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Outubro 10, 2022

ASHERÁH:
Sua presença em Canaã
em concordância com a Bíblia hebraica e apesar dela
Marisa Furlan1 e Aquiles Ernesto Martínez2

Supostas representações de Asheráh em uma postura típica ligada a ideia da capacidade de dar vida
(século VIII AEC., Judáh, Museu Eretz Israel)3

1
Mestra em Ciências da Religião (UMESP), possui graduação em Teologia pela Faculdade de
Teologia da Universidade Metodista de São Paulo (Fateo/UMESP). Membro do grupo de pesquisa
"Arqueologia do Antigo Oriente Próximo - Universidade Metodista de São Paulo", mestranda em
História pelo Centro Universitário Internacional (UNINTER) e Profª de História pelo Governo do
Estado de São Paulo. Contato: marisa.furlan28@gmail.com

2
Ministro ordenado na Igreja Metodista Unida, Professor de Bíblia e Religião na Universidade
Reinhardt, Waleska, GA, E.U.A., e membro do grupo de pesquisa "Arqueologia do Antigo Oriente
Próximo - Universidade Metodista de São Paulo". Prof. Martínez obteve seu Ph.D. da University of
Denver e Iliff School of Theology.” Contato: aem@reinhardt.edu
3
Com excessão da primeira figura em 2.8, p. 14 (https://www.imj.org.il/en/exhibitions/tree-life-
goddess, Museu de Israel), todas as demais imagens nesse ensaio tem os direitos reservados a
Aquiles Ernesto Martínez.
ABSTRACT: A profile of goddess Asheráh and RESUMEN: Perfil de la diosa Aserá y el culto
the cult in her honor that developed in the que se desarrolló en su honor en la tierra de
land of Canaan, reconstructed from selected Canaán, reconstruido a partir de textos
texts from the Hebrew Bible and despite its selectos de la Biblia hebrea y a pesar de su
hostile and violent ethnocentrism. etnocentrismo hostil y violento.

Key Words: Asheráh, goddesses, Canaanites, Palabras claves: Aserá, diosas, cananeos,
Canaan, biblical exegesis, Ancient Near East, Canaán, exégesis bíblica, Antiguo Oriente
and fertility Próximo y fertilidad

1. Introdução

A religião entendida como um fenômeno transcultural, com características semelhantes e


repetíveis, que busca estabelecer e desenvolver uma relação significativa com várias
concepções do "Mistério" (MARTÍNEZ, 2020a), foi um importante pilar na configuração e
experiências das sociedades do Antigo Oriente Próximo, particularmente no Levante
Central. Direta e indiretamente, inúmeras fontes históricas como manuscritos, inscrições
e epigrafias tornam essas experiências mais acessíveis. A estes testemunhos são
adicionadas grandes descobertas feitas pela arqueologia moderna como altares, templos,
estátuas, estelas, estatuetas e outros objetos cerimoniais.
Grande parte dessas evidências apontam para uma imensa variedade de deidades, em suas
projetadas concreções femininas e masculinas ou uma mistura de características humanas
e animais. Essa disseminação nos permite ter uma ideia desses seres esotéricos, a devoção
prestada a eles e as atividades cultuais para honrá-los. E embora pouco ou nada dessas
deusas e deuses possam ser extraídos das fontes a nossa disposição, as informações sobre
muitas delas são muitas vezes sólidas e abundantes devido sua popularidade, mas quase
nunca apresentadas objetivamente, completamente e neutralmente, servindo sempre aos
interesses contextualizados daqueles que as interpretam e seus beneficiários, o que
dificulta a reconstrução objetiva e subsequente dos dados fornecidos.
Neste marco, as narrativas bíblicas4 tem "algo" a dizer sobre as religiões de seu tempo,
especialmente sobre algumas de suas divindades, atividades e crenças. E apesar de seu
preconceito marcante e hostilidade em relação as expressões cultuais que não estavam
em sintonia com seu monoteísmo radical, um certo "suco" sobre este importante assunto
conseguiu escapar da ideologia preconceituosa bíblica e pode ser resgatado. Claro, desde
que a metodologia aplicada possa trazer à tona o que aquela narrativa esconde, reprime
ou até deturpa.

4
Para tais narrativas, usamos a Bíblia Hebraica Stuttgartensia, 2009 e a Bíblia de Jerusalém, 2002.

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Poucas são as deidades identificadas pelo nome nas Escrituras (por exemplo, Ba’al, Milcom,
Moloch, etc.). Porém embora exista um vasto conhecimento sobre elas, como resultado
de excelentes pesquisas específicas, a tendência nas ciências bíblicas tem sido privilegiar
interpretações formuladas e recicladas na literatura secundária ou considerar muitas
fontes fora da Bíblia para enquadrar as interpretações dela. Tanto que a narrativa bíblica
em si não teve a chance de se expressar primeiro. Para corrigir esse hábito ou tendência,
é necessário um corretivo metodológico que traz um equilíbrio; ou seja, devemos começar
com o testemunho da Escritura antes de consultar outras fontes, reconstruir seu contexto
e integrar todo o conhecimento coletado.5 Em outras palavras, em diálogo com a Bíblia e
seu contexto (o mundo de significado “por trás do texto bíblico"), o mundo “no texto
bíblico" a partir de nossa localização social como leitores (ou mundo de significado “diante
do texto bíblico") deve ser nossa prioridade (MARTÍNEZ, 2019).
Feito este esclarecimento metodológico, afirmamos que, após o deus Ba’al, na Bíblia
hebraica, Asheráh é a mais importante divindade devido as muitas referências sobre ela e
ao seu culto na terra de Canaã.6E considerando a posição de poder e influência e a devoção
apaixonada de seus seguidores, que se filtra por meio da retórica anti-canaanita das
Escrituras, vale a pena conhecer Asheráh e quaisquer das práticas da religião que se
formou ao redor dela, especialmente quando muitas abordagens não dão ao discurso bíblico
a prioridade que merece como parte de um processo integral.7 Naturalmente, este perfil

5
LEUENBERGER (2021, p. 187) concorda com nossa abordagem ao dizer que devemos estudar os
textos bíblicos que falam sobre ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬Asheráh de forma crítica, a fim de extrair inferências sobre
esta deusa ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬Asheráh é mencionada em algumas fontes ugaríticas, mas não há iconografia com
seu nome impresso ou anexado com o qual uma conexão direta pode ser feita. Na verdade, 23 dos
127 objetos descobertos que têm a ver com deusas mencionam apenas Anat, Astarde e Qedeshet
(CORNELIUS, 2008, p. 87, 89, 99-100). Uma possível exceção poderia ser a figura de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬Asheráh
como uma árvore em um dos frascos encontrados em Kuntillet Ajrud, mas mesmo lá a conexão
não é direta. A epigrafía tem sido interpretada como uma referência ao deus egipcio Bes e à sua
consorte (Ver Religião e Literatura na antiga Palestina. Acesso em 27/09/2022
https://www.religionofancientpalestine.com/?page_id=131).

6
Veja Asheráh (Dt. 16:21; Jz 6:25f, 28, 30; 1Rs 15:13; 16:33; 18:19; 2Rs13:6; 17:16; 18:4; 21:3, 7; 23:4, 6-7,
15; 2Cr 15:16; Mq. 5:14); Asherim (Ex 34:13; Dt 7:5; 12:3; 1Rs 14:15, 23; 2Rs 17:10; 23:14; 2Cr 14:3; 17:6;
24:18; 31:1; 33:19; 34:3s, 7; Is 17:8; 27:9; Jr. 17:2); Asherot (Jz 3:7; 2Cr. 19:3; 33:3).

7 Veja, TRONETTI, 2022, p. 1-2; CROATTO, 2001, p. 30-36, cf. p. 36-39; KAEFER e PALAZZI, 2019, p. 9-
12; MONTEIRO, 2019, p. 352-370. Uma possível exceção é o artigo escrito por ANTHONIOZ (2014,
p. 125-139) embora sua abordagem não esteja completa, ela tem o propósito de comparar essa
“deusa” com a Astarde, especialmente em termos de uso do plural para referir-se à pluralidade de
ambas as divindades.

