só,
a) confere ao estrangeiro o direito de obter autorização de permanência no território nacional.
b) confere ao estrangeiro o direito de obter visto de trânsito.
c) confere ao estrangeiro o direito de obter visto permanente.
d) confere ao estrangeiro o direito de obter visto de turista.
e) não confere ao estrangeiro o direito de obter visto de qualquer natureza.
241. (CESPE/CEBRASPE - 2018 - Polícia Federal - Delegado de Polícia Federal) O visto concedido por
autoridade diplomática constitui mera expectativa de direito do estrangeiro, que pode, ainda assim, ser
inadmitido no país. Por outro lado, se admitido o estrangeiro em seu território, o país passa a ter deveres em
relação a ele, em maior ou menor grau, conforme a natureza do ingresso.
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242. (TRF - 2ª Região - 2018 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Quanto à expulsão, marque a
opção correta:
a) A Lei de Migração expressamente prevê que o estrangeiro cuja presença atente contra a segurança
nacional e ordem pública pode ser expulso.
b) O estrangeiro que tiver filho brasileiro sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva pode
ser expulso.
CPF: 073.496.444-77

c) Brasileiro naturalizado não pode ser expulso do território nacional.


d) Pessoa com mais de 70 anos, residente no Brasil há mais de 10 anos, não pode ser expulsa em nenhum
caso.
e) Estrangeiro, com cônjuge ou companheiro residente no Brasil reconhecido judicial ou legalmente, pode
souza -- CPF:

ser expulso.
Marceli souza

8.5. Extradição
Marceli

8.5.1. Conceito

Nguyen Dinh, Patrick Daillier e Alain Pellet (2003, p. 524) conceituam a extradição como o ato pelo
qual um Estado remete a outro uma pessoa que se encontra em seu território, e a respeito da qual o Estado
requerente encara o exercício de competência penal. Para Francisco Rezek (2018, p. 202), cuida-se de uma
relação executiva, com envolvimento do Poder Judiciário dos dois Estados, visto que o governo do Estado
requerente só requisitará a entrega do indivíduo em virtude de processo penal em curso ou findo, em sua
justiça. Já o governo do Estado requerido, de regra, não goza de liberalidade para a entrega da pessoa,
devendo haver manifestação prévia de sua Justiça.
O fundamento da extradição é o princípio da jurisdição internacional. Seu surgimento, no entanto,
é polêmico. Enquanto Matteo Del Chicca (2012, p. 84) remete-se à época de combate à pirataria, Florisbal
Del’Omo (2017, p. 69) aponta-o como o mais tradicional instrumento de cooperação internacional, que
remonta a Antiguidade, tendo seu primeiro registro em 1291 a. C., em um tratado entre os egípcios e os
hititas. O autor aponta, ainda, que o Tratado de Paz de Amiens, entre França, Inglaterra e Espanha, de 1802,
deu novos rumos ao instituto, pois não cogitou a extradição de criminosos políticos.

211
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

8.5.2. Classificação

A extradição pode ser classificada sob diversos enfoques:

• Do ponto de vista dos Estados participantes da relação jurídica:


▪ Extradição ativa: é vista da perspectiva do Estado que requer a extradição
▪ Extradição passiva: é a perspectiva do Estado requerido. Para Valerio Mazzuoli (2020, p. 806)
a extradição passiva é sempre requerida, não sendo possível a chamada extradição
espontânea ou ex officio.
• Em relação estágio do processo penal que fundamenta o pedido ela pode ser:
▪ Extradição instrutória, processual ou cognitiva: o pedido se dá no curso de um processo
penal;
▪ Extradição executiva ou executória: busca-se o cumprimento de pena pelo extraditando
(SILVA, 2020, p. 345).
• Em relação ao ato internacional que fundamenta o pedido de extradição:
▪ Extradição convencional: derivado de tratado ou convenção internacional;
▪ Extradição extraconvencional: baseada em promessa de reciprocidade.
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• Considerando o (des)cumprimento do procedimento de extradição (SILVA, 2020, p. 345):


▪ Extradição de fato: seria a entrega informal do foragido, pelas autoridades policiais,
desrespeitando as normas sobre o instituto.
▪ Extradição de direito: aquela realizada conforme a legislação vigente.

Roberto Luiz Silva (2020, p. 345) ainda aponta como espécies de extradição:
CPF: 073.496.444-77

• Extradição em trânsito: é a passagem da pessoa extraditanda por território de terceiro Estado,


rumo ao estado requerente.
• Extradição condicionada ou temporária: ocorre para o processamento do extraditando, com
souza -- CPF:

condição de retorno ao Estado de origem para eventual cumprimento de pena, em caso de


condenação.
Marceli souza

• Extradição espontânea: ocorre quando o Estado passivo se oferece para entregar o estrangeiro.
Ex.: o caso da Colômbia, em 2001, que, ao prender Fernandinho Beira-Mar, manifestou interesse
Marceli

de sua entrega ao Brasil, antes mesmo do pedido das autoridades brasileiras.


• Extradição consensual, simplificada ou voluntária: ocorre com a anuência do extraditando.
• Extradição indireta: ocorre como resultado de expedientes de deportação, expulsão, repatriação
indevidos, por vedação à extradição.

8.5.3. Princípios regentes

Roberto Luiz Silva (2020, p. 338) elenca uma série de princípios que norteiam o instituto da
extradição:

• Aut dedere aut judicare/punier: na tradução literal do termo, cabe ao Estado entregar (dar) ou
julgar e punir o (pretenso) extraditando. O princípio é um desdobramento da ideia de justiça
internacional em que o criminoso não deve ficar impune por seus atos. Assim sendo, caso a
extradição seja negada pelo Estado, havendo previsão no tratado internacional ou promessa de
reciprocidade, o Estado ativo compromete-se em julgar e punir o agente, de acordo com seu
direito interno. No Brasil, não obstante a vedação de extradição de brasileiros natos, o Código
Penal prevê a possibilidade de extraterritorialidade da lei penal nas hipóteses do art. 7º, II, “b”,

212
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

c/c art. 7º, § 2º. O descumprimento do princípio do Aut dedere aut judicare pode gerar ainda a
responsabilidade internacional do Estado, como no caso Habré, em que a CIJ condenou o Senegal
por não processar e julgar o ex-presidente do Chade, Hissène Habré, pela prática de crimes contra
a humanidade (SILVA, 2020, p. 339). O ministro Celso de Mello, em obter dictum, no julgamento
da questão de ordem no HC 83113, deixou clara a aplicação do princípio em âmbito nacional:

OBITER DICTUM DO RELATOR (MIN. CELSO DE MELLO), MOTIVADO PELA PERDA


SUPERVENIENTE DE OBJETO DA PRESENTE AÇÃO DE "HABEAS CORPUS": IMPOSSIBILIDADE
CONSTITUCIONAL ABSOLUTA DE EXTRADITAR-SE BRASILEIRO NATO E POSSIBILIDADE DE
APLICAÇÃO EXTRATERRITORIAL DA LEI PENAL BRASILEIRA A FATOS DELITUOSOS
SUPOSTAMENTE COMETIDOS, NO EXTERIOR, POR BRASILEIROS - CONSIDERAÇÕES DE
ORDEM DOUTRINÁRIA E DE CARÁTER JURISPRUDENCIAL.
O brasileiro nato, quaisquer que sejam as circunstâncias e a natureza do delito, não pode
ser extraditado, pelo Brasil, a pedido de Governo estrangeiro, pois a Constituição da
República, em cláusula que não comporta exceção, impede, em caráter absoluto, a
efetivação da entrega extradicional daquele que é titular, seja pelo critério do "jus soli", seja
pelo critério do "jus sanguinis", de nacionalidade brasileira primária ou originária. Esse
privilégio constitucional, que beneficia, sem exceção, o brasileiro nato (CF, art. 5º, LI), não
se descaracteriza pelo fato de o Estado estrangeiro, por lei própria, haver-lhe reconhecido
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a condição de titular de nacionalidade originária pertinente a esse mesmo Estado (CF, art.
12, § 4º, II, "a").
Se a extradição não puder ser concedida, por inadmissível, em face de a pessoa reclamada
ostentar a condição de brasileira nata, legitimar-se-á a possibilidade de o Estado brasileiro,
mediante aplicação extraterritorial de sua própria lei penal (CP, art. 7º, II, "b", e respectivo
§ 2º) - e considerando, ainda, o que dispõe o Tratado de Extradição Brasil/Portugal (Artigo
IV) -, fazer instaurar, perante órgão judiciário nacional competente (CPP, art. 88), a
concernente "persecutio criminis", em ordem a impedir, por razões de caráter ético-
jurídico, que práticas delituosas, supostamente cometidas, no exterior, por brasileiros
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(natos ou naturalizados), fiquem impunes. Doutrina. Jurisprudência. (HC 83113 QO,


Relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 26/06/2003, DJ 29-08-2003 PP-
00036 EMENT VOL-02121-17 PP-03409 RTJ VOL-0187-03 PP-01069)

• Princípio da identidade, dupla tipicidade ou dupla incriminação: a conduta objeto do pedido de


souza -- CPF:

extradição deve ser prevista como crime tanto no Estado requerente quanto no Estado requerido.
Marceli souza

Art. 82. Não se concederá a extradição quando: (...)


II - o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado
Marceli

requerente;

• Princípio dupla punibilidade: devem estar presentes as condições de punibilidade tanto no


Estado requerente quanto no Estado requerido.

Art. 82. Não se concederá a extradição quando: (...)


VI - a punibilidade estiver extinta pela prescrição, segundo a lei brasileira ou a do Estado
requerente;

• Princípio do non bis in idem: o extraditando não pode ter sido julgado pela mesma conduta no
Estado passivo ou terceiro Estado.
• Princípio da especialidade: de regra, o extraditando não poderá ser julgado por crime diverso
daquele que fundamentou o pedido de extradição (GUERRA, 2019, p. 439). Roberto Luiz Silva
(2020, p. 342) destaca que esse princípio não é absoluto, sendo excepcionado pela extensão da
extradição, também conhecida como extradição supletiva, e pela purga da extradição:
▪ Extradição supletiva ou extensão da extradição: ocorre quando, no curso do processo de
extradição, é aferido que o extraditando praticou outros crimes não descritos no pedido
originário. Nessa hipótese, o Estado ativo poderá requerer a permissão para o julgamento
dos demais crimes:

213
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

PEDIDO DE EXTENSÃO DE EXTRADIÇÃO - INTERROGATÓRIO.


1. O Governo da Itália formaliza pedido de extensão da Extradição 716-5, deferida
parcialmente em 18 de novembro de 1997 (folha 146 a 163) e executada no dia 16 de agosto
de 2000 (folha 540), com a entrega do extraditando Clemente Ferrara às autoridades
policiais daquele País.
2. A Corte, em entendimento reiterado - Questão de Ordem na Extradição nº 444, Questão
de Ordem na Extradição nº 462 e Extradição 840 - sobre o que versa o artigo 91, inciso I, da
Lei 6.815/80, estabeleceu que o Estado requerente de extradição já concedida pode
solicitar a extensão para a persecução penal pela prática de delito diverso do que motivou
o primeiro pedido desde que tenha sido praticado em momento anterior ao deferimento
do pleito.
3. Determino a expedição de carta rogatória à Justiça do Estado requerente, nos termos do
artigo 783 do Código de Processo Penal, para a realização do interrogatório do nacional
italiano Clemente Ferrara, dela constando o esclarecimento de que o extraditando,
querendo, poderá constituir advogado no Brasil para defendê-lo. (Ext 716 extensão. Decisão
monocrática. Relator: Min. MARCO AURÉLIO, julgado: 25/05/2005, publicado em
06/06/2005)

▪ Purga da extradição: ocorre quando a descoberta de eventual crime cometido pelo


extraditado acontece após a perfectibilização da extradição. Nessa hipótese, o agente
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deverá, após o cumprimento da pena, retirar-se do Estado em um prazo predeterminado,


sob pena de ser julgado pelos demais delitos (SILVA, 2020, p. 343). São exemplos do instituto
os artigos XIV dos Tratados de Extradição entre Brasil e Argentina (ratificado pelo Decreto n.º
62.979/1968) e Brasil e Bélgica (ratificado pelo Decreto n.º 41.909/1957):

Artigo XIV. O indivíduo extraditado em virtude deste Tratado não poderá ser processado,
nem julgado, por qualquer infração cometida anteriormente ao pedido de extradição, nem
poderá ser entregue a terceiro país que o reclame, salvo se nisso convier o Estado requerido
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se o próprio indivíduo, expressa e livremente, quiser ser processado e julgado por outra
infração, ou se, posto em liberdade, permanecer voluntariamente no território do Estado
requerente durante mais de trinta dias, contados da data em que tiver sido solto.
Parágrafo único. Nesta última hipótese, o extraditado deverá ser advertido das
consequências a que o exporá sua permanência, além do aludido prazo, no território do
souza -- CPF:

Estado onde for julgado.


Marceli souza

Artigo XIV. O indivíduo extraditado em virtude deste Tratado não poderá ser processado,
nem julgado, por qualquer outra infração cometida anteriormente ao pedido de extradição,
Marceli

nem poderá ser entregue a um terceiro país que o reclame, salvo em um dos casos
seguintes:
a) se, expressa e livremente, pediu ser julgado ou cumprir a pena;
b) se nisso concordou o Estado requerido;
c) se o extraordinário permaneceu voluntariamente no território do Estado requerente
durante mais de trinta dias, contados da data em que tiver sido posto definitivamente em
liberdade.
Na hipótese da alínea a, o pedido do extraordinário deverá ser comunicado do Governo que
o entregou.
O extraditado deverá ser advertido das consequências a que o exporia a sua permanecia no
território do Estado onde foi julgado, por mais de trinta dias depois de solto.

8.5.4. Fundamento do pedido de extradição

No Brasil, o pedido de extradição pode ter por base um tratado internacional ou promessa de
reciprocidade.
O tratado pode ser bilateral ou multilateral — como nos casos do Decreto n.º 4.975/2004, que
ratificou tratado de extradição entre os Estados-membros do MERCOSUL, e do Decreto n.º 5.867/2006, que
tem como partes os membros do MERCOSUL, Bolívia e Chile.

214
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

O STF, no julgamento do PPE 769, em 2016, decidiu que o tratado pode ter eficácia retroativa, isto
é, abarcar crimes praticados anteriormente à sua ratificação, desde que haja previsão expressa.
A promessa ou declaração de reciprocidade, por sua vez, refere-se ao comprometimento do Estado
requerente em conceder uma extradição superveniente na hipótese de crime análogo (ACCIOLY, SILVA e
CASELLA, 2016, p. 511). Valerio Mazzuoli (2020, ebook, p. 807) explica que o pedido de reciprocidade pode
ser preexistente ou superveniente. Na declaração de reciprocidade preexistente, o pedido do Estado ativo é
fundado em um compromisso de reciprocidade assumido anteriormente pelo Estado passivo em uma
extradição pretérita. Já na declaração superveniente, a declaração inicia a relação jurídica entre os Estados.
Para o autor, a distinção é importante pelo fato de que a declaração preexistente equivaleria a um tratado
internacional.
Em que se pese a posição do autor, o ato, em verdade, configura-se um ato unilateral, que também
gera efeitos jurídicos. Afinal, houve a manifestação do Estado comprometendo-se à extradição futura. Já a
declaração superveniente serviria apenas como base jurídica para o processo de extradição.
Francisco Rezek (2018, p. 204) defende que, na hipótese de promessa de reciprocidade, o governo
brasileiro tem a faculdade da recusa sumária, ao contrário de pedidos fundamentados em tratados
internacionais, sob pena de responsabilidade internacional.
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No mesmo sentido, Roberto Luiz Silva (2020, p. 337) aponta que a promessa de reciprocidade tem
efeitos stricto senso, isto é, ao contrário da posição de Mazzuoli, para o autor a promessa de reciprocidade é
feita caso a caso, podendo ser aceita ou rejeitada, sem a possibilidade de responsabilização internacional do
Estado passivo em caso de negativa.
Ademais, o autor destaca que a competência para a análise do pedido de reciprocidade é exclusiva
do Poder Executivo (SILVA, 2020, p. 337), excluindo-se, portanto, a deliberação legislativa.
CPF: 073.496.444-77

8.5.5. Competência para o julgamento do pedido de extradição

Compete ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, I, g, da Constituição, o julgamento do
pedido de extradição.
souza -- CPF:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,


Marceli souza

cabendo-lhe:
I - processar e julgar, originariamente: (...)
Marceli

g) a extradição solicitada por Estado estrangeiro;

Ao contrário do art. 83 da Lei n.º 6.815/1980, que previa expressamente a competência do plenário
da Corte, a Lei de Migração deixou de se manifestar sobre a organização interna do órgão, vedando, contudo,
a chamada extradição de fato:

Art. 90. Nenhuma extradição será concedida sem prévio pronunciamento do Supremo
Tribunal Federal sobre sua legalidade e procedência, não cabendo recurso da decisão.

Após a Emenda Regimental n.º 45/2011, compete a uma das turmas do STF o julgamento do feito
(RISTF, art. 9º, I, h).

8.5.6. Condições básicas do pedido de extradição

Valerio Mazzuoli (2020, ebook, p. 668) denomina como condições básicas ou gerais para a concessão
do pedido de extradição: a existência de processo penal no Estado requerente (em andamento ou com
sentença transitada em julgado); a dupla tipicidade (dupla incriminação ou princípio da identidade) em que
a conduta praticada deve ser prevista como crime tanto no Estado requerente quanto no Brasil; a presença
de condição de punibilidade do delito em ambos os Estados (princípio da dupla punibilidade).

215
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ext. 1096 decidiu que a aferição das condições básicas
para a concessão da extradição independe da vontade do extraditando:

EXTRADIÇÃO - EXAME - CONCORDÂNCIA DO EXTRADITANDO. A simples concordância do


extraditando não é hábil a afastar o crivo do Supremo quanto ao atendimento dos requisitos
próprios a deferir-se a extradição. EXTRADIÇÃO - CARÁTER EXECUTÓRIO - REQUISITOS
LEGAIS. Uma vez atendidos os requisitos legais, impõe-se o deferimento da extradição. (Ext
1096, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 11/09/2008, DJe-187
DIVULG 02-10-2008 PUBLIC 03-10-2008 EMENT VOL-02335-01 PP-00001 LEXSTF v. 31, n.
361, 2009, p. 308-311)

Não basta apenas o trâmite de processo penal no Estado requerente, mas também sua competência
para o julgamento do feito. De regra, a conduta deve ter sido praticada no Estado requerente (critério da
territorialidade), admitindo-se, no entanto, a aplicação dos critérios de extraterritorialidade do Estado ativo:

Art. 83. São condições para concessão da extradição:


I - ter sido o crime cometido no território do Estado requerente ou serem aplicáveis ao
extraditando as leis penais desse Estado; e

Nos casos de extraterritorialidade, Roberto Luiz Silva (2020, p. 347) defende a necessidade de
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previsão anterior no Tratado de Extradição.


Sobre o tema, o STF já se posicionou sobre a procedência da extradição, nas hipóteses de condutas
múltiplas, em que apenas uma parte delas é cometida no território do Estado requerente:

1. EXTRADIÇÃO. Passiva. Competência internacional concorrente. Tráfico internacional de


substâncias entorpecentes. Tipo penal de incriminação múltipla. Delitos cometidos em
diferentes países. Consideração como delitos autônomos e distintos. Aplicação do art. 36,
II, "a", I, da Convenção Única de Nova Yorque, promulgada pelo Dec. nº. 54.216/64.
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Competência reconhecida ao Estado requerente. Preliminar rejeitada. Precedentes. Tem


competência para processar e julgar extraditando, por crime de tráfico internacional de
substâncias entorpecentes, o Estado em cujo território se realizou uma das modalidades
incriminadas no tipo misto alternativo daquele delito, cada uma das quais se considera
como crime autônomo. (Ext 1033, Relator(a): CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em
souza -- CPF:

02/04/2007, DJe-032 DIVULG 06-06-2007 PUBLIC 08-06-2007 DJ 08-06-2007 PP-00029


EMENT VOL-02279-01 PP-00007 LEXSTF v. 29, n. 345, 2007, p. 343-354)
Marceli souza

Ressalta-se a Lei de Migração (art. 82, VIII) manteve a vedação da extradição em hipótese de
Marceli

julgamento por tribunal de exceção, prevista nos art. 77 c/c art. 78, II, do Estatuto do Estrangeiro, sendo o
termo compreendido pelo STF, em sua forma mais ampla:

(...) A noção de tribunal de exceção admite, para esse efeito, configuração conceitual mais
ampla. além de abranger órgãos estatais criados ex post facto, especialmente instituídos
para o julgamento de determinadas pessoas ou de certas infrações penais, com evidente
ofensa ao princípio da naturalidade do juízo, também compreende os tribunais regulares,
desde que caracterizada, em tal hipótese, a supressão, em desfavor do réu, de qualquer das
garantias inerentes ao devido processo legal. a possibilidade de privação, em juízo penal,
do due process of law, nos múltiplos contornos em que se desenvolve esse princípio
assegurador dos direitos e da própria liberdade do acusado - garantia de ampla defesa,
garantia do contraditório, igualdade entre as partes perante o juiz natural e garantia de
imparcialidade do magistrado processante - impede o valido deferimento do pedido
extradicional (...) (Supremo Tribunal Federal. Ext 524, Relator(a): Min. Celso de Mello,
Tribunal Pleno, julgado em 31/10/1990, DJ 08-03-1991 PP-02200 EMENT VOL-01610-01 PP-
00058 RTJ VOL-00134-01 PP-00056)

A Constituição veda a extradição de nacionais (CF/88, art. 5º, LII). Francisco Rezek (2018, p. 208)
destaca que, ao contrário da Grã-Bretanha, Estados Unidos e Colômbia, que admitem a extradição de seus
nacionais, o Brasil, de regra, só extradita estrangeiros.

216
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Há, no entanto, de se distinguir a situação dos brasileiros natos e naturalizados, pois, enquanto a
vedação da extradição de brasileiros natos é absoluta, a dos naturalizados comporta exceções
constitucionais: a prática de crimes comuns antes da naturalização ou o envolvimento em tráfico ilícito de
entorpecentes.
Sendo absoluta a vedação da extradição de brasileiros natos, eventual reconhecimento desse status,
ainda que no curso do processo de extradição, gera o indeferimento do pedido, tendo em vista a natureza
declaratória da decisão e seus efeitos ex tunc:

EXTRADIÇÃO. Havendo o extraditando comprovado a reaquisição da nacionalidade


brasileira, indefere-se o pedido de extradição. constituição federal, art. 153, parágrafo 19,
parte final. não cabe invocar, na espécie, o art. 77, I, da Lei n. 6.815/1980. Essa regra dirige-
se, imediatamente, a forma de aquisição da nacionalidade brasileira, por via de
naturalização. na espécie, o extraditando e brasileiro nato (Constituição Federal, art. 145, I,
letra 'a'). A reaquisição da nacionalidade, por brasileiro nato, implica manter esse status e
não o de naturalizado. indeferido o pedido de extradição, desde logo, diante da prova da
nacionalidade brasileira, determina-se seja o extraditando posto em liberdade, se al não
houver de permanecer preso. (Supremo Tribunal Federal Ext 441, Relator(a): Min. NÉRI DA
SILVEIRA, Tribunal Pleno, julgado em 18/06/1986, DJ 10-06-1988 PP-14400 EMENT VOL-
01505-01 PP-00018)
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Por outro lado, é necessário rememorar que o termo inicial da aquisição da nacionalidade brasileira
secundária não ocorre da decisão do Ministro da Justiça, mas se configura apenas após a entrega do
certificado de naturalização pelo juiz federal (da 1ª Vara). A maturação tem natureza constitutiva e, portanto,
gera efeitos ex nunc:

MOMENTO AQUISITIVO E APLICAÇÃO DO ART. 5º, LI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. - A


concessão da naturalização constitui, em nosso sistema jurídico, ato que se insere na esfera
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de competência do Ministro da Justiça, qualificando-se como faculdade exclusiva do Poder


Executivo (Lei nº 6.815/80, art. 111). - A aquisição da condição de brasileiro naturalizado,
não obstante já deferida a concessão da naturalização pelo Ministro da Justiça, somente
ocorrerá após a entrega, por magistrado federal, do concernente certificado de
naturalização". (Supremo Tribunal Federal. Ext 1074, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO,
souza -- CPF:

Tribunal Pleno, julgado em 27/03/2008, DJe-107 DIVULG 12-06-2008 PUBLIC 13-06-2008


EMENT VOL-02323-01 PP-00028 RTJ VOL-00204-03 PP-00954
Marceli souza

Analisando a jurisprudência do STF, é necessário destacar a situação da Ext 1010 QO, em que houve
Marceli

a negativa de extradição, pela prática de crime de tráfico ilícito de entorpecentes, de brasileiro naturalizado,
pela falta de reciprocidade. No caso, a Alemanha buscou a extradição de brasileiro naturalizado
fundamentando seu pedido em declaração de reciprocidade. Ocorre que, pela legislação alemã, não se
admite a extradição de nacionais (natos ou naturalizados), o que impediu a extradição.
A Constituição veda, ainda, a concessão de extradição pela prática de crimes políticos ou de opinião
(CF/88, art. 5º, LII), tema também disposto no art. 82, VII, da Lei de Migração.
Não há, no ordenamento pátrio, um conceito legal de crime político, ao contrário de alguns países,
contudo, o art. 82, § 1º, permite a extradição quando o fato imputado constituir infração da lei penal comum,
ainda que conexo a um delito político, cabendo ao Supremo Tribunal Federal apreciar a natureza do delito:

Art. 82
§ 1º A previsão constante do inciso VII do caput não impedirá a extradição quando o fato
constituir, principalmente, infração à lei penal comum ou quando o crime comum, conexo
ao delito político, constituir o fato principal.
§ 2º Caberá à autoridade judiciária competente a apreciação do caráter da infração.
(...)
§ 4º O Supremo Tribunal Federal poderá deixar de considerar crime político o atentado
contra chefe de Estado ou quaisquer autoridades, bem como crime contra a humanidade,
crime de guerra, crime de genocídio e terrorismo.

217
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

No julgamento da extradição de Cesare Battisti (Ext 1.085), o ministro relator Cezar Peluso (2009, p.
122) destacou a existência de três teorias para a conceituação dos crimes políticos:

• Objetiva: analisa a natureza do bem jurídico tutelado, como a organização político-jurídica do


Estado;
• Subjetiva: atenta-se à finalidade perseguida pelo agente, ou seja, à natureza dos bens lesados; e
• Mista: reúne as duas teorias pretéritas, analisando tanto o bem jurídico atingido como se a
motivação do agente teve índole política.

Com base nessa premissa, o ministro passou a dividir os crimes políticos em puramente políticos e
complexos (relativos ou mistos), em que preponderaria o caráter político do delito em relação ao crime
comum. O chamado crime político puro é compreendido, na jurisprudência do STF, como todas as infrações
lesivas à segurança interna e externa do Estado. Com base nesse entendimento, o Brasil negou a extradição
de estrangeiro acusado de transmitir segredos para a fabricação de armas nucleares ao Iraque:

Extraditando acusado de transmitir ao Iraque segredo de estado do Governo requerente


(República Federal da Alemanha), utilizável em projeto de desenvolvimento de armamento
nuclear. Crime político puro, cujo conceito compreende não só o cometido contra a
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segurança interna, como o praticado contra a segurança externa do Estado, a


caracterizarem, ambas as hipóteses, a excludente de concessão de extradição, prevista no
art. 77, VII e §§ 1º a 3º, da Lei nº 6.815-80 e no art. 5º, LII da Constituição. Pedido indeferido,
por unanimidade. (Supremo Tribunal Federal. Ext 700, Relator(a): Min. Octavio Gallotti,
Tribunal Pleno, julgado em 04/03/1998, DJ 05-11-1999 PP-00003 EMENT VOL-01970-01 PP-
00085 RTJ VOL-00171-01 PP-00053)

Já a diferenciação entre o crime complexo e o crime comum, pela jurisprudência do STF, é feita com
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base na teoria da preponderância, não obstante o ministro Paulo Brossard, no julgamento da Ext. 615, ter
destacado que a maior dificuldade na adoção dessa teoria é a ausência de um critério racional para a
distinção do dispositivo. Em voto-vista, no julgamento da Ext. 399, o Min. Moreira Alves (1983, p. 37),
baseado no sistema legal suíço, elencou três princípios gerais necessários para a caracterização da
souza -- CPF:

preponderância da natureza política de um crime complexo:


Marceli souza

• o ato deve ser cometido com a finalidade de realização de um atentado contra a organização
Marceli

política ou social do Estado;


• a conduta deve ter relação clara e direta com o fim proposto pelo dito partido, de modificação da
organização política ou social do Estado; e
• mesmo na hipótese em que o objetivo final visado seja político (stricto sensu), o elemento de
direito comum poderá superá-lo em função do meio empregado para atingir o fim.

