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CONTEMPORÂNEA
PETAR PETROV
UNIVERSIDADE DO ALGARVE
2. Doze anos volvidos sobre a publicação de Godido e Outros Contos, será a vez
de uma outra colectânea de narrativas breves, intitulada Nós Matámos o Cão-Tinhoso
que merecerá a atenção da crítica como uma revelação no domínio da ficção
moçambicana. Tal como o seu antecessor, o livro, da autoria de Luís Bernardo
Honwana, apresenta, temática e formalmente, determinados elementos estéticos da
esfera da transparência literária. Semanticamente, a referida transparência tem a ver
com as questões tratadas, sempre do domínio social, tendo a exploração e a segregação
uma presença constante. Na sua totalidade, as narrativas de Honwana visam denunciar
as forças produtivas em jogo, o autoritarismo do Estado colonial, a opressão exercida
pelas instituições do poder e pelo seu aparelho ideológico ou evidenciar certos aspectos
de consciencialização social e de classe de determinadas personagens. Neste âmbito e
exemplo relevante é o conto “Dina”, cujo enredo reúne todos os ingredientes da herança
neo-realista. Temas como a rudeza do trabalho rural, o sofrimento do trabalhador sujeito
a uma disciplina desumana, a arrogância do branco relativamente ao negro, a
impotência perante o opressor, a prostituição como forma de sobrevivência, a
incompreensão e a alienação realçam as configurações mais salientes de um espaço
social violentado (cf. Hamilton, 1983).
Os restantes contos, em número de seis, mostram também situações concretas de
exploração, humilhação e racismo, comportando, assim, uma perspectiva crítica e
desmistificadora, típica da chamada literatura comprometida. Para além disso, e em
função da sua ordem de apresentação, podem ser vistos como o percurso autobiográfico
de um narrador homodiegético que, ao longo das histórias, toma consciência de certas
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