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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Neusa Regiane Mendes

Osório César: conexões entre psicologia, arte e educação

(1920 – 1950)

Mestrado em Educação: História, Política, Sociedade

São Paulo
2018
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
PUC-SP

Neusa Regiane Mendes

Osório César: conexões entre psicologia, arte e educação

(1920 – 1950)

Mestrado em Educação: História, Política, Sociedade

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifí-


cia Universidade Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de MESTRE em Educação:
História, Política, Sociedade, sob a orientação do Profes-
sor Dr. Daniel Ferraz Chiozzini.

São Paulo
2018
BANCA EXAMINADORA

____________________________________________

____________________________________________

____________________________________________
A injustiça avança hoje a passo firme.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
O poder apregoa: as coisas continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam.
E em todos os mercados proclama a exploração:
Isto é apenas o meu começo.
Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem:
Aquilo que nós queremos nunca mais o alcançaremos.
Quem ainda está vivo nunca diga: nunca.
O que é seguro não é seguro.
As coisas não continuarão a ser como são.
Depois de falarem os dominantes, falarão os dominados.
Quem pois ousa dizer: nunca?
De quem depende que a opressão prossiga? De nós.
De quem depende que ela acabe? De nós.
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe e o que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã.
E nunca será: ainda hoje.”

Elogio (Louvor) da Dialética, Bertolt Brecht


Dedico à Naaria Luz pela sua existência. Com sua candência e pulsão
de vida tem alumiado o passo a passo esse percurso.
Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
pelo apoio financeiro concedido para a realização da pesquisa.
Agradecimentos

Uma árdua jornada se desdobrou desde o início da minha existência até chegar nesse
lugar; o percurso somente foi possível pelas implicações das generosas porções dos afe-
tos a mim devotados por mulheres destemidas. Algumas delas se constituem no farol
que iluminam a estrada entre o passado, o presente e me inspiram a projetar o futuro, à
todas essas mulheres minha profunda gratidão.
À memória da minha avó do coração Luiza (Elisa Buke de Godoy) e de dona San
(Santina Benini), que me revestiram de afetos, ensinando que não existem limites para
a imaginação.
À memória da minha mãe preta Neusa Fontana Toniolli por todo acolhimento e pro-
teção.
Ao amado, Alexsandro dos Santos, que com a sua generosidade abrigou os meus
sonhos como se fossem os seus.
À Barbara Scarelli, que ilumina os meus dias com seu amor e cuidados.
À Cristina Santos, amiga querida que há três décadas me revigora com a sua alegria,
sabedoria e principalmente por compartilhar seu solo sagrado.
Ao querido Rodnei Pereira pela generosidade com que compartilha sua sabedoria
conosco, sobretudo pelo voto de confiança depositado.
Aos os meus pais, pela possibilidade da existência nesse mundo cheio de incertezas,
especialmente à Genil Milanez Mendes, pelo amor que compartilhamos pelo Juquery.
À Elisabete Adania (Betinha), a quem devoto o mais profundo respeito pela compe-
tência e sabedoria que conduz as nossas vidas.
À professora Luitgarde Oliveira Cavalcanti Barros pela acolhida, pela solicitude e
inestimável cooperação.
À Lourdes Xandó Rosa, pelo seu apoio, cooperação, cuidado, por suas preciosas in-
formações, sobretudo por compartilhar suas memórias de afetivas e transformar a minha
percepção sobre a formação do campo intelectual na cidade de São que, jamais foram
as mesmas depois das suas narrativas.
Ao mestre Luis Ernesto Kawall, por sua acolhida e valiosa contribuição para a minha
compreensão sobre a formação do campo das artes paulistanas.
À Marysia Portinari, pelo apoio e generosa receptividade.
À Dionysa Brandão, pela disponibilidade em colaborar, sobretudo, por compartilhar
as histórias incríveis sobre seu pai, Otávio Brandão.
Aos queridos Karina Müller e Leonardo Marchetti pela generosidade com que me
acompanharam nessa jornada.
Aos docentes do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Polí-
tica, Sociedade, em especial aos professores doutores Carlos Antonio Giovinazzo Ju-
nior, Circe Maria Fernandes Bittencourt, Jose Geraldo Silveira Bueno, Kazumi Muna-
kata, Leda Maria de Oliveira Rodrigues, Luciana Maria Giovanni e Odair Sass por con-
tribuírem expressivamente no meu percurso acadêmico.
Aos colegas integrantes do programa, em especial à Luana Aguiar Werneck; Daniela
do Nascimento Rodrigues, José Fagner Alves dos Santos e Emerson Porto Ferreira pelo
afeto, cuidado e principalmente por renovarem minhas esperanças nos laços de amizade.
Aos professores doutores Mauro Castilho Gonçalves e Bruno Bontempi Júnior, pelas
valiosas contribuições no exame de qualificação.
Ao meu orientador, professor doutor Daniel Ferraz Chiozzini, pela contribuição.
Aos colegas da Faculdade do Educador, especialmente à Rosemary Schettini (Rose),
Luciana Savoi, Larissa Mazetto e Joana Leitte pela parceria, cuidado e principalmente
por tornarem meus dias mais divertidos.
À todos os gestores e servidores das instituições e acervos: Academia Brasileira de
Letras, em especial à Ana Renata Tartaglia; Arquidiocese da Paraíba, em especial à Ri-
cardo Grisi Velôso; Arquivo Nacional; Arquivo Público do Estado de São Paulo; Ar-
quivo Público do Estado do Rio de Janeiro; da Biblioteca Mário de Andrade, especial-
mente à Joana Darc M. de Andrade e Rizio Bruno Sant’ Ana; Biblioteca do Museu de
Arte de São Paulo Assis Chateaubriand; Biblioteca Municipal de Franco da Rocha; Bi-
blioteca Nacional; Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo; Nú-
cleo de Acervo, Memória e Cultura do Complexo Hospitalar do Juquery, especialmente
a Glalco Cyriaco; Prefeitura Municipal de Franco da Rocha, em especial à Adilson Cu-
nha, Andreia Udvari, Angela Gizzi, Adilson Almeida (4P), Elen Palandi, Eva da Glória
Pena (Glorinha), Maria Spera, José Pedro Ramos e Rosemeire Santos; Sociedade Bra-
sileira de Psicanálise de São Paulo; Universidade Federal da Paraíba, especialmente a
professora doutora Cláudia Engler Cury; Museu de Imagens do Inconsciente, especial-
mente à Luiz Mello; Universidade Federal do Rio de Janeiro, em especial à Leandro
Carvalho, Maurício Azevedo, Vinicius Klein.
Resumo

Esta pesquisa consiste numa investigação sobre a trajetória e a produção do médico pa-
raibano Osório Cesar, apontado como precursor dos estudos acerca das conexões entre
arte e loucura no Brasil, buscando identificar o espaço do tema “educação” no conjunto
de sua obra. A análise dialoga com os pesquisadores e pesquisadoras que têm empreen-
dido investigações orientadas para a compreensão da ação de intelectuais no campo da
educação, considerando os desdobramentos mais recentes da história cultural e da his-
tória política. Privilegiou-se a reconstrução da rede de sociabilidades e das incursões de
Osório Cesar como pesquisador das ciências médicas, como um elaborador e difusor
dos princípios fundamentais para a compreensão entre arte e loucura e da arteterapia;
como entusiasta da educação das crianças, à época, classificadas como anormais e como
elaborador e divulgador de proposições e ideias políticas. As fontes selecionadas no
trabalho de investigação foram textos da imprensa, artigos em periódicos e livros pro-
duzidos pelo autor ou por seus colaboradores e opositores, registros dos arquivos públi-
cos (em especial, aqueles produzidos sob a égide do Departamento de Ordem Política e
Social); além de teses e dissertações que trataram de aspectos específicos da vida de
Osório Cesar. As conclusões alcançadas nos permitem afirmar que Osório Cesar exer-
ceu uma agência significativa como intelectual nas diferentes arenas investigadas e que
sua contribuição para os estudos históricos em educação, ancorada nas fronteiras entre
psicologia, psiquiatria e pedagogia, guarda relevância para a compreensão do cenário
de constituição do campo da educação no início do século XX.

Palavras-chaves: Osório Cesar, arte e loucura, arteterapia, história da educação, crian-


ças com deficiência intelectual, história dos intelectuais.
Abstract

This research consists of an investigation on the trajectory and the textual production of
the physician Osório Cesar, pointed as the precursor of the studies about the connections
between art and madness in Brazil. The analysis dialogue with researchers aimed to
understanding the intellectual and political action of education’s field, considering the
most recent developments in cultural history and political history. Methodologically, it
privileged the rebuilding of the sociability network and the incursions of Osório Cesar
as a researcher of the medical sciences, as a developer and disseminator of the funda-
mental principles for the understanding between art and madness and art therapy; as
child education enthusiastic, at the time, classified as abnormal child´s and as formulator
and publisher of propositions and political ideas. The sources have been selected in the
research were newspaper texts, journals and book articles produced by the author or by
his collaborators and opponents, records of public archives (particularly, those produced
under the auspices of the Political and Social Order Department); in addition to of the
theses and dissertations addressed with specific aspects of Osorio Cesar's life. The con-
clusions reached allow us to affirm that Osório Cesar exercised a significant agency as
an intellectual in the different arenas investigated and that its contribution to historical
studies in education, anchored in the frontiers between psychology, psychiatry and ped-
agogy, is relevant to the understanding of the scenario of constitution of the art-educa-
tion in the early 20th century.

Keywords: Osório Cesar, art and madness, art therapy, history of education, children
with intellectual disability, history of the intellectuals.
Sumário
Introdução ................................................................................................................... 12

I – O recorte temporal, as fontes de pesquisa e a singularidade do sujeito ........ 22

1 Contornos do sujeito ......................................................................................... 33

1.1 Uma trajetória singular ................................................................................ 33

1.2 Os contextos de engajamento e as ferramentas mentais disponíveis ........ 38

1.2.1 A reforma psiquiátrica paulista como processo de higienização social 39

1.2.2 O movimento eugênico brasileiro............................................................. 41

1.3 O apagamento de um legado ........................................................................ 45

2 As questões da arte-educação ........................................................................... 47

2.1 Os intelectuais tupiniquins da/na Belle Époque paulistana ....................... 47

2.2 A arte e a educação nas discussões sobre o Brasil do início do século XX 54

2.2.1 A arte dos loucos no Juquery ................................................................... 56

2.2.2 A alfabetização das crianças anormais (1929) ........................................ 71

3 Proposições e posições políticas........................................................................ 78

3.1 A ordem social: uma visão panorâmica do cenário político brasileiro ..... 79

Considerações finais ................................................................................................... 99

Referências bibliográficas ....................................................................................... 105

Fontes analisadas ................................................................................................... 115

3.2 Teses e dissertações ..................................................................................... 115

3.3 Documentos .................................................................................................. 116

3.4 Periódicos ..................................................................................................... 116

3.5 Produção textual .......................................................................................... 118


Introdução

Assim como para grande parte dos franco-rochenses, o Hospital do Juquery foi,
durante a minha infância e adolescência, a extensão do quintal de casa. O Juca – codi-
nome cunhado pelos moradores da cidade de Franco da Rocha para se referir ao Hospital
do Juquery – foi por mais de cinco décadas o espaço de socialização da cidade, as in-
cursões nas oficinas de laborterapia e em outros espaços daquele lugar, orbitam minha
memória afetiva dos passatempos da primeira infância.
Entretanto, uma inquietação recorrente me fazia refletir: por que essa memória
afetiva, compartilhada por mim e por meus conterrâneos, não incluía o acesso/aproxi-
mação com a história e a obra intelectual de uma série de personagens que marcaram a
produção científica, cultural e educacional brasileira e que conviveram em torno do Juca
desde o final do século XIX até meados do século XX? Para além do mais famoso de
seus médicos – Franco da Rocha – os moradores da cidade sabem muito pouco a respeito
de outras histórias e sujeitos que contribuíram para que o Hospital do Juquery fosse uma
referência internacional de produção de conhecimento.
Sem dúvida, Francisco Franco da Rocha é a figura mais destacada e estudada,
tanto no campo da história política e intelectual quanto no campo da história da medi-
cina. Sua importância se expressa, inclusive, com a adoção de seu nome quando da re-
organização territorial da Bacia do Juquery, em substituição ao nome original da cidade.
O médico Francisco Franco da Rocha, reconhecido no meio científico como eminente
psiquiatra, foi o fundador do maior complexo psiquiátrico da América Latina, conside-
rado o principal polo difusor dos estudos sobre as “degenerescências”. Sua produção
científica marcou fortemente a organização do conhecimento sobre a loucura e também
o conjunto de procedimentos à época considerados os mais eficazes para seu tratamento.
Erigindo-se como liderança intelectual e política, Franco da Rocha atraiu e
agregou, nos quadros funcionais do Juquery, cientistas brasileiros e europeus alinhados
às suas correntes teóricas, alimentando uma potente rede de sociabilidade e geração de
conhecimento. Mas, essa rede de sujeitos segue pouco visível, sofrendo uma espécie de
apagamento.
Foi somente no meu recente percurso como arte-educadora que me deparei com
a potência e o impacto da produção de um desses personagens invisibilizados: Osório

12
Cesar1. Em 2012, ao participar como apoio operacional na exposição Lygia Clark – uma
retrospectiva no Itaú Cultural, durante uma conversa despretensiosa sobre questões da
arteterapia e seus precursores; Claudia Teles, educadora da exposição – com a genero-
sidade que lhe é peculiar – me chamou a atenção sobre a necessidade dos devidos cré-
ditos acerca do pioneirismo de Cesar nos estudos e pesquisas sobre as conexões entre a
arte e loucura no Brasil. Essa descoberta não foi trivial: assim como parcela considerável
dos indivíduos que transitam pelo campo da arte e saúde mental, eu também atribuía o
pioneirismo acerca dos estudos sobre arte e loucura no Brasil à médica alagoana Nise
da Silveira.
As referências e as pesquisas sobre a produção de Osório Thaumaturgo Cesar
são bastante restritas. Tal ausência nos estudos e narrativas sobre a história intelectual e
a história da ciência me conduziram a formular a hipótese de que, em certa medida, a
importância do Hospital do Juquery, como o principal espaço de produção científica e
cultural e a rede de sujeitos que, sob a liderança de Franco da Rocha, engajaram-se em
investimentos intelectuais, durante a primeira metade do século XX, permanecem re-
côndita.
O levantamento de artigos, teses e dissertações que fazem referência a Osório
Cesar e que estão depositadas nos acervos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes-
soal do Ensino Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientí-
fico e Tecnológico (CNPq), indicou a existência de 21 produções textuais, em forma de
artigos, dissertações e teses.
A principal narrativa historiográfica sobre o impacto da produção científica-
intelectual de Osório Cesar surgiu no final dos anos 1980, quando a professora Maria
Heloisa Ferraz inseriu uma nota biográfica no rodapé no capítulo 4 da sua tese de dou-
torado. O capítulo, intitulado Recuperação da Escola Livre: Museu Osório Cesar – Ate-
liê de trazia o subitem Organização do Museu, no qual relata a inauguração deste na
cidade de Franco da Rocha (FERRAZ, 1989, p.177). A tese foi versada em livro e pu-
blicada na década seguinte com o título: Arte e loucura: limites do imprevisível2.
Ferraz (1989) assinalou em seu resumo que sua pesquisa nascera da “necessi-
dade de recuperar o material icnográfico da Escola Livre de Artes Plásticas do Juquery,
assim como caracterizar sua história, seu desenvolvimento e influências nas áreas

1
Anexo A.
2
Ver Ferraz, 1998.
13
cientifica e cultural”. A pesquisadora localizou, em sua pesquisa, que as discussões da
Semana de 333 teriam potencializado o surgimento de cursos relacionados às conexões
entre arte e loucura e que “a instalação dos cursos foi divulgada pelos jornais Folha da
Manhã, O Dia, Correio Paulistano e O Estado de S.Paulo, demonstrando que a matéria
era de grande interesse para a época. Os recortes com tais informações encontram-se no
Museu Osório Cesar” (p. 46-47).
Por seu turno, Camargos (2001) identificou, em sua investigação sobre as es-
truturas e redes de sociabilidade intelectual na São Paulo do início do século XX, que a
presença de Cesar no território paulistano é notada na segunda metade dos anos de 1910,
nos encontros artísticos-literários organizados pelo senador Freitas Valle4 na Villa Kyri-
all – conhecido reduto de intelectuais, artistas e políticos da Belle Époque paulistana –
contratado como violonista para entreter os convidados das reuniões do mecenato.
A investigação de Andriolo (2003) concluiu que Cesar foi o pioneiro na siste-
matização dos estudos e pesquisas sobre as conexões entre arte e loucura no Brasil,
também conhecida como a expressão artística dos alienados ou arte do inconsciente.
Revelou, também, que seu ingresso nesse campo das ciências médicas não teria se ini-
ciado na psiquiatria. O mapeamento da produção textual do autor, empreendido por An-
driolo, revelou que seus primeiros escritos, ainda como estudante da Universidade Livre
de São Paulo, teriam sido dois ensaios clínicos sobre Odontologia5.
Por sua vez, Amin (2009) em sua dissertação O “Mês das Crianças e dos Lou-
cos”: reconstituição da exposição paulista de 1933, recompôs o cenário e os embates
que permearam as conferências organizadas e promovidas por Flavio de Carvalho e
Osório Cesar no Clube dos Artistas Modernos (CAM). A pesquisadora concluiu que o
evento significou “um marco em termos do encontro entre as áreas de arte, educação e
psicologia e teve desdobramentos culturais significativos na cidade de São Paulo na
década de 1930” (p. 8).
No campo da História da Arte, Carvalho (2016), em sua tese, A formação do
pensamento estético de Osório Cesar: estudos dos textos sobre arte, cultura escritos no
período de 1920 a 1950, analisou “um conjunto de aproximadamente 400 crônicas de

3
A Semana de 33, refere-se ao evento promovido por Flavio de Carvalho e Osório Cesar no Clube dos
Artistas Modernos (CAM), denominado “Mês das Crianças e dos Loucos”, realizado entre 26 de
agosto a 28 de outubro de 1933. O tema será retomado no capítulo adiante.
4
Ver: Freitas Valle. Disponível em: <//enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa467510/freitas-valle>.
Acesso em 20 de agosto de 2017.
5
Anexo B.
14
livros e artigos publicados em periódicos entre as décadas de 1940 e 1950” (p. 8), das
quais intencionava compreender quais foram as bases do pensamento intelectual de Osó-
rio Cesar sobretudo, no campo das artes plásticas.
Provocada pela leitura e análise dessas investigações, busquei localizar em pe-
riódicos do primeiro quartel do século XX alguns outros traços da presença intelectual
de Osório Cesar que pudessem confirmar sua interação com outros intelectuais.
A título de exemplo, localizei o folhetim intitulado Doutrinas Biológicas
(1919), no qual o autor desenvolve um estudo celular, “o átomo da vida” com prefácio
de Ulysses Paranhos, o livro é dedicado ao argentino José Ingenieros, conceituado pelo
autor como “o maior filósofo da América do Sul”.
No mesmo período, a revista A Cigarra em sua seção destinada a compartilhar
as novidades literárias, avaliava assim o livro:

Não encarece, porém, somente o livro de Osório Cesar a severidade


dos problemas que lhe tentaram o espírito, mas também esse cuidado
de forma que nele já distingue do cientista próximo o escritor que será
um dia, conciso e claro, despido de retórica e de pretensões literárias
(A Cigarra, ano VI, edição 124, p. 39, 1919).

Três anos antes, o escriba da seção Bibliografia do Correio Paulistano (SP)


avaliava Cesar como um dos destaques “das novas plêiades de intelectuais” e assevera
que:

E si parece ter qualquer coisa de didático, que lembra preleções aca-


dêmicas, isso em nada a desabona, antes, quem a lê, convence-se, de
logo, que está diante de um intelectual talentoso, que conhece a maté-
ria a que se dedica – e que, portanto, possui em si, verdadeiramente o
gérmen de um futuro pensador no qual, como prevê o dr. Ulysses Pa-
ranhos, que lhe prefacia a obra “o filósofo e o biologista se unirão para
enriquecer a literatura brasileira com dádivas, duradouras e preciosas”
(Correio Paulistano, edição 20234, 1/11/1916, p. 4).

O esforço analítico empreendido até agora em torno de Osório Cesar e de sua


produção intelectual tem se dedicado, de forma mais explícita e intencional, à sua atua-
ção como agente do mundo das artes. À exceção do trabalho empreendido por Arley
Andriolo, em seu doutorado no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo,
restam pouco exploradas as outras formas de agência intelectual de Cesar, bem como
abordagens que o localizem como parte integrante de uma rede de intelectuais. Da
mesma maneira, seguem pouco analisadas as eventuais incursões de Osório Cesar no
campo da produção e circulação de ideias sobre educação e desenvolvimento humano.

15
Por assim acreditar, me engajei, no início de 2013, na construção de um projeto
de intervenção educativa e cultural em torno da revisitação do território do Juquery, o
projeto #OcupaJuca. À época, o Partido dos Trabalhadores havia assumido o executivo
municipal e pude apresentar o projeto ao Secretário Municipal Adjunto de Educação,
Alexsandro do Nascimento Santos. Naquela oportunidade, iniciamos com um conjunto
de rodas de conversas com educadores da rede municipal sobre o território do Juquery
e sobre sua importância educativa e cultural para a cidade. Essa ação respondia a uma
das metas estabelecidas no Plano de Governo que versava sobre a recuperação e pre-
servação da memória como estratégia para requalificar e ressignificar a relação da co-
munidade sobre a identidade, memória e sentido de pertencimento com a cidade de
Franco da Rocha a partir dessas intervenções.
O escopo do projeto avançou a partir de uma parceria formalizada entre a Se-
cretariais Municipais de Educação, Adjunta de Cultura e Relações Institucionais e me
permitiu idealizar e realizar em 2013, o #OcupaJuca, a celebração dos 80 anos do “Mês
dos Loucos e das Crianças”, que tinha como proposta a realização de encontros de for-
mação para educadores de artes da rede municipal com a ampliação de repertório acerca
da importância histórica das Semanas de 33, a apresentação do papel do precursor dos
estudos sobre as conexões entre arte e loucura no Brasil e a proposição de reflexões
sobre os processos criativos em arte-educação, empreendidos pelos educadores da rede
municipal da educação.
O #OcupaJuca foi idealizado com base na primeira referência bibliográfica
consultada, a qual indicava a denominação do evento como a “Semana dos Loucos e das
Crianças” (ANDRIOLO, 2003, p. 2). Nesse sentido, a escolha foi a de manter a deno-
minação da Semana de 33 como uma metáfora/alusão ao movimento modernista. Com
o propósito de recriar parte da atmosfera do Mês dos Loucos e das Crianças, realizamos
três encontros6 – entre agosto e outubro – nos quais, pesquisadores, educadores e artistas
compartilharam seus estudos e experiências com base nas análises da obra de Osório
Cesar, da Escola Livre de Artes Plásticas (ELAP) e de produções artísticas produzidas
no Juquery. Essas atividades, configuraram-se como uma ocupação simbólica daquele
território que há mais de um século dá os contornos da memória afetiva de centenas de
indivíduos, tanto para o bem, quanto para o mal.

6
Anexo C.
16
Desde criação do Asilo de Alienados do Juquery, é muito comum relacionar o
território à insanidade, logo os indivíduos nascidos na cidade são automaticamente as-
sociados à loucura, ou seja, a principal representação do imaginário coletivo é de que
todo franco-rochense seja louco, assim como todo brasileiro seja – supostamente – exí-
mio jogador de futebol ou sambista. Reis (2009), observa que o impacto da imagem
negativa relacionada ao Hospital do Juquery, mobilizou políticos na década de 1970 na
criação do cognome ‘Ciência e Ternura’ por meio de instrumento legal (Lei Municipal)
como estratégia de promoção para ‘melhorar o nome da cidade’ de Franco da Rocha.
Nesse contexto e subsidiado por notícias veiculadas em periódicos de circulação regio-
nal, o autor supõe que o “slogan foi criado para suplantar uma imagem negativa da ci-
dade, vinculada principalmente às questões do Hospital” (2009, p. 6).
Esse aspecto é ratificado por Fraletti (1986), assegurando que o processo de
decadência administrativa e assistencial do Juquery, iniciado a partir da Ditadura do
Estado Novo, se intensificou no início dos anos de 1970, quando as sucessivas denúncias
relacionadas às irregularidades médico-administrativas, maus-tratos e superlotações de-
sencadearam “as iras da imprensa, o protesto de deputados, e a devassa contra os Go-
vernos que vêm se sucedendo de 1938 para cá” (1986, p. 168-171).
A produção historiográfica sobre a memória do Hospital do Juquery está cen-
trada, sobretudo, em torno do fundador do Asilo de Alienados do Juquery, nesse sentido,
Reis (2009) afirma que:

Esta memória que centraliza a figura do doutor Francisco Franco da


Rocha e do Hospital do Juquery, seleciona os lugares e acontecimen-
tos que devem ser lembrados como experiência da cidade, anulando
as relações de poder e as desigualdades que compõem o próprio social
para homogeneizar esse passado como mito (2009, p. 7).

A memória seletiva apontada por Reis (2009) é corroborada pelas avaliações


realizadas no final de cada encontro da celebração dos 80 anos da Semana de 33; cerca
de 90% dos participantes – média de 30-40 educadores – manifestavam grande surpresa
com a riqueza histórica que a cidade carrega em suas camadas, especialmente no campo
de estudos acerca da arte-educação.
Naquele momento foi constatado que, apesar de todas as contradições históri-
cas que permeiam o surgimento e desenvolvimento da cidade de Franco da Rocha, du-
rante o #OcupaJuca havíamos atingido os objetivos da ação, que eram: requalificar e
ressignificar a identidade social e sentido de pertencimento da comunidade sobre aquele

17
território de expressiva importância histórica para o campo da arte-educação e saúde
mental brasileira.
Em 2014, durante o planejamento da formação da equipe técnica do Programa
Mais Educação7 da rede de ensino municipal de Franco da Rocha, motivados pelo le-
gado artístico, científico e cultural deixado por Osório Cesar, o #OcupaJuca foi incor-
porado ao programa, estendido posteriormente aos beneficiários (alunos do 5º ano do
Ensino Fundamental)8 do programa Mais Educação e também aos integrantes do núcleo
de Educadores da Pinacoteca do Estado de São Paulo.
No âmbito das relações institucionais da gestão pública municipal, a inovação
da proposta foi a articulação e formalização da parceria entre as secretarias municipais
de Educação e Governo com parte da equipe do Núcleo de Ação Educativa da Pinaco-
teca do Estado de São Paulo9 − outro importante equipamento público projetado pelo
arquiteto Ramos de Azevedo − que pela primeira vez planejou e programou visitas edu-
cativas alinhadas com os contextos históricos que envolviam o público-alvo. Essas
ações permitiram o acesso dos integrantes da equipe técnica do programa Mais Educa-
ção e aproximadamente 1500 alunos beneficiários da rede municipal de ensino de
Franco da Rocha às visitas mediadas no conjunto central do Complexo Hospitalar do
Juquery, na Pinacoteca e Estação Pinacoteca.
A minha contribuição sistemática em uma série de ações no processo de recu-
peração e memória da cidade de Franco da Rocha, sobretudo o movimento de formação
do campo da arte-educação empreendidas por Osório Cesar no Hospital do Juquery,
previstas no #OcupaJuca foram consolidadas entre 2016-201810 e estão registradas nos
projetos: 1) revitalização de uma das edificações desativadas do conjunto arquitetônico
tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico Arqueológico, Artístico e
Turístico (Condephaat), atual Centro de Vivência em Múltiplas Linguagens Raimunda
Assunção dos Santos (2016), um espaço de diversão, cultura e lazer, destinado aos

7
O Programa Mais Educação foi criado como estratégia do Ministério da Educação para indução da
construção da agenda de educação integral nas redes estaduais e municipais de ensino. Preconizava a
ampliação da jornada escolar nas escolas públicas, para no mínimo 7 horas diárias, por meio de ativi-
dades optativas nos macrocampos: acompanhamento pedagógico; educação ambiental; esporte e la-
zer; direitos humanos em educação; cultura e artes; cultura digital; promoção da saúde; comunicação
e uso de mídias; investigação no campo das ciências da natureza e educação econômica. Disponível
em: <//portal.mec.gov.br/par/195-secretarias-112877938/seb-educacao-basica-2007048997/16689-
saiba-mais-programa-mais-educacao >. Acesso em 30 de setembro de 2017.
8
Anexo D.
9
Anexo E.
10
Anexo F.
18
alunos atendidos pela rede municipal de ensino; 2) formações Osório Cesar e suas pro-
duções no Juquery e De Juquery a Franco da Rocha: cartografias afetivas (2017) e, 3)
elaboração da Nota Técnica nº 1  Juquery: educação, memória e território (2018), pro-
cesso nº 6559/2018-1, no qual, apresento um conjunto de componentes para a elabora-
ção do plano de trabalho para as ações de conservação, preservação e recuperação da
memória do Juquery.
Se a relação de negação/sofrimento da cidade com o território do Hospital do
Juquery e a carência de estudos e reflexões sobre a produção de Osório Cesar são duas
preocupações que me movem há bastante tempo, resta explicitar por qual razão decidi
buscar minha formação como pesquisadora de educação e investir numa pesquisa de
mestrado na área da história da educação.
Acompanhei, durante os anos de 2013, 2014 e 2015, a construção da pesquisa
de doutorado de Santos (2015), que versou sobre as origens da Faculdade de Educação
da Universidade de São Paulo (USP), tendo como eixo metodológico a chamada Histó-
ria dos Intelectuais da Educação. Parte dos esforços do Grupo de Pesquisa Intelectuais
da educação Brasileira: formação, ideias e ações, o trabalho do pesquisador me fez per-
ceber que a categoria de ‘intelectual’ e, sobretudo, ‘intelectual da educação’, parecia ser
explicativa de uma parte importante do trabalho de Osório Cesar. Uma das leituras que
Santos sugeriu que eu fizesse para confirmar essa minha percepção, corroborada mais
tarde durante as disciplinas cursadas, bem como nas discussões como um dos referenci-
ais teóricos debatidos no grupo de pesquisa foram os textos de Jean-François Sirinelli.
De acordo com Sirinelli (2003):

Antes de mais nada, os intelectuais constituem um grupo social de


contornos vagos que durante muito tempo foi pouco significativo em
termos de tamanho. Esse “pequeno mundo estreito” aparentemente
desencorajava qualquer abordagem quantitativa, e por conseguinte
seu observador se expunha, aos olhos de seus eventuais detratores, à
acusação de impressionismo, pouco propícia a um estudo científico
sereno, num setor que requer exatamente um dose extra de serenidade
(2003, p. 234).

A medida que esquadrinhava as produções textuais cotejadas com as análises


produzidas por Ferraz (1989), Amin (2009) e Carvalho (2016) fui tomada pela inquie-
tação; surgiram alguns questionamentos: por que a produção textual de Osório Cesar
não é reconhecida como referência no campo nos processos de ensino e aprendizagem
da arte-educação? Os estudos produzidos pelo pensador no campo da arte e loucura

19
tiveram papel essencial na consolidação do pensamento estético no campo da história
da arte e da psicologia? Nesse sentido, inferi que era possível compreender Osório Cesar
como um intelectual. Entretanto, seria ele um intelectual da educação?
Embora as narrativas produzidas por Andriolo (2003), Dalgalarrondo et al
(2007), Kawall (1979) e Fabris (1981) não estejam no conjunto de referências biblio-
gráficas analisadas, consideramos essencial incluí-las, uma vez que nos permitem deli-
near parte da produção textual do pensador, bem como dimensionar o impacto de suas
ações no conjunto da obra.
No processo de constituição da Educação como objeto epistêmico, Magalhães
(2016) assinala três categorias de intelectuais: os “produtores de grandes textos”, que
são os influenciadores e criadores de movimentos; os “grandes intelectuais”, que escri-
turam as convenções acerca das rupturas e as inovações ao longo da história; os intelec-
tuais “cultivadores e organizadores”, que materializam a ideia programada; e os inte-
lectuais divulgadores, que “recriam e prolongam para além do tempo”, coexistem com
a reprodução, a ilustração, do mesmo modo que promovem/fomentam a conformação
das ideias em virtude da reestruturação de práticas, registro, protocolos, planos e produ-
tos (2006, p. 305).
O investimento empreendido na busca e compilação da produção textual de
Osório Cesar parecia indicar que sim, ele era um intelectual da educação, especialmente
em ações de cultivo/organização de materiais e referências de fontes diversificadas, na
produção de grandes textos autorais, assim como na divulgação e disseminação de gran-
des textos produzidos por outros autores. Contudo, era essencial interpretar se: 1) A
massa documental inventariada tratava de fato da produção de um intelectual? 2) A pro-
dução textual analisada abordava necessariamente temáticas relacionadas ao campo da
educação? Nesse sentido, a análise buscou inventariar os textos esparsos com o intuito
de constatar a probabilidade de interpretá-lo ou não como um intelectual da educação à
luz das proposições de Justino Magalhães.
Assim, para ampliar a lente sobre a memória de Cesar e, sobretudo, argumentar
sobre a necessidade de deslocá-lo da marginalidade a um lugar de destaque no campo
intelectual como personagem na História dos Intelectuais, recorro à definição concebida
por Sirinelli (1996):

Por esta última razão, é preciso, a nosso ver, defender uma definição
de geometria variável, mas baseada em invariantes. Estas podem de-
sembocar em duas acepções do intelectual, uma ampla e sociocultural,

20
englobando os criadores e ‘mediadores’ culturais, a outra mais res-
trita, baseada na noção de engajamento. No primeiro caso estão abran-
gidos tanto o jornalista como o escritor, o professor secundário como
o erudito. Nos degraus que levam a esse primeiro conjunto postam-se
uma parte dos estudantes, criadores ou ‘mediadores culturais’ em po-
tencial, e ainda outras categorias de ‘receptores’ em potencial, e ainda
outras categorias de ‘receptores de cultura’. (…) Estes últimos podem
ser reunidos em torno de uma segunda definição, mais estreita e base-
ada na noção de engajamento na vida da cidade como ator – mas se-
gundo modalidades diferentes, como por exemplo, a assinatura de ma-
nifestos (1996, p. 242-243).

