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TRT

Disponibilização: Juuh Alves


Tradução e Revisão: Oli
Leitura e Formatação: Dadá

Dedicatória
Este livro é dedicado às minhas amigas,
minhas irmãs de alma,
aquelas que me salvaram uma e outra vez.
Virgem
Perséfone, rainha do submundo, destinada a viver
metade da sua vida na escuridão e metade na luz.
Prólogo
Via-a em todos os lugares. Andando em calçadas, em restaurantes lotados,
uma vez num breve flash de cabelo escuro e laço branco logo antes de uma porta
de elevador se fechar. Sem pensar e com meu coração trovejando em meu peito
eu corri quatro lances de escadas só para descobrir que era outra pessoa. Alguém
segurando a mão de um menino. Ela puxou-o para mais perto de seu lado
enquanto saía do elevador, olhando para mim com cautela, como se eu pudesse
agarrá-lo e correr.
Esses foram os tempos em que eu ainda duvidava da minha própria
sanidade, ainda questionava se ela realmente existiu. Mas então eu me
lembrava da sensação de seus dedos na minha pele, a seda escorregadia de seu
cabelo, o som de sua risada e a forma como eu a amava e ainda amo, e eu sei, eu
sei no fundo da minha alma que ela é real.
Eu sonhei com ela e, na escuridão, ela me segurou em seus braços.
Na escuridão ela sussurrou que eu era forte o suficiente para aguentar, que eu
era digno do amor que ela tinha me dado... e ela me lembrou de quem eu era
antes mesmo de ser alguém em tudo.
Meu Lírio da Noite. Somente da lua.
Porque agora, quando a luz do dia veio, ela não está mais aqui.
Capítulo um

Holden

O poderoso zumbido das hélices do helicóptero começou a se enfraquecer à


medida que diminuiu a velocidade e finalmente parou. Eu abri os olhos turvos e
olhei pela janela para a grande floresta ao redor do campo onde havíamos
desembarcado. Meus músculos se contraíram e eu soquei minhas mãos nas
minhas coxas, mas me senti um pouco melhor do que quando tinha decolado de
San Francisco. Pelo menos eu tinha dormido. Talvez por algumas
horas? Isso já era alguma coisa, e mais do que eu tivera na noite anterior.
Possivelmente mais do que eu tinha tido nos últimos três dias.
"Você vem, homem?" Brandon chamou quando abriu a porta. "Desculpe
acordá-lo, mas há uma cama na parte de dentro que vai ser muito mais
confortável do que esse assento."
"Eu não estava dormindo", murmurei, agarrando minha mochila e movendo-
me lentamente em direção à porta. A batida dolorosa na minha cabeça e náusea
passaram por mim. Droga, eu ainda me sentia como se a morte estivesse à
espreita. Fiz uma careta quando pulei para fora pela porta aberta. "Eu estava
rezando."
Brandon riu. "Oh, homem de pouca fé. Você realmente duvidou que eu te
deixaria aqui inteiro? Habilidades loucas de piloto, mano." Ele se virou e começou
a caminhar, sem se preocupar em fechar as portas do helicóptero – o
que significava, eu supunha, que ele não ficaria por muito tempo. Eu segui atrás
dele.
"Você não pode sequer segurar uma bola de futebol maldita metade do
tempo. E eles te pagam milhões para fazer isso. Por que eu deveria confiar minha
própria vida em suas mãos?" Brandon me lançou um olhar fulminante por cima
do ombro, mas então riu.
"Ainda não posso acreditar que você comprou um helicóptero", eu disse,
atingindo-o enquanto andávamos através da alta grama orvalhada.
Brandon deu de ombros. "Eu sempre quis aprender a voar. Por que não? A
vida é curta. Se você tem a oportunidade de cruzar algumas coisas fora de sua
lista, eu digo para fazê-lo. Além disso, leva três horas de carro até aqui a partir do
aeroporto comercial mais próximo. Voar é muito mais rápido."
"Jesus, quão longe de qualquer civilização estamos afinal?"
"Cerca de 70 milhas de Telluride. Quando eu disse privacidade, eu quis
dizer privacidade."
Nós caminhamos através de um bosque de escassas árvores e saímos do
lado de uma sólida cabana de luxo de dois andares, com janelas do chão ao teto
em ambos os níveis. Quando nos aproximamos, eu pude ver as árvores e o céu
refletidos no vidro, como se a enorme estrutura fosse parte de uma ilusão
cintilante. À noite deve parecer um farol luminoso. Eu assobiei, olhando para a
floresta diretamente na frente da cabana, vislumbrando o
que provavelmente seria a visão de dentro. "Droga, embora você tenha
construído uma remota cabana no deserto, você não deixou nada a desejar.
Isto que é gostar da porra cintilante, cara. Será que ela vem com
um par de fantasmas assustadores?"
Brandon riu quando eu o segui até um grande conjunto de escadas de
pedra. "Cuidado com o que você brinca. A última vez que estive aqui com um
grupo, um par de garotas jurou que viram um fantasma na floresta.
Vieram gritando e berrando da banheira de água quente." Ele atirou-me o que eu
assumi supostamente ser uma expressão de medo mortal, e imitou com uma mão
uma forma de garra.
Eu fiz um som de escárnio e revirei os olhos quando ele pegou um molho de
chaves e abriu a porta.
"Soa como uma má combinação de álcool e insolação." E células cerebrais
limitadas – o que sempre foi um fator que acompanhava as garotas das festas
de Brandon. Eu deveria saber; elas eram as mesmas com quem eu
festejava, também.
"De qualquer maneira, elas exigiram muita proteção contra os calafrios
excessivos. Proteção nua. Na minha cama. Foi um ganha-ganha. Você sabe o que
é realmente assustador, embora? Aparentemente há um velho hospital
psiquiátrico abandonado a mais ou menos oito quilômetros daqui. Não
é do caralho?" Não havia nenhum sarcasmo em sua voz.
Ele realmente quis achava isso incrível.
"Incrível" repeti sem entusiasmo. E assustador. Mas eu tinha alguns
problemas maiores do que um prédio abandonado à milhas de distância. Brandon
jogou as chaves sobre uma mesa lateral quando entramos na enorme sala. Todo o
espaço era decorado com mobiliário resistente, masculino e condizente com um
chalé de esqui de luxo, organizado em pequenos grupos para fazer tudo
parecer mais íntimo.
"Eu tive um perito em decoração feng-shui trabalhando aqui, para garantir
que o fluxo de energia fosse equilibrado e toda essa merda." Eu olhei para ele
fixamente antes de olhar em volta brevemente.
"É isso que me faz falta? Energética equilibrada?"
Brandon deu de ombros. "Poderia ser, cara."
Eu consegui dar uma risada suave, deixando cair o meu saco e caminhando
em direção à janela, onde eu poderia olhar a vista. Daqui de cima era uma
experiência totalmente diferente. A bela vastidão da floresta profunda ao redor, as
montanhas cobertas de nuvens muito além, a maneira como o orvalho brilhava
nas folhas sob as inclinações da luz do sol do fim da tarde. Eu
silenciosamente apenas olhei por alguns minutos.
"Então, você realmente vai me deixar aqui, hein?" Eu perguntei sem me
virar, minha voz soando mais desolada do que eu pretendia. Nada me aguardava,
exceto o ar, a floresta, as montanhas e o céu. Oh, e um hospital
psiquiátrico abandonado. Não poderia esquecer disso. Bem, e eu mesmo – a
única coisa da qual eu nunca podia escapar, embora eu fosse bom em
tentar. Aqui fora, embora...
Brandon fez uma pausa. "Sim, eu realmente vou. E você vai ficar bem –
melhor do que nunca. Você sabe, tem–"
"Sim, eu sei." Minha mente complementou o que Brandon não tinha falado:
uma segunda chance, uma chance final, a oportunidade de forjar um
retorno... tempo para me recompor. Eu continuei a olhar pela janela. À bela
simplicidade da paisagem parecia uma paródia da complexidade suja e escura
dentro de mim. Ou talvez não fosse complexo em tudo. Talvez fosse a coisa mais
simples do mundo: eu era um maldito fodido. Eu tinha enfiado a
cabeça tão fundo dentro da minha própria bunda que agora não
podia mais encontrar meu caminho de volta. Balançando a cabeça para clarear
meus pensamentos eu me virei para Brandon, que estava olhando para mim com
preocupação.
Corri a mão pelo meu cabelo. Eu precisava de um chuveiro. Encolhendo-me,
perguntei: "Você vai me dizer o que aconteceu na noite passada?"
Brandon fez uma pausa. "Você não se lembra de nada?"
"Pedaços e partes". Eu caí na cadeira mais próxima, massageando minhas
têmporas. Eu ainda sentia o resto da enorme dor de cabeça com a qual eu tinha
acordado, graças à copiosa quantidade de álcool que eu tinha consumido na noite
anterior. "Lembro-me de Paul me atirando para fora." Meu agente, com o rosto em
brasa e cheio de raiva quando ele muito literalmente me expulsou de sua casa.
Esparramado na sujeira, gemendo, saliva pegajosa escorrendo pelo meu queixo
enquanto Brandon me arrastava para cima.
"Você fodeu Sabrina no banheiro térreo, cara. A festa inteira ouviu."
Sabrina. Linda, loira, esposa troféu do Paul.
Náusea rolou através de mim. Oh, merda. Porra. Caí para trás na cadeira,
tentando agarrar as peças de memória que passavam pelo meu cérebro. Sabrina
tinha me seguido até o banheiro e feito uma proposta e eu... Jesus,
eu tinha fodido a mulher no banheiro? Eu não tinha nenhuma lembrança de
concordar, apenas a vaga visão de bater alguém contra a pia enquanto essa
alguém arranhava minhas costas e fazia sons aleatórios, choramingando alto.
Antes que eu percebesse o que estava fazendo, cheguei em torno
das minhas costas e, quando pressionei levemente, pude sentir a picada das
feridas que ela deve ter me infligido com suas longas unhas – a prova da
minha ação nojenta. Vômito ameaçou escapar e eu o engoli, passando minhas
mãos suadas sobre minhas coxas. "Foda-se," eu murmurei. "Foda-se, foda-se."
"Sim, bem, eu acho que isso resume tudo," Brandon concordou. "Em vários
níveis." Sua expressão estava cheia de pena e eu desviei o olhar. Houve
alguns segundos de silêncio, e então ele continuou. "Você não pode continuar
assim, mano. Este não é você. Você não pode continuar vivendo dessa
maneira. Mas você tem que ser o único a fazer a escolha, embora. Sua vida pode
ser boa de novo, cara."
Concordei, mesmo não tendo ideia de como possivelmente minha
vida poderia melhorar. "Sim, eu sei," menti. "Isto é bom. Cara, eu aprecio isso." E
eu faço. Se não fosse o refugio dessa cabana seria reabilitação de celebridade,
e em algum lugar onde paparazzi ficavam escondidos nas árvores tentando obter
uma imagem minha chorando em terapia de grupo ou algumas dessas merdas.
Em vez disso, Brandon tinha me pegado do chão – literalmente – e me levado
para sua casa.
Em seguida, na parte da manhã, ele apareceu com café e Tylenol e ofereceu-
me este lugar - contanto que eu prometesse usá-la para me colocar nos trilhos. E
eu queria, realmente queria. Eu estava tão cansado de foder minha vida,
das festas intermináveis e das bebedeiras, dos desesperados puxa-sacos, do sexo
sem sentido e das excessivamente brilhantes manhãs seguintes, que sempre
chegavam com vergonha, doença e depressão. E então eu tinha empacotado
uma bolsa e aceitado sua oferta. Eu sabia que deveria olhar para isso como um
presente, mas, na realidade, me esconder parecia muito mais atraente do que
enfrentar meus inúmeros erros. Então aqui estava eu.
Brandon se aproximou e agarrou meu ombro, me dando um aperto de
suporte. "Antes de eu sair, preciso verificar sua bagagem."
Olhei para ele, estreitando os olhos ligeiramente. Mas, tudo o que vi em sua
expressão era preocupação e possivelmente algum pesar. Ele não estava
saboreando jogar de diretor. Eu considerei dizer-lhe para ir se foder, mas a
verdade é que eu realmente não podia me dar ao luxo de perder mais amigos.
Deixei escapar um suspiro. "Sim, certo. Ok." Levantei-me e peguei minha
mochila, então deixei-a cair no sofá e afastei-me enquanto ele fazia uma pesquisa
dos conteúdos - à procura de comprimidos, eu sabia. Ele se importava, claro, mas
eu imaginei que ele também não me queria tendo uma overdose em sua remota
cabana no deserto do Colorado. A mídia teria um dia de campo com isso. Tentei
sentir algum tipo de medo por saber que muito
provavelmente isso era exatamente o que ia acontecer, mas tudo o que senti foi
uma sensação distante de curiosidade. Eu me perguntei quanto tempo
levaria ate alguém encontrar meu corpo.
Depois de um minuto ele fechou a minha mochila e empurrou-a.
"Pegue qualquer um dos quartos no andar de cima. A governanta está fora esta
semana. A despensa e os refrigeradores na cozinha e
garagem estão estocados com alimentos para um mês. Há uma
academia completa no térreo – use-a, cara. A altitude daqui torna o treino melhor
do que você poderia ter em qualquer outro lugar. Há um Jeep na garagem, e as
chaves estão no cabide de madeira ao lado da porta."
"Eu pensei que o negócio era eu ficar enfurnado aqui durante as próximas
quatro semanas." Além disso, ele sabia que eu não deveria dirigir.
"É. Mas você ainda está autorizado a saber onde você tudo está, no caso de
uma emergência. Você não está preso." Seu olhar sustentou o meu por um
momento. No entanto, estava implícito em sua expressão. "Se você tiver alguma
dúvida, me ligue. A recepção de celular aqui é decente; eu raramente
tive problema com isso." Eu apenas balancei a cabeça. "Apenas seja discreto,
cara. Descanse. Recupere-se. Coloque sua cabeça no lugar."
Seus olhos se demoraram no meu rosto por muito tempo. Ele
parecia querer dizer mais alguma coisa, mas mudou de ideia. Certo. Eu
sabia o que ele queria dizer, de qualquer maneira: ‘Fique escondido. Exile-se,
assim você não pode foder mais do que já tem feito. Pense muito bem sobre porque
você odeia a sua vida tão malditamente, seu estúpido bastardo ingrato.’
"Ok. É melhor eu ir embora enquanto as condições de voo
ainda são favoráveis." Ele me deu um tapinha no ombro e caminhou em direção à
porta. Após um tranquilo clique da fechadura atrás dele eu estava sozinho.
Náuseas me bateram de novo e eu me sentei no sofá, puxando respirações
profundas de ar enquanto colocava minha cabeça entre os joelhos.
Tudo estava tranquilo. Depois de alguns minutos, porem, o
silêncio foi momentaneamente quebrado pelo som distante de um pássaro
gritando. Parecia vagamente humano, e fez um arrepio correr pela minha
espinha.
Um momento depois ouvi o barulho dos rotores do helicóptero,
que desapareceu lentamente. Brandon se foi.
Passei minhas mãos pelo meu cabelo curto e escuro e, em seguida, sentei-
me e alcancei a minha mochila, abrindo-a e sentindo o bolso escondido que foi
costurado perto do fundo. Eu rasguei o fio e tirei o saco plástico envolto com fita
adesiva. Minhas mãos tremiam enquanto eu o abria, e eu xinguei baixinho
quando dois comprimidos caíram silenciosamente sobre o tapete aos meus pés,
rolando para baixo da mesa de café. Me abaixei em minhas mãos e joelhos e
procurei por eles. Minha tranquilidade absoluta naquele momento era
descaradamente clara, mesmo para mim. Soltei um suspiro de alívio quando
meus dedos encontraram os pequenos comprimidos.
Eu levei o saco zipado para a cozinha, olhando em volta para os armários
escuros de tamanho industrial com aparelhos de aço inoxidável e bancadas de
granito cinza escuro. Escondi o saco atrás de algumas caixas de cereais na
despensa. Eu não sabia por que os estava escondendo - era hábito, neste ponto –
então estalei os dois comprimidos que tinham caído no chão em minha boca,
inclinando-me sobre a pia para beber direto da torneira.
Eu ia parar de tomar os comprimidos. Mais um par de dias e eu o faria. Eu
tinha um mês antes que precisasse levar a sério a formação. Mais alguns dias não
teriam importância. Eu reuniria minhas forças quando chegasse a hora. Quando
eu estivesse pronto. Mas, não hoje. Hoje eu precisava dos comprimidos. Eu
precisava da dormência abençoada que os comprimidos trariam.
Novamente de pé em frente à janela com vista para a floresta, eu me
perguntava que tipo de animais selvagens vivia nela. Ursos? Eu precisava me
preocupar com ursos? Lobos? Não importa. Eu ficaria aqui dentro. Ursos ou lobos
eram muito menos assustadores do que paparazzi tentando conseguir uma
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fotografia do ex-quarterback atualmente desempregado.
Eu chamaria Ryan–
Eu sacudi a cabeça e vacilei em meu próprio pensamento. Mesmo depois de
quase três meses eu ainda pensava em chama-lo às vezes, quando precisava do
meu melhor amigo, uma pessoa que me conheceu antes que eu pertencesse a
todos. Antes que eu fosse Holden Scott, propriedade pública. E então eu
me lembrava que ele se foi, e ainda ficava chocado. Quanto tempo isso
duraria? Essa fração de um segundo quando a minha mente
inconsciente acreditava que ele ainda estava vivo – há apenas um telefonema de
distância? E eu realmente queria que fosse embora? Uma parte do meu cérebro
se recusava a acreditar que ele realmente não estaria aqui para sempre. Minha
cabeça latejava novamente. Cheio de feia auto piedade, deitei-me sobre o sofá de
couro e capotei na frente da televisão, esperando que o deus do feng-
shui das boas vibrações já estivesse energizando meu caminho. Eu
tentaria conseguir algum sono. Eu precisava dormir pra caralho; estava tão
malditamente cansado. Talvez tudo ficasse melhor depois de algum descanso.

O sono não veio. Algum tempo depois da meia-noite eu tropecei para fora da
casa para obter um pouco de ar fresco. O riso enlatado de algum show de fim de
noite soava no fundo - e o som fabricado de felicidade fez minha mandíbula
apertar até doer. Tudo parecia errado. Minhas pernas não desistiam de sua
inquietação, como se formigas se arrastassem pelas minhas veias. Eu não
podia, porra, respirar. Mesmo os meus pensamentos estavam fora. Parecia que
algo ou alguém estava batendo incessantemente no meu cérebro, como se
estivesse tentando chamar a minha atenção, e isso doía. Eu tinha me despido da
minha boxer mais cedo, e embora a brisa da noite do final do verão fosse apenas
levemente fria, se sentia bem contra a minha pele nua. Fiquei no parapeito da
enorme plataforma circular maciça do convés olhando para a mata escura,
inalando o ar fresco como se ele pudesse de alguma forma purificar-me de todos
os meus fracassos.
Eu me assustei um pouco quando peguei um movimento entre duas
árvores, um vago esboço de uma forma humana vestindo branco. Esticando os
olhos, olhei para o lugar onde jurei que vi... alguma coisa. Mas depois de
um momento eu desviei o olhar, esfregando meus olhos cansados. Jesus, eu
estava vendo coisas. Isso já tinha acontecido antes, quando eu passei dias sem
dormir. E agora estava acontecendo novamente.
Ou talvez tivesse sido um lobo, um animal, um truque da luz da lua que
fez parecer uma sombra humana. Eu levantei meus braços, rindo para o vazio
tranquilo da noite. "Hei, ursos! Lobos! Prestem atenção, filhos da puta. Sabe
quem eu sou?" Minhas palavras ecoaram pela escancarada escuridão. "Sou
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Holden Scott, o homem mais cobiçado do país, segundo a NFL ." Soltei meus
braços. "Desonrado, mas ainda cobiçado. Olhem para mim. Eu sou a porra de um
DEUS! Mulheres de toda parte me querem. Elas querem ter meus bebês. Elas se
infiltram em meus quartos de hotel e se escondem debaixo da cama. É a merda
mais louca." Eu ri, mas meu riso não tinha nenhum humor e mais parecia um
latido estranho. "Elas –" deixei escapar uma respiração instável. "Elas –" eu
suguei ar fresco da noite afiada, sentindo as ondas de miséria como se fossem
tangíveis, me batendo para baixo, arrastando-me abaixo, me puxando para o
fundo, enchendo minha boca com o sabor pegajoso de desespero.
"Veja, aqui está à coisa – eu tenho um plano B. Eu poderia começar por mim
mesmo. Sem mais brindes. Eu faria uma fortuna mínima. Eu sou um deus
entre os homens", eu chamei de novo. E, então, minhas pernas cederam e eu caí
de joelhos sob o julgamento silencioso da lua. E baixei minha cabeça.
Parecia que minha alma estava dormindo, e eu não tinha ideia do
que poderia acordá-la novamente.
Capítulo dois

Holden

A manhã seguinte amanheceu clara e fresca, o brilho fraco do sol amarelo


no horizonte. Eu tinha conseguido várias horas de sono e me sentia um pouco
revigorado de pé no parapeito do convés com uma caneca de café, assistindo a
pálida luz da manhã perseguir as sombras da noite. Se ao menos eu pudesse
segurar esse sentimento por tempo suficiente para agarrar o meu recomeço. Se
não aqui, então onde? Certamente não no campo com uma bola de futebol
entrelaçada em minhas mãos e milhares de fãs gritando meu nome; nem entre as
coxas de alguma beleza de olhar vago; nem mesmo entre os supostos amigos em
minha própria casa – sempre tendo que adivinhar o que eles realmente queriam
de mim, e inevitavelmente descobrindo que era algo diferente de amizade. Se não
for aqui, talvez em nenhuma parte. Talvez em nenhum lugar em tudo.
No meio da tarde o desejo se estabeleceu novamente, a besta sedenta por
uma dose. Andei pelo convés tentando me convencer a resistir, mesmo sabendo
que, no final, eu não resistiria. Sabendo que eu não poderia inventar
uma razão boa o suficiente. Eu era patético, eu sabia. Quantas pessoas
trocariam de lugar comigo em um batimento cardíaco? Quantas pessoas
revirariam os olhos e tocariam o melhor violino do
mundo enquanto enxugavam as lágrimas falsas que seus olhos derramavam
pela pobre estrela do esporte que tinha tudo e jogou tudo fora por estupidez?
Ou por direito. Ou ambos. Mesmo que eu não conseguisse descobrir
exatamente por que. Quando eu tentei, minha cabeça começou a doer, e eu
não pude mais formar um pensamento claro. Se eu pudesse descobrir isso talvez
eu tivesse uma chance de lutar para mudar as coisas para melhor. Ou talvez eu
ainda fosse um fodido fraco que sabia o que precisava fazer, mas não era forte o
suficiente para efetivamente tomar uma atitude.
Porque, francamente, levou muitos confortos da vida – sem ter que gastar
um segundo para me preocupar com o básico – para sustentar este nível de auto
piedade.
Sem mencionar que a minha fama me isolava das consequências que os
outros podiam enfrentar. "Claro, homem" me cercava – pessoas que preferiam me
fazer feliz a correrem o risco de serem expulsos da minha vida e perderem o
status da minha amizade, ou os negócios que o relacionamento fornecia. Houve
um tempo em que eu pensei que isso me traria sorte. Agora...
Eu já estava na cozinha por um tempo mexendo no saco de comprimidos
como se o plástico fosse a pele de uma pessoa amada. Finalmente, com um som de
desgosto, eu joguei-o sobre o balcão e fui procurar algum licor. Talvez algumas
doses aliviassem a tensão. Eu nunca tive um problema com álcool – ou melhor,
eu nunca senti que não conseguiria parar de beber se realmente
quisesse. Embora eu definitivamente tenha feito algumas
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merdas estúpidas sob sua influência - ou seja, dirigir pela Sunset Boulevard
com duas modelos de maiô gritando para fora do meu teto solar
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e, consequentemente, ganhar um merecido DUI .
Brandon provavelmente tinha solicitado que o local estivesse livre de licor,
mas depois de procurar em torno do canto de trás da despensa, eu encontrei uma
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garrafa de Johnnie Walker ainda na caixa, e com cumprimentos na frente –
obviamente um presente que Brandon tinha esquecido. Quem limpou o lugar
não tinha encontrado esta. Não foi perdido por mim que eu sentia
uma vitória com a descoberta, provavelmente, e pelo menos, um pouco
trágica. Engoli uma dose de qualquer maneira, fazendo uma careta quando
o líquido queimou minha garganta e resistindo à vontade de vomitar. Tomei
uma profunda respiração e tomei outro gole, fechando os olhos quando o calor se
espalhou por minhas veias. Porém, depois das seis daquela noite o álcool não
foi suficiente e eu cedi ao chamado do meu amante, tomando vários analgésicos
com um gole de uísque e sentindo a dormência bem vinda das drogas e do
coquetel de bebidas fluindo através do meu sistema.
Eu tropecei para o convés e acendi a churrasqueira, segurando meu copo
para o céu em cumprimento à magnificência do pôr do sol inundando o
firmamento com redemoinhos vívidos de rosa e ouro. "Show impressionante.
Bom trabalho."
Enquanto o bife começava a chiar, eu olhava para além das árvores perdido
em meus próprios dispersos e metade formados pensamentos. Movimento. Algo
branco. Eu gelei e fechei os olhos, uma raia de animado medo penetrando minha
espinha e um sendo pouco silenciado pelos produtos químicos, mas
ainda presente. Fiquei ali por vários momentos, o único som vindo da carne
chiando e de alguns gritos de pássaros distantes. Os cabelos na parte de trás do
meu pescoço se arrepiaram. Algo está prestes a acontecer, minha mente
sussurrou. Era um pensamento estranho, mas o sentimento que o
acompanhava era familiar, e uma memória voltou para mim.
Tinha sido meu último ano na faculdade, e o jogo final da temporada estava
prestes a começar. Lá estavam os olheiros nas arquibancadas, pelo menos dois ou
três. Eu tinha esquecido alguma coisa no vestiário e tive que correr de volta para
apanhá-la. Ou eu estava na arquibancada? Por que
eu estaria nas arquibancadas? Não, não, isso não estava certo.
Droga de memória. Eu realmente não deveria ter misturado álcool e comprimidos.
De qualquer maneira, no último ano... no meu caminho para o vestiário – sim,
tinha sido o vestiário, eu estava certo – eu tinha parado na porta
e um sentimento lavou através de mim: algo está prestes a acontecer. O mesmo
sentimento que eu tive agora. Eu tinha sido um guerreiro no campo naquele dia,
e três meses depois eu tinha sido selecionado pelo San Francisco na primeira
rodada e assinado um dos contratos mais lucrativos da NFL.
Meu coração aumentou a velocidade e adrenalina subiu por minhas
veias agora, assim como tinha sido então. Algo está prestes a acontecer.
Engolindo em seco eu me virei e andei tão casualmente quanto possível para a
outra grade ate encostar-me nela, e a floresta onde eu tinha visto o movimento
agora estava às minhas costas. Eu tirei meu telefone do bolso e o ergui para uma
selfie. Meus músculos estavam tensos. Eu esperei. Percebi um movimento de
novo, desta vez pela tela do meu telefone. Eu cliquei no botão e tirei uma foto.
Virando-me para a grelha, virei o bife e abri a imagem. Uma parte do meu rosto
bloqueou parte do fundo, mas eu tinha garantido uma boa visão das árvores
atrás de mim. E lá estava – o movimento que eu tinha visto. "Sim”, eu murmurei,
sentindo uma onda de sucesso e ampliando meus dedos na tela para aumentar o
zoom. Eu trouxe o telefone mais perto do meu rosto.
"Puta merda", eu respirei. Fosse o que fosse eu quase não o peguei com
minha câmera, mas era alguma coisa. Eu dei mais zoom, mas não
consegui identificar exatamente o que era, pois a
imagem estava muito embaçada. Talvez um pedaço de material branco? Cabelo
escuro? Mas, eu não estava louco, e eu não estava vendo coisas. E o que quer
que tivesse estado lá, tinha esperado até eu virar de costas para se lançar entre
as árvores. Será que animais eram tão inteligentes? "Que diabos?" Murmurei,
levantando a cabeça e olhando em volta mais uma vez, frio gelando minha
espinha. "Que diabos?" Eu repeti.
Eu debati chamar Brandon. Ou talvez chamar a polícia? Mas para relatar o
quê? Que eu possivelmente vi um fantasma? Eu ri alto. Isso seria ir mais além,
especialmente considerando que eu estava claramente sob influência de álcool.
De qualquer forma, se eu chamasse a policia essa historia certamente vazaria, e
eu seria ainda mais motivo de chacota do que já era - e mais cedo ou mais
tarde haveriam paparazzi suspensos nas árvores. É claro que eu tinha a imagem,
mas a foto estava muito ruim para ser chamada de qualquer tipo de prova. Isso
seria explicado de alguma forma e eu acabaria parecendo um idiota. E talvez eu
não devesse confiar em mim mesmo de qualquer forma, considerando a
condição em que eu estava.
Eu comi o meu jantar sentado no convés e com meus olhos treinados sobre
a floresta, mas não avistei nada de novo naquela noite. Finalmente eu
tropecei para dentro da casa, e segurei meu telefone agarrado ao meu peito
enquanto cochilava no sofá, como se a imagem pudesse deixar de existir uma vez
que eu fechasse os olhos.

Tirando a minha roupa, entrei na água quente e borbulhando da jacuzzi


exterior, suspirando quando meus músculos relaxaram. Já se passaram quatro
dias desde que cheguei aqui, e eu estava entediado como o inferno. A garrafa de
uísque se foi, e eu só tinha comprimidos suficientes para durar mais uma semana
ou algo assim. Eu seria forçado a me desintoxicar. Que porra é essa que eu estava
pensando concordando com isso? Eu teria que tomar o Jeep de Brandon e
dirigir para o aeroporto que ele tinha mencionado para pegar um voo. Brandon
ficaria desapontado, mas ele superaria. A água morna me cercou, fazendo minhas
pernas se sentirem como geleia, e a roda de vapor estava nublando meus sentidos
enquanto meus olhos se fechavam.

"Você acredita em Deus, Holden?" A voz de Ryan engasgou.


Será que eu acreditava? Eu não tinha certeza. Meus pais acreditam. Eu fui
criado para acreditar. Minha mãe estava sempre falando em ser um bom cristão,
mas eu nunca tinha realmente dado um monte de pensamento a Deus. Mas o
que responder à Ryan? Sua vida era uma merda. Seu pai era um maldito sádico. É
claro que ele queria acreditar que havia um propósito para toda a dor
que ele constantemente sentia, uma explicação para todas as malditas cicatrizes.
Tristeza tomou conta de mim e eu engoli. Minha garganta estava grossa. "Sim,
cara. É claro."
Ele assentiu com a cabeça com os olhos fechados, a contusão em seu
maxilar roxo escuro machucado, sangue ainda endurecido no lábio. Seu pai tinha
feito isso com ele. Eu cerrei minhas mãos nas minhas coxas, irritado, impotente.
Ele me deu o mínimo vislumbre de um sorriso, mais fugaz do que uma única
gota de chuva caindo. "Ok, bom, porque em alguns dias eu não acho que posso
fazer isso sozinho, Holden."
"Você não está fazendo isso sozinho. Eu estou aqui," respondi. Algo ardia em
meu peito.
Ele sorriu novamente. "Eu sei. Você sempre esteve aqui. Você, seus pais." O
sorriso desapareceu e ele fez uma leve careta.
"Talvez Deus tenha me enviado, sabe?" Eu dei uma pequena risada. "Jesus
Cristo Todo-Poderoso, isso soa realmente estúpido e auto importante, não é?" Ele
me deu a primeira pequena risada que tinha produzido há um tempo. "Sim,
realmente, seu arrogante imbecil." Mas seu sorriso aumentou e ele ergueu a mão,
os dedos fazendo um V, o gesto que ele sempre fez da arquibancada no final de
um jogo, deixando-me saber que me assistiu. Eu levantei minha própria mão e
sorri de volta para ele.

Água encheu minha boca e eu engasguei, me empurrando para cima


e tomando uma golfada de ar. Meu corpo se debatia na água borbulhante da
banheira de hidromassagem e eu olhava ao redor descontroladamente, tentando
lembrar onde estava. Oh, foda-se, eu devo ter adormecido. Eu tinha sonhado com
Ryan quando éramos crianças, mas cair dormindo na banheira? Jesus, se o álcool
e as drogas não me matassem eu faria o trabalho de alguma outra forma – num
carro ou afogado numa maldita jacuzzi. Meu coração estava batendo a mil por
hora.
Sentei-me e passei a mão pelo meu cabelo molhado, olhando para além das
árvores. Havia uma garota em pé na borda da floresta. Eu me assustei, deixando
escapar um pequeno grito. Ela assustou-se também, e se virou para começar a
fugir. Em pé de repente eu gritei: "Espere!"
Ela hesitou e virou a cabeça para olhar para mim. Peguei uma toalha e
corri para fora da banheira quente, quase escorregando e plantando
a cabeça no convés. Ela voltou para a floresta e correu. "Espere!"
Eu chamei novamente.
Desci as escadas e percorri toda a área gramada em frente à cabana,
envolvendo a toalha ao redor de minha cintura enquanto corria e segurando-a no
lugar para que não caísse.
Eu entrei na floresta onde ela estava segundos antes e parei.
A claridade era mais obscura aqui, com poucos raios de sol filtrando através das
árvores densas. "Olá?" Eu chamei; mas não houve resposta, e eu não podia
detectar nenhum som.
Olhei para os meus pés descalços e voltei por onde
vim, acompanhando minhas próprias pegadas. Voltei por onde eu tinha entrado
nas árvores atrás dela e olhei mais de perto, mas havia apenas um conjunto
de trilha: a minha própria. Franzindo a testa eu caminhei de volta para o
alojamento, olhando por cima do ombro enquanto me afastava da floresta, um frio
se movendo para baixo de minha espinha. Primeiro Ryan, agora isso. Eu estava
vendo fantasmas? É isto que acontece quando se está tão profundamente no
vício? Buracos químicos estavam se formando em meu cérebro? Ou era a falta de
sono fazendo-me ter visões? Eu estava tendo um colapso? Mas não, Ryan tinha
sido uma memória, apenas um sonho.
"Não", repito em voz alta, tranquilizando-me, "eu a vi." Cabelo escuro e um
vestido de renda branca. Mas quem diabos usava um vestido de renda branca na
floresta? Eu sabia que ela não fazia parte do grupo de paparazzi que
normalmente me perseguia. Se fosse, seu propósito teria sido tirar uma foto, e as
mãos da garota estavam vazias. Não havia nenhuma câmera. Então, de onde ela
tinha vindo? Não havia nada por milhas ao redor. E o que eu faço agora?
Claramente ela não queria se comunicar comigo. Mas, se não, por que
ela continua voltando? Deve ter sido ela antes. Ela estava me observando.
Mas, por quê? O que ela queria?

Acordei bem cedo, tomei banho e vesti jeans, camiseta e tênis. Era o
primeiro dia que eu de verdade tinha me vestido desde que tinha chegado à
cabana de Brandon. E a sensação estranha percorrendo minhas veias
era... excitação.
Arrumei um pouco de comida e água e fiz meu caminho para a floresta com
uma mochila nas costas, entrando no mesmo local onde a garota tinha entrado no
dia anterior.
Eu não queria ir muito longe e perder meu senso de direção. Não havia
caminho a seguir nesta floresta, nada que falasse de alguém ter estado aqui
antes de mim. E isso não era exatamente o que eu precisava – me perder na
escuridão arborizada quando não havia viva alma ao redor,
e ninguém saberia que eu estava perdido por mais três semanas. Eu morreria
sozinho, em silêncio e sem a menor cerimônia, e talvez um dia eles
encontrassem os meus ossos - ou talvez não.
Eu andei por uma hora ou mais, apreciando o ar fresco em meus pulmões, o
sussurro das folhas movendo na brisa e o som dos gritos dos pássaros nas árvores
acima. Eu chamei pela garota aqui e ali, apenas no caso, mas não houve resposta
em troca. Minhas pernas começaram a ter cãibras depois de um mais um
tempo, e eu comecei a me perguntar se realmente era um louco. O que eu estava
fazendo vagando pela floresta em busca de uma visão que pode ou não realmente
existir? E assim de repente me senti como um completo idiota. A excitação com a
qual eu acordei foi transformada em azeda loucura. E eu me senti como a merda
fisicamente, também. Meu corpo estava dolorido e inquieto, e eu precisava de um
par de comprimidos. Na minha esperança naquela manhã eu não tinha sequer
pensado para trazer alguns comigo. Sentei-me numa rocha e tirei minha garrafa
de água da mochila, tomando um longo gole. Eu estava com frio e minha camiseta
mal fornecia calor suficiente no ar fresco da floresta, muito densa para permitir
qualquer luz do sol onde eu estava. "Para a puta que pariu", murmurei.
Fiquei ali sentado em silêncio por mais alguns minutos, reunindo forças
para me levantar e voltar para a cabana. Meu caminho ate aqui tinha sido uma
longa subida, e eu sabia que tudo o que eu tinha a fazer era descer para
encontrar a saída. Tomando outra bebida, meus olhos se moveram em torno da
floresta na minha frente, e meu olhar pegou o que parecia um animal pequeno
que se encontrava na base de uma árvore. Franzindo a testa, levantei-me
e me aproximei. Parecia um coelho. Ajoelhei-me e olhei mais de perto. Seus olhos
estavam abertos e vidrados, e formigas cobriam seu
pelo emaranhado. Eu levantei minha cabeça, de repente me sentindo... observado.
Era como se uma aglomeração de aranhas estivesse correnddo pela minha
espinha. Eu me empurrei para uma posição de pé, virando-me em um círculo.
A mata de repente ficou estranhamente
silenciosa, e o silêncio parecia opressivo, errado. Andando para
trás eu lentamente afastei-me do coelho morto, voltando pelo caminho por
onde vim.
Meus ombros relaxaram um pouco quando eu entrei na área por onde andei
apenas dez minutos antes – uma clareira gramada cheia de
sol quente, com apenas algumas árvores pontilhando a área predominantemente
aberta. Mas eu imediatamente fiquei tenso novamente quando ouvi um guincho
estridente, chamando minha atenção para algum tipo de lamento de alma
penada. Respirando fundo me escondi atrás da árvore mais próxima, prendendo
minhas costas a ela, meu coração batucando em meus ouvidos. Merda, merda,
merda.
Espreitando, pude ver o animal que estava dando o terrível grito – era um
javali. E parecia ter sido capturado de alguma forma, ou possivelmente ferido.
Tomei um momento para recuperar o fôlego e me inclinei contra a
árvore para tomar uma grande golfada de ar. Eu quase ri de mim mesmo. Obtenha
sua merda em conjunto, Holden. É a porra de um porco.
Ainda assim, seria sábio seguir em frente. Eu não estava armado, e animais
selvagens de qualquer tamanho poderiam ser perigosos. Não tinha sido o
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rei de Game of Thrones 7 trespassado por um javali enquanto caçava? Apesar
de que, pensando nisso agora, não era o pior caminho a percorrer: havia algo
muito viril sobre morrer assim, na verdade. Muito melhor do que ser encontrado
em seu próprio vômito no chão de algum banheiro, o qual provavelmente seria o
meu fim no ritmo em que eu estava indo.
De repente, o porco soltou outro grito estridente, voltando-se para onde eu
estava como se tivesse de alguma forma me sentido. Ele redobrou seus esforços de
luta e pranto. Eu agora podia ver que sua perna estava presa de alguma forma.
Ele gritou e grunhiu ferozmente, tentando em vão se libertar. Fui atingido por
uma súbita cabeça correndo e recostei-me contra a árvore, ofegando por ar. De
repente um pássaro veio atacando violentamente do céu, mal perdendo meu
rosto. Eu senti o escovar das penas de suas asas conforme gritei e caí pra
frente, e minha frequência cardíaca subiu acentuadamente quando vi que o porco
estava livre e vindo direto na minha direção. Eu me mexi para trás na sujeira
e nas agulhas de pinheiro, soltando um grito profundo e finalmente puxando-me
para o meus pés.
Puta merda, puta merda, puta merda, minha mente maníaca cantou.
Medo arqueou através de mim enquanto eu ficava de pé, me virava e corria,
tropeçando e deslizando para baixo do morro. Meus
pensamentos se agruparam num alarme desarticulado, e meu estômago corria o
risco de vomitar seu conteúdo a qualquer momento. Meu corpo inteiro
estava tremendo. Eu nunca tinha estado tão fodidamente apavorado.
No momento em que cheguei há cabana uma hora mais tarde, eu já estava
respirando normalmente e me sentindo um molenga completo e absoluto. Que
tipo de covarde eu era? É isso que um grande e forte quarterback faz?
Fraco, fraco, fraco. Não é forte o suficiente... Algum canto detrás da minha
mente gritou antes de eu desliga-lo, desanimado. Eu gemi. De súbito, náuseas
intensas me fizeram parar e tomar um longo suspiro de ar, assim eu não
perderia o conteúdo do meu estômago. A dor de cabeça estava voltando
novamente também.
Fraco, fraco, fraco.
Não, estava tudo bem. Eu só precisava colocar meus pensamentos em
ordem, e os comprimidos iriam me ajudar a fazer isso. Talvez só um, para aliviar o
estresse. Imaginei o que devo ter parecido quando corri desse porco selvagem
através da floresta e quase senti pena dos paparazzi por perderem essa
chance. Consequentemente, riso histérico borbulhou em meu peito.
Eu fui apreendido por isso tão violentamente que deitei na grama e literalmente
rolei com hilaridade.
Mas parei quase tão rapidamente quanto tinha
começado, meu riso encontrando morte rápida em meus lábios. Jesus... Jesus.
Alguém me salve.
Capítulo três

Lily

Eu arrastei a escova pelo meu cabelo úmido, inclinando a cabeça em direção


à lareira para ajudar a secá-lo mais rapidamente.
Passei a mão até a pele nua da minha perna, pensando sobre
as garotas que eu tinha visto na cabana na borda da floresta – aquelas
que usavam as minúsculas roupas de banho e dançavam a música alta no
convés. Eu queria saber o que pareceria estar tão confortável em minha própria
pele. Eu tinha sido muito curiosa e me inclinei demais para fora. Uma delas tinha
me visto, e então todas tinham começado a gritar e gritar e escorregar
pelo convés quando saíram da banheira de hidromassagem e correram para
dentro.
Eu queria rir em voz alta, mas não o fiz.
Em seguida, vários homens chegaram à borda da floresta com lanternas. Eu
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só os assisti detrás de uma árvore de abeto . Eu nem sequer tive que me
esforçar para me esconder.
Encarando sem ver as chamas saltando do fogo, eu me perguntei
novamente sobre o homem. Ele quase foi trespassado por um porco hoje. Se esse
pássaro voando baixo não tivesse chamado sua atenção, ele nem sequer saberia
que o porco estava correndo na direção dele. Pressionei meus lábios juntos
enquanto desembaraçava um nó no fim do meu cabelo.
Quem em seu juízo perfeito deixaria alguém obviamente incapaz
de se cuidar aqui sozinho?
O homem tinha me visto algumas vezes, e eu me perguntei se ele ia contar
a alguém sobre mim. Será que acreditariam nele? Pareceu-me
que ele poderia estar fora de si. Eu o vi tropeçar em torno da cabana – pude vê-
lo na varanda e no interior também, através das altas janelas descobertas. E ele
fez um monte de gritar e reclamar para ninguém em particular.
E então anteontem ele tropeçou no meio da escada e caiu no
chão, meio gemendo/meio rindo. Eu esperei para ter certeza que ele poderia
realmente se levantar antes de sair. Sim, muito provavelmente ele era
louco. Suponho que havia algum tipo de ironia em mim apontando sua
insanidade, considerando que eu estava trancada em uma instituição mental e
tudo.
Mas, enfim, ele era bonito; dava-lhe isso. Mais do que
bonito... lindo mesmo. Poderiam os homens ser bonitos? Bem, ele era. E
evidentemente ele também sabia disso. Ele tinha falado sozinho sobre isso um lote
inteiro na varanda. Eu mesmo poderia tê-lo achado atraente se ele não fosse tão
obviamente louco e inútil. Eu balancei minha cabeça, minha
escova correndo através dos cachos parcialmente secos do meu cabelo
comprido, com o ritmo e o fogo pondo-me em algum tipo de transe
leve enquanto pensava sobre ele.
O que havia nele que me fez tão curiosa, apesar de sua óbvia loucura? Eu ri
silenciosamente para mim mesma. Ok, então, talvez ele não fosse um lunático,
mas havia definitivamente algo errado. A coisa era que ele não era apenas
louco: ele estava triste também. Ele parecia muito... sozinho, e
não por estar realmente vivendo uma existência solitária, pelo menos no
momento. Havia alguma outra razão que eu não conseguia entender,
embora certamente conseguisse me identificar com o que quer que seja - e
talvez esse fosse o porquê de eu estar atraída por ele. Sim, talvez fosse isso.
"Por que ele está tão triste?" Eu sussurrei para o fogo. Era final de
agosto e a noite estava apenas levemente começando, mas estava tão frio aqui.
Tão grande e tão frio. O calor era bom, e o fogo estalou como se respondendo
minha pergunta. Uma tora rolou de repente e uma pequena faísca saltou para
fora, pousando no tapete aos meus pés. Eu usei a minha escova para esmagá-la e
depois voltei a escovar meu cabelo, me perguntando onde o homem estaria agora,
e pensando – dentro ou fora? Uivando para a lua, talvez? Eu sorri para
mim mesma.
Quanto tempo ele ficaria? Eu assumi que a cabana no vale era mais uma
casa de férias do que qualquer coisa, usada principalmente no inverno, quando
as pistas de esqui estavam abertas. Embora por que ele quisesse passar
suas férias totalmente sozinho durante qualquer estação eu não tinha certeza.
Então me perguntei novamente o que o homem que chamou seu próprio nome –
Holden Scott – estava fazendo naquele exato segundo.
Capítulo quatro

Holden

Eu estava vomitando. Mais uma vez. Ajoelhado no chão e segurando a tigela


de porcelana, eu esvaziei o conteúdo do meu estômago e, em seguida,
gemi em miséria quando caí no chão, descansando minha bochecha no azulejo
frio. "Foda-me," eu gemi com a voz rouca.
Fechei os olhos, mas o quarto começou a girar e então os abri
imediatamente, olhando para o rodapé na minha frente. Você não pode continuar
assim. Você não pode continuar vivendo dessa maneira. As palavras
de Brandon voltaram para mim e eu gemi de novo, puxando-me para cima.
"Jesus, eu sei, está bem? Eu sei."
Eu fiz meu caminho para a sala e deixei-me cair no sofá, mantendo meus
olhos fixos no enorme lustre de bronze pendurado no teto com vigas acima. Eu
estava tão cansado, sempre tão cansado, mas também nunca conseguia dormir
por muito tempo. Fora da janela a primeira luz do
amanhecer estava sombreando o céu com mil tons de cinza. Se apenas
eu pudesse dormir...

Eu não vi o garoto sentado no chão ao lado das arquibancadas com a cabeça


num livro até que praticamente tropecei nele. "Droga, desculpe", eu disse, pulando
rapidamente para o lado, endireitando-me e mudando meu capacete de futebol
para o meu outro lado. O garoto olhou para mim, revelando uma grande e preta
marca em sua face direita. O olho desse lado de seu
rosto estava fechado, vermelho e parcialmente inchado. "Whoa, o que aconteceu
com você?" Eu perguntei. "Você está bem?"
Ele franziu a testa e, em seguida, levou os dedos até a contusão, como se eu
tivesse acabado de lhe recordar que ela estava lá. "Sim, eu estou bem", ele
murmurou, balançando o desgrenhado cabelo loiro escuro assim que ele caiu
sobre sua testa e em seus olhos, esperando que eu fosse embora.
"Tem certeza? Porque isso se parece com um olho roxo real. Como você
conseguiu isso?" Ajoelhei-me na grama ao lado dele. Sua expressão era
confusa, como se ele não soubesse como reagir a alguém falando com ele.
"Uh, eu bati de cara numa porta por acidente", disse ele.
Eu inclinei minha cabeça, considerando-o. Ele estava mentindo. Ele
provavelmente tinha se metido em uma briga. Ergui as sobrancelhas. "Não, você
pode inventar uma história melhor do que essa. Essa já foi usada um milhão de
vezes."
Ele pareceu surpreso por um segundo, mas depois fez sua expressão ficar
em branco novamente.
"História?" ele perguntou.
"Sim. Você sabe, você tem que ser mais imaginativo." Inclinei a cabeça e
olhei para o céu, pensando até que algo veio a mim. Olhei para o garoto. "Aquele
zelador assustador que quase sempre," eu coloquei meu capacete para baixo e
usei meus dedos para fazer aspas no ar, "’atravessa’ o vestiário quando
estamos tomando banho tentou sequestrar você, mas você lutou com ele com as
habilidades Ninja que aprendeu com o velho chinês que gerencia o seu prédio, você
sabe, quando ele não está cultivando árvores bonsai."
O garoto olhou para mim em silêncio por alguns segundos e, em seguida,
disse: "Eu não vivo em um prédio de apartamentos, eu acho que
você quis dizer japonês ao invés de chinês, e essa história não é criativa em tudo –
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ela é claramente uma versão pobre de Karatê Kid .
E isso também poderia colocar um inocente zelador num monte de problemas –
talvez até mesmo fazê-lo ser demitido do trabalho, do qual precisa para alimentar
seus três filhos adotivos."
"Esse cara tem três filhos adotivos?" Eu fiz um tremor falso.
Ele encolheu os ombros. "Ele poderia ter."
"Veja, isso é o que há de errado com os serviços sociais. Eles dão crianças
adotivas para caras como ele. Todo o sistema é uma piada."
O garoto estreitou os olhos – o olho bom, pelo menos – e me encarou por
alguns momentos.
Em seguida, seu lábio inclinou-se ligeiramente e ele gargalhou uma risada
curta. Quando ele parou parecia... desnorteado. Sim, desnorteado. Essa era a
palavra. E ela tinha estado num teste de vocabulário apenas na semana anterior.
Eu levei um momento para silenciosamente felicitar-me por usá-la.
"Eu sou Holden", eu disse. "Holden Scott."
Ele parou por um segundo antes de estender a própria mão e apertar a que
eu lhe estendia. "Ryan Ellis."
Dois caras do meu time passaram nesse momento, e eu ouvi-os rir sob suas
respirações. "Ei, Holden, cara", disse Vince Milne, "hoje é dia de adotar-um-
perdedor e ninguém me avisou?" Ele cutucou as costelas de Jeremy Pratt - que
estava andando ao seu lado - e Jeremy riu.
"Sim, é, Vince," eu respondi. "Você já está adotado?"
"Eh, vá se foder", ele murmurou baixinho antes de se afastar. Eu odiava
aquele babaca. E ele era um jogador de futebol incompetente, também.
Virei-me para Ryan, que estava tentando parecer ocupado organizando sua
mochila, fingindo não ter ouvido nada do que Vince e eu estávamos dizendo. Eu
poderia dizer que ele tinha ouvido cada palavra, no entanto, porque seu rosto
estava vermelho brilhante.
"Enfim, pra que lado você esta indo? Eu estou indo para casa, se
você quiser companhia."
"Uh, eu vou em direção a Bridgetown Road", ele murmurou.
"Eu também. Vamos lá." Levantei-me, reunindo meu capacete, e ele levantou-
se também, lentamente. Tínhamos quase a mesma altura, embora Ryan fosse
realmente magro. Ele fechou sua mochila e colocou-a em seu ombro.
"Sua mochila parece pesar uns dois quilos."
Ryan sorriu. "Ela pesa. Foi assim que eu ganhei todos esses músculos."
"Ha. Então, em que série você está?"
"Sétimo ano, o mesmo que você," disse ele.
Eu balancei a cabeça, sentindo-me mal que ele obviamente sabia quem eu
era, mas eu nunca o tinha notado antes. Eu limpei minha garganta. "Então, hei,
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você quer parar em Skyline e comer um par de Coneys ? Você está com
fome? Eu estou faminto. Eu vou muito lá depois que treino. Alguns dos outros
caras podem estar lá também. Os legais."
Ele balançou sua cabeça. "Não, eu não posso. Eu tenho que estar em casa."
"Oh, tudo bem. Outra hora, então."
Quando começamos a caminhar, Ryan disse: "Então você, uh, obviamente,
joga futebol."
"Sim, eu amo isso. Cara, é a minha vida. Eu sou o número vinte e dois. Vou
ao Pro (Professional) algum dia", eu disse animadamente. "E então eu vou viver
numa grande mansão, e sair com celebridades, e ter meu próprio chef pessoal,
e dirigir os carros mais legais." Era tudo que eu sempre sonhei. "Você joga alguma
coisa? Mesmo que só por diversão?"
Ryan sacudiu a cabeça, enfiando as mãos nos bolsos. "Não. Gosto de
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assistir, no entanto. Eu gosto do Cowboys ."
Virei-me para ele. "Esse é o meu time favorito. Puta merda, eles são
incríveis!"
Ryan sorriu e acenou.
"Se você gosta tanto de futebol, por que não joga?"
Ele apertou os lábios e olhou para seus sapatos enquanto caminhávamos.
"Meu pai... O equipamento e as coisas, você sabe. São apenas... não cabem
no nosso orçamento." Seu rosto ficou meio vermelho. Eu balancei a cabeça para
que ele soubesse que eu compreendia.
"Meus pais tem num orçamento, também. Eu sei o que você quer dizer. Meu
pai teve que pegar horas extras para poder pagar para eu jogar."
Ryan assentiu, parecendo como se eu o tivesse feito se sentir melhor. "Eu
vou a todos os jogos da escola. Acho que vi seus pais neles, também –
segurando cartazes do número vinte e dois.”
Eu balancei a cabeça. "Sim, eram eles, tudo certo." Revirei os olhos. "Os
únicos que estão vestidos inteiramente nas cores de nossa escola, agitando
pompons, espuma de dedos número um, e segurando cartazes com o meu número.
É tão embaraçoso." Eu continuei falando. Eu sempre falei pra
caramba. Como se meu cérebro não tivesse um botão de desligar. Todos os
meus pensamentos fluíam pela minha boca. "Meus pais achavam que não
poderiam ter filhos. Eles tentaram por anos e nada, e então, boom! Quando
minha mãe tinha quarenta e nove anos ela descobriu que estava grávida de
mim. Você devia vê-la quando ela conta a história: ela parece
toda sonhadora, como se o próprio Deus tivesse descido e a engravidado, sabe?
Então eles meio que exageram com a coisa toda de paternidade. Como se eu fosse
sua criança milagre."
Ryan deu um pequeno sorriso. "Eu acho que você meio que é."
"Sim, eu acho", respondi. "Então, o que acontece com seus pais?"
Ryan ficou tenso e olhou para os seus sapatos novamente. "Somos somente
eu e meu pai." Eu esperei, mas ele não foi em frente. Olhei para ele com o canto do
meu olho enquanto caminhávamos em silêncio por
alguns quarteirões, ganhando coragem para fazer a pergunta que eu realmente
queria saber.
"Será que o seu pai fez isso com você?" Perguntei tão casualmente quanto
possível, acenando para seu olho roxo quando ele virou a cabeça para mim. Sua
expressão mostrou surpresa por um segundo, e ele parecia meio
louco; mas depois ele fechou os olhos e olhou à frente, tomando a decisão de
responder honestamente.
"Sim."
Fiquei quieto por um minuto, imaginando como era ter um pai que batia em
você, em seu rosto. O que fez uma criança para merecer algo assim? "Seu pai
parece um babaca real."
"Ah, então você o conhece," Ryan disse sarcasticamente.
Eu respirei uma pequena risada. "Ei, você sabe... então... hum, por que você
não vem algum dia? Poderíamos assistir a um jogo. E isso daria a meus pais
alguém para paparicar além de mim."
Pareceu por um momento que Ryan poderia ficar um pouco louco sobre a
oferta, mas depois ele apenas deu de ombros. "Talvez. Ei, esta é a minha rua. Eu
tenho que ir."
"Ok", eu respondi enquanto ele se afastava. "Vejo você amanhã, então."
Ele não se virou, mas eu o ouvi murmurar: "Vejo você amanhã".

