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Estudo da viabilidade técnica e financeira do aproveitamento


energético dos resíduos gerados em granja leiteira selecionada
Study of the technical and financial feasibility of the energetic use
of the waste generated in a selected dairy farm
Resumo: O objetivo deste trabalho foi verificar a viabilidade da utilização dos resíduos
gerados por gado leiteiro confinado para a produção de biofertilizantes e biogás, com
posterior geração de energia elétrica. Para isso, estimou-se a produção de resíduos de uma
granja selecionada, assim como seu potencial de geração de biogás e biofertilizantes.
Realizou-se o dimensionamento de um reator anaeróbio e a seleção de um gerador de energia
para as condições apresentadas. Calculou-se que o sistema proposto necessitaria de um
investimento inicial de R$ 80.906 e teria uma receita líquida anual de R$ 32.377, acarretando
num payback simples de 2,5 anos e numa rentabilidade anual de 40%. Como o payback é
inferior à vida útil esperada do sistema idealizado e a rentabilidade é superior à de outros dois
investimentos considerados, este empreendimento foi considerado viável.
Palavras-chave: biofertilizante; biogás; biodigestor.

Abstract: The objective of this study was to verify the feasibility of using the waste generated
by confined dairy cattle to produce biofertilizers and biogas, with subsequent generation of
electricity. Therefore, the production of waste in a selected farm was estimated, as well as its
potential for biogas and biofertilizers generation. The design of an anaerobic reactor and the
selection of an energy generator for the presented conditions were performed. It was
estimated that the proposed system would require an initial investment of R$ 80,906 and
would have an annual net revenue of R$ 32,377, resulting in a simple payback of 2.5 years
and 40% annual return. Since payback is lower than the expected lifetime of the planned
system and the return is higher than the other two investments considered, this system was
considered feasible.
Keywords: biofertilizer; biogas; biodigester.

INTRODUÇÃO

Apesar da maior parte da energia elétrica brasileira ser gerada em centrais


hidrelétricas, ainda há pouco aproveitamento de outras fontes renováveis, que apresentam um
grande potencial. Uma destas fontes renováveis é a biomassa, que pode ser definida como
toda matéria orgânica de origem animal ou vegetal. No meio rural, dejetos de animais e
resíduos vegetais são as biomassas mais frequentes. (SOUZA et al., 2004).
O setor agropecuário gera muita biomassa animal que não costuma ter um manejo
adequado, sendo indiscriminadamente aplicada no solo, o que compromete a saúde humana e
o meio ambiente por meio da contaminação da água e do ar. É importante a sensibilização dos
produtores rurais quanto a esse problema, pois ele é grave e poderia ser resolvido com a
utilização de técnicas como, por exemplo, a biodigestão dos resíduos. (AQUINO et al., 2014;
HOLM-NIELSEN; SEADI; OLESKOWICZ-POPIE, 2009).
A digestão anaeróbia da matéria orgânica tem como produtos o biofertilizante e o
biogás. O biofertilizante gerado é de alta qualidade e sua aplicação não apenas melhora a
qualidade do solo, como também não é prejudicial ao meio ambiente. Já a utilização do biogás
contribui para a redução de emissões de gases responsáveis pelo efeito estufa. (HOLM-
NIELSEN; SEADI; OLESKOWICZ-POPIE, 2009).
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Majoritariamente composto por metano e dióxido de carbono, o biogás apresenta um
alto poder calorífico e é facilmente armazenado, podendo ser utilizado quando necessário.
Possuindo diversas aplicações, no meio rural ele costuma ser utilizado para gerar energia
térmica e elétrica. As tecnologias que o utilizam para a geração de eletricidade, assim como as
tecnologias empregadas em outras fontes renováveis, são variadas e permitem uma geração
distribuída e em pequena escala, o que as torna atrativas tanto ambiental quanto socialmente.
(SOUZA et al., 2004).
Neste contexto, este trabalho teve como objetivo a análise da viabilidade da produção
de biofertilizantes e biogás a partir dos resíduos gerados por gado leiteiro confinado em uma
granja selecionada, com posterior geração de energia elétrica e conexão à rede. Este
aproveitamento dos resíduos possibilitaria a redução das despesas da granja e,
concomitantemente, contribuiria com as políticas de preservação ambiental.
Para isso, foi estimada, com base na literatura, a produção de biomassa residual de
uma granja, assim como seu potencial de geração de biogás e biofertilizantes. Então, foi
dimensionado um biodigestor e escolhido um gerador de energia para as condições
apresentadas. Por último, foi feito um levantamento do investimento necessário e da
economia em energia e fertilizantes que seria ocasionada pelo projeto, a fim de se determinar
e avaliar o tempo de retorno do investimento e a rentabilidade do empreendimento.

