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“O Movimento Cidades Saudáveis e seu desenvolvimento no Brasil”

por

Evangelos Adriano Pereira

Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre Modalidade


Profissional em Saúde Pública.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Regina Cele de Andrade Bodstein

Rio de Janeiro, outubro de 2014.


Esta dissertação, intitulada

“O Movimento Cidades Saudáveis e seu desenvolvimento no Brasil”

apresentada por

Evangelos Adriano Pereira

foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof. Dr. Carlos dos Santos Silva


Prof. Dr. Willer Baumgarten Marcondes
Prof.ª Dr.ª Regina Cele de Andrade Bodstein – Orientadora

Dissertação defendida e aprovada em 24 de outubro de 2014.


Catalogação na fonte
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica
Biblioteca de Saúde Pública

P436 Pereira, Evangelos Adriano


O movimento cidades saudáveis e seu desenvolvimento no
Brasil. / Evangelos Adriano Pereira. -- 2014.
86 f.

Orientador: Bodstein, Regina Cele de Andrade


Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública
Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2014.

1. Cidade Saudável. 2. Promoção da Saúde. 3. Ação


Intersetorial. 4. Saúde da População Urbana. 5. Políticas
Públicas. 6. Brasil. I. Título.

CDD - 22.ed. – 613.0981


Ai palavras, ai palavras, que estranha potência a vossa!
Ai palavras, ai, palavras, sois de vento que não retorna,
e, em tão rápida existência, tudo se forma e transforma!
Sois de vento, ides no vento, e quedais, com sorte nova!
(Cecília Meireles)
Dedico esta Dissertação a Silvana Ferreira de
Carvalho, minha esposa, que com sua fé, amor,
compreensão e incentivo ajudou-me a concluir
este trabalho.
Agradecimentos

Agradeço primeiramente ao autor da vida e do universo, Deus.

À minha mãe Eva das Mercês Silva Pereira (in memoriam), cujas lembranças resistem ao tempo e
mesmo com ela ausente da vida posso sentir a energia do seu amor materno.

Aos meus pequenos filhos Evangelos Emanuel Pereira Carvalho e Arthur Adriano Pereira Carvalho,
razão de grande felicidade em minha vida.

Ao meu pai Gregório Pereira Barbosa, homem simples e sensato, que nunca poupou esforços para
ver meu progresso nos estudos, desde a tenra infância quando ele me alfabetizou.

À minha irmã Evanilza Renata Pereira, uma verdadeira amiga, companheira e incentivadora dos
meus estudos.

Ao doutor Athaíde da Costa Oliveira (in memoriam), cirurgião-dentista, amigo que acreditou em
mim e ajudou-me a manter vivo o sonho da medicina em meados dos anos 90, o que influenciou o
caminho que agora percorro na área da Saúde Pública.

Aos professores que ministraram as aulas do Mestrado, pelo carinho e dedicação com que
transmitiram conhecimento e sabedoria, incentivaram o debate e raciocínio crítico.

À minha orientadora, Professora Doutora Regina Cele de Andrade Bodstein, pela cooperação, apoio
e paciência.

Aos colegas e amigos da turma do Mestrado, que com otimismo, companheirismo e união tornaram
a jornada mais tênue.

A todos aqueles que contribuíram para minha pesquisa: pessoal do CEPEDOC e Faculdade de
Saúde Pública da USP, pessoal do Ministério da Saúde, professor Marco Akerman.

A Secretária de Saúde de Pompéu, Danielle Ferreira de Campos Santos, por apoiar meu estudo e
pesquisa com finalidades de concluir o Mestrado Profissional.
SUMÁRIO
PÁGINA
INTRODUÇÃO 10
Capítulo1
Promoção da Saúde-Origens e Evolução 20
1.1- Relatório Lalonde 21
1.2-Conferência de Alma-Ata 22
1.3-Conferência de Ottawa 24
1.4-Outras Conferências 28
Capítulo 2
A Origem e Definição de Cidades Saudáveis 31
2.1-Os Pressupostos para os Municípios Saudáveis 35
Capítulo 3
O Contexto Brasileiro e o Movimento Cidades Saudáveis 40
Capítulo 4
Experiências em Municípios Brasileiros 46
4.1-Campinas 46
4.2-A Experiência no Estado de Minas Gerais: Dionísio e São José do
Goiabal 50
4.3-Crateús 52
4.4-Sobral 56
4.5-Jundiaí 60
4.6-Flexeiras 62
4.7-Maceió 63
4.8-Anadia e Arapiraca 65
4.9-Iraquara 66
4.10-Palmeira 66
Capítulo 5
Análise e Conclusões 68
CONSIDERAÇÕES FINAIS 78
REFERÊNCIAS 80
LISTA DE ABREVIATURAS

