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SÊNECA. A brevidade da vida. Escala: São Paulo, 2010.

“A Vida é breve; longa é a arte”

Não é que temos tempo exíguo. O problema é que perdemos muito dele p. 19.

Bastante longa é a vida e suficiente para levar a termo os maiores empreendimentos, desde que
bem utilizada p. 20.

Não é que recebemos uma vida breve. Nós a encurtamos, quanto, ao invés de sermos ciosos da
mesma, agimos com prodigalidade p. 20.

Para muitos a vida ficou abreviada seja por causa da inveja pela fortuna alheia, seja por causa
do afanoso cuidado pela própria.
Outros ainda sem projeto definido de vida perseguem sempre novos, dentro de uma
superficialidade vaga e displicente em relação a própria pessoa p. 21.

Pequena é a parte da vida que vivemos p. 22.

Os homens não admitem que alguém confisque suas propriedades. Quando ocorre o menor
conflito em torno dos limites, já recorrem às pedradas e até mesmo às armas. Ao invés, toleram
que outros lhes invadam a vida e até são eles mesmos a introduzirem os futuros possessores dela
p. 25.

Demonstram-se zelosos na manutenção do patrimônio, porém, em se tratando de perda de


tempo, manifestam-se plenamente, pródigos, quando é o único bem para o qual a honestidade
exige avareza p.25.

Tenta lembrar-te de quantas vezes perseverantes no mesmo propósito; de quantos dias


transcorrestes com projeto definido; de quais tirastes proveito pessoal; de quanto teu rosto
manteve-se em tranquila dignidade; de quando teu espírito não se curvou ante a covardia; de
quantas obras chegastes a termo, ao longo desse largo espaço de vida; de quantos te
defraudaram sem que sentisse a falta; de quantos te furtaram a dor fútil. A alegria néscia, a
avidez trepidante e a conversação comprometedora. Por fim, vê quão de pouco sobrou de que
era mesmo teu p. 26.

Esbanjas o tempo como se o tirasses de um reservatório pleno e abundante, no entanto, advém a


hipótese segundo a qual bem aquele dia que direcionas para uma pessoa ou para algum negócio
será para ti o último p. 26.

Quem há que possa estar acima daquele que se sobrepõe até à fortuna p. 34.

O que menos faz o indivíduo atarefado é viver. Nenhuma ciência é mais difícil do que a do bem
viver.
Professores para as demais artes proliferam a granel. Em algumas delas há até adolescentes que
as aprenderam tão bem que agora, dispõem-se a ensinar. Todavia, a arte do bem viver exige a
vida inteira, sendo talvez, mais surpreendente que a vida toda é um aprendizado do saber como
morrer p. 38.

Por conseguinte, não digas que fulano viveu muito porque tem cabelos brancos e rugas. Ele não
viveu muito. Apenas durou bastante. Pensas, por ventura, que navega muito aquele de quem
uma violenta tempestade assalta o barco, deixando-o à deriva, para um lado e para outro, ao
sabor de ventanias enfurecidas? Ele não navega muito. Só balançou bastante p. 40.
Os homens recebam os saldos anuais e por eles empatam trabalho, serviço e dedicação. O tempo
ninguém valoriza. Todos os esbanjam qual coisa sem apreço. Isso não obstante, vê os enfermos.
Se o perigo da morte aproxima-se, eles abraçam os joelhos dos médicos. Se temem a pena
capital, mostram-se dispostos a doar todos seus bens em troca da prorrogação de sua própria
existência p. 41.

Ninguém restitui os anos. Ninguém os devolve a ti como tu mesmo. A idade segue seu ritmo e
não muda de direção nem retarda sua marcha. Não faz ruído nem dá sinal de velocidade.
Avança com pés de veludo. Ordem nenhuma dos reis nem preferência popular projetam sua
meta final mais além. Correrá com a mesma pressa que no primeiro dia em que principiou a
caminhada. Nem de pressa nem devagar p. 42

Para onde olhar? Até quando pensas viver? Tudo quanto está por advir assenta-se em terreno
inseguro. Cuida de viver o já e o agora!
Ouça como clama o maior dos poetas. Inspirado por boca divina, canta neste verso salutar:
“O melhor da vida é o primeiro que escapa dos míseros mortais. Por que vacilas?” Continua o
poeta. “Por que hesitas? Se não usares, ele foge.”
E mesmo, se ocupares, ele escapa. Assim deves entender que a celeridade do tempo deve ser
conectada com a velocidade do emprego dele p. 43.

