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José Carlos Redson

Ter clareza sobre o que é um conto literário é imprescindível, embora o


conceito sobre este gênero apresente bastante oscilação entre os mais renomados
estudiosos desse tipo de narrativa. O conto condensa e potencializa em seu espaço
todas as possibilidades da ficção e constitui-se como um espaço de multiplicidades
narráveis a partir de uma célula de realidade transubstanciada em signo. Trata-se de
um organismo vivo, consubstanciado, uma narrativa legível, elíptica que transita
entre “o retrato fosco da brutalidade corrente e a sondagem mítica do mundo, da
consciência ou da pura palavra” (Bosi, 2015, p. 24).
Por ser uma narrativa que comporta pluralidade de procedimentos inventivos,
não é novidade a presença de uma linguagem hibridizada, uma vez que as fronteiras
entre este ou aquele gênero ou até mesmo entre sistemas de linguagens são tênues.
Cortázar (2011) traça uma definição do conto literário com extrema leveza e
poeticidade e refuta um conceito apenas taxonômico, pois considera o conto um
organismo vivo. E como tal, é movente. Nessa perspectiva, instaura-se um jogo entre
a realidade humana e a realidade criada, representada. O conto que acumula em si
“uma síntese viva e uma vida sintetizada”, dispõe de processos que reúne elementos
diferentes, concretos ou abstratos, para fundi-los num todo coerente. Essa fusão de
elementos díspares destacada por Cortázar, efemeridade e persistência, manifestam-
se como um recorte de um instante, como a fotografia e, que repercute intensamente
no leitor, enquistando-lhe. Segundo Candido, em A educação pela noite e outros
ensaios, (1989, p. 210), o conto representa o melhor da ficção brasileira mais recente,
e de fato alguns contistas se destacam pela penetração veemente no real graças a
técnicas renovadoras, devidas, quer à invenção, quer à transformação das antigas”.
No Brasil, os contos surgem como forma literária na segunda metade do século
XIX. Primeiro, em uma forma aproximada tanto do conto, quanto da crônica, sendo
os principais autores jornalistas, com presença da narratividade, embora fossem mais
próximos da esfera jornalística do que da esfera literária. O conto brasileiro atingiu
características verdadeiramente literárias com os autores da segunda fase do
Romantismo – a escolha do gênero enquanto um reflexo da época romântica que
buscava nas ficções, poesias e teatro como sua fuga. Podemos citar Álvares de
Azevedo, com Noite na taverna, cuja obra possui uma “composição depurada, de
plano definido e proporções equilibradas, a despeito da delirante concepção das suas
personagens e de suas situações em permanente paroxismo” (Coutinho, 1986, p. 47).
Além destes referidos autores, o Brasil teve em Machado de Assis seu grande
expoente, sobre o qual Alberto de Oliveira afirmou em 1922: “Se o nosso conto
literário não começou com Machado de Assis [...] firmou-se com ele, recebendo-lhe
das mãos trato que nenhuma das outras anteriormente lhe havia dado e feição nova e
característica com o interesse dos temas e alinhado cuidado do estilo” (Coutinho,
1986, p. 47). Machado de Assis evoluiu o gênero no Brasil no que concerne à técnica,
ao estilo e à própria temática, apresentando “domínio perfeito do gênero”, no que diz
respeito também à forma, apresentação das personagens, conflitos e clímax,
aparentando uma simplicidade na qual o conto não é sabedor, ao contrário, trata-se
de um gênero bastante difícil de dominar. Para Cortázar (2006, p. 46), “um conto é
significativo quando quebra seus próprios limites, com essa explosão de energia
espiritual que ilumina bruscamente algo que vai muito além da pesquisa e às vezes
miserável história que conta”.
