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© 2014 Jeffrey R. Holland.

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Dados da Publicação-na-Catalogação da Biblioteca do Congresso
Holland, Jeffrey R., autor.
Em tempos de angústia: consolo espiritual por meio dos Salmos / Jeffrey R. Holland.
páginas cm
Inclui referências bibliográficas e índice.
ISBN 978-1-60907-271-1 (hardbound: alk. paper)
1. Bíblia. Velho Testamento Salmos — Meditações 2. Consolação. 3. Vida cristã — autores Mórmons.
4. A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias — Doutrinas 5. Igreja Mórmon — Doutrinas I.
Título.
BS1430.54.H65 2012
223'.1077—dc23 2012033592
Impresso no Brasil
Publishers Printing, Salt Lake City, UT
10 9 8 7 6 5 4 3 2 1

Para Pat

Consultávamos juntos suavemente,


e andávamos em companhia na casa de Deus.

Salmos 55:14
Table of Contents
Prefácio
Introdução
Seção 1 Meditações
Seção 1 Meditações
"As Ânsias do Meu Coração"
Salmos 56:9
Salmos 1:1-3
Salmos 3:2-5
Salmos 4:1
Salmos 4:4; 27:14; 46:10
Salmos 4:6-7
Salmos 5:1; 119:15, 48
Salmos 5:11-12
Salmos 6:2-4, 6, 8; 57:1
Salmos 8:2
Salmos 11:1
Salmos 15:1-3; 17:3; 34:13
Salmos 17:8
Salmos 18:2, 30; 61:2; 62:6
Salmos 18:36; 94:18-19
Salmos 19:1-3; 8:3-6
Salmos 19:13
Salmos 20:7
Salmos 22:4-5
Salmos 24:3-4; 51:10
Salmos 25:7
Salmos 27:4-5
Salmos 27:10
Salmos 30:5; 42:5; 130:6
Salmos 31:12; 34:18; 51:10, 17
Salmos 32:7
Salmos 34:7
Salmos 36:9
Salmos 37:16; 49:16-17; 73:3
Salmos 37:23-24
Salmos 40:10
Salmos 41:1
Salmos 55:16-17
Salmos 57:7; 26:1-2, 11
Salmos 61:2
Salmos 69:3
Salmos 71:9, 18.
Salmos 77:10-12
Salmos 78:5-8; 145:4
Salmos 85:11
Salmos 86:3-6; 103:8-11, 17-18; 119:58
Salmos 89:9
Salmos 89:30-34
Salmos 94:9-10; 100:3, 5; 119:99-100
Salmos 105:15
Salmos 113:9
Salmos 116:15
Salmos 118:6
Salmos 118:24
Salmos 119:19
Salmos 119:59-60
Salmos 119:67, 71-72.
Salmos 119:94
Salmos 119:103, 105; 12:6; 18:28
Salmos 119:108
Salmos 127:1
Salmos 127:3-5
Salmos 133:1
Salmos 139:23
Salmos 141:3
Salmos 141:5
Salmos 144:12
Seção II O Messias
Seção II O Messias
Salmos 145:14; 146:8
Salmos Messiânicos
Salmos 2
Salmos 8
Salmos 16
Salmos 21
Salmos 45
Salmos 68
Salmos 72
Salmos 89
Salmos 102
Salmos 110
Salmos 118
A Crucificação e a Expiação
Seção III O Vigésimo Terceiro Salmo
Seção III O Vigésimo Terceiro Salmo
Salmos 23
Verdes Pastos, Águas Tranquilas e o Bom Pastor
Vídeos
Prefácio
Neste livro, você encontrará minhas reflexões e meditações pessoais
sobre um conjunto bastante eclético dos salmos. Foram raras as vezes em que
incluí um salmo na íntegra; em geral, fiz comentários sobre um versículo aqui
e outro ali ou então sobre versículos retirados de salmos diferentes. Bem
pouco do que escrevi reflete a opinião de estudiosos que conhecem o idioma,
a cultura e a história da época do Velho Testamento, quando os salmos foram
escritos. Ocasionalmente, mas com pouca frequência, incluí um pensamento
ou citação de outras pessoas. Por ser um livro mais voltado para a adoração
do que para a compreensão, não mencionei certos elementos doutrinários que
seriam apropriados em uma abordagem mais minuciosa, por exemplo, não
focalizei a Tradução de Joseph Smith da Bíblia, nem passagens que fazem
parte da liturgia de outras religiões.
Por serem prioritariamente ponderações, os comentários feitos aqui
refletem apenas o meu pensamento e, portanto, não devem ser considerados
como o único, nem como o melhor, ponto de vista a ser veiculado em um
livro como esse. A natureza pessoal destes ensaios deixa claro que esta
coletânea não é uma publicação oficial de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos
dos Últimos Dias. Eu sou o único responsável por estes ensinamentos. Se
houver erros de julgamento, análise ou ponto de vista, eles são de minha
responsabilidade e de ninguém mais.
Uma palavra a respeito da autoria dos salmos é relevante neste prefácio.
Esses poemas/canções/orações são geralmente atribuídos a Davi, o menino
pastor que se tornaria o mais popular rei da história da antiga Israel. No
entanto, é quase certo que não tenha sido Davi quem escreveu todos os
salmos reunidos na Bíblia. A opinião dos estudiosos contemporâneos não é
unânime nem definitiva a respeito do assunto, mas basta-nos saber que Davi
escreveu muitos dos salmos, e talvez a maioria deles. Felizmente, para os
propósitos deste livro, a autoria de quaisquer dos salmos não representa
problema algum. Para deixar as controvérsias de lado, ao longo do livro
simplesmente refiro-me ao autor como “o Salmista”.
A seleção que fiz é praticamente sequencial, seguindo a ordem da
compilação como aparece hoje na Bíblia. Entretanto, o arranjo escolhido não
possui nenhuma relevância em particular. Por exemplo, usei o Salmos 56
como introdução simplesmente porque senti que tinha a mensagem certa para
começar o livro. Além disso, tomei a liberdade de agrupar passagens de
salmos diferentes cujas ideias se relacionam ou são semelhantes.
Como sempre, agradeço a Randi Greene, minha fiel secretária há mais
de 25 anos. Ela digitou as numerosas e dispersas anotações que resultariam
neste livro, sempre demonstrando otimismo, mesmo diante de pensamentos
fragmentados e impulsos literários que talvez não fizessem muito sentido
quando foram postos sobre sua mesa. É triste pensar que, quando este livro
for finalmente publicado, Randi não estará mais trabalhando conosco. Minha
família e os colegas de escritório sentirão saudades dela.
Também expresso gratidão ao profissionalismo e incentivo de meus
amigos na Deseret Book Company, especialmente a Sheri Dew, Cory
Maxwell, Emily Watts, Richard Erickson e, neste livro em particular, a Lisa
Roper e Allison Mathews. Eles toleraram mais caos, interrupções e prazos
perdidos do que qualquer editor ou editora merece, mas sempre com um
sorriso no rosto e sem reclamar.
Por fim, agradeço a minha esposa, Pat, que se pergunta por que eu
concebo tais projetos, mas ainda assim me ajuda a concretizá-los. Boa parte
do tempo despendido para escrever este livro foi tirado do meu tempo com
ela, mas, como sempre, Pat não reclamou nem se queixou daquelas noites em
que a luz ficava acesa até mais tarde. Só alguém com o talento de um salmista
conseguiria captar seu esplendor. Este livro é dedicado a ela.
Jeffrey R. Holland
Salt Lake City, Utah
2012
Introdução

Viver o Evangelho em Nossa Própria Esfera


Viver o Evangelho em Nossa Própria Esfera
Seção 1 Meditações
“As Ânsias do Meu Coração”
Um dos fatos inegáveis da vida mortal é a presença recorrente de
preocupações,o desafio constante da dificuldade e da dor. Com frequência
nos encontramos nadando contra a corrente, naquilo que Hamlet chamou de
“um mar de angústias”.1 Já foi dito que enfrentar problemas é,
aparentemente, o denominador comum da vida e o elo que une pobres e ricos,
instruídos e ignorantes, crentes e céticos. É evidente que todos os que
mergulham nas corredeiras caóticas da vida, inclusive os justos, enfrentarão
provações e tribulações ao longo do caminho. Um escritor famoso afirmou
que esperar que a vida nos trate bem porque somos boas pessoas é como
esperar que um touro não nos ataque porque somos vegetarianos.2
Quando os dias (e noites!) difíceis chegarem,e certamente chegarão,será
de grande ajuda lembrar que “assim deve ser”, que nos grandes conselhos do
céu, antes que o mundo existisse, aceitamos esse período de desafios e
refinamento. Naquela ocasião, fomos ensinados que o preço a pagar a fim de
progredirmos era enfrentar, sobrepujar e suportar problemas. E nos
comprometemos a continuar progredindo eternamente. Em um grandioso
pronunciamento patriarcal, feito há quase três mil anos, o profeta Leí ensinou
que era fundamental para o plano eterno de Deus que nossa busca pela
exaltação,pelo triunfo da retidão sobre a iniquidade, da felicidade sobre a
miséria, do bem sobre o mal,exigisse a “oposição em todas as coisas”.3
Assim, ainda que por vezes desejemos o contrário, é essencial que nossa
jornada temporal seja entrelaçada por todo tipo de escolhas e opções,
oportunidades e obstáculos, altos e baixos, alegrias e tristezas. Ao
analisarmos, e, ocasionalmente enfrentarmos essa miríade de experiências,
temos a oportunidade de aprender e crescer, desenvolver–nos e arrepender–
nos, exercer fé, continuar tentando e trilhando o caminho até nosso lar eterno.
Obviamente, a maior certeza nesse plano é que desde o início havia uma
salvaguarda intrínseca, uma garantia infalível (por assim dizer) contra todos
os erros que cometêssemos, todas as provações que enfrentássemos, todos os
desânimos, todas as doenças e mesmo contra a morte, que acometerá a todos.
Essa salvação viria na forma de um Messias, o Messias — o Senhor Jesus
Cristo, o Filho de Deus. Ele viria “com poder de cura em suas asas”,4 tanto
temporal quanto espiritualmente. Sua mensagem seria de esperança e paz.
Seu Sacrifício Expiatório sobrepujaria a morte e o inferno, em favor de cada
homem, mulher e criança, desde Adão até o fim do mundo. Ele quebraria as
correntes da servidão e de nossas aflições; Ele nos libertaria. Falaremos sobre
isso mais à frente.
Ainda que tenhamos recebido a promessa de ajuda para carregar nossos
fardos, seu peso frequentemente nos esmaga durante a espera por auxílio. Foi
justamente para esses dias de oposição, esses “tempos de angústia”, que
grande parte dos salmos bíblicos foi escrito. Veja essa súplica:

Não te alongues de mim, pois a angústia está perto, e não há quem


ajude.5

Ou essa:

Olha para mim, e tem piedade de mim, porque estou solitário e


aflito.

As ânsias do meu coração se têm multiplicado; tira-me dos meus


apertos.

Olha para a minha aflição e para a minha dor, e perdoa todos os


meus pecados.6

Ou então essa:

Livra-me, ó Deus, pois as águas entraram até à minha alma.

Atolei-me em profundo lamaçal, onde se não pode estar em pé;


entrei na profundeza das águas, onde a corrente me leva.
Estou cansado de clamar; a minha garganta se secou; os meus
olhos desfalecem esperando o meu Deus. ( . . .

) Tira-me do lamaçal, e não me deixes atolar; seja eu livre dos que


me odeiam, e das profundezas das águas.

Não me leve a corrente das águas, e não me absorva ao profundo,


nem o poço cerre a sua boca sobre mim.

Ouve-me, Senhor, pois boa é a tua misericórdia. Olha para mim


segundo a tua muitíssima piedade.

E não escondas o teu rosto do teu servo, porque estou angustiado;


ouve-me depressa.7

Ou essa outra:

Sobem aos céus; descem aos abismos, e a sua alma se derrete em


angústias.

Andam e cambaleiam como ébrios, e perderam todo o tino.

Então clamam ao Senhor na sua angústia; e ele os livra das suas


dificuldades.

Faz cessar a tormenta, e acalmam-se as suas ondas.

Então se alegram, porque se aquietaram; assim os leva ao seu


porto desejado.
Louvem ao Senhor pela sua bondade, e pelas suas maravilhas para
com os filhos dos homens.8

Essas e muitas outras passagens semelhantes se tornam o equivalente


espiritual daquilo que um bravo soldado declarou nos dias da revolução
política e religiosa que preparou o caminho para a Restauração do evangelho.
Parafraseando o revolucionário Thomas Paine, eu, também: “admiro aqueles
que conseguem sorrir em meio aos problemas, fortalecer-se com a angústia e
ganhar coragem por meio da reflexão. A mente pequena se encolhe, mas
aquele cujo coração é firme, e cuja consciência aprova sua conduta,
perseguirá seus princípios até a morte”.9
O maior propósito dos salmos escriturísticos é ajudar–nos a “ganhar
coragem por meio da reflexão”, a exercer a fé necessária para “sorrir em meio
aos problemas” e fortalecer-nos “com a angústia”. As promessas de luz para
os que estão em escuridão e de força para os que combatem o inimigo são
temas recorrentes nos salmos.
Tais súplicas constantes a Deus em momentos de dificuldade, tais
clamores ao céu por consolo em meio ao caos não são a única temática ao
longo dos salmos, mas constituem uma porção significativa dessas antigas
canções que são orações e orações que são canções. Mesmo que
reconheçamos os outros tópicos poéticos dessa que é a maior literatura
devocional de todas, é notável como muitos apenas complementam esse tema
central. Há muitos outros tipos de salmos.Os estudiosos sugerem até sete
classificações ou “gêneros” sálmicos os quais incluem tópicos como paz e
louvor, natureza e nacionalismo, zelo e a busca por Sião. Mas até mesmo o
motivo por trás dessas amplas reflexões é a percepção de que a vida é muito
difícil e que os mortais precisam dos constantes cuidados de Deus para
prevalecer. Os salmos classificados como “súplicas”, orações ou petições a
Deus por auxílio e proteção em tempos de angústia, ultrapassam o número
dos demais com ampla vantagem.
Já foi dito que o livro de Salmos, como um todo, exerceu mais
influência sobre o pensamento ocidental do que qualquer outra coletânea
poética jamais escrita.10 A veracidade disso pode ser questão de gosto
literário, mas, para os leitores da Bíblia em geral, certamente é verdade que
os Salmos, dentre todo o cânone, são a parte mais aceita e aplicada na vida
pessoal. Em meio aos outros livros da Bíblia, o de Salmos se destaca por sua
intensa súplica por libertação, consolo e proteção. Ele não documenta a
história como o resto do Velho Testamento, nem focaliza o ministério, os
escritos doutrinários ou as figurações proféticas. Não só isso, as outras
coletâneas de “literatura de sabedoria” presentes na Bíblia, como Provérbios,
Eclesiastes e Cantares de Salomão, apenas complementam os Salmos. Porém,
nenhuma delas, nem mesmo combinadas!, se compara com o tom pessoal,
com o conteúdo, com a quantidade ou com a qualidade dos salmos, essas
invocações ao Deus compassivo que cura corações quebrantados, ao Salvador
dos humilhados e destituídos. Como tal, o livro de Salmos talvez seja o único
texto bíblico admirado de maneira quase idêntica por cristãos e judeus, para
não mencionar outras crenças, ou mesmo pelos que não têm crença alguma,
que encontram consolo e coragem em sua mensagem.
Nesse sentido, os salmos atuam como uma ponte bíblica que alcança
todas as pessoas, em especial os que leem e releem o Velho e o Novo
Testamentos. Das 283 vezes em que o Velho Testamento é citado no Novo
Testamento, 116 são do livro de Salmos. O próprio Jesus citou o livro de
Salmos mais do que qualquer outro texto do Velho Testamento. Além das
menções feitas pelo próprio Salvador, os autores dos quatro Evangelhos
utilizaram-se grandemente dos salmos para documentar Sua vida e Seu
ministério, em especial os momentos excruciantes de Sua prisão, julgamento
e Crucificação. Seria possível afirmar que, dentre todos os textos sagrados,
nenhum livro de escritura discorre mais profundamente sobre a missão
messiânica, nem anseia ou almeja mais por Seu retorno, do que as canções do
salmista. Certamente, nada teve um papel mais fundamental para essa
elevação de status dos salmos do que as palavras do próprio Jesus a Seus
discípulos, após Sua Ressurreição e antes de Sua ascensão. Depois de
aparecer a eles, mostrar–lhes Seu corpo ressurreto e comer peixe e mel com
eles, Jesus “disse–lhes: São estas as palavras que vos disse estando ainda
convosco: Que convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito
na lei de Moisés, e nos profetas e nos Salmos. Então abriu–lhes o
entendimento para compreenderem as Escrituras”.11 No que concerne à
mensagem messiânica e à compreensão do grande Jeová, passado, presente e
futuro, o livro de Salmos toma seu lugar de direito ao lado “da lei e dos
profetas”12, cujo reconhecimento é muito mais frequente.
Para concluir esta introdução, talvez seja interessante chamar a atenção
do leitor para duas outras relações entre os salmos e o evangelho de Jesus
Cristo. Em primeiro lugar, é preciso entender que um número significativo
dos salmos foi composto para ser usado no templo ou pelo menos
incorporado à experiência do templo, devido a sua beleza e relevância
doutrinária. Vários livros já foram escritos por estudiosos acerca desses
“salmos do templo”. Não é o propósito deste livro abordar esse assunto, mas
basta dizer que, quando os antigos israelitas ouviam certos salmos,
imediatamente os associavam ao templo. Não é de surpreender que doutrinas
tão inspiradoras fossem associadas à experiência do templo, cujo propósito
era ser tão reconfortante quanto o é hoje em dia. Quando nos sentimos
angustiados ou desencorajados ou quando precisamos de orientação especial,
vamos ao templo. Tanto naquela época quanto hoje, os filhos de Israel podem
ver os salmos como parte e como um lembrete daquela experiência.
Isso leva à segunda relação a ser feita, de que o Sermão da Montanha
como um todo e, particularmente os versículos introdutórios conhecidos
como as Bem-aventuranças, refletem tanto os ensinamentos dos salmos
quanto a experiência no templo.13 Em vez de explorar detalhadamente essa
ligação entre o Sermão da Montanha e o templo, permitam–me usar dois
exemplos das Bem-aventuranças para ilustrar esse ponto.
Estudiosos da bíblia perceberam que nos textos do Velho Testamento, a
expressão bem-aventurado (ou equivalente à tradução de‘ashre em hebreu) é
usada para iniciar um versículo mais de 40 vezes. Dessas, pelo menos 26
ocorrências estão no livro de Salmos. Na verdade, não é coincidência que o
primeiro salmo comece dizendo: “Bem-aventurado é o homem ( … )”14
Com essa construção frasal tão familiar àqueles que amavam os salmos,
e por ter Jesus subido “a um monte”,15 da mesma forma que os israelitas
subiam “ao monte do Senhor, à casa do Deus de Jacó”,16 fica claro que a
conexão entre as bem-aventuranças, o templo e os salmos é concreta e
intencional.

Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar


santo?

Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a


sua alma à vaidade, nem jura enganosamente.

Este receberá a bênção do Senhor e a justiça do Deus da sua


salvação.

Esta é a geração daqueles que buscam, daqueles que buscam a tua


face, ó Deus de Jacó. ( . . .

) Quem é este Rei da Glória? O Senhor dos Exércitos, ele é o Rei


da Glória.

(Salmos 24:3–6, 10, Versão do Rei Jaime)

Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar


santo? Aquele que é inocente nas mãos e puro no coração; que não
entregou sua alma à vaidade, nem jurou enganosamente a seu próximo.
Este receberá uma bênção do Senhor e misericórdia de Deus, seu
Salvador. Esta é a geração daqueles que buscam, daqueles que buscam
a face do Deus de Jacó. ( . . .

) Quem é este Rei da Glória? O Senhor dos Exércitos, ele é o Rei


da Glória.

(Salmos 24:3–6, 10, Septuaginta)

No monte (das bem-aventuranças), Jesus ensinou que são “bem-


aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus”.17 Podemos
presumir com certeza que o Salvador sabia que Seus ouvintes, ao escutarem
aquelas palavras, se lembrariam do salmo 24, um dos “cânticos de subida”,
entoados tanto por sacerdotes quanto por leigos, ao subirem para o templo a
fim de adorar a Deus, e um dia vê–Lo. A relação entre a pureza do coração e
o privilégio de se contemplar a face do Senhor é bastante clara na Versão do
Rei Jaime da Bíblia, mas fica mais explícita na Septuaginta (LXX).18
Comparando-se as duas versões:
Esse salmo deixa claro que aqueles que sobem “ao monte do Senhor”
para “permanecer em seu lugar santo”, o templo, devem ter mãos limpas e
inocentes, além de um coração puro. Só então é possível contemplar a face de
Deus. Dessa forma, em uma única frase, “Bem-aventurados os limpos de
coração, porque eles verão a Deus”, Jesus estabelece uma conexão imediata
entre os salmos, o templo e o discipulado cristão que se esperava daqueles a
quem Ele ensinava.19
Outro breve exemplo das bem–aventuranças é este: “Bem-aventurados
os mansos, porque eles herdarão a terra”.20 Esta frase usada por Jesus foi
tirada diretamente do Salmo 37:11: “Mas os mansos herdarão a terra, e se
deleitarão na abundância de paz”.
E as conexões continuam, especificamente com as Bem-aventuranças e
de modo geral com o Sermão da Montanha, além de vários outros
ensinamentos em comum entre o Velho e o Novo Testamentos. Com tudo
isso em mente, convido o leitor a ponderar sobre algumas das muitas bênçãos
e promessas contidas nos salmos, tanto as de antigamente quanto as hoje,
para aqueles que suplicam por auxílio. Nesta coletânea, repete-se a promessa
de que o Senhor velará por nós a todo instante e curará todas as nossas
feridas. Sim, haverá estresse e tristeza em nossa vida e o céu nem sempre
dará as respostas que gostaríamos, mas Deus sempre dará a resposta de que
necessitamos, e com ela, Ele nos dará tanto a força quanto o consolo
espiritual necessários em nossos tempos de angústia.

Notas
^1. William Shakespeare, Hamlet, Príncipe da Dinamarca, ato 3, cena 1,
linha 60; tradução livre.
^2. Ver Harold S. Kushner, The Lord Is My Shepherd: Healing Wisdom
of the Twenty-Third Psalm, 2003, pp. 102.
^3. 2 Néfi 2:11.
^4. Ver Malaquias 4:2; 2 Néfi 25:13; 3 Néfi 25:2.
^5. Salmos 22:11.
^6. Salmos 25:16–18.
^7. Salmos 69:1–3, 14–17.
^8. Salmos 107:26-31.
^9. Ver Thomas Paine, The American Crisis, 1819, pp. 16; tradução
livre.
^10. C. Hassell Bullock, Encountering the Book of Psalms, 2001, p. 15.
^11. Lucas 24:44–45; grifo do autor.
^12. Esse status elevado dos salmos também é sugerido pela divisão
geralmente aceita da coletânea em cinco partes (1–41, 42–72, 73–
89, 90–106, 107–150), um lembrete intencional da divisão dos
cinco livros de Moisés.
^13. O professor John W. Welch da Brigham Young University escreveu
extensamente sobre isso no livro The Sermon on the Mount in the
Light of the Temple, 2009.
^14. Salmos 1:1; grifo do autor.
^15. Mateus 5:1.
^16. Isaías 2:3.
^17. Mateus 5:8.
^18. A Septuaginta é a tradução da Bíblia em hebraico para o grego, feita
entre o terceiro e o primeiro século A.C. É assim chamada porque
70 tradutores judeus realizaram o trabalho. O Apóstolo Paulo e os
primeiros Pais da Igreja frequentemente faziam citações da
Septuaginta.
^19. Para mais detalhes sobre essa conexão entre os salmos e as bem-
aventuranças, veja Andrew C. Skinner, “Israel’s Ancient Psalms:
Cornerstone and the Beatitudes”, em The Sermon on the Mount in
Latter-day Scripture, 2010. Esse salmo propriamente dito é
discutido com mais detalhes nas páginas (57) a (59) deste livro.
^20. Mateus 5:5.
Salmos 56:9

Quando eu a ti clamar, então voltarão para trás os meus inimigos:


isto sei eu, porque Deus é por mim.

Apesar de parecer fora da ordem desta coletânea, escolhi começá-la com


esta passagem, pois tenho plena convicção de que toda confiança, todo
consolo, toda força e segurança começam nela — “Isto sei eu ( … ) Deus é
por mim”. Essa verdade precisa ser gravada em nosso coração, impressa em
letras garrafais em nosso cérebro, para nunca ser esquecida. Assim como o
sangue da Páscoa com o qual os antigos israelitas tinham de marcar a verga e
as ombreiras de suas portas, precisamos ter sempre diante dos olhos e dentro
do coração alguns lembretes figurativos de que Deus é por nós. Em nossas
idas e vindas, independente dos problemas e provações diários, o começo e o
fim apontam para a verdade eterna de que Deus é por nós. Ele nos ama. Ele é
nosso Pai Celestial. Ele nunca dorme nem repousa em Seus cuidados para
conosco. Sua obra e Sua glória são prover a nossa salvação, a nossa
exaltação, o nosso retorno a Seu lar em segurança.
Tudo o que Ele faz serve para concretizar esse grande propósito,
quaisquer que sejam os aprimoramentos ou as provações pelos quais
necessitemos passar para alcançar esse objetivo. Reconhecendo a dimensão
de Sua majestade e toda a física quântica do Universo, desde o desabrochar
de uma flor na primavera, até a expansão de reinos em incontáveis galáxias,
Deus busca unicamente abençoar e exaltar Seus filhos, e salvar a alma de
todos os homens (se assim permitirem).
Sendo assim, ao nos esforçarmos para nadar neste mar de angústias,
precisamos nos apegar a essa ideia; ou, como diríamos na Igreja, precisamos
adquirir um testemunho disso. Deus é por nós. Ele nunca está contra nós.
Todos temos a liberdade, o arbítrio eterno, de fazer escolhas, mesmo aquelas
que são estúpidas, cruéis ou mesmo más. Por causa disso, Ele pode ser contra
as coisas que fazemos ou contra as coisas que outras pessoas fazem a nós. Ele
sempre será contra o pecado, o abuso e o erro, independente da forma em que
se manifestam ou de quem os realiza. Mas ainda assim, Ele possui a
habilidade divina de separar Sua oposição ao pecado de Seu amor imutável
pelo pecador. Talvez não sejamos tão bons em fazer essa distinção, mas Ele é
perfeito nisso e já teve muitas oportunidades de praticar.
Em todas as dificuldades humanas, sociais e naturais deste mundo
mortal, por meio e ao longo delas, Deus sempre nos ama. Ele sempre é por
nós. Por Sua divindade, Ele não pode agir nem ser de outra maneira. Ele não
teria razão de ser, se agisse de outra forma. Faz parte de Sua natureza amar
Seus filhos. Há algumas qualidades e virtudes que são inseparáveis da
divindade. Uma delas, a principal, é o amor infalível, imutável e incessante
que Ele tem por Seus filhos. Nós buscamos conquistar esses atributos
divinos, enquanto Ele já os possui. Se Ele deixasse de vivê-los, os
abandonasse ou fosse infiel a eles, “deixaria de ser Deus”.21 Mas Ele nunca
deixará de ser Deus e nunca comprometerá as virtudes e características de
Sua divindade.
Assim, estaremos mais bem preparados para perseverar diante das
dificuldades, para seguir em frente com fé, se nos apegarmos a alguns
princípios sólidos que nos fortalecerão ao longo do caminho. O primeiro e
mais fundamental de todos é o de que Deus vive e nos ama, que Ele é por
nós. E como o Apóstolo Paulo escreveu, “Se Deus é por nós, quem [e
poderíamos acrescentar o que] será contra nós? ( . . . ) Somos mais do que
vencedores, por aquele que nos amou.”22

Notas
^21. Alma 42:25.
^22. Romanos 8:31, 37.
Salmos 1:1–3

Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos


ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na
roda dos escarnecedores.

Antes tem o seu prazer na lei do Senhor, e na sua lei medita de dia
e de noite.

Pois será como a árvore plantada junto a ribeiros de águas, a qual


dá o seu fruto no seu tempo; as suas folhas não cairão, e tudo quanto
fizer prosperará.

Uma das implicações da existência de Deus e de Seu cuidado paterno


para conosco é que Ele nos mostrará o que precisamos saber para ter sucesso.
De fato, um dos lamentos que ouvimos neste mundo que não abraçou a
Restauração do evangelho, é que Deus não fala mais — seguido do terrível
pensamento de que, portanto, Ele não Se importa mais. Bem, Ele ainda Se
importa, como tem Se importado desde o início. Ele ainda fala, e Seu
conselho, que inclui revelações para os dias atuais, torna-se para nós Sua lei.
Suas leis — que nas escrituras são apropriadamente chamadas de
“mandamentos” — estão ligadas às verdades recebidas da eternidade. São
regras para o viver reto, que sempre existiram e que sempre foram ensinadas
por Ele. O primeiro passo para evitarmos o sofrimento e driblarmos o maior
número possível de dificuldades é que tenhamos “prazer ( … ) na lei do
Senhor” e que pensemos sempre em Seus mandamentos, que meditemos “de
dia e de noite” sobre eles. Da mesma forma que não conseguimos fazer algo
que não aprendemos, também não conseguimos obedecer a leis que não nos
foram ensinadas. Os ensinamentos dos profetas de Deus, vivos ou já
falecidos, que delineiam e destacam as leis do Senhor, são como uma barra
de ferro a que devemos nos agarrar resolutamente, enquanto trilhamos o
caminho desta vida em meio às névoas de escuridão.23
Nem todas as provações e tribulações que enfrentamos são produto da
violação dos mandamentos, mas algumas são. Obviamente, há certos
problemas que não conseguiremos evitar: ainda que obedeçamos aos
princípios do evangelho, enfrentaremos desafios. Mas, sem dúvida, cada um
de nós enfrenta problemas que poderiam ter sido evitados se tivéssemos tido
uma compreensão mais ampla dos conselhos de Deus, e se tivéssemos sido
mais fiéis em observá-los. Precisamos enxergar essas orientações divinas
como uma das maiores dádivas que recebemos, e não como um pesado
conjunto de restrições que nos impedem de ser espontâneos e livres. Não!
Pelo contrário: as leis do Senhor nos levam para “o caminho, a verdade e a
vida”.24 Na mortalidade, é grande a probabilidade de ficarmos perdidos na
maior parte do tempo. Precisamos de alguém que nos mostre como dar a
volta por cima em segurança. Essa é a função da lei do Senhor, o
aconselhamento protetor dos mandamentos dados por aqueles que conhecem
o caminho e por Aquele que é o Caminho.
E para não deixar passar despercebido, note a dolorosa observação com
a qual este primeiro salmo inicia. Ela funciona como um pano de fundo para
todos os demais salmos. É um lembrete de que, em nossa busca por uma vida
pacífica e produtiva, não devemos ser tolos a ponto de procurar problemas.
A vida já é difícil o bastante sem que adicionemos a estupidez à lista de
nossos erros. Como deve ser frustrante para Deus quando, ao querer nos
ajudar e conhecendo os perigos ao longo do caminho, Ele nos vê escolher, de
livre e espontânea vontade, andar segundo o conselho dos ímpios e nos
assentar na roda dos escarnecedores. Mesmo que evitemos o ímpio, o pecador
ou o escarnecedor, ainda assim enfrentaremos problemas; então, que tolice —
e, francamente, talvez “tolice” não seja um termo forte o bastante — é ir
atrás de problemas, andar entre os que causam problemas, sentar-nos com
aqueles que roubam nossa fé e nosso esforço por obedecer. Assim como José
do Egito, precisamos fugir, correr para longe de tentações e confusões.25
Pedimos demais, quando conscientemente quebramos os mandamentos
de Deus e então clamamos a Ele que nos liberte dos problemas que, a
princípio, deveríamos ter nos esforçado para evitar. Como observado, nem
todos os nossos desafios são desse tipo, mas infelizmente não temos
desculpas para as aflições que poderiam ter sido evitadas se tivéssemos
prazer na lei do Senhor e se lembrássemos de Seus mandamentos de dia e de
noite. Graças aos céus, literalmente, por Deus nos ajudar mesmo quando
nosso maior inimigo somos nós mesmos; porém, devemos nos esforçar mais
para não tornar Seu trabalho mais difícil do que já é. Medite sobre Suas leis.
Esforce-se por cumprir Seus mandamentos. Evite todos os problemas que
puder evitar. Procure ser fiel. Então poderá pedir a Ele, justificadamente, que
tome conta do resto. Assim, as folhas de nossa própria árvore da vida não
cairão e o fruto que tanto desejamos colher sobejará a cada estação.

Notas
^23. Ver 1 Néfi 8.
^24. João 14:6.
^25. Ver Gênesis 39:7–12.
Salmos 3:2–5

Muitos dizem da minha alma: Não há salvação para ele em Deus.

Porém tu, Senhor, és um escudo para mim, a minha glória, e o que


exalta a minha cabeça.

Com a minha voz clamei ao Senhor, e ouviu-me desde o seu santo


monte. ( . . .

) Eu me deitei e dormi; acordei, porque o Senhor me sustentou.

É certo que, em nosso mundo cada vez mais secular e pós-moderno,


centenas dirão dos enlutados e desapontados: “Não há salvação para ele em
Deus”. Porém, há salvação em Deus. Ele ouvirá nossos clamores “desde o
seu santo monte”. Deus sempre ouve nossas orações e sempre as responde.
Talvez não ouçamos Suas respostas ou talvez não as reconheçamos por não
saber ouvi-las; e quem sabe em alguns casos não gostemos de Suas respostas,
ainda que afirmemos confiar Nele. Nesses momentos em especial, devemos
lembrar que Ele é um “escudo”. E uma das coisas contra as quais esse escudo
nos protege é contra nós mesmos. Devemos constantemente relembrar que
Ele é Deus e nós não. Assim, quando precisarmos optar entre o Seu ponto de
vista sobre nossas necessidades e o nosso, temos que ceder à Sua visão e ao
Seu divino amor.
Há ainda dois outros lembretes neste salmo. O primeiro é que, em
momentos de provação, devemos manter a cabeça erguida. Não
conseguiremos ver o sol se erguendo no horizonte, nem a luz no fim do túnel,
nem a glória de Deus, se estivermos sempre olhando para as pedras em nosso
caminho. Como dito por um anjo, certa vez, a um antigo profeta que estava
“abatido de tristeza”: “Levanta, portanto, a cabeça e alegra-te, pois tens
grandes motivos para te alegrares”.26 “Levantai os vossos olhos”, Jesus disse
numa ocasião a Seus jovens e inexperientes discípulos.27 Toda grande causa
precisa de visão. Precisamos ver antes de alcançar. Deus será “o que exalta a
[nossa] cabeça”, se permitirmos que Ele o faça.
Outro conselho ainda mais prático neste salmo é “dormir”. O salmista
diz: “Eu me deitei e dormi; acordei, porque o Senhor me sustentou.” Nem
todos os problemas desaparecem com uma noite de sono, mas nossa
capacidade de enfrentá-los e de percebermos abordagens mais construtivas
aumenta quando descansamos. MacBeth fala por todos os que enfrentam
problemas ao ansiar pelo sono que “desata a emaranhada teia dos
cuidados ( … ) [e é] o bálsamo das mentes feridas”.28 Foi a sabedoria divina
que inseriu uma noite entre dois dias. Não tome decisões importantes, nem
tente resolver problemas sérios quando estiver exausto. Durma um pouco.
Sua mente se tranquilizará e seu espírito se reanimará. Você terá forças
renovadas para cumprir a tarefa. Deus o ouvirá em Seu santo monte e, com a
cabeça erguida, você verá o amanhecer de um novo dia. “Voltando e
descansando sereis salvos; no sossego e na confiança estaria a vossa força.”29

Notas
^26. Alma 8:14–15.
^27. João 4:35.
^28. William Shakespeare, MacBeth, ato 2, cena 2, linha 37; tradução
livre.
^29. Isaías 30:15.
Salmos 4:1

Ouve-me quando eu clamo, ó Deus da minha justiça, na angústia


me deste largueza; tem misericórdia de mim e ouve a minha oração.

Com certa frequência, todos temos a necessidade pessoal, e até dolorosa,


de receber alívio para nossos sofrimentos. Todos clamamos a nosso Pai
Celestial: “Ouve minha oração”.
Se esse alívio não vier tão rapidamente quanto gostaríamos, precisamos
nos lembrar de que em tempos de angústia Deus nos “dá largueza”, nos faz
crescer e expandir; Ele exige que façamos mais do que estamos desejosos (ou
dispostos) a exigir de nós mesmos. Nosso propósito na vida é crescer em
divindade e em virtudes tais como a fé, a esperança e a caridade, a paciência,
a perseverança e a força. Se esse crescimento tiver que acontecer por meio da
tristeza, da angústia ou do luto, que assim seja. Tudo vai dar certo no final.
Antes de aprender a correr, precisamos aprender a caminhar; e antes de
caminhar, precisamos aprender a ficar de pé. Seguimos um plano divino, por
meio do qual um dia seremos elevados acima de todas as angústias; porém,
muitas orações serão necessárias, assim como muitas respostas, antes que
sejamos vitoriosos. Como Isaías, eu também afirmo: tende bom ânimo.
“Não sabes, não ouviste que o eterno Deus, o Senhor, o Criador dos fins
da terra, nem se cansa nem se fatiga? ( . . .
) Dá força ao cansado, e multiplica as forças ao que não tem nenhum
vigor. ( … )
Mas os que esperam no Senhor renovarão as forças, subirão com asas
como águias; correrão, e não se cansarão; caminharão, e não se fatigarão.”30
Dessa maneira, a angústia nos faz crescer e, por fim, nos fará subir “com
asas como águias”. Não desista da corrida. Continue a correr. Continue a
caminhar. Continue a orar. O Senhor renovará suas forças.

Notas
^30. Isaías 40:28–31.
Salmos 4:4; 27:14; 46:10

Perturbai-vos e não pequeis; falai com o vosso coração sobre a


vossa cama, e calai-vos.

_______________

Espera no Senhor, anima-te, e ele fortalecerá o teu coração;


espera, pois, no Senhor.

_______________

Aquietai-vos, e sabei que Eu sou Deus; serei exaltado entre os


gentios; serei exaltado sobre a terra.

