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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE BLUMENAU
DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA

Ana Luiza Berwanger de Souza

Relatório de Iniciação Científica


Teoria de controle aplicada a modelos
matemáticos de câncer e quimioterapia

Blumenau
2023
Ana Luiza Berwanger de Souza

Teoria de controle aplicada a modelos matemáticos de


câncer e quimioterapia

Relatório submetido à Universidade Federal


de Santa Catarina como requisito para finali-
zação da Iniciação Científica proposta para o
período de novembro de 2022 à novembro de
2023.
Orientador: Francis Félix Córdova Puma

Blumenau
2023
Resumo
Sistemas dinâmicos são ubíquos na matemática e na natureza. Consequentemente, a
modelagem matemática via Equações Diferenciais encontra também as mais diversas
aplicações. Entretanto, as aplicações em Biologia recentemente têm atingido grande
dimensão, em particular em câncer/tumores - quimiotaxia, angiogênese, dinâmica tumoral,
etc. Foram realizadas pesquisas sobre a biologia do câncer e quimioterapia antineoplásica,
modelagem matemática em câncer e farmacologia, e modelagem em quimioterapia entre
outras subáreas para estudar os tipos de equações diferenciais associadas ao tema.

Palavras-chave: Modelagem. Matemática. Câncer. Quimioterapia.


Sumário

Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4

1 DADOS DO PROJETO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
2.1 Aspectos biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
2.2 Aspectos matemáticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.2.1 Sistemas Dinâmicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.2.2 Estabilidade e Controle . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9

3 MODELAGEM MATEMÁTICA EM CÂNCER . . . . . . . . . . . . 11


3.1 Modelo exponencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
3.2 Modelo logístico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
3.3 Modelo de competição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14

4 TRATAMENTOS DO CÂNCER: CONTROLE . . . . . . . . . . . . 16

5 CONCLUSÕES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20

REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
4

Introdução

Ainda não há nenhum modelo para crescimento de tumor sólido totalmente baseado
em fundamentos e propriedades observáveis de biologia tumoral (Herman1 ). Os modelos
atuais para o crescimento de tumor são, principalmente, oriundos de ajustes de curvas,
simulações computacionais, ou de Equações Diferenciais baseadas em simplificações de
conceitos biológicos.
Utilizou-se para o modelo de Gatenby2 o método de aproximação em torno de
pontos de equilíbrio para estudar a estabilidade e controlabilidade das soluções, e tal
modelagem permite estudar o crescimento de tumores sólidos por meio do crescimento da
massa/volume de células em relação a algum metabolismo importante, como oxigênio e
taxa de natalidade/mortalidade.
O modelo de Gatenby estuda a dinâmica populacional com competição entre dois
tipos de células: N1 (células saudáveis) e N2 (células tumorais). Foi realizada uma análise
para determinar a estabilidade e a propriedade de controlabilidade local, o que é garantido
para determinados pontos de equilíbrio.
Nesse último sentido foi adotada uma modelagem do crescimento tumoral aplicando
as ferramentas da teoria de controlabilidade matemática, assumindo algumas simplificações
de propriedades biológicas encontradas na literatura.

1
“Towards a general model for solid tumor growth”, Preprint, 2002.
2
R. A. Gatenby. Application of competition theory to tumour growth: implications for tumour biology
and treatment, European Journal of Cancer, 32A(4) (1996), 722–726.
5

