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A QUE HORAS PASSARÁ O AUTOCARRO?

Luís Gonçalves

TEATRO

COMÉDIA

A QUE HORAS PASSARÁ O


AUTOCARRO?
PERSONAGENS:

Dona Celestina:
Piélas (bêbado):
2 passageiros:
1 passageira:
Graça:
Rapaz da Pizza:
Policia:
Motorista:
Senhora de Idade:

CENA 1

Numa paragem do autocarro, está um individuo todo embriagado deitado


no chão a dormir tem um carapuço todo sujo na cabeça. Sentada no banco
está uma senhora com cerca de 60 anos a fazer a sua renda á espera do
autocarro, tem uma carteira ao pé de si. Esta usa uma grande cabeleira,
tem metade do buço (bigode) por fazer e uns oculos ao fundo do nariz.
Além de um banco, há um sinal de paragem de autocarros e um caixote do
lixo. Há mais dois homens e uma senhora em pé á espera do autocarro

26/03/2013 HOMEM DO TEATRO


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Celestina: Que massada! Mas será que o autocarro nunca mais vem? (olha
para as horas do seu relogio de pulso. Continua com a sua renda) 15
minutos atrasado! Este motorista é sempre o mesmo, sempre atrasado!
Não há dia nenhum que chegue a horas, deve pensar que as pessoas têm a
vida dele. Hã! Mas eu sei muito bem o que este motoristazeco anda a
fazer! Sei muito bem qual é a razão do atraso. Anda metido com a
empregada do café do moelas! Parece que vai lá para o café para o
marmelanço mais ela, depois uma pessoa é que tem de ficar aqui á espera
a secar. Ouvi dizer que andam para lá aos beijos mesmo na frente dos
clientes não tem vergonha nenhuma. Aquele café é pior que a casa dos
segredos! Mas tão bonito é ele como ela. Pois a moça é casada, tem dois
filhos de pais diferentes e nenhum é do actual marido! É mesmo uma
badalhoca aquela gaja. E agora por causa deles tenho a minha vida
atrasada. Precisava tanto de ir á vila e não tenho transporte proprio. O
meu marido já faleceu, foi no dia do nosso casamento, o padre
perguntou-lhe se ele queria casar comigo e ele nem teve tempo de
responder. Caíu para o lado nunca mais se levantou. Bateu logo ali a asa!
Já tentei tirar a carta de condução, mas chumbei 20 vezes no exame de
codigo. Á 21ª vez passei, mas cheguei ao exame de condução, não parei
num sinal de stop e pimba! Chumbei novamente! É que esta aldeia é pior
que a linha do ramal da Lousã! Parou no tempo! Não há nada para uma
pessoa ir á compras. Só um café. Tivemos comboio mas fecharam a linha,
tinhamos um talho mas foi fechado pela Asae, porque pelos vistos foram
apanhados a vender carne de ponei, em vez de carne de cabrito. Por isso,
quando precisamos de alguma coisa, temos de ir á vila de autocarro, ou
então de boleia. Mas isso de aceitar boleias já acabou há muito tempo.
Aqui a Celestina já não aceita boleias de ninguém primeiro, porque temos
porque temos que puxar pela nota no final da viagem, depois porque aqui
há tempos uma vizinha minha deixou-me a meio do caminho, porque eu ia
a falar de mais. Ainda tive que andar a pé uns bons quilometros e eu já
tenho 60 anos. Não sou nenhuma jovem! Por isso é que nunca mais aceitei
boleia de ninguém, só vou á vila de autocarro. Mas primeiro que ele cá
chegue é um castigo. (olha para as horas) 4 minutos atrasado! (continua
com a fazer a sua renda) Eu que tenho tanta coisa para lá fazer na vila.
Precisava de ir ás compras. Tenho que andar sempre a pedir chouriço ao
meu visinho, porque não tenho lá em casa. Se não fosse o homem não
comia chouriço. Precisava de ir á Manuela dos pêlos arrancar o resto do
meu buço, pois a neta, da filha da minha prima Charneca, fez-me a
depilação ao buço mas só arrancou metade, a outra metade ficou por
fazer. Se é que é uma habilidade que ela tem e diz ela que tem uma loja de
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estética. Também havia de ir á cabeleireira, somos muito amigas, sempre


