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Copyright by © Maria de Lourdes de Albuquerque Fávero e [ader de Medeiros Britto

Ficha Catalográfica elaborada pela Divisão de Processamento Técnico - SIBI!UFRJ

0545 Dicionário de educadores no Brasil / organização de Maria de Lourdes de


Albuquerque Fávero e Jader de Medeiros Britto. 2. ed. aum. Rio de
Janeiro: Editora UFRJ / MEC-Inep-Comped, 2002.
1008 p.; 16 x 23 em.
1. Educação - Dicionários 2. Fávero, Maria de Lourdes de Albuquerque
3. Britto, jader de Medeiros.
CDD: 370.03

ISBN85'-7I08-226-x

Ia edição: 1999

Edição de Texto
Maria Teresa Kopschitz de Barros
Revisão
Bruno Dorigatti AqUIslçto 0,.,...-. -~
Carmen Gadelha OrIgem --
João Sette Câmara
Sollc'tante
josette Babo
Proc
Simone Brantes
R$ o!:' . < 3 ~1 ,J.
Capa e Projeto Gráfico N.o de Chamada
Alice Brito
J. I. .~
L
Editoração Eletrônica
Alice Brito ,I. ~
Ana Carreiro
janíse Duarte
Marisa Araújo

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Apoio J(f)I Fundação Universitária


111 José Bonifácio
· - ..•. _- --- ----~-

transformada na atual Universidade Federal de


PAULO REGLUS NEVES Pernambuco) .
FREIRE
Sua ativa presença na vida educacional, cul-
Nasceuem Recife, no Estado de Pernambuco, tural e política da cidade, e, depois, do Estado
em19 de setembro de 1921. Filho de Joaquim e do País, levou-o a ocupar diversas outras
TemístoclesFreire e Edeltrudes Neves Freire, posições concomitantes. Em maio de 1960,
casou-se, em 1944, com Elza Maria Costa de participou da criação do Movimento de Cul-
Oliveira,com quem teve cinco filhos: Maria tura Popular do Recife, um importante movi-
Madalena, Maria Cristina, Maria de Fátima, mento cultural criado pelo Prefeito Miguel Ar-
Joaquime Lutgardes. Professora e Diretora de raes e organizado sob a orientação e a lideran-
escola primária, Elza participou ativamente ça de Germano Coelho, então Secretário de
no desenvolvimento das primeiras experiên- Educação do Recife. Paulo Freire foi incum-
ciaseducacionais de Paulo Freire. Após o fa- bido de dirigir a Divisão de Pesquisas da enti-
lecimento de Elza, em 1986, casou-se em se- dade. Em fevereiro de 1962, assumiu a direção
gundasnúpcias, em março de 1988, com Ana do recém-criado Serviço de Extensão Cultural
MariaAraújo. Faleceu em São Paulo, em 2 de (SEC) da Universidade do Recife. Em 1963,
maiode 1997. integrou a primeira turma de conselheiros do
Conselho Estadual de Educação do Estado de
Suas primeiras experiências profissionais Pernambuco. Em meados de 1963, foi desig-
foramvividas ainda como estudante, no magis- nado pelo Ministroda Educação, Paulo de Tarso
térioda Língua Portuguesa, no Colégio Oswal- Santos, para a Presidência da recém-criada Co-
doCruz,em Recife. Diplomando-se em Direito, missão Nacional de Cultura Popular, e, em mar-
em 1946, na tradicional Faculdade de Direito ço do ano seguinte, assumiu a coordenação
do Recife, desistiu logo em seguida da prática do Programa Nacional da Alfabetização, então
da advocacia. Em 1947, ingressou no Sesi de promovido pelo Ministério da Educação com
Pemambuco como Diretor do Setor de Edu- a utilização do "Método Paulo Freire" de alfa-
cação e Cultura. Em 1954, assumiu a Superin- betização de adultos.
tendência da instituição, permanecendo nesse Esses primeiros tempos das atividades do edu-
cargo até 1957. Foi professor de Filosofia da cador foram marcados sobretudo por seus tra-
Educação na antiga Escola de Serviço Social balhos na educação de adultos analfabetos.
do Recife. Em 1959, concorreu ao provimento Não obstante o amplo elenco de atividades que
da Cadeira de História e Filosofia da Educação viera desenvolvendo, Paulo Freire só começou
da antiga Escola de Belas-Artes de Pernam- a ser conhecido no Brasil no início de 1963,
buco. Não foi indicado, mas o título de Doutor quando surgiram as primeiras informações so-
obtido pela participação em concurso possi- bre os seu método de alfabetização de adultos.
bilitou-lhe, em 1960, a nomeação para o cargo Inicialmente falou-se muito em um método
de professor efetivo de Filosofia e História da que alfabetizavaem 40 horas. Aospoucos, essa
Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências primeira informação foi sendo substituída por
e Letras da Universidade do Recife (depois outras mais adequadas e os fundamentos de
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j1P