1 Dados do Projeto

Ao longo do ano de 2023, a discente Ana Luiza Berwanger de Souza dedicou-se


ao desenvolvimento de um projeto de Iniciação Científica sob a orientação do Prof. Dr.
Francis Félix Córdova Puma. O cerne da pesquisa concentrou-se na temática "Teoria de
controle aplicada a modelos matemáticos de câncer e quimioterapia", destacando-se na
área de Análise Matemática.
Os propósitos subjacentes a essa investigação consistiram em explorar diversas
abordagens matemáticas para modelar o câncer. Fundamentando-se em artigos científicos
[1] e livros específicos [2], [3], [4], [5], a pesquisa buscou criar modelos que representassem
também o tratamento do câncer. Os modelos vistos contemplaram a introdução de um
controle externo à equação original modelada para o câncer, representando a perturbação
ocasionada pelo tratamento da doença. Além disso, foram estudados os estados de equilíbrio
da equação, e estudos relacionados à estabilidade em torno desses estados de equilíbrio.
A metodologia empregada para atingir os objetivos centrais envolveu reuniões
semanais e apresentações de seminários. Durante esses encontros, os participantes, que
também estavam envolvidos em projetos de Iniciação Científica, compartilhavam o progresso
de suas pesquisas. A base teórica da pesquisa foi fundamentada em livros e artigos que
exploravam a aplicação da matemática ao contexto do câncer e seus tratamentos. Além
disso, foram consultados materiais relacionados à biomatemática, considerando a notável
similaridade entre as equações modeladas e as dinâmicas de sistemas, como, por exemplo,
quando o tumor e as células saudáveis são interpretados como espécies competindo por
recursos e espaço em um mesmo órgão. Nesse contexto, modelos de presa-predador se
mostraram pertinentes e úteis.
6

2 Fundamentação teórica

Com o intuito de promover uma compreensão mais abrangente de todos os tópicos


a serem explorados nesta Iniciação Científica, iniciou-se a pesquisa com uma análise
aprofundada dos aspectos biológicos e matemáticos relevantes.

2.1 Aspectos biológicos


Compreender os conceitos biológicos associados aos tumores desempenha um papel
crucial no estudo da modelagem matemática em câncer. Essa familiaridade permite aos
pesquisadores desenvolverem modelos mais precisos e representativos da dinâmica tumoral,
considerando fatores como crescimento, proliferação celular e interações com o ambiente
circundante.
A integração desses conhecimentos biológicos na modelagem matemática não apenas
aprimora a validade dos modelos, mas também proporciona percepções valiosas sobre
os processos subjacentes ao desenvolvimento e tratamento do câncer. Essa abordagem
multidisciplinar é fundamental para avançar nas estratégias terapêuticas e compreender
as complexas interações que regem o comportamento dos tumores. Por isso, estão abaixo
listados os principais termos relacionados à biologia de um câncer, acordando com a
referência [2].

• Câncer é caracterizado pelo crescimento descontrolado de células que podem ou


não se espalhar por outros órgãos ou tecidos. A causa do câncer é relacionada ao
genótipo do indivíduo e/ou ao meio.

• Tumor é o aumento de volume dos tecidos pela proliferação de células.

• Tumor benigno é aquele no qual as células mutantes permanecem contidas dentro


de um único local, com uma fronteira de células normais bem definida.

• Tumor maligno é o tipo de tumor que as células mutantes se misturam com as


células normais. Esse tipo constitui o câncer.

• Metástase é a formação de um novo tumor a partir de outro, mas sem continuidade


física entre os sítios tumorais.

• Angiogênese tumoral é o processo de neovascularização no qual as células tumorais


estimulam a formação de novos vasos sanguíneos, nesse caso as células tumorais são
passadas à corrente sanguínea, o que pode ocasionar em metástases.
Capítulo 2. Fundamentação teórica 7

Outro tópico tratado é o bom prognóstico dessa patologia, que consiste no diag-
nóstico adequado e o mais precoce possível, pois a identificação do câncer em seu estágio
inicial possibilita uma maior chance de cura. Isso se deve ao fato que, de início, o câncer
pode ser mais facilmente controlado por não possuir angiogênese e evitando, dessa forma,
seu crescimento e até mesmo que se generalize em demais órgãos. Isso é ilustrado na figura
1.

Figura 1 – Ilustração da detecção do câncer.

Fonte: Site Sanar, artigo sobre "Câncer colorretal: prevenção, rastreamento e tratamento"

É importante ressaltar que, apesar da imagem retratar especificamente do com-


portamento de um câncer colorretal, essa evolução pode ser esperada em demais tipos
de tumores malignos, considerando que são respresentados pelo crescimento anormal e
descontrolado de células cancerígenas.
Portanto, por mais que cânceres em órgãos diferentes tenham comportamentos
diversos, aqui será vista a modelagem em relação ao crescimento dessas células de forma
generalizada. Futuramente nesta pesquisa, o que definirá essas especificidades serão os
parâmetros considerados nas equações modeladas.
Capítulo 2. Fundamentação teórica 8

2.2 Aspectos matemáticos


Além da importância do contexto biológico, a fundamentação sólida dos conceitos
matemáticos utilizados é de suma importância. Por isso, no decorrer da pesquisa foram
utilizados alguns conceitos matemáticos a serem expicitados nesta seção.

