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História: Tomoco Kanemaki
Conceito Original: Tetsuya Nomura
Ilustrações: Shiro Amano

Tradução:
Mangekyou54

Nerd, Uai! Vídeos, Games e Tradução


www.nerduai.blogspot.com.br

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Índice

Prólogo 8
Mergulho no Coração

Capítulo 1:
Ilhas do Destino & Castelo Disney 9
Primeira Impressão

Capítulo 2:
Cidade da Travessia 25
Encontro

Capítulo 3:
País das Maravilhas 44
A Primeira Princesa

Capítulo 4:
Selva Profunda 65
Amigos

Fragmento 82
Conversa Secreta

Capítulo 5:
Cidade da Travessia 83
Reencontro

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Um garoto de 14 anos que vive nas Ilhas do
Destino, um lugar paradisíaco e sereno cercado
pelo mar. Geralmente ele pode ser encontrado
brincando com seu amigo de infância, Riku, e
uma garota da idade deles, Kairi. Com um forte
senso de certo e errado, ele está sempre se
metendo em confusões, pois não consegue ficar
parado quando vê algo que considera injusto.

O melhor amigo de Sora nas Ilhas do


Destino. Com 15 anos, ele é um pouco
mais velho e tem um jeito mais maduro,
mas não deixa de ser questionador. Ele e
Sora fazem tudo juntos desde que eram
Uma animada garota de 14 anos que está bem pequenos, mas Riku está sempre um
sempre com Sora e Riku. Ela chegou às Ilhas do passo à frente. No fim, ele é quase como
Destino alguns anos atrás, vindo de algum lugar um irmão mais velho para Sora.
além do oceano. Ela não se lembra muito bem
dessa época, então é muito curiosa a respeito do
mundo lá fora, mas, ao mesmo tempo, tem 6
medo dele. Ela mesma acha isso confuso.
O mago da corte do
Capitão dos cavaleiros Castelo Disney.
do Castelo Disney. Juntamente com Pateta,
Detentor de um bom ele parte em busca do
coração e uma seu rei e amigo, Mickey
personalidade Mouse, que
despreocupada, ele luta desapareceu
apenas com um escudo, repentinamente. Ele é
ao invés de usar armas. um cara legal, mas tem
Está em uma jornada pavio curto e é muito
com Donald para cabeça-dura.
encontrar o seu rei.

Irmãos esquilos responsáveis pelo desenho e Um grilinho muito educado que viaja
manutenção da Nave Gummi. O de nariz preto com Sora, Donald e Pateta. Costuma
é o Tico e o de nariz vermelho é o Teco. ser a voz da razão entre eles.

Uma garota que seguiu um coelho branco e foi


parar no País das Maravilhas. Ela é honesta e
sempre diz o que pensa. Foi acusada de tentar
roubar o coração da Rainha de Copas e
submetida a um julgamento injusto.

Uma bruxa má extremamente poderosa, capaz de controlar 7


os Sem Coração. Ela interfere o tempo todo na jornada de
Sora e seus amigos. Sua especialidade é explorar as
fraquezas no coração das pessoas.
PRÓLOGO
mergulho no coração

Mais e mais. A escuridão se expandia mais e mais.


Seguindo um pequeno resquício de luz, ele caminhou.
Ouviu uma voz doce. Então sentiu uma presença.

Aí está você!
Tanto a fazer. Tão pouco tempo.
Mas não se apresse. Não tenha medo.
A porta ainda está fechada.
Agora, dê um passo à frente. Consegue fazer isso?
Há poder em você. Dê forma a ele... e isso lhe dará força.
E então a luz brilhará sobre você.
Mas, quanto mais você se aproxima da luz, maior sua sombra se torna.
Mas não tenha medo. E não se esqueça.
Você possui a arma mais forte de todas.
Então não se esqueça.
Você é aquele que abrirá a porta.
Agora, vá.

E assim, a porta do destino começou a se abrir.

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ILHAS DO DESTINO & CASTELO DISNEY
primeira impressão

Quando ele abriu os olhos, a luz do sol invadiu com todas as forças. O som
das ondas era o mesmo de sempre, batendo contra as pedras e relaxando a mente.
Sora se levantou e se esticou. Diante dele se estendiam o céu e o mar azuis cujo
fim nem era possível ver. Até onde ele sabia, aquele era o mundo inteiro. Aquelas
eram as Ilhas do Destino, um pequeno arquipélago perdido no mar.
Hã...? O que foi que aconteceu mesmo?
Ele tinha a sensação de que sonhara com algo importante. Tinha sido um
pesadelo...? Não, parecia que havia algo de bom. Uma voz... Uma luz... E também
uma grande sombra negra... Tinha sido mesmo um sonho?
- Sora!
- Uou!
Kairi apareceu de repente na frente dele. Sora deu um pulo de susto.
- Não faz isso, Kairi!
- Sora, você é mesmo um preguiçoso! Eu sabia que o encontraria enrolando
aqui. – as palavras de Kairi eram de repreensão, mas seus lábios sorriam. Seus
cabelos ruivos reluziam sob a luz brilhante que jorrava do céu e se refletia no mar
e na areia.
- Eu não estava enrolando. É que apareceu uma coisa preta enorme que
me engoliu! Eu não conseguia respirar, não conseguia... Ai! – o que quer que ele
fosse dizer se perdeu quando Kairi deu um tapa na sua nuca.
- Ainda está sonhando? – com a pergunta, Sora começou a duvidar do que
dizia. Como poderia haver um monstro horrível daqueles por ali num dia lindo
como aquele?
- Não foi um sonho! Ou foi...? Eu não sei...
Sora começou a balançar a cabeça. Kairi suspirou fundo e caminhou até a
água. De costas para ele, de repente ela pareceu distante, por algum motivo. Ele
não sabia o que dizer, mas, nesse meio tempo, Kairi olhou de volta, sorrindo.
- Vamos parar de perder tempo? O Riku está ficando bravo.
- Hã? – alarmado, ele se virou, e Riku estava bem ao seu lado, segurando
uma tora e com uma cara feia.
- Já vi que só eu estou trabalhando aqui. – parecia uma tora bem pesada. E
Riku jogou em cima de Sora sem a menor cerimônia.
- Ai! – gritou Sora, tentando não ser esmagado. Riku se virou para Kairi:
- E você é tão preguiçosa quanto ele!
- Então você percebeu? – Kairi deu uma risadinha e se aproximou deles –
Mas então vamos. Vamos terminar juntos. Ah, já sei! Que tal uma corrida até lá?
– sem esperar uma resposta, ela saiu em disparada.

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- O quê? Assim, do nada? – Sora saiu correndo atrás dela, e Riku foi logo
em seguida.
- Preparar, já! – Kairi já estava correndo, mas as palavras fizeram os outros
dois acelerarem ainda mais.

O sol estava a pino. Eles tinham muito trabalho pela frente.


- Riku, você busca as toras... E alguns tecidos e corda. Sora, vá pegar água
potável, e encontre alguns cogumelos comestíveis pra gente levar também. Eu
cuido dela enquanto isso.
- Beleza!
Sora e Riku saíram correndo como se fosse outra competição, deixando
marcas na areia seca. Não muito longe dali, ouviram Tidus e Wakka brincando
com espadas de madeira.
- Quer ir lá, Sora?
- Mas a Kairi não vai ficar brava? – Sora estava usando isso como desculpa.
A verdade é que ele nunca conseguia vencer Riku, então não queria entrar na
brincadeira.
- Ah, não liga pra isso. – Riku deu um tapinha nas costas dele e correu até
onde Tidus e Wakka estavam.
- Afe...
Quase todas as brincadeiras dos meninos da ilha envolviam competições,
e de longe a preferida era luta de espada. Wakka, alguns anos mais velho que
todos os outros, atuava como uma espécie de professor. Recentemente, Sora e
Riku tinham ficado bons o bastante para derrotá-lo uma vez ou outra. Eles já
estavam praticamente no mesmo nível do Tidus.
- Lá vou eu! – anunciou Tidus antes de avançar sobre Wakka.
- Vão, meninos, vão! – agitada, Selphie pulava sem parar, balançando as
pontas curvadas do seu cabelo.
- Não vai me pegar! – a voz de Wakka ecoou em meio ao som de madeira
se chocando com madeira, e a espada de Tidus voou da mão dele.
- Ai, que droga. – Tidus desabou na areia, exausto. Riku pegou a espada,
que tinha caído por ali, e se dirigiu a Wakka:
- Minha vez!
- Ei, eu preciso de tempo pra respirar! – disse Wakka, coçando a cabeça e
jogando sua espada para Sora – Você enfrenta ele dessa vez, Sora.
- Mas a Kairi vai ficar brava...
- Você está cheio de aberturas! – enquanto Sora ainda tentava convencê-lo
a não participar da brincadeira, Riku partiu para o ataque.
- Ei! Assim não é justo, Riku!

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- Lutas não têm que ser justas!
Sora se esquivou do ataque com um pulo e enfim se colocou em posição
de combate. Afinal, parecia que não havia outro jeito.
- Ótimo, assim é bem melhor! Agora tente me pegar! – Riku sorriu com
uma cara de quem sabia que mal precisava se esforçar. Sora não tinha chance.
- Lá vou eu!
As espadas de madeira se chocaram com um claque. Sora se esforçou para
fazer tudo do jeitinho que Wakka tinha ensinado, atacando Riku verticalmente.
Claque, claque, claque e claque de novo. O estilo de Sora envolvia ficar sempre na
ofensiva.
- Argh!
- Muito bem, Sora! Continue assim! Você vai conseguir derrubar ele!
Assim que Wakka terminou de falar, Sora fez um ataque certeiro.
- Ai!
A espada voou da mão de Riku, girou no ar e se encravou na areia.
- Uau! – exclamou Tidus.
Respirando pesado, Sora estendeu a mão para Riku, que havia caído de
costas.
- Tsc. Baixei a guarda.
- Ou talvez eu seja melhor que você! – sorrindo, Sora ajudou Riku a se
colocar de pé e em seguida saiu em disparada rumo à colina – Vamos confirmar
quem é o melhor! Te desafio a uma corrida até os suprimentos!
- Fechado! – respondeu Riku, que rapidamente limpou a areia e começou
a correr.
- Uma corrida até o quê? – mas a pergunta de Wakka ficou sem resposta,
pois Sora e Riku desapareceram num instante.
- Ultimamente, esses dois... E a Kairi também. Tenho a impressão de que
estão aprontando alguma... – disse Selphie, fazendo uma cara de quem estava
pensando profundamente. Wakka deu de ombros.
- Bom, se o Riku está com eles, a gente não precisa se preocupar.
- Não é esse o problema! – disse Selphie irritada, chutando a areia.
- É, não é justo! Eu também quero participar! – Tidus tentou segui-los, mas
Sora já tinha sumido entre as árvores da colina, e Riku na direção do mar.

- Cogumelos... Onde eu posso achar mais cogumelos...?


Sora vagava pela colina em busca de cogumelos. Todos os que cresciam na
ilha eram comestíveis, e algum tempo atrás eles até assaram alguns à beira de
uma fogueira. Mas, se eles pretendiam navegar pelo oceano sabe-se lá por
quantos dias, precisariam de muito mais que “alguns”.

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Do alto da colina, ele podia ver Riku juntando coisas. Ele carregava algo
que parecia um grande pedaço de tecido.
Deve ser legal ser o Riku...
O pensamento não saía da cabeça dele. O fato de ele ter vencido a luta não
parecia nada mais que um acidente. Sora sempre perdia para Riku em tudo. Nas
notas da escola, em corrida, fosse o que fosse. Ele não conseguia vencer Riku. Se
fosse possível ser melhor que ele em pelo menos alguma coisa...
Sora desceu a colina e se embrenhou na folhagem espessa que crescia ao
lado da cachoeira. Ali havia uma entrada para uma pequena caverna. Era o lugar
secreto deles. Sora e Riku a descobriram e contaram para Kairi.
- Faz tempo que não venho aqui...
Dentro da caverna, o som constante das ondas se tornava um assobio. Mais
adiante, o espaço era mais aberto, como uma grande sala. E, na sua extremidade...
aquela porta. Uma porta grande, mas que não tinha maçaneta, nem nada. Ela só
existia, como que à espera de um visitante de algum lugar.
Na parede da caverna, ao lado da porta, havia alguns rabiscos.
- Ah, ali está.
Anos atrás, Kairi e Sora desenharam o rosto um do outro na parede, e as
imagens continuavam lá. Sora se abaixou e correu a mão carinhosamente pelos
rabiscos.
Se ele fosse melhor que Riku...
De repente, Sora ouviu um barulho.
- Quem está aí? – indagou, virando-se na direção.
Era um homem sob um manto marrom.
- Eu vim ver a porta. – declarou ele, numa voz rouca. Sora não conseguia
ver o rosto por baixo do capuz – Este mundo foi conectado.
- Do que você está falando?
O homem não esboçou a menor reação a Sora e continuou:
- Um mundo conectado às trevas... que logo se apagará completamente...
Naquela hora, um arrepio correu pela espinha de Sora.
- Ei, seja lá quem você for, está me assustando! De onde você veio, afinal?
Ele não respondeu à pergunta, mas disse lentamente:
- Há muito a aprender. Você sabe tão pouco.
- Você é de outro mundo, não é?
- Você ainda não sabe o que há do outro lado da porta. Quem não sabe
nada não pode entender nada.
Até então, Sora estivera olhando para o homem misterioso, mas agora se
voltara para a porta.
Essa porta... – pensou – Essa porta imensa... Eu já não vi uma porta assim em
algum lugar? E não faz muito tempo... – Ei, quem é você...
Quando Sora se virou de volta, o homem havia sumido.

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Saindo da caverna, Sora precisou de um tempo para se reajustar ao brilho
do sol. A ilha se estendia diante dele com seu mar e seu céu reluzentes, e o que
tinha acontecido lá dentro já parecia um sonho. De mãos cheias de cogumelos,
colhidos na caverna, ele começou uma corrida de volta para a enseada onde Kairi
e Riku estariam esperando.
Aquele homem... na porta. Pareceu um sonho. E ninguém acreditaria se
ele dissesse alguma coisa a respeito. Ali naquele pequeno arquipélago chamado
Ilhas do Destino, não havia ninguém desconhecido. E muito menos alguém de
além do oceano. Não, espere... havia uma pessoa.
Kairi.
Dizem que ela veio de algum lugar do outro lado do mar. A Kairi veio de outro
mundo além do oceano, algum lugar que nós nunca vimos e do qual nunca ouvimos falar.
É isso que nós vamos descobrir...
- Sora! Que demora!
- Desculpa! Foi difícil achar cogumelos...
Ofegante de tanto correr, Sora ergueu a pilha de fungos para Kairi ver.
Assim que viu o rosto dela, o incidente com o homem estranho desapareceu da
sua mente. Kairi e Riku aguardavam ao lado de um tronco de árvore bastante
alto.
- Uau! Você achou muitos mesmo, hein!
- Nada mau!
Os dois sorriram e o ajudaram a colocar os cogumelos no chão.
- É, Sora, parece que estamos prontos pra uma bela viagem. – disse Riku.
Sora olhou para cima e viu o tecido amarrado no tronco de árvore como
uma bandeira.
- Onde você conseguiu isso?
- Ah, por aí. – Riku deu de ombros e começou a escalar o tronco – Se houver
uma tempestade, vamos ter que subir no mastro e baixar a vela.
- Eu sei disso.
Kairi riu ao ver que os dois começavam a se bicar.
Os três estavam montando uma jangada, uma bem grande e forte. Uma
jangada que os levaria a mundos que eles nunca tinham visto. Amarraram várias
toras com uma corda e encaixaram um tronco de árvore como mastro. E então
içaram uma vela, feita com o tecido que Riku tinha encontrado, que agora bailava
com a brisa do mar.
- Ela já está ansiosa! – exclamou Kairi.
Riku desceu do mastro.
- É. Com isto, podemos ir aonde quisermos. – disse ele, olhando ao longe,
para além do horizonte perfeitamente uniforme. O sol já mergulhava, e o céu

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mudava de um azul claro para um vermelho forte – Ei, Sora, ainda não demos
um nome pra nossa embarcação.
- Hã? Ah, é mesmo! Temos que fazer isso! – disse Kairi.
- Que nome devemos dar?
Kairi voltou o olhar para o mastro. A vela balançava em silêncio, a vela
que usaria o poder do vento para conquistar os mares.
- Uma embarcação a vela, movida pelo vento...
Com o comentário de Kairi, Sora decidiu sugerir o nome no qual estivera
pensando o dia todo.
- Que tal... Highwind?
- Highwind...? – Riku repetiu devagar – Quando o vento estiver no auge,
ela nos levará aonde quisermos.
- Legal, né? – disse Sora. Riku concordou.
- Então vai ser Highwind! – Kairi sorriu e abraçou o mastro, olhando para
o mar aberto – Está ficando tarde, né?
Riku e Sora também notaram que o céu acima do horizonte brilhava em
vermelho e sabiam que isso significava que logo o sol desapareceria.
- Se nós chegarmos até o fim do mar... Tenho certeza que vamos encontrar
o mundo de onde você veio, Kairi. – Sora falou de um jeito que parecia que queria
uma confirmação. Kairi se virou lentamente, olhando para o longe.
- Não podemos ter certeza disso.
- Se não formos lá ver, nunca vamos saber. – respondeu Riku, cruzando os
braços.
- Você acha mesmo que podemos chegar tão longe assim numa jangada?
– indagou Sora. Riku olhou para ele por um momento e depois se voltou para o
mar.
- Bom, se não der certo, a gente pensa em outra coisa.
O sol afundou ainda mais no horizonte, deixando o mar todo e até a areia
vermelhos. Eles já tinham visto aquela cena inúmeras vezes juntos, mas, para
Sora, ela parecia um pouco diferente hoje. Algo o estava deixando inquieto.
Depois que partirmos... o que vai acontecer com a gente?
Eu quero ver outros mundos, ele pensou. O mar ali era sempre agradável,
mesmo que houvesse tempestades de vez em quando. As praias eram lindas, com
uma areia fofa e quentinha. Havia pássaros nas colinas e cogumelos para comer.
Amigos maravilhosos, como Riku, Kairi, Tidus, Selphie e Wakka. Os adultos
também eram gentis. Sua mãe, seu pai, as outras pessoas da cidade... Ele vivera
muitos momentos felizes nas Ilhas do Destino. Mas a paisagem que Sora via era
sempre a mesma. Se ele pudesse pelo menos ver um mundo diferente... talvez
algo mudasse.
Era por isso que ele queria sair dali.
- Vamos supor que a gente chegou a um outro mundo. O que você faria
lá? – Kairi perguntou a Riku um pouco nervosa – Você só quer ver, como o Sora?

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- Bom, na verdade eu ainda não pensei muito nisso. Eu só... É que eu
sempre me perguntei por que nós estamos aqui, nesta ilha. Se há outros mundos
lá fora, por que nós viemos parar justamente neste? – Riku fez uma pausa por um
momento, como que ouvindo às ondas, e continuou: – E, se realmente existem
outros mundos, então o nosso é só um pedacinho de algo muito maior... A gente
poderia muito bem ter nascido em outro lugar, não?
Um pedacinho de algo maior. Isso era muito complicado. Sora, que não
estava acompanhando muito bem o raciocínio, se deitou na jangada.
- Sei lá.
Riku olhou para ele, exalou um suspiro e começou a caminhar na direção
da praia.
- É por isso que precisamos sair daqui e descobrir. Nada vai mudar se nós
continuarmos parados aqui.
O olhar de Sora acompanhou Riku.
- Aqui tudo é sempre igual. Eu quero ir.
- Vocês andam pensando muito ultimamente, hein? – disse Kairi.
- Graças a você. Se você não tivesse aparecido aqui, talvez eu nunca tivesse
pensado em nada disso. – e, olhando para ela – Obrigado, Kairi.
Para Sora, essas palavras pareceram mais gentis que qualquer coisa que
ele já tinha ouvido. Seu coração acelerou por um momento.
- Ahn, de nada... – respondeu Kairi com um sorriso tímido, virando-se na
direção do mar de novo.
- Bom, acho que é melhor eu ir andando. Vocês dois não deviam ficar aqui
até tarde também. – e Riku se afastou na direção do cais a toda velocidade, como
se de repente tivesse ficado encabulado com o que disse. Observando-o, Kairi
comentou, baixinho:
- O Riku mudou, né?
- Como assim? – indagou Sora. Ele não tinha notado nada de diferente em
Riku. Ele parecia o mesmo de sempre.
- Bem... Hm... Você não acha?
- Não. Acho que é impressão sua.
Kairi pareceu ter ficado um pouco triste com a resposta. De repente, disse:
- Ei, vamos pegar a jangada e ir embora! Só nós dois!
Ela encarava Sora com um sorriso travesso.
- Hã? O que deu em você? É você que está diferente, Kairi.
- É, talvez.
Ela começou a caminhar de volta para a praia. Algo pequeno e brilhante
caiu do seu bolso.
- Kairi, você deixou cair uma coisa.
- Ah... – ela pegou com cuidado e mostrou a ele. Era um pingente feito de
conchas do mar, coladas na forma de uma estrela.
- O que é isso?

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- Estou fazendo amuletos da sorte com conchas de tálassa. Os marinheiros
costumavam usar antigamente. Dizem que ajuda a garantir uma boa viagem.
- Ah, um amuleto de marinheiro... – Sora estava encantado com o objeto
na mão de Kairi.
- Vou fazer um pra cada. Assim nós com certeza voltaremos pra cá sãos e
salvos, mesmo que a gente se perca. Nós vamos estar sempre juntos.
Ela guardou o amuleto no bolso de novo com cuidado. Metade do sol já
tinha desaparecido no mar.
- Sabe, no começo eu estava com um pouco de medo... mas estou pronta
agora. – Kairi olhou para Sora, falando de modo decidido – Seja lá aonde eu for
ou o que eu vir, sempre poderei voltar pra cá.
- Sim, é claro!
Eu também quero voltar pras Ilhas do Destino, ele pensou. Quero ver outros
mundos, mas vou voltar. Pra este mar, este céu e todas as pessoas que vivem aqui. Pra
este lugar, com Riku e Kairi.
- Estou feliz. Sora, não mude.
- Hã?
Kairi sorriu novamente.
- Mal posso esperar. Vai ser maravilhoso quando partirmos!
- É. Nós vamos conseguir, sem dúvida.
O sol já quase sumira agora. As ondas continuavam indo e vindo, com sua
calma de sempre.

Uma grandiosa fanfarra de trompetes soou.


O castelo se erguia imponente ante o límpido céu azul. As vassourinhas
não perdiam tempo na sua importante tarefa de limpeza matinal. Donald passou
por elas de peito erguido e rabo balançando de um lado para o outro. Como era
o mago da corte, a primeira coisa que ele fazia todos os dias era se apresentar
diante do rei.
- Aham...
Reunindo todo o fôlego que conseguiu, ele raspou a garganta e bateu à
porta. Ela era imensa, mais de vez vezes maior que ele. Uma portinhola menor,
do tamanho exato de Donald, se abriu na porta maior, e ele adentrou o salão. Lá,
no maior aposento do castelo, ficava o trono do rei, e Donald se dirigiu até ele
seguindo o longo tapete vermelho.
- Bom dia, majestade! Que alegria v... quack?!
O rei deveria estar sentado ali. Mas o trono estava vazio. A única presença
era a de Pluto, o cachorro do rei, deitado atrás dele.
- Pluto?

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Ao ouvir o seu nome, Pluto correu até Donald. Ele segurava um envelope
branco na boca.
- Quack?
Pluto levantou a cabeça, esperando Donald pegar o envelope. Trêmulo,
Donald o fez e, ao abri-lo, encontrou uma única folha de papel. Assim que seus
olhos começaram a acompanhar as letras...
- Quaquaquaquaquaquaquack!
Donald saiu aos berros do salão do rei.

Donald,

Me desculpe por partir assim, sem avisar, mas temos problemas sérios a caminho,
e não há tempo a perder. Eu preciso agir imediatamente.
As estrelas vêm se apagando uma a uma, e isso significa que o desastre não tardará
a nos acometer.
Fico triste por deixá-los, mas preciso investigar.
Na condição de rei, pedirei para você e Pateta cuidarem de uma coisa.
Há alguém que possui uma “chave”... a chave para a nossa sobrevivência. Então
eu preciso que vocês o encontrem e fiquem perto dele. Entendido?
Nós precisamos dessa chave, ou será o nosso fim.
Vão para a Cidade da Travessia e encontrem um homem chamado Leon. Ele lhes
mostrará o caminho.
P.S. Pode pedir desculpas à Minnie por mim? Obrigado, parceiro.

Esse era o bilhete que ele deixara para trás. Uma carta muito importante
do seu amado rei. E do seu querido amigo. Se tudo aquilo era verdade, a situação
era séria. Aquele estranho problema das estrelas se apagando e o desastre que se
aproximava. Será que o rei estava mexendo com algo muito perigoso?
Donald cruzou os longos corredores e saiu para os jardins. Era lá que ele
encontraria Pateta, o capitão dos cavaleiros reais.
- Capitão Pateta! Temos problemas!
Pateta dormia profundamente. Donald tentou acordá-lo, mas sem sucesso.
- Pateta! – os gritos ecoavam nos jardins calmos, mas Pateta nem se mexeu.
Agora totalmente sem paciência, Donald estalou os dedos e gritou: – Trovão!
Um pequeno relâmpago desceu do céu e aterrissou bem no nariz de Pateta.
- Ahyuck? – Pateta piscou algumas vezes e finalmente viu Donald – Ah, e
aí, Donald? Bom dia. Que dia bonito, não?
Donald interrompeu o cumprimento despreocupado.
- Cala a boca! Temos um problemão!
- Problemão?

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- Escuta, não pode contar pra ninguém!
- Ninguém? Contar o quê?
- Presta atenção, é ultrassecreto! – Donald falava em total agitação. Pateta
não entendia a razão de toda aquela urgência. Ficou de pé sem nenhuma pressa
e se espreguiçou, olhando para Donald.
- Nem a Rainha Minnie pode saber?
- Nem mesmo a rainha!
- Margarida?
- A Margarida é que não mesmo!
- Bom dia, senhoras! – cumprimentou Pateta, olhando atrás de Donald.
- Hã?
Finalmente entendendo a razão da pergunta de Pateta, Donald se virou e
viu sua namorada, Margarida, e a Rainha Minnie.
- O que está acontecendo, Donald?
- Quack... Quaquaquaqua...