Importante ressalvar que esse foi o critério utilizado pelo ministro Cezar Peluso no julgamento do
famoso caso Cesare Battisti (Ext. 1.085):

Toda infração a que se atribui natureza política possui das características: uma, decorrente
da criminalidade comum, definida pelo direito penal e a outra, representada por seu motivo
ou fim. Eventual atrocidade do fato não produz nenhum efeito sobre a natureza de uma
infração política, mas forçosamente, anula ou diminui o seu feitio político, ressaltando-lhe
o caráter de ilícito grave de direito comum. (Ext 1085, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO,
Tribunal Pleno, julgado em 16/12/2009, DJe-067 DIVULG 15-04-2010 PUBLIC 16-04-2010
EMENT VOL-02397-01 PP-00001 RTJ VOL-00215-01 PP-00177, p. 125)

Ainda com base no critério da predominância ou preponderância, o STF já negou a extradição de


estrangeiros à Argentina, quando seus atos foram praticados no contexto de uma rebelião armada, mas os
meios utilizados não foram atrozes:

218
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

3. (A) - Fatos enquadráveis na lei penal comum e atribuídos aos rebeldes - roubo de veículo
utilizado na invasão do quartel, e privações de liberdade, lesões corporais, homicídios e
danos materiais, perpetrados em combate aberto, no contexto da rebelião -, são
absorvidos, no direito brasileiro, pelo atentado violento ao regime, tipo qualificado pela
ocorrência de lesões graves e de mortes (lei de segurança nacional, art. 17): falta, pois, em
relação a eles, o requisito da dúplice incriminação. 3. (B) - A imputação de dolo eventual
quanto as mortes e lesões graves não afasta necessariamente a unidade do crime por elas
qualificados. 4. Ditos fatos, por outro lado, ainda quando considerados crimes diversos,
estariam contaminados pela natureza política do fato principal conexo, a rebelião armada,
a qual se vincularam indissoluvelmente, de modo a constituírem delitos políticos relativos.
5. Não constitui terrorismo o ataque frontal a um estabelecimento militar, sem utilização
de armas de perigo comum nem criação de riscos generalizados para a população civil:
dispensável, assim, o exame da constitucionalidade do art. 77, par-3, do estatuto dos
estrangeiros. (Supremo Tribunal Federal. Ext 493, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE,
Tribunal Pleno, julgado em 04/10/1989, DJ 03-08-1990 PP-07235 EMENT VOL-01588-01 PP-
00142 RTJ VOL-00132-02 PP-00652)

Em relação à dupla tipicidade, é necessário ressalvar que, independentemente do nomen juris da


legislação dos Estados, a conduta deve ser considerada um crime, e não contravenção penal. O STF, no
julgamento da Ext 1130, enfatizou a duplicidade da conduta, pouco importando a simetria entre as penas em
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cada um dos ordenamentos:

2. Desproporção entre as penas cominadas no Brasil e no Paraguai, a resultar ausência de


dupla tipicidade ou a impor a aplicação da pena menor. Improcedência: relativamente aos
crimes, a Lei n. 6.815/80 exige tão-somente seja observada a dupla tipicidade. Nada dispõe
a respeito da simetria entre as penas e não determina a aplicação da pena menor. (Ext 1130,
Relator(a): EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/2008, DJe-071 DIVULG 16-04-
2009 PUBLIC 17-04-2009 EMENT VOL-02356-01 PP-00086 RTJ VOL-00210-02 PP-00551)
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Há de se destacar que a Lei de Migração (art. 82, IV) ampliou a pena mínima do delito de um ano
(prevista na Lei n.º 6.815/80, art. 77, IV) para dois anos, para permissão da extradição.
O art. 82, III, da Lei de Migração, também mantendo disposição do Estatuto do Estrangeiro (art. 77,
III), veda a extradição na hipótese em que o Brasil é competente para julgar o crime imputado ao
souza -- CPF:

extraditando:
Marceli souza

Art. 82. Não se concederá a extradição quando: (...)


III - o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao
Marceli

extraditando;

O STF, ao interpretar a antiga lei, distinguia a competência para o julgado do delito da efetiva
instauração de processo penal. Não basta, portanto, a competência in abstrato, sendo necessária a
instauração de processo penal para apuração da mesma conduta imputada ao agente.

CONCURSO DE JURISDIÇÃO E INEXISTÊNCIA, NO BRASIL, DE PROCEDIMENTO PENAL-


PERSECUTÓRIO CONTRA O EXTRADITANDO: POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO PLEITO
EXTRADICIONAL. - Mesmo em ocorrendo concurso de jurisdições penais entre o Brasil e o
Estado requerente, torna-se lícito deferir a extradição naquelas hipóteses em que o fato
delituoso, ainda que pertencendo, cumulativamente, ao domínio das leis brasileiras, não
haja originado procedimento penal-persecutório, contra o extraditando, perante órgãos
competentes do Estado brasileiro. (Ext 1151, Relator(a): CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno,
julgado em 17/03/2011, DJe-094 DIVULG 18-05-2011 PUBLIC 19-05-2011 EMENT VOL-
02525-01 PP-00001 RTJ VOL-00222-01 PP-00031)

Importante destacar que o fato de o extraditando ser casado ou ter um filho brasileiro não impede a
sua extradição (ainda que o art. 55 da Lei de Migração vede a expulsão), nos termos da súmula n.º 421:

Súmula n.º 421 do STF: Não impede a extradição a circunstância de ser o extraditando
casado com brasileira ou ter filho brasileiro.

219
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

A dupla punibilidade também deve ser respeitada, nos termos do art. 82, VI, da Lei de Migração.
Apesar do dispositivo legal versar apenas sobre a prescrição, o Supremo interpreta de forma extensiva o
dispositivo, vedando a extradição em qualquer hipótese de extinção da punibilidade, seja no direito interno
ou do Estado requerente.
Sobre o tema, importante destacar que o STF, contrariando a jurisprudência da Corte Interamericana
de Direitos Humanos, no julgamento da Ext 1362, considerou prescritos os delitos de homicídio qualificado,
sequestro e associação criminosa praticados por pretenso integrante do grupo terrorista "Triple A", nos anos
de 1973 e 1975, ainda que aos delitos tenha sido imputada a qualificação de crimes de lesa humanidade. Os
principais argumentos do ministro relator para o acórdão, Teori Zavascki, seguido pela maioria da corte
foram:

• o Brasil não ratificou a Convenção sobre a Imprescritibilidade de Crimes de Guerra e dos Crimes
contra a Humanidade, e, por isso, deve ser reconhecida a prescrição.
• as normas de Direito Internacional Público, entre elas o Estatuto de Roma, são de status
supralegal e, por isso, aplica-se ao caso o art. 5º, XV, da Constituição, que veda a irretroatividade
da lei penal, exceto para o benefício do réu.
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Outro ponto relevante diz respeito à possibilidade de extradição quando o Estado requerente adota
penas proscritas em nosso ordenamento (CF/88, art. 5º, XLVII). Em relação à prisão perpétua, o STF
entendeu, inicialmente, no julgamento do HC 44074, ser possível a entrega do extraditando, mediante
promessa de comutação da pena perpétua ao período máximo admitido pelo ordenamento pátrio, para o
cumprimento de pena privativa de liberdade (30 anos).Posteriormente, no julgamento da Ext 426, a corte
alterou seu entendimento, possibilitando a extradição a Estados que adotem a prisão perpétua,
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independentemente de compromisso de limitação da pena privativa de liberdade, por ausência de previsão


legal ou convencional para tanto. Por fim, o tribunal retornou ao posicionamento inicial em 2004, no
julgamento da Ext 855, exigindo a comutação da pena:

A extradição somente será deferida pelo Supremo Tribunal Federal, tratando-se de fatos
souza -- CPF:

delituosos puníveis com prisão perpétua, se o Estado requerente assumir, formalmente,


quanto a ela, perante o Governo brasileiro, o compromisso de comutá-la em pena não
Marceli souza

superior à duração máxima admitida na lei penal do Brasil (CP, art. 75), eis que os pedidos
extradicionais - considerado o que dispõe o art. 5º, XLVII, "b" da Constituição da República,
Marceli

que veda as sanções penais de caráter perpétuo - estão necessariamente sujeitos à


autoridade hierárquico-normativa da Lei Fundamental brasileira. Doutrina. Novo
entendimento derivado da revisão, pelo Supremo Tribunal Federal, de sua jurisprudência
em tema de extradição passiva. (Ext 855, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno,
julgado em 26/08/2004, DJ 01-07-2005 PP-00005 EMENT VOL-02198-1 PP-00029 RB v. 17,
n. 501, 2005, p. 21-22)

Em relação às demais penas prescritas na Constituição, em especial a de morte, a Lei de Migração,


condiciona a entrega do extraditando ao compromisso do Estado requerente de comutar a pena de morte
ou corporal em restritiva de liberdade:

Art. 96. Não será efetivada a entrega do extraditando sem que o Estado requerente assuma
o compromisso de: (...)
III - comutar a pena corporal, perpétua ou de morte em pena privativa de liberdade,
respeitado o limite máximo de cumprimento de 30 (trinta) anos;

Sobre o tema, Valerio Mazzuoli (2020, ebook, p. 679) aponta que o compromisso não se trata
propriamente de um requisito para o deferimento da extradição, mas uma condição da entrega do
extraditando.

220
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

8.5.7. Pedidos simultâneos

Na hipótese de coexistência de pedidos de extradição por Estados distintos, o art. 85, § 1º, da Lei de
Migração traz a ordem de preferência:

Art. 85. Quando mais de um Estado requerer a extradição da mesma pessoa, pelo mesmo
fato, terá preferência o pedido daquele em cujo território a infração foi cometida.
§ 1º Em caso de crimes diversos, terá preferência, sucessivamente:
I - o Estado requerente em cujo território tenha sido cometido o crime mais grave, segundo
a lei brasileira;
II - o Estado que em primeiro lugar tenha pedido a entrega do extraditando, se a gravidade
dos crimes for idêntica;
III - o Estado de origem, ou, em sua falta, o domiciliar do extraditando, se os pedidos forem
simultâneos.
§2º Nos casos não previstos nesta Lei, o órgão competente do Poder Executivo decidirá
sobre a preferência do pedido, priorizando o Estado requerente que mantiver tratado de
extradição com o Brasil.
§3º Havendo tratado com algum dos Estados requerentes, prevalecerão suas normas no
que diz respeito à preferência de que trata este artigo.
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Inicialmente, aplicar-se-ão as normas de preferência previstas em tratado ou convenção firmados


entre o Brasil e um dos Estados requerentes (Lei n.º 13.445/2017, art. 85, § 2º, parte final, e § 3º). Não
havendo tratado, serão aplicáveis as normas dos § 1º:

I - o Estado requerente em que fora cometido o crime mais grave, segundo a legislação
brasileira;
II - caso os delitos sejam de mesma gravidade, a extradição será feita ao Estado que primeiro
requereu;
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III - em caso de simultaneidade de pedidos de crimes de mesma gravidade, o extraditando


é entregue ao seu Estado de origem ou o de seu domicílio.

Por fim, não havendo a incidência de nenhuma das normas citadas, caberá ao Governo brasileiro,
entendido como Poder Executivo, definir a qual Estado o extraditando será entregue.
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8.5.8. Procedimento
Marceli souza
Marceli

O procedimento da extradição passiva, pelo ordenamento brasileiro, tem três fases distintas:

1ª. De natureza administrativa, vai do recebimento do pedido de extradição pelo Poder Executivo,
e seu envio ao STF.
2ª. De natureza judiciária, refere-se à aferição pelo Supremo Tribunal Federal das condições de
procedência do pedido.
3ª. Refere-se à entrega do extraditando ao Estado requerente ou a comunicação da negativa do
pedido.

O pedido de extradição é feito pelo Estado requerente ao Ministério das Relações Exteriores ou
diretamente ao Ministério da Justiça, caso haja previsão convencional, instruído com as indicações do fato
criminoso sobre a identidade do extraditando e com cópia das normas do Estado requerente sobre o crime,
sua competência para julgar o processo penal, sobre a pena e a prescrição do delito:

Art. 88. Todo pedido que possa originar processo de extradição em face de Estado
estrangeiro deverá ser encaminhado ao órgão competente do Poder Executivo diretamente
pelo órgão do Poder Judiciário responsável pela decisão ou pelo processo penal que a
fundamenta. (...)

221
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

§ 3º O pedido deverá ser instruído com cópia autêntica ou com o original da sentença
condenatória ou da decisão penal proferida, conterá indicações precisas sobre o local, a
data, a natureza e as circunstâncias do fato criminoso e a identidade do extraditando e será
acompanhado de cópia dos textos legais sobre o crime, a competência, a pena e a
prescrição.

Art. 89. O pedido de extradição originado de Estado estrangeiro será recebido pelo órgão
competente do Poder Executivo e, após exame da presença dos pressupostos formais de
admissibilidade exigidos nesta Lei ou em tratado, encaminhado à autoridade judiciária
competente.
Parágrafo único. Não preenchidos os pressupostos referidos no caput, o pedido será
arquivado mediante decisão fundamentada, sem prejuízo da possibilidade de renovação do
pedido, devidamente instruído, uma vez superado o óbice apontado.

Os documentos serão acompanhados de versão oficial em português, nos termos do art. 88, § 2º:

Art. 88 (...)
§ 2º Compete aos órgãos do sistema de Justiça vinculados ao processo penal gerador de
pedido de extradição a apresentação de todos os documentos, manifestações e demais
elementos necessários para o processamento do pedido, inclusive suas traduções oficiais.
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Sobre o tema, para o STF, a tradução deve ser certificada pelas autoridades do Estado requerente,
não sendo necessária uma versão confeccionada por um tradutor juramentado:

No que concerne à alegação de não ter sido apresentada tradução juramentada em língua
portuguesa dos documentos que instruem o pedido, o Colegiado entendeu que a expressão
“tradução oficial”, utilizada pelo art. 80 do Estatuto do Estrangeiro, refere-se à tradução
cuja autenticidade é certificada pelas autoridades do Estado requerente e cujo
encaminhamento se dá por órgãos oficiais, o que confere a mencionada autenticidade, nos
termos do art. IX do Tratado e da jurisprudência desta Corte (Ext 1100/República do Chile,
CPF: 073.496.444-77

DJE de 3.10.2008; Ext 1171/República da Argentina, DJE de 25.6.2010). Observou que, no


caso, a tradução foi certificada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da
América, e os documentos encaminhados a esta Corte pelo Ministério da Justiça e pela via
diplomática, não havendo falar-se em defeito de tradução. (Supremo Tribunal Federal. Ext.
souza -- CPF:

3621. Relator: Min. Roberto Barroso. Julgamento em 28.3.2017. Informativo nº 859)

O Ministro da Justiça fará o primeiro exame de admissibilidade do pedido, restrito aos seus
Marceli souza

pressupostos formais previstos em eventual tratado e na Lei de Migração. Considerando presentes os


Marceli

requisitos, haverá a remessa ao STF por meio de Aviso Ministerial.


A fase judicial deve respeitar o sistema belga ou sistema de contenciosidade limitada ou de
delibação, cabendo ao STF apenas a análise dos requisitos formais do pedido e da ausência de impedimento
convencional, constitucional ou legal para a extradição. Portanto, não cabe ao Supremo reapreciar o
processo originário ou os fundamentos adotados pela autoridade estrangeira:

3. No exame de delibação próprio do julgamento de Extradição, somente é analisada a


legalidade externa do pedido. Não se ingressa, portanto, nos pressupostos e na motivação
da decisão proferida pela Justiça do Estado requerente. (Ext 1352, Relator(a): ROBERTO
BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/06/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-126
DIVULG 29-06-2015 PUBLIC 30-06-2015)

A Lei de Migração inovou ao possibilitar ao Estado ativo, mesmo não sendo parte no processo (SILVA,
2020, p. 356), solicitar a prisão cautelar do extraditado, em casos de urgência, e desde cumpridos os
requisitos do art. 84 da Lei:

Art. 84. Em caso de urgência, o Estado interessado na extradição poderá, previamente ou


conjuntamente com a formalização do pedido extradicional, requerer, por via diplomática
ou por meio de autoridade central do Poder Executivo, prisão cautelar com o objetivo de
assegurar a executoriedade da medida de extradição que, após exame da presença dos

222
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

pressupostos formais de admissibilidade exigidos nesta Lei ou em tratado, deverá


representar à autoridade judicial competente, ouvido previamente o Ministério Público
Federal.
§ 1º O pedido de prisão cautelar deverá conter informação sobre o crime cometido e deverá
ser fundamentado, podendo ser apresentado por correio, fax, mensagem eletrônica ou
qualquer outro meio que assegure a comunicação por escrito.
§ 2º O pedido de prisão cautelar poderá ser transmitido à autoridade competente para
extradição no Brasil por meio de canal estabelecido com o ponto focal da Organização
Internacional de Polícia Criminal (Interpol) no País, devidamente instruído com a
documentação comprobatória da existência de ordem de prisão proferida por Estado
estrangeiro, e, em caso de ausência de tratado, com a promessa de reciprocidade recebida
por via diplomática.
§ 3º Efetivada a prisão do extraditando, o pedido de extradição será encaminhado à
autoridade judiciária competente.
§ 4º Na ausência de disposição específica em tratado, o Estado estrangeiro deverá
formalizar o pedido de extradição no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data em que
tiver sido cientificado da prisão do extraditando.
§ 5º Caso o pedido de extradição não seja apresentado no prazo previsto no § 4º, o
extraditando deverá ser posto em liberdade, não se admitindo novo pedido de prisão
cautelar pelo mesmo fato sem que a extradição tenha sido devidamente requerida.
marceliangel@hotmail·com

§ 6º A prisão cautelar poderá ser prorrogada até o julgamento final da autoridade judiciária
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

competente quanto à legalidade do pedido de extradição.

Verifica-se, do disposto no § 4º, que o pedido de prisão pode ser feito antes do próprio pedido de
extradição. Nessa hipótese, caso o pedido não seja apresentado em 60 dias, o acusado deverá ser posto em
liberdade.
Se, à época do Estatuto do Estrangeiro, havia discussão sobre a prisão do extraditando ser uma
condição de procedibilidade da medida, inclusive com vedação expressa da substituição da prisão por medida
CPF: 073.496.444-77

cautelar diversa da prisão, o artigo 86 da Lei de Migração, em consonância com os princípios constitucionais,
prevê exatamente o contrário. Em outros termos, a regra será a liberdade ou as medidas diversas da prisão,
permanecendo a prisão apenas nas hipóteses de urgência do art. 86:
souza -- CPF:

Art. 86. O Supremo Tribunal Federal, ouvido o Ministério Público, poderá autorizar prisão
albergue ou domiciliar ou determinar que o extraditando responda ao processo de
Marceli souza

extradição em liberdade, com retenção do documento de viagem ou outras medidas


cautelares necessárias, até o julgamento da extradição ou a entrega do extraditando, se
Marceli

pertinente, considerando a situação administrativa migratória, os antecedentes do


extraditando e as circunstâncias do caso.

Finda a fase judicial e deferido o pedido, passa-se à fase da entrega do extraditando. No julgamento
da Ext 1085 (Caso Cesare Battisti), os ministros do STF debateram sobre a natureza do ato da entrega e a
vinculação do Presidente da República ao acórdão do tribunal, sendo decidido, por maioria, que a decisão da
corte autoriza a entrega do extraditando, mas cabe ao Presidente da República a aplicação da decisão nos
termos do tratado de extradição:

8. EXTRADIÇÃO. Passiva. Executória. Deferimento do pedido. Execução. Entrega do


extraditando ao Estado requerente. Submissão absoluta ou discricionariedade do
Presidente da República quanto à eficácia do acórdão do Supremo Tribunal Federal. Não
reconhecimento. Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado
requerente. Resultado proclamado à vista de quatro votos que declaravam obrigatória a
entrega do extraditando e de um voto que se limitava a exigir observância do Tratado.
Quatro votos vencidos que davam pelo caráter discricionário do ato do Presidente da
República. Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, deve o Presidente da
República observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, quanto à
entrega do extraditando. (Ext 1085, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado
em 16/12/2009, DJe-067 DIVULG 15-04-2010 PUBLIC 16-04-2010 EMENT VOL-02397-01 PP-
00001 RTJ VOL-00215-01 PP-00177)

223
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Nos termos da lei, o prazo de entrega será de 60 dias da comunicação, sob pena de o extraditando
ser posto em liberdade:

Art. 92. Julgada procedente a extradição e autorizada a entrega pelo órgão competente do
Poder Executivo, será o ato comunicado por via diplomática ao Estado requerente, que, no
prazo de 60 (sessenta) dias da comunicação, deverá retirar o extraditando do território
nacional.

Art. 93. Se o Estado requerente não retirar o extraditando do território nacional no prazo
previsto no art. 92, será ele posto em liberdade, sem prejuízo de outras medidas aplicáveis.

Negada a extradição, não será admitido novo pedido relacionado aos mesmos fatos:

Art. 94. Negada a extradição em fase judicial, não se admitirá novo pedido baseado no
mesmo fato.

Por fim, caso o extraditando esteja sendo processado criminalmente ou cumprindo pena no Brasil, o
artigo 95 da Lei de Migração prevê a autorização pelo Poder Judiciário — não pelo Presidente da República,
como no Estatuto do Estrangeiro — para a liberação antecipada:

Art. 95. Quando o extraditando estiver sendo processado ou tiver sido condenado, no Brasil,
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

por crime punível com pena privativa de liberdade, a extradição será executada somente
depois da conclusão do processo ou do cumprimento da pena, ressalvadas as hipóteses de
liberação antecipada pelo Poder Judiciário e de determinação da transferência da pessoa
condenada.
§ 1º A entrega do extraditando será igualmente adiada se a efetivação da medida puser em
risco sua vida em virtude de enfermidade grave comprovada por laudo médico oficial.
§ 2º Quando o extraditando estiver sendo processado ou tiver sido condenado, no Brasil,
por infração de menor potencial ofensivo, a entrega poderá ser imediatamente efetivada.
CPF: 073.496.444-77

8.5.9. Abdução internacional

Roberto Luiz Silva (2020, p. 361) conceitua a abdução internacional como a captura irregular de um
souza -- CPF:

estrangeiro sob a jurisdição de outro Estado, com o objetivo de julgamento pelo Estado autor.
Trata-se da utilização das vias de fato, desrespeitando as normas do Direito Internacional, em
Marceli souza

especial, a soberania do Estado em que o estrangeiro está localizado.


Marceli

Francisco Rezek (2018, p. 255) ressalta, no entanto, que a pessoa capturada não poderia alegar
ilegalidade na sua prisão, pois a “vítima” seria o Estado que o reclama.
A abdução pode ser feita por agentes do Estado ou por terceiros (mercenários, caçadores de
recompensa) por ele contratados.
Há, na história, casos famosos de abdução internacional como os de Ronald Biggs, em 1998,
sequestrado no Brasil por um grupo de ex-soldados britânicos e entregue às autoridades de Barbados, ou o
caso de Adolf Eichmann, general nazista abduzido em 1960, por agentes do Mossad (serviço sequestro
israelense) na Argentina e levado à Israel para ser julgados pelos crimes cometidos durante a Segunda Guerra
Mundial.

8.6. Transferência de execução de pena e transferência de pessoa condenada

Os institutos de transferência de execução de pena e de transferência de pessoa condenada


remontam ao Tratado de transferência de pessoas condenadas e execução de penas impostas por
julgamentos entre a República Federativa do Brasil e o Reino dos Países Baixos, ratificado pelo Decreto n.º
7.906/2013. O artigo 2 do tratado é de importante valia para a compreensão dos institutos, posteriormente
inseridos como normas gerais na Lei de Migração:

224
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Artigo 2. Princípios Gerais


1. Os Estados comprometem-se a proporcionar mutuamente a medida mais ampla de
cooperação com relação à transferência de pessoas condenadas e à execução de penas
impostas por julgamentos, em conformidade com as disposições deste Tratado.
2. Uma pessoa condenada no território de uma Parte poderá ser transferida para o território
da outra Parte, em conformidade com as disposições deste Tratado, a fim de cumprir a pena
a ela imposta. Para essa finalidade, a pessoa poderá expressar ao Estado de condenação ou
ao Estado de execução o seu interesse em ser transferida de acordo com este Tratado.
3. A transferência poderá ser solicitada pelo Estado de condenação ou pelo Estado de
execução.

Os institutos partem de um pressuposto em comum, há um estrangeiro sob custódia do Estado


brasileiro, que será transferido a outro Estado, como medida de cooperação internacional.
A principal distinção entre os institutos se dá pelo fato de que, na transferência para a execução da
pena, o pedido é feito pelo pretenso Estado receptor; já, na transferência de pessoa condenada, o pedido é
feito pelo estrangeiro. Essa distinção define o estatuto jurídico de ambos os institutos, pois a transferência
para a execução da pena independe da vontade do apenado (KENICKE, 2021, ebook, p. RL-1.31).
Por esse motivo, ela não poderá ser deferida nas situações em que a extradição é vedada, ou, ainda,
nas hipóteses do parágrafo único do art. 100 da Lei de Migração:
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073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Art. 100. Nas hipóteses em que couber solicitação de extradição executória, a autoridade
competente poderá solicitar ou autorizar a transferência de execução da pena, desde que
observado o princípio do non bis in idem.
Parágrafo único. Sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940 (Código Penal), a transferência de execução da pena será possível quando preenchidos
os seguintes requisitos:
I - o condenado em território estrangeiro for nacional ou tiver residência habitual ou vínculo
pessoal no Brasil;
CPF: 073.496.444-77

II - a sentença tiver transitado em julgado;


III - a duração da condenação a cumprir ou que restar para cumprir for de, pelo menos, 1
(um) ano, na data de apresentação do pedido ao Estado da condenação;
IV - o fato que originou a condenação constituir infração penal perante a lei de ambas as
souza -- CPF:

partes; e
V - houver tratado ou promessa de reciprocidade.
Marceli souza

Para Roberto Luiz Silva (2020, p. 334), a transferência de um apenado tem um importante papel na
Marceli

ressocialização do preso, sendo considerada verdadeira questão humanitária (KENICKE, 2021, ebook, p. RL-
1.32), pois possibilita o cumprimento da pena junto de seus familiares e compatriotas:

Art. 103. A transferência de pessoa condenada poderá ser concedida quando o pedido se
fundamentar em tratado ou houver promessa de reciprocidade.
§ 1º O condenado no território nacional poderá ser transferido para seu país de
nacionalidade ou país em que tiver residência habitual ou vínculo pessoal, desde que
expresse interesse nesse sentido, a fim de cumprir pena a ele imposta pelo Estado brasileiro
por sentença transitada em julgado. (...)

Art. 104. A transferência de pessoa condenada será possível quando preenchidos os


seguintes requisitos:
I - o condenado no território de uma das partes for nacional ou tiver residência habitual ou
vínculo pessoal no território da outra parte que justifique a transferência;
II - a sentença tiver transitado em julgado;
III - a duração da condenação a cumprir ou que restar para cumprir for de, pelo menos, 1
(um) ano, na data de apresentação do pedido ao Estado da condenação;
IV - o fato que originou a condenação constituir infração penal perante a lei de ambos os
Estados;
V - houver manifestação de vontade do condenado ou, quando for o caso, de seu
representante; e
VI - houver concordância de ambos os Estados.