2.2.1 Sistemas Dinâmicos


Um sistema dinâmico é um modelo que descreve a evolução temporal de um sistema.
Ou seja, os estados do sistema estão variando ao longo do tempo, e quando tal variação
ocorrer num intervalo de tempo tão pequeno quanto se deseja, será chamado de sistema
dinâmico de tempo contínuo.
Por tratar-se de um tempo tão pequeno quanto se deseja, serão utilizados os cálculos
infinitesimais, e no caso dessa pesquisa, as derivadas. Assim, as equações que compõem
os sistemas dinâmicos vistos serão Equações Diferenciais Ordinárias (EDOs), tema já
estudado anteriormente no curso. Foi utilizada a notação de Newton para derivadas,
considerando que todas as equações são derivadas em relação ao tempo, assim, um sistema
dinâmico pode ser descrito como:

Ṅ = F (t, N ) , t ∈ R+ (2.1)

Onde as variáveis representam os estados do sistema (2.1), e são denotadas


por (N1 , N2 , · · · , Nn )′ = N , com (N1 , N2 , · · · , Nn )′ a transposta do vetor ou matriz
(N1 , N2 , · · · , Nn ). E as funções (f1 , f2 , · · · , fn ) = F ∈ C 1 fornecem expressões que descre-
vem como a variação de cada variável Ni (t) é alterada em um intervalo de tempo.

Ṅ1 = f1 (t, N1 , N2 , · · · , Nn )




Ṅ2 = f2 (t, N1 , N2 , · · · , Nn )



Ṅ = F (t, N ) ⇐⇒ ..


 .

Ṅn = fn (t, N1 , N2 , · · · , Nn )

Definição 1. Um sistema dinâmico Ṅ = F (t, N ) é dito autônomo se a função F é


independente de t. Daí, segue que:
Ṅ = F (N )

Quando o sistema é autônomo, F é dito um Campo Vetorial. Como exemplo, se


definimos N = (x, y)′ ∈ R2 , a função F (x, y) = (ax − αxy, −cy + γxy)′ é conhecida como
campo vetorial do modelo de Lotka-Volterra.
Capítulo 2. Fundamentação teórica 9

Durante os estudos, esse modelo foi visto por descrever sistemas biológicos [5] em
que duas espécies interagem: uma como presa x e outra como predadora y. Esse fato é
de extrema relevância, pois a modelagem estudada nesta pesquisa considera as células
saudáveis e tumorais como populações em competição.
Nesse caso, as hipóteses principais utilizadas são de que a única fonte de alimento
da espécie predadora é a população das presas e que não há competição alguma entre
indivíduos da mesma espécie. Portanto, o modelo de Lotka-Volterra pode ser interpretado
pelo seguinte sistema dinâmico:

 ẋ = xa − αxy
 ẏ = −cy + γxy

sendo que, nesse sistema, a função F independe de t, ou seja, é um sistema autônomo,


cuja solução é representada por a · ln y + c · ln x − αy + γx = C.

Definição 2. Consideremos N = (N1 , N2 , · · · , Nn )′ e o Sistema

Ṅ = F (t, N ) (2.2)

(2.2) é um sistema linear se F for uma função linear da variável N , ou seja, existe um
produto entre uma matriz A(t) e a váriavel N que descreve F (t, N ). Daí,

F (t, N ) = A(t)N, A(t) = [aij (t)]n×n .

No caso de um sistema como em (2.2) em que F não é linear, esse sistema é chamado de
sistema não-linear.

2.2.2 Estabilidade e Controle

Definição 3. O estado de equilíbrio é uma solução constante, do sistema dinâmico


Ṅ = F (N ), onde denota-se N (t) = N ∗ . Tal estado pode ser calculado pela equação:

F (N ∗ ) = 0.

