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O SIUPÉ E A FUNDAÇÃO DE SOBRAL

por Jota Valentim, em 22.10.13

21/08/2011
É fato conhecido na história do Ceará que, apesar de ter sido “descoberto” pelos
europeus antes da vinda de Cabral, a ocupação do seu território só viria a acontecer
mais de cem anos depois.

Desde o “descobrimento”, vários pontos do Brasil foram habitados, porém somente


no ano de 1534 ocorreu a primeira tentativa de colonização das terras descoberta
com a instituição pelo rei de Portugal Dom João III das Capitanias Hereditárias, que
consistia na divisão da colônia em doze territórios entregando a administração a
membros da corte, chamados de donatários. Alguns não chegaram a tomar posse,
caso do donatário da capitania do Ceará. No dizer de Gilmar de Carvalho, “O Siará
Grande, imenso areal entre Pernambuco e o Maranhão, ficou à deriva pela recusa de
seu donatário Antônio Cardoso de Barros de vir colonizar as terras que recebera da
coroa”. (01)

Somente no ano de 1612, no dia de São Sebastião, 20 de janeiro, Martins Soares


Moreno, o guerreiro branco da obra de Alencar deu com os costados na foz do rio
Ceará e ali construiu o forte São Sebastião, dando inicio a ocupação da costa
cearense. Depois veio a invasão holandesa com a construção do Forte Shoonenborch
no cume do morro Marajaitiba, ao sopé do qual corria o riacho do mesmo nome,
hoje o nosso agonizante Pajeú. Mais tarde, a retomada dos portugueses e a
reconstrução do forte com o nome de Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção,
marcaram a ocupação definitiva da costa. A ocupação das terras do interior,
entretanto, ainda demoraria cerca de 80 anos, com a concessão de sesmarias por
volta do ano de 1680. Essas sesmarias foram solicitadas inicialmente nas margens
dos rios próximos à Fortaleza e em seguida nos mais distantes, concentrando-se
principalmente nas bacias dos dois principais rios cearenses, Jaguaribe e Acaraú.

A primeira sesmaria que se tem notícia na ribeira do Acaraú foi concedida em 20 de


setembro de 1683 a um grupo de moradores da capitania de Pernambuco,
comandados por Manoel de Góes, ficando conhecida como “datas dos Góes”.
No ano de 1702, a 14 de outubro foi concedida uma sesmaria a Leonardo de Sá e seu
amigo Antônio da Costa Peixoto, “medindo três léguas de terras seguindo o curso
do rio Acaraú, com meia légua de largo para cada banda do dito rio”.

Antônio da Costa Peixoto, português de nascimento, chegou ao Ceará no ano de


1676 fixando residência nas imediações do forte onde serviu como soldado. No ano
de 1694 solicitou sesmaria na margem do dito rio Siupé e ali passou a residir,
constituindo família e alcançando certa ascendência social e política, sendo eleito
vereador da Câmara do Aquiraz em 25 de janeiro de 1700. Antônio nunca chegou a
se apossar pessoalmente das terras à margem do Acaraú. Com a sua morte essas
terras foram herdadas pelos seus filhos, dentre os quais a filha Apolônia da Costa
Peixoto, que casaria com o Sargento-mor Antônio Marques Leitão, nascido em
Portugal, Freguesia de Óbidos no ano de 1663, tendo migrado para o Ceará nos fins
do século XVII. Em 22 de fevereiro de 1731, Leitão recebeu o título de Sargento-mor
dos Reformados do Distrito da Vila da Fortaleza, por serviços prestados como
soldado nessa capitania e na capitania do Piauí no combate aos gentios (índios).
Após o casamento, Leitão e Apolônia passaram a residir também na localidade de
Siupé onde viveram toda a vida. Em 05 de março de 1738 a filha do casal, Quitéria
Marques de Jesus, casa-se com Antônio Rodrigues Magalhães, recebendo como
dote dos pais as terras herdadas por sua mãe Apolônia na ribeira do Acaraú.