O amplo volume de fontes – primárias e secundárias – se constituiu em um


obstáculo bastante expressivo. A organização do conjunto documental inventariado foi
acompanhada da “síndrome do mineiro” assinalada por SIRINELLI (1996, p. 244) e se
fez presente durante em boa parte do processo de investigação e classificação.
O conjunto documental inventariado permitiu verificar que, Osório Cesar tran-
sitou pelas principais arenas de disputas dos debates sobre as transformações das políti-
cas públicas no Brasil, suas redes de sociabilidades nacionais e internacionais, seu en-
gajamento político legitimado pela sua produção intelectual como articulista com publi-
cações diárias em diversos veículos de imprensa e sua extensa produção textual no
campo das ciências médicas, da política e da sociologia apontam alguns caminhos da
investigação.
Nesse sentido, ao evocar na memória a genealogia de Osório Cesar, considero
imprescindível redesenhar o legado geracional, cotejados com os atravessamentos da
história dos intelectuais da Primeira República, a circulação de ideias entre os pares,
suas trajetórias cruzadas, as convergências nas redes de sociabilidades da Paulicéia Des-
vairada e as narrativas enviesadas em torno do personagem.
Com o intuito de compreender a agência de Cesar no campo da educação e
considerando o volume da produção do pensador, a análise se desdobrou em duas fren-
tes: a primeira concentrou-se no fichamento de um conjunto de quatro obras seleciona-
das, a saber: A arte primitiva nos alienados: manifestação escultórica com caráter sim-
bólico feiticista num caso de síndrome paranoide (1925); A expressão artística nos ali-
enados: contribuição para o estudo dos símbolos na arte (1929); A alfabetização das
crianças anormais. Revista da Educação – Ecos da III Conferência Nacional da Edu-
cação (1929) e A arte nos loucos e vanguardistas (1934), abordadas no capítulo dois do
presente estudo. A segunda, concentrou-se na análise da produção textual e nas ações

21
empreendidas pelo pensador a partir da segunda metade da década de 1930, apresentada
no capítulo três.
Na estruturação do corpus epistemológico da pesquisa, a memória oficial re-
correntemente difundida nas bibliografias de referência não respondia às indagações
suscitadas. Assim, para a compreensão do conjunto da primeira chave interpretativa, a
análise foi pautada pelos conceitos propostos por Sirinelli (1996) sobre as noções de
itinerário, geração e sociabilidade (1996, p. 245).
A escolha foi imprescindível para compreender a circulação de Cesar e o seu
acolhimento nas estruturas de sociabilidades paulistanas nas primeiras décadas do sé-
culo XX; observou-se que era imperativo mapear seu percurso desde a Paraíba do Norte
(atual João Pessoa) até São Paulo, bem como interpretar como o pensador estabeleceu
as conexões com as suas redes, sobretudo identificar como estas redes de relações foram
solidificadas. Para o itinerário estabelecemos a estruturação da cartografia sobre a am-
biência intelectual do pensador com destaque para os eixos de seu engajamento: ciência,
arte, educação e política.
Foi movida por essas inquietações, e ancorada nessa hipótese em torno da pro-
dução textual e da ação de Osório Cesar, que decidi me inscrever na seleção do Pro-
grama de Estudos Pós-Graduados em Educação: História, Política, Sociedade. Apro-
vada, sob a orientação do professor Daniel Ferraz Chiozzini, passei a disciplinar e orga-
nizar o meu trabalho de pesquisa – antes, intuitivo – de forma a compreender melhor os
contornos da experiência de Osório Cesar como intelectual.

I – O recorte temporal, as fontes de pesquisa e a singularidade do sujeito

O recorte temporal da pesquisa se inicia na década de 1920, quando Cesar pas-


sou a integrar a equipe médica do Hospital de Alienados do Juquery, como primeiro
praticante, o que corresponderia, no tempo presente, à residência médica. Foi nesse ce-
nário, pautado pelos ideais da supremacia moral e racial – permeado por aproximações-
distanciamentos – que o jovem paraibano iniciou sua carreira como médico anatomopa-
tologista11.
Nos anos iniciais como médico-residente do Juquery, Cesar organizou a oficina
de Artes Plásticas com a proposta de recuperar e reintegrar sujeitos com transtornos
mentais. Inspirado nas obras Bildnerei der Geisteskranken (Expressões da Loucura), do

11
Anexo G.
22
historiador da arte e médico alemão Hans Prinzhorn e La art et folie (Arte e Loucura),
do psiquiatra Jean Vinchon, Osório instigava as aptidões artísticas dos internos (CE-
SAR, 1929). Nessa seara e impulsionado pelas teorias psicológicas e estéticas de pen-
sadores da época, o médico iniciou estudos para ampliação de seu repertório acerca da
arte dos alienados, a partir das observações dos desenhos dos internos do Juquery. Suas
ações eram norteadas pela visão dos principais estudiosos, que defendiam o trabalho
livre dos internos na escolha dos temas, técnicas, materiais e com o mínimo de interfe-
rência do orientador.
Dalgalarrondo et al (2007) observa que, o período de maior efervescência na
produção textual no campo das ciências médicas editadas por Cesar foi o decênio de
1920. O conjunto documental inventariado revela seis obras, das quais duas foram pu-
blicadas em parceria: uma com o médico e deputado federal J. Penido Monteiro, na qual
escreveu um estudo do simbolismo místico nos alienados, e outra, em forma de artigo
intitulado sobre dois casos de estereotipia gráfica com simbolismo sexual, produzido
com o médico Durval Marcondes. Outra obra que merece destaque na produção cientí-
fica de Cesar é A expressão artística nos alienados: contribuição para o estudo dos
símbolos na arte com prefácio de Motta Filho (1929).
Se essa é a face mais conhecida do trabalho de Osório Cesar, é imprescindível
que as outras dimensões de sua vida e de sua ação intelectual não sejam secundadas e
que, no esforço analítico da pesquisa histórica, estejamos atentos ao entrecruzamento
das distintas e complementares formas de engajamento de Cesar na esfera pública.
Em sua última entrevista, concedida ao jornalista Luis Ernesto Kawall e publi-
cada no caderno Ilustrada, da Folha de S.Paulo, com o título: Osório Cesar, 83 anos, o
pioneiro esquecido, Cesar nos revela o seu descontentamento com aquilo que qualificara
como esquecimento de suas realizações para além do campo da medicina:

[...] Vivo de aposentado como médico do Juquery, como escritor, não,


não me deram por causa das prisões ... Leio arte e filosofia, mexo nas
minhas coisas, nos meus escritos, continuo marxista ... Raciocínio
pior agora, e tenho alguma dificuldade para ler, mas, acho, também já
cumpri a minha missão cá na terra (KAWALL, Caderno Ilustrada,
Folha de S. Paulo, 12/8/1979, p. 60).

Buscando deslocar Osório Cesar para além da posição de ‘médico do Juquery’


e como pesquisador das ciências médicas, localizei ao menos três outros engajamentos
deste intelectual na primeira metade do século XX: sua participação na rede de interlo-
cutores que atuou na conformação da psicologia e da psicanálise brasileiras (e de suas
23
conexões com a proposição de uma pedagogia científica) e que são apontadas como
parte fundante do arcabouço da arteterapia, seu engajamento na sistematização e divul-
gação das transformações vividas com o regime soviético e das ideias políticas sob ori-
entação do marxismo e sua produção reflexiva sobre o campo da educação das crianças
com deficiência intelectual.
Antecipando parte das análises que serão empreendidas nos capítulos adiante,
importa sinalizar inicialmente alguns contornos desses distintos investimentos intelec-
tuais. Embora as correspondências ativas e passivas não estivessem contempladas no
escopo do projeto como objeto de análise da investigação por demandarem metodologia
de análise especifica de seus conteúdos, consideramos pertinente mencionar alguma de-
las com o intuito de dimensionar as redes de sociabilidades. Malatian (2001) afirma que
“[...] A correspondência comporta trocas de ideias, elaboração de projetos, sela pactos,
expõe polêmicas, fixa-se rupturas. Pode-se detectar por meio delas as intricadas redes
de relações sociais que reúnem seus autores” (p. 208).
Durval Marcondes e Osório Cesar são reconhecidos pelos pesquisadores do
campo como dois dos principais interlocutores do pai da psicanálise. Marcondes rece-
beu quatro cartas, enquanto Osório Cesar teria recebido três missivas. É importante sub-
linhar que a troca epistolar empreendida entre esses intelectuais foi permeada por sinais
de reconhecimento e de partilha da produção que vinham realizando no período. O in-
teresse e engajamento de Cesar acerca desse tema também se revela por sua participação
na criação da Sociedade Brasileira de Psicanálise (SBPSP): seções de São Paulo e Rio
de Janeiro.
A primeira troca correspondências entre Sigmund Freud e Osório Cesar (1927)
é confirmada na publicação dedicada à obra de S. Freud, editada pela Revista Brasileira
de Psicanálise o intercâmbio de ideias é corroborado na seção Freud e seus interlocu-
tores brasileiros. Em 10 de janeiro daquele ano, o criador da teoria psicanalítica expres-
sava sua gratidão pelo interesse dos intelectuais brasileiros na fundamentação de seus
estudos acerca dos mecanismos psíquicos, pautados em suas teorias, sobretudo pelo em-
penho na difusão de suas ideias. Dez meses depois, Freud envia a segunda mensagem a
Osório Cesar – 20 de novembro de 1927 – em que assinala o recebimento do manuscrito
e comunica o envio do manuscrito para a revista Imago (SBPSP, 2006, p. 15).
Ao observar a estratégia adotada por Freud para a circulação de suas ideias,
acerca das tramas das relações humanas, nota-se que o pensador manteve intensas

24
interações com seus mestres, discípulos e pensadores por meio da troca de correspon-
dências ativas e potentes. O artigo enfatiza que para além do exercício de polidez, a
revelação sobre o expediente de que o nobre remetente respondia a todos os que lhe
escreviam era sobretudo, parte do plano para ampla divulgação de sua obra (SBPSP,
2006). Esse recurso pode ser certificado pelo volume de mensagens produzidas12 ao
longo da sua produção intelectual, na qual, constata-se que o pensador empreendeu vi-
goroso esforço na articulação internacional para a propagação e consolidação do movi-
mento psicanalítico no mundo.
No Brasil, a difusão de suas ideias, reverbera entre um de seus principais dis-
cípulos brasileiros. Osório Cesar adquire as principais bibliografias internacionais, que
representava o que havia de mais moderno e avançado para a época. É a partir desse
momento que passa a notabilizar-se no meio intelectual paulista como estudioso da Psi-
canálise, ainda que não se tenha localizado registros da sua certificação como psicana-
lista. A importância de sua contribuição nos estudos evidencia-se pela sua participação
ativa na criação das Sociedade Brasileira de Psicanalise de São Paulo e da seção do Rio
de Janeiro. Moretzsohn (2015) assinala o empenho de médicos brasileiros na difusão da
Psicanálise no Brasil e é nesse contexto que Durval Marcondes reúne, no salão nobre
do Liceu Nacional Rio Branco – atual Colégio Rio Branco –, nomes bastante expressi-
vos em várias áreas da cultura para debater e fundar a Sociedade Brasileira de Psicaná-
lise de São Paulo (SBPSP), a primeira da América Latina, com ata de fundação lavrada
no dia 24 de novembro de 1927 (p. 242).
A fundação da SBPSP teve apoio de escritores, jornalistas, artistas plásticos,
médicos e professores, os quais, pautados por referências bastante distintas entre si, in-
tencionavam desvendar novos caracteres para a compreensão da realidade social. Os
participantes que aderiram às discussões foram: Antonio de Sampaio Dória, político,
jurista, educador; Antônio Ferreira de Almeida Junior, médico, advogado, educador;
Antônio Paim Vieira, médico, artista plástico; Antônio Roldão Lopes de Barros, advo-
gado, educador; Cândido Motta Filho, advogado, jornalista e juiz de paz; César Marti-
nez, neurologista; Durval Marcondes, psiquiatra; F. Marcondes Vieira, psiquiatra;

12
A Divisão de Manuscritos da Biblioteca do Congresso em Washington, depositária do acervo de Sig-
mund Freud – constituído entre 1856-1939 – indica que a massa documental contém cerca de 48.600
itens, entre anotações, correspondências, diários, entrevistas, ensaios clínicos, registros militares entre
outros, classificados por nome do destinatário ou organização, produzidos em alemão, inglês e francês.
Disponível em: <lcweb2.loc.gov/service/mss/eadxmlmss/eadpdfmss/2004/ms004017.pdf>. Acesso
em 10 de janeiro de 2017.
25
Fausto Guerner, neurologista; Flamínio Fávero, médico legista; Francisco Franco da
Rocha, psiquiatra; Getúlio de Paula Santos, clínico geral; James Ferraz Alvim, psiquia-
tra; José Lopez Ferraz, político; Lourenço Filho, educador; Maurício Pereira Lima, clí-
nico geral; Menotti Del Picchia, escritor; Nestor Solano Pereira, leprologista; Osório
César, psiquiatra; Pedro de Alcântara Marcondes Machado, pediatra; Raul Briquet, obs-
tetra; Samuel L. Ribeiro, médico sanitarista; Thomé Alvarenga, neurologista; Wladimir
Ferraz Kehl, inspetor médico escolar (2015, p. 242).
Na terceira e última carta enviada por Freud a Osório Cesar, datada de 7 de
fevereiro de 1928, o pensador reafirma seu contentamento sobre o crescente interesse
pelas suas teorias no Brasil e, em contraponto com as duas anteriores, adota um tom
informal na despedida: “Com toda minha simpatia, Freud”. O artigo destaca ainda os
médicos Arthur Ramos, Júlio Pires Porto Carrero e Gastão Pereira da Silva como os
primeiros discípulos de Freud no Brasil, logo, considerados os pioneiros na divulgação
de seus pensamentos (SBPSP, 2006). A articulação e militância sobre as doutrinas de
Freud arregimenta novos partidários, o engajamento de pensadores cariocas é anunciado
em uma nota do Diário Nacional, no qual os discípulos do pai da psicanálise apontam
as novas diretrizes:

Realizou-se, no dia 17 do corrente, no gabinete de psicanálise do Hos-


pital Nacional de Psicopatas, no Rio de Janeiro, uma reunião presidida
pelo prof. Juliano Moreira, em que se tratou da unificação do movi-
mento psicanalítico brasileiro, pela formação, em outros centros de
cultura do Brasil, de núcleos filiados à Sociedade Brasileira, fundada
o ano passado, em São Paulo, com o fim de coordenar e orientar os
estudos freudianos entre nós.
Compareceram, além do seu ilustre presidente, os srs. Dr. Murilo de
Campos, dr. Carneiro Ayrosa, prof. Deodato de Moraes, dr. Porto Car-
reiro, dr. Osório Cesar e dr. Durval Marcondes, esses dois últimos de
São Paulo. [...] (Diário Nacional, edição 298, 27/6/1928, p. 5)

Quanto ao seu engajamento político e sua ação sistematizadora e divulgadora


da experiência soviética e do Marxismo, as evidências mais significativas que encontrei
datam das décadas de 1930, 1940 e 1950.
Durante a década de 1930, na militância política, seu interesse pelo marxismo
é evidenciado, sobretudo em dois de seus livros publicados após o retorno de sua viagem
à Rússia: o primeiro, intitulado, Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS
(1932), prefaciado em francês por Henri Barbusse, escritor, ex-diretor do Le Monde e
ilustrado por Tarsila do Amaral e o segundo, intitulado, Que é o estado proletário?
(1933). Esse último com capa ilustrada pelo artista Flávio de Carvalho, propõe reflexões
26
sobre a vida do operário na Rússia soviética, seguido de um estudo sobre seguro social
operário.
O pensador reafirma sua militância política quando publica A vida do operário
na União Soviética (1935), seu livro, Misticismo e loucura: contribuição para o estudo
das loucuras religiosas no Brasil (1939), foi premiado pela Academia Nacional de Me-
dicina em 1948 (Jornal do Comércio, 2/7/1948, p. 4).
O interesse de Cesar pelo sistema governamental soviético é ratificado na pu-
blicação de A medicina na União soviética: sobre o efeito terapêutico do Soro citotóxico
anti-reticular (1945). Na segunda metade dessa mesma década edita a obra sobre os
Aspectos da vida social entre os loucos (1946) e Simbolismo místico nos alienados: um
caso de misticismo gráfico num esquizofrênico paranoide (1949).
A oposição à hegemonia burguesa é confirmada em diversos artigos de Cesar,
publicados no Grupo Folha e no Estado de S.Paulo nas décadas de 1930 e 1940, no qual
exalta o sistema político soviético e destaca a premente necessidade de organização do
proletariado brasileiro, a exemplo do que acontecia na URSS e, notadamente, na convo-
cação da população para o engajamento das classes operárias na luta antifascismo que
ganhava força no Brasil.
Por fim, no cruzamento entre os interesses e engajamentos políticos e aqueles
mais fortemente conectados com suas pesquisas na psiquiatria, Cesar (1945) destaca, do
seu período de estudos na Europa, a participação no experimento do estudo das funções
psíquicas (reflexos condicionados, incondicionados ou naturais) no Instituto de Medi-
cina Experimental de Leningrado e no XV Congresso Internacional de Fisiologia em
Leningrado-Moscou, presidido por Ivan Pavlov (p. 22). Sua conexão com pensadores
como David Vigosdsky, Henri Barbusse, Romain Rolland e Roy Franklin Barton, pes-
quisador do museu de Antropologia e Etnografia (MAE), é atestada em relatórios e de-
poimentos dos prontuários do Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS-SP) e
notas grafadas em parte da sua produção textual.
Os fragmentos históricos localizados no conjunto documental depositados em
acervos públicos apontam que a sua dedicação aos estudos acerca do sistema operário
soviético e ao marxismo o levaria à prisão política por mais de cinco vezes no governo
de Getúlio Vargas, entre 1930-45.
O conjunto de narrativas historiográficas consultadas evidenciam também a
contribuição de Cesar no campo da Educação (arte-educação e arteterapia). Suas ações

27
para a compreensão das conexões entre arte e loucura são apontadas como referencial
teórico primordial para o estudo do campo tanto nas ciências médicas, como nas ciências
humanas, que ainda repercutem na contemporaneidade.
Amin (2009), assinala que a “Mês dos Loucos e das Crianças”, organizada e
promovida pelo artista Flávio de Carvalho e Osório Cesar no Clube dos Artistas Moder-
nos (CAM)13, entre 28 de agosto a 28 de outubro de 1933, foi a primeira exposição dos
desenhos dos loucos do Juquery e de crianças de escolas de São Paulo14, seguida de uma
série de conferências, nas quais artistas, intelectuais, médicos e pesquisadores debate-
ram acerca das conexões entre arte e loucura com temas como:

1. Estudo comparativo entre a arte de vanguarda e a arte dos aliena-


dos – dr. Osório Cesar em 30 de agosto de 1933.
2. Interpretação de desenhos de crianças – dr. Pedro de Alcântara
Machado em 13 de setembro de 1933;
3. Psicanálises dos desenhos dos psicopatas – dr. Durval Marcon-
des em 19 de setembro de 1933;
4. O louco sob o ponto de vista da psicologia geral – dr. Fausto
Guerner em 26 de setembro de 1933;
5. A arte e a psiquiatria através dos tempos – dr. Pacheco e Silva
em 26 de setembro de 1933;
6. Marcel Proust literariamente e psicanaliticamente – dr. Neves
Manta em 3 de outubro de 1933;
7. O valor negativo da psicopatologia na crítica de arte – dr. Plínio
Balmaceda Cardoso em 17 de outubro de 1933;
8. A música nos alienados – pianista, mestre José Kliass em 17 de
outubro de 1933;
9. Dr. Raul Malta com apresentação sobre tema ligado ao
evento, não citado em nenhuma das fontes, tampouco,
sua data;
10. A noite dos poetas loucos – poemas recitados por Maria Paula
sem referências das datas e horários (2009, p. 78).

A historiadora da arte, Annateresa Fabris (1981), indica, em seu texto Cosmo-


gonias Outras – de apresentação como curadora do pavilhão de Exposição Nacional de
Arte Incomum da XVI Bienal de São Paulo – que a Semana de 33 foi assentada pelos
críticos de arte da época como “um ataque frontal aos métodos e à estética” prescritos
pela Escola Nacional de Belas Artes, além de enfatizar a característica da mostra como
mecanismo de crítica ao “medíocre gosto da classe média, que, centrado em cenas de

13
A fundação do Clube dos Artistas Modernos (CAM) foi liderada por Flávio de Carvalho (1899 - 1973)
que teve o apoio dos artistas Antonio Gomide (1895 – 1967), Carlos Prado (1908 - 1992) e Di Caval-
canti (1897 - 1976) como colaboradores na constituição do CAM.
14
Ver: COUTINHO, Rejane. A coleção de desenhos infantis do Acervo Mário de Andrade. Tese (dou-
torado) da Universidade de São Paulo, Escola de Comunicações e Artes. Universidade de São Paulo,
2002.
28
amor/procriação, repele o ‘anormal’ por colocar em crise seu sistema de valores, por
revelar o que há de mais profundo no homem e na natureza” (1981, p. 19-25).
SOUZA (2005) observa que os estudos sobre os desenhos das crianças tem seu
marco inicial no final da década de XIX, entretanto, o reconhecimento dos valores esté-
ticos da arte infantil com base na autoexpressão encontra ressonância somente a partir
da Semana de 22 no Brasil. Nesse sentido, os modernistas, Anita Malfatti e Mario de
Andrade exercem papel central na valoração estética da arte infantil, assim como para a
introdução de novos métodos de ensino da arte pautados pelo “ensino livre” (p. 89) . No
campo da Educação “intelectuais e educadores empreendem debates e planos de reforma
para a recuperação do ‘atraso’ brasileiro. Destacam-se intelectuais como: Fernando Aze-
vedo, Osório Cesar e Flávio de Carvalho, interessados na produção artística das crianças
[...]” (2005, p.90).
Na gênese do conceito sobre as estéticas e rupturas dos processos criativos em
arte, publica a obra A arte nos loucos e vanguardistas, com prefácio de Neves Manta
(CESAR, 1934). O autor apresenta a estrutura do processo de ensino e aprendizagem
em arte-educação nas oficinas de Artes do Hospital do Juquery, para indivíduos com
sofrimentos/transtornos mentais com “base na autoexpressão” (FERRAZ, 1989, p. 68).
O livro contém a transcrição da Conferência proferida pelo articulista na Semana de 33.
No campo da arte-educação, os anos de 1940 são marcados por parcerias com
artistas, período em que Cesar propôs e analisou as produções artísticas desencadeadas
pelos princípios de plasticidade sonora; impulsionou os processos de ensino e aprendi-
zagem na ELAP; articulou e divulgou as produções dos loucos do Juquery no Brasil e
na Europa. Seus experimentos influenciaram as produções de diversos artistas, entre
eles: Niobe Xandó, Aldo Bonadei, Lasar Segall (este se abrigou um período no Juquery
para uma residência artística, como resultado produziu uma série de desenhos a bico-
de-pena retratando o cotidiano dos internos) e a fotografa Alice Brill.
No início dos anos 1950, Cesar convidou a artista Maria Leontina15, premiada
e reconhecida nos círculos paulistanos, para orientar as atividades na seção de Artes do
Juqueri; edita [Contribution à l'étude de l'art chez les aliénés...], no qual abordava o
processo de ensino e aprendizagem da arte para indivíduos com sofrimentos e transtor-
nos mentais. Concentrado em seus estudos e pesquisas sobre os processos criativos,

15
Ver: Maria Leontina. Enciclopédia Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultu-
ral, 2018. Disponível em: <//enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa8721/maria-leontina>. Acesso
em: 23 de maio de 2017. Verbete da Enciclopédia.
29
sobretudo na crítica de arte social, Cesar organiza exposições e conferências sobre a arte
dos loucos do Juquery.
No campo das ciências sociais, a produção intelectual de Osório Cesar conecta-
se com a de Roger Bastide – que também se apropria do território do Hospital Psiquiá-
trico do Juquery como um de seus loci de investigação, com o propósito de comprovar
empiricamente as convergências entre a Sociologia e a Psicanálise. A parceria de Bas-
tide e Cesar resultou no artigo “Arte, loucura e cultura” (1956), em que apresentam
importantes elementos para analisar as relações entre arte, cultura e sociedade.
Em resumo, ao coletar os fragmentos da produção científica-intelectual de Osó-
rio Cesar, verifica-se sua intensa dedicação aos temas sobre as conexões entre arte e
loucura, expressão artística, arte-psicanálise, arte de vanguarda e plasticidade sonora;
campo de estudos que orbitavam o campo da cultura no período concebido e foram na
contemporaneidade deslocados no campo da arte-educação. O recorte temporal entre
1920-1950, embora extenso foi considerado imprescindível para a compreensão dos iti-
nerários e redes de sociabilidade, sobretudo o impacto desses contextos na produção de
Cesar.
Numa breve análise sobre o conjunto da obra de Cesar, cotejadas com o lugar
de articulação, mediação e circulação, nota-se que a memória construída em torno da
singularidade de sua produção foi bastante seletiva, sobretudo em Franco da Rocha,
cidade na qual, repousam seus restos mortais. No início da segunda metade da década
de 1970, Cesar doou parte de seu acervo pessoal distribuídos em duas partes: a) Biblio-
teca da Prefeitura Municipal de Franco da Rocha e b) para o Complexo Hospitalar do
Juquery. Contudo, boa parte do material foi dilapidado – resultado da inábil gestão do
acervo – bem como foi possível verificar – na visita realizada em março de 2017 à Bi-
blioteca Municipal Caio Graco da Silva Prado, localizada na av. dos Coqueiros, s/nº,
Centro, Franco da Rocha, SP – que os livros que restaram encontravam-se bastante de-
teriorados pela ausência de acondicionamento, manejo sistematizado na conservação e
higienização, nas últimas quatro décadas.
É crível atribuir que essa seletividade decorra do fato de que as fontes de pes-
quisas sejam dispersas e escassas pela inexistência de um acervo pessoal organizado e
preservado16, embora as informações coletadas sejam originárias de fontes primárias e

16
O Lançamento da Obra de Restauro do Museu “Osório César” foi anunciado pela Prefeitura Municipal
de Franco da Rocha no último bimestre de 2017. Disponível em: <www.francodaro-
cha.sp.gov.br/franco/artigo/noticia/7112>. Acesso em 20 de maio de 2018.
30
secundárias17, entretanto, é mister sobrepensar o contexto sociopolítico do período ana-
lisado e a construção do arcabouço dessa biografia, produzida com base nos relatórios
e depoimentos dos prontuários do DEOPS-SP, artigos em periódicos, publicações, cor-
respondências ativas e passivas entre o personagem investigado e alguns de seus inter-
locutores, bem como as bibliografias existentes abordam aspectos pontuais de sua pro-
dução, conforme observa Schmidt (1997).
Como se verifica, para a elaboração e difusão de suas ideias, projetos e teorias;
Cesar circulava ao mesmo tempo entre as elites das cidades de São Paulo, Rio de Ja-
neiro, Argentina, Montevidéu, Paris e Moscou. Nesse sentido, para a compreensão e
entendimento do lugar de fala e das estruturas das arenas de disputas nas quais Osório
Cesar transitava, é imprescindível assinalar a definição acerca das redes de sociabili-
dade, destacada por Gomes (1999):

Instrumento analítico e/ou categoria histórica, a sociabilidade será


aqui tratada também em sentido mais estrito: como um conjunto de
formas de conviver com pares, como um “domínio intermediário” en-
tre a família e a comunidade cívica obrigatória. As redes de sociabili-
dade são entendidas assim como formando um “grupo permanente ou
temporário, qualquer que seja seu grau de institucionalização, no qual
se escolha participar (p. 14).

O esforço investigativo está organizado, nessa dissertação, em três capítulos e


uma sessão de considerações finais, além desta introdução.
No primeiro capítulo, intitulado Contornos do sujeito, são apresentadas a tra-
jetória pessoal, os encontros intelectuais e a rede de sociabilidades de Osório Cesar –
que inclui sujeitos do campo da medicina, da conformação do campo da psicanálise no
Brasil, das artes e da educação. Nessa perspectiva, as fontes estão divididas entre artigos,
dissertações e teses; livros e periódicos. O objetivo é compreender como Cesar interagia
com os atores e instituições do campo intelectual em afirmação no Brasil.
No segundo capítulo, intitulado As questões da arte-educação, são analisadas
e discutidas as incursões do médico paraibano como propositor e sistematizador de re-
flexões sobre a função terapêutica da arte, suas relações com a loucura e os caminhos
da educação de crianças consideradas anormais no início do século XX. As análises das
fontes concentraram-se nas produções textuais de Cesar, bibliografias e livros.

17
A ortografia das citações utilizadas neste trabalho foram atualizadas para melhor compreensão dos
leitores.
31
No terceiro capítulo, intitulado Proposições e posições políticas, são analisadas
e discutidas as incursões de Cesar no campo da política, em especial suas ligações com
o pensamento marxista e sua divulgação no Brasil; bem como as consequências desse
posicionamento nas suas relações com o campo intelectual. Nesse sentido, as principais
fontes de análises foram os documentos textuais anexados aos prontuários dos Departa-
mento de Ordem Política e Social, depositados em acervos públicos do Estado de São
Paulo e Rio de Janeiro.

32
1 Contornos do sujeito

A informação oficial que inicialmente localizamos sobre a morte de Osório


Cesar informava que o médico havia falecido 3 de dezembro de 1979, foi enterrado no
Cemitério Municipal de Franco da Rocha. No atestado de óbito 18, consta o registro de
que ele não havia deixado bens, nem filhos.
Entretanto, num dos movimentos de pesquisa de campo, dialogando com Lour-
des Xandó Rosa – filha da artista Niobe Xandó – recebemos uma indicação sobre a
existência de uma possível descendente de Cesar. Empreendemos, então, uma busca
documental com as pistas fornecidas e localizamos Maria Thereza de Barros Cesar Ma-
ragliano, sua filha, fruto do casamento com a química Olga Ferreira de Barros. No
anúncio do noivado (1923), publicado em um periódico da época, a mãe de Therezinha
Cesar (como a filha de Cesar é conhecida entre os familiares), era anunciada como moça
exemplar da elite paulistana, filha do advogado Fernando Antonio Ferraz. O jovem pa-
raibano é apresentado como estudante de medicina. A noiva de Cesar era sobrinha de
Alarico da Silveira, secretário do Interior de São Paulo (1920) e secretário da Presidên-
cia da República no governo de Washington Luís (1926-1930).
Num contexto de profunda restrição para as uniões matrimoniais como era o
início do século XX nas elites paulistanas, casar-se com uma jovem de uma família com
tamanho capital político e social no início do século XX indicava uma origem social e
um capital social e político equivalente ou uma trajetória muito singular. Qual teria sido
o caso de Osório Cesar?