DICIONÁRIO DE EDUCADORES NO BRASIL

suas propostas puderam ser melhor compreen- seus modos de vida. Em seguida, as lições
didos. organizavam-se a partir das "palavras gera-
doras". Essas lições eram apresentadas aos
Asprincipais características do método de Pau-
adultos em slides ou cartazes que reprodu-
lo Freire são bem conhecidas. Quase todas as
ziam cenas evocadas pelas palavras gerado-
expressões geralmente empregadas no ensino
ras. A palavra geradora tijolo, por exemplo,
eram substituídas por outras, não contamina- era apresentada sob uma figura que remetia
das pelo autoritarismo e pelas orientações para experiências vividas pelos trabalhado-
ideológicas que, de acordo com o educador, res da construção civil. Os participantes dos
seriam inerentes à educação escolar tradi- "círculos de cultura" eram levados a dialo-
cional no País. Assim, em vez de classe, falava- gar, entre si e com o coordenador de debates,
se em "círculo de cultura". O professor era sobre os conteúdos existenciais associados
substituído pelo "coordenador de debates" (o às diferentes figuras.
"educador-educando") e o aluno pelo parti-
cipante do "círculo de cultura" (o "educando- Todos os trabalhos de alfabetização reali-
educador"). Eliminavam-se cartilhas e livros zavam-se no âmbito do diálogo entre os par-
de textos, substituídos pelo trabalho com a ticipantes do "círculo de cultura". As palavras
linguagem corrente na localidade e pela dis- trabalhadas na alfabetização eram as utili-
cussão das experiências de vida dos partici- zadas pelos habitantes. As situações exami-
pantes dos "círculos de cultura". nadas durante os debates eram extraídas de
suas experiências de vida. Tudo girava em
A equipe de alfabetizadores começava por tomo das condições da vida na localidade.
investigar os meios de vida e a linguagem falada Assim, Paulo Freire assentava a educação do
na localidade em que se realizariam os traba- adulto analfabeto na própria vida dos edu-
lhos de alfabetização. Do conhecimento assim candos. Durante as discussões, os coorde-
obtido sobre a cultura e o "universo vocabu- nadores procuravam conduzir a reflexão do
lar" da população, extraíam-se as "palavras grupo para a apropriação crítica das deter-
geradoras", selecionadas sob um duplo crité- minações das condições de vida da popula-
rio de riqueza silábica e de riqueza de "con- ção local. A busca dessa "conscíentização"
teúdos existenciais" para os participantes. As era o objetivo fundamental do processo. De
sessões iniciais do processo de alfabetização acordo com Paulo Freire, o homem primeiro
eram dedicadas à discussão das denominadas se conscientizava para, em seguida, como con-
"fichas de cultura" - uma série de slides ou seqüência, alfabetizar-se. Desde as primeiras
cartazes, que apresentavam aos participantes atividades, durante a discussão das "fichas de
representações de cenas que possibilitavam o cultura", até a conclusão da fase inicial do
exame das noções de "mundo da natureza" e processo de educação popular, a alfabetiza-
"mundo da cultura". Durante o diálogo desen- ção deveria apresentar-se, claramente, não
volvido com base nessas imagens, o grupo era apenas como domínio das técnicas de leitu-
conduzido a refletir sobre o homem como ra e escrita, mas, principalmente, como aqui-
criador de cultura, isto é, como construtor de sição da capacidade de "leitura do mundo".