Tal como uma conversa ou uma leitura ou uma ocupação intensa enganam o caminhante,
dando-lhe a sensação de estar chegando ao termo de modo mais rápido, assim também essa
contínua e velocíssima viagem da dia que, seja sonolentos, sejam acordados, andamos a passo
igual, dela não se apercebem os atarefados, salvo quando chegam ao final da caminhada p. 44.

A fim de corrigir certos indivíduos de seus erros, é necessário esclarecê-los e não,


simplesmente, repreendê-los p. 45.

A vida divide-se em três etapas: o que se foi, o que está, aí; e o que será. Dessas três a que
vivemos é a mais breve. A vindoura é duvidosa. A vivida é certa, mas irrevogável. Contra essa
última a fortuna perdeu todos os seus direitos, já não consegue que seu arbítrio possa recuperá-
la p. 45.

Os atarefados só possuem o tempo presente, mas que é tão volátil que não conseguem sequer
agarrá-lo. Mesmo esse lhes é furtado por incontáveis afazeres p. 47.

Dentre todos os seres humanos os ociosos de verdade são os que se dedicam à filosofia. Esses
são os únicos que vivem. Não são apenas guardiões zelosos da própria idade. Eles somam com a
própria as demais idades. Assim todos os anos já transcorridos passam a ser integrados nos seus
p. 59.

O tempo para o amor é breve e rápido. Ele fica ainda mais reduzido por força da volúpia
viciosa. É por isso que os indivíduos, por aí, transitam de um lado para outro, sem deter-se em
determinado prazer p. 64.

Como parecem breves as noites nos braços das prostitutas ou submersos na embriaguez p. 64.

Perdem o dia na expectativa da noite e perdem a noite com medo do dia p. 64.

Quando, em planuras infindas, comandava seus exércitos tão numerosos a ponto de serem
computados não pelo número e, sim, pela extensão de área ocupada, então o insolente rei dos
Persas chorou ao pensar que, dentro de cem anos, nada restaria de todo aquele verdor de sua
juventude p. 65.
Não só brevíssima, mas, em extremo, mísera é a vida daquele que, com esforço imenso,
acumula o que deve ser protegido com igual esforço. Com afã conseguiu o que queria, mas
possui o que está sob ameaça de soçobrar p. 66.

É melhor saber organizar a vida do que entender de abastecimento público p. 70.

Há, com efeito, certas doenças que se curam quando ignoradas pelos enfermos. É que para
muitos a causa da morte foi tomar conhecimento da própria enfermidade p. 71.

Miserável é a condição de vida dos atarefados. No entanto, ainda bem mais miserável é a
daqueles que nem se consagram às ocupações próprias; que controlam o próprio sono pelo
alheio; que caminham pelos passos dos outros; que dependem de ordem para as coisas mais
espontâneas deste mundo, a saber, amar ou odiar p. 74.

Existe então tamanha satisfação em morrer atarefado? Fato é que tal mentalidade assinala a
maioria dos mortais. É-lhes mais persistente o desejo de trabalhar que a capacidade afetiva.
Brigam contra a fraqueza corporal e pensam que só ela influencia a velhice que lhes provoca a
jubilação do trabalho p. 76.

Alguns até providenciam acerca de coisas situadas para depois da morte: a construção de
grandiosos mausoléus, a ereção de monumentos públicos, cerimônias mortuárias e solenes
enterros. Para mim, mais valeria que as exéquias desses indivíduos fossem feitas de modo
rápido como breve foi a vida deles, a saber, à luz de velas e tochas como enterro de crianças p.
76.

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