Acordei com o nome de Ryan em meus lábios novamente. Sentei-me


abruptamente e gemi com a dor que pulsava em minha cabeça. Eu estava
deitado no sofá da sala de estar, e o sol da manhã entrava pelas janelas do chão
ao teto. Eu tinha adormecido ao amanhecer, então não podia ter dormido por
muito tempo. Mas, eu tinha sonhado. Pela primeira vez em muito tempo.
Havia algo sobre esse sonho, algo em meu cérebro me avisando para dar
atenção a coisas aparentemente sem importância - mas eu não conseguia
descobrir o que era. Alguma coisa apenas parecia fora. Mas tinha deixado uma
sensação persistente de... felicidade.
Era isso – eu tive a primeira memória feliz de Ryan.
Eu ri baixinho para mim mesmo. Talvez houvesse algo neste feng shui,
afinal. E talvez - apenas, talvez - eu poderia aventurar-me na
floresta novamente para procurar meu fantasma. Algo em mim estava
tendo dificuldade em acreditar que ela não existia – eu a vi. Além disso, o que
diabos mais eu tinha para fazer? Javalis selvagens que se danem.
Capítulo cinco

Holden

No fim da tarde, enquanto eu estava sentado do lado fora curtindo o ar


fresco da montanha e bebendo uma caneca fumegante de café, senti-me um
pouco mais vivo. Eu tinha tomado um comprimido – apenas um. Só para aliviar a
tensão. Eu tinha acordado do meu sonho... esperançoso, eu acho, e
tentei ficar sem hoje, mas a náusea era muito grave. Então tomei apenas um
comprimido... e eu tomaria cada vez menos até...
Deixei escapar um longo suspiro. Eu tinha tentado isso antes, e não
funcionou. Mas talvez aqui fosse diferente. Você tem que ser o único a fazer a
escolha...
A garota... se ela estava lá fora, o que estaria fazendo agora? Ela estava
naquela floresta? Sozinha? Ela deve estar bem equipada para cuidar de si
mesma, o que me fez sentir ainda mais ridículo por ter deixado um
porco colocar um medo do diabo em mim. Eu não tinha sido destemido uma
vez? Então por que tinha corrido? Não conseguia me lembrar. Mas, novamente,
eu não conseguia lembrar-me de muito nestes dias.
Sentado ali na varanda olhando para a floresta, com a vaga sugestão de
esperança correndo por mim, tomei uma decisão. Eu estaria voltando àquela
floresta hoje, e ia encontrá-la, e resolveria o mistério de quem ela era.
Uma hora mais tarde, sentindo aquela mesma sensação excitante
que costumava sentir antes de um jogo, preparei-me para encontrá-la e logo em
seguida entrei na floresta.
O dia estava ameno, mas o chão da floresta estava frio por causa da
nevoa espessa sob a copa das árvores. Eu andei pelo que julguei ser o mesmo
caminho que percorri na última vez. Determinado a livrar-me da estranheza e do
medo da minha última viagem por essas madeiras, fiz um esforço para apreciar
a beleza selvagem ao meu redor, inclinando-me para olhar para toras e
aglomerados de cogumelos selvagens.
Para um rapaz do centro-oeste como eu, estas madeiras eram todas novas e
diferentes e, pela primeira vez em várias horas, eu fui novamente pego naquele
lugar perdido da aventura de infância. Quando era criança adoraria ter
visto esta floresta – construir fortalezas de pedras e paus, fingir ser um
explorador. Eu tinha sido cheio de vida, esperança e entusiasmo uma vez, não
tinha? Provavelmente. Eu não conseguia entender o sentimento agora, mas sabia
que tinha sido uma criança feliz, um menino que tinha sonhado que qualquer
coisa era possível, e encontrado alegria em coisas simples. Talvez esse fosse até
mesmo um garoto que deveria ser pranteado, porque ele se foi agora, substituído
pelo vagabundo que eu me tornara.
Gritei para a garota, mas com um pouco menos de entusiasmo. Passaram-
se horas e eu estava começando a duvidar de mim mesmo outra vez.
Eu caminhei durante mais algum tempo
antes de finalmente desistir e decidir voltar. Eu estava ficando com frio apesar do
clima ameno fora desta densa floresta, e não estava vestindo as camadas
adequadas de roupa, subestimando a queda de temperatura do dia que agora se
transformava em noite. E eu estava me sentindo doente outra vez. Eu precisava
de uma dose. Minhas orelhas estavam zumbindo levemente e minha pele parecia
estranha, como costumava ficar quando eu não tomava um comprimido por
um tempo: pulsante e elétrica. Eu odiei isso. E eu estava desapontado, deprimido
mesmo. Eu ainda não tinha visto um único sussurro da garota.
Eu comecei a voltar por onde vim, mas de repente percebi que estava
andando em terreno plano por um tempo – não morro acima como tinha feito no
outro dia. Naquela dia tinha sido fácil o suficiente ter uma ideia de
direção, porque eu simplesmente voltei a descer despois de subir. Mas agora,
olhando em volta para o desconhecido, preocupação começou a vibrar através do
meu intestino. Um trovão cortou as árvores. "Foda-se," eu murmurei. Certamente
eu não estava perdido. Comecei a voltar para onde pensei ter vindo, mas senti-me
virando ao redor, inseguro. Meu coração agora batia um staccato em meu
peito. Galhos se balançavam ao vento que aumentava cada vez mais, e um súbito
relâmpago riscou o céu, por um breve instante iluminando a
floresta com misterioso brilho branco.
E então veio a chuva.
A luz silenciosa brilhou através das árvores, obscurecendo a floresta ainda
mais com nuvens escuras que se moviam através do céu crepuscular, lançando
tons prateados de cinza para todos os lados.
Peguei meu celular tentando obter sinal, mas foi inútil. É claro que não
haveria serviço aqui no meio desta floresta densa. "Você está no meio de porra
nenhuma, idiota," eu murmurei para mim mesmo. Comecei a
andar novamente, movendo-me mais rapidamente agora, e lutando com
esses espinheiros que pareciam me alcançar e agarrar, retorcendo-me para longe
dos galhos de pontas salientes que rasgavam minhas roupas e tropeçando em
coisas que eu já não podia ver a meus pés, caindo uma vez e
sentindo as agulhas afiadas dos pinheiros e pedaços de cascas de
árvores cavarem a carne das minhas mãos.
"Filho da puta!" Eu gritei, levantando-me e parando, girando num círculo
completo. No que diabos eu estava pensando? Eu tinha tentado isso antes e fui
derrotado, e hoje decidi repetir o mesmo erro. Por que eu tinha imaginado que era
uma boa ideia dar a esta floresta uma segunda chance?
Por causa dela.
Eu era tão fodidamente estúpido às vezes. Então agora eu tinha que
encarar os fatos: eu estava sozinho na floresta,
não tinha abrigo à vista, estava num ambiente hostil que já tinha obtido o melhor
de mim em mais de uma maneira, e tudo isso durante a porra
de uma tempestade.
Aqui fora não importava que eu tivesse milhões de dólares no banco. Não
importava que eu fosse uma super estrela para algumas pessoas, ou uma
tragédia fodida para outras. Não fazia qualquer diferença eu ter um anel do
Super Bowl ou uma frota de carros.
Nada disso importava, porque a floresta não se importava.
E sinceramente, nada disso realmente importava em geral. Nada disso me
trouxe felicidade, nenhum único pedaço. E o que se deve fazer quando se
tem tudo no mundo e nenhum maldito pedacinho do todo traz o mínimo
de alegria? Onde se supõe que eu deveria chegar? O que resta para me oferecer
alguma esperança?
Eu tentei de tudo... de tudo. Malditamente de tudo. Sentei-me pesadamente
numa grande pedra olhando friamente ao redor, dificilmente capaz de
ver qualquer coisa através das pesadas gotas de chuva. Eu ia morrer aqui, quer
de exposição à tempestade ou sendo espetado por um javali. Ou talvez pior.
Provavelmente pior. E eu me preocupava com a morte, claro, mas não tinha
certeza se me importava em ser morto. Havia paz na morte. Silêncio.
Eu estava perdido, e minhas mãos estavam sangrentas e desgastadas. Eu
estava sem fôlego, nauseado, e muito... triste. Eu estava tão fodidamente triste.
Sentia-me nu, e tudo o que restava era o medo e a tristeza, ambos tão terríveis.
Inclinei minha cabeça para cima na direção da chuva, e senti que ela se
misturava com as lágrimas quentes escorrendo pelo meu rosto. Cristo, agora eu
estava chorando? Esta floresta tinha me deprimido de maneiras que eu não
queria nem pensar, especialmente agora quando eu estava sem rumo e sozinho.
"Você está perdido", veio sua voz. Baixei meu olhar de espanto e encontrei-a
de pé ao lado de uma árvore, observando-me. Seu cabelo e roupas
estavam encharcados pela chuva, embora ela não parecesse perceber. Era como
se ela tivesse sido formada a partir de uma combinação mágica dos meus próprios
desejos e da noite em si.
Eu hesitei por um longo tempo e fiquei apenas olhando para ela,
perguntando-me se ela era um sonho e deixando que suas
palavras se afundassem através da minha pele e tomassem conta do meu coração
e minha alma. "Sim", eu sussurrei. "Sim, eu sei."
Ela balançou a cabeça lentamente como se entendesse tudo. "Venha", disse
ela. "Eu vou ajudá-lo a encontrar seu caminho outra vez.”
Alívio inundou o meu sistema tão ferozmente que me deixou tonto quando
eu me levantei e caminhei em sua direção, meus olhos tomando seus detalhes
enquanto eu me aproximava. Seu cabelo era muito escuro, talvez até preto,
embora fosse difícil dizer uma vez que ele estava todo molhado. Ela o tinha
trançado e pendurado sobre um ombro. Fios soltos tinham escapado e estavam
presos em suas bochechas. E seu rosto, Deus, o rosto dela.
Ela era... linda.
Por um momento eu simplesmente a olhei. Ela era real? Seu vestido de
renda branco estava colado ao seu corpo, mostrando curvas delicadas abaixo. Ela
estava com um par de botas marrons com meias grossas saindo do topo, mas
sem casaco.
"Você não está com frio?" Perguntei em voz baixa enquanto um
arrepio percorria meu corpo. Meus dentes estavam visivelmente batendo.
Ela sorriu, seu rosto mudando de impressionante para de tirar o fôlego, a
sua beleza quase sobrenatural.
"Não."
Eu pisquei para ela, pensando em como ela tinha aparecido na névoa. "Você
é um sonho?" Meditei. "Ou talvez um... fantasma?"
Ela inclinou a cabeça, seu olhar agora intenso. "Eu não posso imaginar ser o
sonho de alguém. Mas um fantasma?" Ela ficou pensativa por um instante,
algo passando por sua expressão, algo que eu não sabia como ler.
"Talvez", ela sussurrou. "Sim, eu acho que poderia ser." E com isso ela se
virou e moveu-se na direção oposta à direção para a qual eu estava andando.
Eu queria falar com ela, perguntar-lhe o que ela queria dizer, mas meus
dentes estavam batendo tão violentamente que eu mal conseguia formar
palavras, e a dor de cabeça que tinha começado mais cedo era agora como um
martelo batendo em meu crânio. Então, em vez disso, concentrei-me em suas
costas - e na curva doce de sua bunda sob o vestido
molhado – enquanto ela moveu-se certamente e rapidamente através da floresta,
levando-me para fora da escuridão em direção ao brilho luminoso da lua. A chuva
diminuiu e depois parou por completo, e os pássaros noturnos pareciam ganhar
vida em torno de nós enquanto caminhávamos.
"Qual é o seu nome?" Eu finalmente
consegui perguntar conforme caminhávamos através do
vale que eu pude reconhecer do outro dia – o mesmo lugar onde eu tinha visto o
porco – e começávamos a descer.
Ela olhou para mim, mordendo o lábio e parecendo estar considerando se
respondia ou não.
Mas eventualmente ela disse: "Lily. Meu nome é Lily."
"Lily o quê?"
"Apenas Lily."
Eu conversei com ela e caminhei ao seu lado agora que as árvores eram
escassas e havia espaço para dois. Sua respiração nublava no ar da noite,
assim como a minha. Se ela era realmente um fantasma, era diferente de
qualquer fantasma que eu sempre imaginei. Ok, então ela não queria me dizer
seu nome completo, mas eu tinha que descobrir algo sobre ela. "Onde você mora?
Foi-me dito que a cidade mais próxima fica há um par de horas de distância."
Ela assentiu com a cabeça, olhando para mim com cautela por debaixo de
seus cílios. "Eu vivo por perto."
"Mas –"
"Você não deveria vir para a floresta se não sabe para onde está indo", disse
ela, olhando à frente novamente, de volta para onde estávamos andando.
Eu parei de me mover e ela parou ao meu lado, olhando para mim
interrogativamente. Eu não estava preparado para ela.
E eu definitivamente não estava preparado para ver seus olhos à luz da lua:
amplos e amendoados, verdadeiramente violetas e emoldurados por
exuberantes cílios escuros. Por um momento minha respiração falhou. Eu nunca
tinha visto olhos como os dela. "Eu sei. Eu... bem, eu estava procurando por você",
eu disse distraidamente antes que pudesse considerar uma resposta diferente.
Ela me estudou, sua expressão de repente perplexa. "Eu? Por quê?"
Corri a mão pelo meu cabelo molhado, sentindo-me mais desequilibrado do
que já estive em minha vida. Por que de repente eu me sinto na oitava
serie, como um garoto no meio do baile da escola tentando conversar
com uma garota? "Eu... bem, eu vi você, hum, no outro dia e..."
"Na borda da floresta? Sim, eu sei. Eu pensei que você ia se afogar na
banheira." Ela inclinou a cabeça para o lado.
"Oh, uh... Sim, provavelmente pareceu assim. Eu só adormeci. Obrigado,
apesar de tudo."
"Pelo quê?"
Dei de ombros e esfreguei a parte de trás do meu pescoço. "Por importar-se
comigo." Limpei a garganta. "A coisa é, Lily, eu pensei ter visto você algumas
vezes, e estava curioso. Eu queria... me apresentar." Apresentar-
me? Realmente? Que porra está errado com você, Holden?
Lily bateu sua língua ao longo de seu lábio inferior com a testa franzida,
olhando para algum lugar logo atrás de mim. Finalmente seus
olhos se encontraram com os meus novamente. "Bem, é bom conhecê-lo, Holden
Scott, Deus entre os homens."
Olhei para ela fixamente por um momento, e conforme a memória voltava
eu finalmente comecei a entender. "Oh, merda", eu murmurei sob a
minha respiração. "Uh, sobre isso... Eu, uh-"
Ela riu de repente, seus dentes brancos piscando para mim à luz da lua, e
então ela se virou.
"Eu deveria pedir desculpas por espionar você." Mas ela não parecia
arrependida. "Adeus, Holden Scott."
Dei um passo atrás dela. "Espere! Por favor, não vá. Eu moro logo
ali... temporariamente, quero dizer. Por agora. Eu vivo lá. Quer entrar para
uma bebida? Uma bebida ou... ou uma refeição ou algo assim?" Uma
refeição? Como se ela fosse sem-teto? "Não que você pareça com fome. Só que
eu gostaria–" Jesus. Eu fiz uma careta.
Lily riu de novo, e eu não pude deixar de me juntar a ela, sentindo-me
constrangido e olhando para os meus pés antes de olhar em seus olhos. "Aquela
coisa de Deus entre os homens foi obviamente um total exagero."
Ela levantou uma sobrancelha. "Obviamente." Mas o sorriso
voltou a seus carnudos lábios cor-de-rosa novamente, e não havia
nada malvado em sua expressão.
"Você sabe quem eu sou?" Perguntei.
Lily olhou para mim em confusão. "Eu acabei de dizer seu nome. Holden
Scott."
"Não, quero dizer, não o meu nome, mas, você sabe quem eu sou?"
O olhar em seu rosto estava totalmente confuso, e eu deixei escapar um
longo suspiro. "Deixa pra lá."
"Você deveria ir se aquecer e dormir um pouco." Quando ela começou a se
afastar novamente, dei um passo atrás dela mais uma vez.
"Você vai voltar amanhã?" Mesmo eu podia ouvir a nota
desesperada em minha voz.
Lily fez uma pausa e me olhou por tanto tempo que meu coração começou a
vibrar mais rápido com nervosa esperança.
"Sim. Encontre-me aqui amanhã ao pôr do sol.” Ela olhou para a lua e
depois de volta para mim. Vitória corria em minhas veias. Ela ia me encontrar
novamente amanhã. "Eu tenho que ir."
"Ok, Lírio da Noite. Obrigado."
Ela se virou, andando para trás enquanto se afastava. "Ok, Holden, Deus
entre os homens. E, de nada." E então, com uma pequena risada, ela virou-se e
correu para a floresta, desaparecendo na escuridão.
Olhei para baixo, sorrindo para meus próprios pés e notando a
lama endurecida em meus sapatos e as pegadas profundas onde eu pisei no solo
encharcado. Meus olhos mantiveram-se vagando, procurando pelas pegadas de
Lily ao lado das minhas, mas, mais uma vez, era como se ela nunca tivesse estado
ali. Nenhum vestígio dela foi deixado.
Capítulo seis

Holden

Eu estava sobre o vaso sanitário, segurando o saco de comprimidos


em minhas mãos suadas, tremendo. Eu não tinha
tomado nenhum quando voltei para casa na noite anterior, embora meu
corpo os tivesse exigido, e agora já era de manhã. Deixando escapar um gemido
profundo, eu joguei o saco no balcão e fechei com força a tampa do vaso sanitário.
Eu não estava pronto. Abri o saco com avidez e joguei dois comprimidos na boca,
colocando a mão debaixo da torneira e engolindo grandes goles de água.
Por um momento meu reflexo olhando para mim com desdém pelo
espelho. Deus entre os homens. Isto me fez rir de mim mesmo.
Lily. O nome dela é Lily. E ela é linda.
Eu precisaria dos comprimidos se ia passar algum tempo com Lily. Se
eu não fosse um fracassado hoje e tivesse me livrado dos comprimidos,
precisaria pelo menos de três ou quatro dias para a desintoxicação e para me
recuperar. No mínimo. Não havia nenhuma maneira que eu poderia encontrá-la
hoje à noite se eu estivesse no meio do retrocesso. E eu queria tanto me
encontrar com ela novamente. Era a primeira coisa que eu realmente queria num
tempo muito longo. Deus, eu tinha um milhão de perguntas sobre ela.
Quem ela era? De onde ela veio? Onde ela mora? Por que ela me observava?
Depois de tomar um longo banho e beber metade de um pote de café, desci e
verifiquei o ginásio da casa de Brandon. Acendi a luz, olhei em volta e soltei um
assobio. Espelhos cobriam a totalidade da parede oposta. Máquinas de treino
tops de linha e bancos de peso estavam espalhadas por toda a impressionante
sala. Havia uma TV de tela grande montada no canto oposto, com um sistema de
som criado por baixo e seus falantes presos às paredes.
Passei meia hora na esteira, sem fôlego depois de quinze minutos, mas
empurrando-me para terminar os trinta completamente. Então passei alguns
minutos levantando peso, e suei a camisa depois de duas repetições. Porra, eu
estava fora de forma. Eu estive fora por uma temporada e meia, e eu não tinha
feito nada além de comparecer a festas e profanar meu corpo. E agora eu sabia
que não estava apenas emocionalmente deprimido, mas que o meu corpo estava
quebrado também. Sentindo-me derrotado, apaguei as luzes e deixei o ginásio.
Eu fiquei impaciente pelo resto do dia, verificando o tempo mais e mais. Eu
olhei na internet, e a previsão para o pôr do sol era às 19h21min. Às seis e
meia eu caminhei em direção à floresta, dizendo-me que não queria que ela me
esperasse no caso dela chegar mais cedo. Meu coração estava batendo de forma
constante e antecipação enchia meu peito.
Era uma bela noite: o ar estava fresco, mas não excessivamente frio, e o
sol estava quente em minhas costas. Eu levei o meu moletom pesado amarrado
em volta da minha cintura, então eu só estava vestindo uma camiseta de mangas
compridas. Empurrando as mangas até meus braços, eu entrei na floresta e me
inclinei tão casualmente quanto possível contra uma árvore para esperar.
Quando foi a última vez que eu tinha esperado por uma garota? Eu
honestamente não conseguia me lembrar. Segundo grau, talvez? Havia algo
profundamente gratificante sobre o assunto, com uma ponta de excitação
nervosa. E se ela não viesse? E se ela viesse?
Quando 19h21 veio e se foi, o céu mudou de azul suave para tons
brilhantes de laranja, e eu esfreguei as palmas das mãos no meu jeans. Será que
ela ia me deixar esperando? Desapontamento me encheu quando eu considerei
que poderia estar caminhando de volta à cabana sozinho em meia hora, sem
que Lily tivesse se mostrado. Talvez ela tivesse esquecido. Talvez o nosso
"encontro" apenas não significasse tanto para ela. Talvez algo tenha surgido.
Talvez eu fosse um idiota por esperar que ela quisesse vir em tudo.
Olhei para cima abruptamente e ela estava um pouco longe, me
observando. Alívio e felicidade trouxeram um sorriso de imediato a minha cara.
"Você veio", eu disse, dando um passo em direção a ela.
Ela inclinou a cabeça para o lado, balançando a trança preta por cima do
ombro. "Você achou que eu não viria?"
"Eu não tinha certeza."
Ela inclinou a cabeça para trás. "Vamos, eu quero mostrar-lhe algo que
acho que você vai gostar."
Eu a segui. Mais uma vez ela estava usando um vestido – azul com botões
na frente. Parecia da época em que as mulheres usavam luvas brancas e curtas e
pequenos chapéus numa base regular. Apesar da antiquada aparência o vestido
cabia-lhe bem, e eu não pude evitar que meus olhos se demorassem sobre as
linhas femininas de seu corpo. Ela estava usando sapatilhas de lona preta em
seus pés, e estava novamente sem casaco. Senti meus lábios se curvarem para
cima e me perguntei quem era essa garota. Uma garota. Uma garota de carne
e sangue.
Nós marchamos através da floresta enquanto a luz que nos rodeava ficou
turva. Eu não podia mais ver o horizonte acima das árvores, e o céu era uma
pálida sombra sobrecarregado de laranja. O ar estava perfumado com o aroma
picante dos pinheiros cobrindo o cheiro almiscarado da umidade e das folhas
podres sob nossos pés.
"Cuidado onde pisa", disse Lily, apontando para a direita. "Há uma cobra na
grama ao lado daquele tronco morto."
Eu girei minha cabeça à esquerda enquanto Lily dava uma risadinha. Olhei
para o tronco e para o terreno em torno dele, mas não vi nada. "Você
estava brincando?" Perguntei.
Lily olhou para mim. "Não. Ela não vai feri-lo, no entanto. A menos que
você fique em seu caminho."
Limpei a garganta, fazendo o meu melhor para não tremer. Eu ainda não
tinha pensado sobre cobras estando nessas madeiras. Porra, eu odiava cobras.
Eu ri, sentindo-me como um idiota. Mas quando a olhei ela estava sorrindo
para mim, de uma forma que me fez sorrir de volta.
Vi-a se afastar por um momento e, em seguida, corri para alcançá-la. "Lily,
você... o que eu quero dizer é..." A área à nossa frente estava completamente nua
de árvores ou arbustos e, por isso, eu andei mais rapidamente, movendo-me
para frente e virando para andar de costas enquanto ela estava olhando para
mim.
"Tenha cuidado para não pisar em uma cobra andando para trás assim. Não
é inteligente virar as costas para o que você não pode confiar."
Eu ri baixinho e me virei novamente para andar ao lado dela, e ela
sorriu em óbvio divertimento. "Ha, ha. O que eu estava tentando perguntar é,
você vive na floresta?" Isso era mesmo possível?
Ela me lançou um olhar estranho. "Não, Holden, eu não vivo nesta floresta.
Eu estou apenas familiarizada com ela. Vamos." Ela virou-se abruptamente,
puxando meu braço para segui-la.
"Bem, onde você mora? Eu não quero me intrometer, mas me disseram que
não havia ninguém por perto."
"Eu moro um pouco longe."
Olhei em volta, imaginando o que ela queria dizer com um
pouco longe daqui. Foi a mesma resposta que ela tinha me dado antes. Pelo que
pude ver a partir da varanda da cabana, não havia nada além da
floresta por centenas de milhas quadradas. "Oh, ok, assim como no meio do nada,
então?"
Lily riu. "Sim, eu acho que você poderia dizer isso. Mas, novamente, você
também esta no meio do nada."
Eu sorri. "É verdade, mas só temporariamente."
"Talvez eu só esteja aqui temporariamente também."
"Oh, então o que você –"
"Por que tantas perguntas?"
"Eu só quero –"
"Siga-me", ela disse quando fez uma curva brusca entre duas árvores. O
terreno ficou levemente rochoso, e a floresta menos densa. Eu segui
atrás de Lily, porque as árvores estavam espaçadas de uma forma que não
deixava espaço para dois andarem lado a lado. Depois de dez minutos ou mais as
árvores se abriram outra vez, e eu alcancei Lily novamente. Poucos minutos
depois chegamos à beira de um precipício, e eu cautelosamente olhei para baixo.
Não era muito longe do chão, mas eu lancei um bufo de ar e me afastei de
qualquer maneira. Eu nunca fui particularmente propenso a alturas, e depois de
Ryan...
"Por aqui," disse Lily, fazendo um gesto com a mão para eu segui-la. Eu fiz,
e ela olhou para baixo. "Começa aqui." Me juntei a ela e vi um conjunto bruto de
escadas esculpidas à direita do penhasco.
"Whoa," eu disse, olhando para baixo. Os degraus percorriam todo o
caminho para o chão. "Quem fez estes?"
"Eu não sei", disse ela, dando um passo para baixo.
"Espere, Lily, deixe-me ir primeiro", eu disse.
Ela olhou para mim. "Eu já desci por eles antes."
"Eu sei... Eu só..." Eles poderiam ser quebradiços, e você pode cair. Eu não
posso deixá-la cair. "Apenas faça minha vontade." Eu sorri. "Por favor."
Ela hesitou, mas depois mudou de lado quando eu passei por ela.
"Obrigado", eu disse, sorrindo para ela novamente.
O céu escureceu e a lua apareceu, iluminando o pequeno desfiladeiro com
um tranquilo brilho. Quando eu quase tinha chegado ao fundo as duas últimas
escadas caíram. Eu pulei e, em seguida, estendi minhas mãos para Lily. "Aqui,"
eu disse, colocando as mãos em volta de sua cintura, "deixe-me ajudá-la." Algo
sobre minhas mãos ao redor de sua cintura parecia mais íntimo do que eu
pretendia, e calor encheu-me quando a desci para o chão e ela
ficou ali na minha frente, olhando para o meu rosto.
"Ok?" Eu perguntei. Minha voz soou estranha aos meus ouvidos, rouca e
grave.
"Sim, eu estou bem. Mas você ainda está..." Ela olhou para baixo, onde
minhas mãos ainda descansavam. Eu puxei-as rapidamente.
"Desculpe," eu respirei, balançando a cabeça. Olhei para cima e ao redor.
"Que lugar é este?"
"Eu não tenho certeza", disse Lily, afastando-se de mim. "Mas, aqui, olhe."
Ela mudou-se para uma grande rocha à beira de onde as rochas
encontravam a vegetação, e empurrou algumas folhas de lado. Escavada na rocha
estava um tipo de sala muito pequena, com uma janela perfeitamente quadrada e
obviamente feita pelo homem. E na parte superior da janela estava uma escultura
de algum tipo. Olhei mais de perto.
"São mãos?" Perguntei.
"Sim. Parecem que estão buscando uma a outra, e as pontas dos dedos mal
se tocam."
"Huh," eu disse com espanto.
"Há um lugar há várias horas daqui onde algum povo
antigo construiu casas inteiras sob o penhasco – direto nas rochas. Parece
que eles mal começaram uma aqui e, em seguida, decidiram ir para outro lugar."
"Hmm," eu cantarolava. "Eu me pergunto por quê." Passei a mão ao
longo do peitoril da janela antes de ficar de lado e inclinar-me para a pequena
abertura, apenas grande o suficiente para duas pessoas se deitarem. Quando
eu me inclinei de volta para fora percebo que Lily estava traçando as mãos
esculpidas com o dedo.
"É tão estranho pensar sobre alguém aqui em outro tempo esculpindo estas
mãos, refletindo tudo o que estava pensando, talvez se preocupando com alguma
coisa, talvez irritado com alguém." Ela sorriu suavemente enquanto observava
seu próprio dedo movendo-se pela escultura das mãos.
Havia algo sensual sobre observar seu dedo se mover dessa forma, e eu
quase podia senti-la em minha própria pele, traçando, explorando... Eu não pude
evitar o arrepio quente que atravessou meu corpo.
"Talvez pensando em uma garota," eu forneci.
Ela olhou para mim e seu sorriso cresceu. "Talvez." Ela olhou para a janela
e colocou a mão no parapeito, inclinando a cabeça. "Parece tão engraçado que
uma pessoa, todos os seus pensamentos, todas as suas ideias, todos os seus
sentimentos, podem estar aqui num minuto e somente... desaparecerem em
seguida."
Eu estudei seu perfil enquanto ela continuava a olhar pela janela. E eu
sabia exatamente o que ela quis dizer. Eu pensei a mesma coisa quando perdi
meu melhor amigo. Como ele podia ser tão vivo, tão vibrante, tão completo com
todas aquelas coisas que eram só dele, e depois só... desaparecer. Para onde ele
foi? "Eu sei o que você quer dizer, Lily", eu disse. "Eu já pensei a mesma coisa."
Os lábios de Lily se inclinaram ligeiramente para cima, embora ela
continuasse a olhar em frente. "Mas você sabe o que é ainda pior?" Ela olhou para
mim, seu sorriso desvanecendo-se, sua expressão se tornando
triste. "Deixar nada para trás. Nenhuma prova de que alguma
vez você existiu, nada parecido com isto", ela moveu a mão pelo peitoril, "e
ninguém para lembrar ao mundo que você esteve aqui, mesmo que por um breve
momento no tempo. Ninguém para escovar os dedos
contra os seus próprios e reconhecer sua sensação mesmo no escuro."
Eu pisquei para ela, abrindo a boca para falar e, em seguida, fechando-a
novamente. O que ela disse me atingiu de tal modo, realmente muito profundo.
Por alguma razão eu me sentia cheio de emoção. Esse era meu trabalho agora.
Meu trabalho era manter a memória do meu melhor amigo
vivo, o que só eu conhecia dele, o que ele não mostrou a qualquer outra pessoa.
Seus pais tinham ido embora; ele não tinha irmãos ou irmãs. Eu era o único aqui
na terra que tinha conhecido seu eu verdadeiro. Algo sobre esse
pensamento, sobre a responsabilidade sugerida, encheu-me igualmente de uma
súbita onda de alegria e uma estranha e dolorosa tristeza, talvez até mesmo
medo. "Eu... sim," eu disse, minha voz quebrando um pouco. Lily pareceu voltar
ao momento, sacudindo a cabeça ligeiramente.
"Eu acho que este lugar me deixa meio introspectiva." Ela me deu
uma inclinação envergonhada de seus lábios "E algo sobre isso me faz sentir como
se eu já tivesse estado aqui antes. Uma espécie de... déjà vu, talvez. Não é
estranho?"
Olhei para o pequeno espaço na rocha, pensando que talvez
eu me sentisse da mesma maneira. Havia algo sobre a largura do peitoril abaixo
da minha mão que parecia familiar de alguma forma, como se minha
pele conhecesse cada solavanco e ranhura antes mesmo de senti-los. Não,
não era totalmente estranho. "Talvez nós tenhamos estado aqui antes," eu
provoquei. "Talvez você tenha sido uma princesa Indiana e eu fui um... chefe.
Talvez tenhamos nos conhecido em outra vida." Eu sorri para ela, inclinando meu
quadril contra a rocha.
Ela riu, o som ecoando no espaço cavernoso em que estávamos.
"Porque quando as pessoas imaginam suas vidas passadas elas sempre se
projetam como alguém famoso ou importante?" Ela inclinou a cabeça. “Todo
mundo é Elvis ou Cleópatra ou Einstein. Por que ninguém nunca foi Joe Green,
um mecânico de Long Beach, numa vida passada?"
Eu ri. "Quando se trata de outras vidas, eu digo sonhe grande ou vá para
casa."
Ela riu quando balançou a cabeça, erguendo as sobrancelhas delicadas. "Eu
prefiro ser alguém simples, com uma vida simples e problemas simples." Ela olhou
em volta. "Não uma princesa. Talvez só uma coletora. Eu andaria na floresta
durante todo o dia à procura de raízes, flores e ervas, e seria feliz com isso. Seria
o suficiente." Ela me lançou um sorriso. E eu tive que concordar com ela, porque
eu tinha todas as coisas extravagantes, tudo de melhor que o dinheiro podia
comprar, e ainda assim, neste lugar tranquilo, havia... felicidade?
Tranquilidade? Talvez a antítese de tudo o mais na minha vida: a simplicidade.
Rodeado por nada além de árvores e o céu noturno, no meio da floresta, com
esta garota, eu me sentia... certo. Estávamos olhando um para o outro
agora, sérios, com uma corrente de algum tipo fluindo entre nós. Algo que eu
não estava inteiramente seguro de entender, porque parecia tão grande, tão cedo.
Lily desviou o olhar primeiro, justo quando eu peguei o primeiro tom
de vermelho em suas bochechas.
"Aqui, há mais uma coisa que eu queria te mostrar." Ela virou-se e eu a
segui. "Olha", ela disse, dobrando-se para algo no chão debaixo de uma árvore
próxima. Fui até ela e me abaixei também, a luz da lua iluminando apenas o
suficiente para eu ver o que ela estava apontando. Eu peguei uma peça pequena,
brilhante e preta de rocha, segurando-a maravilhado.
"Pontas de flechas", murmurei.
"Sim. O que é estranho é existirem tantas delas, todas num só lugar", ela
sussurrou.
"Huh," eu disse, sentindo algo como maravilha me percorrer. Colocando
a rocha negra no chão, peguei outra de um avermelhado único, percebendo quem
teria amado isso ainda mais do que eu. "Ryan amava história. Ele teria amado
isso. Droga." Peguei outra do chão e levantei-a. Era macia e cor-de-rosa, e a ponta
ainda mais penetrante e afiada.
"Quem é Ryan?" Lily perguntou.
Eu girei minha cabeça, nem mesmo percebendo que tinha mencionado seu
nome em voz alta. Eu a estudei por um momento. "Onde você mora?" Eu
perguntei, levantando uma sobrancelha.
Lily riu suavemente. "Ah, olho por olho?" Ela ficou em silêncio, mas não
pareceu estar com raiva. Eu esperei, apenas olhando para ela. "Eu moro
com a minha mãe não muito longe daqui. Um par de milhas ou assim."
Eu balancei a cabeça, limpando a garganta. "Ryan, ele era meu melhor
amigo. Ele... ele faleceu recentemente."
Lily estudou meu rosto, seus olhos violeta parecendo olhar pra dentro de
mim. "Oh, eu sinto muito", ela sussurrou.
Desconfortável, eu desviei o olhar de volta para as pontas de flecha.
"É estranho que elas todas estejam juntas assim, como se alguém as tivesse
recolhido por toda a floresta."
"Esse foi o que eu pensei, também," disse ela.
"Hmm," eu disse, franzindo a testa. "Estranho."
Ela deu de ombros. "Eu sei. É interessante olhar todos os diferentes tipos
juntos, embora. Esta é a minha favorita." Ela pegou uma branca perolada, tão fina
que se podia ver através dela em alguns pontos. "Parece tão delicada", ela disse
suavemente, "e ainda poderia derrubar um animal de grande porte, ou mesmo
um homem." Ela sorriu um pouco e, em seguida, olhou para mim. Eu percebi
que a olhava fixamente, meus olhos imersos nas belas linhas do seu rosto, na
varredura de seus longos cílios contra suas bochechas, e
na maneira como mechas de cabelo escapavam a partir de sua trança
e enrolavam em torno de sua mandíbula. Eu queria continuar estudando-a, mas
me forcei a olhar para longe.
"Você disse que queria me mostrar algo que pensou que eu fosse gostar.
Como você soube que eu gostaria destes?"
Pela primeira vez desde que a conheci um olhar inseguro passou sobre seu
rosto, e ela puxou o lábio inferior entre os dentes.
Ela soltou uma risada suave e balançou a cabeça, começando a ficar de pé.
"Bem, eu só percebi que todos os homens gostam de armas."
"Eu gosto delas", eu rapidamente tranquilizei-a, segurando seu braço para
que ela permanecesse ajoelhada. "Eu gosto. Elas são incríveis. Este lugar é
incrível." Eu acho que você pode ser incrível também.
Ela tinha me oferecido uma das únicas coisas que provavelmente tinha a
oferecer. Eu não sabia muito sobre esta garota... ainda. Mas ela deve viver uma
vida simples. As coisas que ela tinha para dar estavam... aqui. E ela tinha
dado uma para mim.
Por um instante nossos olhos se encontraram sob a luz ofuscante que
dourava os tons da noite. Lily se levantou e eu a acompanhei. Sentia-me confuso
e perdido por algum motivo que não poderia compreender. Lily estendeu a mão e
tomou meu pulso, e então colocou a ponta de flecha branca que disse ser a sua
favorita na palma da minha mão, fechando meus dedos em torno dela. Sua pele
estava quente e eu podia sentir calos muito leves em suas palmas. Fiquei
imaginando como seria tocá-los contra meus lábios.
"Eu suponho não ser realmente minha para dar, mas não acho
que alguém vá se importar se você mantê-la."
"Obrigado." Enfiei-a no bolso da minha calça jeans, sentindo-me como se
tivesse recebido algo precioso. "Aqui," eu disse, pegando uma pequena pedra
afiada e retornando a uma parte da parede do precipício a poucos passos de
distância da pequena e estranha janela-caverna. Usei-a para desenhar duas
figuras de vara, uma com uma saia triângulo. "Muito tempo depois que tivermos
ido, isso ainda estará aqui. E talvez um dia alguém redescubra esse lugar, e
quem estas figuras eram. Nós vamos viver para sempre.”
"Exceto que você provavelmente só desfigurou um achado arqueológico
histórico".
Eu pisquei para ela e seu lábio curvou-se para cima. "Você está me
provocando", eu disse.
Ela riu. "Principalmente. Vamos."
Olhei para trás mais uma vez, para a escultura das mãos, e em
seguida segui-a, rindo baixinho.
Nós subimos os degraus imperfeitos e começamos a andar através da área
rochosa aberta para a floresta mais densa. Eu andei perto de Lily, roçando seu
braço de propósito. Cada vez que fiz isso senti como se mil terminações nervosas
viessem à vida no pedaço de pele que toquei nela. Ela não falou, e eu me
perguntei se ela sentiu a mesma eletricidade que eu. Senti-me com quinze anos
novamente. Parecia como se eu tivesse acabado de descobrir que ainda havia algo
inocente em mim, algo puro e intocado, apesar do meu passado. Eu não sabia que
uma garota ainda poderia fazer meu coração disparar e minha boca secar.
Especialmente uma que eu acabara de conhecer. Mais ainda, uma que
não estivesse escassamente vestida e tentando entrar nas minhas calças.
Sem falsas banalidades, sem subterfúgios, sem egocentrismo. Somente... calma.
Era como se minha alma ansiasse para se encontrar com a dela, para
compreender tudo dela, para conhecer cada detalhe de sua vida.
Ela olhou para mim, talvez pensando em algo semelhante, porque
perguntou: "Então, Holden, o que você está fazendo aqui?" ela estava referindo-se
à cabana no meio do nada, eu assumi.
Suspirei. Eu quase não queria entrar nisso. "Eu poderia contar-lhe tudo
sobre isso, Lily, mas tenho medo que você não me respeitaria mais se o fizesse."
"O que lhe deu a ideia que eu respeito você?"
Meu próprio riso surpreendido soou por entre as árvores. "Todo mundo me
respeita. Eu sou um super-herói. Um Deus entre os homens."
"Hmm," ela cantarolou, parecendo impressionada. "Então, qual é o seu
superpoder?"
Eu arranhei meu pescoço quando pisei sobre uma raiz de
árvore, garantindo-me um momento para pensar sobre isso. Qual era o meu
superpoder? Toda mundo diria que era ser um jogador de futebol. Mas, isso não
era realmente um superpoder. Isso era algo pelo qual eu ralei pra
caramba durante praticamente toda a minha vida. Eu era
naturalmente talentoso, claro, mas ainda tinha que me esforçar para ser bom.
Além disso, eu não necessariamente queria contar a Lily sobre minha
carreira agora. "Eu posso voar", eu disse, sorrindo para ela.
Ela olhou para mim. "Oh, sério? Que coincidência. Eu também." Eu ri
baixinho, e nós caminhamos em silencio por um momento. Eu estava tendo
problemas para me concentrar, porem, porque seu braço continuou escovando
contra o meu, e de vez em quando eu pude sentir o cheiro dela - algo fresco
com um tom muito fraco de flores silvestres.
"Onde você voa, Lily?"
Ela parou de andar e se virou para mim. "Em qualquer lugar que eu queira.
Às vezes eu vou para uma cidade populosa, e outras vezes para uma ilha deserta.
Uma vez eu fui a Júpiter."
"Júpiter? Eu nunca estive lá. Como foi?"
Ela abraçou seus braços em volta de seu corpo. "Frio."
Eu ri, e, em seguida, olhei para ela, sentindo-me subitamente sério, meu
sorriso vacilante. "Você acha que nós poderíamos descobrir uma maneira de voar
juntos?" Eu dei-lhe um sorriso provocador, mas ela não sorriu de volta. Ela
inclinou a cabeça para o lado, sua expressão tornando-se pensativa e quase
terna: "Suponho que qualquer coisa é possível."
"Onde você pousaria?" Eu sussurrei. Ela me olhou com curiosidade. "Eu
quero dizer, voar é apenas bom se você tem um lugar para pousar, onde alguém
está esperando por você." De onde veio isso? Eu não sabia, mas ainda assim a
verdade da minha própria declaração bateu-me no intestino. Quem estava
esperando por mim?
Ela ficou em silêncio por vários segundos, algo se movendo por trás de seus
olhos, algo que eu não conseguia ler. Sua boca abria e então fechava
novamente, e sua testa vincou ligeiramente, como se a resposta tivesse patinado
através sua mente e em seguida fugido de seu alcance. "Você sempre pensa tanto
assim, Holden Scott?" ela finalmente perguntou, dando um aceno quase
imperceptível de cabeça quando recomeçou a andar. Eu balancei a cabeça
ligeiramente também, sacudindo o momento estranho. Eu sempre pensava muito?
Sim, eu acho que sim. Sempre fiz. Eu corri alguns passos para alcançá-la.
"Eu acho que sim. Sim." Nós caminhamos para fora das árvores e
entramos numa área mais aberta.
Lily riu suavemente, olhando para o céu. Segui seu olhar.
"Eu nunca vi tantas estrelas," eu disse. "Elas estão tão claras."
"Eu vou lhe mostrar o melhor lugar para vê-las. E então vou levá-lo de
volta. Está ficando tarde."
"Não é tão tarde", eu disse, não estando pronto para o meu tempo com
ela chegar ao fim. "Você poderia voltar comigo e ficar por um tempo", sugeri, mas
Lily sacudiu a cabeça.
"Não, não esta noite."
Não essa noite. Isso significava que talvez outra noite? Eu segurei-me a
isso. Eu mal te conheço, Lily, mas já gosto de você. E de alguma forma, sinto que
preciso de você.
A floresta parecia viva em torno de nós: o movimento do feixe de
luz lunar suavemente andando às voltas perto do chão,
asas desconhecidas batendo suavemente nas árvores. Talvez eu tenha
sintonizado isso tudo quando tinha estado aqui sozinho, não querendo considerar
o que estava fazendo esses ruídos então. Mas de repente, com Lily ao meu lado,
eu não sentia ansiedade. Ela obviamente conhecia bem este lugar. E se ela não
estava nervosa, nem estaria eu.
Chegamos a uma formação rochosa e eu segui-a quando ela começou a
subir. No topo havia uma grande rocha plana onde ela se deitou, olhando para as
estrelas. Deitei-me ao lado dela e olhei para cima. O céu estava brilhante e
cintilante, e levou minha respiração por um momento. Não parecia como se eu
estivesse olhando para ele, mas como se eu fosse parte dele, como se estivesse
flutuando. Era como se nós tivéssemos pisado para fora de algum precipício
mágico e caído direto no céu.
"Eu sinto que toda esta noite é um sonho", eu disse. "Sinto que vou acordar
em San Francisco depois de ter adormecido por um minuto e perceber que sonhei
esta coisa toda. Sonhei com você." Virei minha cabeça e descobri que Lily já
estava olhando para mim, observando-me enquanto eu observava o céu.
Ela sorriu e se apoiou em um cotovelo. "San Francisco? É onde você mora?"
Eu me apoiei em um cotovelo também, e encarei-a. "Sim." Eu quase disse a
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ela que jogava futebol para o 49ers , mas era como se aqui, nesta floresta, não
existisse essa vida. Eu queria deixar esse Holden para trás só por agora, e
continuar como tínhamos iniciado, compartilhando coisas que escolhemos
partilhar, mas não tudo, não agora. Aqui eu não queria ser... ele. Eu só queria
ser eu.
De repente percebi que não queria explicar minha vida a ela. Eu desviei o
olhar, o constrangimento da minha própria situação me agredindo. Eu nunca tive
que me explicar a alguém. A grande maioria da população mundial já me
conhecia. Dizer isso em voz alta, escolher as palavras, significaria apropriar-
me de mim mesmo de alguma forma, e foi isso que me fez hesitar. Se
eu lhe contasse minha história em voz alta, falando tudo sinceramente, eu
seria forçado a reivindicar-me. E até agora nunca houve razão para fazer algo
assim.
Talvez fosse isso, esta estranha remoção da minha própria vida. Desde que
eu tinha sido convocado e tornei-me parte dos tabloides, eu tinha começado
a me sentir como se pertencesse ao mundo. Eu comecei a olhar para as opiniões e
julgamentos do público em geral como se fossem a narrativa da minha própria
existência. Isso foi insatisfatório e árduo, e por causa disso eu passei os últimos
três anos não me sentindo verdadeiramente conhecido por qualquer um, talvez
nem por mim mesmo. Claro, eu não tinha melhorado minha situação
com minhas escolhas – praticamente tudo que eu fazia nestes
dias garantia julgamento e condenação, e foi discutido em grandes
e corajosas manchetes. Isso era... solitário.
Mas eu não quero pensar sobre tudo isso agora. Eu não quero ver uma
expressão de decepção e desdém no belo rosto de Lily. Eu não queria que
esta garota soubesse que eu era uma bagunça. Eu queria deixar isso para trás e
apreciar um simples momento de paz que não tive em anos.
Os olhos de Lily se moviam sobre o meu rosto como se ela estivesse
tentando ler meus pensamentos através da minha expressão. Virei-me, olhando
momentaneamente de volta para o céu claro e iluminado pelas estrelas. "Quantos
anos você tem, Lily? Você viveu aqui toda a sua vida?"
Ela parou por um momento e então disse: "Dezenove, quase vinte anos,
e, sim, eu vivi no Colorado por toda a minha vida. Eu cresci perto de Telluride."
Dezenove. Era jovem, e parecia muito inocente... mas, de alguma forma
muito sábia, também. Eu era seis anos mais velho que ela. Mas naquele
momento isso não parecia fazer qualquer diferença.
Eu sorri, meus olhos se movendo sobre suas belas feições novamente e
persistindo em seus lábios cheios por um momento. Gostaria de saber se
eles eram tão quentes quanto o resto dela, ou se pareceriam
frios contra os meus próprios.
"Diga-me algo sobre o seu passado", ela murmurou. Olho por olho.
Eu vasculhei minha mente para dar-lhe algo sobre a minha própria infância.
"Eu fui um Escoteiro. Ganhei todos os tipos de prêmios, na verdade. Eu fui o
orgulho da tropa um sete um." Confusão fez minha cabeça pulsar por um
momento. Sim, sim, eu tinha sido um Escoteiro. Eu tinha esquecido disso.
Lily riu, caindo para trás e me trazendo de volta para o momento.
"Vou construir um santuário de pedra em sua honra quando você deixar
essa floresta."
Eu ri. "Se eu deixar essa floresta. Eu obviamente precisei de algum tipo
de ajuda no passado recente."
"Seu segredo está seguro comigo. Tropa um sete um nunca saberá que seu
melhor escoteiro se perdeu na floresta." Ela inclinou-se novamente e sorriu para
mim, e meu coração acelerou. "Você gostou? De ser um Escoteiro?"
Tentei me lembrar, mas minha memória era tão nebulosa nos dias de hoje.
Eu tinha dificuldades para lembrar de eventos específicos. Mas eu podia... senti-
los. Ser um Escoteiro. Fechei os olhos por um momento. Sim, sim, eu
tinha gostado muito. "Sim", eu respondi finalmente.
"O que mais? Do que mais você gosta?"
Uma mecha de cabelo caiu sobre o meu olho, e Lily levantou a mão e
acariciou-a para longe - e em seguida congelou, como se tivesse sido pega fazendo
algo que não tinha a intenção de fazer. Ela piscou quando seus olhos
encontraram os meus.
"Sinto muito", disse ela, puxando sua mão para trás.
Estendi a mão e peguei a mão dela na minha, absorvendo-a. "Não,
por favor, isso foi bom. Eu não me importo se você toca em meu cabelo." Na
verdade, eu queria que ela me tocasse em qualquer e em toda parte. Eu queria
sentir o toque quente de seus dedos na minha pele, eu queria que ela se
aproximasse e se deitasse ao meu lado para que eu pudesse sentir o comprimento
de seu corpo junto ao meu. Este momento de repente pareceu mais íntimo do que
qualquer outro que eu já tinha experimentado antes, e nós ainda não
tínhamos removido sequer um item do vestuário. Nós ainda não tínhamos nem
nos beijado.
Lily levou a mão timidamente de volta para o meu cabelo e entrelaçou os
dedos nele. Eu gemi e me deitei de novo, fechando os olhos. Deus, isso era bom.
Fazia tanto tempo que alguém apenas... me tocou. Ela continuou a enfiar os
dedos através dos meus cabelos com curiosidade óbvia, como se nunca tivesse
tocado o cabelo de um homem antes. Seria possível que ela não tivesse?
Sentindo-me relaxado e meio em transe, eu disse: "Gosto de esportes,
especialmente futebol, de Star Wars e jazz. Não necessariamente juntos ou nessa
ordem." Eu arqueei meu lábio e levantei uma sobrancelha antes de fechar meus
olhos mais uma vez. "E eu gosto do velho jazz, você sabe, como Miles Davis ou
Coltrane." As mãos de Lily continuaram se movendo em meu cabelo, fazendo-me
suspirar.
"O que mais?" ela sussurrou.
"Eu gosto, uh, de livros engraçados... Eu gosto de museus, fogos de
artifício... Viajar. Gosto de café da manhã no jantar, e... cinema. Gosto de cinema.
E eu particularmente gosto de ir quando não há mais ninguém na sala (de
cinema), somente eu." Eu me sentia como se pudesse cair no sono. "Eu gosto de
terças-feiras."
"Por que terças-feiras?"
"Porque ninguém gosta de terças-feiras, então recebo tudo para mim. Terça-
feira é toda minha."
De alguma maneira eu ouvi os lábios de Lily moverem-se num sorriso, mas
não abri meus olhos.
"E tempestades de neve. Eu amo o inverno e tempestades de neve." Fiz uma
pausa. "Por que me sinto como se estivesse escrevendo um anúncio pessoal?"
Lily riu suavemente, suas unhas arranhando levemente todo meu couro
cabeludo. Eu estava meio dormindo e meio ligado, e me sentia malditamente bem.
"E você? Do que você gosta, Lily?" Parecia que minha voz estava se enrolando um
pouco.
"Hmm," ela disse, fazendo uma pausa por um momento. "Eu gosto de ler. E
eu gosto de história."
"O quê mais?"
Ela parou novamente. "Eu não sei." Ela parecia triste.
Abri os olhos a meio mastro e olhei para ela, sonolento. "Que tipo de música
você gosta?"
Ela inclinou a cabeça, observando sua mão no meu cabelo. "Minha mãe
costumava tocar essas canções de amor dos anos quarenta. Eu não as ouço há
um longo tempo, mas eu costumava amá-las."
"O que quis dizer ontem quando me disse que achava que poderia ser um
fantasma?" Eu perguntei, meus olhos se fechando mais uma vez conforme eu
desfrutava a deliciosa sensação de sua mão quente correndo em meu cabelo e em
meu couro cabeludo. Eu resisti à vontade de gemer em voz alta,
pensando que qualquer som como esse poderia assustá-la e impedi-la de me
tocar.
Ela ficou em silêncio por um longo momento, e eu me perdi no conforto de
ser tocado tão delicadamente. Nada no meu passado recente tinha sido suave. E é
isso que Lily era: suave e pura. Estar com ela me fez nitidamente ciente
de quão dura e suja minha própria vida era. "Eu quis dizer que, às vezes, eu não
me sinto parte desse mundo. Eu não sinto como se minha vida fosse... real", ela
finalmente respondeu suavemente.
Abri os olhos, olhando para seu rosto adorável. Sim. "Eu sei o que você quer
dizer," eu disse. "Eu me sinto da mesma maneira. Eu me sinto exatamente da
mesma maneira. Mas, isso... isso parece real. Essa sensação é real para você
também?"
Ela assentiu com a cabeça para mim, sua expressão muito séria. "Sim", ela
sussurrou. Fechei os olhos mais uma vez.
Eu podia sentir o familiar arranhão dentro de mim, a necessidade de uma
correção, e eu sabia que provavelmente deveria sair, embora não quisesse. Mas,
eu estava tão cansado. Eu não tinha dormido mais do que algumas horas nos
últimos dois dias, e a mão de Lily no meu cabelo era celestial. Se eu só fechasse os
olhos por alguns minutos...

Eu acordei tonto e sozinho com a primeira luz do amanhecer aparecendo no


céu oriental. Sentei-me abruptamente, e o moletom que Lily deve ter colocado
sobre mim caiu de lado. Uma dor aguda atravessou minha cabeça e eu gemi.
Mas, eu tinha dormido. Eu ri baixinho para mim mesmo. Eu me senti grato
à Lily, como se de alguma forma tivesse sido ela quem me deu este pequeno
presente. E embora eu precisasse de um comprimido - ou vários - eu podia sentir
os efeitos curativos de mais do que algumas horas de sono. "Lily?" Eu chamei,
mas não houve resposta. Eu levantei-me lentamente, tomando
cuidado para não sacudir meu cérebro dolorido mais do que o necessário. Minha
pele estava úmida e espinhosa, e eu precisava chegar em casa... mas eu sorri de
qualquer maneira, recordando a magia da noite passada. Tinha sido uma espécie
de fuga, e os primeiros momentos reais de paz que eu tinha experimentado em
muito tempo.
De pé sobre a rocha, notei vários pequenos seixos estabelecidos na forma de
uma seta, e olhei naquela direção. Ao longo dos topos das árvores eu podia ver a
ponta do telhado da cabana de Brandon. Eu não estava muito longe,
e agora sabia que direção tomar.
Lily tinha novamente me mostrado o caminho.
Capítulo sete

