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Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – UERN

Campus Avançado de Pau dos Ferros – CAPF


Letras com Habilitação em Língua Portuguesa e suas respectivas
Literaturas – Licenciatura
Pau dos Ferros, 13 de agosto de 2021
Professora: Drª. Concísia Lopes do Santos
Aluna: Anália Vitória Costa Ferreira
Disciplina: Teoria da Literatura II

Análise do narrador do conto machadiano “O caso da vara”

Neste texto, será analisado o foco narrativo do conto machadiano “O caso da


vara”, que trata sobre os conflitos de Damião, um jovem seminarista que tem o desejo de
sair do seminário e, portanto, vai atrás de Sinhá Rita – conhecida de seu padrinho – para
que ela o ajude a se livrar do colégio para padres, mesmo contra a vontade de seu pai, e
Lucrécia, escrava de Sinhá Rita que tem de terminar uma tarefa a tempo, para que não
seja castigada por sua dona com uma vara (que aliás, compõe o título).
Observa-se, no conto, que a presença da narração é expressiva, constante, não se
pode, então, classificá-la como os modos de onisciência seletiva (múltipla ou não), nem
o dramático e nem o de câmera; também não podem ser o narrador testemunha ou o
protagonista, pois o conto é estruturado em 3ª pessoa. Visando tudo isso, pode-se afirmar
que a narração é onisciente; mas, levando em consideração que o narrador não faz
intromissões na narrativa – em nenhum momento esboça grandes opiniões, conversa com
o leitor, faz interferências diretas que interrompam o ritmo da história –, ele pode ser
classificado como narrador onisciente neutro. O narrador conhece os sentimentos e
pensamentos dos personagens, como no momento em que Damião pensa em apadrinhar
Lucrécia, caso ela não conclua a tarefa de renda e seja punida por Sinhá Rita: “Damião
reparou que tossia, mas para dentro, surdamente, a fim de não interromper a conversação.
Teve pena da negrinha, e resolveu apadrinhá-la, se não acabasse a tarefa.” (ASSIS, 1891,
p. 3); a onisciência do autor é vista em outros momentos também – quando ele aponta o
arrependimento de Damião por ter de entregar a vara; quando Sinhá Rita diz que tem em
sua casa um casaco de seu falecido marido para emprestar a Damião, mas já previamente
o narrador enfatiza que o objeto é de João Carneiro, desmentindo Sinhá Rita, que tentava
esconder o verdadeiro dono do rodaque “Sinhá Rita dispunha justamente de um rodaque,
lembrança ou esquecimento de João Carneiro. ‘Tenho um rodaque do meu defunto’, disse
ela, rindo [...]” (ASSIS, 1891, p. 3), etc. Dessa forma, visando os aspectos de conhecer o
íntimo de todos os personagens, mas não fazer comentários dentro da história, que fujam
do que está se passando na narrativa, considera-se o narrador como onisciente neutro.
Quanto a presença de CENAS e SUMÁRIOS, é possível notar expressiva
demonstração de ambos, no entanto, a presença de SUMÁRIO ainda é predominante.
Embora também haja CENAS, principalmente em partes dos diálogos e nos momentos
de maior tensão da narrativa, como o momento em que Sinhá Rita vai castigar Lucrécia
e Damião tem que decidir se entregará ou não a vara para Rita.
Seu ponto de vista é de narrar acima da história, ou seja, como se ele observasse
tudo de um panorama superior, apenas falando o que está se passando e o que os
personagens estão sentindo. Os canais são as palavras do narrador, suas percepções. A
distância é significativa, já que não existem, por exemplo, grandes detalhamentos
descritivos do local, das pessoas, dos sentimentos (embora exista em alguns momentos).
Essa narração mais distante dá para o leitor a sensação de apenas estar ouvindo uma
história e não de estar inserido no ambiente em que ela ocorre, como por exemplo no
modo de narração Câmera, que, por causa do excessivo detalhamento, traz a sensação
para o leitor, em alguns momentos, de estar inserido dentro da cena.
Conclui-se então que “O caso da vara”, de Machado de Assis, é um conto com
narrador onisciente neutro, com predominância de Sumários, ângulo empregado de cima,
com as palavras e percepções do narrador sendo os canais para a narração e uma grande
ou média distância (variando em certos momentos) entre o narrador e o leitor.

REFERÊNCIAS:
ASSIS, Machado de. O caso da vara. 1a. ed. [S. l.: s. n.], 1891.
GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. [S. l.: s. n.], 2001.
LEITE, L. C. M. A tipologia de Norman Friedman. In: LEITE, L. C. M. O foco
narrativo. São Paulo: Ática, 2002. cap. 2, p. 25-70.

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