Frequentemente ficamos tão concentrados em nossas próprias


circunstâncias e problemas que nos esquecemos de nos maravilhar com Deus
e com o que Ele tem feito em Sua majestade. Jó, o protótipo do justo que
sofre, carregava essa mesma culpa, assim como todos nós vez ou outra. Jó
havia feito tantas perguntas que, em contrapartida, o Senhor então decidiu
questioná-lo: “Quem é este que escurece o conselho com palavras sem
conhecimento?” Perguntou Deus. “Onde estavas tu, quando eu fundava a
terra? ( . . . ) Sobre que estão fundadas as suas bases, ou quem assentou a sua
pedra de esquina[?] ( . . . ) Ou quem encerrou o mar com portas, quando este
rompeu ( … ) E disse: Até aqui virás, e não mais adiante ( … ) ?”31 E assim
por diante, Deus continuou fazendo perguntas a Jó sobre a vida e a morte, a
escuridão e a luz, as nevascas e os botões de rosa, as constelações nos céus.
À medida que as perguntas continuaram, para as quais nem Jó nem
qualquer outro mortal tem a resposta, o Senhor então questionou: “ou tu me
condenarás?”32 Aprendemos que não, a menos que sejamos iguais a Deus. A
não ser que nós também possamos fazer o Seu trabalho. A não ser que
tenhamos um “braço como Deus”.33
Humildemente e com certo constrangimento, Jó respondeu: “Por isso
relatei o que não entendia; coisas que para mim eram inescrutáveis, e que eu
não entendia. ( . . . ) Por isso me abomino e me arrependo no pó e na
cinza”.34
Não precisamos nos abominar, mas talvez seja necessário nos
arrependermos quando somos tentados a erguer os punhos contra Deus e
questionar: “Por quê?” ou “Por que eu?” ou “Por que agora?” ou “Por que
isso?” Só saberemos a resposta para essas perguntas quando conhecermos
Deus, quando tivermos feito o que Ele fez e visto o que Ele viu. Nenhum de
nós fez isso ainda.
Assim, em tempos de angústia, devemos “[nos] perturba[r] e não
pe[car]”. Lemos nas escrituras pelo menos uma dúzia de vezes o Senhor
ordenar a Seus profetas: “aquietai-vos”. Precisamos ser um pouco mais
tranquilos, um pouco mais calmos. Precisamos falar “com o [nosso] coração
( … ) e [calar-nos]” Com essa perspectiva, viveremos e repousaremos com
maior paz e segurança.
Para reforçar essa verdade, Deus afirmou novamente aos Santos de
nossos dias: “Para e espera ( … ) e providenciarei meios para realizares as
coisas que te ordenei”.35 Ele é “exaltado na [e sobre] a terra” e, de modo
semelhante, pode nos erguer acima das provações, se fizermos “alegremente
todas as coisas que estiverem a nosso alcance; e ( … ) [aguardarmos], com
extrema segurança, para ver a salvação de Deus e a revelação de seu
braço”.36
Um de meus irmãos na fé, um apóstolo moderno que enfrentou sérios
problemas de saúde, contra os quais um homem menos valente teria desistido
de lutar, disse em uma conferência geral da Igreja: “Esperar no Senhor
significa ‘[permanecer] firmes’ ( … ) [e dizer] ‘Seja feita a tua vontade, ó
Senhor, e não a nossa.’ Ao esperar no Senhor, somos ‘inabaláveis na
obediência aos mandamentos’”. Ele concluiu citando a promessa de Isaías
que mencionei anteriormente: correr e não se cansar, caminhar e não se
fatigar.37 Vindo de alguém que talvez nunca mais consiga correr ou andar
sem auxílio, essa é uma demonstração de coragem. Ele é uma pessoa que
deseja aguardar e esperar no Senhor.
Se, de tempos em tempos, Deus pede a Seus profetas que esperem,
certamente Ele pode fazer — e fará — o mesmo conosco. Nessas ocasiões, a
atitude mais corajosa que podemos ter é simplesmente esperar, aguardar, ser
pacientes, calar-nos e acreditar na vitória, ainda que ela não venha agora.
Tenha bom ânimo. O Senhor fortalecerá o seu coração.

Notas
^31. Jó 38:2, 4, 6, 8, 11.
^32. Jó 40:8.
^33. Jó 40:9.
^34. Jó 42:3, 6
^35. Doutrina e Convênios 5:34.
^36. Doutrina e Convênios 123:17.
^37. Robert D. Hales, “Esperar no Senhor: Seja Feita a Tua Vontade”, A
Liahona, novembro de 2011, p. 72.
Salmos 4:6–7

Muitos dizem: Quem nos mostrará o bem? Senhor, exalta sobre nós
a luz do teu rosto.

Puseste alegria no meu coração, mais do que no tempo em que se


lhes multiplicaram o trigo e o vinho.

Em tempos de angústia ou de desespero, é comum acharmos que porque


algo deu errado, tudo deu errado. E, como o salmista observa, perguntamos a
nós mesmos: “Quem nos mostrará o bem?”, como se afirmássemos que em
épocas de tristeza e necessidade, não há nada de bom na vida, na natureza ou
na humanidade. Em resposta a esse lamento, o salmista roga que a luz do
rosto de Deus brilhe sobre Seus filhos, desfazendo a escuridão e as sombras
da vida.
Há muita coisa boa ao nosso redor, muita coisa para nos fazer até mais
felizes do que a época das colheitas, quando a abundância dos campos e das
vinhas nos faz relembrar como Deus é bom para nós.
Aqueles que afirmam que não há amor no mundo nunca viram uma mãe
fitar os olhos de seu recém-nascido. Aqueles que afirmam não haver beleza
no mundo não visitaram a Nova Inglaterra no outono ou a velha Inglaterra na
primavera ou os lagos e as paisagens suíços em qualquer época do ano.
Aqueles que dizem que não há harmonia no mundo nunca ouviram Brahms
ou Beethoven, Puccini ou Vivaldi. Quem nunca suspirou ao contemplar pela
primeira vez a arte de Michelangelo ou Titian, Rembrandt ou Matisse,
Constable ou Monet? E quanto às bênçãos da ciência, da medicina, da
comunicação e do transporte? Para onde quer que olhemos, há coisas
maravilhosas tanto no céu quanto na Terra.
“Quem nos mostrará o bem?” Uma criança, um vizinho, um amigo e
também nosso Pai Celestial. “Senhor, exalta sobre nós a luz do teu rosto.
Puseste alegria no meu coração, mais do que no tempo em que se lhes
multiplicaram o trigo e o vinho.”
Salmos 5:1; 119:15, 48

Dá ouvidos às minhas palavras, ó Senhor, atende à minha


meditação.

_______________

Meditarei nos teus preceitos, e terei respeito aos teus caminhos.


(...

) Também levantarei as minhas mãos para os teus mandamentos,


que amei, e meditarei nos teus estatutos.

Um salmo anterior nos aconselhou a “falai com o vosso coração”.38 Este


salmo dá a essa prática um nome: meditação. Não ficamos tanto tempo
sozinhos quanto deveríamos, para pensar, orar, sonhar e refletir. “O mundo
está em excesso conosco” disse Wordsworth,39 e esse mundo geralmente é
barulhento, antipático, estridente e vulgar. Parece que grande parte do que o
mundo nos oferece diariamente tem por objetivo não nos deixar meditar, não
nos deixar falar com nosso coração.
Prazos, caronas, telefones e listas de afazeres. Buzinas, alarmes,
números para memorizar e pessoas para encontrar. Precisamos de um pouco
de paz e silêncio. Precisamos de um pouco de silêncio e paz. Mas nossas
circunstâncias em geral não permitem que nos “retiremos” para o topo de
uma montanha ou para uma praia reservada. Às vezes, nem conseguimos ir
para um parque dentro da cidade. Mas devemos procurar nos “retirar” para
nosso espaço interior, aquele silencioso centro espiritual que Deus concedeu
a cada um de nós. Não encontraremos um retiro mais calmo e silencioso do
que nossa própria alma. Precisamos desligar algumas coisas e deixar outras
de lado. Precisamos ficar em silêncio.
O Presidente David O. McKay ensinou: “Prestamos pouca atenção ao
valor da meditação, um princípio de devoção. Em nossa adoração, há dois
elementos: um é a comunhão espiritual que surge de nossa própria meditação;
o outro, a instrução ministrada pelos demais, principalmente aqueles que
detêm autoridade para guiar e instruir-nos. Dos dois, o de maior proveito do
ponto de vista da introspecção é a meditação. A meditação é a linguagem da
alma. Ela é definida como uma ‘forma de devoção íntima ou exercício
espiritual que consiste na reflexão profunda e contínua sobre um tema
religioso’. A meditação é uma forma de oração”.40
Em parte, considero a meditação algo tão precioso pois permite que
Deus fale comigo. A oração, na maioria das vezes, é quando falamos a Ele
com urgência. Nossa mente está cheia de coisas. Nosso coração está cheio de
coisas. Temos tantas necessidades, vontades e desejos. Às vezes, minhas
orações são quase como uma lista de desejos.
Em meio à urgência de tais necessidades, somos tentados, antes, durante
e depois da oração, a não ouvir. Raramente nos preparamos para orar;
raramente refletimos em silêncio após nossas orações. Esses são momentos
para meditarmos reverentemente. Eles permitem que nossa mente e nosso
coração falem e ouçam claramente, ainda que sem palavras, ou pelo menos,
sem palavras faladas.
As palavras faladas são cruciais. A oração em voz alta é um requisito
básico da vivência do evangelho. O Salvador pediu-nos que orássemos como
Ele orou. E certamente também devemos meditar como Ele meditou, sempre
pensando reverentemente e silenciosamente em Deus. Costumamos falar na
Igreja sobre os sussurros do Espírito. Precisamos ouvir esses sussurros. Eles
são mansos e delicados, mas essenciais. A meditação é um dos métodos pelos
quais mostramos “respeito aos caminhos [de Deus]”.

Notas
^38. Salmos 4:4.
^39. William Wordsworth, “Personal Talk”, em The New Oxford Book of
English Verse, seleção e edição por Helen Gardner, 1972, p. 507;
tradução livre.
^40. Ensinamentos dos Presidentes da Igreja: David O. McKay, 2003, p.
35.
Salmos 5:11–12

Porém alegrem-se todos os que confiam em ti; exultem


eternamente, porquanto tu os defendes; e em ti se gloriem os que amam
o teu nome.

Pois tu, Senhor, abençoarás ao justo; circundá-lo-ás da tua


benevolência como de um escudo.

Leí declarou a Jacó: “Os homens existem para que tenham alegria”,41
mas há dias em que a alegria parece estar em falta. No entanto, o salmista nos
dá o melhor conselho possível para obtermos e conservarmos uma
indescritível felicidade. Precisamos colocar nossa confiança no Senhor e
gritar de alegria por ser Ele o nosso defensor, o nosso protetor, o nosso
benfeitor, o nosso Deus. O simples fato de ouvir Seu nome é suficiente para
despertar a lembrança de Seu caráter e de Sua bondade. Um nome é capaz de
fazer isso quando nos faz pensar em pessoas que amamos. O santo nome de
Deus, o qual somos ordenados a não tomar em vão, é fonte de alegria sem
par, pois nos traz o sentimento de que somos amados e que estamos seguros e
protegidos “como [que por] um escudo”.
Santo Agostinho observou certa vez que os homens desejam ser felizes,
mesmo quando vivem de modo a tornar impossível a felicidade. Que bênção
é — ou deveria ser — recebermos a chave que abre as portas à felicidade.
Frequentemente encaramos a felicidade da mesma forma que uma criança
diante de uma vitrine, triste por não ter as moedas para comprar algo que, na
verdade, é gratuito. É uma dádiva que qualquer comprador pode levar. “Os
que não tendes dinheiro, vinde, comprai, e comei; sim, vinde, comprai, sem
dinheiro e sem preço, vinho e leite.”42 A verdadeira alegria está disponível
pelo mesmo preço. Ponha sua confiança em Deus. Ame-O e ame Seu nome.
Ouça-O com diligência.
“A verdadeira alegria é o penhor [dinheiro] que recebemos dos céus”,
escreveu um dos maiores sacerdotes/poetas da Inglaterra. “É o tesouro da
alma e, portanto, deve ser guardado em um lugar seguro; mas não há lugar
seguro neste mundo para guardá-lo.”43 Se desejamos a alegria verdadeira,
precisamos confiar em Deus. O retorno desse investimento é a alegria e a
proteção como que de um escudo, junto com o crescimento eterno que
acompanha o processo.

Notas
^41. 2 Néfi 2:25.
^42. Isaías 55:1.
^43. Sermões de John Donne, nº 28; tradução livre.
Salmos 6:2–4, 6, 8; 57:1

Tem misericórdia de mim, Senhor, porque sou fraco; sara-me,


Senhor, porque os meus ossos estão perturbados.

Até a minha alma está perturbada; mas tu, Senhor, até quando?

Volta-te, Senhor, livra a minha alma; salva-me por tua


benignidade. ( . . .

) Já estou cansado do meu gemido, toda a noite faço nadar a


minha cama; molho o meu leito com as minhas lágrimas, ( . . .

) Apartai-vos de mim todos os que praticais a iniquidade; porque o


Senhor já ouviu a voz do meu pranto.

_______________

Tem misericórdia de mim, ó Deus, tem misericórdia de mim,


porque a minha alma confia em ti; e à sombra das tuas asas me abrigo,
até que passem as calamidades.

Todos nós teremos a experiência, por vezes frequente, de chorar a ponto


de perturbar não só nossos ossos como também nossa alma. E às vezes essa
perturbação se demora. Nessas horas, teremos também a oportunidade de
clamar, assim como o Profeta Joseph Smith na Cadeia de Liberty: “ó Senhor,
até quando?”.44 Como o salmista pergunta posteriormente, “Até quando te
esquecerás de mim, Senhor? Para sempre? Até quando esconderás de mim o
teu rosto?”45 O Profeta Joseph também clamou ao se sentir abandonado: “Ó
Deus, onde estás? E onde está o pavilhão que cobre teu esconderijo? Até
quando tua mão será retida? ( … ) sim, ó Senhor, até quando ( … ) esses
agravos e essas opressões ilícitas” continuarão?46
Às vezes esses agravos ocorrem simplesmente porque a vida tem seus
problemas, mas há ocasiões em que são causados por aqueles que “[praticam]
a iniquidade”. Esse foi o caso com as provações do Profeta Joseph Smith e
pode ser o nosso caso também. Não obstante, precisamos lembrar que mesmo
nessas situações extremas, mesmo quando sofremos “agravos e opressões
ilícitas”, Deus estará conosco e sussurrará: “paz seja com tua alma”.47
Ao nos encorajar a ser pacíficos em tais dificuldades, Ele pede-nos que
nos lembremos do seguinte:
Em primeiro lugar, nossas adversidades e aflições não durarão mais que
um momento. As provações parecem ser longas e infinitas quando estamos
imersos nelas, mas terão um fim. De uma perspectiva eterna, elas de fato não
duram mais que um momento. Depois que fizermos tudo a nosso alcance para
prevenir um problema ou reparar um erro, só nos resta perseverar.
Frequentemente em nossa provação mortal, a única reação que nos resta é
esperar e nos esconder “à sombra das asas [de Deus] ( … ) até que passem as
calamidades”. As dificuldade passam, os tempos difíceis chegam ao fim, a
angústia que pensávamos nunca acabar por fim acaba. Existe esperança, não
apenas estoicismo, na perseverança.
Em segundo lugar, se suportarmos bem nossas adversidades, Deus nos
exaltará no alto e triunfaremos sobre nossos inimigos, sejam eles pessoas que
querem nos prejudicar ou simplesmente as vicissitudes da vida,
acompanhadas de dor e angústia. Qualquer que seja o caso, é-nos prometido
que seremos elevados e venceremos nossos inimigos.
Em terceiro lugar, precisamos lembrar que temos amigos. Graças aos
céus pelos amigos! O Senhor relembrou ao Profeta Joseph que seus amigos
ainda o apoiavam e voltariam a saudá-lo com “coração caloroso e com mãos
amistosas”.48
Em quarto lugar, em meio ao desespero, sempre há a tendência de se
desenvolver a autopiedade. É preciso combatê-la a todo custo, pois danifica
tudo o que toca. Precisamos lembrar que ainda não somos “como Jó”.49
Temos muitas e muitas bênçãos e há muitas e muitas pessoas no mundo que
enfrentam circunstâncias bem mais difíceis que as nossas.
Tudo isso pode nos ajudar a secar as lágrimas, mas isso não significa
que não haverá choro. O salmista chorou tanto que fez “nadar” a sua cama.
Quase no fim de sua vida, o profeta Néfi disse que “molha[va seu] travesseiro
durante a noite” ao orar por seu povo.50 A “voz do ( … ) pranto” faz parte da
experiência mortal. As lágrimas fazem bem. Elas são o preço que pagamos
pelo amor, o cuidado e a compaixão no mundo. Um dia, com grande vitória,
Deus “limpará de seus olhos toda a lágrima; e não haverá mais morte, nem
pranto, nem clamor, nem dor; porque já as primeiras coisas são passadas”.51
Um dia, nossas calamidades passarão.

Notas
^44. Doutrina e Convênios 121:3.
^45. Salmos 13:1.
^46. Doutrina e Convênios 121:1-3.
^47. Doutrina e Convênios 121:7.
^48. Doutrina e Convênios 121:9.
^49. Doutrina e Convênios 121:10.
^50. 2 Néfi 33:3.
^51. Apocalipse 21:4.
Salmos 8:2

Tu ordenaste força da boca das crianças e dos que mamam, por


causa dos teus inimigos, para fazer calar ao inimigo e ao vingador.

Um dos relatos mais tocantes do Livro de Mórmon (ou de todas as


escrituras?) é a visita de Cristo aos nefitas e a reunião das crianças a seus pés,
após um longo dia de ensinamentos e testemunhos. Ao orar profundamente
em favor daqueles pequeninos, “ele chorou, ( . . . ) e pegou as criancinhas,
uma a uma, e abençoou-as e orou por elas ao Pai. E depois de haver feito
isso, chorou de novo; E dirigindo-se à multidão, disse-lhes: Olhai para vossas
criancinhas”.52 Então, os céus se abriram e anjos desceram e ministraram a
eles, rodeando as criancinhas como que por fogo.
Mas isso não é tudo; Nos dias seguintes, Jesus “ensinou e abençoou as
criancinhas da multidão, sobre as quais foi falado; e ( … ) até crianças de
colo abriram a boca e proferiram coisas maravilhosas; e as palavras por elas
proferidas a ninguém foi permitido escrever”.53
Considerando o poder e a majestade dos ensinamentos do Salvador
àqueles nefitas — inclusive o chamado dos Doze discípulos nefitas, o sermão
no templo, as profecias sobre a tribo de Israel, os esclarecimentos sobre a lei
de Moisés, o estabelecimento da ordenança sacramental, os grandiosos
discursos sobre a oração e o Espírito Santo, para nomear apenas alguns — é
maravilhoso pensar que aquilo que as crianças aprenderam e ensinaram foi
ainda maior do que as coisas que Jesus disse a seus pais. Não obstante, o livro
afirma, a respeito das crianças, que Ele “soltou-lhes a língua; e disseram
grandes e maravilhosas coisas a seus pais, maiores até do que as que [Jesus]
revelara ao povo”.54
O profeta Alma ensinou: “[Deus] transmite a sua palavra aos homens
por intermédio de anjos; sim, não só aos homens, mas também às mulheres.
Ora, isso não é tudo; muitas vezes as crianças recebem palavras que
confundem o sábio e o instruído”.55
Nós todos amamos nossos filhos. Os meus são mais importantes para
mim e para minha esposa do que qualquer coisa que possuímos. Todos
deveríamos respeitar nossos filhos e ouvi-los. De muitas maneiras,
precisamos ser mais como eles, porque “dos tais é o reino dos céus”.56 As
crianças vêm “trilhando nuvens de glória ( … ) da presença de Deus, que é
[seu] lar”,57 e, portanto, com frequência elas serão uma fonte de inspiração e
comunicação divina para nós. Mesmo nos momentos mais difíceis, é
impossível permanecer triste ao segurar um bebê ou ao fitar os olhos
inocentes e encantados de uma criança. Quando crescem, cresce também seu
entusiasmo — que transborda, borbulha e contagia, com tanta energia, que
seus pequeninos corpos não conseguem reter. Nenhuma angústia sobrepuja a
alegria da infância. “[Deus ordenou] força da boca das crianças e dos que
mamam”.

Notas
^52. 3 Néfi 17:21–23.
^53. 3 Néfi 26:14, 16.
^54. 3 Néfi 26:14.
^55. Alma 32:23.
^56. Mateus 19:14.
^57. William Wordsworth, “Ode: Intimations of Immortality from
Recollections of Early Childhood”, em New Oxford Book of
English Verse, p. 509; tradução livre.
Salmos 11:1

No Senhor confio; como dizeis à minha alma: Fugi para a vossa


montanha como pássaro?

Às vezes, quando a vida é complexa e exigente precisamos


simplesmente nos “retirar”. Não confunda retirar-se com “fugir”. Retirar-se é
ir — fisicamente, se possível; se não, ao menos espiritual, mental e
emocionalmente — a uma montanha ou a outro lugar de renovação. Às vezes
precisamos voar como um pássaro e, ao fazê-lo, encontrar a liberdade para
nos recompor e renovar. Assim, poderemos voltar para a luta tendo
fortalecido a fé, aumentado a esperança e renovado o vigor para a batalha da
vida.
Jesus fazia isso sempre que possível. Quando a multidão era muito
grande na costa, Ele partia de barco para o outro lado do lago. Quando a
agitação — e frequente hostilidade — em Jerusalém aumentavam, Ele Se
retirava para Sua amada Galileia. Quando a multidão o cercava nas ruas ou
nos mercados, Ele fugia para Sua "montanha como um pássaro”.

E, despedida a multidão, subiu ao monte para orar, à parte. E,


chegada já a tarde, estava ali só.58

E novamente:

E, sendo já dia, saiu, e foi para um lugar deserto; e a multidão o


procurava, e chegou junto dele; e o detinham, para que não se ausentasse
deles.59

E mais uma vez:

E, levantando-se de manhã, muito cedo, fazendo ainda escuro,


saiu, e foi para um lugar deserto, e ali orava.
E seguiram-no Simão e os que com ele estavam.

E, achando-o, lhe disseram: Todos te buscam.60

E outra vez:

E ficaram cheios de furor, e uns com os outros conferenciavam


sobre o que fariam a Jesus.

E aconteceu que naqueles dias subiu ao monte a orar, e passou a


noite em oração a Deus.61

A vida é exigente. Nossos dias são complexos. As necessidades das


pessoas são enormes. Espera-se que combatamos o bom combate. Esse é
nosso propósito e nosso dever. Mas para isso, precisamos de renovação
física, refrigério espiritual e paz emocional. Para isso, precisamos de tempo
com Deus e com nós mesmos. Precisamos estar sozinhos. Precisamos da
força que um voo para nossa montanha sagrada proverá.

Notas
^58. Mateus 14:23.
^59. Lucas 4:42.
^60. Marcos 1:35–37.
^61. Lucas 6:11–12.
Salmos 15:1–3; 17:3; 34:13

Senhor, quem habitará no teu tabernáculo? Quem morará no teu


santo monte?

Aquele que anda sinceramente, e pratica a justiça, e fala a verdade


no seu coração.

Aquele que não difama com a sua língua, nem faz mal ao seu
próximo, nem aceita nenhum opróbrio contra o seu próximo;

_______________

Provaste o meu coração; visitaste-me de noite; examinaste-me, e


nada achaste; propus que a minha boca não transgredirá.

_______________

Guarda a tua língua do mal, e os teus lábios de falarem o engano.

Os primeiros líderes desta dispensação aprofundaram nossa


compreensão sobre o poder da fala ao afirmarem que “É pelas
palavras ( … ) [que] todo ser opera, quando opera pela fé. Disse Deus: ‘Haja
luz; e houve luz.’ Josué falou, e as grandes luzes que Deus havia criado
ficaram paradas. Elias ordenou e os céus foram cerrados pelo espaço de três
anos e seis meses, durante os quais não choveu. ( . . . ) Tudo isso foi feito
pela fé. ( . . . ) A fé, portanto, opera pelas palavras; e com [palavras] suas
obras mais poderosas foram e serão realizadas”.62 Como todas as dádivas
“que vem de cima”, as palavras são “[sagradas] e [devem] ser [mencionadas]
com cuidado e por indução do Espírito”.63 As palavras são tão poderosas que
às vezes precisamos avaliar a maneira como falamos uns com os outros e
como falamos sobre nós mesmos.
Há um versículo de um livro apócrifo que expressa a seriedade dessa
questão melhor do que eu. Nele lemos: “O golpe do chicote deixa marcas na
carne; mas o golpe da língua quebra os ossos”64 Com essa forte imagem em
mente, é importante observar o que Tiago, o irmão de Jesus, disse sobre o
homem “perfeito”: “Porque todos tropeçamos em muitas coisas. [Mas] se
alguém não tropeça em palavra, o tal é perfeito, e poderoso para também
refrear todo o corpo”.
Dando continuidade à metáfora de refrear, Tiago escreveu: “Ora, nós
pomos freio nas bocas dos cavalos, para que nos obedeçam; e conseguimos
dirigir todo o seu corpo.
Vede também ( … ) as naus que, sendo tão ( … ) grandes, e levadas de
impetuosos ventos, se viram com um bem pequeno leme”.
Então, Tiago chega aonde pretendia: “Assim também a língua é um
pequeno membro. ( . . . ) [Mas] vede quão grande [floresta]65 um pequeno
fogo [pode incendiar]. (
. . . )A língua [é um fogo,] posta entre os nossos membros, ( … ) e
contamina todo o corpo, ( … ) e é inflamada pelo inferno.
Porque toda a natureza, tanto de bestas feras como de aves, tanto de
répteis como de animais do mar, ( … ) foi domada pela natureza humana;
Mas nenhum homem pode domar a língua. É um mal que não se pode
refrear; está cheia de peçonha mortal.
Com ela bendizemos a Deus e Pai, e com ela amaldiçoamos os homens,
feitos à semelhança de Deus.
De uma mesma boca procede bênção e maldição. Meus irmãos [e
irmãs], não convém que isto se faça assim”.66
Isso foi, no mínimo, muito direto. Evidentemente, Tiago não quis dizer
que nossa língua é sempre iníqua, tampouco que tudo o que dizemos seja
“cheio de peçonha mortal”. Mas ele deixou claro que ao menos algumas de
nossas palavras podem ser destrutivas, até venenosas — e essa é uma
acusação assustadora! A voz que presta um profundo testemunho, profere
orações fervorosas e canta os hinos de Sião pode ser a mesma voz que
deprecia e critica, envergonha e rebaixa, inflige dor e destroi seu próprio
espírito e o de outras pessoas no processo. “De uma mesma boca procede
bênção e maldição”, lamenta Tiago. “Meus irmãos [e irmãs], não convém que
isto se faça assim.”
Paulo falou com toda franqueza, mas com muito otimismo. Ele disse a
todos nós: “Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, mas só a que for
boa ( … ) [e promova] a edificação, para que dê graça aos que a ouvem.
E não entristeçais o Espírito Santo de Deus. ( . . .
) Toda a amargura, e ira, e cólera, e gritaria, e blasfêmia e toda a malícia
sejam tiradas dentre vós. ( . . .
) Antes sede uns para com os outros benignos, misericordiosos,
perdoando-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo”.67
Procuremos ser perfeitos pelo menos neste aspecto — que refreemos
nossa língua quando precisar ser refreada, para que não transgridamos com
nossa boca.

Notas
^62. Lectures on Faith, 1985, pp. 72–73; grifo do autor.
^63. Doutrina e Convênios 63:64.
^64. Eclesiásticos 28:17.
^65. Tradução alternativa do grego
^66. Tiago 3:2–10; grifo do autor
^67. Efésios 4:29–32
Salmos 17:8

Guarda-me como à menina do olho; esconde-me debaixo da


sombra das tuas asas.

Um especialista mundial em desenvolvimento infantil disse certa vez


que cada criança merece ter alguém que seja completamente louco por ela.
Infelizmente, nesta vida mortal, nesta existência temporal, nem todas as
crianças terão essa dádiva. Mas é certo que, de uma maneira maravilhosa e
conhecida apenas por Ele, Deus vê cada criança, cada indivíduo nascido na
Terra, como a “menina do [Seu] olho”. Não sabemos como a compaixão
divina pode ser tão abrangente e, ao mesmo tempo, individual; mas ela é
assim. De alguma forma, Deus consegue concentrar-Se em todos nós,
pessoalmente, e saber, de maneira singular, as preocupações e os medos de
cada um. Em nossos momentos de necessidade, é como se nenhuma outra
voz O distraísse, como se nenhuma outra preocupação desviasse Sua atenção.
Naqueles momentos em que necessitamos especialmente Dele, sejam em
tempos de angústia ou não, é como se fôssemos o único objeto de Sua afeição
e atenção. Somos a “menina do [Seu] olho” e, por ser o Pai protetor e
cuidadoso que é, Deus nos esconde “debaixo da sombra de [Suas] asas”.
Todas as crianças — independente da idade — podem encontrar grande
consolo com isso, especialmente em tempos de angústia.
Salmos 18:2, 30; 61:2; 62:6

O Senhor é o meu rochedo, e o meu lugar forte, e o meu libertador;


o meu Deus, a minha fortaleza, em quem confio; o meu escudo, a força
da minha salvação, e o meu alto refúgio. ( . . .

) O caminho de Deus é perfeito; a palavra do Senhor é provada; é


um escudo para todos os que nele confiam.

_______________

Desde o fim da terra clamarei a ti, quando o meu coração estiver


desmaiado; leva-me para a rocha que é mais alta do que eu.

_______________

Só ele é a minha rocha e a minha salvação; é a minha defesa; não


serei abalado.

Dentre as metáforas mais reconfortantes dos Salmos e de outras


escrituras está a figura de Deus como uma rocha ou fortaleza. Ele é rocha
sólida, rocha maciça, rocha segura. Ele é firme. Ele não pode ser sobrepujado
ou derrotado. Mas para o resto de nós, a vida nem sempre parece tão sólida,
firme ou segura. Às vezes, as circunstâncias nos desequilibram e vacilamos.
Enfrentamos situações que nos desorientam, que nos deixam desconcertados,
incertos ou com medo.
Que maravilhoso é poder contar nesses momentos com uma rocha a nos
amparar, com um refúgio para onde fugir. Que maravilhoso é saber que,
quando nossos pés escorregarem, ou nossa fé cambalear, haverá algo firme e
inamovível — algo sólido — para nos amparar e acalmar nossa ansiedade.
O profeta Helamã, no Livro de Mórmon, deu o seguinte conselho a seus
filhos, Leí e Néfi: “Lembrai-vos, lembrai-vos de que é sobre a rocha de nosso
Redentor, que é Cristo, o Filho de Deus, que deveis construir os vossos
alicerces; para que, quando o diabo lançar a fúria de seus ventos, sim, seus
dardos no torvelinho, sim, quando todo o seu granizo e violenta tempestade
vos açoitarem, isso não tenha poder para vos arrastar ao abismo da miséria e
angústia sem fim, por causa da rocha sobre a qual estais edificados, que é um
alicerce seguro; e se os homens edificarem sobre esse alicerce, não cairão”.68
Obviamente, aquilo que se aplica ao Filho também se aplica ao Pai. A
oração de Ana é também a nossa: “Não há santo como o Senhor; porque não
há outro fora de ti; e rocha nenhuma há como o nosso Deus”.69
Tendo o Pai, o Filho, o Espírito Santo e o evangelho como âncoras em
nossa vida, estaremos mais bem preparados e teremos mais força para
enfrentar os desafios. Eles são nossa libertação. Além de imutáveis e
inamovíveis, Eles também são infalíveis. Confiamos Neles e nisto reside
nossa salvação.
“Portanto não temais, pequeno rebanho; fazei o bem; deixai que a Terra
e o inferno se unam contra vós, pois se estiverdes estabelecidos sobre minha
rocha, eles não poderão prevalecer.”70

Notas
^68. Helamã 5:12.
^69. I Samuel 2:2
^70. Doutrina e Convênios 6:34.
Salmos 18:36; 94:18–19

Alargaste os meus passos debaixo de mim, de maneira que os meus


artelhos não vacilaram.

_______________

Quando eu disse: O meu pé vacila; a tua benignidade, Senhor, me


susteve.

Na multidão dos meus pensamentos dentro de mim, as tuas


consolações recrearam a minha alma.

Quando permitimos que Deus entre em nossa vida (ou somos


suficientemente sábios para entrar na Dele), Ele “[alarga] nossos passos” no
caminho a trilhar — ou, em outras palavras, Ele nos dá pés que não vacilam.
Grande parte do auxílio miraculoso que encontramos no evangelho é
exatamente isso — um milagre dos céus, o poder do divino sacerdócio, a
visitação de anjos para nos ministrar por meio de um fino véu. Essas são
dádivas de Deus, manifestações de Sua graça. Elas nos são dadas sem que
exerçamos muito controle ou poder — ou mesmo dignidade, ao que parece
— de nossa parte.
Mas o miraculoso auxílio de Deus consiste de outros elementos que Ele
nos concede, a fim de que possamos ajudar a nós mesmos. Alguns caminhos
parecem inacessíveis. Algumas montanhas parecem impossíveis de escalar.
Alguns passos são difíceis de ser dados. Nesses casos, os céus intervêm, mas
não para abrir o caminho, remover a montanha ou encurtar o caminho. Em
geral, Deus envia um tipo diferente de auxílio. Ele nos fortalece e firma
nossos pés. De fato, Ele nos dá pés mais seguros, pernas mais fortes, costas
mais firmes e ombros mais resistentes. Ele cuida de nós, em vez de cuidar
dos problemas que enfrentamos. Assim, prosseguimos com força renovada,
menos propensos a deslizes e mais preparados.
Há um exemplo disso no Livro de Mórmon. Numa situação muito
difícil, “as cargas impostas a Alma e seus irmãos se tornaram leves; sim, o
Senhor fortaleceu-os para que pudessem carregar seus fardos com
facilidade”.71 As provações ainda existiam, mas os ombros do povo foram
capazes de suportar a carga que o Senhor colocou sobre eles.
Vez após outra, repetidamente e mais frequentemente do que
reconhecemos, o Senhor nos ampara quando vacilamos. Ele firma nossos
passos. Ele nos sustenta para que não caiamos. Obviamente, conhecemos
pessoas que não só vacilaram, mas caíram de cabeça. No entanto, mesmo
quando erramos, Ele pode nos erguer, curar nossas feridas e nos colocar de
volta no caminho.
Mas faríamos bem se parássemos para prestar atenção às dezenas e
centenas de vezes em que não caímos. É bem provável que, por nossa
ignorância e teimosia, talvez merecêssemos ter caído. Mas não caímos. Sua
misericórdia nos amparou. Ao longo da vida, reconhecemos muitos
momentos em que quase erramos, mas há muitos mais que não percebemos,
cujas consequências ou perigos não conhecemos. Antes de escorregarmos —
ou mesmo quando começamos a escorregar — fomos amparados em
segurança. Em meio à multidão desses pensamentos e recordações, dessas
oportunidades que poderiam ter sido diferentes ou trágicas (mas que não
foram!) “as tuas consolações recrearam a minha alma”.

Nota
^71. Mosias 24:15.
Salmos 19:1–3; 8:3–6

Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra


das suas mãos.

Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a


outra noite.

Não há linguagem nem fala onde não se ouça a sua voz.

_______________

Quando vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas
que preparaste;

Que é o homem mortal para que te lembres dele? e o filho do


homem, para que o visites?

Pois pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de honra


o coroaste.

Fazes com que ele tenha domínio sobre as obras das tuas mãos;
tudo puseste debaixo de seus pés.

Quando o anticristo Corior, com arrogância e provocação, pediu a Alma


que lhe mostrasse um sinal da presença e do poder de Deus, Alma respondeu
prontamente: “Tu já tiveste muitos sinais”. O maior dos sinais é a evidência
eterna da “Terra e tudo que existe sobre a sua face, sim, e seu movimento,
sim, e também todos os planetas que se movem em sua ordem regular”. Pois
tanto hoje quanto na Antiguidade, essas coisas “testemunham que existe um
Criador Supremo”.72
Dentre as experiências mais humildes e emocionantes que teremos na
mortalidade, estão os vislumbres ocasionais que temos da imortalidade,
quando contemplamos as maravilhosas criações de Deus. Essas maravilhas
incluem o esplendor de um belo outono, ou o despertar repentino da
primavera. Incluem também as majestosas montanhas e os gélidos fiordes. A
beleza dessas obras divinas pode ser percebida de inúmeras maneiras, tanto
na Terra quanto quando observamos o céu estrelado (o que é muito mais
chamativo para os olhos).
Pessoalmente, acho que não há nada mais inspirador do que admirar o
desvelar de um céu estrelado, sem a interferência de luzes terrenas. Para mim,
essa é a visão mais arrebatadora da natureza. Mas é claro que o que vemos a
olho nu é uma parte ínfima de apenas uma galáxia — a nossa. Com o auxílio
das magníficas lentes de telescópios e das fotografias espaciais, podemos ver
um pouco dos outros “mundos incontáveis”.73 Verdadeiramente, “uma noite
[após] outra noite mostra sabedoria”: a sabedoria de Deus. Não há país ou
cultura neste planeta sobre o qual as estrelas não brilhem constantemente,
testificando Sua onisciência e Sua onipotência. Da mesma forma, não há
local do Universo em que a majestade das criações de Deus não seja visível.
Todas essas coisas são “obra dos dedos [de Deus]”.
Ainda assim, Suas maiores obras são os homens, as mulheres e crianças,
as pessoas “comuns” entre as quais caminhamos. Algumas dessas pessoas
estão angustiadas, outras sofrem grandes infortúnios; algumas passam por
problemas que não são sua culpa e outras carregam fardos que elas mesmas
colocaram sobre si. Mas quaisquer que sejam suas condições, a maior de
todas as criações de Deus são Seus filhos — nós. Mesmo diante das criações
celestiais que nos maravilham em uma clara noite estrelada, nós é que “pouco
menor [fomos feitos] do que os anjos” ou, em hebraico, pouco menor que
“Eloim [os Deuses]”. Sendo assim, somos coroados com glória e honra aqui e
com a promessa de glória e honra lá.
C. S. Lewis disse certa vez que se pudéssemos reconhecer quem somos,
perceberíamos que caminhamos ao lado de “deuses e deusas em potencial”, a
quem, se pudéssemos vê-los em toda sua dignidade e glória eternas, seríamos
tentados a adorar.74 Por isto ser verdade, precisamos ter pensamentos mais
elevados a respeito de nós mesmos e dos outros. Dentre todas as criações de
Deus, os homens e as mulheres mortais são Sua maior obra, a única a
carregar as sementes vivas de Seu esplendor eterno, com a possibilidade de
perpetuar a glória dessas grandes criações. Precisamos lembrar disso quando
um bebê nasce, assim como precisamos nos lembrar disso quando esses
bebês crescem e enfrentam angústias. Precisamos ajudá-los e continuar tendo
pensamentos elevados a respeito deles. Precisamos honrar a divindade que
existe em cada ser humano. Ao fazermos isso, devolvemos a Deus uma
pequena porção da glória e honra com as quais Ele nos coroou.
Em um mundo — ou em um universo — de problemas grandes e
pequenos, um mundo de forças físicas, financeiras, políticas e sociais que
aparentemente fogem do nosso controle, haverá momentos em que nos
perguntaremos: “Eu tenho alguma importância nisso tudo? Será que minha
pequena e às vezes dolorosa porção no grande esquema das coisas importa
tanto assim? É possível que Deus me conheça e tenha tempo para mim e para
ouvir minhas orações? Com todas as coisas que requerem a atenção divina —
fome, guerras, doenças, pecados — é possível que, em meio a grande
expansão do Universo, meu coração seja conhecido, compreendido e
valorizado?” Em dias desanimadores e difíceis, quase todos nos perguntamos
essas coisas.
Mas a verdade eterna, a resposta imutável é um “sim” para todas essas
perguntas e para muitas outras. A grande e eterna verdade é que a totalidade
do plano da vida, o plano para nossa salvação, é composta pelo roteiro
individual de cada homem e mulher, cada menino e menina. Deus nos
conhece por nome, endereço, circunstâncias pessoais e necessidades. Ele sabe
quais são nossas esperanças e nossos sonhos, nossos medos e nossas
frustrações. Acima de tudo, Ele sabe quem nós realmente somos e quem
podemos nos tornar, por meio da fé Nele.
Tudo o que ocorreu nos cinco primeiros dias da criação — a harmonia
do Universo, a ordem dos planetas, as grandes obras da natureza, a criação da
flora e da fauna — todas essas coisas existem com o propósito único de nos
abençoar como indivíduos, valorosos filhos e filhas eternos de Deus. Um de
cada vez. Todos e cada um de nós. Todos nós.
O que é um homem, o que é uma mulher? Quem, de fato, nós somos?
Mesmo aqui, na mortalidade, em nosso estado imperfeito, somos pouco
menores que os Deuses. Como filhos de nosso Pai Celestial, temos a
capacidade inerente de nos tornarmos como Ele, de alcançarmos nosso
potencial divino e de atingirmos nosso destino divino. Se formos fiéis —
literalmente “cheios de fé” — especialmente em tempos de angústia,
poderemos ouvir, ao admirarmos o céu estrelado, um sussurro nos confirmar
a verdade:

Vagando pela noite adentro


Sob o brilhante firmamento
Na mais completa solidão
Tenho, eu sei, Deus por companheiro.
Se sobre a erva ajoelhado, elevo uma prece a Deus,
Vem, sem palavras, a resposta.
Minha dor cura, traz-me alívio,
E sinto alegre o coração.75

Notas
^72. Alma 30:44.
^73. Moisés 1:33.
^74. C. S. Lewis, The Weight of Glory, HarperCollins: 2001, p. 45;
tradução livre.
^75. “Come unto Him”, Hymns of The Church of Jesus Christ of Latter-
day Saints, 1985, nº 114.
Salmos 19:13

Também da soberba guarda o teu servo, para que se não


assenhoreie de mim. Então serei sincero, e ficarei limpo de grande
transgressão.