APS Atenção Primária à Saúde

CEPEDOC Centro de Estudos, Pesquisa e Documentação em Cidades Saudáveis

CIDA Canadian International Development Agency

CONASEMS Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde

ESMIG Escola de Saúde de Minas Gerais

ESP-CE Escola de Saúde Pública do Ceará

FSP/USP Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo

FUNED Fundação Ezequiel Dias

IPES Instituto de Pesquisas Especiais para a Sociedade

MS Ministério da Saúde

NTPs Núcleos de Trabalho e Pesquisa

NUMCIS Núcleo Municipal de Cooperação Internacional em Saúde

OMS Organização Mundial da Saúde

OPAS Organização Pan-americana da Saúde

PASS Programa de Ação Social em Saneamento

PUC-CAMPINAS Pontifícia Universidade Católica de Campinas

SUS Sistema Único de Saúde

UNICAMP Universidade de Campinas

WHO World Health Organization


Resumo

Esta dissertação é um estudo sobre o Movimento Cidades Saudáveis e sua inserção no Brasil a
partir de fins da década de 80. O objetivo central do estudo é analisar o processo de
desenvolvimento da estratégia Movimento Cidades Saudáveis no Brasil, assim como qual a atual
situação em que o movimento se encontra no país. Procura analisar o marco teórico em que se
desenvolveu a estratégia Cidades Saudáveis, associada à evolução da discussão e concepção de
Promoção da Saúde. Para isto, a dissertação aborda desde os marcos da Promoção da Saúde como o
Relatório Lalonde, a Conferência de Alma-Ata e a Carta de Ottawa, analisa o surgimento e
evolução do Movimento Cidades Saudáveis com apoio da Organização Mundial da Saúde e
Organização Pan-Americana da Saúde, no caso principalmente da América Latina e, incluso, o
Brasil, aborda os pressupostos da estratégia e apresenta uma análise de um conjunto de experiências
brasileiras em municípios que, em um dado momento, adotaram a estratégia Cidades Saudáveis.
Conclui-se que diversos fatores contribuíram para a fragilidade das experiências, a participação de
instituições de ensino e pesquisa foram importantes no desenvolvimento da estratégia e um
desdobramento do movimento no Brasil constitui um trabalho em rede que compartilha e dá suporte
a políticas públicas saudáveis.

Palavras-Chave:
“Cidades Saudáveis”, “Municípios Saudáveis”, “Promoção da Saúde”, “Intersetorialidade”, “Saúde
Urbana”.
Abstract

This dissertation is a study of the Healthy Cities Movement and its place in Brazil from the late 80s.
The main objective of the study is to analyze the development process of the strategy of Healthy
Cities Movement in Brazil, as well as what is the current situation of the movement in the country.
It looks to analyze the theoretical framework in which the Healthy Cities strategy has developed,
associated with the evolution of the discussion and design of Health Promotion. For this, the
dissertation addresses from the landmarks of Health Promotion as the Lalonde Report, the Alma-
Ata Conference and the Ottawa Charter, examines the emergence and evolution of the Healthy
Cities Movement with support from the World Health Organization and the Pan-American Health
Organization, especially in the case of Latin America, and included, Brazil, addresses the
assumptions of the strategy and presents an analysis of a set of experiments in Brazilian
municipalities that, at any given time, adopted the Healthy Cities strategy. It is concluded that
several factors contributed to the fragility of the experiments, the participation of educational and
research institutions were important in developing the strategy and an offshoot of the movement in
Brazil is a network that shares and supports healthy public policies.

Keywords:
"Healthy Cities," "Healthy Municipalities", "Health Promotion", "Intersectoral", "Urban Health".
10

INTRODUÇÃO

As últimas décadas foram marcadas por grandes transformações, desde o pós-guerra até o novo
cenário construído com o fim da guerra fria e, com ela, o fim da polarização política no mundo. As
transformações sociais e políticas ocorridas refletem a evolução da abordagem da saúde.

Por um lado, com esforços de pensadores e pesquisadores militantes de causas sociais ou


preocupados com o desenvolvimento da qualidade de vida como fator de cidadania, apregoou-se o
direito à saúde, com destaque para movimentos como no Brasil, que garantiram em constituição a
universalização deste direito.

