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ANÁLISE FUNDAMENTALISTA DO BITCOIN

Por: Gabriel Bearlz


Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

SUMÁRIO
▪ Introdução .................................................................................................................................. 03
▪ Histórico ..................................................................................................................................... 04
▪ Infraestrutura ............................................................................................................................. 11
o Public Key Cryptography (PKC) ..................................................................................... 11
o Curvas Elípticas ............................................................................................................. 12
▪ Blockchain do Bitcoin ................................................................................................................. 14
o A Blockchain ................................................................................................................. 14
o Nodes ........................................................................................................................... 15
o Hash .............................................................................................................................. 15
o Merkle Tree .................................................................................................................. 17
▪ Mineração .................................................................................................................................. 20
o A Mineração ................................................................................................................. 20
o Hash Target .................................................................................................................. 22
o Hash Rate ..................................................................................................................... 22
o Proof-of-Work .............................................................................................................. 23
o Halving .......................................................................................................................... 25
o Business de Mineração ................................................................................................. 28
▪ Pool de Mineração ......................................................................................... 28
▪ Hardwares (ASICs) .......................................................................................... 29
▪ Concentração ................................................................................................. 30
▪ Ataque 51% .................................................................................................... 31
▪ Mineradores e a Pressão de Venda ............................................................... 32
▪ Entendendo a Escalabilidade do Biticoin ................................................................................... 42
▪ Evoluções da Blockchain e do Bitcoin ........................................................................................ 44
o Open Source ................................................................................................................. 44
o Lightning Network ........................................................................................................ 45
o Segwit ........................................................................................................................... 48
o Forks ............................................................................................................................. 49
▪ Risco Regulatório ........................................................................................................................ 53
▪ Análise de Mercado .................................................................................................................... 55
▪ Considerações Finais................................................................................................................... 64

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INTRODUÇÃO

O Bitcoin é a primeira moeda digital, global e 100% descentralizada. A moeda, que foi
lançada em 2009, possui algumas características que justificam sua utilização em massa
nos dias atuais, assim como seu valor de mercado.

Primeiramente, o conceito de descentralização. O Bitcoin é construído em cima da rede


blockchain, fator que permite que todas as transações da moeda ocorram de forma
peer-to-peer, sem necessidade de um intermediador. Os mais puristas defensores do
Bitcoin reforçam a importância de a moeda não sofrer interferências de bancos ou
Estados.

Em segundo lugar, destaco o conceito de escassez. Nos últimos meses, política


monetária é o assunto em pauta, vide Bancos Centrais expandindo seus balanços em
combate à crise causada pelo Covid-19. Ao contrário de moedas fiat, o código do bitcoin
não permite a livre “impressão” de moedas. A sua emissão é controlada e a oferta total
travada em um número pré-definido de moedas. Essa característica faz com que o
Bitcoin seja visto por muitos como moeda não inflacionável e uma reserva de valor.

Por último, destaco a tecnologia por trás da moeda. Além da blockchain, que permite a
execução do conceito de descentralização, a característica do código do bitcoin ser open
source permite a constante evolução da tecnologia na qual a moeda é ancorada,
permitindo que gargalos no daily use da moeda possam ser estudados e aprimorados.
Ainda, para que essas mudanças sejam executadas, é necessário a validação da maior
parte da rede, retirando o risco da tomada de decisão de um player centralizador.

Nessa análise, abordaremos com maior profundidade cada um desses pontos, com
ênfase nos diferenciais e riscos dessa tecnologia.

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HISTÓRICO

Em 31 de outubro de 2008 foi publicado o “White Paper” 1 do Bitcoin – um pdf de 9


páginas que explica o funcionamento do ativo. O documento foi publicado por um
programador auto intitulado Satoshi Nakamoto (identidade real desconhecida), onde
ele deixa claro a intenção de criar um método de pagamentos descentralizado.

O White Paper, intitulado “Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System”, inicia-se


com: “A purely peer-to-peer version of electronic cash would allow online payments to
be sent directly from one party to another without going through a financia l institution.”

Key events:

2008 –

▪ Publicação do White Paper do bitcoin.

2009 –

▪ Mineração do primeiro bloco do bitcoin.

2010 –

▪ Lançamento da BitcoinMarket.com, primeira exchange da moda.


▪ Primeira compra: a primeira utilização do bitcoin como método de pagamento.
Um programador comprou duas pizzas por 10.000 BTC, uma transação que hoje
valeria U$ 230 milhões.
▪ Lançamento da primeira “faucet” de bitcoin, uma forma de distribuir
gratuitamente criptomoedas, que originalmente concentravam-se
principalmente nas mãos de mineradores.

2011 –

▪ Lançamento de novas criptomoedas. Namecoin, Swiftcoin e Litecoin nasceram


como forks do próprio bitcoin.

1
https://bitcoin.org/bitcoin.pdf

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2012 –

▪ Primeiro halving do bitcoin.

2013 –

▪ Banimento do bitcoin na China.


▪ Bug em uma atualização da rede (BerkeleyDB bug na versão 0.8) ocasionando
acidentalmente um hard fork e sendo solucionado quando os usuários voltaram
a utilizar a versão antiga.
▪ Primeira audiência no Departamento de Segurança dos EUA para discutir o
bitcoin.
▪ Criação de ASICs (equipamentos específicos para mineração do bitcoin).

2014 –

▪ Uma série de ataques hacker à principal exchange do mundo na época,


resultando no roubo de 850.000 bitcoins e consequentemente sua falência.
▪ Criação da Pantera Capital e Grayscale, as duas maiores gestoras de
criptomoedas do mundo.

2016 –

▪ Publicação do whitepaper da Lightning Network, uma das principais evoluções


existentes na rede do bitcoin.
▪ Segundo halving do bitcoin.

2017 –

▪ Bitcoin Scaling Agreement (ou New York Agreement), o que levou à criação da
Segwit.
▪ Hard fork do Bitcoin Cash, ocasionado devido à falta de acordo em relação às
mudanças no código do bitcoin que aumentaria agressivamente o tamanho do
bloco da blockchain, visando endereçar os problemas de escala do ativo.
▪ Suspensão do “2x” hard fork. Outro hard fork que visava aumentar o tamanho
do bloco da blockchain foi suspenso devido à oposição dos usuários da rede.
▪ Publicação do protocolo Lightning Network.

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▪ CME lança o primeiro contrato futuro de bitcoin.

2018 –

▪ 80% da oferta de bitcoin é minerado.


▪ SEC define que o bitcoin não é um “valor mobiliário”.

2019 –

▪ Lançamento da Bakkt, empresa controlada pelo mesmo grupo que controla a


NYSE, voltada para oferecer contratos futuros em bitcoin.
▪ A FCA (UK Financial Conduct Authority) declara que não irá regular o bitcoin.

2020 –

▪ Terceiro halving do bitcoin.


▪ Primeiro banco de criptomoedas do UK.
▪ Suécia lança sua CBDC (Central Bank Digital Currency).
▪ OCC aprova a custódia de bitcoin por bancos americanos.
▪ MicroStrategy investe U$ 650 milhões em bitcoin. 2
▪ Paypal lança serviço de compra e venda de bitcoin em sua plataforma.3

Como visto, o bitcoin é uma inovação recente (2008) com um histórico muito curto
desde a utilização ampla do ativo (essa definição é relativa, há motivos para dizer que o
bitcoin ainda não é utilizado amplamente). Durante esse percurso, a moeda passou por
obstáculos relacionados à regulação por Estados ou órgãos reguladores do mercado
financeiro. Em 2020, estamos observando um movimento muito forte de
institucionalização do mercado como um todo, o que pode ser considerado um grande
passo na curta história do ativo.

Os primeiros anos do bitcoin foram marcados pela utilização fraudulenta da moeda. A


primeira grande aplicação do BTC foi o Silk Road (2011), um grande marketplace da Deep
Web, onde era possível comprar produtos ilícitos utilizando a moeda. No mesmo ano,

2
https://www.coindesk.com/microstrategy-buys-bitcoin-debt
3
https://www.paypal.com/us/webapps/mpp/crypto

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de acordo com um estudo promovido pela Universidade de Sidney, 44% dos bitcoins
existentes tinham alguma relação com atividades ilícitas.

Interface do Silk Road.

O início da utilização do bitcoin como método de pagamentos começou a sinalizar os


problemas de escalabilidade do ativo. Como consequência, surgiram diversas propostas
de alterações no código do BTC, resultando na criação de novas moedas (o chamado
hard fork). A maior parte desses projetos não decolaram e o bitcoin provou-se a solução
mais segura, apesar da dificuldade em escalar as transações.

Durante o período (2011-2014), como esperado, o mercado de criptomoedas era


extremamente amador e pouco seguro. Havia pouca informação disponível para o
usuário leigo (que não fosse programador) sobre a tecnologia da blockchain, as
melhores formas de armazenar sua cripto, como funcionam wallets, etc. Além disso, o
mercado possuía poucos players e prestadores de serviços. A maior parte do volume
concentrava-se em poucas exchanges com práticas rústicas de segurança. Prato cheio
para hackers.

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Foi nesse contexto que, em 2013 e 2014, a maior exchange do mundo até então (Mt
Gox), que concentrava cerca de 70% da circulação do mercado, foi hackeada repetidas
vezes. Os ataques resultaram em um prejuízo de 850.000 bitcoins para os usuários.

