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Universidade Estadual de Campinas

Faculdade de Educação
Trabalho de Pedagogia da Educação Infantil
Docente: Maria Aparecida Guedes Monção
Ana Claudia Gonçalves Roman: RA: 266009
Guilherme Eduardo Camilo Calçada/ RA: 170828

Querida amiga Ana

Como você está? Estou morrendo de saudades de você e saudade, principalmente, das nossas
conversas. Por aqui, está meio complicado, pois agora que comecei o estágio na Educação Infantil,
estou em conflito com algumas situações que ocorrem na escola. Você acredita que uma das docentes
com quem trabalho está cronometrando o tempo que ela troca a fralda dos bebês? E não é só neste
momento que ela tenta ser ágil, isto ocorre também nos demais cuidados com as crianças, entre eles,
os relacionados à alimentação e à higiene. Quando ela não está desesperada em finalizar, ela
demonstra desinteresse no que está fazendo, ou seja, geralmente está conversando com uma colega de
trabalho um assunto aleatório. Além disso, está professora zomba frequentemente de seu ofício, diz
que estudou quatro anos para ser babá e me “aconselha” a desistir. Sinceramente, amiga, não estou
aguentando mais essa situação, estou quase desistindo sim, por causa dela. O que você faria no meu
lugar?

Um grande beijo e um abraço, de seu grande amigo Guilherme.

Boa tarde, Guilherme!

Eu estou bem e como você está? Também estou morrendo de saudades de você! Precisamos
nos ver urgentemente. Sinceramente, também sinto muitas saudades das conversas, era tão fácil! E que
legal que você começou o estágio, meus parabéns! Poxa Gui, que pena que está passando por isso.
Mas me identifico muito com você, realmente, enfrentamos situações difíceis nas escolas,
principalmente na posição de estagiários.
Mas é muito triste para mim ver que uma professora formada pensa assim, mas é provável que esta
percepção está justamente ligada a sua formação docente. Considero essa visão antiquada, uma vez
que relaciona a Educação Infantil “como um espaço de cuidados ou, como diria Kuhlmann Jr. (1991),
como um espaço de educação assistencialista” (OSTETTO, p. 180). Lembra das aulas de Pedagogia da
Educação Infantil? Estudávamos que Cuidar e Educar são indissociáveis, eles “(...) não são campos
separados que precisam ser juntados, mas partes interconectadas da vida da criança” (OECD, 2006,
p.59 apud HADDAD, 2010, p. 424). “O pedagógico também envolve o que se passa nas trocas
afetivas, em todos os momentos do cotidiano da criança; perpassa todas as ações: limpar, lavar, trocar,
alimentar, dormir” (OSTETTO, p.192). “Ao atender o bebê, o adulto não apenas lhe dá o cuidado
físico, mas o insere no mundo simbólico de sua cultura ao interpretar suas expressões, gestos,
posturas” (Oliveira et alii 1992, p.41 apud OSTETTO, p.191). Portanto, esses momentos com os bebês
são essenciais, únicos, cada um é uma possibilidade de interação e troca, e é isso “que possibilita às
crianças o acesso a novos conhecimentos” (OSTETTO, p.192). Sugiro que você dialogue com sua
colega, informando-a que estes momentos devem ser aproveitados e o quão importantes eles são. Te
desejo boa sorte Gui! E não desista, tudo vai melhorar! Juntos somos mais fortes!
Um beijo e abraço de sua amiga Ana Cláudia.

