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O caminhar brando e suave de meus pés, arrepiados em meio ao

húmido e frio solo, eu a ouço chamar meu nome, implorar por ajuda.
Onde está Elleanor? Onde seus gritos me trazem? São questões que
inundam minha mente, assim como a água que paira ao meu redor
inunda meu corpo, assim como a corrente o arrebate entre as afiadas
rochas, me fazendo ceder a pressão e sentir, pouco a pouco meu interior
ser tomado por seu fluído, sofrendo, ouvindo ela gritar, enquanto meu
corpo apenas luta por uma misera parcela de ar puro. E antes que meus
olhos pudessem fechar, que meu ser desististe e só morresse... Eu o
senti e então, despertei.

Acordo num solavanco brusco, com lágrimas descendo de meus olhos, e


um zumbido crescente castigando meus ouvidos. A visão embaçada, aos
poucos revela a minha frente aquele ambito. A sala de Banimento,eu
dormi? Desmaiei? Minha cabeça dói, e algo forte me incomoda, não só
pela sensação de estar sendo observado e julgado, mas... outra coisa.

-- Senhor Hemsés?

A voz grave me traz a de volta a realidade em que eu flertava, absorto


ainda em meu devaneio, e pelo choque de sua carga eu me deparo com
a atmosfera dos olhares direcionados a mim e a voz baixa de alguem ao
meu lado sussurando meu nome diversas vezes

-- Troy! Troy! Ta chapando seu idiota? Acorda!

Me viro na direção de Victor, o olhando confuso mas antes que eu


pudesse questiona-lo, sinto uma presença a minha frente, que me traz
uma sensação de morte repentina. Eu deslizo meu olhar em sua direção,
apenas para encarar o rosto ríspido do Professor Asterio me encarando

-- Senhor Hemsés. Pode responder a pergunta ou está tão absorto em


seus pensamentos inúteis que é incapaz até de ler o quadro?

-- Eu...

-- Sim?

Segundos de pensamento em que paro, para tentar voltar a qualques


resquicio do que eu estava fazendo na aula, mas nada. As palavras do
quadro parecem alienigenas a mim, apenas consigo ouvir fundo em
minha mente a voz de Elleanor me chamar, gritando meu nome. Eu
rapidamente abaixo minha cabeça, negando lentamente a fala do
docente

-- Desculpe senhor, eu não sei.

Um suspiro saí de seus lábios, em resposta a minha clara mentira de


escape, e mesmo sem olhar, consigo sentir a nitidez julgosa de seu olhar,
-- Patético.

Nublo sua voz que dá continuidade a aula, e respiro fundo tentamndo


me colocar na realidade novamente, Qundo ouço a voz de Victor me
alcançar novamente, o que faz eu me virar na direção do garoto

-- Cara, que porra foi essa?

-- Não sei... eu, acho que tive uma sensação...

-- Que? Sensação de que maluco?

--Eu não sei... de Perigo?

-- Não to entendo Troy. Quem ta em perigo porra, a gente?


Paro alguns segundos com a pergunta pairando em minha mente,
quando novamente a sensação gélida invade minha espinha, e um nome
grita em minha cabeça

-- Elleanor.

Victor me encara, parecendo confuso mas sentindo o peso da situação.


Ele então suspira, olhando na direção do Professor que nós ignora,
escrevendo em seu quadro

-- O que você viu?

-- Não sei direito, tava escuro, parecia molhado... era como se eu tivesse
me afogando.

-- Como se tivesse embaixo d’água?

-- É. Como se eu tivesse... pera. Onde a Elle disse mesmo que ia?

-- Há alguns dias atrás?

-- É, onde ela disse que ia?

-- Sei lá, Bahamas?

-- Não, não, não... Bermudas! Triangulo das Bermudas

-- Droga...

Me levanto rapidamente, pegando meus materiais e fazendo um sinal


para Victor me acompanhar, e saio dali, ouvindo apenas distante Asterio
chamar meu nome, e questionar minha saída, mas ignoro caminhando
junto do garoto para os corredores superiores. Primeiro minha irmã,
depois um professor com tendências nazistas.

-- Onde a gente vai?

-- Não sei... eu preciso fazer alguma coisa. Essa visão, ela parecia de
alguma forma ta sendo bloqueada.

-- E como a gente vai desbloquear o Triangulo das Bermudas inteiro?


Paro em meio ao corredor, pensando na pergunta de Victor. E quando
penso em responder qualquer coisa, a atmosfera ja escura, se torna
ainda mais sombria, quando as sombras se movem a nossa frente e uma
figura canideia surge

-- Talvez eu possa ajudar

A figura fala, em uma voz sussurada que me chama atenção, meu


familiar especial. Me viro para ele, o encarando e puxo Victor até o
mesmo

-- O que você... você não tinha ido com o Mephisto?

