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ACÓRDÃO
2. A Justiça Eleitoral deverá avaliar o conteúdo publicado na Internet de forma mais profunda a
fim de determinar se caracteriza propaganda eleitoral, com a consequente aplicação das
regras eleitorais sobre a matéria, ou se, por outro lado, o conteúdo constitui mera
manifestação espontânea de pessoa natural identificada ou identificável, hipótese em que não
se sujeitará às referidas regras.
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transmitido na televisão em que não há qualquer descontextualização, montagens ou recortes,
de modo que as publicações impugnadas estão acompanhadas de mensagens que não
extrapolam o direito à crítica inerente ao debate democrático, a ponto de justificar a
interferência desta Justiça especializada.
RELATÓRIO
Trata-se de representação, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pela Coligação Brasil da
Esperança em desfavor de Flávio Nantes Bolsonaro e outros, em que se alega suposta prática de
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desinformação por se veicular fatos sabidamente inverídicos e descontextualizados na Internet em ofensa à
honra do candidato à Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva.
a) entre os dias 11 e 12 de setembro, os representados veicularam teor desinformativo nas redes sociais Twitter,
Instagram, Facebook, TikTok e Kwai, no sentido de que Lula, caso vença as eleições presidenciais de 2022,
implementará o confisco de bens e ativos financeiros no país;
b) “a desinformação foi criada a partir de uma matéria jornalística do canal CNN que foi ao ar em fevereiro do
presente ano, na qual foi informado que dirigentes do Partido dos Trabalhadores previam a necessidade de
instauração de situação emergencial para tratar a crise econômica do país, dentre elas, uma possível
quarentena fiscal. Contudo, em momento algum, afirmam que o candidato Luiz Inácio Lula da Silva ou o Partido
dos Trabalhadores teriam a intenção de realizar confisco dos bens da população brasileira – até porque não
existe tal ideia, tampouco há esta previsão no plano de governo do candidato” (p. 3);
c) os representados publicaram materiais contendo fatos inverídicos e manipulados, desmentidos por veículos
de comunicação e por agências de checagem;
d) a matéria jornalística foi utilizada de forma descontextualizada e desvirtuada pelos representados com fins
eleitoreiros;
e) o vídeo da CNN fala “em decretação de situação de emergência”, que não prevê confisco de bens. Ademais,
não existe qualquer similitude entre “quarentena fiscal” e confisco de bens, o que só atesta a má-fé dos
representados ao compartilharem a desinformação” (p. 6);
f) “não há no estatuto do Partido dos Trabalhadores ou no Plano de Governo do candidato e da coligação ora
Representante qualquer menção a confisco de bens ou medida semelhante” (p. 16);
Defende a presença dos elementos autorizadores da concessão da tutela de urgência, alegando que a
probabilidade do direito decorre da “manifesta violação às normas e princípios que disciplinam a propaganda
eleitoral, sobretudo a Resolução nº 23.610/2019 deste c. TSE”, e o perigo do dano encontra-se “na perpetuação
de desinformações que maculam a lisura do processo eleitoral” (p. 21).
Requer a concessão de tutela de urgência para que se determine a remoção imediata dos vídeos impugnados.
No mérito, postula pela confirmação da medida liminar, bem como a condenação dos representados à sanção
de multa.
Não concedida a liminar, submeto a decisão ao referendo do Plenário deste Tribunal, nos
termos do art. 2º da Portaria-TSE nº 791/2022.
É o relatório.
VOTO
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O SENHOR MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO (relator): Senhor Presidente,
reproduzo os fundamentos da decisão monocrática em que foi indeferido o pedido de tutela de urgência (ID
158150846):
A representante pretende, em sede de tutela provisória de urgência, remover das redes sociais Twitter,
Instagram, Facebook, Kwai e TikTok comentários de pessoas naturais junto a vídeo jornalístico da CNN, sob
alegação de que as mensagens teriam teor desinformativo, em ofensa à honra do candidato à Presidência da
República Luiz Inácio Lula da Silva.