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PAULO REGLUS NEVES FREIRE

Esse método de alfabetização era uma ex- conforme quadros de referência construídos
pressão particular das idéias e das práticas por intelectuais do Iseb: Alberto Guerreiro
que o educador já vinha desenvolvendo e ama- Ramos, Roland Corbisier, Álvaro Vieira Pinto,
durecendo há muitos anos, em suas atividades Hélio jaguaribe, além de outros, que apare-
noSesie no magistério superior. EmEducação cem sistematicamente em suas reflexões.
eatualidade brasileira, um trabalho publica- Acompanhando posições desses autores, acre-
do como edição de tese, em 1959, Paulo Freire ditava que o desenvolvimento nacional inde-
realizou um primeiro ensaio de sistematização pendente era um imperativo de sobrevivência
daquelas idéias: começava por esclarecer sua para a nação. Mas reafirmava que o desenvol-
concepção de homem, formada sobretudo na vimento dependeria da participação do povo,
convivência com as reflexões de pensadores conscientemente crítico, nas transformações
católicos progressistas. Eram freqüentes suas sociais necessárias. E essa participação, por
referências a Maritain, Bernanos, Mounier sua vez, dependeria da educação conscíen-
e, entre os brasileiros, Alceu Amoroso Lima. tizadora.
Compreendia o homem como um ser de rela- Examinando e discutindo as idéias desses au-
ções, ontologicamente limitado e ao mesmo tores, aos quais acrescentava ainda Karl Man-
tempo aberto para o mundo, e também situa- nheim, Zevedei Barbu, [ohn Dewey, Ortega y
do, datado, marcado pela sua "circunstância", Gasset, Anísio Teixeira, e outros, Paulo Freire
mas capaz de transcender os seus condicio- dava forma à sua compreensão da sociedade
namentos e de interferir criadoramente nessas brasileira e definia o projeto de sociedade que
condições de existência. Aspossibilidades de considerava desejável para o futuro da nação:
interferência do homem definiam-se e en- uma sociedade capitalista florescente, desen-
contravam limitações no interior de uma rea- volvida, autônoma, democrática e justa. Age-
lidade histórico-social determinada. Somente neralização da consciência crítica entre os ha-
a formação e o desenvolvimento de uma cons- bitantes aparecia como denominador comum
ciência capaz de apreender criticamente as na construção das possibilidades de realização
características dessa particular realidade pos- desses diferentes objetivos.
sibilitariam a sua ação livre e criadora. Assim,
Um pouco mais tarde, ao elaborar as suas
aquela humanização do homem, isto é, a plena
propostas para a educação e a alfabetização
realização do homem como criador de cultura
de adultos, Paulo Freire procurou realizar na
e determinador de suas condições de exis-
prática aquelas orientações que defendia teo-
tência passava, necessariamente, pela for-
ricamente para o processo educativo. Assim,
mação e pelo desenvolvimento da consciência
ao organizar os trabalhos da alfabetização
crítica. Situavam-se exatamente aí as funções
sempre com base no diálogo entre os parti-
do processo educativo. A educação, já nesse
cipantes, procurava exercitar, já no próprio
primeiro trabalho, era entendida fundamen-
processo educativo, tanto a prática do diálogo
talmente como processo de conscientização.
quanto o aprendizado do respeito às posições
A atualidade brasileira, na época, era com- do outro. A prática do diálogo seria o cami-
preendida por Paulo Freire principalmente nho para a formação da personalidade demo-

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crática. De igual modo, ao fundamentar as Development, foi objeto de ampla campanha