batia o papo com a mulher e sempre sabia se o tio, do primo, do irmão
dela, anda metido com a nora, da prima, da tia, do cunhado dela. E já
agora, se a prima, da mãe, da irmã, do pai, faz alguma coisa de jeito em
casa. É pelos visto nem um ovo sabe estrelar! Também precisava de ir á
calista, arrancar um calo que me nasceu na ponta da lingua. Isto doi muito,
pensam o quê? A Calista está sempre a dizer: “Experimente falar menos!”
Eu bem tento mas isto não passa. (olha para o seu relógio de pulso) Mas
de certeza que já perdi a vez, por causa daquele motoristazeco de meia
tijela que passa a vida no marmelanço. Mas deixem-o cá chegar, que já vai
ver qual é o preço dos marmelos! (De repente o bêbado ressona bem alto.
A dona Celestina mandam um salto) Raios te partam Bêbado duma figa!
Que me assustaste! Este também passa a vida bêbado! Não sei de onde
esta trampa veio! Deita cá um pivete e depois passa a vida enfiado no café
a beber vinho! Tem o focinho curto o homem. Eu sei muito bem o que
havias de beber! Era chá! Chá da meia noite. Ao menos acaba com a
desgraça.

CENA 2

Entretanto aparece a Graça

Celestina: (para o publico) Olhem! Em falar em desgraça, chegou a Graça!

Graça: Olá Dona Celestina! Falta muito para o autocarro? (senta-se ao lado
da dona Celestina)

Celestina: (para o publico) Eu não disse que ia ser uma desgraça? Nem o
horário do autocarro sabe! Ao menos que compre um! (para a Graça) Olá
Graça! Está atrasadissimo! Já estou aqui há quase uma hora e ele ainda
não apareceu!

Graça: Este motorista é sempre assim!

Celestina: Então mas como vai a Graça? Já não há olhos que a vejam!

Graça: Olhe, eu vou indo como o governo...

Celestina: (Para o publico) Pois desgovernada!

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Graça: Disse alguma coisa dona Celestina?

Celestina: (ri-so cinico) Não! Não! Estava a falar aqui com as minhas
agulhas! As malandrecas picaram-me! (novamente o ri-so cinico) Eheeheh!
(mudando de assunto) Então mas anda como o governo porquê? Anda
meia entroikada é? (riso cinico)

(dona Celestina está sempre a fazer a renda com muita energia, só pára de
vez enquando para falar)

Graça: Ando meia entroicada e de que maneira dona Celestina! Ando cada
vez pior e não vejo melhoras.

Celestna: (para o publico) Isso já eu sabia! (para a Graça) Então o que se


passa?

Graça: É a minha osteoviróse que dá cabo de mim!

Celestina: Osteo quê Graça?

Graça: Osteoviróse! Não conhece essa doença? Fartam-se de falar disso na


televisão. É falta de calcário nos ossos!

Celestina: Mas qual osteoviróse? É osteoprose que se diz! E não é falta de


calcário. É falta de calcio nos ossos! Ai Graça mas que desgraça! Você é
alguma máquina de lavar ou quê mulher?

Graça: Já fui! Lá vai o tempo em que eu era uma verdadeira máquina,


agora não valo nada! Depois é o meu marido, ressona durante a noite
depois não me deixa dormir. (O bêbado ressona uma vez bem alto e
Cuscantina assusta-se) Ai credo nossa senhora da tramela! Ia-me dando
aqui um penico!

Celestina: Um quê?

Graça: Um penico!

Celestina: Fanico mulher! Fanico! Ai Graça! Graça! Mas que desgraça!

CENA 3
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Entretanto aparece o rapaz da pizza, traz consigo uma caixa de pizza

Rapaz da Pizza: Ora bom dia! Qual das senhoras é que encomendou uma
pizza?

Celestina: Fui eu!

Rapaz da Pizza: Aqui tem! (entrega a caixa de pizza, dá á Celestina. Esta


pára de fazer a sua renda e aceita a pizza )

Celestina: Então quanto é que é?

Rapaz da Pizza: Olhe se quer saber nem sei! Acho que são cerca de 5 euros
ou 10 euros. Não tenho a certeza! Mas vou ligar para a pizzaria e já me
dizem!... (pega no telemovel, marca um numero, espera um pouco e fala)
Estou?... Olha quanto é uma pizza 4 estações?

Celestina: Não é a pizza 4 estações! É a pizza Romana! (para a Graça) Ai


Graça que desgaça!

