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2023 foi o ano dos combustíveis fósseis. A explicação é que depois da crise sanitária do
Covid-19, seguida pelas tensões geopolíticas e por uma crise da economia, veio para a mesa
a preocupação com a confiabilidade da oferta de energia. Se até a chegada da pandemia
a questão da sustentabilidade reinava sozinha na discussão da transição energética, a
confiabilidade do sistema energético, que ainda é dada, basicamente, pelos fósseis, tornou-
se a preocupação principal no curto e médio prazo.
No Brasil, o ano de 2023 foi agitado. Início de novo governo é sempre marcado por novos planos
e promessas. E, em 2023, não foi diferente. Margem Equatorial, Renovação de Concessões das
distribuidoras de energia elétrica, Apagão, Programa Gás para Empregar, o papel da PPSA,
PL do Combustível do Futuro, Preço dos Combustíveis, o papel das energias renováveis, a
geração térmica, entre outros, são apenas alguns exemplos de temas que permearam as
discussões no setor energético ao longo do ano.
No entanto, a discussão de todos esses assuntos ficou mais nas intenções do que nas
realizações. 2024 será um ano difícil, já que no calendário político teremos as eleições para
prefeituras em todo o Brasil. É provável que todos os assuntos discutidos em 2023 voltem
à mesa do Executivo e do Congresso em 2024. Esperamos que comecem a ganhar soluções
consistentes e coerentes.
No setor elétrico, o impacto das adversidades climáticas e das mudanças tecnológicas sobre
as atividades do setor foi o principal assunto. Além dos desafios do clima, 2023 herdou uma
grande discussão de 2022 sobre a renovação das concessões de distribuição de energia
elétrica. A definição dos termos da renovação das concessões, cujo prazo inicial era 2022,
foi prorrogado para 2023 e acabou ficando para 2024, deixando muitas incertezas para as 21
distribuidoras de energia cujos contratos de concessão expiram entre 2025 e 2031.
As diretrizes, trazidas pela Nota Técnica do MME ao TCU, precisam ser discutidas no
Congresso. Essa é a forma de garantir ao segmento de distribuição e, por consequência, ao
setor elétrico, o fundamento jurídico e a base regulatória capazes de trazer segurança às
próprias resoluções da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), trazendo benefícios
tanto para concessionárias quanto para consumidores.
Em 15 de agosto, ocorreu outro evento marcante para o setor, o corte de 18.900 MW do SIN, que
impactou 25 estados e o Distrito Federal. Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico
(ONS), a ocorrência foi causada pela atuação de mecanismos de proteção sistêmicos do SIN.
A ferramenta de defesa do sistema teria sido acionada após a abertura, sem explicação, da
Linha de Transmissão de 500 quilovolts (kV) Quixadá-Fortaleza II, localizada no Ceará, e de
propriedade de Chesf, subsidiária da Eletrobras. Esse evento ilustrou o problema da expansão
da participação das fontes renováveis, como a eólica e a solar, na matriz elétrica, sem a
contrapartida da geração térmica, que garante a segurança do sistema.
Ainda em 2023, o setor elétrico brasileiro foi fortemente impactado por uma crise hídrica
histórica na Região Norte, a detentora do maior potencial hidroelétrico do país. O primeiro
sinal de alerta veio com a interrupção excepcional da operação na Usina Hidroelétrica (UHE)
Santo Antônio, em razão dos baixos níveis de vazão registrados no rio Madeira, em Rondônia.
A UHE opera a fio d’água, ou seja, sem reservatório. Diante da situação, o ONS foi obrigado
a despachar Usinas Termoelétricas (UTEs), inclusive a óleo diesel, mais caras e poluentes, de
forma a garantir o fornecimento de eletricidade.
Outra mudança significativa para o setor elétrico, nesse primeiro ano de governo, está
relacionada à aprovação da reforma tributária. No setor elétrico, a principal demanda é a
manutenção do status de essencialidade da eletricidade, um enquadramento conquistado
recentemente, em 2022, que limita a incidência de tributos sobre o bem ou serviço.
Para 2024...
