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Universidade Estadual do Rio Grande do Norte – UERN

Campus Avançado de Pau dos Ferros – CAPF


Letras com Habilitação em Língua Portuguesa e suas respectivas
Literaturas – Licenciatura
Pau dos Ferros, 27 de agosto de 2021
Professora: Dra. Concísia Lopes do Santos
Aluna: Anália Vitória Costa Ferreira
Disciplina: Teoria da Literatura II

Análise do tempo do conto machadiano “O caso da vara”

O conto do autor realista Machado de Assis – O caso da vara – fala sobre a


dificuldade de Damião, um frustrado seminarista, em sair de seu seminário, já que seu pai
não permite tal decisão, sendo assim, ele pede ajuda a uma conhecida de seu padrinho, a
senhora chamada de Sinhá Rita. Sinhá Rita possui algumas jovens escravas, dentre delas
Lucrécia, que aparece na história protagonizando um conflito secundário: terminar sua
tarefa até o anoitecer para não apanhar com a vara de sua dona, Rita. Lucrécia, no entanto,
não conclui sua tarefa e, portanto, Rita se posiciona para o castigo, a história se encerra
com Damião tendo de decidir entre salvar Lucrécia do castigo físico ou entregar a vara
para Sinhá Rita, já que a senhora está o ajudando a sair do seminário. A escolha que ele
faz é a de entregar a vara para Rita.
A história machadiana se passa antes do ano de 1850. Certamente, essa escolha
do autor se deve ao fato de que algumas leis contribuintes para o compassado cessar da
escravidão brasileira tenham começado a viger a partir do ano de 1850. São elas: Lei
Eusébio de Queirós (1850 – proibia o tráfico negreiro); Lei do Ventre Livre (1871 –
crianças nascidas de escravas já nasciam livres); e Lei do Sexagenário (1885 – que dava
a liberdade para os escravos a partir de 60 anos). Portanto, essa escolha de época traz uma
facilidade para o autor, Machado de Assis, construir esse ambiente de normalização de
práticas para com escravos, sobretudo crianças. Pois bem, a época da história machadiana
se passa, historicamente falando, antes das primeiras ações legislativas significativas
contra a escravatura.
Mas, embora a história traga em sua estrutura temporal tantas datas significantes,
ela não tem uma duração tão longa quanto a sucessão de anos para as leis abolicionistas.
A duração da história é apenas de um único dia – indo das 11 horas de uma manhã; de
uma sexta-feira; de algum agosto; de algum ano antes de 1850, até o anoitecer (momento
esse, aliás, o qual Lucrécia é penalizada por não concluir sua tarefa) – essa curta duração,
no entanto, é crucial para a construção do enredo da narrativa, pois o conflito de Lucrécia
depende justamente do anoitecer.
Quanto ao tempo de passagem, é cronológico, porque não há interferência de
nenhuma percepção interna de algum personagem que faça ele perceber o tempo a sua
maneira ou narrar a história sem ser em ordem cronológica. A história é narrada de acordo
com a sucessão dos fatos, não há também presenças de anacronias (Analpses ou Prolapse).
Os tempos verbais variam, principalmente, entre presente e pretéritos do indicativo.
Sobre as figuras retóricas, para o desenrolar temporal, observa-se a presença de
Sumário e Cenas, quando há a síntese de momentos e quando há a narrativa dele de forma
simultânea, respectivamente. Tais trechos podem ser percebidos em “Dentro de pouco,
ambos eles riam, ela contava-lhe anedotas, e pedia-lhe outras, que ele referia com singular
graça.” (ASSIS, 1891, p. 3) – perceba que, aí, há um sumário dos acontecimentos daquele
momento –; já nas partes prepostas com travessões, por exemplo, temos a presença de
cenas. As duas, aqui citadas, são as únicas figuras temporais presentes na narração.
Dessa forma, observando os aspectos aqui explicitados, sintetiza-se que o tempo
histórico é em um cenário em que o declínio da escravidão ainda não é tão presente no
Brasil do século XIX, com uma narrativa ocorrida com duração de um dia, passagem do
tempo cronológica e com a presença de Sumário e Cena.

REFERÊNCIAS
ASSIS, Machado de. O caso da vara. 1a. ed. [S. l.: s. n.], 1891.
GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. [S. l.: s. n.], 2001.
NUNES, Benedito. Do tempo real ao tempo imaginário. In: NUNES, Benedito. O tempo
na narrativa. São Paulo - SP: Editora Ática S.A, 1995. cap. 2, p. 16-26.
NUNES, Benedito. Os tempos da narrativa. In: NUNES, Benedito. Os tempos da
narrativa. São Paulo - SP: Editora Ática S.A, 1995. cap. 3, p. 27-37.

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