A inevitável pergunta contida nesse versículo é: O que é a “soberba”? E


por que está intimamente associada à “grande transgressão”?
A palavra presumir vem para o idioma inglês a partir de uma raiz latina
que significa “antecipar” ou “assumir”. Sendo assim, a “soberba” é um
pecado preconcebido ou, em outras palavras, um pecado previamente
planejado.
Uma transgressão é uma infração e, como todos os pecados, tem
consequências. Mas os pecados que concebemos ou planejamos previamente,
aqueles que calculamos e prevemos, são a “grande transgressão”. Uma coisa
é pecar em ignorância ou inocência, cair vítima de uma tentação momentânea
ou de um lapso de julgamento moral. Mas outra coisa bem diferente é
intencionalmente planejar e premeditar o pecado.
Já ouvi jovens declararem que desejam fazer loucuras durante a
juventude e que, após terem experimentado uma vida libertina, buscarão a
Deus e se arrependerão. Eles pensam que há tempo suficiente para fazer
ambas as coisas e que no final tudo ficará bem. Até citam exemplos de
pessoas que foram pecadoras na juventude, mas que morreram firmes na fé.
Nenhuma outra declaração que ouvi foi mais aterradora do que essa. Essa é a
“soberba”, que será considerada por Deus como a “grande transgressão”. As
consequências desse tipo de pecado não serão boas para os que dele forem
culpados.
É perigoso planejar fazer como o filho pródigo e esperar que Deus nos
perdoe, que Cristo derrame Seu sangue por nós, que a misericórdia nos
envolva. Um dos maiores pecados que um mortal poderia cometer é
crucificar Cristo “de novo”,76 conscientemente pedir a Ele que sofra uma vez
mais na cruz (ou repetidas vezes) enquanto cometemos conscientemente,
após planejamento e premeditação, o pecado da “soberba”.
Que Deus permita que nunca sejamos soberbos ou presunçosos em
relação a Sua graça, Sua misericórdia e Seu perdão. Que Deus nos proteja de
todos os pecados, mas em especial daqueles que conscientemente planejamos
cometer. Eles são a “grande transgressão”.

Nota
^76. Hebreus 6:6.
Salmos 20:7

Uns confiam em carros e outros em cavalos, mas nós faremos


menção do nome do Senhor nosso Deus.

É importante lembrar que o primeiro princípio do evangelho é a fé, não


num sentido abstrato, mas especificamente a “fé no Senhor Jesus Cristo”.77
Isso é importante pois, sem fé em Cristo, a fé em qualquer outra coisa é
parcial, inadequada ou mesmo destrutiva. O salmista afirma que uns colocam
sua confiança em carros e cavalos. Ele poderia ter mencionado rebanhos e
vinhas. Ele poderia ter mencionado ações e títulos, casas e carreira. Ele
poderia ter mencionado dinheiro vivo, propriedades e influência política.
Em nossos dias, a lista de coisas nas quais podemos colocar nossa
confiança é muito maior, pois fomos abençoados com as riquezas e os luxos
da Terra. No século 21, somos tentados por muitos novos tipos de cavalos e
carros. Mas com o tempo — assim como acontecia antigamente — suas rodas
enferrujarão e suas patas desfalecerão.
O verdadeiro propósito da vida é que, ao longo dela (e no seu final),
tenhamos colocado nossa fé não só nas coisas que a enriquecem, mas nas que
perdurarão além dela. Devemos investir nas coisas que podem ser levadas
para além da sepultura, para a vida eterna. Não há cavalo ou carro — antigo
ou moderno — que possa fazer essa viagem conosco.
“Não entesoureis para vós tesouros na Terra, onde a traça e a ferrugem
consomem ( … ) Mas ajuntai tesouros no céu ( … ) Porque onde estiver o
vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.”78
Não basta apenas ter fé. É preciso ter fé naquilo que salva e redime. E só
há um nome dado debaixo do céu que pode fazer isso. “Faremos menção do
nome do Senhor nosso Deus.”

Notas
^77. Regras de Fé 1:4.
^78. Mateus 16:19–21.
Salmos 22:4–5

Em ti confiaram nossos pais; confiaram, e tu os livraste.

A ti clamaram e escaparam; em ti confiaram, e não foram


confundidos.

Quando nossos problemas parecerem enormes e o futuro incerto, quando


nos perguntarmos se existe uma escapatória, seria bom lembrarmos que
nossos antepassados, falando pessoal ou coletivamente, tiveram os mesmos
medos que nós e receberam auxílio do alto. O ato de recordar que aqueles que
nos precederam precisaram ser e foram libertados nos dá esperança. Em
algumas ocasiões, as soluções vieram rapidamente; em outras, elas
demoraram meses e anos, mas vieram.
Quando o jovem Néfi precisou encorajar seus irmãos a agirem
fielmente, ele instou-os a relembrarem as tarefas ainda mais difíceis que seus
pais haviam enfrentado anos antes. “Sejamos fortes como Moisés”, disse ele,
“porque ele por certo falou às águas do Mar Vermelho e elas dividiram-se
para um e outro lado; e nossos pais saíram do cativeiro passando sobre terra
seca”.79 Em nossa hora de necessidade, seria bom lembrarmos que aqueles
que nos precederam enfrentaram aflições ainda maiores que nós, mas “saíram
do cativeiro”.
Um missionário ou missionária que se sinta desanimado ou com
saudades de casa precisa lembrar que aqueles que serviram antes deles
também tiveram os mesmos sentimentos, mas “saíram do cativeiro”. A mãe
que sinta uma dor insuportável por causa do comportamento de um filho
precisa lembrar de que sua própria mãe pode ter tido os mesmos medos, mas
por fim “foi livrada”. Aqueles que sofreram perdas financeiras ou cuja
carreira ruiu podem ser encorajados pelo fato de que outros tiveram o mesmo
revés, mas “em [Deus] confiaram” e encontraram uma saída — talvez não a
mais fácil, nem a mais rápida, mas a encontraram.
Quando chegarem os dias difíceis, lembrem-se de que outros
enfrentaram tudo isso e muito mais, a exemplo dos grandiosos pais e mães
pioneiros, nas primeiras décadas da história da Igreja. Eles caminharam com
fé a cada passo e “[encontraram] um lar”.80 Eles clamaram a Deus e foram
libertados, mesmo quando acreditar ou esperar pelo escape parecia algo
impossível.
Nós também podemos confiar que Ele nos libertará.

Notas
^79. 1 Néfi 4:2.
^80. “Vinde, Ó Santos”, Hinos, nº 20.
Salmos 24:3–4; 51:10

Quem subirá ao monte do Senhor, ou quem estará no seu lugar


santo?

Aquele que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a


sua alma à vaidade, nem jura enganosamente.

_______________

Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um


espírito reto.

O Salmo 24, como observado no capítulo introdutório deste livro, é um


dos mais citados — e cantados — de todo o cânone das escrituras. A. W.
“Mickey” Hart transformou essas palavras em música. Sua canção
emocionou milhões de pessoas. Eu ainda fico emocionado cada vez que a
ouço.
Há muitos requisitos para que se possa subir “ao monte do Senhor” e
estar “em seu lugar santo” — como mencionado antes, essa é uma referência
direta ao templo — mas o salmista gentilmente os reduz a apenas dois:
pureza e humildade.
Já ouvi dizer que o Velho e o Novo Testamentos contradizem um ao
outro, que eles parecem ter sido escritos com propósitos distintos, para
pessoas diferentes. Mas não foram. De maneira muito simplificada,
poderíamos dizer que a maior parte do Velho Testamento trata do homem
exterior, enquanto o Novo Testamento lida com o interior, mas ambos são
importantes e precisam ser abordados para nossa salvação. A fim de virmos a
Deus, devemos estar limpos tanto externamente (nossas mãos) quanto
internamente (nosso coração).
Pensem na bênção de um bebê, a participação do sacramento ou a
participação das ordenanças do templo. Para podermos usufruir plenamente
dessas experiências sagradas, deveríamos literalmente ter mãos limpas (assim
como nossas roupas e nosso semblante). Nossa aparência precisa ser a mais
limpa possível, ao buscarmos estar na santa presença de Deus. Novamente,
de maneira muito simplificada, isso poderia ser considerado um requisito do
“Velho Testamento”, mas de qualquer forma é uma exigência.
Contudo, além dessa evidência externa, também precisamos ser limpos
internamente — ou puros, se preferir — uma demonstração de que a
condição interior dá sentido à exterior. Nossos pensamentos precisam ser
limpos; nossas motivações, inocentes; nossas ações, puras, sem vaidade ou
dolo. Precisamos ser humildes discípulos de Cristo. Esse poderia ser
considerado o requisito de dignidade do “Novo Testamento” para que
possamos estar na presença de Deus.
De fato, a pureza interior e exterior talvez seja a primeira coisa que
reconheceremos no Salvador, quando Ele retornar para governar e reinar
sobre a Terra. Mórmon escreveu para seu filho e para a congregação nefita
daquela época: “rogai ao Pai, com toda a energia de vosso coração, ( … ) que
vos torneis os filhos [e filhas] de Deus; que quando ele aparecer, sejamos
como ele ( … ) que sejamos purificados, como ele é puro”.81
Tiago, o irmão de Jesus, compartilhou conosco uma lição de vida. Ele
disse: “A sabedoria que do alto vem é, primeiramente pura, depois
pacífica”.82 Que descrição poética e precisa do templo e daqueles que o
frequentam dignamente. Em nossos dias — nesta grandiosa dispensação que
tem a construção de templos como pano de fundo — podemos compreender
mais plenamente a determinação de Deus em “[reservar] um povo puro diante
de [Si]”. Na casa do Senhor, podemos ser “santificados por meio daquilo que
( … ) [recebemos] e [fazer] convênio de que [agiremos] em toda a santidade
diante Dele”.83
Em tempos de angústia, podemos ir ao templo e devemos ir com mãos
limpas e coração puro. Assim, um “espírito reto” será renovado em nós.

Notas
^81. Morôni 7:48.
^82. Tiago 3:17.
^83. Doutrina e Convênios 43:14, 9.
Salmos 25:7

Não te lembres dos pecados da minha mocidade, nem das minhas


transgressões; mas segundo a tua misericórdia, lembra-te de mim, por
tua bondade, Senhor.

Ninguém consegue ter, na juventude, a sabedoria que terá quando atingir


a maturidade trazida pela experiência. Apesar disso não é desculpa para a
transgressão, os céus e os líderes da Igreja se esforçam generosamente para
perdoar os pecados e as transgressões dos jovens. Ao longo dos anos, Deus e
os profetas certamente têm feito todo o possível para advertir, prevenir e
aconselhar — e, quando necessário, disciplinar — os jovens. Ao mesmo
tempo, eles se esforçam para apoiar, curar e ajudar rapazes e moças a se
arrependerem e seguirem em frente, a deixarem para trás seus erros e
contemplarem as oportunidades e a paz reservadas para aqueles que se
arrependem, ao atingirem a maturidade.
Na juventude, todos sobem a montanha da vida carregando menos
experiência e sabedoria do que aqueles mais experimentados; mas com
auxílio — e, se necessário, perdão — é possível chegar ao topo e vislumbrar,
do outro lado, uma vida repleta de bênçãos e alegrias prometidas. Todo
jovem que tiver pecado precisa saber que Deus perdoa; que Ele é um Deus de
misericórdia; que o arrependimento concede a cada pessoa — jovem ou idoso
— a oportunidade de sobrepujar erros, por meio da Expiação do Senhor Jesus
Cristo. Tal dádiva não deveria ser tratada com leviandade; mas, felizmente,
para todos nós, este é o evangelho da segunda chance, a igreja do final feliz.
Todo jovem que estiver disposto a sentir tristeza pelo pecado; a pagar o
preço para buscar o perdão do Senhor e Seu poder capacitador, a fim de
mudar de vida; a esforçar-se para viver de uma maneira melhor,
independentemente dos erros cometidos no passado; tal jovem tem o direito
de clamar ao Senhor — e ter a certeza de que sua súplica será honrada: “Não
te lembres dos pecados da minha mocidade”.
Uma última observação: Se Deus está disposto a perdoar e esquecer os
pecados — aquele que verdadeiramente se arrepende “é perdoado e eu, o
Senhor, deles não mais me lembro”84 — então certamente devemos fazer o
mesmo. Nada é mais anticristão do que ficar relembrando pecados passados
— dos outros ou de nós mesmos — não permitindo, assim, deixá-los morrer.
Isso é negar a Expiação de Cristo. É obstruir o perdão divino. É desenterrar
aquilo que o próprio Deus quer que fique enterrado. Perdoe as transgressões,
seja de jovens ou adultos. Permita que a Expiação assuma o controle. Deixe
que o futuro seja brilhante, mesmo que o passado não o tenha sido. Você, eu
e toda a humanidade um dia suplicaremos por essa graça. Que demonstremos
nosso discipulado cristão concedendo-a aos outros.

Nota
^84. Doutrina e Convênios 58:42.
Salmos 27:4–5

Uma coisa pedi ao Senhor, e a buscarei: que possa morar na casa


do Senhor todos os dias da minha vida, para contemplar a formosura do
Senhor, e inquirir no seu templo.

Porque no dia da adversidade me esconderá no seu pavilhão; no


oculto do seu tabernáculo me esconderá; pôr-me-á sobre uma rocha.

Para os santos dos últimos dias, o lugar mais santo da Terra é o templo
de Deus, a casa do Senhor. Por definição e por dedicação, é um lugar santo,
um local onde Deus está presente; uma estrutura terrena que nos permite ter
uma experiência celestial. Já foi dito que, no evangelho restaurado, todas as
estradas levam ao templo e que o templo nos leva à eternidade. De todas as
maneiras, o templo é um local de beleza estonteante, onde nos é possível
“contemplar a formosura do Senhor”. Não é à toa que dentre os pouquíssimos
atos de ira registrados acerca de Jesus, os dois maiores se deram em resposta
à profanação do templo, a “casa de [Seu] Pai”,85 o lugar onde Deus desce ao
homem, e o homem ascende a Deus.
O templo é uma bênção para nós, especialmente “em tempos de
angústia”. Quando nos sobrevêm momentos difíceis ou quando temos
decisões importantes a tomar, instintivamente vamos ao templo. Lá
encontramos paz e respostas. É um local de tranquilidade, pureza e revelação.
O emaranhado de complexidades da vida se desfaz e o caminho que devemos
percorrer, o curso de ação que devemos tomar — ou apenas a segurança e a
paz que desesperadamente buscamos — tornam-se evidentes. O templo
verdadeiramente é uma rocha sobre a qual Deus nos coloca quando as ondas
e os ventos sopram mais fortes.
Literalmente, não podemos estar sempre no templo, nem vamos até lá
para nos “esconder”. Depois de passarmos um tempo em seus recintos
sagrados, voluntariamente saímos de lá e entramos novamente na vida, para
enfrentar as questões da mortalidade. Contudo, em nosso coração, podemos
acalentar essa experiência e nos apegar ao desejo de que, se pudéssemos,
iríamos “morar na casa do Senhor todos os dias da [nossa] vida, para
contemplar a formosura do Senhor”. Ao fazer isso, encontraremos beleza e
alegria em outros locais e circunstâncias.

Nota
^85. Lucas 2:16; ver também Mateus 21:13.
Salmos 27:10

Porque, quando meu pai e minha mãe me desampararem, o Senhor


me recolherá.

Ninguém deveria inspirar mais confiança na vida de uma criança do que


sua mãe e seu pai. Felizmente, a maioria dos pais são magníficos. O amor dos
pais pelos filhos, ainda que nem sempre seja expresso com perfeição, é a
coisa mais próxima ao amor divino que encontraremos neste mundo. Criar
filhos é extremamente importante, por isso: como mães e pais, representamos
— e damos nosso melhor para imitar— o amor e o vigor que nossos pais
celestiais têm pelos filhos que nos emprestaram. Tendo o exemplo de
paternidade celestial como modelo, a paternidade mortal se reveste de um
significado profundo e eterno.
Infelizmente, há pais e mães que abdicam de sua responsabilidade, que
fogem do lar (literal ou figurativamente), ignorando os filhos que anseiam
por amor. É doloroso e preocupante pensar nisso, mas há evidências de que
esse tipo de abandono ocorre em algumas sociedades, em especial onde o
casamento é desprezado e a destruição da unidade familiar é ignorada. Às
crianças que passam por essa perda — ainda que nenhuma devesse enfrentá-
la — o salmista oferece uma certeza que nunca falhará, um amor que nunca
esfriará, um vínculo paterno que nunca deixará o lar ou a vida. Ele oferece o
amor de um pai celestial.
O amor de Deus a Seus filhos é seguro. A paternidade é Seu papel mais
precioso; de todos os títulos que possui, o Seu preferido é “Pai”. Quando não
houver pais terrenos, Ele nos “recolherá” em Seus fortes braços. Ele nunca
nos abandonará.
Salmos 30:5; 42:5; 130:6

O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.

_______________

Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas em


mim? Espera em Deus.

_______________

A minha alma anseia pelo Senhor, mais do que os guardas pela


manhã.

Numa amigável conversa à mesa de jantar, o anfitrião disse aos


convidados que a sobremesa só seria servida se uma pergunta relativa ao
evangelho fosse respondida corretamente: “Qual é a virtude sem a qual
nenhum homem ou mulher pode viver?”
O primeiro convidado respondeu fé — ninguém pode, de fato, viver sem
fé em Deus.
O anfitrião respondeu que a fé em Deus era certamente a mais
fundamental das virtudes religiosas e que, para se viver uma vida
verdadeiramente boa, santa ou feliz, a fé seria um requisito. Mas, não, a
resposta não era fé. Infelizmente, ele conhecia muitas pessoas que viviam
sem fé em coisa alguma e, apesar de triste, aquele fato indicava que a vida
pode continuar sem fé, pois era o que acontecia com aquelas pessoas.
O segundo convidado respondeu que era o amor — que ninguém
conseguiria viver sem amor.
Novamente, o anfitrião avaliou a resposta, dizendo que, sem dúvida, a
afirmação seria verdadeira se estivéssemos falando do amor que Deus tem
por nós; no entanto a pergunta dizia respeito às virtudes que nós temos, não
às que Deus possui. Infelizmente, disse ele, existem várias pessoas que vivem
sem amor por nada nem por ninguém — mas ainda assim continuam a viver.
Ele então respondeu a sua própria pergunta: “De fato, acredito que o
ingrediente mais essencial da vida, a virtude que permite o florescimento de
outras bênçãos, tais como a fé o amor, seja a esperança”. Isso não significa
que a esperança seja a maior das virtudes (o Apóstolo Paulo registrou que o
amor era a maior das três),86 mas quer dizer que, em certo sentido, a
esperança é a mais essencial, ao menos inicialmente, pois faz emergir as
outras duas.
Todos precisamos crer que as coisas ficarão melhores. Não importa
como a noite seja escura nem quanto tempo a luta vai durar, todos precisamos
crer que o amanhecer virá e que as lágrimas da noite serão desfeitas pelos
raios do sol matutino. O salmista nos transmite a boa e velha esperança ao
prometer que “o choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã”.
Nossos medos de infância estão relacionados à noite. Talvez sejam
apenas uma simples e inevitável ansiedade da juventude. Talvez sejam
símbolo de um tipo de escuridão mais teológico, uma escuridão do mal e do
medo da destruição espiritual. Qualquer que seja o caso, todos nós, velhos e
jovens, já enfrentamos uma longa noite de espera, ansiando pelos primeiros
raios de luz da manhã.
Felizmente, a manhã sempre chega. Felizmente, a escuridão sempre é
afastada e a confiança retorna à medida que vemos e ouvimos o mundo voltar
à vida. Para fazer eco às palavras de Eclesiastes: “Nasce o sol”.87
Que maravilhoso seria se cantássemos junto com o salmista: “A minha
alma anseia pelo Senhor, mais do que os guardas pela manhã”. Devemos
desejar a luz do Salvador em nossa vida com a mesma intensidade que
esperamos o caloroso e confiante nascer do sol. Cristo é a “resplandecente
estrela da manhã”.88 — o sol, o Filho. Um dia, Ele retornará para governar e
reinar como Senhor dos Senhores e Rei dos Reis. Aguardamos esse dia com
mais anseio que “os guardas pela manhã”.
Ao longo da vida, iremos chorar inúmeras vezes. Mas as lágrimas não
são permanentes; o desespero não durará para sempre. Na escuridão da noite,
em meio a nossas angústias, talvez não vejamos uma saída ou uma libertação,
mas esse sentimento passa à medida que a noite também passa. As coisas vão
melhorar quando a manhã chegar. Com o raiar de um novo dia (ou de outro
dia ou de ainda mais um dia) a alegria retornará. Talvez não seja tão rápido
quanto gostaríamos. Inicialmente, pode ser que o auxílio não seja tão
evidente quanto gostaríamos, mas ele virá. Não importa o quanto dure o
choro de uma noite, sempre haverá alegria pela manhã, se
“[esperarmos] (…) em Deus”.

Notas
^86. Ver I Coríntios 13:13.
^87. Eclesiastes 1:5.
^88. Apocalipse 22:16.
Salmos 31:12; 34:18; 51:10, 17

Sou como um vaso quebrado.

_______________

Perto está o Senhor dos que têm o coração quebrantado, e salva os


contritos de espírito.

_______________

Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um


espírito reto. ( . . .

) Os sacrifícios para Deus são o espírito quebrantado; a um


coração quebrantado e contrito não desprezarás, ó Deus.

Às vezes, os acontecimentos da vida estilhaçam nossos maiores sonhos e


esperanças. Algumas de nossas aspirações e conquistas mais queridas acabam
trincadas ou mesmo quebradas. Dentre os itens materiais que apreciamos,
pode ser que uma porcelana da china ou o relógio que pertencia a um
antepassado se quebre. Às vezes são os ossos ou ainda mais doloroso, os
casamentos e os laços familiares que se quebram. Há ocasiões em que
verdadeiramente nos sentimos “como um vaso quebrado”; assim como
Humpty Dumpty, estamos certos de que nem mesmo os cavalos e os homens
do rei conseguirão nos juntar outra vez.
Mas já foi dito que Deus ama coisas quebradas — e as torna benéficas
para nós. É preciso “quebrar” as nuvens para nutrir o solo; é preciso
“quebrar” o solo para cultivar grãos; é preciso “quebrar” os grãos para fazer
pão; é preciso “quebrar” o pão para que sejamos nutridos; e assim são os
ciclos da vida. Essa sequência divina é semelhante à parábola do Salvador,
que disse que o grão de trigo não nos dará seu fruto a menos que caia na terra
e morra.89
Da mesma forma, isso ocorre com corações quebrantados e espíritos
contritos. Devemos nos lembrar de que os filhos de Deus ainda estão sob o
convênio do sacrifício. Contudo, não oferecemos mais as primícias dos
rebanhos ou a primeira colheita das vinhas. Não, pois com a vinda de Cristo,
esse tipo de sacrifício foi encerrado, e recebemos o mandamento de oferecer
novos símbolos da Expiação de Cristo: “Oferecerás um sacrifício ao Senhor
teu Deus em retidão, sim, um coração quebrantado e um espírito contrito”.90
É bem provável que Deus ame um coração quebrantado acima de todas
as outras coisas. Sendo assim, quando chegar o nosso dia do sacrifício, talvez
acompanhado de dor, que confiemos e acreditemos. Saiba que Deus aceitará
sua oferta e que, por meio do grande milagre da Expiação de Jesus Cristo, Ele
lhes dará um coração curado e são. Essa é a grande verdade ensinada pela
Ressurreição. Cristo, o Grande Médico, nos recompensará no tempo e na
eternidade. Pela graça e pela bondade de Deus, todos os vasos quebrados
serão plenamente restaurados.

Notas
^89. Ver João 12:24.
^90. Doutrina e Convênios 59:8.
Salmos 32:7

Tu és o lugar em que me escondo; tu me preservas da angústia; tu


me cinges de alegres cantos de livramento.

Não sou músico, mas amo música. Fui grandemente abençoado por ter
casado com uma musicista magnífica. Ela fez com que a música se tornasse
uma parte constante e inseparável de nosso lar e de nossa vida. Além disso,
pela minha experiência na Igreja, sei que nada contribui mais plenamente
para trazer o Espírito do Senhor a uma reunião do que a boa música ou os
“cantos de livramento”, se preferir. Um dos primeiros conselhos que recebi
como Autoridade Geral foi que precisávamos aumentar a qualidade e a
quantidade das músicas na Igreja; e, ao mesmo tempo, aumentar a qualidade,
mas diminuir a quantidade de discursos.
A música não só tem o encanto de “acalmar o coração selvagem,
amolecer as pedras ou fazer um nodoso carvalho se curvar”,91 mas também
tem o poder de edificar e elevar o espírito que já é elevado. Na verdade,
poderíamos dizer que, quanto mais elevado for um espírito, maior será o
impacto que a boa música terá sobre ele. E quando enfrentamos dificuldades,
não há nada que toque mais fundo em nosso coração do que uma melodia que
parece ter sido enviada diretamente dos céus. Alguém disse — e creio que
seja verdade — que no compêndio de textos sagrados da Igreja, os hinos de
Sião tomam seu lugar de direito ao lado das escrituras e dos ensinamentos
dos profetas vivos. Seja pela grandiosa atuação do Coro do Tabernáculo ou
pelo caloroso testemunho musical de um nervoso solista na unidade mais
distante da Igreja, os “cantos de livramento” sempre são uma fonte de
inspiração ao aflito, de consolo aos que estão sobrecarregados. Não é de
surpreender que nossos antepassados pioneiros, ao enfrentarem angústias e
fardos, cantassem: “Mas não deveis desanimar Se tendes Deus para vos amar;
Podeis agora proclamar: Tudo bem! Tudo bem!”92 Graças damos ao Senhor
por todo tipo de boa música — das músicas de raiz até Bach, Beethoven e os
hinos de Sião. Encontramos alegria na melodia, na harmonia, na eloquência
orquestrada pelos “cantos de livramento” que falam à alma.
Aparentemente, o Salvador do mundo também compreendia a grande
bênção da música, pois em Sua hora de libertação eterna, Ele instituiu o
sacramento da Ceia do Senhor, cantou um hino com Seus discípulos e partiu
resolutamente para a agonia do Getsêmani e para a dor do Calvário.93
Faríamos bem em acreditar que aquele hino trouxe força adicional durante
aquele que foi o maior momento de aflição da história da humanidade. Em
tempos de angústia, a música inspiradora pode fazer o mesmo por nós.

Notas
^91. William Congreve, A Noiva Enlutada, ato 1, cena 1, versos 1–2;
tradução livre.
^92. “Vinde, Ó Santos”, Hinos, nº 20.
^93. Ver Mateus 26:30.
Salmos 34:7

O anjo do Senhor acampa-se ao redor dos que o temem, e os livra.

Não importa o quanto acreditamos em anjos, precisamos acreditar ainda


mais, pois eles verdadeiramente “[acampam] ao [nosso] redor” e, de diversas
maneiras, frequentemente nos protegem e nos livram. Da Antiguidade até
hoje, o ministério de anjos tem sido um dos principais métodos pelos quais
Deus Se comunica, vigia e protege, tanto física quanto espiritualmente, os
Seus filhos na Terra. Um anjo foi enviado para consolar e aconselhar Adão e
Eva logo após terem sido expulsos do Jardim do Éden.94 Hostes de anjos
transmitiram inúmeras mensagens e prestaram serviço ao longo de todo o
período do Velho Testamento; quando a vinda do Salvador estava próxima, o
anjo Gabriel foi enviado para anunciar a Zacarias que o precursor do Messias,
João Batista, iria nascer; depois, o mesmo anjo Gabriel também foi à Maria
para declarar que ela seria a mãe do Filho de Deus.95 Após essa mensagem,
um anjo (seria Gabriel novamente?) transmitiu a maravilhosa notícia a José,
ordenando-lhe que tomasse Maria como sua esposa.
Pouco depois disso, um anjo anunciou a José que o recém-nascido corria
perigo e que sua pequena família deveria fugir para o Egito. Posteriormente,
um anjo informou-lhe que era seguro retornar à terra da herança de sua
família.96 E a vida de Jesus estava apenas começando. Anjos visíveis e
invisíveis velaram por Ele e, ocasionalmente o auxiliaram a cumprir a missão
dada a Ele por Seu Pai Celestial, de levar a efeito o plano de salvação e
realizar a Expiação pelos pecados de toda a humanidade.97
Ainda que a vida e a missão de Jesus fossem, de todas as formas,
especiais e distintas, vemos o cuidado e a atenção dos anjos do céu. Há mais
de trezentas referências nas escrituras que relatam visitações, ministrações e
intervenções angélicas a uma grande variedade de pessoas, muitas das quais
eram indivíduos comuns. E esses são apenas os exemplos que foram
canonizados! Quantos e quantos homens, mulheres e crianças já viram,
ouviram ou foram atendidos por anjos, em momentos corriqueiros da rotina
diária, sem que isso fosse registrado nas escrituras? Ocasionalmente,
recebemos permissão divina para ver os anjos que estão entre nós, mas em
geral os agentes celestiais vêm e vão e nós, “não o sabendo, [hospedamos]
anjos”.98
Experiências como a dos anjos que estiveram presentes no nascimento
de Jesus são relembradas a cada Natal. Contudo, se nossos olhos fossem mais
espirituais e se nossos ouvidos estivessem mais sintonizados com o céu,
provavelmente cantaríamos “Eis dos anjos a harmonia” ou “Anjos descem a
cantar” o ano inteiro, pois certamente eles estão lá e nos observam.
“Cessaram os dias de milagres? Ou deixaram os anjos de aparecer aos
filhos dos homens? Ou negou-lhes ele o poder do Espírito Santo?” Ou fará
ele isso enquanto durar o tempo ou existir a Terra ou existir na face da Terra
um homem para ser salvo? Eis que vos digo: Não; porque ( … ) é pela fé que
os anjos aparecem e ministram entre os homens. ( . . . ) Pois eis que a ele
estão sujeitos, para ministrarem de acordo com a palavra de sua ordem,
manifestando-se aos que têm uma fé vigorosa e uma mente firme em toda
forma de santidade.”99
Tenham uma fé vigorosa e uma mente firme. Os anjos do Senhor vão
acampar a seu redor e os libertarão.

Notas
^94. Ver Moisés 5:6–8.
^95. Ver Lucas 1:11–38.
^96. Ver Mateus 2:13–23.
^97. Ver, por exemplo, Mateus 4:11; 28:2; Lucas 22:43; 24:23.
^98. Hebreus 13:2.
^99. Morôni 7:35–37; 30.
Salmos 36:9

Porque em ti está o manancial da vida; na tua luz veremos a luz.

Em geral, a escuridão é o inimigo, seja literal ou metaforicamente.


Lúcifer é considerado o príncipe das trevas, e o próprio inferno é descrito
como um lugar escuro e sombrio, onde literalmente não há luz. Às vezes,
nossa vida mortal é tão difícil que a esperança parece ter fugido e somos
deixados para tatear na escuridão.
Como é importante aprendermos, o quanto antes em nossa vida, que na
luz de Deus, na luz de Cristo, na luz do Espírito, encontraremos não só a
própria luz, mas a fonte que ilumina tudo o que vemos.
O papel redentor da luz de Cristo é uma importante doutrina do
evangelho restaurado.100 Acreditamos que cada indivíduo nascido neste
mundo carrega em sua alma aquela luz, independente do que o tempo ou as
transgressões fizerem para tentar extingui-la. Ela não pode ser
completamente extinguida. Se permitirmos, aquela luz será o meio pelo qual
veremos a luz. Ela crescerá até se tornar a luz eterna por meio da qual todos
os homens, todas as mulheres e crianças poderão reconhecer a verdade, reagir
a ela e fazer convênios com o Senhor.
Após deixarmos este mundo, no qual precisamos desesperadamente da
pura e verdadeira luz para encontrar o caminho e entender o significado das
coisas, o que nos espera são reinos de glória cujas diferenças são
simbolizadas por graus adicionais de luz — a luz das estrelas, a luz da lua e, a
mais brilhante de todas, a luz do sol.101 Na verdade, a luz que cercava o Pai e
o Filho foi descrita pelo Profeta Joseph Smith como a “mais brilhante que o
sol.”102
Se você teme por entes queridos que atualmente andam em trevas,
mantenha a esperança. A luz que emana do “manancial da vida” vivifica a luz
correspondente que há em cada um de nós, se tão somente permitirmos. Já
pude sentir a escuridão e suplicar pela luz que redime. Ela sempre veio — de
forma segura, constante, na hora certa.
“Ele é a luz e a vida do mundo; sim, uma luz sem fim, que nunca poderá
ser obscurecida.”103 Por Sua luz, podemos enxergar a luz — e andar nela —
para sempre.

Notas
^100. Ver Doutrina e Convênios 84:46.
^101. Ver I Coríntios 15:40–42; também Doutrina e Convênios 76:50–
112.
^102. Joseph Smith–História 1:16; grifo do autor.
^103. Mosias 16:9.
Salmos 37:16; 49:16–17; 73:3

Vale mais o pouco que tem o justo, do que as riquezas de muitos


ímpios.

_______________

Não temas, quando alguém se enriquece, quando a glória da sua


casa se engrandece.

Porque, quando morrer, nada levará consigo, nem a sua glória o


acompanhará.

_______________

Pois eu tinha inveja dos néscios, quando via a prosperidade dos


ímpios.

Quando deixaram o Jardim do Éden, foi dito a Adão e Eva que


precisariam ganhar seu sustento com o suor de seu rosto. Desde aquela época,
todos nós temos suado, alguns com mais sucesso que outros. Por todas as
eras, a história da humanidade tem sido a história de homens e mulheres se
esforçando para adquirir bens materiais deste mundo, no intuito de suprirem
suas necessidades e proteger seus filhos.
Se perguntássemos a alguém nas ruas: “Qual é a maior fonte de estresse
em sua vida?” é bem possível que a resposta fosse algo como: “As finanças
— como ganhar dinheiro, como usá-lo, como poupá-lo e, em alguns casos,
como impedir que ele me destrua”.
Todos ansiamos pelo dia em que não haverá pobres entre nós, em que
cada homem, mulher e criança terá bênçãos financeiras e temporais
suficientes para suprir suas necessidades. Esse é um objetivo comunitário
pelo qual vale a pena lutar. É uma das principais características para que se
tenha uma vida social perfeita como a de Sião. Talvez não alcancemos esse
ideal antes do grande dia milenar, sob o governo do próprio Cristo, mas
podemos lutar por ele.
Nesse meio tempo, devemos fazer tudo o que for possível para reduzir o
estresse que as finanças impõem em nossa vida. Devemos fazer nosso melhor
para estar preparados para viver de modo previdente, obtendo toda
qualificação e educação possível. Durante o processo, precisamos controlar
nossos apetites, gastar menos do que ganhamos, parar de desejar mais do que
precisamos e parar de pensar que precisamos mais do que realmente
necessitamos. É um clichê — mas no fim das contas é verdade — dizer que
precisamos de poucas coisas materiais para ser felizes; em contrapartida,
vemos muitas pessoas cheias de posses, mas infelizes. Isso não é uma
demonstração de cavalheirismo em relação àqueles que são verdadeiramente
pobres — só o pecado tem mais poder para destruir o espírito humano do que
a pobreza real. E quando a pobreza leva ao pecado, temos uma situação
duplamente trágica. Desde o início dos tempos, o dinheiro por si só — ter
mais e mais disto ou daquilo — tem se mostrado incapaz de trazer felicidade
e, às vezes, até mesmo contrário à ela.
Esforcem-se para viver dentro de seu orçamento. Não precisamos
comprar as mesmas coisas que nossos vizinhos, só porque eles decidiram
refinanciar tudo o que têm. Sejam modestos, poupem com regularidade,
paguem o dízimo e as ofertas, ajudem os pobres. Vivam com a fé que vem
pelo uso correto do dinheiro.
Jacó, no Livro de Mórmon, disse que teríamos riquezas se as
buscássemos com o propósito de usá-las sabiamente. “Pensai em vossos
irmãos como em vós mesmos”, disse ele, “e sede amáveis para com todos e
liberais com vossos bens, para que vossos irmãos sejam ricos como vós. Mas
antes de buscardes riquezas, buscai o reino de Deus. E depois de haverdes
obtido uma esperança em Cristo, conseguireis riquezas, se as procurardes; e
procurá-las-eis com o fito de praticar o bem — de vestir os nus e alimentar os
famintos e libertar os cativos e confortar os doentes e aflitos”.104 A maioria
de nós não obterá tais riquezas em abundância. Haverá dias em que elas nem
parecerão ser suficientes. Mas se vivermos em retidão, elas serão o bastante.
“Vale mais o pouco que tem o justo, do que as riquezas de muitos ímpios.”
Mais uma coisa: Talvez não haja maior ironia do que ver pessoas
inteligentes e honestas que invejam as posses de pessoas tolas ou que
desejam aquilo que foi conquistado por meios ilícitos. Se tivéssemos que
fazer uma lista dos tipos de pessoas com as quais não gostaríamos de ser
relacionados ou comparados, certamente os “tolos” e os “iníquos” estariam
no topo. Por que despendemos tempo, dinheiro e emoções invejando aquilo
que não é admirável ou tentando nos tornar o tipo de pessoa com a qual não
gostaríamos de nos associar? Jesus disse: “Pelos seus frutos os
conhecereis”.105 Será que posses fúteis não revelam a tolice de seus
proprietários? Ou, pior ainda, será que atos malignos não revelam os motivos
sinistros de pessoas iníquas? Alexander Pope disse que “errar é humano”,106
e isso provavelmente é verdade; contudo, querer aquilo que é errado, invejá-
lo, ansiá-lo e desejá-lo, certamente é desumano — ou, no mínimo, indigno.
Porém, mais perigoso do que o objeto invejado, é a inveja propriamente
dita. Há quatro milênios, um dos principais mandamentos do mundo judeu-
cristão tem sido: “Não cobiçarás”.107 De várias formas, este parece ser o mais
triste e o mais patético dos Dez Mandamentos. Digo isso porque a inveja, em
geral, não diz respeito ao que nos falta, mas é um desgosto (ou, na melhor das
hipóteses, um ressentimento) pelo que outra pessoa tem. Em resumo, é um
ato de verdadeira mesquinharia — um pensamento direcionado não a nossa
prosperidade, mas sim à desgraça alheia. Muitas tristezas e decepções
poderiam ser evitadas se aprendêssemos a invejar menos, a nos contentar
mais com o que temos e a doar para aqueles que verdadeiramente necessitam.