Tendo essa definição, denota-se por estabilidade de um sistema de equações a


capacidade desse sistema de retornar/aproximar a um estado de equilíbrio. Já o problema
de controle matemático é determinar como e quando um estado específico pode ser
atingido por um sistema, a partir da inserção de uma perturbação externa à equação
original. Nessa pesquisa, foram vistas formas de perturbação à equação original, ou seja,
controle, em torno dos estados de equilíbrio obtidos. Portanto, um problema de controle
pode ser representado por Ṅ = F (N ) + B(N, u), onde B(N, u) é o controle externo à
equação original.
Capítulo 2. Fundamentação teórica 10

Um dos resultados mais importantes vistos em [5] e [4] é o Teorema de Picard-


Lindelöf. Para apresentá-lo, consideremos o problema de valor inicial (PVI) tal que

Ṅ = F (t, N )
N (t0 ) = N0

Teorema 1. Seja D ⊂ R × Rn um conjunto aberto, F uma função definida em D e


com valores em Rn tal que F (t, N ) é localmente lipschitziana em relação a N em D,
e (t0 , N0 ) ∈ D. Então, a solução do PVI anterior existe e é única em um intervalo
Iδ = [t0 − δ, t0 + δ], com δ > 0.
11

3 Modelagem matemática em Câncer

Nessa parte da pesquisa, tendo os conceitos já bem fundamentados, foi possível


aprofundar os estudos em relação às modelagens matemáticas do câncer. Biologicamente,
os tumores possuem comportamentos singulares, que podem estar diretamente relacionados
ao órgão onde se encontram. Dessa forma, foi visto que existem diversas formas de modelar
essa doença, considerando o órgão onde está instaurado, o estágio em que se encontra,
dentre outros fatores.
Nessa seção, serão vistos alguns dos modelos estudados [2], dando maior enfoque
ao modelo proposto por Robert Gatenby [6] em 1996, que é baseado na competição de
células saudáveis e células tumorais.

3.1 Modelo exponencial


Thomas Malthus, um economista britânico do século XIX, é notavelmente reco-
nhecido por seu estudo pioneiro sobre o crescimento populacional. Em 1798, Malthus
explorou a dinâmica demográfica por meio de equações exponenciais. Ele argumentou que a
população humana tendia a crescer geometricamente, enquanto os recursos disponíveis para
sustentá-la aumentavam apenas aritmética. Essa disparidade, expressa por uma equação
exponencial, levou Malthus a prever que, eventualmente, a população ultrapassaria a
capacidade de sustentação, resultando em escassez de recursos e, por conseguinte, em
crises e retrocessos populacionais.

Figura 2 – Thomas Malthus

Fonte: Site Britannica, artigo sobre "Thomas Malthus"

Com isso, esse modelo presume o crescimento geométrico de uma população, que não
Capítulo 3. Modelagem matemática em Câncer 12

possui uma limitação. Assim, considerando um tumor em estágio inicial de desenvolvimento


onde não ocorre angiogênese, e considerando-o como constituído de uma única população
celular, pode-se assumir que sua taxa de crescimento é proporcional ao número de células
tumorais N (t).

Figura 3 – Representação gráfica do crescimento exponencial

Fonte: Site Khan Academy, artigo sobre "Crescimento exponencial e logístico"

Tendo isso, as hipóteses teóricas para aplicação deste modelo são que a população de
células tumorais N (t) cresce segundo uma razão geométrica r, é desconsiderada a estrutura
espacial do tumor e N (t) é tratado como uma variável contínua. Assim, a equação de um
modelo exponencial pode ser descrita por

Ṅ = rN (3.1)

Onde Ṅ é a taxa de crescimento do câncer e N = N (t) é o número de células


tumorais no instante de tempo t > 0. Realizando os devidos cálculos, a solução da equação
(3.1) para N (0) = N0 é

N (t) = N0 ert (3.2)


Capítulo 3. Modelagem matemática em Câncer 13

3.2 Modelo logístico


Como citado anteriormente, o modelo exponencial presume um crescimento geomé-
trico da população de células, ou seja, não se vê uma certa limitação para esse crescimento.
Contudo, sabe-se que as células tumorais competem entre si por recursos vitais e oxigê-
nio, dessa forma, pode-se representar o Modelo Logístico de Verhulst e Lotka com
saturação.