atividades na discussão das experiências exis- publicitária e promoveu a divulgação do mé-
tenciais dos analfabetos, procurava alcançar todo Paulo Freire por todo o Brasil e mesmo
um progressivo domínio crítico sobre os con- no exterior.
dicionamentos da vida popular na localidade. Durante a construção do método de alfabe-
Aeducação para o diálogo confundia-se com tização, o educador permanecia fiel às con-
a prática do diálogo na educação. Da mesma vicções sistematizadas nos anos anteriores. A
forma, a educação para a formação da per- proposta dessa educação conscientizadora, no
sonalidade democrática identificava-se com a entanto, foi desenvolvida e praticada no Bra-
prática da democracia no processo educativo. sil a partir de 1961, numa realidade soíal, po-
O desenvolvimento da consciência crítica rea- lítica e ideológica em rápida transforma-
lizava-se na prática da reflexão e do debate ção. Vivia-se,então, uma das fases mais agu-
crítico sobre as experiências de vida dos par- das da Guerra Fria. A Revolução Cubana de-
ticipantes dos "círculos de cultura". finira-se pelo bloco socialista. A disputa pelo
As orientações teóricas consolidadas no mé- poder, no Brasil, reproduzia internamente as
todo de alfabetização vinham sendo amadu- tensões vividasno exterior. Arenúncia deJânio
recidas por Paulo Freire há muitos anos, du- Quadros e a difícil condução de João Goulart
rante suas atividades na educação de trabalha- à presidência radicalizavam a luta política in-
dores no Sesi. Mas a participação nos projetos terna. Tudo contribuía para fazer da alfabe-
do MCp'a partir de 1960, foi decisiva em seu tização pelo método Paulo Freire um dos nu-
envolvimento direto com as questões especí- merosos fatores dessa radicalização política.
ficas da alfabetização do adulto. O método de Em sua criação e em todas as principais eta-
alfabetização foi elaborado e consolidou-se pas de sua trajetória no País, inclusive em a-
entre 1961 e 1963, ao longo das atividades de bril de 1964, quando os trabalhos da alfabe-
seu autor no Movimento de Cultura Popular, tização foram interrompidos por decisão do
e, depois, no Serviço de Extensão Cultural da Governo militar, o método esteve sempre en-
Universidade do Recife. As primeiras expe- volvido em situações nas quais os motivos de
riências no processo de elaboração do método natureza política predominavam sobre as
de alfabetização, realizadas em 1961 no "Poço preocupações propriamente educacionais. A
da Panela", onde funcionava um dos Centros educação, para o educador, nunca fora en-
de Cultura do MCP,tiveram continuidade no tendida como politicamente neutra. Já em
SECoEntre 1962 e 1963, a equipe constituída seus primeiros trabalhos, optara claramente
por Paulo Freire no SECorientou e colaborou pela defesa dos interesses da população mais
na coordenação dos trabalhos de alfabetização humilde. Maisainda, as características do mé-
realizados na Paraíba, em São Paulo e no Rio todo de alfabetização acentuavam a identifi-
Grande do Norte. A experiência de Angicos, cação entre a política e a educação ou, em
no Rio Grande do Norte, financiada pelo outras palavras, explicitavam os conteúdos
Governo do Estado com recursos fornecidos políticos inerentes ao processo educativo. A
pela United States Agency of International discussão das condições de vida de adultos
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PAULO REGLUS NEVES FREIRE

analfabetos, na verdade, correspondia à dis- A repressão ao movimento de educação po-