Lily

Eu ouvi sua voz através da floresta. Hesitei antes de me levantar devagar,


tentando controlar a súbita batida selvagem do meu coração.
Recusei-me a parecer demasiada ansiosa para vê-lo. Mas eu estava. Oh, eu
queria vê-lo.
Onde você voa, Lily?
Eu desejei tanto poder perguntar à minha mãe sobre o protocolo de como
agir com um homem, mas eu sabia que não iriamos mais além, e por isso não me
atrevi. Além disso, passaram-se anos desde que ela tinha estado em qualquer
lugar perto de um homem, então ela provavelmente não seria a melhor fonte de
conselhos, de qualquer maneira. Então, ao invés disso, até o momento eu segui as
deixas de Holden e fiz o que era confortável para mim. Tinha que
haver algum instinto em mim para me guiar nessa dança entre homem e mulher.
Suspirei. Quem realmente poderia dizer se alguma coisa do que eu estava
fazendo era certo?
Eu gostava dele. E eu gostava de passar o tempo com ele. Já. Muito.
Demais. E isso me assustava.
Isso só acontece porque mesmo antes de você vir para cá,
você foi muito protegida, Lily. É claro que eu estava prestes a ser cativada pelo
primeiro homem que chamou minha atenção.
Mas, pelo menos eu tinha aprendido que ele não era tão louco quanto eu
tinha pensado originalmente. Ele estava triste, apesar de tudo. Eu estava
certa sobre isso. Imaginei que todo o seu estranho comportamento devia-se ao
excesso de bebida. Um jardineiro que tivemos quando eu era
uma garotinha gostava de beber também, e eu o vi tropeçando por vezes quando
estava de folga. Mas, isso tinha sido há muito tempo... E eu não tinha visto
ninguém beber álcool desde então. Mas, eu tinha certeza de que a minha
memória dos efeitos estava correta.
Eu deveria ficar longe. Essa amizade- ou fosse o que fosse -entre
nós era compelida a nos levar a lugar nenhum. Mas, por mais que eu tentasse,
simplesmente não conseguia. Eu queria tantas coisas que não era inteligente
querer. Eu queria saber mais sobre Holden, queria falar com ele. Eu queria ver
aquele doce sorriso torto dele, e eu queria sentir a emoção selvagem de prazer
que senti quando seus olhos pousaram nos meus lábios por muito tempo. E eu
queria ser beijada. Mesmo que apenas uma vez, eu queria ser beijada. E eu posso
estar enganada, mas acho que Holden quis me beijar, também.
Não me atrevi a perguntar-lhe muito sobre si mesmo, embora. Isso só o faria
perguntar sobre mim. Perguntas convidam outras perguntas, e eu não poderia
lhe dar muitas respostas. Mas, eu pensei que se nós apenas nos prendêssemos a
tópicos que faziam pouca diferença estaríamos bem. E muito em breve ele voltaria
para San Francisco; suas férias - ou fosse o que fosse isso – terminariam em
breve, e nada disso teria importância então. Eu saberia pouco sobre ele, e ele
saberia pouco sobre mim. Eu soquei para baixo a decepção que
esse pensamento me trouxe – esta era a maneira que tinha que ser. Ajustei a
mochila que estava carregando e caminhei mais rápido em direção a sua
voz chamando através das árvores. Ainda tínhamos o agora, e mesmo que
não chegássemos a conhecer os segredos um do
outro, podíamos ainda desfrutar de algum tempo juntos. E, por
enquanto, apenas por agora, eu não teria que ser tão solitária.
Quando eu pisei atrás dele e bati em seu ombro, ele deixou escapar um
pequeno grito e girou ao redor, ostentando choque e medo em sua expressão. Eu
não pude deixar de rir um pouquinho. "Jesus, como é que você
anda tão silenciosamente?", perguntou ele, com a mão sobre o coração.
Com a visão de seu rosto, borboletas levantaram voo na minha barriga, e eu
fiz o meu melhor para ignorá-las. Eu sorri. "Hábito, eu acho. É melhor não
fazer muito barulho na floresta.
Pensei que um altamente condecorado Escoteiro soubesse disso melhor do que
ninguém", o provoquei. Ele era lindo assim tão de perto. Seu cabelo era da cor
do caro mel, e seus olhos eram azuis como o céu de verão, cercados por cílios
escuros da mesma cor dourado profundo de seu cabelo. Ele era alto e magro, mas
eu podia ver que tinha músculos bem trabalhados através de suas roupas
quando ele se movia. Havia algo muito gracioso sobre ele – alguma
coisa quase serena sobre a maneira como ele se movia – bem, quando ele não
estava ao redor cambaleando bêbado, de qualquer maneira.
"Então, deve haver uma maneira melhor de contatá-la do que apenas gritar
seu nome na floresta", disse Holden.
Eu balancei minha cabeça. "Não."
Seu rosto ficou sério. "Ok." Ele me olhou como se quisesse dizer alguma
coisa, mas mudou de ideia e decidiu-se por: "Como você está?" Seus olhos se
moveram sobre mim de uma forma que me fez sentir bem. Ele parecia gostar do
que viu. Eu trouxe a minha mão até minha bochecha, querendo saber
exatamente do que ele gostou.
"Eu estou bem. E você?"
Holden riu, me mostrando seu belo e largo sorriso novamente. Ele apertou
as mãos por trás de si mesmo e se balançou em seus calcanhares. "Eu estou
muito bem, também. Obrigado por perguntar."
Eu sorri, voltando-me e olhando para trás, para me certificar que ele estava
me seguindo. Ele caminhou rapidamente para me alcançar.
"Então, o que devemos fazer hoje?"
"Você é quem estava chamando por mim. Você não tem um plano?"
"Meu plano é ser incrível e impressionante, assim você desejará passar mais
tempo comigo." Ele inclinou a cabeça e me deu um sorriso esperançoso e, Deus,
ele era tão bonito. Não era certo ser assim tão lindo. Eu não pude deixar de sorrir
de volta, e tinha certeza que minhas bochechas estavam vermelhas. "E eu
nem cheguei a dizer que sinto muito por cair adormecido em você na noite
passada."
Eu balancei a cabeça, olhando para ele. De repente ele parecia
inseguro, ate mesmo um pouco envergonhado. "Parecia que você estava
gostando", eu disse. "E eu não me importei."
Holden parou e eu também, olhando-o e me perguntando por que ele tinha
parado. Ele passou a mão pelo cabelo, me fazendo querer tocá-lo novamente.
Eu agora sabia que seu cabelo era macio e espesso, e que fazia cócegas nos meus
dedos uma vez que caíam entre eles. "Eu precisava. Eu precisava do sono. A
verdade é, Lily, que eu não me senti muito bem ultimamente – por muito tempo,
na verdade - e eu queria passar mais tempo com você hoje, e agradecer por ontem
à noite, mas, eu também queria dizer que vou precisar levar uma semana ou
mais para tentar me sentir melhor. Eu," ele passou a mão pelo cabelo de novo, "eu
acho que estou pronto. Eu espero... bem, eu espero que
você possa esperar por mim... esperar por mim para explicar isso para você. Eu
espero que você confie em mim." Sua expressão estava cheia de algo que parecia
pesar, ou talvez medo. Talvez ambos.
"Está tudo bem, Holden. Você não me deve nada," eu disse, hesitante. Eu
estava confusa sobre o que exatamente ele estava me dizendo. Mas as olheiras
sob seus olhos, o jeito que ele tremia às vezes, sem razão aparente, me
disse que algo não estava certo. Ele era um alcoólatra? Era tão ruim assim? Ou
ele tinha algum outro tipo de doença?
Ele olhou para mim por um segundo, e mais uma vez eu pude ver
como ele estava cansado, como estava triste. "Talvez não," ele murmurou,
desviando o olhar. "Não, não, eu devo. Mesmo nós mal nos conhecendo, você me
fez sentir tranquilo de uma forma como eu não me sentia há muito tempo.
Sinceramente, Lily, você me fez querer me sentir melhor. E, então, sim, eu devo a
você. E eu lhe devo uma explicação sobre por que eu não estarei de
volta por um tempo."
Decepção encheu meu peito, mas ele parecia tão perturbado e confuso,
então eu agarrei sua mão e segurei-a na minha. "Está tudo bem. Eu entendo", eu
disse, embora não entendesse inteiramente. O que eu sabia era que ele estava
lutando, e que tomava toda a sua força fazê-lo.
E ele disse que estaria de volta. Ele disse que não estava indo embora para
sempre – ainda não, de qualquer maneira. Ele tinha decidido que precisava fazer
algo difícil, e eu não iria tornar tudo ainda mais difícil para ele.
"Sim", eu disse.
"Sim, o quê?" Ele inclinou a cabeça.
"Você me perguntou se eu poderia confiar em você, e a resposta é sim. Eu
confio em você." E eu confiava. Inexplicavelmente, talvez, mas confiava.
Holden soltou um suspiro. "Obrigado. Isso significa muito." Ele sorriu para
mim e apertou minha mão.
"Então, como é que vamos passar este dia? Eu estava esperando que você
tivesse algumas ideias."
Eu ri uma pequena risada. "Na verdade, eu estava indo pescar antes de
ouvi-lo me chamando." Eu encolhi os ombros, indicando a mochila que estava
carregando.
"Há algum lugar para pescar por aqui?"
Eu balancei a cabeça, passando por cima de um galho caído. "Há cerca de
uma milha daqui há um córrego."
"Que tipo de peixe?"
"Truta."
"Onde está sua vara de pesca?"
"Eu a deixo lá - eu sei que sempre estarei de volta em um dia ou dois. Há
apenas um punhado de peixes por dia."
Conforme entramos numa clareira, a visão de algo se movendo chamou
minha atenção, e eu olhei do outro lado no espaço aberto para ver um alce macho
– um touro – montado em uma fêmea. Eu tinha visto
animais acasalando muito vezes antes, mas por alguma razão, ficar aqui em pé
assistindo o casal com Holden parecia... estranho. Isso fez minha pele formigar e
meus mamilos endurecerem, e fez-me intensamente consciente dele ao meu
lado. Me fez intensamente consciente de sua masculinidade.
De repente o dia parecia muito brilhante, o sol muito quente sobre a minha
pele. Olhei para o rosto de Holden e o vi olhando na mesma direção... e suas
maçãs do rosto estavam coradas. Ele me chamou a atenção e, em seguida, ergueu
as sobrancelhas e riu dessa forma constrangida que às vezes fazia.
Eu achava sua reação extremamente atraente. Ele havia se chamado
de Deus entre os homens, e, no entanto, suas expressões falavam de um homem
que estava constrangido, quase tímido. Eu não sabia ao certo quem era o
verdadeiro Holden até agora. Gostaria de saber se ele mesmo sabia.
"Acho que nós estamos nos intrometendo."
Deixei escapar um suspiro. "Acho que você está certo. Aqui, vamos por este
caminho." Ele me seguiu enquanto eu tomava uma rota alternativa, e nós
caminhamos em silêncio por um tempo, ambos perdidos em nossos próprios
pensamentos. Eu particularmente me perdi tentando recuperar o descontraído
sentimento que senti apenas alguns momentos atrás.
Lembrei-me dele gritando em sua
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varanda sobre quão cobiçado era, sobre como poderia começar o lenocínio de si
mesmo. De repente eu queria saber exatamente o que isso significava. Eu não
tinha compreendido cada palavra do que ele disse, visto que houve um monte
de depreciação, mas eu pensava ter entendido a essência da coisa toda: as
mulheres o queriam e ele raramente dizia não. Mulheres. Plural. Qualquer
que fosse a vida que Holden Scott tinha, havia muitas mulheres esperando por
ele. Parei de repente, consequentemente fazendo Holden parar bruscamente,
e me virei em sua direção. Ele estava quase sobre meus calcanhares e agora
estávamos cara a cara. Limpei a garganta. "Eu..."
"O que é isso?" ele perguntou, preocupação gravada em sua expressão.
Eu apertei os lábios, sem saber como perguntar o que queria
perguntar, nem sabendo como conseguir a tranquilidade da
qual precisava. Do que exatamente eu preciso ser tranquilizada? Eu queria saber
se ele pensava em me beijar tanto quanto eu pensava em beijá-lo. Eu queria
dizer-lhe que nunca tinha beijado um homem antes. "Eu ouvi o que você disse na
sua varanda... a maior parte, de qualquer maneira, e sobre as mulheres... você...
bem–"
"Cristo", ele me interrompeu, colocando as mãos nos bolsos. "Eu realmente
fiz de mim um asno naquela noite, não foi?"
"Hum, eu –"
"Você não tem que responder a isso. Foi uma pergunta retórica." Ele fez
uma pausa, uma carranca vincando a pele entre suas sobrancelhas
enquanto ele olhava ao redor da floresta. "Eu fiz. Eu me fiz um imbecil total. A
verdade é que eu venho me fazendo de imbecil total há muito tempo. Mas eu
quero parar de fazer isso." Ele olhou de volta para mim. "O que eu quis dizer
antes, e as razões pelas quais vou ter que ficar longe de você por um tempo, é que
eu vou parar de fazer coisas que me levam a agir como o imbecil que
eu fui naquela noite. Lamento que você teve que testemunhar aquilo. Tenho
vergonha desse episodio, porque aquilo não é quem eu quero ser."
Eu balancei a cabeça e coloquei minha mão em seu braço. "Não, você não
precisa se desculpar sobre aquela noite. Você pensou que estava sozinho. Eu
sou a única que deve se desculpar por espiá-lo. Eu apenas... eu ouvi-", eu lambi
meus lábios e o olhar de Holden mudou-se para a minha boca, seus olhos
parecendo escurecerem a um azul mais profundo, como se uma tempestade de
verão estivesse vindo: "sobre as mulheres, quero dizer, e então estou
apenas querendo saber se..." Parei novamente.
Por que eu trouxe isso? Eu precisava de tempo para considerar o que
estava tentando perguntar a ele. Eu precisava de tempo para colocar meus
pensamentos em ordem, antes de dividi-los com Holden. Ou talvez eu não devesse
ser educada em tudo. Nós mal nos conhecíamos. Eu resisti à vontade de virar e
simplesmente fugir desse momento terrivelmente estranho.
Quando olhei para trás para o rosto de Holden, ele tinha o brilho de um
sorriso em seus lábios. "Lily, você está querendo saber se eu tenho uma horda
inteira de mulheres esperando por mim em San Francisco? Uma namorada?
Talvez até mesmo uma esposa... ou duas?" Seu sorriso cresceu mais e eu pisquei.
Ele estava me provocando, mas sim, eu estava perguntando essas coisas. Eu
estava me perguntando exatamente isso. "Você está me perguntando se eu quero
te beijar? Você está querendo saber se eu acho que você é a garota mais bonita
que eu já vi? São estas coisas que você está pensando, Lírio da Noite?" Ele usou
seu dedo indicador para percorrer a curva da minha bochecha.
Pisquei. Minhas bochechas estavam quentes e eu estava um pouco
atordoada. E Holden parecia muito satisfeito
consigo mesmo. Infinitamente satisfeito consigo mesmo. "Eu... não, eu estava
realmente me perguntando como elas dividem o tempo com você. Cada uma
delas detém dias diferentes? Ou é apenas um vale tudo virtual? Estou
somente... curiosa, porque soa muito complicado. Não admira que você esteja tão
cansado."
O rosto de Holden ficou em branco por um breve momento, e então ele
inclinou a cabeça para trás e riu. Depois de um minuto ele olhou para mim e
disse. "Eu mereci isso." Eu ri também, e voltei a caminhar, olhando para trás para
ter certeza que ele estava me seguindo. Ele correu para alcançar-me.
"O que exatamente constitui uma horda, de qualquer maneira?" Eu
perguntei, olhando para ele de lado e tentando não sorrir, mordendo os lábios
para que eles não se virassem para cima por iniciativa própria.
"Uma horda? Oh, hum, três. Uma horda é constituída por três."
Eu ri. "Mentiroso." Holden riu também, e em seguida agarrou minha mão,
balançando-a entre nós enquanto caminhávamos. Sua pele era fresca e suave, e
minha mão parecia pequena na sua. Nós dois continuamos a sorrir um para o
outro dessa maneira pateta que fez meu coração se expandir. Finalmente eu
desviei o olhar, mas um pequeno sorriso permaneceu em meus lábios.
Sim, eu confiava nele. Eu realmente confiava. Não tenho nenhuma
experiência para avaliar se estava confiando cegamente ou não, mas sabia que
gostava dele, e que me sentia segura com ele.
"A propósito", disse ele depois de um minuto, tirando-me do meu devaneio,
"supondo que eu não estivesse imaginando, a resposta à pergunta sobre eu ter
hordas de mulheres – todas as três - à minha espera em casa, a resposta é não. E,
quanto a querer beijá-la, a resposta é sim. Um definitivo sim. E quanto à
possibilidade de eu te achar belíssima, essa resposta é sim também. Sei que você
não se importa, e sei que você não está se perguntando, mas eu precisava tirar
tudo isso do meu peito. Tem sido um fardo difícil de carregar sozinho." Ele me deu
um sorriso torto, mas recheou seu bolso com a mão livre, e um leve rubor
coloriu as maçãs do seu rosto. Eu não pude deixar de sorrir de volta. Eu me senti
tonta novamente, e quente, e vibrantemente viva pela primeira vez em muito
tempo.
Quando olhei de volta para Holden alguns minutos depois, porém,
ele estava perdido em pensamentos. Eu podia ouvir o barulho suave da água nas
proximidades. Nós tínhamos quase chegado ao córrego. "Eu quero contar-lhe tudo
sobre a minha vida, Lily, sobre as coisas que me trouxeram aqui, mas eu
quero fazer isso apenas depois de arrumar algumas coisas. Eu sei
que provavelmente parece que eu estou falando em código, e eu sinto muito por
isso."
O olhar em seu rosto estava tão perturbado, tão sombrio. Eu balancei a
cabeça. "Está tudo bem. Eu já disse que confio em você."
Holden sorriu e puxou minha mão, então eu estava andando ao lado dele.
Seu corpo tocando o meu parecia clarear o clima imediatamente. Caminhamos
por entre as árvores e saímos na margem do córrego. Ele soltou a minha mão.
"Então, onde está sua vara de pescar?"
"Por aqui." Eu tinha deixado minha vara de pesca encostada a uma
formação rochosa do outro lado do córrego. Para chegar lá eu pulei na água de
uma rocha para outra – cerca de seis vezes – pousando sobre a musgosa costa do
lado oposto do córrego. Virando-me, eu vi que Holden ainda estava de pé do outro
lado, olhando em dúvida para as rochas que eu tinha acabado de usar como
trampolins. "Vamos. É fácil," eu chamei.
Holden respirou fundo e, em seguida, deu um passo hesitante na primeira
rocha, equilibrando os dois pés conforme julgava a distância até a próxima. "Você
tem que fazê-lo rapidamente", disse eu. "Se não você vai –" Eu respirei fundo e
trouxe a minha mão vazia até minha boca, tentando não uivar
com riso quando Holden caiu de cara na água. Ele veio para cima cuspindo e
agitando os braços, e eu não pude evitar: eu me dobrei de tanto rir, segurando
meu estômago. "Ok, então você não é muito atlético," eu disse através do
meu riso. Holden ergueu-se lentamente, chegando à sua altura máxima, e a
camisa e calça jeans moldaram seu corpo de uma maneira que fez
a hilaridade morrer na minha garganta. Engoli em seco, deixando escapar
algumas últimas tosses de riso.
"Você armou para mim." Ele estreitou os olhos, mas havia diversão em sua
expressão. Ele não estava realmente furioso.
Eu balancei minha cabeça. "Não, eu juro. Eu pensei que você fosse
conseguir. Eu só vou pegar... isto", eu disse, pegando minha vara de pescar, "e
voltar para o seu lado." Holden andou uns poucos com água até sua coxa, e
puxou-se para a margem. Ele balançou a cabeça como um cão e, em seguida,
olhou para mim e sorriu.
"Venha aqui", ele chamou. Eu pulei facilmente de rocha em rocha e
caí na margem ao lado dele. "Exibida", ele murmurou. "Você sabe que
geralmente eu sou o único que se destaca em tudo? Estar com você tem sido uma
experiência muito humilhante, deixe-me lhe dizer."
"Talvez você precisasse de algo assim, Holden Scott, Deus entre os
Homens", eu disse, rindo um pouco mais.
Ele riu. "Você provavelmente está certa." Ele começou lentamente a tirar
sua camisa, e eu dei um passo para trás.
"Este era o seu plano mestre, não era? Tramar minha queda no
córrego para então eu ter que tirar minhas roupas molhadas?"
Eu balancei minha cabeça, minha boca de repente seca. "Não, não.
Realmente, não era isso –" ele puxou a molhada peça de vestuário sobre a
cabeça, e os meus olhos deslizaram para baixo de seu peito nu ate chegar aos
cumes de seu estômago, e depois de volta para cima quando sua camisa saiu
completamente. Ele era muito magro, mas seus músculos eram definidos e
sua forma muito masculina. Seus ombros largos afilavam numa cintura
estreita, e sua calça jeans parecia como se mal se segurasse em seus quadris.
Sentindo-me fora de equilíbrio de uma maneira que eu não estava
acostumada em tudo – e não sabendo como agir ao lado de um maravilhoso
homem seminu – virei-me e andei com as pernas bambas para um tronco de
árvore caído na margem do córrego, onde eu costumava me sentar quando
pescava. Esse tronco em particular tinha uma mancha brilhante de luz solar, e
um local perfeito bem na minha frente para um buraco de pesca. Inclinei-me para
frente e escavei na lama mole na margem do córrego procurando uma
minhoca, e espetando-a rapidamente no anzol uma vez que a encontrei. Eu lancei
minha linha na água assim que Holden sentou-se ao meu lado.
Eu mantive meus olhos focados na água por alguns minutos, finalmente me
atrevendo a lançar um olhar para ele um pouco depois. Ele tinha seu rosto
inclinado para o sol, e seus olhos estavam fechados. Eu me permiti um momento
para admirá-lo, a luz realçando o ouro em seu cabelo e muito ligeiramente sua
nuca e rosto. Ele não deve ter feito a barba hoje. Deixei meus olhos beberem nas
linhas fortes e masculinas de sua mandíbula e maçãs do rosto, ate descansarem
em seus lábios bem formados e entreabertos com uma expressão de
contentamento pacífico. Meus olhos passearam pelo seu torso nu e
seu peito suave e bronzeado, enquanto eu lutava para resistir ao instinto que me
pedia para estender a mão e passá-la do seu estômago ate os
contornos masculinos de seus ombros e braços.
Uma leve brisa agitava as árvores, e o som do córrego emprestou um fundo
15
suave à canção de um curiango chamando sua companheira
incessantemente numa árvore próxima. Quando os olhos de Holden de repente
se abriram eu me assustei um pouco, e olhei de volta para a água.
"Idiota repetitivo, não é?" Holden perguntou, falando sobre o som do
pássaro vindo da direita atrás de nós.
Eu sorri. "Eles cantam por horas, às vezes. Os machos são muito
persistentes quando querem uma fêmea."
"É disso que se trata? Um chamado de acasalamento?"
Eu balancei a cabeça, colocando a vara de pesca num pequeno buraco
no tronco onde estávamos sentados para sustenta-la.
"Quer que eu segure isso?" Holden perguntou.
Eu balancei minha cabeça. "Não há nenhuma necessidade de segurá-la. Eu
normalmente só coloco-a aqui ao meu lado. Eu vou perceber se tiver fisgado
algo." Eu olhei para ele, e ele estava olhando para mim com um pequeno sorriso
em seus lábios. "Quanto ao curiango, sim, esse é o seu canto de acasalamento."
"Será que ela vai responder?"
"Eventualmente, eu suponho. Ou talvez ela
não esteja interessada neste curiango em particular. Talvez ela não queira ser
parte de sua horda, junto com todas as outras três."
O canto do lábio de Holden curvou-se, e havia um brilho em seus olhos
quando ele inclinou a cabeça e disse: "Um sujeito persistente como ele? Nah,
eu acho que todas as mulheres gostam dos persistentes."
Fiz um pequeno som bufando. "Talvez você não saiba tanto sobre as
mulheres quanto acredita que sabe." Eu dei-lhe um olhar provocante. Ou talvez
você saiba demais.
Holden riu. "Eu estou começando a pensar que você pode estar certa." Ele
inclinou a cabeça para trás em direção ao sol. "Isso é bom, pacífico".
Sim, era. Mesmo sentada aqui com ele eu me senti muito bem, natural. "Eu
sei. Eu sempre venho aqui quando possível no verão."
"Sozinha?"
"Sim, sim, sozinha."
"Sua mãe não vem com você?"
Olhei para ele bruscamente, mas quando ele não retirou a pergunta eu
suspirei, já cansada do olho por olho. Dava muito trabalho. "Não, minha mãe
não sai muitas vezes. Ela... bem, ela foi ferida anos atrás,
e permanece internada."
"Ferida–"
"E você? Será que os seus pais vivem em San Francisco, também?"
Holden fez uma pausa, seus olhos azuis persistindo no meu rosto por
alguns momentos antes dele olhar para a água. "Não, eu sou de Ohio, mas ambos
os meus pais morreram."
Eu observei seu perfil novamente enquanto ele olhava para
frente, com aquele triste olhar de perda em seu rosto, o mesmo que ele
tinha quando me contou sobre seu amigo Ryan.
Eu estendi a mão e a coloquei sobre sua coxa, e seu olhar lançou-se
para baixo onde minha mão o tocou. "Sinto muito, Holden. Eu sei o que é sentir-
se solitário." Eu senti o aumento de calor em minhas bochechas. Eu não deveria
ter dito isso.
Seus olhos encontraram os meus, e embora houvesse perguntas nos seus,
ele simplesmente agarrou minha mão. "Obrigado."
Algo elétrico encheu o ar, chiando através de nós como um raio faz
antes de piscar no céu num repentino e eletrizante arco de luz intensa.
Eu afastei minha mão e levantei-me rapidamente. "Quer ver uma maneira mais
rápida de pescar do que ficar à espera por um peixe morder a minhoca?"
Holden riu. "Sim. Mostre-me."
Tirei minhas botas e meias e subi meu vestido para cima, amarrando-o em
um nó no lado da minha coxa. Comecei a andar na água rasa e quando olhei
rindo de volta para Holden, seu olhar sobre mim era atento e cheio de algo que eu
não conseguia definir. Algo que parecia faminto. Ele olhou para baixo em minhas
pernas nuas e de volta para os meus olhos. Engoli em seco, mas trouxe meu dedo
até meus lábios, instruindo-o a ficar bem quieto. Então
eu fiquei muito tranquila na água, que apenas escovava o fundo do meu vestido
amarrado. Eu não movi um músculo enquanto acompanhava o movimento dos
peixes que nadavam através das minhas pernas: duas grandes
trutas. Num movimento ultrarrápido e inesperado, porem, eu mergulhei as duas
mãos na água e fiz um som de espanto quando permaneci de mãos vazias.
Concentrando-me novamente, eu fiquei ali de pé por mais um longo e tranquilo
momento, meus olhos novamente seguindo os corpos
escorregadios e prateados dos peixes passando por mim. Novamente eu mergulhei
minhas mãos na água, atingindo apenas um pouco à frente de onde o peixe que
eu estava seguindo nadou, e rindo em voz alta quando o peixe deslizou para a
direita longe do meu alcance. Eu pulei para o lado quando outro nadou
ao meu lado, mais uma vez permanecendo de mãos vazias. Holden estava rindo
na margem. "Alguma vez você já realmente pegou um desse jeito?",
ele perguntou.
"Ainda não, mas vou conseguir antes deste verão terminar", eu disse, rindo
de volta. Ele sorriu para mim, e meu coração deu pelo menos três batidas
consecutivas. Esta era a primeira vez que eu o tinha visto
parecer genuinamente despreocupado e feliz, com as pequenas linhas
entre seus olhos completamente suavizadas. Quando eu percebi que
estava simplesmente de pé ali olhando para ele, me virei para trás, olhando para
a água novamente. Pela minha visão periférica, porem, eu vi Holden caminhar até
a beira da água, arregaçando sua ainda molhada calça jeans. Ele entrou na água
ao meu lado.
Pelos próximos quinze minutos, tentamos em vão pegar uma truta, ambos
fazendo papel de ridículo e apenas olhando os saltos dos peixes enquanto eles
fugiam de nossas mãos. Uma vez eu quase dei de cara na água, mas Holden me
agarrou e nós dois apenas rimos enquanto seus braços ficaram em torno de mim
por mais tempo do que o necessário - e minha respiração ficou
presa quando nossos olhos se encontraram.
"Última tentativa", disse ele. Eu balancei a cabeça. Nós ficamos parados e
silenciosos. De repente, as mãos de Holden mergulharam na água
e, quando ele as tirou, uma truta gorda estava se mexendo em suas mãos. Eu
engasguei, minha boca caindo aberta. Holden se ergueu lentamente em toda sua
altura, deixando sair um pequeno grito.
"Oh, meu Deus!" Eu exclamei, rindo descontroladamente com Holden
enquanto o peixe se debatendo finalmente se acalmava em suas mãos. "Eu não
posso acreditar que você fez isso."
"Eu posso dizer honestamente que também não posso", disse ele, sacudindo
a cabeça com uma expressão de maravilhada incredulidade no rosto.
"Sorte de principiante", eu murmurei, tentando parecer descontente.
Mas isso saiu rouco e impressionado.
Eu estava realmente impressionada, afinal de contas. "Ou talvez você
tenha experiência e não me disse."
Ele riu. "Quanto tempo você disse que estava fazendo isso?" Havia
divertimento em seu tom, e eu revirei os olhos.
Ele colocou o peixe no saco plástico que eu tinha deixado mais cedo ao lado
da minha vara de pesca, e então retornou ao córrego para lavar as mãos. Abaixei-
me ao lado dele e lavei as minhas próprias, uma onda
de insegurança de repente caindo sobre mim. Nós tínhamos acabado de pescar
com nossas próprias mãos, no que era uma espécie de encontro. Ele tinha
participado e se divertido, aparentemente, mas deve ter pensado que eu era
algum tipo de garota pagã ou das caverna – ou uma criança tola. Era isso:
provavelmente nossa tarde o fez reviver sua infância. Ugh. Eu tinha certeza
que aquelas garotas que eu tinha visto dançando na varanda nunca fariam algo
assim. Elas provavelmente pensariam que isso era nojento.
Quando voltei para o tronco ao qual ele já tinha retornado, dei de
ombros auto conscientemente. "Muito tempo. Obviamente eu tenho demasiado
tempo em minhas mãos." Eu tentei dar uma
risada autodepreciativa, que soou estranha e sufocada.
"Hei, não fique chateada porque eu sou naturalmente melhor em pescar
com as mãos do que você."
Eu açoitei minha cabeça em sua direção e vi que ele estava me provocando.
Ele piscou, parecendo tão feliz que eu não pude evitar rir novamente, a
autoconsciência que tinha tomado conta de mim segundos antes se derretendo.
Eu balancei minha cabeça.
Holden, por sua vez, se inclinou para frente e coçou o tornozelo, e foi então
que eu notei suas costas. Inclinei-me e toquei sua pele cautelosamente, e ele
sentou-se rapidamente, seus olhos encontrando os meus.
"Você tem tantas cicatrizes", eu disse.
Ele deu um sorriso apertado. "Meu trabalho não é gentil com meu corpo. Eu
fui ferido mais vezes do que posso contar."
"Seu trabalho..." Sentei-me ao lado dele, franzindo a testa ligeiramente e
me perguntando o que no mundo poderia ser. Ele acenou com a cabeça para o
chão aos meus pés.
"O que você está lendo?" ele perguntou, obviamente mudando de assunto.
Olhando na direção para a qual ele estava apontando, eu vi a borda do livro
de poemas que espreitava para fora da minha mochila. Dei de ombros. "Oh,
nada," eu disse, usando o pé fechar minha mochila.
"Nada? Aquilo parecia um livro para mim. O quê? É um romance de mau
gosto ou algo assim?"
Eu ri. "Não. Apenas... um livro de poemas."
"Você gosta de poesia?"
Eu podia sentir o calor de seu olhar sobre o lado do meu
rosto, e me senti corando do pescoço às bochechas. Algo sobre ele saber do meu
amor pela poesia parecia muito pessoal. "Sim", eu disse suavemente. "Eu gosto."
"Posso ver?"
Eu hesitei brevemente, mas não consegui pensar numa boa razão para
dizer não. Arrancando o livro da minha mochila eu o segurei em sua direção, sem
olhar em seu rosto. Ele o pegou da minha mão e ficou em silêncio por um
momento. "Poesia romântica." Eu o ouvi folheá-lo e depois parar enquanto
lia algo para si mesmo. Minha curiosidade era muito grande, e eu não pude deixar
de olhar para ver em qual poema ele tinha parado.
"Ela caminha em formosura, como uma noite", ele leu, " Em que o céu está
sem nuvens e com estrelas palpitantes, e o que há de bom em treva ou
resplendor, se encontra em seu olhar e em seu semblante.” Ele olhou para cima e
chamou minha atenção. "Lord Byron." Ele fez uma pausa. "Eu nunca soube
que Byron escreveu poemas sobre você", ele disse suavemente. Eu senti meu
rubor se aprofundar e olhei para as minhas próprias mãos.
"É sobre a Sra. John Wilmot, prima de Byron pelo casamento. Ela estava de
luto quando ele a conheceu."
Ele continuou sussurrando. "Talvez para Byron fosse sobre ela, mas para
mim é sobre você." Eu trouxe o meu olhar para ele, e por algum motivo eu queria
chorar. Quantas vezes eu tinha me sentado sozinha lendo esse poema, e
sonhado um dia ser admirada dessa maneira?
"Lírio da Noite", disse ele suavemente. "Eu sabia que essa era a maneira
perfeita para descrevê-la." Meu coração explodiu de alegria, e eu
só conseguia sorrir. Ele me entregou o livro de volta, e eu o devolvi a minha
mochila.
"Você sabe quem foi Byron", eu disse. "Você gosta de poesia, também?”
"Eu gosto de literatura", disse ele, um olhar confuso cruzando seu
rosto enquanto ele franzia a testa. Ele trouxe a mão ate sua cabeça e massageou
as têmporas, como se estivesse se agarrando a uma memória, e isso fosse algo
que lhe machucava. "Sim...", disse ele, afastando a mão e sorrindo para mim. "Eu
não falei com ninguém sobre isso em um longo tempo."
Eu balancei a cabeça, sentindo o prazer por ele ter compartilhado algo
pessoal comigo.
Passamos a próxima hora ou assim falando sobre as coisas ao nosso redor,
os pássaros nas árvores, os tipos de plantas que cresciam ao lado da água. Eu
sabia os nomes de alguns deles, mas não todos. Eu tinha ganhado um livro sobre
a flora e fauna do Colorado anos para trás, e tinha tentado aprender o máximo
que pude - mas como eu logo percebi, levaria uma vida inteira
para aprender tudo. E quem sabe talvez isso fosse o que eu tinha. Eu fiz uma
careta com o pensamento, algo desesperado e saudoso que eu não sabia como
definir enchendo meu peito e fazendo meu coração apertar. Eu queria mais do
que isso para a minha vida agora. Mais do que o pequeno, escuro
e solitário mundo em que eu vivia.
Eu queria alguém para me salvar. Mas eu não sabia o que fazer sobre isso.
À medida que a hora avançava, eu observei as mãos de Holden
começarem a tremer, e embora o sol estivesse brilhando sobre nós, ele começou a
suar de uma maneira que eu pensava ser excessiva. Eu tinha visto
sinais de que ele estava doente anteriormente, mas não sabia como – nem se isso
era parte do que ele teria que enfrentar enquanto estivesse fora.
"Você deve voltar", eu finalmente disse, meus olhos pousando em seus
dedos trêmulos. Ele esfregou as mãos em suas coxas, parecendo nervoso e triste.
"Sim, eu deveria. Este foi um dos melhores dias que passei nos últimos
anos. Obrigado por me dar isso. Obrigado por gastar seu tempo comigo."
Eu balancei minha cabeça. "Foi realmente... eu gostei, também." O que
era um eufemismo, embora eu não soubesse de que outra forma expressar o
quanto eu gostei do nosso tempo juntos, nem como explicar como ele me
fez esquecer quão soltaria eu estava, ou como queria que este
dia nunca acabasse.
Eu recolhi minhas coisas, enrolando os peixes no plástico –
um que Holden tinha pegado com as mãos e outros dois que eu tinha pegado com
a vara - e coloquei-os na minha mochila. Eu deixei a minha vara de pesca para
trás, justo como costumava fazer.
Caminhamos em silêncio a maior parte do caminho de volta, Holden
parecendo cada vez mais nervoso. Meu coração estava esmagado, também. Eu
não sabia quando iria vê-lo de novo, e já sentia falta dele. E isso me aterrorizava.
Eu queria mais tempo. Não vá, eu queria dizer. Por favor, não vá. Ainda não. Mas
eu não podia, e eu não iria – não quando ele pediu-me para dar-lhe tempo.
Perdida em meus próprios pensamentos eu mal notei quando chegamos à borda
da floresta onde ele me deixaria para voltar para sua cabana. Holden recostou-se
contra uma árvore e cruzou os braços sobre o peito. Ele colocou sua camiseta de
volta, e ela estava quase seca, embora seu jeans ainda estivesse úmido. Ele então
fechou os olhos com uma expressão de dor.
Forçando um sorriso e de repente me sentindo muito desajeitada e tímida,
eu respirei fundo e dei um passo para mais perto dele. "O olhar no seu
rosto... parece como se você estivesse indo para a guerra", eu provoquei,
tentando aliviar o clima.
Holden expirou ruidosamente. "Não exatamente... mas é quase isso. Você
vai estar à minha espera, Lily?"
Eu não tinha certeza exatamente o que eu estaria esperando. Holden Scott
me confundia, e parecia completamente fora do meu alcance. Mas, para mim, só
havia uma resposta. Eu sorri. "Sim." Seus olhos percorreram meu rosto.
"Por que você olha para mim desse jeito?" Perguntei suavemente.
"De que jeito?"
"Como se estivesse tentando me memorizar.
Como se acreditasse que eu posso desaparecer."
"Eu não sabia que estava fazendo isso", disse ele, afastando um pedaço de
cabelo do meu rosto. "Mas, por favor, não desapareça.”
Eu balancei minha cabeça. "Eu não vou." Dei um passo ainda mais perto, e
de repente ele pareceu tornar-se muito consciente de mim. Ele permaneceu ali de
pé, mais alto que eu, seus olhos intensamente focados. Eu avancei o passo final
em seu espaço, fiquei na ponta dos pés e pressionei meus lábios ao lado de sua
boca, apenas com a intenção de dar-lhe um beijo simples.
Por um segundo, ele pareceu congelado, mas então um som
gutural e estranho saiu de sua garganta e ele virou a cabeça para que meus
lábios deslizassem sobre os dele, e nossas bocas fossem pressionadas juntas.
Eu hesitei levemente, mas seus braços estavam de repente em torno de mim, o
que tornou impossível afastar-me dele como por pouco não fiz. Abri os olhos e vi
que os seus estavam fechados e que haviam linhas vincadas entre suas
sobrancelhas, como se ele estivesse com dor. Eu não tinha certeza do que isso
significava, então deixei meus cílios tremularem fechados novamente e esperei
para ver o que ele faria em seguida. Eu me assustei quando senti a ponta da sua
língua correr ao longo dos meus lábios. Instintivamente minha própria língua
saiu para lamber meus lábios onde o seus tinham estado, para que eu pudesse
prová-lo em minha boca. Ele fez mais um daqueles sons guturais quando
percebeu o que eu tinha feito, e eu pensei que isso significava que ele gostou do
que estava acontecendo, então abri minha boca um pouco mais para que ele
pudesse deslizar sua língua para dentro. Deixei escapar uma rápida respiração
ofegante quando prazer intenso estremeceu através de mim. A mão de Holden
veio para trás da minha cabeça e ele inclinou-a, aprofundando ainda mais sua
língua na minha boca. Seu beijo enviou uma sensação da ponta da minha
língua por todo o caminho até os meus joelhos, e eu caí contra
ele quando encontrei sua língua com a minha própria. Eu queria ficar mais perto,
absorver tudo dele, experimentar essa sensação tremeluzente em minhas veias
por tanto tempo quanto possível.
Corri minhas mãos por suas costas. A sensação de seus músculos
se deslocando sob as mãos aumentaram o prazer do beijo, e eu não pude deixar
de gemer em sua boca. Ele me puxou para mais perto, respondendo ao meu
gemido com um dos seus próprios.
Nosso beijo se aprofundou enquanto eu seguia sua liderança, deixando a
minha língua dançar com a dele, provando sua essência masculina. Ele tinha
gosto salgado e doce, e era mais maravilhoso do que eu jamais poderia ter
imaginado.
Eu não sei por quanto tempo nós nos beijamos, mas depois de algum tempo
ele se afastou, polvilhando beijos menores ao redor da minha boca e bochecha. Eu
tive outro pequeno tremor quando seus lábios roçaram contra a pele sensível do
meu pescoço. "Lily", Holden disse, e sua voz soou ofegante e rouca, "as coisas que
você está fazendo comigo agora. Eu estou tentando me controlar, mas–"
"Não se controle. Por favor, só me beije mais uma vez", eu sussurrei contra
sua boca. "Eu quero provar sua língua novamente."
Holden gemeu, e então colocou as mãos nos lados do meu rosto e me beijou
novamente, nossas línguas se acariciando e emaranhando por longos e deliciosos
minutos. Quando ele finalmente terminou o beijo ele estava ofegante de novo, e
eu podia sentir o ligeiro tremor de seu corpo, como se ele estivesse mal
controlando alguma coisa.
"Eu tenho que parar, Lily. Eu não quero, mas tenho que fazer. Eu vou pegar
fogo se não o fizer." Eu balancei a cabeça. Ele parecia tão desesperado, como se
ele estivesse em algum tipo de agonia. Eu tinha uma vaga ideia do que ele estava
sentindo.
Meu corpo estava quente e com dores e não satisfeito, apesar de ter
experimentado algo tão incrível. E se mais beijos levassem a mais quentes
incômodos, eu acho que poderia pegar fogo também. Ergui os olhos para ele e ele
olhou para mim com ternura, usando os dedos para acariciar ao longo da minha
bochecha. Eu me inclinei para o seu toque e sorri. Me sentia sonhadora e tonta e
muito, muito feliz. Ele se inclinou e beijou minhas pálpebras, e eu ri suavemente
com a sensação de cócegas dos seus lábios. Ele esfregou o queixo áspero contra a
minha bochecha e eu ri de novo, sentindo seu sorriso em meus lábios. "Lily", ele
sussurrou. "Lírio da Noite. Como posso dizer adeus a você agora?"
"Com felicidade", eu sussurrei, "porque nos veremos em breve. E, quando o
fizermos, você vai me beijar de novo."
"Sim", ele engasgou, "sim, eu vou." Beijei-o uma última vez, suave e
docemente no canto de seus lábios, da maneira que eu pretendia ter feito em
primeiro lugar. Me afastei dele, mantendo os braços estendidos e nossos dedos
juntos, até que caíram separados.
E então me virei e fui embora, olhando para trás apenas uma vez
para encontrar Holden ainda encostado na árvore na borda da floresta,
observando-me deixar o lugar onde ele estava.
Capítulo oito
Holden

Observá-la se afastar foi a coisa mais difícil que eu já tinha feito. Mas eu
sabia o que precisava fazer. Lily tinha me mostrado. Ela não sabia, mas tinha me
dado um gosto de paz, de felicidade e de conforto. E eu queria essas coisas.
Ansiava-as com uma dor profunda em minha alma. Eu
tinha me esquecido delas, mas ela me lembrou que eu podia sentir alegria,
me lembrou que eu ainda era capaz de manter a felicidade no meu coração.
Não era muito tarde. Não se eu não deixar ser.
O gosto dela... era como esperança, ao mesmo tempo familiar e
desconhecido. Eu queria pedir-lhe para segurar minha mão, para me acalmar
enquanto meu corpo removia os entorpecentes produtos químicos que eu estava
usando para escapar da minha dor e infelicidade por muito tempo. Mas eu sabia
que isso era algo que eu tinha que fazer sozinho se queria ter alguma chance de
oferecer-lhe tudo de mim – não este fragmentado homem que eu era agora. E se
Lily visse quem eu realmente era, visse o que eu tinha feito para o meu corpo, eu
sabia que ia apenas se assustar, e provavelmente se afastar. Brandon estava
certo – eu precisava ser o único a fazer a escolha. E, finalmente, eu era o único
que podia fazer o trabalho. E embora eu quisesse Lily na minha vida como não
quis mais nada num tempo muito longo, eu também teria que fazer isso por mim.
Eu teria que ficar melhor para mim mesmo, mais do que tudo.
Fechando a porta da cabana atrás de mim, eu fui direto para a
cozinha onde tinha deixado o saco plástico com o punhado de comprimidos
que ainda restava. Não me permitindo pensar, eu andei direto para o banheiro,
despejei o conteúdo do saco no vaso sanitário e acionei a descarga, observando o
redemoinho de água drenar os comprimidos. E apenas por precaução, acionei a
descarga novamente.
E então medo me encheu, mas eu fechei olhos e imaginei Lily. Bonita Lily
misteriosa. Eu voltaria ao melhor do que já tinha sido, e lhe pediria para
compartilhar todos os seus segredos. E talvez então eu fosse corajoso o suficiente
para compartilhar os meus.
"Foooooda", eu gemi miseravelmente. Na tarde seguinte, cada músculo do
meu corpo doía, e meu estômago estava sendo sacudido com mais dores
agonizantes. Eu me contorcia de dor no sofá com minhas pernas puxadas até meu
estômago. O suor escorria pela minha testa. Eu ia morrer. Não havia nenhuma
maneira que eu poderia sobreviver a esta miséria. Por que eu tinha jogado fora os
comprimidos? Deus, por quê? Não sendo capaz de ficar parado por mais do que
alguns minutos, levantei-me e cambaleei para a cozinha, onde me servi um copo
de água – eu estava tremendo tanto que tinha derramado mais da metade do
liquido quando finalmente consegui levar o copo à boca.
Eu queria fugir do meu próprio corpo – sair, me libertar. A sensação de
claustrofobia agravava o medo e a ansiedade que eu já estava sentindo. Eu
estava preso agora. Preso em minha própria pele. Não havia maneira de eu
conseguir dirigir nesse estado, e levaria pelo menos um dia para alguém chegar
até mim. E então ainda mais tempo para chegar a qualquer lugar onde eu poderia
convencer alguém a me passar uma receita para analgésicos para a dor, dos
quais eu precisava tão mal.
Mais tarde, naquela noite, ouvi o som dos pés de alguém subindo as
escadas. Eu estava sentado no chão do chuveiro com meus braços em torno
das minhas pernas, água morna chovendo em mim. Ela tinha começado quente e
tinha trabalhado por um tempo acalmando meus músculos doloridos, mas
agora estava apenas morna. Eu pensei em ficar na banheira de hidromassagem,
mas decidi que o chuveiro era mais sensato dado o estado em que eu estava. Se
eu adormecesse, estaria mais seguro aqui. Meu corpo estava em tanta agonia
que os passos mal agitaram qualquer emoção em mim. Eu acho que eu deveria
estar preocupado, assustado, curioso, pelo menos, mas eu não podia me importar,
muito menos tamborilar uma resposta apropriada.
"Bem, não é assim que eu esperava te encontrar ", veio a voz feminina. Ah
não. Não. Porra, não. Eu estava morto. Eu estava morto e no inferno. E um dos
servos de Satanás tinha aparecido para me torturar. Eu virei minha cabeça e vi
claramente através do vidro da porta do chuveiro. Taylor. A filha do gerente dos
49ers, e minha ex-namorada.
"O que você está fazendo aqui?" Perguntei.
Taylor abriu a porta do chuveiro, fazendo-me cair numa pilha no
chão, gemendo. "Piedosa porra. O que diabos está acontecendo com você?" Ela
realmente parecia um pouco preocupada.
Eu me arrastei até o sanitário e vomitei. "Oh Deus! Jesus", Taylor gritou,
seu ruído me fazendo sentir dez vezes pior do que já me sentia. O que eu não
pensava ser possível. Eu ouvi seus saltos clicando no piso do banheiro, e um
minuto depois ela voltou com um pano, correu água fria sobre ele e se
inclinou em cima de mim para limpar minha testa e ao redor da minha boca.
"O que você está fazendo aqui, Taylor?" Resmunguei sombrio.
"Eu vim para vê-lo, para passar algum tempo sozinha com você." Havia uma
nota de desgosto em sua voz.
Claramente meu vômito após sua chegada não tinha sido parte do
plano original dela.
"Por quê?" Fechei os olhos, sentindo o suor frio romper pela minha pele
novamente. "Nós terminamos há mais de quatro meses." O pano frio estava de
volta na minha testa, e eu me senti bem. Meu cérebro estava tão nebuloso.
Taylor ficou em silêncio por um minuto. "Foi há quatro semanas. Você não
tem nenhum conceito de tempo? E nós não terminamos. Você só começou
a agir estranho e distante, e eu precisava de um descanso. De qualquer
maneira, nada daquilo importa. Eu andei pensando em você. E quando descobri
onde você estava, soube que precisava chegar até você. Este é o lugar perfeito
para nos reconectarmos, você não acha?"
Reconectar? O quê? Não. "Você pode me ajudar a chegar ao sofá?" Eu
não tinha forças para ouvi-la, muito menos argumentar ou me preocupar com
tudo o que ela estava dizendo.
Taylor me ajudou a levantar-me, e eu agarrei uma toalha com minhas mãos
trêmulas, envolvi-a em minha cintura e manquei até o sofá, caindo sobre ele.
"O que há de errado com você, afinal?"
"Eu estou me desintoxicando, Taylor. Apenas me deixe aqui para morrer,
por favor", murmurei.
"Oh, merda. Ouça, eu aplaudo seus esforços para se limpar, porém cortar
tudo de vez é simplesmente estúpido. Eu vi isso antes. Trouxe-lhe alguns
comprimidos – você deixou um par de frascos no meu apartamento, e eu joguei-os
em minha mala. Você precisa deles, para–"
Eu trouxe-me para uma posição sentada, fazendo uma careta e apertando
meu queixo enquanto meus músculos travavam. "Você tem alguns comprimidos?"
Perguntei desesperadamente. Oh, doce alívio, porra. Eu faria qualquer coisa
para me sentir melhor, mesmo que apenas por uma hora. Qualquer coisa.
Qualquer coisa.
"Sim, um par de frascos." Ela veio sobre mim no sofá e montou no meu colo.
Então usou seu dedo indicador para traçar meus lábios e, inclinando-se devagar,
me beijou. Seu cabelo comprido e escuro criou uma cortina em torno de nós.
"Diga ‘por favor’", ela disse suavemente.
"Jesus fodido Cristo, apenas dê-me os malditos comprimidos", eu quase
gritei.
Taylor se levantou, dando-me uma careta amuada. "Ok, ok, Sr. Impaciente.
Relaxe." Ela se moveu em direção a sua bagagem ao lado da porta da frente e a
remexeu pelo que pareceu uma eternidade. Eu queria gritar. Levantei-me e fui
até ela, deixando a toalha cair no chão. Eu não dei a mínima. "Ah, aqui vamos
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nós." Ela ergueu um frasco de Percocet e eu avidamente agarrei-o, tentando
duas vezes abri-lo com minhas mãos trêmulas antes de finalmente arrancar a
tampa e tragar dois comprimidos, sem água. Eu fiz meu caminho para a cozinha e
bebi da torneira, em seguida, tropecei de volta para a sala e afundei-me no sofá,
respirando rapidamente e já sentindo a droga correndo em minhas
veias, trazendo alívio. Doce. Abençoado. Alívio.
"Aqui, assim está melhor, certo?" Taylor perguntou, mais uma vez
montando meu colo. Eu coloquei minhas mãos em seus quadris para movê-la,
mas descobri que não tinha forças. "Por que você está fazendo isso, de qualquer
maneira? Por que agora?"
"Porque eu preciso voltar à minha vida. Voltar para a equipe."
"Não há pressa, embora, não é? Eles podem gerenciar sem você enquanto
você toma seu tempo melhorando."
Eu não me incomodei em explicar nada para ela. De qualquer maneira, ela
não fazia parte do meu futuro. "Saia de cima mim, Taylor."
Ela não se mexeu. "Ah, vamos lá. Agora que você está se sentindo melhor e
eu estou aqui, vamos ter um pouco de diversão. Você se lembra da diversão, não
é?"
"Eu não quero diversão. Eu quero dormir. E eu preciso que você saia."
Ela arrastou seu dedo pelo meu peito, parecendo pensativa. "Ei, eu sei que
você ainda está confuso sobre o que aconteceu. Todos nós estamos. Mas,
chafurdar não vai trazê-lo de volta. Ele queria –"
"Puta que pariu! Fique longe de mim!" Você não sabe porra nenhuma sobre
o que ele queria. Você nem mesmo realmente o conhecia.
Ela sentou-se em linha reta, mas não se afastou. "Bem, esse não é um belo
agradecimento que recebo por ter percorrido todo o caminho até esse Bumfuck
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Egito , trazendo-lhe o que você obviamente precisava e no momento em que
precisava, e até mesmo", ela arrastou uma unha pelo meu peito nu,
"pretendendo mostrar-lhe a diversão que você obviamente tem perdido. Eu
até trouxe alguns brinquedos. Você sentiu minha falta, não é, baby? Veja,
tivemos uma coisa boa, e nós mal começamos." Ela se inclinou e chupou o lóbulo
da minha orelha.
Eu novamente pensei em empurrá-la para longe, mas o intenso alívio de
finalmente conseguir uma pausa da agonia nos meus músculos era tão
maravilhosa que, de repente, eu nem conseguia estar excessivamente irritado
com a atenção indesejada.
"Não era?" Ela ronronou. "Eu sei que eu senti sua falta." Ela estendeu
a mão para baixo e apertou meu pau. "Senti falta disso."
"Chega," eu arrastei, empurrando as mãos dela. "Fique longe de mim."
Ela suspirou alto, mas afastou o corpo do meu. "Tudo bem. Eu entendi. Você
precisa se refrescar. Vamos para a cama, e de manhã você vai se sentir melhor."
"Quem te trouxe aqui?" Eu perguntei, meus olhos ainda fechados.
"Kelly. Ela esteve aqui numa das festas de Brandon e guardou as direções.
Ela vai voltar para me buscar em poucos dias." Jesus, muito presunçosa?
"Como você soube que eu estava aqui?"
"Brandon disse a alguém que disse a alguém... você sabe como é." Não, isso
não soava como Brandon. O mais provável é que ela usou algum
método desonesto para descobrir. O que Taylor queria, Taylor obtinha. Cadela
conivente.
Eu suspirei. "Você precisa ligar para a Kelly e dizer-lhe para vir te buscar."
"Como?"
"Ligue para Kell–"
"Eu vou me fazer uma bebida", disse ela. "Você quer alguma coisa?"
"Não. E não há álcool aqui."
"Não se preocupe", ela cantarolou, sua voz sumindo enquanto ela se movia
em direção à cozinha. "Eu trouxe a minha própria."
Jesus, que idiota ignorante ela era. Assim como eu. Eu sorvi seus
comprimidos sem um segundo pensamento. E agora, o dia e meio anterior foi tudo
por nada. Nada.
Eu agarrei meu cabelo, auto-ódio me agredindo. Sentei-me um pouco e
virei a cabeça em direção à janela.
Lily estava de pé há apenas alguns metros da varanda olhando para cima.
Eu fiquei rapidamente de pé, agarrando meu couro cabeludo e
gritando uma obscenidade quando o sangue correu direto para meu cérebro,
fazendo com que o latejar na minha cabeça recomeçasse. Peguei minha toalha,
cobri-me e corri para a porta, chamando o nome de Lily enquanto a abria. Ela
tinha se virado e se dirigido de volta para a floresta, mas quando me ouviu
chamando seu nome parou - e em seguida pegou seu ritmo
novamente, agora correndo.
O olhar em seu rosto... era pura devastação.
Oh, Deus. Oh, Deus. Ela tinha visto Taylor sentada no meu colo me
acariciando, visto minhas mãos em seus quadris, mas não tinha visto eu me
afastando dela. "Lily," eu chamei novamente, segurando a toalha em volta da
minha cintura. Eu queria gritar um fluxo de palavrões. "Lily, por favor," implorei.
Quando ela alcançou para as sombras na borda da floresta, ela finalmente
desacelerou e virou-se para mim. "Sinto muito. Eu não deveria ter vindo. Eu só
estava preocupada com você. Eu só... queria ter certeza de que
você chegou bem em casa. Que você..." Ela mordeu o lábio. "Eu só queria ver você.
Isso foi..." Ela agitou a cabeça como se não soubesse como continuar. Eu queria
agarrá-la e puxá-la para o meu corpo. Eu queria lhe contar como era um oásis no
meio do deserto para mim, que era por ela que eu estive rastejando no último dia
e meio.
"O que você está fazendo aí fora?" Taylor gritou da varanda.
"Jesus Cristo! Vá para dentro, Taylor. Agora," eu gritei por cima do meu
ombro. Taylor cruzou os braços e, mesmo à distância, eu podia ver que ela estava
lançando olhares mortais para mim.
"Deus, Brandon disse que você estava um pouco louco!" Taylor gritou
enquanto pisava para dentro. "Mas você está realmente apenas sendo um maldito
pau!"
Quando me virei de volta para Lily, ela já se movia mais profundamente
para dentro da floresta. "Espere," eu chamei, correndo atrás dela e segurando a
toalha em volta de mim, meu corpo apenas firme o suficiente para correr uma
curta distancia. E Lily começou a se mover mais rapidamente.
"Lily, Lily, por favor, só me escute," eu chamei por ela. "Espere, por favor,
Lily. Eu quero... Eu quero..."
Ela se virou com as faces coradas, seus olhos profundos poços de mágoa.
"O quê?" Ela exigiu. "O que você quer, Holden? O que você quer comigo?
Certamente não parece que você está sozinho."
Eu balancei minha cabeça. "Por favor, o que você viu lá atrás não é o que
você acha que foi. Taylor não é minha namorada. Ou pelo menos... eu não a
considero minha namorada. Ela... o ponto é, eu não pensei sobre ela ou há vi em
meses. Por favor, não é o que você pensa," eu repeti.
Ela deu de ombros, deixando escapar uma pequena risada frágil. "Eu não
acho nada. Eu não tenho nenhuma ideia do que pensar. Deus, o que você
quer comigo? O que você quer?" Ela virou-se, sem esperar por uma resposta, e
por um momento eu fiquei congelado. O que eu queria?
Uma onda de insegurança tomou conta de mim. O que eu quero? Ficar
melhor. Para você. Então eu posso te beijar, posso plantar meu nariz no lugar entre
o seu ombro e seu pescoço macio e sentir que sou digno o suficiente para estar lá,
namorar você, romancear com você... isso pode funcionar. Quero saber sobre a sua
vida. Quero falar sobre a minha. O quê, o que eu quero? "Passar o tempo com
você", eu finalmente consegui dizer. "Somente... estar com você, Lily. Deus. Eu
quero estar com você."
Ela parou e se virou para mim lentamente. Dando de ombros, ela disse: "Só
que isso nunca vai funcionar. Nós apenas não fazemos qualquer sentido juntos."
Eu balancei a cabeça e inclinei-me contra uma árvore. Deus, eu ainda
estava tão fraco e doente. "Você é a única coisa que fez sentido para mim em um
tempo muito longo. Se você soubesse..." Suor havia irrompido na minha testa, e
eu limpei-a, agarrando a árvore enquanto tentava ficar em pé. Lily olhou para
mim com cautela.
"Você deveria voltar, Holden. Você não está nem vestido." Eu queria resistir.
Eu queria lutar por ela - mas eu não podia, e eu me odiava por isso.
"Por favor," eu sussurrei, "por favor..."
Lily caminhou de volta para onde eu estava e levou a mão para a minha
testa. "Você está tão quente", ela disse. "Você deveria voltar para dentro."
Atrás de mim Taylor estava gritando na varanda de novo sobre o idiota que
eu era. Eu a ignorei, e Lily fez o mesmo, fingindo que ela não estava lá. "Eu quero
ir com você", suspirei. Sua mão escorregou até a minha bochecha. Atrás de mim,
a voz de Taylor se levantou e a porta bateu novamente, fazendo-me
amaldiçoar seu nome sob a minha respiração.
"Eu não disse que você deve aprender a reconhecer uma cobra? Ou é
provável que você pise justamente sobre uma."
Suspirei novamente. "Eu sei", eu disse, cansado. E elas estão por toda
parte. Minha vida é tão cheia delas que eu tenho medo de fazer uma mudança.
Meus olhos fecharam, e eu pressionei minhas costas contra a casca áspera
da árvore. Quando comecei a escorregar para baixo do tronco me peguei
me empurrando de volta à realidade.
Mas Lily tinha desaparecido.

Eu fiz meu caminho desorientadamente de volta para a cabana, meus pés


descalços arranhados e molhados. Quando eu entrei, eu caí no sofá. Taylor estava
olhando para mim do outro lado da sala, com os braços cruzados sob os seios
grandes. "O que diabos você estava fazendo lá fora em uma toalha?" ela
perguntou.
Eu atirei-lhe um olhar impaciente. Eu mal tinha energia para lidar com ela.
"Eu estava conversando com Lily," respondi.
"Quem é Lily?" Ela me olhou fixamente.
"A garota. Você não a viu?"
Taylor estreitou os olhos. "Eu não vi ninguém. Parecia que você estava
gritando para a floresta. O que esta acontecendo com você? Estou seriamente
preocupada."
Deixei escapar um longo suspiro. O que eu estava pensando ao
passar algum tempo com ela no passado? Oh, bem, eu não tinha pensado.
Eu provavelmente estava bêbado ou drogado, ou ambos. De repente eu não só me
sentia exausto, mas também me sentia deprimido. Uma depressão que agitava
minha alma e me fazia querer cair num buraco negro. Eu tentei tanto me livrar
dos comprimidos, mas, no mesmo segundo em que eles foram colocados de
novo na minha frente, eu tinha cedido. É claro, foi no meio de intensa agonia
física, mas mesmo assim... eu esperava ser mais forte do que isso. E agora tive a
confirmação que não, eu não era. Então, eu ia tentar outra vez? Estremeci com
a memória de quão completamente horrível me senti. Eu estava disposto a repetir
a experiência de novo tão cedo?
Em algum lugar ao fundo eu ouvi telefone de Taylor tocar e ela atender,
andando para outra sala. Eu tentei não ouvir a conversa, e quando ela veio
pisando de volta para a sala, falou: "Kelly estará de volta na parte da manhã. Ela
está hospedada num hotel em Telluride esta noite."
"Bom", murmurei, inclinando a cabeça de volta no sofá e jogando meu braço
sobre os olhos para bloquear a luz acima de mim.
Depois de um minuto, Taylor se aproximou e sentou-se no sofá ao meu lado.
"Posso pelo menos dormir na mesma cama que você esta noite? Eu
sinto sua falta. Sinto falta dos seus braços em volta de mim", ela disse docemente,
tentando uma tática diferente.
Minha cabeça estava tão tonta, e tudo que eu queria era que Lily voltasse.
Mas ela não ia, e eu não podia ir atrás dela na condição em que estava. Eu tinha
prometido a mim mesmo que ficaria melhor. E tinha prometido a ela. Ela
não sabia, mas eu tinha lhe prometido também. Não com essas
palavras – mas com o mesmo sentido. E eu recusava-me a quebrar uma
promessa feita a Lily. Eu tinha que fazer as coisas direito com ela em primeiro
lugar, entretanto. "Taylor," eu comecei, "por que você namorou comigo, de
qualquer maneira? O que você viu em mim? Do que você gostou em mim?"
Taylor pareceu confusa por um momento. "Você sabe o que eu gosto em
você. Eu era tão difícil de ler?"
Ela correu um dedo pelo meu braço.
"Algo diferente do... físico, embora."
Taylor suspirou. "Será que tem que haver mais do que isso? Não é o
suficiente?"
Eu pensei nisso por um segundo. Imaginei que sim, já que por um tempo
beleza física foi tudo que me interessou. Mas, alguma vez tinha me
proporcionado mais do que satisfação momentânea?
"Não, na verdade não é. E, Taylor, você pode ter algo melhor que isso,
também, quer você perceba ou não", eu disse, colocando-me de pé
e usando um lado do sofá para me equilibrar. "Boa noite. Se Kelly chegar aqui
antes de eu me levantar, vou dizer adeus agora. E para constar, estamos
separados."
Eu a ouvi suspirar surpresa, mas ela não veio atrás de mim. Eu tranquei a
porta uma vez que eu subir as escadas e entrei no meu quarto. E com isso,
desmoronei na cama e adormeci, com o rosto triste de Lily me seguindo em meus
sonhos dispersos.
Capítulo nove

Lily

"O jardim está repleto de flores," minha mãe disse, pegando uma haste e
recortando sua parte inferior antes de coloca-la no vaso com as outras.
"Cheirou aquelas rosas? É assim que as rosas de um verdadeiro jardim
cheiram, e não como aquelas compradas em lojas que quase não têm qualquer
fragrância." Ela fez um som de clique, como se a ideia de rosas compradas em
lojas a ofendesse gravemente.
Eu olhei por cima do meu livro. Eu estava lendo o mesmo parágrafo de novo
e de novo, mas ainda não sabia o que ele dizia. "Elas são lindas", murmurei. "Eu
gosto daquelas brancas com amarelo no meio."
"Narcisos", ela disse suavemente antes que eu deixasse de ouvi-
la novamente.
Uma mulher. Havia uma mulher com Holden. Uma mulher bonita e
parcialmente vestida. Meu intestino cerrou e eu senti as lágrimas
ameaçarem cair. Você é tão estúpida, Lily.
É claro que eu era estúpida. Holden provavelmente pensou que eu parecia
alguém que nunca havia saído de casa, que raramente interagiu com alguém. E
ele pensou isso porque essa era a verdade. As mulheres que ele namorou
provavelmente eram sofisticadas e mundanas. Elas provavelmente falavam...
falavam sobre... eu soprei uma respiração. Bem, é claro que eu não tinha ideia do
que elas falavam. Esse era o ponto, na verdade. Desespero tomou conta de mim.
"...contente que você concorda!" Eu balancei minha cabeça quando percebi
que minha mãe estava falando novamente.
"Sinto muito, mamãe, você estava dizendo alguma coisa?"
Minha mãe revirou os olhos. "Sim, mas realmente não era nada importante.
Eu respondi por você. Recentemente eu tenho tido conversas mais interessantes
comigo mesma – muito estimulantes, na verdade."
Eu ofereci-lhe um pequeno sorriso. "Desculpe, eu me perdi na minha
própria cabeça."
"No que você tem pensando tão intensamente ultimamente?" Ela me deu
um olhar especulativo. Metade especulativo, de qualquer maneira. A outra
metade do seu rosto, a metade com profundas cicatrizes, não tinha muito
movimento.
Balançando a cabeça, eu disse: "Nada em particular." Fingi ler o livro
novamente. Mas na minha visão periférica eu podia ver ela me observando por
um momento, e então suspirando antes de voltar ao seu arranjo.
"Açafrão roxo, íris azul royal", disse ela, colocando as flores no vaso. Ela
trouxe uma ao nariz e inalou. "Mmm. Jacinto", disse ela. "Não cheira
maravilhoso?" Ela cortou a haste e o colocou num vaso, também. "Há tantos
vegetais no jardim aqui, também – alface e pepinos, beterraba, batata, abóbora."
Eu balancei a cabeça, distraída. Minha mente vagou novamente. Tinha
Holden mentido quando disse que havia algo que precisava fazer? Foi apenas algo
que ele disse para que eu não o incomodasse enquanto a mulher estivesse lá? E
então ele poderia andar nu com ela para a satisfação do seu corpo e coração?
Porque foi isso que ele tinha feito. Eu tinha dado uma olhadela, e seu corpo
definitivamente não era nada decepcionante. Antes fosse. E ainda, apesar do que
eu tinha visto, ele correu para mim, deixando-a lá. Eu não sabia o que
sentir... confusão, tristeza, esperança?
Eu balancei a cabeça, tentando me livrar de todas as perguntas e de todas
as dúvidas. Eu não deveria me importar tanto. Então, ele tinha me beijado. E daí?
Não era como se isso pudesse ir a qualquer lugar. Era inútil lamentar a perda de
algo que eu nunca poderia ser. Eu tinha achado... Eu achava que ele gostava de
mim do mesmo jeito que eu gostava dele. Apesar de não conhecê-lo muito bem, eu
tinha confiado nele. Meu estômago apertou com os restos do terrível e doloroso
ciúme que eu senti quando os vi pela janela. Ela em cima dele, as mãos dele em
seus quadris. Ele nu. Ela linda. E eu observando à distância... idiota.
Talvez a outra mulher não se importasse. E mesmo que ele realmente
quisesse passar um tempo aqui comigo, talvez fosse melhor que ele
tivesse alguém em casa. Não era como se ele fosse ficar no Colorado
permanentemente.
Olhei para a minha mãe e a vi fazendo uma careta, movendo seu rosto como
se o flexionando enquanto colocava as últimas flores no vaso.
Simpatia me venceu. Perdida em meu próprio
mundo eu a tinha ignorado recentemente. "Quando foi a última vez que você
aplicou qualquer creme que o médico lhe deu?"
Ela balançou a cabeça. "Não em um par de dias."
"Mãe, você precisa usar esse medicamento consistentemente. Funciona
melhor dessa maneira, e você sabe disso. Sua pele esta repuxando agora porque
está seca. Não é de admirar que você esteja desconfortável. Aqui, deixe-
me passar um pouco para você."
Ela concordou e foi para o outro quarto lavar as mãos e, em seguida, voltou
e sentou-se na cadeira ao lado da lareira, apoiando a cabeça nas costas e
posicionando seus cabelos loiros e compridos como cascata sobre o ombro. Eu
podia ver fios de cinza através dele agora, que brilhavam à luz do fogo como se
estivessem representando os enfeites que ela costumava colocar na nossa árvore
de Natal. Nós não usávamos mais enfeites de Natal agora. Eu me perguntava por
que não. Eu supunha ter saído do estilo, mas eu adorava. Balançando
a cabeça para me livrar da memória, peguei o pequeno tubo de creme e
fiquei atrás dela, utilizando uma pequena porção dele em meus dedos a
massageando as cicatrizes grossas que atravessavam o lado esquerdo de seu
rosto e seu pescoço. Ela suspirou. "Obrigada, querida, isso está melhor. O que eu
faria sem você?"
Eu sorri, mas meu coração apertou dolorosamente ao pensar nela sem mim.
Sozinha. Às vezes eu sonhava em ir a algum lugar onde havia muita gente, onde
eu pudesse me sentar e vê-los sem me esconder, onde talvez eles nem
falassem comigo. Eu sonhei com coisas que não ousava compartilhar com minha
própria mãe. Sonhei com coisas que eu sabia que nunca seriam reais.
"Eu gosto desse vestido, a propósito", disse minha mãe.
Eu sorri. Era o meu favorito, também. O de laço branco.
"Você provavelmente não deve usar vestidos na floresta, no entanto. Vai
estragá-los."
Dei de ombros. "Se eu não usá-los, eles vão eventualmente apenas
apodrecerem. E eles merecem viver um pouco, você não acha?", perguntei,
sorrindo. "O que será feito deles de outra forma? Serão doados para alguma
loja de roupas vintage, eventualmente?"
Minha mãe sorriu de volta, o lado direito de sua boca inclinando para cima
mais do que o esquerdo. "Eu suponho que eles merecem viver um
pouco, considerando que estiveram guardados num porão escuro por tanto
tempo", ela disse quando piscou um olho para mim, sorrindo mais largo. Por que
eu sinto que isso era uma boa descrição de mim? Mantida no escuro. Esquecida.
"Bem, bom, porque eu estarei dando-lhes uma abundância de novas
memórias." Eu continuei esfregando o creme em sua pele. Eu mesmo recebi meu
primeiro beijo em um deles.
Depois de um minuto, ela perguntou. "Onde você vai, Lily? Quando vai
para a floresta – onde você vai? Você fica longe por tanto
tempo, e todos os dias, às vezes."
"Não longe", respondi. Era uma mentira, eu sabia. "Eu gosto de lá." Era onde
eu me sentia viva. "Às vezes, eu apenas passeio e... perco a noção do tempo, eu
acho."
"Eu me preocupo com você. Não pode ser cem por cento seguro."
"Nada é, mãe." Suspirei. "Não há necessidade de se preocupar, no entanto.
Eu prometo."
"Você precisa ir tão longe? Não vai se perder ou algo assim?"
"Não, eu não vou me perder."
"E você não vê ninguém, não é?"
"Quem eu veria? É no meio do nada, na floresta."
"Eu não sei, caminhantes ou –"
"Não há trilhas nestas florestas, mãe."
Os olhos de minha mãe, claros e verdes, estavam abertos agora, e ela me
estudou de perto. Sua expressão era uma mistura de confusão e tristeza. Ela
parecia olhar muito para mim assim ultimamente. O tempo todo, na realidade.
Mas ela não fez mais perguntas, pelo que eu estava aliviada.
"Você poderia andar comigo, você sabe."
Ela apertou os lábios. "Eu ando no jardim. Isso é suficiente para mim."
Suspirei. Ela nunca muda, não se aventura. Então, onde é que isso me
deixa?
"Temos que pensar em ir embora, você sabe. Só queríamos estar aqui para o
verão, e já estamos no final de agosto. Vai ser seu aniversário em breve. O que
você acha sobre sair antes?"
Eu fiz uma careta. Apesar do que tinha acontecido com Holden, eu não
tinha certeza se estava pronta para sair ainda. Aqui eu tinha liberdade. "Podemos
pensar sobre isso? Ainda é tão bonito na floresta. E você ama o jardim, certo?
Você é feliz aqui, mamãe?"
Ela assentiu com a cabeça, e eu sorri para seu rosto amado, meus olhos se
movendo sobre as linhas familiares de suas feições. Mas meu coração de
repente se encheu com uma terrível e dolorosa tristeza. "Eu te amo", eu disse,
engolindo a estranha emoção.
Esse negócio todo com Holden tinha me esmagado mais do que deveria. Eu
tinha confiado em Holden, confiança essa que foi varrida para longe, e agora eu
estava vazia e confusa. Minhas emoções estavam todas desordenadas. Minha mãe
me deu um sorriso terno.
"Eu também te amo, minha querida Lily. Eu sempre, sempre amarei."
Enquanto eu continuava a alisar o creme sobre a metade devastada de seu
rosto, minha mente insistia em voltar a Holden. Você estará esperando por mim,
Lily? Sim. Eu tinha sido tola em prometer algo de forma tão imprudente. Então,
até onde eu voltaria para a floresta? Eu não chegaria perto de sua cabana. Eu
não faria isso. Eu ficaria longe. Eu não iria me sujeitar à dor que com certeza ele
traria. Eu ganhei o meu primeiro beijo, e teria que me agarrar a isso. Não
precisava significar nada mais.
Capítulo dez
Holden

Eu fui para a floresta todos os dias durante os próximos três dias, vagando
sem rumo e chamando por Lily. Em algumas vezes até tentei
propositadamente me perder, mas eu devo ter começado a perceber coisas sobre
esta floresta que eu não tinha a intenção de manter sob controle. "Como diabos
uma pessoa pode deixar de se perder numa floresta remota quando está
realmente tentando se perder?", murmurei. "Isso é a prova, Holden, que você é
um caso perdido. Completamente sem esperança."
Voltando à cabana, eu andava implacavelmente. Havia tanta coisa
boa na área aqui para estimulação. Eu poderia andar por dias e só
ocasionalmente cobrir o mesmo terreno. Era o paraíso para um andador
vigoroso. Foda. Lily.
Corri a mão pelo meu cabelo. Eu ia acabar com um trilha permanente na
varanda de tanto andar, e ficar careca prematuramente de
tanto puxar os cabelos.
Como no mundo as coisas tinham desandado tão rápido? Taylor, a cobra,
porra. O que eu já tinha visto nela?
Ela é boa de cama.
Tenho certeza que ela é. Ela adquiriu qualidades na prática.
As palavras passaram pela minha mente, fazendo com que minha cabeça
doesse. Eu trouxe uma mão para cima e massageei a parte de trás do meu
pescoço. Ryan, eu tinha que conversar com Ryan. Eu tive essa conversa com
Ryan naquele dia. Balancei minha cabeça. Não, não, eu me recusei a pensar
sobre aquele dia. Eu empurrei-o para fora da minha mente com força. Não.
Eu tinha que explicar as coisas para Lily. Eu tinha que deixá-la saber que o
que aconteceu não foi culpa minha. Eu tinha que saber se ela ia me dar outra
chance. Não importava que eu tivesse que começar tudo de novo com a
desintoxicação. Eu não poderia fazer isso até que saber que as
coisas estavam resolvidas com Lily. E agora, graças a Taylor, ou talvez não graças
a Taylor, eu tinha um novo suprimento. Mas, não, isso era bom, porque eu tinha
que ter certeza que Lily e eu estávamos bem. Eu tinha que saber se ela estaria
esperando por mim do outro lado, por assim dizer. Eu precisava me
certificar que ela ia me guiar através da escuridão. Então, se ela não estava na
floresta, onde estava? Ela disse que vivia nas proximidades, mas onde?
Voltando para dentro, puxei meu laptop para fora e sentei-me no sofá com
ele no meu colo. Eu usei o Google Earth para procurar a cabana, e
o único outro edifício por milhas e milhas era o hospital psiquiátrico
abandonado que Brandon tinha mencionado. Whittington Hospital for
the Mentally Insane (para os mentalmente insanos). Eu fiz uma pesquisa no
Google e percorri através de duas páginas de informações.

O Hospital Whittington for the Mentally Insane, mais tarde renomeado


simplesmente como Whittington, foi o primeiro construído em 1901, e
conta com quarenta acres de extensão de terra. O edifício de sessenta
mil metros quadrados foi desenhado por Chester R. Pendleton, que acreditava que
os doentes mentais devem ser cuidados e tratados com bondade e compaixão,
longe dos muitos fatores de stress do mundo exterior. Sua visão se traduziu
em interiores de luxo, incluindo capelas, auditórios, bibliotecas e salas privadas
para os pacientes, todos com tetos abobadados e janelas grandes e abundantes
para permitir luz solar e ventilação máximas. O extenso terreno e
jardins eram lindamente ornamentados por estátuas, fontes e bancos, e contava
ainda com excelentes trilhas para caminhada.

Eu rolei através das poucas imagens em preto e branco on-line, não


observando o ano exato em que foram feitas. Apesar do fato de que o interior era,
de fato, muito atraente – leve e arejado – o exterior do edifício parecia algo saído
de um filme de terror. Enorme e gótico, com altas torres ornamentadas, arcos
grandiosos, e janelas panorâmicas. Havia ainda gárgulas gritando ladeando a
parte superior das janelas. Eu tinha certeza que nada poderia deixar os doentes
mentais tão completamente à vontade quanto monstros do lado de fora de seus
quartos. Não pude deixar de tremer com o pensamento.

Whittington foi construído há mais de vinte milhas de distância da


comunidade mais próxima, para garantir que se houvesse a fuga de
algum paciente, não haveria nenhum risco para os habitantes de fora. Whittington
era um hospital de propriedade privada, cujos pacientes eram compostos
principalmente por membros de famílias ricas que desejavam manter
seus parentes em condições de privacidade. Nos últimos anos, porem, embora
ainda de propriedade privada, Whittington começou a aceitar doações, subvenções
e algum financiamento estatal para abrigar os menos afortunados.
Apesar das boas intenções de seu projeto e primórdios,
Whittington foi originalmente destinado a tratar trezentos pacientes, mas tinha
uma população de quase mil e quinhentos nos anos vinte. O número de
pessoal, no entanto, manteve-se estável. Isto significava que os pacientes eram
muitas vezes severamente negligenciados, ficando doentes e sujos por falta de
cuidados, e o pessoal nunca foi equipado para oferecer-lhes mais. Não
era incomum um paciente morrer e não ser descoberto por dias, até mesmo
semanas, às vezes.
Em 1915, o Dr. Jeremias Braun tornou-se o diretor de Whittington, e instituiu
tratamentos que têm sido associados com os horrores de instituições
psiquiátricas do passado: celas acolchoadas utilizadas como solitária, restrições
mecânicas - incluindo camisas de força, o excesso de medicamentos para aqueles
de difícil controle, a terapia de choque de insulina, psicocirurgia e a lobotomia. A
lobotomia icepick, que era essencialmente usar um picador de gelo no osso casca-
fina acima do olho, era uma cirurgia radicalmente invasiva no cérebro e usada
para tratar todos os tipos de delírios, tais como a enxaqueca, a melancolia, a
depressão profunda, a "histeria" (um termo usado para as mulheres que
apresentavam desejo sexual e emoções fortes). No infeliz paciente, os lobos
frontais seriam desligados do resto do cérebro por uma simples manobra rápida
lado-a-lado, deixando o indivíduo com efeitos irreversíveis.
Em uma entrevista de 1941, Braun descreveu os doentes mentais de
Whittington como dóceis e complacentes sob sua direção; no entanto, os visitantes
da instalação falavam de pacientes vagando sem rumo em transe, às vezes
vagamente olhando para os próprios pés, e batendo a cabeça repetidamente em
mesas, tudo sem intervenção do pessoal.
Eventualmente, as crenças de Braun sobre doenças mentais tornaram-se
ainda mais bizarras e perigosas. Quando ele observou que febres muito altas
podem causar alucinações, ele teorizou que infecções não somente causariam
doenças no corpo, mas na mente também. Em 1923, ele começou a extração de
dentes dos pacientes e, muitas vezes, de suas amígdalas também, embora os
raios X nem sempre confirmassem alguma infecção. Quando isso não
curava seus pacientes, ele começou a remoção de outras partes do corpo, tais
como estômago, porções do cólon, da vesícula biliar, baço, ovários, testículos e
úteros, embora ele não tivesse nenhum treinamento formal como cirurgião. Além
disso, estas cirurgias foram muitas vezes feitas sem o consentimento do paciente
ou da família, e, por vezes, apesar de seus protestos veementes.
Braun citava taxas de cura de mais de 90%, mas, na realidade, suas
cirurgias muitas vezes resultavam em morte. Isso, no entanto, não o impediu
de continuar seu "trabalho pioneiro". O que fez as práticas de Braun mais
perturbadoras, porem, foi que ele regularmente publicou suas descobertas em
muitas revistas de artigos psicológicos e médicas. E ninguém na comunidade
psicológica tomou qualquer atitude contraria às suas práticas. Braun faleceu em
1962.