Por outro lado, sucessivas crises econômicas e um crescente aumento no debate sobre custos da
saúde permitiram que uma linha de estudiosos, em sintonia com determinados governos
defendessem novas estratégias para diminuir os custos com a saúde, ou seja, tomaram decisões com
foco meramente econômico.

Tais atitudes, se de uma forma representou um retrocesso e gerou problemas de financiamento,


também permitiram que certas práticas, como a Atenção Básica, pudessem se desenvolver, já que
além do ganho em relação à qualidade de vida com nítida melhora de indicadores de saúde
demonstrado classicamente em variados estudos, a organização de um modelo de saúde baseado na
Atenção Básica diminui enormemente os custos em níveis de maior complexidade.

O eixo que norteou a discussão do tema saúde e gerou grande impacto nas últimas décadas refere-se
à Promoção da Saúde. A Promoção da Saúde, principalmente a partir da década de 70, ganhou
destaque no debate mundial, a partir da Conferência de Alma-Ata, ocorrida no ano de 1978, em que
a Atenção Primária foi o tema discutido. Governos de diversas nações passaram a ter uma
referência internacional para que produzissem políticas públicas relacionadas à Promoção da Saúde.

Torna-se importante salientar que nesta época o mundo vivia em plena Guerra Fria e costurar
acordos em torno de metas para a saúde das nações envolvia conciliar interesses conflituosos entre
as duas grandes potências naquele momento- os Estados Unidos e a União Soviética. Assim, os
interesses capitalistas foram preservados do ponto de vista que a Atenção Primária reduzia custos e
os interesses socialistas não foram prejudicados, pois, a discussão e desenvolvimento da Atenção
11

Primária trazem consigo a quebra do velho paradigma da saúde e se apresenta como modelo capaz
de causar uma revolução social, uma vez que oferece saúde de qualidade para populações
anteriormente excluídas do sistema.

No Brasil, há mais de duas décadas, após o advento da Constituição de 1988 e a criação do Sistema
Único de Saúde, a promoção da saúde vem sendo debatida e desenvolvida por gestores e
profissionais, principalmente no âmbito da Atenção Básica da Saúde.

Na década de 80, com a I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, ocorrida no Canadá,
tem-se um marco na história e no aspecto conceitual da Promoção da Saúde. As diretrizes adotadas
a partir da Carta de Ottawa, documento final da conferência e assinado pelos governos presentes,
foram amplamente analisadas e aprofundadas nas conferências seguintes e temas como a
necessidade da universalização da saúde, integralidade da atenção, necessidade de trabalhar a saúde
em conjunto com outras políticas na área da educação, transportes, meio ambiente dentre outros
setores ganharam espaço nas agendas dos governos e transformaram em tendência mundial.

Em direção a esta tendência, organismos multilaterais iniciaram a adoção de práticas com o intuito
de promover saúde através da nova lógica de pensar saúde. O apoio de organismos internacionais
como a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), escritório regional da Organização Mundial
da Saúde (OMS) para as Américas, e o próprio escritório central da OMS, tiveram um papel
fundamental ao possibilitar o desenvolvimento de estratégias adotadas em um contexto
internacional, baseada em princípios discutidos em conferências ou outros eventos com participação
de diversos países, como o Movimento Cidades Saudáveis.

O movimento Cidades Saudáveis, que incialmente é concebido na América do Norte,


especificamente no Canadá, expande-se rapidamente ao redor do mundo, primeiramente para países
europeus e em seguida para outros continentes, inclusive na América Latina e Brasil.

A estratégia Cidades Saudáveis logo é percebida pela OPAS e OMS como ferramenta importante
para que se alcance padrões sanitários considerados aceitáveis e para promover uma interação
saudável entre os indivíduos e comunidade com o meio em que vivem. É uma estratégia que
fortalece o discurso defendido em relação aos objetivos da Atenção Primária à Saúde e aos
preceitos de Promoção da Saúde descritos na Carta de Ottawa.
12

A adoção da estratégia Cidades Saudáveis está intimamente ligada a um conjunto de condições que,
ou devem já estar presentes no município, ou precisam paralelamente ser desenvolvido no decorrer
da implantação da estratégia. Requer um modelo estruturado nos princípios da Atenção Primária e
que, dentro da estrutura dos espaços democráticos, haja garantia da participação popular na tomada
de decisões relacionadas às políticas públicas.

Um eixo fundamental do Movimento Cidades Saudáveis é a intersetorialidade e assim, uma outra


característica fundamental para aqueles municípios que adotaram ou adotam a estratégia, é a
capacidade de articular ações intersetoriais, em que nem sempre a saúde necessita tomar a frente nas
discussões e ações mas que o conjunto dos setores estejam comprometidos com o bem estar e
qualidade de vida da população.

