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Antonio Feliciano de Castilho Antero de Quental


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Muito há que me eu pergunto a mim donde proviria esta
enfermidade que hoje grassa por tantos espíritos, de que até
alguns dos mais robustos adoecem, que faz com que a literatura, e
em particular a poesia, anda marasmada, com fastio de morte à
verdade e à simplicidade, com o olhar desvairado e visionário,
com os passos incertos, com as cores da saúde trocadas em carmins
postiços
(...)
Quem não vê que vem tornando a contagiosa escola dos conceitos,
das sutilezas, das vanidades discretas, dos alambicamentos
metafísicos, das bátegas de flores, de pérolas, de diamantes, das
mariposas, das estrelas, das asas de anjos; a anarquia, o
turbilhão enfim de todas quantas imagens udas e miúdas há, e
pode, e não pode haver para usurparem o lugar devido aos
pensamentos e aos afetos; a mascarada das figuras em suma, as
saturnais da fantasia, a soltura das florais?
(...)
Deixando de parte, por agora, Braga e Quental, de que, pelas
alturas em que voam, confesso, humilde e envergonhado, que muito
pouco enxergo nem atino para onde vão, nem avento o que será
deles afinal. g
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Antonio Feliciano de Castilho, em posfácio a Poemas da Mocidade, de Pinheiro Chagas, 1865.


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g Eu hei de sempre ver uma péssima ação, digna de toda a importância dum
castigo, nas impensadas e infelizes palavras de V. Exa., dignas quando
dum sorriso de desdém e do esquecimento.
(...)
Combatem-se os hereges da escola de Coimbra por causa do negro crime de
sua dignidade, do atrevimento de sua retidão moral, do atentado de sua
probidade literária, da impudência e miséria de serem independentes e
pensarem por suas cabeças. E combatem-se por faltarem às virtudes de
respeito humilde, às vaidades omnipotentes, de submissão estúpida, de
baixeza e pequenez moral e intelectual.
(...)
Não é traduzindo os velhos poetas sensualistas da Grécia e de
Roma; requentando fabulas insossas diluídas em milhares de versos
sensabores; não é com idílios grotescos sem expressão nem originalidade,
com alusões mitológicas que já faziam bocejar nossos avós; com frases e
sentimentos postiços de acadêmico e retórico; com visualidades infantis e
puerilidades vãs; com prosas imitadas das algaravias místicas de frades
estonteados; com banalidades; com ninharias; não é, sobre tudo,
lisonjeando o mau gosto e as péssimas ideias das maiorias, indo atrás
delas, tomando por guia a ignorância e a vulgaridade, que se hão de
produzir as ideias, as ciências, as crenças, os sentimentos de que a
humanidade contemporânea precisa para se reformar como uma fogueira a
que a lenha vai faltando. g
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Antero de Quental, Bom Senso e Bom Gosto, 1865.


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g Todavia, quem pensa e sabe hoje na Europa não é Portugal, não é Lisboa,
cuido eu: é Paris, é Londres, é Berlim. Não é a nossa divertida Academia
das Ciências, que revolve, decompõe, classifica e explica o mundo dos
fatos e das ideias. É o Instituto de França, é a Academia Cientifica de
Berlim, são as escolas de filosofia, de história, de matemática, de física,
de biologia, de todas as ciências e de todas as artes, em França, em
Inglaterra, em Alemanha. Pois bem: a Alemanha, a Inglaterra, a França,
comprazem-se no nevoeiro, são incompreensíveis e ridículas, são
metafísicas também. As três grandes nações pensantes são risíveis
diante da crítica fradesca do sr. Castilho. Os grandes génios modernos
são grotescos e desprezíveis aos olhos baços do banal metrificador
português.
(...)
Levanto-me quando os cabelos brancos de V. Exa. passam diante de mim.
Mas o travesso cérebro que está debaixo e as garridas e pequeninas
cousas que saem dele confesso não merecerem, nem admiração, nem
respeito, nem ainda estima. A futilidade num velho desgosta-me tanto
como a gravidade numa criança. V. Exa. precisa menos cinquenta anos de
idade, ou então mais cinquenta anos de reflexão.
É por estes motivos todos que lamento do fundo d'alma não me poder
confessar, como desejava, de v. ex.
Nem admirador nem respeitador
Antero do Quental. g
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Antero de Quental, Bom Senso e Bom Gosto, 1865.