Notas
^104. Jacó 2:17–19.
^105. 3 Néfi 14:20.
^106. Alexander Pope, “An Essay on Criticism”, parte II, 1709; tradução
livre.
^107. Êxodo 20:17.
Salmos 37:23–24

Os passos de um homem bom são confirmados pelo Senhor, e


deleita-se no seu caminho.

Ainda que caia, não ficará prostrado, pois o Senhor o sustém com
a sua mão.

Observe que esse salmo fala sobre um “homem bom”, cujos passos são
sancionados pelos céus e agradáveis a todos. Ainda assim, ele (ou ela) pode
momentaneamente tropeçar ou errar a pisada, assim como qualquer pecador.
Uma das verdades mais encorajadoras do evangelho de Jesus Cristo
certamente está na noção de que, ainda que todo homem venha a cair — seja
ele bom ou mal — “não ficará prostrado, pois o Senhor o sustém com a sua
mão”. Essa é a essência das “boas novas” declaradas por Jesus. Os erros
podem ser sobrepujados, os pecados, perdoados, a morte não será vitoriosa e
o inferno não será nosso destino. Tudo o que Cristo e os profetas ensinaram
aponta para a verdade de que por meio do desejo e da obediência, todos
podem ser perdoados de seus pecados. Tudo o que poderia ter sido — e muito
mais — ainda pode vir a ser.
Talvez haja momentos em que pensemos ser os únicos a terem
tropeçado e caído, momentos em que compreensivelmente poderíamos nos
perguntar: “Como isso pôde acontecer comigo?” Mas só houve um homem
em toda a história deste mundo que foi perfeito. Todos os demais “pecaram e
destituídos estão da glória de Deus”.108 No entanto, apesar dessa escritura
confirmar que não estaremos sozinhos à mesa dos transgressores, isto jamais
deveria servir de desculpa para que tenhamos um comportamento inadequado
ou justifiquemos nossos pecados. Pelo contrário: o fato de sabermos que
todos — bons ou maus — estão se esforçando para recuperar-se de algum
tipo de erro, e que nesse processo contamos com auxílio divino, deveria ser
um estímulo para nós.
Felizmente, a maioria desses “tropeços” são pequenos escorregões. Mas
alguns podem ser bastante graves. Contudo, sejam tropeços grandes ou
pequenos, de curta ou longa duração, a promessa é a mesma. Se estivermos
procurando ser bons — ou se estivermos tentando voltar a ser bons após
termos nos desviado do caminho — esses passos em direção à recuperação
“são confirmados pelo Senhor” e Ele Se deleita conosco. Não há nada que
toque mais profundamente o coração dos pais do que um filho ou uma filha
se esforçando para retornar a eles e a Deus. Não há pais que consigam
conviver com a ideia de que não há esperança, de que seu filho ou filha esteja
irrecuperavelmente “prostrado”, sem mãos auxiliadoras que o possam
sustentar.
Felizmente, como sempre acontece com o evangelho de Jesus Cristo, há
uma mão estendida. Ela nunca se recolhe. Ela sempre está lá.

Nota
^108. Romanos 3:23.
Salmos 40:10

Não escondi a tua justiça dentro do meu coração; apregoei a tua


fidelidade e a tua salvação. Não escondi da grande congregação a tua
benignidade e a tua verdade.

A obrigação de compartilhar as “boas novas” com os outros sempre foi


uma parte fundamental do evangelho de Jesus Cristo. Por termos sido
abençoados com verdades redentoras e com sussurros espirituais, somos
chamados a compartilhá-los. No sonho de Leí, quando ele viu a grande
árvore da vida e experimentou seu delicioso fruto — mais delicioso que
qualquer outro fruto no mundo — seu primeiro impulso foi olhar ao redor e
procurar por sua família.109 Quando Enos derramou sua alma em oração e
recebeu de Deus uma notável e redentora promessa, sua reação foi continuar
a orar, pedindo que aquela bênção fosse concedida a outros.110 Quando
presenciamos um estonteante arco-íris ou um espetacular pôr do sol, em geral
desejamos que outras pessoas — especialmente nossos entes queridos —
participem conosco desse momento. Quando desfrutamos de férias
maravilhosas ou viajamos para um belo lugar, é comum enviarmos fotos ou
cartões postais que transmitem nossa alegria e nosso desejo de que outros
tenham a mesma experiência.
Espera-se que ajamos da mesma maneira em relação à justiça e ao amor
que Deus demonstra por nós. Poderíamos chamar isso de trabalho
missionário, mas soaria um tanto trivial. É mais como um apreço pelo que
recebemos e um desejo de compartilhar aquilo que torna a vida tão
recompensadora. É enxergar a nós mesmos como um instrumento para
ensinar o amor que Deus tem por nós e para declarar as bênçãos que Ele tem
concedido tão liberalmente sobre Seus filhos.
Quando recebermos tão grandes bênçãos, que não as escondamos “da
grande congregação”. Não desejaríamos esconder a justiça de Deus tão
intimamente. O profeta Alma disse que devemos ter a imagem de Cristo
gravada em nosso semblante.111 Ou seja, devemos ter a aparência de quem é
feliz e abençoado, de quem recebeu a verdade — e a vive, fala sobre ela e a
compartilha. A melhor mensagem missionária que podemos compartilhar é
testificar — por meio de nossa vida justa, de nossa felicidade e otimismo, de
nossa fala espontânea — das coisas boas que recebemos liberalmente.

Notas
^109. Ver 1 Néfi 8:12–13.
^110. Ver Enos 1:9, 11.
^111. Ver Alma 5:19.
Salmos 41:1

Bem-aventurado é aquele que atende ao pobre; o Senhor o livrará


no dia do mal.

Certamente, não há preocupação maior para Deus do que com os pobres,


os destituídos e os miseráveis. Parece que não há som que chegue tão pronta
e dolorosamente a Seus ouvidos quanto o “gemido dos necessitados”.112
Mesmo nos rigorosos dias da lei Mosaica, o Senhor ordenava que se
alguém emprestasse dinheiro a um pobre, não deveria cobrar juros. Durante
os seis anos em que os campos e as fazendas israelitas produziam, os donos
não deveriam apanhar o que caísse ao chão, para que os pobres pudessem
fazê-lo e assim ter o que comer. Depois, a cada sete anos, os campos
deveriam ser deixados integralmente abertos aos pobres, por 12 meses, “para
que [pudessem] comer os pobres do teu povo”.113
Observe essa pequena amostra da miríade de escrituras que defendem os
pobres:

Levanta o pobre do pó, e desde o monturo exalta o necessitado,


para o fazer assentar entre os príncipes, para o fazer herdar o trono de
glória; porque do Senhor são os alicerces da terra, e assentou sobre eles
o mundo.114

_______________

O que escarnece do pobre insulta ao seu Criador, o que se alegra da


calamidade não ficará impune.115

_______________

O que dá ao pobre não terá necessidade, mas o que esconde os seus


olhos terá muitas maldições.116
_______________

Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e
dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me.117

_______________

Pois eis que não somos todos mendigos? Não dependemos todos do
mesmo Ser, sim, de Deus, para obter todos os bens que temos, tanto
alimentos como vestimentas e ouro e prata e todas as riquezas de toda
espécie que possuímos?118

_______________

E agora, por causa das coisas que vos disse—isto é, para


conservardes a remissão de vossos pecados, dia a dia, a fim de que
andeis sem culpa diante de Deus—quisera que repartísseis vossos bens
com os pobres, cada um de acordo com o que possui, alimentando os
famintos, vestindo os nus, visitando os doentes e aliviando-lhes os
sofrimentos, tanto espiritual como materialmente, conforme as carências
deles.119

_______________

E eles repartiam os seus bens com os pobres e os necessitados e os


doentes e os aflitos, cada um de acordo com o que possuía; e não
usavam vestimentas custosas; contudo, eram asseados e formosos.120

_______________

[Eles] se humilhavam, socorrendo os que tinham necessidade de


seu socorro, repartindo seus recursos com os pobres e necessitados,
alimentando os famintos e sofrendo toda espécie de aflições por amor a
Cristo que haveria de vir, segundo o espírito de profecia.121

_______________
Sim, e persistireis em voltar as costas aos pobres e aos necessitados
e a negar-lhes vossos bens?122

_______________

Se negardes ajuda aos necessitados e aos nus e não visitardes os


doentes e aflitos nem repartirdes o vosso sustento, se o tendes, com os
que necessitam — digo-vos, se não fizerdes qualquer destas coisas, eis
que vossa oração é vã e de nada vos vale e sois como os hipócritas que
negam a fé.123

_______________

Pois eis que amais o dinheiro e vossos bens e vossos trajes finos e o
adorno de vossas igrejas mais do que amais os pobres e os necessitados,
os doentes e os aflitos.124

_______________

E se deres de teus bens aos pobres, a mim o farás.125

_______________

Mas eis que não aprenderam a ser obedientes às coisas que exigi de
suas mãos, mas estão cheios de toda sorte de maldades e não repartem
seu sustento com os pobres e aflitos dentre eles, como convém a
santos.126

_______________
Talvez nada prejudique mais o espírito humano do que a pobreza. Que
nunca seja dito que nós “[esmagamos] o [povo de Deus] e [moemos] as faces
dos pobres”.127 Verdadeiramente, o Senhor livrará, no dia da angústia, o
homem ou mulher que houver estendido a mão para o pobre.

Notas
^112. Salmos 12:5.
^113. Êxodo 23:11.
^114. I Samuel 2:8
^115. Provérbios 17:5.
^116. Provérbios 28:27.
^117. Mateus 19:21.
^118. Mosias 4:19.
^119. Mosias 4:26.
^120. Alma 1:27.
^121. Alma 4:13.
^122. Alma 5:55.
^123. Alma 34:28.
^124. Mórmon 8:37.
^125. Doutrina e Convênios 42:31.
^126. Doutrina e Convênios 105:3.
^127. Isaías 3:15.
Salmos 55:16–17

Eu, porém, invocarei a Deus, e o Senhor me salvará.

De tarde e de manhã e ao meio dia orarei; e clamarei, e ele ouvirá


a minha voz.

Uma de nossas escrituras compara a oração com a forma mais pura e


simples de adoração.128 Na mortalidade, seja na segurança do berço ou nos
momentos finais da vida, nossa relação mais próxima, íntima e pessoal com
Deus acontece quando oramos individualmente e com determinação.
As escrituras ensinam que devemos “orar sempre”,129 a despeito de quão
exigente esse convite possa parecer. Obviamente, ninguém conseguirá passar
o tempo todo oferecendo uma oração formal, ou de joelhos, ou mesmo em
voz alta, mas é possível sempre termos uma oração no coração e fixar nossos
desejos no Senhor. Amuleque descreve isso como “[deixar] que se encha o
[nosso] coração, voltado continuamente para ele”.130 Alma ensinou a
Helamã, seu filho: “que todos os teus pensamentos sejam dirigidos ao
Senhor, sim, que o afeto do teu coração seja posto no Senhor para
sempre”.131
Mas mesmo que se fale a respeito de um coração em constante oração e
de uma atitude voltada para os céus, é preciso reconhecer que Deus também
espera que “[clamemos]”, que frequentemente oremos honesta e
sinceramente em voz alta. Orar “de tarde e de manhã e ao meio dia” é uma
evidência da obediência do salmista a esse mandamento. Isso não significa
que as orações em nosso coração devam ser formuladas ou contadas, mas é
interessante notar que frequentemente as escrituras relatam que os antigos
oravam formalmente pelo menos três vezes ao dia. O Livro de Mórmon
registra a injunção para que “[clamemos] a ele em [nossas] casas, sim, por
todos os de [nossa] casa, tanto de manhã como ao meio-dia e à noite”,132 e o
corajoso Daniel “três vezes no dia se punha de joelhos, e orava”.133
Não devemos ter hábitos mecânicos em relação à oração. O número de
vezes que oramos é muito menos importante que a sinceridade e a fé com a
qual oferecemos nossas orações. Mas há um lembrete constante nas escrituras
para que oremos sempre, para que a oração marque o modo como
começamos, conduzimos e concluímos nosso dia.
Por quê? Além do fato de que Deus é nosso Pai e de que sempre
precisamos de Sua amorosa e onisciente orientação, nas escrituras
encontramos inúmeros lembretes de que há uma segurança específica na
oração, uma proteção especial contra o mal. E já que o mal sempre está “solto
na terra”,134 encontramos nos escritos sagrados o conselho de que devemos
orar sempre “para não [cairmos] em tentação”.135 Inerente a esse conselho
talvez esteja a compreensão de que uma pessoa humilde e que ora sempre
tem menos probabilidade de ir atrás de confusão, de ir aonde a influência do
mal se encontra. Mas o convite à oração indubitavelmente significa muito
mais que isso — significa que na oração há, literalmente, uma proteção
divina ou, se preferir, um escudo (uma palavra muito usada nos salmos), o
qual, em resposta à humilde oração, mantém o mal à distância e impede que
as forças de Lúcifer nos sobrepujem.
Devemos sempre ter uma oração no coração e, tão frequentemente
quanto possível, “clamar” em voz alta a nosso Pai Celestial. Há poder na
articulação de palavras em oração, na maneira como soam em nossos ouvidos
e na maneira como ecoam nos céus.

Nas horas tristes de pesar,


Minh’alma pode descansar
E se livrar da tentação,
Em doce, grata oração!136

Notas
^128. Ver Alma 33:3.
^129. 3 Néfi 18:18; Doutrina e Convênios 20:33; 61:39.
^130. Alma 34:27.
^131. Alma 37:36.
^132. Alma 34:21.
^133. Daniel 6:10.
^134. Doutrina e Convênios 52:14.
^135. 3 Néfi 18:18.
^136. “Ó Doce, Grata Oração” Hinos, nº 79.
Salmos 57:7; 26:1–2, 11

Preparado está o meu coração, ó Deus, preparado está o meu


coração.

_______________

Julga-me, Senhor, pois tenho andado em minha sinceridade. ( . . .

) Examina-me, Senhor, e prova-me; esquadrinha os meus rins e o


meu coração. ( . . .

) Mas eu ando na minha sinceridade.

A perseverança sobre a qual tanto se fala nos salmos — quando as


dificuldades se abatem sobre nós, quando as angústias parecem estar em todo
lugar — aparece aqui descrita como ter um coração “preparado”. Depois que
fizermos tudo ao nosso alcance, devemos manter nossa posição, firmar
nossos pés, fortalecer nossas resoluções e preparar nosso coração. Podemos
afirmar, assim como foi dito por um grande reformador religioso: “Aqui
permaneço e não há nada mais a ser dito. Deus me auxilie”.137
É impossível controlar todos os fatores externos. Nem sempre
conseguiremos controlar as forças da natureza ou a mortalidade. À nossa
volta movem-se as complexidades da vida telestial, as quais nem sempre se
curvarão aos nossos desejos. Mas podemos ter um coração preparado.
Podemos permanecer fiéis, podemos manter nossa integridade, podemos nos
apegar àquilo em que acreditamos. Independente do que aconteça, podemos
decidir não ser dissuadidos de nossa fé ou movidos de nossa lealdade para
com Deus e com os princípios da verdade.
Mesmo quando seus problemas e suas aflições só aumentavam, Jó, o
protótipo do homem experimentado e angustiado, afirmou: “Enquanto em
mim houver alento, e o sopro de Deus nas minhas narinas, não falarão os
meus lábios iniquidade, nem a minha língua pronunciará engano. Longe de
mim que eu vos justifique; até que eu expire, nunca apartarei de mim a minha
integridade. ( . . . ) Pese-me em balanças fiéis, e saberá Deus a minha
sinceridade”.138
Mas o que podemos fazer se não conseguimos ser sempre tão firmes
quanto Jó? Onde podemos encontrar integridade e determinação maiores que
a nossa para nos mantermos fiéis quando tropeçarmos? Um dos maravilhosos
hinos sobre a Expiação nos relembra como podemos curar nosso coração —
ou, mais apropriadamente, quem pode curar nosso coração — quando não
formos tão firmes quanto deveríamos ser:

Ó, sou um devedor da graça


Sou devedor, todos os dias!
Que Tua bondade, como um grilhão,
Una meu errante coração a Ti.
Inclinado a vaguear Senhor, me sinto,
Inclinado a abandonar o Deus a quem amo;
Eis meu coração, toma-o, confirma-o,
Sela-o para tuas cortes nas alturas.139

Não importa como nos sintamos fracos, preocupados ou tentados: Cristo


pode selar-nos, firmar-nos, preparar-nos “como a um prego num lugar
firme”.140 Sua dádiva para nós foi fixada exatamente com essa segurança na
cruz do Calvário.

Notas
^137. Martinho Lutero, “Before the Diet of Worms”; tradução livre.
^138. Jó 27:3–5, 31:6.
^139. “Come, Thou Fount of Every Blessing”, Hymns, 1948, nº 70.
^140. Isaías 22:23.
Salmos 61:2

Desde o fim da terra clamarei a ti, quando o meu coração estiver


desmaiado; leva-me para a rocha que é mais alta do que eu.

Quando as ondas de problemas rebentarem-se contra nós, a coisa que


mais necessitaremos é encontrar um refúgio firme e seguro, um terreno mais
elevado. É isso que o evangelho de Jesus Cristo oferece a todo homem, toda
mulher e criança. Quando Pedro e João iam apressadamente para o templo,
pouco depois da Crucificação, da Ressurreição e da ascensão do Salvador ao
céu, um mendigo chamou-lhes da escadaria do templo e pediu-lhes uma
esmola. As escrituras nos informam que ele era um homem coxo de
nascença, que havia passado quase 40 anos sendo carregado daqui pra lá na
escadaria do templo, onde mendigava àqueles que iam à casa do Senhor.
Quando viu Pedro e João, ele fez a eles seu apelo. Esses dois apóstolos,
antigos pescadores que haviam deixado suas redes para seguir o Salvador,
não possuíam nenhum tipo de riqueza. Pedro disse ao homem: “Olha para
nós”. E o homem fitou-o, esperando receber uma esmola. Pedro então falou:
“Não tenho prata nem ouro; mas o que tenho isso te dou. Em nome de Jesus
Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda”.
E a passagem continua dizendo que Pedro, “tomando-o pela mão direita,
o levantou”.141
O Presidente Harold B. Lee disse o seguinte a respeito dessa
experiência: “Agora, imaginem aquela nobre alma, o líder dos apóstolos,
talvez com o braço sobre os ombros do homem, dizendo: ‘Meu bom homem,
tenha coragem, vou dar alguns passos junto com você. Vamos caminhar
juntos, e eu asseguro que você conseguirá andar, pois recebeu uma bênção
pelo poder e autoridade que Deus concedeu a nós, seus servos’”. O
Presidente Harold B. Lee então disse: “Não podemos erguer outra alma se
não estivermos em terreno mais elevado do que ela. Tem que ter a certeza, se
for resgatá-la, de que sua conduta servirá de exemplo para o que você
gostaria que ela fosse”.142
Todos passamos por dias em que nos sentimos “sobrecarregados”, dias
em que nosso coração fica manso e humilde. Nessas ocasiões, todos rogamos
por alguém — quem quer que seja — que nos leve para um terreno mais
elevado, para terreno mais firme para os pés. Como somos gratos por aqueles
que são fortes e fiéis, que descem até nós, nos erguem e nos recolocam sobre
a rocha de Cristo. Nesses momentos agradecemos aos céus por todos os que
nos ajudam — e por Aquele que sempre é nosso maior auxílio, que não
apenas está sobre um terreno mais elevado, mas é um terreno mais alto; que
não só nos ergue e nos recoloca sobre uma rocha, mas é a própria rocha.

Notas
^141. Atos 3:4, 6–7.
^142. Harold B. Lee, “Stand Ye in Holy Places”, Ensign, julho de 1973,
p. 123.
Salmos 69:3

Estou cansado de clamar ( … )

Essa breve declaração dispensa comentários. A pungência dessas quatro


palavras é suficientemente eloquente. Todos já passamos por algum tipo de
angústia, um sofrimento pessoal tão intenso e grave que nos cansamos de
derramar tantas lágrimas. Nessas ocasiões, talvez fosse útil lembrar de três
coisas:
Primeiro: o choro é terapêutico. Ninguém quer passar por esse tipo de
terapia com frequência, mas é bom darmos vazão a poderosas emoções
reprimidas. Em circunstâncias profundamente pessoais, é perfeitamente
natural e apropriado chorar e deixar que a harmonia interior e o equilíbrio
emocional sejam restaurados.
Segundo: uma das mais belas cenas registradas nas escrituras dos
últimos dias é a descrição do encontro de Enoque com Deus, em que nosso
Pai Celestial é visto chorando por Seus filhos na Terra.
“E aconteceu que o Deus do céu olhou o restante do povo e
chorou. ( … … E Enoque disse ao Senhor: Como é que podes chorar, sendo
que és santo e de toda eternidade para toda eternidade? ( . . . ) E o Senhor
disse a Enoque: Olha estes teus irmãos; eles são a obra de minhas próprias
mãos ( … ) e todo o céu chorará sobre eles ( … ) portanto não deverão os
céus chorar, vendo que eles sofrerão?”143 Cristo também chorou pelas
angústias e dores de Seu povo.144 Se os seres divinos podem chorar pelas
dores e angústias enfrentadas na mortalidade,145 nós também podemos.
Terceiro: que grande consolo nos traz a promessa encontrada em outro
salmo: “Os que semeiam em lágrimas segarão com alegria”.146 Às vezes
(espera-se que não tão frequentemente) a única maneira de segar alegrias é
semear lágrimas. Talvez haja dor, esforço, trabalho árduo e angústia na
semeadura, no plantio e no cultivo dessas preciosas sementes, mas as
promessas do Senhor são certas: “O que semeardes, isso colhereis”.147
Podemos ter a certeza de que um dia, de alguma forma, em algum lugar, todo
o bem que tivermos semeado, toda a honestidade que tivermos praticado,
todo o esforço fiel que tivermos empenhado e todo pensamento virtuoso que
tivermos acalentado nos trará sua própria recompensa e será contado para o
nosso bem nos grandiosos dias da colheita divina.
Quando estiver cansado de chorar, persevere. As lágrimas logo serão
enxugadas de seus olhos.

Notas
^143. Moisés 7:28, 29, 32, 37.
^144. Ver, por exemplo, João 11:35; 3 Néfi 17:14, 21–22.
^145. Ver Lucas 19:41-44.
^146. Salmos 126:5.
^147. Doutrina e Convênios 6:33.
Salmos 71:9, 18.

Não me rejeites no tempo da velhice; não me desampares, quando


se for acabando a minha força. ( . . .

) Agora também, quando estou velho e de cabelos brancos, não me


desampares, ó Deus, até que tenha anunciado a tua força a esta
geração, e o teu poder a todos os vindouros.

Na juventude, somos tentados a pensar que somos imortais e


invencíveis, que o futuro é nosso e que sempre seremos saudáveis e fortes. As
crianças quase não pensam no envelhecimento, muito menos em ficarem
verdadeiramente enfermas. Mas as décadas passam, os anos deixam sua
marca e, no final, nossa força vai “acabando”.
Existem lições que só serão aprendidas com a idade avançada, que não
conseguiríamos aprender na juventude; por isso, faz parte do plano de Deus
passarmos por todas as etapas da experiência mortal. Como Ralph Waldo
Emerson escreveu certa vez: Os anos ensinam aquilo que os dias não chegam
a conhecer”.148
Infelizmente, o avanço da idade pode vir acompanhado de deficiências,
doenças, decepções, limitações físicas e, às vezes, limitações mentais. É bem
provável que todo “idoso” já tenha dito ao Senhor: “Não me rejeites no
tempo da velhice; não me desampares, quando se for acabando a minha
força”.
Mas esse apelo geral por auxílio também deveria ser acompanhado pelo
anseio especial de ainda poder anunciar a força de Deus “a esta geração”.
Não desejaremos desistir, pois é provável que ainda não tenhamos cumprido
nossa missão. Ainda não teremos demonstrado todo o poder e toda a força do
evangelho, os quais pautaram nossa vida e estão nos tornando quem somos e
quem queremos nos tornar. A geração mais nova, nossos filhos e netos,
precisa perceber isso em nós; eles precisam ouvir de nossos próprios lábios.
Há lições aprendidas pelos mais velhos que só podem ser aprendidas, e
ensinadas pelos mais velhos. Não há outro modo nem outra fonte para obtê-
las.
Sendo assim, digo a todos aqueles que estão se sentindo “[velhos] e de
cabelos brancos”: perseverem, continuem orando, continuem vivendo,
amando e aprendendo. E, acima de tudo, continuem ensinando. Aproveitem
toda oportunidade para ensinar à próxima geração tudo aquilo que Deus fez
por vocês, toda a fé e todos os milagres que a seguiram e que vocês
contemplaram ao longo da vida. Talvez seu maior sermão seja a eloquência
de uma vida longa e digna. Celebrem até mesmo o entardecer de sua vida e
orem para que se prolongue “até que [tenham] anunciado a [força dos céus] a
esta geração, e o [poder de Deus] a todos os vindouros”.

Nota
^148. Ralph Waldo Emerson, “Experience”, em Essays: Second Series,
1841; tradução livre.
Salmos 77:10–12

Eu me lembrarei dos anos da destra do Altíssimo.

Eu me lembrarei das obras do Senhor; certamente que eu me


lembrarei das tuas maravilhas da antiguidade.

Meditarei também em todas as tuas obras, e falarei dos teus feitos.

Quando os tempos difíceis chegam e permanecem conosco por algum


tempo, pode ser que tenhamos a impressão de que a vida sempre foi difícil,
de que nunca fomos felizes, de que nunca fomos abençoados. Isso é uma
grave injustiça para com Deus e nós mesmos. É óbvio que já fomos felizes. É
óbvio que já fomos abençoados. A vida nem sempre foi difícil; por isso,
quando as provações vierem, podemos deixá-las para trás com mais
facilidade se prontamente nos lembrarmos tanto das alegrias passadas quanto
das promessas de felicidade à frente.
Tudo o que diz respeito ao evangelho de Jesus Cristo aponta para a
alegria pela qual viemos a esta Terra149 e para o “perfeito esplendor de
esperança”150 que devemos cultivar ao buscarmos a glória futura na
eternidade. Ainda que nem todos os momentos sejam necessariamente
alegres, o conjunto é um “plano de felicidade”.151 A felicidade está presente
ao longo da jornada e certamente a encontraremos no final da viagem. Sendo
assim, lembrar “dos anos da destra do Altíssimo” não só é um bom conselho,
mas também uma obrigação moral. Devemos isso a Deus e a nós mesmos
lembrar “das obras do Senhor ( … ) [e suas] maravilhas da antiguidade”. Não
é de surpreender que um conhecido hino cristão repita esse mesmo conselho:

Se da vida as vagas procelosas são,


Se com desalento julgas tudo vão,
Conta as muitas bênçãos; dize-as de uma vez,
E verás, surpreso, quanto Deus já fez.152

Porém, perceba que este salmo nos aconselha a fazer coisas além de
simplesmente relembrá-las ou enumerá-las de forma passiva ou
negligentemente. Ele nos aconselha a “medita[r] [sobre] todas as obras [de
Deus] e fala[r] de [todos os Seus] feitos”. Essas duas atividades — meditar
sobre a bondade de Deus e falar sobre ela — estão entre os maiores passos
que podemos dar em direção à cura de um coração angustiado. Pensar sobre
Deus — Sua natureza, Seu amor, Sua compaixão, Suas bênçãos — é em si e
por si só uma experiência espiritual. Tais pensamentos têm o poder de
rechaçar sentimentos negativos e lembranças tristes. Falar sobre essas
bênçãos — na prática, “prestar nosso testemunho” delas, nem que seja para
nós mesmos ou para quem nos é mais próximo — fixa sentimentos espirituais
em nosso coração e confere-lhes uma existência própria e tangível. Aquilo
que verbalizamos ganha vida,153 por isso, quando falamos em voz alta sobre
as bênçãos que recebemos, sua existência se torna mais óbvia, mais poderosa,
mais permanente.
Quando os problemas chegarem, lembre-se da destra do Altíssimo.
Lembre-se das maravilhas da Antiguidade. Medite sobre suas bênçãos — fale
sobre elas — “dize-as de uma vez”. E lembre-se do conselho de Amuleque:
“Que vivais rendendo graças diariamente pelas muitas misericórdias e
bênçãos que [Deus] vos concede”.154

Notas
^149. Ver 2 Néfi 2:25.
^150. 2 Néfi 31:20.
^151. Alma 42:16.
^152. “Conta as Bênçãos”, Hinos, nº 57.
^153. Por isso é muito importante não cultivar o hábito de verbalizar
sentimentos negativos e temores. Ao expressá-los de maneira
indevida, permitimos que eles passem a existir, o que não lhes é
merecido.
^154. Alma 34:38.
Salmos 78:5–8; 145:4

Porque ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e pôs uma lei em


Israel, a qual deu aos nossos pais para que a fizessem conhecer a seus
filhos;

Para que a geração vindoura a soubesse, os filhos que nascessem,


os quais se levantassem e a contassem a seus filhos;

Para que pusessem em Deus a sua esperança, e se não


esquecessem das obras de Deus, mas guardassem os seus mandamentos.

E não fossem como seus pais, geração contumaz e rebelde,


geração que não regeu o seu coração, e cujo espírito não foi fiel a
Deus.

_______________

Uma geração louvará as tuas obras à outra geração, e anunciarão


as tuas proezas.

Um dos grandes mandamentos dados à antiga Israel (e à Igreja


contemporânea) era transmitir à geração seguinte um registro e um
testemunho dos ensinamentos de Deus — Suas bênçãos, Seus mandamentos,
Seus convênios, Seus milagres. Todos os pais e todas as mães deveriam
ensinar essas coisas a seus filhos. Isso “para que a geração vindoura a
soubesse, [mesmo] os filhos que nascessem” para que eles, por sua vez,
ensinassem a “seus filhos” — os netos — a fim de que todas as gerações
pudessem colocar suas esperanças em Deus e guardar Seus mandamentos.
No Livro de Mórmon, o drama por trás da história dos descendentes de
Leí e Saria é um exemplo clássico de pais que não conseguiram transmitir a
seus filhos as verdades e tradições redentoras. Grande parte das perdas
sofridas pelos lamanitas se deu ao fato de que os pais não ensinaram tradições
corretas às gerações mais novas, ou ensinaram-lhes tradições falsas. O livro
relata que isso também aconteceu posteriormente com algumas famílias
nefitas. A advertência deste salmo (e do Livro de Mórmon) é clara: devemos
ensinar a próxima geração e aqueles que ainda vão nascer, para que “não
[sejam] como seus pais, geração contumaz e rebelde, geração que não regeu o
seu coração, e cujo espírito não foi fiel a Deus”.155
Aprendemos que, quando Josué guiou os filhos de Israel à terra
prometida e foi-lhes miraculosamente permitido cruzar o rio em terra seca,
ele disse aos que vivenciaram aquele milagre: “Cada um levante uma pedra
sobre o ombro, segundo o número das tribos dos filhos de Israel; Para que
isto seja por sinal entre vós; e quando vossos filhos no futuro perguntarem,
dizendo: Que significam estas pedras? Então lhes direis que as águas do
Jordão se separaram diante da arca da aliança do Senhor; passando ela pelo
Jordão, separaram-se as águas do Jordão; assim estas pedras serão para
sempre por memorial aos filhos de Israel”.156 Este é apenas um exemplo de
testemunho deixado por uma geração para a próxima, sobre as maravilhas de
Deus e Seus “atos poderosos” em sua vida.
Perto do fim de sua vida, Néfi afirmou que as coisas que havia escrito
deveriam ser “guardadas e preservadas e passadas a [seus] descendentes, de
geração em geração. ( . . . ) Portanto estas coisas passarão de geração a
geração, enquanto durar a Terra. ( . . . ) Pois trabalhamos diligentemente para
escrever, a fim de persuadir nossos filhos e também nossos irmãos a
acreditarem em Cristo e a reconciliarem-se com Deus; pois sabemos que é
pela graça que somos salvos, depois de tudo o que pudermos fazer.
( … ) Portanto falamos ( … ) para que nossos filhos saibam que a lei é morta;
e, sabendo que ela é morta, esperem por aquela vida que está em Cristo”.157
Devemos prestar testemunho com frequência. Certamente, devemos
prestar testemunho àqueles que não ouviram o que nós ouvimos, que não
viram o que nós vimos. Dentre todos os possíveis ouvintes, ninguém merece
mais do que nossos filhos ouvir nosso testemunho, nossas experiências,
nossas convicções.
Notas
^155. Salmos 78:8.
^156. Josué 4:5–7
^157. 2 Néfi 25:21–23, 27.
Salmos 85:11

A verdade brotará da terra, e a justiça olhará desde os céus.

Esse versículo soa familiar para os membros de A Igreja de Jesus Cristo


dos Santos dos Últimos Dias. No sétimo capítulo do livro de Moisés, na
Pérola de Grande Valor, o Senhor fala o seguinte a respeito dos últimos dias:
“E ( … ) os céus escurecerão e um véu de trevas cobrirá a Terra; e os céus
tremerão, assim como a Terra; e haverá grandes tribulações entre os filhos
dos homens”. Porém, termina com essa maravilhosa e reconfortadora
promessa: “Mas meu povo eu preservarei”.158 De que maneira Ele os
preservará? Ele vai preservá-los por meio da restauração do evangelho de
Jesus Cristo. Antes da profecia de Salmos 85:11, o Senhor disse o seguinte a
respeito dos tempos trabalhosos dos últimos dias: “E justiça enviarei dos
céus; e verdade farei brotar da terra para prestar testemunho do meu
Unigênito; de sua ressurreição dentre os mortos; sim, e também da
ressurreição de todos os homens; e justiça e verdade farei varrerem a Terra,
como um dilúvio, a fim de reunir meus eleitos dos quatro cantos da Terra”.159
É evidente que muitas das coisas que apreciamos no evangelho
restaurado de Jesus Cristo compreendem a verdade que brotou da terra, na
forma do Livro de Mórmon, e a justiça enviada dos céus, na forma de
visitações divinas e revelações constantes. O Pai e o Filho apareceram ao
menino profeta e abriram caminho para a maior de todas as dispensações — a
nossa dispensação. O anjo Morôni veio para restaurar “outro testamento de
Jesus Cristo” — o Livro de Mórmon. Profetas e apóstolos antigos desceram
do céu para visitar a Terra e restaurar as chaves do sacerdócio, que incluem
as chaves para a coligação de Israel em toda a Terra; as chaves da
dispensação de Abraão, por meio de quem todas as famílias seriam
abençoadas; as chaves utilizadas no serviço do sacerdócio, inclusive do
templo, por meio das quais o coração dos pais se voltaria para seus filhos, e o
coração dos filhos se voltaria para seus pais. A história do evangelho
restaurado é uma longa e feliz sequência de verdades eternas brotando da
terra, e de justiça constante sendo enviada dos céus. Não é de surpreender que
o Profeta Joseph Smith clamasse com zelo poético:
“Não prosseguiremos em tão grande causa? ( . . . ) Que as montanhas
gritem de alegria, e todos vós, vales, clamai em alta voz; e todos vós, mares e
terras secas, contai as maravilhas de vosso Eterno Rei! E vós, rios e riachos e
ribeiros, fluí com alegria. Que as matas e todas as árvores do campo louvem
ao Senhor; e vós, pedras sólidas, chorai de alegria! E que o sol, a lua e as
estrelas da manhã cantem juntas e que todos os filhos de Deus gritem de
alegria! E que as criações eternas proclamem seu nome para todo o sempre. E
torno a dizer: Quão gloriosa é a voz que ouvimos do céu, proclamando a
nossos ouvidos glória e salvação e honra e imortalidade e vida eterna; reinos,
principados e poderes!”160

Notas
^158. Moisés 7:61.
^159. Moisés 7:62.
^160. Doutrina e Convênios 128:22-23.
Salmos 86:3–6; 103:8–11,
17–18; 119:58

Tem misericórdia de mim, ó Senhor, pois a ti clamo todo o dia.

Alegra a alma do teu servo, pois a ti, Senhor, levanto a minha


alma.

Pois tu, Senhor, és bom, e pronto a perdoar, e abundante em


benignidade para todos os que te invocam.

Dá ouvidos, Senhor, à minha oração e atende à voz das minhas


súplicas.

_______________

Misericordioso e piedoso é o Senhor; longânimo e grande em


benignidade.

Não reprovará perpetuamente, nem para sempre reterá a sua ira.

Não nos tratou segundo os nossos pecados, nem nos recompensou


segundo as nossas iniquidades.

Pois assim como o céu está elevado acima da terra, assim é grande
a sua misericórdia para com os que o temem. ( . . .
) Mas a misericórdia do Senhor é desde a eternidade e até a
eternidade sobre aqueles que o temem, e a sua justiça sobre os filhos
dos filhos;

Sobre aqueles que guardam a sua aliança, e sobre os que se


lembram dos seus mandamentos para os cumprir.

_______________

Roguei deveras o teu favor com todo o meu coração; tem piedade
de mim, segundo a tua palavra.

Um dos tristes legados deixado nas eras iniciais do cristianismo


tradicional foi a noção de um Deus cheio de ira, vingança e raiva, como se
fosse um árbitro mesquinho de beisebol ou futebol, ansioso por nos expulsar
do jogo. Como isso deve ser trágico e desalentador para Aquele que é o Pai
de todos nós.
Obviamente, nosso Pai Celestial tem expectativas para nós e pode ficar
desapontado com nossas ações. Por causa de transgressões graves, Ele pode
ficar genuinamente bravo, da mesma maneira que qualquer pai amoroso
ficaria diante da tolice ou das más escolhas de um filho, mas Ele é tardio para
irar-Se e não “reterá a sua ira” para sempre. Acima de tudo, Ele é
misericordioso porque Ele é bom. Ele está sempre pronto a ajudar e a
perdoar.
Se pudéssemos expandir nossa compreensão do Pai, entender Sua
divindade e aceitar Sua compaixão, estaríamos muito mais inclinados a
reconhecer Sua divindade e merecer Sua clemência. Todos teremos a
oportunidade de erguer a “voz das [nossas] súplicas” em oração, às vezes por
meio da oração sincera, angustiada e até dolorosa. A promessa das escrituras
e a eloquência dos salmos afirmam que Deus é “bom, e pronto a perdoar”.
Podemos erguer nossa alma a Ele sabendo, com absoluta certeza, que ela será
recebida em glória, que Ele “não reprovará perpetuamente”, que Sua
misericórdia é “desde a eternidade e até a eternidade”.
Salmos 89:9

Tu dominas o ímpeto do mar; quando as suas ondas se levantam, tu


as fazes aquietar.

