1132-Texto Do Artigo-4097-1-10-20190307

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Resumo: Este artigo é resultado de uma pesquisa

que teve como objetivo narrar as memórias de três


benzedeiras velhas do Município de Palmas-TO e
Porto Nacional/TO, para compreender os preceitos e
rituais dessas práticas de cura e cuidados com a saúde
realizados por elas. Esta pesquisa justifica-se tendo
em vista que apesar de existirem pesquisas no Brasil
MEMÓRIAS E SABERES DAS sobre o assunto, contudo, no estado do Tocantins há
BENZEDEIRAS VELHAS DE PALMAS muito para ser feito quando se trata de conhecimentos
tradicionais. Para a fundamentação, utilizou-se das
E PORTO NACIONAL/TO contribuições de obras de autores renomados sobre o
assunto. Como metodologia optou-se pela abordagem
qualitativa, de desenho não experimental, transversal
descritivo, cujo método utilizado foi o da história oral.
O material foi coletado por meio de entrevistas semi-
dirigida com as benzedeiras no município de Palmas/
MEMORIES AND KNOWLEDGE OF OLD TO e Porto Nacional/TO. As entrevistas foram gravadas
e transcritas. Tomando como base o marco teórico e
BENZEDEIRAS OF PALMAS AND PORTO o resultado da pesquisa foi possível concluir que os
NACIONAL/TO preceitos e rituais dessas práticas de cura e cuidados
com a saúde realizados pelas benzedeiras de Palmas/
TO e Porto Nacional/TO, se constituem em referências
de conhecimentos e ensinamentos que necessitam
de estratégias voltadas à preservação desses
Soely Kunz Cericatto 1 conhecimentos tradicionais, respeitando a história, a
cultura, os valores, os desejos e os sentimentos desses
Jocyléia Santana dos Santos 2 mestres do saber, pois a cultura é um patrimônio e
Neila Barbosa Osório 3 deve ser preservada.
Luiz Sinésio Silva Neto 4 Palavras – Chave: Benzedeiras, Conhecimentos,
preceitos e rituais.

Abstract: This article is the result of a research that


had as objective to narrate the memories of three old
benzedeiras of the Municipality of Palmas-TO and
Porto Nacional / TO, to understand the precepts and
rituals of these practices of healing and health care
done by them. This research is justified considering
that although there is research in Brazil on the subject,
however, in the state of Tocantins there is much to
be done when it comes to traditional knowledge. For
the reasoning, we used the contributions of works by
renowned authors on the subject. As a methodology,
we chose a qualitative, non-experimental, cross-
sectional descriptive design, whose method was
oral history. The material was collected through
semi-directed interviews with the benzedeiras in the
municipality of Palmas / TO and Porto Nacional / TO.
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Tocantins-UFT. 1 The interviews were recorded and transcribed. Based
E-mail: soelykunz@hotmail.com on the theoretical framework and the result of the
research, it was possible to conclude that the precepts
and rituals of these healing and health care practices
performed by the Palmas / TO and Porto Nacional /
Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco 2 TO Teachers constitute references of knowledge and
(2006). Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da
teaching that they need strategies aimed at preserving
UFT/CAPES. E-mail: jocyleiasantana@gmail.com
this traditional knowledge, respecting the history,
culture, values, desires and feelings of these masters
Doutora em Ciência do Movimento Humano pela UFSM/RS. 3 of knowledge, since culture is a heritage and must be
Coordenadora do Programa Universidade da Maturidade – UMA/UFT. E-mail: preserved.
neilaosorio@mail.uft.edu.br Keywords: Mentoring, Knowledge, precepts and rituals.

Doutor em Ciências e Tecnologia em Saúde-UNB-DF, da Comissão de 4


TCC. Vice-coordenador e docente do programa Universidade da Maturidade-
UMA/UFT. E-mail: luizneto@mail.uft.edu.br
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Introdução
Este estudo traz algumas reflexões acerca das práticas e das contribuições da benzeção na
perspectiva das benzedeiras do distrito de Taquaruçu, localizada a 30 Km do município de Palmas,
e de Porto Nacional/TO.
Para apoiar estas mulheres detentoras de conhecimentos tradicionais pretende-se com esta
pesquisa reunir informações que permitam a valorização e a preservação desses conhecimentos,
por isso definiu-se como problema da pesquisa a seguinte questão: Existe a possibilidade de
reconhecer os conhecimentos das benzedeiras como ofício tradicional de saúde popular, garantindo-
lhes o direito de exercerem seus saberes como agentes de saúde?
Parte-se da hipótese de que ao serem registradas, comentadas e fundamentadas, os
resultados dessa pesquisa possam se constituir em referências e contribuir para a possibilidade
de reconhecer os conhecimentos das benzedeiras como ofício tradicional de saúde popular, para
que no futuro essas benzedeiras possam ter o direito de exercerem seus saberes como agentes de
saúde.
Esta pesquisa é de relevância social, pois os conhecimentos tradicionais das benzedeiras
passados de geração para geração, exigem dos governantes investimentos e valorização desses
saberes. Nesse sentido, é necessário ampliar as pesquisas e os conhecimentos sobre esse tema,
pois as iniciativas para a preservação desses saberes no âmbito das Universidades, ainda são
reduzidas, ou seja, muito tem que ser feito em prol desses mestres do saber. Nesse sentido, cabe
aos profissionais da educação pesquisar para que os resultados das pesquisas possam contribuir
para planejar estratégias voltadas à preservação desses conhecimentos tradicionais, respeitando
a história, a cultura, os valores, os desejos e os sentimentos desses mestres do saber. Assumir
um papel precursor neste processo é um dever, tanto dos governantes quanto dos profissionais
da educação, como da sociedade como um todo, pois a cultura é um patrimônio e deve ser
preservada, mas para isso é necessário investimento, pesquisa, valorização, conscientização no
sentido de buscar novas Políticas de atenção aos mestres dos saberes, cujo os ensinamentos são
passadas de geração em geração.
Esta pesquisa justifica-se, tendo em vista que apesar de existirem pesquisas no Brasil sobre o
assunto, contudo, no estado do Tocantins há muito para ser feito quando se trata de conhecimentos
tradicionais, pois a quantidade de benzedeiras a serem identificadas no Tocantins, evidencia a
necessidade de novas pesquisas com o intuito de aprofundar o conhecimento sobre o tema, e
buscar informações que permitam, verificar a possibilidade de reconhecer os conhecimentos das
benzedeiras como ofício tradicional de saúde popular, para que no futuro essas benzedeiras possam
ter garantido por meio de Lei o direito de exercerem seus saberes como agentes de saúde, uma vez
que em alguns municípios de alguns estados do Brasil isso já é realidade, como é o caso do município
de Rebouças (em 2009), e São João do Triunfo (em 2011) ambas do estado do Paraná, onde a ação
das benzedeiras, rezadeiras, curandeiras e costureiras de rendiduras foi reconhecida e legalizada
por Lei. No caso do Município de Rebouças foi regularizada pela Lei Municipal n°1401/2010, já no
caso do Município de São João do Triunfo foi regularizada pela Lei Municipal n°1370/2011.
As motivações que me levaram a optar por essa temática têm ligação com minha história
de vida, e também por que as pesquisas nessa área, são muito importante pois visa a preservação
dessa cultura pois as benzedeiras são pessoas de grande valor, responsáveis por manter viva essa
tradição, sendo necessário além de investimentos por parte dos governantes a criação de Políticas
de atenção a estes mestres do saber.
Nesse sentido, evidencia-se a necessidade de resgatar diferentes histórias e momentos das
benzedeiras por meio da história oral. Registros estes que serão valiosos de pessoas que conhecem
as peculiaridades do mundo místico, com o relato das benzedeiras, e as narrativas sobre diferentes
ofícios, pretende-se registrar um pouco de suas histórias, suas vivências seus preceitos suas ações
e rituais de cura e cuidados com a saúde e o modo de viver de cada uma.
Sob esse prisma, verifica-se que a preservação da memória é fundamental para fortalecer
a sensação de pertencimento de uma cultura e identidade de um povo com conhecimentos tão
preciosos. É também, essencial para que possamos divulgar essa cultura, e encontrar caminhos
alternativas que garantam mais justiça social, igualdade de direitos, democracia e liberdade. O
resgate das memórias e história, exigem muita dedicação, pois a história oral permite fazer uma
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história do tempo presente.