Na linha da escalabilidade do bitcoin, o período viu uma importante inovação para o


ativo: a criação de ASICs, equipamentos específicos para mineração de criptomoedas.
Essa inovação foi importante pois aumentou a capacidade computacional dos
mineradores, que são o elo responsável pela validação das transações em bitcoin. O
gráfico abaixo mostra a capacidade de mineração e a evolução dos principais hardwares
dedicados.

O próximo passo do amadurecimento desse mercado foi o surgimento dos primeiros


fundos de investimento em criptomoedas. Em 2014, a Pantera Capital e a Grayscale
entraram no business. Não coincidentemente, hoje são as duas maiores gestoras de
criptomoedas do mundo.

Em 2017, a criação de contratos futuros de bitcoin pela CME (segunda maior exchange
de contratos futuros do mundo) foi um evento essencial para a entrada dos investidores
institucionais no mercado, junto com a Lightning Network, solução criada para
endereçar os problemas de escalabilidade do bitcoin.

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Tudo somado, a segunda metade de 2017 viu um forte movimento de bolha no mercado
de criptomoedas. Um grande volume de investidores não fundamentados entrou em
um mercado com uma infraestrutura completamente despreparada. A rede não
suportou esse movimento, taxas de transações explodiram e o tempo médio de
validação de uma transação aumentou expressivamente. Não coincidentemente, o
mercado sofreu uma correção forte nos meses seguintes, criando um ambiente
extremamente adverso para as criptomoedas.

Apesar da bolha e da crise subsequente, esse período foi importante para abrir os olhos
do mundo para o bitcoin. Embora boa parte dos investidores que saíram lesionados da
crise tenham carregado o mantra “criptomoeda é bolha”, uma série de investidores
institucionais passaram a estudar esse mercado. Nos últimos 3 anos, mais de U$ 1,2
bilhão foram aportados via Venture Capital em empresas especializadas em custódia e
investimento institucional em criptomoeda.

Assim como o mercado privado abriu os olhos para cripto, com o setor público não foi
diferente. Passado 2017, as discussões envolvendo órgãos governamentais e
criptomoedas cresceram, principalmente após a divulgação em 2018 de que o Facebook
estaria lançando a sua própria moeda digital. Frente ao cenário de uma base de 4 bilhões

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de clientes com acesso à essa tecnologia, esse movimento fomentou a discussão de


Bancos Centrais criarem CBDCs (Central Bank Digital Currency).

É completamente plausível afirmar que o ano de 2017 foi um divisor de águas para o
mercado de cripto e para o bitcoin. Desde então estamos vendo um movimento desse
mercado saindo do amadorismo e caminhando para a institucionalização, representada
pelo aprofundamento de estudos em cripto, investimentos em empresas de tecnologia
em blockchain ou custódia e discussões mais tolerantes com a esfera pública.

Nessa linha, 2020 pode ser visto como um ano de confirmação dessa tendência. O
número de investidores institucionais e valores sob gestão em fundos de cripto
disparou, além de observarmos a entrada de players que antes eram céticos quanto à
utilização de criptomoedas, como o Paypal, que disponibilizou dentro de sua plataforma
a compra e venda de bitcoin, projetando para 2021 a realização de pagamentos dentro
da plataforma utilizando a moeda. Para termos uma ideia de dimensões, estima-se que
o bitcoin possui 100 milhões de usuário ativos, enquanto o Paypal possui 350 milhões.

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INFRAESTRUTURA

PUBLIC KEY CRYPTOGRAPHY (PKC) –

Um dos conceitos fundamentais para entender o funcionamento da blockchain e a


segurança dessa tecnologia é a PKC, ou public key cryptography. A PKC é uma
criptografia que se baseia em chaves públicas, privadas e assinaturas digitais. Essa
dinâmica de utilizar duas chaves fornece ao PKC um conjunto de características e
capacidades para resolver uma série de problemas. Esse tipo de criptografia tornou-se
um importante elemento da segurança computacional moderna, sendo utilizado em
diversas soluções.

Em um sistema PKC, a chave pública é utilizada por um remetente para criptografar a


mensagem, enquanto o destinatário utiliza uma chave privada para decriptografar a
mesma mensagem. Todo par é único e todas as chaves são diferentes entre si, além dos
pares matemáticos serem muito grandes. Logo, essas duas características fazem com
que seja praticamente impossível chegar no remetente partindo do destinatário.

PKC também é conhecida como criptografia assimétrica. A criptografia simétrica é feita


quando a mensagem é enviada por meio de uma única chave. Ou seja, ao possuir essa
única chave, têm-se a mensagem inteira.

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Na blockchain do bitcoin, a PKC é a base do sistema de transmissão de informações. As


chaves públicas correspondem ao endereço da sua carteira (wallet), ou seja, onde suas
criptomoedas estão localizadas. Já a chave privada será responsável por confirmar as
suas transações. Ou seja, qualquer movimentação de bitcoin em sua wallet só será
confirmada por quem detém a posse da chave privada.

Porém, a lógica do sistema depende da presunção de que a chave privada é secreta.


Caso essa chave seja “roubada”, a segurança acaba. Caso o dono perca a chave, fica
impossível de confirmar qualquer transação, ou seja, seus bitcoins foram perdidos. Esse
tipo de equívoco é conhecido como “burn coins”.

Ainda, como estamos falando de um algoritmo de criptografia complexo, o processo de


validação pode ser lento quando estamos lidando com uma quantidade relevante de
dados.

CURVAS ELÍPTICAS –

Discutindo a PKC, concluímos que a segurança da blockchain consiste na criptografia


baseada em chaves públicas/privadas e o sistema de validação das transações. Porém,
devemos validar o mecanismo que permite que seja muito improvável realizar a
criptografia reversa, ou seja, descobrir a chave privada a partir da chave pública.

Esse mecanismo se chama curvas elípticas, e corresponde à função matemática por trás
da PKC. Primeiramente é interessante pontuar que existem duas formas de realizar esse
tipo de criptografia: curvas elípticas ou RSA, modelo amplamente usado em
programação. Porém, a maioria das criptomoedas utilizam as curvas elípticas pois elas
permitem o mesmo nível de segurança com uma quantidade menor de dados. Por
exemplo, uma chave de 256-bit criptografada por curvas elípticas é tão segura quanto
uma chave de 3072-bit criptografada por RSA. Como estamos falando de bitcoin e existe
a necessidade de escalabilidade e velocidade na validação de transações, o primeiro
modelo prova-se mais lógico.

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Uma curva elíptica consiste na curva referente a um tipo específico de equação


matemática. No caso da curva do bitcoin e outras criptomoedas, a equação é :

y² = x³+7

O formato da curva é o seguinte:

Por que essa função matemática permite uma criptografia assimétrica?

Uma curva elíptica de 256-bit significa que a função partiu de um ponto específico da
curva (chave pública), adicionou um outro ponto aleatório e a partir dessa união
encontrou um terceiro ponto na curva. A partir desse ponto, adicionou um novo
elemento, encontrando um novo terceiro ponto. Esse processo foi realizado 510 vezes
até encontrar um último ponto, que corresponde à chave privada.

Realizar a derivação inversa dessa curva e chegar no ponto de partida é impossível para
qualquer algoritmo computacional existente hoje. Grosso modo, matematicamente
improvável e praticamente impossível. Apesar desse modelo ser a base de grande parte
da criptografia computacional do mundo, não se exclui a possibilidade do
desenvolvimento de soluções computacionais que possam realizar esse tipo de
operação.

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BLOCKCHAIN DO BITCOIN

A BLOCKCHAIN –

Como dizer se um dólar, uma CNH ou um cartão de voto são verdadeiros ou falsos? Cada
um deles possui um número de identificação, registrado no sistema de alguma
autoridade que validará a veracidade. Com o bitcoin, a blockchain exerce o papel de
sistema onde as transações passam por um processo de validação. Porém, ao invés
desse processo ocorrer centralizado nas mãos de uma autoridade, a blockchain permite
que todos os usuários do sistema sejam validadores e armazenadores de todas as
transações envolvidas nesse ecossistema.

A blockchain é considerada uma tecnologia revolucionária por dois motivos principais:

1. Para alterar qualquer dado existente em um bloco antigo da blockchain, seria


necessário alterar todos os blocos seguintes, uma quantidade imensa de dados.
2. Para uma transação ser validada e anexada na blockchain, é necessário a
aprovação de 50% + 1 de toda a rede. Portanto, para fraudar uma transação de
bitcoin, é necessário ter o controle da maior parte do poder de validação da
blockchain.

Para realmente entender a forma como a blockchain funciona, faz-se necessário o


entendimento de conceitos técnicos como nodes, hash, nonce e markle tree, como
veremos a seguir

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Esquema de validação da blockchain.

NODES –

Como dito anteriormente, a blockchain pode ser vista como o livro razão do bitcoin,
onde todas as suas transações são registradas e validadas. Para uma nova transação ser
registrada, é necessário que 50% + 1 dos computadores ligados à blockchain validem e
“anotem” essa operação em sua cópia do livro razão (blockchain). Quando esse processo
é feito e a veracidade das transações é comprovada, elas são atualizadas em todas as
cópias da blockchain.

Esses computadores responsáveis por validar as transações são conhecidos como


nodes. Existem dois tipos de nodes, sendo os full nodes os principais. Full nodes
possuem a cópia completa de todas as transações e blocos da blockchain, desde seu
início. Eles são capazes de criar blocos e adicioná-los à rede do Bitcoin, enquanto os
demais nodes apenas tem o poder de validar novas transações.