A matéria jornalística veiculada informa que ala do PT defende “uma espécie de quarentena fiscal” no país, caso
Lula vença as eleições que se avizinham. Transcrevo da inicial o teor da matéria jornalística da CNN (ID
158124984, p. 4-5):
Gente muito próxima ao ex-presidente Lula está defendendo uma espécie de quarentena fiscal, caso, claro,
ele vença as eleições. A discussão entrou no radar do Caio Junqueira que detalha essa história para gente
agora. Boa noite, Caio.
É isso, um grupo formado por ex-dirigentes petistas, próximos aos ex-presidente Lula elaborou um
documento interno, com propostas do Partido para a economia dentre outras áreas, caso a legenda, claro,
vença as eleições presidenciais.
A primeira delas, prevê a decretação de abre as aspas “uma situação de emergência em âmbito nacional
para que o novo governo tenha os meios legais necessários para enfrentar, nas palavras dos petistas, o caos
herdado do governo anterior” fecha aspas.
Na prática, uma medida que permita que o governo tenha liberdade para romper as regras fiscais e utilizar o
orçamento livre de amarras, por um período determinado, o tema vem sendo tratado como uma ideia, na
prática de um plano emergencial temporário inicial.
Esse documento é assinado, dentre outros, pelo ex-presidentes do PT José Genuíno e Rui Falcão, que tem
participado dos debates internos do partido sobre os rumos da campanha e de um eventual novo governo
Lula. Rui Falcão, por exemplo, passou o ano novo na residência de Lula e é um interlocutor frequente do ex-
presidente.
Além disso, o documento fala por exemplo em corrigir imediatamente o orçamento herdado do ano anterior,
recuperar a capacidade de investimento do BNDES, Banco do Brasil e da Caixa Economia Federal, bem
como das empresas estatais, tomar as medidas necessárias para cobrar um imposto emergencial sobre
grandes fortunas, lucros e dividendos, a retomada imediata do Bolsa família, numa versão ampliada a
retomada imediata do programa mais médicos e a convocação de concursos públicos emergências para
recompor o quadro de servidores públicos federais”.
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[Flávio Bolsonaro na rede Instagram] Com o ex-presidiário no poder, nem o seu dinheiro no banco você vai
conseguir proteger! (https://www.instagram.com/reel/CiyUhhbgxdz/?igshid=Ym MyMTA2M2Y%3D)
[Elisa Brom na rede Twitter] Quarentena Fiscal??? É isso que o PT fará caso volte a governar o país. Quem
tem dinheiro no banco, poupança, investimento, empresas, negócios e aplicações é melhor ficar de olho.
Lembrando que quem vota na terceira via ou defende o voto Nulo, está favorecendo o Ex Presidiário (
https://twitter.com/brom_elisa/status/1490686991607996417?s=46&t=w2LeS9jaHE3lNm9NzeJ6ag)
[Roger Rocha Moreira na rede Twitter] Ala do PT defende ‘quarentena fiscal’ se Lula vencer as eleições.
[Movimento Acorda Brasil] ALERTA GERAL. QUARENTENA FISCAL. Novo nome para o já conhecido, e
jamais esquecido, Plano Collor de congelamento de contas bancarias de pessoas fisicas e juridicas! Um
absurdo que, quem viveu, jamais esqueceu! Vai brincando com fogo, vai…Fonte: CNN… nao é fake news
viu?
Veiculação do vídeo da CNN com a seguinte legenda: quem tem dinheiro no banco, na poupança, na
previdência privada, nos investimentos, nos imóveis, nas empresas, nos negócios e nas aplicações em geral
é melhor ficar de olho!
Isso tudo está no estatuto do PT. Lula vai tomar o seu dinheiro.
Veiculação do vídeo da CNN com a seguinte legenda: quem tem dinheiro no banco, na poupança, na
previdência privada, nos investimentos, nos imóveis, nas empresas, nos negócios e nas aplicações em geral
é melhor ficar de olho!