Desse modo, em sua evolução, o conto tem sofrido frequentes modificações,
tanto em sua estrutura, quanto em sua classificação literária. Com o advento do
Modernismo literário, a arte de contar narrativas curtas sofreu mudanças, tanto na
forma, quanto na linguagem, nas situações psicológicas, até se apresentando, por
vezes, mais sintético, abandonando o “estilo Maupassant” e adotando os de Tchecov e
Mansfield. Essa novidade do gênero trouxe à tona nomes como Mário de Andrade,
Alcântara Machado, Ribeiro Couto, João Alphonsus, dentre outros. Nesta fase, o
grande nome do conto nacional foi Graciliano Ramos que trouxe para esse gênero
“cortes verticais da vida, numa frieza de método técnico, numa parcimônia que seria
indigência, não fosse sua arte de contar das mais ricas em sugestões, pelo teor da
palavra direta” (Coutinho, 1986, p. 56).
Entre Machado de Assis e Guimarães Rosa, houve grande desenvolvimento e
evoluções no conto brasileiro. Os contos de Clarice Lispector, por exemplo, traçam
“um caminho que vai do eu narrativo aos objetos” (Bosi, 2015), a linguagem
clariceana aproxima-se de “uma estranheza radical”. No conto “Menino a bico de
pena”, o menino se percebe no retrato de “O menino”, como neste trecho: “e na
parede tem o retrato de O menino. É difícil olhar para o retrato alto sem apoiar-se
num móvel, isso ele ainda não treinou” (Lispector, 1998, p. 137). As personagens de
Clarice Lispector são, geralmente, mulheres inseridas em um cotidiano
aparentemente banal, imersas em situações configuradoras de alienação e com uma
frágil consciência de si mesmas e do mundo circundante, em torno do qual gravitam.
Aos poucos, esse cotidiano se revela perigoso, pois pode levar a personagem – a partir
de experiências vivenciadas com objetos, animais ou pessoas – a um desvelamento de
sua condição, fazendo-a adentrar um processo intenso de reflexão de si mesma e de
sua condição como ser existente. No entanto, um dos primeiros escritores a publicar
foi o brasileiro Norberto de Sousa Lima. Sua primeira publicação é datada de 1841,
em um folheto de mais ou menos trinta páginas com o conto intitulado “As Duas
Órfãs”. Onze anos depois, esse escritor reuniu esse trabalho a outros três e publicou o
volume Romances e Novelas.
Contextulmente, o conto moderno nasce com Edgar Allan Poe. Não se trata
apenas de que Poe inventa uma série de gêneros: o conto psicológico, o de terror/
horror, a fantasia/ ficção científica, a enorme tradição do relato policial. Poe inventa,
sobretudo, outra lógica para o conto. Ricardo Piglia descreveu essa lógica tirando um
exemplo do bloco de notas de Tchekhov (outro mestre do conto na forma moderna):
“um homem, em Montecarlo, vai ao cassino, ganha um milhão, volta para o hotel e se
suicida”. Aqui está o embrião do conto moderno, porque ele opera contra o senso
comum, que seria ir ao cassino, perder um milhão e suicidar-se. Como a anedota
dissocia o suicídio da experiência do jogo, ela abre uma bifurcação. Trata-se,
portanto, de duas histórias, a do jogo e a do suicídio. Enquanto o conto pré-moderno
conta uma história, o conto moderno conta duas histórias. Tem a primeira história,
que é a da superfície; e tem a segunda história, que é a história secreta, como
podemos ver em “A terceira margem do rio”, de Guimarães Rosa. Não existe uma
“mensagem do texto”, um ensinamento, algo escondido atrás da história que você
tenha que descobrir. No conto moderno, o que está escondido atrás da história é
outra história.
No conto inaugurado por Poe, não existe ensinamento moral, como no conto
pré-moderno. O que interessa é o relato narrado e aquilo que não foi dito. Mas o que
não foi dito não é uma “ideia” ou “mensagem”, é outro relato. Personagens de classe
média transitam nas minúcias do cotidiano, meio sem saber o que fazer ou para onde
ir, vão tendo pequenas epifanias que lhe iluminam as misérias da vida de todo dia, e
no caleidoscópio quebrado que é o relato que recebe o leitor, você vai percebendo que
a única história dois que se cifra é o desespero dos personagens por narrar a história
um.