METODOLOGIA

A granja analisada se localiza na serra gaúcha e sua atividade principal é a criação de


gado visando a produção de leite. Outra atividade que ela desenvolve é o cultivo de milho,
com o qual é produzida silagem para alimentação do rebanho bovino.
Atualmente, conta com 80 vacas leiteiras confinadas e seu consumo médio mensal de
energia elétrica é de 2.500 kWh.
O estudo realizado neste trabalho pode ser dividido em quatro etapas: estimativa da
produção de dejetos e geração de biogás da granja, dimensionamento do reator anaeróbio,
seleção de gerador de eletricidade e avaliação financeira.

Estimativa da produção de dejetos e geração de biogás

Inicialmente, quantificou-se a produção de biomassa residual da propriedade leiteira, a


fim de estimar o potencial de geração de biogás.
Para isso, associou-se o tamanho do rebanho bovino à produção diária de dejetos por
animal, segundo diferentes autores (Tabela 1). O volume diário de dejetos foi calculado sendo
considerada uma massa específica de 933 kg/m³. (OSHIRO et al., 2016).

Tabela 1 - Produção diária de dejetos por animal


Autores Produção diária de dejetos por animal
Deublein e Steinhauser 0,05 m³
Oliver et al. 25 kg
Santos e Nogueira 21 kg
Sganzerla 10 kg
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Deublein e Steinhauser (2008, p. 63), Oliver et al.
(2008), Santos e Nogueira (2012, p. 46) e Sganzerla (1983, p. 12).

Os resultados obtidos foram então relacionados com os dados de produção de biogás


(Tabela 2), também de acordo com a literatura.
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Tabela 2 - Produção estimada de biogás
Autores Produção de biogás
Deublein e Steinhauser 1,03 m³/bovino/dia
Oliver et al. 40 a 49 m³/tonelada de dejetos
Krish et al. 0,91 m³/bovino/dia
Sganzerla 44,55 m³/tonelada de dejetos
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Deublein e Steinhauser (2008, p. 63), Krish et al.
(2005, p. 23), Oliver et al. (2008 apud LUCAS JÚNIOR, 2005) e Sganzerla (1983, p. 12-20).

Biodigestor anaeróbio

De acordo com Calza et al. (2015), estudos apontam que o reator canadense apresenta
os menores custos por volume de resíduos tratados. Além disso, este reator pode ser
construído com mantas sintéticas flexíveis, o que lhe confere uma instalação facilitada.
(OLIVER et al., 2008). Assim, optou-se pela utilização deste modelo.
Para o dimensionamento do reator, considerou-se que a literatura recomenda a adição
de 1 L de água para cada quilograma de dejetos, então foi possível calcular o volume de água
a ser adicionado diariamente. (SGANZERLA, 1983). A soma do volume de dejetos com o
volume de água forneceu o volume de carga diária.
Para o cálculo do volume do biodigestor, multiplicou-se o volume da carga pelo tempo
de retenção hidráulica. Para dejetos bovinos, tem-se um tempo de retenção hidráulica de 35
dias. (OLIVER et al., 2008).
O tanque de entrada foi dimensionado para conter o volume da carga diária, enquanto
que foi considerada uma capacidade três vezes maior que este valor para o tanque de saída,
para que o biofertilizante possa ser armazenado. (OLIVER et al., 2008).