1.1 Uma trajetória singular

Na pesquisa que empreendemos, investigando a origem familiar e o registro de


nascimento de Osório Cesar, localizamos apenas um assentamento de batismo no acervo
da Arquidiocese Paraíba. Velôso (2016)19, responsável pelo acervo consultou o período
entre 1893 a 1899, encontrou somente um registro que supõe ser o mesmo por coincidir
a data de nascimento e nome da mãe, entretanto, a descrição do assentamento revela um
dado curioso: “branco, batizado no dia 1 de abril de 1894, nascido em 17 de novembro
de 1893, batizado privadamente por João Dias Vilella. filho natural de Petronilla de
Abrantes Ferreira, sendo padrinhos Nossa Senhora do Bom Pastor e Leôncio Daniel de

18
Anexo H.
19
VELÔSO, Ricardo G. Informações sobre certidão de nascimento de Osório Thaumaturgo Cesar.
[mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <regianemendes@hotmail.com> em 9/11/2016.
33
Figueiredo”. Segundo informações do técnico responsável pelo acervo, a Paróquia
Nossa Senhora das Neves, a 1ª da capital era a única paróquia existente nesta no Estado.
Surge o primeiro questionamento: se o registro é de fato de Osório Cesar, por que fora
“batizado privadamente”?
Ribeiro (1994), retrata a história do Clube Sinfônico da Paraíba, um dos mais
intensos locus de socialização da Paraíba nos primeiros anos do século XX; a família
“Cézar” é representada pelo regente, compositor e violonista Plácido de Alcântara Cé-
zar, tio de Cesar. O clã é descrito como “uma família de músicos de talento” p. 57). O
pai de Cesar, Diomedes, professor de teoria e solfejo; regente do coro da Igreja do
Carmo, é evidenciado como músico notável. Plácido Cézar é apontado pelo autor como
músico virtuoso, considerado o mais consagrado violonista de sua época, foi Spalla da
primeira orquestra sinfônica da Paraíba do Clube Sinfônico da Paraíba, membro do
Partido Liberal, 1º sargento e mestre da Banda do Batalhão de Segurança da Paraíba.
Embora considerados elementos essenciais no processo investigativo, não foi
possível incorporar ao conjunto analítico, dados sobre o período do percurso relacionado
à formação inicial na composição da cartografia educacional relacionadas ao ensino bá-
sico de Cesar, devido ao curto espaço de tempo para a coleta, inventário e exame das
fontes documentais. Entretanto, a inserção social e a proximidade de seus ascendentes
com o principal núcleo católico da Paraíba apresentam-se como fortes indícios de que
sua escolarização elementar tenha ocorrido no ensino confessional.
A historiografia aponta que Cesar desembarcou na cidade de São Paulo com
18 anos (1912), ingressou no Ensino Superior de Odontologia e sobreviveu “graças às
aulas particulares de violino” (FERRAZ, 1989, p.177). No contexto sociopolítico, a che-
gada do jovem Osório Cesar na cidade de São Paulo coincide com o tensionamento dos
conflitos armados provocados pelo governo do marechal Hermes da Fonseca (1910-
1914), um período marcado por inúmeras divergências desde seu início. As convulsões
sociais do período pautam as mobilizações na busca pela diminuição das desigualdades,
desencadeadas por manifestações e revoltas sangrentas. O primeiro enfrentamento rela-
tado é a Revolta da Chibata (1910), organizada por marinheiros insurgentes – suas rein-
vindicações foram registradas em carta por João Cândido, pleiteava a melhoria das con-
dições de trabalho (alimentação e salários).
Nesse panorama de efervescência social no Brasil e no mundo, a trajetória aca-
dêmica de Cesar, nos primeiros dois anos da década de 1910, se entrelaça com as

34
disputas para a consolidação da primeira instituição privada de ensino superior do Es-
tado de São Paulo – criada na primeira década do século XX.
A formação do estudante é corroborada pela localização da solicitação de ma-
trícula para ingresso no curso de Odontologia lavrada por Osório Thaumaturgo Cesar,
endereçada ao professor Eduardo Augusto Ribeiro Guimarães, reitor da Universidade
Livre de São Paulo (ULSP)20 em 18 de março de 1912. No requerimento, Cesar indica
seu número de matrícula, enviado ao reitor:

Osório Thaumaturgo Cesar, com 18 anos ... aluno nº 10 do Curso de


Odontologia dessa Universidade (1ª Serie) requer sua inscrição para
os exames de 1ª época (CESAR, 13/11/1912).

A criação da primeira Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo, res-


pectivamente a primeira universidade privada do Estado de São Paulo foi viabilizada
pela reforma Rivadávia (1911), articulada por pensadores com ideários positivistas.
Criada em novembro de 1911 como instituição de ensino privada, a Universi-
dade Livre de São Paulo foi financiada pelo “educador e capitalista Luiz Antonio dos
Santos” (MOTT et al, 2007), apoiado por um grupo de intelectuais paulistas – médicos,
farmacêuticos, dentistas e advogados – pautados pelos pressupostos da Lei Orgânica do
Ensino Superior defendida por Rivadávia da Cunha Corrêa, ministro da Justiça e Ne-
gócios Interiores. Instalada nas proximidades da Santa Casa de Misericórdia, na rua
Bento de Freitas nº 60 – sede do Ginásio Nogueira da Gama –, a primeira universidade
privada do Estado de São Paulo, segundo os registros disponíveis, iniciou suas ativida-
des pedagógicas em 1912. O professor Eduardo Augusto Ribeiro Guimarães, republi-
cano, defensor deliberado de princípios positivistas – eleito deputado pelo Partido Re-
publicano – um dos principais difusores do ensino livre, é quem idealiza o pioneiro
empreendimento, que é também escolhido como reitor.
A Universidade Livre tinha como propósito a formação da escola primária (al-
fabetização), secundária (instrução preparatória fundamental) e a superior (instrução
profissional). No esteio da controversa reforma Rivadávia21, a proposta educacional
congregava as escolas superiores de Direito, Engenharia, Farmácia, Medicina, Odonto-
logia, Comércio e de Belas Artes. No projeto foram previstos cursos de Ciências e

20
Ver: História da Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. Disponível em: <www.dichistori-
asaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/verbetes/facmedcirsp.htm>. Acesso em 14 de setembro de 2017.
21
Ver: Cury, Carlos. R. J. (2009). A desoficialização do ensino no Brasil: a Reforma Rivadávia. Educ.
Soc., Campinas, vol. 30, n. 108, p. 717-738. Disponível em:<www.sci-
elo.br/pdf/es/v30n108/a0530108>. Acesso em 20 de novembro de 2017.
35
Letras, História, Filosofia e Literatura, Veterinária, Zootecnia e Agronomia, Cultura Fí-
sica (com aulas de Esgrima), Instrução Militar e Ginástica e de Obstetrícia, dos quais os
de Comércio e Belas Artes funcionaram em um curto período, segundo assinala (MOTT
et al, 2007, p. 43). Era composta por Eduardo Augusto Ribeiro Guimarães, reitor; Ulys-
ses Paranhos22, vice-reitor; Matias Valadão, Gabriel Rezende, José Malhado Filho, Ne-
vio Barbosa, Sérgio Meira, Spencer Vampré, Vicente Carvalho, Artur Mota, Alexandre
Albuquerque, membros do conselho superior; Bernardino de Campos, Monsenhor Fran-
cisco de Paula Rodrigues e Luiz Pereira Barreto, membros honorários.
O conjunto documental da Universidade Livre de São Paulo indica que, apesar
da instituição ter operado em curto período (1911-1917), a circulação de ideias e trocas
de saberes na academia, fomentado sobretudo pelo corpo diretivo e docente foi bastante
diversificado e intenso, mesmo com sua existência efêmera.
Mott (et al, 2007) assinala a presença de autoridades governamentais na insta-
lação oficial da Universidade Livre, ocorrida em março de 1912, bem como a participa-
ção do senador do Estado, Antonio Candido Rodrigues e do diretor do Serviço Sanitário,
o médico Emílio Ribas na celebração do início letivo, em maio do mesmo ano. Esses
elementos permitem dimensionar o impacto político do empreendimento. Os autores
ainda destacam que, na composição do corpo docente foram convidados:

[...] alguns dos principais nomes da intelligentsia paulista, médicos


ligados à Santa Casa, à Sociedade de Medicina e Cirurgia, ao Instituto
Pasteur, ao Instituto Bacteriológico, à Maternidade de São Paulo, ao
Juquery ... principais instituições públicas e privadas da capital pau-
lista no período” (MOTT et al, 2007, p. 44).

Entre os quais, destacam-se: Clemente Ferreira, Diogo de Faria, Francisco


Franco da Rocha, Raul Briquet, Sérgio Meira e Vital Brasil. Os registros revelam que a
vida estudantil na primeira década do século XX era bem intensa; o Centro Acadêmico
criado pelos alunos da ULPS tinha como finalidade celebrar datas nacionais, representar
os alunos, manter um acervo de livros (biblioteca), promover atividades culturais, pu-
blicar a revista Athenea entre outros. Com propósitos vanguardistas, a campanha contra
o trote e a organização de eventos esportivos como elemento de prática social e intera-
ção estudantil foram algumas das ações empreendidas pelos integrantes da agremiação
estudantil; modelos de socialização que encontram ressonâncias até os dias atuais, como

22
Ver: Ulysses Paranhos. Disponível em: <www.memoriall.com.br/0091A#.W1ZSZNJKiM8>.
Acesso em 20 de novembro de 2017.
36
se nota pelos torneios esportivos universitários incorporados como práticas em institui-
ções públicas.
As fontes consultadas no fundo da Coleção da Universidade Livre de São Paulo
são outros componentes que merecem destaque, sobretudo os cadernos de matrículas,
prontuários de alunos e os livros de registros dos docentes que, de alguma forma, me
permitem identificar protagonistas da História da Educação e dos Intelectuais, essenci-
almente reconstruir a trajetória nas estruturas das redes de sociabilidade de Osório Ce-
sar. Entre os agentes das estruturas de sociabilidade localizados no fundo da coleção da
Universidade Livre, identifico Ulysses Paranhos, Francisco Franco da Rocha e Antonio
Pacheco e Silva, sujeitos que estiveram diretamente conectados a Osório Cesar.
O médico Antonio Carlos Pacheco e Silva23 ex-diretor do Hospital do Juquery
figura entre os alunos da Universidade Livre de São Paulo. Os registros apontam que
Pacheco e Silva inicia como ouvinte do curso de farmácia, na sequência se transfere
para medicina, onde cursa até o quinto ano. A exemplo de Osório Cesar e seus contem-
porâneos, quando a Universidade Livre de São Paulo encerra suas atividades em 1917,
Pacheco e Silva também transfere-se para a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro
onde obtém o diploma (MOTT et al, p. 2007).
A experiência de sociabilidade e formação na Faculdade de Medicina do Rio
de Janeiro parece relevante para completar o panorama desta primeira etapa da vida e
trajetória de Osório Cesar.
A criminologia positiva de Lombroso pautou as principais bases para as con-
cepções das diretrizes da psiquiatria brasileira. Ainda como estudante de medicina da
Faculdade da Praia Vermelha, no início dos anos de 1920, Cesar passa a integrar a
equipe do Laboratório de Análises Clínicas e Bromatológicas do Asilo de Alienados do
Juquery, como praticante, o que corresponde no tempo presente à residência médica.
No segundo semestre desse mesmo ano a Folha da Noite24, anunciava a nomeação de
José Figueiredo de Lacerda Franco para substituir interinamente Osório Cesar no Labo-
ratório do Hospício do Juquery. Embora, a comunicação não explicite os motivos do
pedido de afastamento do Cesar, outra publicação, dois anos mais tarde, parece sinalizar
os passos do jovem estudante. A nota anunciava o retorno de Cesar como médico

23
Ver: Antonio Carlos Pacheco e Silva Disponível em: <pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B4nio_Car-
los_Pacheco_e_Silva>. Acesso em 20 de novembro de 2017.
24
Ver nota na seção Hospital de Juquery. Folha da Noite, edição 874, 10/10/1923. Disponível em
Acervo Folha S. Paulo.
37
praticante do “Hospício de Juquery”, do qual esteve licenciado por quase dois anos para
“prestar serviços” no 13º Regimento de Infantaria, na Capital Federal” (Folha da Noite,
5/5/1925, p. 3).
Fagundes (2010), observa que nesse mesmo período, constatava-se a crescente
insatisfação de parte da população brasileira contra o “viciado quadro político-eleitoral”,
o qual beneficiava principalmente as elites políticas dos Estados de Minas Gerais e São
Paulo. O autor assinala que o período fora pontuado por movimentos de contestação nos
grandes centros urbanos sobre a chamada ‘política do café com leite’ e ressalta que: “as
suas expressões mais conhecidas foram: o movimento Tenentista, a Reação Republi-
cana, a Semana de Arte Moderna, a ‘Revolução de 1924’, a Coluna Prestes e a fundação
do Partido Comunista do Brasil” (2010, p. 128).
Osório Cesar, ao mesmo tempo em que cumpria seus créditos como estudante
de medicina da Praia Vermelha, viveu um período de expressivas mobilizações e emba-
tes; circulando nos espaços e convivendo com os atores da fração médica e artística da
nossa elite intelectual no período. Dessa forma, é possível afirmar que Cesar estava
imerso numa ambiência de calorosas discussões no campo da ciência, das artes e da
política nacional.
Ao concluir o curso de medicina, Osório Cesar foi oficialmente incorporado ao
quadro de servidores da instituição como médico assistente (1925)25. O Asilo de Alie-
nados do Juquery foi, por quase um século, um dos principais polos de produção e di-
fusão de conhecimento científico no campo da saúde mental no país; idealizado, fun-
dado e administrado (1898-1923) pelo médico Francisco Franco da Rocha – militante
do movimento eugênico no Brasil. Franco da Rocha coordenou a reforma psiquiátrica
defendida pelo deputado Alfredo Pujol em discurso na Câmara dos Deputados (1892).

1.2 Os contextos de engajamento e as ferramentas mentais disponíveis

Concordamos com Sirinelli (1996, p. 150) quando o pesquisador afirma que


uma das dimensões da rede de sociabilidades intelectuais é a de se converter num “co-
letivo articulado de agências e agentes”, que funciona como mecanismo de acesso a um
circunscrito e determinado conjunto de ferramentas mentais, isto é, um apanhado de
pensamentos, ideias, conceitos, categorias de análises socialmente determinados, que se

25
Ver nota na seção Hospício de Juquery. Folha da Noite, 5/5/1925, p. 3. Disponível em Acervo Folha
S. Paulo.
38
tornam propriedade dos indivíduos e que instrumentalizam seu modo de pensar e agir
no mundo. Tais ferramentas, a um só tempo, legitimam e reafirmam alguns percursos
discursivos e analíticos e rejeitam, desqualificam outros percursos discursivos e analíti-
cos, separando os iniciados dos não iniciados.
Vale ressaltar que as ferramentas mentais também estão relacionadas aos mo-
vimentos geracionais; ou seja: determinadas as gerações intelectuais compartilham fer-
ramentas mentais próprias de seu tempo. Entendemos que:

A noção de geração precisa ser compreendida como entretecida tanto


a partir dos chamados “efeitos de idade” quanto dos microcosmos de
convivência e das redes de relação. Do ponto de vista historiográfico,
a geração é tanto um objeto quanto um instrumento de análise. Tam-
bém é importante considerar que as gerações podem ser – e, em dife-
rentes casos, efetivamente são – formadas a partir de uma sensibili-
dade histórica formada por uma estrutura e uma conjuntura, assim
como podem emergir como resultantes da aproximação de indivíduos
e grupos que vivenciaram um mesmo evento gerador, uma mesma
crise, mesmo considerando que as repercussões do acontecimento
fundador não são eternas (SANTOS, 2010, p. 32).

Assumindo tal perspectiva, dois movimentos específicos são marcantes para a


geração de médicos psiquiatras paulistas – e, em particular, para o subconjunto deles
que construiu e atuou no Juquery - na virada do século XIX e no início do século XX: o
movimento eugenista e a reforma psiquiátrica. Compreender a produção e circulação do
legado de Osório Cesar requer que tenhamos em perspectiva o significado dessa con-
juntura.

1.2.1 A reforma psiquiátrica paulista como processo de higienização social

Para a devida compreensão da importância do Asilo de Alienados do Juquery


na história da psiquiatria do Brasil é essencial recuar no tempo histórico e voltar ao fim
do XIX; período marcado pelo desordenado processo de industrialização, com a crise
acentuada pela expansão imigratória e o crescimento populacional; fatores esses que
contribuíram expressivamente para desencadear uma série transtornos psíquicos sociais.
Os governantes comprometidos com a resposta social sobre o flagelo da população de
indesejáveis que circulavam pelo centro da cidade de São Paulo, estabeleceram a polí-
tica de assistência aos alienados do Estado.
A assistência aos alienados em São Paulo iniciou-se em 1848 quando o governo
institui por Lei à autorização para elaboração de plantas e orçamento de um hospício
onde pudessem ser abrigados todos os doentes do Estado. O Asilo Provisório de

39
Alienados de São Paulo (1852) foi inaugurado na Av. São João, primeira unidade des-
tinada exclusivamente ao tratamento dos psicopatas no Estado de São Paulo, que eram
recusados pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, com nove internos. Até aquele
momento os alienados eram mantidos em prisões, nas quais não havia tratamento. Em
1864, o Asilo de Alienados foi transferido para a Rua Tabatinguera. A unidade era ad-
ministrada por um leigo, Frederico Antonio Alvarenga, e seus internos eram visitados
por médicos não especialistas, os doutores Claro Homem de Mello e João César Rudge
(PEREIRA, 2003, p. 154).
Foi nesse contexto que o paulista Francisco Franco da Rocha, recém-chegado
da Europa após um período de estudos e alinhado com as propostas apresentadas no
Congresso Internacional de Alienados de Paris (1889), estabeleceu as bases do novo
modelo assistencial para o tratamento de transtornos mentais: implantação de asilos e
colônias agrícolas. O alienista foi convidado por Cerqueira Cesar, presidente interino
de São Paulo para conduzir a reforma de assistência psiquiátrica e passou a integrar a
equipe médica do Hospício Tabatinguera (1893). O grupo de trabalho para a escolha das
terras para a implantação do Asilo Agrícola foi instituído e composto por Alberto Löef-
gren e Teodoro Sampaio, membros da Comissão Geográfica e Geológica de São Paulo.
Em 1895, por indicação de Löefgren e Sampaio, as terras com 150 hectares à margem
da estrada de ferro Santos-Jundiaí, foi escolhida, a estação Juquery. O arquiteto Ramos
de Azevedo assumiu a tarefa de projetar e construir o novo hospício; em 18 de maio de
1898 a 1ª Colônia Agrícola do Asilo de Alienados do Juquery foi inaugurada com 80
pacientes, e instaurando um modelo de atendimento calcado na noção de higienização
social que traduz, até hoje, marcas significativas na geografia e na identidade da cidade
de Franco da Rocha.
Diwan (2007) observa que, a teoria eugênica defendida por Francis Galton
(1822-1911), publicada no livro Heditary Talent and Character, em 1873, é considerada
sua obra mais conhecida. A eugenia, um termo originário do grego, significa “bem nas-
cido”. A autora afirma em sua obra que “A eugenia surgiu para validar a segregação
hierárquica”. O movimento eugênico teve abrangência mundial e grande aceitação na
época, motivando diversos movimentos ideológicos, sobretudo com impacto na educa-
ção (p. 37-46).
O médico Franco da Rocha, que integrou o quadro de docentes da Universidade
Livre de São Paulo, foi, também um dos fundadores da Sociedade Eugênica de São

40
Paulo (SESP) – a primeira sociedade de eugenia da América Latina – fundada por Re-
nato Kehl em janeiro de 1918. No Brasil o movimento eugênico, influenciou diversas
práticas sociais, interferindo sobretudo em propostas educacionais elaboradas nas pri-
meiras décadas do século XX. Nesse período a teoria da degenerescência ganhou força
no cenário nacional como pressuposto e estratégia central de um processo de evolução
civilizatória e melhoria da raça.
Souza (2007) assinala que, na sociedade eugênica, entre os membros com car-
gos administrativos, encontrava-se os médicos Arnaldo Vieira de Carvalho (presidente);
Olegário de Moura (vice-presidente); Renato Kehl (secretário Geral); T.H. Alvarenga e
Xavier da Silveira (segundo secretários); Argemiro Siqueira (tesoureiro arquivista); e o
sanitarista Artur Neiva. O fundador do Hospital Psiquiátrico de Juquery, Franco da Ro-
cha era integrante do conselho consultivo da agremiação. A Sociedade Eugênica tinha
entre seus objetivos – de acordo com seu estatuto – publicado nos Annaes da Eugenia:

Estudar as leis da hereditariedade; a regulamentação do meretrício;


dos casamentos e da imigração; as técnicas de esterilização; o exame
pré-nupcial; a divulgação da eugenia e o estudo e aplicação das ques-
tões relativas à influência do meio, do estado econômico da legislação,
dos costumes, do valor das gerações sucessivas e sobre aptidões físi-
cas, intelectuais e morais (2007, p. 152).

1.2.2 O movimento eugênico brasileiro

A última década do século XIX foi marcada por expressivas modificações com
o crescente processo de industrialização e urbanização em todo o mundo. Evidenciou-
se, desse modo, a necessidade de preparar o país para o desenvolvimento. O lema “Or-
dem e Progresso”, forjado na bandeira nacional como ideário republicano, por pensado-
res positivistas, como fio condutor da nova identidade nacional, foi contestado por gra-
ves conflitos de ordem política e social no Brasil, determinando assim uma transforma-
ção significativa da mentalidade intelectual brasileira.
Os reflexos econômicos e sociais da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) in-
fluenciaram sobremaneira os debates sobre a identidade nacional no Brasil nas primeiras
décadas do século XX. Nesse sentido, Souza (2008), observa que as autoridades se apro-
priam da medicina, a higiene e a eugenia como “um conjunto de ferramentas civiliza-
doras e salvacionistas, como práticas essenciais no processo de reforma social e de cons-
trução de uma nova nacionalidade” (2008, p. 151).

41
A leitura socialmente legitimada à época era de uma sociedade marcada pelo
adoecimento, localizado no flagelo da população de indesejáveis que circulavam pelos
grandes centros urbanos, na expansão desordenada das moradias que conformava con-
dições de vida consideradas insalubres e indecentes nos cortiços e na relação direta entre
esses dois fenômenos sociais e comportamentos, identificados com a população mais
pobres e considerados primitivos, como o alcoolismo, a prostituição, a violência e do-
enças como a tuberculose e a sífilis (GUALTIERI, 2008, p. 93). Nessa perspectiva,
estabelecem diretrizes para operar a intervenção social com o propósito de regular a
qualidade de vida e dinâmicas sociodemográficas.
O conceito de eugenia surgiu no final do século XIX, em um estudo elaborado
pelo antropólogo naturalista inglês Francis Galton, para designar o indivíduo “bem nas-
cido” (1883), os pressupostos pautados pela teoria do Evolucionismo Social de Charles
Darwin (1809-1882) – do qual Galton era primo – e de estudos de naturalistas como
Alfred Russel Wallace (1823-1913) e Ernest Haeckel (1834-1919), os quais defendiam
a imprescindibilidade no controle do aumento populacional dos pobres e poucos dotados
intelectualmente.
No Brasil, no período pré-abolição, os defensores da Lei do Ventre Livre
(1871) provocaram intensos debates para definir como a população escrava seria incor-
porada à “nova ordem social” com trabalho livre, que demandasse alguma instrução
(LOVATO; GOUVÊA, 2017, p. 54). Nesse sentido, a escola era apontada por integran-
tes do movimento abolicionista como instrumento imprescindível na transformação des-
ses indivíduos em profícuos trabalhadores. Contudo, logo após a libertação dos escravos
(1888), as discussões foram abandonadas; a ausência de políticas públicas que assegu-
rassem o acesso aos direitos fundamentais – educação, saúde, moradia emprego e renda
– aumentou expressivamente os indicadores de exclusão social no país.
A teoria galtoniana desvelava-se para uma expressiva parcela dos formuladores
das políticas públicas como a solução científica para a regeneração humana. Gualtieri
(2008) observa que as “ideias eugênicas transformaram-se em importantes armas ideo-
lógicas para aqueles que buscavam justificar o domínio de uma determinada classe so-
cial ou de um grupo étnico sobre outro” (p. 94).
Seguindo a tendência mundial, as discussões sobre eugenia foram introduzidas
no Brasil nas primeiras décadas do século XX, seus pressupostos foram pautas recor-
rentes no campo intelectual e científico debatidas/defendidas especialmente entre

42
médicos, higienistas, juristas e educadores. A compreensão etnográfica tornou-se prio-
ridade no processo de modernização dos países latino-americanos, encontrar alternati-
vas para a construção de uma nova identidade nacional, reinterpretando o significado da
miscigenação no imaginário do perfil ideal de povo despontou como tarefa basilar.
Embora os princípios tenham adquirido diferentes matizes de acordo com o
território, Gualtieri (2008) observa que “praticamente todos os movimentos eugênicos
priorizaram a educação pública” como componente essencial no processo de homoge-
neização das populações. A autora destaca como marco das discussões sobre eugenia
no Brasil a apresentação do trabalho “Sur lês métis au Brésil” (Sobre os mestiços no
Brasil), pelo médico e antropólogo João Baptista Lacerda, diretor do Museu Nacional
do Rio de Janeiro no Congresso Universal de Raças (1911) em Londres, no qual ele
contraria as explicações de senso comum da época e defende que “os mestiços não eram
inferiores e, portanto, a mestiçagem não deveria ser considerada uma das causas da de-
generação racial”. Para Lacerda, a mestiçagem era a solução para as ações de branque-
amento da nação, deliberada como estratégia biopolítica para controle populacional em
países como o Brasil, constituídos por povos heterogêneos. Como argumento, o antro-
pólogo observou que “graças à mestiçagem, o negro estava desaparecendo e o mestiço
tendia a produzir descendentes brancos, o que levaria ao branqueamento e a homoge-
neização do brasileiro” (p. 95).
O anseio pelo branqueamento do povo brasileiro era tese defendida por repre-
sentantes de importantes setores da sociedade, os quais idealizavam um novo Brasil,
povoado por povos caucasianos, considerados elementos essenciais para a constituição
da nova nação. Ancorados nessa perspectiva, no final da década de 1910, o movimento
eugenista brasileiro se mobilizou por meio de maciça campanha para divulgação das
teorias eugenistas no meio intelectual, liderada pelo médico Renato Kehl, nomeado se-
cretário geral da Sociedade Eugênica de São Paulo (SESP) – declarado admirador da
política de Adolf Hitler26. Entre as personalidades de destaque no movimento eugenista
estavam o professor Fernando Azevedo, nomeado primeiro secretário, o antropólogo e
médico Roquette-Pinto, na organização e divulgação das teorias, juntamente com Mon-
teiro Lobato, Belisário Penna e Octávio Domingues.
Embora os registros indiquem uma existência efêmera – a historiografia evi-
dencia que a Sociedade encerrou suas atividades depois de 12 meses – seus dirigentes e

26
Ver: KEHL, Renato, 1935. Lições de Eugenia. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves.
43
sócios organizaram e produziram uma série de conferências e textos registrados nos
Annaes de Eugenia (1919) e suas ações encontraram ressonâncias no âmbito das políti-
cas públicas por pelo menos duas décadas.
Gualtieri (2008), assinala que o líder do movimento eugenista brasileiro estava
convicto de que a adoção dos pressupostos elaborados por Galton contribuiriam para
aniquilar os sujeitos indesejáveis da orbe, sua tese é explicitada nos registros dos Annaes
de Eugenia: “os indivíduos doentes, incapazes, criminosos e amorais”, assim o planeta
passaria a ser povoado apenas pelos “bem gerados, eugenizados”. Nos argumentos ela-
borados, o autor alertava e indicava a premente necessidade de articulação de agentes
do governo e da instrução pública para a criação de disciplina escolar obrigatória sobre
a “educação eugênica” no ensino primário, assim como no superior. (KEHL, 1919 apud
GUALTIERI, p. 99).
As ressonâncias do movimento eugênico no Brasil é corroborada pela afirma-
ção de Renato Kehl ao justificar a participação de médicos, sociólogos, educadores no
1º Congresso de Eugenia, realizado no Rio de Janeiro (1929): “mesmo com o fim da
Sociedade, a iniciativa não foi interrompida: ‘a cruzada eugênica, apesar de tudo conti-
nuou [...] Uma prova de que o entusiasmo não arrefeceu é este Congresso. Que ora se
realiza’” (GUALTIERI, 2018, p. 484).
O final da década de 1920 foi caracterizado pelos embates entre os integrantes
do movimento, os quais procuram definir os contornos e o alcance da higiene e eugenia,
cada qual de acordo com a corrente teórica adotada como base conceitual. De um lado
os eugenistas conservadores pautados pela corrente teórica galtoniana, como Renato
Kehl; e de outro, os de matriz mendeliana27, representado por Roquette-Pinto28, defensor
da eugenia positiva, o qual argumentava que, na sua perspectiva, a mestiçagem brasi-
leira não representava uma degeneração.
Na obra Lições de eugenia (1935), Renato Kehl defende a adoção de medidas
intervencionistas, para tanto, estabelece a perspectiva conceitual classificada em três
ações: “eugenia negativa, positiva e preventiva”. Gualtieri (2008), observa que:

A primeira, acolhida como ideário de nação civilizada e defendida


pelo eugenista, “incluía ações voltadas para impedir a procriação de

27
Ver: Gregor Mendel. Disponível em //www.ebiografia.com/gregor_mendel/. Acesso em 10 de maio
de 2018.
28
Ver: Edgar Roquette-Pinto. Disponível em //cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-repu-
blica/ROQUETTE-PINTO.pdf. Acesso em 10 de maio de 2018.
44
indivíduos considerados indesejáveis, por exemplo, pela prática da es-
terilização compulsória” (2008, p. 99).

Nesse contexto, a autora assinala:

[...] A eugenia positiva buscava fomentar os casamentos bem dotados


e estimular medidas que favorecessem a paternidade responsável
como a instituição do exame pré-nupcial e a educação eugênica; a eu-
genia preventiva estava centrada nas questões de higiene pré-natal, de
puericultura e de educação sexual”.
A educação eugênica no ideário de Kehl, tinha por princípio desen-
volver a consciência do indivíduo sobre sua responsabilidade em re-
lação à espécie (2008, p. 99).

É nesse contexto de efervescência cívico-patriótica que os intelectuais articu-


ladores do movimento político-educacional brasileiro estabelecerão as bases conceituais
para a tão propagada reinvenção da nação brasileira.

1.3 O apagamento de um legado

Na sua derradeira entrevista, já citada anteriormente, embora combalido pelo


avançar da idade, Cesar expressou elementos de sua trajetória e, entre reticências e
retomadas, buscou defender a legitimidade da sua qualificação como intelectual, bem
como reivindicar um lugar na história dos intelectuais brasileiros:

[...] Meu trabalho foi facilitado, pois entrei para o Juquery ... Curei
muitos doentes mentais pela arte ... Fiz muitas exposições de seus tra-
balhos aqui, no Rio, em Paris, sempre pioneiramente ... Por que não,
a cura pela arte? ... Van Gogh não era um louco, e, hoje, não é consi-
derado um gênio? ... Acho que fiz umas 50 exposições desse tipo, e o
Rebolo e toda a geração de 40/50 devem se lembrar das mostras dos
psicopatas no Clubinho dos Artistas ... Mas, a mais importante, foi a
que levei para a Sociedade de Psicologia de Paris, onde falei a mais
de 200 médicos ali reunidos ... Pena com exceções, esse movimento
não tivesse continuado até hoje (KAWALL, Caderno Ilustrada, Fo-
lha de S. Paulo, 12/8/1979, p. 60).

Na ocasião, Cesar atribuía a rejeição por sua produção ao seu engajamento e


militância política que o acomoda entre os marginais perseguidos durante o Estado
Novo:

É isso ... Publiquei mais de 20 livros sobre a expressão artística dos


alienados, a arte primitiva dos dementes, simbolismos gráficos e sen-
suais entre psicopatas, a arte dos loucos e vanguardistas, e outros, de
pesquisa científica e caráter social ... O livro sobre a Rússia tem pre-
fácio de Henri Barbusse, diretor do ‘Le Monde’, e o ‘Misticismo e
loucura’, foi o prêmio maior da Academia Brasileira de Letras em
1948 ... E até hoje tenho a segunda edição dessa obra pronta, quem
45
sabe agora ... (KAWALL, Caderno Ilustrada, Folha de S. Paulo,
12/8/1979, p. 60).

Tartaglia (2017), arquivista da Academia Brasileira de Letras revela uma in-


congruência no artigo29: ao contrário do que foi publicado no Caderno Ilustrada da Fo-
lha de S. Paulo (1979), o livro ‘Misticismo e loucura’ recebeu o prêmio maior da Aca-
demia Brasileira de Medicina. Nesse sentido, o tratamento dado à ação e ao engajamento
intelectual de Osório Cesar – ou até mesmo a ausência – nos indica que o pensador
ocupa um lugar na borda da História (SIRINELLI, 2003, p. 234). Essa afirmação é cor-
roborada pelo reduzido número de historiografia dedicada a investigar a produção tex-
tual de Cesar. Nota-se ainda que todas as produções posteriores que intencionam lançar
luz à biografia de Osório Cesar foram elaboradas com base na nota biográfica por Ferraz
(1989, p. 17), contudo, parte delas apresentam inconsistências de dados quanto à sua
origem, formação e trajetória. De certo modo, a inexistência de um acervo pessoal or-
ganizado e preservado justificam parte das distorções difundidas sobre a vida e a produ-
ção intelectual do pensador, embora em outros casos fique evidenciado incorreções pro-
positais ao tratamento dado à sua historiografia e até mesmo uma leitura panorâmica de
sua obra.
De outro lado, desvendar as chaves interpretativas das aproximações-distanci-
amentos; enfrentamentos-tensões e as imanências-permanências entre os atores sociais
que orbitavam os “pequenos mundos” do pensador, se configurou em um empreendi-
mento intenso, muitas vezes um exercício árduo e ingrato; como ressalta Sirinelli (1996,
p. 245), mas que se apresentou para nós como incontornável.