Enojado com o que tinha acabado de ler, rolei para baixo o artigo um pouco
mais e descobri que, em 1988, todo o Whittington - exceto uma pequena ala - foi
fechado. O hospital inteiro tinha sido desligado apenas cinco anos atrás.
Sentei-me no sofá por um pouco mais de tempo, apenas olhando para a tela.
Engolindo o nó na minha garganta, eu fechei a tampa do meu laptop. Jesus, era
uma maldita casa de horrores. Ou tinha sido. Algo sobre o medo e a angústia
daqueles que tinham sido trancados... Eu não queria insistir nisso por muito
tempo, não queria considerar os detalhes.
Mas, de repente, eu tinha uma profunda curiosidade de vê-lo em pessoa –
de descobrir se as imagens on-line realmente faziam justiça à construção
assustadora. Mapeando o caminho pelo mapa do google, achei que Brandon tinha
razão: ficava há cerca de cinco milhas de distância, numa caminhada reta pela
floresta.
Estava só no meio da manhã. Reuni alguns suprimentos – comida, água
e um moletom - e parti na direção de Whittington. O terreno era profundamente
arborizado em sua maior parte, e não houve falésias para escalar ou rios para
cruzar – felizmente – então levou-me pouco mais de três horas para fazer a
caminhada através da floresta enevoada. Eu chamei o nome de Lily de forma
intermitente, mas não recebi resposta.
Eu saí das árvores e fiquei de pé diante do que eu
reconheci ser Whittington, o gigantesco e gótico edifício de pedra. Meu coração
começou a bater mais rapidamente. Parecia uma coisa viva, que respirava, e eu
tremi. Agora que eu estava bem na frente dele eu não podia deixar de imaginar
toda a dor e sofrimento insondáveis que tinham tido espaço atrás daquelas
paredes. Tudo porque ninguém tinha se disposto ou sido corajoso o suficiente
para ajudar. Essas pessoas tinham sido invisíveis para a sociedade,
consideradas descartáveis, e tudo por causa de algo pelo qual não eram
responsáveis. O mais fraco entre os fracos. E nesse momento eu pude senti
seus terrores e desesperanças até meus ossos, na minha própria medula.
E ainda, enquanto eu estava olhando para o edifício peculiar com a cabeça
ligeiramente inclinada, percebi que esse edifício também exalava uma
espécie estranha de magnífica beleza, bem como algumas tristezas ocultas que
ficavam logo abaixo da superfície da pedra, como se a própria construção quisesse
dizer ‘o que aconteceu aqui não foi minha culpa’.
Meu olhar viajou para cima até que se estabeleceu na janela mais alta, a
grandeza da estrutura roubando minha respiração por um instante.
Olhei à minha direita e recuei um pouco quando vi o que deve ter sido o
cemitério do hospício. Eu andei em direção a ele, tomando nota das lápides em
ruínas, algumas cobertas com anjos alçados em direção ao céu. Esta deve ser a
parte mais antiga do cemitério. Quanto mais eu andava, mais recente as pedras
pareciam, e as datas esculpidas nelas corroboravam minha observação. Ervas
daninhas prosperavam, quase cobrindo completamente alguns dos
marcadores menores. Eu gostaria de saber quem foi enterrado aqui –
pacientes que tinham morrido sem família? Caso contrário, não estariam eles em
lotes familiares ou mais perto das casas de seus entes queridos? Sentindo-
me totalmente assustado, eu me virei e voltei para onde tinha começado.
O maciço, portão de ferro forjado rangeu alto quando eu o abri e atravessei.
Do portão ate os degraus da frente do hospício era de cerca de um quarto de
milha. Meus pés trituraram o cascalho do que tinha sido originalmente uma longa
calçada, agora infestada por ervas daninhas, grama e flores silvestres que
cresciam em manchas aleatórias. O céu estava de um tom azul-acinzentado, e
cheio de ondulantes nuvens. Ao longe eu podia ver algumas nuvens de chuva se
aproximando, mas nada parecido com isso produziria uma grande tempestade -
esperançosamente. Eu ainda tinha que voltar.
Quando finalmente cheguei aos degraus da frente, subi-os lentamente
enquanto olhava ao redor. Tudo parecia muito. Tentei virar a maçaneta da
maciça porta dupla de madeira, mas estava trancada. Olhando em volta, vi uma
janela quebrada no primeiro andar, e foi fácil o suficiente me levantar até o
parapeito da janela e mergulhar para o lado de dentro. Quando eu fiquei de pé
e já tinha escovado meu jeans, percebi estar num corredor sujo. Era cheio de
detritos, a pintura estava descascando das paredes em grandes tiras, e uma
cadeira de rodas enferrujada jazia derrubada na minha frente. Mudei-me para o
lado e caminhei pelo corredor, esticando o pescoço para ver dentro dos quartos
antes de passar na frente das portas.
Em um havia uma velha maca contra a parede, e em outro havia uma
harpa em pé, a maior parte de suas cordas quebradas e enrolando
descontroladamente em todas as direções, como o cabelo de alguma megera
selvagem. O local era assustador como a merda. Eu esperava que Freddy Krueger
virasse a esquina e caminhassem em minha direção a qualquer momento.
"Lily?" Eu gritei bem alto, não realmente acreditando que ela estaria dentro
deste lugar deserto, mas encontrando um estranho conforto em ouvir seu nome
ecoar pelos corredores vazios. Eu andei por corredor após corredor chamando o
nome dela.
Quando passei por uma das grandes janelas, porem, eu percebi
um movimento. Ao longe, na borda da floresta, Lily estava de joelhos fazendo algo
no chão à sua frente. Lily! Meu coração acelerou, e eu me virei e andei o mais
rapidamente possível através de todos os detritos no chão em direção à porta da
frente. Eu fui capaz de abri-la pelo lado de dentro, e desci as escadas de dois em
dois degraus, correndo pela longa entrada de automóveis e para fora do portão da
frente, sempre em direção a Lily.
"Lily," eu disse sem fôlego quando finalmente parei atrás dela.
Ela se empurrou um pouco e virou-se, lágrimas escorrendo pelo seu rosto. "Ei, o
que há de errado?" Foi quando eu vi uma coruja no chão na frente dela, e caí de
joelhos ao seu lado. "Oh merda, ela está bem?" Lily balançou a cabeça.
"Não, ela está... morta." Ela soltou um suspiro trêmulo e usou as duas mãos
para limpar as lágrimas antes de balançar a cabeça. "Eu acabei de descobri-
la aqui deitada no chão. Ela deve ter somente... morrido de velhice. Não parece ter
nada de errado com ela." Ela fungou.
"Eu sinto muito."
Ela assentiu com a cabeça e usou uma camisola que estava amarrada em
volta de sua cintura para recolher a ave morta. "Eu não acho que as
corujas tenham expectativa de vida muito longa. Eu tenho que enterrá-la."
"Eu vou ajudar. Você tem uma pá?"
Ela balançou a cabeça. "Não, eu vou ter que usar um pedaço de pau ou algo
assim. O terreno é muito macio em certas partes da floresta. Ela deve ficar bem."
Eu andei um pouco em direção da floresta com ela, e enquanto ela segurava a
coruja eu cavei uma pequena sepultura na terra fofa do chão da floresta. Nós não
falamos, o que me fez ciente de todos os sons ao meu redor: os pássaros cantando
nas árvores, as folhagens sibilando na brisa, e as fungadas ocasionais de Lily.
Quando eu acabei, ela baixou a coruja para o chão, com a
camisola ainda enrolada em torno dela, que foi como eu a cobri enquanto outra
lágrima rolava pelo rosto de Lily.
"Você deve pensar que eu sou tão boba por estar chorando por uma coruja",
disse ela. "Mas ela costumava vir sentar-se na cerca ali, todos os dias, e eu meio
que me acostumei com ela." Ela deu de ombros. "Sempre que eu passava e a via,
pensava nela como boa sorte, uma espécie de sentinela sábia que pode lhe
mostrar o caminho se você estiver perdido e com medo." Ela inclinou a
cabeça parecendo triste, mas pensativa.
"Eu não acho que você seja tola." Acho que você é a garota mais bonita e
compassiva que eu já conheci.
Ela concordou, finalmente olhando para mim.
"Uma vez, quando eu era mais jovem, eu encontrei uma coruja bebê na
borda da nossa propriedade. Eu estava irritada com a minha mãe e apenas corri
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para fora, e então me deitei no chão sob uma árvore de abeto . Eu estava
chorando, e, de repente, ouvi este pequeno som, como se fosse algo muito
pequeno batendo no chão ao meu lado. Eu olhei ao redor e lá estava este pássaro
bebê indefeso que tinha acabado de cair de seu ninho, felizmente num leito de
agulhas de pinheiro e folhas. Ele era tão confuso e tão pequeno. Eu o peguei e
tentei ver o ninho de onde ele tinha caído, mas devia estar tão alto
e tão escondido que eu não pude localizá-lo. Eu não tinha como subir na árvore
de abeto, então o levei para casa comigo."
"Casa..." murmurei. "É por perto?"
Ela sorriu. "Não é longe." Começamos a caminhar. "De qualquer forma, eu
não achava que ele viveria. Mas ele fez. Ele viveu e ficou forte, e, eventualmente,
eu liberei-o de volta para a floresta. Eu acho que imaginei que esta coruja poderia
ser a mesma."
Eu sorri. "Talvez fosse. Talvez ela tenha reconhecido você. Por que você
estava com raiva da sua mãe?"
"Hmm?"
"Você disse que correu para fora porque estava com raiva da sua mãe."
"Oh." Ela franziu as sobrancelhas. "Eu queria ir a uma festa, e ela não me
deixou. Só uma tola festa..." Ela sorriu, olhando para mim de lado, seu sorriso
desaparecendo. Ela olhou para seus pés quando passou por cima de um galho
caído, mordendo o lábio e obviamente considerando alguma coisa. Finalmente, ela
perguntou: "O que você está fazendo aqui, Holden?"
Suspirei. "Eu estava tentando encontrá-la."
Ela parou, olhando diretamente para mim. "Por quê?"
"Porque eu queria ter certeza que você entendeu o que realmente
aconteceu – ou não aconteceu - na outra noite... Que você estava bem..."
"Oh", disse ela, mordendo o lábio. "Entendo."
"Lily," eu disse, agarrando suas duas mãos na minha. "Sinto muito sobre
isso. Juro que não tinha ideia que Taylor estava vindo me visitar. Se eu soubesse,
teria dito a ela para não vir. Eu me livrei dela. Ela já foi."
"Por quê? Não por minha causa, espero. Porque –"
"Não, não foi por sua causa. Não inteiramente. Eu teria dito a ela para não
vir porque não estou interessado em passar tempo com ela. Mas, eu quero passar
tempo com você. Eu quis dizer o que eu disse."
Lily lambeu os lábios e baixou os olhos ao chão, como se estivesse
pensando. "Você estava nu, e ela estava..."
Eu fiz uma careta. "Eu sei. Deus, eu sinto muito. Não era o que parecia. Ela
me surpreendeu, e eu não estava no meu melhor momento." Jesus, isso era o
eufemismo do século. "Eu não sabia que ela estava chegando. Por favor, confie em
mim. Por favor, me dê uma segunda chance. Eu passei os últimos três dias
vagando pela floresta procurando por você. Eu vou fazer uma caminhada de três
horas a pé ate aqui todos os dias se for preciso. Ou para sua casa, se você deixar.
Eu virei para você, então você não terá que andar todo o caminho ate mim,
especialmente agora que eu sei o quão longo ele é. Eu farei qualquer coisa que
você me pedir para fazer. Só, por favor, não me diga que você não quer mais me
ver.” Ela soltou um grande suspiro, puxando suas mãos das minhas.
“Isso não é uma boa ideia, Holden. Eu pensei–"
"Isso não pode ser verdade. Não pode ser errado querer passar algum tempo
juntos. Eu sei que há coisas com as quais eu tenho que... lidar, e eu sei que você
não confia em mim o suficiente para compartilhar sua vida comigo, ainda. E
eu também sei que toda a coisa com Taylor dificilmente ajudou nisso tudo." Eu
esfreguei a parte de trás do meu pescoço. "Mas eu estou esperando que
você me queira. Estou esperando que você vá me deixar merecê-la. Por favor, não
me diga para ir embora." Eu coloquei minhas mãos nos bolsos, engolindo em seco
e sentindo-me intensamente vulnerável na sua frente. Por que ela iria te querer?
Por que ela iria dar-lhe uma segunda chance? Por quê?
"Oh, Holden..." Ela olhou para longe por um minuto e eu prendi a
respiração. Depois de um minuto tenso, porem, ela suspirou e deu o menor aceno
de cabeça, praticamente imperceptível. Meu coração disparou.
"Isso é um sim?"
Seus lábios se curvaram para cima. "Um meio sim".
"O que devo fazer para ganhar um sim total?" Inclinei-me ligeiramente para
olhar em seus olhos, seus cílios escuros ventilando suas bochechas.
Seus lábios se curvaram um pouco mais, e seus olhos encontraram os
meus. "Eu vou deixar você saber quando eu pensar em alguma coisa." Eu não
podia deixar de sorrir, não podia deixar de me maravilhar por ela ter me dado
outra chance. A metade de uma chance. Metade de uma. Eu tomaria o que ela me
daria.
"Como me encontrou aqui, de qualquer maneira?" ela perguntou depois de
um momento.
"Sinceramente, eu não sabia que você estaria aqui. Eu só esperava. Eu vim
para conferir o Whittington."
Lily olhou por cima do ombro para o hospital abandonado. Voltando-se para
mim, ela disse: "Arrepiante, não é? Coisas terríveis aconteceram lá."
"Eu sei. Eu li sobre isso on-line."
Ela assentiu com a cabeça, franzindo a testa ligeiramente.
"Ele estava aberto até recentemente, mas ao final de várias décadas de falta de
doações privadas e financiamento do Estado transformou-se no que é agora." Ela
acenou com a mão em sua direção. "Numa confusão se desintegrando. É
assustador." Ela ficou pensativa por um momento. "Algo bom deveria ser
feito lá dentro, você não acha? Algo para provar que os seres humanos se
preocupavam com os outros." Ela olhou para trás rapidamente novamente. "Se os
locais seguram a dor, talvez o amor e bondade a liberte."
Ela parecia pensativa enquanto mordia o lábio.
Meus olhos tomaram conta de sua expressão perturbada. Ela é tão
compassiva. "Esse é um pensamento agradável. E eu acho que você pode estar
certa. O que você faria com ele?"
Um fantasma de um sorriso atravessou seu rosto. "Eu ajudaria aqueles que
não podem ajudar a si mesmos."
"Como quem?"
Ela encolheu os ombros. "Há sempre alguém que a sociedade escolhe não
ver. Alguém que é invisível e não por culpa própria."
Eu balancei a cabeça. "A saúde mental é muito diferente agora do que era
naquela época. Muito mais compreendida."
"Sim. Na maior parte, eu acho. Você quer andar comigo?"
À medida que começamos a andar, ela disse: "Houve duas fugas diferentes
de pacientes em Whittington. Uma aconteceu durante o inverno mais frio já
registrado. Uma jovem, com dezesseis anos na época, saiu por uma
janela e de alguma forma conseguiu atravessar o portão e ir para a floresta.
Determinou-se que ela tinha sido altamente medicada e simplesmente se afastou.
Um grupo de busca foi enviado, mas ela não foi encontrada. Assumiu-se que ela
morreu em algum lugar deste", ela acenou seu braço ao redor, "vasto deserto.
Especialistas disseram que não havia nenhuma maneira que ela poderia ter
sobrevivido às temperaturas."
"Isso é terrível", murmurei. "Apenas dezesseis anos? Jesus. Eu não sabia
que havia adolescentes lá, também."
"Oh, sim. Houve crianças e os adolescentes desde que abriu." Nós
dois ficamos em silêncio por um momento, eu ponderando o terror que uma
criança deve ter sentido em um lugar como aquele. "Às vezes me pergunto se
eu poderia estar andando em cima dos seus restos", disse ela, me lançando um
olhar. "Isso é muito macabro?"
Eu lhe dirigi um pequeno sorriso. "Sim. Mas eu acho que é realmente
possível. Poderia ser bom para a família dela, de qualquer maneira, para poder
enterrá-la."
"Isso foi o que eu pensei, também."
Eu fiz uma careta. "Que outra fuga teve lá?"
"Foi seis anos atrás, em uma noite de julho, quando houve uma tempestade
de verão que causou uma falha de energia no Whittington. Todas as luzes se
apagaram por várias horas. Durante esse tempo muitos dos pacientes
escaparam para essas florestas. Eles andaram até de manhã, quando um grupo
de busca foi enviado, e todos, menos um, foram arredondados."
"Quem não foi encontrado?" Eu perguntei.
Lily ficou em silêncio por um momento. "Um homem de dezenove anos de
idade, filho de um executivo rico de Connecticut. Os grupos de busca
subsequentes não o encontraram também. Ele sobreviveu aqui fora", ela acenou
com a mão de novo, "por mais de cinco meses, antes de se esgueirar de volta
para o Whittington, provavelmente pretendendo roubar comida. Quando isso
aconteceu, era um dia de visita. Enquanto as famílias dos pacientes estavam
dentro o paciente escapou e subiu no porta-malas de um carro. A família, sem
saber, transportou-o ate sua propriedade, onde sua filha adolescente descobriu-o
mais tarde se escondendo nos estábulos."
"Como você sabe disso?" Eu perguntei, intrigado.
"Eu achei as histórias em recortes de jornais velhos", disse ela, olhando
para frente.
"Onde? Lá dentro?"
Ela olhou para mim e balançou a cabeça. Ela tinha sido curiosa, também.
Eu me perguntei se deveria dizer a ela que não era seguro vagar por edifícios
abandonados, mas eu não sabia como formular uma reprimenda sem
que soasse condescendente. Especialmente quando eu tinha feito o mesmo.
"O que aconteceu quando a garota descobriu que o paciente que escapou
estava em seus estábulos?"
"Eles se apaixonaram", ela disse simplesmente.
"O paciente e a filha se apaixonaram? Wow. Como isso aconteceu?"
Lily deu de ombros. "Ele era bonito e amável. Muito, muito perturbado,
mas também muito, muito gentil. Ela o abrigou, alimentou, vestiu e manteve-o
aquecido e, eventualmente, deu-lhe seu coração." Olhei para ela. A expressão em
seu rosto era melancólica. Ela olhou para mim novamente e continuou. "Ou assim
eu imagino", ela disse quando me deu um leve sorriso. "Talvez eu esteja apenas
romantizando, mas é assim que eu imagino o que aconteceu." Ela encolheu os
ombros.
"O que aconteceu depois disso?" Perguntei.
"Ele acabou de volta ao Whittington, eventualmente." Ela deu de ombros
novamente. "Essas coisas nunca acabam bem, eu suponho."
"Não?" Perguntei. "Talvez ele tenha ficado melhor. Talvez ele tenha
encontrado o tratamento certo, e se reencontrado com ela depois. Talvez
eles tenham acabado juntos, depois de tudo."
Ela inclinou a cabeça. "E é por isso, Holden Scott, que eu acredito que você
é um romântico, também."
Eu ri. "Agora, isso é algo do qual eu nunca fui acusado antes."
Ela sorriu. "Não?"
Eu balancei a cabeça, pegando sua mão na minha. Ela olhou para nossas
mãos unidas e sorriu suavemente. "Eu senti sua falta", eu disse.
Ela olhou para mim. "Por três dias?"
"Sim. Será que você não sentiu minha falta?"
Ela fez uma pausa antes de responder. "Sim."
"Você acha que foi ele quem recolheu as pontas de flechas?" Eu perguntei
depois de um momento, de repente recordando-as.
"Eu me perguntava isso, também", disse ela. "Eu gosto de pensar que
sim. Gosto de pensar que ele encontrou maneiras de manter sua mente ocupada.
Talvez ele até tenha gostado daqui de fora." Ela sorriu. "Eu gosto."
"Eu acho que ele era solitário, apesar de tudo. Talvez essa seja a razão pela
qual ele voltou. Talvez não fosse pela comida. Afinal, a floresta pode
fornecer sustento para um homem se ele sabe o que está fazendo. Talvez
ele tenha decidido que era melhor estar preso do que ficar sozinho".
"Qual você prefere?" ela perguntou.
"Entre ficar preso e estar solitário? É difícil dizer. Eu nunca fui preso antes.
Mas, com base no que eu li on-line, eu provavelmente escolheria a solidão.
Parecia que ficar preso era o menor dos tormentos que os pacientes
experimentaram em Whittington, pelo menos nos dias mais antigos. E talvez ele
fosse solitário enquanto estava preso. Eu acho que aqui na floresta pelo menos ele
teve sua liberdade."
Lily ficou em silêncio por um momento. "Sim. Liberdade." Ela fez uma pausa.
"Eu suponho que nós nunca saberemos o que ele estava pensando exatamente."
"Não, acho que não."
Lily olhou para o céu. "Parece que vai chover. Eu odeio
pensar em você tendo que voltar todo o caminho no mau tempo."
"Eu cheguei ate aqui. Acho que posso fazer o caminho de volta."
Ela ergueu as sobrancelhas, parecendo duvidosa. "Que tal esperar um
pouco, Escoteiro?"
Ela puxou minha mão e nós nos abaixamos sob alguns galhos baixos de
árvores.
A chuva só caiu por um momento, e o dossel espesso de ramos
fornecia completo abrigo quando nos sentamos em um remendo seco do
chão, nos escorando no tronco de uma árvore. O ar estava frio, mas eu estava
usando meu moletom. Tirei-o e envolvi-o em torno dos ombros de Lily, colocando
um braço em torno dela e puxando-a para perto. Ela deitou a cabeça no meu
ombro e nós nos sentamos lá por alguns minutos, apenas ouvindo a precipitação
sobre as folhas.
Eu mal sabia qualquer coisa sobre essa garota. Eu só sabia que quando eu
estava com ela, o mundo inteiro parecia diferente. Era como se esta floresta fosse
nossa própria terra secreta, e aqui, poderíamos ser qualquer coisa
que quiséssemos ser. Qualquer coisa. "Parece que o mundo é diferente aqui", eu
disse, expressando meu pensamento.
Ela cantarolou. "Eu sei." Ela inclinou a cabeça e olhou para mim. "Você
está aqui sozinho, Holden? Sozinho naquela casa, eu quero dizer."
"Eu sinto que tenho estado sozinho por um tempo muito longo, Lily. Não é
só o local... isso é somente... eu, eu acho." Eu coloquei meus lábios em sua testa.
"Eu não me sinto só quando estou com você, no entanto," murmurei, escovando
meus lábios sobre sua pele fria e cobrindo-a levemente de beijos, como se ela
fosse feita de luar.
Ela levantou o rosto para que seus lábios estivessem quase tocando os
meus. "Eu não me sinto só quando estou com você, também," ela sussurrou,
levantando a boca e pressionando seus lábios contra os meus. Desejo arqueou o
centro do meu peito, e eu me virei para que pudesse trazer as minhas mãos
para seu rosto e reivindicar sua boca completamente. Nossas línguas se
encontraram e se emaranharam e Lily gemeu, subindo em mim de modo a
ficar montada em meu colo enquanto nos beijávamos. "Eu senti tanto a sua falta",
disse ela entre beijos. "Tanta coisa me assustou." O moletom caiu de seus ombros,
expondo-nos à névoa, mas eu não me importava. Meu próprio corpo estava tão
superaquecido com ela sentada no meu colo que eu pensei que poderia de
repente ter uma autocombustão espontânea.
"Sinto muito", eu disse. Porque era minha culpa passarmos os últimos
dias separados. Minha vida estúpida que me encontrou mesmo até
aqui, e que tinha ficado entre Lily e eu. Senti-me envergonhado. E eu tinha muito
para sentir vergonha. Lily beijou o canto da minha boca, seus lábios
deslizando pela minha mandíbula e em torno do meu ouvido. Um gemido abafado
escapou dos meus lábios enquanto sua língua traçava minha orelha.
"Está tudo bem?" ela sussurrou, sua respiração quente contra a minha
pele.
"Deus, sim," eu ofegava, toda a floresta desaparecendo em torno de
mim. Era só ela. Só seu fresco cheiro, a sensação de seu peso em cima de mim,
suas mãos, sua pele, seus lábios. Apenas ela.
A chuva aumentou, o som dela batendo mais firmemente nas folhas acima,
o ar ficando mais úmido ao nosso redor, e uma ou duas gotas frias de chuva
encontraram seu caminho entre os ramos para cair sobre nossa pele. Meu
coração batia freneticamente, minha excitação crescendo a cada segundo. Eu
queria tanto Lily que machucava.
"Mostre-me o que fazer", disse ela. "Mostre-me do que você gosta."
"Não há nada que você possa fazer que eu não goste. Eu prometo. Oh,
Deus", eu gemi enquanto ela mordia levemente a minha orelha. Minha ereção
latejava.
Ela beijou ao longo da minha mandíbula novamente. "Você me faz querer
coisas que eu não deveria querer", disse ela.
"Por que você não as quer?"
"Porque", ela disse, trazendo a boca para a minha e me beijando novamente,
"isto é apenas temporário. Tem que ser, Holden. Eventualmente você vai voltar
para onde você pertence."
Eu mal conseguia lembrar-me onde eu pertencia. Ultimamente parecia que
eu não pertencia a lugar nenhum.
"Podemos pensar em algo. Nós podemos ficar juntos. Cabe a nós. Há sempre
uma maneira..."
Ela sorriu contra os meus lábios. "Apenas me beije." Eu o fiz, minha mente
esvaziando novamente quando centrei-me nas sensações que ela estava
criando em meu corpo. Ela inclinou a cabeça para trás enquanto eu beijava a pele
sedosa de sua garganta, correndo minha língua para prová-la ali. Eu queria
saboreá-la em todos os lugares, conhecer o seu gosto e o de mais ninguém.
"Lily..." Estendi a mão para seu vestido. Abri alguns botões e a parte
superior deslizou de seus ombros, revelando a cremosa elevação de seus seios
subindo e descendo acima de seu sutiã branco. Eu cheguei por trás dela e soltei-
o, seus seios derramando livres, os profundos mamilos cor-de-rosa já apertados e
duros. Respirei trêmulo e me inclinei para frente, beijando o espaço
entre seus seios, respirando o cheiro dela, quente e concentrado no local.
Toda Lily. O efeito que ela tinha sobre mim era novo e familiar ao mesmo tempo –
como se realmente tivéssemos nos conhecido em outra vida – e minha alma se
regozijou na mera sugestão de uma memória, mesmo que minha mente
e carne estivessem conhecendo-a agora. Senti-me tonto com a
mistura explosiva de emoção profunda e poderosa luxúria.
Lily suspirou e levou as mãos à minha cabeça quando minha boca
fechou sobre um de seus mamilos doces. Eu rolei minha língua ao redor puxando-
o suavemente e, em seguida, mudei-me para o outro. Lily moía contra
minha ereção, e eu assobiei uma respiração, parando momentaneamente
para recuperar um pouco de controle. "Oh, não pare", ela engasgou, empurrando
seu peito úmido em minha boca. Eu sorri contra sua pele, tomando o mamilo em
minha boca novamente e sugando-o levemente.
Silenciosos sons de prazer subiram de sua garganta, e ela deslizou para
baixo, trazendo a boca de volta para a minha. "Eu quero você", ela sussurrou.
"Eu quero você, também. Muito. Mas não aqui. Não no chão. Eu tenho que...
Eu tenho que dar-lhe algo melhor do que isso."
"Aqui está bom", disse ela, e eu não pude deixar de sorrir com a nota
desesperada em sua voz.
"Não, não está bom. Mas eu não vou deixá-la insatisfeita. Posso tocar em
você?"
Seus olhos encontraram os meus e se ampliaram muito ligeiramente.
Eles estavam um tom mais escuro de violeta, vidrados de paixão.
"Sim", disse ela. Eu trouxe a minha boca de volta para a dela, chegando por
baixo do vestido e deixando minha mão trilhar até sua coxa. Ela congelou.
"Confie em mim", eu disse. Seu corpo relaxou, e ela começou a me beijar
novamente.
Eu usei o meu dedo para traçar o cós de sua calcinha, e ela estremeceu
em cima de mim. Alcançando dentro, encontrei a pequena protuberância inchada
escondida no topo de suas dobras e circulei meu dedo em torno dela.
Ela empurrou-se na minha mão e gemeu. Eu pensei
que muito provavelmente acabaria gozando em minhas calças, tamanha era
a emoção de vê-la tão excitada. Eu separei minhas próprias pernas debaixo dela,
então tinha mais espaço para mover minha mão, e deslizei um dedo em sua
entrada molhada. "Oh, Deus", murmurei. "Você está tão molhada, tão doce." Ela
trouxe seu rosto para o lado do meu pescoço e eu senti sua boca abrir em um
suspiro quando a penetrei apenas um pouco mais profundamente com meu dedo,
usando meu polegar para acariciar e brincar com seu pico sensível. Sua quente
respiração contra meu pescoço me fez perder a cabeça com o desejo. Mas isso era
sobre ela. Sobre o prazer dela.
Assim que pensei nisso, o corpo de Lily ficou tenso, e ela soltou um pequeno
grito abafado contra o meu pescoço quando estremeceu e gozou na minha mão.
Depois de um momento, escorreguei meu dedo dela e trouxe minha mão para seu
pescoço, para que eu pudesse guiar sua boca suavemente para a minha. Antes de
nossos lábios se encontrarem eu vislumbrei o rosto dela, embriagado com prazer e
ostentando um pequeno sorriso em seus lábios. Beijei-a devagar, tentando
desesperadamente conter a minha própria necessidade não satisfeita.
Lily deixou escapar um pequeno suspiro, descansando contra mim por
alguns momentos. Respiramos juntos enquanto o aguaceiro diminuía para um
punhado suave nas folhas acima. "A chuva está parando", ela murmurou
suavemente.
"Isso significa que nós temos que voltar?" Eu perguntei.
Ela sorriu e colocou seus lábios de volta nos meus, balançando a cabeça.
"Volte comigo. Fica comigo esta noite."
"Eu não posso. Minha mãe..."
"Você é uma mulher adulta, Lily. Certamente ela não pode esperar que você
não viva a sua vida."
Ela suspirou, afastando-se de mim e fugindo do meu colo. Eu ainda estava
meio duro, então ajustei-me ligeiramente. "Isso é exatamente o que ela espera.
Para ela, eu nunca vou crescer. É... complicado."
"Então me explique."
Ela se levantou, e eu também. "Eu vou encontrar uma maneira de ir à sua
cabana nos próximos dias, ok?" Ela sorriu. "E enquanto isso, ainda temos a
floresta."
"Eu vou levar tudo o que puder obter, Lírio da Noite". Eu sorri e beijei-a
novamente.
Nós ainda temos a floresta.
Capítulo onze

Holden

Os próximos dias estavam entre o mais felizes que eu já tinha vivido, apesar
de sentir-me enjoado e acorrentado aos comprimidos que ainda não tinha
encontrado a coragem de parar de tomar. Essa tarefa pesava sobre mim
como uma sombra escura na parte de trás da minha mente. Eu sabia que
precisava parar, e logo – eu queria que Lily conhecesse tudo de mim, não o
escudo do homem que eu havia me tornado.
Além disso, as dores de cabeça estavam piorando. Eu estava doente de uma
forma que os comprimidos nunca tinham me deixado antes. Eu precisava parar de
toma-los e recuperar minha saúde antes que pudesse sequer pensar em dar
alguma coisa a outra pessoa. Mas, enquanto isso, eu me alegrava com o mundo
maravilhoso que a aparentemente sonhadora Lily criou. Nós caminhamos
através da floresta de mãos dadas enquanto ela apontava todas as coisas
que eu teria perdido se estivesse sozinho: os tordos de madeira e borboletas, os
19
arbustos de aquilégias , agora marrons no final do verão.
Bebemos da fria e doce água corrente do córrego que fluía das montanhas e
alimentamos um ao outro com morangos selvagens.
Nós nos beijamos por toda parte, de encontro às árvores e rochas, em
campos abertos e na beira do córrego, deitados ao sol com a água
borbulhando e espirrando ao nosso lado. Ela me deixou num frenesi de
luxúria tão poderoso que eu mal podia recuperar o fôlego por alguns dias. Eu
a queria com cada célula do meu corpo. E a maneira como ela movia seus quadris
contra os meus, a forma como seus olhos vidravam quando eu a tocava... eu sabia
que ela me queria também. Eu nunca tinha conhecido esse tipo
de necessidade física, ainda mais forte do que o desejo que sentia pelos
comprimidos. Fez-me louco, mas trouxe-me esperança. A paz entorpecente que os
comprimidos trouxeram era uma ilusão. Lily, Lily era real. E, com ela, eu não
tinha necessidade de ser qualquer um dos títulos que havia ganhado. Eu não
precisava ser meus erros ou minha dor. Eu era só... eu, e pude finalmente
começar a ficar bem com isso.
Mas, eu também sabia muito bem que Lily era inocente –
seus toques experimentais, suas reações de surpresa, o ousado
deleite que ela demonstrou cada vez que eu a toquei de forma a lhe
proporcionar prazer, me disse tudo o que eu precisava saber.
Talvez uma vez que eu me livrasse dos comprimidos, poderíamos ficar nesta
floresta até o fim dos tempos. Uma vida simples de repente parecia um sonho
desejoso, incrível. Passar os dias caminhando pelo ar fresco da floresta, falando
sobre tudo e nada, desfrutar de noites na frente de um fogo acolhedor e depois de
fazer amor até tarde da noite, celebrando a vida na mais antiga das maneiras. Eu
queria mergulhar nesse tipo de profunda e bela simplicidade, e de repente
ansiava por isso para a minha alma. Soava como... liberdade.
Eu andei para encontrá-la na borda da floresta alguns dias depois que a
toquei pela primeira vez sob os galhos de uma árvore na névoa da
chuva. Era uma noite iluminada pela lua, e quando eu entrei na penumbra da
floresta ela virou-se lentamente em direção ao som dos meus passos. Ela estava
usando um vestido roxo pálido e suas botas marrons. Seus lábios inclinaram-
se num belo sorriso, e o sussurro de uma brisa balançou uma mecha de seu
cabelo.
De repente, um feixe de luz pálida se deslocou através das
árvores iluminando seu corpo, parecendo fazê-la brilhar, como se
estivesse vacilando entre este mundo e o outro. E meu coração brilhou
também em sua beleza imponente. Ela era tão deslumbrante que doía. Um sonho.
Uma visão. Não, não, real. Muito real. O momento não foi um devaneio, mas uma
súbita realidade afiada. Porque a emoção que eu senti não podia ser negada: Eu
estava apaixonado por ela. Profundamente, loucamente e docemente apaixonado.
E eu não podia dizer a ela, entretanto. Não era justo – eu era apenas
metade de um homem agora. Então eu guardei meus sentimentos para mim
mesmo, por agora. E soube com certeza que tinha que ficar limpo. Eu não
poderia mais adiar. Esta noite seria a nossa última noite juntos até que
eu pudesse vir a ela como ela merecia.
Eu andei até ela, meu corpo de repente tremendo e minha
cabeça recomeçando a doer, como parecia ter feito toda a semana.
"Oi", ela respirou, envolvendo os braços em volta de mim e trazendo
imediatamente seus lábios nos meus.
Beijei-a e depois ri suavemente quando ela afastou a cabeça.
"O quê?" ela perguntou.
"Eu gosto que você não possa manter suas mãos longe de mim."
"Como eu poderia? Como resistir a um Escoteiro com altas honras, e que
beija como você? Eu sou apenas humana, afinal de contas."
"Verdade. Você era um caso perdido no minuto em que eu
entrei nessa floresta."
"Hmm," ela cantarolava enquanto limpava uma gota de umidade do meu
lábio inferior. "Eu sei."
Inclinei a cabeça para o lado. "Você pode vir para a cabana esta noite? Você
não esteve dentro dela ainda."
Ela mordeu o lábio, mas depois acenou com a cabeça. Peguei a mão dela
e conduzi-a por toda a aberta área gramada ate as escadas da cabana. Ela
parecia um pouco nervosa, mas eu apertei a mão dela e puxei-a junto comigo.
Quando entramos pela porta ela hesitou e olhou em volta. Quando ela
finalmente se mudou mais para dentro, colocou a mão na parte de trás do sofá,
olhando para o teto alto e com vigas de madeiras. Eu segui seu olhar –
lembrando-me dos alto-falantes nas paredes que eu tinha notado na primeira
semana quando cheguei – e caminhei até a prateleira, onde liguei o iPod
encaixado lá. Um cover de Elvis de "Can not Help Falling in Love" encheu a sala, e
Lily se virou para mim sorrindo. Eu andei de volta para ela,
de repente me sentindo tímido. Limpei as palmas das mãos no meu jeans
e segurei-a em meus braços, balançando ao som da música. "Eu não sou
um dançarino muito bom", admiti.
"Isso parece bom", disse ela, pressionando-se mais perto de mim. "Eu nunca
tinha dançado antes."
Recuei um pouco. "Nunca?"
Ela balançou a cabeça. "Veja, você não devia ter me dito que não é um bom
dançarino. Eu nunca teria descoberto." Ela sorriu e meu coração gaguejou.
"Até você dançar com outra pessoa."
Por um momento ela simplesmente olhou para mim. "Eu não quero dançar
com mais ninguém."
Engoli em seco. "Eu também não, Lily." Puxei-a para mais perto enquanto a
música continuava, pensando em como as letras se aplicavam em mim. Porque eu
não podia evitar. Eu estava apaixonado pela garota
nos meus braços, e isso parecia... destinado a ser, como se fosse nosso destino.
Lindamente projetado. De alguma forma, e contra todas as probabilidades, nos
encontramos mutuamente aqui, no meio do nada. Duas pessoas que precisavam
um do outro tão desesperadamente. A música terminou e
nós nos separamos, e Lily beijou-me suavemente.
"Obrigada", ela disse, "por me dar a minha primeira dança."
Eu sorri para ela e fui desligar a música. Ela vagou pela sala de estar e
eu a segui, sem dizer uma palavra enquanto ela andava até a cozinha,
arrastando a mão ao longo das bancadas de granito. "Isso é bom", disse ela. "É tão
estranho estar vendo-a de dentro, em vez de através da janela." Ela me deu
um pequeno sorriso envergonhado. "Disse a perseguidora."
Eu ri, inclinando o quadril na moldura da porta e cruzando os braços. Eu
ficaria feliz apenas observando-a para sempre. O jeito que ela parecia, a maneira
como ela se movia...
Ela deu um leve aceno de cabeça e caminhou até a geladeira, onde levou
um momento para olhar as imagens afixadas com ímãs – várias. Eu mesmo ainda
não tinha tido tempo para olhar atentamente para
elas. Principalmente pareciam fotos de festas, e agora que eu estava
percebendo provavelmente eram dos diferentes encontros que Brandon teve aqui.
Ela sorriu, inclinando-se para que pudesse olhar mais de perto aqui e lá. "Então,
muitos amigos..." ela murmurou, com uma nota de... inveja? Era ciúme em sua
voz? Não, nada tão forte. Talvez melancolia? Como se ela não tivesse nenhum
amigo.
"Eu –"fiz uma careta, impedindo-me de pedir-lhe para me contar todos os
detalhes sobre seu passado. Eu queria isso, precisava disso, mas eu também
queria dar-lhe o mesmo e –massageei minhas têmporas – eu não poderia fazer
isso até que estivesse limpo. Fala disso a sua recompensa, minha mente
sussurrou. Sim, Lily seria a minha recompensa.
"Onde você dorme?" ela perguntou, seu sorriso voltando.
"Lá em cima", eu respondi. Deus, eu queria levá-la para minha cama e
passar a noite adorando cada polegada de sua pele. Eu queria me perder no céu
quente de seu corpo. "Você quer uma bebida? Uma soda, ou..." Minha voz soava
rouca.
Lily assentiu. Eu fui para o armário e comecei a fazer sua
bebida enquanto ela caminhava até a janela e olhava para fora por um momento.
Minha respiração vacilou quando olhei para o perfil dela. Ela era tão linda.
Será que eu nunca me acostumaria com o efeito que ela tinha sobre mim?
Ela vagou de volta para a sala de estar. Quando eu entrei na sala um
minuto depois dela e segurando sua bebida, ela estava de pé junto à janela
com uma revista na mão. Eu supunha que ela a tinha encontrado na cesta ao
lado do grande estofado de couro reclinável, naquela cheia com todos os tipos de
material de leitura.
Eu congelei quando ela se virou para mim com o rosto
pálido e reprimido. Atingido. Ela olhou da revista para mim. "Holden Scott," ela
disse suavemente, piscando para mim. "Este é... este é... você?" ela
perguntou. Considerando o pequeno pedaço de capa que eu podia ver, ela estava
segurando uma Sports Illustrated. Eu não sabia qual edição específica era, e eu
tinha sido capa várias vezes, então poderia ser uma de muitas. Eu balancei a
cabeça. Ela olhou da capa de revista de volta para mim novamente. Seu corpo
estava rígido e ela parecia em estado de choque.
"Eu sei que eu não lhe disse que sou um jogador de futebol, ou que sou,
bem, muito conhecido", eu disse, largando sua bebida na mesa de café. Corri a
mão pelo meu cabelo quando ela me olhou mais incisivamente. Então ela
piscou, parecendo confusa e desconfiada. "Sinto muito", murmurei, enfiando as
mãos nos bolsos. "Eu só... eu só não quero ser ele", eu balancei a cabeça para a
revista, "aqui, com você. Você me ajudou a lembrar que esse não é quem eu sou.
E, Deus, tem sido tão doloroso." Eu fiz uma careta, apertando os olhos fechados
por um momento. "Eu acho que não estou fazendo sentido, mas você me ajudou.
Você me ajudou muito, e eu não quero explicar tudo a você até estar bem
novamente. Você pode confiar em mim?" Eu andei em sua direção. Quando
eu parei na frente dela, seus olhos se moveram lentamente ao longo do meu
rosto enquanto ela mordia o lábio.
"É por isso que você está aqui?" ela perguntou. "Para ficar bom?" Sua voz
falhou na última palavra, e ela mais uma vez olhou para a revista e de volta para
mim.
Eu balancei a cabeça. "Sim. E eu estou tentando. Eu estou
tentando tanto ficar bem." Ela continuou a olhar para mim, e algo trabalhava por
trás de seus olhos, algo que eu não tinha ideia de como ler. Eu me acalmei
enquanto esperava por sua reação. Finalmente ela estendeu a mão e
tentativamente pegou a minha mão na dela, olhando para a parte de trás da
minha mão enquanto corria um dedo sobre cada junta. Eu tremi ao seu toque.
Seus olhos encontraram os meus, seu lindo olhar violeta parecendo muito grave.
"Sim, Escoteiro, eu confio em você. E quero que você fique bem novamente."
Minha respiração saiu em uma corrida e alívio inundou meu peito. Ter
alguém que tinha fé em mim fez meu coração apertar com gratidão.
"Esta terá que ser a nossa última noite por um tempo. Apenas uma
semana, esperançosamente. Mas eu... eu preciso –"
Ela colocou os dedos em meus lábios. "Eu sei. Então, vamos aproveitar ao
máximo o tempo que temos, ok? Eu quero passar a noite com você. Tudo bem?"
"Deus, sim, é claro. Não há nada que eu queira mais do que isso."
Ela respirou fundo, trêmula, parecendo se recompor. "Ok. Ok. Então, que tal
nós irmos para a varanda?"
20
Eu sorri, me sentindo eufórico por ela estar ficando. "Eu tenho s’mores ",
eu disse. "Vamos assar alguns marshmallows?"
Ela soltou um suspiro e me deu o brilho de um sorriso. "Definitivamente."
Voltei para a cozinha e peguei o saco de marshmallows, algumas barras de
chocolate e uma caixa de biscoitos. Nós fomos para a varanda, e eu puxei um par
de cadeiras até a churrasqueira.
Lily ficou quieta enquanto eu acendia o fogo. Quando eu a olhei, ela estava
olhando para a floresta, onde o eixo de ouro do por do sol estava fluindo nas
árvores. Na floresta tudo devia parecer dourado agora.
Corri para dentro e peguei um prato para colocar os ingredientes para
os s’mores. Lily parecia estar em profunda reflexão, e eu não a interrompi. Eu
tinha certeza que ela estava pensando sobre eu ser famoso. Certamente ela não
esperava por isso. Eu me perguntei se ela achava que isso impactaria sua própria
vida. Eu queria que impactasse, uma vez que eu estivesse melhor. O
pensamento em si me assustou, mas não de uma forma que trouxe medo. Em vez
disso, foi de uma maneira que me trouxe... paz. Apenas parecia certo. Eu
queria tirá-la desta floresta, trazê-la para o meu apartamento... Não, eu não
morava mais lá - massageei minhas têmporas - voltar para a mansão que eu
tinha comprado recentemente e ainda não tinha desfrutado. Eu queria leva-la
para lá, aprender seus segredos, cuidar dela, fazê-la minha.
Acima de nós, o céu estava se transformando numa máscara profunda
de índigo. O pequeno fogo crepitava e saltava. "Você quer um cobertor?",
perguntei.
Lily balançou a cabeça.
Eu me senti nervoso em torno dela de novo, como nas primeiras
vezes que saímos. "Eu suponho que
você vá zombar das minhas habilidades de Escoteiro," eu disse, apontando para a
pequena fogueira, aquela que eu tinha feito usado fósforos. "Pedra é geralmente o
meu método preferido de acender fogo, é claro, mas é escassa aqui. A primeira
regra do escotismo é que você tem que se contentar com o que tem." Ela riu
suavemente e levantou as sobrancelhas.
"Escotismo?"
"Isso."
"Eu pensei que a primeira regra do escotismo era sempre estar preparado."
"Certo, mas se você não estiver, descubra como se virar de qualquer
maneira. Faça funcionar. Esta é uma espécie de alteração à primeira regra."
"Ah, eu vejo. Bem, você sabe as regras do escotismo melhor do que eu." Ela
arrastou sua cadeira para mais perto da minha, e eu relaxei. As coisas pareciam
menos estranhas e menos tensas agora do que tinham sido alguns minutos antes.
"Eu gosto de dois marshmallows no meu s'more. E você?"
Ela sorriu para mim e acenou com a cabeça. Eu relaxei ainda mais, meus
ombros baixando. Ela levantou e agarrou os espetos que estavam na borda da
fogueira e, com um marshmallow preso sobre cada um, entregou um para mim.
Ficamos em silêncio até os marshmallows chiarem e ficarem dourados,
o suave cheiro adocicado subindo no ar em torno de nós e se misturando com a
fumaça do fogo. "Você vai me contar sobre Ryan?", ela perguntou suavemente.
Eu me assustei, olhando para ela. "Ryan?" Eu perguntei, minha voz
embargada.
Ela assentiu com a cabeça, seus olhos cheios de algo que eu estava tendo
um momento difícil para interpretar. Tristeza? Eu inalei uma respiração profunda
de ar enfumaçado e açucarado, puxando meu espeto para fora do fogo quando
percebi que meu marshmallow estava escurecendo rapidamente. Ela já tinha
puxado seu marshmallow do fogo e estava cautelosamente puxando um pedaço
com os dedos. Ela colocou-o em sua boca, mas não pareceu sentir qualquer
prazer com isso. "Como ele morreu?" ela sussurrou depois de um minuto.
Eu coloquei o espeto e o marshmallow intragável de lado, inclinando os
cotovelos sobre os joelhos e olhando fixamente para as chamas. Algo sobre a
dança das chamas me acalmou, era quase hipnotizante. "Ele caiu. Ele caiu para a
morte." Fiz uma pausa, ainda não olhando para Lily, mas eu podia sentir sua
presença calmante ao meu lado. "Nós estávamos festejando. Ou... ele estava, pelo
menos. Todos eles estavam..." eu fiz uma careta, a memória enevoada que eu
tinha tentado afastar espalhando seus dedos esguios contra o meu cérebro,
empurrando minha carne, fazendo minha cabeça latejar.
"Ele tinha sido tão malditamente infeliz nos meses que antecederam sua
morte." Era isso mesmo? Por que isso faz eu me sentir mal? Eu tinha empurrado a
memória distante tão duramente, cobrindo-a com drogas e álcool... mas agora eu
precisava lembrar.
Oh, Deus, ficar sem os comprimidos significava que eu teria que me lembrar
de cada pedacinho da historia. Não haveria distrações... nenhuma necessidade
física para me proteger da dor emocional. Suspirei. Lily estendeu a mão e colocou-
a na minha coxa, dando um aperto suave. Você consegue fazer isso.
"Ele caiu, e eu não tenho certeza se ele queria ou não",
eu, finalmente disse, as palavras irrompendo numa longa exalação de ar. A dor
em meu peito aumentou. Parecia que um peso gigante estava sentado em cima
de mim, e eu estivesse em risco de ser esmagado por ele. "Mas, eu... eu
não pude salvá-lo. Eu não pude salvá-lo. Eu tentei. Eu tentei, mas não consegui.
Eu tentei segurá-lo, mas ele... ele escorregou. Só escorregou." Eu queria chorar
com a agonia que a verdade me trouxe. Eu queria levantar a cabeça para os céus
e amaldiçoar um Deus que permitiu que a mão do meu melhor amigo
escorregasse da minha. Eu não tinha sido forte o suficiente. Minha cabeça pulsava
e eu a agarrei, gemendo.
"Eu cresci com ele. Ele era meu melhor amigo, meu–"
"Ele era seu herói." A voz de Lily veio a mim como um sussurro. "E você
nunca disse isso a ele."
Eu balancei a cabeça, a dor aliviando ligeiramente. "Sim", eu disse. "Sim."
"Oh, Escoteiro", ela disse, e eu ouvi as lágrimas em sua voz. Virei-me para
ela e ela estava lá com os braços abertos. Eu me inclinei e coloquei minha cabeça
no seu colo, e ela colocou os braços em volta de mim e descansou a cabeça em
cima da minha enquanto pranteávamos meu melhor amigo. Seu limpo aroma
reconfortante me envolveu, e me fez sentir seguro. Finalmente. Eu finalmente me
senti seguro. Me senti amado. "Eu acho que ele sabia", ela disse
suavemente. "Não, eu tenho certeza disso. E você nunca realmente o perdeu. Ele
sempre será uma parte de você. Sempre."
Depois do que pareceram horas - mas que na realidade
foram provavelmente cerca de dez minutos - comecei a me sentar, e o
constrangimento de como eu tinha caído em pedaços nos braços de
Lily era esmagador. Eu não tinha colocado mais lenha na fogueira, e por um
momento eu apenas olhei para o fogo morrendo, tentando compreender as minhas
emoções.
Havia uma certa sensação de alívio por ter compartilhado um pouco
daquela terrível noite com Lily, mas eu sabia que havia mais patinando nas
bordas da minha mente. Eu empurrei o que quer que fosse para longe. Eu não era
forte o suficiente para lembrar de tudo de uma vez. Não era suficientemente
forte... Lily se inclinou para trás e se levantou, me puxando com ela. Meus
pensamentos desapareceram nesse momento, e eu abençoei o vazio
preenchendo minha cabeça enquanto a segui em direção à porta, assistindo seus
quadris balançarem enquanto ela andava.
Ela se virou para mim, de pé tão perto que eu tive que baixar a cabeça para
olhar para o rosto dela. A noite estava ficando escura, mas as poucas luzes que
estavam na casa lançavam um brilho silencioso sobre nós.
"Você vai me mostrar onde dorme, Escoteiro?" ela perguntou em voz baixa.
Meu coração acelerou e minha boca ficou seca quando eu assenti.
"É... apenas... à direita subindo as escadas", eu disse estupidamente.
Ela assentiu com a cabeça, abrindo a porta e entrando. Eu
a acompanhei, com um caso grave de nervos de repente me atacando. Deus, eu
esperava que ela quisesse dizer o que eu pensei que ela quis dizer. Quando
chegamos ao topo da escada ela parou e me deixou liderar o caminho para o
pequeno quarto que eu tinha escolhido, no final do corredor. Eu acendi a luz, e
por um momento Lily apenas ficou na porta olhando ao redor. O quarto
era simples, apenas com uma cama queen-size coberta com uma colcha azul
escuro, uma cômoda de madeira e uma mesa de cabeceira. Eu não queria dormir
no quarto principal. Algo sobre isso parecia desrespeitoso. Afinal, aquele era o
quarto de Brandon. Minha mochila estava no chão do closet.
Eu vi quando Lily se aproximou de mim, pegando as minhas duas mãos. "Eu
quero você", ela disse suavemente.
Engoli pesadamente, sangue correndo para o meu pau e fazendo-o inchar
e forçar contra meus jeans.
"Você tem certeza?" Eu perguntei com a voz trêmula. "Ainda há tanta coisa
–"
Ela colocou os dedos sobre os meus lábios. "Sim. Neste quarto, esta noite,
onde podemos apenas ser... nós. Podemos deixar todo o resto ir? Apenas por hoje
à noite? Vamos ficar aqui, apenas permitindo-nos sermos você e eu e nada mais.
Nada mais em tudo." Havia algo tão vivo em sua expressão. "Nós merecemos isso,
não é?"
Eu estava perdido para ela. Perdido e achado ao mesmo
tempo. Como isso era possível? "Vamos fazer...?" Eu perguntei.
"Sim, acho que vamos."
"E você... você me quer?" Eu perguntei, sentindo-
me aterrorizado, aturdido e grato.
Seus lábios inclinaram-se num sorriso. "É mesmo tão difícil de acreditar?"
"Eu... eu não sei." Fiz uma careta.
Ela assentiu. "Então me deixe provar para você." E então ela inclinou-se na
ponta dos pés e me beijou. Eu gemi ao sentir o gosto dela. Marshmallow
açucarado e Lily. Eu coloquei seu rosto delicado em minhas mãos e inclinei sua
cabeça, para que eu pudesse sentir seu gosto mais profundamente, provocando-a
com minha língua. Ela agarrou meus ombros e sangue correu em meus ouvidos
com a luxúria cravando em minhas veias. Eu a queria. Eu queria conhecer cada
parte dela. Todos os beijos que tínhamos tido durante a semana passada só
serviram para me deixar louco de desejo. Eu voltava para a cabana noite
após noite todo dolorido por ela, ansiando segurá-la durante a noite. Eu estava
desesperado agora. Eu a queria de uma forma que nunca tinha
desejado outra mulher antes. Bem aqui, agora, eu poderia ate acreditar que ela
era a única mulher que eu já tinha tocado.
Lily acendeu a pequena lâmpada da cabeceira e, em seguida, desligou a luz
do teto antes de retornar a mim. Ela esfregou seu corpo contra o meu,
fazendo com que minha ereção palpitasse e pulsasse. Deixei escapar outro
gemido quando segurei seu seio, usando o polegar para esfregar o mamilo através
do material fino de seu vestido. Lily arfou um pequeno som de prazer.
Perdido... perdido. E achado.
Eu me afastei e olhei para o rosto de Lily: seus olhos estavam baixos com
paixão e seus lábios estavam inchados e vermelhos dos meus beijos. Eu trouxe
minha mão de volta para seu rosto e usei o polegar para traçar a linha de
sua maçã do rosto. "Você é a mulher mais linda que eu já vi", sussurrei.
Os olhos de Lily baixaram e seus lábios curvaram-se. Ela usou seus pés
para chutar fora suas botas frouxamente atadas, e encontrou meus olhos antes
de se virar e mover seu cabelo do seu ombro enquanto inclinava a cabeça para
frente. Eu me aproximei e lentamente comecei a baixar o zíper de seu vestido,
inclinando-me e beijando-a na espinha conforme mais de sua pele era revelada.
Ela arrepiou-se e eu sorri contra o calor de suas costas nuas, continuando a
mover minha boca juntamente com o zíper, inalando o cheiro limpo de sua pele
enquanto minha língua lançava-se para fora para prová-la. Quando cheguei à
alça de sutiã, inclinei-me e tirei-o também.
Lily se virou e deixou tanto o vestido quanto o sutiã caírem aos seus
pés e, enganchando seus polegares em sua calcinha branca, deixou-a cair
também. Ela estava diante de mim nua, com os olhos baixos e seus cílios
escovando suas bochechas. Ela se mudou de um pé para o
outro parecendo insegura, movendo os braços como se quisesse cobrir os
seios mas estivesse resistindo.
Eu estendi a mão e coloquei minhas mãos em seus antebraços. "Por favor",
eu disse, minha rouca voz, "Por favor, deixe-me olhar para você." Ela deixou os
braços soltos ao lado do corpo, lambeu os lábios e ergueu os olhos para encontrar
os meus. Eu estava duro como pedra, e tudo que queria fazer era deitá-la e torná-
la minha. Eu permiti que meus olhos vagassem sobre seu corpo nu, de seus
ombros delgados para seus pequenos e redondos seios e mamilos cor-de-rosa
profundo – enrugados sob o meu olhar. Segui olhando avidamente por
seu plano estômago e para baixo, me detendo ao V de cachos escuros entre suas
coxas.
"Você é perfeita," eu disse a ela. Não havia outro homem no planeta
que a tinha contemplado assim. Só eu. "Minha Lily, meu fantasma", sorri, "meu
sonho. Somente minha." Eu me inclinei para trás e beijei-a outra vez,
profundamente, movendo-me para seu pescoço quando ela arqueou a cabeça
para trás ofegando pequenos e doces sons de prazer. Quando minha boca
encontrou seu mamilo ela estremeceu e choramingou, moendo sua pélvis na
minha. Eu lambi e chupei, trazendo uma mão ao redor da cintura dela para
segurá-la firme enquanto a provava. Minha outra mão roçou abaixo em suas
costelas, meus dedos movendo-se suavemente sobre cada osso, patinando
sobre sua barriga, e finalmente chegando no lugar quente entre suas coxas.
Quente e tão molhado. Tão pronto. "Lily," Eu engasguei, tremendo ligeiramente no
poder do meu desejo por ela.
Ela rompeu meu abraço, dando um passo para trás e sentando-se na cama.
Eu puxei minha camisa e arranquei meus sapatos, inclinando-me
para também remover rapidamente minhas meias, e quando eu
estava pronto para desabotoar minha calça jeans, Lily já tinha puxado os
lençóis para trás e deitado nua na cama. Por um momento minhas
mãos se acalmaram e minha mente ficou completamente e totalmente em branco.
Eu deixei minha calça cair e saí dela, e depois de minha boxer, ajoelhando-
me sobre a cama entre suas coxas e beijando seus lábios. Quando me
afastei, toquei o calor dela com a minha mão. Ela gemeu. "Lily, você não tem ideia
do quanto eu quero você, quão bonita você está." Ela olhou para mim com tanta
ternura que meu coração se apertou. Eu vim sobre ela e esfreguei o nariz no dela,
sorrindo, completamente cheio de amor pela garota incrível debaixo de mim. Ela
era tão suave quanto a seda.
Ela levou a mão até sua bochecha e fechou os olhos, levantando as
sobrancelhas e rindo suavemente. "Eu deveria estar tão nervosa?"
Eu sorri. "Eu acho que é normal. Mas, eu não vou fazer nada que você não
queira, ok?"
"Ok", ela sussurrou, puxando-me para outro beijo. Sua mão se moveu
timidamente entre os nossos corpos, e eu me afastei um pouco para deixá-la
explorar, liberando uma respiração tremula num esforço para me controlar. Seus
dedos tocaram a cabeça da minha ereção e eu ofeguei quando ela me explorou,
o olhar em seu rosto atento e reverente. "Você parece veludo," ela disse, e eu sorri
antes de beijá-la mais uma vez.
"Envolva seus dedos ao redor de mim. Segure-me em sua mão," eu implorei.
Ela fez o que eu instruí e eu gemi. Parecia o céu. Então ela correu os dedos para
cima e para baixo em meu eixo, até que eu pensei que explodiria em sua mão.
Meu joelho estava entre suas pernas e, enquanto ela me
tocava, se pressionou mais contra a minha coxa, gemendo baixinho.
"Tem certeza que quer isso, Lily?" Eu sussurrei.
"Sim, sim", disse ela, "por favor."
Eu estava tremendo, e não por causa dos comprimidos desta vez. Eu quase
podia sentir-me empurrando dentro de seu acolhedor calor, e sabia exatamente
como ela se sentiria ao meu redor. Eu balancei a cabeça, inclinando-me
e vasculhando a mesa de cabeceira enquanto procurava a camisinha
que eu rogava a Deus que estivesse lá. Estava. O bom e velho Brandon. Eu
rasguei o pacote, e Lily ficou me olhando com os olhos arregalados quando a rolei
sobre mim. Então eu inclinei-me e beijei-a novamente, baixando minha mão
entre suas pernas e trazendo o líquido de seda até o broto inchado que a fez
gritar quando circulei-o com meu dedo. "Oh Deus, oh Deus", ela respirou.
Inclinando-me, levei um mamilo em minha boca enquanto usava meu dedo
para tocar e brincar entre suas pernas. Depois de um minuto ela começou a
circular seus quadris e gemer, e então ela gozou com um ofegante grito e um
longo estremecimento. Tão sensível. Tão perfeita. Seus olhos se abriram e ela
piscou várias vezes, da mesma forma que tinha feito na primeira vez que eu a
tinha feito gozar, como se não tivesse exatamente certeza do que
tinha acontecido. Eu não pude deixar de sorrir quando a beijei novamente.
Observa-la se contorcer de prazer tinha praticamente me desfeito. Eu
coloquei uma mão atrás de seu joelho e puxei sua perna para cima, abrindo-a
para mim. "Guie-me," eu disse. "Eu não vou mais fundo a menos que você me diga
para ir."
Ela levantou a cabeça e colocou os dedos em torno de mim, me
alinhando em sua entrada. Então ela deitou-se e olhou em meus olhos quando eu
empurrei apenas a cabeça do meu pênis para dentro, sibilando no estreito
engate de seu corpo. "Jesus, Lily," eu disse. "Você se sente tão bem."
"Mais," ela disse, e um arrepio percorreu minha espinha enquanto eu
empurrava para dentro.
"Isso está bem?" Eu engasguei. Eu queria socar-me dentro dela tão
mal que estava dolorido, desesperado. Ela assentiu com a cabeça, mas sua
expressão tornou-se de dor.
"Mais", ela disse, mas havia uma ponta de hesitação na voz. Quando
não me mexi, ela repetiu a palavra com mais força. "Mais."
Respirei profundamente por um segundo, baixando o rosto para a curva de
seu pescoço e, em seguida, com um movimento rápido, me empurrei todo o
caminho para dentro dela, rosnando com o prazer intenso e emocionante.
Pontinhos de luz estavam explodindo diante dos meus olhos.
O corpo de Lily ficou rígido, e quando eu levantei minha cabeça ela estava
mordendo o lábio, e havia lágrimas em seus olhos. "Essa é a pior parte", eu disse.
"Eu prometo. Eu vou fazer isso ficar melhor agora, ok? Confia em mim?"
Seus olhos encontraram os meus e ali eu me juntei a ela, no momento em
que me sentia mais profundo. Parecia mais do que físico. Parecia que nossos
corações se juntaram, também. Eu nunca tinha experimentado isso antes. Nunca.
"Sim", ela sussurrou novamente, tocando meu rosto muito suavemente.
"Sim, Escoteiro, eu confio em você." Meu coração se apertou quando eu senti seu
corpo relaxar. Eu entendi o presente que ela estava me dando – não só seu corpo,
mas sua ampla confiança, sua boa-vontade em ser tão vulnerável.
E embora o instinto estivesse me instruindo para me empurrar e fodê-
la, movi-me lentamente, suavemente, deixando seu corpo se acostumar com o
meu.
"Melhor?" Eu perguntei. "Ok?"
Ela assentiu com a cabeça. "Sim, melhor. Parece bom." E então eu comecei a
mover-me dentro e fora de seu corpo firmemente envolto em torno de mim -
e pensei que ia morrer de prazer. "Eu te amo", cantei. "Eu te amo." E eu o fazia,
eu a amava. Eu nunca havia amado ninguém como amava Lily, e sabia que
nunca iria amar.
"Eu também te amo", ela sussurrou em meu ouvido. Eu senti a umidade de
suas lágrimas no meu rosto e me perguntei por que ela estava chorando,
esperando que fosse por causa da intensidade desta experiência. "Eu te amo,
Escoteiro."
Empurrando nela mais uma vez, meu abdômen apertou e eu pressionei
profundamente dentro dela quando meu corpo estremeceu na liberação, o prazer
se espalhando do meu pau, pelas minhas coxas e por todo o caminho para os
meus dedos dos pés. "Eu te amo", eu disse de novo, circulando meus quadris para
ordenhar o prazer e depois acalmar. "Eu te amo."
Eu enterrei meu rosto no lado de seu pescoço, inalando seu perfume
doce enquanto suas mãos se moviam carinhosamente sobre minhas
costas, seus dedos me acalmando aqui e ali quando ela traçava uma cicatriz
e circulava o dedo em torno de uma pequena no meu ombro, que eu não
conseguia me lembrar como tinha conseguido. Meu cérebro se sentindo nublado
com felicidade e prazer. Sorrindo e beijando sua mandíbula ainda molhada,
acabei em seus lábios. Ela estava sorrindo também, e tinha um gosto tanto
salgado quanto doce.
"Lírio da Noite", sussurrei. "Meu Lírio da Noite. Você está bem?"
Ela sorriu docemente para mim e balançou a cabeça. Beijei-a uma última
vez antes de me puxar para fora dela - e ela ganiu baixinho.
"Eu sei. Eu não gosto dessa parte também", eu disse. Eu fiz uma viagem
rápida ao banheiro onde joguei a camisinha, então voltei para a cama.
Deitei-me e puxei Lily para mim, abraçando-a contra o meu corpo. Ela era
suave e doce e quente. "Vem para casa comigo?"
"Estamos na sua casa", ela disse distraidamente, correndo a ponta do dedo
ao redor do meu mamilo e o observando endurecer sob seu toque. Eu tremi.
"Não, a minha verdadeira casa. Eu não quero dizer amanhã. Quero dizer em
algumas semanas. Uma vez que eu estiver... sentindo-me melhor. Você vai voltar
para San Francisco comigo?"
Ela ficou em silêncio por um momento, seu dedo se acalmando. "Eu não
posso. Minha mãe..." Um leve olhar de confusão cruzou suas feições bonitas, mas
depois desapareceu, fazendo-me pensar se eu tinha apenas imaginado-o.
"Sua mãe poderia vir com a gente. Inferno, eu vou comprar à sua mãe sua
própria casa."
Ela sorriu. "Ela nunca permitiria isso. Só não é possível."
Inclinei a cabeça para olhar para ela. "Lily, ela não pode esperar que você
viva na borda da floresta para o resto da sua vida. Que tipo de vida você
realmente tem aqui, na verdade?"
"Você não sabe como é a minha vida," ela disse, sua voz soando mais dura.
"Não realmente."
Suspirei. A última coisa que eu queria fazer era brigar com ela, ou afastá-la
depois do que tínhamos feito há pouco. "Eu sei. Eu só quero dizer... você não se
sente solitária?"
Ela hesitou antes de responder. "Sim. Às vezes. Mas não esta noite." Ela se
aconchegou mais perto, encobrindo um pequeno bocejo. "Segure-me." Puxei-a
mais apertado, beijando sua cabeça. Nós teríamos que conversar sobre isso em
um par de dias, quando eu tivesse atravessado o pior da desintoxicação. Meu
corpo ficou tenso só com o pensamento. Aqui vamos nós outra vez. Mas eu me
preocuparia com isso amanhã. Hoje à noite eu tinha Lily. Adormeci segurando-a
em meus braços, nosso cheiro me trazendo felicidade e conforto.
Em algum ponto no meio da noite, acordei ouvindo-a choramingando
suavemente, e puxei-a mais firmemente. "Shh", eu acalmei. "Você só está
sonhando."
"Não me deixe", ela murmurou, uma nota de angústia terrível em seu tom
sonolento.
"Lily," Eu disse, balançando-a um pouco. "Acorde, você está sonhando."
Eu mal podia ver seus olhos abertos no escuro, mas por um segundo ela
apenas me olhou, como se não soubesse onde estava ou com quem estava.
"Escoteiro", ela finalmente murmurou quando relaxou contra mim, envolvendo os
braços em volta da minha cintura e voltando a dormir. Esperei alguns minutos e,
em seguida, me afastei tão lenta e silenciosamente quanto possível. Fui ao
banheiro e me aliviei e, em seguida, peguei um par de comprimidos do frasco que
tinha deixado no armário de remédios. Levantei-os aos meus lábios
mas... hesitei. Olhei para mim mesmo no espelho do banheiro por um momento,
pensando em Lily, pensando em tudo o que ela tinha me dado, sentindo meu
amor por ela fluir através de meu corpo como um bálsamo curativo. Eu te
amo, Escoteiro. Eu queria ser melhor para Lily. Ela merecia mais do que o homem
que eu era agora. Joguei os comprimidos no vaso sanitário e dei descarga. E
então peguei os dois frascos que Taylor trouxe e os esvaziei no vaso
sanitário também, dando descarga novamente e exalando uma longa rajada de ar.
Joguei os dois frascos vazios no lixo. Era isso. Jesus, era isso.
Voltei para a cama e para o corpo quente de Lily, e de alguma forma
caí imediatamente de volta no sono.
Eu acordei quando o nascer do sol entrava pela janela. A besta interior
estava arranhando minha coragem.
E eu estava sozinho.
Capítulo doze

Holden

Isso machuca. Oh Deus, isso doía tanto. Meu corpo era uma bola de fogo de
dor ardente, cada músculo gritando em agonia. Você pode fazer isso. Você pode
fazer isso. Lily. Lily. Eu estava com tanta sede. Sedento a ponto de dor. Mas,
sempre que eu tinha tentado beber algo, tinha voltado. Eu queria Lily. Mas eu
não podia deixar ela me ver dessa maneira.
Você pode fazer isso.
Eu queria estar de volta na cama com ela. Eu só queria viver lá para
sempre.
Você pode. Assim que você passar por isso. Você pode.
Eu precisava de ar. Eu gemi, conseguindo me arrastar do sofá para a
varanda, onde engoli em seco grandes respirações de ar fresco. Um músculo
na minha perna se retorceu, e eu gritei enquanto agarrava a parte de trás da
minha coxa. Eu pulei alguns passos, minha perna dolorida não colaborando. E eu
não tinha percebido que estava perto do topo das escadas até estar mergulhando
nela. Então eu ouvi algo estalar, e mais dor explodiu em meu corpo. Eu não
podia sequer apontar onde – tudo aconteceu muito rápido. E então eu bati no
concreto, e estrelas explodiram diante dos meus olhos antes de tudo ficar preto.
Eu estava na floresta.
Eu me machuquei, mas ainda continuava a avançar, me movendo em
direção a Lily.
Eu precisava de Lily.
Tinha que encontrá-la.
Tudo doía, e eu não sabia quanto tempo eu poderia continuar andando.
Meu corpo todo doía tão violentamente que eu mal podia ver.
Lily.
Avancei de qualquer maneira, tropeçando e caindo aqui e ali, perdendo
tempo... mas avançando um pouco mais.
Lily.
E então eu pisei em nada. Eu gritei bem alto conforme a terra saia
de debaixo de mim.
Lily.
Caindo.
Caindo.
Estourando de dor.
Lily.