Boa tarde, querido Guilherme


Olá, querido amigo, espero que esteja bem e que as coisas estejam dando certo por aí, gostaria de dizer
que a saudade não diminuí, mesmo que eu tenha estado trocando mensagens com você
frequentemente. Bem, queria te contar uma situação que vem acontecendo no meu estágio, aqui tem
uma professora que acredito que esteja praticando racismo com as crianças, não é nada muito
explicito, mas já aconteceu muitas situações em que algumas crianças negras foram abraçá-la e elas
negou o abraço, porém depois de um tempo ela abraçou os alunos brancos que estavam comportados
em suas carteiras. Houve uma outra situação que me deixou bem triste, ela estava amarrando o cabelo
crespo de uma menina negra, logo em que a garota tinha chegado na sala de aula, nesse momento, uma
aluna branca de cabelo liso pediu para que a professora amarrasse o dela também, então essa
professora disse “ não minha querida, preciso amarrar o dela porque se não ele fica armado e
bagunçado, mas o seu não precisa”, isso me partiu o coração, pois ela utilizou essas palavras bem
perto da aluna com os cabelos crespos.
Acontecem muitas outras situações que me deixam extremamente desconfortável, mas prefiro não
continuar para não tomar muito de seu tempo. Eu tento demais fazer com que esses momentos não
sejam perceptíveis para as crianças, tanto é que algumas crianças já me disseram que eu gosto mais
das crianças que são negras, pois como elas são deixadas de lado pela professora eu tento suprir esse
desafeto. Porém tem outra coisa, e isso me deixa insegura de tomar partido nessas situações, a questão
é que a professora é uma mulher negra, e pensando em tudo sobre essas coisas de lugar de fala e de
privilégio branco é meio complexo saber que atitude devo tomar nessa situação. Bem, espero que
tenha conseguido me expressar de forma clara.
Aguardo seu retorno meu caro amigo. Abraços.

Bom dia, querida Ana.

Eu estou muito bem, espero que por aí também. Novamente gostaria de dizer sinto muito por
todas as situações que veem acontecendo durante seu estágio. De fato, a situação é preocupante, e você
não está indignada sem razão, obrigado por confiar em mim para compartilhar as suas experiências.
Sobre os últimos relatos, gostaria de te relembrar o que podemos entender como lugar de fala, já que
isto te preocupa em relação a professora. De acordo com Ribeiro (2017), o “lugar de fala “é capaz de
desestabilizar as normas vigentes por trazer a importância de se pensar no rompimento de uma voz
única, com o objetivo de propiciar uma multiplicidade de vozes” (p.172). Nesse sentido, o lugar de
fala não diz respeito a ideia de que só quem está em determinado contexto pode falar, mas sim de que
todos podem falar desde que se reconheça de onde cada um está falando, assim você enquanto uma
mulher branca não deve ficar constrangida em identificar tratamentos racistas de uma professora
negra, o racismo é tão enraizado em nossa sociedade que até nós pessoas negras podemos cometê-lo.
A questão que me pega nisso tudo, é como podemos de certa forma mudar e impedir que as crianças
tenham vivencias ruim dentro dessa sala de aula? Quando fizemos a disciplina de pedagogia da
educação infantil falamos sobre isso, quando os autores Oliveira e Abramowicz (2010) retoma o termo
“paparicarão” para a discussão sobre como essa prática revela a diferença de tratamento das
professoras em relação às crianças negras e brancas. Essas situações são muito comuns dentro da
escola, pois a escola também é representação do que acontece na sociedade fora da escola, eu acredito
que para combater essa situação você deveria procurar saber quais são as medidas que a escola adota
para lidar com a diversidade em sua instituição, se ela de fato está comprometida a combater as
relações de desigualdade ético raciais, bem como as de gênero e capacitistas. Acho que se não há uma
postura enquanto a esse assunto, você deve introduzir essa discussão e pensar em projetos que lidem
com esse assunto, toda equipe escolar pode ser envolvida, e isso pode até mudar o olhar dessa
professora, que está, intencionalmente ou não, reproduzindo um racismo internalizado, para ela é
normal agir como ela age, e é isso que a escola em sua concepção de respeito às diversidades deve
combate. Assim que assim como eu você deve ter visto situações extremamente machistas dentro da
escola, comigo aconteceram inúmeras, principalmente quando ao invés de me deixar cuidar de uma
criança que tinha feito coco na calça, a diretora pediu que a secretária resolvesse a situação, pois
segundo ela, eu enquanto homem não sabia lidar com aquilo.
Essas coisas acontecem a todo momento é nosso trabalho lutar contra isso, eu acho que uma boa ideia,
voltando para a sua situação, é chamar pessoas para palestrar sobre o assunto, mostrar que as coisas
“normais não são normais”, lembra do dia que a professora Cidinha trouxe o Luciano e a Rosa para
falar conosco? Foi muito bacana e mudou muito a minha visão sobre as coisas. Bem acho que é isso
amiga, espero ter ajudado de alguma forma, e siga firme sem desistir por favor.
Te amo, minha querida. Atenciosamente, Gui

Bom dia, Ana!

