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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Educação e Humanidades


Faculdade de Educação

Douglas de Toledo Vaz

Educação de Jovens e Adultos em Volta Redonda:


trajetórias forjadas no aço

Rio de Janeiro
2018
Douglas de Toledo Vaz

Educação de Jovens e Adultos em Volta Redonda: trajetórias forjadas no aço

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-Graduação em Educação, da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Linha de pesquisa:
Cotidianos, Redes Educativas e Processos
Culturais.

Orientadora: Profa.. Dra. Jane Paiva

Rio de Janeiro
2018
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CEH/A

V393 Vaz, Douglas de Toledo.


Educação de Jovens e Adultos em Volta Redonda: trajetórias forjadas no aço/
Douglas de Toledo Vaz. – 2018.
142 f.

Orientadora: Jane Paiva.


Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Faculdade de Educação.

1. Educação de jovens e adultos – Volta Redonda (RJ) – Teses. 2. Educação


e Estado – Teses. 3. Trabalhadores - Educação – Teses. I. Paiva, Jane. II.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Educação. III. Título.

es CDU 374(815.3)

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta
dissertação, desde que citada a fonte.

___________________________________ _______________
Assinatura Data
Douglas de Toledo Vaz

Educação de Jovens e Adultos em Volta Redonda: trajetórias forjadas no aço

Dissertação apresentada, como requisito parcial


para obtenção do título de Mestre, ao Programa
de Pós-Graduação em Educação, da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro. Linha de pesquisa:
Cotidianos, Redes Educativas e Processos
Culturais.

Aprovada em: 21 de agosto de 2018

Banca Examinadora:

_________________________________________
Profª. Dra. Jane Paiva (Orientadora)
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ

_____________________________________________
Profª. Dra. Ana Karina Brenner
Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ

_____________________________________________
Profª. Dra. Eliane Ribeiro Andrade
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro — UNIRIO

Rio de Janeiro
2018
DEDICATÓRIA

Dedico esse trabalho a todos os trabalhadores pioneiros dessa cidade que formaram a
base de Volta Redonda, em especial aos meus entrevistados (Antônio Amaro Pierramatei,
Francisco Augusto da Silva, Cícero Baptista Teixeira e Nelita Maria da Silva Teixeira e Naim
Dibb) que colaboraram com suas trajetórias e nos permitiram, por meio de suas memórias,
vislumbrar os processos de educação de adultos da usina Presidente Vargas.
AGRADECIMENTOS

À Deus pois é por Ele e para Ele que eu faço todas as coisas.
À minha magnífica, linda e paciente esposa que me apoia e vive com minha ausência
para que eu possa realizar meus sonhos, e esse foi mais um.
Aos meus familiares que me apoiam e acreditam que eu chegarei onde eu sonho
chegar.
A todos que, de forma direta (muitas vezes fazendo o meu serviço para que eu pudesse
estudar) e de forma indireta (incentivando, motivando e muitas vezes me desafiando a ser
mais).
Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se
educam entre si mediatizados pelo mundo.
Paulo Freire
RESUMO

VAZ, Douglas de Toledo. Educação de Jovens e Adultos em Volta Redonda: trajetórias


forjadas no aço. 2018. 142 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018.

Esta pesquisa investigou, exploratoriamente, fontes primárias em acervos e registros


documentais da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), no período de 1940-1960 e a
memória de ex-trabalhadores na indústria como fonte oral, em busca de conhecer as ações de
educação e formação de adultos trabalhadores, visando a responder a seguinte questão: como
se deram os processos de escolarização e de qualificação profissional nos primeiros anos de
implantação da Usina Presidente Vargas. Para tanto, investigou o processo de formação da
cidade de Volta Redonda, nascida para servir a necessidades da indústria de base e como
chegaram a ela os adultos, quase sempre analfabetos, que serviram desde a construção da
planta industrial como operários e depois como industriários, nas diversas funções que a
siderurgia requeria. A fundamentação teórica baseou-se na legislação educacional da época e
em concepções nacionais e internacionais da educação de adultos para compreender os
sentidos ali desenvolvidos; autores que estudaram a história de formação da cidade e da
implantação da indústria foram também preciosas fontes históricas. A interpretação das fontes
documentais fez-se à luz desse referencial, complementada pelas memórias de depoentes que
aportaram elementos à compreensão da documentação, quase sempre confirmando-a. Os
sujeitos da pesquisa foram ex-trabalhadores da Companhia Siderúrgica Nacional a partir da
década de 1940 até 1970, no município de Volta Redonda. O estudo justificou-se pela
necessidade de desencavam memórias e reconstruir, na medida do possível a história da
educação e adultos no Rio de Janeiro, especificamente na região do Médio Paraíba. Ao final,
o que se pode constatar diz respeito a como processos de formação profissional eram
intensificados pela CSN, e não da mesma forma os de escolarização, quase sempre feitos por
iniciativa dos trabalhadores fora da indústria, mesmo sabendo na pouca ou ausente
escolaridade dos que atuavam em postos os mais diversos, exigentes de conhecimentos
formais supostamente adquiridos na escola. Quanto aos trabalhadores, o estímulo profissional
existente vinculava-se à formação continuada para exercício da profissão, o que significava
formação, qualificação e aperfeiçoamento. Êxito nos cursos oferecidos eram contemplados
com melhores salários e até mesmo mudança de cargos. O plano de longo prazo da empresa,
no entanto, visava à escolarização de filhos dos trabalhadores para que fossem futuros
empregados, para o que, não poucas vezes, a empresa apoiou e incentivou financeiramente a
rede municipal de Volta Redonda.

Palavras-chave: Educação de adultos. Qualificação. Escolarização. CSN.


ABSTRACT

VAZ, Douglas de Toledo. Youth and Adult Education in Volta Redonda: Trails forged in
steel. 2018. 142 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação,
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018.

This research has delved into primary sources, in collections and documentary records
of the Companhia Siderúrgica Nacional – CSN (National Steelworks Company), ranging from
1940-1960, and the memory of ex-workers from the industry, as oral sources, as a means of
getting to know the actions in education and formation of working adults, aiming to answer
the following question: how did the schooling and professional qualification processes get
done in the early days of the Usina Presidente Vargas (President Vargas Plant). To that end, it
has researched the process of formation in the city of Volta Redonda, born to supply the needs
of the basic industry, and how the adults (almost always illiterate) that worked at the plant
since its building, as construction workers, and then after, as industry laborers in the various
jobs required, got to it. The theoretical framework was based on the education law of the time,
and on national and international concepts of adult education in order to comprehend the
meanings developed in that place; A number of authors that have also studied the history of
the city’s development and the industry’s implantation were also precious historical sources.
The analysis of the documentary sources was born from this reference frame, complemented
by the memories of deponents that contributed elements to the understanding of the
documentation, almost always validating it. The subjects of the research were ex-laborers of
the Companhia Siderúrgica Nacional, from 1940 to 1970, in the municipality of Volta
Redonda. The study was justified in the need of unraveling memories and rebuilding, as much
as possible, the history of education of adults in Rio de Janeiro, specifically in the Médio
Paraíba area. In the end, what can be said is related to how professional formation processes
were intensified by the CSN, and the schooling ones were not, almost always being done by
the workers themselves, outside the factories’ doors, even when in a situation of scarce
schooling or lack thereof of the ones who worked at the most diverse posts, demanding of
formal knowledge supposedly acquired in regular schooling. Relating to the workers, the
professional stimulus was linked to the continued formation for the exercise of labor, what
meant formation, qualification and perfectioning. Success in the offered courses was
contemplated with better wages and even change in posts. However, the company’s long-term
plan was to educate the worker’s children in order to make them future employees, to such
end that, not few times, the company supported and endorsed Volta Redonda’s municipal
education network.

Keywords: Adult education. Qualification. Schooling. CSN.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Localização de Volta Redonda ................................................................................ 42


Figura 2 - Mapa de Volta Redonda demonstrando a área da CSN e vazios demográficos ...... 44
Figura 3 - Lingote n. 02, 10 de abril de 1953. .......................................................................... 74
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CAI Curso de Aprendizagem Industrial


CEAA Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos
CF 1988 Constituição Federal de 1988
CLT Consolidação das Leis do Trabalho
CNER Campanha Nacional de Educação Rural
CONFINTEA Conferência Internacional de Educação de Adultos
CSN Companhia Siderúrgica Nacional
EdA Educação de Adultos
EF Ensino Fundamental
EJA Educação de Jovens e Adultos
EM Ensino Médio
ETPC Escola Técnica Pandiá Calógeras
FERP Fundação Rosemar Pimentel
FGV Fundação Getúlio Vargas
FIRJAN Federação da Indústria do Estado do Rio de Janeiro
FOA Fundação Oswaldo Aranha
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
ISEB Instituto Superior de Estudos Brasileiros
JK Juscelino Kubistchek
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDBEN Leio de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LEI Linha de Engenharia Industrial
MEC Ministério da Educação
PIB Produto Interno Bruto
PNE Plano Nacional de Educação
RJ Rio de Janeiro
SBM Siderúrgica de Barra Mansa
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comércio
SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SENAR Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
SESI Serviço Social da Indústria
UBM Universidade de Barra Mansa
UFF Universidade Federal Fluminense
UGB Universidade Geraldo D’Biase
UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................... 12
1 EDUCAÇÃO, INDUSTRIALIZAÇÃO E MEMÓRIAS......................................... 18
1.1 Educação popular ....................................................................................................... 18
1.2 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ................................................................ 20
1.3 Educação ao longo da vida ......................................................................................... 23
1.4 As Conferências de Educação de Adultos ................................................................ 25
1.5 Educação de Adultos pré-industrialização ............................................................... 28
1.6 Inicia-se a industrialização de base no Brasil – a mudança da sociedade ............. 30
1.7 Campanhas de alfabetização de adultos ................................................................... 34
1.8 Após as Campanhas .................................................................................................... 35
1.9 Escolarização na Companhia Siderúrgica Nacional ............................................... 37
1.10 Memórias orais............................................................................................................ 39
2 A FORMAÇÃO DE VOLTA REDONDA ............................................................... 42
2.1 Histórico Pré Volta Redonda ..................................................................................... 45
3 EDUCAÇãO DE JOVENS E ADULTOS À SOMBRA DA CSN........................... 60
3.1 As primeiras referências ............................................................................................ 60
3.2 Atores do processo e suas vivências .......................................................................... 62
3.2.1 Antônio Amaro Pierramatei .......................................................................................... 62
3.2.2 Francisco Augusto da Silva .......................................................................................... 64
3.2.3 Cícero Baptista Teixeira e Nelita Maria da Silva Teixeira ........................................... 67
3.2.4 Naim Dibb .................................................................................................................... 70
3.3 A trajetória da educação na CSN: O Lingote ........................................................... 72
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 88
REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 93
ANEXO A – Volta Redonda: cidade do aço ................................................................ 99
ANEXO B - A construção de uma usina/cidade ........................................................ 104
ANEXO C – A educação de adultos e "O Lingote"................................................... 111
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INTRODUÇÃO

Nascido e criado em Volta Redonda, filho de pai operário da Companhia Siderúrgica


Nacional (CSN), mãe dona de casa e pertencente a tradicional família operária da cidade,
morava na periferia. Essa origem e o desenvolvimento da vida da cidade em torno dessa
empresa compuseram a temática que faz parte integrante da minha vivência e história.
Durante muitos anos fui beneficiado pelas políticas sociais e compensatórias da CSN;
meu pai, apesar de ter tido várias oportunidades, não quis estudar, mas na política de
incentivo aos estudos sempre primou pela escolarização minha e de minha irmã, para que
pudéssemos ter chances maiores do que as dele. Nesse intuito, dialogar sobre os direitos e
reais acontecimentos na educação de adultos na cidade de Volta Redonda torna-se parte da
minha essência.
A Constituição Federal (CF) de 1934 é a primeira que garante a educação como direito
de todos, oferecendo aos adultos que não tiveram acesso à educação, a proteção legal que os
amparava, para que pudessem acessar processos de aprendizado da leitura e da escrita. No
Art. 149, emerge como direito de todos, e deve ser ofertado pela família e pelo poder público,
para que forme o indivíduo segundo preceitos da moral e desenvolva espírito brasileiro e
solidário. (CF 1934, Art. 149). Em 1937, uma nova Constituição é promulgada e o texto em
que se garantia a educação como direito de todos, é retirado.
A partir dos anos de 1940, inúmeras campanhas para a alfabetização de adultos se
iniciaram, principalmente pautadas na ideologia que Getúlio Vargas tentava instituir no
Brasil. Um dos momentos marcantes foi a Reforma Capanema, em 1942, responsável por
muitas leis educacionais da época. Cabe destacar, para esse estudo, o Decreto-lei n. 4.073, de
30 de janeiro de 1942, que organizou o ensino industrial e o Decreto-lei n. 4.048, de 22 de
janeiro de 1942, que instituiu o Senai.
Nos anos que se seguiram, na Europa, nos acordos de restauração do continente
europeu, no pós-guerra, estava incluída a educação de adultos:

[...] como forma de adaptar os cidadãos a um mundo que se refazia, em que os


conhecimentos haviam avançado em progressão geométrica por força de
necessidades específicas do conflito e que, consequentemente, exigia novas
aprendizagens, (re)novados sujeitos aprendentes. Os sentidos dos acordos
internacionais incluíam a cultura de paz ao campo da educação de adultos e
buscavam fazer com que a educação contribuísse para a reinstauração de direitos [...]
(PAIVA, SALES, 2013, p. 11)

A Unesco, em Assembleias Gerais, estabelecia acordos com todos os países, porém os


mais desenvolvidos recebiam apoios no período do pós-guerra para realizar as metas
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agendadas, enquanto ao Brasil e a outros países em desenvolvimento, restavam seus próprios


esforços para que jovens e adultos fossem vistos como sujeitos de direito e para que, a longo
prazo, pudessem se desenvolver como nações livres do analfabetismo e com avanços no
campo da cidadania. O Brasil só reconquistará novamente o direito à educação para todos
com a Constituição de 1988, que volta a assegurá-la como direito social. (PAIVA, SALES,
2013)
Dessa forma, pensar a construção do Brasil e as desigualdades sociais que a
acompanharam desde a fundação do país, é perceber que a pátria falhou com muitos
brasileiros que não puderam usufruir dos benefícios de que trata o Artigo 2º da CF 1988.
Duramente conquistado em 1996, o direito à educação não se fazia como direito social. Por
isso, muitos de nossos compatriotas não tiveram a possibilidade de alcançar a escola e/ou de
concluir seus estudos em tempo oportuno por diversos motivos: falta de políticas públicas, de
escolas, extrema desigualdade social etc. Formou-se, assim, historicamente, uma população
adulta com grupos analfabetos, semianalfabetos, analfabetos funcionais e sem formação
técnica para o trabalho.
Naquele momento histórico havia muitos profissionais em atuação no trabalho
informal, por não terem escolaridade formal, nem certificação técnica, em uma sociedade
capitalista que não oferece postos de trabalho e que, por isso mesmo, valoriza o ―mérito dos
diplomas‖ como critério de acesso aos postos existentes, fazendo crer aos indivíduos que não
o obtêm que são culpados pelo fracasso. Esses sujeitos são ―formados‖ na vida, no ver, no
fazer, no errar e fazer de novo, no aprender por si próprios. Nesse contexto, muitas vezes há
errônea interpretação dos Artigos 37 e 38 da LDBEN, quando se oferece o ensino noturno
regular (inciso VI Art. 4º) como forma de educação de jovens e adultos, o que foge em muito
da proposta original que a lei propugna.

Art. 37. A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram
acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria.
§ 1º. Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que
não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais
apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições
de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.
[...]
Art. 38. [...] § 2º. Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por
meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames. (BRASIL, 1996,
Art. 37 e §1º.; Art. 38 § 2 º.)

Além disso, no inciso III, Art. 27 ("Os conteúdos curriculares da educação básica
observarão, ainda, as seguintes diretrizes:"), a mesma Lei declara que esses conteúdos devem
conter "orientação para o trabalho", o que não se pode confundir com formação para o
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mercado de trabalho, pois esse artigo trata, além da orientação para o trabalho, no inciso I
―[...] de difusão de valores fundamentais ao interesse social, aos direitos e deveres dos
cidadãos, de respeito ao bem comum e à ordem democrática;‖ ou seja, apontando que a
educação não se reduz a uma formação estreita, mas à formação humana e cidadã.
Na atualidade, vem-se resgatando a necessidade de formar trabalhadores cujos
processos pautem-se na ciência, na técnica e na tecnologia, o que está corroborado pelo texto
da LDBEN. Mas não se pode desconsiderar que esta concepção se faz em tensão e disputa
com o sistema capitalista, que acentua a divisão ―[...] entre trabalho intelectual e manual como
estratégia de subordinação, tendo em vista a valorização do capital‖ (KUENZER, 2010, p.
861).
Os registros sobre educação de jovens e adultos nas concepções que se discutem na
atualidade são muito recentes. Por muito tempo as escolas noturnas eram a única forma de
alfabetizar adultos que, após um dia árduo de trabalho, se encaminhavam a uma classe que,
em muitos casos, eram informais, nas quais os que ―sabiam um pouco mais‖ transmitiam ―aos
que nada sabiam‖. Somente com o processo de industrialização é que se pode perceber
algumas melhorias no processo.
Na pesquisa aqui apresentada, pude observar que a construção da Usina Presidente
Vargas, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), foi um marco histórico na região
conhecida como Médio Paraíba, e principalmente para a cidade que nasceria ao seu entorno,
Volta Redonda. Fundada em 9 de abril de 1941 por Decreto do então presidente Getúlio
Vargas, tinha como objetivo fornecer aço aos aliados, durante a Segunda Guerra Mundial e,
em tempos de paz, ajudar o desenvolvimento do Brasil.
Com o advento dessa indústria, muitos foram os migrantes que chegaram à cidade,
vindos de vários cantos do país, mas principalmente do Rio de Janeiro, de São Paulo, de
Minas Gerais, do Espírito Santo e de vários estados da região Nordeste.
Em um país que até este momento vivia muito mais voltado para o campo, isto é, para
o trabalho agrário, e não tinha mão de obra especializada, a chegada da indústria a Volta
Redonda exigia trabalhadores com perfil diferente. Os que chegavam, em maioria agricultores
e analfabetos, não tinham experiência de trabalho na construção civil para pôr de pé a planta
industrial, nem nos processos de produção de uma indústria cuja tecnologia e conhecimentos
exigiam mão de obra qualificada. Eram esses os trabalhadores que teriam de atuar na
construção de uma faraônica indústria, com tecnologia de ponta e requerimentos de
conhecimentos que os migrantes não apresentavam. A implantação da indústria teve de se
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fazer junto à formação de trabalhadores que, além de não qualificados para as funções, em
larga escala eram, em considerável parte, não alfabetizados.
Assim, essa pesquisa justificou-se no âmbito da compreensão de como se deu a
formação inicial desses trabalhadores, cujas condições desafiavam a indústria que recém se
implantava, não apenas no tocante às especificidades do que exigia a produção do aço, mas
também quanto à compreensão de que esta formação específica dependia de escolaridade e do
saber ler e escrever. Além disso, a empresa nascia sob um projeto nacional de transformação
da sociedade que se instalaria em seu entorno A pesquisa, por isso, investigou que instituições
foram responsáveis pela alfabetização e/ou formação e capacitação dos trabalhadores e como
se davam as formações para o serviço da indústria de produção do aço. De modo secundário,
penso que apontei pistas de como foram sendo cumpridos os objetivos de criar uma sociedade
que serviria ao propósito da indústria na região.
Entendendo os fenômenos alcançados, de alguma forma compreendi aspectos da
formação política que os trabalhadores entrevistados demonstraram em suas narrativas e o
modo como a cidade passou a lidar com a educação de adultos, essencial para a formação dos
trabalhadores, além das iniciativas culturais que foram sendo instaladas na sociedade
voltarredondense, que surgia ao redor dessa indústria.
Como objetivo geral da pesquisa, enunciei a ideia de construir um histórico das
experiências de educação de jovens e adultos e educação ao longo da vida na cidade de Volta
Redonda, estado do Rio de Janeiro, após o ano de 1940 até 1970, período que marcou o início
das obras da Companhia Siderúrgica Nacional, início do funcionamento, e emancipação da
cidade.
Como objetivos específicos, defini: construir um histórico dos acontecimentos que
levaram à formação e emancipação da cidade de Volta Redonda; desenvolver um aporte
teórico sobre a educação popular e a educação de jovens e adultos, educação ao longo da vida
pré-industrialização e após os anos de 1940 que deram sustentação às experiências
vivenciadas em torno da usina da CSN; analisar documentos e registros históricos para a
criação de uma cronologia de como e quais ações ocorreram na cidade; realizar entrevistas
para evocar memórias de processos educacionais voltados para jovens e adultos no período
pós CSN; registrar em áudio e transcrever as entrevistas coletadas; estabelecer paralelos entre
práticas e discursos da época enfocada com a atualidade, no que se refere à educação de
jovens e adultos, educação popular e educação ao longo da vida.
Os objetivos supracitados, bastante ambiciosos, não foram em muito atendidos, por
diversos fatores que se interpuseram no caminho do curso de mestrado, tanto no que respeita à
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minha inserção profissional, não sendo bolsista, o que determinou maiores restrições nos
tempos de busca sistemática de instituições e atores que me franqueassem acesso à
documentação e a dados. Com isso, quero informar que a presente dissertação não contempla
uma realidade mais ampla da educação e adultos no período definido, mas aproxima leitores e
futuros pesquisadores de um tema ainda por desvendar, cujos indícios e primeiras sinalizações
foram aqui contempladas.
Minha metodologia de pesquisa, pelos limites apontados ficou restrita, quase
exclusivamente, a um levantamento documental que procurei sistematizar e organizar,
apresentando-o nos principais aspectos relacionados aos objetivos traçados e a quatro
entrevistas realizadas.
Assim, de acordo com Gil (2008), esta pesquisa pode ser classificada como básica, por
ter aportado elementos novos e úteis para o crescimento e desenvolvimento da ciência, sem
aplicação prática prevista e, ainda, com análises bastante incipientes. Considera-se ser esta
uma pesquisa exploratória, que permitiu maior familiaridade entre o objeto de pesquisa e o
pesquisador. Sua riqueza consistiu no desvendamento de fontes documentais e algumas fontes
orais que não imaginava mais possível de acessar, face ao distanciamento temporal em que as
ações iniciais ocorreram.
Em relação aos procedimentos metodológicos, segundo os critérios indicados por
Gerhardt e Silveira (2009), a pesquisa foi dividida em três fases: a) num primeiro momento,
bibliográfica, quando tratei os registros históricos sobre a formação da cidade de Volta
Redonda, sobre alfabetização e formação de jovens e adultos no Brasil a partir de 1930; b) em
seguida, conformou-se a pesquisa documental, principalmente sobre registros qualitativos,
apontamentos quanto à metodologia e práticas de educação executadas a partir da chegada da
CSN, e no acervo do periódico O Lingote, que constituiu a maior surpresa como fonte
documental achada nos arquivos da empresa; c) por fim, a terceira fase tratou das entrevistas,
quando captei informações de fontes orais, completando lacunas e corroborando informações
das fontes documentais.
As entrevistas realizadas com ex-funcionários que viveram e trabalharam na Usina
naquela época reforçaram o que Zanella (2009) destaca, de que as entrevistas possibilitam que
o respondente exponha suas ideias — e nesse caso, memórias —, evitando respostas fixas,
próprias de questionários fechados. As memórias dos depoentes, olhadas a partir de alguns
aportes teóricos, ajudaram a compreender o que envolveu a instalação e o desenvolvimento da
Usina, pela ótica dos que vivenciaram aquele tempo. Compreender como a memória permite
entender pessoas e grupos de pessoas e suas estruturas significa, para Alberti (2006, p. 165),
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―entender como pessoas e grupos experimentaram o passado torna[ndo] possível questionar


interpretações generalizantes de determinados acontecimentos e conjunturas‖.
A dissertação está dividida em quatro capítulos. No primeiro capítulo abordei os
conteúdos das duas primeiras Conferências Internacionais de Educação de Adultos (Confintea
I e II) e concepções e recomendações que ajudariam a compreender o marco conceitual da
educação de adultos no tempo em que se dá a formação na CSN.
No capítulo 2 tratei da cidade de Volta Redonda e o histórico de sua criação,
demonstrando o passo a passo de como ela se estabeleceu, desmembrando-se como distrito
que era do município de Barra Mansa. Apresento ainda quem eram os trabalhadores, de onde
vieram, quais as condições de vida que deixaram para trás e quais encontraram, podendo-se
refletir sobre suas escolhas, a decisão de escolarização e formação e de que modo puderam se
constituir como sociedade e município.
No capítulo 3, com referenciais iniciais e apontamento das limitações encontradas na
busca por informações, incluí registros de classes de alfabetização na cidade e onde se
situavam; como a empresa atuava sob uma concepção de educação de adultos e de que forma
buscava a qualificação dos trabalhadores. O achado da publicação distribuída na CSN de 1953
até 1977, um informativo chamado O Lingote, instrumento de comunicação, noticiava ofertas
de educação escolar e profissional, destacava os êxitos das iniciativas realizadas e o
desempenho de trabalhadores e estimulava a inserção desses trabalhadores em outras
instâncias da vida social e da igreja, em Círculos Operários. Por fim, quatro entrevistados
aportam suas memórias e experiências educativas dentro e fora da empresa, interpretando os
discursos institucionais e os efeitos do pertencimento em suas vidas.
Nas considerações finais faço alguns alinhamentos pertinentes ao trabalho da pesquisa,
evidenciando limitações e perspectivas para novos estudos baseados nesse estudo inicial
exploratório. A relevância de deslindar a história de processos ocorridos em uma cidade
nascente do Sul do Rio de Janeiro, e como ela se estrutura para atender os interesses de uma
também nascente empresa estatal demonstra como e para onde vão, ainda hoje, a instituição
de modelos sociais a serviço do desenvolvimento da industrialização e do capital.
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1 EDUCAÇÃO, INDUSTRIALIZAÇÃO E MEMÓRIAS

Para se compreender os movimentos educacionais de adultos que ocorreram na cidade


de Volta Redonda com a implementação da Companhia Siderúrgica Nacional, faz-se
necessário o entendimento de como se tratava a educação no fim dos anos de 1920, início dos
anos 1930, em destaque especial à educação de jovens e adultos (EJA) e quais eram as
perspectivas que começavam a nascer com as mudanças políticas e econômicas do país. As
leis que permeavam e que mudavam a educação, o processo de tecnicismo para a formação de
mão de obra, a valorização do conhecimento, as campanhas para alfabetização de adultos, os
movimentos migratórios e as contribuições e rupturas de paradigmas freireanos que, na
atualidade, vêm sendo novamente tensionados por movimentos ideológicos. Apesar de terem
sido formulados depois de experienciados no século passado, esses paradigmas se fazem
atuais em nossa realidade, pois como afirma Calvino (1993), uma bibliografia se torna um
clássico quando seus leitores percebem que ela ainda não terminou de dizer o que queria, e
que ainda possui muitos mistérios a deslindar.

1.1 Educação popular

Observa-se que a educação pode libertar ou aprisionar, revelar-se ou esconder-se,


favorecer a coragem ou amedrontar — um complexo conjunto de aspectos que surpreendem e
estão presentes nas muitas experiências realizadas cotidianamente. Depende, em síntese, das
intenções de quem tem o poder de criar/propor políticas e mecanismos educacionais, assim
como de quem faz a educação na prática social. Vanilda Paiva (2003, p. 46), entretanto, assim
pensa a educação:

Reconhece-se que a educação pode ser um instrumento importante para a


conservação ou para a mudança social: os que detêm o poder tentam fazer dela um
instrumento de conservação, enquanto seus opositores tentam utilizá-la como
instrumento de mudança. Nessa luta, levam vantagem os detentores do poder,
capazes de decidir acerca da orientação dos sistemas educativos, da difusão ou não
do ensino, da criação ou não de programas educativos paralelos ao sistema comum.

