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Vocês

É que já estão longe, há um mar que nos separa


Mas o que nos separou foi o tempo. Quando vos penso, repenso a tudo o que uma vez fomos.
Amigos, brigas, verões na praia e sentimentos. Quando sulquei os céus não imaginei que fosse
tanto mato. Vocês não fazem ideia da saudade que tenho da agua. Porque fazem um menino
que é do mar amar o mato com tanta violência? As vezes paro e penso, o quanto vocês hão de
se banhar, enquanto eu me banho de escrita e de nostalgia. Separei-vos como uma lembrança
qualquer numa gaveta, mas não há uma lembrança sequer que não me tormenta. Aqui tem
pássaros aos borbotões, enxurradas de capim, ratos do tamanho de um cachorro, pessoas que
aprendem a apreciar. Aprendi apreciar também, vocês deveriam ver, quão perito me tornei
em escutar. Mas não quero falar de mim, lhe envio esta carta porque queria que vocês me
falassem mais sobre o mar. Sobre quem nos separa. Família, trabalho, dois filhos, desilusões,
que mais??
Que mais?? Eu nem do italiano pude me separar, fiz a má escolha de querer ensinar e agora
me encontro a escrever essa carta que nunca vou enviar, e se eu fosse, vocês não iam
entender, porque nem falam essa língua, língua da minha mãe, língua que eu estava obrigado
a amar, língua a quem estava obrigado. Vocês não compreenderiam, e digo, não é do meu
interesse que vocês compreendam, há uma enorme distância agora entre nós: filhos, trabalho,
casamentos e a vontade de continuar. Eu prometi, sei que prometi, mas agora vocês vão me
culpar das promessas que não cumpri? Quando minha promessa foi que voltarei sim voltarei
para vos encontrar, mas o que posso fazer com a promessa do fado que esse mato havia de ser
meu lugar. E eu o odeio, juro o odeio, porque não o sei contemplar! Me falam de pássaros,
tem casais de pássaros que cantam nos coqueiros sua paixão, só nos coqueiros, eu os odeio, os
odeio porque são lindos e eu continuo solteiro, tem pássaros, pássaros que cantam o dia
inteiro cantam e não param de cantar, eu vivo no meio da cantilena enquanto sou silencio
destoado entre o mato e mal amado e não sei cantar, vocês sabem que eu não sei, mas essa
terra canta, canta, grita e lhe dói a garganta e eu sou terra do mar, sou terra molhada, sou
terra afastada da vontade de voltar, sou terra desesperada, sou terra enfeitiçada pelo
mediterrâneo e medi o terral que nos separa e descobri que o tempo é quem devemos culpar,
o tempo e o nosso coração, que desistiu de relembrar. Minto. Minto. Minto. Nunca esqueci do
vosso sorriso, nunca esqueci dos nossos passeios, nunca esqueci das pedras lançadas no mar,
nunca esqueci as calçadas, sentados, amigos, a devanear. Eu esqueci, esqueci-me de mim, da
parte que prometeu se afogar, nessa separação se preciso fosse, para até vocês voltar. Eu não
menti para vocês, eu menti para mim. Agora a cantilena me acalenta, agora o mato em mim se
acrescenta e faço da arvore que tinha que virar barco, raiz e me enraízo aqui, aqui, aqui, longe
de vocês, mais perto de mim. Não há o que entender, não há porque chorar, eu não hei de
voltar para ficar, eu não eu de ficar, porque dói as raízes cortar, vocês acham que eu não
estaria sujeito a amar? Pois apareceram mais, e igual abracei vocês, precisei abraçar. E abracei,
este foi o meu pecado? Nunca esqueci, mas procurei na solidão que sentia de vocês,
preencher o que ficou vazio quando sai do vosso meio. E esse meio aqui, esse meio de terra,
de mato, de arvores pra vocês de samba pra me de chico, de pagode e de poesia, se encravou
em mim e eu não soube largar. Se eu largasse, de novo, de novo como já larguei vocês, como
já me abandonei, agora haveria de me matar. Perdão, o que nos separa é o mar, o que me
separa é a vida porque há morte de mais em recomeçar, e eu já morri uma vez por vocês, e
vou levar o luto até minha tumba, que não posso suportar morrer outra vez.
Azul