225
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

As transferências para a execução de pena ou de pessoa apenada são precedidas de tratado ou


promessa de reciprocidade, aproximando-se, nesse ponto, da extradição. Porém, ao contrário da extradição,
as transferências não estão ligadas à prática de crime no Estado requerente.
No caso da transferência para a execução de pena, o pedido será feito por via diplomática (troca de
notas) junto ao Ministério da Justiça que, uma vez aferidos os requisitos formais, remeterá o pedido para a
apreciação do Superior Tribunal de Justiça. No tribunal, segue-se o rito da homologação de sentença
estrangeira:

Art. 101. O pedido de transferência de execução da pena de Estado estrangeiro será


requerido por via diplomática ou por via de autoridades centrais.
§ 1º O pedido será recebido pelo órgão competente do Poder Executivo e, após exame da
presença dos pressupostos formais de admissibilidade exigidos nesta Lei ou em tratado,
encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça para decisão quanto à homologação.
§ 2º Não preenchidos os pressupostos referidos no § 1º, o pedido será arquivado mediante
decisão fundamentada, sem prejuízo da possibilidade de renovação do pedido,
devidamente instruído, uma vez superado o óbice apontado.

Deferida a transferência, o STJ expedirá carta de sentença a ser cumprida por juiz federal:
marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Art. 102. A forma do pedido de transferência de execução da pena e seu processamento


serão definidos em regulamento.
Parágrafo único. Nos casos previstos nesta Seção, a execução penal será de competência
da Justiça Federal.

No caso de transferência de pessoa condenada, o interessado deve fazer o pedido junto ao Ministério
da Justiça, que verificará os requisitos formais do pedido, nos termos do art. 293 do Decreto n.º 9.199/2017,
para após diligenciar junto às autoridades judiciárias e penitenciárias:
CPF: 073.496.444-77

Art. 293. Apresentado o pedido de transferência de pessoa condenada, o Ministério da


Justiça e Segurança Pública verificará o preenchimento dos seguintes requisitos:

Nos termos do art. 105 da Lei de Migração, compete à Justiça Federal a execução da medida:
souza -- CPF:

Art. 105. A forma do pedido de transferência de pessoa condenada e seu processamento


serão definidos em regulamento.
Marceli souza

§ 1º Nos casos previstos nesta Seção, a execução penal será de competência da Justiça
Federal.
Marceli

§ 2º Não se procederá à transferência quando inadmitida a extradição.

Por fim, no caso de transferência de pessoa condenada, o art. 103 da Lei prevê a possibilidade de
deferimento do pedido com a aplicação de medida de impedimento de reingresso no território nacional:

Art. 103 (...)


§ 2º A transferência de pessoa condenada no Brasil pode ser concedida juntamente com a
aplicação de medida de impedimento de reingresso em território nacional, na forma de
regulamento.

8.7. Entrega

Como bem aponta André de Carvalho Ramos (2018, p. 332), o Estatuto de Roma (Decreto n.º
4.388/2002) prevê, em seus artigos 89 e 59, a entrega (surrender) dos acusados em julgamentos admitidos
pelo Tribunal Penal Internacional, gerando enormes debates acerca do instituto, principalmente em relação
às limitações constitucionais e legais da extradição:

Artigo 89. Entrega de Pessoas ao Tribunal


1. O Tribunal poderá dirigir um pedido de detenção e entrega de uma pessoa, instruído com
os documentos comprovativos referidos no artigo 91, a qualquer Estado em cujo território

226
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

essa pessoa se possa encontrar, e solicitar a cooperação desse Estado na detenção e entrega
da pessoa em causa. Os Estados Partes darão satisfação aos pedidos de detenção e de
entrega em conformidade com o presente Capítulo e com os procedimentos previstos nos
respectivos direitos internos. (...)

Artigo 59. Procedimento de Detenção no Estado da Detenção


1. O Estado Parte que receber um pedido de prisão preventiva ou de detenção e entrega,
adotará imediatamente as medidas necessárias para proceder à detenção, em
conformidade com o respectivo direito interno e com o disposto na Parte IX.

Hildebrando Accioly, Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva e Paulo Borba Casella (2016, p. 514)
destacam que o Brasil não apenas ratificou o Estatuto de Roma, como a Emenda Constitucional n.º 45/04
inscreveu também expressamente a aceitação à jurisdição do TPI. Para os autores, a entrega não equivale à
extradição a um Estado estrangeiro, mas, sim, a uma medida de cooperação com um tribunal internacional
do qual o Brasil reconheceu jurisdição. Daí ser possível, segundo os autores, o envio de estrangeiro ou
brasileiro para ser julgado perante o tribunal, sob pena de se tornar inoperante o mecanismo de
responsabilização e violar o dever de cooperação do artigo 86 do Estatuto:

Artigo 86. Obrigação Geral de Cooperar


marceliangel@hotmail·com
073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

Os Estados Partes deverão, em conformidade com o disposto no presente Estatuto,


cooperar plenamente com o Tribunal no inquérito e no procedimento contra crimes da
competência deste.

Ademais, é importante destacar que o próprio Estatuto de Roma distingue a entrega da extradição:

Artigo 102. Termos Usados


Para os fins do presente Estatuto:
a) Por "entrega", entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado ao Tribunal nos
CPF: 073.496.444-77

termos do presente Estatuto.


b) Por "extradição", entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado a outro Estado
conforme previsto em um tratado, em uma convenção ou no direito interno.

Valerio de Oliveira Mazzuoli (2020, ebook, p. 906) aponta, ainda, que é possível a entrega de
souza -- CPF:

nacionais ao TPI, pois não se está sujeitando um nacional a outro sujeito de Direito Internacional de mesma
categoria que o Estado (brasileiro), mas a uma organização internacional, criada pelo esforço comum, com
Marceli souza

jurisdição própria.
Marceli

Ademais, o TPI não deve ser considerado um tribunal estrangeiro, mas um órgão jurisdicional
internacional que o Brasil compõe e do qual reconhece jurisdição.
André de Carvalho Ramos (2018, p. 334) ressalta que a própria leitura da Constituição corrobora com
a terminologia e lógica do Estatuto de Roma. O art. 102, I, g, prevê a extradição a Estado estrangeiro,
enquanto a entrega é feita ao Tribunal Internacional. Além disso, o art. 7º dos Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCT) já previa o ingresso do Brasil em tribunal internacional de proteção dos
direitos humanos.
Portanto, para a corrente doutrinária majoritária, a entrega é distinta da extradição, sendo possível
ser tomada em face de brasileiros natos ou naturalizados.

8.8. Direitos de asilo e refúgio

8.8.1. Noções conceituais

André de Carvalho Ramos (2011, p. 15) aponta que parte da doutrina e de órgãos internacionais,
muitas vezes, utiliza os termos asilo e refúgio como sinônimos ou equivalentes ao mesmo instituto jurídico,
ainda que tratados internacionais, normas nacionais e a doutrina façam distinção entre os institutos.

227
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 188), por exemplo, entende que os institutos têm a mesma
natureza jurídica, proteger o indivíduo ameaçado de perseguição, porém, do ponto de vista histórico, asilo
seria gênero e o refúgio, uma de suas espécies.
Para a maioria da doutrina, a distinção conceitual entre asilo e refúgio é o motivo da perseguição:

• Asilo: a acolhida de estrangeiro perseguido por motivos políticos;


• Refúgio: acolhida do imigrante fundada em temor de perseguição por motivos odiosos, que não
os de natureza política, como raça, religião, nacionalidade, grupo social (SILVA, 2020, p. 295)

8.8.2. Noções históricas

André de Carvalho Ramos (2011, p. 16) aponta que o asilo é um instituto que remonta ao Estado
Helênico (cujo termo grego é “ásilon”), já, para Roberto Luiz Silva (2020, p. 293), sua origem é do Direito
Romano (do termo latim “asylum”), em que um criminoso buscava proteção e refúgio. Na Idade Média, a
concessão do asilo ganhou contornos religiosos, sendo concedido em monastérios e tempos, sob
fundamento da piedade divina (RAMOS, 2011, p. 16). O asilo, nesse período, ao contrário do instituto
moderno, estava restrito aos crimes comuns, sendo os crimes políticos passíveis de extradição.
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Foi com as revoluções liberais que o asilo passou a ser destinados aos crimes políticos, motivo pelo
qual muitos textos normativos preveem o termo “asilo político” (RAMOS, 2011, p. 16).
O surgimento do instituto do refúgio, por sua vez, remonta a período próximo ao final da Primeira
Guerra Mundial, em especial, com o deslocamento massivo de pessoas associados à Revolução Comunista
Russa e o fim do Império Otomano (RAMOS, 2011, p. 25).

8.8.3. Normativas internacionais sobre os institutos


CPF: 073.496.444-77

Sendo um instituto antiguíssimo, o asilo tem previsão internacional desenvolvida de forma pioneira
nas Américas (RAMOS, 2011, p. 17), sendo o primeiro tratado internacional sobre o tema o Tratado sobre
souza -- CPF:

Direito Internacional Penal, de 1889. Ainda em âmbito americano, existem a Convenção de Havana sobre o
Asilo, de 1928, a Convenção de Montevidéu sobre Asilo Político, de 1933, o Tratado sobre Asilo e Refúgio
Marceli souza

Político, de Montevidéu, de 1939, a Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem, de 1949, a


Convenção sobre Asilo Diplomático e a Convenção sobre Asilo Territorial, de 1954, e a Convenção Americana
Marceli

de Direitos Humanos, de 1969, que em seu artigo 22.7 dispõe:

Artigo 22. Direito de Circulação e de Residência (...)


7. Toda pessoa tem o direito de buscar e receber asilo em território estrangeiro, em caso
de perseguição por delitos políticos ou comuns conexos com delitos políticos e de acordo
com a legislação de cada estado e com os convênios internacionais.

Em âmbito universal, ganha destaca o artigo XIV da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

Artigo XIV
1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em
outros países.
2. Esse direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por
crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações
Unidas.

Thiago Oliveira Moreira (2019, p. 177) destaca que não há previsão expressa, no Pacto Internacional
sobre Direitos Civis e Políticos, da proteção de asilo político, não obstante defender que o direito está
implícito no artigo 12.2 do tratado internacional:

Artigo 12 (...)

228
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

2. Toda pessoa terá o direito de sair livremente de qualquer país, inclusive de seu próprio
país.

Em relação ao refúgio, André de Carvalho Ramos (2011, p. 25) destaca que, sob os auspícios da Liga
das Nações, os acordos internacionais sobre refugiados tinham destinatários específicos, tendo sido criado
um Escritório Internacional para os Refugiados apenas em 1931.
Para o autor, foi o artigo supramencionado da Declaração Universal dos Direitos Humanos que deu
novo impulso à proteção dos refugiados, tendo sido elaborado o primeiro tratado internacional sobre o tema
(a Convenção de Genebra relativa ao Estatuto dos Refugiados). Um ano antes, foi criado o Alto Comissariado
das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), que atualmente é órgão permanente da Assembleia Geral
da ONU.
É importante destacar que a Convenção de 1951 traz duas grandes limitações relacionadas ao
reconhecimento do status de refugiados. A primeira é a limitação temporal, reconhecendo tal condição
apenas para os fluxos ocorridos antes de 1951. A segunda é uma limitação geográfica, por reconhecer como
fatos fundadores apenas os ocorridos na Europa.
Esse estatuto perdurou até 1967, data da elaboração do Protocolo Adicional à Convenção sobre
Refugiados, que suprimiu apenas a limitação temporal.
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O Brasil ratificou a Convenção de 1951 em 1961, por meio do Decreto n.º 50.215/1961. O protocolo
de 1967 foi ratificado em 1972, suprimindo-se, assim, a limitação temporal. O fim da limitação geográfica
ocorreu apenas em 1989, por meio do Decreto n.º 98.602/1989.

8.8.4. Normas nacionais

A concessão de asilo político é um princípio das relações internacionais da República Federativa do


CPF: 073.496.444-77

Brasil, nos termos do art. 4º, X, da Constituição:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios: (...)
X - concessão de asilo político.
souza -- CPF:

Ademais, a vedação constitucional da extradição fundada em crimes políticos ou de opinião


Marceli souza

complementa as regras sobre o asilo:


Marceli

Art. 5º (...)
LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião;

Não há previsão constitucional expressa sobre refúgio, porém, André de Carvalho Ramos (2011, p.
27) prevê, como fundamento, a cláusula de abertura do art. 5º, § 2º, aplicando, ainda, por analogia, o
disposto no art. 4º, X.
Em âmbito infraconstitucional, o asilo era tratado nos arts. 28 e 29 do Estatuto do Estrangeiro, sendo
atualmente regrado pelos arts. 27 a 29 do Estatuto do Migrante. Já o refúgio é objeto da Lei n.º 9.474/1997.

QUESTÕES
243. (CESPE/CEBRASPE - 2015 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Raul, nacional do Estado X,
solicitou asilo diplomático na embaixada do Estado Y, localizada no território do Estado Z, alegando que tem
sofrido perseguição política por ação conjunta dos Estados X e Z. O asilo diplomático foi concedido pelo
Estado Y, que reconhece como norma de direito internacional costumeiro o asilo diplomático, ao passo que
o Estado Z alega que nunca reconheceu tal norma como válida e obrigatória para si. Nessa situação
hipotética,
a) o Estado Y não pode entregar Raul às autoridades do Estado Z, após a concessão do asilo, mas pode
entregá-lo às autoridade de seu próprio Estado.

229
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

b) o Estado Z está obrigado a conceder a Raul um salvo-conduto para que ele deixe o seu território.
c) a embaixada do Estado Y, localizada no território do Estado Z, é inviolável, mesmo estando Raul em seu
interior.
d) Raul tem direito a ter reconhecido pelo Estado Z o asilo diplomático concedido pelo Estado Y.
e) o Estado Y tem o dever de aplicar a Raul o princípio aut dedere aut judicare.
244. (FCC - 2006 - BACEN - Procurador) A norma costumeira de origem internacional que proíbe que os
Estados expulsem seus súditos de seu próprio território proscreve prática conhecida por
a) apatria.
b) retorno.
c) banimento.
d) extradição.
e) devolução.
245. (MPF – 2013 – Procurador da República) De acordo com a Corte Internacional de Justiça, no
julgamento de 20 de julho de 2012 do caso “questões relativas à obrigação de perseguir ou extraditar”
(Bélgica v. Senegal),
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a) O crime de tortura é, no direito internacional, de natureza consuetudinária e, por isso, prevalece a


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obrigação do Senegal de extraditar ou promover a persecução penal (aut dedere aut judicare) contra o ex-
presidente do Chad, Hissène Habré, para fatos que tiveram lugar antes mesmo da entrada em vigor da
Convenção da ONU contra a Tortura para o Senegal;
b) o crime de tortura não é, no direito internacional, de natureza consuetudinária, sendo sua criminalização
resultado do direito convencional e, por isso, prevalece a obrigação do Senegal de extraditar ou promover a
persecução penal (aut dedere aut judicare) contra o ex-presidente do Chad, Hissène Habré, apenas para fatos
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que tiverem lugar após a entrada em vigor da Convenção da ONU contra a Tortura para o Senegal;
c) o crime de tortura é, no direito internacional, de natureza consuetudinária, mas, a obrigação do Senegal
de extraditar ou promover a persecução penal (aut dedere aut judicare) contra o ex-presidente do Chad,
Hissène Habré, somente prevalece para os fatos que tiveram lugar após a entrada em vigor da Convenção da
souza -- CPF:

ONU contra a Tortura para o Senegal;


d) o crime de tortura é, no direito internacional, de natureza consuetudinária, mas, a obrigação do Senegal
Marceli souza

de extraditar ou promover a persecução penal (aut dedere aut judicare) contra o ex-presidente do Chad,
Marceli

Hissène Habré, somente prevalece para os fatos que tiveram lugar após a entrada em vigor da Convenção da
ONU contra a Tortura para a Bélgica.
246. (MPU - 2017 - PGR - Procurador da República) Dentre os enunciados abaixo, somente estão corretos:
I - No auxílio direto passivo, o Estado estrangeiro submete o seu pedido ao Brasil, que deve adotar os meios
internos necessários para cumprir tal pedido, fazendo incidir, de modo imediato, os direitos fundamentais
tais quais previstos no ordenamento brasileiro.
II - Na extradição passiva, o Brasil adotou o modelo misto ou belga, pelo qual o Poder Judiciário do Estado
Requerido afere, em geral, a regularidade extrínseca do pedido, com exceções previstas em tratado, lei ou
mesmo na Constituição.
III - Na assistência jurídica internacional passiva, é possível a incidência indireta dos direitos fundamentais
por intermédio da invocação do respeito à ordem pública do Estado brasileiro.
IV - Na cooperação jurídica internacional em matéria penal, a transferência de sentenciados, por seu cunho
humanitário, exige tão somente a anuência do Estado sentenciador e do Estado recebedor, sendo
dispensável a concordância do indivíduo condenado.
a) I e III.
b) II e IV.

230
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

c) I, II e III.
d) todos estão corretos.
247. (CESPE/CEBRASPE - 2009 - Instituto Rio Branco) Mecanismo tradicional de cooperação jurídica em
matéria penal, a extradição, no Brasil, só se realiza após ter sido submetida a julgamento no Supremo
Tribunal Federal, órgão que tem a competência originária para tal.
248. (CESPE/CEBRASPE - 2010 - Instituto Rio Branco) Fundada em tratado, a demanda extradicional não
pode ser sumariamente recusada pelo Estado requerido.
249. (FCC - 2009 - DPE-MA - Defensor Público) Relativamente à possibilidade de extradição de indivíduos
sujeitos a investigação ou processo criminal perante autoridades estrangeiras, a Constituição da República
prevê que o estrangeiro que se encontrar em território nacional
a) não será extraditado em hipótese alguma.
b) não será extraditado na hipótese de cometimento de crime político ou de opinião.
c) será extraditado apenas na hipótese de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, na forma da lei.
d) poderá ser extraditado, no caso de prática de crime comum, desde que a condenação seja anterior à
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sua entrada no país.


e) não poderá ser extraditado, exceto nas hipóteses de cometimento dos crimes de racismo ou tortura.
250. (CESPE / CEBRASPE - 2013 - Polícia Federal - Delegado de Polícia) A extradição poderá ser concedida
pelo Estado brasileiro quando o pedido do governo estrangeiro for fundado em tratado ou em promessa de
reciprocidade.
251. (TRF - 2ª Região - 2014 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal) Assinale a opção correta:
CPF: 073.496.444-77

a) A extradição é espécie do gênero cooperação jurídica internacional e consiste na entrega, de um Estado


a outro, e a pedido deste, de pessoa que, no território do requerente, deva responder a processo penal ou
cumprir pena. Há casos excepcionais em que a extradição passiva pode ocorrer em relação a brasileiro.
b) A extradição ativa não pode abranger brasileiros, salvo hipótese excepcional, ocorrida antes da aquisição
souza -- CPF:

da opção de nacionalidade.
c) Os requisitos e o exame da extradição, tanto a ativa quanto a passiva, estão sujeitos a controle judicial
Marceli souza

pelo juiz federal de 1º grau, que pode anular a solicitação feita pelo Ministério da Justiça à autoridade
Marceli

estrangeira, ou por ele recebida.


d) A deportação diz com a irregularidade administrativa do ingresso do estrangeiro e faz-se após o prazo
de 10 dias para que o alienígena deixe voluntariamente o território, para o seu país de nacionalidade ou,
excepcionalmente, para país que aceite recebê-lo.
e) A expulsão é ato discricionário de competência exclusiva do Presidente da República, informado pelo
princípio da soberania. Quando a extradição não for possível pela lei brasileira, poderá o Presidente da
República optar pela expulsão do indivíduo.
252. (CETRO - 2017 - TJ-RJ - Titular de Serviços de Notas e de Registros) No que se refere ao instituto da
extradição afeita ao Processo Penal, assinale a alternativa correta.
a) Uma vez que o extraditando seja casado com brasileira ou tenha filho brasileiro, afastada está a
extradição, não importando o crime cometido no estrangeiro.
b) O STF pode autorizar a extradição independentemente de o ordenamento jurídico do Estado estrangeiro
conceder ao extraditado garantias relacionadas ao devido processo legal.
c) A prisão cautelar, para efeitos extraditórios, é instituto não recepcionado pelo texto constitucional de
1988.

231
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

d) A vedação constitucional de extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião não se estende
a autor de atos delituosos de natureza terrorista.
e) Ao STF cabe, constitucionalmente, interpretar cláusula de Tratado de Extradição vinculada ao
cometimento de crime no país de origem, vinculando-a, posteriormente, à decisão política de extraditar ou
não do Presidente da República.
253. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) Constitui óbice ao deferimento do
pedido de extradição a inexistência, no ordenamento jurídico do Estado requerente, de sistema de
progressão de regime de cumprimento de pena privativa de liberdade.
254. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) A existência de vínculos conjugais e(ou)
familiares do extraditando estrangeiro com pessoas de nacionalidade brasileira não se qualifica como causa
obstativa da extradição.
255. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) Será excluído da detração o período
em que o extraditando tiver ficado preso cautelarmente no Brasil por crimes cometidos em território
nacional que não estiverem elencados no pedido de extradição.
256. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) Se o estrangeiro manifestar de modo
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inequívoco o seu desejo de ser extraditado, ficarão dispensadas as formalidades inerentes ao processo de
extradição.
257. (TRF - 2ª Região - 2018 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Brasileira nata adquire
voluntariamente a nacionalidade derivada norte-americana, sem que isso lhe tenha sido imposto de alguma
maneira. Em seguida, contraiu matrimônio com norte-americano - assassinado poucos anos depois - e, após
a sua morte, veio para o Brasil. Os Estados Unidos apresentaram um pedido de extradição ao governo
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brasileiro sob o fundamento de que ela era acusada de matar o marido. Com relação à hipótese é correto
afirmar que:
a) É possível a extradição de brasileira nata, quando o pedido é fundado em tratado em vigor no Brasil.
b) Brasileira nata somente pode ser extraditada no caso de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de
souza -- CPF:

entorpecentes e drogas afins.


c) É possível a extradição de brasileira naturalizada, nos termos da Constituição Federal, e de estrangeira,
Marceli souza

considerada como tal a pessoa que perdeu a nacionalidade brasileira por ter adquirido voluntariamente outra
Marceli

nacionalidade.
d) A extradição somente é possível quando fundada em tratado.
e) O direito brasileiro admite somente a extradição decorrente de condenação penal definitiva no exterior.
258. (FCC - 2018 - Câmara Legislativa do Distrito Federal - Técnico Legislativo) Considere as situações
hipotéticas abaixo.
− Arnold é brasileiro naturalizado, residente no Brasil e, antes de sua naturalização, praticou crime comum
no seu país de origem.
− Dimitri é estrangeiro e encontra-se, atualmente, no Brasil, tendo cometido crime político em seu país de
origem.
− Frida é estrangeira e encontra-se, atualmente, no Brasil, tendo cometido crime de opinião em seu país de
origem.
− José é brasileiro nato, residente no País, tendo cometido crime no exterior durante viagem de férias, da
qual já retornou.
Levando-se em consideração somente as informações aqui fornecidas, de acordo com a Constituição Federal,
é cabível a extradição APENAS de:

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA SUJEITOS DO DIREITO INTERNACIONAL • 3

a) Arnold e José.
b) Dimitri e Frida.
c) Arnold e Frida.
d) Arnold.
e) Dimitri e José
259. (Quadrix - 2019 - CRF-ES) Portugueses equiparados poderão ser extraditados pelo Brasil, por crimes
comuns, para qualquer outro país.
260. (CESPE / CEBRASPE - 2011 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal) Assinale a opção correta acerca da
condição jurídica dos estrangeiros.
a) O Brasil admite a concessão tanto do asilo diplomático quanto do asilo territorial.
b) Somente é passível de expulsão do território brasileiro o estrangeiro que sofra condenação por crimes
que atentem contra a segurança nacional ou a ordem política ou social.
c) Segundo o direito internacional costumeiro, nenhum Estado tem o direito de negar visto para o ingresso
de estrangeiro em seu território, seja em definitivo, seja a título temporário.
d) A deportação, como forma de exclusão do estrangeiro do território brasileiro, somente se efetiva
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mediante ato que, exarado pelo ministro de Estado da Justiça, impeça o retorno do deportado ao país.
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e) A CF dispõe que o brasileiro naturalizado somente pode ser extraditado em caso de crime comum ou de
comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, desde que, em ambos os casos,
os crimes tenham sido praticados antes da naturalização.
261. (CESPE / CEBRASPE - 2013 - AGU - Procurador Federal) O reconhecimento superveniente de status
de refugiado obsta o prosseguimento de processo extradicional que tenha implicações com os motivos do
deferimento do refúgio.
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DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

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DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

1. INTRODUÇÃO

Os indivíduos, muitas vezes, têm relações que ultrapassam os limites territoriais de um Estado. Essa
característica, sempre existente na humanidade, acaba por ser intensificada com os anos, em especial com
a era digital.
A transcendência entre as fronteiras estatais, em uma mesma relação jurídica, gera problemas que
acabam por desaguar no acesso ao Poder Judiciário (MAZZUOLI, 2021, ebook. p. 19). Questiona-se, portanto:
qual Estado deve julgar uma demanda? Qual a legislação aplicável ao caso? Daí o principal do Direito
Internacional Privado (DIPr) acaba por ser o conflito de leis no espaço, ao ponto de alguns doutrinadores
afirmarem que o Direito Internacional Privado, “mais do que um direito verdadeiro, tem sido entendido como
uma técnica de aplicação do Direito” (DEL'OLMO; JAEGER JR., 2016, ebook, p. 1.)
Essa concepção não é a única e muito menos a majoritária. Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020,
ebook, p. 3) explicam que há várias concepções sobre o objeto do direito internacional privado:

• Escola francesa: entende que são objeto da disciplina a nacionalidade, a condição jurídica do
estrangeiro, o conflito de leis e o conflito de jurisdições. Há ainda quem insira o tema dos direitos
adquiridos em sua dimensão internacional (DOLINGER e TIBURCIO, 2020, ebook, p. 3)
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• Escola alemã: tem uma visão mais restrita, considerando objeto da ciência o conflito de leis;
• Escola anglo-saxã: inclui, além do conflito de leis, o conflito de jurisdição.

A linha seguida até agora é a de que nacionalidade, condição jurídica do migrante e do visitante, é
tema atinente do Direito Internacional Público.
Por outro lado, restringir as normas do DIPr apenas à resolução de conflito de leis, sem a definição
do órgão julgador de uma determinada lide, acaba por ser uma concepção, com o devido acato, incompleta.
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Daí conceitua-se o Direito Internacional Privado como o conjunto de normas de direito público
interno que buscam regular elementos de conexão, para a definição do direito aplicável a uma lide (nacional
ou estrangeiro), quando houver dúvida sobre quais normas devem ser aplicáveis, assim como as regras de
souza -- CPF:

definição do órgão julgador da demanda.


André de Carvalho Ramos, em um conceito semelhante, ensina o seguinte:
Marceli souza

[...] no século XXI, o Direito Internacional Privado consiste em um conjunto de normas


Marceli

jurídicas nacionais e internacionais que regula (i) a escolha de uma regra de regência sobre
fatos transnacionais que afetam a vida dos indivíduos e pessoas jurídicas, bem como a (ii)
fixação de uma jurisdição para solucionar eventuais litígios sobre tais fatos, além de estudar
as (iii) fórmulas de cooperação jurídica internacional entre Estados que resultem na efetiva
prestação de justiça aos envolvidos nessas situações transacionais. (RAMOS, 2018, p. 25)

O Direito Internacional Privado (DIPr) não é ramo do Direito Internacional Público (DIP). O DIP
refere-se a aspectos das relações internacionais. As normas do DIPr são normas do Direito interno, ainda
que algumas de suas normas constem de tratados.
Ademais, a aplicação das normas de Direito Internacional Privado não é facultativa, isto é, as normas
devem ser aplicadas ex officio pelo julgador em um caso posto a julgamento, daí sua natureza de normas de
direito público.
O Direito Internacional Privado configura, segundo Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 651),
exceção ao princípio da territorialidade, pois nem sempre o Estado irá aplicar as normas decorrentes
diretamente de sua soberania.
Talvez, melhor seria dizer que as normas do DIPr acabam por mitigar o princípio da territorialidade,
pois é o Estado que, no exercício da soberania (interna), admite a aplicação do Direito estrangeiro em
território nacional.

