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São Paulo | outubro de 2020

FERNANDA DO NASCIMENTO CINTRA

DESIGN, BORDADO E RESISTÊNCIA:

ENTRE TRAJES E PONTOS DE OPOSIÇÃO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Gra-


duação Stricto Sensu da Universidade Anhembi Mo-
rumbi, como requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Design.

Orientadora: Prof. Dra. Cristiane Mesquita

São Paulo

2020/2
FERNANDA DO NASCIMENTO CINTRA

DESIGN, BORDADO E RESISTÊNCIA:


ENTRE TRAJES E PONTOS DE OPOSIÇÃO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Gra-


duação Stricto Sensu da Universidade Anhembi Mo-
rumbi, como requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Design.

Aprovada em ___/___/_______

BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dra. Cristiane Mesquita – Orientadora e presidente da banca


Universidade Anhembi Morumbi
_______________________________________________________

Prof. Dra. Suzana Avelar – Examinadora externa


Universidade de São Paulo - EACH
______________________________________________________

Prof. Dra. Priscila Almeida Cunha Arantes – Examinadora interna


Universidade Anhembi Morumbi
_______________________________________________________
Fernanda do Nascimento Cintra
Especialista em Negócios de Moda pela Faculdade
Senai-SP. Graduada em Tecnologia Têxtil pela FA-
TEC- SP. Atua nas áreas têxtil e moda desde 2002,
em pesquisa e criação, desenvolvimento de produ-
tos, modelagem plana e tridimensional, desenho téc-
nico de moda, entre outras. É professora desde 2009.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca UAM


com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)

C575d
Fernanda do Nascimento, Cintra
DESIGN, BORDADO E RESISTÊNCIA: ENTRE
TRAJES E PONTOS DE OPOSIÇÃO / Cintra Fernanda
do Nascimento. - 2020.
145f. : il.; 30cm.

Orientador: Cristiane Mesquita.


Dissertação (Mestrado em Design) - Universidade
Anhembi Morumbi, São Paulo, 2020.
Bibliografia: f.114-127
1. Design de moda. 2. Design e política. 3.
Bordado de oposição. 4. Zuzu Angel. 5. Linhas de
Sampa.

CDD 741.6

Walkiria Shimono Cascardo - CRB 8/7319

Todos os direitos reservados.


A reprodução e a divulgação total ou parcial deste
trabalho por qualquer meio convencional ou eletrônico
é autorizada para fins acadêmicos e pesquisas
científicas, desde que citada a fonte. A reprodução do
trabalho para fins comerciais requer autorização do
autor e do orientador.
Dedico este trabalho a todos aqueles que, diante de arbitrariedades,
produzem manifestações de resistência das mais variadas formas.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente
primeiramente ààCAPES
CAPESpelae ao Setor
Bolsa de Pesquisa
de Estudos da Universidade
concedida, bem como
Anhembi Morumbi
à Universidade pela bolsa
Anhembi de estudos
Morumbi concedida.
pela Bolsa Esse
de Estudos auxílio oportunizou
Institucional, a
Modalida-
realização
de Parcial. da pesquisa.
Esses auxílios oportunizaram a realização da pesquisa
Agradeço a Cristiane Mesquita, minha orientadora. Por toda a parceria, por
acreditar na minha pesquisa, compartilhar seus conhecimentos, clarear o ca-
minho e apontar novos olhares de maneira generosa, incansável, precisa e por
contribuições tão enriquecedoras. Minha gratidão e admiração a você!
Às Professoras convidadas, Priscila Almeida Cunha Arantes e Suzana Avelar,
por terem prontamente aceito o convite para participar da banca de defesa. Obri-
gada pela leitura delicada e cuidadosa e por colocarem pontos de vista tão rele-
vantes para o texto, que me proporcionaram novas reflexões.
Agradeço aos professores e ex-professores, à coordenação e ao apoio do
PPGDesign Anhembi Morumbi: Agda Carvalho, Ana Mae Barbosa, Gisela Beluz-
zo de Campos, Mirtes Marins de Oliveira e Sérgio Nesteriuk, pelos ensinamentos
compartilhados. Vocês são inspiradores! A querida Antônia Costa, agradeço por
todo seu auxílio.
Obrigada àqueles que compartilharam o peso de tentar tornar-me uma pes-
quisadora e deixaram meu percurso mais leve: todos os que conheci por meio
desse PPG e que hoje chamo de amigos.
Ao pessoal do Instituto Zuzu Angel, que me acolheu, respondeu paciente-
mente à tantas perguntas – e pegou caixas e mais caixas para eu pesquisar:
Hildegard, Manon, Simone, Rubens e Bianca. Passaria meses nessa casa linda
em contato com o acervo, que nos convida a desvendar mapas e montar que-
bra-cabeças.
Muito obrigada também ao pessoal do Linhas de Sampa, pela atenção e
paciência com as quais me receberam. Lenira, Reiko, Gláucia, Cauê, Carmem
e outres. A dignidade do trabalho de vocês dá esperança, vontade de estar e de
bordar junto. Sua luta atravessa qualquer preconceito.
Ao meu companheiro Renan. Este processo foi concluído graças ao seu
incentivo. Suas contribuições foram tantas! De revisor a curador – passando por
editor de imagens... Comemorou comigo cada conquista e me motivou em mo-
mentos de desânimo e frustração durante a pesquisa. Por vezes, acreditou mais
em mim do que eu mesma.
Aos meus pais Maria Clara e Mauro, pelo amor incondicional. Sempre priori-
zaram a minha educação e me ensinaram a reconhecer as injustiças a nossa volta.
A minha irmã Flávia, por ser um exemplo de determinação e torcer sempre por mim.
Aos demais familiares e amigos, agradeço pelo carinho de sempre, pelo
incentivo e por compreender todas as minhas ausências.
Obrigada também ao Thiago, que me motivou e ajudou a organizar as ideias
em uma fase intensa, enquanto eu acompanhava minha mãe em tratamento con-
tra o câncer. Elídia, obrigada pela sua precisão e por sugestões tão interessantes.
“O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.”

“This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de


Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Finance Code 001.”
“Eu tinha que estar terminando um projeto abominável em petit point para ocu-
par minha cabeça [...]. Em um canto do quadrado do pufe, eu bordei uma pe-
quena caveira: representava a caveira da minha madrasta Paula, mas se alguém
perguntasse o que era aquilo, eu responderia que era um memento mori, um
lembrete do fato de que todos morreríamos um dia. Dificilmente poderiam con-
testar isso, já que era um símbolo religioso [...]”.

(Margaret Atwood)
RESUMO
Esta pesquisa apresenta um percurso investigativo que enfoca os
conceitos de traje de oposição e bordado de oposição, por meio
de aproximações entre os campos do design de moda e da po-
lítica. Para tanto, além de uma tomada histórica, são elencadas
significativas mudanças nos modos de vida, ocorridas na segun-
da metade do século XX, em articulação com roupas e bordados.
Nesse contexto, o conceito de resistência é delineado na produ-
ção de subjetividade contemporânea, a partir da abordagem de
trajes e de bordados, apresentados por meio de dois estudos de
caso. O primeiro deles é uma coleção de roupas da designer de
moda mineira Zuzu Angel, criada no ano de 1971 em meio à di-
tadura civil-militar brasileira (1964-1985). O segundo, inserido no
cenário político da última década (2010-2020), são os panfletos
bordados do Coletivo paulistano Linhas de Sampa, realizado nos
últimos dois anos. A pesquisa enfoca as potências do traje e do
bordado de oposição como fatores narrativos dissonantes, que
criam espaços expressivos questionadores da hegemonia social,
no sentido de ampliar as articulações entre os campos do design
e da política.
Palavras-chave: design de moda; design e política; bordado de
oposição; Zuzu Angel; Linhas de Sampa

ABSTRACT
This research presents an investigative path that focuses on the
concepts of oppositional dress and oppositional embroidery, throu-
gh approximations between the fields of fashion design and politi-
cs. To this end, in addition to a historical take, significant changes
in ways of life are listed, which occurred in the second half of
the 20th century, in conjunction with clothing and embroidery. In
this context, the concept of resistance is outlined in the produc-
tion of contemporary subjectivity, from the approach of costumes
and embroidery, presented through two case studies. The first is
a collection of clothing by the fashion designer from Minas Gerais,
Zuzu Angel, created in 1971 in the midst of the Brazilian civil-mi-
litary dictatorship (1964-1985). The second, inserted in the politi-
cal scenario of the last decade (2010-2020), are the embroidered
pamphlets of the São Paulo Collective Linhas de Sampa, carried
out in the last two years. The research focuses on the powers
of the oppositional dress and embroidery as dissonant narrative
factors, which create expressive spaces that question social he-
gemony in the sense of expanding the articulations between the
fields of design and politics.
Keywords: fashion design; design and politics; oppositional em-
broidery; Zuzu Angel; Linhas de Sampa
LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Atributos básicos a um projeto de design..............................................21


Figura 2- Traje feminino emancipado....................................................................29
Figura 3- Traje zoot...............................................................................................31
Figura 4- Traje existencialista................................................................................31
Figura 5- Traje ted.................................................................................................31
Figura 6- Traje hippie............................................................................................33
Figura 7- Traje punk..............................................................................................33
Figura 8- Traje insurgente árabe...........................................................................34
Figura 9- Traje de mulheres norte-americanas feministas....................................35
Figura 10- Bolsa de esmolas francesa..................................................................37
Figura 11- Bordadeiros no período pré Renascimento..........................................37
Figura 12- Bordadeiras no período pós Renascimento.........................................37
Figura 13- A mãe trabalhadora, de Jean Simeón Chardin....................................38
Figura 14- Manual de boas maneiras com instruções de bordado.......................39
Figura 15- Mulheres em aula de bordado.............................................................39
Figura 16- Banner sufragista.................................................................................41
Figura 17- Banner sufragista.................................................................................42
Figura 18- Banner WSPU......................................................................................44
Figura 19- Bordado de Beryl Weaver....................................................................46
Figura 20- Caminho de mesa de Beryl Weaver....................................................47
Figura 21- Artesãs da Linha Nove.........................................................................49
Figura 22- Obra de Antônio Manuel......................................................................60
Figura 23- Obra de Cildo Meireles........................................................................61
Figura 24- Capa do Long Play Tropicália..............................................................61
Figura 25- Coleção inspirada em cangaço............................................................63
Figura 26- Vestido de noiva feito com toalhas de renda.......................................63
Figura 27- Catálogo Zuzu Saias............................................................................64
Figura 28- Tecido estampa São João....................................................................65
Figura 29- Stuart Angel em dois momentos..........................................................67
Figura 30- Material de imprensa do desfile International Dateline IV....................70
Figura 31- Esboço inicial de desenhos para bordar..............................................71
Figura 32- Esboço inicial de desenhos para bordar com indicação de cores de
linha.......................................................................................................................71
Figura 33- Contato da bordadeira de Angel..........................................................72
Figura 34- Vestido túnica bordado – réplica para Ocupação................................73
Figura 35- Vestido túnica bordado – original do desfile........................................73
Figura 36- Lista de desenhos para bordados de vestido túnica............................73
Figura 37- Detalhes dos bordados presentes em decote do vestido túnica..............74
Figura 38- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido túnica..................74
Figura 39- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido túnica...............75
Figura 40- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido túnica...............76
Figura 41- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido túnica...............77
Figura 42- Traje de luto de Angel..........................................................................79
Figura 43- Colar de anjo usado com traje de luto.................................................79
Figura 44- Recorte do Jornal Última Hora.............................................................80
Figura 45- Estudos de bordados...........................................................................81
Figura 46- Estudos de bordados...........................................................................81
Figura 47- Logo Zuzu Angel..................................................................................81
Figura 48- Varal de bordados do Coletivo Linhas de Sampa................................84
Figura 49- Encontro dominical de integrantes do Linhas de Sampa.....................94
Figura 50- Chamamento para bordar....................................................................94
Figura 51- Linhas de Sampa oferecendo oficinas de bordado..............................95
Figura 52- Reação dos manifestantes aos bordados............................................96
Figura 53- Manifestantes usando os bordados.....................................................96
Figura 54- Painel de bordados..............................................................................97
Figura 55- Receita de ponto atrás.........................................................................98
Figura 56- Receita de pontos diversos..................................................................99
Figura 57- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................100
Figura 58- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................100
Figura 59- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................100
Figura 60- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................100
Figura 61- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................101
Figura 62- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................102
Figura 63- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................102
Figura 64- Série de bordados Linhas de Sampa..................................................103
Figura 65- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais...................103
Figura 66- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais...................104
Figura 67- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais...................105
Figura 68- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais...................105
Figura 69- Linhas formadas nas relações virtuais................................................107
Figura 70- Bordado da autora..............................................................................112
Figura 71- Bordado da autora..............................................................................113
SUMÁRIO

Introdução.............................................................................................................13
1. Design, política e resistência em trajes e bordados..........................................18
1.1 Design, política e resistência......................................................................19
1.2 Nos bastidores do traje de oposição..........................................................27
1.3 Bordado de oposição entre história e resistência.......................................36
1.3.1 Um breve arremate: linhas iniciais......................................................36
1.3.2 Nos bastidores do bordado como resistência: alguns pontos................40
2. Nos bastidores da ditadura civil-militar: Zuzu Angel e os bordados..................51
2.1 Nos bastidores da ditadura civil-militar brasileira (1964-1985)...................54
2.2 Zuzu Angel: uma designer brasileira..........................................................63
2.3 Nos bastidores do caso Stuart Angel..........................................................67
2.4 Os bordados de oposição de Zuzu Angel...................................................71
3. Bordados nos bastidores do Coletivo Linhas de Sampa...................................83
3.1 Nos bastidores dos levantes mundiais dos anos 2000: um breve
percurso................................................................................................................85
3.2 Nos bastidores da política brasileira: alguns momentos
pontuais (2013-2020)........................................................................................88
3.3 Ações do Coletivo Linhas de Sampa: Bordando a resistência...................92
Considerações finais............................................................................................108
Bibliografia............................................................................................................114
Apêndices.............................................................................................................128
INTRODUÇÃO

A passagem de tempo entre meados do século XVIII e o


início do século XIX irrompeu em relevantes mudanças na
sociedade. Transformações no contexto social, político,
econômico, cultural e tecnológico aconteceram no Ociden-
te, em decorrência do advento da Revolução Industrial.
O novo cenário industrial alterou fortemente o papel dos
indivíduos, em especial, pelo surgimento do sistema de
fábricas em parte da Europa e nos Estados Unidos. Na-
quele período, um fluxo deslocou as populações do campo
para as cidades. A urbanização fez emergir questões so-
ciais que manifestaram-se de variadas formas e que, em
conjunto a outros componentes, continuaram a ocorrer no
século seguinte, com a intensificação dos sistemas domi-
nantes e do capitalismo1.

O século XX tem seu cenário delineado pela emer-


gência de novos processos de subjetivação. Tais proces-
sos podem ser sintetizados como processos que envolvem
o perfil de um modo de ser – em determinada época. São
também variáveis componentes da subjetividade outros
fragmentos que se fazem no tempo e no espaço. Dessa
forma, as grandes transformações que ocorreram na se-
gunda metade do século intensificaram os modos de vida
instaurados desde a Revolução Industrial, em especial a
partir dos anos 1950, com o término da Segunda Guerra
Mundial. O fortalecimento dessas variáveis é visível em
vários âmbitos, como no processo da globalização, que
é intensificado graças à avanços tecnológicos e comuni-
cacionais. Dentre os aspectos decorrentes desses fluxos,
enfocamos o conceito de “resistência”, no contexto da
consolidação de modelos de ser e de viver majoritários e
hegemônicos e nos deslocamentos que se produzem em

1 _ Sistemas dominantes ou hegemônicos são percebidos nos Esta-


dos Unidos e de alguns países da Europa com as relações oriundas
dos processos da mercantilização capitalistas, no contexto da Revolu-
ção Industrial (AGNEW, 2005).

13
dissonância, nas tangentes ou em sentido contrário.

Um dos campos no qual é possível acompanhar as


transformações oriundas dos processos da industrialização
e da subjetivação é o design. A palavra design, importada
da língua inglesa, se refere tanto a concepção de plano, de-
sígnio, intenção, quanto a configuração, arranjo e estrutura.
Tem sua origem mais antiga no latim designare, verbo que
abrange ambos os sentidos, o de designar e o de desenhar.
Cardoso (2016) defende: “Em termos históricos, o grande
trabalho do design tem sido ajustar conexões entre coisas
que antes eram desconexas. Hoje, chamamos isso de pro-
jetar interfaces” (CARDOSO, 2016, p. 44).

A possibilidade de ligações do campo do design a tan-


tas outras áreas promove novas inter-relações, ao longo
de sua história. Algumas vezes, o design aparece em ar-
ticulação com o campo da política, em fluxos ambíguos,
em consonância e em dissonância com os poderes hege-
mônicos. Um dos exemplos nos quais é possível perceber
tais conexões é no design de moda. Manifestações como
roupas e bordados, quando situadas em desalinho com os
poderes vigentes podem resistir de diferentes maneiras:
por exemplo ao questionar os sistemas políticos autoritá-
rios; ao combater a repressão da liberdade de expressão;
ao conectar-se com o combate às formas opressoras de
regulação da vida, entre outras práticas repressoras, em
diferentes épocas e lugares.

O design, nesses casos aparece empregado em sen-


tido amplo e expandido, em outras palavras, politizado.
Para Mesquita (2010), os modos de vestir ou se adornar
são elementos que se compõem com os outros vetores,
criando assim subjetividades que oscilam suas forças;
apresentando diversos elementos que se interligam, con-
siderando os múltiplos componentes da subjetividade
como agentes que são atravessados por aspectos cultu-
rais, políticos, econômicos, científicos, afetivos, familia-
res, etc. Permeadas por manifestações de resistência em
articulação acerca dos conceitos de “traje de oposição” e
“bordado de oposição”, especialmente aquelas que se en-
contram presentes em trajes, materialidades e técnicas,
bem como os componentes subjetivos, delineiam-se algu-
mas possibilidades de diálogos entre os campos design de
moda e política.

14
Neste contexto, a presente pesquisa enfoca o concei-
to de “resistência” como uma variável relevante na subje-
tividade contemporânea. Por meio de aproximações entre
design de moda e política, a partir da investigação de tra-
jes e bordados, em configuração com as articulações entre
os campos, para melhor compreensão de seus diálogos e
reverberações, pela abordagem dos dois estudos de caso,
conforme descrito a seguir.

O primeiro é o trabalho da designer mineira Zuzu An-


gel, em coleção intitulada International Dateline Collection
IV, que foi concebida no ano de 1971 no contexto da dita-
dura civil-militar brasileira (1964-1985). O segundo estu-
do de caso, inserido no contexto político da última década
(2010-2020) são os panfletos bordados do Coletivo pau-
listano Linhas de Sampa, realizado nos últimos dois anos.

Dessa forma, esta investigação do design de moda no


campo social, pode contribuir para fomentar os campos de
interlocução entre as searas. Na revisão bibliográfica perce-
beu-se que por mais que existam inúmeros trabalhos que
conectam design e política, há uma certa carência de estu-
dos que articulem a técnica do bordado à resistência. Esta
análise poderá contribuir para referenciar futuras pesquisas
que articulem a técnica com o campo e promover a expan-
são das discussões também para o campo da educação,
pois incentiva a sistematização de alguns conhecimentos
que podem colaborar para a formação de designers.

A motivação para pesquisar esse tema surgiu duran-


te um movimento intitulado Jornadas de Junho, ocorrido
no ano de 2013. Os protestos no Brasil em 2013 foram as
maiores marchas da história do país. Durante esse período,
me conscientizei acerca das reverberações da política na
sociedade e de maneira individual.

A escolha pelo trabalho de Zuzu Angel foi motivada


por uma Ocupação em memória aos 50 anos do golpe de
1964, ocorrida no Instituto Itaú Cultural na cidade de São
Paulo (SP) entre os dias 2 de abril e 11 de maio de 2014.
A exposição buscava resgatar a memória de Zuzu Angel,
uma das vítimas da ditadura. Sua coleção de protesto é
dotada de singularidades relevantes, especialmente nos
dias de hoje, em função das suas potencialidades esté-
ticas, das estratégias de luta e de combate que ressoam

15
nas mazelas dos tempos atuais, em diversos sentidos.
Suas estratégias e os diversos componentes que per-
meiam suas criações dispararam curiosidades a respei-
to das relações entre o campo do design de moda e da
política. A pesquisa de mestrado foi uma das estratégias
encontradas por mim, para refletir acerca dessas cone-
xões, em diálogo com as práticas realizadas pelo coletivo
Linhas de Sampa, no momento presente.

A abordagem pretende colaborar para melhor com-


preender aproximações entre política e design de moda,
bem como ampliar o repertório que articula vestuário e
produção de subjetividades hegemônicas e/ou questiona-
doras – no contexto dos modos de vida individuais e cole-
tivos predominantes em determinadas épocas e contextos
(MESQUITA, 2010).

Para desenvolver uma pesquisa de caráter qualitativo,


enfocamos PAPANEK (1985), CARDOSO (2016), FOU-
CAULT (1988), WILSON (1989) e PARKER (2010). Para a
realização dos procedimentos práticos ou de campo foram
empregadas produções teóricas que auxiliaram na cons-
trução de metodologias para a pesquisa de campo. Para
ambos os estudos de caso, usamos as proposições de DU-
ARTE (2002), que delimitam as diretrizes para a pesquisa
de campo e as entrevistas. A metodologia de SALUSTIANO
(2016) também se fez importante para a análise de um dos
estudos de caso.

É relevante comentar que os cenários de resistência


delineados por esta pesquisa aparecem circundados por
uma analogia com os bastidores. Segundo Ferreira (1995,
p. 88) o bastidor é um aparelho composto de dois aros
de madeira que se encaixam, onde se coloca, esticado, o
tecido para bordar. A palavra também é usada no teatro,
para as armações que definem o espaço cênico, ou pla-
no de fundo, assim como usa-se o termo para designar
intrigas e enredos íntimos, particulares ou que não vem a
público. Nesta dissertação, utilizaremos este termo em al-
guns momentos, em analogia aos cenários que permeiam
os estudos de caso, sendo eles os bastidores do traje de
oposição, da ditadura civil-militar brasileira, do caso Stuart
Angel e dos levantes mundiais dos anos 2000, que serão
apresentados nos capítulos desta dissertação.

16
Esta investigação divide-se em três capítulos. O capí-
tulo I apresenta uma (a)bordagem que articula design, po-
lítica e resistência. Partimos de uma percepção acerca do
design como articulador de campos e criador de interfaces,
perpassando o conceito de “resistência”, para, em conexão
com o conceito do “traje de oposição”, apresentarmos mo-
mentos na história ocidental nos quais se faz presente esse
tipo de traje. São eles: o traje emancipado feminino, o terno
zoot, o traje existencialista, o traje ted, o traje hippie, o traje
punk, o traje insurgente árabe e o feminista norte-america-
no, que exemplificam aproximações entre design e política.
Em seguida, uma breve história sobre ato de bordar delineia
um percurso que se fará importante para melhor compre-
ender a técnica do bordado e suas relações com a política.
Abordaremos o conceito de “ponto subversivo”, que, neste
trabalho chamamos de “bordado de oposição”, destacado
por meio de dois exemplos: o sufrágio feminino e a segunda
onda feminista. Uma breve apresentação sobre o contexto
das práticas manuais no Brasil amplia esta reflexão e nos
aproxima dos nossos estudos de caso.

No capítulo II, é apresentado o primeiro estudo de


caso. A partir dos bastidores da ditadura civil-militar brasi-
leira (1964-1985), (a)bordamos o contexto histórico e um
olhar para as principais características culturais do perío-
do, que nos conduz para o trabalho de bordados da desig-
ner mineira Zuzu Angel na coleção International Dateline
IV, do ano de 1971. O estudo se apoia na coleta iconográ-
fica e nas entrevistas nas quais pode-se observar trajes,
materialidades e elementos que articulam design e resis-
tência política, bem como algumas de suas aproximações
com movimentos culturais da época.

O terceiro capítulo enfoca momento presente, a partir


de uma exposição sobre as manifestações de rua inicia-
das no ano de 2013. O segundo estudo de caso, realiza
uma pesquisa breve sobre o panorama político atual ao
observar o trabalho dos panfletos bordados e as ações do
Coletivo Linhas de Sampa, nos últimos dois anos. No sen-
tido de articular o bordado como técnica que realça ações
de resistência, realizamos uma (a)bordagem dos cenários
das manifestações de rua e de uma das formas de ativis-
mo que se consolidaram nos últimos anos.

17
1. Design, política
e resistência em
trajes e bordados
Este capítulo busca observar articulações entre trabalhos de de-
sign de moda com resistência política. Nosso percurso para deli-
mitar algumas das variáveis atravessa as proposições de Michel
Foucault (1988) para “resistência”, em articulação aos conceitos
de “trajes de oposição” de Elizabeth Wilson (1989), alinhavados
ao contexto da produção de bordados, com base nas reflexões
de Rosziska Parker (2010) de “ponto subversivo” e indica alguns
exemplos nos quais se fazem presentes aproximações entre fe-
nômenos socioculturais que articulam design de moda e resistên-
cia política.

Para contextualizar, apresenta-se uma (a)bordagem reflexi-


va do campo do design e sua inserção na sociedade, seguido de
levantamento histórico sobre os trajes de oposição e da técnica
do bordado, com enfoque para os ecos sociais dessas manifes-
tações ligadas ao design de moda. A investigação consiste em
pesquisa bibliográfica e coleta iconográfica, de abordagem quali-
tativa, observa trajes e bordados, nos quais aspectos do cenário
sociocultural e político são materializados, para referenciar ma-
nifestações de resistência que enfrentam diversas variáveis do
diagrama de forças dominantes.

Pretende-se investigar as potências do traje de oposição e


do bordado como fatores de dissonância, que criam espaços ex-
pressivos questionadores das hegemonias sociais e políticas.

1.1 Design, política e resistência

O processo ocorrido entre meados do século XVIII e o início do


século XIX conhecido como Revolução Industrial, desencadeou
para as populações dos países em industrialização um largo
acesso a bens de consumo (MORAES, 2017). Para alguns, a am-
pliação gerou declínio na qualidade e na beleza dos produtos.
Essa percepção e as consequentes mudanças nas estruturas de
projetos e produtos deram origem aos primeiros processos de
design, que contaram com a colaboração de artistas, arquitetos,
governos, associações comerciais, museus e instituições de ensi-

19
no com o propósito de melhorar a configuração das mercadorias
(CARDOSO, 2016).

Em decorrência desses movimentos, artefatos e utensílios


de estrutura física e aparência mais eficientes do ponto de vista
funcional passaram a ser realidade por volta dos anos 1930 (ibid,
2016). Os avanços tecnológicos ocorridos durante século XX –
em especial após o término da Segunda Guerra – e a ampliação
do modelo ocidental de sociedade capitalista, promoveram o sur-
gimento de outras necessidades, que implicaram ao design novas
problematizações, para além da configuração dos artefatos, em
um sentido que transbordava aos esquemas vigentes até então.

As primeiras reflexões acerca das responsabilidades dos


projetos de design perante a configuração de mundo da época fo-
ram inicialmente provocadas pelo designer e educador austro-a-
mericano Victor Papanek (1927-1999) na década de 1970. Suas
proposições comparavam a contribuição dos projetos de design
face às dificuldades que se apresentavam. Para ele, a contribui-
ção dos designers ficava aquém das necessidades vigentes na
sociedade no período. Assim, refletia sobre os projetos de uma
nova maneira, ao acrescentar demandas sociais e ecológicas.

O autor realiza uma crítica do papel do design na chama-


da “sociedade de consumo”, decorrente do término da Segunda
Guerra, quando o capitalismo entra em uma fase na qual o cres-
cimento econômico e a geração de riqueza estavam ligados a ati-
vidade comercial. Para isso, incentivava-se o consumo de várias
maneiras, especialmente pelo uso de ferramentas publicitárias.
Sua obra chamada Design para o mundo real, foi lançada na Su-
écia e tinha como proposta central repensar o papel do design de
um novo prisma. Em suas palavras:
Numa era de produção em massa, em que
tudo deve ser planejado e projetado, o design
se tornou a ferramenta mais poderosa com
a qual o homem molda suas ferramentas e
ambientes (e, por extensão, a sociedade a si
mesmo). Isso exige do designer elevada res-
ponsabilidade social e moral [...] Nem um úni-
co volume sob a responsabilidade do desig-
ner, nenhum livro sobre design que considere
o público dessa maneira jamais foi publicado
em qualquer lugar2 (PAPANEK, 1985, p. 12).