N
 
Ṅ = r N 1 − (3.3)
k
No modelo, N (t) representa o número de células tumorais e k é a dita capacidade de
suporte da população tumoral, que no contexto de câncer pode ser, por exemplo, o tamanho
do órgão onde esse tumor encontra-se. Além disso, a saturação é representada pelo termo
 
1 − Nk , que caracteriza uma competição intraespecífica entre as células cancerígenas.

Figura 4 – Representação gráfica do crescimento logístico

Fonte: Site Khan Academy, artigo sobre "Crescimento exponencial e logístico"

Realizando os devidos cálculos, encontra-se a solução da equação (3.3), dada por


k
N (t) =   (3.4)
1 + Nk0 − 1 e−rt
Observe que para calcular o limite
lim N (t) = ?
t→+∞

Deve-se conhecer o limite de e−rt , pois os demais termos da solução são parâmetros
constantes. Assim, tendo que
lim e−rt = 0
t→+∞
Capítulo 3. Modelagem matemática em Câncer 14

então
k k
N (t) =   = =k
1+ k
−1 0 1+0
N0

Logo, conclui-se que N (t), o número de células tumorais, tende à capacidade suporte
k quando t → +∞. Biologicamente, é possível interpretar que o câncer poderá crescer até
atingir seu tamanho máximo, ou seja, o tamanho do órgão onde se encontra.
É importante ressaltar que foram vistos outros modelos com saturação, como o
de Gompertz e von Bertalanffy, dos quais generalizam ainda mais a equação de Verhulst
e Lotka. Tais modelos calculam, por exemplo, a rapidez na qual a saturação é atingida.
Esses e demais modelos podem ser encontrados na referência [2].

3.3 Modelo de competição


Robert Gatenby é um renomado cientista conhecido por seus estudos inovadores
na área de modelagem matemática em câncer. Seu foco principal reside na concepção
de modelos que descrevem a dinâmica da competição entre células saudáveis e tumorais
dentro do organismo. Com isso, em 1996 publicou um artigo [6] sobre a aplicação da teoria
de competição para o crescimento tumoral, onde propôs o modelo estudado.

Figura 5 – Robert Gatenby

Fonte: Site Moffitt, Cancer center

Este modelo é baseado na competição de células normais e células tumorais estando


estas modeladas como populações competidoras pelo espaço e outros recursos em algum
volume do tecido dentro de um órgão. Nesta análise, a heterogeneidade de células tumorais
e os tipos de células normais no tecido normal são simplificados supondo uma dominância
normal N1 e uma população tumoral N2 existentes em um dado tempo.
Capítulo 3. Modelagem matemática em Câncer 15

Dessa forma, o modelo proposto por Gatenby é

N1 a12 αN1 N2
 
Ṅ1 = αN1 1 − − (3.5)
k1 k1
N2 a21 βN1 N2
 
Ṅ2 = βN2 1 − − (3.6)
k2 k2
Onde α e β são as constantes de crescimento exponencial, k1 e k2 são as capacidades
suporte relativas e os parâmetros a12 e a21 representam os coeficientes de competição, ou
seja, representam como as populações são afetadas mutuamente.
Perceba que o sistema das equações 3.5 e 3.6 é um sistema não-linear. Veja
também que, em azul, observa-se o modelo exponencial. Isso se deve ao fato que em estágio
inicial, o câncer cresce em razão geométrica. Já em vermelho, denota-se a competição
intraespecífica entre as células, por meio da equação logística. Por fim, em ciano, é possível
verificar o termo que representa a competição interespecífica, ou seja, como as populações
de células normais são afetadas pela população de células tumorais, e reciprocamente como
as células saudáveis afetam as tumorais.
16

