Você está na página 1de 174

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ENFERMAGEM

LUCIANE RÉGIO MARTINS

MULHERES, MÃES, CUIDADORAS DE CRIANÇAS E


ADOLESCENTES NEGROS, USUÁRIOS DE CAPSij

SÃO PAULO
2022
LUCIANE RÉGIO MARTINS

MULHERES, MÃES, CUIDADORAS DE CRIANÇAS E


ADOLESCENTES NEGROS, USUÁRIOS DE CAPSij

Versão corrigida da Tese apresentada ao


Programa Interunidades de Doutoramento
em Enfermagem da Escola de Enfermagem e
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto,
para a obtenção do título de Doutora em
Ciências.

Área de Concentração: Enfermagem

Orientadora: Prof.a Dr.a Sônia Barros


Coorientador: Dr. Luís Eduardo Batista

VERSÃO CORRIGIDA

A versão original encontra-se disponível na Biblioteca da Escola de Enfermagem da


Universidade de São Paulo e na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da
Universidade de São Paulo.

SÃO PAULO
2022
Nome: Luciane Régio Martins

Título: Mulheres, mães, cuidadoras de crianças e adolescentes negros,


usuários de CAPSij

Tese apresentada ao Programa Interunidades de


Doutoramento em Enfermagem da Escola de
Enfermagem e Escola de Enfermagem de Ribeirão
Preto, para a obtenção do título de Doutora em
Ciências.

Aprovado em: / /

Banca Examinadora

Orientador: Prof. Dr.


Instituição: Assinatura:

Prof. Dr. Instituição:


Julgamento: Assinatura:

Prof. Dr. Instituição:


Julgamento: Assinatura:

Prof. Dr. Instituição:


Julgamento: Assinatura:

Prof. Dr. Instituição:


Julgamento: Assinatura:

Prof. Dr. Instituição:


Julgamento: Assinatura:
Dedico este estudo às Mulheres/mães/cuidadoras e seus filhos.
Para todas as mulheres negras que lutam.
“Não existe luta sozinha”

Dedico à mãe, Terezinha


Régio; irmã, Adriana; e, companheiras
de lutas, Leila, Carol, Bruna,
Estefânia e Ale.

“Para uma só mulher ficar em pé, precisam muitas”


“Fui buscar água.
Fiz o café. Avisei as crianças que não tinha pão.
[...] Tudo quanto eu encontro no lixo eu cato para vender.
Deu 13 cruzeiros. Fiquei pensando que precisava comprar
pão, sabão e leite para a Vera
Eunice. E os 13 cruzeiros não dava!
Cheguei em casa, aliás no meu barracão, nervosa e exausta.
Pensei na vida atribulada que eu levo. Cato papel, lavo roupa
para dois jovens, permaneço na rua o dia todo.
E estou sempre em falta. A Vera não tem sapatos. E ela não
gosta de andar descalça.
[...] Saí indisposta, com vontade de deitar.
Mas, o pobre não repousa. Não tem o privilégio de gosar
descanço.
Eu estava nervosa interiormente, ia maldizendo a sorte (...)
Catei dois sacos de papel. Depois retornei, catei uns ferros,
umas latas, e lenha.
Vinha pensando. Quando eu chegar na favela vou encontrar novidades.”

Carolina Maria de Jesus, 16 de julho

(Trecho com escrita original, “Diário de


uma favelada - Quarto de Despejo”)
AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, com carinho especial, à Professora Dr.ª Sônia Barros. pelo
acolhimento, orientações, sobretudo, ensinamentos e aprendizados, por confiar e
acreditar, com quem aprendi que é “sempre pelo afeto”, que a verdadeira
transformação profissional e pessoal encontra sentido. Agradeço ao Dr. Luís Eduardo
Batista, por ter aceitado o ser coorientador, mostrar caminhos e por sua presença e
intelectualidade. A ambos, peço desculpas pelo tempo que a branquitude me fez
titubear. Com amor, agradeço por me auxiliarem no processo decolonial de
identificação do racismo institucional, dos privilégios da branquitude, para destramar
o circuito manicomial racista, sexista, capitalista e de supremacia branca na sociedade
brasileira.

Agradeço ao Prof. Dr. Benedetto Saraceno, que em visita ao Brasil, discutiu a


primeira versão do pré-projeto de pesquisa, por suas recomendações.

Agradeço à Prof.ª Dr.ª Márcia Aparecida Ferreira de Oliveira, pelas palavras


interventoras e afeto, incentivo com práxis, a quem aprendi a amar e compartilhar
tantos processos. Tenho muita admiração por sua força de sororidade acadêmica,
dentre tantos movimentos egóicos colonizados, ensinou-me a resistir pelo bem
comum sempre.

Agradeço à Prof.ª Dr.ª Ana Luisa Aranha e Silva pelo “sim” (abrindo as portas
da EEUSP em 2014), e por me aproximar profissionalmente da Enfermeira Caroline
Ballan, que divide comigo sonhos de formar Enfermeiros em Saúde Mental. Admiro
sua luta por dignidade para todes.

Em especial, à Caroline Ballan, obrigada companheira, pela irmandade. Por


identificar que eu precisava de uma amiga e por se tornar ela, emprestando
contratualidade, paciência, estímulo e afeto. Sua luta pelas mulheres todas está
presente na força deste estudo, nas conversas e escutas. Também, muita admiração
e carinho, estendido ao Matias.

Agradecimento à Secretaria de Pós-graduação da EEUSP, aos queridos, Mara,


Vanessa e Edivan; também, bibliotecários e funcionários, Juliana, Paulo e Vanderlei;
demais colaboradores.
Agradeço aos colegas do grupo de pesquisa Enfermagem e as Políticas de
Saúde Mental - GEnPSM, pelo companheirismo nos percalços e construções
coletivas, de trabalho e amizade. Helena Cortez, Anaísa Cristina Pinto - companheira
e amiga para a vida, Lara Simone Floriano, Carla Aguiar, Carla Nascimento, Heloísa
Claro, Milena Marques, Laís dos Santos e Jussara dos Santos.

Em especial, à Bruna de Paula Candido, agradeço pela cumplicidade no estudo


do racismo, de coorientanda, tornou-se parceira de estudos.

Agradeço aos colegas do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar em Políticas


Públicas de Saúde Mental (GPIPPSAM), do Instituto de Estudos Avançados da USP,
liderado pelas Prof.ª Dr.ª Sônia Barros, Prof.ª Dr.ª Márcia Aparecida de Oliveira e Dr.ª
Ana Luisa Aranha e Silva.

Agradeço ao Curso de Enfermagem da FCMSCSP, local de trabalho e


reinvenções de modos de pensar e ensinar, na Enfermagem em Saúde Mental, a ex-
Diretora, Prof.ª Dr.ª Maria do Carmo Querido Avelar, nos desafios da docência; a
Diretora atual do Curso de Enfermagem, Dr.ª Lívia Keismanas de Ávila, obrigada pelas
oportunidades e confiança; ex-secretária, Fabiana, carinho e admiração. Agradeço
aos colegas Professores, docentes do Curso de Enfermagem, que me apoiam, Dr.ª
Maria Fernanda Terra (amiga fenomenal), Dr.ª Graziela Souza, Ms. Lenir Soares, Dr.ª
Gislaine Camiá, Dr. Geraldo de Azevedo, Dr.ª Maria Angela Reppetto e demais, sinto-
me honrada pela convivência. Aos meus alunes, gratidão.

Agradeço a fortaleza das mulheres da família, minha mãe, Terezinha Régio,


torcida incondicional. Minha irmã, Adriana Martins, primeira professora, Enfermeira,
que me inspira todos os dias, pela pessoa ética e amorosa, “sem roseiras, não
seríamos as irmãs de hoje”. Minha amiga-irmã, Leila Coutinho, Enfermeira,
companheira de todas as horas. Aos demais, pai, Afonso Martins, irmãos, sobrinha e
sobrinhos, obrigada.

Agradeço aos queridxs do CAPSij Brasilândia, que me acolheram e se tornaram


parte desta história toda e outras. À Enfermagem, com Estefânia Ventura, e as demais
Enfermeiras, Bárbara e Sheila; Anderson, Pedro, Daniela, Erica (artista da capa, “A
nega do leite” – https://www.instagram.com/_anegadoleite/), demais trabalhadores.

Agradeço e peço “a bênção”, responsável pela minha mudança de Estado e de


vida, a Ialorixá, Mãe, Maria Cristina Martins ou Iyá Cristina d’Oxum. Agradeço ao Pai
Walter e minhas irmãs e irmãos do Ilê Iyalode Oyó. Amigas, Zuleica, Priscila e
Marcelo.

Amigas/os sem vocês, a vida não teria a menor graça! Por isso, agradeço a
Alessandra Trindade, Bruno Dorneles, Sabrina Silva, Marcya Cabral, Cristina Chagas,
Angela Becker, Cesar Bicca, Imran Ahmed, Audisséia Felippo, Verônica Lopes,
Lusinete Lopes e Eucllides Dantas. In memoriam, aqueles que me fazem falta todos
os dias, Stella Chebli e Edson Rosa. Também, Fabiane Capelassi de Souza e Ana
Maria.

Companheiros de lutas, Károl Veiga Cabral, Iris Rotgel, Bruno Logan


(@rdcomlogan), Cláudia Braga, Emiliano Camargo, Cristina Lopérlogo, Simone
Ramalho, Pedro Gava, Luciana Colvero, Ana Lúcia Machado, Ala Loucos Pela X, Bar
Bibitantã e Ybyatã (Gisela, Dani e Fábio).

Agradeço à Rede HumanizaSUS (RHS, www.redehumanizasus.net e


ciberespaSUS), que tr@nsborda mundos, editorxs/cuidadorxs, pelo tempo de trabalho
e amizade: Ricardo Teixeira, Jacqueline Abrantes, Maria Luiza Sardenberg, Erasmo
Ruiz, Patrícia Silva, Emília, Shirley Monteiro, Rejane Guedes, Mariana Sales, Sabrina
Ferigato e Raphael Travia.

Sobretudo, agradeço aos amigos Marcello Pimentel e Rejane Monteiro pela


edição, revisões e companheirismo nos desafios!

Agradecimento especial às mulheres participantes deste estudo, no


compromisso de retorno na luta pela garantia de direitos.
Régio Martins L. Mulheres, mães, cuidadoras de crianças e adolescentes negros,
usuários de CAPSij [tese] – São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São
Paulo; 2022.

RESUMO

Introdução: A discriminação da loucura e os agravos produzidos pelo racismo, como


determinante e condicionante da saúde, influencia, diretamente e indiretamente, sobre
as condições de vida. Como pressuposto, as mulheres, mães, cuidadoras de crianças
e adolescentes pretos e pardos em CAPSi sofrem discriminação dupla, pela sua cor
de pele e por ter um filho/a com problemas de saúde mental. Objetivo: compreender
o percurso das mulheres, mães, cuidadoras de crianças/adolescentes negros com
problemas de saúde mental, usuários do CAPSij na RAS. Método: trata-se de um
estudo exploratório, descritivo de abordagem qualitativa. As concepções teóricas são
do Racismo tridimensional. Utilizou-se um Banco de Dados Empíricos com 37
mulheres. Devido à Pandemia da COVID 19, uma amostra não-probabilística por
conveniência de 18 mulheres foram entrevistadas. As categorias empíricas, cinco (5):
I – Atenção à Saúde, 2 temas: Percurso na RAS (Concepção de saúde como
urgência; A compreensão de UBS; Acesso à UBS; Pontualidade do atendimento;
Problemas de saúde e Cuidados de Saúde), O CAPSij (O CAPSij como apoio técnico
e afetivo; Expectativas em relação ao CAPSij; A expectativa em relação ao CAPSij na
Pandemia da COVID 19; O tratamento no CAPSij; Controle social no CAPSij); II –
Cuidar de criança/adolescente com problema de saúde mental, 7 temas:
Descobrindo o Problema de Saúde Mental (Identificação do problema de saúde;
Descrição do Problema de Saúde Mental; A reação da mulher e familiares; O problema
de saúde mental e a sociedade; Carga e estresse no convívio familiar), “Os
sentimentos” (Defesa da criança/adolescente; Sentimentos frente a
criança/adolescente com problemas de saúde mental), Enfrentando a discriminação
(Estigma, discriminação pelo problema de saúde mental), Construindo Autonomia
(Autonomia dos filhos), A família, Rede Social (Apoio Familiar; As amigas como apoio
afetivo; Apoio com limite; Participação do pai das crianças/adolescentes; Os homens,
masculinidade e machismo; Cuidado dos filhos sem apoio), A Pandemia da COVID 19
(Sustentabilidade da família; Dificuldades durante a pandemia), O Futuro (Desejos da
mãe; Receios da mãe; Os planos da mãe; A questão financeira; A filha como
companheira). III – A Escola, 2 temas: A escola regular e a especializada (A Escola
Regular; O atendimento na Escola especializada, Escolas conveniadas com Estado
com método ABA), Escola na pandemia da COVID 19 (A Escola na Pandemia); IV –
Gênero, 5 temas: O Feminino (Concepções de gênero - “ser mulher e mãe”;
Feminilidade - gostar de ser mulher e mãe; Desigualdade de gênero - Patriarcado
sexista; Concepção de casamento; Acesso à Informação e métodos anticonceptivos;
A Luta pela igualdade de gênero), A Maternidade (A mulher e os planos interrompidos
pela maternidade ou cuidados dos filhos; Ambivalências em relação à maternidade;
Concepção de Maternidade; Expectativas de aprendizado na maternidade; Esquecer
de si para cuidar do filho/a; Resiliência Materna), Antes e depois (Atividades antes do
diagnóstico), Sororidade (Apoio para o cuidado entre mulheres da família, Referências
Maternas, Ensinamentos geracional feminino e feminista), Resistência
(Espiritualidade, Religião e Saúde Mental; Instrução da mulher; Positividade na atitude
das mães). V – Racismo, 1 tema: Identidade Negra (Autodeclaração, quesito raça/cor,
cor da pele; Identificação e sentimentos em relação ao racismo; a construção da
identidade negra; Racismo, território; Racismo no CAPSij; Referência Negra).
Discussão: A estrutura da sociedade brasileira ancora-se no racismo patriarcal
sexista capitalista de supremacia branca. À luz dos determinantes sociais em saúde,
o racismo produz, sistematiza as iniquidades, pois opera como um “dispositivo de
racialidade”. Considerações Finais: Defendemos uma atitude antimanicomial
antirracista na RAS e RAPS, utilizando “raça” como categoria analítica
interseccionalizada a gênero e classe social no trabalho em Saúde Mental. Este
estudo é um desdobramento inicial para outras pesquisas.

Palavras-chave: Saúde mental. Racismo. Enfermagem. Gênero. Reforma psiquiátrica.


Régio Martins L. Women, mothers, caregivers of black children and adolescents,
CAPSij users [tese] – São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo;
2022.

ABSTRACT

Introduction: The discrimination of madness and the harm produced by racism, as a


determinant and condition of health, influences, directly and indirectly, on living
conditions. As a presupposition, women, mothers, caregivers of black children and
adolescents in CAPSij suffer double discrimination, due to their skin color and having
a child with mental health problems. Objective: to understand the path of women,
mothers, caregivers of black children/adolescents with mental health problems, CAPSij
users in RAS. Method: this is an exploratory, descriptive study with a qualitative
approach. The theoretical conceptions are of three-dimensional racism. An Empirical
Database was used with 37 women. Due to the COVID 19 Pandemic, a non-
probabilistic convenience sample of 18 women was interviewed. The Empirical
categories, five (5): I – Health Care, 2 themes: Path in the RAPS ( Conception of health
as urgency; Understanding of UBS; Access to UBS; Punctuality of service; Health
problems and Health Care), The CAPSij (CAPSij as technical and affective support;
Expectations regarding CAPSij; The expectation regarding the CAPSij in the COVID
19 pandemic; Treatment at CAPSij; Social control at CAPSij); II – Caring for a
child/adolescent with a mental health problem, 7 themes: Discovering the Mental
Health Problem (Identification of the health problem; Description of the Mental Health
Problem; The reaction of women and family members; The mental health problem and
society; Burden and stress in family life), “Feelings” (Defense of the child/adolescent;
Feelings towards the child/adolescent with mental health problems), Facing
discrimination (Stigma, discrimination due to health problems mental), Building
Autonomy (Children's autonomy), The family, Social Network (Family Support; Friends
as affective support; Support with limits; Participation of the father of
children/adolescents; Men, masculinity and machismo; Caring for children without
support), The COVID 19 Pandemic (Family sustainability; Difficulties during the
pandemic), The Future (Mother's wishes; Mother’s fears; The mother's plans; The
financial issue; The daughter as a companion). III – The School, 2 themes: The regular
and the specialized School (The Regular School; Attendance at the specialized
School; Schools of State agreements with the ABA method), School in the COVID 19
pandemic (The School in the Pandemic); IV - Gender, 5 themes: The Feminine
(Gender conceptions - "being a woman and mother"; Femininity - enjoying being a
woman and a mother; Gender inequality - Sexist patriarchy; Conception of marriage;
Access to information and contraceptive methods; the struggle for maternity, gender
equality), Maternity (The woman and plans interrupted for the motherhood or childcare;
Ambivalences in relation to maternity, Concept of Maternity, Motherhood learning
expectations, forgetting about herself to take care of the child, Maternal Resilience),
Before and after (Activities before diagnosis), Sisterhood (Support for care among
women in the family; Maternal References; Female and feminist generational
teachings), Resistance (Spirituality, Religion and Mental Health; Women's education;
Positivity in the attitude of mothers). V – Racism, 1 theme: Black Identity (Self-
declaration, race/color, skin color; Identification and feelings in relation to racism; the
construction of black identity; Racism, territory; Racism in CAPSij; Black Reference).
Discussion: The structure of Brazilian society is anchored in white supremacist
capitalist sexist patriarchal racism. In light of the social determinants of health, racism
produces, systematizes inequities, as it operates as a “raciality device”. Final
Considerations: We defend an anti-racist anti-asylum attitude in RAS and RAPS,
using “race” as an analytical category intersectional with gender and social class in
Mental Health work. This study is an initial development for other researches.

Keywords: Mental health. Racism. Nursing. Gender. Psychiatric reform.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Dimensões do racismo tridimensional, apresentado por Werneck


(2016) ................................................................................................. 45

Figura 2 - Mapa do município de São Paulo, com destaque para os serviços de


assistência na Região Norte ............................................................... 48

Figura 3 – Mapa da Região Norte - Freguesia do Ó e Brasilândia ...................... 49


LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Publicações científicas ..................................................................... 52

Quadro 2 - Etapas e Estratégias Metodológicas ................................................ 53

Quadro 3 - Apresentação das mulheres segundo a faixa etária, o quesito


raça/cor, ocupação, renda e moradia............................................... 59

Quadro 4 - Quadro de Recomendações........................................................... 144


LISTA DE SIGLAS

ABA Applied Behavior Analysis

AFAB Associação de Familiares, Amigos e Bipolares

APS Atenção Primária em Saúde

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CAPS AD Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas

CAPS Centro de Atenção Psicossocial

CAPSi Centro de Atenção Psicossocial Infantil

CAPSij Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil

CBO Classificação Brasileira de Ocupação

CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CHD Círculo Hermenêutico Dialético

CID-10 Classificação Internacional de Doenças

CRS Coordenadoria Regional de Saúde

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

EEUSP Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo

GC Grupo Condutor

GEnPSM Grupo de Pesquisa em Enfermagem e Políticas de Saúde Mental

GTH Grupo de Trabalho de Humanização

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

NAPS Núcleo de Atenção Psicossocial

OSs Organização Social de saúde

PAISM Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher

PET-Saúde Programa de Educação pelo Trabalho em Saúde

PNAB Política Nacional da Atenção Básica


PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNAISC Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança

PNAISM Política Nacional da Atenção Integral à Saúde da Mulher

PNSIPN Política Nacional da Saúde Integral da População Negra

PTS Projeto Terapêutico Singular

RAPS Rede de Atenção Psicossocial

RAS Rede de Atenção à Saúde

RI Racismo institucional

RP Reforma Psiquiátrica

RPbA Reforma Psiquiátrica Brasileira Antimanicomial

RS Rio Grande do Sul

SES Secretaria Estadual da Saúde

SPSS Statistical Package for the Social Sciences

SRT Serviços Residenciais Terapêuticos

SUS Sistema Único de Saúde

TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido


SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA TEMÁTICA ............................................ 25


1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 26
1.1 CONSTRUÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA ...................................... 28
1.1.1 As políticas de saúde no SUS e a população negra ........................ 28
1.1.2 A política de saúde mental no Brasil e a atenção à crianças e
adolescentes .................................................................................... 34
1.1.3 Crianças e adolescentes negros atendidos em CAPSij e a vivência
do cuidado e, saúde mental das mulheres cuidadoras .................... 37
1.1.4 Problematização e justificativa ......................................................... 38
1.1.5 Pressuposto ..................................................................................... 39
1.1.6 Questões norteadoras ...................................................................... 40
2 OBJETIVOS ...................................................................................................... 42
2.1 OBJETIVO GERAL ..................................................................................... 42
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ....................................................................... 42
3 CAMINHO METODOLÓGICO ........................................................................... 44
3.1 FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA ..................................................... 44
3.2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .................................................................. 44
3.3 PERCURSO EXPLORATÓRIO - CENÁRIO E POPULAÇÃO DO
ESTUDO ..................................................................................................... 47
3.3.1 Caracterização do cenário ............................................................... 47
3.3.2 População do estudo ........................................................................ 51
3.4 ETAPAS DA PESQUISA E ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS............... 51
3.4.1 Atualização do banco de dados empíricos ....................................... 52
3.4.2 O percurso de tematização .............................................................. 54
4 RESULTADOS .................................................................................................. 57
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO DE ESTUDO ................................ 57
4.1.1 Perfil sociodemográfico .................................................................... 57
4.2 AS ENTREVISTAS E O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DAS
CATEGORIAS EMPÍRICAS ........................................................................ 60
4.2.1 CATEGORIA I – Atenção à Saúde ................................................... 61
4.2.1.1 Tema: O percurso na RAS ................................................ 61
4.2.1.2 Tema: “O CAPSij” .............................................................. 70
4.2.2 CATEGORIA II - “Cuidar de criança/adolescente com problema de
saúde mental”................................................................................... 75
4.2.2.1 Tema: Os sentimentos....................................................... 86
4.2.2.2 Tema: Enfrentando a discriminação .................................. 88
4.2.2.3 Tema: Construindo autonomia .......................................... 90
4.2.2.4 Tema: A família, rede social .............................................. 90
4.2.2.5 Tema: A pandemia da COVID 19 ...................................... 95
4.2.2.6 Tema: O futuro .................................................................. 97
4.2.3 CATEGORIA III - A ESCOLA ......................................................... 100
4.2.3.1 Tema: A escola regular.................................................... 100
4.2.3.2 Tema: A escola na pandemia da COVID 19 .................... 105
4.2.4 CATEGORIA IV - GÊNERO ........................................................... 106
4.2.4.1 Tema: A maternidade ...................................................... 109
4.2.4.2 Tema: Antes e depois ...................................................... 112
4.2.4.3 Tema: Sororidade ............................................................ 112
4.2.4.4 Tema: Resistência ........................................................... 115
4.2.5 CATEGORIA V – RACISMO .......................................................... 117
4.2.5.1 Tema: Identidade negra................................................... 117
5 ANÁLISE DOS DADOS................................................................................... 122
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 141
REFERÊNCIAS ................................................................................................... 148
APÊNDICES ........................................................................................................ 164
ANEXOS ............................................................................................................. 168
APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA
TEMÁTICA
APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA TEMÁTICA| 25

APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA TEMÁTICA

Durante a formação acadêmica na Universidade Federal de Santa Maria no


final dos anos 1990, início dos anos 2000, escolhi atuar como Enfermeira em Saúde
Mental. Naquele tempo, a promulgação da Lei n.º 10.216 era muito aguardada,
acompanhei a transformação de ambulatórios em serviços de base comunitária na
cidade de Santa Maria – RS (Ambulatório de Saúde Mental que se transformou no
primeiro Centro de Atenção Psicossocial - CAPS II da região). Realizei Trabalho de
Conclusão de Curso na Emergência Psiquiátrica do Hospital Universitário,
acompanhando a unidade de internação e a Associação de Familiares, Amigos e
Bipolares (AFAB). Nessa época, o aporte teórico e teórico-prático de Reabilitação
Psicossocial para a Cidadania de Direitos, amplamente utilizado pela Organização
Mundial de Saúde, chegava com notícias trazidas por professoras, primeiras portarias
e conversas em sala de aula.

No percurso profissional, participei da implantação de Centros de Atenção


Psicossocial (CAPS I e CAPS AD II), auxiliando na escrita dos projetos institucionais
para credenciamento. Fui servidora pública Municipal e desenvolvi grupos de
Educação em Saúde, relatados na Rede HumanizaSUS [www.rede humanizasus.net],
com nomes escolhidos pelos participantes: “Cantinhos de contos”, “Ânimo de viver”,
“Os Estradeiros”, no intuito de promover cidadania, fomentar diálogos sobre Direitos
dos Usuários no Sistema Único de Saúde - SUS e Direitos dos Usuários da Saúde
Mental. Também relatados, os grupos desenvolvidos na formação/especialização em
Atenção e Gestão do SUS, pela Política Nacional de Humanização em parceria com
a Universidade Federal do Rio Grande do Sul: “GTH e subgrupos de GTH - O SUS
que dá certo”.

Coordenei a Política Regional de Saúde Mental na 4.a Coordenadoria Regional


de Saúde, sede em Santa Maria – SES/RS, abrangendo 32 municípios para
implementação da Linha de Cuidado em Saúde Mental (criação de Grupos
Condutores, Oficinas Terapêuticas na APS, encontro de Redes, ampliação da Rede
de Atenção Psicossocial). Ativando GC em encontros para projetos de abertura de
CAPS Regionais e Municipais, identificava dificuldades, barreiras burocrático-
administrativas, escassez de recursos humanos, disputa de narrativas dos técnicos
APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA TEMÁTICA| 26

enquanto as pessoas com problemas de saúde mental continuavam sem poder


contratual, contestava vontades políticas de gestores que reproduziam a lógica
manicomial (ao primar pelas internações como primeira intervenção, seguindo
interesses privados de donos de hospitais e comunidades terapêuticas, perspectivas
de gestão capitalistas e alienadas). Na Coordenação Regional da Política de Saúde
Mental na 4.a CRS/Santa Maria - RS fiz parte do Comitê Regional de Crise em 2013,
para o acompanhamento/acolhimento dos sobreviventes e familiares de vítimas
envolvidas na Tragédia da Boate Kiss.

Com a prática profissional, povoada de questões, decidi pela Pós-graduação,


solicitei exoneração de cargo público e mudei de Estado (do Rio Grande do Sul para
São Paulo), com poucas economias e bastante coragem. Realizei Mestrado na Escola
de Enfermagem da Universidade de São Paulo -, EEUSP, no Departamento de
Enfermagem em Saúde Coletiva, sendo Bolsista CAPES, orientanda da Prof. a Dr.a
Emiko Yoshikawa Egry, identificando interfaces entre a violência contra a criança e
questões de Saúde Mental (Régio Martins, 2016; Régio, Egry, Apostólico, 2016).

Foi no Grupo de Pesquisa Enfermagem e as Políticas de Saúde Mental,


liderado pela Prof.ª Dr.ª Sônia Barros, que aquelas questões-motivações pregressas
à Pós-Graduação, as inquietações do Mestrado, encontraram a teoria e as
ferramentas teórico-práticas que exercem transformação concreta na vida das
pessoas com problemas de saúde mental, pela cidadania de direitos. Este processo
de doutoramento, é compromisso social e político, não cristalizado na ideia de
realização profissional, sobretudo, ferramenta de cidadania em lutas coletivas por uma
sociedade mais justa, que não será possível sem combate do racismo, sexismo,
desigualdade de gênero, estigma do problema de saúde mental, que passa por um
processo decolonial brasileiro, na desconstrução de privilégios da branquitude.

No atual contexto político do país, é preciso a defesa de conquistas sociais de


direitos, ameaçadas por este período de retrocesso, em que os investimentos na
educação, saúde e previdência social estão sendo realocados em um patamar de um
estado mínimo. Por isso, com o compromisso ético de possibilitar um retorno efetivo
à sociedade, por meio de pesquisa para a produção de conhecimento científico capaz
de fomentar políticas de enfrentamento das iniquidades, é uma necessidade e um
desejo de luta.

O estudo proposto integrou projeto de pesquisa “guarda-chuva” elaborado pelo


APRESENTAÇÃO: O DESPERTAR DA TEMÁTICA| 27

GEnPSM intitulado “O processo de cuidar em saúde mental da


criança/adolescente negro em CAPS infantil”. Uma solicitação da equipe de um
Centro de Atenção Psicossocial Infantojuvenil do município São Paulo (CAPSij
Brasilândia), sugerindo o recorte de raça/cor, pois coletavam este dado na
caracterização dos usuários, mas faltavam estudos a partir dessa perspectiva e
problematização. Este projeto “guarda-chuva” recebeu financiamento da FAPESP, nº
2018/07251-2.
1 INTRODUÇÃO
INTRODUÇÃO| 26

1 INTRODUÇÃO

Reconhecendo-se a dívida histórica para com as pessoas negras e no intuito


de agir junto às iniquidades, dentre essas, aquelas que produzem sofrimento psíquico
e problemas de saúde mental na infância/adolescência, esta tese engaja-se na
segunda Etapa de pesquisa do projeto do Grupo de Pesquisa Enfermagem e as
Políticas de Saúde Mental (GEnPSM) intitulado “O processo de cuidar em saúde
mental da criança/adolescente negro em CAPS infantil”. Elencou-se as
prerrogativas do Sistema Único de Saúde (SUS), da Política Nacional de Saúde
Mental, da historicidade da Reforma Psiquiátrica brasileira Antimanicomial (RPbA),
Reabilitação Psicossocial, e da Política Nacional de Saúde Integral da População
Negra (PNSIPN), como fundamento para desenvolvimento deste projeto (Brasil, 1988;
1990a; 1992; 2001; 2002a; 2002b; 2007; 2010a; 2011b; 2011c).

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil


possuía mais de 100 milhões de pessoas autodeclaradas negras 1 em 2010,
constituindo 51% da população brasileira, passando a 56,2% em 2019, assim, maioria
no país (Brasil, 2010c; 2019).

Contraditoriamente, a constatação de que o Brasil é um país negro não impede


a existência do racismo, ancorado em diversas discriminações, violências vivenciadas
pelas pessoas negras na mesma sociedade em que esta é maioria. Assim, para
enfrentamento da realidade objetiva, utiliza-se a raça negra como categoria política e
científica na análise do racismo estrutural e institucional, na produção de barreiras de
acesso a direitos, os quais engendram problemas a serem enfrentados pelas políticas
públicas, dentre essas, da saúde (Brasil, 2007).

Com base em evidências científicas, a PNSIPN foi criada no SUS e discorre


sobre as diretrizes para o enfrentamento das taxas de adoecimento e morte dessa
população, realizando levantamento sistemático de iniquidades, barreiras de acesso
à saúde, racismo e discriminações que impactam diretamente na condição e
qualidade de vida de pessoas negras. A PNSIPN, frente às desigualdades de acesso
a direitos, iniquidades que são produzidas por meio do racismo institucional definido

1 Segundo o IBGE população negra são aqueles/as de raça/cor preta e parda.


INTRODUÇÃO| 27

como (Brasil, 2013):

[...] produção sistemática da segregação étnico-racial, nos processos


institucionais. Manifesta-se por meio de normas, práticas e comportamentos
discriminatórios adotados no cotidiano de trabalho, resultantes de ignorância,
falta de atenção, preconceitos ou estereótipos racistas. Em qualquer caso,
sempre coloca pessoas de grupos raciais ou étnicos discriminados em
situação de desvantagem no acesso a benefícios produzidos pela ação das
instituições (Brasil, 2013, p.16).

Nos diálogos de Lélia Gonzalez (de 1975, até a segunda metade da década de
1990), a autora destaca na “história oficial” brasileira, o “discurso pedagógico
internalizado”, base de diversos “estereótipos” direcionados à população negra, tais
como, “passividade, infantilidade, incapacidade intelectual, aceitação tranquila da
escravidão” (Gonzales, 2020, p.50). Além disso, remete a este preconceito, a ideia do
brasileiro como um ser “cordial” e pacífico, que se ancora na miscigenação como
fundamento da ideologia racista de igualdade, ou seja, o mito da democracia racial
(Gonzales, 2020).

O “racismo à brasileira” utilizado para negar a existência do próprio racismo,


serve-se do mito da democracia racial pela ideia de que o povo brasileiro é mestiço,
“nem branco, nem negro e nem índio”, não existindo discriminação, a não ser a
socioeconômica (Munanga, 2017, p. 38). Esse autor salienta que a exclusão
“econômica ou de classe atinge a todos, brancos, afrodescendentes e indígenas”,
sendo os dois últimos grupos mais atingidos pela “dupla discriminação”, pela condição
social e pela cor da pele (Munanga, 2017, p.43).

Entretanto, é a teoria de Gonzalez que atenta para se evitar destinar ao


“economicismo”, às causas das iniquidades da população negra, as quais são da
ordem de uma “indagação mais ampla”, ideológica do racismo. Nas palavras da autora
(Gonzalez, 2020):

Apesar da seriedade dos teóricos brasileiros, percebe-se que muitos deles


não conseguem escapar às astúcias da razão ocidental. [...] podemos
constatar em seus discursos os efeitos do neocolonialismo cultural. [...]
Vejamos a seguir as tendências dominantes na análise das relações raciais
no Brasil [...] a análise do processo abolicionista [...] dessa tendência justifica
a situação atual de marginalização do negro como efeito do “despreparo do
ex-escravo para assumir os papéis de homem livre, principalmente na esfera
do trabalho”.8 A repentina passagem do regime servil para o de trabalho livre
fez do “bom escravo um mau cidadão”.9 Cultura da pobreza, anomia social,
família desestruturada, enquanto efeitos atuais desse salto, explicariam as
desigualdades raciais vigentes.10 Tal interpretação, além de deslocar para o
negro as razões de sua mobilidade social, não considera o fato de que
INTRODUÇÃO| 28

a grande maioria da população de cor (90%) já se encontrava livre e


economicamente ativa antes de 1888.11 Por outro lado, [...] libera o
segmento branco e suas instituições, atribuindo-lhes menor
responsabilidade quanto à situação atual do negro. A segunda tendência
de peso a ser considerada é representada pelo marxismo ortodoxo. Aqui, a
categoria “raça” acaba por se diluir numa temática econômica
(economicista, melhor dizendo), uma vez que a discriminação não passa
de um instrumento manipulado pelo capitalista que visa, mediante a
exploração das minorias raciais, dividir o operariado. [...] Por outro lado, em
termos de realidade brasileira, há que considerar que a maioria da população,
praticamente, não alcançou a situação de força de trabalho relacionada ao
capitalismo industrial competitivo”2 (Gonzalez, 2020, p.31-32).2

1.1 CONSTRUÇÃO DO PROBLEMA DE PESQUISA

1.1.1 As políticas de saúde no SUS e a população negra

Com a Constituição Federal foi possível incluir a saúde como direito de toda
população brasileira (Brasil, 1988), e a criação do SUS universalizou o acesso como
“direito fundamental”, e destinou ao Estado o dever de “prover as condições
indispensáveis ao seu pleno exercício”. Pelo princípio da Universalidade, o direito ao
acesso da população negra aos serviços de saúde foi deflagrado, no entanto, este,
não tem sido assegurado na prática concreta dos serviços de saúde brasileiros, devido
ao racismo institucional. (Brasil, 1988; 1990a; Werneck, 2016)

Historicamente, a atenção destinada à saúde da população negra foi e ainda é,


quantitativamente e qualitativamente, inferior à da população branca, sendo que no
âmbito da psiquiatria não foi diferente (Brasil, 1990a; 2007; 2009a). No Brasil, a
população negra está excluída de vários direitos sociais e sofre com a desigualdade
social, a qual pode ser constatada em menor escolaridade, ganho de salários
menores, e pelo fato da maioria dessa população residir em bairros marginalizados e
periféricos das cidades. O retrato disso está nos dados do Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílios e em outros estudos produzidos pelo Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística (PNAD/IBGE), cujo percentual de analfabetismo entre pessoas
negras atinge número mais do que o dobro, comparando-se às brancas, ou seja, de

2 8 - Carlos Hasenbalg. Aspectos das relações raciais no Brasil. p.50


9 -Florestan Fernandes. O negro no mundo dos brancos; A integração do negro na
sociedade de classes: Octavio Ianni, As metamorfoses do escravo.
10 - Ver Carlos Hasenbalg. op, cit., "Desigualdades raciais no Brasil"; Thomas Skidmore,
Preto no branco, pp. 56-60.
11 - José Nun. op. cit.
INTRODUÇÃO| 29

13,6% contra 6,2% (Brasil, 2008).

No Estado de São Paulo, a proporção de pessoas negras em situação de


desemprego é 50% mais elevada, em média, do que a de brancos (9,7%). A proporção
de mulheres desempregadas é de 15% entre as brancas, e de 27,8% entre as negras,
sendo elas as que sempre trabalharam; para os homens negros na construção civil,
esse percentual atinge 16,8%, contra 9,5% de brancos. Além disso, constatou-se que,
nos setores de trabalho subalternizados, as condições de trabalho são
frequentemente precárias e a remuneração é muito inferior (Fundação SEADE, 2011).

Batista (2004; 2005) analisou o perfil da mortalidade de homens brancos, pretos


e pardos, por meio dos registros de óbitos do Estado de São Paulo do ano de 1999,
examinando as taxas de mortalidade por causas básicas e reunidas por grupos de
causas da CID-10, no quesito raça/cor. O estudo evidenciou que, quando comparado
a taxa da mortalidade de homens pretos e brancos, os pretos morrem mais do que os
brancos. Os maiores diferenciais no percentual de mortalidade dos homens pretos
foram óbitos por: “transtornos mentais” (considerada a quarta causa de morte, em
decorrência do uso de álcool e outras drogas), doenças infecciosas (tuberculose e
HIV/AIDS) e causas externas (homicídio).

De acordo com o Atlas da Violência de 2020, entre 2008 e 2018, 75,7% das
vítimas de homicídio eram negras. Esta taxa aumentou 11,5% entre negros e diminuiu
12,9% entre não negros (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2020). Além disso,
destaca-se a iniquidade em saúde entre pessoas brancas e negras, pois, a expectativa
de vida ao nascer de brancos é de 73,9 anos, enquanto a de negros (pretos e pardos)
é de 67,8 anos (Waiselfisz, 2011).

Os indicadores de mortalidade materna são maiores entre as mulheres pretas


e pardas, sendo que as mulheres negras são mais acometidas pelas doenças crônicas
como a hipertensão arterial, diabetes mellitus, configurando- se o grupo de maior
mortalidade materna por eclâmpsia, hemorragias, e em geral por doenças
cerebrovasculares, doenças isquêmicas do coração (Brasil, 2012). No entanto,
importa contextualizar utilizando pesquisas com dados divulgados pelo IPEA (2011),
em que o acesso à Atenção Básica é desigual para mulheres afrodescendentes.
Mesmo que sejam maioria em partos pelo SUS, as mulheres negras têm muito menos
acesso ao pré-natal, recebem menos anestesia na hora do parto, são menos
orientadas sobre aleitamento materno, e também obtiveram menos acompanhantes
INTRODUÇÃO| 30

no parto do que as mulheres brancas. Outros índices como o acesso a exames


ginecológicos, a dentistas, são também menores para as mulheres negras. Embora
os brancos sejam minoria no país, e nas doenças crônicas, os negros e pardos tiveram
acesso inferior a transplantes, sendo que as mulheres negras tiveram dupla
desvantagem por serem mulheres e por serem negras (IPEA, 2011). Werneck (2016)
aponta que as piores condições de escolaridade, renda, condições de vida e acesso
a bens e serviços da população negra explicitam o racismo existente na sociedade e
que esses fatores estruturais dialogam com os indicadores de saúde, afinal a saúde é
determinada socialmente.

Desta forma, deflagra-se que o racismo impacta, expressivamente, na saúde


da população negra e determina sua exclusão e estratificação social. Sobretudo,
pesquisas evidenciam a “cegueira institucional” caracterizada pela ausência de ações
governamentais orientadas para o enfrentamento desse cenário – ou melhor, dessa
reprodução do racismo no cotidiano do setor da saúde e em outros setores de
instituições públicas e privadas –, contribuindo para a permanência e o agravamento
das iniquidades (Lopes, 2005; 2010).

Assim, os grupos sociais historicamente excluídos têm acesso dificultado em


todos os setores da vida pública, inclusive no setor da saúde (Goes, Nascimento,
2013). Há uma complexa relação étnico-racial existente no Brasil, cuja disparidade
reflete diretamente nos direitos fundamentais das pessoas, por existir uma hierarquia
social, na qual a população de brancos ocupa as posições mais privilegiadas e
reproduz “exclusões, reforça desigualdades sociais e econômicas, gera impacto sobre
as formas de adoecimento e morte da população, assim como no acesso a bens e
serviços” (São Paulo, 2015, p.8).

A inclusão social é defendida por alguns autores, a fim de abranger grupos em


vulnerabilidades (idosos, minorias étnicas, órfãos, mulheres, desempregados,
refugiados, e pessoas com problemas de saúde mental etc.), os quais sofrem com o
estigma, o preconceito e a discriminação (Levitas, 2006; Morgan et al., 2007; Huxley
et al., 2012).

A dialética inclusão/exclusão social tem sido utilizada amplamente em


discussões sobre a vulnerabilidade de pessoas com doença mental e sobre o estigma
da doença mental (Morgan et. al., 2007; Salles, 2011; Huxley et. al., 2012; Santos,
2013; Corrigan, Kosyluk, Rusch, 2013). A exclusão social como expressão tem
INTRODUÇÃO| 31

significado de banimento, reclusão e expulsão, com enfoque no efeito segregador de


práticas que criam estigmas com o intuito de desacreditar o sujeito que se quer banir,
gerando desigualdade social (Levitas, 2006; Morgan et al., 2007; Zioni, 2006).

Salienta-se que na Psiquiatria tradicional, desde o final do século XVIII, o


tratamento dispensado às pessoas com doença mental é excludente e, atualmente,
ainda se mantém esta lógica segregativa em vários países (Foucault, 1995; Saraceno,
2013). A manutenção de 62% de leitos psiquiátricos em manicômios no mundo, contra
21% de leitos em hospitais gerais, comprova a permanência da clínica excludente
como forma de tratamento, o que demonstra a resistência da psiquiatria à abordagem
biopsicossocial (Saraceno, 2013).

A marginalização da loucura ocorre também, além do confinamento em


manicômios, por meio do estigma da doença mental (Foucault, 1995; Goffman, 2004;
Santos, 2013). Esta exclusão tem como resultado a desvalorização do sujeito,
impedindo-o de realizar trocas no meio social (Salles e Barros, 2013; Santos, 2013),
corroborando a observação do relatório do Social Exclusion Unit (2004) e dos estudos
de Salles (2011) e Santos (2013), os quais afirmam que a exclusão social das pessoas
com doença mental está diretamente relacionada ao estigma do problema de saúde
mental e da medicalização dos sintomas.

A exclusão da pessoa com problemas de saúde mental pode ser ainda maior
quando ela é negra, dada a expressiva realidade racista no Brasil. Ao analisar, na
perspectiva racial os resultados do Censo Psicossocial dos Hospitais Psiquiátricos,
identificou-se que a maioria dos moradores de hospitais psiquiátricos no estado de
São Paulo, 60,29% eram brancos. Assim descrito pelos autores (Barros et al., 2008):

No entanto, os dados de raça/cor do censo demográfico do ano 2000


informaram que 27,4% da população do estado de São Paulo é preta e parda
e na população moradora de hospitais psiquiátricos, esse número alcançou
38,36% [...] constatou-se uma maior proporção de negros que estão
internados porque não têm renda e/ou lugar para morar (Barros et al., 2014,
p. 1235).

David (2018), abordou o racismo como “relação de poder e de sustentação de


privilégios”, o qual produz sofrimento psíquico à medida em que se sustenta na
produção de subjetividades racializadas, tendo como modo de enfrentamento para a
desconstrução do racismo, a “aquilombação dos CAPS”, o qual se torna uma
ferramenta produtora de equidade racial no cotidiano do cuidado em saúde mental.
INTRODUÇÃO| 32

Por aquilombamento, define-se como um “agir antirracista” na RAPS (David, Vicentin,


2021, p. 266).

Diversas evidências científicas reiteram que as iniquidades se constituem em


vulnerabilidades para o aparecimento de doenças, sendo essas produzidas pelo
racismo institucional (Batista; Escuder; Pereira, 2004; Barbosa, 1998; Batista et al.,
2004; Lopes, 2005; David, 2018).

A identificação dos usuários do SUS segundo suas características étnico-


raciais vem ocorrendo de maneira progressiva, na perspectiva do reconhecimento da
relação raça/cor e produção de saúde (São Paulo, 2015). No entanto, é preciso
avançar para além da autodeclaração, estabelecer a influência do racismo
institucional, arraigado na gradação de tons de cor da pele, barreiras enfrentadas pela
população negra no processo de cuidado em saúde e nos resultados produzidos a
partir deste, para que seja possível superar as iniquidades sofridas pela pessoa negra
com problemas de saúde mental atendida no SUS.