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deverá ser complementado com um posterior acercamento das fontes extra bíblicas e das
descobertas arqueológicas.8
Dada a centralidade de Asheráh, consideramos necessário examinar a caracterização que
os relatos bíblicos fazem desta divindade feminina e sua adoração como primeiro
movimento interpretativo, sem ter que divagar em intermináveis debates teóricos ou
problematizar a natureza das evidências e da nossa interpretação dela com tecnicalidades.

2. Um perfil entre muitos

Uma leitura bem focada da Bíblia hebraica, com a ajuda de procedimentos metodológicos
adequados, nos dá uma resposta inicial a pregunta: “Quem era Asheráh”? E isso é possível
quando, depois de peneirar a areia da predisposição hebraica contra as culturas
canaanitas, o politeísmo reinante e a chamada "idolatria", nos concentramos nas "pedras
de ouro" que permanecem na peneira. O que a Bíblia hebraica e até mesmo sua tradução
grega (Septuaginta ou LXX9) dizem sobre esta “deusa” e seu culto?

2.1 Nome próprio

A primeira coisa que se destaca é que Asheráh é identificada por um nome próprio no texto
hebraico, e nada mais. O seu nome é ‫( ֲא ֵׁש ָרה‬Asheráh),10 no singular, e ~yrIv
ß ea (Asherim),
no plural. Sua etimologia é incerta.11 Entretanto devemos levar em conta que as muitas
referências bíblicas sobre ela e seus cultos não são uma validação de seu status como uma
“deusa” entre inúmeras deidades canaanitas, muito menos uma confissão de fé. Em sua
campanha para desacreditar o politeísmo, os autores hebraicos usam o nome ‫ֲא ֵׁש ָרה‬
Asheráh (em suas formas singular e plural) apenas para identificá-la na comunicação de

8
Para isso, contamos com textos ugaríticos, e egípcios assim como inscrições fenícias e greco-
romanas. A partir dessas fontes, podemos conhecer ‫ ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬Asheráh melhor, e também as deusas
Astarde, Anat e Qedeshet (ver CORNELIUS, 2008; BINGER, 1977; MAIER, 1986).

9
A Septuaginta é a tradução grega do Antigo Testamento hebraico. A partir de agora leia-se LXX.

De agora em diante, usaremos a palavra hebraica ‫ ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬para identificar a deidade pesquisada
10

nesse ensaio.

11
Há dificuldades em identificar a origem e o significado da palavra ‫( ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬BINGER, 1997, p. 143-144;
cf. SILAS, 2016, p. 16). Embora milhares de estatuetas femininas tenham sido descobertas
representando algumas deusas, e o estudo delas tenham representado um avanço (SILAS, 2016, p.
17), não há realmente nenhuma relação direta, clara e definitiva entre elas e ‫א ֵׁש ָ ָֽרה‬.
ֲ

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seus ataques; ou seja, como referência utilitária ou dispositivo retórico. Do ponto de vista
dos escritores bíblicos, ela não é uma “deusa” literalmente. Sua representação material
poderia ser vista como uma coisa repugnante a ser destruída. Apenas aqueles que a
homenageiam obviamente acreditam em sua existência e divindade, o que inclui,
paradoxalmente, o povo hebreu e muitos de seus líderes.12

Estatuetas de várias épocas (2. 950-732 AEC.; e 3. 1550-1200 AEC) que mostram a
necessidade popular de representar a feminilidade ou a capacidade de gerar e sustentar
a vida, com possíveis vínculos com ‫ ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬ou outras divindades (Megiddo, Instituto
Oriental, Chicago).

Acerca de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬não há explicação sobre sua posição e atributos ou as principais crenças
de seus seguidores. Não há mitos. Rituais e cerimônias estão inseridos no fundo religioso

12
As traduções do texto hebraico ao Português erram quando adicionam a palavra “deusa” (Dt
12:3; 16:21; Jz 3:7; 6:25; 1Sm 7:3; 12:10; 1Rs 11:5, 33; 2Rs 23:7, 14; 2Cr 33,7, 34:4; Jr 7:18).

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dos textos, mas não são descritos. A partir do relato da queda do Reino do Norte, por
exemplo, com base no contexto literário, deduzimos que algumas práticas podem ter tido
ligações com esta “deusa”, embora a relação não seja direta. Portanto deve ser lida com
suspeita: sacrifícios infantis, adivinhação e feitiçaria (2Rs 17:17). 13 Apesar disso mais notório
é a rejeição que, como veremos mais tarde e para cumprir o mandato divino, é feita as
representações materiais de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, aos seus fabricantes e aos que a veneram. A mediação
física é o ponto a ser contestado e deve ser destruído, não apenas validado a abstração ou
a presunção da existência de um ser realmente superior. Porque não se pode destruir
alguém que é uma ilusão, mentira ou criação humana (Sl 115:4-7), mas sim com sua
representação material.

2.2 Ausência de matronagem étnico

A origem ou nexo exclusivo de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬com qualquer cultura ou grupo particular em Canaã
não está explicitada na Bíblia hebraica. Ou seja, ela não é uma deidade de nenhuma pessoa
ou nação específica. Não há afirmativa direta que ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬teria sido uma “deusa Canaanita"
ou "Fenícia", por exemplo.14Nenhuma cidade foi nomeada com o nome dela, como
aparentemente aconteceu com a deusa Astarot.15 Ela era uma deidade canaanita apenas
no sentido de que era apaixonadamente venerada no território onde habitavam, além dos
israelitas, os cananeus, heteus, jebuseus, amonitas, ferezeus, heveus, e outros grupos, e
cujas fronteiras geográficas a Bíblia hebraica as vezes delimita.

Para reforçar este ponto, o uso do termo em plural ~yrIßva


e (Asherim) poderia explicitar que
havia muitas representações materiais locais dessa deidade.16 Em outras palavras, ela foi
“deusa” de muitos dos habitantes da “terra prometida” (Ex 34:11-17; Js 3:3) ou das nações
mais poderosas de Israel cujas deidades eram adoradas, entre as quais ela deve ser incluída
(Dt 7:5). De acordo com o testemunho bíblico, ninguém controlava o culto dela ou tinha

13
Não há evidência de que crianças tenham sido sacrificadas em adoração a esta “deusa”. Em
relação a este tema, ver MOSCA, 1975.

14
Ao contrário do que acontece com a ‫ ; ֲא ֵׁש ָרה‬Astoret, que é "a deusa dos sidônios" (1Rs 11:5, 33).

15
Ou seja, a cidade que leva o mesmo nome desta “deusa” (como a mesma “deusa”), que está
localizada em Bashan e onde Sehon reinou (Dt 1:4; Js 9:10; 12:4; 13:12, 31; 1Cr 6:71).

16
O gênero feminino, com e sem o artigo específico: Ex. 34:13; Dt. 7:5; 12:3; Jz 3:7; 1Rs 14:15; 2Rs
17:10; 23:14 (artigo); 2Cr 19:3 (artigo); 33:3; Mq. 5:14 (v. 13 no texto hebraico); e Jr 17:2. Também no
plural masculino com o artigo: 1Rs 14:23; 2Cr 14:3; (v. 2 no texto hebraico) 17:6; 24:18; 31:1; 33:19;
34:3-4, 7; e Is 17:8; 27:9.

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uma relação exclusiva com essa divindade, e nem ela tinha predileção por ninguém.17
Aparentemente, ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬era uma divindade "henoteísta", ou seja, adorada por vários
grupos étnicos que, apesar de acreditarem na pluralidade das divindades, prestavam
homenagem especial a ela em diversos lugares.

2.3 Popularidade resiliente

O fato de haver quarenta referências nos textos bíblicos que mencionam ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬pelo nome
e sancionam fortemente sua adoração, bem como edifícios, altares, lugares altos e objetos
para fins cerimoniais, não só nos diz de sua presença imponente em Canaã, mas também
que a religião que se formou ao seu redor era totalmente antagônica aos interesses de
Israel e de seu deus legitimador. Essa popularidade, inferida dos textos bíblicos com
cautela,18chegou a tal extremo que os próprios israelitas acabaram assimilando aquilo do
que deveriam separar e censurar. Aparentemente ela não era uma ameaça séria durante o
tempo de Josué e Juízes. O culto oficial de YWHW ainda não havia sido institucionalizado.