2 _ Do texto original: “In an age of mass production when everything must be


planned and designed, design has become the most powerful tool with which
man shapes his tools and environments (and, by extension, society and him-
self). This demands high social and moral responsibility from the designer […]
Not a single volume on the responsibility of the designer, no book on design
that considers the public in this way, has ever been published anywhere”. Tra-
dução nossa.

20
Com esse propósito Papanek definiu então seis atributos
básicos a qualquer projeto de design, sendo eles: método, uso,
necessidade, telesis, associação e estética. O atributo método
diz respeito a interação de ferramentas, processos e materiais de
forma eficiente; o atributo uso se refere a competência do artefato
no cumprimento das suas funções básicas; o atributo necessi-
dade busca avaliar o quanto o produto atende alguma carência
e não apenas desperta desejo de consumo; o atributo telesis se
refere a adequação na ordem socioeconômica em que o artefato
está inserido; o atributo associação se conecta a qualidades que
atendam a públicos com necessidades específicas; e por fim o
atributo da estética é aquele que confere ao elemento beleza,
prazer e significado (PAPANEK, 1985). Assim, todos os atributos
básicos do projeto deveriam se interconectar em um objeto, con-
ferindo a ele o que Papanek compreendia como função (figura 1).

Figura 1- Atributos básicos a um projeto de design

Fonte: Elaborado pela autora.

Segundo Papanek, um projeto de design deveria ser capaz


de integrar os processos e materiais de maneira eficiente, cumprir
suas funções e necessidades básicas – não apenas despertar
desejo de consumo – mas sim, adequar-se a ordem socioeconô-
mica na qual está inserido e ainda assim, ser capaz de agregar

21
significado em seu uso. Embora suas proposições datem da dé-
cada de 1970, reverberam ainda hoje de forma expressiva.

Passados 50 anos, os problemas mundiais se modificaram


exponencialmente e as concepções de Papanek para o que ele
chamava de “mundo real” em muito se diferenciam do contex-
to atual. Somado às questões levantadas por ele, tais como a
fome, a miséria, o desemprego, o excesso de bens de consumo
e esgotamento de recursos naturais e suas consequências, ainda
é possível adicionar a ampliação da tecnologia e das ferramen-
tas de comunicação (CARDOSO, 2016). Bambozzi (2014) cola-
bora, indicando redesenhos produzidos pelos novos sistemas de
comunicação, que são capazes de potencializar a expansão do
campo do design:
Poderíamos assim enxergar a expansão des-
te campo, envolvendo práticas estranhas ao
meio do design. Algum tipo de redesenho se
faz nesse campo, uma vez permeado por ten-
sões produzidas pela arte e, em particular, por
sistemas de comunicação, redes que se am-
pliam e que denotam mais facilmente as con-
tradições (BAMBOZZI, 2014, p. 111).

É possível considerar que as inter-relações do campo do de-


sign se ampliaram ao longo do século XX, para além daquelas
anteriormente propostas por Papanek, no livro análogo Design
para o mundo complexo, em decorrência da evolução da tecnolo-
gia. Cardoso defende:
O ‘mundo real’ de Papanek já não é o mesmo:
sobretudo, porque a explosão do meio digital
nos últimos 25 anos tem transformado de modo
profundo a paisagem econômica, política, so-
cial e cultural. A ‘era da informação’ chegou
para todos – por meio de mudanças essenciais
em sistemas de fabricação, distribuição e finan-
ças [...]. À medida que o mundo virtual aumenta
em abrangência, a realidade parece desman-
char-se no ar. [...] Não que o ‘mundo real’ tenha
deixado de existir! Os problemas apontados por
Papanek, de miséria e exploração, violência e
degradação, são mais reais do que nunca. [...]
Apenas foi acrescentada à realidade material
uma camada a mais, que tudo envolve e tudo
permeia (ibid., 2016, p. 19).

22
É reconhecível que, um dos campos com os quais o design
dialoga é o campo político. Um exemplo dessa conexão pode ser
percebido na Alemanha nazista, quando Adolf Hitler (1889-1945)
encomendou como parte de sua campanha o design de um carro
popular (PAPANEK, 1985). Em outra via, o surgimento da contra-
cultura3 nos anos 1960 fez despontar designers engajados, com
propostas contrárias aos sistemas políticos e econômicos vigentes,
dando margem a projetos que colocam o usuário como figura cen-
tral e participativa no fabrico de artefatos e objetos, como forma de
resistência. Nesta pesquisa, observamos estratégias que se fazem
por meio dos trajes, das materialidades e das técnicas empregadas
e podem ser entendidas como manifestações de resistência.

Primeiramente, vale notar a etimologia do termo resistência.


Cunha (2012) define que a palavra surge a partir do conceito do la-
tim resistere, sendo que o prefixo “re” indica “para trás” ou “contra”
e é seguido pelo sufixo “sistere”, que significa ficar firme, manter
a posição: “ficar firme e manter a posição contra alguém ou algo”
(CUNHA, 2012, p. 559).

No dicionário da língua portuguesa, a palavra resistência é


inicialmente compreendida no senso comum como “força que se
opõe a outra e que não cede a outra; luta em defesa; oposição ou
reação à uma forma opressora, força que se opõe ao movimento
de um sistema” (FERREIRA, 1995, p. 566). Outras interpretações
podem ser encontradas em vários campos do conhecimento: na
biologia, como capacidade natural que tem um indivíduo de não
ser lesado por agentes nocivos; na eletrônica, como a proprieda-
de de toda substância de se opor à passagem de corrente elétri-
ca, ou mesmo na psicanálise, como obstáculo ao retorno ao nível
de consciência de material reprimidos (idem, 1995).

O conceito de resistência é recorrente também no campo da


filosofia. O filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) realizou
pesquisas que refletem as sociedades disciplinares, tais como go-
vernos, prisões e manicômios e as relações de poder e de contra
poder (resistência) que se fazem nesses ambientes. Na década
de 1960, Foucault utilizava a palavra transgressão para denomi-
nar a técnica que alguns escritores empregavam para desviar ou
resistir aos dispositivos de normalização impostos para a escrita.
Ao se deslocar da ação individual da escrita e observar terrenos
de ação coletivos – tais como os movimentos estudantis france-
ses do final da década de 1960 – passou a empregar o termo,

3 _ Ver item 1.2.

23
com a proposição de que a resistência é inseparável das relações
de poder (REVEL, 2005).

Para o filósofo, era importante observar as relações de po-


der e suas variadas ramificações e esferas – desde aquelas mais
insignificantes – no sentido de compreender de que maneira po-
dem irromper tais manifestações. Em suas palavras:
Trata-se de captar o poder e, suas extremida-
des [...]; captar o poder nas suas formas mais
regionais e locais, principalmente no ponto
em que, ultrapassando as regras [...] penetra
em instituições, corporifica-se em técnicas e
se mune de instrumentos de intervenção ma-
terial, eventualmente violento (FOUCAULT,
1992, p. 182).

Assim como que podem ser percebidos vários graus de po-


der, considera-se que, por essa mesma razão, sempre surgem
novas possiblidades de resistência, criação de espaços de lutas
e possibilidades de transformação. Para o autor:
Portanto, não existe, com respeito ao poder,
um lugar da grande Recusa — alma da revol-
ta, foco de todas as rebeliões, lei pura do re-
volucionário. Mas sim resistências, no plural,
que são casos únicos: possíveis, necessárias,
improváveis, espontâneas, selvagens, solitá-
rias, planejadas, arrastadas, violentas, irre-
conciliáveis, prontas ao compromisso, interes-
sadas ou fadadas ao sacrifício; por definição,
não podem existir a não ser no campo estra-
tégico das relações de poder. (FOUCAULT,
1988, p. 91).

Segundo Foucault, algumas posições de resistência são re-


veladas por meio de expressões radicais, enquanto, na maioria
das vezes, outras se fazem de forma mais discreta. Em suas
palavras:
Também são, portanto, distribuídas de modo
irregular: os pontos, os nós, os focos de re-
sistência disseminam-se com mais ou menos
densidade no tempo e no espaço, às vezes
provocando o levante de grupos ou indivíduos
[...] Grandes rupturas radicais, divisões biná-
rias e maciças? Às vezes. É mais comum, en-
tretanto, serem pontos de resistência móveis
e transitórios, que introduzem na sociedade
clivagens que se deslocam, rompem unida-

24
des e suscitam reagrupamentos, percorrem
os próprios indivíduos, recortando-os e os re-
modelando, traçando neles, em seus corpos e
almas, regiões irredutíveis (ibid, 1988, p. 91).

O autor enfatiza o papel das relações de poder como funda-


mentais para disparar novas formas de pensar e novas formas de
resistência:
Da mesma forma que a rede das relações de
poder acaba formando um tecido espesso que
atravessa os aparelhos e as instituições, sem
se localizar exatamente neles, também a pul-
verização dos pontos de resistência atravessa
as estratificações sociais e as unidades indi-
viduais. E é certamente a codificação estraté-
gica desses pontos de resistência que torna
possível uma revolução (ibid, 1988, p. 91).

Foucault defende que, da mesma forma que dispositivos de


poder são reforçados e se modificam, o mesmo ocorre com a re-
sistência, de modo que coexistem, numa oscilação de forças. Em
suas palavras: “Para resistir, é necessário que a resistência seja
como o poder. Tão inventiva, tão móvel, tão produtiva quanto ele.
Que, como ele, venha de baixo e se distribua estrategicamente”
(ibid, 1992, p. 241).

Nesta pesquisa, consideraremos como resistência, atos que


se expressam contra movimentos inscritos pelos sistemas hege-
mônicos e que podem estar ligados a interesses específicos, tais
como de classe, gênero ou raça. Nesse sentido, é possível con-
siderar as estratégias citadas por Foucault em ação, sendo per-
cebidas em práticas no campo do design. Nessa dissertação, se-
rão apresentadas por meio de trajes, materialidades e bordados,
práticas disparadas de diferentes origens e necessidades, que
muitas vezes, subvertem a função inicial dos objetos, artefatos e
técnicas, fazendo emergir questões importantes.

Jesus (2014) defende que projetos de design que atendem


apenas aos interesses hegemônicos limitam as possibilidades.
Para o autor, o capitalismo acaba por se apropriar de toda e qual-
quer força criativa com finalidades comerciais adequadas aos
seus interesses e por isso, se faz importante avançar no modo
como pode operar o campo do design, alinhado a impermanência
da vida social, ao incentivar ações políticas capazes de se infiltrar

25
na vida cotidiana, que produzem deslocamentos nos processos
de subjetivação e criam novos possíveis:
[...] é em que medida o design pode fazer al-
guma coisa para alcançar as subjetividades
vulneráveis e fazer reverberar algum possí-
vel, alguma possibilidade de encontro e de
partilha com o Outro, distante das superfícies
desenhadas e programadas e que consigam
apontar alguma transformação da paisagem
subjetiva e objetiva que experimentamos hoje
em dia (JESUS, 2014, p. 18).

Bambozzi (2014) colabora, ao propor que o campo pode


servir a engendramentos para além daqueles conhecidos. Se
praticado para além da lógica capitalista, é possível ao designer
ser um agenciador de elementos considerados estranhos ou um
decodificador de estratégias, que podem extrapolar o âmbito do
consumo e ocorrer nas instâncias das ideias e da resistência:
Falemos assim de um desenho de fluxos, de
contra estratégias, de aproveitamento de es-
truturas de poder em outras possibilidades.
De conhecimento dos mecanismos da coer-
ção em processos distribuídos e que gerem
empoderamentos compartilháveis (BAMBO-
ZZI, 2014, p. 111).

Assim, estratégias decodificadas, como aponta Bambozzi, é


uma maneira de olhar para os trajes, materialidades e técnicas
(a)bordados neste trabalho e podem se articular com a perspec-
tiva proposta por Papanek para projetos socialmente responsá-
veis. Em suas palavras:
O design, para ser [...] socialmente responsá-
vel, deve ser revolucionário e radical (voltan-
do às raízes) no sentido mais verdadeiro. Ele
deve se dedicar ao ‘princípio de menor esfor-
ço’ [...] em outras palavras, usando o mínimo
de recursos para a diversidade máxima [...]
ou, fazendo o máximo com o mínimo4 (PAPA-
NEK, 1985, p. 140).

4 _ Do texto original “Design, if it is to be [...] socially responsive, must be revolu-


tionary and radical (going back to the roots) in the truest sense. It must dedicate
itself to nature’s ‘principle of least effort’, in other words, minimum inventory for
maximum diversity […] or, doing the most with the least”. Tradução nossa.

26
Nesse contexto, o próximo tópico apresenta exemplos nos
quais as lógicas vigentes são questionadas, mais especialmente
no campo do design de moda. Por meio da abordagem da histo-
riadora inglesa Elizabeth Wilson (1989), são elencados exemplos
que expressam resistência a partir de trajes, como um dos fios
condutores desta pesquisa.

1.2 Nos bastidores do traje de oposição

Os fenômenos denominados por Wilson como “trajes de


oposição” promovem diálogos entre roupas e movimentos de re-
sistência: “As modas de oposição têm por finalidade expressar
a dissidência ou as ideias diferentes de um dado grupo, ou das
opiniões hostis à maioria conformista” (WILSON, 1989, p. 247).
O conceito de Wilson pode ser exemplificado em diferentes mo-
mentos da história.

Ao longo do tempo, nota-se a reincidência de trajes que bus-


cam realizar alguma maneira de protesto ou oposição, graças
às barreiras sociais que, somadas às diferenças políticas, fazem
com que grupos e indivíduos busquem formas de se expressar
por meio de símbolos representativos no vestuário, podendo esse
ser um potente meio para comunicar as ideias e valores de pes-
soas ou de grupos específicos.

Ao adensar os estudos no campo da história da moda, é pos-


sível perceber que se as roupas de protesto, em alguns momen-
tos são produzidas nas ruas de modo espontâneo. Já em outras
ocasiões, são criadas por designers de moda e apresentadas nas
passarelas, nas fotografias e nos inúmeros meios que emergiram
com a internet.

Podemos afirmar que perspectivas que relacionam os trajes


com o campo político são amplamente pesquisadas por diver-
sos autores. As primeiras menções datam do século XVI, quan-
do os ingleses restringiam o uso do traje típico inglês pelos ci-
dadãos de suas colônias, Irlanda e Escócia (WILSON, 1989, p.
242). No século XVIII, na Europa, o movimento dandy reforçava
a nova ideia de estratificação da sociedade, em oposição ao luxo
e à ostentação da aristocracia, que se encontrava em crise e ain-
da não havia sido completamente destronada pela democracia5

5 _ Para adentrar o assunto, o livro Sobre a modernidade: O pintor da vida


moderna, de Charles Baudelaire (1971).

27
(ibid, p. 246) e expressava valores como efemeridade e simplicida-
de na vestimenta masculina, que na época era considerada exces-
sivamente simples, quando comparada aos trajes aristocráticos e
exagerados.

Já no século seguinte, alguns trajes de oposição surgiram com


a nova mulher6, um ideal feminista relacionado à inserção das mu-
lheres na vida social e no trabalho, instâncias nas quais até então
elas haviam sido ignoradas, deixando para trás a feminilidade dos
espartilhos, trocando-os por roupas que tinham referências mas-
culinas, como a camisa e em alguns casos, calças compridas, que
permitiam maior liberdade de movimentos (CRANE, 2013).

Para contextualizar os bastidores de nosso cenário do século


XX, vale (a)bordar alguns acontecimentos relevantes: o período
é marcado por duas Grandes Guerras, além de inúmeras outras,
que passam a coexistir, tais como a chamada Guerra Fria (1945-
1991), entre Estados Unidos capitalista e a antiga União Soviética
socialista. Esse foi um conflito político, militar, tecnológico, econô-
mico, social e ideológico entre as duas nações e suas zonas de
influência (HECHT; SERVENT, 2015).

Em torno das questões da Guerra Fria, ocorrem conflitos em


diversos países do mundo, marcados pelos regimes autoritários,
como a Guerra do Vietnã, entre os anos de 1955 a 1975, confli-
to dissidente da Guerra Fria, com forte motivação ideológica, no
qual estavam presentes exércitos do países capitalistas contra
os países socialistas, que resultou na morte de cerca de 400 mil
a 2 milhões de pessoas. Com objetivo de evitar o surgimento de
outras ditaduras comunistas naquele período, os Estados Unidos
foram responsáveis pela configuração mundial e suas reverbera-
ções em seu bloco de influência deram origem a regimes autoritá-
rios, o que também culminou, nos bastidores, em cenários ideais
ao surgimento de alguns movimentos intitulados contraculturais.
Dunn (2001) aponta a contracultura como:
O significado principal da contracultura foi a
rejeição do complexo militar-industrial com sua
visão profundamente destrutiva e antiecológica
de crescimento econômico eterno. A contracul-
tura era uma exploração da ‘política da consci-
ência’ que exigia novas maneiras de compre-
ender a sexualidade, a comunidade, a natureza
e a psique individual7 (DUNN, 2001, p. 173).

6 _ Termo criado pela escritora feminista Sara Grand. Disponível em: <https://
www.jstor.org/stable/25103291?seq=3#metadata_info_tab_contents>. Acesso
em 4 de set. de 2019.
7 _ Do texto original: “The primary significance of the counterculture was its

28
Em muitas dessas situações, a geopolítica8 mundial foi alte-
rada e foram vários os movimentos de resistência que emergi-
ram em distintos lugares. Nesse contexto, juntamente dos fluxos
contraculturais, os trajes de oposição engendram-se a partir de
diferentes variáveis, tais como posicionamentos culturais e polí-
ticos, questões de gênero e raça e embates contra os sistemas
econômicos e a luta de classes.

Do período citado, alguns exemplos valem ser lembrados: o


traje feminino emancipado na Europa e nos Estados Unidos, dos
anos 1900 a 1914, expressava os valores do primeiro movimento
feminista, que lutava, a princípio, pelo direito ao voto das mulhe-
res e eclodiu no final do século XIX (SILVA, 2008). Segundo Cra-
ne (2006), a composição do vestuário misturava peças femininas,
da cintura para baixo e masculinas, da cintura para cima. Saias
eram combinadas com camisas de mangas largas e punhos abo-
toados; o colarinho era bem fechado com gravatas ou broches. O
teor de resistência e oposição expresso nessa forma de se vestir
é enfatizado pela atitude dessas mulheres, que adotam traços
masculinizados no vestuário, com intenção de evocar austerida-
de, conforme ilustra a figura 2.

Figura 2- Traje feminino emancipado

Fonte: V&A Museum. Disponível em: <http://collections.vam.ac.uk/item/


O78182/photograph-unknown>. Acesso em 29 de set. de 2019.

rejection of the military-industrial complex with its profoundly destructive and anti-
-ecological vision for eternal economic growth. The counterculture was an explo-
ration of the “politics of conciousness” tha called for new ways of understanding
sexuality, community, nature, and the individual psyche”. Tradução nossa.
8 _ Geopolítica é a congruência entre demasiados grupos de estratégias ado-
tadas pelo Estado para administrar seu território e anexar a geografia cotidiana
à história (MAGNOLI, 1994).

29
Nas décadas de 1930 e 1940, afro-americanos sofriam dis-
criminações violentas e largo preconceito nos Estados Unidos. Al-
guns desses homens buscavam se expressar por meio de trajes
de oposição, com seus ternos zoot, movimento ligado à afirma-
ção da identidade cultural por meio do vestir, iniciado por jovens
hispano e afro-americanos nas regiões periféricas de Nova York,
Los Angeles, Detroit, Chicago e Atlanta. (ALFORD, 2004). Ainda,
segundo a autora: “Por viverem em uma sociedade na qual eram
silenciados, estes indivíduos usavam a auto expressão por meio
de trajes de oposição”. (ibid, p. 103). O traje era composto por ter-
nos com ombreiras enormes, calças muito largas com suspensó-
rios e outras proporções exageradas, também nas gravatas com
nó e nos chapéus (figura 3). Esses elementos eram motivados
em parte pelo culto ao swing, dança que exigia vestimentas am-
plas. Para alguns, era também um disfarce da atividade criminal,
alternativa que restava no contexto da marginalidade.

No período entre as guerras, as atenções, a força de traba-


lho bélica e as decisões dos países concentravam-se majorita-
riamente no conflito, enquanto qualquer manifestação cultural e
contracultural era reprimida. Para alguns teóricos como Mendes
e Haye (2006), o período após a Segunda Guerra é considerado
relevante no sentido de produzir movimentos nos quais os jovens
expressavam sentimentos de insatisfação e desesperança, algu-
mas vezes materializados por meio de trajes de oposição.

Um exemplo é o vestuário ligado ao existencialismo, corren-


te filosófica influenciadora do pensamento e produção diversos
artistas, filósofos, escritores e cineastas, entre eles o filósofo
francês Jean-Paul Sartre (1905-1980), a escritora francesa Simo-
ne de Beauvoir (1908-1986), além de tantos outros. Jovens que
questionavam o capitalismo, os sistemas europeus vigentes e as
diretrizes econômicas resultantes do final da Segunda Guerra e
opunham-se por meio de roupas simples e desestruturadas que
simbolizavam o antimaterialismo, ao mesmo tempo em que fa-
ziam referência ao comunismo e à igualdade de classes e direi-
tos. As roupas eram simples e evitavam qualquer manifestação
de gênero (figura 4), podendo haver suéteres tricotados, calças
jeans, blusas de gola alta e camisas que referenciavam o comu-
nismo da China. A cor predominante era o preto, uma cor associa-
da a revolta (WILSON, 1989).

O outro traje de oposição do pós-guerra é denominado ted,


uma abreviação para Edward. O nome era uma referência à épo-

30
Figura 3- Traje zoot Figura 4- Traje existencialista

Fonte: Smithsonian Magazine. Disponível em:<https:// Fonte: Old Cinema Journal. Disponível em: <https://old-ci-
www.smithsonianmag.com/artsculture/brief-history-zoot- nema.livejournal.com/79713.html>. Acesso em 26 de set.
suit-180958507/ >. Acesso em 27 de set. de 2019. de 2019.

Figura 5- Traje ted ca do reinado de Eduardo VII, filho e sucessor


da Rainha Vitória, no Reino Unido, que ocorreu
durante os dez primeiros anos do século XX e
remetia aos trajes masculinos das classes altas
daquela época. O traje contestava e reivindica-
va a diferença de classes de maneira irônica, já
que os operários se vestiam como se fossem
aristocratas. A falta de oportunidade dos jovens
operários ingleses face ao cenário econômico e
o conservadorismo britânico daquele tempo de
imobilidade social (MACKENZIE, 2010) é ilus-
trada pela figura 5. Wilson detalha o traje: pa-
letós compridos de ombros quadrados e golas
de veludo, combinados com calças afuniladas e
sapatos de solado largo expressavam rebeldia.
Para a autora:
O ted era um tipo novo de
Fonte: Museum of London. Disponível em: <https://
membro da classe traba-
www.museumoflondonprints.com/image/141217/
henry-granttwo-men-dressed-in-the-teddy-boy-sty- lhadora, que tinha um sa-
le-1953>. Acesso em 20 de set. de 2019. lário generoso para os pa-

31
drões salariais anteriores à guerra; no entanto,
viviam num mundo que não oferecia oportuni-
dades aos jovens das classes trabalhadoras [...]
Um mundo que - muito diferente da América- era
culturalmente dominado pelos estilos e valores
da alta burguesia. (WILSON, 1989, p. 255).

Nos anos seguintes, nos Estados Unidos, a contracultura vai


adquirindo outras formas e os levantes estudantis que eclodem ali
reclamam contra a Guerra do Vietnã. No ano de 1968, emerge des-
sa situação o movimento cultural hippie, que impactou o comporta-
mento, a cultura, a música, o cinema e produziu trajes de oposição.
Essa forma de se vestir era contrária às vigentes até então e evo-
cava a liberdade em diversos sentidos. O traje de oposição hippie
apresentava uma variação imensa de referências. Alguns exemplos
de peças eram as camisas de mangas compridas e bufantes, cal-
ças de bocas largas, casacos floridos e saias longas (figura 6), que
rejeitavam as modas impostas pela indústria consumista ocidental e
massificada e valorizava peças de segunda mão (WILSON, p. 258).

Já na Europa, na segunda metade da década de 1970, o mo-


vimento punk pode ser identificado com um dos mais impactantes
do ponto de vista estético, pela sua própria agressividade. O escritor
inglês William Shakespeare (1564-1616) já havia usado essa pala-
vra 400 anos antes na peça Medida por Medida, existindo uma vas-
tidão de sinônimos para ela, tais como “pedaço de madeira podre
usada para acender fogo”, ou mesmo “vagabundo de pouca idade”
(BIVAR, 2001). Foi uma corrente cultural, artística, musical e de trajes
de oposição, que possuía referências intelectuais no fluxo político e
denominado internacional situacionista, que atribuía responsabilida-
de a sociedade de consumo e a cultura capitalista pela alienação da
sociedade. (MACKENZIE, 2009).

Pode-se dizer que o grupo era formado por uma nova onda
de teds e que sua vertente mais expressiva estava ligada à cena
musical londrina. O traje de oposição punk era criado por meio de
bricolagem – técnica que ressignifica o uso de materiais ordinários –
em um visual composto por objetos interessantes: coleiras caninas,
roupas rasgadas, cabelos com corte exótico, raspado e espetado
no centro da cabeça (figura 7). O objetivo do conjunto era chocar,
parecer artificial e colocar em xeque os conceitos de bom gosto e
de beleza da época; expressão material da angústia da Guerra Fria
e do medo da vida pós industrial e pós moderna a que estavam sub-
metidos os jovens nos centros urbanos (WILSON, 1989).

32
Figura 6- Traje hippie Figura 7- Traje punk

Fonte: WILCOX (2004, p. 38).

Fonte: Time Magazine. Disponível em: <https://time.


com/3506707/peace-love-music-and-mud-life-at-woodstock/>.
Acesso em 01 de out. de 2019.

É possível verificar que na Europa e nos Estados Unidos, os


movimentos jovens e trajes de oposição apareceram em núme-
ro considerável para afirmar o vestuário como campo expressivo
de valores simbólicos e afirmação de resistências das mais di-
versas. No geral, é perceptível que aqueles mais emblemáticos
ganharam bastante espaço, reverberaram de diversas maneiras
através dos meios de comunicação que avançavam mais e mais
e, alguns deles influenciaram outras regiões - inclusive o Brasil,
em determinados momentos.

Lipovetsky (1987) colabora para compreender as conexões


com o vestuário, quando lembra que o campo de moda exerceu
o papel de cessar as imitações do passado, colocando, no lugar,
um espírito de curiosidade, que promovia atitudes heterogêneas,
de maneira que a disparidade e os elementos subjetivos ganha-
ram o universo dos comportamentos. Assim, ao longo do século

33
XX, outras tantas manifestações dos trajes de oposição podem
ser percebidas, graças à multiplicidade de emergências sociais.

Vale mencionar ainda no século XXI, expressões por meio de


trajes insurgentes podem ser percebidas e reforçam uma interse-
ção contínua entre a juventude e os trajes de oposição, a primeira
se voltando para a segunda como meio de transmitir dissidência
em tempos de crise. Um dos exemplos, situado durante a primei-
ra década, são os levantes em torno da Primavera Árabe9, na
qual os jovens opositores reforçaram o uso do tradicional lenço
palestino keffiyeh (figura 8) para a proteção do rosto contra balas
de borracha e gás lacrimogênio (CARTA MAIOR, 2010).

Figura 8- Traje insurgente árabe

Fonte: TBS. Disponível em: <https://tbsnews.net/international/global-economy/


egyptians-are-no-better-arab-spring-44327>. Acesso em 20 de jun. de 2020.