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CONFERÊNCIAS DO CASINO
“Abrir uma tribuna onde tenham voz as ideias e os trabalhos que
caracterizam este movimento do século, preocupando-nos sobretudo com
a transformação social, moral e política dos povos;
Ligar Portugal com o movimento moderno, fazendo-o assim nutrir-se
dos elementos vitais de que vive a humanidade civilizada;
Procurar adquirir a consciência dos factos que nos rodeiam na
Europa;
Agitar na opinião pública as grandes questões da Filosofia e da
Ciência modernas;
Estudar as condições da transformação política, económica e
religiosa da sociedade portuguesa;
Tal é o fim das Conferências Democráticas.”

Lisboa, 16 de maio de 1871.


Adolfo Coelho, Antero de Quental, Augusto Soromenho, Augusto Fuschini, Eça de Queirós,
Germano Vieira Meireles, Guilherme de Azevedo, Jaime Batalha Reis, Oliveira Martins, Manuel
Arriaga, Salomão Saragga, Teófilo Braga.
Ê
• O Espírito das Conferências - Antero de Quental
• Causas da Decadência dos Povos Peninsulares - Antero de Quental
• Literatura Portuguesa - Augusto Soromenho
• A Literatura Nova (o Realismo como nova expressão de Arte) - Eça
de Queirós
• A Questão do Ensino - Adolfo Coelho

• Os historiadores críticos de Jesus -


Salomão Sáragga
• O Socialismo, - Batalha Reis As Conferências
• A República - Antero; foram suspensas
• A Instrução Primária - Adolfo Coelho; em 26 de junho
• A Dedução Positiva da Ideia Democrática - de 1871.
Augusto Fuschini.
Causas da Decadência dos Povos Peninsulares

Três causas: o Catolicismo do Concílio de Trento, o


Absolutismo e as Conquistas.
“Deste mundo brilhante, criado pelo génio
peninsular na sua livre expressão, passámos,
quase sem transição, para o mundo escuro,
inerte, pobre, ininteligente e meio
desconhecido.”
“Assim, enquanto outras nações subiam, nós
baixávamos. Subiam elas pelas virtudes
modernas; nós descíamos pelos vícios
antigos, concentrados, levados ao último
grau de desenvolvimento e aplicação.”

Antero de Quental, 1871.


A literatura nova
(o Realismo como nova expressão da arte)
O realismo (...) é a negação da arte pela arte; é a
proscrição do convencional, do enfático e do
piegas. É a abolição da retórica considerada
arte de promover a emoção, usando da inchação do
período, da epilepsia da palavra, da congestão
dos tropos. É a análise com o fito na verdade
absoluta. Por outro lado, o realismo é uma reação
contra o romantismo: o romantismo era a apoteose
do sentimento; o realismo é a anatomia do
caráter, é a crítica do homem. É a arte que nos
pinta a nossos próprios olhos – para condenar o
que houver de mau na nossa sociedade.

Eça de Queirós, 1871.


Enterro em Ornans, de Gustave Courbet, 1849-1850.
Os quebradores de pedra, de Gustave Courbet, 1849.
BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA
MÓNICA, Maria Filomena. “O sr Ávila e os conferencistas do Casino”.
Análise Social, vol. XXXV (157). Lisboa: Instituto de Ciências Sociais
da Universidade de Lisboa, 2001.

REIS, Carlos (dir.). História da literatura portuguesa: o realismo e o


naturalismo. Lisboa: Alfa, 2001. v.5.

REMÉDIOS, Maria Luiza Ritzel. Eça de Queirós e a literatura


nova. Letras de Hoje, 31(4)., 2013. Disponível em:
https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/article/view/1
5626

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