A grande recepção que a religião de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬teve pode ser inferida a partir das referências
geográficas onde a adoração dela foi estabelecida por um longo tempo e contra a qual
alguns reis fiéis a aliança mosaica, tiveram que lutar. Houve presença deste culto nos reinos
de Judá (2Cr 17:6; 24:3; 31:1) e Israel (2Rs 23:15; 18:19; 2Cr 34:7), bem como em todo o
território supostamente ocupado pelo povo hebreu. Santuários, altares e imagens dessa
deidade também são mencionados em Ofra (Js 6:11, 25-26), Samaria (2Rs 21:7; 23:4, 6; 2Cr
34:3), Jerusalém (2Rs 21:7; 23:4, 6; 2Cr 34:3) e possivelmente em Betel (2Rs 23:4,15).

Tal foi o encanto ou poder desta “deusa” que os líderes do Reino do Norte e Judá por
influência cultural, adaptação cultual ou conveniência, colocaram sua fé em ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, usando
sua posição de privilégio e recursos para promover a adoração dela. Enquanto vários reis
e religiosos lutavam contra esta “deusa”, como parte de seu esforço para erradicar a
idolatria e nem sempre com coerência absoluta (por exemplo Josias, Ezequias e Asa; 1Rs

17
Corroboramos com a ideia de Römer ao usar o termo “forçosamente” para referir-se a sua
titularidade como “deusa” (2017, p.165), visto que para essa designação não há respaldo concreto,
direto e definitivo, ou seja, não há evidências materiais, bíblicas ou arqueológicas para justificar
essa pertença.

18
A popularidade e a força desafiadora da adoração de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬é o que o discurso bíblico pressupõe.
E embora a iconografia feminina seja abundante na região e dado o fato de que não há inscrições
para identificar as muitas imagens existentes, devemos aceitar sua popularidade com certo
cuidado, especialmente quando as Escrituras tendem a "inflar" ou "caricaturar" a realidade.

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15:14), a maioria adotou alguma forma de politeísmo. Quanto ao culto a ‫ ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬, a narrativa
bíblica destaca como culpados deste “pecado”: Roboão, Acabe, Manassés, Joás, Oséias,
Joacáz e Jezabel (1Rs 15:11-13; 16:33; 18:19; 2Rs 13:6). Também Maaca, mãe de Asa, que fez
, .mi) imagem” de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, possivelmente uma árvore para representá-la
uma “horrível (tc,lÞp
(evn tw/| a;lsei auvth/j). E por essa transgressão, este rei a depôs de sua posição como
rainha-mãe (1Rs 15:13).

Na ausência de inscrições identificando nomes de deusas ou características físicas


claramente replicadas em bustos ou estátuas, é impossível determinar com certeza se as
estatuetas presentes ou outras similares eram representações de feminilidade ou objetos
que simbolizavam deusas. No entanto, a pose desses objetos era um padrão transcultural
nos tempos bíblicos.

2.4 Para todos e todas igualmente

Sem descartamos o estímulo que essa “deusa” possa ter especificamente para as
mulheres, possivelmente em torno de sua posição e funções domésticas, algumas
evidências bíblicas (tomadas como uma representação fiel da realidade) sugerem a
popularidade desta “deusa” tanto para homens como para mulheres; assim como para
várias classes sociais e grupos étnicos. Seus seguidores incluem a realeza e as pessoas em
geral. A proporção de adoradores e a intensidade e frequência de adoração entre ambos
os sexos, é claro, não podem ser medidos. Milhares de estatuetas descobertas não
provam em si mesmas ou automaticamente que esta deidade foi seguida particularmente
por mulheres.

No entanto, embora a religião de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬como a Bíblia hebraica sugere pudesse ser
relativamente inclusiva, não deveríamos nos surpreender que as mulheres se

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identificassem especialmente com essa divindade por causa da afinidade feminina e da
capacidade de dar e nutrir a vida. Portanto, teria havido grupos de mulheres consagradas
e especialmente equipadas para atendê-la. Lembrando que o rei Salomão construiu
"lugares altos" para Quemós e Moloc, e também para "as mulheres estrangeiras" que
ofereciam incenso e sacrifícios aos seus "deuses" (1Rs 11:7), e embora seja verdade que
não sabemos a quais deuses particulares elas serviram, ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬pode ter sido um deles. O
fato de que havia mulheres que teciam para esta “deusa” no Templo de Jerusalém (2Rs
23:7) e que a Rainha Maaca tinha reunido uma imagem horrível desta divindade (2Cr 15:16),
dá força à nossa conjectura. A este grupo de devotos, podemos adicionar Nehusta (mãe
de Jeoaquim, Jezabel e Ataliah (Filha de Judá e Jezabel) (TRONETTI, 2022, p. 6-7).

2.5 Objeto de adoração

‫ ֲא ֵׁש ָרה‬foi uma “deusa” venerada e adorada por seus seguidores, isso é uma realidade que
é dada como um fato em todas as passagens que rejeitam violentamente seu culto. Neste
sentido, falar dela como “deusa” ou como um “objeto” em si mesmo não é uma distinção
que os escritores bíblicos tentam fazer. Para eles ela foi “nada”.19 A crítica é dirigida à seu
culto (TRONETTI, 2022, p.3) e as mediações ou representações físicas dela (ANTHONIOZ,
2012, p. 134). O que fica claro, é que a criação e uso de diversos objetos e espaços religiosos
em sua homenagem pressupõe uma profunda devoção a esta “deusa”: altares, lugares
altos, representações físicas, objetos consagrados, santuários, pessoas à seu serviço, etc.
Apenas em Jz 3:7, como parte de uma crítica incisiva da infidelidade religiosa do povo de
Israel durante o tempo dos juízes, é abertamente dito que os israelitas fizeram "mal aos

19
Em sua análise da terminologia e iconografia associando o deus 'El com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬em Kuntillet 'Ajrud
e Khirbet el-Qom, Emerson identifica essa “deusa” como um "objeto de adoração" em vez de uma
deidade como tal (EMERTON, 1999). E mesmo que alguns pesquisadores não saibam se ela foi um
símbolo de culto ou uma “deusa” (WHITE, 2022; HADLEY, 2000), nossa pesquisa, contudo, reforça
a ideia de que ela foi um objeto embasado em dois argumentos: 1) Do ponto de vista do autor
implícito ou dos autores do texto hebraico, esta divindade nunca é apresentada de forma clara e
direta como uma “deusa”. É apenas um ser maior para aqueles que acreditam nela, sejam eles
canaanitas ou apóstatas hebraicos. 2) Além disso, os tradutores da LXX consideram ‫ ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬como
um objeto de culto representado materialmente; ou seja, como "bosques". E embora seja verdade
que essa mediação material pudesse ter sido apenas um símbolo, não devemos rejeitar a ideia de
que para muitos, árvore ou árvores representem a mesma “deusa”, com uma possível conotação
"panteísta".

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olhos do Senhor", o que significava concretamente “prostrar-se” ou "servir" os Ba’als e
‫( ֲא ֵׁש ָרה‬Jz 3:7; 2Rs 21:3).

2.6 Grave ameaça

As muitas condenações de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e a propagação de sua adoração em Canaã devem ser
entendidas, não como um mero fato informativo ou casual, mas como um grande desafio
a ideologia religiosa dos hebreus que buscavam se impor a força. Do ponto de vista das
relações de poder e da sociologia da legislação, essa “deusa” era muito mais do que uma
das muitas escolhas religiosas. Era, de fato, uma rival poderosa e imprudente que teve que
ser eliminada através de denúncia e atos de violência. ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬era um verdadeiro perigo. Os
redatores da história deuteronomista tiveram medo dela. A criação, promoção e
implementação de leis contra o culto a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬revelam claramente que esta religião era
uma grande rival ao monoteísmo hebraico até sua morte ou sobrevivência em outras
formas de adoração séculos depois. Se não, por que insistir tanto em desacreditar sua
imagem, proibir as práticas em sua honra, destruir sua representação física, acabar com
cada objeto e construção dedicado a ela, e punir severamente seus praticantes e
promotores? Lembremos que a pena de morte deveria ser aplicada a todos os idólatras.20

2.7 Imagens diversas

De acordo com os escribas bíblicos, ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬foi representada física e/ou materialmente, o
que foi um desvio da lei mosaica (Ex 20:4-6). Seus seguidores criaram estátuas ou efígies
dela e de outras divindades. Esta situação alarmante justifica, obviamente, para os
opositores deste culto, a criação e implementação de mandamentos contra a elaboração
de imagens. Infelizmente e por razões óbvias, na Bíblia hebraica muitos detalhes

