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Faculdade de Direito da Universidade do Porto - 2023/2024

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ÍNDICE:
Direito das obrigações............................................................................................................................4
Caso prático nº1............................................................................................................................... 11
Caso prático nº2...............................................................................................................................12
Caso prático nº3...............................................................................................................................12
Relações obrigacionais complexas...................................................................................................... 14
Caso prático nº4: Acórdão de 13 de outubro de 2016 (Maria da Graça Trigo)...............................17
Caso prático nº5...............................................................................................................................18
Caso prático nº6...............................................................................................................................18
Eficácia externa das obrigações.......................................................................................................... 19
Resolução do caso prático nº 9........................................................................................................ 22
Resolução do caso prático nº10....................................................................................................... 23
Direitos reais e direitos de crédito.......................................................................................................24
Resolução do caso prático nº12....................................................................................................... 26
Direitos pessoais de gozo......................................................................................................................27
Contrato-promessa...............................................................................................................................29
Resolução do caso prático nº11: Direitos pessoais de gozo............................................................ 29
Resolução do caso prático nº13: Direitos reais e direitos de crédito e contrato-promessa..............30
Resolução do caso prático nº14: Contrato-promessa.......................................................................32
Resolução do caso prático nº15: Contrato-promessa.......................................................................34
Resolução do caso prático nº16: Contrato-promessa (art.442.º/3/parte final do CC e interpelação
admonitória) e Contrato para pessoa a nomear............................................................................... 36
Resolução do caso prático nº17: Pacto de preferência......................................................................39
Resolução do caso prático nº18: Contrato a favor de terceiro.........................................................40
Gestão de negócios............................................................................................................................... 42
Resolução do caso prático nº19: Gestão de negócios......................................................................44
Resolução do caso prático nº 20: Gestão de negócios.....................................................................45
Resolução do caso prático nº 21: Enriquecimento sem causa.......................................................... 46

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NOTA PRÉVIA:

Esta é a sebenta das aulas práticas de DIREITO DAS OBRIGAÇÕES- TURMAS 1 E 2,


disponibilizados pela Comissão de Curso dos alunos do 3o ano da licenciatura em Direito da
Faculdade de Direito da Universidade do Porto, para o mandato de 2023/2024.

Foram elaborados pela aluna Adriana Rebelo, tendo por base as aulas e documentos disponibilizados
pela docente Mariana Fontes da Costa.

Salienta-se que estes apontamentos são apenas complementos de estudo, não sendo dispensada, por
isso, a leitura das obras obrigatórias e a presença nas aulas.

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Direito das obrigações

● O que é uma obrigação?

Art.397.º do CC- uma obrigação é um vínculo jurídico, pelo qual uma pessoa fica adstrita para com
outra à realização de uma prestação.

O que caracteriza o direito das obrigações é que as relações obrigacionais têm por objeto uma
obrigação.

As coisas distinguem-se das outras prestações, pelo facto das prestações corresponderem a um
comportamento, ou seja, um dever de atuar de uma certa forma.

Então vamos estudar o direito que o credor tem de o devedor se comportar de uma determinada forma,
ou seja, que este adote uma determinada conduta.

Estes comportamentos podem passar pela entrega de coisas, logo as obrigações estudam o ato de
entregar a coisa e a coisa, que está ligada aos direitos reais.

Segundo o Dr. Antunes Varela, a propósito do art.398.º do CC, este colocava a questão se podiam
estar em causa direitos não patrimoniais no âmbito das prestações, concluindo que era possível, como
a título exemplificativo é mencionado na obra o exemplo das carpideiras que são pessoas contratadas
para chorar nos funerais.

Existem 3 grandes distinções ao nível das prestações:

● Prestações de facto e de coisas:

As prestações de facto esgotam-se no comportamento e as prestações de coisas têm subjacentes ao


comportamento o ato de dar, entregar ou restituir uma coisa.

A prestação de facto pode ser:

o Positiva/ facere: o devedor obriga-se a fazer algo.

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o Negativas:

● non facere: devedor compromete-se a não adotar uma determinada conduta.

Nas relações comerciais existem várias prestações de non facere, como o dever de
não concorrência, a cláusula de exclusividade, não concorrência.

● Pati: devedor obriga-se a tolerar uma determinada condita de outrem, isto é,


do credor ou de terceiro a que este credor ou terceiro não teria direito se não
fosse a existência da prestação.

Exemplo: estando em causa um prédio que não está encravado, eu autorizo o meu
vizinho para este passar pelo meu terreno para chegar mais facilmente ao seu terreno.

Aqui são relevantes, especialmente, as prestações de facto de terceiro, em que o devedor se obriga a
que um terceiro adote um determinado comportamento.

Exemplo: A e B casados em comunhão geral de bens têm um apartamento e A celebra um


contrato-promessa com C, no qual vende o apartamento em nome dos 2, ou obriga-se perante C a que
B celebre o contrato-promessa.

Esta situação exemplar é válida, nos termos do art.406.º/2 do CC, mas não vincula o terceiro.

As prestações de facto de terceiro são, na verdade, prestações de facto próprio, em que o devedor se
compromete a conseguir que o terceiro se comporte de determinada maneira.

Qual a consequência para o devedor se não consegue que o terceiro se comporte de uma determinada
maneira?

A resposta passa por 3 hipóteses:

● Obrigação de meios: o devedor obriga-se a adotar todas as diligências adequadas para


alcançar o resultado, não sendo, porém, responsabilizado nos casos em que tendo adotado
essas diligências ainda assim o resultado não é alcançado. Correspondem, normalmente, às
prestações de facto de terceiro.

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● Obrigação de resultado: o devedor obriga-se a alcançar o resultado acordado, só não sendo


responsabilizado quando não é possível alcançar esse resultado por causa que não lhe é
imputável.

Exemplo: no primeiro caso, mulher não quer vender a casa. Num segundo caso, a mulher tem um
acidente e entra em coma, não podendo vender a casa.

● Obrigação de garantia: o devedor obriga-se a alcançar o resultado, sendo sempre


responsável se esse não for alcançado, independentemente do motivo.

Estas obrigações são raras, mas são comuns nos contratos grandes de empreitadas nacionais,
em que o devedor ao celebrar um contrato com o credor, se obriga a pagar,
independentemente do motivo que originou o incumprimento.

A prestação de coisa pode ser:

o Prestação de coisa futura (art.399.º e 211.º do CC): dizem-se coisas futuras as coisas
que ou ainda não têm existência jurídica ou tendo existência jurídica ainda não estão
na titularidade do disponente.

A venda de bem alheio é válida quando feita na qualidade de venda de bem futuro.

Como isto se processa?

Nos termos do art.893.º do CC, a venda de bens alheios consubstancia uma venda válida,
quando celebrada na perspetiva de ambas as partes de a coisa vir a ser adquirida pelo
disponente/ alienante.

A coisa mal entra no disponente, a propriedade transfere-se para a esfera do disponente.

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Se o disponente nunca vem a adquirir a coisa? Numa prestação de bens futuros, quando a
coisa não é adquirida pelo alienante a prestação extingue-se, segundo o art.880.º/1 do CC.-
Emptio rei speratae (negoceia-se a coisa esperada).

E quanto ao dever de indemnizar, depende se for uma obrigação de meios, resultado ou de


garantia, ou seja, o dever de indemnizar depende da natureza da obrigação.

O art.880.º/2 do CC temos uma solução diversa, quando é atribuído carácter aleatório à coisa,
o adquirente não recebe a coisa e paga o preço na mesma. - emptio spei (negoceia-se a
esperança).

● Prestações instantâneas e prestações duradouras: O que está subjacente a esta distinção e


o tempo que decorre entre o momento do surgimento da obrigação e o momento do seu
cumprimento.

Nas prestações instantâneas, o comportamento exigível do devedor extingue-se num só momento ou


no período de tempo considerado irrelevante.

Exemplo: da compra e venda a entrega da coisa e a entrega do preço.

Nas prestações duradouras a prestação protela-se no tempo, sendo que a duração temporal da
relação obrigacional tem uma influência decisiva no conteúdo da própria prestação, ou seja, o decurso
do tempo influencia o conteúdo efetivo da prestação.

Exemplo: num contrato de arrendamento temos o pagamento de uma renda, que varia consoante o
período de tempo consoante o arrendamento dura, ou seja, a prestação materializa-se em função do
decurso do tempo.

Podemos ter 2 categorias de prestações duradouras:

o Prestações de execução continuada: cumprimento prolonga-se ininterruptamente no


tempo.

Exemplo: contrato de fornecimento de água.

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o Prestações reiteradas/ periódicas/ de trato sucessivo: prestações renovam-se em


prestações singulares sucessivas, em regra por períodos de tempo consecutivos.

Exemplo: contrato de arrendamento.

Note-se que estas prestações reiteradas são distintas das prestações fracionadas ou repartidas, ou
seja, as prestações duradouras em sentido estrito não se confundem com as prestações fracionadas ou
repartidas.

As prestações fracionadas o cumprimento também se protela no tempo, à semelhança do que acontece


com as prestações duradouras, através de prestações instantâneas sucessivas, mas no caso das
prestações fracionadas o objeto da prestação está previamente fixado e não é influenciado pelo
decurso do tempo.

Exemplo: A pediu ao banco B 15000€ para arranjar os dentes, o banco consegue o empréstimo a uma
taxa de juro de 12%, qual o tipo de prestação presente?

Neste caso temos 2 prestações que são a devolução do capital que advém do contrato de mútuo que é
uma prestação pecuniária e um a prestação de pagamento de juros.

Assim, a prestação do mútuo é fracionada e a prestação do pagamento de juros é uma prestação


reiterada.

● Diferenças de regime de prestações reiteradas e prestações fracionadas:

Resolução do contrato: a resolução é o modo unilateral fundamentado de extinguir um contrato. A


resolução tem efeitos retroativos, segundo o art.434.º do CC sendo equiparado ao art.289.º do CC.

