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INTRODUÇÃO
Para além da variabilidade intra-anual (tratada
em artigo anterior, ver Grandes Culturas nº 5),
o uso eficiente do azoto (UEA), na produção
de cereais de outono/inverno em ambiente
Mediterrânico, é particularmente difícil, devi-
do a restrições climáticas e edáficas. O trigo é
normalmente semeado entre novembro e me-
ados de dezembro, ocorrendo o afilhamento e
a diferenciação das espiguetas entre dezembro
e fevereiro. Dada a influência decisiva do nú-
mero de grãos por unidade de superfície na
produtividade da cultura, qualquer deficiência
azotada nesta fase conduz a perdas irremediá-
veis da produção. Isto significa que o azoto tem
de estar disponível para a cultura entre dezem-
bro e fevereiro (ao contrário da recomendação
comunitária), numa época em que as suas per-
das potenciais por lavagem e desnitrificação
são elevadas. As perdas medidas de azoto por Fotografia 1
lavagem atingiram valores de 90 kg N.ha-1. Ensaio de azoto na cultura de Trigo, na folha com 2.12 % de matéria orgânica, no Centro
ano-1 na Tapada da Ajuda (Lisboa) (Almeida, Experimental da Revilheira. Imagem colhida em 15 de Março de 2015. É bem visível o
1965). As restrições edáficas resultam do baixo crescimento vigoroso do trigo mesmo nos talhões sem aplicação (centro da imagem),
teor em matéria orgânica da generalidade dos assim como a quase ausência de efeito visual dos diferentes tratamentos (entre 0 e 180
nossos solos, o que torna a nutrição azotada da kg N/ha) na variação do crescimento da cultura.
cultura muito dependente da aplicação de adu-
bos, e da má drenagem dos solos, que agrava as
perdas de azoto por desnitrificação para além Mediterrânicas (Alves, 1961), devido ao efeito kg N.ha-1 foram aplicados à sementeira (15 de
de limitar a entrada de máquinas no terreno da temperatura média anual na sua taxa de novembro) e o restante numa cobertura a 20
para uma repartição conveniente do adubo. mineralização (Jenkinson and Ayanaba, 1977). de janeiro. O adubo NH4+DMPP foi aplicado
Para aumentar o UEA torna-se necessário Neste artigo dá-se conta, de uma forma todo à sementeira. Foi aplicada uma segunda
aumentar as reservas do solo em azoto e dimi- resumida, dos trabalhos realizadas no ICAAM cobertura, variável de acordo com a adubação
nuir as perdas de azoto dos adubos aplicados. sobre vários destes assuntos. de fundo + 1ª cobertura, de forma a igualar a
A utilização de adubos amoniacais conjunta- adubação total de todos os tratamentos a 160
mente com inibidores da nitrificação tem re- kg N.ha-1 com um adubo nitro-amoniacal (28
velado potencial para reduzir as perdas de N MATERIAL E MÉTODOS de fevereiro).
tanto por lavagem como por desnitrificação O ensaio em que se avaliou o uso de adubos Para estudar o efeito de leguminosas na
(Di and Cameron, 2002; Liu et al., 2013). O amoniacais em conjunto com inibidores da resposta do trigo ao N foram realizados en-
teor do solo em N pode ser aumentado pela nitrificação (3,4-dimethyl pyrazole phosphate saios, entre 1991/92 e 1995/95, num solo Bvc
inclusão de leguminosas na rotação, apesar - DMPP) foi realizado num solo Pm no ano de na Herdade da Almocreva (Beja), envolvendo
dos resultados poderem ser erráticos, uma vez 2003/2004 e decorreu no Centro Experimen- rotações de dois anos. Foram testadas três le-
que a fixação biológica de N é dependente das tal da Revilheira, em conjunto com a Direção guminosas para grão (fava, ervilha e grão de
condições ambientais e apresenta uma grande Regional de Agricultura do Alentejo. Foram bico todas semeadas no outono), três legumi-
variação (Nutmann, 1976). Outra possibilida- testados dois tipos de adubos (NH4+ DMPP nosas forrageiras (luzernas anuais, trevo encar-
de é o aumento do teor do solo em matéria or- e NH4NO3) nas doses de 20, 40 60 e 80 kg nado e trevo da pérsia) e o girassol foi utilizado
gânica, o que é uma tarefa difícil em condições N.ha-1. No caso do azoto nitro-amoniacal, 20 como testemunha. No ano seguinte foi seme-
90
Fotografia 2
Ensaio de azoto na cultura de Trigo, na folha com 1.04 % de matéria orgânica, no Centro Experimental da Revilheira. Imagem colhida
em 15 de Março de 2015. É bem visível a deficiência de azoto dos talhões sem aplicação (centro da imagem), assim como a variação
do crescimento em função do azoto aplicado (entre 0 e 180 kg N/ha).