De acordo com Pereira e Pereira (2010), educação popular seria sinônimo de conflito,
por não ter nascido dentro de estruturas escolares fechadas como as conhecemos ainda hoje;
ao contrário, afirmam que ela nasceu na busca de emancipação, pelo desejo de participar e ser
ouvido, em associações de moradores, movimentos populares organizados, de igrejas, em
assembleias sindicais etc. Essas organizações populares tomam como base a liberdade —
requerimento de seres humanos para a emancipação social. A força desses movimentos, em
muitos casos, adentrou salas de aulas e espaços formais de educação como possibilidade de
19

criar espaços de diálogo acerca da compreensão e tomada de consciência sobre a sociedade


vigente e vindoura.
Em Brandão (1986) lemos que educação popular tem seus primeiros passos na
América Latina, em momentos de substituição de exportação de produções agrárias para a
industrial, pela necessidade de escolarizar as massas em caráter emergencial para,
supostamente, melhor atender demandas da produção. Esse caráter de urgência foi
responsável, em muitos casos, pelas campanhas de alfabetização de adultos.
Mas cabe indagar, ao se abordar o termo popular, sobre quem se está falando, quem
seria esse popular. Por que utilizar, por exemplo, tal termo junto, adjetivando, a palavra
educação? Segundo Figueiredo (2009), popular ligaria a educação às classes pobres, às
massas marginalizadas que, no curso histórico, ficaram distanciadas da educação formal. Na
maior parte, são adultos que ficaram distanciados da educação formal e que, em grande
número, não têm condições de suprir nem suas necessidades mais básicas.
Depois da Segunda Guerra Mundial, os ideais democráticos começaram a alcançar
todo o mundo, e no Brasil não foi diferente, e a educação de massas começou a ser foco das
políticas. O pensamento de alfabetizar quem não sabia ler e escrever tomou discussões,
legislações e a atenção. Numa sociedade que buscava migrar para a era da indústria, ter uma
população —segundo o pensamento da época — inculta, ignorante, sem higiene, não era o
ideal. Voltaram-se os olhares para o cidadão das áreas rurais, com o intuito de ―civilizá-lo‖.
Na década de 1950 tais ideais adentram as discussões de intelectuais e no II Congresso
Nacional de Educação de Adultos vários posicionamentos surgem diante dessa perspectiva
educacional. Uma delas, a de Paulo Freire, que agradou e atraiu vários intelectuais e
lideranças com a defesa de uma educação que, além de alfabetizar, também conscientizava
(BEISIEGEL, 1989).
Brandão (1986) afirma que a educação popular está voltada para a ideia de
participação, por meio de diversas situações e instrumentos, pelos quais as classes populares
conseguem ler sua própria história e reconhecer seus saberes, e transformar tal leitura em
força e poder para mudanças.
Para Paulo Freire, a educação popular tinha o poder de mudar realidades, de
transformar o fatalismo em perspectiva de mudança.

A ideologia fatalista, imobilizante, que anima o discurso neoliberal, anda solta no


mundo. Com ares de pós-modernidade, insiste em convencer-nos de que nada
podemos contra a realidade social, que de histórica e cultural, passa a ser ou virar
―quase natural‖. Frases como ―a realidade é assim mesmo, o que podemos fazer?‖
ou ―o desemprego no mundo é uma fatalidade do fim do século‖ expressam bem o
fatalismo desta ideologia e sua indiscutível vontade imobilizadora. (FREIRE, 1996,
p. 21)
20

Ainda em Freire (2002) encontramos a educação popular com o objetivo de formar


sujeitos com consciência cidadã e propiciar a organização do trabalho político para que o
sujeito se afirme, porque para ele a consciência da realidade é uma das principais funções da
educação libertadora. Respeita o homem como pessoa.
Brandão (1984, p. 103) entende por educação popular ―A educação através da qual ele,
o sujeito, não se veja apenas como um anônimo sujeito da cultura brasileira, mas como um
sujeito coletivo da transformação da história e da cultura do país.‖
Em todos os conceitos apresentados, independentemente de se saber a real motivação
do início do termo educação popular ou saber quem o cunhou pela primeira vez, é simples
entender seus objetivos de tirar o indivíduo de uma inércia social e pessoal e inseri-lo em uma
busca individual e coletiva de liberdade e apropriação de seu papel como transformador da
realidade.
Brandão (1984, p. 23) traz reflexões sobre o fato de serem tão comuns no Brasil,
depois dos movimentos de industrialização, intenções dos movimentos de alfabetização. De
acordo com o autor:

Do ponto de vista de empresários e políticos do capital, os interesses na educação do


povo sempre foram definidos: a) pela necessidade de reprodução das ideias,
símbolos e dos hábitos sociais que preservem uma ordem social de dominância
estabelecida se possível, sem ser contestada; b) pela necessidade de reprodução de
força de trabalho popular ―civilizada‖ para a cidade (alfabetizada, instruída em
hábitos burgueses de cidadania) e ―capacitada‖ para a fábrica.

Por essa perspectiva os objetivos da educação popular podem ser analisados, porque
também podem ser difusos e, por isso, se anularem; se por um lado eles podem servir para a
libertação do indivíduo, por outro podem aprisioná-lo, a depender dos objetivos de quem
controlará os processos educativos.

1.2 EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

A educação de adultos como uma atividade especializada e


deliberadamente organizada surgiu apenas quando a civilização tomou
forma e trouxe com ela as ideias de progresso democrático e social. É
sintomático que, onde quer que o progresso seja observado na
estrutura material ou moral da sociedade no mundo de hoje,
experiências em educação de adultos também estão sendo
organizadas.
CONFINTEA, 1949 apud IRELAND e SPEZIA, 2018, p. 89
21

Políticas públicas voltadas para pessoas adultas, institucionalmente, surgiram no final


dos anos de 1940. Não quer dizer que não houvesse escolarização para adultos, pelo contrário,
ela existia, mas para poucos e quase sempre voltada ao âmbito religioso. Quando a
Constituição de 1934 traz em seu texto a universalização da educação para todos, dá início ao
debate de uma educação voltada para aqueles que não puderam se escolarizar na idade ―certa‖
e de como se daria o regresso dessa população à escola.
Colocados de lado todos os objetivos sociais na ideia de civilização dos que não
possuíam ―trato social‖, os objetivos econômicos preponderavam, pois o país passava por
intensa mudança na característica produtiva, deixando pouco a pouco de ser um país com
características somente rurais e produção do campo (quase exclusivamente) para adentrar a
era da industrialização e de objetivos políticos, visto que para analfabetos o voto era proibido,
e a intenção de escolarizar aqueles que tiveram o direito à educação negado na infância
parecia de bom tom à nação. (MACIEL, 2011).
A forma como essa educação de adultos foi proposta deixa o diálogo aberto para
inúmeras análises, pensando acerca de metodologias empregadas e de abordagens e materiais
produzidos à época. As campanhas de alfabetização de adultos tiveram papel relevante nessa
empreitada, pois além de escolarizar tinham objetivos sociais e de estruturação global da vida
das pessoas, se quisesse ou não ficar no campo ou vir para a cidade.
O êxodo rural decorrente, segundo Maciel (2011), encheu as cidades, pois a massa de
população buscava novas oportunidades nas cidades e, ao mesmo tempo, era atraída para que
dessem sua contribuição ao desenvolvimento do país. Nesse processo, as massas populares
conquistaram direitos sendo a elas ofertada a escolarização necessária, pois cada vez mais
crescia o número de analfabetos nas cidades oriundos do campo que precisavam ser
alfabetizados para que contribuíssem com o desenvolvimento do país. (MACIEL, 2011)
Logo se firmaria no Brasil o conceito de supletivo, que trazia arraigadas as ideias de
aceleração da aprendizagem. O conceito era simples: quem não pode estudar na infância (a
chamada época própria) precisava acelerar seus aprendizados, porque não havia tempo a
perder. O fato é que essa aceleração, de acordo com Di Pierro (2005) não veio incorporada
com as contribuições dos movimentos de educação e de cultura popular que emergiam nos
congressos e debates acadêmicos, principalmente com a figura de Paulo Freire sobre como se
constituiria a formação para jovens e adultos de modo global. Ao contrário, o conceito e a
aceleração nele embutida eram puramente tecnicistas e atendiam aos apelos da
individualização e do tecnicismo, assim como ideias da instrução programada que fizeram
crescer, anos depois, cursos não presenciais em centros supletivos e em telecursos, o que
supostamente assegurava a aceleração da aprendizagem, gerando a busca por certificação
rápida.
22

Na atualidade ainda se mantém a concepção compensatória da educação de jovens e


adultos, e o entendimento de que a sociedade precisa pagar essa dívida com esse público,
mesmo depois da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9394/96). Di Pierro
(2005, p. 1118) discorre sobre esse tema contradizendo esse conceito:

Ao focalizar a escolaridade não realizada ou interrompida no passado, o paradigma


compensatório acabou por enclausurar a escola para jovens e adultos nas rígidas
referências curriculares, metodológicas, de tempo e espaço da escola de crianças e
adolescentes, interpondo obstáculos à flexibilização da organização escolar
necessária ao atendimento das especificidades desse grupo sociocultural. Ao dirigir
o olhar para a falta de experiência e conhecimento escolar dos jovens e adultos, a
concepção compensatória nutre visões preconceituosas que subestimam os alunos,
dificulta que os professores valorizem a cultura popular e reconheçam os
conhecimentos adquiridos pelos educandos no convívio social e no trabalho.

As bases do pensamento sobre a educação de jovens e adultos no Brasil foram, em


grande parte, equivocadas e, por isso mesmo, produziram campanhas, metodologias e
propostas na perspectiva de recuperação do tempo perdido, mantendo ainda agora o
paradigma compensatório e perpetuando, muitas vezes, a infantilização das propostas, pois se
é necessário que se compense a fase perdida quando criança, acaba-se por realizar propostas
infantis que desconsideram o saber de jovens e adultos, suas vivências e a cultura acumulada
durante a vida.
Mas responsabilizar apenas uma pedagogia estreita, que não se diferenciou e se
manteve com a ideia compensatória, sem relacioná-la aos resultados qualitativos escassos
desenvolvidos no decorrer dos anos, seria muito parcial. A escassez de recursos financeiros
para desenvolver propostas e materiais, não apenas no caso da educação de jovens e adultos,
mas de modo geral, no campo educacional, e a formação inespecífica de professores que
atuariam com esse grupo é outro fator de peso nessa balança, há muito desequilibrada. São
estes, ainda na contemporaneidade, problemas que atingiram propostas de desenvolvimento
de ensino ao longo da história da educação, e que teve afetação maior nas modalidades sem
prestígio social e sem visibilidade, neste caso, a educação de jovens e adultos.
A educação de jovens e adultos foi estimulada pela articulação de inúmeros órgãos,
inclusive internacionais, como exemplo a Unesco. Criado um Fundo Nacional de Ensino
Primário, destinaram-se 25% dos recursos para modalidades de supletivo ofertadas a
adolescentes e adultos analfabetos, pois se fazia necessário educá-los para que entrassem no
mundo da produção. (MACIEL, 2011).
23

1.3 Educação ao longo da vida

Educação ao longo da vida nos remete ao ideal de ―eterno aprendiz‖, como bem
metaforiza o poeta (GONZAGUINHA, 1982). A ideia é a de estarmos aprendendo sempre e
que seja um aprendizado fluido. Kastrup (2001, p. 107) relata a importância dessa fluidez e do
quanto se precisa descristalizar o aprendizado, num looping permanente de aprendizagens e
desaprendizagens:

O melhor aprendiz não é aquele que aborda o mundo através de hábitos


cristalizados, mas aquele que consegue permanecer sempre em processo de
aprendizagem. O processo de aprendizagem permanente pode, então, igualmente ser
dito de desaprendizagem permanente. Em sentido último, aprender é experimentar
incessantemente, é fugir do controle da representação. É também, nesse mesmo
sentido, impedir que as aprendizagens formem hábitos cristalizados. Aprender é
estar atento às variações contínuas.

A educação ao longo da vida se caracteriza, em grande parte, pelo cotidiano social - os


conhecimentos são socializados oralmente, de uma geração para a outra, e dessa forma é
orientada a convivência social.
Nesse contexto, a educação de jovens e adultos, quando realizada fora do ambiente
escolar, é uma forma de estabelecer diálogo entre sujeitos, transmitindo valores,
conhecimentos, possibilitando novas experiências, culturas, religiosidades, acionando
memórias e códigos que constituem as diversas identidades.
O termo life long learning – educação ao longo da vida — designa, de acordo com
França & Stepansky (2005) um processo que acontece tanto durante a vida de trabalho como
o da saída do mercado de trabalho. A concepção permite, segundo Holzmann (2002 apud
FRANÇA, SOARES, 2009), o acesso à aprendizagem quando as pessoas mais necessitam,
por terem chegado a uma idade não considerada tempo de escola. Para os autores engloba,
assim, processos formais, o aprendizado não formal e o treinamento informal, que se estende
da infância ao final da vida. Durante o aprendizado ao longo da vida, segundo o autor, devem
estar presentes programas de atualização e que propõem desenvolvimento, bases para novas
metodologias, treinamento e aprendizagem digital para trabalhadores mais velhos, integração
entre mais jovens e mais velhos.
Para Aníbal (2013), a educação permanente e a educação ao longo da vida se diferem.
Enquanto a educação permanente vai ter o foco na educação de adultos como um projeto de
transformação social com um ideal humanista e solidário, tendo o objetivo de construir uma
sociedade com instituições interligadas na manutenção da República, na perspectiva da
aprendizagem ao longo da vida tem a educação de adultos como uma forma de o indivíduo se
24

adaptar ao social, sob a égide neoliberal e individualista estruturada por instituições de


qualificação e que protegem o interesse privado.
Paiva (2005, p. 138) diverge da compreensão anterior, quando compreende que ―[...] A
educação ao longo da vida vai mais além da distinção entre educação básica e educação
permanente: significa conquistar uma sociedade educadora em que existam oportunidades
múltiplas para aprender e desenvolver as capacidades das pessoas.‖ Em muitas outras
oportunidades (em palestras, debates em grupo de pesquisa, orientações, artigos) esta ideia da
autora tem sido por ela explicitada da seguinte forma: nos anos 1970, a teoria do capital
humano, dominante na educação, orientava a concepção de educação permanente, porque se
atendia a um ―modelo‖ de educação de adultos para o trabalho, ou seja, guiado pela ideia de
que a escolarização de adultos diretamente influenciava o desempenho dos trabalhadores, o
que interessava ao capital e a seus lucros. Observe-se que não se trata de defender, nesse
tempo, uma educação como direito e ponto (sem qualificá-la, como o exemplo, educação
para o trabalho, mas tratando-a como direito fundamental da pessoa humana).Na década de
1970 os acordos se inclinam à ideia primordial de educação como direito — e, como tal, que
não se dobra nem é regido por alguma motivação externa, mas educação como essencialidade
da formação de um sujeito sempre inacabado (enquanto se está vivo, se aprende, nos termos
da Confintea, ―educação do berço ao túmulo‖). Entre nós, no Brasil, este direito à educação
para todos, firmado na Constituição Federal promulgada em 5 de outubro de 1988 demarcará
um novo tempo e concepção para pensar políticas públicas. Na contemporaneidade, a ideia de
educação continuada da V Confintea passa a ser substituída pela concepção de aprendizagem
ao longo da vida, centrando no sujeito o complexo movimento de, como pessoa humana, se
mover no mundo em processos de aprendizado.
Ireland (2013) relata a importância da educação ao longo da vida e cita a Carta
Internacional dos Aprendentes, que surgiu no Pará e que demonstra força em defesa ao
aprendizado ao longo da vida. Nela, os estudantes são colocados com o pilar da promoção e
do desenvolvimento na garantia e continuidade da educação de adultos e educação ao longo
da vida quando eles reafirmam o direito de todos e também de cada indivíduo a diversas
formas de aprendizado em momentos múltiplos de sua vida.
A concepção ou ideologia de aprendizagem ao longo da vida aparece pela primeira
vez na Europa logo depois da Primeira Guerra Mundial. De um lado ela se mostrava com o
objetivo de reeducar adultos, isto é, oferecera educação para a paz que a escola não fora capaz
de dar. Em outro extremo, o aumento da expectativa da vida das pessoas tornava essencial
criar mecanismos de manter aprendendo pessoas idosas que cada vez morriam mais velhas.
25

Na América Latina não houve ênfase no conceito, porque os países, regra geral, não
haviam conseguido universalizar a educação para todos, especialmente para as jovens
gerações. Dar acesso não significa oferecer educação, na perspectiva neoliberal em que se
valoriza o conhecimento útil em que emergem questões competitivas e individualistas.
(GADOTTI, 2009)

1.4 As Conferências de Educação de Adultos

As Conferências de Educação de Adultos há anos têm-se estabelecido como um


influente espaço no que tange à temática da educação de jovens e adultos. Duas Conferências
se destacam para a temática desse trabalho, pois no recorte temporal em que ele ocorre, busca-
se achar vestígios dessas discussões na época histórica e no trabalho então desenvolvido.
Há 69 anos atrás a I Confintea dava início aos debates sobre aprendizados das pessoas
adultas, e termos como educação de adultos, educação popular etc. perpassaram as demais
Conferências, por todos esses anos, criando, reinventando e dando significados para as futuras
práticas e para as existentes. Essas Conferências estimularam diretrizes e políticas que foram
sendo produzidas/elaboradas, fomentadas e discutidas. Em alguns momentos, essas
Conferências até mesmo evitaram a extinção do debate em algumas nações. Nesse item serão
tratadas apenas as duas primeiras, por se relacionarem diretamente ao tempo histórico aqui
rememorado, e poderão, assim, trazer compreensões ao diálogo que busquei estabelecer nessa
pesquisa.
A I Confintea acontece justamente no ano de 1949 (17 a 25 de junho de 1949), quando
estiveram reunidos 106 delegados representando 27 países no People’s College, na cidade de
Elsinore, Dinamarca.
Pela proposta do documento preparatório à Conferência, conteúdos, metodologias,
programas variariam, visto que deveria ser colocada em pauta a necessidade dos indivíduos,
dos grupos sociais, a urgência etc. Enquanto uma nação poderia apresentar a urgência do país
em ensinar a ler e a escrever a populações analfabetas, tornando-as alfabetizadas, em outro
poderia ser a formação para atuar no trabalho industrial.
Outra consideração importante, ao ser pensado um curso para adultos (destaco para
fins desse trabalho a comissão de conteúdo e educação profissional), seria a motivação dos
sujeitos, visto que estes não estariam obrigados a realizá-lo, buscando-o por desejo de
realização de algum intento.
26

No que tange à educação profissional, em Elsinore foi discutida a diferenciação entre


educação de adultos e educação para o trabalho, visto que muitos crescem no ofício do
trabalho sem qualificação prévia, simplesmente por aprender a fazê-lo todos os dias; alguns
não se adaptam e, então, mudam de profissão. A educação de adultos, para ser efetiva, deveria
resolver os impasses, porque melhorar no trabalho era, muitas vezes, a maior motivação.
Considerando esse aspecto, a educação de adultos teria responsabilidades diferentes:
orientação profissional, formação pré-profissional, cursos de reciclagem, a profissão como um
meio de cultura. (CONFINTEA, 1949 apud IRELAND e SPEZIA, 2012, p. 92)
Quanto ao aspecto de a educação ser desenvolvida em áreas mais pobres o documento
oficial afirma:

Entre os povos menos desenvolvidos, então, a educação de adultos deve levar a um


esforço máximo para avançar em todos os ramos da educação. Adultos esclarecidos,
por exemplo, se esforçam para obter melhores escolas para os jovens. O conteúdo da
educação nas áreas menos desenvolvidas deve ser determinado em harmonia com os
costumes do próprio povo, seus próprios estilos de vida, suas necessidades
específicas como eles mesmos as veem e experimentam. A tarefa da educação de
adultos é fazer um balanço dessa postura e desenvolver programas nesse sentido,
para avançar na direção livremente escolhida pelo povo e não para impor programas
de fora para dentro (CONFINTEA, 1949 apud IRELAND e SPEZIA, 2012, p. 92).

A I Conferência recebeu muitas críticas, entre elas, de que não se caracterizava como
um evento internacional, visto que a maioria das nações presentes eram da Europa; que a
educação de adultos ainda não se estabelecera como modalidade, mas tratada na perspectiva
de educação nacional; que sua importância para a redução de problemas de um país não
estava definida; e que ainda tinha o título de ser uma educação utilitária, como no modelo
americano.
Além dessas, outra crítica feita era de que os presentes não representavam as
demandas de educação de adultos, sendo muitos dos convidados presentes já esquecidos em
seus feitos.
Mesmo com esses problemas, a Conferência de Elsinore foi um divisor de águas na
educação de adultos, por representar um grande passo na cooperação e consulta no que tange
a educação de jovens e adultos. (HELY, 1962apud KNOLL, 2005).
A Conferência objetivava uma análise crítica da educação de adultos na maior parte
dos países, quase sempre secundária e distante do protagonismo dos sujeitos. Os delegados
eram céticos em relação à educação de adultos e outros delegados tinham histórico de lutas
em seus países de origem. Os grupos de trabalho voltavam-se para pontos chave da educação
de adultos, como: objetivos, dificuldades de organização, metodologia, colaboração
internacional etc. Nas discussões surgiam desdobramentos como, por exemplo, no grupo de
27

conteúdos, em que surgiram discussões de educação permanente e de educação continuada.


(KNOLL, 2005)
Ainda no interstício temporal da pesquisa, houve outra Confintea, a II. A II
Conferência aconteceu em Montreal, no Canadá, entre os dias 22 a 31 de agosto de 1960, em
um momento em que o mundo passava por expressivas mudanças políticas e econômicas.
Nesse novo contexto se discutiu a educação de adultos.
As principais discussões em Montreal voltaram-se para a delimitação do campo da
educação de adultos. Realizaram-se várias críticas em relação à separação da educação técnica
e vocacional. Processos de alfabetização não inseridos em programas mais amplos de
educação geral também foram amplamente criticados. Na perspectiva de se pensar educação
de jovens dissociada de educação de adultos, a discussão criticou o fato de estarem separadas
se, na verdade, faziam parte de um contínuo. (IRELAND,2013).
Das discussões de relevância e mantidas nos textos da Conferência como ―problema
imenso‖ pode-se destacar a problemática ―[...] dos países cujo modo de vida está passando por
mudanças profundas, como, por exemplo, os países em processo de rápida industrialização e
urbanização‖ (CONFINTEA, 1960 apud IRELAND e SPEZIA, 2012, p. 92). Nessa Confintea
surgiu um tema que não apareceu na primeira: a educação de mulheres, pela importância da
manutenção e desenvolvimento coletivos.
A Conferência também alertou, segundo Ireland (2012), sobre interpretações da
concepção de educação de adultos, de acordo com o desenvolvimento dos países. Em países
desenvolvidos seria uma educação voltada para a educação técnica profissional e, em países
pobres, teria somente a função de alfabetização. Percebe-se, nesse evento, que a educação de
adultos assume a amplitude do que se anunciara havia 10 anos, em Elsinore, quando além de
abordar a alfabetização se enfatizava a educação continuada de adultos, tantos com métodos
já conhecidos como a partir das novas perspectivas que os meios de comunicação traziam.
No que tange à ocupação e ao desenvolvimento da personalidade, foi recomendado
nessa Conferência que a mudança de uma ocupação para outra, ou de um nível social para
outro, fosse incentivada, e vista como um direito do adulto. Ainda que: ―[...] a educação e a
reeducação profissional estejam intimamente ligadas ao desenvolvimento da personalidade do
trabalhador e à oferta de oportunidades de cultura e auto-aperfeiçoamento (CONFINTEA,
1960 apud IRELAND e SPEZIA, 2012, p. 133), isto é, que a aptidão do trabalhador fosse
vista e estimulada para seu crescimento individual e bem coletivo.
Como recomendação, foi exposto que a educação de adultos precisava ser encarada
como parte dos sistemas nacionais de ensino, recebendo para isso recursos necessários à sua
28

manutenção e desenvolvimento. Além dessa recomendação, a fala de encerramento do


presidente da Conferência salientou que a educação precisava ser encarada como processo
contínuo ao longo da vida e de responsabilidade de todos. Além disso, solicitava-se maior
envolvimento da Unesco, principalmente no que toca à comunicação e à troca de experiências
entre os países, com o foco de estabelecer indicadores básicos que permitissem realizar o
controle de ações, para que pudessem ser padronizadas e avaliadas. (IRELAND, 2012)
A Conferência de Montreal terminou com muitas possibilidades apontadas para se
trabalhar a educação de adultos, em diversas formas de estabelecer parcerias, metodologias e
formas de abordagem que ligassem ou intensificassem a relação desses adultos com o
conhecimento do mundo que os rodeia.

1.5 Educação de Adultos pré-industrialização

De acordo com Friedrich, Benite et al., (2010) a educação de adultos nasceu a partir
do momento em que houve falhas no processo de escolarização formal, e compreende um
arcabouço de processos e práticas formais e/ou informais, que estão ligados à aquisição ou
ampliação de conhecimentos básicos, de habilidades técnicas, profissionais e socioculturais.
Haddad, Di Pierro (2000) afirmam que estes processos nascem de modo mais ou
menos sistemático, em ambientes diversos como igrejas, família, associações trabalho,
espaços de lazer ou socioculturais e, mais recentemente, se reafirmam em cursos de
modalidade a distância (EaD).
Por ser modalidade plural e que se consolida em diversos espaços, tratar da EJA pode
ser crítico, pois muitas vezes as abordagens se tornam amplas e se perdem em múltiplas
observações.
Segundo Friedich, Benite et al. (2010) em toda a proposta de educação de adultos há
uma plataforma política voltada, principalmente, para recuperar a escolarização do indivíduo
que não usufruiu do direito de acesso à escola e, finalmente, tornando-se um modo de
suplementar ou complementar a vida escolar.
Em Gadotti e Romão (2006 apud FRIEDICH, BENITE et al., 2010, p. 393), os termos
―educação de adultos, educação popular, educação não formal e educação comunitária são
usados como sinônimos, mas não o são‖. A modalidade de educação de jovens e adultos
caracteriza-se pela postura da United Nations Education Social and Cultural Organization
(UNESCO) que denota ser ela uma área específica da educação. A educação não formal,
29

como concebida nos Estados Unidos, faz referência à educação de adultos dos países de
terceiro mundo, à qual se reserva o uso do termo educação de adultos.
No Brasil, a educação não formal será compreendida como uma educação realizada
em locais onde o governo não conseguiu ou se omitiu de participar, apresentando-se de forma
não parceira com as entidades governamentais. A educação popular tem concepção diversa da
educação de adultos concebida pelos organismos oficiais: aparece nos espaços em que as
necessidades surgem ou em que o Estado não tem vontade política ou força para atuar. Com
os ensinamentos de Paulo Freire, a educação popular nasce com respeito aos saberes
populares. (GADOTTI; ROMÃO, 2006 apud FRIEDICH, BENITE et al., 2010).
A alfabetização de adultos, de acordo com Paiva (1973), data da chegada dos
portugueses no Brasil, quando houve necessidade de catequizar os índios e, assim, preparar os
habitantes que aqui moravam para atuarem como serviçais da nobreza e do clero, utilizando a
alfabetização em língua portuguesa como instrumento de aculturação da população indígena.
Introduzir o adulto em processos de alfabetização não é apenas um ato de ensino, mas
de ter perspectiva de mudança. No período colonial, existiam poucas escolas e estas eram
destinadas às classes média e alta. O ensino não tinha como meta apenas os conhecimentos
científicos mas, principalmente, propagar a crença católica. Como as crianças estudavam, não
havia necessidade de alfabetizar adultos. As classes baixas não tinham acesso à educação e,
quando o tinham, era de forma indireta e assistemática, sem iniciativas das lideranças do país.

A educação escolar no período colonial teve três fases: a de predomínio dos jesuítas;
a das reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da expulsão dos
jesuítas do Brasil e de Portugal em 1759; e a do período em que D. João VI, então
rei de Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808-1821) (GHIRALDELLI JR.,
2008, p. 24)

O método jesuíta permaneceu até o período denominado Pombalino, quando o


Marquês de Pombal expulsou os jesuítas e, com a vinda da Família Real, o foco que já era
difuso, se perdeu totalmente, sendo a priori para servir às necessidades do Estado.
O próximo passo significativo da educação brasileira só se daria com a proclamação
da independência pois, com ela, o Brasil outorgou sua primeira Constituição, que no Artigo
179 garantia instrução primária gratuita para todos os cidadãos. Mas garantir para todos não
era efetivamente dar direito a todos, pois os mais pobres continuavam sem acesso à
escolarização. Soares (2010) relata que, no Brasil, muito antes da independência, havia um
discurso de educação popular, mas a realidade era vergonhosamente inversa, porque a
precariedade no ensino era intensa no Brasil.
30

De acordo com Paiva (1973) a primeira escola noturna no país surgiu em 1854 e
objetivava alfabetizar trabalhadores. A expansão foi veloz, pois 20 anos depois já existiam
cerca de 110 escolas espalhadas pelo Brasil com fins bem específicos, como por exemplo, no
Maranhão, em que era voltada para dar clareza aos colonos de seus direitos e deveres, isto é,
noções de cidadania; no estado do Pará, servia como ferramenta de aculturação, alfabetizando
indígenas.
Com a expulsão dos jesuítas no século XVIII, o ensino de adultos desestruturou-se e
tal perspectiva só voltou aos meios de discussão quando o Brasil se tornou Império. Com a
promulgação do Decreto n. 3.029, de 9 de janeiro de 1881 (Lei Saraiva) criou-se a primeira
reforma eleitoral no país. Nesse momento, o título de eleitor foi instituído e, com ele, ficavam
os analfabetos proibidos de votar, pois havia o entendimento de que a educação era uma
forma de ascensão social e, o contrário, o analfabetismo, uma forma de inabilidade social.
Durante a transição Império-República, a escolarização era tida como redentora de todos os
problemas que o país enfrentava, por isso ocorreu intensa expansão da rede escolar,
juntamente com as ―Ligas contra o analfabetismo‖ que visavam pôr fim ao problema de não
escolarização, para que o analfabeto galgasse o direito de voto (PAIVA, 1973).
Ainda nos anos de 1910, de acordo com Friedrich, Benite et al. (2010), a escolarização
— e junto a ela a educação voltada para adultos — teve melhoria no que tange à qualidade e
ao avanço dos processos didáticos e pedagógicos. O que assumia protagonismo nas
discussões e conversas sobre educação era o papel do protagonismo do Estado diante da
educação. Esses debates adentraram as décadas de 1920-1930 e, diante das mudanças
econômicas e políticas do processo de industrialização iniciadas na década de 1930, a
educação de adultos inicia sensíveis marcas no cenário brasileiro, enquanto as reformas dos
anos 1920 vão tratar da educação em âmbito geral, e causar afetação na educação de adultos.
As discussões realizadas em 1928 no Distrito Federal põem a educação de adultos em
destaque, trazendo vigor ao ensino de adultos nos primeiros anos da década de 1930 (PAIVA,
1973).