Rapaz da Pizza: (continua a falar ao telemóvel) Olha afinal não é a de 4


estações é a Romana! ...

Celestina: Abre a caixa! É lá! Isto mais parece pizza Africana viu-se negra
para cá chegar! É servida Graça?

Graça: Não obrigada! Não tenho fome, comi uma tijela de cavalo cansado
ao pequeno almoço!

(Celestina começa a comer a pizza)

Rapaz da pizza: (ao telemóvel) O quê? Estás bem pá? 2 euros uma pizza? 2
euros é o preço da tosta mista pá! Passa o telemóvel á rapariga das mesas!
Tu não percebes nada disto pá! ... Sou muito esperto o quê, pá?... Mas
quem é que se quer atirar á rapariga? Só que quero fazer uma pergunta de
trabalho á rapariga. Já que tu és um incompetente, que nem sabe o preço
de uma pizza, deixa-me falar com quem sabe.

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Celestina: (para a Graça) Olha quem chama incompetente! O rei da


incompetência!

Graça: Realmente! Se é que deve ser uma pinçaria bem arranjada!

Celestina: Pizzaria mulher! Ai Graça que desgraça!

Rapaz da Pizza: (continua a falar ao telemóvel) O quê? Ela não pode


falar?... Então porquê? Estou? ... Patrão?... Estou aqui numa paragem do
autocarro, patrãozinho... Então queria saber quanto é a pizza Romana?...
Sim está bem!... Está bem patrão obrigado!... Com licença! (guarda o
telemóvel) Olhe o meu patrão diz que perdeu o catalogo das pizzas e
também não sabe os preços decor!

Celestina: Então olhe rapaz! (tira a carteira) Tome lá 50 euros e pode ficar
com o troco!

Rapaz da Pizza: Tem a certeza que posso ficar com o troco?

Celestina: Tenho! Vá lá destribuir as suas pizzas á vontade! Esta por acaso


está uma delicia! Bem diz o outro quanto mais negra, melhor é a febra!

Rapaz da Pizza: Obrigada minha senhora! (abraça e beija a Celestina)


Finalmente tenho sorte na vida! É só azares atrás de azares, então hoje
nem se fala! Pois a minha mota ficou sem gasolina ali adiante. Esqueci-me
de verificar o deposito e agora estava ver que tinha ir no autocarro!

Celestina: Olhe então aproveite a grojeta e vá meta gasolina nas bombas


mais proximas, que o autocarro hoje está pior que as obras do metro
mondego. Nem anda nem desanda!

Rapaz de Pizza: Obrigada! A senhora é uma santa, hei-de ir a Fátima a pé


só para lhe agradecer! Obrigada! (sai)

CENA 4

Graça: A dona Celestina está bem? Dá 50 euros ao rapaz assim? Nem


parecem coisas suas! Não a estou a reconhecer!

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Celestina: Deixe lá isso! A nota também é falsa, fui enganada ante-ontem!


Além disso a pizza também não era para mim! Mas como estou cheia de
fome aceitei.

Graça: Coitado do rapaz! Não tem mesmo sorte na vida! Deve andar
mesmo amaldicioado!

Celestina: Tem a certeza que não quer um bocado de pizza?

Graça: Não obrigada! Não gosto de comer pinça! Prefiro emporrado!

(Celestina mete a caixa da pizza no caixote do lixo. Senta-se novamente e


recomeça com a sua renda)

Celestina: Mas que é que você está para aí a dizer mulher? Prefere
emporrado?

Graça: Então não sabe o que é emporrado? É tão bom! E um emporrado


de espinafres que delicia!

Celestina: Ai Graça que desgraça! Esparregado! É esparregado que diz


mulher! Você qualquer dia ainda vai presa, por causa das besteiras que
diz!

Entretanto ouve-se a sirena da policia

Graça: Mas o que se passa? Esta ali a policia!

Celestina: Sei lá!

CENA 5

Entretanto aparece o Rapaz da Pizza algemado a ser levado á força por um


policia

Rapaz da Pizza: (grita) Solte-me! Solte-me por amor de deus!

Policia: Vamos embora!

Rapaz da Pizza: (grita) Eu só ia para meter gasolina!


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Policia: Pois e ias pagar a gasolina com uma nota falsa! Não era?
Espertinho!

Rapaz da Pizza: Mas eu não tive a culpa!