4 Tratamentos do Câncer: Controle

A importância dos tratamentos do câncer não pode ser subestimada, pois eles
representam a esperança e a possibilidade de cura para muitos pacientes. Além disso, a
aplicação da teoria de controle matemático nesse contexto oferece uma perspectiva única e
valiosa.
A teoria de controle matemático é uma área da matemática aplicada que lida com o
comportamento de sistemas dinâmicos e a manipulação de variáveis para atingir objetivos
específicos. No contexto do câncer, essa abordagem pode ser interpretada de diversas
maneiras.
Primeiramente, os tratamentos do câncer frequentemente envolvem a administração
de agentes terapêuticos, como quimioterapia. Modelos matemáticos podem ser desenvol-
vidos para descrever a dinâmica desses agentes no corpo, levando em consideração sua
distribuição, metabolismo e interação com as células cancerígenas. Esses modelos ajudam
os médicos a otimizar as doses e os regimes de tratamento, buscando maximizar a eficácia
do tratamento e minimizar os efeitos colaterais prejudiciais.
Além disso, a teoria de controle também pode ser aplicada para entender e regular
a resposta imunológica do corpo ao câncer. O sistema imunológico é uma parte essencial
na luta contra as células cancerígenas, e estratégias terapêuticas, como a imunoterapia,
visam fortalecer essa resposta. Modelos matemáticos podem ser utilizados para representar
a dinâmica complexa entre as células cancerígenas, as células do sistema imunológico e os
agentes terapêuticos, permitindo a identificação de estratégias de controle que maximizem
a eficácia da resposta imunológica.
Além disso, a teoria de controle matemático pode ser aplicada no caso de cirurgias,
onde ocorre a remoção de aglomerações de células tumorais.
Portanto, nesta pesquisa foram observados três tipos de tratamento do câncer como
forma de controle u: cirurgia, quimioterapia e quimio-imunoterapia.
A modelagem para cirurgia foi baseada na lei de coleta, sendo o controle externo
à equação original sendo −u. Esta perturbação foi modelada levando em consideração as
leituras sobre o câncer e seus tratamentos, levando em consideração principalmente o fato
de a cirurgia do câncer consistir na retirada de células tumorais.
Já a quimioterapia foi modelada utilizando os princípios da lei de Lotka-Volterra,
onde o controle da quimioterapia seria representado por −µi Ni u, modelado sob a pers-
pectiva de [2], com a quimioterapia sendo um fármaco que age de forma não seletiva,
atingindo as células saudáveis e tumorais.
Capítulo 4. Tratamentos do Câncer: Controle 17

Por fim, o tratamento por quimio-imunoterapia foi modelado utilizando a lei


de diluição, sendo o controle −µi Ni (1 − eδi u ), modelado a partir dos estudos relatados na
referência bibliográfica [1], sobre o tratamento terapêtico a partir da introdução de fármacos
imunológicos, em especial a Interleucina-2, munido da quimioterapia para combater às
células tumorais.
A partir do modelo de crescimento tumoral proposto por Gatenby em 3.5 e 3.6,
pode-se modelar o tratamento quimioterápico da seguinte maneira:

N1 a12 .N2
 
Ṅ1 = αN1 1 − − − µ1 N1 · u (4.1)
k1 k1
N2 a21 .N1
 
Ṅ2 = βN2 1 − − − µ2 N2 · u (4.2)
k2 k2

Com µ1 e µ2 sendo coeficientes relacionados ao efeito do tratamento. No entanto,


podem ser levadas em consideração algumas hipóteses biológicas: com o tratamento de
um câncer, o almejado é que se obtenha um paciente saudável, ou seja, que as células
saudáveis N1 continuem sadias e que as células tumorais N2 sejam minimizadas ou até
mesmo extintas. Com isso, matematicamente, pode-se interpretar que µ1 0, pois deseja-se
que o tratamento afete minimamente as células saudáveis, e µ2 · N2 1, para que afete
fortemente as células tumorais. Daí, segue que o modelo almejado seria representado pelo
tratamento por meio da cirurgia, onde
N1 a12 .N2
 
Ṅ1 = αN1 1 − − (4.3)
k1 k1
N2 a21 .N1
 
Ṅ2 = βN2 1 − − −u (4.4)
k2 k2

Portanto, com o sistema de equações para o tratamento cirúrgico já modelado e


resolvendo a equação abaixo, é possível conhecer os estados de equilíbrio quando o controle
u ∗ 0. Essa escolha de aproximação foi utilizada visando um modelo onde a cirurgia seria
minimamente invasiva e não prejudicial ao paciente.