Nas prestações reiteradas o cumprimento está associado ao decurso do tempo estando associado à
satisfação do credor, por regra, não produz efeitos retroativos, de acordo com o disposto art.434º/2 do
CC.

O decurso do tempo nas prestações fracionadas é um fato acessório de comodidade, que normalmente
até traz prejuízo para o credor, logo em regra a resolução tem efeitos retroativos.

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Perda de benefício do prazo: o art.781.º do CC está associado com a perda do benefício do prazo,
sendo homólogo ao art.934.º do CC que se aplicam apenas a prestações fracionadas e não para
prestações duradoras.

Exemplo: A empresta a B 20000€ sem juros, a pagar em 20 prestações sucessivas mensais de 1000€
cada uma.

B tem um azar e o carro avaria-se ao 6º mês e precisa do dinheiro para o arranjar e não consegue
pagar a prestação, quanto no 8º mês B deve a A, sendo que nesse 8º mês entregou 2000€?

Neste caso, B deve 14000€, porque nos termos do art.781.º do CC o não pagamento de uma prestação
implica o vencimento imediato de todas as prestações e B perde o direito de pagar em prestações,
sendo esta lógica do art.781.º a proteção do credor, pela perda da confiança face ao incumprimento do
devedor.

Nota: O legislador estabeleceu um regime de especial face ao art.781.º do CC que é o art.934.º do


CC.

O art.934.º do CC é o regime especial que se aplica exclusivamente aos contratos de compra e


venda a prestações, pelo que o legislador estabelece um regime de proteção em matéria de compra e
venda que difere do art.781.º do CC.

Análise do art.934.º/1ª parte do CC:

Se houver um contrato de compra e venda a prestações e um incumprimento associado, o credor pode


resolver ou exige o vencimento antecipado.

Assim, se o credor quiser a resolução só o pode fazer se houver reserva de propriedade, pelo que se
houver uma insolvência aquele bem nunca pode ser usado para saldar dívidas do devedor, porque
pertence ao credor.

Exemplo: Se forem 2 prestações, mas que no seu conjunto não excedem a 8ª parte do preço?

Aqui indicia-se uma quebra da confiança, e como no art.934.º/1ª parte do CC o legislador claramente
refere “uma só prestação”, então temos resolução.

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Numa prestação duradoura não sabemos qual o valor, pelo que o valor oscila com o decurso do
tempo, sendo incompatível a perda de benefício do prazo.

● Prestações fungíveis e infungíveis: a fungibilidade tem como sinónimo a substituibilidade.


No caso das prestações, a natureza fungível ou infungível prende-se com a substituibilidade
do devedor, pelo que as prestações fungíveis são aquelas que as prestações podem ser
cumpridas por pessoa diferente do devedor, sem que prejuízo para o interesse do credor.

Exemplo: em regra, todas as prestações da coisa são fungíveis e ainda, mesmo nas prestações
infungíveis, em regra a entrega da coisa é fungível.

Nas prestações infungíveis, o devedor não pode ser substituído no cumprimento por terceiro,
podendo resultar da natureza da prestação ou de acordo das partes.

Existem prestações de fungibilidade relativa, em que o devedor pode ser substituído por um
grupo relativo de pessoas.

A infungibilidade não impede que o devedor possa ser coadjuvado no cumprimento por
auxiliares, como consta do art.264.º/4, 1165.º, 1198.º, 1213.º/2 do CC.

Na fungibilidade que depende da vontade convencionada das partes.

Nada resultando em contrário, as prestações são fungíveis, em regra, nos termos do art.767.º/2
do CC.

Consequências de regime:

● Impossibilidade de cumprimento: nas prestações infungíveis, a impossibilidade


subjetiva, ou seja, do devedor gera extinção da prestação.

Nas prestações fungíveis a obrigação não se extingue, pelo que o devedor é obrigado
a promover a substituição por terceiro. Apenas se o devedor não conseguir essa
substituição é que fica exonerado da responsabilidade.

● Ação executiva: se a prestação de facto infungível, o credor pode requerer na


execução uma sanção pecuniária compulsória (art.829.º-A do CC), que é exclusiva

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das prestações de facto infungíveis. Nas prestações de facto fungíveis, o credor pode
exigir que a prestação seja cumprida por um terceiro às custas do devedor, segundo o
art.828.º do CC.

Caso prático nº1

a) Prestação de coisa, instantânea e fungível.

Prestação de coisa, instantânea fracionada.

b) Contrato de arrendamento.

Prestação do senhorio- prestação de facto negativo que parece ser de pacto, duradoura continuada,
infungível.

Prestação do arrendatário- Prestação de coisa, duradoura reiterada.

c) Contrato de trabalho.

Prestação do empregador- prestação de coisa, duradoura reiterada.

Prestação do trabalhador- prestação de facto, duradoura continuada.

d) Contrato de promessa de compra e venda, bilateral.

As prestações são a celebração do contrato definitivo, pelo que temos prestações de facto positivo,
instantânea.

e) Contrato de mútuo oneroso.

Mutuante não tem obrigações.

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Para o mutuado nascem 2 obrigações distintas, sendo a devolução dos 15000€ que é uma prestação
fracionada e quanto ao pagamento de juros é uma prestação duradoura reiterada, ambas prestações de
coisa.

Caso prático nº2

Contrato promessa. Venda de bem alheio, na qualidade de bem futuro (art.893.º do CC).

Há uma impossibilidade de incumprimento imputável à Bárbara.

O contrato não tem natureza aleatória, logo as prestações extinguem-se, pelo que a prestação da
bárbara e extingue-se a contraprestação do Carlos.

Assim, Carlos tem direito à restituição dos 50000€ cumpridos e não é obrigado a restituir os restantes
50000€.

Caso prático nº3

a) 1083.ºdo CC.

Prestação reiterada- contrato de arrendamento (sem efeitos retroativos). Contrato de compra e venda
do automóvel é uma prestação fracionada (tem efeitos retroativos).

Resolução:

Estamos perante um contrato de compra e venda a prestações, mais especificamente um


incumprimento do contrato de compra e venda a prestações.

O Bernardo, nos termos do art.934.º do CC, pode invocar a perda de benefício do prazo e exige de
imediato o cumprimento de todas as prestações em falta, apesar das prestações em falta não exercerem
a 8ª parte do preço, como temos mais do que 1 prestação B tem o direito de invocar a perda de
benefício do prazo.

O Bernardo para resolver o contrato tem de ter reserva da propriedade, entrega da coisa e mais de 2
prestações em falta, sendo que como estamos perante uma prestação fracionada, a resolução tem
efeitos retroativos, pelo que o Alexandre tem de devolver o automóvel e o Bernardo tem de devolver o
dinheiro exigido, podendo, posteriormente, exigir uma indemnização.

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Nos termos do art.808.º do CC não é permitido resolver um contrato em mora, pelo que a mora do
devedor não dá direito à resolução do contrato, sendo necessário transformar a mora em
incumprimento definitivo para resolver o contrato.

Existem 3 origens do incumprimento definitivo:

· Quando a prestação é impossível;

· Quando o credor perdeu objetivamente o interesse (ex.: vestido da noiva que fica pronto 1 dia
depois do casamento);

· Quando nenhuma das outras 2 circunstâncias se verificam, o incumprimento leva a interpelação


admonitória (art.808.º do CC- credor concede ao devedor um prazo razoável e se o devedor não
cumprir nesse prazo extra, o credor pode resolver esse contrato. Ex.: A tem um carro avaria e ao ir
à oficina o mecânico diz que é um problema do escape, que chega passado 2 dias, todavia passado
esse tempo constata-se que a peça não chegou de França e marca para a próxima segunda e o
mesmo repete-se, pelo que assim, A quer se libertar desta situação, porque precisa do carro, mas
ambos continuam vinculados ao contrato, logo A tem de fazer uma interpelação admonitória em
que se dá um prazo extra para cumprir, definindo-o, e se continuar sem cumprir a mora
transforma-se em incumprimento definitivo e A pode resolver o contrato).

Relativamente ao Carlos estamos perante um contrato de arrendamento, em que temos uma prestação
duradoura reiterada, em que não há lugar à perda de benefício do prazo.

O Carlos tem direito à resolução do contrato, nos termos do art.1083.º/3 do CC, porque estão em falta
3 prestações, contudo não se verificam efeitos retroativos. O regime especial protecionista considera
que se o Alexandre pagar no prazo de 1 mês a resolução fica sem efeito, nos termos do art.1084.º/3 do
CC.

b) Quem ficou de cumprir primeiro era o Bernardo, logo não pode invocar a exceção de não
cumprimento, nos termos do art.428.º do CC.

Resulta do art.429.º para o art.880.º do CC que o devedor pode recursar-se a cumprir se a outra parte
não cumprir em simultâneo, ou não prestar garantias de cumprimento.

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Relações obrigacionais complexas

“Contrato e dever de proteção”: tese do Dr. Carneiro da Frada.

Artigo do Dr. Carneiro da Frada “Os deveres (ditos) “acessórios” e o arrendamento”: revista da
ordem dos advogados, 2013.

A relação obrigacional simples é o arquétipo das obrigações principais, em que a cada umas das partes
cabia um direito e um dever, sendo o modelo teórico de compreensão que não existe.

Todas as relações obrigacionais são complexas, sendo são compostas por conjuntos de direitos,
deveres, faculdades, de ónus e de sujeições de extensão e complexidade variáveis.

O que lhes confere unidade é o facto de elas derivarem do mesmo facto jurídico, que lhes confere
vinculatividade.

Quanto aos deveres:

· Principais da prestação: derivam do facto jurídico, isto é, da fonte das obrigações (contrato,
etc.). constituem o núcleo da relação e são eles que caracterizam e identificam o tipo da relação.
Ex.: no contrato de compra e venda os deveres principais são o cumprimento da coisa e a entrega
ao devedor. Em caso de incumprimento temos o dever de indemnizar o credor.