29
TARTAGLIA, Ana R. Consulta sobre Osório Thaumaturgo Cesar. [mensagem pessoal]. Mensagem
recebida por <regianemendes@hotmail.com> em 5/1/2017.
46
2 As questões da arte-educação

O objetivo deste capítulo é analisar e compreender o lugar da Arte-Educação


no tratamento dos alienados e a incursão de Osório Cesar no tema da Educação dos
Anormais. Nesse sentido, espera-se que as fontes analisadas permitam validar se as ex-
periencias vivenciadas são componentes constitutivos do corpus epistemológico elabo-
rada por Cesar em suas produções. Nesse sentido, a investigação será fundamentada
com base na articulação dos conceitos elaborados por Vieira (2008) e Magalhães (2016).
Para evitar uma leitura anacrônica frente à produção de Osório Cesar na área
da educação, importa assinalar que, neste período, estavam em processo a constituição
e autonomização do campo intelectual e, dentro deste campo intelectual, a autonomiza-
ção das arenas específicas do campo da Educação. Esse processo se deu de forma bas-
tante dialética e nem sempre eram nítidos os contornos singulares dos intelectuais ‘da
educação’ em relação aos intelectuais em geral. Concordamos com Santos (2015)
quando, referenciado em Bourdieu, assinala que:

[...] o campo intelectual, além de guardar com os demais campos da


dinâmica social uma relação de conflito e negociação (porque de re-
lativa autonomia), engendra, dentro de si e de maneira homóloga, um
conjunto de conflitos e negociações a que estão submetidos seus agen-
tes e instituições. [E] é preciso compreender a emergência de um co-
letivo de sujeitos e instituições dedicados a elaborar, disseminar e nor-
matizar os conhecimentos relativos à área da educação, no Brasil, so-
bretudo a partir da segunda metade do século XIX, como um movi-
mento singular, parte de um movimento social mais amplo, de consti-
tuição do campo intelectual (2015, p. 25).

Deste modo, parece-nos importante alguma digressão sobre a ambiência e as


relações entre os sujeitos e espaços de afirmação intelectual do período na cidade de São
Paulo.

2.1 Os intelectuais tupiniquins da/na Belle Époque paulistana

A primeira década do século XX foi marcada por intensa programação artís-


tica-cultural no eixo Rio-São Paulo. Eventos de grande magnitude no campo das artes
foram concebidos nos encontros organizados na Villa Kyriall, reconhecido núcleo sim-
bolista da Belle Époque paulistana. As fontes analisadas indicam que, para além da ex-
tensa produção textual, Osório Cesar transitou por alguns dos principais loci de cultura
da cidade de São Paulo. Os indícios apontam que Cesar frequentou, como violonista, os
encontros de artes organizados por Freitas Valle, na Villa Kyriall. As narrativas sobre o

47
campo da História da Arte paulista indicam que Freitas Valle é considerado um dos mais
dominantes personagens, sobretudo por suas articulações para a consolidação da política
educacional e a concessão de bolsas a diversos artistas nas duas primeiras décadas no
século XX. Valle, participou da fundação da Pinacoteca do Estado de São Paulo (1905),
da comissão organizadora da 1ª Exposição Brasileira de Belas-Artes (1911), figura
como sócio fundador da Sociedade de Cultura Artística (1912), e participou ainda da
Comissão Fiscal do Pensionato Artístico do Estado de São Paulo, regulamentado na-
quele mesmo ano.
É essencial assinalar que o interesse pelo ensino da arte não era uma pauta
nova, mas, até aquele momento, o ensino de arte no Brasil era norteado pelos conceitos
implantados pela Missão Artística Francesa, liderada por Lebreton, que desembarcou
no Brasil (1816) a convite de Dom João VI, com a tarefa de criar a Academia Imperial
de Belas Artes do Rio de Janeiro, fundada 10 anos mais tarde. Camargos (2001) revela
que:

[...] São Paulo não contava com instituições de ensino superior na área
de música ou artes plásticas. Apenas o Liceu de Artes e Ofícios, fun-
dado em 1873 como Sociedade Propagadora da Instrução Popular
para formar artesãos em ferro e vidro, cerâmica e madeira, iria por
sugestão de Ramos de Azevedo ministrar cursos de artes a partir de
1895. Isso porque dois projetos, datados de 1892 e 1893, para a cria-
ção de um Instituto Paulista de Belas Artes, jamais saíram do papel.
Para contornar o problema, o governo implementou uma série de leis
amparando os aspirantes à carreira artística (2001, p. 159).

Contudo, a autora evidencia que foi a partir da regulamentação do Pensionato


Artístico (1912), que se estabelecem as bases da difusão dos conhecimentos estéticos e
a implementação da produção artística em São Paulo, assevera ainda que os integrantes
da Comissão Fiscal do Pensionato eram indicados pelo secretário do Interior, e era com-
posta por Ramos de Azevedo, Oscar Rodrigues Alves Filho, Olívia Guedes Penteado e
João Maurício Sampaio Viana. No entanto “[...] reinava soberana a figura de José Freitas
Valle, que, de moto próprio, decidia quem seria agraciado com as bolsas” (2001, p. 161).
Nesse contexto, diversos artistas eram beneficiados com a concessão de bolsas. Entre
eles, Tulio Mugnaini, Victor Brecheret e Anita Malfatti. O Pensionato financiou, tam-
bém, a primeira exposição do pintor Lasar Segall em São Paulo. E em 1914, promoveu
o 1º Ciclo de Conferências na Villa Kyriall. Entre 1916-1917, foi editado pelo Pensio-
nato, como Jacques D' Avray, a primeira e a segunda séries de seus Tragipoèmes, cada

48
uma com sete peças. Parte da série foi musicada e interpretada em São Paulo, Rio de
Janeiro e Buenos Aires (1916-1919).
O movimento Simbolista despontou na França, na segunda metade do século
XIX, como movimento de contestação ao materialismo cientificista, tendência intelec-
tual de base positivista, prescrevia a adoção do método científico na investigação em
todas as áreas do saber e da cultura. Em contraposição ao materialismo cientificista e
evolucionista, os autores simbolistas procuraram recuperar certos valores do Roman-
tismo, preteridos pelo Realismo. Segundo a proposta simbolista, a arte e a literatura não
poderiam ser manifestadas somente sob o ponto de vista da realidade, era necessário
considerar a subjetividade do indivíduo, valorizando o imaginário, o inconsciente. Neu-
ndorf (2009), nota a origem do Simbolismo na obra de Baudelaire:

Tendo surgido no final do século XIX, é reconhecido como o último


grande movimento estético deste período. Charles Baudelaire, poeta
francês, é apontado como o precursor do movimento, através de sua
publicação “As Flores do Mal” de 1857. Mas é, no entanto, especifi-
camente o seu soneto “Correspondances” que, em geral, é apontado
como um ponto de partida para a construção dos cânones e conteúdos
simbolistas (2009, p. 1985).

No Brasil, as primeiras manifestações simbolistas são notadas desde o final da


última década do XIX, com a publicação das obras Missal (prosa) e Broquéis (poesia),
ambas de Cruz e Sousa (1893), considerado um dos maiores autores simbolistas brasi-
leiros. Nesse cenário também se destacaram Alphonsus de Guimaraens e Pedro Kil-
kerry. Entre as principais características do Simbolismo, evidenciam-se a valorização do
antimaterialismo, da subjetividade, do misticismo e religiosidade; uso em demasia de
metáforas e figuras sonoras, que na contemporaneidade denominamos como experimen-
tos sinestésicos, o interesse pelas zonas profundas do inconsciente e a loucura.
Nessa perspectiva, o movimento simbolista indicava que poderíamos atribuir a
qualquer objeto ou forma uma significação simbólica, sejam eles naturais, produzidos
pelo homem ou até mesmo as formas abstratas. Nesse sentido, Jaffé (1964), assinala que
no campo da história da religião e da arte, “que remonta aos tempos pré-históricos, é o
registro deixado por nossos antepassados dos símbolos que tiveram especial significa-
ção para eles e que, de alguma forma, os emocionaram” (p. 232). Nesse mesmo período,
Valle promoveu em cooperação com Paulo Prado a exposição de pinturas impressionis-
tas, ao lado de esculturas de Antoine Bourdelle, Auguste Rodin e Henri Laurens no hall
do Theatro Municipal de São Paulo.

49
Camargos (2001) observou que Cesar integrava o conjunto musical do dispu-
tado e prestigiado salão paulistano de Freitas Valle ao lado de Souza Lima no violon-
celo, Carlos Pagliuchi na flauta, João Gomes Júnior no piano, Carlos Campos no con-
trabaixo, Ernesto de Marco como cantor e Santino Giannattasio como tenor, contratados
para animar a programação cultural semanal às quartas-feiras.

Sempre solenes, os banquetes faziam-se preceder por convites perso-


nalizados, impressos para a ocasião, contendo o programa cultural e o
traje exigido. Monograma azul designava smoking para os cavalheiros
e a louça seria azul e dourada. O verde requeria casaca, e então a por-
celana seguia idêntico tom cromático, com frisos em ouro. Como a
mesa comportasse 24 comensais, estabeleceu-se a segunda-feira dos
pintores, a terça dos escultores e a quarta-feira poeticamente batizada
Jantar da Lira, dedicada aos músicos. [...] Havia ainda a quinta-feira
dos poetas, a sexta dos escritores e o sábado dos políticos – com a
presença de deputados e senadores ligados ao PRP30 (2001, p. 43).

As narrativas indicam que, para além de núcleo profissional e de subsistência,


a Villa Kyriall foi, na trajetória de Osório Cesar, um dos principais locus de sua forma-
ção. Lima (1982) corroborou essa hipótese em sua autobiografia ao revelar o tratamento
diferenciado dedicado aos músicos, titulado por Freitas Valle como “Pessoal da Lira”:

Com grande satisfação declaro que o “Pessoal da Lira” era o grupo


que mais gozava da camaradagem do nosso chefe e amigo.
Nos dias do nosso jantar em sua companhia, fazia ele questão que
chegássemos em sua residência com uma hora de antecedência, para
permanecermos em sua maravilhosa biblioteca, lendo e aproveitando
para nos instruir. Por aí se vê o interesse que nos dispensava, dese-
jando nos tornar mais cultos (1982, p. 47).

Lima (1982) evidenciou Guilherme de Almeida, Menotti Del Picchia, Homero


Prates e Agenor Barbosa entre os participantes dos encontros artísticos-literários pro-
movidos por Freitas Valle. Ao cotejar a biografia de Souza Lima, pressupõe-se que esses
encontros tenham ocorrido no primeiro decênio de 1910, já que o maestro foi um dos
beneficiados com bolsa de estudos para aperfeiçoamento na Europa (1919), concedida
pelo Patronato Artístico de São Paulo, do qual Valle figurava entre um dos membros da
comissão. O registro do seu retorno ao Brasil, demonstra que aconteceu após uma dé-
cada.
O professor Antônio Cândido destaca que Freitas Valle estabeleceu um núcleo
simbolista bastante articulado e qualifica a Villa Kyriall como um recinto singular; “foi

30
Ver: Partido Republicano Paulista (PRP). Disponível em: <www.fgv.br/cpdoc/acervo/diciona-
rios/verbete-tematico/partido-republicano-paulista-prp>.
50
o mais completo exemplar do que houve em São Paulo de um traço característico da
Belle Époque, a estetização da vida, baseada na concepção segundo a qual o quotidiano
deve transformar-se em obra de arte” (CAMARGOS, 2001, p. 12).
Camargos (2001) evidenciou a importância da Villa Kyriall no fomento à arte
e cultura. Contudo, alertou que é preciso interpretar o espaço de expressão de uma elite
sedenta pela inculcação de um modelo civilizatório, preservando status e privilégios. A
Villa Kyriall é apontada pela autora como o principal núcleo de convívio e centro de
poder na tomada de decisões, “gerido por elite estrita e entrelaçada – esse salão contri-
buiu para configurar o campo intelectual do período” (p. 16).
Ainda que a Villa Kyriall seja reconhecida como o principal locus de discus-
sões no campo artístico-literário paulista, é necessário destacar outras estruturas de so-
ciabilidade, tais como a predecessora de Freitas Valle: Veridiana Prado – considerada
uma das pioneiras do feminismo no Brasil – a aristocrática residência conhecida como
chácara Dona Veridiana31 era aclamada como badalado ponto de encontro de intelectu-
ais, políticos e artistas; sediou eventos culturais e sociais, impulsionou debates políticos
e literários, outros ambientes semelhantes foram as residências de Olívia Guedes Pen-
teado com seu palacete eclético, projetado por Ramos de Azevedo, cravado nos Campos
Elísios, e de Laurinda Santos Lobo, no Rio de Janeiro.
Ao mesmo tempo em que circulou nos salões de Freitas Valle, seja como mú-
sico ou como estudante engajado nos movimentos artísticos, culturais, políticos e soci-
ais da aristocrática São Paulo nas décadas de 1910-1920, Cesar apresentava-se como
violinista na programação cultural do Centro Acadêmico da Universidade Livre de São
Paulo nos saraus no Salão do Conservatório Dramático Musical. O conjunto de notas
localizadas em periódicos da época atestam sua participação; nas publicações, Cesar era
anunciado entre as atrações, nas quais nota-se uma profusão de elogios acerca dos pre-
dicados do jovem paraibano:

Venho de assistir a uma excelente festa – festa de moços, festa de es-


tudantes, muito simples, muito edificante, muito comunicativa.
Foram duas horas de arte, prosa, versos, música. A “Hora Universitá-
ria”, que assim se estreou, proporcionando a um seletíssimo auditório,
com acordes e aos arroubos dessa maravilhosa trilogia [...] o jovem
violinista Osório Cesar (Correio Paulistano, 31/10/1915, p. 2)

31
Ver: Veridiana Valéria da Silva Prado. Disponível em: <http://www.saopauloinfoco.com.br/veridi-
ana-da-silva-prado/>. Acesso em 15 de dezembro de 2017.
51
No ano seguinte seu nome figurava entre os destaques musicais do sarau:

Osório Cesar, o exímio violinista, acompanhado ao piano pela talen-


tosa senhorita Ophelia Adda e por Alonso Anibal, mostrou mais uma
vez o seu gênio artístico”. A dupla figura em outro anuncio da Hora
Universitária no mesmo jornal em novembro do mesmo ano, no qual
são apresentados como “Osório Cesar, 2º ano de medicina e senhorita
Ophelia Adda do 2º ano de odontologia” (Gazeta de São Paulo, seção
“As Bellas Artes”, 27/4/1916).

Ao cotejar o percurso de Cesar com a dos protagonistas da Semana de 22, o


conjunto de notas selecionadas entre os periódicos da época nos aponta que, é possível
inferir que sua aproximação com os modernistas, sobretudo de Mário de Andrade, tenha
sucedido a partir dos encontros artísticos-literários de Freitas Valle, bem como do Con-
servatório Dramático Musical. Outro elemento que reforça a hipótese da aproximação
entre os pensadores decorre do fato de que a biografia de Mário de Andrade revela que
nesse período o escritor foi aluno do Conservatório (1911), depois de diplomado pia-
nista, tornou-se professor na mesma instituição de ensino da qual foi estudante (1917).
Riaviz (2003), ao analisar os “Rastros Freudianos” na obra de Mário de Andrade, ob-
servou que “Osório manteve correspondência com Mário de Andrade, com quem tinha
um diálogo ‘tranquilo e amigável’” (p. 4).
Os participantes dos ciclos de conferências realizadas entre 1921-1924, eviden-
ciam os laços de Freitas Valle com a elite intelectual. As aproximações-distanciamentos
podem ser notadas no comentário de Mário de Andrade ao descrever a inércia cultural
paulistana:

É o único salão organizado, único oásis a que a gente se recolha se-


manalmente, livrando-se das falcatruas da vida chã.
Pode muito bem ser que a ele afluam, junto conosco, pessoas cujos
ideais artísticos discordem dos nossos – e mesmo na Villa Kyriall há
de todas as raças de arte; ultraístas extremados, com dois pés no fu-
turo, e passadistas múmias – mas é um salão, é um oásis (Apud Ca-
margos, 2001, p. 44).

Camargos (2002) nota a presença de Cândido Mota Filho, Menotti Del Picchia
(repórter do Correio Paulistano, órgão do partido), Guilherme de Almeida, Mario de
Andrade, Antonio Piccarolo, Lasar Segall, Villa-Lobos, Coelho Neto, José Oiticica, Go-
dofredo da Silva Teles, Haddock Lobo, Fernando de Azevedo Cassiano Ricardo e Plinio
Salgado, os três últimos (filiados do PRP), entre outros.
No campo das ciências médicas, Cesar era leitor das principais bibliografias
internacionais, considerado o que havia de mais moderno e avançado para a época; ao
52
mesmo tempo em que elaborava ensaios científicos e se aproxima de iminentes autori-
dades da medicina. Sua chegada ao Hospital de Alienados do Juquery, como praticante,
coincide com outro momento pouco comentado na sua historiografia, seu romance com
Olga Ferreira de Barros. Numa edição do ensaio filosófico A Chimica da Vida, a con-
tracapa revela dedicatória manuscrita e assinada na qual Osório Cesar grafa: “Olga, é
teu com todo o afeto do meu coração” (1923). Os fragmentos coletados indicam que o
casal tenha se aproximado durante o percurso estudantil na Universidade Livre. Do ca-
samento de Olga Ferreira de Barros e Osório Cesar nasce Therezinha Cesar (Maria
Thereza de Barros Cesar Maragliano). Ao revisitar o contexto sociocultural da mulher
brasileira nas primeiras décadas do século XX, as narrativas historiográficas revelam
que Olga de Barros Cesar foi uma das mulheres pioneiras em pesquisas científicas na
cidade de São Paulo. A jovem Olga Ferreira de Barros, cortejada por Cesar – na dedi-
catória do folhetim –, figura entre as três primeiras trabalhadoras oficiais contratadas
do Instituto Adolfo Lutz32, seu registro de ingresso é de 1923 como química.
Ao se casar com Cesar (1925), Olga Ferreira de Barros33 já apresentava uma
carreira consolidada como pesquisadora do Instituto Adolfo Lutz. E é na base de dados
desse mesmo Instituto que localizo a obra Flora micótica das fezes34. A pesquisadora é
inscrita como um dos destaques nos primeiros anos de existência da Associação Paulista
de Farmácia e Química35. Era sobrinha de Alarico da Silveira (1878-1943), advogado e
jornalista, secretário do Interior de São Paulo (1920), responsável pela reforma do Pro-
grama de Ensino das Escolas Primárias (1921). Alarico foi nomeado Secretário da Pre-
sidência da República no governo de Washington Luís, e é apontado como precursor
das enciclopédias no Brasil36. A proximidade de Cesar e Silveira é verificada em outras
ocasiões por meio dos recortes localizados em periódicos, especialmente no registro da
dedicatória de uma de suas obras ao correligionário.

32
Ver: Cf. Laboratório de Bacteriologia do Estado de São Paulo. Disponível em: <www.dichistori-
asaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/verbetes/labbacesp.htm>. Acesso em 15 de setembro de 2016.
33
Anexo I.
34
Ver: ALMEIDA, Floriano; CESAR, Olga B.; LACAZ Carlos S. Flora micótica das fezes. Revista do
Instituto Adolfo Lutz [Online], 3.2 (1943): 272-280. Disponível em: <//189.126.110.61/rialutz/arti-
cle/view/25116/25983>. Acesso em 25 de novembro de 2017.
35
Ver: Cf. Associação Paulista de Farmácia e Química. Denominações: Associação Paulista de Far-
mácia e Química (1923); Sociedade de Farmácia e Química de São Paulo (1924). Disponível em:
<www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/pt/verbetes/socfarquisp.htm>. Acesso em 10 de outubro de
2016.
36
Ver: DA FONSECA, Edson N. O negócio das enciclopédias. Ciência da Informação, v. 1, n. 2, 1972.
Disponível em: <//revista.ibict.br/ciinf/article/view/12>. Acesso em 18 de setembro de 2017.
53
2.2 A arte e a educação nas discussões sobre o Brasil do início do século XX

As décadas de 1920 e 1930 foram marcadas por embates que pautaram a ela-
boração de um projeto de nacionalidade e, em sintonia com ele, de um programa para a
reformulação da educação brasileira. Nesse sentido, um grupo de educadores e intelec-
tuais brasileiros passou a debater de forma correlata, os sentidos da nacionalidade e da
cultura brasileira e os rumos da instrução pública. Desempenharam papel fundamental
nesse processo educadores como Fernando Azevedo, Lourenço Filho e Anísio Teixeira
– organizados em associações e dirigindo projetos editoriais. Carvalho (1989) assinala
que:

A intensa agitação que marcara o movimento de renovação educacio-


nal nos anos 20 tinha se traduzido na organização da Associação Bra-
sileira de Educação (ABE), promotora das notórias Conferências Na-
cionais de Educação. A convergência de projetos de construção da
nacionalidade através da educação possibilitou forte coesão do movi-
mento, neutralizando as divergências que aflorariam na década de 30
(p. 30).

Em sintonia com esse processo, também no campo das chamadas Belas Artes,
durante as comemorações do centenário da independência do Brasil (1922), as estruturas
de sociabilidade foram mobilizadas pela Semana de Arte Moderna37, promovida por
Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Mario de Andrade e Oswald de Andrade. Esse movimento
propõe o rompimento com as tradições/retóricas positivistas europeias, contesta o clas-
sicismo imposto pela Academia de Belas Artes no processo de ensino e aprendizagem.
Camargos (2002) observa os acontecimentos inusitados que despontavam no
cenário paulistano para aquele ano. A autora revela que, já nos primeiros dias, a notícia
de um abalo sísmico de pequena proporção sentido na cidade de São Paulo e a fuga de
presos da cadeia pública da capital foram destaques nos principais periódicos. Contudo,
na sequência da narrativa sobre os primeiros dias do início biênio da década de 1920,
adverte:

[...] O choque maior, porém, ainda estava por vir. Perdidos entre as
páginas dos jornais de fevereiro, pequenos “reclames” anunciavam o
Festival de Arte Moderna, que fora abrilhantado pelo “concurso” de
Guiomar Novais e de Heitor Villa-Lobos.

37
Ver Semana de Arte Moderna (1922: São Paulo, SP). In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e
Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2018. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultu-
ral.org.br/evento84382/semana-de-arte-moderna-1922-sao-paulo-sp>. Acesso em: 28 de janeiro de
2017.
54
Mas quem se dispôs a desembolsar 186 mil réis que davam direito às
três récitas levou um susto. Ao transpor os treze degraus de acesso ao
Teatro Municipal, os cavalheiros de fraque e cartola, acompanhados
por damas elegantemente vestidas, paravam estarrecidos. E não era
para menos. Convertido em museu improvisado, o suntuoso hall apre-
sentava pinturas e esculturas que, com raras exceções, desdenhavam
de todos os cânones artísticos até então considerados nas melhores
academias do país e d’além mar (CAMARGOS, 2002, p. 17-18).

A semana de 22, realizada no Teatro Municipal de São Paulo apresentou uma


exposição com cerca de 100 obras e três sessões lítero-musicais noturnas. Camargos
(2002) destacou que o poema Os Sapos38, uma sátira ao Parnasianismo, corrente esti-
lística predominante da época, escrita por Manuel Bandeira, declamado por Ronald de
Carvalho foi ferozmente vaiado:

[...] Quadros sem perspectiva, cores berrantes, figuras deformadas,


manchas indecifráveis e paisagens sombrias virariam pelo avesso as
normas básicas da estética convencional. E pouco adiantava correr
atrás de coerência ou rima nos versos a serem declamados no palco.
Ali, uma enxurrada de desatinos literários feria sensibilidades refratá-
rias a experimentalismos linguísticos. Delírios poéticos sobre aeropla-
nos, estradas da Via Láctea, sapos e guerra provocavam os espectado-
res, que revidaram numa bem orquestrada vaia regida pelos estudantes
do alto das galerias.
[...] Sob a genérica denominação de “os novos”, mas também apeli-
dados de “futuristas”, seus artífices articulariam um movimento cul-
tural que teve o primeiro ato público naquela Semana de Arte Mo-
derna – em verdade, três noitadas de conferências, audições musicais,
leitura de poemas e uma exposição de artes aberta de segunda a sábado
no saguão do Teatro Municipal, cuja imponência contrastava com a
tônica irreverente dos vanguardistas (CAMARGOS, 2002, p. 18).

Camargos (2002) assinalou que o conceito de futurismo foi comunicado pela


primeira vez no Brasil em artigo publicado no Correio da Manhã (RJ), pelo escritor
português Sousa Pinto (1909):

[...] Associando as propostas de Marinetti à insanidade, mais ligada à


psiquiatria do que à arte, Sousa abria caminho para a caracterização
do futurismo como sinônimo de doença, desagregação, desequilíbrio
e aberração, que a crítica brasileira ratificaria como o oposto da sobri-
edade e da harmonia (2002, p. 37).

A autora ainda observou que o Manifesto Futurista trazido da Europa por Os-
wald de Andrade (1912), serviu de base para a elaboração do que seria anos mais tarde
reconhecido como movimento modernista, entretanto, não foi bem aceito, sobretudo por

38
Ver: Os sapos, poema completo. Disponível em: <http://www.macvirtual.usp.br/mac/templates/pro-
jetos/educativo/acerto3.html>. Acesso em: 28 de janeiro de 2017.
55
Mario de Andrade. O movimento ambicionava a consolidação de uma nova estética ex-
perimental com contornos tipicamente brasileiros.
Ao contrário dos pressupostos eugenistas, os modernistas apresentavam a mes-
tiçagem como atributo brasileiro, por isso, defendiam que deveria ser consagrada.
Nesse sentido, postulavam a necessidade da criação de uma identidade que contem-
plasse o povo Tupiniquim, representando desse modo a multiplicidade do país. O es-
forço empreendido para a construção dessa identidade teve Mário de Andrade como seu
articulador central. Schwarcz e Starling (2015) asseveram que Macunaíma surge como
um clássico “ao descrever as desventuras desse herói brasileiro, alijado do padrão mais
universal [...]”. E complementam que:

Dessa vez, de forma metafórica, o herói de nossa gente, um ‘pretinho


retinto’, vira branco, um de seus irmãos vira índio e o outro negro
(branco na palma das mãos e na sola dos pés). Como concluía Mário:
“E estava lindíssimo no Sol da lapa os três manos um louro um ver-
melho outro negro, de pé bem erguidos e nus (2015, p. 339).

Nessa perspectiva, as trocas de correspondências e publicações em periódicos


tornam-se ferramentas imprescindíveis na circulação de ideias, usadas como dispositi-
vos essenciais nas arenas de embates dos protagonistas do processo de reinvenção da
nação brasileira.
Nery (2009), observou que, nesse mesmo período, Fernando Azevedo, profes-
sor da Escola Normal de São Paulo, integra ao lado de Lourenço Filho e Oscar Freire a
Sociedade de Educação de São Paulo, fundada em 1922, na qual publicam, entre 1923-
1924, a Revista da Sociedade de Educação.

2.2.1 A arte dos loucos no Juquery

À meia distância da Capital do estado, o Hospital do Juquery também despon-


tava como centro de produção intelectual e artística. Como médico-residente daquele
equipamento, Osório Cesar passou a observar e estimular as manifestações pictóricas
dos internos do Asilo de Alienados do Juquery, com o propósito de recuperar e reinte-
grar sujeitos com transtornos mentais. Pautado pelos princípios mendelianos, prescrevia
o trabalho livre dos internos na escolha dos temas, técnicas, materiais e com o mínimo
de interferência do orientador.
Osório dialogava com as aproximações entre arte e loucura propostas por, um
grupo de jovens intelectuais parisienses que estabeleciam, naquele mesmo momento, os

56
pressupostos do movimento surrealista: André Breton, Benjamin Péret, Louis Aragon,
Phillip Soupat e Paul. Sobreviventes da Primeira Guerra Mundial circunscrevem no
primeiro Manifesto Surrealista (1924) sua revolta pela barbárie que dizimou parte da
humanidade (PUYADE, 2004, p. 2). As teorias freudianas também foram fundamentais
na conformação da base do movimento, sobretudo a teoria dos sonhos que subsidiou as
proposições da expressão livre por meio do subconsciente.
Nos escritos de Osório Cesar a busca pela estruturação de um corpus teórico
dos estudos acerca das conexões entre arte e loucura, também se evidenciava. Nesse
sentido, seu artigo A arte primitiva nos alienados: manifestação escultórica com caráter
simbólico feiticista num caso de síndrome paranoide (1925), publicado no periódico
Memórias do Hospício de Juquery, é exemplar.
Organizado no formato de ensaio clínico, o artigo descreveu o caso de um pa-
ciente que modelava pequenas figuras religiosas em argila. Analisou a composição for-
mal das figuras, sobretudo, as causas psicológicas, ou seja, os gatilhos que desencadea-
ram a produção escultórica. O autor observou a semelhança das modelagens produzidas
com a do formato das esculturas africanas feiticistas (deuses africanos), assinalou a afro-
descendência do artista louco e concluiu que as produções são manifestações simbólicas
inconscientes da cultura africana, considerando que esta era a herança cultural-religiosa
do paciente. Para justificar seus argumentos, registrou no rodapé uma nota explicativa
na qual revelava a origem do vocábulo e a transcreveu na íntegra:

Feiticista e não fetichista como erradamente se costuma escrever. Este


vocábulo é de origem portuguesa e não francesa como muita gente
pensa. Vem de feitiço, e foi empregado pela primeira vez, muito antes
dos franceses, pelos primeiros exploradores de Guiné, como diz muito
bem Fernando Ortiz no seu interessante livro Glossário de afronegris-
mos, às páginas 204 e 205 que passamos a transcrever [...] (1925, p.
118)

Cesar (1925) assinalou que as imagens são de culto religioso. Pautado pelas
inscrições gravadas nas bases das esculturas, o autor as classificou como obras de arte.
Considerando que o conceito de beleza, para o pensador estava associado à constituição
e aos valores culturais de um povo.

Vejamos a figura 1, uma das suas curiosas produções. “São Jacinto”


é o nome que ele gravou nos pés da escultura. É um feitiço. “A ima-
gem”, diz ele, referindo-se a São Jacinto, “foi construída com o ouro
mais puro da mina que encontrei no terreiro e ela possui a virtude de
espalhar a felicidade entre os homens” (1925, p. 120).

57
Para fundamentar seus argumentos sobre os valores culturais de cada socie-
dade, Cesar (1925) cotejou a arte dos loucos do Juquery com a arte “decadente italiana”,
com base nos estudos produzidos por Charcot e Richer acerca da “célebre cabeça de
Maria, da Igreja de Santa Maria Formosa”. Nesse sentindo, a citação grafada pelo autor
indica que os estudos sobre as conexões entre arte e loucura eram produzidos por Char-
cot e Richer no Hospital Salpêtrière em Paris desde o fim do XIX.
O autor, pautado pelos pressupostos da corrente mendeliana, defendeu a liber-
dade de expressão do artista, observou que a estética futurista, conceito propugnado pelo
movimento modernista, apresentou vários pontos em comum com a arte produzida nos
manicômios. Cesar (1925) destacou que as deformidades na arte não são características
somente dos loucos e artistas modernos, revelou ainda que foram estudadas desde a mais
remota antiguidade. Destacou a citação dos pesquisadores do Hospital Salpêtrière
acerca de uma obra, a “mais antiga escola do Egito, a escola menfita [...] (CESAR, 1925,
p. 124)”. Nessa perspectiva, assinalou que a beleza não é uma manifestação da escola
clássica, instituída para uma fruição universal, é só uma questão da influência do meio
em que está inserido.
Embora o estudo seja de caráter científico, as manifestações criativas de indi-
víduos com sofrimentos/transtornos mentais são evidenciadas nas análises. A arte pri-
mitiva, beleza, arte africana, cultura nacional, são temas incomuns para um estudo de
caráter psiquiátrico para debater a capacidade criativa, sobretudo para a publicação em
um periódico científico. Para fundamentar sua asserção, o autor dialogou com pensado-
res que abordam temáticas como afronegrismo, arqueologia egípcia, arte grega, civili-
zação primitiva, a origem da religião entre outros; apresenta elementos da história da
arte egípcia, italiana, grega, africana, fenícia, assim como o impressionismo e cubismo;
concluiu que as produções eram manifestações simbólicas inconscientes da cultura afri-
cana, observando que essa era a cultura de origem do paciente (imaginário).
No final da década publicou a consolidação dos resultados de seis anos de es-
tudos e observações, na obra A expressão artística nos alienados: contribuição para o
estudo dos símbolos na arte (1929). Ferraz (1998), assinalou que a sistematização orga-
nizada e difundida pelo autor nesse estudo foi “uma obra de referência obrigatória não
somente para aqueles que se dedicavam à psiquiatria, mas também para a intelectuali-
dade de nosso país” (p. 49). A obra tem prefácio assinado por Motta Filho, partidário
dos ideais modernistas, o advogado e escritor figurou entre um dos fundadores da

58
SBPSP, visitou o Hospital de Juquery entre os anos de 1927-1929. Na apresentação
Cesar (1929) advertiu:

Esta modesta monografia é o esforço de seis anos consecutivos de


trabalho estafante.
Desde a nossa designação para o lugar de interno do Hospital de
Juquery, em 1923, já tinhamos em mente a ideia de estudar a arte dos
alienados, comparando-as com a dos primitivos e das crianças.
A ideia surgiu-nos logo depois do aparecimento do belo livro de H.
Prinzhorn, Bildenerei der Geisteskranken e do livro de Vinchon, L.
Arte et Folie. (1929, p. XXI, “Advertencia”).