20
Ex 22:30; Dt 13:1-10; 17:2-7; 18:20-22; Lv 20:1-5; 27:29 e Nm 25:1-9.

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As estruturas de pedras ou estelas de vários períodos são numerosas em Israel e,
portanto, ajudam a entender os textos bíblicos ilustrando-os ou apresentando
referências concretas. As imagens atuais encontradas em Tel Hatzor, no que parece
ser um templo com muitas estruturas de pedra (e mesmo com um sentido fálico),
são a prova da plausibilidade dos relatos bíblicos no que diz respeito a cultura
material (século XVII e XIV AEC).

importantes estão ausentes: significado dessas criações, aspectos, estilos, tamanhos,


localização exata, criadores, custo, tempo que levou para fazê-los, se foram elaborados de
acordo com um padrão que lhes permitiu ser reconhecido ou não, etc. Felizmente e para
ter uma melhor ideia de algumas possibilidades, nós contamos com milhares de estátuas
e estatuetas femininas descobertas na Síria-Palestina e áreas próximas. O problema é que

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muitas vezes não sabemos ao certo quais delas são deusas ou quais são meras
representações artísticas da feminilidade ou fertilidade.21
No contexto desse esforço humano para dar visibilidade e tangibilidade ao abstrato, é
interessante a associação de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬com "postes", "pedras", “colunas” ou "pilares" que,
segundo o contexto literário das narrativas, estariam fora do comum. Os escritores do
Texto Massorético chamam esses objetos de hb'Cem mitzôt (altares), e os tradutores da LXX
traduziram essa palavra como ta.j sth,laj (tas steilas), que significa “postes” ou “colunas
de pedra” (Ex 34:13; Dt 7:5; 12:3; 16:21-22; 1Rs 14:23; 2Rs 17:10; 18:4; 23:14; 2Cr 14:2; 31:3; Is
27:9). 22 No Antigo Testamento essas estruturas são representações da presença divina (De
VAUX, 1976, p. 378), neste caso, de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬. Exemplos delas podem ser encontrados em
sítios arqueológicos ou museus em muitas partes do mundo hoje.

Além dos tAbßCm


e mitsôt, ou ta.j sth,laj (tas steilas) e sem nos dar exemplos, alguns textos
falam de "imagens" ou "ídolos" de (~yliêsPi .h ‫) ֲא ֵׁש ָ ָֽרה‬, que a LXX entende como "esculpido"
(2Cr 33:19; Dt 7:25) e ao qual adiciona a frase explicativa "dos deuses" (ta. glupta. tw/n
qew/n) (Dt 7:5; 12:3). Esta terminologia é usada para falar de uma forma geral sobre outras
deidades. Mas, ao mesmo tempo, por causa de sua posição em orações e amplitude, estas
palavras podem muito bem inserir essa “deusa” e Ba’al. Outros marcadores linguísticos
importantes são oi/j eivdw,loij e ta. ei;dwla, que se referem a "ídolos", no sentido
masculino e feminino, e que na LXX são usados para traduzir o termo ~yBi_c;[]h'( (2Cr 24:18)
e ‘~ylisiP.h; (2Cr 34:7) respectivamente (“ídolos” ou “imagens”). Algumas vezes tAk)SeM;,
(maseqot) é mencionado, um termo que comunica a ideia de imagens feitas de metal
derretido (cwneuto,j, em Grego) (2Cr 34:3-4), mas sem ter uma descrição gráfica delas. A
relação ou diferenciação linguística entre ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬a respeito de toda essa terminologia não
é absolutamente clara ou consistente. Infelizmente um problema, como consequência
dessa falta de especificidade, é que não sabemos exatamente qual era a aparência exata
ou tradicional dessa “deusa”.

21
Na verdade, há milhares de figuras ou estatuetas femininas na Síria-Palestina e regiões
circunvizinhas, representando o tema da fertilidade ou das deusas (NOLL, 2001).
22
VON RAD indica que eles poderiam até ter uma forma ou sentido fálico (1966, p. 115).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 12


Possíveis representações do deus 'El e Anat ou ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, em uma posição semelhante a adotada
por Ba’al (Tel Dan, séc. XIII-XV AEC)

2.8 Árvore e Árvores

Dentro do tema das representações tangíveis de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, há uma relação entre essa
divindade e as árvores, até o ponto em que ambos os elementos são a mesma coisa, como
foco de adoração.23 Várias chaves textuais inseridas no Texto Massorético e a LXX apoiam
essa leitura (Ex 34:13; Dt 7:5; 16:21; 2Rs 23:4, 6, 14, 15; 2Cr 14:3; Jr 17:2; Mq 5:13),
especialmente quando consideramos a rejeição da idolatria, o lugar e o papel centrais que
as árvores tinham nesta concepção pluralista do divino (Dt 12:2; 2Rs 16:4; 2Cr 28:4; Is 57:5;
Jr 2:20; 3:6, 13; Ez 6:13; 20:28).

Essa ideia é sugerida pela ações de “corte”.24 [d;G" (gadac) no plural masculino (Dt 7:5; 12:3;
2Cr 14:3, 31; 34:4,7) mas principalmente como tr;K' (karat), no singular feminino (Jz 6:25-
26, 28, 30; 1Rs 15:13; 2Rs 18:4; 2Cr 15:16) e no plural masculino (Ex 34:13; 2Rs 23:14),
pressupõe a existência de troncos, plantas, ou árvores que devem ser removidas para ser
destruídas. Também a ação de "arrancada"(vt;n") (natash) (Mq 5:14) e a proibição de

23
A associação com as árvores, segundo o LXX, ocorre tanto no plural quanto no singular (em suas
formas femininas e masculinas), e não apenas no plural. Portanto, não é apropriado afirmar que a
forma singular se refere à “deusa” ou imagem dela, e que o plural se refere a ela como um objeto
de adoração. Em todas as referências bíblicas, e especialmente no LXX, ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬é denunciada como
um objeto de culto e não apenas em Crônicas. Ela não existe, ela não é nada, portanto, ela não é
uma deusa (v. KAEFER e PALAZZI, 2020, p. 13-14, etc.).
24
DE VAUX (1976, p. 379) está de acordo com nossa leitura.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 13


plantio ([j;n") (natac) de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ao lado do altar do Senhor (Dt 16:21).25 Na LXX, com exceção

de 2Cr 5:16 e 2Cr 24:18, o termo ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬é a;lsoj (alsos) (“arvoredos”), confirmando nossa
interpretação.
Mas em Jr 17:2, dada a configuração não
tão clara de seu conteúdo,
consistentemente traduzido como
"bosques" ou grupo de árvores
frondosas, temos a impressão de que
esta deidade (se fizermos uma leitura
literal de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬como uma entidade
distinta, imagem ou deusa), era algo
diferente do bosque que na denúncia do
profeta. Porque seria muito estranho
falar de "bosques" ao lado de "árvores
frondosas".
Deuteronômio 16:21 reafirma a
possibilidade de uma árvore específica
Este objeto na forma de um tronco e com
desenhos de árvores pode ter simbolizado de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e YWHW. O fato de haver
‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ou outra deidade. Mas o possível nexo pedras, imagens ou ídolos, devido ao seu
com esta deidade é uma inferência caráter geral e que eles também
(https://www.imj.org.il/en/exhibitions/tree-life- poderiam ter sido colocados entre essas
goddess, Museu de Israel)
árvores, sustenta a ideia de que esta
“deusa” pode ter tido sua árvore
própria.
Tudo isso é sugerir que falar sobre ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e esse tipo de árvores, para os hebreus, afinal,
seria a mesma coisa. Não existe uma separação ou uma marcação distinta. O fato de
Maaca, mãe de Asa, ter criado uma ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, que a LXX entende como uma "árvore", reforça
essa hipótese (2Cr 15:16). Em sua condenação profética contra Judá, Jeremias refuta o
pecado desse povo, que está gravado, não apenas nas tábuas do coração, mas nos "chifres
de seu altar", cujas ligações com as árvores que representam ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬são praticamente
sinônimos (Jr 17:1-2). Indo além do testemunho bíblico, foram descobertos em sítios

25
O uso do verbo #t;n" (natats) (2Cr 34:7), que significa "entrar em colapso", pode sugerir a ideia
de um objeto vertical que poderia muito bem ser feito de madeira, pedra ou outro material
semelhante.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 14


arqueológicos, muitos objetos como imagens de árvores dentro e fora de Israel,
reforçando a popularidade deste tema vinculado a religiosidade dos povos.26

Entre os muitos objetos encontrados em um templo filisteu em Yavne (séc. IX AEC.),


essas duas réplicas artesanais de santuários se destacam nas quais, além de figuras
femininas que são frequentemente associadas com deusas ou a própria ‫א ֵׁש ָרה‬, ֲ
vemos árvores esculpidas ao lado delas (Museu Eretz Israel).