Nesse contexto, verifica-se que os ofícios das benzedeiras estão pautados em saberes
passados de geração para geração. Esses saberes estão pautados nas memórias vividas e devem
ser conservados.
Frente a esta realidade a presente pesquisa objetivou narrar as memórias de três benzedeiras
velhas do Município de Palmas-TO e Porto Nacional-TO, para compreender os preceitos e rituais
de cura e cuidados com a saúde realizados por elas, esta pesquisa buscou conhecer as histórias e
trajetórias das benzedeiras a partir das memórias relatadas.
Para o desenvolvimento da pesquisa, optou-se pela metodologia de abordagem
qualitativa, cujo o método utilizado foi o método da história oral por meio do qual evidencia-se
a memória das benzedeiras no contexto das práticas da cultura popular. A opção por este método
foi justamente porque essa cultura é repassada de geração em geração por meio da oralidade.
Para fundamentação, utilizou-se das contribuições de: BORELLI (1992); BOSI (1995); HALBWACHS
(1990); PORTELLI ( 2000) OLIVEIRA (1985); SANTOS (2007). Esta pesquisa, também, foi baseada em
consultas e análise de materiais impressos como: dissertações, projetos, revistas; artigos; Boletins
Informativos; sites especializados da web/internet. Já para a metodologia utilizou-se das obras de
ALBERTI (2004) e THOMPSON (1992) que discutem, com propriedade, estes procedimentos e que
serviram de base para a metodologia desenvolvida, proporcionando um melhor entendimento
desse método. Para a concretização dessa pesquisa foi realizado encontros com as benzedeiras.
Encontros de comunicação oral de interesse da pesquisa. No primeiro encontro, foi apresentado o
projeto como um todo esclarecendo o objetivo, a metodologia e o roteiro da entrevista. Esclareceu-
se também, que os resultados da pesquisa poderão servir de base para outras pesquisas que
possibilitarão reconhecer os conhecimentos das benzedeiras como ofício tradicional de saúde
popular, reconhecendo a importância da saúde pública, garantindo-lhes o direito de exercerem
seus saberes como agentes de saúde.
Os dados da pesquisa foram produzidos por meio de entrevistas, utilizando-se de um roteiro
com questionário aberto aplicados a três benzedeiras residentes e domiciliadas no distrito de
Taquaruçú, localizado a 30 km do Município de Palmas-TO e Porto Nacional-TO. Essas personagens
são fundamentais para o desenvolvimento desta pesquisa, pois, é por meio de suas histórias suas
memórias de vida e experiências como benzedeiras é que seus preceitos e rituais realizados serão
conhecidos.
Após os encontros e a entrevista para a coleta dos dados, transcreveu-se as narrativas orais
em fichas com os relatos obtidos, após esse procedimento buscou-se compreender quem são essas
pessoas que mantém viva essas práticas de benzeção; como se tornaram benzedeiras; as razões que
levaram a utilização desses preceitos; como foram adquiridos; os preceitos e os costumes e rituais
realizados em suas práticas sociais; doenças, ou males mais tratados pela benzeção; episódios que
marcaram a trajetória enquanto benzedeira; que representação que fazem de si e da sociedade
que as cerca; se existe interesse em articularem-se aos agentes de saúde local e o que deve ser
feito para preservar essa cultura. Após, esta etapa os relatos foram analisadas, e comparadas com
o marco teórico.
Para a concretização dessa pesquisa foi necessário estruturar o presente artigo em três
partes, transpondo para a primeira, uma abordagem sobre memória, benzeção, preceitos e rituais;
a segunda, trata das práticas e as suas contribuições na perspectiva das benzedeiras entrevistadas.
E, por fim, serão apresentadas as considerações finais e as referências.
Espera-se que os resultados, determinados a partir da pesquisa, possam permitir a
realização de uma avaliação direcionada para a busca de novas Políticas de atenção aos mestres
dos saberes, cuja os preceitos e rituais são passadas de geração em geração, garantindo assim, a
redução da exclusão social das benzedeiras na sociedade contemporânea.

Abordagem Sobre História Oral, Memória, Benzeção, Preceitos e


Rituais
Preservar e divulgar informações referentes aos conhecimentos tradicionais repassados de
geração para geração é fundamental para a valorização dessas pessoas consideradas mestres dos
saberes.
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Sabe-se que, a benzedura é uma prática muito antiga que chegou no Brasil no período
colonial, e está presente até os dias atuais. As benzedeiras na realidade são vistas pela comunidade
em geral como mestres dos saberes, são elas que possuem os dons da palavra, nas mãos,
responsáveis por manter viva essa prática de ajudar as pessoas.
Para entendermos a memória, a benzeção, os preceitos e rituais, é necessário evidenciar as
contribuições da História Oral como uma possibilidade para recuperar um pouco sobre as vivências
experiências das benzedeiras no decorrer de suas vidas. A História Oral está voltada a processos
culturais, sociais e históricos, que são problematizados por meio do diálogo com as experiências dos
sujeitos, ao longo da vida.
Nesse perspectiva, entender em primeira instância o verdadeiro sentido da história oral é
muito importante, metodologicamente a história oral é que vai dar sustentação a esta pesquisa,
pois entende-se que a história oral vai além dos fatos, ela é uma forma de chegar as vivências, pois
os documentos escritos por si só não podem revelar o verdadeiro sentido de um meio social.

História oral e memória na contemporaneidade


A história oral é uma prática que gera mudanças que altera tanto o conteúdo como a
finalidade da história revelando novos campos de investigação. Para Alberti, a história oral pode
ser entendida como:
um método de pesquisa (histórica, antropológica,
sociológica,...) que privilegia a realização de entrevistas
com pessoas que participaram de, ou testemunharam
acontecimentos, conjunturas, visões de mundo, como forma
de se aproximar do objeto de estudo. Trata-se de estudar
acontecimentos históricos, instituições, grupos sociais,
categorias profissionais, movimentos, etc. (ALBERTI, 1990,
p.52).

Nesse sentido, a autora deixa claro que a história oral é uma forma de buscar relatos sobre
vivências passadas e presente de pessoas importantes em um determinado local e/ou determinada
comunidade. Com a história oral o sujeito tem a oportunidade de falar, relatar suas histórias de
vida. Ainda nas palavras de Alberti,

[...] a história oral apenas pode ser empregada em pesquisas


sobre temas contemporâneos, ocorridos em um passado
não muito remoto, isto é, que a memória dos seres humanos
alcance, para que se possa entrevistar pessoas que dele
participaram,seja como atores seja como testemunhas. É claro
que, com o passar do tempo, as entrevistas assim produzidas
poderão servir de fontes de consulta para pesquisas sobre
temas não contemporâneos (ALBERTI, 1989, p.4).