Ainda pode-se afirmar que não há como implantar a estratégia Cidades Saudáveis sem que o gestor
local assuma um compromisso formal, com garantia de condições básicas, inclusive aplicação de
recursos adequados para o desenvolvimento de ações propostas pela comunidade e debatidas em
conjunto com o setor público e outros parceiros.

O tema deste trabalho é o Movimento Cidades Saudáveis enquanto estratégia adotada por governos
municipais com apoio da Organização Mundial da Saúde e suas regionais, a partir da década de 80.

Embora seja um movimento que cresceu a partir da década de 80 para localidades diversas, em
países de todos os continentes, adota-se neste trabalho um recorte do objeto para análise. Pretende-
se limitar a análise, nesta dissertação, ao desenvolvimento da estratégia do Movimento Cidades
Saudáveis em municípios brasileiros.

Ao estabelecer o tema e determinar o recorte, a pergunta que se faz para a pesquisa é a seguinte:

“Como se desenvolveu a estratégia do Movimento Cidades Saudáveis no Brasil e qual a situação


atual?”

A partir da pergunta norteadora da pesquisa, procurou-se estabelecer os seguintes objetivos


descritos abaixo.
13

Objetivo Geral

Analisar o processo de desenvolvimento da estratégia Movimento Cidades Saudáveis em


municípios brasileiros, assim como qual é a situação atual em que o movimento se encontra, no
Brasil.

Objetivos Específicos

1) Revisar o marco conceitual que deu origem ao Movimento Cidades Saudáveis e suas
principais características no Brasil;
2) Analisar as principais experiências da estratégia Movimento Cidades Saudáveis em
municípios brasileiros e o papel desempenhado pelas instituições de ensino e pesquisa na
área da saúde neste processo;
3) Analisar os principais resultados da utilização da estratégia Movimento Cidades
Saudáveis em municípios brasileiros e quais os problemas encontrados.

Em relação ao espaço temporal abrangido na análise, toma-se o ano de 1984 como marco do início
do Movimento Cidades Saudáveis, a partir de evento realizado no Canadá, até o ano de 2013, com o
IV Encontro da Rede de Municípios/Cidades Saudáveis e Sustentáveis, ocorrido em Brasília e
promovido pelo Ministério da Saúde (MS). Porém, ao abordar o contexto em que o Movimento
Cidades Saudáveis se desenvolveu, analisa-se fatos anteriores importantes para entender a
concepção da Promoção da Saúde.

Como justificativa para a pesquisa, a principal razão deste estudo é meu interesse pessoal, associado
à minha prática profissional como Médico de Família e Comunidade, inserido no ambiente de
trabalho da Atenção Primária e a atuação como diretor de Relações Internacionais da Associação
Mineira de Medicina de Família e Comunidade, em que trabalha-se com foco na busca de
estratégias de Promoção da Saúde, preferencialmente debatidas em âmbito internacional.

Outra justificativa refere-se ainda à minha atuação em Atenção Primária em pequeno município no
interior de Minas Gerais, Pompéu, com surgimento do desejo e necessidade de criar um espaço para
discutir as tendências da Promoção da Saúde, com visão ampliada para estratégias diversas,
inclusive relacionadas ao ideário do Movimento Cidades Saudáveis. Foi criado, para isto, o Núcleo
14

Municipal de Cooperação Internacional em Saúde- NUMCIS, estrutura aprovada no Conselho


Municipal de Saúde de Pompéu, Minas Gerais, que constitui espaço de estudos e pesquisas de
experiências de práticas e políticas públicas, com ênfase na promoção da saúde e melhoria da
qualidade de vida, baseadas no conceito de Municípios Saudáveis da Organização Pan-Americana
da Saúde (OPAS) e Organização Mundial da Saúde (OMS).

Por motivos diversos, principalmente devido à dificuldade em consolidar um grupo interessado em


manter o debate e contribuir com as discussões, as atividades do NUMCIS permanecem latentes,
mas espera-se que a partir desta dissertação, no âmbito do Mestrado Profissional, possa haver uma
nova fase em que as discussões sejam retomadas e princípios aqui estudados possam ser discutidos
com a comunidade e gestores.

Estudar quais as características desta estratégia, como se desenvolveu no Brasil, que fatores
influenciaram na sua evolução ao longo do tempo e quais as inflexões aconteceram é importante
para entender o que se pode aproveitar na atualidade a fim de melhorar a qualidade de vida a partir
do prisma da saúde, mas com uma visão de intersetorialidade.