Atualmente a rede possui pouco mais de 100 mil full nodes ao redor do mundo. Por um
lado, esse número expressivo pode representar a descentralização da rede em torno de
um dos principais pilares da sua segurança: a validação das transações. Por outro lado,
não existe um dado referente à concentração de full nodes referentes a uma mesma
empresa.

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HASH –

Hash é o nome de uma função matemática que realiza um cálculo transformando um


arquivo de saída em outro arquivo completamente diferente. A função hash não é uma
função criptográfica, é uma função que condensa uma grande quantidade de dados em
uma pequena quantidade de dados, chamada de hash (na linguagem popular, uma
mensagem criptografada).

No caso da blockchain do bitcoin, todos os dados da transação passam por um processo


de criptografia via função hash. A função específica usada é conhecida como SHA 256,
criada pela agência de segurança nacional do USA em 2002.

No exemplo abaixo, vemos a frase “Compre Bitcoins” criptografada via função hash.

A SHA 256 é a função escolhida para ser utilizada na blockchain por ter características
fundamentais para a segurança da rede:

1. O hash é determinístico.

O hash ser determinístico significa que ele sempre irá gerar o mesmo hash para um dado
arquivo de saída e nunca irá gerar o mesmo hash para dois arquivos de saída diferentes.
Ainda, uma pequena mudança no arquivo de saída gera uma hash completamente
diferente, como no exemplo abaixo.

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Portanto, caso haja alguma alteração no dado original da transação, o hash é


completamente alterado, tornando mais fácil o processo de descobrimento da fraude.

2. A função hash só funciona de um lado.

Diferentemente de funções de criptografia “comuns”, a função hash só funciona de um


lado. Isso significa que a partir do hash é impossível realizar engenharia reversa e chegar
no conjunto de dados que originou esse arquivo criptografado, característica
fundamental para a garantia da segurança da rede (um usuário fraudulento não
consegue acessar o hash, voltar à mensagem e alterá-la, para depois validá-la como
verdadeira) além de manter o sigilo de todas as transações.

MERKLE TREE –

Como explicado anteriormente, todas as transações realizadas em bitcoin são


codificadas via função hash. Ainda, é sabido que um bloco da blockchain é formado por

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um conjunto de transações. Logo, caso fosse necessário validar todas as transações, uma
por uma, para validar a veracidade de um bloco, o processo seria extremamente custoso
e demorado. Dessa forma, a estrutura conhecida como “Merkle Tree” é utilizada na
blockchain para transformar esse processo mais eficiente.

A merkle tree é uma estrutura em que vários hashs são combinados de pares em pares,
passando por uma nova etapa de criptografia a cada combinação, até formar uma
espécie de “árvore reversa”, resultando em um hash único conhecido como “merkle
root” ou “root hash”. O esquema abaixo exemplifica esse processo.

Esse root hash ou merkle root será anexado no bloco da blockchain, de forma a resumir
todas as transações presentes dentro daquela unidade. Essa estrutura é essencial para
a verificação da integridade de todos os dados dentro do bloco, pois qualquer mudança
pequena em alguma transação irá alterar o root hash. Dessa forma, um validador
encontrará um root hash enquanto outro validador encontrará um root completamente
diferente (fruto de uma transação fraudulenta). Quando isso acontece, esse node rejeita
o bloco. A partir daí, o processo reverso para encontrar a fraude é mais fácil, basta
descer as camadas da merkle tree e ir traçando o caminho dos hashs alterados, ao invés
de analisar cada transação individualmente, caso não houvesse esse tipo de estrutura.

A merkle tree é essencial em um ecossistema peer-to-peer onde há o compartilhamento


e validação de informação por meio dos próprios usuários, pois condensa uma

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quantidade robusta de dados em apenas um fragmento, fácil de ser validado. O bitcoin


e a blockchain já enfrentam sérias dificuldades em escalar a rede e a merkle tree permite
que o processo de validação dos blocos seja muito mais rápido.

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MINERAÇÃO

A MINERAÇÃO –

O processo de mineração é a espinha dorsal da rede do bitcoin e analisá-lo é


fundamental para entender a segurança da rede e seus principais gargalos.

Primeiramente, vamos entender a estrutura de um bloco da blockchain:

Ao analisar um bloco, nos deparamos com o Prev Hash (hash do bloco anterior da
blockchain), Nonce (número aleatório, única parte passível de alteração do bloco),
Merkle Root (hash que resume todas as transações dentro do bloco) e o Timestamp
(data e hora da construção do bloco).

Todas essas informações passam por um processo de criptografia, gerando uma função
hash para esse bloco:

A atividade do minerador consiste em alterar o nonce desse bloco repetidas vezes até
encontrar um hash que atenda à certas características específicas (abordaremos em
seguida, por hora tome essa informação como dada). Ao encontrar esse número, diz-se
que o minerador encontrou o Golden Nonce. Ele deve informar o valor desse nonce à

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rede e assim que todos os computadores o utilizarem e 50% + 1 comprovarem que esse
nonce gera um hash que atende às características pedidas pela rede, o bloco será
incorporado à blockchain e o minerador recebe uma recompensa por seu trabalho (uma
quantidade pre definida de bitcoins + taxas de transação da rede).

Antes de continuar, é importante entender o porquê desse modelo garantir que


nenhuma operação fraudulenta seja validada. Como dito, os nodes da rede validarão as
transações, enquanto o full node criará novos blocos. Feito isso, esses blocos partem
para a validação dos mineradores. Cada minerador receberá o mesmo bloco e tem o
dever de, por tentativa e erro, definir um hash para esse bloco. Caso algum node ou
minerador tenha alterado alguma transação que houve nesse bloco, o merkle root do
bloco será diferente para um conjunto diferente de mineradores. Um minerador pode
até encontrar um nonce que valide um bloco fraudulento, porém ele precisará que a
maior parte da rede dê o double check dizendo que aquele merkle root realmente é o
verdadeiro, o que não irá acontecer. A única possibilidade dessa fraude acontecer é caso
50% + 1 da rede esteja alinhada em confirmar que aquela transação fraudulenta que
alterou o merkle root do bloco é verdadeira. Esse fenômeno é conhecido como “ataque
51%” e é o maior risco de todo o ecossistema do bitcoin.

Ainda, vê-se no formato do bloco que todos possuem um Prev Hash, ou o hash do bloco
validado anteriormente. Esse fator garante uma das características fundamentais da
blockchain: alterar um bloco antigo irá alterar o merkle root desse bloco, logo, alterar
seu hash e alterar toda a cadeia, pois todos os blocos são conectados pelo hash do bloco
antigo.

Caso desejasse validar essa fraude, esse usuário teria que revalidar todos os blocos antes
que seja adicionado um novo bloco à blockchain, algo que ocorre a cada 10 minutos.
Para isso, seria necessário encontrar os hashs válidos para esses novos blocos e validar
o bloco fraudado atual antes que o restante da rede valide um bloco não fraudulento.
Para que isso ocorra, o poder computacional desse indivíduo deve ser superior ao resto
da rede. Por esse motivo, é considerado impossível que um indivíduo que não domine a
maioria da rede possa fraudar a blockchain.

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HASH TARGET –

A característica específica que o hash deve cumprir para validar um bloco é o seu
tamanho. Inicialmente, é importante pontuar que para a computação, o número zero
no início de um hash significa um espaço vazio, ou um algoritmo a me nos. Logo, o
tamanho do hash depende da quantidade de zeros no seu início e essa característica
definirá se um hash encontrado por um minerador será valido ou não.

Vale reforçar que quanto menor o tamanho desse hash, mais difícil será de encontrá-lo.
Essa definição é essencial para entender o hash rate, que abordaremos mais à frente.

Pensando no tamanho do bloco, o algoritmo da blockchain define automaticamente um


hash target, ou seja, um tamanho máximo para o hash do bloco. A cada duas semanas,
a rede redefine esse tamanho, de forma a balancear sempre a dificuldade da mineração.
Essa é a característica que o minerador deverá buscar no hash do bloco ao testar
diversos números de nonce. É importante reforçar que o trabalho do minerador não é
de adivinhar um hash, mas sim de mudar repetidamente uma parte específica do bloco
(nonce) para que o hash resultante tenha um tamanho menor que o tamanho do hash
target.

HASH RATE –

Hash rate consiste na quantidade de hash produzido por segundo na rede do bitcoin. Ou
seja, quantas vezes é possível gerar um hash tentando validar um novo bloco. Caso a

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rede aumente seu poder computacional e consiga processar uma quantidade maior de
hash por segundo (aumentando seu hash rate), é lógico imaginar que o tempo médio
para validar um bloco diminuirá. Compreender o mecanismo de equilíbrio do hash rate
é fundamental para entender a dinâmica da mineração e outras características da
segurança da rede.

Apesar do aumento expressivo da hash rate do bitcoin, o tempo médio de validação de


um bloco não se alterou. Isso acontece porque o algoritmo da blockchain controla os
mineradores a partir de um mecanismo de oferta e demanda. A rede sempre busca
manter o tempo médio da mineração de um bloco em dez minutos.

Como dito, o processo de validação de um bloco passa pelo hash target e o tamanho do
hash target define a dificuldade de encontrá-lo. Quando a rede lê um aumento de hash
rate e, consequentemente, a diminuição do tempo médio de mineração, ela ajusta a

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dificuldade da mineração. A cada 2016 blocos minerados (em média, duas semanas), a
rede observa a distância dos blocos (tempo que levou para minerá-los) e toma uma
decisão sobre o ajuste de dificuldade.