Para tanto, é necessário compreender raça como uma categoria sociológica e


política, que confere a um grupo de pessoas sua identidade, especificidade,
necessidades diferenciadas, para que, a partir desse reconhecimento das
desigualdades, as iniquidades sejam enfrentadas, segundo a lógica da equidade
(Lopes, 2005).

Silva et al. (2017), em uma revisão narrativa da literatura sobre o perfil de


usuários de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), aponta que em apenas três
artigos, dentre dezessete, havia a informação raça/cor; e, nenhum desses discutiu os
dados coletados, atitude que corrobora a perpetração da violência racista por meio do
racismo institucional. Os pesquisadores concluíram que não utilizar o recorte raça/cor
como variável limita o monitoramento e a avaliação do enfrentamento de iniquidades,
e impossibilita ações que deveriam promover a igualdade racial. Esse estudo apontou
escassez de pesquisas brasileiras utilizando a variável raça/cor em CAPS, e esse fato
atrasa a formação de políticas públicas adequadas para o enfrentamento de
iniquidades sociais e raciais. Os autores referem que isso pode ser um reflexo de
como as desigualdades raciais são invisibilizadas e tratadas “como inexistentes, o que
reforça as iniquidades”. A recomendação é que a variável raça/cor seja utilizada em
pesquisas envolvendo saúde mental e também como categoria de análise, por ser
INTRODUÇÃO| 33

“importante marcador de cunho social”, gerar “evidências científicas sobre o racismo


como produtor de sofrimento psíquico” e “contribuir com a atuação dos serviços, da
gestão e da sociedade civil/controle social” (Silva et al., 2017, p. 111-2). Ainda, sobre
a expressão do racismo, Silva et al. (2017):

[...] vivenciamos cotidianamente cenas/expressões do racismo, quando um


profissional sente receio e/ou desconforto de perguntar a raça/cor de uma
pessoa; quando um grupo de amigos está junto e apenas o negro é abordado
pela polícia; quando um negro entra em restaurantes e hotéis de luxo e
depara com olhares entrecruzados; na pouca participação de modelos negros
na publicidade em um país predominantemente negro” (Silva et al., 2017, p.
110).

Houve nos últimos anos, um crescimento do corpo de evidências


epidemiológicas, as quais mostram fortes associações entre a discriminação racial e
as piores condições de saúde da população adulta (Lopes, 2004; Domingues et al.,
2013, Araújo et al., 2009; Faro, Pereira, 2011).

O Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) foi instituído


em 1983, sendo considerado um marco histórico influenciado pelo movimento
feminista, e que rompeu com um modelo materno-infantil existente ao propor o
cuidado da saúde reprodutiva. Em 2004, entrou em vigor a Política Nacional de
Atenção Integral à Saúde da Mulher (PNAISM), que incorporou ideias do “movimento
de mulheres, movimento negro, e o de trabalhadoras rurais”, pesquisadores
interessados neste tema, entre outros setores e organizações da sociedade civil
(Brasil, 2004, p.5).

O racismo e discriminação racial como determinante em saúde e direcionador


de iniquidades étnicas têm crescido consideravelmente em todo mundo (Harris et al.,
2012). A discriminação racial pode afetar a saúde de várias maneiras: o acesso restrito
a emprego, a moradia e a educação; impactos negativos nos processos
psicopatológicos e cognitivos/afetivos; reduzido conhecimento sobre hábitos
saudáveis e a adoção de comportamentos não saudáveis; e danos físicos causados
por violência racista (Priest et al., 2013).
INTRODUÇÃO| 34

1.1.2 A política de saúde mental no Brasil e a atenção à crianças e


adolescentes

Pitta (2011) destaca na década de 1970, o movimento dos trabalhadores de


Saúde Mental, em resposta à grande expansão asilo-manicomial durante os anos da
ditadura militar no Brasil (criação de manicômios cada vez maiores, conhecida como
época da “indústria da loucura”, pois, a população de internados aumentou de 14 mil
para 30 mil em 1970; posteriormente, em 1982, para 98 mil pessoas). Esses
movimentos eram praticamente clandestinos, organizando “congressos, associações,
sindicatos, redes, constituindo-se como movimentos sociais” (Pitta, 2011, p. 4583).

Na década de 1980 aconteceram: o Encontro Brasileiro da Rede de Alternativas


à Psiquiatria, em Belo Horizonte (Minas Gerais), em 1983; o I Congresso de
Trabalhadores de Saúde Mental de São Paulo, em 1985; a I Conferência Nacional de
Saúde Mental, no Rio de Janeiro, em 1987; e, o II Encontro Nacional dos
Trabalhadores de Saúde Mental, em Bauru (SP), no ano de 1987 – encontro, esse,
que foi articulado durante a I Conferência e que afirmou a ideia de reforma psiquiátrica
iniciada em Minas Gerais (Pitta, 2011).

Desses movimentos “Por uma Sociedade Sem Manicômios”, duas experiências


assinalaram mudanças significativas ao modelo de atenção, até então asilar, tendo
sido elas: a inauguração do primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)
Professor Luiz da Rocha Cerqueira em São Paulo, no ano de 1987; e, a intervenção
na Casa de Saúde Anchieta (hospital psiquiátrico particular fundado em 1951), na
cidade de Santos - movimento de desinstitucionalização de moradores do manicômio,
em 1989. Aliava-se a essas experiências, também, a criação dos Núcleos de Atenção
Psicossocial (NAPS), em Santos (Brasil, 1992; Pitta, 2011).

Em 1989, o deputado Paulo Delgado foi autor do projeto de Lei n.º 3.657 (que
originou a Lei n.º 10.216/2001), ancorando-se em três artigos que discorreram sobre:
a proibição de abertura e contratualização de novos hospitais psiquiátricos com o ente
público; o destino de verbas para recursos não-manicomiais de tratamento; e, a
comunicação das internações compulsórias ao judiciário. Além disso, na década de
1980, iniciou-se uma articulação do Movimento da Reforma Psiquiátrica (RP) com os
movimentos sociais, sendo que essa parceria de luta se fortaleceu a partir da década
de 1990 (Brasil, 1989; Pitta, 2011).
INTRODUÇÃO| 35

No Brasil, na década de 1990, diversos serviços comunitários de saúde mental


foram sendo implantados, como os Ambulatórios de Saúde Mental, os NAPS e os
CAPS, possibilitando que uma nova estrutura de atenção psicossocial fosse
estabelecida a partir do fechamento progressivo de Hospitais Psiquiátricos,
realizando-se uma aposta ético-política sustentada pelo cuidado em liberdade (Brasil,
1992; Amarante, 2008; Pitta, 2011).

Barros (2011, p. 1781), refere que esse processo de mudança necessitou um


“novo olhar dos gestores para formular novos instrumentos de medidas de cobertura
e de avaliação”, financiamento, entre outros, que possibilitaram a construção de
políticas de saúde mental. Além disso, a autora relata alguns instrumentos, tais como,
supervisão e descredenciamento de hospitais psiquiátricos que violavam direitos, bem
como políticas que asseguravam a vida fora dos manicômios, a exemplo disso, a Lei
Federal n.º 10.708/2003, que instituiu o Programa “De Volta pra Casa”, para moradia
em Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) (Barros, 2011).

Em 1992, a II Conferência Nacional de Saúde Mental foi um marco histórico da


RPbA e teve forte participação dos movimentos sociais, e as recomendações e
proposições do relatório foram importantes base para reformulação da atenção em
saúde mental. No período de 1998 a 2000, muitas iniciativas se consolidam, e inicia-
se a tramitação do projeto de Lei n.º 3657/1989, da RP na Câmara de Deputados, que
se estendeu por 11 anos. (Barros, 2011; Pitta, 2011) A Lei Federal n.º 10.216 é o
Marco jurídico que sustenta o processo de reorientação, reorientou o modelo
assistencial no país, ao dispor sobre a priorização do tratamento em serviços de base
comunitária, dispondo sobre a proteção e os direitos das pessoas com problemas de
saúde mental, e a progressiva extinção dos manicômios (Brasil, 2001a).

Dessa forma, os CAPS constituíram-se como dispositivos estratégicos da


Política Brasileira de Saúde Mental, e como organizador da rede assistencial em
Saúde Mental às pessoas com problemas de saúde mental, severos e persistentes,
residentes em sua área de abrangência, por meio de acompanhamento clínico, da
reinserção social dos usuários pelo acesso ao lazer, trabalho, exercício da cidadania
e fortalecimento dos laços familiares e comunitários (Brasil, 2002b; 2004a; 2011c).

Considerando a pluralidade das necessidades de saúde mental, existem


diferentes tipos de CAPS, sendo esses, classificados em seis diferentes modalidades,
considerando a população de abrangência, a complexidade do atendimento, a
INTRODUÇÃO| 36

especificidade da demanda e a composição da equipe: CAPS I (até 70.000


habitantes), CAPS II (70.000 até 200.000 habitantes), CAPS III (acima de 200.000
habitantes e funcionamento 24 horas), CAPS i II (infância e adolescência), CAPS AD
II (álcool e drogas) e CAPS AD III (álcool e drogas 24 horas). (BRASIL, 2002b; 2011c)

Os CAPS são serviços de saúde municipais, abertos, comunitários que


oferecem atendimento diário, sendo a modalidade infantojuvenil (CAPSij), serviço de
saúde mental destinado a crianças e adolescentes com até 18 anos incompletos, com
problemas de saúde mental severos e persistentes e/ou usuários de substâncias
psicoativas, que apresentam intoxicações e síndromes de abstinência leves. (Brasil,
2004a)

A Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) e as


diretrizes Nacionais para Atenção Integral à saúde dos Adolescentes e Jovens
reverberam direitos, eixos prioritários a serem considerados na atenção em CAPS
infantojuvenis (Brasil, 2004a; 2010c; 2015).

Sobre a configuração familiar dos usuários dos serviços de saúde mental


infanto-juvenil, a maioria das crianças e adolescentes que utilizam esses serviços,
pertencem a famílias nucleares (Weintraub et al., 2013; Rangel et al., 2015), ou seja,
residem com os pais. Segundo as autoras, a mãe é muito presente no cotidiano dos
usuários do CAPSi, apresentando-se como o principal cuidador deste usuário. Além
disso, em 82,7% dos casos em que a mãe era a responsável pela renda familiar, a ela
também era atribuído o cuidado da criança, em contrapartida, o pai, quanto provedor
desta família, não se responsabilizava pelos cuidados da criança (93,5%), delegando
esta tarefa à mãe (82,2%) (Weintraub et al., 2013).

O SUS é orientado pelo trabalho em redes de produção de saúde, tendo sido


formadas a Rede de Atenção à Saúde (RAS) e a Política Nacional de Atenção Básica,
nas quais estão descritas ações de Saúde Mental de competência da Atenção Básica,
bem como o detalhamento da atenção integral aos usuários da Saúde Mental na Rede
de Atenção Psicossocial (RAPS) (Brasil, 2010d, 2011c, 2011d). A RAPS, instituída
pela Portaria GM n.º 3088/2011, que tem dentre seus objetivos, o combate ao estigma
e preconceitos relacionados às pessoas com problemas de saúde mental, com base
nos direitos humanos, articula serviços em VII eixos: a atenção primária, a atenção
psicossocial especializada, urgência e emergência, residencial transitório, hospitalar,
estratégias de desinstitucionalização e reabilitação psicossocial.
INTRODUÇÃO| 37

1.1.3 Crianças e adolescentes negros atendidos em CAPSij e a vivência do


cuidado e, saúde mental das mulheres cuidadoras

A título de interesse desta tese, retoma-se o fato de que o racismo como


determinante em saúde e como direcionador de iniquidades étnicas tem crescido
consideravelmente em todo mundo (Harris et al., 2012). A discriminação racial pode
afetar a saúde de várias maneiras: o acesso restrito a emprego, a moradia e a
educação; impactos negativos nos processos psicopatológicos e cognitivos/afetivos;
reduzido conhecimento sobre hábitos saudáveis e a adoção de comportamentos não
saudáveis; e danos físicos causados por violência racista (Priest et al., 2013).

Há um aumento no interesse de pesquisadores em examinar o impacto da


discriminação racial na saúde e bem-estar da criança e adolescentes, que são
consideradas particularmente vulneráveis aos efeitos prejudiciais da discriminação
racial (Priest et al., 2013). Os autores afirmam que a exposição direta ou indireta de
crianças à discriminação racial tem sido associada a condições/estado de saúde, bem-
estar e desenvolvimento precários (Priest et al., 2013). Dentre esses resultados
encontrados pelos autores, 51% diziam respeito às questões de saúde mental, e
dentre os resultados negativos estão ansiedade, depressão, estresse pós-traumático,
negativa autoestima e suicídio; dentre os resultados positivos estão o ajustamento
psicológico, ajustamento emocional, adaptação psicológica e resiliência (Priest et al.,
2013). As crianças e adolescentes são titulares de todos os direitos fundamentais
inerentes à pessoa humana, entre os quais o direito à dignidade. O artigo 3.º do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) imputa a todos o dever de respeitar essa
população com a mais absoluta prioridade, colocando-os a salvo de qualquer forma
de discriminação ou opressão, inclusive a discriminação racial (Brasil, 1990b).

Diversas ações têm sido desenvolvidas no sentido de superar as iniquidades


em saúde relacionadas à questão racial, e direcionadas por meio da Política Nacional
de Saúde Integral da População Negra (Brasil, 2007). No entanto, em relação à
Política Nacional de Saúde Mental, observa-se a necessidade de aprimorar
correlações entre a saúde mental e a questão racial.

A PNSIPN ancora-se na Constituição Federal e nos princípios do SUS,


utilizando o quesito cor como fonte epidemiológica, que define prioridades e ações
para “identificação, abordagem, combate e prevenção do racismo institucional no
INTRODUÇÃO| 38

ambiente de trabalho, nos processos de formação e educação permanente de


profissionais” (Brasil, 2007, p.14). Além disso, fomenta o controle social e ações
afirmativas baseadas na equidade em saúde, ou seja, que diminuindo as diferenças
promove a igualdade racial (Brasil, 1990a; 2007; 2009a).

Werneck (2016), em revisão de literatura constatou que a saúde da mulher


negra tem baixa expressão nos estudos científicos publicados. Este dado pode indicar
que a implementação de ações para a saúde da população negra e da saúde da
mulher negra ainda não foram consolidadas “como campos temáticos e de pesquisa,
relacionada ao baixo grau de penetração nas instituições de pesquisa dos debates
sobre o racismo, seus impactos na saúde e suas formas de enfrentamento” (Werneck,
2016, p. 536).

1.1.4 Problematização e justificativa

Eliminar as desigualdades é impossível, considerando a diversidade das


pessoas, mas, é possível eliminar os eventos que se configuram como racismo
institucional (Cruz, 2006), que pode impedir o cuidado integral no SUS. O racismo
institucional atua provocando uma desigualdade na distribuição de serviços,
benefícios e oportunidades aos diferentes segmentos da população do ponto de vista
racial (López, 2012).

A questão da discriminação da loucura e a falta de programas ou ações


específicas no serviço para lidar com os agravos produzidos pelo racismo, como
determinante e condicionante da saúde, influencia, diretamente e indiretamente, sobre
as condições de vida, tornando-a mais difícil com poderes e interesses desiguais
(Brasil, 2007; Werneck, 2010).

Segundo a PNAISM (Brasil, 2004), ainda que maioria da população mundial,


as mulheres sofrem com desigualdades de gênero/poder fortemente arraigadas na
sociedade, sendo delegado a elas um papel de subalternidade em relação aos
homens, constatados por salários menores, jornadas duplas e triplas de trabalho,
vivendo em situação de maior pobreza, ou exercendo atividades não remuneradas,
consequentemente, com menos acesso aos bens e serviços de saúde.

Além disso, as mulheres sofrem com violências domésticas, sendo que esses,
INTRODUÇÃO| 39

e outros elementos agravam as desigualdades de gênero, tais como, “classe social,


raça, etnia, idade e orientação sexual, situações que limitam o desenvolvimento e
comprometem a saúde mental de milhões de mulheres” (Brasil, 2004, p. 45).

Sendo assim, observa-se que tanto os “loucos” em geral foram excluídos pela
sociedade, também as mulheres em desigualdade de gênero, posição social desigual,
que tem salários menores ou sem remuneração são mais acometidas pelos problemas
de saúde mental, com destaque para as mulheres pretas e pardas, viúvas,
divorciadas, principais responsáveis pela família e sem atividades de lazer (Araújo,
Pinho, Almeida, 2005).

Segundo Silva et al. (2015), mães de crianças com “transtorno mental”


precisam fazer diversas renúncias pessoais, relatam dificuldades de cuidar dos filhos
nessa condição, enfrentam preconceito, sobrecarga, e tem impacto na sua
autoestima, que provoca ansiedade, depressão, dentre outros problemas
relacionados.

Frente aos dados apresentados, o questionamento é se as demandas de


cuidado da mulher, cuidadora de crianças/adolescentes são respondidas pela RAS e
pela RAPS. Este estudo específico investigou o percurso dessas mulheres, mães,
cuidadoras de usuários do CAPSij.

1.1.5 Pressuposto

Parte-se do pressuposto de que mulheres, cuidadoras de crianças e


adolescentes pretos e pardos em CAPSi, sofrem discriminação por sua cor de pele e
por ter um filho/a com problemas de saúde mental. (Brasil, 1990a; 2007; 2009a).
Dessa maneira, os impactos psicossociais determinados pelo estigma da doença, e,
também, discriminação e exclusão em função dos filhos e de sua própria condição
enquanto mulher e de cor preta ou parda, as fazem mulheres duplamente
discriminadas, por sua cor de pele e por ter filhos/a com problemas de saúde mental
negros, acumulando vulnerabilidades, podendo refletir negativamente na construção
do cuidado dos mesmos.
INTRODUÇÃO| 40

1.1.6 Questões norteadoras

Considerando a literatura científica, da história da loucura e exclusão social das


pessoas com problemas de saúde mental, do racismo institucional e estrutural, as
pesquisas revelam problemas advindos de discriminações sobrepostas, duplas ou
triplas, pelo estigma da doença mental, por questões de gênero de mulheres, quando
essa é negra. Assim, o estigma, o preconceito e a discriminação das mulheres negras
e seus filhos (crianças, adolescentes negros) estabelecem a sumária importância da
coleta e utilização do quesito raça/cor em estudos que servem de base para as
políticas de saúde mental para o cuidado comunitário territorial.

Balizados por pesquisas científicas envolvendo esses temas, suscitaram


indagações, as quais contribuíram para a organização das questões norteadoras
deste estudo, assim explicitadas:

• Quais os serviços da RAS e da RAPS as mulheres, mães acessam ou


não, e como percebem esse atendimento e/ou barreiras?

• Quais fatores impactam na saúde das mulheres, mães- cuidadoras de


crianças e adolescentes negros em CAPSij?

• Como é para essas mulheres cuidar de si e cuidar de uma


criança/adolescente negro com problema de saúde mental?
2 OBJETIVOS
OBJETIVOS| 42

2 OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

Compreender o percurso das mulheres, mães, cuidadoras de


crianças/adolescentes com problemas de saúde mental, usuários do CAPSij, em
relação à Rede de Atenção à Saúde (RAS).

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

• Caracterizar o processo saúde-doença destas mulheres;

• Possibilitar espaços de reflexão para estas mulheres na perspectiva de


promover a qualidade da relação entre os familiares-
crianças/adolescentes- serviços;

• Contribuir com proposições para a atenção das necessidades


específicas da população do estudo.
2 CAMINHO METODOLÓGICO
CAMINHO METODOLÓGICO| 44

3 CAMINHO METODOLÓGICO

3.1 FUNDAMENTAÇÃO METODOLÓGICA

O desenvolvimento de um estudo exploratório, descritivo de abordagem


qualitativa, possibilitou desvelar opiniões e percepções das mulheres, mães,
cuidadoras envolvidas em contexto histórico-social, marcadamente, ideológico. A
escolha por uma abordagem qualitativa permite compreender relações sociais,
humanas e significados, por isso adequada para investigações de grupos específicos
e as contradições de contextos (Minayo, 2010).

No projeto “O processo de cuidar em saúde mental da criança/adolescente


negro em CAPS infantil”, do qual deriva este estudo, foi realizado a caracterização
do perfil sociodemográfico-clínico das crianças e adolescentes negros, e o percurso
dos mesmos antes de chegar ao CAPSij e dentro dele. Foi financiado pela Fundação
de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo n.º 2018/07251-
2. Esta parte inicial contou com os integrantes do Grupo de Pesquisa Enfermagem e
as Políticas de Saúde Mental (GEnPSM), na coleta e análise dos dados.

3.2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

As concepções teóricas que sustentam o olhar para este estudo estão definidas
a partir das três dimensões do Racismo, aplicadas no contexto do Brasil por Werneck
(2016), elaboradas em Jones (2002), na complexidade do racismo à brasileira
(Munanga, 2017).

Werneck (2016) refere que é escassa a produção do conhecimento sobre


mulheres negras na formação de profissionais da saúde, existem poucos debates em
pesquisas científicas na perspectiva racial, torna-se necessário “subsidiar pesquisas
e contribuir para a formulação e gestão de políticas públicas adequadas às
necessidades expressas nos indicadores sociais e de saúde das mulheres negras
brasileiras (Werneck, 2016, p. 535).”

Werneck (2016) retoma a racialidade como dispositivo, associada por Suely


CAMINHO METODOLÓGICO| 45

Carneiro ao conceito foucaultiano no contexto brasileiro, como uma ferramenta que


age:

[...] reduzindo a abrangência da cidadania por estar na base da criação e


manutenção de preconceitos, ou seja, ideias e imagens estereotipadas e
inferiorizantes acerca da diferença do outro e do outro diferente, justificando
o tratamento desigual (discriminação)” (Werneck, 2016, p.541).

Werneck (2016), com fundamentos do racismo tridimensional em Jones (2002),


elabora o racismo em sistema complexo “deletério” e de "naturalização das
iniquidades produzidas”, com dimensões concomitantes, as quais produzem “efeitos
sobre os indivíduos e grupos (não apenas de suas vítimas), gerando sentimentos,
pensamentos, condutas pessoais e interpessoais, atuando também sobre processos
e políticas institucionais” (Werneck, 2016, p.541).

Figura 1 Dimensões do racismo tridimensional, apresentado por Werneck (2016)

Assim, o racismo tridimensional afeta as dimensões pessoais (internalizadas),


interpessoais e institucionais, de maneiras simultâneas. A dimensão
pessoal/internalizada do racismo afeta a subjetividade negra, com “padrões racistas”,
incorporando “visões e estigmas”; a interpessoal é expressa em “preconceito e
discriminação”, desdobradas em ações de desrespeito, desconfiança, desvalorização,
perseguição, desumanização, e também omissões, negligências acistas; a
institucional, racismo sistêmico (conceito “cunhado pelos ativistas do grupo Panteras
Negras, Stokeley Carmichael e Charles Hamilton, em 1967”), ou melhor definido como
CAMINHO METODOLÓGICO| 46

racismo institucional (RI), realoca este, na dimensão estrutural, ou seja, nas “formas
organizativas, políticas e normas que resultam em tratamentos e resultados
desiguais”, como acesso material, que afeta as condições de vida concretas, pela
“indisponibilidade e/ou acesso reduzido a políticas de qualidade”, pela assimetria de
acesso ao poder, por meio de “menor acesso à informação/menor participação e
controle social/escassez de recursos”, e por isso esta é considerada a “dimensão mais
negligenciada do racismo” (Werneck, 2016, 541-2).

Jones (2002) propõem estratégias para confronto do racismo institucional, que


passa por “nomear o racismo” (“How is racism operating here?”, na tradução livre,
“Como o racismo age aqui?”) e mobilizar ações coletivas a partir do entendimento dos
mecanismos, mobilizando “ações políticas”. Para tanto, a autora reforça três focos
necessários: nomear o racismo (“naming racism”), entender os mecanismos locais
e os impactos do racismo na comunidade (“understanding the local mechanisms
and impacts of racism”), agir para desmantelar o racismo com “focos nas estruturas
e processos do racismo institucional” (“acting to dismantle racism”, “focus on the
structures and processes of institutionalized racism”) (Jones, 2002, p.18- 19).

Sobretudo, para Jones (2002), o racismo é causa das iniquidades raciais na


saúde (“fundamental cause of “racial” disparities in health”), portanto, o racismo
institucional deve ser confrontado, medindo-se seus impactos na saúde e bem-
estar/condições de vida, a partir do exposto anterior, como metodologia em
pesquisas científicas.

O racismo no Brasil tem características particulares e peculiares, com base no


mito da democracia racial, que nega a existência do racismo, colocando-se as
discriminações na esfera econômica, como as diferenças de classe social. No entanto,
a sociologia aborda essa ideia, como uma “ficção ideológica” com tese na “harmonia
das raças”, “cordialidade das relações raciais”, que tem origens no abolicionismo
disfarçado de “ideais humanitários” e a criação de representações, estereótipos
criados pela classe social de supremacia branca. No ideal da burguesia branca
estabelecida no positivismo comteano de “Ordem e Progresso”, subliminarmente,
como obediência aos padrões, "total lealdade a seus interesses e valores sociais”, e
ainda, “jugo escravo como ameno, suave, doce e cristãmente humano” (Fernandes,
2004, p.45-46).

Com isso, conservou-se a hierarquização, passando da “espoliação colonial”


CAMINHO METODOLÓGICO| 47

para a “espoliação escravista” no século XIX, em benefícios próprios e controle do


Estado em circuito fechado de poder institucional capitalista de controle das forças
produtivas no século XX (Fernandes, 2004). A ideia da “cordialidade submissa”
brasileira, a inexistência de leis segregacionistas como em outros países, embasa a
peculiaridade do “racismo implícito”, na negação do mesmo, compreendido como a
inércia do mito da democracia racial (Munanga, 2017).

O argumento de igualdade na sociedade mestiça e “raça humana” sem


diferenciação, não se fundamenta ao analisarmos as desigualdades sociais e a
discrepância de participação social de pessoas negras nos espaços de poder.

Munanga (2017) refere que, a ideia de mestiçagem presente na ideologia racial


brasileira, serve como ferramenta para “escamotear os problemas da sociedade, ora
para combater as propostas de políticas afirmativas que beneficiam os que se
assumem como negros”. Sobretudo, exerce uma força desmobilizadora de luta por
direitos, quando divide as pessoas negras em pretas e pardas, fundamento da
ambiguidade de mestiçagem e agem para impedir a formação da negritude como
identidade. Por fim, o autor define “o racismo brasileiro como difuso, sutil, evasivo,
camuflado, silenciado em suas expressões e manifestações, porém eficiente em seus
objetivos” (Munanga, 2017, p. 41).

Consequentemente, entende-se que é fundamental entender como o racismo,


a discriminação e a exclusão social são produzidos e afetam o cotidiano das mulheres,
mães, cuidadoras de crianças e adolescentes pretos ou pardos usuários de CAPSij.

3.3 PERCURSO EXPLORATÓRIO - CENÁRIO E POPULAÇÃO DO


ESTUDO

3.3.1 Caracterização do cenário

A Coordenadoria de Saúde Norte de São Paulo, pertencente à Subprefeitura


Norte, é composta pelas Supervisões Técnicas de Saúde: Casa Verde/Cachoeirinha,
Freguesia/Brasilândia, Jaçanã/Tremembé, Perus, Pirituba, Santana/Tucuruvi, Vila
Maria/Vila Guilherme. A Figura 2 mostra a totalidade da Região Norte e os serviços
de saúde e assistência, desta área de abrangência.
CAMINHO METODOLÓGICO| 48

Figura 2 - Mapa do município de São Paulo, com destaque para os serviços de


assistência na Região Norte

Fonte: ASF - [https://www.saudedafamilia.org/_wp/index.php/pt/home/contratos-de- gestao/contrato-


de-gestao-freguesia-obrasilandia-casa-verde-cachoeirinha/]

O cenário do estudo foi o CAPSij II Brasilândia, inaugurado em 10 de setembro


de 2009, gerenciado por meio de administração indireta, isto é, é um serviço
administrado por uma Organização Social de saúde (OSs), Associação Saúde da
Família (ASF). Este serviço está localizado na Zona Norte da cidade de São Paulo, e
sua área de abrangência está delimitada entre dois distritos administrativos: Vila
Brasilândia e o bairro da Freguesia do Ó. Esses bairros diferem quanto à característica
da população, sendo o primeiro de maioria populacional negra (mais de 50%) e o
segundo, branca, sendo acessado majoritariamente pelas pessoas provenientes do
território Brasilândia. Este serviço de saúde mental responde a uma população da
subprefeitura Freguesia/Brasilândia, que tem uma população de 407.245 [atualizado
em 21 de março de 2022] habitantes, densidade populacional de 12,9, com 264.918
habitantes na região da Brasilândia e 142.327 habitantes na Freguesia do Ó.

O CAPSij II Brasilândia atende, especificamente, crianças e jovens até 18 anos


CAMINHO METODOLÓGICO| 49

que tenham problemas de saúde mental graves e persistentes, e/ou que necessitem
de acompanhamento diário, com capacidade para realizar 220 atendimentos mensais
e funciona de segunda a sexta-feira, das 7h às 19h, sendo oferecidos atendimentos
que englobam as necessidades singulares; em grupos e atendimento individual com
os técnicos de referência, com atividades terapêuticas grupais e, ainda, visitas
domiciliares, grupos de família, reuniões do conselho gestor e assembleias. No
entanto, estima-se que o montante dos atendimentos seja superior, até 260
atendimentos/mês, com uma população de 500 (prontuários ativos), e em torno de
2.000 prontuários inativos. A supervisão técnica Freguesia do Ó/Brasilândia está
localizada na Freguesia do Ó.

Figura 3 – Mapa da Região Norte - Freguesia do Ó e Brasilândia

Fonte: Mapas - Subprefeitura Freguesia/Brasilândia - SP.

O CAPSij II Brasilândia é referência de apoio matricial em saúde mental para


19 serviços de saúde na Atenção Primária em Saúde (APS), como Unidades Básicas
de Saúde (UBS tradicional), mistas e Estratégia de Saúde da Família (ESF), sendo
estas: UBS Vila Penteado, UBS Vila Terezinha, UBS Pereira Barreto, UBS Silmarya
Rejane Marcolino Souza - Jardim Carobé, UBS Dr. Augusto Leopoldo Ayrosa Galvão,
UBS Jardim Paulistano, UBS Vila Progresso, UBS Jardim Ladeira Rosa, UBS Vila
Ramos - Freguesia do Ó, UBS Jardim Guanabara, Ambulatório de Especialidades
Freguesia do Ó, UBS Cruz das Almas, UBS Maria Cecília, UBS Elisa Maria, UBS Vila
Palmeiras, UBS Nova Esperança, UBS Jardim Vista Alegre, UBS Paulistano II - Nova
Esperança e UBS Vila Dionísia. O território da Freguesia do Ó/Brasilândia possui
CAMINHO METODOLÓGICO| 50

também um CAPS Adulto III, CAPS AD III, Centro de Convivência e Cooperativa


(CECCO), 03 Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT) e 02 Unidades de
Acolhimento Adulto (UAA).

O processo de trabalho para matriciamento da Atenção Básica e cuidado é


dividido em três miniequipes: Beira Rio (região próxima do Rio Marginal Tietê), Pé de
serra (região onde fica o CAPSij) e Alto da serra (região mais próxima da Brasilândia,
caminho da Serra da Cantareira). Além disso, conta com serviços de saúde mental de
retaguarda 24 horas (CAPSij III - Santana, também na Zona Norte; Aricanduva, na
Zona Leste; Sé, no Centro; Heliópolis, na sudeste e Cidade Dutra).

Atualmente, a unidade conta com equipe multiprofissional de 27 trabalhadores


- 1 gestor, com formação em Psicologia, 2 médicos Psiquiatras,

1 médico Pediatra (havia 2), 3 Psicólogos, 3 Enfermeiras, 5 Técnicas de


Enfermagem, 3 Terapeutas Ocupacionais, 2 Assistentes Sociais, 1 Farmacêutico, 0
Técnica de Farmácia, 2 Oficineiras, 2 profissionais de “apoio”, 1 Fonoaudióloga, 3
Técnicas-administrativas, 1 Administrativo de Portaria e 1 Motorista. A equipe
completa agrega os diversos saberes das profissões da saúde e assistência social,
observa-se a Enfermagem como maioria na equipe, totalizando 8 profissionais.

Desde 2017 organizam a Feira Preta de Troca de tempo, de aquilombamento


e protagonismo do território Freguesia do Ó e Brasilândia, com a participação de
serviços da RAS, RAPS, SUS, redes intersetoriais e de justiça, com objetivo de discutir
a produção de saúde e garantia de direitos. O coletivo KilomBrasa foi criado pelo
CAPSij em 2018, para produzir um movimento de “aquilombamento”, “aquilombação”,
de protagonismo e representatividade da população negra. Outro coletivo é o “Ó da
Brasa”, de geração de trabalho/renda/ganho, compartilhado entre os CAPS do
território (CAPSij II Brasilândia, CAPS III Adulto Brasilândia e CAPS AD III
Brasilândia), que iniciou em 2020, meio ao cenário de Pandemia da COVID 19,
primeiramente, com doações de materiais para fabricação de máscaras de proteção
individual em pano e posteriormente, com incentivo de financiamento via FIOCRUZ.
Também fabricam também bolsas, bonecas e outros itens, decididos em assembleias,
a partir do conceito de autogestão.
CAMINHO METODOLÓGICO| 51

3.3.2 População do estudo

Os sujeitos deste estudo foram as mulheres, mães, cuidadoras das


crianças/adolescentes pretos ou pardos com problemas de saúde mental usuários do
CAPSij II Brasilândia, selecionadas segundo os critérios de inclusão.

Para seleção das entrevistadas, seguiu-se os seguintes critérios de inclusão:


cuidar da criança/adolescente preto ou pardo com problemas de saúde mental usuário
do CAPSij, não receber remuneração pelo exercício do cuidado, exercer o papel de
cuidadora há mais de um mês, manifestar – diante da pesquisadora – ser a
responsável direta pelos cuidados da criança/adolescente e ser maior de 18 anos. Os
critérios de exclusão foram: não desejar participar da pesquisa, desligamento dos
usuários no período da coleta de dados, ou não preencher os critérios de inclusão.

A amostra realizada foi não-probabilística e por método de conveniência,


devido dificuldades de contato com as mulheres, muitos telefones não existentes ou
pouca disponibilidade delas para participarem das entrevistas; e, também, devido ao
tempo para execução da pesquisa. Uma amostra não- probabilística é uma escolha
da amostra de acordo com os critérios de inclusão ou exclusão, definidos pelo
pesquisador. E, a amostra por conveniência é utilizada em “pesquisa clínico-
epidemiológica”, acessando “itens [...] mais facilmente disponíveis” (Freire, 2021).

Entendendo-se que um cuidador é uma profissão reconhecida na Classificação


Brasileira de Ocupações (CBO), neste estudo foram consideras aquelas cuidadoras
que não recebem remuneração para esse cuidado.

3.4 ETAPAS DA PESQUISA E ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

Inicialmente, este estudo partiu de informações contidas em banco de dados


empíricos resultante do projeto “O processo de cuidar em saúde mental da
criança/adolescente negro em CAPS infantil”, citado anteriormente, cujo objetivo
foi caracterizar o perfil sociodemográfico e clínico- epidemiológico dos cuidadores das
crianças/adolescentes pretos e pardos do CAPSij (264 familiares). Devido às
dificuldades para contatar o montante de familiares (pelos seguintes motivos:
inexistência de telefones, mudanças de endereços, e tempo hábil para as
CAMINHO METODOLÓGICO| 52

entrevistas/formulário), foi previsto estatisticamente um “n” mínimo, como amostra não


probabilística por conveniência, estimado de 90 mulheres.

No entanto, naquela etapa de pesquisa, foram realizadas 59


entrevistas/formulário, que após revisão e descartes de entrevistas incorretas,
resultaram em 49 familiares participantes. Desses, 5 eram homens e 44 eram
mulheres, as quais, por autodeclaração: pretas (14), pardas (23) brancas (6) e
indígena (1). Por fim, outras 10 (9 mulheres e 1 homem) entrevistas foram realizadas
pelos bolsistas fora dos critérios de inclusão, sendo detectadas, não constando na
listagem de pessoas elencadas para as entrevistas/formulário, e seguindo rigor
metodológico, também foram descartadas.

Essa etapa foi concluída e disseminada por meio de publicações científicas, as


quais estão descritas no Quadro 1, a seguir.

Quadro 1 - Publicações científicas

Ano de Autores/Título
Publicação
Barros S, et al. Relatório técnico do diálogo deliberativo “O processo de cuidar em
2020 saúde mental da criança/ adolescente negro usuário de CAPSIJ”. São Paulo: EEUSP,
2020.

Barros S, Ballan C, Batista LE. (orgs). Atenção psicossocial a crianças e adolescentes


2021 negros no SUS: caderno de textos. São Paulo: EEUSP, 2021.

Barros S, Santos JC, Candido B, Batista LE, Gonçalves MM. Atenção à Saúde Mental
2022 de crianças e adolescentes negros e o racismo. Revista Interface. 2022;26:e21525.

3.4.1 Atualização do banco de dados empíricos

Para este estudo em específico, foram feitas 39 “entrevistas” realizadas com 37


mulheres, pois, duas mulheres tinham dois filhos usuários do CAPSij II, e foram
registradas duas vezes cada uma. Portanto, o “n” inicial da pesquisa foi esse Banco
de Dados Empíricos de 37 mulheres.

Os sujeitos de pesquisa, ou seja, as 37 mulheres foram contatadas por telefone


no ano de 2020, sendo a primeira entrevista agendada e realizada no mês de março.
Essa foi a primeira estratégia de captação das mulheres para as entrevistas. No
entanto, dado o cenário da Pandemia da COVID 19, a partir da segunda quinzena de
CAMINHO METODOLÓGICO| 53

março 2020, as atividades presenciais foram suspensas no CAPSij, sobretudo, os


grupos terapêuticos, mas atendendo crises e realizando suporte territorial,
consequentemente, a pesquisa foi interrompida devido às medidas de distanciamento
social prescritas palas autoridades governamentais e sanitárias.

No mês de agosto de 2020, como segunda estratégia de coleta3, após liberação


parcial de medidas restritivas para controle da pandemia, o contato com os sujeitos
de pesquisa foi retomado por telefone. Para viabilizar essa fase de coleta de dados,
foram comprados Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) para proteção das
entrevistadas e entrevistadora. As entrevistas foram realizadas no mês de outubro de
2020 no CAPSij II, estendendo-se até fevereiro de 2021. Considerando a urgência da
Pandemia da COVID 19, decidiu-se por uma amostra por conveniência, na qual o
“n” foi de 18 mulheres cuidadoras, para a realização de entrevistas
semiestruturadas com questões norteadoras.

O Quadro 2 das Etapas e das Estratégias Metodológicas, ilustrando o processo


de pesquisa inicial e atual, é apresentado a seguir.

Quadro 2 - Etapas e Estratégias Metodológicas

PROJETO GUARDA-CHUVA

GEnPSM ETAPAS PROPOSTAS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

- Investigação do perfil - Coleta e análise de dados realizada pelos


sociodemográfico-clínico das pesquisadores do GEnPSM;
crianças e adolescentes do CAPSi,
bem como seu percurso antes e - Análise dos prontuários, utilizando
dentro do serviço; formulário/questionário.

- Identificação de todos os - Utilização de um formulário/questionário sobre


cuidadores de crianças/adolescentes os cuidadores de usuários pretos ou pardos do
CAPSij, separando-os por sexo (todas as
pretos ou pardos do CAPSi,
mulheres-cuidadoras de usuários do CAPSij
separando-os por sexo. foram encaminhadas para esta segunda
Etapa).

Etapa II - DOUTORADO

3
Retomou-se contato por telefone, ofertando oportunidade de escolha do local para as entrevistas:
1) CAPSij II; 2) Na residência da entrevistada; 3) UBS/ESF de referência. A maioria das mulheres
optou por ir ao CAPSij II Brasilândia, pelo local oferecer protocolo de prevenção e detecção da
COVID 19, com aferição de temperatura e busca por sintomas gripais para acesso, com menos fluxo
de pessoas e menor possibilidade de contágio.
CAMINHO METODOLÓGICO| 54

OBJETIVO GERAL
Conhecer o percurso das mulheres, mães, cuidadoras de crianças/adolescentes com problemas de
saúde mental, usuários do CAPSij, em relação à Rede de Atenção à Saúde (RAS).

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

⮚ Caracterizar o processo saúde-doença destas mulheres;


⮚ Possibilitar espaços de reflexão para estas mulheres na perspectiva de promover a qualidade da
relação entre os familiares-crianças/adolescentes- serviços;
⮚ Contribuir com proposições para a atenção das necessidades específicas da população do
estudo.

ETAPAS PROPOSTAS ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS

- Utilização do Banco de Dados Empíricos, com 37 - Entrevistas semiestruturadas


mulheres, mães de crianças/adolescentes negros Para compreensão das entrevistas
do CAPSij II Brasilândia, selecionadas segundo semiestruturadas, utilizou-se a análise de
critérios de inclusão e exclusão. Devido à discurso, de acordo com Fiorin (2005). Esse
Pandemia da COVID 19, uma amostra não- processamento consiste em identificar
probabilística por conveniência de 18 mulheres unidades de informação e categorizar as
foram entrevistadas. unidades de informação relacionadas ao
mesmo conteúdo e discurso (Fiorin, 2005).

As entrevistas nessa segunda estratégia, foram realizadas no CAPSij II


Brasilândia, sendo que três das entrevistas tiveram interrupções de áudio, por entrar
um técnico na sala, outra pela mãe não ter com quem deixar a criança e esta mexer
no equipamento, outra em virtude de necessidade da mãe sair e retornar com as
crianças para finalização.

As entrevistas foram transcritas, organizadas criando-se códigos para cada


mulher, no qual “Entrevista” refere-se a “E”, “Mulher” refere-se a “m” e “Linha” refere-
se a “L”, numeradas de 01 a 18. Exemplo: Entrevista Mulher “01”, foi catalogada =
Em1_L01, Em1_L02… Em1_L40, e assim por diante. As dezoito (18) entrevistas
foram assim codificadas, numeradas em “x” - linhas: Em1_Lx, Em2_Lx, Em3_Lx,
Em4_Lx, Em5_Lx, Em6_Lx, Em7_Lx, Em8_Lx, Em9_Lx, Em10_Lx, Em11_Lx,
Em12_Lx, Em13_Lx, Em14_Lx, Em15_Lx, Em16_Lx, Em17_Lx, Em18_Lx.

3.4.2 O percurso de tematização

Após a transcrição das entrevistas, procedeu-se a leitura por impregnação dos


discursos dos sujeitos de pesquisa, para depreender significados, e organizar a
tematização e as categorias que emergiram. Os temas foram identificados na
totalidade das 18 entrevistas e as categorias empíricas do agrupamento de temáticas.
CAMINHO METODOLÓGICO| 55

Na análise do discurso, Fiorin (2005, p.10) compreende que todo discurso é cultural e
“produzido a partir de certas condicionantes históricas”.

Dessa maneira, a tematização das entrevistas foi realizada, identificando-se e


reagrupando os temas que produziram as categorias empíricas. Para este autor,
“temas são categorias que organizam, categorizam, ordenam os elementos do mundo
natural”, e textos podem ser figurativos ou temáticos, ou seja, “criam efeito de
realidade” representando “o mundo”, ou “procuram explicar a realidade” (Fiorin, 2005,
p.65).

Para Fiorin (2005), o percurso temático é “um encadeamento de temas”, sendo


no “nível dos temas e das figuras”, que a ideologia de um discurso se manifesta. Além
disso, um tema pode aparecer “em vários discursos”, o que não o caracteriza
propriamente, mas “uma configuração discursiva” com “diferentes percursos”
temáticos e figurativos, isto é, variações percebidas somente se houver “confronto de
vários discursos” (Fiorin, 2005, p, 74-80).

Alerta o autor que, nem todo “amontoado de palavras” é uma frase e o “discurso
não é um amontoado de frases”, necessitando que as construções tenham além de
sintaxe (estrutura do discurso, uma “sintaxe discursiva”) e uma semântica (fatores
sociais e uma “semântica discursiva”, a qual iremos nos deter, onde encontra-se a
“determinação ideológica) (Fiorin, 1990, p. 17-9).
4 RESULTADOS
RESULTADOS| 57

4 RESULTADOS

4.1 CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO DE ESTUDO

4.1.1 Perfil sociodemográfico

Estes dados extraídos da síntese de caracterização do perfil dos familiares do


banco de dados empíricos, apresentam somente a população do estudo, no caso, as
mulheres. Foram organizados no processo de localização, contato e reorganização,
após as exclusões necessárias explanadas no método.

Observou-se que, da totalidade de mulheres (37), a maioria autodeclarou-se


negra (89,2%) e estavam na faixa etária entre 20 e 50 anos (64,8%). As mulheres
pardas configuraram maioria, 56,7% (21), seguidas de pretas, 32,4% (12); 8,1%,
brancas (3) e 2,7%, indígena (1). Assim distribuídas:

• 20 a 30 anos - 3 pardas, 3 pretas e 1 branca;

• 30 a 40 anos - 8 pardas, 4 pretas;

• 40 a 50 anos – 7 pardas, 3 pretas e 2 brancas;

• 50 a 60 anos – 3 pardas, 1 preta e 1 indígena;

• com mais de 60 – 1 preta.