· Secundários da prestação: ainda têm como finalidade a realização da prestação principal. Estes
deveres são essenciais à satisfação plena do interesse do credor naquela prestação. Incluem-se no
sinalagma e a sua violação justifica recurso à exceção de não cumprimento.

Ex.: no contrato de compra e venda do automóvel podemos ter como dever acessório temos a
entrega do livrete. Na compra e venda de uma máquina complexa um dever acessório é a
entrega do manual de instruções, sem os quais não se sabe como usar a máquina.

Aqui temos algo essencial ao cumprimento da prestação principal, sem os quais não é possível
a realização da prestação.

· Acessórios de conduta: derivam da lei, mais especificamente derivam da boa-fé. Têm por base o
respeito e concretização legal da cláusula geral da boa-fé.

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Exemplo: na compra e venda de uma máquina complexa a prestação principal ºe a entrega da


máquina, a prestação secundária são a embalagem conveniente e as instruções de funcionamento e os
deveres acessórios são as precauções tomadas para que a máquina não deslize no momento da
montagem.

O objetivo é calcular materialmente o vínculo obrigacional, proteger quer as partes na sua pessoa quer
no seu património e proteger terceiros que tenham como obrigação um especial contacto.

o Deveres acessórios com finalidade positiva: visam o reforço e substancialização do


dever de prestar, prosseguindo um interesse que ainda é conexo com aprestação.

Ex.: deveres de informação e de lealdade.

o Deveres acessórios com finalidade negativa: o Dr. Carneiro da Frada denomina estes
deveres acessórios com finalidade negativa como deveres de proteção. Visam
proteger a contraparte dos riscos de danos na sua pessoa e património que nascem da
e, por causa, da relação estabelecida.

A violação de um dever de proteção acarreta, simultaneamente, responsabilidade


extracontratual.

Exemplo: A vai a fazer compras, escorrega no chão molhado e parte a bacia. Assim,
temos uma situação ilícito, pelo que não houve sinalização do piso molhado, pelo que se
aplicam as regras do concurso de responsabilidades.

Enquanto na responsabilidade contratual não existe presunção da culpa, pelo que o lesado
tem de provar a culpa do lesante, na responsabilidade por violação de deveres acessórios
de culpa, a doutrina tem entendido que se aplica a presunção de culpa do devedor, nos
termos art.799.º do CC.

O credor não tem de provar que o devedor deveria ter agido de outra maneira, mas que o
devedor não podia ter agido de outra maneira.

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Os deveres acessórios de conduta surgem no âmbito pré-contratual, da culpa in


contrahendo, perdurando durante toda a vida da relação obrigacional e depois da extinção
da prestação principal gozam de eficácia pós-contratual- culpa pos pactum finitum.

Estes deveres prevalecem mesmo depois de nulidade ou anulabilidade do contrato. -


“obrigações sem dever de prestar” (Laurence).

Em que momento da relação nascem os deveres acessórios da conduta?

Eles nascem na fase pré-contratual, no instituto de culpa in contrahendo, persistem durante toda a
relação principal, e perduram para além do término ou cumprimento dos deveres principais (culpa
post pactum finitum) e, mesmo, que por força da anulação da relação contratual que os deveres
principais se extingam retroativamente (obrigações sem dever de prestar).

Contratos com eficácia de proteção para terceiros- os deveres acessórios de conduta podem
estender-se a terceiros, especialmente ligados a uma parte do contrato.

Exemplo do caso Linóleo: A convidou a B a um café. C queria comprar linóleo. O funcionário sobe o
escadote e tira um rolo do meio, todavia os rolos desatam-se e magoaram o amigo de C.

O tribunal alemão invocou deveres acessórios de conduta com eficácia a terceiros, pelo que aquele
terceiro se encontrava naquele contexto, por força das negociações em curso, estando especialmente
ligado a uma das partes do negócio, reforçando o risco que levou ao dano.

Os deveres acessórios de conduta, por este motivo, abrangem os deveres acessórios de conduta
abrangem terceiros, sendo que o contraente responde por violação dos deveres acessórios de conduta
pelos seus auxiliares.

Distinguindo-se destes contratos com eficácia de proteção para terceiros temos os contratos com
deveres de proteção a cargo de terceiros.

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Um exemplo é o arrendamento, pelo que os terceiros que vivem com o arrendatário têm deveres de
preservação de coisa equivalentes aos do arrendatário.

Qual o regime jurídico a aplicar em caso de violação de um dever acessório de conduta?

Temos 2 posições doutrinais diferentes:

· Regime da responsabilidade contratual pura (Menezes Cordeiro);

· Responsabilidade de terceira via (Carneiro da Frada): as regras devem-se ir buscar ao regime


de responsabilidade contratual ou extracontratual, consoante a maior proximidade teleológica.

Exemplo: ao nível de presunção de culpa tem-se entendido que se aplica o art.799.º do CC.

Respeitado o princípio da proporcionalidade e os requisitos do instituto é possível invocar a


exceção de não cumprimento por violação de deveres acessórios de conduta.

A exceção de não cumprimento é invocada por violação de deveres acessórios de conduta, mas pelo
facto da outra parte não ter cumprido com deveres principais e secundários, o que não significa que o
lesado não tenha de cumprir os seus deveres acessórios de conduta.

A violação de deveres acessórios de conduta pode levar à cessação de um contrato, tendo como
sanção a indemnização.

Caso prático nº4: Acórdão de 13 de outubro de 2016 (Maria da Graça Trigo)

O dever de fornecer o código de desbloqueio é um dever secundário, porque sem o código de


desbloqueio a máquina não iria funcionar.

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B invoca a exceção de não cumprimento, porque A devia 3000€ de arranjos de máquinas que tinha ido
arranjar a A, todavia não há sinalagmaticidade entre o arranjo das máquinas e da obrigação de
fornecer o código de desbloqueio, logo não pode invocara. Exceção de não cumprimento.

Caso prático nº5

a) Temos uma situação de violação de um dever de proteção da integridade física dos adeptos e é um
caso de dever post pactum finitum.

As obrigações principais são pagar o bilhete e assistir ao jogo, mas de reserva do acesso ao
estádio um dever de proteção da integridade física da pessoa até ao momento me que ela sai
do estádio.

É um dever ex lege, que deriva do art.763.º/2 do CC.

Para averiguar a violação temos de analisar os requisitos da responsabilidade civil, pelo que
foi um ato voluntário, ilícito, culpa, nexo de causalidade.

Existe uma presunção de culpa do art.799.º do CC e, portanto, a existência de um dever de


indemnização depende do quanto B consegue demonstrar as diligências necessárias.

b) Estamos perante um dever com eficácia de proteção de terceiros, podendo abranger pessoas de
uma esfera de risco partilhada com o credor do dever de proteção, logo a ação de pedido de
indemnização era procedente.

Caso prático nº6

Estamos perante um contrato de prestação e serviços, em que as obrigações principais são a mudança
do óleo e o pagamento do preço, aparentemente temos uma violação do dever acessório de conduta de
proteção do património, em que automóvel estava ao cuidado e guarda do Filipe.

Existe uma presunção de culpa que Filipe tem de afastar para não ser responsável.

No lugar de advogado de Filipe era importante demonstrar que a oficina estava dotada de um bom
sistema de vigilância, de reforço das portas, janelas, etc.

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O Emanuel teve um dano superior a 70€, logo pode invocar a exceção de não cumprimento e o Filipe
deve reparar os vidros.

Eficácia externa das obrigações

Em que medida é que os deveres que emergem das relações obrigacionais vinculam terceiros, ou seja,
existe um dever geral de terceiros de não perturbar direitos de crédito alheios ou ainda pode um
terceiro ser responsabilizado ou obrigado a indemnizar um credor, seja por ter contribuído para tornar
impossível a prestação ou ter instigado o devedor a não cumprir?

Se os deveres que derivam da relação obrigacional podem vincular terceiros.

Exemplo: devedor insolvente que não tem condições de indemnizar, a responsabilidade de indemnizar
não lhe é imputável, mas a terceiro.

O devedor não tem culpa, mas de terceiro.

Zé Pagodinho é um cantor de pagode brasileiro e foi contratado por uma marca de cerveja para cantar
um jingle publicitário que teve muito sucesso. Em consequência, as vendas daquela marca
aumentaram e o cantor tinha o contrato de serviço de exclusividade por 1 ano com aquela marca de
cerveja, tendo sido ficada uma cláusula penal caso se verificasse um incumprimento.

A marca mais famosa face ao sucesso da marca concorrente iniciou negociações secretas com o
cantor, acordando pagar a cláusula penal que o incumprimento do contrato exigia. Assim, Zé
Pagodinho faz um novo jingle publicitário para a tal marca famosa e a marca com quem tinha
contratado primeiro invoca a eficácia externa das obrigações, por comportamento atentatório aos bons
costumes, com o intuito de interferir com o incumprimento.

A grande questão é que as obrigações só geram efeitos para as partes, pelo que são relativas, não se
verificando a eficácia externa das obrigações, uma vez que os terceiros não podem ser
responsabilizados numa relação entre o credor e o devedor.

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A regra deve ser que as obrigações só produzem efeitos sobre as partes, mas deverá haver limites?

A eficácia externa das obrigações goza de aceitação nos países da Common Law através da wrongful
interference no Reino Unido e da TORT for inducing breach of contrat (responsabilidade
extracontratual por incumprimento das obrigações) nos EUA, em França temos o mesmo instituto do
Tort aplicado nos EUA.

Na Alemanha, Itália e Portugal temos a teoria da responsabilidade do terceiro cúmplice tem tido
inúmeras desistências, pela questão da relatividade e pelo impacto que traz ao nível da
desmultiplicação da causalidade e ao nível das relações contratuais.

Exemplo: A é cantor e promete-se a dar um concerto no hotel B e o hotel C toma conhecimento e


oferece-lhe outra proposta, em que paga o triplo, para atuar o seu hotel, que é ao lado do hotel B.