Tempo médio de validação de um bloco em minutos vs número de blocos:

Agora, vamos imaginar o seguinte cenário:

Trabalhando com um cenário em que o bitcoin esteja a U$ 1000, existam 4 pessoas


minerando o ativo e recebendo 0,1 BTC (U$ 100,00) por hora por um custo (custos
variáveis de energia elétrica, excluiremos os custos fixos por simplificação) de U$ 50 por
hora. Após um dia, o bitcoin sofre uma alta para U$1.500 em seu preço (valorização de
50%). Torna-se mais interessante minerar novos Bitcoins, pois a atividade tornou-se
mais lucrativa, pois 0,1 BTC agora valem U$ 150,00.

A taxa de lucro atraiu dois novos mineradores, o que fez com que o tempo para minerar
um novo bloco fosse reduzido para 7 minutos e aumentou a Hash Rate (há mais pessoas
cedendo seu poder computacional). O grau de dificuldade é aumentado em 50% pelo
algoritmo, forçando com que os mineradores gastem mais poder computacional para
minerar (criar) novos Bitcoins e aumentando o tempo médio de mineração de um bloco

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para 9 minutos, o que torna a atividade 20% menos lucrativa para os mineradores. Um
minerador decide que a lucratividade da operação está baixa (foi reduzida de U$ 100,00
para U$75,00) e se retira, reduzindo mais o tempo de mineração de um novo bloco, que
passa a ser de 10 minutos.

No final do processo, há mais mineradores na rede, em uma dificuldade maior, como o


mesmo tempo de mineração de um novo bloco definido pelo algoritmo (dez minutos),
o que aumentou a Hash Rate de forma consistente.

Por que existe esse mecanismo?

Principalmente porque ele garante que não haja a fuga de mineradores da rede . Caso o
preço do bitcoin caia consideravelmente e a dificuldade de minerar um bloco continue
constante, pode-se criar um cenário em que a remuneração dos mineradores não
compense os custos fixos e variáveis da atividade, fazendo com que ele simplesmente
pare a atividade. Esse cenário seria catastrófico para o bitcoin pois a rede simplesmente
não teria mais validadores de blocos, logo, não seria possível realizar nenhuma
transação.

Ainda, em momentos de alta do bitcoin, as margens desses mineradores aumentariam,


criando uma tendência de acúmulo de capital nos maiores players, o que levaria a
maiores CapEx e inovação de hardware, favorecendo a concentração da rede (isso já
acontece, apesar do mecanismo de oferta e demanda atenuar a tendência).

Em suma, podemos entender o mecanismo de oferta e demanda da blockchain da


seguinte forma:

- Quando o preço do bitcoin sobe, as margens dos mineradores também sobem e há


uma tendência de entrada de novos players, aumentando a hash rate e reduzindo o
tempo de mineração de um bloco. A resposta da rede é o aumento da dificuldade da
mineração.

- Quando o preço cai, as margens dos mineradores são reprimidas e há uma tendência
de fuga de players, diminuindo a hash rate e aumentando o tempo de mineração de um
bloco. A resposta da rede é a redução da dificuldade da mineração.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

O gráfico abaixo mostra o mecanismo em pleno funcionamento:

PROOF-OF-WORK –

Proof-of-work (POW) é o modelo pelo qual a rede da blockchain remunera o trabalho


dos mineradores. A ideia de POW foi introduzida em 1993 como uma forma de validação
descentralizada de e-mail. Posteriormente, Satoshi Nakamoto definiu esse como o
modelo da blockchain do bitcoin.

Proof-of-work, como o próprio nome diz, remunera um minerador que prove o seu
esforço. Quando um minerador encontra um Golden Nonce antes dos outros players,
ele envia esse valor para a rede e ao 50% + 1 o validarem como correto, esse minerador
recebe um prêmio por isso. No caso da blockchain do bitcoin, ele recebe uma
quantidade pré-definida de moedas, além das taxas de transação da rede, que são
variáveis e pagas por cada um dos usuários.

Por que é bom?

Porque cria um incentivo para a entrada de diversos players na rede, colaborando para
a descentralização da mineração. Como mostrado anteriormente, o modelo de proof-
of-work, junto com o mecanismo de equilíbrio da dificuldade da mineração, faz com que

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

o business de mineração seja atrativo em qualquer cenário de preço do bitcoin,


anulando o risco sistêmico de pane na rede por falta de validadores.

Por que não é bom?

Porque cria um business de escala que tende a centralizar o mercado. Entenda que o
minerador só recebe a remuneração da rede se ele encontrar o Golden Nonce antes dos
outros. Ou seja, a remuneração é diretamente ligada ao poder computacional do player.
Essa característica faz com que mineradores se juntem em pools (literalmente
empresas) bem capitalizados, com acesso aos hardwares mais desenvolvidos do
mercado e consequentemente com um controle de boa parte da rede. Enquanto isso,
apesar do mecanismo de equilíbrio de dificuldade, players menores são cortados da
rede.

Ainda, à medida que o preço do bitcoin sobe e a remuneração aumenta, mais players
entram na rede e a dificuldade da mineração também aumenta. Essa dinâmica faz com
que o trabalho para validar um único bloco seja progressivamente maior, aumentando
o consumo de energia que esses hardwares têm para realizar a mineração. Como base
comparativa, hoje os mineradores consomem mais energia que países como a Nova
Zelândia, Bélgica ou Portugal.

Por fim, têm-se o risco do ataque 51%. Nada impede que pools de mineradores se
juntem de forma a tomar controle da maior parte da rede e fraudar as operações, visto
que esses players são progressivamente mais capitalizados. Hoje já podemos observar
uma concentração relevante da mineração do bitcoin, como analisaremos à frente.

Solução proposta: proof-of-stake –

Desde os primórdios do bitcoin os problemas do modelo de proof -of-work são


conhecidos. Em 2009, em um fórum na internet, foi lançada a ideia do proof-of-stake
(POS). Atualmente, esse é o algorítmo de validação de parte da ETH 2.0.

No modelo de POS, alguns membros da rede são escolhidos para validarem o próximo
bloco. Nesse formato, não falamos de mineradores, falamos de validadores. Para se
tornar um validador, o usuário precisa depositar uma certa quantidade de moedas que

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

ficam travadas na rede, como um colateral. A chance de você ser escolhido para forjar
o próximo bloco depende da quantidade de moedas que você deposita em garantia,
como exemplificado abaixo.

Como recompensa, o validador recebe as taxas das transações presentes naquele bloco
específico.

A segurança do modelo de POS mora no fato de que validadores perdem uma parte do
seu depósito caso aprovem transações fraudulentas. O desenho financeiro do modelo
de POS faz com que o validador perca mais depósito do que seja possível ganhar com a
fraude de um bloco. No modelo de POS, para realizar um ataque 51%, seria necessária
uma quantidade abundante de moedas para depositar em colateral para poder validar
as operações. Caso o BTC operasse via POS, para realizar um ataque 51%, seria
necessário U$ 79 bilhões.

HALVING –

Como vimos, o modelo de proof of work remunera o minerador pelo seu esforço e
energia elétrica consumida. A cada novo bloco criado (golden nonce encontrad o e
validado pelo resto da rede) o minerador recebe uma recompensa em bitcoins, além das
taxas de transações pagas pelos usuários da rede.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Porém, essa emissão de moedas como recompensa não é infinita. Para evitar que a
moeda passe por um processo de inflação, essa recompensa é progressivamente
reduzida, até chegar a zero (como a rede equilibra o tempo médio de mineração, a
expectativa é de que esse momento ocorra em 2140). A recompensa é zerada quando
a quantidade total de bitcoins na rede chega a 21 milhões. Esse processo é conhecido
como halving e gera um dos principais pilares da visão do bitcoin como reserva de valor,
que é a escassez da moeda.

Abaixo, a escada de remuneração da mineração. O halving reduz essa remuneração pela


metade e segue uma janela de 210.000 blocos (aproximadamente 4 anos).

Apesar do halving reduzir a remuneração dos mineradores, o mecanismo de equilíbrio


da dificuldade da mineração faz com que o halving não afete de forma significativa a
lucratividade da atividade de mineração. Naturalmente, a rede diminui sua dificuldade
para equilibrar a queda da remuneração nominal. Ainda, apesar da queda nominal na
quantidade de bitcoins, a alta do preço da moeda aumentou expressivamente a
remuneração dos mineradores:

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

A partir de 2140, a única forma de remuneração dos mineradores serão as taxas de


transação. Para isso, é necessário um equilíbrio entre as taxas de transação e a
dificuldade da mineração, de forma que a atividade de mineração continue sendo
economicamente viável e as transações em bitcoin não sejam extremamente custosas.

O gráfico abaixo mostra esse movimento:

Por fim, em maio desse ano houve um novo halving e muita discussão foi feita em cima
do impacto desse evento no preço do bitcoin. Nos últimos halving, o impacto no preço
do BTC foi positivo, principalmente pois existe um período de incerteza pré halving sobre
a forma como a rede vai se ajustar, a quantidade de mineradores pós halving e os efeitos

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

nas taxas de transação. Ainda, existe uma percepção pós halving de aumento de
escassez da moeda e mudança na dinâmica de oferta e demanda. Porém, só vimos três
halving na história do bitcoin. Uma amostragem muito pequena para qualquer
afirmação assertiva.