Como você está? Já te adianto que estou aflito. Mas antes de te contar o motivo, sim, precisamos
marcar algo urgente mesmo. Enfim, a questão é que há uma criança na minha sala que está com
piolhos, e são muitos. Ela coça sua cabeça constantemente, estou morrendo de dó. E a professora me
pediu que eu conversasse com a família, pois ela disse que não tem mais paciência para dialogar com
tal. Ela já precisou fazer isso anteriormente e os pais foram se queixar para a diretora e, por fim, não
adiantou nada. Estou nervoso, pois não faço ideia do que fazer, e se os pais dela forem reclamar de
mim também? Como poderia resolver esta situação, especialmente para a criança?

Agradeço desde já, seu querido amigo Guilherme!

Bom dia, Gui!

Eu estou bem, mas estou aflita por você agora. Calma, acho que você não precisa ficar nervoso com
esta situação. É certo que “a relação entre educadores e familiares é permeada por conflitos, sendo
necessário, para a efetivação de uma relação de parceria, promover ações que garantam um diálogo
permanente a respeito da educação coletiva das crianças” (MONÇÃO, 2015, p. 652). Dialogar com a
família, e saber fazê-lo, pode ser a chave para solucionar esta situação. Lembre-se de que “segundo
Paulo Freire, ‘[...] somente quem escuta pacientemente e criticamente o outro, fala com ele [...]’”
(2011, p. 111 apud MONÇÃO, p.95). Neste sentido, converse com a família, acolhendo-a, escutando-a
verdadeiramente. Você não sabe o motivo dos pais terem ido reclamar para a diretora, talvez seja pelo
modo de como a professora conversou com eles. Se atente as suas palavras, “se deseja beneficiar a
criança, é preciso saber conversar com a família no sentido de persuadi-la a buscar alternativas para
garantir o bem-estar e a integridade física e emocional de seus filhos” (MONÇÃO, 2015, p. 661). Para
isso, antes de tudo, vá sem julgamentos, principalmente, depois do que você conversou com a sua
colega, a “ausência de disposição para analisar as atitudes das famílias não permite estabelecer uma
relação dialógica” (MONÇÃO, 2015, p. 672). Lembre-se de que você desconhece o motivo da criança
estar e continuar com os piolhos e cuide-se para não homogeneizar as famílias, considerando “que a
falta de cuidados é apenas uma opção individual, desprovida de elementos políticos e sociais”
(MONÇÃO, 2015, p. 661). Por fim, reforço novamente: tenha calma, cuidado e atenção. Boa sorte
amigo!
Beijos de sua querida amiga, Ana Cláudia.

Querido amigo Gui

Como você está, espero que esteja bem. Bom, tenho tido algumas dificuldades aqui na escola, as vezes
eu penso que a nossa formação é muito privilegiada, pois aprendemos muitas coisas que nos fazem ser
profissionais melhores e desenvolver uma boa relação com os nossos alunos, as professoras daqui as
vezes não reconhecem a criança no centro da aprendizagem, e tratam elas como se elas não fossem
sujeitos, parece que elas são bonecos que elas mandam e desmandam, não escutam o que elas pensam
sobre as coisas ou o que elas tem a dizer, isso já sem contar o autoritarismo que em algumas turmas e a
única forma de tratamento. Estou sofrendo muito, parece que tudo que aprendemos na faculdade não
se aplica aqui, e tenho medo de me tornar uma dessas professoras embrutecidas. O que você acha que
devo fazer? Como devo agir? Preciso manter tudo o que aprendemos na minha mente para não perder
a vontade de continuar.
Um abraço e um beijo meu amor, aguardo ansiosamente o seu retorno.

