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-- É intrigante...

-- Intrigante Senhora?

-- A superficie... Os humanos... Tudo, parece ser tão, intrigante.

-- Por que acha isso?

-- Eu não sei. Eles parecem, tão leves, tão felizes, mesmo aqueles que um
dia pisarão por essas terras. Todos parecem, em paz.

-- Alguns ocultam seus anseios com sorrisos

-- É isso que mais me chama atenção. Aqueles que em meio ao caos,


sorriem e dizem que tudo está bem...

-- Senhora?

-- Diga-me Maercicai. Sempre quis ser meu braço direito?

-- Dos Arquidiabos, a senhora é a que mais tenho apreço. É uma honra


servi-lá.

Um sorriso sincero é ofertado ao diabo, e logo volto a encarar a paisagem


dos vitrais videntes.

-- O que acha de estender seus serviços um pouco?

-- O que quer dizer com isso majestade?

-- Você cuidará das coisas aqui, enquanto eu estarei fora

-- Fora? E onde vai Senhora?

-- Não é obvio? Irei ao Reino Humano.


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2 anos depois - Condado de Elvenwood

-- Foram essas as últimas palavras que dei a Marcicai antes de partir para a
superficie. Antes de decidir ocultar minha aparência antiga com este objeto,
antes de conhece-lo.
A mulher de cabelos negros amarrados elegantemente, com uma pele de
um bronze profundo e vestes refinadas, mas com corte de uma cortesã,
fala em direção ao homem sentado a sua frente. Este de pele escura,
profunda e misteriosa, olhos azuis que denotam surpresa ao encarar a
mulher que ama, dizer tais palavras.

-- Thalia, isso é... Perdoe-me, eu não sei o que dizer.

-- Eu devia te-lo contado mais cedo, eu sei Marcel. Mas, eu tive medo.

-- Medo? De que, de que eu fosse machuca-la?

-- Não! Medo de perde-lo, medo de nos separarmos.

-- Querida, passamos 2 anos maravilhosos juntos desde aquele dia em que


lhe encontrei perdida na floresta. Desde que Rodrick e eu trouxemos você
para cá. Eu nunca, iria afasta-la de mim. Pertencente ao inferno, ou não,
eu ainda quero te-la como esposa.

Ambos, sorriem um para o outro, e selam aquele dialogo com um beijo


longo. Naquela noite Primaveril, um nobre humano e uma Demoníaca de
alta casta, cruzariam mais do que seus sangues.
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9 meses mais tarde

Um choro alto e esganiçado ecoa pelos corredores da casa, em um quarto


iluminado por castiçais e prata. Uma mulher grita em prantos, enquanto
seu corpo é dilacerado pelo fruto que gestara. Entre as mãos de uma
parteira, uma pequena vida dá seu primeiro suspiro, mas ela, era diferente.

De uma pele vermelha chamativa, olhos amarelados com pupilas em fenda,


cabelos negros como a noite, calda pontiaguda e presas afiadas, um
pequeno meio demônio, meio humano nascia.

A mãe, cansada após o parto dificultoso, junto ao pai que explodia em


ansiedade, receberam sua criança nos braços, enquanto as parteiras,
olhavam enojada para o feto, saindo rapidamente do local. Marcel,
acariciou a cabeça de sua esposa, e com um sorriso gentil, olhou para sua
filha

-- E então, qual será o nome de nossa garotinha?

-- Dahlia. Dahlia Bryarcliff

-- Usará um nome humano?

-- Sim. Ela nasceu do melhor dos humanos, é justo que carregue isso.

Felizes, ambos os pais comemoravam a chegada de sua nova prole. Mal


sabidos, do futuro que aquela criança teria...
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27 anos depois

Um quarto é iluminado por velas fracas e quase findáveis, enquanto uma


silhueta feminina, caminha pelo quarto, após adentrar as portas do mesmo.
Uma jovem, de pele escura, olhos azuis, cabelos negros como a noite,
carregando um conjunto de papiros, anda até uma mesa de madeira nobre,
puxando o assento e o tomando. Depositando aquele material em cima do
Jacarandá, ela abre uma folha, molha a ponta da pena no tinteiro escuro, e
começa a escrever.