O sino do castelo bateu treze horas. Donald, Pateta, Margarida e a Rainha


Minnie estavam no salão do rei, envoltos numa discussão séria.
- E é isso. – disse Donald, depois de explicar tudo.
- Nossa! Mas o que será que está acontecendo? – preocupou-se Margarida.
- Seja o que for... vamos ter que confiar no rei. – respondeu Minnie, séria.
- Gawrsh. Tomara que ele esteja bem. – disse Pateta, sempre calmo. Donald
deu um chute na canela dele e falou com determinação:
- Alteza, não se preocupe! Nós vamos encontrar o rei e essa “chave”.
- Obrigada.
- Margarida, você pode cuidar da rainha? – pediu Donald.
- É claro. E vocês dois, tomem cuidado. – tendo um destrambelhado como
Donald como namorado, Margarida sabia se virar. Ela protegeria o castelo e a
rainha na ausência deles.
- Ah, Donald. Leve ele com vocês. – a rainha apontou para “ele”, mas não
parecia haver ninguém na direção.
- Ahn... quem?
Então Donald o viu, pulando com todas as forças.
- Aqui embaixo!
- Ele?
Ele era muito menor que Donald e Pateta. Vestia terno e cartola de seda.
Fazendo uma mesura, apresentou-se:
- Eu sou o Grilo Falante, ao seu dispor. – e pulou no chapéu de Donald.
- Quack!

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- Prometo que vou ficar quietinho. Você nem vai lembrar que eu existo! –
com isso, o Grilo Falante pulou no bolso de Donald e se acomodou lá.
- O Grilo Falante disse que o mundo dele também desapareceu. – explicou
a Rainha Minnie.
- Desapareceu? – indagou Pateta. O Grilo Falante botou a cabeça para fora
do bolso de Donald de novo, com as sobrancelhas franzidas.
- Isso mesmo. Tudo simplesmente desapareceu. Eu me perdi de todos. Fui
o único que conseguiu chegar a este castelo.
- Talvez você consiga encontrar os outros do seu mundo. – disse a rainha.
- Sim, é o que eu espero. Obrigado pela ajuda.
- Eu entendo, mas... – Donald olhou para a rainha.
- Quando estiverem lá fora, vocês não devem deixar ninguém saber que
vocês vieram de outro mundo. – orientou a rainha, falando com firmeza.
- Ah, pra preservar a ordem, né? – disse Pateta.
- Isso. Pra preservar a ordem de cada mundo. – respondeu Donald. O fato
de que ele e os outros podiam sair do Castelo Disney e viajar a outros mundos
era um segredo muito bem guardado. Se essa informação se espalhasse, outras
pessoas poderiam tentar viajar entre mundos a seu bel prazer, e a ordem entre
eles entraria em colapso.
Um silêncio pesado tomou conta do salão quando Donald deu meia-volta
para partir. Pateta fez uma saudação de despedida.
- Você também vem! – Donald agarrou Pateta pelo braço e o arrastou.

A fábrica da Nave Gummi ficava no fim de uma longa escadaria em espiral


que se projetava abaixo do castelo. Nuvens de fumaça subiam das máquinas de
aparência complicada. No meio de tudo aquilo, havia uma pequena nave laranja
esperando por Donald e Pateta. Aquele era o único tipo de embarcação capaz de
viajar entre mundos: uma Nave Gummi. Grandes mãos mágicas preparavam a
nave para partida, fazendo uma última inspeção.
- Pato Donald para equipe de decolagem! – disse ele num grande cano, e
sua voz ecoou pela sala de controle – Tudo pronto?
Os dois funcionários fizeram um gesto positivo em resposta. O de nariz
preto era o Tico, o projetista, e o de nariz vermelho era o Teco, o mecânico. Tico
puxou a grande alavanca na sala de controle e a fábrica inteira começou a tremer.
- O que está acontecendo? – perguntou Pateta, e nessa hora uma grande
mão mágica o pegou – Ahyup!
- Fica quieto! – esbravejou Donald, e outra mão mágica o agarrou pelo
rabo. O Grilo Falante quase caiu do seu bolso, segurando a si mesmo com uma
mão e a cartola com a outra.

20
A mão os carregou até a nave e soltou no cockpit. Pluto, que os devia estar
seguindo já há algum tempo, também pulou lá dentro.
- Pluto! – exclamou Donald. Pluto latiu e balançou o rabo.
O cockpit se fechou com os quatro lá dentro, e a porta na frente da nave se
abriu. A Nave Gummi se ajustou lentamente até ficar na posição de lançamento.
- Gawrsh, estou um pouco nervoso. – comentou Pateta.
- Não enche, vai dar tudo certo.
Assim que Donald finalizou a bronca, as luzes se acenderam. Estava tudo
pronto. A Rainha Minnie e Margarida tinham vindo ver a partida. Por favor,
ajudem o rei... e os outros mundos também... O pedido, feito apenas mentalmente,
não chegou ao cockpit, mas Donald fez um sinal positivo com a pata e piscou o
olho para Margarida e a rainha.
O motor foi ligado, fazendo um bum!, e a pequena nave balançou.
- Decolar! – Donald apontou para a frente, mas o que apareceu ali foi uma
seta apontando para baixo – Quack?!
Abriu-se um buraco no chão que engoliu a Nave Gummi. Ela caiu durante
vários minutos, até que saiu do outro lado do Castelo Disney, de cabeça para
baixo. Sem perder tempo, a nave se endireitou e avançou rumo às estrelas.

Uma luz brilhou e, quase ao mesmo tempo, começou o som de gotas no


telhado.
- Chuva?
Sora se levantou e olhou pela janela. Sua casa ficava numa ilha maior, um
pouco afastada daquela em que ele e seus amigos sempre brincavam. Uma casa
pequena numa cidade pequena. Era essa a realidade da sua vida. Ele chegou em
casa com muitas coisas na cabeça, e durante todo esse tempo estivera deitado sem
dormir, olhando para o teto e pensando no que tinha acontecido hoje e no que ia
acontecer em breve.
A chuva começou a ficar mais forte. Não era muito raro cair um pé d’água
depois do pôr do sol ali. O mar geralmente era calmo, mas, de vez em quando,
havia uma tempestade ou mesmo uma enxurrada.
Mesmo assim...
O céu brilhou de novo. Outro raio. Sora logo percebeu...
- Caiu na nossa ilha!
Ele pulou da cama. Pegou seu pequeno barco a remo e se apressou para a
ilha. Ela era cercada por um grande recife, então só algo do nível de um furacão
conseguiria causar danos sérios. Mas, no momento, havia uma jangada muito
importante desprotegida lá. Se ela fosse levada pelo mar... Felizmente as ondas

21
não estavam muito altas ainda. Tudo ficaria bem se ele a amarrasse bem forte
num coqueiro.
Outra descarga elétrica desceu do céu. Sora olhou para o céu noturno sem
estrelas e viu uma bola de energia negra flutuando no ar.
- O que é aquilo?!
Quando chegou à doca, ele viu que já havia outros dois barcos.
- Riku e Kairi também estão aqui?
Sora correu da doca para praia, mas uma espécie de sombra se ergueu do
chão, bloqueando o seu caminho.
- O que está acontecendo?!
Ele atacou com sua espada de madeira e teve a sensação de que acertou
alguma coisa, mas a sombra não sumiu. Na verdade, estavam aparecendo mais e
mais delas.
Essas coisas estão se multiplicando? Sora desistiu de enfrentá-las e correu pela
praia, procurando por Riku e Kairi. O vento engolia a sua voz quando ele gritava
o nome deles. Na cachoeira, parou e olhou ao redor. Então ele viu. Em frente às
moitas que escondiam o caminho para o lugar secreto, havia uma grande porta
branca.
- O quê...?
De repente ele se lembrou do estranho homem que encontrara à tarde.
“... que logo se apagará completamente...”
Não pode ser, pensou Sora. Mas tenho certeza que ele disse isso... Seja como for,
tenho que encontrar o Riku e a Kairi. Tentando manter as sombras afastadas com
sua espada de madeira, ele retomou a busca.
- Riku!
Ele viu Riku em meio à escuridão, de frente para o mar. Seus cabelos cor
de prata balançavam ferozmente com o vento uivante. Sora correu até ele.
- Cadê a Kairi? Achei que ela estava com você!
Riku se virou lentamente.
- A porta se abriu...
- Riku?
Tinha algo estranho nele. Ele estava diferente. E que história era essa de
porta? Ele se referia àquela porta branca? Ou...
- A porta se abriu, Sora! Agora nós podemos ir ao mundo exterior! – disse
Riku exaltado, com uma peculiar agitação no olhar.
- Do que você está falando? Temos que encontrar a Kairi!
- A Kairi vem com a gente! – exclamou Riku com todas as forças – Uma
vez que atravessemos, talvez não seja mais possível voltar. Mas esta pode ser a
nossa única chance. Não podemos deixar o medo nos impedir! Eu não tenho
medo das trevas!
Enquanto ele falava, uma energia sombria e sinistra se reunia sobre sua
cabeça.

22
- Riku...?
- Vamos, Sora!
Sorrindo, Riku estendeu a mão, mas aos seus pés a escuridão se acumulava
e crescia, se enrolando nas suas pernas. E, num piscar de olhos, o tinha coberto
por completo.
- Riku!
Sora tentou correr até ele, mas, quando colocou os pés naquela escuridão,
ela começou a envolver o seu corpo também. Cercado de trevas e ainda sorrindo,
Riku chamou o nome dele:
- Sora...
Mas Sora não pôde alcançá-lo. Riku foi engolido pelas trevas e, assim que
Sora estava prestes a ser consumido também, uma luz brilhou no seu peito e as
expulsou. Por um momento, Sora teve de fechar os olhos para suportar o forte
brilho. Uma voz ecoou na sua cabeça, dizendo: Espada-Chave...
Como que seguindo um sinal, aquelas sombras começaram a surgir do
chão de novo. Sora ergueu sua espada contra elas, a Espada-Chave, e dessa vez
elas desapareceram.
- Riku? – ainda segurando firme a Espada-Chave, Sora olhou em volta,
mas não viu o amigo em parte alguma – Riku! Cadê você? Riku!
Sora correu em busca dele, usando a Espada-Chave como arma a todo
momento. Mas não importava quantas daquelas sombras ele derrotava, mais
apareciam. Por fim, ele se deparou com a porta branca novamente.
- Hã?
A porta estava se abrindo, quase como se convidando-o a entrar. Aquele
era o único lugar da ilha onde havia alguma chance de Kairi e Riku estarem. Sora
cruzou a porta.
- Riku! Kairi!
Lá estava a caverna. O lugar secreto deles, ainda o mesmo de sempre. A
única diferença era aquela porta reluzente num canto. E na frente da porta estava
Kairi, olhando para ela em silêncio.
- Kairi! – Sora correu até ela. Ela se virou para ele, devagar e lânguida.
- Sora...?
Assim que ela estendeu a mão para ele, a porta começou a se abrir. Uma
escuridão total, negra como tinta, se lançou de lá, empurrando-a na direção dele
como se tivesse ocorrido uma explosão. Ele tentou pegá-la nos braços... Mas o
corpo dela simplesmente passou direto por ele, atravessando-o. E desapareceu.
Era como se ela tivesse sido sugada para dentro do próprio Sora. Ele chamou o
nome dela, mas, com um forte vendaval, Sora e a ilha inteira foram levados pelos
ares.
- O que está acontecendo?!
Caindo na areia, Sora socou o chão. A poucos metros dele, o chão estava
cortado, como um desfiladeiro. Ele se aproximou da ponta e viu aquela esfera

23
negra cobrindo a ilha inteira. E agora uma grande sombra negra se ergueu diante
dele.
Isso aqui não é mais as Ilhas do Destino, pensou. O Riku não está aqui. A Kairi
também desapareceu. Então como eu ainda estou aqui?
Sora ainda estava de pé e aparentemente bem. A grande sombra desferiu
um ataque contra ele com algo que parecia um braço, derrubando-o. Ele gemeu,
e a Espada-Chave brilhou na sua mão.
“Há poder em você. Dê forma a ele... e isso lhe dará força.”
Sinto que tem alguém falando comigo. Há poder em mim...? Eu não tenho nenhum
poder. Mal consegui derrotar o Riku hoje. Então como...?
“Seja lá aonde eu for ou o que eu vir, sempre poderei voltar pra cá.”
Mas a Kairi desapareceu. O Riku também. E agora até a ilha inteira está prestes a
desaparecer. Nós poderemos mesmo voltar pra cá? Os três?
“Assim nós com certeza voltaremos pra cá sãos e salvos, mesmo que a gente se
perca. Nós vamos estar sempre juntos.”
Sora pensou no sorriso de Kairi. Kairi, Riku e eu. Nós sempre estaremos juntos.
Então nós vamos voltar pra cá. A Espada-Chave brilhou fortemente, como que
reagindo ao sentimento de Sora. De jeito nenhum eu vou perder. Quero ir a outros
mundos, quero que a gente possa correr juntos na praia de novo...
Ele se pôs de pé e deu um grande salto, e seu ataque se tornou um feixe de
luz que feriu a sombra.
- Hááá! Eu não vou perder!
Dois, três golpes da Espada-Chave na mão dele. Mais e mais feixes de luz
apareciam na sombra gigante.
- Você não vai me derrotar!
Sora sentiu a Espada-Chave perfurar alguma coisa, e a sombra emanou
um grunhido assustador.
- Consegui...
Urrando de fúria, a sombra foi sugada para dentro da esfera negra que
continuava flutuando no céu.
- Kairi... – Sora falou quase num sussurro. Antes que ele pudesse recobrar
o fôlego, a esfera pulsou e cresceu, arrastando e engolindo o que restava da ilha,
incluindo Sora. Com um rugido terrível, ela engoliu os coqueiros, os barcos, até
o mar...
Sora tentava se segurar no que restava da ponte de madeira, mas a imensa
força o arrastou. Em meio a um turbilhão de destroços, ele mergulhou na esfera
negra e desapareceu.

24
CIDADE DA TRAVESSIA
encontro

A cidade sempre recebia a todos calorosamente.


Aquela era a Cidade da Travessia. Era um lugar cheio de pessoas que não
tinham para onde ir, que perderam seus lares para aqueles eventos estranhos.
Donald, Pateta, Grilo Falante e Pluto tinham acabado de chegar na Nave Gummi.
O homem que o rei mencionara em sua carta, aquele que tinha uma “chave”,
deveria estar ali em algum lugar.
Donald tomou a liderança, guiando o grupo pelas ruas de paralelepípedo.
- A gente precisa achar o Leon depressa... – disse Pateta, seguindo-o. Pluto
os acompanhava, atento à retaguarda – Será que esta cidade é muito grande?
- Como eu vou saber?
Pateta suspirou discretamente e olhou para o céu noturno. Ele parecia o
mesmo que o que se via do Castelo Disney, o que o fez se sentir um pouco melhor.
O que estaria acontecendo, afinal? Estrelas se apagando, o rei desaparecido, uma
“chave”... Tinha muita coisa que Pateta não entendia, e isso o incomodava. Havia
uma estrela brilhando mais forte que as outras. Que tipo de estrela seria...?
Bem nesse momento, aconteceu.
- Donald...!
Donald olhou para onde Pateta apontava.
- Olha, uma estrela está se apagando!
A luz da estrela enfraqueceu e sumiu.
- Elas estão mesmo se esvaindo...
Pateta tinha ouvido falar disso no castelo, mas era a primeira vez que via
acontecer. Era o tipo de coisa em que era difícil de acreditar a menos que se visse
com os próprios olhos. Ele pensou no que o rei dissera na carta: “temos problemas
sérios a caminho”. E era mesmo verdade. As estrelas estavam se apagando. Isso
não podia ser coisa boa. Donald e Pateta se entreolharam e começaram a andar
mais rápido.
- Vem, Pluto! – chamou Pateta.
Mas Pluto estava ocupado farejando alguma coisa. Seguiu um cheiro até
um beco. Quase não havia luz, mas Pluto não se deixou intimidar. Naquele beco
quase sem iluminação, onde o pouco que se podia enxergar era graças à luz da
lua, havia um garoto esparramado no chão. Pluto correu até ele, balançando o
rabo, e lambeu o seu rosto.

25
Sora murmurou alguma coisa e abriu os olhos. O que ele viu não foi o mar
ou o céu das Ilhas do Destino, mas um lugar que nunca vira antes. E um cachorro.
- Que sonho estranho...
Sim. Este lugar deve ser um sonho. Nunca vi nada parecido.
Ele começou a querer dormir de novo, e Pluto pulou na sua barriga.
- Ai! Não é um sonho!
Sora se pôs de pé, esfregou os olhos e examinou os arredores. Ele ainda
estava no mesmo lugar totalmente desconhecido. O céu noturno se estendia lá
em cima, como nas Ilhas do Destino, mas parecia um pouco mais nublado que o
que ele conhecia.
- E agora...? – sem visualizar outra opção, Sora se voltou para o cachorro –
Ei, você sabe onde nós estamos?
O cachorro balançou o rabo e saiu correndo.
- Ei, espera!
Sora correu atrás do cachorro, mas em algum momento o perdeu de vista.
Ele devia ter se enfiado em algum outro beco. Chegando a uma parte mais aberta,
que parecia uma praça, olhou ao redor novamente. Pelo menos ali havia várias
pessoas, todas aparentemente muito atarefadas.
- Isso é muito estranho... Será que eu estou em outro mundo?
Parecia que ele tinha se perdido num conto de fadas. Não havia nada nem
parecido com aquilo nas Ilhas do Destino: uma praça de paralelepípedos e com
iluminação de lanternas. Então será que, depois de ser sugado por aquela esfera,
ele foi parar em outro mundo? Mas o que tinha acontecido com a ilha? E Riku e
Kairi?
Onde eu estou, afinal...?
Como que tentando responder, a Espada-Chave brilhou na mão dele. Ele
não tinha conseguido fazer nada contra aquelas sombras estranhas com a espada
de madeira, mas a Espada-Chave deu cabo delas facilmente. Ao pensar nisso, ele
pelo menos se sentiu mais seguro. Talvez tudo ainda fosse dar certo.
- Antes de mais nada, eu preciso... Hm, o que é aquilo? – Sora se aproximou
da criatura curiosa que se encontrava no meio da praça – Ahn, onde eu estou?
- Kupo? – a criaturinha fofa com um pompom na cabeça olhou para ele.
- Meu nome é Sora. Eu acabei de acordar aqui...
- Eu sou Kupo, o moogle, kupo.
Então Kupo era o seu nome, e moogle devia ser sua espécie, se Sora tinha
entendido direito.
- Sombras destruíram o meu lar. Eu não tenho pra onde ir, kupo...
- Sombras foram atrás de você também?
- Foram sim, kupo. – o pompom balançava, acompanhando o movimento
de cabeça do moogle.
- Nossa... – Então não foi só nas Ilhas do Destino.
Kupo parecia não querer conversar mais, então Sora o deixou sozinho.

26
- Você é novo aqui? – uma mulher mais velha indagou a ele.
- Onde eu estou? – perguntou Sora outra vez.
- Pessoas costumam aparecer aqui quando não têm mais um lugar para
chamar de lar... Esta é a Cidade da Travessia.
- Eu sou das Ilhas do Destino, e você?
A mulher apenas sorriu tristemente.
- Você não devia perguntar isso aqui. Todos temos lembranças dolorosas.
- Então as sombras também...
- Não faça essas perguntas... – disse ela, com tristeza nos olhos – Um bom
lugar para começar aqui é a Loja de Acessórios. O dono é um homem de muitos
conhecimentos. Ele poderá ajudar você e talvez até responder às suas perguntas.
– ela apontou para uma loja não muito distante da praça.
- Beleza, valeu! – Sora correu em disparada até lá.
No céu, outra estrela se apagou.

- Boa noite, como posso ajud... Ah, é só um garoto.


O homem atrás do balcão usava um par de óculos na cabeça, um cinturão
laranja e tinha um cigarro pendurado na boca. Era um homem de meia-idade,
algo bem diferente do que Sora esperava encontrar no comando de uma loja de
acessórios.
- Eu não sou “um garoto”! Meu nome é Sora! – respondeu ele.
- Tá bom, tá bom, relaxa. O que você manda, Sora? Precisa de um presente
pra namorada?
- Não é nada disso! – Sora estava irritado com a maneira como o homem o
tratava.
- Está perdido, então?
- Não! Bem, talvez. Quer dizer, eu acabei de acordar aqui...
O homem cruzou os braços e pareceu ficar mais sério.
- Certo, que tal você começar do começo, Sora?
- Ahn... Bem, eu venho de um lugar chamado Ilhas do Destino...
Sora contou tudo a ele. Sobre a ilha, as sombras, Riku e Kairi. Ele se sentia
melhor agora que finalmente tinha compartilhado aquilo com alguém.
- Ahã... Entendi...
Quando Sora terminou, o homem ficou quieto, pensativo.
- Me diz então, tio, aqui é mesmo outro mundo?
- Não me chame de tio! Meu nome é Cid!
- Tá... Cid, né? Então, aqui é outro mundo, não é? – Sora não tirava os olhos
dele.
- Não sei se sei do que você está falando, mas aqui não é a sua ilha.

27
Ele não tinha saído da ilha da maneira planejada, mas não havia dúvida
agora. Ele estava em outro mundo. Então onde será que Kairi e Riku tinham ido
parar? Aliás, onde será que todos da ilha tinham ido parar?
- É... Ei, Cid. Você sabe se a Kairi e o Riku também estão aqui?
- Hm... Não sei dizer. – Cid franziu as sobrancelhas.
- É melhor eu ir procurá-los.
Com Sora parecendo mais determinado, Cid sorriu.
- Bom, seja lá o que for fazer, eu te desejo sorte. Se tiver problemas, volte
aqui. Tentarei ajudar como puder.
- Valeu!
Sora segurou a Espada-Chave com força, assentiu e correu até a porta. Cid
se recostou no balcão e ficou olhando pela porta até Sora desaparecer lá fora.
- A Espada-Chave... Então é esse garoto... – murmurou ele consigo mesmo
– Tenho que avisar ao Leon.

- Seria tão legal se eles também estivessem aqui...


Sora corria pela cidade. Pelo que as pessoas que viviam ali diziam, era um
lugar bastante grande. A parte onde ele acordou era o Primeiro Distrito. Mais à
frente ficava o Segundo Distrito, e depois dele o Terceiro. E, se por um lado havia
muitos outros mundos que tinham sido engolidos como as Ilhas do Destino, por
outro devia haver também muitos outros mundos como a Cidade da Travessia,
que ainda estavam a salvo das sombras. Então isso significava que Kairi e Riku
podiam estar em mundos diferentes. Dando-se conta disso, Sora suspirou.
Ele subiu ruas e desceu becos e emergiu na frente de uma grande porta.
- Ei, você parece novo aqui. – disse um garoto que saiu pela porta – É meio
perigoso do lado de lá. Tome cuidado.
- Perigoso? – questionou Sora. Será que aquele garoto também tinha vindo
de um mundo que foi engolido pelas sombras? A julgar pelo que ele tinha visto
do Primeiro Distrito, aquela cidade podia ser qualquer coisa, menos perigosa.
- Você vai entender quando estiver lá. Mas nossa, hoje a cidade está cheia
de gente nova... Será que as sombras conquistaram outro mundo?
O comentário chamou a atenção de Sora.
- Gente nova...? Quer dizer que apareceram outras pessoas além de mim
aqui hoje?
- Pelo jeito, sim. Acabei de ver duas logo à frente, no Segundo Distrito. Era
uma duplinha bem esquisita...
- Valeu!
- Ei, toma cuidado!

28
Talvez fossem Kairi e Riku... Com o coração cheio de esperança, Sora abriu
a porta do Segundo Distrito. Do outro lado, havia uma rua estreita.
- Kairi! Riku! – gritou ele. Ninguém respondeu. Ele continuou a caminhar,
um pouco decepcionado.
De repente, um homem saiu correndo de um beco, tropeçou e caiu bem na
frente dele.
- Ei, você está bem? – Sora chegou mais perto para ajudá-lo, mas o peito
do homem começou a brilhar, emitindo uma luz vermelha. Uma coisa reluzente
em formato de coração saiu de dentro dele e foi sugada por uma pequena esfera
negra. Aquilo era... o mesmo tipo de esfera negra que ele vira na ilha?! Sem nem
pensar, Sora ergueu a Espada-Chave, pronto para lutar. A esfera assumiu uma
forma humanoide por um instante e depois desapareceu. E então, um pequeno
monstro negro surgiu no chão. Essas coisas estavam na ilha! Era exatamente igual
às sombras diminutas que ele enfrentara antes. Elas estão aqui também?!
Apareceram outras e outras. E todas iam na direção de Sora. Ele atacou
com a Espada-Chave e, depois de um ou dois golpes, elas desapareceram. Mas
outras surgiram. Isso não tem fim!
Encurralado, Sora decidiu fugir.

Donald e Pateta estavam no hotel do Segundo Distrito.


- Parece que não tem ninguém aqui. – disse Pateta, abrindo uma porta. O
lugar estava totalmente deserto.
- Leooooon! – berrou Donald, saindo do hotel.
- Onde será que ele está? – Pateta olhava para um lado e para o outro. Algo
chamou sua atenção na praça do Segundo Distrito – Hã?
- O que foi agora, Pateta?
- Pensei ter visto alguém passar correndo.
- Quack? – Donald olhou na direção da praça, mas não viu ninguém – Está
vendo fantasmas agora, é?
- Gawrsh, talvez...

Sora se enfiou em outro beco para despistar as sombras e recobrar o fôlego.


Ninguém conseguiria vencer tantos. Ele esticou os braços e suspirou. Para vencer,
é preciso manter a cabeça fria. Só assim é possível se manter sempre um passo à
frente do inimigo. Pelo menos era o que Wakka sempre dizia.
Vai dar tudo certo. Eu não vou perder.
E Sora abriu a porta do Terceiro Distrito.