Policia: Pois não! Foi o Papa Xico querem ver! Andas a tentar enganar as
pessoas e depois não queres assumir as responsabilidades! Podias ir para
politico!

Rapaz da Pizza: Mas eu fui enganado primeiro!

Policia: Isso não é a mim que tens de dizer é quando chegar-mos ao posto!

Celestina: É uma vergonha! Já não se pode confiar em ninguém! É só


vigaristas neste país!

Rapaz da Pizza: (grita) Você é que me enganou sua velha!

Celestina: Eu? Eu não engano ninguém!

Rapaz da Pizza: Sua bruxa!

Policia: (para o rapaz) Oh! Oh! Respeitinho rapazola! Senão apanhas a


pena a dobrar por insulto a uma cidadã!

Rapaz da Pizza: Mas foi ela que me tramou! Ela é que me pagou uma pizza
com uma nota falsa!

Celestina: Eu? Eu nem gosto de comer esse tipo de comidas!

Rapaz da Pizza: Pois! E o Sporting vai ganhar o campeonato esta


temporada!

Policia: Cala-te rapaz! Olha que tu não gozes com o meu clube! Que ainda
te lixas ainda mais!

Rapaz da Pizza: Mas ela é que me deu a nota falsa!

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Policia: Vê se cresces rapaz e assumes o que fazes! Não metas as culpas


nos inocentes! Agora vamos para o posto!

Rapaz da Pizza: (grita) Isto não é justo! Isto não é justo! Isto só mesmo em
Portugal! Sou enganado e depois vou preso! (para dona Celestina) Eu juro
se algum dia a apanhar que a desfaço em picadinhos e meto-a num
hamburger! Percebeu sua velha?

Celestina: Está maluco o rapaz!

Policia: (para o Rapaz da pizza) Mais um ano na tua pena! Ameaça a uma
cidadã!

Rapaz da Pizza: (grita) Isto não fica assim!

Policia: Cale-te antes que eu seja obrigado tomar medidas drásticas!

Rapaz da Pizza: (grita) Vai paga-las! Vai paga-las!

(Policia e rapaz da Pizza saem de cena e a sirene pára de tocar)

CENA 6

Graça: Ai dona Celestina! Como pode fazer uma coisa destas ao rapaz da
pizza? Coitado do moço! Foi preso por causa de si!

Celestina: E desde quando é que em Portugal se prendem os verdadeiros


culpados? Além disso! Vai ter roupa lavada, comida de borla e televisão.
Tudo de borla! Com a crise que vivemos só tem de me agradecer!

(Piélas volta a ressonar alto. Graça e Celestina assustam-se)

Graça: Aí! Que foi isto?

Celestina: Foi aquele desgraçado daquele bêbado outra vez! Era vir um
carangueijo e comer-lhe o coiso!

Graça: Olha mas está ali um homem? Como é que eu não tinha reparado?

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Celestina: (para o publico) Eu digo que esta mulher é uma desgraça? (para
a Graça) Abra os olhos mulher! Ele já ali estava quando você chegou
mulher!

Graça: Olha mas ele é o Pielas!

Celestina: Foi uma piéla e de que maneira!

Graça: É ele mesmo o Pielas! Eu realmente bem me pareceu que estava


aqui um cheiro esquisito!

Celestina: Pois! Esse é como deserto do Saara já não vê água há séculos.

Graça: Sara? Quem é esse fulano?

Celestina: Mas qual fulano Graça?

Graça: Esse Sara! Também um homem com nome de mulher, onde é que
já se viu? Não me diga... Não me diga que ele é rabiló! Bem isto é para o
que está a dar! Deve ser efeitos da troíka! O Passos Coelho mete a malta
toda entroicada das ideias.

Celestina: Ai Graça! Mas que desgraça! Você é que anda entroicada das
ideias! Eu não falei em nenhum homem chamado Sara! Eu disse que aí
esse bêbado, esse Piélas, ou como raio se chama, é como o deserto do
SAARA! Não vê água no coiro há séculos!

Graça: Ah! Não diga isso do Pielas! Coitadinho! Olhe que ele ainda
pertence á minha familia!

Celestina: (para o publico) Pois agora é que eu estou a ver de onde vêm
tanta pancada!

Graça: (levanta-se e vai ter com ele) Coitado do Pielas! Parece que caiu
para dentro de uma fossa!