Espera-se, a partir desta dissertação, contribuir para o debate sobre os rumos do Movimento
Cidades Saudáveis no Brasil, quais as perspectivas e desafios que os municípios enfrentaram e
enfrentam a fim de desenvolver uma agenda que requer um pacto entre o governo local, a sociedade
organizada e setores não governamentais.

Apesar de já existirem trabalhos que abordam o assunto, acredita-se que ainda há uma lacuna no
conhecimento do tema, o que abre oportunidade para exploração a partir deste trabalho de
dissertação. Esta lacuna refere-se à pouca sistematização das experiências desenvolvidas, à falta de
análise das tendências apresentadas e dificuldade em concluir sobre o que aconteceu com o
Movimento Cidades Saudáveis no Brasil, desde sua origem em fins da década de 80 até a segunda
década do século 21.

A Proposta Metodológica para desenvolvimento da dissertação é a Revisão Bibliográfica Narrativa


de literatura existente e Análise de Documentos como publicações de caráter informativo de
diversas instituições, vídeos e outros.
15

A revisão narrativa da literatura procura analisar um conjunto de estudos que abordam diferentes
aspectos de um mesmo fenômeno e, a partir daí, passa a construí-los em um quadro maior, um mapa
ou mosaico, ou a descrever a história incluída na revisão, por exemplo, através da descrição de
como se adapta a um quadro teórico. Constitui-se um método flexível que permite a reflexão e
crítica do autor da revisão (DENYER E BRINER, 2006).

A dificuldade para realizar revisões sistemáticas em saúde pública é um reflexo da complexidade


das intervenções na área, que tem como foco populações ao invés de indivíduos, além de múltiplos
componentes de intervenção qualitativa e ênfase em processos de longo prazo (JACKSON E
WATERS, 2005). O mérito da revisão narrativa é dar relevância ao enfoque qualitativo das
experiências presentes e discutidas na literatura.

A pesquisa qualitativa é predominantemente descritiva e o pesquisador qualitativo tenta analisar os


dados em toda sua riqueza para compreender o fenômeno estudado. As descrições dos fenômenos
estão impregnadas de significado impressos pelo ambiente, como consequência de uma visão
subjetiva. Assim, a interpretação dos resultados tem como base a percepção de um fenômeno dentro
de um determinado contexto. (TRIVIÑOS, 1987).

A pesquisa qualitativa constitui ainda um campo interdisciplinar e transdisciplinar, que percorre


desde as ciências humanas, as ciências sociais e até mesmo as físicas. Além disto, apresenta um
foco multipragmático e quem a desenvolve está sujeito ao valor da abordagem de métodos diversos.
A influência por posturas éticas e políticas é inevitável (DENZIN E LINCOLN, 2000).

A maior parte das investigações diagnósticas e avaliativas de programas de saúde ou que abrangem
a saúde coletiva e temas afins é desenvolvida a partir de estudos qualitativos, apesar de que em
alguns casos utiliza-se modelos quantitativos experimentais. A preferência pela pesquisa qualitativa
se dá a fim de que o pesquisador verifique a forma em que as pessoas avaliam determinada
experiência, ideia ou acontecimento (IEVORLINO E PELICIONI, 1998).

A avaliação qualitativa requer uma profunda análise dos interesses e conflitos que se estabelecem
nas relações e contextos sociais, o que leva a influência da percepção de um projeto em avaliação.
16

A partir daí, pode-se realizar perguntas sobre os resultados esperados e quais os vínculos que
surgem entre os sujeitos sociais e os mais variados objetos do projeto (BODSTEIN, 2009).

A revisão da literatura constituiu como a estratégia principal no percurso metodológico e a partir da


definição daqueles estudos que abordavam o fenômeno objeto do trabalho, fez-se necessário e útil a
leitura de textos complementares que subsidiaram a análise a partir da definição de conceitos ou
complemento de informações.

A Revisão Bibliográfica foi realizada através de material buscado em bases de dados de livre acesso
(Biblioteca Virtual em Saúde-BVS/Lilacs, Embase Medline/PubMed, Cochrane Public Health
Group e Scielo) e na biblioteca da FSP/USP (acervo do CEPEDOC).

Em relação ao acervo do Centro de Estudos, Pesquisa e Documentação em Cidades Saudáveis


(CEPEDOC), a partir de duas visitas com duração média de quatro dias e aproximadamente oito
horas por dia de trabalho, foi analisado todo o material disponível em sua base física, localizada na
biblioteca da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP).