Nesse sentido, entende-se que a história oral, busca na memória humana o passado
enquanto testemunha do vivido. A memória traz partes de histórias passadas, ela, na verdade não
é completa mas parcial, ela traz lembranças de pessoas inseridas em um contexto familiar ou
social, onde suas lembranças são mediadas por intervenções coletivas, mobilizadas ou não. Isso
vem ao encontro com Halbwachs (2004, p. 85) quando diz que “toda memória é coletiva, e como
tal, ela constitui um elemento essencial da identidade, da percepção de si e dos outros”.
Já para Thompson, a história oral é de grande importância, pois ela é
uma história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida
para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação.
Admite heróis vindos não só dentre os líderes, mas dentre a
maioria desconhecida do povo. Estimula professores e alunos
a se tornarem companheiros de trabalho. Traz a história
para dentro da comunidade e extrai a história de dentro da
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comunidade. Ajuda os menos privilegiados, e especialmente


os idosos, a conquistar dignidade e autoconfiança. Propicia
o contato – e, pois, a compreensão – entre classes sociais e
entre gerações. E para cada um dos historiadores e outros que
partilhem das mesmas intenções, ela pode dar um sentimento
de pertencer a determinado lugar e a determinada época.
(THOMPSON, 1992, p. 44).

Nesse contexto, o autor esclarece que a historia contribui para formar seres humanos mais
completos, ressalta também, que a história oral é um dos meios que possibilita uma transformação
radical no sentido social da história. Para um melhor entendimento do passado Thomson destaca
que,
as entrevistas de história oral também, permitem explorar
aspectos da experiência histórica que raramente são
registrados, tais como relações pessoais, vida doméstica e a
natureza de organizações clandestinas. Elas oferecem uma
rica evidência sobre os verdadeiros significados subjetivos, ou
pessoais, de eventos passados. (THOMPSON, 2000, p. 51)

Sob esse prisma, entende-se que a entrevista proporciona ao pesquisador a oportunidade


de conhecer, de ouvir, de se relacionar com as pessoas das mais diferentes classes sociais e se
envolver com as histórias das pessoas com quem as conta.
Já, na página do CPDOC - Centro de Pesquisa e Documentação de História
Contemporânea do Brasil - A história oral está definida como “uma metodologia de pesquisa
que consiste em realizar entrevistas gravadas com pessoas que podem testemunhar sobre
acontecimentos, conjunturas, instituições, modos de vida ou outros aspectos da história
contemporânea”.
Nessa perspectiva fica claro que na história oral as entrevistas servem de busca para
compreensão do passado por meio de documento, imagens e até mesmo por meio de outras
formas de registro, que possibilitam compreender como que acontecem as experiências vividas
por outros.

Abordagem sobre Memória


A preservação da memória é fundamental importância para fortalecer o sentimento de
pertencimento de uma cultura e identidade de um povo com conhecimentos tão preciosos. É
também, essencial para que possamos divulgar essa cultura, e encontrar caminhos alternativas
que garantam mais justiça social, igualdade de direitos, democracia e liberdade. Para o resgate das
memórias é necessário termos claro o verdadeiro significado da memória, para isso trazemos aqui
alguns conceitos importantes para facilitar esse entendimento.
Nas palavras de Portelli ( 2000, p.69 ) o desafio para o Século XXI é o fato de encaramos a
memória não apenas como preservação da informação, mas também, como sinal de luta e como
processo em andamento. Para a autora a memória, pode ser construída e reconstruída a partir de
diversas fontes, tais como: documentos textuais recolhidos aos arquivos, livros de uma biblioteca,
registros audiovisuais de um colecionador particular ou, ainda, os relatos orais de pessoas que
viveram ou testemunharam acontecimentos, conjunturas, modos de vida e outros.
Já Borelli, ressalta que a memória é uma forma que as pessoas tem de
(...) evidenciar o passado no presente imediato das pessoas,
através dos depoimentos orais, constitui essa possibilidade
de reconstrução e compreensão da história humana. (...) O
movimento de mergulhar em busca da experiência perdida,
de saltar para trás em direção ao passado, poderá permitir a
erupção de algo novo. (BORELLI, 1992, p.81)

Neste sentido, verifica-se que a memória, a experiência e o tempo são fundamentais para
essa recuperação do vivido conforme concebido por quem viveu.
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Bosi, (2007, p. 54), entende que: “a memória do indivíduo depende do seu relacionamento
com a família, com a classe social, com a escola, com a Igreja, com a profissão; enfim, com os grupos
de convívio e os grupos de referência peculiares a esse individuo”.
Nesse contexto, verifica-se que a memória passa a ser um ponto de vista social, pois as
pessoas só buscam no passado o que interessa no momento e/ou futuro. Para reforçar essa idéia
trazemos as palavras de Halbwachs (1990), quando diz que:
não basta que estes nos apresentem seus testemunhos:
também, é preciso que ela não tenha deixado de concordar
com as memórias deles e é necessário que existam muitos
pontos de contato entre uma e outras para que a lembrança
que nos fazem recordar venha a ser constituída sobre uma
base comum. (HALBWACHS, 1990, p. 34)

Nesse sentido, destaca-se que a constituição da memória de um indivíduo é uma combinação


das memórias dos diferentes grupos dos quais ele participa e sofre influência, família, escola, grupo
de amigos e ambiente de trabalho. Halbwachs, destaca ainda, que,
não é suficiente reconstituir peça por peça a imagem de um
acontecimento passado para obter uma lembrança. É preciso
que esta reconstituição funcione a partir de dados ou de
noções comuns que estejam em nosso espírito e também na
dos outros, porque elas estão sempre passando destes para
aqueles reciprocamente (vice-versa), mas isso só será possível
se tiverem feito e continuarem fazendo parte de uma mesma
sociedade, de um mesmo grupo (HALBWACHS, 1990, p. 34).

Nessa perspectiva o autor, deixa claro que, para recordar, é necessário que o nosso
pensamento não deixe de concordar, em certo ponto, com os pensamentos dos outros membros do
grupo. Desse modo, esquecer determinado período/fato/evento de nossa vida é perder também, o
contato com aqueles que fazem parte do nosso grupo social, pois segundo o autor nesse processo
de rememoração coletiva, terá destaque nas memórias de um grupo, aquilo que foi vivido por um
maior número de pessoas resultando em experiências coletivas. Halbwachs (1990), destaca ainda,
que as memórias individuais e coletivas estão em constante interação, afirma ainda, que a natureza
da memória é social e associativa, visto que as nossas lembranças estão atreladas a imagens e
pensamentos que nos prendem aos homens e aos grupos.
Diríamos voluntariamente que cada memória individual é
um ponto de vista sobre a memória coletiva, que este ponto
de vista muda conforme o lugar que ali eu ocupo, e que este
lugar muda segundo as relações que mantenho com os outros
meios. (HALBWACHS, 1990, p. 51).

Sob esse prisma, verifica-se que a memória individual consiste em trabalho, não é apenas
um imaginário, um sonho, pois lembrar não seria reviver, mas sim reconstruir, na atualidade, as
experiências do passado é muito mais do que recuperar o passado, pois busca os fatos estando na
presença. Halbwachs (1990), diz ainda que,

a memória coletiva (...) envolve as memórias individuais, mas


não se confunde com elas. Ela evolui segundo suas leis, e se
algumas lembranças individuais penetram algumas vezes nela,
mudam de figura assim que sejam recolocadas num conjunto
que não é mais uma consciência pessoal. (HALBWACHS,1990,
p.53).

Neste contexto, entende-se que a memória é um dos principais fatores para a construção da
identidade individual e coletiva, pois segundo o autor a memória individual existe sempre a partir
de uma memória coletiva e que todas as lembranças são constituídas no interior de um grupo.
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Benzeção Preceitos e Rituais


A benzedura é uma prática muito antiga que chegou no Brasil no período colonial, e está
presente até os dias atuais. As benzedeiras são vistas pela comunidade em geral como mestres
dos saberes, são elas que possuem os dons nas mãos, e na palavra, responsáveis por manter viva
essa prática de ajudar as pessoas. Na cultura popular, o benzimento é considerado uma forma de
promover cura de doenças em pessoas, seguindo rituais específicos para cada mal. Práticas essas
que são feitas geralmente por mulheres velhas, de classes com baixo poder econômico.
Para auxiliar no entendimento, Oliveira (1985, p. 102) esclarece que, “a benzeção [...] constitui,
por um lado, um saber muito antigo, razão de sua legitimidade; mas ainda, paradoxalmente, às
vezes ativado por um sentimento de algo superado, desatualizado junto a seus partidários.” Essa
mesma autora explica que o ato de benção é,
um ato de súplica, de imploração, de pedido insistente
aos deuses para que eles se dispam dos seus mistérios e se
tornem mais presentes, mais concretos [...]. A benção é um
veículo que possibilita a seu executor estabelecer relações
de solidariedade e de aliança com os santos, de um lado,
com os homens, de outro, e entre ambos simultaneamente.
(OLIVEIRA, 1985, p. 09).