Celestina: Coitado? Coitada é de mim! Já estou farto deste cheiro e de o


ouvir ressonar! Assim como estou farta desta manhã infernal, de esperar
pelo autocarro e ele não aparece! (olha para o seu relógio de pulso) Daqui
a pouco é hora do almoço e aquele verme do motorista sem aparecer!
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Que irresponsável chixa! É que á tarde não dá para ir á vila, só agora de


manhã! Tenho mais que fazer! É que a partir das 2 horas, vai dar na TVI um
programa especial com o Manuel Luís Goucha e eu não posso perder.
Depois tenho que ver a minha novela que passa logo a seguir. Ah! Também
não me posso esquecer de publicar no morar do meu facebook, que
apanhei uma grande seca na paragem do autocarro.

Graça: (fala com o pielas como ele fosse um bébé) Piélas! Cucu! Piélinhas!
Cucu! Acorda meu malandreco! A prima está aqui, não deixa que te façam
mal!

Celestina: Mas o que é que você está a fazer Graça?

Graça: Estou a ver se o Piélas acorda! (para o Piélas) Piélas! Olha a prima!
Acorda seu malandro!

Celestina: Ai Graça! Que desgraça!

Piélas: (Acorda meio estremungado) Que é?

Graça: (para o pielas) Olhem para ti pareces mesmo um sem abrigo!

Piélas: Sem abrigo eu? Mas eu tenho abrigo!

Celestina: Deve ser é ali na fossa do Zé dos Porcos pelo cheiro!

Piélas: Mas o quê?? Não me chateiem a cabeça! Eu preciso é de falar com


o Albardas! (levanta-se a cambalear, deixa cair o carapuço. Graça vai atrás
dele)

Graça: Anda cá Piélas! Para onde vais? Estás bebado!

Pielas: O que queres ao Pielas? Deixa o pielas em paz! O Pielas quer é falar
com o Albardas! (chama) Oh! Albardas? Oh! Albardas onde é que estás? Á
ladrão! Prometeste-me um copo e fugiste!

(Pielas saí de cena)

CENA 7

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Graça: Volta aqui pielas! Ainda és atropelado por um carro!

Celestina: Deus te ouça Graça! Deus te ouça mulher! Também era menos
um que andava aí aos caídos!

Graça: (revoltada) Olhe dona Celestina eu não lhe admito isso! Não lhe
admito que trate assim o homem! Ele é meu familiar!

Celestina: Mas o quê? Não me levante a voz Graça? Porque eu sou mais
velha que voçê! Veja o respeito!

Graça: Respeito? Respeito? Olha quem fala de respeito! Você é que não
tem respeito por ninguém, só sabe dar á lingua, é mal-educada, é uma
siníca, fala mal de toda a gente e é maldosa!

Celestina: (ofendida) Mas... Mas... mas com quem pensa que está a falar?
Quem você pensa que é? Você é uma burra! Nem falar sabe! Não lhe
admito que fale assim para mim! Ouviu?

Graça: Falo assim para si, falo dona Celestina! Voçê tem de ouvir as
verdades! Lembre-se que hoje um rapaz foi preso por causa de si! Isso é
feio! Percebeu? Também não tem o direito de falar assim para o Piélas,
não pode tratar as pessoas como lixo! O Piélas é bom homem! É assim
porque nasceu um bocado tarde! Percebeu? Demorou 12 meses para
nascer!

Celestina: Pronto! Está explicado a razão da pancada do homem! Pois os


burros é que demoram 12 meses para nascer!

Graça: Não diga essas coisas dona Celestina! O que é que a senhora vai
fazer á missa todos os domigos, se passa a vida a fazer mal a todos? Hã?
Diga dona Celestina! Você só de pisar o chão da igreja já está a pecar!

Celestina: (ofendida) Mas... Eu vou á missa para rezar pelo meu pobre
marido e pelo meu pai que já estão no céu!

CENA 8

Os dois homens passageiros e a senhora passageira saem de cena


assustados com a algazarra, fica só a dona Celestina e a Graça em cena
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Graça: O seu marido não conheci, mas o seu pai lembro-me dele, morreu á
3 anos salvo erro! Era o senhor Preporciano não era?

Celestina: Era esse mesmo!

Graça: Pois! O seu pai era bom homem! E foi o bom homem que você
deixou apodrecer no lar onde eu trabalhei! Nem o ia ver! Eu bem me
lembro dona Celestina! E ainda fala você mal deste e daquela!