Algumas considerações são importantes em relação à pesquisa do acervo do CEPEDOC.

Primeiramente, quase a totalidade do material que se encontra no acervo trata-se de conteúdo


lançado, publicado ou divulgado há mais de dez anos, o que impediu uma reflexão mais adequada
em relação à linha temporal do desenvolvimento do Movimento Cidades Saudáveis no Brasil. Uma
impressão inicial é que se tratava de acervo de algo que encerrou-se em algum momento há vários
anos e não houve registros sobre em que circunstâncias teria ocorrido.

Segundo, esperava-se no acervo de documentos do CEPEDOC um conjunto mais ampliado de


registros das experiências brasileiras, com relatórios, atas e outros documentos oficiais. Apesar de
vários itens informarem sobre tais experiências nas mais diversas localidades, através de boletins,
pequenos jornais locais ou institucionais, são escassos documentos oficiais, atas de conselhos ou de
grupos deliberativos relacionados aos projetos da estratégia Cidades Saudáveis.
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Terceiro, uma grande parte dos documentos refere-se a projetos e análise de situações fora do
Brasil, que apesar de subsidiarem a pesquisa com informações relevantes, não foram analisados na
integralidade porque fogem ao recorte do objeto nesta pesquisa.

Por último, observou-se que muitos dos documentos catalogados como parte da base de dados não
guardam relação direta com o histórico ou ações diretamente relacionadas ao Movimento Cidades
Saudáveis. São folhetos, por exemplo, de campanha de combate a dengue lançada pelo Ministério
da Saúde em determinado ano ou campanha de vacinação contra raiva em Fortaleza.

Apesar dos problemas apontados, a base de dados foi um referencial fundamental, principalmente
para descrição das experiências em algumas cidades brasileiras, a partir do que pretendeu-se avaliar
a situação, observar tendências e tentar analisar os problemas apresentados.

A busca de documentos em outras instituições mostrou-se tarefa com um certo grau de dificuldade.
Destaca-se a falta de memória, por exemplo, no próprio Ministério da Saúde, que não tem registros
oficiais dos encontros ocorridos ao longo dos últimos dez anos que antecederam o IV Encontro da
Rede de Municípios/Cidades Saudáveis e Sustentáveis.

Parte dos documentos analisados são publicações ou relatórios de instituições como a OPAS e a
OMS, sendo que alguns fazem parte de acervo pessoal e outros foram obtidos integralmente através
da rede mundial de computadores, a internet. Algumas buscas feitas em site da OPAS e OMS foram
direcionadas para o site de buscas do Google porque as ferramentas de pesquisa deles encontram-se
integradas.

A busca por estes documentos, tanto na base de dados do CEPEDOC como outros, levou ao
tratamento, além da tradicional denominada literatura branca, de uma forma diferente de literatura,
a chamada literatura cinzenta. A literatura cinzenta se caracteriza pela acessibilidade limitada e não
se encontra padronizada em qualquer tipo de controle bibliográfico. Inclui desde atas, relatórios até
simples comunicados de eventos (SOUZA-SANTOS, 2010).

Para a inclusão e exclusão da seleção a ser estudada, foram definidos inicialmente os seguintes
critérios: ter texto completo acessível, estar dentro do período de pesquisa, ser em português, inglês,
e espanhol, não excluir tipos de estudo, observação da qualidade dos estudos sendo que no caso de
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artigo, há obrigatoriedade de estar em periódico com peer review e no caso das teses ou
dissertações, há obrigatoriedade de terem sido aprovadas por banca examinadora. Outros
documentos foram incluídos com base na validação a partir de discussão com a orientadora.

Para as pesquisas nas bases de dados foram utilizadas as seguintes palavras-chaves: “Cidades
Saudáveis”, “Municípios Saudáveis”, “Promoção da Saúde”, “Intersetorialidade”, “Saúde Urbana”.
A definição dos descritores de busca foi efetuada junto com a orientadora. Apesar do recorte
temporal determinado, conforme descrito acima, para as buscas não foram utilizados tais limites,
porque trabalhos anteriores poderiam oferecer subsídios importantes para a reflexão e análise.
Através da leitura integral dos conteúdos ou, em alguns casos, dos resumos, foi possível selecionar
aqueles trabalhos pertinentes para a pesquisa.

Em relação à pesquisa de processos sociais baseada principalmente em revisão bibliográfica,


Minayo observa o grande fluxo de mudanças que confere um caráter de efemeridade a tal processo
e ao mesmo tempo o torna atrelado ao contexto temporal e histórico (MINAYO, 2000).