cussão de condições de vida dos contingen- pular era compreendida sobretudo como
tes menos favorecidos da população. Con- reação das elites conservadoras, detentoras
duzida principalmente por jovens universi- de privilégios, contra a ameaça contida na
tários da "esquerda católica", e também por tomada de consciência por parte do povo e
outros segmentos de diversas correntes das contra os perigos que pressentiam em tudo
"esquerdas", essa discussão das condições de o que pudesse contribuir para a presença
vidadas populações subalternas, naquela ten- atuante do povo no processo histórico.
sa conjuntura político-ideológica, inevitavel-
Em Santiago, Paulo Freire vinculou-se ao Ins-
mente seria praticada como processo de for-
tituto de Pesquisa e Treinamento em Reforma
mação da consciência de classe. Situados, por
Agrária (Icira). Trabalhou, também, no Es-
isso mesmo, no centro das lutas políticas ra-
critório Especial para a Educação de Adultos,
dicais que marcaram aquele período, tanto o
uma iniciativa do governo democrata cristão
método de alfabetização quanto o seu autor
de Eduardo Frei na educação popular. Lecio-
foram duramente alcançados pela repres-
nou na Universidade Católica e foi consultor
são implantada pelo movimento de março de
especial do escritório regional da Unesco. As
1964.
atividades no Icira explicam a importância
Paulo Freire foi indiciado num dos numero- então atribuída em seus escritos às questões
sos Inquéritos Policiais Militares (IPMs) então do "extensionismo rural" e da "invasão cul-
instaurados. No Inquérito Militar do Recife e tural". Concluiu, em 1968, a redação do ma-
nas investigações do Rio de Janeiro sobre o nuscrito de Pedagogia do oprimido, sua obra
Ministério da Educação, foi acolhido pelos mais importante. Publicado inicialmente em
inquisidores mais como inimigo político do inglês e espanhol, em 1970, o livro registra os
que como educador. Em setembro de 1964, resultados de uma persistente e intensa re-
depois de algum tempo de permanência na flexão sobre suas práticas e sobre as orienta-
prisão, o agudo sentimento de insegurança ções do processo educativo. Estuda a relação
levou-o a exilar-se do País. Após curta perma- entre opressores e oprimidos, analisa as di-
nência na Bolívia, radicou-se no Chile, onde mensões políticas da educação e apresenta
viveuaté 1969. Esse período foi marcado por suas propostas para uma educação liberta-
grande produtividade. Em 1965, em Santiago, dora, em oposição àquilo que denominou de
concluiu a redação de Educação como prá- educação bancária, domesticadora. O livro
tica da liberdade, no qual retoma análises documenta uma significativaevoluçãonos qua-
da tese de 1959 e discorre sobre os trabalhos dros teóricos de referência do educador. En-
que realizou na educação de jovens e adultos quanto os escritos anteriores apoiavam-sepre-
analfabetos no Brasil. O livro continha uma ponderantemente em autores não filiados ao
importante introdução de Francisco Weffort. pensamento marxista, como Mannheim, De-
Ambos, o educador e o cientista político, sob wey,Barbu, Ortega y Gasset, jaspers, Huxley,
perspectivas de análise bem diversas, chega- Marcel, Mounier, os isebianos etc., agora, no
vam a conclusões em boa parte convergentes. referido livro, entre os autores citados encon-

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DICIONÁRIO DE EDUCADORES NO BRASIL

travam-se, além de Hegel, Marx, Engels, Lenin, sidade Católica e na Unicamp. Em 1980, par-
Fromm, Sartre, Marcuse, Fanon, Memmi, Lu- ticipou da fundação do Partido dos Trabalha-
kacs, Debray,Freyer, Kossic,Goldman, Althus- dores. Entre 1989 e 1991, foi Secretário de
ser etc. Agora, sob novos quadros de referên- Educação do Município de São Paulo, na ges-
cia, a educação (ou a conscientização), difi- tão da Prefeita LuízaErundina, eleita pelo PT.
cilmente poderia continuar a ser entendida Em 1991, foi Professor Convidado da Univer-
como o instrumento privilegiado de trans- sidade de São Paulo. Durante todos esses anos,
formação dos modos de coexistência. Acima entregou-se a uma intensa atividade intelec-
dela, condicionando-a e determinando os tual em aulas, conversas, entrevistas, palestras,
limites de sua possibilidade de interferência conferências, seminários, congressos, debates
na organização social estava a própria orga- e publicações.
nização social (a sociedade de classes) que a
envolvia. Em sua passagem pela Secretaria de Educa-
ção do Município de São Paulo, enfrentou de-
Em 1969, transferiu-se para os Estados Uni- safios e dificuldades criados tanto por políti-
dos, como professor convidado da Universi- cos e intelectuais conservadores quanto por
dade de Harvard. Seguiu depois para Genebra, segmentos radicais do próprio Partido dos Tra-
onde, em 1970, assumiu a função de Consultor balhadores. Maisuma vez,como nos primeiros
Especial do Departamento de Educação do anos da década de 60, a avaliação de suas ati-
Conselho Mundial das Igrejas. Nessacondição, vidades atenderia mais a motivações de na-
prestou assistência às atividades educacionais tureza política do que a considerações pro-
de outros países na América, na Ásiae na Áfri- priamente educacionais. Sua passagem pelo
ca, como a Guiné-Bissau. Ainda em Genebra, ensino municipal foi marcada pelo esforço
colaborou com um grupo de educadores de construção de um novo padrão de relacio-
brasileiros na criação do Instituto de Ação namento entre a Secretaria, as escolas e os
Cultural (Idac) , do qual se tornou Presidente. educadores da rede. Procurou criar condições
Na interação com as exigências educacionais para a ampliação da autonomia das escolas e
de antigas colônias em processo de conquista para um maior envolvimento dos alunos, dos
da independência, retomou e ampliou as pais e da comunidade na gestão escolar. Du-
análises sobre as antigas e sempre presentes rante toda sua administração, houve empe-
questões da educação dos homens para a nho do Governo Municipal em elevar a re-
democracia, a crítica, a participação e a eman-
muneração do pessoal docente. Dedicou es-
cipação. Procurou examinar o papel da edu- pecial atenção ao processo de melhoria da
cação em face dos desafios colocados pelo formação dos docentes e estimulou projetos
colonialismo e pelos movimentos nacionais de
voltados para a instituição da interdiscipli-
libertação. naridade no ensino. Em estreita colaboração
Retomou ao Brasil, pela primeira vez após o com os movimentos populares, foi criado o
auto-exílio, em 1979. Em 1980, fixou-se de- Movimento de Alfabetização da Cidade de
finitivamente no País. Instalando-se em São São Paulo (Mova). Esses projetos carrearam
Paulo, passou a lecionar na Pontifícia Univer- para a Secretaria de Educação do Município a
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PAULO REGLUS NEVES FREIRE