29
Donald e Pateta reviravam cada canto de cada beco no Segundo Distrito.
- É, parece que não tem ninguém mesmo. Estou ficando assustado.
- Ah, não seja ridículo! Isso não é jeito de o capitão dos cavaleir... Quack?!
Alguma coisa cutucou as costas de Donald. Ele deu um salto incrivelmente
alto e caiu no colo de Pateta.
- Com licença. Vocês são amigos do rei?
Atrás deles se encontrava uma bela jovem de vestido rosa.
- Gawrsh, você conhece o rei?
- Ah, sim. – respondeu ela, solícita.
- Cuidado, Pateta! Pode ser um truque! – Donald já estava com sua varinha
mágica empunhada.
- Mas ela parece boazinha demais pra ser um truque. – disse Pateta.
- Como você pode saber? – Donald continuava na defensiva.
Confuso, Pateta alternava o olhar entre ele e a garota. Suas longas tranças
castanhas balançavam, e ela parecia um pouco preocupada. Mas sorriu de novo
e disse:
- Vocês devem estar procurando o Leon, certo?
- Leon?! – ao ouvir o nome, tanto Donald quanto Pateta ficaram surpresos.
- O rei já fez contato com ele. Vamos. Não é seguro aqui.
- Gawrsh... O que a gente faz, Donald?
- O que deu em você? Não foi você que disse que ela parecia boazinha?
A garota olhou para trás e sorriu.
- Então vocês dois são o Donald e o Pateta. Eu sou a Aerith. É um prazer
conhecê-los.

- Acho que eles não estão aqui...


Depois de perambular bastante pelo Terceiro Distrito, Sora tinha voltado
ao Segundo e agora estava diante da fonte, olhando para o céu. As duas pessoas
novas que o garoto mencionara provavelmente não eram Kairi e Riku, afinal...
Ele não sabia explicar, mas, desde que chegara àquela cidade, estava com
a sensação de que encontraria alguém. Contudo, mesmo depois de tanta procura,
ainda não havia nem sinal de Riku ou Kairi...
- O que eu faço agora...?
Então Sora se lembrou do que Cid (o homem da Loja de Acessórios) tinha
lhe dito. “Se tiver problemas, volte aqui.” Enquanto ele pensava nisso, mais sombras
negras saíram do chão. Essas coisas não desistem! Sora avançou contra elas, com a

30
Espada-Chave empunhada. Ele tinha a impressão de que a estava usando cada
vez melhor. Eu sei que vou encontrá-los!
Desvencilhando-se das sombras, ele correu para o Primeiro Distrito.

- Boa noite, como posso ajud... Ah, é só o Sora.


- Como assim, “só o Sora”? – a recepção fora muito parecida com quando
Sora entrou ali pela primeira vez, e ele também reagiu de maneira igualmente
negativa.
- Nada dos seus amigos?
- Não... – Ele nem precisou se esforçar pra adivinhar, pensou Sora – Mas eu
continuo com a sensação de que vou encontrar alguém aqui!
- Hm... – Cid coçou o queixo – Não acha que é meio cedo pra desistir? Que
tal dar mais uma olhada pela cidade?
- É, acho que você tem razão... – Cid sorriu:
- É claro que tenho!
- Certo. Vou procurar mais um pouco!
- É assim que se fala. É bom ver que você tem bastante energia, garoto.
- Pare de me chamar de garoto! – sentindo-se um pouco mais motivado,
Sora saiu correndo da loja de novo. De repente, ouviu uma outra voz masculina:
- Eles vão aparecer quando você menos esperar.
- Quem disse isso?! – Sora saltou dos degraus da loja para a parte mais
baixa e se virou na direção da voz, já erguendo a Espada-Chave.
- E continuarão a aparecer... enquanto você tiver a Espada-Chave em seu
poder. – o homem carregava uma espada estranha, que continha algo parecido
com o cano de um revólver perto do cabo. Seus cabelos longos balançavam com
a brisa noturna, e um sorriso discreto se formava no canto da sua boca. Dando de
ombros, ele deixou escapar um suspiro. A brisa moveu seus cabelos mais um
pouco, revelando uma grande cicatriz no seu rosto – Mas por que ela escolheria
uma criança como você?
- Ei, o que você quer dizer com isso?
- Não ligue. Agora, deixe-me ver a Espada-Chave.
O homem chegou mais perto. Sora deu um passo para trás, intimidado.
- O quê? De jeito nenhum você vai ficar com ela!
Ele sorriu friamente.
- Tudo bem. Parece que você prefere fazer isso da maneira difícil.
Ele empunhou a espada estranha – a Gunblade – e avançou contra Sora. A
corrente presa ao cano tilintou. Pendurado pela corrente havia um pingente de
prata no formato de uma cabeça de leão, que refletia a luz da lua.
- Eu sabia! Você é aliado deles!

31
- Não tenha tenta certeza. – o homem encurtou a distância rapidamente e
atacou Sora com um golpe feroz.
Sora conseguiu bloquear com a Espada-Chave, mas o homem era tão forte
que parecia até que ela ia quebrar. Sua força estava em outro nível em relação a
tudo que Sora já tinha visto. Nem se comparava a Tidus ou Wakka, nem mesmo
Riku.
- Até que você não é ruim. – comentou o homem, sorrindo e saltando para
trás. Só com aquele único ataque, Sora já estava sem fôlego. Talvez ele não fosse
páreo para alguém assim... – Então que tal isso?
A Gunblade agora veio pela lateral. Sora desviou por um fio de cabelo,
quase sendo vencido pela velocidade do homem. O sorriso invencível dele fazia
Sora sentir que ele o considerava pouco mais que um brinquedo.
- Ainda não terminei! – desta vez foi uma sucessão de golpes vindos de
cima, como uma chuva. Clang! Clang! Sora podia sentir o impacto atravessando
a Espada-Chave e chegando até os seus ossos. Com dificuldade, pulou para trás,
esquivando-se de novo, e então partiu para o ataque.
- Hááá!
Ele atacou na vertical, na horizontal, e definitivamente fez contato. Mas...
- Você é cheio de energia mesmo, hein?
Sora sentiu uma pancada violenta na cabeça, que o derrubou, e então ele
não soube mais o que aconteceu. Mas parecia que ele tinha sido lançado ao ar por
muito tempo, e que podia ver o céu da noite pairando tranquilamente acima dos
seus olhos. Ele caiu de costas no chão e houve um barulho quando sua cabeça
bateu no paralelepípedo. Tudo ficou escuro.
O homem embainhou a Gunblade. Atrás dele, alguém aplaudiu.
- Que sorte encontrarmos ele aqui, hein, Leon?
Ele se virou e lá estava uma garota de cabelos pretos, sorrindo. Com uma
shuriken gigante amarrada nas costas, ela também devia ser uma guerreira.
- Não foi sorte. O Cid me deu a dica. – respondeu ele.
- Hm.
Ela se aproximou de Sora e se ajoelhou para observá-lo mais de perto. Para
alguém que tinha acabado de perder uma luta, o garoto parecia bem confortável,
com uma expressão de quem apenas dormia.
- Parece que ele não se machucou muito.
- É claro que não. Eu peguei leve. – Leon também se aproximou e pegou
Sora no colo, começando a caminhar carregando-o.

Sua cabeça girava. E doía um pouco também.


Hã...? O que foi que aconteceu...?

32
- Sora, você é mesmo um preguiçoso! Acorda!
Era a voz de Kairi. Sora recuperou a consciência, e Kairi olhava para ele,
com cara de preocupada.
Finalmente...!
- Você está bem?
- Acho que sim... – ele se sentou devagar, tentando se concentrar em Kairi.
O rosto dela parecia um pouco turvo. Será que ele estava sonhando?
- Aquelas criaturas que atacaram você estão atrás da Espada-Chave. Mas
é o seu coração que elas realmente querem, porque a Espada-Chave pertence a
você.
- Que bom que você está bem, Kairi... – disse Sora, aliviado. Agora eles só
precisavam encontrar Riku...
- Kairi? Quem é essa? Eu sou a grande ninja Yuffie!
- Hã?
Sora olhou com mais atenção para a garota que estava na sua frente. Seu
cabelo de fato era parecido com o de Kairi, mas a cor era diferente. O rosto era
outro também. Yuffie se dirigiu ao homem que estava encostado na parede atrás
dela:
- Acho que você exagerou, Squall.
- É Leon. – era o homem que Sora enfrentara na praça.
- Você é...
- Não somos seus inimigos. Dê uma olhada ao redor. – disse Leon, calmo.
- Onde...?
Parecia que ele estava num dos quartos do hotel que tinha visto no
Segundo Distrito. A cama onde Sora acordara era grande e macia, e ao seu lado
havia uma toalha umedecida que eles deviam ter usado para esfriar sua cabeça.
A Espada-Chave estava encostada na parede, segura.
- Tivemos que afastar a Espada-Chave de você pra evitar atrair mais
daquelas criaturas. – disse Yuffie – É por causa dela que elas sempre aparecem
perto de você.
- Era o único jeito de esconder o seu coração delas. – completou Leon.
Esconder o coração...? Sora olhou para ele.
- Quando você ficou inconsciente, elas perderam o rastro do seu coração.
Mas não vai funcionar por muito tempo. Ainda é difícil de acreditar... Com tantos
candidatos, o escolhido é você, uma criança... – Leon pegou a Espada-Chave e
tentou manejá-la. Ela brilhou e desapareceu da mão dele, reaparecendo na de
Sora – Bom, acho que não cabe a mim julgar isso.
- Nada disso está fazendo sentido! – reclamou Sora – O que está havendo
aqui?
Leon e Yuffie se entreolharam.

33
Em outro quarto do hotel, Donald e Pateta ouviam a explicação de Aerith,
pacientes e sérios. Quando eles entraram ali antes, procurando Leon, não havia
ninguém, mas agora era possível ouvir vozes no cômodo ao lado também.
- Certo, vocês sabem que existem muitos outros mundos além desta cidade
e do seu castelo, certo?
- Ahã! – assentiu Pateta – Mas era pra isso ser segredo.
- Sim. Sempre foi segredo porque eles nunca foram conectados. Até agora.
– Aerith ficou cabisbaixa – Quando os Sem Coração apareceram... tudo mudou.
- Sem Coração?
- Talvez vocês ainda não tenham visto nenhum. Criaturas sombrias, sem
forma definida... Esses são os Sem Coração.
- Gulp! Eles são tipo fantasmas?!
- Pode-se dizer que sim. Eles são como fantasmas que vivem nas trevas. –
Aerith, que caminhava de um lado para o outro no quarto, parou na frente da
janela, observando as luzes da cidade – A escuridão no coração das pessoas... É
isso que os atrai. E há escuridão em todo coração...
- Não no nosso! – disse Donald, colocando-se de pé.
Aerith balançou a cabeça negativamente.
- Simplesmente sentir um pouco de medo é suficiente para que um coração
se entregue às trevas. Às vezes. – a expressão no rosto de Aerith indicava que ela
estava pensando em algo doloroso. Então ela sorriu, como que para afastar dali
a sua própria escuridão – Já ouviram falar de um homem chamado Ansem?
- Ansem...? – Pateta coçou a cabeça e trocou olhares com Donald. Nenhum
deles conhecia o nome.
- Ele estava estudando os Sem Coração. Todas as suas descobertas foram
registradas num relatório muito detalhado.
- Gawrsh, hã... podemos ver? – Pateta estendeu a mão, mas Aerith fez que
não com a cabeça.
- As páginas se espalharam por toda parte.
- Se espalharam? – indagou Donald.
- Por muitos mundos. – Aerith se sentou na cama de novo.
- Então esses Sem Coração apareceram... aí os mundos foram conectados...
e as estrelas começaram a desaparecer... e tem um relatório sobre eles... e o rei foi
embora... – Donald pensava em voz alta – Então...
Pateta bateu o punho na palma da outra mão.
- Ah! Então talvez o rei tenha ido...
- Procurar o relatório. Sim, é o que eu acho também. – disse Aerith.

34
- Precisamos ajudar ele, depressa! – Pateta começou a puxar Donald, como
se quisesse começar imediatamente. Mas o pato continuou onde estava, de braços
cruzados.
- Mas não precisamos daquela chave primeiro? – perguntou.
- É verdade. A Espada-Chave. – Aerith olhou na direção do quarto vizinho.

- Então... esta é a chave? – Sora olhava para a Espada-Chave, erguendo-a


diante dos seus olhos.
- Exatamente! – confirmou Yuffie.
- Os Sem Coração temem muito a Espada-Chave. – disse Leon – É por isso
que eles continuarão a vir atrás de você, aconteça o que acontecer.
- Eu nunca pedi pra ter essa coisa! – protestou Sora.
- A Espada-Chave escolhe o seu mestre. E ela escolheu você! – repreendeu
Yuffie, cutucando a ponta da espada. Leon abriu um sorriso cínico.
- Se vira.
- “Se vira”? Fala sério... Tipo, como isso aconteceu? Eu lembro que estava
no meu quarto e aí... – nessa hora, Sora engasgou e deu um pulo; o garoto olhava
para os dois adultos com um olhar de desespero – Espera! O que aconteceu com
a minha casa? Minha ilha? Riku! Kairi!
Leon só balançou a cabeça.
- Mas...!
- Acalme-se. Ainda temos mais a te dizer. – as palavras de Leon o fizeram
voltar ao normal. Ele concluiu que não tinha pista melhor que as que eles podiam
dar. Sentou-se de novo, mas seu coração continuava acelerado.
Kairi... Riku... Nossa ilha...
O que podia ter acontecido com eles?
- Você viu uma porta grande se abrir? – indagou Leon.
- Vi.
Aquela grande porta branca, e depois... Mas já havia uma porta antes dela.
- Todos os mundos possuem uma fechadura. E cada fechadura se conecta
ao coração do seu respectivo mundo.
- O coração do mundo...?
- Ninguém sabe como é o coração de um mundo. Mas os Sem Coração
estão sempre em busca das fechaduras. – Leon jogou o cabelo para trás e olhou
na direção do quarto vizinho.
- Os Sem Coração entram pela fechadura e fazem alguma coisa com o
coração do mundo. – disse Yuffie, olhando Sora de perto e ainda cutucando a
Espada-Chave.
- E aí o que acontece? – perguntou Sora.

35
- Trevas emergem da fechadura. E o mundo desaparece.
- O quê?! – Sora deu outro pulo. Aquela grande porta branca. E as trevas
que escorreram para fora dela. A ilha se despedaçando... – Foi isso que aconteceu
com o nosso mundo?
- Exato. – disse Leon, num tom de voz sério – E, para evitar que continue
a acontecer, você tem que trancar as fechaduras.
Sora balançou a cabeça fracamente.
- Mas eu tenho que encontrar a Kairi e o Riku...
- Os mundos que são destruídos se espalham por outros mundos. – disse
Yuffie, tentando acalmá-lo – Então, se você for a outros mundos para trancar a
fechadura deles, talvez tenha uma chance de encontrar os seus amigos.
Com isso, Sora pareceu se animar.
- Talvez. Tem muita coisa que não sabemos ainda. – disse Leon.
- Tá... Então eu tenho que trancar esses mundos, certo? Mas como eu faço
pra...
Sora não concluiu a frase. Eles sentiram uma presença estranha.
- Leon! – Yuffie apontou para um canto. Uma sombra tinha aparecido lá:
um Sem Coração.
- Yuffie, vá! – gritou Leon. Yuffie sacou a shuriken e correu para a porta.
Sora ainda estava sentado, sem saber como reagir.
- Vem, Sora!
- Mas...!
- Os Sem Coração farejaram você. A escuridão no seu coração... no coração
do dono da Espada-Chave!
- Escuridão...?
- Sora, saia daqui com a Yuffie agora! – um após o outro, Leon destruía os
Sem Coração que tentavam se aproximar de Sora. Mas Sora não se mexia. Não
conseguia se mexer.
A Espada-Chave brilhava na mão dele.
Mundos estavam desaparecendo. Mundos já haviam desaparecido. Como
as Ilhas do Destino. E seus amigos tinham sumido. Kairi e Riku. Eu tenho que fazer
isso, pensou ele.
- SORA!
- Certo! – finalmente ele se pôs de pé, segurando firme a Espada-Chave.
- Tomem isso! – Leon manejou a Gunblade e lançou os Sem Coração pelos
ares. A janela se quebrou, e Leon simplesmente pulou para fora por ela. Sora fez
o mesmo. O beco atrás do hotel estava infestado de Sem Coração. Não importava
quantos eles derrotavam, continuavam aparecendo mais.
- Não perca tempo com os peixes pequenos. – disse Leon – Temos que
encontrar o líder! Vamos! – e começou a correr, com Sora no seu encalço.

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- Bem, e é essa a situação.
- Parece que precisamos mesmo dessa tal chave. – disse Donald. Nessa
hora, ouviu-se uma comoção no quarto ao lado. A porta foi aberta violentamente,
e uma garota de cabelo preto entrou correndo.
- Aerith! – Yuffie já pulava na cama – Os Sem Coração estão aqui! O hotel
não é mais seguro! – exclamou, atacando os inimigos que começavam a invadir
quarto.
- Yuffie?! – Aerith se assustou com a velocidade com que tudo acontecia.
- Gawrsh, esses são os tais Sem Coração? – disse Pateta, embrenhando-se
atrás do próprio escudo.
- É, são eles! – respondeu Yuffie.
- Vamos pegá-los, Pateta! – Donald preparou sua varinha, e então...
- Cuidado!
Outro grupo de Sem Coração se atirou dentro do quarto, amontoando-se
sobre Donald e Pateta.
- Wak?! – empurrados para trás, eles se chocaram contra a janela. Logo ela
se quebrou, e eles estavam em pleno ar.
- Gawawawawawawawak!
- Ahyoooooooo!!
Os gritos ecoaram pela cidade.

Ouvindo alguns grunhidos estranhos vindos de cima, Sora olhou, mas era
tarde demais.
- Quack!
- Ahyuk!
- Ai...
Donald caiu em cima de Sora, e Pateta em cima deles.
- O que aconteceu...? – Sora arriscou perguntar, ainda segurando a Espada-
Chave mesmo naquela situação. Acima dele, duas vozes formaram um coro:
- A chave!
E então algo estranho aconteceu no Segundo Distrito.
- O- O que está havendo?
Os três se levantaram quase ao mesmo tempo e imediatamente ergueram
suas armas: Sora, a Espada-Chave; Donald, a varinha; e Pateta, o escudo. Com
um tremor retumbante, muros de pedra se ergueram do chão, prendendo-os na
praça do Segundo Distrito.

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E então começaram a aparecer inúmeros Sem Coração, que partiram direto
para cima deles.
- Lá vem eles! – exclamou Sora.
A única opção era lutar.
- Eu cuido disso! Fogo!
- Vamos lá!
Chamas voaram da varinha de Donald, enquanto Pateta avançou contra
os Sem Coração. Não querendo ficar para trás, Sora saltou sobre um grupo de
Sem Coração. Era um verdadeiro enxame, mas ele estava confiante.
- Ei, nada mau! – elogiou Sora ao ver o resultado da magia de Donald.
- Oras, eu sou o mago da corte, afinal! – gabou-se Donald.
- Lá vem mais! – alertou Pateta.
Sora derrubou um Sem Coração e Donald deu cabo dele com magia. Pateta
atacou outro e o jogou no caminho da Espada-Chave. Eles lutavam perfeitamente
juntos, quase como se já fossem companheiros há muito tempo.
Quando todos os Sem Coração foram derrotados, os três enfim tiveram a
chance de olhar um para o outro pela primeira vez e sorrir.
Mas, no momento seguinte, um grande amontoado de metal caiu do céu.
- Quaaaaack?! – Donald corria de um lado para o outro, tentando não ser
atingido. Os pedaços de metal começaram a rastejar pelo chão e a se reunir no
centro da praça, combinando-se na forma de uma enorme armadura.
- Gawrsh, isso também é um Sem Coração? – indagou Pateta, encolhendo-
se atrás do escudo. Sora fez que sim.
- Aposto que esse é o líder!
Um elmo se encaixou em cima da armadura. Sora, Donald e Pateta tinham
diante de si um Sem Coração gigantesco: o Armadura Reforçada.
- S... Será que conseguimos derrotá-lo...?
- Se lutarmos juntos, vamos conseguir! – Sora preparou a Espada-Chave e
olhou para Donald e Pateta.
- Mas é a primeira vez que lutamos juntos... – disse Pateta.
- Vai dar certo! Eu sou o Sora! – respondeu ele, abrindo um sorriso.
- E eu sou o Pato Donald.
- Ah, eu sou o Pateta!
A apresentação terminou bem a tempo, porque o Armadura Reforçada já
começava o seu ataque.
- Vamos lá!
Os três começaram a correr. Primeiro, Sora deu um pulo e atacou a parte
principal, mas o Armadura Reforçada pareceu não sentir nada.
- Quack! – as partes começaram a se mover por conta própria, e um pé
quase esmagou Donald.
- Gawrsh, você está bem? – Pateta foi logo ajudá-lo. Enquanto isso, Sora
desviava do outro pé, que o escolhera como alvo.

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- Ah! Esse cretino! Fogo! – Donald atingiu a mão direita com sua magia de
fogo, mas isso também não surtiu muito efeito. O tronco e os dois pés, que
pisoteavam tudo como se tivessem mente própria, voltaram-se para ele.
- Não está adiantando nada! – com o pé esquerda o perseguindo, Pateta
ergueu o escudo e correu para um canto da praça.
- Tome isso! E isso! – Donald continuava disparando magias contra o pé
direito, e ele finalmente pareceu enfraquecer. Sora correu e o atacou; a coisa
rangeu.
- Deu certo! Acho melhor nos concentrarmos em uma parte de cada vez! –
exclamou ele, ainda atacando o pé direito. Pateta saiu correndo do seu canto:
- Wahooo!
- Fogo!
O escudo de Pateta causou um impacto forte, e a rajada mágica de Donald
acertou em cheio o alvo, causando uma explosão.
- Isso! – o pé direito se esfacelava – Agora o pé esquerdo!
Eles concentraram os ataques de novo, conforme ele sugerira, e desta vez
neutralizaram facilmente o oponente.
- Ahyuk! Foi uma ótima ideia! – exclamou Pateta, já começando a avançar
contra a mão direita do Armadura Reforçada. Ela ficava girando no ar, o que a
tornava difícil de acertar, mas, com algum esforço, os três conseguiram destruí-
la, seguida da esquerda.
- Agora só falta o corpo principal!
Donald atacou o tronco com uma sequência de magias, e Pateta pressionou
seu escudo contra ele por meio de um salto. A essa altura, tudo que eles podiam
fazer era usar tudo o que tinham para enfraquecê-lo.
- Tome isso!
Sora pulou e, com um golpe, atingiu o tronco, e o Armadura Reforçada
caiu como uma marionete cujas cordas foram cortadas.
- Acabou...?
- Quack! Quack! Quack! – Donald continuava atacando o inimigo imóvel.
E então... um grande coração saiu do tronco e começou a flutuar.
- Hã...?
O Armadura Reforçada se dissolveu em pequenas esferas de luz diante
dos olhos deles e desapareceu.
- Legal! Vencemos! – Sora correu até Donald e o abraçou.
- Quack?!
- Conseguimos! – exclamou Pateta, fazendo a mesma coisa.
Esmagado entre os dois, Donald emitiu um barulho bizarro:
- Waaaak!
- Nada mau, Sora.
Seguindo a voz, Sora viu Leon se aproximando.

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- Bem, eu não derrotei ele sozinho. – sorriu Sora, apontando para Donald
e Pateta.
- É isso mesmo! Ele teve o mago da corte, o Pato Donald, pra...
Pateta deu um cutucão nele para que não interrompesse a conversa.
- Então vocês já se conheceram?
- Se nos conhecemos...? Bem, sabemos o nome um do outro... – respondeu
Sora.
- Entendo. Eles estavam procurando você.
- Eu?
- O portador da Espada-Chave.
Sora se virou na direção de Donald e Pateta, meio sem saber o que esperar.
- Ei, por que você não vem com a gente? – perguntou Pateta, chegando
mais perto dele – Nós podemos ir a outros mundos com a nossa nave.
- Outros mundos...
- Estamos procurando o rei. – explicou ele.
- Será que eu conseguiria encontrar o Riku e a Kairi...?
- É claro! – disse Donald.
Sora olhou para Leon, na esperança de receber algum tipo de conselho.
- Sora, vá com eles. Principalmente se quiser encontrar os seus amigos.
- É... Acho que devo ir...
Seria mesmo possível encontrar Riku e Kairi? Ele tinha lutado muito bem
ao lado daqueles dois, mas será que não tinha sido só um golpe de sorte? De todo
modo, se o que eles queriam era a Espada-Chave...
Espere, não. Sora se lembrou. Ele já tinha decidido que isso era algo que ele
tinha que fazer.
Mas... Eu sou mesmo capaz de fazer alguma coisa?
- Sora... – Donald olhou sério para ele – Você não pode vir se for pra ficar
com essa cara.
- Hã? Por que não?! – foi Pateta quem protestou primeiro. A única reação
de Sora foi ficar ainda mais triste.
- Nada de cara triste, nada de preocupação. Entendido? – Donald fazia
expressões exageradas de propósito.
- Ah, sim, é mesmo! É que a nossa Nave Gummi é movida a sentimentos
bons! – Pateta abriu o sorriso mais tosco que conseguiu – Você tem que estar feliz,
como nós!
- Senão a nave nem sai do lugar! – Donald também abriu um sorriso largo.
Ainda pendendo a cabeça, Sora pensou um pouco e...
- Nhéééé! – ele revirou os olhos e escancarou um sorriso cheio de dentes.
Donald e Pateta caíram na gargalhada.
- Isso! Assim está bem melhor, Sora!
- Essa cara ficou bem engraçada! – completou Pateta.
- Levem isso mais a sério... – mesmo dizendo isso, Leon também sorria.

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- Tudo bem. Eu vou com vocês. – disse Sora, agora sorrindo de verdade –
E vou encontrá-los.
- Então vamos fazer isso direito. Pato Donald! – ele estendeu a mão.
- Eu sou o Pateta! – ele colocou a mão sobre a de Donald.
- E eu sou o Sora! – Sora fez o mesmo, adicionando sua mão sobre a deles.
- Um por todos, todos por um! – a voz de Pateta ecoou.