Isso tudo está no estatuto do PT. Lula vai tomar o seu dinheiro.
Quanto à plausibilidade do direito pleiteado na espécie, a tutela repressiva da Justiça Eleitoral sobre a prática de
propaganda eleitoral irregular deve necessariamente observar – sob o manto da ordem constitucional vigente –
as liberdades de expressão e de manifestação de pensamento.
Destaca-se, no ponto, entendimento do Supremo Tribunal Federal de que “a liberdade de expressão constitui um
dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e compreende não somente as informações
consideradas como inofensivas, indiferentes ou favoráveis, mas também as que possam causar transtornos,
resistência, inquietar pessoas, pois a Democracia somente existe baseada na consagração do pluralismo de
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ideias e pensamentos políticos, filosóficos, religiosos e da tolerância de opiniões e do espírito aberto ao diálogo”
(ADI nº 4439/DF, redator. p/ ac. o Min. Alexandre de Moraes, DJe de 21.6.2018).
A Justiça Eleitoral deverá avaliar o conteúdo publicado na Internet de forma mais profunda a fim de determinar
se caracteriza propaganda eleitoral, com a consequente aplicação das regras eleitorais sobre a matéria, ou se,
por outro lado, o conteúdo constitui mera manifestação espontânea de pessoa natural identificada ou
identificável, hipótese em que não se sujeitará às referidas regras.
Não há recortes ou descontextualização do vídeo em que jornalistas da emissora CNN comentam tema sobre
eventual “quarentena fiscal” na hipótese do candidato Luiz Inácio Lula da Silva vencer as eleições de 2022. O
usuário da Internet que assiste ao vídeo publicado compreende facilmente que, em nenhum momento, os
comentaristas falam em congelamento de contas bancárias de pessoas físicas ou jurídicas, como aparecem nas
legendas das publicações impugnadas.
Com efeito, a insurgência da representante se dá sobre conteúdo orgânico, que consiste na manifestação
espontânea de usuários na Internet e decorre da livre expressão de opiniões ou pensamento.
Assim, verificam-se nas publicações impugnadas mensagens pelas quais – certas ou erradas – exteriorizam
opiniões de pessoas naturais na Internet. Nesse aspecto, cumpre destacar elucidativo trecho do voto do e. Min.
Luís Roberto Barroso no REspe nº 972-29/MG, DJe de 26.8.2019, segundo o qual “[...] para que a liberdade de
expressão seja devidamente assegurada, em princípio, não devem ser caracterizados como “fake news”: os
juízos de valor e opiniões; as informações falsas que resultam de meros equívocos honestos ou
incorreções imateriais; as sátiras e paródias; e as notícias veiculadas em tom exaltado e até
sensacionalista”.
Aliás, conforme o disposto no art. 28, § 6º, da Res.-TSE nº 23.610/2019, “a manifestação espontânea na
internet de pessoas naturais [identificada ou identificável] em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a
forma de elogio ou crítica a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação não será considerada
propaganda eleitoral".
Determina-se a citação dos representados Flavio Nantes Bolsonaro, Roger Rocha Moreira e Elisa Brom de
Freitas para, querendo, apresentarem defesa, no prazo legal de 2 (dois) dias, nos termos do art. 18 da Res.-TSE
nº 23.608/2019.
Ausente a aparência de ilícito eleitoral nas publicações impugnadas, não há justificativa para acolhimento do
pedido de diligências para identificação dos responsáveis por perfis em redes sociais.
Após o transcurso do prazo, com ou sem resposta, intime-se o Ministério Público Eleitoral (MPE) para
manifestação no prazo de 1 (um) dia, com posterior e imediata nova conclusão a esta relatoria.
Em juízo preliminar, ratifico a compreensão delineada na decisão monocrática, razão pela qual
voto no sentido de referendar a decisão não concessiva da liminar.
É o voto.
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EXTRATO DA ATA
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