”Foram dias até finalmente chegar nessa cidade. A viagem foi mais longa
do que eu esperava, por sorte conheci um companheiro gentil, que me
ajudou a chegar até aqui. Lembre-me de agradecer ao Duque Gerold, se
não fosse por seu sinete, eu teria tido mais dificuldades de fazer esses
nobres me ouvirem. A carta que vossa senhoria pediu, foi entregue com
sucesso. Mas não é sobre minha missão, que vim falar nessa carta.

Antes de sair, você me questionou, que verdades eu mantive oculta de


você, durante todo esse tempo. Sabe Lucian, há poucas pessoas nesse
mundo, que eu confiaria em contar isso, a maioria jaze morta há bastante
tempo. Mas você, se provou confiante o suficiente para isso. Então, sinto
que é justo, responder sua pergunta, mas quando terminar essa carta peço
que queime-a, para que nada disso, saia de entre nós.

Bom, vamos lá.

Eu pouco me lembro de minha infância, mas sempre fui a mulher que


conhece hoje. Eu lembro da primeira vez que me vi no espelho, eu fiquei
chocada com o que vi. Meu tio sempre me dissera que eu era diferente,
especial, mas sinceramente, naquele dia, eu me vi pelos olhos odiosos da
minha Tia. Sabe, é ruim nascer diferente do normal, principalmente,
quando se está entre nobres.

Foi pouco depois, que minha mãe me deixou para trás, eu tinha 2 anos, e
meu pai havia morrido. Meu tio me contou, que eu chorava todas as noites,
chamando eles, e que havia dias, em que eu podia jurar, que escutava
minha mãe. Bobagem, era o que eles pensavam.

Mas nessa época, a jovem Dahlia, não havia tanta dor como tem hoje,
naquela época, eu ainda podia sorrir e ter esperança. Mas também, foi
naquela época, em que conheci o pior dos infernos.

Não me entenda mal, eu amo minha família, mas passei coisas horríveis na
mão de minha tia. Espero que entenda, que o que aconteceu nas próximas
linhas ao qual contarei, não foi por meu querer.

Eu havia pouco mais de 12 anos. Já fazia alguns meses que tinha feito
aniversario, e que tinha sangrado. 10 anos da minha vida, eu vivi numa
completa dualidade. Aonde meu tio me tratava como sua filha única, e me
amava como um pai, mas minha tia, apenas me olhava como uma
aberração, me negava o mínimo, e ainda castigava-me, com fogo e ferro.
Depois de meu aniversario, meu tio teve que viajar, uma missão do
Condado, e como conde ele teve que atender. Então fiquei sozinha com
ela, um banquete perfeito para a hidra faminta que me espreitava. Eu me
lembro exatamente daquela noite, a noite em que minha tia, entrou em
meu quarto durante a madrugada, agarrou-me pelos pulsos, e me arrastou
ate homens encapuçados.

-- Leve-a. Bana o Demónio em minha casa, devolva-a ao inferno.

Foram essas as últimas palavras que ouvi de sua boca, antes de adormecer,
graças a um baque em minhas têmporas.Quando eu acordei, eu estava nua,
amarrada em um altar, com pelo menos 5 homens ao meu redor,
entoando um cântico, que fazia meu peito arder. Queria ter entendido
naquela época, que não era dor, era raiva.

Quando o mais alto dos homens, alcançou a última sonata, eu perdi meus
sentidos. Meus olhos se encheram de uma luz vermelha escaldante, como
um fogo, que vazava furiosamente deles. E então, eu acordei. As cordas
queimadas, em frangalhos, mas soltas em meus pulsos e pernas. Os
homens, caídos no chão, com nada mais do que os ossos negros e se
unindo as cinzas de sua carbonização, e então, em um dos vitrais mais
baixos, eu me vi, pela primeira vez, depois de tanto tempo, eu estava sem o
bracelete que minha mãe me dera, antes de sua partida. Era eu novamente.

Mas sabe Lucian, eu percebi naquele momento. Não importa o quão boa
eu fosse, o quão poderosa eu poderia me tornar, ou o quão caridosa eu era,
haveria pessoas, que só por eu ser diferente, tentariam me machucar. E
então, eu o vesti de novo, eu era essa mulher mais uma vez. Mas eu era
covarde, e fugi, ao invés de voltar para casa.