Sem mais nenhum Sem Coração à solta, pelo menos por ora, a Cidade da
Travessia parecia um pouco mais quieta, mas também mais amigável.
- Então, se precisarem de alguma coisa, podem voltar aqui. – disse Leon a
Sora e os outros enquanto eles se preparavam para partir.
- Entendido! – respondeu Sora, sorrindo.
- E vamos trazer o rei! – acrescentou Donald. Aerith assentiu.
- Nós continuaremos a fazer a nossa parte aqui. Ainda não encontramos a
porta da Cidade da Travessia. Enquanto ela estiver destrancada, os Sem Coração
ficarão aparecendo.
- Mesmo assim, não há nada a temer, pois a magnífica Yuffie está aqui! –
gabou-se a ninja.
- Faremos de tudo para encontrar a porta até vocês voltarem. – disse Leon.
Aerith deu um passo à frente. Ela parecia um pouco preocupada.
- Tenha cuidado, Sora.
- Eu vou ficar bem. Tenho o Donald e o Pateta comigo agora!
- É! Deixa com a gente! – Donald batia no peito, o que fez Aerith sorrir.
- Que bom que você fez alguns amigos.
- É!
- Vamos, Sora! – disse Pateta, e Sora começou a caminhar com eles.
- Não baixe a guarda. – aconselhou Leon – E acredite no seu coração.
Sora fez que sim acenando com a mão que segurava a Espada-Chave.
Um espaço misterioso se abriu do outro lado dos portões da cidade, e lá
estava uma estranha nave, que não era nem bem um avião, nem bem um
submarino.
- Esta é a nossa Nave Gummi. Vamos, chega de perder tempo! – Donald
aparentemente estava com pressa, mas, nessa hora, o Grilo Falante saltou para
fora do seu bolso.
- Não estão esquecendo alguém?
- Ah! – assustando-se, Sora quase caiu para trás.
- Eu sou o Grilo Falante. Também vou viajar com vocês.

42
- Nossa, você me pegou de surpresa! Eu sou o Sora. Prazer em conhecê-lo.
– Sora se aproximou e estendeu a mão, e o Grilo falante retribuiu apertando um
dos seus dedos, que era o máximo que o seu tamanho diminuto permitia.
- O prazer é todo meu. Bom, acho que agora sim estamos prontos, certo?
- Certo! – respondeu Pateta, empolgado.
- Bom, então vamos decolar! Estou certo de que teremos grandes aventuras
pela frente! Eu ajudarei no que puder.
- Obrigado, Grilo Falante.
O Grilo Falante educadamente fez uma mesura com o chapéu e desta vez
se acomodou no bolso de Sora.
- Se está tudo resolvido, vamos. Está na hora de encontrar o rei. – e Donald
correu para a nave.
- E eu vou encontrar a Kairi e o Riku! – disse Sora, seguindo-o. Pateta foi
logo atrás.
- Temos que achar as fechaduras também!
E juntos eles partiram para as estrelas, rumo a mundos desconhecidos.

43
PAÍS DAS MARAVILHAS
a primeira princesa

A Nave Gummi cruzava o céu.


- Ei, como essa coisa funciona? Como ela pode viajar entre mundos? – Sora
não parava de fazer perguntas.
- Bom, ela... quack! Olha, não dá pra conversar agora! – respondeu Donald,
virando o manche de um lado para o outro. A nave balançava violentamente.
Como não conseguia respostas, Sora resolveu olhar pelo vidro, e notou que lá
fora havia grandes pedras e outras coisas de formatos estranhos flutuando por
toda parte. Realmente, pilotar devia exigir muita concentração, pois um descuido
e eles bateriam.
- Você quer que eu te ajude a pilotar?
- De jeito nenhum!
- Hunf! – Sora se afastou do cockpit e se sentou num canto. Tudo bem que
ele não tinha experiência naquilo, mas ajuda nunca é demais, não? Pateta viu que
ele estava emburrado e se aproximou.
- Ei, Sora...
- Ei, você não acha que eu poderia muito bem ajudar? O Donald é muito
cabeça-dura!
- Olha, eu já tentei pilotar uma vez, e não é nada fácil pilotar a nave.
- É mesmo? – bem quando Sora disse isso, a Nave Gummi fez uma virada
brusca, e ele quase caiu – Mas não parece tão difícil... Acho que ele é que é ruim
nisso...
Totalmente concentrado no manche à sua frente, Donald parecia não ouvi-
los.
- Eu queria tentar...
O Grilo Falante pulou do bolso de Sora.
- Ouvi dizer que a Nave Gummi usa um tipo de energia misterioso como
combustível.
- Isso mesmo. – disse Pateta – É por isso que ela pode viajar entre mundos.
- Hm... – Sora correu o olhar pela cabine. Exceto por ser muito grande, a
nave não parecia ter nada de especial.
- O material usado para construir a nave também é muito especial. – disse
o Grilo Falante.
- Especial? O que é?
- É algo chamado blocos gummi. E esse material...
- Quack! – o grito de Donald interrompeu o Grilo Falante – Tem alguma
coisa ali na frente!
Sora e Pateta correram até o cockpit.

44
- É assim que é um mundo visto de fora? – indagou Sora, fascinado. Ele
nunca tinha visto nada parecido. O mundo que flutuava no céu era coberto por
um padrão de corações, e havia arcos verdes e um castelo. Um lugar que ele
nunca vira – com o qual jamais sequer sonhara. Tudo que ele mais queria agora
era descer lá.
- É. – respondeu Donald – Os mundos são todos assim. Ficam flutuando
em algum lugar do céu.
- Uau... – os olhos de Sora brilhavam.

O lugar onde a Nave Gummi aterrissou estava envolto por uma neblina
estranhamente colorida. Não era possível ver muito adiante.
- Beleza, vamos lá!
Sora, Donald e Pateta se despediram do Grilo Falante, que ficou para trás
para cuidar da nave, e começaram a investigar o lugar. E aí...
- Ah!
De repente, não havia mais chão. Os três caíram num buraco que parecia
não ter fundo.
- Parece até que estamos voando... – disse Sora. A queda não acabara, mas
estava mais suave agora. Um vento forte atingiu o seu rosto, vindo de algum
lugar lá embaixo.
- Ei, vejam isso! – Pateta balançava os braços como se estivesse nadando.
Depois deitou a cabeça sobre as mãos, como se fosse dormir. E então Donald e
Sora pousaram elegantemente, enquanto Pateta se espatifou contra o chão.
- Ai... – Pateta se levantou meio zonzo, esfregando o traseiro. Nessa hora,
um coelho branco passou correndo na frente deles.
- Ai, os meus bigodes! É tarde, é tarde, é tarde! Eu tenho pressa! Eu tenho
pressa à beça! Ai, ai, meu Deus! Alô, adeus! É tarde, é tarde, é tarde!
O coelho branco desapareceu num corredor, juntamente com seus óculos
e seu enorme relógio.
- Nossa, por que será que ele tem tanta pressa? – perguntou-se Sora.
- Bom, vamos descobrir! – disse Donald.
Os três correram atrás do coelho, mas logo tiveram de parar.
- Uma porta! – era o único lugar por onde o coelho podia ter passado.
- Não tem fechadura... – observou Pateta – Mas aquele coelho só pode ter
vindo por aqui...
Ele tentou abrir a porta e, para a sua surpresa, ela estava destrancada. Mas,
ainda mais curioso, havia outra porta atrás dela, e o coelho branco a cruzava bem
naquele momento.
- Vamos!

45
Eles atravessaram a porta, e depois outra, e outra... Até que chegaram a
uma grande sala. Lá havia uma lareira e um relógio, como se fosse a sala de estar
de alguém, mas havia algo errado... Havia uma torneira gigante!
- Ei, lá vai ele! – Pateta apontou para o coelho branco, que inesperadamente
diminuiu de tamanho, abriu uma porta minúscula e seguiu seu caminho por ela.
- Ele encolheu?! – Sora correu até a porta e se abaixou. Definitivamente era
uma porta pequena demais para ele – Como ele fez pra ficar tão pequeno?
Enquanto ele verificava a porta, a maçaneta começou a se mexer, abrindo
olhos e uma boca e, com uma voz de sono, disse:
- Você é que é grande demais.
- Ela fala! – exclamou Donald. A maçaneta pareceu se irritar e respondeu,
não sem antes bocejar:
- Por que vocês tem que fazer tanto barulho? Até me acordaram.
Pateta se aproximou e deu um “bom dia” cheio de energia. Sora continuou
a conversa:
- Ei, por acaso você viu um garoto e uma garota mais ou menos da minha
idade?
- Ou o rei?
- Ou uma fechadura, talvez...
Cada um fez uma pergunta, mas a maçaneta só bocejou de novo.
- Nossa, quantas perguntas. Eu vi uma garota. A rainha deve saber mais.
- Deve ser a Kairi! – empolgou-se Sora.
Os olhos da maçaneta começaram a pesar.
- Eu preciso dormir mais um pouco... Boa noite...
- Espera! Onde nós podemos encontrar essa garota e a rainha?
- Aí já não é comigo.
A maçaneta praticamente já tinha dormido de novo. Sora insistiu:
- Só mais uma coisa... Como fazemos pra ficar pequenos?
- Experimentem o que tem naquele frasco... ali...
Os três se viraram para trás e, de fato, sobre a mesa havia dois pequenos
frascos, um com um rótulo vermelho e o outro com um rótulo azul.
- Temos que beber isso? – perguntou Sora, mas a maçaneta agora dormia
profundamente.
- Ele mencionou uma rainha, não foi?
- Mas, Sora, quem nós estamos procurando é o rei. – tanto Donald quanto
Pateta olhavam para Sora, um pouco ansiosos.
- Mas... ele também disse que viu uma garota...
- Gawrsh, é verdade, mas... – Pateta cruzou os braços, pensando.
- E também tem aquele coelho branco, todo apressado... Vocês não acham
suspeito?
- É no mínimo estranho.

46
- E também temos que procurar a fechadura. – disse Donald, pegando o
frasco de rótulo vermelho – Ei, tem algo escrito.
Pateta olhou o rótulo mais de perto. Havia um desenho de uma árvore
pequena com uma seta que apontava dela para uma árvore maior. No frasco de
rótulo azul, havia um desenho idêntico, mas a seta estava invertida.
- Então, se bebermos o vermelho, ficaremos maiores, e se bebermos o azul,
ficaremos menores? – disse Sora.
- Não tem perigo mesmo, né? – Pateta não parecia confiante de que era
seguro beber aquilo.
- Acho que a maçaneta não teria por que mentir. – Sora pegou o frasco azul
e levou aos lábios.
- Gawrsh! Sora! – Sora encolheu bem diante dos olhos de Pateta, deixando-
o aturdido.
- Legal, nossa vez! – Donald também bebeu e encolheu. Ainda com cara de
preocupação, Pateta finalmente fez o mesmo.
- Bem, parece que deu tudo certo.
- Só que estamos pequenininhos...
Eles se entreolharam, para se certificarem de que estava tudo bem mesmo.
A mesa estava do tamanho de uma casa agora e a cadeira ao lado dela parecia
uma árvore. Só aquela porta de maçaneta falante estava no tamanho certo para
eles agora.
- Vamos!
Assim que Sora começou a correr na direção da porta, eles ouviram um
barulho estranho... e Sem Coração apareceram.
- Uououuu! – Pateta deu um pulo para trás. Esses Sem Coração eram
diferentes dos que eles tinham enfrentado na Cidade da Travessia. Alguns
pareciam dragões, alguns eram redondos e pesados. Mas o que tinham em
comum era a ausência de rosto. Só dois olhinhos brilhantes.
- Tem mais ali! – exclamou Donald, já lançando suas magias. Mas, como
aconteceu na Cidade da Travessia, não importava quantos eles derrotavam,
outros apareciam – É melhor a gente correr! Isso não vai ter fim!
- Será que tem um Sem Coração grande daqueles aqui também? – indagou
Pateta.
- Não temos tempo pra pensar nisso! Vamos! – Sora correu até a porta de
novo e abordou a maçaneta – Ei, deixe a gente passar!
Ele bateu na porta e até chutou, mas a maçaneta não acordava.
- O que a gente faz...?
- Sora! Tem um túnel ali! – Donald tinha encontrado uma saída: um buraco
na parede. Eles correram para lá.

47
Do outro lado do túnel, havia um jardim do mais puro verde. As moitas
haviam sido cuidadosa e artisticamente podadas, adornando a paisagem com o
formato de corações.
- Gawrsh... Parece um pouco com os jardins do nosso castelo!
- Quack!? Os jardins do Castelo Disney são muito mais bonitos!
Esbravejando, Donald começou a caminhar, e Pateta o seguiu. Sora mal
prestava atenção neles. Estava completamente embasbacado com o que via. Era
diferente de tudo que ele conhecia.
Aquele era o País das Maravilhas – um lugar misterioso governado pela
Rainha de Copas. E eles estavam no enorme jardim da rainha.
- Ei, olhem! – Pateta apontou para um estrado, sobre o qual se sentava uma
mulher robusta com um ar de autoridade: a rainha.
Alguns soldados que se pareciam com cartas de baralho, todos portando
lanças de ponta no formato do ícone de espadas, bloqueavam o caminho a partir
de um certo ponto.
- Ah, deixem a gente passar! – exigiu Donald, mas eles não esboçaram a
menor reação.
O coelho branco subiu numa plataforma próxima à rainha e soou uma
corneta.
- O que está acontecendo? – questionou Donald, vendo a cena transcorrer.
- O tribunal está em sessão! – exclamou o coelho branco.
- Eu vou ser julgada? Mas pelo quê? – disse uma garota de cabelos loiros
que se encontrava em um quadrante em frente ao tablado. Ela usava um vestido
azul claro e um avental sobre ele. Seu rosto transmitia uma profunda indignação.
- Um julgamento? – indagou Pateta.
- O que é um julgamento? – perguntou Sora. Ele nunca sequer tinha ouvido
essa palavra nas Ilhas do Destino.
- Bem, é como uma reunião para decidir se alguém deve ser punido por
um crime.
- Então aquela garota fez algo de errado?
- Acho que já vamos descobrir.
Nesse momento, o coelho branco anunciou:
- Sua Majestade, a Rainha de Copas, presidirá a sessão!
A rainha raspou a garganta antes de falar:
- A garota é culpada. Não há dúvida. E a razão é... porque eu disse que é!
- Isso é totalmente injusto! – exclamou a garota.
- Pois então fale: você tem alguma coisa a dizer em sua defesa? – indagou
o coelho branco.

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- É claro! Eu não fiz absolutamente nada de errado! – Alice se voltou para
a mulher sobre estrado – Você pode ser a rainha, mas isso não te dá o direito de
ser tão má!
Ao ouvir a fala ousada, o coelho branco se encolheu de medo, já prevendo
uma péssima reação da rainha.
- Silêncio! Como ousa me questionar?! – a rainha fechou o seu leque e ficou
de pé – A corte decide que a ré é culpada de todas as acusações!
Aparentemente, aquele era um julgamento dos piores possíveis, no qual
uma única palavra da rainha decidia o veredicto e tudo o mais.
- Ei, temos que ajudá-la. – disse Sora, empunhando a Espada-Chave.
- É, mas... a gente não pode entrevar nos mundos.
- Intervir! – corrigiu Donald.
- Isso! Não podemos nos envolver com o que acontece nos outros mundos.
A voz retumbante da rainha interrompeu a conversa:
- Pelos crimes de assalto e tentativa de roubo do meu coração...
- Roubo do coração? – indagou Sora.
- Só pode ser coisa dos Sem Coração! – disse Donald. Os três assentiram.
Se havia Sem Coração envolvidos, eles não podiam ignorar.
- Cortem-lhe a cabeça! – berrou a rainha.
- Não! Por favor, não!
Com a ordem da rainha, os soldados de formato de carta começaram a se
aproximar de Alice. Mas Sora, Donald e Pateta chegaram lá primeiro.
- Parem agora mesmo!
A rainha se voltou para os três imediatamente:
- Quem são vocês? Como ousam interromper um tribunal?
- Com licença! – disse Sora, dirigindo-se à rainha – Mas nós sabemos quem
é o verdadeiro culpado!
- Que bobagem. Tem alguma prova?
- Hm...
Eles podiam saber que Alice era inocente, mas não tinham qualquer prova.
Havia apenas o fato de que os Sem Coração tentavam roubar corações.
- Se não tem nenhuma prova, o veredicto é culpada!
- Então nós vamos encontrar provas! – insistiu ele.
- Ahyuk! Isso! – concordou Pateta.
- Tragam-me evidências da inocência de Alice! Caso não o façam, cortarei
suas cabeças! – declarou a rainha – A sessão está em recesso!
Os soldados-carta voltaram aos seus postos – depois que Alice foi colocada
numa cela de prisão, que parecia mais uma gaiola gigante. Pateta foi o primeiro
a falar com ela.
- Você está bem? Fique tranquila que vamos encontrar as evidências!
- Meu nome é Alice. Quem são vocês?
- Eu sou o Sora.

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- Eu sou o Pateta. E ele é o Donald.
Ela sorriu um pouco.
- Prazer em conhecê-los. – então ela olhou para baixo, falando desanimada
– Gostaria que tivéssemos nos conhecido em outras circunstâncias... Lamento tê-
los envolvido nesse julgamento estranho.
- Por que ela suspeita de você? – perguntou Sora.
- Eu também gostaria de saber. Assim que viu o meu rosto, a Rainha de
Copas decidiu que a culpa era minha. Mas eu nem a conhecia! Foi a primeira vez
que a vi na vida! – Alice suspirou.
- Isso é horrível! – Donald batia o pé – Ela é que devia ser presa!
- Como você veio parar aqui?
Ela precisou se concentrar um pouco e então falou com hesitação, como se
escolhendo as palavras:
- Hm... Para dizer a verdade, eu não me lembro muito bem. Eu estava com
algumas amigas no campo, lendo, quando encontrei um buraco misterioso no
chão.
- Um buraco?
- Deve ser o mesmo buraco em que a gente caiu! – disse Pateta, trocando
um olhar com Donald.
- Eu cheguei perto pra dar uma olhadinha e acho que caí... Quando me dei
conta, estava acordando aqui.
Pateta coçou a cabeça e murmurou:
- Gawrsh, parece até que ela veio de outro mundo...
- Isso é estranho... – ponderou Donald – Não é normal pessoas viajarem
entre mundos...
Eles mesmos não conseguiriam fazer isso sem a Nave Gummi. Como Alice
teria conseguido? Eles não faziam ideia. Talvez ela tivesse algum tipo de poder
oculto, como Sora com a Espada-Chave.
- Como assim, outro mundo? – questionou Alice.
- Ah... Isso é um assunto privado.
- A ré deve permanecer em silêncio! – exclamou um dos soldados-carta de
guarda. Sora e seu grupo chegaram mais perto da gaiola, para cochichar para
Alice:
- Não se preocupe. Nós vamos encontrar as evidências!
- Obrigada. Espero que consigam. – Alice tentou sorrir de novo.
- Chega de enrolação! Já me fizeram perder tempo demais! Querem ser
presos também? – irritou-se a rainha. Os soldados-carta já os olhavam com cara
feia também. Os três se afastaram para evitar mais problemas e começaram uma
reunião estratégica debaixo de um arco em formato de coração.
- Evidências... Será que vamos ter que levar um Sem Coração pro tribunal?
- Mesmo que aparecêssemos lá com um Sem Coração, isso não provaria
nada em definitivo...

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Enquanto Donald e Pateta discutiam, Sora cruzou os braços, pensando.
- Bom, e quanto ao cheiro deles? Ou marcas de garras... Algo assim não
serviria melhor como evidência?
- Você viu alguma coisa desse tipo por aí, Sora? – indagou Pateta.
- Não exatamente, mas... – Sora esticou a manga da camisa.
- Ah, está rasgada!
- Um deles fez isso quando lutamos antes. Então, se a gente procurar com
cuidado, aposto que podemos encontrar mais alguns rastros deles como esse aqui
neste mundo.
Pateta cheirou a manga da camisa.
- Eles deixam mesmo um cheiro estranho...
- Talvez isso sirva como evidência!
Decidindo que era um bom ponto de partida, os três atravessaram o arco
para dar início às buscas. Eles emergiram numa floresta densa e repleta de flores.

- Tomara que tenha alguma coisa por aqui... – comentou Donald, olhando
ao redor, quando... – Quaaack! – ele gritou e se escondeu atrás de Sora.
- O que foi, Donald?
- A- A- A- Ali! – a mão trêmula de Donald apontava para uma cabeça de
gato que flutuava sem corpo no ar. Pateta engoliu em seco e também correu para
trás de Sora, já erguendo seu escudo.
- Quem é você? – perguntou Sora.
A cabeça de gato balançou de um lado para o outro algumas vezes, até que
encostou no chão e respondeu:
- Puxa, quem será? – o corpo rechonchudo e listrado do gato apareceu,
balançando sobre a cabeça e em seguida a jogando para cima, como se fosse uma
bola num show de malabarismo – Pobre Alice. Em breve perderá a cabeça, muito
embora não seja culpada de nada!
A cabeça do gato começou a flutuar de novo e se encaixou devidamente
no corpo. De cima de uma flor, ele sorriu para o trio.
- Ei, se você sabe quem é o culpado, diga! – exigiu Sora.
- O Mestre Gato sabe todas as respostas... Mas nem sempre as diz.
- Como você é ruim! – exclamou Donald.
O Mestre Gato apenas sorriu.
- A resposta, o culpado, o gato... Tudo se resume a trevas...
E então o gato desapareceu.
- Espera! – gritou Sora. Se eles não conseguissem encontrar evidências, não
conseguiriam ajudar Alice.
A voz do gato ecoou uma última vez pela floresta:

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- Eles já deixaram a floresta. Não direi para onde foram. Mas talvez exista
outra pessoa que sabe... Ou não.
- Será que podemos confiar nele? – disse Donald, inquieto, e o Mestre Gato
apareceu de novo, bem na frente dele.
- Confiar ou não confiar? Eu confio em você para tomar a decisão certa! –
sorrindo, o gato desapareceu novamente.
- Acho melhor procurarmos em outro lugar. – disse Sora.
- Você acreditou no que o gato disse? – perguntou Pateta.
- Algo me diz que ele estava dizendo a verdade!
Donald queria confiar na determinação de Sora, mas não sabia onde mais
eles poderiam procurar.
- Então... Você tem alguma ideia de aonde ir?
- Hm... Vamos tentar ir por ali.
Eles começaram a seguir uma trilha, mas um grupo de Sem Coração surgiu
no caminho.
- Uou!
- Gawrsh, essas coisas estão nos seguindo por toda parte... – Pateta respirou
fundo e preparou o escudo. Ele não gostava de enfrentar os Sem Coração, mas,
agora que estava se acostumando a lutar ao lado de Sora e Donald, eles não o
assustavam mais tanto quanto antes.
- Mas isso é óbvio! Aerith disse que eles seguiriam o portador da Espada-
Chave, e essa pessoa é o Sora! – disse Donald, atacando com sua magia.
- Me desculpem... – disse Sora num tom de desânimo após dar cabo de um
Sem Coração.
- Ah, não precisa se desculpar, Sora. – respondeu Pateta – Nós servimos
ao rei, e ele nos enviou para encontrar a chave, então esse é o nosso trabalho. Não
tem por que você se desculpar!
- Mas... – Sora ficou ainda mais desanimado. Então, se o rei não os tivesse
enviado, esses dois nem se importariam comigo... Era uma ideia que o entristecia. Eles
se conheciam há pouco tempo, mas estava sendo divertido. Donald era sempre
agitado, enquanto Pateta nunca saía do sério. Claro que não era a mesma coisa
que com Riku e Kairi, mas... – Argh! – enquanto ele se perdia nos pensamentos,
um Sem Coração o atingiu com suas garras, e Sora caiu para trás.
- Aguente firme, Sora! – Pateta correu até ele e ofereceu uma poção de cura.
- Obrigado, Pateta.
- Não é boa ideia ficar viajando no meio de uma luta. – e Pateta correu para
ajudar Donald. Sora também se levantou e voltou à batalha.
Tendo finalmente derrotado todos os Sem Coração, os três se jogaram no
chão, exaustos.
- Ufa... Fiquei cansado agora. – comentou Pateta, cujo olhar estava voltado
para uma grande flor de lótus acima da sua cabeça.
- Quack... – Donald nem conseguia falar.

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Nesse momento, eles ouviram uma voz sussurrar:
- Obrigada.
- Hã? – Sora se levantou e olhou ao redor.
- Aqui...
- Quem é? – Donald perguntou com delicadeza, e a flor de lótus acima
deles balançou – A flor?!
- Isso mesmo. Sou uma flor de lótus. – e a flor se abriu.
- Uau...
Um doce perfume tomou conta do lugar. Pólen caiu sobre eles, o que, por
algum motivo, aparentemente recuperou suas energias.
- Não conseguíamos florescer com aquelas coisas por aqui. – disse a lótus.
- Aquelas coisas...? Ah, os Sem Cora... – Pateta começou a falar, mas tapou
a boca no meio do caminho. Eles não podiam contar a ninguém sobre os Sem
Coração. Isso configuraria uma intervenção.
- Aquelas coisas sombrias! – explicou a flor.
- Ei, você viu um bem grande? – perguntou Sora.
- Um bem grande...? – a flor pareceu pensar por um momento – Acho que
talvez... por ali... – a flor apontou o caminho com a sua maior pétala.
- Por ali?
- Isso vai ajudar vocês. – assim que a flor disse isso, um talo brotou do chão
e se estendeu até um ponto mais alto. De lá, eles teriam uma rota muito melhor
para chegar ao destino. O talo tinha folhas bem grandes, do tamanho perfeito
para que Sora e os outros pudessem subir.
- Obrigado!
- Sou eu quem agradece. – respondeu a lótus, que se fechou em seguida.
Os três pularam na primeira folha e de lá na segunda. A terceira estava um
pouco mais alta.
- Nossa, será que a gente alcança essa?
- A gente consegue!
Subindo mais e mais, eles finalmente chegaram a uma área mais alta onde
era possível andar e puderam continuar seu caminho. Não demorou muito para
encontrarem uma abertura em meio à infinidade de folhas, que parecia levar a
algum outro lugar.
- Parece que é ali. – disse Donald.
- Gawrsh, será que é seguro entrar? – Pateta parecia apreensivo de novo.
- Acho que aquela flor não mentiria pra nós. – respondeu Donald.
- Mas aquele gato pode ter mentido...
- Só tem um jeito de saber! – e Sora correu para a abertura. Os outros dois
o seguiram.
- Uou!
Na abertura, não havia chão. Eles caíram por um tempo até chegar a um
outro lugar estranho.