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PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Trata-se de mitigação, seja pela escolha soberana do legislador pátrio, seja porque a autoridade só
poderá aplicar do Direito estrangeiro quando autorizado pela ordem jurídica interna, também denominada
com lei do foro, ou lex fori.
A relação jurídica que deu causa a eventual litígio é uma relação transacional. Para se saber qual a
norma aplicável (lex fori ou não) é que se faz uma análise por meio dos elementos de conexão, isto é, dos
fatores definidos no próprio ordenamento interno, indicativos do vínculo entre uma pessoa ou situação e
uma ordem estatal aplicável, como o domicílio, a nacionalidade, de uma das partes, o local onde se encontra
o bem etc.

2. FONTES

As fontes do Direito Internacional Privado têm origem exclusivamente interna ou proveniente de


normas internacionais.
As fontes internas são as emanadas do Estado, seja em âmbito constitucional ou infraconstitucionais,
com o fito de encontrar a lei aplicável a uma determinada situação jurídica.
De forma a harmonizar o tratamento (global e regional) a alguns temas, os Estados buscam, por meio
de tratados internacionais, estabelecer, em conjunto, a definição das normas aplicáveis a determinados
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casos. Surgem, assim, as fontes internacionais do Direito Internacional Privado.


Considerando a linha metodológica acerca da natureza das normas do Direito Internacional Privado,
é possível apontar que o art. 5º, XXXI, da Constituição, ao dispor sobre a sucessão de bens de estrangeiros:

Art. 5º (...)
XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira
em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável
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a lei pessoal do "de cujus";

Ademais, quanto à competência jurisdicional, o art. 114, I, prevê a competência absoluta da Justiça
do Trabalho para o julgamento de litígios oriundos da relação de trabalho. Já o art. 109, I, prevê a
competência da justiça federal para o julgamento de causas que tenham a União, entidade autárquica ou
souza -- CPF:

empresa pública federal na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as ações de falência,
acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça do Trabalho. Também é da Justiça Federal (CF/88, art. 109, III) a
Marceli souza

competência para o julgamento das causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado
Marceli

estrangeiro ou organismo internacional.


Estão na Constituição as normas sobre a competência do Superior Tribunal de Justiça para a
homologação de sentença estrangeira e para concessão de exequatur às cartas rogatórias (CF/88, art. 105, I,
i), bem como da Justiça Federal para a execução das medidas (CF/88, art. 109, X).
Adotando-se o conceito ampliado do objeto do Direito Internacional Privado, encontram-se na
Constituição normas relacionadas à nacionalidade (CF/88, art. 12; art. 109, X), à condição jurídica do
migrante/visitante (CF/88, art. 5º, LII; art. 22, XV; art. 102, g; e art. 109, X) e direitos adquiridos (CF/88, art.
5º, XXXVI).
Além das normas constitucionais, cabe à Lei de Introdução às Normas Brasileiras (Decreto-Lei n.º
4.657/1942) a função de ser a principal fonte formal das normas do Direito Internacional Privado no Brasil,
pois reúne, nos arts. 7º a 19, as regras básicas da matéria no ordenamento jurídico nacional. Outro diploma
legal de suma importância para o Direito Internacional Privado brasileiro é o Código de Processo Civil, que
regula temas como a competência internacional e a homologação de sentença estrangeira.
É possível a uniformização de temas por meio de tratados celebrados entre os Estados, dentre os
quais o mais notório é o Código de Bustamante (Decreto n.º 18.871/1929). Necessário ressalvar, contudo,
que vários de seus preceitos estão derrogados. Há, ainda, tratados celebrados no âmbito das organizações
internacionais, dentre as quais pode-se citar o Mercosul e a OEA.

236
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

3. CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO

Como já aludido, por meio do princípio da territorialidade, a regra é que um Estado, dentro de seu
território, aplique as normas de seu ordenamento jurídico. Contudo, em uma determinada relação jurídica,
é possível que duas ordens jurídicas sejam potencialmente atingidas, isto é, que a causa seja conexa a mais
de um Estado. Possível, também, que a ocorrência de um fato tenha maior vínculo a um Estado, ainda que
tenha ocorrido em outro.
Nessas situações, é possível haver dúvida sobre qual norma nacional aplicável, configurando o
chamado conflito de leis no espaço.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 651) explica que um conflito de leis no espaço poderá
levar à aplicação de normas nacionais, de Estado estrangeiro ou previstas em tratados internacionais para a
resolução de uma lide. Por isso, as normas do direito internacional privado são chamadas de indicativas,
indiretas, de sobredireito ou de superordenamento (PORTELA, 2015, p. 654). Elas não resolvem o problema,
mas indicam o ordenamento que deverá fazê-lo.
Para Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 160), as normas indiretas ou indicativas são as principais
normas do Direito Internacional Privado, mas não as únicas, ante a presença de um número restrito de
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normas que desempenham funções auxiliares ou complementares às que indicam o direito aplicável,
denominadas normas conceituais ou qualificadoras.
Por fim, a definição da norma aplicável para a resolução do conflito de leis no espaço depende dos
chamados elementos de conexão, definidos por Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 654) como
critérios que apontarão o preceito que deverá incidir em cada caso específico de conflito.

QUESTÕES
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262. (IADES - 2018 - APEX Brasil - Analista – Jurídico) A respeito das fontes de direito internacional privado,
assinale a alternativa correta.
a) O Supremo Tribunal Federal (STF) adota a teoria da paridade, segundo a qual, havendo conflito entre o
tratado internacional e a lei nacional posterior, prevalecem as regras estabelecidas no tratado.
souza -- CPF:

b) Para entrar em vigência, documentos provenientes de decisões do Mercosul necessitam ser


anteriormente incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro.
Marceli souza

c) Sentenças estrangeiras não são consideradas fontes de direito internacional privado no Brasil.
Marceli

d) A denúncia de tratado internacional já incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro depende de


aprovação do Congresso Nacional, seguida de decreto promulgado pelo Poder Executivo.
e) A principal fonte de direito internacional privado de origem nacional é a lei. São consideradas fontes,
ainda, a doutrina e a jurisprudência, sendo que a primeira se manifesta como intérprete e guia para a
segunda.
263. (IADES - 2016 - Ceitec S.A - Analista Administrativo e Operacional – Advogado) A respeito das fontes
do direito internacional privado, assinale a alternativa correta.
a) Com a vigência do Novo Código Civil, instituído pela Lei nº 10.406/2002, houve modificações
significativas em relação às normas de direito internacional privado vigentes no Brasil.
b) De acordo com a teoria da paridade, consagrada pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal
de Justiça, havendo conflito entre o tratado internacional e a lei nacional posterior, prevalecem os
compromissos externos fixados no tratado.
c) A denúncia de um tratado internacional com vigência no Brasil observa o mesmo procedimento da
respectiva internalização, sendo indispensável a aprovação pelo Congresso Nacional, seguida da
promulgação de decreto do Poder Executivo.
d) No direito internacional privado brasileiro, o direito costumeiro é incapaz de criar normas.

237
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

e) Embora o objeto da disciplina do direito internacional privado seja o direito interno, ele é considerado
basicamente direito internacional em face das relações jurídicas de direito privado estritamente
internacionais.
264. (ESAF - 2016 - ANAC) Com relação ao objeto do Direito Internacional Privado, assinale a opção correta.
a) O Direito Internacional Privado é ramo do direito privado, por tratar de questões civis como casamento
e herança.
b) O principal sujeito do Direito Internacional Privado é o Estado.
c) O Direito Internacional Privado é primordialmente estruturado por normas de sobredireito, que
estabelecem regras de conexão para a escolha de uma entre as leis em conflito.
d) A disciplina da homologação de sentença estrangeira não se inclui no Direito Internacional Privado por
ser norma processual.
e) O conceito de ordem pública não possui relevância para o Direito Internacional Privado.
265. (CESPE / CEBRASPE - 2010 - Caixa – Advogado) As fontes de direito internacional privado no Brasil não
incluem:
a) o Código de Bustamante, de 1928.
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b) os contratos internacionais privados.


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c) a Lei de Introdução ao Código Civil, de 1942.


d) a doutrina.
e) a jurisprudência.

4. ESTRUTURA DA NORMA DE DIREITO INTERNACIONAL


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A norma indicativa (indireta) de Direito Internacional Privado estrutura-se em duas partes: o objeto
de conexão e o elemento de conexão:
• objeto de conexão: refere-se à matéria, isto é, ao tema objeto da norma (personalidade,
capacidade, direitos de família etc.).
souza -- CPF:

• elemento de conexão: refere-se ao critério de definição do ordenamento jurídico aplicável à


matéria. São exemplos de elementos de conexão, o domicílio, a nacionalidade, a lex fori, a lex loci
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delicti comissi, a lex executionis, a lex rei sitae e a autonomia da vontade.


Marceli

Florisbal de Souza Del'Olmo e Augusto Jaeger Júnior (2017, ebook, p. 44) adota como elemento
normativo a consequência jurídica, que nem sempre estaria escrita, podendo ser entendida como a
aplicação da regra propriamente dita.
O Direito Internacional Privado traz, também, as chamadas normas de caráter conceitual ou
qualificadoras, que têm a função de informa como uma regra indicativa deve ser interpretada ou aplicada.
Ademais, tais normas podem trazer hipóteses em que sua aplicação é vedada, como em casos de violação da
“ordem pública” (RECHSTEINER, 2018, p. 160).
Por fim, Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 654) destaca que, para quem adota uma
concepção ampla do Direito Internacional Privado, ligada à escola francesa, em relação à nacionalidade e à
condição jurídica do estrangeiro, é possível conceber a existência de normas diretas (que definem
obrigações, permissões ou vedações).
Florisbal de Souza Del' Olmo e Augusto Jaeger Júnior (2017, ebook, p. 44) classificam os elementos
de conexão em:

• Pessoais: nacionalidade, domicílio e residência (simples e habitual), origem e religião;


• Reais: lei da situação da coisa (lex rei sitae ou lex situs), local de aquisição da coisa, domicílio ou
nacionalidade do proprietário (mobilia sequuntur personam).

238
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

• Reais de natureza especial: lei do pavilhão, para navios e aeronaves; lugar em que se encontra;
lei do destino; lugar de partida; local de registro; domicílio ou nacionalidade do proprietário.
• Delituais ou penais: lugar do fato ilícito (lex delicti commissi); domicílio ou nacionalidade do
infrator; domicílio ou nacionalidade da vítima; natureza da infração; lei do dano (lex damni);
• Voluntários: lei do lugar da celebração (lex loci celebrationis); lugar da execução da obrigação (lex
loci executionis); autonomia da vontade (lex voluntatis);
• Normativos: lex fori (lei do foro); lex causae (que, por exclusão, são todas as normas que a
conexão não é a lex fori); lei mais favorável, que, por sua vez pode ser de cinco espécies:
▪ Favor infans: lei mais favorável à criança;
▪ Favor negotii: norma que valida o ao ou contrato;
▪ Favor matrimonii: lei que gera a manutenção do vínculo conjugal;
▪ Favor laesi: norma que favorece vítima do dano;
▪ Lei favorável ao consumidor.

4.1. Conexões pessoais


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Florisbal de Souza Del'Olmo e Augusto Jaeger Júnior (2016, ebook, p. 45) destacam que as conexões
que são centradas na pessoa são resolvidas basicamente pelos fatores do domicílio e da nacionalidade.

4.1.1. Domicílio

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 655) destaca que o domicílio (lex domicilii) é o principal
elemento de conexão adotado no Brasil. Por esse critério, deve-se aplicar a norma do local de domicílio de
CPF: 073.496.444-77

uma das partes da relação jurídica.


O autor aponta ainda que o emprego do domicílio como elemento de conexão relaciona-se à
definição jurídica de domicílio, que, por sua vez, pode variar entre os Estados. A determinação da noção de
domicílio normalmente consta de tratados ou no ordenamento nacional. No caso brasileiro, apenas os artigos
souza -- CPF:

70 a 78 definem o conceito de domicílio, tendo em vista que o país não ratificou a Convenção Interamericana
sobre o Domicílio das Pessoas Físicas, firmada em Montevidéu, em 1979.
Marceli souza

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 656) destaca que, para o Direito Internacional Privado,
Marceli

uma pessoa só pode ter um domicílio, ainda que a legislação reconheça a existência de mais de um.
Florisbal de Souza Del'Olmo e Augusto Jaeger Júnior (2017, ebook, p. 46) apontam que, em caso de
pluralidade de domicílios, a ordem de preferência é: domicílio nacional, domicílio legal (em detrimento do
voluntário) e aquele que coincide com a residência.
O domicílio como elemento de conexão está previsto no art. 7º da LINDB. Quanto à capacidade para
o casamento, o critério de regência também é o domicílio:

Art. 7º. A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o
fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

Caso o domicílio dos cônjuges seja diverso, adota-se, no Brasil, o primeiro domicílio para regular os
casos de invalidade do matrimônio e o regime de bens do casamento. Como determina o art. 7º, § 4º da
LINDB, o regime de bens do casamento, legal ou convencional, deve obedecer à lei do país em que os
nubentes tiveram domicílio.

Art. 7º (...)
§ 3º - Tendo os nubentes domicílio diverso, regerá os casos de invalidade do matrimônio a
lei do primeiro domicílio conjugal.
§ 4º - O regime de bens, legal ou convencional, obedece à lei do país em que tiverem os
nubentes domicílio, e, se este for diverso, a do primeiro domicílio conjugal.

239
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

A sucessão por morte ou por ausência também obedece à lei do país onde era domiciliado do
defunto ou desaparecido, ante a dicção do art. 10 da LINDB:

Art. 10. A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o
defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.

Será a lei do domicílio do herdeiro ou do legatário a que regulará a capacidade para suceder:

Art. 10 (...)
§ 2º - A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder.

Aplica-se a lei do país em que for domiciliado o proprietário quanto aos bens móveis que ele trouxer
consigo ou que se destinarem a transporte para outros lugares:

Art. 8º. (...)


§ 1º - Aplicar-se-á a lei do país em que for domiciliado o proprietário, quanto aos bens
moveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros lugares.

O penhor se regula pela lei do domicílio da pessoa, em cuja posse encontre-se a coisa empenhada:

Art. 8º. (...)


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§ 2º O penhor regula-se pela lei do domicílio que tiver a pessoa, em cuja posse se encontre
a coisa apenhada.

A autoridade judiciária brasileira será competente quando o réu for domiciliado no Brasil ou aqui
tiver que ser cumprida a obrigação:

Art. 12. É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no
Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.
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4.1.2. Nacionalidade

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 657) explica que o elemento de conexão da
nacionalidade é também chamado de lex patriae. Para a resolução de alguns conflitos de leis, aplicar-se-á a
souza -- CPF:

norma do Estado do qual a pessoa é nacional.


O critério é empregado nos casos de casamento de estrangeiros, perante as autoridades diplomáticas
Marceli souza

ou consulares de seu país de origem:


Marceli

Art. 7º. (...)


§ 2º O casamento de estrangeiros poderá celebrar-se perante autoridades diplomáticas ou
consulares do país de ambos os nubentes. (Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1º.8.1957)

Quanto ao apátrida e ao refugiado no Brasil, aplica-se a lei do domicílio ou, em sua falta, a da
residência, como determinam a Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, (artigo 12, 1) e a
Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, de 1951 (art. 12, 1) (PORTELA, 2015, p. 656).

4.1.3. Residência habitual

Alguns tratados internacionais (além dos citados acima) têm fixado o local da residência habitual
como elemento de conexão para a configuração do estatuto social:

• Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, de 1980;


• Convenção Interamericana sobre Conflitos de Leis em Matéria de Adoção de Menores, de 1984;
• Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional,
de 1993.

240
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Nos casos citados, a residência habitual da criança é o elemento definidor de seu estatuo social.

9. A residência habitual, para fins da Convenção de Haia é aquela em que a criança tinha as
suas raízes, estava vivendo em caráter de permanência. E, segundo a referida Convenção,
é a Lei desse Estado soberano que deve decidir as questões relativas à guarda dos menores.
Pelo que dispõe o art. 3o. do Decreto 3.413/2000, neste caso, mostra-se ilícita a
transferência dos menores para o Brasil em 2006, ante a existência de um direito de guarda
efetivamente exercido pelo genitor, que tinha a seu favor uma decisão judicial à qual a
recorrente, por livre vontade, resolveu se submeter.
10. Ausente qualquer circunstância prevista no art. 13 do Decreto 3.413/2000 a
desaconselhar o retorno dos menores ao seu País de residência habitual (Noruega).
11. A Convenção Sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, ao
estabelecer como uma de suas finalidades possibilitar o exercício das relações parentais
dentro da legalidade e a preservação dos vínculos familiares e rechaçar qualquer atitude
unilateral que possa macular o pleno exercício dessas relações, nada mais fez do que
proteger os superiores interesses das crianças, preservando-lhes a dignidade que a
condição humana lhes garante. (STJ, REsp 1315342/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES
MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 04/12/2012)

4.2. Conexões reais


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4.2.1. Lex rei sitae

Pelo critério lex rei sitae, incide a norma do lugar onde a coisa está situada. Tal elemento de conexão
tem por objeto o regime dos bens aplicável aos bens imóveis e aos bens móveis de situação permanente.
Com isso, os conflitos de leis relativos aos direitos reais regem-se com base no princípio da territorialidade.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 177) destaca que esse critério é aplicável apenas aos bens
CPF: 073.496.444-77

corpóreos, não atingindo créditos obrigacionais ou propriedade imaterial, por exemplo. No ordenamento
pátrio, esse elemento é consagrado nos seguintes dispositivos da LINDB:

Art. 8º. Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei
do país em que estiverem situados.
souza -- CPF:

Art. 10. (...)


Marceli souza

§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira
em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que
Marceli

não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus. (Redação dada pela Lei nº 9.047, de
18.5.1995)

Art. 12. (...)


§1º Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis
situados no Brasil.

4.2.2. Conexões reais de natureza especial

Alguns bens têm normas de regência fora da LINDB, como aeronaves e embarcações. Nesse caso,
aplica-se as normas do Estado onde eles estão matriculados ou registrados, nos termos do Direito
Aeronáutico e do Direito do Mar.
Na LINDB, as exceções à norma estão previstas nos seguintes dispositivos:

Art. 7º. A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o
fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família.

Art. 8º. (...)


§ 1º - Aplicar-se-á a lei do país em que for domiciliado o proprietário, quanto aos bens
moveis que ele trouxer ou se destinarem a transporte para outros lugares.

241
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 9º (...)
§ 2º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o
proponente.

Art. 10.A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o
defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.

4.3. Conexões delituais

Segundo o elemento de conexão lex loci delicti commissi, é aplicável a norma do lugar onde o ato
ilícito foi cometido. É o critério referente às obrigações extracontratuais que ensejam responsabilidade civil
pela prática de atos ilícitos.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 178) destaca que o lugar do ato pode não ser idêntico ao lugar da
produção de seus efeitos. Para o autor, os casos mais relevantes que ensejam a aplicação desse elemento de
conexão são os relacionados aos danos ambientais, à concorrência desleal e às violações de direitos da
personalidade pela mídia.
Com a ampliação das fake news em âmbito virtual, esse elemento de conexão acaba ficando em voga,
seja em relação aos autores da conduta, quanto das próprias empresas detentoras das redes sociais, que são
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utilizadas para proliferar as condutas.


Pode-se citar os casos de Beqa Latsabidze, uma estudante de vinte e dois anos da cidade de Tbilisi,
no estado da Geórgia, criadora do site www.MyFreshNews.com; e de Dimitri, pseudônimo de um estudante
de dezoito anos da cidade de Veles na Macedônia. Cada um deles lucrou milhares de dólares com notícias
falsas nas eleições americanas de 2016 (VOJAK, 2017, p. 124). Segundo reportagem de Alexander Smith e
Vladimir Banic (2016), Dimitri chegou a lucrar US$ 60.000,00 (sessenta mil dólares) por mês em fake news
relacionadas às eleições presidenciais americanas.
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Daí necessária a utilização do elemento de conexão para se saber qual a legislação aplicável a casos
dessa espécie.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 178) aponta, ainda, que em algumas legislações, o elemento de
souza -- CPF:

conexão da lex loci delicti commissi acaba sendo substituído por outro em determinados tipos de ato ilícito,
como acidentes rodoviários.
Marceli souza

IMPORTANTE!
Marceli

O Brasil não adotou expressamente esse elemento de conexão em sua legislação, não obstante parte
da doutrina defender sua utilização em casos relacionados à internet.

4.4. Conexões voluntárias

4.4.1. Autonomia da vontade

Segundo explica Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 658), a autonomia da vontade refere-se
à possibilidade de escolha do Direito aplicável a uma relação privada, com conexão internacional, pelos
participantes da relação jurídica. É também conhecida como lex voluntatis.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 180) ressalta que a autonomia da vontade não é fonte originária
do direito e não pode ser entendida como desvinculada da ordem jurídica estatal. Ademais, não poderia ser
considerada um costume internacional, pois é sempre o ordenamento interno (lex fori) que decide quando
a autonomia da vontade poderá ser respeitada.
Por isso, Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 659) ressalta que a autonomia da vontade é, em
regra, limitada pela ordem jurídica estatal.

242
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

De regra, permite-se o emprego da autonomia da vontade em contratos e, em alguns Estados, nas


sucessões e no que se refere aos regimes de bens. Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 180) aponta que, em
alguns estados, admite-se excepcionar normas cogentes pela autonomia da vontade.
Sua aplicabilidade no direito brasileiro é controversa na doutrina.
Florisbal de Souza Del' Olmo e Augusto Jaeger Júnior (2017, ebook, p. 49) apontam que a Lei de
Introdução ao Código Civil de 1916 trazia menção expressa sobre a aplicação da autonomia da vontade em
seu art. 13, relacionadas às obrigações:

Art. 13. Regulará, salvo estipulação em contrário, quanto á substância e aos efeitos das
obrigações, a lei do lugar, onde forem contraídas.
Parágrafo único. Mas sempre se regerão pela lei brasileira:
I. Os contratos ajustados em países estrangeiros, quando exeqüíveis no Brasil.
II. As obrigações contraídas entre brasileiros em país estrangeiro.
III. Os atos relativos a imóveis situados no Brasil.
IV. Os atos relativos ao regime hipotecário brasileiro.

Contudo, na redação do art. 9º da LICC de 1942 (atual LINDB), houve a supressão do termo “salvo
estipulação em contrário”:
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Art. 9º Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se


constituírem.

Para Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 660), a supressão do termo “salvo estipulação em
contrário” tornaria inválido o elemento de conexão da lex voluntatis no ordenamento brasileiro, não
obstante a Lei n.º 9.307/1996 (Lei de Arbitragem) admitir que as partes tenham a opção de escolher as
normas aplicáveis ao processo.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 183) cita também os artigos 7 e 8 do Protocolo de Haia sobre o
CPF: 073.496.444-77

Direito Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos, de 2007 (ratificado pelo Decreto n.º 9.176/2017), que
permite a designação do direito aplicável ao seu âmbito.
Em relação à arbitragem, além da legislação nacional, o autor cita também o Acordo sobre
Arbitragem Comercial Internacional no âmbito do Mercosul, ratificado pelo Decreto nº 4.719/2003, que
souza -- CPF:

também admite a autonomia da vontade para a escolha do direito aplicável à resolução do caso.
Marceli souza

A autonomia da vontade é expressamente abarcada no artigo 7 da Convenção Interamericana sobre


Direito Aplicável aos Contratos Internacionais, de 1979. Contudo o tratado não foi, até o momento, ratificado
Marceli

pelo Brasil, ainda que o Congresso Nacional, por meio do Decreto-legislativo n.º 36/1995 tenha aprovado o
texto, faltando, portanto, a manifestação do Presidente da República.
Não obstante a celeuma, o Superior Tribunal de Justiça tem precedente admitindo a autonomia da
vontade em contratos internacionais:

2. Em contratos internacionais, é admitida a eleição de legislação aplicável, inclusive no que


tange à regulação do prazo prescricional aplicável. Prescrição afastada, in casu, diante da
aplicação do prazo previsto na lei contratualmente adotada (lei do Estado de Nova Iorque -
Estados Unidos da América). (REsp 1280218/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA,
julgado em 21/06/2016, DJe 12/08/2016)

O Código Civil de 2015, privilegiando a autonomia da vontade, determina o reconhecimento da


eleição do foro, ainda que isso não se confunda com a eleição do direito aplicável para a resolução da lide
(MAZZUOLI, 2021, ebook. p. 159).

Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações: (...)
III - em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

243
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Quanto à eleição do foro, a autonomia da vontade também não é absoluta, considerando-se que o
art. 23 do CPC prevê as hipóteses de competência absoluta do judiciário brasileiro:

Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:
I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;
II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e
ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de
nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional;
III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de
bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha
domicílio fora do território nacional.

Ressalte-se que o STJ, antes mesmo do CPC/2015, já tinha precedente admitindo a eleição de foro
estrangeiro:

2. A eleição de foro estrangeiro é válida, exceto quando a lide envolver interesses públicos.
(REsp 242383/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado
em 03/02/2005, DJ 21/03/2005, p. 360)

4.4.2. Locus regit actum ou lex loci contractus (lugar de constituição da


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obrigação)

O elemento de conexão locus regit actum ou lex loci contractus ou “lugar de constituição da
obrigação”, implica na aplicação do ordenamento do local em que a obrigação foi contraída. O Brasil emprega
esse critério como regra geral para os contratos e obrigações:

Art. 9º. Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se
constituírem.
CPF: 073.496.444-77

Nos termos do art. 9º, § 2º da LINDB, a obrigação resultante do contrato é considerada constituída
no local de residência do proponente:

Art. 9º. (...)


souza -- CPF:

§ 2º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o


proponente.
Marceli souza

Quando a obrigação tiver de ser executada no Brasil, a lei prevê que devem ser admitidas as
Marceli

peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos:

Art. 9º. (...)


§ 1º Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de forma essencial,
será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei estrangeira quanto aos requisitos
extrínsecos do ato.

Ademais, o art. 11 da LINDB adota o critério locus regit actum em relação à constituição das pessoas
jurídicas:

Art. 11. As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as


fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituírem.

Por fim, o CPC determina que o título executivo extrajudicial, para ter eficácia executiva no Brasil,
deve satisfazer aos requisitos de formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração, além de indicar o
Brasil como lugar de cumprimento da obrigação:

Art. 784. (...)


§ 3º O título estrangeiro só terá eficácia executiva quando satisfeitos os requisitos de
formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração e quando o Brasil for indicado como
o lugar de cumprimento da obrigação.

244
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

4.5. Conexões normativas

Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 183) destaca que cada Estado tem suas normas sobre direito
internacional privado, mas a regra básica é a aplicação das normas vigentes no lugar do foro, isto é, a lex fori,
quando da realização da relação jurídica base.
Na prática, aplicar a lex fori é a aplicação das normas vigentes na legislação interna. O critério incide,
também, quando o Direito estrangeiro não puder ser aplicado, por violação da ordem pública, ou não for
verificável.

4.6. Outros elementos

A doutrina indica outros elementos de conexão. Valerio de Oliveira Mazzuoli (2021, ebook, p. 163)
aponta que, em alguns países, a religião e os costumes tribunais podem ser elementos que influenciam os
direitos e obrigações. Ademais, o autor cita que, em Israel e em países árabes, o direito matrimonial é de
competência da religião.