Há épocas de nossa vida em que somos cercados por tormentas de


emoções, tribulações ou angústia, momentos em que suplicamos por alguém
que aplaque a tempestade. Tendo em mente a vantagem militar de uma
grande frota naval, o orador romano Cícero certa vez disse que “aquele que
governa as ondas, governa o mundo”. Mal sabia ele a verdade de suas
palavras. Deus governa as ondas, assim como governa o mundo. Uma das
maiores histórias do Novo Testamento trata do poder demonstrado pelo
Salvador em uma circunstância dessas.
Após ter ensinado por muitas horas, Jesus convidou Seus discípulos a
cruzarem para o outro lado da Galileia. Como acontece frequentemente na
Terra Santa, uma grande tempestade sobreveio-lhes durante a travessia do
mar que eles conheciam tão bem, e “subiam as ondas por cima do barco, de
maneira que já se enchia”.161
Lembremos que homens como Pedro, Tiago e João estavam naquele
barco com Jesus; homens que ganhavam a vida naquele mar, que conheciam
suas correntes e todos os aspectos de sua personalidade. Isso nos ajuda a
compreender a violência da tempestade, a ponto de eles terem ficado tão
temerosos que acordaram o Salvador, dizendo: “Mestre, não se te dá que
pereçamos?”162
O fato de que Jesus dormia enquanto tudo isso acontecia é, para mim,
muito terno e revela pelo menos duas coisas: primeiro, Sua paz de espírito
diante de qualquer tempestade; e segundo, como Ele devia estar fatigado após
doar tanto de Si para ministrar às multidões. De qualquer forma, ele foi
acordado por causa do medo de Seus discípulos. Em resposta à fé deles, Ele
Se levantou e repreendeu o vento, ordenando aos elementos: “Cala-te,
aquieta-te. E o vento se aquietou, e houve grande bonança”.163
Então, após repreender o vento, Ele admoestou brandamente Seus
amados discípulos, dizendo: “Por que sois tão tímidos? Ainda não tendes fé?”
E qual foi a reação deles? “E sentiram um grande temor, e diziam uns aos
outros: Mas quem é este, que até o vento e o mar lhe obedecem?”164
De tempos em tempos, todos temos a chance de clamar: “Mestre, o mar
se revolta” — tempos em que “grande tristeza [nos] quer ( … ) consumir”,
em que a “dor ( … ) perturba [nossa] alma”. Mas se estivermos na companhia
do Salvador do mundo, “o Mestre do céu e mar”, Ele calmará os ventos e
aquietará as ondas.165 Verdadeiramente, não precisamos temer. Com o
auxílio de Deus, certamente teremos mais fé.

Notas
^161. Marcos 4:37.
^162. Marcos 4:38.
^163. Marcos 4:39.
^164. Marcos 4:40–41.
^165. “Mestre, o Mar Se Revolta”, Hinos, nº 72.
Salmos 89:30–34

Se os seus filhos deixarem a minha lei, e não andarem nos meus


juízos,

Se profanarem os meus preceitos, e não guardarem os meus


mandamentos,

Então visitarei a sua transgressão com a vara, e a sua iniquidade


com açoites.

Mas não retirarei totalmente dele a minha benignidade, nem


faltarei à minha fidelidade.

Não quebrarei a minha aliança, não alterarei o que saiu dos meus
lábios.

É tolice acreditar que não seremos prejudicados por quebrar os


mandamentos. O propósito dos mandamentos é delinear um caminho que, se
seguido, nos manterá longe de dores e angústias desnecessárias. Toda ação
tem uma reação, como aprendemos com a física newtoniana; isso se aplica à
quebra dos mandamentos. E a reação sempre terá um resultado negativo.
Mas Deus nunca retirará totalmente de nós Sua benignidade, nem faltará
à Sua fidelidade, a não ser por insistência nossa. Podemos ter certeza de que
Ele não quebrará Sua aliança conosco, nem alterará as palavras que foram
ditas em nosso benefício. As escrituras estão repletas de declarações
comprovando que “o que eu, o Senhor, disse está dito e não me desculpo; e
ainda que passem os céus e a Terra, minha palavra não passará, mas será toda
cumprida”.166
Tais palavras, promessas e expressões falam de Seu amor, de Sua
bondade, de Sua paternidade. Sendo assim, quanto antes percebermos Suas
leis e estatutos — Seus mandamentos — como algo para nosso benefício,
melhor será. Além disso, é encorajador saber que quase nada do que fazemos
nos colocará permanentemente fora do alcance de Sua misericórdia e de Sua
redenção. Sua benignidade não será retirada de nós. Sua fidelidade não
falhará. Ele não quebrará Suas promessas, inclusive a de que ficará ao nosso
lado para sempre, se desejarmos, a fim de redimir nossa alma do pecado.
Confie em tudo aquilo que Deus falou. Saiba que você pode usufruir de
Sua graça, se quiser. Deus sempre guarda os convênios que fez conosco.
Encontraremos grande alegria ao longo da vida, se guardarmos os convênios
que fizermos com Ele.

Notas
^166. Doutrina e Convênios 1:38.
Salmos 94:9–10; 100:3, 5; 119:99–100

Aquele que fez o ouvido não ouvirá? E o que formou o olho, não
verá?

Aquele que argui os gentios não castigará? E o que ensina ao


homem o conhecimento, não saberá?

_______________

Sabei que o Senhor é Deus; foi ele que nos fez, e não nós a nós
mesmos; somos povo seu e ovelhas do seu pasto. ( . . .

) E a sua verdade dura de geração em geração.

_______________

Tenho mais entendimento do que todos os meus mestres, porque os


teus testemunhos são a minha meditação.

Entendo mais do que os antigos; porque guardo os teus preceitos.

Essas passagens são uma branda reprovação a todos aqueles que, por seu
brilhantismo, talvez sejam tentados a considerarem-se mais inteligentes que
Deus. É bem possível que os maiores riscos do mundo de conquistas
acadêmicas sejam o orgulho e a vaidade que as acompanham, a arrogância de
uns poucos que dizem, não à mão ou ao pé, mas ao próprio Deus: “Não tenho
necessidade de ti”.167 A vaidade de uma pessoa brilhante torna-se, no fim das
contas, uma tragédia, se essa dádiva a afasta daquele Deus que a concede. Na
maravilhosa jornada da busca por conhecimento, talvez a única advertência
que realmente precisemos nos lembrar é que “é bom ser instruído, quando se
dá ouvidos aos conselhos de Deus”.168 Se ouvimos verdades filosóficas ou
científicas, é porque “aquele que fez o ouvido” primeiramente também as
ouviu — e, na verdade, as declarou. Se contemplamos a beleza de uma obra
de arte ou de literatura, é porque aquele “que formou o olho” primeiramente a
contemplou e a compartilhou com o artista ou escritor. Será que não podemos
ter a humildade de reconhecer que há ouvidos melhores que os nossos ou que
há olhos mais perceptivos que os nossos? Seria tão difícil reconhecermos que
Aquele que nos ensina, que é o receptáculo de todo o conhecimento, sabe as
verdades que sabemos e muitas outras? Algumas dessas verdades adicionais
incluem questões de fé e devoção que salvarão nossa alma na eternidade.
Todos precisamos nos proteger contra a vaidade e a arrogância, mas em
especial aqueles que são talentosos e brilhantes; afinal, verdade seja dita, eles
possuem mais razões para se tornarem arrogantes. A história nos mostra que
isso não é uma tarefa fácil — a vaidade sempre está em guerra com a
humildade e, com frequência, ganha muitas batalhas.
O fato é que quanto mais capazes nós somos, mais humildes deveríamos
ser. Deus “é Deus; foi ele que nos fez”. Deveríamos inclinar a cabeça e
dobrar os joelhos diante de Sua grandeza, em parte porque Ele concedeu uma
pequena medida dela a cada um de nós.

Notas
^167. I Coríntios 12:21.
^168. 2 Néfi 9:29.
Salmos 105:15

Não toqueis os meus ungidos, e não maltrateis os meus profetas.

O próprio Davi deu-nos uma indelével lição a esse respeito, quando se


recusou a tirar a vida do rei ungido, Saul, seu adversário. Não importava que
Saul houvesse procurado repetidamente tirar a vida de Davi, nem que o teria
feito, caso tivesse conseguido. Mas a recíproca não era verdadeira. Davi
honrava o ofício e, consequentemente, o homem que o portava. Na verdade,
ele ficava preocupado quando outras pessoas não demonstravam o mesmo
respeito por seu rei, tanto que lamentou profundamente o dia em que a vida
de Saul lhe foi tirada.
Hoje em dia, temos profetas, apóstolos e líderes ungidos. Eles nunca
afirmaram ser perfeitos, afinal só um ser humano em toda a história o foi.
Mas mesmo sendo imperfeitos, eles representam Aquele que foi perfeito — o
que é uma responsabilidade grandiosa. Procurando ser o melhor que
conseguem, esses líderes foram chamados para exercer determinadas funções
e cumprir certos deveres em nome de Deus. Ninguém tem mais consciência
dessa responsabilidade do que eles próprios, que são portadores do
sacerdócio. Ninguém sente mais o peso dessa obrigação, nem tem maior
ciência de suas limitações, nem se preocupa mais com o fato de que não
importa o quanto seja bom, precisa ser ainda melhor. Nós que os observamos
temos ciência disso e os amamos por seu serviço. Percebemos tão poucas
limitações. Ao nos esforçarmos para apoiá-los e sustê-los em seu serviço,
nossas palavras e ações poderiam, ao menos, não lesá-los, depreciá-los,
aviltá-los ou desdenhar deles.
O Presidente Boyd K. Packer cita frequentemente um relato sobre a vida
de Abraham Lincoln, que sempre foi muito criticado, conforme registrado
por um de seus biógrafos. Num encontro com adversários que criticavam sua
maneira de conduzir a Guerra Civil, Lincoln disse:
“Cavalheiros, suponhamos que tudo o que possuíssem em ouro fosse
colocado nas mãos de um [homem], que levaria suas posses para o outro lado
do Rio Niágara com uma corda. Com passos cautelosos e lentos, ele avança
seguro à corda, carregando todos os seus bens. Vocês iriam balançar o cabo e
gritar para o homem: ‘( … ) Fique mais ereto!( … ) Abaixe-se um pouco
mais! Vá mais rápido! Vire para o sul! Vire para o norte!’? Seria esse seu
comportamento nessa situação crítica?
Não! Vocês iriam prender a respiração, todos vocês, e também sua
língua. Vocês nem se mexeriam até que ele chegasse ao outro lado”.169
No que diz respeito ao serviço espiritual, muito mais elevado e
importante, precisamos orar em favor de nossos líderes e apoiá-los. Eles são
homens e mulheres maravilhosamente bons, que dão seu melhor para
conhecer e cumprir a vontade de Deus em relação à Igreja. E eles têm “a
unção do Santo”, que adiciona santidade a seu sincero esforço.170 Devemos a
eles a mesma lealdade e devoção que damos ao Santo cujo trabalho eles
foram chamados a realizar.

Notas
^169. John Wesley Hill, Abraham Lincoln: Man of God, 1927, p. 402;
tradução livre.
^170. I João 2:20.
Salmos 113:9

Faz com que a mulher estéril habite em casa, e seja alegre mãe de
filhos. Louvai ao Senhor.

Uma das profundas e pungentes angústias que encontramos com


frequência entre os membros da Igreja é a dor que uma mulher digna sente
por não ser casada ou não ser capaz de ter filhos. O espírito deste salmo
trouxe grande paz a muitas delas, pois nos ajuda a lembrar da promessa dos
profetas, de que Deus não reterá nenhuma bênção merecida por uma mulher
justa, se ela continuar andando pela fé, permanecer fiel e perseverar vivendo
com esperança.
A promessa feita a toda mulher digna é que ela terá a chance de se casar,
na vida ou na eternidade, e que terá a oportunidade de um dia, de alguma
maneira, “[habitar] em casa, e [ser] alegre mãe de filhos”.
Não sabemos em detalhes como isso acontecerá ou sob quais
circunstâncias essa milagrosa promessa se cumprirá, mas sabemos que será
cumprida. Essa promessa serve para trazer grande certeza àqueles que têm o
desejo digno de se casar, ter filhos e constituir uma vida familiar com laços
eternos de amor.
Tais desejos serão realizados. Deus assim prometeu. E será uma
experiência alegre.
Salmos 116:15

Preciosa é à vista do Senhor a morte dos seus santos.

Os funerais estão entre as reuniões mais sagradas e espirituais realizadas


em A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Às vezes, pode ser
que a morte pareça ter chegado fora de hora — um bebê, uma criança, um
adolescente, um missionário, um jovem pai que deixa uma família
igualmente jovem, e assim por diante. Mas mesmo em relação àqueles que
viveram uma vida longa e plena, temos um sentimento genuíno de perda com
sua partida. Pode ser um cônjuge, um pai, um avô, ou simplesmente um
amigo ou vizinho. Nesses momentos, quando rememoramos sua vida e
bendizemos seu nome, é apropriado “[chorar] a perda dos que morrerem”,
como ensinam as escrituras.171
As lágrimas derramadas pela partida de pessoas boas é o preço que
pagamos pelo amor neste mundo. Percebemos o quanto foram preciosas essas
pessoas e sua vida, por isso facilmente reconhecemos que “[preciosos são] à
vista do Senhor”. Da mesma forma que sentimos essa perda, imaginem o
quanto deve ser alegre o reencontro dessas pessoas com seus entes queridos e
com o próprio Senhor do outro lado do véu. Nada é mais “precioso” que uma
vida humilde, digna e cheia de amor. Sendo assim, como deveríamos ser
gratos por saber que o Senhor dirá a essas pessoas: “Bem está, servo bom e
fiel. ( … ) entra no gozo do teu senhor”.172 É digno deixá-los partir, a fim de
que possam contemplar o rosto do Salvador e ouvir essas palavras.

Notas
^171. Doutrina e Convênios 42:45.
^172. Mateus 25:21.
Salmos 118:6

O Senhor está comigo; não temerei o que me pode fazer o homem.

Na Igreja, cantamos “Quem segue ao Senhor? Hoje iremos ver.


Clamemos sem temor Quem segue ao Senhor?” 173
Em meio às batalhas da vida e às vicissitudes que enfrentamos,
certamente não há nada mais reconfortante do que saber que estamos do lado
do Senhor e, por isso, Ele está do nosso lado. Isso não quer dizer que as
batalhas cessarão. Não significa que os transtornos serão reduzidos ou
instantaneamente vencidos. Significa, sim, que podemos lutar com confiança
contra os males e a oposição que, no devido tempo, cederão à influência
divina.
Obviamente, a dor é ainda maior se esses males e essa oposição vêm por
meio de outra pessoa. A vida por si só já é suficientemente dura, mas fica
muito mais desconfortável quando os problemas surgem por causa de outro
ser humano. Mas tem sido assim desde que Caim matou Abel. Homens e
mulheres ferem regularmente uns aos outros. Tudo o que podemos fazer é
manter-nos fiéis a nossos princípios, mesmo que outros os abandonem — e
isso é o suficiente. Para aqueles que guardam Seus mandamentos, Deus
sempre será um aliado.
Estevão foi um dos primeiros mártires na causa de Cristo, mas por estar
do lado do Senhor, ele não temeu. Sua devoção custou-lhe a vida, mas ele
não morreu com medo. Num sentido muito real, praticamente nada do que o
homem fizesse contra ele teria importância. Estevão, “estando cheio do
Espírito Santo, fixando os olhos no céu, viu a glória de Deus, e Jesus, que
estava à direita de Deus”. Suas últimas palavras foram aquelas “que em
invocação dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito. E, pondo-se de joelhos,
clamou com grande voz: Senhor, não lhes imputes este pecado. E, tendo dito
isto, adormeceu”.174 Que descrição emocionante da pacífica confiança que
nos advém quando estamos do lado do Senhor e quando Ele está do nosso.
A luta enfrentai,
Honremos nosso Pai;
Já chega o opressor;
Quem segue ao Senhor? 175

Na eterna batalha entre o bem e o mal, não há nada que os outros


possam fazer que nos firam permanentemente ou nos prejudique eternamente,
se soubermos que estamos do lado do Senhor e que Ele está do nosso.

Notas
^173. “Quem Segue ao Senhor?” Hinos, nº 150.
^174. Atos 7:55–60.
^175. “Quem Segue ao Senhor?” Hinos, nº 150.
Salmos 118:24

Este é o dia que fez o Senhor; regozijemo-nos, e alegremo-nos nele.

Uma das grandes tentações na vida é passar tanto tempo olhando para o
passado ou para o futuro, que deixamos de ver as oportunidades presentes.
Devemos estudar o passado, com toda a certeza. Todos precisamos aprender
as lições da história. Muitas escrituras foram dadas para nos ensinar sobre os
desafios que outras pessoas enfrentaram no passado, a fim de que possamos
evitá-los, caso se apresentem diante de nós. Além disso, precisamos planejar
nosso futuro. Todos precisamos olhar para frente. Nenhum de nós deve se
surpreender quando o amanhã chegar e com ele novas circunstâncias. Ao
aprendermos com o passado e planejarmos para o futuro, na verdade estamos
lidando unicamente com o presente. A vida precisa ser vivida no tempo
presente. A hora atual é a única de que dispomos.
É significativo que o temeroso Moisés tenha perguntado ao Senhor,
quando estava prestes a resgatar os escravos israelitas: “Eis que quando eu
for aos filhos de Israel, e lhes disser: O Deus de vossos pais me enviou a vós;
e eles me disserem: Qual é o seu nome? Que lhes direi?” E o Senhor
respondeu a Seu profeta: “EU SOU O QUE SOU. ( . . . ) Assim dirás aos
filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós”176 Gramaticalmente (e
teologicamente) falando, essa é uma declaração divina de Deus no presente
do indicativo. (Ele tinha acabado de dizer a Moisés: “Eu sou o Deus de teu
pai, o Deus de Abraão, o Deus de Isaque, e o Deus de Jacó”.177) Sim, Ele
esteve conosco no passado e, sim, estará conosco no futuro. Ele é o Alfa e o
Ômega, o Princípio e o Fim, o Primeiro e o Derradeiro. Todos esses são
títulos aplicáveis ao Senhor. Mas quando precisamos urgentemente Dele,
quando precisamos Dele com grande fé, quando os desafios são imediatos e
estão nos sobrepujando, Ele está conosco no presente.
EU SOU, EU SOU, EU SOU. Deus, com certeza, está tentando nos
ensinar uma grande verdade com isso. Ele é. Ele realmente vive. Ele
realmente age em nossa vida. Ele está comprometido conosco na primeira
pessoa do singular, no presente do indicativo, na voz ativa. Não pode haver
nada mais reconfortante do que isso.

Notas
^176. Êxodo 3:13–14.
^177. Êxodo 3:6; grifo do autor.
Salmos 119:19

Sou peregrino na terra; não escondas de mim os teus


mandamentos.

Ao longo da vida, muitas vezes teremos o sentimento de que este mundo


em que vivemos não é nosso lar. É um lugar maravilhoso. É um lugar belo. É
a criação de Deus. E é parte de Seu plano para nossa salvação. Mas não é
nosso lar. Antes de virmos para cá, nossa mente passou por um véu do
esquecimento, mas nos foi prometido que após esta vida, voltaremos para o
nosso verdadeiro lar. Relembraremos o que sabíamos antes de adentrarmos a
mortalidade, assim como levaremos conosco muitas lições maravilhosas
aprendidas aqui. Contudo, enquanto estamos aqui, este mundo telestial pode
às vezes parecer um lugar solitário. Podemos nos sentir como estrangeiros
aqui.
Jacó, filho de Leí e Saria, nascido no deserto de suas aflições, teve uma
vida difícil em todos os aspectos, chegando a sentir um pouco dessa solidão
sobre a qual falamos. Perto do fim da vida, ele disse: “O tempo passou para
nós e nossa vida também passou como se fosse um sonho, sendo nós um
povo solitário e solene, errante, expulso de Jerusalém, nascido em meio a
tribulações num deserto e odiado por nossos irmãos, o que causou guerras e
contendas; assim, lamentamo-nos até o fim de nossos dias”.178
É claro que não passaremos todos os dias em solidão ou lamentando. Na
verdade, oramos para que sempre haja dias brilhantes e amizades
maravilhosas entre os santos de Deus e a família da fé. Ainda assim, este
mundo não é nosso lar, e não se espera que vivamos como se fôssemos ficar
por aqui. E aqui chegamos aos mandamentos de Deus. Não é de surpreender
que o salmista clame: “Não escondas de mim os teus mandamentos”. A
obediência é a única maneira pela qual podemos passar por esse mundo, às
vezes hostil.
Nota
^178. Jacó 7:26.
Salmos 119:59–60

Considerei os meus caminhos, e voltei os meus pés para os teus


testemunhos.

Apressei-me, e não me detive, a observar os teus mandamentos.

Talvez o ponto mais marcante da parábola do filho pródigo seja que,


após ter cometido muitos erros, tomado seu próprio caminho e desperdiçado
todos os seus bens, o jovem “[tornou] em si”.179 Cada um de nós precisa
“tornar em si”. Precisamos “considerar nossos caminhos” e corrigi-los ao
longo do processo. Assim como o filho pródigo, precisamos “[voltar os
nossos] pés para os [nossos] testemunhos”. Precisamos nos apressar a voltar
— voltar para nosso Pai, para nossa família, para nosso futuro, para nossa fé.
Semelhantemente, a súplica de Leí a seus filhos desgarrados bem que
poderia se aplicar a todos nós: “Despertai, meus filhos, cingi a armadura da
retidão. Sacudi as correntes com que estais amarrados e saí da obscuridade e
levantai-vos do pó”.180 Precisamos despertar para as consequências de nossas
ações e reconhecer o que estamos fazendo de errado.
É interessante que um dos maiores estratagemas usados por Satanás é
impedir-nos de “considerar nossos caminhos”. Ele quer nos manter ocupados
com jogos, hobbies, preocupações, cuidados ou finanças. Há muitas coisas
que podem manter nossa mente ocupada e distraída, mas pelo menos uma
parte de nosso dia deveria ser devotada para que “consideremos nossos
caminhos” (e isso, na verdade, pode conduzir à nossa salvação).
Depois, com rapidez e convicção, devemos voltar nossos pés para Deus.
Ele é amoroso. Ele está nos esperando. Seus braços estão estendidos. Mas Ele
não nos forçará a andar em Sua direção. É um passo que nós precisamos dar.
É bem provável que nunca nos sintamos inclinados a fazer isso, a menos que
consideremos nossos caminhos por meio de autoexame ou autoavaliação.
Não demorem. Apressem-se!
Notas
^179. Lucas 15:17.
^180. 2 Néfi 1:23.
Salmos 119:67, 71–72.

Antes de ser afligido andava errado; mas agora tenho guardado a


tua palavra. ( . . .

Foi-me bom ter sido afligido, para que aprendesse os teus


estatutos.

Melhor é para mim a lei da tua boca do que milhares de ouro ou


prata.

) Não gostamos de pensar que precisamos ser afligidos para poder


aprender as lições da vida, mas às vezes é necessário. Alma teve grande êxito
entre os zoramitas que haviam sido afligidos com grande pobreza e
desprezados socialmente. É irônico, mas não nos surpreende, o fato de que
essa condição teve um valioso efeito sobre eles, pois pararam para ouvir a
palavra do Senhor. A esse respeito, Alma disse: “Vejo que sois humildes de
coração; ( . . . ) porque fostes compelidos a ser humildes, benditos sois;
porque o homem, às vezes, se é compelido a humilhar-se, procura o
arrependimento; ( … ) [e] encontrará misericórdia; e quem encontrar
misericórdia e perseverar até o fim, será salvo”.181
E depois teve esse momento profético: “Por terdes sido compelidos a ser
humildes fostes abençoados, não vos parece que serão mais abençoados os
que verdadeiramente se humilharem por causa da palavra? ( . . . ) Benditos
são os que se humilham sem serem compelidos a ser humildes”.182
Podemos aprender com nossos erros. Na verdade, deveríamos. Seremos
extremamente tolos se não o fizermos. Muitos poderiam cantar junto com o
salmista, afirmando que antes de serem afligidos, estavam se perdendo. Em
tais circunstâncias, talvez as nossas aflições sejam a única maneira de nos
recompor, de nos fazer voltar a guardar Sua palavra. Tendo isso em mente,
deveríamos poder dizer, mesmo ao passar pelas mais difíceis lições e
experiências: “Foi-me bom ter sido afligido”.

Notas
^181. Alma 32:8, 13.
^182. Alma 32:14, 16; grifo do autor.
Salmos 119:94

Sou teu, salva-me; pois tenho buscado os teus preceitos.

Esse é um dos versículos mais curtos desta coletânea, mas também um


dos mais doces. Quaisquer que sejam nossas dificuldades, nossas provações,
nossos problemas, seguimos em frente com a certeza deste grande princípio,
fundamental para nossa fé — de que somos filhos de Deus, e de que Ele
anseia por nos abençoar, sendo a dádiva de Seu Filho Unigênito a maior
bênção de todas.
O Salvador disse certa vez (pela boca de Isaías) que, por mais absurdo
que possa parecer, uma mãe poderia esquecer do filho que deu à luz, a quem
cuidou e amou. É improvável, quase impossível, que alguém que conheça o
amor de mãe consiga imaginar isso — mas ainda assim, esse esquecimento
materno soaria mais provável de acontecer do que se disséssemos que foram
o Pai ou o Filho que nos esqueceram. A razão pela qual eles não nos
esqueceriam (seria possível?) é porque o Filho, com a aprovação do Pai,
gravou-nos “nas palmas das [Suas] mãos”.183 Em nossos momentos críticos,
sempre podemos apelar para essas feridas — essas cicatrizes que nos
relembram do grande preço que foi pago por nossa salvação. Tendo pago tão
elevado preço, nem o Pai nem o Filho desistirão de nós agora. Se seguirmos
seus preceitos, seremos salvos.

Nota
^183. Isaías 49:16; 1 Néfi 21:16.
Salmos 119:103, 105; 12:6; 18:28

Oh! quão doces são as tuas palavras ao meu paladar, mais doces
do que o mel à minha boca.( . . .

) Lâmpada para os meus pés é tua palavra, e luz para o meu


caminho.

_______________

As palavras do Senhor são palavras puras, como prata refinada em


fornalha de barro, purificada sete vezes.

_______________

Porque tu acenderás a minha candeia; o Senhor meu Deus


iluminará as minhas trevas.

As escrituras, as palavras do Senhor, como dadas antigamente e nos dias


atuais, são a maneira mais segura de conhecermos quem é Deus, quais são
Seus propósitos e o que Ele espera de Seus filhos na mortalidade. As
escrituras são nosso padrão de medida para a verdade — “nossas obras-
padrão”. Sem elas, “[teríamos] degenerado, caindo na incredulidade”, sem
compreendermos os mistérios de Deus e sem termos os Seus mandamentos
“sempre diante dos olhos”.184
Será que Deus vai considerar-nos inocentes caso tratemos levianamente
as palavras que Ele pronunciou e as vidas martirizadas por elas?185 Um após
o outro, os grandes nomes do Velho Testamento deram sua vida para que
pudéssemos ter esse grandioso registro. Deus enviou Seu Unigênito ao
mundo para que desse em sacrifício sua vida (bem como a de Seus
apóstolos), a fim de que pudéssemos ter os ensinamentos do Novo
Testamento. Muitos dos profetas de Deus cujas palavras estão registradas no
Livro de Mórmon deram sua vida e selaram seu testemunho com sangue, a
fim de que hoje pudéssemos saber sobre as comunicações de Deus — e sobre
a visita de Cristo — no Novo Mundo. O Senhor enviou o Profeta Joseph
Smith, que também selou seu testemunho com sangue, para que pudéssemos
ter as verdades registradas nas revelações modernas. Hyrum, o irmão de
Joseph, também deu sua vida. Outros também fizeram o mesmo.
Após o Senhor ter feito tudo isso por nós — ter dado ao mundo as
melhores vidas e o melhor sangue, a fim de registrar e preservar Sua santa
palavra — parece muito improvável que Ele se alegrará com o descuido —
ou o desdém — em relação a essas revelações. A “prata” das escrituras foi
refinada em uma fornalha, em parte porque os profetas e apóstolos passaram
por uma fornalha pessoal a fim de que as tivéssemos.
A palavra de Deus é uma barra de ferro que nos guia em meio as névoas
de escuridão, é um banquete divino em um mundo decaído. Nenhuma outra
luz seria mais confiável em meio à escuridão da noite; nada seria mais
saboroso ao paladar do povo que sente fome — “não fome de pão, nem sede
de água, mas de ouvir as palavras do Senhor”.186
Graças aos céus e à eternidade pelas escrituras, “pois eis que as palavras
de Cristo vos dirão todas as coisas que deveis fazer”.187 E assim como
aconteceu com o profeta Leí, acontecerá conosco. “Enquanto lia [as palavras
do livro], ele ficou cheio do Espírito do Senhor”.188 Uma experiência tão
preciosa e penetrante com a Deidade, por meio da palavra revelada, é mais
doce que o mel à nossa boca. O alicerce de meu testemunho começou a se
formar com minhas experiências ao ler as escrituras na juventude. Elas me
sustentaram naquela época e continuam me sustentando hoje. Devemos ser
gratos pelos céus estarem abertos, por sabermos que Deus não apenas falou,
mas ainda fala; pois, em tempos de necessidade e a qualquer hora precisamos
de uma “lâmpada para os [nossos] pés” e de uma “luz para o [nosso]
caminho”.

Notas
^184. Mosias 1:5.
^185. Ver Doutrina e Convênios 84:95.
^186. Amós 8:11.
^187. 2 Néfi 32:3.
^188. 1 Néfi 1:12.
Salmos 119:108

Aceita, eu te rogo, as oferendas voluntárias da minha boca, ó


Senhor; ensina-me os teus juízos.

Há ocasiões em que somos coagidos a dizer o que é certo, como se a


retidão pudesse ser forçada. Em uma corte de justiça, por exemplo, estamos
sob o juramento de “dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a
verdade”. Bem cedo na vida, os pais ensinam os filhos a dizer a verdade, a
pedir desculpas quando cometem uma falta e a dizer “sinto muito”.
Expressões convencionadas como essas têm sua utilidade, mas como é
maravilhoso quando, espontaneamente, oferecemos ao Senhor e às outras
pessoas “as oferendas voluntárias da [nossa] boca”. Elas incluem — mas não
se limitam a — expressões de amor, de gentileza, de paciência, de
compaixão.
Cada vez que oferecemos uma oração honesta e de coração, fazemos
uma oferenda voluntária de nossa boca. Cada vez que prestamos testemunho
ou ensinamos uma verdade, fazemos uma oferenda voluntária de nossa boca.
Além disso, podemos fazer essas oferendas com mais liberalidade e
abundância. Podemos dizer àqueles que nos são próximos e queridos o
quanto os amamos, o quanto significam para nós; podemos dizer-lhes que a
vida não seria tão doce e sagrada sem sua companhia. Podemos falar com
cortesia aos desconhecidos, seja numa loja ou no trânsito. Podemos abrir
nossa boca e levar o evangelho para aqueles que não sabem nada a respeito
de nossas crenças e nossos ensinamentos.
Em lugares sagrados, usamos palavras sagradas; e às vezes o fazemos
ajoelhados diante do altar. Como seria maravilhoso se não precisássemos ser
forçados a dizer essas verdades, se o amor não precisasse ser extraído de nós,
se o perdão não saísse de nossos lábios apenas porque “tivéssemos que
concedê-lo”. As oferendas voluntárias vêm do coração. É de lá que elas
deveriam vir — com rapidez, liberalidade e frequência. Elas precisam refletir
nossa devoção a Deus — liberalmente.
Salmos 127:1

Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a


edificam; se o Senhor não guardar a cidade, em vão vigia a sentinela.

Uma das lições que certamente aprendemos ao longo da vida é que, sem
a ajuda do Senhor, não obteremos nenhum sucesso significativo. Este salmo
fala sobre a edificação de uma casa, mas bem que poderia estar falando sobre
o estabelecimento de uma família, uma carreira, um governo ou uma filosofia
de vida. Esses esforços — por mais nobres e trabalhosos que possam ser —
no final não serão bem-sucedidos sem a ajuda, a sanção, a proteção e a
aprovação do Senhor. Não conseguiremos edificar nem defender uma
instituição, qualquer que seja, sem Seu auxílio.
É provável que o melhor poema escrito por Percy Bysshe Shelley seja o
melancólico soneto chamado “Ozymandias”. É um soneto composto em
resposta a uma inscrição entalhada na base dos restos de uma estátua
quebrada do período do grande Ramsés II do Egito, que dizia: “Rei dos Reis
sou eu, Osymandias. Se souberes quão grande sou e onde me deito, tente
sobrepujar uma de minhas obras”. A grande ironia é que o rei e sua estátua —
sem contar sua fama e seu império — agora não passam de ruínas, para que
todos possam ver exatamente “onde me deito”. O poema de Shelley diz o
seguinte:

Encontrei um peregrino de uma terra antiga


Que disse: Duas pernas de pedra, enormes e em torso,
Erguem-se no deserto ( … ) Perto delas, meio enterrado
Na areia, jaz um rosto em ruínas, cuja testa
E os lábios franzidos, cuja expressão de escárnio de um frio
comandante,
Mostram que o escultor bem percebeu essas paixões,
As quais ainda vivem, estampadas na matéria sem vida,
A mão que as zombava e o coração que as alimentava:
E no pedestal, estas palavras aparecem:
“Meu nome é Ozymandias, rei dos reis:
Contemplai minhas obras, ó Poderosos, e desesperai!”
Nada mais resta. Ao redor da decadente
e colossal ruína, infinito e nu,
Estende-se o solitário e monótono deserto.189

A não ser que o Senhor edifique a nós e a nossa vida, estaremos


trabalhando em vão.

Nota
^189. Percy Bysshe Shelley, “Ozymandias”, em New Oxford Book of
English Verse, p. 580; tradução livre.
Salmos 127:3–5

Eis que os filhos são herança do Senhor, e o fruto do ventre o seu


galardão.

Como flechas na mão de um homem poderoso, assim são os filhos


da mocidade.

Bem-aventurado o homem que enche deles a sua aljava; não serão


confundidos, mas falarão com os seus inimigos à porta.

Cedo ou tarde, todos perceberemos que, dentre todos os relacionamentos


humanos — na verdade, dentre todos os objetivos que temos em um mundo
mortal — nada é tão recompensador quanto a vida e o amor em família. Os
filhos verdadeiramente “são herança do Senhor”. A maioria dos pais sente
grande alegria por seus filhos na maior parte do tempo. Porém, quando as
coisas vão mal, os filhos podem acabar sendo a maior fonte de dor para seus
pais.
Ensinamos que Deus é nosso Pai e que nós somos Sua geração, Seus
filhos espirituais. Esse sentimento e essa perspectiva eterna a respeito da
família trazem mais significado para nossos relacionamentos terrenos. Deus
quer abençoar a nós e a nossos filhos. Ele chora e Se preocupa conosco, da
mesma forma que choramos e nos preocupamos com nossos filhos.
Aprendemos muito a ser piedosos quando trazemos filhos ao mundo e os
consideramos como a “herança do Senhor” que eles são.
Na vida mortal, com suas limitações físicas e desafios emocionais, as
famílias nem sempre são calmas e felizes. Mas com a compreensão eterna
que o evangelho nos dá, sabemos que um dia serão. Confie em Deus, se seus
filhos se desencaminharem. Eles ainda são seus e Dele. Eles são “a herança
do Senhor”.
A felicidade no lar é verdadeiramente a melhor felicidade de todas.
Continue demonstrando amor a seus filhos — da mesma maneira que Deus
continua demonstrando o Seu amor por você. Felizes são o homem e a
mulher cuja aljava está cheia dessas flechas — mesmo que não tenham sido
sempre retas, mesmo que tenham sido um desafio em sua fase de
crescimento!
Salmos 133:1

Oh! quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união.

Nosso corpo, nossa alma e nossa psique existem para estar em paz.
Todos conhecemos a fragilidade de nosso corpo físico quando nossa saúde
está em desordem, quando alguma coisa não está em harmonia com o todo.
Tudo fica ainda mais triste quando a desarmonia é na mente ou no espírito.
Por exemplo, uma enfermidade real pode advir da culpa que nos
acompanha quando não vivemos de acordo com nossas crenças, quando
vamos contra a sinceridade de nosso compromisso moral. Todos já vimos
exemplos de falta de união num casamento, numa família, numa equipe
esportiva ou numa comunidade.
Paulo ensinou que o corpo — quer seja de um indivíduo, de uma igreja
ou de uma nação — não pode guerrear contra si mesmo, que uma parte não
pode ser antagônica em relação às demais, que o todo não subsistirá se um
elemento disser aos outros que deles não necessita.190 A vida será mais feliz,
em todos os sentidos, se formos unos e harmoniosos, permitindo que haja
diferenças de opinião e personalidade, mas sem deixar que divergências e
singularidades legítimas tragam dores e descontentamentos tão sérios que
comprometam a saúde.
Deus espera que sejamos unos como Seus filhos e como Sua Igreja. Ele
espera que “[vivamos] em união”.
Na verdade, uma das grandes características da Sião dos últimos dias é
que seus habitantes serão “unos de coração e vontade e [viverão] em
retidão”.191 Em Sua magnífica Oração Intercessória, Cristo suplicou para que
Seus discípulos fossem unos.192 Posteriormente, “o coração e a alma” dos
Santos do Novo Testamento creram e se tornaram um.193
Como membros da Igreja, somos o corpo de Cristo. Quando a saúde do
corpo todo está em jogo, Ele espera união de propósito e a superação do
egoísmo. Isso ajuda a empreitada toda — bem como os indivíduos que dela
participam — a sobrepujar tempos difíceis. Verdadeiramente, se não somos
um na família de Deus, não pertencemos a Ele.194

Notas
^190. Ver I Coríntios 12:12–27.
^191. Moisés 7:18.
^192. Ver João 17.
^193. Atos 4:32.
^194. Ver Doutrina e Convênios 38:27.
Salmos 139:23

Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece


os meus pensamentos.

Uma antiga tradição na Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos
Dias é a realização de entrevistas. Com regularidade, somos convidados a nos
apresentar diante de nossos líderes (e eles diante dos líderes deles) para que
se certifiquem de que somos dignos de nossa designação e privilégio. Na
infância, isso envolve a preparação para o batismo e a confirmação. Na
adolescência, essa experiência pode estar associada à ordenação ao
Sacerdócio Aarônico ou ao programa de metas das Moças. Esse momento de
autoexame ganha mais importância com o passar dos anos, à medida que as
complexidades da vivência do evangelho se desenrolam. Conforme as
tentações aumentam, as entrevistas ficam mais rigorosas — como na
preparação para a missão, para a experiência do templo ou para outros
momentos sagrados da vida. À medida que participamos plenamente da
Igreja, teremos muitas oportunidades de ser entrevistados em relação à nossa
posição diante do Senhor.
Porém, muito mais importante e pessoal que as entrevistas que temos
com nossos líderes na Igreja, são as entrevistas que temos — a cada dia, a
cada hora, a cada momento — com o Senhor. Pelas escrituras, sabemos que
Ele vê tudo, que “todas as coisas estão presentes diante de [Seus] olhos” e
que Ele está sempre no meio de nós.195 Assim, como é importante estarmos
sempre prontos, a cada instante de nossa vida e de nosso discipulado, para
dizer com sinceridade: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-
me, e conhece os meus pensamentos”. Essa é uma entrevista que o Senhor
sempre faz conosco (se concordarmos com isso ou não). Ele sonda nosso
coração e certamente conhece nossos pensamentos. Faríamos bem em estar
preparados para esse exame “em todos os momentos e em todas as coisas e
em todos os lugares”.196
Notas
^195. Doutrina e Convênios 38:2, 7.
^196. Mosias 18:9.
Salmos 141:3

Põe, ó Senhor, uma guarda à minha boca; guarda a porta dos


meus lábios.