Um novo ano se inicia e velhos problemas continuam assombrando o setor elétrico. Um dos mais
relevantes é a vulnerabilidade da matriz elétrica às condições climáticas. Agora, após um 2023 de
conforto, no que se refere ao nível dos reservatórios, os efeitos do fenômeno El Niño já começam
a deixar o setor elétrico em alerta. O país já passou por crises hídricas graves nos últimos anos,
as quais sempre ameaçaram a segurança do fornecimento. Contudo, todas as ações e medidas
realizadas pelo setor foram paliativas, onerando o consumidor – em particular, o cativo.
Outro tema importante para 2024 no setor elétrico é a definição dos termos para renovação
das concessões de distribuição de energia elétrica. No fim de janeiro, o TCU deu o sinal verde
para que o MME prossiga com os processos de renovação com base nas diretrizes propostas
pelo ministério em 2023. O pedido de suspensão da concessão da Enel, pela prefeitura de
São Paulo, a dificuldade da transferência do controle societário da Amazonas Energia e a
entrada da Light em recuperação judicial mostram a urgência de uma discussão sobre as
renovações diante do cenário de mudanças tecnológicas e climáticas.
Ao todo, são 21 distribuidoras com contrato a expirar entre 2025 e 2031. A necessidade de
definir as diretrizes para as renovações e o atraso do processo refletem um problema muito
maior do setor elétrico, a defasagem regulatória. A modernização de normas e regras do
setor é uma pauta imprescindível e não pode ser negligenciada por mais um ano. Vamos
aguardar as discussões no Congresso.
Além disso, uma série de mudanças, que seriam propostas por novos Projetos de Lei (PLs)
ou Medidas Provisórias (MPs), ainda não foram enviadas ao Congresso. As principais seriam
a extensão por 36 meses do desconto na tarifa de transmissão para a energia eólica e solar,
o que a nosso ver não faz mais nenhum sentido. A discussão sobre a mudança na Lei da
Eletrobras, por sua vez, já se encontra no Senado. Por fim, se falou muito ainda em uma
possível MP tratando da modicidade das tarifas de energia elétrica.
Petróleo e Derivados
No setor de Óleo e Gás (O&G), as mudanças estão muito ligadas ao papel da Petrobras no novo
governo. Enquanto nas gestões Temer e Bolsonaro a Petrobras foi tratada como uma empresa
mais independente e preocupada com os acionistas, o governo do PT volta com uma política
mais intervencionista.
A nova diretoria da Petrobras, atendendo ao prometido pelo presidente Lula durante a campanha
presidencial, abandonou a Política de Preços baseada na Paridade de Importação (PPI), adotando
uma nova estratégia comercial para os preços da gasolina e do diesel produzidos nas refinarias da
petroleira. Segundo a empresa, a nova estratégia segue duas referências: (a) o custo alternativo
do cliente, como valor a ser priorizado na precificação; e (b) o valor marginal para a Petrobras.
O valor exato e as variáveis envolvidas não foram explicitadas pela companhia, o que torna cada
vez mais difícil prever reajustes futuros.
Outra decisão importante para o setor foi a revogação da Resolução CNPE nº 9/2019, que
estabelecia as diretrizes do processo de venda dos ativos de refino no país. Em linha com a nova
diretriz do governo, em novembro, a Petrobras solicitou ao Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) a revisão do Termo de Compromisso de Cessação (TCC), assinado em 2019. O
acordo previa a privatização de oito refinarias e objetivava a quebra do monopólio da Petrobras
no mercado nacional de refino. O acordo viabilizou, inclusive, a alienação de ativos importantes,
como Mataripe (BA)1. No entanto, com a decisão de suspensão da abertura do parque de refino, a
Petrobras interrompeu a venda da Lubnor (CE), que estava praticamente finalizada, e as demais
plantas de refino2 não deverão mais ser concedidas à iniciativa privada. Ressalta-se, ainda, a
intenção de recompra de Mataripe (antiga Rlam).