5. PRECEITOS BÁSICOS DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO


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5.1. Ordem pública

Em relações jurídicas com conflitos de leis no espaço, compete ao direito internacional público definir
o ordenamento jurídico aplicável ao caso, em situação de lide. Contudo, ainda que determinado elemento
de conexão defina o direito estrangeiro para a resolução da lide, o juiz não poderá aplicá-lo em caso de
violação à ordem pública:
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Art. 17 da LINDB:
As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não
terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons
costumes.
souza -- CPF:

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 662) conceitua a ordem pública como “os aspectos
Marceli souza

fundamentais de um ordenamento jurídico e da própria estrutura do Estado e da sociedade”. Beat Walter


Rechsteiner (2019, p. 203), no mesmo sentido, liga a ideia de ordem pública aos princípios fundamentais da
Marceli

ordem jurídica interna.


Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 204) diferencia as chamadas reservas negativas das positivas de
ordem pública:
• Reservas negativas de ordem pública: pelos critérios nacionais, competiria aplicar a lei
estrangeira para a resolução do caso, contudo, mesmo quando os pressupostos estejam
cumpridos, a legislação nacional será aplicada porque a estrangeira viola a ordem pública.
• Reservas positivas da ordem pública: a lex fori exclui de imediato a aplicação da lei estrangeira.
A ideia de ordem pública deve ser compreendida como abrangendo a chamada ordem pública
internacional, principalmente quanto às violações dos direitos humanos. Cabendo ao juiz a análise ampliada
dessa concepção de ordem pública.
Em todos os casos, se o direito estrangeiro não puder ser utilizado por afronta à ordem pública,
aplica-se a lex fori.

245
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

5.2. Qualificação

A qualificação é a aferição ou delimitação do objeto de conexão e, consequentemente, do elemento


de conexão. Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 393) equacionam a qualificação nos seguintes
termos:
CONCEITUAR + CLASSIFICAR = QUALIFICAR

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 661) explica que, por meio da qualificação (prévia), o juiz,
antes de decidir, verifica a qual instituição jurídica correspondem os fatos em julgamento, para, com isso,
determinar o direito aplicável por meio do elemento de conexão.
Há três grandes teorias sobre a qualificação:
• Teoria das qualificações pela lex fori: a que compete ao juiz da causa qualificar o instituto nos
termos de seu próprio ordenamento.
• Teoria da qualificação pela lex causae: defende que o instituto deve ser qualificado à luz da lei
estrangeira, aplicando-se integralmente como concebida no ordenamento de origem.
• Teoria da qualificação por referência a conceitos autônomos e universais: Jacob Dolinger e
Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 399) explicam que, por essa teoria, o juiz não deve ficar adstrito
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a uma determinada lei (do foro ou da causa), mas utilizar métodos comparados em busca de
conceitos autônomos dotados de caráter universal.
O Brasil adota predominantemente a teoria das qualificações pela lex fori, excepcionado a regra
(adotando a lex causae) nas hipóteses dos arts. 8º e 9º da LINDB:

Art. 8º. Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei
do país em que estiverem situados.
CPF: 073.496.444-77

Art. 9º. Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se
constituírem.

5.3. Reenvio ou retorno


souza -- CPF:
Marceli souza

Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 415) explicam que, no século XIX, os
ordenamentos jurídicos adotaram soluções diversas para a resolução de conflitos de leis no espaço. A
Marceli

divergência de soluções entre as normas do DIPr denomina-se como conflito de 2º grau.


O conflito de 2º grau pode ser positivo ou negativo:

• Conflito positivo: entende-se os aplicáveis os dois sistemas para solucionar um determinado


conflito. Portanto, as normas do direito internacional privado dos países da relação jurídica são
competentes para reger a matéria;
• Conflito negativo: ambos os ordenamentos indicam a lei estrangeira para a resolução do conflito
de leis no espaço posto a julgamento. Portanto, cada um dos ordenamentos entende que suas
normas não são aplicáveis (DOLINGER e TIBURCIO, 2020, ebook, p. 415).

O reenvio — retorno, remissão, devolução, opção, renvoi (francês) ou remission (inglês) — ocorre na
hipótese de conflitos de 2º grau negativos, pois, no caso de conflito positivo, a solução é a aplicação da lex
fori:

Materializada, assim, a divergência entre os dois sistemas de Direito Internacional Privado,


em que cada um indica a sua própria lei interna para ser aplicada à questão jurídica, atenta-
se geralmente para a solução ordenada pelo sistema do foro, sem considerar o critério da
jurisdição. Nesta hipótese não ocorrerá o fenômeno do reenvio. DOLINGER e TIBURCIO,
2020, ebook, p. 415)

246
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 662) explica que o reenvio pode existir em vários graus,
considerando-se o número de ordenamentos envolvidos.
Quando o ordenamento de um Estado faz o reenvio a outro, ocorre o reenvio de 1º grau. Se o
ordenamento indicado faz um novo reenvio a outro Estado, este será um reenvio de 2º grau, e assim
sucessivamente.
O ordenamento brasileiro não permite o reenvio, nos termos o art. 16 da LINDB:

Art. 16. Quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei estrangeira,
ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a
outra lei.

Parte da doutrina, no entanto, entende que a ordem pátria admite o reenvio na hipótese do art. 5º,
XXXI, da Constituição, repetido pelo art. 10, § 1º da LINDB (PORTELA, 2015, p. 663):

Art. 10 (...)
§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira
em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que
não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus (Redação dada pela Lei nº 9.047, de
18.5.1995).
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5.4. Direito adquirido

Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 227) destaca que a noção de direito adquirido, para o Direito
Internacional Privado, implica no reconhecimento e proteção de direitos validamente adquiridos sob a ótica
de uma ordem jurídica estrangeira.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 663) explica que o direito reconhecido por um
CPF: 073.496.444-77

ordenamento jurídico estatal acompanha a pessoa em outro Estado, desde que seu conteúdo não
desrespeite a própria soberania do Estado de destino.
Em outros termos, admite-se o direito adquirido desde que ele não fira a ordem pública.
O fundamento do reconhecimento do direito adquirido está no art. 5º, XXXVI, da Constituição c/c
souza -- CPF:

art. 6º da LINDB:
Marceli souza

Art. 5º (...)
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Marceli

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o
direito adquirido e a coisa julgada.

Um exemplo histórico na jurisprudência brasileira atinente ao instituto refere-se ao divórcio.


Mesmo quando o ordenamento pátrio não permitia o divórcio para nacionais, o Brasil reconhecia o
direito adquirido de estrangeiros divorciados sob as normas do ordenamento estrangeiro. Porém, o STF não
admitia a homologação de sentença de divórcio de estrangeiros, que contraíram núpcias em um Estado que
não o admitia e buscaram outro Estado que o permitia para se divorciar:

DIVÓRCIO. HOMOLOGAÇÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA. DENEGAÇÃO. O SUPREMO


TRIBUNAL FEDERAL FIRMOU JURISPRUDÊNCIA NO SENTIDO DE ADMITIR QUE CÔNJUGES
ESTRANGEIROS POSSAM OBTER O DIVÓRCIO NO SEU PAÍS, DE ACORDO COM A LEI DESTE.
JAMAIS, PORÉM, ADMITIU QUE POSSAM CONSTITUIR PROCURAÇÃO NO MEXICO OU NO
URUGUAI, PARA, FRAUDANDO SUA LEI PESSOAL E APROVEITANDO-SE DA LIBERALIDADE
DAS LEIS DAQUELES PAÍSES, OBTER NELES O DIVÓRCIO. (SE 1783, Relator(a): LUIZ GALLOTTI,
Tribunal Pleno, julgado em 02/12/1963, DJ 17-12-1963 PP-04454 EMENT VOL-00566-01 PP-
00135)

Caso os dois ex-nubentes fossem brasileiros, tal direito não lhes era reconhecido. Sendo apenas um
deles brasileiro, o divórcio era reconhecido, mas ele não poderia se casar novamente no Brasil:

247
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Decreto-lei nº 4.657 (redação originária)


Art. 7º (...)
§ 6º Não será reconhecido no Brasil o divórcio, se os cônjuges forem brasileiros. Se um deles
o for, será reconhecido o divórcio quanto ao outro, que não poderá, entretanto, casar-se
no Brasil.

Posteriormente, com a lei de divórcio (Lei n.º 6.515/1977), a então LICC foi alterada para impor o
reconhecimento do divórcio no estrangeiro, respeitado o prazo de 3 anos da separação de judicial, passando
à seguinte redação:

Art. 7º (...)
§ 6º - O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros,
só será reconhecido no Brasil depois de três anos da data da sentença, salvo se houver sido
antecedida de separarão judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá
efeito imediato, obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças
estrangeiras no País. O Supremo Tribunal Federal, na forma de seu regimento interno,
poderá reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de
homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a
produzir todos os efeitos legais. (Redação dada pela Lei nº 6.515, de 1977)

A redação atual da LINDB está de acordo com o disposto no Código Civil de 2002, que previa o prazo
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de um ano à conversão da separação judicial em divórcio:

Art. 7º (...)
§ 6º O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, só
será reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentença, salvo se houver sido
antecedida de separação judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá
efeito imediato, obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças
estrangeiras no país. O Superior Tribunal de Justiça, na forma de seu regimento interno,
CPF: 073.496.444-77

poderá reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de


homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a
produzir todos os efeitos legais. (Redação dada pela Lei nº 12.036, de 2009).

Contudo, com a Emenda Constitucional n.º 66/10, que suprimiu o fim do vínculo conjugal precedido
souza -- CPF:

necessariamente por separação judicial, não há mais que se falar em prazo, nos termos da jurisprudência do
Superior Tribunal de Justiça:
Marceli souza

SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. DIVÓRCIO. REQUISITOS FORMAIS.


Marceli

CUMPRIMENTO. AUSÊNCIA DE OFENSA À SOBERANIA NACIONAL E À ORDEM PÚBLICA.


DEFERIMENTO DO PEDIDO HOMOLOGATÓRIO.
1. Com a Emenda Constitucional 66, de 13 de julho de 2010, que instituiu o divórcio direto,
a homologação de sentença estrangeira de divórcio para alcançar eficácia plena e imediata
não mais depende de decurso de prazo, seja de um ou três anos, bastando a observância
das condições gerais estabelecidas na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(LINDB) e no Regimento Interno do STJ.
2. Uma vez atendidos os requisitos previstos no art. 15 da LINDB e nos arts. 216-A a 216-N
do RISTJ, bem como constatada a ausência de ofensa à soberania nacional, à ordem pública
e à dignidade da pessoa humana (LINDB, art. 17; RISTJ, art. 216-F), é devida a homologação
de sentença estrangeira.
3. Pedido de homologação deferido, estendendo seus efeitos ao pacto antenupcial, com a
homologação também da sentença estrangeira parcial, tal como pleiteado pelas partes.
(SEC 4.445/EX, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, CORTE ESPECIAL, julgado em 06/05/2015, DJe
17/06/2015)

Outro exemplo trazido da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é a dívida de jogo. Se antes
não se admitia a cobrança de dívida dessa natureza em solo nacional quando contraída no exterior,
atualmente o tribunal admite a cobrança, mesmo que a prática seja proibida no Brasil:

248
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

1. Na presente demanda está sendo cobrada obrigação constituída integralmente nos


Estados Unidos da América, mais especificamente no Estado de Nevada, razão pela qual
deve ser aplicada, no que concerne ao direito material, a lei estrangeira (art. 9º, caput,
LINDB).
2. Ordem pública é um conceito mutável, atrelado à moral e a ordem jurídica vigente em
dado momento histórico. Não se trata de uma noção estanque, mas de um critério que deve
ser revisto conforme a evolução da sociedade.
3. Na hipótese, não há vedação para a cobrança de dívida de jogo, pois existe equivalência
entre a lei estrangeira e o direito brasileiro, já que ambos permitem determinados jogos de
azar, supervisionados pelo Estado, sendo quanto a esses, admitida a cobrança.
4. O Código Civil atual veda expressamente o enriquecimento sem causa. Assim, a matéria
relativa à ofensa da ordem pública deve ser revisitada sob as luzes dos princípios que regem
as obrigações na ordem contemporânea, isto é, a boa-fé e a vedação do enriquecimento
sem causa.
5. Aquele que visita país estrangeiro, usufrui de sua hospitalidade e contrai livremente
obrigações lícitas, não pode retornar a seu país de origem buscando a impunidade civil. A
lesão à boa-fé de terceiro é patente, bem como o enriquecimento sem causa, motivos esses
capazes de contrariar a ordem pública e os bons costumes.
6. A vedação contida no artigo 50 da Lei de Contravenções Penais diz respeito à exploração
de jogos não legalizados, o que não é o caso dos autos, em que o jogo é permitido pela
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legislação estrangeira. (REsp 1628974/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,
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TERCEIRA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 25/08/2017)

QUESTÕES
266. (TRF - 3ª REGIÃO - 2018 - TRF - 3ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Consoante ensinamentos da
doutrina, na seara do Direito Internacional Privado, sabe-se que as regras de conexão estabelecem qual o
direito aplicável às diversas situações jurídicas conectadas a mais de um sistema legal, após a necessária
qualificação e em determinadas situações pode ocorrer o fenômeno denominado reenvio. Avalie, a seguir,
CPF: 073.496.444-77

as seguintes assertivas e, depois, expresse sua convicção:


I – O processo de qualificação, ou de classificação, que leva ao elemento de conexão, considera um de três
diferentes aspectos: o sujeito, o objeto ou o ato jurídico.
souza -- CPF:

II – Como exemplos de regras de conexão, podemos citar: lex loci solutionis (lei do local onde as obrigações
ou a obrigação principal do contrato, deve ser cumprida); lex damni (lei do local onde se manifestaram as
Marceli souza

consequências do ato ilícito, para reger a obrigação de indenizar); lex monetae (lei do país em cuja moeda a
Marceli

dívida ou outra obrigação legal é expressa); lei mais favorável, descrita como a lei mais benéfica em situações
específicas.
III – A lei qualificadora não coincide, necessariamente, com a lei aplicável.
IV – O reenvio pode ocorrer em dois graus; em primeiro grau, quando um país nega competência à sua lei
em favor de outro país, que, a seu turno, também nega competência à sua lei, configurando uma recusa
recíproca; em segundo grau, o reenvio pode ocorrer quando a lei do país” A” manda aplicar a lei do país “B”,
e a lei do país “B” determina que se aplique a lei do país “C”.
a) Todas as assertivas estão corretas.
b) Apenas as assertivas I, II e IV estão corretas.
c) Apenas as assertivas I, III e IV estão corretas.
d) A assertiva I é a única correta.
267. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Assinale a opção correta de
acordo com as normas de direito internacional privado (DIPr).
a) Na hipótese de uma fábrica situada na fronteira entre dois países explodir, por negligência ou
imprudência, e destruir propriedades situadas para além do Estado onde se localiza, deve-se utilizar como
elemento de conexão o lugar da conduta.

249
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

b) No DIPr, a qualificação, que significa determinar a natureza do fato ou instituto para o fim de enquadrá-
lo em uma categoria jurídica existente, se relaciona às obrigações, devendo-se aplicar a lei do país em que se
constituírem.
c) No DIPr, considera-se questão prévia a delimitação da competência do juízo.
d) No caso de uma norma jurídica estipular como formas alternativas de regência de atos entre vivos a lei
do lugar de celebração do ato, a do lugar que regula a substância do ato e a lei nacional dos contraentes (se
for comum), aplicar-se-á o elemento de conexão que indicar a norma mais favorável à validade formal do
ato.
e) Para o direito brasileiro, na hipótese de um domiciliado no Brasil e uma domiciliada na Argentina vierem
a se casar e estabelecer como domicílio comum primeiro o Brasil e depois a Argentina, o regime de bens será
regulado pela legislação argentina.
268. (MPF - 2015 - PGR - Procurador da República) Assinale a alternativa correta:
a) De acordo com a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, para qualificar os bens imóveis e
regular as relações a eles concernentes, utiliza-se a lei do domicílio do proprietário.
b) A Convenção Interamericana sobre Normas Gerais de Direito Internacional Privado prevê que as
questões prévias, preliminares ou incidentes que surjam em decorrência de uma questão principal não
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devem necessariamente ser resolvidas de acordo com a lei que regula esta última.
c) De acordo com a Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro, admite-se o reenvio até o segundo
grau, salvo se o direito estrangeiro escolhido pelo reenvio for contrário a ordem pública doméstica.
d) Conforme o Código Bustamante (Convenção de Direito Internacional Privado, 1928), a lei de regência
do estatuto pessoal é a lei do domicílio da pessoa física, sem exceção.
269. (CESPE / CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Haverá reenvio se o direito
CPF: 073.496.444-77

internacional privado do país A indicar o direito do país B como aplicável ao caso, sendo que o direito
internacional privado do país B indica, na mesma hipótese, a aplicação de seu próprio direito material
nacional.
270. (CESPE / CEBRASPE - 2012 - AGU - Advogado da União) A aquisição e a exploração comercial de
souza -- CPF:

navios e aeronaves regem-se pela lei do local onde tenha sido efetuado o registro dos direitos de propriedade
Marceli souza

sobre a coisa.
Marceli

271. (CESPE / CEBRASPE - 2012 - AGU - Advogado da União) O reenvio é proibido pela Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro.
272. (CESPE / CEBRASPE - 2011 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal) Mohamed, filho concebido fora do
matrimônio, requereu, na justiça brasileira, pensão alimentícia do pai, Said, residente e domiciliado no Brasil.
Said negou o requerido e não reconheceu Mohamed como filho, alegando que, perante a Tunísia, país no
qual ambos nasceram, somente são reconhecidos como filhos os concebidos no curso do matrimônio. A
partir dessa situação hipotética, assinale a opção correta à luz da legislação brasileira de direito internacional
privado.
a) A reserva da ordem pública não está expressa na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
b) O juiz, ao julgar a referida relação jurídica, deve obedecer à lei da Tunísia.
c) Nesse caso, não se aplicam normas de ordem pública, pois se trata de relação jurídica de direito
internacional privado, e não, de direito internacional público.
d) O juiz não deverá aplicar, nessa situação, o direito estrangeiro.
e) A lei brasileira assemelha-se à da Tunísia, razão pela qual esta deverá ser aplicada.
273. (TRF - 4ª REGIÃO - 2009 - TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal) Dadas as assertivas abaixo, assinalar a
alternativa correta.

250
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

I. Dá-se reenvio de 3º grau no caso de conflito de regras de Direito Internacional que envolva quatro países.
II. Hipótese comum de conflito de regras de Direito Internacional ocorre quanto ao foro competente para os
inventários e partilhas de bens situados no Brasil, pertencentes a estrangeiro.
III. São exemplos de regras de conexão ou elementos de conexão a lex patriæ (da nacionalidade), a lex loci
actus (do local da realização do ato jurídico), a lex voluntatis (escolhida pelos contratantes), a lex loci
celebrationis (do local da celebração do matrimônio).
IV. Para regular as relações concernentes aos bens, segundo as normas brasileiras de Direito Internacional,
aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados.
a) Está correta apenas a assertiva II.
b) Estão corretas apenas as assertivas I e III.
c) Estão corretas apenas as assertivas II e IV.
d) Estão corretas apenas as assertivas I, III e IV.
274. (CESPE / CEBRASPE - 2010 - DPU - Defensor Público Federal) A regra geral, ante o conflito de leis no
espaço, é a aplicação do direito pátrio, empregando-se o direito estrangeiro apenas excepcionalmente,
quando isso for, expressamente, determinado pela legislação interna de um país.
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6. DIREITO PROCESSUAL CIVIL INTERNACIONAL

6.1. Introdução

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 673) explica que o Direito Processual Civil Internacional
é o conjunto de preceitos que visa regular a aplicação das normas do Direito Internacional Privado. Se o
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direito internacional privado busca identificar a legislação aplicável em caso de conflito de leis no espaço, o
direito processual civil internacional identifica o juízo competente para o julgamento do feito.
Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 544) apontam que, assim como as normas
relacionadas à condição jurídica do estrangeiro, as normas de fixação de competência são diretas e
souza -- CPF:

unilaterais, devendo ser aplicadas ex officio pelo magistrado, quando da análise de sua própria competência
(princípio do kompetenz-kompetenz).
Marceli souza

Em regra, as normas de processo aplicáveis no Direito Internacional Privado são as da lex fori.
Marceli

Contudo, como bem destaca Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 255), é possível a relativização desse critério
por meio de tratados internacionais
Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 549) destacam que as fontes formais do direito
processual civil internacional são basicamente o Código de Processo Civil, a Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro e tratados internacionais (multilaterais ou bilaterais) ratificados pelo Brasil. Um exemplo é
a Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, de Haia, que fixa a competência
do juiz da residência habitual da criança que tenha sido transferida ilicitamente de Estado:

Artigo 12. Quando uma criança tiver sido ilicitamente transferida ou retida nos termos do
Artigo 3 e tenha decorrido um período de menos de 1 ano entre a data da transferência ou
da retenção indevidas e a data do início do processo perante a autoridade judicial ou
administrativa do Estado Contratante onde a criança se encontrar, a autoridade respectiva
deverá ordenar o retorno imediato da criança.
A autoridade judicial ou administrativa respectiva, mesmo após expirado o período de 1 ano
referido no parágrafo anterior, deverá ordenar o retorno da criança, salvo quando for
provado que a criança já se encontra integrada no seu novo meio.
Quando a autoridade judicial ou administrativa do Estado requerido tiver razões para crer
que a criança tenha sido levada para outro Estado, poderá suspender o processo ou rejeitar
o pedido para o retomo da criança.

251
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Sobre o tema, o STJ decidiu, inclusive, pela suspensão de eventual ação de guarda, para a preservação
do juiz natural:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO PROPOSTA NA JUSTIÇA


FEDERAL COM BASE NA CONVENÇÃO DE HAIA SOBRE ASPECTOS CIVIS DO SEQUESTRO
INTERNACIONAL DE CRIANÇAS. AÇÃO DE GUARDA E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS
PROPOSTA NA JUSTIÇA ESTADUAL. INEXISTÊNCIA DE DECISÕES CONFLITANTES.
INEXISTÊNCIA DE CONEXÃO. HIPÓTESE DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA.
1. Na ação de busca e apreensão em curso na Justiça Federal, cinge-se o julgador ao exame
da ocorrência de transferência e retenção ilícitas de criança e de eventual motivo para a
recusa da restituição.
2. A decisão sobre o fundo do direito de guarda e visitação é do juiz de família.
3. A cooperação internacional estabelecida pela Convenção de Haia tem por escopo repor
à criança seu statu quo, preservando o juiz natural, assim entendido o juiz do local de sua
residência habitual, para decidir sobre a guarda e regulamentação de visitas.
4. Inexiste conexão entre a ação de busca e apreensão e a ação de guarda e regulamentação
de visitas, senão, apenas, prejudicialidade externa, a recomendar a suspensão desta última.
5. Conflito de competência não conhecido.
(CC 132.100/BA, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
25/02/2015, DJe 14/04/2015)
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6.2. Aplicação do Direito Estrangeiro

As normas do direito estrangeiro poderão ser aplicadas no Brasil de forma direta ou indireta. Na
aplicação direta, o juiz as utilizará como fundamento da decisão. Na indireta, o juiz nacional profere a decisão
que, após seu trânsito em julgado, será executada em Estado estrangeiro, em razão das circunstâncias
previstas na área do Direito Internacional.
CPF: 073.496.444-77

Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 266) ensina que existem três teorias acerca da aplicação do direito
estrangeiro no Brasil:

• Aplicação ex officio: com base no princípio iura novit curia, o juiz deve, sempre, aplicar o direito
souza -- CPF:

estrangeiro nos casos previstos na legislação, independentemente de provocação das partes. No


entanto, a adoção dessa teoria não impede que as partes cooperem para sua aplicação no caso
Marceli souza

concreto.
• Aplicação por provocação: cabe apenas às partes a alegação e a prova da existência do direito
Marceli

estrangeiro, não podendo o magistrado agir de ofício.


• Aplicação moderada: compete ao juiz ou às partes, por iniciativa própria, buscar a aplicação do
direito estrangeiro.

Sobre o tema, os arts. 14 da LINDB e 376 do CPC dispõem o seguinte:

LINDB, Art. 14. Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca
prova do texto e da vigência.

CPC, Art. 376. A parte que alegar direito municipal, estadual, estrangeiro ou
consuetudinário provar-lhe-á o teor e a vigência, se assim o juiz determinar.

Para a maioria da doutrina, compete ao juiz, de ofício, a aplicação da legislação estrangeira. Caso a
legislação estrangeira seja invocada pela parte, compete-lhe a prova da existência e vigência.
Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 675) destaca que a verificação e a prova do direito
estrangeiro são regidas pela lex fori.
O Brasil é parte da Convenção Interamericana sobre Prova e Informação acerca do Direito
Estrangeiro, de 1979 (Convenção de Montevidéu), que regula a cooperação entre os Estados americanos

252
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

para a obtenção de elementos de prova e de informação a respeito das respectivas ordens jurídicas. Segundo
o artigo 2 do tratado, as autoridades competentes dos Estados-partes proporcionarão, aos entes estatais
interessados, os elementos de prova ou de informação que solicitarem sobre o texto, vigência, sentido e
alcance legal de normas de seu ordenamento jurídico.
Nos termos do artigo 3 da Convenção, a cooperação será feita por meios idôneos de prova, dentre
os quais estão:

• a prova documental: consistente em cópias autenticadas de textos legais em vigor ou


precedentes judiciais;
• a prova pericial: composta por pareceres de advogados ou de especialistas na matéria; e
• as informações do Estado requerido sobre o texto: vigência, sentido e alcance legal do seu
Direito.

Ainda nos termos do artigo 6 da Convenção de Montevidéu, o Estado requerente não é obrigado a
aplicar a norma.
O Brasil é também parte do Protocolo de Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil,
Comercial, Trabalhista e Administrativa (Protocolo de Las Leñas, de 1996), que regula, em seus artigos 18 a
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30, a verificação e a prova do Direito estrangeiro entre os Estados-membros do Mercosul.


O Protocolo de Las Leñas prevê que os Estados-Partes, por meio das “Autoridades Centrais”,
fornecerão mutuamente informações em matéria civil, comercial, trabalhista, administrativa e de direito
internacional privado, sem despesa alguma, desde que não se oponham às disposições de sua ordem pública.
Tais informações poderão também ser prestadas por via diplomática.
Destaca-se, que, também pelo Protocolo de Las Leñas, o Estado que fornece as informações sobre o
CPF: 073.496.444-77

sentido e alcance legal de suas normas não pode ser responsabilizado pela opinião emitida, nem ficará
obrigado a aplicar o seu direito segundo sua resposta. Por outro lado, o Estado que as receber também não
estará obrigado a aplicar a norma estrangeira segundo o conteúdo da resposta recebida:

Informações do Direito Estrangeiro


souza -- CPF:

Artigo 28. As Autoridades Centrais dos Estados Partes fornecer-se-ão mutuamente, a título
de cooperação judicial, e desde que não se oponham às disposições de sua ordem pública,
Marceli souza

informações em matéria civil, comercial, trabalhista, administrativa e de direito


internacional privado, sem despesa alguma.
Marceli

Artigo 29. A informação a que se refere o artigo anterior poderá também ser prestada
perante a jurisdição do outro Estado, por meio de documentos fornecidos pelas autoridades
diplomáticas ou consulares do Estado Parte de cujo direito se trata.

Artigo 30. O Estado que fornecer as informações sobre o sentido do alcance legal de seu
direito não será responsável pela opinião emitida, nem estará obrigado a aplicar seu direito,
segundo a resposta fornecida.
O Estado que receber as citadas informações não estará obrigado a aplicar, ou fazer aplicar,
o direito estrangeiro segundo o conteúdo da resposta recebida.

Verificada e provada a existência da norma estrangeira, é possível haver dúvidas quanto a sua
interpretação. Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 676) destaca que o juiz deve aplicar a norma do
modo mais completo possível, e, para tanto, deve seguir a doutrina e a jurisprudência estrangeiras, de forma
a aplicar a norma de acordo com o ordenamento de origem.
É possível que o direito estrangeiro seja adaptado às circunstâncias nacionais, quando um instituto
que não existe em âmbito nacional acabe sendo aplicado de forma semelhante a um existente, como no caso
do desquite e do divórcio (quando não autorizado pela legislação nacional) (PORTELA, 2015, p. 677).