1.6 Inicia-se a industrialização de base no Brasil – a mudança da sociedade

Após o início da implantação da indústria de base, na década de 1930, as oligarquias


agrárias e pecuaristas começaram a perder força e espaço no cenário nacional, porque a
burguesia tinha urgência para o desenvolvimento industrial de todo país. O projeto liberal e
industrializante se sobrepôs com uma força esmagadora sobre as elites rurais e, de modo
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gradual, formarão uma nova estrutura de acumulação de capital no país, reconfigurando


também o papel do Estado nessa mudança e promovendo a reestruturação do eixo econômico
(MENDONÇA, 1985). Essa nova configuração social, política e econômica que nascia a
partir dos anos 1930 modificou de forma significativa as relações, assim surgindo novas
demandas, no que tange à educação.
Iniciou-se um pensamento mais voltado a políticas públicas educacionais a partir de
um pensamento técnico e de formação de mão de obra, pois no espaço de 430 anos do modelo
agroexportador não se vira a necessidade de que a escola intervisse em nenhuma forma de
reprodução de mão de obra. Em grande maioria, os trabalhos eram de repetição, que se
aprenderiam como aprendizes, não necessitando da presença de escola. A reprodução das
relações dominantes e da ideologia eram preenchidas pelos jesuítas (FREITAG, 1995).
Nesse contexto, as problemáticas que permeiam a educação de adultos entram em
destaque no período, com a promulgação da Constituição de 1934. Ela é a primeira que
garante a educação como direito de todos, protegendo o adulto que não teve acesso à
educação pela falta de legislação que o amparasse, para que pudesse adquirir o aprendizado da
leitura e da escrita. No Art. 149, esse processo emerge como direito de todos, e precisa ser
ofertado pela família e pelo poder público, para que se formem indivíduos dentro da moral e
se desenvolva um espírito brasileiro e solidário. (CF 1934, Art. 149). No Art. 150, institui-se
o ensino primário como integral, gratuito e de frequência obrigatória, inclusive aos adultos.
A CF de 1934 fracassa, visto que Getúlio Vargas, o então presidente, dá um golpe de
Estado e torna-se ditador, criando um novo regime denominado Estado Novo. Três anos
depois, uma nova Constituição é promulgada e o texto em que se garantia a educação como
direito de todos, é retirado.
O Ministério da Educação e Saúde Pública, por volta de 1935, inicia uma visão mais
orgânica do ensino profissional e levanta a hipótese de eliminar diferenças entre trabalho
manual, industrial e agrícola, por meio da obrigatoriedade do ensino profissional, com o
objetivo de estender a obrigatoriedade às escolas de Ensino Médio ou, até mesmo, criar a
Universidade do Trabalhador.
De acordo com Ghiraldelli Júnior (2008), a CF de 1937 desresponsabilizou o Estado
sobre a educação pública, visto que ela afirmava que a função do Estado nessa pasta
administrativa seria dar subsídio e não mais garantia como expressava a Constituição de 1934.
Uma população sem escolarização crítica mas, pelo contrário, somente treinada para
servir como operários em fábricas é mais suscetível a aceitar tudo que lhe é imposto. Assim,
ficava evidente que não havia interesse em uma escolarização para a criticidade.
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O pensamento sobre uma formação de adultos estaria inserido em um contexto mais


amplo nesse processo histórico visto que, antes de 1940, não se pensava uma educação formal
nem propósitos para ela tanto a população e tampouco os poderes constituídos. Assim,
inaugura-se e se delineia de forma real uma era que propõe formação e proposta educativa
para aqueles que trabalham e não puderam se escolarizar em momento oportuno. Coloca bem
Beisiegel (1982), de que foi a partir desse momento que as ideias e as iniciativas se
consolidaram em forma de lei, pois se até então eram os movimentos locais e separados que
reagiam a uma proposta isolada, a partir de 1940 pensa-se uma proposta para jovens e
trabalhadores adultos de todo o país.
Com a industrialização, surge nova necessidade de formar mão de obra com
especialização, para atuar em novas formas de emprego que surgiam. Assim, nas cidades
surgem escolas noturnas com o objetivo de realizar a capacitação desses trabalhadores. A
população das zonas rurais migra para os centros urbanos em busca de igualdade de chances
de trabalho, mas se depara com a inabilidade de decodificar o código escrito, fazendo-se
necessária a criação de escolas que ensinassem os adultos a ler e a escrever.
Todo esse quadro estava alinhado a interesses eleitorais, visto que somente sujeitos
alfabetizados tinham direito ao voto, o que estimulou o governo nos anos de 1940 a lançar a
primeira campanha de alfabetização para jovens e adultos, que se propunha a alfabetizar os
que participassem no período de três meses. A campanha foi muito polêmica, criando
discussões entre inúmeros atores envolvidos diretamente, ou não, e a mais recorrente fala era
quanto a ser essa estrutura ideal, ou se se estava oferecendo apenas o mínimo possível. Ao
final dessa empreitada, Paulo Freire, com suas experiências em Angicos, é convidado a criar
um programa de alfabetização de adultos em nível nacional. No entanto, com o advento do
golpe militar, o programa foi encarado como ameaça e a educação de adultos retorna para as
mãos do governo, que cria o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL).

De acordo com o IBGE, entre os anos de 1940 e 1950, aproximadamente 55% da


população com mais de 18 anos era analfabeta. A preocupação com tal situação iniciou-se em
países menos desenvolvidos, após a 2ª Guerra Mundial, incentivada pela Unesco, um dos
organismos da Organização das Nações Unidas (ONU) que o pós-guerra articulou. A Unesco
incentivava a criação, nos Estados-membro, de programas e políticas de educação de adultos
com ideais de combate ao comunismo. No Brasil, a partir de 1945, quando o Estado Novo
termina, as substituições de importações são consolidadas e uma forte vertente do capitalismo
industrial surge, também novas exigências educativas passam a ter intencionalidade mais
marcante, para aumentar o número de votos e orientar a nova mão de obra ao mercado
industrial que entrava em plena expansão.(LEAL, 1985).
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[...] a educação de adultos que inicia a sua evolução no país, nos meados da década
de 1940, não mais se confunde com as práticas que a precederam na fase anterior.
[...] Uma legislação fragmentária, que não caracterizava um compromisso das
administrações regionais para com a extensão de serviços às populações adultas, e
um pequeno número de escolas mantidas pelas iniciativas estaduais, municipais e
particulares, e abertas aos reduzidos contingentes de adultos [...] cedem lugar, nessa
nova fase, a um empreendimento global do governo da União. Postula-se, agora,
uma necessidade de educação de todos os habitantes adultos. (BEISIEGEL, 1982, p.
10).

De acordo com Fávero (1984), a Unesco definia que educação de base era considerado
mínimo, o mais basal dos conhecimentos, de acordo com necessidades do indivíduo, mas não
deixava de considerar as problemáticas do coletivo em que estava inserido, para intervir em
busca de soluções. Esta concepção ganha grande impulso, corroborando os projetos de
desenvolvimento que se iniciavam no Brasil. Mesmo que as campanhas de massa tenham
fracassado em boa parte do mundo, o Brasil continuava a investir em tal empreitada.
Nesse contexto, a preocupação que outrora era com os abandonados e aqueles que não
estavam originalmente inseridos na sociedade (como indígenas, negros etc.) passa para a
preparação do trabalhador para que venha a atuar no meio urbano e nas indústrias, formado
como profissional para atuar na prestação de serviços e nas fábricas. A educação permanece
com o viés assistencialista, mas também ganha a preocupação de formação profissional.
A educação de adultos institucionalizou-se a partir de 1942, com o Decreto n. 19.513,
que criou o Fundo Nacional do Ensino Primário, cabendo à União a tarefa de regulamentar e
programar a educação de adultos. Ao mesmo tempo, o pensamento industrial no Brasil vai-se
consolidando e também trazendo para si a organização científica do trabalho, visando à maior
produtividade e à melhor eficácia. Objetivava-se, nessa configuração industrial, educar jovens
e adultos trabalhadores tanto nas normas de aquisição do sistema de leitura e escrita (em que
se destacam as campanhas de alfabetização) quanto no que tange à qualificação, formação e
treinamento do trabalhador. Nesse contexto, cria-se no dia 6 de janeiro de 1942, pelo Decreto-
Lei n. 4.048 o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). Colbari (1995) afirma
que o desafio mais difícil era difundir uma nova concepção de mundo que recebesse as novas
exigências de produção e produzisse condições básicas, materiais e ideológicas, para a
acumulação do capital.
O Decreto-Lei n. 4.073 de 30 de janeiro de 1942 (a Lei Orgânica do Ensino Industrial)
estabeleceu as bases da organização e do regime do ensino profissional em todo país, o que
outrora não existia. Tal Decreto traduzia o ensino técnico nas áreas de economia (indústria,
comércio e agrícola) o que demonstrava a tendência de levar o ensino técnico para os
empresários e tirá-lo do Estado, o que se configura até hoje, em maioria dos casos.
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A política educacional do Estado Novo visava a atender tanto a campanhas de


alfabetização como também ao ensino técnico profissionalizante, tendo como prioridade os
interesses das empresas privadas assim como demandas urbanas, sempre com o intuito de
moldar os trabalhadores. De acordo com Garcia (2000), a partir dos anos de 1940 a formação
profissional do trabalhador fica quase exclusivamente na mão dos empresários.
Além do SENAI que havia sido criado para a formação do trabalhador da indústria,
sob a orientação da Confederação Nacional da Indústria, quatro anos depois de sua origem foi
criado em 10 de janeiro de 1946, pelo Decreto-lei n. 8.621, o Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (SENAC), que diferia de seu antecessor por estar voltado ao
comércio e ser, portanto, organizado pela Confederação Nacional do Comércio. Além desse,
décadas depois também seria criado o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural
(SENAR),concebido pela Lei n. 8.315 de23 de dezembro de 1991 e dirigido pela
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil. Todas essas agências mantêm vínculo com
o Ministério da Educação e do Trabalho, em consonância com a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT)1 junto a políticas públicas para garantir formação técnica e profissional para a
classe trabalhadora. Destaque-se o fato de a ordenação legal definir que os recursos dessas
entidades resultarão de enuncia fiscal do Estado brasileiro que só muito recentemente passou
a controlar um pouco mais o uso e a apropriação desses recursos públicos.
O pensamento desenvolvido até então era de que investir na alfabetização assegurava
produtividade, como esclarece Frigotto (1993, p. 41):

O investimento no ―fator humano‖ passa a significar um dos determinantes básicos


para o aumento da produtividade e elemento de superação do atraso econômico. Do
ponto de vista macroeconômico, constitui-se no fator explicativo das diferenças
individuais de produtividade e de renda e, consequentemente, de mobilidade social.

1.7 Campanhas de alfabetização de adultos

As campanhas de alfabetização de adultos se iniciaram de forma significativa a partir


do final da década de 1940, estendendo-se até o início dos anos de 1960.Tais campanhas
tinham o objetivo de ―[...] proporcionar a cada indivíduo os instrumentos indispensáveis ao
domínio da cultura de seu tempo, em técnicas que facilitassem o acesso a essa cultura e com
os quais, segundo suas capacidades, cada homem pudesse desenvolver-se e procurar melhor
ajustamento social‖. (BEISIEGEL, 1982, p. 14)

1
A CLT foi recentemente modificada no governo de Michel Temer, em acordo com o Congresso nacional, em
flagrante prejuízo à classe trabalhadora.
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Estas campanhas, na práxis cotidiana, previam um processo de alfabetização em três


meses para, logo depois, o estudante realizar o antigo curso primário em 14 meses (dois
períodos de sete meses). Após terminar essa fase, iniciavam-se ações voltadas para o
desenvolvimento comunitário e treinamento para o mercado de trabalho, desenvolvendo-se,
assim, noções sociais e econômicas, de forma que em médio e longo prazo o estudante
trabalhador pudesse melhorar suas condições de vida e a campanha a da população como um
todo. A Campanha (CEAA) e o CNER objetivavam uma proposta de melhoria do ensino de
base e, concomitantemente, formavam adultos na educação elementar e na preparação técnica
para que profissionais pudessem atuar (BEISEGEL, 1982).
Com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1961, que propunha a descentralização do
ensino, as campanhas foram extintas com a fama de que viam os adultos como incapazes e
psicologicamente infantis. Os conteúdos pedagógicos estavam desvinculados da esfera
econômica, social e política do país. Paiva (1990, p. 10) assim caracteriza esse momento:

[...] a precariedade dos resultados das campanhas é evidente, seu funcionamento


simultâneo com os mecanismos então criados para ampliação das oportunidades de
educação primária parece, no entanto, ter contribuído para reduzir os índices de
analfabetismo. Esses índices, que apresentam uma tendência histórica a se reduzir,
caem mais rapidamente nas décadas em que se localizam as campanhas: passam de
55% em 1940 para 49,3% em 1950 e para 39,5% em 1960, considerando-se a
população de 15 anos e mais, apesar do elevado crescimento populacional.

1.8 Após as Campanhas

Nesse mesmo período surgem em documentos oficiais as primeiras menções sobre


educação popular com o objetivo de alfabetizar, assim como também a visão de que
campanhas e programas até então desenvolvidos o faziam como ―fábrica de eleitores‖
(PAIVA, 1983). Também surgem as primeiras ideias de educação de adultos como forma de
transformação da sociedade. Em congresso de educação, Paulo Freire apresenta a tese que
invertia o entendimento corrente de que o problema do analfabetismo era decorrente da
situação de miséria no Brasil e não o contrário, como se fazia crer (SANTOS, 1998).
Mais tarde (1957-1961), durante o governo Juscelino Kubistchek (JK), o projeto
desenvolvimentista recolocava a educação em um novo patamar. Na perspectiva do Plano de
Metas (Meta 30), que disserta sobre formação técnica com o intuito de planejar para
desenvolver, foram sugeridas várias modificações, pois apesar de não estar atrelada como
requisito para a produtividade, esteve sempre vinculada à proposta de crescimento
(CARDOSO, 1978). O desenvolvimento, nessa compreensão, só seria possível com um
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sistema educacional compatível, pensamento este corroborado mais tarde pela teoria do
capital humano.
Segundo Cardoso (1978), ter mão de obra qualificada passava a fazer parte da pauta
das discussões das políticas educacionais, sempre visando ao mercado de trabalho como
referência básica para planos e políticas. A preocupação era de tornar o trabalhador
qualificado e especialista para a necessidade momentânea do desenvolvimento da nação. Se
fosse siderurgia, formavam-se operários em especialidades dessa área, se fosse para o
comércio, formavam-se comerciantes etc. Assim, a educação coadunava-se com as
necessidades que surgiam e as complementava e dava base para a estruturação social.

Proponho, por isso mesmo, tratar a educação como um investimento e tratar suas
consequências como uma forma de capital. Dado que a educação se torna parte da
pessoa que a recebe, referir-me-ei a ela como capital humano e que aumentos
importantes na renda nacional são uma consequência de adições a esta forma de
capital. (SCHULTZ, 1973, p. 79)

A ideia de capital humano vai-se intensificando durante os anos de 1960 e 1970 e


gerando cada vez maior proximidade entre o desenvolvimento e as políticas educacionais,
assim dando maior destaque e força à Teoria do Capital Humano que, aos poucos, se alinhará
à tendência tecnicista difundida mais tarde levando, segundo Frigotto (1993), a uma
necessidade do sistema educacional ser redimido por ser ineficaz, passando a ser entregue ao
tecnicismo, que oferecia metodologia e tecnologia mais adequadas para um processo
educacional visto como investimento, reduzido a mais um fator de produção.
No mesmo contexto, o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB)realizava
proposta diferente do Ministério da Educação a qual, segundo Álvaro Pinto (apud FÁVERO,
1984), deveria levar a educação brasileira a uma nova perspectiva para que pudesse ser
orientada sem compromisso com partidarismos políticos ou ideologias de desenvolvimento
social e econômico. Junto a isso, a educação de adultos trabalhadores passava a entrar nas
discussões de natureza política, social, cultural e pedagógica (FRIGOTTO, 1995). A educação
passa a ser vista como emancipadora, pois, além de suprir a escolarização — o que tiraria o
jovem e o adulto de uma provável marginalização — respondia como um dos fatores de atraso
do país. Para mudar essa visão, era necessário promover discussões e observações de cunho
político e cultural, de engajamento e transformação social, principalmente no que dizia
respeito à educação popular.
Nesse momento, configurava-se no cenário nacional a dicotomia educacional: de um
lado, uma educação instrumentalizadora centrada nos recursos humanos, com proposta que
visava a formar mão de obra qualificada e especializada tecnicamente para atuar nas
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necessidades desenvolvimentistas do país; de outro, uma vertente formadora de consciência


nacional que levava a reflexões para a promoção de transformações políticas e sociais em
todo o Brasil, chegando até mesmo à crítica sobre o processo desenvolvimentista do país e ao
próprio papel do Ministério da Educação nessa proposta, inquietação que se aprofundava no
ISEB e nos movimentos populares.

[...] a ―política de massas‖ oportunizou a emergência das camadas populares, isto é,


possibilitou que elas avançassem em suas reivindicações e em sua organização como
classe. O nível crescente dessas reivindicações e a possibilidade de seu atendimento
pelo sistema produtivo e pelos poderes públicos deixavam cada vez mais claros os
limites do populismo. Em consequência, de um lado, as pressões populares
caminhavam no sentido de questionar a própria estrutura da sociedade (passando a
exigir, por exemplo, a Reforma Agrária) e o papel do Estado (FÁVERO, 1995, p.
11).

1.9 Escolarização na Companhia Siderúrgica Nacional

A CSN ao ser instalada no Distrito de Santo Antônio de Volta Redonda trouxe com ela
trabalhadores de diversas localidades do Brasil e sendo esses trabalhadores da área agrária,
em maioria não haviam frequentado escola e não dominavam o emprego de construção civil e
muito menos o ofício da siderurgia que viria anos depois. Assim, com o objetivo de ser para
todo o Brasil um exemplo de sucesso em formação de trabalhadores, a CSN inicia em 1943 o
funcionamento da Escola Profissional que, mais tarde, se tornaria a Escola Técnica Pandiá
Calógeras, o maior formador de mão de obra para siderurgia dentro da cidade de Volta
Redonda.
Nessa perspectiva, a escola cumpriria duas funções primordiais: a primeira, de formar
mão de obra ―sob medida‖ para operacionalizar os equipamentos que funcionariam dentro da
empresa e, por outro lado, demonstrar a disciplina necessária que esses trabalhadores
precisavam desenvolver para se adaptarem ao cotidiano da empresa, além de difundir o
―espírito de colaboração‖ entre os integrantes da grande ―família siderúrgica‖. Toda a
metodologia era pautada em técnicas de psicologia social, para que todos pudessem agir com
senso de responsabilidade no coletivo, e com iniciativa pessoal (MOREL, 1989).
No momento inicial, os trabalhadores vinham para aprender o oficio da construção
civil nos canteiros de obras e havia pouquíssimas ofertas de educação de adultos, visto que
não seriam todos os trabalhadores que permaneceriam na empresa, pois não haveria vagas
para todos.
De acordo com relatos de trabalhadores, especificamente em entrevista com o Sr.
Antônio Pierramatei, os mais velhos, quando chegaram a Volta Redonda, poderiam estudar,
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mas tinham de buscar cursos e escolas particulares, por conta própria. Não havia iniciativa da
empresa para tal e a única forma de aprendizado era a prática nos próprios canteiros de obras.
Os técnicos e experientes que vieram trabalhar ensinavam o ofício para os agricultores que
chegavam. Somente depois de 1943 é que algumas iniciativas de educação começaram a
surgir.
Assim, a primeira iniciativa de escolarização para além do processo de alfabetização e
de formação para o trabalho, após a abertura da Escola Profissional, foi o chamado Círculo
Operário, criado por iniciativa da Igreja Católica, fundado em 1946 com financiamento direto
da CSN. O Círculo funcionava como forma de controle, e respondia à diretoria da CSN.
Segundo o presidente do Círculo, em depoimento encontrado em jornal da empresa publicado
em março de 1960:

O Círculo Operário é uma organização do trabalhador. Tem por finalidade


arregimentar os trabalhadores, criando um movimento forte para ampará-los, educá-
los e defendê-los em toda sua estrutura e condições de vida, quer materialmente,
moral ou espiritual... Pode também interferir nos casos de desentendimentos entre
empregadores e empregados, procurando uma reconciliação de caráter amigável. (O
LINGOTE, mar. 1960, p. 9)

O Círculo visava oferecer lazer, espiritualidade e ofertava cursos para trabalhadores


para que pudessem se desenvolver de forma integral, ao mesmo tempo em que a igreja
expandia sua pregação e ideologias da empresa, por ser esta a financiadora do referido
Círculo, o que cooptava a igreja para ampliar formas de disciplinar os trabalhadores.
O Sr. Valentin Marques dos Santos foi fundador do Círculo de Operários em Volta
Redonda. Natural de Niterói, foi levado para a cidade para atuar no setor de Serviço Social na
CSN. Católico fervoroso, influenciado por padres e bispos, decidiu cumprir sua obra cuidando
do ―crescimento‖ dos trabalhadores. Nas palavras de D. Agnelo Rossi: ―[...] dedicaremos
nossa missão em educar essa gente rude. É preciso torná-los trabalhadores dóceis e isso só
será possível através do Evangelho...‖ (apud SOUSA,1992, p. 71).
A principal função do Círculo era a educação política. Buscava-se a aproximação com
o trabalhador e, de acordo com suas necessidades, o Círculo tentava ir suprindo-as. As
discussões e cursos voltados para o desenvolvimento político do indivíduo buscavam formas
de, ao mesmo tempo em que o educava politicamente, controlá-lo socialmente e na dinâmica
do trabalho. Quando necessário, buscava-se introduzir os indivíduos no mundo da leitura e da
escrita, ensinando-os a ler e escrever. (SOUSA, 1992).
Outra atividade educativa para adultos aconteceu no Grupo Escolar Trajano de
Medeiros, onde hoje é o Instituto de Educação Professor Manuel Marinho. Um curso de
39

alfabetização ministrado por integrantes do Partido Comunista do Brasil e que despertava


interesse da administração da empresa, principalmente do Cel. Macedo Soares e de seus
imediatos — Cap. Edgard Vieira de Magalhães, do chefe do Departamento de Serviços Gerais
e do Ten. Oswaldo Assis Gomes, Chefe do Policiamento (BEDÊ, 2007).
O Partido realizava tal trabalho pedagógico, educacional e social, independentemente
de intenções políticas, já que suas ações eram vigiadas e controladas pelos militares que
temiam ideologias e discursos que pudessem ser trabalhados nesses cursos.
Outro grande agente dentro da cidade em formação principalmente no âmbito cultural
foi a Rádio Zyp-26. Uma rádio que oferecia cursos de formação cultural e de generalidades.
Além desses cursos, oferecia cursos introdutórios para a temática de metalurgia e siderurgia.
As aulas aconteciam no auditório da rádio e gerava certificações para os alunos que
participavam, o que podia ser de valia em processos seletivos e busca por empregos.
Na formação de adultos também, mas muito mais na formação das crianças e
adolescentes, pois na visão da CSN em uma geração ela objetivava que seu quadro fosse
renovado e esses filhos de seus funcionários que haviam sido educados dentro da temática de
siderurgia fossem seus empregados, assim, a CSN fez maciços investimentos no início da
formação do sistema educacional de Volta Redonda custeando parte do plano de
desenvolvimento educacional do município.
A última e derradeira forma de escolarização de adultos e de formação das próximas
gerações siderúrgicas foi a Escola Profissional que em 1946 se torna através de determinação
do MEC a Escola Técnica Pandiá Calógeras que durante muitos anos foi a grande formadora
de mão de obra da Companhia Siderúrgica Nacional. Estudar nessa instituição significava
emprego garantido na CSN e futura oportunidade de Ensino Superior custeado pela própria
CSN. Fato esse diminuído a partir dos anos de 1990 com o processo de privatização da estatal
onde a instituição de ensino precisou se reinventar e abrir outros cursos que não servisse
apenas a siderúrgica para continuar tendo procura significativa.

1.10 Memórias orais

Nas últimas décadas, a discussão teórica sobre memória oral tomou algum
protagonismo nas discussões da pesquisa, principalmente, segundo Frochtengarten (2005), a
partir de acontecimentos posteriores aos anos vividos por Walter Benjamin e Simone Weil. O
holocausto e a bomba nuclear foram eventos que ameaçaram suas vítimas, relegando-as ao
esquecimento, e fizeram com que uma experiência do passado e seu relato se vinculasse de
40

forma decisiva a relacionamentos dos indivíduos com acontecimentos passados (FEKMAN,


2000 apud FROCHTENGARTEN, 2005).
Ao se tratar de memória, pensa-se em uma experiência que se viveu no passado, mas
que é explicada com estruturas contemporâneas, do presente (DELGADO, 2017). Nesse
contexto, a ideia de tempo também se torna relevante, visto que o que ocorreu e o como o
indivíduo o narra estão separados por uma lacuna temporal.
A complexidade da memória como fonte de investigação está exatamente na
temporalidade, pois ao narrar um fato ou suas memórias, um ancião narra sua visão e
vivências do passado com todos os filtros e conhecimentos que adquiriu durante a vida. É a
fala de um tempo em outro tempo e suas narrativas não são história, mas um prisma diferente
ou único de narrar um fato histórico. (DELGADO, 2017).
Para a memória existir, faz-se necessário estarem presentes dimensões do tempo
coletivo e do tempo individual — intrínsecos a cada indivíduo. O fator extrínseco são as
referências e os estímulos para que surjam as lembranças e recordações que o indivíduo
guarda, que constituirão a base do ato de rememorar, o que Halbwachs (1990 apud
DELGADO, 2017, p.10) entende que se relacionará com os ―quadros sociais da memória‖.
A concepção de memória posta como resultado de uma atividade individual e, por
classificação, subjetiva, foi há muito superada pelo pensamento de Maurice Halbwachs, para
quem as lembranças são fruto de reconstrução (FROCHTENGARTEN, 2005).
A memória, como a mais completa fonte do depoimento oral é uma estrutura infinita
em que inúmeras variantes temporais, individuais, coletivas, topográficas criam diálogos entre
si para que possam resgatar lembranças ora veladas, ora explícitas do que guardam,
escondem, expondo e vivendo emoções. (DELGADO, 2017)
Na abordagem de Durkheim (apud POLLAK, 1989), a memória coletiva, isto é, a
memória compartilhada, que aparece em muitos discursos, por sua presença tão forte se torna
institucional, pois possui estabilidade e continuidade.
Quando essa memória vem expressar algo subterrâneo, escondido, velado, é sua
institucionalidade que dará a ela o caráter de certeza, de coerência e de crédito.
As memórias alinhadas ao registro documental serão a ilustração, a interpretação do
dito, do ainda não dito, do que foi registrado sem um sentimento e, por meio da memória e de
sua revelação criam-se significados mais profundos do que os que se pensava ter.
Segundo Pollak (1989) as memórias poderiam se apresentar de, pelo menos, duas
formas: uma, a memória coletiva, numerosa, de que muitos se lembram e que quando entra
em contato com registros, ou o que se chama de memória nacional dominante, coexiste sem
41

nenhum constrangimento, sem colocar em dúvida o que outrora se pensava ou falava; pelo
contrário, corrobora-se, reafirma-se e reforça-se o que está posto como verdade. Ao contrário,
o que o autor chamará de memória subterrânea, esta diverge em pontos ou em tudo o que está
posto, causando constrangimento; muitas vezes sem registro; e quando é posta desafia o
socialmente aceito; tem igual valor, porque só existe nesse registro oral, até que alguém surja
e faça com que a oralidade seja registrada.
Em caso contado no texto Memória, esquecimento, silêncio, Michael Pollak (1989)
relata o caso de uma deportada residente em Berlim e suas memórias, quando a mudez, o
silêncio sobre os fatos é muito mais fruto de gestão da memória do que do esquecimento
delas. O autor registra que, durante a entrevista, a pessoa dava dois significados diferentes
para os temos ―alemã‖ e ―judia‖, de acordo com o que aparecia em seu relato. Ora ela se
excluía dos termos, ora ela se incluía. Esse fato corrobora a ideia de que as memórias orais
são indissociáveis da vida particular do relator, e que muitas vezes essas memórias virão
carregadas de emoção, quanto mais se aproximarem ou se afastarem do socialmente relatado
em documentos e registros, podendo serem vistas como memórias coletivas ou subterrâneas.
Remetendo-nos à memória oral, Weill (1943 apud FROCHTENGARTEN, 2005) trata
os termos ―enraizamento‖ e ―desenraizamento‖ como aqueles entendidos de acordo com a
imersão e com o envolvimento do indivíduo nas memórias narradas. O homem enraizado
participa coletivamente de seu grupo e nele se sustenta, não perdendo seus costumes e
conseguindo, por meio de suas narrativas, repassar seus ideais e pensamentos para frente, pois
a coletividade ao redor dá força para a ação.
O desenraizamento trata de um indivíduo que é retirado de sua coletividade costumeira
e forçado a entrar em outra circunstância, o que o faz pouco a pouco perder suas narrativas,
não na perspectiva do esquecimento, mas, como relata Pollak (1989), pela gestão de suas
memórias que agora se confrontam e confundem com novas formas e narrativas. A exemplo
disso, podem ser colocados em voga os movimentos migratórios que aconteceram em
inúmeros lugares do mundo e também no Brasil, em especial (na perspectiva desse estudo) na
cidade de Volta Redonda. Nesse caso, segundo Frochtengarten (2005) o pensamento e as
habilidades aprendidas nos locais de onde se vem, perdem-se no local onde se instalam. O
personagem que outrora tinha uma forma de autogestão, mergulha em uma realidade de
subordinação à qual ele é submetido pelo trabalho e pelo medo de se tornar um
desempregado. Nesse momento, as tradições acabam por se atrofiarem diante da indústria
cultural.
42

2 A FORMAÇÃO DE VOLTA REDONDA

No Brasil, a partir da década de 1930, o Estado do Rio de Janeiro passou por diversas
transformações por causa da nova forma de produção que começava, e em seu interior, numa
cidade que pouco se destacava, Barra Mansa, daria origem a cidade de Volta Redonda que se
destacaria por receber a maior siderúrgica da América Latina. Sua localização numa região
chamada de Médio Paraíba no interior do Estado do Rio de Janeiro.