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- Mas aqui... Nós estamos em cima da torneira daquela sala estranha.
Como Donald disse, de algum modo eles tinham voltado àquela primeira
sala, onde beberam o líquido dos frascos.
- Nossa, é mesmo!
- Droga, fomos enganados... – Pateta estava desolado.
- Espera! – Sora apontou para a cristaleira, que parecia estar ao alcance de
um pulo deles – Não tem alguma coisa ali?
- Pegadas! – exclamou Donald, já pulando na cristaleira – Vejam isso! São
pegadas, e muito grandes! Com certeza são de um Sem Coração!
Sora e Pateta também pularam lá.
- Isso vai servir como evidência, né? – disse Pateta, examinando as marcas.
- Ora, ora, olha só o que vocês encontraram. – disse uma voz vinda do nada
– Muito bem.
Quando os três se viraram na direção da voz, lá estava o Mestre Gato sobre
a torneira, como sempre, sorrindo.
- Agora podemos salvar Alice! – disse Sora. O gato se colocou sobre duas
patas, sem nunca deixar o sorriso de lado.
- Não tenha tanta certeza! Ela pode ser inocente, mas e vocês? – e o Mestre
Gato fez uma manobra no ar.
- O que você quer dizer com isso? – indagou Pateta.
- Não vou dizer. – respondeu o gato, que flutuou mais um pouco antes de
desaparecer.
- O que foi isso? – Sora tombou a cabeça, sem entender, enquanto Pateta
começou a remover a prateleira da cristaleira que continha as pegadas – Bom,
não adianta ficar pensando nisso. O que importa é que agora podemos ajudar a
Alice!
Pateta finalmente terminou de removê-la.
- Já andamos bastante por aqui, mas ainda não vimos nenhuma fechadura,
né?
- Encontramos evidências, mas ainda não derrotamos os Sem Coração que
estão por trás disso... Opa! – Sora pulou para o chão. Donald o seguiu.
- Leon disse que os Sem Coração estariam perto da fechadura, certo?
- Será que... a gente vai ter que enfrentar outro Sem Coração grande como
aquele...? – Pateta também saltou, carregando o pedaço de madeira no ombro.
- Não sei... – disse Sora – Mas primeiro temos que ajudar a Alice. Depois
pensamos nisso!
Eles voltaram para o tribunal da rainha.

55
- Vamos te ajudar! Eu prometo! – disse Sora a Alice, que ainda estava presa
na gaiola. A Rainha de Copas o encarou.
- Obrigada...
Uma cortina desceu sobre as barras, e a gaiola foi erguida ao alto, fora de
alcance.
- A corte está em sessão! – exclamou o coelho branco – Testemunhas, um
passo à frente!
Segurando a prateleira com as marcas de pegada, Sora subiu no pódio de
defesa. Donald e Pateta se sentaram no júri. A Rainha de Copas se inclinava para
a frente no seu banco, já de mau humor.
- Agora mostre a evidência que encontrou!
Sora mostrou a prateleira.
- Hunf! Só isso? Comparado às evidências que eu coletei, isso não é nada!
Cartas! Tragam as minhas evidências!
Com a ordem da rainha, os soldados-cartas trouxeram uma grande caixa.
Pegaram a prateleira da cristaleira que Sora segurava, colocaram em outra caixa
e embaralharam as duas sem que Sora pudesse ver. Agora ele não sabia mais qual
caixa era qual.
- Ei, o que vocês estão fazendo?! – indignou-se Sora.
A intransigente Rainha de Copas era indiferente a qualquer protesto.
- Que tal você escolher qual caixa tem a evidência correta? Isso decidirá
quem é o verdadeiro culpado!
- Mas isso não faz nenhum sentido!
- Eu estou sendo benevolente e permitindo que você decida! Prefere que
eu tome a decisão sozinha?
- Tá bom... – resignando-se, Sora se voltou para as caixas e começou a
pensar. Ele não fazia ideia de qual poderia ser.
- A da direita, Sora!
- Não, a da esquerda! Tenho certeza que é a da esquerda!
- Não, é a da direita! Sem dúvida!
Do júri, Pateta e Donald disparavam opiniões conflitantes. Sora segurou a
Espada-Chave em pé na sua frente, fechou os olhos e tirou as mãos dela. Por um
momento, o objeto titubeou, como se não soubesse o que fazer, mas então caiu,
para o lado direito.
- É essa!
- Tem certeza? – indagou a Rainha de Copas – Não haverá segunda chance!
- Sim, tenho certeza! – respondeu Sora, pegando a Espada-Chave sem tirar
os olhos da rainha.
- Agora nós vamos ver quem é o verdadeiro culpado.
Um soldado-carta abriu a caixa que Sora tinha escolhido. Um Sem Coração
pulou para fora dela e desapareceu. Nem mesmo a rainha conseguiu esconder
sua surpresa.

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- O que foi isso?!
- A sua evidência. Alice é inocente!
- É! Isso mesmo! – adicionaram Donald e Pateta do júri.
- Grrr... Silêncio! Eu sou a lei aqui! – berrou a rainha – Artigo 29! Todos
que questionam a rainha são culpados!
- Isso é absurdo! – Donald pulava descontroladamente.
- Prendam-nos agora mesmo! – ordenou a rainha apontando seu leque de
corações para os três, e os soldados-carta avançaram imediatamente.
- Vocês dois, ajudem a Alice! – exclamou Sora para Donald e Pateta antes
de saltar para fora da tribuna de defesa.
- Entendido! – Donald e Pateta correram para a torre que segurava a gaiola
de Alice.
- Cartas! Se eles encostarem um único dedo naquela torre, eu corto suas
cabeças! – esbravejou a Rainha de Copas.
Donald pulou na manivela ao lado da torre.
- Não quer girar!
- Vamos quebrá-la!
Pateta e Donald começaram a atacar a manivela, enquanto Sora mantinha
os soldados-carta longe deles.
- Pronto, quebrou! – com a manivela quebrada, a corrente ligada a ela ficou
bamba e a gaiola desceu de novo.
- Alice! – Sora correu até a gaiola e levantou a cortina. Mas Alice não estava
lá – Ela sumiu?! Alice!
- Ela fugiu enquanto a gente lutava? – perguntou-se Pateta.
- Ou talvez... ela tenha sido raptada pelos Sem Coração! – deduziu Sora. A
Rainha de Copas gritou:
- Idiotas! Descubram quem está por trás disso! Não me importa como!
Os soldados-carta pararam de lutar e se espalharam. Sora, Donald e Pateta
decidiram fazer o mesmo, voltando para a floresta das lótus.

- Gawrsh... Não acredito que ela desapareceu...


- Ao invés de perder tempo reclamando, vamos procurá-la. – disse Sora,
que andava na frente.
- Mas por que você acha que foram os Sem Coração?
- Quem mais poderia ter raptado a Alice?
Eles estavam lá quando a gaiola subiu a torre levando Alice e quando ela
voltou sozinha. Isso só podia significar que quem a levou devia ter feito isso
enquanto ela estava suspensa. E só os Sem Coração conseguiriam fazer algo tão
impensável assim. Pelo menos era nisso que Sora acreditava.

57
- Vamos procurar aquela flor que falou sobre sombras. – disse ele.
Quando eles chegaram à flor de lótus com a qual conversaram antes, ela
se abriu novamente, fazendo um puf. Mas o que saiu de dentro dela foi o Mestre
Gato.
- Não gosto muito dele... – reclamou Pateta. Mas Sora não se importou.
- Você viu a Alice?
- Alice, não. – disse o gato sorridente – Sombras, sim!
- Aonde elas foram? – questionou Donald. O gato ficou de pé e começou a
balançar de um lado para o outro.
- Pra cá? Pra lá? Seja qual for a resposta, eu só posso lhes dizer mentiras.
- O que isso significa? – Sora estava indignado.
- Cima, baixo, esquerda, direita... Tudo misturado, graças às sombras. Vão
mais fundo na floresta, até o jardim deserto... E talvez encontrem as sombras na
sala de ponta-cabeça. – balançando o rabo, o Mestre Gato desapareceu outra vez.
- Jardim deserto?
- Ele disse pra irmos mais fundo na floresta. Vamos!
Eles começaram a avançar, mas logo encontraram problemas.
- Ah, mais Sem Coração... – Pateta parecia relutante, mas foi ao ataque, só
para ser repelido por um Sem Coração grande e redondo – Hã? É só impressão
minha ou eles estão mais fortes desta vez?
- Ah! Esses soltam fogo!
Aparentemente, não seria tão fácil chegar às entranhas da floresta.
Pateta derrubou um Sem Coração e perguntou a Sora:
- Mais fundo... É por aqui?
- Parece que sim! Vamos! – Sora começou a correr, abrindo caminho com
a Espada-Chave.
- Fogo! Eu tô pegando fogo! Quaaack! – um Sem Coração tinha ateado fogo
ao rabo de Donald. Ele só conseguiu se salvar por causa da sua magia – Gelo!
- Por aqui, Donald! – Sora pulou num tronco e esticou o braço para Donald.
- Ahyuk! – Pateta veio correndo loucamente, perseguido por Sem Coração
que usavam magia.
- Nossa... Que desastre... – Donald estava decepcionado consigo mesmo.
Sora já estava subindo em outro tronco.
- Não é hora de se importar com isso. Vamos focar na Alice!
- Ahyuk, é isso mesmo! Tem uma donzela em perigo por aqui! – Pateta já
estava no ritmo outra vez.
- Eu sei disso, quack! – Donald se recompôs e foi atrás deles – Olhem... Tem
outro buraco ali.
- Vai ter chão dessa vez, né? – preocupou-se Pateta.
- Vamos! – Sora correu para lá.

58
Uma luz ofuscante os deixou atordoados quando eles saíram da escuridão
do túnel. Aos poucos, foi possível identificar uma grande mesa cheia de pratos e
xícaras. A paisagem ao redor parecia a de um jardim.
- Gawrsh, será que está tendo uma festa? – Pateta começou a caminhar em
volta da mesa. Sora também examinava os arredores. Mas não havia ninguém lá.
- Talvez este seja o jardim deserto.
- Está muito quieto, né? Parece que eles voltaram pro castelo. – até Donald
pareceu relaxar um pouco, já que não havia nenhum Sem Coração à vista.
Sora se aproximou da mesa. Um dos pratos, mais no centro, estava repleto
de biscoitos.
- Será que é seguro comer?
- Ah, relaxa! – Donald e Pateta já estavam enchendo a boca.
- Ei, não é justo! Eu também quero! – Sora comeu um – Que doce!
Era uma doçura muito refinada, mas de algum modo parecia familiar. Sem
nem pensar, ele esticou a mão para pegar outro.
- São muito saborosos.
- É! Olha, esse aqui tem recheio de frutas!
- Esse tem chocolate!
Famintos depois de tanto correr, o trio esvaziou o prato em segundos.
- Uau. Parecia que eu não comia há dias! – disse Pateta, lambendo os dedos
depois do último biscoito. Nessa hora, a mesa virou, e um Sem Coração pulou lá
de baixo – Uou!
- Ah, de novo, não! – ainda mastigando, Donald sacou sua varinha.
- Por aqui, Donald! – Sora o puxou até uma casinha atrás do jardim. Pateta
tropeçou e quase caiu tentando chegar lá.
- Espera, o quê...?
Tinha alguma coisa estranha naquela casa. Tinha uma porta no chão, e o
fogo da lareira queimava de lado. E a cadeira estava deitada no chão.
- Nossa... Isso está me deixando tonto. – Pateta estava desorientado. Sora
tombou a cabeça.
- O que devia estar na parede está no chão, e o que devia estar no teto está
na parede...?
- Mas parece que eu já vi isso em algum lugar... – comentou Donald.
Pateta foi o primeiro a se dar conta.
- Aqui não é... não é a mesma sala em que estivemos antes?
Isso fez Sora pensar no que o Mestre Gato tinha dito.
- Cima, baixo, esquerda, direita, tudo misturado... Ah! – de repente a boca
do gato apareceu na frente dele. E nada mais que a boca. Sora deu um pulo para
trás – Ei, não assuste as pessoas assim!

59
- As sombras estão escondidas em algum lugar. E os momirratos davam
grilvos. Que tal vocês acenderem as luzes? – e o sorriso do gato flutuou até uma
lamparina no meio da sala.
- Tudo bem, deixa comigo! Fogo! – uma bola de fogo voou da varinha de
Donald e acendeu a lamparina.
- Ainda é pouca luz. – agora o rosto do Mestre Gato apareceu na frete de
Donald – Vocês precisam de muito mais.
- Tem outra lamparina ali, Donald! – apontou Sora.
- Certo, lá vai! Fogo! – outra bola de fogo acendeu a outra lamparina, e a
sala ficou mais clara.
- Logo vocês verão as sombras... Elas se erguerão nesta sala... E em outros
lugares... E elas podem ir atrás daquela maçaneta dorminhoca também... – com
isso, o gato desapareceu de novo.
- A maçaneta! – exclamaram Sora e Donald simultaneamente, já correndo
para fora da sala.
- Ei, esperem por mim!

- Nossa, essa correria de um lado pro outro está me deixando exausto... –


Pateta ofegava enquanto eles corriam pela floresta.
- Este mundo é cheio de coisas estranhas! – comentou Donald.
- Parece um mundo de maravilhas! – respondeu Sora.
- É! Que loucura! Só espero que a gente não se perca aqui e consiga achar
o rei pra podermos ir pra casa!
O que vai acontecer comigo quando o Donald e o Pateta encontrarem o rei? Será
que eu os verei de novo?
- O nosso castelo é muito mais divertido! – gabou-se Pateta – E mais bonito
e mais elegante!
Sora abriu um sorriso.
- Bom, a nossa ilha tem uma praia incrível. Dá pra nadar o ano inteiro!
Muito embora ele não soubesse se ela ainda estava lá.
Mas ele tinha prometido a Kairi que voltaria.
- Gawrsh, isso parece legal. Nós não temos praia... – Pateta parecia ter se
interessado de verdade.
- Quando eu encontrar o Riku e a Kairi, vocês deviam vir visitar a gente!
- Você pode vir ao nosso castelo também! – disse Donald – E conhecer a
rainha e a Margarida!
- É! – concordou Sora, empolgado.
Mesmo depois que eles encontrassem Riku, Kairi e o rei e ele voltasse às
Ilhas do Destino, ele não se esqueceria disso. Ele sempre se lembraria de quando

60
correu pela floresta das lótus com Donald e Pateta. Quando se deu conta disso,
Sora ficou mais animado. Eles iam encontrar as fechaduras e impedir a invasão
dos Sem Coração. Depois encontrariam todos. E, mesmo com o fim da jornada,
sua conexão com Donald e Pateta nunca desapareceria.
- Você promete, Sora? – perguntou Pateta. A resposta foi um sorriso.

Depois de retroceder todo o caminho, passando novamente pela corte da


Rainha de Copas, eles chegaram à sala da maçaneta falante.
- Ufa... Parece que não tem nenhum Sem Coração aqui. – Donald olhava
ao redor – Mas temos que ficar alertas!
Pateta começou a averiguar a sala encolhido atrás do seu escudo.
- Vocês terão uma visão melhor de cima. – Sora olhou na direção da voz e
lá estava o Mestre Gato, esticado preguiçosamente sobre a mesa.
- Acha mesmo que a gente devia confiar nesse gato, Sora? – disse Pateta,
mas era óbvio que ele achava que não.
- Para de ser medroso, Pateta! – respondeu Donald e, olhando para Sora –
Vamos?
- Sim, vamos lá!
Sora pulou na mesa. Donald o seguiu, e Pateta, um pouco a contragosto,
também. O Mestre Gato ficou de pé e apontou para o teto.
- As sombras devem estar por aqui, então... estão preparados para o pior?
- Estamos! – respondeu Sora, muito embora agora Pateta estivesse ainda
mais encolhido atrás do escudo. Vendo isso, o Mestre Gato abriu um sorriso
travesso – Bom, se não estiverem, terão problemas...
Então o gato desapareceu, e um Sem Coração enorme desceu do teto. Era
o Mestre dos Artifícios. Seus longos braços se esticavam como molas, e suas mãos
seguravam tacos. Movendo-se como numa dança, ele avançou contra o trio.
- Deve ser ele que raptou a Alice! – Sora pulou da mesa e correu para cima
do Mestre dos Artifícios. Ele balançou os longos braços, atacando com os tacos,
mas Sora se esquivou e encurtou a distância.
- Quack! Espera, Sora! – Donald correu atrás dele.
- Gawrsh, como ele é grande! Não estou gostando disso...
- Vamos! Você também, Pateta!
A contragosto, Pateta também pulou da mesa, mas o Mestre dos Artifícios
o repeliu com uma braçada.
- Iaau!
- Pateta! – Sora correu até ele.
- Ai... – um calo já se formava na testa dele.

61
- Ei! Isso é pelo Pateta! Fogo! – bolas de fogo voaram da varinha de Donald
e se chocaram contra o Mestre dos Artifícios. Mas o único efeito foi que os tacos
que ele segurava se acenderam – Quack?!
Então os tacos em chamas foram lançados em Donald.
- Quaaack! – seu chapéu pegou fogo e ele começou a correr.
- Não dá pra usar magia de fogo nele, Donald!
- Quaaack!
- Água! Precisamos de água! – exclamou Sora.
Donald correu para debaixo da torneira e a abriu. A água jorrou e apagou
o fogo no seu chapéu.
- Parece que esse também é dos fortes... – comentou Pateta ao se levantar.
- Você está bem? – Sora olhou para ele com um rosto de preocupação.
- Não muito... Mas, se não derrotarmos ele, não encontraremos a Alice, o
rei, e nem os seus amigos! E, se não selarmos as fechaduras, os Sem Coração vão
continuar a aparecer. Então vamos lá! – erguendo a voz, Pateta se atirou sobre o
Mestre das Artimanhas e finalmente acertou um golpe.
O Pateta está lutando pela Alice e pelos meus amigos também, pensou Sora. E
eu tenho que lutar para que ele e Donald possam encontrar o seu rei. Não estamos lutando
só por nós mesmos.
Sora seguiu o ataque de Pateta e, um após o outro, eles atingiram o Mestre
das Artimanhas.
- Quack! Deixem um pouco pra mim! – Donald se juntou a eles e desta vez
atacou com magia de gelo – Gelo!
Aos poucos, eles cansavam o Mestre das Artimanhas. Já estava um pouco
mais fácil desviar dos seus longos braços.
- Agora, Sora!
Com as palavras de Donald, Sora subiu na mesa outra vez e saltou para
atacar o Mestre das Artimanhas diretamente no rosto. A Espada-Chave o atingiu
em cheio, e a criatura inteira cambaleou.
- Há! Conseguimos! – Donald pulou de alegria, enquanto o Mestre das
Artimanhas caía ao chão. Então um coração emergiu do seu corpo, igual ao que
acontecera com o Armadura Reforçada.
- Fico me perguntando se isso são corações roubados...
O coração flutuava, subindo e subindo. Ele emitia um brilho lindo – era
difícil de acreditar que tinha saído de dentro de uma coisa tão terrível quanto um
Sem Coração. Quando o coração finalmente desapareceu, o corpo do Mestre das
Artimanhas se encheu de feixes de luz e se esvaiu. Tudo que restou foi o silêncio.
- Ah, é! A Alice! Onde será que ela está? – Donald começou a correr pela
sala, procurando.
- Achei que a encontraríamos quando derrotássemos os Sem Coração... –
desanimado, Sora não sabia o que fazer. Nessa hora, eles ouviram um bocejo.

62
- Quanto barulho... Uma maçaneta não pode dormir em paz por aqui? – a
maçaneta bocejou de novo e, dentro da sua boca...
- Uma fechadura! – exclamou Donald.
A Espada-Chave apontou para a maçaneta e um raio de luz voou da sua
ponta.
- Uou!
A luz se chocou contra a fechadura e, com um clique, ela desapareceu.
- Isso trancou a fechadura? – Sora se aproximou e tentou olhar dentro da
boca da maçaneta.
- Agora vão embora e me deixem dormir! – a maçaneta reclamou mais uma
vez e se recusou a abrir a boca de novo. Sora parou de insistir e se voltou para
Donald e Pateta:
- Bom, parece que trancamos a fechadura, mas a Alice não está aqui...
- Também não encontramos o rei...
- E nem os amigos do Sora.
Um pouco desmotivados, eles se entreolharam, e nessa hora o Mestre Gato
apareceu no meio deles.
- Esplêndido. Vocês são grandes heróis.
- Quack?! Você de novo? – Donald tentou agarrar o gato pelo rabo, mas
não conseguiu.
- Ora, meu caro. Me capturar não lhes ajudará de nada. Ou talvez ajude...
- Você só está falando bobagens de novo. – Pateta não parecia se importar
muito mais com o Mestre Gato.
- A propósito... – agora só a cabeça do Mestre Gato flutuava ali, olhando
alternadamente para os três – Se estão procurando a Alice, saibam que não a
encontrarão aqui.
- O que você quer dizer com isso? – Sora tentou segurar a cabeça do gato,
mas ela simplesmente flutuou para um ponto fora do seu alcance.
- Alice não está mais neste mundo.
- Como assim? Pessoas normais não podem sair do mundo delas...
- Eu não teria tanta certeza. – o resto do corpo dele se materializou, ainda
flutuando – Alice se foi com as sombras... se foi nas trevas...
E essa foi a última coisa que o gato disse antes de desaparecer de vez.
- O que significa isso? – Sora cruzou os braços. Tudo que eles fizeram foi
tentando ajudar Alice, mas agora eles não conseguiam nem imaginar onde ela
estava.
- Talvez tenha alguma coisa que a gente não saiba sobre a Alice. – disse
Donald. Pateta tentou encontrar um rumo para a situação:
- Olha, pode parecer que estamos desistindo, mas acho que o melhor que
podemos fazer agora é voltar pra Nave Gummi. Talvez a gente encontre ela em
outro mundo... Quando voltarmos ao nosso tamanho normal! – ele pulou na
mesa e pegou o frasco de rótulo vermelho.

63
- É, pode ser... – respondeu Sora, desanimado.
- Mas não com essa cara! – disse Donald – Você sabe que a Nave Gummi...
- Eu sei, ela não funciona se a gente estiver triste. – Sora abriu um sorriso
forçado.
- É, só sorrisos! Esse aí não é dos melhores, mas já é um começo.
Sora fez uma careta, pegou o frasco e bebeu. Diante dos olhos deles, ele
começou a ficar cada vez maior, até chegar ao tamanho normal.
- Nós também! – Donald e Pateta beberam e também voltaram ao normal.
- Tudo certo, então. Vamos embora.
E eles voltaram para a nave.

64
SELVA PROFUNDA
amigos

A Nave Gummi acelerou pelo céu. Sora e Pateta conversavam na cabine.


- Não encontramos nada lá...
- Está falando do rei? – indagou Sora.
- Não só do rei. Dos seus amigos também. E ainda por cima a Alice também
desapareceu... – Pateta suspirou.
- Ei, como a gente vai convencer o Sora a sorrir se você ficar desse jeito? –
gritou Donald do cockpit.
- Mas, gawrsh... Enquanto procurávamos uma pessoa, outra desapareceu!
Não dá a impressão de que andamos pra trás? Sem contar que parece que todos
os mundos estão cheios de Sem Coração, e cada um pior que o outro!
- O que será que está acontecendo de verdade? – indagou Sora numa voz
baixa, quase imperceptível.
- Boa pergunta! – disse o Grilo Falante ao saltar para fora do bolso de Sora.
- O que aconteceu no País das Maravilhas foi muito parecido com o que eu
vi no meu mundo... Mas os Sem Coração daqui eram muito mais fortes que os da
Cidade da Travessia. E eu ainda nem sei direito o que é essa Espada-Chave...
Sora apertou com mas força o cabo da espada. A ferramenta brilhante não
ofereceu nenhuma resposta, mas ao menos ele sentia que, pouco a pouco, estava
ficando mais forte. Por outro lado, parecia que os Sem Coração também estavam.
Ele nunca derrotaria esse último sem a ajuda de Donald e Pateta.
- E eu acho que eles vão continuar ficando mais fortes... – suspirou Pateta.
- Não desanimem. Pode ser difícil, mas, a cada momento, chegamos mais
perto da verdade.
- Talvez... – Sora não tinha muita certeza de que aquilo era verdade. Bem
naquele momento, em que o clima estava totalmente pesado, de repente a nave
chacoalhou.
- Opa! Ei, cuidado aí, Donald! – reclamou Pateta.
- Por que você mesmo não pilota, se acha que é tão fácil assim?!
- Eu posso pilotar! – disse Sora mais que rapidamente, agarrando o manche
sem nenhuma cerimônia.
- Quack! Sem chance! – Donald empurrou Sora para longe de novo. Nesse
momento, um mundo coberto de verde emergiu no céu. Eles puderam ver uma
enorme árvore repleta de cipós, uma cabana e uma grande cachoeira.
- O que é isso...?
Selva Profunda. O mundo era uma floresta tropical virgem, um paraíso
silvestre e intocado.

