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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE LETRAS CLÁSSICAS E VERNÁCULAS
LITERATURA BRASILEIRA I
PROF IVAN FRANCISCO MARQUES

GABRIEL HENRIQUE SILVÉRIO – Nº USP 12387616

SÃO PAULO
2023
LITERATURA BRASILEIRA I / 2023 / SEGUNDA AVALIAÇÃO
I - Análise contrastiva
(Opção 1: Poemas escolhidos: Sábado de Aleluia; Noturno de Belo Horizonte [fragmento]; O
voo sobre as igrejas)

Embora o sobrenome “Andrade” seja o mesmo para poetas de um período muito


transformador da literatura brasileira, que se “inicia em 1922”, é nítido que são autores
independentes, mas, que se complementam na proposta de repensar um estado de espírito
nacional, por meio das letras.

Primeiramente, Schwarz, no famoso ensaio “A carroça, o bonde e o poeta modernista”


será certeiro ao definir a poesia de Pau-Brasil como: “[...] justaposição de elementos próprios
do Brasil-Colônia e ao Brasil burguês, e a elevação do produto – desconjuntado por definição
- à dignidade de alegoria do país [...]”. Logo, Oswald de Andrade apresenta essa visão em
“Sábado de Aleluia”, poema com alusão à data intrinsecamente ligada ao catolicismo, marco
dos povos colonizadores. No entanto, o foco se dá por meio da crítica, como na primeira estrofe
onde vê-se a espera “[...] o arcebispo / Sair da história colonial [...]”, isso regado com serpentes
de fogo, que tende a ser uma interpretação contrária da religiosa, aqui ligada metaforicamente
ao elemento folclórico, ao Boitatá, que é ser terrestre, todavia, pretende atingir o céu, esse tido
como espaço sagrado, de alcance divino, e, no meio do quadro “A praça pública está cheia”,
ou seja, pode-se supor uma tríade oriunda de autos e idealismo da composição céu/terra-
purgatório/inferno. Adiante, a inserção da justaposição é tão marcante que vemos em “[...]
Jardins / Palmeiras / Negros”, os escravos como elemento de composição, ou de outro modo,
como objeto, que reproduz no Brasil burguês inúmeras constatações de origem racista,
entretanto aqui velada, por meio do poderio “[...] Do céu doirado e altíssimo [...]”.

Nesse gancho, em “Noturno de Belo Horizonte [fragmento]”, fica evidente o que Meyer
vai classificar como a descoberta do Brasil, assim, Mário de Andrade percorre Minas Gerais
com seu olhar metropolitano a encontrar, - e se defrontar com o deslumbramento -,
arquitetônico, geográfico, rítmico, de uma outra cultura brasileira, porém, que finda no eterno
retorno. Posição cuja tentativa de transformação martiriza homens e constrói antropólogos em
outros tempos. “[...] No marasmo das cidades paradas [...]” o que se vê é uma parte de um todo
constituinte negado, uma interrogação que não forma o autor, contudo pertence ao seu povo,
figura paradoxal que articula a ideia de reformular a inteligência coletiva, com temas múltiplos,
algo que contrasta com o arlequim enfrentando exclusivamente a cidade-metrópole em
“Paulicéia desvairada”, só que traz a noção de simultaneidade para se debruçar novamente
sobre a temática identitária.

Em paralelo, a poesia de Carlos Drummond de Andrade, “O voo sobre as igrejas”


distingue-se, pelo que Antonio Candido disse a respeito dessa fase de euforia modernista do
autor:

“[...] A sua poesia difere da de outros modernistas, inclusive Mário de Andrade, que
tentam fixar o cotidiano a fim de obterem um momento poético suficiente em si
mesmo; ele, ao contrário, procede a uma fecundação e a uma extensão do fato, para
chegar a uma espécie de discreta epopéia (sic) da vida contemporânea. Isto talvez se
ligue à capacidade de injetar fantasia nas coisas banais [...]”. (ANTONIO CANDIDO,
1965, VÁRIOS ESCRITOS, p. 82)