Sabendo que o hotel B fez toda a publicidade do concerto, vendendo os bilhetes, senhas e o hotel C
agiu com o intuito de prejudicar B. Quid Iures?

Para resolver esta situação podemos adotar 1 das 3 posições divergentes em Portugal sobre esta
matéria:

· Galvão Telles: seguida pelo Dr. Menezes Cordeiro, que entende que a eficácia externa das
obrigações resulta diretamente do art.483.º do CC, que regula a responsabilidade civil
extracontratual. (posição francesa). O art.483.º do CC tem como elemento literal “direitos”, não
especificando que são direitos absolutos, logo estes autores consideram que estão em causa
direitos absolutos e relativos, sendo esta a posição mais ampla. Note-se que não há presunção de
culpa do art.799.º do CC. Normalmente estes autores introduzem um elemento de ponderação em
que a culpa tem de ser dolosa, ou seja, tem de estra em causa dolo e não negligência. O Dr.
Menezes Cordeiro entende que para estra preenchida a ilicitude têm de estra preenchidos os
termos do abuso de direito.

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· O art.483.º do CC aplica-se apenas a direitos absolutos e interesses legalmente protegidos,


rejeitando a aplicação a direitos relativos. - Posição mais restritiva.

o Antunes Varela: defende que não há eficácia externa das obrigações, apenas em
situações extremas de concorrência desleal ou de abuso de direito é que estas
situações podem ser salvaguardadas. Entende que está relacionado questões de
propriedade, como direito absoluto, em que o credor arroga um direito que não tem,
por exemplo.

o Ribeiro de Faria: aproxima-se do Dr. Carneiro da Frada. Não aceita a eficácia externa
das obrigações, mas se o terceiro tiver intenção de prejudicar o credor ou tiver
consciência do prejuízo que lhe cause, então por “reprovação da consciência ética
imperante” estas situações devem ser corrigidas através do abuso de Direito.

o Carneiro da Frada: considera que nunca está em causa a aplicação imediata do abuso
do direito, porque estão em causa faculdades e não direitos, mas quais os contornos,
em que se pondera a aplicação analógica do abuso de direito em caso de
responsabilidade?

O Dr. Carneiro defende o imperativo ético-jurídico de censurar a criação malévola de


prejuízos a terceiro.

O critério é o do parágrafo 826.º do BGB, através do qual uma pessoa que em oposição
aos bons costumes inflige intencionalmente danos a outra a pessoa está obrigada a
indemnizá-la pelos danos causados.

Não basta a intencionalidades de infligir danos a outro, mas é necessário que essa conduta
seja censurada pelos imperativos éticos dominantes em cada momento.

A motivação do agente é especialmente relevante neste contexto.

Perante a inexistência de um artigo equivalente no Código Civil português e recusando


que o art.483.º do CC se aplique fora dos direitos absolutos, então temos uma lacuna no

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sistema português que se resolve por aplicação analógica do art.334.º do CC (abuso de


direito).

Ver o manual “Uma terceira via no direito da responsabilidade civil”, Almedina 1997.

A diferença entre as posições de cada um dos autores tem a ver com o grau de censurabilidade que é
atribuída.

Ao nível da jurisprudência do STJ tem sido consistentemente restritiva em matéria de eficácia externa
das obrigações. Não obstante, nota-se uma evolução de sentido contrário na jurisprudência mais
recente, assistindo-se nos últimos anos a uma evolução invisível no sentido de acolhimento de uma
forma menos restritiva da teoria da eficácia externa das obrigações.

Resolução do caso prático nº 9

Considerações importantes:

1º: identificar o problema: relatividade, eficácia externa e apresentar as 2 grandes posições em termos
estruturais (art.483.º do CC e posição restritiva que nega a aplicação do art.483.º do CC);

2º: sem prejuízo de haver variações me termos doutrinais apresentamos a solução que consideramos
mais adequada.

3º: enquadrar ao caso prático.

Resposta:

L-M

N (não pode receber uma indemnização de Mário, por força da relatividade das obrigações, mas
pode receber de Luís.)

Estamos perante uma questão sobre a eficácia externa das obrigações, me que temos de saber se o
nuno podia interferir no pacto entre o Mário e o luís.

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Quando o Luís vende as ações a nuno, sem dar conhecimento ao Mário, viola o pacto de preferência,
logo temos um incumprimento contratual de Luís.

Assim, temos responsabilidade civil contratual de Luís, mas Mário quer responsabilizar diretamente
Nuno, que é terceiro no contrato.

Podemos ter indícios de que se aplica analogicamente o art.334.º do CC do abuso de direito, porque
Nuno instigou o Luís a não comunicar a intenção de venda das ações a Mário, agindo com dolo e em
oposição aos bons costumes.

Por outro lado, poderíamos defender que para haver abuso de direito era necessária uma ação extra
para além da instigação, logo não se aplicava o abuso de direito.

Resolução do caso prático nº10

a) A questão que se coloca é se o clube que tinha o direito de crédito sobre o Bertinho se tornou
impossível, porque ele não pode jogar devido ao acidente e, por isso, pode o clube pedir uma
responsabilidade pelo atropelamento?

A resposta é negativa, porque não cabe na posição mais defendida, porque não há abuso de
direito, porque não houve intenção de causar danos ao clube e nem podíamos aplicar o abuso
de direito por analogia, porque não há o exercício de uma faculdade de contratar, mas um
acidente.

Relativamente à posição do at.483.º do CC, desde logo, era necessário que ao nível da culpa,
Alberto conhecesse o contrato entre o Bertinho e o clube e tivesse a intenção de agir em
prejuízo do clube.

Aqui o terceiro gera uma impossibilidade de cumprimento. É exigível ao nível da culpa que o
terceiro tenha agido dolosamente, sendo claro no caso em questão que. não há elementos que
concluíam esta ação dolosa.

b) Estamos perante uma situação em que temos a eficácia externa da pensão de alimentos, nos
termos do art.495.º/3 do CC (exceção- regula a indemnização por dano morte e no nº3 temos uma
apresentação de quem tem direito a indemnização, por consequência da morte), consagrando que
o terceiro é obrigado a indemnizar aquele que em consequência deixa de poder de exigir a
obrigação de alimentos.

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Direitos reais e direitos de crédito

As distinções entre os direitos reais e direitos de crédito têm implicações ao nível do regime:

Direitos de crédito Direitos reais

Direito a um comportamento, cujo objeto é a Direito sobre a coisa: poder direto e imediato
prestação. de uma pessoa sobre uma coisa.

Direito relativo. Direito absoluto.

Princípio da liberdade contratual (art.405.º do Princípio da prevalência, princípio da sequela,


CC). princípio da tipicidade (numerus clausus-
art.1306.º do CC).

Os direitos pessoais de gozo situam-se numa área de fronteira entre os direitos reais e os direitos de
crédito.

Assim, entendemos que enquanto o titular do direito de crédito necessita da colaboração do devedor
na adoção do comportamento devido, com a exceção dos direitos potestativos, o poder do titular do
direito real exerce diretamente sobre a coisa, não dependendo de intermediação.

Os direitos reais são absolutos, pelo que possuem eficácia erga omnes, sendo oponíveis a todas as
outras pessoas.

Daqui retiram-se 2 características fundamentais dos direitos reais:

· Princípio da prevalência manifesta-se nas seguintes situações:

o Prevalência dos direitos reais sobre os direitos de crédito, independentemente de


estes terem sido constituídos antes ou depois daqueles;

o Prevalência do direito real primeiramente constituído, significando que o direito


real prevalece sobre qualquer situação jurídica posteriormente constituída sobre a

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coisa, sem que para tal tenha concorrido a vontade do seu titular, se não for
possível a conciliação entre ambas as situações.

Exemplo: A constitui uma hipoteca sobre a sua casa em 2010, em 2015 constitui uma
2ª hipoteca sobre a sua casa para pagar créditos bancários e em 2020 A encontra-se
em situação de incumprimento quanto a ambos os créditos. A deve 50000€ a B da 1ª
hipoteca constituída em 2010 e deve 50000€ da hipoteca constituída em 2015.

A venda da casa em hasta pública rende 70000€, como vamos distribuí-los?

Dos 70000€, 50000€ são distribuídos para 1 ª hipoteca que prevalece inteiramente e é
totalmente ressarcida e, o que sobra (20000€) é que vai ser atribuído à 2ª hipoteca.

Exceções a este princípio:

1) Estando em causa um direito sujeito a registo prevalece o direito


primeiramente registado e não o primeiramente constituído, por causa da
inoponibilidade dos factos não registados a terceiro.

2) Há alguns direitos reais de garantia que prevalecem sobre outros direitos de


garantia anteriormente constituídos.

Exemplos: privilégios imobiliários que prevalecem sobre as hipotecas


anteriormente constituídas.

Direito de retenção que prevalece sobre a hipoteca.

· Direito de sequela consiste na faculdade que tem o titular do direito real de fazer valer o seu
direito sobre a coisa, onde quer que esta se encontre.

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Exemplo: A é proprietário de um prédio e constitui uma hipoteca sobre esse prédio a favor de B. 3
anos depois e enquanto a hipoteca está em vigor, A vende o prédio a C. O que acontece à hipoteca?

C adquire o prédio onerado com a hipoteca, porque o direito real acompanha a coisa onde quer que ela
vá, logo C adquire o prédio hipotecado.

Tipos de direitos reais:

· Garantia: conferem ao seu titular a possibilidade se pagar ou fazer pagar o valor ou rendimentos
de certa coisa em caso de incumprimento do devedor, de preferência a qualquer outro credor.
Destinam-se a assegurar o cumprimento das obrigações e conferem ao seu titular (credor) a
possibilidade de se pagar o valor ou rendimentos. É sinónimo de garantia reais das obrigações;

· Gozo: conferem ao titular a faculdade de fruir as utilidades ou vantagens económicas da coisa,


que é objeto do Direito;

· Aquisição: facultam ao seu titular a aquisição e direitos relacionados com uma coisa aos mesmos
juridicamente afetados. Estão normalmente ligados à aquisição de direitos reais de gozo e é deles
exemplo, o direito real de preferência ou o contrato-promessa com eficácia real.

