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A BOCA DA NOITE

CENA I

Voz em off – O Pássaro voará para além do espelho? Lentamente, o


cadáver de um pesadelo anseia nos devorar. É um convite ao
labirinto. Seremos nós o tempo... o banquete, mas os convidados?
Quem fala é um morto, ou a morta. O quê? Uma porta, a morta, um
abismo na frequência infernal de um cadáver. Nas entranhas,
suspiros bruscos de uma interrogação, nós, os desejos de um caos de
gritos e suas vontades trovejantes. Silêncio, apagara-se um facho
no centro do olho do velho farrapo, um minuto, mas não era uma
pausa. Ensurdecidos, no veneno se perderam os sonhos,
indeterminando o tempo. Alto, um certo ar estava de trapaça,
gravando numa face uma aparência em neon ... Úmida, para que ela
sentisse cores. Admirando o quê? Um joelho? Envenenadas serão as
profundezas da mariposa, do pé à mão... uma mão! A mão? A ponta do
dedo na escuridão, vigiada pelo gigante olho, ficará tão
desapontada quanto essa suposição da orelha, pois não é verdade o
que apontou sobre uma das pernas, que estava entorpecida na ponta
da ratoeira e cruzada, não estava ereta! ... É um breu o que não
sentiram os narizes! O que faremos nós quando tudo que parece
verdadeiro for engolido? ... A boca da noite...

CENA II
Alfeu – Um ingresso!
Senhora –O que isso significa?
Alfeu - Estou certo que dois mais dois são cinco ou algum tipo de
milagre. Normalmente são seis, sete e meio, dez ou vinte. Em um
olhar fixo no espelho se faz o porquê de um ovo ....
Senhora – Você trouxe o olho?
Alfeu – Tão rapidamente um ao encontro do outro que já estou no
fim do inferno.
Senhora – Coloque-o e assista!
( )
Petúnia– Não me deixe nunca.
Alfeu –Se você estivesse em queda livre no espaço...
Petúnia – Eu estaria gargalhando e vomitando cometas magníficos.
Alfeu – Como seria senão enxergássemos?
Petúnia – Um oceano.
Alfeu – Ontem, enquanto sonhava...
Petúnia – Era uma das expressões do tempo!?
Alfeu – Era inverno no dia cinza do orvalho... Em uma velha casa
silenciosa. O ouvido enxergava tudo! Estamos em um quarto olhando
para um corredor... Será o quê seremos, ou o quem? Ouça, é um
corredor. Não enxergo direito, mas tem uma outra pessoa lá,
desfocada, você vê? São corações em um sonho, em um corpo? Você
toda desmontada e eu sem minhas pernas!
Petúnia – Corri até que finalmente fiquei contente por ver muros de
cílios tão quebrados e rosas rasgadas em pupilas tão dilatadas

( )
CENA III
Senhora – Às vezes não se conta ou começa, mas nunca... Às vezes
termina começando mesmo sem ser toda ou metade. Agora, qual seria?
Uma peça de teatro é certo que jamais. Nessa, a noite anseia
devorar as costas de uma alma que virou aquecedor, cuja a boca
desvairada abocanhou o candelabro atalaiado...
Pink – Ouviu dizer do olho que roubaram? Um tal de Éolo, era dele ... Um
olho que ele colocara em Mangora. Arrancaram-lhe sem nenhuma
faísca de piedade. (Grito de horror)
Alfeu - Conheço um degolador de víboras, mas nenhum ladrão de
olhos!
Pink – O quê?
Alfeu – Estou te ouvindo, mas não te vejo.
Pink – De certa forma, esse encontro não está acontecendo.
Alfeu – Eu fui enfeitiçado!
Pink – No dia cinza do orvalho... Não é um olho qualquer,
Alfeu – Eu vou matar uma pessoa.
Pink – Quem você irá matar?
Alfeu – Eu não sei, mas você conhece.
Pink – Quem te enfeitiçou?
Alfeu –Era um gigante abutre negro, ele olhava para mim batendo
as asas muito lentamente e me cuidava profundamente os olhos como
se fosse me engolir... Eu tentei estrangula-lo, mas minhas mãos
derreteram. Certo, ele disse que eu saberia a hora...Uma Senhora
que perdera o topo da cabeça escutava atentamente a nossa conversa
e, com muita atenção, perguntou como eu conseguiria suportar a
carniça que se levantaria em minha volta e os cacos em minhas
tripas. Ela me atacou querendo enfiar-se em minha boca até o mais
profundo do meu ser.
Pink –Meter-se em sua boca? Isso causaria uma dor pavorosa...
Imagine o estômago!
Alfeu – Ela queria mergulhar nos abismos do meu sangue!
Pink – E mergulhou?
Alfeu – Tomou impulso e se atirou em minha boca. Desde desse dia
não me reconheço, nem ninguém, nenhuma face, nem os pés.
Pink – Como você vai matar essa pessoa?
Alfeu – Um corpo despencará durante o ensaio na hora de uma
casa...
Pink – O fio está se rompendo... É um olho de Mangora!
Alfeu– São frívolos todos os móveis!
Pink – Espere, o olho!
Senhora– Existe uma magia... Quando for amanhã, hoje não será
lembrado.... E se hoje fosse amanhã, eu estaria... Exatamente ali.
( )
CENA IV
Alfeu – Não sei onde fica sua casa e também não a conheço.
Senhora – Escondida no matagal, em uma velha casa de tijolos,
subindo. É lá que eu moro... Na pequena montanha.
Alfeu – Estou certo que não a conheço, boa noite.
Senhora –Casa adorável a sua, já a minha... é impossível. Entre
as árvores, enroscada naquele emaranhado de galhos, tão coberta de
folhas, de musgo.... E os ossos!
Alfeu – A senhora perdeu o juízo?
Senhora – Eu sou a convidada!
Alfeu – Deve ser um engano.
Senhora – Tão terrível como um tacho de miolos, mas não. Houve um
assassinato!
Alfeu – Eu vou chamar a polícia!
Senhora - A luz apagou-se depois da fala e tudo voltou ao início.
O assassino se aproximou e meteu!
( )
Éolo – Quer foder comigo?
Petúnia – Esse é o nosso quarto?
Éolo – Eu vou te dizer o que eu quero...Um seio!
Petúnia – E se ele descobrir?
Éolo – E como poderia?
Petúnia – O olho!

Senhora – Há uma sentença de morte, não tem para onde fugir...


Alfeu - Eu vou chamar a polícia!
Senhora – Não me lembro se hoje é noite, se é antes, se é dia ou
ontem. Você não se lembraria se hoje fosse amanhã... Então, não
chamará a polícia.
Alfeu – Senhora!!
Senhora – Há uma ponte sinuosa suspensa no infinito e o nome
dela é Alfeu. A Ponte Alfeu!
Alfeu – A senhora está delirando.
Senhora – Um menino saiu para brincar. Queria correr tão rápido, gritar tão
alto. Ao abrir a porta, percebeu o mundo, um aroma que acabara de
nascer... Conforme atravessou a porta, ele causou um reflexo, o
qual um dia seria o seu braço, um abutre, o indistinguível ... O
mal surgiu do útero do mesmo segundo, enfurecido, com suas pontas
pontiagudas e suas mandíbulas, escurecendo, pontudo. Absurda era a
sua escuridão, uma boca doida para abocanhar... Cheia de dentes
serrilhados ...Devorou numa só bocada a noite! Tinham ninhos de
cobras no céu e rios de ácido na língua... Partiu-se ao meio a
porta!

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