Com base em todas essas observações, a grande questão exegética é: que significado ou
função essa “deusa” tinha com as árvores? E diante do silêncio dessas passagens e da
ausência de informações de seus antecedentes na narrativa bíblica, somos novamente
deixados de fora do código de comunicação. No entanto, com base no senso comum
preconcebido, só podemos conjecturar que essa deidade possivelmente teve algo a ver
com a criação, manutenção e desenvolvimento da vida, das quais as árvores podem muito
bem ter sido símbolo mediático. O símbolo da árvore está presente em outras religiões, e
esse paralelismo incita um estudo transcultural. 27

26
Para Römer, por exemplo, estatuetas-postes, foram encontradas em grande quantidade nas
cidades judaítas mais importantes dos sécs. VIII-VII AEC (Jerusalém, Arad, Bersabéia, Beit-Mirsim,
Bet-Sames, Laquis), onde a forma mais frequente é composta por um poste (tronco de árvore),
feito à mão, sobre o qual se fixava um busto feminino postos em relevo, na maioria das vezes
sustentado pelas mãos (2017, p. 165).
27
Por exemplo, esse símbolo tem nexos com uma estátua do Imperador Cláudio (41-54 E.C.),
encontrada em Megara, talvez representando Zeus e cujo suporte parece ser uma águia na forma
de um tronco de árvore (Museu Arqueológico de Atenas). Em uma versão do mito da origem da
“deusa”, contado em parte pelo geógrafo Estrabo, temos imagens de arvoredos perto de Celçuk,
Turquia. E protegido por espíritos divinos, em um relevo de Assurbanipal II no Museu Britânico,

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 15


As referências a plantas e arbustos específicos de cada topografia era uma prática lógica e comum.
Neste apoio cerimonial na forma de um santuário, por exemplo, vemos desenhos de palmeiras que
podem ter tido um significado decorativo. Contudo não podemos negar o religioso, como parte do
tema dos bosques (Megiddo, 1300-1200 AEC., Instituto Oriental, Chicago)

2.9 Aspecto desconhecido

A partir do testemunho bíblico, inferimos que, embora muito se diga sobre várias formas
de representação física de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, realmente não sabemos nada de sua aparência. Então,
por que detalhar graficamente quem é considerada uma mentira, uma fabricação humana
e inimiga do deus hebreu, e cuja adoração foi uma violação da lei mosaica? Falar de pilares,
postes, pedras, imagens e ídolos não nos ajuda. A coisa mais próxima deste tópico seriam
referências a bosques ou troncos. E ainda assim, essa ideia não é precisa devido a imensa
variedade de árvores em Canaã. Nem mesmo as descobertas arqueológicas de estátuas ou
figuras femininas foram capazes de estabelecer uma conexão clara, direta, decisiva e
consistente entre esta parte da cultura material existente e a identidade desta deidade. De
fato, a sua iconografia é um “mistério”.28 E como estamos lidando com algo

diante o deus Shamash, duas imagens deste rei aparecem olhando uma árvore ao centro de ambas
(Nimrud, 865-860 AEC.).
28
Seu nome é mencionado em algumas fontes ugaríticas, mas não há iconografia com seu nome
impresso ou anexado. Na verdade, dos 127 objetos descobertos que têm a ver com deusas, apenas

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 16


desconhecido, então, não devemos descartar a prática de criar e usar multiformes
representações artísticas de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬.

2.10 Altares

Para o culto as divindades utilizavam móveis e estruturas estáveis ou fixas que, dentro ou
muito próximas de espaços geográficos, eram usadas para sacrifícios, oferendas e outras
cerimônias religiosas. Mas em torno de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, só sabemos da existência do que os

escritores bíblicos chamam ‫ח‬


ְ ‫ ִמְז ֵּב‬mitvot, traduzido como "altar", e que os autores da LXX
traduzem com o equivalente semântico βωμός (bōmós) (Dt 7:5; 12:3; 2Cr 31:1; Jr 17:2; Is
27:9; 17:8). As passagens bíblicas não indicam especificamente o que os adoradores
ofereciam, mas dá para pensar em incenso, sacrifícios animais e coisas parecidas.29
Curiosamente, no caso de Ba’al, ‫ח‬
ְ ‫ִמז ֵּב‬ mitzot é traduzido como φυσιαστάριον

(fusiastárion), não como βωμός (bōmós) (2Rs 21:3; 2Cr 34:4, 7). Embora exista a
possibilidade de que esses termos sejam sinônimos, é possível que existam certas nuances
semânticas distintas que os textos bíblicos não esclarecem. De qualquer forma, o
decepcionante sobre a menção de altares é que a narrativa não dá detalhes sobre esses
representantes da cultura material canaanita. Então não sabemos nada específico sobre
materiais mais fortes e duráveis, como pedras. Felizmente, descobertas arqueológicas nos
dão uma boa ideia dos tipos de altares que eram usados em tempos bíblicos, entretanto
não preenchem esse vazio. Vale ressaltar que a criação e o uso desse tipo de objeto, com
suas peculiaridades cultuais, são parte integrante de toda as religiões.
Mais uma vez, no contexto da animosidade e do preconceito religioso, por que reservar
tempo e espaço para descrever as crenças, objetos e práticas daqueles que eram inimigos
de Israel, em benefício de pessoas que têm interesse no estudo comparativo das religiões?

23 deles têm inscrições com nomes específicos de deusas. Entretanto, ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬não está entre eles
(LEUENBERGER, 2021, p. 87, 89, 99-100).

29
Não seria estranho oferecer canábis, especialmente quando consideramos que algumas
amostras desta substância foram encontradas no altar menor em Tel Arad, que alguns afirmam ter
dedicada a ‫א ֵׁש ָרה‬.
ֲ Sobre o tema de canábis num sentido geral e algumas descobertas, ver ARIE,
ROSEN e NAMDAR, 2020, p. 5-28; KOMP, 2022.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 17


De peças móveis e pequenas a estruturas maiores e fixas, altares mencionados na narrativa
bíblica eram muitos e diversos. E na ausência de especificidade de 2Rs 2:4 em torno dos objetos
queimados por Hilquias, só podemos imaginar o que o texto bíblico omite. Talvez este altar em
Tel Hatzor ajude.

2.11 Vários objetos cultuais

Embora não sejam dados detalhes sobre isso, apenas um texto em particular nos diz sobre
outros objetos da cultura material que foram destruídos por ter tido contato ou ter sido
criados com o propósito de promover a adoração a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬. Dizem-nos que o rei Josias, em
seu esforço para cumprir as estipulações da lei mosaica, ordenou que Hilquias removesse
a ‫( כ ִלי‬keli) traduzida como σκεῦος (skeuos na LXX, “objetos”) da Casa do Senhor. Este
sacerdote, além de obedecer ao comando do rei, queimou esses objetos fora de Jerusalém
nos campos de Cedron e, em seguida, levou suas cinzas para Betel (2Rs 23:4).
Este vocábulo parece ser uma referência a vasos, utensílios ou algum tipo de recipiente
para fins cerimoniais. Mas dada a natureza ampla deste termo, é possível incluir como
referência objetos como suportes, copos, jarros, lâmpadas e afins. A partir deste breve
texto, também podemos deduzir que tanto para os cananeus quanto para os hebreus
havia uma distinção marcante entre lugares e objetos que eram e os que não eram
especiais. Além disso, em um contexto de luta pelo poder, o que é sagrado para um grupo
é sacrilégio para outro. Tanto na ideologia religiosa hebraica, como em outros grupos
religiosos com uma filosofia semelhante do universo, até mesmo objetos são culpados de
idolatria por associação.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 18