Resolução do caso prático nº12

Estamos perante 2 direitos de crédito conflituantes, mas ambas relações obrigacionais, em que
resultam 2 direitos de crédito.

Os direitos de crédito não gozam do princípio da prevalência e, portanto, não há nenhuma regra de
prioridade temporal nestes casos. Assumindo o devedor os 2 compromissos ele poderá escolher aquele
que irá cumprir, tendo de indemnizar o outro pelos danos causados ao abrigo do incumprimento
contratual, segundo o disposto art.798.º do CC, sendo isto apenas possível nos direitos de crédito que
são direitos relativos que não gozam da característica da prevalência.

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Direitos pessoais de gozo

Estes direitos caracterizam-se por serem direitos de crédito, mas que proporcionam ao seu
beneficiário o gozo de uma coisa corpórea, o que os torna especialmente próximos dos direitos reais.

O Dr. Menezes Cordeiro considera que os direitos pessoais de gozo só são direitos de crédito por
questões histórico-culturais, na sua essência deveriam ser direitos reais.

A lei portuguesa reconhece 4 direitos pessoais de gozo:

· Direito do locatário (art.1022.º do CC);

· Direito do parceiro pensador (art.1121.º do CC);

· Comodatário (art.1129.º do CC);

· Depositário (art.1185.º do CC).

Apesar de permitirem o gozo da coisa através de um poder direto sobre ela, assentam na relação entre
o titular do direito pessoal de gozo e o titular do direito real, dependendo desta relação obrigacional
para existirem.

Exemplo: O direito do arrendatário deriva da relação obrigacional entre ele e o proprietário do imóvel
que é o senhorio.

De que relação depende o direito de propriedade do proprietário? Nenhuma, pelo que os direitos reais
não dependem de nenhuma relação.

Regra: Aplica-se aos direitos pessoais de gozo o regime dos direitos de crédito, com as seguintes
exceções que aproximam estes direitos pessoais de gozo aos direitos reais:

· Art.407.º do CC: havendo conflito entre 2 direitos pessoais de gozo prevalece o primeiramente
constituído, estando presente uma manifestação do princípio de prevalência. Se estiver em causa
um direito pessoal de gozo sujeito a registo também vigora a exceção da prioridade do registo.

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O Dr. Carneiro da Frada considera que não deveria prevalecer o direito primeiramente constituído,
mas o efetivado que obteu primeiramente o direito sobre a coisa. Supondo que havia 2 contratos de
arrendamento, em que o 1º foi constituído em fevereiro e 2º em março, segundo o art.407.º do CC
aquele que prevalece é o 1º contrato, mas o Dr. Carneiro da Frada considera que prevalece aquele que
obter primeiro o direito sobre a coisa.

· Art.1037.º/2, 1125.º/2, 1133.º/2 e 1188.º/2 do CC: os titulares de um direito pessoal de gozo


podem recorrer à ação possessória para o reivindicarem perante terceiros.

· Art.1057.º do CC: o direito do locatário é assistido por um direito de sequela, podendo ser
invocado e oposto contra terceiro que tenha adquirido o bem na pendência da locação.

Exemplo: A e B celebram um contrato de locação e na vigência do contrato, B, senhorio, vende o


imóvel a C. O que acontece ao contrato de arrendamento?

O contrato de arrendamento acompanha a transmissão do bem, o que significa que A pode exigir de C
o exercício do seu direito de arrendatário, pelo que C passa a ser o senhorio de A. O direito de sequela
é exclusivo da locação, não se exigindo nos demais direitos pessoais de gozo.

Nota importante: Este direito de sequela é exclusivo da locação e não existe nos demais direitos
pessoais de gozo, o que é na verdade um forte argumento quanto à natureza obrigacional destes
direitos.

Existe outro argumento importante que é o facto destes direitos não gozarem de um princípio da
liberdade contratual, mas de um princípio de numerus clausus (só existem os direitos presentes na lei).

Se as partes criarem direitos pessoais de gozo novos estes estão sujeitos à sequela?

Não, apenas a locação.

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Contrato-promessa

Exemplo de análise do art. 442.º/2/2ª parte do CC:

A celebra com B um contrato promessa, em que A promete vender a B uma fração de um apartamento
em construção de 100000€ e houve sinal da coisa no valor de 10000€. Tendo em conta que estamos
perante um período inflacionista, o valor do prédio aumentou e 3 anos depois a fração do prédio vale
150000€. B vende o bem a C por 150000€.

Assim, B pode optar pela devolução do sinal em dobro (20000€) ou como houve tradição da coisa
pode fazer o seguinte cálculo o valor à data do cumprimento (150000€)+ valor do sinal (10000€)-
valor convencionado para a venda (100000€)= 60000€.

Resolução do caso prático nº11: Direitos pessoais de gozo

a) Quando a Bárbara chegou ao Porto para se instalar no aparamento o Carlos já o tinha ocupado,
como podemos resolver esta situação?

Estamos perante um conflito de direitos pessoais de gozo, que deriva da incompatibilidade entre as
duas prestações assumidas por A.

Nos termos do art.407.º do CC e, por força da manifestação do princípio da preferência, em sede de


direitos pessoais de gozo, prevalece o direito primeiramente constituído, logo prevalece o direito de
Bárbara.

E quanto ao contrato celebrado entre António e Carlos, o contrato é nulo?

O contrato entre A e C não é nulo, porque estamos. No âmbito dos direitos pessoais de gozo, mas A
coloca-se em situação de incumprimento contratual, tendo de indemnizar C, nos termos do art.798.º
do CC.

b) Primeiramente, temos de atentar que com a venda do imóvel ao adquirente adquire um direito real
com eficácia erga omnes, ou seja, implica a transferência de um direito real oponível a todos.
Embora, em termos gerais, o direito real prevaleça sobre o direito de crédito, nos termos do

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art.1057.º do CC, a lei exceciona desta preferência, especificamente os contratos de locação, que
gozam da característica da sequela.

Assim, o imóvel é vendido onerado com o contrato de arrendamento.

c) Neste caso, teríamos um comodato, pelo que a resposta não seria a mesma dada anteriormente. O
direito de sequela, em matéria de direitos pessoais de gozo, é exclusivo do direito de locação, não
abrangendo o contrato de comodato.

Resolução do caso prático nº13: Direitos reais e direitos de crédito e contrato-promessa

a) Estamos perante um caso prático sobre contrato promessa, mas na verdade temos um conflito
entre direitos reais e direitos de crédito.

Quem detém a propriedade do apartamento, após o dia 20 de novembro?

O Guilherme, porque houve um contrato de compra e venda entre Eva e Guilherme, mas
anteriormente houve um contrato promessa entre Eva e Fernanda, que só gera para Fernanda um
direito de crédito à data da celebração do contrato, enquanto para Guilherme gera um direito de
propriedade, logo em termos de direito ao imóvel, avaliando a posição jurídica de Fernanda e de
Guilherme, por força do princípio da preferência, os direitos reais prevalecem sobre os direitos de
crédito, mesmo que primeiramente constituídos, por isso prevalece o direito de propriedade de
Guilherme.

Do contrato promessa resultou a tradição da coisa que gera para o promitente comprador (Fernanda),
nos termos do art.755.º/1/f) do CC, um direito de retenção.

Um direito de retenção é um direito real de garantia, que tem como função conferir ao seu titular o
ressarcimento do valor daquele bem com prioridade face aos restantes credores.

F tem o direito de garantia sobre o imóvel, significa na prática que G tem o direito de propriedade e F
tem o direito, em consequência do não cumprimento do contrato- promessa, ao dobro do valor do
sinal (40000€).

O direito de retenção é um direito para proteger os mais frágeis, por isso, existem divergências
doutrinais sobre a aplicação do direito de retenção apenas em contratos com consumidores ou a todos
os contratos de compra e venda.

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O direito de retenção prevalece sobre a hipoteca.

Há sempre um dano, que constitui uma perda e que recai sobre alguém.

Resposta:

a) Devemos partir da identificação do tipo contrato e da classificação jurídica: neste caso, entre E e F
foi celebrado um contrato-promessa bilateral, sinalizado e sem eficácia real, pelo que para ter
eficácia real devia haver escritura pública ou documento particular autenticado ou quando o
próprio contrato contém uma cláusula, pela qual as partes estipulam essa eficácia real, de acordo
com o art.413.º do CC. Assim, o contrato-promessa só gera efeitos obrigacionais, gerando para
Fernanda um direito de crédito.

Eva quando vende o imóvel ao Guilherme incumpre o contrato-promessa, logo temos um


incumprimento de Eva perante Fernanda, que nos remete para o regime do não cumprimento
do contrato- promessa.

Primeiramente, não é relevante neste caso a execução específica, pelo que, em regra, a
execução específica pode ser afastada pela vontade das partes e o sinal equivale a presunção
iuris tantum de afastamento da execução específica.

De acordo com o art.830.º/3 do CC, não é possível afastar a execução específica por vontade
das partes e, portanto, o sinal não equivale a afastamento da execução específica por vontade
das partes, nos casos dos contratos consagrados do art.410.º/3 do CC, ou seja, nos casos em
que o objeto do contrato-prometido é um edifício ou fração autónoma a construir ou em
construção, o sinal não equivale a afastamento da execução específica, segundo o disposto
art.830.º/3 do CC

Todavia, mesmo nos casos do art.410.º/3 do CC estando em causa um contrato-promessa sem


eficácia real, a venda de um bem a terceiro por promitente vendedor afasta a possibilidade de
o promitente comprador recorrer à execução específica, porque pelo princípio da prevalência,
em que estão em causa dois direitos incompatíveis, prevalece o direito real, mesmo que o
direito de crédito tivesse sido constituído anteriormente.