Oliveira (1985, p.15 -16) diz ainda que “[...] o modo como cada profissional encaminha a
sua benção releva a sua formação religiosa e sua visão de mundo, da qual a sua benção é uma das
expressões. No ato da benção, cada pessoa que benze revitaliza determinados símbolos sagrados.”
A construção desse saber leva em consideração as experiências e vivências ao longo de suas vidas.
Segundo o dicionário aurélio online de português benzer significa “abençoar; fazer
benzeduras; fazer o sinal da cruz. A benzedura segundo o dicionário é o ato de benzer, acompanhado
de rezas supersticiosas. Já a benção no dicionário entendida como o ato de expressão ou gesto
com que se abençoa; sinal da cruz feito sobre o que se benze; benefício, graça, favor especial.
Nesse sentido, entende-se que a benzeção é uma prática que é utilizada por pessoas de
diferentes religiões e cultura no Brasil e no mundo. Envolve os mais variados personagens sociais
dentro de um mesmo grupo.
Nas palavras de Oliveira (1985, p.25) a benzedeira “[...] é uma cientista popular e possui
uma maneira muito peculiar de curar: combina os místicos da religião e os truques da magia aos
conhecimentos da medicina popular”. O ofício da benzeção segundo a autora não se limita ao
ato de benzer, orar impor as mãos, muitas vezes elas exercem o papel de conselheiras com longas
conversas.
Ainda de acordo com Oliveira (1985, p. 39), “não basta apenas que a própria benzedeira
reconheça a existência de um dom na sua vida, é necessário que a comunidade onde ela mora
partilhem com ela”. Nesse sentido, o ofício e a propagação da benzeção se concretizam na relação
que estabelece entre as pessoas. As benzeções fazem parte da cultura popular e envolvem crenças
religiosas. Leite e Archanjo (2008) dizem que:
As benzedeiras encaram seu ofício como um serviço assumido
por tradição, por acreditarem no bem que fazem aos outros
[...]. Não cobram pelos serviços prestados, mas muitos dos
que procuram seus serviços costumam levar presentes como
forma de agradecimento. (LEITE; ARCHANJO, 2008, p. 18-19).

Sob esse prisma, ressaltamos que a disseminação desses ensinamentos, parte também,
da valorização dessas práticas pela comunidade, sendo necessário à preservação desses saberes
tradicionais, respeitando a história, a cultura, os valores, os desejos e os sentimentos desses
mestres do saber.
Entende-se que o dom se constitui em um fenômeno social, pois, para que ele exista, deve
haver o reconhecimento do grupo. Isso também, acontece com a bênção, pois, ao evidenciarmos
essa prática, também estamos lidando com um processo social.
Para Machado (1997), o ritual é uma forma de representação utilizados pelas benzedeiras
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são eles é que dão de certa forma a legitimidade à prática, ressalta ainda que,

o fortalecimento da crença está na força do ritual e,


consequentemente, naquele que o dirige. Os fenômenos
naturais pertencem, nesta ótica, ao mundo mágico.
Doença, morte, alegria e tristeza, nascimento e crescimento
são produtos de um mesmo poder. Ilusão e realidade se
confundem. Basta que se tenha fé nas palavras e ações
empreendidas pelo portador do dom para que os resultados
possam ser obtidos. (MACHADO, 1997, p. 237).

Sob esse contexto, verifica-se que os ritos são necessários, pois, o fortalecimento da crença
está na energia do ritual e, naquele que está a frente. Os rituais são representados por gestos,
palavras, formalidades, pensamentos e ações que estão ligados a crenças, religião ou costume
popular. Os ritos seguem algumas regras e é importante entender o objetivo de cada um. Para
Nogueira, et el (2012, p.169) “O ritual da benzeção, [...] carrega na prática a qualidade de trazer
a quem a procura um conforto que muitas vezes não foi encontrado em outros ambientes e com
outros métodos medicinais.” Os ritos se caracterizam como parte das relações sociais e da vivência
humana, pois cada cultura cada povo possui seus próprios ritos, com significados que fazem sentido
para suas crenças e costumes. Para Oliveira (1985) o ato de rezar,
traz consigo grande simbologia, sobretudo quando levado
em consideração o seu teor suplicante e solidário, no qual se
objetiva proteger o enfermo das mazelas físicas ou simbólicas
que estão o assolando. Nesse sentido, “ a benção, objeto
múltiplo e específico do ato de benzer, pode ainda possuir um
efeito de exorcização do mal, que repara a tragédia, a dor, a
aflição e o sofrimento. (OLIVEIRA, 1985, p.10)

Ainda, de acordo com Oliveira (1985) existem inúmeras doenças que são tratadas com
benzedura entre elas estão: quebranto, inveja, cobreiro, mau-olhado, espinhela caída, vento-
virado; dor de cabeça, erisipela, destaca ainda, e que cada benzedeira tem a sua forma de benzer,
essas doenças ou males, sendo que a cura só se realiza pela fé.
Oliveira (1979) diz que:

Por mais genérica que possa parecer a trajetória de iniciação


da benzedeira, ela possui uma estrutura muito peculiar
quando comparada a outras profissões, porque a benzedeira
é autônoma e atende nos limites da sua vivenda. Trata-se de
um aprendizado lento e gradual, iniciando-se geralmente em
contexto privado e possuindo uma duração que pode envolver,
em alguns casos, dias, em outros, meses, anos. (OLIVEIRA,
1979 p. 247 e 248)

Significa dizer que, para colocar em prática esses ensinamentos depende de cada um,
alguns conseguem internalizar esses ensinamentos em menos tempo, já outros podem demorar
dias ou anos, depende da fé de cada um.
Neste ítem, evidenciou-se a história oral, a memória, os preceitos e rituais de cura e cuidados
com a saúde na visão de autores que discutem, com propriedade esses assuntos proporcionando
um melhor entendimento dessa temática.

As práticas e as suas contribuições na perspectiva das benzedeiras


Conhecer, preservar e divulgar informações referentes aos conhecimentos tradicionais
repassados de geração para geração é fundamental para a valorização dessas pessoas consideradas
mestres dos saberes. Para isso, buscou-se compreender por meio das entrevistas quem são essas
pessoas que mantém viva esses processos e práticas de benzeção.
Nessa perspectiva, trazemos aqui as contribuições referentes as memórias que emergem
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dessas práticas de benzeção, preceitos e rituais confrontando-as com o marco teórico.