Com as dificuldades impostas pela pandemia da COVID 19, as entrevistas


semiestruturadas foram realizadas com 18 mulheres, uma amostra não-probabilística
por conveniência. Dentre essas participantes, a maioria se autodeclarou negra
(88,8%) e estava na faixa etária entre 30 e 50 anos (32,4%). As mulheres pardas foram
maioria, 61% (11), seguidas de pretas, 27,5%, (5); e, em minoria, 5,5% brancas (1) e,
5,5%, indígena (1). Assim, distribuídas: duas mulheres estão entre 20 e 30 anos (1
parda e 1 preta); seis, entre 30 e 40 anos (4 pardas e 2 pretas); seis, entre 40 e 50
anos (4 pardas, 1 preta e 1 branca); quatro entre 50 e 60 anos (2 pardas, 1 preta e 1
indígena). Não houve entrevistada com mais de 60 anos.

Neste grupo de mulheres, em relação à escolaridade:

• na faixa etária dos 20 e 30 anos, duas (1 preta e 1 parda), realizaram o


RESULTADOS| 58

Ensino Médio Completo;

• entre 30 e 40 anos, uma das mulheres autodeclaradas pretas cursou


Ensino Superior Completo e a outra, Ensino Médio Completo; dentre as
mulheres autodeclaradas pardas, duas tem Ensino Fundamental
Completo e duas, Ensino Fundamental Incompleto;

• entre 40 e 50 anos, uma das mulheres autodeclaradas pardas tem


Ensino Médio Completo, outra, Ensino Médio Incompleto e duas Ensino
Fundamental Incompleto, a mulher autodeclarada preta tem Ensino
Médio Incompleto e a mulher branca, Ensino Fundamental Incompleto;

• entre 50 e 60 anos, uma das mulheres autodeclaradas pardas tem


Ensino Superior completo, enquanto a outra, Ensino Fundamental
Incompleto, a preta tem Ensino Médio Completo e a mulher
autodeclarada indígena é a única não alfabetizada.

Em relação à renda, 16,6% das mulheres (duas pardas e uma preta) recebem
o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS4) como fonte exclusiva de renda,
com valor de um salário-mínimo, na época, R$ 998,00. Uma dessas mulheres
(autodeclarada preta) tem nível superior completo e por receber o benefício do filho e
ser a única cuidadora, não é possível que a mesma trabalhe, sendo essa a realidade
da maioria das famílias que tem como provedora apenas a mãe da
criança/adolescente. Ainda, 11,1% das mulheres autodeclaradas pardas (2), que são
as únicas provedoras, com salários inferiores ao atual salário mínimo (R$ 300,00 e
R$ 1.000,00); 5,5% das mulheres (autodeclarada parda) informa que recebe apenas
o bolsa família; 5,5% das mulheres (autodeclarada preta) informa que o filho mais
velho é o provedor com valor de pouco mais que salário mínimo (R$ 1.280,00); 5,5%
das mulheres (autodeclarada parda, avó materna), é a principal provedora, conta com
aposentadoria como fonte de renda.
Quando a mulher vive com o pai da criança/adolescente refere que o mesmo
como provedor (5 pardas, 1 preta e 1 branca), com salário entre R$ 2.500,00 e
R$ 1.100,00, valor superior ao salário-mínimo, que remete ao status patriarcal de
privilégios dos homens. Uma das mulheres autodeclaradas parda, com nível superior

4
Lei Orgânica de Assistência Social ou lei 8.742/93
RESULTADOS| 59

e trabalha, contabiliza duas fontes (seu salário e aposentadoria do marido), com renda
de R$ 6.000,00. A mulher autodeclarada como indígena tem fonte de renda a
aposentadoria do pai da criança/adolescente negro, cerca de R$ 1.200,00, por ser um
pouco mais que o BPC/LOAS, optou por manter esse benefício herdado (pai falecido).
Sobre o tipo de moradia, a maioria reside de aluguel (6 mulheres, por
autodeclaração: 3 pardas, 1 preta, 1 indígena e 1 branca), cedida (5 mulheres, por
autodeclaração: 3 pretas, 2 pardas), própria (5 mulheres, por autodeclaração, todas
pardas), ocupação (2 mulheres, por autodeclaração: 1 parda e 1 preta). As moradias
são em sua maioria de alvenaria com revestimento, com 2 até 5 cômodos.

Esses dados estão apresentados no Quadro 3, a seguir.

Quadro 3 - Apresentação das mulheres segundo a faixa etária, o quesito raça/cor,


ocupação, renda e moradia

Coabitam
(número de Casa: tipo e
Faixa Quesito pessoas: M
Instrução Ocupação Renda número de
Etária Raça/cor – mãe, P – cômodos
pai, F –
filho(s)

Pai, Salário e
Benefício Alugada,
Parda EMC Do lar social, 4 MP2F alvenaria*, 2
20 a 30
anos R$ 2.200,00

Preta ESI Estudante ensino BPC/LOAS, 2 MF Cedida,


superior R$ 998,00 alvenaria*, 2

Parda ESI Do lar Pai, Salário, 4 MP2F Cedida,


R$ 1.100,00 alvenaria*, 2

Preta ESC Do lar BPC/LOAS, 2 MF Cedida,


R$ 998,00 alvenaria*, 4

Preta EMC Confeiteira Pai, salário, 5 MP3F Cedida,


autônoma R$ 2.500,00 alvenaria*, 3
30 a 40
anos Modelo Mãe, salário, Própria,
Parda EMC 3 M2F
comercial R$ 1.000,00 alvenaria*, 2

Parda EFI Do lar, Diarista BPC/LOAS, 4 M3F Alugada,


eventual R$ 998,00 alvenaria*, 3

Mãe, Benefício Cedido,


Parda EFI Do lar Social (BF), 3 M2F
alvenaria*, 2
R$ 261,00

Do lar e Ocupação, 1
eventualmente cômodo de
40 a 50 Parda EMC Mãe, salário, 2 MF alvenaria*, e
anos manicure R$ 300,00
autônoma 1 cômodo de
madeira
RESULTADOS| 60

Coabitam
(número de Casa: tipo e
Faixa Quesito pessoas: M
Instrução Ocupação Renda número de
Etária Raça/cor – mãe, P – cômodos
pai, F –
filho(s)

Parda EFI Do lar Pai, salário, 4 MP2F Própria,


R$ 1.200,00 alvenaria*, 4

Branca EFI Do lar Pai, salário, 3 MPF Alugada,


R$ 1.200,00 alvenaria*, 2

Parda EFC Do lar Pai, salário, 3 MPF Alugada,


R$ 1.100,00 alvenaria*, 3

Parda EFI Cabeleireira Pai, salário, 5 MP3F Própria,


R$ 2.000,00 alvenaria*, 5

Filho mais Ocupação,


Preta EMC Do lar velho, salário, 4 M3F
alvenaria*, 4
R$ 1.280,00

Mãe,
Não Aposentadoria/ Alugada,
Indígena Do lar Benefício do M2F
alfabetizada alvenaria*, 3
pai falecido,
R$ 1.200,00

Assistente de Mãe e pai,


Parda ESC gestão pública, salário e 3 MPF Própria,
50 a 60
advogada aposentadoria, alvenaria*, 5
anos R$ 6.000,00

Aposentadoria/ 3 Avó/avô, Própria,


Parda EFI Do lar INSS, neto alvenaria*, 5
R$ 2.000,00

Preta EMC Do lar BPC/LOAS, 3 M2F Alugada,


R$ 940,00 alvenaria*, 4

4.2 AS ENTREVISTAS E O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DAS


CATEGORIAS EMPÍRICAS

As categorias empíricas que emergiram da tematização dos discursos


analisados foram cinco (5):

I. Atenção à Saúde;

II. Cuidar de criança/adolescente com problema de saúde mental; III – A


RESULTADOS| 61

Escola;

III. Gênero;

IV. Racismo.

4.2.1 CATEGORIA I – Atenção à Saúde

4.2.1.1 Tema: O percurso na RAS

Apresentando os resultados da Categoria I - Atenção à Saúde, no tema O


Percurso na RAS. Este tema foi conformado por seis subtemas que emergiram dos
discursos: Concepção de saúde como urgência; A compreensão de UBS; Acesso à
UBS; Pontualidade do atendimento; Problemas de saúde e Cuidados de Saúde.

Dentre os subtemas que emergiram, as participantes expressam uma


concepção de Saúde como urgência com centralidade do cuidado no hospital, em
comparação às concepções sobre a Unidade Básica de Saúde (UBS), como local de
cuidados “básicos” de saúde, considerado por elas de “menor complexidade”, como
aferir pressão, agendamentos de consultas pontuais e realização de
encaminhamentos para especialistas, destacando problemas como a falta de médicos
e centralizando o cuidado nesses profissionais.

Em1_L11: “UBS, quando preciso [...] o pronto atendimento.”

Em2_L24-25: “Eu vou direto no hospital, no Penteado e no Cachoeirinha. É


onde eu faço os meus tratamentos.” {hospital geral}

Em4_L28 a 31: “Mãe: Não, no posto eu não vou não. Toda hora que a gente
vai lá não tem médico. Olha, é difícil de ir lá. Quando eu fiquei ruim, eu fui para
o hospital. É, lá no AMA. Lá de Perus.”

Em11_L24: “Eu fazia tratamento com ele a muito tempo aí eu o Mandaqui.”


{hospital psiquiátrico}

Em11_L121: “Posto de saúde, não, quando eu passo mal, eu vou para o AMA.”

Assim, ao relatarem onde cuidam da saúde, desvelam uma concepção de


cuidado como atendimento às urgências e não como um cuidado longitudinal, de
prevenção e promoção, com o hospital exercendo centralidade na escolha de solução
para os problemas de saúde.
RESULTADOS| 62

Em5_19 a 21: “Olha, casos urgentes mesmo, eu vou no Pronto Socorro, [...]
por causa das minhas meninas eu vou no hospital, porque são menores de
idade”.

Em2_L15 a 17: “Faz um bom tempo que eu passei mal [...] eu fui parar no
hospital por causa da pressão, muito alta, mas tranquilo, a minha mãe ficou
com os meninos, e eu fui com o vizinho.”

Outro subtema que emergiu, foi a compreensão de UBS como “posto de


vacina”, pode ser identificado, conforme o relato a seguir, reiterando o hospital, mas
sobre a atenção primária como de menor complexidade, sem o reconhecimento do
cuidado longitudinal.

Em5_22 e 23: “Ah, eu frequento, mas não para casos urgentes, acho que no
máximo assim, mais urgente, no caso de tomar vacina, sim, eu frequento, mas
não no caso de urgência.”

Em relação ao acesso ao SUS e uso da atenção complementar - “convênios”,


as entrevistadas referem ter acesso:

Em9_L4: “Eu procuro a clínica, eu tenho convênio, é para lá que eu vou”

Em10_19 a 21: “tanto a UBS, né? No SUS, quanto o particular, porque eu tenho
convênio, mas eu sempre ando em conjunto porque... hoje eu posso ter e
amanhã não, eu prefiro estar ali com os dois, lado a lado.”

Identifica-se contradição no sistema de saúde, quando os sujeitos da pesquisa


relatam suas necessidades e procuram por atendimento utilizando convênio particular.
O SUS estrutura a saúde no país, seja ela pública ou privada, e tem sofrido sobrecarga
em parte pela ideologia neoliberal privatista. Essa lógica, além de produzir uma
sensação de insegurança na população, desmobiliza, sucateia o sistema de saúde,
afeta o controle social, e produz concepções de menosprezo, que encoberta a crítica
aos limites políticos exercidos pelos governos e conduz a população a acreditar que
o SUS é falho, não funciona, ou mesmo, “é para pobre”.

O cuidado de Enfermagem é apontado no hospital, e compreende a assistência


na atenção básica como procedimentos, que destaca o aspecto técnico em detrimento
de um saber ser/fazer do Enfermeiro, que se processa no cuidado integral e específico
da profissão.

Em5-38 e 39: “Nos Postos de Saúde, para medir pressão, como que… de
temperatura, essas coisas... já no hospital, sim, claro…” {sobre atendimento de
RESULTADOS| 63

Enfermagem}

Nos fragmentos de falas, o acesso à UBS é referido de ocorrer por meio de


agendamento de exames, encaminhamentos para especialistas, rotinas dasunidades
com “senhas”.

Em1_12-13: “[...] vários exames na fila [...] conseguir uma vaga, [...]
encaminhamento para ortopedista.”

Em2_L26: “Porque preciso para marcar, para poder passar lá. Aí eu tenho que
ir…”

Em5_L24 e 25: “Sim, eu tenho o posto, é como eu disse, eu não... faz um bom
tempo que eu não vou, mas eu tenho o posto assim…aquela coisa...”

Em6_L13: “É difícil, tem senhas...”

Em11_L129-131: “Já fiz papa tudo mas vai fazer cinco anos que eu não passo
no papa, né? Porque com essa doença [...] tá difícil o médico aí agora que eu
consegui marcar uma consulta pra mim depois de cinco anos consegui marcar
uma consulta para mim no posto lá.”

Nos fragmentos de frases, as participantes relatam sobre acolhimento na


atenção básica e o atendimento das equipes locais.

Em4_L172 a 175: (mãe) Faz um tempo que eu não faço, eu não queria fazer
naquele lugar, naquele posto...eu não vou. Tem que passar fila, não pode você
passar, (inaudível) chega naquela consulta não tem médico, tá? Eu até desisto.
Fico em casa.”

Em4_L178 a 182: (mãe) {sobre a ACS} “Passa lá, mas vai nas outras pessoas
que estão precisando mais. Então, elas só vão lá e avisa. Ela nem perguntou
como que eu estava, o dia que eu passei mal, passei mal aqui, fiquei ruim e fui
para o hospital. (inaudível) então, ninguém quer saber como você está, então,
eu nem vou...então nem falo, como que eu estou.”

Em10_L37 a 40: “Estão lá conversando, você fica lá meia-hora em pé, e eles


estão nem aí para responder, passam… espera um pouquinho, espera um
pouquinho, se você precisa pegar algum exame, joga para um, joga para outro
e ninguém resolve.”

Por meio dos discursos, as rotinas de ações desenvolvidas, tal como a coleta
do preventivo do câncer do útero (Papanicolau), são exemplificadas pela frase
temática a seguir.

Em1_L461 a 464: “Faz tempo que eu não consigo fazer, porque está muito
ruim o posto, lá… de casa, então, não tem ginecologista, [...] você tem que
marcar a consulta com a enfermeira. Com a enfermeira eu consigo pedir
certos exames e tudo mais, não muito de boa vontade, mas enfermeira não
RESULTADOS| 64

é um médico.”

Dentre os discursos, a medicina é retratada como superior e eficiente, mesmo


que demore o atendimento, o profissional é médico e o tempo de espera não
incomoda.

Em5_29 a 33: “Bom, eu vou nesse posto há bastante tempo, não lembro assim
de ter alguma reclamação, lembro que o ginecologista que nos atendia, ele
tinha a fama, né? De demorar bastante, mas nos atendeu, tipo… uma, perto
de duas horas, muitas grávidas, mas em relação a isso, eu não tenho o que
reclamar, sempre respondendo às perguntas, isso me deixou confortável, era
um bom profissional, só demorava”.

Ainda em relação ao acesso à atenção primária, os fragmentos a seguir,


referem-se ao tempo de consulta realizada pelos profissionais. Ao serem atendidas
pelos médicos, o atendimento continua sendo bom, mesmo que demorando entre 15
minutos ou menos.

Em5_34 a 37: “Olha... acho que uns 15 (minutos), porque ele mexia na minha
barriga e fazia perguntas de como eu estava, explicava o mês que eu estava,
então, e às vezes, dependendo da situação, até me medicava, falava para mim
procurar fazer um ultrassom e tal, bem variado, bom, assim, no máximo…”

Em10_L41 a 44: “Eu gosto, já passo lá com os médicos há muitos anos,


então, você acaba meio que... criando um vínculo, né? Eu gosto... não é um
grupo, né? Sete ou dez minutos, mas se eu tiver alguma dúvida em relação
alguma coisa, eu posso perguntar, e eles respondem numa boa.” {Pergunta
sobre atendimento de Enfermeiras, referem atendimento com os Médicos}

A pontualidade do atendimento, destacados nos fragmentos, remetem às


concepções da medicina assistencial e curativista, procurando a UBS somente
quando existe um problema de saúde, ou uma demanda específica de cuidado,
acompanhamento de quadros clínicos instalados, como nos discursos a seguir.

Em2_L9 a 11: “Eu vou na minha consulta também [...] um problema de mioma,
tenho um nódulo na tireoide.”

Em5_L26-7: “Só das gravidezes mesmo [...] nas gravidezes, fiz tudo
bonitinho...”

Em6_L14: “Eu vou no posto, quando precisa, não vou sempre” [...] “vou pra
passar ele, na pediatria.”

O fragmento destaca a valorização do vínculo e cuidado longitudinal realizado


por equipes de Estratégia da Saúde da Família, com o cuidado sendo realizado na
RESULTADOS| 65

residência dos usuários.

Em3_L238 a 240: “A médica, como sempre ela cuidou do diabetes da minha


mãe, ela me indicou na época e agora que eu comecei, ela foi lá em casa me
procurar para conversar.”

Nos discursos, as mulheres referem acessar o SUS para atendimentos de


rotina, exames, como o preventivo de câncer, controles específicos com exames de
sangue e cardiológicos.

Em6_L16-17: “Marco Papanicolau [...] e é difícil eu ir no posto, se eu sentir


alguma dor, eu vou.”

Em10_L22 a 24: “Meus filhos no SUS, eles passam no Pediatra na UBS, ou


vou ginecologista, clínico, tudo, mas quando precisa fazer algum exame
específico, eu vou no particular” [Dentista?] “No Posto demora, né? Se não tem
urgência passa no Posto, se tem uma urgência vai para uma UPA.”

Em13_L11-12: “Eu faço os exames periódicos [...] Todos os exames que são
pedidos [...] não tomo nenhuma medicação.”

Em13_L15 a 18: “Papanicolau, mamografia, [...] densitometria óssea, [...]


hormônio, [...] exame de sangue [...] tenho que dar ênfase [...] ultrassom
transvaginal porque minha irmã faleceu de câncer no ovário e é um câncer raro
[...] fico muito atenta.”

Em13_L25-26: “Cardiologista, [...] porque mulheres têm infarto.”

As participantes fazem uso de prevenção, que é um dos pilares do SUS na


atenção primária em saúde, presente no fragmento, demonstra um entendimento
diferente nos discursos sobre cuidados de saúde.

Em10_L6 a 8: “Dificilmente eu tenho um problema de saúde, eu não sou uma


pessoa que costuma ficar doente não, [...] eu faço a preventiva, os exames
preventivos.”

Em relação aos problemas de saúde, reportam problemas clínicos e que


afetam a saúde mental. Dentre esses, cardíacos, hipertensão, diabetes mellitus,
asma, bronquite, coluna, câncer, “muitas dores”, insônia, estresse, preocupação e
ansiedade, preocupações com os filhos, depressão e ideação suicida.

Em1_L145: [você tem problema cardíaco?] “Eu tive, fiz a cirurgia, né?”

Em1_L452 a 456: “Eu tenho muitas dores na coluna, eu tinha que esperar
passar no médico para começar a fazer os exercícios, mas eu não pude
esperar, porque eu sabia que eu precisava melhorar [...] a coluna meio que toca
RESULTADOS| 66

no ciático e eu fico cada vez mais com mais dores.”

Em1_L470 a 473: “[...] estou esperando para ortopedista, [...] preciso definir
essas dores vasculares [...], da coluna, eu preciso ginecologista, que eu
estou esperando também, e eu estou esperando para fazer o exame para o …
eu preciso fazer exame para bursite, preciso fazer os exames do coração [...]
eu sou toda complicada, tenho muitas dores
aqui, no pulso, no braço todo, eu tive que ficar imobilizada uns dias.”

Em2_L31: “Meu mioma [...] vai ter o ultrassom [...] eu passei oito meses
menstruada direto [...]”

Em2_L34 a 37: “Por causa da troca de injeção, por causa do mioma [...] eu não
posso engravidar [...] já sou operada [...] tomo a injeção por causa do mioma
[...] deu errado e passei oito meses direto. Muito estresse, a pessoa fica muito
estressada, muito preocupada.”

Em2_L42 a 45: “Tenho um pouco de insônia [...] durmo e acordo, durmo, acordo
de novo [...] cuidando do meu outro filho mais velho, né? Porque eu tenho
preocupação com ele.”

Em3_86 a 88: “Eu tenho bronquite, diabetes e pressão alta [...] tenho asma.”

Em3_L67-68: “Teve uns tempos atrás eu falei que eu ia me matar... eu não


queria ficar sem minha mãe [...] falei com meu marido, né? Desculpa ter falado
assim, a gente já luta para tirar o nosso filho deste mundo, eu tô querendo sair
igual.”

Em3_L89-91: “Menina, despenquei no carro, parecia que estava tendo alguma


coisa, eu quero minha mãe, quero minha mãe, quero minha mãe.”

Em3_L249 a 251: “Eu sempre parece que quero ficar no controle da situação
como alguma coisa fugiu da minha situação eu fico me comendo, que foi no
caso cheguei do CAPS e o XXXX já não tava essas Coca-Cola.”

Em3_L372: “No meu momento de ansiedade eu corro pro bolo.” Em16_L1:


“Sou hipertensa.”
Em17_L5: “Tive um infarto, quase que eu morri.” Em17_10: [você tem diabetes
também?] “Tem.”
Em18_L50-51: “Descobri um câncer no útero, eu vou operar nas ‘Clínicas’ um
câncer no pescoço.”

Em18_L107 a 115: “[...] estou tentando marcar um lugar para fazer a biópsia.
Que nem isso aqui, estou me tratando nas Clínicas, [...] eles falaram que não
tinha tanta urgência para me operar, porque [...] é benigno. [...] se dá para
esperar, eu espero, aí vou fazer o Papanicolau, posto me chamou, por causa
do útero, para ver se é benigno ou maligno...”,

Em18_L145 a 147: “Junta tudo, dinheiro, fumo 9 cigarros por dia, estou aqui
conversando com a senhora, mas eu estou doida pra sair lá fora e fumar. Sou
muito ansiosa.”

Identificaram-se cuidados de saúde referidos pelos sujeitos de pesquisa, os


quais foram destacados em frases temáticas. As mulheres em seu discurso, relatam
RESULTADOS| 67

que em função de cuidar da criança/adolescente com problema de saúde mental, não


conseguem cuidar de sua saúde, sem identificarem a rede social fragilizada como
problema, ou seja, mais relacionado ao cuidarem sozinhas dos filhos. Essa situação
afeta sua saúde mental, por consequência deixam de tomar medicamentos para
ficarem alertas durante o cuidado dos filhos, em detrimento do cuidado de si.

Em3_L238 a 240: “Tanto que eu já tomo Sertralina.”

Em4_L17 a 19: (avó) “Só o omeprazol que eu tenho problema no estômago, e


a fluoxetina para mim relaxar um pouco, porque é muita coisa para mim
sozinha.”

Em4_L38 a 43: (mãe) “É, sinto falta de ar. Tenho pressão alta e bronquite. Só
esses… e o remédio de calmante. Quando eu tomo ele é só para dormir.
Consigo nem se levantar… aí, esses dias, ‘ai, mãe, quero ir pra lá’, aí... nem
estou tomando…estou cuidando dele. Lá em casa é assim.”

Em8_L74 a 81: “Não tem... a vive exclusivamente para eles. Eu tenho


depressão , pressão alta, pedra no rim. Pedra no rim, eu tenho que operar,
pedra maior, às vezes, não tem... eu já falei, eu não tenho como deixar
ela... Aí, a mulher disse, tem que fazer tomografia, fazer exame, deixar ela
em algum lugar. Aí, eu tenho que fazer mamografia, tem que exame
ultrassom... eu não tenho quem... e ela não fica. Aí, não sei se vou
conseguir. Não tem com quem deixar. E a escola...”

Em11_13 a 16: “Tenho bronquite, eu não posso ficar muito nervosa, tô com
medo de infarto [...] não posso passar muito nervoso, eu sou muito nervosa, os
estresses deixou mais nervoso ainda, que eu tenho que cuidar de um, cuidar
de outro, cuidar de outro... Então, para mim é correria sozinha, então, eu não
cuido da minha saúde, aí, o que eu posso dizer que eu queria muito cuidar
da minha saúde [...] mas como eu tenho meu filho que assim agitado então
não dá.”

Em11_278 a 283: “A médica agora vai marcar uma consulta para mim... para
mim ver se dá um remédio para mim, controlado, igual do meu filho, para mim
tomar, para ver se eu tomo e durmo um pouco, para ficar calma, porque eu tô
passando muito nervoso, muito, muito, agitada.”

Em2_L12 a 14: “Tomo losartan, dois, todo dia, eu tomo dois e um para fazer
xixi que eu não sei o nome ainda não aprendi, aquele nome” [...] {É
hidroclorotiazida?} “É, é esse mesmo.”

Sobre isso, o modelo comunitário de cuidado em saúde mental reforça a


necessidade de cuidar integralmente do sujeito que sofre com problemas de saúde
mental, acolhendo a família também, considerando o território onde vivem. As frases
temáticas referem-se aos cuidados de saúde consigo, estão relacionados à rotina dos
filhos, dentre esses, a participação em grupos terapêuticos, acompanhamento
psicológico, uso de medicação psicotrópica (antidepressivos, sedativos,
RESULTADOS| 68

antipsicóticos), e um tempo para si com amigas, com outras pessoas, pois para elas,
conversar produz saúde.

Em1_L15-16: “Pra saúde mental, [...] terapia psicanalítica, mas eu faço no


SINTESP.”

Em1_L22-24: “Corro pra lá, tem que sempre encaixar dentro da rotina, não
tem como fazer em qualquer lugar [...] Só encaixando com a rotina.”

Em3_24-25: “Eu também estou passando no psicólogo do posto para poder


lidar com a morte da minha mãe. Isso mexeu muito comigo.”

Em4_7: “Remédio que eu tomo, Omeprazol e o Fluoxetina para mim relaxar um


pouco, porque é muita coisa para mim.”

Em4_L121 a 129: (avó) “Mas eu participava do grupo, eu participo de tudo…


de tudo, que tenha, eu participo. E participo também lá no posto, mas agora
veio essa epidemia… né? Diminuiu. [...]eu gosto de participar, como eu não sou
de sair, sou mais de ficar só em casa, eu quero abrir a minha mente, quero
conversar, quero escutar, quero falar.”

Em4_L199 a 202: “Ela passou uns remédios para mim tomar para vozes, ainda
estou tomando esse remédio, é muita coisa, sono, aí, nessas correrias eu não
tomo esses remédios, estão lá em casa esses remédios [...] sinto tontura
quando tomo ele, aham!”

Em10_L11 a 14: “Fisicamente [...] fazer os exames preventivos [...] e


psicologicamente, é eu sair e ser eu [...] fazer uma social com as amigas,[...]
fazer uma sobrancelha,[...] algo do tipo que eu seja eu. Seja a XXXXX, não a
mãe do YYYY ou ... Isso me faz muito bem.”

Em10_L16: “Esses escapes [...] ajudaram a valer.”

Em14_L2 a 5: “Ah, para mim me manter bem, eu tenho que distrair a minha
mente, ocupar com outras coisas, mas é difícil, não vai pensar que é fácil, não
é não [...] Eu procuro conversar mais com as pessoas, sabe... não me isolar
mais, porque no começo eu me isolava muito, mas é pior.”

Em15_L15: “Ah, eu gosto de conversar, dentro de casa, … distraio a cabeça.”

Em15_L18: “Eu não gosto de ficar sozinha.”

Os discursos detalham como cuidam de sua saúde: uso de vitaminas,


exercícios físicos, exames periódicos, cuidados com a alimentação e medicamentos.
As respostas refletem o que as participantes conhecem, no plano ideal, sem a crítica
das dificuldades enfrentadas para se ter um “padrão ideal” de cuidado que promova a
saúde.

Em1_L448 a 452: “Eu tenho que me cuidar por causa da falta de alguns
nutrientes, que é da carne, então, eu faço reposição de B12, agora eu estou
RESULTADOS| 69

bem desleixada, até faz alguns dias que eu não faço, me alimento bem, muita
fruta, muita verdura, começando a me exercitar em casa, porque não posso
fazer nenhuma atividade fora.”

Em1_L455 a 458: “Fiz um raio X, eu tenho escoliose, e a escoliose… a coluna


meio que toca no ciático e eu fico cada vez mais com mais dores, [...] o
caminho é se exercitar, só não sei se eu faço o exercício certo, mas eu
faço o exercício em casa, pela internet, exercício, ioga em casa...”

Em1_L465 a 467: “Preciso fazer outros exames, do coração, estou curada, mas
eu tenho que estar sempre fazendo, para poder ver se está tudo bem, pelo
menos de 3 em 3 anos.”

Em6_19-22: “Praticando esporte, indo pra academia, e uma boa


alimentação, comer as coisas certas… e não comer demais… não ficar
sem comer direitos, dieta, [...] de vez em quando eu como coisinhas que
engorda, eu me cuido.”

Em9_L7 a 7: “O que mudou é mais comida natural, suco natural essas


coisas, menos industrializadas, talvez melhore um pouco da vida.”

Em9_L11 a 14: “Quando o XXXX tá estudando, eu consigo fazer


caminhada, eu deixo ele no colégio e vou para casa a pé, é longe... eu caminho
assim uns 40 minutos a pé. Eu gosto, de manhã cedo eu gosto. Agora com
essa pandemia, não tem como fazer.”

Em13_L27: “Eu comecei a caminhada também, todo dia, quarenta minutos.”

Em13_L36 a 39: “Cuido também na alimentação, cortar o açúcar, [...] pão,


massas, [...] doce, tem que cortar muito o doce, o pão e o açúcar, essas
coisas... gordura eu já cortei [...] não como gordura.”

Em13_L41 a 45: “[...] meu gasto funciona mais na feira, do que no mercado.
[...] seleciona mais as coisas da feira, do que do mercado [...] menos
industrializados [...] foca mais na fruta, do que em coisas industrializadas.”

Em13_L46 a 52: “A chia, a linhaça [...] farofa de ovo com linhaça [...] gordura
nada [...] Fritura eu não consigo nem comer mais, nem pastel na feira mais
[...] não consigo comer gordura, fritura… [...] está cortado [...] salada [...] muita
coisa leve. [...] gosto muito do peixe, mas é caríssimo o peixe, esta parte... mas,
aí, eu troco o preço da carne, pelo preço do peixe [...]”

Em13_L54 a 57: “E eu gosto do peixe mais simples, a sardinha [...] comer com
mais simplicidade [...] diminuir [...] montante [...] Aquele prato generoso não
existe mais [...] Mais qualidade e menos quantidade.”

Em13_L58 a 72: “Não como fritura há muito tempo, diminuí o açúcar... [...]
vendo o brigadeiro [...] mas eu não como. Dificilmente eu como. [...] para
experimentar, uma vez ou outra, mas eu quase que não como [...] nos lugares
[...] vou no iogurte [...] uma fruta [...] percebi que o segredo é não fumar, não
beber e andar [...] meu pai sempre almoçou, jantou, tomou café da tarde,
[...] faço isso [...] tomo café, almoço, lanche da tarde, jantar e tudo sempre
no mesmo horário. Tenho uma rotina, que é para o intestino estar
sempre... Pronto. Sempre naquela sequência [...] quem vive comigo tem que
viver assim.”
RESULTADOS| 70

Em13_L63 a 66: “Meu pai tem noventa e sete anos [...] longevidade... eu
percebi que o segredo é não fumar, não beber e andar, porque ele
entregava jornal. Então essa parte cardio dele é muito [...] boa.”

Em13_L75-76: “Comida é realmente a refeição, é um cereal, arroz,


proteína.”

Em13_L78-80: “[...] almoçar em casa, [...] qualidade de vida [...] levo marmita
[...] a salada, o legume… ‘marmiteira’, tranquila.”
Em13_L88: “Porque eu tenho horário. Ele precisava do horário.” Em16_L55
a 57: “Eu tomo fluoxetina, Diazepam... o XXXX…. Aí, tomo
amiodarona para o Coração… aí, losartana, e tomo diurético
[hidroclorotiazida?] isso… e tomo de três em três meses injeção, pra não
menstruar.”

Em17_L3-4: “Me cuido muito mal, essa cirurgia que eu fiz [...] fiz uma ponte de
safena.”

Em17_L35-36: “Não, tem três meses, mas não estou 100%, não… ainda tem
os machucados na pele, faço curativos, tem essa aqui que tem que ficar presa
2… 3 meses. {a camisa elástica}”

Em17_L51 a 53: “Fumando menos, mas eu bebi... nossa [...] não está
cicatrizando, quando eu passo aqui… ainda dói, está doendo, por isso que eu
uso essa faixa.”

As mulheres referem não ter com quem “contar”, serem as únicas responsáveis
pela sustentabilidade da vida, da casa, faz com que se sintam inseguras, não
consigam fazer cuidados para sua saúde. Sobretudo, nos discursos aparecem o medo
de morrer e de familiares não conseguirem cuidar de seus filhos.

Em10_L89-91: [cirurgia] “Estética, é porque eu sou pós-bariátrica, né? E aí, no


convênio você tem direito às reparadoras, né? Fiquei magra… se estou com
medo? Tô. Estou com medo deles também não dar conta lá em casa, porque
você fica, né? Impossibilitada.”

Em11_L10-11: “Minha saúde? [...] eu não cuido, né? Porque eu tenho que
cuidar de três crianças [...] meus três filhos. Eu moro sozinha, pago
aluguel, então para mim é bem difícil cuidar da minha saúde.”

4.2.1.2 Tema: “O CAPSij”

Ainda na Categoria I, sobre Atenção à Saúde, o segundo tema encontrado foi


sobre “O CAPSij”, composto por seis subtemas: O CAPSij como redutor de estresse
familiar; o CAPSij como apoio técnico e afetivo; expectativas em relação ao CAPSij; a
expectativa em relação ao CAPSij na Pandemia da COVID 19; o tratamento no
CAPSij; e Controle social no CAPSij – assembleias.
RESULTADOS| 71

Nos discursos das mulheres, aparece o CAPSij como Redutor de Estresse


Familiar, pois ao cuidarem dos filhos no serviço de saúde mental, encontram outras
mães com problemas semelhantes e compartilham histórias, identificam-se umas com
as outras. No fragmento a seguir, elas ilustram esse aspecto.

Em5_167 a 172: “Encontrei outras mães, [...] contando umas histórias, algumas
que eu não me identificava, [...] minha filha estava um pouco mais evoluída, [...]
eu, nossa, realmente, minha filha passou por isso [...] lá fora não tem muitos
exemplos, não vou negar, tá, eu me identifico, é normal... é normal, não vou
falar lá fora, não tem muitos exemplos, sabe? Tipo, principalmente na minha
casa, não tem muitos exemplos, você não tem muita informação, daí, chega
aqui, eu sou tipo… sou mais uma.”

Outro aspecto abordado nos discursos, retrata o CAPSij como Apoio Técnico
e Afetivo, reconhece a importância do serviço e a diferença que produz no cotidiano
como apoio técnico e afetivo. Em diversos grupos terapêuticos com crianças
pequenas, o número de técnicos é aproximadamente de um
técnico/terapeuta/trabalhador para “uma criança”, “um para um”, produzindo sensação
de tranquilidade, como exposto em frase temática a seguir.

Em1_L200 a 203: “No CAPS, eu sei que tem mais profissional do que
menino, praticamente, entende, são quatro profissionais, seis meninos, vai
uma média assim, tipo, eles estão bem amparados, bem amparados [...],
eles estão bem cuidados, eu fico bem tranquila”

O apoio técnico e afetivo é considerado imprescindível, bom, confiável, a


“solução”, uma ajuda necessária para a melhora do problema de saúde mental e
acolhimento familiar.

Em4_L163-164: (avó) “Quando eu preciso alguma coisa, elas me ajudam o


máximo que elas podem.”

Em4_L167-168: “O XXXX não pode sair do CAPS, não pode, e ele tem que
estar lá, porque não tem outra solução.”

Em5_248 a 249: “Bom, eu não sei dizer como estão as atividades, como são
as atividades daqui, então, eu não questiono, confio.”

Em6_L86-87: “Tem muita coisa boa aqui dentro.”

Em6_L90: “Foi importante, porque eu não sabia como lidar.”

Em18_L4 a 6: “O CAPS ajuda muito, muito, quero agradecer muito ao CAPS,


quando eu percebi que ela tinha esse problema e comecei a frequentar aqui,
ela mudou bastante, melhorou muito.”
RESULTADOS| 72

O apoio técnico e afetivo, nos atendimentos em grupo de família, para as


mulheres, é reconhecido como importante intervenção, de compartilhamento de
experiências entre as mães, que comparam e conseguem avaliar a evolução do
tratamento dos filhos e diminuir sua ansiedade, sensação de impotência.

Em3_L403-404: “Eu estou aprendendo, vindo aqui no grupo de mães quando


tem... não, no psicólogo.”

Em9_L63 a 65: “Claro, na XXXX-feira é bom. Eu gosto porque eu fico sabendo


da vida das pessoas [...] grupo de família... todas as XXXX-feira.”

Em18_L60 a 66: “Eu estou falando, se não fosse aqui!? Acho que não sei
o que seria não {e eles ajudaram?} De tudo, até comida, [...] muito bom
essas reuniões [...] enquanto as crianças saem com as cuidadoras [...] as
mães ficam conversando entre nós, umas com as outras, uma falando
como que o filho tá, como o filho não tá… o que uma faz, a outra fala não…
mas a minha filha lá, também ficou assim, agora ela cresceu, ela melhorou… o
grupo de família é bom, é importante [...] A gente fica num desespero tipo,
será que essa fase dela nunca vai passar? A outra… ‘passa sim, a minha tá
melhor e era pior que ela’ [...] isso ajuda, a gente vai para casa mais tranquila,
que eu já tenho comigo que só a mão de Deus, como que vai ser?”

A articulação de rede que o CAPS realiza como apoio, para atender às


necessidades dos usuários do serviço, funciona como um empréstimo de
contratualidade pela viabilização de direitos. Assim, exposta em frase temática.

Em18_L186 a 190: “Uma vez eu quase perdi ela na Avenida, eu no ponto de


ônibus esperando com ela, e quando vi, ninguém… essa menina vai e me
atravessa a rua, aí, eu até parei de vir ao CAPS… eles foram perguntar, porque
que eu não estava vindo, aí, foi que o CAPS me ajudou a conseguir o Atende,
para estar trazendo ela aqui.”

Outros discursos demonstraram que além do apoio e segurança que o CAPSij


possibilita, há um vínculo de confiança e afetividade, assim, nos trechos a seguir.

Em4_L157: (avó) “Acho, muito importante, para mim é importante demais.”

Em4_L161: (avó) “Eu espero que sim, porque aqui eu me sinto como que se
eu estou em casa.”

Em5_L239 a 241: “[...] o CAPS me ajuda muito, na época a gente precisou de


mais profissionais além daqui, mas o CAPS me ajuda bastante, né? Na questão
do conforto para mim ah eu me sinto mais calma.”

Em5_L247: “Ele me abraçou.”{o CAPSij}

Em6_L88-89: “Eles ajudam, sim, com atendimento com ele, com remédio, no
desenvolvimento, bastante.”
RESULTADOS| 73

As mulheres expressam em seus discursos, expectativas em relação ao


CAPSij, relacionadas a atendimentos específicos e individuais.

Em4_L162-163: “Então, quando eu chegar lá*, eu quero me sentir também,


quero que eles me ajudem, que nem eles aqui me ajudam.” {*qualquer lugar na
sociedade}

Em6_L85-86: “Porque seria melhor, se ele passasse com fono [...], porque ele
não fala.”

Em17_L152 a 155: “Mas é que é ruim aqui porque não é individual, lógico que
o grupinho é importante, mas ela deveria ter algo individual, uma fono
individual.”

Além disso, explicitam expectativas em relação ao CAPSij na Pandemia da


COVID 19, bem como as necessidades durante esse período.

Em4_L155-156: “As meninas daqui, elas vão lá na minha casa. Duas vezes
elas iam, elas iam uma vez por semana, agora elas não vão, mas normal,
essa epidemia.”

Em5_249 a 253: “Então, eu acredito que nessa pandemia, eu queria que eles
fossem mais presentes para essas pessoas em casa, visitassem mais,
tentassem ser mais presentes. No início eles foram, até que eles me
ajudaram com uma cesta básica, ajudou muito, mas agora a pandemia
foi… os comércios foram abrindo, as coisas estão normalizando, não é
que está nada normal.”

Em5_254 a 263: “Sim e por exemplo, eu não posso ficar trazendo ela aqui, e
as mães não podem trazer as crianças para cá, só que acredito que a
pandemia, eu acredito que, principalmente para uma autista, muda muita
coisa.”.

Em5_266 a 271: “Eu acho que o CAPS precisava ter mais um pouco de
assistência para as mães em casa, porque… como eu disse, eu ainda sou
privilegiada por conta do pai, imagina as crianças que nem isso tem, é isso, só
minha questão, ser mais presente com as mães em casa, mas enquanto eu
frequentava aqui, que eu trazia ela aqui, eu não… todas minhas perguntas
eram respondidas, se a gente... sempre que eu precisei deles, eles me
ajudavam, não tenho o que reclamar.”

Em5_273 a 276: “Só uma vez, na sexta, e não foi nenhuma visita, né. A moça
só foi no portão da minha casa, então não foi, eles me ligavam, tinha…
acho que era uma vez por semana, eles ligavam e perguntavam como está
ela, aí, uma vez parou, até que pai dela até questionou, o CAPS não ligou
mais? Não.”

Em5_283 a 285: “Uma atividade do CAPS que poderia ajudar nessas coisas,
eu acho bem importante, ou só do tipo, olha… ela tá estressada, o que eu
posso fazer? O que eu posso fazer para acalmar?”

Em9_L66 a 70: [O grupo de Família tá acontecendo no celular ou não?] “Eu


RESULTADOS| 74

acho que não… Ah, às vezes, acho que eles ligam. É, de vez em quando
ela liga, quando ela precisa de alguma coisa, ela liga. Agora que o CAPS
agora, só no próximo ano.”

O tratamento no CAPSij é retratado nos discursos, como importante, um


“divisor de águas”, havendo melhora do problema de saúde mental, aumento na
socialização, “uma das melhores coisas que aconteceu”, dentre outras frases
temáticas apresentadas a seguir.

Em2_L185: “Aqui foi tudo bom, desde que eu entrei nas lutas.” Em2_L189:
“Fazem muitas coisas da paz, espairecer a mente dele aqui.”
Em3_L9-10: “Pelo menos ele não se corta mais, né? Não fala tanto em morte.”

Em9_39-40: “O XXXX melhorou. Melhorou bastante. O XXXX não se


enturmava com as outras crianças, agora ele se enturma!”

Em9_45-46: “Agora o XXXX já está de boa, o XXXX… já saio com ele, se


comporta direitinho [...] Graças a Deus o XXXX tá começando a ficar do jeito
que eu queria.”

Em10_L71-72: “Ele veio para cá para fazer as terapias, também, foi um divisor
de águas, foi das melhores coisas que aconteceu.”

Em10_76 a 78: “Ajudou bastante, hoje ele se socializa, ele fala, e ele está
bem pra caramba, está na escola, ele tem as dificuldades dele, tem os dias
dele, mas ele está super bem.”

Em11_L25 a 27: “Eu acabei ficando, gosto do atendimento daqui me ajuda


bastante até hoje estão me ajudando, né? Ai, eu gosto muito do atendimento
daqui.”

Em11_32 a 34: “Tão bonzinho, eles ajudam a gente, tudo que a gente precisa
eles ajuda, nunca fala que não. Eu gosto do atendimento daqui muito. é isso
que me ajuda aqui bastante.”

Em14_L65-66: “Mas aqui era bom, ele cansava mais, sabe, ele interagia mais,
outros lugares... então acalmava ele um pouco.”

Em17_L152: “Eu acho que aqui ajuda entendeu, até porque tem crianças,
ajuda.”

Algumas famílias enfrentam problemas mais complexos, que remetem o


problema de saúde mental à necessidade de atenção medicamentosa, ou mesmo
rotatividade de profissionais médicos.

Em4_L45 a 48: [melhorou depois que começou aqui?] (avó) “Não”.

(mãe) “Não, não está melhor. Cada dia que ele está crescendo, ele está ficando
pior, quando ele chega aqui ele está calmo, quando ele chega em casa, ele
quer agredir a gente. Esses dias ele agrediu. Olha, eu estou todo machucada.”
RESULTADOS| 75

Em4_L94 a 97: (avó) “Então, e o que eu mais quero é isso, não tem o que falar,
e estou sempre no CAPS, porque os remédio que dá não tá adiantando
nada, não está fazendo nada, os remédio que dá não está adiantando
nada, mas eu não posso porque é a única coisa que eu tenho para pedir
socorro.”

Em6_L90: “Melhorou bastante, sim, mas falta muita coisa.”

Em11_27 a 31: “Porque eu queria que melhorasse aqui, né? Que os médicos...
que os médicos que já acompanhavam nós, ficassem aqui, né? Mas alguns
estão saindo, tá entrando outros novos, então, eu queria que melhorasse
isso.”