O outro exemplo pertence à década seguinte, quando des-


taca-se uma grande marcha ocorrida no ano de 2017 em defe-
sa da legislação e políticas relacionadas aos direitos humanos e
outras questões de pautas minoritárias, tais como os direitos das

9 _ Para mais detalhes, ver item 3.1 desta pesquisa.

34
mulheres, a reforma da imigração, os direitos reprodutivos, direitos
LGBTQI+, a liberdade religiosa, entre outras. O evento reuniu mais
de cinco milhões de pessoas10, sendo realizado em várias cidades
dos Estados Unidos e do mundo e ocorreu imediatamente após a
posse do presidente americano Donald Trump (1946 -) contra algu-
mas das suas declarações, consideradas ofensivas. O símbolo de
resistência ficou a cargo de gorros da cor rosa, como pode ser visto
na figura 9. Faziam alusão à uma frase de cunho machista dita por
Trump em sua campanha no ano anterior11 (PORTAL G1, 2017).

Figura 9- Traje de mulheres norte-americanas feministas

Fonte: National Review. Disponível em: <https://www.nationalreview.


com/2017/01/sjw-blog-vagina-imagery-womens-march-was-offensive-women-
-without-vaginas/>. Acesso em 22 de jul. de 2020.

A partir dessa abordagem sobre traje de oposição ao longo da


história, quando o vestuário ocupa um papel de resistência, fare-
mos uma analogia com o conceito de Wilson no sentido de enfocar
uma técnica que, em muitos momentos, é utilizada com o propósito
de contrariar contextos sócio-políticos hegemônicos. Assim sendo,
nossa abordagem seguirá apontando momentos nos quais o bor-
dado assumiu esse papel.

10 _ Para mais informações, ver <https://g1.globo.com/mundo/noticia/marcha-


-das-mulheres-reuniu-mais-de-dois-milhoes-contra-trump.ghtml>. Acesso em
20 de jul. de 2020.
11 _ Para mais informações ver: https://observador.pt/especiais/pode-o-grab-
-them-by-the-pussy-ser-o-fim-de-donald-trump/. Acesso em 20 de jul. de 2020.

35
1.3. Bordado de oposição entre história e resistência

1.3.1 Um breve arremate: linhas iniciais

Este tópico apresenta um breve percurso pela história do borda-


do, a partir do entendimento dessa prática tão antiga e popular.
Para tanto, a obra da historiadora britânica Rozsiska Parker, O
Ponto Subversivo (2010) é importante fonte historiográfica sobre
o tema, pois considera o bordado, entre outras funções, como
uma prática insurgente. Segundo Parker (2010), o bordado é co-
nhecido como uma prática para adornar tecidos, fazendo uso da
agulha, podendo ser feito com linhas ou contas variadas, criando
desenhos, texturas e adornos que permitem infinitas possibilida-
des de composição. Ganderton (2015) colabora, lembrando que:
“Bordado pode ser definido a princípio, como a ornamentação em
tecidos com pontos decorativos. É uma prática antiga, que en-
globa uma riqueza histórica e geográfica, pois os mesmos pon-
tos são encontrados em trabalhos de várias partes do mundo12”
(GANDERTON, 2015, p. 6).

O bordado é uma técnica composta por diferentes materiais,


ferramentas e técnicas. Dentre os materiais, a principal matéria-
-prima são tecidos, base para receber o trabalho, seguido das
linhas, que dão forma, cor e vida aos bordados. As ferramentas
utilizadas são diversas, entre elas estão tesouras, agulhas, alfine-
tes, marcadores de tecido, desmanchadores de pontos, dedais,
bastidores e papel carbono. As técnicas utilizadas podem ser as
mais variadas e são elas que formam os inúmeros tipos de pontos
e desenhos (ibid, 2015). Um exemplo é a bolsa de esmolas fran-
cesa bordada do século XIV da figura 10.

Inexiste registro preciso da data de execução do primeiro


bordado: “As fontes são dispersas e escassas, assim como os
relatos não passam de pontos fragmentados [...] muito do que
ocorreu continua esperando revelação” (MALERONKA, 2007, p.

12 _ Do texto original: “Embroidery has been defined simply as the ornamenta-


tion of textiles with decorative stitches. It is an ancient craft which encompasses
a wealth of history, and the same stitches are used by embroiderers throughout
the world”. Tradução nossa.

36
Figura 10- Bolsa de esmolas Figura 11- Bordadeiros no perío- Figura 12- Bordadeiras no perío-
francesa do pré Renascimento do pós Renascimento

Fonte: Parker (2010, p. 33). Fonte: Parker (2010, p. 4). Fonte: Parker (2010, p. 62).

15). Para Parker (2010), o período do Renascimento13 foi delimitador,


no sentido de separar os afazeres manuais por gênero:
Durante o século XVII, o bordado foi usado para in-
culcar desde cedo a feminilidade inata nas garotas.
No século XVIII, bordar significava um estilo de vida
aristocrático e descontraído – não trabalhar estava
se tornando a marca da feminilidade [...] Finalmente
no século XIX a conexão entre bordado e feminilida-
de foi considerada natural. As mulheres bordavam
porque eram naturalmente femininas e eram femi-
ninas porque bordavam14 (PARKER, 2010, p. 11).

A figura 11 mostra uma ilustração italiana do século XIV, que re-


presenta homens trabalhando com bordados. Foi a partir do período
conhecido como Renascimento que o bordado passou a ser conside-
rado uma atividade exclusivamente destinada às mulheres e ligada às
boas maneiras, tal como costurar e cozinhar, práticas ensinadas nas
esferas domésticas, de mãe para filha. A figura 12 apresenta mulheres
na função de bordadeiras.

13 _ Ocorrido no Ocidente entre os séculos XV e XVI. Característico pela rejeição aos


valores da Idade Média (entre os séculos V e XV) e por demonstrar novamente valori-
zação dos valores da Antiguidade Grega e Romana (BURKE, 2008).
14 _ Do texto original: “During the seventeenth century the art was used to inculcate
femininity from such an early age that the girl’s ensuing behavior appeared innate.
By the eighteenth-century embroidery was beginning to signify a leisured, aristocratic
lifestyle - not working was becoming the hallmark of femininity […] Finally, in the nine-
teenth century, embroidery and femininity were entirely fused and the connection was
deemed to be natural. Women embroidered because they were natural feminine and
were feminine because they naturally embroidered”. Tradução nossa.

37
As práticas de bordado continuaram a permear universos ex-
clusivamente femininos nos séculos seguintes. A figura 13, data-
da do ano 1740 é a pintura A mãe trabalhadora, do artista francês
Jean Siméon Chardin que mostra o trabalho de bordado sendo
transmitido de mãe para filha. A figura 14 mostra um manual de
boas maneiras feminino norte-americano do ano de 1889, com
instruções de bordado.

O século XX também evidencia este fato, que pode ser per-


cebido a partir de escolas que incluíam a prática no treinamento
de fazeres manuais dedicados às mulheres (figura 15). Como as-
sinala Parker: “[...] enquanto os garotos ganhavam livros, as ga-
rotas recebiam agulhas e linhas” (PARKER, 2010, p. 193). Após a
Segunda Guerra Mundial, as práticas domésticas são novamente
incorporadas às revistas femininas, por meio de encartes de mo-

Figura 13- A mãe trabalhadora, de Jean Simeón Chardin

Fonte: Museu do Louvre. Disponível em: <http://cartelfr.louvre.fr/cartelfr/visi-


te?srv=car_not_frame&idNotice=10250> Acesso em 12 de nov. de 2019.

38
Figura 14- Manual de boas maneiras com instruções de bordado

Fonte: Parker (2010, p. 161).

Figura 15- Mulheres em aula de bordado

Fonte: Parker (2010, p. 193).

39
delos para bordar, com a proposta de resgatar conceitos como
paz, prosperidade e abundância, por meio dessa atividade, que
como tantas outras, ficara em suspenso durante os anos de ba-
talha (ibid, p. 202).

É importante destacar alguns exemplos nos quais o bordado


e resistência política encontram-se de maneiras expressivas. En-
tre eles, são dignos de nota os banners bordados do movimento
sufragista, bem como os bordados pela liberação feminina, a par-
tir da década de 1970. Para melhor compreender e estabelecer
essas relações, conectadas ao contexto da produção de borda-
dos, nos utilizaremos do conceito de “ponto subversivo”, proposto
por Parker (2010):
[...] o bordado, é sem dúvida uma prática cul-
tural que envolve iconografia, estilo e função
social [...] bordadeiros transformam materiais
para produzir sentido – e toda uma gama de
significados – são invariavelmente notados15
(PARKER, 2010, p. 6).

1.3.2 Nos bastidores do bordado como resistência: al-


guns pontos

Tendo início na Inglaterra a partir da segunda metade do século


XVIII e durante todo o século XIX, a Revolução Industrial con-
solida a formação do Capitalismo e o surgimento da indústria
como modo majoritário de produção (MORAES, 2017). Ao final
do século XIX, em decorrência da industrialização, a inserção das
mulheres na vida social e no trabalho se ampliou. Em instâncias
nas quais até então elas haviam sido silenciadas, emergem ma-
nifestações de descontentamento com relação às injustiças de
gênero, tais como o direito de receber educação universitária,
de exercer a medicina, de ter propriedades em seu nome, entre
tantos outros. Algumas dessas manifestações são realizadas por
meio de banners bordados (PARKER, 2010).

Para que a proposta triunfasse, primeiramente as mulheres


reivindicavam pelo direito civil e político ao voto (LLOYD, 1968).
O movimento insurgente das sufragistas – como eram chamadas
– defendia a extensão do direito de voto sem distinção de gêne-

15 _ Do texto original: “Embroidery, is indoubtely, a cultural practice involving


iconography, style and a social function [...] that embroiderers do transform
materials to produce sense – whole range of meanings – is invariably entirely
overlooked”. Tradução nossa.

40
ro, etnia, origem ou classe social (PINTO, 2010). As primeiras
manifestações surgiram no final do século XIX, na Inglaterra, se
espalharam por alguns outros países industrializados e perdura-
ram até o início do século XX. Inspiradas pelos protestos sindicais
masculinos – nos quais trabalhadores portavam banners impres-
sos e bandeiras sindicais – as feministas produziram materiais
expressivos que se diferenciavam graças à sua habilidade supe-
rior com as atividades domésticas manuais, eclesiásticas, costu-
ras e, principalmente, bordados (ibid, p. 198). A figura 16 mostra
um banner com o bordado de oposição sufragista bordado com
os dizeres “lembre-se: moradores de rua e suas irmãs exigem
votos” (tradução nossa) do ano de 1908.

Figura 16- Banner sufragista

Fonte: Acervo do Museu de Londres. Disponível em: <https://collections.museu-


moflondon.org.uk/online/object/91870.html >. Acesso em 07 de dez. de 2019.

41
Figura 17- Banner sufragista

Fonte: Acervo do Museu de Londres. Disponível em: <https://www.museumo-


flondonprints.com/image/177698/suffrage-banner-of-hammersmith-wspu-20th-
-century>. Acesso em 05 de dez. de 2019.

Essas mulheres usavam o bordado para provocar questiona-


mentos sobre o papel feminino na sociedade que estava em tran-
sição, em decorrência do contexto industrial (PARKER, 2010). O
banner sufragista da figura 17 é um bordado do ano de 1907, nas
cores oficiais do movimento – roxo e verde – e exibe a frase “atos
e não palavras” (tradução nossa), com apliques de veludo e de-
licadas flores de íris, em contraste com a pintura do martelo e da
ferradura, que são ferramentas normalmente ligadas à masculini-
dade. Esse conjunto pode ser entendido como uma reivindicação
de igualdade entre homens e mulheres.

A mais importante união de sufrágio era denominada WSPU


– Women’s social and political union ou União social e política
das mulheres – formada por trabalhadoras. Nesses sindicatos e
uniões de mulheres também se faziam presentes: atrizes, artis-
tas, vendedoras, operárias, donas de casa, entre outras. Juntas,
entre os anos de 1905 e 1913, protestavam em marchas com
suas bandeiras, guarda-sóis e estandartes bordados. Segundo

42
Parker, pode-se dizer que a forma e conteúdo da maioria dos bor-
dados retratava a feminilidade não como fragilidade, mas como
força, que visava apresentar o movimento sufragista como apoio
a igualdade de direitos:
Não havia nada de ingênuo no protesto sufra-
gista por meio de bordados, elas estavam fa-
miliarizadas com métodos e materiais do bor-
dado, elas entenderam o conteúdo simbólico
dos materiais16 [...]. O guarda-sol era um ob-
jeto essencialmente feminino que, tomado em
conjunto com o bordado, sugere que o uso do
bordado pelo movimento era tático para com-
bater a propaganda anti-sufrágio, que cons-
tantemente retratava as feministas de maneira
caricata e masculinizadas17 (PARKER, 2010,
p. 198,199).

Fortes repressões eram sofridas pelas feministas. Na Ingla-


terra, por exemplo, mulheres foram presas, praticaram greve de
fome como revolta e por vezes, eram alimentadas à força. Algu-
mas bordaram um painel em homenagem as grevistas, como uma
declaração pública, com os nomes das líderes dos movimentos18.
A figura 18 apresenta o banner sufragista bordado nas cores roxo
e verde, composto de assinaturas das 80 mulheres que resistiram
ao fazer greve de fome. A bandeira foi carregada pela primeira
vez em uma procissão realizada no mês de junho de 1910. O ato
simbolizava solidariedade. Nas palavras de Parker:
Algumas eram bordadeiras qualificadas, ou-
tras conseguiam apenas seguir a sua própria
caligrafia com a linha e a agulha. A faixa se tor-
nou um ato de solidariedade [...] Aprisionadas
e em greve de fome, as mulheres bordaram
lenços com suas assinaturas, reunindo a tradi-
ção de petição política e protesto19 (PARKER,
2010, p. 200).

16 _ Do texto original “There was nothing naive in the suffrage use of embroi-
dery. they were familiar with methods and materials of pictorial embroidery.
They understood the symbolic content of materials”. Tradução nossa.
17 _ Do texto original “The parasol was such a quintessentially feminine object
that, taken in conjunction with embroidery, it suggests that the use of the art by
the movement was tactical, to counter anti-suffrage propaganda that constantly
depicted feminists as ‘large-handed, big footed, flat chested and thin-lipped’”.
Tradução nossa.
18 _ Mrs. Christabel Pankhurst e Mrs. Pethick Lawrence líderes do movimento
sufragista (LLOYD, 1968).
19 _ Do texto original “Some were highly skilled embroiderers, others able only
clumsy to follow the lines of their handwriting. The banner transformed a prison
gesture of solidarity into a public statement. Imprisoned and on hunger strike,
the women embroidered handkerchiefs with their signatures, bringing together
the tradition of political petition and protest”. Tradução nossa.

43
Figura 18- Banner WSPU

Fonte: Acervo do Museu de Londres. Disponível em: <https://collections.museu-


moflondon.org.uk/online/object/91239.html>. Acesso em 10 de dez. de 2019.

A Primeira Guerra Mundial (1914-1919) converteu boa parte


da mão-de-obra fabril em função do conflito. As mulheres aten-
diam postos de motoristas de ônibus e auxiliares das Forças Ar-
madas, por exemplo. O serviço feminino de guerra e a reinvindi-
cação de sufrágio universal foram apresentados somente no ano
de 1918, o que garantiu o direito de voto às mulheres com mais
de 30 anos de idade.

O período entre as duas guerras mundiais ficou marcado pela


decadência das lutas por igualdade de gênero, que naquele perí-
odo, graças à algumas conquistas, fez com que uma maioria de
mulheres abandonasse qualquer tipo de militância. Nos Estados

44
Unidos, por exemplo, depois de inseridas no espaço público e pro-
fissional, grande parte dessas mulheres foram demitidas e tiveram
que deixar os seus antigos postos de trabalho para os homens
que estavam voltando da guerra. Portanto, elas foram incentivadas
a retomar um estilo de vida prioritariamente doméstico (GARCIA,
2018). Nesse contexto, o outro exemplo no qual é possível notar a
relação entre a produção de bordados e contexto sócio-político é o
movimento feminista ocorrido após esse período, também conheci-
do como segunda onda feminista, na década de 1970.

Os movimentos feministas que surgiram anos 1970 herda-


ram algumas das características dos fluxos contraculturais forma-
dos durante a década de 1960, como a recusa dos papéis sexuais
rígidos e a discordância com o cenário político. Entretanto, com
relação aos bordados, enquanto os hippies produziam bordados
com associações emocionais e individualistas, as feministas dos
anos 1970 mostravam que suas expressões pessoais eram, ao
mesmo tempo, políticas, “que a vida pessoal e doméstica é tanto
o produto das instituições e ideologias da nossa sociedade quan-
to a vida pública” (PARKER, 2010, p. 205, tradução nossa20). As-
sim, as mulheres da segunda onda feminista bordavam de manei-
ra subversiva, criticando os valores predominantes na sociedade
pós-guerra. Seus bordados incentivam as mulheres a desenvol-
ver seu poder pessoal, bem como uma voz de resistência.

Um exemplo é o trabalho da feminista Beryl Weaver. Um de


seus trabalhos faz uso de elementos do século XVIII, que combi-
na a submissão feminina das mulheres Vitorianas21, com símbo-
los feministas e mensagens encorajadoras. O bordado (figura 19)
apresenta duas damas e um diálogo, a dama à esquerda pergunta
a mulher que empurra o carrinho: “Como vai a pequena mulher
hoje?” – e usa o símbolo do gênero feminino (♀) para se referir a
ela. A segunda mulher responde: “Ela está ficando mais forte e rai-
vosa o tempo todo, obrigada”. Nesse bordado, todas as flores e o
sol também são adornados pelo símbolo do gênero feminino e, na
base do desenho está a frase: “de pequenos botões grandes flores
crescem” (tradução nossa). De maneira irônica, o bordado de opo-
sição de Weaver explora a potência contida no gênero feminino,
considerado o mais frágil.

20 _ Do texto original: “Feminists in their embroidery showed that the personal


was the political- that personal and domestic life is as much the product of the
institutions and ideologies of our society as is public life”. Tradução nossa.
21 _ Período do reinado da Rainha Vitória, no Reino Unido, de junho de 1838
a janeiro de 1901, no século XIX. Os homens dominavam, tanto em espaços
públicos, como em privado e as mulheres deviam ser submissas e dedicar-se
em exclusivo à manutenção do lar e à educação dos filhos (GARCIA, 2018).

45
Figura 19- Bordado de Beryl Weaver

Fonte: Blog The Unchastened Stitch. Disponível em: <https://www.unchaste-


nedstitch.com/blog>. Acesso em 12 de dez. de 2019.

O caminho de mesa da figura 20 foi bordado por Beryl com


os dizeres we can’t spare (“não devemos poupar”, tradução nos-
sa), adornado por delicadas flores, galhos e nomes de mulheres,
contendo o símbolo feminino. Weaver critica o papel da mulher na
sociedade e questiona: “É a maneira que nós (mulheres) estamos
sempre em comparação com flores, mulheres e flores – pessoais
e quentes – bonitas, mas facilmente descartáveis22” (WEAVER In.
PARKER, 2010, p. 206).

22 _ Do texto original: “the way we are always compared to flowers, woman


and flowers - personal and warm- pretty but stultified”. Tradução nossa.

46
Figura 20- Caminho de mesa de Beryl Weaver

Fonte: British Library. Disponível em: <https://www.bl.uk/spare-


-rib/articles/a-day-in-the-life-of-spare-rib>. Acesso em 08 de dez.
de 2019.

47
Para Borges (2019), técnicas manuais como os bordados,
entre outras práticas, podem ser consideradas capazes de pro-
duzir narrativas sobre a cultura popular. Por vezes, são conside-
radas menos valorosas, quando comparadas equivocadamente
com a alta cultura23. Em suas próprias palavras: “As narrativas
construídas sobre a chamada cultura popular são, muitas vezes,
assimiladas em campos de oposição em relação a uma pretensa
cultura erudita” (BORGES, 2019, p. 7).

Tais práticas populares engendram saberes ancestrais, ao


sair de comunidades indígenas do Brasil e são potencializadas
por outras culturas, quando realizadas por africanos e outros imi-
grantes, que forçosamente ou não, seguiram aportando no país:
Os registros históricos da presença e resistên-
cia desses povos permanecem no fazer inte-
lectual e manual da cultura do nosso país [...]
as linhas e as tramas são símbolos que cos-
turam e afirmam sociabilidades, reforçando os
sentimentos de pertença e de identidade cul-
tural, possibilitando a transmissão de técnicas
em momentos de partilha de valores e afetos
[...] remetendo à ancestralidade e à perma-
nência das tradições, somadas às transforma-
ções próprias do tempo e das gerações (BOR-
GES, 2019, p. 7).

A autora atribui a carência de dados a respeito desses traba-


lhos ao caráter regional das práticas, pois os artesãos encontram-
-se normalmente espalhados pelo Brasil e não possuem meios
para divulgar seus artefatos. Alguns países criaram programas e
legislações para contemplar essas atividades. A Unesco estabe-
leceu na década de 1990 um modelo intitulado Tesouros Huma-
nos Vivos, que oferece subsídios para a criação de programas
de valorização de mestres de diferentes ofícios, dentre eles, o
bordado. Nos anos 2000, o Brasil firmou o registro do patrimô-
nio imaterial, que engloba conhecimentos e modos de fazer per-
tencentes aos fazeres das comunidades, bem como seus rituais,
festas coletivas e outras práticas da vida social24. Os estados que
possuem mais incentivo, são aqueles que possuem políticas pú-
blicas de valorização desses trabalhadores, entre eles Alagoas,

23 _ São consideradas alta cultura maneiras, atitudes e obras que são feitas
pela aristocracia para seu próprio consumo, com acesso restrito às massas.
Essa cultura admite em si os tópicos em torno das artes plásticas: cinema,
música, esculturas, teatro, pinturas, literatura e outros (BOURDIEU,1982)
24 _ Para mais informações, ver: <http://portal.iphan.gov.br/uploads/publica-
cao/sfgec.pdf>. Acesso em 25 de jul. de 2020.

48
Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte (ibid, p. 9). É
importante lembrar que, embora oficialmente são chamados de
mestres – no masculino da palavra – estima-se que 85% dos ar-
tesãos sejam mulheres.

As práticas manuais podem ser agentes de mudanças e de


resistência, tanto econômicas como sociais ou culturais, pois, em
muitos momentos, materializam produtos que geram fontes de ren-
da para comunidades ou indivíduos (BORGES, 2019). Além disso,
muitas vezes são responsáveis por fomentar o convívio social. O
grupo paulista de bordadeiras Artesãs da Linha Nove, moradoras
das comunidades da Linha do Nove (Vila Leopoldina, zona Oeste
de São Paulo) descreve a importância dessas relações e relata ter
encontrado no bordado uma prática de resistência, fortalecimento
e de possibilidade de vivenciar situações de solidariedade (figura
21). No âmbito da cultura, é possível observar ainda que “as mu-
lheres se apropriam de suas próprias identidades e as traduzem
criativamente, contando suas histórias” (ibid, p. 10).

Figura 21- Artesãs da Linha Nove

Fonte: Insitituto Acaia. Disponível em: <https://www.artesol.org.br/Artesas_da_


Linha_Nove>. Acesso em 10 de abr. de 2020.

49
Aos fatores de mudança elencados por Borges, as proposi-
ções de Barbosa Ramos e Prado (2019) acrescentam também
aspectos políticos, defendendo que as práticas podem, em certas
situações, subverter a função ornamental dos bordados. Algumas
vezes aparecem, inclusive, como forma de ativismo:
[...] a partir da reterritorialização dos atos anô-
nimos e domésticos dos trabalhos de agulha
que se estendem sobre o espaço público, em
que grupos constroem discursos e possíveis
diálogos com o público, de forma lúdica e pal-
pável, [...] são levantadas uma série de ques-
tões que incluem o envolvimento dos sujeitos
na ação (BARBOSA RAMOS; PRADO, 2019,
pp. 69-74).

Vale lembrar, que o bordado é uma técnica originalmente


conectada com fazeres artesanais, entretanto bastante utiliza-
da no campo do design, sobre uma diversidade de produtos. A
própria técnica, bem como alguns desses artefatos, podem ser
entendidos como produtos que se localizam entre o artesanato
e design. A partir desta compilação de exemplos relativos ao
bordado, nossa abordagem seguirá com enfoque nos dois estu-
dos de caso. O primeiro deles apresenta o trabalho de bordados
realizado por Zuzu Angel e o segundo propõe um olhar para as
práticas do Coletivo paulistano Linhas de Sampa.

50
2. Nos bastidores
da ditadura civil-mili-
tar: Zuzu Angel e os
bordados
No contexto das articulações entre resistência, trajes de oposi-
ção e bordados de oposição, este capítulo (a)borda mais especi-
ficamente o design de moda, como um campo de materialização
dessas conexões. Nosso percurso para delimitar algumas das va-
riáveis dá início na segunda metade do século XX, com o término
da Segunda Guerra Mundial (1945), a emergência da Guerra Fria
(1945-1991) e perpassa o contexto da ditadura civil-militar e suas
reverberações nos campos político, social e cultural.

Neste capítulo será apresentado o trabalho da designer de


moda brasileira Zuzu Angel, que teve sua vida afetada pessoal-
mente, em virtude do regime totalitário vigente no Brasil, com o de-
saparecimento de seu filho Stuart Angel, em maio de 1971. Stuart
era militante de um dos movimentos de oposição ao governo. Para
tanto, apresentamos um breve contexto sobre o regime autoritário
e o envolvimento de Angel na luta política em processo no país.
Seu trabalho na criação de trajes com apelo político e o lançamen-
to da International Dateline Collection IV – Holiday and Resort, na
cidade de Nova York, em agosto do mesmo ano, realiza uma de-
núncia acerca da situação política e social promovida pela ditadura
civil-militar por meio de bordados de oposição, para narrar o que
não poderia ser falado com palavras, diante da censura vigente
naquele duro momento.

Para esta observação foram de fundamental importância, a


prática da pesquisa de campo que possibilitou a realização de co-
leta iconográfica e das entrevistas, no sentido de aprofundar as
discussões e apontar aproximações entre a criação de Zuzu Angel
e as vozes de resistência aos sistemas dominantes, no contexto
da ditadura civil-militar brasileira. As reflexões de Duarte (2002), no
artigo intitulado Reflexões Sobre o Trabalho de Campo, apontaram
as diretrizes a serem seguidas, entre elas, está o que a autora cha-
ma de “delimitação do universo”, que diz respeito a composição de
sujeitos do universo da investigação. Em suas palavras:
[...] a definição de critérios segundo os quais
serão selecionados os sujeitos que vão com-
por o universo de investigação é algo primor-
dial, pois interfere diretamente na qualidade

52
das informações, a partir das quais será pos-
sível construir a análise e chegar à compre-
ensão mais ampla do problema delineado [...]
dependendo do volume e da qualidade delas,
o material de análise torna-se cada vez mais
consistente [...] (DUARTE, 2002, p. 141).

Outra diretriz importante ocorre quando, na realização das


etapas de coleta iconográfica e entrevistas torna-se possível
reconhecer padrões simbólicos, práticas e sistemas classifica-
tórios. Esse reconhecimento é chamado de “delimitação da situ-
ação de contato”:
Quando já é possível identificar padrões sim-
bólicos, práticas, sistemas classificatórios, ca-
tegorias de análise da realidade e visões de
mundo do universo em questão, e as recor-
rências atingem o que se convencionou cha-
mar de ‘ponto de saturação’, dá se por fina-
lizado o trabalho de campo, sabendo que se
pode (e deve) voltar para esclarecimentos [...]
o número de pessoas entrevistadas varia em
razão do objeto e do universo de investigação,
até que o material obtido permita uma análise
mais ou menos densa das relações estabele-
cidas (ibid, p. 144).