Já tratamos neste livro sobre o poder da fala e a grande influência das


palavras. Mas há momentos em que não deveríamos falar, em que
deveríamos ficar literalmente de boca fechada. Uma diferença entre o Velho e
o Novo Testamentos é que havia uma teoria da retribuição mais acentuada no
Velho Testamento. A lógica era a de que se você dissesse algo ruim a meu
respeito, eu poderia dizer algo ruim sobre você. Por centenas de anos foi
assim: “Olho por olho, e dente por dente”.197
Uma das coisas mais belas já ditas sobre o Salvador foi o testemunho do
Apóstolo sênior, Pedro, de que “quando o injuriavam, não injuriava”.198 As
virtudes do evangelho, como a paciência, a longanimidade, a bondade e a
caridade, sugerem que não façamos mal, seja por palavras ou de outra
maneira, mesmo quando alguém nos fizer o mal. Há coisas que simplesmente
precisamos suportar. Uma parte da vida Cristã é “sofrer em silêncio”, em vez
de jogar lenha na fogueira dos problemas, da dor, dos erros. Dois erros não
fazem um acerto. Se alguém tiver nos insultado, não ganharemos nada se
pagarmos na mesma moeda.
É provável que não haja um lugar em que essa lição seja mais necessária
e mais rápida de se aprender do que no lar e na família. Há coisas que os
cônjuges nunca deveriam dizer uns aos outros, mesmo sob provocação. Há
coisas que os pais nunca deveriam dizer aos filhos, mesmo quando estiverem
no limite da paciência. Há coisas que os filhos nunca deveriam dizer aos pais,
caso estejam dispostos a guardar o grandioso quinto mandamento dado por
Deus.
Deveríamos aprender a refrear nossa língua. Deveríamos nos lembrar
que as palavras que dizemos não voltam atrás e podem ser para sempre
recordadas com pesar e arrependimento. Nem tudo o que sentimos deve ser
dito. Quase nada do que pensamos com raiva deve ser dito. Nosso mundo
seria um lugar melhor e mais feliz se, em tempos de angústia e aflição,
pudéssemos suplicar: “Põe, ó Senhor, uma guarda à minha boca; guarda a
porta dos meus lábios”.

Notas
^197. Mateus 5:38; ver também Levítico 24:20.
^198. I Pedro 2:23.
Salmos 141:5

Fira-me o justo, será isso uma benignidade; e repreenda-me, será


um excelente óleo, que não me quebrará a cabeça; pois a minha oração
também ainda continuará nas suas próprias calamidades.

Só uma alma verdadeiramente magnânima desejará a correção, a crítica


construtiva, a reprovação pelo conselho do Senhor e de Seus servos. A
imagem do justo que “fere” alguém pode parecer um pouco forte, mas a
questão é que um mandamento dado em retidão será, no fim das contas, “uma
benignidade”, se melhorar nossa vida. Do mesmo modo, se a reprovação é
necessária, ela será “um excelente óleo”. Relembramos do óleo consagrado
sendo administrado à cabeça de pessoas queridas em momentos de
necessidade. Com certeza, esse é um óleo que “não [nos] quebrará a cabeça”.
Pelo contrário, sua aplicação é gentil e suave.
Teríamos mais vantagens ao longo da vida se fôssemos humildes o
suficiente para encarar conselhos úteis como benignidades, e advertências,
mesmo que sejam convites ao arrependimento, como “um excelente óleo”.
Nessas circunstâncias, mesmo nos momentos críticos que pareçam
“calamidades”, devemos elevar orações de gratidão por nosso crescimento
pessoal e pela preocupação daqueles que nos amam o bastante para nos
corrigir.
Salmos 144:12

Para que nossos filhos sejam como plantas crescidas na sua


mocidade; para que as nossas filhas sejam como pedras de esquina
lavradas à moda de palácio;

Essa frase do salmista evoca uma das mais belas imagens escriturísticas
em relação aos filhos. Todos queremos que nossos filhos sejam o melhor que
podem ser e queremos que sejam melhores do que fomos. Os pais esperam
que seus filhos estejam protegidos, que sejam puros, fortes e justos. Seria
estranho que um pai não desejasse que seu filho fosse bom, honesto e
responsável, que não quisesse que seu filho fosse um cidadão que contribui
para edificar a família, a Igreja e a nação.
Boa parte da tradição hebraica das escrituras trata dos filhos e dos
princípios do sacerdócio. Contudo, frequentemente esquecemo-nos de
reconhecer as coisas belas e fascinantes que são ditas sobre as mulheres —
sejam mães, filhas ou irmãs. O que poderia ser mais inspirador do que a
imagem de nossas filhas como pedras de esquina de um palácio, ou mesmo
de um templo — assim como Cristo, que é “a principal pedra da esquina” da
Igreja e de nossa vida.199
Deus não tem preferidos. Ele não ama Seus filhos mais do que Suas
filhas; na verdade, com muita frequência, Suas filhas dão o exemplo e
estabelecem o padrão — tão necessário — para Seus filhos. As mulheres já
provaram ser a salvação de muitos homens. Em nossa vida, elas
verdadeiramente são sólidas pedras fundamentais — preciosas joias de fé e
fidelidade, que tornam nossa vida, nosso lar, nossa igreja e comunidades mais
puras e brilhantes. Elas são “à moda de palácio”, e damos graças aos céus
pela piedade que há nelas.

Nota
^199. Efésios 2:20.
Seção II O Messias
Salmos 145:14; 146:8

O Senhor sustenta a todos os que caem, e levanta a todos os


abatidos.

_______________

O Senhor abre os olhos aos cegos; o Senhor levanta os abatidos; o


Senhor ama os justos;

Como conclusão desta coletânea bastante eclética e pessoal dos salmos,


talvez não haja promessa mais adequada para “tempos de angústia” do que
essa. Começamos com a certeza de que Deus é por nós. Encerramos com a
confirmação de que Ele quer e vai levantar “a todos os abatidos ”— e, em um
momento ou outro, todos nos sentiremos abatidos. Se estivermos abatidos por
causa de preocupações, angústias ou tribulações, podemos ser erguidos. Se
estivermos espiritualmente cegos, surdos, coxos ou mesmo mortos, Deus
pode curar todas essas imperfeições e restaurar nossa força e nosso alicerce.
Se qualquer um de nós cair, podemos ser levantados.
Não há maior certeza nas escrituras (e nos salmos) do que esta: que
Deus não vacilará nem falhará para conosco; que Ele não dorme nem cochila;
que quando estamos cansados e não conseguimos mais correr, Ele nos
erguerá como que com asas de águia. O propósito deste livro é mostrar esse
amor divino por nós, essa brilhante luz de Deus que ilumina os cantos
escuros de nossa vida. Mas essa tentativa de alcançar aqueles que estão em
trevas ou que passam por dificuldades não seria completa (nem responsável)
se não concluísse com o entendimento de que nunca deveríamos optar pelas
trevas, de que nunca deveríamos mergulhar no desespero, de que não
deveríamos cultivar o hábito de flertar com problemas ou procurar por eles,
mesmo que não tenhamos tido nenhuma dificuldade recente.
O Pai, o Filho e o Espírito Santo sempre estão prontos para “[sustentar]
a todos os que caem”, mas nunca deveríamos cair intencionalmente, assim
como não deveríamos ficar caídos esperando que a graça de Deus junte os
nossos cacos. Em suma, em todas as provações de nossa vida, precisamos nos
esforçar para ser justos. Talvez nunca estejamos livres da dor. Com certeza
nunca estaremos livres de problemas. Nem sempre teremos dias brilhantes e
ensolarados. Às vezes o dinheiro, os talentos e as oportunidades estarão em
falta; às vezes nosso pavio estará curto. Os salmos nos relembram que, na
maior parte do tempo, estaremos cercados por problemas, com dores de
cabeça e corações partidos em todas as direções.
Porém, com tudo isso, podemos ser justos! Enquanto esperamos por
auxílio, podemos ajudar a nós mesmos. Enquanto nos debatemos com um
problema, podemos procurar uma oportunidade de socorrer alguém que
também esteja enfrentando dificuldades, talvez maiores que as nossas.
Sabemos que não há como fugir dos problemas, mas devemos fazer tudo a
nosso alcance para fugir do pecado. Os céus merecem pelo menos isso de
nós, como forma de gratidão por termos sido levantados quando estávamos
abatidos, por termos sido sustentados quando caímos. “O Senhor ama os
justos”; e nenhuma dificuldade na vida deveria impedir que nos
qualifiquemos para essa nomeação.
Salmos Messiânicos

Talvez Jesus tenha citado os Salmos mais do que qualquer outro livro do
Velho Testamento porque encontrou neles um claro registro de Seus
ensinamentos, Sua missão e Sua majestade. Sendo assim, Ele certamente
mostrou a preeminência deste belo livro sobre todos os textos mais antigos
que testificavam de Sua divindade. De certo modo, tudo no Velho
Testamento, como a lei de Moisés, “serviu de aio, para nos conduzir a
Cristo”, como disse o Apóstolo Paulo.200 Contudo, a despeito dos
ensinamentos fundamentais sobre o Messias encontrados nos outros livros
desse antigo registro — em alguns mais do que em outros — os salmos se
destacam. No que diz respeito à metáfora de Paulo, essas declarações
poéticas parecem nos levar direto para a compreensão da natureza
misericordiosa e da compaixão do Salvador do mundo.
Ainda que não seja literalmente assim, temos a impressão de que quase
todos os “150 capítulos” fazem referência à vida e à missão do Filho de Deus
ou têm uma aplicação ou significado nela. Lucas afirma que, quando Jesus
ressurreto uniu-Se aos dois irmãos na estrada para Emaús, Ele começou “por
Moisés, e por todos os profetas” e “explicava-lhes o que dele se achava em
todas as Escrituras”.201 Sabemos, como Ele mesmo afirmou, que os salmos
estavam entre os principais textos aos quais Ele faria menção nessa ocasião,
pois já os havia usado em outras circunstâncias. Quando apareceu aos
apóstolos pouco antes de ascender aos céus, Jesus “disse-lhes: São estas as
palavras que vos disse estando ainda convosco: Que convinha que se
cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de Moisés, e nos profetas e
nos Salmos. Então abriu-lhes o entendimento para compreenderem as
Escrituras”.202
Talvez seja suficiente fazer alusão a alguns dos salmos messiânicos mais
óbvios, com o intuito de convidar o leitor a procurar e ponderar sobre os
muitos outros onde se encontram referências, analogias e símbolos da vida,
da missão e da mensagem de Jesus Cristo.
Notas
^200. Gálatas 3:24.
^201. Lucas 24:27.
^202. Lucas 24:44–45; grifo do autor.
Salmos 2

Por que se amotinam os gentios, e os povos imaginam coisas vãs?

Os reis da terra se levantam e os governos consultam juntamente


contra o Senhor e contra o seu ungido ( … )

Eu, porém, ungi o meu Rei sobre o meu santo monte de Sião.

Proclamarei o decreto: o Senhor me disse: Tu és meu Filho, eu


hoje te gerei. ( . . .

) Agora, pois, ó reis, sede prudentes; deixai-vos instruir, juízes da


terra.

Servi ao Senhor com temor, e alegrai-vos com tremor.

Beijai o Filho, para que se não ire, e pereçais no caminho, quando


em breve se acender a sua ira; bem-aventurados todos aqueles que nele
confiam.

Este é o primeiro salmo messiânico dentre os muitos que aparecem na


coletânea do Velho Testamento. Em conjunto com o Salmo 1, que já foi
debatido neste livro, o Salmo 2 é, em geral, considerado uma introdução para
os salmos seguintes.203 Obviamente, é significativo o fato de que a
introdução a essas súplicas também inclua a noção do Messias, tanto quanto
os demais salmos que tratam desse tema.
No que diz respeito às angústias que enfrentamos na vida — que são o
tema deste livro — vale a pena notar que o primeiro versículo deste salmo
apresenta problema para Deus e a Seu Filho. Os gentios (que poderiam ser
definidos como todos os que não têm fé) “se amotinam”, e os povos (um
termo amplo o suficiente para englobar quase todo mundo) “imaginam coisas
vãs”. Logo nos salmos iniciais aprendemos que não somos os únicos a ter
angústias, mas que os membros da Deidade e os anjos que os assistem têm
seus próprios problemas: nós! Tudo no Universo parece obedecer à ordem
das coisas, exceto nós, os filhos de Deus — a família nascida espiritualmente
Dele e destinada a se tornar como Ele na eternidade, se tão somente não nos
amotinarmos contra Seu plano e não imaginarmos coisas vãs que nos
distraem.
Observe que a palavra vão tem pelo menos dois significados nas
escrituras, e ambos são aplicáveis aqui — “vão” pode significar egoísta,
presunçoso e excessivamente orgulhoso, assim como ineficaz, fútil e mal
sucedido. Os dois significados são aplicáveis aos “gentios” e aos “povos” que
não abraçam o evangelho de Jesus Cristo, que “consultam juntamente contra
o Senhor [o Pai] e contra o seu ungido [o Filho]”. À medida que Cristo Se
aproximava do Getsêmani e do Calvário, Seus inimigos — os príncipes e
anciãos de Seus dias, como eram constituídos — “consultaram entre si como
o surpreenderiam nalguma palavra”,204 “formavam juntamente conselho
contra Jesus, para o matarem”205 e, no final, “tendo deliberado em conselho,
compraram com [as moedas de Judas] o campo de um oleiro, para sepultura
dos estrangeiros”.206 Como foi “vã” —presunçosa e fútil — tal rebelião que
tentou barrar a salvação do Todo-Poderoso. Sabendo que tudo isso
aconteceria, ainda assim Deus, o Pai de todos nós, colocou Seu Filho
Unigênito, o Rei de todos nós, sobre o trono de Sião e declarou Sua
divindade a todo o mundo. “Meu filho és tu, hoje te gerei”. Citou o Apóstolo
Paulo diante dos principais da sinagoga em Antioquia, declarando que esse
“Filho” era Jesus Cristo e não Davi, como muitos Israelitas acreditavam e
ensinavam.207
Essas são declarações simples e diretas da verdade. É assim que as
coisas são. Mesmo que nos amotinássemos ou insistíssemos para que fossem
de outra maneira, mas não são. Deus tem um plano para nossa exaltação e
Seu Filho Unigênito está no cerne dele. Portanto, em vez de rebelião e
vaidade, amotinação e presunção, somos chamados a demonstrar sabedoria e
humildade, entendimento e obediência. “Agora, pois, ó reis, sede prudentes;
deixai-vos instruir, juízes da terra. Servi ao Senhor com temor, e alegrai-vos
com tremor. Beijai o Filho [como forma de lealdade, da mesma forma que se
beija o emblema de um rei] ( . . . ) Bem-aventurados todos aqueles que nele
confiam”.

Notas
^203. No mesmo sentido, os salmos a partir do 146 até o 150 são
tradicionalmente vistos como a conclusão da coletânea de salmos.
^204. Mateus 22:15.
^205. Mateus 27:1.
^206. Mateus 27:7.
^207. Ver Atos 13:33.
Salmos 8

Ó Senhor, Senhor nosso, quão admirável é o teu nome em toda a


terra, pois puseste a tua glória sobre os céus!

Tu ordenaste força da boca das crianças e dos que mamam, por


causa dos teus inimigos, para fazer calar ao inimigo e ao vingador.

Quando vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas
que preparaste;

Que é o homem mortal para que te lembres dele? e o filho do


homem, para que o visites?

Pois pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de honra


o coroaste.

Fazes com que ele tenha domínio sobre as obras das tuas mãos;
tudo puseste debaixo de seus pés:

Todas as ovelhas e bois, assim como os animais do campo,

As aves dos céus, e os peixes do mar, e tudo o que passa pelas


veredas dos mares.

Ó Senhor, Senhor nosso, quão admirável é o teu nome sobre toda a


terra!
Como vimos anteriormente, este é um salmo muito querido e conhecido,
que está entre os mais citados das escrituras canonizadas. Ele mostra a
dignidade e a divindade dos “[filhos e filhas] do homem” — você e eu,
mortais seres humanos — que “pouco menor [fomos feitos] do que os anjos”
e têm um lugar proeminente na criação do cosmos (veja, na página (49) uma
explicação sobre o uso da palavra “Eloim” em hebraico, no lugar de “anjos”).
Essa é, claramente, a intenção deste salmo, que exprime tanto o temor quanto
a gratidão do salmista ao pensar que Alguém tão glorioso pudesse
compartilhar uma porção significativa dessa glória com meros mortais. Todos
nós já adquirimos coragem ao pensar que, como Sua mais importante criação,
estamos numa posição muito favorável diante de Deus. Jesus citou o segundo
versículo deste salmo para indicar que as crianças que clamavam louvores a
Ele no templo também eram inspiradas e estavam em posição semelhante à
dos anjos, mesmo os “meninos e [as] criancinhas de peito”.208
Mas assim como acontece com muitos outros salmos (e com outras
escrituras também), esta passagem pode ser elevada a outro nível de
compreensão, sem perder o sentido primário visto acima, tornando-se um
salmo sobre o Messias.
Sendo um salmo direcionado ao “Senhor, Senhor nosso”, o salmista
focaliza um ser divino desde o princípio: Deus, o Pai, a Quem as orações são
dirigidas. O Pai também é chamado de “Homem de Santidade”.209 Tendo
esse título em mente, fica fácil ecoar a referência ao “filho do homem”. É
verdade que essa expressão não está com iniciais maiúsculas, e há muitas
escrituras que utilizam “filho do homem” em minúsculas para se referir à
humanidade, aos filhos e filhas mortais da família humana. Ainda assim, a
expressão “filho do homem”, com ou sem maiúsculas, inegavelmente sugere
algo de divino, pelo fato de Jesus tê-la aplicado tão frequentemente a Si
mesmo. Não é de se admirar que façamos essa associação mental, tendo em
vista que os autores dos quatro Evangelhos do Novo Testamento aplicam o
título “Filho do homem” a Jesus nada menos que oitenta e quatro vezes!
Como tal, esse deveria ser considerado o título mais comum nas escrituras,
aplicado a Jesus e Sua missão.
Com essa segunda leitura deste salmo, o que aprendemos antes — o
louvor de um homem ou mulher comum — agora se tornam o louvor do
Filho do Homem. É Jesus que “pouco menor [foi feito] do que os anjos
[Eloim]” na mortalidade, e que será coroado “de glória e de honra” à direita
de Seu Pai, quando Sua triunfante missão tiver sido completada. Por fim, é a
Cristo que o Pai concedeu “domínio sobre as obras das [Suas] mãos”. Cristo
é o único de quem se pode verdadeiramente dizer que todas as coisas foram
colocadas “debaixo de seus pés”. Ele é o único mestre do mar, da terra e do
céu, sem mencionar as bestas do campo, as aves do ar e os peixes das águas
na grande expansão da criação. O Apóstolo Paulo aplica este salmo direta e
explicitamente a Jesus, tanto na primeira epístola aos Coríntios quando na
epístola aos Hebreus.210
É inspirador e animador ler sobre a posição exaltada de Cristo diante de
Deus na grande ordem da criação, e então percebermos que nós — homens e
mulheres comuns, com todos os tipos de falhas e imperfeições — fazemos
parte dessa grande ordem, de uma maneira que nossa divindade também se
destaca! Essa leitura do Salmo 8 também amplia o significado da declaração
do Apóstolo Paulo aos Romanos:
“O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de
Deus. E, se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de
Deus e coerdeiros de Cristo: se é certo que com ele padecemos, para que
também com ele sejamos glorificados”.211

Notas
^208. Mateus 21:16.
^209. Moisés 7:35.
^210. Ver I Coríntios 15:27; Hebreus 2:6–8.
^211. Romanos 8:16–17; grifo do autor.
Salmos 16

Guarda-me, ó Deus, porque em ti confio.

A minha alma disse ao Senhor: Tu és o meu Senhor ( . . .

) O Senhor é a porção da minha herança e do meu cálice; tu


sustentas a minha sorte.

As linhas caem-me em lugares deliciosos: sim, coube-me uma


formosa herança.

Louvarei ao Senhor que me aconselhou; até os meus rins me


ensinam de noite.

Tenho posto o Senhor continuamente diante de mim; por isso que


ele está à minha mão direita, nunca vacilarei.

Portanto está alegre o meu coração e se regozija a minha glória;


também a minha carne repousará segura.

Pois não deixarás a minha alma no inferno, nem permitirás que o


teu Santo veja corrupção.

Far-me-ás ver a vereda da vida; na tua presença há fartura de


alegrias; à tua mão direita há delícias perpetuamente.
Este é, às vezes, chamado de Salmo Dourado ou Salmo do Segredo
Precioso. Com a perspectiva tanto da história quanto do registro do
evangelho, aprendemos que a resposta para o “segredo” da inevitabilidade da
morte e das garras do inferno repousa na redenção do Senhor Jesus Cristo.
Dentre os primeiros apóstolos, tanto Pedro quanto Paulo reconheciam essa
interpretação aplicada a Cristo e, por meio Dele, a toda a humanidade, a
respeito do possível medo que Davi sentia pela própria morte e destruição.
No primeiro e majestoso dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo
derramou dons grandiosos sobre a Igreja, Pedro citou este salmo, enfatizando
particularmente os versículos de 8 a 10. Ele usou essa passagem para
testificar da Ressurreição de Cristo. Vale a pena transcrever pelo menos uma
parte do testemunho apaixonado de Pedro. Os trechos do Salmo 16 citados
por ele estão em itálico para facilitar a localização, mas a passagem inteira,
conforme registrada em Atos 2 é essencial para a declaração dessa
testemunha ocular da Ressurreição:
“Homens israelitas, escutai estas palavras: A Jesus Nazareno, homem
aprovado por Deus entre vós com maravilhas, prodígios e sinais, que Deus
por ele fez no meio de vós, como vós mesmos bem sabeis;
A este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de
Deus, prendestes, crucificastes e matastes pelas mãos de injustos;
Ao qual Deus ressuscitou, soltas as ânsias da morte, pois não era
possível que fosse retido por ela;
Porque dele disse Davi: Sempre via diante de mim o Senhor, Porque está
à minha direita, para que eu não seja comovido;
Por isso se alegrou o meu coração, e a minha língua exultou; E ainda a
minha carne há de repousar em esperança;
Pois não deixarás a minha alma no inferno, Nem permitirás que o teu
Santo veja a corrupção; ( . . .
) Homens irmãos, seja-me lícito dizer-vos livremente acerca do patriarca
Davi, que ele morreu e foi sepultado, e entre nós está até hoje a sua sepultura.
Sendo, pois, ele profeta, e sabendo que Deus lhe havia prometido com
juramento que do fruto de seus lombos, segundo a carne, levantaria o Cristo,
para o assentar sobre o seu trono,
Nesta previsão, disse da ressurreição de Cristo, que a sua alma não foi
deixada no inferno, nem a sua carne viu a corrupção.
Deus ressuscitou a este Jesus, do que todos nós somos testemunhas”.212
Posteriormente, no livro de Atos, o Apóstolo Paulo cita tanto o Salmo 2
quanto o Salmo 16, ao testificar da Ressurreição de Cristo. Novamente, as
citações dos salmos estão em itálico.
“E nós vos anunciamos que a promessa que foi feita aos pais,
Deus a cumpriu a nós, seus filhos, ressuscitando a Jesus; Como também
está escrito no salmo segundo: Meu filho és tu, hoje te gerei.
E que o ressuscitaria dentre os mortos, para nunca mais tornar à
corrupção, disse-o assim: As santas e fiéis bênçãos de Davi vos darei.
Por isso também em outro salmo diz: Não permitirás que o teu santo
veja corrupção.
Porque, na verdade, tendo Davi no seu tempo servido conforme a
vontade de Deus, dormiu, foi posto junto de seus pais e viu a corrupção.
Mas aquele a quem Deus ressuscitou nenhuma corrupção viu”.213
Obviamente, os primeiros apóstolos, sem mencionarmos o próprio Davi,
viam a Ressurreição de Jesus não apenas como a grande característica que
distinguia o ministério de Jesus, mas também como a esperança que cada um
de nós tem de que seremos preservados por nossa confiança na graça de
Deus.214 É no Pai e no Filho que temos nossa porção e somos sustentados.215
Neles temos uma formosa herança e Deles recebemos conselhos.216 Por essa
razão, temos sempre diante de nós a imagem da divindade. Por termos
sempre conosco a força de Deus, nunca vacilaremos.217 Por essa certeza,
nosso coração se regozija e nossa “carne repousará segura”.218 A promessa
da Ressurreição e a salvação que ela simboliza trazem plenitude de alegria;
Cristo assenta-Se à mão direita de Deus219 e Nele “há delícias
perpetuamente”.220

Notas
^212. Atos 2:22–27, 29–32; grifo do autor.
^213. Atos 13:32–37; grifo do autor.
^214. Ver Salmos 16:1.
^215. Ver Salmos 16:5.
^216. Ver Salmos 16:6–7.
^217. Ver Salmos 16:8.
^218. Salmos 16:9.
^219. Ver Atos 2:34.
^220. Salmos 16:11.
Salmos 21

O rei se alegra em tua força, Senhor; e na tua salvação


grandemente se regozija.

Cumpriste-lhe o desejo do seu coração, e não negaste as súplicas


dos seus lábios. ( . . .

) Pois vais ao seu encontro com as bênçãos de bondade; pões na


sua cabeça uma coroa de ouro fino.

Vida te pediu, e lha deste, mesmo longura de dias para sempre e


eternamente.

Grande é a sua glória pela tua salvação; glória e majestade


puseste sobre ele.

Pois o abençoaste para sempre; tu o enches de gozo com a tua


face.

Porque o rei confia no Senhor, e pela misericórdia do Altíssimo


nunca vacilará.

Neste salmo, assim como em muitos outros, a imagem do rei é utilizada


para associar o governo de Davi com o de Cristo, o Rei dos reis. Por mais
bênçãos do céu que um governante mortal possa ter, é a Jesus que o Pai dará
“o desejo do seu coração”, sem negar “as súplicas dos seus lábios”. É Jesus
quem personifica “as bênçãos de bondade” e sobre Sua cabeça seria posta
figurativamente, no fim de Sua missão mortal, “uma coroa de ouro fino”. É
sobre Jesus que “glória” e “majestade” foram postas. Com certeza, é Jesus
que foi “[abençoado] para sempre” e, em Sua devoção e sinceridade, Ele
“nunca vacilará” nas verdades que incorpora e no testemunho que prestou do
Pai.
Salmos 45

Tu és mais formoso do que os filhos dos homens; a graça se


derramou em teus lábios; por isso Deus te abençoou para sempre.

Cinge a tua espada à coxa, ó valente, com a tua glória e a tua


majestade.

E neste teu esplendor cavalga prosperamente, por causa da


verdade, da mansidão e da justiça; ( . . .

) O teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do teu reino é


um cetro de equidade.

Tu amas a justiça e odeias a impiedade; por isso Deus, o teu Deus,


te ungiu com óleo de alegria mais do que a teus companheiros.

Todas as tuas vestes cheiram a mirra e aloés e cássia, desde os


palácios de marfim de onde te alegram.

Aqui o Messias é descrito como “mais formoso do que os filhos dos


homens”. As referências a “graça”, “glória”, “majestade”, “verdade”,
“mansidão” e “justiça” evocam as qualidades do Salvador do mundo. Além
disso, a linguagem doutrinária como a que aparece nos versículos 6 e 7 — “O
teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do teu reino é um cetro de
equidade” e “Tu amas a justiça” — faz eco à linguagem inspirada usada pelo
Profeta Joseph Smith nas profundezas da Cadeia de Liberty, onde observou
“que os direitos do sacerdócio são inseparavelmente ligados com os poderes
do céu e que os poderes do céu não podem ser controlados nem exercidos a
não ser de acordo com os princípios da retidão”. Então, se compreendermos
esse princípio e vivermos à altura dessa promessa, “o Espírito Santo será teu
companheiro constante, e teu cetro, um cetro imutável de retidão e verdade; e
teu domínio será um domínio eterno e, sem ser compelido, fluirá para ti
eternamente”.221
Paulo, em sua notável epístola aos Hebreus, faz essa correspondência
por meio de um longo e vigoroso testemunho de Jesus Cristo, no qual cita,
dentre outras escrituras, este salmo — especificamente os versículos 6 e 7, já
transcritos aqui, adicionando a menção de que Cristo foi ungido “com óleo de
alegria”.222
Em meio a nossas lutas e quando nos sentimos humilhados, como é
encorajador, como nos traz esperança o conhecimento de que nos
“alegraremos” novamente. O santo sacerdócio traz consigo maravilhosas
promessas do convênio. O Espírito Santo sela esses compromissos em seu
papel de Santo Espírito da Promessa. Todas essas promessas servem para
tornar os dons do evangelho plenamente eficazes — e operantes — em nossa
vida. “Os homens existem para que tenham alegria”.223
Que maravilhoso é pensar que no final poderemos ser ungidos junto com
Cristo, “com óleo de alegria”, quase como se fosse por meio de uma
ordenança do sacerdócio, para sermos verdadeiramente felizes para todo o
sempre.

Notas
^221. Doutrina e Convênios 121:36, 46.
^222. Hebreus 1:9.
^223. 2 Néfi 2:25.
Salmos 68

Mas alegrem-se os justos, e se regozijem na presença de Deus, e


folguem de alegria.

Cantai a Deus, cantai louvores ao seu nome; louvai aquele que vai
montado sobre os céus, pois o seu nome é Senhor, e exultai diante dele.

Pai de órfãos e juiz de viúvas é Deus, no seu lugar santo.

Deus faz que o solitário viva em família; liberta aqueles que estão
presos em grilhões; mas os rebeldes habitam em terra seca.

Ó Deus, quando saías diante do teu povo, quando caminhavas pelo


deserto, ( . . .

) A terra abalava-se, e os céus destilavam perante a face de Deus;


até o próprio Sinai foi comovido na presença de Deus, do Deus de
Israel.

Tu, ó Deus, mandaste a chuva em abundância, confortaste a tua


herança, quando estava cansada.

Nela habitava o teu rebanho; tu, ó Deus, fizeste provisão da tua


bondade para o pobre.

O Senhor deu a palavra; grande era o exército dos que


anunciavam as boas novas. ( . . .

) Os carros de Deus são vinte milhares, milhares de milhares. O


Senhor está entre eles, como em Sinai, no lugar santo.

Tu subiste ao alto, levaste cativo o cativeiro, recebeste dons para


os homens, e até para os rebeldes, para que o Senhor Deus habitasse
entre eles.

Bendito seja o Senhor, que de dia em dia nos carrega de


benefícios; o Deus que é a nossa salvação. ( . . .

) O nosso Deus é o Deus da salvação; e a Deus, o Senhor,


pertencem os livramentos da morte. ( . . .

) Reinos da terra, cantai a Deus, cantai louvores ao Senhor. ( … )

Àquele que vai montado sobre os céus dos céus, que existiam desde
a antiguidade; eis que envia a sua voz, dá um brado veemente.

Atribuí a Deus fortaleza; a sua excelência está sobre Israel e a sua


fortaleza nas mais altas nuvens.

Ó Deus, tu és tremendo desde os teus santuários; o Deus de Israel


é o que dá força e poder ao seu povo. Bendito seja Deus!

Este é um salmo messiânico particularmente específico em que o


versículo 4 refere-se a “JAH”, uma variação do mais comum “yhwh” na
literatura judaica. Essas são apenas duas dentre as várias abreviações do
nome de Deus — tradicionalmente “Jeová” ou a transliteração “Yahweh”—
sendo que a escrita ou pronúncia completa dessa palavra era proibida aos
filhos de Israel. (A regra básica dizia que bastava retirar as vogais e deixar
consoantes o suficiente para que o leitor pudesse identificar de quem se
estava falando.) Obviamente, este é Jesus Cristo pré-mortal, o Deus que
livrou a antiga Israel do cativeiro no Egito e o “Senhor” a quem são
direcionadas muitas das orações em que o salmista suplica por libertação
pessoal ou política. Nesse sentido, contudo, é importante observar que o
salmista frequentemente apela a Eloim. A palavra “Deus” usada em Gênesis
1:1 — “No princípio criou Deus os céus e a terra”, é um substantivo plural
que faz referência aos “Deuses” e, na tradição dos santos dos últimos dias,
refere-se a Deus, o Pai. Assim, a o relacionamento singularmente uno entre o
Pai e o Filho fica evidente nos Salmos e em todo o Velho Testamento.224
Neste salmo, o “Senhor” é o “pai de órfãos e juiz de viúvas”, um Deus
que fez “provisão da [Sua] bondade para o pobre”. Tais expressões, é claro,
destacam elementos que se tornariam incontestáveis nos ensinamentos de
Jesus, quando ministrou na mortalidade. Ao ler uma passagem como essa, é
quase impossível não pensar imediatamente na sucinta definição que Tiago
deu sobre a mensagem de Cristo: “A religião pura e imaculada para com
Deus, o Pai, é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e
guardar-se da corrupção do mundo”.225
Obviamente, da mesma forma que “até o próprio Sinai foi comovido na
presença de Deus, do Deus de Israel” (Jeová), a morte e o inferno também
serão “comovidos” pela presença e pelo poder desse mesmo Deus, Aquele
que “[levará] cativo o cativeiro”. Paulo cita essa passagem em sua epístola
aos Efésios, reafirmando aos leitores (assim como o Profeta Joseph Smith fez
na Cadeia de Liberty) que Cristo iria “[subir] ao alto”, pois havia pagado o
preço para “[descer] às partes mais baixas da terra”.226 Verdadeiramente, “o
nosso Deus é o Deus da salvação; e a Deus, o Senhor, pertencem os
livramentos da morte. ( . . . ) Deus de Israel é o que dá força e poder ao seu
povo. Bendito seja Deus!”

Notas
^224. Um debate útil sobre os nomes de “Deus” nos salmos (de maneira
específica) e no Velho Testamento (de forma geral) pode ser
encontrado em Richard P. Belcher, Jr., The Messiah and Psalms,
2006, principalmente nas páginas 8 e 159.
^225. Tiago 1:27.
^226. Efésios 4:8–9; ver também Doutrina e Convênios 122:8–9.
Salmos 72

Ó Deus, dá ao rei os teus juízos, e a tua justiça ao filho do rei.

Ele julgará ao teu povo com justiça, e aos teus pobres com juízo.
(...

) Julgará os aflitos do povo, salvará os filhos do necessitado, e


quebrantará o opressor. ( . . .

) Nos seus dias florescerá o justo, e abundância de paz haverá


enquanto durar a lua.

Dominará de mar a mar, e desde o rio até às extremidades da


terra.

Aqueles que habitam no deserto se inclinarão ante ele, e os seus


inimigos lamberão o pó. ( . . .

) E todos os reis se prostrarão perante ele; todas as nações o


servirão.

Porque ele livrará ao necessitado quando clamar, como também


ao aflito e ao que não tem quem o ajude.

Compadecer-se-á do pobre e do aflito, e salvará as almas dos


necessitados.
Libertará as suas almas do engano e da violência, e precioso será
o seu sangue aos olhos dele. ( . . .

) O seu nome permanecerá eternamente; o seu nome se irá


propagando de pais a filhos enquanto o sol durar, e os homens serão
abençoados nele; todas as nações lhe chamarão bem-aventurado.

Bendito seja o Senhor Deus, o Deus de Israel, que só Ele faz


maravilhas.

E bendito seja para sempre o seu nome glorioso; e encha-se toda a


terra da sua glória. Amém e Amém.

Este salmo ocupa um lugar de preeminência, ao lado apenas de uns


poucos outros, por pelo menos duas razões: Primeiramente, porque é um dos
poucos salmos que, de fato, temos certeza de que foi escrito por Davi; em
segundo lugar, porque demonstra como a adoração e a súplica a um rei
terreno — neste caso, Salomão, filho de Davi — transforma-o em um
símbolo ou prefiguração de Cristo, o Rei Celestial. Muitos salmos se
encaixam na categoria dos que se aplicam tanto a seres mortais, que vivem as
circunstâncias imediatas, quanto a seres celestiais, que habitam na eternidade;
porém, nenhum mostra tão claramente essa mudança de tom literário e
teológico quanto o Salmo 72.
Perceba como o primeiro versículo apresenta esse significado duplo em
poucas palavras. Ele é claramente um apelo a Deus, por parte do “rei” (Davi)
em favor do “filho do rei” (Salomão), mas facilmente somos levados a vê-lo
como uma tipologia, tendo Deus como o “rei” e Jesus como o “filho do rei”,
especialmente quando a palavra “juízos” é associada ao primeiro, enquanto
“justiça” é associada com o último — caracterizações bíblicas tradicionais a
respeito do Pai e do Filho.
Com essa introdução tão bem alicerçada, é quase impossível não ver
Cristo simbolizado nas descrições que se seguem a respeito de Salomão: Ele
julgará a todos com “justiça”, mas dará especial atenção aos “aflitos” e aos
“necessitados”. Sob Seu reinado, “florescerá o justo” e haverá “abundância
de paz” eternamente (“enquanto durar a lua”). Seu domínio será global e Seu
governo, universal, “de mar a mar, e desde o rio até às extremidades da
terra”. Mais uma vez, faz-se especial menção aos aflitos: “Porque ele livrará
ao necessitado quando clamar, como também ao aflito e ao que não tem
quem o ajude”. E Sua libertação será tanto espiritual como temporal.
Compadecendo-se dos pobres em suas dificuldades financeiras, Ele também
“salvará as almas dos necessitados” e os redimirá do engano e da violência,
duas das mazelas que frequentemente acompanham a pobreza. “Precioso será
o seu sangue aos olhos dele”.
Nos versículos finais, o salmo parece mudar completamente o foco,
deslocando-se inteiramente do rei terreno para o Rei Celestial. O simbolismo
de Cristo e Seu reino milenar é intencional:

O seu nome permanecerá eternamente; o seu nome se irá


propagando de pais a filhos enquanto o sol durar, e os homens serão
abençoados nele; todas as nações lhe chamarão bem-aventurado.

Bendito seja o Senhor Deus, o Deus de Israel, que só Ele faz


maravilhas.

E bendito seja para sempre o seu nome glorioso; e encha-se toda a


terra da sua glória. Amém e Amém.

Alguns estudiosos acreditam — e o texto parece indicar isso — que este


talvez seja o último salmo canonizado de Davi.227 Independente disso,
certamente podemos afirmar que este é um de seus maiores salmos
messiânicos e, nesse sentido, serviria muito bem como um discurso de
despedida tratando do Filho de Deus, que um dia viria com o título adicional
de Filho de Davi.228

Notas
^227. Ver Salmos 72:20.
^228. Ver Mateus 1:1.
Salmos 89

Ó Senhor Deus dos Exércitos, quem é poderoso como tu, Senhor,


com a tua fidelidade ao redor de ti?

Tu dominas o ímpeto do mar; quando as suas ondas se levantam, tu


as fazes aquietar. ( . . .

) Teus são os céus, e tua é a terra; o mundo e a sua plenitude tu os


fundaste. ( . . .

) Tu tens um braço poderoso; forte é a tua mão, e alta está a tua


destra.

Justiça e juízo são a base do teu trono; misericórdia e verdade irão


adiante do teu rosto.

Bem-aventurado o povo que conhece o som alegre; andará, ó


Senhor, na luz da tua face.

Em teu nome se alegrará todo o dia, e na tua justiça se exaltará.


(...

) Porque o Senhor é a nossa defesa, e o Santo de Israel o nosso


Rei. ( . . .

) Ele me chamará, dizendo: Tu és meu pai, meu Deus, e a rocha da


minha salvação.

Também o farei meu primogênito mais elevado do que os reis da


terra. ( . . .

) E conservarei para sempre a sua semente, e o seu trono como os


dias do céu. ( . . .

) A sua semente durará para sempre, e o seu trono, como o sol


diante de mim.

Será estabelecido para sempre como a lua e como uma testemunha


fiel no céu.