Em18_L171 a 173: “Estou um pouco mais tranquila vou ser sincera, por causa
aqui do CAPS … Tentando, mas ela tomou um remédio desde cinco anos e ela
tá com 13, eu acredito que o remédio já não dá mais...”

Outro ponto importante tematizado, relaciona-se ao Controle Social no


CAPSij - assembleias, com temas que agregam reflexões, como no discurso descrito.

Em1_L63 a 69: “Assunto da assembleia, mas o assunto era... nessa reunião


era para falar sobre a estrutura mesmo do CAPS, quantos anos ele tinha
[...] grupo de pais, eles retomaram agora... fazia muito tempo que a gente não
tinha grupo de pais, pelo menos nesses dois anos que eu estou, eu nunca
participei de grupo de pais. Essa foi a segunda reunião. E o assunto da primeira
reunião, foi a desmedicalização na infância, e a segunda reunião foi sobre
a estrutura geral do CAPS.”

4.2.2 CATEGORIA II - “Cuidar de criança/adolescente com problema de saúde


mental”

A Categoria II foi organizada a partir de sete temas, que conformam também


subtemas, e ampliam o escopo da concepção de cuidado.

No primeiro tema, Descobrindo o Problema de Saúde Mental, foram


identificados discursos que conformam cinco subtemas correlacionados: Identificação
do problema de saúde; Descrição do Problema de Saúde Mental; A reação da mulher
e familiares; O problema de saúde mental e a sociedade; Carga e estresse no convívio
familiar. O segundo tema, “Os sentimentos”, foi informado pelos subtemas, cujos
discursos demonstram a Defesa da criança/adolescente e os Sentimentos frente a
criança/adolescente com problemas de saúde mental. O terceiro tema, “Enfrentando
a discriminação”, aponta uma interface com subtema, Estigma, discriminação pelo
RESULTADOS| 76

problema de saúde mental. No quarto tema, “Construindo Autonomia”, os discursos


apontam sobre preocupações com a Autonomia dos filhos. O quinto tema, “A família,
Rede Social”, foi informado pelos subtemas: Apoio Familiar; As amigas como apoio
afetivo; Apoio com limite; Participação do pai das crianças/adolescentes; Os homens,
masculinidade e machismo; Cuidado dos filhos sem apoio. No sexto tema, “A
Pandemia da COVID 19”, identificaram-se frases temáticas em subtemas,
Sustentabilidade da família e Dificuldades durante a pandemia. O último e sétimo tema
dessa categoria do cuidado, “O Futuro”, foi informado pelos subtemas, Desejos da
mãe; Receios da mãe; Os planos da mãe; A questão financeira; e A filha como
companheira.

No tema descobrindo o problema de Saúde Mental, foi possível encontrar


fragmentos de texto durante a identificação do Problema de Saúde, que indicam
momentos de dúvidas, angústia, exames realizados até que o possível diagnóstico ou
a hipótese diagnóstica ocorresse, pesquisando- se na internet.

Em1_L72 a 80: “Ele era pequenininho,[...] eu trabalhava [...] casada [...] tinha
convênio ele fez diversos exames [...] lembro do médico [...] ‘você vai fazer
todos os exames, se todos esses exames derem ok, que ele tá bem nos
exames, é porque ele é autista mesmo’. [...] Fizemos vários exames, ficamos
bastante tempo nessa de... se tinha, se não tinha, se tinha, se não tinha, e
aí... logo que eu peguei o diagnóstico, [...] consegui a vaga pra ele na AMA,
Associação dos Autistas.”

Em1_L126 a 135: “Na minha família todo mundo já tinha percebido [...] meu
irmão já tinha percebido... ele conhecia crianças com autismo na situação onde
ele morava, [...] ‘ o XXXX enfileirando... peraí, que vou tirar o óculos’,
enfileirando, fazendo aquelas coisas clássicas [...] de autismo, e eu não fazia
ideia, só um traço, [...] minha irmã viu também, ela é da área da saúde, ‘olha,
acho que está diferente’, aí, quando eu... magina... aí, quando eu peguei a lista
do diagnóstico, a lista de sintomas na internet, aí, me caiu... era autista, não
tinha como (choro).”

É pelo discurso que as mulheres, mães, revelam como descobriram o problema


de saúde mental, comparando o desenvolvimento dos filhos com outras crianças.

Em1_L98 a 104: “Quando eu vi um monte de criancinha do mesmo tamanho,


daí, a professora falava: ‘cada um pega uma bola’ [...] todas aquelas crianças
entendiam aquele comando, menos o meu, que tava ali muito aéreo, [...]
deve ter alguma coisa errada mesmo, porque são várias criancinhas, não
é porque o filho do vizinho que é diferente, não... são várias crianças, dá
pra fazer uma amostra ali de... né? Dá pra entender o quanto realmente tá
fora da curva.”
RESULTADOS| 77

Em5_L141 a 145: “[...] eu comecei a notar, a minha filha não falava e já


estava na hora, minha filha não andava, um ano e pouco, [...] eu via que
não era normal [...] eu tenho uma sobrinha, que é oito meses mais velha que
minha filha, e aí, eu tipo via a comparação [...] me lembrava das minhas
sobrinhas quando eram crianças e vendo minha filha também, eu fiquei…né,
tem alguma coisa diferente”.

Em5_L147 a 152: “[...] aí, apareceu uma menininha na idade dela, assim, as
duas pegaram uns pregadores, sentaram uma de costas pra outra e começou
a brincar, a gente ficou, ‘nossa’, com a família, ‘que engraçado’… ‘elas foram
brincar da mesma coisa, mas não juntas’ e aí, a vó dela e a mãe dessa
menina vieram conversar comigo, aí, ah, o que ela faz? Ela ama mexer na
terra... a XXXXX, ‘ah, a minha filha também’... ‘ela gosta de fazer isso’ … ‘ah,
minha filha é autista’... e eu [...] comecei a desconfiar, [...] eu e o pai dela
começamos a pesquisar e a ficar desconfiados, foi então, quando uma
psicóloga...”

Também, dentre essas frases temáticas, a descoberta do problema de saúde


mental produz angústia, estresse, carga mental, preocupações, dificuldades,
renúncias etc.

Em10_L15-16: “Porque no início é muito difícil, né? E aí você perde a


identidade.”

Em18_30 a 43: “Na época que ela nasceu, eu trabalhava em casa de família
[...] chegava tarde, ela já estava dormindo, foi crescendo, [...] falava, de repente
parou de falar, começou com essa agressividade, aí, eu via que ela pegava
alicate de unha, puxava a unha assim [...] ‘não tá doendo?’”

O discurso das mulheres demonstra o percurso de identificação do problema


de saúde mental, as desconfianças a respeito do diagnóstico.

Em1_L83 a 104: “Tinha acabado de se separar, [...] ele começou a desconfiar


que o XXXX [...] tinha um desenvolvimento autista, a gente estava separando,
[...] eu achava que esse desenvolvimento atípico era porque ele não tinha
irmãos e não tinha convívio com outras crianças, [...] achava que faltava essa
troca e [...] com um ano e meio, [...] quando a gente começou a desconfiar”

Em5_L165 e 166: "Fizeram uma reunião e mandaram vim aqui para o CAPS, e
aí, eu conheci o pessoal do CAPS…”

Em11_L21 a 23: “Comecei descobrir que ele tem esse probleminha, essa
agitação, toda, toda hora a escola ligava para mim, ‘ai, seu filho não está me
dando paz’, pulava portão, batia nas crianças.”

Em13_L207 a 209: “Sabendo que era um diagnóstico comprometedor, mas eu


falei: ‘não, ele vai falar, eu vou realmente incentivar ao máximo’ [...] eu estava
focada em resolver o problema [...] não me abalei com diagnóstico.”

Em17_L150-151: “Com… ela melhorou acho que depois do remédio… chorava


muito, batia, batia, quebrava as coisas, agora ela tá mais calma.”
RESULTADOS| 78

Em18_L164 a 169: “Ela tinha dois para três anos... e o diagnóstico dela
recebi com cinco anos, que ela começou a mudar… Ela começou a falar,
depois foi parando, bloqueio de falar, foi a creche que falou: ‘BBBB (diz seu
nome), XXXX é diferente’… Falei: ‘é diferente como?’ ‘Ela tem autismo,
leva ela no médico, sua filha tem um problema’, ela ficava lá no meio, não
brincava com as outras crianças, as crianças chegavam perto dela e ela batia.”

Os discursos conformam temas comuns, tais como, inferência de profissionais


corroborando a inexistência de problemas de saúde mental, que dificultam a detecção
precoce e atrasam o início da estimulação. Ainda que as mulheres notassem
alterações no comportamento, ou estranhamento das atitudes das crianças, médicos
(dentre esses, pediatras), fonoaudiólogos, professores, desestimulam investigações e
atrapalham a identificação do problema de saúde mental.

Em1_L89 a 94: “[...] Coloquei ele numa creche, ele me falava (o pai),
queria uma escolinha, aí, eu coloquei ele numa escolinha, [...] levei ele
na época do convênio [...] e a profe, ‘mãe, fica tranquila, ele só é
pequenininho ainda’... [...] falei: ‘ele não fala nada’, ‘mas ele tá
soltando ma ma mã... ele vai falar’, ‘mas ele não fala’ , ... ‘fica
tranquila… fica tranquila’, foi pior pra gente, porque a gente não
pode prevenir... coloquei ele numa escolinha, e aí, eu percebi a
gravidade do problema quando eu vi o grupo de pequenininhos,
porque eu não tive criança no meu convívio, quando criança, eu sou a
última criança, eu e minha irmã, o resto todos mais velhos, então, não
acompanhei desenvolvimento na época de criança, [...] ver meu filho,
pra mim ele tava no desenvolvimento... desenvolvimento errado.”

Em2_L130 a 133: “Se você olhar para ele, não parece que ele tem nada, [...]
se ficar alguns minutos, [...] ele começa com uns jogado de braço e agora
aumentou porque trocou um remédio, [...] o doutor disse [...] paciência, que
tem um "colateral.”

Em5_135 a 140: “[...] Ela tinha meses de nascença quando eu percebi,


comecei a estranhar por causa que ela não ficava com o corpo bem
durinho, ela ficava… com vários atrasos, e aí, tem aquela história ‘ah, não,
mas cada criança tem seu tempo’, e eu, ‘então… tá estranho isso’, aí, eu me
comuniquei com a pediatra dela, acho que a pediatra dela viu que tinha alguma
coisa errada e ‘ah, eu vou te encaminhar para um fisioterapeuta’ [...]”

Em10_L51 a 53: “Percebia que ele não acompanhou os marcos do


desenvolvimento, [...] o médico fala que ‘cada criança tem um tempo e que
você não pode comparar.’”

Em10_L64 a 66: “Tem um pouco despreparo, né? Do médico, dos médicos,


você fala o que acontecia, ‘ah, normal, vamos observar, vamos observar.’”

Em10_L66-67: “No fundo, eu já sabia que ele tinha um problema [...] tempo [...]
passando, e [...] avaliando, tratando e demorou para [...] diagnóstico, [...] não
deu o diagnóstico [...] de cara… demorou uns dois anos para ele falar, ‘eu
acho que é alguma coisa.’”
RESULTADOS| 79

Em13_L200 a 205: “Como eu já vinha acompanhando o atraso na fala, eu já


me preocupava um pouco com isso [...] Foi pequeno. Com dois anos ele não
falava frases [...] ia para fono. E aí, uma, uma outra fono, [...] ela falou que
todas as possibilidades de atraso na fala, uma delas era autismo.”

Em18_L35 a 37: “Ficava muito tempo assim parada brincando, parece que
paralisava, coisa de dois minutinhos, aí, foi frequente, então levei no
Mandaqui (Hospital Psiquiátrico): ‘Sua filha tem Autismo’. ‘O que é isso,
autismo?’ Aí, foi explicando, e corri pra cá [...] foi quando ela começou a
frequentar aqui. [...]

Na dificuldade de compreender o comportamento da criança, a mulher, a mãe


tem sua saúde mental abalada, como no relato a seguir.

Em18_L56 a 59: “Começou a frequentar aqui, eu só chorava, que no começo


eu só chorava, eu não conseguia ver nada nela, comecei a perceber quando
ela cresceu [...] Eu chorava, fumava e tomava café…”

A dificuldade de entender o problema de Saúde Mental, o comportamento da


criança, a mãe relata atendimento em hospital, que segundo ela, piorou o quadro de
sua filha, mas que naquele momento, não suspeitou de negligência da equipe.

Em18_L151 a 163: “Médica vinha toda hora com aquela coisa de sugar, aspirar
[...] uma outra veio, ‘ela é muito nova, você está toda hora na menina’, no que
ela fechou a boca, a crise da XXXX não parava, a equipe já pegou aquele
botijão de gás, já levou ela [...] depois de uma hora vieram me chamar,
entubaram essa menina, depois de 15 dias que tiraram [...] deu alta de um dia
para o outro, a XXXX chegava em casa assim {olha pra cima} [...] acho que a
XXXX não está reconhecendo a gente não, a menina totalmente vaga [...]
o médico explicou, [...] mexeu com o cérebro dela, aí... eu ia ter lá cabeça
de processar ninguém, né? Eu queria ver minha filha bem, né? Sei lá, você
larga a criança para o hospital e sai com um problema pior ainda.”

Os discursos das mulheres deflagram a descrição do Problema de Saúde


Mental, referem mudança da vida delas como pessoas, mulheres, bem como relatam
preocupações, ansiedade e estarem alertas para evitar crises, como nos excertos a
seguir.

Em1_L 207 a 217: “Estou bem emotiva em relação a isso [...] O problema não
é o diagnóstico, o diagnóstico é muito triste, saber de uma série de coisas que
o autismo roubou do meu filho, e que por mais que eu tente recuperar, a mãe
vira uma eterna terapeuta, eu aprendi uma série de coisas, eu fiz a minha
graduação é em Pedagogia para poder me especializar, eu fiz o estágio na
escola dele por dois anos, então[...], mãe não tem que ser terapeuta, mãe não
tem que ser profissional, mãe é mãe, mas eu sou profissional com meu filho,
em casa. Boa parte do que ele aprende, boa parte do que ele é, tudo isso é um
treino constante que eu faço com ele, que essa ... (oportunidade? inaudível),
RESULTADOS| 80

para que ele tenha uma vida com qualidade, no máximo que eu posso
oferecer.”

Em3_L286 a 287: “Eu agoniada, mas tava preocupada com o XXXX, dele
surtar a qualquer momento.”

Em3_L305 a 307: “Aí, só que ele lá embaixo ele colocou o fone no ouvido fica
escondido de todo mundo. Falei: ‘agora o ZZZZZ vai surtar.’”

Em3_L374 a 377: “Antes por causa do XXXX, para lidar melhor com a crise
dele, porque eu só chorava, é ver meu filho cortado e já me dava desespero,
vou perder meu filho, aí, chorava, chorava, né? E sofria muito de ver ele
sofrendo e não saber mais o que fazer para ajudá-lo.”

Em3_382 a 383: “Já chorei muito abraçada com meu filho nos meus
braços, já vi meu filho sangrando e meu marido até tirar, eu até limpar os
braços dele, ele passou no pescoço também, eu falo para ele que ele já é um
vitorioso desde a hora que ele nasceu, porque eu tive diabetes gestacional, né?
Eu me internei na Cachoeirinha até ele nascer com oito meses.”

Em3_443_444: “Vivemos tempos assim, no começo de ficar 30 dias com ele


na cozinha, sem dormir, vigiando ele.”

Em3_L464 a 469: Então, os 15 anos, a gente ficou ao lado dele a noite inteira,
que realmente ele cortou todo o braço mesmo, deu meia-noite eu falei
para o guardinha, eu estava conversando com ele, ‘meu filho tá fazendo 15
anos aqui na maca, meu Deus, por que isso?’ A noite inteira sem dormir, ele
acordou meio sonolento procurando assim, ‘mãe’… ‘a mãe tá aqui, pode
dormir que tô aqui.’ Sabe? Ali do lado dele o tempo todo.”

Em3_453 a 455: “Ele abaixava a cabeça ou quando ele começava a colocar no


último volume aquela música de depressão, alguma coisa a gente vai... tinha
que fazer com ele, tirou apontador do meu lápis de olho para se cortar”

Em3_L456-457: “Você ver sangue toda hora toda hora na cozinha, e correr
com ele.”

Em4_L108 a 110: (avó): “Como o XXXX ele foge de casa, do nada, uma porta
aberta, do nada ele vaza, começa a falar, dia e noite, é muito ruim, a gente
não sabe o que faz.”

Em5_L57/58: “Eu já não sei diferenciar o que que é uma crise, o que é
manha, você tem uma criança manhosa, a parte mais automática é você
repreender.”

Em5_L59 a 61: “Uma criança autista, você está reprimindo, e parece que
ela tem um bloqueio, que ela não entende que você tá repreendendo.”

As frases temáticas retratam discursos das mulheres, acerca de situações que


enfrentam no cotidiano do cuidado dos filhos.

Em4_L24 a 26: “Porque não é fácil cuidar dele, porque ele é um pouco violento,
ele já está grande, ele quer ir para a rua, e é muito difícil.”
RESULTADOS| 81

Em4_L50 a 52: (mãe) “Eu vou para cima também, eu não vou deixar acabar
com todas nós. Eu não vou deixar. Mas ele está mais forte que a gente. Até
engordei. Ó lá... toda machucada.”

Em4_L54 a 60: (mãe) “Na sexta quando eu saí daqui mesmo, ele já me agrediu,
olha aqui a cicatriz, e foi para cima dela. Aí, os vizinhos já no portão, porque eu
fui para cima dele, falou que vai chamar o conselho, falou que não pode bater,
então, ele pode bater na gente, e a gente não pode bater… e se a polícia vai
vim, vai prender nós, aí, a gente evita bater, eu não vou deixar, quando chega,
aí, eu não deixo [...] A gente não quer bater, mas ele pouco… ele pega eu…
fica muito agitado.”

Em4_L64-65: (avó) “Coisa de óbito, parece que ele não entende a gente mais,
não é fácil, está muito difícil, me atira até faca, deixa a gente até sem força.”

Em4_L61 a 63: (avó) “Ele está andando dentro de lugar que ele não pode… ele
está andando dentro das ‘boca’, eu já fui intimada com os PCC de lá, entendeu?
Ele não para, é preciso mudar, o pessoal já veio conversar comigo.”

Em18_L70 a 78: “Eu tô com medo, eu tenho medo, [...] ela tá crescendo [...] eu
vim pedir para o médico se não passa algum remédio para tomar de dia, porque
ela começa a agredir a gente, grita, os morador vem, ‘que tá acontecendo com
a XXXX?’ Ela fica assim, batendo nela mesma, daqui a pouco dá aquela crise
de choro nela, aí, passa [...] Só dentro de casa, não dá pra sair com ela, que
nem agora pra tirar ela do carro aqui, do carro que foi buscar, foi muito difícil
para tirar ela de dentro do carro.”

Em18_L81 a 87: “O córrego é de ponta a ponta na [...] que eu moro, não tem
como sair com ela, às vezes, ela corre [...] tem que ficar pedindo, gritando para
os outros pegar, para segurar, se vai sair com ela na viela, você tem que ficar
de frente dela rodeando, [...] uma vez, ela deu um tapa em um senhor, o senhor
passou mal [...] tinha problema de pressão alta, [...] ela tem muita força, um
tapa dela dói muito.”

Os discursos das mulheres a seguir, abordam sobre os cuidados em situações


de crise dos filhos, descrevendo os acontecimentos e situações enfrentadas por elas,
dúvidas e ações de enfrentamento dos problemas.

Em3_L264-265: “Até agora, a gente guarda a faca, pega na hora de fazer


alguma coisa, né?”

Em3_L437 a 443: “De largar compra no supermercado tá com meu marido


assim, minha filha, que nós estava se rastreando por assim, manda rapidinho
um áudio, vem embora que o XXXXX tá esquisito… da gente largar o carrinho
cheio de compras e o pessoal nem entender o que estava acontecendo, a gente
chegar em casa, coisa de intervalo, ele começou a esmurrar os negócios e
tem que agarrar, tá surtando.”

Em4_L88-89: (mãe) “Nada ele gosta, nada ele quer, ele só gosta... só quer
fazer o que ele quer, e aí, a gente não pode deixar, fazer o que ele quer… e
logo ele surta.”

Em5_L61/62: “Então, você acaba tipo... eu devo orientá-la? Mas eu não sei
RESULTADOS| 82

se ela tá se orientando.”

Em5_L62/63: “A questão também do… estresse, das crises, a crise da minha


filha, não sei se é de todos, então, é só ao dormir.”

Em5_L63 a 65: “Eu li uma vez que os autistas, então, que é o caso dela, eles
se estressam e quando eles vão se deitar, eles têm … todo aquele movimento
que é agitado durante a noite.”

Em5_L65/66: “Ela tem uma noite muito chata, então, ela grita, ela chora, ela
fala, ela quer andar, pular na minha cama, mesmo deixando tudo no escuro
[...]”

Em5_L68 a 71: “E muitas das vezes, eu estou... sentada, conversando, ela


entra numa crise, e ela chora, e às vezes eu tento acalmar, mas eu não
consigo, então, isso…”

Em5_L72: “Sobre a questão do regredir, tem uma questão é... da decepção


mesmo.”

Em9_L33 a 35: “O XXXX ele é assim, ele é calmo, não vou falar que ele é uma
criança agitada, nervosa… ele já foi muito agitado.”

Em9_L35 a 38: “O XXXX quando entrou aqui era uma criança complicada, não
dava para sair com ele nem para o supermercado, ele queria quebrar tudo, hoje
não, hoje o XXXX tá mais calmo, às vezes ele fica o dia todo... mãe,
mãe...mãe, mãe…ele fica e me enerva.”

Em10_54 a 58: “Quando ele começou a andar, [...] fez um ano e meio [...]
mudou da água para o vinho [...] desconheci meu filho [...] nesse momento foi
difícil [...] você não sabe o que tem, [...] não dormia, só chorava, só gritava,
batia, se batia o tempo inteiro, no começo foi muito difícil [...] passado pelo
médico [...] neurologista.”

Em10_60 a 64: “Foi quando ele começou a ficar muito agitado, que eu vi que
tinha alguma coisa estranha, né?… passou a não dormir à noite, uma criança
que dormia desde recém-nascido a noite inteira, passou a não dormir à noite,
ele passou a não querer estar com as pessoas e não gostava de ser tocado, e
eu falei: ‘não, tem alguma coisa errada.’”

Em10_L141 a 143: “Ele não ficava com ninguém, e eu, eu que sou a mãe,
eu perdia a paciência com ele, né? Ficava imaginando outra pessoa
cuidando dele.”

Em14_L6 a 9: “Ele era muito nervoso … sabe? Não tomava a medicação, e


aí … eu não conseguia conter ele, e aí, eu comecei a me isolar, ele chorava
muito, muito, muito, não ficava em canto nenhum, gritava muito.,. nossa, aí, eu
me isolei... um tempo,”

Em17_L22-23: “Eu termino xingando ela, batendo {ela chora muito}, quero
que ela faça as coisas, mas ela não faz nada, entende?”

Em18_L1 a 4: “Ela não deixa cortar unha em casa [...] cortar unha, cabelo,
queria ver se ela vinha para cá, [...] está começando a ter crise, [...] deu para
quebrar os vidros dentro de casa, vou ter que mandar quebrar tudo os
RESULTADOS| 83

vidros de dentro de casa antes que ela se corte.”

Em18_L43-44: “Que nem lá em casa, fazendo comida, ela põe a mão nas
panelas, põe no fogão.”

Em18_L45 a 47: “Porque antes, ela tomava banho, agora para pôr no
banheiro, tem que empurrar, ligar o chuveiro, enfiar com roupa e tudo, e
ir tirando a roupa dela… e lá em casa é só eu, ela e minha filha de 22 anos.”

Em18_L136 a 139: “Ela toma três risperidonas para dormir, que é para o
autismo [...] para dar, tem que fazer o Tang normal [...] aí, eu ponho os três
remédios, amasso e dou pra ela tomar.”

Outro subtema que emergiu na tematização, foi a reação da mulher e


familiares, o qual demonstrou que essas mulheres precisam lidar com a reação dos
familiares, sem apoio para si mesmas e filhos. Nos discursos as mulheres relataram
terem sido chamadas de “louca”, estarem “mentindo”, “inventando” o diagnóstico.

Em1_L104 a 110: “A família dele, do pai, a gente travou uma guerra, eles
falavam que eu estava louca, inventei doença, [...] o pai dele chegou a me
ameaçar logo, que ia tirar meu filho [...] porque eu tava inventando, ‘isso não
existe.’ A falta de informação! [...] lembro que uma vez que o avô falou para
mim: [...] ‘você tá inventando isso pra ele, se ele tivesse isso que você está
falando, dava pra ver na cara’. Confundindo com Síndrome de Down.”

Em1 L111_112: “Eu tive que travar uma briga e foi tão desgastante, não
cheguei a viver o luto do filho perfeito, acho que estou vivendo isso hoje.”

Em1_L117 a 126: “Foi assim, extremamente pesado, [...] o diagnóstico já é


difícil receber, receber o diagnóstico e ainda ter que brigar com a própria família
[...]. Eles diziam pra mim ‘você está louca, isso não existe’... a tia [...] mulher
super estudada, doutora e tudo mais, ela pegou e virou pra mim [...] ‘fica
tranquila, ele tem TDAH, ele tem TDAH só [...] é só déficit de atenção, fica
tranquila” [...] na época, eu sem nenhum tipo de conhecimento, [...] tive que
falar para ela ‘desculpa, mas TDAH a gente não descobre lá na época de
alfabetização?”

Em5_156 a 163: “Foi tipo... o que que é autismo? [...] caraca, o que que vai ser,
o que minha filha vai ser tipo… como? E aí? [...] minha família também teve um
choque [...] minha irmã mais velha como muito claro, é quase uma mãe pra
mim, ela, daí, falou, era de se desconfiar, né? E aí, a gente já estava meio que
se acostumando por falta, dos atrasos dela, mas foi difícil, ainda mais quando
vem uma profissional, olhar para teus olhos e falar, olha, ao que me parece é
um espectro autista, aí, você fica tipo... eu não sabia nem o que falar, eu saí do
posto quieta e o pai dela, tipo… ‘e aí? Você não vai falar nada?’ e eu não sei o
que que eu falo! foi bem...”

Em5_242 a 244: “Eu não vou falar pra você, há um preconceito, na minha casa
todo mundo fala assim, ah… aqui, não sei o que… ah… não, não há um
preconceito na minha casa, também não há na família dele, do pai dela, mas...
é diferente, as crianças ser… como dizer, ah... típicas outras são as atípicas e
tal e aí você é uma criança diferente, eu não me sinto assim tão abraçada
RESULTADOS| 84

quanto me sinto no CAPS.”

Em6_L45-49: “Pra mim assim, ele tem esse problema dele, mas eu não vejo
problema nele, nem em mim [...] tem pessoas que não tem braços, nem pernas,
não enxergam queriam estar no lugar dele, no meu, então não tenho problema,
sou feliz, durmo feliz, acordo feliz, sou feliz o dia todo, eu sou assim [...] não
tenho problema nenhum.”

Em6_L95: “Tem dificuldades, sim, mas eu consigo levar uma vida normal.”

Em6_97-98: “Não tô nem aí, nem um pouquinho mesmo, não é fingimento, não
é nada, continuo no salto.”

Em6_114-115: “Eu acho que eu tenho que estar melhor do que ele, pra poder
passar o que eu tenho de melhor.”

Em6_117-118: “Então vou fazer o que posso, vou dá o meu melhor pra eles.”

Em11_L20-21: “Todo mundo jogando na minha cara essas coisas.”

Em13_L202-203: “Falava muito pouco e eu já tinha me preocupado.”

Em13_L206: “Eu não estava focada no problema. Eu estava focada na


solução.”

Em13_L209-210: “Porque eu não achava que seria assim ‘ah, não ele não vai
falar.’”

Em13_229-230: “Por isso que eu fiz rotina de alimentação, cuidado...”

Os fragmentos de textos apresentam o problema de Saúde Mental e a


Sociedade, abordando temas como estigma e inclusão.

Em5_174 a 181: “É. Dá um… eu me identifico, é eu me identifico, [...] é normal,


vamos dizer, assim, é normal [...] não vou falar também que, lá fora, é tudo
um absurdo, porque toda vez que eu falo sobre isso, da XXXXX, [...] que ela
tem autismo, as pessoas dizem… ‘ah tá, tem uma criança aqui que eu
conheço, eu tenho uma amiga, eu tenho um sobrinho’, todo mundo já
começa a se identificar, sabe? Já não… ela já não é mais aquela* (que pode
ser identificada como louca?*)… pelo menos, eu vejo assim, no ano de 2020,
2019, quando eu falo... ninguém virou pra mim, olha e ‘aaah (susto), meu Deus
ela é…’ mas, ‘ah tá, legal.’”

Em6_L116-117: “Ensinar ele a conviver na sociedade.”

Em8_L25 a 30: “Porque a sociedade não sabe lidar com isso. As pessoas
dizem que você não dá educação. Eles acham que é birra. A sociedade acha
que é birra, que não tem educação. E não é bem assim, o que é birra, o que é
autismo, entendeu? [...] ela dá risada, você é que tem que saber lidar com a
sociedade, muitas mães aqui no CAPS, elas não conseguem lidar com eles.”

Em8_L31 a 35: “Eles não podem fazer o que eles querem, e nem a sociedade
quer, você tem que aprender a lidar com os dois, com eles e com a sociedade,
a sociedade não quer dar espaço pra eles, mas eles também não seguem a
RESULTADOS| 85

sociedade, a ignorância, entendeu? Já chegou um homem e uma mulher,


que eu tinha que tirar ela do banco, porque ela estava chorando.”

Em18_L82 a 87: “Quando ela mais nova quando vinha pro CAPS, fazia as
danação dela dentro do ônibus, acho que a teimosia, ‘ah... moço desculpa…’
Remédio da minha filha, os pais brincando com os filhos na praça… sangue…
não fica assim no meio da rua não, se tiver assim no meio da rua, eu te
arrebento. [...] ele também nunca viu uma pessoa com autismo?”

As frases temáticas a seguir, apresentam a carga (física, psíquica, relacional)


e estresse no convívio familiar, que diminui o tempo das mulheres para o cuidado
de si mesmas, organizando-se para isso na rotina dos filhos, referindo limitações e
sem aporte financeiro adequado.

Em1_L21 a 24: “Corro pra lá, tem que sempre encaixar dentro da rotina, não
tem como fazer em qualquer lugar [...] Só encaixando com a rotina. [o tempo
todo? então, é primeiro ele e depois você?] O tempo todo. Sempre. Só o que
dá, sobra do tempo, de acordo com rotina dele.”

Em1_L523 a 525: “Minimamente, sabe? Eu consegui ano passado levar meu


filho, juntando dinheiro com uma amiga, essa minha amiga que é psicóloga
e me ajuda, eu peço muito suporte para ela, então, por meses para passar
dois dias na Praia Grande.”

Em3_L451-452: “Quando eu via que ele punha o pé para levantar, eu


também levantava.”

Em3_L448-449: “Aí, eu não aguentava ficar lá, meu marido... ‘quer trocar?’
eu, ‘não, você tem que trabalhar de manhã’, aí, 30 dias assim.”

Em3_L262 a 264: “Todo dia o peso do cacete com menino fazendo no


intervalo de segundos, você virar as costas e esse moleque se cortava.”

Em3_L274-275: “Tinha que ter sempre alguém para mim tomar banho,
minha menina ou ele para alguém tá vigiando o menino.”

Em3_L430 a 432: “O XXXX começou a ficar com depressão, aí, eu fiquei...


gente, ‘eu vou estar lá e quando chegar aqui meu filho vai tá morto.’”

Em3_L449 a 461: “Quando eu via que ele punha o pé para levantar eu também
levantava [...] ligada no telefone, o pai dele ligava, e aí, XXXX? Tá aqui no
computador, ele abaixava a cabeça… ou quando ele começava a colocar no
último volume aquela música de depressão, alguma coisa a gente [...] que fazer
com ele… que tirou apontador do meu lápis de olho para se cortar [...] tudo [...]
uma tortura aquilo ficou na minha mente [...] você ver sangue toda hora toda
hora na cozinha, e correr com ele [...] ele falou: “quando eu fizer 15 anos
eu vou morrer, vou me matar.”.

Em3_L465 a 468: “Minha filha tinha ido viajar com a minha sogra, passou o
Natal comigo, mas no Ano (Novo) viajaram, a gente poderia ter ido não
fomos, ficou eu e o pai dele sentados no quintal, coisando um churrasco,
aí... XXXX vem comer com o pai! ‘Não quero’ [...]”
RESULTADOS| 86

Em4_L98 a 101: (avó) “Assim, também, ela, a YYYY (Mãe), ela também tem
problema, então, ela não tem muita paciência, então, assim, eu tenho que
cuidar dele, tenho que cuidar dela... tenho que cuidar da filha, então fica
tudo para mim, eu fico sozinha, na verdade é tudo mais eu.”

Em4_L102 a 108: (avó) “Eu me cuido por último porque… eu cuido de mim,
mas o que eu cuido de mim não está dando conta… não está dando conta
dos cuidados. Porque para eu ter um bom cuidado, eu tinha que ter um bom
assim, ficar de boa, ficar sem ficar essa pressão… hoje já passou, graças a
deus tá tudo bem, aí, eu fico e amanhã? Como vai ser o dia? [...] Sempre
preocupada. Eu já deito preocupada naquilo, já deito preocupada naquilo.”

Em4_L111 a 115: (avó) “Já conhecem, ela tem XX anos, eu comecei a cuidar
dela... ela tinha dez anos, está entendendo? Criei ela, criei a irmã dela, criei
a filha, agora estou com o filho… E de todos eles deu trabalho, mas todos,
mais é ele, porque ele se informa muito rápido das coisas.”

Em4_L147 a 1521: (avó) “Lá no começo, que ela (a mãe) me dava muito
trabalho, eu fiz um tratamento de psicólogo, inclusive eu descobri o problema
dela, porque a gente brigava muito, eu e elas, por causa das coisas que elas
faziam e eu não gostava, e eu trabalhava, não tinha tempo de cuidar direito e
eu queria saber, por que que elas eram assim? Eu explicava uma coisa, elas
faziam outra. Aí, eu tive que passar no psicólogo.”

Em5_51 a 53: “Em geral? É bem estressante, muito complicado, porque, ah,
tipo, [...] nós, mães, temos aquela coisa, tem que saber o que você fazer,
porque é seu filho e eu não sei o que fazer”.

Em5_55 a 57: “[...] sobre ter alguém pra ficar com ela, isso muda bastante, mas
ter uma criança com... uma neuro típica é complicado, muito difícil, muito
estressante, assim, você não sabe o que fazer.”

Em5_66 a 69: “Ela tem uma noite muito chata, então, ela grita, ela chora, ela
fala, ela quer andar, pular na minha cama, mesmo deixando tudo no escuro,
isso acaba me atrapalhando quando a gente vai dormir, isso acaba
atrapalhando quem quer dormir, porque moro no mesmo quintal com minha
família.”

Em9_L31-32: “Quando ele dorme à noite eu descanso… fica todo dia… ‘mãe,
mãe, mãe’... é complicado.”

4.2.2.1 Tema: Os sentimentos

Os sentimentos relacionados ao cuidado dos filhos aparecem nas narrativas


das mulheres, compreendidos em subtemas que permeiam o processo de
tematização, tais como a Defesa da criança/adolescente e Sentimentos frente a
criança/adolescente com problemas de saúde mental.

Os discursos depreendidos das falas das mulheres apontam a defesa da


criança/adolescente em momentos e locais diversos, como modo de protegê-los,
RESULTADOS| 87

acolhendo singularidades e problemas diante das crises, traduzindo necessidades das


crianças/adolescentes.

Em3_L17 a 19: “Ele mesmo falou que mexeu em alguma coisa computador
parou de novo e que ele é um lixo que ele só faz merda, e começa querer voltar
aquelas conversas que ele falava sempre, até falei para ele: ‘você não é isso,
acidente acontece, todo mundo erra.’”

Em4_L90 a 93: (mãe) “Muito ruim. Muito ruim porque a primeira vez que
levaram ele, a SAMU, eu estou doente desde esse dia, elas me ajudaram,
dor no peito, na cabeça, e eu fico pensando naquele dia que eu vi levando
ele, o que será de mim, sem ele?”

Em4_L186-187: “É meu filho né. É difícil. [...] Não é porque ele quer, né?”

Em5_53 a 54: “E, sobre eu cuidar da saúde, assim, eu não vou dizer que
minha filha me atrapalhou muito, isso seria mentira, porque eu lembro que
eu cheguei a me cuidar, cheguei a fazer Papanicolau, essas coisas, e mesmo
com ela nascida [...]”

Em7_L3 a 6: “O XXXX é assim... chegou em uma época que ele não é aquele
menino agressivo. Ele é um menino que não dá muito trabalho. Ele é uma
pessoa simples, uma pessoa calma, sabe? Só na hora que precisa dar o
remedinho dele que, se está tudo controlado ele fica calmo.”

Em7_L110 a 113: “Mas é o que eu falo, o XXXX nunca foi um pesadelo na


minha vida. Ele é a mesma coisa dos meus outros filhos, ele só quer um
pouco mais de atenção, né? É mais atencioso... a gente tem que dar um
pouco mais de atenção para ele, né?”

Em9_79 a 83: “O XXXX, eu acredito que lá pelos 14, ele vai estar bem
melhor. É porque o XXXX corresponde, eu trabalho a mente do XXXX um
pouco. Comprei o jogo da memória para jogar com ele, e ele tá… (inaudível)
eu comprei giz para ele riscar o chão… fazer educação física, eu acho que o
XXXX até tá indo! agora a psicóloga e a fono, estão paradas.”

Em9_L88 a 98: “É que às vezes eu acho que as mães são tão complicadas.
Uma vez eu falei: ‘aqui... eu não trato o XXXX como um autista.’ Eu não…
não vou poupar ele, ah, ele é autista e eu vou ter que poupar ele… não. Eu
trato ele como todo mundo [...] se precisar ele levar uma bronca, ele leva,
se precisar castigo ele fica de castigo. Eu não vou poupar ele. Eu lavo a
louça, ele seca. (inaudível)... se tratar como um autista, ele vai ficar
incapacitado [...] quando estão tratando como autista, estão
incapacitando de fazer as coisas, eu falo para as minhas irmãs, olha... ele é
autista, mas ele não é deficiente. Capazes eles são. E ele faz tudo muito bem.”

Em10_L53-54: “Ele era extremamente pacífico, gente.”

Em10_107 a 109: “Eu fiquei brava. Eu fiquei brava, porque é um direito, é válido
para todos, independente… você tem que tá preparada. E aí, eu falei: ‘não,
ele vai ficar, vocês têm que estar preparados para isso’. E aí, o bati pé {na
Escola}”
RESULTADOS| 88

Em10_L110-111: “Ele é de boa, ele é tranquilo, agora ele se comunica.”

Em6_L61: “Tenho dois filhos, né? Especial...”

Em14_L10-11: “É até os seis…[...] e não é só devido ao transtorno, por mais


que ele tenha um transtorno, ele entende algumas coisas.”

Em17_L140: “Hoje está melhor do que quando tinha 3 anos, né?”

Em17_L147 a 149: “Ela tá melhor agora do que antes, entende?”

Em18_99 a 101: “Como que eu vou fazer isso com a XXXX? Eu não me
imagino sem a XXXX, um minuto! Só na morte.”

As frases temáticas a seguir abordam sentimentos frente a


criança/adolescente com problemas de saúde mental, dentre esses, as
participantes conseguem expressar emoções, tais como como decepção, sentirem-se
perturbadas, no entanto, reiterando a importância do filho/a, felicidades de pequenos
momentos, vontade de estar junto, e uma modulação do humor reativo, como se irritar
com o choro. Os discursos demonstram a mistura de sentimentos, que ora atormenta
as mães, pela negatividade e incertezas do futuro dos filhos/as, ora balizam a relação
pelo amor incondicional.

Em5_72 a 76: “Eu não vou mentir, há uma decepção, porque você vê outras
crianças, e nossa e minha filha não vai... não chegou nisso, por outro lado, de
todas as decepções que eu tive, as pequenas vitórias já me deixam felizes,
então, ah... ela fez uma coisinha, e tudo bem… (inaudível), ela fez... então isso
me deixa feliz, então, esses seriam os meus sentimentos e acho que é isso [...]”

Em17_L140 a 141: “Quando ela tinha três anos era pior. Eu estava a ponto de
enlouquecer, eu trabalhava, quando ela era pequena, quando ela era
menorzinha eu trabalhava … eu saia chorando para não ter que ir para casa,
aí… minha patroa falava: ‘como assim? A gente quer ir para casa!’ Eu não
aguento mais, não quero mais. Eu não tinha prazer.”

Em17_L148 a 149: “Em termos de perturbar a mente da gente… ela continua


com a perturbação, mas como ela tá maior, e parou com o choro, me deixa
menos irritada.”

4.2.2.2 Tema: Enfrentando a discriminação

Neste caso, a discriminação pelo problema de saúde mental, que desvela o


estigma socialmente construído, desde a invenção de um lugar de reclusão, de “isolar
para tratar” no mito pineliano, ao medo produzido pela ideia de periculosidade do
“louco”.
RESULTADOS| 89

Os fragmentos de texto apresentados abordam modos de lidar com o Estigma,


discriminação pelo problema de saúde mental, e por consequência, com a
discriminação da pessoa com problema de saúde mental.

Em3_L379-380: “Tenho medo ainda das ações dele, do que se passa dentro
da cabeça dele.”

Em6_27-30: “Eu sou bem tratada, eu e meus filhos, porque eu acho assim, a
pessoa pobre não precisa entrar no lugar malvestido, né? Então, procuro
sempre vestir bem ele, meus filhos, eu ando bem-vestida, meus filhos e
as pessoas estando assim, as pessoas tratam bem, muito bem, pelo
menos no meu caso.”

Outro fragmento aponta a discriminação percebida pelas mulheres, mais em


relação ao problema de saúde mental do que fatores como o racismo.

Em6_L35: “Por racismo não, só devido o problema que ele tem autismo.”

Em7_L114 a 117: “Não. Jamais. É... sempre tem um, né? Sempre tem um
que às vezes fala umas besteiras, mas a gente escuta por aqui e sai lá.
Então a gente esquece. Mas o XXXX nunca foi uma pessoa que veio da
tristeza não. Ele sempre deu alegria, é joia rara da gente.”

Em6_L35-36:“As pessoas olham diferente” [...]“uns sabem que ele tem.”

Em6_L41-42: “Então, eu vejo que as pessoas têm preconceito, claro está


não adianta falar que não.”

Em6_L39a 41: “As mães ficam um pouquinho chateadas, mas a vida


continua e bola pra frente, eu não sinto nada, eu não abaixo a cabeça, me
sinto normal, porque pra mim ele é uma criança normal. Todo mundo para
mim é normal.”

Em6_L42 a 44: “Eles não vão me ajudar em nada, eu olhando que está com
preconceito do autismo eu não ligo, não ligo mesmo, não é fingimento, eu
não ligo de verdade.”

Em7_L121-122: “São dois filhos, dois morenos e dois brancos. O que faleceu
era a minha cor e ele já puxou o pai, mais branquinho, igual a outra menina.”

Em11_L152 a 155: “Xingou, falou assim... que eu era uma desocupada, que eu
não tinha o que fazer, ficar andando com uma criança daquele jeito, eu tinha
que ficar cuidando dele dentro de casa, falei: ‘mas eu precisava sair, foi um dia
que eu vim para cá {CAPS}.”

A partir das frases temáticas, pode-se dizer que um local onde a discriminação
ocorre, está relacionada a ambientes escolares.

Em6_L36 a 38: “Fisicamente são pessoas normais, só quando fica um


RESULTADOS| 90

pouquinho perto é que as pessoas percebem, já olham de cara feia, na escola,


professor...”

Em14_L11 a 19: “Quando ele estava na EMEI, ele sofria bullying, e ele entendia
isso. Então, ele se tornou agressivo, e tentava, sabe… agredir, e chorava na
sala, e era bullying, e tinha o estrabismo no olho dele, e ele tinha muito bullying
na sala, e aí, ele descontava nele mesmo, ele se autoagredia, ele gritava muito
[...] olho dele é mais alinhado, era bem tortinho, quando ele sofria bullying,
sabe, era dele se estressar ou me bater, descontava nele mesmo, ele se
autoagredia dentro da sala, ele fazia, ficava muito nervoso, gritava muito,
chorava muito.”

Em14_L21-22: “Era por isso, até hoje, se ele se exclui, ele desconta nele
mesmo, ele não sabe se controlar as emoções dele.”

Em18_L18 a 23: “O e-mail mandava buscar às 7 h, 7h30 mandava buscar ela,


porque uma vez eu fui buscar ela ela tava com a marca no braço, eu não vou
mentir, eu tirei ela para não agredir a mulher que cuidava dela e, às vezes,
chegava com ela… ela já sabia... que ela tinha problema a professora. Passou
por mim e via que ela fingia que não via.”

4.2.2.3 Tema: Construindo autonomia

Neste tema, os discursos conformam um subtema, que remetem à Autonomia


dos filhos. Os fragmentos de texto sobre Autonomia dos filhos, são descritos como
difíceis de ocorrerem.