Grupo gerador

Nesta etapa, selecionou-se no mercado nacional um gerador de eletricidade apto a


utilizar todo o volume de biogás gerado.
Considerando a quantidade média de biogás que o gerador selecionado consome,
pode-se estimar quantas horas ele funcionará por dia. Multiplicando a quantidade de horas de
funcionamento pela potência do gerador, pode-se, enfim, estimar a quantidade de energia
elétrica a ser produzida.

Avaliação financeira

A primeira etapa da avaliação financeira consistiu no levantamento do investimento


necessário para a produção de biogás e geração de eletricidade.
Optou-se pela simulação do investimento inicial considerando a construção das caixas
de entrada e saída em alvenaria e o biodigestor sendo um fosso revestido por manta plástica
de PEAD flexível.
Para a estimativa da quantidade de materiais de construção, utilizou-se a ferramenta
calculadora do site “PraConstruir”. Considerou-se 10% de perdas nas quantidades dos
materiais necessários. Os valores referentes aos materiais de construção foram verificados
junto a loja Leroy Merlin, enquanto que as mantas plásticas foram orçadas com o Grupo
Nortène.
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Contatou-se o Grupo Fockink para a solicitação de um orçamento para o gerador
escolhido. Não se obteve retorno, então foi decidido considerar o preço obtido por Rosa et al.
(2017) para este gerador, com um acréscimo de 19,92% referente à variação do dólar durante
este período de dois anos.
Numa outra etapa, estimou-se a economia de energia que a propriedade passará a ter
com a implantação do sistema de geração. Para isso, foi calculado o valor anual que seria
pago à concessionária por toda a energia disponível para consumo da granja. Então, subtraiu-
se deste valor a quantidade que será efetivamente paga para a concessionária com a
implantação do sistema de geração a biogás.
Levou-se em conta que a energia elétrica da granja leiteira é abastecida pela
permissionária Certel e sua classificação de consumo é “Rural Trifásico”, pertencente ao
Grupo de Tensão B. Atualmente, sua tarifa cobrada é de R$ 0,29601 por kWh, com Bandeira
Tarifária verde. Somado a este valor, tem-se o ICMS (30%), o PIS/PASEP (0,4%), o COFINS
(1%) e a Contribuição de Iluminação Pública (R$ 5,57). (CERTEL, 2019).
Outra fonte de economia com a implantação do biodigestor seria a produção de
biofertilizante para utilização na plantação de milho da granja. Então, quantificou-se, com
base na literatura, os macronutrientes úteis presentes no digestato e se calculou quanto seria
gasto se estes fossem adquiridos no mercado (preços verificados na loja Galpão Centro-
Oeste).
Com os valores obtidos, já foi possível realizar o cálculo do payback simples como
método de avaliação financeira. Este método consiste em considerar como tempo de retorno
do investimento o resultado da divisão do investimento inicial pela economia líquida anual.
(ROSA et al., 2017). O tempo de payback obtido foi comparado à vida útil estimada de 10
anos do sistema. (ZANONI; SCHNEIDER, 2018).
Também foi possível calcular a rentabilidade anual do sistema, que consiste na razão
entre a economia líquida anual e o investimento inicial. (ZANIN; BAGATINI; PESSATO,
2010). O valor obtido foi comparado com o rendimento anual de duas aplicações financeiras:
a caderneta de poupança e o Certificado de Depósito Bancário (CDB) com rentabilidade de
115% do CDI e vencimento de um ano.

RESULTADOS

Utilizando-se a metodologia descrita anteriormente, obteve-se uma produção média


diária de 2,20 m³ de dejetos, como pode ser vista na Tabela 3.

Tabela 3 – Produção estimada de dejetos na granja


Autores Produção de dejetos (m³/dia)
Deublein e Steinhauser 4,00
Oliver et al. 2,14
Santos e Nogueira 1,80
Sganzerla 0,86
MÉDIA 2,20
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Deublein e Steinhauser (2008, p. 63), Oliver et al.
(2008), Oshiro et al. (2016), Santos e Nogueira (2012, p. 46) e Sganzerla (1983, p. 12).