Minha cabeça latejava com a luz muito brilhante atrás de minhas pálpebras
fechadas. Eu fiz uma careta e virei a cabeça gemendo, recuando no meio do
caminho para o sono do qual eu tinha sido arrancado de uma forma que eu
não me lembrava. Minhas mãos estavam pesadas e dormentes.
Eu ouvi uma voz. Lily, essa era a voz de Lily. A resposta a uma oração. Ela
estava falando com alguém em tons sussurrados. Tentei me tirar do sono, mas
estava tão cansado. Muito cansado. Palavras aleatórias e frases
flutuavam pelo caminho, mas eu não tinha forças para tentar agarrá-las.
"Calma, ele vai te ouvir", disse Lily.
"E daí? Eu apenas disse que ele é bonito. Tenho certeza de que ele está
ciente disso, certo?"
"Sim e não," Lily sussurrou entrecortada.
"O que isso significa?" a outra mulher exigiu.
"Eu vou te dizer uma vez que ele for cuidado," disse Lily. Por que ela
parecia tão triste?
Eu me afastei de novo, apenas momentaneamente.
"Perigoso?" Ouvi Lily perguntar.
"Sim, os bonitos são sempre os mais perigosos", a mulher murmurou.
"Ele não é perigoso", disse Lily.
"Isso é o que você pensa agora."
Eu flutuava mais perto da superfície agora, tentando mais uma vez me
afastar das garras do sono. Tentando. Falhando. Caindo de volta para baixo, para
baixo, para baixo. Lily.
Ouvi a voz de Lily novamente, suas palavras dispersas que eu não podia
reunir.
Eu acordei novamente, e percebi que a luz além das minhas pálpebras
fechadas estava diferente. Quanto tempo tinha passado? "Lily," eu resmunguei,
agarrando-me a única palavra que me fez querer lutar para acordar. Tentei abrir
os olhos.
A luz era muito brilhante embora, e eu cerrei-os fechados outra vez. "Tentei
chegar até você, eu tentei tanto..."
"Shush. Lily não está aqui, mas ela estará de volta em breve. Apenas
descanse. Você quase se matou, mas Lily te trouxe aqui. Você está seguro agora."
Eu caí para trás e voltei a dormir, e meu último pensamento foi que eu
tinha sido raptado por uma bruxa.
Quando acordei de novo eu estava numa banheira de água em frente a uma
fogueira. "Você está me cozinhando?" perguntei confuso, não tendo certeza se me
importava.
"Seus músculos estavam em caibras", veio a voz feminina. "A água quente
vai ajudar. Por quanto tempo você foi viciado em medicação para a dor?"
Eu coloquei minha cabeça para trás, sua pergunta me fazendo tentar usar
meu cérebro. Ele parecia muito confuso. Eu trouxe minhas mãos para cima
e as usei para massagear minhas têmporas. "Não por muito tempo. Um par
de meses."
A mulher bufou. "Esse é um período longo o suficiente."
"Como você sabia?"
A mulher fez uma pausa por um momento. "Eu só sei."
"Como eu vim parar aqui?"
"Você se jogou de um penhasco, eu acho."
Isso não parecia certo. Eu procurei minha memória. "Não, eu não fiz isso",
eu disse. "Eu tropecei."
"Ok. Bem, seu dedo está quebrado, e suas costelas estão machucadas. Você
teve sorte, na verdade. Mas você também estava perigosamente desidratado."
Abri os olhos quando seus passos se aproximaram, e ela alimentou o fogo.
Uma mulher idosa com short, cabelo cinza escuro e um rosto que ainda era
adorável, apesar de sua idade avançada. Ela me lembrava vagamente de Lily.
"Quem é você?" Perguntei. "Onde está a mãe de Lily?"
"Isso não é algo com o qual você tenha que se preocupar. Você tem
problemas suficientes em suas mãos, de qualquer maneira. Foque em ficar cada
vez melhor." Eu me encolhi quando senti um espasmo muscular na minha
panturrilha.
Eu esperei que ela continuasse a falar, mas ela não o fez. Meu cérebro
ainda estava nebuloso e meu corpo parecia um peso morto, então eu decidi não
insistir no assunto. "Lily?" Perguntei.
"Mandei-a embora por um tempo. Desintoxicação é complicado e envolve
muito trabalho físico e pessoal. Eu não acredito que você gostaria que ela
limpasse você."
Eu fiz uma careta. Não, não gostaria. "Obrigado", eu disse. "Obrigado por
isso." Eu me senti grato a esta mulher, por me dar essa pequena dignidade.
Ela encolheu os ombros. "O pior já passou, eu acho."
"Há quanto tempo estou aqui?" Eu perguntei, afundando mais
profundamente na água quente. Era tão bom. Eu abri os olhos por tempo
suficiente para olhar ao redor. O quarto parecia uma antiga biblioteca, com
uma ornamentada lareira de mármore ocupando uma grande parte de uma das
paredes, estantes cheias de livros ao longo de todas as outras e uma área de estar
bem atrás da banheira.
"Quatro dias." Quatro dias. Quatro dias sem comprimidos. Uma onda de
orgulho percorreu minha espinha. O pior tinha acabado. Eu espero.
"Quando ela vai voltar?" Eu perguntei.
A mulher fez uma pausa sem olhar para mim, ainda alimentando o fogo.
"Hoje à noite. Está com fome?" Eu considerei sua pergunta, percebendo que
realmente estava.
"Eu acho que eu poderia comer. Talvez eu devesse. Talvez isso fosse bom."
Ela me entregou uma toalha e olhou para longe, mas não parecia
embaraçada por esta situação. Eu pensei que talvez ela estivesse desconfortável
comigo ali em geral, embora eu não soubesse por que. Meu cérebro estava ainda
tão nebuloso que eu estava desorientado. Levantei-me devagar, usando a toalha
para me cobrir, e dei um passo cauteloso para fora da banheira para o tapete
Oriental desbotado no chão. Enrolei a toalha em volta da minha cintura.
"Como você me levou para esta banheira?"
"Você andou. Eu só te apoiei. A nebulosidade deve começar a diminuir agora
que você está se movendo. E suas roupas estão naquele quarto." Ela apontou
para uma porta aberta.
Eu balancei a cabeça e caminhei em direção a ela. Minhas pernas
pareciam pesar dez toneladas cada. Levou toda a minha energia vestir minhas
roupas. A mulher trouxe-me à sala de estar e, curvando-me sobre uma mesa de
café em frente ao pequeno sofá, eu comi algum tipo de ensopado de legumes com
batatas e um caldo grosso e rico.
Estava delicioso, e eu teria comido mais se tivesse força. Eu bebi dois copos
de água depois de comer, e mal conseguia manter os olhos abertos quando
terminei.
A mulher me ajudou a voltar para o pequeno quarto onde eu troquei de
roupa e, desta vez, eu levei um momento para olhar em volta. Tinha uma cama de
solteiro no canto e uma cômoda contra a parede. Havia bugigangas pessoais em
todos os lugares – uma pedra-de-rosa que era tão
suave que parecia ter sido polida, um ninho de pássaros, penas de todas as cores
e tamanhos, uma cesta cheia de pinhas e ate mesmo uma pequena ponta de
flecha lascada... coisas da floresta. "Este é o quarto de Lily, não é?"
Quando eu passei por ela, a mulher assentiu e inclinou a cabeça em direção
à cama, me dizendo para deitar nela. Eu não ia discutir. Eu ia dormir por um
tempo para estar acordado quando Lily voltasse. "Obrigado", murmurei sem me
virar. "Obrigado por me ajudar." A mulher não respondeu; eu só ouvi o clique da
porta sendo fechada. Despi-me rapidamente e subi na cama. O travesseiro
cheirava como Lily. Caí no sono imediatamente, acordando
apenas momentaneamente quando ouvi uma discussão abafada no outro lado da
porta. Eu só conseguia distinguir as palavras de Lily, porem.
"Você não sabe disso. Você não sabe, a menos que..."
"... deve haver um jeito." Choro silencioso.
"Eu posso ser. Eu posso ser o que ele precisa."
Mais choro.
Lily.
Tentei me puxar completamente para fora do sono, me puxar em direção a
ela, mas eu não podia.
Sonhei com Ryan. Ele veio até mim através da névoa, falando comigo,
lembrando-me, contando-me sua história, porque eu tinha esquecido. Oh, Deus,
eu esqueci. Não, eu não tinha esquecido. Eu não queria lembrar. Eu o
prendi para fora, o abandonei. Eu me abandonei. Sim, eu tinha me abandonado.
Porque eu pensei que merecia.
Meu melhor amigo estendeu a mão para mim e eu ofeguei, a imagem se
tornando cada vez mais clara conforme ele se aproximava. Eu queria desviar o
olhar, por vergonha e uma enorme sensação de... medo. Eu estava me perdendo,
sozinho. Mas, ele estava sorrindo, e ele parecia... feliz. "Perdoe-me," eu me
engasguei.
"Não há nada a perdoar. Não foi culpa sua. Nada disso foi culpa sua", disse
ele. "Eu fiz o que estava destinado a fazer nesta vida. É hora de me deixar ir
agora." Não, não, não.
Acordei com lágrimas em meu rosto e braços quentes envolvidos em torno
de mim. "Shh", ela sorriu. "Eu estou aqui. Eu estou bem aqui."
"Lily," Eu botei para fora, enterrando a cabeça em seu peito. "Oh Deus,
Lily." Ela me segurou enquanto eu chorava, me segurou enquanto tudo voltava.
Ela foi a minha força quando a verdade me arrastou para baixo. Quando os
soluços finais afundaram meu corpo, eu inclinei a cabeça para trás e olhei para
o seu suave e doce rosto. Ela escovou o cabelo da minha testa e beijou meu rosto
com ternura. Havia tanta compreensão em sua expressão. "Você sabe sobre mim?
Você sabe?" Eu perguntei.
Ela balançou a cabeça lentamente e depois me beijou novamente.
"Sim, amor."
Eu movi meus olhos sobre seu rosto, tentando ler sua expressão, tentando
entender o que ela sentia por mim agora que sabia. Eu não sabia o que eu sentia
por mim agora que eu sabia.
"Isso me quebrou, Lily. Eu o perdi," eu tomei um grande fôlego trêmulo, "e
isso me quebrou."
"Eu sei, Escoteiro, eu sei."
E soava como se ela realmente soubesse. "Ele era a minha outra metade."
Ela balançou a cabeça. "Não, ele era o seu melhor amigo. Você é um homem
completo, e não a metade de alguém."
Seu rosto estava tão bonito, tão triste e tão cheio de compaixão. Isso
tudo era demais, extremamente demais. Eu fiz uma careta pela dor na minha
cabeça. "Não, eu não sou um homem completo. Talvez nem você me conheça. Você
acha que sim? Porque não deveria."
"Não", ela disse suavemente, e depois com mais força, "não. Eu
sei que seu superpoder é voar." Ela sorriu. "E eu sei que você gosta de futebol, de
Star Wars e de jazz, do velho tipo." Seus dedos patinaram pela minha bochecha, e
eu me inclinei para eles. "Eu sei que você gosta de livros engraçados e de museus,
e de fogos de artifício e viagens. Se eu fosse cozinhar para você, eu te
faria panquecas mesmo que fosse meia-noite, e então eu o levaria para ver um
filme num teatro vazio numa terça-feira, durante uma tempestade de neve. E
então", sua voz ficou ainda mais silenciosa, "quando nós voltássemos para casa,
você faria amor comigo tão docemente que eu choraria e cantaria ao
mesmo tempo. Eu sei que você é gentil e bom e que ama as pessoas com todo o
seu coração e mente. Eu sei que, quando você ama alguém, você vai amar para
sempre. Não são todas essas coisas verdadeiras, Escoteiro?" Seus dedos
encontraram as cicatrizes nas minhas costas e ela seguiu-as levemente, com
amor, as pontas de seus dedos encontrando o pequeno buraco disperso.
"Sim", eu respirei. "Sim, Lily," murmurei. Ela era a única
coisa certa sobre mim, então. Somente ela. Somente o quanto eu a amava.
Sob os cobertores, as mãos de Lily vagaram pelo meu quadril, suas unhas
arranhando suavemente a minha coxa exterior. Eu tremi,
endurecendo rapidamente. Seu cheiro, a sensação macia dela ao meu redor... eu
precisava dela tão desesperadamente. Eu precisava dela para me lembrar que eu
era real.
"Lily," eu sussurrei de novo, minhas próprias mãos percorrendo seu corpo
agora. Ela estava vestindo apenas sutiã e calcinha – que rapidamente removeu
- ajudando-me então a tirar minha boxer. Meu corpo doía
em todos os machucados, mas eu não me importei. Seus lábios encontraram os
meus e eu suspirei, sentindo o gosto dela, aquecendo-me no conforto de sua boca
na minha, sua língua se enroscando com a minha própria. Gemendo baixinho ela
me agarrou na mão e acariciou-me várias vezes, até que eu estava pulsando. Ela
posicionou seus quadris e me guiou dentro dela sob os cobertores. Eu gemi no
aperto macio e molhado de sua carne ao redor da minha própria. "Oh," eu gemi.
"Oh, Deus." Lily gemeu também quando nossos lábios se encontraram outra
vez. Isto era um alívio. Era o paraíso. Quente sob os cobertores eu naveguei ate
meu porto seguro, meu corpo se conectando ao da Lily enquanto
nos movíamos juntos, buscando encontrar conforto mútuo no corpo um do outro.
Minutos depois nós gozamos juntos, segurando-nos um ao outro e
clamando tão suavemente quanto possível.
Continuamos nos beijando por longos minutos enquanto voltávamos à
terra. Lily estava sorrindo suavemente contra a minha boca, mas eu queria cair
no sono novamente. Fazer amor com Lily havia destruído o último resquício da
minha energia.
Apesar de seu sorriso, uma lágrima rolou pelo seu rosto. "Você sabe que
não precisa mais de mim, certo?" Um tipo dormente de pânico formou um arco
através de mim.
"Não, não, eu sempre vou precisar de você. Sempre. Eu sempre vou te
amar." Por que soou como se ela estivesse dizendo adeus? Lutei para pensar.
Mas eu ainda estava tão cansado... muito, muito cansado. Eu ainda me sentia
como se dez toneladas de pedregulho estivessem sentadas na minha cabeça. Doía
pensar.
Sua expressão era triste. "Não, você precisa voltar para a sua vida,
Escoteiro. Você é forte o suficiente agora." Eu tentei manter meus olhos abertos –
mantê-los nela – mas minhas pálpebras estavam tão pesadas. Eu me
perguntei, sonolento, se a mulher que cuidou de mim me deu algo para dormir.
"Eu sempre vou te amar, Escoteiro. Sempre." Foi a última coisa que ouvi
antes do sono me reivindicar mais uma vez, roubando-me dos braços de Lily.

"Ei, amigo, você está acordado? Acorde, homem." Pisquei, fazendo uma
careta contra a luz brilhante entrando através da janela. Fechei e abri os olhos,
ajustando-me a luz.
"Brandon?" Eu perguntei, minha voz rouca.
"Sim, sou eu. Como você está? Jesus, parece como se você tivesse sido
espancado."
Sentei-me lentamente olhando ao redor. Eu estava na cama na cabana. Eu
cocei a cabeça, as coisas devagar caindo no lugar dentro da minha cabeça. Como
eu tinha chegado aqui? Eu tinha estado na cama com Lily. Como no mundo Lily
e outra mulher tinham me trazido de volta à cabana? Eu levei mais alguns
minutos apenas olhando para o espaço, como se todas as peças fossem
magicamente se juntar... pensando em tudo o que tinha acontecido desde que eu
tinha estado aqui. Olhei para o meu peito nu, percebendo as ataduras em volta
do meu tronco. Havia grandes contusões pretas e azuis em toda parte, algumas
apenas progredindo para um amarelo doentio. Minhas costelas ainda doíam. Uma
boa parte de mim coçava. Meu dedo estava em uma tala e envolvido com ataduras
também. Inalei uma respiração afiada, e o peso de tudo isso – de tudo que eu
tinha experimentado, tudo que eu tinha percebido – esmagou meu peito. Eu
encostei-me à cabeceira da cama, agarrando meu cabelo com a minha mão boa.
"Onde está Lily?"
Brandon franziu a testa, sentando-se no final da cama. "Lily?"
"Você não a viu?" Eu perguntei, puxando-me para cima um pouco rápido
demais. "Eu só não consigo descobrir como elas me trouxeram de volta ate
aqui." Eu ainda me sentia tonto, mas meu corpo parecia decente, e minha
mente estava em sua maior parte clara - ou clareando, de qualquer maneira.
Mais clara do que tinha estado em meses. Eu pensei sobre os quartos onde eu
tinha estado. Meu Deus, eu estava em Whittington. A altura do teto, a forma
como a pintura estava descascada nas paredes, a semelhança com as fotos que
eu tinha olhado on-line. Eu não entendia por que Lily tinha me levado para um
hospital abandonado, nem por que ela tinha um quarto montado lá, mas... "Ela
deve ter voltado. Eu tenho que encontrá-la." Suspirei, fechando meus olhos
novamente e reunindo forças para sair da cama.
"Ok, mas espere, eu..." Ele franziu os lábios, sua expressão preocupada. "As
coisas correram bem para você aqui? Você está se sentindo melhor?
Taylor finalmente 'confessou' que esteve aqui. Desculpe por isso, a proposito. Mas
ela disse que você ainda estava agindo um pouco estranho."
"Sim, eu estava, acho. Eu não estava exatamente esperando vê-la."
Suspirei. "Mas, eu estou me sentindo melhor agora. Só preciso ver Lily."
"Mas você está claro, certo?" Ele me olhou. "Você sabe o seu nome, não é?
Você sabe por que está aqui?"
Meus olhos encontraram os dele. Eu sei. Oh Deus. Oh Deus, isso dói. "Sim",
eu disse, minha voz vacilante. "Sim, meu nome é Ryan. Ryan Ellis."
Ele soltou um suspiro aliviado. "E você sabe que Holden –"
"Holden está morto, eu sei", eu disse, uma dor intensa agarrando meu peito.
Meus ombros começaram a tremer.
"Eu sei. Sim, eu sei de tudo agora. Eu me lembro. Eu sei."
Capítulo treze
"O que você está fazendo aqui sozinho? A festa é lá dentro," Holden
arrastou, contorcendo-se levemente e caindo na cadeira ao meu lado
enquanto passava a mão pelo cabelo curto e escuro.
Eu tomei um gole da minha cerveja e olhei para ele. Apesar de estar bêbado,
ele parecia infeliz. E ele parecia sempre infeliz, ultimamente. "Eu precisava de
algum sossego", respondi. "Acho que não estou no clima de festa."
"Quando você não esta no clima de festa?"
Eu levantei minha cerveja para ele em acordo. "Quase nunca." Mas, hoje à
noite eu vim apenas para olhar por Holden. Ele parecia querer estragar sua vida
nos dias de hoje. Como se estivesse em seu caminho para foder as coisas.
Ele fez um som de aborrecimento. "Taylor está olhando para você. Certeza
que ela te quer, cara."
Ela quer. Ela tinha demonstrado seu interesse claramente. "Não estou
interessado. Taylor é uma cadela interessada apenas em seu próprio status. Eu
não sei por que você saiu com ela, na verdade."
"Ela é boa na cama."
"Eu tenho certeza que é. Ela adquiriu bastante prática."
Holden deu uma risada curta, que morreu em seus lábios.
"Qual é o plano, Holden?" Eu perguntei, olhando para ele. Ele sabia o que eu
estava pedindo.
Sua cabeça caiu para trás na cadeira. "Meu plano é ser incrível e
impressionante", disse ele estupidamente, repetindo a frase que tinha usado
tantas vezes antes. Até recentemente, porem, isso havia sido dito com humor e
vivacidade.
Ele costumava me fazer sorrir.
"Você costumava ser incrível e impressionante o tempo todo," eu disse,
limpando a garganta. Minha voz soou arranhada. Agora ele era apenas... triste. Por
quê? Por que ele estava tão fodidamente triste?
"Que tal sair daqui?" Eu perguntei. "Longe de todas essas pessoas. Vamos
conseguir alguns cafés da manhã. Do Denny? Moons Over My Hammy?"
"Você é a pessoa que gosta de comida de café da manha no jantar. E
você apenas gosta de dizer Moons Over My Hammy, não de comer lá".
Dei-lhe um sorriso pálido. Era verdade, eu gostava de como soava. Melhor
nome para uma lanchonete que servia café da manha de todos os tempos. "O que
há para não gostar sobre café da manha no jantar?"
Ele deu de ombros, parecendo realmente confuso. "Eu não sei. É como se eu
não pudesse encontrar algo em mim para gostar de qualquer coisa nestes dias."
"São os comprimidos, Holden. Você tem que largar esses comprimidos. Seu
joelho está curado há meses agora."
"Os comprimidos podem ser as únicas coisas das quais eu realmente
gosto."
Pressionei meus lábios juntos e como eu estava, disse: "Bem, se você
não quiser ajudar a si mesmo, Holden, não há nada que eu possa fazer por
você." Sentindo-me inútil, eu caminhei para porta de vidro deslizante que levava
para dentro.
"Jesus, você viu este por do sol?" ele perguntou.
Fiz uma pausa e olhei para trás. Holden estava caminhando sobre a
grade da varanda. Ele parecia... perdido, embora permanecesse estranhamente
calmo.
"Eu nunca mais olhei para o fodido pôr do sol. Você já... desfrutou de algo
ate enjoar, Ry?"
Eu liberei a maçaneta da porta. "Sim", eu disse. "Quero dizer, eu acho."
Ele assentiu. "Isso é bom", disse ele, e eu ouvi as lágrimas em sua voz. Eu
fiquei quieto. Holden estava chorando? Ele se inclinou sobre o corrimão de ferro
forjado da varanda. "É tão alto", disse ele, inclinando-se mais.
"Holden, que porra?"
"É bom sentir algo, porém, não é?" Sua voz estava abafada e baixa.
Dei um passo em direção a ele e, nesse momento, ele se virou sobre os
trilhos. "Puta merda!" Eu gritei, me arremessando em direção a ele. Ele soltou um
grito, agarrando uma das hastes da grade e ficando pendurado apenas por uma
mão. Eu estava de joelhos e envolvi minhas mãos em torno dele. "Socorro!" Eu
gritei atrás de mim, "Socorro!" Mas a festa no interior estava muito alta. Ninguém
poderia me ouvir. "Não me solte, Holden." Eu estava ofegante, meu coração
batendo no meu peito em puro terror. "Eu vou me levantar e me inclinar, e eu quero
que você pegue minha mão. Ok, Holden, pegue minha mão. Eu não vou deixar você
cair. Eu não vou deixar você cair."
Enquanto eu falava, minhas pernas tremiam tanto que eu mal conseguia me
mover. Mas eu fiquei de pé e inclinei-me, oferecendo minha mão para ele. "Pega",
eu botei pra fora. "Pegue minha mão, Holden." Seus olhos estavam selvagens
quando ele estendeu a mão e pegou a minha. Deixei escapar uma lufada de ar,
meu coração batendo descontroladamente. "Ok, ok, eu tenho você, ok? Eu vou te
puxar para cima agora. Trabalhe comigo, ok?" Comecei a puxá-lo para
cima, ambas as minhas mãos entrelaçadas em torno da dele e sua outra mão
sobre o balcão. De repente, porem, ele soltou a borda e segurou-se só em mim. Eu
grunhi com o esforço repentino de segurar mais de duzentos quilos de peso.
Minhas mãos tremiam e meus braços estavam latejando. Eu não podia sequer
forçar a saída das palavras.
"Sinto muito, Ry. Estou muito cansado", disse ele, algo passando em seus
olhos e acentuado o pico de terror que apunhalava através do meu intestino.
Alguma coisa... qualquer coisa. Eu não sabia o quê. Sua mão afrouxou na
minha, e nossas palmas das mãos suadas escorregaram enquanto eu gritava. E
quando seu corpo bateu no chão abaixo com um baque alto, eu me despedacei.
Ele se foi.
Ele se foi.
Foi.
Meu herói se foi.
Capítulo quatorze

Ryan

Eu convenci Brandon a me levar para Whittington. Ele tinha cedido, mas


ostentava uma expressão preocupada no rosto. Eu não tinha me importado. Eu
estava desesperado para encontrar Lily. Quando chegamos ao portão, no entanto,
havia um enferrujado cadeado nele, que não tinha estado lá antes.
"Estava aberto da última vez," murmurei. Após uma caminhada pelo perímetro,
encontramos uma parte quebrada da porta ao lado do
jardim, completamente apertada.
O jardim obviamente não tinha sido cuidado em um tempo muito longo, mas
era cheio de cor, talvez ainda mais belo por sua selvageria, pela maneira como as
videiras cresceram na parede de tijolos, misturando tudo em conjunto. Engraçado
as coisas que você observa mesmo quando seu coração está partido.
"Esta é a merda mais assustadora que eu já fiz", Brandon murmurou
enquanto me seguia para dentro da construção pela porta da frente, que ainda
estava destrancada desde a última vez que eu estive aqui. "Mas um
bocado impressionante, também," ele admitiu, uma pequena risada
seguindo suas palavras. Por quinze minutos nós apenas vagamos pelos
corredores na maior parte vazios, pisando em cadeiras de rodas enferrujadas,
empurrando de lado o metal pesado das portas, olhando dentro de pequenas salas
que devem ter sido celas outrora, e chamando o nome de Lily de novo e de novo.
Foi quando eu encontrei os quartos onde tinha ficado – os quartos onde eu
tinha me desintoxicado. Eles estavam vazios. Não havia móveis, exceto
um estrado de metal, no quarto onde eu tinha feito amor com Lily.
Eu tinha, não tinha?
Eu caí contra o batente da porta, massageando a cabeça, ofegando
e sussurrando o nome dela.
Eu conhecia este lugar. Eu tinha estado aqui antes.
Não, não, não. "Eu não entendo", eu disse, ofegante.
A mão de Brandon agarrou meu ombro. "Cara, não há nenhuma Lily. Olha,
quem quer que você pensou que viu –"
"Não!" Eu insisti, afastando sua mão fora. Desespero corria pelas minhas
veias. "Não, eu não, porra, eu não a imaginei. Não. Lily! Jesus, Lily, por favor, por
favor," eu engasguei, agarrando minha cabeça em minhas mãos. Deus, e se eu
tivesse produzido ela? Jesus, Jesus, Jesus. Não, não, ela era real. Eu não iria
acreditar no contrário.
"Você trouxe drogas com você, Ryan?" Brandon tinha finalmente
perguntado. "Você esgueirou drogas em sua bolsa?"
Eu soltei um suspiro trêmulo. "Sim, mas não eram alucinógenos.
Eram analgésicos. E... olha," eu disse com entusiasmo, passando por cima do
manto da lareira, "sem poeira. Como poderia não haver nenhuma poeira aqui, a
menos que alguém tenha usado esse cômodo?", eu olhei para ele com expectativa,
talvez um pouco desesperadamente ate.
As mãos de Brandon estavam nos bolsos, e ele olhou para mim de forma
lastimosa quando encolheu os ombros. "Porque está no meio do edifício? Selado
apertado. Eu não sei", ele disse. É evidente que ele não estava convencido que
os analgésicos poderiam não me fazer alto o suficiente para ver merda, ou ele
pensou que eu estava completamente fora de meu juízo. Deus, eu estava. Eu
estava fora de meu juízo.
Meu Deus. Eu estava louco.
Meu pai me disse que eu era louco, e ele estava certo.
Ele estava certo.
Eu estava louco.
Eu era inútil.
"Não", eu disse fracamente.
Eu tinha deixado Brandon me levar para fora de lá.
Não.
Lily, Lily, Lily...
Capítulo quinze

Ryan

Via-a em todos os lugares. Andando em calçadas, em restaurantes lotados,


uma vez num breve flash de cabelo escuro e laço branco logo antes de uma porta
de elevador se fechar. Sem pensar e com meu coração trovejando em meu
peito, eu corri quatro lances de escadas só para descobrir que era outra pessoa.
Alguém segurando a mão de um menino. Ela puxou-o para mais perto de seu lado
enquanto saía do elevador, olhando para mim com cautela, como se eu pudesse
agarrá-lo e correr.
Esses foram os tempos em que eu ainda duvidava da minha própria
sanidade, ainda questionava se ela realmente existiu. Mas então eu me lembrava
da sensação de seus dedos na minha pele, a seda escorregadia de seu cabelo, o
som de sua risada e a forma como eu a amava e ainda amo, e eu sei, eu sei no
fundo da minha alma que ela é real.
Eu sonhei com ela e, na escuridão, ela me segurou em seus braços. Na
escuridão ela sussurrou que eu era forte o suficiente para aguentar, que eu era
digno do amor que ela tinha me dado... e ela me lembrou de quem eu era antes
mesmo de ser alguém em tudo.
Meu Lírio da Noite. Somente da lua.
Porque depois, quando a luz do dia veio, ela não está mais lá.
Capítulo dezesseis

Ryan

"Durante o tempo em que você esteve no Colorado, você já se questionou se


você foi realmente Holden?" Dra. Katz perguntou. Ela nunca escreveu nada sobre
o bloco de notas em seu colo, então me perguntei por que ela o tinha lá. Talvez ela
vigorosamente espalhasse notas entre compromissos, e queria ter certeza de que
estava pronto. Talvez ela apenas mantinha-se neste olhar profissional. Eu queria
um médico que precisava de acessórios para convencer seu paciente que era
profissional?
Eu tinha visto um psiquiatra nos primeiros seis meses em que estive de
volta em San Francisco, mas ele parecia menos interessado em ouvir minha
história do que na prescrição de medicamentos. A última coisa que
eu precisava era de mais malditos comprimidos. E, assim, cerca de um mês atrás,
eu tinha feito uma consulta com um psicólogo. Talvez eu só precisasse falar com
alguém. Esta era apenas a minha terceira consulta e, apesar, de seu bloco de
notas de suporte, eu gostava dela.
Eu balancei minha cabeça. "Não. Quero dizer, havia lugares que eu acho
que me guardei da minha mente, coisas que eu senti que pareciam erradas e que
escolhi não investigar, mas... não. Eu nunca realmente questionei. Eu tinha todos
os seus pensamentos, todos os seus sentimentos, todas as suas memórias. Por
aqueles dias, eu era ele. Só que... eu não era qualquer um. Está tudo tão
terrivelmente confuso. Até para mim."
Ela assentiu com a cabeça. "Ryan, houve alguma
vez em que você 'desapareceu' na sua cabeça antes disso?"
Eu suspirei, movendo meus pensamentos de volta à sua pergunta. Eu
pensei muito sobre isso. "Sim, quando eu era criança. Meu pai, ele, bem, para ser
franco, ele batia a merda fora de mim numa base bastante regular." Fiz uma
pausa, engolindo em seco. Porra, a própria memória do homem
ainda era muito dolorosa. Ele tinha me colocado numa gaiola, às vezes, para me
punir como um animal sem valor. Ladre como um cão! Ladre como um cão, seu
fodido animal sujo. Ladre como o cão que você é, e então eu vou deixá-lo sair. Ele
tinha morrido há sete anos, e eu não tinha nem comparecido ao seu funeral. Eu
nunca disse adeus. Eu tinha pensado nisso como uma pequena forma de retorno,
mas na realidade, talvez eu tivesse sido o único danificado. Eu nunca tive
o encerramento. Como se isso fosse mesmo possível. "Eu tentei me endurecer,
mas... nunca consegui. Eu só nunca conseguia." Suspirei. "Então, em vez disso,
fiquei perito em ir para outro lugar na minha mente, sabe? Eu tinha que
somente... sair. Eu fiquei tão bom nisso que, após um tempo, eu
nem mesmo sentia os socos ou as queimaduras. Ele ficava irritado e desligava,
você sabe, e eu não reagia. Mas, eu não podia ficar inexpressivo por fora e ainda
fingir que isso não machucava, porque assim ele ia bater ainda mais duro. Não
importa, embora." Eu balancei minha cabeça.
"Por que não importa, Ryan?"
"Porque não havia nada que eu pudesse fazer para pará-lo. Eu só tinha que
descobrir como sobreviver a isso."
"Alguma vez você se tornou outra pessoa durante esses tempos, Ryan?"
"Não, nunca."
Ela assentiu, mastigando o fim de sua caneta e me olhando pensativa. Será
que ela não acreditava em mim?
"Eu vi no seu arquivo que você foi hospitalizado uma vez. Qual foi a razão
para isso?"
Eu respirei fundo. "Eu... eu estava na faculdade. Eu estava sob
stress, sozinho –"
"Holden não estava com você nessa época."
"Certo. Eu fui para o Arizona. Eu queria ficar longe de Ohio, longe do meu
pai. Eu só não sabia o quão difícil seria..." Minhas palavras flutuaram para longe.
"Continue."
"Eu só... tinha um monte de ansiedade. Eu simplesmente não estava indo
bem."
"Mas a sua estadia no hospital, ela ajudou você?"
"Sim. Eu consegui voltar ao meu caminho e fui capaz de retornar à
escola, graduar-me e começar minha carreira."
Dra. Katz observou-me novamente por um minuto, e eu mexi no meu
assento sob o seu olhar penetrante. "Então, inicialmente, com o seu pai, você
somente afastou-se mentalmente da situação. Isso foi como você sobreviveu. Até
Holden?"
A dor apertou meu coração. Será que eu sentiria falta dele para
sempre? Eu gostaria que fosse de alguma outra maneira? Eu
relaxei, respirando profundamente. "Sim, até Holden. Ele fez amizade comigo." Eu
ri baixinho. "Quero dizer, isso soa passivo, e Holden nunca foi passivo. Na verdade
ele praticamente exigiu ser meu amigo. Essa era a maneira
como ele funcionava, você sabe? Eu estava tão desconfiando de todo mundo. Mas,
Holden, ele era como esta força, uma força de... energia e bondade".
"Você o adorava."
Fiz uma pausa, considerando isso. "Eu acho que... sim, eu acho. Mas, não
era porque ele era um grande jogador de futebol, ou por ser um figurão ou uma
celebridade. Eu amava Holden porque ele tinha um jeito de... de alguma maneira,
ele fazia cada pessoa na sala se sentir como se fosse a mais importante lá.
Como era que ele fazia isso? Isso sempre me espantou. Ele... é difícil de explicar.
Você teria que ter conhecido-o." Eu parei novamente. "Ele era tão genuíno. E seus
pais eram pessoas tão boas também." Correndo a mão pelo meu cabelo, eu
permiti que minhas memórias fluíssem. "Eu pude finalmente
experimentar como uma família deveria ser." Se você não pretende ajudar a si
mesmo, não há nada que eu possa fazer nada por você, eu disse a ele. Eu
tinha dito isso para ele, depois de tudo o que ele tinha feito para mim. Depois de
todas as vezes que ele veio em meu socorro. Depois de toda a sua persistência, eu
o tinha deixado sozinho para cuidar de si mesmo naquela noite. Se ao menos eu
tivesse ficado para falar com ele, para tranquilizá-lo, para forçá-
lo a sair daquela sacada mais cedo... Eu falhei com ele. Deus, eu falhei com ele,
e isso ainda ardia como uma faca que estaria para sempre plantada em meu
intestino. E que me cortava cada vez que eu me movia. Eu senti minha
mente nublar com tristeza, e lutei para me puxar para a superfície.
Dra. Katz assentiu novamente. "Será que os pais de Holden sabiam o
que o seu pai fazia para você? E então eles te deram proteção?"
"Sim", eu botei pra fora. "Sim, eles fizeram."
"E eles faleceram no ano anterior a Holden?" ela perguntou.
Eu balancei a cabeça, um caroço subindo pela minha garganta. "Eles eram
mais velhos. Eles tiveram-no mais tarde na vida." Isso abalou-nos tanto. Às vezes
eu quase sentia como se tivesse sido mais atingido do que ele... mas, eu também
sabia que a morte de seus pais era parte da razão pela
qual Holden acabou viciado em comprimidos, do por que eles tinham sido tão
atraentes para ele.
"Eu posso entender por que você estava tão ligado a Holden, por que você o
via não só como seu amigo, mas como seu herói, seu salvador. Eu posso entender
isso, Ryan."
Meu peito estava apertado. "Sim", eu suspirei. "Fizemos tudo juntos. Fomos
para faculdades diferentes, mas então ele foi recrutado para o 49ers e me ajudou
a conseguir a entrevista para a vaga como seu treinador atlético." Ele tinha agido
de forma diferente depois disso, apesar de tudo. De alguma forma, a fama
parecia... escurecê-lo. Ela esmaeceu a luz do espírito de Holden. E então
ele se feriu e começou a tirar a dor com comprimidos... os mesmos
comprimidos que eu eventualmente comecei a tomar, para assumir de onde ele
parou. De alguma forma isso parecia menos doloroso do que aceitar que ele
estava morto. Tinha sido a única maneira que eu tinha encontrado de mantê-
lo vivo, mas ao mesmo tempo foi parte do que me fazer desaparecer. "Você acha
que eu sou louco, Dra. Katz?" Eu tentei rir, mas saiu estranho, sufocado.
"Louco? Eu tento não usar essa palavra em meus diagnósticos, Ryan." Ela
sorriu. "Somos todos loucos em nossas próprias maneiras. Seu
eu poderia diagnosticá-lo como portador de uma doença mental? Eu diria que
concordo um pouco com o psiquiatra que você originalmente viu, o Dr. –"
"Hammond," eu ofereci.
"Sim, o Dr. Hammond. Ele o diagnosticou com transtorno dissociativo
causado por trauma. Eu tendo a concordar, baseada em nossas sessões até agora,
embora essa desordem geralmente refira-se à pacientes com duas ou mais
personalidades. Você a apresenta de forma diferente do que alguns outros
pacientes, pois assumiu a identidade de uma pessoa real em detrimento da
sua própria. No entanto, esse seria o meu diagnóstico, se
eu tivesse que fechar uma caixa. Infelizmente, porém, a mente nem sempre se
encaixa em limpas e pequenas caixas, não é?" Ela me deu um leve sorriso antes
de continuar. "No seu caso, entretanto, faz sentido, não é? Você aprendeu cedo
como separar sua mente do sofrimento e da dor. E então, quando Holden morreu,
você experimentou um trauma mais uma vez, e caiu em sua resposta reforçada e
condicionada: remoção mental. Você culpou-se pela morte dele. Culpou-se por
não ver a extensão de sua infelicidade e por não ser capaz de fazer qualquer coisa
para ajudá-lo. Eu acho que, num esforço para compreendê-lo, tornou-se ele.
Você tentou salvá-lo como ele te salvou e, ao fazê-lo, fugiu um pouco
de sua própria dor. E os comprimidos tornaram tudo mais fácil, é claro,
distraindo-o do verdadeiro problema, apesar de não causarem esse transtorno."
Coloquei minha cabeça para trás, olhando para o teto. "Isso soa... louco.
Como é que eu ainda conseguia colocar um pé na frente do outro enquanto
estava fora da minha mente?"
Quando a olhei novamente, Dra. Katz me deu outro pequeno sorriso. "A
mente pode ser muito misteriosa. E há coisas que podem nos quebrar. Mas,
pessoas com transtornos mentais ainda – e muitas vezes - mantêm empregos que
exigem habilidades complexas, e contribuem para a sociedade de numa série de
maneiras valiosas. É claro que, se formos usar a palavra louco para cobrir o amplo
espectro de sofrimentos mentais, incluindo o seu, então sim, você esteve louco por
um tempo. Você ainda se sente louco, porém?"
Eu lancei uma lufada de ar, olhando sem ver pela janela por um momento.
Eu me sentia louco? Principalmente, não. Lembrei-me daquela sensação de estar
num sonho que eu senti depois que Holden morreu, e toda vez que eu estava na
cabana de Brandon. Eu tinha andado e falado, me convencido que eu era Holden.
Eu vivi sua vida, continuando exatamente de onde ele parou, mas sem conexão
real com nada. Até Lily... foi como se ela me trouxesse de volta, me fazendo querer
encarar a realidade novamente. "Não", finalmente respondi. "Mas eu ainda me
sinto triste. Talvez eu sempre vá me sentir triste." Não era o tipo de tristeza que
trazia mais lágrimas, apesar de tudo. A tristeza simplesmente era parte de mim
agora. Ela havia se estabelecido em meus ossos, e eu meio que percebi que
sempre estaria lá. "Mas eu já não me sinto louco."
Eu não podia deixar de pensar em Whittington. Se eu tivesse vivido há cem
anos, eu seria uma daquelas pessoas babando num canto em algum lugar, talvez
lobotomizado, tendo meus órgãos removidos. No mínimo eu
seria esquecido... invisível, inútil. Uma mancha vergonhosa na minha família e na
sociedade. Ela assentiu com a cabeça. "Ryan, você acha que, em parte, você se
tornou Holden porque acreditou que deveria ter sido o único a morrer naquela
noite? Você gostaria que tivesse sido você, em vez dele?"
Estudei minhas mãos. "Sim. Às vezes eu ainda acho isso."
"Você percebe, é claro, que isso é o seu pai falando, certo? Nenhum dos dois
merecia morrer. Não Holden e não você."
Suspirei. "Eu sei," finalmente disse. Mas especialmente não ele. Ele era o
super-herói, o garoto de ouro.
"Bom." Dra. Katz fez uma pausa. "Você ainda pensa sobre a garota? Você
ainda questiona sua existência?"
Aquela era uma pergunta mais difícil de responder. Eu tinha voltado a
Whittington a cada mês nos primeiros nove meses. Eu vaguei pelos corredores
chamando por Lily, procurando qualquer coisa que pudesse indicar que ela
tinha voltado. Eu fui para a floresta e chamei por ela, mas ela nunca apareceu.
Ela não estava lá. Eu também procurei por qualquer evidência de que ela existia,
mas não consegui encontrar nada. Isso me fez sentir como se ela fosse algo que
minha mente tinha criado enquanto eu estava lá – apenas uma bela parte da
minha loucura. Mas como poderia ser assim? Ela expressou pensamentos que não
eram meus. Disse coisas que eu não fazia ideia. Certo? Eu tinha feito amor com
ela, adorado seu corpo. Corri meus dedos pelo meu cabelo, a memória de Lily
fazendo o mesmo na primeira noite voltando para mim. "Eu não sei", disse. "Eu
não penso assim, mas... não tenho nenhuma prova que ela exista além do fato de
que eu ainda sinto falta dela pra caramba. Você acha que ela foi uma invenção da
minha imaginação?"
"Eu não posso dizer, Ryan." Ela mordeu o fim de sua caneta por um
momento. "O fato de que ela desapareceu só no momento em que você admitiu
para si mesmo quem realmente é indica que havia alguma ligação..." Tristeza
encheu meu peito.
"Eu sei. Parece muita coincidência."
"Mas talvez seja apenas isso – uma coincidência. Talvez a garota, Lily,
tivesse outro motivo para sair."
"Talvez." Suspirei. "A coisa é, se eu realmente a criei –
criei uma pessoa, e criei sentimentos por essa pessoa – então isso só contribui
para a minha insanidade. Isso pode indicar que eu preciso de vários
diagnósticos."
"Ninguém precisa de um diagnóstico. Um diagnóstico sobre algo não
muda ou altera a desordem, apenas a torna mais fácil de tratar.
Mesmo que Lily tenha sido um sintoma da sua dor, ela se foi agora."
"Eu sei", disse eu tristemente. "Mas, Deus, ela me salvou. De tantas
maneiras..."
"E talvez esse fosse o seu papel. Talvez você a tenha criado para salvá-lo.
Talvez, se você procurar em sua memória, acabe descobrindo que já fez a mesma
coisa antes. Talvez não. O ponto, porém, é que ela fez o trabalho dela e, em
seguida, era a vez dela ir. Era hora de sua mente deixa-la ir."
Você sabe que não precisa mais de mim, certo? Mas, eu precisava. Eu
precisava dela.
"Uau, isso soa realmente louco", murmurei.
Dra. Katz riu novamente. "Dizem que as pessoas loucas raramente
questionam sua própria sanidade."
"Quem diz isso?"
"Outras pessoas loucas," Dra. Katz brincou.
Eu ri e ela sorriu. "E a outra boa notícia é que os transtornos
dissociativos respondem muito bem à terapia - a
psicoterapia individual, especificamente. Estou feliz que você me encontrou."
"Sim eu também."
Ela sorriu momentaneamente e, em seguida, sua expressão tornou-se séria.
"Tem quase um ano desde que você voltou para San Francisco, embora. Você esta
saindo com amigos? Está namorando novamente, Ryan?"
"Não", eu disse. "Eu não tenho interesse. E sinceramente, eu senti que
precisava me concentrar em ficar melhor novamente."
"Boa escolha. Mas não se afaste das outras pessoas. Você merece a
felicidade, Ryan. Merece o amor. Talvez seja hora de fazer alguns planos sociais,
sair, testar as águas."
Eu sorri. "Ok, eu vou pensar sobre isso."
"Bom. Muito bom. Você fez um maravilhoso progresso hoje. Acabou
nossa hora, mas eu vou vê-lo na próxima semana."
Capítulo dezessete

Ryan

Retornar ao trabalho tinha sido uma das transições mais fáceis. Os caras
tinham me recebido de volta com os braços abertos. Claro, eles nunca tinham
entendido completamente a extensão do que tinha acontecido dentro da minha
cabeça. Eles me viram desmoronar e começar a tomar comprimidos para dor. Eles
tinham me visto afundar no mesmo comportamento de Holden antes de morrer:
festas, sexo sem sentido, condução imprudente. Eles tinham visto eu me referir a
mim como Holden, mas aparentemente apenas pensaram que isso era parte do
processo de luto. Ou talvez efeito das drogas e do álcool. Eles não tinham
entendido quão profundamente perturbado eu tinha estado. Caso contrário, eu
provavelmente teria sido internado em vez de levado para uma cabana de luxo no
meio do nada. Eles não sabiam, o que era bom, porque provavelmente nunca
confiariam em mim de novo se soubessem a completa verdade. Apenas a Dra.
Katz sabia... a Dra. Katz e Lily.
Claro, talvez Lily só soubesse porque eu sabia. "Jesus." Eu
suspirei, desespero fazendo minha cabeça doer.
"Ryan, meu homem," Jameson, um membro da equipe, disse, entrando no
meu escritório. "Como vai?"
"Ei, Jameson. Nada mal. E você? Como está o ombro?"
Jameson moveu o ombro ao qual eu me referia. "Melhor. Muito melhor. Hei,
um grupo de nós está saindo esta noite. Junte-se a nós."
"Oh... nah, eu tenho que trabalhar na parte da manhã."
"Eu não disse que você tinha que se destruir. Sei que já passou por isso. Eu
só quis dizer que você não sai com qualquer um de nós há quase um ano. Nós
sentimos sua falta, cara." Ele me deu um tapa nas costas e eu sorri. "Vamos
21
lá, será como a sua festa de debutante. Sua Quinceañera ." Ele dançou alguns
passos de salsa. Eu ri. "O que você diz? Há um mundo inteiro lá fora além
do esporte."
"Que diabos? Ok". Eu tinha ficado nervoso sobre sair, sobre estar em torno
da equipe, em torno do álcool. Mas talvez a doutora estivesse certa. Eu tinha que
viver no mundo em algum ponto.
"Bom negócio. Vá para casa, vista seu vestido de festa e encontre-nos lá às
nove."
Eu ri. "Vejo você então."

A equipe tinha decidido ir a um bar no distrito financeiro de San Francisco,


decorado de forma a imitar um navio pirata, com velhos barris de madeira nas
paredes e tetos. Jameson havia mandado uma mensagem para me informar que
os caras tinham uma mesa no mezanino. Fiz o meu caminho através do bar
lotado, e todos os garotos levantaram-se e deram-me uma rodada de aplausos
quando tomei um assento. Eu acenei para que todos se sentassem,
envergonhado. "Ok, ok," eu disse enquanto eles riam. "Muito engraçado."
22
Mike, da equipe de running back agarrou meu ombro e me
sacudiu. "Bem-vindo de volta à terra dos vivos", disse ele, e eu não pude deixar de
rir. Era isso ou chorar, e eu percebi que já chorei o suficiente para uma vida
inteira. Eu tentei o meu melhor para conter minha ansiedade,
sintonizar o ruído demasiado alto, a embriaguez ao meu redor, ignorar o cheiro de
23
álcool e me concentrar apenas nas minhas Buddies .
Nós conversamos e rimos por um tempo, e eu estava realmente tendo um
tempo decente ate que alguém pediu um Jack e Coca-Cola.
Esta tinha sido a bebida de Holden.
Melancolia me assaltou, e meu humor mudou. De repente, eu estava hiper
consciente de que Holden não estava lá, que nunca estaria. Eu mantive um
sorriso estampado no rosto, de qualquer maneira. Mas, eu não pude mantê-
lo uma vez que Taylor chegou, sentando-se no colo de Jameson e sussurrando
algo em seu ouvido. Pelos próximos dez minutos ela alternou entre curtir com ele
e atirar-me olhares que pareciam meio zombeteiros e meio desconfiados. Eu não
precisava de nada disso – isto. Esta tinha sido a queda de Holden, ou pelo
menos parte dela. Eu não acho que alguém notou que eu
tinha ficado muito calado de repente. "Hei, eu vou ao banheiro. Já volto", eu disse
para ninguém em particular, levantando-me e caminhando em direção à escada.
Eu usei o banheiro e, em seguida, fui ao bar - não estava pronto para voltar
ao andar de cima ainda, para o turbulento riso da equipe, para todas as meninas
moendo em torno da mesa, algumas tirando fotografias, algumas até
mesmo filmando, mas todas com olhares de desespero em seus rostos, esperando
que um dos membros da equipe as notassem, mesmo que fosse apenas por uma
noite. Quando o barman ocupado apontou para mim, eu pedi uma água. Ele fez
uma careta e eu dei-lhe um olhar apologético, jogando dez dólares em seu vidro
de gorjetas, embora eu devesse lhe dizer para ir se foder.
"Você ficou preso como motorista designado, também?"
Olhei para minha direita, onde uma menina bonita com cabelo escuro e
batom vermelho estava ao meu lado, aparentemente esperando sua bebida. Na
penumbra do bar seu cabelo parecia quase preto, e isso me fez pensar em Lily.
Suficiente. Pare de perseguir fantasmas, Ryan. Acenei com a cabeça para a
menina e olhei para o barman, que estava servindo algumas pessoas do outro
lado do bar.
"Eu tinha esquecido quão detestáveis pessoas bêbadas são quando você não
está bebendo", disse ela, revirando os olhos e me dando um pequeno sorriso.
Quando eu não disse nada, ela pareceu envergonhada. "E se eu tiver para ouvir
mais uma piada de mau gosto sobre piratas..."
Eu franzi as sobrancelhas. "Piada de pirata?" Não pude deixar de perguntar.
Ela usou seu dedo para indicar ao redor da sala. Ah, o tema pirata. "Traga-
me um jarro de cerveja, rapariga!" Ela disse isso com uma voz profunda,
aparentemente imitando a pessoa que pediu que ela fizesse uma corrida ao bar.
"Quero dizer, sério, certo?" Ela mordeu o lábio.
Eu ri. Ela era realmente bonita.
O barman serviu minha água na minha frente, mas antes que eu pudesse
agradecê-lo ele já estava de volta ao bar, apontando para outro cliente. Virei-me
para a menina, levantando meu copo de água. "Boa sorte." Coisa estúpida para
dizer.
Mas, ela me deu um grande sorriso, de qualquer maneira. "Você também."
Voltei para as escadas, mas não pude me obrigar a subir. De repente este
era o último lugar onde eu queria estar. Seria rude apenas sair sem dizer adeus,
porem. Eu sairia para respirar do lado de fora um pouco, e então voltaria
e faria minhas despedidas. Esse era o plano. Eu pousei meu copo de água sobre
uma mesa, saí do bar e fiquei ao lado da porta na penumbra do toldo com minhas
mãos nos bolsos, me perguntando por que eu não tinha adivinhado que seria tão
ruim. Essa nunca tinha sido a minha cena. Por que eu achei que seria bom nisso
agora? Eu assisti um grupo de meninas rindo enquanto empurraram uma
amiga obviamente bêbada e usando um vestido branco e véu com um pênis de
plástico apontando para cima para dentro de numa limusine. O sinal preso na
bunda dela dizia: "Eu gosto de ser espancada."
As portas para o bar se abriram novamente e alguém saiu, parando ao meu
lado. Ambos olhamos um para o outro ao mesmo tempo, arregalando os
olhos, a expressão dela de crescente constrangimento. Essa era a garota com
quem eu tinha falado há um minuto no bar. "Eu não o segui pra fora, eu juro."
Eu ri. "Claro que não."
Ela revirou os olhos. "Não, realmente, eu não te segui. Mas já que está aqui,
você tem um cigarro?"
"Eu não fumo."
"Eu geralmente também não fumo, mas meu ex-namorado acabou de
passar com sua noiva e –"
"Você não está bêbeda o suficiente para lidar com esse tipo de
coisa esta noite."
Ela riu. "Exatamente. Nem de perto."
A porta se abriu de novo e, por um segundo antes de ser fechada, riso
estridente fluiu para fora - alguém gritando como se em contentamento.
"Soa como a Disneylândia adulta lá", ela murmurou.
"Não admira que eu esteja aqui fora."
Seus olhos se arregalaram. "Você não gosta da Disneylândia?" Ela olhou em
volta, como se estivesse se certificando de que ninguém tivesse me ouvido, como
se eu tivesse dito a ela que era um terrorista.
Eu ri e balancei a cabeça. "Não, mas com toda a justiça, eu nunca estive lá.
Eu só estou supondo, com base no fato de que eu não gosto de montanhas-
russas. Ou de magia. Ou de maravilha."
Ela se inclinou para frente e riu. "Certo. Magia. Maravilha. Tão chato. Não é
de admirar que a Disneylândia adulta não seja realmente a sua coisa."
Eu balancei a cabeça e apontei para um café do outro lado da rua. O
sinal luminoso estava fazendo um zumbido estranho, e um dos ‘F’ de ‘café’ estava
faltando. Um velho estava sentado numa cabine na janela, com a cabeça em cima
da mesa, dormindo ou possivelmente morto. "Aquele lugar ali é mais minha cara."
Ela olhou para ele por cima do ombro com tristeza. "Sim, não há
nenhuma mágica ou surpresa lá. Provavelmente pouca higiene pessoal também."
Eu balancei a cabeça, olhando para ela e dando-lhe um sorriso lento. "Ah,
mas há uma coisa. Donuts."
Seus olhos se arregalaram. "Vamos."
Eu ri. "Você não pode simplesmente deixar seus amigos."
"Eu vou mandar um texto para que eles saibam onde estou." Ela acenou
para a porta. "Não é como se eu não fosse vê-los se eles saírem - vamos sentar
perto da janela. A propósito, meu nome é Jenna."
"Ryan". Eu sorri. "Ok, por que não? Vamos."
Esperamos por alguns carros para passar e, em seguida, corremos em
frente, puxando a porta aberta para os aromas reconfortantes de açúcar, gordura
e café. Uma garçonete no balcão, que estava lendo uma revista, apontou a mão
em torno do café, indicando que poderíamos escolher nosso assento. Eu escolhi
uma mesa perto da janela, um par abaixo do cara (provavelmente) adormecido.
Jenna deslizou na cadeira do outro. Uma vez que a garçonete tinha anotado
nosso pedido - dois cafés e duas rosquinhas - Jenna perguntou: "Então Ryan, o
que você faz?"
"Eu sou um treinador atlético."
Ela riu suavemente. "É um trabalho ou uma roupa de baixo?"
"Ha ha." Mas eu lhe dei uma risada genuína.
"Então, sério, o que um treinador atlético faz?"
Dei de ombros. "Sou basicamente o empregado favorito da equipe. Arrumo
tornozelos, esfrego músculos doridos, trato lesões de reabilitação. Em poucas
palavras."
Ela levantou uma sobrancelha. "Então você trabalha para, tipo, uma equipe
de esportes?"
Eu balancei a cabeça. "Eu trabalho para o 49ers."
Seus olhos se arregalaram. "Não, sério? Isso é tão legal." A garçonete trouxe
o nosso café, e Jenna despejou dois pacotes de açúcar no dela antes de dizer: "Eu
sou uma fã. O que aconteceu com Holden Scott no último ano foi tão trágico.
Você o conhecia bem?"
"Sim", eu disse, e limpei minha garganta quando minha voz saiu rouca.
"Sim."
Aparentemente, algo na minha cara deu uma pausa em Jenna, porque ela
tomou um gole de seu café e, em seguida, disse: "Eu sinto muito."
"Está tudo bem", eu disse. Só que não estava bem. eu sentia falta dele. Mas
eu odiava deixar os outros desconfortáveis. "Então, o que você faz, Jenna?"
Ela sorriu, obviamente aliviada por mudar de assunto. "Eu estou em
marketing." Ela me contou um pouco sobre seu trabalho e a empresa onde
trabalhava. Eu principalmente ouvi, embora minha mente vagasse apenas um
pouco. Há todos estes pequenos marcos depois que se perde alguém.
Principalmente, eles passam de maneiras que outros nem reconhecem, mas ainda
continuam a me abalar. Eu me perguntava quanto tempo isso iria durar.
Aqueles poucos momentos após o nome de Holden ser mencionado, quando
eu tive que me esforçar para recuperar meu equilíbrio. Aqueles poucos momentos
em que tive de focar para não cair de joelhos.
Tenha orgulho dessas vitórias, Dra. Katz tinha dito. Porque isso é o que são,
pequenos triunfos pessoais de força. E eles são importantes.
Eu sintonizei em Jenna. "De qualquer forma", ela suspirou, "eu gosto. Eu
gosto do trabalho, e das viagens que ele envolve."
"Com que frequência você viaja?"
"Pelo menos uma vez por semana. Na verdade, estou partindo para Chicago
amanhã. Parte da razão que me ofereci para ser a motorista da noite." Ela sorriu,
inclinando a cabeça. Ela estava flertando comigo, e eu não tinha certeza de como
me sentia sobre isso.
Ela era bonita, definitivamente, mas... Será que eu nunca sentiria por outra
mulher aquela excitação intensa que senti por Lily? Eu acho que não,
especialmente se isso tivesse acontecido puramente em minha própria mente.
Seria impossível recriar uma fantasia, eu supunha. E talvez uma reafirmação da
realidade fosse exatamente o que eu precisava. Talvez passar o tempo com
alguém como Jenna – alguém indiscutivelmente real – fosse apenas o que o
médico ordenou, por assim dizer.
Nós bebemos nosso café e comemos nossas rosquinhas, não faltando uma
conversa, e isso foi agradável. Quando os amigos de Jenna mandaram uma
mensagem pra ela eu a levei para o outro lado da rua, e esperei com ela ate seus
amigos saírem do bar. Também decidi que ninguém ia sentir minha falta se eu
não voltasse para dentro para dizer adeus - todos eles estariam
completamente bêbados por este ponto. Eles poderiam chamar uma
limusine quando quisessem sair. Jenna olhou para mim esperançosamente.
"Essa se transformou numa noite melhor do que eu pensava que seria", disse ela.
Sua expressão mudou de esperança para expectante.
O olhar em seu rosto dizia eu gosto de você. Quero saber mais sobre você.
Lily olhou para mim assim. Respire fundo, Ryan. Lily está... sumida. E passar
tempo com Jenna tinha sido... fácil.
"Para mim também." Eu sorri. "Posso te ligar, Jenna?"
Ela soltou um suspiro. "Absolutamente. Aqui, deixe-me dar-lhe meu
cartão." Ela puxou um cartão de visita branco de sua pequena bolsa e o entregou
para mim, mordendo o lábio inferior. "Estou realmente ansiosa para ouvir de você,
Ryan."
Eu sorri. "Boa noite." Quando eu tinha caminhado até a esquina, me
virei outra vez. Jenna ainda estava em pé na calçada, observando-me sair. Eu
levantei minha mão e acenei, e ela acenou de volta.
Capítulo dezoito

Lily

Você é um sonho? Ou talvez um... fantasma?