N1∗ a12 N2∗


  
 0 = αN1∗ 1 − k1
− k1 
N2∗ a21 N1∗

 0 = βN2∗ 1 − k2
− k2
− u∗
Ao resolver a equação, são encontrados quatro estados de equilíbrio:

• (N1∗ , N2∗ ) = (0, 0), situação biologicamente improvável, levando em consideração que
o paciente não teria células boas nem células tumorais.

• (N1∗ , N2∗ ) = (0, k2 ), caso em que o paciente viria à óbito, tendo em consideração que
as células tumorais N2∗ atingiram sua respectiva capacidade suporte e o a contagem
de células saudáveis N1∗ foi extinta.
Capítulo 4. Tratamentos do Câncer: Controle 18

• (N1∗ , N2∗ ) = (k1 , 0), situação em que o paciente seria completamente curado, pois as
células tumorais N2∗ foram extintas.
k1 −k2 a12 k2 −k1
• (N1∗ , N2∗ ) = ( aa21 ,
21 a12 −1 a21 a12 −1
), situação em que as células saudáveis N1∗ e tumorais
N2∗ estariam coexistindo.

Com isso, ao identificar os estados de equilíbrio, foi realizada a linearização do


sistema 4.3 e 4.4, por meio do cálculo do Jacobiano da equação aplicado à cada um dos
pontos de equilíbrio. Ou seja, denotando N ∗ = (N1∗ , N2∗ ) e F = (f1 , f2 ), em que:
  
N1 a12 .N2
 f1 (N1 , N2 ) = αN1 1 − k1
− k1 

N2 a21 .N1
 f2 (N1 , N2 ) = βN2 1 − k2
− k2

2N1∗ a12 N2∗ a12 N1∗


       
∂f1 ∂f1
∗ ∂N1∗ ∂N2∗ α 1− k
− α −
J(N ) :=  =  1 k1 k1
a21 N2∗ 2N2∗ a21 N1∗
   
∂f2 ∂f2
∂N1∗ ∂N2∗
β − k2 β 1− k2
− k2

Ou seja, realizando os devidos cálculos:


 
α 0 
J0 = 
0 β

 
−α −a · α
J1 =   12  
0 β 1 − a21k2k1

   
a12 k2
α 1− k1
0
J2 =  
−a21 · β −β

  a k2
 2k
 
a21 (a12 −2)−1+a12 1− 12
k
− k2  a12 (k2 −a21 k1 ) 
1 1
α a21 a12 −1
α k1 (a21 a12 −1)
J3 = 
 
 a k1
 2k
 
 a21 1− 21 −1+a12 (a21 −2)+ k 1
a21 (k1 −a12 k2 )
 k

2 2
β k2 (a21 a12 −1)
β a21 a12 −1

 
a21 k1 −k2 a12 k2 −k1
Tendo que J(0, 0) = J0 ; J(k1 , 0) = J1 ; J(0, k2 ) = J2 ; J ,
a21 a12 −1 a21 a12 −1
= J3
Com isso, cada jacobiano dará uma linearização do sistema (4.3) - (4.4), onde no
ponto (N ∗ , u∗ ) esses sistemas linearizados são definidos por:

λ̇ = Jλ − Bw , λ = (λ1 , λ2 ) ∈ R2 ,
 
0
em que, J = dN dF
(N ∗ ) e B =  , tendo em vista que B é a representação do controle,
1
que no caso do tratamento por cirurgia é inserido somente na segunda equação, a fim de
afetar as células tumorais N2 .
Capítulo 4. Tratamentos do Câncer: Controle 19

Seja a equação de controle

Ṅ = f (N, u) ; N (0) = N0 (4.5)

E sejam τ > 0 o tempo final da dinâmica e (N ∗ , 0) um ponto de equilíbrio de (4.5). A


controlabilidade exata diz que, para cada N0 , N̂ ∈ Rn , existe um controle u tal que
N (τ ) = N̂ . Ou seja, garante que a solução da equação atingirá um valor específico N̂ no
instante de tempo t. No caso linear, a controlabilidade exata é caracterizada pelo Teorema
de Kalman. Por outro lado, um sistema é localmente controlável em torno do ponto
N ∗ se existe δ > 0; ∀ N0 , N̂ ∈ Bδ (N ∗ ), existe u um controle, de modo que a solução de
(4.5) satisfaz N (τ ) = N̂ .
Assim, encontrando a linearização do sistema (4.3) - (4.4), foi possível aplicar dois
teoremas importantes: o Teorema de Kalman [2] e o Teorema de Controlabilidade
local em torno de um ponto de equilíbrio [3].