Há um coiso azul na sala


Em cima cobre, uma toalhinha
Em baixo um copo velho
É um coiso cheio de agua
(E de agua se carrega)
Serve para toda nossa sede
Quando estamos com sede
Quando estamos com seco

Há um coiso azul em mim também


Desprivado foi do seu azul
Azul ficou só o botijão
Mas não há azul, ele adentro
(E vazio se carrega)
Serve para toda minha magoa
Quando saudoso estou da agua
Quando o seco em mim desagua

Há lembranças da terra quente


Em cima azul impossível
Em baixo azul de sal, banhado
É lembrança cheia de água
(E nos olhos se carrega)
Serviu de chão para que eu florisse
Quando enraizei no areal
Regado do mediterrâneo
Fui arrancado ainda jovem
Fui arrancado do jovial
Há muito azul aqui que morre
E só a aridez que se espraia
Estou plantado no sabiá
Na capivara e no medo noturno
Estou regado de sol, de barro e capim
E de azul há só as araras
E o vazio das bordas lembrando
Do tão azul que já fui em mim

Narcisismo

Desbotoa camisa, abotoa o ego


Vista-o bem. E o batom?
Vivaz meu bem, vivaz!
Desbota o outro com seu tom
Quero o som, o palco o violão
Me vê tudo!
Toca um dó sustenido!
Sem dó meu amor, sem dó
Não é para plateia!
Você é sua LIBIDO!
Precisa ser bem enfeitiçada
minha linda poesia
Não se vide de arte!
Mas só dum bocado de curtidas

O mundo está em guerra

O mundo está em guerra


Ai de vós que não percebeis
Hei de vós que em nós morreis
Falam de amor, mas amor não há
Falam de ousadia, mas o poder feneceu
Falam de otimismo, mas o sorriso enrijeceu
E ousam falar, quando nem mãos aprenderam usar?
O mundo está em guerra, e nós?
O mundo está uma guerra em nós.
Desde a primeira guerra existe
A terceira sempre foi a guerra da voz
E todo mundo grita, mas ninguém escuta
Todo mundo ordena, mas ninguém recruta
É o caos da intolerância justificada na impaciência
Impaciência de quem está cansado de ver dor
Sem ter dor na sua vivencia
E atrás do seu teclado grita com toda sua veemência
O mundo está em guerra
Haveis de participar, o mundo está em guerra
Correis para não se calar
O mundo é sua guerra e guerra quereis guerrear
No conforto de não poder sair
Para lá fora ter que realmente lutar
O mundo está em guerra e sempre esteve
Você?
Ficou no demasiado distraído
Teclou, no seu teclado carcomido

Cessou, pensou, agora cessou, não viveis em tempo de guerra


Viveis em tempo de paz, festa e a procura do amor
Não há guerra, se cegueira faço do seu horror
Mas agora ei-la inevitável, agora apedreja o intolerável
Agora briga para o que é instável, agora luta, luta!
Que há guerra lá fora e é maleável
Agora que descobriu pedra na mão, e dentro de casa apedreja
E mata, o que tu considerar apedrejavel
O mundo está em guerra, mas outra guerra há entre vós
Não é a guerra do opresso, é a guerra do avestruz
Que arrancou a cara da terra
E agora toma partido, corra! toma seu partido
Não deixe de se opor, sempre houve guerra
Mas de vê-la fostes inibidos, portanto corra, rápido!
Aponta rápido seu dedo, pra mostrar que está na luta
E és corajoso e não tem medo!
É a guerra esquelética do fim do mundo
Precisamos saber que na trincheira estas conosco
Tecla tecla tecladinho! Manifesta que eu sou oposto!!
Enquanto da trincheira feita de corpos eu tiro foto
Da indignação estampada no meu rosto
Não vos culpamos agora, não vos culpamos pelo atraso
Não vos culpamos porque ontem dessa guerra fazíeis descaso
Não culpamos porque na batalha não se estipula prazo
Mas escuta. Escuta o chamejar do mundo e seu abraso
Escuta o estralo dos ossos feito lenha queimando no ocaso
Seja do dia, seja da rua, seja dos corpos putrefazendo na rua
E não traveis guerra entre vós, com seu teclado lá na lua
Apontando quem não é digno de voz ou quem é merecedor do título de algoz
Não grita HÁ GUERRA na rede-louca! Saia da concha para guerrear
E se preciso for morra.
Pois foi assim que na guerra, quem realmente lutou, aprendeu respeitar