Bom dia, minha querida Ana.

Estava ansioso para receber notícias suas. Espero que esteja bem e sinto muito pelas coisas que estão
acontecendo. Primeiramente, gostaria de agradecer você pela nossa última conversa, nossa troca de
mensagens tem me ajudado bastante no estágio. Segundamente, gostaria de dizer que eu também sinto
que toda teoria que aprendemos não está sendo aplicada de verdade no nosso estágio. Passei por
situações bem parecidas com as suas e me senti muito mal, me lembro bastante das aulas de política
educacional e pedagogia da educação Infantil, quando estudamos que o conceito de infância
antigamente não existia, que na verdade as crianças daquela época nem se quer poderiam ser
entendidas como tal, pois suas vestimentas, gestos, obrigações e até mesmo o modo de serem tratadas,
eram subjugadas aos adultos (NEU, BERLEZE e KUNZ, 2015). Lembro também que as crianças da
época não eram sujeitos, a infância e o “ser criança” era uma etapa primitiva para o desenvolvimento
do “ser adulto”.
Pensando em algumas práticas que vemos nos nossos estágios parece que nada mudou, que essa visão
adultocentrica ainda não foi superada, na faculdade nós aprendemos sobre esse processo histórico do
direito da criança, se anteriormente está era tida como algo sem nome, estágio de transição para o
adulto, na sociedade atual a criança é reconhecida como “outro eu do adulto” “o devir-criança” ou “o
adulto em miniatura”, mas isso não está certo. Nós entendemos a infância e a criança como momento e
ser social, essa é a nossa concepção de educação infantil, dessa forma, a criança deve ser vista como
um indivíduo, que tem necessidades e desejos, como um sujeito histórico e de direitos, como ser total,
completo e indivisível (PEREIRA e DEON, 2022). Sei que deve estar sendo difícil, mas não desanima
amiga, tenta levar essas coisas para a sala de aula, mostrar que a nossa concepção de educação infantil
e de criança não são coisas da nossa cabeça, são de fato debruçadas em teorias historicamente e
cientificamente consolidadas.

Espero ter ajudado querida amiga, te amo muito. Com carinho, Gui

Boa noite, amiga!

Tudo bem com você? Desculpa te escrever tão tarde. Mas estou em conflito com a situação de um
aluno na escola. Infelizmente, sua tia faleceu há algumas semanas e sua família está passando por um
momento muito difícil. O aluno em questão, chora constantemente, com total razão, e se isolou um
pouco mais das demais crianças. Estou muito preocupado com ele e gostaria muito de ajudá-lo. Você
poderia me dar algum conselho?

Atenciosamente, Guilherme.

Bom dia, Gui!

Eu estou bem, mas como você está, realmente? Sabe que pode me ligar a qualquer momento, certo?!
Sinto muito pela tia de seu aluno, realmente é um período muito difícil. E nem imagino como deve
estar sendo para a criança. Como você sabe Gui, “Cuidado, Acolhimento e Escuta são princípios, e
como tais devem estar presentes em todos os momentos” (MONÇÃO, p. 96), eles são partes
fundamentais da educação. Porém, nesta fase tão delicada, eles se fazem ainda mais essenciais e, isso
“requer um olhar e uma escuta atenta aos sentimentos, pensamentos e às palavras” (MONÇÃO, p. 93-
94) tanto da criança quanto de sua família. Em uma mensagem que te escrevi, foi abordado a
importância do diálogo constante e respeitoso com as famílias, e agora, é crucial que ele continue
presente. “Essas dores não podem ser camufladas, precisam ser cuidadas e acolhidas, compreendidas
como uma dimensão humana” (MONÇÃO, p. 88), olhe e escute cuidadosamente seu aluno, e mais do
que nunca, entre em “contato com a ternura, a cordialidade, a compaixão, a alteridade, o amor, a
solidariedade” (MONÇÃO, p. 86), ele necessita disto. Lembre-se de que “As crianças choram mais
vezes do que os adultos, e não é por frescura, mas porque sentem as coisas mais profundamente,
sofrem mais” (KORCZAK, 1997, p. 77 apud MONÇÃO, p. 85). Neste sentido, tenha a sensibilidade
“para uma aproximação real da criança, compreendendo-a do ponto de vista dela, e não da do adulto”
(HADDAD, 2010, p. 436), e mantenha sempre a afetividade nesta relação. “De acordo com Paulo
Freire (1983), a educação é um ato de amor” (MONÇÃO, p. 94).

