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2.

2 GASEIFICAÇÃO

2.2.1 Histórico

A conversão de material orgânico em gás combustível surgiu nas últimas


décadas do século XVII, em que a produção de gás mais antiga foi a de destilação seca,
que se baseava no aquecimento do combustível em uma redoma, na ausência de
oxigênio (Cortez, 1997). O gás combustível só começou a ser difundido para aplicações
domésticas e comerciais a partir de 1830, sendo utilizada de maneira incisiva na
iluminação com uso de gás. Em 1839, o gaseificador em contracorrente foi
desenvolvido por Bishoff e aperfeiçoado por Siemens, em 1857, sendo usufruído em
toda a Europa, desde então (Cortez, 1997).
O auge da aplicação de gaseificadores ocorreu durante a segunda guerra
mundial, durante a crise do petróleo, quando cerca de um milhão de veículos,
mundialmente, utilizavam gaseificadores em leito fixo, chamados de gasogêneos. No
Brasil, esses veículos chegaram a uma quantidade de 20000, utilizando como
combustível pedaços de madeira, coque, turfa e antracito. Com o fim da guerra, o
fornecimento de combustíveis derivados de petróleo voltou a normalidade, e a
tecnologia de produção de gás em automóveis foi abandonada (Andrade, 2007).

2.2.2 Conceitos

Segundo Friedrich (2017), a gaseificação é um processo responsável pela


transformação de resíduos sólidos em uma fase gasosa (gás de síntese) e uma fase sólida
através da oxidação parcial, para isso utiliza-se agentes gaseificadores (vapor de água,
oxigênio, ar ou dióxido de carbono) em quantidades estequiométricas inferiores. O gás
de síntese (syngas) apresenta um maior poder calorífico e pode ser utilizado na
produção de biocombustíveis. A parte sólida é chamada de char, que inclui a fração
orgânica não convertida e o material inerte presente na biomassa tratada (Molino,
Chianese, Musmarra, 2016).
O gás de síntese tem como composição monóxido de carbono (CO), hidrogênio
(H2), metano (CH4), dióxido de carbono (CO2), hidrocarbonetos leves (etano e propano,
por exemplo) e hidrocarbonetos pesados. Gases indesejáveis também podem estar
presentes, como ácido sulfídrico e ácido clorídrico ou gases inertes, como N 2. A
presença desses depende do tratamento que a biomassa foi submetida e das condições
operacionais do processo de gaseificação. O poder calorífico do syngas varia de 4 a 13
MJ/Nm3, dependendo da matéria-prima e da tecnologia de gaseificação utilizada (Qian
et al., 2013; Wu, Yang, Blasiak, 2014; Liu, Ji, 2013).
O char, por sua vez, é composto pela mistura da fração orgânica não convertida
e cinzas. A fração não convertida depende fortemente do processo de gaseificação e das
condições operacionais, enquanto a quantidade de cinzas está diretamente relacionada
com o tratamento da biomassa. O poder calorífico varia de 25 a 30 MJ/kg, dependendo
da quantidade de fração orgânica não convertida (Bulmãu et al., 2010).
As principais reações de gaseificação são endotérmicas, e a energia necessária
para sua ocorrência depende da oxidação de parte da biomassa, através de um processo
auto térmico, quando o gaseificador (equipamento que realiza a gaseificação) é
aquecido internamento através da combustão parcial, ou o processo alo térmico, quando
a energia requerida pela gaseificação é fornecida externamente. Para o caso da
gaseificação auto térmica, a sequência de estágios requeridos são: oxidação
(exotérmico), secagem (endotérmico), pirólise (endotérmico) e redução (endotérmico)
(Molino, Chianese, Musmarra, 2016).