Figura 1 - Localização de Volta Redonda

Fonte: skyscrapercity.com

Volta Redonda é um dos 92 municípios do estado do Rio de Janeiro (Região Sudeste).


Cidade localizada no Sul do estado, situa-se na microrregião denominada Médio Paraíba. De
acordo com o IBGE o município tem área de 182,8 km2, numa altitude de390m.
A formação geológica se deu a partir de rochas cristalinas e suas falhas verticais foram
resultados de formação geomorfológica. A Serra do Mar é conhecida também como a
Cordilheira do Brasil e sua formação montanhosa é prolongada por 1000km com altitudes que
variam de 1200 a 20200 metros acima do nível do mar que vai desde o norte do Estado de
Santa Catarina até o Rio de Janeiro onde se encontra a Serra da Mantiqueira.
A topografia é no formato de relevo em ―meia-laranja‖ ou mares de morros que são
formados por ação erosiva aumentada pelo clima quente e úmido. Por ter sido uma área de
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muita ocupação humana, a paisagem sofreu mais degradação, o que aumentou os processos
erosivos.
O Produto Interno Bruto (PIB) per capita do município é de R$40.174,38, deixando
Volta Redonda em 25º lugar no estado do Rio de Janeiro (RJ).
A cidade apresenta 96,1% de domicílios com esgotamento sanitário adequado; 63,4%
de domicílios urbanos em vias públicas com arborização; e 75,1% de domicílios urbanos em
vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiros, calçadas, pavimentação e
meio-fio). Quando comparados estes itens com outros municípios do estado, fica na posição
3/ 92; 43/92; e 3/92, respectivamente (IBGE, 2017).
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município em 2010 estava em 0,771,
o que denota crescimento pequeno, mas progressivo, visto que em 1991 tinha 0,58 e em 2000
subira para 0,682.
A população no último Censo era de 257.803 pessoas e estimada para o ano de 2017
em 265.201 habitantes. A densidade demográfica está em 1.412,75 hab./km2.Com uma
população avaliada como jovem, de 20% de crianças de 0 a 14 anos, 65% entre 15 e 59 anos e
15% acima de 60 anos de idade, tem maioria da população declarada como católica apostólica
romana. A renda média é de 2,6 salários mínimos e a taxa de desemprego gira em torno de
18%.
O município é quase 100% urbano, não possuindo áreas significativas classificados
como rural o que caracteriza que a maior parte das ocupações trabalhistas estão na prestação
de serviços e em segundo lugar na indústria contradizendo em primeira instância os fatores
nascentes da cidade, fato esse, explicado pelo processo de privatização da empresa nos anos
de 1990.
A CSN ocupa uma grande área do município. Uma área significativa do centro da
cidade com a fábrica em si e mais diversos terrenos pela cidade que pertencem a CSN e que
durante a privatização foi vendida igualmente deixando a cidade com um gargalo de espaço
físico, fazendo a CSN, privatizada, a maior detentora de terrenos ociosos em Volta Redonda.
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Figura 2 - Mapa de Volta Redonda demonstrando a área da CSN e vazios demográficos

Fonte: Googlemaps

No âmbito educacional a cidade tem bom resultado no Índice de Desenvolvimento da


Educação Básica (IDEB): nos anos iniciais do ensino fundamental (EF) 5,9, o que coloca
Volta Redonda em 7º lugar no estado do Rio de Janeiro (RJ); nos anos finais do EF a média é
de 4,2, colocando o município em 40º lugar no estado. A cidade de Volta Redonda, de acordo
com o setor de Supervisão Escolar da Secretaria Municipal de Educação (SME), tem
13unidades escolares ofertando a modalidade EJA, segundo a Secretaria de Educação, mas
por causa da atuação exercida por esta, depois do reconhecimento do MEC em 2015, que
conferiu ao município o selo de cidade livre do analfabetismo, a procura pelos anos iniciais
vem sendo cada vez menor. Talvez isto se dê face ao pouco estímulo do governo municipal,
entendendo que não há mais analfabetos a serem atendidos, o que exigiria investigação que
comprovasse a veracidade dessa condição. Diferentemente, a procura pelos anos finais do EF
tem aumentado, o que pode confirmar o selo de cidade livre do analfabetismo, significando
que a crescente demanda se dá pelo desejo de os alfabetizados seguirem a escolarização.
Outro elemento que pode concorrer para essa busca de continuidade pode estar relacionado à
proposta diferenciada apresentada para a modalidade.
No ano de 2017, na rede municipal há três escolas funcionando em tempo integral de
forma regular e 36, das 104 Unidades Escolares, têm ampliação da carga horária com os
Programas Mais Educação e Novo Mais Educação.
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Para maior compreensão e entendimento da cidade de Volta Redonda, segue em anexo


uma foto da cidade que demonstra como a paisagem é ligada à estrutura da indústria
Presidente Vargas.

2.1 Histórico Pré Volta Redonda

Volta Redonda é uma cidade conhecida em todo o país pela existência da Companhia
Siderúrgica Nacional, criada em 9 de abril de 1941, nascida como empresa pública estatal e
estratégica para o desenvolvimento do país e privatizada em 1993 no governo de Fernando
Henrique Cardoso. Sua história, entretanto, não começa como município e, portanto, merece
ser minimamente contada.
Para compreender todo o processo que levou à construção da Usina Presidente Vargas
(CSN) e a criação do município de Volta Redonda, faz-se necessário viajar um pouco mais
além na história, para compreensão dos motivos pelos quais esse território geográfico foi
escolhido para abrigar a maior indústria siderúrgica da América Latina.
Era por volta do ano de 1727, e os jesuítas, depois de delimitarem o que seria a
Fazenda Santa Cruz, na Baixada, e que ainda hoje guarda este nome, transpassaram a Serra do
Mar e abriram um caminho para o início da colonização do Vale do Paraíba, na região medial.
Posteriormente, foi aberta a estrada ligando Rio de Janeiro a São Paulo, o que futuramente
receberia o nome de rodovia Presidente Dutra. Somente em 1744, no entanto, os primeiros
desbravadores nomearam a curva do Rio Paraíba do Sul, de Volta Redonda, quando a região
já estava sendo explorada por garimpeiros em busca de ouro e pedras preciosas. Muitas
fazendas se instalaram na região, com alguns nomes que ficaram até hoje, como Três Poços,
Belmonte, Santa Cecília, Retiro e Santa Rita — hoje nomes de bairros do município.
Logo no ano seguinte, 1728, Luís Vaía Monteiro, governador do Rio de Janeiro,
determinou que se abrisse uma estrada para São Paulo no sentido da Serra do Mar, vencendo
dessa forma a distância geográfica entre o centro paulista e a cidade do Rio de Janeiro, assim
nascendo a região do Médio Paraíba, habitada pelos índios Puris e Coroados.(ARIGÓ, 1989)
Em 1779, em nome do progresso da região recém descoberta, o sargento-mor Joaquim
Xavier Curado com ajuda do governante da capitania e do vice-rei, iniciou uma verdadeira
guerra que rechaçou os indígenas não adaptados ao trabalho servil. (ARIGÓ, 1989)
Depois de 22 anos, em 1801, as terras que futuramente formariam o município de
Volta Redonda são anexadas à Vila de Resende. (ARIGÓ, 1989). Em 1820, essas terras
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passam a ser subordinadas às Vilas de São João Príncipe e de Nossa Senhora da Glória de
Valença. (ARIGÓ, 1989)
Em3 de outubro de 1832, nasceu a Vila de São Sebastião de Barra, pelo ofício
encaminhado à Assembleia Legislativa do Império. Essa Vila, aproximadamente 100 anos
depois iniciaria um processo de industrialização, graças a reflexos oriundos da Grande
Depressão de 1929 e de sua posição geográfica que, aglutinados a uma manobra política,
veria parte de suas terras se emancipando, ficando ao lado do que seria conhecido como a
cidade mais desenvolvida da Região do Médio Paraíba, com a maior siderúrgica da América
Latina. Voltando no tempo, ainda, entre 1860 e 1870 a navegação pelo rio Paraíba do Sul
viveu seu período áureo entre Resende e Barra do Piraí. Ao mesmo tempo, os trilhos da
Estrada de Ferro D. Pedro II chegaram na Barra do Piraí e a Barra Mansa.
A Princesa Isabel e seu esposo inauguraram, em 16 de setembro de 1871, o trecho
ferroviário até Barra Mansa, que criava uma estação em Volta Redonda. Este fato,
futuramente, seria preponderante para a escolha de Volta Redonda como sede da Companhia
Siderúrgica Nacional. Também nesse tempo era inaugurada a primeira agência dos Correios.
(ARIGÓ, 1989)
De acordo com Athayde (1965) logo após a abolição da escravatura Santo Antônio de
Volta Redonda acentuou seu declínio. Com a Proclamação da República, alguns fazendeiros,
incentivados pelo Governo Estadual, ainda procuraram substituir a mão de obra que até há
pouco, era escava, pelo trabalhador livre.
No mês de dezembro do ano de 1890, imediatamente após a Proclamação da
República, o primeiro governador do estado do Rio de Janeiro criava o distrito de Paz de
Volta Redonda, formado por fazendas desmembradas de São Sebastião de Barra Mansa e de
Nossa Senhora do Amparo.
Dois anos depois, o território do Rio de Janeiro é reorganizado pelo Decreto n. 01 de 8
de maio e pelo n. 1-A de 3 de junho, quando o distrito de Paz de Volta Redonda foi extinto.
Em 1893, buscaram atrair imigrantes para suas terras, todavia, uma praga de
gafanhotos, e a ―peste do gado‖ em 1907 e 1914 respectivamente provocariam a destruição
das propriedades agrícolas. Em apenas duas décadas, o preço do alqueire de terra baixou de
vertiginosamente. A partir desta época, inúmeros fazendeiros provindos de Minas Gerais e
estimulados pela inauguração de um trecho ferroviário da antiga Estrada de Ferro Oeste de
Minas, iniciaram a compra de velhas fazendas de café em Santo Antônio de Volta Redonda,
algumas decadentes ou abandonadas. Nesse período, desenvolveu-se a pecuária na região. Até
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o final da década de 30, Santo Antônio de Volta Redonda passou por inúmeros ciclos de
produção agrícola, desencadeando em oscilação da população. (ATHAYDE, 1965)
Já na década de 1910, chegam os primeiros trabalhadores mineiros para a região. Com
a abolição da escravatura e a decadência da agricultura, a região do Médio Paraíba atraiu
muitos trabalhadores por conta das atividades agropecuárias. (ARIGÓ, 1989)
Em 1922, Volta Redonda novamente passa a ser um distrito, de acordo com o Decreto
n. 1.820 de 4 de dezembro. Trinta e sete dias depois Volta Redonda deixa novamente de ser
distrito, pelo Decreto n. 15.923 de 10 de janeiro de 1923. (ARIGÓ, 1989)
Três anos depois, em 1926, a Lei n. 2.028, de 23 de outubro, sancionada pelo
presidente Feliciano Pires de Abreu Sodré, restabelece de forma definitiva a categoria de
distrito para Volta Redonda, desmembrando-a territorialmente de Barra Mansa e de São
Joaquim. (ARIGÓ, 1989)
Em plena II Guerra Mundial, no ano de 1941, teve início o ciclo de industrialização
brasileiro. Gradativamente as atividades agrícolas foram diminuindo, dando espaço ao
processo industrial estimulado pelo Estado Novo, cujo auge na década de 1930 é seguido pelo
declínio nos anos de 1940, resultado das condições dos conflitos gerados pela Guerra
Mundial. O processo de industrialização nacional iniciado por volta da década de 1930,
aumentou os investimentos em indústria e diminuiu as taxas de agricultura.

Tabela 1 - Mudanças estruturais na economia brasileira e taxas anuais de crescimento


Anos Agricultura Indústria
1920-1929 4,1% 2,8%
1933-1939 1,7% 11,2%
1939-1945 1,7% 5,4%
Fonte: MENDONÇA, Sonia. A industrialização brasileira. São Paulo: Moderna, 1985, p.41.

A industrialização no Brasil foi iniciada com base no fordismo e no americanismo.


Para Gramsci (2001, p. 248), as concepções desses dois modos de produção capitalista,
associadas à emergência dos Estados Unidos como nova potência hegemônica mundial
traziam embutidas ―[...] a racionalização [que] determinou a necessidade de elaborar um novo
tipo humano, adequado ao novo tipo de trabalho de processo produtivo‖.
Volta Redonda, meu locus de pesquisa, nesse cenário mais amplo, foi escolhida como
local para instalação da Usina Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), marcando as bases da
industrialização brasileira. (ATHAYDE, 1962).
O local, um interessante acidente geográfico, havia sido berço de nações indígenas
como Puris e Acaris e teve a presença de grandes exploradores, de barões do café, de
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escravos, barqueiros e agricultores. Cedia lugar, agora, aos operários vindos das mais diversas
regiões. Seus novos moradores perceberam a desvantagem da dependência do distrito para
com o município-sede em 1954. Após uma série de marchas políticas, Volta Redonda
conquistou sua emancipação em 17 de julho, marcando um novo ciclo no desenvolvimento de
sua história.
Até chegar à sua municipalização, o local, denominado de Santo Antônio de Volta
Redonda pertenceu aos termos da cidade do Rio de Janeiro (1565-1801),da Vila de Rezende
(1801-1813), da Vila de São João Príncipe (1813-1820),das Vilas de São João Príncipe e da
Nossa Senhora de Valença (1820-1832) e da Vila de São Sebastião da Barra Mansa (1832-
1854). (CALIFE, 2005)
A implantação das indústrias, na década de 1930, atraiu vários trabalhadores rurais que
estavam desacampados, visto que após a quebra da política do ―café com leite‖ em 1929 pelo
Presidente Washington Luís — quando apoiou politicamente o Presidente do Estado de São
Paulo, Júlio Prestes, para candidatura à Presidência da República —, que afrontou políticos
mineiros, gaúchos e também paraibanos, que não aceitavam o rompimento com a política
estabelecida até então. Este fato, entre outros, levou ao golpe de Estado que depôs
Washington Luís em 1930, a menos de um mês para o término de seu mandato. A intensa
motivação política diante da indústria fez com que os políticos da época almejassem esse
passo no processo de desenvolvimento do Brasil, o que no Sul do estado do Rio de Janeiro
não aconteceu diferente.
Trabalhadores que outrora tinham destreza em instrumentos da terra se viram diante de
um passo a ser dado pelo crescimento econômico. Chegavam de várias fazendas e de vários
lugares do Brasil com a expectativa do trabalho industrial.
O processo industrial, juntamente com a oferta de águas pelo rio Paraíba do Sul,
associada à facilidade do transporte pelas ferrovias existentes, somaram-se como fatores que
fizeram com que Barra Mansa despontasse como principal região econômica do país.
Os caminhos ferroviários foram essenciais para atrair novos empreendimentos e,
mesmo a cidade, ainda com economia forte no setor agropastoril, por vocação, era indicada
por Cincinato Braga, desde 1919, como região ideal para o estabelecimento de indústrias
siderúrgicas, pela facilidade do transporte do minério pelos trilhos, vindos de regiões
mineiras, e da partida do aço para diversas regiões do Brasil por estes mesmos caminhos.Com
a quebra da política do ―café com leite‖, a também política ruralista perde força e a cidade,
formada por fazendas e atividades agropastoris, apesar de ponto de convergência de muitos
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caminhos e ferrovias, iniciava um novo ciclo econômico — a industrialização. Com a


Revolução de 1930, o país tomava outro rumo.
A vocação siderúrgica apontada por Cincinato Braga vai tomar fôlego pela
determinação do Presidente Getúlio Vargas de construir um projeto de nacionalidade. A
industrialização de Barra Mansa, como início do processo brasileiro, foi apressada pela
depressão americana que teve seu ponto culminante em 1929.O Brasil, portanto, precisava ser
rápido. As possibilidades ferroviárias atiçaram os olhares de indústrias diversas e, por alguns
anos, foram promovidas negociações até que, em 1937, três grandes indústrias se instalaram
em Barra Mansa, além de outras indústrias menores. São elas: a Companhia Industrial
Comercial Brasileira de Produtos Alimentares (Nestlé); a Cia. Metalúrgica Barbará; e a
Siderúrgica Barra Mansa (SBM), apropriando-se da oferta do minério de ferro que vinha de
Minas Gerais pela Ferrovia Oeste de Minas e da possibilidade de distribuição da produção
para os três grandes centros urbanos: Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte. Essas
indústrias foram o marco inicial da industrialização de Barra Mansa, e assim, depois destas,
outras indústrias buscaram as facilidades que a cidade se dispunha a oferecer.
Nesse momento histórico, Barra Mansa possuía vários distritos, sendo um deles Santo
Antônio de Volta Redonda que, até 1941, era apenas o 8º Distrito de Barra Mansa, um ponto
insignificante na cartografia do estado do Rio de Janeiro, cortado pela Estrada de Ferro
Central do Brasil. Não poderia, futuramente, ser classificada como ―cidade morta‖ do Vale do
Paraíba, um título que lhe foi dado por Monteiro Lobato no livro homônimo, já que Volta
Redonda, mesmo nos tempos dourado se opulentos do café, não fora gloriosa como Bananal,
em São Paulo. (BEDÊ, 2004; VEIGA e FONSECA, 1989)
A gigantesca influência do então interventor no estado do Rio de Janeiro e genro de
Getúlio Vargas, o comandante Ernâni do Amaral Peixoto; de ligações de parentesco com
Ademar de Barros e com Nelson Godói, dono da fazenda Santa Cecília; da especulação
imobiliária da família Guinle, que futuramente faria o primeiro presidente da Usina, fez com
que o pequeno 8º Distrito de Barra Mansa, Santo Antônio de Volta Redonda, fosse escolhido
para sediar a maior usina produtora de aço do país — a Companhia Siderúrgica Nacional.
Pode-se afirmar que a escolha foi puramente política, visto que Volta Redonda não se localiza
geograficamente nem perto do mar — o que favoreceria o escoamento da produção —, e nem
perto das jazidas de minério de ferro — matéria-prima para a produção do aço, abundante em
Minas Gerais —, estando, entretanto, estrategicamente localizada no meio do caminho entre
Rio de Janeiro e São Paulo (SOUZA, 2016).
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Carvalho (1995) apresenta outros motivos, além dos políticos, pelos quais Volta
Redonda foi escolhida: motivos econômicos e estratégicos. Os econômicos estariam definidos
pelos baixos salários decorrentes da decadência do café no Vale do Paraíba; pela fartura de
água doce de fácil acesso, necessária às máquinas da usina; pelos serviços da Estrada de Ferro
Central do Brasil; e pela proximidade estratégica com o Rio de Janeiro, São Paulo e Minas
Gerais. O motivo estratégico era a localização afastada da costa, o que, em tempos de guerra,
a colocaria distante do alcance de submarinos.
No Natal de 1941, 18 dias após o ataque japonês em Pearl Harbour, no Havaí,
topógrafos e agrimensores construíram um acampamento nos laranjais da fazenda Santa
Cecília, sobre as colinas onde se esquadrinhavam os terrenos à margem do rio Paraíba do Sul.
Ali seria erguida a maior usina produtora de aço do hemisfério Sul, que faria o Brasil entrar
na era da indústria pesada (BEDÊ, 2004; SOUZA, 2016).
Iniciando a década de 1940, Santo Antônio de Volta Redonda possuía cerca de 3.000
habitantes. Era um típico arraial, cumprindo funções de entreposto, pouco diferindo de anos
anteriores. Segundo Leonor Barreira Cravo citada por Calife (2005), o arraial possuía uma
igreja que era voltada a Santo Antônio, uma escola, um bar, uma Agência dos Correios, uma
padaria, uma cadeia e alguns armazéns que serviam de depósito para as mercadorias que
vinham das fazendas até seu embarque para outras cidades, além de umas poucas casas
residenciais.
Com tudo pronto para o início das obras, com financiamento negociado, local e
gerência definidos pelo coronel Macedo Soares, restava uma questão ainda sem resposta: com
qual mão de obra uma usina de tal porte seria construída? E depois de pronta? Quem
trabalharia na indústria? ―Uma classe é constituída através da história; não existe portanto, um
modelo de classe operária, porque ela se forma ao longo do tempo, no processo social ao qual
é partícipe". (VEIGA e FONSECA, 1989, p.16)
Para o início das obras, de acordo com Carvalho (1995), vieram 127 técnicos
brasileiros, 55 norte-americanos e 7.000 operários brasileiros.
O plano siderúrgico para o município tinha objetivos muito claros e podiam ser vistos
na fala de seus idealizadores, quando arguiam sobre as características civilizatórias que eram
empreendidas nas propostas da siderúrgica no que tange à necessidade de educar um
trabalhador de um novo tipo. Ao mesmo tempo possuía um caráter bem claro estadonovista
que defendia a intervenção do Estado no mercado por meio de leis trabalhistas e
previdenciárias, sendo uma estratégia que levaria o trabalhador ao papel de cidadão pelo
trabalho. Diziam os intelectuais do Estado Novo:
51

Deodato de Morais: ―O trabalho é civilizador‖;


Severino Sombra: ―Toda moderna concepção econômica, política e social deverá ter
por base a ideia fato – o trabalho‖;
Paulo Figueiredo: ―Para o Estado Novo trabalho não é simples meio de ganhar a
vida, mas sobretudo, meio de servir a pátria.‖
(Revista Cultura Política n. 24, 4, 2 apud BEDÊ, 2007, p. 72)

No ano de 1942, a Companhia Siderúrgica Nacional abriu recrutamento para


trabalhadores, e contratou inicialmente dezenas de recrutadores, homens que tinham
delegação para percorrer o estado do Rio de Janeiro e suas cidades do interior, assim como os
estados de São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, alistando trabalhadores, colocados em
caminhões até a estação ferroviária mais próxima, de onde tomavam um trem para Volta
Redonda (BEDÊ 2004).
Jessie Jane Vieira de Souza (1989, p. 14), baseada em relatos de trabalhadores
migrantes, registra que estes eram trazidos na carroceria de caminhões:

Esse caminhão saía e ia buscar homens, recebendo por cabeça, como se dizia
naquele tempo... O caminhão chegava cheio de homem, tudo sentado, chegava e ia
lá no hospital central, no prédio antigo, quase na entrada da usina e descia por um
caminhão, e dava o nome. Quem não sabia o nome eles batizavam. Muitos não
sabiam seus endereços, não sabiam nem o nome do pai nem da mãe, o agenciador é
que dava o nome.

Além da promessa de um bom emprego, havia também o discurso nacionalista. Como


o mundo se encontrava em guerra, e o Brasil tinha posição ambígua, nesse momento, ir
trabalhar numa indústria militar era se tornar um ―voluntário da pátria‖. Ir para as fábricas de
interesse militar era compatível como serviço militar, ajudando a pátria como um operário
soldado. (MOREL apud BEDÊ, TONOLI,2010)
Tal realidade militar era uma ―faca de dois gumes‖, de acordo com Bedê e Tonoli
(2010), pois se por um lado o trabalhador nessa indústria era dispensado do serviço militar e
não precisava ir aos campos de batalha na Europa, por outro, deveria se submeter a regimes
de trabalho e disciplinares muito pesados, uma realidade de quartel.
As condições de trabalho eram muito deploráveis, pouca higiene, lama, banheiro
coletivo, banho frio, e falta de sexo. Apesar da segurança da situação militar, garantindo que
os trabalhadores não iriam para a guerra, havia uma gigantesca rotatividade de mão de obra, e
entre 1941 e 1946 ocorreram 41.650 admissões e 30.751 demissões. (PIMENTA apud BEDÊ
e TONOLI, 2010, p. 51)
No povoado de Santo Antônio de Volta Redonda se encontravam militares, técnicos,
políticos que sempre estavam visitando a cidade, além dos operários permanentes, que
constituíam famílias e se fixavam em torno do trabalho na Usina. O povoado precisava de
52

nova forma de organização, traduzida por um urbanista modernista que colocasse ordem
urbana e social no povoado.
A Lei Estadual n. 2185, de 17 de julho de 1954, então, desmembra de Barra Mansa o
Povoado de Santo Antônio de Volta Redonda, que se instala como município em 6 de
fevereiro de 1955.
No início das obras havia dois grandes acampamentos — o acampamento principal,
situado onde hoje se encontra a Vila Santa Cecília com casas coletivas e familiares
construídas basicamente de madeira e que tinham luz elétrica, rede de água e esgoto que eram
ligadas a fossas sépticas; e, no outro lado, não distante, havia o acampamento rústico, nome
dado futuramente ao bairro que nasceria nessa região, onde as casas eram feitas de madeira e
barro e não possuíam as ―comodidades‖ que havia no outro acampamento, deixando claro a
estratificação social na sociedade nascente.
Existia casas para todo escalão de funcionários. Segundo relatos de ex-funcionários,
existia a moradia coletiva de madeira, que era a pior, e para mudar para as moradias de
alvenaria precisava passar um ano no que eles chamavam de ―inferno‖. Nessas moradias, não
havia banheiros internos, que se localizavam no exterior, e eram de uso coletivo. As
necessidades fisiológicas eram feitas em penicos e as crianças eram responsáveis por arear
esses recipientes no córrego Secades, que ficava atrás do núcleo residencial provisório. Essa
ação não era em nada diferente do que faziam os moradores das fazendas do 8º Distrito. A
diferença era a quantidade de pessoas que se aglomeravam e poluíam o córrego com seus
dejetos, contaminando a água e o solo, disseminando verminoses e tifo, que matou muitos dos
novos habitantes da cidade (BEDÊ, 2004).
De acordo com Moura (2016 apud SOUZA, 2016), o projeto da cidade que
futuramente seria apelidada como cidade do aço era baseado na utópica cidade socialista La
Cité Industrielle, de Tony Garnier, em que havia zoneamentos e estruturas para indústria,
habitação, lazer. Seria uma cidade sustentável: captaria seu lixo e o trataria; seria capaz de
produzir parte de seus alimentos; ofereceria tratamento de saúde para funcionários e
familiares; políticas públicas assistencialistas; seria laica, sem espaços para construção de
templos religiosos. Não haveria cadeias. A cultura seria amplamente difundida por teatros,
bibliotecas e museus com o objetivo de formar uma sociedade culta e pensante. Havia todo
um planejamento para a construção da cidade que nasceria ao redor da indústria. Segundo
Graciolli (1997), esse modelo de cidade industrial assumiu a forma típica de uma
companytown, entendidas como cidades criadas em regiões de controle de uma empresa, com
duplicidade em seus objetivos. Inicialmente, desejaria munir com determinado grau de
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garantias o que a força de trabalho necessita, oferecendo desde moradia até saúde e lazer; por
outro lado, estenderia o domínio da organização empresarial para o domínio privado, por
meio de ações disciplinantes.
Para a construção da cidade, o arquiteto que elaborou o projeto, Atílio Correia Lima,
nascera em Roma em 8 de abril de 1901, e se formara na Escola de Belas Artes, no Rio de
Janeiro, recebendo diploma de engenheiro-arquiteto (SOUZA, 2016). Calife (2005) coloca
que a tarefa recebida por Atílio era planejar e criar uma cidade moderna, para
aproximadamente 4.000 habitações individuais, infraestrutura adequada e equipamentos
urbanos variados. O urbanismo seria associado à arquitetura, e deveria compor ―a imagem de
progresso a ser refletida para o país‖ (CALIFE, 2005, p. 6). O projeto original não foi
utilizado, mas serviu de inspiração para que o autor atingisse vários pontos da expectativa do
Presidente. Em diálogo com o Presidente Getúlio Vargas, ambos expõem suas visões e
idealizações sobre a cidade. Observe-se:

Getúlio: Eis o lugar que eu mesmo imaginava, o ambiente próprio para abrigar
famílias que terão como primeiro objetivo suprir o país de aço para desenvolvimento
dessa nação que estou tirando das oligarquias. Esta cidade é uma prioridade para
mim. O que o senhor imaginou será executado com todo material humano possível e
com todo dinheiro necessário. Sem ostentação, mas com tudo que dignifique o
trabalhador brasileiro.
Atílio: Senhor Presidente, conforme as diretrizes que recebi, procurei criar uma
cidade modelo de bem viver.
Getúlio: Não lhe deve ter escapado que vamos arregimentar homens, com suas
famílias de todas as partes do Brasil. E meu país tem sido mantido no atraso. Não
quero que esses trabalhadores permaneçam deixando o couro no serviço e não
recebendo nada em troca. Quero lhes dar a oportunidade de ascenderem socialmente.
Atílio: Cursei urbanismo na Sorbonne, Presidente, e lá aprendi uma orientação que
diz numa linguagem acadêmica exatamente o seu desejo. É assim: ―enfim, há
sempre uma primeira natureza prestes a se transformar; uma natureza segunda não
se realiza sem as condições da natureza primeira que é sempre incompleta e a
mudança não se produz sem que a natureza segunda se realize‖. Este é o princípio da
dialética do espaço, Presidente. Busquei isso mesmo em meu projeto: levar o
homem acostumado a uma vida sem perspectiva a viver num ambiente que o faça
querer ser melhor.
Getúlio: Sim. É isto que persigo para meu povo, mas acredito que não pode ser
conseguido sem lutas e esforços, e com muita autoridade. Por isto, deve ser mantida
a hierarquia de mando.
Atílio: O espaço organiza-se segundo a estrutura de classes do lugar e a correlação
de forças que entre elas se estabelecem. Em Volta Redonda, cada classe social
definirá seu espaço próprio de existência. A corriqueira expressão ―Ponha-se no seu
lugar‖ com que o dominante se refere ao dominado terá aí clara significação
espacial. As casas foram planejadas segundo sete tipos diferentes variando a
localização, tamanho e comodidades, destinadas a engenheiros, mestres,
contramestres e operários.
Getúlio: Vou mandar levá-lo a algumas pessoas que estão lhe esperando para quem
o senhor explicará detalhadamente o projeto. Desejo-lhe boa sorte. (SOUZA, 2016,
p. 12-14)
54

Volta Redonda em 1942, possuía uma população distrital de aproximadamente 3000


habitantes e na CSN nesse mesmo ano já trabalhavam mais que o dobro de funcionários, cerca
de 6.154 operários, o que demonstrava que boa parte da mão de obra não eram residentes do
distrito. O objetivo era criar um espaço, uma cidade na lógica fabril e do capital, para que ela
fosse moldada em todos os aspectos pelo interesse de produção de bens.