É importante destacar que o fim do programa de desinvestimento da Petrobras não se aplica
somente às refinarias, estando suspensas também todas as vendas de ativos de upstream –
em particular, aos campos em terra. Em comunicado, a companhia disse que, considerando sua
aderência estratégica ao portfólio, bem como o perfil de rentabilidade, encerraria os processos de
desinvestimento do Polo Urucu, Polo Bahia Terra, Campo de Manati e da Petrobras Operaciones
S.A. (subsidiária da Petrobras na Argentina).
Em novembro de 2023, a Petrobras apresentou o seu novo plano estratégico para o período
2024/2028, que trouxe um volume de investimentos de US$ 102 bilhões. O segmento de
Exploração e Produção (E&P) segue representando o maior percentual de investimento da
empresa. A novidade é a volta de investimentos significativos em refino, fertilizantes e energias
renováveis, além de redução no pagamento de dividendos.
Outro destaque do plano foi o anúncio do incremento de 25% dos investimentos em atividades
de exploração na Margem Equatorial. As bacias do Sudeste, onde estão localizados os principais
poços da empresa, receberão o mesmo investimento que a Margem Equatorial, reforçando as
pretensões da petroleira de expandir a produção na região.
O debate acerca da exploração da Margem Equatorial ampliou-se quando o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) negou o pedido de exploração da área pela
1
Os outros ativos alienados foram a Refinaria Isaac Sabbá (Reman) e a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX).
2
Regap (MG), Repar (PR), Refap (RS) e Rnest (PE).
O ano mal começou e já circulam notícias preocupantes para o setor de óleo e gás. Em janeiro, o presidente
Lula anunciou a retomada dos investimentos da Petrobras na refinaria de Abreu e Lima (Rnest), projeto
polêmico que já demandou mais de US$ 20 bilhões desde o início das obras, frente a um orçamento inicial
de US$ 2,3 bilhões em 2005. Essa decisão é um grande equívoco e ignora aspectos centrais no histórico de
construção desse ativo, que culminou em caso de corrupção, com o próprio TCU alegando superfaturamento
nos contratos referentes à obra. Além disso, a retomada de investimentos na Rnest, tal como nos ativos de
refino no geral, decreta a retomada do monopólio da Petrobras no segmento. A reviravolta no segmento de
refino traz limitação, vetando a entrada de novos players, e insegurança regulatória e jurídica.
No setor de petróleo, o assunto mais aguardado será a resposta do Ibama em relação à Margem
Equatorial. Dada a complexidade do assunto, é provável que essa decisão não seja resolvida de
imediato. Portanto, no segmento de exploração, a atenção está voltada para os avanços da campanha
de perfuração na Bacia Potiguar, envolvendo o primeiro dos 16 poços que a Petrobras pretende perfurar
na promissora Margem Equatorial até 2028.
De acordo com o Plano Estratégico da Petrobras, para 2024 são previstos investimentos de US$ 18,5
bilhões, sendo US$ 15,5 bilhões destinados a E&P, US$ 1,9 bilhão para refino, transporte e comercialização,
US$ 600 mil para a área corporativa e US$ 500 mil para gás e energias de baixo carbono.
Espera-se que a exploração e produção de óleo e gás permaneça em uma crescente. A Petrobras divulgou
que avançará com a contratação de seis Unidades Flutuantes de Produção, Armazenamento e Transferência
(FPSO, na sigla em inglês) para os projetos Sépia 2, Atapu 2, Barracuda-Caratinga, Albacora e Sergipe-
Alagoas. Também está prevista a inauguração do FPSO Marechal Duque de Caxias em 2024, que será a
terceira unidade de produção no campo de Mero.
No setor privado, a Enauta iniciará as operações do FPSO do Campo de Atlanta e a Equinor trabalhará em
seus projetos Bacalhau e Raia (antigo Pão de Açúcar), na Bacia de Santos. Além disso, Karoon, PRIO, 3R
Petroleum, Trident Energy e BW Energy possuem compromissos de investimentos relacionados a projetos
offshore. E, a respeito de produtores onshore, empresas como 3R Petroleum, Petrorecôncavo, Origem
Energia, Seacrest, Imetame e Petrosynergy continuarão investindo na revitalização de ativos maduros.
Além disso, a Eneva avançará com campanhas de perfuração nas bacias do Parnaíba e Amazonas.