De forma semelhante ao recém mencionado Salmo 72, este salmo utiliza


uma linguagem que se aplica tanto a um líder mortal (Davi) quanto a seu
Deus, o que dá a essa oração um sentido adicional no que diz respeito ao
Messias, que posteriormente viria como um ser mortal e também divino.
Observem, por exemplo a referência feita no versículo 9: “Tu dominas o
ímpeto do mar; quando as suas ondas se levantam, tu as fazes aquietar”. Ou
nos versículos 26–27: “Ele me chamará, dizendo: Tu és meu pai, meu Deus, e
a rocha da minha salvação. Também o farei meu primogênito mais elevado
do que os reis da terra”. Ou nos versículos 36–37: “O seu trono [durará]
como o sol diante de mim. Será estabelecido para sempre como a lua e como
uma testemunha fiel no céu”. Todas essas passagens têm um significado
referente a governantes mortais, mas também um significado especial
referente à vida e ao ministério de Jesus, assim como Seu reinado como Rei
dos reis e Senhor dos senhores.
Salmos 102

Mas tu, Senhor, permanecerás para sempre, a tua memória de


geração em geração.

Tu te levantarás e terás piedade de Sião; pois o tempo de te


compadeceres dela, o tempo determinado, já chegou. ( . . .

) Então os gentios temerão o nome do Senhor, e todos os reis da


terra a tua glória.

Quando o Senhor edificar a Sião, aparecerá na sua glória.

Ele atenderá à oração do desamparado, e não desprezará a sua


oração.

Isto se escreverá para a geração futura; e o povo que se criar


louvará ao Senhor.

Pois olhou desde o alto do seu santuário, desde os céus o Senhor


contemplou a terra,

Para ouvir o gemido dos presos, para soltar os sentenciados à


morte;

Para anunciarem o nome do Senhor em Sião, e o seu louvor em


Jerusalém ( … )
Desde a antiguidade fundaste a terra, e os céus são obra das tuas
mãos.

Eles perecerão, mas tu permanecerás; todos eles se envelhecerão


como um vestido; como roupa os mudarás, e ficarão mudados.

Porém tu és o mesmo, e os teus anos nunca terão fim.

Este salmo sugere uma época nos últimos dias ou no milênio, em que
chegará o dia em que o Senhor Se compadecerá de Sião e “todos os reis da
terra” reconhecerão o Único Rei Verdadeiro, Jesus Cristo, que “aparecerá na
sua glória”. Como sempre, o Rei estará particularmente preocupado com o
pobre e o “desamparado”. De uma maneira muito evidente, o versículo 20 —
que diz que esse Libertador “[ouvirá] o gemido dos presos” e “[soltará] os
sentenciados à morte” — faz eco à grandiosa passagem messiânica registrada
em Isaías (uma das mais belas do Velho Testamento), que começa assim: “O
Espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu, para
pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração,
a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos”.229
Esses versículos se revestem de seu maior significado — e foram
cumpridos — quando Jesus foi até Nazaré, Seu lar na infância, entrou na
sinagoga no sábado e citou essas palavras de Isaías 61, conforme registrado
em Lucas 4: “O Espírito do Senhor é sobre mim, Pois que me ungiu para
evangelizar os pobres. Enviou-me a curar os quebrantados do coração, a
pregar liberdade aos cativos, e restauração da vista aos cegos, a pôr em
liberdade os oprimidos”.
Com isso, sentou-Se, olhou para todos na sinagoga (que certamente
olhavam para Ele!) e disse-lhes: “Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos
ouvidos”.230
Obviamente, essa era uma declaração pública de que Jesus era o
Messias, afinal todos na sinagoga — e praticamente todas as pessoas,
segundo a cultura popular judaica — teriam reconhecido o versículo de Isaías
(e do salmista também?), que há muito entendia-se ser aplicável unicamente
ao Messias, quando viesse na carne. Cheios de ira, os ouvintes expulsaram
Jesus e o levaram ao cume do monte “para dali o precipitarem”. Porém, numa
escritura maravilhosamente simples, Lucas diz apenas que “Ele [Jesus],
porém, passando pelo meio deles, retirou-se”.231

Notas
^229. Isaías 61:1.
^230. Lucas 4:18, 21.
^231. Lucas 4:29–30.
Salmos 110

Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão direita, até


que ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés.

O Senhor enviará o cetro da tua fortaleza desde Sião, dizendo:


Domina no meio dos teus inimigos.

O teu povo será mui voluntário no dia do teu poder; nos


ornamentos de santidade, desde a madre da alva, tu tens o orvalho da
tua mocidade.

Jurou o Senhor, e não se arrependerá: tu és um sacerdote eterno,


segundo a ordem de Melquisedeque.

Como tantos outros salmos que fazem referência a um Senhor — o Pai


— falando a outro Senhor — o Filho —, esta passagem coloca Cristo à
tradicional “mão direita” do Pai,232 uma posição que permite a união do Pai e
do Filho de todas as formas espirituais possíveis, mas que destaca a separação
física de Seu corpo.
Este salmo também é significativo por ser um dos dois únicos lugares do
Velho Testamento em que o nome do grande Sumo Sacerdote Melquisedeque
é mencionado — a outra passagem sendo Gênesis 14:18–20, onde lemos que
Abraão deu “o dízimo de tudo” a Melquisedeque. Em sua epístola aos
Hebreus, o Apóstolo Paulo citou, não apenas uma, mas duas vezes, esses
versículos do Salmo 110,233 buscando enfatizar a divina autoridade de Cristo.
Essas quatro passagens são tudo o que restou na Bíblia a respeito desse
grande sumo sacerdote. Felizmente, os santos dos últimos dias sabem mais a
respeito de Melquisedeque, devido às referências presentes no décimo
terceiro capítulo de Alma, no Livro de Mórmon. Nesse outro “testamento de
Jesus Cristo”, fica claro que, no Velho Testamento, Melquisedeque
simbolizava o Cristo que viria na época do Novo Testamento. Observa-se que
Melquisedeque era “rei da terra de [Jeru]Salém”; que “governou subordinado
a seu pai”; que havia “recebido o ofício do sumo sacerdócio” na “santa ordem
de Deus”; que “pregou o arrependimento a seu povo”; que “estabeleceu paz”
e “foi portanto chamado de príncipe da paz” — características que até o leitor
mais casual associaria a Jesus, quando veio na mortalidade.234
Por Melquisedeque ter sido um sumo sacerdote tão grande — “houve
muitos antes dele e também houve muitos depois, mas nenhum foi maior”235
— seu nome foi honrado eternamente como o mais nobre substituto de que
dispomos para o nome do Filho de Deus, no que concerne ao santo
sacerdócio. A seção 107 de Doutrina e Convênios, uma das maiores
revelações já dadas a respeito do santo sacerdócio, inicia assim:
“Há, na igreja, dois sacerdócios, a saber: o de Melquisedeque e o
Aarônico, que inclui o Sacerdócio Levítico.
A razão de o primeiro chamar-se Sacerdócio de Melquisedeque é que
Melquisedeque foi um grande sumo sacerdote.
Antes de sua época chamava-se Santo Sacerdócio segundo a Ordem do
Filho de Deus.
Mas por respeito ou reverência ao nome do Ser Supremo, a fim de se
evitar a repetição frequente de seu nome, eles, a igreja na antiguidade, deram
a esse sacerdócio o nome de Melquisedeque, ou seja, Sacerdócio de
Melquisedeque.
Todas as outras autoridades ou ofícios da igreja são apêndices desse
sacerdócio”.236
Mais uma vez, os salmos contribuem para nosso importante e singular
entendimento sobre o Messias pré-mortal.

Notas
^232. Ver Mateus 26:64; Marcos 16:19; Atos 2:33; 7:55; e I Pedro 3:22,
apenas cinco das dezesseis ocasiões em que essa relação “à mão
direita” é mencionada nas escrituras.
^233. Ver Hebreus 5:6; 7:17.
^234. Ver Alma 13:14–19.
^235. Alma 13:19.
^236. Doutrina e Convênios 107:1–5; grifo original.
Salmos 118

Louvai ao Senhor, porque ele é bom, porque a sua benignidade


dura para sempre. ( . . .

) Invoquei o Senhor na angústia; o Senhor me ouviu, e me tirou


para um lugar largo.

O Senhor está comigo; não temerei o que me pode fazer o homem.

O Senhor está comigo entre aqueles que me ajudam. ( . . .

) É melhor confiar no Senhor do que confiar no homem.

É melhor confiar no Senhor do que confiar nos príncipes. ( . . .

) O Senhor é a minha força e o meu cântico; e se fez a minha


salvação. ( . . .

) A pedra que os edificadores rejeitaram tornou-se a cabeça da


esquina.

O último versículo deste salmo apresenta uma das mais vigorosas e


contundentes metáforas de Cristo em todas as escrituras — a de Jesus como
“a pedra” que foi rejeitada pelos Seus, mas que “tornou-se a cabeça da
esquina”.
Assim como fez com outros aspectos messiânicos, Isaías elevou essa
analogia ao majestoso reino da profecia quando escreveu:
“Porque assim o Senhor me disse ( . . .
) Santificai o Senhor dos Exércitos; e seja ele o vosso temor e seja ele o
vosso assombro.
Então ele vos será por santuário; mas servirá de pedra de tropeço, e
rocha de escândalo, às duas casas de Israel; por armadilha e laço aos
moradores de Jerusalém.
E muitos entre eles tropeçarão, e cairão, e serão quebrantados, e
enlaçados, e presos.
Liga o testemunho, sela a lei entre os meus discípulos. ( . . .
) Portanto assim diz o Senhor Deus: Eis que eu assentei em Sião uma
pedra, uma pedra já provada, pedra preciosa de esquina, que está bem firme e
fundada; aquele que crer não se apresse”.237
Paulo utiliza extensivamente essa metáfora em passagens como a de I
Coríntios 1:22–24:
“Porque os judeus pedem sinal, e os gregos buscam sabedoria;
Mas nós pregamos a Cristo crucificado, que é escândalo para os judeus,
e loucura para os gregos.
Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes
pregamos a Cristo, poder de Deus, e sabedoria de Deus”.
Observem também Efésios 2:19–22:
“Assim que já não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos
dos santos, e da família de Deus;
Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos profetas, de que
Jesus Cristo é a principal pedra da esquina;
No qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para templo santo no
Senhor.
No qual também vós juntamente sois edificados para morada de Deus
em Espírito”.
No entanto, nenhum apóstolo desenvolveu tão bem essa metáfora
escriturística quanto Pedro. Ele, que também era chamado de “pedra”,
conhecia em primeira mão a força de Cristo como a “pedra de esquina” da
Igreja. Quando Pedro e João foram levados à prisão, seus captores
questionaram-nos: “Com que poder ou em nome de quem fizestes isto?”
(“isto” dizia respeito à cura de um coxo no templo, entremeada por pregações
que trouxeram, respectivamente, três e cinco mil almas à fé!), ao que Pedro,
“cheio do Espírito Santo, lhes disse: Principais do povo, e vós, anciãos de
Israel,
Visto que hoje somos interrogados acerca do benefício feito a um
homem enfermo, e do modo como foi curado,
Seja conhecido de vós todos, e de todo o povo de Israel, que em nome
de Jesus Cristo, o Nazareno, aquele a quem vós crucificastes e a quem Deus
ressuscitou dentre os mortos, em nome desse é que este está são diante de
vós.
Ele é a pedra que foi rejeitada por vós, os edificadores, a qual foi posta
por cabeça de esquina.
E em nenhum outro há salvação, porque também debaixo do céu
nenhum outro nome há, dado entre os homens, pelo qual devamos ser
salvos”.238
Posteriormente, em seus próprios escritos canonizados, Pedro reutilizou
essa metáfora para testificar de Cristo:
“E, chegando-vos para ele, pedra viva, reprovada, na verdade, pelos
homens, mas para com Deus eleita e preciosa,
Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e
sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por
Jesus Cristo.
Por isso também na Escritura se contém: Eis que ponho em Sião a pedra
principal da esquina, eleita e preciosa; E quem nela crer não será confundido.
E assim para vós, os que credes, é preciosa, mas, para os rebeldes, A
pedra que os edificadores reprovaram, Essa foi a principal da esquina,
E uma pedra de tropeço e rocha de escândalo, para aqueles que tropeçam
na palavra, sendo desobedientes; para o que também foram destinados”.239
Porém, é óbvio que a referência mais autorizada a essa metáfora foi feita
pelo próprio Mestre, a Grande Pedra de Israel. Após contar uma das mais
vigorosas parábolas sobre Sua vinda e rejeição, Cristo disse a Seus
opositores, fazendo referência ao Salmo 118:
“Nunca lestes nas Escrituras: A pedra, que os edificadores rejeitaram,
Essa foi posta por cabeça do ângulo; Pelo Senhor foi feito isto, E é
maravilhoso aos nossos olhos?
Portanto, eu vos digo que o reino de Deus vos será tirado, e será dado a
uma nação que dê os seus frutos.
E, quem cair sobre esta pedra, despedaçar-se-á; e aquele sobre quem ela
cair ficará reduzido a pó.
E os príncipes dos sacerdotes e os fariseus, ouvindo estas palavras,
entenderam que falava deles;
E, pretendendo prendê-lo, recearam o povo, porquanto o tinham por
profeta”.240
Cristo é verdadeiramente a grande “Rocha do Céu”.241 Não foram só os
outros que afirmaram isso Dele, mas Ele próprio, em Sua humildade e
modéstia, disse o mesmo a respeito de Si. “Todo aquele, pois, que escuta
estas minhas palavras, e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que
edificou a sua casa sobre a rocha; E desceu a chuva, e correram rios, e
assopraram ventos, e combateram aquela casa, e não caiu, porque estava
edificada sobre a rocha. E aquele que ouve estas minhas palavras, e não as
cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a
areia; E desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram
aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda”.242
Em nossa própria vida, quando as chuvas descem, os rios correm e os
ventos sopram, podemos ter certeza disso, mais do que de qualquer outra
coisa no Universo: Nossa fé em Cristo, nosso alicerce em Cristo e o ato de
edificarmos sobre Cristo serão um alicerce seguro, que suportará toda tristeza
e toda dor. Ele é o alicerce sobre o qual, se edificarmos, não cairemos.

Notas
^237. Isaías 8:11, 13–16; 28:16.
^238. Atos 4:7–12.
^239. I Pedro 2:4–8.
^240. Mateus 21:42-46.
^241. Moisés 7:53.
^242. Mateus 07:24-27.
A Crucificação e a Expiação
Como vimos antes, uma das coisas mais comoventes que podemos
perceber ao ler os salmos é a frequência com que o Salvador fez referência a
eles em Seu ministério mortal, e a regularidade com que os autores dos
Evangelhos do Novo Testamento testificaram que Jesus era o Messias, por
meio dos salmos messiânicos. Além disso, não há referências mais pungentes
do que aquelas que se originam ou destacam as horas finais da vida do
Salvador, à medida que Ele Se preparava para Sua crucificação. Aqui estão
algumas dessas referências:
Salmo 41:9 “Até o meu próprio amigo íntimo, em quem eu tanto
confiava, que comia do meu pão, levantou contra mim o seu calcanhar”.
Com algumas das palavras mais tristes já escritas, esta passagem prevê a
traição e a infidelidade de Judas para com o Mestre. Sobre esse incidente (e
esta passagem), Jesus diria na noite da Última Ceia: “Não falo de todos vós;
eu bem sei os que tenho escolhido; mas para que se cumpra a Escritura: O
que come o pão comigo, levantou contra mim o seu calcanhar”. Pouco
depois, Judas recebeu o bocado das mãos de Jesus e “entrou nele Satanás.
( . . . ) [E] saiu logo. E era já noite”.243 Tememos que, para Judas, a noite
dure para sempre.
Salmo 69:4 “Aqueles que me odeiam sem causa são mais do que os
cabelos da minha cabeça; aqueles que procuram destruir-me, sendo
injustamente meus inimigos, são poderosos”.
O Salmo 35 já registrava: “Não se alegrem os meus inimigos de mim
sem razão, nem acenem com os olhos aqueles que me odeiam sem causa”.244
Durante o tempo que passou ensinando os Doze, após a Última Ceia da
Páscoa, Jesus disse:
“Aquele que me odeia, odeia também a meu Pai.
Se eu entre eles não fizesse tais obras, quais nenhum outro tem feito, não
teriam pecado; mas agora, viram-nas e me odiaram a mim e a meu Pai.
Mas é para que se cumpra a palavra que está escrita na sua lei: Odiaram-
me sem causa”.245
Salmo 110:1 “Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha mão
direita, até que ponha os teus inimigos por escabelo dos teus pés”.
Quando Jesus Se apresentou diante de Caifás e recusou-Se a responder-
lhe, o sumo sacerdote irou-se e disse: “Conjuro-te pelo Deus vivo que nos
digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus”. Ao que Jesus pronunciou Suas
únicas palavras naquela ocasião: “Tu o disseste; digo-vos, porém, que vereis
em breve o Filho do homem assentado à direita do Poder, e vindo sobre as
nuvens do céu”.246
Salmo 69:21 “Deram-me fel por mantimento, e na minha sede me
deram a beber vinagre.”
Ao se prepararem para crucificar Jesus, lemos que os soldados romanos
“Deram-lhe a beber vinagre misturado com fel; mas ele, provando-o, não
quis beber”.247
Salmo 22:18 “Repartem entre si as minhas vestes, e lançam sortes sobre
a minha roupa.”
João, que estava presente quando os soldados romanos retiraram as
vestes de Jesus e preparavam-se para pregá-Lo na cruz, registra que:
“Tendo, pois, os soldados crucificado a Jesus, tomaram as suas vestes, e
fizeram quatro partes, para cada soldado uma parte; e também a túnica. A
túnica, porém, tecida toda de alto a baixo, não tinha costura.
Disseram, pois, uns aos outros: Não a rasguemos, mas lancemos sortes
sobre ela, para ver de quem será. Para que se cumprisse a Escritura que diz:
Repartiram entre si as minhas vestes, E sobre a minha vestidura lançaram
sortes. Os soldados, pois, fizeram estas coisas”.248
Salmo 22:16–17 “Pois me rodearam cães; o ajuntamento de malfeitores
me cercou, traspassaram-me as mãos e os pés. Poderia contar todos os meus
ossos; eles veem e me contemplam.”
Mateus diz o seguinte a respeito desse terrível momento: “E, havendo-o
crucificado ( … ) e, assentados, o guardavam ali”.249
Salmo 22:7–8 “Todos os que me veem zombam de mim, estendem os
lábios e meneiam a cabeça, dizendo: Confiou no Senhor, que o livre; livre-o,
pois nele tem prazer.”
Mateus registra que “os que passavam blasfemavam dele, meneando as
cabeças, e dizendo ( … ) salva-te a ti mesmo. Se és Filho de Deus, desce da
cruz. E da mesma maneira também os príncipes dos sacerdotes, com os
escribas, e anciãos, e fariseus, escarnecendo, diziam: Salvou os outros, e a si
mesmo não pode salvar-se. Se é o Rei de Israel, desça agora da cruz, e
creremos nele. ( . . . ) E o mesmo lhe lançaram também em rosto os
salteadores que com ele estavam crucificados”.250
Salmos 22:1–2 “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Por
que te alongas do meu auxílio e das palavras do meu bramido? Deus meu, eu
clamo de dia, e tu não me ouves; de noite, e não tenho sossego.”
Este versículo contém a frase mais excruciante do Sacrifício Expiatório
do Salvador, talvez o clamor mais excruciante da história. Mateus nos
relembra deste que foi o ponto de maior agonia durante toda a Crucificação:
“E desde a hora sexta houve trevas sobre toda a terra, até à hora nona. E perto
da hora nona exclamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lamá sabactâni;
isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”251
Salmos 22:14–15 “Como água me derramei, e todos os meus ossos se
desconjuntaram; o meu coração é como cera, derreteu-se no meio das minhas
entranhas. A minha força se secou como um caco, e a língua se me pega ao
paladar; e me puseste no pó da morte.”
João registra a necessidade física sentida pelo Salvador durante a
Crucificação: “Depois, sabendo Jesus que já todas as coisas estavam
terminadas, para que a Escritura se cumprisse, disse: Tenho sede. Estava,
pois, ali um vaso cheio de vinagre. E encheram de vinagre uma esponja, e,
pondo-a num hissope, lha chegaram à boca”.252
Salmos 31:4–5 “Tira-me da rede que para mim esconderam, pois tu és a
minha força. Nas tuas mãos encomendo o meu espírito; tu me redimiste,
Senhor Deus da verdade.”
Lucas registra aquela que talvez seja a súplica mais agradável do longo e
indescritível Sacrifício Expiatório: “E era já quase a hora sexta, e houve
trevas em toda a terra até à hora nona, escurecendo-se o sol; Escurecendo-se
o sol, e rasgou-se ao meio o véu do templo. E, clamando Jesus com grande
voz, disse: Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito. E, havendo dito isto,
expirou”.253
Salmos 34:19–20 “Muitas são as aflições do justo, mas o Senhor o livra
de todas. Ele lhe guarda todos os seus ossos; nem sequer um deles se
quebra.”
Em seu relato da Crucificação, João observa que “os judeus, pois, para
que no sábado não ficassem os corpos na cruz, visto como era a preparação
(pois era grande o dia de sábado), rogaram a Pilatos que se lhes quebrassem
as pernas, e fossem tirados.
Foram, pois, os soldados, e, na verdade, quebraram as pernas ao
primeiro, e ao outro que como ele fora crucificado;
Mas, vindo a Jesus, e vendo-o já morto, não lhe quebraram as pernas.
Contudo um dos soldados lhe furou o lado com uma lança, e logo saiu
sangue e água.
E aquele que o viu testificou, e o seu testemunho é verdadeiro; e sabe
que é verdade o que diz, para que também vós o creiais.
Porque isto aconteceu para que se cumprisse a Escritura, que diz:
Nenhum dos seus ossos será quebrado”.254
É comovente perceber que a única coisa a ser dita em favor dos soldados
que testemunharam o maior ato de amor jamais realizado na história da
humanidade é que eles não quebraram os ossos do Salvador. Isto porque,
como observado por João, Jesus já estava morto e, portanto, não era
necessário que Sua morte fosse apressada por meio de asfixia, como era de
costume, processo que era feito quebrando-se o osso das pernas, de forma
que a vítima não conseguisse mais apoiar-se nos cravos em seus pés para se
“erguer” e aliviar a pressão sobre seus pulmões.
De que, então, Cristo morreu? Ele morreu pelo peso do pecado e da dor,
da doença e da tristeza, dos males e angústias do mundo, desde Adão até o
fim dos tempos. Tudo o que é de alguma forma moralmente errado, ou
pessoalmente doloroso e angustiante, desde o início dos tempos, foi reunido e
posto sobre os ombros de Jesus — Dele e de ninguém mais. Aquele que tinha
poder para salvar, de fato, operou a salvação, ao pisar sozinho o lagar da
Expiação.
Como registrado pelo salmista a respeito do Messias: “Afrontas me
quebrantaram o coração, e estou fraquíssimo; esperei por alguém que tivesse
compaixão, mas não houve nenhum; e por consoladores, mas não os
achei”.255 Afrontas me quebrantaram o coração. Essa foi a causa final de Sua
morte.
Devemos nos lembrar, obviamente, de que Jesus entregou Sua vida
voluntariamente. Ele tinha vida divina dentro de Si e, portanto, nenhum
homem ou poder conseguiria tirar Sua vida. No entanto, “houve
necessariamente uma causa física direta para o desenlace” de Sua morte,
como disse o Élder James E. Talmage,256 causa essa que constituiu-se de um
coração irreversivelmente ferido.
Seu coração parou devido à dor, à angústia e ao sofrimento. A parada
cardíaca veio após uma parada respiratória, em que uma mistura de água com
sangue fluiu para dentro da cavidade pleural que envolve o pulmão. É por
isso que sangue e água saíram de Seu lado, quando foi furado pela lança de
um soldado. Apesar de todo o Seu sofrimento físico e espiritual, Jesus não
havia sofrido nenhum tipo de trauma ou lesão nos órgãos internos. Sua
indescritível dor redentora não foi resultado de ferimentos que, em outras
circunstâncias, teriam causado hemorragia interna ou descarga amniótica. Ele
foi uma singular vítima de um coração “quebrantado”. “Como água me
derramei, e todos os meus ossos se desconjuntaram; o meu coração é como
cera, derreteu-se no meio das minhas entranhas.”257
Por causa do significado singular e das consequências eternas desse
processo de vitória sobre a morte e o inferno, daquele momento em diante,
nós — e todos os que nascerem até que Cristo retorne — adotamos um novo
símbolo para o convênio que fizemos de sacrifício. Pequenos cordeiros não
seriam mais oferecidos após o grande Cordeiro de Deus ter vindo. Em vez
disso, nosso símbolo seria diferente, mais pessoal, com um significado mais
profundo do que o possuído por aquele da época do Velho Testamento. Para
nós hoje, o significado da grande dádiva da Expiação, que inclui a
Ressurreição, foi tirado da cruz de Cristo. Como o Salvador ressurreto
afirmou aos nefitas no Novo Mundo:
“Eis que eu sou Jesus Cristo, o Filho de Deus. ( . . .
) Eu sou a luz e a vida do mundo, Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio
e o fim.
E vós não me oferecereis mais derramamento de sangue; sim, vossos
sacrifícios e holocaustos cessarão, porque não aceitarei qualquer dos vossos
sacrifícios e holocaustos.
E oferecer-me-eis como sacrifício um coração quebrantado e um
espírito contrito. E todo aquele que a mim vier com um coração quebrantado
e um espírito contrito, eu batizarei com fogo e com o Espírito Santo. ( . . .
) Eis que vim ao mundo para trazer redenção ao mundo e salvar o
mundo do pecado”.258
Essa orientação foi mais uma vez repetida nesta grande e última
dispensação:
“Sim, bem-aventurados aqueles cujos pés estão sobre a terra de Sião,
que obedeceram a meu evangelho; pois receberão como recompensa as coisas
boas da terra e ela produzirá com sua força.
E também serão coroados com bênçãos do alto, sim, e com
mandamentos, não poucos. ( . . .
) Oferecerás um sacrifício ao Senhor teu Deus em retidão, sim, um
coração quebrantado e um espírito contrito”.259
Dada a preocupação do salmista com símbolos e representações do
Messias, não é de se surpreender que ele tenha previsto acertadamente essa
grande transição na forma como os sacrifícios eram feitos segundo a lei do
Velho Testamento e segundo o evangelho do Novo Testamento. Ele declarou:
“Cria em mim, ó Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito reto.
Não me lances fora da tua presença, e não retires de mim o teu Espírito
Santo. ( . . . ) Pois não desejas sacrifícios, senão eu os daria; tu não te deleitas
em holocaustos. Os sacrifícios para Deus são o espírito quebrantado; a um
coração quebrantado e contrito. ( . . . ) Perto está o Senhor dos que têm o
coração quebrantado, e salva os contritos de espírito”.260
Parece que a compreensão do salmista sobre o mais alto símbolo da
salvação nos últimos dias, um símbolo que só foi instituído após a
Crucificação e a Expiação serem consumadas, era maior do que a de qualquer
outro escritor bíblico — tanto no Velho quanto no Novo Testamento.

Notas
^243. João 13:18, 27, 30; grifo do autor.
^244. Salmos 35:19.
^245. João 15:23–25; grifo do autor.
^246. Mateus 26:63–64; grifo do autor.
^247. Mateus 27:34; grifo do autor.
^248. João 19:23-24; grifo do autor.
^249. Mateus 27:35-36; grifo do autor.
^250. Mateus 27:39–42, 44; grifo do autor.
^251. Mateus 27:45-46; grifo do autor.
^252. João 19:28-29; grifo do autor.
^253. Lucas 23:44–46; grifo do autor.
^254. João 19:31-36; grifo do autor.
^255. Salmos 69:20.
^256. James E. Talmage, Jesus, o Cristo, 1998, p. 646, nº 8.
^257. Salmos 22:14. Para mais evidências a respeito dessa questão
médica, ver “On the Physical Death of Jesus Christ” Journal of the
American Medical Association, 21 de março de 1986, p. 1455.
^258. 3 Néfi 9:15, 18–21; grifo do autor.
^259. Doutrina e Convênios 59:3–4, 8; grifo do autor.
^260. Salmos 51:10–11, 16–17; 34:18; grifo do autor.
Seção III O Vigésimo Terceiro Salmo
Salmos 23

O Senhor é o meu pastor, nada me faltará.

Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas


tranquilas.

Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por


amor do seu nome.

Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria


mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me
consolam.

Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos,


unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda.

Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os


dias da minha vida; e habitarei na casa do Senhor por longos dias.
Verdes Pastos, Águas Tranquilas e o Bom Pastor
O Salmo 23 não só é o salmo mundialmente preferido, mas sem dúvida
é também o mais conhecido e citado de todo o cânone das escrituras. A linha
de abertura — para todos os efeitos, o título — com certeza deve estar entre
as frases mais conhecidas da língua inglesa. Além disso, fora a teologia
expressa nesse salmo, ele é reconhecidamente uma das mais belas canções-
poemas já escritas. É amado por cristãos e judeus, jovens e velhos, crentes e
descrentes, corajosos e receosos. Se alguém se dispuser a memorizar um
capítulo completo, ainda que curto, das escrituras, provavelmente escolherá
este.
Mas o que há nessa passagem que a torna capaz de comover e consolar
uma variedade tão vasta de leitores? Um talentoso rabi judeu afirmou, após
décadas estudando os salmos:
“Em apenas 57 palavras em hebraico, e por volta do dobro disso na
tradução para o inglês, o autor do vigésimo terceiro salmo nos dá ( … ) uma
lição de teologia mais prática do que encontramos em muitos livros. ( . . . ) Se
estivermos ansiosos, este salmo nos dá coragem para vencermos nossos
temores. Se estivermos tristes, ele nos consola para que encontremos nosso
caminho ao cruzar o vale da sombra [da morte]. Se sentimos amargura por
causa de pessoas desagradáveis, ele nos ensina como lidar com elas. Se o
mundo esgota nossas forças, este salmo nos ensina como revigorar nossa
alma. Se estivermos obcecados com o que nos falta, ele nos ensina a ser
gratos pelo que temos. E, acima de tudo, se nos sentimos solitários e à deriva
em um mundo sem amigos, ele nos oferece a inestimável certeza de que ‘tu
estás comigo’”.261
A menção empregada neste salmo a ovelhas e pastores é,
provavelmente, o simbolismo mais rapidamente identificável pela tradição
hebraica. As ovelhas estavam em todo o lugar no mundo bíblico e nas
escrituras. Jó possuía 14 mil ovelhas. O rei Salomão sacrificou 120 mil
ovelhas na dedicação do templo que havia construído. As parábolas e
princípios que têm relação com ovelhas e pastores estão entre as metáforas
mais comuns nas escrituras e, não é de surpreender, eram um motivo
recorrente na arte dos primeiros cristãos. No Velho Testamento, o retrato de
um jovem pastor carregando uma ovelha em seus ombros prefigurava Cristo
como o pastor no Novo Testamento. Os registros sagrados, desde Adão e
Eva, estão permeados de símbolos e representações da salvação relacionados
a ovelhas. Após ter sido expulso do Jardim do Éden, Adão foi imediatamente
ensinado sobre a Expiação de Jesus Cristo e o simbolismo da salvação por
meio do Cordeiro de Deus — presumivelmente não apenas a primeira, mas a
mais importante verdade que poderia receber na mortalidade. Caim e Abel
trouxeram o fratricídio ao mundo por causa de uma discussão sobre o
sacrifício de uma ovelha em comparação com o sacrifício de uma oferta
menos simbólica.262
Em contraste com o tradicional pano de fundo da mortalidade —
sacrifício e uma variedade de problemas — o vigésimo terceiro salmo tem
um apelo universal, por meio do consolo que oferece àqueles que sofreram,
ou ainda sofrem, com uma vida de provações e tribulações. Como já foi dito
por alguém com uma pitada de humor, este salmo serve para pais com filhos
rebeldes, para soldados indo para a guerra e para alguém que esteja saindo da
cadeia. Quaisquer que sejam nossas necessidades, ele mostra que Deus está
envolvido de modo pessoal e atuante em nossa vida. “(…) faz ( … ) Guia-me
( … ) Refrigera a minha alma ( … ) Tu estás comigo ( … ) Tu preparas uma
mesa perante mim ( … ) Unges a minha cabeça”. Do começo ao fim, este
salmo apresenta um Pai atento e atuante e um filho necessitado e disposto a
receber.
É importante notar que, apesar do título deste salmo, do meio para o
final o simbolismo se afasta do tema pastoral. A primeira metade fala do
pastor e de suas ovelhas. A segunda metade fala de um anfitrião real que
prepara um abundante banquete para seus convidados. Como rebanho, as
ovelhas desfrutam de verdes pastos e águas tranquilas; como convidados, os
visitantes têm o mais farto e generoso banquete possível. Nos dois casos,
encontramos paz e proteção. Vale a pena refletir individualmente sobre cada
elemento deste amado salmo.

“O Senhor é o meu pastor”


Neste que é o mais belo de todos os poemas nas escrituras, o salmista
parte de duas premissas: primeiro, que todos nós somos “como ovelhas”,
conforme declarou o profeta Isaías. Como tal, precisamos de um pastor pois,
por inocência ou ignorância — mas às vezes por vontade própria e teimosia
— “cada um se [desviou] pelo seu caminho” e, como resultado “[andamos]
desgarrados”.263 Andamos de um lado para o outro, provamos disto e
daquilo, até que em algum momento percebemos que estamos a ponto de nos
perder ou de ser destruídos. Percebemos que nós, ou alguém que tenha
relação conosco, fizemos algo estúpido ou errado — o que, em geral, é a
mesma coisa. Percebemos que precisamos desesperadamente de ajuda:
estamos com problemas e procuramos desesperadamente por nosso pastor,
nosso defensor, nosso salvador.
Isso leva à segunda premissa da declaração inicial do salmista: o único
pastor infalível e seguro é o Senhor Jesus Cristo — YHWH, Jeová, o Senhor
Deus de Israel, o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim, o Grande Eu Sou,
Aquele que veio na mortalidade como Jesus de Nazaré, para resgatar toda
ovelha que quiser ser salva. Como disse o salmista em outra ocasião, “Ele é o
nosso Deus, e nós povo do seu pasto e ovelhas da sua mão”.264 A vida
rapidamente nos ensina que precisamos de um pastor “em todos os momentos
e em todas as coisas e em todos os lugares”.265 O amor, o vigor, a devoção e
a determinação do pastor, demonstrados em Seu cuidado, são o ponto central
de nossa vida, ainda que isso não fique tão óbvio até que estejamos em
perigo. Porém, esquecemos que neste mundo decaído, com o tentador
procurando nos destruir, estamos em perigo a todo o momento. Graças aos
céus — literalmente — por Cristo ser o nosso protetor! Como o profeta Isaías
prometeu, quando o Senhor vier: “como pastor apascentará o seu rebanho;
entre os seus braços recolherá os cordeirinhos, e os levará no seu regaço; as
que amamentam guiará suavemente”.266
No mesmo sentido, no Velho Testamento não há profecia maior do que
a eloquente e inclusiva declaração do profeta Ezequiel, a respeito do
ministério mortal de Jeová como Pastor e Salvador.
“Porque assim diz o Senhor Deus: Eis que eu, eu mesmo, procurarei
pelas minhas ovelhas, e as buscarei.
“Como o pastor busca o seu rebanho, no dia em que está no meio das
suas ovelhas dispersas, assim buscarei as minhas ovelhas; e livrá-las-ei de
todos os lugares por onde andam espalhadas, no dia nublado e de escuridão.
E tirá-las-ei dos povos, e as congregarei dos países, e as trarei à sua
própria terra, e as apascentarei nos montes de Israel, junto aos rios, e em
todas as habitações da terra.
Em bons pastos as apascentarei, e nos altos montes de Israel será o seu
aprisco; ali se deitarão num bom redil, e pastarão em pastos gordos nos
montes de Israel.
Eu mesmo apascentarei as minhas ovelhas, e eu as farei repousar, diz o
Senhor Deus.
A perdida buscarei, e a desgarrada tornarei a trazer, e a quebrada ligarei,
e a enferma fortalecerei; mas a gorda e a forte destruirei; apascentá-las-ei
com juízo”.267
Quando Cristo veio na época do Novo Testamento, Ele reafirmou o
ponto de vista das testemunhas da época do Velho Testamento: “Eu sou o
bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas.
Mas o mercenário, e o que não é pastor, de quem não são as ovelhas, vê
vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as arrebata e dispersa as
ovelhas.
Ora, o mercenário foge, porque é mercenário, e não tem cuidado das
ovelhas. ( . . .
) Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai, e dou
a minha vida pelas ovelhas”.268
Verdadeiramente, “nosso Senhor Jesus Cristo [é o] grande pastor das
ovelhas”.269 Como o salmista afirma, Ele é meu pastor — pronome
possessivo da primeira pessoa do singular. Tradicionalmente, os antigos
israelitas falavam de “nosso” Deus, o que era muito apropriado para o povo
como um todo. Mas este amado salmo nos relembra que Deus também é o
Deus dos indivíduos e que Seus cuidados são extremamente pessoais. O
Senhor é o meu pastor.

“Nada me faltará”
Imediatamente, reconhecemos pelo menos duas interpretações para a
palavra faltará. A primeira diz respeito às coisas de que necessitamos, mas
que nos faltam: um estado de privação e insuficiência. Por definição, se nada
“faltará” às ovelhas, isso significa que não ficarão sem os elementos básicos
para seu bem estar. Além disso, sendo que o verbo está no futuro (faltará),
isso significa que as necessidades das ovelhas serão supridas, que elas serão
protegidas contra a miséria e a indigência, nos dias que estão por vir. Em face
aos medos e preocupações do salmista, essa é a maneira mais reconfortante e
consoladora de se interpretar essa frase. Obviamente, isso não significa que
não haverá tempos difíceis ou períodos de escassez, quando os recursos
financeiros se esgotam ou as necessidades familiares não são satisfeitas. Mas,
certamente, o que não pode se esgotar ou ficar escassa é nossa fé — fé em
Deus, fé no futuro, fé em que as coisas darão certo. O Senhor declarou: “O
que eu, o Senhor, disse está dito e não me desculpo; e ainda que passem os
céus e a Terra, minha palavra não passará, mas será toda cumprida”.270
Precisamos nos lembrar e sempre acreditar que “Deus é poderoso para
cumprir todas as suas palavras. Pois ele cumprirá todas as promessas que te
fizer”.271 Sua promessa é que não passaremos necessidades para sempre. Sua
promessa é que, se tivermos os olhos fitos Nele e em Sua glória, somos e
continuaremos sendo cuidados.
Isso nos leva à segunda interpretação que podemos fazer do verbo
faltará, que diz respeito às coisas que desejamos e pelas quais ansiamos. Essa
interpretação me faz lembrar de uma jovenzinha numa classe da Escola
Dominical, que citou uma versão equivocada — ou melhorada — deste
salmo: “O Senhor é o meu pastor. Tudo me sobrará”. Reconheço que
precisamos desejar algumas coisas. Nossa última regra de fé diz: “Se houver
qualquer coisa virtuosa, amável, de boa fama ou louvável, nós a
procuraremos”.272 Fica claro que há muitas coisas nobres e desejáveis, que
vale a pena buscarmos.
Porém, no contexto dos salmos e das angústias que enfrentamos
diariamente, parece óbvio que a mensagem aqui é que não devemos desejar
constantemente o que não temos, nem almejar aquilo que não é nosso. Em
sua pior forma, isso se chama cobiça, avareza ou ganância. Mas mesmo que
seja de maneira branda, não passa da desagradável e inútil inveja. A literatura
clássica está repleta de personagens que partiram em uma aventura, seja em
busca do Santo Graal, do pote de ouro no fim do arco-íris ou para conquistar
mundos, apenas para descobrir que seu prêmio (e, certamente, sua felicidade)
estava o tempo todo ao alcance de suas mãos — já fazia parte de sua vida, de
seu lar ou de suas circunstâncias simples e humildes. Nesse sentido, sofremos
muito e desnecessariamente por desejar, desejar e desejar — em especial
quando esses desejos estão focalizados em coisas mundanas ou indignas.
Deus incentiva a busca por coisas boas. Ele quer que tenhamos “fome e sede
de justiça”.273 E com certeza ele fica cansado de nos ver desejar tantas coisas
que “a traça e a ferrugem consomem”.274 O salmista, ao afirmar que nada lhe
faltaria, quis dizer que não pediria excessiva ou incessantemente as coisas do
mundo, o que prenunciou o conselho dado por Jacó, no Livro de Mórmon:
“Portanto não despendais dinheiro naquilo que não tem valor, nem vosso
trabalho naquilo que não pode satisfazer”.275 Nada me faltará.