Volta Redonda será um marco da nossa civilização, um monumento a testar a


capacidade de nossa gente, um exemplo de tal poder de evidência afastará quaisquer
dúvidas e apreensão sobre o futuro instituindo no país um novo padrão de vida e
uma nova mentalidade‖ (MOREL, 1989, p. 48).

A ideologia do governo estadonovista era de criar uma sociedade que, em duas


gerações, estivesse longe das problemáticas educacionais da vida agrária, isto é, seria uma
população 100% escolarizada com emprego, analfabetismo nulo e com desigualdades sociais
diminutas. A utopia Volta Redonda seria um marco civilizatório de um povo livre e que ao
mesmo tempo se subjugava ao ideal de crescimento e desenvolvimento. Assim diz Moreira
(2000 apud BEDÊ, 2004, p. 66):

[...] todo o empreendimento tornou-se um espelho da ideologia forjada pelo Estado


Novo de valorização do trabalho e de reabilitação do trabalhador nacional, traduzido
em uma política social que incluía não apenas medidas de proteção à saúde física e
mental do homem brasileiro, mas também de incentivo a suas capacidades
produtivas. Nesse sentido, a satisfação de necessidades básicas como habitação,
alimentação, saúde e educação.

Para compreensão da estrutura física de Volta Redonda no início da construção da


CSN, encontram-se no Anexo 2 fotografias da cidade nos anos de 1940 a 1960 com o objetivo
de materializar os relatos dos autores do referencial da seção 2.2 do capítulo 2.

2.2 O trabalhador que veio para Volta Redonda

Os homens que vieram construir Volta Redonda, espontaneamente ou


recrutados em seus estados, eram bisonhos, quase sempre mal
tratados, completamente ignorantes do que seria uma usina
siderúrgica. [...]. Em geral, só conheciam quatro ferramentas: a
enxada, a foice, o machado e o facão. Como produtores de energia,
além deles, sabiam que existiam o boi, o cavalo, e muares; a
eletricidade era para eles uma força misteriosa, ignorada na maioria
dos lugares do interior do país.
Depoimento de Edmundo Macedo Soares e Silva, 1940 apud MOREL,
1989, p. 76
55

No início da década de 1940, a Companhia Siderúrgica Nacional, segundo Tronca


(2006), poderia ser considerada o símbolo da viabilidade do sonho da burguesia — a
industrialização. Para sua efetivação, todas as atenções estavam em Volta Redonda no fim da
década de 1950, representando em seu gigantismo a realização do sonho do progresso
nacional, demonstrado muito bem por Monteiro Lobato em suas obras.
No sonho operário inspirava-se o orgulho de ser operário da CSN, pois os
trabalhadores se sentiam parte do progresso por trabalhar em uma empresa que os resgatava
para uma vida cheia de promessas de prosperidade e êxito, ao tirá-los do campo e os
encaminhá-los para uma vida urbana-fabril. O Sr. Ronaldo Gori, filho de engenheiro e ele
mesmo engenheiro aposentado pela CSN, onde trabalhou por 35 anos, menciona uma
conversa com o fotógrafo oficial da empresa, que corrobora o procedimento de como eram
dados os nomes a alguns trabalhadores que chegavam do interior:

O cara chegava, aí tiravam uma fotografia do cara, perguntavam:


- Qual é seu nome?
- É... Zé!
- De onde você vem?
- Ah... Eu vim lá de... de um lugar de Minas.
- Sim, mas o que você fazia lá? Qual seu nome todo?
- Não... Meu nome é...
Aí, não tinham nem nome. Aí eles davam um nome para o cara.
- Você trabalhava onde?
- Na Fazenda do Seu Fernando.
- Ah! Zé Fernando! (DA SILVA, 2010, p.17)

Os trabalhadores que vieram para a construção eram homens que largavam as lavouras
e o trabalho na pecuária. ―Analfabetos e sem qualquer qualificação profissional que os
habilitasse para o serviço na indústria, eram encaminhados para o trabalho braçal da
construção civil‖ (BEDÊ, 2004, p. 38). No cotidiano do novo ofício iam sendo apresentados a
novas ferramentas de trabalho. As mãos que outrora usavam enxadas e foices agora se
acostumavam com as picaretas que aprendiam a manipular com extrema velocidade e que
deixavam surpresos os mestres de obra.
Mais do que aprender a manipular instrumentos, esses trabalhadores, nas palavras de
Waldyr Bedê (2004, p. 38), aprendiam a ―fazer fazendo‖, e aprendiam o sistema inglês de
medidas usadas nas máquinas e em equipamentos importados pela CSN, como a polegada.
Pelas ―capacitações‖ em serviço, alguns se tornaram pintores, outros pedreiros e
alguns motoristas, todos aprendendo os ofícios, no fazer do dia a dia. O professor Ernane
Fernandes Moura (apud SOUZA, 2016, p. 8) registra em sua monografia: ―Ressaltamos
também que boa parte dos trabalhadores que migraram para Volta Redonda no momento da
56

construção da usina, não tinham profissão e foram treinados e tiveram sua mão de obra
reaproveitada a fim de serem operários da usina‖.
Percebe-se que os trabalhadores tiveram uma segunda fase de formação profissional,
posto que a primeira foi quando da migração do conhecimento agropecuário para o
conhecimento da construção industrial, desenvolvida no trabalho de construção da própria
usina; a segunda, ao necessitarem ser qualificados para atuar no processo de produção do aço,
como operários.
Para essa qualificação para o trabalho, muitos desses trabalhadores, analfabetos, foram
alfabetizados durante o processo de industrialização.
Durante anos a empresa trabalhou com a ideia de homem do campo atrasado e que
precisava se ajustar para poder viver no espaço urbano. O suporte assistencialista e repressivo,
como relatado por muitos funcionários mais antigos da empresa, tinha caráter muito violento.
Muitas vezes a empresa mantinha policiamento nos canteiros de obras e os conflitos com as
chefias chegavam a situações extremas, como a morte de trabalhadores.
Os policiais internos da empresa realizavam verdadeiras seções de espancamento com
os funcionários com a pretensão de ―dar o exemplo‖ do que aconteceria a todos se não
seguissem as diretrizes da empresa. Muitos desses espancamentos aconteciam nas filas do
refeitório, pois diferente do que a empresa apregoava, a comida era de baixíssima qualidade.
Evidente que isso não é encontrado nos registros oficiais, mas nos relatos informais de
dezenas de funcionários, assim como também nos registros judiciais. A realidade da vida
operária estava muito distante do que imaginou o Presidente Getúlio Vargas, durante a
conversa mantida com o arquiteto Atílio, na apresentação do projeto de construção da cidade
em torno da indústria.
O próprio sindicato diversas vezes usava de subterfúgios para manipular a verdade e
apresentar os fatos mais atenuados do que verdadeiramente havia acontecido.
No contexto em que se fizeram os trabalhadores da Usina Presidente Vargas, podem-
se observar traços da identidade retratada por Monteiro Lobato, já em 1918, na obra Urupês.
Ali, o autor caracteriza o trabalhador brasileiro a partir de dois fatores condicionantes: a) a
imagem racista que se vivia na época; e b) a necessidade de atualização das formas de
dominação sobre estes trabalhadores. No livro, o personagem caipira criado se torna
conhecido com jeca-tatu. Esse caipira era apresentado com diversas características
estereotipadas como a passividade, a preguiça, a incapacidade de compreensão do sentimento
pátrio, a ignorância diante da coisa pública, a mentalidade supersticiosa, a incapacidade para
produção de qualquer tipo de iniciativa que fosse de ordem econômica: não produzia nada,
57

apenas colheria e receberia o que a natureza lhe oferecesse; ou de ordem política: esperava de
cócoras o que aconteceria depois de votar em seu governante.
Na obra de Monteiro Lobato (1918) essa perspectiva vai-se alterando com o passar da
narrativa, visto que o jeca vai construindo um discurso de progresso que tinha o trabalho
como eixo principal. Esse progresso e as novas relações sociais aos quais ele é submetido o
torna mais eficiente e produtivo. Para o desenvolvimento, Lobato acredita que o saneamento e
a higiene eram de essencial enfrentamento, pois ao contrário não haveria possibilidade de ele
se adequar a uma sociedade moderna e civilizada. Entrelaça o saneamento com o bem-estar
social, juntamente com a disciplina no trabalho, com objetivo de produtividade eficiente. A
disciplina seria traduzida com a adaptação do homem ao maquinismo.
O General Edmundo Macedo Soares esteve presente desde a formulação do projeto de
construção da Usina até sua realização, e expressou preocupação com aspectos diversos das
pessoas que iriam trabalhar e às formas como eram submetidos os trabalhadores que
chegavam à CSN. A chegada dos trabalhadores ao local de construção da Usina, muitas vezes
acompanhados das famílias, era similar a um ritual de passagem. O processo de contratação
seguia a ordem de: a) desembarque do trem ou caminhão que trazia os ―arigós‖; b) ida ao
hospital central para fazer exame de saúde; c) registro de documentos (que a maior parte não
tinha) pelo departamento de serviço de pessoal. Em seguida, os trabalhadores recebiam
uniformes, eram encaminhados ao alojamento, era feita verificação de experiência anterior, o
levantamento de habilidades, um teste de alfabetização e, depois, a distribuição de tarefas e
turmas.

Os trabalhadores chegavam a Volta Redonda e encontravam médicos, enfermeiros,


chefes adequados para enquadrá-los, alojamento e comida. Passavam logo por um
exame físico: quase sempre depois lhes tiravam os trapos que os cobriam, recebendo
em troca macacões, em seguida eram submetidos a regras de higiene e colocado sem
casas de madeira, se tinham família, ou em alojamentos coletivos, se solteiros.
Passavam a ser educados por seus chefes e funcionários da CSN em tudo: na vida
comum, no refeitório, no trabalho. Educadores sociais visitavam-lhes a casa e
alojamentos, desinfetados periodicamente [...] ao mesmo tempo criava-se o ensino
profissional em Volta Redonda. (MOREIRA, 2000, p. 55)

A mudança de casa assumia um papel de controle e dominação, pois a partir do


momento que o trabalhador era transferido para uma casa melhor, o que era visto como uma
dádiva, se sentia em obrigação para com a indústria, pelo sentimento de reciprocidade. As
casas construídas pela Usina cresciam em número como passar dos anos, pois fazia parte da
ação ter a gratidão e, assim, o pleno trabalho desse funcionário, sem queixas.
58

Tabela 2 - Construção de residências pela CSN


Ano Residências construídas Residências em
construção
1943 544 0
1945 2084 947
1947 2841 859
1949 0 0
1951 3004 88
1953 3451 0
1955 3895 72
Fonte: Adaptado pelo pesquisador dos Relatórios da Diretoria 1962 e 1963, p.
45 e 11, respectivamente.
90

No ano de 1943 havia 544 casas construídas, e a partir desse ano foram feitos planos
anuais de construção que, muitas vezes, não conseguiram ser cumpridos. Em dez anos, de
1943 a 1953, houve crescimento de cerca de 500% no número de habitações, mas a cada ano a
defasagem ficava em torno de 70% e 60%, isto é, não eram construídas casas suficientes para
atender as demandas de habitação dos trabalhadores.
Juntando-se a escassez de moradias para os empregados da Usina ao fato de haver uma
população grande e em expansão, tem-se uma equação que dá início a habitações
precarizadas, o que mais adiante se transformaria em aglomerados subnormais. Tais casas não
eram concebidas como no projeto inicial de Atílio Corrêa Lima, mas serviam para diminuir a
tensão criada pela falta de moradias. Na construção dessas casas a CSN ainda mantinha
caráter paternalista, porque vendia a preços muito baixos madeiras e outras matérias primas
para a construção das habitações. ―[...] a gente tinha liberdade de chegar e pedi, eles ajudava
[...] tauba de madeira pra fazê barraco, concreto, qualquer coisa a gente ia lá tinha a
autoridade de comprá o que eles não usavam, tinha muita facilidade.‖ (Arquivo Público do
Rio de Janeiro, Fundo DPS apud BEDÊ, 2007, p. 99).
Esses muitos trabalhadores, suas histórias, as famílias, costumes, ideias, culturas iam
se entrelaçando de forma natural ou impositiva, fosse durante o trabalho, ou na rua, ou nas
áreas de lazer ou descanso. Waldir Bedê (2004), em suas memórias de infância vivida no
processo de construção da cidade, comenta que as refeições nordestinas, mineiras e capixabas
se misturavam nos fogões das casas e eram partilhadas entre vizinhos de regionalidades
diferentes. Até mesmo a rede, de costume indígena e amplamente utilizada por gaúchos e
nordestinos, passa a ser usada pelos mineiros, substituindo a cama, principalmente pelas
péssimas condições de higiene.
Volta Redonda se dividiu em duas partes, uma para quem trabalhava na indústria e a
outra para quem não era admitido, geralmente comerciantes e trabalhadores que atendiam a
CSN.
59

A cidade ficou dividida em duas: à margem direita do rio desenvolvia-se o núcleo


urbano, a partir da conjugação do Plano de Implantação da Usina – seria a ―Cidade Nova‖; à
margem esquerda, a ―Cidade Velha‖, separada pela CSN e que não dispunha dos serviços da
parte planejada. Os antigos habitantes não aproveitados pela CSN foram deslocados para a
parte Velha ou para a periferia da cidade e os grandes proprietários da região aí se
converteram em loteadores e especuladores de terrenos. (CALIFE, 2005, p. 6)
De acordo com Aristeu Aquiles, que também idealizou o Estado Novo, o taylorismo
que valorizava o poder da máquina e dava a ela maior poder na produção, vinha sendo
substituído pelo pensamento de que, além da natureza das máquinas, também havia
necessidade de se preservar o capital humano. (BEDÊ, 2007)
Nessa perspectiva, o taylorismo abria espaço para uma concepção superior, em que se
valorizavam as máquinas e suas estruturas produtivas, mas o indivíduo trabalhador era levado
em conta por sua saúde física e mental, assim como por sua capacidade de adaptação psíquica
ao novo processo de produção. Essa nova forma de conceber o fordismo, reconcebido pela
máxima estadonovista buscava ser uma nova forma por dentro da relação de trabalho,
mediada por políticas de intervenção do Estado. (BEDÊ, 2007)
Os trabalhadores que vinham trabalhar na construção da CSN não eram vistos como
simples trabalhadores. A estratégia de persuasão criava a representação de que os primeiros
trabalhadores eram ―pioneiros‖, ―heróis das trincheiras‖, ―soldados operários‖ dos canteiros
de obra (RUMMERT, 2000). Tal nomeação vinha acompanhada de outras estratégias, como o
oferecimento de benefícios reais, como direitos sociais, carteira profissional, salário, casa,
comida, assistência de saúde, segurança e também a possibilidade de melhoria de vida pessoal
e também de sua família.
Junto aos benefícios e estímulos, eram colocados diante do trabalhador também a
pressão contra abandono do emprego; graduais extensões da jornada de trabalho até alcançar
10 horas; e suspensão de férias. A hierarquia era observada e forçada por meio de rigorosos
códigos disciplinares, pelos quais era ensinada a hierarquia: direção-chefia-supervisores-
encarregados-operários-serventes.
Os sujeitos que vieram para Volta Redonda eram oriundos de todas as partes do Brasil.
Sendo assim, havia uma diversidade e uma heterogeneidade que fundou a sociedade nascente.
Seguem-se, no Anexo 3, fotografias desses sujeitos em situações diversas do cotidiano e em
situações ligadas à escolarização.
60

3 EDUCAÇãO DE JOVENS E ADULTOS À SOMBRA DA CSN

3.1 As primeiras referências

A primeira referência que me levou a tentar compreender a educação de jovens e


adultos em Volta Redonda foi a professora Regina, que trabalhou na área pelo Serviço Social
da Indústria (SESI) nos anos 2000 e dirigiu a instituição de 2010 até 2015, quando se
aposentou.
A professora Regina destacou, em nossa conversa, muitos pontos importantes, um
deles sobre a questão do sistema municipal de ensino em Volta Redonda, que só passou a
existir a partir dos anos de 1970, o que tira do campo dessa pesquisa a ação educacional do
sistema de ensino municipal que passou a atender os trabalhadores vindo de todas as partes do
Brasil para capacitação para o trabalho e/ou para se alfabetizarem.
Em nossa conversa ela apontou o nome de outra professora, a Sra. Maryvone Silvestre,
que teria sido a primeira diretora da primeira escola estadual de Volta Redonda, Trajano de
Medeiros, que só trabalhava com as séries iniciais do atual Ensino Fundamental, o antigo
Primário. Ao sair dessa escola, os filhos dos trabalhadores que vieram trabalhar na construção
da indústria eram encaminhados para a escola Getúlio Vargas, que ficava na Vila Operária, no
chamado Conforto.
Em nossa conversa ela também apontou o fato de o SESI ter iniciado, a partir da
década de 1940, uma ação pioneira, cuja primeira indústria que a realizou teria sido a CSN:
instalar escolas dentro das indústrias. Ela relata que a norma dos professionais que vinham do
Rio de Janeiro, pelo SESI, era ―onde tiver uma sala e cadeiras abrimos uma classe‖. As aulas
eram ministradas fora do horário de serviço, no caso da aquisição da escrita, e no caso da
capacitação e da qualificação, muitas vezes, se realizava no próprio local de trabalho.
Além disso, Regina fez várias indicações de pessoas e obras para que eu pudesse
buscar subsídios à pesquisa. Sendo esta a primeira entrevista, julgo seu relato de grande valia,
visto que vários nomes e locais que outrora estavam no campo das ideias tomaram forma e
adquiriram personalidade, podendo vir a contribuir para tal empreitada.
Em nossa conversa, citou o nome do professor Rogério, diretor da Escola Técnica
Pandiá Calógeras, uma escola voltada para a formação de mão de obra especializada para a
CSN. Também relatou sobre uma produção, uma revista de apenas uma edição, ―O Arigó‖,
que trazia muita informação sobre a construção e os primeiros anos da indústria nascente na
61

região. Além disso, fez indicações sobre o Sindicato dos Metalúrgicos e o arquivo pequeno
que guardava, mas que poderia conter informações pertinentes à minha pesquisa.
Para iniciar esta pesquisa, entrei em contato com a Sra. Teresa Falcão que,
prontamente, me atendeu e disse que poderia me ajudar, mas que estava em viagem e que eu
voltasse a contatá-la quando voltasse. No seu regresso, ela se aposentou e me colocou em
contato com a coordenação pedagógica central do Serviço Social da Indústria, localizado na
sede da Federação da Indústria do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN), por meio de um
número telefônico disponibilizado. Depois de várias tentativas consegui falar com a
coordenadora de assuntos pedagógicos (de quem omito o nome por questão de ética da
pesquisa), que me solicitou um e-mail com a descrição de todos os elementos da pesquisa e de
que precisava em relação à atuação do SESI. Passadas duas semanas, um novo contato
quando a coordenadora adiou o atendimento por mais um mês. Isto feito, quando restabeleci o
contato foi-me solicitada uma carta da orientadora, especificando as informações requeridas,
para atender a exigências do setor de documentação. Somava-se a isto, uma declaração da
pós-graduação de que eu era aluno regularmente matriculado. Providenciados os documentos,
mais alguns dias se passaram. Ao retomar o contato, informou-me as férias iminentes, o que
me obrigava a esperá-la. Não admitiu substituição de pessoa para me atender e, mais uma vez,
esperei.
Passados os 30 dias de férias, a coordenadora relatou que não estava mais na função e
um novo contato foi requerido, com o reenvio do e-mail com toda a proposta, carta de
apresentação, declaração. Desde então haviam se passado seis meses. A resposta da
coordenação não foi acolhedora, sob a alegação de que o setor realizava um projeto e que
demandas externas não poderiam ser atendidas. Expus a situação, argumentei, aleguei o
tempo que se excedia, a necessidade de franqueamento às informações e a resposta foi de que
cumpria ordens, o que me fez solicitar o contato dos superiores para pleitear acesso e, a partir
daí, nunca mais responderam meus e-mail. Este relato importa nesta dissertação por
demonstrar o quanto pode ser árduo o caminho do pesquisador, quando as instituições não são
sensíveis ao significado do que seja produzir conhecimento e nem se entendem com
transparência para que a memória de suas ações possa constituir história. No caso do SESI
isto é bastante grave, por se tratar de um sistema com financiamento público, o que requer
total transparência não apenas das ações realizadas, mas também do uso dos recursos.
Assim, fiquei sem dados do SESI referentes a relatórios de alfabetização realizada na
CSN; quantos foram os trabalhadores atendidos nas classes; se efetivamente elas aconteciam
dentro da Usina, como apontado em vários relatos etc. Para um programa de mestrado de, no
62

máximo, 30 meses, como o nosso, em que o campo se restringe praticamente a 18 meses, o


tempo é fundamental e pode atraiçoar o pesquisador.
Durante o tempo dessa busca pelo SESI realizei contato com a Diocese de Volta
Redonda, pois a história da cidade se cruza com a igreja católica, principalmente dos anos
1970 a 1990, por ação e presença do Cardeal Dom Waldir Calheiros, um grande defensor dos
direitos dos funcionários da CSN. Quando entrei em contato com a Cúria Diocesana, fui
levado a conhecer o Sr. Evaldo Marinho, trabalhador da CSN até os anos 2000, que
acompanhou o então Bispo Dom Waldir em toda sua luta, e que até hoje realiza trabalho de
resgate em todas as dioceses do Médio Paraíba, recolhendo evidências de como a igreja esteva
presente na vida e no crescimento de todas essas cidades. O Sr. Evaldo abriu-me o contato
com inúmeras pessoas, uma delas um dos ex-prefeitos de Volta Redonda, totalmente imerso
na história da CSN, principalmente no que tange ao assassinato de três trabalhadores pela
explosão de uma bomba no dia 9 de novembro de 1988, que pôs fim à greve dos 3.000
operários que ocuparam a usina Presidente Vargas, em Volta Redonda. Soldados do Exército
e da Polícia Militar invadiram a unidade, de armas na mão, para dispersar a manifestação que
já durava muitos dias. O desfecho do conflito, que poderia explodir a usina e a cidade se um
soldado disparasse um tiro próximo à maquinaria foi, portanto, trágico. Até mesmo um
monumento construído posteriormente pelo arquiteto Oscar Niemeyer, em homenagem aos
mortos durante a greve, foi destruído por uma bomba, o que aconteceu um dia depois da
inauguração do monumento, em um 1º de maio.
Entre as pessoas que o Sr. Evaldo me apresentou estava o Sr. Francisco, que veio para
Volta Redonda em 1963 e se tornou um emblema do envolvimento (ou não) da indústria no
processo de escolarização de adultos no município de Volta Redonda, no que tange à
participação da Companhia Siderúrgica Nacional.

3.2 Atores do processo e suas vivências

3.2.1 Antônio Amaro Pierramatei

O Sr. Antônio Amaro Pierramatei, de ascendência italiana, nasceu em 18 de janeiro de


1946, hoje com 72 anos. Natural de Visconde do Rio Branco, Minas Gerais, veio para Volta
Redonda com 27 anos no ano de 1972, tendo apenas a 4ª série primária, e já casado. Entrou na
Companhia Siderúrgica Nacional como ajudante geral na parte de locomotiva. Segundo ele,
fazia todo tipo de serviço.
63

A situação estava difícil lá e onde eu morava não tinha como ganhar nem meio
salário mínimo, vim ganhar meu primeiro salário foi com 27 anos na CSN, meu
sonho era trabalhar na CSN, eu não posso reclamar que eu não melhorei mais, pois
eu não quis estudar, quem veio naquela época e quisesse melhorar, podia melhorar.

Questionado se havia algum incentivo para estudar como trabalhador da empresa, ele
relatou:

[...] o incentivo que tinha era só as baterias mesmo, tinha incentivo, tinha sim, mas
como eu nunca gostei desse negócio de estudar, eu me conformei com isso que
estava aí, entendeu? Tinha uns peão que falava que quando começaram a trabalhar
não tinha nada e que só depois de alguns anos que começou a aparecer cursos. Aí
surgiu as baterias para fazer: A e B. Era A e B, eu fiz a B, A, B e C, eu só me lembro
da A e da B. A bateria A era pra cargo maior, quem queria um cargo mais alto e a B
era pra um cargo mais intermediário. Pra fazer as provas era praticamente o primário
mesmo que precisava saber, um primário mais forte, mais caprichado, tinha que
saber ler e escrever. Eu calculo que eu fiz por volta de 1981, que 1982 eu passei e
tinha uma promessa: o seguinte, quem fizesse a bateria B podia pegar o cargo de
maquinista e no mesmo ano surgiu o curso de maquinista e quando fiz a prova tirei
em terceiro lugar nas duas. O curso era dentro da empresa, a gente chegava duas
horas antes, uma ou duas horas e fazia o curso, não me lembro se eu recebia pelo
curso. Ele durava uns seis meses. Só depois de concluir o curso eu podia pegar o
cargo. Eu fazia o curso de bateria e o curso de maquinista juntos, eu pegava um e
falhava no outro e vice-versa e eu passei em terceiro lugar nos dois. Os dois me
colocavam como maquinista, mas um era mais teórico para o tipo de trabalho e a
bateria era pra ver nosso conhecimento. Eu fazia um curso para me preparar pra
bateria e não ia no outro e já tinha uma promessa de emprego, os cinco primeiros, e
eu passei em terceiro lugar. Eu aposentei nessa função. Mais pra frente surgiu uma
prova para supervisor e eu fiz, mas depois acabou o cargo de supervisor e eu voltei
pra maquinista outra vez.