Assim, a pesquisa de campo foi realizada no Instituto Zuzu


Angel, (Rio de Janeiro- RJ) no mês de abril de 2019, nos dias
25 e 26. Fundada no ano de 1993, é a primeira organização não
governamental de moda no Brasil e abriga todo o acervo docu-
mental e têxtil da produção de Zuzu Angel. Diversas coleções
estão presentes, tais como a Coleção Carmen Therezinha Sol-
biati Mayrink Veiga25, de alta costura; Coleção Casa Canadá26 e a
Coleção Mosaico da Vida Brasileira Séculos 20 e 21, que reúne
roupas, acessórios, objetos de personagens de vários setores da
vida brasileira. O instituto também se dedica à restauração de
têxteis e sua conservação27.

As pessoas entrevistadas seguiram os critérios propostos por


Duarte (2002): Hildegard Beatriz Angel Bogossian, jornalista, filha
de Zuzu Angel e presidente do Instituto Zuzu Angel; Manon de
Salles Ferreira, doutora em conservação têxtil e coordenadora do
Instituto Zuzu Angel, responsável pelo acervo têxtil e Indumentária

25 _ Socialite Brasileira (1919-2017). Disponível em: <https://oglobo.globo.


com/ela/gente/carmen-mayrink-veiga-uma-mulher-que-soube-fazer-histo-
ria-22163982>. Acesso em 12 de jan. de 2019.
26 _ Boutique carioca da década de 1950. Disponível em: https://oglobo.globo.
com/ela/moda/casa-canada-boutique-elegante-dos-anos-1950-17595369>.
Acesso em 12 de jan. de 2019.
27 _ Disponível em: <https://www.zuzuangel.com.br>. Acesso em 2 de set. de 2019.

53
e Simone Costa Avila, museóloga responsável pelo acervo docu-
mental do Instituto Zuzu Angel. As transcrições das entrevistas re-
alizadas constam nos apêndices 1, 2 e 3 da pesquisa.

2.1 Nos bastidores da ditadura civil-militar brasileira


(1964-1985)

O cenário geopolítico do período conhecido como Guerra Fria


provocou o surgimento de regimes ditatoriais em todo o mundo.
Hecht e Servent (2015) definem assim a batalha travada entre os
Estados Unidos de diretrizes capitalistas e a União Soviética de
regime comunista e aponta conflitos indiretos ocorridos o final da
Segunda Guerra (1945) e a extinção da União Soviética (1991).
Tratava-se de um embate político, militar, tecnológico, econômi-
co, social e ideológico entre as duas nações e suas zonas de in-
fluência. Em torno dessa forma de guerra, ocorrem confrontos em
diversos países do mundo marcados pelos regimes autoritários,
como a Guerra do Vietnã (1955-1975).

Entre os anos de 1964 e 1985 o Brasil viveu sob o coman-


do de uma ditadura civil-militar. A fase pode ser dividida em três
ciclos: o primeiro, de legalização do regime autoritário por meio
da criação de decretos-lei, do ano de 1964 até 1968; o segundo,
com maior centralização política, restrição, controle e censura, de
1969 a 1974; e, por fim, o terceiro, com certa abertura política,
do ano de 1974 até a revogação do Ato Institucional de número
5, em 1978, terminando em 1985, com a campanha Diretas Já –
amplo movimento civil de reivindicação por eleições presidenciais
no Brasil, ocorrido entre os anos de 1983 e 1984 (ibid, 2008).

Dos governos anteriores até implantação do regime autoritá-


rio, é importante mencionar as relações do então presidente Jânio
Quadros (1917-1992) com a União Soviética e a China, seu apoio
a Cuba para a permanência na Organização dos Estados Ameri-
canos (OEA), o que contrariava os norte-americanos. Pressionado
pela ala dos conservadores, Quadros renunciou ao cargo em 25
de agosto de 1961 (LOPEZ; MOTA, 2012). Seu vice, João Gou-
lart (1919-1976) assumiu. De acordo com Colling (1997) durante
seu governo, enquanto estudantes, trabalhadores e organizações
populares se ampliavam no campo político brasileiro, Goulart era
receoso quanto à alianças estrangeiras no processo de desen-
volvimento brasileiro, defendeu o monopólio estatal do petróleo,
enquanto apoiou a reforma agrária e pretendia estender o direito

54
ao voto para os analfabetos, entre outros fatos que alarmaram as
camadas conservadoras dos empresários, banqueiros e militares.

No ano de 1959 ocorreu a Revolução Cubana com o apoio da


URSS, que marcou o ingresso da América Latina no contexto da
Guerra Fria – os Estados Unidos tinham como proposta proteger
os países latino-americanos de futuras alianças comunistas, agi-
ram nos bastidores junto aos governos, optaram por intervenção
direta na política dos países do continente americano, visaram
preservar sua hegemonia econômica e militar: “Em realidade, o
presidente pretendia, em troca de créditos vultosos, barganhar o
alinhamento político do Brasil na Guerra Fria” (LOPEZ; MOTA,
2012, p. 792).

Os Estados Unidos apoiaram diversos golpes militares na


América Latina, com objetivo de evitar o surgimento de outras di-
taduras comunistas. Argentina (1962-1983), Bolívia (1971-1985),
Brasil (1964-1985), Chile (1973-1990), Colômbia (1953-1957),
Guatemala (1954-1996), Nicarágua (1976-1985), Paraguai (1954-
1989), Peru (1968-1980) e Uruguai (1973-1990) foram os países
que instalaram os regimes totalitários (FICO et al., 2008).

Àquela altura, o governo norte-americano financiou a opo-


sição militar, boicotou a economia, limitou os investimentos no
Brasil e possuía tropas e navios preparados, caso fosse necessá-
rio intervir. Com sentimento de ameaça na possível aliança entre
Goulart e a URSS, ocorreram pressões populares e militares que
levaram à sua queda em abril de 1964. Nos bastidores e sem
eleições diretas, assumiu a presidência o Marechal Humberto de
Allencar Castello Branco (1897-1967) (ibid, 2012).

Os projetos do governo Castello Branco eram de execução


de reformas políticas e econômicas, combate à inflação e redu-
ção nos reajustes salariais da população, bem como o controle
dos comunistas (LOPEZ; MOTA, 2012). Para Colling (1997), esse
plano econômico manteve o modelo excludente quanto às polí-
ticas sociais: “[...] o que afetava as camadas inferiores da socie-
dade, desativando a educação dos adultos, diminuindo os sindi-
catos e afetando também os agricultores, com a desativação das
ligas camponesas28” (ibid, p. 25). Ainda segundo a autora, como
reação às ações militares surgiram inúmeros partidos políticos.
Enquanto alguns deles inspiraram-se no modelo da União Sovié-

28 _ Foram organizações criadas pelo antigo PCB (Partido comunista do Bra-


sil) a partir do ano de 1945, em prol da reforma agrária e da melhoria das con-
dições de vida no meio rural brasileiro (STEDILE, 2006).

55
tica desarmada, outros buscaram se guiar por modelos como Chi-
na e Cuba, que formavam exércitos populares de luta armada. No
Brasil, a primeira ação armada ocorreu no ano de 1967, quando
um dos partidos oposicionistas, de nome Aliança Nacional Liber-
tadora, liderado por Carlos Mariguella, (1911-1969) dirigente do
Partido Comunista do Brasil (PCB), invadiu um carro forte em São
Paulo, com objetivo de arrecadar dinheiro para o financiamento
da luta revolucionária.

Em diversas partes do mundo, ocorreram manifestações es-


tudantis com variadas pautas. Os fluxos estudantis reverberavam
na produção cultural e deram vozes à resistência contra as guer-
ras, a discriminação racial e a desigualdade de gênero, entre vá-
rias questões, em torno de questões mundiais como a Guerra do
Vietnã (1959-1975), o movimento hippie (final de 1960-1970) e a
disseminação da pílula anticoncepcional como liberação feminina
(1960). No contexto da juventude, mais do que ler, estudar e na-
morar, era imprescindível fazer política.

Os levantes ocorridos na França no mês de maio de 1968


são considerados importantes, pois consolidaram o desdobra-
mento de várias lutas anteriores, que propuseram uma revisão
dos costumes. Os universitários buscavam o fim de algumas pos-
turas conservadoras, como a divisão dos dormitórios por gênero.
A reação imediata foi a adesão de outros conglomerados, como o
Partido Comunista Francês e outros sindicatos, com pautas que
permeavam questões políticas contra o Presidente Charles de
Gaulle – considerado conservador – e dispararam uma série de
greves realizadas por cerca de 9 milhões de trabalhadores, o que
resultou em um abono de 35% no salário mínimo. Já nos Esta-
dos Unidos ocorria um crescente descontentamento em relação
a Guerra do Vietnã. Na sociedade americana, o caráter de não
violência era a tônica dos protestos em um primeiro momento.
(PONTES; CARNEIRO, 1968).

O movimento oposicionista estudantil brasileiro foi às ruas


no mesmo ano. Pode-se destacar uma enorme onda repressora
e a morte de manifestantes, que resultou no protesto conhecido
como Passeata dos 100 mil no Rio de Janeiro em junho de 1968,
liderada por estudantes, artistas e intelectuais, que reivindicavam
contra o regime autoritário (VENTURA, 1988). Naquele momen-
to, ocorreu a atuação das insurreições de luta armada. Por meio
de sucessivos atentados e assaltos a banco, o assassinato do
agente infiltrado norte-americano Rodney Chandler (1938- 1968)
na cidade de São Paulo. Somado a ocorrência de atos públicos

56
e greves, ocorre a promulgação do Ato Institucional número 5, no
mês de dezembro de 1968. A partir de então, um regime policial
civil-militar rígido regulava toda a vida brasileira:
[...] absoluta, a censura instalava-se [...] na
imprensa, nos meios de comunicação, nas
escolas e nas universidades. Indo mais longe
na escalada repressiva, houve suspensão de
direitos de muitos cidadãos, prisões preventi-
vas de civis por militares, demissões do serviço
público e perseguições em empresas particula-
res, confiscos (LOPEZ; MOTA, 2012, p. 830).

Após a implantação do AI-5, uma das principais iniciativas


do governo militar era controlar as informações. Vários órgãos
foram criados e ficaram responsáveis pelas práticas de tortura
na época. Entre eles, o SNI (Sistema Nacional de Informações),
CISA (Centro de Informações Social da Aeronáutica), CENIMAR
(Centro de Informações da Marinha), CIE (Centro de Informações
de Exército) e a OBAN (Operação Bandeirantes), precursora dos
DOI-CODIS (Departamento de Operações Internas – Centro de
Operações de Defesa Internas. Esse período de censura rigorosa
durou até o ano de 1974 (COLLING, p. 27).

Durante o regime, foram seis presidentes e uma junta provi-


sória. Destes, destaca-se o General João Figueiredo (1918-1999),
que foi o último dos presidentes. Seu governo, tal como o anterior,
seguiu com um moroso retorno a alguns princípios democráticos,
destacando-se criação da Lei da Anistia, sancionada em agosto
do ano de 1979, que beneficiou mais de 100 presos políticos e
permitiu retorno de pessoas exiladas em outros países, momento
esse que culminou com o surgimento movimento Diretas Já.

Por fim, no ano de 1985 ocorreu uma eleição indireta feita


pelo Congresso, que nomeou como presidente Tancredo Neves
(1910-1985) e simbolizou o retorno ao governo civil. O presidente
faleceu antes de tomar posse, assumindo seu vice, José Sarney
(1930 -). De acordo com a Comissão Nacional da Verdade criada
no ano de 2011 pela presidente Dilma Roussef (1947 -) para in-
vestigar as graves violações de direitos humanos, ocorridas entre
1946 e 1988, pode-se dizer que o período do regime contabiliza
em torno de 475 mortes e a tortura de cerca de 20 mil pessoas.

No Brasil, no período do regime totalitário não se lutava


necessariamente por questões estudantis ou operárias como
aconteceu no na França, ou contra a Guerra do Vietnã, como

57
nos Estados Unidos. Entretanto, os manifestantes brasileiros
enfrentavam um regime de exceção desde o ano de 1964: “Ao
contrário do movimento francês, não se lutava no Brasil contra
abstrações [...] mas contra uma ditadura de carne, osso e muita
disposição para reagir” (VENTURA, 1988, p. 134).

Para Dunn, é importante perceber que no Brasil, os fluxos


contraculturais possuíam nuances específicas e criticavam não
apenas o contexto militar, mas a própria constituição da cultura
consumida e produzida no país naquele momento. Em suas pró-
prias palavras:
Análises mais compreensivas da contracul-
tura, no entanto, chamaram a atenção para
sua resistência à cultura institucionalizada, à
racionalidade tecnocrática e a inúmeras for-
mas de controle social sob o regime militar. Os
imperativos anti-imperialistas que orientaram
o discurso revolucionário da década de 1960
tornaram-se menos relevantes quando o artis-
ta questionou a própria noção de uma ‘cultura
nacional’ unitária29 (DUNN, 2001, p. 174).

Para além do campo político, se faz necessário observar ao


redor dele, para compreender o contexto contracultural brasilei-
ro. Com a chegada do Ato Institucional-5, fez-se necessário criar
meios de expressão capazes de passar pelos censores. Nesse
período, os criadores de cultura muitas vezes faziam uso de lin-
guagens inovadoras, se apropriavam de experimentalismos e efe-
meridades, tais como performances rápidas e intervenções provi-
sórias, bem como o emprego de materiais ordinários e perecíveis
e reconfiguravam também o papel dos espectadores e usuários,
assim provocavam questionamentos a respeito da própria indús-
tria cultural e das obras consideradas comerciais (PERIGO, 2016).
Apesar da autocensura e das linguagens específicas, o regime
teve consequências para muitos brasileiros que passam a viver na
clandestinidade, além de tantos outros que foram expulsos do país
ou escolheram o exílio voluntário para escapar da prisão e do as-
sédio, especialmente a partir do decreto AI-5. Os exilados incluíam
políticos da oposição, líderes estudantis, guerrilheiros da luta ar-
mada, acadêmicos, escritores e artistas (DUNN, 2001).

29 _ Do texto original: “More sympathetic analyses of the counterculture,


however, have drawn attention to its resistence to institutionalized culture, te-
chnocratic rationality, and myriad forms of social control under military rule. The
Anti-imperialist imperatives that oriented revolutionary discourse of the 1960s
became less relevant as artist questioned the very notion of a unitary ‘national
culture’”. Tradução nossa.

58
Segundo Calirman, a ausência de diretrizes por parte do
governo com relação aos critérios de censura era o que provo-
cava nos criadores uma espécie de “censura imposta” por eles
mesmos, o que delineava algumas fronteiras entre o “permiti-
do” e o “proibido”:
Temendo a perseguição, muitas vezes exer-
cida de forma arbitrária e sem aviso, estes
artistas se esforçaram para não deixar vestí-
gios de autoria em suas obras. Mais anárquica
do que dogmática, eles desenvolveram uma
linguagem metafórica para abordar as reali-
dades que enfrentavam diariamente (CALIR-
MAN, 2014, p. 6).

É importante destacar que, ao mesmo tempo em que algumas


formas de cultura se mostravam mais engajadas politicamente e
assumiam um tom nacionalista e populista militante – tais como
o cinema de Glauber Rocha30 e o teatro de Chico Buarque, José
Celso Martinez Correa31 e Augusto Boal32 – por outro lado, muitas
vezes os criadores da época forjavam novas formas de produzir
e de exibir seus trabalhos. Pode-se dizer que no final dos anos
1960 e nos anos 1970 intelectuais e artistas buscavam realizar sua
produção combinando aspectos políticos e éticos, mas que não se
mostrassem ideologicamente orientados, ainda assim abordando
as exigências conflitantes entre a política nacional brasileira e a
cena cultural internacional. Nas palavras de Calirman:
Desconfiados do discurso predominante em
ambos os lados, este novo grupo de jovens
artistas e rebeldes voltou-se para seus cor-
pos, seu país e seus pensamentos, literal e
metaforicamente [...] A esquerda os acusou
de serem elitistas, sem comprometimento
social com a produção cultural de base, en-
quanto a direita os rotulou de rebeldes lan-
çando as sementes do comunismo em todo o

30 _ Terra em Transe (1967) é um filme de Glauber Rocha (1939-1981), que


provoca um olhar reflexivo sobre situação nacional naquele momento. Põe em
cena militantes, militares, intelectuais, políticos e empresários, todos envolvi-
dos na disputa do poder (VENTURA, 1998).
31 _ A peça teatral Roda Viva, de Buarque (1944 - ) e Correa (1937 - ) narra
a história de um ídolo da canção que decide mudar de nome para agradar
o público, no contexto da indústria cultural/ televisiva nascente no Brasil dos
anos 1960. O personagem é a representação de uma figura manipulada - pela
indústria fonográfica e/ou imprensa - que promove uma reflexão acerca da
sociedade de consumo (VENTURA, 1988).
32 _ O espetáculo Opinião de Augusto Boal (1931-2009) foi a primeira rea-
ção de impacto organizada pela arte engajada contra a ditadura. Nara Leão
(1942-1989) (depois substituída por Maria Bethânia (1946 - ), João do Vale
(1934-1996) e Zé Kéti (1921-1999) intercalavam canções de fundo político com
narrações sobre os problemas sociais do país. (FONTE: MEMÓRIAS DA DITA-
DURA. Disponível em: <http://memoriasdaditadura.org.br/teatro/>). Acesso em
22 de mai. de 2020.

59
país, que elevou a posição do Brasil no cená-
rio internacional (ibid., 2014, p. 5).

A atitude de alguns criadores da época era criticada por


aqueles que eram engajados politicamente. Segundo Dunn, em
um primeiro momento, embora recebessem muitas críticas por
não articularem oposição coletiva ao regime militar, os artistas
e os seguidores contraculturais propuseram novos discursos e
práticas de resistência ao controle autoritário, que ao longo do pe-
ríodo de censura, assumiram outras formas que, algumas vezes,
convergiram com novos fluxos sociais e culturais (DUNN, 2001).

No contexto que articula produção cultural do período às vo-


zes de resistência do trabalho de Zuzu Angel que será apresenta-
do nesse capítulo, algumas obras do período podem ser lembra-
das. O artista português naturalizado brasileiro Antônio Manuel
(1947 - ) manipulava imagens originais de moldes de jornais, fazia
experimentos nos quais isolava e editava elementos, com ênfase
na violência recorrente nas manifestações estudantis. A obra de
1968, Repressão outra vez – eis o saldo (figura 22) era composta
de grandes painéis cobertos por cortinas pretas, com cordas que
podiam ser manipuladas pelo espectador e quando suspensas,
exibiam manchetes de jornal que narravam a forte violência pro-
duzida pelo momento político no país (CALIRMAN,2014).

Figura 22- Obra de Antônio Manuel

Fonte: Bienal de São Paulo. Disponível: <http://www.bienal.org.br/post/267>.


Acesso em 21 de jun. 2020.

Da produção do carioca Cildo Meireles (1948 -), destacam-


-se instalações realizadas com materiais inusitados, como Ti-
radentes: Totem-monumento ao preso político (1970). Meireles
escolheu o feriado símbolo da Inconfidência Mineira de 21 de
abril para a performance, na qual amarrou dez galinhas vivas em

60
Figura 23- Obra de Cildo Meireles
uma estaca de madeira e depois de encharcá-
-las de gasolina, incendiou-as vivas, num ritual
público de grande impacto que tinha como in-
tenção denunciar as práticas de tortura, morte e
desaparecimento de presos políticos no regime
(figura 23). Segundo Calirman (2014), por meio
da homenagem ao mártir nacional Tiradentes33,
o artista buscava traçar um paralelo entre a si-
tuação repressiva do país naquela época e as
condições vivenciadas durante o período colo-
nial (ibid., 2014).

Muitos outros artistas provocavam reflexões


sobre a situação que ocorria no país. Entre eles
é possível citar os cariocas Hélio Oiticica (1937-
1990), Lygia Pape (1927-2004), a mineira Lygia
Clark (1920-1988) e o português naturalizado
brasileiro Artur Barrio (1945 -). Vale lembrar que
o nome de um dos trabalhos de Oiticica, Tropi-
cália (1967) acabou posteriormente sendo em-
Fonte: Memórias da ditadura. Disponível em: <http:// prestado como título para uma canção e para o
memoriasdaditadura.org.br/obras/tiradentes-totem-monu-
mento-ao-preso-politico-1970-de-cildo-meireles/tiradentes- movimento cultural transgressor que emergia na
-totem-monumento-ao-preso-politico-19702/>. Acesso em época (figura 24). Liderado pelos músicos baia-
12 de jul. de 2020.
nos Caetano Veloso (1942 -) e Gilberto Gil (1942
Figura 24- Capa do Long Play Tropicália
-), subverteu o ritmo tradicional da bossa nova
brasileira por incorporar sons de guitarras elétri-
cas e rock e mesclar elementos arcaicos e mo-
dernos, tendências nacionais e internacionais.
Com o apelido de tropicalismo, transbordou as
barreiras musicais e estéticas (VELOSO, 1997;
CALIRMAN, 2014).

Veloso afirma que o grupo buscou referên-


cias em outra corrente cultural precedente. Inti-
tulado como movimento antropofágico, foi criado
pelo poeta paulista Oswald de Andrade (1890-
1954) e pela pintora paulista Tarsila do Amaral
(1886-1973) na década de 1920. Provocava
reflexões sobre os padrões culturais de origem

33 _ Joaquim José da Silva Xavier, conhecido como Tira-


dentes (1746-1792) era dentista e foi um dos mártires da
Fonte: O Globo. Disponível: <https://g1.globo.com/pop-ar- independência do Brasil e por isso enforcado, esquarteja-
te/musica/noticia/2018/08/07/tropicalia-ou-panis-et-circen- do e teve sua cabeça exposta em Ouro Preto-MG, em 21
cis-completa-50-anos-conheca-os-bastidores-do-disco. de abril. Posteriormente homenageado, teve a data de sua
ghtml>. Acesso em 22 de ago. de 2020. morte instituída como feriado nacional (MARTINO, 2014).

61
eurocêntrica, ao partir da premissa de que os brasileiros não de-
veriam imitar e sim devorar as novas informações estrangeiras,
assimilando-as e reinventando-as de maneira autônoma sob os
atributos da cultura brasileira, prática conhecida como canibalis-
mo cultural. Em suas palavras: “A ideia do canibalismo cultural
servia-nos, aos tropicalistas, como uma luva. Estávamos ‘comen-
do’ os Beatles e Jimi Hendrix” (VELOSO, 1997, p. 248).

Segundo Dunn, assim como ocorria com outros campos cul-


turais, no início, este movimento não foi diretamente afetado pela
censura, graças aos formatos empregados e, principalmente,
porque “sua música geralmente não estava associada a protes-
tos políticos” (DUNN, 2001, p. 162, tradução nossa34). Entretanto,
posteriormente, com o AI-5 alguns dos artistas da tropicália sofre-
ram prisão e exílio.

É importante refletir que o campo da cultura brasileiro foi


afetado pelos levantes jovens mundiais de contracultura, porém,
com algumas características específicas em função do contexto
autoritário. Assim, o tropicalismo é considerado um dos principais
elementos de referência da contracultura brasileira do período da
ditadura civil-militar. Dunn (2001) enfatiza: “como em outras par-
tes do mundo, a contracultura brasileira produziu seu próprio re-
pertório de modas e códigos linguísticos” (ibid., 2001, p. 170, tra-
dução nossa35). A abordagem extrapolou as dimensões musicais
e passou a ser uma sensibilidade que englobava todo um espírito
de produção cultural da época, por meio de conexões entre artes
plásticas, música, teatro, literatura e cinema e que tinha, de um
lado alinhamento com as vanguardas internacionais e de outro,
um tom nacionalista (CALIRMAN, 2014).

Assim, a produção contracultural do período em suas múlti-


plas manifestações dava vozes diversas à resistência contra as
guerras, a discriminação racial e a desigualdade de gênero, entre
outras questões. Nesse contexto, pode-se dizer que o design de
moda também foi cenário de uma produção que manifestava ele-
mentos contrários aos valores hegemônicos vigentes na época.
Entende-se que no Brasil, no período da contracultura, o traje de
oposição mais contundente e de maior (trans)bordamento foi pro-
duzido pela mineira Zuleika de Souza Netto (1921-1976).

34 _ Do texto original: “The former tropicalists were relatively less affected by


censorship, largely because their music was generally not associated with poli-
tical protest”. Tradução nossa.
35 _ Do texto original: “As elsewhere in the world, the Brazilian counterculture
produced its own repertory of fashions and linguistic codes”. Tradução nossa.

62
Figura 25- Coleção inspirada em cangaço 2.2 Zuzu Angel: uma designer brasileira

Pode-se dizer que Angel é considerada uma


das principais referências no percurso do design
da moda brasileira. Primeiramente, por contra-
riar as lógicas vigentes em seu tempo, quebran-
do os paradigmas europeus para o vestuário, ao
utilizar matérias-primas e elementos brasileiros
em suas criações. Posteriormente porque com o
envolvimento de seu filho nos movimentos opo-
sicionistas ao regime autoritário, a trajetória de
Zuzu Angel converge com a história política do
país. Assim, os acontecimentos passam a in-
fluenciar diretamente seu trabalho como desig-
ner de moda, que já vinha sendo desenvolvido
desde o final dos anos 1950. Angel foi a primeira
designer de moda a utilizar em suas produções
as pedras brasileiras e a fazer coleções com ên-
fase em componentes da nossa cultura, como
a linha Dateline Collection I, que (a)bordava as
visualidades do cangaço brasileiro (figura 25),
Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel.
Foto da autora. materiais nacionais como a chita36 e as rendas
brasileiras, como o vestido de noiva da figura 26,
Figura 26- Vestido de noiva feito com toa- feito com toalhas. (BRAGA e PRADO, 2012).
lhas de renda
Na Europa e nos Estados Unidos, os tra-
jes de oposição apareciam em grande número
especialmente entre movimentos jovens e ga-
nharam muito espaço. Já na América do Sul,
especificamente no Brasil, não é esse cenário
que predomina. Por mais que houvessem de-
signers de moda atuando nos países sul-ame-
ricanos, esses eram ainda influenciados a partir
de referências imperialistas europeias e norte-
-americanas, de forma que o trabalho de Angel
pode ser considerado relevante pelo fato de ela
ter utilizado suas roupas como expressão de re-
sistência política ao regime civil-militar instalado
no Brasil, uma vez que (trans)bordou sua busca
por respostas ao desaparecimento de seu filho
Stuart Angel.

36 _ Chita é um tecido de algodão barato e de baixa qua-


Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. lidade estampado com cores fortes, geralmente florais,
Foto da Autora. tramas simples e de baixo custo (DANIEL, 2011).

63
Zuleika de Souza Netto nasceu no ano de 1921 na cidade de
Curvelo, em Minas Gerais. Desde jovem, costurava para si mes-
ma e, posteriormente, para os três filhos Stuart Angel (1946-1971),
Ana Cristina Angel (1948 -) e Hildegard Angel (1949 -). No ano de
1956, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, capital do
Brasil naquele momento. Das amizades com algumas mineiras
surgiram suas primeiras freguesas, para quem ela começou a tra-
balhar com tecidos simples como panos de colchão, misturados
a fitas de gorgorão e confeccionar saias. Por isso foi apelidada
de Zuzu Saias (VALLI, p. 19). Embora tivesse entre suas clientes
algumas pessoas envolvidas com o governo da época, ela não
possuía ainda nenhuma aspiração ou preocupação política. Na
década de 1960, Angel projetou-se como protagonista da moda
carioca. Vestiu artistas internacionais e famosas, como a atriz ca-
nadense Yvone de Carlo (1922-2007) e a norte-americana Kim
Novak (1933-). Atendia também muitas clientes que integravam
as altas classes sociais do Rio de Janeiro. Um dos primeiros en-
saios de sua coleção de saias pode ser verificado na figura 27.

Figura 27- Catálogo Zuzu Saias

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Foto da Autora.

64
Graças a seus bons contatos e a seu casamento com o co-
merciante canadense naturalizado norte-americano Norman An-
gel Jones (1920-1985), Zuzu exportava suas roupas para várias
lojas nos Estados Unidos, entre elas, a casa Bergdorf Goodman
– tradicional loja de departamentos de luxo localizada no cen-
tro de Manhattan, na cidade de Nova York. Da sua produção do
período, destacam-se noivas com túnicas e calça e vestidos fei-
tos a partir de toalhas de rendas brasileiras. Além disso, entre as
estampas, a iconografia tropical que apresenta aves, borboletas,
flores e frutos.