Se configura como estudo analítico, sobretudo de divulgação e compreensão


do impacto da introdução da Psicanalise no Brasil. Nesse trabalho, o Cesar (1929) ana-
lisou os documentos da cultura indígena Pareci reunidos e organizados por Edgar Ro-
quette-Pinto, cotejados com a produção dos loucos do Hospital de Juquery. Ele narrou
como foi motivado pelo estudo da produção gráfica, plástica e sonora de pacientes psi-
quiátricos influenciado pelos livros: Bildnerei der Geisteskranken (Expressões da Lou-
cura) do historiador da arte e médico alemão Hans Prinzhorn e La art et folie (Arte e
Loucura) do psiquiatra Jean Vinchon. Iniciou em 1923 uma coleção “com as peças e os
trabalhos mais interessantes dos doentes de Juquery”, com a intenção de analisá-las,
comparando-as com a arte dos primitivos e a arte das crianças (1929, p. XXI):

As produções artísiticas dos alienados, principalmente as plasticas e


os desenhos decorativos que estudamos, apresentam-se interessante e
com caracteristicas para comparações com os trabalhos artíticos dos
primitivos e das crianças.
Uma boa parte do material artístico que reproduzimos dos indios do
Brasil e dos negros, devemos ao prof. Roquette Pinto, diretor do
Museu Nacional do Rio de Janeiro, que nos facilitou e orientou, com
a bondade e a inteligencia que lhes são inatas, durante o tempo de
nossa estada no Rio, as ricas coleções do Museu. (1929, p. XXI,
“Advertencia”).

Entretanto, a coleção analisada pelo pensador não ficou limitada à produção de


pacientes do Hospital de Juquery, do mesmo modo Cesar (1929) reuniu desenhos, es-
culturas e principalmente pinturas de artistas brasileiros e estrangeiros. Nota-se que,
nessa obra o autor empregou recursos etimológicos para explicar ao leitor que o tema
do livro era o estudo das expressões simbólicas, elaboradas por indivíduos com quali-
dades intuitivas preciosas e não com sofrimentos/transtornos mentais (1929, p.1, nota
1).

59
O pensador apresentou um panorama acerca das concepções antigas para a lou-
cura e dissertou sobre o misticismo que envolviam/orbitavam os povos antigos das re-
giões da Mesopotâmia e do norte da África – como a Caldeia, a Assíria e o Egito, os
quais acreditavam que todas as atividades do universo eram impelidas por sortilégios e
que seus efeitos operavam sobre os homens, por isso, as doenças, compreendendo a
loucura, eram acarretadas pela possessão de espíritos demoníacos. Cesar referenciou os
tratados de filosofia e medicina gregos, dedicou especial atenção à analogia matéria-
espírito, apresentada nos diálogos platônicos, sobretudo com nexo de causalidade exis-
tente entre as perturbações da alma e patologias físicas. O pensador reafirmou sua tese
inscrita em suas produções anteriores de que a compreensão da enfermidade se dava
com base nessa teoria que buscava a cura e a saúde por meio do tratamento da alma.
Ele observou que as composições apresentavam qualidade ambígua, assim,
para a compreensão da produção artística dos alienados e análise das conexões entre arte
e loucura, Cesar pautado pelo sistema classificatório de Kraepelin39 organizou e apre-
sentou o primeiro sistema classificatório da arte dos alienados, como diretriz na estru-
turação do comparativo, divididos em quatro categorias de arte: arte do primitivo, arte
primitiva, arte clássica e arte de vanguarda. As categorias sistematicamente comenta-
das e acompanhadas de imagens, permitiam comparações entre a manifestação simbó-
lica dos alienados e obras de arte. Cada uma delas concebida com base em concepções
artísticas peculiares, as quais sugeriam equivalência entre os estilos artísticos e o desen-
volvimento da mente humana. Para isso, recorreu à extensa literatura internacional sobre
os pintores impressionistas, estética, arqueologia e loucura.
Pautado por pensadores contemporâneos, o autor definiu a arte do primitivo
influenciado pelos predicados da psique do homem paleolítico como base comparativa;
para a arte primitiva sobressaiu as características do pensamento totêmico. Para a arte
clássica, o debate foi moderado em torno das convenções sobre as produções plásticas,
o qual preconizava o fazer artístico seguindo os modelos da representação. A arte de
vanguarda estava relacionada à etapa de desenvolvimento anímico no qual o indivíduo
estava liberto da censura dos fenômenos mentais determinado pela educação e conven-
ções sociais, possibilitando acessar desse modo as tramas inconscientes.

39
Ver: Emil Kraepelin. Disponível em: <broughttolife.sciencemuseum.org.uk/broughttolife/peo-
ple/emilkraepelin>. Acesso em 10 de julho de 2018.
60
Para ele, a concepção de um sistema classificatório para as expressões plásticas
dos alienados era fator imprescindível na compreensão de quais conexões o pensamento
humano conservava ainda como seu modo primeiro de inteligência, isto é, com o axioma
simbólico. As categorias foram concebidas para determinar e organizar as diferentes
manifestações do pensamento simbólico nos alienados com comparações dos estilos ar-
tísticos. Cesar descreveu em seu estudo que, seu desejo na metodologia proposta era
somente criar um sistema que fosse utilizado como diretriz de estudo e não como estru-
tura rígida de classificação.
No campo da arte, a década de 1930 em São Paulo é pautada pelo lastro dos
acontecimentos renovadores perpetrados pelos intelectuais envolvidos na organização
da Semana de 22. O Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade (1928), tinha como
objetivo articular a noção de canibalismo com a finalidade de reafirmar a capacidade do
povo brasileiro de se reinventar. Gonçalves (1990), destacou que a movimentação em
torno das produções plásticas é cada vez mais intensa, surgem novos valores que irão
constituir o assoalho para a consolidação definitiva do conceito de arte moderna, ob-
serva que o Grupo Santa Helena, composto por Aldo Bonadei, Francisco Rebolo Gon-
çalves, Fulvio Pennacchi, Humberto Costa, Alfredo Rizzotti, Alfredo Volpi, Clóvis Gra-
ciano, Manoel Martins e Mario Zanini “exercerá papel decisivo, como locus de circula-
ção de ideias e consolidação de uma nova proposta do fazer arte” (p. 42-44). Para a
autora, os helenistas representaram o ponto determinante na transformação social no
cenário das artes plásticas, foi a primeira vez que produziram lado a lado, o artista de
origem burguesa e o artista-operário. O registro do depoimento de Clóvis Graciano, gra-
vado na década de 1970, produzido por Gonçalves (1990), reforçou essa constatação:

O Grupo Santa Helena poderia não ter uma tese. Era um grupo mais
de pintores-artesãos, que procuravam reformar a pintura acadêmica, e
havia o trânsito de conhecimento entre todos eles: Volpi, Rebolo, Bo-
nadei, Pennacchi, Rosa. (...) Permutávamos conhecimentos, permutá-
vamos técnica e acabamos fazendo uma coisa, pra época, muito im-
portante” (p. 42).

Nessa mesma ocasião, constata-se o interesse de Benjamin Péret, um dos prin-


cipais expoentes do movimento surrealista francês ao lado de André Breton, sobre os
estudos acerca das conexões entre arte e loucura empreendidos por Cesar no Hospital
do Juquery. Puyade (2004) ao retratar a trajetória e as relações do poeta francês com o
Brasil (1929-1931), revela: “[...] o interesse pela arte e pensamento primitivos foi, sem
dúvida nenhuma, um elemento determinante para impulsionar Péret e Elsie a viajarem
61
para o Brasil” e acrescenta: “[...] a arte primitiva do Brasil é inteiramente desconhecida
para eles. Péret deseja, sem dúvida nenhuma, abrir um novo caminho de conhecimento”
(p.5).
O autor ainda expressa no artigo o interesse de Péret sobre a arte dos alienados
do Juquery:

Péret mantém intacta sua atividade surrealista ao longo de sua perma-


nência no Brasil. Ao mesmo tempo em que colabora na revista parisi-
ense, interessa-se de perto pelos trabalhos de Osório Cesar sobre a arte
dos loucos, mas é no pensamento mítico brasileiro que concentra toda
a sua atenção (PUYADE, 2004, p. 11).

Cesar, separado de Olga Ferraz, licencia-se do Hospital do Juquery por um ano


e parte para um período de estudos na Europa (1931), acompanhado por Tarsila do Ama-
ral, com quem viveu um breve romance (1931-1933). Durante a viagem à União Sovi-
ética visitam centros de pesquisa em saúde, instituições de ensino, museus. A rede de
sociabilidade formada durante a viagem possibilitou que o pensador articulasse à apro-
ximação cultural entre o Brasil e a União Soviética. A coleção Mário de Andrade, com
suas correspondências ativas e passivas, revelou uma carta enviada de Leningrado, gra-
fadas com as siglas OC e TA, que representam Osório Cesar e Tarsila do Amaral. Ama-
ral (2001), registrou o pedido a Mario para que enviasse obras da literatura brasileira à
David Vygodsky:

Mario, é preciso que você envie as suas obras com a máxima urgência
para o sr. David Vigodsky, Mokhovaia, 9 Leningrad. Pois este sr. está
encarregado pelo governo soviético de escrever a história da literatura
contemporânea hispano-americana para a grande enciclopédia sovié-
tica em preparação. Ele está a par da literatura argentina. Do Brasil
conhece somente alguns clássicos e entre os novos, Guilherme, atra-
vés de uma tradução espanhola, e Jorge de Lima.
Peço a você também, o favor de falar aos outros rapazes daí que man-
dem trabalhos. Por exemplo: Alcântara Machado, Menotti etc.
O seu livro foi entregue ao prof. Braude, da Universidade de Moscou
(cadeira de história da música).
Saudades do Osório [Leningrado, 9/7/1931] (p. 112).

Amaral (2001) ainda registrou a reposta ao pedido de Osório Cesar, no qual o


escritor Mario de Andrade devolveu a missiva em 28 de agosto: “[...] Carta do Osório
que logo botei em obedecimento, mandei os meus livros pro tal de escritor russo, os do
Alcântara, mandei recado pro Manuel Bandeira, que também se incumbiu de mandar de
outros do Rio. O Gui também manda” (p. 116).

62
Gomide (2014), revelou que David Vygódski (1893-1943), poeta, crítico, tra-
dutor (de vinte idiomas), primo de Lev Vygotsky, foi um dos primeiros estudiosos da
cultura latino-americana na Rússia. Apontado como um dos intelectuais mais brilhantes
da literatura e cultura daquele país. O autor observa que Vygódski foi responsável por
organizar, preparar coletâneas e estudos acerca da literatura brasileira, para publicação
na Grande enciclopédia soviética; considerado um membro obstinado dos principais
movimentos e grupos artísticos das décadas de 1910 e 1930, entre os quais o formalismo.
Como interlocutor, manteve contato, por meio de correspondências, com vanguardas de
diversos países, muitos deles conectados por Osório Cesar. Entre eles, escritores, artistas
e intelectuais brasileiros.
De acordo com a relação de poemas brasileiros traduzidos por Vygódski (1927-
1932), recuperada por Gomide (2014), presume-se que o “Guilherme” mencionado por
Cesar e o “Gui” indicado por Mario Andrade na troca de missivas, seja o escritor Gui-
lherme de Almeida (p. 317):

Poesia brasileira. Poemas. 1927-1932


“Manhã" – Guilherme de Almeida (13-7-1931).
“Ode ao burguês" – Mário de Andrade (2-11-1932).
“Moda dos quatro rapazes" – Mário de Andrade (30-5-1932).
“O rebanho" – Mário de Andrade (2-11-1932.
[Sem título] – Machado de Assis (4-8-1929).
"Irene no céu" – Manuel Bandeira (13-9-1932).
[Sem título] – Manuel Bandeira (13-9-1932).
"O Europeu" – Ronald de Carvalho (8-10-1932).
"Interior" – Ronald de Carvalho (14-? -1931).
"Poética" – Ronald de Carvalho (28-?-1927).
"Cinema de arrabalde" – Ribeiro Couto (14-9-1932).
[Sem título] – Ribeiro Couto (25-?-1931).
[Sem título] – Ribeiro Couto (14-9-1932).
"Lenin no futuro" – Correia Lima (21-3-1931).
"Diálogo sobre a felicidade" – Ribeiro Couto (15-9-1932).
"Os ciganos" – Jorge de Lima (28-2-1931).
"[Súplica?]" – Alvaro Moreira (5-2-1930).
[Sem título] – Murilo Mendes (8-?-1931).
"História do Brasil" – Afrânio Peixoto (março ou maio de 1932.
[Sem título] – Afrânio Peixoto (sem data).
[Sem título] – Afrânio Peixoto (sem data).
[Sem título] – Afranio Peixoto (março ou maio de 1932).
[Sem título] – Afranio Peixoto (março ou maio de 1932).
[Sem título] – Afranio Peixoto (março ou maio de 1932).
[Sem título] – Afranio Peixoto (março ou maio de 1932).
"Compaixão" – Tasso da Silveira (25-10-1931).
"A professora" – Julio [?] (1-11-1932).
[Sem título] – Julio [?] (1-11-1932) (GOMIDE, 2004, p. 316)

63
O retorno ao Brasil é marcado pelo seu declarado engajamento político, sobre-
tudo pelo seu interesse pelo marxismo evidenciado em dois de seus livros publicados
após essa viagem à Rússia: Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS
(1932) com prefacio em francês, assinado por Henri Barbusse, escritor, ex-diretor do Le
Monde, e ilustrado por Tarsila do Amaral. Nesse mesmo período, o pensador passou a
ser investigado por agentes do DEOPS, que o levaria à prisão pela primeira de diversas
detenções. Sua proximidade com os principais pensadores marxistas europeus é atestada
em relatórios e depoimentos dos prontuários do DEOPS e no Instituto de Estudos Bra-
sileiros (IEB).
Amin (2009) assinalou que a “Mês dos Loucos e das Crianças”, organizado e
promovido pelo artista Flávio de Carvalho e Osório Cesar, no Clube dos Artistas Mo-
dernos (CAM)40, entre 28 de agosto a 28 de outubro de 1933, foi a primeira exposição
dos desenhos dos loucos do Juquery e de crianças de escolas públicas de São Paulo,
seguida de uma série de conferências, nas quais artistas, intelectuais, médicos e pesqui-
sadores debateram acerca das conexões entre arte e loucura com temas como:

1. Estudo comparativo entre a arte de vanguarda e a arte dos aliena-


dos – dr. Osório Cesar em 30 de agosto de 1933.
2. Interpretação de desenhos de crianças – dr. Pedro de Alcântara
Machado em 13 de setembro de 1933;
3. Psicanálises dos desenhos dos psicopatas – dr. Durval Marcon-
des em 19 de setembro de 1933;
4. O louco sob o ponto de vista da psicologia geral – dr. Fausto
Guerner em 26 de setembro de 1933;
5. A arte e a psiquiatria através dos tempos – dr. Pacheco e Silva
em 26 de setembro de 1933;
6. Marcel Proust literariamente e psicanaliticamente – dr. Neves
Manta em 3 de outubro de 1933;
7. O valor negativo da psicopatologia na crítica de arte – dr. Plínio
Balmaceda Cardoso em 17 de outubro de 1933;
8. A música nos alienados – pianista, mestre José Kliass em 17 de
outubro de 1933;
9. Dr. Raul Malta com apresentação sobre tema ligado ao evento,
não citado em nenhuma das fontes, tampouco, sua data;
10. A noite dos poetas loucos – poemas recitados por Maria Paula
sem referências das datas e horários (AMIN, 2009, p. 78).

Os debates, explicitam os resultados de análises acerca dos psicodiagnósticos,


tanto de crianças como a dos loucos do Juquery, apresentam a perspectiva de que a arte

40
A fundação do Clube dos Artistas Modernos (CAM) foi liderada por Flávio de Carvalho (1899 - 1973),
que teve o apoio dos artistas Antonio Gomide (1895 – 1967), Carlos Prado (1908 - 1992) e Di Caval-
canti (1897 - 1976) como colaboradores na constituição do CAM.
64
criada pelas imagens elaboradas por crianças, em quase nada se diferencia da arte pro-
duzida pelos loucos, ou seja, são manifestações espontâneas do inconsciente, desprovi-
das dos elementos classicistas propugnado pelas academias, portanto, deveriam ser re-
conhecidas como arte. Coutinho (2002), observa que as primeiras investigações acerca
do desenho infantil tem seu marco no final da década de XIX, pautados por movimentos
de diversos centros de pesquisas europeus e americanos, nos quais estudiosos nos cam-
pos da psicologia, da pedagogia e da arte se dedicaram a analisar e sistematizar teorias
sobre a importância da valorização da arte bruta (p. 171). Os estudos procuravam na
perspectiva científica compreender a psicogênese do homem cotejando o desenvolvi-
mento da criança e a evolução dos povos primitivos. No campo da arte foram utilizados
como referenciais para a reflexão e desconstrução da metodologia aplicada no ensino e
aprendizagem dos processos criativos. Nesse sentido, retomamos aqui, a narrativa pro-
duzida por Fabris (1981), na qual assinala que a Semana de 33 foi assentada pelos críti-
cos de arte da época como “um ataque frontal aos métodos e à estética” prescritos pela
Escola Nacional de Belas Artes.
Verifica-se que o movimento liderado por Flávio de Carvalho e Osório Cesar
se materializou como um dos marcos das discussões acerca da estética e rupturas da
história da arte no Brasil. Ao cotejar as observações assinaladas por Amin (2009) e Fa-
bris (1981), é possível notar que a Semana de 33, sob vários aspectos, foi o segundo
momento mais importante da história da arte no Brasil, depois da Semana de Arte Mo-
derna em 22.
Paralelamente, Osório Cesar publicou Que é o estado proletário? (1933), com
capa ilustrada pelo artista Flávio de Carvalho. Nesta obra propõe reflexões sobre a vida
do operário na Rússia soviética, seguido de um estudo sobre seguro social operário.
No ano seguinte, publicou o estudo A arte nos loucos e vanguardistas (1934),
nesse estudo Cesar apresenta o processo de ensino e aprendizagem em arte-educação
desenvolvido na seção de Artes do Hospital do Juquery com “base na autoexpressão”
(FERRAZ, 1989, p. 68.). A obra é resultado dos estudos empreendidos por Cesar para
a conferência de abertura proferida no “Mês dos Loucos e das Crianças”, em 30 de
agosto de 1933. O autor elaborou um estudo comparativo entre a arte dos indivíduos
com transtornos mentais (loucos) e a arte de vanguarda. Cesar (1934) discorreu sobre
os processos sinestésicos e a relação com a produção dos artistas loucos, a visão psica-
nalítica sobre a estética nas produções artísticas, pautado pelas teorias freudianas. A

65
obra tem prefácio assinado por Neves-Manta que reverencia o autor como o maior e
principal pesquisador brasileiro das “perquirições psicanalíticas e digressões estéticas”
(p. 11).
O autor (1934) retoma as argumentações acerca do futurismo e do cubismo,
inscritos nas produções textuais anteriores, reverencia o Manifesto Futurista como mo-
vimento revolucionário empreendido por Boccione, Marinetti, Carrara e outros (1909).
Cesar assinala que “o futurismo também nasceu numa época de dinamismo embriaga-
dor. Ninguém mais crê nos dogmas. Não há mais fé cristã. A escravidão nos atormenta”
(p. 21). Para justificar o futurismo como movimento de vanguarda, descreve as mobili-
zações empreendidas pelos artistas futuristas intransigentes, os quais registram “em ma-
nifesto revolucionário” o conselho para que se queimem e destruam as obras clássicas.
Nesse sentido, Silva (2010) aponta que as vanguardas são os movimentos radicais sur-
gidos nas primeiras décadas do século XX. Na perspectiva de Cesar, as vanguardas:

[...] alteraram os rumos das artes, principalmente os da pintura e da


literatura. Com o Futurismo de Marinetti em 1909, o Expressionismo
alemão no ano seguinte, o Cubismo, em 1913, o Dadaísmo, em 1916
e, oito anos mais tarde, o Surrealismo, o mundo conheceu novas ati-
tudes artísticas que tinham como objetivo um maior questionamento
dos valores da época e uma revolução em relação à herança cultural
recebida até então. Esses movimentos já estavam germinando no Ro-
mantismo e no Simbolismo do século anterior. Em 1909, Filippo To-
maso Marinetti, em seu manifesto futurista, divulgado pelo jornal
francês Le Figaro, vem preconizar uma total ruptura com a tradição e
pregar uma nova estética, movida pela “beleza da velocidade” e por
muita energia, à imagem e semelhança da máquina (CESAR, 1934, p.
1).

Com o intuito de dimensionar o argumento que pautou a elaboração do Mani-


festo Futurista, recorremos ao dicionário na busca pela acepção de vanguarda41, origi-
nária do francês avant-garde significa: “1) Primeira linha de um exército, de uma es-
quadra, etc., em ordem de batalha ou marcha. 2) Parte da frente. = dianteira, frente. 3)
Agente, grupo ou movimento intelectual, artístico ou político que está ou procura estar
à frente do seu tempo, relativamente a ações, ideias ou experiencias”.
Logo, o termo vanguarda nomeava uma estratégia militar com predominante
intervenção devastadora que pretendia dissolver frentes, aniquilar infraestruturas, con-
franger retaguardas, desmobilizar e cindir os meios de subsistência do inimigo. Subirats

41
Ver: “Vanguarda”. In: Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013. Disponí-
vel em <www.priberam.pt/DLPO/vanguarda>. Acesso em 10 de junho de 2018.
66
(1993), observou que “esse conceito militar de vanguarda designava uma dissolução
geral de tudo quanto fora sólido em proveito de um princípio arcaico de violência e
poder” (p. 10). Nesse contexto, os movimentos artísticos se apropriaram do termo mili-
tar de “vanguarda” para estabelecer as bases conceituais do movimento revolucionário
no campo das artes.
Na construção da narrativa, na qual explicitou as bases conceituais da arte de
vanguarda, Cesar (1934) apresentou um panorama da história da arte, passou pela An-
tiguidade, Renascentismo, Cubismo, Futurismo, Expressionismo; analisou obras de
Marcel Duchamp, George Braque, Fernand Léger, Robert Delaunay, Marc Chagall entre
outros. Em sua retórica, o pensador alinhado com as discussões estéticas de seu tempo
no campo da arte, reafirmou: “A arte deveria ser dinâmica, reproduzir o movimento que
é a vida” e nota que foi sob essa perspectiva que artistas produziram interessantes tra-
balhos tais como Matéria, de Marinetti (1912); O homem com o bandolim, de Braque
(1912); O rei e a rainha rodeados de nus velozes, de Duchamp (1912); Mulher de azul,
de Léger (1912); O poder da rua, de Carrà e Paris visto de uma janela, de Chagall (p.
21). Para legitimar suas arguições, estabelece os indicadores comparativos para a dis-
tinção sobre a simbologia presente nas produções plásticas, pautados pelo pensamento
do neurologista forense espanhol, Gonzalo Lafora, contemporâneo do médico russo,
Konstantin Tretiakoff, diretor do Laboratório Anatomopatológico do Hospital de Ju-
query (1922-1926).
Assim como nas narrativas anteriores, o discurso eugênico da corrente mende-
liana permeou toda a produção, Cesar (1934) recorreu à religião, mencionou Jesus
Cristo, Maomé e Buda para validar seus argumentos acerca do “novo núcleo dogmático,
seja ele qual for, religioso ou artístico” (p. 27). O pensador, pautado pelas teorias de
Lafora, sugeriu indicações de julgamento da arte, argumentou que no seu tempo, a aná-
lise deveria iniciar do particular para o geral e afirmou que:

[...] em primeiro lugar estuda-se o homem vivo, interroga-se o porquê


de suas formas varias de atividade, das que se conseguem uma expli-
cação psicológica e logo trata-se de explicar comparativamente os fac-
tos antigos e aprofundar mais segredos dos modernos (CESAR, 1934,
p. 29).

Cesar (1934) acrescentou ainda que essas eram as diretrizes de estudo da arte
moderna, não se concentrando somente pela perspectiva estética, mas sobretudo pela
perspectiva espiritual. O autor expõe “resumidamente” dois casos apresentados em

67
parceria com Durval Marcondes, psiquiatra da Inspeção Médico-Escolar (1927). Em
um deles reafirmou as diretrizes sanitárias preconizadas no período, observou traços de
degenerescência, com base no prontuário e nas análises antropométricas:

Trata-se de um indivíduo de 32 anos, preto, ex-soldado de polícia.


Entrou no Hospital de Juquery a 2 de julho de 1919, removido da Ca-
deia Pública, onde estava preso por ter assassinado a mulher a macha-
dadas.
Somaticamente apresenta diversos estigmas de degeneração, tais
como assimetria craniana, orelhas pequenas e abauladas, abobada pa-
latina e pés chatos (CESAR, 1934, p. 41).

O autor comparou as esculturas produzidas pelo interno com a arte cubista,


advertiu o leitor que o conceito de beleza no seu tempo tem sido bem diferente de tempos
passados e o equiparou aos artistas de vanguarda. Concluiu que as manifestações artís-
ticas correspondem à simbologia que Freud observou na interpretação dos sonhos, por-
tanto, para o autor, refletem imagens do inconsciente.
Em seus registros, Cesar (1945), destacou no campo das ciências médicas o seu
período de estudos na Europa, especialmente a sua participação no experimento do es-
tudo das funções psíquicas (reflexos condicionados, incondicionados ou naturais) no
Instituto de Medicina Experimental de Leningrado (1931) e no XV Congresso Interna-
cional de Fisiologia em Leningrado-Moscou (1935), presidido por Ivan Pavlov (p. 22).
No campo da história da arte, Gonçalves (1990) assinalou que as residências,
cafés, ateliês, galerias e os salões consolidaram-se a partir da década de 1940 como
importantes núcleos de integração cultural, sobretudo da arte moderna, nos quais artis-
tas, intelectuais e críticos de artes se reuniam-se para discutir, debater, estudar: “onde a
ação mais significativa era o intercâmbio de conhecimentos e o estímulo mútuos” (p.
58). Para a autora, Cesar é apontado entre as personalidades que se destacaram como
um dos personagens centrais desses grupos, ao lado de De Fiore, Paulo Rossi Osir, Lasar
Segall, Sérgio Milliet e Adolpho Jagle.
Esse período é marcado por uma atuação significativa de intelectuais em con-
tinuidade ao processo de consolidação das metodologias de estudo e pesquisa acerca das
manifestações artísticas. Intensificaram-se as ações, diversos grupos reuniam-se para
discutir, debater, estudar ou até mesmo congregar artistas em ateliês; para estabelecer o
intercâmbio de conhecimentos e o estímulo mútuo. Gonçalves (1990) observou que
além dos helenistas, surgiram outros dois loci significativos na discussão e difusão do
novo modelo de produção plásticas. Entre eles, o ateliê do pintor e escultor Joaquim

68
Figueira na Rua Brigadeiro Luis Antonio e o Seibi-kai, um grupo de artistas plásticos
japoneses.
A arte moderna é tomada como objeto de interesse por parte de críticos, muito
mais que na década anterior, Mario de Andrade, Sergio Milliet, Lourival Gomes Ma-
chado, Luis Martins, Ibiapa Martins, Osório Cesar, Quirino da Silva, Ciro Mendes, Ge-
raldo Ferraz, Roger Bastide, José Geraldo Vieira, Giuliana Giorgi, Maria Eugênia
Franco, são assinalados como críticos atuantes, colaborando em periódicos de São Paulo
e algumas revistas de cultura como Clima, Fundamentos, Planalto e Revista Acadêmica.
Gonçalves (1990) ressaltou que nesse período surge um coletivo dedicado ao estudo das
plasticidades sonoras: o Grupo de Cultura Musical formado pelo médico Adolpho Ja-
gle, amigo de diversos modernistas. Tem entre seus associados e frequentadores ocasi-
onais um expressivo número de artistas plásticos modernos. Entre eles, Bonadei, Zanini,
Rebolo, Pennacchi, Manoel Martins, Waldemar Costa, Clóvis Graciano, Carlos Scliar,
Alice Brill, Hilde Weber, Virginia Artigas são alguns nomes registrados no livro de
presença.
O pensador é apontado como um dos intelectuais engajados na luta da geração
moderna pela afirmação de novas linguagens nas artes plásticas. Com o encerramento
do Grupo de Cultura Musical por falta de recursos, as reuniões tiveram continuidade na
residência de Osório Cesar, os encontros tinham como proposta promover experimentos
sensoriais por meio de exercícios de plasticidades sonoras na perspectiva ótica-científica
pautadas por teorias psicanalíticas, dos quais participavam Bonadei, Zanini, Walter
Levy, Carlos Scliar e Gastão Worms. Esse período é denominado por Bonadei como a
fase das Impressões Musicais (1940-1944). Ainda que no campo história da arte a ins-
titucionalização do abstracionismo no Brasil, é tomada como “data-chave” a criação do
Museu de Arte Moderna (1948), dirigido inicialmente pelo crítico francês Leon Degan,
vinculado às correntes abstracionistas francesas (p. 78), o estudo de Gonçalves (1990)
revelou que as experiencias empreendidas por Cesar constituem a fase das raízes da
abstração do pintor. Em certa medida, os experimentos de Cesar influenciaram a pro-
dução de Bonadei. O pensador é responsável pela redefinição dos elementos plásticos
presentes na obra do artista. Embora os registros historiográficos indiquem que o perí-
odo mais intenso dessas experiências seja entre 1942-1944, é possível notar indícios
dessas discussões na segunda metade da década. Os referencias teóricos indicam que
Jagle e Cesar são os precursores das primeiras discussões acerca dos processos

69
sinestésicos com a aplicação de técnicas e associações imprevistas no campo da arte,
nos quais articulavam-se processos sensoriais auditivos, óticos e científicos.
Cesar publicou, pelo Departamento Municipal de Cultura o artigo Aspectos da
vida social entre loucos (1946), o autor retratou seu processo de observação sobre a
interação entre os loucos do Juquery, logo de início expõe seus referenciais teóricos ao
argumentar sobre o conceito de loucura, indicou sua perspectiva científica pautado pelos
escritos Doenças Mentais (1838) do psiquiatra Étienne Esquirol, considerado um dos
precursores da psiquiatria moderna ao lado de Pinel. Nesse sentido, Cesar (1946) reto-
mou o conceito de Esquirol registrado em obras anteriores para justificar sua inclinação
na defesa do tratamento humanizado dispensado aos alienados:

[...] Antes de entrarmos diretamente no tema deste trabalho vamos


tentar aqui estabelecer o conceito médico de loucura.
Falar de um louco, já dizia o psiquiatra Esquirol no século passado é,
para vulgo, falar de um homem que aprecia mal as suas relações com
o mundo exterior, sua posição e o seu estado; que se entrega aos atos
mais desordenados, mais extravagantes, mais violentos, sem motivo,
sem combinações prévias, sem premeditação ...
Felizmente esse conceito, que ainda perdura na imaginação popular,
não corresponde de todo à verdade em relação aos alienados.
Quem entrar num manicômio e procurar conversar atentamente com
os doentes, ouvir com interesse as suas queixas, as suas curiosas his-
tórias, notará, por certo, que entre uma grande parte dêles, o raciocínio
é lógico, a linguagem correta e a imaginação, por vezes, é criadora,
exuberante mesmo dentro do mundo mágico em que vivem.
O alienado é simplesmente isto: “um doente cujas perturbações do es-
pírito são um obstáculo, transitório ou permanente à sua adaptação a
sociedade na qual êle deve viver (P. Voivenel – La Raison chez les
fous, p. 14-15. Paris, 1927) (CESAR, 1946, p. 8)

Cesar (1946) destacou que os artistas loucos são os mais interessantes doentes
sob o ponto de vista da psicologia freudiana, denominando-os como “parte do grupo
esquizofrênico da psiquiatria moderna” (p. 12). O autor descreveu a edificação da ponte
de acesso entre Franco da Rocha e Caieiras (Aldeamento de Juquery), construída pelos
internos do Juquery (p. 13), revelou como a música foi introduzida no nosocômio como
processo terapêutico de interação:

Existindo no Hospital do Juquery vários doentes que conheciam mú-


sica e tocavam instrumentos de sopro, certa-vez lembrou-se o dr. Le-
opoldo Passos de encarregar um doente que além de ser excêntrico
filosofo, tinha boa qualidade de entender bem a divina arte de Orfeu
e, assim é criada a Charanga Hebefrênica do Juquery” (CESAR, 1946,
p. 14).