As práticas orais das benzedeiras do Taquaruçú e Porto Nacional


Foram entrevistadas três benzedeiras, duas residentes e domiciliadas no distrito de Taquarucú,
localizado a 30 km do município de Palmas estado do Tocantins e uma residente e domiciliada no
município de Porto Nacional, localizado a 60 km de Palmas/TO. Pelos dados obtidos pela pesquisa,
constatou-se que a idade das benzedeiras variou entre 58 e 75 anos. Uma das benzedeiras é
viúva e aposentada, outra é doméstica e solteira, a outra não é aposentada trabalha no Colégio
Sagrado Coração de Jesus. Das entrevistadas, uma não estudou, outra possui o ensino fundamental
incompleto e a outra possui o primeiro grau completo. Quanto à origem das benzedeiras, duas
migraram do Piauí e a outra de Goiás.
Para facilitar a compreensão dessas práticas orais destacamos as memórias e as histórias de
cada benzedeira entrevistada, cujo os relatos foram expostos levando em consideração o critério
de idade, ou seja, da mais velha para a mais nova: confrontando-os com o marco teórico.
Práticas de Benzeção de Maria C.C (2017, Entrevista realizada no dia 20/01/2017 em
Taquaruçú distrito de Palmas/TO.
Dona Maria C.C é uma pessoa bastante conhecida em Taquaruçú. Ela foi indicada por pessoas
da comunidade conhecida pelo seu ofício de benzedeira. Localizar, Dona Maria C.C no distrito de
Taquaruçú, não foi difícil, uma residência simples, porém muito acolhedora. Dona Maria C.C, nos
recebeu com a maior alegria, conversamos muito no primeiro encontro e no segundo também,
conforme relatos a seguir.
Iniciei a entrevista solicitando a Dona Maria C.C que contasse um pouco da sua vida, foi
quando destacou:

vim de uma cidade do interior do Piauí chamada de


Guadalupe, e já estou com 74 (setenta e quatro anos), católica,
viúva, aposentada e sem estudo, porque no meu tempo não
tinha onde estudar, minha mãe era índia que foi pega no laço
e amançada. Casei muito cedo com um caboclo mais velho do
que eu, tive minha primeira fia, e logo resolvemo ir embora
de Guadalupe, por que lá tinha muita dificuldade de viver,
minha famía foi umas das primeiras a chegar no Taquaruçú,
tudo difícil, na época foi dado o nome de Entroncamento
para a vila de Tacaralto, não tinha carro não tinha nada,
era tudo muito longe ai construímos uma casa de piassaba
nesse Entroncamento, para descansar quando ia para Porto
Nacional a cavalo. (Entrevista realizada com Maria C.C, no dia
20/01/2017, às 14h).

Dando sequência a entrevista solicitei para falar um pouco da sua vida como benzedeira.
Perguntei há quanto tempo a senhora é benzedeira, Dona Maria C.C falou que “Tem muitos anos
não me lembro mais quanto tempo, mas foi muito cedo eu era nova, desde daqueles tempos me
dedico a benzeção”. E por que se tornou benzedeira, Dona Maria C.C, foi “por que sempre quis
ajudá as pessoas”. Quando questionada sobre as razões que levam a utilização desses preceitos.
Dona Maria C.C, ressaltou que foi “vontade de fazer o bem, benzo as pessoas para ter mais saúde
pela oração e fé, esse dom vem de Deus mesmo.” De onde surgiram e como foram adquiridos esses
saberes, Dona Maria C.C, alegremente disse “Surgiram na minha famía no Piauí onde morei, apendi
com meus avós, eram tudo fio de índio que tinham muita muita sabedoria para passá, e eu sempre
quis aprende, então sempre prestei atenção no meus avós, também aprendi com minha sogra”.
Percebe-se, que esse relato se respalda nas palavras de Oliveira (1985, p. 102) quando
esclarece que “a benzeção [...] constitui, por um lado, um saber muito antigo, razão de sua
legitimidade; mas ainda, paradoxalmente, às vezes ativado por um sentimento de algo superado,
desatualizado junto a seus partidários”. Quando questionada sobre os preceitos e costumes e
rituais de cuidados com a saúde mais usados em suas práticas de cura, Dona Maria C.C, disse “faço
minha benzeção com o terço orando e com muita fé e devoção, por que a oração tem poder, realizo
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a corrente do nó rezo com fé a oração da libertação e peço a Estrela do Céu que tem o poder para
dar a benção e a cura as pessoas que necessitam”.
Percebe-se que esse relato vem ao encontro com Oliveira (1985, p.15 -16) quando diz que
“[...] O modo como cada profissional encaminha a sua benção releva a sua formação religiosa e
sua visão de mundo, da qual a sua benção é uma das expressões”, assim entende-se que, cada
benzedeira tem a sua própria maneira de benzer, pois a cada uma foi dado um dom para curar.
Para Oliveira (1985) o ato de rezar traz consigo grande simbologia, sobretudo quando levado em
consideração o seu teor suplicante e solidário, no qual se objetiva proteger o enfermo dos males.
Já o terço, nas palavras de Moura (2009, apud NOGUEIRA, et al.2012, p.169) possui valor de
totalidade, ou seja, ao circundar a pessoa com o terço, a benzedeira envolve-a em um círculo de
cura, fechando o corpo para a doença e o mal.
Quando questionada sobre as doenças, mais tratados pela benzeção, Dona Maria C.C,
ressaltou que “são muitas mas as mais benzidas é o quebranto, cobreiro,  mau-olhado, pessoas
desaparecidas, arca caída, erisipela feridas abertas nas pernas, dor de cabeça (tira o sol), muitas
outras”. Observa-se pelos relatos que eles estão de acordo com o que diz Oliveira (1985) quando
ressalta que existem inúmeras doenças que são tratadas com benzedura dentre as quais estão as
destacadas pela entrevistada.
Quais as contribuições que os benzimentos trazem para as pessoas que buscam esses
serviços de saúde, Dona Maria C.C, diz, “ele faz o bem melhora as doenças, a cura vem pela fé e eu
acredito e faço muito pelas pessoas. Muitos pais trazem os fios para benzer é porque eles tem fé
acreditam na oração, aqueles que não acreditam não tem fé na oração ele não é curado”.
Entende-se que a cura é alcançada por meio da fé de quem busca ajuda, pois a libertação
do mal é feita por Deus independente da religião. Para Nogueira, et al (2012, p.169) “O ritual da
benzeção, [...] carrega na prática a qualidade de trazer a quem a procura um conforto que muitas
vezes não foi encontrado em outros ambientes e com outros métodos medicinais.” Existe algum
acontecimento que marcou a sua vida enquanto benzedeira. Dona Maria C.C, responde,
“Sim, uma história muito engraçada uma mulhé pediu para
curar um homem de dor de cabeça, mas ele não morava aqui,
mais tarde depois de um tempo essa senhora mandou dize,
que esse homem queria me conhecê por que tinha melhorado,
mas que vinha me buscar de avião, ai eu disse, Deus que me
livre eu nunca vou voar passar por cima das pessoas eu só
ando de carro com meus fios e sobrinhos, no máximo até
Tacaralto, e ai a mulhé disse, é só embarcar no avião e fechá
os zoios, quando abrir já chegou, eu disse não minha fia, eu
não vo, ai eles vieram até aqui conversaram bastante fizeram
muitas fotos filmaram e depois disseram que eu ia aparece
na TV e que era para eu assistir, pois eu assisti e, não é que eu
apareci de verdade na TV junto com eles falando explicando
tudo, igual estó explicando falando pra você.” (Entrevista
realizada com Maria C.C, no dia 20/01/2017, às 14h).

Diante do exposto, verifica-se este relato se respalda nas palavras de Halbwachs (1990,
p.53) quando fala que “memória coletiva envolve as memórias individuais,(...) mas não se
confunde com elas”. Neste contexto, entende-se que a memória individual existe sempre a partir
de uma memória coletiva e que todas as lembranças são constituídas, ou seja, as lembranças são
construídas a partir dos estímulos, trazendo para o presente lembranças do passado. Dando
continuidade perguntei que saberes esta prática esconde, Dona Maria C.C, falou,
“não esconde nada minha fia, essa mocidade quer que eu dito
a oração para escreverem, mas eu falo que a oração não pode
colocá no papel ele perde o valor, o poder o encanto, eles tem
é que aprende pela cabeça, essa tal de memória parece que
não é boa não, tem que ter muita fé espiritualidade, eu até
tento ensiná, mas essa mocidade de hoje, não quer saber,
não aprende, parece que não dão valor a esses ensinamentos
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que vem de Deus e que são passadas de geração em geração


pais, fios e avós, eles dizem que esses ensinamentos não dão
dinheiro, por isso não tem interesse em aprende, e também
dizem que não tem tempo”. (Entrevista realizada com Maria
C.C, no dia 20/01/2017, às 14h).