Eu passei 6 longos ciclos, na floresta ao Redor de Elvenwood, vivendo de


nada mais do que caça, coleta e sobrevivência. Se eu finalmente tinha
encontrado paz? Não. As vezes, eu tinha pesadelos constantes, com uma
voz me chamando, e depois as chamas, e quando acordava, tudo ao meu
redor, planta e animal, estava morto. Até mesmo longe do caos, eu só
machucava as coisas ao meu redor.

Foi nesse dia, que jurei aprender a me controlar, que nunca mais iria me
deixar dominar pelos sentimentos, que eu não iria matar mais ninguém.

Como eu era tola...

Enfim. Depois desses longos anos, eu ja estava matura, e em idade máxima.


As coisas já havia mudado, e então eu decidi voltar para casa, após ouvir a
conversa de dois garotos, que choravam lamentando por sua mãe Ophelia
Moonfield, minha Tia. Quando retornei, para minha felicidade, eu
encontrei apenas meu Tio Rodrick, e seus dois filhos. Harold e Finnegan.
Minha tia, havia adquirido uma doença rara, e morrido há alguns meses.
Eu senti a tristeza deles, mas sinceramente, comemorei por dentro. De
volta, e agora melhor aceita, sem aquele passado me atormentando, eu
passei os últimos 4 anos de meu tio cuidando dele, enquanto seus filhos
cresciam e viravam homens. Eu estava lá em seu leito, assim como ele
esteve em meu nascimento. Eu pensei em ir embora depois que seu corpo
havia sido velado, mas as últimas palavras deixadas por ele e por meu pai,
me impediram.

Eles deixaram, tudo o que tinham em meu nome. Tudo o que foi
conquistado, todo o legado, caiu sobre mim. E reles coisas, quase sem
valor sequer sentimental, sobraram para meus primos.

Lembra que eu disse a algumas linhas atrás, que fiz coisas, que não eram
minha culpa? Que tais, foram acasos acidentais? Essa, é uma dessas
situações.

Meus primos, tomados pelo ódio e pela cobiça, discutiram sobre a


herança, a um nível que beirou a agressão contra mim. Eu queria te-los
avisado, eu queria ter impedido. Mas quando dei por mim, ambos ja
estavam no chão, com sangue saindo de seus olhos. Mortos... por minha
causa.

Eu então, me fechei. Ninguém mais ouviu falar de mim, eu era uma


enlutada órfão, que simplesmente fechou sua casa, e que ajudava seu
condado, como um fantasma. Foi assim, presa em minha prisão particular.

Até aquele dia. 5 anos depois, o dia em que um Emissário do Duque


bateu em minha porta, o dia em que Lucian Castellian, convidara a
Condessa Bryarcliff, a se unir no conselho, como uma vassala enviada.
Aquele dia, o dia em que nós conhecemos, o dia em que vi em você, o
mesmo que eu havia visto em mim há muito tempo, foi o dia em que
decidi mudar.

Foram anos, de preparo. Anos, retornando a ser uma nobre. Meses,


reunindo contatos, me aliando a guildas, servindo sorrisos falsos em
banquetes da alta casta. Meses, atrás de uma esperança, da esperança que
me dera, quando eu lhe vi.

Eu enviarei, e anexo a essa carta, o relatório de minha missão. Mas não


voltarei tão cedo Lucian. Essa cidade, ela tem respostas, e hoje, eu sonhei
com aquela mesma voz feminina que me chamava. Obrigada, por me
trazer de volta a mim, mas infelizmente, terá que esperar mais um pouco
para me rever.

Se tudo der certo, eu irei encontrar um caminho, um caminho para ser eu


mesma, um caminho para fugir de meus fantasmas e de minha dor, um
caminho, para essa voz... um caminho, para longe de todo o caos e
destruição que cometi.

É como você disso. Todos temos Luz e sombras dentro de nós, e agora
Luci, eu preciso encontrar minha luz.

Obrigada, por tudo.


- Com carinho, Dáhlia Bryarcliff ”

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