Um grande abraço de sua querida amiga Ana Cláudia.

Querida amiga Ana,

Como você está? Amiga, me tira uma dúvida, por favor, como funciona o currículo na sua escola?
Porque aqui, andei observando o trabalho de algumas das professoras, e não estou muito contente.
Pelo que parece, elas objetivam escolarizar as crianças, dando ênfase, quase que unicamente, no
letramento, na linguagem e no desenvolvimento matemático, restringindo o tempo das brincadeiras e o
uso do espaço externo da instituição. Lembro-me que estudamos coisas diferentes, e acredito que não
deveria funcionar assim.

Um grande abraço de seu amigo Guilherme.

Querido amigo Guilherme,

Eu estou bem e você? Realmente Gui, estudamos outras coisas. Também não concordo com essa
concepção de escolarização das crianças. Mas muito depende também da visão que essas professoras
possuem, uma vez que, “a questão é o conteúdo do currículo ou da estrutura curricular, outras tensões
entram em cena, refletindo o embate sobre o papel da educação infantil em relação ao que se espera
que a criança saiba e faça ao participar desta etapa da educação básica” (HADDAD, 2010, p.431).
Talvez, elas visualizem as crianças como sujeitos que ainda virão a ser e não que já são. Aqui na
minha escola, há algumas professoras que possuem esta mesma concepção, e isso também me
incomoda. Geralmente, “o currículo na educação infantil frequentemente toma forma de uma estrutura
pequena ou quadro de referência com orientações pedagógicas curtas. Essas estruturas permitem
interpretação local (...)” (HADDAD, 2010, p.430), então acredito que uma das formas de entrar em
sintonia seria tentar dialogar com as estas professoras e com a comunidade escolar, a fim de que
compartilhemos uma visão mais próxima de Educação. Mas neste dialogo e nas nossas próprias práxis,
não podemos nos esquecer de algumas coisas essenciais, dentre elas: que na Educação Infantil, as
“brincadeiras e as interações ocupem lugar fundamental, tal como é preconizado pelas Diretrizes
Curriculares Nacionais de Educação Infantil (DCNEI)” (MONÇÃO, p. 82); em segundo lugar, como
já discutido anteriormente, “As palavras Cuidado e Acolhimento estão presentes nas práticas
educativas junto aos bebês e às crianças pequenas, pois revelam a especificidade do currículo da
primeira infância” (MONÇÃO, p.85); e por fim, ver “(...) a criança como um todo, a criança com
corpo, mente, emoções, criatividade, história e identidade social (...)” (OECD, 2006, p.59 apud
HADDAD, 2010, p. 423). Precisamos sempre manter o diálogo e continuarmos estudando Gui. Espero
que você consiga o que pretende. Vou tentar conversar com as professoras aqui também.

Atenciosamente, sua amiga Ana Cláudia.