Transpondo para o caso, F tem o direito de crédito e o G tem o direito de propriedade,


resultante do contrato de compra e venda celebrado entre a Eva e o Guilherme que produziu
efeitos reais, logo pelo princípio da prevalência o direito real de G prevalece sobre o direito de
crédito de F, o que faz com que se afaste a possibilidade de execução específica.

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Assim, F pode exigir uma indemnização através de 2 hipóteses, nomeie-se a possibilidade de


pagamento do sinal em dobro (40000€) e indeminização pelo aumento do valor da coisa, que
se calcula pela soma do preço atual do bem com o valor do sinal, subtraindo ao valor
acordado pelo contrato-promessa, sendo que esta última só é possível quando há tradição da
coisa (o bem é colocado à disposição do promitente comprador).

Esta indemnização está garantida legalmente por um direito de retenção, que é um direito real
de garantia que confere a F a garantia de que vai ser ressarcida pelo valor daquele bem com
prioridade em relação aos restantes credores, de acordo com o art.755.º/1/f) do CC.

Assim, voltamos a ter novamente dois direitos em conflito entre o direito real de retenção F e
o direito real de gozo de G, em que pelo princípio da prevalência, F pode recusar-se a
abandonar o imóvel até ser ressarcida do valor que lhe é devido pela E, que por sua vez, não
tem direito ao imóvel.

A partir do momento que E pagar a F a indemnização devida, F tem de sair do imóvel, sendo
que o direito de retenção protege o direito de indemnização.

Por fim, note-se que, na pior das possibilidades, haveria ata pública para vender o imóvel,
sendo o valor resultante da venda utilizado para ressarcir a F e o restante que sobrasse para o
G.

b) Neste caso, nasceria um direito real de aquisição para Fernanda e, por força do princípio da
preferência, entre o direito real de aquisição de F e o direito real de gozo de G prevaleceria o
direito de F, que foi o primeiramente constituído.

F pode recorrer à execução específica, nos termos do art.830.º/3 do CC, porque sendo um
contrato do art.410.º/3 do CC, então nos termos do art.830.º/3 do CC, o sinal não equivale a
afastamento da execução específica, acrescendo que tenho o direito real de aquisição eficácia
erga omnes ele é oponível a G, cedendo o direito real de gozo deste, em caso de execução
específica por F.

Resolução do caso prático nº14: Contrato-promessa

a) O contrato promessa em apreço é de compra e venda, sem eficácia real, bilateral e não sinalizado.

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Verificou-se um não cumprimento temporário por parte do promitente vendedor. Apesar de não ser
um contrato enquadrável no art.410.º/3 do CC, a inexistência de sinal leva a que não exista presunção
de afastamento de execução da execução específica por vontade das partes, logo B pode recorrer a
execução a específica, nos termos do art.830.º/2/3 do CC.

Não havendo sinal, não podia haver indemnização pelo dobro do sinal, então teríamos de averiguar se
haveria indeminização pelo aumento do valor, em que a doutrina se divide.

Há autores que defendem que a existência de sinal é teleologicamente irrelevante para efeitos de
indemnização pelo aumento do valor da coisa, logo calculava-se pela diferença entre o valor atual e o
preço fixado inicialmente no contrato.

O art.442.º/2 do CC em sentido literal, deixa clara que para que haja indemnização pelo aumento do
valor da coisa temos de estar perante um contrato sinalizado, sendo esta outra posição doutrinal.

Assim, para se aplicar a indemnização pelo aumento do valor da coisa teríamos de fazer uma
interpretação restritiva.

Não admitindo a possibilidade de indemnização pelo aumento do valor da coisa, então resta a B pedir
uma indemnização nos termos gerais de direito, nos termos do art.798.º do CC, que se calcula pela
teoria da diferença (diferença entre a situação patrimonial em que o lesado se encontra hoje e a
situação em que o lesado se encontraria se não houvesse o incumprimento).

Seguidamente temos outra divisão doutrinal, em que B para exigir a indemnização terá de transformar
a mora em incumprimento definitivo através de uma interpelação admonitória, nos termos do art.808.º
do CC, em que se concede ao devedor um prazo adicional para cumprir, findo o prazo e verificando-se
ainda ao incumprimento o promitente comprador pode resolver o contrato.

Nota importante: A execução específica só é permitida em incumprimento temporário, em que o


devedor está em mora e se o incumprimento é definitivo, então temos uma indemnização pelo
incumprimento que já não é possível de se reverter, logo dá lugar a indemnização.

b) Temos uma divisão doutrinal sobre a relevância jurídica de um contrato promessa bilateral que
apenas foi assinado por 1 das partes.

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Segundo o art.410.º/2 do CC, quando o contrato promessa exige escritura pública ou documento
autenticado exige assinatura das 2 partes, no caso de ser bilateral, o que no presente caso não sendo
assinado pelas 2 partes é nulo por vício de forma.

Existem 2 institutos que procuram aproveitar contratos nulos que são a redução e conversão.

As questões que se colocam são de saber se este contrato pode valer como unilateral, vinculando a
parte que se obrigou e se esse juízo corresponde a uma redução ou conversão?

Na redução só não ocorre se a parte que não a deseja provar que as partes não a desejariam se
tivessem dela sabido no momento da celebração do contrato.

A conversão só ocorre se a parte que a deseja provar que essa teria sido a vontade das partes, se
tivessem sabido na data de celebração do contrato promessa.

O Dr. Antunes Varela defende o regime da conversão, em que está em causa uma nulidade total, mas o
Dr. Almeida Costa defende uma nulidade parcial, à qual se aplica o regime da redução.

O STJ no assento de 29 de novembro de 1989 que não resolve o problema e considera que é admitido
que este contrato-promessa bilateral a que falta uma assinatura valha como contrato promessa
unilateral e “desde que esta tivesse sido a vontade das partes”.

No assento de 15 de março de 1993 considera-se que está em causa uma nulidade parcial do negócio
e, por isso, aplica-se o regime da redução, mas materialmente aplicou no caso as regras da conversão.

Em conclusão, entende-se que prevalece a tese da conversão.

Resolução do caso prático nº15: Contrato-promessa

Estamos perante um contrato-promessa de compra e venda de bens móveis, neste caso um quadro,
bilateral, sinalizado e sem eficácia real, pois não cumpre os 3 requisitos do art.413.º do CC (indicação
pelas partes de que querem realizar um contrato-promessa com eficácia real, assinatura de ambas as
partes e escritura pública ou documento particular).

Verificamos que não houve tradição da coisa, pois esta manteve-se na exposição da galeria do António
até à data de celebração do contrato definitivo com Bárbara, que seria a 10 de janeiro de 2017.

O António, na qualidade de promitente-comprador, incumpre o contrato de compra e venda prometido


com Bárbara, logo estamos no campo do incumprimento do contrato-promessa.

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Primeiramente, como o contrato é sinalizado e, por isso, afasta a presunção iuris tantum (ilidível) de
recurso à execução específica, nos termos do art.830.º/2/3 do CC, pelo que restava à Bárbara,
enquanto detentora do direito de crédito, resultante do contrato-promessa com eficácia meramente
obrigacional exigir uma indemnização a António.

Assim, a Bárbara, de acordo com o art.442.º/2/ 1ª parte do CC, exigir o pagamento do dobro do sinal
penitenciário prestado que era de 30000€ (15000x2), mas não poderia recorrer a uma indemnização
pelo aumento do valor do bem, pelo facto de não ter ocorrido tradição da coisa, segundo o disposto
art.442.º/2/2ª parte do CC, que iria ser calculado pela soma do valor atual do bem com o valor do
sinal, subtraindo o valor convencionado pelas partes (seria um valor de 65000€, se esta fosse uma
possibilidade, neste caso).

Por fim, cumpre destacar que a Bárbara não poderia recorrer à interpelação admonitória, na precisa
medida em que o António já havia incumprido definitivamente ao celebrar um contrato de compra e
venda com um colecionador alemão, que adquire de forma imediata o direito real de propriedade
sobre o quadro.

Acrescente-se que estando o bem na posse do colecionador alemão, que nesta relação é terceiro, a
Bárbara nunca poderia executar o quadro a este, por força do princípio da prevalência, segundo o qual
prevalece sempre o direito real sobre o direito de crédito, ainda que este tenha sido primeiramente
constituído.

Em suma, restava a Bárbara ser ressarcida, por meio da indemnização paga pelo António.

Resposta:

Estamos perante um contrato-promessa sinalizado, bilateral e sem eficácia, estando perante uma
situação de incumprimento do promitente-vendedor.

Como o bem foi vendido a terceiro, A já se encontra em incumprimento definitivo, na medida em que
vendeu o bem a um terceiro.

Assim, B pode de imediato avançar com uma indemnização pelo dobro do sinal, sem necessidade de
interpelação admonitória, uma vez que já nos encontramos em incumprimento definitivo.

Não havendo tradição da coisa, não poderia recorrer a indemnização pelo aumento do valor da coisa.

A execução específica nunca seria possível, por 2 motivos, primeiramente, porque o contrato não
tendo eficácia real a venda a terceiro afasta imediatamente a possibilidade de execução específica e,
ainda, que o bem não tivesse sido vendido a terceiro, para haver lugar a execução específica seria

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necessário afastar a presunção ilidível do art.830.º/2 do CC, dado que não estamos perante um
contrato enquadrável no art.410.º/3 do CC.

Resolução do caso prático nº16: Contrato-promessa (art.442.º/3/parte final do CC e interpelação


admonitória) e Contrato para pessoa a nomear

a) Estamos perante um contrato-promessa de compra e venda bilateral, sinalizado e sem eficácia


real.

Temos um incumprimento temporário de C, porque a prestação ainda é possível e não há nada no


enunciado que indique perda objetiva do interesse ou interpelação admonitória.

A perda objetiva do interesse tem de resultar claro que fora daquele dia não havia interesse para a
parte de celebrar o contrato.