Adeus

(mãe, para a velhice que inevitavelmente te alcança)


Está cedo para um adeus
Um beijo não basta
Nem basta um sorriso seu
Se você de mim for tirada
O que restará de meu

Pois o tempo é breve


Para te amar como deveria
E você é já velha e leve
Pronta para voar além
do abraço que a gente não teve
[e que agora não teria.

O dia é curto, e nele não basto


Queria amor, mas dele me afasto
O punho fecha o dente range
O amor é demasiado e também me constrange
A lagrima escorre se penso longe
[não quero adeus, pois ele plange.
Quanto o compasso passeou
E quanto dele resta
Quanto amor é preciso
ou quantos beijos na testa
Para que nosso adeus seja sorriso

Se adeus for hoje, não peça perdão


Se adeus for hoje, não estique a mão

Se a Deus for, que Ele seja em vão

Nunca haverá amanhã para nosso amor


Ele não coube ontem, e é demasiado agora
não haverá adeus, se adeus for

Sem
É um arrepio abstrato
Arrepio arredio
Inane do contato
Mas compacto.
Ausente na pele
Epiderme, pelo-mato
Mas presente de fato
Foi-se no sentido
Esbanjou no olhar, no ouvido
Caso foi papel
Cutucou o olfato
E ao não ser palpável
enfim, provocou seu tato
Chorou
É poesia

Me expresso melhor em poesia


Acolchoar,motim,, rizomatico, congraçar, bagaço, irmanar, frívolo, pusilânime, obscurantismo,
cordato, quintessência, placebo, análogo, gorjear, surrupiar, sinestesia, lirismo, postiço,
deveras, bruma, inanição, ensimesmar, apatetado, confluência, equinamidade, feérico,
bruxulear, dialética, antítese, gangorra, nuance

E o que se dizia, é verdade, acolchoei minha letra com um punhado de insanidade. Não é cria,
é motim, essa libido-escrita pelo que vai além. Cadê? A mim não se subjuga, já disse, ela não é
escrava, é fuga. Corri atrás dela, noite e dia incansavelmente procurando nela uma rima, me
disse que não tinha: ofereceu-me sua bruma. E me perdi. Me perdi nela na confusão da letra
com a qual brigo e me desfaço e depois da briga, e haja de briga das unhas que cravei nela,
sobra tinta, mas de mim sobra só o bagaço. Sim, é o que se dizia: que não havia jeito para fazer
dela esposa, para eu ser dela e ela ser minha. Essa é amante infame, corri atrás dela no sol, na
chuva, no capim, nas vielas de Roma, e numa cama bagunçada. Até no meu gato, quando se
aconchega em mim, como se eu fosse sua almofada. A procurei para traze-la ao meu peito,
mas fui lacaio para minha amada. Corri, de novo para pedi-la em casamento, penso: se a
surrupiar, encontra-la adormecida, ou distraída no seu assento, ensimesmada em pensamento
na sua vestimenta infinita, na sua boca jamais mordida, no cansaço da nossa corrida, haverá
esperança, de acalentar meu lirismo, de apaziguar minha inanição, de prender seu dedo casto
numa aliança. Me ama. Peço. Não me responde, ela corre até que eu caia em lama, postiço.
Olha como fiquei: apatetado por ela, me apetitei dum bocado de porquê. E agora é meu
pesadelo e também meu fado, me chame de odiado, sou escravo desse cansaço, da procura
incessante é que congraço, pois só uma vez a desejei como amante e não desejei outra, se
tornou paixão perpetuamente. A alcancei num deserto, mas de muitos almejos desmaiei.
Espraiado no nada, frívolo pra ela, enquanto a via dançar belíssima com sua sombra, e ela...
sorria? Era a sinestesia do milagre, era a verdade na miragem, ela era meu quadro, e eu era
paisagem? Passou por mim, sem ter cruzado, era calor, era frio, era todo tipo de enfado,
gorjeou uma canção impossível durante sua passagem e já babado que eu estava, pusilânime,
me apavorei, pois eu sempre corri atrás dela e nunca me aproximei e agora eu quase morto,
ela vem até aqui para fazer de mim o que eu nunca a tornei? Pois, sim. Sem vulto, macho ou
fêmea, eterna ou efêmera, nunca cobriu o sol, pois nela mesmo era luz, era também sombra,
era pó. E se desfez. Nunca foi minha, mas de mim ela se afez. Sonho feérico do qual acordei
mais uma vez, visão da qual me cismo pois dela nunca despertei. É sentido, é niilismo, é
verdade e também obscurantismo, é a confluência do partido e o indizível destraduzido, é o
mar, é o ocaso lido. Agora entende minha tortura? Não é a paixão pueril pela vida, não me
apaixonei pela despedida, nem me encantei pela procura. Sim, o que se dizia é verdade, e o
que se dizia continua sendo minha realidade, e também minha ilusão, confia, apaixone-se por
todo tipo de loucura, mas nunca tente amar a poesia.