Em1_494 a 496: “Relacionamento como? Namoro? Não. Queria poder


acreditar nisso, seria lindo saber que ele teria condições de viver isso.”

Em6_L77-78: “Eu não vejo isso, mas um dia pode acontecer. Mas não vejo,
né? Não sei porque ”

4.2.2.4 Tema: A família, rede social

Outro tema identificado nos discursos, abordam seis subtemas, tais como: o
Apoio familiar; as amigas como apoio afetivo, apoio com limite; participação do pai das
crianças/adolescentes; os homens, a masculinidade e o machismo; cuidado dos filhos
sem apoio.

Os discursos apontam o subtema apoio familiar, por proximidade de moradia


com os demais familiares, e contar com outras mulheres com filhos na família é algo
que parece fazer diferença.

Em5_220 a 223: “Sim, são um quintal de três casas, com meu quatro, é…
RESULTADOS| 91

meu pai e o cantinho dele, ele tá solteiro, eu e as duas, e o pai delas que a
gente acabou se divorciando, ah, separou, mais… e a minha irmã mais velha
com os três filhos dela e o noivo dela, e minha irmã do meio com as duas filhas
dela, só os três”.

Em4_L35-36: (avó) “Estou conseguindo lá, perto dela, para a gente


trabalhar junto, e cuidar junto. Lá uma dá força para a outra.”

Em5_L228 a 232: “Tipo, ah, ele… ah, a minha filha é autista, ele, sei lá… sem
aquele preconceito de opinião, não. Assim como ele abraçou bastante a
causa, ele cuida bem dela, ele tem, tipo, ah, não, ela está estressada é por
causa disso, ‘ah, fala para o pai o que você quer’, entendeu? Um pouco ele
abraça mais, tanto que… quando minha filha mais nova vai pra cima dela,
ele defende ela, porque sabe que…”

Em14_L69: “A minha mãe, o pai dele não liga, não... o pai dele tem dois filhos
autistas.”

Em10_L167 a 169: “É que minha irmã trabalha, né? Mas nos finais de
semana, ela... se precisar, ela fica com ele, mamãe também, consigo
contar com eles sim.”

Em14_L214 a 216: “Deveria ter um tipo de apoio especialmente para a mãe


solo, é muito difícil sabe… devia existir um lugar que pudesse ficar com ele,
ajudar, a gente pudesse fazer uma consulta médica.”

Outros fragmentos de discurso das mulheres apontam as amigas como apoio


afetivo, ou seja, pontos de fortalecimento e resistência.

Em1_L226 a 232: “Conheci muitas meninas, num grupo de internet, tudo


pela internet, minha vida, se eu quiser ter uma vida social é pela internet.
[...] conheci muitas amigas, pela internet[...], gente virou um grupo de vida
mesmo, de amigas mesmo, de realidades totalmente diferentes [...], mães
também, [...] cada uma de um bairro, de outra cidade, tem duas que são de
outras cidades, e que habitualmente a gente se encontra, [...] elas vão lá
em casa, e é o que mantém minha saúde mental.”

Em1_L234: “Pela internet, no grupo, aleatório [...], a gente conseguiu virar


amigas de vida, faz já cinco anos.”

Em9_30-31: “Às vezes, eu converso com alguma colega, mas não dá nem
tempo, nem sempre dá… porque o XXXX me ocupa! 24 horas!”

Em10_157 a 159: “Amigas, eu falo assim, graças a Deus, que eu tenho


amigas de verdade, porque elas também me ajudaram muito, elas me
levavam, passava em casa, você tá fazendo o quê? Se arruma, vamos sair.
Ia todo mundo junto.”

Em10_L160-161: “Ah, amiga, dorme aqui em casa. Vamos, vamos não sei
aonde, as minhas amigas ajudaram bastante.”

Em10_L164 a 166: “Eu tenho mais intimidade com as minhas amigas do


que com minha irmã, mais do que uma amizade, né? Muitos anos, né? Desde
RESULTADOS| 92

a escola.”

No cuidado dos filhos, os discursos conformaram o subtema relativo ao apoio


com limite, que essas mulheres recebem de familiares e outros componentes da rede
social.

Em1_L239-249: “De 15 em 15 dias, o XXXX vai para a casa da madrinha,


porque o pai não pega [...] A madrinha é uma santa [...] É irmã dele, a madrinha
dele, do meu filho... e... fez esse papel de pai, de 15 em 15 dias pega o menino,
leva pra passear e tudo mais. [...] E aí... meio que pegou o XXXX, como se
fosse filho dela, sabe? O XXXX é prioridade pra ela, nisso eu não posso
reclamar.”

Em5_235 a 237: “Então, assim, tipo assim, falta de pessoas não tem, posso
não ter uma pessoa ali, ah vou trabalhar, vou arrumar um emprego, ficar com
minha filha, talvez não tenha, mas sempre tem pessoas ao redor, nunca estou
sozinha.”

Em6_L54-55: “Quando estão de folga eles ajudam, assim de vez em quando


levam ele pra passear um pouquinho, eu saio com ele e tenho uma vida
normal.”

Em14_L217 a 219: “Porque assim, a minha mãe me ajuda, ajuda! Só que


assim, às vezes, ela não tem paciência, eu chego lá e ela está brigando…
falando, não sei o que… ele quer sempre ir embora logo, então, não... não tem.”

Em14_222 a 232: “Sim. Médico… Eu já faltei várias vezes médico, médico meu,
dentista, por causa dele. Ah, ela {a mãe} ia sair, não tinha ninguém… e não
tinha como levar ele junto, não dá… aí, eu tinha que… faculdade eu já faltei.
Várias vezes, não tinha quem olhasse, eu tinha que faltar… ou tinha que sair
mais cedo, tinha que falar com a professora para sair mais cedo, para ir embora
logo com ele, muitas vezes ter que ir com ele de aplicativo, porque o ônibus
demora… e não é barato, e aí, depois das 4h é mais caro… aí, eu ainda sou
obrigada a tirar de onde não tem, a parcelar mil vezes no cartão, para poder
manter… comprar um pouco, não tem outro jeito, tem coisa que eu compro, só
que seja parcelado em um monte de vezes, para poder fazer mais coisas, não
dá. Senão não consigo, não consigo.”

Outro subtema que emerge dos discursos, trata sobre a participação do pai
das crianças/adolescentes, exemplo de contradição, quando as mulheres mantêm
relação de respeito com ex-cônjuges, mas esses não desenvolvem seu papel junto
aos filhos.

Em1_L227 a 229: “Uns anos atrás, me enlacei muito com a família, eu tinha um
relacionamento muito maduro, muito... nós somos amigos até hoje”

Em1_L526 a 530: “Ele só vai para Minas com a família, quando era pequeno,
eles mudaram, depois que ficou grande, nossa, nem isso eles não fazem, ele
amava viajar [...] depois que ele ficou grande, nem isso eles fazem, sabe?
Viajar? Nunca mais. E ele gostava tanto.”
RESULTADOS| 93

Em6_L64 a 67: “O outro está com o pai [...] o outro pego de 15 em 15 dias,
quando eu estava com o pai dele, vinha os dois juntos, e às vezes, comigo, e
às vezes, com o pai ou então todo mundo junto.”

Em6_L69: “A guarda, também não daria para ficar com os dois.”

Em6_L70-71: “Se ele estivesse com a vida ruim, então ou eu pegaria, mas
estou vendo que ele está muito bem, tô tranquila.”

A palavra que a participante escolhe para definir o apoio é “parceria”, “ele é


bem parceiro”, mas ainda um “menino”, “ele faz” esta parceria se for preciso, e não
como alguém que tem a mesma responsabilidade de manutenção “do lar”.

Em10_L137-138: “Sim, esse menino é bem parceiro. Se ele chega em casa,


eu não tiver bem, não tiver feito, ele faz… tudo certo”

Em8_L89 a 95: “Eu sofro porque o pai dela não dá pensão pra ela, eu tenho
que ficar lembrando pra ele, que ela existe. [...] A minha depressão é só isso,
eu tenho que ficar mostrando para ele, que eu tenho uma filha especial. Ele fica
lá fora, falando com os vizinhos, ela fica escutando a voz dele, querendo ficar
com ele, e ele não entra para dentro. A mãe dele é assim, ela não tem paciência
com ela, ele não tem paciência comigo. Aí, ele diz, ‘separa', eu digo, ‘separo’,
é mais um problema para a cabeça dela... ele paga aluguel com os salário dela,
paga as outras coisas, e ela é apaixonada por ele.”

Em8L_119 a 121: “Nós, mães, por exemplo, se eu for no supermercado e deixar


com o pai dela, questão de segundos, quando você chega tá tudo bagunçado,
porque ele vai ficar lá no celular.”

Em8_132 a 134: “É comum o que a gente passa. Eu acho que a pior coisa que
eu passo é a falta de apoio ... do pai dela. Ele tem uma filha especial, a filha
dele não é igual a todo mundo. [...] Não achou uma xuxinha pra ela, não acha.”

Em8_L135 a 140: “Ele não gosta, ele fica me pressionando. A coisa mais difícil
é ele achar uma bala. Ele tem uma bomboniere, eu que tem que dar... mas ele
não tem... Não traz um pirulito pra ela. Ele chega ele brinca com o cachorro,
ele não vai ver ela e ela olha assim pra ele... aí, depois que ela sai, eu digo
assim, você não se dá conta, e ele diz ‘eu não vi’, você brincou com o
cachorro na frente dela, você não raciocina que ela veio duas vezes olhar
pra você?”

Em8_141 a 142: {no caps} “Veio algumas vezes... mas ele não vem, ele não
gosta, ‘ficar ouvindo aquelas coisas que eles falam.’”

Em8_L143 a 149: “Não, imagina! Todo mundo, eu que levo, ela também não
gosta. Eu vou para lá... os dois nem se dão muito. Ele vai uma vez por ano lá.
Então, ele fica... Você pode ir embora. Coisa mais fácil, assim... Eu tenho que
pagar aluguel... ele diz ‘você pode pegar suas coisas...’. Eu vou gastar muito
mais que você, você pega a sua roupa, vai... Você não está feliz, me deixa
quieta com ela. Não me ajuda, não me atrapalha. Ele ah... Ele quer que eu saia.
Eu e ela saia. E que ele fique na boa.”
RESULTADOS| 94

Em10_L137-138: “A gente entrou num acordo, né? Eu trabalhava fora, mas daí
a gente implantou, hoje até que o XXXXX até que fica com alguém, mas
antigamente não ficava com ninguém.”

Em10_L143-144: “Aí, a gente entrou num acordo, eu vou ficar à disposição dele
e ele vai trabalhar, a gente aperta daqui, aperta dali e deu certo.”

Em11_57 a 59: “Quem cria sou eu, aí, eu falei: ‘ah, deixa pra lá’, eu crio os três
sozinha, aí, tô criando até hoje, cada um é de um pai, né? Então, eu crio os três
sozinha, dois é registrado de um pai, esse maiorzinho não é.”

Em11_L273 a 275: “É um pouco difícil, né? Porque, assim, se um dos pais


pegasse eles para levar para passear, agora tá chegando Natal e Ano Novo e
falava assim, oh: ‘eu vou ficar com um uma semana para você’ com o outro,
mas nenhum faz isso, né?’”

Em14_109 a 113: “Ele não se importa, o pai dele... ligo, que o XXXX quer ver
ele, sente saudades dele, ele não quer saber, ele diz que tem vergonha do
XXXX, que ele é doido, fala tudo isso, ele tem vergonha da filha também, dos
dois, ele tem orgulho do filho da mulher dele, que ela tem outro filho, dos filhos
dele não... os dois dele que tem autismo.”

Em18_L170-171: “O pai dela visita para pedir pela pensão dela. ‘Não… louca,
problema mental?’ Foi embora.”

Em14_L68: “O pai dele não liga não... o pai dele tem dois filhos autistas.”

Em14_L121 a 123: “Semana passada, ele deu um carro para a mulher dele,
um carro. E o filho dele andando de ônibus com esta dificuldade, faz a terapia,
sem dinheiro, ele não está nem aí, ele está no conforto na casa dele.”

Em14_242 a 247: “Além do pai dele, como pai, né?… nem mil reais ele dá,
quando quer… por isso eu coloquei ele na justiça, eu não tenho como esperar
a hora que ele quer, o dia que ele quer, a hora que ele acha que tem quer dar,
ele tem condições, ele não se importa, igual eu falei, ele deu um carro para a
mulher dele, ele não se importa com o filho dele, tem ficar parcelando aplicativo,
andando de ônibus, tudo tem que ser eu… ele não tá nem aí.”

Em14_L97 a 103: “Ele tem muito do pai, ele pegava tudo aquilo do pai... ele
era muito explosivo assim com a gente (inaudível), um dia eu parei e disse,
‘meu filho, você está totalmente nervoso’, ele começou a gritar, chorar muito
ficar soluçando... na escola, ele via o pai dos outros meninos, ele ficava me
puxando, sabe? Ele tem muito medo do pai, até hoje, o pai perto, ele se
encolhe... por mais que ele seja especial, ele viu muita coisa que deve ter ficado
assim na cabeça dele.”

Nos discursos, Os homens, masculinidade e machismo, aponta novamente,


a violência financeira, violência física e psicológica, manipulação, que diminui a
autoestima das mulheres, afeta dimensões psicológicas, cria memórias de medo e
violências.

Em3_L195 a 197: “Teve um desses meus irmãos, que no mesmo dia em que
RESULTADOS| 95

minha mãe estava morta, lá dentro esperando para sair, ele falou sobre vender
a casa [...] esse que está amargurado comigo.”

Em11_L179 a 181: “Já registrei lá o papel da delegacia, já, porque eles me


batiam e tudo, aí, a polícia falou assim: ‘é melhor você para cada um no seu
canto.’”

Em14_L85 a 88: “Relacionamento te põe pra baixo, mexe com seu psicológico
[...] toda aquela manipulação que eles fazem [...] ele pegava tudo aquilo do
pai… de chorar muito, ficar soluçando, {o pai} bater na mulher {a atual mulher},
até hoje o pai perto, ele se encolhe, ele viu muita coisa, fica assim na cabeça."

Contraditoriamente, outros discursos apontam para a total falta de apoio, o


medo de adoecer e morrer, conformaram o cuidado dos filhos sem apoio, um
subtema.

Em8_L18 a 20: “É que minha família não tem sabedoria para lidar, a família do
pai... ela não se dá nem com o pai dela, se eu faltar, ela vai ter que se virar,
comecei a fonoterapia por isso.”

Em11_19-20: “Ninguém me ajuda, na época que eu trabalhava numa gráfica,


né? Mas como não tinha ninguém para cuidar dele, era todo mundo
jogando na minha cara essas coisas.”

Em11_L121 “Estava lá, na Cachoeirinha, aí, eu liguei pro meu outro filho,
que tem nove anos, falei pra ele fala pro XXXX que eu tava esperando ele lá
em cima, para mim pegar ele e trazer para cá.”

Em11_L175 a 277: “Então, para mim fica difícil, né? Porque eu tenho que dar
atenção pra uma, atenção pra outro pro outro, e aí, fica muita coisa na minha
cabeça, aí, bagunça minha cabeça, não aguento.”

Em18_L89: “Eu não levo à festa, à casa de parente nenhum.”

Em1_486 a 493: “A ordem natural das coisas é morrer primeiro a mãe e depois
o filho, eu torço todos os dias para ter a sorte de ou a gente morrer no mesmo
dia, ou que ele consiga partir antes, sabe? Nem que eu tenha lá, meus 97 anos,
e ele 77, ele viveu bastante, mas eu não vou ficar em paz até… não vou ficar
tranquila, o que eu garanto para ele? Se a gente não tem residência assistida,
o que eu espero que quando ele estiver velho, seja uma realidade, para eu
poder descansar, porque esse é um dos meus maiores medos.”

Em18_L102 a 104: “… se eu morrer… Se eu falecer (choro/soluços), se Deus


me levasse, eu queria que ele levasse ele junto comigo, que… o que a gente
vive, ninguém tem paciência… quem vai cuidar dele?”

4.2.2.5 Tema: A pandemia da COVID 19

Durante a pandemia da COVID 19, tornaram-se evidentes as desigualdades


sociais, que apareceram nos discursos das mulheres sobre as dificuldades de garantir
RESULTADOS| 96

a Sustentabilidade da família.

Em1_L29: “Como que a gente paga um aluguel com mil reais?”

Em1_L530 a 542: “Não é saber que, ah, hoje eu não tenho… não, a gente não
tem condições. As pessoas, ah, se ela começar a trabalhar direitinho, começar
a estudar bonitinho, ela vai ter, no nosso caso não é… tipo, não vai ter, não vai
ter cara! A não ser por caridade, com gente te ajudando, mas por mérito
próprio? Que é o que eu queria, não tenho… na luta, eu queria um espaço
melhor, [...] fora dali, entendeu? Desculpa esse chororô aqui… nos últimos dias
eu estou muito apreensiva sobre isso, sabe?”

Em16_L24-25: “Eu estou muito triste. Quer dizer, eu fico com ele, né, peço pra
um pagar uma conta pagar outra, durante a pandemia… Eles mandaram uma
cesta para o XXXX, uma para mim e outra pra ele, não tem como cuidar só com
a cesta… não tem como, tá muito difícil.”

Em18_L172 a 180: “Comprei um barraco [...] na viela, [...] ele recebe um bônus,
trabalho para os outros, lavo, porque eu tenho máquina, [...] conserto, o
emprego que peguei na minha vida foi empregada doméstica [...] a patroa me
achou nessas internet, foi na minha casa, viu que minha casa era de telha, e
ela ajuda, deu de presente, foi por isso que eu consegui depois fazer em cima
[...] comecei a receber o auxílio, comprei a laje, bati a laje, agora um pouco
mais pra frente, para poder alugar… sabe, nunca me interessei em ficar parada,
não tem como ficar parada, isso já é de mim.”

Em18_L181 a 185: “Quando ela era pequena, eu continuei trabalhando em


casa de família, eu levava ela bem pequenininha para o meu serviço, que a
minha patroa falou que não tinha problema, meus patrão saía, botava os
meninos na perua para ir para a escola, então ela ficava tranquilinha, mas aí
quando ela foi crescendo não tinha mais como ir.”

Frases temáticas evidenciam as dificuldades durante a pandemia, relatadas


pelas mulheres, mães de crianças/adolescentes negros com problemas de saúde
mental. Dentre essas, as descritas a seguir.

Em5_254 a 263: Eu acredito, assim, por exemplo, não tenho muita dificuldade
de usar a máscara, ele já identificou que toda hora que vai sair, precisa de
máscara, então, entendeu, se eu quero sair de casa… é, antes era a chave, ela
via pegando a chave, ah... vai sair de casa, ah, eu… estou pegando a máscara,
quer dizer que eu vou sair, porque eu preciso sair de casa, e eu, digamos que
eu tenho sorte, eu tenho quintal, amiga, a família tá aí, comigo. A única pessoa
de fora é o pai, e pai tá todo, vem cá, mas para autista é diferente, ficar só em
casa, ainda mais ela que tinha uma rotina, ela tinha uma rotininha, ela acordava
cedo, ia para a escola, brincava, ficava um pouquinho...”

Em9_L19 a 23: “Ele ficou muito preso, coisas que fazia antes, agora não faz...
toda XXXX-feira ele vinha aqui, no CAPS, agora não dá mais... numa feira, eu
vou correndo, porque eu deixo ele em casa, ele quer descer para ir comigo. A
caminhada nada, nem pensar. Passei o dia domingo, assim… não tem onde
levar as crianças, um parquinho, um shopping, nada disso.”
RESULTADOS| 97

Em9_L29: “Ele fazia natação e eu tive que parar.”

Em9_48 a 54: “Agora nessa pandemia... Ele ficou um pouco agitado, ele tinha
parado, agora ele agitou um pouco. Aí, levei ele no neurologista que passou o
remédio só para noite, quando eu vejo que ele tá muito agitado, eu dou o
remédio e ele dorme tranquilo. Isso mexeu muito, né? Na cabeça das crianças.
Já estava acostumado a levantar 5 horas da manhã, tomar café para ir para a
escola e teve que parar tudo isso.”

Em11_L47 a 51: “Veio essa pandemia, aí, apertou para todo mundo muita
gente foi embora, muita gente ficou sem emprego, muita gente tá passando
fome, então, fica difícil para todo mundo.”

Em14_L29 a 31: “Não me adaptei com aula online, porque para conseguir o
acesso à internet é muita, muita gente, e dá para ter a internet no celular... e
aí, eu não consegui… não me adaptei, aí, tranquei."

Em14_L33 a 37: “É que não tem nada, tudo pela internet, e tem o Wi-Fi lá... é
das 7h às 10h, lá… era mais por isso mesmo, só que mesmo assim era muito
difícil, eles colocou um só, para economizar gasto, era o único acesso ao
professor, era só por e-mail, às vezes demora muito tempo a responder, estava
muito difícil, daí, não dava muito pra aula.”

Em5_264 a 266: “... porque que parou… ah, legal, pode dormir até mais tarde,
é legal, mas... ele está estranhando e as noites também, isso irrita muito ele,
às vezes ele fica fechado em casa o dia todo, levo ele para o quarto e ele não
quer nada, e tal.”

E3m17_L130 a 133: “tive infarto bem no começo da pandemia, o hospital


estava lotado, de paciente com corona, e agora tá tendo de novo, 91% do
hospital está tomado pelo corona, Santa Casa, por isso eles queriam me operar
em julho, porque tava vazio em agosto… aí, eles avisaram que tinha que
operar.”

4.2.2.6 Tema: O futuro

Dentre os discursos das mulheres, temas que emergiram foram associados aos
Desejos da mãe; receios da mãe; planos da mãe, a questão financeira; a filha como
companheira.

Os desejos da mãe é um subtema que aparece, em fragmentos de textos,


revelando expectativas em relação ao desenvolvimento dos filhos, de um futuro
possível para os mesmos.

Em3_L413 a 415: “A parte com as outras pessoas realmente eu fiz, mas claro
que eu ainda tenho meu filho, que para mim também me sentir mais aliviada
eu queria que meu filho estivesse bem, tem 16 anos, né? Trabalhar como
aprendiz, voltar para escola, entendeu?”

Em5_193 a 199: “Verbalmente, eu até espero assim, um dia, ela falar alguma
RESULTADOS| 98

coisa, assim, eu falo que, com cinco anos, ela não dizer eu te amo, mas não
verbalmente, eu vejo que e ele não responde, a gente… não brinco com muita
frequência, mas eu estou ali com ela nos jogos que elajoga, estou presente nas
coisas que ela faz, eu... mentira, porque brincar… eu brinco com ela porque ela
me mede, ela mostra os brinquedos pra mim, e eu tenho essa esperança de
que um dia ela vai evoluir, que ela vai se sentir bem, que ela vai… enfim,
conquistar o futuro dela.”

O discurso da participante aborda os Receios da mãe, e ela faz uma


comparação de que toda mãe, independentemente, se o filho tem problema de saúde
mental, ou não, preocupa-se com o futuro dele, o que vai ser. É algo da ordem de “ser
mãe”.

Em5_199 a 201: “Com meus receios, mas eu nem posso dizer que tenho
receios, assim, como uma mãe de uma criança especial, mas, sim, receios de
uma mãe, as mães todas têm receios do que o filho vai ser.”

Outra frase temática relacionada aos discursos das mulheres, aponta para os
planos da mãe, reiterando a defesa das crianças.

Em5_203 a 205: “Olha, para eu ser justa, ela não me impede. Isso, eu sou
sincera. Talvez não por ser uma criança especial, mas por ser uma criança que
precisa de cuidados, que precisa de alguém para ficar com ela.”

A questão financeira é um subtema que emerge dos discursos, por ser um


eixo fundamental da sustentabilidade da vida, imbricado e que impacta nos demais,
anteriormente descritos, apresentados pelos fragmentos de textos a seguir.

Em5_206 a 210: “[...] e eu vejo assim... que meu emprego vai ser meu alicerce,
assim, agora, tenho planos de cursos, de faculdade, eu ainda não tenho. Eu
tenho aquela ideia bem do alicerce, eu vou trabalhar, eu vou me estabilizar, ter
contas ali pagas, eu vou pagar minhas contas, e aí, quando eu ver, ‘ah, eu tô
tranquila’, eu posso pensar em alguma coisa”.

Em5_238 a 239: “Tem a questão financeira, sim, um trabalho para mim, que
estou desempregada, é essencial.”

Em5_227: “Nossa, a questão financeira, eu não tenho o que reclamar dele não,
e ele abraçou, eu nunca tive esse problema.”

Em9_L8 a 10: “O custo de vida sai muito caro, o custo de vida tá caro,
supermercado… você vai no supermercado, é absurdo, no açougue, então, tá
complicado!”

Em11_L34-35: “Foi por ele, que eu estou aqui, hoje, porque eu ganho o
benefício dele, dá para pagar aluguel, minha água, minha luz, mantimento.”

Em11_L200 a 202: “E mora junto no quintal, ela mora embaixo, eu moro na


RESULTADOS| 99

parte de cima. Eu moro numa casa de três cômodos, eu pago R$ 580,00, aí,
vem água a luz [...] pra mil reais dá pra nada, só de luz, esse mês, eu paguei
R$ 180,00”

Em14_L214: “Imagina se eu pagasse aluguel, eu ia passar fome.”

Em14_L150 a 155: “O LOAS para mim é pouco, só comida, ele come muito,
não sei se você já ouviu dizer que criança que tem esse problema, ele tem uma
fome maior do que as pessoas, ele tem muita fome, ele come muito, um pacote
de biscoito, e põe tudo num pote, e ele come sozinho, comida, ele come o dele,
ele não deixa eu comer, ele quer comer o meu... ele quer comer do outro.”

Em14_L156 a 158: “Então, é só em comida, eu gasto com muita coisa, eu gasto


com muita comida… fora o remédio que o médico passa, que, às vezes, não
tem no SUS, tem que comprar por fora.”

Em14_208 a 210: “Tinha um projeto na câmara, que eles iam aumentar ¼ do


salário-mínimo, para mais…, uma coisa assim. Aí, eu digo assim, se eu
conseguir trabalhar ganhando meio, ganhando um salário, eles não
cortam o LOAS.”

Em14_L212 a 213: “O LOAS não dá, trabalhar é impossível. Aí, corta. Sendo
que é tão pouco… Só para ele, aí, tem água, tem luz, tem a comida...”

Em16_L2: “desde 2012 estou sem trabalhar, na luta.”

Em16_L6: “Meu esposo, ele me abandonou [...] ele não é beneficiado… eu


preciso muito, tive um problema de saúde e a empresa me mandou embora.”

Em16_L15 a 22: “[...] falta as coisas, tem que pedir. Eu nunca fui de pedir,
eu sempre trabalhei desde os nove, [...] quando ele nasceu, [...] me deram a
escolha... você quer trabalhar, eu ganhava dois salários na época, não tinha
como eu parar de trabalhar, ganhava o ticket [...] quando eu precisei dele, que
não podia mais trabalhar… e foi embora.”

Em17_73 a 80: “Quando é alto custo é muito longe, aí, tem que pegar ônibus,
metrô, aí, o dinheiro de comprar, entendeu… aí, tem a pomada que tem
que passar aqui, que o médico passou, não tem no posto, não... faz uma
exceção, é R$ 60,00. Ai, faz a conta, R$ 1.045,00 do benefício, R$ 400,00
na casa, tem que comer, tem que comprar remédio, ainda bem que tem o
bolsa, que meu bolsa família do mês passado, porque se a gente tem
dinheiro o remédio a gente compra, com meu bolsa família… desse mês
passado eu comprei clopidogrel, sinvastatina, acabou o dinheiro.”

Em17_L119 a 123: “Foi muito gasto, muito gasto…porque eu tinha… 15 dias


que tinha operado, como é que eu vou de ônibus? [...] não conseguia nem
falar direito, aí… tinha que ir de Uber [...] essa ferida abriu, tinha que ir
toda semana, aí, tudo foi gasto”

Os discursos revelam que as mulheres consideram a filha como


companheira, aspecto que diminui a solidão e conforma parceria no relacionamento
mãe-filha.
RESULTADOS| 100

Em3_L104 a 107: “Minha filha que sempre foi amigona minha, mesmo, para
tudo, que nem um dia que ela veio aqui uma vez… ela falou: ‘minha mãe é
minha melhor amiga’, realmente eu aconselho muito ela, ela me aconselha
muito também, a gente conversa muito, ela divide isso do irmão comigo, me
ajuda muito.”

Em5_212 a 219: “Eu… eu lembro que uma amiga minha, de uns dez anos atrás
mesmo, a gente saia juntas, ela me chamou para ir na casa dela, e aí, eu falei,
peguei a minha filha e falei vamos sair e até quando eu só tinha ela, todas
minhas amigas, a XXXXX é minha parceira de sair, eu saio sempre com
ela, eu tenho minhas amigas de volta, algumas amigas, faço algumas
colegas, (inaudível) ah, e depois que eu tive ela, eu ainda tive outro
emprego, eu tive outras amigas, essas pessoas para conhecer, então,
dessa parte assim… essa solidão assim, eu já não sinto. Eu tenho um
pouco de dificuldade hoje de sair, eu não vou dizer que é por causa dela,
ela não me impede”.

4.2.3 CATEGORIA III - A ESCOLA

A Escola por ser espaço de proteção das crianças/adolescentes, de construção


de contratualidade, torna-se importante a ser analisado na perspectiva da garantia de
direitos, e quando negligenciados, os impactos na vida das mulheres, mães,
cuidadoras, que lutam pela inclusão dos filhos. Nesta categoria apareceram dois
temas emergiram dos discursos: A escola regular e a especializada (com três
subtemas: A Escola Regular, o atendimento na Escola especializada, Escolas
conveniadas com Estado com método ABA) e a Escola na pandemia da COVID 19
(subtema: a Escola na Pandemia).

4.2.3.1 Tema: A escola regular

Os fragmentos de texto dos discursos revelam sentimentos das mulheres em


relação ao tratamento dos filhos no âmbito escolar, e dificuldades relacionadas à
participação e acolhimento das demandas de inclusão.

Em1_L141 a 143: “Na época, quando eu peguei o diagnóstico do XXXX, ele


estava em uma escolinha particular do bairro, naquela época, meu filho ficava
o dia todo no cantinho, fazendo nada.”

Em1_L145 a 146: “Passava o dia no canto [...] não tinha nenhum tipo de
atividade de fato, [...] alguém mediando essas atividades, não tinha, [...] entrava
chorando e saia chorando.”

Em1_L181-182: “Mas para sentar e ficar diante de uma professora, com 45


alunos na sala de aula, e todo estímulo que ele vai receber, eu sei que vai piorar
RESULTADOS| 101

o quadro do meu filho.”

Em4_L325 a 329: “É porque é assim… às vezes, ele vai… levanta, levanta e


vai na cadeira de um, vai na cadeira de outro, pega uma coisa de uma pessoa,
pega de outro, e as crianças não têm o que falar, a professora falava daí, ele
começava a xingar. Lá na LLLLL também na outra escola, não consegui ficar
com ele por causa disso.”

Em4_L330-333: “A escola não pode, mas também pode ter um risco dele
machucar alguém, e aí, como que fica? [...] Não, mas eles iam para a escola,
mas a escola não adiantava nada, eles ficavam lá, e aí?”

Em7_L12 a 15: “O XXXX nunca me deu trabalho. Dá trabalho assim... o XXXX


nunca foi um menino que gostou de ir para a escola. Ele sofreu bullying lá. Com
uns 15 anos ele sofreu esse bullying, então ele não voltou mais. Ele paralisou
e não quis mais voltar.”

Em7_97-108: “Então, foi uma escola que ele se adaptou bem, mas daí veio o
bullying. Um menino veio e ficou gritando no ouvido dele. É... mas também o
bichinho ficava sozinho, porque todo mundo saía, né? Daí a pessoa vinha e
ficava gritando no ouvidinho dele. Gritando no ouvido dele e ele sentadinho ali...
então ele pegou birra e nunca mais foi. E é isso. Deixou a gente muito triste,
né? Porque era uma coisa de sair, que ele estava gostando... tinha muito apoio
das pessoas, dos alunos... mas sempre tem uma pessoa pra tirar a paz dos
outros, né? Mas, ele tá lá em casa, de boa, não dá trabalho nenhum, graças a
deus. Ele faz as coisas, a gente ensina ele fazer... a tomar conta dele mesmo,
né? Porque tem que aprender, né? Fazer as coisinhas deles. Então é isso. Mas
nunca nada me abateu nem tirou a minha paz.”

Em7_L211 a 213: “A gente já tentou, meu marido foi não sei em quantas
escolas e ele não vai, depois que ele sofreu esse bullying, sabe? A gente foi
ver outra escola para ver se ele se interagia.”

Em8_L12 a 15: “Minha filha é muito aérea. Inclusive ela tem uma professora
em casa só pra ela... é o lugar que ela aprende melhor, porque na sala ela fica
assim... andando. Ela não presta atenção. É que são 29 alunos, 29 alunos
falando, dois ou três especiais na sala. Uma estagiária para dar conta dos três,
não tem como.”

Em8_L16-17: “Não tem funcionários, porque tem crianças que necessitam


mais, porque é assim, do cérebro, porque é cadeirante.”

Em8_L57-58: "Então, se ela não sabe, tem que ter a estagiária, tem que ter
ensaio, entendeu? Se ela quer ensinar só as crianças normal, ela não vai se
orgulhar. As outras, abraçavam... tinham aquele carinho, essas aí, não tinham
o carinho, eles são carentes. [...] e os autistas para inserir tem que ser
conquistados, se você não conquistar eles, você não vai conseguir. Eu acho...
se você não tiver carinho, compreensão com eles, você não vai conseguir dar
aula. Você não sabe o que tem na casa dele, qual o comportamento dele, se
você não conhecer um pouco, ficar só no bom dia, boa tarde, não vão conseguir
dar aula para ela.”

Em14_L262 a 265: “Ele conseguia aprender algumas coisas… tinha uma


professora que me ajudava, ela não tinha preconceito das coisas, a diretora
queria que ele entrasse separado das crianças e ela bateu o pé, ela disse ‘não,
RESULTADOS| 102

ele vai entrar junto com as crianças.’”

Em14_276 a 280: “E eu queria ficar mais tempo na escola antiga do XXXX que
é melhor, eles não deixam uma hora, e não tem uma lei que proíbe…? A
diretora disse que não, a lei na Região Norte, a política é essa, devido eles
acharem que não pode demorar tanto na escola, funcionários com … tiraram a
vaga dele, colocaram outro… mas era bem boa essa escola.”

Uma das entrevistadas referiu que a não inclusão do filho, mesmo em escola
particular, o que a desencoraja a acreditar que na escola pública seja diferente.

Em1_L150-152: “Naquela época o pai me ajudava e a gente pagava o colégio


particular... e eu trabalhava na época, se num colégio particular, que era um
colégio bom [...] ele tá tendo esse tipo de atendimento, como vai ser se ele for
para uma rede regular de ensino público? Eu não tive coragem, naquela época,
ainda mais com diagnóstico de autismo.”

Em1_L156 a 16[L3] 5: “[...] faço o que eu posso para o XXXX estar inserido na
sociedade, porque eu entendo que é importante [...] Agora, pegar meu filho com
diagnóstico de autismo, no nível que ele tem, e colocar ele numa sala de aula
para aprender sobre história do Brasil, que eu acho é o que ele aprenderia
nessa idade [...] sem nenhum tipo de apoio pedagógico de fato, uma criança
que nem vai conseguir ficar sentada ali, eu não tenho coragem, de verdade.”

Em1_186 a 195: “Teve uma época que veio meio que um... (inaudível) no
convênio, e as crianças tinham que ser obrigadas a passar um tempo de
adaptação na escola pública, foi um caos lá. A criança estava lá numa escola
especial, é... é... especial, aí, eles colocam ele ali, ele regride, porque ela não
tem o profissional ali para mediar e a escola ... os profissionais não fazem ideia,
infelizmente, os profissionais não conhecem e sabem quase nada de autismo,
e aí, essas crianças são sendo cobaias de uma falsa inclusão, eu acho que o
mundo ideal é o mundo da inclusão mesmo, mas quando você tem alguma
coisa pra isso... quando você tem suporte. Simplesmente, a gente não tem,
quem vai colocar o filho como cobaia?”

Em4_L302 a 313: (avó) “Na escola, elas não podem nem ir! [...] Não, não pode.
A única escola é a que ele está hoje, a única que eu não tenho o que reclamar
é esta que o XXXX, é a “B”, perto da minha casa [...] Escola da prefeitura, até
B.O. eles deram de fazer.[...] É muito triste… Porque a escola não quer, não
quero aqui na escola, não ponho… [...] É ao contrário, a escola que fez contra
mim [...] E a única mesmo que sustentou ele até hoje, que tá um tempo, que
não tirou ele… que está lá o nome dele foi a “B”. Ele não vai para a escola, mas
também eles não tiram. E a professora, todo dia, fala com a gente, pergunta
como ele está, manda liçãozinha… é o que ele faz.”

Em4_L325 a 333: (avó) “É porque é assim, às vezes, ele vai… levanta, levanta
e vai na cadeira de um, vai na cadeira de outro, pega uma coisa de uma pessoa,
pega de outro, e as crianças não tem o que falar, a professora falava daí ele
começava a xingar. … lá na “C” também, na outra escola, não conseguiu ficar
com ele por causa disso [...] A escola não pode, mas também pode ter um risco,
dele machucar alguém e aí como que fica? [...] Não mas eles iam para a escola,
mas a escola não adiantava nada, eles ficavam lá e aí?"
RESULTADOS| 103

Os discursos explicitam as dificuldades das mulheres em assegurar, que a


escola providencie profissionais de apoio nas salas de aulas dos filhos/as, como nos
fragmentos de textos selecionados a seguir.

Em1_183 a 185: “Sabe que na realidade, ninguém tem conseguido. Eu tenho


conversado com outras mães, que conhecem mães, que vão nas escolas
dizem ‘eu não consigo monitor.’”

Em2_L123-124: “O único problema que eu tive lá na escola com os


meninos foi só para arrumar uma cuidadora [...] tipo a segunda
professora.”

Em2_L126 a 128: “As professoras me enrolaram muito para não querer arrumar
[...] eu fui levando as cartas da TO, da psicóloga para escola, até quando elas
conseguiram [...] não queria colocar a segunda, porque achava que ele não
precisava.”

Em4_L315 a 323: (avó) {sobre monitor na escola} “Não. É a professora, os


trabalhos e os alunos… eu vejo que a professora precisa de ajuda, várias
vezes eu ficava na escola junto com ele, dentro da sala de aula, várias
vezes… muito triste, porque ele não sabia fazer ficava olhando para as
outras crianças. Eu mesmo como lugar de mãe e avó, não daria para essa
professora, não daria para ela cuidar dele, e dar atenção para aquelas
pessoas que estavam ali… porque ela era sozinha. Ou ela dava atenção
para os outros alunos, ou ela dava atenção para o
XXXX. Então não tinha condições, não tinha condições dele estudar na
sala de aula só com uma professora.”

Em14_L268 a 272: “Tem auxiliar que é estagiária, porque na verdade o governo


não paga o monitor, é estagiária [...] Se precisar de um laudo falando que ele
precisa de um acompanhante, aí o Estado paga, a prefeitura não, a prefeitura
é uma auxiliar, estagiária de pedagogia.”

Na atenção escolar, as mulheres, mães das crianças/adolescentes muitas


vezes precisam fazer um enfrentamento para a garantia de direitos dos filhos/as.

Em10_L97 a 103: “Em questão do transtorno, só na EMEI que eles queriam


ditar o horário que ele ia ficar, porque a regra... a regra lá é, os pais que chegam
primeiro para fazer matrícula tem o direito de escolher o horário, eu fui uma das
primeiras a chegar lá, porque eu queria ele lá à tarde, aí chegou lá e elas
falaram que ‘não’, que já tinha uma criança e que não poderia, aí eu falei: ‘não,
a regra é válida para todos, e assim, eu cheguei cedo, eu quero ele à tarde e à
tarde ele vai ficar.’”

Em18_17 a 25: “Ela foi só até a primeira série, porque se entrava 1h… 1h30,
ela mandava buscar. Se entrava às 7h, 7h30 ela mandava buscar, porque eu
lembro uma vez, eu fui buscar ela, ela estava com uma marca no braço. Eu não
vou mentir, eu tirei ela para não agredir a mulher que cuidava dela. E, às vezes,
chegava com ela, já sabia que ela tinha problema, a professora passou por
mim, e via ela, fingia que não via, ia trabalhando… professora, professora, ó a
XXXX, ela está aqui.”
RESULTADOS| 104

As dificuldades e barreiras impostas pela escola regular, produzem a evasão.

Em18_L26-27: “Uma luta para ir para na escola, porque eu não ia embora, [...]
eu ficava lá fora, se é para XXXX ficar dentro do pátio da escola separada das
crianças, eu não vou trazer mais, ela não estudou, ela não frequentou a escola”

Os discursos das mulheres apresentam o atendimento na Escola


Especializada da AMA com ambivalência, sem definir o papel da mesma.

Em1_151 a 154: “Coloquei ele na AMA, que é a associação dos amigos dos
autistas, é uma escola referência, quando eu digo “referência” entre aspas, é
porque ela tem muito nome e tudo mais... sei que lá é um atendimento... sei lá,
acho que podia ser melhor.”

Em18_11 a 14: “A base é para essas crianças autistas, lá tem um playground,


ensina a pintar, pintar com pecinha, é igual ao CAPS, [...] tem mais capacidade,
não sei [...] Já está preparado para… onde chegar no problema dela.”

Outros fragmentos dos discursos relatam sobre as Escolas conveniadas com o


Estado com Método ABA5

Em1_L166 a 180: “Enquanto ele tiver o subsídio que ele tem, porque ele, hoje,
está numa escola conveniada com o governo do Estado, é uma escola “barra”
atendimento terapêutico, eu só tiro de lá para colocar em uma outra do mesmo
modelo. [...] retirá-lo de lá, eu não tenho coragem”[...] o poder público precisa
escutar as mães quando elas escolhem esse tipo de opção, eu entendo
que cada caso é um caso, eu entendo, tá? Tem criança que eu vejo na escola
dele e eu falo para as mães, por que não coloca na rede regular? A criança vai
aprender tanto na troca, e a sociedade para aprender precisa trocar, mas eu
acho que para meu filho, não. Porque ele não ia saber nenhum tipo
daquele conteúdo . Meu filho não lê, meu filho não escreve, meu filho está
sendo alfabetizado, mas dentro do sistema ABA, que a escola não vai dar
continuidade. Hoje, é o que ele pode, para troca na sociedade ele tem no
CAPS, no Circo escola, e na comunidade geral quando eu levo para
passear, meu filho não fica recluso, eu faço o que eu posso pro meu filho estar
sempre em sociedade.”

Em1_L186 a 198: “Porque teve uma época que veio [...] no convênio [...] as
crianças tinham que ser obrigadas a passar um tempo de adaptação na escola
pública, foi um caos lá, a criança estava lá numa escola especial, [...] ai eles
colocam ele ali, ele regride porque [...] não tem o profissional ali para mediar e
a escola, os profissionais não fazem ideia, infelizmente, os profissionais não
conhecem e sabem quase nada de autismo, e aí, essas crianças são sendo
cobaias de uma falsa inclusão, eu acho que o mundo ideal é o mundo da
inclusão mesmo, mas quando você tem alguma coisa pra isso, quando você
tem suporte. Simplesmente, a gente não tem, quem vai colocar o filho como
cobaia? O professor do meu filho tem... tá numa sala com uns... são no máximo
seis alunos, na sala do meu filho tem cinco, com quatro profissionais, entende?

5 ABA - Applied Behavior Analysis


RESULTADOS| 105

[...] Todos tem autismo, só vai mudando o nível e tal, na sala dele são mais ou
menos todos com o mesmo nível, mesmo diagnóstico”

Os fragmentos de frases comparam concepções das mulheres sobre o cuidado


no CAPSij, e o sentimento de que a escola não garante a mesma atenção, que pode
ser amenizada com um número maior de profissionais para intermediação.

Em1_199 a 203: “[...] é um grupo menor, [...] crianças com algum tipo de
transtorno, elas são mais inocentes, são mais boazinhas e eu não vejo nenhum
grupo de meninos típicos que vão vandalizar meu filho. Porque eu quero saber,
quem garante isso? Esse é o problema né?”

Em1_L203 a 206: “No CAPS eu sei que tem mais profissional do que
menino, praticamente, entende, são quatro profissionais, seis meninos, vai
uma média assim, tipo, eles estão bem amparados, bem amparados
(inaudível), eles estão bem cuidados, eu fico bem tranquila”.

4.2.3.2 Tema: A escola na pandemia da COVID 19

As falas das mulheres sobre a Escola na Pandemia, é um dos subtemas


abordado nas frases temáticas a seguir, que referem diversas dificuldades de acesso
à Escola durante os meses mais críticos da pandemia da COVID 19 (2020/2021), sem
atividades, sem acompanhamento escolar para os/as filhos/as, ou sem saber como
realizá-las.

Em4_L334 a 336: “Esse ano todo, esse ano todo ele ficou fora da escola, esse
ano ficou fora do CAPS, mas das escolas, das atividades, que denunciam, tem
que denunciar.”

Em5_280 a 283: “Por exemplo, ele vai para a escola como todas as crianças lá
em casa, eles receberam atividades, não só ele como exclusiva, mas como
todas as crianças, né? Eu não vou conseguir passar as atividades com ele,
porque eu não sei se eu vou conseguir fazer, acabo não fazendo, então…
sabe?”