Talvez. Sim, eu acho que poderia ser um fantasma.
Eu não sinto como se minha vida fosse... real.
As palavras deslizaram pela minha mente enquanto eu estava olhando para
a pequena parte da Ponte Golden Gate que podia ver da janela do hospital. Meus
olhos se mudaram para uma mulher caminhando, empurrando um bebê num
carrinho de criança por um dos caminhos do jardim abaixo. Em algum lugar nas
proximidades uma buzina de carro retumbou. Será que eu sentia que minha
vida era real agora? Talvez. Pelo menos mais do que tinha sido antes.
Aqui eu pude observar as pessoas, interagir com outras pessoas, andar na
grama... até sair, agora que tinham me dado mais liberdade.
"Você foi vê-lo novamente, não é?"
Virei a cabeça da janela para olhar para a minha avó quando ela entrou na
sala. Eu cruzei os braços sobre o peito.
"Ele não me viu," murmurei.
Minha avó suspirou. "Lily, querida. Ele está indo bem agora. É hora de
deixá-lo ir. Na verdade, preciso falar sobre nosso retorno ao Colorado. Meu
contrato de arrendamento da casa em Marin é no próximo mês."
Afastei-me da janela e movi-me rapidamente para o pequeno sofá onde ela
tinha acabado de se sentar e peguei suas mãos nas minhas. Ignorando o
comentário sobre o contrato de arrendamento, eu disse: "É isso mesmo, vovó, ele
está indo tão bem. Ele está de volta ao trabalho. Ele parece ser... ele mesmo outra
vez."
Minha avó deu uma risada curta. "Ele mesmo? Lily, você não sabe
quem ele é. Você não tem nenhuma ideia. E ele não tem ideia de quem você é,
também."
Eu balancei a cabeça, negando suas palavras. "Isso não é verdade. Eu o
conheço. Eu sei quem ele é aqui." Eu puxei uma mão e usei-a para bater contra
meu peito. Ele estava no meu coração. Por alguma razão, a visão daquelas mãos –
as pontas dos dedos apenas mal se roçando – que haviam sido esculpidas na
rocha no Colorado correu pela minha mente. Procurando um ao outro no
escuro. Eu o sentia. Eu o conhecia.
Minha avó sacudiu a cabeça. "Nós já passamos por isso. Concordamos
em ficar aqui temporariamente, apenas enquanto você era tratada.
Nós concordamos com isso. E, você prometeu que me deixaria ser a única a
verificá-lo. E que voltaria para casa uma vez que seu tratamento fosse
concluído."
"Eu não quebrei essa promessa," eu disse, puxando minha outra mão livre e
inclinando-me para trás no sofá. Eu ia para casa com ela. Primeiro para a casa de
aluguel e, em seguida, para o Colorado. Mas eu ficaria lá? Eu poderia aturar isso?
Minha avó me deu um olhar simpático. "Eu entendo, meu amor. Eu sei
exatamente o que você está sentindo. Eu sei o quanto dói. E essa é a razão pela
qual eu não vou deixar você se envolver com Ryan Ellis novamente. Eu não vou
deixar você machucá-lo, ou se machucar. Não é justo com ele. Se você o ama, vai
deixá-lo ir." Ela passou a mão sobre seu cabelo curto. Eu queria chorar, porque
sabia em meu coração que ela estava certa.
Mordi meu lábio. Era inútil discutir com ela. E se eu persistisse ela só
choraria, e eu não queria vê-la chorar. Eu não podia lidar com a tristeza – seu
desapontamento – e minha própria dor. Fazia quase um ano, e eu ainda me
sentia desesperadamente triste. Ela disse que acabaria, mas ainda não tinha
acontecido. Não de verdade. E eu trabalhei tão duro para parar a dor. Pressionei
meus lábios juntos e me levantei. "Eu vou sair para conseguir algum café."
"Você vai sair?" ela perguntou.
"Sim, vou ate o Coffee Shop na outra rua." Isso era algo que eu
amava sobre estar aqui em San Francisco. Não importava o que eu queria ou
precisasse, ficava geralmente a quinze minutos de distância.
Minha avó ficou de pé. "Nós poderíamos tomar um café aqui. No refeitório."
"Não, eu preciso sair." Eu estava cansada de estar dentro, cansada do
cheiro de desinfetante. "E eu realmente prefiro ir sozinha."
Ela franziu a testa. "Ok. Você tem certeza que é uma boa ideia?"
Suspirando, eu me virei para ela. "É apenas um café, vovó, eu vou ficar
bem. E eu tenho que me acostumar a viver no mundo real novamente."
"Ok, Lily", disse ela novamente. "Você está certa. É claro que você está.
Acho que vou indo também então." Eu fingi que não notei que ela
estava apertando as mãos como se estivesse torcendo um pano.
"Oh, Lily," ela disse, seguindo-me enquanto eu me vestia. Eu pensei
que ela tentaria me parar. "Eu me esqueci de te dizer. Minha amiga Cora, do
clube de tênis, está hospedando um evento de caridade em Marin para essas
crianças da Guatemala das quais está sempre falando, e ela quer que você
participe. Disse que seria uma ótima maneira para você sair. Eu achei que você
provavelmente adoraria. É no seu aniversário – seu vigésimo-primeiro.
Poderíamos comemorar lá."
Eu hesitei. "Um evento de caridade para crianças da Guatemala?"
Eu adoraria isso. Era a forma da avó de me pedir desculpas. Ofereci-lhe um
pequeno sorriso. "Isso soa maravilhoso."
"Podemos procurar vestidos on-line mais tarde. Ou eu poderia chamar o
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comprador pessoal (personal shopper) da Bloomingdale’s . Tenho certeza que
iria trazer algumas amostras aqui para você experimentar."
Eu fiz uma careta. Seria embaraçoso para um estranho trazer vestidos para
mim aqui. "Ou eu poderia ir ate lá" eu disse. Minha avó assentiu, mas seu sorriso
vacilou, como se eu ir a um pequeno café fosse tolerável, mas uma grande loja de
departamentos cruzasse a linha.
Beijei sua bochecha, coloquei meus sapatos e saí, andando rapidamente
através das terras e sorrindo para George quando saí pelo portão da frente.
"Tenha cuidado, Lily," ele chamou, como sempre fazia.
"Eu vou, George."
Era uma manhã de nevoeiro chuvoso, e eu não pude deixar de lembrar
daquele dia na floresta, sob os galhos de uma árvore. Meu coração se
apertou. Ryan. Às vezes ainda era difícil para mim me referir a ele por esse nome,
mesmo em minha mente. Eu o conheci como Holden. Eu tinha me apaixonado
por ele como Holden. Mas, Shakespeare tinha razão, porque o que importava um
nome? Holden, Ryan... Eu amava o homem.
Eu amava o homem que era intenso e calmo, gentil e tímido, inteligente e
engraçado. Eu amava o homem que tinha me olhado como se ele não tivesse
certeza de como eu tinha acabado sendo sua, que me julgava sua estrela da
sorte. Eu fechei os olhos para interromper as lágrimas. Eu nunca seria dele
novamente, mas ainda assim sentia que ele seria meu para sempre. Será que
ele se perguntou por que eu o tinha deixado? Eu sabia que ele provavelmente não
entenderia, e esse era o meu maior arrependimento. Talvez eu devesse ter
deixado um bilhete... alguma coisa. Mas, minha avó tinha concordado em ajudá-lo
em troca de nós sairmos naquela noite. Ela concordou em ajudá-lo somente
quando eu prometi que não teria mais contato com ele. E uma vez que eu disse a
ela por que ele estava lá...
Eu sabia que ele precisava ficar melhor. Eu sabia que ele precisava voltar à
sua vida e encontrar uma maneira de recuperá-la. Eu só não tinha previsto
que me machucaria tanto quando ele saísse, e saber que eu não poderia ser parte
da vida dele.
O café estava quente e movimentado com a atividade quando cheguei. Eu
pedi um café com leite e encontrei uma mesa no canto. Pelo menos eu tinha algo
para olhar para frente, com o evento de caridade chegando. Minha
avó estava confortável comigo o assistindo porque seria do outro lado da
ponte, em Marin, onde ela estava hospedada numa casa de aluguel.
Peguei meu telefone e rapidamente pesquisei o 49ers, procurando
quaisquer imagens recentes de Ryan. Eu sabia que deveria parar. Só
me trazia dor ver fotos dele. Mas também me trazia orgulho e felicidade vê-lo bem.
Havia algumas fotos recentes de um bar nas páginas de um tabloide. Eu peguei
um vislumbre de Ryan no fundo de uma das imagens, sentado a uma
mesa e olhando para o lado. Ele estava sorrindo. Eu usei o meu dedo indicador
para traçar o pequeno esboço de seu rosto na tela do telefone. Recordei o
momento em que percebi que ele estava sofrendo de algum tipo de transtorno
mental.
O momento em que meu coração caiu a meus pés e eu senti
como se pudesse afundar no chão bem na frente dele. A imagem do homem na
capa da revista, um estranho que eu não conhecia, mas que era rotulado como
"Holden Scott." Eu não tinha entendido exatamente o que estava acontecendo,
mas pelo olhar em seu rosto eu sabia que ele não estava mentindo para mim. Ele
acreditava ser Holden Scott. Ele não sabia quem era. E, de repente, a
sua confusão – sua tristeza – tinha feito algum tipo de sentido. E o que eu podia
fazer? Eu já tinha me apaixonado por ele. Eu ainda o amava. "Escoteiro",
murmurei, imaginando se o sorriso em seu rosto na fotografia era
real, me perguntando se ele estava realmente feliz.
Querendo saber se ele ainda pensava em mim.
Capítulo dezenove

Ryan

Eu joguei minha jaqueta no sofá e tirei meus sapatos. Eu tinha saído para
jantar com Jenna, e tínhamos tido um bom tempo. Ela me contou tudo sobre sua
viagem, me fazendo rir com histórias engraçadas sobre o colega de trabalho a
quem ela tinha ficado presa na partilha de um quarto de hotel, depois que sua
reserva de quarto tinha sido erroneamente anulada e não havia outros quartos
disponíveis.
Sentei-me numa cadeira. Eu gostava dela, e gostava de passar tempo com
ela, mas também me sentia estranho. E a intensidade que senti quando passei
um primeiro tempo com Lily não estava lá. Mas devia estar? Eu
tinha estado metade fora de minha cabeça quando me apaixonei por Lily,
quando a tinha beijado e feito amor com ela. Todo aquele tempo
parecia quase um sonho agora, como se nada tivesse realmente acontecido. Como
se eu nunca tivesse voado para a cabana de Brandon no Colorado. Como se
minha vida tivesse parado no momento em que Holden escorregou da
minha mão e tivesse apenas recentemente retomado. E, no entanto, por dentro,
eu ainda me sentia meio adormecido – como se uma parte de
mim permanecesse em falta, incompleta.
Olhei em volta do meu apartamento. Tudo estava limpo e arrumado.
Crescendo, minha casa sempre foi detonada, sempre cheirava como lixo,
podridão e merda de cachorro. Eu não tinha pensado muito sobre isso até que
comecei a sair para a casa de Holden. Eu não sabia que algumas casas
cheiravam a alimentos cozidos e roupa fresca. Eu não sabia que alguns pais
acendiam velas sazonais que cheiravam a baunilha ou como campos de maçã ou
de lavanda temperados. Aquilo me fez intensamente consciente do mau cheiro da
minha própria casa, e tinha me feito pensar se eu cheirava tão sujo quanto minha
casa para as pessoas na escola. Mesmo que eu tentasse o meu melhor para
manter minhas roupas limpas, lavando-as na banheira com sabão em barra
quando meu pai não estava em casa, era como se eu tivesse o fedor da
casa embebido na pele depois de um tempo.
Era por isso que eu era tão exigente agora. Eu aspirava e espanava o pó
regularmente, mudava meus lençóis uma vez por semana, e pratos sujos com
certeza que não eram deixados na pia. Eu nunca viveria como um animal. Eu
nunca cheiraria como um animal.
Caminhando de volta para o meu quarto, me despi e joguei minhas roupas
sujas no cesto vazio do meu armário. Meu olhar se prendeu na mochila que eu
tinha jogado no canto e ainda não tinha descompactado. Eu não estava certo
porque agarrei-a agora. Eu a defini na minha cama e vesti uma camiseta e cueca
e, em seguida, parei na frente dela. Um estranho sentimento de perda me
atravessou. Não, essa viagem tinha sido muito real.
A viagem, pelo menos... Lily, porem... mexi minhas mãos pelo meu cabelo e,
em seguida, abri o zíper da mochila. Eu a remexi, mas não havia nada ali, exceto
roupas – roupas sujas, que estavam muito atrasadas para uma lavagem.
Reunindo-as, entrei na minha pequena lavandaria e joguei-
as na máquina de lavar. Um par de jeans caiu das minhas mãos para o chão no
caminho, porem. Suspirando, eu fui ajunta-lo para jogá-lo na
máquina também, mas parei, remexendo seu bolso. Porque eu fiz isso... eu não
tinha certeza. O bolso estava vazio. Troquei as mãos e cheguei dentro do
outro bolso, parando quando meus dedos seguraram algo duro e liso. Agarrei-o e
puxei-o para fora, e fiquei por vários momentos apenas olhando para o que tinha
na mão: a ponta de flecha branca que Lily tinha me dado. Ela parece tão delicada,
e ainda assim poderia derrubar um animal de grande porte, ou mesmo um
homem. Suas palavras ecoaram na minha cabeça e eu respirei fundo. "Lily,"
sussurrei. Eu segurei a ponta de flecha contra a luz do teto e, em seguida,
agarrei-a na minha mão. Era sólido. Era real. Cerrei os olhos fechados. Ela
era real também?
Seria possível que eu tivesse corrido sozinho pela floresta, criado um
cenário de fantasia inteiro sobre como recolhi objetos reais e desenhei figuras de
vara na rocha para apoiar a ficção da minha própria vida? Jesus, eu tinha sido a
porra de um aloprado? Eu me encolhi. Caminhando de volta para o meu
quarto, larguei a ponta de flecha em cima da minha cômoda e respirei fundo. Os
loucos raramente questionam sua própria sanidade.
Tomei um banho rápido e, em seguida, ainda incapaz de tirar essa ponta
de flecha da minha mente, fui para a sala e abri meu laptop. Eu pesquisei
Whittington e obtive os mesmos resultados que da primeira vez. Eu rolei através
do site que eu tinha originalmente olhado. Sentado, eu mastigava meu lábio
inferior, pensando sobre tudo o que eu não tinha considerado ainda. Lily tinha me
falado sobre duas fugas. Eu procurei por quaisquer informações sobre qualquer
uma das duas, mas não encontrei nada. Pode ser que Lily tenha realmente
lido essas histórias em artigos de jornais velhos que encontrou dentro do
hospital, e que essas histórias simplesmente não tivessem sido colocadas on-
line por algum motivo - ou eu podia ter inventado a coisa toda. De volta à estaca
zero. Após uma breve pausa, onde eu apenas olhei para a tela do meu laptop, fiz
uma pesquisa pelos proprietários de Whittington. Pensei que tinha
recordado da leitura que ele tinha sido um hospital de propriedade privada.
Levou-me cerca de cinco minutos para encontrar as informações: Whittington e
sua circundante propriedade eram de Agostinho Corsella, um magnata do setor
imobiliário do Colorado, que o tinha comprado em 2008. Ele tinha falecido, mas
parecia que a contrução ainda era propriedade da família
Corsella. Eu pesquisei, procurando mais informações sobre ele, mas não havia
nada que pudesse me interessar. Bocejando, fechei o laptop e coloquei-o de lado,
decepcionado com a minha pesquisa on-line infrutífera. Mas, o que eu
realmente estava procurando, de qualquer maneira? Alguma coisa. Qualquer
coisa.
Eu tinha a ponta de flecha agora. Isto era alguma coisa, não era? Não era?
Pensei por um momento, lembrando a miríade de coisas que Lily tinha dito
para mim.
Eu entrei na minha conta do iTunes e fiz algumas pesquisas. Amo canções
de amor dos anos 40, ela tinha dito. "All of Me" começou a tocar, enchendo o
silêncio da minha sala de estar. Eu a ouvi do começo ao fim, me perguntando se
esta era uma das que Lily mais teria gostado. Conforme a seleção de músicas
tocava - "I'll Be Seeing You", "Tenderly" e "Some Enchanted Evening" - eu olhava
vagamente para o teto, minha cabeça apoiada no encosto do sofá, minha mão no
meu cabelo. E eu me perguntava se essas músicas supostamente eram muito
tristes e criavam dor intensa no peito.
E o que dizer da tristeza persistente que estava sempre-presente no meu
coração? Eu poderia sentir tanta falta de alguém que nunca tinha
realmente existido? Eu poderia ansiar por um sonho? Eu tinha
retornado para mim mesmo, mas ainda estava sem ela, e tudo
apenas parecia... fora.
Esgotado por meus próprios pensamentos eu subi na cama um pouco
depois, e o rosto de Lily foi a última coisa em minha mente quando eu caí em um
sono sem sonhos.

"Hei, você aí, bonito," Jenna disse, levantando-se da escada do meu prédio
onde tinha estado sentada, esperando por mim. Ela estava usando uma saia
preta slim e uma blusa branca, obviamente tendo vindo direto do
trabalho, assim como eu.
"Hei," eu disse, sorrindo. "O que você está fazendo aqui?"
"Eu descobri hoje cedo que tenho que voar para St. Louis esta noite –
problema de empacotamento de emergência." Ela revirou os olhos e eu ri.
"Parece sério."
"É solúvel. Esperemos. De qualquer forma, eu não posso ir para o jantar
amanhã à noite, e estou chateada. Pensei que talvez pudéssemos passar um
pouco de tempo juntos agora, antes eu que tenha que ir para casa e me
arrumar." Ela inclinou a cabeça, parecendo esperançosa.
"Oh, uh, sim, ok."
Ela fez uma careta. "Você está ocupado. Eu deveria ter ligado. Essa não é
uma boa surpresa. Eu pesquisei seu endereço e apenas apareci, o que
provavelmente está cruzando a linha. Eu estou indo muito rápido. Deus."
Um rubor envergonhado levantou-se em seu rosto, o que foi cativante.
Eu não pude deixar de sorrir enquanto segurava sua minha mão. "Não, não.
Eu não me importo. É uma boa surpresa. Eu estava apenas indo a academia.
Mas prefiro gastar meu tempo com você." Eu balancei a cabeça em direção ao meu
prédio. "Deixe-me apenas mudar de roupa, e então podemos ir comer alguma
coisa?"
Jenna soltou um suspiro. "Sim, legal." Ela ainda parecia insegura, e por
isso eu me inclinei e beijei-a na bochecha.
"É bom ver você, por sinal."
Ela sorriu. "Prazer em te ver também." Peguei a mão dela e levei-a até o
meu apartamento.
Meia hora depois, nós caminhávamos ao longo de uma rua perto da
marina, em direção a um restaurante italiano para o qual eu não tinha ido há
mais de um ano. "Oh, eu queria perguntar se você está disponível daqui a duas
semanas, a partir de agora? Sexta-feira?", Perguntou Jenna, virando-se para mim
um pouco enquanto andava.
"Eu acho que sim", eu disse, parando em frente do restaurante e segurando
a porta aberta enquanto ela passava. "O que estará acontecendo na sexta-
feira daqui a duas semanas a partir de agora?"
"Um dos meus maiores clientes está ajudando no acolhimento de uma coisa
de caridade em Marin. Eu lhe disse que estaria lá."
"Qual é a caridade?"
"Crianças da Guatemala. Eles estão construindo uma escola ou algo assim."
Eu ri e levantei uma sobrancelha. "Uma causa perto de seu coração,
então?"
Ela riu. "Não realmente, mas haverá champanhe. O que você acha? Você
tem um smoking?"
Minha mente ficou momentaneamente em branco quando recordei uma
reação muito diferente para pessoas em necessidade. Há sempre alguém que a
sociedade escolhe não ver. Alguém que é invisível, e não por culpa
própria. E se ainda assim ela não tivesse existido? Confusão e desespero
puxaram meu coração, mas eu fiz o meu melhor para empurrar os sentimentos de
lado. Reorientando-me para a mulher na minha frente – a mulher real –
pensei rapidamente sobre o que ela me pediu. Um smoking...
"Eu posso conseguir um."
"Impressionante."
A hostess nos levou para a nossa mesa, e pedimos vinho.
"Então, o que você estará fazendo neste fim de semana?"
Limpei a garganta. "Na verdade, eu tenho que limpar a casa de Holden. Eu
estava pensando em fazê-lo neste final de semana. Faz um ano e meio e eu ainda
não toquei em nada."
A boca de Jenna abriu um pouco. "Oh, puxa. Eu não sabia que
você era tão próximo de Holden Scott."
Eu balancei a cabeça. Na verdade, Holden tinha deixado tudo para mim –
seu dinheiro, sua casa, todas as suas coisas. Eu pensei sobre isso, e decidi que
estava pronto para passar por algumas dessas coisas, pelo menos - livrar-me de
suas roupas e coisas sem sentido como essa. Eu faria um pouco de cada vez, indo
devagar, vendo como me sentia. Pelo menos isso era o que Dra. Katz tinha dito na
minha última sessão. "Sim. Sim, eu era. Nós éramos melhores amigos desde a
infância. Nós dois crescemos em Ohio."
Os olhos dela se arregalaram. "Oh Deus, Ryan. Eu sinto muito. O que você
vai fazer com as coisas dele? Aposto que alguns itens iriam alcançar preços loucos
se você os leiloasse."
"Eu não leiloaria as coisas de Holden," eu disse um pouco na defensiva.
Ela colocou a mão em cima da minha sobre a mesa. "Eu só quis dizer
que isso poderia trazer algum dinheiro, que você poderia usar para ajudar outras
pessoas. Ele era defensor de alguma instituição de caridade ou algo assim?"
Suspirei. "Sim. Vou pensar sobre isso." Deus, mesmo falar sobre isso tinha
me deixado cansado. Eu realmente poderia fazê-lo?
Jenna fez uma pausa, dando-me um pequeno sorriso. "Se você puder
esperar alguns dias, eu posso vir e ajudar."
Eu resisti, fazendo uma careta. "Não, obrigado, Jenna. Isso é algo
que eu tenho que fazer por conta própria."
O rosto dela caiu enquanto ela afastava a mão. "Eu entendo."
"Obrigado." Felizmente a garçonete interrompeu a pausa constrangedora
que se seguiu, servindo nosso vinho. Eu brinquei com os talheres diante de
mim sobre a mesa. "Ouça, Jenna," eu disse. Ela sorriu, como se esperando más
notícias. "Eu acho que deveria te dizer algo sobre mim. E quero dizer antes que
isto vá de qualquer modo mais longe. Eu não quero que você se sinta
enganada e –"
"Você está namorando outra pessoa", disse ela.
"O quê? Não, nada disso. Não, é sobre mim."
Ela pareceu relaxar. "Ok, o que é?"
Fiz uma pausa, procurando as palavras certas. "Quando Holden morreu,
eu... me perdi por um tempo. Eu," Jesus, isto era difícil, "fiquei um pouco louco."
Jenna inclinou a cabeça, parecendo confusa. "Ok. Bem, eu acho que isso é
apenas natural. Quero dizer, deve ter sido um grande golpe. Agora que eu sei que
vocês eram melhores amigos... deve ter sido devastador."
Eu balancei a cabeça. "Sim, mas... Eu não acho que estou comunicando a
gravidade do meu colapso. A verdade é que eu não fiquei apenas um pouco
louco: eu fiquei muito louco." Deixei escapar uma pequena risada contendo pouco
humor. "Eu achei que você deveria saber. E eu não vou te culpar se você quiser
correr na direção oposta agora."
Ela me olhou por um momento, e eu me desloquei em desconforto, olhando
para baixo. "Ryan, você está tentando me dizer que você é mercadoria
danificada?"
Eu encontrei seus olhos. "Uh, sim, acho que isso é o que eu estou
tentando dizer. Isso é exatamente o que estou tentando te dizer, na verdade."
Ela estendeu a mão e colocou-a sobre a minha mais uma vez. "Sinto muito
que você tenha passado por tal momento difícil. E eu sinto muito que você perdeu
alguém que amava. Mas eu acho que o fato de que você ficou tão mal mostra que
você é alguém que eu quero conhecer melhor, e não alguém de quem eu quero
fugir."
Eu abri minha boca para dizer algo, mas a fechei novamente. Isso foi muito
bom. Eu não tinha certeza de ter transmitido corretamente a extensão da minha
loucura, mas eu também não tinha certeza se devia lhe dar todos os detalhes. Eu
me sentia melhor apenas dando-lhe um resumo, entretanto.
Jenna levantou o copo. "Ok, então: aos novos começos", disse ela.
"à maravilha e à magia." A vela sobre a mesa piscou, e por um momento a luz
atingiu seus olhos e os fez parecerem quase violeta. Lily. Pisquei quando a luz
mudou de novo, e eles voltaram à sua cor avelã verdadeira.
Eu sorri e me senti um pouco instável. Segurando meu copo para cima e
inclinando a cabeça, eu disse: "À Disneylândia."
Mais tarde, eu dirigi de volta ao apartamento dela e acompanhei-a até a
porta. E então, porque ela era bonita e agradável, e porque me fez rir
genuinamente pela primeira vez em quase um ano, e me fez sentir como se eu
não fosse realmente mercadoria danificada, eu a beijei. Seus lábios estavam
quentes e macios, e tinham gosto de um novo começo.
Capítulo vinte

Lily

"O que você acha?" minha avó perguntou.


Olhei para o quarto simples na casa de aluguel: havia apenas uma cama,
uma cômoda e uma mesa de cabeceira.
Os lençóis da cama era brancos. Estéreis. Não parecia muito diferente do
quarto de onde eu tinha acabado de sair. Pelo menos não tinha cheiro de
desinfetante. "É bom", eu disse.
Minha avó sorriu. "Bem, é apenas temporário, de qualquer maneira, mas
fique à vontade. Tomei a liberdade de encomendar alguns vestidos para você. Eles
estão no armário. Experimente-os quando estiver com vontade, querida."
Eu endureci, sem me virar quando balancei a cabeça. "Obrigada,"
murmurei.
Quando ouvi a porta se fechando atrás de mim, eu andei até o armário e
abri a porta. Pendurados no interior estavam dois sacos de roupa. Levei-os para
fora e abri o zíper do saco de cima. Dentro havia um vestido longo, preto e sem
mangas, simples, mas elegante. Eu relaxei um pouco. Ok, então eu não tinha
escolhido eu mesmo, mas era lindo, eu daria isso à minha avó. E era mesmo o
meu tamanho. Coloquei-o de lado e descompactei o segundo saco. Meus olhos se
arregalaram quando eu puxei um vestido deslumbrante para fora do
saco plástico. Era um vestido de baile de um ombro só que ia até o chão, em um
tom de roxo tão profundo que parecia quase preto quando me afastei da luz. Era
uma releitura de um vestido da década de 40, algo que Lana Turner ou Rita
Hayworth teriam usado num filme de Hollywood. Eu amei tudo sobre
este. Rapidamente retirei minha calça jeans e camiseta de mangas compridas e
o provei. Mesmo com o branco das alças do meu sutiã aparecendo, era bonito
e servia perfeitamente, como se tivesse sido feito apenas para mim. Eu girei,
observando como a saia balançou em torno de mim. Algo sobre isso trouxe uma
sensação de felicidade que eu não tinha sentido há muito tempo. Uma onda de
esperança encheu meu peito. A vida ainda pode realizar milagres, mesmo os
muito pequenos. E talvez, se houvessem pequenas doses suficientes de
alegria, e com frequência suficiente, eu poderia sobreviver. Como se o caminho da
minha vida fosse um quebra-cabeça ponto-a-ponto, os espaços entre os pontos de
alegria eram cheios de incerteza, e talvez até mesmo dor. Mas, eventualmente, eu
tinha que chegar até o fim, e então se formaria algum tipo de imagem. Alguns
tipos de pontos.
Houve uma batida na minha porta. "Entre," eu chamei, esperando minha
avó. A porta se abriu e meu corpo congelou. Era o mordomo de minha avó, Jeffrey.
Ele sorriu.
"Olá, Lily. Meu Deus, quão bonita você está. Qual é a ocasião?"
Ele parou atrás de mim, e eu encontrei seus olhos no espelho – de cor marrom tão
escuro que quase pareciam pretos.
"Eu... Eu estava apenas provando um vestido para um evento ao qual vovó
estará me levando." Limpei a garganta. Eu não gostava desse homem. Ele me
deixava nervosa, mas eu não gaguejaria na frente dele. Eu não daria isso a ele.
Ele sorriu de novo, seus olhos se movendo para baixo do meu corpo. Eu
resisti à vontade e me cobrir com os meus braços, e resisti ao impulso de me
afastar. "Adorável", murmurou. "Tão adorável. Tão crescida." Depois de
outro momento tenso ele se afastou, como se estivesse saindo de um transe.
"Bem, eu só vim aqui para dizer Olá e deixá-la saber que estou aqui se você
precisar de alguma coisa." Eu balancei a cabeça, não quebrando o contato visual.
"Bom", ele murmurou, caminhando até a porta. Ele olhou para mim.
"Estou feliz em vê-la bem, Lily. Muito, muito feliz."
Assim que ele saiu, eu andei rapidamente para a porta e tranquei-
a, ficando de pé contra ela por um momento e respirando profundamente. Então
eu me despi, devolvi os vestidos aos seus sacos de roupa e pendurei-
os com cuidado, ressentindo-me de Jeffrey por manchar o que tinha sido um
momento feliz. Qual era o ponto de parecer bonita num vestido novo, de qualquer
maneira, quando o homem que eu queria que me visse nele nunca o faria?
Eu rapidamente vesti novamente meu jeans e camiseta.
Como eu andava na ponta dos pés em silêncio ao descer as escadas, ouvi
minha avó falar com Jeffrey. Eu peguei meu nome, mas não me preocupei em
ouvir exatamente o que eles estavam discutindo. Vesti meu casaco e abri a porta
lentamente. Pouco antes de fechá-la, gritei para trás de mim: "vou sair. Estarei de
volta em breve." Eu precisava sair e limpar minha cabeça.
Eu ouvi alguns passos bruscos vindo em minha direção, e então fechei a
porta atrás de mim e rapidamente andei ate a esquina, deixando escapar um
suspiro quando fiquei fora de vista. Eu não queria que minha avó se preocupasse,
mas também não tinha vontade de lidar com ela se preocupando quando
eu saísse para dar uma simples caminhada pelo bairro. Eu detesto ser tratada
como uma criança, apesar de ter quase vinte e um. Isso era tedioso e irritante.
Metade da minha vida tinha sido gasta me sentindo como uma princesa presa
numa torre. Uma princesa danificada. Aquela que não deve esperar ser
resgatada. E agora que eu sabia que o assustador Jeffrey estava
aqui, tudo parecia pior. Muito pior. Por que minha avó confiava nele, eu não tinha
ideia.
Havia um parque a poucas quadras do aluguel da minha avó,
um pequeno caminho a pé tecendo em torno do perímetro. Virei na entrada,
movendo-me para o lado no caso de um atleta ou de ciclista surgir atrás de mim.
Era um dia excepcionalmente frio para a Califórnia, trazendo à mente a sensação
de estar na floresta no Colorado nas noites frias de outono. Enfiei minhas mãos
nos bolsos do casaco para aquecê-las.
Crianças faziam sons altos de prazer – que me fizeram lembrar de aves
gorjeando – enquanto brincavam no parquinho. Fechei os olhos por um instante,
tentando relaxar com cheiro de pinho e folhas mortas flutuando no ar fresco da
noite. Enquanto caminhava, o sol começou a se pôr e a luz do dia esmaeceu. Eu
andei ate uma seção do caminho que era sombreado por árvores de eucalipto em
massa e, por alguma razão, olhando ao redor, toda a paisagem de repente
parecia ter sido desenhada em tinta preta, como a cor incômoda de uma cena
de crime. Pisquei, tentando desesperadamente me controlar. Não, não agora. O
banco. Chegar ao banco. Rápido, respirações rasas. Dentro e fora, Lily. Dentro e
fora. Meus pulmões pareciam estar cheios do frio acentuado do ar. Meu coração
batia descontroladamente contra as minhas costelas. Oh, Deus. Um ataque de
pânico. Obtenha o controle. Obtenha o controle.
Focada no chão aos meus pés, minha respiração finalmente diminuiu e meu
coração se tornou regular mais uma vez. Minha visão lentamente voltou ao
normal, e eu fui capaz de sentar-me direito. O cenário foi retomado. Som e
cor irromperam, e eu deixei escapar um suspiro aliviado. Por que isso continua
acontecendo?
Siga em frente.
Afaste-se da dor.
Quando me senti calma o suficiente para continuar, completei a volta com
as pernas trêmulas, terminando novamente na entrada do parque, de onde corri
de volta para a casa da minha avó. Eu nunca contaria a ela sobre a minha
ansiedade. Ela só se preocuparia e usaria isso para me conter. E eu queria
liberdade. Tudo que eu queria era liberdade.
Onde é que você voa, Lily?
Em qualquer lugar que eu queira.
Em qualquer lugar em tudo.
Capítulo vinte e um

Lily

"Tem certeza que isso não é muita maquiagem? Eu me sinto como uma
espécie de dançarina de Las Vegas."
Minha avó riu. "Garota boba. Claro que não. Será que sua avó te deixaria
usar muita maquiagem? Você está deslumbrante. Como deve estar. É seu
aniversário."
Eu sorri. "Sim..." Virei-me para o espelho, dando uma última olhada em mim
mesma. Eu estava usando o vestido roxo profundo e um par de saltos de tiras.
Meu cabelo tinha sido domado em um estilo bonito, e minha avó tinha
encomendado um lírio – quase a matiz exata do roxo profundo do meu vestido –
de um florista, e o prendeu na parte de trás do meu cabelo. Sorri quando olhei
para ele no pequeno espelho levantado para eu me ver no espelho maior atrás de
mim. Minha maquiagem era dramática, com olhos escuros e lábios nude. Eu
não me sentia exatamente como eu mesma, mas ainda assim não podia negar que
me senti muito, muito bonita. Talvez até mesmo como uma menina que tinha
uma vida pela frente. E se não, talvez apenas por hoje à noite eu poderia fingir
que era mais do que apenas um sonho extraviado.
A limusine já estava esperando por nós na frente da casa da minha avó, e
nós fomos até o hotel onde o evento estava sendo realizado num dos salões de
festas. Saindo da limo, eu fechei os meus olhos e tomei uma respiração profunda,
calmante. Eu não podia deixar de sorrir.
Você se sente real, Lily? Sim. Sim, esta noite talvez eu me sinta.
Minha avó e eu verificamos nossos casacos e fizemos o nosso caminho para
o salão de baile, nossos calcanhares clicando sobre o mármore da entrada do
hotel. Luzes brilhavam, e eu podia ouvir as tensões baixas da música à deriva do
lado de dentro do evento. "Agora, Lily," minha avó disse, inclinando-se para perto
do meu ouvido, "se você começar a se sentir oprimida, basta apertar a minha mão
e nós vamos sair imediatamente. Você não tem que dizer uma palavra."
"Vovó, eu estou bem. Eu prometo. Por favor, não me siga. Eu te amo,
eu realmente faço, mas eu vou ficar bem."
"Tudo bem", disse ela, oferecendo-me um pequeno sorriso nervoso. "Sim,
tudo bem, querida. Divirta-se. Misture-se. A noite é sua. Claro que é."
Entramos no salão de baile, e eu olhei em torno quando minha avó nos
levou para a nossa mesa. Homens estavam bonitos em seus smokings elegantes, e
as mulheres brilhavam e brilhavam, vestidas em todos os belos tons de vestido de
baile que existiam. Todos pareciam conhecer a arte de facilmente se misturar,
alguns sentados em grandes mesas e outros conversando mais ao lado. Vê-los
socializar sem esforço me fez sentir como uma impostora. As mesas foram
enfeitadas com toalhas de mesa laranja, vermelho brilhante e roxo, e a arte
nos corredores era laranja escuro, como se fossem feitos à mão - Guatemala, eu
assumi. E nos centros estavam grandes tigelas de flores tropicais com aparência
brilhante. O doce perfume inebriante flutuava no ar quando me sentei no
lugar em frente ao cartão que soletrava meu nome na elegante caligrafia escrita à
mão.
"Os itens de rifa estão lá, se você desejar olhar para eles," minha avó disse,
apontando para o outro lado da sala, onde eu podia ver grandes cestas e outros
itens no topo das mesas. Hóspedes caminhavam entre as linhas de itens, e muitos
tomavam coquetéis coloridos e champanhe.
"Sim, eu vou", eu disse, ficando de pé.
"Bom. E faça um lance em algumas coisas", disse minha avó. "É por uma
causa maravilhosa."
Eu sorri para ela, assim que uma mulher mais velha usando
um longo vestido branco abordou nossa mesa, saudando minha avó. Minha avó
me apresentou a ela, e nós dissemos nossos olás. "Vou encontrar você lá", eu
disse à minha avó, indicando a área de licitação e acenando com a cabeça
novamente para a mulher.
"Sim, eu acabarei em alguns minutos", minha avó disse, voltando-se para a
mulher de branco.
Atravessei a multidão, tomando um copo cheio de líquido cor-de-rosa de
uma das bandejas e sorvendo um longo gole do doce e picante coquetel. Lambi
meus lábios. "Oh, desculpe-me," eu disse para a mulher que estava carregando a
bandeja. "O que é isso?"
"Um martini de romã."
Estava uma delícia, mas eu só poderia ter dois.
Eu os terminaria rapidamente antes que minha avó me encontrasse.
Não, não, eu não o faria. Este era o meu aniversário, afinal de contas, e eu
tinha vinte e um. Eu podia.
Eu andei até um corredor, olhando por cima dos cestos primeiro e depois
passando para as férias, os bilhetes e outros itens que estavam descritos em
detalhes em pequenos cartazes. Eu escrevi meu nome embaixo de uma cesta
cheia de itens de spa. Por que não?
E quanto a você? Do que você gosta, Lily?
Eu não sei.
Então, talvez fosse hora de descobrir. Eu assinei meu nome abaixo dos
bilhetes para dois para um show da Broadway que seria apresentado num
teatro em San Francisco, e em seguida num jogo de hóquei, e numa viagem de
um dia para Napa Valley, incluindo um passeio de balão de ar quente. Eu tinha
dinheiro. Talvez fosse hora de descobrir como gastá-lo. Embora, se eu ganhasse,
eu não poderia estar em San Francisco há tempo para usar qualquer uma delas.
Tomei outro gole do martini de romã. Olhando por cima do ombro para o outro
lado da sala, vi que minha avó estava, ainda, em profunda conversa com a mulher
de branco. E agora outra mulher tinha se juntou a elas. Ela estava gesticulando
com as mãos, e minha avó e a outra mulher tinham um olhar espantado em seus
rostos. Revirei os olhos. Elas estavam provavelmente discutindo as últimas fofocas
no clube de tênis ao qual minha avó tinha se juntado.
"Oh, olha, uma viagem para Paris", disse um homem. Eu endureci, gelo
subindo pela minha espinha.
"Você já esteve lá?" uma mulher perguntou. Com cabelo
castanho preso num coque e vestindo um vestido preto que mergulhava para
baixo em suas costas, ela era a imagem da elegância.
"Não, mas eu adoraria ir algum dia," disse o homem ao lado dela, com um
sorriso em sua voz. Meu corpo congelou completamente. Eu conheço essa voz. A
reconheceria em qualquer lugar. Oh, Deus. Choque me atingiu como um golpe
físico, e eu andei vários passos para trás, esbarrando em alguém atrás de mim.
Meu pulso saltou loucamente e eu tentei me desculpar com o
homem em quem eu tinha batido, mas as palavras não vieram. Ele me deu um
olhar estranho, mas depois sorriu educadamente, movendo-se de lado. Eu olhei
de volta para o casal ainda na minha frente. Meu sangue estava zumbindo em
minhas veias, e eu senti como se pudesse vomitar. Isso não podia estar
acontecendo. A vida não podia ser tão cruel. Oh, sim, Lily, ela pode. A vida está
mijando agora, na oportunidade de ser tão cruel. A vida está esfregando as mãos
de alegria, tão animada esta neste momento.
Eles ainda estavam olhando em outra direção. Ele estava rindo agora,
dizendo algo em sua orelha, sua mão na parte inferior de suas costas.
Ele... Ryan.
Oh não, não, não.
Era definitivamente ele. Eu o reconheceria em qualquer lugar pela forma
como ele segurava seus ombros, a inclinação de sua cabeça, o tom dourado
profundo de seu cabelo, a cadência de sua risada. A mulher que estava com ele
tombou a cabeça para trás e riu junto com ele. Então ela se virou, e tomando seu
rosto em suas mãos, beijou-o. Oh, Deus. Ele pareceu brevemente surpreso, mas
então beijou-a de volta. Eles estavam se beijando, e eu estava ali de pé atrás
deles, tremendo, martini virando da minha mão. Eu respirei fundo e meus joelhos
quase dobraram. Girando meu braço, coloquei o copo sobre uma mesa à minha
direita. Ou talvez tenha perdido-o completamente. Eu não fazia ideia. Estática
encheu minha cabeça e bílis subiu pela minha garganta. Minhas
entranhas se agitaram dolorosamente. Corra, Lily. Tudo que você tem que fazer é
virar e correr. Faça isso agora. Só que eu não podia. Eu estava presa no lugar,
incapaz de me mover, observando-os se beijar com os olhos fechados, os lábios
que uma vez tinham se movido sobre a minha pele tão amorosamente agora
travados com os dela.
"Lily, querida. Aí está você," minha avó cantou em voz alta, parando atrás
de mim e rompendo o feitiço doloroso que estava me fazendo ofegar em voz alta.
Como se fosse um sonho – um pesadelo, na verdade – eu assisti os músculos de
Ryan tencionar e a garota se separar dele, olhando-o intrigada. O olhar em seu
rosto deve ter lhe dado uma pausa, porque ela inclinou a cabeça, os lábios em
movimento. Ela deve estar se perguntando o que estava errado. Sua cabeça
virou-se para mim, e eu tropecei para trás mais uma vez. Ele estava
se virando. Oh, Deus.
"Lily, qual é o problema? Você parece positivamente pálida, querida. Eu
estou tentando apresentá-la ao Sr. Bradley. Ele é o –"
"Eu tenho que... eu não posso..." Eu botei pra fora, sem fôlego.
Onde você voa, Lily?
Longe. Eu voo longe.
Seus olhos estavam em mim agora, arregalados, sem piscar.
Ryan, era Ryan.
Seu rosto, seu belo rosto.
Ele parecia pálido, chocado. A mulher ao seu lado estava dizendo-lhe algo. E
oh, eu não podia fazer isso. Eu ia cair. Eu precisava voar para longe. E, de
repente, no que parecia ser um instante, ele estava diante de mim.
"Lily," ele engasgou, agarrando-me em meus braços nus. Eu ofegava. Não
podia fazer minha boca se mover. "Lily!" ele quase gritou. Então ele me balançou e
eu soltei um pequeno rangido. Meu coração alojou-se na minha garganta. Ele
estava aqui, na minha frente. Com outra mulher. Oh, Deus, por quê?
"O que no mundo?" alguém perguntou. "O que você está fazendo? Senhorita
Corsella, você precisa de assistência?" Meus olhos dispararam brevemente para o
dono da voz desconhecida e, em seguida, de volta para Ryan. Eu mal podia
respirar, muito menos responder.
"Deixe ela ir," minha avó disse estridentemente para Ryan, ignorando o
homem a seu lado.
Ryan virou-se para o homem. "Você a vê?" Ele demandou. O rosto do homem
tornou-se um estudo em confusão.
"Desculpe-me? Se eu vejo Lily? Ela está de pé bem na minha frente. Está
tudo bem, rapaz?" Ele virou-se para a minha avó. "Bianca?"
Ryan ignorou o homem e se virou para mim. "Lily? Como? Como?"
perguntou ele com a voz embargada, pânico em seu tom. Ou era alegria? Oh não,
isso era pior. Isso era muito pior. Não era? Seus olhos se moveram rapidamente
pelo meu corpo e, em seguida, de volta para meus olhos num
piscar rápido de movimento. "Jesus, Lily," ele respirou. "Lily."
"Eu..." A sílaba morreu em meus lábios. Eu tentei me afastar dele, mas
ele me agarrou mais duro. Oh Ryan, Ryan, Ryan. Eu queria gritar,
porque, misturado com o choque e o intenso ciúme de vê-lo com outra pessoa, eu
senti minha própria alegria. Uma lança cega de euforia, com pontas de
ferro, foi cravada completamente no meu coração. Ryan, meu Ryan, minha mente
insistiu.
Só que ele não era meu em tudo.
"Não", ele disse, "não".
"Ryan, o que está acontecendo?" a mulher que estava com ele perguntou
suavemente, de pé ao seu lado e um passo atrás, olhando em volta,
provavelmente envergonhada e confusa. Eu só a vi na minha visão periférica,
incapaz de tirar os olhos de Ryan. Ele a ignorou, seus olhos ainda treinados em
mim.
"Deixe ela ir," minha avó repetiu mais alto. Ela não queria atrair mais
atenção do que já tínhamos feito.
"Por favor," eu finalmente consegui dizer, "por favor, me deixe ir, Ryan." O
tempo pareceu parar quando seu nome real saiu de meus lábios, a sala
parecendo ficar mais brilhante em volta de mim. Os olhos de Ryan se arregalaram
ainda mais.
"Você sabe o meu nome", disse ele. "Você sabe quem eu realmente sou. Eu
não tinha certeza..."
A mulher que estava com ele deu um pequeno passo para trás, olhando
entre nós dois.
"Deixe ela ir, Ryan," minha avó repetiu para mim. "Você está fazendo uma
cena."
"Vovó, está tudo bem..." Eu olhei para a minha avó, e Ryan, seguindo meu
olhar, finalmente olhou de mim para ela.
"Você", disse ele. "Você estava lá."
"Sim, agora a solte para podermos sair e conversar. Solte-a." Ela olhou ao
redor, oferecendo um pequeno sorriso para a multidão em geral,
alguns caminhando nas proximidades, alguns olhando para nós e
sussurrando. Nada para ver aqui, gente, nada demais.
Ryan olhou de novo para mim, seus olhos selvagens, sua expressão ainda
presa. Ele deixou cair as mãos de meus braços, e eu tropecei ligeiramente para
trás. Ele se adiantou para me firmar, mas minha avó estava mais perto e
envolveu um braço em volta da minha cintura, me segurando. "Vamos apenas
sair", ela repetiu. Ela sorriu para o homem com quem estava falando, o homem
que notei brevemente estar observando a cena com uma expressão preocupada
no rosto.
"Sim, por favor, eu gostaria de ir," eu disse, virando-me, minha avó se
movendo comigo. Minhas pernas pareciam pesadas quando ela me levou para fora
do salão. Eu tinha que me concentrar para fazê-las se movimentar. Atrás de
mim eu ouvi momentaneamente Ryan falando com a mulher com quem estava, e
então ouvi seus passos no piso de mármore atrás de nós. Fiquei tonta, como se a
metade do martini que eu tinha consumido tivesse ido direto para a
minha cabeça. Como se eu estivesse bêbada.
Eu senti seu calor atrás de mim antes de me virar, sua mão novamente no
meu braço. "Lily, por favor", disse ele. Nós estávamos fora do salão de baile agora,
a música filtrando para o vestíbulo onde estávamos. "Você é real", Ryan
sussurrou, sua mão segurando a minha e seu polegar fazendo um círculo sobre o
meu pulso, como se verificando se eu estava realmente viva. Pisquei. "Você é
real", ele repetiu, como se precisasse dizê-lo duas vezes para convencer a si
mesmo.
Senti meu rosto se contrair numa carranca. "Você achou que... que eu não
era real?" Eu finalmente perguntei, confusa.
Ele soltou uma rajada de ar. "Eu, Cristo, Lily, eu não tinha certeza. Eu
questionei isso, sim. Eu tenho questionado isso."
Algo sobre isso doía. "Eu... vejo," eu disse. Se ele não sabia que eu era real,
ele não pode ter sentido minha falta, ansiado por mim como eu ansiava por ele.
Ele não podia ter. Ele não deve ter. É por isso que ele estava com essa mulher,
dando-lhe seu corpo e seu coração. Ele tinha se esquecido de mim, seguido em
frente. Ele tinha me descartado como nada mais do que um sonho.
"Você me deixou. Por quê?" ele perguntou. "Por que você não me disse que
estava aqui? Em San Francisco? Quanto tempo –"
"Vamos passar para o lado," minha avó disse, caminhando alguns passos,
então fomos mais longe da porta aberta. Segui-a e assim o fez Ryan. Ryan estava
olhando para a minha avó.
"Você estava lá", disse ele, repetindo o que disse lá dentro. Ele se virou para
mim. "Ela é sua avó."
"Sim", eu sussurrei. "Minha avó," eu hesitei e depois acrescentei: "Bianca
Corsella." Eu tinha considerado não oferecer o nome dela, mas havia uma centena
de pessoas no interior do salão de baile que poderia dizer-lhe os nossos nomes.
Não parecia valer a pena retê-los agora. Os olhos de Ryan estavam se movendo
sobre o meu rosto, sua expressão ainda chocada, confusa.
"Onde está sua mãe, Lily? Eu não entendo nada disso. Por favor,
me explique."
Minha avó pegou minha mão. "Minha filha, a mãe de Lily, está morta há
um longo tempo", minha avó disse calmamente. "Minha neta está doente, Ryan,
assim como você. Tudo o que você sabe sobre ela é uma
mentira. Lily estava vivendo uma mentira." Ela olhou em volta para se certificar
de que ninguém a tinha ouvido falar. Eu apertei meus olhos fechados e, em
seguida, abri-os. "Por favor, você tem que entender que ela não pode vê-lo
novamente." Calor foi subindo do meu peito até meu pescoço, enchendo minha
cabeça, fazendo-me sentir como se eu fosse desmaiar. Eu não queria que ele
soubesse. Era irracional, porque eu o tinha entendido, eu tinha entendido que ele
estava doente, mas eu só... não queria que ele soubesse. Não sobre mim. Eu me
senti humilhada e pequena e cheia de desespero.
Porque agora ele ia perceber o que eu já tinha vindo a compreender: nós
nunca poderíamos ficar juntos. Nunca haveria um nós. Não era possível. Eu não
sou boa para ele, e sinceramente, ele provavelmente não era bom para mim. A
mulher no interior do salão de baile, a mulher esperando por ele, a bela mulher
no vestido preto que ele estaria levando para casa esta noite e com quem
faria amor, ela era melhor para ele do que eu. Eu não sabia nada sobre ela,
mas, eu sabia disso. E isso me encheu de dor e de um doente e feroz ciúme.
Imaginei seu corpo nu movendo-se acima dela e respirei audivelmente, miserável.
Ryan estava olhando para mim, claramente tentando entender. "Lily?" ele
perguntou.
Fechei os olhos momentaneamente. "É verdade", eu disse, encontrando seu
olhar. "Minha mãe está morta. Estive num hospital este ano. Estou doente, Ryan.
Eu estava... melhorando. Já aconteceu antes, eu..." Minha voz ficou menor. Eu
não sabia mais o que dizer.
"Ok", ele disse, "nós podemos trabalhar com isso, Lily."
"Não há nada para trabalhar," minha avó disse, trancando seu braço no
meu.
Ryan olhou para ela, o primeiro sinal de raiva em sua expressão. "Lily e eu
podemos ter um momento a sós, por favor?", ele perguntou, sua mandíbula
apertada.
"Absolutamente não. Lily, querida, nós precisamos ir. Você parece
positivamente abalada, de qualquer maneira." Ela olhou para Ryan. "Você
pode ver quão delicada ela é? Pode ver o que isso tem feito com ela?"
"É o melhor", eu disse fracamente. "O que minha avó disse é verdade. Tudo
que você sabe sobre mim é uma mentira. Eu vivi uma mentira. É o melhor que eu
vá embora, Ryan."
"O melhor?" ele perguntou, incrédulo. "O melhor?"
Ele olhou novamente para trás e entre a minha avó e eu, seus olhos um
pouco selvagens novamente. "Você não pode simplesmente sair daqui!"
"Nós certamente podemos", minha avó disse, levando-me embora. "Lily tem
razão. É o melhor. Você vai perceber isso. Volte para o seu encontro, Ryan. É bom
vê-lo bem." Ryan estava ali, balançando a cabeça em descrença enquanto
eu permitia que minha avó me levasse embora. Parecia que meus joelhos se
curvariam a qualquer momento. Tudo em mim estava gritando para correr de
volta para Ryan e pedir-lhe para me levar de lá, me levar com ele, mas eu não
podia. Mais miséria me envolveu.
Ryan, me leve de volta para a nossa floresta, onde podemos estar juntos,
onde podemos ser apenas nós, onde você era livre para me amar e eu era livre
para te amar de volta. Leve-me para lá. Oh, por favor, por favor me leve pra lá.
Mas não. Minha avó estava certa de nos separar, e a mulher lá dentro
estava esperando por ele.
"Lily," Ryan repetiu, mas ele não tentou impedir-nos novamente. Ele deixou-
nos ir embora. Deixou-me ir. Assim como eu devo deixá-lo ir. Atrevi-me a olhar
pela janela da limusine quando ela se afastou do meio-fio. Através das portas de
vidro eu podia ver Ryan ainda de pé no saguão, observando quando nosso carro
passou e foi embora. Ele foi ficando menor e menor, e a distância entre nós
cresceu, todas as minhas esperanças encolhendo conforme mais longe dirigíamos
- até que finalmente desapareceram completamente. Novamente. Finalmente,
incapaz de conter a angústia por mais um minuto, eu coloquei meu rosto em
minhas mãos e solucei.
Capítulo vinte e dois

Ryan

O vidro atingiu a parede e quebrou, o som quebrando o silêncio do meu


apartamento, me sacudindo do choque ainda me segurando firmemente em seu
aperto.
Lily.
Aqui, em San Francisco.
Ela era real – ela tinha estado bem na minha frente.
E ela sabia quem eu era, também. Eu tinha certeza que ela descobriu que
eu não era Holden.
Você sabe sobre mim? Você sabe?
Sim, amor.
Mas, eu não sabia que ela sabia quem eu realmente era. Não sabia se ela
tinha feito a conexão. Claro, eu nem sabia se ela era real, então eu não
me permiti pensar muito sobre esse aspecto. Cada vez que o fiz, me fez pensar se
eu ia enlouquecer novamente – até
mesmo se considerar isso me faria enlouquecer de novo – e então
eu desliguei. Cristo. Eu não tinha mais que saber se ela era real, e por isso eu
deixei-me pensar sobre o resto. Sobre como ela tinha parado de usar meu nome
e só me chamava de Escoteiro depois que olhou para a foto de Holden na capa da
revista.
Sim, ela definitivamente sabia. Meu Deus.
Talvez ate mesmo você não me conheça. Você sente assim? Você deve.
Não, não.
Lily. Eu a tinha encontrado e a tinha visto ir embora. O que mais eu poderia
ter feito? Enfrentá-la? Ela queria sair. Ela parecia prestes a entrar em colapso.
Mas sinceramente, eu só tinha permitido que ela saísse porque sabia seu nome.
Lily Corsello. Seu nome era Lily Corsello, e sua avó era Bianca Corsello. Sua
família era dona do Whittington. Santa foda.
E ela estava mentalmente doente? Ela tinha sido hospitalizada? Por
um ano? Eu não sabia o que fazer com isso, não entendia. Minha mente ainda
estava chocada. Eu a amava. Deus, eu a amava tanto. Eu ainda a amava. Se eu
tinha qualquer dúvida antes desta noite, vendo-a na minha frente, sentindo uma
onda selvagem de alegria, como se tivesse voltado dos mortos – que, em essência,
para mim, ela tinha – tirou toda e qualquer pergunta sobre a profundidade
dos meus sentimentos. Sua doença mental: era por isso que ela pensava que não
poderíamos ficar juntos. Ela passou o último ano em um hospital e pensou... o
quê? Que eu a teria desprezado por isso? Por que ela pensaria isso depois do que
sabia de mim, da batalha que lutei o tempo todo em que estive no Colorado? Da
batalha que eu poderia lutar pelo resto da minha vida.
Ela pareceu tão magoada quando eu disse a ela que tinha me perguntado
se ela era real. Sentado aqui agora, sozinho no meu apartamento, eu me
perguntava como diabos eu poderia ter questionado isso. Seus olhos. Aqueles
olhos violetas. Mesmo eu não poderia ter sonhado com olhos assim. Corri a mão
pelo meu cabelo, deixando escapar um grunhido de frustração. O que eu deveria
fazer agora? Um milhão de perguntas giravam em minha mente.
O ding do meu telefone interrompeu meus pensamentos caóticos. Jenna. Eu
me sentia terrível sobre Jenna, mas Jesus, como eu deveria lidar com essa
situação? Ver Lily tinha me batido com a força de um furacão. Eu
tinha levado Jenna para casa logo após isso, não oferecendo-
lhe outra explicação além de que eu conheci Lily quando estava no Colorado,
e que ela tinha desaparecido. Eu não sabia o que tinha acontecido com ela, e vê-
la lá foi um choque. Eu disse a Jenna que toda a situação tinha me dado dor de
cabeça e que precisava ficar sozinho. O que não era uma mentira. Minha cabeça
latejava de uma maneira que não acontecia há um ano. Ainda assim, o olhar
esmagado no rosto de Jenna me deixou sentindo-me como um idiota completo e
absoluto. Eu joguei meu telefone de lado. Eu responderia a Jenna na parte da
manhã, quando pudesse vir com uma explicação melhor – quando eu soubesse o
que dizer a ela.
Retirando meu computador, eu novamente pesquisei Augustine Corsella,
procurando especificamente informações sobre sua família. Agora que eu sabia o
que estava procurando, fui capaz de limitar a pesquisa e encontrar algumas
migalhas para me ajudar a juntar as peças. Ele foi socorrido por sua
esposa, Bianca. Augustine e Bianca tiveram uma filha chamada Rachel. E
havia outro nome anexado a esses nos sites de busca que eu olhei – Lily Corsella.
Rachel deve ser sua mãe. Eu não pude encontrar qualquer informação sobre seu
pai, porem. E ela usava o sobrenome de sua mãe... Eu tive que
assumir que seu pai não estava no quadro, por algum motivo ou outro.
Infelizmente, o único endereço que encontrei para qualquer um deles era
um endereço perto de Telluride. Merda. Eles estavam aqui em San Francisco. Sua
avó tinha dito que a estava levando para casa. Como eu ia descobrir o endereço
dela? Ok, eu me preocuparia sobre isso amanhã. Tinha várias ideias. Inferno,
eu chamaria um detetive particular se tivesse que fazer. Lily não ia desaparecer
novamente.
Voltei a tentar encontrar informações sobre a mãe de Lily, que parecia ser
o centro do mistério. Por que diabos não estou recebendo respostas diretamente
de você, Lily? Depois de pesquisar por mais de quinze minutos, fui capaz de
confirmar que Rachel Corsello era falecida. Não havia muita informação sobre ela.
Eu não consegui encontrar nada sobre como ela morreu. Mas
ela estava definitivamente morta. Então, Lily tinha... o quê? Mantido-a viva em
sua mente? Ela tinha morado em Whittington, naquele empoeirado
e abandonado edifício de horrores, imaginando que sua mãe estava lá com ela,
andando sozinha através floresta dia após dia
e finalmente me encontrando? Deus, Lily. Eu desliguei o computador, achando
muito difícil continuar tentando preencher os muitos espaços em
branco sem as explicações de Lily. Eu devia isso a ela, ouvir a história de seus
lábios. E ela me devia uma explicação também, caramba.
Tudo o que você sabe sobre ela é uma mentira. Lily estava vivendo uma
mentira.
Eu apertei meus olhos fechados. Não. Eu me recusava a
acreditar que nossos sentimentos um pelo outro fossem uma mentira.
Eu estava doente, também. Possivelmente ainda mais doente do que Lily.
E, todavia, eu a amava. Isso tinha sido real. Ainda era real. Não iam me
convencer do contrário. Nem mesmo eu, não de novo.
Eu coloquei meu computador de lado e levantei-me, esfregando as palmas
das mãos no meu jeans. Eu estava impaciente e ainda tinha dor de cabeça, mas,
tudo que eu queria fazer era correr por toda cidade em direção a Lily. Mas eu
realmente não tinha ideia de onde ela estava. Desamparo corria através de mim,
fazendo com que meu intestino torcesse dolorosamente. E se ela tentasse
desaparecer? E se sua avó a levasse para algum lugar onde eu não poderia
encontrá-la? Não, não, sua avó estava obviamente tentando protegê-la –
intenções equivocadas ou não – e ela não ia escondê-la em algum lugar. Eu as
tinha deixado sair hoje à noite, apenas sair. Eu deixei-as sair, e tinha que
acreditar que minhas ações tinham acalmado a mente de sua avó. Além disso,
elas estavam aqui em San Francisco. Se sua avó imaginasse que eu era uma
grande ameaça, certamente ela não teria concordado em colocar Lily num
hospital tão próximo. Deus, ela provavelmente tinha estado há menos de trinta
minutos de mim todo esse tempo. Todas as noites eu sentava sozinho no meu
apartamento ou andava pelas ruas sem rumo, terminando em lugares
estranhos, consumido pela miséria, ouvindo sua voz na minha cabeça, como
se suas palavras estivessem flutuando ao meu lado no vento... e ela estava a
algumas milhas de distância. Eu sonhava com ela mais e mais,
visões me torciam e me fazia acordar em um suor frio, jurando que seu perfume
pairava no ar em torno de mim como uma bênção. E todo esse tempo ela
tinha estado ao meu alcance.
Eu agarrei meu casaco. Não podia ficar neste apartamento. Eu sai e andei
uns quarteirões para um bar onde nunca estive antes. Eu não tinha tomado uma
gota de álcool desde que tinha deixado o Colorado, mas
se alguma coisa justificava uma súbita recaída, isso parecia malditamente
certo. Lily.
Capítulo vinte e três

Lily

O aquário estava um pouco lotado num domingo às onze da manhã. Escuro


e fresco, e com vida marinha ocupando tanques em ambas as paredes e até
mesmo em cima, era como andar debaixo d'água, como estar num mundo
diferente. Perdida em pensamentos, eu apreciei os tanques do chão ao teto,
arrastando o dedo ao longo do vidro quando um peixe nadou até ele, seguindo seu
movimento com a mão. Eu tinha estado escondida o dia inteiro, e precisava sair
ou ficaria louca. Esse argumento particular tinha feito minha avó
pálida, então ela tinha sugerido vir para o aquário, para onde ela tinha
comprado entradas há vários meses. Ela tinha um compromisso – graças a Deus –
e por isso eu fui capaz de sair sozinha. Eu não estava particularmente
interessada no aquário, mas esse não era realmente o ponto. O ponto era
a pequena dose de liberdade, algo para ocupar minha mente. E assim lá estava
eu. Claro, eu estava cinte de que a mulher com um crachá de aquário pendurado
em seu pescoço parecia estar onde quer que eu tenha passado, e isso
certamente não era uma coincidência. Minha avó chamou alguém para ter
certeza que eu não fugiria mais uma vez.
Eu não acho exatamente que a culparia. Eu obviamente lhe dei alguns cabelos
brancos. E, depois do que aconteceu no evento de caridade, eu tinha certeza que
ela pensava que eu poderia quebrar a qualquer momento. E, Deus, talvez eu o
fizesse. Ainda assim, sentir-me como uma doente mental mesmo no mundo
exterior, era intolerável. Eu não poderia viver assim. Não há vida em
tudo isso. Senti o calor de um corpo atrás de mim – a consciência que fez os
pequenos pelos na parte de trás do meu pescoço se levantarem – antes de ouvi-lo
falar. Meu corpo enrijeceu.
"Você ainda tem o mesmo cheiro. Mesmo aqui." Sua voz era baixa e
ligeiramente rouca bem atrás da minha orelha. "É como se eu pudesse sentir o
cheiro da floresta em torno de nós, mesmo agora. Pinho e," ele fez uma pausa, e
eu de alguma forma sabia que ele estava fechando os olhos, "essas flores
silvestres que crescem ao lado do córrego – as brancas." Sua respiração começou
a abanar o lado do meu pescoço e eu tremi, fechando os olhos brevemente,
jurando que a pressão da água nos tanques igualava a corrente
que fluía entre nós. Se apenas.
"Você não deveria estar aqui", eu disse, mas saiu ofegante e inseguro. Mais
uma pergunta do que a declaração que eu pretendia. Meu coração estava
batendo em meu peito.
"Não?" Ele moveu meu cabelo sobre meu ombro e se inclinou. "Então onde
eu deveria estar, Lily?"
"Esta não é a floresta, Ryan. É o mundo real e –"
Minhas palavras morreram quando a mão de Ryan se moveu lentamente
pelo meu braço, e seus dedos entrelaçaram nos meus. Eu cerrei os olhos
fechados.
"E o quê?"
"Como você me achou?"
"Eu liguei para a companhia do carro que você usou, lhes disse que tinha
esquecido algo em seu veículo e eles tiveram que confirmar o endereço. Segui-
a ate aqui então."
"Inventivo," eu disse, puxando minha mão da sua. Eu estava tremendo, e de
repente eu o odiava apenas um pouco por fazer isso para mim. O odiava por
fazer isto machucar mais do que já tinha.
"Eu voltei, você sabe, a cada mês durante nove meses seguidos. Voltei para
Whittington e procurei por você. Você me assombrava. Eu andei pela
floresta. Chamei seu nome. E todo esse tempo, todo esse tempo, Lily, você estava
a poucas milhas de distância de mim. Você simplesmente desapareceu. Você ia
mesmo me deixar sem nenhuma explicação de novo?" A dor em sua voz fez meu
peito doer. "Você não pensa em mim, também?"
Oh, Deus. Oh, Ryan. Por favor, não faça isso comigo. Ele tinha voltado. Ele
tinha procurado por mim. Ele empurrou meu braço e eu tropecei numa esquina
com ele, num pequeno recanto do outro lado de um tanque de água-viva. Luz em
movimento dançava ao redor de nós no espaço escuro, e eu estava cara a cara
com ele agora. Ele estava bem na minha frente – perto demais – seus tristes olhos
azuis, suas altas maçãs do rosto, o nariz reto, e aqueles lábios... os
lábios que eu nunca beijaria novamente. Os lábios que eu tinha visto beijar outra
pessoa. "O que minha avó lhe disse não foi o suficiente?" Desviei os olhos. "Tudo o
que aconteceu entre nós, nada daquilo foi real. Nada. Você era uma fantasia,
nada mais. Você não vê, agora que sabe sobre mim? Nós éramos apenas duas
pessoas doentes correndo pela floresta como crianças brincando de faz de conta."
Ele se inclinou para trás de repente, como se eu tivesse batido nele. "Você
está errada, e você não acredita nisso. Você não pode sequer olhar para mim
quando diz isso. Isto não é real. Isto é falso, Lily. Uma mentira. Você agindo como
se aquilo que tínhamos nada significasse é falso. O que tínhamos na floresta era
real e estava certo. O que eu sentia por você, o que eu sinto por você, é real."
"Você não sabia quem eu era", sussurrei. "Você nem sabia quem você era."
Ele me olhou por alguns instantes. "Esse é o ponto, então? Você não é capaz
de ficar comigo porque estou doente? Mercadoria estragada?"
"Eu... Sim," menti, endireitando minha postura. "Isso e o fato que eu sou
doente, também. Eu estou doente. Essa garota que você estava beijando no
evento de caridade, você deve estar com ela. Alguém normal, alguém..." Eu
parei, sem saber exatamente como acabar essa afirmação. Alguém melhor, mais
saudável... alguém que não fosse eu. Oh, Deus, apenas o
pensamento me feriu com uma intensidade que roubou meu fôlego.
Eu me sentia como se estivesse morrendo por dentro.
Ele me olhou por alguns momentos tensos, seus olhos movendo-se sobre
minhas características. "É isso que você quer? Você quer que eu fique com ela?"
"Sim", eu disse, me sentindo doente. "Sim, isso é o melhor." Meu corpo
estava frio e instável. Ryan deu um passo para trás. Eu abri minha boca para
pedir-lhe para não ir, mas a fechei. Isto era por ele. E realmente, era por mim,
também. Era o melhor. Não era?
"Por que você veio para San Francisco?" Ele demandou.
"Por quê?"
"Sim. Se o que você sentia por mim não era real, então por que você está
aqui?"
"O hospital... é um dos melhores e –"
"Isso é mentira. Há uma abundância de bons hospitais em todo os Estados
Unidos. Por que aqui?"
Eu soltei um suspiro. "Eu só... eu queria ter certeza
que você estava indo bem. Eu queria ser capaz de ver você, te ver. Eu estava
preocupada, eu –"
"Você se importa."
"Sim, é claro que eu me importo. Eu sei o que é estar doente e sozinha. Mas
isso é tudo. Eu verifiquei você, mas nunca quis te ver novamente."
"Você estava me seguindo. Eu vi você. Deus, Lily, eu pensei que estava
enlouquecendo de novo." Ele colocou a mão na testa e inclinou a cabeça para
trás, olhando para o teto por um momento antes de olhar diretamente nos meus
olhos. Não. Não, ele nunca deveria me notar.
Pisquei. "Eu não sabia que você tinha me visto. Sinto muito."
"Você sente muito? Jesus." Ele correu os dedos por seu cabelo já
despenteado, como se tivesse corrido sua mão nele antes mesmo de chegar aqui.
Lembrei-me da sensação de seu cabelo, da textura dos fios, lembrei-me de
tudo como se fosse uma memória marcada na minha pele. "Você lamenta", ele
repetiu enquanto eu mastigava meu lábio.
"Você pensou que eu não fosse nada mais do que uma visão", eu disse, e a
dor disso - a ridícula e irracional mágoa - me encontrou novamente.
Mas, talvez fosse mais fácil para ele ir embora agora. E isso era uma coisa
boa. Tinha que ser.
"E ainda assim eu ansiava por você. Eu deveria saber." Ele olhou para trás
de mim por um momento.
"É só que tudo estava... eu tinha dificuldade em confiar mim mesmo –"
"Eu sei. Eu entendo."
Algo mudou em sua expressão. Algo que eu não conseguia ler, algo intenso.
"Você não acha que foi o destino? Como nos conhecemos? E,
então, como estávamos na mesma festa maldita? Como é que não foi o destino?
Nós encontramos um ao outro uma vez, através dessa enorme extensão de
floresta – duas pessoas encontrando uma a outra no escuro. Pegue minha mão,
Lily. Segure-se em mim agora. Por favor." Ele estendeu a mão para mim, me
implorando com os olhos. Chupei um suspiro de ar, levantando minha mão. Assim
como eu conhecia a suave textura do seu cabelo – longo para correr meus dedos
por ele de novo – eu sabia que ele tinha mãos fortes, mãos graciosas que me
tocaram intimamente. Elas tinham tocado meu corpo e minha alma.
Eu ansiava por seu toque novamente. Apenas um toque, Lily. Sinta o seu amor
mais uma vez. Nossos dedos escovaram.
Atrás de Ryan, eu vi a mulher com o uniforme do aquário passar,
olhando para nós e caminhando com pressa. Esta era a minha resposta. Este era
o meu destino. Não Ryan. Nunca ele... "Eu tenho que ir", respirei. Eu soltei minha
mão. "Não, Ryan, eu tenho que ir. Nós nunca poderemos estar juntos. Nunca. Não
me procure novamente. Eu tenho que ir." Ryan olhou para mim por um segundo e
depois deixou cair sua própria mão, dando um passo para o lado.
"Vá então."
Eu mudei-me em torno dele e corri em direção à entrada, resistindo à
vontade de romper em soluços.