Ego
O ego, o ego é grande, elefante. É de marfim, é de tatuagem, é de batom, é de mim. O ego
sente, é cabelo bonito arrumado no pente, é calçado fino, é cinco anos de aparelho, é sorriso
de mil dentes, o ego é carente de atenção, as vezes feroz, no demasiado complacente.
O ego cabe na palma da mão, de tão frágil que ele é, mas pede pra maquiar as unhas, o cabelo,
e o coração, o ego é exigente, e sempre tira o ego do são. O ego é indeciso; o ego é logo! As
vezes narciso, outras vezes é afogo. O ego é tudo que o ego diz que não é: descrente, mal-
educado, invejoso, cagado. Não, isso não! O ego milita para o necessitado, o ego admira os
outros e sua gente, o ego é sempre bem-comportado, o ego é perfume... você sente?
O ego é choro de repente. O ego é pavor! É enorme mas tem medo de rato, o ego é tolerante,
mas intolera o abstrato. O ego não pode ser achismos, tem que ser fatos! O ego é orgulhoso, o
ego é impiedoso, ele tapa os ouvidos, pois no ego e sua opinião, não há espaço para o
duvidoso.
O ego é surto, nunca curto; demorado. É desassossego, é narcótico pro anestesiado, é placebo
doentio pro ego ferrado.
Ah, o ego, ele é MARAVILHOSO. Segure-o firme na mão, trate de deixar o ego bem
aconchegado. O ego é tremente, porém é espadaúdo e se incha no seu jeito de ser, seja jeito
pungente, de prego, crivado tão profundo no apego, que se faz impossível desapegar. Prega
um quadro na parede, uma linda pintura de si, o ego também é pintor. Define os traços, define
as cores, e deveras, define o humor.

A rua é um atrativo
Disse a vadia com seu sorriso altivo.
Teclado
Para que eu dessinta a rapidez com a qual me sinto:
Revolvo até o aroma do absinto
Escrevo, teclo, recalco o dedo, longo ou seja; sucinto
Quando teclo, relevo, portanto minto
Mas se escrevo, teclo, o recalque intimo
do pesar que é tinto

nascimento
O mundo morre; duas vezes morre para antecipar outro intervalo
Eu nasço nesse desfecho, mas nasço morto e cresço ao avesso