BUSINESS DE MINERAÇÃO –

O business de mineração é pautado na escala. No início do bitcoin, a mineração era


dominada por players pequenos que realizavam a atividade em CPU. À medida que o
mercado cresceu e a moeda se valorizou, a mineração tornou-se uma atividade
extremamente lucrativa, levando o mercado para a institucionalização na forma de
pools de mineração, desenvolvimento de hadwares dedicados e a busca da otimização
do custo energético.

A institucionalização da mineração pode ser vista sob diversos vieses, positivos e


negativos. De forma organizada, buscarei analisar como esse movimento afeta o
mercado do bitcoin.

Pool de mineração:

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Pool é o apelido dado às empresas de mineração. Os pools atuam em espaços industriais


chamados “fazendas de mineração”, onde concentram milhares de equipamentos
específicos para mineração.

Pool de mineração na Islândia:

O processo de estruturação de um pool de mineração existe um alto custo fixo – em


média, U$ 1,5 milhão em equipamentos, além do custo variável médio de U$ 1 milhão
por mês em energia elétrica. Sob a ótica de profissionalização do mercado, a
estruturação de um pool e os custos envolvidos pode ser vista como um movimento
positivo, visto que o custo de oportunidade para esse player sair do mercado em um
bear market é alto. Em média, levam 18 meses para o breakeven de um pool.

Por outro lado, a formação de um pool de mineração cria grandes vantagens


competitivas para esse player e acaba por concentrar um processo desenhado para ser
descentralizado. Algumas vantagens competitivas de um pool:

1. Quanto maior o pool, maior o poder computacional desse player. Quanto maior
o poder computacional, maior a probabilidade de ele validar um bloco. Quanto
maior essa probabilidade, maior a receita desse player e menor a receita do resto
da rede. No final do dia, a tendência é esse player progressivamente dominar
uma fatia maior da rede.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

2. Pools possuem maior barganha na compra de energia, firmando contratos


grandes e longos. Ainda, a capitalização desse player permite que ele instale o
pool em países com menor custo energético.
3. Pools possuem vantagem no acesso a equipamentos. Dois dos três maiores pools
do mundo são controlados pelo maior produtor de hardware para mineração do
mundo. Ainda, as compras em escala permitem que o custo fixo seja diluído de
acordo com seu tamanho.

Hardware de mineração:

Hardwares de mineração são equipamentos específicos para a mineração do protocolo


SHA 256. Ao longo da história do bitcoin, foram desenvolvidos diversos modelos de
ASICS (sigla do hardware dedicado para mineração) e em cada uma das versões, a
capacidade de processamento deu um salto, como podemos ver abaixo:

A capitalização dos principais pools permite que eles estejam constantemente


renovando seu backlog e injetando capacidade na rede, fazendo com que players menos
capitalizados e com menor capacidade de investimento tenham dificuldade em se
manterem lucrativos, sendo empurrados para fora do mercado.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Principal ASIC, criado por empresa que domina os maiores pools de mineração do mundo:

Concentração da mineração:

Como resultado da dinâmica do mercado de mineração, atualmente cinco pools – todos


baseados na China – dominam 50% de todo o poder computacional da blockchain, a
maior concentração da história. Os pools BTC.com e Antpool são ambos controlados
pela Bitmain.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Os pools são em sua grande maioria concentrados no Sudeste Asiático e Oriente Médio,
locais onde a energia elétrica é mais barata, como podemos ver abaixo:

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

A China concentra a maior parte da mineração mundial, por alguns motivos específicos
que valem a pena serem estudados:

Primeiramente, o custo de energia que representa metade do custo no USA. A matriz


energética chinesa viu um grande avanço da energia hidrelétrica, que hoje é a segunda
maior fonte de energia do país. Em sua maioria, as represas são localizadas no interior
do país, dinâmica perfeita para os mineradores que combinam terra barata com baixos
custos de transmissão. A maior parte dos pools de mineração chineses estão
concentrados na província de Sichuan, maior produtora de energia hidrelétrica do país.

Ainda, a Bitmain, maior produtora de ASICs e maior operadora de pools de mineração,


é baseada na China. Além da vantagem de capitalização, esses pools ainda possuem a
vantagem de receberem as atualizações mais recentes dos equipamentos em primeira
mão, antes de toda a indústria de mineração.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Existem diversos riscos discutíveis em relação à concentração da mineração na China.


Em 2013, o governo chinês baniu o bitcoin. Vale lembrar que estamos falando de um
governo com alto grau de de intervencionismo no setor privado. Caso houvesse alguma
sanção na região, 50% do poder computacional da blockchain estaria comprometido. O
país convive com estações de chuvas bem definidas que afetam o preço e supply de
energia elétrica, ficando os mineradores expostos ao governo e às condições climáticas.
Por fim, em agosto de 2020, a Bitmain informou que diversos pedidos de ASICs não iriam
ser entregues no prazo dado uma disputa interna entre os co-fundadores pelo controle
da empresa.

Apesar da blockchain ser um modelo desenhado para a descentralização, a intersecção


com a economia real e o crescimento dessa indústria levou à uma centralização em
várias pontas do mercado, que oferecem riscos ao funcionamento pleno da rede da
blockchain e consequentemente do bitcoin.

Ataque 51%:

“The incentive may help encourage nodes to stay honest. If a greedy attacker is able to
assemble more CPU power than all the honest nodes, he would have to choose between
using it to defraud people by stealing back his payments, or using it to generate new
coins. He ought to find it more profitable to play by the rules, such rules that favor him
with more new coins than everyone else combined, than to undermine the system and
the validity of his own wealth.”

O parágrafo acima é uma parte do white paper do bitcoin. A visão de Satoshi é defendida
por parte da comunidade do bitcoin quando o assunto é a possibilidade de um ataque
51% pelos pools de mineração extremamente concentrados. Os defensores desse
“Teorema da Honestidade”, acreditam que os mineradores não possuem incentivo para
fraudar a blockchain do bitcoin pois a partir do momento em que o fizessem, a moeda
perderia todo seu valor.

Economicamente, defendem, faz mais sentido continuar operando como o maior player
de mineração do mercado e manter sua remuneração em bitcoin. De fato, no momento

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

em que 51% da rede validasse uma operação fraudulenta, todos os usuários saberiam e
sairiam desse mercado, levando o valor do “roubo” a zero.

Essa visão parte do pressuposto que os agentes de mercado são racionais, quando não
são. Como veremos abaixo, bitcoin e bitcoin cash (BCH) possuem a mesma blockchain e
o mesmo hardware de mineração, fazendo com que o poder computacional dos
mineradores sirva para as duas moedas. Logo, um minerador de BCH pode possuir
incentivos para acabar com a confiança do mercado na rede do BTC. Dessa forma, uma
parte dos usuários sairiam do mercado e outra buscariam uma opção que consideram
mais “confiável”, havendo uma possível fuga de capital para BCH.

Partir do pressuposto que não haverá um ataque graças à racionalidade e honestidade


dos agentes não é suficiente para garantir a segurança da rede. Para se provar uma
blockchain segura, a rede precisa ter evoluções no seu protocolo de forma a mitigar os
riscos de concentração de mineradores. A melhor forma que vemos hoje seria uma
alteração no algorítimo de consenso (proof-of-work).

Mineradores e a pressão de venda:

O foco desse tópico é entender como os mineradores afetam diretamente o preço do


bitcoin de acordo com o momento de mercado e a forma como a indústria de mineração
se organiza. É um estudo essencial para entender o nível de influência dessa indústria,
que é controlada por poucos players, no mercado do bitcoin.

Em suma, mineradores podem ser vistos como a maior força de venda no sistema do
bitcoin. A receita desses players é em bitcoin e eles precisam transformá-la em moeda
fiduciária para arcar com seus custos variáveis. Essa é uma indústria em que não há
constante acumulação de capital devido ao mecanismo de equilíbrio da dificuldade da
mineração existente na rede da blockchain. Explico melhor abaixo.

O custo de produção de um minerador é basicamente derivado do custo de energia


elétrica, que representa 95% dos custos variáveis. Tudo mais constante, um minerador

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

necessita que o preço do bitcoin esteja em um certo patamar para que a atividade seja
lucrativa. Como externalidade, mineradores situados em locais com menores custos
energéticos e com equipamentos mais eficientes possuem vantagens competitivas
significativas.

O gráfico abaixo exemplifica a importância da renovação do seu imobilizado.


Comparando duas versões seguidas do principal ASICs do mercado, vemos que o preço
de breakeven do bitcoin para um mesmo custo energético é quase três vezes menor
para a versão mais nova do hardware.

Agora, vamos imaginar um cenário de bear market:

Enquanto o preço do bitcoin cai, mineradores menos eficientes (menos escala, em locais
com matriz energética mais cara ou operando com ASICs antigos) começam a não atingir
seu preço de breakeven. Caso esses players tenham um estoque de moedas, começam
a liquidá-las no mercado para cobrir seus custos. Caso o preço continue caindo, esse
minerador será obrigado a parar de operar e sairá do mercado. A rede então terá uma
diminuição de hash rate e irá ajustar a dificuldade da mineração em duas semanas. No
final do dia, temos a receita da mineração dividida em uma quantidade menor de
players.