A organização do material para análise seguiu determinados preceitos como proposto por Pimentel,
que afirma que organizar um conteúdo significa processar a leitura de acordo com fichamento,
avaliação de termos e assuntos recorrentes, adoção de uma codificação que facilite manusear o
material. Assim, pode-se construir um rico banco de dados capaz de trazer suporte para cada
abordagem desenvolvida dentro do trabalho (PIMENTEL, 2001).

Na estratégia de análise dos resultados, na abordagem qualitativa foi levada em conta as variações
encontradas nos estudos em relação à bibliografia consultada. Espera-se que com a revisão narrativa
tenha-se subsídios para discutir a estratégia Cidades Saudáveis. Os resultados foram apresentados
basicamente sob a forma de texto descritivo.

A partir deste caminho metodológico escolhido, o texto foi desenvolvido e divido em 5 capítulos, a
fim de oferecer respostas aos objetivos específico e geral da dissertação.

O primeiro capítulo trata de um ponto fundamental para que se possa contextualizar o Movimento
Cidades Saudáveis, que é a construção do conceito de Promoção da Saúde. Analisa-se desde o
Relatório Lalonde, marco fundamental na questão da promoção da saúde, a Conferência de Alma-
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Ata, em 1978, cujo tema era Atenção Primária à Saúde, a I Conferência Internacional da Promoção
da Saúde que gerou outro importante marco- a Carta de Ottawa, em 1986, e as conferências que se
seguiram, cujos debates ampliaram e fortaleceram a busca por adoção de políticas públicas com
foco na promoção da saúde.

O segundo capítulo trás uma análise do surgimento do Movimento Cidades Saudáveis, assim como
o que se entende por Cidade Saudável, a partir de pesquisadores do tema e da Organização Mundial
da Saúde (OMS) e Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Ainda apresenta os pressupostos
para os Municípios Saudáveis e suas características.

O terceiro capítulo discute o contexto brasileiro na época das primeiras experiências com a
estratégia Municípios Saudáveis. Em um momento de grandes transformações que se seguiram à
redemocratização do país e com advento do SUS, a estratégia Cidades Saudáveis trouxe a
oportunidade de consolidar o que previa o texto constitucional e garantir fortalecimento de
determinados pontos em pauta na época como descentralização, municipalização, ações
intersetoriais e participação popular.

O quarto capítulo percorre algumas experiências ocorridas em municípios brasileiros. A ênfase


permanece em fatores específicos como envolvimento de universidades e centros de pesquisa, e
desenvolvimento de estratégias inovadoras como trabalho conjunto com escolas. Procura-se
também demonstrar como alguns problemas foram capazes de comprometer os projetos no âmbito
da estratégia Cidades Saudáveis.

O quinto e último capítulo é dedicado a uma análise e conclusão do trabalho, através de reflexões
sobre alguns pontos expostos em outros capítulos, na busca de compreender os avanços, desafios e
inflexões apresentados pelo Movimento Cidades Saudáveis.
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CAPÍTULO 1
PROMOÇÃO DA SAÚDE-ORIGENS E EVOLUÇÃO

Desde o início do século XX existe a menção sobre a ideia da Promoção de Saúde, pelo sanitarista
Henry Sigerist, que lhe dava o significado de ações de Educação em Saúde e ações estruturais do
Estado para melhorar as condições de vida.

O trabalho de Henry Sigerist enfatizava a visão integral da medicina através de quatro funções:
promoção da saúde, prevenção da doença, restauração da saúde e reabilitação. Estas funções seriam
tratadas mais tarde como níveis de prevenção. Propunha ainda a formação de um médico social que
entendesse o desenvolvimento e as funções sociais da medicina, com interesse pela saúde ao invés
da doença, o que seria viável com aumento de carga horária de ciências sociais nos cursos médicos.
Em defesa da ampla provisão de serviços públicos de saúde, defendia a ideia de centros de saúde
com um generalista apoiado por grupo de especialistas, além de rede hospitalar de apoio. Por fim,
Henry Sigerist já afirmava em 1941 que saúde não era somente uma condição física e mental, mas
com um sentido social, com algo que sobrepõe à simples ausência de doença. Esta é a origem da
definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), que em sua constituição estabelecida em 1946,
define saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a
ausência de doença ou enfermidade (NUNES, 1992).