4000 ab ab ab ab
ab ab ab
O estudo relativo à resposta do trigo ao 3500
b
Produção de trigo
4
bc
azoto, em função do teor do solo em matéria cd cd cd 3000
3 2500
orgânica, foi realizado num solo Pm, no Cen- d
2000
tro Experimental da Revilheira, em conjunto 2 1500
1000
com a Direção Regional de Agricultura do 1 500
Alentejo, em que se compararam diferentes 0 0
20 40 60 80 20 40 60 80
sistemas de mobilização do solo e gestão dos
Adubação azotada (Fundo + 1.a cobertura) (kg N/ha) Adubação azotada (Fundo + 1.a cobertura) (kg N/ha)
resíduos das culturas. A rotação de culturas
NO3NH4 NH4+DMPP NO3NH4 NH4+DMPP
do campo de ensaio foi tremocilha → trigo
→ Aveia para feno → cevada. Os talhões em
mobilização convencional e enfardação das
palhas dos cereais (1.04% de matéria orgâni- Figura 1 Figura 2
ca na camada 0-30 cm) e os talhões em se- Extração de azoto pela cultura de trigo à Produção da cultura de trigo em função do
menteira direta com manutenção das palhas data da 2ª cobertura em função do tipo tipo de adubo e dose aplicada na aduba-
(2.12% de matéria orgânica 0-30 cm) foram de adubo e dose aplicada na adubação ção de fundo e 1ª cobertura. Em todos os
utilizados para realizar ensaios de resposta do de fundo e 1ª cobertura. tratamentos foi aplicada uma 2ª cobertura
trigo ao azoto. Foram utilizados quatro níveis variável, de forma a igualar a adubação
(0, 60, 120 e 180 kg N ha-1), dos quais 20 kg azotada total a 160 kg N/ha, em todos os
N ha-1 à sementeira e o restante aplicado em De facto, foi o tratamento com azoto nitro- tratamentos.
duas coberturas. -amoniacal, com a distribuição de 20 unidades
de fundo e 40 na 1ª cobertura, que conduziu
aos melhores resultados em relação a qualquer pelo que será recomendável em sistemas de
RESULTADOS E DISCUSSÃO dos dois parâmetros. Esta solução tem ainda a sementeira direta ou solos com uma boa dre-
A utilização do adubo amoniacal com o inibi- vantagem de permitir ajustar a adubação a pra- nagem. Em solos mobilizados e em que não
dor da nitrificação, aplicado de uma só vez em ticar à precipitação do ano, de acordo com o seja possível assegurar a aplicação de azoto em
fundo, não melhorou a recuperação de azoto modelo de gestão do azoto proposto no artigo janeiro, a utilização do adubo amoniacal com
pela cultura à data da 2ª cobertura (Figura 1) anterior. Naturalmente, esta solução exige que o inibidor da nitrificação deverá ser uma solu-
nem a produção atingida (Figura 2). a transitabilidade do solo esteja assegurada, ção a ponderar. Terá a vantagem de aumentar
1
de da Almocreva, Beja. 0 2 4 6 8 10 12
500 Ano de ensaio
Lavoura Sd+Palhas
B Diferença entre a média das legumino- O baixo teor de matéria orgânica da gene- 3500
3862
3587
sas para grão e o girassol; C Diferença en- ralidade dos nossos solos não é uma inevita- 3000 3587
tre a média das leguminosas forrageiras e bilidade do ambiente Mediterrânico. Em siste- 2500
2000
para grão. Valores médios de quatro anos. mas de sementeira direta consegue-se reduzir
1500
Solo Bvc – Herdade da Almocreva, Beja. as suas perdas, tanto por erosão como por 1000
mineralização e, se aumentarmos as adições 500
37 98 160
ao solo mantendo os resíduos das culturas no 0
0 60 120 180
Das leguminosas testadas, as forrageiras reve- terreno, é possível aumentar, de forma signifi- Adubação azotada (kg N/ha)
laram uma maior capacidade de fixar azoto. cativa e relativamente rápida, o teor do solo em 1% mo 2% mo 3% mo
92
produção de trigo seria de 3862 kg/ha para uma folha enriquecida em matéria orgânica (2.12% em matéria orgânica. Para o efeito é necessário
adubação azotada de 37 kg N/ha. Isto significa m.o.). É bem visível a diferença entre os dois reduzir as perdas, ou seja, mobilizar o solo o mí-
uma redução da adubação azotada ótima de campos, não só no potencial produtivo do trigo, nimo possível, e aumentar o retorno dos resídu-
cerca de 64 kg N/ha, por cada aumento de 1% mas também na sua dependência da adubação os ao solo. A manutenção das palhas dos cereais
no teor de m.o. do solo. Mas porque a produção azotada. no terreno é decisiva nesta estratégia. Juntamen-
esperada aumenta, a eficiência de utilização da A eficiência da adubação azotada, na pro- te com as palhas é necessário a adição de azoto
adubação azotada para a produção de trigo au- dução de trigo em condições Mediterrânicas, é que, neste contexto, pode e deve ser proveniente
menta exponencialmente com o teor do solo em normalmente baixa, por restrições climáticas e da inclusão de leguminosas na rotação. Neste
matéria orgânica (Figura 7). Nas Fotografias 1 e edáficas. Por um lado, a variabilidade intra-anu- caso, o azoto fixado pelas leguminosas não se
2 este efeito da matéria orgânica do solo, na pro- al do clima torna muito difícil o cálculo da adu- destina a ser absorvido pelo cereal, mas sim a
dução do trigo e sua resposta ao azoto, está bem bação ótima e, assim, conduz a erros frequentes permitir aos micróbios do solo a transformação
expressa. Na Fotografia 2 está uma imagem do na dose a plicar. A solução para este problema do carbono recalcitrante das palhas, especial-
ensaio de azoto na folha convencional (1.04% foi abordada em artigo anterior e passa por re- mente a lignina, em húmus do solo.
de m.o.) e na Fotografia 1 do mesmo ensaio na partir a adubação azotada em duas coberturas,
ajustando-as ao valor da precipitação. Por outro
lado, durante os meses de dezembro a fevereiro REFERÊNCIAS
decorre o afilhamento e a diferenciação das espi- > //
120 BIBLIOGRÁFICAS
kg de trigo/kg de azoto
tro experimental da Revilheira – solo Pm. blema. A única via é o aumento do teor do solo