Consequentemente, o potencial médio de produção de biogás é de 70 m³ por dia,


conforme disposto na Tabela 4.
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Tabela 4 – Potencial de produção de biogás da granja
Autores Produção média de biogás (m³/dia)
Deublein e Steinhauser 82,40
Krish et al. 72,94
Oliver et al. 89,00
Sganzerla 35,64
MÉDIA 70,00
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Deublein e Steinhauser (2008, p. 63), Krish et al.
(2005, p. 23), Oliver et al. (2008 apud LUCAS JÚNIOR, 2005) e Sganzerla (1983, p. 12-20).

Calculou-se um volume médio de 2,05 m³ de água a ser adicionada ao biodigestor


diariamente. Então, pode-se calcular os volumes de carga e do biodigestor, que são
apresentados na Tabela 5.

Tabela 5 – Volumes da carga e do biodigestor


Água a ser Volume da Volume do
Autores
adicionada (m³/dia) carga (m³/dia) biodigestor (m³)
Deublein e Steinhauser 3,73 7,73 270,62
Oliver et al. 2,00 4,14 145,03
Santos e Nogueira 1,68 3,48 121,80
Sganzerla 0,80 1,66 58,01
MÉDIA 2,05 4,25 148,86
Fonte: Elaborado pela autora, com base em Deublein e Steinhauser (2008, p. 63), Oliver et al.
(2008 apud LUCAS JÚNIOR, 2005), Oshiro et al. (2016), Santos e Nogueira (2012, p. 46) e
Sganzerla (1983, p. 12-21).

Resolveu-se utilizar um volume útil médio de 148 m³ no dimensionamento do


biodigestor. Foi escolhido o formato de tronco piramidal invertido, possuindo uma borda livre
de 40 cm de profundidade. Dimensionou-se sua base maior (superior) para uma largura de
6,5 m e comprimento de 18,5 m. Já a base menor (inferior), foi dimensionada para uma
largura de 3 m e um comprimento de 15 m. Sua profundidade foi estabelecida como 2,4 m.
Para o dimensionamento dos tanques de entrada e saída, considerou-se uma carga
média diária de 4 m³. As dimensões definidas para eles são apresentadas na Tabela 6.

Tabela 6 – Dimensões dos tanques de entrada e saída


Volume (m³) Profundidade (m) Comprimento (m) Largura (m)
Tanque de entrada 4 1 2 2
Tanque de saída 12 1 4 3
Fonte: Elaborado pela autora.

Para a etapa de seleção do gerador, considerou-se a vazão de biogás estimada de 70 m³


por dia, calculada anteriormente.
Assim, optou-se pelo grupo gerador do modelo SG25B, da Fockink, que consome em
torno de 11 m³ de biogás por hora. Assim, estimou-se que o gerador operaria de seis a sete
horas por dia. Este gerador possui um motor da MWM, 4 cilindros e, em operação contínua,
sua potência aparente é de 17 kVA e gera 14 kW. Junto ao grupo gerador, também é fornecido
pela Fockink um painel elétrico para proteção e controle do sistema.
Multiplicando-se a potência de 14 kW por 6,36 horas de produção diária de energia,
obteve-se uma produção de 89,09 kWh diários. Num mês de 30 dias, a produção de energia
atingiria 2.672,73 kWh.
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Como o gerador escolhido é capaz de produzir até 20 kW em regime de emergência,
considera-se que a potência instalada na granja seria de 20 kW. Para uma central de
microgeração distribuída com esta potência instalada, o Módulo 3 do PRODIST recomenda a
conexão em baixa tensão. (ANEEL, 2017).

Avaliação financeira

O levantamento do investimento inicial necessário totalizou um valor de


R$ 80.906,34. A Tabela 7 relaciona os itens que integram este investimento.

Tabela 7 – Investimento inicial


Material Características Valor (R$)
Geomembrana PEAD 295 m² de 1,5 mm 6.309,56
Tubos e conexões PVC ocre (entrada de
Ø 150 mm 1.585,27
dejetos e saída de biofertilizante)
Tubos e conexões PVC marrom
Ø 40 mm 148,36
(condução do biogás)
Areia média 1 m³ 159,80
Pedra brita 1 m³ 69,90
Tijolos 700 unidades de 9x14x24 cm 448,00
Cimento CP II 6 unidades de 50 kg 83,94
Cal hidratada para construção civil 3 unidades de 20 kg 38,07
Mão de obra 2 pedreiros por 75 horas 4.500,00
Terraplanagem/escavações 10 horas 1.500,00
Grupo gerador 17 kVA – 14 kW 64.518,44
Instalações elétricas do painel até a rede
- 1.545,00
da concessionária
TOTAL - 80.906,34
Fonte: Elaborado pela autora.