Para 2024, também, é esperado o início da operação do gasoduto Rota 3 e da unidade de processamento
de gás, que trará 18 milhões de metros cúbicos por dia (m3/d) de gás natural do pré-sal, e o início de
operação de três novos terminais de Gás Natural Liquefeito (GNL), pela New Fortress Energy (NFE) no
Pará e em Santa Catarina, e Compass Gás e Energia, do grupo Cosan, em São Paulo.
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou a última rodada de
licitação de áreas de exploração de petróleo e gás, realizada em 13 de dezembro. No 4º Ciclo da Oferta
Permanente de Concessão (OPC) foram arrematados 192 blocos exploratórios, em todas as nove
bacias que tinham áreas em oferta. No entanto, apenas uma das cinco áreas de partilha de produção,
Tupinambá, na Bacia de Santos, foi vendida para a BP Energy.
O Brasil conta com o Programa de Oferta Permanente como modelo de licitação de blocos exploratórios e
áreas com acumulações marginais de petróleo e gás natural. Nesse programa, as licitações são realizadas
após as empresas manifestarem interesse em um ou mais blocos exploratórios em oferta permanente.
Entre esses ativos estão concessões e áreas de partilha de produção. A menos que a ANP apresente áreas
de partilha de produção mais atraentes, o modelo de concessão, especialmente nas bacias de Santos,
Pelotas e Margem Equatorial, deve concentrar a atenção de grandes petroleiras.
Apesar das oportunidades de crescimento, o setor de gás ainda não possui mecanismos legais e
regulatórios apropriados para se desenvolver no Brasil. A verticalização da cadeia e o monopólio
da Petrobras são determinantes para a falta de competição e a baixa diversificação de atores.
O novo governo lançou, em 2023, o Programa Gás para Empregar. Nas palavras do ministro de
Minas e Energia, “é um programa que visa o processo de reindustrialização nacional através do
gás, não só o gás do pré-sal, mas de todas as petroleiras.”. O presidente da República, Luiz Inácio
Lula da Silva, também apontou para a necessidade da promoção de medidas que estimulem o
gás natural, considerado por ele como insumo essencial para a garantia de segurança energética
e desenvolvimento industrial nacional.
Dentre os objetivos do programa estão listados: (i) o aumento da oferta de gás natural da União
ao mercado doméstico; (ii) o melhor aproveitamento e retorno, tanto social quanto econômico,
da produção de gás natural, priorizando a redução dos volumes de reinjeção; (iii) a maior
disponibilidade do hidrocarboneto para a produção nacional de fertilizantes hidrogenados,
produtos petroquímicos e outros setores produtivos; e (iv) a incorporação do gás natural à
estratégia nacional de transição energética.
O CNPE também destacou quatro medidas que poderão ser implementadas a fim de se alcançar
os objetivos elencados. Dentre as medidas, o maior destaque foi dado à implementação do
reconhecimento como custo em óleo, pela Empresa Brasileira de Administração de Petróleo
e Gás Natural S.A. – Pré-Sal Petróleo S.A. (PPSA), do desenvolvimento de infraestrutura
essencial. A medida englobaria o acesso, construção, operação e manutenção de unidades
de escoamento e processamento do gás natural dos contratos de partilha de produção.
Programas como o Gás para Empregar, que promovem a redução dos obstáculos físicos
e regulatórios, são um ponto chave para que o combustível se torne um dos alicerces
da indústria nacional.
Indo além do planejamento e de questões regulatórias, 2023 também marcou a chegada dos
novos modelos de contrato da Petrobras. A partir de maio do último ano, a petroleira passou a
oferecer dois indexadores diferentes, o petróleo tipo Brent e o gás natural no Henry Hub, junto a
cinco opções de prazos de suprimento: quatro, cinco, sete, nove e onze anos.
Ao todo, a companhia estimou que 10% do volume recém-contratado adere à nova modalidade.
A participação ainda tímida da entrega em hub deriva da percepção de risco das distribuidoras,
que é alimentada por fatores como a alta exposição às penalidades de transportadores pela
retirada de uso de menos da capacidade contratada nos gasodutos.