253
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

O direito estrangeiro, quando aplicável, equipara-se à legislação ordinária, e em razão disso, pode
ser objeto de controle de constitucionalidade incidental (RECHSTEINER, 2018, p. 270).
Além da hipótese de não aplicação por incompatibilidade com a Constituição, as normas estrangeiras
não serão aplicadas quando ofenderem a ordem pública, a soberania nacional e os bons costumes, nos
termos do art. 17 da LINDB:

Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de
vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem
pública e os bons costumes.

A instituição desconhecida (ou instituto desconhecido) ocorre quando um determinado instituto


regulado pelo ordenamento estrangeiro não tem previsão na ordem nacional. Como já aludido, para
resolução de tal hipótese, é comum recorrer à adaptação, empregando uma norma interna semelhante,
desde que a ordem pública não seja violada (PORTELA, 2015, p. 678).
Entende-se por lei imperfeita aquela que prevê ou a aplicação do Direito interno ou a do Direito
estrangeiro, como o art. 10, § 1º da LINDB que dispõe:

Art. 10 (...)
§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira
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em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que


não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus. (Redação dada pela Lei nº 9.047, de
18.5.1995)

6.3. A prova dos fatos ocorridos no exterior

Acerca da prova dos fatos ocorridos no exterior, a LINDB dispõe:


CPF: 073.496.444-77

Art. 13. A prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar,
quanto ao ônus e aos meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas
que a lei brasileira desconheça.

Assim, Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 688) explica que o ônus da prova e o modo de
souza -- CPF:

produzi-la são regidos pela norma do local onde ocorreu o fato cuja ocorrência pretende-se provar, de
Marceli souza

acordo dom o critério lex loci actus ou, simplesmente, lex loci. Entretanto, a lex fori brasileira não permite
meio de prova não autorizados pelo ordenamento brasileiro.
Marceli

Nos termos do art. 192 do CPC, os documentos redigidos em língua estrangeira devem ser
acompanhados de versão na língua portuguesa, por via diplomática, pela autoridade central ou por tradutor
juramentado:

Art. 192. Em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso da língua portuguesa.
Parágrafo único. O documento redigido em língua estrangeira somente poderá ser juntado
aos autos quando acompanhado de versão para a língua portuguesa tramitada por via
diplomática ou pela autoridade central, ou firmada por tradutor juramentado.

6.4. Competência internacional

Luiz Guilherme Marinoni (2021, ebook, p. RB-2.2) destaca que o Código de 1973 fazia a distinção
entre a competência internacional e competência interna. Contudo, tal classificação era equivocada, na
medida em que tais normas diziam respeito às relações entre a jurisdição brasileira e as jurisdições
estrangeiras. Portanto, não traziam normas de competência, mas limites da jurisdição, e não tinham âmbito
internacional, pois delimitavam os limites nacionais do exercício da jurisdição.
O atual código corrigiu parcialmente os equívocos do diploma anterior, mantendo apenas a alusão à
competência.

254
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

6.4.1. “Competência” exclusiva

O art. 23 do CPC dispõe que:

Art. 23. Compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra:
I - conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil;
II - em matéria de sucessão hereditária, proceder à confirmação de testamento particular e
ao inventário e à partilha de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de
nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional;
III - em divórcio, separação judicial ou dissolução de união estável, proceder à partilha de
bens situados no Brasil, ainda que o titular seja de nacionalidade estrangeira ou tenha
domicílio fora do território nacional.

Cassio Scarpinella Bueno (2020, p. 443) destaca que eventual decisão de juízo estrangeiro sobre a
matéria prevista no artigo 23 não poderá ser homologada em território nacional.
Sobre o dispositivo, merece atenção o inciso III, que, em consonância com a jurisprudência formada
à época do CPC de 1973, permite às partes acordarem entre si sobre o destino de imóveis situados no Brasil,
vendando, contudo, que o juízo estrangeiro determine a partilha dos bens situados no Brasil ou disponha
sobre eles (BUENO, 2020, p. 443).
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6.4.2. “Competência” concorrente ou cumulativa

Os arts. 21 e 22 do Código de Processo Civil enumeram os casos em que a ação pode ser ajuizada
tanto no Brasil quanto no exterior, dando-se a jurisdição cumulativa ou concorrente:

Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
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II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;


III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.
Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a
pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.
souza -- CPF:

Art. 22. Compete, ainda, à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações:
I - de alimentos, quando:
Marceli souza

a) o credor tiver domicílio ou residência no Brasil;


b) o réu mantiver vínculos no Brasil, tais como posse ou propriedade de bens, recebimento
Marceli

de renda ou obtenção de benefícios econômicos;


II - decorrentes de relações de consumo, quando o consumidor tiver domicílio ou residência
no Brasil;
III - em que as partes, expressa ou tacitamente, se submeterem à jurisdição nacional.

A sentença proferida por juízo estrangeiro será eficaz no território brasileiro, desde que seja
homologada pelo STJ.
No caso da competência internacional concorrente, a mera propositura de demanda perante tribunal
estrangeiro a respeito de causa que poderia ser conhecida pela jurisdição brasileira não induz litispendência,
nem impede que a autoridade nacional a conheça, ou de causas com ela conexas:

Art. 24. A ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta
a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas,
ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em
vigor no Brasil.
Parágrafo único. A pendência de causa perante a jurisdição brasileira não impede a
homologação de sentença judicial estrangeira quando exigida para produzir efeitos no
Brasil.

255
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Da dicção legal, o termo para o afastamento da litispendência é a perfectibilização da homologação


da sentença estrangeira pelo STJ. Portanto, homologada a sentença estrangeira, a demanda não poderá ser
julgada em âmbito interno.
Por outro lado, enquanto não advinda a coisa julgada no processo nacional, é possível a homologação
da sentença estrangeira (CPC, art. 24, parágrafo único).

6.4.3. Competência internacional nos tratados

A fixação da competência pode ser feita mediante tratados internacionais, nos termos da parte final
do art. 24 do CPC.
O Protocolo de Buenos Aires sobre Jurisdição Internacional em Matéria Contratual, no âmbito do
Mercosul, foi assinado em 1994 e ratificado pelo Decreto n.º 2.095/96.
O protocolo estabelece normas específicas de competência internacional aplicadas a contenciosos
envolvendo contratos internacionais de natureza civil ou comercial celebrados entre particulares com
domicílio ou sede social em diferentes Estados-Partes do Mercosul, ou quando pelo menos uma das partes
do contrato tenha seu domicílio em um Estado do Mercosul. Para a aplicação do Protocolo, é necessário um
acordo de eleição de foro e que haja uma conexão razoável da causa com o foro indicador.
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O Protocolo não será aplicado nos casos de falência, recuperação judicial, direito de família e
sucessão, contrato de trabalho, causas de natureza de seguridade social, administrativa, consumo,
transportes, seguros e direitos reais.
O artigo 4 do Protocolo define o Estado-parte competente para a resolução dos conflitos em matéria
cível ou comercial:

Artigo 4
CPF: 073.496.444-77

1. Nos conflitos que decorram dos contratos internacionais em matéria civil ou comercial
serão competentes os tribunais do Estado-Parte em cuja jurisdição os contratantes tenham
acordado submeter-se por escrito, sempre que tal ajuste não tenha sido obtido de forma
abusiva.
2. Pode-se acordar, igualmente, a eleição de tribunais arbitrais.
souza -- CPF:

A validade e os efeitos da referida cláusula de eleição são regidos pelas normas dos Estados que
Marceli souza

teriam jurisdição para a resolução da lide:


Marceli

Artigo 5
1. O acordo de eleição de jurisdição pode realizar-se no momento da celebração do
contrato, durante sua vigência ou uma vez suscitado o litígio.
2. A validade e os efeitos de eleição de foro serão regidos pelo direito dos Estados-Partes
que teriam jurisdição de conformidade com o estabelecido no presente Protocolo.
3. Em todo caso, será aplicado o direito mais favorável de validade do acordo.

Na ausência de acordo, a escolha do foro caberá ao autor, sendo-lhe facultado escolher entre o juízo
do cumprimento do contrato; do domicílio do demandado ou de seu domicílio ou sede social, desde que seja
esse o local da prestação, como determina o artigo. 7 do Protocolo:

Artigo 7
Na ausência de acordo, têm jurisdição à escolha do autor:
a) o juízo do lugar de cumprimento do contrato;
b) o juízo do domicílio do demandado;
c) o juízo de seu domicílio ou sede social, quando demonstrar que cumpriu sua prestação.

Acerca de conflitos societários, o local competente é o da sede principal da administração, nos


termos do artigo 10:

256
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Artigo 10. São competentes para conhecer dos litígios que surjam entre os sócios sobre
questões societárias, os juízes da sede principal da administração.

Acerca das sociedades que celebrem contratos em Estados-partes diversos do local de sua sede, o
Protocolo dispõe:

Artigo 11. As pessoas jurídicas com sede em um Estado-Parte, que celebrem contratos em
outro Estado-Parte, podem ser demandadas perante os juízes deste último.

Havendo pluralidade de demandados, o artigo 12 do tratado preceitua:

Artigo 12
1. Se vários forem os demandados, terá jurisdição o Estado-Parte do domicílio de qualquer
deles.
2. As demandas sobre obrigações de garantia de caráter pessoal ou para a intervenção de
terceiros podem ser propostas perante o tribunal que estiver conhecendo a demanda
principal.

Por fim, o artigo 13 do Protocolo prevê a situação de reconvenção e assim está redigido:

Reconvenção
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Artigo 13. Se a reconvenção se fundamentar em ato ou em fato que serviu de base para a
demanda principal, terão jurisdição para conhecê-la os juízes que intervierem na demanda
principal.

6.4.4. Forum shopping

O Código de Processo Civil prevê a possibilidade de exclusão da jurisdição nacional quando houver
previsão expressa nos contratos transnacionais:
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Art. 25. Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da


ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato
internacional, arguida pelo réu na contestação.
§ 1º Não se aplica o disposto no caput às hipóteses de competência internacional exclusiva
souza -- CPF:

previstas neste Capítulo.


§ 2º Aplica-se à hipótese do caput o art. 63, §§ 1º a 4º.
Marceli souza

Nesse caso, a matéria deverá ser arguida pelo réu em sede de contestação. Caso não o faça, presume-
Marceli

se a anuência à jurisdição nacional para o julgamento do feito. Sobre o tema, Cassio Scarpinella Bueno explica
ainda que:

A remissão ao art. 63, feita pelo § 2º do art. 25, permite que as regras relativas à eleição de
foro sejam aplicadas à hipótese. Assim, a eleição de foro só produz efeito quando constar
de instrumento escrito e aludir expressamente a determinado negócio jurídico. Cabe
acrescentar, diante do caput do dispositivo, que se deve tratar de contrato internacional. O
foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes. Antes da citação, a cláusula de
eleição de foro pode ser reputada ineficaz de ofício pelo juízo, se abusiva, determinando a
remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu. Cabe ao réu, citado, alegar a
abusividade da cláusula de eleição de foro na contestação. Se não o fizer, perderá o direito
de suscitar a questão em virtude da preclusão (BUENO, 2020, p. 444).

Sempre importante destacar que a escolha do foro não pode se dar nas hipóteses da jurisdição
exclusiva do Estado brasileiro.

QUESTÕES
275. (CESPE / CEBRASPE – 2007 – TST) Um programa de TV, na Inglaterra, fez sucesso ao listar algumas
das leis mais bizarras do mundo. A vencedora foi uma norma de Ohio, nos Estados Unidos, que proíbe
embriagar peixes. (Época, 12/11/2007, p. 24.) Considere-se que, desconhecendo essa inusitada lei, um

257
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

cidadão brasileiro tenha ido pescar com amigos no mencionado estado americano e acabou por
“embebedar” algumas trutas. Descoberto o fato pelas autoridades locais, ele foi condenado ao pagamento
de multa de dez mil dólares. O processo correu à revelia, pois, a essa altura, o réu já havia retornado ao Brasil.
A sentença proferida pela corte americana precisa ser homologada, condição necessária para que qualquer
sentença estrangeira possa produzir efeitos e ser executada no Brasil.
276. (TRF - 2ª Região - 2018 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) O art. 963, VI, do Código de
Processo Civil exige, para que uma sentença estrangeira seja homologada, que não haja ofensa à ordem
pública. Qual o alcance desse requisito?
I- A sentença estrangeira deve ser idêntica àquela que seria proferida no Brasil, caso o litígio fosse submetido
ao Judiciário brasileiro.
II- A sentença estrangeira, quanto ao mérito, deve ser compatível com princípios fundamentais do direito
brasileiro.
III- A sentença estrangeira, quanto ao seu procedimento no exterior, deve ser compatível com o devido
processo legal.
IV- A sentença estrangeira deve ter considerado a legislação brasileira sobre o assunto.
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a) Somente a alternativa I está correta


b) As alternativas I e IV estão corretas.
c) Somente a alternativa II está correta.
d) Somente a alternativa III está correta.
e) As alternativas II e III estão corretas.
277. (MPU - 2017 - PGR - Procurador da República) Dentre os enunciados abaixo, somente estão corretos:
CPF: 073.496.444-77

I - A qualificação consiste na atividade de classificação jurídica dos fatos transnacionais, que antecede a
própria escolha da lei e determinação de jurisdição.
II - Os fatos e atos realizados no estrangeiro precisam, para serem provados, obedecer necessariamente a
souza -- CPF:

todas as formalidades e restrições da lei brasileira.


III - De acordo com a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, caso a obrigação se destine a ser
Marceli souza

executada no Brasil, deve-se usar a lei estrangeira do local da constituição no tocante aos requisitos
Marceli

extrínsecos do ato, e ainda a lei brasileira no tocante à forma essencial.


IV - O fundamento do reenvio consiste na vedação de se utilizar o direito material de um Estado cujo juiz,
hipoteticamente, não o utilizaria na regulação de determinado fato transnacional.
a) todos estão corretos.
b) I e III.
c) II e IV.
d) I, III e IV.
278. (TRF - 3ª REGIÃO - 2018 - TRF - 3ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Cuidando-se dos efeitos civis do
sequestro internacional de crianças, de acordo com e nos estritos termos da convenção concluída na cidade
de Haia, em 25/10/1980, considere as seguintes assertivas:
I – Qualquer decisão que, baseada nos termos da Convenção, determine o retorno da criança, não afeta os
fundamentos do direito de guarda.
II – Se restar provado que a criança já está integrada no seu novo meio, por mais de um ano, a autoridade
judicial ou administrativa não está obrigada a determinar o seu retorno.

258
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

III – Decisão fundamentada quanto ao direito de guarda pode servir de base para justificar a recusa de retorno
da criança, nos termos da Convenção, podendo as autoridades judiciais ou administrativas do Estado
requerido levar em consideração os motivos dessa decisão na aplicação da Convenção.
IV – É lícita a exigência de prestação de caução ou depósito para garantir o pagamento dos custos e despesas
relativas aos procedimentos previstos na convenção, podendo o interessado, se o caso, alegar
impossibilidade de arcar com tais gastos, caso em que poderá ser eximido de tais pagamentos.
a) Todas as assertivas são corretas.
b) A assertiva III é a única correta.
c) As assertivas I e II são as únicas corretas.
d) As assertivas III e IV são as únicas corretas.

7. A COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL

7.1. Introdução

No curso de processos em trâmite em um determinado Estado, é possível que a prática de alguns


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atos venha a ocorrer em outro Estado. Para que tais atos possam ocorrer é necessário que os Estados definam
regras para seu exercício, por meio da cooperação internacional. Nesse sentido, Cassio Scarpinella Bueno
define a cooperação internacional nos seguintes termos:

Por “cooperação internacional” deve ser entendido o conjunto de técnicas que permitem a
dois Estados colaborar entre si visando ao cumprimento de medidas jurisdicionais
requeridas por um deles fora de seus territórios. (BUENO, 2020, p. 444)

O art. 26 do CPC dispõe sobre as normas gerais da cooperação internacional:


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Art. 26. A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de que o Brasil faz parte
e observará:
I - o respeito às garantias do devido processo legal no Estado requerente;
souza -- CPF:

II - a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil,


em relação ao acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se assistência
judiciária aos necessitados;
Marceli souza

III - a publicidade processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira
Marceli

ou na do Estado requerente;
IV - a existência de autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de
cooperação;
V - a espontaneidade na transmissão de informações a autoridades estrangeiras.
§ 1º Na ausência de tratado, a cooperação jurídica internacional poderá realizar-se com
base em reciprocidade, manifestada por via diplomática.
§ 2º Não se exigirá a reciprocidade referida no § 1º para homologação de sentença
estrangeira.
§ 3º Na cooperação jurídica internacional não será admitida a prática de atos que
contrariem ou que produzam resultados incompatíveis com as normas fundamentais que
regem o Estado brasileiro.
§ 4º O Ministério da Justiça exercerá as funções de autoridade central na ausência de
designação específica.

Como se vê, no Brasil, a matéria será inicialmente pelos tratados ratificados pelo país. Em âmbito
global, o Brasil é parte dos seguintes tratados:

• Convenção para a Repressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio e Protocolo Final de 1950 –


Decreto n.º 46.981/1959;
• Convenção sobre Prestação de Alimentos no Estrangeiro – (Convenção de Nova Iorque) de 1959
– Decreto n.º 56.826/1965;

259
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

• Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças (Convenção de Haia)


de– Decreto n.º 3.413/2000;
• Convenção da UNIDROIT sobre Bens Culturais Furtados ou Ilicitamente Exportados – Decreto n.º
3.166/1999.

Já no plano interamericano, o Brasil participa dos seguintes instrumentos internacionais:

• Protocolo sobre Uniformização do Regime Legal das Procurações Utilizadas no Exterior, de


17/2/1940;
• Convenção Interamericana sobre cartas Rogatórias de 1975 – Decreto n.º 1.899/96 e seu
Protocolo adicional (Decreto n.º 2.022/1996)
• Convenção Interamericana sobre o Regime Legal das Procurações a serem utilizadas no Exterior
de 1975 – Decreto n.º 1.213/1994;
• Convenção Interamericana sobre Prova e Informação acerca do Direito Estrangeiro, de 1979 –
Decreto n.º 1.925/1996;
• Convenção Interamericana sobre Obrigação Alimentar, de 1989 – Decreto n.º 2.428/1997; e
• Convenção Interamericana sobre a Restituição Internacional de Menores, de 1989 – Decreto n.º
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1.212/1994.

No Mercosul, o principal ato internacional na matéria é o Protocolo de cooperação e Assistência


Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa, de 1992 (Protocolo de Las Leñas) –
Decreto n.º 2.067/96.
Além desses tratados multilaterais, o Brasil tem tratados bilaterais com diversos Estados.
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De regra, a autoridade central será o Ministério da Justiça, por meio do Departamento de


Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). Contudo, é possível que algum tratado
traga previsão expressa, como no caso da Convenção sobre Prestação de Alimentos no Estrangeiro, de Nova
York, que prevê o Procurador-Geral da República como autoridade central.
souza -- CPF:

7.2. Objeto da cooperação internacional


Marceli souza

O art. 27 do CPC traz o rol dos atos processuais que serão objeto da cooperação internacional:
Marceli

Art. 27. A cooperação jurídica internacional terá por objeto:


I - citação, intimação e notificação judicial e extrajudicial;
II - colheita de provas e obtenção de informações;
III - homologação e cumprimento de decisão;
IV - concessão de medida judicial de urgência;
V - assistência jurídica internacional;
VI - qualquer outra medida judicial ou extrajudicial não proibida pela lei brasileira.

Da dicção do inciso IV do dispositivo, verifica-se que o rol do artigo é exemplificativo, sendo


permitidos todos os atos, de natureza judicial ou extrajudicial não proibidos pela legislação nacional.

7.3. Auxílio-direto

O auxílio-direto é a técnica de cooperação internacional na qual o ato jurídico é praticado sem a


necessidade da participação do poder judiciário requerido para sua perfectibilização. Portanto, o ato será
praticado independentemente da expedição de carta rogatória, tendo por objeto não apenas a comunicação,
mas também a tomada de providências solicitadas entre Estados estrangeiros.

260
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 28. Cabe auxílio direto quando a medida não decorrer diretamente de decisão de
autoridade jurisdicional estrangeira a ser submetida a juízo de delibação no Brasil.

Art. 29. A solicitação de auxílio direto será encaminhada pelo órgão estrangeiro interessado
à autoridade central, cabendo ao Estado requerente assegurar a autenticidade e a clareza
do pedido.

O Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça prevê que, nas hipóteses de distribuição de
carta rogatória em que o objeto seja atinente ao auxílio direto, os autos serão encaminhados ao Ministério
da Justiça para as diligências necessárias:

Art. 216-O (...)


§ 2º Os pedidos de cooperação jurídica internacional que tiverem por objeto atos que não
ensejem juízo deliberatório do Superior Tribunal de Justiça, ainda que denominados de
carta rogatória, serão encaminhados ou devolvidos ao Ministério da Justiça para as
providências necessárias ao cumprimento por auxílio direto.

A comunicação no auxílio-direto será feita entre as autoridades centrais, independentemente da


participação de órgão judicial:

CPC, Art. 31. A autoridade central brasileira comunicar-se-á diretamente com suas
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congêneres e, se necessário, com outros órgãos estrangeiros responsáveis pela tramitação


e pela execução de pedidos de cooperação enviados e recebidos pelo Estado brasileiro,
respeitadas disposições específicas constantes de tratado.

Como já destacado, o auxílio-direto faz-se em atos que não estão dotados de reserva de jurisdição.
Porém, caso seja necessária a atuação judicial em decorrência de norma do ordenamento nacional, o CPC
prevê que compete à autoridade central nacional adotar as providências necessárias:
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Art. 32. No caso de auxílio direto para a prática de atos que, segundo a lei brasileira, não
necessitem de prestação jurisdicional, a autoridade central adotará as providências
necessárias para seu cumprimento.

Nessa hipótese, a autoridade central (Ministério da Justiça) remeterá o pedido para a AGU tomar as
souza -- CPF:

providências. Sendo o MP a autoridade central, competirá ao próprio órgão adotar as medidas judiciais
necessárias:
Marceli souza

Art. 33. Recebido o pedido de auxílio direto passivo, a autoridade central o encaminhará à
Marceli

Advocacia-Geral da União, que requererá em juízo a medida solicitada.


Parágrafo único. O Ministério Público requererá em juízo a medida solicitada quando for
autoridade central.

Por fim, a competência jurisdicional para os atos de auxílio-direto com necessidade de atuação
judicial será da justiça federal, nos termos do art. 34 do CPC:

Art. 34. Compete ao juízo federal do lugar em que deva ser executada a medida apreciar
pedido de auxílio direto passivo que demande prestação de atividade jurisdicional.

7.4. Carta rogatória

Beat Walter Rechsteiner (2018, p. 332) explica que a carta rogatória é o principal instrumento de
cooperação judiciária internacional. Também conhecida como “rogatória” ou litterae requisitoriales
(PORTELA, 2015, p. 698), trata-se de pedido feito por um Estado estrangeiro ao juiz nacional para a prática
de um ato processual.
Ela é, de regra, escrita no idioma da justiça rogada, admitindo-se, contudo, exceções de natureza
convencional (RECHSTEINER, 2018, p. 332).

261
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

O trâmite da rogatória se dá com base nas normas da lex fori, sendo, no Brasil, a LINDB, o art. 36 do
CPC e o Regimento Interno do STJ suas principais fontes:

Art. 36. O procedimento da carta rogatória perante o Superior Tribunal de Justiça é de


jurisdição contenciosa e deve assegurar às partes as garantias do devido processo legal.
§ 1º A defesa restringir-se-á à discussão quanto ao atendimento dos requisitos para que o
pronunciamento judicial estrangeiro produza efeitos no Brasil.
§ 2º Em qualquer hipótese, é vedada a revisão do mérito do pronunciamento judicial
estrangeiro pela autoridade judiciária brasileira.

Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 698) explica que o Estado rogado não está obrigado a
prestar a cooperação, principalmente quando o ato atende contra seu próprio ordenamento.
O autor destaca também que o Brasil presta a cooperação solicitada por Estado estrangeiro tanto
com fundamento em tratados como na garantia, expressa na rogatória recebida, de aplicação do princípio
da reciprocidade (PORTELA, 2015, p. 699).
A doutrina classifica as cartas rogatórias em dois tipos:
• Ativas: quando expedidas por autoridade judiciária do Brasil; e
• Passivas: quando recebidas por Estados estrangeiros.
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A carta rogatória ativa obedecerá, quanto à admissibilidade e ao modo de cumprimento, ao disposto


em eventual tratado. Na falta deste, deve a rogatória ser remetida à autoridade central estrangeira por via
diplomática, devidamente traduzida para a língua do país de destino, nos termos dos arts. 37 e 38 do CPC:

Art. 37. O pedido de cooperação jurídica internacional oriundo de autoridade brasileira


competente será encaminhado à autoridade central para posterior envio ao Estado
requerido para lhe dar andamento.
CPF: 073.496.444-77

Art. 38. O pedido de cooperação oriundo de autoridade brasileira competente e os


documentos anexos que o instruem serão encaminhados à autoridade central,
acompanhados de tradução para a língua oficial do Estado requerido.

Os requisitos para a confecção da carta rogatória ativa, no Direito interno brasileiro, estão previstos
souza -- CPF:

nos arts. 260, 261 e 338 do CPC:


Marceli souza

Art. 260. São requisitos das cartas de ordem, precatória e rogatória:


Marceli

I - a indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato;


II - o inteiro teor da petição, do despacho judicial e do instrumento do mandato conferido
ao advogado;
III - a menção do ato processual que lhe constitui o objeto;
IV - o encerramento com a assinatura do juiz.
§ 1º O juiz mandará trasladar para a carta quaisquer outras peças, bem como instruí-la com
mapa, desenho ou gráfico, sempre que esses documentos devam ser examinados, na
diligência, pelas partes, pelos peritos ou pelas testemunhas.
§ 2º Quando o objeto da carta for exame pericial sobre documento, este será remetido em
original, ficando nos autos reprodução fotográfica.
§ 3º A carta arbitral atenderá, no que couber, aos requisitos a que se refere o caput e será
instruída com a convenção de arbitragem e com as provas da nomeação do árbitro e de sua
aceitação da função.

Art. 261. Em todas as cartas o juiz fixará o prazo para cumprimento, atendendo à facilidade
das comunicações e à natureza da diligência.
§ 1º As partes deverão ser intimadas pelo juiz do ato de expedição da carta.
§ 2º Expedida a carta, as partes acompanharão o cumprimento da diligência perante o juízo
destinatário, ao qual compete a prática dos atos de comunicação.
§ 3º A parte a quem interessar o cumprimento da diligência cooperará para que o prazo a
que se refere o caput seja cumprido.

262
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 377. A carta precatória, a carta rogatória e o auxílio direto suspenderão o julgamento
da causa no caso previsto no art. 313, inciso V, alínea “b”, quando, tendo sido requeridos
antes da decisão de saneamento, a prova neles solicitada for imprescindível.
Parágrafo único. A carta precatória e a carta rogatória não devolvidas no prazo ou
concedidas sem efeito suspensivo poderão ser juntadas aos autos a qualquer momento.

Acerca da competência para a expedição de carta rogatória ao Brasil: é possível que Procuradoria de
Estado Estrangeiro requeira à autoridade judiciária brasileira o cumprimento de carta rogatória por si
expedida:

EMBARGOS DECLARATÓRIOS – OMISSÃO. Uma vez constatada omissão no julgamento


verificado, presente tratado de cooperação em matéria penal firmado pelo Brasil e pela
República Italiana – integrado à ordem jurídica nacional –, impõe-se o provimento dos
embargos de declaração, muito embora sem o alcance da eficácia modificativa,
reconhecendo-se que o Ministério Público italiano possui legitimidade para expedir carta
rogatória. (HC 87759 ED, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em
13/12/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-053 DIVULG 13-03-2012 PUBLIC 14-03-2012)

AGRAVO REGIMENTAL. CARTA ROGATÓRIA. COOPERAÇÃO JURÍDICA. BRASIL. ITÁLIA.