Na outra mão, quando o mercado vive um bull market, toda a indústria vê sua receita
crescendo e a menor necessidade de liquidar sua remuneração em bitcoin. Há uma
concepção errada de que bull market necessariamente leva à entrada de players na
indústria. A decisão de construir um pool de mineração é tomada em meses, enquanto
estamos falando de um mercado muito volátil com um mecanismo de correção a cada

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

duas semanas. À medida que o mercado continua subindo, menor a pressão de venda
exercida pelos mineradores.

A dinâmica acima mostra uma tendência extremamente pró-cíclica dos mineradores em


relação ao mercado. Quando vivemos um bull market, existe um delay muito grande
entre a alta de preço e a tomada de decisão de aumento de produção. Logo, a tendência
é de uma atitude menos vendedora desse player. Apenas em um cenário de preços
altistas por um longo período de tempo irá representar o acúmulo de capital por parte
do minerador e consequentemente investimento em aumento de capacidade produtiva,
fazendo com que o minerador tome uma decisão anticíclica, vendendo parte do seu
estoque de criptomoedas.

Quando vivemos um bear market, não existe delay entre mercado e tomada de decisão.
Mineradores menos eficientes desligam as máquinas quando a margem fica negativa. É
uma decisão rápida de se fazer. Enquanto isso, operadores mais eficientes mantém
margens positivas ou continuam operando com margens negativas até o ajuste de
dificuldade da rede. O custo de oportunidade de fechamento desse player é muito alto,
pois ele dispendeu um alto custo fixo para a estruturação do pool, assinou contratos
longos de energia e de aluguel (2 anos em média). Quando o ajuste de dificuldade vier,
esse player aproveitará de um mercado mais enxuto, aumentando seu market share.

Muitos defendem que os mineradores são grandes responsáveis pelas grandes


flutuações de preços do bitcoin, devido à essa atitude pró-cíclica. Para termos uma
noção da suposta pressão de venda dos mineradores: a receita dos mineradores em
2019 foi de U$ 5.5 bilhões. No fechamento de 2019, estima-se que a Coinbase possuía
uma base de 1 milhão de bitcoins depositados, ou U$ 6.8 bilhões. Ou seja, sob a premissa
de que os mineradores vendem 100% dos bitcoins minerados, a pressão de venda vinda
dos mineradores é equivalente à toda a base de clientes da Coinbase saindo
permanentemente do mercado todo ano.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Em suma, acredito na força dessa dinâmica nos primórdios do mercado, porém, vejo
uma tendência de perda de força desse movimento graças a dois mecanismos recentes
do mercado: lending e contratos futuros.

Hoje, é possível ter acesso a crédito utilizando criptomoedas como colateral por meio
de plataformas de lending. Essa solução permite que mineradores mantenham seu
estoque de bitcoin ao invés de liquidá-lo no mercado quando estiverem abaixo do
breakeven. Essa dinâmica reduz a pressão de venda no sistema, o que acredito ser uma
alavanca de valor muito grande para todo o ecossistema.

Ainda, há dois anos existe um mercado de derivativos de bitcoin com volume crescente.
Em momento de alta do mercado, esses players podem utilizar seu estoque para travar
o preço da moeda próximo do seu breakeven, realizando liquidação financeira da
mesma. Outro gatilho de valor que reduz a pressão de venda dos mineradores.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

ENTENDENDO A ESCALABILIDADE DO BITCOIN

Somado tudo que vimos até agora, fica claro que o modelo de blockchain do bitcoin é
extremamente ineficiente para realizar atividades práticas pois sacrifica escalabilidade
em troca de segurança e descentralização. A imagem abaixo representa o “Trilema da
Segurança”, um exercício muito utilizado pela comunidade do bitcoin para exemplificar
o que foi falado:

A blockchain do bitcoin valida um bloco a cada 10 minutos e cada bloco possui o


tamanho de 1MB. Para efeitos comparativos, isso significa que o bitcoin possui
capacidade de processamento de 5-7 transações por segundo, enquanto a Visa processa
47.000.

Na blockchain, todo node tem que armazenar e validar cada transação criptografada.
Após essa validação, os mineradores precisam anexar o bloco à blockchain. Não é um
modelo desenhado para conciliar segurança e escalabilidade.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Em 2017, quando o ativo passou a ser utilizado em maior volume, o gargalo de escala
começou a aparecer. A rede não estava preparada para ser utilizada em massa e não
possuia quantidade suficiente de nodes e mineradores. O sistema de taxas de
transações da blockchain funciona de forma que os usuários que pagarem as maiores
taxas terão preferência na validação das suas transações. Durante a explosão das
criptomoedas, a rede não conseguiu validar todas as transações e as taxas explodiram
de valor.

Fazendo um comparativo, estimado que o Ether leve em média 14 segundos para gerar
um bloco (vs 10 minutos do bitcoin). Durante 2017, algumas transações de bitcoin
chegaram a levar 3 horas para serem validadas. Fazendo outro comparativo, as taxas de
transação do Ether representam menos de 2% do valor das taxas do bitcoin.

Para ser utilizado como método de pagamento, o bitcoin necessita encontrar


mecanismos para tornar-se uma moeda mais escalável. Esse problema é amplamente
discutido em toda a comunidade de desenvolvedores dessa tecnologia, e diversas
soluções estão sendo propostas e desenvolvidas, algumas com muito sucesso.
Discutiremos a seguir.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

EVOLUÇÕES DA BLOCKCHAIN E DO BITCOIN

OPEN SOURCE –

Para entender as evoluções na tecnologia da blockchain, e no bitcoin, é necessário


primeiramente entender o conceito de Open Source. Ou seja, o código do Bitcoin pode
ser acessado por qualquer usuário por meio da plataforma Github. Dessa forma, existem
diversos desenvolvedores analisando o código e propondo uma série de alterações.
Desde a criação do bitcoin, já foram realizados mais de 23 mil commits (atualizações e
resoluções) em seu código, com 688 contribuidores e 3.500 observadores.

Alguns sistemas amplamente utilizados hoje nasceram por meio de projetos Open
Source, como o Google Chrome, o sistema Android e o sistema Linux.

Nos primórdios do Bitcoin, as soluções eram discutidas principalmente em fóruns, por


meio do lançamento de papers com estudos de programação relacionados à problemas
específicos da rede. Com o crescimento do mercado de criptomoedas, esse se tornou
um business amplo e os desenvolvedores se agruparam em grupos como a Bitcoin Core,
Digital Currency Initiative MIT e Lightning Labs.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

LIGHTNING NETWORK –

A Lightning Network foi uma solução lançada via paper em janeiro de 2016, que só saiu
do papel (sendo implementada por uma empresa chamada Lightning Labs) a partir de
2017, após o boom das criptomoedas evidenciar os problemas de escalabilidade da
rede. É um protocolo que diz que pequenas transações com bitcoin não precisam ser
registradas na blockchain, podendo ser registradas fora dela (off-chain).

Vamos relembrar o processo por trás de uma movimentação de bitcoin:

Transações são transmitidas para toda a rede, são validadas por cada full node, que
também forma um bloco que por sua vez é minerado por todos os mineradores. Quando
um minerador encontra um Golden Nonce, transmite esse número para toda a rede que
validará esse valor e, consequentemente, o bloco. Então, esse bloco é registrado na
cópia do bitcoin de todos os full nodes. No final do dia, as transações são registradas,

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

validadas e transmitidas por todos diversos elos da cadeia, um processo seguro, porém
muito ineficiente.

A solução trazida pela Lightning Network (LN) é a criação de um “off -chain payment
channel”. Ou seja, criar um canal de pagamento onde pequenas transações seriam
realizadas fora do âmbito da blockchain. No final, o saldo dessas transações seria
registrado na blockchain, transformando uma série de transações em apenas duas: uma
para abrir o canal de pagamento e outra para fechá-lo.

A LN funciona conforme o exemplo abaixo:

Existem duas pessoas: João e Maria. João é dono de uma cafeteria e Maria é sua cliente.
Ambos realizam transações diariamente e Maria gostaria de pagar pelo seu café em
Bitcoins. Devido ao formato da Blockchain, cada uma dessas transações levaria em
média 10 minutos para serem realizadas, algo inviável para a realidade dos dois
usuários.

A solução sugerida foram os canais de pagamento da Lightning Network. Basicamente,


a LN cria um “off-chain payment channel”, em que todas as transações são realizadas
fora da blockchain. Esse canal funciona como um layer 2, enquanto a blockchain como
um layer 1.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Pela LN, é criada uma carteira entre João e Maria, onde qualquer movimentação é
realizada unilateralmente, por meio da assinatura de smart contracts entre os dois.

Vamos supor que João e Maria criaram um canal e Maria depositou 20 BTCs de saldo.
Na próxima vez que for comprar um café, Maria irá transferir 0,5 BTCs (preço do café)
para João por meio desse canal de pagamento, sem necessidade de registro na
blockchain. A validação será feita por meio da assinatura de smart contract. Esse
contrato irá alterar o saldo de Maria para 19,5 BTCs e o de João para 0,5 BTCs, tudo isso
off-chain, na Lightning Network. Essas transações são realizadas simultaneamente e sem
a necessidade de pagamento de taxas.

Quando não existir mais sentido nessa relação, João e Maria fecham o canal e registram
os saldos finais na blockchain, ou seja, dois players potencialmente reduziram dezenas
de transações em apenas duas.

Outro conceito importante dentro do protocolo da LN é o de “rotas de pagamentos”.