Quanto ao TCC, a companhia protocolou junto ao Cade um pedido de revisão do termo referente
aos ativos de gás, tal como fez no refino. O argumento é de que seu Plano Estratégico 2024 –
2028 prevê a ampliação de atividades nestes mercados. Portanto o processo de desinvestimento
seria contrário aos seus interesses econômicos. O TCC firmado com o Cade para o mercado de
gás previa a venda das participações da Petrobras nas transportadoras NTS, TAG e TBG, além
da transferência da Gaspetro. A petroleira também deveria conceder acesso às suas unidades
de processamento de gás natural. Pelo cumprimento dos compromissos pela Petrobras, o Cade
arquivaria processos administrativos sobre condutas abusivas da Petrobras no mercado de gás
natural. No âmbito do acordo foram concluídas as vendas da Gaspetro, TAG e NTS. Já a liquidação
do controle (51% das ações) da Petrobras na TBG não foi realizada.
Vale notar, ainda, os novos capítulos do caso “Gasoduto Subida da Serra: Transporte ou
Distribuição”. Mais um ano se passou e a classificação do empreendido continua sendo motivo
de contenda no segmento de gás natural. O Subida da Serra foi um projeto aprovado em 2019,
pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), nos limites de
sua competência e dentro dos termos da legislação aplicável naquele momento, como parte
inerente da 4ª Revisão Tarifária Ordinária da Comgás. A partir da publicação da Nova Lei do Gás,
a Lei nº 14.134/2021, transportadores de gás vêm pleiteando junto à ANP a requalificação do
Subida da Serra como um gasoduto de transporte.
Diante dos questionamentos, em julho de 2023, a ANP abriu a Consulta Pública nº 10/2023. O
objetivo do processo foi obter subsídios ao teor da minuta de acordo entre a ANP e a Arsesp.
Idealmente, a partir das contribuições seria possível criar as condições possíveis e necessárias
para que o gasoduto possa operar de acordo com as legislações federal e estadual. O caso,
apesar de impactar diretamente apenas o estado de São Paulo, deve criar um precedente
para futuras deliberações da ANP sobre questões similares, reforçando o arcabouço
regulatório do segmento.
Para 2024...
Nas palavras de Madam Li, atual presidente da International Gas Union (IGU), “a crise
energética lembrou ao mundo que só quando a energia é acessível e segura é que pode
tornar-se verdadeiramente sustentável. Muitos países em desenvolvimento na Ásia, África e
América do Sul continuarão a precisar de mais gás para alimentar a economia, para reduzir
a poluição do ar e as emissões. É evidente que, para a construção de sistemas de energia
sustentáveis e acessíveis para todos, são urgentemente necessários investimentos em gás, a
par de mais energias renováveis”.
Nesse sentido, que o ano de 2024 fomente as discussões sobre o licenciamento ambiental
para a exploração do shale gas, uma forma de tornar o preço do energético mais competitivo
no Brasil. O novo ano é a oportunidade de dar ao setor uma política efetiva para reduzir
a reinjeção do gás natural que já ultrapassa os 70 milhões de m3/d. Não é possível o país
continuar a ser importador de gás e reinjetar esse volume gigantesco. E, por fim, não se
deve ignorar a importância do aumento da infraestrutura essencial do gás natural no país,
pois sem ela não haverá esse mercado no país. O Brasil é um dos países que tem a menor
quilometragem de gasodutos do mundo. Uma malha dutoviária robusta é essencial para
interiorizar o energético e fomentar a reindustrialização do país.
O destaque das energias renováveis em 2023 foi a significativa expansão da energia solar na
matriz elétrica brasileira, batendo recordes em função da geração distribuída. Em outubro de
2023, a capacidade instalada total de geração de energia elétrica do Brasil atingiu 221.025 MW,
incluindo geração distribuída (GD), dos quais 34.878 MW corresponderam à geração de fonte
solar, o equivalente a 15,8% da matriz, e a terceira maior fonte atrás apenas da hidráulica (49,7%)
e da térmica (22,1%), como mostra o Gráfico 1.
