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D IÁ L O G O S
V ol XI
Timeu
Crítias
O 2.° Alcibíades
Hípias Menor
N Maranhão, a 18 de
janeiro de 1897. Fez os
estudos primário e secundário
na capital maranhense.
Doutorou-se em Medi
cina pela Faculdade da Bahia.
Em 1920, passou a
residir em São Paulo, onde
até hoje vive. É jcasado com a
professora Filomena Nunes,
sua colaboradora nas tradu
ções do grego.
Obteve, por concurso, o
cargo de médico-legista do Es
tado de São Paulo, do qual se
encontra aposentado.
Em 1956, foi eleito
para a Academia Paulista de
Letras, nela ocupando a ca
deira n. 5, que tem por
patrono Eduardo Prado.
É sócio do Instituto
Histórico e Geográfico de São
Paulo.
Outras traduções publi
cadas: Teatro completo de
Shakespeare; A Iliada e a
Odisséia, de Homero, em edi
ções da Cia. Melhoramento e
do Livro de Ouro.
DIÁLOGOS
Vol. XI
Timeu
Crítias
O 2.° Alcibíades
Hípias Menor
LIVRARIA OSORIO
DÜ.A CEÜ? MACHADO. 4 63
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DIÁLOGOS
V o l. XI
Timeu
Crítias
O 2.° Alcibíades
Hípias M enor
BELÉM - 1986
GRÁFICA E EDITORA
UNIVERSITÁRIA
ISBN 8 5 -2 4 7 -0 0 0 8 -4
CRÍTIAS
Sumário O SEGUNDO
ALCIBÍADES
HIPIAS MENOR
C R Í TI AS
Personagens :
Timeu Crítias — Sócrates — Hermócrates
0 Crítias é tradicionalmente considerado uma produção imedia
tamente posterior ao Timeu. 0 início do diálogo constitui a maior
prova dessa opinião, e a passagem em 108 a-c tanto a confirma como
reforça a tese de que Platão pretendera escrever uma trilogia, da qual
seria o Crítias o segundo elemento, precedido pelo Timeu e seguido
pelo Hermócrates.
Com este escrito retomamos a história da guerra travada entre os
atenienses proto-históricos eosatlântidas, que.começara a ser delinea
da no Timeu (20d-26d). O relato tratará das coisas humanas, e como
estas são mais difíceis de considerar que as divinas, Crítias, à seme
lhança de Timeu, formula um pedido de indulgência (106c-108a).
O propósito do diálogo parece ser o esclarecimento da origem da
sociedade política e da constituição (cf. 109d) e a demonstração da
superioridade de um determinado modelo político, no caso o de Ate
nas proto-histórica. Tal propósito aproximaria estreitamente o Crí
tias da República e do Livro 111 das Leis, e explicaria a criação do mi
to da Atlântida, pois era no confronto entre dois tipos opostos de or
ganização política (o da Atlântida fundada sobre a força, o de Ate
nas sobre a virtude) que aquela superioridade poderia ser demonstra
da.
O Crítias, que chegou-nos inacabado, não havendo qualquer fonte
que nos autorize afirmar ter sido ele alguma vez escrito completa
mente, tem importância particular para a concepção platônica da his
tória: é nele que encontramos a teoria das três idades: a dos deuses, a
dos heróis e a dos homens (cf. 109b e ss.).
CRlTlAS - Personagens:
sa depois de uma longa viagem, agora que concluí por maneira satis
fatória a travessia de meu assunto. Suplico à divindade que nasceu
com estes discursos, conservar deles as palavras ditas com proprieda-
b de; mas, se porventura, sem o perceber, eu emiti alguma nota falsa,
recaia sobre mim a punição devida. Ora, a pena justa consistirá em
por no tom certo os que desafinam. E para que sejam verdadeiros
nossos ulteriores discursos acerca da geração dos deuses, suplicamos
à divindade conceder-nos o melhor e mais perfeito corretivo: o co
nhecimento. E agora, uma vez formulada minha súplica, passo a Crí-
tias, conforme o combinado, a continuação do discurso.