70
O autor ainda revelou em sua narrativa que os músicos da Charanga receberam
a visita do maestro e professor Kliass, um dos mestres mais afamados de piano em São
Paulo (p. 15). Cesar (1946) defendeu a competência de organicidade dos alienados; para
corroborar sua argumentação descreveu uma fuga coletiva de 17 alienados do Juquery
em uma “revolução numa manhã gélida de julho de 1924”, e evidenciou o senso crítico
dos alienados na articulação, organização e execução da fuga; reafirmou que “o alienado
bem orientado é capaz de organizar-se em sociedade” (p. 12-14). Concluiu a narrativa
analisando a admirável construção projetada e realizada pelos internos afirmando: “A
sua construção é notável. Somente a imaginação prodigiosa e uma paciência beneditina
poderiam, num indivíduo normal, realizar essa mecânica assombrosa sem os recursos
da técnica moderna” (p. 24).

2.2.2 A alfabetização das crianças anormais (1929)

Nas tramas/tessituras do movimento político educacional, a participação de


Osório na controversa III Conferência Nacional da Educação (1929)42 – mesmo que
indireta – é uma passagem que merece destaque. As Conferências Nacionais de Educa-
ção são consideradas um dos maiores eventos educacionais da década de 1920, entre-
tanto, a organização dessa Conferência, realizada em São Paulo, foi marcada por calo-
rosos embates entre os intelectuais paulistas e cariocas; de um lado, os representantes
da Sociedade de Educação de São Paulo (SBE) e de outro, a seção carioca da Associa-
ção Brasileira de Educação (ABE). Embora a Sociedade de Educação tivesse se filiado
a ABE, tornando-se Departamento Estadual da agremiação, resultado da articulação de
Renato Jardim, os confrontos entre as duas agremiações foram desencadeados durante
a II Conferência Nacional da Educação, ocorrida em Belo Horizonte, em 1928 (NERY,
2009, p. 187).
O professor Fernando Magalhães, contrariado com o parecer produzido por
Lourenço Filho, representante da Sociedade (denominada departamento paulista da
ABE), discutido em plenário, pronunciou um discurso de ofensiva. Como resposta, Vi-
cente Licínio Cardoso, presidente da ABE, Alberto Moreira, Tobias Moscoso e outros
delegados dos Estados, manifestaram apoio a Renato Jardim, Lourenço Filho, Veiga
Miranda e Figueira de Mello, o que motivou Fernando Magalhães a se retirar da

42
Não foram localizadas evidências sobre a efetiva participação de Osório Cesar na III Conferência
Nacional da Educação.
71
Conferência antes de seu final. Os embates resvalaram para o ano seguinte, no centro
da arena de disputas Renato Jardim e Fernando Magalhães protagonizaram a batalha,
divulgada nos principais periódicos nacionais (NERY, 2009, p. 187).
Nery (2009) observou que a contenda entre a Sociedade e a ABE sinalizava o
cancelamento da Conferência em São Paulo como desfecho. Do outro lado, Júlio Pres-
tes, presidente de São Paulo que havia anunciado sua candidatura, projetou na Confe-
rência uma boa oportunidade para divulgar as realizações de seu governo no campo da
educação, como estratégia conciliatória interferiu na disputa por meio de Amadeu Men-
des que se ofereceu para organizar e garantir a realização do evento (p. 189). A missiva
escrita por Mendes é publicada nos principais periódicos:

O professor Fernando Magalhães, recebeu do sr. Amadeu Mendes, di-


retor geral da Instrução Pública de S. Paulo, a seguinte carta:
“S. Paulo, 26 de fevereiro de 1929 – Exmo. sr. dr. Fernando, de Ma-
galhães – Rio de Janeiro – Tendo ficado resolvido na 2ª conferência
nacional de educação em Belo Horizonte, que a terceira conferencia
se realize em S. Paulo, em setembro próximo vindouro, venho em
nome do governo, convidar v. excl. para vir a esta capital, a fim de
prestar a sua valiosa colaboração nos trabalhos de organização dos
programas, a serem desenvolvidos nesse certame [...] (A Gazeta SP,
edição 6928, 28/2/1929, p. 1)

Contrariado com a estratégia adotada por Amadeu Mendes, Renato Jardim re-
nunciou à presidência da Sociedade de Educação. Em solidariedade, outros dirigentes
também o fazem (A Gazeta SP, edição 6931, 4/3/1929, p. 1). Os embates seguem, a
Sociedade passou por alguns meses de inatividade, nova diretoria foi eleita antes da
realização do controverso evento em SP, o professor Raul Briquet tomou posse como
novo presidente em cerimônia realizada durante a III Conferência, Renato Jardim e
Sampaio Doria discursaram. A retrospectiva acerca das ações da Sociedade e analise
dos conflitos que permearam a organização do evento em terras paulistanas foram pu-
blicadas no artigo intitulado A nova diretoria da Sociedade de Educação (O Estado de
S. Paulo, 14/9/1929, p. 8).
É nesse cenário pontuado por conflitos que o artigo: A alfabetização das cri-
anças anormais, publicado originalmente em um dos periódicos nos quais Cesar (1929)
colaborava: “São Paulo Jornal” (p. 393), é transcrito na edição de dezembro da Revista
da Educação, a qual concentrou sua edição em temas apresentados e debatidos na III
Conferência Nacional de Educação. No subtítulo grafado em caixa alta, o autor revela
os pressupostos eugênicos forjados na instituição:

72
O que é a ‘Escola Pacheco e Silva’, annexa ao Hospital do Juquery –
dando pão do espírito a uma pequena multidão de crianças que, “per-
didas para a sociedade e relegadas ao manicômio’ expiam ali os peca-
dos dos paes” (CESAR, 1929, p. 389).

De acordo com Ribeiro (1999, 2006), a ação do estado brasileiro no atendi-


mento de saúde mental infantil no Brasil começou a se estruturar na segunda metade do
século XIX, com a criação do Hospício D. Pedro II, em 1852. Esse início, entretanto,
não significou uma separação entre o tipo de tratamento oferecido às crianças e aquele
destinado aos adultos insanos.
Sem o objetivo de retomar de modo exaustivo um levantamento sobre esse iní-
cio do atendimento psiquiátrico à criança insana, mas apenas para circunscrever a am-
biência que, na virada do século XIX para o século XIX, marcava o horizonte de refle-
xões dos médicos brasileiros, retomamos aqui conclusões dos estudos empreendidos por
Arruda (1995), Januzzi (1992), Ribeiro (1999) e Uchoa (1981). Tais estudos indicam
que o interesse crescente pela questão da deficiência mental tem um marco importante
com o trabalho de Carlos Eiras, intitulado Tratamento dos Idiotas (1900), apresentado
no IV Congresso de Medicina e Cirurgia. Quanto às crianças, ressalta-se o empenho de
Juliano Moreira e Fernandes Figueira na inauguração de uma área anexa ao Hospital
Psiquiátrico da Praia Vermelha, destinado exclusivamente às crianças com deficiência
mental, em 1903. Esse feito, certamente, inspirou a criação de um pavilhão semelhante,
no Hospital do Juquery, em 1921.
Na interação com o campo da educação, temos Helena Antipoff, em 1929,
inaugurando o Laboratório de Psicologia da Escola de Aperfeiçoamento Pedagógico em
Minas Gerais – onde passou a realizar testes de inteligência e desenvolvimento mental
em crianças. Empreendimento semelhante se inaugurou na Escola Normal da Praça da
República, sob a liderança de Lourenço Filho e Noemi Rudolfer.
A Escola Normal da Praça, aliás, já havia recebido investimento nesse mesmo
sentido alguns anos antes, com o trabalho de Clemente Quaglio. Monarcha (1999) de-
fende que Quaglio era um teórico da chamada pedologia, “enquanto ramo especializado
da Psicologia Experimental”. Em suas pesquisas, Monarcha identificou que Quaglio te-
ria, no ano de 1909, criado, em uma pequena escola de sua propriedade, ainda em Am-
paro, um Gabinete de Antropologia Pedagogica e Psicologia Experimental, talvez um
dos primeiros do Estado. De fato, a podologia aparece nos escritos de Binet, como uma

73
espécie de ramo alternativo à pesquisa experimental com mensuração em psicologia.
(Antunes, 2010).
Assumindo o cargo de chefe de seção para o qual fora nomeado por Thompson,
Clemente Quaglio passou a apoiar a disciplina de Pedagogia e Educação Cívica, já em
1909. Em 1911, o professor autodidata lançou o livro “Lições de Podologia”, pela Thi-
pografia Siqueira e, comprovando o aumento de seu prestígio, lançou, em 1912, pela
renomada editora Francisco Alves o livro “Como corrigir os exercícios escritos e como
interrogar a leitura”.
Em 1913, Quaglio lança mais dois livros, por outras duas editoras: A solução
do problema pedagógico-social da educação da infância anormal de inteligência no
Brasil, pela Tipografia Espindola & Cia e o livro “Noções de anatomia e fisiologia: de
acordo com o programa oficial para exame de suficiência nas escolas normais secun-
darias, pela Typographia Casa Minerva. De 1914 até 1947, Monarcha (1999) identifi-
cou outros 42 títulos publicados pelo autor.
Os registros localizados por Monarcha (1999) sinalizavam que uma das ações
empreendidas por Quaglio foi a constituição de um Gabinete de Antropologia Pedagó-
gica e Psicologia Experimental junto à Escola Normal da Praça. Este gabinete ficou
vinculado, em certa medida mais próximo da cadeira de Pedagogia e Educação Cívica.
A primeira seção da Diretoria Geral de Instrução Pública ficou, assim, dividida, com
funções de caráter mais administrativo e funções de pesquisa. Talvez essa aproximação
tenha justificado a mudança do nome (e, provavelmente, dos programas) da disciplina
de Pedagogia e Educação Cívica, que passou a contar com a expressão “Psicologia Ex-
perimental” na frente do nome: Psicologia Experimental, Pedagogia e Educação Cívica.
Fiore (1982, p. 167) sinalizou que o Pavilhão para atendimento a crianças in-
sanas do Juquery apresentava uma inovação importante: “a primeira escola para crianças
anormais, com dois pavimentos e capacidade para 60 crianças, algumas das quais já se
encontravam internadas no Juquery na época da inauguração e outras transferidas com
a colaboração do Juizado de Menores”.
É sobre essa iniciativa que trata o texto de Osório Cesar:

Em São Paulo, no Hospital do Juquery, desde maio do corrente ano


que funciona a “Escola Pacheco e Silva”, sob a direção do pediatra dr.
Vicente Baptista, espírito culto e investigador, auxiliado pelo sr. Nor-
berto de Souza Pinto, professor de pedagogia experimental e psicolo-
gia aplicada à educação (CESAR, 1929, p. 389)

74
Cesar (1929) iniciou com a apresentação Escola “Pacheco e Silva” do Juquery.
Argumentou sobre o panorama das políticas públicas para o atendimento de “crianças
anormais”, afirmando que:

Antes, a situação desses pobres meninos era de cortar o coração.


Quem os visse crescer no ambiente hospitalar como seres irracionais,
sem nenhum contato com a vida espiritual, ficaria certamente penali-
zado diante dessa pequena multidão de crianças anormais, que perdi-
das para a sociedade e relegadas ao manicômio a expiarem as culpas
dos pais, aguardavam oportunidade para receber a luz benéfica da ins-
trução (CESAR, 1929, p. 389).

Dialogando com o campo que se conformava à época, o autor passou a relatar


a existência de escolas semelhantes no Distrito Federal, Belo Horizonte e São Paulo e,
por fim, reverenciou a criação da escola no Juquery como grande acontecimento, indi-
cou “brilhantes observações pedagógicas”, sobre as quais discorre no artigo, ilustrado
com desenhos elaborados pelos “doentinhos mentais”. A legenda indica que foram pro-
duzidos após “as primeiras lições que os alfabetizaram, num período de 80 aulas (CE-
SAR, 1929, p. 390)”43. Nesse sentido, Coutinho (2002), assinala que:

A pedagogia absorveu em seus programas os resultados das pesquisas


científicas, principalmente o conhecimento sistematizado sobre o de-
senvolvimento da capacidade de produção gráfica da criança e das
pesquisas artísticas, o reconhecimento e a importância da liberdade de
expressão da criança (p. 172).

É interessante assinalar, que os gabinetes de antropologia pedagógica e psico-


logia experimental, propostos por Clemente Quaglio para a Escola Normal também são
parte da estrutura proposta na Escola do Juquery, como registrou Osório Cesar: “a escola
possui um pequeno Laboratório de Psicologia Experimental e de Antropologia Pedagó-
gica, aparelhado para verificação dos exames mais importantes de psicologia patoló-
gica”.
Essa aproximação entre a Escola para crianças anormais do Juquery e a produ-
ção de Clemente Quaglio (posteriormente, herdada por Lourenço Filho e Noemi Rudol-
fer) no Laboratório de Psicologia Experimental da Escola Normal da Praça da República
parece indicar que havia um campo comum de reflexão e produção de conhecimento em
torno da noção de uma pedagogia científica, muito própria do início do século XX,
como, afinal, indicou o próprio Osório Cesar:

43
Anexo J.
75
É positivamente admirável o avanço que a pedagogia científica tem
conseguido alcançar nestes últimos tempos, principalmente no terreno
da psiquiatria. E louvável é, também, a ação dos ortofrenistas como essa
do sr. Norberto de Souza Pinto, modesto estudioso que tem-se esfor-
çado nesse terreno, introduzindo e aperfeiçoando na prática escolar, mé-
todos novos e originais seus no ensino individual que cada caso requer.
(CESAR, 1929, p. 391).

Cesar (1929) produziu um descritivo metodológico, qualitativo e quantitativo


do equipamento público; indicou o número de crianças matriculadas no início do semes-
tre letivo, destacou o expressivo aumento da demanda no período e descreveu a meto-
dologia aplicada: “O ensino intuitivo e processado pelo método individual, onde a efi-
ciência da aprendizagem constituem um corolário da acuidade mental do educando á
metodologia especializada criada de momento”. O pensador apontou os conteúdos pro-
gramáticos: a) Educação dos sentidos; b) Educação das atenções; c) Educação da me-
mória; d) Exercício de linguagem escrita e oral; e) Trabalhos manuais; f) Lições de coi-
sas; g) Exercício de desenho; h) Canto; i) Ginástica; j) Exercício de cálculo instrutivo
(p. 391). Embora a metodologia aplicada na Escola Pacheco e Silva não se configurasse
uma novidade no sistema de ensino paulista destinado às denominadas escolas normais,
a proposta inovadora se materializava no subtítulo do artigo, no qual Cesar (1929) reve-
lou que havia um expressivo número de crianças “perdidas para a sociedade e relegadas
ao manicômio, expiam ali os pecados dos pais” (CESAR, 1929, p. 389).
O autor assinala a competência do professor Norberto Souza Pinto na organi-
zação do programa de ensino, destaca os excelentes resultados obtidos em curto espaço
de tempo; fundamenta sua narrativa com a descrição de uma evolução pedagógica. Para
isso, compartilha o resumo da observação de “um menor da instituição; a ficha de anam-
nese revela o aluno G., 14 anos, entrada no Hospital de Juquery em 6 de janeiro de
192944, analfabeto, epilético. O histórico da evolução do interno, apontou que embora
não tivesse melhora no quadro clínico, após um curto período escolar de 80 aulas, fora
alfabetizado:

Com esse programa admiravelmente organizado, o sr. Professor Nor-


berto de Souza Pinto, que é sem favor nenhum um competente orto-
freniata45, tem conseguido resultados surpreendentes de completa

44
O artigo original apresenta inconsistências nas datas, as quais foram grafadas como: “entrada no Hos-
pital de Juquery em 23 de janeiro de 1929 e entrada na escola em 6 de janeiro de 1929”. No âmbito
desta pesquisa, a escolha foi reordenar as datas pela evidente probabilidade do inverso.
45
Especialista em Ortofrenia: arte de corrigir as tendências morais ou intelectuais. Dicionário Priberam
da Língua Portuguesa. Disponível em <www.priberam.com/dlpo/ortofrenia>. Acesso em 30 de abril
de 2018.
76
alfabetização em espaço de tempo relativamente curto, de menores
mentalmente anormais fadados a viverem a mercê da natureza, se não
fossem os progressos de moderna pedagogia cientifica.
É positivamente admirável que o avanço que a pedagogia científica
tem conseguido alcançar nestes últimos tempos, principalmente no
campo da psiquiatria. E louvável é também a ação dos ortofrenistas
como essa do sr. Norberto Souza Pinto, modesto estudioso que tanto
tem se esforçado neste terreno, introduzindo e aperfeiçoando na pra-
tica escolar, métodos novos e originais seus no estudo individual que
cada caso requer (CESAR, 1929, p. 392).

O pensador concluiu sua narrativa desdobrada com uma perspectiva propagan-


dística, enfatizando o papel de Pacheco e Silva na implantação de uma “obra formidável
de patriotismo e humanidade”, realizada pelo governo do Estado de São Paulo (CESAR,
1929, p. 393).

77
3 Proposições e posições políticas

Embora na delimitação do corpus da pesquisa, o recorte político na trajetória


do pensador, não fosse o foco principal da investigação, os fragmentos que compõem
essa camada do sujeito, evidenciam-se como essenciais na reconstrução de sua a produ-
ção intelectual. Nesse sentido, espera-se que as fontes analisadas permitam validar se as
experiencias vivenciadas são componentes constitutivos da hipótese elaborada/expres-
sas nos objetivos da pesquisa laborada por Cesar em suas produções.
Nessa perspectiva, a investigação será fundamentada com base na articulação
dos conceitos elaborados por Carvalho (1989), Le Goff (1990) e Vieira (2008). Ao ana-
lisar as fontes primárias inventariadas no acervo do Partido Comunista46, é possível
inferir que a massa documental per se se constitui em substancial objeto de investigação,
no entanto, os limites desta dissertação exigiram que selecionássemos e analisássemos
apenas parte do material. As fontes inventariadas sinalizam que a década de 1930 se
constitui como um divisor de águas na trajetória de Osório Cesar, uma vez que se evi-
dencia seu engajamento no Partido Comunista.
A quebra da bolsa de valores de Nova Iorque (1929) alterou bruscamente o
cenário do capitalismo liberal mundial, o reflexo da Grande Depressão impacta signifi-
cativamente a economia brasileira, afetando a principal fonte de renda: a produção ca-
feeira. A crise abalou as exportações, enfraqueceu as oligarquias. Esse período é carac-
terizado pelos embates entre correntes políticas representantes das classes dominantes e
o proletariado na busca pela hegemonia na elaboração e estabelecimento das novas di-
retrizes políticas; a cidade de São Paulo é tomada pela ebulição artística, cultural, eco-
nômica e social (GIANNOTTI, 2007, p. 92).
Com o conturbado processo de sucessão do governo de Washington Luís (úl-
timo governo representante da política do Café com Leite), se acirraram as divergências
entre as elites políticas paulista e mineira e a sociedade brasileira acompanhou o levante
dos dissidentes políticos das regiões Sul e Nordeste que se uniram para desarticular a
hegemonia exercida pela elite cafeeira, sob a acusação de vitória fraudulenta de Júlio
Prestes nas eleições presidenciais. A revolta armada irrompeu e a Revolução de 1930 se
materializou com a tomada de poder pelos oposicionistas, a deposição de Washington

46
Partido Comunista, prontuário nº 2431, 16 volumes. Acervo DEOPS/SP, Acervo Público do Estado
de São Paulo.
78
Luís da presidência da república, o impedimento da posse de Júlio Prestes, seu sucessor
e a instauração da Era Vargas com seu governo provisório (1930-1934).
Nesse mesmo período, assistia-se uma intensificação da produção intelectual:
Caio Prado Junior, Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda publicavam obras com
os resultados de suas investigações sobre a herança cultural, explorando os matizes e
raízes da formação do povo brasileiro (LOVATO; GOUVÊA, 2017, p. 64). A massa
documental analisada nessa investigação (correspondências, periódicos e documentos
textuais), depositadas nos acervos DEOPS, permite identificar uma rede de diálogos
encadeados entre Cesar, parte dos intelectuais comunistas brasileiros e os pensadores
marxistas filiados ao Partido Comunista europeu naquela década, agentes sociais que,
marcaram sobremaneira sua produção intelectual. Depois de retornar de sua temporada
de estudos e pesquisas na Europa, em 1931, Cesar e Tarsila do Amaral passam a ser
ostensivamente investigados pelo DEOPS.
Seu interesse pelo marxismo é corroborado, especialmente, em dois de seus
livros publicados: Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS, prefaciado
por Henri Barbusse e ilustrado por Tarsila do Amaral (1932)47; e Que é o estado prole-
tário? (1933), com capa ilustrada pelo artista Flávio de Carvalho, propõe reflexões sobre
a vida do operário na Rússia soviética, seguido de um estudo sobre seguro social operá-
rio. As estruturas de sociabilidade estabelecidas nesse período são algumas das tramas
que compõem o mosaico da imensa tela que reconstrói o mapa conceitual sobre a traje-
tória do pensador. Os contextos corroboram as análises preliminares empreendidas no
capítulo dois sobre as potências das redes de sociabilidades. Por sua vez, as tessituras
das redes que marcam esse período apontam alguns indícios que podem ter contribuído
para desencadear, de algum modo, o aniquilamento das ressonâncias da produção de
Cesar.

3.1 A ordem social: uma visão panorâmica do cenário político brasileiro

Fundado no início da década de 1922, o PCB tinha como objetivo principal


mobilizar as classes operárias e promover uma revolução do proletariado substituindo,
desse modo a sociedade capitalista pela socialista (ROXO; SACRAMENTO, 2012, p.
13). Ferraz (1983) observou a presença de Cesar na casa de Tarsila na primeira metade

47
Capa e prefácio do livro Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS, prefácio de Henri
Barbusse (1932).
79
de 1930, no capítulo “Intervenção: a educação sexual e o divórcio”, ao revelar quem
foram os entrevistados sobre a série publicada no Diário da Noite, dedicada a debater
questões sociais, sobretudo a legislação denominada pelo jornalista como “um inquérito
‘queimante’” (p. 76). O autor acrescenta ainda que, na tentativa de “pôr uma brasa na
consciência paulistana”, elaborou uma pauta bastante ousada para época, reunindo as
principais autoridades do eixo Rio-São Paulo: entre elas Franco da Rocha, Durval Mar-
condes Custódio de Carvalho, Osório Cesar, Pacheco e Silva, João Arruda entre outros.
Ao descrever a presença de Cesar entre os entrevistados, afirma:

A 21 de maio, implacavelmente, o inquérito continuava: era a vez do


dr. Osório César, um dedicado estudioso de psicanálise, a quem en-
contráramos frequentando a casa de Tarsila do Amaral, circunspecto,
em seus ternos escuros. Não só era favorável ao divórcio, como afir-
mou que o “caráter das crianças deve ser fixado por uma educação
sem constrangimentos” (FERRAZ, 1983, p. 78).

Ferraz (1983), ainda revelou que o envolvimento de Cesar e Tarsila se tornara


público três meses após a separação da pintora:

A 26 de julho, Tarsila do Amaral, que travara relações ostensivas com


o dr. Osório Cesar, nos anunciava sua intenção de trabalhar no ensino
da pintura e do desenho, antes de partir para Paris, onde intenciona
realizar em 1931, sua terceira exposição (p. 78).

Embora não fossem encontradas evidências de contatos ou até mesmo proxi-


midade entre Osório Cesar, Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral anteriores a esse
período, é possível inferir que o convívio entre o trio tenha se dado nos encontros dos
salões artísticos-literários, sobretudo na Villa Kyriall. Oswald de Andrade foi frequen-
tador assíduo dos encontros promovidos por Freitas Valle junto com Washington Luiz,
presidente da República, de quem era amigo desde 1916, a ponto de tê-lo como padrinho
de seu casamento com Tarsila (1926). Osório, por sua vez, registra sua maior frequência
aos encontros da Villa Kyriall entre 1913-1918. Portanto, é possível inferir que o en-
contro entre os sujeitos pode ter ocorrido nas duas primeiras décadas do século XX. A
proximidade de Oswald de Andrade e o presidente perrepista favoreceu os organizado-
res da Semana de 22 na divulgação do Movimento Modernista, que teve o apoio do
jornal Correio Paulistano, periódico financiado pelo PRP, um dos símbolos da oligar-
quia paulista (MICELI, 2001, p. 95). O período é pontuado pelo afastamento e desvin-
culação de parte dos intelectuais com as correntes perrepistas, os quais passam a defen-
der os ideais comunistas semeados a partir da criação da seção brasileira da

80
Internacional Comunista, o PCB (1922), entre os intelectuais, Oswald de Andrade as-
sume uma retórica reconhecida como apropriação dos intelectuais de esquerda (NEVES,
2005, p. 45).
A viagem empreendida pelo casal incluiu intercâmbios com uma série de visi-
tas a institutos artísticos, culturais, educacionais e de saúde. Cesar, dedica-se ao mesmo
tempo em interações que possibilitem articulações científicas e políticas; no campo ide-
ológico revela uma guinada à esquerda, afasta-se das correntes perrepistas. No retorno
da temporada de três meses de viagem à Europa com passagem pela Rússia e França,
organiza sua primeira produção textual com reverências ao marxismo-leninismo. Nesse
mesmo período, publica Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS. A
obra é prefaciada por Henri Barbusse e ilustrado por Tarsila do Amaral (1932)48. Bar-
busse, escritor, ex-diretor do Le Monde, apresenta a nota introdutória da obra em fran-
cês. Ele era um dos principais articuladores do Partido Comunista Francês, além de ser
autor do clássico O fogo, no qual narra os registros do front durante a Primeira Guerra
Mundial. Esse livro foi laureado com o Goncourt (1916), o mais concorrido prêmio
literário francês, e ainda hoje figura na lista de referências literárias de seu país. Na
produção da obra organizada como um relato de viagem, Cesar (1932) compartilha com
os leitores os registros das visitas realizadas as diversas instituições e evidencia seu en-
cantamento sobre a organização política e social soviética. O pesquisador destaca a sua
participação em um dos experimentos realizados para os estudos das funções psíquicas
(reflexos condicionados, incondicionados ou naturais), no Laboratório de Fisiologia do
Instituto de Medicina Experimental de Leningrado conduzido por Ivan Pavlov:

[...] Durante a nossa visita a esse Instituto, procuramos avistar o emi-


nente cientista, mas não tivemos sorte porque ele acabava de partir
para o campo, onde fora gozar as suas férias anuais.
Convidados por um dos seus jovens assistentes, fomos presenciar,
num cão, as experiencias dos reflexos condicionados.
Foi Pavlov que introduziu na ciência o método experimental para o
estudo das funções psíquicas, que até 1900 era vago, subjetivo, ine-
xato (CESAR, 1932, p. 138).

O fisiologista russo é reconhecido mundialmente por suas investigações cien-


tíficas que resultaram na elaboração da teoria do reflexo condicionado, com base nos
testes realizados em cães. As descobertas de Pavlov influenciaram sobremaneira os es-
tudos e pesquisas nos campos da medicina, da psicologia e pedagogia. Pavlov

48
Anexo L.
81
julgava/pressupunha que o reflexo condicionado exercia um papel importante no com-
portamento humano, por consequência na educação. Ostermann e Cavalcanti (2010)
afirmam que as teorias de Pavlov forneceram as bases para que John Watson estabele-
cesse uma das principais teorias da aprendizagem no mundo ocidental: a corrente com-
portamentalista ou behaviorismo (p. 10).
Em outra passagem, Cesar (1932) descreveu uma visita ao Instituto do Cérebro,
órgão filiado à Academia Comunista de Moscou, fez elogios à sua moderna estrutura e
revelou:

Em companhia da dra. Schevtchenko, colaboradora scientifica, visita-


mos todas as dependências do Instituto. A coleção dos cortes seriados
é bastante grande. As salas de técnica histológica contêm completo
aparelhamento moderno. No museu, vimos uma bela coleção de mol-
dagem dos cérebros dos mais afamados escritores e cientistas da
U.R.S.S: Mayakovski (poeta), Fritshe (crítico literário-artístico, mar-
xista) Reissner (professor) e outros.
O cérebro de Lenin aí está também. Foi comovidamente que o tivemos
entre as mãos, e que examinámos esse cérebro que dirigiu o destino
de milhões de homens, direção que ainda continua num desdobra-
mento constante para a creação da sociedade nova, que fatalmente da
U.R.S.S. se estenderá pelo mundo inteiro (CESAR, 1932, p. 141).

Ainda nesse relato de viagem, em um ato bastante ousado, especialmente ao


cotejarmos as observações do autor interpretados à luz dos contextos políticos do perí-
odo, Cesar (1932) imbuído dos princípios da eugenia positiva retomou o tema acerca
da educação sexual e, animado com o sistema de saúde soviético, especialmente com as
políticas públicas relacionadas à saúde da mulher, descreveu os mecanismos da legali-
zação do aborto adotados pelo governo, utilizando indicadores para evidenciar que a
adoção da lei não impactou as taxas de natalidade no país (p. 157). A conclusão do texto
também é surpreendente, para o período: o autor afirma que o direito ao aborto corres-
ponde a “um dever social e a um direito social” (CESAR, 1932, p. 172-173).
Nesse mesmo ano, as fontes primarias inventariadas revelam a troca da pri-
meira de um conjunto de três correspondências enviadas por Osório Cesar a Arthur Ra-
mos, pioneiro dos estudos da Psicologia Social no Brasil (1932).
Nos estremecimentos que emergiram nas elites paulistanas a partir da ascensão
de Getúlio Vargas, uma série de desdobramentos de repressão alcançaram os intelectu-
ais paulistas. Em 1932, os registros do DEOPS revelam a primeira detenção de Osório
Cesar. Recolhido por cerca de 50 dias, sob a alegação de campanha comunista a favor
do governo soviético. Na sua ficha criminal do DEOPS, Cesar é qualificado assim:

82
OSÓRIO CESAR - Intelectual comunista e médico do Hospital do
Juquery.
Já esteve em Montevidéu num Congresso Antiguerreiro, organizado
pelo Partido Comunista (3ª Internacional). Esteve na Rússia, ultima-
mente, em missão científica, mas ao chegar, desde logo, reiniciou sua
propaganda. Em São Paulo sempre tem feito propaganda comunista e,
também presidiu o Comité Antiguerreiro, aqui criado pelo P.C.B. Em
sua residência, hoje foram encontrados documentos que provam sua
atividade comunista. Detido em 28 Presidio (Prontuário Osório Ce-
sar)49.

As ações de repressão ao comunismo estamparam os principais periódicos. A


revista A Cigarra, por exemplo, publicou uma série de imagens em suas duas páginas
centrais com o título “Repressão ao Comunismo”, e revelava quem eram os conspirado-
res revolucionários. Cesar figurava entre os 36 presos, ao lado de Mary Houston Pedrosa
(cunhada de Benjamin Péret) e seu marido Mario Pedrosa:

Comunistas presos pela Delegacia de Ordem Política e Social que


exerciam sua atividade em nosso Estado, promovendo agitações, dis-
tribuindo boletins e divulgando, por todos os meios, as doutrinas ex-
tremistas. Protegidos pela complacência das autoridades que a Dita-
dura trouxe para São Paulo depois dos acontecimentos de Outubro, os
adeptos do credo de Moscou agia ou agiam com inteira liberdade, fa-
zendo ampla propaganda dos ideais subversivos, principalmente entre
a classe operaria, e preparando o seu plano de destruição contra as
nossas instituições e o nosso patrimônio. A campanha movida contra
esses maus elementos, pelo delegado de Ordem Política e Social, de
acordo com o Chefe de Polícia, dr. Thyrso Martins, merece todos os
aplausos e vem desmentir as invencionices da Ditadura, que propalou
ser, a Revolução Constitucionalista, um movimento comunista (A Ci-
garra, set/1932, edição 427).

Essas prisões, desencadearam os movimentos de aproximações e afastamentos entre


os agentes comunistas da seção brasileira. Os embates sobre as novas direções políticas
se fortaleceram, suscitaram as dissidências e rupturas dentro da organização. Os “cama-
radas” passaram a se dividir: de um lado permaneceram os marxistas-leninistas e de
outro organizaram-se os trotskistas ou bolchevistas-leninistas. Este últimos, integravam
também a Liga Comunista Internacionalista (LCI), órgão vinculado à Oposição Interna-
cional de Esquerda (OIE), composta por Mário Pedrosa, Lívio Xavier, Aristides Lobo,
Plínio Gomes de Melo, João Mateus, Benjamin Péret, Victor Azevedo Pinheiro, João da
Costa Pimenta, Fúlvio Abramo, Raquel de Queiroz, Dalla Déa, entre outros. Declara-
vam-se a fração à esquerda do PCB. O objetivo dos correligionários da LCI era articular

49
As citações ao Prontuário Osório Cesar, nº 1936, volume I, 28/8/1932. DEOPS/SP, serão doravante
identificados como Prontuário Osório Cesar.
83
e mobilizar a oposição interna às direções stalinistas dos partidos comunistas, procu-
rando, desse modo, convencer os camaradas sobre as diretrizes políticas trotskistas
(FERREIRA, 2010, p. 16).
Os representantes da LCI brasileira, contrariados com os rumos políticos do PCB
postulados pelos integrantes da corrente marxista-leninista, romperam com os dirigentes
do partido sob a alegação de que Octávio Brandão defendia a formalização de alianças
com setores da elite, ou seja, acusavam a ala dirigente do PCB de representar os interes-
ses dos pequenos burgueses (FERREIRA, 2010, p. 16). Ferreira (2010) observa que os
ataques das correntes trotskistas, contrárias à proposta de alianças entre a burguesia-
proletariado estavam relacionados ao favorecimento da burguesia industrial. Esse era
um dos argumentos que indicavam que o desdobramento dessa articulação ocasionaria
o que a Liga Comunista “chamou de ‘Revolução a Retalhos’” (p. 19). O autor assinala
que:

No entendimento da Liga Comunista o campesinato fazia parte da pe-


quena burguesia; entretanto, no Brasil predominava o trabalhador ru-
ral assalariado vivendo em situação quase miserável. Daí os integran-
tes da Liga entenderem a presença da “Revolução a Retalhos”, mesmo
no transcorrer do período “Classe contra Classe”, como produto, aliás,
de uma aliança do PC com a pequena burguesia e a “revolução por
etapas” consagrada no 3º Congresso do Partido” (FERREIRA, 2010,
p. 19).