1. Oxidação

A oxidação parcial da biomassa é imperativa para que se obtenha a


quantidade energética necessária para os processos endotérmicos e a temperatura de
operação no valor estabelecido. A oxidação é feita com déficit de oxigênio em
relação a quantidade estequiométrica, de forma oxidar parcialmente a biomassa. As
principais reações de oxidação são as descritas a seguir (Basu, 2010).
kJ
C+ O2 → C O2 , Δ H=−394 , combustão do char
mol
1 kJ
C+ O 2 →CO , Δ H=−111 , oxidação parcial da biomassa
2 mol
1 kJ
H 2 + O2 → H 2 O , Δ H =−242 , combustão do hidrogênio
2 mol

Além da energia térmica requerida para condução das próximas etapas da


gaseificação, uma mistura de gases (CO e CO 2) e água é formada. Além desses
elementos, nitrogênio pode estar contido, se a oxidação da biomassa foi realizada na
presença de ar, caso contrário, haverá uma quantidade desprezível desse composto.

2. Secagem

A secagem consiste na evaporação da umidade contida na matéria-prima, em


que, a energia utilizada para esse processo é a liberada na oxidação. Essa quantidade
de calor, necessária para vaporizar, depende da quantidade de umidade presente na
biomassa. Segundo Hamelinck et al. (2004), uma biomassa pode ser considerada
seca ao atingir uma temperatura de 150°C (Eichler et al., 2015).

3. Pirólise

Nesta etapa, ocorre a decomposição da matriz carbonácea dos materiais, em


que, a quebra das ligações químicas influi na formação de novas moléculas com
menor peso molecular. Por meio da pirolise, são obtidas frações de um sólido, de
um líquido/condensado e de uma fase gasosa (Basu, 2010).
A parte sólida apresenta uma alta quantidade de carbono e elevado poder
calorífico. Essa fração contém os materiais inertes, compostos pelas cinzas e pela
fração orgânica. Já a líquida é formada por alcatrões, que são constituídos de
substâncias orgânicas complexas, e são condensáveis a temperaturas relativamente
baixas. Por último, a fase gasosa é tipicamente 70-90% da massa da matéria-prima,
sendo uma mistura de gases que não são condensáveis a temperatura ambiente, essa
fase é denominada usualmente de “gás de pirólise”. Essa última fase é formada,
principalmente, por hidrogênio, monóxido de carbono, dióxido de carbono e
hidrocarbonetos leves, como metano e outros C2 e C3 (Basu, 2010).
A pirólise ocorre a temperaturas na faixa de 250 a 700°C, sendo um processo
endotérmico. A energia necessária para que essa etapa ocorra advém da oxidação. A
reação geral de pirólise é a exposta abaixo:

Biomassa ↔ H 2 +CO +C O2 +C H 4 + H 2 O+ Alcatrões+ char


4. Redução

A redução envolve todos os produtos das etapas de pirólise e oxidação, à


vista disso, a mistura de gases reage com o char, formando o syngas final. As
principais reações que ocorrem nesse estágio são (Arena, 2012):

kJ
C+ C O2 ↔ 2 CO , Δ H=172 , reação de Boudouard
mol
kJ
C+ H 2 O ↔CO + H 2 , Δ H=131 , reforma do char
mol
kJ
CO+ H 2 O ↔C O2+ H 2 , Δ H =−41 ,reação de deslocamento gás−água
mol
kJ
C+ 2 H 2 ↔C h4 , Δ H =−75 , metanação
mol

Embora as reações de deslocamento gás-água e de metanação sejam


exotérmicas, a contribuição das reações de Boudouard e de reforma do char
(endotérmicas) contribuem de maneira mais intensa na variação de entalpia da
reação global. Outro ponto a se destacar é a característica de equilíbrio presente em
todas as reações, logo, ao aumentar a temperatura, as reações endotérmicas são
favorecidas, enquanto na situação contrária (diminuição da temperatura) as reações
exotérmicas são mais favoráveis. Assim, a temperatura desempenha um papel
fundamental na determinação da composição do syngas e, consequentemente, nas
suas características (poder calorífico, presença de alcatrões) (Molino, Chianese,
Musmarra, 2016).
A temperatura típica para os processos de gaseificação em larga escala varia de
800°C a 1100°C, já nos processos que utilizam oxigênio como agente gaseificador a
temperatura requerida fica na faixa de 500-1600°C (Molino, Chianese, Musmarra,
2016).

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