Questionei o que ―caía‖ na prova, o que era cobrado nessa prova de bateria e ele me
disse que, principalmente, matemática, pouca coisa de português. Então perguntei se todos
tinham oportunidades, se qualquer um que chegasse e desejasse crescer na empresa poderia
crescer, e como era esse estímulo, se eram estimulados a estudar fora da empresa.

Tinha, mas eu não me interessei, nunca gostei de estudar. Entrei em 1973 e me


aposentei em 1994 e depois da bateria eu não me interessei em estudar mais. Tinha
muitos companheiros que só sabiam escrever o nome, para esses tinha um incentivo,
não me lembro como era, mas era opção da pessoa querer subir, ela sempre apoiava.
É aquele negócio, o cara veio lá da roça, numa empresa estatal e começava a ganhar
um pouquinho se conformava com aquilo.

No final questionei se ele ainda trabalhava no período da privatização 2 da CSN, e o


que ele percebera ter mudado nessa política de incentivo, após a privatização da empresa
estatal.

2
A CSN deixou de ser propriedade do governo no dia 5 de abril de 1993, data da sua privatização, quando foi
comprada por um consórcio privado, na onda de privatizações que se iniciaram no governo de Itamar Franco.
Neste mesmo mês de abril ocorreu um plebiscito para saber qual a forma de governo (parlamentarismo ou
presidencialismo) o Brasil deveria adotar. A consulta popular e o resultado das urnas confirmaram a
64

Eu peguei o começo da privatização, eu aposentei em novembro de 1994 mas só saí


em março de 1995. Depois disso, a empresa só contratava se tivesse segundo grau.
Mas a empresa sempre deu crescimento pra quem quisesse. Meu filho entrou na
escola técnica, entrou e fez faculdade, curso de administração e hoje é supervisor,
ele viu que pra melhorar tinha que estudar e foi de interesse dele.

3.2.2 Francisco Augusto da Silva

O Sr. Francisco foi mais um dos personagens que eu conheci por intermédio do Sr.
Evaldo. Nasceu no dia 27 de abril de 1940, na região Norte do estado do Rio de Janeiro, na
cidade de Santo Antônio de Pádua. Veio para Volta Redonda com 23 anos para buscar
trabalho e estudar, pois segundo ele gostava muito de estudar. Era necessário estudar para
realizar a prova de admissão da CSN, entrar na empresa e melhorar de vida. Os irmãos mais
velhos vieram na frente para conseguir trabalho e, quando conseguiram, o Sr. Francisco veio,
deixando os pais e outros irmãos para trás. Anos depois conseguiram trazer de Santo Antônio
de Pádua o restante dos irmãos e os pais.

Cheguei dia 27 de maio de 1963, conhecia as letras e sabia escrever meu nome e ler
poucas coisas; onde eu morei eu comecei a estudar quando criança, mas rapidinho
meu pai me tirou da escola para que eu pudesse trabalhar na lavoura da nossa
família. Tínhamos umas plantações e animais para sobreviver. Bom, voltando, na
semana seguinte, meu irmão — que já faleceu — me levou na escola do professor
Raimundo, bom professor, bom em português e fiquei estudando três anos com esse
professor Raimundo aqui em Niterói. Era pago, naquela época eu não lembro quanto
pagava, pois era cruzeiro, rsrsrs. Mas eu pagava com os bicos que eu arranjava, pois
eu não trabalhava, mas eu mesmo pagava. Eu tinha vindo pra arranjar dinheiro pra
casar e não casei com quem eu queria, casei com outra que conheci aqui. Tive duas
filhas, uma natural e uma adotiva.

Continuando a conversa, eu o questionei se tinha conhecimento de alguma classe de


escolarização que fosse sem custo, em que não precisaria pagar nada, e me respondeu que isto
era muito difícil. Que para crianças havia escolas, mas para adultos nunca tinha ouvido falar.
Não sabia se a cidade as oferecia pelo estado do Rio de Janeiro. Nesse período, os sistemas
municipais de ensino ainda não ofereciam educação de adultos. Pelo menos ele não conhecia
nenhuma oferta. Sabia que havia algumas turmas pela igreja, o que de fato era verdade, pois a
igreja foi muito atuante na história de Volta Redonda. Quando questionado se com aquelas
aulas ele conseguira terminar o primário e se certificar, ele prontamente respondeu:

Não, eu estudei para me preparar para a CSN, estudei, me senti preparado, fiz prova
e passei e fiquei aguardando. Na prova cobrava português, matemática e desenho. A
vaga veio semanas depois e quando chegou minha vez eu entrei na CSN sem o
primário, aí lá dentro eu entrei numa função que eles chamavam de trabalhador, eu

preferência da população pela permanência da república presidencialista. Em maio, assumia o quarto Ministro
da Fazenda do governo Itamar, Fernando Henrique Cardoso, que coordenou a implementação do Plano Real.
65

já nasci trabalhador, rsrsrsrs... eu fiquei por seis meses em provisório como


trabalhador, eu... tipo, fazia limpeza em tudo, na área, banheiro e depois de um
tempo é que eles regularizaram minha situação e me colocaram na função de
servente, que eu continuava fazendo a mesma coisa mas agora tinha um nome. Aí,
depois que eu virei servente, alguns meses depois alguém me falou sobre umas
―baterias‖ que a gente podia entrar lá e fazer preparação, uma melhor preparação
para trabalhar; eu entrei em 1967, mais ou menos, foi em 1967 e eu entrei para a
―bateria B‖ e eu passei em primeiro lugar em português, e foi uma surpresa, pois um
peão que veio lá da roça, analfabeto, passar em primeiro lugar... graças a esse
professor Raimundo que ensinou muita coisa pra mim.

Perguntei, então, sobre o que era ensinado nesse curso e de que forma era possível
melhorar de função e se o curso certificava:

A bateria era um curso que a gente fazia e se preparava para crescer dentro da
empresa. Era um curso para qualificar, que tinha mais ou menos a duração de um
ano e a gente estudava no horário do serviço. Era uma qualificação dos funcionários
e eu aprendi mais a matemática e em português eu aprendi mais, e continuei
aprendendo o que eu tinha aprendido com o professor Raimundo. Aí no final do
curso você era observado e, no fim do curso, se tivesse vagas, a gente fazia uma
prova e mudava de função.

Curioso com a ideia de ―baterias‖, insisti para que me explicasse melhor como
funcionavam as ―baterias‖.

A bateria mais baixa era a C, para quem era analfabeto, daí ele aprendia a ler e
escrever e aprendia coisas das funções da empresa, e quando surgia oportunidade
eles faziam as provas. Quem já sabia um pouco mais, já sabia ler e escrever, fazia a
bateria B, que foi a que eu fiz, e a bateria A era para buscar cargo de chefia. Eu fiz a
B, mas a A eu não fiz, pois eu tinha um amigo, um verdadeiro Espírito Santo de
Deus, que me disse que eu ia estudar e fazer prova para a Escola Técnica; ele me
disse que eu ia passar e daí eu disse a ele: ―como eu vou passar se eu não sei
desenho e não sei matemática ainda?‖ Ele me disse que eu ia aprender com ele, ele
ia me ensinar e eu ia passar. Eu ia sábado, domingo, feriado... eu estava na casa dele
e um ano depois eu fiz a prova e passei. Os professores que davam aula dentro do
curso eram profissionais mais antigos e que tinham estudo.

Sr. Francisco entrou na escola técnica sem ter, formalmente, concluído o ensino
primário. Quis então saber como ele se ―virava‖. Como era cursar a escola técnica dessa
forma?

Era o curso de aprendizagem industrial básico. E no fim eu era certificado como


aprendiz industrial. Tinha aula de matemática, desenho, português, história e
geografia e outra coisa que eu não me lembro muito, bastante matéria que eu
cansava, mas estudava. As aulas eram à noite, tinha muito peão como eu por volta
dos 30 e 40 anos, mas tinha moleque de 18 também. Pra começar o curso não
precisava ter escolaridade, eu acabei o curso e continuei sem primário.

O curso não certificava a conclusão do primário, e Sr. Francisco diz que ―pra CSN não
precisava ter primário, precisava saber ler, escrever e ter capacidade para passar.‖
Voltei à questão de que, dentro da CSN, havia muito estímulo para quem quisesse
estudar, fazer os cursos de ―baterias‖. Os cursos, entretanto, eram sempre voltados para a
66

formação, qualificação e aprendizagem para o trabalho, e não certificavam nem o primário


nem o ginásio.

Era sempre formação para o trabalhador, quem não sabia ler e escrever não era
assistido. A gente se sentia sempre estimulado pela promessa de melhora de salário e
cargo. Via uns colegas progredindo e eu continuava a estudar e os colegas
estimulavam também. Eu tinha um companheiro, nem sei se ele está vivo ainda, Zoé
o nome dele, e ele sempre me dizia: Chiquinho — ele me chamava de Chiquinho —
estuda, pois você tem muito que crescer aqui dentro.

Com todo este estímulo, quis saber se a CSN ajudava financeiramente as pessoas a
estudarem. Sr. Francisco respondeu:

Não. A recompensa viria depois, se estudasse iria melhorar e se não estudasse não
melhoraria, só se fosse ―peixe‖ do chefe, rsrsrs. Mas todo mundo tinha sua chance.
Bastasse ter vontade e muita força de vontade. Lá dentro tinha toda estrutura para
crescer profissionalmente. Às vezes não precisava nem saber ler e escrever,
acontecia dos instrutores ensinarem para fazer os exames. Meu irmão, por exemplo,
não sabia ler nem escrever, não teve muito estudo, mas tinha muita força de vontade
e se qualificou, viajou até pra fora do país. A CSN investia na pessoa, ensinava a ler
e escrever e qualificava.

Sr. Francisco me conta que terminou o curso de Aprendizagem Industrial Básico em


1975. Pergunto, então se, depois disso, ele melhorou de cargo, quero saber o que lhe
aconteceu.

Por causa dessas coisas de pessoas escolhidas, eu não subi de nível logo depois, eu
esperei um pouco e teve briga entre dois gerentes para que eu pudesse melhorar de
nível. Daí eu fui de nível 1 para nível 5. O trabalho melhorou e o salário também.

E Sr. Francisco continua:

Quando eu terminei o curso de Aprendizagem Industrial eu resolvi cortar caminho,


fui fazer o supletivo de primeiro e segundo grau. Em um ano eu completei os dois
cursos. Eu estudei aqui em Volta Redonda de forma particular. Eram professores
que queriam ganhar um pouco mais e depois eu ia para o Rio de Janeiro fazer a
prova para eu terminar o 1º e o 2º Grau. Depois que eu terminei, eu pensei, vou fazer
vestibular e comecei a estudar, enfrentei, fui fazer vestibular no Rio e não passei,
mas consegui aproveitar as notas e entrar na FERP [Centro Universitário privado em
Volta Redonda]. Fiz dois períodos do curso de Matemática, mas querendo fazer
Engenharia. Aí lá na empresa um gerente me indicou — as chefias podiam indicar
pessoas para fazer cursos técnicos na Escola Técnica Pandiá Calógeras — aí eu
tranquei a matrícula e comecei a fazer o técnico, pois achei que um curso técnico era
mais viável. Pela minha idade eu seria mais aproveitado do que com a engenharia.
Depois que terminei o técnico melhorou muito, eu estava como controlador da
produção e fui para o nível 10 como programador da produção. Eu penso na minha
história e fico muito feliz pois entrei como faxineiro e termino como chefe de turno
porque eu busquei. Muita gente que entrou comigo não cresceu, entrou e aposentou
na mesma função. Eu me senti muito estimulado por isso, pois eu fui mudando e
crescendo.

Sr. Francisco foi, então, instigado a contar como terminou essa história:
67

Depois disso tudo, desse crescimento, eu fui demitido. Era o início da privatização e
muitos postos de trabalho foram cortados e eu fui um deles. Mas tem outras coisas,
porque eu sempre fui da Igreja Católica, muito atuante, fui presidente de Associação
de Moradores, fui do Partido dos Trabalhadores e eu acabava ajudando os outros
trabalhadores a pensar sobre isso. Fui muito atuante no Sindicato dos Metalúrgicos.
Nas duas greves tive destaque, e eu acho que eu fiquei marcado por isso. Me viam
como um agitador, e eu fui demitido. Aí estava fazendo um tratamento de glaucoma
e o médico disse que eu não poderia ser demitido, fui para INSS e ainda tive
leucopenia. Continuei correndo atrás e um perito do INSS me ajudou e eu aposentei.

Como se observa, apesar da dedicação e desenvolvimento pessoal e profissional, Sr.


Francisco não foi poupado — e nem valorizado — quando da privatização. Depois de trilhar
uma carreira bem sucedida, tendo em vista a história de interdições que sofrera desde a
infância, e tido um crescimento contínuo dentro da empresa, com muitas histórias de ajuda
mútua, a demissão veio e somente um problema de saúde interrompeu o caminho do
desemprego e a ―rua da amargura‖, que provavelmente não o deixariam se aposentar, apesar
de toda a história de superações.

Eu fiquei em choque, eu com 51 anos pensei: como vou arrumar emprego? Mas
graças a Deus, com ajuda de médicos eu continuei minha vida, dos grupos, das
pastorais, continuei participando de tudo. Continuo estudando e aprendendo. Eu me
sinto hoje orgulhoso de ter passado por isso tudo e estar aqui recordando, e também
fico triste, pois tem muitas pessoas que não têm esses incentivos que eu tive, pois
doaram nossas estatais todas para o capital estrangeiro e nós estamos aí passando
essa crise. Volta Redonda está jogada aos trapos e Volta Redonda morrendo com
tanta poluição. Volta Redonda era arborizada e hoje a cidade é quente, destruíram
nossa cidade.

3.2.3 Cícero Baptista Teixeira e Nelita Maria da Silva Teixeira

O casal Nelita e Cícero, dois personagens desse tempo e que encontrei tardiamente,
fez relato que se mistura fortemente com a história da cidade e, por isso mesmo, é muito
valioso o diálogo que com eles estabeleci. Ele, nascido em Lambari, Minas Gerais, em 13 de
setembro de 1931, veio para Volta Redonda no ano de 1942, por intermédio de um primo,
técnico da CSN. Trabalhou tanto na construção como na siderurgia. Veio com os pais e os
seis irmãos (três mulheres e três homens) para Volta Redonda, no intuito de conseguir
melhorar de vida. Na cidade de Lambari estudou pelo SENAI, por solicitação do emprego que
mantinha na mesma cidade, um frigorífico, e conseguiu certificação em nível de 1º grau. Em
sua cidade só se falava da enorme empresa que estava sendo construída no estado do Rio de
Janeiro, na cidade de Barra Mansa (Volta Redonda ainda era distrito de Barra Mansa), e ele
começou a sonhar com a perspectiva de vir para o Sul do estado do Rio de Janeiro tentar uma
nova vida. Quando chegou em Volta Redonda conseguiu trabalhar na CSN e assim que
completa 17 anos assume o cargo de Mecânico Ajustador, graças ao curso que fez no SENAI.
68

Nelita, nascida na cidade de Cabo Frio, na Região dos Lagos, no estado do Rio de
Janeiro, vem para Volta Redonda e se torna professora formada pelo Instituto de Educação
Trajano de Medeiros, e logo começa a lecionar em escolas da rede estadual. Anos mais tarde
dedica-se a duas grandes paixões: a literatura, e escreve diversos livros sobre a história de
Volta Redonda, ou de poesias, em que grande parte delas trata do amor que tem por Volta
Redonda, uma paixão pela cidade que lhe deu condições de criar e educar os sete filhos. Em
1991, recebeu o título de cidadã voltarredondense, o que lhe conferiu uma placa com seu
nome e a poesia chamada ―A chaminé‖, num marco histórico da cidade, o chamado ―grande
chaminé‖; e as turmas de supletivo, em que deu aula até 70 anos, quando se aposenta, em
2011, compulsoriamente Gostaria de ter ficado pelo menos mais cinco anos.
Em um momento de nossa conversa perguntei ao Sr. Cícero como havia sido sua
trajetória na CSN, se ele havia estudado, se havia mudado de função na empresa e, caso
houvesse mudado, se os motivos teriam sido os estudos.

Entrei na CSN já com um cargo bacana, de mecânico ajustador e foi por indicação
de um primo meu. Como eu já tinha um curso do SENAI fui logo estimulado a fazer
alguns cursos pela CSN. Logo que entrei fiz a bateria B, tinha a ―A‖, ―B‖ e ―C‖; eu
fiz a B, pois já tinha estudo e o 1º grau completo, daí fiz, mas fiz poucas semanas do
curso, logo fiz a prova e a entrevista e subi para o cargo de mestre de manutenção.

Nelita o interrompe dizendo: ―Foi nessa época que eu o conheci, ele tinha quebrado o
pé e ele passava mancando. Chamava ele de Pepé. Ele passava e eu via ele pela janela e, aí, a
gente começou a namorar‖.
Cícero continua sua história:

Eu sou das águas minerais e ela das águas salgadas, daí a gente misturou. (Risos).
Daí eu continuei fazendo cursos lá dentro e estudando, seis filhos meus têm
faculdade, só um que não quis fazer, pois passou em um concurso público e se
acomodou.

Questionei-os pelo fato de me contarem a história de curso superior de seis filhos, o


que para mim parecia indicar o desejo de demonstrar o sucesso da família e da formação que
lhes dera. Nelita tomou a palavra, seguida de Cícero:

Estudar é muito importante, todos os nossos filhos estudaram para que tivessem
oportunidades na vida. É enriquecimento. Eu gostava muito de estudar.
O estudo é muito importante e quisemos dar esse incentivo para nossos filhos para
que eles tivessem a melhor chance. Por mim todos estudavam, mas um não quis.

Voltei a indagar sobre a trajetória profissional de Cícero, depois que se tornou mestre
de setor, e acrescentando à pergunta a curiosidade de saber se outras pessoas teriam ido tão
bem como ele, na carreira profissional.
69

Eu continuei estudando nos cursos com a promessa de melhorar. Tanto é que me


aposentei como encarregado de turno, um bom cargo dento da empresa, mas muita
gente não saiu do lugar. Tinha a escola profissional que as pessoas podiam entrar pra
melhorar de cargo. Tinha até quem não sabia nada e que fez escola profissional,
depois fez técnico. Todo mundo tinha oportunidade, não tinha essa de ser favorito,
todos que quisessem conseguiriam, mas tinha que querer. Teve gente que eu sei que
formou engenheiro e começou na escola profissional. Eu não quis estudar mais, pois
isso não era importante, quer dizer, uma coisa que eu nem devia falar, pois é chato,
mas ter diploma de 2º grau não era importante. Nessas firmas não olhavam o
indivíduo, e sim a ficha. Tinha eletricista que colocava um pedaço de borracha para
não fechar um curto, gambiarra, mas se sabia fazer...

Nelita complementa o sentido que a ficha tinha para a empresa:

Você era o que sua ficha de trabalho dizia que você era. A sua experiência é que
fazia diferença. Eles não queriam saber se você sabia ler ou escrever, eles queriam
saber se você sabia trabalhar, queria aprender e, se quisesse, eles estariam dispostos
a ensinar. A alfabetização era uma consequência de sua formação. Acredito que, na
maioria das vezes, a pessoa até se alfabetizava, mas não era o foco.

Como se observa, o que Nelita narra é que o aprendizado da prática, o bom


desempenho profissional na função é que poderia levar à alfabetização, não sendo requerido o
saber ler e escrever para poder melhorar de função, invertendo a lógica com que,
habitualmente, se pensa o sentido da alfabetização. Cícero segue a narrativa:

Isso, era o que estava na minha ficha. A CSN não dava muita proteção ao estudo de
escola. Quando eu cheguei com um curso do SENAI num lugar onde a maioria era
analfabeto de pai e mãe, eu logo cresci, pois me viam como um potencial pra
compartilhar o que eu sabia e foi assim, não posso reclamar, pois eu cresci cedo,
cedo, lembro que quando fui aposentar eles me seguraram mais seis meses e me
deram seis rapazes recém saídos da escola técnica para que eu pudesse treinar para
que um assumisse minha vaga e os outro cinco assumissem outras áreas. As más
línguas falavam que eu era queridinho, mas eu sabia ser chefe. Eu agradava meu
serventuário. Nunca tive problemas com minhas equipes. Eu confiava neles e eles
em mim.

Cícero conta que se aposentou como ―encarregado de turno, ganhava muito mais que
na primeira função que eu entrei, mas isso graças a ter feito muitos cursos e subido de nível‖.
Para Nelita dirigi a pergunta sobre se havia oferta de educação de jovens e adultos pela
Prefeitura ou pelo governo do estado, ao que ela respondeu:

Eu estudei no Getúlio Vargas e fiz Normal, para ser professora. Dei aula em várias
escolas do estado e no início dos anos de 1980 eu dei aula no supletivo. Tinha um
monte de alunos da CSN; dei aula no Trajano; no Rio Grande do Sul; do Norte. Eles
trabalhavam o dia todo, merendavam e depois iam beijar na boca na porta da escola.

Nelita, em seu relato, parecia fazer crítica aos trabalhadores estudantes que, em vez de
irem assistir aulas, apenas iam para a porta da escola para namorar.
Ao final da entrevista, a Sra. Nelita presenteou-me com um de seus livros, e um de
seus poemas transcrevo, ao finalizar esse relato, pela relevância de seu discurso para esse
70

trabalho, porque a cidadã voltarredondense de 1991 fez, pela poesia, a narrativa de um dos
principais marcos históricos de Volta Redonda:

A CHAMINÉ
Região de muita terra!
Um rio, montanhas e prados;
Aqui viviam dois povos
Os puris e os coroados
Nesta imensa região,
Outrora ―sertão bravio‖,
Depois mui ricas fazendas
De café era o plantio.
O gado e as plantações
O progresso ia chegando.
O engenho de açúcar
A minha gente empregando.
Quando eu fui construída
Em 1903
Fui orgulho do meu povo,
Como hoje, de vocês.
Assisti a toda mudança.
As ruas sendo calçadas,
Luz elétrica chegando,
Nas casas, água encanada.
E o movimento aumentando.
Máquinas pra todo lado,
Mineiros e nordestinos,
Trabalho tinha um bocado!
Perguntei: que será isso?
Que reboliço! Afinal!
O progresso ali estava:
Siderúrgica nacional.
Tudo foi sendo mudado.
Nem gado e nem café.
Muita coisa derrubada,
Só eu continuo em pé!
E o povo participando
Com muita animação
Por causa da CSN
Veio a emancipação!
Quem mais marcou seu progresso
Foram os trabalhadores
Operários conscientes
De direitos e deveres.
Eles fizeram a história.
Sou testemunha e dou fé.
Quem lhes fala esta verdade.
É o marco histórico:
A chaminé!
Nelita Teixeira

3.2.4 Naim Dibb

O Sr. Naim Dibb, descendente de migrantes do Oriente Médio e da Europa, nascido


em Três Rios em 9 de junho de 1935, morava na cidade de nascimento com os pais e irmão.
71

Em 1942, mudou-se para Petrópolis, onde estudou até o final do Científico (atual Ensino
Médio). Trabalhava em banco, o Banco do Comércio e Indústria, e foi transferido para Volta
Redonda. Veio sozinho, o pai até tinha recebido oferta para vir para Volta Redonda, mas não
quis. Dizia seu Naim que o pai era um empreendedor, teve bar, restaurante, comércio e
terminou a vida trabalhando no Quitandinha, em Petrópolis. Sr. Naim entrou para a CSN
como operário e foi a observador industrial em 1961. Seu trabalho consistia em observar as
reações químicas e físicas no processo de produção do aço. Os minérios se fundiam e o aço
saía em forma de gusa, e o gusa entrava na lingoteira, depois era cortado e, em outra forma,
sairia a lâmina de aço. O que em 1960 demorava 8h para fazer, hoje, com tecnologia que
demorou mais de 100 anos para ficar perfeita, se faz em 25 minutos, com economia
gigantesca para a CSN.
Sr. Naim Dibb conta porque saiu de Petrópolis, onde tinha uma vida estabilizada, com
emprego, para vir para Volta Redonda:

Eu queria estudar, quando o banco me transferiu eu gostei muito pois aqui tinha
curso técnico, tinha faculdade e eu queria muito estudar, por isso saí do banco e
entrei na CSN, pois ela ajudava as pessoas a estudarem e no banco não dava. Eu fiz
o curso Técnico em Metalurgia, eu estava com 28 anos, eu comecei tarde, fui fazer
engenharia tinha mais de 40 anos, trabalhava de dia e estudava à noite, pois quem
tinha mais de 18 anos estudava à noite na Escola Técnica, uma média de 15 alunos
por turma. Volta Redonda era pequena, tinha elétrica, mecânica e metalurgia. Eu
terminei e melhorei de cargo depois do Técnico. Eu entrei na CSN como operário e
saí como Engenheiro.

Nessa mesma época funcionava um curso à noite de Aprendizagem Industrial para


quem tinha menos escolaridade, e o Sr. Naim Dibb assim se lembra do que oferecia: ―Tinha o
Curso de Aprendizagem Industrial, a gente chamava de CAI, tinha, oh meu Deus, me lembro
muito desse, tinha carpinteiro, eletricista, mecânica, bombeiro, tinha CAI de dia e de noite‖.
E segue explicando o que era o CAI:

O CAI precisava ter a 4ª série primária. Eu não me lembro de alguma coisa


específica pra isso não, com as ―baterias‖, eu não lembro se fazia o curso na Escola
Técnica ou na CSN, não, a ―bateria‖ C era pra esse pessoal [não alfabetizados], daí
aprendia, tirava o diploma do primário e podia fazer o CAI na Escola Técnica.
Quando eu entrei na CSN eu fiz um curso de um ano para observador metalúrgico,
entrei como operário e logo fui colocado num ―curso de apostila‖, eu recebia a
apostila e estudava e fazia prova. Passei com nota de 9,98. Eu fiz curso de acearia,
laminação a frio e laminação a quente. Eu passei por toda a empresa e aprendi a
explicar todos os problemas que davam no aço e sempre ―tirava as férias‖ dos chefes
de setor.

Em seguida, o Sr. Naim Dibb narra como foi parar na engenharia industrial:

Abriu uma vaga na linha de engenharia industrial (LEI) daí abriram uma seleção e
tinha sete vagas e mais de 50 candidatos. Foi uma semana de prova, psicotécnico,
72

teórica, prática e os sete selecionados fariam um curso com os engenheiros da LEI


para começar a atuar; daí fui selecionado e fui classificado como Cronotécnico.
Tinha duas classificações A e B, você entrava como nível B e depois nível A e o
trabalho diminuía e aumentava o salário. E tinha umas provas esquisitas, tinha um
psicólogo que eu fui fazer a prova e bati na porta e disse: ―cheguei!‖. Ele nem olhou
na minha cara e eu fiquei esperando, depois de mais de 40 minutos ele me chamou e
me deu uma folha falando que eu tinha passado na prova, era pra saber se eu tinha
paciência, pois eu mexeria com cronômetro e com o tempo, era umas coisas doidas
assim.
Eu comecei como cronotécnico e depois fui fazendo trabalhos dentro da empresa, fiz
cursos no Rio de Janeiro e me tornei Administrador, então fui promovido a analista
dentro da CSN. Depois disso, eu fiz engenharia civil, comecei em Barra do Piraí na
Fundação Rosemar Pimentel (FERP), em Barra do Piraí e terminei no Rio de
Janeiro. Depois comecei na UFF, aqui em Volta Redonda, mas não terminei, parei
no 7º período. Depois fiz licenciatura em matemática pelo Centro Universitário
Geraldo De Biase, e depois fiz direito na Universidade de Barra Mansa (UBM), mas
pouco exerci, pois logo fui levado a analista de dados e administração.

Em seguida, Sr. Naim Dibb busca explicar de onde veio sua vontade de estudar:

Não sei, do sacrifício da vida, via meu pai que não tinha estudo e via como era
sacrificante pra ele. E eu queria casar e ter família, então eu quis deixar janelas
abertas pra mim. Dei aula na Escola Técnica, dei aula na UGB, dei aula na Fundação
Oswaldo Aranha (FOA), dei aula na Prefeitura de Barra Mansa e hoje eu quero
viver, mas tenho que agradecer muito à minha mulher, pois ela deixou de estudar
para educar nossos filhos; quando eu passei em engenharia eu já tinha 2 filhos, e
[era] quando eu ia sempre para o Rio, e ela deixou de estudar para ficar com as
crianças.
Depois que eu aposentei eu fiz uma Pós-graduação em Engenharia Ambiental
Urbana, voltei para a CSN e fiquei lá mais 8 anos, depois mais 2 anos na Light e,
por último, na loja Correta, mas o deles eu não terminei pois tive um câncer e não
consegui mais, fechei a firma e parei com tudo.