Nesse sentido, a visão moderna do conto encarregou-se de despojar a narrativa
curta de seu tratamento pomposo e prolixo, tratou de cortar uma floresta de
verbosidade. Em meio às várias tendências dessa nova narrativa, tem-se, por
exemplo, a literatura e o debate com o realismo ou a espetacularização do real. Pode-
se pontuar como característica desse tipo de produção a reinvenção da representação
realista. Nota-se uma forma de narrar exacerbadamente aproximada do real e
compromissada com as descrições minuciosas e com os relatos, como faz Rubem
Fonseca.
O conto, como uma forma narrativa, não é composto somente a partir de sua
estrutura, pois apresenta-se aberto, independentemente de sua extensão ou da
presença desse ou daquele elemento em sua composição. Exemplos de textos que
rompem com essa visão tradicional e simplista de apontar o número de páginas como
importante na classificação da narrativa, são os contos de Tutaméia, de Guimarães
Rosa e o conto O alienista, de Machado de Assis. Os contos de Guimarães Rosa, por
exemplo, apresentam uma estrutura extremamente condensada, raramente
irrompendo a barreira das quatro páginas; já o texto machadiano apresenta uma
narrativa extensa. Repletos de inúmeras características divergentes da visão
tradicional, o conto, como aponta Mário de Andrade, é aquilo que o autor quer que
seja conto. Portanto, espaço, tempo, personagens, trama, linguagem e ponto de vista
são componentes estruturais, mas não imprescindíveis para fundamentar a teoria do
conto, sendo apresentados no intuito de entender como se apresenta esse gênero
narrativo tão cercado de controvérsias. Outra característica da trama do conto
moderno é a quebra de expectativas que levava o leitor a desvendar o mistério
intrínseco a cada conto. Essa ruptura não faz o leitor perder o interesse pelos contos,
pois esses continuam ocasionando sensações e sentimentos diante do cotidiano
banalizado e esquecido pelo indivíduo. A linguagem, assim como os elementos já
citados, é guiada pela objetividade e economia, não cabendo exageros nem
floreamentos. O conflito essencial do conto pode ocorrer na fala das personagens, por
meio do diálogo, elemento importante à estrutura desta forma narrativa.
Dentro desse contexto de modernidade, o conto literário se firma como tal a
partir do século XX, embora tenha sido no século XIV que esse gênero encontrou seus
descendentes mais próximos, sendo o aspecto da tessitura o elo genético que os
aproxima. Armando Moreno (1987) destaca que o ritmo e a linguagem poética se
integraram ao conto ainda no século XIV. Assim como da pena e tinteiro passou-se ao
uso da caneta, o conto, aqui referido sempre como conto literário, sofreu
transformações substanciais ao longo dos tempos. Neste percurso, pode-se destacar
que desde Boccaccio, sem deixar de citar Edgar Allan Poe e Júlio Cortázar, entre
outros, cada um, a seu modo, contribuiu para o amadurecimento e a consolidação
desta vertente narrativa.
Quando pensamos no aspecto do estudo do conto, principalmente do conto
contemporâneo produzido no Brasil, não podemos deixar de realçar as contribuições
do professor e crítico literário, Alfredo Bosi (2015). Em sua obra O conto Brasileiro
Contemporâneo, temos dezenove exemplos de contos produzidos no Brasil. Dentre
eles, ganham destaque além, é claro, dos já citados Guimarães Rosa e Clarice
Lispector, Osman Lins, Lygia Fagundes Teles, Autran Dourado.
Nos tempos atuais, essa configuração do conto se apresenta como um terreno
repleto por areias movediças, pois fragmenta o modo tradicional de narrar. Esse
“gênero” é tão instigante que se torna pertinente realizar uma espécie de painel,
retomando alguns elementos clássicos e paradigmáticos que ainda lhe são essenciais,
sem deixar de destacar os procedimentos inventivos que dominam este tipo de
narrativa na contemporaneidade. Cortázar (2006, p. 150), coloca que “se, não
tivermos uma ideia viva do que é o conto, teremos perdido tempo, porque um conto,
em última análise, se move nesse plano do homem onde a vida e a expressão escrita
dessa vida travam uma batalha fraternal, se me for permitido o termo; e o resultado
dessa batalha é o próprio conto, uma síntese viva ao mesmo tempo que uma vida
sintetizada, algo assim como um tremor de água dentro de um cristal, uma
fugacidade numa permanência”.