Os relatórios dos agentes do DEOPS, com os registros das ações do PCB50,


indicam que a propaganda intelectual em prol da URSS aumentou sobremaneira a partir
desse período. Asseguram que diversas organizações foram criadas como aparato polí-
tico: a Associação Amigos da Rússia (1931), o Clube dos Artistas Modernos (1933),
Socorro Vermelho Internacional, Comitê Antiguerreiro de São Paulo (1934) estão entre
elas. As fontes primárias analisadas demonstram que Cesar51 surgia, nos registros, como
uma das figuras centrais nas bases da militância por sua articulação, produção e circu-
lação, bem como na manutenção e mobilização de recursos para o Partido.
Com o resultado da Revolução de 1932, o cenário nacional foi tomado pelas
articulações e mobilizações em torno da campanha eleitoral para a Assembleia Nacional
Constituinte e as forças políticas se passam a se reorganizar para responder as demandas
sociopolíticas no processo de transição do Brasil que se desloca da condição de país

50
Partido Comunista, prontuário nº 2431, 16 volumes. Acervo DEOPS/SP, Arquivo Público do Estado
de São Paulo.
51
Prontuário Osório Cesar, fls. 86, p.
84
agrário-exportador para urbano-industrial. Andreucci (2006) destaca que se intensificam
os embates entre governo e os integrantes da Comissão, nomeada pelo Governo Provi-
sório, responsáveis pela elaboração do anteprojeto da Nova Constituinte, em substitui-
ção à de 1891. Nesse contexto, aumentaram as tensões entre situação e oposição, os
agentes dos departamentos e seções do Estado varguista organizaram seus aparatos de
perseguição e repressão aos agitadores, e praticamente todas as editorias foram subme-
tidas à vigilância (p. 166).
O primeiro trimestre de 1933 foi marcado pela ascensão dos nazistas ao poder
e iminência da Segunda Guerra, decorrente da escalada do império japonês, assombrava
o imaginário social do planeta; em Amsterdã, os escritores Henri Barbusse e Romain
Rolland reuniram os principais pensadores europeus em torno da mobilização da luta
antifascista. Em São Paulo, a oposição se articulava em prol de reinvindicações sobre
as novas legislações, e os “agitadores de greves” eram os principais alvos da polícia
política de Vargas.
Nesse contexto, Cesar fora anunciado nos principais periódicos (1933)52 como
um dos representantes escolhidos entre os participantes da reunião preparatória para cri-
ação do Comitê Antiguerreiro. Tal demarcação o torna alvo do acompanhamento pró-
ximo do “reservado Guarany”, um agente infiltrado do DEOPS que revela o passo a
passo de Osório Cesar nos microssistemas políticos. Nos relatórios, passam a ser regis-
trados detalhes das atividades realizadas, bem como os embates ocorridos no CAM.
Entre eles, as conferências realizadas no Mês das Crianças e dos Loucos.
No “relatório reservado”, de 6 de abril, o agente observava que Osório Cesar
presidiu ao lado de Juvenal Soares, Oscar Rodrigues da Silva, Vicente Costa e Arlindo
Pinto, uma reunião “de vários elementos do P.C. de tratarem dos interesses do Partido
Comunista, adesão dos tenentes e do movimento grevista de 1º de maio”, na sede da
União dos Operários em Fábricas de Tecidos (UOFT), no Largo São José do Belém,
SP53. O mesmo relatório revelava que Cesar foi “recolhido” ao Presídio do Paraíso em
11 de abril, novamente acusado de “agitação da ordem social”, levado para o Presídio
Paraíso, onde permaneceu por 16 dias com a determinação de ficar “incomunicável”.
Em um de seus relatórios, o “reservado Guarany” advertia seus superiores sobre as in-
terações/mobilizações políticas de Cesar em participações nas ações culturais

52
Reunião preparatória do Comitê Contra a Guerra. Diário de São Paulo, 6/2/1933.
53
Anexo M.
85
programadas no CAM, acompanhado de Tarsila do Amaral e do escritor Jaime Adour
da Camara54. Um registro desse período chama bastante a atenção: um impresso que se
supõe ser um folheto, comunica à “Classe Trabalhadora” o resultado do processo refe-
rente à primeira detenção, atribuído ao réu por publicar o livro Onde o proletariado
dirige? Depois de compartilhar trechos da sentença com exaltações à sua obra, Cesar se
justifica sobre um artigo publicado no jornal “O Estado de S. Paulo”, no qual esclarece:

[...] Aproveito a oportunidade para declarar não ser de minha autoria


artigo inserto no “O Estado de S. Paulo” de 26 de maio p.p. sob o
título: “Pacifismo e Comunismo”, trazendo as iniciais O.C.
Desminto também os boatos de ter ligações “revolucionistas” com
elementos “tenentistas”.
Osório Cesar (15/8/1933)

A ordem social, instalada a partir do Governo Provisório, desconfigurou o mo-


dus operandi das estruturas de sociabilidade da primeira década do século XX; os en-
contros artísticos-literários que se alternavam entre a Villa Kyriall e as residências de
Veridiana Prado e Olivia Guedes Penteado, se deslocaram para os ateliês, cafés, resi-
dências, galerias e associações que assumem as estruturas de sociabilidade da Paulicéia
Desvairada de Mario de Andrade. Nesse momento, Osório Cesar apresentou ao público
seus estudos sobre a arte dos Loucos do Juquery e concedeu uma entrevista para a Folha
da Noite55 sobre a sua conferência de abertura do Mês dos Loucos e das Crianças, rea-
lizado no CAM (1933). Pelos mesmos dias, manifesto dos intelectuais de São Paulo
contra a guerra imperialista e contra o fascismo, é publicado em periódico ligado ao
grupo Folha56. Nela os signatários, entre eles Osório Cesar, expressavam a grande pre-
ocupação com a iminência da eclosão da Segunda Guerra Mundial em seu enunciado:

Uma numeroso grupos de intelectuais paulistas, de vários credos po-


líticos e filosóficos acaba de lançar um manuscrito contra a guerra
imperialista e contra o fascismo. Pode-se discordar de uns tantos fun-
damentos desse manifesto e não endossar muitas de suas afirmativas.
Mas não se pode abafar um movimento em prol da paz que, todos
devemos prestigiar quando o mundo parece em véspera da mais tre-
menda catástrofe (Folha da Noite, 28/10/1933, p. 3).

É possível observar, pelo tom do manifesto, que as mobilizações do Partido


Comunista Francês (PCF), liderado por Henri Barbusse e Romain Holland, sobre a cri-
ação da Frente Contra a Guerra e a escalada do Imperialismo, reverberam em solo

54
Anexo N.
55
O desenho dos loucos. 2ª Folha da Noite, 31/8/1933, p. 8-9.
56
Contra a guerra imperialista e contra o fascismo. Folha da Noite, 31/8/1933, p. 3.
86
brasileiro. Ainda em 1933, Osório Cesar publicava seu livro Que é o estado proletário?
no qual propunha reflexões sobre a vida do operário na Rússia soviética, seguido de um
estudo sobre seguro social operário. A nota do autor nas páginas iniciais explicita:

Este trabalho é uma exposição organizada, adaptada para o português


de alguns capítulos sobre o Estado proletário das obras de Preobra-
jenski (Anarquismo e Comunismo), Marx (A Comuna de Paris), Le-
nin (A Comuna de Paris), Stalin (Os fundamentos do leninismo) En-
gels (Origem da família, da propriedade privada e do Estado) Bukha-
rin (ABC do comunismo, etc. [...] (CESAR, 1933, p. 8).

O livro trazia em anexo, nas páginas finais da obra, um apêndice no qual co-
munica em letras garrafais o “resumo” do processo de sua prisão, com a respectiva sen-
tença do “Juízo Federal” (p. 169) e notas de intelectuais com apreciações da obra Onde
o proletariado dirige: visão panorâmica da URSS. Entre eles, Henri Barbusse, da Im-
prensa Médica, s/d, assinado por Neves-Manta, da Revista do Colégio Livre de Estudos
Superiores de Buenos Aires, de 12/1932, assinado por Julia Laurencena, de David Vi-
godsky de 30/7/1933.
O relatório do DEOPS do período confirmava o engajamento de Cesar na mi-
litância comunista, também, pela troca de correspondências para intercâmbio cultural
realizado por intermédio da “organização russa VOKS”57, no qual revela:

[...] mantinha constantemente correspondência, com essa organiza-


ção, e nota-se em suas atividades de intelectual uma perfeita obediên-
cia ao programa da V.O.K.S. (Prontuário Osório Cesar).

A VOKS era apontada, pelos agentes dos órgãos de repressão, como uma das
organizações “especialmente criada pela União Soviética para facilitar a propaganda
comunista entre os intelectuais”58. Os agentes do DEOPS sustentam suas argumentações
com base em uma correspondência apreendida, na qual Roy Barton, pesquisador do
Museu de Antropologia e Etnografia (MAE) 59 entre 1930-40, se apresentara a Cesar por
indicação de membros da VOKS. O interlocutor é apontado como o pioneiro dos estu-
dos sobre antropologia jurídica americana, pela publicação do Direito Ifugao (1919)
60
. A mensagem revelava o empenho dos membros da organização soviética para a

57
Anexo O. Relatório de inquérito DEOPS-SP, prontuário Osório Cesar, nº 1936, fls. 67, p 169.
58
Anexo O, fls. 84, p. 164.
59
O MAE é conhecido como Kunstkamera e foi o primeiro museu da Rússia.
60
Sobre Direito Ifugao. In: ALVES, Leonardo M. Antropólogos Jurídicos: Roy Franklin Barton e o
Direito Ifugao. Ensaio e notas: artes, humanidades e ciências sociais [online], 2016. Disponível em:
<//ensaiosenotas.com/2016/03/01/antropologos-juridicos-roy-franklin-barton-e-o-direito-ifugao/>.
Acesso em 20 de junho de 2017.
87
divulgação da produção de Cesar acerca do misticismo e loucura em solo russo, bem
como o interesse de Barton nas obras do loucos do Juquery e as orientações para o
envio de obras (1933).
A Constituição de 1934, promulgada no segundo semestre pela Assembleia
Nacional Constituinte, pautada pelo pensamento liberal, apresentou inovações em seu
texto: promulgou o Código Eleitoral criado no anterior, como mecanismo de aceleração
do processo de redemocratização; instituiu o voto secreto, o direito de voto às mulheres,
a legislação trabalhista (CLT), jornada de trabalho de oito horas diárias, salário mínimo,
férias, 13º salário, criação da Justiça Eleitoral entre outros. Embora a Constituição re-
presentasse um expressivo avanço nos direitos sociais, Getúlio Vargas favoreceu-se do
amplo apoio político conquistado entre os deputados da Constituinte e obteve a aprova-
ção do processo eleitoral pelo voto indireto. Desta forma, torna-se presidente eleito do
Governo Constitucional (1934 – 1937)61.
O segundo governo de Vargas é marcado pelas tensões sociais, por crises polí-
tica e econômicas; desdobrou-se em torno de dois ideais: o fascismo defensor do totali-
tarismo introduzido na Itália por Mussolini, representado pela Ação Integralista Brasi-
leira (ABI), fundada em 1932 e o ideal democrático, representado pela Aliança Nacional
Libertadora (ANL), articulada desde 1933, formalizada somente em 1935. As polariza-
ções político-ideológicas se intensificam, a radicalização sobre o controle e punição dos
opositores é deflagrada (PRESTES, 2005, p. 103).
A circulação de ideias e bens culturais nesse período eram pujantes; nesse con-
texto, a criação de editoras tornou-se um potente mecanismo para estabelecer o status
de legalidade nas ações de mobilização do proletariado. Para além da cooptação de re-
cursos humanos, a arrecadação de recursos financeiros estava circunscrita entre uma das
atribuições das organizações auxiliares que integravam o comitê executivo do Komin-
tern62. Cesar, na posição de 2º secretário do Comitê do Antiguerreiro 63 – núcleo de As-
sistência III da Internacional Comunista, tinha como tarefa conduzir a movimentação
financeira por meio da arrecadação de doações, produção e circulação de ideias.

61
Ver: Diretrizes do Estado Novo (1937 - 1945) – Direitos sociais e trabalhistas. Disponível em:
<//cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos37-45/DireitosSociaisTrabalhistas>. Acesso em
10 de junho de 2018.
62
Osório Cesar, prontuário nº 1963, fls. 68, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público do Estado de
São Paulo.
63
Idem acima.
88
Tôrres (2013), assinala que entre as editoras que se empenharam na divulgação
de temas sobre os novos comportamentos da sociedade soviética, a “Editora Calvino
Filho foi a principal responsável por publicar os relatos de viajantes brasileiros, todos
eles positivos à URSS” e enumera as principais publicações do período:

Rússia (1931), de Maurício de Medeiros, Um engenheiro brasileiro


na Rússia (1933) de Claudio Edmundo, O que vi em Roma, Berlim e
Moscou (1934), de Juvenal Guanabarino. Já a Companhia Editora Na-
cional publicou: O Paraíso Moscovita (deux russies) (1931), de Paul
Marion e U.R.S.S.: Um Mundo Novo (1934), de Caio Prado Junior.
Em 1931, A Editorial Pax divulgou uma trilogia de relatos também
favoráveis à URSS: A Nova Rússia, de Júlio Alvarez del Vayo, Im-
pressões de Moscou, de Diego Hidalgo e Com os olhos abertos: Re-
portagem sobre a Rússia em 1930, de Pierre Dominique. Outras edi-
toras publicaram ainda: Os deuses vermelhos (1931 – Empresa Edi-
tora Nacional Lux), de Adolpho Agorio; No Misterioso país de Tar-
melão: O Socialismo na Ásia Central (1934 – Edições Nosso Livro),
de Vaillant Couturier; A Nova Rússia (1932 - Civilização Brasileira –
RJ), de Henri Barbusse; Onde o proletariado dirige... Visão panorâ-
mica da U.R.S.S. (1932 – Edição brasileira), de Osório Cesar; Uma
visita a nova Rússia (1931 – Editora Americana), de Fernand Corcos
e Rússia: uma nova humanidade (Editora Atlântida), de José Dubois
(TÔRRES, 2013, p. 82).

Como mecanismo de obtenção de recursos financeiros, as pequenas editorias


atuavam como órgão de propaganda do regime soviético. São diversos títulos publica-
dos no período, entre eles os relatos de viagens: U.R.S.S: um novo mundo (1934), de
Caio Prado Junior; Um engenheiro brasileiro na Rússia (1934), de Cláudio Edmundo;
e a tradução das obras A vida sexual e o amor na URSS, de I. Helman e A vida sexual
na Rússia soviética, de H. Fouillet. Este último, com prefácio de Osório César, tinha
como objetivo desmistificar a propaganda anticomunista empreendida pelas correntes
ultraconservadoras (ver Lelo Zeno, carta, fls.82, relatório DOPS).
Andreucci (2006), observa que na estrutura das redes discursivas circunscritas
no jogo social do período, as ações de Cesar estavam alinhadas com as diretrizes do
Partido. Nos registros do DEOPS, o relatório de um dos agentes assinala que as vendas
de uma das obras de Cesar teria a “renda foi doada ao Partido Comunista com o intuito
de angariar recursos para novas publicações”. Também sinaliza que Cesar seria o res-
ponsável por duas pequenas editoras: Udar e Spartaco (2006, p. 176) 64. As fontes pri-
márias indicam que, ao ser indagado sobre as produções da empresa, Cesar admite que
as editoras são de sua propriedade e o relator acrescenta: “[...] foram editados por essas

64
Anexo O, fls. 82, p. 165.
89
empresas de sua propriedade, dois livros sob os títulos: “’A Mulher na Rússia Soviética”
e “O que é Estado Proletário’”.
No centro da arena política os embates travados tinham, de um lado, represen-
tantes da Ação Integralista Brasileira (AIB) – corrente política de extrema direita com
caráter fascista. Esse grupo exprimia os anseios da oposição conservadora, advogava
por uma maior intervenção do estado na política econômica brasileira. O jornalista Pli-
nio Salgado era seu principal líder; de outro, a Aliança Nacional Libertadora (ANL),
organização pautada pelos pressupostos ideológicos da extrema esquerda comunista, de
vetor pró soviético, suas ações articulavam-se em torno da organização da reforma agrá-
ria pela defesa de uma revolução marxista e a queda do regime totalitarista imperialista.
Sob a liderança de Luiz Carlos Prestes, a ANL contava com o militante Osório
Cesar como um dos principais combatentes no front. A ação da ANL tornou bastante
visível nesse período e o país é coberto por disputados comícios e manifestações públi-
cas em diversas cidades, com ações apoiadas e divulgadas pelos principais periódicos,
os conflitos entre comunistas e integralistas estampam os noticiários.
Frente ao acirramento das disputas e desfazendo parte da ambiguidade que per-
meara sua ascensão ao poder, o presidente Vargas decidiu, então, romper com seus in-
terlocutores de esquerda que outrora o apoiaram e conduziram ao governo, endurecendo
o discurso e radicalizando sua posição contra toda e qualquer forma de manifestação co-
munista desse período (PRESTES, 2005, p. 104).
Cesar, imbuído dos propósitos marxista-leninistas, não arrefeceu sua ação de
divulgação comunista e publicou, em 1935, A vida do operário na União Soviética
(1935), pela Editora Udar, de sua propriedade. No prefácio assinado pelo editor os an-
tecedentes editoriais são apresentados e a argumentação quanto ao nome da Coleção é
justificada por uma narrativa mítica, acionando nomes de intelectuais como Rachel de
Queiroz, , Romain Rolland, Antonio Gramsci e Luiz Carlos Prestes:

A Editoral Udar, depois de QUE É O ESTADO PROLETÁRIO? do dr.


Osório Cesar e a MULHER NA RUSSIA SOVIETICA de diversos
autores, com a prefácio da notável escritora revolucionária Rachel de
Queiroz, apresenta ao público ledor brasileiro a mais sensacional no-
vidade gráfica que é a presente coleção “Janus”.
[...] em cada volume o leitor encontrará sempre dois trabalhos dife-
rentes, duas capas diversas, uma para cada lado, resolvendo o pro-
blema econômico do livro e tornando movimentada as exposições de
nossas livrarias.

90
De preferência colocaremos um autor brasileiro e um estrangeiro, em
cada volume, embora cada trabalho seja inteiramente diverso do ou-
tro, mesmo sob o ponto de vista de orientação doutrinária.
Assim lançamos dois volume: o número 1 cuja face é constituída por
um trabalho do Dr. Osório Cesar: A VIDA DO OPERÁRIO NA
UNIÃO SOVIÉTICA, observações feitas por ele próprio de visu, no
país proletário enriquecido com dados estatísticos e seguido de um
outro trabalho de Desider Bokani sobre o seguro operário completa o
estudo anterior; na outra face, B, encontrarão os leitores um vibrante
trabalho de Romain Rolland, o grande escritor francês cuja personali-
dade interessantíssima Stefan Sweig pontilhou tão bem. Romain Ro-
land estuda a personalidade de Antonio Gramsci, revolucionário itali-
ano e vários dos seus companheiros encarcerados pelo fascismo e que
morrem paulatinamente nas prisões do Duce (CESAR, 1935, p. 3-5).

Com a narrativa de manter a ordem política e social, o governo Vargas pro-


mulga a Lei de Segurança Nacional (1935), estabelecendo penas severas contra os in-
surgentes. Logo após a promulgação da LSN, Cesar partiu para um intercambio cientí-
fico na Europa. Uma nota publicada no Diário da Noite65 anunciava a participação do
cientista no XV Congresso Internacional de Fisiologia em Leningrado-Moscou, presi-
dido por Ivan Pavlov:

SANTOS, 12 (Da sucursal do “Diário da Noite”) – Embarcou hoje,


no “Eubêe” com destino a U.R.S.S., o dr. Osório Cesar, medico psi-
quiatria dessa capital, que vae assistir ao Congresso Internacional de
Fisiologia de Leningrado, a realizar-se no mês vindouro sob presidên-
cia do dr. Pavlov, o grande sábio da Rússia.
A viagem do dr. Osório Cesar, além desse objetivo pessoal, significa
também um furto da propaganda que já se vem fazendo no Rio, em
São Paulo, em prol do estabelecimento de relações entre intelectuais
brasileiros e russos [...] (Diário da Noite, 1ª edição, 13/5/1935)

A nota descreve a missão de Osório Cesar em solo russo: o intercâmbio de


“uma grande quantidade de material” para o Instituto de Moléstias Tropicais de Moscou
do Instituto Biológico do professor Rocha Lima entre outros; além da coleção de foto-
grafias organizadas pelo dr. Salles Gomes, do serviço de hanseníase, ambos do Estado
de São Paulo; o trabalho sobre tifo, do professor Octavio de Carvalho, diretor da Escola
Paulista de Medicina e uma coleção de “barbeiros infectados da moléstia de Chagas que
recebera dos pesquisadores. Além de muitos trabalhos dos colaboradores do Instituto
Manguinhos (atual Fundação Oswaldo Cruz). O cenário sociopolítico brasileiro estava
muito agitado e a tensão aumentava bastante quando, em 5 de julho, integrantes da ANL
promoveram manifestações públicas para celebrar os levantes Tenentistas de 1922 e

65
Em viagem para a U.R.S.S. Diário da Noite, 1ª edição, 13/5/1935
91
1924. O governo Vargas, atento ao crescimento das mobilizações organizadas que ins-
tavam as massas a lutar na frente revolucionária do proletariado e amparado pela LSN,
ordena o fechamento da ANL.
No trajeto de volta ao Brasil, a bordo do navio Bagé, vindo de Recife, Osório
Cesar é preso, sob a alegação de conspiração e articulação nas ações relacionadas aos
levantes tenentistas (12/10/1935). O cárcere durou dois dias. Novamente o relatório dos
agentes DEOPS sinalizava o envolvimento de Cesar como “agitador comunista”, e re-
velavam trechos de uma carta apreendida, na qual era possível comprovar que Osório
Cesar havia sido informado do fechamento da ANL por Otávio Brandão, quando ainda
estava a bordo do navio que o trazia de volta ao Brasil. Logo, as prerrogativas apresen-
tadas pelos agentes para a detenção de Cesar eram os seus antecedentes criminais e as
conexões que o intelectual teria com Luiz Carlos Prestes e Otávio Brandão. Esse argu-
mento era fortalecido pela sua permanência em território soviético como correspondente
do jornal A Manhã (RJ), em um período de seis meses Cesar assina dois artigos enviados
direto de Moscou: o primeiro retrata os desfiles que marcaram o aniversário da morte
de Lenin66 e outro sobre o funeral de Henri Barbusse67.
Entre as fontes primárias localizadas sobre esse período, encontra-se uma cópia
de um radiograma enviado por Osório Cesar à “camarada” Nise da Silveira, no qual ele
compartilha seu percurso até sua chegada ao Rio de Janeiro, solicita colaboração para o
acolhimento do “nosso companheiro de ideologia” que estava de mudança para a cidade
e finaliza: “Tenho comigo um material louco”68. O detalhe que chama a atenção nessa
mensagem é o fato de que, não foram localizadas indexações sobre o nome do “cama-
rada” apresentado por Cesar a Nise da Silveira como um agente que professava da
mesma ideologia nos acervos DEOPS. As notícias publicadas, relacionadas às prisões
de Cesar e à tripulação do Bagé nos dias posteriores69, tanto pelas correntes situacionis-
tas quanto pelas oposicionistas nos revelam o clima de tensão vivido no País; os embates
inflamados eram produzidos em um elevado tom dramático, alimentados por teorias
conspiratórias; sinalizam os acontecimentos no território nacional nas semanas seguin-
tes: é nesse cenário que nos últimos dias de novembro os militares insurgentes rebelam-

66
120 mil membros de mais variadas organizações esportivas, A Manhã (RJ), 28/7/1935, p. 4.
67
Henri Barbusse e os funerais em sua honra. A Manhã (RJ), 2/10/1935, p. 2.
68
Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 52-87, volume 1.
69
Sobre o tema consultar a base de dados do Correio de S. Paulo (SP), edição 1074, p. 3 e A Manhã
(RJ), edição 149, p. 11.
92
se nas cidades de Natal (RN), Rio de Janeiro (RJ) e Recife (PE); um ruído de comuni-
cação entre as frentes revolucionárias colocam à operação em risco.
A ausência de sincronia na articulação e mobilização das ações e a baixa adesão
de agentes de outros estados, ocasionaram o fracasso do levante, que foi controlado pari
passu pela polícia de Vargas. A batalha, denominada pejorativamente por Intentona Co-
munista, enfraqueceu sobremaneira a esquerda brasileira. As ambiguidades na base do
próprio movimento abriram precedentes para a instauração do terceiro mandato da Era
Vargas, denominado Estado Novo (1937-1945). Último e mais longo período do go-
verno varguista, essa fase teve como principal característica o regime autoritário, pon-
tuado pela repressão severa ao comunismo. Osório Cesar volta a ser preso em 28 de
novembro70.
No acervo do médico Arthur Ramos é possível verificar na coleção de corres-
pondências ativas e passivas71, em duas cartas enviadas por Cesar ao colega (1936), que
o “insurgente” esteve detido no Hospital Militar da Força Pública de São Paulo. Na
missiva, o pensador agradece o colega pelo envio do livro “Introdução à Psicologia
Social”, solicita remessa do livro O Folclore Negro no Brasil e indaga sobre a possibi-
lidade de publicar seu livro, Misticismo e Loucura. Um mês depois, Cesar envia nova
mensagem. Solicita o exemplar da Introdução à Psicologia Social, argumenta que está
“impossibilitado de adquirir, neste momento, por intermédio das livrarias” e indica o
endereço do Hospital Militar da Força Pública, rua João Teodoro, para o envio da obra.
As fontes primárias consultadas indicam a interação entre Cesar e Ramos em momento
anterior a esse período, no qual Cesar agradece o envio do livro “Estudos de psicaná-
lise”, solicita uma remessa dos livros “A sordice nos alienados” e “Primitivo e Loucura”
(1932). Nesse sentido, as correspondências enviadas por Cesar sugerem a retomada do
pensador sobre os estudos e pesquisas acerca das conexões entre arte e loucura no perí-
odo do cárcere, quando produz releituras sobre as produções textuais da década anterior
e dedica-se na produção de uma obra sobre ciência e religiosidade.
Do conjunto de fragmentos analisados, circunscritos no recorte temporal da
década de 1930, o relatório do inquérito apresenta elementos essenciais para a contex-
tualização da hipótese de investigação sobre as distensões-afastamentos, conexões-

70
Ver: Revolta Comunista De 1935. Disponível em: <www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-
tematico/revolta-comunista-de-1935>. Acesso em 10 de junho de 2018.
71
Retomamos aqui as afirmações registradas na Introdução, p. 24. Ver: MALATIAN, Teresa. Cartas.
Narrador, registro e arquivo. In: PINSKY, Carla B.; LUCA, Tania R. de (Org.) O historiador e suas
fontes. São Paulo: Contexto, 2011, p. 195-221.
93
rupturas na trajetória de Osório Cesar. O pensador foi investigado e acusado formal-
mente, pelo DEOPS de pertencer aos quadros dirigentes dos movimentos de esquerda
na luta revolucionária, identificado como “agitador das massas” com amplo acesso às
estruturas dos microssistemas, no âmbito nacional e internacional de acordo com a afir-
mações do agente:

Sua perigosa atividade intelectual, seu modo de pensar, transmitindo


a outros, por meio de conferencias, escritos, livros, etc. é tão perigosa,
ou mais ainda, do que a de qualquer agitador de fabrica ou de rua, pois
este, repetimos, terá aprendido esses métodos porque inspirados pelo
intelectual que em vez de beneficiar, amparar e socorrer a humanidade
com os meios que e recursos que a ciência lhe terá dado, desses meios
e recursos se serve para corromper os que dele se aproximam, assim
incentivando a pratica de delito e fomentando a disseminação de
ideias violentas e destruidoras (Prontuário Osório Cesar)72.

O final dessa década é marcado pela retração nas ações de articulação e mobi-
lização sociopolítica de Cesar, os documentos indicam que, a partir desse período, o
pensador dedica-se a questões menos espinhosas, parece seguir o roteiro estabelecido
por Tarsila do Amaral, ex-companheira de viagem, a qual, em uma carta apreendida
destaca:

[...] nos revela que essa artista não compartilhava mais dos ideais do
Dr. Osório Cesar, aconselhando-o a “pensar mais na ciência e na car-
reira, do que nas questões sociais”;
“diz ainda:- “não tens, como eu, reivindicações a fazer, que te adian-
tará todo o sacrifício que já tens feito para um dia ser chamado de
traidor” (Prontuário Osório Cesar)73.

O agente acrescenta outro trecho em que afirma que, Tarsila do Amaral “reco-
nhece a carta de sua autoria” e ainda assevera ter aconselhado Cesar a dedicar-se mais
aos estudos das ciências médicas do que às sociais, sobretudo o marxismo e que “não
ignora que o Dr. Osório Cesar é um entusiasta do marxismo e sabe que a família deste
é contra as ideias por ele adoptadas” (Prontuário Osório Cesar)74. Entre os documentos
textuais produzidos pelos agentes DEOPS, nota-se que sua posição de interlocutor com
a alta cúpula do Partido é atestada em diversas ocasiões, das quais destacamos duas,
transcritas, a seguir:

[...] o documentos de fls. 44, que é uma carta datada de 7 de maio de


1935, é bastante expressivo. -

72
Anexo O, fls. 64, p. 169.
73
Anexo O, fls. 81, p. 165.
74
Anexo O, fls. 72, p. 167.
94
O Dr. Luiz Parigot de Souza, médico residente em Curitiba (estado do
Paraná), escreveu ao indiciado, nas vésperas do embarque deste para
a Rússia, pedindo-lhe para “levar um abraço aos camaradas de lá e um
especialmente ao Prestes e Octavio Brandão”. Certo estava, pois o Dr.
Parigot de que o indiciado com elles se encontrariam na Rússia (Pron-
tuário Osório Cesar)75.