Quando interrogado sobre se a CSN pensava a escolarização dos trabalhadores, nosso


entrevistado assim se expressou, acrescentando como se beneficiou com as oportunidades de
estudo e como o valorizou na própria família:

Ela dava curso, no início não, não ligava pra isso, mas depois ela começou a se
preocupar. Tinha a ―bateria‖ A, B e C. As pessoas pagavam particular para fazer o
curso e depois ela dava as provas. Depois de alguns anos ela começou a dar esse
curso também e depois a prova. Eu não me lembro se ela dava certificação, mas
acho que não. O cara vinha fazer a prova, entrava na área, tomava conhecimento e
depois fazia o curso. O cara pra aprender aquilo, ele via a prática e depois aprendia a
teoria. Na escola profissional tinha aula de tudo e quando eles aprendiam o ofício ele
acabava aprendendo a ler também, ou fazia ao mesmo tempo.
Fiz uma trajetória bonita, estudei, cheguei aqui só com o Científico e terminei com
três faculdades e uma pós-graduação. Aposentei, dei faculdade pra todos os meus
filhos, um deles é doutor em engenharia química e estou feliz. Já dei palestras, já
abri congresso. Peço a Deus forças para viver agora com saúde. Foi assim...

3.3 A trajetória da educação na CSN: O Lingote

Na metalurgia e fabricação do aço, dá-se o nome de lingote a uma massa de um metal


específico, ou de um material que exerce condução que, ao ser aquecido a uma temperatura
73

acima de seu ponto de derretimento, e ao ser derramado em uma forma, assume um formato
que facilita seu manuseio, melhorando o armazenamento, transporte e uso final. O lingote tem
pouquíssima impureza, pois só é derretido e colocado dentro do molde. (FARIA, 2016)
O lingote é tão relevante na produção do aço, que foi o nome dado, suponho, para um
jornal de comunicação interna da indústria, que teve, como pude observar, papel relevante na
―missão civilizadora‖ da empresa. Minha tarefa de pesquisador o alcançou quando consegui
— por um breve tempo — ter acesso aos arquivos da CSN.
Esse acesso aos arquivos não foi muito simples. Em um primeiro momento, foi-me
franqueada a documentação que solicitei. Iniciei as leituras de atas da diretoria desde a
fundação da CSN e os estagiários do Centro de Documentação Corporativa (CDC) ainda
separaram algumas caixas de documentos e também arquivos d’O Lingote, supondo que me
interessariam para a pesquisa. Essa foi a grande descoberta porque, até então, não tinha
notícia prévia da existência desse jornal e foi por meio dele que pude melhor perceber o papel
educativo que a CSN exercia sobre os trabalhadores.
Quando o trabalho já ia bastante avançado, as leituras sendo feitas, uma contraordem
impediu que eu continuasse a realizá-lo. Como já havia fotografado e me apropriado de
algumas informações, pude trazer para a pesquisa um conjunto pequeno de documentos e
informações, sabendo que muitos outros documentos e materiais ficariam encobertos, porque
indisponíveis ao meu acesso, pela contraordem da coordenadora do Centro. Dessa forma,
precisei organizar fragmentos do que havia conseguido e alinhá-los com as memórias, mesmo
sabendo que muitas lacunas ainda permaneceriam.
O Lingote foi o nome da produção impressa que correu pela cidade entre os
trabalhadores, desde o ano de 1953 até 1977. Esse pequeno informativo, com padrão de 12
páginas inicialmente, produzido pelo setor de comunicação e jornalismo da CSN tinha
diversas utilidades. O periódico apresentava as seguintes características: formato standart;
papel tipo jornal; e no expediente constava o serviço de relações públicas da Companhia
Siderúrgica Nacional); não havia informação sobre a tiragem impressa. Era distribuído a todos
os setores da CSN para que os funcionários os retirassem e o lessem. Suas edições eram
numeradas sequencialmente.
74

Figura 3 - Lingote n. 02, 10 de abril de 1953.

Fonte: Centro de Documentação Coorporativo CSN

Na primeira página, como todo jornal, havia a manchete, isto é, a principal notícia
tratada naquela edição, além de outras colunas fixas. Dentro, havia uma seção separada, que
dava espaço para ―personalidades anônimas‖ da empresa, nomeada: ―Conheça seu colega de
trabalho‖. Nesta seção sempre surgia a história de um trabalhador; o setor em que atuava; o
que fazia e como vivia na sociedade voltarredondense.
Em outra seção fixa do jornal, havia passatempo e uma página separada para
mulheres. Nessa página se tratava da forma como as mulheres deveriam se comportar na
sociedade.
75

Sempre havia uma ou duas páginas sobre esporte e lazer no âmbito estadual (os
campeonatos) e municipal (os torneios), assim como atividades de lazer de que os
trabalhadores e familiares poderiam desfrutar.
No espaço restante do jornal, havia notícias da sociedade voltarredonsense; do interior
da empresa; balanços; novidades da empresa e, no que tange à importância destacada na
pesquisa, informações sobre cursos que se iniciavam, finalizavam, deixando perceber como
foi se desenvolvendo progressivamente a educação de trabalhadores adultos em Volta
Redonda.
Pela relevância deste periódico, publicado quinzenalmente nos primeiros anos com um
quantitativo de 24 exemplares por ano; depois mensalmente com um total de 12 por ano; e
bimestralmente nas últimas edições, com seis exemplares por ano, utilizei-o como fonte
principal, porque por meio dele percebia como se davam as ofertas de cursos para
trabalhadores, identificando a relação com a formação profissional e/ou com a escolarização
e, até mesmo, com a alfabetização, observando, ainda, se havia parceiros para essas ações
institucionais.
Para a organização metodológica dessa análise da oferta de cursos, recolhi na própria
CSN, na ocasião, os números publicados d’O Lingote. Utilizei a letra ―A‖ para artigos e
numeração sequencial, de modo que se possa ver, sem dificuldades, a matéria na íntegra, no
Anexo 3. Dessa forma, apresento neste item um panorama descrevendo as relevâncias
presentes em cada um dos artigos encontrados, remetendo à leitura completa, no Anexo,
sempre que de interesse do leitor.
A primeira notícia que se tem referência n’O Lingote ocorreu no ano de 1953, em
abril, primeiro ano da publicação. Abriam-se inscrições para operários que só tinham o curso
primário, oferecendo o curso ginasial (atual 6º ao 9º anos do ensino fundamental). A
oportunidade era somente para operários que faziam turnos, de modo a que se conseguisse
organizar os horários das turmas que os atenderiam. (cf. A1). Nesse ano, o que observei foi a
necessidade de a indústria promover o aumento da escolaridade de seus trabalhadores, em
clara relação com compromissos da educação de adultos.
Em A2, de junho de 1953, lê-se sobre uma palestra que professores da escola
profissional assistiram, quanto aos passos do Método Marrison (método que trabalha por
unidades didáticas), método este que estava sendo utilizado em Nova Friburgo, para que os
professores dali também pudessem utilizá-lo na escola profissional. Como observado, ainda
no mesmo ano o interesse da CSN passa a se voltar à educação profissional, incluindo a
formação de professores.
76

Em A3 e A4, observa-se a saudação ao novo prédio da escola profissional que saía do


―barracão‖ em que estava instalada e ganhava uma sede própria no bairro Sessenta. A
perspectiva da educação profissional passa a ter mais intensidade, resultando em construção
de uma escola para trabalhadores. Nessa matéria é lembrada a primeira turma de
aprendizagem industrial e como a CSN, em 1944, enfrentou a escassez de mão de obra,
investindo nessa escola, pelo ensino do ofício aos trabalhadores. Nove anos depois, os
primeiros alunos dessa escola assumem o ensino do ofício para a nova geração.
No mês de dezembro de 1953 foi aberto o chamado para cursos profissionalizantes
para adultos e jovens. O trabalhador da CSN tinha a probabilidade de, ao concluí-lo, subir de
cargo dentro da empresa, e os menores de idade, além de receber bolsa de estudos, também
receberiam uma carta declaratória do ofício aprendido e, assim, garantiriam um emprego na
CSN, ao final do curso. (cf. A5)
No artigo d’O Lingote de 25 de dezembro de 1953, lê-se uma notícia significativa. Na
primeira parte, anuncia-se o encerramento dos cursos de qualificação e das turmas de
supletivo mantidas pela CSN. Essa foi a primeira publicação oficial com que tive contato,
comprovando a conclusão de nove turmas de supletivo (mantidas pela CSN), o que poderia
ser resultante de petição de professores voluntários solicitando auxílio da empresa, no ano de
1947, contida em relatório da diretoria a que tive também acesso. Em seguida, a matéria faz
menção oficial ao Círculo Operário3, entidade ligada à igreja católica de grande importância, e

3
Associações civis de trabalhadores, de inspiração católica, surgidas no Brasil na década de 1930. A primeira
dessas associações foi o Círculo Operário Pelotense, fundado na cidade de Pelotas (RS) em 15 de março de
1932. Na década de 1920, surgiu no Brasil um movimento leigo empenhado na discussão dos problemas
sociais à luz de pensadores católicos como Jacques Maritain. Na década seguinte, organizaram-se no país
vários grupos inspirados pela Igreja, como a Liga Eleitoral Católica, a Associação de Universitários Católicos e
a Ação Católica Brasileira. Nesse quadro surgiu também um movimento operário católico, que iria resultar na
criação dos círculos operários, e, mais tarde, na Confederação Brasileira dos Trabalhadores Cristãos. Os
círculos operários tinham como objetivo coordenar a atividade de seus sócios a fim de alcançar uma real
elevação econômica, cultural e social das classes trabalhadoras, constituindo-se, assim, como uma organização
de caráter econômico-social e de direito civil, não sendo, portanto, associação de direito eclesiástico, como a
Juventude Operária Católica (JOC). Faziam parte do círculo operário, como sócios efetivos, operários manuais,
empregados do comércio, pequenos funcionários públicos, trabalhadores por conta própria, pequenos
proprietários rurais e, em geral, todos os assalariados de ambos os sexos e de qualquer profissão. Os círculos
operários não tinham nenhuma dependência, direito ou outra relação de ordem jurídica com o Ministério do
Trabalho. Não são, ainda, associações religiosas, nem dependem diretamente da hierarquia eclesiástica em
assuntos de sua finalidade imediata, embora inspirados em encíclicas católicas. Julgavam-se, ainda, ―fora e
acima da política partidária‖, não podendo os dirigentes servir-se do nome dos círculos que representavam para
apoiar partidos políticos ou entrar em compromisso com eles. Sua função residia em promover a assistência e o
auxílio mútuo ao operário, aspirando ―a uma ordem social de perfeita justiça, caridade e harmonia‖. Em 1937,
na tentativa de organizar um movimento nacional unificado, o padre Brentano promoveu no Rio de Janeiro o
primeiro congresso nacional circulista. Nessa ocasião foi constituída formalmente a Confederação Nacional
dos Operários Católicos (CNOC), composta de 34 círculos, com 31 mil membros espalhados em cinco estados.
No período do Estado Novo, o movimento operário católico cresceu bastante. Os círculos receberam o
reconhecimento oficial do governo e foram beneficiados por favores, na medida em que ajudavam a
administrar a legislação de bem-estar social instituída por Vargas. Ao fim desse período, existiam duzentos
77

que poderia ter assumido, junto com a CSN, a tarefa de ministrar os cursos supletivos. (cf.
A6)
No recorte A7 leio a menção sobre a Superintendência de Assistência Social da
empresa, cujo Departamento de Assistência Educacional exercia o controle da parceria com o
SENAI, no desenvolvimento dos cursos de qualificação. A educação municipal e os
supletivos eram assistidos pela CSN. Em 1954, mais de 1.500 crianças estudavam na região,
graças a escolas mantidas pela CSN. O que observo é o empenho crescente da indústria em
promover a escolarização mais diretamente dos filhos de trabalhadores que constituiriam a
mão de obra futura da CSN, embora nessa década ainda se verifique a oferta de escolarização
de trabalhadores.
Em A8, de 25 de janeiro de 1954, um artigo informa que os estudantes, tanto crianças
como jovens e adultos dos cursos supletivos estavam usufruindo das férias escolares,
enquanto o Departamento de Orientação Educacional da CSN iniciava estudos para formular
planos educacionais, cursos e oferecer mais turmas de supletivo para toda a população
voltarredondense.
No mês de abril de 1954, o artigo trata dos quantitativos que a escola profissional
formou. Lê-se que foram 247 alunos no turno do dia e 429 jovens e adultos qualificados e
capacitados para atuarem na CSN. Ainda trata da pretensão da escola profissional pedir
permissão ao Ministério da Educação e Saúde (à época) para ministrar o ensino técnico. (cf.
A9). Observa-se que a ação da CSN no campo educacional ia bem além da possível ideia de
cursos livres, sem regularização legal, para assumir condição de legalidade, como requerido
pelo Ministério da pasta.
Em A10, pode-se ler sobre uma aula teórica sobre a operação da usina ministrada
dentro da empresa, demonstrando a importância que a CSN dava à educação de trabalhadores,
colocando seus técnicos em nível dos altos padrões do setor industrial brasileiro.
A inauguração do Grupo Escolar Presidente Roosevelt é noticiada em A11, um marco
para o ensino em Volta Redonda. Inicialmente oferecia 6 mil novas vagas e, mais tarde, a

círculos e duzentos mil associados em todo o país. Com a queda de Vargas, o movimento católico entrou em
declínio, devido em parte ao descrédito que começavam a ter os princípios do corporativismo com a derrota do
fascismo na Segunda Guerra Mundial. No meio da década de 1950, a Igreja tratou de modernizar os círculos,
reorientando seu programa e suas atividades com vistas ao trabalhador brasileiro. A partir do VII Congresso
Nacional dos Círculos Operários, foram incrementadas as escolas de líderes operários, a primeira das quais foi
fundada no Rio de Janeiro pelo padre Belisário Veloso, então assistente eclesiástico da CNOC. Nesse
momento, registrava-se um esforço no sentido de orientar o movimento fundamentalmente para os problemas
trabalhistas. (Adaptado de Mônica Kornis, com fonte BRANDÃO, B. Movimento; CÍRCULO OPERÁRIO.
Anual; WIARDA, H. Movimento). Disponível em http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-
tematico/circulos-operarios . Acesso em 1 nov. 2018.
78

escola se torna um grande referencial no ensino supletivo, até chegar ao ensino por módulos,
que acaba por torná-lo obsoleto, já no fim dos anos de 1990.
Em janeiro de 1955, pode-se ler a comemoração do fim dos anos letivos de todos os
educandários de Volta Redonda, além de mais uma menção à escola profissional e à escola do
Círculo de Operários que, além do supletivo, buscava oferecer formação política e social aos
alunos. (cf. A12)
O artigo em A13 destaca um prêmio — pondo a meritocracia em cena — aos alunos
que se destacaram na escola profissional. O objetivo era valorizar os estudantes e estimular os
demais a terem boa produtividade e frequência satisfatória. Os 22 alunos premiados ganharam
uma viagem para São Paulo, paga pela CSN.
Em abril de 1955 ocorria um marco na história da cidade: era oficialmente instalado o
Curso Industrial Básico, com o objetivo de formar a geração vindoura que deveria assumir o
trabalho na CSN. O curso visava preparar os indivíduos para o curso técnico e dar um passo a
mais em direção a um curso superior na área de metalurgia ou em qualquer outra similar,
podendo ser absorvido pela empresa. Os estudantes menores realizavam o curso durante o dia
e havia poucas turmas à noite, para os maiores de idade. (cf. A14). Como se pode observar a
CSN não apenas se projetava a um futuro tecnológico que exigiria novas formações
especializadas, como também ―preparava‖ os estudantes que poderiam vir a ser a nova
geração de trabalhadores requerida pela indústria em franco desenvolvimento.
O artigo de A15 (maio de 1955) trata do sucesso dos cursos oferecidos na escola
industrial e a melhoria gradativa que se observava com o contínuo aperfeiçoamento dos
professores e dos equipamentos que, ao chegarem à CSN, eram instalados com a participação
de professores e alunos.
Já no ano de 1955 a escola industrial recebeu oficialmente reconhecimento legal para
funcionar como escola, podendo emitir cartas de ofício e certificações. Esse reconhecimento
foi feito pelo chefe do governo Café Filho. (cf. A16)
Em meados de 1955, com proposição da CSN por meio do Departamento de
Assistência Educacional, foi criado o Centro de Extensão Cultural, que objetivava oferecer
cultura geral e formação cultural para os operários e seus familiares, em cursos nos quais
poderiam se inscrever opcionalmente. (cf. A17)
Na perspectiva de formação continuada e ao longo da vida, pode-se assim considerar,
tendo em vista concepções vigentes à época, foi convidado a Volta Redonda um renomado
cientista, professor da École Mines de Saint Étienne, da França, uma das maiores autoridades
em Metalurgia e Siderurgia. O curso foi realizado com técnicos e engenheiros superiores,
79

tanto da CSN como de convidados de outras partes do Brasil. O objetivo era de formação e
aprimoramento, ajudando a fortalecer a indústria siderúrgica no Brasil. (cf. A18)
Outra oportunidade de curso para adultos ocorreu em agosto de 1955, ofertado pela
rádio Zyp-264. O curso aconteceu em duas modalidades: para radiouvintes e de forma
presencial (com a nomenclatura de ―normais‖). Ambos tiveram acesso ao auditório da rádio e
ao material, na primeira meia hora de aulas. Depois, na segunda parte, somente os alunos da
modalidade presencial teriam o direito de debaterem e tirarem dúvidas, podendo os demais
acompanhar pelo rádio. Todo o curso era transmitido pelo rádio. Somente os alunos inscritos
teriam direito ao certificado. Os cursos oferecidos eram de Português, Inglês, Geografia,
Introdução à metalurgia, Administração de pessoal e Elementos de psicotécnico. (cf. A19)
No artigo A20, noticia-se que um engenheiro e quatro técnicos receberam uma bolsa
de estudos para realizar curso especial de metalurgia no Centro de Estudos da Indústria
Metalúrgica, em Mertz, na França. O curso e a viagem foram todos custeados pela CSN,
visando à formação e especialização de seus funcionários.
Em A21, a matéria trata de investimentos que a CSN realizou voltados à educação
municipal primária. A fala da diretoria da empresa considerava importante que a cidade
tivesse investimento no ensino primário, pois quando adulto, há mais dificuldade para
aprender, sendo papel da empresa propiciar à população jovem a escolarização, para não ter
de fazê-la quando adulto. Cita ainda os cursos de aprendizagem industrial, e a possibilidade
de abrir o curso científico voltado para a indústria. Nesta matéria, claramente se observa a
função que a indústria dispensa à formação básica escolar: preparar a mão de obra
trabalhadora, para que venha a favorecer e facilitar a admissão de trabalhadores já
escolarizados, de modo a desempenharem produtivamente o trabalho na indústria metalúrgica.
O artigo A22 trata de incentivo à continuidade da escolarização dos funcionários, para
o que a CSN custeou um curso de aperfeiçoamento na Escola Brasileira de Administração da
Fundação Getúlio Vargas (FGV).
A preocupação com a formação qualificada de trabalhadores para a indústria nascente
e que se afirma, nesse período histórico, é visível, já que se tratava de um campo novo no
país, para o qual se voltavam expectativas e no qual se aprendia fazendo, no mais das vezes.
Com o passar do tempo, são percebidas necessidades de formação, e a empresa investe para
garantir a continuidade das operações industriais, formando quadros e assegura a

4
O rádio foi relevante nas iniciativas de formação de trabalhadores e de escolarização nos movimentos de
educação popular, em todo o país, pela penetração que alcançava. Não me ocupei dessa discussão aqui pelo
fato de as únicas fontes obtidas terem sido restritas aos jornais. Certamente que o uso das rádios podem ser
objeto de novas investigações por pesquisadores.
80

competitividade internacional. Observe-se esse trecho da publicação de 1956, que começa


questionando a necessidade de se formar ―mais pensantes‖ para melhorar a formação dos
operários. Afirma-se que Volta Redonda precisava formar ―mais pensantes‖, e anuncia as
melhorias nos equipamentos escolares e nos cursos de aprendizagem e aperfeiçoamento. (cf.
A23)
Um grande passo na educação de Volta Redonda foi o reconhecimento do curso
Industrial Básico pelo Ministério da Educação. Além disso, com esse reconhecimento, a
Escola Profissional Industrial passa a ser chamada de Escola Técnica Pandiá Calógeras
(ETPC). (cf. A24)
Mais uma iniciativa financiada pela CSN foi a do curso oferecido pela Zyp-26 (cf.
A25). A matéria aborda de forma sucinta o curso de Estatística Aplicada nos mesmos moldes
do anteriormente citado, no artigo A19 d’O Lingote.
Em A27 aborda-se mais um passo dado na escolarização do município e como a CSN
se interessava por mudar em poucos anos o perfil da população. Os cursos da ETPC estavam
preparando jovens e adultos que lá ingressassem para cursos de ensino superior. A CSN,
nessa empreitada, injetou um volume significativo de recursos financeiros para que pudesse
progredir a formação desses jovens e adultos.
A matéria em A28 foi toda dedicada à Escola Técnica, a seus cursos, horários de
funcionamento e à qualidade de ensino ali oferecida. Destaque especial dado aos cursos de
formação de adultos, tanto de aprendizagem industrial como cursos técnicos.
Mais uma menção à rádio Zyo-26, quando alunos dos cursos realizaram aula prática
dentro da CSN. A rádio e seus cursos eram sempre realizados no intuito de levar ensino para
trabalhadores da CSN e para a população em geral. (cf. A29)
No artigo catalogado como A30, trata-se da viagem de quatro engenheiros, de um
químico e de um médico, todos funcionários da CSN, aos Estados Unidos para realizarem
estágio e aperfeiçoamento em seus distintos campos de atuação, potencializando suas
atuações dentro da empresa.
Em A31 a matéria se inscrevia como mais uma forma de engrandecer a qualidade da
Escola Técnica que, após ser reconhecida pelo Ministério da Educação, vinha obtendo
repercussão em todo o Brasil, como uma escola de ponta.
O artigo de 10 de maio de 1957 demonstra, retornando ao tema, como a CSN, além de
se preocupar com a escolarização dos funcionários, pensava as próximas gerações também,
concedendo bolsas de estudo para os filhos dos funcionários, mas em cursos específicos como
engenharia e química — certamente áreas de seu interesse. O artigo também é uma espécie de
81

edital que apresentava os passos que o pai ou responsável deveria seguir para pleitear a bolsa.
(cf. A32)
Mais um crescimento da empresa era noticiado: a metodologia TWI de gestão,
proposta para treinamento de todos os funcionários em cargo de liderança. Na edição 100 de
O Lingote a notícia sobre a formação dos líderes teve início, demonstrando a constante
preocupação da empresa de não estagnar, mas crescer e se desenvolver, balizada na formação
continuada. (cf. A33)
O artigo da edição 104, de agosto de 1957, corrobora mais uma vez a preocupação da
cidade junto com a CSN pela educação dos munícipes. No artigo intitulado Junto com a usina
construíram-se escolas demonstrava-se o envolvimento da CSN com as questões
educacionais da cidade: em primeira instância, no pensamento de curto e médio prazo, com os
adultos; e, a longo prazo, com as crianças. (cf. A34)
Mais um artigo sobre os cursos da rádio Zyp-26. Em outubro de 1957 (edição 106) a
rádio diplomou 108 alunos que terminaram com êxito os cursos oferecidos, isto é, tiveram
presença e aproveitamentos satisfatórios. (cf. A35)
Em março de 1958, na edição 111, mais uma notícia sobre formação —
aperfeiçoamento e especialização. Doze funcionários da CSN foram para São José dos
Campos durante dois meses, fazer um curso no Instituto Tecnológico da Aeronáutica,
confirmando o interesse da CSN com o desenvolvimento profissional de seus funcionários.
(cf. A36)
Em A37 (junho de 1956, edição 114) há a notícia do término da primeira turma do
curso de aperfeiçoamento de Auxiliares Técnicos para funcionários da CSN.
Enquanto as capacitações e fases do TWI prosseguiam, as notícias sobre os cursos de
formação e aperfeiçoamento em metalurgia e siderurgia continuavam circulando. (cf. A38)
O artigo de outubro de 1958 (edição 118) tratava de mais um passo na ideia de
educação que se buscava desenvolver em Volta Redonda: a inauguração de um laboratório de
física e química para o desenvolvimento de estudos e análises do aço produzido. (cf. A39)
O artigo A40, edição 129, trata de uma formatura de conclusão do ginásio na Escola
Getúlio Vargas. Mas O Lingote cobria essa formatura, pois havia inúmeros operários da CSN
diplomados nessa cerimônia, comprovando haver, já em 1958, oferta de escolarização de
adultos no município.
Um processo de seleção para serventes atraiu 440 candidatos para realização da prova,
demonstrando o interesse da população para trabalhar na empresa, certamente apostando nas
promessas de crescimento e aperfeiçoamento profissional. (cf. A41)
82

No artigo A42 noticia-se sobre um funcionário que já trabalhava na CSN havia 18


anos e fora convidado a realizar curso de aperfeiçoamento nos Estados Unidos, todo pago pela
CSN, demonstrando que mesmo trabalhadores antigos da empresa deveriam ser qualificados e
treinados.
Em A43 e A45 (edição 135, 142, agosto de 1960 e março de 1961 respectivamente)
leem-se mais duas notícias sobre dois cursos de aperfeiçoamento dentro da CSN, ambos de
Controlador de Ponte Rolante.
O curso de Solda Elétrica Rápido foi também noticiado como um curso oferecido pelo
Centro de Treinamento e Seleção (CTS), que por muitos anos ficou responsável na empresa
pelo treinamento e cursos de aperfeiçoamento dos funcionários adultos. (cf. A44, edição 140,
de janeiro de 1961)
Em março de 1962, na edição 149, mais uma notícia sobre turma de aperfeiçoamento
de Auxiliares Técnicos. (cf. A46)
Mais um curso técnico do CTS finalizava, desta vez o Curso sobre Abrasivos de Ligas,
e era noticiado n’O Lingote. Nessa turma, inúmeros setores estiveram envolvidos e todos os
módulos foram ministrados por engenheiros dos setores relacionados com a temática. (cf.
A47)
Em setembro/dezembro de 1963, edição 161noticiavaque uma turma de alfabetização
de adultos fora aberta pelo CTS no Porto de Areias, indicando que as aulas aconteceriam no
próprio porto e demonstrando o compromisso da CSN não apenas por qualificar e aperfeiçoar,
mas de eliminar o analfabetismo dentro da CSN e na cidade de Volta Redonda, como
preconizava Getúlio Vargas e os fundadores da Usina Presidente Vargas e projetistas da
cidade de Volta Redonda. (cf. A48)
Outro curso de aperfeiçoamento promovido dentro da própria CSN, dessa vez, para
tratar de corrosão, foi noticiado na edição 170 de janeiro de 1965. O curso também era
ministrado pelo CTS e se assinalava que cada temática dos cursos de aperfeiçoamento surgia
nos setores, de acordo com as demandas também surgidas pelas necessidades da produção na
CSN. (cf. A49)
N’O Lingote de dezembro de 1965 (edição 179) aparece a notícia de um novo acordo
entre a CSN e o SENAI, o que confirma que esse acordo de cooperação já havia sido firmado
em, pelo menos, outro momento. O acordo previa o SENAI e o CTS com responsabilidade
comum na continuação da formação, da qualificação e do aperfeiçoamento da mão de obra da
empresa. (cf. A50)
83