DILIGÊNCIAS. VÍCIOS FORMAIS. INEXISTENTES. QUEBRA SIGILO BANCÁRIO. SOBERANIA.
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ORDEM PÚBLICA. PARCIAL PROVIMENTO.


No Direito italiano a Magistratura e o Ministério Público convivem em uma só estrutura
administrativa.
A Procuradoria da República junto ao Tribunal de Parma tem legitimidade para solicitar
cooperação brasileira em investigações.
O Ministério Público Italiano não tem competência para determinar a quebra de sigilo
bancário ou sequestro de valores, tanto na Itália, como no Brasil: tal atribuição é privativa
de juiz.
O sequestro de valores depositados em contas correntes no Brasil depende de sentença,
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previamente homologada pela Justiça brasileira, que o decrete.


(AgRg na CR .998/IT, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, Rel. p/ Acórdão Ministro HUMBERTO
GOMES DE BARROS, CORTE ESPECIAL, julgado em 06/12/2006, DJ 30/04/2007, p. 258)

O Superior Tribunal de Justiça não admite a expedição de carta rogatória em matéria de sucessões
souza -- CPF:

com o objetivo de obter informações a respeito de bens localizados no exterior, tendo em vista o princípio
da pluralidade dos juízos sucessórios (CPC, art. 23, II):
Marceli souza

2. A pretensão de expedição de carta rogatória a país diverso não merece agasalho pelo
Marceli

Poder Judiciário, se não se evidenciar a existência de motivo de ordem pública, que seja útil
ao processo, devendo ser rechaçada quando requerida visando a satisfação de interesses
meramente pessoais, como na hipótese. Precedente.
3. Tendo em vista que a sucessão de bens do de cujus situados no estrangeiro regula-se pela
lei do país alienígena, nos termos do art. 23, II, do CPC/2015 (art. 89, II, do CPC/1973), o
qual preconiza o princípio da territorialidade, mostra-se descabida a solicitação de
informações a instituição financeira situada no estrangeiro (Suíça no presente caso), uma
vez que os valores lá constantes de titularidade do autor da herança, à data de abertura da
sucessão, não serão submetidos ao inventário em curso no Brasil, devendo ser processada
naquele país a sua transmissão a quem de direito.
4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1297819/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO
BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2018, DJe 19/10/2018)

Processual Civil. Inventário. Requerimento para expedição de carta rogatória com o objetivo
de obter informações a respeito de eventuais depósitos bancários na Suíça. Inviabilidade.
Adotado no ordenamento jurídico pátrio o princípio da pluralidade de juízos sucessórios,
inviável se cuidar, em inventário aqui realizado, de eventuais depósitos bancários existentes
no estrangeiro. (REsp 397769/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 25/11/2002, DJ 19/12/2002, p. 362)

O objeto da rogatória deve ser lícito à luz da legislação pátria.

263
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

As rogatórias suspenderão o processo quando a prova for considerada imprescindível:

CPC, Art. 377. A carta precatória, a carta rogatória e o auxílio direto suspenderão o
julgamento da causa no caso previsto no art. 313, inciso V, alínea “b”, quando, tendo sido
requeridos antes da decisão de saneamento, a prova neles solicitada for imprescindível.

As rogatórias não devolvidas dentro do prazo concedido sem efeito suspensivo poderão ser juntadas
aos autos do processo a qualquer momento:

Art. 377 (...)


Parágrafo único. A carta precatória e a carta rogatória não devolvidas no prazo ou
concedidas sem efeito suspensivo poderão ser juntadas aos autos a qualquer momento.

O Estado que recusar o cumprimento da carta rogatória brasileira será considerado inacessível,
ensejando a citação do réu por edital:

Art. 256. A citação por edital será feita:


II - quando ignorado, incerto ou inacessível o lugar em que se encontrar o citando;
§ 1º Considera-se inacessível, para efeito de citação por edital, o país que recusar o
cumprimento de carta rogatória.
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Quanto às cartas rogatórias passivas, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro dispõe, em
seu art. 12, § 2º, o seguinte:

Art. 12 (...)
§ 2º A autoridade judiciária brasileira cumprirá, concedido o exequatur e segundo a forma
estabelecida pela lei brasileira, as diligências deprecadas por autoridade estrangeira
competente, observando a lei desta, quanto ao objeto das diligências.

Para ser cumprida no Brasil, portanto, a carta rogatória dependerá do exequatur do Superior Tribunal
CPF: 073.496.444-77

de Justiça, nos termos do art. 105, I, “i”, da Constituição:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:


I - processar e julgar, originariamente: (...)
i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas
souza -- CPF:

rogatórias; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)


Marceli souza

A competência para conceder o exequatur às cartas rogatórias é do Presidente do STJ ou da Corte


Especial, no caso de impugnação às rogatórias decisórias, nos termos dos arts. 216-O e 216-T do RISTJ:
Marceli

RISTJ, Art. 216-O. É atribuição do Presidente conceder exequatur a cartas rogatórias,


ressalvado o disposto no art. 216-T.

Art. 216-T. Havendo impugnação ao pedido de concessão de exequatur a carta rogatória de


ato decisório, o Presidente poderá determinar a distribuição dos autos do processo para
julgamento pela Corte Especial.

Considerando a alteração feita pela EC n.º 45/2004 todas as normas infraconstitucionais sobre as cartas
rogatórias que mencionem a competência do STF devem ser lidas conforme a Constituição, como se
estivessem mencionando o STJ.
Para a concessão do exequatur, o STJ realiza um juízo de delibação, isto é, aprecia apenas as
condições de sua execução, não adentrando ao mérito ou às razões que fundamentaram a decisão do órgão
judicial estrangeiro.

CPC, art. 36 (...)


§ 1º A defesa restringir-se-á à discussão quanto ao atendimento dos requisitos para que o
pronunciamento judicial estrangeiro produza efeitos no Brasil.

264
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

§ 2º Em qualquer hipótese, é vedada a revisão do mérito do pronunciamento judicial


estrangeiro pela autoridade judiciária brasileira.

RISJT, Art. 216-Q (...)


§ 2º No processo de concessão do exequatur, a defesa somente poderá versar sobre a
autenticidade dos documentos, a inteligência da decisão e a observância dos requisitos
previstos neste Regimento

O cumprimento da rogatória estrangeira requer, salvo previsão em tratado, sua tradução para o
português, podendo a tradução em apreço ser feita no Estado rogante:

CPC, Art. 41. Considera-se autêntico o documento que instruir pedido de cooperação
jurídica internacional, inclusive tradução para a língua portuguesa, quando encaminhado
ao Estado brasileiro por meio de autoridade central ou por via diplomática, dispensando-se
ajuramentação, autenticação ou qualquer procedimento de legalização.

O trâmite da rogatória é feito por via diplomática ou por autoridade central brasileira, o que lhe
confere autenticidade.
Não será concedido exequatur à carta rogatória que ofenda a soberania nacional ou a ordem pública,
nos termos dos arts. 17 da LINDB e 39 do CPC:
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Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de
vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem
pública e os bons costumes.

Art. 39. O pedido passivo de cooperação jurídica internacional será recusado se configurar
manifesta ofensa à ordem pública.

O art. 216-P do RISTJ refere-se, ainda, à soberania nacional e a dignidade humana:


CPF: 073.496.444-77

Art. 216-P. Não será concedido exequatur à carta rogatória que ofender a soberania
nacional, a dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública.

Ademais, não serão cumpridas cartas rogatórias que impliquem em ato executório ou que dependam
souza -- CPF:

da homologação da sentença. Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 705) explica que os atos
executórios são os de arresto, sequestro, penhora e a transferência de títulos ou bens.
Marceli souza

A parte interessada será citada para, no prazo de 15 dias, impugnar a rogatória. Contudo, a medida
Marceli

solicitada na rogatória poderá ser realizada sem a oitiva da parte, quando sua intimação prévia puder
resultar na ineficácia da medida:

RISTJ, Art. 216-Q. A parte requerida será intimada para, no prazo de quinze dias, impugnar
o pedido de concessão do exequatur.
§ 1º A medida solicitada por carta rogatória poderá ser realizada sem ouvir a parte
requerida, quando sua intimação prévia puder resultar na ineficiência da cooperação
internacional.
§ 2º No processo de concessão do exequatur, a defesa somente poderá versar sobre a
autenticidade dos documentos, a inteligência da decisão e a observância dos requisitos
previstos neste Regimento.

O Ministério Público terá vistas dos autos nas rogatórias pelo prazo de 10 dias para, querendo,
impugná-la.

RISTJ, Art. 216-S. O Ministério Público Federal terá vista dos autos nas cartas rogatórias pelo
prazo de dez dias, podendo impugnar o pedido de concessão do exequatur.

Havendo impugnação, o processo poderá, por determinação do Presidente do STJ, ser distribuído
para julgamento pela Corte Especial. Das decisões do Presidente nas rogatórias caberá agravo regimental.

265
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 216-T. Havendo impugnação ao pedido de concessão de exequatur a carta rogatória de


ato decisório, o Presidente poderá determinar a distribuição dos autos do processo para
julgamento pela Corte Especial.

Art. 216-U. Das decisões do Presidente ou do relator na concessão de exequatur a carta


rogatória caberá agravo.

Importante destacar também que com a transferência da competência do STF para o STJ, com a
Emenda Constitucional n.º 45/2004, abriu-se a possibilidade da via recursal quando a questão versar sobre
tema constitucional, por meio de Recurso Extraordinário, nos termos do art. 102, III da CF/88.
A execução das rogatórias, após o exequatur, é de competência da justiça federal de 1ª instância,
nos termos do art. 109, X, da Constituição:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...)


X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta
rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas
referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;

Do cumprimento da carta rogatória pelo Juízo Federal competente cabem embargos, a serem
opostos no prazo de 10 dias por qualquer interessado ou pelo MP, a serem julgados pelo Presidente do STJ.
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Da decisão que julgar os embargos, cabe agravo regimental. Se for o caso, o Presidente do STJ ou o Relator
do agravo poderá ordenar diretamente o atendimento da medida solicitada.

RISTJ, Art. 216-V. Após a concessão do exequatur, a carta rogatória será remetida ao Juízo
Federal competente para cumprimento.
§ 1º Das decisões proferidas pelo Juiz Federal competente no cumprimento da carta
rogatória caberão embargos, que poderão ser opostos pela parte interessada ou pelo
Ministério Público Federal no prazo de dez dias, julgando-os o Presidente deste Tribunal.
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§ 2º Os embargos de que trata o parágrafo anterior poderão versar sobre qualquer ato
referente ao cumprimento da carta rogatória, exceto sobre a própria concessão da medida
ou o seu mérito.

É possível que os juízes federais solicitem a cooperação da Justiça Estadual quando a rogatória se
souza -- CPF:

destina a citar ou intimar pessoa que tem domicílio onde não haja sede da Justiça Federal, como já entendeu
o STJ:
Marceli souza

CONFLITO. CARTA ROGATÓRIA. EXEQUATUR. COMPETÊNCIA.


Marceli

1. Em conflito de competência não há espaço para discussão a respeito da regularidade de


carta rogatória com exequatur concedido por decisão irrecorrida.
2. Compete à Justiça Federal cumprir carta rogatória após a concessão do exequatur pela
Presidência do Superior Tribunal de Justiça (Art. 109, X, da Constituição Federal).
3. O Juízo Federal pode solicitar cooperação da Justiça Estadual quando a carta rogatória se
destina a citar ou intimar pessoa que tem domicílio onde não esteja instalada sede da
Justiça Federal (Art. 42, caput, da Lei 5.010/66).
(CC 89791/SP, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
14/11/2007, DJ 26/11/2007, p. 114)

Nos termos do art. 262 do CPC, a carta rogatória tem caráter itinerante, pelo que, antes ou depois
de ser ordenado seu cumprimento, poderá ser apresentada a juízo diverso do que dela consta, a fim de ser
praticado o ato:

Art. 262. A carta tem caráter itinerante, podendo, antes ou depois de lhe ser ordenado o
cumprimento, ser encaminhada a juízo diverso do que dela consta, a fim de se praticar o
ato.

A rogatória, após seu cumprimento ou verificada a impossibilidade dele, será devolvida ao Presidente
do STJ que a remeterá, por meio do Ministério da Justiça ou do Ministério das Relações Exterior, ao Estado
rogante:

266
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 216-X. Cumprida a carta rogatória ou verificada a impossibilidade de seu cumprimento,


será devolvida ao Presidente deste Tribunal no prazo de dez dias, e ele a remeterá, em igual
prazo, por meio do Ministério da Justiça ou do Ministério das Relações Exteriores, à
autoridade estrangeira de origem.

A devolução independe de traslado, pagas as custas pela parte:

CPC, Art. 268. Cumprida a carta, será devolvida ao juízo de origem no prazo de 10 (dez) dias,
independentemente de traslado, pagas as custas pela parte.

7.5. Homologação de sentença estrangeira

De acordo com o princípio da territorialidade, o Estado detém o monopólio do direito e da força em


seu território. Portanto, é consequência desse princípio o costume que nenhum Estado está obrigado a
reconhecer a sentença proferida por juiz ou tribunal estrangeiro em seu território (RECHSTEINER, 2019, p.
266).
Ocorre que as decisões proferidas por autoridades judiciais, muitas vezes, podem surtir efeitos a
serem cumpridos em outros Estados. Por isso, em regra, os Estados acabam por reconhecer as decisões
proferidas por outros órgãos jurisdicionais, desde que cumpridos os requisitos da lex fori, exceto quando
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houver tratado firmado entre as partes.


Portanto, Paulo Henrique Gonçalves Portela (2015, p. 725) conceitua a homologação da sentença
estrangeira como o ato em que se permite que uma decisão judicial proferida em um Estado possa ser
executada no território de outro. O instituto é também conhecido como reconhecimento, ratificação ou
execução de sentença estrangeira.
O autor destaca que a homologação de sentenças estrangeiras obedece a critérios vinculados a
métodos ou sistemas doutrinários:
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• Revisão do mérito da sentença: deve haver novo processo judicial no Estado homologante, como
se não existisse sentença estrangeira anterior a homologar, e somente após o julgamento do
souza -- CPF:

processo nacional, e dependendo de seus resultados, poderá a decisão estrangeira ser


homologada;
Marceli souza

• Revisão parcial de mérito: a homologação depende da verificação da boa ou má aplicação da lei


do Estado onde a sentença estrangeira gerará efeitos;
Marceli

• Reciprocidade diplomática: a homologação é fundamentada em tratados que envolvam o Estado


de origem da sentença e aquele onde a decisão judicial deverá surtir efeitos, sem os quais não
será possível;
• Reciprocidade de fato: a homologação só pode ocorrer quando o Estado de origem da sentença
também homologa sentenças estrangeiras;
• Delibação: não se entra no mérito da decisão a ser homologada, examinando apenas
pressupostos formais. É o sistema adotado no Brasil. (PORTELA, 2015, p. 727)

Nos termos do art. 105, I, i, da Constituição, cabe ao Superior Tribunal de Justiça a homologação de
sentença estrangeira no país. Tal competência fora introduzida pela Emenda Constitucional n.º 45/2004,
sendo anteriormente, de competência do STF.
Importante destacar que a modificação da competência originária possibilitou a via recursal ao STF,
por meio do recurso extraordinário, desde que fundado em matéria constitucional.
A primeira condição de execução de uma sentença estrangeira no Brasil é sua homologação pelo STJ.
Se o provimento, ainda que não judicial, tiver, no Brasil, natureza de sentença, ele deverá ser
homologado, nos termos do art. 216-A do RISTJ:

267
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 216-A
§ 1º Serão homologados os provimentos não judiciais que, pela lei brasileira, tiverem
natureza de sente.

A atribuição de homologação da sentença estrangeria é do presidente do STJ ou da Corte Especial


quando houver contestação:

Art. 216-A. É atribuição do Presidente do Tribunal homologar decisão estrangeira,


ressalvado o disposto no art. 216-K.

Art. 216-K. Contestado o pedido, o processo será distribuído para julgamento pela Corte
Especial, cabendo ao relator os demais atos relativos ao andamento e à instrução do
processo.

Mais uma vez, ressalva-se que o sistema adotado é o da delibação, cabendo ao STJ verificar se a
decisão estrangeira se coaduna com os princípios basilares de nosso ordenamento e se atende aos requisitos
formais, não adentrando ao mérito, exceto quando afrontar a ordem pública, a soberania nacional e os bons
costumes (PORTELA, 2015, p. 729):

Art. 216-F. Não será homologada a decisão estrangeira que ofender a soberania nacional, a
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dignidade da pessoa humana e/ou a ordem pública.

Ademais, o art. 15 da LINDB dispõe alguns dos requisitos para a homologação da sentença
estrangeira:

Art. 15. Será executada no Brasil a sentença proferida no estrangeiro, que reúna os
seguintes requisitos:
a) haver sido proferida por juiz competente;
b) terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado à revelia;
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c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução
no lugar em que foi proferida;
d) estar traduzida por intérprete autorizado;
e) ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal Superior Tribunal de Justiça
(mudança gerada pela Emenda Constitucional n.º 45/2004).
souza -- CPF:

Parágrafo único. (Revogado pela Lei nº 12.036, de 2009).


Marceli souza

Já o CPC insere a ausência de coisa julgada no Brasil, a eficácia no país que proferiu a decisão e a
ausência de ofensa à ordem pública como requisitos:
Marceli

Art. 963. Constituem requisitos indispensáveis à homologação da decisão:


I - ser proferida por autoridade competente;
II - ser precedida de citação regular, ainda que verificada a revelia;
III - ser eficaz no país em que foi proferida;
IV - não ofender a coisa julgada brasileira;
V - estar acompanhada de tradução oficial, salvo disposição que a dispense prevista em
tratado;
VI - não conter manifesta ofensa à ordem pública.
Parágrafo único. Para a concessão do exequatur às cartas rogatórias, observar-se-ão os
pressupostos previstos no caput deste artigo e no art. 962, § 2º.

O RISTJ faz uma distinção entre os requisitos da decisão e da inicial (como se verá a seguir):

Art. 216-D. A decisão estrangeira deverá:


I - ter sido proferida por autoridade competente;
II - conter elementos que comprovem terem sido as partes regularmente citadas ou ter sido
legalmente verificada a revelia;
III - ter transitado em julgado.

268
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Importante ressaltar que a falta de assinatura da autoridade competente na decisão homologanda


não necessariamente é óbice para a homologação, desde que haja autenticação da decisão por outros meios
permitidos em Direito:

SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. ALEMANHA. ADOÇÃO DE PESSOAS MAIORES DE


IDADE. CITAÇÃO DO REQUERIDO NO PROCEDIMENTO NO EXTERIOR. PROVA DO TRÂNSITO
EM JULGADO DA DECISÃO. ASSINATURA DO JUIZ. DESNECESSIDADE.
1. Havendo previsão, na legislação do país de origem, de dispensa do consentimento do pai
biológico para a adoção de pessoa que já atingiu a maioridade, resulta desnecessária a
prova da citação do requerido no procedimento estrangeiro, bem como da sua intimação
da correspondente sentença.
2. Evidenciado que a decisão homologanda (a) foi expedida pelo tribunal competente; (b)
contém o carimbo do juízo, bem como a certificação da fidelidade da cópia ao original, por
parte da funcionária da justiça escrivã do cartório; (c) é cópia chancelada pelo consulado
brasileiro, resta demonstrada sua autenticidade, tornando-se desnecessária a assinatura do
juiz no documento.
3. Presentes os demais requisitos, bem como verificado que o teor da decisão não ofende
a soberania nem a ordem pública (arts. 5º e 6º da Resolução STJ nº 9/2005).
4. Sentença estrangeira homologada. (SEC 563/DE, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI,
CORTE ESPECIAL, julgado em 15/08/2007, DJ 03/09/2007, p. 110)
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Caso uma das partes do processo originário seja residente no Brasil, é indispensável que sua citação
tenha sido regular, assim considerada a que fora efetivada mediante carta rogatória:

HOMOLOGAÇÃO DE DECISÃO ESTRANGEIRA CONTESTADA. GUARDA DE FILHOS. GENITORA


RESIDENTE NO BRASIL. NECESSIDADE DE CITAÇÃO POR CARTA ROGATÓRIA. SENTENÇA
PROFERIDA ANTES DA CONCESSÃO DO EXEQUATUR. HOMOLOGAÇÃO INDEFERIDA.
I - A citação de brasileiro residente no Brasil deve ocorrer por carta rogatória.
II - A citação no processo estrangeiro somente pode ser considerada válida após a concessão
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do exequatur na carta rogatória.


III - Não é possível a homologação de título judicial estrangeiro proferido em data anterior
à concessão do exequatur em carta rogatória que tem por finalidade a citação de residentes
no Brasil.
IV - Homologação de decisão estrangeira indeferida. (HDE 1.260/EX, Rel. Ministro
souza -- CPF:

FRANCISCO FALCÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 06/11/2019, DJe 12/11/2019)


Marceli souza

O comparecimento à audiência realizada pelo juiz estrangeiro também supre a falta de citação:
Marceli

I - A citação, no processo estrangeiro, pode ser verificada pela anuência do requerido ao


acordo homologado na justiça alienígena. (HDE 2.591/EX, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO,
CORTE ESPECIAL, julgado em 17/06/2020, DJe 29/06/2020)

Quanto ao trânsito em julgado, a súmula 420 do STF dispõe que:

Súmula 420 do STF: Não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do
trânsito em julgado.

Sobre o tema, o tribunal tem o entendimento que, nas decisões provenientes dos Estados Unidos, o
carimbo com a expressão filed certifica o trânsito em julgado, sendo o suficiente para a comprovação do
requisito:

II - Esta Corte possui entendimento pacífico de que o carimbo com a expressão "filed"
certifica o trânsito em julgado dos títulos judiciais oriundos da justiça norte-americana.
(HDE 2.591/EX, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 17/06/2020,
DJe 29/06/2020)

Quando a homologação implicar na aplicação de norma estrangeira, o art. 16 da LINDB determina:

269
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 16. Quando, nos termos dos artigos precedentes, se houver de aplicar a lei estrangeira,
ter-se-á em vista a disposição desta, sem considerar-se qualquer remissão por ela feita a
outra lei.

É, portanto, proibido o reenvio.


Os laudos arbitrais estrangeiros também se incluem entre as decisões que devem ser homologadas
para produzir efeitos no Brasil, nos termos do art. 35 da Lei n.º 9.307/1996:

Art. 35. Para ser reconhecida ou executada no Brasil, a sentença arbitral estrangeira está
sujeita, unicamente, à homologação do Superior Tribunal de Justiça.

No mesmo sentido, o art. 960, § 3º do CPC dispõe:

Art. 960 (...)


§ 3º A homologação de decisão arbitral estrangeira obedecerá ao disposto em tratado e em
lei, aplicando-se, subsidiariamente, as disposições deste Capítulo.

Deve-se utilizar o critério da territorialidade para se aferir ser o laudo arbitral estrangeiro ou nacional:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA ARBITRAL.


NACIONALIDADE. DETERMINAÇÃO. CRITÉRIO TERRITORIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
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OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. NÃO INDICAÇÃO. SÚMULA 284/STF.


1. A ausência de expressa indicação de obscuridade, omissão ou contradição nas razões
recursais enseja o não conhecimento do recurso especial.
2. A execução, para ser regular, deve estar amparada em título executivo idôneo, dentre os
quais, prevê o art. 475-N a sentença arbitral (inciso IV) e a sentença estrangeira homologada
pelo STJ (inciso VI).
3. A determinação da internacionalidade ou não de sentença arbitral, para fins de
reconhecimento, ficou ao alvedrio das legislações nacionais, conforme o disposto no art. 1º
da Convenção de Nova Iorque (1958), promulgada pelo Brasil, por meio do Decreto
CPF: 073.496.444-77

4.311/02, razão pela qual se vislumbra no cenário internacional diferentes regulamentações


jurídicas acerca do conceito de sentença arbitral estrangeira.
4. No ordenamento jurídico pátrio, elegeu-se o critério geográfico (ius solis) para
determinação da nacionalidade das sentenças arbitrais, baseando-se exclusivamente no
local onde a decisão for proferida (art. 34, parágrafo único, da Lei nº 9.307/96).
souza -- CPF:

5. Na espécie, o fato de o requerimento para instauração do procedimento arbitral ter sido


apresentado à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional não
Marceli souza

tem o condão de alterar a nacionalidade dessa sentença, que permanece brasileira.


6. Sendo a sentença arbitral em comento de nacionalidade brasileira, constitui, nos termos
Marceli

dos arts. 475-N, IV, do CPC e 31 da Lei da Arbitragem, título executivo idôneo para embasar
a ação de execução da qual o presente recurso especial se origina, razão pela qual é
desnecessária a homologação por esta Corte.
7. Recurso especial provido para restabelecer a decisão proferida à e-STJ fl. 60.
(REsp 1231554/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em
24/05/2011, DJe 01/06/2011)

Os títulos executivos extrajudiciais prescindem de homologação para serem executados no Brasil:

Os títulos de crédito constituídos em país estrangeiro, para serem executados no Brasil


(CPC, art. 585, § 2º), não dependem de homologação pelo Supremo Tribunal Federal. A
eficácia executiva que lhes é inerente não se subordina ao juízo de delibação a que se refere
o art. 102, I, "h", da Constituição, que incide, unicamente, sobre "sentenças estrangeiras",
cuja noção conceitual não compreende, não abrange e não se estende aos títulos de crédito,
ainda que sacados ou constituídos no exterior. Doutrina. Precedentes. (Rcl 1908 AgR,
Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 24/10/2001, DJ 03-12-2004
PP-00013 EMENT VOL-02175-01 PP-00092 RT v. 94, n. 834, 2005, p. 171-176 RTJ VOL-00192-
03 PP-00852)

O art. 961, § 2º do CPC e o art. 216-A do Regimento Interno do STJ admitem a possibilidade de
homologação parcial da sentença estrangeira. Jacob Dolinger e Carmem Tiburcio (2020, ebook, p. 621)

270
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

explicam que, se apenas parte da sentença estrangeira ferir a ordem pública ou a soberania nacional, o STJ
não negará a homologação em sua integralidade.
Uma vez homologada, a sentença estrangeira é considerada título executivo judicial, aplicando-se as
normas para o cumprimento de sentença, sendo a Justiça Federal a competente para a execução da decisão:

Art. 965. O cumprimento de decisão estrangeira far-se-á perante o juízo federal


competente, a requerimento da parte, conforme as normas estabelecidas para o
cumprimento de decisão nacional.

As condições da ação de homologação, como matéria de natureza processual, obedecem a lex fori.
Os requisitos da petição inicial estão previstos no art. 216-C do RISTJ:

Art. 216-C. A homologação da decisão estrangeira será proposta pela parte requerente,
devendo a petição inicial conter os requisitos indicados na lei processual, bem como os
previstos no art. 216-D, e ser instruída com o original ou cópia autenticada da decisão
homologanda e de outros documentos indispensáveis, devidamente traduzidos por
tradutor oficial ou juramentado no Brasil e chancelados pela autoridade consular brasileira
competente, quando for o caso.

Se a petição não cumprir com o dispositivo citado, o Presidente do Tribunal pode assinalar prazo ao
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requerente para suprir a ausência, sob pena de arquivamento do pedido:

Art. 216-E. Se a petição inicial não preencher os requisitos exigidos nos artigos anteriores
ou apresentar defeitos ou irregularidades que dificultem o julgamento do mérito, o
Presidente assinará prazo razoável para que o requerente a emende ou complete.
Parágrafo único. Após a intimação, se o requerente ou o seu procurador não promover, no
prazo assinalado, ato ou diligência que lhe for determinada no curso do processo, será este
arquivado pelo Presidente.
CPF: 073.496.444-77

Admite-se a tutela de urgência nos procedimentos de homologação de sentenças estrangeiras, nos


termos dos arts. 962 do CPC e 216-G do Regimento Interno do STJ:

Art. 962. É passível de execução a decisão estrangeira concessiva de medida de urgência.