Assim, a partir desta situação mora, D pode recorrer a execução específica, pelo que estamos perante
uma fração autónoma que cabe no art.410.º/3 do CC, logo de acordo com o art.830.º do CC, a
execução específica não pode ser afastada pela vontade das partes.

Na medida em que o imóvel continue na titularidade de C, D pode recorrer a execução específica.

D terá direito a indemnização ao dobro do valor do sinal que seria de 50000€ (10000€+15000€x2) ou
indemnização pelo aumento do valor da coisa, uma vez que houve tradição, pelo que D passou
imediatamente a habitar o apartamento.

O art.442.º/3/ parte final do CC estabelece que é possível recorrer à indemnização pelo


aumento do valor da coisa sem interpelação admonitória, ou seja, da parte final do art.442.º/3
do CC parece que o promitente lesado pode recorrer à indemnização pelo aumento do valor da
coisa, sem ter primeiro de transformar a mora em incumprimento objetivo, mas como é
possível? Existem 2 posições doutrinais diferentes:

· O Dr. Antunes Varela considera que se isto é permitido para a indemnização do


aumento do valor da coisa não há motivo para vedar essa possibilidade para a
indemnização pelo dobro do sinal. Assim, critica de iure condicto a solução do
art.442.º/3 do CC que vai contra a lógica do sistema, mas entende que a única
interpretação que se pode retirar dela é de facto de que é possível ao promitente
lesado requerer a indemnização sem transformar a mora em incumprimento

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definitivo. A consequência dessa transformação é impedir o promitente faltoso de


oferecer o cumprimento em alternativo.

· Para o Dr. Calvão da Silva, a norma do art.442.º/3/parte do CC não se coaduna


com o sistema dotado em matéria de incumprimento pelo CC, pelo que deve ser
objeto de uma interpretação ab-rogante. Assim, o recurso à indemnização
pressupõe sempre a transformação da mora em incumprimento definitivo e a
prévia resolução do contrato.

Esta posição tem sido adotada pelo STJ.

Em resumo, não faz sentido pedir uma indemnização pelos danos totais do contrato,
quando não estamos perante um incumprimento definitivo, ou seja, quando ainda
estamos em mora não é possível pedir uma indemnização por danos definitivos e
totais, enquanto o contrato ainda está em vigor.

b) Se houve interpelação admonitória, depois pode haver execução específica?

Se o contrato se resolver por interpelação admonitória, não é possível recorrer à execução específica.

Existe uma divisão doutrinal em que se questiona se a interpelação admonitória implica


automaticamente a resolução do contrato ou não:

· Dr. Antunes Varela: a interpelação para cumprimento, também chamada


interpelação admonitória, não acarreta necessariamente como cominação a
resolução do contrato, tudo dependendo da formulação da mesma.

· Dr. Almeida Costa: a interpelação admonitória tem como consequência, sem


mais, a transformação da mora em incumprimento definitivo, afastando, portanto,
a possibilidade de recurso à execução específica.

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Logo se D interpelou C para cumprir, mas sem indicar que a consequência do não
cumprimento dentro desse prazo era a resolução do contrato, para a posição do Dr. Varela D
mantém o direito à execução específica.

Se indicar que a consequência do não cumprimento do prazo de interpelação admonitória é


resolução do contrato, então fica afastado a execução específica.

c) Estamos perante a figura do contrato para pessoa a nomear, consagrada no art.452.º-456.º do


CC.

O que caracteriza este contrato é que uma das partes reserva-se a faculdade de designar uma outra
pessoa, que assuma a sua posição na relação contratual, como se o contrato tivesse sido diretamente
celebrado com esta última.

O contrato produz efeitos mal é celebrado, inter partes, mas havendo nomeação esses efeitos
repercutem-se retroativamente na pessoa que, entretanto, foi nomeada.

A nomeação é inválida, pois apesar da forma ter sido respeitada, a declaração de nomeação de D foi
feita através de documento escrito, mas não foi comunicada a C dentro do prazo supletivo de 5 dias, a
contar da celebração do contrato-promessa.

Além disso, falta uma outra formalidade, pelo que esta declaração de nomeação deveria ter sido
acompanhada de um documento escrito de ratificação do E ou de uma procuração nesse sentido, se
fosse anterior á data de celebração do contrato, de acordo com os art.453.º e 454.º do CC.

O Dr. Carneiro da Frada entendeu que a presença do E entendeu que devia ser entendida como uma
ratificação tácita.

Nota importante para o exame: Em sede de exame para contextualização teórica temos de
desenvolver a teoria, mas sempre em coordenação com o conteúdo do caso prático.

O contrato para pessoa a nomear e contrato a favor de terceiro é muito fácil de encaixar noutras
figuras contratuais.

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Resolução do caso prático nº17: Pacto de preferência

a) Estamos perante um direito legal de preferência, nos termos do art.1091.º do CC.

O direito legal de preferência goza de eficácia real, nos mesmos termos que o pacto de preferência
goza de eficácia real.

Desde logo que temos violação da forma, em que a comunicação tem de ser feita por carta registada
com aviso de receção, nos termos do art.1091.º/4 do CC.

Neste caso, estamos perante um convite a contratar e não uma mera notificação para a preferência,
pelo que temos de ter um destinatário concreto e o obrigado à preferência o que vem a apresentar.
Quando A manifesta que não está interessado não há renúncia à preferência, desde logo sendo um
direito legal de preferência não pode haver renúncia antecipada, o que significa que B quando
negoceia com C, o A mantém o seu direito legal de preferência.

A comunicação de C vale como notificação para a preferência? Não. Porque a notificação tem de ser
feita pelo obrigado, ou seja, por B e não por C e a forma não foi respeitada pelo art.1091.º/4 do CC.

Perante uma violação de direitos de preferência, A tendo uma preferência legal pode recorrer à ação
de preferência, consagrada no art.1410.º do CC e no âmbito desta ação há uma sub-rogação da posição
de A na posição de C.

b) Estaria em causa um documento escrito assinado pelo obrigado à preferência, nos termos do
art.415.º do CC que remete para o art.1410.º/2 do CC.

Não tendo o pacto de preferência eficácia real, A já não poderia recorrer à ação de preferência do
art.1410.º do CC, porque o direito rela de C prevaleceria sobre o direito real de A.

Assim, A apenas poderia exigir uma indemnização.

c) Estamos perante uma divisão doutrinal, em que a dúvida é se está em causa:

· Litisconsórcio necessário: segundo o Dr. Antunes Varela e o Dr. Ribeiro de


Faria, a ação tem de ser intentada contra o terceiro e o obrigado à preferência.

Defendem, assim, 3 argumentos:

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o Unidade de julgados;

o Custas: Não faz sentido que as custas judiciais recaiam sobre o titular do
direito de preferência nem sobre o terceiro, mas sobre aquele que violou
o pacto de preferência, porque foi ele que deu causa à ação.

o Literal: citação dos réus (art.1410.º do CC- fala em réus e não réu).

· Litisconsórcio voluntário: é intentada só contra o terceiro.

O STJ tem entendido que estamos perante um litisconsórcio voluntário e não necessário, exceto se
houver um pedido de indemnização.

Resolução do caso prático nº18: Contrato a favor de terceiro

a) Estamos perante um contrato a favor de terceiro, pelo qual um dos contraentes, que se
chama promitente, atribui por conta e à ordem de outro, o promissário, uma vantagem
a um terceiro, beneficiário, estranho a uma relação contratual.

O promitente é bernardo e o promissário, Gonçalo e o beneficiário é Fernando.

Assim, neste contrato aquele promete que fazer algo a terceiro, atribui por conta e à
ordem do promissário uma vantagem a um terceiro que não é arte no contrato.

O que caracteriza este contrato é o facto de os contraentes procederem com a intenção e


atribuir através dele um direito a um terceiro, ou que dele resulte uma atribuição
patrimonial para o beneficiário.

Assim, a relação de cobertura e previsão e relação de valuta.

O Dr. Carneiro da frada fala de uma relação de atribuição, através do contrato a favor de
terceiro que emerge do contrato um direito ao terceiro, em que nesta relação se une
promitente ao beneficiário.

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A relação de cobertura e provisão é a relação que se estabelece entre o promitente e o


promissário, sendo que a relação neste caso prático se consubstancia na compra e venda
de um automóvel e a relação e valuta é estabelecida entre o promissário e o beneficiário.

No contrato a favor de terceiro temos um vínculo que une o promitente a promissário


(relação de cobertura e. provisão- contrato de compra e venda) e um outro vínculo que
une o promissário ao beneficiário (relação de valuta- doação).

O Dr. Carneiro das Frada considera que existe uma relação de atribuição que une o
promitente ao beneficiário, sendo que a doutrina não costuma abordar, mas não é uma
relação contratual, pelo que não há um vínculo contratual entre o promitente e o
beneficiário.

O Bernardo não sabe porque o Gonçalo atribui o preço ao Fernando, o que interessa são
os termos da relação de cobertura, que daqui resulta os direitos para o Bernardo.

O Bernardo invoca uma exceção de não cumprimento, pelo que enquanto o carro não é
pago, enquanto o defeito não for resolvido.

A questão que se coloca é se o Bernardo pode opor a exceção de não cumprimento ao


Gonçalo?

Os meios de defesa que nascem da própria relação de provisão são oponíveis quer ao
promissário quer ao beneficiário, o que significa que o Bernardo pode invocar a exceção
de não cumprimento quer contra o Gonçalo, quer contra o Fernando.

b) Se isto não fosse um contrato a favor de terceiro, o Bernardo podia exigir uma
compensação, mas como é um contrato a favor de terceiro, não o pode fazer, ou seja,
pode invocar todos os meios de defesa que derivam daquela relação, mas não pode
invocar meios de defesa estranhos àquela relação, de acordo com o art.449.º do CC.

c) O Bernardo é estranho à relação de valuta que existe entre o Gonçalo e o Fernando,


não podendo atura neste caso e quem poderia eventualmente atura este caso era o
Gonçalo se o Fernando não tivesse aceitado a promessa, nos termos do art.448.º do
CC, o Gonçalo poderia revogá-la.

