Você está na página 1de 2

Fahrenheit 451 é um clássico das distopias.

É um livro incrivelmente bem escrito, mas impressionantemente angustiante. Você


termina o livro com uma antítese guardada no peito, é impossível escolher sentir
esperança ou desesperança com todo o retrato que é demonstrado no texto.
Montag é um bombeiro, mas na sociedade em que se passa a história a função dos
bombeiros mudou, em vez de apagarem fogo, eles incendeiam... livros. O fato de lê-lo já é
uma afronta pessoal ao contexto da narrativa, e isso foi genial. É como se ele dissesse
para nós: “Você já é parte de uma mudança, faça valer a pena.”. Ele é um personagem
bem construído, e ver a sua ruptura do sistema é fantástico, e perceber o quanto aquilo
soa natural a ele, é como se vivesse um dejavu.
Ele tem uma esposa, Mildred, por quem não é mais apaixonado, mas isso não elimina
todos os momentos bons que passaram juntos, tanto que quando ele narra a sua possível
morte, é com um pesar melancólico, nada de exageros, mas com um toque do amor que
um dia estivera lá. E tem Clarisse, por quem eu achei que ele se apaixonaria, apesar de
julgar politicamente incorreto, afinal ela era menor de idade e muitos anos mais jovem que
ele.

Porém, o fato é que eu estava errada.


Existe uma questão que me tirou um pouco o sono, o que aconteceu com Clarisse? Eu
queria e quero acreditar que a menina ainda estava viva, mesmo com todos dizendo que
ela morrera.

Ela é irritantemente intimista, e docemente instigante. É cativante. Imagino que seria


muito difícil alguém não gostar dela, mas é fato que eu senti muito por ela, queria poder tê-
la visto ajudar a mudar o mundo.

É uma história relativamente curta, com poucos personagens, dando-o a oportunidade de


explorá-los com maestria. Foi bom conhecer todos os personagens, mesmo que Beatty ou
Mildred, pois eles nos ensinaram muito

. O mundo criado por ele foi assustadoramente familiar. No posfácio, ele diz: “Existe mais
de uma maneira de queimar um livro.

E o mundo está cheio de pessoas carregando fósforos acessos.”. E, é muito preocupante


quando vemos que tem pessoas que trocaram, de fato, a leitura de um livro por um
resumo do mesmo, ou pela experiência cinematográfica, que apesar de muito construtiva e
elaborada, não suprem ou compensam o verdadeiro significado que o autor deu à sua
obra.
Acho que o contexto retratado foi tão angustiante quando olhado da perspectiva brasileira
atual, o processo crescente de crise no mercado editorial, acompanhado pelo descredito
alarmante da ciência (propiciado pelo discurso do atual presidente), e por toda a tecnologia
que, muitas vezes, cegam algumas pessoas. Imagino o quão perturbador deve ter sido
para o Ray Bradbury, autor da obra, viver para ver o que ele tinha escrito virar realidade,
pelo menos em partes, no caso dele, que faleceu em 2012.
É uma escrita fluente, com poucos diálogos, mas ainda sim não se torna desinteressante.
A construção dos personagens, apesar de demonstrar não ser tão profunda, foi analisada
e explorada de forma tão intensa e maravilhosa que não restaram lacunas despropositais
na trama. Fica claro o porquê da fama do livro, é uma leitura necessária de ser debatida
dentro das instituições, principalmente as educacionais, como escolas e universidades.
“Você sempre dizia: não enfrentem um problema, queimem-no. Bem, agora fiz as duas
coisas, Adeus, capitão.”

“O sol ardia todo dia. Queimava o Tempo. O mundo se precipitava num circulo e girava
sobre seu eixo e, de qualquer modo, o tempo já estava ocupado queimando os anos e as
pessoas sem nenhuma ajuda dele. Ainda, se ele queimava coisas com os bombeiros, e se
o sol queimava o Tempo, isso significava que tudo queimava! Um deles tinha que parar de
queimar. Por certo o sol não pararia.”

Você também pode gostar