Outro foi o depoimento prestado pelo “súbdito” Ernesto Joske, alemão detido
em razão de suas atividades subversivas, no qual esclarece:

[...] não nega que serviu de intermediário do “Socorro Vermelho In-


ternacional” como “companheiro de confiança” junto a pessoa do Dr.
Osório Cesar e de ter recebido deste importâncias diversas que se des-
tinavam aquela organização revolucionária; reconhece Joske sua cali-
grafia na caderneta citada e afirma que a primeira quantia recebida do
Dr. Osório foi produto de uma lista em branco, do Socorro Vermelho
Internacional que havia ele deixado nas mãos do Dr. Osório Cesar;
(Prontuário Osório Cesar)76

Karepovs (1999), observa que o bancário alemão, Ernesto Joske foi um dos
estrangeiros deportados (junho de 1936) como retaliação à sua militância no sindicato,
uma das consequências da repressão instaurada durante o golpe de Estado. Ainda na
massa documental inventariada, outros fragmentos significativos são localizados: as no-
tícias veiculadas nos periódicos nos permitem delinear um panorama do cenário. Entre
as notas que merecem destaque encontra-se a do julgamento do processo sobre as ativi-
dades comunistas dos membros da ANL em Santos. Cesar aparece entre os indiciados,
ao lado de Patrícia Galvão (conhecida nas redes de sociabilidade como Pagú, a compa-
nheira de Oswald de Andrade), Luiz Carlos Prestes, Caio Prado Jr., Jayme Adour da
Camara e outros77. Cesar encerra a década com uma publicação sobre ciência e religio-
sidade: Misticismo e loucura: contribuição para o estudo das loucuras religiosas no
Brasil (1939), premiado pela Academia Nacional de Medicina em 194878.
As fontes analisadas indicam que, na década de 1940, o percurso de Cesar é
pontuado pelo seu afastamento do front político-social, do papel de “agitador das mas-
sas” da esquerda revolucionária; suas ações são concentradas nos estudos e pesquisas
acerca das conexões entre arte e loucura, sobretudo sobre temas relacionados às ciências
humanas: os experimentos sinestésicos realizados nos encontros semanais do grupo Im-
pressões Musicais, em seu apartamento; pelas publicações de artigos e entrevistas sobre

75
Anexo O, fls. 79, p. 166.
76
Anexo O, fls. 84, p. 164.
77
O processo sobre as atividades comunistas. Folha da Manhã. 8/2/1936, edição 3646, 16
78
Jornal do Commercio – Rio de Janeiro, edição 231, 2/7/1948, p. 4.
95
arte e loucura, cultura, educação, política, religião e sociedade; assim como por suas
ações para a consolidação da Escola Livre de Artes Plásticas do Juquery.
Nesse sentido, selecionamos alguns dos artigos produzidos por Osório Cesar
sobre temas relacionados às ciências humanas e sociais, entre 1940-1960, esse conjunto
contribui para evidenciar a potência intelectiva do pensador em sua trajetória, circuns-
critas no recorte temporal analisado. Os periódicos alternam-se entre crônicas/notas
acerca das críticas de arte, salões paulistas e as políticas públicas para educação (espe-
cialmente sobre a arte e a cultura)79; as experiências sinestésicas empreendidas em seu
apartamento80, as mobilizações em torno da luta contra o fascismo81 e, por fim, questões
sociopolíticas, das quais destacamos o artigo O destino do homem no após-guerra82, no
qual o autor assinala caminhos para o desenvolvimento social no cenário caótico de
destruição indicando os campos de estudo que devem concentrar esforços para superar
os obstáculos: antropologia física e social.
O autor faz uma crítica aos sociólogos e biólogos no anúncio da fundação da
União Cultural Brasil-URSS e à constituição de suas comissões83, além de ser signatário
do manifesto dos intelectuais e escritores em apoio à candidatura de Caio Prado Jr. 84 na
campanha de renovação democrática. Na nota sobre a fundação da nova organização,
destinada ao intercambio científico, literário e artístico, Osório Cesar é indicado ao lado
de Caio Prado Jr. para compor a comissão encarregada de elaborar o estatuto. No rela-
tório do DEOPS, com o descritivo da estrutura das comissões, além de Cesar, localiza-
se os nomes de Jorge Amado, secretário; Sergio Milliet, diretor literário da agremiação,
da qual participam: Oswald de Andrade e Affonso Schimdt; Clóvis Graciano, diretor
artístico. Também integravam a comissão: Anna Stella Schic e Júlio Gouvêia; André
Dreyfus, diretor científico, junto com Mario Schemberg; Zeferino Vaz; Fernando de
Azevedo, diretor pedagógico; João Cruz Costa e Olga Bohomoletz Henriques; Caio
Prado Jr, diretor de divulgação; João Araújo Nabuco e João Penteado N. Stevenson entre
outros.

79
Osório Cesar escreve sobre o ministro Capanema e a arte moderna. A Manhã (RJ), 25/6/1944, edição
00882 (1) p. 5.
80
Os fenômenos supranormais. Folha da Manhã, 15/1/1945, p. 76 e No apartamento de Osório Cesar.
Folha da Manhã, 21/5/1946, p. 6.
81
Campanha pró-bônus de guerra. Diário da Noite, 24/2/1943, p. 3 e É preciso mobilizar todas as ener-
gias do Brasil. Diário da Noite, 26/2/1943, p. 1-2.
82
O destino do homem no após-guerra. Folha da Manhã, 21/10/1945, p. 7.
83
Foi fundada ontem em São Paulo a União Cultural Brasil-U.R.S.S. Diário da Noite, 24/4/1945, p. 3.
84
Ao povo de São Paulo. Diário da Noite, p. 3. 24/4/1945.
96
O contexto indica que na primeira metade da década de 1930, a trajetória do
pensador foi caracterizada por intensa militância política, indiciado por ações extremis-
tas, foi apontado como “intelectual, agitador de alta periculosidade”, incriminado como
um dos articuladores aliancistas e mensageiro dos tenentistas nos movimentos revolu-
cionários; esses são os componentes centrais da justificativa de seu mais longo encarce-
ramento (1935-1937). Em sua última entrevista, Cesar revela o impacto de seu decla-
rado posicionamento político em sua trajetória:

Preso fiquei no célebre presídio da Polícia Política Paulista, o Maria


Zélia e aquilo sim, é que era loucura ... Mas, no final de longo pro-
cesso, que durou 5 meses, o íntegro delegado que presidiu o inquérito,
Fernando Luiz Vieira Ferreira, disse que o meu livro ‘Onde o proleta-
riado dirige’ honrava a cultura brasileira ... E fui solto ... Agora deten-
ções tive muitas outras, mas não me arrependo de nada. E quer saber
de uma coisa (?), sou fã de Luiz Prestes até hoje ... A sociedade bra-
sileira há de encontrar o seu caminho democrático de abertura e a
nossa cultura viverá dias melhores” (KAWALL, Caderno Ilustrada,
Folha de S. Paulo, 12/8/1979, p. 60).

O governo Vargas foi marcado pelas ações de coerção e perseguição à mem-


bros aos quadros diretivos de grupos antifascistas. A patrulha instaurada no governo do
presidente Arthur Bernardes para combater os movimentos proletários foi consolidada
nesse período. VIANNA et al (2014) destaca o empenho e a truculência dos agentes da
polícia política na missão vigiar, descrever o passo-a-passo, classificar, prender, tortu-
rar, confinar e expulsar os indivíduos que causavam aborrecimentos.

Pelos registros encontrados na massa documental analisada, verifica-se que


Osório Cesar foi monitorado até mesmo após o fim da Era Vargas, com anotações que
se estendem para além da década posterior. De outro lado, as fontes primárias indicam
que, após a sua libertação e indulto das acusações, Cesar passa a se dedicar com mais
intensidade às questões relacionadas à arte, à ciência e ao misticismo; colabora em di-
versos periódicos como crítico de arte e se empenha na divulgação dos artistas loucos
do Juquery.
Desse período, o que parecia orgulhar Cesar eram as exposições das produções
dos loucos do Juquery. Em seu depoimento a Kawall (1979), observa que a Exposição
Internacional de Arte Psicopatológica, realizada durante o Primeiro Congresso Mundial
de Psiquiatria em Paris (1950), foi a mais importante de todas elas.

97
Acho que fiz umas 50 exposições desse tipo, e o Rebolo e toda a ge-
ração de 40/50 devem se lembrar das mostras dos psicopatas no Clu-
binho dos Artistas ... Mas, a mais importante, foi a que levei para a
Sociedade de Psicologia de Paris, onde falei a mais de 200 médicos
ali reunidos (Cesar apud KAWALL, 1979, p. 60).

A postulação de Vianna (2014) cotejadas com o relato ao jornalista Luis Er-


nesto Kawall e seu evidenciado afastamento da família, certificado na declaração de seu
atestado de óbito) sugerem que o terrorismo físico e psicológico vivenciado no período
do cárcere impactaram sobremaneira a vida de Osório Cesar, cooperando para o apaga-
mento de sua memória, sobretudo da importância de sua contribuição para a formação
do campo da arteterapia e arte-educação no Brasil.

98
Considerações finais
Esta investigação pretendeu analisar e compreender a ação e o legado do mé-
dico paraibano Osório Cesar, na primeira metade do século XX em diferentes campos
da produção intelectual brasileira com ênfase para o lugar ocupado pela educação em
sua obra. A hipótese inicial era a de que havia, por parte da produção historiográfica
disponível sobre o pensador, certo apagamento de importantes dimensões de sua circu-
lação intelectual.
Inicialmente, frequentando os saraus e encontros da Villa Kyriall, avançando
no estreitamento de laços de confiança, amizade e de pertencimento familiar com fra-
ções da elite paulistana. O trabalho analítico empreendido identificou que Osório Cesar
participou, ativamente, de diferentes redes de sociabilidade intelectual, frequentando
outros e diversificados espaços e contextos significativos de encontro e reconhecimento
de mulheres e homens ligados as letras e as ciências no Brasil das primeiras décadas dos
1900.
Sobre sua produção intelectual, o trabalho de pesquisa revelou um sujeito eru-
dito, com investimentos multifacetados que se espalhavam nas ciências médicas, nas
inovações de fronteira que combinavam a emergência da psicanálise, os estudos iniciais
da psicologia e a pedagogia no Brasil e alcançavam a questão do atendimento escolar
de pessoas com deficiência intelectual. Na interface entre produção intelectual e ativi-
dade política, restou demonstrada a ação intensa de Cesar na sistematização, divulgação
e disseminação das ideias de orientação comunista e de análises sobre a vida comum
sob o regime soviético.
No que tange à primeira dimensão, os trabalhos de Cesar no campo das ciências
médicas são importantes registros da reflexão sobre saúde mental e políticas de atendi-
mento à população alienada no Brasil do início do século XX.
Como se verifica no capítulo dois, estabelecendo as relações de conexão e com-
plementariedade, a escrita de Cesar também é registro relevante das primeiras formula-
ções sobre a psicanálise que emergem no Brasil, em colaboração com Durval Marcondes
e outros pioneiros da área.
Desfazendo certa leitura comum sobre o pioneirismo de Nise da Silveira nas
propostas de tratamento da loucura por meio da arte, a investigação demonstrou que
Osório Cesar desempenhava, antes mesmo dos registros disponíveis sobre o trabalho de
Nise, uma intensa atividade e uma profunda reflexão sobre as conexões entre a arte e a
loucura e que buscava ampliar o alcance de seus achados dialogando com a psicanálise
99
como chave de leitura do inconsciente. Em seus primeiros estudos sobre as conexões
entre arte e loucura, pautado pelas teorias freudianas, imbuído da missão de validar as
suas interpretações sobre a psique, em um gesto ousado, o pesquisador envia seus escri-
tos a Freud que retorna com uma devolutiva positiva. A troca de missivas o encorajou a
sistematizar e consolidar as análises das produções plásticas dos loucos do Juquery nas
Oficinas de Artes, suas ações resultaram duas décadas mais tarde na formalização da
Escola Livre de Artes Plásticas, para o trabalho sistemático com a população atendida
no Hospital Psiquiátrico do Juquery. As produções dos artistas da Escola compõem os
acervos: da Coleção de Sainte-Anne (Collection Sainte-Anne), do museu Collection de
l’Art Brut em Lausanne, do cineasta Bruno Decharme, da Associação de arte bruta Abcd
- Art Brut diffusion & connaissance entre outros. No Brasil, as obras dos artistas do
Juquery compõem o acervo Museu de Arte de São Paulo (MASP), Museu de Arte Mo-
derna (MAM).
No campo da história da arte, o que se evidenciou, na investigação foi um des-
locamento forte do lugar quase marginal, no início de sua socialização entre os artistas
paulistanos do período para um lugar central, como crítico e analista de arte, bem como
colaborador de personalidades marcantes deste campo. Alguns dos vínculos de sociabi-
lidade são notados nas trocas de mensagens entre Osório Cesar e Mario de Andrade
(1931). Gonçalves (1990) assinala que as residências, cafés, ateliês, galerias e os salões
consolidam-se, a partir da década de 1940, como importantes núcleos de integração cul-
tural, sobretudo da arte moderna, nos quais artistas, intelectuais, críticos de artes se re-
únem para discutir, debater, estudar: “onde a ação mais significativa era o intercâmbio
de conhecimentos e o estímulo mútuos” (p. 58). Para a autora, Cesar é apontado entre
as personalidades que se destacam como um dos personagens centrais desses grupos, ao
lado de De Fiore, Paulo Rossi Osir, Lasar Segall, Sérgio Milliet e Adolpho Jagle.
No capitulo três, a investigação evidenciou o engajamento e o compromisso de
Osório Cesar com a conformação do campo comunista no Brasil, os registros DEOPS o
qualificaram como agitador, elaborador e divulgador das causas do proletariado. Sua
atuação se revelou estruturante, na medida em que exercia um papel mediador, sistema-
tizador e também fomentador de ações para a disseminação das propostas políticas de
orientação marxista, bem como para o desfazimento de preconceitos, interpretações es-
tereotipadas e narrativas que visavam deslegitimar a experiência soviética no período.

100
No campo editorial, nota-se a articulação de Cesar na inserção de literaturas
dos principais pensadores comunistas, alinhados às correntes marxistas-leninistas, entre
eles destacamos: Henri Barbusse, Roman Rolland. Como editor, mobilizou recursos na
tentativa de introduzir, no mercado editorial brasileiro, títulos de autores estrangeiros
reconhecidos por suas ideologias revolucionárias. No prefácio de sua obra A vida do
operário na União Soviética (1935), o pensador Antonio Gramsci é mencionado como
objeto de pesquisa do escritor Romain Rolland. Como assevera Magalhães (2016), ob-
serva-se que a produção textual de Osório Cesar o qualifique no âmbito dos “intelectuais
produtores de grandes textos”, assim como “intelectuais cultivadores e organizadores”,
que materializam a ideia programa e os intelectuais divulgadores, que “recriam e pro-
longam para além do tempo”, coexistem com a reprodução, a ilustração, do mesmo
modo que promovem/fomentam a conformação das ideias em virtude da reestruturação
de práticas, registro de ideias, protocolos, planos e produtos (p. 305).
Ao cotejar a produção textual de Cesar, sua militância política, as redes de so-
ciabilidade em que esteve inserido e o lugar de fala no campo da educação, nota-se que
o pensador esteve no centro de microssistemas estruturantes no contexto geopolítico,
tanto no Brasil como no mundo, na primeira metade do século XX. A sua intensa ativi-
dade no núcleo revolucionário da ANL, agravada por suas detenções no período var-
guista, o transportaram para o isolamento político-social. Os prognósticos registrados
no depoimento de Tarsila do Amaral85 acerca das coerções e perseguições realizadas
por agentes do DEOPS, parecem confirmados por autores como Carneiro (2002), Motta
(2005) e Roxo (2012).
Especificamente no campo da educação, a investigação demonstrou a relevân-
cia de ao menos duas importantes incursões de Osório Cesar. Em primeiro plano, as
formulações que o pesquisador elaborou sobre a compreensão da psique por meio da
arte estiveram fortemente conectadas ao processo de revisão do campo do ensino da arte
no Brasil no início do século XX, sobretudo na conformação do campo das “Escolas
Livres de Artes”.
As interpretações que o intelectual propunha para o lugar da arte e para sua
função expressiva do psiquismo foram imprescindíveis para o questionamento do aca-
demicismo e do formalismo que presidiam as compreensões dos artistas e dos educado-
res brasileiros no período.

85
Anexo O, fls. 81, p. 165.
101
Dito de outro modo, para compreender/interpretar Osório Cesar como intelec-
tual, sobretudo do campo da Educação é preciso observar que o ensino da arte no Brasil,
na primeira década do século XX, era pautado por um paradigma ainda atrelado às vi-
sões sobre produção artística e sobre ensino da arte implantados por Lebreton, líder da
Missão Artística Francesa, que desembarcou no Brasil (1816) na implantação da Aca-
demia Imperial de Belas Artes do Rio de Janeiro.
Ainda nos processos de ensino e aprendizagem da arte, Ferraz (1989, 49)
sublinha que a sistematização organizada e difundida por Cesar passou a ser, “uma obra
de referência obrigatória não somente para aqueles que se dedicavam à psiquiatria, mas
também para a intelectualidade de nosso país”.
A realização da Semana de 33 talvez seja o ponto chave para a compreensão
do alcance dessa contribuição de Osório Cesar. As narrativas de Amin (2009) e Fabris
(1981), indicam que o movimento foi o segundo momento mais importante da história
da arte no Brasil, depois da Semana de Arte Moderna em 22. Amin (2009) assinalou
que “o evento promoveu ampla oportunidade de discussão do tema em São Paulo” e
acrescenta que “Vários artistas visitaram o Juquery para conhecer os trabalhos ali de-
senvolvidos com os internos. Outros organizaram encontros de discussão em que artistas
e profissionais de psiquiatria pudessem trocar ideias” (p. 133). Nota-se que o movimento
liderado por Flávio de Carvalho e Osório Cesar se materializou como um dos marcos
das discussões acerca das estéticas e rupturas da história da arte no Brasil. Coutinho
(2002), revela que as análises empreendidas por Cesar “no meio artístico” contribuiu
para as discussões sobre a abertura de “novas possibilidades estéticas, mais próximas da
liberdade de expressão” (p. 172).
Gonçalves (1990) ressaltou que Cesar foi um dos intelectuais empenhados na
luta da geração moderna pela afirmação de novas linguagens nas artes plásticas (p. 63),
e observa que as reuniões realizadas na residência de Osório Cesar tinham como obje-
tivo promover experimentos sensoriais por meio de exercícios de plasticidades sonoras
articulados com perspectivas auditivas, cognitivas, ópticas e científicas, pautadas por
teorias psicanalíticas, dos quais participavam Bonadei, Zanini, Walter Levy, Carlos
Scliar e Gastão Worms; as experiências sinestésicas são denominadas por Bonadei como
a fase das Impressões Musicais. A autora ainda destacou que as experiências empreen-
didas por Cesar constituem a fase das raízes do movimento abstracionista no Brasil.

102
Os referenciais teóricos apontam que Adolpho Jagle e Osório Cesar são os pre-
cursores das discussões acerca dos processos sinestésicos com a aplicação de técnicas e
associações imprevistas no campo da arte. Gonçalves (1990) asseverou que Cesar é uma
das personalidades centrais no processo de consolidação dos estudos e pesquisas acerca
das manifestações artísticas (p.58). Em geral, as narrativas produzidas com base na pes-
quisa de Ferraz (1989), corroboram a contribuição de Cesar na constituição do campo
da arte-educação, sobretudo acerca dos conceitos de estéticas e rupturas nas linguagens
artísticas e suas expressões.
Noutra frente, Osório Cesar aparece como inspirador, incentivador e responsá-
vel pelas condições da emergência da primeira escola para atendimento de crianças
anormais, na qual Norberto de Souza Pinto realizou uma experiência pioneira no campo
da educação das crianças com deficiência intelectual. Promovendo o diálogo entre a
psiquiatria, a psicologia experimental e a pedagogia, Osório Cesar e Norberto de Souza
Pinto acrescentaram importante movimento aos investimentos que vinham sendo feitos
no período. Coutinho (2002), sublinha que “A pedagogia absorveu em seus programas
os resultados das pesquisas científicas, principalmente o conhecimento sistematizado
sobre o desenvolvimento da capacidade de produção gráfica da criança e das pesquisas
artísticas” (p. 172). Essa declaração é legitimada pela afirmação de Ferraz (1989), na
qual adverte que a sistematização organizada e difundida por Cesar passou a ser, “uma
obra de referência obrigatória não somente para aqueles que se dedicavam à psiquiatria,
mas também para a intelectualidade de nosso país” (p. 49).
Os limites deste trabalho impediram que cada uma dessas dimensões da ação
intelectual de Osório Cesar fosse aprofundada com a devida intensidade. Deste modo, é
preciso reconhecer que seriam relevantes estudos e pesquisas que pudessem avançar
nessa seara, sobretudo, investigando:

a) A participação, circulação e diálogo de Osório Cesar dentro do Partido Co-


munista Brasileiro e sua participação na conformação das ideias e das for-
mas de ação política daquela coletividade na primeira metade do século
XX;
b) A reconstituição dos itinerários de viagem de Osório Cesar na década de
1930 e a análise detida de suas interações em solo soviético, tanto no que
diz respeito ao trabalho como cientista/pesquisador, quanto no que diz res-
peito a sua militância política;

103
c) A investigação dos desdobramentos da produção de Osório Cesar no campo
da arte-educação, a partir de seus investimentos de sistematização da pro-
dução artística da Escola Livre de Artes Plásticas do Hospital do Juquery;
d) A investigação e reconstituição das interações entre Osório Cesar e Nor-
berto de Souza Pinto, na organização e funcionamento da escola criada para
o atendimento de crianças anormais no Hospital do Juquery.

Por fim, ao retomar as indagações iniciais cotejadas com as análises do con-


junto da obra, conclui-se que: 1) A massa documental inventariada trata-se de fato da
produção de um intelectual. 2) Ainda que o reconhecimento da sua produção no campo
da Educação não tenha sido legitimado e explicitado nas narrativas historiográficas pro-
duzidas que intencionaram lançar luz à sua obra, os estudos empreendidos por Osório
Cesar no campo da arte e loucura contribuíram sobremaneira para a estruturação dos
conceitos fundantes dos campos da arteterapia, da arte-educação, da pedagogia, da psi-
cologia e da psiquiatria. Logo, trata-se da produção de um intelectual da educação.

104
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3.2 Teses e dissertações


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3.3 Documentos

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DEOPS-SP. Prontuário Osório Cesar, nº 1936, 3v., ANO.

DEOPS-SP. Prontuário Partido Comunista, nº 2431, 16v., ANO.

DEOPS-SP. Prontuário Tarsila do Amaral, nº 1689, 1v., ANO.

ACERVO JUDICIÁRIO DO ARQUIVO NACIONAL. Osório Taumaturgo Cesar, fi-


cha 215079, 3v., 1938.

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PCB em Santos (SP), ficha 228408, 12v., 1938.

Documentos textuais do acervo do Laboratório de Digitalização da Fundação Biblio-


teca Nacional, Rio de Janeiro

CESAR, Osório. Carta a Arthur Ramos agradecendo o envio do livro “Estudos de


psychnalyse” e pede remessa dos livros “A sordice nos alienados” e “Primitivo e Lou-
cura”. São Paulo, 17/03/1932. [1] p. Orig. Ms. Coleção Arthur Ramos. Documento 200,
I-35, 26, 1004
CESAR, Osório. Carta a Arthur Ramos solicitando exemplar “Introdução à Psicologia
Social”. São Paulo, 15/09/1935. [1] p. Orig. Ms. Coleção Arthur Ramos. Documento
201, I-35, 26, 1005
CESAR, Osório. Carta a Arthur Ramos agradecendo o envio do livro “Introdução à
Psicologia Social”, solicita remessa do livro “O Folclore Negro no Brasil” e indaga
sobre a possibilidade de publicar seu livro “Misticismo e Loucura”. São Paulo,
19/8/1936. [1] p. Orig. Ms. Coleção Arthur Ramos. Documento 202, I-35, 26, 1006.

3.4 Periódicos

DOUTRINAS BIOLÓGICAS POR OSÓRIO CESAR. A Cigarra. São Paulo, edição


124, s/d, 1919, p. 39.

116
REPRESSÃO AO COMMUNISMO. A Cigarra. São Paulo, edição 427, s/d, 1932, p.
25.
PELAS ESCOLAS. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Correio Paulistano (SP),
edição 17738, 10/dez/1912, p. 6.
DO MEU CANTO. Correio Paulistano (SP), edição 18785, 4/nov/1915, p. 2.
LETRAS E LETRAS. Hyperesthesia da dentina (reação pulpar, sua origem e trata-
mento), Correio Paulistano (SP), edição 18917, 13/mar/1916, p. 2.
REGISTOS DE ARTE. Hora Universitária, Correio Paulistano (SP), edição 18943,
8/abr/1916, p. 5.
ATHENEA. Correio Paulistano (SP), edição 19011, 16/jun/1916, p. 5.
REGISTOS DE ARTE. Concerto Santino Giannastasio [Cesar é anunciado como pro-
fessor de música], Correio Paulistano (SP), edição 19281, 15/fev/1917, p. 5.
ATOS OFICIAIS. Secretaria do Interior, licenças concedidas [Osório Cesar, escriturário
da Diretoria de Instrução Pública], Correio Paulistano (SP), edição 20677, 23/jan/1921,
p. 4.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSYCHO-ANALYSE. Correio Paulistano (SP), edi-
ção 23099, 23/nov/1927, p. 11.
O FASCISMO E SEUS METHODOS. Correio Paulistano (SP), edição 24178,
18/jan/1935, p. 11.
CESAR, Osório. 120 mil membros de várias organizações esportivas, A Manhã (RJ),
edição 81, 28/jul/1935, p. 4.
______. Henri Barbusse e os funerais em sua honra, A Manhã (RJ), edição 137,
2/out/1935, p. 2.
A “SUBLEVAÇÃO DO BAGÉ ...”. A Manhã (RJ), edição 149, 16/out/1935, p. 11.
O INSTITUTO DE PHYSIOLOGIA DE MOSCOU. A Manhã (RJ), edição 150,
17/out/1935, p. 5.
CESAR, Osório. O ministro Capanema e a arte moderna. A Manhã (RJ), edição 882,
p. 5, 25/jun/1944
“IMPRENSA MÉDICA”. A Manhã (RJ). edição 1352, 5/jan/1946, p. 5.
HORA UNIVERSITÁRIA. edição 3067, A Gazeta (SP), 27/abr/1916, p. 2.
PALCOS E SALÕE. A Gazeta (SP), edição 3251, 29/nov/1916, p. 2.
A LUTA CONTRA A GUERRA EM SÃO PAULO. A Gazeta (SP)edição 8121,
6/fev/1933, p. 3.

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Notas de arte. Clube dos Artistas Modernos. A Gazeta (SP), edição 8251, 12/jul/1933,
p. 5.
NOTAS SOCIAES. A Gazeta (SP), edição 8328, 11/out/1933, p. 2.
LIVROS & AUTORES. “Que é o estado proletário?”, A Gazeta (SP), edição 8350,
7/nov11/1933, p. 6.

LITERATURA & CIA. Diário da Noite (RJ), edição AO2335, 10/mai/1935, p. 2.


PARA ASSISTIR AO CONGRESSO INTERNACIONAL DE PHSYSIOLOGIA DE
LENINGRADO. Diário da Noite (RJ), edição B02336, 13/mai/1935, p. 13.
A SESSÃO PLENÁRIA DE HOJE NO TRIBUNAL DE SEGURANÇA. Diário da
Noite (RJ), edição 3260, 10/jun/1938, p. 2.
FOI ABSOLVIDO EM PRIMEIRA INSTANCIA O MÉDICO OSÓRIO CESAR. Diá-
rio da Noite (RJ), edição 3265, 16/6/1938, p. 2.
A CAMPANHA PRÓ BÔNUS DE GUERRA. Diário da Noite (RJ, edição 3708,
24/fev/1943, p. 11.
É PRECISO MOBILIZAR AS TODAS AS FORÇAS DO BRASIL. Diário da Noite
(RJ), edição 3710, 26/fev/1943, p. 1.
A ARTE E A GUERRA. Diário da Noite (RJ), edição 3711, p. 27/fev/1943, p. 3.
ESTA A VENDA O N. 20 DE LEITURA. Diário da Noite (RJ), edição 3569,
7/set/1944, p. 15.
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caráter simbólico feiticista num caso de síndrome paranoide. Revista Latino-americana
de Psicopatologia Fundamental. Ano X, n 1, março, 2007.
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BASTIDE, Roger; CEZAR, Osório. Pintura, loucura e cultura. Arquivos do Departa-
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Livros

CESAR, Osório. A expressão artística nos alienados: contribuição para o estudo dos
symbolos na arte. São Paulo: Officinas Graphicas do Hospital do Juquery, 1929.
______. Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da U.R.S.S. São Paulo: [Edição
Brasileira], 1932.
______. Que é o estado proletário? Reflexões sobre a Rússia Soviética. São Paulo:
Udar, 1933.
______. A arte nos loucos e vanguardistas; prefácio de Neves-Manta. RJ: Flores &
Mano, 1934.
______. A vida do operário na União Soviética. São Paulo: Udar, 1935.
______. Misticismo e loucura: contribuição para o estudo das loucuras religiosas no
Brasil, 1939.
______. A medicina na União soviética; sobre o efeito terapêutico do Soro citotóxico
anti-reticular. São Paulo: Laboratório Carrano, 1945.
_____. [Contribution à l'étude de l'art chez les aliénés...]. Franco da Rocha: Departa-
mento de Assistência a psicopatas, 1951.

Separatas

CESAR, Osorio. Simbolismo místico nos alienados. São Paulo: Departamento de Cul-
tura, 1949. 72p. 6 lâm. Separata da revista do arquivo, nº CXXIV.

119
Anexos

120
Anexo A. Osório Cesar, jovem

Fonte: Osório Cesar, a/d, coleção Ana Maria e Paulo Vasconcelllos, reproduzido do catálogo Arte
e inconsciente: três visões sobre o Juquery  Instituto Moreira Salles, 2002

121
Anexo B. Registro das publicações de Osório na década de 1910

Fonte: Contracapa do livro A Chimica da Vida de Osório Cesar. Acervo família Cesar Maragli-
ano, 2017

122
Anexo C. Registros da linha do tempo do #OcupaJuca, a celebração dos 80 anos do
“Mês dos Loucos e das Crianças”

Primeira roda de conversa com educadores da rede municipal

Fonte: Convite eletrônico, arte e diagramação Adilson Cunha e Regiane Mendes, agosto/2013

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, OJr., acervo DirCom PMFR,
agosto/2013

123
Segunda roda de conversa com educadores da rede municipal

Fonte: Convite eletrônico, arte e diagramação Adilson Cunha e Regiane Mendes, setembro/2013

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, OJr, acervo DirCom
PMFR, setembro/2013

124
Terceira roda de conversa com educadores da rede municipal

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Thiago Lins, acervo Dir-
Com PMFR, outubro/2013

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Thiago Lins, acervo Dir-
Com PMFR, outubro/2013

125
Anexo D. Registros das formações das equipes de educadores do Programa Mais Edu-
cação da rede municipal da PMFR. Acervos pessoais e públicos.

Primeira formação dos técnicos do Programa Mais Educação da rede municipal

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Barbara Scarelli, acervo
DirCom PMFR, maio/2014

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Barbara Scarelli, acervo
DirCom PMFR, maio/2014

126
Segunda formação dos técnicos do Programa Mais Educação da rede municipal

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Barbara Scarelli, acervo
DirCom PMFR, maio/2014

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Barbara Scarelli, acervo
DirCom PMFR, maio/2014

127
Terceira formação dos técnicos do Programa Mais Educação da rede municipal

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom PMFR,
maio/2014

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom PMFR,
maio/2014

128
Expedição investigativa: técnicos do Programa Mais Educação da rede municipal

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Thiago Lins, acervo DirCom
PMFR, julho/2014

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, Thiago Lins, acervo DirCom
PMFR, julho/2014

129
Anexo E. Registros da visita técnica da equipe de educadores do Núcleo de Ação Edu-
cativa (NAE) da Pinacoteca do Estado de São Paulo.

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom
PMFR, setembro/2014

Fonte: Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom
PMFR, setembro/2014

130
Anexo F. Memorial de ações #OcupaJuca 2016-2018

1) Centro de Múltiplas Linguagens Raimunda Assunção dos Santos

Fonte: GENISELI, Ewerton. Educação no Juca. Diretoria de Comunicação da Prefeitura de Franco


da Rocha. Franco da Rocha, 2016. Disponível em: <www.francodarocha.sp.gov.br/franco/artigo/noti-
cia/5444>

Fonte: GENISELI, Ewerton. No Juca. Diretoria de Comunicação da Prefeitura de Franco da Rocha.


Franco da Rocha, 2016. Disponível em: <www.francodarocha.sp.gov.br/franco/artigo/noticia/6291>

131
2) Formações

2a) Osório Cesar e suas produções no Juquery

Educadores da rede municipal na produção do Dicionário de Linhas e traços, Andreia Udvari, 2017

Educadores da rede municipal na produção do Dicionário de Linhas e traços, Andreia Udvari, 2017

132
2b) De Juquery a Franco da Rocha: cartografias afetivas

Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom PMFR, se-
tembro/2014

Divulgação do evento na rede social da página oficial da prefeitura, a/d, acervo DirCom PMFR,
setembro/2014

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3) Nota Técnica nº 1/2018

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Anexo G. Ofício nº 206, Secretaria de Estado dos Negócios do Interior.

Nomeação de Osório Cesar como praticante do Laboratório de Análises Químicas e Bromatológi-


cas, acervo do núcleo de Acervo, Memória e Cultura do CHJ, 2017.

164
Anexo H. Atestado de óbito de Osório Cesar.

Nomeação de Osório Cesar como praticante do Laboratório de Análises Químicas e Bromatológi-


cas, acervo do núcleo de Acervo, Memória e Cultura do CHJ, 2017.

165
Anexo I. Certidão de casamento de Olga Ferreira de Barros e Osório Cesar.

Cópia da certidão de casamento, acervo do Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt da Se-
cretaria da Segurança Pública de São Paulo, 2016

166
Anexo J. Desenhos das crianças da Escola Pacheco e Silva

Fonte: Revista da Educação, vol. IX, nº 3dez/1929, p. 390

167
Anexo L. Capa e prefácio do livro Onde o proletariado dirige: visão panorâmica da
URSS, prefácio de Henri Barbusse (1932).

168
169
Anexo M. Informações sobre a atividade de Osório Cesar

Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 52-87, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público do
Estado de São Paulo

170
Anexo N. Informações sobre a atividade de Osório Cesar

Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 52-87, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público do
Estado de São Paulo.

171
Anexo O. Relatório de inquérito DEOPS-SP, fls. 42-87.

Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 84-87, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

172
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 80-83, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

173
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 76-79, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

174
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 72-75, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

175
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 68-71, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

176
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 64-67, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Pú-
blico do Estado de São Paulo.

177
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 62-63, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 52-53, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

178
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 47-50, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público
do Estado de São Paulo.

179
Fonte: Osório Cesar, prontuário nº 1936, fls. 43-46, volume 1, acervo DEOPS do Arquivo Público do
Estado de São Paulo.

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