"Ei, garota", Nyala disse, abrindo a porta e afastando-se imediatamente.


"Feche-a atrás de você. Eu estou escrevendo." Eu fechei a porta e me dirigi para
seu escritório, o desespero do meu encontro com Ryan fazendo-me sentir lenta,
sem energia e deprimida.
Eu tinha deixado o aquário precisando de um amigo, precisando de Nyala.
Eu a tinha chamado, mas ela não respondeu. Eu sabia que não significava que
ela não estava em casa e disponível, embora – ela raramente atende seu telefone
– então eu esperei o melhor e tomei o ônibus para seu duplex em The Mission.
"Desculpe, Nyala. Eu não quero interrompê-la." Ny só tinha estado em casa
por um par de meses, e eu apenas a visitei uma vez nesse tempo. Ela só ia ao
hospital quando sentia que estava se desfazendo. Ela tinha ido lá um punhado de
vezes ao longo do ano em que eu tinha sido tratada, e nós tornamo-nos grandes
amigas, apesar de não termos muito em comum – na superfície, pelo menos. Ela
estava em seus cinquenta, usava os cabelos em longos dreadlocks que caíam
pelas costas, e, geralmente vestia brilhantes vestidos africanos com gravuras
impressas. Ela era quente e maravilhosa, e eu pensei nela como uma figura
materna, embora ela fosse imprevisível e dada a voos de fantasia. Pelo menos
era assim que eu a descrevia. Os doutores poderiam descrevê-la de forma
diferente, eu estava certa.
"Não, não, eu posso colocar a escrita de lado, por agora. E eu posso
facilmente falar enquanto esculpo. Deixe-me apenas fechar esse arquivo." Nyala
estava num de seus humores maníaco-criativos. Era criar ou morrer, ou pelo
menos essa é a maneira como ela descrevia. Às vezes ela ficava até três ou quatro
dias seguidos movendo-se entre escrita, escultura e pintura. Então ela ia dormir
por uma semana. Ela nunca se importou de me visitar quando estava num desses
modos, embora. De fato, as maiores coisas que ela fazia, as melhores - ou assim
parecia – eram fruto de quando ela estava no hospital, e consequentemente o
material de arte era limitado. Ela bateu em algumas teclas em seu computador e
em seguida levantou-se, gesticulando para eu segui-la. Ela abriu a porta para o
quarto na parte de trás de seu apartamento, que dava para o jardim e
tinha janelas em três paredes, que deixavam entrar muita luz natural. Ela tinha
vários cavaletes configurados, e uma mesa onde parecia estar criando o busto de
uma mulher. Ela sentou-se na frente da argila e começou trabalhá-la com as
mãos.
"Sente-se", ela apontou para um macio sofá antigo e cor-de-rosa na parede
oposta a ela. Eu sentei-me, inclinando-me contra a parte traseira e suspirando
alto.
"Uh oh. O que foi?" Nyala perguntou.
"Ryan. Encontrei Ryan numa festa e, em seguida, ele... me encontrou." As
mãos de Nyala pausaram momentaneamente antes que ela começasse a
trabalhar novamente. Seus olhos permaneceram em mim, embora.
"Ele fez, não é?"
"Você não parece surpresa."
"Eu não estou."
Inclinei a cabeça. "Por que você não está surpresa?"
"Destino."
Eu gemi. "Essa é a segunda vez hoje que eu ouço essa palavra."
Nyala olhou para mim. "O destino é a língua que Deus usa para falar
conosco, baby. Cabe a nós ouvirmos, embora. O que aconteceu?"
Inclinei a cabeça, considerando suas palavras. Fiquei surpresa por Nyala
acreditar em Deus, já que para qualquer pessoa com uma doença de qualquer
tipo era difícil acreditar em um Deus amoroso. Por que ele não podia nos curar,
então? Nós não éramos dignos? Mas, isso era para outro dia, eu supunha. Eu me
reposicionei no sofá e contei-lhe sobre esbarrar em Ryan no evento de caridade e,
em seguida, sobre ele aparecendo no aquário esta manhã. "Droga", ela disse, a
palavra cheia de surpresa. Era difícil surpreender Nyala quando ela estava num
de seus humores criativos.
"Sim", eu disse. "Eu sei."
Nyala ficou em silêncio por um momento, se concentrando no que suas
mãos estavam fazendo com o barro em sua frente.
"Você nunca o deixou ir", disse ela.
Deixei escapar um longo suspiro. "Não, eu ainda o amo. Mas ainda não
importa." E me lamentar por ele da maneira que eu estive fazendo durante meses
e meses... Eu não podia mais fazê-lo. De novo não.
"Oh, isso é importante. Eu diria ter muita importância."
Eu balancei minha cabeça. "Eu não vou fazer isso com ele, Ny."
"O quê? Amarrá-lo com o fardo que você representa?"
Deixei escapar uma pequena risada, carente de humor. "Basicamente, sim."
Fiz uma pausa. "Ele parece tão bem, Nyala." Eu não pude evitar o pequeno
sorriso que puxou meus lábios. "Ele parece saudável e... feliz."
"E você não está? Saudável, quero dizer?"
Eu balancei minha cabeça. "Não. E provavelmente nunca serei, não
totalmente. Você conhece meu passado, Ny. O que eu tenho a oferecer-lhe além
da promessa de uma vida caótica? De sempre me perguntar se estou prestes a...
entrar num dos meus episódios de fuga da realidade?"
Ela levantou uma sobrancelha, mas seus olhos permaneceram em seu
trabalho. "Episódios? É assim que os especialistas estão chamando-os hoje em
dia?" Não, isso é do que minha avó chamou, e eu tinha tomado o termo.
"Você entende meu ponto, porém, Ny. Depois de tudo que Ryan passou, ele
merece lidar com isso? Lidar comigo? Será que ele merece esse destino?" Mordi
meu lábio, ponderando a questão enquanto miséria caia sobre mim.
Nyala deu de ombros. "Merece isso? Será que algum de nós merece o que
temos nesta vida? É assim que funciona?" Ela encolheu os ombros, respondendo
sua própria pergunta. "Às vezes, eu acho. Mas na maior parte, não."
Suspirei. "Eu só... por que tenho que ser dessa maneira? Eu só quero ser
livre de tudo isso. Deus, eu só quero jogar isso tudo fora."
Nyala estava olhando para mim com simpatia. "Você não pode. Algumas
coisas devem acontecer, e isso é apenas a maneira que é. Não cabe a nós
sabermos o porquê. Ouça, baby, a vida é uma série de coisas que escolhemos
e outras que aceitamos." Ela se levantou, pegando um pano sobre a
mesa em frente e limpando as mãos antes de vir sentar-se ao meu lado no sofá.
"As coisas que nós escolhemos, bem, essas são nossas. Mas
nós não temos escolha sobre as coisas que nos são impostas. Algumas são mais
pesadas do que outras, de algumas podemos ate nos desfazer, mas outras são
nossas para manter. Nós não temos escolha quanto aos
encargos que nos dão para suportar, mas nós temos escolha quanto a como
segurá-los. Nós podemos prendê-los às nossas costas e andar pelo
mundo curvados sob seu peso, como alguém que deve gastar seus dias numa
torre de sino. Ou nós podemos permanecer altos e eretos como uma daquelas
rainhas africanas carregando uma cesta na cabeça." Ela endireitou a coluna e
manteve a cabeça erguida, demonstrando suas palavras, e então sorriu
gentilmente. "Não, querida, nós não podemos escolher que dificuldades levar, mas
podemos escolher a graça com que as carregamos."
Deixei escapar um pequeno soluço, uma lágrima escorrendo pelo meu
rosto.
25
"Agora, você é Quasimodo ou uma rainha africana?" ela perguntou.
Eu ri baixinho, enxugando outra lágrima. "Eu quero ser uma rainha."
Nyala me deu um sorriso deslumbrante. "Bom. Então levante-se. Faça sua
reivindicação, meu amor. Ryan – ou qualquer homem – teria sorte de ter
você, corajosa e linda garota." Ela levantou-se e voltou para sua escultura.
"Mesmo que eu seja uma rainha, ainda sou difícil de amar", insisti.
"Eu não achei difícil te amar. Acho que é bastante fácil, na verdade."
Eu sorri. "Isso é porque você só... me aceita."
"Talvez ele queira aceitá-la, também."
"Eu não deveria deixá-lo." Eu quero deixá-lo. Eu quero deixá-lo tanto.
"Pode não ser sua escolha. E, menina, os que veem o que carregamos e nos
querem de qualquer maneira, esses são para segurar."
"Como poderia isso acabar bem, Ny?" Eu perguntei.
"Oh, Lily. Felizes para sempre não significa uma vida de perfeição. Eu não
acho que alguém realmente acredite que felizes para sempre significa que não há
dias infelizes, ate mesmo anos infelizes. Significa amar para sempre, apesar de
todas as muitas razões mais fáceis para não fazer isso."
Eu suspirei em voz alta novamente, pensando que Ryan não sabia a
extensão de com que poderia estar lidando, ou
o que o para sempre poderia significar entre nós dois. "Oh, a angústia", Nyala
disse e riu. "Eu deveria escrever sobre isso num dos meus romances."
Eu dei-lhe um olhar severo de simulação, e depois sorri. "Eu deveria
escrever um romance sobre mim mesma. Obviamente tenho a imaginação
para isso."
Nyala assentiu. "Você tem o coração de um artista. É por isso que muitos de
nós perdemos nossas mentes."
Eu ri. "O quê?"
"Não, é verdade. Vá a qualquer instituição no mundo e faça uma enquete.
Eu não tenho quaisquer dados científicos para comprovar, mas a partir da minha
observação pessoal, a maior parte das pessoas loucas são
artistas. São almas sensíveis – como artistas têm que ser, para poder criar arte à
qual outros reajam. Mas, isso também significa que eles são mais
facilmente quebrados."
Eu balancei a cabeça, sorrindo. "Eu não sou uma artista."
"Talvez você apenas não tenha encontrado sua arte ainda". Ela afastou a
cabeça e deu à argila uma avaliação visual e, em seguida, voltou a trabalhar.
"Pense sobre o que significa ser um escritor, por exemplo – você tem que criar um
mundo inteiro em sua cabeça e, em seguida, personagens de estilos acreditáveis.
Você conhece todos os seus pensamentos, cada sonho, cada intenção, cada
potencial, cada motivação. Você tem que viver na cabeça deles o suficiente para
compreendê-los, para contar sua história. Tem que torná-los tão críveis que os
seres humanos vão realmente se apaixonar por esse personagem. Ou chorar suas
perdas, ou sentir raiva em seu nome - sentir emoção autêntica por eles. Eu acho
que um escritor precisa ser, pelo menos, parcialmente louco para gerir algo
parecido."
Sim. Sim, isso é exatamente como era viver na minha própria
mente. Eu nunca, nunca tentaria minha mão em escrever, porque eu não
teria nenhum problema de entrar na mente de um personagem. Meu problema
era que eu ficaria lá. E eu não saberia se o mundo onde eu de repente estaria
vivendo era real ou não. Isso era enlouquecer – era como pular diretamente para
um romance. Em qualquer caso... "Eu acho que a maioria dos
autores diz apenas que tem uma imaginação vívida," a corrigi.
Ela estalou os dedos, um pequeno pedaço de argila voando para longe
de sua mão. "Sim! E você e eu temos as imaginações mais vívidas de todos. Da
próxima vez que uma de nós ver uma pessoa que não existe, ou
conhecer todos os pensamentos e sentimentos de uma visão, vamos
dizer uma a outra: ‘Sua imaginação não é particularmente vívida? Que maravilha!
Que maravilha! Não é apenas vívida, é surpreendentemente
vívida. Espantosamente vívida. A mais vívida de todas’."
Eu ri, minha alma se sentindo mais leve. Nyala de alguma
forma sempre conseguia isso. Sempre. Eu acho que algumas pessoas podem
chamá-la de louca, e sim, houve momentos em que ela afundou num abismo
escuro, onde só ela existia – mas, eu a chamava de meu milagre. Ela, de alguma
forma, sempre era capaz de mudar magicamente minha visão sobre toda uma
situação, fornecer essa pequena mudança na percepção que me dava esperança
de superar o problema. E isso sempre me fez bem, porque ela era capaz de colocar
voz ao que já estava em meu coração. Como ela fazia isso, eu não tinha certeza,
mas se isso não fosse um milagre, eu não sabia o que era.
"Esses charlatões podem tentar nos diagnosticar com outra coisa Lily, mas
garota, nosso diagnóstico real é uma imaginação particularmente viva. E nós
duas sabemos disso." Ela me deu um grande sorriso.
Oh, se isso fosse verdade. Ainda assim, às vezes tínhamos que rir. E foi isso
que eu fiz, entrando em colapso no sofá.

Eu me senti um pouco melhor quando saí da casa de Nyala, deixando-


a profundamente absorta em sua argila, embora ver Ryan no aquário
ainda pesasse sobre meu coração. Enquanto caminhava, peguei meu telefone
para ligar para a minha avó. Ela atendeu no segundo toque. "Olá, querida."
"Oi, vovó. Eu só queria que você soubesse que eu estou indo para casa."
"Ok. Eu preciso correr para a loja, porem, e por isso, se eu não estiver em
casa quando você chegar aqui, logo estarei de volta. Eu tenho um pote de molho
no fogão. Será que você teve um bom tempo no aquário?"
Eu hesitei. "Sim. Vovó, você mandou alguém me seguir lá?"
Houve uma pausa. "Não. Por que eu faria isso?"
"Porque você não confia em mim." E eu poderia culpá-la?
Ela suspirou. "Eu confio em você, Lily. E eu quero que você saia. É bom para
você. Eu só não quero –"
"Eu sei. Você não quer que eu veja Ryan. Nós conversamos sobre isso. Eu
concordei."
"Certo. Falando nisso, eu programei nossa viajem. Nós voaremos de volta
para o Colorado daqui a duas semanas, de amanhã."
Engoli em seco. "Tudo certo."
"Tudo bem. Eu vou ver você em breve?"
"Sim, nos vemos em breve."
Levou pouco mais de quarenta e cinco minutos para o transporte
público me levar do centro de San Francisco a Marin. A partir daí, eu
caminhei para casa de aluguel da minha avó, chamando quando entrei. "Olá?"
Não houve resposta. Segui o cheiro do molho da vovó – rico em tomates,
manjericão e alho – e o vi fervendo no fogão. Agarrando a colher de pau que
estava num descanso de colher ao lado do fogão, eu levantei a tampa da panela,
inclinando-me e inalando o cheiro reconfortante. Eu agitei o molho e recoloquei a
tampa, movendo-me para a pia para lavar as mãos. Eu faria uma salada para
acompanhar o jantar.
"Lily", veio a voz profunda atrás de mim.
Surpreendida e virando abruptamente, encontrei Jeffrey de pé na porta.
Meu coração martelou no meu peito. "O-Olá", eu disse. "Eu só estava indo fazer
uma salada. Você vai se juntar a nós para o jantar?"
Ele balançou sua cabeça. "Não, eu tenho um compromisso hoje à noite."
"Ok", eu disse, olhando para o crachá preso à lapela de seu terno. Por que
ele estaria usando um crachá? Eu fiz uma careta, piscando para ele, incapaz de
lê-lo do outro lado da cozinha. Ele começou de repente a avançar ate mim, e eu
respirei fundo, meus olhos observando atentamente seu rosto. Eu pressionei
minha bunda contra a pia, incapaz de me afastar mais do que já tinha feito.
Jeffrey parou a um passo de mim. Ele ergueu sua mão e correu os nós dos dedos
pela minha bochecha. Eu vacilei. "Você parece tão nervosa em torno de mim. Por
quê? Eu estou aqui para ajudá-la. Eu só quero –"
"Lily," minha avó chamou a partir do hall de entrada. Jeffrey recuou.
"Aqui," eu chamei em voz alta. Jeffrey me deu uma última avaliação e, em
seguida, virou-se e deixou a cozinha. Eu o ouvi conversar brevemente com minha
avó e, em seguida, a porta da frente fechou. Alguns segundos depois minha avó
entrou na cozinha, carregando uma sacola de compras. Eu tomei a bolsa dela e
ela inclinou-se para mim quando eu a beijei na bochecha.
"Você está bem? Você parece pálida."
"Eu estou bem", eu disse suavemente. "Eu estava indo fazer uma salada."
Virei-me para a geladeira.
"Isso seria ótimo. Todos os ingredientes estão frescos."
"Vovó, sobre Jeffrey –" O toque da campainha me cortou. "Eu vou atender",
murmurei.
Eu andei através da sala de estar para o grande hall de entrada,
espreitando através da cortina ao lado da porta. Era uma mulher, que virou-se a
meio caminho, embora, e eu a reconheci imediatamente. Era a mulher da festa
beneficente. A mulher que estava com Ryan. "Santo Deus," sussurrei.
Ela se virou e me viu espiando-a. Respirando fundo, eu abri a
porta. "Olá?" Perguntei, fingindo que não sabia quem ela era.
"Não finja que você não me reconhece", disse ela. "Eu posso dizer pela sua
expressão que você o faz. Meu nome é Jenna. Posso entrar?"
Olhei para ela. Ela era ainda mais bonita quando vestida casualmente em
jeans e um suéter. Seu cabelo ruivo estava solto e enrolado em torno de seu belo
rosto, e seus olhos castanhos profundos eram um contraste
impressionante em sua pele cremosa. "Como você sabe onde eu moro?"
"Eu tenho uma boa amizade com um cliente que ajudou a organizar o
evento de caridade", disse ela, não entrando em detalhes. Eu supunha que ela
tinha acesso à lista de convidados, bem como a todas as informações relativas a
isso. Suspirei e fiquei para trás, segurando a porta aberta para ela entrar. Que
maneira maravilhosa de encerrar um dia maravilhoso.
"Quem está aí, Lily?" minha avó chamou.
"Alguém para mim", respondi, gesticulando para Jenna me seguir para a
sala de estar formal à direita do hall de entrada. Sem dúvida minha
avó a ouviria pela porta, mas eu não me importava. Hoje não. Sentei-me
num sofá, e Jenna se sentou no outro sofá, de frente para mim.
"Eu acho que vou direito ao ponto", disse ela. "Eu sei quem você é. Eu sei
sobre você, e eu vim para lhe dizer para ficar longe de Ryan."
Que diabos?
Deixei escapar uma pequena risada. "Você sabe sobre mim? E o que você
sabe, exatamente?"
"Eu estava ouvindo quando você falou com ele no saguão. Eu ouvi o que
sua avó disse sobre você estar doente. Sobre você ficar num hospital – um
hospital psiquiátrico, presumo. Um ano inteiro? Você deve ser muito, muito
perturbada. Você ainda está? Perturbada, quero dizer." Ela inclinou a cabeça
para o lado e estreitou os olhos, como se pudesse dizer mais sobre o meu estado
mental se me olhasse bastante atentamente.
Senti-me pálida e apertei minhas mãos no meu colo. Eu não tinha
certeza se já tinha sentido tão profunda repugnância por alguém antes. Cobra.
"Eu não sei como a minha situação é da sua conta, Jenny, certo?"
Ela me deu um sorriso, que se dissolveu em algo beirando o desprezo.
"Jenna," ela corrigiu, sua voz pingando falsa doçura. "Ouça, Lily, Ryan me contou
em detalhes sobre suas próprias lutas; ele abriu seu coração, realmente. Ele está
finalmente se curando de sua perda agora. Você realmente acha que ele precisa
trazer mais imprevisibilidade para sua vida? Mais caos e incerteza? Se você se
preocupa com ele em tudo, o que eu suspeito que você faça, considerando a
maneira que olhou para ele no evento, certamente você pode ver que eu estou
certa."
Fiz uma pausa enquanto olhava para ela, tentando o meu melhor para não
deixá-la ver o quanto suas palavras me afetavam. Eram o cerne da minha dor
sobre Ryan, na verdade. Como essa mulher horrível sabia disso? Era como se ela
pudesse ver dentro do meu coração, o que não era tolerável. E o fato de que ele
compartilhou seus segredos mais profundos com ela só... machucava. Esta era a
mulher por quem Ryan tinha sentimentos agora? Eu acho que devia estar
pessoalmente ofendida pelo seu mau gosto por mulheres. Ele estava beijando-
a. Sua boca tinha estado na boca da mulher que estava na minha frente agora,
capaz de vomitar essas coisas tão feias e detestáveis. E eu tinha dito que ele
deveria ficar com ela? Eu tinha praticamente exigido que ele a escolhesse. Porque
eu pensei que isso era o certo, o melhor. Eu não respondi sua pergunta.
"Ele e eu estamos apenas começando algo muito especial. Acho que ele
sente algum vínculo com você, considerando que você esteve presente durante
um tempo muito difícil em sua vida, e acho que ele sente como se não pudesse ir
embora agora. Ele deve se sentir muito triste por você." Ela balançou a
cabeça, como se o pensamento fosse algo que a deixasse triste. "Então, faça a
coisa certa – faça o favor de não obriga-lo a fazer uma escolha que vá fazê-lo se
sentir culpado. Ele não precisa de outra coisa pesando em sua mente."
"Eu gostaria que você saísse da minha casa agora."
"Alegremente. Já terminei o que vim fazer aqui." Ela retrucou. "Pense no
que eu disse. Eu tenho certeza que você vai perceber que estou certa."
"Adeus, Gemma."
Ela estreitou os olhos para mim novamente. "Adeus, Lily. Fique bem."
Mas, o olhar em seu rosto desmentia suas palavras. Se uma pessoa pudesse ser
assassinada com um olhar, eu certamente estaria deitada no chão em uma poça
de sangue agora.
Eu não fiquei de pé. Minhas mãos estavam tremendo de raiva
- e também de humilhação. Era quase como se Jenna fosse a própria encarnação
de todas as minhas inseguranças mais profundas. Ela saiu da sala,
e, um momento depois, ouvi a porta da frente fechar silenciosamente atrás dela.
Eu ouvi o som macio do calçado da minha avó voltando para a cozinha, e
deixei escapar um longo suspiro. Um momento depois eu ouvi um barulho na
cozinha, e minha avó dizer: "Oh, querida, que bagunça."
Capítulo vinte e quatro

Ryan

Minhas pernas não queriam cruzar o limiar, mas eu sabia em meu coração
que estava na hora. A casa de Holden. Tomando um fôlego, eu entrei. Estou aqui,
amigo. Estou finalmente pronto. Tudo parecia exatamente o mesmo, mas uma
espécie de vazio preenchia o espaço, um sentimento de solidão que nunca tinha
estado aqui antes. Deus, tenho sentido sua falta. A arrumadeira de Holden tinha
sido mantida, então tudo estava arrumado e limpo - e as linhas frescas de um
aspirador de pó eram visíveis no tapete da sala. Eu queria fugir deste lugar, fugir
dos sentimentos que o mantinham vivo dentro de mim, fugir do desespero
borbulhando em minha garganta... mas não o fiz. Com o coração pesado, subi
a grande escadaria dupla no hall de entrada, me dirigindo para o que tinha sido o
quarto de Holden. Eu faria um pouco hoje, e então guardaria o resto para outro
dia, uma vez que não precisava acontecer tudo de uma vez. Esta
casa estava paga, e mesmo que não estivesse, eu tinha muito dinheiro para
continuar a fazer os pagamentos necessários para assegurar sua manutenção.
Fui diretamente ao enorme e maciço closet de casal de Holden, onde
peguei algumas malas das prateleiras. Jenna estava certa: pessoas
provavelmente cairiam com tudo em ofertas da roupa íntima de Holden
- mas eu não me sentia bem com isso. Eu tranquilamente deixaria este
material num abrigo de sem-tetos – ou numa dessas instituições de caridade que
ajudavam a fornecer trajes de entrevista para pessoas indigentes – bagagem
inclusa - e não diria uma palavra sobre quem foi o dono. Isso era o que
Holden iria querer, e ninguém sabia disso melhor do que eu. Ele tinha sido
generoso demais, mas não chamativo. Nunca vistoso. E tudo o que ele tinha feito
por caridade, tinha feito anonimamente.
Sapatos foram jogados sem cerimônia nas malas de viagem, em seguida,
jeans e camisetas. Eu traria um saco de lixo até aqui da próxima vez, para
jogar fora seus itens de vestuário pessoais. Eu ainda estava tão
fodidamente puto, e talvez por isso eu realmente os leiloaria no eBay. Eu só não
tinha certeza de quem exatamente eu estava com raiva, se dele ou de
mim mesmo - talvez ambos. Suspirei. "Desculpe, cara, mas eu estou. Eu
estou, porra, louco. Eu estou tão foda. Você deveria estar aqui." Eu sentei no
banco pequeno no meio do quarto e apenas olhei ao redor, deixando cair algumas
lágrimas. Isto estava ok; era normal. Esta era a maneira normal de pessoas de
luto agirem. Era por isso que eu tinha vindo aqui hoje, quando tinha planejado
vir a semanas atrás, mas decidi que não estava pronto? Eu estava aqui agora –
um dia depois de Lily ter me rejeitado? Por quê? Para provar que era forte o
suficiente para lidar com isto? Para provar que eu não era mercadoria danificada?
Para provar que poderia lamentar normalmente? "Cristo", murmurei.
Eu carreguei as malas para o corredor, e dei uma última olhada em torno de
seu quarto. Eventualmente eu teria que fazer alguma coisa com o mobiliário.
Ou talvez eu pudesse vender a casa mobilada. Andei para as escadas, carregando
as malas estofadas e deixando-as na porta da frente. Eu olhei de volta para a
grande escada. O escritório. Era o único outro lugar que eu poderia pensar ter
que precisar limpar pessoalmente, o único outro lugar onde ele poderia ter itens
pessoais, correspondência pessoal, etc.
Dentro da sala havia algumas estantes, mas os únicos livros presentes
nelas eu poderia dizer que tinham sido colocados ali por um decorador. Holden
nunca tinha lido, ou se interessado em ler, Guerra e Paz em sua vida. Eu tive que
rir com isso. Holden tinha sido muitas coisas, mas um leitor ávido
não estava entre elas.
Nós raramente ficávamos em seu escritório, e eu não reconheci a
maior parte dos itens que estavam ali, mas uma caixa na parte inferior da estante
parecia vagamente familiar. Peguei-a e coloquei-a sobre a mesa. O que eu vi
quando a abri fez minha respiração falhar. Oh merda. Eram fotos de
nós quando crianças. Enquanto eu as folheava, memórias patinaram pela minha
mente: quando fomos autorizados a usar armas BB para atirar em latas no
quintal de Holden por horas depois da escola, quando deveríamos estar fazendo
lição de casa. Quando Holden ganhou kits de carros modelo para seu aniversário
e Natal, e seu pai construiu-os com a gente. Como Holden ficou impaciente
e eu acabei por termina-los enquanto ele tagarelava implacavelmente sobre
qualquer coisa e tudo, apenas lá, fazendo-me companhia. A vez que um garoto na
escola me fez tropeçar no corredor e riu quando eu caí, e mais tarde
Holden gastou sua mesada em espuma de barbear e esguichou cerca de quinze
latas disso através das aberturas em seu armário. Assistir filmes de terror de
classificação R quando eu passava a noite em sua casa, mesmo que não fosse
permitido, e em seguida ter muito medo de ir dormir. As lágrimas ainda
estavam escorrendo pelas minhas bochechas, mesmo depois que eu fechei a
caixa. De algum modo estranho, agora que Holden tinha ido embora, eu
sentia como se tivesse feito todas essas coisas sozinho. Parecia que eu continuava
a perder Holden em pequenos pedaços: pela primeira vez em sua presença física,
em seguida, nas coisas que eu não conseguia mais lembrar – o som de sua voz, as
frases originais que ele gostava de usar. Uma vez que sua casa estivesse limpa,
eu perderia a prova dele nos itens que possuía.
E então eu estaria verdadeiramente sozinho. Nenhuma família. Nenhum melhor
amigo. Ninguém.
Você nunca realmente o perdeu. Ele sempre será uma parte de você.
Sempre, Lily tinha dito.
Lily. E, de repente, a paz quebrou através de uma das fissuras do meu
coração partido, assim como aquelas pequenas flores que, de alguma forma –
impossivelmente – cresciam entre as fissuras das rochas na borda do córrego na
floresta. Holden tinha me mudado; ele me salvou de tantas formas que, estando
ele aqui agora ou não, eu o manteria para sempre. Cerrei meus
olhos, represando outro dilúvio de lágrimas. Apesar da paz que a pouco fluiu
através do meu coração, estabeleceu-se uma dolorida tristeza também. Eu
reconheci, neste momento, o que era: eu estava dizendo adeus.
Eu finalmente era forte o suficiente para deixá-lo ir. Inclinei a cabeça para trás e
segurei meus dedos em forma de V. "Obrigado," eu sufoquei. "Muito obrigado,
amigo."
No meu caminho para fora de sua casa, parei no banheiro do térreo. Depois
que lavei minhas mãos, abri o armário de remédios. Dentro havia dois frascos –
comprimidos para dor, prescritos para Holden. Eu hesitei apenas brevemente
antes de fechar o gabinete e sair do banheiro. Eu não me
incomodei nem mesmo em jogá-los no vaso sanitário, e senti nenhum desejo de
tomá-los. Quando fechei a porta atrás de mim, apesar da tristeza persistente,
meu coração se sentiu cheio de todas as coisas que Holden tinha me dado nesta
vida: paz, amor e força. E eu levaria esses dons de cura comigo para sempre.

A campainha tocou, assim que eu tinha sentado para um jantar solitário de


queijo grelhado e sopa de tomate. Enxugando minhas mãos, me levantei para
respondê-la, e para encontrar Jenna ali, mordendo nervosamente o lábio. Meus
ombros caíram. "Hei, Jenna," eu disse, sentindo a culpa de ver seu rosto ferido
diante de mim. Eu mantive a porta aberta, para que ela pudesse entrar, e levei-a
ao meu sofá. "Como você está? Quer algo para beber?"
Ela me deu um sorriso hesitante. "Eu adoraria um pouco de vinho, se você
tiver."
"Sinto muito, eu não mantenho qualquer álcool no meu apartamento. Eu
tenho refrigerante..."
"Refrigerante é bom. Obrigada."
Fui para a cozinha, enchi um copo e trouxe-o de volta para ela. Ela tomou
um gole. Sentei-me ao lado dela.
Ela colocou o copo sobre a mesa de café e virou-se para mim. "Peço
desculpas por aparecer sem avisar –"
"Está tudo bem." Eu balancei minha cabeça. "Eu não te liguei de volta, e
você merece uma explicação." Eu corri a mão pelo meu cabelo. "Sinto muito,
Jenna. Sinto muito pelo que aconteceu no evento de caridade. Posso apenas
imaginar como você se sentiu. Se eu tivesse alguma ideia..."
Ela estendeu a mão e a colocou na minha perna, apertando-
me suavemente. "Está tudo bem, foi uma surpresa. Reencontrar alguém de seu
passado pode ser um sentimento tão confuso."
Lembrei-me da primeira noite em que a conheci no bar – ela disse que seu
ex-namorado tinha aparecido com sua noiva. Ainda assim, ela não tinha pensado
que seu ex era um fantasma...
"Sim, foi um choque."
Ela olhou para baixo. "Você tem falado com ela? Lily, certo?"
Fiz uma pausa. "Sim. Ela não quer ter nada a ver comigo."
Parecia que os ombros de Jenna relaxaram um pouco. "E você?"
Suspirei. "Isso é mais difícil de responder, Jenna. E eu sinto muito por isso.
Eu realmente sinto." Ela se remexeu, cruzando as pernas e tirando a mão da
minha coxa.
"Você ainda está apaixonado por ela?"
Baixei a cabeça para frente, massageando minha nuca, ganhando tempo
enquanto me sentia terrível sobre esta situação toda. Depois de um
momento, porem, olhei de volta para Jenna. "Sim, eu ainda estou apaixonado por
ela."
Seu rosto amassou um pouco. "E, no entanto, ela não te quer."
"Não, ela não me quer."
Jenna respirou fundo, sentando-se mais ereta. "Escute, Ryan, nós apenas
começamos a namorar. Eu entendo que você tenha sentimentos por alguém. E
isso é uma merda para mim. Mas, por que não vemos onde pode ir entre nós? Eu
estou disposta a ficar e ver o que acontece. Eu realmente sinto que, dado o tempo,
podemos ter algo especial juntos."
Eu pisquei para ela. "Jenna..." eu soltei um suspiro, balançando a cabeça
de um lado para o outro lentamente. "Lily não quer estar comigo, mas isso não
muda o que eu sinto por ela. Não vai mudar como me sinto sobre ela – pelo menos
não por enquanto. E Jenna, não seria justo para mim não terminar as coisas com
você, quando meu coração ainda está envolto em outra pessoa. Seria errado."
"Mas você gosta de mim", disse ela, mágoa evidente em sua voz.
Fechei os olhos por um momento. "Eu gosto de você. Eu gosto muito de você.
É por isso que é tão difícil."
"Mas, você está terminando comigo por uma garota que não te quer? Você
não vai nem mesmo nos dar uma chance?" Seu rosto era uma mistura de
decepção e confusão.
"Eu... não. Sinto muito." Eu balancei minha cabeça. "Eu pensei
que tivesse seguido em frente, mas isso claramente não aconteceu." Deus,
isso era fodidamente cansativo. Mas eu devia isso a nós dois, ser honesto. Não
havia nenhuma maneira de eu poder continuar o namoro com Jenna - de jeito
nenhum eu poderia desenterrar qualquer interesse em beijá-la ou tocá-la,
quando sabia que Lily estava do outro lado da cidade. Somente... de
jeito nenhum. E eu sei que isso me faz um tolo. Eu sei que me faz lamentável
e provavelmente estúpido. Não, não provavelmente –definitivamente me faz
estúpido. Mas eu não arrastaria Jenna à minha idiotice. Então eu seria
estúpido e imoral.
Jenna deixou escapar um longo suspiro. "Bem, então eu acho que é isso",
ela disse tristemente.
Eu quase pedi desculpas novamente, mas havia apenas certa quantidade
de vezes aceitáveis para se pedir desculpas, antes de parecer chato e
possivelmente convencido. Jenna era uma garota legal, bonita e inteligente.
Ela não teria qualquer dificuldade em encontrar alguém, alguém com muito mais
para oferecer. Eu fechei minha boca e dei-lhe um olhar que esperava que
pudesse transmitir a extensão do meu pesar sobre toda esta situação.
Ela levantou-se e eu o fiz também. Seus olhos pareciam enevoados. Eu fui abraçá-
la, mas ela ergueu a mão e sacudiu a cabeça, e então eu recuei. Eu quase disse
algo mais, algo sobre esperar que ela encontrasse alguém que não fosse um idiota
preso a outro alguém, como ela merecia alguém melhor, sobre quão
terrível eu me sentia naquele momento - mas nada parecia certo. Tudo que
passou pela minha mente soou como uma frase pronta ou francamente relevante.
No final, eu decidi que era melhor não dizer nada.
"Adeus, Ryan. Eu desejo-lhe o melhor. Eu realmente o faço." Sua expressão
era triste, mas sua voz estava firme. Ela não ia quebrar. E eu me senti
culpado por isso, mas aliviado.
Eu balancei a cabeça. "Obrigado, Jenna. Eu me sinto da mesma maneira."
Ela virou-se e saiu, fechando a porta silenciosamente atrás de si. Eu
afundei de volta no sofá, descansando minha cabeça contra a parte de trás e
gemendo de frustração. Deus, Lily, o que você está fazendo comigo?
Capítulo vinte e cinco

Lily

Eu respirei fundo e bati na porta em minha frente. A porta de Ryan. Ele não
estaria em casa, é claro. Era um dia de semana, e ele estaria no trabalho, mas eu
percebi que tentaria de qualquer maneira, antes de deixar a nota com meu
número de telefone pedindo-lhe para me ligar em sua caixa de correio. Então,
quando a porta se abriu, eu suguei numa assustada respiração e recuei. Ryan
estava ali, vestindo jeans e uma camiseta preta, sua expressão
de franca surpresa. "Lily," ele disse, olhando para mim.
Eu abri minha boca para falar e então calei-me, despreparada, sem saber
exatamente o que dizer. "Eu não esperava que você estivesse em casa",
finalmente consegui dizer.
Ele inclinou seu quadril contra a porta e cruzou os braços sobre o peito, sua
expressão um pouco cuidadosa, como se estivesse esperando que eu fosse feri-
lo. Mais uma vez. Da maneira que eu tinha feito no evento de caridade, e em
seguida, no aquário. "Então por que você veio? Se achava que eu não estaria em
casa?"
Mordi meu lábio por um momento. "Eu estava indo para deixar-lhe uma
nota, com o meu número de telefone. Ficaria esperando que você pudesse
me ligar."
Ele fez uma pausa, seus olhos correndo por mim rapidamente. Depois de
outro momento, ele disse: "Dois dias atrás, você me disse para nunca entrar em
contato com você de novo."
"Eu sei. Eu sei que o fiz."
Ele simplesmente me olhou por um momento, fazendo-me sentir ainda mais
desconfortável do que já estava. Tudo bem, então ele não ia fazer isso fácil para
mim agora. Eu não o culpava: ele estava em modo de autopreservação. "Bem,
agora você pode me dizer o que pretendia dizer ao telefone pessoalmente," ele
disse, sem maldade. Ele estava perfeitamente imóvel, como se cada
músculo estivesse tenso.
"Eu honestamente não tinha certeza do que ia dizer. Eu pensei que teria
um pouco de tempo para pensar sobre isto."
"Ah."
"Então, hum, por que você está em casa?"
"Eu liguei e disse que estava doente."
"Oh. Você está? Doente, eu quero dizer?"
"Não."
Fiz uma pausa, esperando que ele continuasse, mas ele apenas olhou para
mim. Ele ainda tinha aquele olhar ligeiramente surpreso em seus olhos, o
mesmo que do evento de caridade, como se ainda não pudesse acreditar que eu
era real. Eu me sentia real agora, embora. Me sentia muito real. Meu coração –
repleto de dor e incerteza – estava me lembrando quão real eu era a cada batida
pesada. "Oh, ok, bem, isso é bom." Eu peguei a nota que tinha escrito do meu
bolso e entreguei-lhe. Ele pegou e colocou-a no bolso, e depois chupou seu lábio
inferior em sua boca por um momento.
"Você quer entrar?"
"Eu... Sim. Quer dizer, se estiver tudo bem." Reúna a sua coragem, Lily.
Você não esperava que ele estivesse em casa, mas ele está. Lide com isso. Ele
deu um passo para trás e para o lado quando eu entrei em seu apartamento,
meus olhos se movendo sobre os móveis, observando o desenho clássico
e simples, e constatando que ele obviamente era um muito arrumado dono-de-
casa. Embora parecesse que ele tinha estado estacionado em seu sofá. Seu laptop
estava aberto, e lá tinha uma garrafa de água e o que parecia ser o resto de um
sanduíche num prato, e alguns livros com papéis em cima, então eu não podia ver
os títulos.
Ele acenou com a mão para uma cadeira ao lado do sofá, onde eu me sentei.
Ele se sentou no sofá. "Assim, qual era a essência do que você ia dizer
quando eu te ligasse? Porque eu teria. Eu teria ligado para você de imediato."
Havia algo se movendo por trás de seus olhos – nervosismo talvez – mas sua
expressão se manteve neutra.
Meus dedos se retorciam em meu colo, e eu olhei para eles antes de
finalmente levantar meus olhos para Ryan. "Devo-lhe uma explicação."
Ele ficou quieto por um momento. "Essa é a única razão pela qual você está
aqui? Para me explicar as coisas?" o ‘em seguida sair de novo’ estava implícito.
Pisquei para ele. "Bem, isso, e para que você saiba que sua namorada veio
me ver."
"Minha namorada?" Ele franziu a testa. "Você quer dizer Jenna? Por quê?"
Eu balancei a cabeça. "Oh, ela não mencionou? Ela foi muito clara sobre
meu dever de ficar longe. Sobre eu ser ruim para você."
Seus lábios se apertaram e ele pareceu brevemente surpreso, mas então
sua expressão ficou em branco. "Então vocês duas concordam nisso."
"Sim. Não!" Raiva e indignação cravaram através de mim. "Deus, Ryan. Eu
entendo por que você quer tornar isso difícil para mim. Eu entendo por que você
está com raiva. Mas, não, eu não concordo com ela. O modo como ela colocou as
coisas... ouvir isso de alguém me fez perceber..." Eu joguei minhas mãos no ar."
Eu nem sequer sei o que isso me fez perceber, mas quando ela falou, parecia – "
"Errado", ele forneceu.
Deixei escapar um suspiro frustrado. "Sim. Errado. Parecia errado."
Seus ombros relaxaram um pouco, e ele apoiou os cotovelos sobre os
joelhos, ficando apenas um pouco mais perto de mim. "É errado. E Jenna não é
minha namorada. Sinceramente, nós só fomos à dois encontros. Eu terminei com
ela ontem, completamente."
Isso me surpreendeu, depois de ver a profundidade da possessividade dela.
"Oh... eu... eu quero dizer, por quê?"
"Porque não é justo ficar com uma pessoa quando se está apaixonado por
outra, é por isso." A voz dele se encheu de intensidade, como se ele mal tivesse se
controlando, e com essas palavras poderia não mais se conter.
Deixei escapar um suspiro. Ele ainda me ama. "Ryan..."
"Venha sentar perto de mim, Lily. Explique o que aconteceu. Conte-me
sobre sua vida. Eu quero saber sobre você. Quero saber cada pequena coisa. Por
favor, não tenha medo. Por favor, saiba que não há nada que você possa me dizer
que vá me fazer sentir de forma diferente sobre você." Quando eu me levantei e
sentei-me ao seu lado, ele se virou para mim e tomou minhas mãos nas suas. Dei-
lhe um sorriso e senti meus lábios vacilarem levemente. Este. Este é o lugar onde
eu desejava estar. Era tão bom ser tocada por ele. Ele sorriu de volta,
delicadamente, e então me puxou em direção a ele, envolvendo os braços ao meu
redor. Eu relaxei em seus braços. Era tão bom ser segurada. Eu não tinha sido
segurada por qualquer pessoa durante o ano que passamos separados. Eu sentia
muita falta dele, então. Eu fucei em seu sólido e caloroso peito enquanto lágrimas
deslizavam pelo meu rosto. Quando me afastei, ele usou seus polegares para
limpá-las. "Lily, Lírio da Noite", ele murmurou. "Você tem estado tão sozinha,
também. Você esteve sozinha, assim como eu."
Eu balancei a cabeça. "Sim", sussurrei. "Mas não solitária, Ryan. Eu sentia
sua falta. Só de você."
Ele plantou seus lábios na minha testa por alguns instantes antes de dizer:
"Eu senti sua falta, também, Lily. Eu não consigo nem expressar o quanto senti
sua falta. Eu sofria por você. Eu ainda o faço. E continuo a fazer." Sua voz soava
rouca e cheia de dor. Eu queria levantar minha boca à sua. Eu estava
tremendo de vontade de explora-lo novamente, mas tínhamos muito para discutir.
Tantas coisas, e todas que poderiam fazê-lo correr...
"Ryan", murmurei. Ele pareceu ler meus pensamentos, porque se afastou
e segurou minhas mãos nas suas de novo.
"Posso te servir um copo de água? Um café?"
Eu balancei a cabeça, tensão se libertando do meu corpo. Era como se ele
tivesse lido minha mente, e soubesse que eu precisava de um momento. Ele
parecia conhecer as minhas necessidades tão bem, embora nós tivéssemos
passado tão pouco tempo juntos. "Claro, água seria ótimo."
Ryan se levantou e se dirigiu para a cozinha enquanto eu caminhava até a
janela e tomava uma respiração profunda, preparando-me. Eu nunca falei sobre a
minha doença com outra pessoa além de Nyala e meu médico. Eu nunca
tinha sentido tanto medo assim.
Olhei para fora da janela de Ryan, com vista para a vastidão do Golden Gate
Park. Olhando daqui, eu quase podia imaginar que era a nossa floresta. Isso me
fez sentir... com saudades de casa. Embora eu supunha que casa fosse a palavra
errada, uma vez que a floresta não tinha sido realmente a minha casa. Ainda
assim, a sensação persistia. Eu tinha sido feliz lá, embora na época eu tivesse
sido um mero fantasma de mim mesma.
Virei-me quando ouvi Ryan entrar no quarto e caminhar de volta para o
sofá. Ele colocou uma garrafa de água sobre a mesa de centro, da qual eu tomei
um longo gole uma vez que sentei-me novamente.
"Você precisa de um minuto?" ele perguntou.
Eu coloquei a água para baixo e balancei a cabeça. "Não, eu só preciso
começar. Eu preciso te contar."
"Então comece", disse ele suavemente.
Eu respirei fundo e comecei minha historia. "No inverno em que eu tinha
dez anos, minha mãe me levou para ver o Quebra-Nozes no centro de Telluride.
Era uma noite gélida e quase ficamos em casa, mas, no final, minha mãe decidiu
enfrentar o clima. Não era longe, e as estradas tinham sido caras." Fiz uma
pausa, lembrando quão linda tinha sido aquela noite, a forma como os galhos das
árvores tinham estado envoltos no gelo, tornando-se brilhantes ao luar. Tudo
parecia uma terra de conto de fadas. Toda a noite parecia mágica. Eu tinha ficado
encantada com o ballet, varrida pela música que a orquestra tocou. O quente
chocolate que minha mãe comprou-me durante o intervalo tinha sido grosso e
doce, completado por redemoinhos de chantilly e um agitador de bastão de doces.
Minha mãe estava particularmente bonita em seu casaco branco de inverno e
lenço vermelho, seu longo cabelo loiro e brilhante, seus olhos verdes brilhando de
felicidade. Quando saímos eu disse a ela que tinha sido a noite mais maravilhosa
da minha vida.
"Nós tínhamos estacionado a várias quadras do teatro, e porque estávamos
conversando e rememorando o desempenho, conseguimos virar e terminar numa
rua lateral que só tinha uma luz ofuscante de rua. Foi quando um homem saiu
da entrada de um edifício." Ryan tomou a minha mão na sua, apertando-
a e deixando-me saber que ele estava lá. "No começo eu estava apenas confusa,
mas podia dizer que minha mãe estava com medo, e então eu fiquei
assustada também. Nós tentamos dar meia volta e ir para o outro lado, mas ele
imediatamente nos arrebatou. Ele colocou uma faca na garganta da minha mãe e
exigiu dinheiro."
"Deus, Lily", disse Ryan. Parei quando peguei a água e tomei outro longo
gole, precisando de um momento.
"Minha mãe entregou-lhe a bolsa, e ele derramou tudo no chão e levou o
que queria. Mas ele ainda não tinha acabado com a gente. Ele arrastou minha
mãe para uma porta e começou a rasgar as roupas dela–" Eu exalei um grande
fôlego trêmulo, mesmo agora revivendo o medo confuso que tinha
me agarrado naquela época. "Eu estava chorando, é claro, e ele continuou me
dizendo para calar a boca, ou ele mataria minha mãe. Eu..." Eu tinha
começado a me agitar nesse ponto, e Ryan me puxou para seu peito, fazendo sons
suaves de conforto.
"Você não precisa fazer isso, Lily, não se você não quiser."
"Eu quero", insisti. "Eu preciso." E sinceramente, eu não sabia se poderia
parar agora que tinha começado. Contar essa história era como um trem
desgovernado. Eu tinha que ver a sua conclusão – parecia que eu não tinha
escolha nesse assunto. Ainda assim, era bom mergulhar no calor do corpo de
Ryan enquanto eu contava tudo a ele.
Sem me afastar, continuei: "Ele a estuprou. Ele a estuprou
na minha frente, e eu não pude fazer nada. Eu não percebi o que estava
acontecendo, só que ele estava machucando-a de forma brutal." Senti o corpo de
Ryan tenso, mas ele continuou acariciando meu cabelo. Ele nunca parou.
"E então ele a empurrou para o lado e ele... ele me agarrou. Seus olhos estavam
vidrados, como se ele tivesse consumido alguma coisa. Ele começou a rasgar as
minhas roupas, como tinha acabado de fazer com ela." Os braços de Ryan me
abraçaram com força de novo, e eu podia senti-lo tremendo agora também. Ryan,
meu doce amor. "Minha mãe não tinha lutado, não até então. Mas, no momento
em que ele estendeu a mão para mim, ela voltou à vida. Ela começou a gritar e
arranha-lo. Eu estava gritando também. Isso foi..." Minhas palavras
desapareceram enquanto eu limpava as lágrimas que tinham começado a cair.
"Foi como se tivéssemos entrado no inferno logo após sair do quente
e maravilhoso teatro." Parei novamente, respirando fundo, tentando me
recompor.
"O homem trouxe a faca ao rosto da minha mãe, e ele começou a cortá-
la uma e outra vez e–"
"Lily, Lily", Ryan sussurrou. "Doce Lily, eu sinto muito." Eu enterrei meu
rosto em seu peito, meu ritmo cardíaco aumentando e minha respiração saindo
em rajadas curtas enquanto a cena passava diante dos meus olhos.
"Havia muito sangue", eu ofeguei contra sua camiseta. "Eu nunca tinha
visto tanto sangue antes. Esta foi a primeira vez que eu só... fui embora. Eu
só–" Chupei uma golfada profunda de ar.
"Eu sei", disse Ryan. "Eu entendo." Sim, ele sabia. Sim, ele entendia.
Eu me aprofundei em seu peito, incidindo sobre o ritmo constante do seu coração,
seu reconfortante perfume masculino. Ele esfregou minhas costas, murmurando
palavras calmantes no meu ouvido e me acalmando, como se soubesse
exatamente o que fazer, como se tivesse feito isso uma centena de vezes antes.
Meu ritmo cardíaco baixou, firmando-se novamente. Eu finalmente me afastei e
olhei para seu rosto. Sua expressão ostentava tanta gentileza e compreensão... e
uma dor crua que eu nunca tinha visto antes, nem mesmo quando ele me contou
sobre Holden.
"Eu não conheci meu pai. Na verdade, minha mãe
não o conhecia realmente também. Ela o conheceu num fim de semana, quando
estava numa viagem de meninas em New York City. Ela passou a noite com ele
e, depois, na manhã seguinte, encontrou o anel de casamento que ele tinha
escondido na gaveta do criado mudo. Ela descobriu um mês depois que estava
grávida. Os médicos dizem que às vezes esses distúrbios mentais
são hereditários, mas eu nunca vou saber com certeza, considerando que só
conheço uma parte da minha família."
Ryan alisou uma mecha de cabelo que tinha caído na minha bochecha.
"Será que saber ajudaria, embora? Eu penso sobre isso as vezes, também. Minha
mãe morreu quando eu era apenas um bebê, e eu não sei muito sobre o seu lado
da sua família. Sinceramente, eu também não sei muito sobre o lado da família do
meu pai, além de que a maioria deles são bêbados ou vagabundos." Ele suspirou."
Eu só não sei que diferença isso faria."
Dei-lhe um leve sorriso. "Talvez fosse mais fácil se pudéssemos culpar
alguém."
Ryan soltou um pequeno riso em uma respiração. "Vamos culpá-los, então.
Eles não podem fazer nada sobre isso."
Eu ri uma pequena risada. "OK."
O olhar de Ryan se moveu sobre meu rosto. "Ela não morreu naquele dia,
apesar de tudo. Ela sobreviveu."
"Minha mãe? Sim, ela sobreviveu. Às vezes eu me perguntava se ela
desejava não tê-lo feito, embora. Mas... sim. Ela tinha sido bonita antes e, de
repente, um lado de seu rosto estava terrivelmente marcado
com cicatrizes, realmente devastado. Antes... ela gostava de sair, estava sempre
planejando coisas para nós, como férias, passeios de um dia, peças de teatro,
shopping. Depois disso, porem, ela nunca mais saiu de casa. Fomos morar com
meus avós em sua propriedade, e ela tornou-se uma reclusa. E ela não queria
que eu saísse, também. Ela ficou com medo do mundo, com medo de que algo
terrível fosse acontecer comigo. E eu fui colocada num hospital por um
tempo." Sacudi a cabeça. "Eu não aceitava que nós tínhamos sido atacadas,
e estava vivendo num dos meus mundos de sonho". Eu mordi meu lábio por um
momento. "Quando voltei, fiquei mais do que feliz em ficar dentro de casa com
ela, onde era seguro. Eu estava com medo do mundo também. Ela me tirou da
escola, contratou professores particulares, e durante anos,
nós apenas... agarramo-nos uma à outra."
"Mas você cresceu brava, não é? Você queria mais do que o pequeno mundo
que sua mãe tinha criado para você."
Eu balancei a cabeça, sentindo as garras da culpa apertarem minha
garganta. "Sim", eu sussurrei asperamente. "Eu queria mais. Nós brigávamos.
Nós lutamos muito naquela época."
"Isso é normal, Lily. O que você estava sentindo era normal."
"Eu sei... Logicamente, pelo menos, eu sei."
"Isso não torna mais fácil, no entanto."
"Não, não faz."
"Sua mãe acabou dando-lhe mais liberdade?"
Eu balancei minha cabeça. "Eu fiquei doente de novo. Nesse tempo não foi
mesmo por qualquer razão particular." Eu fiz uma careta. "De qualquer caso, a
essa altura, o meu avô, que era grande no setor imobiliário, tinha comprado
Whittington."
"Você foi enviada para Whittington?" Ryan respirou.
Eu balancei a cabeça. "Naquele tempo, somente uma ala estava
aberta. Era diferente do que é agora. O jardim ainda era belo. A ala
aberta era limpa, e havia apenas alguns poucos pacientes sendo atendidos. Meus
avós acreditavam que eu teria cuidados mais pessoais lá do que em qualquer
outro lugar."
Ryan sentou-se no sofá, parecendo surpreso. "Uau, Lily."
Eu balancei a cabeça. "Eu sei. Não me lembro muito do que aconteceu
enquanto eu estava lá. Eles me mantinham altamente medicada. É tudo tão
turvo." Franzi minha testa. "Mas, eu não fiquei lá por muito tempo. Eu
fiquei melhor e voltei para casa. E logo depois minha mãe morreu. Um aneurisma.
Tal aberração."
"Oh não, Deus, Lily. Baby, eu sinto muito."
"Isso me enviou para outro lugar imaginário, outra vez." Eu dei um longo
suspiro trêmulo. "E de volta para Whittington."
"Oh, Jesus."
Eu balancei a cabeça, recordando o frio que fazia lá, como as luzes estavam
sempre muito brilhantes, os ruídos muito altos. "Mais uma vez, eu não fiquei lá
por muito tempo... logo voltei para casa. Mas eu não podia lidar. Não foi possível
lidar com a perda da minha mãe, com conviver no mundo sem ela. Eu não sei."
"Lily, você nunca recebeu uma chance para lamentar. Será que seus avós
te ajudaram com isso? Será que alguém te ajudou com isso?"
Não, ninguém tinha feito. "Não, eles não falavam sobre ela. Eu acho que
eles pensaram que mencionar o nome dela me dirigiria para outro surto psicótico.
E talvez eles tivessem razão, mas," eu respirei, "não falar sobre ela, apenas fingir
que ela nunca existiu, quando ela tinha sido o meu mundo inteiro
- meu tudo - foi... insuportável. Deus, Ryan, doeu tanto." Eu apertei meus olhos
fechados por um momento. Ainda doía. Ela era a única pessoa que conhecia as
imagens horríveis que eu tinha visto. Ela era a única pessoa que conhecia o
desamparo esmagador que eu senti naquela noite. Eu sentia falta dela tão
desesperadamente.
"Eu sei, baby." Ele trouxe a minha mão à boca e a beijou.
"No ano passado aconteceu de novo, e foi por isso que eu fugi." Baixei os
olhos. Eu poderia descrever o que aconteceu a partir da perspectiva dos meus
médicos, mas, eu queria que ele compreendesse meu lado da historia. "É tão
difícil de explicar e soar racional, porque não é racional. Não é, e eu sei disso." Fiz
uma pausa. "O mundo muda, e então algo em mim muda também, porque eu
apenas aceito o que acontece. Eu aceito uma nova história, uma nova vida,
novos personagens. Às vezes é apenas uma ligeira variação da minha vida real,
e, às vezes, é inteiramente diferente." Era como se eu estivesse olhando para o
mundo real através de um caleidoscópio, ainda ali, mas ao mesmo tempo girando,
mudando com mil cores, padrões e luzes diferentes. Observei minhas próprias
mãos inquietas em meu colo, sentindo-me constrangida e insegura.
"Eu sei", ele disse suavemente, porque ele sabia. Eu olhei para ele e vi sua
compreensão, a aceitação em seus olhos, e senti ambos, tanto o amor quanto
a tristeza florescerem em meu peito. Meus lábios formaram um sorriso triste, e eu
balancei a cabeça, respirando fundo antes de continuar. "Na primavera passada,
eu comecei imaginando que minha mãe ainda estava viva. Meu avô – que esteve
doente – e minha avó estavam planejando vender Whittington. E, em minha
imaginação, minha mãe queria passar o verão lá. Somente uns dois
meses com nós duas, mais o ar da montanha e a luz do sol - e o alívio da minha
avó, que não fez nada além de olhar para minha mãe e eu
com preocupação, e andar em torno torcendo as mãos. Eu
não sei nem mesmo lhe dizer exatamente como isso fazia sentido na
minha mente, nós estarmos lá. Mas eu ainda poderia contar-lhe sobre
as conversas que tive com a minha mãe... eu poderia explicar tudo, se isso não me
fizesse soar como a pessoa louca que eu sou."
"Lily, pare, não fale assim." Sua voz estava rouca.
"É verdade, porém, não é?"
Ryan suspirou, pressionando os lábios por um momento. "Eu acho que nós
dois somos loucos, então. E, Lily, eu também acho que, às vezes, a única maneira
de sobreviver é ficando louco."
Eu pensei sobre isso por um momento, sobre quão semelhantes a dor
e a loucura eram - dois lados da mesma moeda, talvez. Eu pensei sobre
como pessoas feridas e doloridas puxavam os cabelos e rasgavam suas roupas,
parecendo querer escapar de sua pele. E eu pensei sobre como os doentes
mentais, por vezes, faziam a mesma coisa. Eu os tinha visto com bastante
frequência nas instituições em que tinha estado, e tinha feito isso eu mesma em
algumas ocasiões. Talvez fosse isso que um doente mental realmente sentia – um
extremo pico de duradoura aflição. Então me diga, como era possível carregar tal
coisa com graça?
Mas ele tinha que entender... "Isso acontece comigo uma e outra vez, Ryan.
Acontece mais e mais – mesmo quando as coisas estão aparentemente bem."
"Você esteve bem por um ano."
"Sim, e eu estive bem por outros ‘uns’ anos antes. Isso é realmente algo com
o qual você quer lidar? Quando você já tem suas próprias lutas? Quando você
está apenas indo bem? Se sentindo forte? Você está, não está?" Senti lágrimas
picando meus olhos novamente - um transbordamento delas.
"Lily", disse ele, o tom de sua voz torturado. "Eu quero você exatamente
como você é. Eu só... eu quero você, e –"
"Por favor," o interrompi. "Por favor, não diga isso agora." Eu trouxe dois
dedos até seus lábios. "Por favor, pense sobre o que eu lhe disse. Considere com o
que você está concordando. Considere como seria uma vida comigo. O
que significaria uma vida entre nós dois. Por favor, Ryan. Por favor, faça isso por
mim. E, se depois que você pensar nisso tudo, decidir que ficarmos juntos não é
o melhor para você, que não é o melhor para nenhum de nós, prometa que vai ser
honesto comigo, certo? Que você vai ser honesto comigo, porque você é bom e
gentil, e porque você me ama." Eu afastei meus dedos de seus lábios e usei minha
mão para acariciar seu rosto. Os leves espinhos de uma nova barba
riscaram minha palma. Ele fechou os olhos e inclinou-se ao meu toque por alguns
momentos.
Quando finalmente abriu os olhos, ele balançou a cabeça, sua expressão
solene. "Ok. Sim, eu vou sempre ser honesto com você. Sempre."
Eu soltei um suspiro e assenti. "Eu sei", respondi. "Eu confio em
você, Escoteiro." Dei-lhe um sorriso trêmulo. "Eu confiei em você desde o momento
em que te conheci."
Ryan inclinou-se e colocou sua testa contra a minha, e
ambos apenas respiramos juntos por vários momentos. "Você vai me dizer o que
aconteceu no Whittington? Como você me encontrou e como sua avó acabou lá?"
Eu balancei a cabeça. "Sim."
Ryan sentou-se e eu limpei minha garganta. "Eu o encontrei na floresta,
bem perto de Whittington. Você tinha caído num barranco raso. Você parecia
principalmente machucado e arranhado, mais por andar pela floresta do
que por causa da queda."
"Eu estava tentando chegar até você."
Eu balancei a cabeça, acariciando minha mão em sua bochecha novamente.
"Eu sei." Afastei minha mão e continuei, "eu usei uma
colcha grossa e o mudei para ela, e então o arrastei ate Whittington. Quando
chegamos lá, eu usei seu telefone para ligar para a minha avó. Ela era enfermeira
antes de conhecer meu avô... de qualquer maneira, eu sabia que ela seria capaz
de ajudá-lo." Eu balancei a cabeça. "Eu provavelmente deveria ter chamado uma
ambulância, mas achei que você não tinha quebrado nada vital, e não havia
sangue –"
"Você fez muito bem. Eu estava bem."
Eu balancei a cabeça, ainda me sentindo culpada. "De qualquer forma,
minha avó te avaliou e concordou em ajudar,
contanto que eu prometesse voltar a um hospital. Encontrar-me lá, enlameada e
frenética, e descobrir que eu tinha vivido em Whittington com a minha...
mãe," mordi o lábio e fechei os olhos brevemente, "ela estava preocupada e com o
coração partido, para dizer o mínimo." Eu suspirei, lembrando-me do
confronto, dos argumentos, das lágrimas. "Eu concordei em me internar, contanto
que fosse em algum lugar perto de você. E quando voltamos para a cabana, eu
achei sua mochila e uma etiqueta de bagagem com o seu nome.
Estava desbotada e difícil de ler, mas estava lá. Ela apenas confirmou o que eu já
suspeitava – que o seu nome era Ryan, e não Holden. Ryan Ellis.
Minha avó descobriu o resto das suas informações." Fiz uma pausa. Esse tempo
todo ainda era tão escuro e nebuloso. Eu estava cheia de dor, de medo.
Deixei minha avó lidar com os detalhes enquanto passava os dias como se
estivesse meio dormindo. Dor podia fazer isso com uma pessoa, eu acho. "Mais
tarde, minha avó alugou uma casa em Marin, mas vamos voltar para o Colorado
depois que meu tratamento estiver completo."
"Então foram você e sua avó que me levaram à cabana de Brandon, que me
levaram lá em cima?"
"Entre nós duas, sim", eu disse. "Você ajudou um pouco, mas minha avó
tinha lhe dado uma leve medicação para dormir."
"Eu pensei assim", ele murmurou. "Obrigado por ter cuidado de mim." Ele
olhou para baixo por um momento. "Deus, Lily, o que você fez por mim." Ele
levantou os olhos para mim, e eles estavam cheios com uma emoção que eu não
conseguia definir. "Você concordou em ir para um hospital
por tempo indeterminado. Por minha causa. É como ir para a prisão. Eu sei. Eu-",
sua voz falhou, "eu nem sei o que dizer sobre isso, como expressar-lhe quão grato
eu sou."
Eu balancei a cabeça, olhando para o meu colo. "Eu faria qualquer coisa
por você, Ryan, qualquer sacrifício. E, bem no fundo, eu sabia que estava
doente também. Eu sabia. Apesar da minha preocupação por você, eu sabia que
precisava de tratamento para mim mesma."
Ryan ficou em silêncio por um momento, seus olhos vagando em meu rosto.
"Você deve ter ficado..." ele fez uma pausa como se procurasse a palavra certa,
"surpreendida ao descobrir quem eu realmente era, o que eu estava passando."
"Sim", eu disse, e então limpei minha garganta. "Eu sabia que não podíamos
ficar juntos, sabia que eu não era boa para você, mas eu te amei. Eu ainda faço.
Ainda te amo."
"Lily", disse ele, puxando-me contra si de novo, "eu te amo, também. Nós
nunca seremos perfeitos ou sem falhas: a vida que nos foi dada não é assim. Mas,
Lily, em meu coração, você é perfeita para mim. Perfeitamente minha. E eu sou
seu."
O calor de repente fluindo em minhas veias me surpreendeu. Depois de
tudo o que tínhamos acabado de conversar, depois dele descobrir todos os meus
segredos, de eu revelar até o último esqueleto que mantinha guardado em meu
armário, eu mal podia acreditar que era capaz de sentir desejo. E ainda assim eu
fiz. Ryan se afastou um pouco para que pudesse olhar nos meus olhos. "Posso
beijar você?", perguntou.
"Sim", murmurei suavemente, inclinando-me e escovando meus lábios sobre
os dele. Ele hesitou por um espaço de dois batimentos cardíacos antes de dizer:
"Não me beije como se fosse um adeus, Lily. Não faça isso comigo novamente. Me
prometa isso".
Eu apertei meus olhos fechados e balancei a cabeça. "Eu não estou dizendo
adeus." Eu só quero que você seja capaz de decidir se pode ou não viver o tipo de
vida que teria comigo.
Suas mãos foram para o meu rosto, e ele pressionou seus lábios nos meus.
Ele deslizou sua língua na minha boca e eu suspirei, o som de prazer misturado
com doce alívio, com esperança. Parecia que, em muitas maneiras, eu o conhecia
melhor com os olhos fechados. Eu me lembrava do gosto de sua boca, de sua pele.
Eu lembrei-me dos sons que ele fazia quando estava me fazendo perder
o controle, e dos sons que fazia quando estava se perdendo. Lembrei-me da
sensação de seu corpo pressionando no meu, da maneira como ele tremia contra
mim. Nós nos beijamos e beijamos, sentados em seu sofá, familiarizando-
nos um com o outro mais uma vez, e isso me fez sentir como voltar para casa.
Quando finalmente nos afastamos, eu disse: "Eu tenho que voltar. Minha
avó está me esperando." Mas eu não me movi - ao invés disso, me mantive
acariciando sua mandíbula, seu ouvido.
"Você não tem que ir. Você pode apenas ficar aqui, e nós
poderíamos... conversar um pouco mais", disse ele, não se movendo também – ao
contrario, movendo os lábios de volta para os meus e me beijando novamente. Eu
sorri contra seus lábios.
"Não, eu realmente tenho que ir. Eu não quero, mas tenho," murmurei,
finalmente me afastando e encontrando seus olhos. "E, Ryan, se você pensar
sobre nós e decidir que não é certo, se você decidir que não
devemos ficar juntos, eu não vou culpá-lo." Eu o beijei mais uma vez rapidamente
nos lábios e depois na testa, e então em ambos os olhos. "Eu entendo, e vou te
amar mesmo assim. Eu vou te amar, mas vou deixa-lo ir... novamente."
"Deus, Lily", disse ele, esfregando os lábios na minha testa, "Eu já –"
"Não. Por favor, tome algum tempo. Eu só te peço isso. Eu preciso saber que
você tomou algum tempo para realmente pensar sobre isso. Por favor."
Ele balançou a cabeça, mais seguro agora, e se afastou para me dar
espaço. "Sim, tudo bem. Tudo bem. Eu vou pensar sobre isso. Prometo."
Dei-lhe um pequeno sorriso e apertei sua mão, trazendo-a para o meu
coração e segurando-a lá por um momento antes de deixá-lo ir. Com as pernas
trêmulas, andei em direção a porta. Meu corpo queria ficar. Meu coração queria
ficar. Mas eu sabia que, naquele momento, eu precisava ir, e conforme Ryan
lentamente me levou à porta – segurando minha mão na sua por todo o caminho –
eu sabia que ele me entendia. Quando ele abriu a porta, eu
andei rapidamente por ela. Não tive coragem de olhar para trás. Se ele
escolhesse me deixar ir, significava que eu tinha acabado de deixar meu coração
para trás.
Capítulo vinte e seis