O mundo morre uma terceira vez, há um genocídio no ar


O mundo se arredia, inclusive eu. E assim nasço

Gangorra
Não é vida, não é mundo, não é nem deus, é tudo -
[A quinta-essência do sentido
A nuance do descolorido
A razão no enlouquecido]
É diminuto se traduzido!
É eterno se reduzido!
“O perfeito é tão cândido...”
Mas há casto sem libido?
“Sou vivido, sou vasto! ”
Mas há o múltiplo sem vosso indivíduo!
“Não há barulho no silêncio”
Mas há silencio no ruído?
Percebe? É tudo, mas também não:
É híbrido, é homogêneo e também é foragido
É análogo compreensível, ao que deveras incompreendido
É a metade do ilimitado; é de estrelas só um punhado
É a verdade no fingido; é o vivido nas novelas
É na inercia principal, de quem sempre tem corrido
É antítese da tese, naquele urdir jamais tecido
É fosforo aceso; é palitinho carcomido
É a chama que não é mais
Mas meu cigarro tem ligado
E não há cigarro na minha mão,
mas de fumaça estou envolvido
Sobre a incógnita do desvão
Será gangorra no infinito?
É quase tudo, mas não é tão
Já sei!
É:

Minto
Compro um punhado de ansiedade
Ao custo de buscar notoriedade
Barbaridade, ceder ao instinto

Inexistir
Imperpetuemos, até que nos tornemos algo diferente
Serei oposto do que um dia fui, permanente.
Sou impermanência.
Mas havemos de carimbar a marca da nossa existência?
Impertinente.
Não fui jubilo de vida. Sou prova da insistência.
E assim persisto, e de não ser - consisto.
E haja d’isto: serei persistência

Não é anseio meu, devanear sobre o coração e seu íntimo.


Sou artista do ínfimo, sou limiar do abismo.
Não me interessa a essência de todos os achismos
Sou entulhado de impotência.
Vossa riqueza é minha inexistência

Poesia do sonambulo
E para que seja análogo ao primor que és, a beleza que lhe condiz. Darei eu quaisquer palavras
de consolo, para que encontre o conforto numas rimas que nada digam, ou ao menos
contemplem, ou numas narrativas que pouco resumem, ou abrangem tão pouco, que
mentem? Seria afetação do meu sentido, e indecência para contigo, e sua obra, e o que lhe
devo, e como lhe é devido. Para que retome, no tempo poente, antes de se pôr, se for me
dado o honorifico, de ser-lhe contiguo, no aspecto, no riso, no passo. Que não torne o costume
uma elegia, nem o teclado sobrecarga do meu anseio, que molde ao invés, com paciência e
ternura, o que é resguardado por trás do olho, feito bruma de lembranças na compreensão
infindável da sua pessoa. Personificação essa, que não caberá a nenhum escrito, pois é deveras
impossível tarefa, trazer a letra tudo o que foste, és, e sempiterna, terá de ser. Ser, tão
opacamente vislumbro, não é resumo, nem é sumariado na maior das enciclopédias. Ser, é,
transcendente e volátil, até quando deixa de. Quanto mais você, fonte do que me é mais
precioso, náiade, guardiã dos rios da minha brandura, e sol iridescente, que me é luz até nas
trevas espessas, deste furioso terral, ao qual me trouxeste, quanto mais você, serás enigma
dum perpetuo desvendar, que tão avassaladoramente palpito, no retinir da minha tecla, não
hei de desvelar, nem após sua morte.

Pajem
Meu pajem é muito amaneirado. Tenha sido ele afetado por mim, o pela carga do meu
armado, tenha sido afetado ele pela minha afetação. Pois em mim há um pouco dele, e nele há
trepidação. Prefere vinhos à nossa guerra, prefere nossos momentos de libação. É labaredas
na nossa fogueira, dança conjunta da noite tarda, noite vil que não espera. É primor quando se
trata de ligar meus incensários. Meu pajem é corredor, quando se trata de escolher meu
vestuário. Não se importa se sou pobre ou perdedor. Não leva em conta se o que carreia
consigo é tinta, caneta ou pincel. Meu pajem adora minha poesia e sabe ser régio dum rei do
papel. Eu e meu pajem somos frutos da falta do que é espontâneo, mas quando estamos
juntos dançando na fogueira, somos quinta-essência do que é mais genuíno. Eu sou do meu
pajem, e meu pajem não é de mais ninguém.

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