Qual a sua opinião em relação ao trabalho realizado pelas benzedeiras, Dona Maria C.C,
“há minha fia ele é um trabaio muito bom e gratificante! ele ajuda as pessoas a melhorá, somos
pessoas de Deus estamos aqui só para fazer o bem, eu fico muito grata de fazer o bem, isso mexe o
meu coração fico muito muito feliz”.
Na sua opinião o que as benzedeiras representam para a sociedade, Dona Maria C.C,
“acho que todos gostam acreditam, sempre estou pronta
para ajudar rezar, vem gente de todo lado o portão da minha
casa está sempre aberto, vem muitas pessoas se benzer e
agradecer pela melhora eu sou muito feliz, eu acredito muito
em Deus e Nossa Senhora, você pode vê a minha casa está
cheia de imagem elas protegem e ajudam é só acreditar ter
fé, o Padre veio na minha casa e até falou que nem preciso ir a
igreja que tenho tudo aqui, e mais ele disse que tenho o mais
importante que é a fé e a oração”. (Entrevista realizada com
Maria C.C, no dia 20/01/2017, às 14h).

Essa afirmação vem ao encontro com as palavras de Oliveira (1985,p25) quando diz que a
benzedeira “é uma cientista popular que possui uma maneira muito peculiar de curar: combina os
místicos da religião e os truques da magia aos conhecimentos da medicina popular.”
A senhora já sofreu algum preconceito pela sociedade, Dona Maria C.C, “Não, eles gostam
por que aqui agente só faz o bem e eles acreditam. A despois quem não vai gostá eu to sempre feliz
rsssssss.” Percebe-se, pelos relatos que as benzedeiras na verdade, são vistas pela comunidade em
como mestres dos saberes, por que são elas que possuem os dons, e também são as responsáveis
por manter viva essa prática de ajudar as pessoas.
A senhora considera um profissão, Dona Maria C.C, “Não sei o que é isso!! mas é benção de
Deus! e eu gosto muito do que faço e sou muito muito feliz! rsss. Como é a forma de pagamento,
Dona Maria C.C,
“Não cobro nada, Deus paga quando cura das doenças, estou
aqui para fazer o bem e ajudá as pessoas, com a fé. Mas
sempre ganho sextas básicas, corte de roupas, elas sempre
dão alguma coisa, acho que é agradecimento, mas eu não
cobro nada, isso é presente, eu só faço bem pela fé e oração”.
(Entrevista realizada com Maria C.C, no dia 20/01/2017, às
14h).

Essa afirmação se respalda nas palavras de Leite e Archanjo (2008, p.18-19) quando
ressaltam que “(...) Não cobram pelos serviços prestados, mas muitos dos que procuram seus
serviços costumam levar presentes como forma de agradecimento” Existem outras benzedeiras
na sua família? Elas estão atuando como benzedeiras? Dona Maria C.C, “Sim, meus avós tudo
descendente de índio com muita sabedoria mas já morreram tudo, agora tenho uma fia que já ta
benzendo e aprendendo no dia a dia, ela tem que acreditar mais! rssss”. O que a senhora acha da
idéia de atuar junto aos agentes de saúde, Dona Maria C.C, “é bom né! faze o bem pras pessoas”.
Pela afirmação percebe-se que existe um certo interesse, mas não deu muita atenção. Na sua
opinião o que deveria ser feito para preservar essa cultura? Dona Maria C.C,

“Alguém tem que aprende antes que esses véios morrem tudo,
mas essa mocidade de hoje não quer saber disso, ninguém
tem fé, isso ta no sangue da pessoa, tem que ter gosto se elas
não conseguem desenvolve essa espiritualidade não adianta,
tem que ter o dom de Deus e fé, mas eu sempre falo vamus
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aprende essas sabedorias que são passadas de geração


para geração, voceis não pode perder esses ensinamentos.”
(Entrevista realizada com Maria C.C, no dia 20/01/2017, às 14h

Neste relato Dona Maria C.C, foi muito clara falou da importância dessa cultura e também
deixou claro que são poucas as pessoas que tem interesse em herdar e preservar essa cultura tão
importante passada de geração em geração. Haveria ainda alguma coisa que gostaria de dizer?
Dona Maria C.C, “Não, acho que não tem mais nada esvaziou!!!! Rssssss... acho que já falei tudo.”
Ao finalizar Dona Maria C.C, convidou para conhecer a sua casa, levou até o seu quarto e
disse “aqui estão as imagens de Nossa Senhora, é aqui é que faço minhas orações e pedidos de
cura.” Eram muitas imagens, um espaço que transmite luz, paz, serenidade. Agradeci Dona Maria
C.C, e falei que iria voltar e que foi um prazer ter conversado com ela, ela pediu para eu voltar e
pediu a Deus para me proteger iluminar meus caminhos e de minha família.
Práticas de Benzeção de Luzia, L.d.S, (Entrevista realizada no dia 31/01/2017, às 15h em
Porto Nacional/TO)
Iniciei a entrevista solicitando que contasse um pouco da sua vida, foi quando Sra. Luzia,
L.d.S, destacou:
“Nasci no município de Mossamedes-GO, tive uma infância
difícil, morava na zona rural com mais 12 irmãos. Aos 7 anos
de idade minha mãe faleceu [...] na ocasião tive que morar
com uma família em São Luiz de Montes Belos-GO. Convivi
com essa família até os 16 anos de idade, quando voltei
para a cidade de Mossâmedes-GO, na fazenda que residia
anteriormente. [...] me casei em julho de 1976 e fui morar com
minha sogra que era benzedeira [...]. Pouco tempo depois tive
minha primeira filha, que e sempre que adoecia minha sogra
a benzia, ficando boa em seguida. Tempo depois tivemos que
mudar para Goiânia, distante de Mossâmedes, momento em
que comecei a benzer, pois minha sogra havia me ensinado as
orações [...] como não conhecia ninguém que benzia. Pedia
sempre sabedoria a Deus e que ele me desse sempre o dom
para que eu pudesse benzer meus filhos. Em 1994, mudamos
para Porto Nacional -TO, desde cheguei trabalho no Colégio
Sagrado Coração de Jesus. Em meados de 2008 nasceu a
neta da minha coordenadora, que me pediu para eu benzer
[...], depois desta ocasião sempre aparecem pais pedindo
para benzer seus filhos de quebrantes, vento virado e arca
caída, mas não sou benzedeira profissional, benzo como uma
devoção. Para fazer benzeção, tem que estar em oração, tem
que estar na presença de Deus, pois tudo que faço é em nome
do pai, do filho e do espírito santo, sem qualquer pretensão
de receber qualquer quantia ou algo em troca, pois para Deus
tem que ser feito tudo com amor. Luzia, L.d.S, (Entrevista
realizada no dia 31/01/2017, às 15h)

Percebe-se, que esse relato se respalda nas palavras de Borelli (1992, p.81) quando diz
que “a memória é uma forma que as pessoas tem de [...] evidenciar o passado no presente
imediato das pessoas, através dos depoimentos orais, constitui essa possibilidade de reconstrução
e compreensão da história humana”.
Dando sequência a entrevista, perguntei a ela há quanto tempo a senhora é benzedeira,
Sra. Luzia, L.d.S, falou que é benzedeira “ há 36 anos”. E por que se tornou benzedeira, Sra. Luzia,
L.d.S, foi “para benzer meus filhos.” Quando questionada sobre as razões que levam a utilização
desses preceitos, Sra. Luzia, L.d.S, diz “Porque morava longe de tudo, e sabia as orações, ocasião
que minha filha estava com uma desidratação [...] foi quando benzi tendo ela melhorado.” Diante
dessas afirmações observa-se, que a necessidade faz com as pessoas busquem por meio da fé e
da espiritualidade a cura, e novas formas de viver e aprender fazendo. De onde surgiram e como
foram adquiridos esses saberes, Sra. Luzia, L.d.S, falou “Aprendi as orações com minha sogra.”
20 Revista Humanidades e Inovação v.6, n. 2 - 2019