A cultura brasileira também comparece, com as estampas das


festas tradicionais de referências ao cangaço (BRAGA e PRADO,
2012). Da parceria da designer com a extinta tecelagem carioca
Dona Isabel, foi desenvolvido um artigo denominado Polybel, feito
de uma mistura de algodão e poliéster, ilustrado na figura 28, em
um tecido com a temática popular das festividades de São João.

Figura 28- Tecido estampa São João

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Foto da autora.

65
Marcado pela valorização da cultura e pelo desejo de de-
mocratização da moda, o trabalho de Angel é considerado pio-
neiro em diversos sentidos, especialmente na persistência pela
brasilidade. Para Johansen (2014), “ela foi inovadora, mostrando
o potencial de inspiração nas tradições e nos materiais brasilei-
ros. A moda não precisava ser copiada de nenhum outro lugar!”.
Sua filha Hildegard Angel colabora ao confirmar a inventividade
da mãe por se inspirar em elementos brasileiros para criar seus
produtos, algo bastante inusitado para a época e que fez com que
a mãe fosse ridicularizada muitas vezes:
O pioneirismo [...] que eu vejo, foi a brasilidade
na moda. Porque...não que os outros estilistas
não se inspirassem em coisas brasileiras, se
inspiravam, mas não faziam disso o tema do
seu trabalho [...] Os sofisticados brasileiros
consideravam tudo que era do Brasil ‘cafona,
brega, jeca’, então foi também romper uma
estrutura de pensamento equivocada sobre
as coisas brasileiras. E isso ela fez com muita
coragem, sendo muito atacada, muito ridicu-
larizada, mas ela desafiou toda essa arrogân-
cia da colonização cultural brasileira, que os
brasileiros tinham uma colonização cultural
francesa... e ela desafiou aqueles padrões de
elegância convencional e fez a moda brasilei-
ra, com as cores brasileiras, com os tecidos
brasileiros, estampas, temática, o espírito do
Brasil (informação oral).

Além de outros aspectos, vale mencionar que Angel traba-


lhou com bordado feito à mão – outro momento de referência
às raízes brasileiras – e essa técnica foi um dos recursos mais
potentes para sua expressão.

Durante a pesquisa de campo, muito foi questionado sobre


informações referentes ao acervo, em busca de compreender e
traçar uma pesquisa acerca de todas as peças pertencentes à co-
leção International Dateline IV. Por meio de entrevistas foi cons-
tatado que as coleções encontram-se incompletas. Avila colabora
em entrevista:
[...] As coleções mais antigas e as coleções
emblemáticas não foi muito fácil recuperar.
Não existem mostruários e por isso que exis-
te bastante réplica, que foram em sua maioria
feitas para representar na Ocupação (Itaú Cul-
tural, 2014), no filme (Zuzu Angel, 2006) [...]. A
gente tem algumas coisas, mas não tem tudo
[...] as roupas da coleção, foram coisas que

66
foram vendidas [...]. E fora que as roupas da
Zuzu, eram roupas que fizeram muito suces-
so, que as pessoas queriam ter, representava
uma certa posição social você ter alguma rou-
pa da Zuzu (informação oral).

Para Manon de Salles Ferreira, ainda há um grande trabalho


a ser realizado com acervo, para além daquele feito pelo Instituto
Itaú Cultural (2014), com objetivo de interligar de maneira mais
contundente as informações dos itens do acervo:
[...] a coleção tem em torno de 600 peças,
fora documentos, o foco era a gente fazer a
conservação e documentação [...] tem muita
pesquisa a ser feita [...] porque tem coisas um
pouco confusas, às vezes peças que come-
çam numa coleção, que são replicadas na ou-
tra, são repetidas, que são vendidas depois e
voltam (informação oral).

2.3 Nos bastidores do caso Stuart Angel

Em 1970, ocorre o desaparecimento do filho de Zuzu Angel (figu-


ra 29). Stuart Angel era militante de um dos movimentos de es-
querda revolucionário chamado MR-8. Entrou para os bastidores
da clandestinidade no final dos anos 1960. Na manhã do dia 14
de maio de 1971, o jovem foi preso no Rio de Janeiro e levado
para a Base Aérea do Galeão. Sua esposa Sônia (1946-1973),
também militante, já estava exilada no Paraguai.

Figura 29- Stuart Angel em dois momentos

Fonte: O Globo. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/esportes/quem-


-foi-stuart-angel-homenageado-por-torcedores-do-flamengo-no-domin-
go-23565804>. Acesso em 18 nov. 2019.

67
No dia 14 de maio de 1971 à noite, Zuzu Angel re-
cebeu a notícia por meio do advogado do militante Alex
Polari, que estava preso no mesmo local do filho de An-
gel e assistiu da janela de sua cela às torturas feitas
contra o jovem. O homem contou que vira Stuart amar-
rado na traseira de um jipe, tendo sido arrastado pela
base aérea do Galeão e morrendo por asfixia. A partir
dessa informação, ela decidiu interromper seu traba-
lho para descobrir os motivos do horror que estava lhe
acontecendo (VALLI, 1987, p. 37). Em meio ao desa-
parecimento de Stuart, Zuzu tornou-se envolvida com
a luta política em processo no país. Em suas próprias
palavras:
E eu tenho que sofrer? E meu filho?
Morto na tortura? Isto acontecen-
do no Brasil desde 1964? Eu, na
minha santa ignorância. Fazendo
moda, vestidinho com flor e passa-
rinho. Moda alegre, descontraída,
moda e liberdade[...] será que isto
é comigo? Como pode ser que há
esta guerra no Brasil. Brasileiro
contra brasileiro. E eu tenho que
entrar nela [...] agora tenho que en-
trar para a política e virar militante.
Que jeito? A procura do meu filho,
e depois do filho das outras (VALLI,
1987, p. 35).

É possível entender que a situação que envolvia a


família de Angel foi referência determinante para a cria-
ção de trajes com apelo político. Em agosto do mesmo
ano, Zuzu lança a International Dateline Collection IV –
Holiday and Resort, em Nova York, com a intenção de
denunciar a situação política e social promovida pela di-
tadura civil-militar.

O desfile ocorreu casa do cônsul Brasileiro Lauro


Soutello (1958-2002). A coleção era separada em duas
partes, Holiday e Resort, contendo dezenas de peças.
A quantidade exata dos modelos desfilados não foi en-
contrada em documentos durante pesquisa de campo
no Instituto Zuzu Angel. Apesar disso, é possível saber
que os modelos pertencentes à moda de protesto foram
exibidos dentro do tema Holiday, apresentando vestidos

68
com modelagens amplas – que continham os bordados
de oposição que serão detalhados em seguida. O se-
gundo tema Resort, apresentou roupas leves e apropria-
das ao lazer e as férias. Todos os modelos eram com-
plementados com uma faixa preta no braço esquerdo,
fazendo alusão ao luto (VALLI, 1987).

Em material destinado à imprensa coletado durante


pesquisa de campo, (figura 30) é possível conhecer al-
guns detalhes sobre o desfile International Dateline Col-
lection IV – Holiday and Resort. A moda de protesto do
desfile foi destacada no documento destinado à impren-
sa, onde é possível perceber a intenção da designer em
protestar contra o regime militar:
O anjo é exibido de uma maneira
indefesa e com sorriso feliz, mas
questionador, [...] junto de bonecas
em combinação com cores sólidas
[...] e se torna um bordado que é
usado com sofisticação. O vestido
longo [..] é apresentado em várias
versões e em uma delas mostran-
do um ‘novo anjo travesso’ que traz
consigo a pergunta: Zuzu está ten-
tando nos dizer algo? Zuzu captou o
clima de 1972, com vestidos macios
e leves que são discretos, mas ao
mesmo tempo cheios de emoção,
com saias em viés, blusas de de-
cotes profundos [...] também saias
de fenda dupla. Para honrar a deu-
sa brasileira Iemanjá, foi criado um
vestido de noiva de crepe branco,
com cauda curta e mangas bufan-
tes37 (ANGEL, 1971).

37 _ Do texto original: “The helpless angel is drawn in a childlike


manner with a happy but questioning smile. […] dollhouse prints in
conjunction with soft colors. The angel then becomes an embroi-
dered motif which is used with sophistication. Zuzu loves the long
dress […] and there are a several versions of this theme in her
collection. The motif on one of them is a completely new angel- the
mischievous angel. Is Zuzu trying to tell us something? Zuzu has
captured the mood of 1972 with soft, floaty dresses that are unders-
tated but at the same time are chockful with excitement. Bias-cut
skirts, halter necklines […] double slit skirts. To honor Jemanja, the
Brazilian goddess of the Sea, Zuzu has created a white crepe dress
with short train and fascinating sleeves”. Tradução nossa.

69
Figura 30- Material de imprensa do desfile International Dateline IV

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Imagem da autora.

70
2.4 Os bordados de oposição de Zuzu Angel

Nesta pesquisa, considera-se que o traje de protesto produzido por


Angel é elaborado a partir de técnicas concentradas no bordado,
com texturas, cores e relevos. O processo de criação dos desenhos
era realizado de forma manual. Na coleta iconográfica foi possível
ver o esboço inicial dos projetos na figura 31, que Zuzu posterior-
mente coloria e passava para a bordadeira executar (figura 32).

Figura 31- Esboço inicial de desenhos para bordar

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Imagem da autora.

Figura 32- Esboço inicial de desenhos para bordar com indicação


de cores de linha

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Imagem da autora.

71
Figura 33- Contato da bordadei- Os bordados também eram feitos manualmente por uma bor-
ra de Angel dadeira de nome Lecy localizada no Largo do Machado - RJ. Em
caderneta pessoal de Zuzu, é possível ver o seu contato com o
telefone (figura 33).

Apesar da simplicidade aparente, tais bordados apresentam


uma intensa e significativa carga simbólica, intrinsecamente liga-
da ao contexto da produção. Os bordados de anjos amordaçados,
meninos aprisionados, sóis quadrados, jipes e quepes militares
fazem alusão à prisão, à tortura e ao silenciamento sofridos por
Stuart, como pode ser visto no vestido (figura 34). Para Andrade,
os desenhos parecem não remeter claramente a um significado
específico, mas os desenhos também tinham a função de reforçar
um universo infantilizado, lembrando desenhos feitos por crian-
ças, representando brincadeiras de menino “que possivelmente
divertiam Stuart naquela fase da vida” (ANDRADE, 2006, p. 3).

Da coleta iconográfica realizada durante pesquisa de campo,


Fonte: Acervo documental do Instituto resultam as imagens apresentadas. Também foi possível manu-
Zuzu Angel. Imagem da autora.
sear a peça original do desfile (figura 35), um dos objetos funda-
mentais deste estudo. Para Ferreira, o vestido bordado pode ser
considerado um texto:
[...] o vestido branco, na verdade aquilo para
mim é um vestido texto, textual, você lê uma
situação política de um país e o mais interes-
sante é que é de uma forma singela sutil, não
é uma moda agressiva, porque poderia ser
uma coisa agressiva. Ela contou uma história
ali extremamente sofrida, absurda, de uma
maneira poética [...] porque você olha aquele
vestido, ainda te passa uma coisa não agres-
siva [...] (informação oral).

Zuzu fez uso da técnica de bordado de oposição para nar-


rar os acontecimentos e (a)bordar seu protesto. Se os bordados
separados têm grande significado, em conjunto podem ser lidos
como um texto que narra a prisão e o desaparecimento do filho,
as notícias desencontradas sobre a violência, sobre sua morte e
busca incansável da mãe. Angel fez uso de padrões simbólicos,
com bordados manuais de ponto cheio em estilo naif38, com
formas que não seguem padrões convencionais da moda, cujos
traços coloridos imitam cadernos infantis, como pode ser visto
nas figuras que apresentam a coleção. Alguns dos elementos

38 _ Naif é uma estética que não se enquadra nos moldes acadêmicos, em


francês, ingênuo, não se enquadra às regras tradicionais de representação.
(HODGE AND ANSON, 2006)

72
Figura 34- Vestido túnica bordado – réplica para Figura 35- Vestido túnica bordado – original do
Ocupação desfile

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Dis- Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima-
ponível em: <https://www.zuzuangel.com.br/vestuario/ gem da autora.
vestido-de-protesto-politico-manga-longa>. Acesso em 08
de nov. de 2020.

Figura 36- Lista de desenhos para bordados escolhidos para ornar os vestidos podem ser
de vestido túnica vistos em manuscrito de Zuzu (figura 36) e são:
anjo, barquinho, canhão, caracol, casinha com
fumaça, estrela, menino com grade, menino
com chapéu, navio com bandeira, navio sem
bandeira, passarinho, pinto, soldado, tanque,
pomba da paz e sol.

A figura 37 mostra alguns detalhes do ves-


tido, nos quais quepes militares aparecem em
diversas cores, formatos e em tamanhos des-
proporcionais, que sugerem os poderes das di-
ferentes forças militares e patentes. O jipe, que
de acordo com depoimento de Polari, teria sido
usado na tortura sofrida por Stuart, também é
bordado (figura 38).

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel.


Imagem da autora.

73
Figura 37- Detalhes dos bordados presentes em Figura 38- Detalhes dos bordados presentes em
decote do vestido túnica corpo do vestido túnica

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima- Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima-
gem da autora. gem da autora.

Zuzu sempre registrou todo seu trabalho de busca, guarda-


va documentos e fazia muitas anotações. Pode-se dizer que era
recorrente na procura por pistas sobre Stuart, um anseio e preo-
cupação em registrar aquilo que ocorria. Durante sua busca, con-
viveu com outras mães, que também perderam os filhos durante
o regime. Em suas palavras:
Como não viver o drama das outras mães que
não tinham coragem ou, às vezes, nem tinham
dinheiro para sair pelo mundo gritando, como
eu fazia para procurar meu filho desapareci-
do, isto é, assassinado na tortura? Que todo
mundo sabia e fingia que não sabia: torturado
e assassinado nos porões da PE da rua Ba-
rão de Mesquita, no CISA, ou no CENIMAR,
nessas milhares de masmorras que a ditadura
criou pelo Brasil afora [...] Estou lendo tudo,
coleciono tudo. Anoto nomes dessas centenas
de jovens (pelo tamanho do Brasil devem ser
milhares) intimidados, lançados nas ruas, nas
casas, onde se encontrem para serem mortos
em interrogatórios ou nesses tiroteios de men-
tirinha que os jornais dão todo dia (ANGEL, In.
VALLI, 1987, pp. 32, 38).

A museóloga Simone Costa Ávila confirma a prática de Zuzu


de fazer anotações e de guardar toda e qualquer informação que
pudesse auxiliar posteriormente:

74
Ela era uma colecionadora nata, que pensava
muito nos registros, documentava tudo, regis-
trava tudo, fazia muitas anotações em todos
os lugares, fazia anotações nos moldes dela,
em rascunhos, tudo da Zuzu tem uma anota-
ção complementar [...] Você vê manuscritos
dela em todos os lugares. Ela era uma pessoa
de manuscritos. Tanto em documentos, quan-
to na parte têxtil (informação oral).

Em suas muitas investidas na procura por Stuart, precisou


enfrentar diversas instâncias militares. As três armas – marinha,
exército e aeronáutica – são representadas nos bordados, na fi-
gura 39:
Com elas, as 3 Armas, estava meu filho, Guar-
dado por Elas, encapuzado, escondido, nu, in-
terrogado em todos os centros de tortura – da
Marinha, do Exército e da Aeronáutica – sem
falar dos centros particulares (que depois fi-
quei sabendo que existiam por esta imensi-
dão) operados pelos Esquadrões da Morte
(ANGEL, in VALLI, 1987, p. 32, 33).

Figura 39- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido


túnica

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Fotos da autora.

75
A ausência de informações sobre Stuart por parte do regime
autoritário não coincidia com as informações clandestinas que
Angel recebia. Em muitas idas da designer aos órgãos de segu-
rança, não recebia mensagens objetivas. Os militares desconver-
savam, negavam a passagem dele por qualquer uma das instân-
cias mencionadas, alegando que seu nome nunca constou nas
listas de presos e que deveria estar no exterior (ANGEL, in VALLI,
1987). O advogado defensor Nilo Baptista (1944 -) colaborou com
Zuzu em depoimento, no qual afirmou que todas as instâncias sa-
biam tratar-se de um caso de assassinato: “[...] sabia que estava
defendendo um morto. Todos sabiam; o procurador militar sabia
que acusava um morto, os juízes militares e o auditor sabiam que
julgavam um morto” (BAPTISTA, Nilo. In: VALLI, 1987, p. 68).

Os bordados de oposição da figura 40 fazem menção à pri-


são de Stuart, apresentando o sol quadrado, o sol atrás das gra-
des e dois pássaros separados por uma gaiola, inacessíveis um
ao outro. A figura 41 exibe dois bordados: à esquerda, um menino
empinando sua pipa sorrindo e à direita, esse mesmo menino é
apresentado com feições tristes e chorando, com uma cerca se-
parando-o do sol. Andrade contribui:
O regime militar era o responsável pelas cruel-
dades denunciadas e, por isso, foram repre-
sentadas as três forças armadas, através dos
uniformes e quepes dos soldadinhos e pelos
aviões tanques, jipes e navios. E, quem sabe,
os tambores não seriam uma referência às
bandas militares? O sol aparece atrás das
grades ou quadrado, em referência à maneira
popular de expressar a vida na prisão. (AN-
DRADE, 2006, p. 4)

Figura 40- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido


túnica

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Fotos da autora.

76
Figura 41- Detalhes dos bordados presentes em corpo do vestido
túnica

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Fotos da autora.

Para Bogossian, a mãe usou seu trabalho de designer de


moda para motivações para além de vestir a sociedade carioca,
no sentido de realizar uma grave denúncia internacional, quando
toda a sua luta não repercutia no Brasil:
A moda foi um instrumento a que a Zuzu re-
correu num momento de grande angústia,
desespero quando soube, efetivamente que
meu irmão havia sido assassinado e torturado
barbaramente, foi um instrumento a que ela
recorreu para fazer essa denúncia internacio-
nalmente (informação oral).

Ferreira defende que Angel buscava ferramentas de design,


em articulação com política, a partir de bordados questionadores,
porém coloridos e suaves:
[...] o grande marco foi o desaparecimento do
Stuart, a questão do envolvimento do Stuart,
foi onde ela viu que a partir do que ela fazia,
do que ela produzia [...] tinha como fazer como
esse design dizer além, além de ser uma rou-
pa bonita [...] nos bordados ela mostrou isso,
firmes mas suaves e alegres. Ela nunca dei-
xou de botar cor em nada, ela nunca foi fú-
nebre no que ela apresentou, pelo contrário
(informação oral).

77
O tratamento dos bordados de oposição utilizado por Angel era
uma estratégia de design utilizada para driblar a censura que imperava
na época. Priscila Andrade (2006) colabora nesta proposição: “Para
que a coleção pudesse passar pela censura, era preciso que a mensa-
gem estivesse disfarçada, por isso o tratamento naif foi conferido aos
bordados”. (ANDRADE, 2003, p. 8)

No desfile dessa coleção, a própria designer se apresentou por-


tando um traje de oposição. De forma contundente e performática, An-
gel trajou um vestido de luto preto (figura 42), acompanhado de cinto
repleto de crucifixos e colar de anjo de porcelana (figura 43). Todo o
conjunto faz menção à situação do filho desaparecido e de sua mor-
te. Em consonância com Wilson, pode-se dizer que existe uma certa
relação entre o luto e a roupa de oposição, à qual Angel se aproxima:
Como deixamos de usar o luto, o preto estabele-
ceu-se como a cor da ira mais do que a cor do des-
gosto, como sinal de agressão e de revolta [...] ele
tem se associado não apenas aos fascistas, mas
também aos anarquistas [...] O preto é uma cor
dramática e faz apelo ao público, como o traje da
revolta sempre deve fazê-lo [...] (WILSON, 1989, p.
253-254).

Vale notar que, apesar do luto, a designer faz uso das cores.
Para Ávila:
Ela conseguiu colocar cor (na coleção), apesar de
toda a dor, exceto no vestido de luto dela. Aquilo era
ela e ela fez para ela, não fez para ninguém ali. Era
o luto dela, ali ela exteriorizou o que ela realmente
estava sentindo por dentro [...] e colocou as fitinhas
pretas nas meninas no desfile. Mas ela de forma
nenhuma colocou essa tristeza, essa amargura em
nenhuma peça dela. Então [...] isso é muito da res-
ponsabilidade do designer, da estilista que ela era,
que ela sempre foi, que é até hoje (informação oral).

Ferreira contribui afirmando que o luto de Angel acabou se tornan-


do uma alegoria, que ela usava socialmente, no sentido de chamar a
atenção da sociedade para o silenciamento do caso envolvendo seu
filho Stuart:
[...] a maneira de ela se posicionar, como o luto que
ela usava, aquilo virou uma alegoria depois do des-
file que ela continuou a usar socialmente aquela
roupa para marcar uma posição política (informa-
ção oral).

78
Figura 42- Traje de luto de Angel
Na ocasião, o desfile não recebeu atenção
da imprensa nacional, em decorrência da cen-
sura que imperava naquele momento. No recor-
te do Jornal Última Hora39 (figura 44) é possível
perceber que, o evento não foi noticiado com
destaque e nem em seu caráter de protesto.
Embora a ditadura tenha se iniciado no ano de
1964, o envolvimento de Zuzu com a gravidade
da situação política não se deu de imediato e
sim a partir do momento em que seu filho entrou
para a luta armada e depois, para a clandestini-
dade no final dos anos 1960.

Para Ventura (1987), a designer de moda


desenvolveu sua luta de maneira audaciosa:
Para tentar reaver o corpo
de Stuart – cuja morte e pri-
são nunca foram admitidas
pelos órgãos de segurança
– Zuzu desenvolveu uma
luta de cinco anos em que
usou como armas o de-
sassombro, o atrevimento,
a imaginação e até o hu-
mor (VENTURA, in VALLI,
1987, p. 24).
Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Dispo-
nível em: <https://www.zuzuangel.com.br/documental/foto-
grafia-de-zuzu-angel-usando-vestido-de-luto-destacando-
-desenhos-na-gola-de-vestido-xadrez-usado-por-modelo>.
Acesso em 12 de nov. de 2020. Diante do exposto, é relevante refletir so-
bre esse acontecimento na vida, na criação e
Figura 43- Colar de anjo usado com traje de luto
na produção do design de moda de Zuzu Angel,
sobretudo pelo fato de a maior potência de sua
obra ter se dado no período posterior ao incidente
com Stuart Angel. Em outras palavras, é possível
afirmar que o ocorrido foi decisivo para o engaja-
mento da designer na situação política. No dia 23
de abril de 1975, Zuzu entregou uma carta para
seu amigo, o compositor Chico Buarque (1944 -),
na qual alertava: “Se eu aparecer morta, por aci-
dente ou outro meio, terá sido obra dos assassi-
nos do meu amado filho” (VALLI, 1987).

39 _ Fundado em 1951, no Rio de Janeiro, chamava


atenção pelo seu perfil e diagramação ousados e foi des-
continuado no ano de 1991. Fonte: <https://acervo.oglobo.
globo.com/em-destaque/ultima-hora-de-samuel-wainer-
-um-jornal-inovador-que-nasceu-em-1951-19408074#ixzz-
6D0r9vBHh>/. Acesso em 21 de jan. de 2020.
Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima-
gem da autora.
79
Figura 44- Recorte do Jornal Última Hora

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Imagem da autora.

Por meio de pesquisa de campo, ficou claro que Zuzu con-


tinuou trabalhando com bordados após esse desfile. Há outros
bordados de oposição que foram realizados no ano de 1976, po-
rém encontram-se inacabados. Representações naif da lesma (fi-
gura 45), a casa e os anjos (figura 46) em formatos quadrados,
que podem simbolizar a morosidade para a resolução do caso.
Ferreira corrobora com essa observação quando afirma que os
trabalhos de bordado continuaram para além do desfile de 1971.

Ela não parou nessa coleção (1971), aqueles fragmentos que


têm [...] foram feitos depois, como ela foi assassinada, ela não con-
seguiu realizar peça nenhuma com aquilo [...] Então eram estudos
para outras peças que não foram realizadas (informação oral).

Os anjos têm uma presença relevante em representações no


trabalho de Zuzu (ANDRADE, 2006). Além da explícita referência
ao seu sobrenome, a designer dizia que Stuart, quando criança,
parecia um anjinho e que os desenhos o representavam, bem
como aos outros jovens mortos pelo regime autoritário. O símbolo
acaba por se tornar sua marca registrada (figura 47).

80
Figura 45- Estudos de bordados Figura 46- Estudos de bordados

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima-


gem da autora.

Figura 47- Logo Zuzu Angel

Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima-


gem da autora.

A morte de Zuzu Angel deu-se em 14 de


abril, no ano de 1976, em um desastre de au-
tomóvel. De acordo com a imprensa da época,
ela teria dormido ao volante. No ano de 1998, o
Diário Oficial da União publicou o seu reconheci-
mento oficial como uma das vítimas da ditadura
civil-militar brasileira. Em 2014, a Comissão Na-
cional da Verdade40 levantou suspeitas de que
um crânio encontrado no Rio de Janeiro pudes-
se ser de Stuart. O nome dele consta na lista
de desaparecidos políticos até os dias atuais.
Apenas no ano de 2019 sua família recebeu os
atestados de óbito de mãe e filho41. Nesse mes-
mo documento consta:

40 _ Disponível em: <http://cnv.memoriasreveladas.gov.


br>. Acesso em 12 de ago. de 2019.
41 _ Disponível em: <https://revistaforum.com.br/brasil/
Fonte: Acervo documental do Instituto Zuzu Angel. Ima- hildegard-recebe-certidao-de-obito-de-stuart-ezuzu-angel-
gem da autora. -mortos-pela-ditadura/>. Acesso em 20 de set. de 2019.

81
Zuzu estava absolutamente sóbria na noite do
acidente e uma semana antes tinha feito revi-
são completa em seu carro que, sem aparente
motivo, desviou-se da estrada, capotando di-
versas vezes em um barranco. A análise das
fotos e dos laudos periciais, as inúmeras con-
tradições e omissões encontradas no inquérito
e depoimentos de testemunhas oculares com-
puseram uma base robusta para a decisão da
CEMDP reconhecendo a responsabilidade do
regime militar por mais essa morte de oposi-
tor político. (COMISSÃO ESPECIAL SOBRE
MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS,
2007, p. 414).

No dia 15 de junho de 2020, 44 anos depois, o Poder Judici-


ário reconheceu o assassinato de Zuzu Angel por parte do Estado
e caberá à União pagar uma indenização de meio milhão de reais
às suas duas filhas, Hildegard e Ana Cristina42.

Diante do exposto, é relevante refletir sobre esse aconteci-


mento na vida e na produção de design de moda de Zuzu Angel,
sobretudo pelo fato de a maior potência de sua obra ter se dado
no período posterior ao incidente com Stuart Angel. Em outras
palavras, é possível afirmar que o ocorrido foi decisivo para o
engajamento da designer na situação política.

Pode-se dizer que, para a aproximação proposta até aqui, as


roupas e os bordados são variáveis usadas em prol da resistência
de diferentes maneiras, por exemplo, quando se situam fora do
alinhamento com os poderes vigentes; ao questionar sistemas
políticos autoritários; ao combater a repressão da liberdade de
expressão; ao conectar-se com o combate às formas opressoras
de regulação da vida, entre outras possibilidades.

As articulações produzidas a partir dos conceitos de “resistên-


cia”, de “traje de oposição” e de “bordado de oposição” permearam
o trajeto desta investigação no estudo da coleção International Da-
teline IV de Zuzu Angel. O design de Angel aponta para conexões
entre design de moda e política, por meio da técnica do bordado,
conexões que também podem ser reconhecidas no estudo de caso
que será apresentado em seguida.

42 _ Disponível em: <https://www.brasil247.com/blog/zuzu-angel-crime-e-casti-


go>. Acesso em 16 de jun. de 2020.