Solar Eólica
15,8% 12,4%
Biomassa
7,6% Petróleo
3,9%
Térmica
22,1% Carvão
1,5%
Outros fósseis
0,1%
Nuclear
7,5%
Eólica
PCH 25,0% CGH
1,9% 0,1%
Fonte: Sistema de Informações de Geração da ANEEL – Fonte: Sistema de Informações de Geração da ANEEL –
SIGA – Janeiro/2024. SIGA – Janeiro/2024.
Para 2024...
É importante que se desenvolva um arcabouço relatório que preveja condições justas para
novos entrantes no sistema ao mesmo tempo que garante uma remuneração adequada
para investidores em infraestrutura. Para além, também é importante se atentar à possíveis
armadilhas de um segmento que ainda está em desenvolvimento, como comportamentos
oportunistas. O último caso dessa natureza foi o Consórcio Gênesis, que apresentou os dois
maiores deságios do Leilão de Transmissão nº 01/2023. O grupo foi desqualificado pela Aneel
por não apresentar as garantias financeiras necessárias para a execução dos projetos.
No fim de 2023, o governo federal lançou o Programa MOVER – Programa Mobilidade Verde e
Inovação, que pode beneficiar o segmento de biocombustíveis. Idealizado pelo Ministério do
Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o programa consiste em um pacote
de incentivos para a indústria automotiva produzir veículos que poluam menos, melhorando
a sustentabilidade da frota brasileira. Para tanto, amplia-se as exigências de sustentabilidade
da frota automotiva e estimula a produção de novas tecnologias nas áreas de mobilidade e
logística, expandindo o antigo Rota 2030.
Quando se fala de mudanças concretas, a mais importante seria, sem sombra de dúvidas, a
retomada da evolução dos mandatos de mistura do biodiesel. Em 2021 e 2022, quando os
preços dos combustíveis estavam pressionados pela alta no mercado internacional, o Governo
Federal havia decidido pela manutenção da mistura obrigatória em 10%, interrompendo as
alterações previstas para o período. Em abril deste ano, o percentual foi ajustado para 12%
e o calendário para futuras alterações também foi acertado. A previsão é de que a mistura
chegue à 15% em abril de 2026, com aumento de 1 ponto percentual por ano.
Para começar o ano, o Governo Federal lançou o programa Nova Indústria Brasileira, uma política
industrial destinada ao desenvolvimento nacional até 2033. O amplo programa apresenta –
entre suas metas aspiracionais – um aumento de 50% na participação dos biocombustíveis
na matriz de transportes, participação esta que atualmente corresponde a 21,5%. Além disso,
o programa torna os investimentos na produção de biocombustíveis elegíveis à prioridade de
financiamento, incentivando o desenvolvimento de produtos financeiros e linhas de créditos
(por exemplo, do BNDES) mais favoráveis à viabilização desses projetos – com juros mais
baixos e prazos de amortização mais longos.
Para 2024, é importante que os planos saiam do papel. A aprovação do Combustível do Futuro
é imprescindível. Com incentivos efetivos os biocombustíveis podem ser o diferencial da
transição energética brasileira, oferecendo uma solução “tupiniquim” para a descarbonização
de diversos setores de nossa economia.
Umas das principais metas do programa é “promover a indústria verde, reduzindo em 30% a
emissão de CO2 por valor adicionado na indústria”. A ideia é alcançar esse objetivo através de
medidas como a concessão de benefícios fiscais para a produção nacional de equipamentos
relacionados à geração de energia renovável. Outros desafios incluem a ampliação de parcerias
envolvendo o setor privado, a academia e a indústria, bem como a concessão de novos incentivos
para o desenvolvimento de novas tecnologias associadas à agenda de descarbonização.
O tamanho e a complexidade da transição estão muito além das expectativas iniciais. Desmantelar
um sistema energético construído ao longo de mais de 150 anos demanda um esforço hercúleo
e a cooperação de todos os agentes envolvidos, e isso agora está mais claro do que nunca.
O imediatismo que poderia ser notado em discursos de cinco anos atrás, hoje dá lugar à
racionalidade. Não se pode mais falar de transição sem falar de segurança energética.