No artigo (edição 190 de janeiro de 1967) que celebra o término do curso de


aprendizagem industrial em Volta Redonda, a notícia enaltece a missão e o compromisso que
a CSN tem com a cidade de Volta Redonda para a formação integral, justificando os
intensivos investimentos em construção de escolas e formação de professores, para
desenvolver de forma profissional e humana os alunos — futuros trabalhadores da empresa.
(cf. A51)
Em A52 (edição 207 de maio/julho de 1969)) um pequeno artigo trata dos
investimentos e preocupação da CSN com a escolarização, aperfeiçoamento e qualificação de
seus funcionários. Até o momento, destacava, haviam acontecido 174 cursos com 3.566
alunos formados; 190 funcionários foram enviados ao exterior para fazerem estágios; teriam
sido concedidas 709 bolsas de estudo para filhos de funcionários; e 255 alunos se formaram
nos cursos técnicos da ETPC. Além disso, a empresa alocara para o município de Volta
Redonda um montante significativo de recursos financeiros para a implantação de um plano
de desenvolvimento da educação.
No artigo A53 (edição 210, novembro e dezembro de 1969) lê-se o relato de um
funcionário da CSN que chegou em Volta Redonda como agricultor. Na ocasião noticiada ele
recebia um certificado de melhor aluno do estado do Rio de Janeiro, exatamente no momento
em que terminava o curso de eletricista.
Em A54 (edição 217, março e abril de 1970), noticiava-se que 29 trabalhadores
terminavam um curso de qualificação profissional em parceria com o SENAI. A novidade era
que a cada hora de aula frequentada os alunos recebiam um valor em dinheiro para auxiliar
nos gastos.
O último artigo a que consegui ter acesso neste conjunto de O Lingote (edição X, mês,
ano), tratava de cursos básicos, pré-básicos e de alfabetização ministrados na Escola Técnica
Pandiá Calógeras. Ali, noticiava-se, 32 alunos haviam sido diplomados e 50 bolsas de estágio
no país e no exterior foram ofertadas aos concluintes dos cursos técnicos. (cf. A55)
Como se pode observar após a leitura de todo esse material, periodicamente a CSN se
ocupava em informar o que aconteceria ou o que acontecera, reafirmando o interesse da CSN
pela qualificação profissional dos seus empregados e, ao mesmo tempo, em trazer às novas
gerações formação educativa para atuação na indústria, ou seja, formação profissional.
A CSN, para cumprir seus objetivos, se aproximava, convergindo, das/com
recomendações de conferências internacionais no que tange ao aprendizado no trabalho; na
formação ao longo da vida; em concepções de educação de adultos, vigentes à época,
84

trazendo pela prática de formação profissional, esses temas para a realidade do público que
tanto aspirava entrar nessa empresa como trabalhador.
Ao fomentar motivações para o estudo como forma de crescimento na empresa e para
a qualificação, de modo a que o trabalhador expanda sua prática, a CSN também incentiva a
formação cultural por meio de parcerias, principalmente com a rádio que, na época, era o
meio de informação popular.
3.4 Alinhando histórias
As quatro histórias que consegui colher, entrevistando personagens envolvidos com a
CSN, são exemplos vivos de uma memória pouco evocada ou não contada, mas de imensa
relevância na história brasileira. Cheias de vida, emoção, em muitas vezes com dificuldade de
fala para que pudesse ser registrada e narrada. Pouco se conhece desse ângulo da ação da CSN
no cenário da educação de adultos no país, e o que representou na educação em geral, na
região do Médio Paraíba. Minha pesquisa fez uma pequena aproximação, sinalizando um
campo fértil que poderá ser aprofundado, por novas investigações.
Os personagens destacados puderam contemplar meu objetivo de que suas histórias se
entrecruzassem entre elas e às fontes documentais a que tive acesso. Registros históricos
frequentemente aportam uma única voz (a voz oficial) sobre fatos que, quando narrados, pela
ação ativa das memórias de pessoas, despertam maiores compreensões, trazendo a memória
coletiva que pode (ou não) corroborar e descortinar processos vividos que atravessaram a
formação escolar e profissional dos sujeitos, em torno e mesmo no interior da Usina
Presidente Vargas, durante os primeiros anos de sua criação.
Percebem-se muitos discursos cruzados na fala de nossos personagens, o que segundo
Pollak (1989) traduziria a memória coletiva, o que dá às falas sustentação, tornando-as
institucionais e dando maior credibilidade a essas memórias.
Dos nossos quatro personagens, todos vieram para Volta redonda na perspectiva de
melhoria de vida ou de melhor qualidade de vida, e apenas um chegou a Volta Redonda
analfabeto. Um deles chegou com o curso primário completo (5º ano de escolaridade); outro
chegou com o ginásio, o atual 9º ano do ensino fundamental, realizado na escola do SENAI
na cidade em que nasceu; outro chegou com o científico completo (atual ensino médio). Das
quatro trajetórias, dois chegaram até o ensino superior e, em seus relatos, são enfáticos em
afirmar que isso somente foi possível com as facilidades e incentivos que a CSN oferecia. Os
outros dois personagens que não chegaram a estudar mais, ainda assim alcançaram cargos
mais altos na empresa, demonstrando o apreço da empresa pelo desenvolvimento e
qualificação profissional, interessada no domínio de técnicas e tecnologias, deixando em
85

segundo plano a formação escolar. A formação de trabalhadores para o capital norteava, sem
sombra de dúvida, as ações da empresa aqui elencadas.
Três dos nossos personagens realizaram, para seu desenvolvimento profissional,
provas ou cursos da chamada ―bateria‖. Todos fizeram a ―bateria‖ B, no nível do final do
primário, mas suficiente para abrir portas dentro da empresa e melhorar condições de
trabalho. De acordo com vagas que iam aparecendo, os trabalhadores eram informados da
prova e, em muitos casos, a vaga não era imediata, mas o aprovado era alocado para aprender
no novo setor, podendo alguns meses depois trabalhar na ocupação para a qual realizara a
―bateria‖.
No que tange a processos de alfabetização formal, encontrei em dois relatos a presença
de oferta privada, com professores que recebiam para preparar os trabalhadores para
realizarem as provas, e que também os alfabetizava. No ano de 1947 encontrei menção a
algumas classes de alfabetização de adultos que funcionavam na Escola Estadual Trajano de
Medeiros. A busca de documentação na escola foi frustrada por inúmeras negativas, pois nem
a escola e tampouco a coordenadoria do Médio Paraíba sabiam onde se encontrava a
documentação que eu buscava. Ainda, a escola profissional que passou a exercer suas
atividades a partir do ano de 1943, ao ofertar seus cursos, oferecia um curso de Aprendizagem
Industrial básico, relatado diversas vezes pelo O Lingote e realizado pelo Sr. Francisco
Augusto da Silva, um de nossos entrevistados. Tais cursos não certificavam formalmente a
escolarização, servindo para preparar, qualificar, formar para atuação dentro da empresa.
A escolarização formal, segundo alguns relatos de entrevistados, e de acordo com os
achados da pesquisa, nunca foi prioridade da empresa. Os cursos da empresa não
certificavam, embora apoiasse e promovesse, diretamente, ou em parcerias a preparação do
trabalhador para exercer sua função dentro da empresa. Nas entrevistas, os trabalhadores
relataram que não tinham conhecimento de nenhuma iniciativa formal de alfabetização dentro
da empresa, o que não significava que a empresa não se interessasse pela situação de
analfabetismo entre trabalhadores. Nos relatos do Sr. Francisco, principalmente, observa-se
como se sentia motivado em aprender, para que pudesse crescer na empresa, o que exigiu
fazer cursos e, para isso, como base, saber ler e escrever. Muitas vezes o interesse do
trabalhador em avançar em uma carreira/profissão motivava-o a buscar classes de
alfabetização, para que pudesse aprender a ler e a escrever e, desse modo, estar apto a realizar
os cursos (―baterias‖) que lhe permitiriam crescer na empresa.
As iniciativas existiam, pude encontrar em, pelo menos, dois artigos n’O Lingote
noticiando cursos de alfabetização que ocorreram, ora oferecidos pela empresa, ora em
86

parceria com o município, mas custeados pela empresa. No documento Ata de 1946, em
anexo, lê-se a menção a um curso de alfabetização de adultos que funcionava em uma escola
estadual, o grupo escolar Trajano de Medeiros. Por esse documento verifica-se que
professores voluntários pediram ajuda à CSN, pois, segundo eles, a Inspetoria de Ensino
interditaria o curso de alfabetização de adultos que não tinha autorização para funcionar
naquele prédio. Diante do fato, os professores voluntários solicitavam à diretoria da CSN um
local para que o curso de alfabetização de adultos pudesse funcionar e não fosse interrompido.
O interesse pela escolarização voltada ao trabalho, principalmente para a educação de
adultos, era uma prerrogativa da Constituição de 1934, preceituando uma educação para
todos. Em 1935, o Ministério da Educação e Saúde Pública iniciava a ter uma visão mais
orgânica do ensino profissional e levantava a hipótese de eliminar diferenças entre trabalho
manual, industrial e agrícola, pela obrigatoriedade do ensino profissional. (GHIRALDELLI
JÚNIOR, 2008).
A tendência no momento de construção da CSN em Volta Redonda era a da
industrialização. Assim, ter claras todas as diferenças e focar os aprendizados compunham
uma decisão acertada. Mais tarde, isso seria corroborado pelas orientações dos fóruns e de
conferências internacionais tiveram lugar. Nesse quesito, a CSN realizou uma ação que pode
ser interpretada pelo menos de duas formas distintas. Uma primeira interpretação de que ela
se orientava por uma ideia comercial e capitalista, pouco se importando com o crescimento
das pessoas, mas com o foco no crescimento da empresa. Capacitava-os e os qualificava para
exercerem um trabalho, sem pensar na formação política e cidadã. Uma segunda interpretação
situa-se no campo do capital e do crescimento comunitário, sem negar que a empresa
objetivava o crescimento do capital (objetivo de toda empresa) mas que, além disso,
valorizava o desenvolvimento profissional dos trabalhadores na empresa e em visão de largo
prazo, projetava o futuro, apoiando a educação e até mesmo a cultura no município, como
garantia de trabalhadores mais bem formados/escolarizados para as sequentes gerações. Sr.
Francisco e o Sr. Naim são evidências dessas possibilidades iniciais em relação a eles
próprios, assim como pelas trajetórias já construídas por seus filhos.
O ideal de construção da cidade ao redor da indústria, uma ideia de Getúlio Vargas de
criar uma cidade cuja sociedade se consolidaria pelo valor do trabalho parece ter sido posta
em curso, durante o período investigado. Getúlio Vargas, segundo Souza (2016, p. 12-14),
projetava assim a vida de todo trabalhador: ―Quero dar-lhes a oportunidade de ascenderem
socialmente‖. O ideal de construção deste modelo de cidade figuraria como exemplo a ser
seguido em todo o país, saindo do atraso da submissão às oligarquias e adentrando no avanço
87

da industrialização. As contradições permeando este modelo podem ser apontadas nas ações
da igreja católica que, mesmo a serviço, nos Círculos Operários da CSN, desenvolviam
formação política e cidadã, mescladas com interesses partidários que sempre se fizeram
presentes nos sindicatos de trabalhadores.
Ainda que o pensamento do engenheiro chefe, responsável pela construção da cidade,
fosse de estimular o cidadão que nela morasse para uma vida regulada pela nova indústria,
Atílio, o engenheiro não poderia imaginar o que os sujeitos fariam com a liberdade e a
autonomia conquistadas no mesmo espaço de trabalho que pensava controlar. Assim, sua
máxima de que esse espaço seria posto para ―[...] levar o homem acostumado a uma vida sem
perspectiva a viver num ambiente que o faça querer ser melhor‖ (SOUZA, 2016, p. 12-14) foi
criativa e inventivamente recriado pelos sujeitos que adotaram Volta Redonda como lugar de
pertencimento e território de vida.
88

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O município de Volta Redonda é a cidade mais desenvolvida da microrregião do


Médio Paraíba no estado do Rio de Janeiro e tal situação é explicada por que a cidade nasceu
para atender a demandas e desejos de uma empresa nacional que tinha aspirações para o
território e cumpria um projeto de desenvolvimento para o país.
Por questões geográficas e políticas, esse território foi escolhido para sediar o que
seria a maior siderúrgica da América Latina e em torno da indústria surgiu a cidade que, nas
projeções de seus idealizadores, seria uma utopia no Brasil, cidade nascida impulsionada por
uma empresa e para servir a uma empresa, de cidadãos cultos, com ética, e qualificados para o
trabalho que ali se desenvolvia, valorizando e buscando o próprio desenvolvimento individual
para atuação no coletivo.
A indústria de base nascia e a população, outrora agrária, iniciava uma fase de
mudança de paradigma econômico. Na política do país, Getúlio Vargas assumia e desenvolvia
políticas chamadas de populistas, que aumentavam seu prestígio diante da população,
outorgava direitos aos trabalhadores e buscava o crescimento do país. Políticas e discursos
estadonovistas buscavam elevar o país a padrões e a dimensões outrora nunca alcançados,
alavancando o país econômica e politicamente.
No âmbito educacional, a universalização do ensino entrara nas discussões desde a
Constituição de 1934, que trazia o adulto como sujeito de direito à educação e introduzia a
ideia de formação pensando no mundo do trabalho; em 1937 as perspectivas mudavam,
desresponsabilizando o Estado do dever com a educação de todos, passando de responsável
para mantenedor, ajudador. Somente a partir de 1940 se iniciam as discussões para que a
formação se voltasse ao mercado de trabalho, principalmente para aqueles que não tiveram
oportunidades de se escolarizarem na infância.
De acordo com o IBGE, em 1940 55% da população era analfabeta, principalmente
porque um país agrário não necessitava de escolarização. Não foi diferente em Volta
Redonda.
A partir de 1940, campanhas de alfabetização levaram escolarização para locais onde
outrora não havia oportunidades de aprendizagem formal. Além de escolarização e educação
popular, as campanhas ofereciam atendimento médico, odontológico, entre outros.
No mundo do pós-guerra, a Unesco organizava e pactuava com as nações-membro da
Organização das Nações Unidas (ONU) conferências internacionais sobre educação de
adultos, discutindo temáticas sobre formação de adultos, especialmente com foco na
89

reconstrução europeia, mas que se espalhavam pelos demais continentes. Esses pactos
ratificavam os textos legais que definiam a importância da formação para o trabalho e
abordagens diversas requeridas para um público que se tornava sujeito de processos
educacionais. A condição de sujeito de direito à educação só se faria real a partir da
Constituição Federal de 1988.
No município de Volta Redonda, esses processos educacionais de adultos se iniciam
com a chegada da CSN e sua construção, pela necessidade de atender trabalhadores vindos de
vários lugares do Brasil, em maioria analfabetos, para trabalhar na construção da indústria.
Iniciava-se, assim, um processo de escolarização e formação profissional para a qualificação
da mão de obra.
Todo empenho da CSN nessa empreitada era apenas um recorte de toda a
movimentação que ocorria no Brasil com políticas populistas do governo do Estado Novo,
que tinha como foco estímulo à indústria nacional para o desenvolvimento do país.
Durante a pesquisa realizada no Centro de Documentação da CSN busquei por
qualquer documento que comprovasse a ocorrência desses cursos de alfabetização, de
escolarização e de formação de mão de obra, mas o acesso inicial concedido foi bloqueado e
somente alguns tipos de documentos me foram autorizados. Os contratempos e complicações
gerados pela contraordem da chefe do Centro colocaram-se como empecilhos à ampliação das
informações em fontes primárias documentais.
Um dos materiais franqueados foi a publicação impressa que ocorreu na época, O
Lingote, que trouxe muitas contribuições à minha investigação, mas limitadas porque, em
geral, noticiavam e davam popularidade às ações de interesse da indústria.
O processo de escolarização, regra geral, não era ofertado na empresa, inicialmente,
como eu pressupunha, mas esta, prioritariamente oferecia a formação para o trabalho. Pela
cidade aconteciam iniciativas privadas de escolarização para adultos, e na Escola Trajano de
Medeiros havia aulas com professores voluntários.
No momento em que a construção entra na fase final a CSN, percebendo a necessidade
de escolarização de adultos para a mudança no perfil da mão de obra, em 1943 cria a Escola
Profissional. Nela havia cursos de alfabetização e de aprendizagem industrial, possibilitando
alguma escolarização dos trabalhadores e a qualificação para atuação na siderurgia.
Os incentivos profissionais para quem se alfabetizasse eram poucos e, por isso, muitas
pessoas preferiam ter aulas apenas em preparação às provas de ingresso à CSN e às chamadas
―baterias‖, provas internas que permitiam ao trabalhador subir de nível salarial e de carreira
na empresa.
90

Oficialmente, como expresso nas publicações, a CSN apoiava a alfabetização dos


trabalhadores, assim como o seguimento de estudos, como melhoria da performance
profissional durante a vida produtiva. Isso, aparentemente, não tinha alcance junto aos
funcionários pois, nas quatro entrevistas realizadas, os cinco depoentes foram explícitos ao
afirmarem que não sentiam interesse por parte da empresa, que a maior preocupação era com
o conhecimento sobre o ofício que iriam desempenhar, e não com o conhecimento escolar que
possuíssem. Um dos relatos afirma que, muitas vezes, os cursos estimulavam os trabalhadores
a estudarem, mas os incentivos para se alfabetizarem pelo desejo ou por vontade de crescer
como pessoa, não eram explicitados.
O ―espírito do tempo‖, com mudanças legais e conceituais proclamadas por
conferências internacionais que chegavam ao empresariado, fizeram o perfil da empresa
mudar, e os cursos foram se ampliando, a Escola Profissional cresceu e se tornou Escola
Técnica, com cursos aceitos pelo Ministério da Educação e com formação geral em nível
científico (atual ensino médio).
Os Círculos Operários existentes e a rádio Zyp-26 consolidavam princípios de uma
educação popular, mesmo quando subsidiados pela CSN, de modo contraditório. Ofereciam à
população voltarredondense um vislumbre cultural e discussões políticas que contribuíam
para a reflexão dos trabalhadores. Mais tarde, essa atuação seria realizada de forma mais
veemente pelo sindicato dos metalúrgicos e as pastorais da Igreja Católica, mas então sem
interferência da CSN.
No que tange ao contexto da educação ao longo da vida, pode-se afirmar que a CSN
ao realizar o trabalho de qualificação e de formação continuada de seus funcionários,
consubstanciava concepções que surgiam no cenário internacional. Inicialmente, o fazia para
que o trabalhador pudesse crescer profissionalmente na empresa e, depois, para que pudesse
ser cada vez mais especializado na função conquistada.
Os processos de formação continuada em serviço eram os mais presentes na CSN,
como observado na pesquisa, apresentando-se em forma de cursos e de aperfeiçoamentos, até
mesmo no exterior, oferecidos a diferentes trabalhadores. Mesmo que o indivíduo não se
escolarizasse, poderia chegar a cargos de liderança e gerenciais na empresa, sem necessidade
de certificados de conclusão do antigo ginásio e do científico. Observa-se que é no processo
de formação profissional que o trabalhador refinava conhecimentos e experiências com a
leitura e a escrita, recebendo ainda formação cultural e política nas variadas iniciativas da
igreja e de apoios que a empresa prestava à cidade.
91

O que ficou muito evidente nessa pesquisa foi o quanto a educação profissional — e
não simplesmente a educação de adultos — assumiu o protagonismo na empresa. Ainda que o
entendimento de educação de adultos à época expressasse esta vertente, tanto em marcos
legais como por recomendações de organismos internacionais para os quais a escolarização
era indispensável à realidade da educação de adultos, a CSN continuou com forte empenho na
formação e qualificação profissional de seus trabalhadores.
A pesquisa teve inúmeras limitações: a primeira, de tempo do pesquisador, muito
reduzido, pelo fato de, não sendo bolsista, manter seus vínculos profissionais nas duas redes
públicas a que pertence. Agregaram-se a isso as muitas negativas de órgãos que não
concederam acesso à documentação, o que poderia favorecer novas análises das ofertas
educativas durante os anos retratados na cidade de Volta Redonda.
Como principal resultado, cumprindo um dos objetivos previstos, retirei da
obscuridade a história com a educação de adultos da maior siderúrgica da América Latina e os
processos de formação de trabalhadores que permearam a chegada e o desenvolvimento da
indústria de base na cidade de Volta Redonda.
A história da CSN foi marcada por greves, por intervenção militar que não chegaram a
ser por mim abordadas, pelo bloqueio às informações e ao acesso moroso. O interesse de
pesquisadores no tema pode ser ainda buscado em registros guardados em, pelo menos, quatro
lugares diferentes no Brasil, como o Arquivo Municipal de Volta Redonda; o Arquivo
Nacional; a Biblioteca Nacional; e o escritório central da empresa em duas grandes capitais:
Rio de Janeiro e São Paulo.
Lacunas no arquivamento e nos sentidos históricos de preservação da memória
documental contribuíram para que eu não encontrasse muitos materiais que deveriam existir,
mas não nos locais em que busquei.
O município da Volta Redonda, com seus 64 anos e a CSN com 77 anos forjaram uma
história diferente das outras cidades do Médio Paraíba. Graças à presença dessa indústria que
realizou um trabalho motivacional na cidade, elucidando a importância da qualificação
profissional e do apoio à escolarização, segundo uma ótica de pensar a cidade naquele tempo,
hoje se tem um sistema de ensino amplo e mais estruturado, tanto com escolas públicas como
privadas.
As trajetórias educacionais que aqui se formaram foram forjadas em aço, pois são
fortes e, mesmo eu, sendo filho de um operário que não terminou os estudos, sempre tive todo
apoio e incentivo para que pudesse estudar e buscar perspectivas de futuro. Tudo isso dá a
92

certeza de que, mesmo com muitos questionamentos sobre as práticas adotadas, a CSN forjou
um modo de educação no aço da história dessa cidade.
Esse trabalho abre algumas proposições que podem ser objeto de pesquisas futuras.
Uma proposição inicial seria a de análise das metodologias usadas em classes de alfabetização
nos anos de 1940 em comparação a propostas freireanas de alfabetização de adultos que
ocorreram em parte, simultaneamente.
Outra perspectiva de trabalho futuro poderia ser quanto à abordagem de concepções e
metodologias das formações profissionais e dos cursos de aperfeiçoamento; como eram
trabalhadas as propostas de formação profissional junto aos trabalhadores, que, em muitos
casos, se alfabetizavam em meio aos cursos de aperfeiçoamento e qualificação.
93

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Petrópolis: Vozes, 1989.
99

ANEXO A – Volta Redonda: cidade do aço

Foto 1: Visão do alto do Hotel Sider Palace no centro de Volta Redonda.


Fonte: https://www.skyscrapercity.com

Foto 2: Foto tirada de dentro da CSN demonstrando a influencia na paisagem. Ao


fundo, o bairro Aterrado.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com
100

Foto3 : Visão ao cai da tarde na Vila Santa Cecília, bairro central de Volta Redonda.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com

Foto 4: Visão rotineira de Volta Redonda, chaminés eliminando gases, vapores e poluição.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com
101

Foto 5: Passarela sobre a BR 393, toda construída em aço produzido na indústria marcando a
cidade com trações de ferro e aço, fazendo jus ao seu apelido: Cidade do Aço.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com

Foto 6:Monumento idealizado por Oscar Neyemeier chamado 9 de Novembro, que


homenageia os três trabalhadores mortos na explosão de uma bomba durante a greve dos
anos de 1980.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com
102

Foto 7: Estrutura Metálica que envolve a Biblioteca Pública Municipal de Volta


Redonda, marca de uma cidade chamada: Cidade do Aço.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com

Foto 8: Praça Brasil. Um obelisco no meio da cidade de Volta Redonda com entalhes
dos trabalhadores e 4 estátuas ao seu redor, uma de Getúlio Vargas diante do
Escritório Central, centro antigo administrativo da CSN, dias mulheres com
engrenagens que significavam a era da tecnologia e modernidade que a cidade
entrava e atrás o operário.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com
103

Foto 9: Visão da Praça Brasil, com um prédio da CSN/CBS, Um cenro de lojas e escritórios que tem
uma estrutura metálica enaltecendo a CSN e ao fundo, o Majestoso Escritório Central, antiga sede
administrativa da CSN e hoje um prédio sem uso.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com

Foto 10: Visão da CSN com destaque a empresa White Martins dentro da CSN.
Fonte: https://www.skyscrapercity.com
104

ANEXO B - A construção de uma usina/cidade

Foto 1: Trabalhadore sna construção dos galpões d CSN


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 2: Trabalhadore sna construção dos galpões d CSN


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
105

Foto 3: Galpão de madeira utilizado como depósito e centro de operação para construção
Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto4: Visão aérea da cidade nos anos de 1970


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
106

Foto 5: Construção de casas de alvenaria para entrega aos funcionários.(Década de 1960)


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 6: Visão parcial do terreno da CSN,vilas operárias ao fundo.


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
107

Foto 7: Construção de galpão dentro da CSN.


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 8: Trabalhadores sendo levados para o trabalho.


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
108

Foto 9: Acampamento dos primeiros técnicos para início da análise topográfica para planejamento da
CSN e acampamentos dos operários.
Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 10: Funcionários da CSN com faixas de suas turmas de qualificação (Década de 1940)
Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
109

Foto 11: Trabalhadores na fábrica de concreto.


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 12: Classe de formação de motoristas. (Década de 1950)


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
110

Foto 13: Primeira sede da Escola Profissional (1943)


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo

Foto 14: Alunos em oficinas na Escola Profissional.


Fonte: Centro de Documentação Coorporativo
111

ANEXO C – A educação de adultos e "O Lingote"

A1-O Lingote – Ano 1 nº3 pág.8 - 25 de abril de 1953

A2 - O Lingote – Ano 1 nº5 pág.10 - 10 de junho de 1953


112

A3 - O Lingote – Ano 1 nº7 pág.6 – 25 de junho de 1953


113

A4 - O Lingote – Ano 1 nº7 pág.6 e 7 - 25 de junho de 1953

A 5- O Lingote – Ano 1 nº18 pág.9 - 10 de dezembro de 1953


114

A6 - O Lingote – Ano 1 nº19 pág.6 - 25 de dezembro de 1953

A7 - O Lingote – Ano 2 nº20 pág.6 e 7 - 10 de janeiro de 1954


115

A8 - O Lingote – Ano 2 nº21 pág.6 - 25 de janeiro de 1954

A9 - O Lingote – Ano 2 nº26 pág.6 - 09 de abril de 1954


116

A10 - O Lingote – Ano 2 nº27 pág.9-- 25 de abril de 1954

A11 - O Lingote – Ano 2 nº36 pág.9. 10 de setembro de 1954


117

A12 - O Lingote – Ano 2 nº44 pág.10. 10 de janeiro de 1955

A13 - O Lingote – Ano 3 nº49 pág.8 - 25 de março de 1955


118

A14 - O Lingote – Ano 3 nº51 pág.8 - 25 de abril de 1955


119

A15 - O Lingote – Ano 3 nº52 pág.7 - 10 de maio de 1955

A16 - O Lingote – Ano 3 nº53 pág.9 - 25 de junho de 1955


120

A17 - O Lingote – Ano 3 nº56 pág.8 - 25 de junho de 1955

A18 - O Lingote – Ano 3 nº58 pág.1 - 10 de agosto de 1955


121

A19 - O Lingote – Ano 3 nº59 pág.12 - 25 de agosto de 1955

A20 - O Lingote – Ano 3 nº pág.9 - 25 de setembro de 1955


122

A21 - O Lingote – Ano 3 nº64 , pág.12 - 10 de novembro de 1955

A22 - O Lingote – Ano 3 nº65 , pág.10 - 10 de dezembro de 1955


123

A23 - O Lingote – Ano 4 nº70 , pág.6 e 7 - 10 de fevereiro de 1956

A24 - O Lingote – Ano 4 nº72 , pág.1 - 10 de março de 1956


124

A25 - O Lingote – Ano 4 nº75 , pág.1 - 25 de abril de 1956

A26 - O Lingote – Ano 4 nº75 , pág.12 - 25 de abril de 1956


125

A27 - O Lingote – Ano 4 nº77 , pág.6 - 10 de maio de 1956


126

A28 - O Lingote – Ano 4 nº82 , pág.12 - 10 de agosto de 1956

A29 - O Lingote – Ano 4 nº84 , pág.03 - 10 de setembro de 1956


127

A30 - O Lingote – Ano 4 nº86 , pág.01 - 10 de outubro de 1956

A31 - O Lingote – Ano.4 nº97 , pág.9- 25 de março de 1957


128

A32 - O Lingote – Ano 4 nº100 , pág.09 - 10 de maio de 1958

A33 - O Lingote – Ano 5 nº100 , pág.5 - julho de 1957


129

A34 - O Lingote – Ano 5 nº104 , pág.6 e 7 - agosto de 1957

A35 - O Lingote – Ano 5 nº106 , pág.1 - outubro de 1957


130

A36 - O Lingote – Ano 5 nº111 , pág.5 - março de 1958

A37 - O Lingote – Ano 6 nº114 , pág.5 - junho de 1958


131

A38 - O Lingote – Ano 6 nº115 , pág.5 - julho de 1958

A39 - O Lingote – Ano 6 nº118 , pág. - outubro de 1958


132

A40 - O Lingote – Ano 7 nº129 , pág. 6. - fevereiro de 1959

A41 - O Lingote – Ano 8 nº134 , pág.2. - julho de 1960


133

A42 - O Lingote – Ano 8- nº135 , pág.2. - agosto de 1960


134

A43 - O Lingote – Ano 8- nº135 , pág.2. - agosto de 1960


135

A44 - O Lingote – Ano 8- nº140 , pág.2. - janeiro de 1961

A45 - O Lingote – Ano 8- nº142 , pág.10. - março de 1961


136

A46 - O Lingote – Ano 10- nº149 , pág.11. - março de 1962


137

A47 - O Lingote – Ano 10- nº151 , pág.4. - maio de 1962


138

A48 - O Lingote – Ano 11- nº161 , pág.14. - setembro/dezembro de 1963


139

A49 - O Lingote – Ano 12- nº170 , pág.2. - janeiro de 1965

A50 - O Lingote – Ano 12- nº179 , pág.11. - novembro/dezembro de 1965


140

A51 - O Lingote – Ano 12- nº190 , pág.9. - janeiro de 1967


141

A52 - O Lingote – Ano 16- nº207 , pág.9. - maio/junho de 1969

A53 - O Lingote – Ano 16- nº210 , pág.8. - novembro e dezembro de 1969


142

A54 - O Lingote – Ano 17- nº212 , pág.8. - março/abril de 1970

A55 - O Lingote – Ano 17- nº213 , pág.8. - maio de 1970

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