Esse ciclo, tido como de um poeta maduro nos mostra o quotidiano como célula de
extração poética, bebendo, em uma certa medida, como que da estética de uma notícia de jornal
para formular seu texto. Evidencia-se, então, a tendência do desencanto em versos como “[...]
Era uma vez um Aleijadinho, / não tinha dedo, não tinha mão, / raiva e cinzel, lá isso tinha,
[...]”. Ainda provocativo, - a si e aos modernistas: é válido grifar que Brejo das almas apresenta
um soneto, que na linha dos vanguardistas era rechaçado e não digno de nota -, com essas
colocações, Drummond constrói seu papel na literatura sem deixar de ser político diante do
social, que faz do modo de representar as nossas condições humanas uma crônica estendida
sobre o verso.

Conclui-se, diante do que foi exposto, que mesmo possuindo traços ímpares, os três
poetas versaram sobre o Brasil e sua ocorrência em um contexto que tinha por autoafirmação
o desprendimento, mesmo que a base tenha sido as próprias vanguardas europeias ou até
mesmo os clássicos, que estavam na lista de leituras dos autores. De tal maneira é válida a
argumentação que foi utilizada por eles porque redesenhou a forma/conteúdo e para além, fez-
se constituir colunas que imprimiram um registro de uma literatura em conjunto onde cada qual
deu a sua contribuição, o seu por em esperança ao mundo uma denúncia capaz de alternar ao
que se tinha até o período.
REFERÊNCIAS

ANDRADE, Mário de. Aspectos da literatura brasileira. Disponível em: <Novo Documento
2020-03-23 18.33.00 (usp.br)>. Acesso em: 18 jun 2023.

CANDIDO, Antonio. Vários Escritos. São Paulo: Ouro sobre Azul, 2004.

MEYER, Marlyse. Caminhos do imaginário no Brasil. Disponível em: <Caminhos do


imaginário no Brasil - Marlyse Meyer - Google Livros>. Acesso em: 18 jun 2023.

SCHWARZ, Roberto. A carroça, o bonde e o poeta modernista. Disponível em: <Schwarz -


A carroça, o bonde e o poeta modernista - [PDF Document] (vdocuments.site)>. Acesso em:
18 jun 2023.
II – Memorial
Professor, em princípio, por uma questão de associação errônea mesmo, conectei
Literatura Brasileira I aos primórdios das nossas letras, algo talvez que buscasse na carta de
Pedro Vaz de Caminha esse velho clichê de ter a partir dos portugueses o que foi construído
no país etc. Associação essa colonial, com relação mais à Literatura Portuguesa que para com
nossas próprias produções. Porém, um curso que teve como base os modernistas de 1922 realça
muito mais nossos questionamentos sobre identidade, pois nos insere à vanguarda, que tem
como possível analogia, o desbravar à frente, e a forma como se deu esse semestre sustentou a
hipótese que esse caminho fortalece nossas reflexões com senso crítico sobre as produções
literárias no país. Evidentemente, não focalizando o quadro de produzir, produzir, produzir,
mas concatenar as problemáticas socias, identitárias, linguísticas na relação literatura e
sociedade, indagando o que esse espaço tanto possibilitou no passado, sem deixar de ser um
espelho para o contemporâneo.

Dessa forma, de João Miramar ao poeta que é um mundo, Drummond, acredito que
desmistifiquei conceitos, por exemplo, a concepção de moderno, da importância do processo
histórico enquanto valor construído pelos modernistas, sem evidente inserir no foco novas
construções, como a síntese do movimento Pau-Brasil, da Antropofagia, da base Macunaíma,
que na oposição tupi e alaúde constrói um instrumento de peso, - de síntese nacional -, para
dizer: “esse sem caráter (psicológico) somos nós”. Um alumbramento para qualquer aluno que
percebeu na literatura uma possibilidade de buscas, encontros, análises e inspirações poéticas
para levar uma vida mais experienciada nesse campo que o dia a dia, do capital, não nos quer
oferecer. Com isso, LBI tornou o meu cotidiano mais andradiano, com marcadas pinceladas de
amaral, traços de malfatti, e cores concisas de um Brasil que se propôs por meio do primitivo
se sustentar.

