Você está na página 1de 1

Lado reverso e lado bom

Há um bom tempo venho sentindo que estou sendo menos tolerante com as
crianças, com “deslizes infantis” que poderiam ser relevados. Eis que num desses
momentos, uma criança me diz:
– Você é muito durona com a gente!
Naquele momento tudo que sentia se confirmou. Não foi possível dar continuidade
àquela conversa, pois a diretora da escola entrou na sala com vários kits de
uniforme e aquilo deixou a sala eufórica.
Fui para casa com aquelas palavras na cabeça esperando o próximo dia de aula
para retomar a conversa. Era véspera de um feriado prolongado e minha
ansiedade crescia. A frase “Você é muito durona com a gente!” foi minha
companheira por longos dias e noites. Vivi um feriado interminável.
Finalmente, chegou o dia de retomar a conversa.
– Antes do feriado, Joaquim me disse que sou muito durona com vocês. Eu
queria saber o que é ser durona e o que posso fazer para melhorar.
Joaquim, num ímpeto, responde prontamente:
– Durona porque fica muito brava com a gente.
Ao que outra criança tenta explicar:
– Ela fica brava quando a gente faz coisa errada, não cumpre os
combinados.
Passamos um tempo conversando sobre a necessidade de respeitar os
combinados que construímos juntos. Mas ainda ficava uma questão que me
afligia: como melhorar “minha dureza”?
E a sabedoria infantil logo se manifestou:
– É porque a gente tem um lado reverso e um lado bom.
– Lado reverso, o que é? – perguntei.
Apontando para sua cabeça, com sua mão dividindo-a ao meio, diz:
– É um lado bom e um lado ruim. Lado reverso é o lado ruim.
– Como faço para melhorar, não deixar o lado reverso aparecer?
– Deixa o lado bom aumentar.
E lá vem outra criança no auge de sua sabedoria infantil:
– É como se fosse um vulcão, né, Roseane? Vai subindo, subindo até que
a lava sobe e o vulcão explode.
Segurei as lágrimas para não chorar, pois era assim mesmo que me sentia, um
vulcão em erupção.
Atônita, ainda ouvi o que outra criança completou:
– O bom é ficar como a água do rio, tranquilinha.
Parei... Olhei para as minhas crianças em roda...
Vi que mesmo aquelas que não se pronunciaram estavam atentas a essa
conversa tão profunda e tocante.
Vi crianças me ensinando a controlar as emoções e a estarem ao meu lado para
que eu conseguisse.
Profª Roseane Daminelli Gomes

Você também pode gostar