Nesse contexto literário, o conto contemporâneo ganhou novas configurações,
como suas fronteiras fluídas e possibilidades de hibridização, com procedimentos
construtivos de outros sistemas de linguagem, ou seja, outras artes. Essas novas
configurações foram mais férteis a partir do Modernismo. O conto, nas palavras de
Cortázar (2006), “é uma verdadeira máquina literária de criar interesse”, gerar
efeitos de sentidos pela sua intensidade. Assim, a “intensidade do conto é essa
palpitar da sua substância, que só se explica pela substância” (Cortázar, 2006, p.
123). Nas décadas de 1960 e 1970, observa-se um grande número de escritores, como
Rubem Fonseca, Osman Lins, Luiz Vilela, Moacyr Scliar, entre outros, fazendo o
conto atingir significativa grandeza. Há, nos contistas dos anos 1970, um sentimento
trágico, nefasto, afastando a possibilidade de comunicação das personagens diante de
um mundo desestruturado e sufocante.
Nos anos 1980 no Brasil, a arte literária luta de modo significante para superar
dificuldades geradas por fatores de ordem sócio-econômica e pela concorrência de
outras manifestações altamente motivadoras vinculadas mais aos prazeres do lazer e
do consumo. A ficção entra em uma espécie de trânsito, não mais autocentrada em
vertentes memorialistas, picarescas, alegóricas. A saída da censura das redações dos
jornais em meados de 1978, ano anterior à anistia aos presos políticos, retira muito
da função parajornalística da literatura, que se encarregava de suprir as notícias
lacunares proibidas na grande imprensa.
No período modernista brasileiro, a produção de contos cresce de forma
considerável, crescimento que se dá em escala ainda maior nos anos 1970, de modo
que se torna possível afirmar que o conto é a forma literária de maior preferência
entre os mais novos escritores. Um ponto que pode elucidar e corroborar com esse
argumento é a verificação da enorme quantidade de antologias de contos que vêm
aparecendo dos anos 1990 até o presente. A contística brasileira não cessa de crescer
em número de leitores e escritores. A partir dos anos 1990, com a apresentação das
coletâneas de contos organizadas por Nelson de Oliveira, Geração 90: manuscritos
de computador e Geração 90: os transgressores, vimos impresso em livros o que já
vinha ocorrendo em blogs na web: uma prosa fragmentada e contaminada pelo
ciberspace.
Nos anos 1990, percebe-se na escritura uma série de rupturas/fissuras e
inovações do ponto de vista formal e temático, que nos permitem afirmar que o conto
vem assumindo novas facetas que, pouco a pouco, o afastam da tradição. Entre essas
rupturas, é destacado o modo minimalista do conto, constituído geralmente de um ou
dois parágrafos, fazer esse já identificado nas narrativas de Dalton Trevisan, a partir
dos anos 1980. O mini conto ou conto minimalista, de acordo com Paulino, seria “um
tipo de narrativa que tenta a economia máxima de recursos para obter também o
máximo de expressividade, o que resulta num impacto instantâneo. Marcelo Spalding
apresenta um interessante e pertinente trabalho sobre o conto minimalista a partir de
um estudo sobre os micro-contos que compõe o livro organizado por Marcelino Freire
Os cem menores contos brasileiros do século. De acordo com o trabalho de Spalding,
o microconto seria um gênero literário produzido nos séculos XX e XXI ainda que “as
narrativas breves sempre existiram nas composições dos sumérios, nos escritores
bíblicos, na narrativa oral africana (...) mas ao fazer um corte temporal, pensamos no
desenvolvimento de um gênero literário com leis próprias.