Celestina: Ouça aqui! Sua troika tinta, você não tem o direito de me chapar
isso na cara! Meta-se mas é na sua vidinha.

Graça: As verdades são para ser ditas e agora se me dá lincença vou


embora! (vai para sair)

Celestina: Ai vai embora? Não tinha de ir ao médico da vila tratar da sua


osteoperóse?

Graça: (volta para trás) Quem disse que eu tenho osteoperose?

Celestina: Foi você!

Graça: (ri na cara dela) Acha mesmo que eu tenho osteaperóse? Eu estava
a brincar consigo mulher! Não tenho doença nenhuma! Estou bem de
saúde, rija que nem um calhau! Como vê não é tão esperta quanto parece!
E agora se me dá licença vou andando!

Celestina: Olha que o seu primo deixou ficar o carapuço!

Graça: Qual meu primo?

Celestina: O pielas!

Graça: (ri) Nem o conheço de lado nenhum, só quero é ver se arranjo um


companheiro, mas ele fugiu! Vou á procura de outro companheiro em
outro lugar!

(Graça sai de cena)

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CENA 9

(fica Celestina fica sozinha e abandonada)

Celestina: Isso vá embora! Vá embora e veja se arranja um companheiro


que lhe ensine a fazer fazer alguma coizinha! Esta é que eu não esperava.
Ainda por cima é mentirosa e eu estupida acreditei nela. Depois eu é que
sou a má desta história! (imita a Graça) Ai tenho uma osteovirose! Afinal
era a gozar comigo! (imita novamente a Graça) O seu pai era bom homem!
Foi o bom homem que abandonou no lar! (fala normal) Sonsa! Lá sabe ela
o que diz! O homem já não estava bom da cabeça! Já não o conseguia
aturar! Abandonei o meu pai sim! Porque ele era um barrasco e
abandonou-me uma vez em Angola, quando eu era criança. Andou para lá
enrolado com as Angolanas, depois fez para lá filhos a dar com pau e elas
não o largavam. Queriam todas casar com ele! Então fugiu para Portugal e
deixou-me sozinha com a minha Mãe até rebentar a guerra. Depois,
também viemos para cá! Por isso essa Graça que não fale daquilo que não
sabe! Mas ela tem-me as prometidas, pois com a Celestina não se brinca.
Um dia destes agarro numa catana que o meu pai trouxe de Africa!
Escondo-me ao pé da casa dela e quando ela for a passar! (pausa) ZÀZ!
Corto-lhe umas silvas que ela tem lá ao pé de casa! Pois aquela mulher
não vê nada á frente dos olhos. Aquilo mais parece a floresta da amazónia.
Ela há-de ver que aqui a Celestina tem 60 anos, mas mas não anda a
dormir! (tira uns binóculas da carteira) Há pois! Posso morar no monte da
aldeia, um pouco isolada da população mas tenho a aldeia toda sobe o
controle! Comprei estes binóculos nos chineses dão-me muito geito! Por
isso a menina Graça que se meta a pau comigo, porque eu não brinco em
serviço! Bem! O que é que eu estou para aqui a falar sozinha que nem
uma doida? Vou-me mas é embora já que o autocarro não vêm. Mas
amanhã vai ouvir poucas mas boas. (arruma a sua renda na mala,
levanta-se) Ai as minha cruzes! (pega na mala e vai-se embora sai de cena)

CENA 10

Entretanto ouve-se o barulho de um autocarro a chegar á paragem.


Aparece um autocarro (pode ser de papelão ou qualquer coisa a imitar a
um autocarro). Lá dentro vem o Motorista a fazer que vem a conduzir

Motorista: Maldita paragem do autocarro sempre vazia! Eu não acredito


que apanhei uma fila de carros pelo caminho, por causa de um papa
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reformas, para chegar aqui e não estar cá ninguem. Nunca mais me


enganam! (arranca e sai de cena)

CENA 11

Entretanto aparece uma senhora de idade, com uma bengala vindo do


lado contrario do autocarro.

Senhora de idade: A que horas passará o autocarro? (olha para as horas.


Tira o horário do bolso) Está atrasado! Sempre a mesma coisa!(senta-se no
banco)

(fecha-se os panos)

FIM

AUTOR: Luís Gonçalves

26/03/2013

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