Portanto, o experimentalismo artístico dessa matéria, junto com as noções de nacional


da primeira metade do século XX, solidificou em mim a necessidade de se ter esse debate
dentro de um curso de Letras, para que possamos desenvolver, com as construções do que foi
e do que é, a crítica, a formulação de aulas futuras, a subjetividade de se imaginar em um
contexto que amplia exposições e experiências capazes de darem ênfases à interpolações que
tensionam nosso olhar e decoloniza o próprio pensamento.
III - Compilação das intervenções

Re: O poeta do castelo - sábado, 10 jun 2023, 16:56


Um filme onde a câmera é a essência do poeta: o alumbramento. O poeta é o fingidor, que não
finge a dor, mas seu outro lado, o riso do ator. E o sente, tendo em vista sua naturalidade. "O
poeta do castelo" é registro de um pilar da literatura por meio de uma visão que construiu em
imagem cinematográfica as belas letras de uma poesia menor. Porém, cheia de argumento, de
iluminações. De um cinema que desencadearia no novo. A simplicidade, o apartamento
pequeno, os muito livros, a avenida e a árvores são temas e cenários da composição, não se é
ao luxo de um quadro francês, por exemplo, é brasilidade, não desimportante, é o que se é, uma
proposta certamente bela, devido retratar uma identidade nacional e, histórica, pois registra
aquele que conheceu o Bruxo e os poetas concretistas.

Re: A rosa do povo - quinta, 15 jun 2023, 15:38


"A Rosa do Povo" pode ter como interpretação a relação entre o mundo do capital e a poesia.
Isto, com Itabira no centro deste conjunto de ideias e argumentações poéticas, dado que a
cidade mineira foi fonte de exportação de minério durante a II guerra mundial. Então, por meio
deste raciocínio, estamos abordando a poesia dentro de uma sociedade que perdeu a ênfase
criativa/democrática/racional/argumentativa em nome do conflito bélico. Esta visão aplicada
ao poema "Morte do Leiteiro", tendo o poeta utilizado a linguagem coloquial, que aqui narra
em tom jornalístico, cronológico... Vai desencadear ao que Antonio Candido chamou de
alargamento do gosto do cotidiano "através do aprofundamento da consciência do outro"
(Inquietudes na poesia de Drummond, 1985). Logo, estamos falando de uma história com
apresentação, complicação e resolução. E ainda tendo o narrador em terceira pessoa, temos a
sustentação da ideia de afastamento, como os jornais, assim é um poeta espectador que escreve.
Escreve a cena e transmite a tensão por meio de verbos no presente. É possível também
focalizar nas antíteses e paralelismo que desenham a estrutura, "pouco leite / muita sede", as
desigualdades deste conjunto de coisas acontecendo. Ou seja, por mais que seja um quadro do
cotidiano, é no mesmo conjunto/espaço que está, a sociedade - nós, em crise. "Procura da
poesia" também remete este cenário de perda de ênfase, mas dentro da própria poesia, o que
desenvolve a metalinguagem como marca. Podemos dividir esta produção em duas partes, a 1ª,
abordando proibições, e, a 2ª, o trabalho para se escrever, para obter a linguagem poética
"verdadeira". Desta forma, estamos diante de um trabalho que assumiu as problemáticas
daquele tempo e que vai transpor esse olhar, porém, em forma de denúncia, de interpolação
capaz de trazer a reflexão, a comoção, o trágico para o centro do debate, em uma medida,
talvez, de realinhar ao menos a linguagem em alguma instância, em algum mundo.

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