Crftias — Pois não, Timeu; aceito a incumbência. Mas começarei
c justamente como o fizeste, quando pediste vênia para discorrer sobre
107 a um assunto da máxima relevância. Igual indulgência suplico para
mim, por estar convencido de que vou tratar de questões de muito
maior importância. E embora saiba que meu pedido implica certa
presunção e, antes de tudo, descortesia, não me é possível deixar de
formulá-lo. Que homem de senso ousará afirmar que tudo quanto
expuseste não foi muito bem dito? O que me cumpre demonstrar
como me for possível é que minha exposição, por mais difícil,
reclama para si muito maior indulgência. É mais fácil, Timeu, falar
b dos deuses para os homens e deixar o auditório satisfeito, do que discorrer
acerca dos mortais entre nós mesmos. A inexperiência e a total
ignorância dos ouvintes em assuntos de que eles nada entendem,
deixa o orador em posição bastante cômoda; pois, a respeito dos
deuses, todos nós temos consciência de que nada sabemos. Contudo,
para ser mais claro em minha exposição, considera comigo o seguinte.
Tudo o que é objeto de nossos discursos, por força terá de ser
imitação ou representação. Se atentarmos na arte do pintor, no pre-
c paro de imagens dos corpos dos deuses ou dos homens, tendo em
mira a dificuldade ou facilidade de proporcionar com essas imitações
prazer ao espectador, verificaremos que, se na representação de
montanhas, rios, florestas, todo o céu com tudo o que nele se encon
tra e se movimenta, alguém alcança alguma semelhança, embora
mínima, com seu trabalho, declaramo-nos imediatamente satisfeitos,
d E mais: como não temos conhecimento preciso dessas coisas, não
examinamos as pinturas nem as julgamos com excessivo rigor,
contentando-nos com um sombreado um tanto vago e ilusório. Mas
se alguém se abalança a reproduzir a forma humana, de pronto
percebemos os defeitos do desenho, pois nosso conhecimento
familiar de nós mesmos nos transforma em juizes severos, com rela
ção a quem não conseguiu nesse ponto a semelhança desejada. Ora,
forçoso será adm itir que a mesma coisa se observa com os discursos:
na descrição das coisas celestes e divinas, já nos basta um pouquinho
de verossimilhança; mas, somos muito rigorosos na crítica da repro
dução do que é mortal e humano. Assim, se na minha dissertação
improvisada eu não conseguir expor tudo com a exatidão necessária,
tereis de desculpar-me, pois, antes de mais nada, importa considerar
que, muito longe de ser fácil, é dificílim o reproduzir a contento as
coisas mortais. Fiz esse preâmbulo, Sócrates, não apenas para lem
brar-vos dessa particularidade, como para pedir-vos indulgência, não
menor, senão maior, para o que me disponho agora a apresentar-vos.
Se achardes justo meu pedido, concedei-ma de boa mente.
11 — Sócrates — E por que não, Crítias? E desde já façamos o mes
mo com Hermócrates, nosso terceiro orador, por ser mais do que certo
que dentro de pouco ele nos pedirá a mesma coisa, quando tiver de
falar. Arranje, pois, um exórdio diferente, sem ser obrigado a repetir
o teu, e fale com a certeza prévia de que obterá nossa complacência.
Porém desejo informar-te, meu caro Crítias, da disposição de teu pú
blico; aplaudiram com entusiasmo o poeta que te precedeu; necessi
tas, portanto, de muita indulgência para falar depois dele.
Hermócrates — Essa advertência, Sócrates, tanto serve para ele co
mo para mim. Mas a verdade, Crítias, é que lutadores tím idos jamais
obtém o troféu. Urge, pois, que ingresses com denodo na liça para fa
lar, e depois de invocares Apoio e as Musas, canta-nos e exalta a vir
tude de teus concidadãos de antanho.
Crítias — Meu caro Hermócrates, só te mostras corajoso por estares
colocado em últim o lugar e haver mais um que vai falar antes de ti;
mas daqui a pouquinho saberás por experiência se a coisa é tão fácil
assim. Todavia, aceito teus conselhos e encorajamento, e além das
divindades que enumerastes, chamarei os demais em meu auxílio, par
ticularmente Mnemósine, pois dela depende, por assim dizer, a parte
principal de meu discurso. Se eu conseguir evocar com fidelidade à
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