Em10_L113 a 122: “Na escola dele não tem… minha sobrinha é professora,
ela quem imprime lá os desenhos, umas folhinhas para eles lá, eles fazem a
atividade lá, na escola dele mesmo, não tem [...] uma ave foi lá em casa, mas
não é nem da escola dele, eu acho que é um trabalho que eles estão fazendo
com todas as crianças para saber como elas estão, só. Mas a escola mesmo
entrar em contato, não [...] ligaram e eles falaram que não, que a crise, que não
tá tendo atividade, nem nada. Até desencanei de ligar.”

Em10_L125-126: “Nada. Nada, nada, nada. Tem uma página lá no Facebook,


mas eles não postam nada.”

Em9_L55 a 57: “Quando eu vou na escola com ele pegar o trabalho dele, “você
não pode abraçar os professores, não dá a mão”, e ele olha ela de longe…
RESULTADOS| 106

cumprimenta ela de longe [...] Quando ele não sabe, não responde, vem… mãe
e isso aqui? Isso aqui? Aí, eu fico com ele e ele consegue fazer tranquilo [...]
professora faz chamada no vídeo para ele... ele se comporta direitinho com
ela.”

Em14_L52 a 56: “Ele tá, mas não tem conseguido acompanhar, não é adaptado
para ele, é totalmente diferente das apostilas, ele não consegue, porque ele tá
naquela fase de rabiscar, aí, nem rabiscar ele ainda não tem nenhum
movimento de pegar, da pinça. Ele não tem, ainda... treinando isso, está
treinando, então não dá pra fazer.”

Ainda neste tema, os discursos abordam as rotinas antes da Pandemia


COVID 19, que foram interrompidas, afetando tanto as crianças, como suas
cuidadoras com novos desafios.

Em14_57 a 59: “Claro que faz falta, faz falta as crianças, a social, é ruim pra
ele, ele é muito, ele é um autista, que ele está naquela fase de que... ele não
quer falar, ele fica mudo, então ele não fala nada com as outras crianças… na
escola”

Em14_63-64: “A rotina dele era muito diferente, era muito pesada .. ia para
outra terapia, vinha para cá, ia pra escola … ele era outra coisa.”

4.2.4 CATEGORIA IV - GÊNERO

Compreendendo gênero como uma construção social, nesta categoria, os


discursos apresentaram cinco temas e subtemas: O Feminino (seis subtemas:
Concepções de gênero - “ser mulher e mãe”; Feminilidade - gostar de ser mulher e
mãe; Desigualdade de gênero - Patriarcado sexista; Concepção de casamento;
Acesso à informação e métodos anticonceptivos; A Luta pela igualdade de gênero); A
Maternidade (seis subtemas: A mulher e os planos interrompidos pela maternidade ou
cuidados dos filhos; Ambivalências em relação à maternidade; Concepção de
maternidade; Expectativas de aprendizado na maternidade; Esquecer de si para
cuidar do filho/a; Resiliência materna); Antes e depois (subtema: Atividades antes do
diagnóstico); Sororidade (três subtemas: Apoio para o cuidado entre mulheres da
família; Referências maternas; Ensinamentos geracional feminino e feminista);
Resistência (três subtemas: Espiritualidade, Religião e Saúde Mental; Instrução da
mulher; Positividade na atitude das mães).

No tema do FEMININO, os discursos apontam subtemas referentes às


Concepções de gênero – “ser mulher e mãe”, ou seja, o cuidado dos filhos é
RESULTADOS| 107

delegado socialmente como uma responsabilidade da mulher, podendo ser negociado


com o parceiro a saída das atividades de trabalho, o que não ocorre com os homens,
que muitas vezes resumem seu papel como uma “obrigação” (até a maioridade dos
filhos), ou mesmo como complementar às ações da mulher.

Em3_L426-426: “Que o pai já não teria nenhuma obrigação mais, que ele é
maior de idade.”

Em5_97 a 103: “[...] é minha primeira filha e ele já tinha uma filha. Essa é minha
primeiro filha, [...] a gente tipo, ah, ‘você pode ficar em casa para cuidar para
cuidar’, até porque minha filha, talvez pelo autismo, de leite ela nunca foi muito
fã... de leite de lata, era só leite do peito, não dá para deixar uma criança
assim… e aí, a gente acabou conversando, ele falou: ‘não, olha… eu tenho
uma condição boa para você ficar em casa’, e eu fiquei em casa, ai, eu pedi as
contas no meu emprego, aliás, a gente pediu para eles mandarem a gente
embora.”

Outro subtema que emergiu dos discursos, é a Feminilidade - gostar de ser


mulher e mãe, pela possibilidade da mulher gerar um outro ser humano, ou exercer
o papel de mãe de outra “mulher” (“menina”), desdobradas em concepções existentes
sobre o feminino socialmente construído.

Em5_124: “Sou apaixonada pela ideia de ser mãe e especialmente ser mãe de
menina”

Em5_125 a 129: “De uma menina, é … tipo… eu lembro disso, foi com uma
colega de trabalho, falava: ‘ai, eu quero tanto ter uma menina.’ E aí, uma
menina falou assim pra mim: ‘ai... nossa, se você pensa tanto e se você tiver
um menino é verdade menino, você vai acabar decepcionada.’ Aí, eu falei:
‘verdade, um menino, né?’ Tão legal, comecei a imaginar como seria ter um
menino pra adaptar isso na minha cabeça, mas quando tive uma menina, eu
fiquei bem feliz...”

Além desses, um subtema revelado pelos discursos, trata da desigualdade de


gênero - Patriarcal sexista, que pelos papéis sociais impostos às mulheres pela
sociedade, como a maternidade e o cuidado da família, cuidado dos parceiros,
fundamentam o sexismo do patriarcado capitalista. Todo trabalho que as mulheres
realizam de cuidados, não é reconhecido pela sociedade patriarcal, como obrigação,
mérito e em contraposição, os feitos paternos são sempre destacados.

Em5_362 a 370: “Na questão do machismo… o que eu ouço muito assim é a


questão, ah, mais… em questão do machismo, é mais das pessoas acharem
que eu sou centro de reabilitação. Ah, você tem que orientar o cara, eu tenho
que fazer isso pelo cara, sendo que eu fico de cara, de homem? ah e em
relação também… a maternidade [...] é mais cobrada da mulher, isso aí eu sofri
RESULTADOS| 108

bastante, e esse peso… Porque assim, eu vejo o seguinte, nem pelas pessoas,
eu vejo por mim também, é a mulher, ela se mata, ela se cuida, ela faz tudo,
ah, ela é guerreira, mas ela não… a mãe, o pai que faz nem metade disso, ele
já é aplaudido, é interessante isso aí.”

Em5_372 a 378: “[ ] como toda mulher vive, né? Um relacionamento, uma


hipótese do relacionamento acabar sendo abusivo, acaba sendo tóxico, [ ]
parece que é uma regra que toda mulher tem que passar, então, tem além
desse estigma, o machismo, tem o autismo também… já da sexualidade eu,
assim como eu cresci vendo o pessoal falando do meu cabelo, eu cresci vendo
o pessoal chamando meus amigos de ‘viadinhos’, meus amigos assumirem
gays, hoje eu tenho minhas amigas lésbicas, [...] é outro mundo.”

Em13_190-191: “Você é filha do seu pai. Pensa no sobrenome dele que você
tá levando. Eu ia para a escola com um peso.”

Por meio dos discursos as mulheres revelam Concepções sobre o


casamento, como meio de “abrandar problemas”, “aceitar os vícios do marido”,
esperando que “mude”, com “fé”, também passadas geracionalmente.

Em3_L128 a 130: “Eu fui me modelando em muitas coisas sabe, então, tipo,
assim, às vezes, até minha mãe falava, porque eu sou muito nervosa, eu
to aprendendo a mudar algumas coisas agora. [ ] ele sempre
procurou agradar, mas antes ele bebia, mas ele nunca me agrediu, sempre
presente no dinheiro, nas coisas da casa, mas ele tava no começo vivendo
uma vida de solteiro sendo casado, aí eu sempre falando assim… ‘eu vou
desistir, eu vou desistir, vou desistir’, mas tinha uma coisa comigo que falava,
se eu desistir dessa pessoa, essa pessoa não é ruim, é trabalhador,
tirando o vício da bebida, não tem nenhum e talvez vai se estragar no
mundo.”

Em3_L141 a 143: “Eu falei: ‘não vou desistir e fala pro meu marido, estou
anulando minha vida pra viver a sua.’”

Em3_L146 a 150: “Eu que sempre fui mais nervosa, aí, ele ia falar para minha
mãe, ‘minha sogra, a XXXXX, tá nervosa, né?’, até minha filha falou: ‘mãe,
sempre foi você mesmo’. Aí, minha mãe sempre me aconselhava nisso, né?
‘XXXXX, você é muito nervosa, filha, você tem um bom marido, mas você é
muito nervosa, é um vício, ele vai melhorar você não crê?”

Em13_L135: “Embora tenha tido um casamento bonito... ela sempre falava


isso: ‘ai, que burra!’”

Ainda, nos fragmentos de frase a seguir, sobre o acesso à informação e


métodos anticonceptivos pelas mulheres.

Em13_L161-162: “Dizia ‘você não vê que pessoa tal é enfermeira? Porque ela
estudou para ser enfermeira. Ela ganha mais. Vai ganhar mais, vai ter mais
possibilidades’ [...] deixava isso bem claro para a gente”

Em13_L167 a 167: “[...] chegou a falar [...] claramente [...] se ela tivesse a
RESULTADOS| 109

possibilidade de usar um método contraceptivo [...] teria usado e não teria nove
filhos [...] falou assim: ‘é que eu não sabia disso, não tinha acesso ainda...’”

Além disso, nesses discursos, o subtema conforma a luta pela igualdade de


gênero, buscada pelas mulheres.

Em3_L228-229: “É, mas eu sei como você não vai fazer, XX, porque você é do
jeito que a mamãe criou, eu sei como você é.”

Em13_L105-106: “Eu lamento, as mulheres [...] sem ter o poder de decidir a


vida [...] vejo o ensino à distância e eu digo tem que ir, tem que fazer, tem que
estudar.”

Em13_L112-114: “O dinheiro que tem é pra família, para pagar o aluguel, para
comer... isso dói muito. A gente não merecia isso, né? A gente merecia uma
outra expressão [...] Planejamento de vida.”

Em13_L115 a 116: “Eu tenho muita pena, quando eu vejo uma moça de quinze,
dezesseis anos grávida [...] porque não planejou.”

4.2.4.1 Tema: A maternidade

Os discursos revelam aspectos relacionados à mulher e os planos


interrompidos pela maternidade ou cuidado dos filhos, que ela exerce
majoritariamente sozinha.

Em1_L214 a 223: “A gente fica em segundo plano, não tem como. Então, a
minha graduação foi EaD, porque eu não podia fazer em nenhuma faculdade
comum, [...] agora [...] tenho minha graduação e não posso trabalhar. Porque
para trabalhar, eu teria que arrumar... gente, eu não sinto confiança pra alguém
cuidar o dia inteiro, e daí, o quanto eu teria que pagar pra poder, pra um
cuidador o dia inteiro com meu filho, o dia inteiro, então quando eu digo, teria
que ficar com ele o dia inteiro, levar para as coisas todas, e aí, professor ganha
o suficiente pra pagar como? É e... acompanhante... mais bancar uma vida...
daria elas por elas, [...] ou, eu ganharia, no final das contas, até menos, do
que eu tenho hoje.”

Em2_L117: “Eu tive ele, eu tinha 11 anos.”

Em3_L428 a 430: “Um dos meus projetos era fazer o curso que eu gosto que
seria de ou design de sobrancelha ou negócio de unhas que eu sempre gostei
muito do negócio de unhas.”

Em10_L140-141: “...antes dele, e aí, depois que ele nasceu, ainda cheguei
trabalhar um tempo, mas depois...”

Em13_L134: “Carregou esta frustração de nunca estudar. E de ter tido filhos e


de ter ficado.” {falando sobre a mãe dela}
RESULTADOS| 110

Em13_L145: “Falava isso: ‘dá muito gasto.’”

Além disso, a presença de frases temáticas que apresentam ambivalências


em relação à maternidade, que revelam as contradições do ser-mãe.

Em5_L88 a 93: “Eu tinha 19 anos, sabe né, a vida era… eu estava trabalhando,
então minha vida era isso, era trabalhar, chegar em casa, era dormir, tipo, vida
bem rotineira [...] e veio uma criança e eu, eu falo isso para as minhas irmãs,
eu falo isso também, eu nunca fui aquela pessoa que gostava de criança, nunca
fui fã de criança, essa é a verdade [...] As minhas amigas chegavam com os
filhos delas, e eu ficava tipo, ai…pra lá... e ai, quando ela nasceu, mudou tudo
isso pra mim, sabe...”

Em5_121 a 124: “E a segunda parte que me deixou assim... Foi o meu corpo
começou a mudar, como você mesmo viu, eu era uma adolescente, né? E aí
mudou, mas nada assim que eu... ‘nossa, que horror... me arrependo de ser
mãe’, não, não teve…”

Não obstante, o subtema encontrado nos discursos revela concepções sobre


a maternidade, como fator também estressor, em virtude do isolamento social e/ou
solidão materna.

Em5_110 a 113: “[...] Só que no primeiro dia que eu fiquei no hospital, eu estava
sozinha, estava eu e ela, meu marido estava trabalhando e acho que ele ainda
trabalhava no…(inaudível), eu estava com ela no colo e ela começou a chorar
e eu comecei a chorar junto, acho que foi a primeira vez que eu falei: é, eu sou
mãe’...”

Em5_114 a 121: “E, no início também foi bem complicado pra mim, porque eu…
ficava… fechada, né? Ficava meio que isolada, ficava isolando os amigos de
certa forma, né? Porque eu estava sempre cuidando da minha da bebê,
também não tinha acesso às minhas amigas, algumas eu perdi contato, até tipo
sumia mesmo, me distanciava, e eu sentia o que todo mundo fala da solidão
materna, né? Que você se sente sozinha, você se sente sem amigos e... às
vezes, eu via, né? O homem saindo de casa, eu via meus amigos aí… os
amigos queria fazer churrasco, comemorar a vida da sua filha, saber o que
aconteceu, mas você mesmo não consegue ter seus amigos, você não tem
nada.”

Em13_L106-109: “[...] A coisa da maternidade carrega a mulher [...] não larga


da maternidade. Então a mulher fica presa ali... principalmente quem tem um
filho com um transtorno.”

Os discursos das mulheres apresentam expectativas de aprendizado na


maternidade, sobretudo com outras mulheres, familiares.

Em5_103 a 110: “E... no primeiro dia no hospital ainda, que foi muito
engraçado, assim… eu de boa, sou tranquila, tudo de boa, e… vou ter uma
RESULTADOS| 111

filha, mas eu tenho... eu moro com minhas irmãs, eu moro com meu pai, eu
moro com... meu marido na época, depois a gente terminou o relacionamento,
aí, eu falava: ah, qualquer coisa, eu não vou tá sozinha.’ Todo mundo ali já tem
uma experiência com filho, a única pessoa que não teve um filho foi eu, tem
minha cunhada, todo mundo ali teve uma experiência com filho, menos eu…
eu não fui a primeira, se ela chorar vai ter quem tem a quem recorrer...”

Em5_130: “Então, tem bastante mulheres na minha casa...”

Em5_131 a 134: “É, e isso eu posso ficar tranquila, porque minha família é
bem... gosta muito dela e além das minhas irmãs que eu tenho, tenho
sobrinhas, são quatro sobrinhas todas, fora a família do pai, tem muitas irmãs,
tem muita mulher na vida dela assim, fora o pessoal do CAPS, professora...”

Os fragmentos de frases apontam que as mulheres esquecem de si para


cuidar do/a filho/a, como meio de garantir cuidados.

Em2_L157: “Acho que não tem mais nada, cuidar dos meus filhos, lutar por
eles.”

Em10_L128-129: “Precisa, não é fácil, nem um pouco, fica pior, aí, você vai se
deixando de lado.”

Em13_L216 a225: “Ele ingeriu água do parto e [...] teve que fazer cirurgias,
com quarenta e oito horas de nascido [...] tive que correr. [...] recebi alta para
acompanhar [...] não tive tempo de pensar em problema. Eu tive tempo de
resolver [...] com ponto da cesárea [...] entrei na ambulância [...] eu subi escada,
eu andei de ônibus [...] não me preocupei. A cesárea era a última coisa que eu
me preocupava. Eu me preocupava com ele.”

Outras frases temáticas nos discursos destacaram os problemas e a


Resiliência materna, sobretudo, com e pelos filhos.

Em6_L99 a 103: “Tem muitas mães que têm filhos, [...] às vezes, o problema
não é tão grave, é até menor do que o dele... faz quase tudo como uma pessoa
normal. E... tem depressão a mãe, por causa da criança que tem problema, eu
vejo, ela chora, nem se arruma, [...] e ela só tem um filho. Eu tenho dois e o
YYYY é mais grave do que ele.”

Em6_L105 a 107: “Eu me vejo, me olho no espelho, eu tenho coragem, tenho


força... fácil não é, não é mesmo, mas tem que ter força e coragem e amar
muito os filhos... amar muito ele, e bola pra frente, vamos vencer.”

Em6_L108 a 119: “[...] tem mães que me vê com dois (filhos), vê eu bem, [...]
nunca tô pra baixo, nunca vão ver, [...] o meu jeito é esse, [...] acordo assim,
estou viva, vamos vencer. Vamos fazer tudo como se fosse o último dia de vida,
porque eu não sei o dia de amanhã, [...] se eu tô de pé, vamos fazer do dia o
melhor de todos, hoje, amanhã fazer o dia ser ótimo, todos os dias fazer, eu
penso assim. Tem pessoas que vivem pra baixo com depressão, então como
vai cuidar? Eu acho que eu tenho que estar melhor do que ele, pra poder passar
o que eu tenho de melhor.
RESULTADOS| 112

Em10_L129 a 135: “Eu aprendi que eu não tenho que dar conta de tudo, né?
E o dia que não der tudo bem, a mulher, né? A gente se cobra muito, e eu
aprendi que eu não tenho que dar conta de tudo, que no dia que tiver bem no
dia, no outro dia míngua, pronto, isso me fez bem comigo, me libertou, né? Que
você se cobra demais, e veja que você não consegue, você fica frustrada, hoje
não, hoje se der deu, se não der, amanhã dá, e se não der amanhã, semana
que vem dá e tá tudo bem.”

Em13_L206: “Eu não estava focada no problema. Eu estava focada na


solução.”

4.2.4.2 Tema: Antes e depois

Este tema apresenta discursos relacionados, ou acompanhamento realizado


por serviços de saúde. Dentre esses, os fragmentos de texto apresentaram a
atividade antes do diagnóstico.

Em1_L502 a 519: “Os degraus podem ser curtinhos, dependendo de seus


privilégios, [...] pessoa branca, de classe média etc., ou os degraus podem ser
enormes, para uma pessoa periférica, negra etc., mas os degraus existem. [...]
os cuidadores de pessoas com deficiência, é como se não tivesse essa escada,
tiraram… eu tenho asas, eu sei que eu posso voar, mas me cortaram, eu não
posso, entendeu? (choro) [...] vem o diagnóstico, na hora que você ganha o
diagnóstico, [...] te tiram essa escada, você entendeu? Eu sei que seria uma
ótima profissional, mas eu não tenho condições de atuar, eu gostaria muito,
entendeu? Espero que eu consiga, gostaria muito de fazer uma pós, mas para
eu fazer isso, vou ter que saber onde enfiar meu filho, mas isso eu não faço,
então é isso, me tiraram a escada, eu vou ter que conviver… se eu fosse de
classe média, eu estaria um pouco mais tranquila, e eu poderia né? Ter as
coisas, mas na minha condição, saber que eu vou sempre ter uma vida
medíocre, eu não vou poder almejar viajar, eu não vou poder almejar ter um
carro, eu não vou poder almejar fazer escolhas que para mim… que até para
as pessoas pode parecer, ah, não, isso é supérfluo, supérfluo para quem
sempre teve, para quem nunca teve e sempre almejou? É isso que eu vejo, é
eu e meu filho.” {Ela chora… chora.}.

Em2_173 a 175: “Antes de eu começar o tratamento do XXXX, eu fazia a unha


[...] tive que parar, não tem como eu dar continuidade fazendo unha, andando
com o XXXX [...] eu tenho que ir para o Mandaqui [...] a mulher quer vir, eu
tenho que ir em outro lugar mais o XXXX, então, sem chance. Vai perdendo as
clientes.”

Em4_L164 a 166: (avó) “E eu parei mais de trabalhar mesmo, porque tinha que
ter os dias certos para vir aqui, e eu não vinha no CAPS.”

4.2.4.3 Tema: Sororidade

Os discursos tematizados revelam o apoio para o cuidado entre mulheres da


família, com destaque para as mães das mulheres, as histórias compartilhadas de
RESULTADOS| 113

fortalecimento e sororidade.

Em3_L95 a 99: “Eu sei que você é um bom companheiro, tem as crianças, mas
para mim é complicado entendeu? Falei para ele, eu estava acostumada com
a minha mãe, alguém para ir lá e conversar porque eu sou uma pessoa assim
que, a gente tem amigos, mas nem tudo para amigos a gente fala, depende do
que a gente tá passando, né?”

Em3_L103: “Era muito minha mãe, para um conselho, alguma coisa


entendeu?”

Em3_156-157: “Nós passamos tanta coisa com meus irmãos, nem sabe.”

Em3_L158 a 160: “Se a gente come arroz e feijão puro, nós estamos passando
aqui... porque a gente fizer, a mamãe só confia em você, não conta para
ninguém, assunto meu e seu, ninguém precisa saber, então são muitas coisas.”

Em3_L171 a 173: “Eu ia esquecer? Sua mãe contava para igreja que era seu
aniversário, que você... porque era tudo, sabe?”

Em3_L229 a 232: “Era eu e ela, ela fez muita bondade para muita gente sabe,
então, eu sou, eu sou assim, eu não consigo dizer não, eu não consigo ser ruim
e depois aquelas pessoas que eu ajudo, me pagam com muita gratidão.”

Em3_L326 a 329: “Fazia doces mesmo que nós duas tinha diabetes. Tinha vez
que a gente abusava é para a gente medir o nosso diabete, tava lá nas alturas.
Mãe, a gente abusou, fala até para a médica, A XXXXX fica brava comigo mas
a gente comentou você pode chupar sorvete, a ZZZZZ vai lá e compra, aí, eu
e ela.”

Em3_L330-331: “Aí, minha tia fala para mim cada doce que você quiser, cada
doce que você se lembra dela, lembra com alegria que ela gostava dessas
coisas, sabe?”

Em3_L399-400: “Eu sempre com a minha mãe do meu lado, a gente levava ele
para as clínicas e saia às cinco horas da manhã.”

Em3_L163-166: “Minha mãe falou: ‘nunca... eu sei quem é minha filha e coisas
importantes da vida da gente, eu não conto na casa de ninguém, eu amo todos,
mas a que eu sou mais apegada é você e meus netos, que nasceram e
cresceram aqui comigo.’”

Em3_L191 a 194: “Para mim a minha dor é minha dor, diferente da deles”, como
minha tia já me explicou, né? Que o homem sabe e por eu ser a única mulher.”

Em3_174 a 177: “Da Congregação, sabe, aí eu levava ela na igreja, porque o


horário que ela ia, 6 horas, meu marido ainda não tinha chegado do serviço, e
9h30 que acabava o culto, ele ia comigo buscar ela, sabe, e ela quando se
internava no Hospital, eu ia, quando ela chegava.”

Em3_L178-179: “Eu sinto que desde que minha mãe morreu muita coisa
mudou em mim”

Nos fragmentos de textos, as Referências maternas são explicitadas com


RESULTADOS| 114

valorização das matriarcas, revelando saudades e aprendizados.

Em3_L178-179: “Eu sinto que, desde que minha mãe morreu, muita coisa
mudou em mim.”

Em3_L182 a 184: “É difícil, não é bolo, não é roupa, não é nada, não tem isso
que mude em mim, é aqui dentro, a falta dela, é a presença dela ali.”

Em3_185 a 186: “Eu misturo tudo isso em mim, esse sentimento de saudade
com revolta.”

Em3_L314 a 316: “O que eu me culpei, assim, depois foi que chegou lá era
lacrado só no rostinho, né ? Aí, eu falei: ‘gente, vocês não me deixaram entrar,
eu tinha que ter entrado lá e ter abraçado ela e beijado ela pela última vez.’”

Em3_L321-322: “Falei pro moço ‘não dá pra abrir aqui para eu abraçar e beijar
minha mãe?’ Ele falou: ‘não pode, moça.’”

Em3_L353 a 358: “Eu não asso pernil, que a minha mãe adorava isso, sabe?
Começava a chegar final de ano, aí, o pernil, né? Ela fazia as coisas, dava tanta
alegria, eu falei: ‘isso eu não vou fazer.’ Ele falou: ‘não, XXXXX, não precisa ter
pernil, se não quiser cozinhar nem nada, XXXXX’. Mesmo assim eu fiz, mas
não teve como eu dizer que eu não chorei, e de lá para cá, eu tô assim, sabe?
Eu choro, eu converso com ela, eu sinto muito.”

Em3_L233 a 235: “Isso é uma coisa que não tem que haver cobranças e
preocupações, nem a você, nem a BBB. É em relação a mãe, não sei quanto
tempo eu vou levar a me recuperar, eu não sei nem se vou me recuperar.”

Nas frases temáticas, a seguir, nota-se o ensinamento geracional feminino e


feminista.

Em13_L133 a 143: “A minha mãe era analfabeta [...] carregou esta frustração
de nunca estudar. E de ter tido filhos e de ter ficado [...] ela falava: [...] ‘ai, não
arranja barriga não, que com o dinheiro que você vai gastar para dar para a
criança, você pode comprar batom, sapato...’ E aquilo me fascinava [...] aquela
ideia [...] ‘não quer comprar uma roupa, um soutien bonito, um sapato, uma
bolsa, um batom?’ Aquilo vinha um brilho, assim, no meu olho... ‘e assim, com
seu dinheiro? Então não arranja barriga. Se você arrumar um filho, você vai ter
que cuidar do filho’. Então eu já via aquilo como... ela falou: ‘filho, só quando
você pode criar, não arranja filho antes da hora, né?’”

Em13_L149 a 151: “Ela falava: ‘burra, já de barriga’. Eu achava engraçado,


mas eu captava aquilo [...] falou: [...] ‘faz... planejamento.’ Mas ela não conhecia
esta palavra, mas faz uma forma de viver.”

Em13_L151-152: “Vai viver, vai para o carnaval, vai arrumar o cabelo. Dando
para mulher, a possibilidade de aproveitar a sua vida como mulher [...] nem
tanto se sacrificar pelo filho... deixa [...] para hora que você realmente
puder...”

Em13_L173-175: “Ela era muito feminista, [...] ela cuidava de crianças, para
RESULTADOS| 115

outras mulheres poderem trabalhar [...] por uma bagatela [...] falava assim:
‘para que que eu vou explorar ela? A vida já explora [...] vou ajudar, para que
ela possa trabalhar, para melhorar.’”

M13_L185-186: “Ela precisa comprar casa, precisa comprar comida... sou eu


que vou explorar ela? Eu não. O patrão já explora.”

4.2.4.4 Tema: Resistência

Os discursos revelam a importância da Espiritualidade, Religião no equilíbrio


e Saúde Mental na vida dessas mulheres.

Em2_L20-22: “Escuto bastante louvor, [...] minha mãe é evangélica, [...] tipo
seguindo [...] vou devagarzinho, mas estou indo [...] Me dá um pouco de paz.”

Em3_L78-83: “Minha tia é espírita. Ela me explica muito lado espiritual [...] mas
para mim perder, não chorar, né? Ficar chamando tanto ela, senão, ela não
descansa onde ela tá, e ela fica triste e vem de alguma forma perto de mim,
porque ela sabe que eu tô triste, eu tô sofrendo, ou fazendo alguma coisa.”

Em3_L150: “É um vício, ele vai melhorar. Você não crê?”

Em3_L155: “Tem que ter fé, que ela, o que ela era uma mulher de fé.”

Em4_L23-24: “Congregação. Depois que eu comecei com a igreja, eu tô bem


mais forte, tem dias que eu tô mais caída.”

Em6_L24-26: “Eu creio em Deus [...] Não tenho lugar específico, às vezes, vou
no templo de Salomão, não sou fanática em religião.”

Em6_L115 a 117: “O que eu puder fazer, farei, o que eu não puder, só Deus.
Fazer ele falar é só com Deus [...] tem coisa que eu não posso, é só Deus.”

Em7_L109: “De mim mesma, do meu interior, de deus, que me dá forças cada
vez mais.”

Em11_181-182: “Sou da igreja, né? Nunca usei nada de errado, né? Criando
meus filhos e indo para igreja.”

Em11_185 a 187: “Ajuda. Ajuda ficar em paz, ajuda a ficar mais calma, né?
ouvindo a palavra de Deus, né? Deus consola meu coração, fala umas coisas
boa pra mim, que eu tava precisando, né? Então eu fico mais aliviada quando
eu tô dentro da igreja.”

Em11_261: “Mas eu tenho fé em Deus que logo, logo essa epidemia vai acabar.
Só ter fé.”

Em11_264: “Não, minha amiga é Deus.”

Em11_270 a 272: “Eu só tenho minha mãe mesmo, a minha mãe tem os
problema dela, lá, então eu, meu problema, eu deito no meu colchão e fico
RESULTADOS| 116

orando e pedindo para Deus me dá força pra criar essas três benção, só isso
que eu peço para Deus.”

Outro subtema que é revelado pelos discursos, trata da Instrução da mulher,


e os percalços para viabilizar esta atividade em suas vidas.

Em13_L101: “Eu fiz faculdade de Direito.” Em13_L103: “Estudar amplia o


leque, né?”

Em13_L117 a 130: “Eu tinha vinte e poucos anos [...] planejei isso [...]
trabalhava e fui atrás [...] fui para uma faculdade que me dava um incentivo
[...] a PUC. Não tinha o PROUNI [...] eles falavam que era o dinheiro do padre
[...] usei o dinheiro da arquidiocese [...] com oitenta por cento de bolsa e
depois eu devolvi. Depois de formada, eu fui trabalhar para devolver [...] para
que outras pessoas pudessem estudar. [...] Se eu não pagar, a outra pessoa
não vai poder estudar. Esse dinheiro voltando para instituição, vai fazer com
que outras bolsas sejam concedidas. É uma mão lava a outra. Se você não
pensar no social, [...] vai querer fazer medicina, odontologia, que é mais caro,
até... e ela não vai poder fazer, por que eu não paguei? [...] a culpa foi minha?
[...] jamais eu atrapalharia a vida de alguém. Não tenho esse direito.”

Em13_L157 a 159: “É preguiça? Depois não reclama [...] não vai ganhar o que
você devia. Eu perguntava: ‘ganha mais?’ e ela: [...] ´sim, a pessoa sabe mais,
ganha mais´. E eu ficava muito curiosa.”

Em14_L14: “Eu curso Superior, mas eu tranquei agora.”

Em14_L38: “É, eu entrei justamente para poder ajudar ele em casa, mas
não deu.”

Em14_L67-68: “Não muito, né? Porque eu tinha a faculdade, mas também


ajudava. O tempo que ele ficava na escola, eu tinha tempo para as minhas
coisas.”

Em15_L3-4: “Pra dizer a verdade, não estudei, não, naquela época, eu só


queria trabalhar, para eu não ficar dependendo das outras pessoas, não quis
estudar.”

Em15_L9: “Eu não cheguei a ir pra escola, eu só trabalhava e cuidando ele.”

Para finalizar esta categoria, frases temáticas apresentam um aspecto


importante, por onde elas resistem, que é a Positividade na atitude das mães.

Em3_L178-179: “Eu sinto que, desde que minha mãe morreu, muita coisa
mudou em mim.”

Em2_L156: “A solução é essa. É pensar e acreditar.” Em3_382: “Eu vou


jogando palavras positivas em cima.”
RESULTADOS| 117

4.2.5 CATEGORIA V – RACISMO

Na categoria Racismo, foram agregados temas e subtemas pertinentes:


Identidade Negra (cinco subtemas: Autodeclaração, quesito raça/cor, cor da pele;
Identificação e sentimentos em relação ao racismo; a construção da identidade negra;
Racismo, território; Racismo no CAPSij; Referência Negra).

4.2.5.1 Tema: Identidade negra

A análise dos discursos revelou que, ao se abordar a questão do racismo,


algumas das entrevistadas negam a existência do mesmo, o que pode ser
compreendido pelo contexto (de morar em território, majoritariamente, de população
negra), ou reproduzindo o racismo estrutural que mascara a sua existência.

No subtema, Autodeclaração, quesito raça/cor, Cor da pele, as frases


temáticas revelam concepções racializadas, e percebe-se tanto a ideologia do mito da
democracia racial, quanto da internalização da cultura europeia branca, na maneira
como negam a cor com palavras e expressões, tais como, “não tá pegando sol [...] as
mãos dele tá mais branquinha, os pés também”, “pardo, mais pra branco”, “não é
considerado negro”, “eu sou parda, mas eu não acho que ele seja negro”, “nenhum
problema que ele seja pardo, branco, negro”, “não tenho muito essa exigência, de que
faça a cor”.

Em2_L6-7: “Porque ele não tá saindo de casa, não tá pegando sol, vejo que as
mãos dele tá mais branquinha, os pés também.”

Em6_L1-4: “Ele não é considerado negro [...] eu tenho outro filho, que é
considerado, que é considerado que é negro. {qual é a cor da pele dele?}
Parda, ele na verdade, pardo, mais pra branco.”

Em13_L5: “Eu sou parda, mas eu não acho que ele seja negro.”

Em13_L7 a 13: “O pai não é pardo como eu, a gente nem define muito mais
isso... [...] nenhum problema que ele seja pardo, branco, negro... na verdade,
eu não tenho muito essa exigência, de que faça a cor.”

Em11_2 a 4: {e a sua cor da pele?} “Morena.” {Você se autodeclara branca,


preta ou parda?} “Parda.”

Em4_L1: {E a sua cor?} “Sou branca.”

Nas frases temáticas que exemplificam a Identificação e sentimentos em


RESULTADOS| 118

relação ao racismo, percebe-se uma ambiguidade de sentimentos, quando o assunto


é racismo. As mulheres demonstram desconforto ao falar sobre o tema, baixam o
olhar, recebem a pergunta com surpresa, negam que o racismo tenha alguma
expressão na vida delas, desconhecem. Esses discursos remetem ao racismo
internalizado, e concepções ideológicas de superioridade de pessoas brancas. Na
dúvida, negam a existência do racismo, novamente a trama do mito da democracia
racial.

Em2_L113: “Eu nunca nem sei isso.”

Em2_L114-116: “Sempre tem um lugar, a gente ouve, eu não ligo, vou te falar
uma coisa, eu não dou atenção [...] às vezes, a pessoa também tá naquele dia
[...] a gente [...] tem que entender, eu não ligo, nem nunca reparei nesse tipo
de coisa.”

Em2_L187 a 189: “Eu acho que o XXXX nem entende isso, acho que raça pra
ele, vai para outro sentido, uma coisa que não tem nada a ver.”

Em4_L203 a 205: “Não, no posto, eu mesmo, nunca falaram nada. Tudo


direitinho. Assim, talvez, no médico, assim, quando eu precisei no pronto
socorro, tem os médicos, aí, sim. Mas no posto que a gente frequenta, não.”
{sobre racismo}

Em10L_36: “Que eu tenha percebido, não.”

Em10_L96-97: “Na questão da cor que eu tenho presenciado, ele não… ele
também não tem noção disso.”

Em2_L119 a 121: “Meu primeiro que tem 24 hoje, então, eu acho que é por isso
que eu não ligo mais para essas coisas, não é que eu não me recordo, não me
lembro de ninguém ter sido racista comigo, não. Racismo, não.”

Além disso, a construção da Identidade Negra, é expressa nos fragmentos


de textos, que exemplificam modos de discriminação racial e racismo.

Em5_348 a 350: “Na infância, já na adolescência e não só na infância, eu


sempre senti foi assim, um peso pessoal, mais excluído, que foi em relação ao
cabelo, o meu cabelo, ele é cacheado, crespo, e ele é volumoso e não era
qualquer progressiva que dava conta.”

Em5_351 a 353: “É, hoje, eu assumo meus cachos (ela sorri), mas até um
tempo atrás, normalmente, eu sofria com isso, sabe? Do tipo, ‘ah, por que não
faz uma progressiva?’ ‘Cabelo duro, que não sei o que…’”

Em5_354 e 355: “Ah, falavam isso na escola, eu devia ter meus 12 anos, olhou
assim pra mim do nada e falou: ‘ah, vai… ó, sua cabelo duro.’”

Em5_356 a 358: “E já teve coleguinha [...] que olhava assim, não minhas
RESULTADOS| 119

amigas, que amigas mesmo eu nunca tive nada, mas minhas colegas olharem
e falar assim: ‘ah você, é… nossa, por que você não faz uma progressiva?
Cabelo liso, e já aconteceu também, que…’”

Em5_359 a 361: “[...] sofri muito bullying [...] de falar eu sou negra e as pessoas
dizerem: ‘não, você não é negra’, mas, em relação do cabelo, do cabelo, teve
uma vez que eu também fiquei mal, lá pela cor da gengiva, o pessoal rindo, é
isso…”

Em5_398 a 400: “Fala do nariz, eu nunca escutei essa questão, como eu não
sou considerada negra, então uns dizem: ‘ah, você não é negra, você tem a
pele clara’, a pessoa vai ser racista para outro [...] faz uma piadinha [...] ‘Eu to
aqui’ [...] você fica... ”

Em5_402 e 403: “Eu lembro uma vez, eu tava num salão de cabelereiro e ele
era especializado em loiras, só tinha loiras, e eu lá tava tipo...”

Em5_404 a 407: “E eu tava cortando o meu cabelo, ela olhou pra mim e disse:
‘o meu pai é preto, aquele preto safado, os pretos são assim tudo safado’, …
aí, eu fiquei olhando assim, ‘ não fala isso do negro’… e ela assim, ‘é verdade’,
que eu não sei o que, não sei o que… eu acho que foi racista no salão, só tava
eu lá.”

Em5_408 a 410: “Uma outra funcionária que também era branca, ela tipo ouviu,
e ela ficou tipo… (concordando). É como ele mesmo, olhar para a pessoa, ah,
de escutar, de falar, preta, aquele cabelo duro, não sei o que...”

Em5_412 e 413: “Nunca tipo direta… Ou senão. ‘ah, era uma brincadeira, não
estava falando sério. Você se ofendeu com isso?’”

Os discursos desvelam interfaces entre Racismo, território, o apartheid social


existente, que concentra mais pessoas negras nas periferias e bairros mais afastados.

Em5_42 a 45: “Não... eu também acredito, porque os locais que eu frequento


são muito frequentados por negros, né? É bem difícil na verdade, você achar,
assim, uma pessoa branca, então, eu não senti isso, pelo menos, não no
sentido de médicos.”

Em8_L36 a 41: “Imagina, nós estamos em 2021 ainda tem esse negócio do
preconceito e do racismo, essas coisas... aí, na escola, antigamente, quando
ela ia, ela era empurrada, achavam engraçado o cabelo dela, deveria ir para
estudar... deveriam dizer: ‘você vai para a escola para estudar, ou prestar
atenção no cabelo dela?’ Deveria vir para estudar. O cabelo dela é só diferente
do seu. Assim, o racismo você tem que acompanhar eles, sozinha a sociedade
não vai mudar.”

Em8_L43: “Eles podem fingir que aceita e tudo, mas eles não vão mudar.{Onde
sofreu racismo?} Na escola, no ônibus, em qualquer lugar, às vezes...
antigamente, eu respeitava essa coisa de idade... muitos idosos... ‘o que que
esta menina está fazendo sentada aí?’ Eu ficava com ela em pé, hoje em dia
não, pego a carteirinha dela, o mesmo direito que ela tem, o senhor tem, então,
falando de idoso que não consegue parar em pé... eu não sei viver, eu levo
minha filha para qualquer lugar, é direito deles, porque já disseram que autismo
RESULTADOS| 120

não tem cura, tem melhora, autismo é uma doença e não tem cura, ela tem
melhora, tem uns que conseguem fazer faculdade, levar vida normal, tudo...
casar, ... fez faculdade tem um médico, fez faculdade, autista, né?”

No subtema, Racismo no CAPSij, a frase temática revela discurso sobre não


haver racismo no serviço de saúde mental, a participante diz que sente-se bem, pois
é atendida por profissionais negros como ela. Isto remete à ideia da representatividade
da população negra entre os técnicos, profissionais, em uma equipe que problematiza
questões raciais e investe na contratação de profissionais negros.

Em5_46 a 50: “Não, nunca tive nenhuma discriminação, na verdade, eu até me


sinto bem aqui, porque são muitos negros, muitas mulheres negras que
atendem, eu diria até que, a maioria são mulheres negras, pais, tipo, ah, se
identificam comigo, não também, algum pouco de discriminação, não lembro
de ter passado algum, nem estresse, nenhum aqui. Muito menos por isso.”

Os discursos abordam sobre as Referências negras na construção do


empoderamento, e também remete à ideia de que representatividade importa, e que
quanto mais o racismo for combatido, mais pessoas negras ocuparão lugares na
música e na política e todos os campos da vida.

Em5_L419 a L421: “Então, nós sabemos, ela nasceu em setembro, virginiana


é o mesmo signo que o Michael Jackson, eu falo isso com meus amigos, a
minha filha tem o mesmo signo que o Michael Jackson, mas é mulher…”

Em13_L95 a 97: “Eu chegava para algum lugar tipo Michelle Obama, jantava
e depois ia para o lugar [...] Convidou [...] na Casa Branca [...] falou: [...]
‘venham jantados’, porque era só um petisco [...] eu falei: ‘poxa, eu preciso.’”
5 ANÁLISE DOS DADOS
ANÁLISE DOS DADOS| 122

5 ANÁLISE DOS DADOS

A pesquisa realizada junto às mulheres, maioria autodeclaradas pretas e


pardas, mães, cuidadoras de crianças/adolescentes negros de CAPSij, demonstrou
que elas protagonizam todo o cuidado sozinhas, bem como a sustentabilidade das
demandas cotidianas da vida, e que resistem às diversas dificuldades em função dos
filhos. Compreender as barreiras de acesso a direitos, que vulnerabiliza as mulheres,
passa pela identificação do racismo institucional que sistematiza as opressões
raciais e de gênero, determinando a desigualdade de classe social pela pauperização
delas.

Pesquisas científicas enfatizam a necessidade de avançarmos na identificação


das vulnerabilidades intereseccionalizadas e produzidas pelo racismo. Dessa
maneira, os autores referem que além de coletar o quesito raça-cor, é preciso analisar
os dados de maneira crítica e propositiva, pois é insustentável a contradição das
iniquidades afetarem, a maioria da população brasileira (Batista et al., 2022).

Assim, torna-se urgente que proposições concretas que alterem políticas


sociais e de saúde, com prioridade absoluta para o combate às desigualdades
racializadas, por serem inconstitucionais, e por afetarem a maioria das mulheres
brasileiras e seus filhos. Se o Brasil é o segundo país negro do mundo, atrás somente
da Nigéria, segundo González (2020), coloca-se em evidência que esta a população
brasileira de fato.

Dentre as primeiras pesquisas divulgadas no início do século XXI pelo IPEA,


detalharam que a maioria das mulheres negras brasileiras eram empregadas
domésticas (21%), e que apenas 23% tinham carteiras de trabalho assinadas
(comparadas às brancas, com 12,5%, sendo 30% registradas); 46,27% delas nunca
havia realizado exames para detecção do câncer de mama (“contra 28,73% de
mulheres brancas” na mesma situação). A situação piorava em relação à renda
dessas mulheres, que apesar de terem maior escolaridade do que os homens,
menores salários, em média “R$ 279,70 – contra R$ 554,60 para mulheres brancas,
R$ 428,30 para homens negros e R$ 931,10 para homens brancos”. Elas
representavam 23,4% da população, mapeadas discriminações duplas neste banco
de dados, pelo racismo e sexismo (IPEA, 2003).
ANÁLISE DOS DADOS| 123

O relatório das desigualdades (2022), quase 20 anos depois, refere que 77%
das mulheres negras se consideram “classe média baixo” ou “pobre”, sendo que 59%
das pessoas concordaram que a população negra recebe salários menores por serem
negros, tendo aumentado “8 pontos percentuais” entre 2019-2022, o acesso ao nível
superior, possivelmente pela Lei de Cotas, 84% dos entrevistados concordaram que
a pobreza afeta mais a população negra do que os pobres brancos, 87% dos
brasileiros concordaram que os governantes tem “obrigação” de diminuir a
desigualdade social e, outro dado contraditório, é que 68% concordaram que eleger
pessoas negras para cargos políticos tem menor possibilidades. Nesse breve retrato
atualizado, percebe-se que as desigualdades raciais, de gênero e de classe sociais
têm sido percebidas pelos brasileiros nos últimos anos, no entanto, as condições
permanecem semelhantes, mesmo com uma pequena melhora no acesso às
universidades, continuam discrepâncias relacionadas às condições de vida,
salários/renda e o racismo velado nas concepções de sociedade, quando relatam
menos chances de pessoas negras serem eleitas. (OXFAM, 2022)

Pesquisa semelhante sobre a percepção do racismo pelos brasileiros foi


publicada (Munanga, 2017), quando perguntados sobre se considerarem racistas,
maioria respondeu que não, mas quando abordados sobre a possibilidade dos filhos
estabelecerem relações por meio do casamento com pessoas negras, referiam que
não concordavam, pois, estariam fadados à maior discriminação. Esses exemplos,
remetem à atitude propositiva necessária urgente, que a pesquisa das produções
científicas apontou (Batista et al., 2022), de que não é mais possível sustentar e
continuar compilando-se dados sobre o racismo e seus efeitos na sociedade
brasileira, dentre esses os danos psicossociais materiais.