“Deitar-me faz em verdes pastos”


Podemos presumir com certeza que o sonho de toda ovelha é deitar-se
em verdes pastos — a boa vida, do ponto de vista desses pequenos animais
peludos de quatro patas. Pode até soar algo muito bom para nós, vez ou outra.
Nada em nossa lista de tarefas. Nenhuma ameaça externa nem conflitos
interiores. Beleza que enche os olhos, pão (ou, pelo menos, grama!) que
alimenta o corpo, tranquilidade que embala a alma — a paz da natureza ao
redor.
O que impediria uma ovelha de desfrutar tais circunstâncias
rotineiramente? Um experiente criador de ovelhas, que já escreveu sobre o
assunto, afirmou que há quatro coisas que impedem as ovelhas de desfrutar
desse pacífico repouso: o medo; o atrito com outras ovelhas; a presença de
pragas; e a fome.276
Não é preciso ser muito inteligente para perceber que, nesse ponto,
somos muito semelhantes às ovelhas. Essas são algumas das coisas que nos
impedem de ter paz neste mundo. Há milhares de medos, reais ou
imaginários, onde a fé não foi cultivada. Há conflitos com familiares, amigos
ou inimigos, os quais poderiam ser eliminados se permitíssemos que o
evangelho de Jesus Cristo prevalecesse. Há pequenos distúrbios banais,
mesquinhos e irritantes, que não têm consequências eternas, mas nos
aborrecem e incomodam. Há apetites temporais que se infiltram e nos
afastam das buscas espirituais. Se desejamos paz e tranquilidade em nossa
vida, temos que diagnosticar, tratar e sobrepujar essas intrusões. É mais fácil
falar do que fazer, mas temos que trabalhar nisso, a fim de aproveitarmos
todo o tempo possível nos verdes pastos que Deus deseja nos dar.
Só mais alguns comentários sobre a palavra faz. Pela doutrina do arbítrio
e da liberdade moral, o Senhor não nos faz realizar nada. Mas Ele nos faz
responsáveis por nossas ações. Ele pode nos fazer sentir as consequências do
pecado. Ele pode fazer com que os elementos ao nosso redor respondam ao
Seu comando, e pode nos persuadir a fazer o bem. Mas no cotidiano da vida
mortal, Ele não nos “faz” realizar nada contra nosso próprio arbítrio. Sendo
assim, em que sentido Ele nos “faz” deitar em paz e tranquilidade?
Talvez possamos encontrar pelo menos parte da resposta numa
interpretação diferente da palavra faz. Seria possível que o salmista estivesse
dizendo que “Deus me fez a fim de que eu pudesse deitar em verdes pastos”?
Será que, como acontece com muitos outros princípios e ensinamentos do
evangelho, o Senhor está nos mostrando o ideal, o propósito final de nossa
vida? Mesmo que a paz, a tranquilidade e os verdes pastos pareçam distantes
hoje, será que a palavra faz significa que essas promessas me aguardam? Que
esses são os propósitos para os quais fui criado?
Se lembrarmos que somos verdadeiramente filhos do Deus vivo, tendo
em mente o plano para nossa salvação e as verdades que nos ajudarão a
chegar lá, seremos capazes de confiar no grandioso destino celestial de nossa
vida e de continuar buscando alcançar aquele dia em que não teremos mais
medos nem inimigos, mas apenas paz de espírito e de consciência. Esse foi o
propósito para o qual fomos criados, o propósito que devemos nos esforçar
para alcançar. Ele me fez para que eu possa deitar-me em verdes pastos.

“Guia-me mansamente a águas tranquilas”


Esta frase é a outra metade da promessa de verdes pastos aos pequeninos
de Deus, que vimos anteriormente. Mais do que o sustento obtido com a
grama, as ovelhas (e os outros animais) precisam de um suprimento constante
de água. Homens e animais podem sobreviver por um longo período de
tempo sem comida, mas nada viverá por muito tempo sem água. Agua vita. A
água da vida. A água é um elemento absolutamente essencial em nossa
composição; talvez tenha sido por isso que Deus a instituiu como o meio pelo
qual somos batizados para a vida eterna. “Aquele que não nascer da água e do
Espírito, não pode entrar no reino de Deus”, disse Jesus a Nicodemos;277 E à
mulher samaritana no poço Ele ensinou: “A água que eu ( … ) der se fará
( … ) uma fonte de água que salte para a vida eterna”.278
Naquela que talvez seja a mais antiga igreja Cristã já escavada (uma
casa do século 3 em Dura Europos, na Síria), foi encontrada a pintura de um
pastor, alinhada ao centro da fonte batismal de um batistério cuidadosamente
construído. Olhando de cima para os que participavam daquela ordenança
essencial, o Bom Pastor guiava Suas ovelhas ao rebanho da salvação, por
meio da água viva. Dessa forma, em diversos níveis de interpretação, a água
é essencial para nossa salvação. Não conseguimos viver sem ela, e um pastor
amoroso se certificará de que a encontremos. Ele teve sede na cruz, a fim de
que nós nunca precisássemos passar por tamanha sede, seja no corpo ou na
alma. Precisamos beber profusamente de Sua água viva e ser eternamente
gratos à fonte inesgotável de onde ela flui.
No que diz respeito ao tema deste salmo e deste livro, não podemos
deixar de notar que os cordeiros de Deus são levados a “águas tranquilas”.
Não há turbulência, ansiedade ou oposição nelas. Não há conflitos nem
transtornos. Qualquer cordeiro ficaria com medo se essa fonte estivesse
sempre agitada ou perturbada. Temos medo de enchentes e de correntezas
fortes; também tememos nadar longe da costa. Tsunamis, tufões e furacões
— todos originados no mar — deixa um rastro de destruição maior do que
qualquer outra manifestação violenta da natureza. Quando as coisas não vão
bem em nossa vida, dizemos que tudo foi “por água abaixo”; e às vezes
estamos “afogados” em dívidas, em autopiedade ou nas complexidades da
vida. Para que possamos obter sustento para o corpo e a alma, precisamos de
águas tranquilas, pacíficas, calmas. Elas são um sinônimo de segurança.
Somos guiados a elas pelo Bom Pastor. Guia-me mansamente a águas
tranquilas.

“Refrigera a minha alma”


Seria ótimo se a vida fosse calma e estável, de modo que nunca nos
sentíssemos desencorajados ou esgotados. Se em nossa vida não houvesse
tribulações, dificuldades ou circunstâncias que exaurissem nosso capital
espiritual e emocional, não teríamos necessidade de que nossa alma fosse
refrigerada. Mas a vida não é calma nem estável, e todos enfrentamos
situações que esgotam nossas forças. A fadiga é algo que debilita a todos nós.
Todos ficamos cansados. Por isso precisamos dormir, precisamos sair da
rotina, precisamos sair de férias, por mais curtas ou baratas que sejam.
Certamente é por isso que Deus ordenou um dia de descanso. O rabi
Harold S. Kushner escreveu algo a respeito de Êxodo 31:17: “Em seis dias o
Senhor criou os céus e a terra, e no sétimo dia Ele descansou e sentiu-Se
refrigerado”. Ele observa que, em hebraico, os verbos correspondentes a
“descansar” e “refrigerar” são shavat, significando “Ele parou” (de onde se
origina a palavra Sabbath) e yinafash, significando literalmente “Ele
recuperou Sua alma”.279
Se Deus necessita de descanso e de refrigério, se precisa “recuperar Sua
alma” (ainda que apenas simbolicamente, para nos dar o exemplo), então
todos nós precisamos também. Todos precisamos de reabastecimento, de
renovação, de incentivo e de esperança. Felizmente, Deus organizou a vida de
uma maneira que podemos ter isso tudo, se quisermos. Como observado, Sua
água é “água viva”, água que será “uma fonte de água que salte para a vida
eterna”.280 Isso é que é renovação de verdade!
Da mesma forma, é com o pão da vida. O pão da existência mortal nos
deixa com fome, às vezes logo após o comermos. Mesmo o maná que veio
aos israelitas no deserto, no sentido espiritual, não tinha um prazo longo, nem
concedia vida. Mas Cristo, como o “pão da vida”, concede, concedia e
sempre concederá. “Eu sou o pão da vida”, ensinou Jesus. “Aquele que vem a
mim não terá fome ( … ) Porque o pão de Deus é aquele que desce do céu e
dá vida ao mundo”.281 De Deus, obtemos vida e esperança, sustento e auxílio.
Somente os céus podem restaurar nossa alma e firmar nossos pés.
Em relação a esse último ponto, Phillip Keller, um experiente criador de
ovelhas, observou que às vezes as ovelhas caem de pernas para o ar e não
conseguem se erguer sozinhas.282 Considerando a fisiologia da ovelha — e
talvez sua psicologia —, elas permanecem deitadas de costas, balançando as
pernas no ar até morrerem, caso o auxílio não lhes chegue rapidamente.
Nessas circunstâncias, não é só a morte natural que as ameaça, pois as
ovelhas se tornam infelizes presas indefesas para qualquer predador que as
encontre.
Abrindo um parêntese, é interessante observar que as ovelhas gordas e
saudáveis são mais propensas a cair de pernas para o ar — o que sugere que o
conforto e a luxúria talvez sejam um desafio tão grande quanto a penúria e as
limitações. Acontece que uma ovelha bem alimentada e de pelo longo —
aparentemente, tudo o que um criador gostaria — pode deitar e rolar um
pouco, para se esticar e relaxar. Contudo, se nesse momento de descontração
o centro de gravidade se deslocar e as quatro patas perderem contato com o
chão, a ovelha ficará de pernas para o ar. É pouco provável que as pernas,
mesmo balançando no ar, consigam contrapor o peso do corpo da ovelha, que
agora mantém as pernas para cima. Não sei se Paulo tinha uma ovelha assim
em mente, mas talvez ele tenha pensado em um cristão próspero e
autossuficiente quando afirmou: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe
não caia”.283
Todos nós caímos “de pernas para o ar” de vez em quando e sabemos
muito bem como é clamar, chorar e nos debater de medo, sem termos a
capacidade de nos reerguer sozinhos. Então, como sempre deveríamos fazer,
buscamos a Deus e suplicamos por auxílio em tempos de angústia. Por ser o
Bom Pastor, Ele está sempre observando, sempre cuidando, sempre
procurando as ovelhas que estão de pernas para o ar. Prontamente, Ele vem e
nos dá a água viva e o pão da vida, nos erguendo e endireitando a situação.
Ele nos coloca de pé novamente. Ele refrigera a nossa alma. Mas não nos
surpreendamos se Ele nos aconselhar a eliminar um pouco de peso e tosquiar
a lã em excesso. Como faz o Pai Lavrador, “Ele limpa toda [a vara] que dá
fruto, para que dê mais fruto”;284 A vida tem altos e baixos, mas o Bom
Pastor sempre vai buscar-nos, ajudar-nos e, se necessário, disciplinar-nos na
medida certa, para que não fiquemos novamente vulneráveis no futuro.
Refrigera a minha alma.

“Guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome”


Os homens, os rios e as ovelhas quase sempre escolhem o caminho com
menos obstáculos. Em geral, isso significa vagar errante por aí ou, como diria
uma velha canção, “deixar a vida me levar”. Essa tendência está no cerne dos
problemas da mortalidade. Como disse o Rei Benjamim, “Porque o homem
natural é inimigo de Deus e tem-no sido desde a queda de Adão e sê-lo-á para
sempre; a não ser que ceda ao influxo do Santo Espírito e despoje-se do
homem natural e torne-se santo pela expiação de Cristo, o Senhor; e torne-se
como uma criança, submisso, manso, humilde, paciente, cheio de amor,
disposto a submeter-se a tudo quanto o Senhor achar que lhe deva infligir,
assim como uma criança se submete a seu pai”.285
Nesse versículo, se substituirmos “Santo Espírito” e “Senhor” por
“Pastor”, que são títulos intercambiáveis neste caso, teremos a essência do
salmo: “Guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome”. Assim
como a ovelha que não consegue se virar sozinha, descrita na primeira
metade do versículo, somos lembrados aqui que não conseguiremos chegar
ao fim da jornada sozinhos. Não somos inteligentes, nem bons, nem fortes o
suficiente. Precisamos de auxílio e de orientação. Precisamos de alguém que
conheça o caminho.
Conheço apenas um dos Provérbios que se repete duas vezes
textualmente. Seria essa uma ênfase sutil? Trata-se de Provérbios 14:12,
repetido novamente em 16:25: “Há um caminho que ao homem parece
direito, mas o fim dele são os caminhos da morte”, repetido quase palavra por
palavra em 16:25: “Há um caminho que parece direito ao homem, mas o seu
fim são os caminhos da morte”. Agora, compare com a declaração
consoladora de Jesus: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem
ao Pai, senão por mim”.286 Repetidamente, assim como outros convites nas
escrituras, Cristo nos convida a segui-Lo, a vir onde Ele está, a fazer o que
Ele faz, a ir aonde Ele vai, a permanecer onde Ele permanece. O caminho em
que Ele está, é o caminho onde deveríamos estar. O caminho que Ele
delimita, é o caminho da justiça. No grandioso salmo registrado no Livro de
Mórmon, Néfi suplica: “Ó Senhor, não me feches as portas da tua justiça,
para que eu ande na senda do vale baixo, para que eu seja firme no caminho
plano. ( . . . ) Endireita a minha vereda diante de mim. Não ponhas em meu
caminho uma pedra de tropeço, mas limpa-o e não obstruas o meu
caminho”.287 Cristo conhece o caminho pois andou nele. Ele conhece o
caminho porque Ele é o Caminho.
E o que dizer da expressão “por amor do seu nome”? Trilhar o caminho
estreito e apertado da justiça, o caminho de Cristo, significa reconhecermos
que “este é o caminho; e não há qualquer outro caminho ou nome debaixo do
céu pelo qual o homem possa ser salvo no reino de Deus. ( . . . ) Esta é a
doutrina de Cristo”.288 Além disso, “o amor” pelo nome de Cristo adquire
mais importância à medida que o caminho da justiça leva à realização de
convênios e à participação em ordenanças que, por sua vez, levam à vida
eterna. Um novo nome é quase sempre um elemento-chave em um novo
convênio.289 Sendo assim, o nome de Cristo é primordial na identificação de
Sua Igreja,290 no batismo e na confirmação realizados nela,291 no partilhar do
sacramento da ceia do Senhor,292 na ordenação ao sacerdócio,293 nas
ordenanças do templo e assim por diante. Verdadeiramente, é no amor do
nome de Cristo e por meio Dele que o caminho da mais alta justiça é trilhado.
Por Sua honra e reputação estarem em jogo — “por amor de seu nome” —
Ele guarda todas as promessas feitas a Seus filhos do convênio, em especial a
promessa inerente ao próprio nome Jeová: “o Imutável”, “o Grande Eu Sou”.
A promessa feita a Moisés vale para nós também: “Certamente eu serei
contigo”.294 Você pode contar com Ele. Seu bom nome está em risco. Ele
guia-me pelas veredas da justiça, por amor do Seu nome.

“Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não


temeria mal algum, porque tu estás comigo.”
A partir deste versículo, o foco sai do Pastor na terceira pessoa do
singular (ele) e vai para um Anfitrião Benfeitor na segunda pessoa do
singular (tu). Com essa transição, o salmo adquire um tom ainda mais
pessoal, como uma oração repleta de gratidão. A vida deixa de ser
representada pelas ovelhas e pelo pastor, mas aproxima-se do homem ou da
mulher que batalham e se angustiam. Agora passamos a tratar da vida, da
morte e das sombras que permeiam a experiência mortal. É interessante notar
que em tempos de escuridão, andamos em um “vale”. Se pensarmos numa
doença bastante contemporânea, um “vale” é uma “depressão”, um terreno
mais baixo. Nele, “a bandeira [não] se alteia”.295 Nele, estamos para baixo,
quase no fundo do poço. E quando olhamos para cima, enxergamos apenas o
longo caminho a ser trilhado.
Na mortalidade, somos forçados a reconhecer como o mundo é escuro e
o quanto ainda precisamos enfrentar, às vezes diariamente. Mas neste
grandioso e reconfortante salmo está a promessa de que essas tribulações
telestiais não são permanentes nem definitivas. Ainda que a vida terrena
acabe com a morte, andamos pelo vale de sua sombra e dos males (ou meros
fatores naturais) que a ocasionam, mas saímos seguros no outro lado. Por
quê? Porque Deus é conosco, na vida e na morte, até a vida eterna.
Isso nos faz lembrar de que existe outra característica digna de nota, a
respeito de um “vale”. Em geral, os vales são mais verdejantes, viçosos, belos
e tranquilos que os montes e colinas ao seu redor. Se houver uma nascente
em um desses montes, é bem provável que um rio corte o vale procurando o
caminho para o mar. Além disso, quando chegamos a um vale, sabemos que,
pelo menos por enquanto, não precisaremos escalar nada: estamos em uma
situação mais confortável, tanto que podemos descansar e nos revigorar,
podemos tomar fôlego e recobrar as forças antes da próxima escalada. Os
primeiros pioneiros a viajar para o oeste dos Estados Unidos ansiavam pelo
dia em que chegariam ao vale, e se regozijavam muito quando o alcançavam.
Aquele vislumbre, aquele objetivo, era o que mantinha homens e mulheres
acreditando e andando.
Estejamos num dia bom ou ruim; num momento triste ou alegre; num
vale verdejante ou encoberto pela sombra do mal ou da morte, “não
[temeremos] mal algum, porque tu estás [conosco]”. Em geral, boas
companhias nos bastarão quando não encontrarmos explicação para as dores
da vida.Quando meu irmão morreu na infância, lembro-me do consolo
trazido por aqueles que vieram a nossa casa apenas para sentar-se em silêncio
com meus pais. As palavras eram desnecessárias. Sua simples presença era a
melhor dádiva que poderiam nos ofertar. Nesse sentido, independente da
natureza de nosso vale, não há salmo mais reconfortante que o Salmo 56,
com o qual iniciamos essas reflexões: “Quando eu a ti clamar, então voltarão
para trás os meus inimigos: isto sei eu, porque Deus é por mim”.296 Ele está
conosco na vida e na morte. Ele está conosco no caminho ensolarado e na
sombra. Ele venceu o mal por ser a personificação da bondade. Ele é a
Ressurreição e a Vida. Não há mal que se equipare à Expiação de Jesus
Cristo, e nem a morte é capaz de triunfar sobre Sua vitória. O sol, o Filho,
sempre se ergue. Onde quer que andemos, o que quer que enfrentemos, não
temos nada a temer — nunca. Sim: ainda que eu andasse pelo vale da sombra
da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo.

“A tua vara e o teu cajado me consolam”


Antigamente, as únicas ferramentas de trabalho de um pastor eram uma
vara e um cajado. A vara era uma arma pequena e robusta, semelhante a uma
clava, usada para defesa e para afugentar intrusos. Nas mãos de um pastor
que soubesse usá-la, era um objeto que transmitia a ideia de força e poder.
Num sentido mais teológico, a “vara” que Deus usa para nos proteger e
afugentar o inimigo são Sua boca e as palavras eternas de conselho que dela
emanam. Quando necessário, essas palavras e a boca de onde provêm podem
ser bem fortes. O profeta Isaías escreveu: “Mas julgará com justiça aos
pobres, e repreenderá com equidade aos mansos da terra; e ferirá a terra com
a vara de sua boca, e com o sopro dos seus lábios matará ao ímpio”.297 As
palavras — e a Palavra — de Deus serão um verdadeiro consolo para os fiéis,
mas serão um instrumento de condenação para os ímpios.
O cajado era maior e mais leve, geralmente com uma das pontas
terminada em forma de gancho, usada para resgatar ovelhas perdidas. Mais
do que a vara, o cajado está associado, tanto na arte quanto na mitologia, ao
pastor e seu constante cuidado. Qualquer um que já tenha visto uma classe da
Primária encenar o nascimento de Jesus deve ter reconhecido os pastores
empunhando seus cajados. Além de ser uma extensão do braço do pastor, seja
para resgatar uma ovelha ou mostrar-lhe uma nova direção a seguir, o cajado
também serve de apoio para o pastor cansado de caminhar. Tudo o que diz
respeito ao cajado transmite a ideia de segurança e cuidado. Nas escrituras,
ele é a grande ferramenta usada para o resgate e a redenção.
Em nossa vida, precisamos ser defendidos e também resgatados. De uma
forma ou de outra, estamos vulneráveis. Seja em confrontos ameaçadores ou
no simples viver rotineiro, somos abençoados e protegidos pelo cuidado
constante de Deus. A tua vara e o teu cajado me consolam.

“Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus


inimigos”
Perceba mais uma vez que, apesar de o tema das ovelhas e do pastor
continuar presente até certo ponto, estamos agora falando de uma mesa para
um banquete real, destinado ao consumo e ao deleite humano. Infelizmente,
há inimigos por perto (na verdade, o povo de Deus, e em especial a
juventude, sempre vive em território inimigo); porém, apesar disso, um belo
banquete está posto, e os inimigos não têm permissão para aproximar-se ou
perturbar o convidado especial. O anfitrião tem fartura de alimentos e poder
para proteger. Seu convidado pode comer e beber em paz. Há um sentimento
de invulnerabilidade, extremamente desejável em tempos de angústia.
Além do mais, é preciso notar que esse banquete é servido para o
viajante sem ser requisitado ou anunciado. A cena nos faz relembrar das
grandiosas palavras de Isaías a respeito da generosidade de Deus:
“Ó vós, todos os que tendes sede, vinde às águas, e os que não tendes
dinheiro, vinde, comprai, e comei; sim, vinde, comprai, sem dinheiro e sem
preço, vinho e leite.
Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão? E o produto do vosso
trabalho naquilo que não pode satisfazer? Ouvi-me atentamente, e comei o
que é bom, e a vossa alma se deleite com a gordura”.298
Não podemos deixar de notar que uma das razões teológicas pelas quais
o inimigo se mantém afastado dessa festa é a retidão do povo. O profeta Néfi
observou:
“E ele reúne seus filhos dos quatro cantos da Terra; e ele conta suas
ovelhas e elas conhecem-no e haverá um rebanho e um pastor; e alimentará
suas ovelhas e nele serão apascentadas.
E por causa da retidão de seu povo, Satanás não tem poder”.299
A certeza do triunfo de Cristo sobre o adversário e sobre nossas
imperfeições. Inesperado. Gratuito. (Às vezes não apreciado!) Sempre
ilimitado. Esse é o banquete da salvação: a derrota sobre a morte, sobre o
inferno e sobre os dias difíceis. Na visão final das coisas, João, o Revelador,
observa que a grata hospitalidade de Deus na eternidade constitui em sentar-
se à mesa da ceia do Cordeiro.300 Essa é a imagem culminante da Expiação e
da redenção de Jesus Cristo. Para um viajante cansado e amedrontado, tal
esplendor e repouso devem ser de tirar o fôlego. Preparas uma mesa perante
mim na presença dos meus inimigos.

“Unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda”


Em suas diversas formas, a palavra ungir aparece quase duzentas vezes
nas escrituras. Em tempos antigos, óleo perfumado era derramado sobre a
cabeça dos convidados, quando um ilustre anfitrião oferecia um banquete.
Naquela época, a unção sugeria, no mínimo, santidade e respeito.
Frequentemente implicava também um convênio. Em seu significado mais
elevado, a unção era parte de uma coroação, da concessão de um reino e
reinado. Todos esses significados estão presentes na profecia feita por Isaías
a respeito da vinda do Messias:
“O Espírito do Senhor Deus está sobre mim; porque o Senhor me ungiu,
para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de
coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos;
A apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança do nosso
Deus; a consolar todos os tristes;
A ordenar acerca dos tristes de Sião que se lhes dê glória em vez de
cinza, óleo de gozo em vez de tristeza, vestes de louvor em vez de espírito
angustiado; a fim de que se chamem árvores de justiça, plantações do Senhor,
para que ele seja glorificado”.301
Como mencionado antes, esta é a escritura messiânica que Cristo leu na
sinagoga em Nazaré, causando furor por ter em seguida dito aos presentes:
“Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos”.302
Num momento posterior da vida do Salvador, o tocante registro de
Lucas frisa um tipo diferente de unção sobre o Senhor:
“E rogou-lhe um dos fariseus que comesse com ele; e, entrando em casa
do fariseu, assentou-se à mesa.
E eis que uma mulher da cidade, uma pecadora, sabendo que ele estava à
mesa em casa do fariseu, levou um vaso de alabastro com unguento;
“E, estando por detrás, aos seus pés, chorando, começou a regar-lhe os
pés com lágrimas, e enxugava-lhos com os cabelos da sua cabeça; e beijava-
lhe os pés, e ungia-lhos com o unguento.
“Quando isto viu o fariseu que o tinha convidado, falava consigo,
dizendo: Se este fora profeta, bem saberia quem e qual é a mulher que lhe
tocou, pois é uma pecadora.
E respondendo, Jesus disse-lhe: Simão, uma coisa tenho a dizer-te. E ele
disse: Dize-a, Mestre.
Um certo credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos
dinheiros, e outro cinquenta.
E, não tendo eles com que pagar, perdoou-lhes a ambos. Dize, pois, qual
deles o amará mais?
E Simão, respondendo, disse: Tenho para mim que é aquele a quem
mais perdoou. E ele lhe disse: Julgaste bem.
E, voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês tu esta mulher? Entrei
em tua casa, e não me deste água para os pés; mas esta regou-me os pés com
lágrimas, e mos enxugou com os seus cabelos.
Não me deste ósculo, mas esta, desde que entrou, não tem cessado de
me beijar os pés.
Não me ungiste a cabeça com óleo, mas esta ungiu-me os pés com
unguento.
Por isso te digo que os seus muitos pecados lhe são perdoados, porque
muito amou; mas aquele a quem pouco é perdoado pouco ama.
E disse-lhe a ela: Os teus pecados te são perdoados.
E os que estavam à mesa começaram a dizer entre si: Quem é este, que
até perdoa pecados?
E disse à mulher: A tua fé te salvou; vai-te em paz”.303
O sentimento do salmista a respeito da unção sobre sua (nossa) cabeça é
significativo por causa da dádiva que Cristo concede a cada um de nós.
Assim como o convidado foi tratado como realeza, nós também temos a
chance de ter uma vida divinamente ordenada, como reis e rainhas no reino
eterno. Quando levamos em consideração as bênçãos desta vida e do mundo
vindouro, nosso cálice verdadeiramente “transborda”. A gratidão é a chave
para que possamos desfrutar de todos os outros dons de Deus, pois, sem ela,
todo o resto nos parecerá insuficiente e inadequado. Em vez de reclamar que
a vida é difícil, ou que nossas bênçãos não parecem suficientemente
abundantes, ou que as rosas estão cheias de espinhos, não deveríamos ser
gratos pela vida ser preciosa, apesar de difícil? Por termos a promessa de vida
eterna? Pelas bênçãos maravilhosas que temos? Pelas bênçãos ainda mais
maravilhosas que receberemos? Por existirem rosas entre os espinhos? No
evangelho de Jesus Cristo (reescrevendo um ditado popular), “tudo são
flores”. A bondade de Deus transborda. Unges a minha cabeça com óleo, o
meu cálice transborda.

“Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos


os dias da minha vida”
Infelizmente, o salmista não afirma que nosso cálice estará sempre cheio
na mortalidade, ou que nossa cabeça estará sempre ungida com óleo; porém,
neste versículo temos a promessa de que, mesmo nesta esfera telestial de
provações e crescimento, a bondade e a misericórdia de Deus estarão sempre
conosco. Isso significa que, assim como diz o hino, Deus nos guardará “com
o seu poder”, para todo o sempre, na alegria e na tristeza, nas vitórias e nas
derrotas.304 Na verdade, ao que parece a palavra em hebraico traduzida como
seguir significa algo mais próximo de perseguir. Nesse sentido, podemos nos
lembrar do poema “The Hound of Heaven” [O Cão de Caça Celestial], de
Francis Thompson. Nele, um cão de caça (o Senhor) “persegue” um cristão,
sem desistir, até que a presa pare de fugir da graça e submeta-se ao amor de
Deus e seja salvo.
Além disso, devemos notar que nesse versículo as palavras bondade e
misericórdia são usadas como substantivos e não como meros adjetivos ou
virtudes descritivas. Essa frase apresenta, pela primeira vez neste salmo, a
promessa de auxílio por meio de outras fontes divinas, além do Senhor. Na
tradição hebraica, muito já foi escrito a respeito da ideia de que dois anjos ou
mensageiros especiais são enviados pelo Senhor para cuidar de uma pessoa
ou dignitário especial. Eles devem estar sempre atentos e nunca abandonar a
pessoa. Um distinto estudioso foi mais longe ao afirmar que essa escritura é
precursora da ideia tradicional que surgiria a respeito dos “anjos da guarda”.
A noção de que existem dois anjos designados para cuidar especificamente de
cada mortal sobre a terra não faz parte de nossa doutrina, mas a realidade do
cuidado angélico é e sempre será nossa doutrina, “enquanto durar o tempo ou
existir a Terra ou existir na face da Terra um homem [ou mulher] para ser
salvo”.305
A mensagem é clara: Os seres celestiais, com bondade e misericórdia,
com ternura e compaixão, com força e segurança, cuidarão dos filhos de
Deus dia e noite, na saúde e na doença. Essa é a interpretação mais
importante e eterna deste versículo.
Mas também devemos levar em consideração outra possível leitura.
Outra possível interpretação — que parece estar de acordo com a crença
cristã — é que após termos sido tratados tão amorosamente pelo Bom Pastor
e por uma Hoste Real, devemos “[ir], e [fazer] da mesma maneira” aos
outros.306 Ou seja, se somos beneficiários de tamanha generosidade e
abundância, essas bênçãos deverão “[nos seguir]” e nos acompanhar, ficar
evidentes para as pessoas com que nos relacionamos, “todos os dias da
[nossa] vida”. Se fomos tratados com bondade, devemos agir com bondade.
Se fomos tratados com misericórdia, devemos agir com misericórdia. Onde
quer que andemos, as pessoas deveriam poder dizer de nós: “Estive na
presença de discípulos de Cristo. Senti bondade emanar deles. Encontrei
misericórdia em suas mãos. Eles vivem vidas de compaixão e amor. Essas
qualidades parecem ‘segui-los’, onde quer que andem”.
Um dos mais simples resumos da vida Cristo é que Ele “andou fazendo
bem”.307 A bondade “[o seguia]”. E deveria seguir aqueles que professam
Seu nome e O chamam Mestre. Certamente que a bondade e a misericórdia
me seguirão todos os dias da minha vida.

“Habitarei na casa do Senhor por longos dias”


Esta, como muitas outras, é uma referência sálmica ao santo templo.
Nunca é demais falar da importância que as ordenanças do templo têm no
plano de Deus para Seus filhos e Suas filhas. Todas as estradas do evangelho
levam à casa do Senhor (ou, como neste belo salmo, de volta à casa do
Senhor), o que é meio caminho para o céu. O templo é uma grande
intersecção entre o tempo e a eternidade. Lá, ao sermos instruídos e
comungarmos com o que é divino, aprendemos de maneira vigorosa e
pungente quem realmente somos, onde estávamos antes de virmos para cá,
porque era imprescindível que viéssemos à mortalidade e qual pode ser nosso
destino eterno, caso abracemos e vivamos as verdades do evangelho, em
especial às que dizem respeito à Expiação de Jesus Cristo.
Essa busca pessoal pela exaltação se reveste de maior importância à
medida que, ao longo de nossa estadia na Terra, adquirimos mais
entendimento sobre o significado da família eterna. No templo aprendemos,
novamente, que somos literalmente filhos e filhas espirituais de Deus, com
laços que nos ligam eternamente a Ele e uns aos outros, e com promessas
especiais quanto à continuidade das relações familiares após a morte. A
respeito destes que são “osso dos [nossos] ossos, e carne da [nossa] carne”,308
um profeta moderno perguntou: “Terá porventura existido um homem que
verdadeiramente amasse uma mulher — ou uma mulher que verdadeiramente
amasse um homem — sem jamais ter orado para que seu relacionamento
continuasse depois desta vida? Acaso existem pais que sepultaram um filho
sem almejar a garantia de que aquele ente querido voltaria a lhes pertencer
num mundo vindouro? Será que alguém que crê na vida eterna seria capaz de
duvidar que o Deus dos céus concederia a Seus filhos o atributo mais
precioso da vida, o amor, cuja expressão mais significativa encontra-se nos
relacionamentos familiares? Não, a razão exige que os relacionamentos
familiares continuem após a morte. O coração humano anseia por isso, e o
Deus dos céus revelou uma maneira de garantir que isso aconteça. As
ordenanças sagradas da casa do Senhor provêm o meio para tal”.309
Por causa dessas promessas sagradas, da santidade e da divina segurança
que são suas características, o templo sempre foi um lugar de refúgio em
tempos de angústia, uma fortaleza onde comungamos por meio de nossos
convênios, quando nossas necessidades se avolumam. Neste, que é o mais
consagrado dos edifícios, o espaço mais sagrado na Terra, Deus vem
figurativamente (e, um dia, virá literalmente) para nos cumprimentar,
investir-nos, abraçar-nos e nos selar como Seus. Em contrapartida, nós nos
esforçamos — dentro e fora de seus recintos — para nos erguer acima da
corrupção mundana e das influências perniciosas da mortalidade; para
alcançar possibilidades celestiais; para ser o melhor espírito que pudermos
ser, “tendo um perfeito esplendor de esperança e amor a Deus e a todos os
homens”.310 Tal revelação e renovação, tal coragem e paz atingem seu ápice
dentro do santuário do Senhor. Não é de se surpreender que os atos mais
furiosos de Jesus na mortalidade tenham sido em reação à dessacralização do
templo e de seus propósitos consagrados. E não é de se admirar que o
salmista encontre tamanha satisfação ao entrar no templo, para nunca mais
sair do alcance de seu consolo e proteção. João, o Revelador, viu essa grande
oportunidade estendida a todos nós: “Estes que estão vestidos de vestes
brancas, quem são, e de onde vieram? ( . . . ) Estes são os que vieram da
grande tribulação, e lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do
Cordeiro. Por isso estão diante do trono de Deus, e o servem de dia e de noite
no seu templo”.311 Habitarei na casa do Senhor por longos dias.
_______________
Ao encerrarmos este salmo (e este livro sobre os salmos), devemos notar
que a palavra Senhor (Yahweh) abre este canto/prece (“o Senhor é o meu
pastor”), e também o fecha (“na casa do Senhor por longos dias”). Apesar de
o nome de Jeová não ser usado no restante do Salmo 23, do início até o fim
fica claro que Ele é o Bom Pastor sobre o qual se fala, assim como o
generoso anfitrião real.
Nossa vida deveria ser como este salmo. Ele deveria ser nosso início e
nosso fim. Ele deveria ser nosso primeiro e nosso último. Ele deveria ser
nosso Alfa e nosso Ômega. “O Deus de toda a consolação”, como o Apóstolo
Paulo tão amorosamente O descreveu,312 deveria abrir e fechar nossa
experiência a cada dia e cada noite. Assim como Alma aconselhou a seu
filho: “Roga a Deus por todo o teu sustento; sim, que todos os teus feitos
sejam para o Senhor e, aonde quer que fores, que seja no Senhor; sim, que
todos os teus pensamentos sejam dirigidos ao Senhor, sim, que o afeto do teu
coração seja posto no Senhor para sempre. Aconselha-te com o Senhor em
tudo que fizeres e ele dirigir-te-á para o bem; sim, quando te deitares à noite,
repousa no Senhor, para que ele possa velar por ti em teu sono; e quando te
levantares pela manhã, tem o teu coração cheio de agradecimento a Deus; e
se fizeres essas coisas, serás elevado no último dia”.313
Nossas esperanças e nossos sonhos. Nosso início e nosso fim. Nosso
passado, nosso presente e nosso futuro deveriam ter como características a
proximidade e a adoração a Ele. Somos seu rebanho e deveríamos desejar ser
seus convidados especiais, não só em tempos de angústia, mas sempre.

Notas
^261. Kushner, The Lord Is My Shepherd, p. 9; tradução livre.
^262. Ver Moisés 5:5–8, 17–33.
^263. Isaías 53:6.
^264. Salmos 95:7.
^265. Mosias 18:9.
^266. Isaías 40:11.
^267. Ezequiel 34:11–16
^268. João 10:11–15.
^269. Hebreus 13:20.
^270. Doutrina e Convênios 1:38.
^271. Alma 37:16–17.
^272. Regras de Fé 1:13.
^273. Mateus 5:6.
^274. Mateus 6:19.
^275. 2 Néfi 9:51.
^276. W. Phillip Keller, A Shepherd Looks at Psalm 23, 1970, pp. 41–42.
^277. João 3:5.
^278. João 4:14.
^279. Kushner, The Lord Is My Shepherd, p. 65; tradução livre.
^280. João 4:14.
^281. João 6:35, 33.
^282. Keller, A Shepherd Looks at Psalm 23, p. 70.
^283. I Coríntios 10:12.
^284. João 15:2.
^285. Mosias 3:19.
^286. João 14:6.
^287. 2 Néfi 4:32–33.
^288. 2 Néfi 31:21; grifo do autor.
^289. Por exemplo, leve em consideração o fato de o Senhor ter mudado
o nome de Abrão para Abraão, e o nome de Jacó para Israel (ver
Gênesis 17:1–5; 32:28; também Isaías 62:2; Apocalipse 2:17; 3:12;
Doutrina e Convênios 130:11).
^290. Ver 3 Néfi 27:7–8.
^291. Ver Doutrina e Convênios 20:37.
^292. Ver Doutrina e Convênios 20:77.
^293. Ver Doutrina e Convênios 107:1–4.
^294. Êxodo 3:12.
^295. “No Monte a Bandeira”, Hinos, nº 4.
^296. Salmos 56:9.
^297. Isaías 11:4.
^298. Isaías 55:1-2.
^299. 1 Néfi 22:25–26; grifo do autor.
^300. Ver Apocalipse 19:9.
^301. Isaías 61:1-3.
^302. Lucas 4:21.
^303. Lucas 7:36–50.
^304. “Deus Vos Guarde”, Hinos, nº 85
^305. Ver Morôni 7:36.
^306. Lucas 10:37.
^307. Atos 10:38.
^308. Gênesis 2:23.
^309. Gordon B. Hinckley, “Por Que Há Templos?” A Liahona, outubro
de 2010, p. 21.
^310. 2 Néfi 31:20.
^311. Apocalipse 7:13–15.
^312. II Coríntios 1:3.
^313. Alma 37:36-37.
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