65
- Por que o rei estaria num buraco desses? É perda de tempo ir lá. – disse
Donald.
- Mas o Riku e a Kairi podem estar lá! – argumentou Sora – Vamos, Donald.
Precisamos descer!
Não era porque o rei não estava lá que eles podiam simplesmente ignorar
aquele mundo. Além do mais, ele tinha concordado em ajudar Donald e Pateta a
procurarem o rei em troca de eles o ajudarem a procurar Riku e Kairi. Ambos
tinham os mesmos direitos.
- Sem chance. Estamos numa missão importante! – e Donald acelerou a
Nave Gummi.
- Desça lá agora! – Sora tentou tomar o manche de novo. Mas Donald era
cabeça-dura demais para dar o braço a torcer.
- Não!
- Ahn, pessoal... Parem com isso... – disse Pateta.
- Isso mesmo! Nada de brigas! – o Grilo Falante tentou se interpor entre
eles, mas Sora e Donald estavam em franca batalha pelo manche. Nenhum dos
dois ia desistir.
- Vamos!
- Esquece!
- Nós vamos descer, então não enche! – Sora empurrou Donald, agarrou o
manche e girou com toda a força para baixo.
- Ei, você ficou maluco?! Qua- Quaaaack!
Donald tentou reverter a posição da Nave Gummi, mas era tarde demais.
A nave estava fora de controle, mergulhando de cabeça no mundo verde.
- Quack! – agora não havia mais nada a se fazer a não ser tentar salvar o
pouso. Donald começou a apertar botões por toda parte – Isso é tudo culpa sua,
Sora! – gritou ele e apertou um botão vermelho. O cockpit se abriu e os três foram
lançados para fora da Nave Gummi em meio a gritos.
- Aaaaaaaaah!
- Gawaaaaaah!
- Quaaaaaack!
O Grilo Falante se segurava no manche com todas as forças.
- Essa não! Pessoal! – exclamou.

Com um barulhão e muitos arranhões, Sora mergulhou nas árvores até


atravessar o teto de uma pequena casa. Por fim, chegou ao chão. Estava inteiro...
Mais ou menos.
- Ai, ai, ai... – ele se levantou, apertando o calo que se formara na cabeça –
Donald? Pateta?

66
Não se via os dois em parte alguma. Eles deviam ter se separado na queda.
Sora estava no que parecia ser uma cabana de madeira. Do lado de fora da janela,
a selva verde se estendia até onde os olhos alcançavam.
- O que eu faço agora...? – Sora emitiu um grande suspiro e, nessa hora,
sentiu uma rajada de vento ao seu lado – Hã?!
Isso o desequilibrou e, meio que por instinto, ele ergueu a Espada-Chave.
Só então ele se deu conta de que havia um leopardo dentro da cabana. O animal
claramente não era amigável. Sora deu um passo para trás e o leopardo saltou
sobre ele.
Encurralado contra uma parede, Sora se esquivou por pouco da investida.
O leopardo rugiu e se abaixou, aparentemente preparando seu próximo ataque.
Sora sentiu o suor escorrendo pelas suas costas. Ao contrário dos Sem Coração,
o leopardo emanava uma hostilidade tão feroz que era quase tangível.
Ele rugiu de novo, do fundo da garganta, e avançou. Os dentes afiados se
fecharam em volta da Espada-Chave. Usando todas as suas forças, Sora foi capaz
de empurrar o leopardo, mas, antes mesmo que pudesse respirar, a fera já estava
atacando de novo, desta vez com as garras. A Espada-Chave as interceptou mais
uma vez, e a força do choque lançou ambos para trás.
Outro ataque foi desferido e bloqueado, e outro, e outro, até que tanto Sora
quanto o leopardo começaram a se cansar. O próximo ataque seria decisivo...
Sora reuniu todas as suas forças no braço que segurava a Espada-Chave.
Mas sua mão estava suada e escorregou por um momento – e foi nessa hora que
o leopardo atacou.
Essa não!
Ele fechou os olhos, esperando pelo pior, e nessa hora um homem entrou
na cabana pulando pela janela. A mandíbula do leopardo encontrou a lança que
ele trazia nas mãos, e o homem o empurrou para trás.
- Sabor... – murmurou o homem antes de partir para o ataque. O leopardo
saltou pela janela para fugir. Sora sentiu que a pouca força que ainda lhe restava
começava a se esvair.
Foi por pouco...
Ele se esforçou para não cair ao chão. O homem se aproximou. Ele usava
um pedaço de pele de animal como tanga, aparentava não pentear o cabelo há
anos e olhava fixamente para Sora.
- Sabor, perigo.
- Sabor é o leopardo? – indagou Sora, mas o homem só tombou a cabeça,
como se não entendesse – Ahn... Obrigado.
Quando Sora fez uma mesura, o homem fez o mesmo.
- Obrigado.
- Hã? – o que Sora tinha feito para merecer um obrigado? – Ahn... Onde
eu estou?
- Estou, estou.

67
Aparentemente o homem só estava repetindo o que Sora dizia.
- Hm... Onde será que os outros estão? – Sora coçava a cabeça – Ei, eu me
perdi dos meus amigos. Você viu eles?
O homem continuava com um olhar confuso.
- A-mi-gos. – disse Sora, devagar.
- Amigos! – repetiu o homem, empolgado. Será que ele tinha entendido?
- Isso, meus amigos! São dois. O barulhento é o Dona... Não, esquece.
O olhar de incompreensão do homem se intensificou ainda mais, pois Sora
praticamente falava sozinho agora.
- Não é que o Donald e o Pateta não sejam meus amigos... Mas o Donald
só quer saber de encontrar o rei. Então eu tenho que priorizar a Kairi e o Riku
também. – e, se voltando para o homem – Eu estou procurando os meus amigos,
Riku e Kairi.
- Procurando Riku, amigos? – disse o homem – Kairi... Amigos?
- Hm... É... – o sorriso de Kairi brilhou na mente dele.
- Amigos aqui.
- Sério?! – Sora deu um pulo de alegria. O homem sorriu e disse algo que
Sora não conseguiu entender – Hã? O que você disse?
Ele repetiu o mesmo som de novo, mas era uma língua estranha, diferente
de tudo que Sora já tinha ouvido.
- Amigos aqui! – o homem gesticulava intensamente.
- Não sei se eu entendi, mas me mostre! – Sora não tinha certeza se Riku e
Kairi estavam mesmo ali, mas não podia simplesmente ignorar o que o homem
dizia – Me leve até eles!
O homem tombou um pouco a cabeça e bateu com o punho no peito.
- Tarzan. Tarzan vai.
Sora também apontou para si mesmo:
- E eu sou o Sora. Tarzan vai, Sora vai!
Tarzan assentiu, e Sora o seguiu até fora da cabana. Um verde exuberante
se espalhava por toda parte até onde a vista alcançava. Eles adentraram a selva.
Enquanto isso...

Donald acordou em cima de uma rocha numa floresta de bambu. Jamais


ele vira um lugar assim antes. Ele se levantou e olhou ao redor, admirado, até
que finalmente notou Pateta caído num canto, desmaiado. Mas não havia nem
sinal de Sora.
- Pateta!
- Hm...? – Pateta bocejou e se espreguiçou, despreocupado como sempre –
Que sono bom! Bom dia, Donald!

68
- Não me venha com essa! Olhe a situação em que estamos!
- Hã? O Sora não está aqui. Gawrsh, tomara que ele esteja bem...
- Ah, quem precisa dele? Podemos encontrar o rei sem ele! – Donald bateu
o pé e estendeu a mão para pegar sua varinha, que deveria estar ao seu lado. Mas,
ao invés dele, ele sentiu que tocou algo peludo – Quack... Quaaaaack?!
Ele olhou para o que tinha tocado, e lá estava um filhote de gorila.
Então algo se mexeu na moita atrás deles.
- Quem está aí?! – quando Donald e Pateta se viraram na direção, o filhote
de gorila saiu correndo e, na pressa, deixou algo brilhante cair.
- Ei, isso é...
- Um bloco gummi?
Os dois se entreolharam e assentiram. Se havia blocos gummi ali, então
mais alguém devia ter estado ali antes...
- Quem vai lá?! – ecoou uma voz de repente. Donald e Pateta deram um
pulo de susto. Quando se viraram, lenta e timidamente, se depararam com um
homem que segurava uma espingarda.

Sora e Tarzan estavam no meio de uma densa floresta. Tarzan avançava se


balançando em cipós, e Sora fazia tudo que podia pra tentar acompanhá-lo.
- Ei! Tarzan, devagar!
Tarzan olhou para trás e coçou a cabeça.
- Hm, a gente pode dar uma pausa? Você não entende o que eu digo, né?
- Vai, vai!
- Tá bom, tá bom... Vai... – respondeu Sora, sem fôlego, mas, nessa hora,
um Sem Coração surgiu da folhagem atrás de Tarzan – Cuidado!
Tarzan se virou rapidamente e perfurou o Sem Coração com a sua lança,
não dando sequer chance de ele concluir o ataque. Sora já tinha notado quando
Tarzan o salvou do leopardo, mas ele era forte.
- Eu também quero ajudar! – Sora se juntou a ele para lutar, e eles deram
cabo dos Sem Coração que vieram depois. Quando acabaram com todos, Sora
apoiou a Espada-Chave nos ombros para descansar – Bom, até que não foi tão
ruim!
- Não foi tão ruim. – repetiu Tarzan, sorrindo empolgado. Eles decolaram
de novo pelas árvores.
Os dois continuaram avançando pela selva até chegar a uma clareira onde
havia uma pequena tenda. Parecia que havia pessoas vivendo ali, o que fez Sora
sentir um certo alívio.
Mas e o Donald e o Pateta? Será que eles estão bem?

69
Sora se esforçou para afastar o pensamento. Mesmo sem os dois, ele ainda
podia enfrentar os Sem Coração... E, se Riku e Kairi estavam mesmo ali, não havia
mesmo necessidade de depender deles.
- Jane! – chamou Tarzan, já entrando na tenda. Sora o seguiu. Lá dentro,
uma moça bonita mexia em algum tipo de máquina.
- Tarzan! – exclamou ela ao vê-lo. Nessa hora, notou a presença de Sora –
Quem é esse?
- Ah, oi. Eu sou o...
- Nossa, você me entende! – ela parecia bastante surpresa – Então não deve
ser da família do Tarzan...
- Eu sou o Sora.
- E o meu nome é Jane. Você também veio estudar os gorilas?
Antes que ele pudesse responder, um homem carregando uma espingarda
entrou na tenda.
- Duvido muito.
Atrás do homem robusto, Sora conseguiu ver Donald e Pateta.
- Sora?! – os dois correram empolgados na direção dele.
- Puxa, achamos que nunca mais veríamos você de novo! – disse Pateta.
Sora também correu até eles, mas aí se lembrou da briga na Nave Gummi
e se recusou a falar com Donald.
- Estava preocupado com você, Pateta!
- Nós também estávamos preocupados! Né, Donald? – mas Donald, sendo
um cabeça-dura, não respondeu e olhou na direção oposta.
- Bom, pelo menos estamos todos juntos agora! – e o Grilo Falante surgiu
saltando de trás de Jane.
- Grilo Falante! – os três correram até ele.
- Achei que estava tudo perdido quando nós caímos da Nave Gummi, mas
parece que deu tudo certo.
- Quack! Onde está a Nave Gummi? – indagou Donald, já agitado. O Grilo
Falante sorriu.
- Calma, está escondida atrás da tenda.
- Que alívio! – Donald respirou fundo.
- Ah, então vocês são todos amigos. – disse Jane. O homem da espingarda
cruzou os braços.
- Um circo de palhaços. Não servem pra caçar gorilas.
- Estamos aqui pra estudá-los, senhor Clayton, não caçá-los. – disse Jane –
Isto é uma pesquisa!
Sem dar qualquer indício de que a tinha escutado, Clayton deu meia-volta
e saiu da tenda.
- Ahn... Eu sou a Jane. Nós viemos aqui pra selva pra estudar os gorilas. E
aquele é o Clayton. Ele é caçador, mas no momento está trabalhando como nosso
guia aqui na floresta. E vocês são...?

70
- Eu sou o Pato Donald. Esse é o Pateta e aquele é o Grilo Falante. Estamos
procurando o nosso rei.
- Um rei? Nossa! Você também é amigo do rei, Sora?
Donald e Sora se entreolharam, e ambos fecharam a cara, irritados.
- Bom, quanto mais gente ajudando, melhor, não? – disse Jane, tentando
apaziguar o clima entre eles – Sintam-se em casa.
- Só que o Donald não tem nada pra fazer aqui, né? – cutucou Sora.
- Na verdade, tenho sim!
- Hã?
Pateta mostrou um pequeno bloco brilhante a Sora.
- Veja, é um bloco gummi. Encontramos aqui.
- Ou seja, o rei pode estar em algum lugar por aqui. – disse Donald – Então
nós vamos ter que trabalhar juntos pra procurar por ele. Por enquanto.
- Então tá. Vou deixar vocês me ajudarem. Por enquanto. – revidou Sora.
Jane se aproximou e se dirigiu a ele:
- Você também está procurando alguém, Sora?
- Estou procurando os meus amigos. O Tarzan disse que eles... que o Riku
e a Kairi estariam aqui... Mas eu não consigo me comunicar com ele direito... –
Sora balançou a cabeça, desanimado. Se ele entendesse o que Tarzan dizia, talvez
conseguisse mais pistas sobre Kairi e Riku.
- O Tarzan foi criado pelos gorilas desta selva. – disse Jane – Ele ainda não
entende muito bem a nossa língua, então às vezes é difícil falar com ele. Mas nós
podemos tentar. Certo, Tarzan?
Ao lado dela, Tarzan coçou a cabeça.
- Onde a Kairi e o Riku estão? – perguntou Sora.
- E o rei! – adicionou Donald.
Tarzan só tombou a cabeça para o lado, sem entender.
- Nossos amigos estão aqui, certo?
- Amigos... aqui.
- Então diga onde! – Sora estava quase implorando. Mas quem respondeu
foi outra pessoa.
- Só tem um lugar onde eles podem estar.
- Clayton! – Sora se virou na direção da voz. O caçador praticamente tinha
se esgueirado de volta à tenda, sem que ninguém percebesse.
- Meu rapaz, faz tempo que nós estamos nesta floresta. – disse Clayton –
Já estávamos aqui muito antes de vocês chegarem. Mas nunca vimos esses seus
amigos. Posso apostar que eles estão com os gorilas. Mas o Tarzan se recusa a nos
levar até eles.
- Por favor, senhor Clayton. – começou Jane – O Tarzan não esconderia...
Ele a interrompeu e começou a intimidar Tarzan:
- Então nos leve lá! Nos leve até os gorilas! Go-ri-las!
Tarzan olhou para Sora.

71
- Tarzan...
Tarzan sorriu e fez que sim para Clayton.
- Tarzan, você tem certeza? – preocupou-se Jane.
- Tarzan vai ver Kerchak. – disse ele.
- Kerchak?
- Esse deve ser o líder. – disse Clayton – Perfeito. Eu os acompanharei, na
condição de guarda-costas. A selva é um lugar perigoso, afinal. – e sorriu.
- Gawrsh, esse cara me passa uma sensação ruim. – cochichou Pateta a Sora.
- Bom, eu vou ficar aqui cuidando da Nave Gummi. – disse o Grilo Falante
– Até mais!
Os três assentiram e saíram da tenda.

- Tudo bem mesmo, Tarzan? – perguntou Sora enquanto eles caminhavam


pela floresta.
- Ir ver amigos. – respondeu ele com um sorriso, tomando a dianteira.
- Ele entendeu o que eu disse?
- Quack! – Donald deu um pulo para trás. Um Sem Coração apareceu bem
na frente deles, como Sora temia.
- Vocês não precisam fazer nada! – exclamou ele, já erguendo a Espada-
Chave – Eu e o Tarzan damos conta deles!
Se eles começassem a lutar, Tarzan notaria a comoção e voltaria, e assim
os Sem Coração ficariam encurralados entre eles.
- Quack?! Está querendo dizer que não precisa da minha magia?!
- Foi isso que eu disse, não foi? – respondeu Sora, começando a atacar.
- Quack?! – exclamou Donald, balançando sua varinha – Então não somos
mais um por todos e todos por um!
- Ai, parem com isso, pessoal... – disse Pateta, mas os dois continuaram a
enfrentar os Sem Coração sem olhar um na cara do outro. Finalmente, depois de
derrotar todos, eles pararam para respirar. E mais Sem Coração pularam das
moitas e foram direto para cima de Donald.
- Cuidado, Donald! – exclamou Sora.
Gritando algo que eles não entenderam, Tarzan veio ao resgate no último
segundo.
- Qua-aaaak! – assustado, Donald tinha caído de bunda no chão.
Sora suspirou aliviado, mas, quando abriu a boca, foi em tom agressivo:
- Eu disse que a gente dava conta deles!
- Quack! – Donald se colocou de pé e retrucou – Não subestime o mago da
corte!

72
- Não me importa o que você é! Não preciso dessa sua magia idiota pra
enfrentar os Sem Coração!
Donald deu uma rosnada e saiu andando.
- Ai, ai... – suspirou Pateta, chateado.
Tarzan olhou para ele com preocupação.
- Sora, Donald, amigos? Não amigos?
- Gawrsh, eu não sei... – Pateta olhava preocupado para Donald e Sora, que
ainda não admitiam fazer as pazes.

Abrindo caminho por entre as grandes árvores, eles enfim chegaram a


uma parede rochosa, uma pequena fissura na paisagem verde. Numa árvore
particularmente enorme, havia dois gorilas sentados. O maior só podia ser
Kerchak.
Tarzan começou a falar na língua dos gorilas. O que estava ao lado de
Kerchak olhou para ele com uma expressão de preocupação.
- Ahn... Vocês entenderam isso? – cochichou Pateta. Donald balançou a
cabeça em negação.
- Kerchak! – chamou Tarzan de novo. Mas Kerchak se levantou de repente
e começou a se afastar – Kerchak!?
Não houve resposta. Kerchak subiu numa árvore, saltou e sumiu na selva.
O outro gorila olhou para Tarzan mais uma vez antes de segui-lo. Tarzan deu um
suspiro desanimado.
Sora chegou perto dele.
- Ei, não se preocupe com a gente. É que... – algo o incomodou quando viu
a direção na qual os gorilas foram – Estou com um mau pressentimento. Vamos...
E começaram a retornar à cabana na árvore.

- Eles não entendem qual é o verdadeiro valor dos gorilas. – murmurou


Clayton, agachado numa moita e com a espingarda preparada. Dentro da cabana
na árvore, um pequeno gorila brincava com uma bola – Um filhote vale mais que
um adulto...
Ele mirou no pequeno gorila. E então... o Pato Donald apareceu na mira.
- Qua-aaaak! – gritou Donald ao ver o cano da arma.
Mordendo os lábios de raiva, Clayton puxou o gatilho. Mas sua mira se
desviou um pouco, e o que foi atingido acabou sendo o chapéu de Donald. O
gorila filhote fugiu.
- Ei, que ideia é essa?! – berrou Donald para Clayton.

73
Nessa hora, Kerchak apareceu na cabana. Tarzan o chamou, mas, de novo,
ele não respondeu e rapidamente foi embora. Tarzan não sabia mais o que fazer.
Enquanto isso, Sora, Donald e Pateta estavam diante de Clayton, de cara muito
fechada, esperando uma explicação.
- Vocês não entendem. Eu só estava tentando... Ah, tinha uma cobra na
cabana! Eu salvei a vida daquele gorila!
Ao ouvir a tentativa de justificativa de Clayton, Tarzan só fechou os olhos
e balançou a cabeça em desaprovação. Eles decidiram voltar ao acampamento
por ora, onde Jane deu uma bronca em Clayton:
- Como você pôde fazer isso, senhor Clayton?
- Mas, senhora Porter, eu já disse... Eu não estava mirando no gorila.
- Não se atreva a chegar perto deles de novo!
- Tudo isso por causa de um pequeno equívoco? Ora, por favor... – Clayton
tentou protestar, mas ninguém estava disposto a aceitar suas desculpas – Tudo
bem, tudo bem então... – ele se resignou, a contragosto, e saiu da tenda.
- Que horror... Sinceramente, eu não sei mais o que fazer com ele. – disse
Jane – Me desculpem por isso.
- Não precisa se desculpar. – respondeu Sora. Jane continuava cabisbaixa:
- Mas... fui eu que pedi pra ele vir conosco como guia...
Ouviu-se um barulho de tiro.
- Ah, não...! – Sora, Tarzan e os outros correram imediatamente para fora
da tenda.
- São Sem Coração!
Havia um gorila cercado por eles.
- Então de onde veio aquele tiro?
- Vamos ajudar o gorila primeiro!
Sora e Tarzan trocaram um olhar e partiram para o ataque.
- Tarzan, fique na tenda protegendo a Jane! Pateta, você ajuda o gorila! E,
Donald... – Sora estava prestes a emitir um comando para ele, mas não soube o
que dizer e acabou engasgando.
- Quack! Nós não somos amigos mesmo!
- Ah, não é hora pra isso! – exclamou Pateta, que tentava chegar ao gorila.
Tarzan já estava trucidando os Sem Coração do seu lado com sua lança.
- É! Vamos logo, temos que acabar com esses Sem Coração! – Sora entrou
na luta. Donald pareceu ficar um pouco confuso, mas ergueu a varinha e
começou a atacar com magia.
- Os Sem Coração estão indo atrás de outro gorila ali! – avisou Pateta, que
tentava ajudar o primeiro a escapar para a floresta.
- Vocês cuidam desses aqui! – deixando o resto daquele grupo para Tarzan
e Donald, Sora correu para ajudar Pateta.
- Talvez aquele tiro que ouvimos tenha sido mesmo o Clayton tentando
ajudar os gorilas. – disse Pateta.

74
- Eu gostaria de acreditar nisso... – Sora simplesmente não era tão otimista
quanto Pateta. Não havia nenhum indício de que os Sem Coração tentaram atacar
aquele gorila antes, então... – Opa! – enquanto ele pensava, um Sem Coração
acertou Sora com toda a sua força, jogando-o de costas no chão. E ele estava vindo
na sua direção de novo.
Ele não tinha como se proteger.
- Trovão! – do outro lado da lareira, ele ouviu a voz que conjurara a magia.
A voz de Donald – Você me deve uma! Quack! – exclamou Donald, mas, dando-
se conta de que deveria estar brigado com Sora, fechou a cara rapidamente.
- Não quero nenhum favor seu!
- Quaaack!? – Donald estava prestes a começar outra briga, mas nessa hora
uma figura veio correndo até ele – Hã? Ah, é você.
Era o filhote de gorila. Tremendo de medo, ele se agarrou em Donald.
- Olha, eu não vou conseguir lutar com você aí assim...
Pateta correu até eles.
- Ei, que tal se ele se esconder na tenda?
- Isso! – Donald pegou o pequeno gorila e correu até a tenda. Nesse meio
tempo, Tarzan viu o outro gorila sob ataque dos Sem Coração. Ele disse algo na
língua dos gorilas e começou a correr. Sora e Pateta continuaram lutando, e
também Donald, que já estava de volta depois de deixar o gorila com Jane.
Os quatro, cada um a seu modo, tentavam ajudar os gorilas que estavam
sendo atacados pelos Sem Coração. Mas, mesmo tendo um inimigo comum, Sora
e Donald continuavam se estranhando.
- Ah, por que vocês não fazem as pazes logo? – pediu Pateta sem muita
esperança, mas nada surtia efeito naquela dupla de cabeças-duras. Depois de um
bom tempo de luta, em que eles praticamente varreram a área ao redor para dar
cabo dos Sem Coração, se reuniram de novo em frente à tenda. Como parecia que
estava tudo calmo agora, eles finalmente conseguiram parar para recuperar o
fôlego. Mas Tarzan ainda estava apreensivo, olhando ao redor ansioso.
- Será que a Jane e aquele gorila estão bem? – Donald levantou o tecido da
tenda – Jane!
Não houve resposta. Preocupados, todos correram para lá.
- Não tem ninguém aqui.
Eles até procuraram, mas não havia onde esconder ali. Jane e o pequeno
gorila não estavam em lugar algum. Tarzan olhava sério para cima, sem dizer
nada.
- O que foi, Tarzan? – perguntou Sora.
- Cheiro estranho... Jane, perigo. Jane perto... perto casa árvore!
- Vamos pra lá!
Eles saíram da tenda e correram para a casa da árvore.

75
Quando chegaram à enorme árvore que abrigava a cabana, eles ouviram a
voz de Jane:
- Tarzan!
A porta da casa estava escancarada. Jane e o filhote de gorila colocaram a
cabeça para fora para espiar.
- Jane! – exclamou Tarzan.
- O que está acontecendo? – indagou Sora.
- O senhor Clayton apareceu na tenda e... é a última coisa que eu lembro.
Ouviu-se então um barulho de tiro atrás deles.
- Clayton!
Sora e os outros se viraram, e lá estava Clayton, com a arma empunhada.
- Não Clayton! – assustou-se Tarzan, em seguida dizendo algo na língua
dos gorilas – Não Clayton!
E, como que esperando por isso, Clayton emitiu um rugido horrível que
nem parecia humano.
- Aquele... não é o Clayton?
Foi então que aconteceu – algo saiu da moita atrás de Clayton. Seus passos
pesados faziam o chão da floresta tremer. E estava chegando mais perto. No meio
tempo em que eles pararam para tentar ver o que era, Clayton sumiu.
- Aonde ele foi?!
- Ali está ele! – Pateta apontou para o alto. Clayton estava sentado no ar,
como que possuído por alguma coisa.
- Ele está voando?
- Não, só está sentado em algo que não podemos ver...
O que estava diante deles era um Sem Coração, o Espião Sorrateiro, mas
eles não faziam ideia de como enfrentá-lo. Algo invisível jogou Tarzan longe.
- Tarzan!
Sora, Donald e Pateta tentaram ir até ele para ajudar, mas uma sombra
marrom-escuro se interpôs no caminho. Parecia até que tinha surgido apenas
para proteger o rapaz ferido. E, de fato...
- Kerchak! – exclamou Sora. O gorila imenso rugiu e balançou seus fortes
punhos no ar. Ele conseguiu acertar a coisa invisível, e as partes atingidas ficaram
verdes por um breve momento.
- É ali! – Sora correu e atacou com a Espada-Chave no lugar onde Kerchak
havia acertado. Quando ele causava algum dano, uma pele reptiliana gosmenta
ficava visível. Atrás dele, Kerchak pegou Tarzan e pulou na cabana da árvore.
- Tarzan! – vendo-o ferido, Jane o envolveu nos braços.
- Agora podemos lutar sem preocupação! – disse Donald.