Dada a falta de especificidade, talvez as imagens a seguir possam nos ajudar a ter uma
ideia melhor do significado do termo ‫( כ ִלי‬keli). Entre os muitos objetos que fizeram parte
das ações cultuais do politeísmo há séculos, observamos, na primeira fotografia, vários
tipos de vasos para libações. Um deles tem uma forma circular com touros (símbolo de
Ba’al) e romãs (frutas ocasionalmente ligadas ao tema da fertilidade). O maior detentor
tem motivos arbóreos (Megiddo, Instituto Oriental, Chicago). Na segunda imagem, vemos
um frasco para libações na forma de uma mulher, em uma postura comum e com possíveis
ligações a alguma deusa (Templo Filisteu, Tell Qasille, séc XI AEC., Museu Eretz Israel).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 19


2.12 Lugares altos

É impressionante que os adoradores desta “deusa” canaanita escolhessem "lugares


elevados" ou hm'B' (bamáh) para realizar sua adoração em honra a ela, bem como outras
divindades (1Rs 14:23; 2Cr 31:1; 3:3, 19; 34:3). O tema de ter espaços sagrados (naturais ou
na forma de edifícios) é uma constante nas religiões. Vale lembrar que dentro ou perto do
templo em Jerusalém, possivelmente em uma casa consagrada, havia recintos a serviço de
deidades canaanitas (~yviêdEQ.h; yTeäB' (batei haqdeshim) com um sentido pejorativo, e como
o.n oi=kon tw/n kadhsim (on oikon ton kadesim, de acordo com a LXX), onde um grupo de
mulheres teceu (mantos ou tendas) para ‫( ֲא ֵׁש ָרה‬2Rs 23:7). Se esses espaços já existiam
no templo ou se foram reformados ou adicionados para esse fim, não sabemos.

Do hebraico hm'B' (bamah) (traduzido como u`yhla ou juzeila na LXX), a interpretação


"lugar" ou "lugares altos" sugere um espaço geográfico elevado, possivelmente um
monte do qual templos menores ou santuários construídos em tais lugares não podem ser
excluídos. No entanto, o ponto a destacar em nossa pesquisa é que não sabemos
exatamente a que a palavra se refere. Além disso, por que eles têm que ser elevados? Para
estar mais perto da suposta morada celestial de ‫ ? ֲא ֵׁש ָרה‬A Bíblia, por não ser uma
compilação de documentos canaanitas, não deixa claro essas questões. Curiosamente, e
para mostrar o quão comum era a prática de usar espaços altos, YHWH ordenou a Gideão
que, depois de destruir o altar de Ba’al e cortar a árvore de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬deveria construir um
altar no topo de um penhasco (Jz 6:26).
Criar espaços diferenciados obviamente diz algo sobre a visão de mundo, crenças e valores
de seus criadores e usuários. Entre outras coisas, revela que há uma hierarquia de
preferências; as coisas são diferentes e têm valores diferentes. Algo ou alguém pode ser
mais ou menos importante, dependendo da decisão (prática e conveniência) que cada
pessoa ou grupo social dá a tudo que compõe a vida. Os adoradores de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ilustram e
reforçam esses princípios universais.

2.13 Pessoas a seu serviço

Parte da excessiva boas-vindas que ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬teve, pode ser vista nos esforços para organizar
a adoração em sua honra, especialmente entre os próprios hebreus e a liderança a seu
serviço, como já notamos. Para sermos um pouco mais específicos, pelo menos uma vez
somos informados de grupos de profetas servindo outras divindades durante o tempo do
rei Acabe (1Rs 19:1-6). Também de 400 profetas ligados a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e de sua comunhão com

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 20


a Rainha Jezabel (1Rs 18:19), e de 450 profetas ligados a adoração de Ba’al. Se isso era uma
constante ou algo conjuntural, não sabemos. Mas pode denotar uma certa infraestrutura
organizacional que deu importância a adoração a esta “deusa”, caso contrário a existência
desta religião não poderia ser explicada por tanto tempo. Além disso, vale a pena
perguntar se havia "mulheres" a serviço dela dentro desse grupo profético e que a
linguagem patriarcal oculta esse fato, ou se havia profetisas e servidoras à parte a quem o
texto bíblico não dá visibilidade, muito menos crédito.
Para reforçar essas observações, continuando com a perspectiva de gênero, é curioso
notar a existência de mulheres que teciam para ‫( ֲא ֵׁש ָרה‬2Rs 23:7), o que sugere a criação
de mantos, tecidos, tiras ou tendas de algum tipo. Poderíamos dizer que o que foi uma
atividade diária e doméstica (Ex 35:25-26), tornou-se uma atividade com foco religioso.30
Além de não saber quantas mulheres realizavam essa tarefa, quem eram e de onde
vinham, não temos informação de qual era o produto de seu trabalho, seu significado e
função. O narrador só diz que elas realizavam esse trabalho para cobrir essa “deusa”.
Ademais, há uma vaga referência a destruição de salas ou recintos no Templo de Jerusalém
para "as coisas sagradas" ou ~yviêdEQh. ; (hapdeshim), literalmente com um sentido
pejorativo, uma vez que a ideia de "prostituição religiosa", como muitas traduções tomam
como incerta e inserem, não está claramente no texto hebraico. Na verdade, não há
evidências explícita e clara de prostituição ritual neste texto e outros paralelos
(MARTÍNEZ, 2018, p. 61-76). Apesar disso, o que está claro é a devoção dessas mulheres a
essa “deusa”. Se não, por que dedicar tanto tempo avaliando negativamente sua
ocupação e puni-las?

2.14 Alta valorização do sagrado

Na conceituação deuteronomista de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e nas atividades e objetos que mediam sua
relação com o divino, observamos que dada a sua condição religiosa preeminente, cada
objeto ou atividade que tem a ver com ela não foi algo comum ou um símbolo de rotina,
mas de valor supremo e incalculável. Dentro dessa concepção do universo, então, para os
adoradores dessa divindade há uma diferenciação marcante entre "o sagrado" e "o
profano", "o transcendente" e "o imanente", com um valor superior dado ao sagrado e ao
transcendente. Tanto que a destruição de qualquer objeto de adoração, pelo valor
diferenciado imputado por aqueles que criam nela, merecia "a pena de morte". É por isso
que os homens da cidade de Ofra, ao saber que Gideão havia destruído o altar de Ba’al e
‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, exigiram que Joás tirasse o seu filho Gideão de casa para ser executado por este

Com precedentes nas mulheres que serviram na entrada do tabernáculo (Ex 38:8; 1Sm 2:22) (De
30

VAUX, 1976, p. 972).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 21


terrível ato (Jz 6:30). E não é por menos porque, na linguagem religiosa, Gideão cometeu
um sacrilégio o pecado de profanação.
Todavia vale a pena lembrá-los que em nossa análise, a sacralização da realidade social não
foi exclusiva da religião de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬. Sem ir muito longe, os próprios hebreus estruturaram
seu pensamento e estilo de vida de acordo com a mesma cosmovisão. É por isso que eles
incorporaram a pena de morte na lei mosaica e aplicaram a mesma aos seus
transgressores, particularmente àqueles que adoravam outros deuses e deusas e criavam
imagens. E se esse povo adotou esse modus operandi, por que outros povos não poderiam
fazer algo semelhante?

2.15 Criação humana

Embora não se aplique explicitamente a tudo o que tem a ver com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e sua adoração,
é poderosamente impressionante que, segundo Isaías, "os altares" para ela não vieram do
nada ou simplesmente apareceram, mas foram feitos por seus devotos: "altares que são
obra de suas mãos ... altares de incenso que seus dedos fabricaram (ênfase nossa)" (Is 17:8),
assim como as capas ou mantos para ‫( ֲא ֵׁש ָרה‬2Rs 23:7). Por implicação e bom senso, a
palavra tem a ver também com imagens, altares e santuários, como revela a linguagem
utilizada, embora essa característica não seja diretamente mencionada em cada
passagem. Para tal finalidade, observe a ênfase nas ações de "fazer", "levantar",
"derreter", que pressupõe a ação humana (Dt 16:21; 1Rs 14:15, 23; 15:13; 16:33 2Rs 17:10, 16;
18:4; 21:7; 23:7, 14-15; 2Cr 33:3; 15,16; 33:19).
Para os escritores bíblicos, nenhum objeto, pessoa ou prática que tenha algo a ver com
"idolatria" é de origem divina ou literalmente reproduz tal coisa. Embora as evidências
possam ser entendidas de maneira diferente em algumas ocasiões31, as deusas e deuses,
para muitos, não existem. Na linguagem moderna e além da predisposição bíblica, tudo é
construção social mediado pelo visível e tangível. As mesmas regras se aplicam aos
israelitas.