Percebe-se como já mencionado neste artigo, que estes conhecimentos são passados de geração
em geração como afiram Oliveira(1985). Quando perguntei sobre os preceitos e costumes e rituais
de cuidados com a saúde mais usados em suas práticas de cura, Sra. Luzia, L.d.S, diz “Tudo é feito
com fé, tanto de quem está benzendo com quem está sendo benzido, tudo que faço é em nome do
pai, do filho e do espírito santo, pois para Deus tem que ser feito tudo com amor.” Assim entende-
se que, cada benzedeira tem a sua própria maneira de benzer, como afirma Oliveira (1985, p.15
-16). Fale sobre as doenças, mais tratados pela benzeção, Sra. Luzia, L.d.S, disse “quebranto, vento
virado e arca caída.” É como diz Oliveira (1985) existem inúmeras doenças que são tratadas com
benzedura entre elas estão as citadas no relato. Na sua opinião quais as contribuições que os
benzimentos trazem para as pessoas que buscam esses serviços de saúde, Sra. Luzia, L.d.S, “Tudo
envolve a fé, quem procura com fé recebe a benção de Deus.” Nesse sentido, entende-se que a fé
cura as doenças, basta pedir a Deus Essa afirmação está respaldada nas palavras de Oliveira (1985,
p.10) quando diz que “ato de benzer, pode ainda possuir um efeito de afastar [...] a dor, a aflição e
o sofrimento.”
Existe algum acontecimento que marcou a sua vida enquanto benzedeira. Sra. Luzia, L.d.S,
“Todos as vezes é um acontecimento especial, agindo em nome de Deus.” Qual a sua opinião
em relação ao trabalho realizado pelas benzedeiras, Sra. Luzia, L.d.S, “É muito importante, uma
responsabilidade pois a benzeção é em nome de Deus.” Na sua opinião o que as benzedeiras
representam para a sociedade, Sra. Luzia, L.d.S, “Para muitos não é visto com importância, mas
para outros é visto como uma via de acolhimento.” Esse relato vem ao encontro com Oliveira (1985,
p. 39), quando diz que “não basta apenas que a própria benzedeira reconheça a existência de um
dom na sua vida, é necessário que a comunidade onde ela mora partilhem com ela”. A senhora
já sofreu algum preconceito pela sociedade, Sra. Luzia, L.d.S, “Não”. A senhora considera uma
profissão, Sra. Luzia, L.d.S, “Não, mas sim um dom.” Oliveira (1979, 1979 p. 247 e 248) diz que “por
mais genérica que possa parecer a trajetória de iniciação da benzedeira, ela possui uma estrutura
muito peculiar quando comparada a outras profissões, porque a benzedeira é autônoma e atende
nos limites da sua vivenda.”
Como é a forma de pagamento? Sra. Luzia, L.d.S, “Não tem pagamento, tudo o que faço é
sem qualquer pretensão de receber qualquer quantia ou algo em troca.” Essa afirmação se respalda
nas palavras de Leite e Archanjo (2008, p.18-19) quando ressaltam que “(...) Não cobram pelos
serviços prestados, mas muitos dos que procuram seus serviços costumam levar presentes como
forma de agradecimento” Existem outras benzedeiras na sua família? Sra. Luzia, L.d.S, “Não.”
O que a senhora acha da idéia de atuar junto aos agentes de saúde, Sra. Luzia, L.d.S, “Não tenho
esse objetivo.” Pecebe-se pelo relato que não existe esta pretensão, pois tudo o que faz é com fé
e benefício para o outro. Na sua opinião o que deveria ser feito para preservar essa cultura? Sra.
Luzia, L.d.S, “Acreditar, ter fé em Deus.” Subentende-se pela resposta que Deus proverá, e que
outras pessoas vão prosseguir pois, é só ter fé e acreditar. Haveria ainda, alguma coisa que gostaria
de dizer? Sra. Luzia, L.d.S, “Não, nada mais.” Agradecemos sua participação, na certeza de que esta
pesquisa será de grande valor.
Práticas de Benzeção de Maria N.J.S (2017, Entrevista realizada no dia 21/01/2017, às 9h,
em Taquaruçú)
Dando sequência a entrevista, retornei a casa da Dona Maria C.C agora para entrevistar sua
filha Sra. Maria N.J.S, solicitei a ela para falar um pouco da sua vida como benzedeira, Sra. Maria
N.J.S, diz “ Nasci em Marcos Parente no Piaui, vim embora com meus pais para o Tocantins, era
nova, hoje estou com 58 anos, sou católica, doméstica e solteira, e tenho o ensino fundamental
incompleto.” Perguntei a ela há quanto tempo a senhora é benzedeira, Sra. Maria N.J.S falou que é
benzedeira “desde os 15 anos de idade”. E por que se tornou benzedeira, Maria N.J.S foi “Através
da minha avó, que me ensinou.” Quando questionada sobre as razões que levam a utilização desses
preceitos, Maria N.J.S diz “Eu benzo para que as pessoas venham a ter mais saúde, através da fé.”
De onde surgiram e como foram adquiridos esses saberes, Maria N.J.S, falou “Sempre vi minha avó
benzer, então fiquei curiosa e quis aprender. Pedi a ela para me ensinar e antes de morrer ela me
ensinou”. Quando perguntei sobre os preceitos e costumes e rituais de cuidados com a saúde mais
usados em suas práticas de cura, Maria N.J.S, disse “Faço minha benzeção orando rezando. Uso
ramo verde, água no vidro [... ]” Para Machado (1997, p.237) o ritual é uma forma de representação
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utilizados pelas benzedeiras são eles é que dão de certa forma a legitimidade à prática,
ressalta ainda que, o fortalecimento da crença está na força do ritual e, consequentemente,
naquele que o dirige.”
Fale sobre as doenças, mais tratados pela benzeção, Maria N.J.S, disse “qubranto, dor
de cabeça, arca caída, isipela, e zipa...” é como diz Oliveira (1985) existem inúmeras doenças que
são tratadas com benzedura entre elas estão as citadas no relato. Existe algum acontecimento
que marcou a sua vida enquanto benzedeira, Maria N.J.S, “Sempre que rezo para as pessoas e
elas ficam bem, eu me sinto emocionada, então toda vez que a minha fé cura alguém isso marca
a minha vida.” Qual a sua opinião em relação ao trabalho realizado pelas benzedeiras, Maria N.J.S,
“São pessoas de fé porque são usadas por Deus para tirar a dor das pessoas. As benzedeiras são
pessoas de Deus”. Percebe-se que, quando ela diz que são pessoas de fé porque são usadas por
Deus para tirar a dor essa afirmação está respaldada nas palavras de Oliveira (1985, p.10) quando
diz que o “ato de benzer, pode ainda possuir um efeito de exorcização do mal, que repara a tragédia,
a dor, a aflição e o sofrimento.”
Na sua opinião o que as benzedeiras representam para a sociedade, Maria N.J.S, “Somos
conhecidas e importantes, sempre me dispunho a ajudar quem precisa da minha reza.” Esse relato
vem ao encontro com Oliveira (1985, p. 39), quando diz que “não basta apenas que a própria
benzedeira reconheça a existência de um dom na sua vida, é necessário que a comunidade onde
ela mora partilhem com ela”. A senhora já sofreu algum preconceito pela sociedade, Maria N.J.S,
“Não”. A senhora considera um profissão, Maria N.J.S, “Profissão não. Benção de Deus.” Nesse
sentido Oliveira (1985, p. 09) diz que [...]. a benção é um veículo que possibilita a seu executor
estabelecer relações de solidariedade e de aliança com os santos, de um lado, com os homens, de
outro, e entre ambos simultaneamente.”
Como é a forma de pagamento? Maria N.J.S, “Não cobro nada. Deus que me paga”. Essa
afirmação se respalda nas palavras de Leite e Archanjo (2008, p.18-19) quando ressaltam que “[...]
não cobram pelos serviços prestados, mas muitos dos que procuram seus serviços costumam levar
presentes como forma de agradecimento” . Existem outras benzedeiras na sua família? Maria
N.J.S, “Sim minha mãe. Ela benze sempre.” O que a senhora acha da idéia de atuar junto aos
agentes de saúde, Maria N.J.S, “Ótima idéia”. Percebe-se, pela resposta que essa idéia foi bem
vinda nas palavras de Maria N.J.S, ou seja, agradou. Na sua opinião o que deveria ser feito para
preservar essa cultura? Maria N.J.S, “Passar esses ensinamentos de geração para geração, assim
como eu aprendi outros também aprenderão.” Esse relato, mais uma vez vem ao encontro com o
que diz Oliveira (1985). Haveria ainda alguma coisa que gostaria de dizer? Maria N.J.S, “Gosto de
benzer e ver as pessoas felizes e saudáveis.” Agradecemos a sua atenção, pois suas informações
são muito importante , e vão contribuir para a busca de estratégias voltadas à preservação desses
conhecimentos tão importantes.