Antonio Rodrigues Magalhães nasceu na Vila do Forte dos Reis Magos, futura cidade
de Natal, província do Rio Grande do Norte, em 05 de junho de 1702. Era filho de
Luiz Oliveira Magalhães, natural do Sergipe Del Rei e Isabel Gonçalves do Rio Grande
do Norte. Antônio migrou para o Ceará por volta de 1726 juntamente com seu
cunhado João Pinto de Mesquita, marido de sua irmã Tereza de Oliveira, os quais
foram morar na fazenda Jucurutu, nas margens do rio do mesmo nome na ribeira do
Acaraú, em terras hoje pertencente ao município de Santa Quitéria. Após o
casamento, Antônio Rodrigues Magalhães tomou posse das terras herdadas pela
esposa, instalando a fazenda Caiçara, embora continuasse morando no Siupé. No ano
de 1741 o Sargento-mor Antônio Marques Leitão fez uma doação de terras para a
constituição do patrimônio da Capela de Nossa Senhora da Soledade do Siupé. Na
mesma ocasião, o genro, Antônio Rodrigues Magalhães contribuiu para o
“encapelamento e aumento da Capela” com a doação de “dez cabeças de bestas
femininas e vinte e cinco de gado vacum feminino”.

No ano de 1742, estando em sua fazenda Caiçara, Antônio recebeu a visita do Padre
Lino Gomes Correia, Visitador Geral dos Sertões do Norte, o qual havia escolhido a
fazenda Caiçara como o local mais apropriado para sediar o Curato da Ribeira do
Acaraú e nela construir sua matriz. Nessa ocasião Antônio faz a doação de 100
braças de terra em quadro para a constituição do patrimônio da Matriz de Nossa
Senhora da conceição da Caiçara. No ano seguinte, a 4 de março de 1743, Antônio
Rodrigues adquire por compra um terreno, bem próximo a sua fazenda Caiçara, no
sopé da serra da Meruoca, aumentando seu patrimônio na região. No ano de 1746,
alargando ainda mais sua área de atuação, Antônio comprou a fazenda Pindá, na
ribeira do rio Canindé, compra efetuada através de seu procurador o Pe. Francisco
Antunes Pereira, capelão do Siupé.
A partir de outubro de 1751 o casal Antônio e Quitéria, já com sete filhos, todos
nascidos no Siupé, passa a residir na Fazenda Caiçara. Ali, nasce sua filha caçula,
Bárbara no final do ano de 1754, tendo sido batizada na capela da fazenda em 7 de
janeiro de 1755. No ano seguinte, em 10 de Dezembro de 1756, é finalmente
passada a escritura das terras doadas ao patrimônio da matriz da Caiçara.
Seis meses depois, no inicio do mês de junho de 1757, quando viajava para sua
fazenda Pindá no alto sertão do Canindé, “no lugar Fazenda Requengue”, Antônio
foi vítima de uma queda de cavalo vindo a falecer. Seu corpo foi transportado para o
Siupé onde foi sepultado na Capela de Nossa Senhora da Soledade do Siupé, no dia 3
de junho de 1757. O sogro, Antônio Marques Leitão faleceu no Siupé em 7 de março
de 1758, com 99 anos de idade sendo também sepultado na mesma capela. Sua
mulher Quitéria Marques de Jesus viria a falecer no dia 31 de agosto de 1759, na sua
fazenda Caiçara em cuja capela foi sepultada.
No entorno da matriz da Caiçara floresceu um pequeno povoado que foi mais tarde,
no dia 5 de julho de 1773, elevada a categoria de vila com o nome de Vila Distinta e
Real de Sobral. No dia 12 de janeiro de 1841 foi elevada a categoria de cidade com o
título de Fidelíssima Cidade Januária de Acaraú e finalmente cidade de Sobral em 25
de outubro de 1842.
Antônio Rodrigues Magalhães passaria para a história como o Fundador de Sobral.
Texto baseado nos livros: Cronologia Sobralense, vol. I e vol. II – Francisco Sadoc de
Araújo – Fortaleza, Ed. Gráfica Editorial Cearense Ltda, 1974; Raízes Portuguesas do
Vale do Acaraú - Francisco Sadoc de Araújo – Fortaleza, Ed.Gráfica Editorial
Cearense Ltda, 1991;
NOTAS: 1. Gilmar de Carvalho em texto para o Anuário do Ceará, 2007/2008.
(*) Jose Ivo Santos Viana, Engenheiro, pesquisador e apaixonado pela história, de
Sobral e do Ceará.

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