Numa segunda etapa, avaliou-se a economia de energia que o sistema ocasionará.


Considerando o consumo mensal de 2.500 kWh, a composição da fatura atual é
apresentada na Tabela 8.

Tabela 8 – Composição da fatura atual


Consumo Valor energia ICMS PIS COFINS Iluminação Fatura
mensal (kWh) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) mensal (R$)
2.500 740,03 222,01 2,96 7,40 5,57 977,96
Fonte: Elaborado pela autora.

Com a implantação do sistema de geração a biogás, a granja passaria a produzir


2.672,73 kWh por mês. Somado a este valor, a granja teria acesso a 100 kWh da distribuidora,
que se configuram como custo de disponibilidade de energia. A Tabela 9 apresenta quanto
seria pago caso toda a energia disponível fosse proveniente da distribuidora.
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Tabela 9 – Composição da fatura da estimativa de energia disponível
Consumo Valor energia ICMS PIS COFINS Iluminação Fatura
mensal (kWh) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) mensal (R$)
2.772,73 820,76 246,23 3,28 8,21 5,57 1.084,04
Fonte: Elaborado pela autora.

Entretanto, apenas 100 kWh do consumo seriam pagos à distribuidora. Sobre estes 100
kWh adquiridos, incidem o ICMS, PIS e COFINS, e, mais uma vez, é preciso adicionar a
Contribuição de Iluminação Pública. Assim, a fatura após a implantação do sistema de
geração a biogás é apresentada na Tabela 10.

Tabela 10 – Composição da fatura com geração a biogás


Consumo Valor energia ICMS PIS COFINS Iluminação Fatura
mensal (kWh) (R$) (R$) (R$) (R$) (R$) mensal (R$)
2.772,73 29,60 30,00 0,40 1,00 5,57 66,57
Fonte: Elaborado pela autora.

Ao se subtrair a fatura mensal com geração a biogás da fatura da energia disponível,


obteve-se uma economia de energia de R$ 1.017,47. No período de um ano, esta economia
alcançaria R$ 12.209,65.
Quanto à economia em biofertilizantes, considerou-se que a granja produz em média
2,2 m³ de dejetos por dia e que estes possuem uma massa específica de 933 kg/m³,
ocasionando uma produção diária de 2.052,83 kg de dejetos. Segundo Sganzerla (1983), os
dejetos bovinos são compostos por 16,5% de matéria seca, então pode ser considerada uma
produção diária de 338,72 kg de matéria seca nos dejetos.
Como Siqueira Júnior (2005 apud OSAKI, 1990, p. 503) diz haver uma média de
1,11% de nitrogênio (N), 0,68% de fósforo (P2O5) e 0,67% de potássio (K2O) na matéria seca
do esterco de bovinos leiteiros, calculou-se uma presença média diária de 3,76 kg de
nitrogênio, 2,30 kg de fósforo e 2,27 kg de potássio no biofertilizante produzido pela granja.
A Tabela 11 apresenta a quantidade anual de biofertilizante que pode ser produzida e quanto
seria gasto se esta fosse adquirida no mercado.

Tabela 11 – Produção de biofertilizante de acordo com o digestato produzido anualmente pelo


biodigestor
Quantidade Preço de mercado Valor total
Fertilizantes
produzida (kg/ano) (R$/kg) (R$/ano)
Sulfato de amônio (N) 1.372,31 7,97 10.938,00
Superfosfato simples (P2O5) 840,70 8,18 6.877,70
Cloreto de potássio (K2O) 828,33 4,99 4.131,17
TOTAL 21.946,87
Fonte: Elaborado pela autora.