Querido amigo Gui

Olá, Gui. Está tudo bem por aí? Espero que sim, Bom, as coisas aqui deram uma melhorada, segui
muitos dos seus conselhos e a escola aderiu muitas das coisas que eu propus por aqui, então não tenho
grande reclamações ou questões. A situação que queria te falar, e prometo ser breve, seria sobre a fala
de uma professora na segunda-feira, as crianças estavam agitadas e queriam ir logo para o parque,
porém a professora estava muito irritada e começou a gritar com as crianças pedindo que elas ficassem
em silêncio, logo após isso ela virou para mim e disse: “Ai, essas crianças estão desesperadas para ir
no parque hoje, ai depois as pessoas acham que educação infantil é só brincar, é isso que elas pensam,
a vida não é só brincadeira, tem muito mais coisa criançada”. Nessa hora eu fiquei em estátua não
sabia o que dizer, fiquei bem confusa na verdade, eu acho que a aprendizagem é importante, mas será
que a criança não aprende enquanto brinca? Será que o brincar é o problema mesmo? E se a educação
infantil fosse só o brincar o que teria de errado nisso? Fiquei com esses questionamentos e gostaria da
sua ajuda, o que você pensa a respeito? Me conte por favor.
Aguardo com todo carinho o seu retorno. Beijos e abraços, Ana

Boa noite, minha cara amiga Ana

Olá, minha querida amiga. Fico feliz que conseguiu pôr em prática tudo o que conversamos, por aqui
as coisas vêm se resolvendo também, parece que finalmente estão começando a dar certo, seus
conselhos ajudaram bastante. Bom, em relação a fala infeliz da professora, não há muito o que fazer, a
concepção de educação infantil dela talvez seja uma concepção escolarizadora, mas a nossa
claramente não é, não foi para isso que fomos formados, se é que me entende. Acho que em relação as
suas questões devemos começar a pensar o que as legislações dizem sobre o brincar na educação
infantil. De acordo com a Base Nacional Comum Curricular – BNCC (BRASIL, 2018), brincar é um
dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação infantil. Brincar cotidianamente de
diversas formas, em diferentes espaços e tempos, com diferentes parceiros (crianças e adultos), amplia
e diversifica seu acesso a produções culturais, seus conhecimentos, sua imaginação, sua criatividade,
suas experiências emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais.
O Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil – RCNEI (BRASIL, 1998), o brincar
ocorre por meio de várias categorias e experiências que são diferenciadas pelo uso do material ou dos
recursos predominantemente implicados em sua execução, e são organizadas em três categorias
básicas: brincar de faz-de-conta, brincar com materiais de construção e brincar com regras. Dessa
forma, se entende que tudo que é realizado na educação infantil deve ser pautado nas múltiplas
interações e nas muitas brincadeiras. Segundo Pacheco, Cavalcanti e Santiago (2021):
“A brincadeira é uma atividade que deve ser explorada em sala de
aula e demais espaços, auxiliando a criança em seu processo de
desenvolvimento. Sendo também um recurso que pode contribuir na
aprendizagem, explorando esse prazer que as crianças têm durante o
ato de brincar, para chamar a atenção e tornar as aulas mais
interessantes” (p.4)

Nesse sentido, o brincar é mais do que uma das atividades que as crianças realizam na educação
infantil, ele é o centro, bem como, um direito da criança que deve ser garantido pelos profissionais da
educação, pela família e comunidade. Assim, eu penso que você deve explicitar isso dentro da escola,
e nesse assunto você tem a própria BNCC para te respaldar, nem tem o que temer, muito menos se
questionar em relação a esse assunto. Você estava certa de se indignar com tal fala equivocada, foi
treinada para isso, e a professora embrutecida estava desabafando enquanto restringia os direitos das
crianças sem nem se dar conta.
Nesta situação eu também entendo a professora, pois as famílias que vivem com a expectativa em
relação as suas crianças, mas você precisa instigar ela a aprender a responder esse tipo de
questionamento de forma correta, sem que ela caia no senso comum sobre a educação. Acho que é
isso, agradeço a confiança pelas mensagens e espero que consiga pelo menos deixá-la com a pulga
atrás da orelha sobre este assunto, um bom jeito de fazer isso pode ser usar os seus próprios
questionamentos para conversar com ela, as vezes só precisamos de um empurrãozinho mesmo.

Atenciosamente de seu caro e lindo amigo, Guilherme


Referências
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