31
Por exemplo, não ter deuses "antes" do Deus da Aliança não implica necessariamente a aceitação
da existência de outras deidades. Pode ser lido como se esse Deus estivesse acima dos outros (Ex
20:3, 23).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 22


Estatuetas femininas de metal adotando uma postura tradicional, com possíveis ligações
com a fertilidade ou deusas ligadas a esse conceito e entre as quais ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬se destaca. Muitos
textos bíblicos condenam a fabricação e adoração de estruturas metálicas como as que
vemos aqui.

2.16 Associação diferenciada com outras divindades

A caracterização hebraica de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬nem sempre denota a existência de uma única


“deusa”, no singular e divorciada de outras deidades. Ela aparece ao lado de Nehustan no
templo de Jerusalém mesmo que a relação não seja explicada (1Rs 18:4); também ao lado
do deus de Israel (Dt 16:21). Em vários textos ela é mencionada ao lado de Ba’al. Além de
ser o deus mais temido e, portanto, a quem mais dá atenção a Bíblia hebraica, sua relação
com esta “deusa” é constante e inseparável.
Contudo vale ressaltar que, embora não sejam fornecidos detalhes sobre a relação entre
este deus e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, as imagens construídas para representar essa divindade e Ba’al são
diferentes quando aparecem juntas. Por exemplo, “postes" e "pedras" são mencionados
em relação a esta divindade feminina. Mas a respeito de Ba’al os autores falam de altares
e imagem dedicados a ele no sentido geral. Há uma história em que sua imagem e bezerros
aparecem juntos, mas a relação não é direta com nenhuma dessas divindades. Também
sabemos de "imagens de metal fundido”, em um sentido amplo, que podem muito bem
ter sido incluído um desses deuses ou outras deidades; mas os textos não falam sobre esse
assunto.
E como a ordem das palavras muitas vezes indica a ordem de importância, superioridade
ou preeminência, essa característica parece definir a Ba’al e sua relação com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬desde
que ele é sempre mencionado primeiro. O número de profetas atribuídos a ambos os
deuses reproduz essa diferenciação hierárquica: 450 para Ba’al e 400 para ‫( ֲא ֵׁש ָרה‬1Rs 18).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 23


Das muitas citações bíblicas e fontes secundárias, sabemos que o primeiro desta dupla é o
deus canaanita mais importante.
No livro das Crônicas, para reproduzir em português o número plural da palavra hebraica
Ba’alim, falamos de Baales, o que parece sugerir uma espécie de sinédoque; ou seja, "a
parte para o todo". Em outras palavras, o termo singular Ba’al acabou sendo usado como
uma referência genérica a vários deuses ao mesmo tempo (ou Ba’alim), e não somente a
designação para um deus específico. E isso aconteceu possivelmente como parte de um
processo de relativa institucionalização e diversificação da imagem deste deus entre os
cananeus e o próprio povo de Israel.

Figuras representando o deuses 'El e Ba'al (Megiddo, Instituto Oriental, Chicago)

O que se fala do altar de Ba’al e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬juntos em algumas narrativas nos lembra das
descobertas feitas em Tel Arad e da proibição do texto bíblico de não "... levantar qualquer
imagem de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬junto ao altar que você construir para o Senhor. Também não deve
erguer pedras, pois o SENHOR seu Deus as odeia” (Dt 16:1-22; Jz 6:25). Neste sítio
arqueológico foram encontrados um altar principal (que possivelmente se refere ao deus
‘El) e um menor (com uma possível associação com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ou Astarde), colocado no que
parecia ser "um lugar santíssimo". E embora não saibamos se o altar maior pode ter algo
a ver com Ba’al primeiro, em outro momento antes de ser transferido para o deus 'El ou
simultaneamente, a associação entre uma divindade masculina e outra feminina é notável,
assim como sua representação material e espacial. Quando levamos em consideração a
sequência de eventos na trama da história de Israel, as referências a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ao lado de Ba'al
e depois ao lado de YWHW e em seu templo (Dt 16:21; cf. 2Rs 21:7; 23:6-7) sugerem, não
apenas uma estreita associação entre essa “deusa” e esses deuses, mas também a passagem

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 24


de uma figura divina masculina para a outra. Isso reflete como Israel substituiu um deus por
outro como parte de um processo de assimilação cultural e ressignificação dos insumos
religiosos fornecidos pelos cananeus. Por fim, tenta centralizar a adoração e forçar as pessoas
a adorar um único deus, apesar das medidas repressivas contra os infratores, o que não
funcionou. Adorar Ba'al e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬fazia parte da cultura popular. Além da narrativa bíblica, a

associação entre ‘El e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬é testemunhada extra biblicamente.32

Além Ba’al e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, e para diversificar a crença em muitas deidades, outro grupo de forças
superiores adoradas e representadas materialmente foram "as estrelas do céu", sem que
tenhamos sua identidade ou traços específicos. Os israelitas prostraram-se em adoração
diante de "todo o exército do céu" ~yIm;êVh
' ; ab'cä .-lk'l (2Rs 17:16; 21:3; 23:4-5), que a LXX
entende como "poder" (du,namij) e que então se traduz como "exército" para se referir e
criticar fortemente a devoção de Manassés a idolatria (2Cr 33:3). Nessas passagens,
esclarecidas por outros, a referência é ao sol, lua, estrelas e outras entidades semelhantes
(Dt 4:19, 17:3; Sl 33:6; Jr 3:19; 8:2; 33:22; 19:13; Is 34:4; 40:26; 45:12; Sf 1:5; Ne

Altares e estelas descobertos em Tel Arad e expostos no museu de Israel sugerem uma relação
diferenciada e hierárquica entre as divindades, que alguns ousam atribuir a 'El e ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ou Astarde,
muitas vezes sem se abrir a outras possibilidades.

32
A partir da iconografia encontrada em Kuntillet 'Ajrud pode ser deduzido que havia uma relação
hierárquica próxima com o deus 'El e segundo o qual ambos abençoaram seus fiéis
(LEUENBERGER, 2021, p. 179-190; SMOAK e SCHNIEDEWIND, 2019, p. 5-6; DEVER, 2005; TRONETTI,
2022, p. 4-6). Essa relação pode-se presumir da própria Bíblia, mas sem qualquer detalhe.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 25


9:6). No entanto, o tipo de relação com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬ou o próprio Ba’al, não está claramente

evidente. Mas podemos supor, que essas estrelas são mencionadas junto com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e,
acima de tudo, porque elas são objeto de ira e destruição. Evidências extra bíblicas e
transcultural certifica a reinante devoção a chamada astrologia entre os cananeus.

2.17 Outras Asherim ~yrIßvea?

O conceito de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, como aconteceu com o de Ba’al, também parece ter sofrido algumas
mudanças, como parte de um processo de diversificação conceitual e de simplificação e
formalização linguística, e como fruto de outra localização social de quem utilizava tal
terminologia. Em algumas passagens, no texto hebraico curiosamente, se fala não de uma
‫ ֲא ֵׁש ָרה‬no singular,33 mas de várias (tAr)vea]h' ou Asherot),34 “Asheráhs”, em feminino e
plural e em masculino plural (]~yrIßva
e ]ou Asherim).35 Algo semelhante acontece com a deusa
"Astaret" de quem se fala como tro+T'v.[;h ouou Astarot de acordo com a LXX (Jz 2:13; 10:6)36,
uma deusa intimamente relacionada com ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬. Tanto que estas se confundem ou
equiparam-se na troca cultural de ideias para os escritores bíblicos (Dt 1:4; Js 9:10; 12:4;
13:12, 31; Jz 2:13; 1 Sm 7:3-4; 12:10; 31:10).
Essa mudança de número gramatical pode interpretar-se de várias maneiras. Pode ser
tomada simplesmente como uma referência gramatical a muitos “bosques” ou “árvores”
(como mediações físicas de ‫ ) ֲא ֵׁש ָרה‬em Israel (como é refletido na interpretação da LXX)
ou representações locais da mesma deidade em muitos lugares, seja na corte ou templo
ou em áreas fora do contexto oficial.37Mas, em sua forma feminina com as marcas
patriarcais e inclusivas no termo Asherim, essa mudança nos leva a pensar em uma

33
Dt 16:21; Jz 6:25-26, 28, 30; 1Rs 15:13; 16:33; 18:19; 2Rs 13:6; 17:16 (sem o artigo); 18:4; 21:3 (sem o
artigo), 7; 23:4, 6-7, 23:15.
34
Ex. 34:13; Dt. 7:5; 12:3; Jz 3:7; 1Re 14:15; 2Re 17:10; 23:14 (com artigo); 2Cr 19:3 (com artigo); 33:3;
Mq. 5:14 (v. 13 na Bílbia Hebraica); e Jr 17:2.