É preciso assegurar, não apenas saúde para todos, mas, sobretudo, intervir
radicalmente para ampliação do acesso à vida material com dignidade para as
mulheres negras e suas famílias. Nas concepções históricas relacionadas às
pesquisas sobre racismo e seus efeitos no Brasil, a pioneira que utilizou raça como
categoria analítica foi apresentada por Barbosa (1998). Lopes, Werneck (2010)
explicitam que, o conceito de raça não se refere a aspectos biológicos, genéticos, de
diferentes fenótipos. Raça é uma construção social ideológica de estratificação social,
cujo “estrato inferior da hierarquia sociorracial” é destinado à população negra, e
sistematizada pelo racismo (Lopes, Werneck, 2010). Assim como em Stuart Hall, o
ANÁLISE DOS DADOS| 124

papel da cultura é apontado como modo de produção da ideia de raça/racismo,


discorrida em estudos desse autor sobre gênero, raça e etnicidades (Holanda, Sovik,
2003; Zubaran, Wortmann, Kirchhof, 2016).

Para Souza (2021), o conceito de raça possui “funções simbólicas (valorativas


e estratificadoras)”, e a “categoria racial possibilita a distribuição dos indivíduos em
diferentes posições na estrutura de classe, conforme pertençam ou estejam mais
próximos dos padrões raciais da classe/dominante” (Souza, 2021, p. 48).

De acordo com pesquisa publicada no final dos anos 90, sobre “Cor nos Censos
Brasileiros”, existia a necessidade de produzir “estudos e pesquisas sobre as
dimensões antropológicas e psicossociais”, na perspectiva racial (Rosemberg, 1999,
p. 135). Anjos (2013), socióloga, refere questionamento da “tríade de categorias
branca-parda-preta” utilizadas na autodeclaração pelo IBGE, pois, na visão do
“movimento negro [...] uma categoria intermediária entre “branca” e “preta”, [...] abre
aos respondentes a possibilidade de declaração de uma cor mais clara ou
“branqueamento” nas respostas” (Anjos, 2013, 104).

O pensamento fanoniano (2020), afirma a construção de raça por uma relação


de poder hierarquizado, inventada pelos brancos, conforme o autor:

[...] os brancos retiram dos negros sua ontologia, inventando-o pelo “não ser”,
por um “sentimento de inexistência” e não puramente de inferiorização, que
para o autor, “é o correlato nativo da superiorização europeia”, ou seja, “é o
racista que cria o inferiorizado” (Fanon, 2020, p. 125).

Dessa maneira, conforme Santos et al. (2022), historicamente, raça foi


amplamente utilizada como categoria analítica para reiterar aspectos biológicos não
científicos, mas por outro lado, essa tem sido abordada como categoria social, ao
deflagrar as iniquidades e o racismo como desigualdade de poder (Santos et al.,
2022).

Segundo os pressupostos e objetivos deste estudo, o perfil sociodemográfico


revelou dinâmicas da sociedade brasileira, pela vulnerabilização das mulheres negras
em diversos aspectos, como educação, renda, moradia, lazer, com expressiva
ausência paterna no cuidado dos filhos, bem como rede social fragilizada. Crenshaw
(2002), refere isso como “interseccionalidades estruturais”, os aspectos relacionados
a raça e gênero, e “interseccionalidades políticas”, as políticas feministas antirracistas.
Para a autora, a “discriminação interseccional” se torna complexa de “ser identificada
ANÁLISE DOS DADOS| 125

em contextos em que forças econômicas, culturais e sociais silenciosamente moldam


o pano de fundo” (Crenshaw, 1991, p.176). Essa, por sua vez, é estrutural, “invisível”,
interrompe existências e possibilidades, perpetuando privilégios da branquitude,
discutidos por Schucman (2014), a partir da violência racista colonial relatada por
Schwarcz (1993; 2012; 2015) e, no princípio teórico feminista negro, por Bento (2022).

Este arranjo complexo de vulnerabilidades racializadas, arraigado no


capitalismo neoliberal, age na pauperização de mulheres negras. Essas exercem
trabalho doméstico e cuidado dos filhos, como trabalho não remunerado ou visto como
tal. Segundo as autoras, há necessidade de uma “forte reorganização da relação entre
produção e reprodução social”, que valorize a “vida das pessoas”, acima da “produção
do lucro”, ou seja: “[...] movimentos comunitários de base popular por habitação,
assistência à saúde, segurança alimentar e uma renda básica incondicional” (Arruza,
Bhattacharya, Fraser, 2019, p.118).

Na análise do material qualitativo das entrevistas, a maioria dos fragmentos das


narrativas deflagram a existência de preocupações das mulheres com a saúde dos
filhos em primeiro plano e depois com a sua, questões de ordem de acesso a políticas
de saúde mental e de inclusão escolar preparadas para as necessidades dos mesmos.
Segundo as autoras, a “família [...] foi feminizada e sentimentalizada, definida como
“cuidado” em oposição a “trabalho”, realizado por “amor” em oposição ao dinheiro”,
corroborando a ideologia que provoca a desigualdade de gênero (Arruza,
Bhattacharya, Fraser, 2019, p. 109). No entanto, o referencial teórico aponta
contradição, pois existe ação anterior, relacionada ao racismo e suas práticas, a qual
é “um dos fatores centrais na produção das iniquidades em saúde experimentadas por
mulheres” (Werneck, 2016, p.540).

As contradições relacionadas ao acolhimento das demandas e necessidades


das mulheres, mães, de crianças\adolescentes negros nos serviços de saúde, são
referidas por elas quando esses as apoiam, ou ora desassistem. Assim, confrontando
esses discursos com os objetivos e questões norteadoras deste estudo, a tematização
e a conformação das categorias empíricas demonstraram no percurso das mulheres,
a carga mental, o sofrimento psíquico provocado pelas barreiras do racismo
institucional, que em contradição, nem sempre são percebidos pelos sujeitos, bem
como seus efeitos (efeitos psicossociais do racismo).

O referencial teórico utilizado é categórico ao enfatizar, à luz dos determinantes


ANÁLISE DOS DADOS| 126

sociais em saúde, apontados pela OMS como aspectos estruturantes das condições
de vida e seus efeitos psicossociais, contradições na espiral dialética, em que o
racismo produz, sistematiza as iniquidades, pois, opera como um “dispositivo de
racialidade”. Segundo a autora, o racismo institucional é capaz de penetrar nos
“diferentes campos da vida social”, onde “produz seus resultados”, “reduzindo a
abrangência da autonomia” intimamente ligado “à criação e manutenção de
preconceitos”, estruturando o “tratamento desigual (discriminação)” (Werneck, 2016,
p. 541).

Por meio dos discursos das participantes, elas relatam medo de morrer antes
dos filhos adquirirem autonomia e preocupam-se com a continuidade do cuidado, a
partir de políticas de amparo dos mesmos em situações extremas. Relatam
discriminações dos filhos pelos problemas de saúde mental ou deles sofrerem
racismo, ambos no âmbito educacional-escolar, também por parte da família,
sobretudo dos homens (pai das crianças/adolescentes), profissionais da área da
saúde e especialistas do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).

Werneck (2016), com base em reflexões de Jones (2002), identifica o racismo


como sistema, de âmbito tridimensional (interpessoal/internalizado, interpessoal e
institucional), ao qual está relacionado a produção de uma racionalidade segmentada,
internalizada que provoca sentimentos de inferioridade, articula-se às ações
interpessoais e políticas que desumanizam, nesse caso, até mesmo na ideia de morte,
ou mesmo na desassistência no âmbito material, e de políticas educacionais inclusivas
efetivas e de saúde.

O racismo interpessoal/internalizado também é compreendido de maneira


fundamentada pelas concepções psicanalíticas, segundo estudos realizados por
Nogueira (2021), como um dos efeitos psicossociais do racismo. Nas palavras da
autora, “as representações da estrutura psíquica “não são puro reflexo das condições
objetivas”, como interpretado no materialismo histórico-dialético, mas essas “são
contaminadas pelas condições objetivas que receberão, no plano do inconsciente,
elaboração própria a partir das quais são assimiladas e incorporadas, tornando os
sujeitos cativos e mantenedores de tais condições” (Nogueira, 2021, p.34).

Jurandir Freire Costa, psiquiatra e psicanalista, em prefácio sobre a obra


imprescindível escrita por Neusa Souza Santos, “Tornar-se Negro”, enfatiza que a
“violência racista do branco, exerce-se [...] pela impiedosa tendência a destruir a
ANÁLISE DOS DADOS| 127

identidade do sujeito negro”, que a autora refere ser determinada por meio da
“internalização compulsória e brutal de um ideal do ego branco” (Santos, 2021, p. 25).
Santos (2021) assinala que existe um “custo emocional da sujeição, negação e
massacre de sua identidade original, de sua identidade histórico-existencial” (Santos,
2021, p. 46).

Para Santos (2021), o ideal do ego “engendra uma ferida narcísica, grave e
dilacerante”, que demanda a construção de “um outro ideal do ego”, capaz de romper
essa lógica, reconstruindo subjetivamente “valores e interesses” por meio de
“militância política, lugar privilegiado de construção transformadora da história”
(Santos, 2021, p. 77). Nesse processo de internalização de sentimentos de “culpa e
inferioridade, insegurança e angústia”, é o que provoca a “autodesvalorização,
timidez, retraimento e ansiedade fóbica”, no que ela cita preceitos fanonianos ao dizer
que, o “parceiro branco é transformado em instrumento tático, numa luta cuja
estratégia é cumprir os ditames superegóicos, calcados nos valores hegemônicos da
ideologia dominante (Santos, 2021, p.73-77).

As concepções sobre atenção básica permeadas pelos discursos das


mulheres, como nível de atenção de baixa complexidade remete à construção
histórica do modelo biomédico sobre o processo saúde-doença, que induz a procura
por um modelo curativista, a despeito da prevenção e promoção de saúde e da
concepção de saúde ampliada, como dignidade humana. Nos discursos das mulheres,
a noção dos níveis de assistência, centraliza-se sua referência no hospital, conduz a
uma discussão necessária sobre a complexidade da atenção, acompanhamento
efetivo das famílias de caráter territorial comunitário e as articulações de redes de
cuidado com redes intersetoriais.

Esse contexto em que as contradições são produzidas remetem-se aos


modelos de cuidado e suas interfaces que se sustentam historicamente, por meio das
concepções dos trabalhadores de saúde e práticas assistenciais, bem como
concepções produzidas pelo senso comum na sociedade. Segundo Barros (2002), o
modelo biomédico possui “raízes históricas vinculadas ao contexto do Renascimento
e de toda a revolução artístico-cultural” e de expansão colonial, embasadas no
pensamento cartesiano, mecanicista, de segmentar elementos indissociáveis. As
críticas a esse modelo de produção do corpo e interpretação da medicina, foram feitas
na tentativa de “compreender o processo saúde-doença” e a “complexidade da sua
ANÁLISE DOS DADOS| 128

determinação”, explicando- se os contextos e contradições hegemônicas,


fundamentados, sobretudo, em estudos desenvolvidos por George Rosen sobre
concepções de saúde pública do movimento sanitário associadas às condições de
vida e produção de doenças (renda, ambiente, “ações governamentais”), e Michael
Foucault, de dispositivos disciplinares biopolíticos de poder, dentre outros. (Rosen,
1994; Barros, 2002, p. 72-74; Rabelo, 2010 ).

Por biopolítica, remete-se ao conceito foucaultiano de controle da população e


exercício do biopoder, sobretudo, destacando-se a racialização, assim nas palavras
do autor, se “o genocídio é, de fato, o sonho dos poderes modernos, [...] é porque o
poder se situa e exerce ao nível da vida, da espécie, da raça e dos fenômenos maciços
da população”. Foucault (2012) aponta que a vida se tornou objeto central, a qual pode
ser compreendida como “necessidades fundamentais, a essência concreta do
homem, a realização de suas virtualidades, a plenitude do possível”, e complementa
que “pouco importa que se trate ou não de utopia; temos aí um processo bem real de
luta”, onde se resiste e existem processos de reivenção.(Foucault, 2012, p.149-150)

Como referências importantes para compreensão desses processos


discursivos, alguns autores mediam à compreensão. Ribeiro (2019) refere que “pensar
lugar de fala é uma postura ética” para agir e “pensarmos as hierarquias, as questões
de desigualdade, pobreza, racismo e sexismo”, pois, para a autora, a linguagem é
dispositivo de poder (Ribeiro, 2019, p.83). Carneiro (2005) aponta, especificamente,
algo que fundamenta a leitura dos discursos analisados, nas palavras da autora:

“[...] biopolítica, gênero e raça articulam-se produzindo efeitos específicos, ou


definindo perfis específicos para o "deixar viver e deixar morrer". No que diz
respeito ao gênero feminino, evidencia-se a ênfase em tecnologias de
controle sobre a reprodução, as quais se apresentam de maneira diferenciada
segundo a racialidade; quanto ao gênero masculino, evidencia-se, a simples
violência” (Carneiro, 2005, p.72).

Para Carneiro (2005), a estratégia utilizada é o biopoder, para o qual não


necessita “raça enquanto categoria socialmente institucionalizada”, para que os
privilégios e “benesses sociais”, inclusive de direito a viver, se hierarquize utilizando
uma “espécie de automatismo associativo”, por meio de “sentimentos e
representações. Assim, a autora refere que é o biopoder que “aciona o dispositivo de
racialidade para determinar quem deve morrer e quem deve viver”, assim descrita pela
mesma: “onde não há para o dispositivo de racialidade interesse de disciplinar,
ANÁLISE DOS DADOS| 129

subordinar ou eleger o segmento subordinado da relação de poder construída pela


racialidade, passa a atuar o biopoder como estratégia de eliminação do Outro
indesejável”. (Carneiro, 2005, 76)

Corroborando esses fundamentos, na sociedade brasileira há um epistemicídio,


tal como Santos, Meneses (2013) referem como modos de “fascismo epistemológico”,
ou seja, que oculta a “epistemologia da força”, naquela que consideram versão mais
“violenta”, pois, tratou-se de uma “conversão forçada e a supressão dos
conhecimentos não ocidentais levadas a cabo pelo colonialismo europeu e que
continuam hoje sob formas nem sempre mais sutis” (Santos, Meneses, 2013, p.460).

Outro autor intercessor, atualiza como necropolítica, os cenários


contemporâneos da violência e auxilia para pensarmos a realidade da sociedade
brasileira, a eugenia, praticada nos hospícios do início do século XX, apresentada no
início deste estudo. Mbembe (2018) desdobra o conceito de biopoder nas “noções de
soberania” e na instauração do “estado de exceção”, a qual se refere como a
“expressão máxima da soberania”, expressa pelo “poder e na capacidade de ditar
quem pode viver e quem deve morrer”; e, também “altericídio”. (Mbembe, 2018; 2019)

Assim, ao analisar os discursos para compreensão do percurso das mulheres


na RAS e compreender os motivos que permeiam suas frustrações nas expectativas
de acolhimento, bem como os atendimentos realizados pelos profissionais de saúde
e da atenção destinadas a elas por membros da equipe multiprofissional da atenção
básica, utilizamos os recursos reflexivos desencadeados anteriormente. Para não
afirmar que a visão delas remeteria, ingenuamente, à ideologia hegemônica que
produz discursos do SUS “não responder às demandas” e “não resolver”.

O acesso à UBS, as filas para retirada de senhas em postos de saúde,


encaminhamentos com de espera longa para especialistas, entre outras burocracias
estruturais, são apontamentos que permeiam os discursos dessas mulheres. Segundo
autores, os serviços de saúde de base territorial podem incidir na prevenção de
doenças e promoção da saúde, tendo como ferramenta os espaços coletivos de
cogestão, assembleias, colegiado gestor deliberativo nas unidades de saúde (Pinto
Filho, Lima, 2020). E, também, outras pesquisas referem a importância de disputar-se
o campo da comunicação, na interface política de valorização do SUS e da saúde
como “bem comum e de direito” (Santos et al., 2022, p. 1554).
ANÁLISE DOS DADOS| 130

Os discursos analisados para compreensão do percurso das mulheres na RAS


demonstraram frustração nas expectativas sobre o acolhimento, atendimentos
realizados pelos profissionais de saúde e atenção destinadas a elas por membros da
equipe multiprofissional da atenção básica. Além disso, a observação do processo de
trabalho das equipes, na visão das usuárias, remete à ideologia hegemônica do
sistema do SUS, “não responder às demandas”, “não resolver”.

O acesso à UBS, as filas para retirada de senhas em postos de saúde,


encaminhamentos com de espera longa para especialistas, entre outras burocracias
estruturais, são apontamentos legítimos que permeiam os discursos dessas mulheres.
Segundo autores, os serviços de saúde de base territorial podem incidir na prevenção
de doenças e promoção da saúde, tendo como ferramenta os espaços coletivos de
cogestão, assembleias, colegiado gestor deliberativo nas unidades de saúde (Pinto
Filho, Lima, 2020). Contudo, autores referem a importância de disputar-se o campo
da comunicação, na interface política de valorização do SUS e da saúde como “bem
comum e de direito” (Santos et al., 2022, p.1554).

O discurso das mulheres aborda a contradição do SUS enquanto cobertura,


quando relatam receio de ficar sem assistência para si e os filhos, utilizando
complementarmente um sistema particular (convênios). De acordo com inquérito
realizado sobre atendimentos médicos no SUS e atenção privada, evidenciou-se que
pessoas com maior poder aquisitivo e melhor escolaridade são mais atendidos em
ambos, em detrimento daquelas em desvantagem, remontando a padrões de garantia
de acesso “socialmente determinados” (Dilélio et al, 2014). Sobre esse processo de
determinação, pesquisas apontaram as iniquidades de acesso da população negra a
atendimentos de saúde, em virtude do racismo institucional (Batista, Werneck, Lopes,
2012), e a mais recente, que evidencia a “magnitude e dinâmica dos problemas
relacionados” e “análise de políticas, programas, serviços e tecnologias”, importância
da utilização do quesito raça-cor e desagregação de dados encontrados por cor da
pele nas pesquisas científicas (Batista et al., 2022). Haja visto a existência de fontes
primárias e secundárias contundentes sobre barreiras de acesso que afetam
principalmente as mulheres negras e a população quilombola (Silva et al., 2020;
Neves, Mussi, 2020).

Outro ponto sobre o percurso da atenção na RAS, apresentado nas frases


temáticas, refere-se ao procedimento de coleta do preventivo do câncer do útero
ANÁLISE DOS DADOS| 131

(Papanicolau), que é uma ação com protocolos específicos definidos pela PAISM,
desenvolvida por Enfermeiros/as. Este não é um atendimento exclusivo de médicos
especialistas em ginecologia, principalmente, quando de rotina, pressupondo um
trabalho articulado em equipe multiprofissional. Segundo o protocolo de Enfermagem
na atenção primária, elaborado por um conjunto de pesquisadoras do COREN/SP, a
consulta de enfermagem é uma ferramenta importante na detecção precoce de risco
para câncer do colo do útero, tendo como materialização, a coleta do exame
preventivo do tipo “Papanicolau”, realizada privativamente pelo Enfermeiro, capaz de
avaliar a necessidade de outros encaminhamentos quando necessário. (COREN/SP,
2020)

A ideologia de hierarquia médica possui historicidade arraigada na cultura


brasileira, desde a instauração da invasão colonial, com os privilégios da sociedade
burguesa, berço desses profissionais. Por meio do discurso, reiterou-se “mas
enfermeira não é um médico”, à medida que a essas, também adiciona-se outra
ideia socialmente construída, como seres “angelicais”, “de boa vontade", ancorada em
preceitos cristãos, devido os cuidados exercidos pelas irmãs de caridade, freiras, nos
primeiros hospitais.

Sobre esse aspecto, estudo realizado sobre a “produção do conhecimento


racializada” corrobora esses apontamentos históricos da colonialidade na medicina,
confirmando “intersecções dos processos de epistemicídio(s), racismo e sexismo
epistêmico”, o qual, nas palavras da autora (Mathias, 2022):

[...] produziram hierarquias de epistemes na saúde, colocando a medicina,


branca e europeia trazida pelo colonizador, como a representante da ciência,
hierarquizando os outros saberes também atuantes na assistência à saúde
nos dispositivos hospitalares, como a psicologia, o serviço social, a nutrição,
bem como a enfermagem (Mathias, 2022, p. 88).

Nos discursos, o CAPSij aparece como serviço de saúde mental de referência,


o qual, além de apoio e segurança, produz vínculos de confiança e afetividade,
desenvolvendo empréstimo de contratualidade e aumento da rede social das famílias,
atuando como redutores de estresse, carga mental e cuidado. Os CAPSij estão
fundamentados na atenção psicossocial desenvolvida em grupalidades,
coletivamente, de base territorial comunitária, no entanto, os discursos apresentam
pedidos de atendimentos específicos singularizados. Por sua vez, os projetos
terapêuticos singulares possuem essa especificidade, podendo ocorrer situações que
ANÁLISE DOS DADOS| 132

necessitam de especialistas disponíveis na atenção básica, tais como, fonoaudiologia,


odontologia, psicologia clínica, fisioterapia etc. Os pedidos de atendimentos como
esses dentro do CAPSij remontam concepções médico-curativistas do modelo
biomédico explicitado anteriormente.

A saúde mental comunitária de acompanhamento longitudinal, exercida nos


CAPSij por equipe multiprofissional, não centraliza sua atuação na “doença”, mas nos
singulares da experiência-sofrimento, dos direitos da criança em se desenvolver no
convívio, com propostas voltadas para aumento da contratualidade, investimentos na
autonomia, que possibilite a inscrição participativa no mundo. Esse pensamento
remete-se aos preceitos científicos basaglianos clássicos, na máxima por ele
desenvolvida de ocupar-se de fazer emergir o sujeito, colocando a doença “entre
parênteses”, na ideia completa, descrita a seguir (Basaglia, 2010):

[...] se quisermos enfrentar cientificamente o problema do doente mental será


preciso, em primeiro lugar, pôr “entre parênteses” a doença e o modo pelo
qual ela foi classificada*, para considerar o doente no desdobramento em
modalidades humanas que - justamente enquanto tais - nos pareçam
abordáveis (Basaglia, 2010, p. 36). *grifo nosso.

Esse conceito assim disposto, para além de ter servido de base para a Reforma
Psiquiátrica Italiana, a qual influenciou a RPbA, abre-se em desdobramentos
passíveis de serem utilizados como fulcro de pensar políticas de saúde mental na
perspectiva dos direitos humanos. Nesse caso, assim como o objeto de investigação
deste estudo, os efeitos psicossociais do racismo que têm sido evidenciados por
pesquisas científicas, sobretudo nos últimos anos, propondo análises para além da
coleta do quesito raça-cor (a partir do acúmulo do grupo de pesquisa Enfermagem e
as Políticas de Saúde Mental - GEnPSM/EEUSP*), aquilombamento antirracista na
RAPS, compreensão das dimensões étnico-raciais a partir dos determinantes de
saúde na produção do sofrimento psíquico. (Barros et al., 2022; Barros et al., 2020;
Barros, Ballan, Batista, 2021; Barros, Batista, 2017; David, 2018; 2021; Silva, Oliveira,
2021; Silva et al., 2017)

Retomando clássicos como os Escritos Selecionados em Saúde Mental


Reforma Psiquiátrica de Franco Basaglia, no mesmo capítulo da ideia citada
anteriormente, escreve sobre o racismo, assim em suas palavras (Basaglia, 2010):

O racismo, em todas as suas facetas, não passa de expressão da


ANÁLISE DOS DADOS| 133

necessidade dessas áreas de compensação, assim como a existência dos


manicômios, como símbolo daquilo que poderíamos definir como “a reserva
psiquiátrica”. E equiparando-a ao apartheid do negro ou aos guetos, é a
expressão da vontade de excluir aquilo que se teme por ser ignoto e
inacessível. [...] Diante de seus medos e da necessidade de assumir as
próprias responsabilidades, o homem tende a objetificar no outro a parte de
si que não sabe dominar: ou seja, a excluir o outro que ele tem dentro de si
como sua contingência. É um modo de negá-la em si mesmo, negando o
outro; de afastá-la, excluindo os grupos em que foi objetivada (Basaglia,
2020, p.37).

Basaglia como psiquiatra, escreveu sobre a dinâmica de exclusão/inclusão, e


foi sagaz ao entrar em contato com o pensamento de Frantz Fanon, desenvolvido
durante a Revolução Argelina, compilado em pesquisas contemporâneas (Passos,
2018; 2019), porém sofrendo “apagamento”, supostamente pelas críticas decoloniais
fanonianas, no entanto, perseverando na ideia de ruptura radical basagliana com o
manicômio. Segundo a autora, Basaglia dedicou “a Fanon e a sua escolha de romper
com esse modelo de opressão, de colonização e de sujeição dos indivíduos, uma
homenagem e reconhecimento de sua postura revolucionária de ruptura” (Passos,
2018).

Fanon, segundo Passos (2018), era pouco conhecido na luta antimanicomial, e


tornou-se referência pelos compilados teóricos de antirracismo. No entanto, em outro
clássico chamado Alienação e Liberdade - Escritos Psiquiátricos (2020), Fanon
descreve sobre maus-tratos exercidos por Enfermeiros, pela equipe técnica (Fanon,
2020):

Os enfermeiros temiam os pacientes; para barbeá-los, o barbeiro exigia que


eles fossem amarrados. Por medo dos pacientes, ou para puni-los, deixavam-
nos numa cela, por vezes sem camisa, sem colchão e sem lençóis no caso
de um “rasgador” inveterado. Os eternos “reincidentes” se viam amiúde
enclausurados, antes mesmo de praticarem efetivamente os atos, como
medida preventiva. [...] quando propúnhamos uma nova tentativa para
distender a estrutura punitiva do serviço clínico, a equipe técnica a recebia
com inércia, por vezes até com hostilidade explícita travestida de ironia: “Tal
paciente se agitou, bateu no outro u quebrou alguns ladrilhos. O que
fazemos? Amarramos ou deixamos que continue?” E nós nos sentíamos
impotentes diante dos argumentos dessa equipe “veterana”, consagrada por
vários anos de vida manicomial [...] (Fanon, 2020, p. 181).

Basaglia e Fanon foram contemporâneos de lutas contra o circuito manicomial,


de anulação de identidades e discriminações, pela liberdade. Fanon, no texto da carta
de demissão diz que a “loucura é um dos meios de que o homem dispõe para perder
sua liberdade”. Basaglia, escreveu em 1968, a Instituição Negada, 10 anos antes da
Reforma Psiquiátrica Italiana, onde reconhece no final desse livro, a carreira de Frantz
ANÁLISE DOS DADOS| 134

Fanon, o racismo, que sistematiza relações “entre branco e negro, ou seja, entre quem
detém o poder e quem não o tem” e que essa dinâmica “era sempre uma relação
institucional, onde os papéis haviam sido definidos pelo sistema” (Basaglia, 1985,
p.320). Diz que Fanon pode escolher a revolução, dizendo que sua realidade era
diferente e a ele cabia viver “as contradições do sistema que (nos) determina, gerindo
uma instituição que negamos, exercendo uma ação terapêutica que refutamos[...]”
(Basaglia, 1985, p.320-321). Isso confere a Fanon seu pioneirismo legítimo de ideias
revolucionárias de liberdade antirracista na psiquiatria.

Anda sobre o percurso das mulheres, nesse caso, durante a pandemia da


COVID19, as participantes relataram o efeito da interrupção e mudanças nos
atendimentos do CAPSij, em virtude das restrições sanitárias estabelecidas como
meio de controlar o contágio. Apontaram a reabertura do comércio em função não do
arrefecimento pandêmico, mais por uma estratégia do capitalismo em manter a si
mesmo, uma das participantes ilustra ao dizer “não é que está nada normal”,
opondo-se à ideia veiculada pela mídia e políticos, do “novo normal”, de retorno à vida
“normal”, quando o estado democrático de direito desmoronava.

No período da entrevista, o que se vivia era um ataque explícito às regras


sanitárias, negligência e desdém do Estado que deveria proteger os cidadãos,
especialmente, pela condução presidencial de Jair Messias Bolsonaro, em tratar a
pandemia como “uma gripezinha”, e que necessidades eram “mimimi”, e que o
combate do vírus SARS-CoV-2, que causa a doença da COVID-19 seria resolvido com
a administração de medicamento sem comprovação científica (Cloroquina), mesmo o
uso deste sendo desaconselhado pela OMS naquele momento, por efeitos adversos
graves.

Esse cenário pode ser revisitado por meio de pesquisas científicas realizadas
sobre os retrocessos, tal como a “(re)manicomialização” na política de saúde mental
brasileira, apontada por Passos et al (2021), com uso de recursos públicos para
contratualização de comunidades terapêuticas, em detrimento dos recursos
comunitários de saúde mental, de base territorial, para uma lógica hospitalocências
de internações psiquiátrica.

Segundo Saraceno (2021), processos de desinstitucionalização refere- se a


restituir vozes, e os aprendizados durante a pandemia da COVD 19 demonstraram
que ainda não existe democracia nos serviços de saúde. Ele propõe sete reflexões,
ANÁLISE DOS DADOS| 135

que abordam as categorias dimensionais necessárias do raciocínio clínico, qualificar


a atenção comunitária e mobilizar autoridades, democratizar radicalmente os serviços
de saúde e colocar os determinantes sociais no centro das intervenções,
responsabilidade pública de pesquisas, articular lutas contra dispositivos biopolíticos,
lutar contra a falta de um projeto de sociedade, governos brutais e pessimismo
passivo, dentre outros aspectos. Para o autor (Saraceno, 2021):

Nesta pandemia, vimos que muitos outros cidadãos ficaram sem voz e sem
poder e, com a mesma lógica, devemos continuar a produzir processos de
desinstitucionalização, ou seja, de restituição de voz, de sentido e de poder
aos que estão privados deles. E teremos que fazer isso com a dureza
necessária (Saraceno, 2021, p. 5).

O modelo comunitário de saúde mental tem como um dos eixos da reabilitação


psicossocial, a rede social, não exclusivamente considerando a família, inclui amigos,
vizinhos, pessoas que são consideradas referências para as pessoas com problemas
de saúde mental. Saraceno (2019)[1] , refere que uma “metodologia de trabalho
equivocada e irracional” baseia-se exclusivamente no diagnóstico, a qual deve ser
ampliada no que definiu de “recursos individuais”, “recursos do contexto”, “recursos
do serviço de atenção” e “recursos do contexto dos serviços de atenção”, que servem
para organizar estratégias de intervenção, pois, a o mesmo diagnóstico varia de
recursos e contextos, assim como a mesma escolha medicamentosa, servindo para
alguns e outros agindo diferentemente. (Saraceno, 2019, 23) Para esse autor, dentre
as estratégias de intervenção, define-se atitude reabilitatória[2] como ajudar as
pessoas com problemas de saúde mental a "restabelecer suas relações afetivas e
sociais, reconquistar seus direitos na comunidade, reconquistar seu poder social”
(Saraceno, 2019, p.35).

Em relação aos diagnósticos que permearam os discursos, as mulheres contam


que os filhos com transtorno do espectro do autismo (TEA) interromperam rotinas de
cuidado durante a pandemia da COVID 10. Isso impactou consideravelmente, no dia-
a-dia delas e deles. As frases temáticas demonstraram que as mulheres tinham
dificuldades de explicar sobre a pandemia aos filhos. Pela falta do convívio dos
usuários no CAPSij, relataram precisar dos profissionais, principalmente, na atenção
às crises, momentos difíceis de solicitações que os filhos de saírem de casa. Estudo
realizado aponta que as mães de crianças com TEA foram afetadas pela “sobrecarga”
devido à “falta de políticas públicas”, e que o fator econômico determinou
ANÁLISE DOS DADOS| 136

possibilidades de cuidado, sendo necessário criar estratégias para situações de


isolamento social para essa população (Freitas, Boff, 2021). [3]

Segundo Saraceno (2019), um diagnóstico ajuda a definir alternativas


medicamentosas, farmacológicas, porém em nada auxilia “a estabelecer estratégias
de intervenção mais complexas e articuladas” (Saraceno, 2019, p.23). Essa afirmação
corrobora a ideia ainda presente no imaginário e reprodução social das famílias, que
se preocupam na busca pela obtenção do diagnóstico, e uma vez com esse, e a
terapia medicamentosa, não compreendem porque a condição dos filhos não se
altera.

Outros discursos referiram-se à rede social das mulheres, as quais relataram


que contam com outras mulheres, tais como, amigas para o resgate de sua
identidade/de si mesma, por meio da autoestima, para apoio e diversão. Segundo
hooks, “a sororidade é poderosa”, e as mulheres podem se “tornar irmãs na luta”
(hooks, 2020, p.22)[4] [5] . Contraditoriamente, essas lutas podem ser heterogêneas e
no que se refere ao sistema de opressão da branquitude operante no Brasil, pode-se
utilizar das palavras de Audre Lorde, as mulheres brancas “se concentram na
opressão que sofrem por serem mulheres e ignoram as diferenças de raça, orientação
sexual, classe e idade”, que ela define como “homogeneidade de experiência coberta
pela palavra “sororidade” que, de fato não existe” (Lorde, 2018, p.145) [6] .

O conceito atual, cunhado por Piedade (201[7] 7), trata-se da dororidade, que é
definido como a experiência de “dor” das “mulheres pretas”, que singular, e
antirracista, por isso contempla a realidade brasileira e assim se diferencia de
sororidade (“que pode ser não racista”), nas palavras da autora:

“Dororidade. Sororidade. A sororidade ancora o Feminismo e o Feminismo


promove a Sororidade. Parece uma equação simples, mas nem sempre é
assim que funciona. Apoio, união e irmandade entre as mulheres
impulsionam o Movimento Feminista. [...] um conceito parece precisar do
outro. Um contém o outro. [...] Dororidade, pois, contém as sombras, o vazio,
a ausência, a fala silenciada, a dor causada pelo Racismo. E essa Dor é
Preta” (Pereira, 2017, p. 16)

Nos discursos, as mulheres referem serem chamadas de loucas pelos


familiares, especialmente, pelos homens, esposos/pais das crianças/adolescentes,
que pelo machismo demonstram menosprezo pelas mulheres, ou seja, violência de
gênero. Freitas (2021), apresenta casos clínicos investigados em prontuários no
ANÁLISE DOS DADOS| 137

Hospital Juqueri, reforçando que gênero é uma “construção social [...] entendido como
uma prática discursiva”, que apaga a história das mulheres. Essa ideia tem princípios
da loucura no “final do século XIX”, na qual a medicina consolidou “a dominação
masculina”, recebendo uma espécie de “chancela científica” ao associar "loucura e
feminilidade” (Freitas, 2021, p.36).[8]

A estrutura da sociedade brasileira é racista sexista capitalista branca.


Associado a esse contexto, a branquitude é conceituada como um sistema de
preservação de privilégios restritos à população branca, apontada por Du Bois (Myers,
2019). Para esse autor, “os conservadores atribuem os “problemas” aos próprios
negros - e com isso tornam sua miséria social invisível ou indigna de atenção pública.”
(Du Bois, 2021)

Segundo Piedade (2017), o “Racismo é imobilizador”, e para a autora, “essa é


a função dele - continuar existindo para manter a Branquitude, como projeto
ideológico, cada vez mais consistente, dominador, excludente” (Piedade, 2017, p.20).
Nascimento (2019), discute a “culpa branca” como um dos efeitos do racismo, que se
apoia na “desresponsabilização racial”, sendo expressa “um mecanismo paralisante”
e “incapacidade de ação, de posicionamento ativo, reflexivo, transformador (ou
reparador, como tem sido tão demandado)” (Nascimento, 2019, p.6).

Ainda sobre os discursos das mulheres, esses remetem à internalização do


patriarcado, que subordina as mulheres, apaga sua história, mas “o patriarcado como
sistema é histórico”, e na afirmação da autora, “sendo assim, pode ser extinto pelo
processo histórico” e por não ter raízes biológicas, pode ser extinto (Lerner, 2019,
p.31). Segundo a autora, por essa razão, a desigualdade de gênero tem origens
anteriores às “classes”, “sociedade de classes”, pois, foi pela apropriação sexista dos
homens ou da sexualidade e reprodução, que o patriarcado se estabeleceu como
sistema e simula a história contada a a partir dos homens. (Lerner, 2019)

Assim, cabe discutir-se a historicidade e como os fatos foram forjados, criando


instituições para manter os homens no poder, como a família, utilizando o patriarcado
como ideologia, expressa por Lerner (2019). Nos discursos das mulheres, seus planos
são interrompidos pela maternidade, contudo é nessa que se fortalecem, resistem
pelos filhos e na experiência de se tornarem mães, terem filhas como parceiras. Os
discursos podem ser remetidos ao “mito da maternidade na cultura ocidental”,
justamente no ponto de conflito, entre “a mãe e a mulher”, o qual tem sua base
ANÁLISE DOS DADOS| 138

histórica no “mito do amor materno”. (Leal, 2017; Badinter, 1985, 2011)

Lerner (2019), refere que o patriarcado utiliza não somente a instituição família,
mas também outras, como as “religiões, a Escola e as Leis”, reiteradas por Aronovich,
que sistematiza as ideias da autora na apresentação. Dessa maneira, as diversas
dificuldades e discriminações enfrentadas pelas mulheres na Escola dos filhos, e
expressas nos discursos explicitados, torna contraditória a Escola não exercer seu
papel como agente potencializador, assim como Gomes (2017) refere, “potência de
emancipação”. Entretanto, essa contradição pode ser remetida à premente estrutura
da sociedade brasileira e suas formas de expressões racista, patriarcal e capitalista.

Gomes (2017), lembra que a educação “não é um campo fixo e nem somente
conservadora”, sobretudo, um “espaço-tempo inquieto, [...] ao mesmo tempo
indagador e indagado pelos coletivos diversos” e “ao mesmo tempo, de um dinamismo
incrível e de uma tensão conservadora”, por onde pode se incidir mudanças
significativas na compreensão da “realidade da população negra e sua relação com a
diáspora africana” e nas dimensões da “interpretação da raça como estrutural e
estruturante” (Gomes, 2017, p. 25-6). Para a autora, a superação é possível, ao
identificar-se o diagrama das “formas de discriminações” e “colonialidade do poder, do
ser e do saber'', cujo centro está “o racismo, o patriarcado e o capitalismo global”.

A partir das contradições nos discursos sobre a Escola, de um padrão de


normas escolhidas e produzidas, remete-nos às ideias de Canguilhem (2012), quando
refere à definição:

“[...] o anormal, enquanto a-normal, é posterior à definição de normal, é a


negação lógica deste. No entanto, é a anterioridade histórica do futuro
anormal que provoca uma intenção normativa. O normal é o efeito obtido pela
execução do projeto normativo, é a norma manifestada no fato. Do ponto de
vista do fato há, portanto, uma relação subordinada à operação de negação,
à correção reclamada pela anormalidade. Não há, portanto, nenhum
paradoxo em dizer que o anormal, que logicamente é o segundo, é
existencialmente o primeiro. (Canguilhem, 2012,p.193)

Diversas pesquisas científicas corroboram para o acolhimento das


necessidades das mulheres negras, que alterem concepções formativas e práticas,
no cuidado psicossocial, tal como as autoras Prestes, Paiva (2016) indicam, para que
não se restrinjam a compilação de “efeitos danosos e nos elementos pessoais das
experiências de discriminação racista/sexista e privação de direitos”, nem aos
”tratamentos, reeducações, treinamento de comportamentos preventivos definidos a
ANÁLISE DOS DADOS| 139

priori”, sendo necessário “expandir a visão do processo saúde-doença” por meio do


“impacto das relações raciais, de gênero”, com práticas que envolvam a sabedoria das
mulheres negras e seus contextos. Diemer, Cavagnoli (2022), sobre o uso das
interseccionalidades nos processos de trabalho em saúde mental. Sobretudo,
referências de luta antimanicomial feminista, imprescindíveis (Pereira, Passos, 2017).

Assim como pesquisas pioneiras, que analisaram o quesito raça/cor coletados,


à luz dos determinantes sociais em saúde, para a garantia de direitos de cidadania de
pessoas com problemas de saúde mental (Candido, et al., 2021; Barros et al., 2020;
2021; 2022), corroboram ideias de que “o racismo é uma realidade violenta” (Kilomba,
2019).
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 141

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

“EU LUTEI COM TODAS AS GARRAS”

Este estudo teve como propósito compreender o percurso das mulheres, mães,
cuidadoras de crianças/adolescentes negros com problemas de saúde mental,
usuários do CAPSij na RAS, e também, caracterizar o processo saúde- doença dessas
mulheres, possibilitar espaços de reflexão na perspectiva de promover a qualidade da
relação entre os familiares-crianças/adolescentes- serviços, contribuir com
proposições para a atenção das necessidades específicas da população do estudo.
Assim, buscou-se revisitar marcos da construção histórica do racismo e da Reforma
Psiquiátrica brasileira Antimanicomial, na perspectiva da garantia de acesso a direitos.

O racismo associado às opressões de gênero e classe social se sustenta por


meio do mito da democracia racial, negando sua existência na sociedade brasileira.
Com base no racismo tridimensional, utilizando raça como categoria analítica na
saúde mental, por meio da perspectiva da reabilitação psicossocial para a cidadania
de direitos dessas mulheres e seus filhos, identificou-se pontos de fortalecimento e
desgaste, bem como vulnerabilidades construídas para manutenção da hierarquia
racista patriarcal sexista capitalista branca.

As mulheres negras, mães de crianças/adolescentes negros de CAPSij têm os


três eixos da reabilitação psicossocial afetados. A exemplo disso, a rede social dessas
mulheres é fragilizada por meio do estigma da loucura, que conduz familiares,
especialmente, os homens (pais das crianças/adolescentes), a delegar às mães todo
cuidado dos filhos com problemas de saúde mental. Além disso, as condições
precárias de sustentabilidade, moradia, são efeitos associados às barreiras do
racismo, que se articulam na tridimensionalidade para manutenção das iniquidades.
É preciso romper com essa lógica, e incidir o cuidado psicossocial antirracista por
meio dos eixos da reabilitação (trabalho/renda/ganho, moradia/casa/habitat, rede
social) para aumento da contratualidade e fortalecimento dessas mulheres.

Analisar o percurso dessas mulheres na RAS, demonstrou que as dificuldades


e problemas encontrados estão sendo produzidos por meio do tecido social de trama
racializada. Por essa razão, torna-se fundamental incorporar raça como categoria
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 142

analítica nos processos de trabalho na atenção primária e na saúde mental, como


modo radical de acolhimento e de construção dos projetos terapêuticos singulares.
Essa postura possibilita balizar o raciocínio clínico dos trabalhadores, por meio de uma
atitude antimanicomial antirracista, capaz de traduzir as necessidades e demandas
de apoio dessas mulheres.

Nesse caminho, foi possível compreender que o apoio que elas precisam é
psicossocial localizado no aumento de contratualidade para si e seus filhos, que passa
pela desconstrução do preconceito para com a loucura, sobretudo, na perspectiva
racial, junto às políticas de saúde e de saúde mental. O cuidado psicossocial precisa
ser emancipador, promover a cidadania de direitos, apoiá-las pela perspectiva racial
e de gênero e seus filhos, e não tratar de cuidar apenas dos efeitos, patologizando e
medicalizando-os, sem enfrentar os problemas. Para Saraceno (2001, p.112),
precisamos enfrentar os problemas reais no cuidado em saúde mental, “aumentar
oportunidades de troca de recursos e afetos”, abertura nos espaços “da relação” e “de
negociação”, de exercício desses direitos.

Para tanto, os trabalhadores podem buscar compreender os fenômenos não


localizados individualmente, mas singularizá-los de fato, levando em conta os
contextos onde são produzidos, e como parte de uma estrutura racista que opera.
Essa, por sua vez, agenciada por meio das instituições, pelo racismo institucional,
precisa ser identificada, reconhecida, nomeada, para ser combatida de maneira
rápida, radical e concomitantemente.

O apoio que referem, advém da equipe do CAPSij e poucas outras


mulheres/amigas, por onde se fortalecem. Elas se sentem sozinhas no âmbito familiar,
julgadas na Escola dos filhos, pela sociedade em espaços públicos quando transitam
com os filhos, sendo mais aparente pelo estigma do problema de saúde mental, pois
o racismo é velado. Assim, efeitos psicossociais do racismo são construídos
socialmente, os quais afetam essas mulheres, causando-lhes carga mental,
problemas de saúde, mantendo-as na base da pirâmide capitalista, sem condições de
vida e renda mínima para sustentabilidade concreta que altere suas possibilidades de
cuidado de si e de seus filhos.