82
3. Bordados nos
bastidores do Cole-
tivo Linhas de Sampa
Em articulação com o trabalho de Zuzu Angel, da época do regime
autoritário deflagrado em 1964, esta pesquisa se desloca para o
cenário dos levantes populares ao redor do mundo nos anos 2000,
com foco no contexto brasileiro e especificamente em um movimen-
to conhecido como Jornadas de Junho, ocorrido em 2013. Lança-
mos um olhar sobre as práticas realizadas pelo coletivo paulistano
Linhas de Sampa. Suas ações e bordados problematizam causas
sociais, defendem os direitos humanos e dão voz às minorias, além
de sinalizar protestos pontuais a partir de situações específicas. As
técnicas utilizadas pelo grupo podem enriquecer este percurso, na
retomada de conceitos trabalhados anteriormente – “resistência” e
“bordado de oposição” – na paisagem que se consolidou nos anos
2000 com o chamado ativismo on-line. As formas de trabalho utili-
zadas pelo grupo apontam para uma discussão sobre a estratégia
do bordado como vetor de resistência.

Figura 48- Varal de bordados do Coletivo Linhas de Sampa

Fonte: Tsunami da Educação, 13 de ago. de 2019. Imagem da autora.

84
Após delinear o contexto dos principais movimentos e ativis-
mos mundiais e brasileiros nos últimos anos, alinhados às manifes-
tações de resistência, olhamos para as ações do Coletivo Linhas
de Sampa (figura 48) e os modos de distribuição de seus panfletos
bordados, para refletir sobre suas práticas e realçar as articulações
entre design e política que contornam esta pesquisa.

3.1 Nos bastidores dos levantes mundiais dos anos


2000: um breve percurso

Ao longo das últimas três décadas, o mundo vem enfrentando


crises globais. Alguns países, mais que outros, vêm reproduzindo
aspectos desses desequilíbrios. Nos Estados Unidos, uma crise
no setor imobiliário derivou de uma ampla facilitação no crédi-
to para compra de imóveis – e a posterior inadimplência. Isso
provocou a falência dos bancos e fez desmoronar o sistema fi-
nanceiro norte-americano em 2008 e desencadeou o movimento
social Occupy Wall Street em 2011: um amplo protesto contra a
desigualdade social e econômica e o setor financeiro (EVANS, 2011).

Os milhares de pessoas que foram às ruas se manifestar


naquela ocasião iniciaram uma onda expressiva de encontros,
ocupações e diversas formas de contestação que perduram até
os dias de hoje em inúmeros lugares do mundo. Por exemplo,
os levantes sociais que despontaram naquele mesmo ano com
a Primavera Árabe, que surgiu na Tunísia quando um ambulante
se suicidou em protesto contra as autoridades que confiscaram
os produtos vendidos por sua família. Ampliada por meio de re-
des sociais, a onda de revolta se espalhou por outros países do
Oriente Médio em manifestações contra o autoritarismo (PINHEI-
RO-MACHADO, 2019). Assim, os episódios em torno do movi-
mento norte-americano Occupy Wall Street e da Primavera Árabe
podem ser considerados fortes impulsionadores de protestos em
todo o mundo.

Insurgências contra o autoritarismo ocorreram também na


China, no ano de 2011. Realizadas pelo movimento democráti-
co chinês, as manifestações questionavam o modelo do governo
comunista. Em 2014, em Hong Kong, na revolta dos guarda-chu-
vas, esse objeto foi usado como barreira contra as bombas de
gás lacrimogênio, clamando contra as interferências do Partido
Comunista. As formas de luta que emergiram desses protestos

85
tinham muito em comum, tal como sintetiza Pinheiro-Machado:
“foi forjada na rua uma nova geração, que busca, na atuação mi-
croscópica e na ação direta, o afeto radical, a criatividade política
e a horizontalidade” (ibid., p.18).

Os levantes populares do movimento Occupy Wall Street,


da Primavera Árabe e tantos outros, ocorreram quase que si-
multaneamente ao redor do mundo. Imagens dos protestos cir-
culavam de maneira ampla, em decorrência do poder de difu-
são da internet e das plataformas de mídias sociais. Com isso,
inaugurou-se um momento no qual o trabalho por uma causa e
o exercício da militância se ressignificaram, tendo como ferra-
menta principal os recursos de conectividade da rede mundial
de computadores. Este formato ficou conhecido como ativismo
on-line. Felice et al. demonstram:
Todas essas experiências, diversas em seus
contextos culturais e políticos originaram-se
on-line, em blogs, sites ou redes temáticas
que, de forma autônoma disseminaram suas
reivindicações, seus protestos, alcançando
em breve tempo proporções que, em muitos
casos superaram as fronteiras nacionais (FE-
LICE et al., 2017, p. 57).

No contexto do ativismo on-line, um elemento fundamental


é a hashtag (#). Em português, esse símbolo é conhecido como
cerquilha ou jogo da velha, graças ao seu formato semelhante ao
popular passatempo cujas linhas formam o campo de disputa. A
hashtag vem acompanhada de uma palavra ou frase precedida
pelo símbolo # em mensagens publicadas em redes sociais como
Twitter, Facebook e Instagram43, entre outras. O prefixo # é capaz
de promover um agrupamento de dados conectados por meio de
hiperlinks – ferramentas virtuais que aglutinam sentenças iguais,
permitem acesso de diferentes lugares do planeta e promovem a
visualização somativa do seu uso. A ferramenta surgiu no ano de
2009 e inaugurou um sistema denominado trending topics, que
indica os principais assuntos debatidos mundialmente nas pla-
taformas virtuais. Segundo Costa-Moura (2014, p. 150) as hash-

43 _ Twitter é um serviço de mensagens rápidas com limitação de caracteres


criado em 2006, que hoje conta com mais de 300 milhões de usuários ativos.
Facebook é uma mídia social e virtual, lançado em 2004 e hoje com 2,5 bi-
lhões de usuários ativos e que é detentor do Instagram, plataforma de fotos e
vídeos, surgida no ano de 2010 e com cerca de 1 bilhão de usuários ativos.
Disponível em: Web Site Hosting Rating: <https://www.websitehostingrating.
com/instagram-statistics/>. Acesso em 20 de mai. de 2020.

86
tags “tornaram-se instrumento político e tiveram sua ascensão
durante as eleições iranianas de 2008-2009”.

No Brasil, um ciclo de manifestações começou em 2013 com


pautas difusas e reivindicações ligadas, por exemplo, ao aumento
na tarifa dos transportes, à corrupção e aos custos do governo
com a realização da Copa do Mundo no país. Estes protestos
se avolumaram e, desde então, é possível notar que os levantes
de 2013 deixaram marcas: crescimento no número de coletivos
descentralizados e uma relevante ampliação no ativismo ligado
aos grupos feministas, LGBTQI+s e antirracistas, especialmente
protagonizados pelas novas gerações. Nas ruas das principais ci-
dades do país, veem-se novas formas de organização, luta, afeto
e solidariedade social.

Desse mesmo fluxo surgiram inúmeros movimentos culturais


que problematizam, questionam e expressam aspectos da situação
social e política no país. Destacam-se o Passe Livre, que defende
melhorias no transporte coletivo brasileiro e a Mídia Ninja, ativistas
de comunicação que propõem alternativas à imprensa tradicional44.

Entre os ajuntamentos que surgiram com variadas propostas,


também está o coletivo urbano Linhas do Horizonte, nascido na
cidade de Belo Horizonte (MG). Se reúnem em espaços públicos
para usar linhas e agulhas como forma de resistência e bordam
tecidos com desenhos e frases alinhados com pautas políticas,
sociais e culturais relativas ao contexto atual. De acordo com o
manifesto do Coletivo em sua página do Facebook, “o Linhas do
Horizonte é um grupo de resistência que, através do bordado e de
outras formas de manifestação artística, borda contra toda forma
de violência aos direitos humanos, políticos e ambientais: homo-
fobia, racismo, intolerância religiosa, censura, feminicídios e ge-
nocídios etc.” (LINHAS DO HORIZONTE, 2017). Inspirados nas
ações do coletivo mineiro, surgiram outros; entre eles o Coletivo
Linhas de Sampa, que borda palavras e desenhos em tecidos nas
ruas da cidade de São Paulo (SP), em defesa de bandeiras que
denunciam, questionam e problematizam determinadas causas
sociais, opõem-se aos preconceitos e colocam-se a favor dos di-
reitos humanos e políticos das minorias. Seus trabalhos também
são conhecidos como “panfletos bordados” (LINHAS DE SAMPA,
2018) e suas práticas serão enfocadas em seguida.

44 _ Disponível em: <https://www.mpl.org.br/>. Acesso em 20 de abr. de 2020.


Disponível em: <https://midianinja.org/>. Acesso em 20 de abr. de 2020.

87
3.2 Nos bastidores da política brasileira: alguns momen-
tos pontuais (2013-2020)

A onda de protestos mundiais reverberou no Brasil com a ocor-


rência de grandes manifestações no ano de 2013. Essa conjun-
tura vinha se formando há alguns anos. O período militar havia
terminado no ano de 1985, resgatando a liberdade de expressão
e os modelos democráticos de eleição de governantes. Apesar
dessa retomada, nos anos seguintes ao término do regime auto-
ritário, o país continuou sendo liderado por partidos que visavam
lucros apenas para as elites, não incentivavam a inclusão social e
efetuaram inúmeras privatizações, criando um contexto que abriu
espaço para o surgimento de partidos políticos emergentes, em
especial aqueles faziam trabalho de base e cresciam nas perife-
rias ou em meio à classe trabalhadora (SOUZA, 2016).

No Brasil, as maiores marchas da história são consideradas


como um desdobramento das lutas da virada do século XX que
ocorreram no mundo todo. Num primeiro momento, tais movimen-
tos se configuraram de forma apartidária e suas pautas reivindi-
cavam melhorias nos sistemas de transporte público e em outros
serviços oferecidos pelo governo, como saúde e educação. Tam-
bém se posicionavam contra os abusos corporativos em função
da Copa do Mundo que ocorreria no ano seguinte. Com as estra-
tégias de comunicação ampliadas da internet e das redes sociais
e sob o lema “não são só 20 centavos” ou “#nãosão20centavos”
– valor do aumento das tarifas de transporte – as Jornadas de Ju-
nho levaram milhões de pessoas às ruas de centenas de cidades
brasileiras em diferentes estados (MELO; VAZ, 2018).

Na chamada “grande mídia brasileira”, representada por emis-


soras de televisão como Rede Globo, Sistema Brasileiro de Tele-
visão (SBT), jornais como Folha de São Paulo, o Globo e revistas
semanais como Veja, Época, Isto é, dentre outras, o fenômeno do
apartidarismo foi muitas vezes distorcido e disseminado como um
evento que pregava o antipartidarismo45 – o que poderia ser facil-
mente entendido como crítica ao governo vigente. Dessas ma-
nifestações, é possível entender que as pautas difusas do início
foram esvaziadas e a maioria das reivindicações logo foi apropria-
da pelas elites para criticar as políticas do governo em exercício

45 _ Apartidarismo é uma ideologia política na qual organismos se mantêm


alheios ao que é defendido dentro de qualquer partido político. Antipartidarismo
é considerado a rejeição a certos partidos políticos (BORBA et al., 2015).

88
(PINHEIRO-MACHADO, 2019). Entretanto, apesar das distorções,
os atos reverberaram amplamente, abrindo um campo fértil para
várias formas de ativismo e militância em prol das mais diversas
causas. Desde então, as Jornadas de Junho estimularam mais e
mais pessoas a se organizar, ocupar espaços públicos e manifes-
tar-se via diferentes linguagens e aparatos.

No ano de 2014, os principais protestos enfocavam os inves-


timentos na realização da Copa do Mundo. Os eventos ficaram
conhecidos como “Não vai ter Copa” ou “#nãovaiterCopa”. Ma-
nifestantes repeliam o torneio nas redes sociais e nas ruas das
principais capitais do país, denunciando a violência do Estado
contra as populações mais vulneráveis e os acordos e licitações
superfaturados de obras que não teriam função após o fim do
evento. Alegavam especialmente que os campos da saúde e edu-
cação estavam em crise, carentes de investimento (ibid, 2019).

Em 2015, novos atos emergiram; dessa vez relacionados a lu-


tas feministas. A ONG feminista Think Olga, criada em 2013 com o
objetivo de empoderar mulheres por meio da informação, lançou a
campanha “Primeiro assédio” ou “#PrimeiroAssédio”, que convida-
va mulheres a relatar casos pessoais de assédio por meio da rede
social Twitter. Essa ação teve enorme impacto, rendendo mais de
82.000 mensagens indexadas. Outros fatores, como um projeto
de lei que dificultava a realização de aborto por vítimas de estu-
pro, fizeram com que diversos coletivos feministas se articulassem
para organizar protestos levando centenas de mulheres às ruas
das principais capitais (ROSSI, 2015).

Naquele mesmo ano, rompeu-se uma barragem de dejetos


da mineração realizada pela empresa Samarco na cidade de Ma-
riana (MG). O despejo de 39 milhões de metros cúbicos de rejei-
tos de minério de ferro poluiu a bacia do Rio Doce e ocasionou 19
mortes. Esse acontecimento provocou uma série de manifesta-
ções em diferentes regiões do Brasil, denominadas principalmen-
te “Não foi acidente”, ou “#nãofoiacidente” (BOECKEL, 2015).

Em 2016, brasileiros foram às ruas pedir o fim da corrupção.


Na ocasião, as demandas eram polarizadas, vinculadas a posi-
cionamentos contra e a favor do processo de impeachment da
Presidenta Dilma Roussef (1947 -). Intituladas “Não vai ter gol-
pe” (“#nãovaitergolpe”) e “Fora Dilma” “#ForaDilma”, ocorreram
simultaneamente em mais de 300 cidades do país46 e culminaram
com a cassação de seu mandato presidencial, em agosto daque-

46 _ Para mais informações, ver COSTA, Petra. Democracia em vertigem (2018).

89
le ano (PINHEIRO-MACHADO; SCALCO, 2018). Na sequência,
as medidas adotadas pelo presidente empossado Michel Temer
(1940 -) produziram desemprego e quedas econômicas (FER-
NANDES JR, 2019), fatores que levaram a novas reivindicações
em todas as regiões do Brasil com o lema “Fora Temer”, ou “#Fo-
raTemer” (RUFFATO, 2016). Tais protestos atravessaram todo o
ano de 2016 e continuaram a ocorrer em 2017, contra as refor-
mas trabalhistas propostas pelo governo, entre elas aquelas que
incluíam a retirada de direitos dos trabalhadores, com a hashtag
“#nãoareformadaprevidência”.

Em 14 de março de 2018, o assassinato da vereadora cario-


ca Marielle Franco (1979-2018) resultou em inúmeros levantes
nacionais e internacionais, que reverberavam a pergunta “Quem
matou Marielle Franco?” ou “#QuemMatouMarielle” e “#Marielle-
Presente”. A socióloga lutava pelos direitos humanos e contra a
violência nas favelas do Rio de Janeiro (ABRANTES, 2018), de
modo que o ocorrido fortaleceu vários grupos e reivindicações
contra a violência policial nas periferias das grandes cidades (Por-
tal G1, 2018). Nesse mesmo ano, efetivou-se a prisão do ex-pre-
sidente Luís Inácio Lula da Silva47, fruto de um processo iniciado
nas investigações ligadas à Petrobras, empreendidas pela cha-
mada Operação Lava Jato da Polícia Federal (EL PAÍS, 2018).
Inúmeras manifestações contra sua prisão levaram às ruas e às
redes a frase “Lula Livre”, ou “#LulaLivre” (BALLOUSSIER, 2018).

Outro grande movimento de 2018 foi intitulado “Ele não” ou


“#Elenão”, convocado por mulheres e com reverberação inter-
nacional contra a candidatura do ex-deputado Jair Bolsonaro48 à
presidência da República. As manifestações ocorreram em diver-
sas regiões, envolvendo mais de 100 cidades de 50 países no dia
29 de setembro (CARNEIRO et al., 2018).

Em 2019, diversos eventos nas ruas abordaram múltiplas


pautas em diferentes áreas. É possível elencar questões ambien-
tais, como o rompimento de mais uma barragem de dejetos, desta
vez da mineração praticada pela empresa Vale do Rio Doce em
Brumadinho (MG), com 270 mortos e destruição avassaladora da
região e a hashtag “#BrumadinhoNaoFoiAcidente” (FELLET; SOU-
ZA, 2019) e os incêndios ocorridos na Amazônia, que devastaram

47 _ Luís Inácio Lula da Silva (1945 - ) é um político, ex-sindicalista e ex-me-


talúrgico brasileiro e um dos principais fundadores do Partido dos Trabalhado-
res-PT. Foi o 35º presidente do Brasil, de 2003 a 2011. Ficou preso de abr. de
2018 a nov. de 2019. (PINTO, 2017).
48 _ Jair Messias Bolsonaro (1955 -), presidente da República desde 2019,
eleito pelo Partido Social Liberal (PINHEIRO-MACHADO, 2019).

90
mais de 2 mil quilômetros quadrados da região (“#AmazoniaEm-
Chamas” e “#amazoniaemchamas”) (BARBOSA, 2019). Protes-
tos em favor dos povos indígenas ocorreram em várias cidades
do Brasil e do mundo (WATSON, 2019), estendendo-se por todo o
ano, com os assassinatos dos caciques Emyra Wajãpi, no Amapá
em julho, com as hashtag “#Wajapi” ou “#soswajapi” (ANDRADE,
2019); e Paulo Guajajara no Maranhão, em novembro (hashtag
“#PauloGuajajara” e “#guajajara”) (Portal G1, 2019).

Outros atos de 2019 derivaram de ações contra o racismo.


Entre eles, destaca-se o “21 Dias de Ativismo Contra o Racismo!”
ou “#21DiasDeAtivismoContraORacismo”, criado pela Organiza-
ção das Nações Unidas (PORTAL MÍDIA NINJA, 2019). As reivin-
dicações em favor da educação e contra cortes de verbas, de-
nominadas “Tsunami da Educação” ou “#TsunamiDaEducação”,
também foram expressivas e ocorreram em mais de 85 cidades
(PORTAL G1, 2019). Os protestos também continuaram contra
as intervenções policiais violentas. Em uma dessas intervenções,
em abril no bairro Guadalupe (RJ), foram disparados mais de
80 tiros sobre o carro de uma família, matando o cantor Evaldo
dos Santos Rosa, de 51 anos e o catador Luciano Macedo, de
27 anos. Isso desencadeou protestos com a hashtag “#Oitenta-
Tiros”. Outra dessas ações resultou no assassinato da menina
Ágatha Félix, de 8 anos, no Complexo de favelas do Alemão (RJ),
em setembro e os atos de protesto ganharam a hashtag “#Aga-
thaFelixPresente” (PORTAL G1, 2019).

No Chile, desigualdades sociais, um sistema previdenciário


ineficiente e o aumento das tarifas de transporte motivaram in-
surreições por parte de estudantes nas redes sob o nome “#Chi-
leDesperto”, que fizeram com que o presidente liberal Sebastian
Piñera (1949 -) pedisse perdão pela insensibilidade diante dos
problemas sociais e fizesse rever os salários e as aposentadorias
naquele país (SAFATLE, 2019).

Muitas vezes, esse tipo de manifestação aborda simulta-


neamente pautas diversas. Os fatores anteriormente descritos
desencadearam movimentos sociais e culturais que questionam
argumentos em âmbito social. Entre eles, encontram-se os pan-
fletos bordados pelo Coletivo Linhas de Sampa, que no cenário
dos últimos dois anos, articulam design, bordado e política.

91
3.3 Ações do Coletivo Linhas de Sampa: Bordando a
resistência

No contexto dos levantes dos anos 2000, muitos grupos praticam ati-
vidades manuais como forma de resistência e cidadania, elaborando
suas obras de maneira singular e insurgente. Entre eles, encontra-se
o Coletivo Linhas de Sampa, objeto de estudo deste capítulo.

Como no estudo de caso apresentado no capítulo anterior,


as reflexões de Duarte (2002) presentes no artigo Reflexões So-
bre o Trabalho de Campo buscaram indicar as diretrizes a serem
seguidas na pesquisa de campo e nas entrevistas. A metodologia
de “delimitação do universo da pesquisa”, que diz respeito à com-
posição de sujeitos do universo da investigação, foi considerada
nas entrevistas, que priorizaram membros do coletivo.

Vale ressaltar que o Coletivo será mencionado como grupo,


exceto pelo nome de Lenira, responsável pelo início do projeto.
Em outras palavras, não serão referidos os nomes dos integran-
tes, respeitando a proposta que preconiza horizontalidade nas
práticas, tal como apontam Bratich e Brush no artigo Fabricando
o ativismo: artesanato, cultura popular, gênero:
Numa dimensão mais cotidiana, desenvolvem
valores e práticas como orientação, constru-
ção de comunidade [...] promovem discussão,
compartilhamento de habilidades e relaciona-
mentos entre pessoas com diferentes origens
[...], especialmente como uma prática politiza-
da de desenvoltura, conhecimento local e for-
mas organizacionais não hierárquicas49 (BRA-
TICH; BRUSH, 2011, p. 247).

Não foram encontradas publicações científicas a respeito do


Coletivo Linhas de Sampa. As entrevistas concedidas por inte-
grantes do grupo à autora nos dias 13 de agosto de 2019 e 14
de abril de 2020 e encontram-se nos apêndices 4,5 e 6 deste
trabalho. As ações acompanhadas foram Tsunami da Educação,
ocorrido na Avenida Paulista (SP) em 13 de agosto de 2019; e
o movimento Resiste Venezuela, de 27 de fevereiro de 2020 no
Armazém do Campo (SP). Para este estudo de caso, o acompa-
nhamento de ações de campo foi fundamental na investigação,

49 _ Do texto original: “On a more everyday level, craftivists develop values


and practices like mentorship, comunity building [...] promote discussion, skill-
-sharing, and relationships among people with different backgrounds [...] espe-
cially as a politicized practice of resourcefulness, local knowledge, and nonhie-
rarchical organization forms”. Tradução nossa.

92
conjugado com as entrevistas, o que resultou numa compilação
de dados relevantes. Também foi importante acompanhar as re-
des sociais, onde o grupo se mantém ativo, majoritariamente nas
plataformas Facebook e Instagram.

O Linhas de Sampa iniciou suas atividades incentivado pelo


Coletivo Linhas do Horizonte, após um encontro durante o Fórum
Social Mundial50 de 2018, em Salvador (BA) entre a coordenadora
do Coletivo mineiro – a arquiteta e ativista Leda Leonel – e a soci-
óloga e ativista paulistana Lenira Machado. O convite feito naque-
le dia propunha expandir o projeto para a cidade de São Paulo51,
com a participação inicial de sete membros. Hoje o grupo conta
com 77 pessoas em participação ativa, número que costuma os-
cilar conforme as diferentes ações. São indivíduos de classe mé-
dia, com variadas ocupações: jornalistas, professores, servidores
públicos, profissionais da área da saúde e também aposentados.

Na página de Facebook, é possível encontrar o manifesto


do Coletivo, em que se destaca o trecho: “Linhas de Sampa é um
grupo autônomo de esquerda, suprapartidário52, cujas iniciativas
independem de partidos, de outros coletivos, de agremiações, de
sindicatos etc.” (LINHAS DE SAMPA, 2018). Realiza seu trabalho
por meio de práticas que podem ser entendidas como “criativida-
de política” (PINHEIRO-MACHADO, 2019). Seus “panfletos” bor-
dados em tecido são pequenas bandeiras que podem ser fixadas
em roupas, sacolas e bolsas. Recebem esse nome porque carre-
gam potencial informativo, levantam questões e fazem denúncias
por meio de palavras e enunciados que defendem causas ligadas
aos direitos humanos, sociais e políticos de grupos minoritários,
visando preservar a democracia e a justiça e problematizar a con-
dição social e política da sociedade.

Para Bratich e Brush (2011), uma das principais caracterís-


ticas dos coletivos é promover discussão, compartilhar habilida-
des e fomentar o relacionamento entre pessoas com diferentes
origens. Os autores defendem que o atual ressurgimento das
práticas manuais tem fortes vínculos com o meio anarquista53,

50 _ O Fórum Social Mundial é um encontro anual articulado por movimentos


sociais para discutir pautas contra o neoliberalismo e as desigualdades sociais
(RELATÓRIO FSM, 2018).
51 _ Na ocasião, o convite foi estendido à ativista Maristela Pimenta, também
presente naquela reunião, a fim de expandir o projeto para o Rio de Janeiro. O
fato se consolidou com a criação do Coletivo Linhas do Rio.
52 _ Que reúne vários partidos mas não se subordina a nenhum (DANTAS, 2017).
53 _ Anarquismo é uma ideologia política que se opõe a todo tipo de hierarquia
e dominação, seja ela política, econômica, social ou cultural, como o Estado, o
capitalismo, as instituições religiosas, o racismo e o patriarcado (BOBBIO, 1998).

93
especialmente como prática politizada de desenvoltura, conheci-
mento local e formas organizacionais não hierárquicas. O Linhas
de Sampa não possui líder, mas sim um colegiado democrático.
O grupo é autofinanciado e não tem sede própria. Em suas pró-
prias palavras:
Na verdade, se você pensar, nosso custo não
é alto [...] Por exemplo, este folheto tem mais
ou menos 12cm x 12cm. Um metro deste al-
godão custa R$ 7,00, tem 1,40m de largura
e rende bastante. Nosso custo não é alto, e
com as doações, a gente se auto paga. Quan-
do nós fazemos reuniões são em lugares que
nos apoiam ou que nós apoiamos como causa
(LINHAS DE SAMPA, informação oral).

As reuniões costumam ser mensais – normalmente no ter-


ceiro domingo de cada mês – na Avenida Paulista, em São Paulo
(SP) (figura 49). Nesses encontros, que são divulgados em suas
mídias sociais (figura 50), acontecem as rodas de bordado, quan-
do também são discutidas as pautas e agendas das ações, com
convite público. As conversas sobre demandas, eventos e mani-
festações de que pretendem participar são realizadas de maneira
horizontal e democrática em grupos ativos no serviço de mensa-
gens WhatsApp. O Coletivo também organiza oficinas para ensi-
nar técnicas de bordado em comunidades carentes (figura 51),
entre outras intervenções.

Figura 49- Encontro dominical de


integrantes do Linhas de Sampa Figura 50- Chamamento para bordar

Fonte: Facebook Coletivo Linhas


de Sampa (2018). Disponível em:
<https://m.facebook.com/pg/linhasde- Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.
sampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. facebook.com/pg/linhasdesampa/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.
de 2020.

94
Figura 51- Linhas de Sampa oferecendo oficinas de bordado

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.face-


book.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

Realizamos uma análise da reverberação do trabalho do


Linhas de Sampa em duas situações distintas: uma delas em
duas diferentes ações em campo; e a outra nos ambientes virtu-
ais. A metodologia utilizada foi a observação proposta por Duarte
(2002), conhecida como “delimitação de situação de contato”.

A primeira ação de campo foi sobre o levante chamado Tsu-


nami da Educação, em agosto de 2019 na Avenida Paulista. Na
ocasião, foi possível acompanhar o desenvolvimento das práticas
do coletivo. Os integrantes do Linhas de Sampa marcaram en-
contro em um local nos arredores, onde bordaram e prepararam
alguns panfletos. Depois, dirigiram-se ao ponto no qual monta-
riam um varal. Escolheram uma localização relativamente afasta-
da do epicentro da manifestação, para garantirem mais espaço.
Uma extremidade da longa tira de malha de algodão foi presa a
um poste e a outra foi fixada por um dos membros do coletivo,
esticando o varal. Então, o grupo pendurou os panfletos com al-
finetes de segurança. A montagem aconteceu em passo acelera-
do e o ato chamou a atenção dos presentes, pois era visível um
grande afluxo de pessoas ao redor.

Em seguida, foi possível testemunhar a reação dos manifestan-


tes. Curiosas, muitas pessoas se aproximaram e o varal logo se tor-
nou uma espécie de suporte de exposição. Os visitantes se surpre-
endiam ao saber que um dos bordados podia ser levado e tomavam
algum tempo para escolher, olhando cuidadosamente as opções.