Vamos supor que exista mais uma pessoa em nosso sistema: Gabriel. Gabriel já é cliente
de João e por algum motivo deseja transferir alguma quantidade de BTCs para Maria. A
primeira solução que vem à cabeça é a criação de um canal entre Gabriel e Maria.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Porém, o conceito de “rotas de pagamento” permite que Gabriel utilize o canal entre
João e Maria para realizar essa transação.

Gabriel transfere BTCs para Maria, alterando os dois saldos. Em seguida, Maria transfere
para João, novamente alterando via contrato os dois saldos.

Além dos benefícios em escalabilidade e custos, a Lightning também confere privacidade


nas transações. Um usuário da rota de pagamentos não consegue identificar o
remetente original ou o destinatário final da transação. Ou seja, em um pagamento que
passou por 6 etapas, o terceiro “nó” só saberá de quem recebeu e para quem está
enviando os Bitcoins, sem informações sobre o resto dessa transação.

A Lightining Network já foi adotada por mais de 11 mil nodes.

SEGWIT –

A solução Segwit foi introduzida em agosto de 2017, proposta pela Bitcoin Core como
mais uma forma de solucionar o gargalo de escalabilidade da blockchain do bitcoin. A
Segwit consiste em uma “soft fork”, ou seja, uma leve alteração na estrutura de blocos
da blockchain, de forma que as assinaturas dos nodes que validam as transações
ocupem menos espaço, fazendo com que um bloco consiga suportar mais transações.

Vamos relembrar que o código do BTC limita o tamanho de um bloco para 1MB, 27.000
transações ou 10 minutos, em média. Nesse formato, as assinaturas das transações
compõem 66% do espaço do bloco, enquanto as informações relacionadas às transações
(foco do bloco) ocupam um espaço bem menor. Isso acontece justamente pela limitação
que o código impõe para o tamanho do bloco.

No formato do Segwit, os blocos passam a ter um tamanho de 2MB, além de criar um


sistema de ponderação onde as assinaturas possuem peso 4 vezes menor que as demais
informações.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Caso um computador não possua a versão Segwit da blockchain (o soft fork), ainda assim
ele conseguirá validar a parte do bloco que possui as transações, evitando que ocorra
uma ruptura na Blockchain, conhecida como hard fork e que é extremamente prejudicial
para a rede como um todo.

Portanto, a utilização da Segwit permite que os blocos armazenem muito mais


informações relacionadas às transações, aumentando o número de transações por

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

segundo e elevando o poder de escala da moeda. Atualmente, mais de 65% das


transações de bitcoin utilizam a Segwit.

FORKS –

Um fork nada mais é do que uma segregação do código da criptomoeda. Acontece


quando um grupo de usuários não concorda com a maioria sobre uma mudança
específica no código. Existem quatro tipos de forks, sendo os principais:

1. Soft Forks. Como o próprio nome sugere, são leves mudanças no software,
realizadas para corrigir algum erro ou aperfeiçoar algum ponto que abre espaço
para falhas de segurança.

2. Hard Forks. É a criação de uma nova versão do software. Hard forks são
permanentes e o usuário pode escolher por utilizar a versão antiga ou atualizá-
la. A coexistência das duas depende da utilização dos usuários. Existem três tipos
de Hard Forks:
a. Planned. Hard Forks planejados voltados para aperfeiçoar a rede.
Normalmente envolvem o abandono da rede anterior.
b. Contentious. Normalmente um hard fork causado por um desacordo
entre os usuários. As duas redes coexistem a partir de então com grandes
mudanças no código.
c. Spin-off coins. Mudanças planejadas para criar novas moedas com
características diferentes. Não necessariamente envolve mudanças
drásticas no código.

Fork Bitcoin Cash:

O fork mais significativo do bitcoin (em termos de market cap) foi o hard fork do Bitcoin
Cash (BCH), em agosto de 2017. O próprio Bitcoin Cash passou por outro fork em
novembro de 2018, criado o Bitcoin SV (BSV).

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

O BCH buscou mudar o código da blockchain do bitcoin e adicionar características que


solucionassem o problema de escalabilidade da moeda. A principal mudança foi a
alteração no tamanho do seu bloco, 32x maior que o bloco do bitcoin.

Tabela comparativa BTC e BCH

É importante pontuar que, como o BCH é um fork do próprio bitcoin, a sua estrutura de
mineração é a mesma. Ou seja, as duas moedas competem pelo poder computacional
dos mineradores, que irão escolher o caminho mais lucrativo.

Dito isso, o BCH como projeto não teve muita adoção logo no início, isso fez com que o
seu preço permanecesse depreciado em relação ao BTC. Logo, a remuneração dos
mineradores era menor e as taxas de transação muito baixas, pois os usuários não
competiam pelos nodes na validação de suas transações.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

As duas moedas continuam existindo, porém com um market cap muito baixo e com
pouca adesão à sua proposta, servindo apenas para especulação de investidores de
altcoins.

Apesar do trabalho exaustivo de desenvolvedores para realizarem forks e criarem


protocolos que substituam o bitcoin, ela continua sendo a moeda mais utilizada e
confiável do ecossistema cripto.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

RISCO REGULATÓRIO

A regulamentação por trás do bitcoin ainda é um assunto cinzento dentro do mercado.


Apesar da tendência de digitalização da economia, open banking e transações peer-to-
peer, a falta de regulamentação para criptomoedas limita muito a expansão do ativo. A
chancela de um grande player privado ou do Estado por trás é um viés de confirmação
para o usuário confiar no ativo e utilizá-lo no seu dia a dia. Portanto, acredito que o
avanço das conversas em relação ao bitcoin na esfera pública é uma alavanca para a
utilização do ativo e, portanto, do seu valor.

Por ser um ativo recente, com histórico de utilizações para meios ilícitos e
descentralizado (sem controle algum), o ativo costuma sofrer resistência de diversos
Estados seja para liberar a sua utilização, seja para criar uma regulamentação própria.
Posicionamentos diferentes já foram tomados em relação à criptomoeda, desde o
banimento na China até o desenvolvimento de uma legislação própria, como aconteceu
no Japão.

No Japão, o governo reconheceu as criptomoedas como um meio de pagamento para


bens e serviços, possuindo uma regulação específica para as empresas que atuam no
setor. A regulação fez com que o mercado de criptomoedas se desenvolvesse
consideravelmente no país, com diversas empresas aceitando criptomoedas como
pagamento.

Na Suíça ocorreu o desenvolvimento de uma regulação específica para ICOs , fazendo


com que ocorresse a criação de um pool de criptomoedas no país, o Crypto Valley.
Inclusive, Zurique é a residência de muitas autoridades do mundo das criptomoedas,
funcionando como um polo intelectual desse mercado.

Por fim, a Estônia reconheceu as criptomoedas como valor representado na forma


digital, além de criar uma regulação específica para exchanges em seu território.

A União Europeia estuda os criptoativos desde 2012, produzindo diversos relatórios


sobre o tema. Alguns países já desenvolveram ou estão no processo para desenvolver
regulações para criptomoedas, como é o caso da França e Alemanha. O posicionamento

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

do bloco econômico sofreu uma notória mudança ao decorrer dos últimos anos, visto
que o Banco Central Europeu apresentava uma postura conservadora e não reconhecia
as criptomoedas como moeda. Mario Draghi, ex-presidente do ECB, disse que o ativo é
“altamente arriscado, não é uma moeda real”.

Em 2020, a nova presidente do ECB assumiu que o bloco estuda a criação de uma CBDC
(Central Bank Digital Currency) para o bloco. Ainda, no início do ano, a Comissão de
Valores Mobiliários Europeia (ESMA) declarou que até 2022 teremos uma regulação
específica para criptomoedas em todo o bloco.

Nos Estados Unidos, apesar de não possuirmos uma regulação federal para
criptomoedas, alguns estados já desenvolveram as regulações próprias. O estado de
Illinois, por exemplo, oferece contratos futuros e opções de bitcoin na CME (bolsa de
valores de Chicago). Hoje, a SEC regula fundos de investimento em criptomoedas e já
temos índices de criptomoedas listados na NASDAQ e NYSE.

Vemos como questão de tempo para que as regulações sejam desenvolvidas da forma
correta e consequentemente o mercado fique mais maduro, institucionalizado e
profissional.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

ANÁLISE DE MERCADO

Definir uma tese de investimento baseada em uma finalidade específica do bitcoin é um


exercício muito desafiador. A forma como os mercados e os usuários veem o bitcoin
mudou muito ao longo do tempo. Estamos falando de uma tecnologia que sofreu
evoluções tecnológicas, encontrou gargalos em seu código e passou por processos de
grande especulação.

Murad Mahmudov realizou um estudo4 visando mapear a forma como o mercado vê o


bitcoin e como essa visão mudou ao longo do tempo. Nesse estudo, Murad classificou o
bitcoin em 7 finalidades diferentes. Darei enfoque em 4 visões que acredito terem um
nível de embasamento forte e que podem vir a se concretizar.

Visão do bitcoin ao longo do tempo.

1. Método de pagamentos p2p.

4
https://hackernoon.com/the-many-faces-of-bitcoin-1c298570d191

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

A visão mais antiga do bitcoin e a intenção do seu fundador. No white paper da moeda,
Satoshi Nakamoto diz:

“A purely peer-to-peer version of electronic cash would allow online payments to be


sent directly from one party to another without going through a financial institution.
Digital signatures provide part of the solution, but the main benefits are lost if a trusted
third party is still required to prevent double-spending. We propose a solution to the
double-spending problem using a peer-to-peer network. The network timestamps
transactions by hashing them into an ongoing chain of hash-based proof-of-work,
forming a record that cannot be changed without redoing the proof-of-work. The
longest chain not only serves as proof of the sequence of events witnessed, but proof
that it came from the largest pool of CPU power. As long as a majority of CPU power is
controlled by nodes that are not cooperating to attack the network, they'll generate the
longest chain and outpace attackers. The network itself requires minimal structure.
Messages are broadcast on a best effort basis, and nodes can leave and rejoin the
network at will, accepting the longest proof-of-work chain as proof of what happened
while they were gone.”