-- Seu tio me pediu para ficar e protege-lo, ocultar minha presença... mas
acho que você e sua irmã precisam de ajuda.

-- O que você pode fazer?

-- Eu? Nada. Mas seu amigo, Sebastian pode ajudar a encontrar a


Elleanor. Pergunte a ele sobre o olho das almas.

-- Isso vai ajudar?

-- Sim. Será o suficiente para quebrar a magia do Triangulo

-- Certo... Vamo lá Victor

-- Okay né... o que eu não faço pelos amigos.

Caminhamos em direção a Sala dos Monitores, mais um lançe de escada


do que pretendia fazer. Mas não me incomodava a dor de subir tantos
degraus, isso era minimo comparado a sensação crescente de medo
dentro de mim. Quando chego rente a porta a abro em um solavanco, o
que faz Sebastian me encarar confuso, felizmente ele estava sozinho.
Caminho até ele, me apoiando sob sua mesa, o encarando de volta

-- Antroy, o que você-


-- Precisamos da sua ajuda, o que você o que sabe sobre o Olho das
Almas?

Ele fecha o semblante e movimenta sua mão rapidamente, fechando e


trancando a porta trás de nós

-- Como sabe sobre isso?

-- Um amigo me disse que isso podia me ajudar

-- Desculpa Troy mas isso-

-- É pra Elleanor

Victor fala, fazendo Sebastian se calar, me olhando

-- Eu tive uma visão dela... ela gritava me pedindo socorro. Eu preciso


encontrar ela Sebastian.

-- Troy me desculpa, mas isso que você quer ta além do que é ensinado

-- Sebastian!! É minha irmã! Não me importa, eu preciso disso! Ela pode


morrer!

O garoto suspira, me encarando com alguma esperança de que eu


desista, mas não, quando percebe isso, ele apenas desiste e vai até seu
báu, a frente de sua cama e com alguns trques, ele pega de um bolso
secreto, um livro em capa dura, preto com escritas em uma língua que
eu nunca vi, mas que por algum motivo, consigo ler.

-- Vocês tem certeza disso?

-- Sim!

Eu e Victor falamos em unissono

- Pois bem. O Olho das Almas é um ritual antigo, Necromancia


primordial. Diz-se que apenas demônios ou quem possui sangue infernal
pode orquestra-lo. É pura magia sombria, e ele está em uma língua ao
qual eu não sei traduzir ou sequer entender.

-- Me mostra

O garoto me encara, mas sem dizer nada, abre o livro encouraçado e


desliza ele a nossa frente. As páginas do ritual estão descritas na mesma
língua que a capa, eu leio tudo, mesmo sem ter certeza de como
consigo.

-- É um ritual de sacrificio. O que mais a lenda diz?

-- Que o Ritual precisa ser feito em um lugar carregado, que o sangue do


maestro e do sacrificado precisam se sintonizar, e que o regente tem
que ser evocado.

-- O regente?

-- Algumas mitologias o chamam de Barqueiro, aquele que esta entre a


vida e a morte, que guia as almas. Ele vai levar sua consciência para o
corpo... ou melhor, para a alma de alguém que ja faleceu. Então, onde
vocês querem ir?

-- Quantas pessoas ja morreram no Triangulo das Bermudas?

Poucas horas depois, nós ja tinhamos andado com os preparativos. A


sensação ja crescia em meu cerne e eu sabia que precisava ser rapido.
[Nome do Familiar] estava ao meu lado, enquanto andavamos para fora
do terreno da escola

-- Onde estamos indo?

-- Precisamos de um lugar profano não é?

-- Sim, mas isso não especifica aonde estamos indo

-- Antes da escola ser construída, muitos seres viviam nesse local,


lutavam por ele até. Quando o terreno começou a ser dominado, uma
antiga e poderosa demoniaca, praguejou contra essa terra. Os feericos
da epoca e algumas bruxas, conseguiram conter a maldição. Mas um
lugar, ficou intocado, maldito... Estamos indo pra lá.
-- Vai ser o suficiente?

-- Mais do que o suficiente. Mas me pergunto se eles vão conseguir


trazer o sacrificio.

-- Eles vão... eles precisam trazer.

-- O fato de estar prestes a matar alguém, e usar seu sangue fresco e seu
corpo para um feitiço, não o incomoda
Nenhum pouco?

-- É minha irmã, da segurança dela que estamos falando.

-- Desculpe, não quis duvidar do senhor. Mas essa é uma linha, que não
dá pra voltar.

-- Eu sei. Vamos continuar?

O Canídeo assente, nós guiando entre arvóres espinhosas e terra seca,


mórbida. O cheiro de morte paira no ar, não há nenhum animal, flor ou
outra vida aqui. É a pura morte e escuridão.

-- É aqui senhor. O Jardim de Lilith.