76
- Pois fique sabendo que eu consigo acabar com ele sozinho! – respondeu
Sora, manuseando a Espada-Chave. Donald bateu o pé de novo.
- Quack!?
Pateta tentou intervir, mas o Espião Sorrateiro avançou sobre eles, como
se estivesse só esperando uma chance.
- Ah!
Os três foram lançados ao chão. Irritado, Sora se levantou e começou a
atacar os pés do Espião Sorrateiro, mas ele o chutou de novo sem dificuldade.
- Ei, Donald... – disse Pateta.
- Não!
- Você é um caso perdido! – Pateta deixou Donald de lado e foi ajudar Sora.
Graças as ataques imprudentes do garoto, o Espião Sorrateiro estava, pouco a
pouco, revelando a sua forma, que se parecia com um camaleão gigante.
- Ah! – Sora foi derrubado de novo.
- Ei, você está bem? – Pateta correu até ele e lhe deu uma poção. Sora logo
se colocou de pé de novo. Donald observava tudo de longe.
- Hunf! Eles que se virem!
Sora saltou outra vez, tentando atacar o Espião Sorrateiro pelo alto, mas
foi interceptado por um movimento da cauda dele.
- Ninguém consegue fazer nada sem mim! Fogo! – uma bola de fogo voou
da varinha de Donald, muito maior do que as de sempre. O Espião Sorrateiro foi
pego de surpresa e perdeu o equilíbrio.
- Donald!
- Vim ajudar os inúteis!
Sora fechou a cara ao ouvir o comentário de Donald, mas agora não era
hora de brigar.
- Lá vem ele de novo!
O Espião Sorrateiro avançava direto na direção deles com a boca aberta.
Sora mirou num dos seus pés e acertou um golpe, fazendo-o parar, e Donald
lançou magia na bocarra escancarada. O impacto fez Clayton cair da cabeça dele.
- Agora! – Sora pulou e desferiu um ataque poderoso na cabeça da criatura,
que desabou – Conseguimos!
Ele abraçou Donald e Pateta, mas aí se lembrou de que não deveria estar
compartilhando qualquer alegria com Donald e se afastou.
O Espião Sorrateiro começou a reluzir e enfim desapareceu, com Clayton
mergulhando no chão. O caçador atordoado tentou se levantar, sem nunca soltar
a espingarda, mas o esforço foi grande demais e ele tombou novamente.
- Sora... – disse Tarzan, que se aproximava apoiado em Jane. Vários gorilas
saíram dos seus esconderijos nas árvores e começaram a comemorar, agitados.
- He... – Sora sorriu, um pouco encabulado. De repente, algo o levantou –
Opa! Ei, Kerchak, me coloca no chão!

77
Apesar dos protestos, Kerchak não deu ouvidos e o lançou ao ar, seguido
de Donald e Pateta. Os outros gorilas se juntaram a ele para a homenagem,
pegando os três e jogando de volta para cima repetidamente.
- Uoooou! – gritou Sora, mas os gorilas continuaram o movimento.
Em dado momento, Kerchak os arremessou com mais força. Sora se sentiu
praticamente voando, e foi parar num outro ponto da floresta, no alto de uma
pequena elevação. Não demorou muito para Donald cair de bunda em cima dele,
e depois Pateta, de cabeça. Parecia um déjà vu da vez em que se conheceram.
- Dá pra sair de cima?
- Quack! – exclamou Donald, e ele e Pateta desmontaram do pobre Sora.
- O que deu neles...? – Sora limpou a poeira da roupa e se levantou. Havia
ali um som quase ensurdecedor de água corrente. Quando ele olhou para cima,
viu uma cachoeira enorme.
- Uau... Olha aquilo... – disse Pateta, deslumbrado.
- Só pra deixar bem claro... Não é porque lutamos juntos antes que somos
amigos! – começou Sora.
- Você tirou as palavras da minha boca! – revidou Donald.
Nessa hora, Tarzan apareceu, ainda apoiado em Jane.
- Tarzan! Você está bem?
- Bem. Tarzan casa. – com o braço que não estava ferido, ele apontou para
a cachoeira.
- Sua casa?
Tarzan pulou numa caverna no alto da parede de rochas. Sora e os outros
fizeram o que puderam para ir atrás.
- Uau... Isso é incrível! – Pateta continuava maravilhado com tudo.
- Acho que estamos atrás da cachoeira. – cochichou Donald para ele. Havia
filetes de água escorrendo pela caverna, e pedras se amontoavam de um jeito que
formava meio que uma escada natural. Tarzan continuou a subir, segurando Jane
com o braço ileso.
- Tarzan, devagar! – Sora, Donald e Pateta não tinham a desenvoltura dele
para aquilo. Finalmente eles chegaram a um tronco de árvore tão imenso que,
mesmo se os três dessem as mãos, não conseguiriam fechar um círculo em volta
dele.
- Uau... – eles estavam sem palavras diante da árvore, que parecia se
estender até o céu.
Tarzan disse algo na língua dos gorilas. Sora reconheceu como a palavra
que ele dissera na primeira vez em que se viram.
- Aqui...?
Tarzan fez um gesto para que Sora fizesse silêncio, levou uma mão até o
ouvido, fazendo uma concha, e fechou os olhos. Era possível ouvir o barulho da
cachoeira ao longe. Ele ecoava pela caverna, numa espécie de melodia misteriosa.
Jane olhou para Tarzan e repetiu a palavra que ele tinha dito:

78
79
- Significa “coração”, não é?
- Você entende ele?
- Acho que sim... Amigos... vivem dentro dos nossos corações...
- Coração. – repetiu Tarzan com um sorriso.
- Ah... Então eles não estão aqui de verdade... – disse Sora, desanimado.
- Amigos, mesmo coração. Clayton, perdeu coração. Sem coração, não vê
amigos. Sem coração... sem amigos. – Tarzan estava se esforçando ao máximo
para dizer algo importante a eles sobre amizade.
- Sora...
- Donald...
Ambos disseram o nome um do outro quase ao mesmo tempo.
- Você primeiro, Donald!
- Não, você!
- Ah, vocês não tem jeito mesmo... – as palavras de Pateta pareciam uma
bronca, mas vieram acompanhadas de um sorriso. Sora decidiu dar o braço a
torcer:
- Me desculpe pelo que eu disse.
- Eu também peço desculpas. – Donald parecia um pouco encabulado.
- É isso aí! Amigos fazem assim! Um por todos e todos por um! – Pateta
correu para abraçar os dois. Foi então que uma luz azul brilhou sobre eles.
- Que luz é essa?
Eles olharam para cima e, no meio do tronco, havia uma aglomeração de
borboletas azuis, cujas asas reluziam, refletindo a luz. Examinando-as de perto,
Donald viu que elas se reuniam em volta de algo, quase como se para protegê-lo:
uma fechadura. Sora ergueu a Espada-Chave e um raio de luz brilhante e fugaz
se lançou na fechadura. Um clique foi ouvido, e algo caiu lá de cima.
- Um bloco gummi! – Pateta o pegou assim que chegou ao chão. O objeto
diminuto brilhava forte.
- Mas com certeza não é do rei... – disse Donald, desmotivado. O filhote de
gorila de antes veio até ele e o abraçou.
- Ora, parece que alguém tem um novo admirador. – brincou Jane. Donald
começou a gesticular intensamente:
- Não, não, não! A Margarida me mata! – ele tentou fugir, mas o gorila foi
atrás. Sora quase caiu no chão de tanto rir. A gargalhada foi interrompida quando
Tarzan chamou seu nome:
- Sora, Tarzan, amigos. – disse ele, sorrindo.
- Tarzan, Sora, amigos!
Uma luz iluminou os dois. A luz do sol atravessando as folhas, a luz das
borboletas, ou ambos.
Amigos.
Corações.
Tarzan.

80
Donald e Pateta.
Kairi e Riku.
Todos eles eram amigos queridos... E não havia nada mais importante que
amigos.
- Donald, Pateta... Vamos! – disse Sora aos seus amigos. Os três começaram
a caminhar de volta à tenda onde o Grilo Falante esperava.
E deixaram a Selva Profunda para trás.

81
FRAGMENTO
conversa secreta

As sombras se reuniram em volta de um pedestal de pedra. No meio dele


havia uma esfera de luz, que mostrava uma visão de Sora, Donald e Pateta.
- Aquele merdinha derrotou outro Sem Coração! Que petulante! Quantos
já foram agora, três?
- E ele está acompanhado dos lacaios do rei. Criaturas nojentas! Só de olhar
pra elas, sinto uma náusea!
- Você causa isso em mim.
- Cale-se!
O homem de capa negra, que segurava um cetro em formato de cobra, e o
homem de chapéu vermelho que tinha um pedaço de metal curvado no lugar da
mão – Jafar e Gancho – começaram a brigar. Uma terceira e arrepiante voz os
interrompeu:
- Chega. – era Malévola, envolta numa capa mais sombria que as próprias
sombras – Aquele poder pertence à Espada-Chave. A força do garoto não é dele.
– ela caminhou até a esfera de luz no pedestal e parou para observá-la.
- Por que não o transformamos num Sem Coração? Isso resolveria as coisas
rapidinho! – disse Gancho, abrindo um sorriso cruel. Voltando-se para ele com
um movimento elegante que balançou sua capa, Malévola também sorriu:
- A Espada-Chave o escolheu. Ele será capaz de conquistar as trevas? Ou
as trevas o engolirão primeiro? Seja como for, ele pode ser muito útil.
As figuras sombrias olharam mais de perto a imagem de Sora.
- Mudando de assunto, o que será que atraiu os Sem Coração a uma selva
como aquela? – ponderou Gancho. Malévola respondeu sem tirar os olhos da
esfera de luz:
- O caçador os atraiu. Sua sede de poder se tornou uma isca.
- Um tolo de coração fraco como ele nunca conseguiria controlar os Sem
Coração. – disse Jafar, erguendo o cetro de cabeça de serpente e se aproximando
de Malévola – Mas o garoto é um problema. Ele tem encontrado as fechaduras.
- Ele levará anos para encontrar todas. – respondeu Malévola, ainda com
o olhar fixo em Sora, Donald e Pateta na esfera de luz – Além do mais, ele sequer
faz ideia de qual é o nosso verdadeiro plano.
- As princesas... – disse Gancho, cruzando os braços.
- Sim. Uma a uma, elas estão caindo em nossas mãos. E, falando nisso... –
Malévola apontou na direção da sua mais nova prisioneira, que havia sumido no
País das Maravilhas: Alice.

82
CIDADE DA TRAVESSIA
reencontro

Sora observava enquanto a Selva Profunda desaparecia ao longe. Parecia


que fazia anos que ele deixara as Ilhas do Destino. Ele havia conhecido muitas
pessoas e dito adeus a algumas delas também. Mas ainda não tinha nenhuma
pista nem de Riku, nem de Kairi. Eles têm que estar por aí, em algum lugar, pensou
Sora, ainda vislumbrando o céu. As estrelas reluziam de um jeito tão bonito. Ele
queria que Kairi e Riku vissem isso também. Não... Ele queria ver isso com eles.
- Ei... Esse bloco gummi é meio esquisito... – segurando o bloco que eles
tinham encontrado na fechadura da Selva Profunda, Pateta coçava a cabeça. Sora
saiu de perto da janela do cockpit e olhou para a coisa na mão de Pateta:
- O que tem de esquisito nele?
- Não sei... Só não parece um bloco gummi normal... – respondeu Pateta,
levantando-o contra a luz.
- Eu também nunca vi um assim. – disse o Grilo Falante, pulando na mão
de Pateta.
- Como assim? – insistiu Sora.
- Hm... Parece que tem algo dentro dele.
- Onde? – Sora olhou mais perto e, graças ao reflexo da luz, conseguiu ver
algo lá dentro que se assemelhava a uma pequena estrela. O que poderia ser?
- Talvez o Leon possa ajudar. – disse Donald do cockpit.
- É... Talvez... Será que a gente devia voltar pra Cidade da Travessia? –
disse Pateta.
- Eu quero pilotar! – Sora tentou tomar o lugar de Donald na cadeira do
piloto.
- Ei, para!
E a velha batalha começou de novo.
- Ei, você devia me respeitar mais! Eu sou o mestre da Espada-Chave!
- Não me importa quem você é! Não é não!
Vendo os dois brigarem, Pateta e o Grilo Falante preferiram sorrir.

Na segunda visita deles à Cidade da Travessia, o céu noturno estava calmo


e convidativo.
- Parece que não tem nenhum Sem Coração no Primeiro Distrito... – disse
Donald, olhando ao redor – Ah, olha ali a Yuffie!

83
Ela estava perto do correio na praça do Primeiro Distrito. Eles correram
até ela.
- Ah, Sora, Donald, Pateta! – Yuffie os cumprimentou com um sorriso –
Bem-vindos de volta!
- Que bom te ver! – responderam Donald e Pateta, mas Sora não conseguiu
dizer nada. Yuffie pareceu não se incomodar com a quietude dele e continuou
falando:
- Como têm sido as suas aventuras?
Pouco a pouco, um interrompendo o outro, os três contaram sobre Alice e
sobre o que tinha acontecido na Selva Profunda.
- Puxa, eu queria ter estado lá também... Que pena que não encontraram
pistas sobre os seus amigos, Sora. – Yuffie ofereceu um olhar de compaixão a ele,
quase como se fosse uma irmã mais velha.
- Está tudo bem! Eu nunca vou desistir de encontrar o Riku e a Kairi!
- E o rei! – adicionou Pateta.
- Mas, Yuffie... – disse Sora – Na verdade, nós voltamos aqui pra perguntar
uma coisa pro Leon.
- Ele deve estar treinando na caverna subterrânea agora.
- Caverna subterrânea?
Sora tinha andado bastante pela cidade, mas não se lembrava de ter visto
nada parecido com isso. Pensando bem, eles ainda não tinham encontrado a
fechadura da Cidade da Travessia, então ainda devia haver muitas coisas que
eles não conheciam na cidade.
- Sabe aquele canal que tem no beco? – explicou Yuffie – Ele leva à caverna.
- O beco atrás do hotel? – indagou Donald.
- Isso! Dá pra ir ao subsolo por lá. Vocês não sabiam?
Os três trocaram olhares. Eles teriam que ir investigar.
- Não, mas já vamos remediar isso. Até mais!
- Cuidado com os Sem Coração do Segundo Distrito!
- Obrigado!

Assim que eles cruzaram o portão para o Segundo Distrito, Sem Coração
brotaram do chão.
- Quack?! – Donald deu um pulo de susto.
- Gawrsh, o Primeiro Distrito estava tão quieto que eu estava duvidando
que teria mesmo algum Sem Coração por aqui...
Pateta logo partiu ao ataque contra o Sem Coração que assustara Donald.
- E parece que eles estão mais fortes que antes!

84
Sora atacou no último segundo um Sem Coração que se aproximava por
trás. Sem dúvida, eles estavam mais fortes. Havia Sem Coração que atacavam
girando como um tornado e Sem Coração que usavam magias mais poderosas
que antes.
- Será que isso significa que as trevas estão ficando mais fortes...?
Eles se refugiaram no hotel.
- Ufa... Acho que aqui eles não vão entrar. – disse Pateta, recuperando o
fôlego.
- Da última vez que estivemos aqui, eles não fizeram nenhuma cerimônia!
– Donald entrou num dos quartos de hóspedes. Era o que tinha papel de parede
verde, onde Sora e Leon conversaram antes.
- Talvez se a gente ficar em outro quarto... – Sora abriu a porta do quarto
ao lado.
- Você ficou nesse verde? – perguntou Pateta, espiando os dois.
- Eu estava conversando com o Leon aqui, pouco antes de conhecer vocês.
- E nós estávamos conversando com a Aerith naquele quarto. Aí a Yuffie
apareceu, e os Sem Coração atacaram...
Eles se entreolharam.
- Então quer dizer que nós estávamos todos aqui ao mesmo tempo, mas
em quartos diferentes? – disse Sora.
- É o que parece...
Eles começaram a rir.
- Quando vocês caíram em cima de mim do nada, eu achei que fossem Sem
Coração!
- A gente não sabia que você estava lá baixo. Né, Donald?
- A maior surpresa foi descobrir que a gente caiu bem em cima da Espada-
Chave!
Logo eles estavam falando sobre o incidente como se tivesse acontecido há
muito tempo, e não poucos dias atrás.
- E agora estamos numa jornada juntos! – concluiu Pateta, orgulhoso.
- É, e não temos tempo pra ficar parados falando sobre isso. – disse Donald
– Vamos!
Eles saíram pela sacada e pularam no beco.

No beco mal iluminado, por mais que eles derrotassem um Sem Coração
atrás do outro, mais continuavam a brotar do chão, como sempre.
- Eles não desistem! – exclamou Donald, disparando sua magia de fogo.

85
- Pateta, achou a passagem do canal? – indagou Sora. Ele enfrentava os
inimigos com Donald, enquanto Pateta tinha sido encarregado de procurar o tal
caminho que levava ao subsolo.
- Não... Mas o único lugar que falta é atrás dessa grade...
O canal passava por uma grande num canto. Pateta tentou balançá-la, mas
era muito firme. Quando conseguiram uma trégua na luta, Sora e Donald foram
até ele.
- Então é aqui?
- Provavelmente...
Sora espiou pela grade, mas do outro lado a escuridão era total.
- Quack! Já apareceram mais! – um enxame de Sem Coração se aproximava
de Donald.
- Talvez, se nós três batermos com toda a força, ela quebre? – disse Pateta.
Eles se entreolharam...
- No três. Um, dois... três!
Pegando impulso, os três correram com tudo e se jogaram contra a grade,
e ela acabou caindo mais fácil que o esperado. A força aplicada por eles e a pouca
resistência do objeto fizeram com que eles perdessem o equilíbrio e caíssem na
água.
- Uooou! – um grande splash ecoou na passagem subterrânea. Parecia que
os Sem Coração não tinham ido atrás deles.
- Puxa, está muito escuro aqui. – Pateta ajudou Donald a se levantar, e eles
começaram a seguir o caminho da água.
- Mas parece que leva mesmo a algum lugar...
Eles continuaram avançando e, de repente, abriu-se um espaço onde já era
possível enxergar.
- Uau...
Era uma grande caverna e, numa reduzida parte de terra seca no meio, se
encontrava Leon, manuseando silenciosamente sua Gunblade.
- Leooooon! – Donald começou a nadar pela água rasa para chegar até ele.
Leon devia ter notado a presença dos três, mas continuou a praticar. Aerith estava
com ele – Aerith!
- Sora, Donald, Pateta! Bem-vindos de volta. – disse ela, sorrindo, quando
eles chegaram à ilha.
- Ei, Aerith...
- Sim?
- A Yuffie também disse “bem-vindos de volta” pra gente... Isso não é meio
estranho? – Sora se sentiu um pouco desconfortável quando Yuffie disse essas
palavras, mas não falou nada. Desta vez, ele decidiu colocar para fora.
- Por quê?
- Bem... É que... eu não sou daqui... – Sora olhava para baixo.
Aerith pareceu ficar um pouco triste.

86
- A Cidade da Travessia é um lugar para onde as pessoas vêm quando não
têm mais um lugar para chamar de lar. – disse Leon, ainda brandindo sua espada
– Então, aqui, as pessoas recebem umas às outras como se fosse o lar delas. Isso
porque nenhum de nós tem um lar de verdade.
- Ah... Ah, entendi... Obrigado... É bom ver vocês de novo.
- Bem-vindo de volta, Sora. – disse Aerith mais uma vez, carinhosamente.
Leon finalmente interrompeu seu treinamento:
- E então, encontraram alguma coisa?
- Bom, não sei se isso conta...
Eles relataram a Leon e Aerith a mesma história que contaram a Yuffie,
sobre Alice e a Selva Profunda.
- Então vocês trancaram duas fechaduras... – Leon cruzou os braços para
pensar. Aerith pareceu se decidir com relação a alguma coisa e disse:
- Você é o único que pode salvar os mundos, Sora. – ela uniu as mãos num
gesto que parecia mais uma oração. O rosto do garoto se encheu de preocupação.
- Mas... como eu posso fazer isso?
- Bom, se você quer procurar os seus amigos... – disse Leon – duvido que
visitar outros mundos seja perda de tempo.
Mesmo que isso seja verdade... não é demais pra mim? – pensou Sora.
- Vamos, Sora, a gente vai conseguir!
- Nós temos que encontrar os seus amigos! E o Rei Mickey!
Donald e Pateta olhavam fixamente para ele.
Nesses últimos dias, eu já fiz muitas coisas que nunca teria imaginado, pensou
ele. Achei que não conseguiria, mas consegui. E... eu sou o único que pode resolver isso,
porque a Espada-Chave me escolheu.
- Sora... – disse Aerith com cuidado.
- Acho que vocês têm razão... Certo!
- Ótimo, é assim que o portador da Espada-Chave deve ser. – disse Leon,
como se Sora ainda precisasse de um último empurrãozinho.
- Ah, é. Leon, nós encontramos esse bloco gummi... – Pateta tirou o objeto
brilhante do bolso e mostrou a ele – Parece diferente dos outros. Você sabe pra
que ele serve?
Leon examinou o bloco gummi, mas não tinha uma resposta.
- Perguntem ao Cid. – disse Aerith – Ele sabe muito sobre blocos gummi.
- Entendido! Vamos lá, então! – Sora começou a caminhar de volta para a
passagem do beco – Obrigado por tudo!
Ele acenou com a Espada-Chave. Leon e Aerith observaram em silêncio
enquanto ele se afastava, com Donald e Pateta logo atrás.
- Mas... – começou Leon quando eles já estavam longe.
- Eu sei. – Aerith pareceu ler a mente dele – Você está preocupado com a
fechadura deste mundo, não é?

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- Se conseguíssemos selar a fechadura, os Sem Coração não conseguiriam
mais vir aqui.
- Mas só selá-la não é suficiente. – Aerith franziu.
- Então tudo que podemos fazer é buscar informações e cuidar do Sora.
- É frustrante, eu sei.
Leon voltou a manusear a Espada-Chave.
E Aerith voltou a rezar.
Por favor, não deixe os mundos desaparecerem.
Por favor, faça com que ele esteja bem.
Ela rezou pelos mundos... por Sora... e por ele.

Sora, Donald e Pateta voltaram ao Primeiro Distrito e correram para a Loja


de Acessórios. Cid estava lá, como sempre, apoiado com os cotovelos no balcão.
- Opa. – cumprimentou ele.
- Cid! – eles correram até o balcão e mostraram o bloco gummi a ele.
- Ora, se não é um bloco gummi.
- Isso. – concordou Donald.
O brilho do bloco gummi se refletiu nos olhos de Cid quando ele o pegou
para ver mais de perto.
- Pra que serve esse tipo de bloco? – perguntou Pateta.
- Você está zoando com a minha cara, né?! – Cid explodiu dramaticamente
– Vocês pilotam uma Nave Gummi e nem conhecem os diferentes tipos de blocos
gummi?! Seus cabeças-ocas! O céu não é lugar pra brincar não, sabiam?!
- Tem muita coisa que a gente não sabe mesmo, e daí? – sentindo-se como
uma criança que levava uma bronca, Sora revidou – Nós temos que usar a Nave
Gummi para ir a outros mundos. Não é como se tivéssemos outra opção!
- Ah. Até que você tem razão. – disse Cid sem muita cerimônia, olhando
para a Espada-Chave na mão de Sora – Tudo bem, eu estou aqui pra ajudar.
- Obrigado.
Cid respirou fundo e explicou:
- Este bloco gummi aqui é alto nível. Se o instalarmos na sua nave, ela vai
conseguir voar pra lugares muito mais distantes. Entendem o que isso significa?
- Lugares mais distantes...? – Pateta coçava a cabeça. Donald captou a dica:
- Significa que vamos poder ir a muitos outros mundos!
- Bingo. Querem que eu instale?
- Claro!
Se eles tivessem acesso a mais mundos, talvez encontrassem Kairi e Riku...
E o Rei Mickey.

89
- Naturalmente, eu cuidarei disso sem problemas. – disse Cid – Mas vou
precisar de um favorzinho enquanto isso.
- O quê? Vamos ter que pagar?! – reclamou Donald, já batendo o pé.
- Calma, calma. Eu só quero que vocês entreguem uma coisa. Enquanto
vocês fazem isso, eu instalo o gummi. Vai demorar um pouco. Não custa nada
aproveitar o tempo fazendo uma boa ação, não acham?
- Acho que... pode ser... – disse Sora, ainda não convencido.
- Bom, enfim... Sabem... – Cid coçava a cabeça. Parecia que ele tinha algo
importante a dizer, mas não conseguia colocar para fora – Ah, vocês vão entender
quando chegarem lá!
Sora, Donald e Pateta se entreolharam, sem entender.
- Tá bom, então. O que nós precisamos entregar?
- Só isto. – ele pegou um livro muito velho – É muito antigo e estava quase
se esfacelando, então eu restaurei.
Havia uma fechadura no livro, mas ele não parecia trancado. Eles abriram
e se depararam com a ilustração de uma floresta, com algumas partes faltando,
aparentemente arrancadas. Parecia um livro de gravuras infantil.
- Tem alguns animais também... – disse Pateta, espiando sobre o ombro de
Sora. Foi só então que Sora se deu conta de que havia desenhos de criaturas que
pareciam brinquedos de pelúcia.
- Tomem cuidado. Esse livro é muito importante. Parece que ele tem um
poder especial. Então eu quero que vocês o levem até uma casa velha no Terceiro
Distrito. Procurem um símbolo de fogo. Ei, baixinho, você sabe usar magia de
fogo?
- O que você acha?! Você está falando com o mago da corte! – exaltou-se
Donald, balançando sua varinha.
- Ótimo. Conto com vocês, então.
- Entendido! – Sora guardou o livro no bolso.
Nessa hora, o chão tremeu com o soar de um sino ao longe.
- Caramba! O que foi isso?! – Sora olhou ao redor, alarmado.
Cid não parecia nem um pouco preocupado:
- Parece que o sino da Loja de Ferramentas está tocando de novo...
- Loja de Ferramentas?
- É uma loja esquisita que fica no Segundo Distrito. Dizem que, se você
tocar o sino dela três vezes, alguma coisa vai acontecer, mas ninguém nunca o
ouviu tocar três vezes seguidas. Talvez você deva ir dar uma olhada depois que
entregar o livro. – Cid sorriu ao dizer essas palavras.
- Tá bom. Donald, Pateta, vamos! – eles saíram da loja e seguiram para o
Terceiro Distrito.
- Ah, há quanto tempo eu não faço isso...? – disse Cid para si mesmo – É
bom ter um trabalho de verdade pra variar.
Ele esticou os braços e desapareceu nos fundos da loja.