colaboração de numerosos professores da USP, 1976; Cartas à Guiné-Bissau. Rio de Janeiro:


da Unicamp, da PUC-Sp'da Unesp e de outras Paz e Terra. 1977; Ideologia e educação:
universidades do Estado. reflexões sobre a não neutralidade da edu-
O estilo de trabalho intelectual de Paulo Freire
cação. RiodeJaneiro: Paz e Terra, 1981; A im-
portância do ato de ler. São Paulo: Cortez /
dificulta a elaboração de uma listagem mais
Autores Associados, 1982; A educação na
ou menos completa de seus escritos. Em gran-
cidade. São Paulo: Cortez, 1991; Pedagogia
de parte devido ao interesse despertado por
da esperança: um reencontro com a Peda-
suaobra, os resultados de suas reflexõese aná-
gogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Ter-
lises quase sempre eram imediatamente sub-
ra, 1992; professora sim, tia não: cartas a
metidos ao debate, mediante comunicações,
quem ousa ensinar. São Paulo: Olho d'Água,
entrevistas ou publicações provisórias, sendo
1993;Política e educação: ensaios. São Paulo:
posteriormente retomados em outros textos
mais elaborados. Com freqüência, determi- Cortez, 1993; Cartas a Cristina. São Paulo:
Paz e Terra, 1994.
nada publicação incluía textos já publicados
isoladamente ou em outras coletâneas de arti- Cabe, finalmente, registrar que suas idéias e
gos. Como resultado, os mesmos textos, com práticas foram objeto de numerosa coleção
algumas alterações, são amiúde encontrados de teses e estudos acadêmicos, no Brasil e no
em diferentes publicações. Com esta ressalva, exterior. Recebeu importantes premiações no
seriam os seguintes os principais livros publi- Brasil e em muitos outros países. É Doutor
cados pelo educador: Educação e atualidade Honoris Causa em cerca de três dezenas de
brasileira. Recife:UniversidadeFederal do Re- universidades no Brasil, na Europa e nos Es-
cife, 1959; Educação como prática da liber- tados Unidos. Exerceu considerável influên-
dade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967; Edu- cia sobre as idéias e as práticas educativas
cação e conscientização: extensionismo em quase todos os setores da atividade edu-
rural Cuernavaca, México: Cidoc, 1968;Ac- cacional. Encontram-se expressões de suas
ción cultural para Ia libertad. Santiago,Chile: idéias em diversos outros campos do pen-
Icira, 1968; Extensión o comunicación? Ia samento religioso, social e cultural.
concientización en el medio rural. Santigo,
REFERÊNCIAS
Chile: Icira, 1969; Pedagogia do oprimido.
BIBLIOGRÁFICAS:
Rio deJaneiro: paz e Terra, 1970;Ias iglesias,
Ia educación y elprocesso de liberación hu- Para elaboração deste verbete, foram utilizadas as
mana en IaHistoria. Buenos Aires:LaAurora, obras de Paulo Reglus Neves Freire mencionadas
1974; Ação cultural para a liberdade e ou- ao longo do texto.
trosescritos. Riodejaneiro: Paze Terra, 1976;
CELSO DE RUI BEISIEGEL
Educación y cambio. Buenos Aires:Búsueda,

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