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Assim, o que poderia acontecer aqui era, nos termos do art.448.º do CC, se não tivesse
havido aceitação F, o G poderia revogar a promessa

d) Quem pode resolver é o Gonçalo, pois este é o promissário, ou seja, é que é parte no
contrato.

No entanto, se a promessa já foi revogada em consequência da aceitação por F, G precisa


do consentimento prévio de F.

É a F que cabe decidir se efetua ou não a interpelação admonitória, cabendo depois a G


resolver ou não o contrato.

A indemnização por não cumprimento cabe ao F.

Gestão de negócios

Uma gestão de negócios, consagrada nos art.464.º a 472.º do CC, que corresponde a intervenção não
autorizada de um sujeito na direção de negócio alheio, feita no interesse e por conta do respetivo
dono.

Assim, o que intervém no negócio é o gestor e à outra parte dá-se o nome de dono do negócio.

Neste caso estamos perante dois interesses conflituantes:

· por um lado, o legislador não quer desincentivar a gestão de negócios por ser útil para preservar
valores em risco, não desincentivando a intervenção altruística;

· Todavia, às vezes, as intervenções mais bem intencionadas vão contra a vontade do dono.

Então, a gestão de negócios é encontrada no equilíbrio entre, por um lado, o estímulo do altruísmo e
solidariedade humana e, por outro lado, a não intervenção não autorizada em negócios alheios.

Existem 3 requisitos a ter em conta na gestão de negócios:

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1) Direção de um negócio alheio: tem que haver a direção de negócio alheio, não do negócio em
sentido técnico jurídico, porque pode ser um negócio jurídico efetivamente, mas também na
prática de atos materiais;

2) Por conta e no interesse do dono do negócio: significa que o gestor tem de transferir para o
dono do negócio todas as vantagens e encargos que derivam da gestão.

É possível que ele atue só no seu interesse? Não, porque isso é uma gestão imprópria, não há
uma verdadeira gestão de negócios. E no interesse de ambos? É a chamada gestão mista, nada
impede que seja exercida no interesse de ambos, como é o caso da gestão remunerada, em que
se entende existir gestão mista, pelo que se presume remunerada quando o gestor atua no
exercício da sua atividade profissional.

Diferentemente, quando ele atua por conta e em nome do dono estamos perante gestão
representativa.

Note-se que quando o gestor atua por conta do dono, mas em nome próprio, é não
representativa.

Importante: Mas é obrigatório atuar sempre por conta.

3) Não há autorização para a atuação: A gestão representativa é sempre sem poderes de


representação. Ele não tem nem o dever, nem o poder de atuar. Se há mandato prévio, por
exemplo, não há gestão de negócios.

Definindo um caso de gestão de negócios tem de se averiguar se é ou não representativa.

Em termos de regime, o elemento central é saber se foi ou não aprovada:

· Se foi aprovada assume-se que ela é conforme com a vontade do dono do negócio e, portanto,
não há dever de indemnização por parte do gestor pelos danos causados, sendo que o que ele tem
de fazer é transferir os encargos e vantagens para o dono.

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Sendo uma gestão representativa, a aprovação da gestão não equivale a ratificação dos
negócios celebrados pelo gestor em nome do dono do negócio. Portanto, a ratificação tem de
ser feita individualmente para cada negócio.

A aprovação é concordar com o que foi feito, afastando-se o direito de indemnização, mas a
ratificação pode não existir, sendo que apenas pode existir ratificação quando o negócio é
celebrado no interesse e por conta do dono do negócio.

Se a gestão é não representativa o dono do negócio, com a aprovação assume todos os


encargos e benefícios que derivam dos negócios, em nome próprio pelo gestor.

· Se não há aprovação temos de analisar se a gestão foi feita de acordo com a vontade real ou
presumível do dono do negócio.

Existe depois uma divisão doutrinal a propósito do critério da culpa:

· Galvão Teles defende que o critério da culpa da gestão deve ser o critério geral do bom pai de
família – critério objetivo de culpa;

· Ribeiro de Faria defende que pelo seu carácter altruístico, o critério da culpa deve ser em
concreto, ou seja, não exigindo ao gestor uma diligência superior àquela que habitualmente ele
coloca na gestão do seu próprio património.

Resolução do caso prático nº19: Gestão de negócios

No presente caso estamos perante uma direção de negócio alheio, por conta e no interesse do dono do
negócio, mas também sendo o âmbito de atividade profissional de Bernardo, há também um interesse
egoístico deste, sendo gestão mista. Ainda, não havia autorização para Bernardo atuar, logo
percebemos que ele atua sem estar dotado de autorização.

É uma gestão não representativa, ele não celebra negócio seja em nome nem por conta de Augusta e
não houve aprovação, isto é, a gestão não foi aprovada.

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Seguidamente temos de avaliar se foi conforme à vontade real ou presumível do dono? Tendo em
conta a análise do enunciado será de admitir que haverá uma conformidade com o interesse de
Augusta de retirar o carro daquele local.

A análise central coloca-se ao nível da culpa do gestor, ou seja, se os danos causados ao carro são ou
não imputáveis ao Bernardo? Aplica-se o critério abstrato ou concreto da culpa? Há ou não presunção
de culpa?

Não há provas de negligência de Bernardo e, por isso, o cerne é se há ou não presunção de culpa,
porque não ficou provada a negligência de Bernardo, nem a culpa dele, a questão é sobre quem recai o
ónus da prova da culpa.

O tribunal entendeu que recaia sobre Augusta que, de acordo com o art.342.º do CC é quem invoca o
facto que tem de o provar.

Batista Machado, neste caso defende que se deve aplicar à gestão de negócios a presunção de culpa
do art.799.º do CC, pelo que se a atividade tivesse sido desenvolvida no âmbito da autorização seria
um contrato de prestação de serviços. Acrescenta ainda que, a atividade do gestor não deriva de uma
mera violação de um dever geral de cuidado, mas sim de um dever especial de proteção, que surge
para o gestor quando inicia a atividade gestionária.

Resolução do caso prático nº 20: Gestão de negócios

a) Estamos perante uma gestão de negócios, isto é, uma direção de negócio alheio por conta e no
interesse do dono, sem haver autorização.

No caso, a gestão é representativa, sendo que B atua em nome de A, aplicando-se as regras de


representação sem poderes do art. 471,º do CC que remete para art.268.º do CC e, por isso, o negócio
é ineficaz perante A até ao momento da ratificação.

Portanto, pode X exigir a Ao pagamento em falta? Não, salvo A ratificar o negócio. Até ao
momento em que A ratifique o negócio, ele é ineficaz perante A.

b) Tudo se reconduz a saber se foi contrária ou não à vontade presumível de A.

Assim, não tendo sido aprovada temos de avaliar se ela foi ao encontro da vontade presumível do
dono ou não, de acordo com os art.465.º/a) do CC e o art.468.º/1 do CC.

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Aqui, a doutrina diverge, em que há quem defenda:

· interferência injustificada;

· interferência que é fundamentada.

Assim, se foi de acordo com a vontade presumível do dono do negócio, então terá de haver
reembolso dos valores, contudo se não foi de acordo com a vontade presumível, então não terá de
haver reembolso e poderá até haver indemnização por parte de B a A, caso tenha existido algum
dano.

c) Nos termos do art.466.º do CC, o gestor é obrigado a indemnizar o dono pelos danos que a
interrupção culposa da gestão der causa.

Ele é livre de iniciar ou não a gestão, mas depois de iniciar a gestão ele não é livre de
interromper, porque a lógica é que ele assume o “compromisso de”, afastando outros
potenciais gestores de atuar.

Neste caso concreto seria difícil provar o nexo de causalidade entre a interrupção da gestão e
o assalto.

Resolução do caso prático nº 21: Enriquecimento sem causa

A pagou quantia a B a que este não tinha direito, por isso, estamos perante problema de
enriquecimento sem causa .

O enriquecimento sem causa é um instituto subsidiário, só se aplicando na falta de outro instituto


para dar resposta à questão.

É importante termos em atenção 3 elementos:

· Há um enriquecimento de uma pessoa, neste caso, C porque B tem direito de regresso contra C;

· à custa de outra, no caso A;

· sem causa justificativa.

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Estamos perante a repetição do indevido, em que a consequência é a devolução ou restituição ao


empobrecido daquilo com que o enriquecido injustamente se locupletou.

O objetivo desta consequência não é sancionar nem indemnizar, mas apenas restituir deslocações
patrimoniais injustificadas.

No presente caso estamos perante um enriquecimento, na modalidade de repetição do indevido, não se


aplicando o art.476.º do CC, porque existe efetivamente uma obrigação, pelo que se aplica ao caso o
artigo 478.º do CC, relativo ao cumprimento de obrigação alheia na convicção de estar obrigado a
cumprir.

No caso, a obrigação de indemnização existe, mas recai sobre B.

Há um contrato a favor de terceiros, porque é um contrato de seguros feito entre a seguradora e o


locatário financeiro, a favor do locador, portanto, quem empobrece no caso é o locador C.

A e B celebram contrato de seguro de automóvel que pertence a C, logo se algo acontece ao


automóvel é C que tem de receber por isso.

Assim, A paga a C, C enriquece indevidamente, empobrecido A, todavia C tem direito ao valor, por
isso, quem efetivamente ganha quando A paga é o B.

A obrigação de indemnização existe, mas não recai sobre A, mas sim sobre B.

Por isso, nos termos do art.478.º do CC, A não tem direito a exigir a restituição do valor de C porque
se exige que C soubesse do erro e nada nos indica sobre isso.

Em suma, A tem direito a restituição do valor do empobrecimento de B, pelo que A pode exigir de B
aquilo com que B injustamente se locupletou.

Ter em atenção as “Lições de direito das obrigações” do professor Eduardo Júnior.

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