35
1Re 14:23; 2Cr 14:3 (v. 2 na Bíblia Hebraica) 17:6; 24:18; 31:1; 33:19; 34:3-4, 7; Is 17:8; 27:9.

36
E mesmo com a própria Astarde (2Cr 5:16; cf. 1Cr 24:18).

37
Não acreditamos que o uso do plural (em suas formas femininas ou masculinas) deve-se
unicamente ou principalmente a um esforço para distinguir ou mesmo contrastar a religião
"popular" de ‫א ֵׁש ָרה‬,
ֲ daquela considerada "oficial" (ver VON RAD, 1966, p. 115; v. ANTONIOZ, 134-
137).

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ressignificação da terminologia para abranger mais “deusas” com características
semelhantes a de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, mesmo que não saibamos dos nomes de outras divindades

femininas. E se a pluralização de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬do ponto de vista dos novos usuários, conota a
existência de outras deusas além da “deusa original”, então as deidades femininas
canaanitas e seus adoradores foram, em vários períodos da história de Israel, uma ameaça
mais grave do que a ameaça da “deusa original” conhecida por esse nome e mencionada
nos textos bíblicos. O mesmo poderia ser deduzido se aceitarmos que essas passagens
testemunham muitos bosques, com base na interpretação que a LXX faz de ~yrIßva e Asherim
ao traduzí-lo para o grego, bem como para o plural.

2.18 A mesma Astarde?

Consistente com o tema de outras Asheráhs, chama a atenção que na LXX, em algumas
narrativas, o termo hebraico ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬não é traduzido como "bosque" ou “arvoredo”, mas
é substituído pela palavra VAsta,rth (astártei) que se refere a deusa Astarde (2Cr 5,16), e
mesmo em sua forma plural VAsta,rtaij (astártais) para reproduzir o hebraico no mesmo
número gramatical (2Cr 24:18).38
Essa mudança é significativa por muitas razões. Além de reafirmar que as deusas em Canaã
realmente eram um problema sério para os hebreus, também reflete a localização social
do tradutor e a livre ressignificação dos termos, além da prática comum de associar ou
mesmo equiparar outras deidades ou deusas com suas próprias deidades por terem as
mesmas funções e atributos.
No estudo das religiões e na interação entre elas, muito pouco é fixo e imutável. Toda
ideia, crença, mediação material ou prática é redefinida e muda. O mesmo acontece com
as palavras. No final, é tudo sobre o contexto e a perspectiva a partir das quais se
interpreta e como esta interpretação cria ou colore essa realidade desde seu início. Este
ciclo não termina, apenas se diversifica.

38
Essa prática de equiparar deusas estrangeiras ou resignificá-las hermeneuticamente era comum
em tempos bíblicos. Dentre vários exemplos podemos destacar o que a tradição hagádica fez com
a figura de Lilith e sua deificação. Ela foi um tipo de ‫א ֵׁש ָרה‬,
ֲ associada com a lua, os ventos,
tempestades, água, pássaros noturnos, as serpentes e a fertilidade (SCHWARTZ, 1991, p. 120-122).

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 27


3. Considerações finais

Tentar recuperar parte da identidade de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, seus seguidores e a relação entre eles
mediado por crenças, práticas e objetos tangíveis e viabilizado na linguagem bíblica, tem
sido possível neste ensaio, mas com importantes qualificações dignas de visibilidade. Com
alguns precedentes metodológicos semelhantes ao que compartilhamos aqui e que os
leitores podem consultar sobre o tema das deidades e religiões a partir da mesma Bíblia
(MARTÍNEZ, 2020 a b, 2021, 2022), reiteramos que toda fonte de informação está
posicionada e, portanto, tem uma maneira muito particular de replicar a realidade. E nela,
gostemos ou não, "a realidade" dos fatos se mistura com as "interpretações", muitas
vezes parciais e até tendenciosas. A Bíblia hebraica não é única nesse sentido, assim como
outras fontes antigas. E embora seja verdade que os "testemunhos” da história podem
ser hostis, idealistas ou românticos em sua representação do mundo para definir sua
identidade social (especialmente em contextos de guerras e sobrevivência), é possível,
pelo menos em teoria, reunir alguns "retalhos” de informações um pouco mais factuais ou
menos tendenciosos, em nossa tarefa titânica de montar o quebra-cabeça do passado. E
ao pensar nesse fenômeno, questionamos veementemente o hábito de demonizar os
outros, não apenas visceralmente e baseado em preconceitos e estereótipos, mas como
um recurso, muitas vezes inconsciente, para fortalecer a identidade e as crenças.
Assim, coerente com esses princípios, não nos deixando enganar pela retórica anti-
canaanita da Bíblia hebraica e com a intenção de recuperar o “outro lado” de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬, neste
artigo apresentamos "algo" dessa deidade, seus devotos, atividades e religiões. Em outras
palavras, temos tentado ouvir as “vozes silenciadas” desta “deusa” e seu culto e, ao fazê-
lo, de alguma forma temos apresentamos seu ponto de vista sem que aceitemos suas
crenças. As passagens que condenaram essa religião, paradoxalmente, são as mesmas que
forneceram dados importantes para reconstruir parte de sua identidade.
Esta tem sido uma abordagem justificável, especialmente quando consideramos que a
Bíblia hebraica, em seu etnocentrismo excludente e visceral, posicionou-se radicalmente
contra tudo o que não concorda, assim como com a adoração do deus hebreu para, entre
outras coisas, legitimar a posse da terra e a aniquilação de seus habitantes em uma versão
idealizada e seletiva da história. Mas também, e apesar da postura bíblica, nesta tentativa,
acreditamos e reafirmamos biblicamente o grande impacto que essa “deusa”
aparentemente teve sobre Canaã e o projeto fracassado para eliminar sua adoração e
memória (Dt 12:3).
Ao longo desta jornada, que merece purificação, a Bíblia hebraica, astutamente lida, tem
sido útil para nós como um primeiro movimento no qual privilegiamos a terminologia que
literalmente fala de ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬e o que se sugere, mas de uma perspectiva relativamente

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 28


sincrônica a fim de reconstruir parte de sua identidade e culto. Uma análise que se
concentre na data dos livros bíblicos onde essa terminologia aparece, a localização social
dos escritores ou algumas memórias históricas, talvez ajudaria a identificar algumas
nuances em que, por razões de abordagem, não detectamos ou deixamos de lado. Nesta
aproximação, as questões de mudança na adoração e no tema como o culto mudou,
diacronicamente vale a pena explorar, porém não seria esse o foco desse ensaio.
Pensando no futuro e para completar esse perfil bíblico, os textos onde aparecem
“conceitos” associados a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬nos quais o mesmo não são utilizados, muito nos intriga.39
Assim como uma estrutura descritiva do que algumas fontes extra bíblicas nos dizem
sobre essa divindade, vale a pena também explorar o impacto que ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬possivelmente
teve em outras regiões do Levante além de Canaã, compilando e analisando a abundante
cultura material que parece ter ligações com essa importante divindade.

39
Se há uma relação entre esta divindade e o título "a rainha do céu" (Jr 7:18; 44:17-19) e o tema de
árvores e deusas; também se há referências a ‫ ֲא ֵׁש ָרה‬em Zc 5:5-11 e Os 2:4-7, 12ss (ver RIBEIRO, 2014),
e também se há personagens na Bíblia que, tendo promovido a idolatria, tinham algo a ver com
‫א ֵׁש ָרה‬,
ֲ nesse caso, Jezabel, Nehusta e Ataliah.

ASHERÁH: FURLAN E MARTÍNEZ 29


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