Teorema 2. Sejam J ∈ Rn×n e B ∈ Rn×m matrizes de constantes e Jλ − Bw um campo


linear definido em Rn ×Rm . O sistema λ̇ = Jλ−Bw é dito Sistema Linear Controlável
se, e somente se,
n = Rank[B JB J 2 B ... J n−1 B] 1 (4.6)

Teorema 3. Considere o sistema Ṅ = F (N ) − Bu, (N, u) ∈ Rn × Rm e (N ∗ , u∗ ) um


dF
ponto de equilíbrio. J = [ dN (N ∗ )] ∈ Rn×n , B ∈ Rn×m e m ≤ n. Se o teste Linear de
Kalman é verdadeiro, então o sistema é localmente controlável em torno de (N ∗ , u∗ ).

Com a aplicação dos teoremas apresentados, retirados da referência [3], é possível


verificar se o sistema original (4.3)-(4.4) é controlável em seus estados de equilíbrio.

1
Rank refere-se ao posto, o número de linhas não nulas de uma matriz, em qualquer uma de suas formas
escalonadas por linhas.
20

5 Conclusões

Por fim, após a aplicação dos teoremas [2] e [3], foi possível concluir que o sistema
(4.3)-(4.4) é Localmente Controlável em torno dos estados de equilíbrio N ∗ = (k1 , 0) e
k1 −k2 a12 k2 −k1
N ∗ = ( aa21 ,
21 a12 −1 a21 a12 −1
). É importante ressaltar que a aplicação dos teoremas não exclui
a possibilidade do sistema ser localmente controlável em torno dos demais estados de
equilíbrio.
Por fim, o enfoque principal desta pesquisa recaiu sobre o papel crucial da inter-
venção cirúrgica no controle do câncer. A modelagem matemática permitiu a simulação de
diferentes estratégias de tratamento e sua influência na redução da carga tumoral.
Os resultados obtidos indicam que a representação matemática do tratamento
cirúrgico oferece uma visão da eficácia potencial da intervenção, tendo em vista a controla-
bilidade local garantida em torno dos pontos que representam a coexistência das células
sadias e tumorais e a potencial cura da doença.
Na conclusão deste estudo, é evidente que foram transpassados conhecimentos
essenciais para a vida acadêmica, tanto em relação às metodologias de pesquisa quanto
aos conteúdos estudados para que houvessem avanços cognitivos.
21

Referências

1 NAVE, O. A mathematical model for treatment using chemo-immunotherapy. Heliyon,


2022. Citado 2 vezes nas páginas 5 e 17.

2 RODRIGUES, D. S.; MANCERA, P. F. A.; PINHO, S. T. R. Modelagem matemática


em câncer e quimioterapia: uma introdução. [S.l.]: Sociedade Brasileira de Matemática
Aplicada e Computacional, 2011. Citado 5 vezes nas páginas 5, 6, 11, 14 e 16.

3 CORON, J. M. Control and nonlinearity. [S.l.]: American Mathematical Soc., 2007.


Citado 2 vezes nas páginas 5 e 19.

4 BAUMEISTER, J.; LEITAO, A. Introdução à teoria de controle e programação


dinâmica. [S.l.]: Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada, 2014. Citado 2 vezes
nas páginas 5 e 10.

5 SALVADOR, J. A.; ARENALES, S. Modelagem matemática ambiental. [S.l.]: Editora


da Universidade Federal de São Carlos, 2021. Citado 3 vezes nas páginas 5, 9 e 10.

6 GATENBY, R. A. Application of competition theory to tumour growth: implications


for tumour biology and treatment. European Journal of Cancer, 1996. Citado 2 vezes nas
páginas 11 e 14.

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