95
Havia mais de 100 panfletos pendurados e levou cerca de
uma hora até que todos tivessem sido distribuídos. Vale notar que
os usuários reverberam esses bordados de oposição ao usarem-
-nos pendurados em suas bolsas e roupas e também contribuem
fotografando-os e postando em mídias sociais, de modo que as
publicações ampliam ainda mais o alcance das práticas do Cole-
tivo (figuras 52 e 53).

Figura 52- Reação dos manifestantes aos bordados

Fonte: Imagens da autora.

Figura 53- Manifestantes usando os bordados

Fonte: Facebook do Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.facebook.com/pg/linhas-


desampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020. E Instagram do Coletivo Linhas de Sampa. Dis-
ponível em: <https://www.instagram.com/linhasdesampa>. Acesso em 08 de abr. de 2020.

96
A outra ação acompanhada foi o movimento Resiste Vene-
zuela em fevereiro de 2020. Na ocasião, não houve distribuição
dos panfletos bordados. Em um painel, alguns integrantes mon-
taram uma exposição (figura 54) de bordados que haviam sido
produzidos para um evento anterior – Mil agujas por la dignidad54
– ocorrido em 7 de dezembro de 2019 no Masp (SP), em soli-
dariedade aos levantes do Chile. Com isso, foi possível verificar
que o Coletivo desenvolve uma multiplicidade de ações e se faz
presente em diversos eventos relativos às pautas que defende.

Figura 54- Painel de bordados

Fonte: Imagens da autora.

54 _ Para mais informações: <https://www.facebook.com/milagujasporladigni-


dadmanifestaciontextil>. Acesso em 13 de jul. de 2020.

97
Nas ruas e nas redes, os bordados do Linhas de Sampa pro-
vocam reflexões em favor das populações periféricas, contra a
violência policial, em prol de lutas femininas, pela educação, a
democracia, a liberdade e contra a reforma da previdência. Tam-
bém cristalizam em algodão colorido a oposição aos processos
imputados contra o ex-presidente Lula, a defesa dos povos tradi-
cionais e do meio ambiente e a solidariedade aos levantes popu-
lares ocorridos na América Latina, especialmente no Chile.

A técnica utilizada é conhecida como bordado livre, feito em


riscos transferidos com papel carbono para o tecido (COATS-
CRAFTS, 2017). Geralmente medem 12 x 12 centímetros, embora
possam surgir em outros formatos, como no estandarte. O ponto
de bordado predominante é o ponto atrás (figura 55), que costuma
ser utilizado para bordar contornos e letras e é considerado um
dos pontos essenciais para bordadeiros por ser bastante versátil,
de rápida execução e não exigir o domínio de técnicas elaboradas.

Também são empregados outros tipos de ponto, demonstra-


dos nas amostras: alinhavo, cadeia, cheio, haste, matiz, mosca,
partido, reto etc. (figura 56).

Figura 55- Receita de ponto atrás

Fonte: CoatsCrafts, 2017. Disponível em: <http://coatscrafts.com/wpcontent/


uploads/sites/4/2018/02/100%20Pontos.pdf> . Acesso em 13 de mai. de 2020.

98
Figura 56- Receita de pontos diversos

Fonte: CoatsCrafts, 2017. Disponível em: <http://coatscrafts.com/wpcontent/uploads/sites/4/2018/02/100%20Pontos.


pdf> . Acesso em 13 de mai. de 2020.

99
Exemplificando o trabalho do Linhas de Sampa, seguem panfletos bordados com frases e
desenhos organizados por temática (figuras 57 a 64). Heterogêneos, não possuem padronização
e recusam um estilo estético definido. O que determina seu resultado final é a pauta defendida em
cada um, que geralmente é norteada por reivindicações de minorias.

Figura 57- Série de bordados Linhas de Sampa Figura 58- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível
em: <https://m.facebook.com/pg/linhasdesampa/photos/>. em: <https://m.facebook.com/pg/linhasdesampa/photos/>.
Acesso em 5 de abr. de 2020. Acesso em 5 de abr. de 2020.

Figura 59- Série de bordados Linhas de Sampa Figura 60- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Fotos da autora e Facebook Coletivo Linhas de


Sampa. Disponível em: <https://m.facebook.com/pg/li-
Fonte: Fotos da autora. nhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.\

100
Figura 61- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Fotos da autora e Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <ht-
tps://m.facebook.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

Algumas características referentes às técnicas utilizadas po-


dem ser elencadas. Em algumas peças, o espaço do tecido é
realçado, às vezes, apenas por palavras. Já em outras, os dese-
nhos vêm acompanhados de palavras de ordem, frases ou outros
elementos.

É possível perceber que os bordados são compostos com


mais de uma cor de linha, na verdade, do mínimo de duas co-
res até dez cores diferentes. Além disso, o grupo faz uso de ou-
tros recursos para decorar as composições: tintas coloridas e até
elementos tridimensionais, como correntes de metal, moedas e
garrafas de vidro. Na grande maioria dos bordados, fica visível
a assinatura do Coletivo em letras do tipo bastão, em caixa alta,
bordadas com ponto atrás.

101
Figura 62- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.face-


book.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

Figura 63- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.face-


book.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

102
Figura 64- Série de bordados Linhas de Sampa

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.facebook.


com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

Figura 65- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.face-


book.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

103
Na segunda observação, abordamos aspectos dos panfletos
na interação com os usuários de redes sociais. Para isso, nos bali-
zamos pela metodologia de Análise de sentimento de Salustiano55.
Um primeiro mapeamento demonstra que, no Facebook, o Coletivo
Linhas de Sampa conta com cerca de 3 mil seguidores56. Suas pu-
blicações já receberam mais de 12 mil interações, sendo que uma
única foto de um dos panfletos chegou a ser compartilhada mais de
3700 vezes. Trata-se do bordado Matam Ágathas para que não se
tornem Marielles (vide figura 57 acima). No Instagram, o grupo tem
perto de 4 mil seguidores57 e cerca de 15 mil interações. A hashtag
“#linhasdesampa” foi publicada mais de 400 vezes. Esta metodo-
logia permite observar reações ambíguas aos panfletos, embora
95% das interações sejam positivas (figuras 65 a 68).

Figura 66- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais

Fonte: Facebook Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://m.face-


book.com/pg/linhasdesampa/photos/>. Acesso em 5 de abr. de 2020.

55 _ A pesquisa de Salustiano intitulada Análise de sentimento requer profissio-


nais qualificados e muitas vezes é feita por ferramentas de inteligência artificial.
Para esta pesquisa, foi realizada uma análise de maneira curiosa e informal. Sua
aplicação preconiza a realização de análise lexical de frases curtas e posterior-
mente classifica-as em dois tipos: positivo e negativo (SALUSTIANO, 2016).
56 _ Para mais informações: <https://www.facebook.com/linhasdesampa>.
Acesso em 05 de abr. de 2020.
57 _ Para mais informações: <https://www.instagram.com/linhasdesam-
pa/?hl=pt-br>. Acesso em 08 de abr. de 2020.

104
Figura 67- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais

Fonte: Instagram Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://www.


instagram.com/linhasdesampa>. Acesso em 08 de abr. de 2020.

Figura 68- Reverberação do trabalho do Coletivo nas redes sociais

Fonte: Instagram Coletivo Linhas de Sampa. Disponível em: <https://www.


instagram.com/linhasdesampa>. Acesso em 08 de abr. de 2020.

105
Os bordados enfatizam expressões de resistência e promo-
vem a reflexão por meio da visualidade, do volume das linhas,
das cores, das texturas e da tridimensionalidade. É possível notar
que, pelos temas bordados, integram-se vários sujeitos de lutas
e pautas diversas. Embora sem padronização estética, tudo é
facilmente identificável. Isso confere aos panfletos certa homo-
geneidade que está ausente dos bordados em si, mas presente
nas articulações que se estabelecem quando apresentados nos
varais dos eventos, bem como nas redes sociais.

As práticas de resistência realizadas pelo Linhas de Sam-


pa denotam elementos que ligam seu trabalho a outras formas
de ativismo, como o craftivismo – que conecta práticas manuais
a ações políticas e foi apresentado anteriormente por Barbosa
Ramos e Prado (2019). O termo surgiu em 2003; é uma palavra
híbrida que combina práticas manuais com propósitos ativistas.
De seu manifesto, podemos destacar:
Um craftivista é alguém que usa seu ofício
para ajudar um bem maior. Seu ofício é sua
voz. Craftivismo é elevar sua consciência,
criar um mundo melhor, ponto a ponto, com
coisas feitas à mão, por uma pessoa [...] e
celebrar as habilidades tradicionais de novas
formas58 (GREER, 2003).

Graças à atuação do Linhas de Sampa na internet, o traba-


lho do Coletivo também passa a ser reconhecido no campo do
ativismo on-line. Pela própria essência da mídia, essa forma de
ativismo permite criar conexões e formar teias, buscando ampliar
a reverberação das ações. Nas palavras de Bratich e Brush: “Po-
demos adicionar a essa outra característica [...] sobre o potencial
radical da web digital – interconexão, tecelagem, produção e re-
produção de alianças59” (2011, p. 248).
Em conexão com as proposições dos autores,
Silva e Stabile (2016), no artigo Análise de re-
des em mídias sociais propõem que as redes
sociais são compostas por dois elementos bá-
sicos, os nós e os laços, que no universo da
computação são conhecidos como vértices e
arestas. Nesse contexto, os nós são os indi-

58 _ Do texto original: “A craftivist is anyone who uses their craft to help the
greater good. Your craft is your voice. Craftivism is about raising your consciou-
sness, creating a better world stitch by stitch, and things made by hand, by a
person […] and celebrating traditional skills in new ways” Tradução nossa.
59 _ Do texto original: “We can add to this another characteristic [...] about the
radical potential of the digital Web—interconnection, weaving, producing and
reproducing alliances”. Tradução nossa.

106
víduos e as relações entre eles são os laços,
ou as interações que incluem compartilhar,
retweetar, comentar e curtir, por exemplo. A
título de curiosidade, na linguagem computa-
cional de arquitetura de dados, as linhas for-
madas pelas interações entre nós e laços de
relações virtuais em muito se assemelham às
construções percebidas nos fazeres que ligam
os tecidos e linhas dos bordados (figura 69).

Ao compreender as manifestações anti-hegemônicas do Li-


nhas de Sampa, nota-se a presença de dispositivos insurgentes
que buscam promover (a)bordagens reflexivas. Além disso, a bai-
xa complexidade operacional dos trabalhos pode ser conectada
com as proposições de Papanek (1985) para projetos de design
socialmente responsáveis na amplitude de sua proposição para
“mundo real”. São práticas que exigem poucos recursos para sua
realização (tecido, linha e agulha), o que permite que os panfletos
sejam produzidos e divulgados em redes sociais quase simulta-
neamente aos acontecimentos.

Figura 69- Linhas formadas nas relações virtuais

Fonte: Silva; Stabile (2016, p. 246).

107
CONSIDERAÇÕES FINAIS

O percurso investigativo desta pesquisa enfoca os conceitos de


“traje de oposição” e “bordado de oposição” permeados pelo con-
ceito de “resistência”, a partir da observação de trajes e bordados
e dois estudos de caso apresentados no texto, em aproximações
entre design de moda e política. Tal enfoque pretende fomentar
campos de interlocução entre o design de moda no campo social
e na sistematização de conhecimentos capazes de estimular a
formação de designers.

Em uma (a)bordagem sobre o papel do design, além de uma


tomada histórica, são elencadas significativas marcas temporais
nos modos de vida em articulação com roupas e bordados. A
função original dos trajes, materialidades e técnicas é subvertida
quando dispara processos à margem das práticas capitalistas.
Em diferentes momentos, esses elementos são manifestações de
resistência.

Nas problematizações investigadas, um olhar sobre o con-


ceito de “traje de oposição” revelou seus atributos e relações com
o campo político, na medida em que manifesta resistência aos
sistemas dominantes. O traje feminino emancipado denunciava
a posição da mulher na sociedade, no contexto da revolução in-
dustrial e buscava igualdade de direitos; o terno zoot afirmava a
identidade de jovens afro-americanos periféricos que, silenciados
pela sociedade, buscavam autoexpressão por meio da roupa. In-
satisfações em face da sociedade de consumo consolidada após
o fim da Segunda Guerra Mundial foram reveladas na simplicida-
de do traje existencialista e também no traje ted, um protesto irô-
nico contra o conservadorismo da sociedade inglesa. O contexto
dos levantes estudantis e da contracultura no final da década de
1960 expôs o movimento cultural hippie, pedindo liberdade inclu-
sive nas roupas, ao rejeitar as regras de vestuário impostas pela
sociedade ocidental. O radicalismo punk reafirmou a insatisfação
dos jovens nas sociedades urbanas.

108
À medida que as sociedades urbanas vão se tornando frag-
mentadas e complexas, surgem desejos de individualidade, es-
pecialmente nas populações mais jovens, materializados em
fronteiras não-verbais. As aproximações entre design de moda e
resistência política ocidental no século XX permitem compreen-
der alguns momentos em que os cenários socioculturais e polí-
ticos podem influenciar modismos, técnicas, tecidos, estampas,
bordados, entre outros componentes dos trajes. Também deno-
tam que, no século XXI, alguns grupos jovens urbanos seguem
produzindo “trajes de oposição”.

Uma das funções do design de moda deriva da necessida-


de capitalista de constante renovação, com padrões de beleza e
estilos impostos em função de sistemas dominantes. À primeira
vista, pode parecer apenas uma atividade voltada aos interesses
econômicos; entretanto, os paradoxos na própria ambiguidade da
sociedade vão sendo adotados como ferramentas de expressão
por indivíduos ou grupos específicos, por serem acessíveis e de
grande plasticidade.

Em aproximação com o conceito de “traje de oposição”, um


breve percurso pela história do bordado foi fundamental para
compreender a técnica e suas particularidades. Relações entre
bordado e resistência política foram intituladas “bordado de opo-
sição” e os exemplos desta articulação vieram em expressões
presentes dos banners sufragistas e nos bordados da segunda
onda feminista. No cenário brasileiro, a (a)bordagem do panora-
ma do bordado encaminhou a nossos estudos de caso.

Esse trajeto nos conduziu à construção do estudo de caso


sobre o trabalho de bordados da designer Zuzu Angel, permeado
pelo contexto da ditadura civil-militar que vigorava no país. A época
produziu diversos movimentos culturais que abraçavam importan-
tes questões e suas estratégias em momentos de forte repressão
e censura. O levantamento iconográfico e o olhar para a coleção
de protesto de Angel fez convergir reflexões sobre mecanismos
que ligaram seu design de moda a uma contundente ação política,
conferindo a seus trajes o atributo de oposição e resistência. Na
coleção e no desfile International Dateline Collection IV – Holiday
& Resort, o design de Zuzu Angel extrapola o consumo, reverbe-
rando uma grave e urgente denúncia, não apenas pelo desapare-
cimento de seu filho, mas também pela situação sociopolítica no
país, confirmando a importância de outros agenciamentos.

109
É notável como essa coleção extrapola as dimensões mer-
cadológicas e realça o atributo político das roupas e suas estraté-
gias decodificadas, que materializam denúncias ao vestir os cor-
pos das modelos. Além disso, a designer aproveita a capacidade
de divulgação de um desfile de moda para amplificar sua voz de
mãe corajosa, combatente e contestadora. Em seus bordados em
estilo naïf, percebem-se diálogos com a linguagem cultural co-
nhecida como tropicalismo, que vigorava na época.

O segundo estudo de caso produziu olhares sobre o cenário


atual e a onda mundial de protestos que emergiram nos anos
2000 e desembarcaram no Brasil nas Jornadas de Junho de
2013, que abriram espaço para coletivos e grupos que elaboram
atividades manuais como forma de resistência. O Coletivo Linhas
de Sampa manifesta resistência por meio de suas práticas, ao
problematizar assuntos inerentes à realidade atual e se opor aos
sistemas opressores. Seu trabalho é amplificado por meio da in-
ternet. No âmbito cultural, a relevância se dá no enfoque de ele-
mentos presentes na cultura nacional, no estímulo às habilidades
ligadas a fazeres tradicionais e ainda no fato de o grupo lidar com
reivindicações no contexto brasileiro, que conferem a suas práti-
cas um caráter de enfrentamento político.

Em ambos os estudos de caso, cumprem-se quase todos os


atributos listados por Papanek em sua proposição de design para
o “mundo real” e também são atendidas as teorias de Cardoso
sobre design para um “mundo complexo”.

Pela compreensão dos diagramas de poder e resistência


plural e múltipla, é possível notar que os bordados de oposição de
Zuzu Angel tinham como único tema o desaparecimento de seu
filho Stuart no ambiente do regime totalitário. Já os panfletos bor-
dados pelo Linhas de Sampa enfocam pautas diversas. Ambos
os autores promovem articulações entre os campos do design e
da resistência política ao fazer uso de ferramentas e estratégias
que permitem tratar de assuntos vigentes. Imbuídos de delicade-
za, tanto como técnica quanto como resultado, Angel e Linhas de
Sampa produzem forças de luta e combate.

Estes estudos nos conduzem às afirmações do filósofo tche-


co Vilém Flusser em sua exploração do termo design, que contri-
bui para a conclusão deste trabalho:
Em inglês, a palavra design funciona como
substantivo e também como verbo [...] Como
substantivo significa, entre outras coisas, pro-
pósito, plano, intenção, meta, esquema ma-
ligno, conspiração, forma, estrutura básica, e

110
todos esses e outros significados estão rela-
cionados a astúcia e a fraude. Na situação do
verbo – to design – significa, entre outras coi-
sas, tramar algo, simular, projetar, esquemati-
zar, configurar, proceder de modo estratégico
(FLUSSER, 2017, p. 179).

Tomados como provocação, os termos enunciados por Flus-


ser podem atar os nossos pontos de conexão. O bordado, em
muitos momentos da história, seja ligado ao design, aos afazeres
artesanais, à arte ou à ocupação doméstica e feminina, teve a
função de trazer luz, materializar imagens, palavras e até mesmo
narrativas articuladas a situações de oposição e resistência que
expressam histórias, bem como símbolos reveladores da subjeti-
vidade brasileira. Essas teorias indicam possibilidades de novos
estudos e poderão ser retomadas futuramente, no intuito de se-
guir ampliando o olhar para trajes, materialidades e técnicas que
conectem design e resistência, entre outros (trans)bordamentos.

Por fim, vale ressaltar que esta escrita foi finalizada durante a
pandemia da COVID-19. Em nível global, pesquisadores afirmam
que este é o maior desafio desde o término da Segunda Grande
Guerra. No Brasil, até o momento, a doença ceifou a vida de cen-
tenas de milhares de pessoas, criando um cenário que chegou
sem avisar e impôs sofrimento, crises e mudanças estruturais no
cotidiano da maioria das pessoas. Não apenas para quem vive
no Brasil, o(s) enfrentamento(s) perpassa(m) questões que ex-
trapolam a crise sanitária. Ser pesquisador hoje, face a tantas
dificuldades e limitações, também pode ser considerado um ato
de resistência.

A proposta de articular os campos do design e da política


utilizando os estudos de caso escolhidos para esta dissertação
exigiu contato com alguns dos episódios recentes mais dramáti-
cos da história do Brasil, do século passado e também dos dias
atuais. Enfrentar as leituras e escritas sobre o caso Stuart Angel
no âmbito da ditadura civil-militar despertaram em mim – e ainda
despertam – reverberações pungentes na esfera das emoções
e dos sentimentos. O mesmo ocorre com os temas (a)bordados
pelo Coletivo Linhas de Sampa na conjuntura atual. Ainda assim,
é certo dizer que foram as agulhas e linhas que ajudaram a cerzir
e cicatrizar essas feridas. Em momentos de desânimo, é para a
potência delicada dos bordados de Zuzu e do Linhas que o meu
olhar se volta: as técnicas e estratégias decodificadas dos bor-

111
dados ao manifestar resistência me deram alento e forças para
perseverar no processo.

O contato com bordados e os meses de isolamento social pro-


vocaram em mim o desejo de bordar. A primeira peça (figura 70)
é um bordado sobre tecido estampado com uma foto de autoria
do fotógrafo brasiliense Joédson Alves60 (autorização no Apêndi-
ce 7 adiante), que mostra a dificuldade dos povos indígenas no
enfrentamento da pandemia da COVID-19. Em meio a mais 106
bordados, foi selecionado para marcar o dia internacional do bor-
dado (30 de julho) e compôs um manto virtual pelo festival Borda61

Figura 70- Bordado da autora

Fonte: Bordado e imagem da autora. Foto de Joédson Alves. Técnica bordado


ponto atrás em tecido de algodão cru estampado.

60 _ Para mais informações ver: <https://www.youtube.com/channel/UCtyLFjZ-


TwAiu5PNGESnlekQ>. Acesso em 21 de jul. de 2020.
61 _ Para mais informações: <https://www.instagram.com/p/CDRGf_BlPJr/>.
Acesso em 01 de ago. 2020.

112
Além disso, fiz o bordado da figura 71 abaixo, motivada pe-
los trabalhos de Antônio Manuel, que usavam manchetes dos jor-
nais como suporte e também a capa do jornal norte-americano
The Washington Post que, em 02 de abril, início do isolamento
no Brasil trouxe a foto aérea impactante de um cemitério na ci-
dade de São Paulo, em que se abriam covas para as vítimas
fatais do vírus. A manchete alertava que o vírus poderia destruir
os países em desenvolvimento, como o Brasil. Fiz esse bordado
em referência à triste marca de 100.000 mortos pela COVID-19
que o Brasil atingiu em agosto – quatro meses após a publicação
norte-americana, que confirmava o destaque do país como um
epicentro da pandemia – um lembrete de nosso direito ao luto e
da não-normalização dessa grave tragédia.

Figura 71- Bordado da autora

Fonte:Fragmento do jornal The Washington Post. Disponível em: < https://


www.pressreader.com/usa/the-washington-post/20200402/281483573488407>.
Acesso em 13 de mai. de 2020. Estampado sobre algodão cru e bordado com
ponto atrás. Interferência da autora, imagem da autora.

Por fim, em meio a infinitos ponto-atrás e ponto cruz, esta


(a)bordagem se encerra, aberta a novas tessituras de resistên-
cias por vir.

113
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WILCOX, Claire. Vivienne Westwood. Londres: V&A Publications, 2004.

WILSON, Elisabeth. Enfeitada de Sonhos. Lisboa: Edições 70, 1989.

127
APÊNDICES

Apêndice 1- Perguntas das entrevistas – Instituto Zuzu Angel

Entrevistadora: Fernanda do Nascimento Cintra. Rio de Janeiro, 2020. Arquivos .mp3.

1) Qual a relação entre o design de moda e a política na coleção International Dateline IV e não
apenas nessa coleção, mas em todo o trabalho da Zuzu Angel?

2) Você percebe algum padrão simbólico ou prática de construção de significado no trabalho


da Zuzu?

3) Na minha pesquisa ao acervo, encontrei gabaritos datados do ano de 1976, contendo bor-
dados de casinha, caracol, todos com formas quadradas. Esses gabaritos ficaram inacabados com
a morte de Angel. Poderia falar mais sobre isso?

4) Quanto ao acervo têxtil e indumentária presente no Instituto Zuzu Angel, notei que não
existem todas as coleções completas, o que dificulta um pouco na descrição das peças, poderia
comentar um pouco mais sobre o acervo?

5) Na produção de Zuzu Angel, havia as roupas sob medida e tinha peças de prêt-a-porter na
loja? Existe algum documento referente à coleção International Dateline IV foi feita para ser desfila-
da em Nova York, atestando que teria sido essa uma coleção feita apenas conceitualmente, tendo
sido feita apenas para um protesto, ou se essa coleção foi comercializada posteriormente no Brasil.

128
Apêndice 2- Respostas das entrevistas – Ins-
fatos políticos do momento, entendeu? Então eu
tituto Zuzu Angel
acho que isso foi o pioneirismo dela. Importante”.
1) Resposta Hildegard Beatriz Angel Bogossian,
Jornalista, filha de Zuzu Angel e presidente do
Instituto Zuzu Angel – Realizada em 30 de janei- 2) Resposta Simone Costa Avila- Museóloga
ro de 2020, 4 minutos e 20 segundos: responsável pelo acervo documental do Instituto
Zuzu Angel – Realizada em 25 de abril de 2019,
“A moda foi um instrumento a que a Zuzu recor-
3 minutos e 42 segundos:
reu num momento de grande angústia, desespe-
ro, quando soube, efetivamente que meu irmão “Eu acho que a Zuzu rompeu barreiras. Acho
havia sido assassinado e torturado barbaramen- que ela foi a primeira designer de moda a utilizar
te, foi um instrumento a que ela recorreu para fa- a moda como essa ferramenta de manifesto. Eu
zer essa denúncia internacionalmente. Então... A acho que antes disso, ela mesma fala em alguns
moda... Se ela fosse pintora seria uma pintura, se relatos, antes de sentir na pele, o desapareci-
ela fosse dramaturga seria uma peça de teatro, mento do filho, a questão do filho envolvido tão
se ela fosse uma compositora seria uma música. politicamente né? E numa época tão repressora,
Como a arte dela, como ela se expressava artisti- ela dizia que ela fazia para peças para ‘dondoca’
camente através da moda, ela resolveu rompen- para ‘damas da sociedade’ e ficava ali naque-
do todas as expectativas, porque, nunca se havia les recortes olhar... não europeu, porque a Zuzu
feito isso, ela resolveu contar a sua tragédia atra- sempre foi muito brasileira no que ela produziu,
vés da sua moda. Se vestiu de luto, colocou um ela sempre foi muito...fez um moda originalmen-
anjo no pescoço, cruzes na cintura e fez da moda te brasileira e muito nossa e muito alegre. Mas
uma bandeira de denúncia das arbitrariedades eu acho que o grande marco foi o desapareci-
que eram cometidas no Brasil naquela época. mento do Stuart, a questão do envolvimento do
Historicamente, não se sabia de um desfile de Stuart, foi onde ela viu que a partir do que ela
moda de um estilista que tivesse conceitualmen- fazia, do que ela produzia ela tinha como fazer
te usado a moda como instrumento de denúncia como esse design dizer além, além de ser uma
política. Há na história, várias ações políticas na roupa bonita, eu tenho que falar alguma coisa,
moda...porque a arte é política né? Então você eu tenho que passar alguma mensagem, uma
vai lá na revolução francesa, quando as mulhe- mensagem do que está acontecendo com os jo-
res começaram a usar uma fitinha vermelha no vens nesse país nesse momento de repressão
pescoço com aqueles vestidos diretório, porque total. Então eu acho que ela foi sem dúvida a
aquela fitinha vermelha no pescoço era um de- precursora e com os traços, como eu até tinha
boche, uma ironia em relação à decapitação da comentado com você, nos bordados ela mos-
Maria Antonieta e você vai, você vai encontrando trou isso, firmes mas suaves e alegres. Ela nun-
fragmentos, referências, de política na moda ao ca deixou de botar cor em nada, ela nunca foi
longo de toda a história, mas não uma coleção fúnebre no que ela apresentou, pelo contrário.
conceituada como uma coleção de denúncia, de Ela conseguiu colocar cor, apesar de toda a dor,
protesto político. E hoje, de certa forma foi um ca- exceto no vestido de luto dela. Aquilo era ela,
minho que ela abriu. Porque hoje nós vemos a ela fez para ela, não fez para ninguém ali. Era
moda, hoje, já tem alguns anos, não muitos, que o luto dela, ali ela exteriorizou o que ela real-
a moda expressa politicamente, em termos de mente estava sentindo por dentro, eu estou aqui