Encaro as veredas de arvóres tortuosas e mortas, pedras banhadas em


fungos e a terra morta sob nossos pés. Em passos lentos, puxo de dentro
de minha mochila velas grossas que começo a espalhar pelo local,
iluminando toda uma área em circulo, e no centro deste desenho com
um galho um circulo ritualistico, com varios sigilos em seu em torno e
figuras da geometria sagrada dentro dele. E acima deste, entre duas
velas, estendo um longo lençol vermelho, aonde adorno com varias
oferendas, entre cranios de animais, corpos mortos, trocas de peles e no
centro, o punhal que Sebastian me deu.

- Eles estão chegando

Faço um breve confirmar com minha cabeça, e então retiro minha blusa
e meu manto, pegando um almofariz e uma materia prima, extraindo
uma tinta natural de coloração branca, e com ela desenho simbolos e
sigilos em meu corpo principalmente ao redor de meus olhos e marco a
palma da minha mão no centro de meu rosto. So faltava os ultimos
passos

-- Por aqui, anda.

Diz Sebastian, que caminha ante a borda das velas e carrega consigo e
Victor um corpo desfalecido em seus braços

-- Trouxeram então?

-- Eu ainda não concordo com isso Troy... mas ja que você ta disposto.

-- Quem trouxeram?
-- Não é alguém inocente, pelo menos isso.

-- Que seja posicionem.

Rapidamente, eles colocam a silhueta ajoelhada na borda do circulo, e


retiram seu capuz. Me choca levemente, encarar uma garota, que há um
tempo jurei matar se voltasse a mexer com minha irmã... quem diria, eu
realmente estava certo.

Suspiro, pegando o punhal e caminhando para o ponto paralelo ao dela,


a encarando de frente.

-- Troy... não precisa fazer isso se não quiser.

Encaro Victor, mas apenas movo a lamina ate o centro de minha mão e
fecho os olhos, cortando minha destra e virando ela para que o sangue
escorra para dentro do traçado. A medida que as gotas formavam uma
pequena união sanguinea, as chamas das velas cresciam e a atmosfera
morbida se intensificava ainda mais, aos poucos que o simbolo no chão
manipulava o sangue que caia nele, sussurros distantes eram ouvidos
em meio a quietude das arvores, e então a sensação, não de medo, mas
de estar sendo observado. Ainda com os olhos fechados, eu começo a
falar em uma língua que eu nem sabia que tinha dominancia, mas as
palavras saiam perfeitas.

- Mi vokas tiun, kiu iras inter regnoj (Eu chamo aquele que caminha entre os reinos)
Mi nomas la gvidilon inter vivo kaj morto (Eu chamo o guia entre a vida e a morte)
Mi nomas la prizonestron de herezuloj (Eu chamo o carcereiro dos hereges)

A medida que caminho contornando o circulo, meu sangue escorre


manipulado por suas bordas, ate a metade, parando exatamente no
centro de cruzamento, e então eu caminho para as costas da garota, que
aos poucos despertava. Um grito, sairia de seus labios ao ver o que
estava acontecendo, mas eu impedi, tapando a boca dela e levando a
lamina ate sua garganta. Ela me encara asssutada, mas tem muito em
jogo para desistir agora. Num movimento rapido, eu deslizo a faca por
sua garganta, deixando seu corpo cair rente ao desenho e seu sangue
escorrer para dentro dele.

- Kaj en via nedirebla nomo, mi petas (Em seu impronunciavel nome, eu peço)
Por la oferita korpo (Pelo corpo sacrificado)
por la koruptita animo (Pela alma corrompida)
mi vidu tion, kion miaj okuloj ne povas (Deixe-me ver o que meus olhos não são
capazes)

Eu largo o punhal de volta no lençol e então me aproximo do cadaver,


colocando cuidadosamente ela, deitada no centro do simbolo, e me
ajoelho atrás de sua cabeça, desenhando com a tinta branca, simbolos
pelo seu corpo e colocando minha palma, marcada em sua testa. E
então, com o sangue unificado que fluia no centro do simbolo, eu
desenho uma linha vermelha no centro de ambas as palmas, na região
do terceiro olho, e então toco a testa da garota, fechando meus olhos.

- kio estas pretere (O que está além)


kio estas kaŝita (O que está oculto)
kio ne venas al mi (O que a mim, não vem)
Blindigu min al la lumo (Cegue-me para a Luz)
iberigu min al la mallumo (Liberte-me a Escuridão)
Sinjoro de la Kavo, malfermu la portalon de animoj kaj lasu min vojaĝi tra ili.
(Senhor do Fosso, abra o portal das almas e me deixei viajar por elas)

As chamas tremulantes e cheias, agora coloriam-se de verde, elas


dançavam calmamente, e não mais a atmosfera era incomoda, mas
acolhedora. Uma sombra, pairava atrás de nós e o som de uma porta era
ouvida, sendo aberta. O caminho estava livre...

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