Obteve-se um total de R$ 34.156,52 economizados em eletricidade e biofertilizantes


anualmente. Desta economia, foram descontados 2,2% do valor do investimento inicial, que
se estima ser o custo anual de operação e manutenção do sistema, resultando em R$ 32.376,58
de economia líquida anual. (ROSA et al., 2017).
Dividindo-se o investimento inicial de R$ 80.906,34 pela economia líquida de
R$ 32.376,58, obteve-se um tempo de retorno do investimento de 2 anos e 6 meses.
Por fim, foi calculado um retorno anual do investimento do projeto de 40%, que pode
ser comparado a outros dois investimentos. Os resultados obtidos são apresentados na
Tabela 12.
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Tabela 12 – Comparação de rentabilidades anuais de investimentos
Retorno do investimento do
Rendimento da poupança (%) Rendimento do CDB (%)
projeto (%)
40,0 4,5 7,5
Fonte: Elaborado pela autora, com base em D’Ávila (2018).

DISCUSSÃO

Os resultados encontrados no presente estudo sugerem que, com a geração de


eletricidade a partir do biogás, a granja poderia aumentar seu consumo de eletricidade em
aproximadamente 11%, enquanto que o valor de sua fatura sofreria uma redução superior a
90%.
Também foi possível observar que a economia gerada pela fabricação própria de
biofertilizantes seria superior à economia ocasionada pela geração de eletricidade, o que
evidencia a importância do aproveitamento dos nutrientes disponíveis nos resíduos.
Sem ser considerada a variação do valor do dinheiro no tempo, obteve-se um tempo de
retorno do investimento satisfatório, ao ser comparado com a vida útil estimada de 10 anos do
biodigestor. Isto indica que, apesar do alto investimento inicial necessário, o empreendimento
se mostraria financeiramente vantajoso ao longo do tempo. Por sua vez, a rentabilidade do
projeto mostrou-se superior aos rendimentos dos investimentos na caderneta de poupança e no
CDB, o que corrobora a viabilidade financeira da implantação do sistema, evidenciando que
esta tecnologia pode ser proveitosa até para pequenos produtores.
Uma possibilidade que pode ser estudada e agregada a este projeto futuramente é a
instalação de um sistema de aquecimento do biodigestor, utilizando a energia térmica
dissipada pelo gerador de eletricidade. A instalação deste trocador de calor aumentaria o
investimento inicial do projeto, mas também se sabe que temperaturas mais elevadas
ocasionam uma maior geração de biogás e até mesmo diminuem o tempo de retenção dos
insumos. Então, apesar de aumentar o investimento inicial, o aquecimento dos insumos
aumentaria a produtividade do sistema, podendo beneficiar seu payback e rentabilidade.
Como a estimativa da produção de biogás e biofertilizantes foi feita com base na
literatura, recomenda-se que os resíduos produzidos sejam submetidos efetivamente à análise
laboratorial para uma caracterização e determinação do real potencial de produção, caso a
granja decida implementar o projeto.

CONCLUSÕES

A partir dos resultados obtidos por meio do estudo realizado, destaca-se algumas
conclusões:
a) com uma produção média de 2,2 m³ de dejetos por dia, a granja apresenta um
potencial diário de produção de 70 m³ de biogás;
b) é indicada a utilização de um biodigestor do modelo canadense, com um volume
útil de 148 m³, para o tratamento dos resíduos;
c) para a geração de energia, indica-se um gerador com motor de quatro tempos, com
uma capacidade de geração de 14 kW em regime contínuo;
d) o sistema proposto possibilitaria suprir toda a demanda de energia elétrica da
granja e ainda produziria um excedente, ocasionando uma economia anual de
R$ 12.209,65;
e) a produção de biofertilizantes evitaria um custo anual no valor de R$ 21.946,87;
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f) o investimento inicial do projeto foi calculado em R$ 80.906,34, sendo os custos
anuais de manutenção e operação do sistema estimados em 2,2% deste valor;
g) sem ser considerada a variação do valor do dinheiro no tempo, obteve-se um
payback de 2,5 anos e uma rentabilidade superior à da caderneta de poupança e do
CDB.
Assim, conclui-se que o sistema de aproveitamento dos resíduos da granja analisada
seria técnica e financeiramente viável.

REFERÊNCIAS

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