Esse tipo de narrativa, marcada pela brevidade extrema, de sintaxe despida, é
profundamente provocadora, instigadora no sentido de que num átimo, em que não
se percebe nem o tempo nem o espaço, tudo se mostra em queda livre de
profundidade. A realidade é representada em parcelas mínimas, em um
enquadramento de imagens expressivas, dispostas lado a lado, revelando a
fragmentação das experiências vividas. Candido (1989, p. 211) lembra que “há um
pluralismo nas modalidades de contos, tais como o fantástico, o psicológico, o
regionalista, o social, o de costumes, dentre tantos outros que constituem o rico
panorama de estilos reunidos por essa forma literária”. Apesar de todas essas
inovações, Antonio Candido, destaca o seguinte aspecto: “muitos autores mantêm
uma linha que se poderia chamar de mais tradicional, sem dizer com isso que seja
convencional, pois na verdade operam dentro dela com audácia – no tema, na
violação dos usos literários, na procura de uma naturalidade coloquial que vem sendo
buscada desde o Modernismo dos anos 20 e só agora parece instalar-se de fato na
prática geral da literatura. Pode-se mencionar neste rumo a obra discreta de Luiz
Vilela, escritor bastante fecundo que estreou em 1967 com um volume de contos”.
Nesse sentido, além dos escritores já conhecidos, tem-se na narrativa
contemporânea, nomes como os de Sérgio Sant’Anna, Jorge Mautner, Adriana
Lisboa, Luiz Vilela, Luiz Ruffato, Antônio Carlos Viana Mangueira, além de tantos
outros. Cândido (1989, p. 215), coloca que “há uma circunstância que nos faz refletir:
a ficção procurou de tantos modos sair de suas normas, assimilar outros recursos,
fazer pactos com outras artes e meios, que nós acabamos considerando como obras
ficcionalmente mais bem realizadas e satisfatórias algumas que foram elaboradas
sem preocupação em inovar, sem vinco de escola, sem compromisso com a moda;
inclusive uma que não é ficcional. Seria um acaso? Ou seria um aviso? Eu não saberia
nem ousaria dizer. Apenas verifico uma coisa que é pelo menos intrigante e estimula
a investigação crítica”. Nesta mesma linha, Julio Cortázar (2006) também aborda o
conto como um gênero de classificações diversas, não possuindo elementos fixos, mas
características mutáveis típicas de cada autor. Ninguém pode pretender que só se
devam escrever contos após serem conhecidas suas leis. Em primeiro lugar, não há
tais leis; no máximo cabe falar de pontos de vista, de certas constantes que dão uma
estrutura a esse gênero tão pouco classificável (Cortázar,2006, p. 150).
Em Valise do cronópio, Cortázar (1989, p. 157), lembra ainda que “a qualidade
de um conto está não no seu tratamento literário pelo escritor, mas também na
leitura proposta pelo leitor ao texto: o único modo de se poder conseguir esse
sequestro momentâneo do leitor é mediante um estilo baseado na intensidade e na
tensão, um estilo no qual os elementos formais e expressivos se ajustem, sem a menor
concessão, à índole do tema, lhe deem a forma visual a auditiva mais penetrante e
original, o tornem único, inesquecível, o fixem para sempre no seu tempo, no seu
ambiente e no seu sentido primordial”. O conto contemporâneo se enquadra dentro
daquilo de que a narrativa deve ser construída explorando recursos estéticos para
evitar exórdios e circunlóquios já que todos os elementos devem ser arrolados para
assegurar a tensão narrativa. O personagem deve receber contornos nítidos, o fato
norteador da trama deve ser desenvolvido, o espaço e o tempo, marcados. Cortázar
compreendia que o conto deveria seguir regras fixas de composição, no entanto, a
rigidez da forma é desmentida pelo próprio autor que, apesar de apontar vários
elementos fundamentais para a boa narrativa curta e ter seus próprios contos
marcados por tais traços, diz que “[...] ninguém pode pretender que só se devam
escrever contos após serem conhecidas suas leis. Em primeiro lugar não há tais leis;
no máximo cabe falar de pontos de vista, de certas constantes que dão uma estrutura
a esse gênero tão pouco classificável” (Cortázar, 2006, p. 150).
Em toda essa discussão acerca da narrativa curta, Cortázar aponta traços
constantes das narrativas curtas e, passados mais de quarenta anos da publicação da
sua teoria, que ainda vigora nos estudos sobre o conto, é oportuno observar se seus
escritos ainda são válidos para a valoração do conto brasileiro do século XXI.

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