90
O trio atravessou o Segundo Distrito de novo.
- Não importa quantos Sem Coração nós derrotamos, continua aparecendo
mais! – reclamou Pateta em meio a uma luta – Será que não seria melhor a gente
esconder a Espada-Chave por um tempo?
- E o que vamos fazer se encontrarmos uma fechadura quando ela não
estiver com a gente? E, além disso, o rei disse pra gente ficar com a chave. –
respondeu Donald – Estaríamos desobedecendo ordens!
Era verdade que os Sem Coração pareciam não ter fim, mas... Nessa hora,
o sino tocou de novo, fazendo o chão tremer.
- Uou! – Sora se desequilibrou e caiu. Pateta o ajudou a se levantar.
- Você está bem, Sora?
- Ai... Não dá pra gente dar um jeito nesse sino?
- É aquele sino lá em cima, né? – Pateta apontou para uma torre – Talvez a
gente consiga pará-lo...
- Quack! Parem de perder tempo! Estamos enrolados aqui, esqueceram? –
esbravejou Donald. De fato, eles estavam no meio de uma batalha contra os Sem
Coração.
- Tá bom, tá bom... – Sora pegou a Espada-Chave e voltou à batalha.

Depois de muita luta, eles chegaram ao Terceiro Distrito.


- Até que enfim, conseguimos... – tentando mais escapar do que realmente
enfrentar os Sem Coração, eles atravessaram rapidamente a praça do Terceiro
Distrito e começaram a procurar a tal casa. Afinal, já estavam bastante exaustos.
Enfim eles localizaram uma grande porta marcada com uma insígnia de
fogo. Cansados, se uniram para tentar abri-la, mas sem nenhum sucesso. Não se
movia sequer um milímetro.
- O que nós vamos fazer? Os Sem Coração estão vindo!
- O Cid não disse alguma coisa sobre magia? – disse Sora, olhando para a
varinha de Donald.
- É verdade... Fogo! – Donald lançou uma bola de fogo na insígnia da porta.
E então... ela se abriu prontamente.
- Vamos!
Quando cruzaram a porta, eles se encontraram dentro de uma caverna.
- Nossa, nunca pensei que haveria um lugar assim na Cidade da Travessia.
– Sora olhava ao redor deslumbrado. Havia um grande lago na caverna e, bem
no meio dele, uma pequena ilha com uma única casa – Será que é ali?

91
Donald não perdeu tempo e começou a pular nas pedras que formavam
um caminho até a casa sobre a água.
- Vamos, depressa! Quack?! – como tinha se virado para trás para apressar
os dois enquanto pulava de pedra em pedra, ele se desequilibrou e caiu na água
de maneira espetacular.
- Gawrsh, tudo bem? – Pateta pulou numa pedra próxima e ajudou Donald.
- Quack! – Donald não respondeu e pulou logo em outra pedra – Sora, vem
logo!
- Já tô indo! – Sora também se colocou a atravessar o lago. Não foi muito
difícil chegar à pequena e estranha casinha que parecia um pote com um chapéu
vermelho em cima.
- Essa também não quer abrir! – Donald chutava a porta. Pelo jeito, cair na
água tinha acabado com a pouca paciência que ele tinha.
- Talvez tenha outra entrada... – Pateta começou a circundar a casa.
- Pra mim, chega! Casas que não dá pra entrar, cair em lagos, chega! Pra
mim, já deu!
- Calma, Donald, não fique tão bravo. – Sora tentou acalmá-lo, ao mesmo
tempo em que corria os olhos pela casa. O telhado vermelho estava um pouco
deteriorado. Se alguém perguntasse, ele diria que ninguém morava ali.
- Sora! Donald! – chamou Pateta – Achei uma entrada!
Eles foram até onde Pateta estava, e lá havia um grande buraco na parede.
- Será que a gente devia mesmo entrar por aqui...?
- Por que não?
Então eles se enfiaram na casa pelo buraco. Ela definitivamente parecia
abandonada. Sora olhou de um lado para o outro, e...
Este lugar é mais que só um monte de poeira e mofo.
Sora se virou. Aquela voz... Sem dúvida, era a voz de Kairi!
Não te lembra o nosso lugar secreto?
Era Kairi quem estava ali. Bem diante dele. Os cabelos ruivos balançaram
quando ela se virou para Sora e abriu um sorriso. Era Kairi, não havia dúvida.
Aquele sorriso era exatamente como ele lembrava, igual ao que ele viu antes de
se perder dela nas Ilhas do Destino.
É igualzinho à caverna onde nós rabiscávamos na parede. Lembra?
- Kairi... – Sora estendeu a mão para tocá-la.
- Sora?
Era a voz de Pateta que chamava atrás dele. Sora se virou e, quando olhou
de novo para onde Kairi estava há instantes... não havia ninguém lá.
- Eu... Eu vi... – Sora tentou explicar, mas outra voz o interrompeu:
- Ora... Ora, ora, ora... Vocês chegaram mais cedo do que eu esperava.
Próximo à parede, estava um velho homem de barba comprida, óculos e
chapéu pontudo.
- Você sabia que a gente ia vir aqui? – disse Sora, caminhando até ele.

92
- É claro.
- Você é um Sem Coração?! – Donald já empunhava sua varinha.
- Há, há, há! Meu nome é Merlin. Como podem ver, eu sou um mago. Eu
passo muito tempo viajando. É bom estar em casa. Seu rei me pediu ajuda.
- O Rei Mickey? – Pateta ficou positivamente surpreso. Era a primeira vez
que eles ouviam notícias do rei desde que a jornada começara.
- Sim, exatamente. Donald, Pateta... E quem seria você? – indagou Merlin,
olhando para Sora.
- Eu sou o Sora.
- Ah, então encontraram a chave... – Merlin o examinava com os olhos. Já
sem paciência, Donald começou:
- O que o rei te pediu pra fazer?
- Calma, um momento... – Merlin foi até uma plataforma de pedra no meio
da sala, subiu nela e fez um gesto com as mãos – Presto!
A bolsa dele se abriu, e de lá saiu todo tipo de móveis e utensílios, cada
um ocupando seu devido lugar na casa.
- Uau! – bem diante dos olhos arregalados do trio, a casa descuidada se
transformou num lugar muito aconchegante. Aquela era a verdadeira casa de
Merlin.
- Pronto, assim é melhor. Agora... – Merlin apontou sua varinha para uma
miniatura de carruagem que estava num canto, cuja parte de cima parecia uma
abóbora – Bibbidy-bobbidy-boo!
Com esse misterioso encantamento, uma velha senhora que vestia uma
túnica azul apareceu.
- Olá. Eu sou a Fada Madrinha. – ela agitou a sua própria varinha e uma
nuvem de poeira brilhante se espalhou pela sala.
- Seu rei pediu ajuda a nós dois. – disse Merlin.
- E onde ele está?!
Ao ouvir a pergunta de Donald, Merlin e a Fada Madrinha trocaram um
olhar.
- “Não resta muito tempo. Não posso voltar. Mas há luz além das trevas.
E há trevas além da luz.” – Merlin e a Fada Madrinha falaram em uníssono, como
se recitassem um poema.
- Isso não faz nenhum sentido! – Donald já batia o pé no chão, irritado.
- “As trevas esperam por você. Mas, se há trevas, também há luz.”
- Luz e trevas... – murmurou Sora.
- Não entendi! – reclamou Donald. Merlin apontou para a Espada-Chave:
- Fiquem com a chave e o caminho se abrirá.
- Com a chave? – indagou Pateta, interessado.
- Foi essa a instrução que o rei deixou.
- E eu? O que eu tenho que fazer? – perguntou Sora. O mago e a fada se
entreolharam de novo.

93
- Vá aonde a luz o guiar.
- E a Kairi e o Riku?!
A Fada Madrinha fez um movimento negativo com a cabeça.
- Eu não sei... mas... eu os sinto... muito perto...
- Apenas vá. – disse Merlin – Vá aonde a chave apontar.
- Tudo bem. Eu vou fazer isso. – a voz de Sora era determinada – Vamos...
Ah, espera...
Merlin já sabia:
- O livro que o Cid pediu para entregarem, certo?
Sora se virou e entregou o velho livro a ele.
- Ora, vejam só. Ele fez um bom trabalho de restauração...
Curioso, Pateta se aproximou.
- Que tipo de livro é?
- Bem... Para dizer a verdade, eu mesmo não tenho certeza. Se quiserem
saber, vocês vão ter que ler.
- Tudo bem. Faremos isso da próxima vez! – disse Sora, e os três partiram.

Quando saíram da casa e colocaram os pés no Terceiro Distrito de novo,


eles foram imediatamente atacados por Sem Coração.
- Eles não param mesmo... – comentou Pateta.
Com muita dificuldade, chegaram ao portão do Segundo Distrito. Assim
que o atravessaram, o sino tocou de novo, com o seu barulho ensurdecedor. O
tremor abalou o chão.
- Quaaaack!
- Não tem um jeito de parar isso? – insistiu Pateta mais uma vez.
- Esqueça isso! – repreendeu Donald – Temos que voltar pra loja do Cid,
pegar a Nave Gummi e ir embora explorar outros mundos!
- Mas tem tantos Sem Coração aqui! A fechadura deve estar por perto! –
disse Sora, olhando para a torre do sino.
- Está sugerindo que o sino tem alguma coisa a ver com a fechadura?
- Bom, não sei, mas... – no meio da frase de Sora, a Espada-Chave começou
a brilhar fortemente – Uou!
- Está brilhando!
Os três se entreolharam, aparentemente chegando à mesma conclusão. E
seguiram para a Loja de Ferramentas.

94
- Uau... – eles estavam admirados com as grandes e muitas engrenagens
que giravam sem parar na Loja de Ferramentas. Mas não era nada fácil se mover
ali dentro.
- Ei, que tal por ali? – sugeriu Pateta, e os três se agacharam para tentar
passar por entre algumas engrenagens – Ah, sem saída...
Eles realmente não faziam ideia de aonde ir.
- O que nós vamos fazer quando encontrarmos o sino? – indagou Donald
enquanto eles desbravavam mais engrenagens.
- Bom, o Cid disse que, se ele for tocado três vezes, alguma coisa acontece,
certo?
- Hã? Não vai ser só aquele barulho insuportável de novo?
- Acho que deve ter mais alguma coisa por trás desse sino. Afinal, olha só
esse monte de mecanismos complicados aqui! Só podem estar escondendo algum
segredo!
- Eu concordo com o Sora. – disse Pateta, saltando por sobre uma espécie
de pêndulo.
- Talvez... – Donald não estava convencido.
Pateta encontrou uma abertura acima de algumas engrenagens.
- Ei, dá pra passar por aqui!
- Quaaack... – tentando manter o equilíbrio, Donald subiu nas engrenagens
e pulou lá. Se ele desse um único passo em falso, seria esmagado rapidinho.
- Ai... É tudo ou nada... – Sora também pulou. Havia uma pequena porta.
- Será que é aqui? – Donald abriu a porta, e eles se depararam com o terraço
da Loja de Ferramentas. A torre onde ficava o sino estava bem diante deles, mas,
previsivelmente, sua entrada estava bloqueada.
- Gawrsh. Pelo jeito, não tem como entrar... – tábuas fechavam o lugar.
- Ah, não deve ser mais resistente que a grade de antes, né? – disse Sora –
Vamos, no três!
Mais uma vez, os três pegaram impulso e correram, e as tábuas quebraram
facilmente.
- Então esse é o sino que faz aquele barulhão... – Sora estava impressionado
com o imenso objeto – Pateta, você fica de guarda?
- Pode deixar!
Pateta se colocou em alerta total, atento ao Segundo Distrito lá embaixo,
enquanto Donald pulou e se pendurou na corda do sino.
- Três vezes, certo?
- Isso!
Tomando a resposta de Sora como uma deixa, ele puxou a corda.
Uma vez...
Duas vezes...
Três vezes...
Mas tudo que aconteceu foi aquele soar retumbante.

95
- Ah... Não aconteceu nada... – lamentou Sora. Mas então Pateta exclamou:
- Uma fechadura!
- Hã?
- Tem uma fechadura ali!
Sora correu até Pateta e olhou para a direção em que ele apontava. Havia
aparecido uma fechadura na fonte da praça.
- Beleza!
Eles desceram do teto da Loja de Ferramentas e correram até lá.
- Agora os Sem Coração não vão mais aparecer na Cidade da Travessia! –
disse Pateta. Mas um enorme rugido fez o chão tremer.
- O que foi isso?!
Um Sem Coração gigante caiu do céu. Um que eles acreditavam já terem
derrotado. Era o Armadura Reforçada.
- Claro que eles não iam deixar a gente trancar a fechadura assim tão fácil...
– reclamou Pateta, pegando seu escudo.
- Mas nós já derrotamos ele antes! – Sora empunhou a Espada-Chave.
Donald ergueu sua varinha. Mas o enorme pé do Armadura Reforçada já
vinha na direção dele.
- Qua- Quaaaack! – Donald tentou se esquivar, mas tropeçou numa pedra.
- Donald! – Sora correu para ajudar, mas não ia dar tempo.
- Cuidado! – Pateta tapou os olhos para não ver o que ia acontecer, mas
então houve um forte barulho metálico, e o pé do Armadura Reforçada voou de
volta.
- Aí está você. O que está havendo aqui?
Sora conhecia aquela voz. Cabelos prateados reluziram na noite escura.
Ele olhou para a direção, e lá estava...
- Riku?!
Com um sorriso de deboche, Riku ajudou Sora e Donald a se levantarem.
- Como você veio parar aqui?!
- Conversamos depois. Aí vem ele! – assim que Riku terminou de falar, o
Armadura Reforçada veio para cima deles com um soco violento, como que na
intenção de se vingar pelo ataque que sofrera antes. Riku e Sora pularam para
fora do caminho, e Donald fez o mesmo em seguida, pouco antes de o punho se
cravar no chão.
- Coisa feia, idiota e feia! Fogo! Trovão! Gelo! – Donald descarregava sua
magia no Armadura Reforçada, e Pateta corria de um lado para outro, sem saber
bem o que fazer. Sora e Riku atacavam seu corpo principal, um de cada vez, como
companheiros que lutavam lado a lado há muito tempo.
- Parece que você aprendeu alguns truques novos, Sora!
- Você também, Riku!

96
Era ele. Aquela aparência, aquela voz... Sem dúvida, era o Riku. Não era
uma ilusão, como a Kairi que ele tinha visto há pouco. Aquele era o verdadeiro
Riku!
- Lá vou eu! – com um salto gracioso, Riku desferiu um golpe certeiro na
cabeça do Armadura Reforçada.
- Minha vez! – Sora atacou o tronco, e então o Armadura Reforçada caiu
se despedaçando, fazendo um barulhão. Nenhum dos seus pedaços se movia.
- Conseguimos! – sem nem pensar, Sora abraçou Riku.
- Tá bom, tá bom, para com isso. – disse Riku, mas ele estava sorrindo.
- Esse é o Riku? – perguntou Pateta.
- É! Era por ele que eu estava procurando! – Sora finalmente soltou Riku,
abrindo um sorriso também – Ah, é! E a Kairi?
- Ela não está com você? – questionou Riku, um pouco alarmado. Parecia
que, enquanto Sora achou que Kairi estaria com Riku, ele deduziu que ela estaria
com Sora.
- Ah, então ela não está com você também...
Riku deu um tapinha no ombro de Sora e tentou animá-lo:
- Ei, não se preocupe. Tenho certeza de que ela também conseguiu sair da
ilha. Nós chegamos a outro mundo. Agora podemos ir aonde quisermos. – Sora
não pareceu compartilhar do entusiasmo, mas ele continuou – Logo estaremos
todos juntos de novo. Certo, Sora? Deixa comigo. Comigo por perto, você não vai
precisar se preocupar com nada.
- Mas eu também estava procurando você e a Kairi. Com a ajuda deles! –
Sora apoiou a Espada-Chave no ombro e abriu um sorriso ao apontar para Pateta
e Donald. Riku olhou para os dois como se fossem suspeitos, por algum motivo.
- Ahn, nós... – sem saber bem o que dizer, Donald olhou para Sora.
- Nós visitamos muitos mundos juntos. – disse Sora – Procurando vocês.
- É mesmo, é? Quem diria? Eu nunca imaginaria. – com a resposta de Riku,
Donald e Pateta se entreolharam e cada um colocou uma mão no ombro de Sora.
- E tem mais! O Sora é o mestre da Espada-Chave! – disse Pateta.
- Quem diria, né? – adicionou Donald, com o seu jeito de sempre.
- Então isso se chama Espada-Chave? – Riku a pegou sem pedir permissão.
- Ei, quando você... Devolva! – Sora pulou em Riku, mas ele se esquivou e
Sora quase caiu.
- Você não muda mesmo, Sora. – Riku riu um pouco e jogou a Espada-
Chave de volta para ele – Pega!
- Uou! – Sora pegou a Espada-Chave meio desajeitado e olhou para Riku
– Ei, você devia vir com a gente também, Riku! A gente tem um foguete incrível!
Você nem vai acreditar quando vir!
- Ei! Não saia decidindo as coisas sozinho! – esbravejou Donald.
- Ah, o que que tem?
- Não! – Donald pulava sem parar, agitado.

97
- Mas o que tem de mais ele ir com a gente? Ele é meu amigo! E finalmente
nos encontramos!
- Não vai acontecer!
Enquanto os dois começavam a brigar de novo, Pateta viu uma das mãos
do Armadura Reforçada começar a se mexer atrás deles.
- Sora! Donald!
Assim que eles olharam na direção, o Armadura Reforçada se remontou e
se colocou de pé. Agora ele estava com as mãos no lugar dos pés e os pés no lugar
das mãos e tinha mudado de cor – já era um novo Sem Coração, o Armadura
Oposta. Ele rugiu e os atacou.
- A conversa ainda não acabou, Donald! – exclamou Sora.
- Quack!?
Com a Espada-Chave em mãos, Sora avançou contra o Armadura Oposta,
mas ele se virou de imediato, como se já esperasse por isso, e lançou esferas de
raios nele.
- U- Uooou! – o ataque atingiu Sora em cheio.
- Essa não! Sora, você está bem? – Pateta correu até ele e o curou.
- Quaaack! Maldito! Isso é pelo Sora! Trovão! – ao ver Sora ser atingido,
Donald conjurou uma magia, e um relâmpago muito maior que o de costume foi
descarregado sobre a cabeça do Armadura Oposta.
- Uau! Boa! – quando se colocou de pé, Sora correu para ajudar Donald o
mais rápido que pôde.
- Quando decido lutar a sério, eu... Quack! – enquanto Donald se gabava,
um dos pés gigantescos da armadura deram um chute no seu rabo.
- Eu também vou ajudar! – como se a atitude de Donald fosse contagiosa,
Pateta saltou sobre o Armadura Oposta e o atacou em pleno ar. Seu escudo bateu
contra o tronco dele e deixou um amassado.
- Uau! Você é incrível, Pateta! – elogiou Sora, e Pateta respondeu fazendo
uma pose de orgulho.
- Hm... Será que eu também consigo? Ah, vamos lá! – e Sora também pulou
no Armadura Oposta, brandindo a Espada-Chave em um grande arco – Iáááá! –
a Espada-Chave desenhou um crescente de luz no ar que atingiu o Armadura
Oposta com uma onda de choque.
- Gawrsh, eu não sabia que você conseguia fazer isso, Sora!
Sora continuou atacando, tentando ignorar o cansaço. A Espada-Chave se
chocava contra a superfície metálica, e o Armadura Oposta começou a recuar, até
que parou de se mexer. E, finalmente, um coração brilhante saiu do seu corpo e
começou a flutuar, transformando-se em luz e desaparecendo em seguida.
- Conseguimos!
Sora, Donald e Pateta comemoraram outra vitória que tinham conquistado
juntos. Mas...
- Espera, cadê o Riku? – Sora se deu conta tarde demais – Riku...?

98
Ele correu pela praça chamando o nome do amigo, mas ele não estava em
lugar algum.
- Ah, não... Justo quando eu encontrei ele! – Sora estava inconsolável. Eu
passei todo esse tempo procurando por ele. Fiquei com tanto medo de que algo ruim tivesse
acontecido. Mas ele continua igualzinho ao que era nas Ilhas do Destino. Não mudou
nada. Isso é bom...
- Sora? – Pateta parecia preocupado.
- Ele simplesmente desapareceu de novo. Não é justo. – murmurou Sora,
segurando a Espada-Chave com mais força. Mas então voltou a abrir um sorriso
– Bom, pelo menos eu sei que ele está bem.
- Você está bem mesmo?
- Sim... A gente vai se encontrar de novo. Tenho certeza disso. Além disso,
já que encontramos o Riku, aposto que não vai demorar pra encontrarmos a Kairi
também!
Ainda com um sorriso no rosto, Sora ergueu a Espada-Chave, apontando-
a para a fechadura, e o raio de luz se lançou dela. A fechadura pareceu absorver
o raio de luz e se fechou, fazendo um clique.

- Boa noite, como posso ajud... Ah, são vocês.


Cid não estava sozinho na sua loja. Leon, Aerith e Yuffie também estavam
lá.
- E aí, entregou o livro? Já terminei de instalar o gummi de navegação.
- Obrigado! Nós também temos uma novidade! – começou Sora.
- Selamos a fechadura! – exclamou Donald.
- Sério? – indagou Yuffie.
- Sim, sério! – respondeu Pateta – Tocamos o sino da Loja de Ferramentas
e a fechadura apareceu na fonte.
- Então foram vocês que tocaram o sino três vezes? – questionou Leon.
- Sim. A Espada-Chave nos disse o que fazer! – gabou-se Sora.
Yuffie chegou mais perto dele e olhou para a Espada-Chave.
- Uau. Essa coisa é incrível mesmo.
- Mas outro Sem Coração gigante apareceu. – disse Donald – E aí...
Desta vez, foi Sora quem o interrompeu:
- Nós encontramos o Riku!
- O amigo que você estava procurando? – perguntou Aerith.
- Ahã! E o Riku nos ajudou na luta! Mas aí o Sem Coração gigante acordou
e, quando derrotamos ele de novo, ele tinha sumido... – Sora começou a ficar
desanimado no meio da frase – Mas talvez a gente consiga encontrar ele de novo.
Eu espero.

99
- Vão encontrar. – disse Aerith, gentil. Yuffie estava mais interessada em
outras coisas:
- Puxa, eu também queria ter visto a fechadura.
- Então havia uma na Cidade da Travessia. – disse Leon, completamente
sério em meio a tudo aquilo, de braços cruzados – Você precisa se apressar, Sora.
Enquanto estamos parados aqui, falando sobre isso, os Sem Coração continuam
a invadir outros mundos.
Sora concordou, sério.
- Sim, mas, antes disso... Vocês já ouviram falar da Malévola? – perguntou
Cid, num tom de voz baixo.
- Quem é essa?
- Uma bruxa, cara! Ela é uma bruxa! – Cid também cruzou os braços. Leon
explicou:
- É por causa dela que esta cidade está repleta de Sem Coração. É melhor
tomar muito cuidado com ela.
- Ela tem usado os Sem Coração há anos. – disse Aerith, com um semblante
triste.
- Foi ela quem levou a ruína ao nosso mundo. – Leon olhou para Cid, que
continuou:
- Um dia, um enxame de Sem Coração invadiu o nosso mundo do nada! –
disse Cid, por fim – Isso foi há nove anos. Eu consegui escapar da confusão e vim
parar aqui, junto com essa galera.
- Que horror... – murmurou Donald, que parecia sinceramente comovido.
- Nosso governante era um homem sábio chamado Ansem. – disse Leon –
Ele dedicou a vida a estudar os Sem Coração. Provavelmente ele estava buscando
uma maneira de derrotá-los de vez.
Lembrando-se do nome, Pateta bateu o punho na mão:
- É dessa pessoa que você tinha falado antes, não é, Aerith?
- Sim. – respondeu ela – E o relatório dele deve conter alguma informação
sobre isso.
- O Rei Mickey também deve estar atrás desse relatório. – concluiu Donald.
Aerith concordou.
- Mas não sabemos onde as páginas dele podem estar.
- Posso apostar que a Malévola está com a maior parte delas. – disse Cid,
desanimado.
- Mas não temos como ter certeza disso! – exclamou Sora, tentando animar
o grupo.
- Sim, você tem razão.
- Então vamos procurá-las!
Aerith sorriu para ele.
- Obrigada, Sora.
- Não sei se posso confiar em você pra isso. – brincou Cid.

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- Ei, como assim?!
- Bom, você não tem lá muita cara de mestre da Espada-Chave! – Donald
entrou na brincadeira.
- O quê?! Até você, Donald?!
- Mas você já não é mais tão fraco quanto antes! – disse Pateta, rindo.
- Não sou mais tão fraco...? Ah, parem com isso!
- Quer experimentar se é verdade? – Leon apontou a Gunblade para Sora.
- Hã?
- Ou talvez você queira tentar a sorte contra a grande ninja Yuffie! – e ela
ergueu sua shuriken.
- Ei, parem com isso, pessoal! Eu estou exausto! – então Aerith riu, e todos
a acompanharam – Ei, por que tá todo mundo rindo de mim?! – reclamou Sora,
mas ele também já começava a rir.

Por detrás de uma janela, duas figuras sombrias observavam a cena.


Uma era Riku. A outra era...
- Viu só? É como eu disse.
Riku não respondeu nada a Malévola. Apenas continuou observando.
- Enquanto você se esforçava para encontrar seu amigo, ele simplesmente
o substituiu por outros. É evidente que ele os valoriza muito mais do que a você.
– sussurrou Malévola no ouvido dele – Você não precisa desse garoto miserável.
Não pense mais nele e venha comigo. Eu o ajudarei a encontrar o que procura...
Mas Riku só continuou a observar Sora pela janela.

Continua...

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