§ 1º A execução no Brasil de decisão interlocutória estrangeira concessiva de medida de
souza -- CPF:

urgência dar-se-á por carta rogatória.


§ 2º A medida de urgência concedida sem audiência do réu poderá ser executada, desde
Marceli souza

que garantido o contraditório em momento posterior.


§ 3º O juízo sobre a urgência da medida compete exclusivamente à autoridade jurisdicional
Marceli

prolatora da decisão estrangeira.


§ 4º Quando dispensada a homologação para que a sentença estrangeira produza efeitos
no Brasil, a decisão concessiva de medida de urgência dependerá, para produzir efeitos, de
ter sua validade expressamente reconhecida pelo juiz competente para dar-lhe
cumprimento, dispensada a homologação pelo Superior Tribunal de Justiça.

Art. 216-G. Admitir-se-á a tutela provisória nos procedimentos de homologação de decisão


estrangeira.

Sobre o tema, é importante destacar que o juízo acerca da urgência não será analisado pelo STJ, mas
pelo órgão jurisdicional estrangeiro.
O prazo de resposta do pedido homologatório é de 15 dias, sendo vedada questão relativa ao mérito
da causa:

Art. 216-H. A parte interessada será citada para, no prazo de quinze dias, contestar o
pedido.
Parágrafo único. A defesa somente poderá versar sobre a inteligência da decisão alienígena
e a observância dos requisitos indicados nos arts. 216-C, 216-D e 216-F.

Havendo contestação, o processo é julgado pela Corte Especial, cabendo, ao Relator, os demais atos
relativos ao andamento e à instrução processual.

271
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

Art. 216-K. Contestado o pedido, o processo será distribuído para julgamento pela Corte
Especial, cabendo ao relator os demais atos relativos ao andamento e à instrução do
processo.

Admite-se a decisão monocrática do relator quando a questão versar sobre questão já pacificada
pela Corte:

Art. 216-K. (...)


Parágrafo único. O relator poderá decidir monocraticamente nas hipóteses em que já
houver jurisprudência consolidada da Corte Especial a respeito do tema.

Apresentada a defesa abre-se vistas ao MP:

Art. 216-L. O Ministério Público terá vista dos autos pelo prazo de quinze dias, podendo
impugnar o pedido.

Não sendo apresentada resposta, será nomeado curador especial ao requerido:

Art. 216-I. Revel ou incapaz o requerido, dar-se-lhe-á curador especial, que será
pessoalmente notificado.

Tanto da decisão do Presidente do STJ quanto do ministro relator caberão agravo regimental à Corte
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Especial da Corte:

Art. 216-M. Das decisões do Presidente ou do relator caberá agravo.

As decisões da Corte Especial poderão ser discutidas mediante recurso extraordinário, desde que
fundamentada em matéria de ordem constitucional. Ressalta-se, contudo, que, nessa hipótese, os efeitos
devolutivos do recurso restringem-se à matéria de direito e não à de fato.
Beat Walter Rechsteiner (2019, p. 305) destaca que a homologação da sentença estrangeira faz coisa
CPF: 073.496.444-77

julgada, impedindo a tramitação de ação ajuizada no Brasil com as mesmas partes e causa de pedir.
Nos termos do art. 960, § 2º, as normas do CPC são subsidiárias às previstas em tratados ratificados
pelo Brasil. É necessário, portanto, citar os atos internacionais ratificados pelo país que regulam a
souza -- CPF:

homologação da sentença estrangeira:


Marceli souza

• Código de Bustamante – que regula a matéria em seus artigos 423-433;


• A Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras de 1958;
Marceli

• A Convenção Interamericana sobre a Eficácia Territorial das Sentenças e Laudos Arbitrais


Estrangeiros de 1979;
• O Protocolo de Las Leñas sobre Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, comercial,
Trabalhista e Administrativa do Mercosul, de 1992.
Em geral, as normas dos acordos não são muito diferentes das encontradas no direito interno. No
entanto, ganha destaque o Protocolo de Las Leñas, que prevê que, nos processos homologatórios regidos
pelo ato, o pedido de homologação tramitará por carta rogatória e por intermédio da autoridade central.
Por fim, importante destacar que as sentenças proferidas por Tribunais Internacionais não
necessitam de homologação, considerando-se que o Brasil reconheceu a competência desses órgãos, não
sendo eles caracterizados como estrangeiros. Outro não foi o entendimento do STJ sobre o tema:

SENTENÇA ESTRANGEIRA. DECISÃO PROFERIDA PELA CORTE PERMANENTE DE JUSTIÇA


INTERNACIONAL DE HAIA, EM 1929, TENDO COMO PARTES O GOVERNO BRASILEIRO E O
GOVERNO FRANCÊS. ILEGITIMIDADE DE EMPRESA ESTRANHA À DECISÃO PARA POSTULAR
A SUA HOMOLOGAÇÃO. ADEMAIS, DECISÃO QUE NÃO SE SUBSUME AO CONCEITO DE
SENTENÇA ESTRANGEIRA E CUJA HOMOLOGAÇÃO AFRONTARIA A SOBERANIA NACIONAL.
I - Inexiste sentença estrangeira a ser homologada, em nome da parte requerente. A decisão
submetida à validação do Judiciário brasileiro advém da Corte Permanente de Justiça
Internacional de Haia, que, à época, proferiu decisão arbitral em contenda instalada entre

272
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

os Governos Brasileiro e Francês, quanto a empréstimo por aquele efetuado nos idos de
1909 e os juros aplicáveis.
II - Assim sendo, carece Gesparte Comércio e Participações Ltda. de legitimidade para
postular a homologação da decisão referente a dois Estados soberanos, sendo imperioso
relevar que, consoante bem lembrado no parecer ministerial, "a busca de outros caminhos
compatíveis com os compromissos assumidos pelos empréstimos tomados pelo governo
brasileiro junto ao governo francês, torna evidente o empenho destes em definir suas
pendências, dentro dos parâmetros legais estabelecidos pelas leis dos países sobre a
matéria".
III - Noutras palavras, o próprio governo francês jamais reclamou a observância da decisão
proferida pela Corte Internacional, não sendo possível que, passado quase um século, venha
empresa particular solicitar a sua homologação no Brasil.
IV - De se considerar, ademais, que a Corte Internacional não profere decisão que se
subsuma ao conceito de "sentença estrangeira", visto que é órgão supranacional. A
propósito, relevo o documento expedido pela Corte Internacional de Justiça, em 24 de
outubro de 2007, juntado pelo requerente, às fls. 323, em que se esclarece: "a CPIJ, assim
como a Corte Internacional de Justiça, não são cortes ou tribunais estrangeiros, cujos
julgamentos não são decisões judiciais ou sentenças estrangeiras que requeiram qualquer
tipo de exequator ou homologação".
V - Em conclusão, não há sentença estrangeira stricto sensu a ser homologada e, tampouco,
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é legítima a empresa Gespart Comércio Participações Ltda. para solicitar tal homologação a
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qual, enfim, afrontaria a soberania nacional.


VI - Pedido denegado. (SEC 2.707/NL, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, CORTE ESPECIAL,
julgado em 03/12/2008, DJe 19/02/2009)

QUESTÕES
279. (MPF – 2018 – Procurador da República) DENTRE OS ENUNCIADOS ABAIXO, SOMENTE ESTÃO
CORRETOS:
CPF: 073.496.444-77

I - No auxílio direto passivo, o Estado estrangeiro submete o seu pedido ao Brasil, que deve adotar os meios
internos necessários para cumprir tal pedido, fazendo incidir, de modo imediato, os direitos fundamentais
tais quais previstos no ordenamento brasileiro.
souza -- CPF:

II - Na extradição passiva, o Brasil adotou o modelo misto ou belga, pelo qual o Poder Judiciário do Estado
Requerido afere, em geral, a regularidade extrínseca do pedido, com exceções previstas em tratado, lei ou
Marceli souza

mesmo na Constituição.
Marceli

III - Na assistência jurídica internacional passiva, é possível a incidência indireta dos direitos fundamentais
por intermédio da invocação do respeito à ordem pública do Estado brasileiro.
IV - Na cooperação jurídica internacional em matéria penal, a transferência de sentenciados, por seu cunho
humanitário, exige tão somente a anuência do Estado sentenciador e do Estado recebedor, sendo
dispensável a concordância do indivíduo condenado.
a) I e III
b) II e IV
c) I, II e III
d) todos estão corretos.
280. (CESPE / CEBRASPE - 2018 - STJ - Analista Judiciário – Judiciária) O pedido passivo de cooperação
jurídica internacional é aquele realizado por órgão estrangeiro.
281. (CESPE / CEBRASPE - 2018 - STJ - Analista Judiciário – Judiciária) A cooperação jurídica internacional
segue parâmetros legais definidos em lei ordinária nacional.
282. (CESPE / CEBRASPE - 2011 - TRF - 1ª REGIÃO - Juiz Federal) No que diz respeito às fontes do direito
internacional privado, ao conflito de leis, ao reenvio e à interpretação do direito estrangeiro, assinale a opção
correta.

273
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

a) A prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar, quanto ao ônus e aos
meios de produzir- se, não admitindo, porém, os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça.
b) As partes têm liberdade para escolher a lei de regência em contratos internacionais em razão da regra
geral da autonomia da vontade, em matéria contratual. Nesse sentido, as leis, atos e sentenças de outro país,
bem como quaisquer declarações de vontade, terão plena eficácia no Brasil, independentemente de
qualquer condição ou ressalva.
c) Entre as fontes do direito internacional privado incluem-se as convenções internacionais, o costume
internacional e os princípios gerais do direito, mas não as decisões judiciais e a doutrina dos juristas, estas,
somente obrigatórias para as partes litigantes e a respeito dos casos em questão.
d) Embora entenda o STF que haja paridade entre o tratado e a lei nacional, esse tribunal firmou a tese de
que, no conflito entre tratado de qualquer natureza e lei posterior, esta há sempre de prevalecer, pois a CF
não garante privilégio hierárquico do tratado sobre a lei, sendo inevitável que se garanta a autoridade da
norma mais recente.
e) Para resolver os conflitos de lei no espaço, o Brasil adota a prática do reenvio, mediante a qual se
substitui a lei nacional pela estrangeira, desprezando-se o elemento de conexão apontado pela ordenação
nacional, para dar preferência à indicada pelo ordenamento jurídico alienígena.
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283. (MPE-MS - 2018 - MPE-MS - Promotor de Justiça Substituto) Sobre o auxílio direto na cooperação
internacional, é incorreto afirmar:
a) O auxílio direto pode ser utilizado para a obtenção e a prestação de informações sobre o ordenamento
jurídico e sobre processos administrativos ou jurisdicionais findos ou em curso.
b) Por meio do pedido de auxílio direto é possível realizar a colheita de provas, salvo se a medida for
adotada em processo, em curso no estrangeiro, de competência exclusiva de autoridade judiciária brasileira.
c) O auxílio direto é procedimento de jurisdição contenciosa que deve tramitar obrigatoriamente perante
CPF: 073.496.444-77

o Superior Tribunal de Justiça, assegurando às partes as garantias do devido processo legal.


d) O Ministério Público poderá requerer em juízo a medida solicitada pela via do auxílio direto passivo, nos
casos em que for autoridade central.
souza -- CPF:

e) A solicitação de auxílio direto será encaminhada pelo órgão estrangeiro interessado à autoridade
central, cabendo ao Estado requerente assegurar a autenticidade e a clareza do pedido.
Marceli souza

284. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) A respeito da homologação
Marceli

de sentenças estrangeiras, assinale a opção correta.


a) Na hipótese de tutela provisória de urgência estrangeira, o beneficiário que tiver interesse na sua
execução no território brasileiro deverá requerer a respectiva homologação ao STJ.
b) Conforme entendimento do STJ, a comprovação da definitividade da decisão homologanda só será
admitida por meio da certidão de seu trânsito.
c) O indeferimento de pedido de homologação de sentença estrangeira impede a propositura de novo
pedido, em função da coisa julgada.
d) No caso de sentença estrangeira que regulamenta alimentos homologada pelo STJ, admite-se a
superveniência de decisão posterior, pelo Poder Judiciário brasileiro, que disponha de forma diferente.
e) Caso um interessado pretenda fazer valer a eficácia, no Brasil, de decisão estrangeira de divórcio
consensual ou conflituoso, deverá requerer ao STJ a respectiva homologação.
285. (CESPE / CEBRASPE - 2017 - DPU - Defensor Público Federal) Pode ser homologada sentença penal
estrangeira que determine o perdimento de imóvel situado no Brasil reconhecido como produto de crime de
lavagem de dinheiro.
286. (TRF - 2ª Região - 2017 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Na hipótese de idêntica ação ser
proposta no Brasil e no exterior, e inexistindo tratado com o país estrangeiro, marque a opção correta:

274
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

a) A litispendência internacional não pode ser conhecida de ofício e deve ser arguida. Arguida, ela impede
que o juiz brasileiro dê curso à ação intentada no Brasil se a questão já tiver sido submetida a juiz estrangeiro.
b) litispendência internacional pode ser conhecida de ofício e impede que o juiz brasileiro dê curso à ação
intentada no Brasil se a questão já está submetida a juiz estrangeiro.
c) Em tema afeto à soberania, os Estados estrangeiros estão impedidos de conhecer demandas que versem
sobre causas situadas no território de outras soberanias, sob pena de responsabilização internacional.
d) Se uma sentença brasileira decidir determinada questão que também tenha sido decidida por sentença
estrangeira, será sempre a sentença brasileira a que produzirá efeitos no Brasil.
e) A ação intentada no estrangeiro não impede que a mesma questão seja submetida a juiz brasileiro, nem
produz litispendência.
287. (FUNECE - 2017 - UECE – Advogado) A cooperação jurídica internacional será regida por tratado de
que o Brasil faz parte e observará
a) a existência de autoridade central para recepção e transmissão dos pedidos de cooperação.
b) a igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros, residentes ou não no Brasil, em relação ao
acesso à justiça e à tramitação dos processos, assegurando-se assistência judiciária somente aos necessitados
nacionais.
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c) a publicidade processual, exceto nas hipóteses de sigilo previstas na legislação brasileira.


d) a obrigatoriedade na transmissão de informações a autoridades estrangeiras.
288. (CESPE / CEBRASPE - 2015 - AGU - Advogado da União) A autoridade judiciária brasileira é
competente, com exclusão de qualquer outra autoridade, para conhecer de ações relativas a imóveis
situados no Brasil.
289. (CESPE / CEBRASPE - 2015 - AGU - Advogado da União) A AGU é a autoridade central federal que
CPF: 073.496.444-77

deve dar cumprimento às obrigações impostas pela Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à
Cooperação em Matéria de Adoção Internacional.
290. (CESPE / CEBRASPE - 2015 - AGU - Advogado da União) A dupla incriminação tem sido considerada
souza -- CPF:

requisito dispensável em certos acordos de cooperação jurídica em matéria penal celebrados pelo Brasil.
291. (NC-UFPR - 2015 - ITAIPU BINACIONAL – Direito) A respeito da cooperação jurídica internacional,
Marceli souza

assinale a alternativa correta.


Marceli

a) Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, incabível a concessão de cartas rogatórias com
conteúdo decisório.
b) De acordo com o regimento interno do Superior Tribunal de Justiça, inadmite-se a homologação parcial
de sentença estrangeira.
c) O Ministério Público Federal terá vista do processo de homologação de sentença estrangeira, podendo
impugná-lo se assim o entender.
d) A cooperação jurídica, mediante auxílio direto, depende de juízo de deliberação via Superior Tribunal
de Justiça.
e) O Brasil somente poderá extraditar estrangeiros a Estados com quem mantenha tratados de extradição,
sendo vedada a extradição mediante promessa de reciprocidade.
292. (CESGRANRIO - 2015 - Petrobras - Advogado Júnior) A homologação de uma sentença estrangeira
no Brasil tem, como requisito indispensável,
a) haver sido proferida por autoridade competente.
b) estar autenticada pelo Ministro da Justiça brasileiro.
c) estar acompanhada de tradução, podendo ser juramentada ou não.
d) ser decisão proferida por órgão colegiado ou tribunal.

275
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

e) terem sido as partes citadas adequadamente, não se admitindo a figura da revelia.


293. (MPU- 2013 - PGR - Procurador da República) Em matéria de conflito de jurisdições estatais no
direito internacional,
a) o exercício da jurisdição territorial tem primazia sobre o exercício da jurisdição extraterritorial,
independentemente do critério que legitime a extraterritorialidade;
b) o exercício da jurisdição territorial tem primazia sobre o exercício da jurisdição extraterritorial pelo
critério do sujeito passivo, não a tendo, contudo, pelos demais critérios legitimadores da
extraterritorialidade;
c) o exercício da jurisdição territorial, ainda que mais frequente, não tem qualquer primazia sobre o
exercício da jurisdição extraterritorial, resolvendo- se o conflito pelo princípio ne bis in idem;
d) a primazia do exercício da jurisdição extraterritorial só é admitida em casos excepcionais, sob pena de
se incorrer em ingerência ilícita nos assuntos de exclusiva competência doméstica do Estado territorial.
294. (CESPE / CEBRASPE - 2015 - TRF - 5ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) A respeito das regras atinentes
ao processo internacional e à homologação de sentenças estrangeiras, assinale a opção correta.
a) O ajuizamento de demanda no Brasil constitui empecilho à homologação de sentença estrangeira.
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b) Para fins de homologação de sentença arbitral, exige-se que a regular citação de pessoa residente no
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território brasileiro tenha sido realizada por carta rogatória.


c) Por ocasião do cumprimento de carta rogatória, aplica-se a lei processual da justiça rogada, sendo
irrelevante solicitação da justiça rogante no sentido de se aplicar sua legislação.
d) Para fins de homologação de sentença estrangeira, exige-se que ela não ofenda a soberania nacional, a
ordem pública, os bons costumes e a reciprocidade no reconhecimento das sentenças brasileiras.
e) Em casos específicos, o STJ poderá reexaminar, a requerimento do interessado, as decisões já proferidas
CPF: 073.496.444-77

em pedidos de homologação de sentenças estrangeiras.


295. (TRF - 2ª Região - 2014 - TRF - 2ª REGIÃO - Juiz Federal) A respeito da Convenção de Nova Iorque
sobre cobrança de alimentos no estrangeiro e sua aplicação no Brasil, assinale a opção correta:
a) A competência é da Justiça Estadual do foro do domicílio do devedor de alimentos.
souza -- CPF:

b) A Advocacia Geral da União exerce a função de autoridade intermediária.


Marceli souza

c) Exige-se, como condição sine qua non, o trânsito em julgado da sentença estrangeira condenatória em
alimentos.
Marceli

d) A Procuradoria Geral da República é instituição intermediária.


e) É condição de procedibilidade, no Brasil, a concessão do exequatur pelo Superior Tribunal de Justiça.
296. (TRF - 4ª REGIÃO - 2014 - TRF - 4ª REGIÃO - Juiz Federal Substituto) Dadas as assertivas abaixo,
assinale a alternativa correta. Acerca da competência internacional do Poder Judiciário Brasileiro, podemos
afirmar que algumas causas, ainda que passíveis de apreciação por magistrados brasileiros, também podem
ser validamente submetidas à esfera de atribuições jurisdicionais de tribunais estrangeiros.
I. Algumas hipóteses legais admitem o concurso de jurisdição entre magistrados estrangeiros e brasileiros.
II. A norma legal que admite competência concorrente permite, nas suas hipóteses, a livre opção por litigar
perante magistrados brasileiros ou perante tribunais estrangeiros.
III. Entre os elementos definidores da competência da autoridade judiciária brasileira, ressalta-se o fato de o
réu ser domiciliado no Brasil e de aqui dever ser cumprida a obrigação, não sendo relevante que a ação se
origine de fato ocorrido no Brasil.
IV. A circunstância de o réu, em processo instaurado perante tribunal estrangeiro, ser brasileiro e
eventualmente domiciliado no Brasil não atua, por si só, como fator de exclusão da competência jurisdicional
da autoridade alienígena.

276
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

V. Em face da legislação brasileira, é legítimo entender-se, quanto aos casos de competência concorrente,
ou seja, aquela que pode ser afastada pela vontade das partes, que valerá a sentença decorrente do primeiro
litígio instaurado.
a) Está correta apenas a assertiva III.
b) Estão corretas apenas as assertivas I e II.
c) Estão corretas apenas as assertivas I, II e IV.
d) Estão corretas apenas as assertivas III, IV e V.
e) Estão corretas apenas as assertivas I, II, IV e V.
297. (CESPE - 2011 - TRF - 3ª REGIÃO - Juiz Federal) Com base na jurisprudência do STJ sobre a
homologação de sentenças estrangeiras no Brasil, assinale a opção correta.
a) A pendência de julgamento, no Brasil, de apelação contra sentença proferida em ação na qual se
discutam alimentos dos filhos dos ex-cônjuges impede a homologação de sentença estrangeira com o mesmo
objeto.
b) Ainda quando encaminhada por via diplomática, a sentença estrangeira deve ser autenticada pela
autoridade consular brasileira.
c) O ajuizamento de ação de revisão de alimentos no Brasil inviabiliza o processamento do pedido de
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homologação de sentença estrangeira relativa ao tema.


d) É autorizada a homologação de sentença estrangeira que, ao decretar o divórcio, convalida acordo
celebrado pelos ex-cônjuges quanto à partilha de bens situados no Brasil.
e) O inadimplemento de obrigações decorrentes da sentença estrangeira impede sua homologação no
Brasil.
298. (CESPE / CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) O Brasil adquiriu grande
CPF: 073.496.444-77

quantidade de determinado produto de uma empresa chilena, visando equilibrar os preços desse produto
no mercado interno brasileiro. Por motivos orçamentários, o pagamento foi efetuado fora do período
estipulado, tendo resultado em uma dívida em dólares. Após tais fatos, a empresa chilena propôs ação de
indenização contra o Estado brasileiro. Com base nessa situação hipotética, julgue os próximos itens.
souza -- CPF:

a) Caso a demanda tenha sido proposta no Chile, uma eventual sentença condenatória deverá ser
Marceli souza

homologada pelo STJ, ocasião em que será possível examinar questões relativas a eventuais irregularidades
no contrato celebrado.
Marceli

b) Se a ação tiver sido proposta no Chile e a justiça chilena tiver expedido uma carta rogatória para ser
cumprida no Brasil, admitir-se-á, nesse caso, a aplicação excepcional da legislação do país rogante por parte
do país rogado.
299. (CESPE / CEBRASPE - 2014 - Câmara dos Deputados - Analista Legislativo) Admite-se, em um
processo consensual, a homologação pelo STJ da sentença estrangeira que determine, de antemão, a
exclusão da competência da justiça brasileira na fase de execução, com base na supremacia da autonomia
de vontade.
300. (ESAF - 2012 - PGFN - Procurador da Fazenda Nacional) No Brasil, os instrumentos de cooperação
jurídica internacional
a) são a carta rogatória e a homologação de sentença estrangeira (conforme previsto na Constituição da
República Federativa do Brasil).
b) são a homologação de sentença estrangeira, a carta rogatória e a extradição (conforme previsto na
Constituição da República Federativa do Brasil).
c) são o auxílio direto, a homologação de sentença estrangeira, a carta rogatória e a extradição (mesmo
que estes não estejam todos previstos na Constituição da República Federativa do Brasil).

277
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO • 4

d) eram a carta rogatória e a homologação de sentença estrangeira. Atualmente é apenas a rogatória, uma
vez que após o Protocolo de Las Lenãs do Mercosul a homologação de sentença estrangeira, no Brasil, se dá
por meio da carta rogatória.
e) resumem-se hoje ao auxílio direto, que substitui todos os outros.
souza -- CPF:
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278
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA GABARITO •

GABARITO
1. Certa 45. Errada 89. Errada 133. C 177. Errada
2. Certa 46. Errada 90. A 134. B 178. Certa
3. C 47. Errada 91. Errada 135. C 179. Certa
4. Errada 48. Errada 92. Errada 136. B 180. A
5. C 49. Errada 93. Certa 137. Errada 181. B
6. E 50. Errada 94. Certa 138. Certa 182. Errada
7. Certa 51. Errada 95. Errada 139. C 183. Errada
8. D 52. Certa 96. Errada 140. Certa 184. Errada
9. Errada 53. Errada 97. D 141. B 185. Errada
10. Errada 54. Errada 98. Errada 142. Certa 186. C
11. Errada 55. Certa 99. Certa 143. E 187. D
12. Errada 56. Errada 100. Errada 144. Errada 188. Errada
13. Errada 57. Certa 101. Errada 145. Errada 189. Errada
14. Errada 58. Errada 102. Errada 146. Errada 190. Errada
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073.496.444-77 -- marceliangel@hotmail·com

15. Errada 59. Certa 103. Errada 147. Errada 191. Certa
16. Errada 60. Certa 104. A 148. B 192. C
17. Errada 61. Errada 105. E 149. Errada 193. Errada
18. Certa 62. Errada 106. Errada 150. D 194. A
19. Errada 63. Errada 107. Errada 151. D 195. A
20. Errada 64. Certa 108. Errada 152. C 196. E
21. Errada 65. Certa 109. Errada 153. Certa 197. B
CPF: 073.496.444-77

22. Certa 66. Certa 110. C 154. Errada 198. Certa


23. Errada 67. Errada 111. D 155. C 199. Certa
24. Certa 68. Certa 112. Certa 156. B 200. A
souza -- CPF:

25. Certa 69. Certa 113. Errada 157. B 201. C


26. Certa 70. Errada 114. Errada 158. B 202. Errad
Marceli souza

27. Certa 71. Errada 115. Certa 159. Certa a


28. Certa 72. Errada 116. Errada 160. D 203. C
Marceli

29. Errada 73. Errada 117. Errada 161. Errada 204. B


30. Certa 74. Certa 118. Errada 162. Certa 205. Errada
31. Certa 75. Certa 119. C 163. D 206. Errada
32. Errada 76. Errada 120. Errada 164. B 207. Errada
33. Errada 77. Certa 121. Errada 165. C 208. Errada
34. Errada 78. B 122. C 166. B 209. Errada
35. Certa 79. Certa 123. Certa 167. Certa 210. Certa
36. Certa 80. Certa 124. Errada 168. C 211. Errada
37. Certa 81. Errada 125. Certa 169. A 212. Errada
38. Errada 82. Errada 126. C 170. D 213. E
39. Certa 83. Certa 127. Certa 171. Errada 214. Certa
40. Certa 84. Errada 128. Certa 172. Certa 215. C
41. Certa 85. D 129. B 173. A 216. D
42. Errada 86. Certa 130. Certa 174. C 217. Errada
43. D 87. Errada 131. Errada 175. Certa 218. Certa
44. Errada 88. Certa 132. Certa 176. E 219. Errada

279
PAULO MÁXIMO DE CASTRO CABACINHA GABARITO •

220. Errada 237. Errada 254. Certa 271. Certa 288. Certa
221. Certa 238. Errada 255. Certa 272. D 289. Errada
222. Certa 239. Errada 256. Certa 273. D 290. Certa
223. Errada 240. E 257. C 274. Certa 291. C
224. Certa 241. Certa 258. D 275. Certa 292. A
225. D 242. C 259. Errada 276. E 293. C
226. A 243. C 260. A 277. D 294. E
227. B 244. C 261. Certa 278. C 295. D
228. A 245. C 262. E 279. C 296. C
229. B 246. C 263. D 280. Certa 297. D
230. Errada 247. Certa 264. C 281. Errada 298. a) E
231. Errada 248. Certa 265. B 282. A b) C
232. Errada 249. B 266. A 283. C 299. Errada
233. Errada 250. Certa 267. D 284. D 300. C
234. Errada 251. A 268. B 285. Certa
235. Certa 252. D 269. Errada 286. E
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236. Errada 253. Errada 270. Certa 287. A


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