Satoshi segue o paper reforçando a tendência de crescimento do e-commerce e a falta


de necessidade de um intermediador nessas relações, trazendo o bitcoin como solução
peer-to-peer. De fato, a proposta de valor do bitcoin é uma ótima proposta. Porém, ao
olharmos os resultados do estudo de Murad, vemos que essa visão perdeu força ao
longo do tempo, principalmente em 2017.

O bitcoin encontrou diversos gargalos para conseguir escalar. Em 2017, no ápice da


bolha das criptomoedas, mostrou que a rede não estava preparada para a ampla
utilização. Desde o início da moeda esses problemas são conhecidos e inclusive
resultaram em alguns forks, como o do “bitcoin cash”. Porém, ao mesmo tempo, a
equipe de desenvolvedores da moeda vem trazendo soluções (Lightning Network e
Segwit, como já citamos) que mostraram resultados satisfatórios em aumentar a
escalabilidade da rede.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

De fato, a rede do bitcoin hoje está muito mais preparada para a utilização em massa.
Como podemos observar, o número de transações está no mesmo patamar do que
vimos em 2017, sem que a rede passe por qualquer dificuldade de operação. As taxas e
o tempo de validação continuam estáveis.

Transações confirmadas por dia (em milhares)

440
353
350

270

80

Taxas pagas aos mineradores (U$)

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Recentemente, empresas vem adotando serviços que utilizam bitcoin como método de
pagamento. A Coinbase possui cartões de crédito nos USA com a função débito,
utilizando o saldo em bitcoin do cliente para o pagamento. Microsoft aceita pagamento
em bitcoin em seu site, lojas KFC nos USA também aceitam bitcoin como forma de
pagamento.

Em novembro de 2020, a Paypal afirmou que estava lançando um serviço de compra e


venda de bitcoins dentro de sua plataforma. Ainda, confirmou que em 2021 liberaria um
serviço de pagamento em bitcoin. Porém, esse tipo de serviço não afeta de fato a rede
da blockchain do bitcoin. A Paypal detém a posse do criptoativo em tesouraria e o cliente
pode realizar as compras via um API que conecta o sistema com o saldo da carteira do
Paypal. Quando a transação é feita, o bitcoin não foi efetivamente movimentado.

Essa ainda é uma visão bem incerta do bitcoin. Apesar de ser a intenção inicial da moeda
e existirem inovações que visam solucionar o problema da escalabilidade (por ser open
source, o código tem espaço para evoluir rapidamente), ainda não tivemos um teste de
utilização em massa após a crise de 2017. Empresas estão começando a criar soluções
de pagamento em cripto e esse será um ótimo termômetro para entender em que
estágio da rede estamos.

2. Reserva de valor digital.

A visão de que o Bitcoin é uma moeda não inflacionável, escassa e livre de interferências
do Estado ou bancos. Quando discutimos essa visão, obrigatoriamente a discussão passa
pela comparação com outros ativos vistos como reserva de valor.

Recentemente, J. Paul Tudor produziu um estudo onde compara diversas reservas de


valor. Tudor reforça que estamos em um ano atípico, com QE (Quantitative Easing) por
parte de Bancos Centrais ao redor de todo o mundo em combate à pandemia, juros
nominais próximos de zero e juros reais negativos. No estudo, Tudor faz um exercício de
comparação entre o ouro e o bitcoin.

“Truth in advertising, I am not a hard-money nor a crypto nut. I am not a millennial


investing in cryptocurrency, which is very popular in that generation, but a baby boomer

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

who wants to capture the opportunity set while protecting my capital in ever-changing
environments.”

Nesse exercício, Tudor definiu algumas características para uma reserva de valor. Trago
junto com minhas interpretações:

1. Purchasing power –

O ouro já foi o padrão monetário internacional, é visto como reserva de valor há dezenas
de anos e tem sua utilidade muito bem definida. Já o bitcoin tem do seu lado o fato de
ser o único ativo amplamente negociável no mundo que possui uma oferta máxima fixa.
Porém, as dúvidas quanto a sua real utilidade e a falta de base em relação ao preço do
ativo fazem com que ele tenha desvantagens em relação ao ouro quando falamos de
poder de compra em um horizonte de 10 anos.

2. Trustworthiness –

Estamos comparando um ativo de troca milenar com um ativo digital criado há 11 anos.
No ponto da confiança, o ouro leva ampla vantagem em relação ao bitcoin.

3. Liquidez –

Liquidez é uma característica que não importa até importar. O bitcoin é única reserva
de valor que negocia 24/7 em todo o mundo. O mercado do ouro não chega a ser
ilíquido, porém não pode ser comparado com o bitcoin hoje.

4. Portabilidade –

Uma reserva de valor deve poder ser transportada de uma jurisdição para outra a baixos
custos de transporte. Ninguém ganha do bitcoin nesse caso.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

No estudo, Tudor atribuiu uma nota para cada uma dessas características. No final, o
ouro recebeu um score de 62 pontos como reserva de valor, enquanto o bitcoin 43. Ou
seja, o bitcoin possui 66% do valor do ouro baseado em seus fundamentos, porém, seu
valor de mercado é 1/60 do market cap do metal, como podemos ver abaixo.

Não estamos falando de um método comprovado ou amplamente aceito pelo mercado,


porém, seguindo uma análise puramente fundamentalista desses dois ativos, o bitcoin
pode estar muito abaixo do seu “fair value”.

3. Moeda de reserva do ecossistema cripto.

Interpretação do BTC como a moeda referência para a precificação de todas as outras


criptomoedas. É uma visão que vêm crescendo ultimamente, à medida que surgem
novas altcoins, moedas que são criadas voltadas para soluções específicas. É curioso
observar que essa visão cresceu durante o boom dos ICOs (2014-2017).

A lógica dessa interpretação reside no fato do bitcoin possuir market cap 7x maior que
a segunda maior criptomoeda, o ETH.

De fato, o bitcoin possui market cap 7x maior que a segunda maior criptomoeda, o ETH.
Em tempos de crise, é possível ver uma fuga de capital de todo o ecossistema para a
moeda considerada mais consolidada, líquida e segura. Porém, não vejo essa como a
utilidade principal da moeda, apenas como um reflexo de seus fundamentos.

Retorno BTC vs criptomoedas em 2020.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

4. Ativo financeiro descorrelacionado.

Essa linha interpreta o bitcoin unicamente como um ativo digital que não possui relação
com qualquer mercado ou Estado. De fato, ao analisarmos a correlação da moeda com
outros ativos financeiros, percebemos que a correlação do bitcoin é baixa ou quase nula,
tornando a moeda um interessante diversificador de portfólio.

Correlação bitcoin vs outros ativos.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Ao observarmos o estudo de Murad, vemos que essa foi a visão que mais ganhou força
no passado recente do bitcoin. Os efeitos podem ser sentidos quando observamos a
dinâmica do mercado institucional de investimentos. Nos últimos três anos, o
patrimônio dos fundos de investimento em cripto aumentou substancialmente. Do lado
regulatório, criou-se uma infraestrutura de investimento mais madura para o bitcoin,
com o advento de um mercado de contratos futuros regulado pela SEC, por exemplo.
Em um estudo realizado pela Fidelity em junho de 20205, 91% dos 800 gestores
institucionais entrevistados afirmaram que gostariam de investir ao menos 0,5% do seu
portfólio em ativos digitais dentro dos próximos 5 anos.

Do lado do investidor varejo, também há espaço para avançar. Como dito, a falta de
regulação e a falta de informações sobre criptomoedas afasta o investidor do ativo.
Ainda, apesar de crescente, o mercado de investimento em cripto via fundos de
investimento ainda é muito pequeno, o que leva o investidor a procurar outros meios
que por vezes não se mostram uma boa opção. Em pesquisa feita pela KPMG, 92% dos
investidores afirmam manter suas criptomoedas custodiadas em exchange s, apesar de
48% deles afirmarem saber que essa não é uma opção segura.

5
https://www.fidelitydigitalassets.com/bin-
public/060_www_fidelity_com/documents/FDAS/institutional-investor-study.pdf

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

Fonte: KPMG

Excluir premissas que envolvem a tecnologia blockchain e a usabilidade do bitcoin deixa


de lado toda sua proposta de valor e pode causar distorções de preços relacionadas à
fatores externos da rede, como vimos em 2020 com a fuga de capital de mercados
tradicionais e a busca de um ativo descorrelacionado com a pandemia.

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Report Fundamentalista do Bitcoin (2021)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Obrigado a você, que chegou até o final desse report, por estudar o mercado de
criptomoedas a fundo. Se ficou alguma dúvida ao longo desse estudo, por favor, nos
mande no portal ou no grupo de assinantes.

Convido você a ler, também, o report da Ethereum, para completar seus estudos. Esses
fundamentos te darão uma visão muito mais ampla do mercado, e te auxiliarão em suas
tomadas de decisões de investimento.

Até um próximo conteúdo,

Gabriel Bearlz.

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