Ryan

A contemporânea casa térrea era visível da parte superior de um conjunto


de degraus de madeira com manchas escuras, que nivelavam e envolviam a
varanda na frente da casa. Eu comecei a descer, tomando a vista incrível. De onde
eu estava, podia ver a Golden Gate e a Baía Bridges, bem como San Francisco e
Sausalito. O sol estava começando a se pôr, o céu ardendo em fogo vermelho e
laranja. Só essa vista tinha que valer milhões - muito por uma casa de aluguel.
Quando cheguei à porta da frente, bati duas vezes. Depois de um
momento ouvi passos, e alguns segundos depois a porta se abriu, para revelar a
avó de Lily. "Olá, Sra. Corsella", eu disse.
Ela apenas me olhou, levemente surpresa.
"Ryan".
Esperei um segundo. "Lily está em casa?"
"Não, ela não está."
Decepção me bateu. "Oh." Eu fiz uma careta. Eu não tinha previsto que ela
não estaria aqui. Eu tinha tentado ligar pra ela no caminho, mas ela não tinha
respondido. Estava na hora do jantar, porem, e eu achei que ela poderia estar
ocupada com isso. Ou talvez ela realmente estivesse aqui e sua avó estava
mentindo para mim. "Sabe onde eu posso encontrá-la?"
"Ryan, por favor, entre." Eu hesitei. Não queria uma palestra sobre por que
Lily e eu não devíamos ficar juntos. Eu tinha tomado um segundo dia de folga do
trabalho, e o gastei fazendo o que Lily tinha me pedido para fazer: pensar em nós.
Suspirei e passei pelo limiar da porta que ela estava segurando aberta, porem,
e a segui para uma sala de estar formal à esquerda, ao lado da pequena entrada
da frente.
Ela se sentou em uma poltrona quase branca, e eu me sentei no sofá.
Esperei ela falar primeiro. "Lily me disse esta manhã que
confiou a você seu... passado. Sua situação."
Sua situação. "Sim, Lily me contou sobre sua vida, sua doença", eu disse.
"Eu aceito tudo sobre ela."
Sua avó olhou para mim por vários momentos - seu olhar avaliador, mas
não frio. "Você a aceita." Ela ficou em silêncio novamente por um momento. "Você
realmente sabe o que isso significa? Você entende o que é amar alguém como
Lily?"
Alguém como Lily. Alguém como eu. "Sim, e isso é a melhor coisa que
já me aconteceu", eu disse, colocando nas minhas palavras a convicção que
sentia em meu coração.
"Você acha isso agora, Ryan. Você acha isso agora porque Lily está indo
bem, e ela está aqui com você em todos os sentidos. Você não sentiu o desgosto de
vê-la apenas... desaparecer diante dos seus olhos, de vê-la conversando com
pessoas que não estão lá, porque está vivendo no seu próprio mundo."
"Não, você está certa, eu não passei por isso. Mas estou disposto a aceitar
essa possibilidade, mesmo a probabilidade. Estou disposto a aceitá-la
porque deixa-la ir é totalmente impensável para mim, não há
outra escolha. Eu a escolho de bom grado, cada parte dela, ate mesmo a
escuridão." Assim como ela me aceitou, ate mesmo a escuridão.
O rosto de sua avó parecia gentil. "Você está apaixonado por ela."
"Sim. Sim."
Ela suspirou. "Bem, isso é um começo, eu suponho."
"Eu gosto de pensar que é realmente um bom começo."
"E você vai cuidar dela?"
"Com todo o meu coração e alma."
O brilho de um sorriso apareceu nos lábios de sua avó. "Ela está apaixonada
por você, também. Ela deixou isso muito claro para mim esta manhã. E deixou
bem claro há um ano, também, embora a meu ver houvessem prioridades mais
terríveis então." Ela olhou para suas mãos por um momento. "Nós conversamos..."
suas palavras desapareceram, mas eu não disse nada. Era como se
ela ainda estivesse ponderando algo. Quando seus olhos encontraram os meus,
estavam cheios de tristeza. "Lily é a única família que me resta, Ryan. E ela não
tem ninguém exceto eu."
Era óbvio que ela amava muito sua neta. Eu não queria que ela pense que
comigo na vida de Lily ela seria relegada a um segundo plano. Ela não merecia
isso. Ela não merecia estar sozinha, também.
"Tinha", eu disse. "Ela me tem agora, também. Vocês duas o fazem."
Ela balançou a cabeça lentamente, com os olhos suaves. "Ela tem dinheiro,
você sabe, da herança de sua mãe. E eu deixarei Whittington para ela. Acho que
ela pode fazer com ele as adaptações que achar
adequadas. Isso parece certo." Whittington pertencia a Lily. Ela fez uma pausa.
"Ainda assim, eu me preocupo, você sabe, com o que vai acontecer a Lily quando
eu me for." Ela colocou a mão sobre o coração. "Meu coração é fraco, e
eu me preocupo –"
"Você não precisa se preocupar mais. Eu quero estar aqui para ela."
"E o que acontece se você também ficar doente de novo? E então?"
Deixei escapar um suspiro. "Eu não sei. Eu não tenho todas as respostas a
esta situação. Mas, eu acho que – não, eu sei – que Lily e eu pertencemos um ao
outro, e eu tenho que acreditar que vamos encontrar uma maneira de fazer as
coisas funcionarem, seja lá o que puder parecer, seja lá o que tivermos que
enfrentar."
Sua avó assentiu tristemente. "Tanta incerteza. É o que eu tentei evitar
para Lily."
"Você não pode. Eu não sei se alguém pode, mas, especialmente para Lily e
eu, sempre haverá incerteza. E é o amor que vai torná-la mais suportável. Não
importa o que, essa sempre será a única coisa certa para nós, nossa única
constante. Será sempre a luz para nos guiar na escuridão."
Os olhos da avó de Lily brilhavam com lágrimas quando ela concordou. "Ok,
Ryan." Ela deixou escapar um profundo suspiro, talvez resignada, talvez
aliviada, talvez ambos. "Desculpe-me por tentar mantê-los afastados. Desculpe-
me por isso. Você tem a minha bênção."
Meus ombros relaxaram e eu dei-lhe um pequeno sorriso. "Onde ela está?"
"Ela foi ao planetário. Ela deve estar em casa a qualquer minuto, se
você –" Nós fomos interrompidos pelo som do meu telefone tocando.
"Desculpe-me", murmurei, pegando meu telefone do meu bolso. Era Lily.
"Lily", respondi. Eu ouvi estática na linha. "Alô?" Virei-me um pouco longe da avó
de Lily.
"Ryan", disse Lily. "Desculpe, está ventando. Você pode me ouvir?"
"Sim, onde você está?"
"Estou na ponte Golden Gate. Estou andando –"
Eu fiz uma careta. "A Golden Gate? O que você está fazendo aí?"
Ela respondeu, mas o que quer que tenha dito foi perdido numa explosão de
estática. "Lily, eu estou indo pegar você, ok? Fique aí, vou te encontrar. Alô?" Eu
ouvi sua voz distorcida e repeti o que tinha dito, logo antes da linha morrer.
Olhei para sua avó. "Vá", disse ela, dando-me um pequeno
sorriso conspiratório. "Vá buscá-la."

O vento bateu no meu rosto enquanto eu me movia rapidamente através


das pessoas andando pela ponte. O céu estava escuro e agora a ponte estava
iluminada, mas a iluminação era suave e moderada. Para mim, a Golden Gate à
noite nunca pareceu iluminada por eletricidade, mas sim como se fosse
banhada à luz das estrelas. Eu andei através da multidão passeando, movendo-
me rapidamente, girando minha cabeça quando via um cabelo escuro -
e decepção batia-me cada vez que eu percebia que não era Lily. Meu coração
começou a bater mais rápido. Onde ela estava? Aumentei meu ritmo ainda mais,
praticamente correndo agora, minha respiração saindo em curtas rajadas de
ar. Eu finalmente avistei uma figura solitária de cabelo longo e escuro em pé
perto de uma das torres. Ela apoiava seus braços no parapeito, olhando para a
baía. Meu coração pulou de alegria. Era ela. Lírio da Noite. Meu Lírio da Noite. Eu
abrandei meu ritmo a medida que me aproximei. A cabeça dela virou à direita
antes que eu chegasse, como se ela estivesse sentindo eu me aproximar - e o
sorriso que iluminou seu rosto fez meu coração saltar no peito. "Oi," respirei.
"Oi", disse ela, virando seu corpo para me encarar.
"O que você está fazendo aqui?"
"Eu nunca andei pela ponte," disse ela. "O pôr do sol estava tão lindo esta
noite e isso só me chamou, eu acho. E agora, a lua." Ela olhou para cima, e eu
também. "Você vê isso?" E, em seguida, eu vi. E não podia acreditar que não tinha
notado antes, tão empenhado em encontrá-la. A lua acima estava cheia e
brilhante, tão brilhante que ofuscou as estrelas.
"Eu vejo agora", sussurrei. Nós olhamos um para o outro e Lily inclinou a
cabeça, seu sorriso desaparecendo, um olhar um pouco nervoso substituindo-o.
"O que você está fazendo aqui?"
Tomei suas mãos nas minhas. "Você me disse que eu tinha
que pensar com o que estava concordando. O que estar com você significa. Que
em algum momento no futuro, você desejará apenas... ir embora. E não será
necessariamente porque algo terrível aconteceu, nem porque você quer.
E também não será porque eu poderia ter feito algo para impedir que isso
acontecesse. Ou, às vezes, será por causa de algo que aconteceu e com o
qual você não pode lidar. Isto é imprevisível e–"
"Sim", ela engasgou, tristeza movendo-se em de seu rosto,
desviando seus olhos para longe de mim e, em seguida, de volta. "Sim, Ryan."
"Então eu vou encontrá-la."
Ela riu numa fungada. "O quê?"
Eu apertei suas mãos com mais força. "Se você for embora, então eu vou
encontrá-la, mesmo que isso signifique ter que me perder por um tempo,
também."
Ela balançou a cabeça, seu sorriso doce intrigado. "Como você será capaz de
fazer isso?"
"Porque," eu disse, movendo-me ainda mais perto, ate nossos corpos se
tocarem e ela ter que inclinar a cabeça para olhar para mim, "Eu não tenho medo
da escuridão. Eu estive lá antes. Eu vou entrar lá voluntariamente e sem
hesitação, e vou encontrá-la. Ninguém mais poderia fazer essa promessa e dizer
isso, Lily. Ninguém. Ninguém além de mim."
Uma lágrima escorreu de seu olho, caindo por sua bochecha,
mas eu continuei a segurar suas mãos, nenhum de nós a secando. "Eu não quero
trazê-lo para a escuridão", disse ela.
"Eu poderia ser o único a ir para lá, em primeiro lugar. Eu não posso
garantir que não vou. Você viria para mim, Lily? Você iria me encontrar?"
"Sim", ela disse, uma súbita intensidade em sua voz. "Mil vezes, sim. Mas, é
por isso que as pessoas dizem que somos errados um para o outro. As
pessoas diriam que estamos encorajando um ao outro a ficar doente."
"Isso é ridículo. Eu não estou dizendo que quero que você fique doente.
E nem estou dizendo que quero ficar doente. O que estou dizendo é que, se você
se perder, eu vou te encontrar. E eu vou te trazer de volta. Onde quer
que você esteja, quem quer que você seja, eu vou chegar lá e vou te encontrar. E
eu espero que você faça o mesmo por mim."
"Eu não sei se isso é possível, Ryan", disse ela com ternura, movendo uma
mecha de cabelo da minha testa, "e, mesmo que seja... o mundo certamente não
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está preparado para esse tipo de coisa. A menos que você seja Willy Wonka e
possua sua própria fábrica de chocolates."
Dei-lhe um leve sorriso. "Então vamos criar o nosso próprio mundo.
Ninguém pode saber o que é possível até estar dentro de mentes como as nossas.
E eu acredito que possamos descobrir como fazer funcionar. De alguma maneira...
você acredita, também?”
Ela finalmente sorriu de novo, seus lábios tremendo. "Você me faz
acreditar."
"Bom, porque é verdade."
Ela soprou uma pequena risada e olhou para baixo, então inclinou os olhos
para cima, parecendo tão bonita que fez meu coração doer. E, lá no fundo, eu
senti algo se agitar a vida, como se minha alma estivesse apenas começando a
acordar. Finalmente. "Eu te amo, Escoteiro", ela sussurrou.
"Eu te amo, Lírio da Noite. Eu te amo tanto". Soltei suas mãos e estendi as
minhas para segurar seu rosto, seu belo rosto. Eu trouxe meus lábios aos dela e a
beijei. "Eu vou te amar para sempre" murmurei entre beijos. "Para sempre. Na
escuridão ou na luz." Ela sorriu contra os meus lábios enquanto o mundo
mudava em torno de nós. E, naquele momento, nós encontramos o nosso próprio
mundo e vivemos nele com alegria.
Capítulo vinte e sete

Lily

Ryan destrancou a porta de seu apartamento e a abriu. Eu ri com feliz


surpresa quando ele me levantou em seus braços e me carregou no colo. "Eu acho
que isso é reservado para as noivas," eu disse, rindo.
Ele sorriu. "Parece que hoje é o dia do nosso casamento não oficial, então",
disse ele. "Eu vou fazer isso de novo quando for oficial, não se preocupe." Ele
dirigiu-se por um corredor e entrou em seu quarto, e beijou-me quando meus
pés tocaram o chão. No simples pensamento de um dia ser sua esposa, felicidade
encheu meu coração. Eu sorri contra sua boca e me afastei, olhando ao redor de
seu quarto. Era tão arrumado quanto o resto do apartamento, com
móveis simples e masculinos, e uma colcha vermelha e azul na cama. Ele tinha
pilhas organizadas de livros em toda parte. Um leitor ávido. E ele ainda lia livros
de bolso. Meus olhos brilharam numa prateleira cheia de modelos montáveis de
todos os tipos – antiquados carros, barcos, comboios, aviões, helicópteros.
Inclinei-me mais perto, olhando para os detalhes dos mesmos. Tudo era tão
pequeno, tão preciso, tão perfeitamente colocado. Eu levei um
momento os estudando. "Você tem o coração de um artista", murmurei.
Ryan veio ficar ao meu lado. "Nah, são apenas modelos. Eles vêm com
instruções. Você não pode realmente bagunça-los." Inclinei a cabeça, olhando os
detalhes de um helicóptero, o jeito que ele tinha desenhado um pássaro no lado
de um, suas asas espalhadas em voo, vento fluindo através de suas
penas. Outro tinha um o logotipo do 49ers nele. A maioria deles tinha pessoas
pequenas desenhadas nas janelas - motoristas, passageiros - todos tão bem
feitos e com expressões diferentes, algumas felizes, algumas pensativas,
algumas entediadas. Tudo era tão pequeno. Como ele tinha feito isso? Pisquei,
uma sensação de déjà vu me superando, como se eu tivesse visto algo semelhante
antes... numa janela uma vez, a luz piscando quando eu tinha passado por uma
porta aberta. Tão rapidamente como veio, porem, o sentimento passou. Levantei-
me em linha reta e me virei para ele.
"Não, eles podem ser apenas modelos para os outros, mas você
os transformou em arte. São incríveis." Ele me deu um meio sorriso torto,
parecendo um garoto que tinha acabado de receber um elogio, e não tinha certeza
de como responder. "Minha amiga diz que pessoas com corações de artistas são
mais sensíveis que outras. E que elas podem ser mais facilmente quebradas."
Ryan afastou meu cabelo para trás do meu ombro, e se inclinou e beijou
meu pescoço, sorrindo contra a minha pele. "Sinto-me tudo menos quebrado
agora", ele sussurrou. Eu ri suavemente, inclinando a cabeça para dar-lhe melhor
acesso. Agora eu não me sentia quebrada, também. Agora eu me sentia viva e
cheia de uma alegria tão surpreendente que quase me fazia sentir vertigem.
Meus olhos caíram sobre algo pequeno e brilhante no topo de sua cômoda, e
eu estendi a mão e o peguei, sorrindo enquanto Ryan continuava a acariciar meu
pescoço. Segurando-o, suguei uma pequena respiração. "Você achou isso", eu
disse, olhando para a ponta de flecha. Ryan levantou a cabeça.
"Sim, encontrei-a no bolso de uma calça." Ele fechou os dedos em torno da
ponta de flecha.
"Você a guardou. Vamos levá-la de volta para a floresta. Talvez possamos
ir esquiar no Colorado neste inverno." Eu sorri, pensando no futuro que
se lançava à nossa frente, de repente cheio não apenas de incerteza, mas
também de possibilidades. Era um pensamento inebriante, desconhecido.
A batinha que eu estava usando tinha um pequeno bolso sobre meu peito, e eu
deixei cair a ponta de flecha ali, concentrando-me novamente na maravilhosa
sensação da boca de Ryan quando ele a deslizou para minha garganta e me
beijou ali. Ele esfregou seus lábios, me fazendo tremer e meu núcleo a apertar.
Mordi o lábio quando ele recuou e tirou sua camisa. Meus olhos deslizaram para
baixo de seu corpo. Ele era um trabalho de arte.
Tão maravilhosamente masculino, tão perfeitamente trabalhado. Eu senti meu
rosto corar de desejo. Quentes faíscas inflamavam entre as minhas pernas.
Eu corri um dedo para baixo sobre os músculos de seu estômago e ele ficou
tenso, uma lufada de ar escapando de seus lábios. Ele estendeu a mão e puxou a
parte inferior da minha bata, e eu levantei meus braços para que ele pudesse
puxá-la sobre minha cabeça. Ele colocou-a em cima de sua cômoda enquanto eu
tirava meus sapatos e saia do meu jeans. Os olhos de Ryan correram pelo meu
corpo – meu sutiã era de algodão branco simples, assim como minha calcinha. Eu
não exatamente esperava acabar de pé em frente dele assim quando saí de casa
mais cedo. Mas, ele não pareceu se importar. Seus olhos queimavam minha
pele, percorrendo o caminhos dos meus seios ate meus pés, e então voltando
novamente - e parando por vários momentos nos meus seios, fazendo meus
mamilos endurecerem. Ryan se adiantou e apertou seu corpo duro contra o meu,
agarrando minha bunda para poder me puxar ainda mais perto. E não havia nada
mais delicioso do que sentir sua pele quente contra a minha própria. Ele me
segurou enquanto sua boca me acariciava. Eu agarrei seus ombros, minhas mãos
deslizando para baixo nos músculos de seus braços. E, de alguma forma e de
algum lugar, senti o aroma acentuado de pinho, como se estivéssemos de volta na
floresta em nosso próprio mundo, apenas nós dois. Eu sorri contra sua boca,
sentindo-me como se estivesse caindo, embora permanecesse firmemente em
meus pés.
Eu usei meus dedos para tirar minha calcinha e, em seguida,
deslizei para fora dela. Antes mesmo de perceber o que estava acontecendo, Ryan
caminhou comigo em direção a sua cama e, quando a senti contra a parte de
trás dos meus joelhos, sentei-me e me inclinei ate que pudesse deitar-me. Ryan
arrastou-se para cima de mim, e a expressão em seu rosto era intensa e cheia de
desejo, de amor. Minha respiração vacilou. Eu o amava. Eu o amava com cada
parte de mim.
Ele tocou minha bochecha suavemente, tão amorosamente que uma
lágrima quebrou e correu pela minha bochecha. Ryan limpou-a com o polegar.
"Por que isso te faz chorar, doce Lírio da Noite?"
"Porque eu nunca imaginei que alguém consideraria meu amor como algo
mais que uma maldição."
"Seu amor é um presente, não uma maldição." Ele traçou minha bochecha
com um dedo, acariciando até meus lábios, onde os traçou, também.
Olhei em seus olhos por vários segundos, finalmente inclinando-me e
beijando-o. Não parecia haver resposta melhor do que isso. Ele gemeu baixinho
e me amou de volta. Incondicionalmente. E eu nunca tinha me atrevido a
considerar tal coisa. Algo grande pareceu se romper e se abrir dentro de mim,
algum tipo de maravilha. Ele sabia tudo sobre mim – todas as maneiras como eu
estava danificada – e ainda pensava que meu amor era um presente. O
mundo todo parecia se iluminar ao meu redor.
Ele desabotoou o fecho frontal do meu sutiã e o tirou. Sua mão roçou
da minha costela ao meu seio, seu polegar circulando meu mamilo endurecido.
Engoli em seco, relâmpagos arqueando meu peito e abrindo minhas coxas. Sua
boca desceu e chupou suavemente meu corpo todo, até que eu estava me
contorcendo sob ele, ondas pulsando entre meus mamilos e meu núcleo. Minhas
mãos vieram ao seu cabelo, e eu entrelacei meus dedos nele.
Quando senti sua mão parar do lado da minha perna para agarrar a parte
de trás do meu joelho, meu núcleo apertou de uma maneira que me fez ofegar.
Ele levantou minha perna, e quando eu fiquei aberta para ele, notei que sua mão
estava tremendo um pouco. Quando ele apertou-se dentro de mim, nossos olhos
se encontraram, o momento parecendo pausar e depois continuar em um flash
brilhante de prazer. "Ryan", eu gemi, "Ryan, Ryan."
Ele falou palavras ao lado do meu pescoço quando começou a se balançar
lentamente - palavras que eu não pude entender, mas que
conhecia mesmo assim. Palavras de amor, de alegria, de prazer. Agarrei suas
nádegas, amando a forma como elas flexionavam cada vez que ele entrava em
mim. Quando meu clímax tomou conta eu ofeguei, e minhas costas curvaram-se
ligeiramente, pressionando minha cabeça de volta para o colchão. Meu orgasmo
pareceu trazer o de Ryan, porque assim que eu estava à deriva na terra, ele
estremeceu e gemeu, circulando seus quadris enquanto respirava asperamente
contra minha pele.
Deitamo-nos juntos e em silêncio por vários momentos enquanto eu
acariciava suas costas e sua respiração desacelerava. "Ela anda em beleza, como
a noite," ele sussurrou. Meus dedos abrandaram e eu sorri. "de climas sem
nuvens e céu estrelado; e tudo o que é melhor do escuro e brilhante." Ainda
estávamos em outro momento, a beleza das palavras
proferidas em sua voz cheia de amor se repetindo na minha cabeça. Ele saiu de
mim, mas continuou deitado. Sob meus dedos, senti as marcas familiares em suas
costas, e inclinei-me ligeiramente para olhar mais de perto. Era um roteiro de
cicatrizes, algumas pequenas, outras redondas e púrpuras, como
queimaduras. Eu podia senti-las com meus dedos – queimaduras de cigarro,
talvez – e outras ainda, finas e brancas. Oh, Deus. "Quem fez isso com
você?" Perguntei, minha voz rouca com simpatia.
Ryan moveu um pedaço de cabelo do meu rosto. "Meu pai", disse ele.
"Seu pai", eu repeti em descrença. Enojada. Ele rolou para o lado e reuniu-
me perto, puxando a colcha sobre nós. Eu tinha lhe contado minha história em
toda sua verdade gloriosa. E agora, envolvidos nos braços um do outro, ele
me contou a sua. Enquanto ele falava dos espancamentos, das cicatrizes, das
queimaduras e das gaiolas, eu aprendi que ele também tinha sofrido
terrivelmente, mas que ainda tinha, de alguma forma, sobrevivido e até
prosperado - e eu caí ainda mais profundamente apaixonada.
Ele estava danificado, mas não quebrado. Ele era bonito e corajoso, e apesar da
dor que tinha suportado, conseguiu manter um coração cheio de amor e
bondade. Nós nunca seremos perfeitos ou sem falhas; a vida que nos foi dada
não é assim. Mas, Lily, em meu coração, você é perfeita para mim. Perfeitamente
minha.
E eu era sua para sempre, nesta vida ou em qualquer outra.

Eu acordei lentamente, tentando abrir os olhos e espremendo-os fechados


quando a luz súbita fez minha cabeça latejar de dor. Eu tentei trazer minha
mão a minha testa, mas esbarrei numa contenção. Meus olhos se abriram e eu
gemi com o estouro agudo de dor, piscando contra a luz. Eu estava na minha
cama na casa de aluguel da minha avó, e minhas mãos estavam atadas na
cabeceira da cama com uma corda. Eu ainda estava vestida com as roupas que
usara na noite anterior. Minha pressão arterial disparou, fazendo com que meu
coração martelasse em meu peito. Meus olhos se ajustaram à luz enquanto eu
trabalhava para controlar minha respiração. O que estava acontecendo? Agarrei-
me a minha memória. Eu me sentia tão tonta, como se tivesse sido
drogada. Sentia-me ferida. Oh Deus. Eu voltei da casa de Ryan na noite
anterior... tínhamos feito amor. Ryan. Eu estava tão feliz.
Ryan queria que eu passasse a noite com ele, mas eu queria ser respeitosa com a
minha avó, então ele tinha me deixado aqui. Ele me deu um beijo de boa noite e...
A porta se abriu e eu fiquei completamente imóvel, tensa. Jeffrey entrou,
vestindo um terno branco com um crachá. Minha visão ficou turva quando ele se
aproximou, e eu soltei um som estrangulado de medo. Seu crachá tinha o
logotipo do Whittington. Oh, Deus, oh, não. O que estava acontecendo? "O que
você quer?" Perguntei. "Porque eu estou presa?" Eu puxei contra a corda. Minha
voz soou grossa e ilegível, como se eu estivesse ouvindo-a debaixo d’água.
Ele sentou-se na beira da cama e aproximou um dedo da minha bochecha,
acariciando-a. "Você é tão bonita, Lily," disse ele. "Tão linda, mas tão danificada.
Muito doente."
"Eu não estou danificada," tentei dizer, mas não tinha certeza se tinha
conseguido ou não. Ele continuou a me olhar com um olhar de fome crua - ou
seria raiva? Eu não podia dizer. Foi apenas como aquele outro homem – aquele
que tinha machucado minha mãe. O mundo pulsava em torno de mim, os
detalhes do quarto se transformando em contornos pretos de um desenho
rabiscado. Eu gemi.
"Mas...", disse ele. "eu não me importo que você esteja danificada. Eu gosto
disso, Lily. Gosto muito disso." Ele se debruçou e me beijou, sondando meus
lábios com a língua. Ele tinha gosto de cigarros e respiração obsoleta. Senti bile
subir pela minha garganta.
Virei a cabeça, forçando a palavra "Não" tão duramente quanto poderia
- mas ainda saiu mais como um sussurro do que um grito. Raiva brilhou em sua
expressão, e ele ergueu a mão para me bater. Eu me preparei para ele, mas, de
repente, uma porta se fechou em algum outro lugar na casa, e ele olhou por cima
do ombro.
"Eu estarei de volta", disse ele, ficando de pé rapidamente e saindo do
quarto. Tentei gritar, mas minha voz não parecia estar funcionando. E se o ruído
não tivesse sido minha avó? E se fosse apenas uma porta de carro batendo ou
algo assim? Ela estava mesmo aqui? Eu deveria gritar para fazê-lo voltar? Eu
precisava ficar livre. Puxei as restrições, mas os nós estavam apertados. Ele havia
deixado alguns flexíveis, mas não muito. Eu precisava de
uma ferramenta... alguma coisa... olhei em volta descontroladamente. Não havia
nada na mesa de cabeceira, exceto uma lâmpada, nada que eu pudesse alcançar.
Senti lágrimas arderem nos meus olhos. Oh, Deus, oh não. Tomei uma
trêmula respiração... e eu ainda estava deitada. Meus olhos de repente se
abriram. A ponta de flecha. Ela estava no bolso da minha bata. Por favor, por
favor, não deixe que ela tenha caído. Com algum esforço eu trouxe-me a uma
posição sentada, o mundo escurecendo com meus esforços. Respirei
fundo algumas vezes, e alguma clareza retornou. Ok, ok.
Dobrando meu pulso até que senti que podia agarrar e esticar minha mão,
agarrei na borda do pequeno bolso. Deixei escapar uma lufada de ar e me
esforcei um pouco mais, suor brotando na minha testa com o esforço e a dor da
minha mão dobrada. Quando meus dedos tocaram a borda da flecha, uma onda
de esperança explodiu dentro de mim, e me empurrou mais longe... mais longe,
meus dedos indicador e polegar seguraram a borda fina num
aperto de morte. Ainda estava lá; ainda estava lá. Eu levei um momento para
tentar relaxar, meu ritmo cardíaco abrandando um pouco e meu tremor
diminuindo. Eu movi minha mão lentamente para cima, agarrando a borda mais
desencapada da ponta de flecha em meus dois dedos trêmulos. Quando eu
a tirei completamente do bolso, virei minha mão lentamente e deixei-a cair em
minha palma, apertando-a com força e deixando escapar um suspiro duro
de vitória. Uma gota de suor escorria do lado do meu rosto. Pensei que podia
ouvir passos no andar de cima, e barulho de metal contra metal. Obtendo um bom
agarre na ponta de flecha, segurei-a num estreito aperto, virando a mão em
direção a corda para que pudesse começar a serra-la. A ponta de flecha parecia
tão delicada, como se a menor pressão pudesse quebrá-la, mas não quebrou.
Ela começou a cortar através da fibra da corda, e eu quase comecei a chorar com
alívio. Agora eu só precisava de tempo. Eu aumentei meus esforços, e serrei a
corda com golpes rápidos.
Depois de cinco minutos ou mais, meu pulso ficou livre, ao som mais ínfimo
de tinidos de sino quando a ponta de flecha atingiu o metal da cabeceira da cama.
Eu caí de volta contra ela, com lágrimas escorrendo pelo meu rosto e suor fazendo
minhas roupas grudarem no meu corpo. Lutei para ficar alerta. Eu estava tão, tão
tonta.
Desamarrei minha outra mão e tropecei para fora da cama, agarrando a
cabeceira para não caira quando sangue correu em minha cabeça. O mundo
nadou na minha frente por alguns instantes, até que finalmente clareou o
suficiente para eu seguir em frente, empurrando os pés nos chinelos no
chão. Eu fui em direção à porta, mas os passos pesados vindo em direção ao meu
quarto me fizeram virar, tropeçando em direção à janela. Eu empurrei-a para
cima, o raspar da madeira fazendo meu sangue gelar. Uma rajada de ar frio
bateu-me na cara. Eu estava chorando abertamente agora, quase soluçando
enquanto subia no parapeito e caía desajeitadamente no chão, me levantando e
começando a correr quando o ouvi gritar algo atrás de mim, sua voz atada com
raiva, pega pelo vento uivante e jogada em algum lugar atrás de mim. Estava
nevando. Oh Deus, estava nevando, e o terreno já estava polvilhado com
a cobertura nua de branco reluzente. Tudo cintilou e brilhou ao meu redor. Tão
frio, muito, muito frio. Eu corri, tropeçando uma vez e gritando, e levantando-
me rapidamente. Eu não sabia que direção tomar, tinha apenas virado ao
redor cega pela neve. Algo voou pela minha cabeça e eu gritei,
tropeçando novamente, mas quando abri meus olhos vi o brilho dos olhos
da coruja olhando para mim, e ouvi seu tranquilo pio como se estivesse me
dizendo para segui-la. E assim eu fiz, seguindo o ar inconstante na minha
frente, o movimento deixado para trás pelas asas do pássaro. Era como se as
lágrimas estivessem congelando no meu rosto e, apesar do fato de que eu estava
correndo, eu estava tremendo de medo e com frio. E eu estava tão tonta, tão só,
tão assustada. Eu corri e corri, até que cheguei a um grande e pesado portão de
ferro. Felizmente o cadeado estava pendurado na corrente, desbloqueado.
Eu arfei um suspiro de alívio e me espremi através da abertura, correndo mais
uma vez, escorregando eventualmente e movendo-me em direção à área
arborizada e escura na minha frente, o pio da coruja me encontrando novamente
no escuro. Corri na direção do som, deixando-me levar, me perguntando se o
homem estava se aproximando. Esconda-se, esconda-se, esconda-se minha
mente apavorada cantava.
O ramo de uma árvore me bateu no rosto e eu deixei escapar um pequeno
grito, empurrando-o para longe. Eu olhei atrás de mim e engasguei ao ver não
a locação da minha avó, mas Whittington de pé na distância, maciço e
gótico, elevando-se contra o céu escuro, a lua coberta por nuvens, as rajadas de
neve quase o obscurecendo agora. Isto já tinha acontecido antes. Uma onda de
tontura me bateu, fazendo com que meus pensamentos se espalhassem como
penas ao vento. E sim, agora eu podia ouvir alguém me perseguindo e, assim,
me empurrei para a frente, correndo entre as árvores e sobre pedras. Pequenos
galhos agarravam meus pés e me faziam tropeçar de novo e de novo, e eu
ouvi um último pio distante, que desapareceu na noite escura.
E então eu vi alguém na minha frente. Ele apareceu em meio a escuridão,
um farol de luz andando em minha direção através do ar branco e rodopiante. Era
um homem, um homem com um casaco pesado e botas. Parecia que ele tinha
vários cobertores ao redor de seus ombros enquanto marchava através da
nevasca e em minha direção, como se eu fosse o seu destino. Meu coração
quase pulou do meu peito, mas eu não me mexi. O tempo acalmou, me segurando
em algum tipo de maravilha que eu não entendia. Eu olhei uma vez para trás de
mim e, então, virei-me para o homem novamente. O homem que tinha estado aqui
fora na neve. Por quê? Eu estiquei meus olhos enquanto ele se aproximava
e, quando vi que era Ryan, exclamei um som selvagem de alegria e alívio que
quebrou o silêncio desta calada noite de inverno. Corri para ele e ele me pegou
em seus braços enquanto eu soluçava seu nome. Nós dois afundamos no chão,
onde ele me segurou no colo. "Shh", disse ele contra o meu cabelo.
"Shh, Lily."
"Ele está vindo atrás de mim", chorei.
"Eu sei", disse ele, mas não havia sofrimento em sua voz. "Ele
vai embora num minuto."
Olhei para trás quando compreensão começou a aparecer. "Ele não existe,"
eu respirei.
"Ele existiu, em Whittington. Mas ele já se foi. Nós escapamos há muito
tempo. Whittington está fechado."
Voltei a olhar para Whittington e percebi que ele estava certo. Estava
escuro, abandonado. Eu levantei meu rosto pra ele, acalmando-me,
confiando nele com todo meu coração. Ele me amava. Ele sempre amou.
Perfeitamente meu. "Está nevando," eu sussurrei.
Ele sorriu muito suavemente. "Eu sei, baby." Ele beijou meu rosto, e pegou
uma lágrima em seus lábios. "Eu sei."
Ele me segurou em seus braços por alguns momentos, seus lábios quentes
pressionados na minha testa. "Na noite passada estávamos juntos na ponte,"
murmurei.
Ele afastou o rosto do meu, alisando meu cabelo para trás. "Estávamos
juntos", disse ele. "Havia uma ponte."
Onde você pousou?
Em seus braços. Eu pousei em seus braços, e você pousou nos meus.
Minha frequência cardíaca diminuiu quando o mundo escuro clareou e a
neve desvaneceu-se no sol da manhã.
"Estamos de volta", eu disse. "Oh Ryan, estamos de volta."
"Sim", respondeu ele, beijando minhas bochechas, testa, queixo e nariz. Ele
sorriu. "Nós estamos. Nós estamos de volta." Registrei o ar aquecido, o cheiro
acentuado de pinho e as folhas úmidas, seus braços apertados em torno de
mim, me puxando para mais perto.
"Sim, estamos", eu repeti através das minhas lágrimas, meus
lábios curvando-se num sorriso trêmulo. Meu Salvador. Meu amor. Ele deve
ter voltado aqui antes de mim. "Você está bem?" Perguntei suavemente.
"Sim, eu estou agora." Ele sorriu.
Depois de vários momentos ele colocou-me em meus pés, assentando um
cobertor em volta dos meus ombros e envolvendo-o firmemente em torno de mim.
Debrucei-me contra ele enquanto caminhávamos, sentindo-me mais forte, minha
mente clareando. Eu inalei uma respiração profunda de ar, olhando para o
homem andando ao meu lado, o homem que eu amava com a profundidade da
minha alma.
"Obrigada por ter vindo para mim", eu disse.
"Sempre", ele respondeu.
Epílogo

Lily

"Acorde, meu amor", sussurrei, beijando uma das arroxeadas


cicatrizes circulares nas costas de Ryan. Ele rolou mais, sorrindo um sorriso
sonolento. Eu coloquei minha mão em seu ombro e apoiei o queixo sobre ele,
olhando para seus olhos azuis. Tão azuis quanto o céu infinito. Observei as linhas
de seu rosto bonito, meu coração dolorido com ternura. Ele era meu. Meu para me
apaixonar uma centena de vezes mais.
"Nós devemos ir", eu disse, abafando um bocejo. "O inverno estará aqui em
breve. Há neve no chão esta manhã. Apenas um pouquinho, mas o dono desta
cabana estará de férias aqui. Nós já a usamos o suficiente."
"Hmm, ok," Ryan sussurrou. "Mas não antes", ele me virou e subiu em cima
de mim quando eu soltei uma explosão surpresa de riso, "de eu a arrebatar uma -
ou doze – vezes nesta enorme cama."
Eu sorri suavemente para ele, arrastando o dedo de sua maçã do
rosto até sua mandíbula, meu polegar esfregando seu lábio inferior cheio. Ele
beijou-o e, em seguida, mordeu-o levemente, seus olhos escurecendo com a
promessa.
"Não há tempo para isso." Eu sorri. "Me leve para casa."
Nós fizemos a caminhada de cinco milhas através do ar frio e fresco da
floresta de mãos dadas, falando sobre tudo e nada. Um vento forte agitava
as esparsas folhas das árvores, que tremulavam para baixo em torno de nós neste
final de tarde do outono.
Mais tarde, enquanto o pôr do sol caia sobre a floresta e o céu
descaradamente lindo se exibia em tons de lilás e lavanda, eu estava na janela da
frente do piso superior de Whittington.
Havia um fogo ardente na lareira, aquecendo o ambiente
e criando danças com sombras e luz. Miles Davis cantava suavemente numa
vitrola velha que eu tinha encontrado no porão. "Eu quero saber quem
vamos ser da próxima vez," devaneei. Ryan chegou e ficou logo atrás de mim,
envolvendo os braços em volta da minha cintura e apoiando o queixo no meu
ombro.
"Eu não sei", ele finalmente disse. "Talvez um médico de Ohio." Eu
considerei isso. Sempre alguém que poderia voltar e ajudá-lo. Oh, Ryan, meu
doce e atormentado amor. Não importava quantas vidas nós vivíamos, algumas
coisas permaneceram constantes. Havia sempre tanta verdade no meio do faz de
conta: sempre tendíamos a voltar para as nossas personalidades verdadeiras,
nossas histórias verdadeiras, antes que pudéssemos sair da
escuridão. Sempre, sempre...
Eu sorri, virando-me em seus braços. "Talvez eu vá ser uma enfermeira."
Inclinei a cabeça para cima, pensando. "Uma enfermeira cega! E você vai ter que
me levar ao redor, é claro."
"Como você pode ser uma enfermeira cega?" Ele sorriu contra a minha pele
quando acariciou minha orelha.
Dei de ombros. "Tão facilmente quanto posso ser um fantasma. Nós vamos
descobrir isso à medida que avançamos. Como de costume."
Ryan riu. "Se apenas funcionasse dessa maneira. Se pudéssemos escolher."
"Se pudéssemos escolher, eu pararia de fazer suas namoradas tão
bonitas."
Ele sorriu, beijando meu pescoço rapidamente. "Todas elas acabam
parecendo com você, de qualquer maneira. Eu não posso evitar."
Eu sorri, mas meu coração se apertou com tristeza súbita. Pensei em Nyala
e em como, embora ela não fosse real, eu lamentei completamente a perda dela do
mesmo jeito. E eu sabia que Ryan sentia o mesmo sobre sua versão de Holden
Scott, o jogador de futebol. Era o preço que pagávamos por sermos almas
sensíveis. Possivelmente ate muito sensíveis para este mundo, nosso volume
emocional muito alto, abafando o mundo real muitas vezes. Mas, nos últimos
anos, com menos frequência do que antes.
Talvez nós fingíssemos ser nós mesmos por um tempo.
"Você não se cansou disso, Ryan? De me salvar?" Olhei de relance para ele
e depois para longe, mas ele colocou um dedo debaixo do meu queixo e inclinou
meu rosto, me forçando a olhar em seus olhos.
Ele balançou sua cabeça. "Não, eu fiz uma promessa, e eu quis dizer cada
palavra." Ele sorriu um dolorosamente doce sorriso. "A maioria das pessoas só se
apaixona por sua amada uma vez. Eu me apaixono por você mais e mais, em uma
centena de vidas diferentes. Quão sortudo eu sou?" ele terminou num sussurro
rouco.
Inclinei minha testa contra a dele, segurando as lágrimas.
"Você se cansou de me salvar?" ele perguntou.
"Não", eu disse, balançando a cabeça. "Não. Eu vou aventurar-me
em qualquer escuridão se souber que você está lá."
Algo sobre isso parecia... cura. E eu me questionei sobre a dor
e a loucura novamente, considerando que, se a dor era tanto uma doença quanto
seu próprio remédio, talvez então com a loucura acontecesse o mesmo. Talvez se
você caminhasse em sua direção, ao invés de fugir dela, talvez se você
mergulhasse nela e deixasse-a levar para onde quisesse, então talvez um dia
você saísse do outro lado, inteiro e curado. Ou talvez fosse apenas minha
fantasiosa mente falando.
"Eu sempre vou voltar para você, Lily. Cada vez. Eu
viajarei através do próprio inferno por você. Você confia em mim?"
"Com a minha alma", sussurrei, afastando uma mecha dourada escura de
cabelo de sua testa, meu olhar lavando seu rosto, suas belas e
amadas características. Beijei-o suavemente, pensando na data exibida no painel
digital da TV a cabo na cabana de férias. "Nós não ficamos longe
por muito tempo – menos de três meses," eu disse.
"Isso é bom?"
Dei de ombros. "Hmm. Eu não sei. Não tem que ser bom ou ruim, eu acho. É
apenas a maneira que é, por agora, de qualquer maneira. E, de qualquer forma,
eu vou amar você para sempre, não importa o que. Eu vou amar cada versão de
você. Sua alma nunca vai mudar. Eu a reconheço cada uma e toda vez. Eu posso
vê-la quando fecho meus olhos. Ela me chama na escuridão. Eu a vejo mesmo
quando sou cega." Eu sorri. "É tão brilhante."
"Eu vejo a sua, também, minha linda Lily."
"Eu sei", eu disse, beijando-o novamente. "Eu sabia quando você me
pegou na neve e me carregou para aquela pequena gruta escavada na rocha
e me aqueceu. Como se ela tivesse sido feita apenas para nós por alguém há
muito tempo, que sabia que precisaríamos dela algum dia. Que estaríamos aqui
sozinhos encontrando um ao outro no escuro".
"Você não estava perdida na neve –"
"Não. Na minha mente, eu era filha de uma família visitando Whittington
naquele dia, e você era o filho de um executivo rico de Connecticut.
Você tinha subido no nosso tronco. A caverna era da minha família."
"Você me encontrou. E então eu encontrei você. Foi onde nós nos
apaixonamos."
"Sim", eu murmurei, lembrando aquele dia, recordando com quanto frio eu
tinha estado, quanto medo, quão perdida. Lembrando-me do mundo que eu tinha
criado e de como ele me encontrou lá na primeira vez. "O médico que trabalhava
em Whittington diria que ainda somos loucos."
Ele me ofereceu o vislumbre de um sorriso. "Sim, acho que eles nos veriam
dessa maneira."
"Mas, agora Whittington é a nossa casa, e pertence somente a nós."
"Hmm", ele cantarolava.
"De qualquer forma, acho que talvez eles sejam os únicos loucos. Porque
eles não podem criar essa floresta lá fora em San Francisco, ou Boston, ou...
Hawaii," eu disse, sorrindo para o último, pensando no calor da ilha no meio do
inverno.
Ryan riu. "Onde quer que iremos, é onde vamos voar. Nós vamos voar para
longe."
Eu coloquei minha mão em seu rosto. Ele era o meu destino, e eu era o dele.
"E então nós vamos voltar. Um para o outro. Sempre. De novo e de novo e de
novo."
O poema referido nesta história (na sua integralidade) é:

She Walks in Beauty


By Lord Byron (George Gordon Byron)

She walks in beauty, like the night


Of cloudless climes and starry skies;
And all that’s best of dark and bright
Meet in her aspect and her eyes;
Thus mellowed to that tender light
Which heaven to gaudy day denies.

One shade the more, one ray the less,


Had half impaired the nameless grace
Which waves in every raven tress,
Or softly lightens o’er her face;
Where thoughts serenely sweet express,
How pure, how dear their dwelling-place.

And on that cheek, and o’er that brow,


So soft, so calm, yet eloquent,
The smiles that win, the tints that glow,
But tell of days in goodness spent,
A mind at peace with all below,
A heart whose love is innocent.

Ela caminha em formosura


Por Lord Byron (George Gordon Byron)

Ela caminha em formosura, como uma noite


Em que o céu está sem nuvens e com estrelas palpitantes,
E o que há de bom em treva ou resplendor
Se encontra em seu olhar e em seu semblante;
Ela amadureceu à luz tão branda
Que o Céu denega ao dia em seu fulgor.

Uma sombra de mais, em raio que faltasse,


Teriam diminuído a graça indefinível
Que em suas tranças cor de corvo ondeia
Ou meigamente lhe ilumina a face;
E nesse rosto mostra, qualquer doce idéia,
Como é puro seu lar, como é aprazível.

Nessas feições tão cheias de serenidade,


Nesses traços tão calmos e eloquentes,
O sorriso que vence e a tez que se enrubesce
Dizem apenas de um passado de bondade,
De uma alma cuja paz com todos transparece,
De um coração de amores inocentes.
Agradecimentos
E agora para a parte que eu mais amo... dando graças a aqueles que me
ajudaram a contar esta história.
Enorme mensagem de saída para a minha editora de enredo, Angela Smith,
por me ajudar a preencher os buracos nesta história complicada, pela leitura de
uma vez por um aspecto, e, em seguida, novamente para o segundo, e em
seguida, uma terceira só porque você me ama. E, em seguida, para distorcer o seu
cérebro assim que você vai estar disponível para me ajudar no próximo. Eu te
amo muito. (Insira muitos emoticons face louca). E eu sinto falta de você sentada
no meu balcão com um copo de vinho na mão mais do que palavras podem
expressar.
Eterna gratidão a minha editora de desenvolvimento e linha, Marion Archer.
Você me alongou de forma que eu estou muito grata, durante todo o tempo me
fazendo rir e desmaiando com os comentários que você enviava de volta no meu
manuscrito. Algum dia eu vou ler através das nossas três páginas de e-mails e
para trás discutindo os pontos da trama desta história, e eu vou saber como não
estamos ambos comprometidos. (Ou somos? Espere onde estou?) Eu acho que os
e-mails em si mesmos poderiam ser utilizados para um estudo de caso...;)
Obrigada por continuar a ensinar e inspirar cada novo livro.
Para meus maravilhosos leitores beta que leram Lily em primeiro lugar e
voltaram com comentários variando de "WTF", em dez horas, para "Você tem sorte
que eu não vivo no seu bairro ou eu estaria em sua porta agora para discutir
isso", às cinco horas da manhã e, em seguida, eles passaram a fornecer tal
incrivelmente comentários e sugestões perspicazes; Heather Anderson, Cat
Bracht, Elena Eckmeyer (que leu Lily três vezes para fornecer
aconselhamento inestimável de psicologia e pode agora precisa de um curto
"descanso" no Whittington ;)), Michelle Finkle, Natasha Gentile, e meu autor beta
Gretchen De La O que leva a palavra torcedora a um nível totalmente novo.
Obrigada por sua amizade, seu tempo, e seu apoio.
Meu editor olhos final, Karen Lawson, que me dá tão imensa confiança na
qualidade de meu produto final, obrigada. Você tem cuidado tão bem de mim,
mesmo quando você está de jet-lag e ainda cheira a óleo de coco!
Obrigado a Amy Kehl e Sharon Broom por darem uma última leitura
através de Lily e me salvar de ter que fazê-lo, e no final, salvar a minha sanidade.
Amor enorme para A. L. Jackson e Katy Regnery que forneceram horas e
horas de risos, apoio, conselho, loucura, e amizade, para não
mencionar que foram realmente parceiros de promoção
impressionantes. Este negócio pode ser solitário - ter "colegas de trabalho" como
vocês duas faz todo o meu mundo um lugar mais brilhante. Eu tenho tão imensa
admiração por você, tanto como autores e como pessoas.
# SideEyesForever # TheGreatKind
Tina Kleuker, sua amável, generosa alma obrigado por todo o trabalho duro
que você colocou nesta versão, meu site, e um milhão de outras coisas que você
pode fazer por mim, tanto pessoal quanto profissionalmente. Não é uma
das que passa despercebida ou negligenciada.
Obrigado a minha agente mal-humorada Kimberly Brower, cujo cuidado e
bondade, e paixão por todas coisas do mundo do livro fez dela não só uma amiga,
mas minha orientadora mais confiável.
Para você, leitor, obrigado por convidar meus personagens a seus clubes do
livro, suas casas, seus corações. Eu sei que há uma fonte inesgotável de novos
livros para ler. Sou eternamente grata que você escolheu o meu para passar seu
tempo precioso.
Obrigado a Mia’s Mafia por fornecer-me um lugar feliz on-line onde eu posso
ir me esconder uma vez ou outra. Vocês todos são tão positivos, tão favoráveis,
e tem tanta diversão. Eu valorizo cada um de vocês!
Para todos os blogueiros de livros para quem a leitura não é apenas uma
paixão, mas um trabalho. Obrigado por fazer o que você faz. Cada análise e
recomendação são apreciadas além da medida.
Para o meu marido: Você acreditou nesta história desde o início, mesmo
quando ela tomou algumas voltas que nenhum de nós esperava. Sem você, eu
não teria tido a coragem de dizer isso. Muito obrigada pela atenção a toda minha
tagarelice incessante, como se cada palavra disso importasse para você. Uma
noite, enquanto eu estava sentada na nossa cama chorando sobre todas as razões
que eu estava com medo de colocar um presente para o mundo, você olhou para
mim e disse simplesmente: "Querida, dê uma chance." Você disse as mesmas
palavras para mim há quase quatro anos, e eu não tenho me arrependido.
Portanto, não importa o quê, este é para você. Você me faz forte, não só com sua
crença em mim, mas porque eu sei que, no entanto, se eu falhar, você vai estar lá
com os braços abertos. Para alguém com o coração de um artista, não há maior
presente, e não há mais suave lugar para pousar. Obrigada por muito,
muito, muito, mas especialmente, obrigada por isso.
Sobre a autora
Mia Sheridan é uma autora best-seller em New York Times, USA Today e
Wall Street Journal. Sua paixão está tecendo verdadeiras histórias de amor sobre
pessoas destinadas a ficarem juntas. Mia vive em Cincinnati, Ohio com o marido.
Eles têm quatro filhos aqui na terra e um no céu. Além de Midnight Lily, Leo,
Leo's Chance, Stinger, Archer's Voice, Becoming Calder, Finding Eden, Kyland e
Grayson's Vow também fazem parte da coleção Sign of Love (Signos do Amor).

Mia pode ser encontrada on-line em:


www.MiaSheridan.com
www.facebook.com/miasheridanauthor
Paerguntas

Clube do Livro
1. Quais foram os seus sentimentos sobre Holden Scott quando você o
conheceu? Ele parecia cair na categoria de um atleta estereotipado, ou houve
coisas que te surpreenderam sobre seu caráter, tanto
físico quanto mentalmente? Você considerou estas coisas como pistas para outra
coisa acontecendo?
2. Quais foram seus pensamentos iniciais sobre Lily? Quem (ou o quê) você
achou que ela era? Essas ideias mudaram à medida que a história progrediu?
3. A floresta une Holden e Lily, e eles passam uma boa parte do tempo lá no
início do livro. Por que é que este remoto parâmetro é importante? De que forma a
floresta tem caráter próprio?
4. Midnight Lily é construído em torno de vários mistérios. Você achou
partes da história mais misteriosas do que outras? Você formulou
hipóteses enquanto lia? Será que alguma delas acabou sendo precisa?
5. Qual é o significado da "caverna" de pedra que Lily mostra a Holden na
floresta? Nessa cena, Holden diz a Lily que, quando se trata de outras vidas, você
deve "sonhar grande ou ir casa." E Lily expressa mais de um interesse em viver
uma vida simples. Quando a verdadeira natureza da situação que acabou de
experimentar revela-se, no final, faz essa troca tornar-se mais significativa?
6. Quais foram os seus sentimentos sobre Whittington? Esses sentimentos
mudaram no final do livro?
7. Quais foram suas primeiras reflexões sobre as duas pessoas que Lily
descreve que escaparam de Whittington? Pensou que havia uma conexão entre
eles e Lily e Holden?
8. Quais são os grandes temas de Midnight Lily? Você
poderia falar a respeito de qualquer um deles?
9. Depois de aprender a verdade sobre o herói e a heroína na situação,
quais são seus sentimentos sobre os personagens de apoio? Especificamente
Nyala e a Dra. Katz. Quem eram estas mulheres para o herói e a heroína? Quais
os papéis que elas desempenharam?
10. Você considera a conclusão da história um final feliz? Por que sim ou
por que não?
11. Quais perguntas permaneceram após o epílogo? Que pistas você pode
identificar que responderam a algumas dessas perguntas (quer na história, ou na
conclusão)?
12. O que você imagina acontecer após o fim da Midnight Lily? Onde você vê
estes personagens em cinco anos? Dez?
Notas
[←1 ]
É uma posição do futebol americano. Jogadores de tal posição são membros da equipe ofensiva do time (do
qual são líderes) e alinham-se logo atrás da linha central, no meio da linha ofensiva. Sua função é dar o
inicio as jogadas e fazer passes para os receptores e também, porém nem tantas vezes, para
os finalizadores. É ele que dá a bola para o corredor iniciar uma jogada de corrida.
[←2 ]
NFL - National Football League (Liga Nacional de Futebol Americano).
[←3 ]
Sunset Boulevard é uma avenida na parte central e ocidental de Los Angeles, Califórnia
[←4 ]
DUI - Driving under the influence (Dirigir sob a influência) ou DWI - Driving while intoxicated (Dirigir
embriagado) é o crime de condução de um veículo automóvel sob efeito de álcool ou
outras drogas (incluindo aquelas prescritas por médicos), a um nível que torna o condutor incapaz de
operar um veículo a motor com segurança. Na maioria dos países, quem é condenado por ferir ou matar
alguém enquanto sob a influência de álcool ou outras drogas podem ser multados, além de ser dada uma
sentença de prisão.
[←5 ]

Marca de uísque.
[←6 ]
Game of Thrones (Guerra dos Tronos) é uma série de televisão norte-americana criada por David Benioff
e D. B. Weiss para a HBO. A série é baseada na série de livros As Crônicas de Gelo e Fogo (A Song of Ice
and Fire), escritos por George R. R. Martin.
[←7 ]
[←8 ]

Árvore resinosa da família das pináceas.


[←9 ]
Karate Kid - A Hora da Verdade - é um filme de artes marciais e drama romântico norte-americano de
1984 do diretor John G. Avildsen e escrito por Robert Mark Kamen, estrelado por Ralph Macchio e Noriyuki
"Pat" Morita e Elisabeth Shue.
[←10 ]
Restaurante especializado em Coneys.
[←11 ]

Coney é um cachorro-quente num bolo coberto com um molho de carne salgados e,


por vezes, outras coberturas.
[←12 ]
O Dallas Cowboys é um time de futebol americano da cidade de Dallas, Texas que disputa a NFL na
divisão Leste da NFC, junto de New York Giants, Philadelphia Eagles e Washington Redskins. Foi fundado
em 1960.
[←13 ]
O San Francisco 49ers é um time profissional de futebol americano que reside em São Francisco,
Califórnia, jogando na NFC West, divisão da National Football League (NFL). O nome "49ers" vem do nome
dado aos garimpeiros que chegaram no norte da Califórnia por volta de 1849, durante a febre do ouro na
Califórnia. Este é o único nome que a equipe já teve e São Francisco é a única cidade em que residiu. A
equipe está legalmente registrada corporativamente como San Francisco Forty Niners, Ltd. e é o mais
antigo time profissional da Califórnia.
[←14 ]
Ação de explorar, estimular ou favorecer o comércio carnal ilícito, ou induzir ou constranger alguém à sua
prática.
[←15 ]

Ave de origem americana.


[←16 ]
A combinação de oxicodona/paracetamol (nome comercial norte-americano Percocet, genérico Endocet, e
Ratio-Oxycocet no Canadá - é também chamado de "paracetamol" nos Estados Unidos, e bem conhecido
pelo nome de marca registrada, "Tylenol"). É um narcótico analgésico utilizado no tratamento de dor
moderada a grave e aguda (curto prazo).
[←17 ]
Um termo usado para descrever qualquer meio-de-nada, área de sertão, especialmente uma que é de
uma longa distância. Derivado do bumfuck, também usado para descrever um local similar. A adição de
"egypt" se originou no Centro-Oeste, descrevendo a região "Little Egypt" de Illinois, uma área
extremamente rural em comparação com o urbano Illinois Norte.
[←18 ]
Pinheiro
[←19 ]
[←20 ]

S'more é uma contração da frase "um pouco mais". A s'mais é um marshmallow


assado sobre o fogo e colocado entre dois biscoitos de maizena com uma camada de
chocolate.
[←21 ]
Quinceañera é uma celebração do décimo quinto aniversário de uma menina em partes da América
Latina e em outros lugares em comunidades de pessoas da América Latina. Este aniversário é
comemorado de forma diferente de qualquer outro, pois marca a transição da infância para a jovem
feminilidade.
[←22 ]
Running back (RB) é uma posição do futebol americano e canadense que normalmente se alinha no
backfield. O principal papel de um running back é correr com a bola que pode ser passada para ele pelo
quarterback ou em um snap direto do centro, sendo que ele também pode receber e também ajudar no
bloqueio.
[←23 ]
Cerveja Budweiser.
[←24 ]
Bloomingdale's é uma loja de departamentos de alto padrão pertencente ao grupo "Federated Department
Stores", que também controla a rede de lojas "Macy's". Bloomingdale's possui 36 lojas ao redor dos EUA,
com vendas anuais de U$ 1.900 milhões´. A loja mais importante da rede é a unidade localizada em
Manhattan (Nova Iorque), na esquina da "59th Street" com a "Third Avenue". Bloomingdale's é conhecida
especialmente por sua sacola, que ganhou o nome de "A sacola marrom", e normalmente vem com esse
nome estampado na mesma.
[←25 ]

Quasimodo é o personagem central do livro O Corcunda de Notre-Dame, de Victor Hugo, publicado em


1831. Um corcunda de nascença, Quasimodo habita o campanário da Catedral de Norte-
Dame, responsável por tocar o sino, afastado da sociedade e temido pelos habitantes locais. Quando a
autora se refere a alguém que gasta os dias preso a uma torre de sino no paragrafo anterior, ela esta
mencionando Quasimodo.
[←26 ]

Willy Wonka é um dos personagens principais do filme (1971 e 2005) e do livro do escritor galês Roald
Dahl, ambos chamados no Brasil de A Fantástica Fábrica de Chocolate. Interpretados em 1971 por Gene
Wilde e em 2005 por Johnny Deep. Ele é o dono da Fábrica de chocolates Wonka, e distribuiu tíquetes
dourados, para que crianças entrassem na fábrica para dentre elas ser escolhido um novo dono. Willy
Wonka é uma pessoa estranha, excêntrica. O passado lhe condena.

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