129
assim, olha, dessa forma e colocou as fitinhas siva, porque poderia ser uma coisa agressiva.
pretas nas meninas no desfile. Mas ela de forma Ela contou uma história ali extremamente sofri-
nenhuma colocou essa tristeza, essa amargura da, absurda, de uma maneira poética entendeu,
em nenhuma peça dela. Então eu acho que isso porque você olha aquele vestido ainda te passa
é muito genial, isso é muito da responsabilida- uma coisa não agressiva. Então o que eu acho
de do designer, da estilista que ela era, que ela interessante mesmo dessas peças muito fortes
sempre foi, que é até hoje, porque ela é atem- e ligadas a esse momento pós morte do Stuart,
poral. Você pode usar qualquer uma daquelas por exemplo, aquela estampa do vestido andori-
peças agora que você vai sair lindíssima”. nhas, é muito forte, são andorinhas pretas com
sangue escorrendo, quer dizer, então eu acho
que é uma estamparia que tem uma mensagem
Resposta Manon de Salles Ferreira – Coordena- fortíssima também. O que eu achei interessan-
dora do Instituto Zuzu Angel, responsável pelo te é que são peças fortes, emocionantes, que
acervo têxtil e Indumentária – Realizada em 24 a gente vê, quem viveu aquele contexto políti-
de abril de 2019, 4 minutos e 56 segundos: ca, mas com uma coisa singela ainda. Aí que
eu acho importante o papel do designer, porque
“O que eu vi trabalhando com o acervo é que,
tem uma harmonia, tem uma estética, tem uma
claro que teve essa importância dela a partir
beleza em cada estampa, eu acho que ela con-
desse desfile protesto político, o momento que
seguiu, apesar de toda a dor que ela passou,
a gente estava vivendo, significou tudo aquilo,
trazer essa leveza, não é nem leveza, essa po-
foi o primeiro desfile de protesto eu acho que na
esia ali, porque são peças assim, principalmen-
história da moda, mas o que eu vejo também,
te a modelagem também, ela tinha um trabalho
então isso meio que sempre ficou à frente do
que ela sempre gostava de valorizar o corpo da
trabalho dela, mas o trabalho dela enquanto de-
mulher brasileira, as curvas, cintura no lugar, en-
signer, é fortíssimo, então principalmente em re-
tão a modelagem dela nunca saiu desse padrão,
lação às estampas e a essa brasilidade que ela
você vê que mesmo ela usando essas estam-
incorpora, então você vê em detalhes, como um
pas, esse tipo de protesto na roupa ela sempre
vestido de noiva feito todo com guardanapos de
manteve essa figura mais feminina do que uma
renda do nordeste, numa época que a gente es-
coisa mais agressiva, então eu acho que ela
tava saindo de estilistas como Dener, Clodovil,
conseguiu ali colocar política na moda dela mas
que era aquela moda afrancesada ainda, então,
sem perder o que ela já vinha fazendo desde
isso tudo eu acho muito forte. Mas a maneira de
sempre”.
ela se posicionar, algumas peças da coleção são
até emocionantes de a gente trabalhar com elas,
como o luto, que ela usava, aquilo virou uma ale-
2) Resposta Hildegard Beatriz Angel Bogossian,
goria depois do desfile, que ela continuou a usar
Jornalista, filha de Zuzu Angel e presidente do
socialmente aquela roupa, para marcar uma po-
Instituto Zuzu Angel – Realizada em 30 de janei-
sição política. Por exemplo, o vestido branco, na
ro de 2020, 4 minutos e 20 segundos:
verdade aquilo para mim é um texto, um vesti-
do texto, textual, você lê uma situação política “O pioneirismo que eu acho que eu vejo, foi a
de um país, e o mais interessante é que é de brasilidade na moda. Porque...não que os ou-
uma forma singela sutil, não é uma moda agres- tros estilistas não se inspirassem em coisas bra-

130
sileiras, se inspiravam, mas não faziam disso o Resposta Manon de Salles Ferreira – Coordena-
tema do seu trabalho. Nem nunca conceituaram dora do Instituto Zuzu Angel, responsável pelo
a brasilidade na moda, porque o Brasil era con- acervo têxtil e Indumentária – Realizada em 24
siderado cafona. Os sofisticados brasileiros con- de abril de 2019, 6 minutos e 08 segundos:
sideravam tudo que era do Brasil cafona, brega,
“Eu acho que o anjo, é por causa do nome dela,
jeca, então foi também romper uma estrutura de
eu acho que ela não tinha essa concepção ‘vou
pensamento equivocada sobre as coisas brasi-
criar essa peça, vou repetir essa peça, vou repetir
leiras. E isso ela fez com muita coragem, sen-
essa imagem, vou repetir esse símbolo, para que
do muito atacada, muito ridicularizada, mas ela
ele se torne frequente em todas as coleções’, eu
desafiou toda essa arrogância da colonização
não vi essa preocupação. É porque era uma outra
cultural brasileira, que os brasileiros tinham uma
época, como eu estava dizendo...mais de bouti-
colonização cultural francesa né? E ela desafiou
que e ela não era uma empresária, ela era mais
aqueles padrões de elegância convencional e
uma criadora mesmo, então eu não vejo essa re-
fez a moda brasileira, com as cores brasileiras,
petição, a não ser o anjo. O anjo está em várias
com os tecidos brasileiros, estampas, temática,
fases, em várias épocas, então... Essa visão de
o espírito do Brasil”.
mercado dela veio graças aos Estados Unidos,
pelas idas e vindas dela. Toda essa relação que
ela teve com os Estados Unidos: isso a Hilde já
Resposta Simone Costa Avila- Museóloga res-
falou em entrevista também algumas coisas que
ponsável pelo acervo documental do Instituto
ela antecipou aqui, essa linha casa, teve uma
Zuzu Angel – Realizada em 25 de abril de 2019,
outra coleção que ela fez mãe e filha também,
3 minutos e 20 segundos:
dentro dessa ideia de criar já uma história, a par-
“Ela era uma colecionadora nata, que pensava te toda de camisolas também, que foram feitas,
muito nos registros, documentava tudo, regis- então ela foi abrindo esse leque em função eu
trava tudo, fazia muitas anotações em todos os acho de uma visão mais americana de fazer essa
lugares, fazia anotações nos moldes dela, em linha de produtos, com essa influência de lá. Ela
rascunhos, tudo da Zuzu tem uma anotação tinha essa visão de mercado de marketing, des-
complementar, para complementar informações sas viagens e dessa relação que ela teve com os
sobre aquela peça, aquele registro, aquele mo- Estados Unidos. E assim, da parte de criação, o
mento. Você vê manuscritos dela em todos os que ela tinha também, um pouco avançado para
lugares. Ela era uma pessoa de manuscritos. a época, essa questão do aproveitamento das
Tanto em documentos, quanto na parte têxtil, em coisas, então, esses porta-copos, por exemplo,
pedaços de tecido, ela escrevia como deveria eram sobras de tecidos que fazia aquele crochê,
de ser. Era uma pesquisadora também, porque gerava o porta-copo... Aí tem porta-óculos tam-
gente tem revistas, livros que ela buscava como bém, as Zuleiquinhas, que na verdade elas do-
fonte de inspiração, obras de arte que ela bus- avam. As Zuleiquinhas ela não fazia, ela doava
cava como fonte de inspiração, como se ela sou- o tecido para uma senhora que ficava no centro
besse da importância dela em algum momento de uma praça em Belo Horizonte. Ela mandava
posterior. Ou então, até que ela não sabia, mas o saco de retalhos para essa senhora, para aju-
ela tinha essa intuição que isso era importante da-la. Aí ela fazia essa bonequinha e vendia. Aí
registrar e guardar, que seria importante”. quando a Zuzu foi assassinada as pessoas co-

131
meçaram a fazer as doações para a Hilde como 4)Resposta Simone Costa Avila- Museóloga res-
solidariedade e tudo isso e aí as pessoas foram ponsável pelo acervo documental do Instituto
doando essas Zuleiquinhas. A Hilde nem sabia Zuzu Angel – Realizada em 25 de abril de 2019,
que tinha essas Zuleiquinhas, o que a mulher 6 minutos e 57 segundos:
fazia com esses retalhos, entendeu? Então isso
“Sim, essas peças de coleção, ela fazia e vendia,
tudo é um trabalho de uma senhora que ficava na
fazia sob medida, por encomenda, ou na maio-
praça central de Belo Horizonte, fazendo, então
ria das vezes para venda. A Hilde conseguiu re-
ela tinha essa coisa de não estragar nada, então
cuperar muita coisa por doação, por coisas que
a gente vê que tem umas bolsas que ela colo-
a Ana Cristina (a outra filha dela) guardou por
ca as etiquetas que eram usadas nas coleções
muito tempo e depois passou para Hilde. Então
antigas para não estragar, então ela também é
as coleções mais antigas e as coleções emble-
bem precursora nessa história de colocar etique-
máticas não foi muito fácil recuperar. Não exis-
ta pra fora, que ninguém colocava, etiqueta em
tem mostruários e por isso que existe bastante
metro, na bolsa, então, tinha muito essa questão
réplica, que foram em sua maioria feitas para
também dos botões que ela reaproveitava, então
representar na Ocupação (Itaú Cultura, 2014),
acho que...ela tinha um pouco dessa visão ameri-
no filme (Zuzu Angel, 2006), para as pessoas
cana de fazer moda”.
terem uma ideia, pois nós temos bastante fotos
3) Resposta Manon Resposta Manon de Salles e documentos, tudo original, revistas e releases
Ferreira – Coordenadora do Instituto Zuzu Angel, originais, mas a roupa em si foi uma recupera-
responsável pelo acervo têxtil e Indumentária – ção mais difícil. A gente tem algumas coisas,
Realizada em 24 de abril de 2019, 3 minutos e mas não tem tudo. Tem as roupas que a Zuzu
36 segundos: vestia, sim, mas as roupas da coleção, foram
coisas que foram vendidas. Também tem muitas
“Eu acho que ela não parou nessa coleção,
coisas da loja. A gente tem bastante camiseta,
aqueles fragmentos que têm, aquela fita foi colo-
pois eram da loja, deu para guardar, mas es-
cada somente para a exposição do Itaú (2014).
ses vestidos, essas outras roupas foi mais difícil
Eles foram feitos depois, como ela foi assassi-
de manter e guardar. E fora que as roupas da
nada, ela não conseguiu realizar peça nenhuma
Zuzu, eram roupas que fizeram muito sucesso,
com aquilo. Tem gola também, você chegou a
que as pessoas queriam ter, representava uma
ver? Então eram estudos para outras peças que
certa posição social você ter alguma roupa da
não foram realizadas. Eu acho que o bordado
Zuzu. A gente recebeu de doações de pessoas
foi também interessante, até porque é uma coisa
um vestido de noiva e um outro vestido também
por si só que já é delicada. Para falar de uma
de outras coleções que não as coleções 4 e 5,
coisa tão dura, foi uma opção. Mas, porque já
que falaram que o sonho delas era ter peças da
está fazendo a ligação com esse grupo de bor-
roupas da Zuzu e por isso mantiveram até hoje,
dados agora. Mas eu acho que na estamparia
que não tem mais onde guardar, os filhos não
também ela colocou muitas situações de protes-
querem e doaram para nós. Mas são pessoas
to, que de repente, não entra nessa pesquisa.
que conheciam a história, conheciam todos o
A gente pode procurar e organizar melhor que
contexto. Estão muito conservadas”.
tem mais dessa coleção. Eu acho que não foi só
nessa, acho que ela tentou continuar, mas acho
que é um recorte interessante de bordados”.

132
Resposta Manon de Salles Ferreira – Coordena- a gente abre uma peça, você pode ficar um mês
dora do Instituto Zuzu Angel, responsável pelo pesquisando, seis meses pesquisando, então,
acervo têxtil e Indumentária – Realizada em 24 como o volume era grande e a gente tinha um
de abril de 2019, 6 minutos e 19 segundos: prazo de entrega, a coleção tem em torno de 600
peças, fora documentos, o foco era a gente fazer
“Como são peças que pertencem a várias cole-
a conservação e documentação, por isso que a
ções, a gente levantou de qual coleção a peça
gente abre espaço para pesquisadores, porque
era. Se a gente entrar no sistema, vê de qual
tem muita pesquisa a ser feita, uma delas que a
coleção a peça era. O critério foi: tinha o gran-
gente está fazendo, comecei a fazer por estam-
de guarda-chuvas Zuzu Angel e a gente ia ca-
pas e a próxima vai ser por coleção, encaixar as
talogando por peça. Algumas peças que têm a
peças que tem de cada coleção. Por que a gente
mesma estampa por exemplo ‘São João’, vesti-
tem que levantar esse registro, porque tem coi-
do com estampa ‘São João’, bolsa com estam-
sas um pouco confusas, às vezes peças que co-
pa ‘São João’. Os que tinham identificação de
meçam numa coleção e que são replicadas na
data, de desfile, de coleção a gente colocava
outra, são repetidas, que são vendidas depois e
na ficha. A Hildegard já tem essa coleção des-
voltam. Tem que resgatar essa história.
de o assassinato da Zuzu e ela vem a tempos
tentando organizar de uma maneira melhor.
Quando o Itaú veio com essa proposta da ex-
5) Resposta Simone Costa Avila- Museóloga
posição, eles tiveram essa contra partida, dando
responsável pelo acervo documental do Instituto
um auxílio nessa coleção Zuzu. Foi uma empre-
Zuzu Angel – Realizada em 25 de abril de 2019,
sa que desenvolveu um banco de dados com
7 minutos e 05 segundos:
todas essas especificações, uma equipe aqui
que foi fazendo todo esse levantamento histó- Existiu comercialmente, eu não posso te preci-
rico da coleção, roupas que ficaram na casa da sar. Pois eu ainda não consegui, eu tenho al-
Hildegard levantando arquivo documental, sepa- gumas coleções, do material que ela produziu,
rando, porque ela guardava bem, mas não com documentos das lojas da Zuzu, documentos de
uma organização museológica, depois teve uma vendas, que eu ainda não tive tempo de aces-
equipe que fez toda higienização dessas peças sar. O nosso maior objetivo é linkar todas essas
e outra equipe que fez a parte de fotografia e coisas, por exemplo: ‘Este vestido é o vestido da
depois conservação, guarda e organização das International Dateline Collection, essa é a nota
reservas. Era um desejo muito antigo da Hilde- fiscal da compra do tecido, este é o recibo de
gard e partir dessas parceria com Itaú, que era venda, este vestido foram feitos 100 peças, ao
pra ser prolongada, se não fosse a crise do país, tal preço’. Seria o próximo passo Isso faz parte
era para estar aberto inclusive o museu ao pú- de um nosso processo de catalogação que ainda
blico, a gente fez essa primeira parte que era não existe, fazer essa grande conexão. Primeiro
o que, proteger essa coleção, então agora ela nós temos que catalogar e identificar todas es-
está toda catalogada, higienizada e nesse espa- sas peças, até porque a nossa prioridade é de
ço com condições adequadas, controle de umi- conservação, por que você tem que tratar logo
dade, temperatura. Mas a parte de pesquisa a da peça antes que ela se deteriore, não posso
gente tem que voltar algumas vezes, porque o deixar posterior. Então nem tudo a gente pode
foco não era a pesquisa, porque cada vez que fazer como a gente gostaria”.

133
Resposta Manon de Salles Ferreira – Coordena-
dora do Instituto Zuzu Angel, responsável pelo
acervo têxtil e Indumentária – Realizada em 24
de abril de 2019, 6 minutos e 19 segundos:

Era uma época diferente também, de você fazer


desfile e venda, era vamos dizer mais amador,
não é como hoje, que a partir daquela coleção
há um plano de venda. Era um estilo mais bouti-
que nos anos 70, era uma produção mesmo que
prêt-a-porter, era mais controlada, então não
tinha esse sistema de hoje, mas acho que era
tudo muito vendável, não é que tinha uma parte
de roupas que eram só para desfile e depois era
desenvolvida uma coleção adaptando, como a
gente vê hoje em dia, a roupa dela acho que era
bem vendável. Em 1973 a quando Zuzu abre a
boutique no Leblon, onde fica até 1976 quando é
assassinada. E para essa loja ela tinha uma pro-
dução mais seriada, que antes não tinha tanto
antes, camisetas e depois parte do estoque veio
para cá (instituto).

134
APÊNDICE 3- TERMO DE CONSENTIMENTO – INSTITUTO ZUZU ANGEL

135
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Concordo em participar, como voluntário, do estudo que tem como pesquisador responsável a
aluna de pós graduação Fernanda do Nascimento Cintra, do Programa de Pós Graduação em
Design Stricto Sensu da Universidade Anhembi Morumbi, que pode ser contatada pelo e-mail
fernandancintra@gmail.com e pelo telefone (19) 99220-2935. Tenho ciência que o estudo tem
em vista realizar entrevistas com pesquisadores e ativistas envolvidos com o tema, visando, por
parte da referida aluna a realização da sua dissertação intitulada “Design e conspiração:
bastidores entre Zuzu Angel e linhas de Sampa”. Nossa participação consistirá em conceder uma
entrevista que será gravada e transcrita, realizando também registros fotográficos da pesquisa
de campo e dos encontros produzindo imagens que serão posteriormente usadas na publicação.
Entendo que esse estudo possui finalidade de pesquisa acadêmica, que os dados obtidos não
serão divulgados, a não ser com prévia autorização, e que nesse caso será preservado o
anonimato dos participantes, assegurando assim nossa privacidade. A aluna providenciará uma
cópia da transcrição da entrevista para meu conhecimento. Além disso, sei que podemos
abandonar nossa participação na pesquisa quando quisermos e que não receberemos nenhum
pagamento por esta participação.

Manon de Salles Ferreira

Rio de Janeiro, Abril de 2019

136
137
APÊNDICE 4 – PERGUNTAS DAS ENTREVISTAS COLETIVO LINHAS DE SAMPA

Entrevistadora: Fernanda do Nascimento Cintra. São Paulo, 2019, 2020. Arquivos .mp3.

1) Como surgiu o Coletivo Linhas de Sampa, foi uma continuidade do projeto Coletivo Linhas
do Horizonte?

2) Como funciona o Coletivo Linhas de Sampa?

3) Quando fazem encontros em lugares públicos, precisam pedir autorização?

4) Como surge a verba para comprar bastidores, linhas e materiais?

5) Quando estão panfletando, ou bordando gera curiosidade nas pessoas, como é a interven-
ção, faz com que mais pessoas tomem conhecimento de assuntos?

6) Qual a profissão dos membros do Coletivo?

138
Apêndice 5 – Respostas das entrevistas Co- Rio de Janeiro e a Lenira Machado, de SP. Elas
letivo Linhas de Sampa conversaram sobre a importância de expandir
as Linhas para outros lugares e caberia às duas
1) Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de
integrantes que estavam o Rio e em SP, criar
Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
um coletivo. A partir daí, a Lenira chamou uma
de 2019, 19 minutos e 12 segundos:
conversa aqui em São Paulo, a Telinha chamou
“Tudo começou com o Linhas do Horizonte (LH). uma conversa no RJ e assim nasceram: Linhas
No passado, durante Fórum Social Mundial em de Sampa, Linhas do Rio, depois disso, vimos
Salvador, três integrantes das LH que estavam tendo conversas em outros lugares, por exemplo
lá para diferentes atividades, se reuniram e de- em Santos e Caraguatatuba, onde os coletivos
cidiram que estava na hora de expandir as Li- se instalaram. Em Itu, o coletivo não vingou”.
nhas para outros lugares. Foi o que aconteceu.
2)Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de
Então, a partir dali, a Lenira Machado, que mora
Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
em São Paulo e a Maristela Pimenta, que mora
de 2019, 19 minutos e 12 segundos:
no Rio, voltaram para suas cidades com a ta-
refa de tentar encontrar quem se aventurasse “Então, nós funcionamos mais ou menos assim:
a criar um coletivo de bordados. E aqui em SP, nós temos uma agenda que é discutida numa
na primeira conversa que tivemos em abril de reunião de periodicidade mais ou menos men-
2018 éramos 7 pessoas, hoje somos 68, 1 ano sal. Reunimos as bordadeiras e os bordadores
e 4 meses depois. Foi uma experiência mui- e cada um vai trazendo as demandas dos seus
to bem sucedida, do pouco tempo que nós te- coletivos e as demandas mais gerais. O pessoal
mos eu acho que o espaço que conquistamos, da saúde traz as demandas da saúde, o pes-
a inserção que tivemos em diversos momentos soal da educação traz as da educação e os co-
da vida política nacional, foi muito legal. E ago- mitês dos coletivos que lutam por democracia e
ra a iniciativa já se desdobrou para Linhas de pela liberdade do Lula trazem também as suas
Santos, que acabou de ser criado. Em julho fi- pautas e aí nós vamos decidindo no conjunto.
zemos uma conversa com as companheiras Por exemplo, tivemos uma reunião semana pas-
santistas que estavam querendo criar um cole- sada (dia 6 de agosto) e ali nós decidimos que
tivo lá e a partir dessa conversa já nasceu Li- naturalmente viriamos para esta manifestação,
nhas de Santos, um grupo bem legal mesmo, que faz parte das pautas mais gerais, as quais
já está trabalhando e bordando em público na apoiamos. Nós temos diferentes formas de atua-
semana Tereza de Benguela, por exemplo”. ção: oficinas, rodas de bordado na rua, participa-
ção em manifestações. No momento temos dois
Resposta membro do Colegiado do Coletivo Li- convites para realização de oficina de bordados
nhas de Sampa – Realizada em 14 de abril de na periferia: uma no Campo Limpo e outra na
2020, 2 minutos e 34 segundos: Chácara Santa Maria, pra lá do Capão Redondo.
Então são oficinas de bordados que nos pedem
“Sobre o Fórum Social Mundial: Três integran-
para fazer. Fizemos uma oficina no Instituto Fe-
tes do LH que estavam no FSM para diferentes
deral de
atividades, fizeram uma reunião. Eram a Leda
(Leonel), de Belo Horizonte, uma das coordena- Educação, no projeto Pertencer, que reúne e
doras do LH, a Telinha (Maristela Pimenta), do abriga crianças filhos de imigrantes, bolivianos,

139
colombianos, paraguaios, que estão ali na região o parque da água branca, nós bordamos uma
do Canindé. Foi uma oficina maravilhosa, porque única vez lá. Estava tendo festival do Morango
o bordado já faz parte da infância de muitas des- e um dos organizadores veio conversar e falou:
sas crianças, principalmente bolivianas, cujas ‘vocês estão vendendo produto?’ Nós respon-
mães e avós já bordam. Para eles essa oficina demos: ‘nós estamos dando’. E eles falam, que:
foi uma coisa muito natural e também emocio- ‘então tudo bem’. Porque o parque é público,
nal, pois eles têm uma referência. Outra forma então, realmente se você for comercializar que
de atuação é a participação em manifestações tem algum impedimento. Na Paulista também,
onde uma multidão se reúne e nós não temos a Paulista é aberta para qualquer iniciativa nos
como bordar. Já levamos os bordados prontos domingo. Nós começamos fazendo bordados no
e fazemos o varal. Onde existem as condições último domingo no mês, sempre no último do-
para bordar, fazemos uma roda de bordado que mingo. A gente variava de horário e lugar, pois
reúne as bordadeiras, os bordadores e as pes- achava que tinha que ter um rodízio. Quando
soas que quiserem podem se juntam e também começaram os mutirões Lula Livre, são todos os
bordar. Nós sempre carregamos um kit, que cha- últimos sábados e domingos do mês, nós acha-
mamos de kit oficina e ali tem linha, agulha, teci- mos que não dava para fazer as duas ativida-
dos e outros apetrechos e oferecemos pra quem de juntas e nós passamos então para o terceiro
quiser bordar com a gente. Se quiser aprender, domingo do mês. Na última vez foi no parque
vai aprender, se já sabe, vai bordar com a gente. da Água Branca. Para este mês, nós ainda não
Para o funcionamento interno do grupo, temos resolvemos onde vai ser. Este mês de agosto
dois grupos de WhatsApp, um, dedicado nós ainda não decidimos. Quando é decidido, a
gente joga nas redes sociais”.
exclusivamente ao funcionamento das Linhas
de Sampa, que é o bordado, o que bordamos, 4) Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de
onde bordamos, que convites nós recebemos e Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
quais vamos aceitar. Um outro grupo é o Linhas de 2019, 19 minutos e 12 segundos:
Antenadas que existe para questões gerais, pra
“Nós somos totalmente autofinanciadas. Quan-
abrir o coração, mandar parabéns para quem faz
do você vai entregar o bordado, tem gente que
aniversário, transmitir alguma coisa de política,
quer pagar de qualquer jeito, a pessoa briga com
informações etc. Nesses dois grupos é que a
você ‘eu quero pagar, vocês gastaram linhas, te-
gente resolve as coisas. É ali que colocamos as
cido’”.
atas, as memórias das reuniões...”.
Nós não aceitamos dinheiro, mas se você qui-
3) Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de
ser doar linha, agulha, tecido, nós aceitamos, é
Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
uma troca. Então por exemplo, nós fizemos uma
de 2019, 19 minutos e 12 segundos:
oficina na Fiocruz- no RJ e foram as três Linhas:
“Nos locais públicos a gente não pode ser im- Horizonte, Sampa e Rio, ali o grupo da Fiocruz
pedido de usar. Só é impedido de usar se você doou material também. Então as meninas volta-
for vender coisas lá dentro. Como o nosso pro- ram com alguns metros de algodão cru. É uma
jeto não é de venda, nosso projeto é de doação troca, por exemplo: agora a mãe de uma ami-
de bordados, são panfletos, então isso não tem ga minha faleceu, ela já começou a mexer nas
impedimento nenhum. Quando nós fomos para coisas da mãe e já me mandou uma foto das

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linhas tal: ‘vocês querem?’ eu falei ‘claro que nós 6) Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de
queremos’. Então já vem uma doação aí. É isso. Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
Na verdade, se você pensar, nosso custo não é de 2019, 19 minutos e 12 segundos:
alto. Por exemplo, este folheto tem mais ou me-
“Não temos ninguém bordando profissionalmen-
nos 12cmx12cm. Um metro deste algodão custa
te. Temos diversas bordadeiras na ativa e outras
R$ 7,00, tem 1,40m de largura e rende bastan-
aposentadas das áreas de educação, saúde,
te. Nosso custo não é alto e com as doações, a
serviço público em geral, jornalistas, publici-
gente se auto paga. Quando nós fazemos reu-
tários. São de diferentes profissões e áreas. E
niões são em lugares que nos apoiam ou nós
é dessa atuação que trazem as pautas para o
apoiamos a causa. Já fizemos reunião no Coleti-
Coletivo que posteriormente pode virar tema de
vo Digital, fazemos no GTA que é o grupo técni-
bordado. Algumas tem tarefas específicas como
co de apoio. A gente não tem custo na verdade
a Lenira, que borda muito pouco, mas é a articu-
sabe? Nós não temos uma sede nada disso. A
ladora política; eu, bordo menos do que gostaria,
nossa conversa é no WhatsApp e uma vez por
mas cuido mais do operacional pra garantir que
mês nessa reunião geral que a gente faz é isso”.
a atividade aconteça. E atualizo o Facebook e
5) Resposta do Colegiado do Coletivo Linhas de do Instagram”.
Sampa – Entrevista Realizada em 13 de agosto
de 2019, 19 minutos e 12 segundos:

“Nós fizemos uma roda de bordado aqui no MASP.


O fato de ter um grupo bordando atrai a atenção
das pessoas. Então nós temos diversas borda-
deiras que se incorporaram ao grupo porque nos
conheceram na rua, conheceram a proposta na-
quele momento, nós contamos um pouco o que é
a proposta, o que a gente borda. Então a pessoa
diz que quer participar, então solicitamos que a
pessoa vá no Facebook, leia nosso manifesto e
se a pessoa se considerar de acordo com o ma-
nifesto, então você vai se incorporar às Linhas.
Então porque assim às vezes as pessoas dizem
assim ‘eu quero fazer parte do coletivo tal’. Nós
respondemos ‘nosso coletivo borda por temas de
esquerda, Lula Livre’. Ai a pessoa fala ‘Ah, Lula
Livre não’. Então explicamos porque assumimos
a bandeira e porque a defendemos nos bordados.
Neste caso específico, argumentamos que a nos-
sa defesa da democracia, o nosso entendimento
é que não há democracia enquanto o Lula estiver
preso. E assim fazemos com todos os temas, pro-
curamos conversar e argumentar com a pessoa
sobre nosso posicionamento”.

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Apêndice 6- Termo de consentimento – Coletivo Linhas de Sampa

142
APÊNDICE 7 – AUTORIZAÇÃO DE USO DE IMAGEM

143
este trabalho foi desenhado em arial
regular, arial bold e arial bold italic por
fernanda sanovicz | outubro de 2020.

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