Considerações finais
Tomando como base o marco teórico e o resultado da pesquisa foi possível concluir
que os preceitos e rituais dessas práticas de cura e cuidados com a saúde realizados pelas
benzedeiras do distrito de Taquaruçú município de Palmas/TO e Porto Nacional/TO ao serem
registrados, comentados e fundamentados, se constituem em referências de conhecimentos
e ensinamentos que necessitam de estratégias voltadas à preservação desses conhecimentos
tradicionais, respeitando a história, a cultura, os valores, os desejos e os sentimentos desses
mestres do saber, pois a cultura é um patrimônio e deve ser preservada, mas para isso constatou-
se que é necessário investimentos, pesquisa, valorização e conscientização, pois, as benzedeiras
são pessoas de grande valor, carregam com elas uma tradição cultural, responsáveis por manter
viva essa tradição, sendo necessário além de investimentos por parte dos governantes a criação de
Políticas de atenção a estes mestres do saber, políticas estas que permitam, verificar a possibilidade
de reconhecer os conhecimentos das benzedeiras como ofício tradicional de saúde popular, para
que no futuro essas benzedeiras possam ter garantido por meio de Lei o direito de exercerem seus
saberes como agentes de saúde, uma vez que em alguns municípios de alguns estados do Brasil isso
já é realidade, como é o caso do município de Rebouças (em 2009), e São João do Triunfo (em 2011)
ambas do estado do Paraná onde a ação das benzedeiras, rezadeiras, curandeiras e costureiras de
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rendiduras foi reconhecida e legalizada por Lei. No caso do Município de Rebouças foi regularizada
pela Lei Municipal n°1401/2010, já no caso do Município de São João do Triunfo foi regularizada
pela Lei Municipal n°1370/2011.
Nesse sentido, cabe evidenciar, que após a análise do resultado das entrevistas foi possível
resgatar e narrar diferentes histórias momentos das benzedeiras por meio da história oral.
Registros estes valiosos de pessoas que conhecem as peculiaridades do mundo místico, com esses
relatos e narrativas sobre diferentes ofícios, foi possível registrar um pouco de suas histórias, e suas
vivências, seus preceitos, suas ações, rituais de cura e cuidados com a saúde, e o modo de viver
de cada uma. Com esses relatos conclui-se, que as benzedeiras desenvolvem importante ofício
na comunidade pois além dos conhecimentos tradicionais, são mulheres simples, que herdaram
esses conhecimentos da família avós. Em seus relatos ressaltam, esse é um trabalho muito bom e
gratificante, somos pessoas de Deus estamos aqui só para fazer o bem, ajudar, e fazer o bem e curar
as pessoas dos males por meio desses preceitos, mas destacam que essa cura só acontece para as
pessoas que tem fé e que acreditam na espiritualidade.
Diante do exposto, conclui-se pela fundamentação teórica e pelos relatos das benzedeiras
que estas são detentoras dos mesmos ofícios e costumes tradicionais das benzedeiras dos
municípios de Rebouças e São João do Triunfo ambos municípios do Paraná, cujo os conhecimentos
foram reconhecidos por Lei. Mas para que isso aconteça no estado do Tocantins é necessário que
as instituições de ensino, realizem pesquisas que venham ampliar esses conhecimentos, pois as
iniciativas para a preservação desses saberes no âmbito das Universidades, ainda são reduzidas,
ou seja, muito tem que ser feito em prol desses mestres do saber, tendo em vista que apesar de
existirem pesquisas no Brasil sobre o assunto, contudo, no estado do Tocantins há muito para
ser feito quando se trata de conhecimentos tradicionais, pois a quantidade de benzedeiras a
serem identificadas no Tocantins, evidencia a necessidade de novas pesquisas com o intuito de
aprofundar o conhecimento sobre o tema. Pesquisas nessa área, é que possibilitam reconhecer
os conhecimentos das benzedeiras como ofício tradicional de saúde popular, para que no futuro
essas benzedeiras possam ter garantido por meio de Lei o direito de exercerem seus saberes como
agentes de saúde. Mas para conquistar esse direito por meio de Lei e torná-las agentes de saúde,
além das pesquisas e catalogação dos dados recomenda-se a união das benzedeiras em prol da
fundação de uma Associação onde juntos deverão reivindicar a implantação de Políticas Públicas
de reconhecimento formal e respeito às Benzedeiras, Benzedores; e também o acolhimento das
práticas tradicionais de cura no sistema formal de saúde; solicitar a valorização e promoção da
cultura religiosa tradicional dos Benzedores; e ainda, é necessário que a Secretaria da Educação
adote nos currículos escolares a educação sobre a cultura local, reconhecendo os Benzedores como
agentes de promoção da cultura local. Pois, são com essas Iniciativas que o grupo se fortalece e
seus saberes tradicionais serão mantidos e divulgados.
Cabe evidenciar, ainda, que o estudo não teve a pretensão de esgotar o assunto, mas de
conscientizar que essa cultura é considerada um patrimônio e deve ser preservada, mas para
isso é necessário investimentos, pesquisa, valorização e mobilização por parte dos governantes,
pesquisadores e dos próprios detentores desses saberes. Se não houver conscientização, de ambos
os lados, esses conhecimentos tendem a desaparecer, pois segundo relatos das benzedeiras
alguém tem que aprender antes que esses velhos morram, ressalta ainda, que essa mocidade
de hoje não quer saber não aprende, não dão valor a esses ensinamentos que vem de Deus e que
são passadas de geração em geração, os jovens não tem interesse nesses conhecimentos, uns por
que não acreditam e não tem fé , outros porque desconhecem, outros porque muitas vezes não
tem tempo, e, outros porque esses ofícios não são remunerados, desanimando quem poderia dar
continuidade a esses conhecimentos tão preciosos que é a cura dos males pela fé.
Conclui-se, por fim, que a maior parte dos objetivos propostos, para esta pesquisa, foram
atingidos, pois a História Oral possibilitou tecer algumas reflexões acerca das práticas e das
contribuições da benzeção na perspectiva das benzedeiras do distrito de Taquaruçú município de
Palmas e de Porto Nacional estado do Tocantins.
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Recebido em 14 de janeiro de 2018.


Aceito em 22 de fevereiro de 2019.

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