Cabe dizer que, a atitude antimanicomial antirracista na atenção primária e


atenção psicossocial transforma problemas em possibilidades. No entanto, precisa ser
incorporada às práticas cotidianas dos trabalhadores de saúde, radicalizada na
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 143

articulação de redes intersetoriais, da educação, assistência social, justiça, territoriais,


com princípios antirracistas, para construção de políticas que impactem na promoção
da saúde, dignidade e cidadania.

Defendemos o antirracismo como lente do trabalho antimanicomial na


Saúde Mental, o qual precisa ser pautado em todas as instâncias institucionais, nos
processos de trabalho dos profissionais na RAS e RAPS, nas reuniões de equipes e
articulações de redes (intersetoriais, de justiça, e outras), no âmbito das esferas de
gestão (municipal, estadual e federal), na formação de profissionais de saúde
(incorporadas às disciplinas e criando modos de raciocínio que atenda a maioria da
população brasileira).

O estigma, o preconceito e a discriminação produzidos socialmente afetam não


somente as crianças/adolescentes com problemas de saúde mental, mas mulheres,
suas mães, cuidadoras, que uma vez precarizadas pelas condições sociais e de
políticas, produzem e instauram sofrimentos psíquicos, adoecimento e morte; e, não
o contrário. Elas não morrem, adoecem e sofrem porque são negras e tem problemas
de saúde mental associados aos filhos ou padecem, tão somente, como algumas
pesquisas desavisadas podem afirmar, mas é o racismo institucional que tem
estruturado a barbárie cotidiana na vida dessas mulheres e suas famílias.

Frente à tese, o cuidado que elas precisam é de políticas que englobam a


perspectiva racial, capazes de desmantelar o racismo-sexista, associados às
desigualdades de classe social. As mulheres negras e seus filhos não são excluídos
socialmente por serem pobres, mas são pauperizados por serem alvos do racismo
institucional invisibilizado pelo mito da democracia racial.

Assim, como Lélia González deixou em sua tese e legado de humanidade, não
é apenas o capitalismo, mas como esse está estruturado por meio do racismo no
Brasil. Nas ideias da autora, a sociedade brasileira é singular, atípica, dada a
colonização e colonialidade instaurada no inconsciente e praticada cotidiana e
veladamente (Gonzáles, 2020).

A carga mental das mulheres/mães negras é contínua. No território onde


moram não sofrem racismo, por serem habitados majoritariamente pela população
negra. O racismo se apresenta nas outras relações e instituições onde recorrem para
ajuda (branqueamento dos espaços de poder), sentem-se sob judice da sociedade,
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 144

dos médicos, da assistência social e justiça. A falta do apoio que elas precisam,
intensifica o sofrimento psíquico, debilitam sua saúde de diversas maneiras, pois não
tem um tempo para si próprias, no que elas afirmam: “não tenho vida”.

É preciso a adequação da Escola, das metodologias de ensino, da formação


de professores e aqueles de apoio na sala de aula, ou seja, práticas inclusivas de
confronto da violação de direitos humanos (e não transferir as responsabilidades às
crianças/adolescentes negros com problemas de saúde mental, como se fosse eles
que não aprendem, ou terem que ir embora para casa mais cedo).

A mulher/mãe negra com problemas de saúde mental está mais vulnerável a


sofrer violências domésticas de todos os tipos, financeira (ter seu benefício tutelado
pelo homem), necessita atenção dos profissionais e ser tratada como prioridade
absoluta, que o sistema apoie a ELAS e seus filhos para que permaneçam juntos e
fortalecidos por uma rede de cuidado e justiça social.

Como recomendações a partir deste estudo, parte elaborada nas reflexões


anteriores, sugere-se pontos-chaves iniciais, ainda parciais, em três âmbitos:

Quadro 4 - Quadro de Recomendações

● Combate ao racismo institucional detalhado no plano plurianual (PPA),


por meio do planejamento estratégico de incentivos para as equipes e
territórios;
● RAS e RAPS antirracistas - incluir estratégias na perspectiva do território
e que diminua desigualdades de gênero;
● Política de saúde mental antimanicomial antirracista - a partir da
Gestão reabilitação psicossocial e convenção sobre direitos das pessoas com
deficiências, incluindo a perspectiva racial e de gênero;
● Recursos financeiros de apoio às mulheres e seus filhos, com
experiência-sofrimento ou problemas de saúde mental, justos e
solidários;
● Incentivo à cultura e mídia para o combate ao estigma dos problemas
de saúde mental associado ao racismo institucional;
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 145

● Oferta de acesso à materialidade (bens materiais e humanos) por meio


da radicalidade de uma educação inclusiva (formação de professores e
alteração de projetos pedagógicos-escolares) e políticas de acesso
específico que atuem nas dificuldades singulares com as famílias
(apoiando as mulheres/mães, os homens/pais e os filhos), lazer e
cultura para as crianças/adolescentes com problemas de saúde mental
e suas famílias;

● Articulação intersetorial antimanicomial antirracista, com políticas de


Assistência Social, Cidadania, Justiça, Trabalho (renda mínima para
todes) e demais;

● Responsabilização da branquitude como desencadeadora dos


processos de iniquidades materiais e imateriais.

● Elaboração conjunta da gestão com os trabalhadores de saúde


(cogestão), de serviços de atenção primária e de saúde mental
(modalidade CAPS), de estratégias de prioridades para atenção
psicossocial na perspectiva racial e de gênero;
● Definir com os trabalhadores de saúde, as estratégias territoriais de
atitudes antimanicomiais antirracistas, que priorizem as mulheres, as
mães e as famílias delas, para organização dos serviços de saúde

Trabalhadores (RAS, RAPS);


● Elaborar pontos de interseccionalidades amplas como ferramentas
para serem utilizadas pelas equipes na construção de projetos
terapêuticos singulares;
● Formação continuada para os trabalhadores na perspectiva
racial e de gênero, antimanicomial antirracista;

● Formação continuada para os trabalhadores na perspectiva decolonial


e antibranquitude.

● Ampliar a cogestão de serviços de saúde com formação antimanicomial


antirracista dos colegiados, em rodas de conversa contínuas (que
possam impactar longitudinalmente nos territórios, diminuir sentimentos
internalizados de inferioridade, emancipar e produzir saúde);
● Apoiar discussões sobre os direitos dos usuários no SUS, na saúde

Usuários mental, pela perspectiva da garantia de direitos humanos com base na


educação popular em saúde e o conhecimento de causa dos usuários
e familiares;

● Auxiliar a sistematização de reivindicações para atualizar políticas de


saúde e de acesso a direitos (liberdade, convívio social, emancipação e
dignidade).
CONSIDERAÇÕES FINAIS| 146

Considera-se que o estudo coletado em meio à pandemia da COVID 19 teve


interferências, desafios e limitações, principalmente, em virtude dos riscos de
contágio, do tempo para execução de todas as etapas e das dimensões de pesquisa.
Sem dúvida, o estudo apresentado é apenas um desdobramento inicial para outras
pesquisas, que não se encerram neste percurso.

Por fim, o enfrentamento da desconstrução da branquitude como fenômeno


brasileiro colonizador entranhado nos processos do cuidado psicossocial, responsável
pelas iniquidades e mitos presentes nas construções sociais, racistas e
estigmatizantes, precisa acontecer de maneira incisiva visceral.
REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS| 148

REFERÊNCIAS

Abelson J, Forest P, Eyles J, et al. “Deliberations about deliberative methods: issues


in the design and evaluation of public participation processes”. En Social Science,
Medicine, julio 2003, vol. 57, issue. 2, p. 239–251.

Almeida Filho N. Estudo de prevalência de desordens mentais na infância em uma


zona urbana de Salvador-Bahia. J Bras Psiquiatr.1982;31(4):225-36.

Amarante P. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. 7.ª ed.
Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2005. 136p.

Araújo EM, Costa MCN, Hogan VK, Mota ELA, Araújo TM, Oliveira NF. Diferenciais
de raça/cor em anos potenciais de vida perdidos por causas externas. Rev Saúde
Pública. 2009; 43(3):405-12.

Araújo TM, Pinho PS, Almeida MMG. Prevalência de transtornos mentais comuns
em mulheres e sua relação com as características sociodemográficas e o trabalho
doméstico. Rev. Bras. Saúde Materna Infantil, 2005; 5 (3): 337-348.

Araujo TRS. Raimundo Nina Rodrigues e a Questão Racial Brasileira no Século XIX
Rev Margens Virtual UFPA, 2007. Disponível em:
http://www.ufpa.br/nupe/artigo9.htm

Badinter E. Um amor conquistador: O mito do amor materno. Rio de Janeiro: Nova


Fronteira, 1985.

Badinter E. O conflito: a mulher e a mãe. Rio de Janeiro: Record, 2011.

Barbosa MIS. Racismo e saúde. [Tese] São Paulo: Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo; 1998.

Barros S, Egry EY. O louco, a loucura e a alienação institucional: o ensino de


enfermagem psiquiátrica sub judice. São Paulo: Cabral; 2001.

Barros S, et al. Relatório técnico do diálogo deliberativo “O processo de cuidar em


saúde mental da criança/ adolescente negro usuário de CAPSIJ”. São Paulo: EEUSP,
2020.

Barros S, Ballan C, Batista LE. (orgs). Atenção psicossocial a crianças e adolescentes


negros no SUS: caderno de textos. São Paulo: EEUSP, 2021.

Barros S, Batista LE, Dellosi ME, Escuder MML. Censo psicossocial dos moradores
em hospitais psiquiátricos do estado de São Paulo: um olhar sob a perspectiva
REFERÊNCIAS| 149

racial. Saúde Soc. [online]. 2014; 23(4):1235-47.

Barros S, Bichaff R, Aranha e Silva AL, Pitta AMF, Covre EM, Souza JC, Oliveira
MAF, Nicácio MFS, Vasco MS, Dellosi ME. Desafios para a desinstitucionalização:
Censo Psicossocial dos Moradores em Hospitais Psiquiátricos do Estado de São
Paulo. São Paulo: FUNDAP, 2008.

Batista LE, Escuder MML, Pereira JCR. A cor da morte: causas de óbito segundo
características de raça no Estado de São Paulo, 1999 a 2001. Revista de Saúde
Pública. 2004; 38(5):630-6.

Batista LE, Santos MPA, Cruz, MM, Silva A, Passos ACA, et al. Masculinidade,
raça/cor e saúde. Revista Ciência e Saúde Coletiva. 2005; 10(1):71-80.

Batista LE, Santos MPA, Cruz MM, Silva A, Passos SCS, Ribeiro EE, Toma TS,
Barreto JO. Produção científica brasileira sobre saúde da população negra: revisão
de escopo rápida. Revista Ciência, Saúde Coletiva, 2022; 27(10):3849-3860.

Bento MAS, organozador. Identidade, branquitude e negritude: contribuições para a


psicologia social no Brasil: novos ensaios, relatos de experiências e de pesquisa.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2014.

Bento C. O pacto da branquitude. São Paulo: Companhia das Letras, 2022.

Bento MAS (org.). Identidade, branquitude e negritude: contribuições para a


psicologia social no Brasil: novos ensaios, relatos de experiências e de pesquisa.
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2014.

Bosch-Capblanch X, Lavis Jn, Lewin S, et al. “Guidance for Evidence- Informed


Policies about Health Systems: Rationale for and Challenges of Guidance
Development”. PLoSMed 2012;9(3):e1001186. doi:10.1371/journal.pmed.1001186.

Brasil. Constituição, 1988. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília:


Senado; 1988.

Brasil. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei n. 3.657, de 12 de setembro de 1989.


Dispõe sobre a extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por outros
recursos assistenciais e regulamenta a internação psiquiátrica compulsória. Brasília;
1989. [citado 2016 mai. 15]. Disponível em:
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=20 004.

Brasil. Lei n. 8080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para


promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento

dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União,


Brasília, 20 de set. 1990a. Seção 1: 18055.
REFERÊNCIAS| 150

Brasil. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei Federal nº 8069, de 13 de julho de


1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras
providências. Brasília; 1990b. [citado 2016 abr. 15] Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria SAS/MS nº 224, de 29 de janeiro de 1992.


Diretrizes e normas para os estabelecimentos assistenciais em saúde mental. 1992.
[citado 2017 abr. 20]. Disponível em:
http://www.saude.mg.gov.br/images/documentos/Portaria_224.pdf.

Brasil. Presidência da República. Lei n. 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre


a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e
redireciona o modelo assistencial em saúde mental. 2001. [citado 2016 abr. 1].
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10216.htm.

Brasil. Ministério da Saúde. Relatório da III Conferência Nacional de Saúde Mental.


Brasília: Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, 2002a.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM n° 336, de 19 de fevereiro de 2002. Define e


estabelece diretrizes para o funcionamento dos Centros de Atenção Psicossocial.
Brasília: 2002b.

Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas.


Saúde mental no SUS: Os centros de atenção psicossocial. Brasília: Ministério da
Saúde, 2004a.

Brasil. Ministério da Saúde. Política nacional de atenção integral à saúde da mulher:


princípios e diretrizes. Brasília: Ministério da Saúde, 2004b.

Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra.


Brasília: SEPPIR; 2007.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística, IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. 2008.
[citado 2016, abr. 15]. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad20
08/default.shtm.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 992, de 13 de maio de 2009. Institui a Política


nacional de Saúde Integral da População Negra. Brasília: 2009a. [citado 2016 jun.
15]. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2009/prt0992_13_05_2009.html.

Brasil. Presidência da República. Lei n. 12.288, de 20 de julho de 2010, que institui o


Estatuto da Igualdade Racial; altera as Leis n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989, 9.029,
de 13 de abril de 1995, 7.347, de 24 de julho de 1985, e10.778, de 24 de novembro
de 2003. Brasília: 2010a. [citado 2016 nov. 13]. Disponível em:
REFERÊNCIAS| 151

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007- 2010/2010/lei/l12288.htm.

Brasil. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Promoção dos


direitos de crianças e adolescentes para o seu desenvolvimento integral, de forma
não discriminatória, assegurando seu direito de opinião e participação. Brasília:
SEDH/PR, 2010b.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística, IBGE. Censo Demográfico, Características Gerais da
População, Religião e Pessoas com Deficiência, 2010c. [citado 2017, abr. 28].
Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/presidência/noticias/imprensa/ppts/000000093525
06122012255229285110.pdf.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010.


Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do
Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: 2010d. [citado 2017 abr. 20]. Disponível
em: http://conselho.saude.gov.br/ultimas_noticias/2011/img/07_jan_portaria4279_3
01210 .pdf.

Brasil. Presidência da República. Decreto n. 7.508, de 28 de junho de 2011.


Regulamenta a Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990, para dispor sobre a
organização do Sistema Único de Saúde - SUS, o planejamento da saúde, a
assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras providências. Brasília:
2011a. [citado 2017, abr. 15]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/decreto/D7508.htm.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 2488, de 24 de outubro de 2011. Aprova a


Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas
para a organização da Atenção Básica, para a Estratégia Saúde da Família (ESF) e
o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS). Brasília: 2011b. [citado
2017 abr. 15]. Disponível em:
http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/arquivos/esf/Portaria
2488_2011.pdf.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 3088 de 23 de dezembro de 2011. Institui a


Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e
com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito
do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília, 2011c.

Brasil. Ministério da Justiça e Cidadania. Secretaria Especial de Políticas para


Mulheres. 2012. [citado 2017 abr. 20]. Disponível em:
http://www.spm.gov.br/assuntos/saude-integral-da-mulher/dados.

Brasil. Ministério da Saúde. Política Nacional da Saúde Integral da População Negra:


uma política para o SUS. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de


REFERÊNCIAS| 152

Geografia e Estatística, IBGE. Indicadores Banco da Pesquisa Nacional por Amostra


de Domicílios. Tabela 262- População residente, por cor ou raça, situação e sexo.
2014. [citado 2017, abr. 28]. Disponível em
http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/tabela/protabl.asp?c=262&z=pnad&o=3&i=P.

Brasil. Ministério da Saúde. Portaria GM n. 1130, de 5 de agosto de 2015. Institui a


Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Criança (PNAISC) no âmbito do
Sistema Único de Saúde (SUS). 2015. [citado 2017 abr. 20]. Disponível em:
http://www.brasilsus.com.br/index.php/legislacoes/gabinete-do- ministro/4007-
portaria-n-1- 130-de- 5-de- agosto-de-2015.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística, IBGE. Indicadores Banco da Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios. Informativo - População residente, por cor ou raça, situação e sexo.
2019. [citado 2022, mar. 2]. Disponível em:
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101707_informativo.pdf

Caillé A. Anthropologie du don: le tiers paradigme. Paris: Desclée de Brouwer, 2000.

Campos RO. Pesquisa avaliativa de uma rede de Centros de Atenção Psicossocial:


entre a saúde coletiva e a saúde mental. Cad Bras Saúde Mental. 2009; 1(1).

Candido BP, Barros S, Régio L, Ballan L, Oliveira MAF. O quesito raça/cor no processo
de cuidado em centro de atenção psicossocial infanto-juvenil. Rev Esc Enferm USP,
2022;56:e20210363.

Canguilhem G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2012.

Carneiro SA. A construção do outro como não-ser como fundamento do ser. [Tese
de Doutorado]. 2005. – Universidade de São Paulo, São Paulo. Acesso em: 01 de
janeiro de 2022.

Castel R. Da indigência, à exclusão, a desfiliação: precariedade do trabalho e


vulnerabilidade relacional. In: Lancetti A. Saúde e Loucura - Grupos e Coletivos, nº4.
São Paulo: Hucitec, 1994, p.21-48.

Castells MA. Sociedade em Rede. A era da informação: economia, sociedade e


cultura. São Paulo: Paz e Terra; 2007, v. 1.

COREN SP. https://portal.coren-sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/01/protocolo-de-


enfermagem-na-atencao-primaria-a-saude-modulo-1-saude-da-mulher.pdf

Corrigan PW, Kosyluk KA, Rusch N. Reducing self-stigma by coming out pround. Am
J Public Health. 2013; 103(5):794-800.

Costa-Rosa A. O Modo Psicossocial: um paradigma das práticas substitutivas ao


modo asilar. In: Amarante P, organizador. Ensaios: subjetividade, saúde mental,
REFERÊNCIAS| 153

sociedade. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; 2000.

Crenshaw K. Mapping the Margins: Intersectionality, Identity Politics, and Violence


Against Women of Color. Stanford Law Review, 1991.

Crenshaw K. Background Paper for the Expert Meeting on the Gender-Related


Aspects of Race Discrimination. 2002;10(1):171.

David EC. Saúde mental e racismo: a atuação de um Centro de Atenção


Psicossocial II Infantojuvenil. [Dissertação de Mestrado]. Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo: 2018.

David EC, Vicentin MCG. Nem crioulo doido nem negra maluca: por um
aquilombamento da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Revista Saúde Debate; 2020;
44(n.esp):264-277.

Delfini PSS, Dombi-Barbosa C, Fonseca FL, Tavares CM, Reis AOA. Perfil dos
usuários de um centro de atenção Psicossocial infantojuvenil da Grande São Paulo,
Brasil. Rev Bras Crescimento Desenvolvimento Hum. 2009; 19(2): 226- 36.

Diemer ASQ, Cavagnoli M. Interseccionalidade entre gênero, classe e diagnóstico:


práticas de Atenção à Saúde Mental no CAPS. Revista Grifos. 2022;31(55).

Dilélio AS, Tomsdi E, Thumé E, Silveira DS, Siqueira FCV, Piccini RX, Silva SM,
Nunes BP, Facchini LA. Padrões de utilização de atendimento médico-ambulatorial
no Brasil entre usuários do Sistema Único de Saúde, da saúde suplementar e de
serviços privados. Cadernos de Saúde Pública, 2014; 30(12):2594-2606.

Domingues P. Movimento negro no Brasil: alguns apontamentos históricos. Tempo


[Internet]. 2007; 12(23):100-120.

Domingues PML, Nascimento ER, Oliveira JF, Barral FE, Rodrigues QP Santos
CCC, et al. Discriminação racial no cuidado em saúde reprodutiva na percepção de
mulheres. Texto Contexto Enferm. 2013; 22(2):285-92.

Du Bois WEB. As almas do povo negro. São Paulo: Editora Veneta, 2021.

Faro A, Pereira ME. Raça, racismo e saúde: a desigualdade social da distribuição do


estresse. Estudos de Psicologia. 2011;16(3):271-278.

Fernandes F. Sociologia crítica e militante. IN: Octavio Iani. (Org.). São Paulo:
Expressão Popular, 2004.

Ferreira ABH. Mini Aurélio: dicionário da língua portuguesa. 7.ª ed. Curitiba: Positivo;
2008.
REFERÊNCIAS| 154

Fiorin JL. Elementos da Análise do Discurso. São Paulo: Contexto, 2005. Fiorin JL.
Linguagem e Ideologia. São Paulo: Editora Ática, 1990.

Fontes BASM. Capital social e terceiro setor: sobre a estruturação das redes sociais
em associações voluntárias. In: Martins PH; Fontes BASM. organizadores. Redes
sociais e saúde: novas possibilidades teóricas. 2.ª ed. Recife: Editora Universitária
da UFPE, 2008. p. 49-77.

Fontes BASM. Redes sociais como novo marco interpretativo das mobilizações
coletivas contemporâneas. Caderno CRH. 2010; 23(59):401-418.

Fontes BASM. Redes sociais e saúde: sobre a formação de redes de apoio social no
cotidiano de portadores de transtorno mental. Rev Ciências Sociais Política e
Trabalho. 2007; (26):87-104.

Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Atlas da violência, 2020. [Internet]. São


Paulo, 2020. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/publicacoes_posts/atlas-
da-violencia-2020/. Acesso em: 12/05/2022.

Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de


Geografia e Estatística, IBGE. Indicadores de cor ou raça, segundo a Pesquisa
Mensal de Emprego março de 2009c. [citado 2016, jun. 28]. Disponível em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme_
nova/marco2009.pdf.

Foucault M. História da loucura na idade clássica. São Paulo: Perspectiva, 1995.

Foucault M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 2003.

Foucault M. Nascimento da clínica. São Paulo: Forense Universitária, 2004.

Foucault M. História da Sexualidade - A vontade de Saber. São Paulo: Editora Graal,


2012.

Freitas MR. Eu não estou louca: breve revisão bibliográfica sobre mulheres e
loucura. Revista Hominun - Humanidades e ensino. 2021.

Fundação SEADE. Pesquisa Municipal Unificada. SP: Seade, 2011. [citado 2016
abr. 20]. Disponível em
http://www.seade.gov.br/produtos/idr/download/merc_trab.pdf.

Galleguillos TGB, Neves H, Lira MMTA, Nazário CL, Castro IEN, Freitas M, et al.
Aspectos da questão étnico-racial e saúde no Município de São Paulo. Boletim
CEInfo Análise |Ano X, nº12/2015. São Paulo: Secretaria Municipal da Saúde, 2015.
60 p.
REFERÊNCIAS| 155

Goes EF, Nascimento ER. Mulheres negras e brancas e os níveis de acesso aos
serviços preventivos de saúde: uma análise sobre as desigualdades. Saúde em
Debate. 2013; 37(99):571-9.

Gomes NL. O movimento negro educador. Rio de Janeiro: Vozes, 2017.

Goffman E. A representação do eu na vida cotidiana. 13.ª ed. Petrópolis: Vozes,


2005.

Goffman E. Estigma: Notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de


Janeiro: LTC, 2004.

Gonzalez L. Por um Feminismo Afro Latino Americano: ensaios, intervenções e


diálogos. Rios F, Lima M. (orgs.). Rio de Janeiro: Zahar, 2020.

Guba EG, Lincoln YS. Fourth Generation Evaluation. Newbury Park: Sage
Publications, 1989. 294p.

Harris R, Cormack D, Tobias M, Yeh LC, Talamaivao N, Minster J.et al. The
pervasive effects of racism: experiences of racial discrimination in New Zealand over
time and associations with multiple health domains. Soc Sci Med. 2012; 74(3):408-
15.

Hoffmann MCCL, Santos DN, Mota ELA. Caracterização dos usuários e dos serviços
prestados por Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil. Cad. Saúde Pública.
2008; 24(3):633-42.

hooks B. O feminismo é para todo mundo: políticas arrebatadoras. Rio de janeiro:


Rosa dos tempos, 2020.

Holanda HB, Sovik L. Stuart Hall. Da Diáspora: identidades e mediações culturais,


Editora UFMG, 2003.

Huxley P, Evans S, Madge S, Webber M, Burchardt T, McDaid D, et al. Development


of a social inclusion index to capture subjective and objective life domains (Phase II):
Psychometric Development Study. Health Technol Assess. 2012;16(1):1-241.

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Desigualdade racial no Brasil: um


olhar para a saúde. Desafios do Desenvolvimento. 2011;8(70). [citado 2016 out. 15].
Disponível em: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view
=article &id=2688:catid=28&Itemid=23.

Jones CP. Confronting Institutionalized Racism. Phylon, 2002;50(1):7-22.

Kantorski LP. Redes que reabilitam - Avaliando experiências inovadoras de


composição de redes de atenção psicossocial (REDESUL). Relatório final. Pelotas
REFERÊNCIAS| 156

(RS), 2011.

Kantorsky LP, Mielke FB; Teixeira Junior S. O trabalho do enfermeiro nos centros de
atenção psicossocial. Trab Educ Saúde. 2008; 6(1):87-105.

Kilomba G. Memórias da Plantação. Rio de Janeiro: Cogobó, 2019.

Kinoshita RT. Contratualidade e reabilitação psicossocial. In: Pitta A. organizadora.


Reabilitação psicossocial no Brasil. 2.ª ed. São Paulo: Hucitec, 2001. p. 55-9.

Leal F. Entre a mulher e a mãe: reflexões sobre a vulnerabilidade psíquica das


mulheres no pós-parto. 135p. Tese (Doutorado) – Universidade Católica do
Salvador, 2017.

Lerner G. A criação do patriarcado: história da opressão das mulheres pelos


homens. São Paulo: Cultrix, 2019.

Levitas R. The concept and measurement of social exclusion. In: Pantazis C, Gordon
D, Levitas R. editores. Poverty and social exclusion in Britain: The Millennium
Survey. Bristol: The Policy Press, 2006. p. 123-60.

Lima MF, Arruda GAO, Vicente JB, Marcon SS, Higarash IH. Crianças dependentes
de tecnologia: desvelando a realidade do cuidador familiar. Rev Rene.
2013;14(4):665-73.

Lopes F. Experiências desiguais ao nascer, viver, adoecer e morrer: tópicos em


saúde da população negra no Brasil. I Seminário Saúde da População Negra 2004.
Disponível em: http://www.mulheresnegras.org/doc/livro%20ledu/053-
102Fernanda.pdf.

Lopes F. Para além da barreira dos números: desigualdades raciais e saúde. Cad
Saúde Pública. 2005; 21(5):1595-601.

Lopes F, Werneck JP. Mulheres jovens negras e vulnerabilidade ao HIV/AIDS: o


lugar do racismo. In: Taquette SR, organizaodra. Aids e juventude: gênero, classe e
raça. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2009, p. 247-266.

Lopes F, Werneck J. Mulheres Negras: Um olhar sobre as lutas sociais e as Políticas


Públicas no Brasil. Rio de Janeiro, Criola, 2010.

López LC. O conceito de racismo institucional: aplicações no campo da saúde.


Interface - Comunicão, Saúde, Educ; 2012;16(40):121-34.

Lorde A. Irmã outsider: ensaio e conferências. São Paulo: Editora Autêntica, 2019.

Martins PH. As redes sociais, o sistema da dádiva e o paradoxo sociológico. In:


REFERÊNCIAS| 157

Martins PH; Fontes BASM. organizadores. Redes sociais e saúde: novas


possibilidades teóricas. 2.ª ed. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2008. p 09-17.

Martins PH. Contra a desumanização da medicina: crítica sociológica das práticas


médicas modernas. Petrópolis: Vozes, 2003.

Martins RL, Egry EY, Apostólico MR. Consideraciones acerca da importância Del
estúdio los saberes necesarios para El afrontamiento de La violência infantil en La
Atención Primaria de Salud. Rev de Investigaciones UNAD. 2016:.5. Prelo.

Mattoso KQ. Ser escravo no Brasil. São Paulo: Brasilense, 1988. Mercklé P.
Sociologie des réseaux sociaux, Paris: La Découverte, 2004.

Mbembe A. Necropolítica – Biopoder, soberanía, estado de exceção, política de


morte. São Paulo: N-1; 2018.

Mbembe A. Crítica da Razão Negra. São Paulo: N-1, 2019.

Mesquista JF, Novellino MSF, Cavalcanti MT. A reforma Psiquiátrica no Brasil: Um


novo olhar sobre o paradigma de saúde mental. Trabalho apresentado ao XVII
Encontro Nacional de Estudos Populacionais; 2010 set. 20-24. Caxambu. Caxambu:
ABEP; 2010.

Mesquita JF. Quem Disse Que Lugar de Louco É no Hospício? Um estudo sobre os
Serviços Residenciais Terapêuticos. Trabalho apresentado ao XVI Encontro
Nacional de Estudos Populacionais; 2008 set. 29 – 03 out. Caxambu. Caxambu:
ABEP; 2008.

Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 12.ª ed.


São Paulo: Hucitec, 2010.

Miranda L, Pereira Furtado J. O dispositivo “técnicos de referência” nos


equipamentos substitutivos em saúde mental e o uso da psicanálise winnicottiana.
Rev Latinoam Psicopat Fund. 2006. IX(3):508-524.

Molina González JL. El estudio de las redes personales: contribuciones, métodos y


perspectivas. Empiria. Revista de metodología de ciencias sociales. 2005; 1(10):71-
106.

Monteiro ARM, Teixeira LA, Silva RSM, Rabelo KPS, Tavares SFV, Távora RCO.
Sofrimento psíquico em crianças e adolescentes: a busca pelo tratamento. Esc Anna
Nery Rev Enferm. 2012; 16(3):523-9.

Monteiro CB. O enfermeiro nos novos dispositivos assistenciais em saúde mental.


Esc Anna Nery. 2006;10(4):735-9.
REFERÊNCIAS| 158

Morgan C, Burns T, Fitzpatrick R, Pinfold V, Priebe S. Social exclusion and mental


health. The British Journal of Psychiatry, 2007; 191(6), 477-83.

Myers E. Beyond the Psychological Wage: Du Bois on White Dominion. Article


Reuse Guidelines; 2018;47(1):6-31.

Nascimento T. Leve sua culpa branca pra terapia. São Paulo: Editora N-1, 2019.

Neves PR, Mussi RFF. Acesso e utilização de serviços de saúde da população


negra quilombola. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=7883161

Office of the Deputy Prime Minister. Mental Health and Social Exclusion – Summary.
London: Social Exclusion Unit 2004; [citado 2016 jul. 20]. Available from:
http://www.nfao.org/Useful_Websites/MH_Social_Exclusion_report_summary.pdf.

Oliveira LL. A Frente Negra Brasileira: Política e Questão Racial nos anos 1930.
[dissertação]. Rio de Janeiro: Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2002.

Oliveira WF. Éticas em conflito: reforma psiquiátrica e lógica manicomial. Cadernos


Brasileiros de Saúde Mental. 2009;1(2)48:61.

Passos R G, Gomes TMS, Farias GS, Araújo GCL. A (re)manicomialização da


política de saúde mental em tempos bolsonaristas: A volta do eletrochoque e das
internações psiquiátricas. Cadernos Brasileiros de Saúde Mental.2021;13(37):42–64.

Pereira M, Passos RG. [orgs]. Luta Antimanicomial e Feminismos: Discussões de


gênero, raça e classe - para a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Rio de Janeiro:
Autobiografia, 2017.

Patel V, Flisher AJ, Hetrick S, McGorry P. Mental health of young people: a global
public-health challenge. Lancet. 2007;369 (9569):1302-13.

Piedade V. Dororidade. São Paulo: Editora Nós, 2017.

Pinto Filho HF, Lima RRT. Gestão participativa em unidades básicas de saúde: uma
proposta para reinventar o trabalho em saúde. Research, Society and Development,
2020;9(1):e175911872.

Pitta AMF. Um balanço da Reforma Psiquiátrica Brasileira: Instituições, Atores e


Políticas. Rev Ciência, Saúde Coletiva. 2011; 16(12): 4579-89.

Prestes CRS, Paiva VSF. Abordagem psicossocial e saúde de mulheres negras:


vulnerabilidades, direitos e resiliência. Saude soc. 2016;25 (3).

Priest N, Paradies Y, Trenerry B, Truong, Karlsen S, Kelly Y. A systematic review of


studies examining the relationship between reported racism and health and wellbeing
REFERÊNCIAS| 159

for children and young people. Social Science, Medicine. 2013;95:115-127.

Rangel LCC, Bustamante V., Silva G.B. Caracterização da População de um Serviço


de Saúde Mental Infantil em Salvador. Psicologia em Estudo. 2015; 20(2):273-84.

Régio L, Egry EY, Apostólico MR. Consideraciones acerca da importancia del


estudio los saberes necesarios para el afrontamiento de la violencia infantil en la
Atención Primaria de Salud. Revista de Investigaciones Unad; 2016.

Régio Martins, L. Atenção Primária em Saúde, enfrentamento da Violência Infantil:


saberes necessários à formação e qualificação profissional. [Dissertação]. São Paulo
- Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2016.

Ribeiro CC, Silva NG, Oliveira AGB. O Projeto Terapêutico nos CAPS de Mato
Grosso: uma análise documental. Cienc Cuid Saude 2009; 8(3):393-402.

Ribeiro D. Lugar de Fala. São Paulo: Pólen, 2019.

Rocha RM. Enfermagem em Saúde Mental. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2010.

Rosemberg P, Piza E Color in Brazilian Census. In: Rebecca Reichmann. (Org.).


Race in contemporary Brazil. 1ed.Pensylvania: The Pensylvania State University
Press, 1999, p. 37-52.

Rosen G. Uma história da Saúde Pública. Rio de Janeiro: Huccitec, 1994.

Roxo HBB. Perturbações mentais nos negros do Brasil. Brazil Médico. 1904;
15(17):156-92.

Salles MM, Barros S. Representações sociais de usuários de um Centro de Atenção


Psicossocial e pessoas de sua rede sobre doença mental e inclusão social. Saúde
soc. 2013; 22(4):1059-71.

Salles MM. Vida cotidiana de usuários de CAPS: a (in)visibilidade no território.


[Tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, 2011.

Sampaio EO. Racismo institucional: desenvolvimento social e políticas públicas de


caráter afirmativo no Brasil. Revista Internacional de Desenvolvimento Local. 2003;
4(6):77-83.

Sampaio JJC. Hospital psiquiátrico público no Brasil: a sobrevivência do asilo e


outros destinos possíveis. [Dissertação] Rio de Janeiro: Instituto de Medicina Social
da UERJ, 1988.

Sanders-Phillipes K. Racial discrimination: a continuum of violence esposurefor


children of color. Child and family clinical psychology review. 2009. 12(2):174- 195.
REFERÊNCIAS| 160

Santo SA. A Lei nº 10.639/03 como fruto da luta anti-racista do Movimento Negro.
Educação anti-racista: caminhos abertos pela Lei Federal. 2005; 10(3):21-37.

Santos M. A natureza do espaço: técnica e tempo. Razão e emoção. São Paulo:


Edusp, 2002.

Santos JC. O estigma da doença mental: compreensão e ações dos trabalhadores


dos CAPS. [Dissertação]. São Paulo: Escola de Enfermagem da Universidade de
São Paulo, 2013.

Santos BS, Meneses MP. [orgs.]. Epistemologias do sul. São Paulo: Cortez, 2013.

Santos RT, Franco TAV, Pitthan RGV, Cabral LMS, Cotrim Junior DF, Gomes BC.
Saúde pública e comunicação: impasses do SUS à luz da formação democrática da
opinião pública. Revista Ciência, Saúde Coletiva, 2022; 27(4):1547-1556.

Santos RV, Bastos JL, Kaingang JD, Batista LE. Cabem recomendações para usos
de “raça” nas publicações em saúde? Um enfático “sim”, inclusive pelas implicações
para as práticas antirracistas. Cadernos de Saúde Pública, 2022; 38(3):e00021922.

São Paulo. Secretaria Municipal da Saúde. Coordenação de Epidemiologia e


Informação/CEInfo. Aspectos da questão étnico-racial e saúde no Município de São
Paulo Galleguillos TGB, Neves H, Lira MMTA, Nazário C, Castro I, Freitas M, Santos
P. Boletim CEInfo Análise |Ano X, nº12/2015. São Paulo: Secretaria Municipal da
Saúde, 2015.

Saraceno B. Libertando Identidades da reabilitação psicossocial à cidadania


possível. Rio de Janeiro: Instituto Franco Basaglia, Te Corá; 2001.

Saraceno B. Reabilitação Psicossocial: Uma Estratégia para a Passagem do Milênio.


In: Pitta AMF. organizadora. Reabilitação psicossocial no Brasil. São Paulo: Hucitec,
1996.

Saraceno B. Two pressing needs: to measure social integration and to re-orient


mental health services towards social integration. Epidemiology and psychiatric
sciences, 2013; 22(1):39-41.

Saraceno B. Manual de Saúde Mental: guia básico para atenção primária. São
Paulo: Hucitec, 2019.

Schucman LV. Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: branquitude,


hierarquia e poder na Cidade de São Paulo. 2014.

Schwarcz LKM. O espetáculo das raças. Cientistas, instituições e pensamento racial


no Brasil: 1870-1930. Companhia das Letras, 1993.
REFERÊNCIAS| 161

Schwarcz LKM. Nem preto nem branco, muito pelo contrário. Cor e raça na
sociabilidade brasileira. São Paulo: Claro Enigma, 2012.

Schwarcz LKM, Starling HM. Brasil, uma biografia: como um novo pós-escrito. São
Paulo: Companhia das letras, 2015.

Silva JB, Soares CCD, Silva PMC, Azevedo EB, Saraiva AM, Ferreira Filha MO.
“Padecendo no paraíso”: as dificuldades encontradas pelas mães no cuidado à
criança com sofrimento mental. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2015 jul./set.;17(3).
Disponível em: http://dx.doi.org/10.5216/ree.v17i3.25632.

Silva NG, Batista LE, Azevedo FC de, Policarpo VC, Barros S. O uso da variável
raça/cor nas pesquisas no campo da saúde mental. In: Anais do 67º Congresso
Brasileiro de Enfermagem (CBEn), 2015, São Paulo. São Paulo: ABEn; 2015. p.
1975. 2015. [citado 2016 nov. 13]. Disponível em:
https://icongresso.itarget.com.br/useradm/anais/?clt=abe.3&lng=P.

Silva NG, Barros S, Azevedo, FC, Batista LE, Policarpo VC. O quesito raça/cor nos
estudos de caracterização de usuários de Centro de Atenção Psicossocial. Rev
Saúde e Sociedade,2017; 26:100-14.

Silva NN, Favacho VBC, Boska GA, Andrade EC, Merces NP, Oliveira MAF. Acesso
da população negra a serviços de saúde: revisão integrativa. Revista Brasileira de
Enfermagem; 2020;73(4).

Silveira MFA, Santos Junior HPO. Que eles falem por si: relatos dos profissionais
sobre a experiência nas residências terapêuticas. Cien Saude Colet. 2011; 16(4),
2089-98.

Silver H, Miller SM. Social exclusion: the European appoach to social disadvantage.
Indicators. 2003; 2(2):5-21.

Simmel G, Wolff KH. The Sociology of Georg Simmel. Illinos: Free pass, [1908] 1950.

Sluzki CE, Berliner C. A rede social na prática sistêmica: alternativas terapêuticas.


São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.

Souza J, Kantorski LP, Mielke FB. Vínculos e redes sociais de indivíduos


dependentes de substâncias psicoativas sob tratamento em CAPS AD. SMAD - Rev
Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. 2006. 2(1):Art. 2.

Souza J. A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato / Jessé Souza. - Rio de


Janeiro: Leya, 2017

Teixeira C. Os princípios do Sistema Único de Saúde. Texto de apoio elaborado para


subsidiar o debate nas Conferências Municipal e Estadual de Saúde. Salvador,
Bahia; 2011. Disponível em:
REFERÊNCIAS| 162

http://www.saude.ba.gov.br/pdf/OS_PRINCIPIOS_DO_SUS.pdf

Waiselfisz JJ. Mapa da violência 2011: os jovens no Brasil. São Paulo: Instituto
Sangari; Brasília: Ministério da Justiça, 2011.

Weintraub ACAM, Vasconcellos MS, Bastos IT, Fonseca FL, Reis AOA. Socio
demographic characterization of users of Child and Adolescent Psychosocial Care
Centers in the state of São Paulo. Estud psicol (Campinas) [online]. 2013;30(3):383-
91.

Werneck J. Racismo institucional e saúde da população negra; Saúde Soc 2016;


25(3):535-49.

Werneck J. Saúde das População Negra. Passo a passo: defesa, monitoramento e


avaliação de políticas públicas. Criola: Rio de Janeiro; 2010.

Wetzel C, Kantorsky LP. Avaliação de serviços em saúde mental no contexto da


Reforma Psiquiátrica. Texto Contexto Enferm. 2004; 13(4):593-8.

Zioni F. Exclusão social: noção ou conceito? Saúde Soc, 2006; 15(3):15-29.

Zubaran MA, Wortmann ML, Kirchhoff ER. Stuart Hall e as questões étnico-raciais no
brasil: cultura, representações e identidades. Projeto História, São Paulo.
2016(56):9-38.
APÊNDICES
APÊNDICES| 164

APÊNDICES

APÊNDICE A - INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS MULHERES-CUIDADORAS

1- Identificação da Mulher-Cuidadora

Iniciais:

Idade: Raça/cor:

Escolaridade:

Idade da criança/adolescente que você cuida:

2 - Questões:

2.1 Como você cuida de sua saúde?

2.2 Quando você tem algum problema de saúde, que serviços de saúde

você procura?

2.3 De que modo você foi tratada nesses serviços de saúde?

2.4 Como é para você cuidar de uma criança/adolescente com transtorno

mental?

2.5 Você e/ou a criança/adolescente negro que você cuida já sofreram

alguma discriminação? Qual e de que maneira? Como você se sente a

respeito?
APÊNDICES| 165

APÊNDICE B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E


ESCLARECIDO

ESCOLA DE ENFERMAGEM DA USP

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

(Mulheres-cuidadoras)

Convido você para participar do estudo “O processo de cuidar em


saúde mental da criança/adolescente negro em CAPS infantil”, que tem
como pesquisadora responsável a Prof.ª Dr.ª Sônia Barros, o qual tem
como objetivo compreender o perfil das crianças e adolescentes em
tratamento e de seus cuidadores.

Esta entrevista tem duração estimada de 30 minutos, a qual será


gravada e transcrita para ser analisada, contudo, o que você contar será
mantido em sigilo. O relatório final da pesquisa será publicado sem que seu
nome seja mencionado, garantindo-lhe o anonimato. Uma oficina de
devolutiva desta entrevista será realizada em um encontro com carga
horária de até 2 horas.

Benefícios: Este estudo pode não trazer benefícios diretos e


imediatos, mas ajudará a qualificação das equipes de saúde mental de
CAPS infantil.

Riscos: Se em algum momento a entrevista trouxer algum


desconforto ou constrangimento devido ao tema proposto, poderemos
interromper a entrevista imediatamente. Você poderá deixar de responder
perguntas, as quais não se sinta confortável e deixar de participar desta
atividade ou do estudo, sem prejuízo algum, a qualquer momento. Caso a
pesquisa lhe trouxer danos, você receberá indenização. Como participante
de pesquisa não haverá valor a ser pago, nem receberá qualquer benefício,
e você não terá despesas com esta pesquisa.

Estou disponível para esclarecer qualquer aspecto relacionado à


pesquisa, a fim de eliminar possíveis dúvidas. Uma via deste TCLE ficará
com você e a outra com o pesquisador (vias rubricadas). Esta pesquisa
atende todas as especificações da Resolução 466, de 12 de dezembro de
2012, que aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas
envolvendo seres humanos. A missão do Comitê de Ética e Pesquisa
(CEP): “O CEP é responsável pela avaliação e acompanhamento dos
APÊNDICES| 166

aspectos éticos de todas as pesquisas envolvendo seres humanos”.

Declaro que, após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e


ter entendido o que me foi explicado e consinto do presente Projeto de
Pesquisa: “O processo de cuidar em saúde mental da criança/adolescente
negro em CAPS infantil”.

Assinatura do participante/representante legal:

Assinatura do pesquisador:

São Paulo, de , de

Pesquisador: Prof.ª Dr.ª Sônia Barros – e-mail: sobarros@usp.br


ENP: (11) 3061-7601/7602. (11) 9991722849. Caso você tenha alguma consideração
ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o Comitê de Ética em
Pesquisa (CEP) – Endereço - Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419, Cerqueira Cesar
– São Paulo/SP CEP – 05403-000 Telefone- (11) 3061-8858, e-mail – cepee@usp.br.

Contato do CEP/SMS para eventuais dúvidas e denúncias quanto à questões


éticas: Rua General Jardim, 36, 8º andar. Telefone – (11) 33972464, email:
smscep@gmail.com.
ANEXOS
ANEXOS| 168

ANEXOS

ANEXO 1 – PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP – EEUSP


ANEXOS| 169
ANEXOS| 170
ANEXOS| 171

ANEXO 2 – PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP – SMS/SP


ANEXOS| 172
ANEXOS| 173
ANEXOS| 174

Você também pode gostar