Henry Sigerist, além de contribuir com seu pensamento expresso em diferentes obras, participou de
formulações da medicina preventiva e social da América Latina e sua inserção nas escolas médicas,
através de assessoria prestada à Organização Mundial da Saúde, na comissão de especialistas em
Educação Profissional e Técnica do pessoal Médico e Auxiliar, em 1952. Nesta oportunidade,
enfatizou a necessidade de treinar o profissional médico para romper barreiras entre a medicina
preventiva e curativa e assumir, dentre outros papéis, o de trabalhador social, que conduza as
pessoas para uma vida cada vez mais saudável (NUNES, 1992).
21

1.1-Relatório Lalonde

Um marco do desenvolvimento da promoção de saúde no mundo aconteceu em 1974, no Canadá, a


partir do chamado Relatório Lalonde. O documento, de autoria do então Ministro da Saúde
canadense Marc Lalonde, propõe uma medicina simplificada e mais socializada, além de melhor
relação custo-efetividade das intervenções nos estilos de vida e meio ambiente. O relatório propõe
dois objetivos amplos para o governo: reduzir os danos à saúde mental e física da população em
risco elevado e melhorar a acessibilidade a bons serviços de cuidados de saúde física e mental.
Estes dois objetivos deveriam ser desenvolvidos a partir de cinco estratégias: promoção da saúde,
regulação, pesquisa, eficiência no cuidado à saúde e estabelecimento de metas. Traz ainda 74
proposições a fim de implementar cada estratégia (LALONDE, 1974).

Os antecedentes históricos de promoção de saúde no Canadá mostram uma reputação no tema desde
a década de 70, a partir de iniciativas de projetos de ações comunitárias para a promoção da saúde e
políticas de saúde pública, facilitadas pela expansão de investimentos do governo federal em
programas sociais nos anos 60 e 70, com participação ativa das dez províncias e dois territórios, que
adotam seus próprios sistemas de saúde naquele país e torna diversificada a experiência de
promoção da saúde (HEALTH CANADA, 1998).

O Relatório Lalonde é considerado um marco político-institucional da Promoção da Saúde, além de


um marco teórico para o campo da saúde pública, pois a vincula de forma direta ao processo de
organização das políticas públicas (UCHOA, 2000).

No documento, oficialmente chamado “A New Perspective on the Health of Canadians-A Working


Document”, Marc Lalonde amplia a visão de saúde, limitada até então pela existência de bons
serviços de atendimento médico, através do conceito de Campo de Saúde, em que um conjunto de
características constituem o que consequentemente será a visão de saúde. Estas características estão
distribuídas em quatro categorias. A primeira é o estilo de vida, relacionada ao comportamento
humano e seus riscos. Outra categoria é o ambiente, que envolve a relação do homem com os
recursos naturais, suas condições de trabalho e meio social em que vive. Uma terceira categoria é
constituída pelas condições biológicas, que envolve os processos fisiopatológicos os quais o ser
22

humano está sujeito como organismo complexo. Por último, os serviços de saúde também se
destacam como uma categoria para entender o Campo de Saúde (LALONDE, 1974).

Em relação ao relatório, ainda se destaca que Lalonde demonstra que os agravos à saúde estão
relacionados à interação das quatro categorias e há riscos de fragmentação das ações de saúde
quando se tenta categorizar agravos de forma rígida e exclusiva. Outro destaque observado por
Lalonde é a existência de um conflito entre as metas desejadas em saúde, como uma boa
acessibilidade dos serviços de saúde, e o comportamento de diferentes atores, como a má
distribuição territorial de profissionais de saúde. Outro exemplo de conflito seria a proporção
razoável de médicos entre as diversas especialidades e a preferência destes profissionais por
algumas dessas especialidades, além de um controle de custos e uma oferta não ordenada de
serviços ou leitos (AGUIAR, 2003).

1.2-Conferência de Alma-Ata

Alguns fatores, dentre o quais os custos cada vez mais altos com a atenção à saúde nos mais
diversos países, levaram a Organização Mundial da Saúde (OMS) a apoiar iniciativas de debate
sobre alternativas em relação à assistência à saúde, a fim de garantir uma maior cobertura, já que
grande parte da população encontrava-se marginalizada em relação ao direito e condições de acesso
aos serviços de saúde. Tais discussões procuravam tirar o foco da solução nos serviços médicos de
forma isolada, já que os custos não poderiam ser suportados por um sistema de saúde (AGUIAR,
2003).

Em 1977, a 30ª Assembleia Mundial da Saúde aprovou uma resolução que estabelecia uma
prioridade para a própria OMS e para os governos dos países signatários: o alcance de um nível de
saúde que permitisse levar uma vida social e economicamente ativa, para todos os povos do mundo,
o que ficou conhecido com “Saúde para Todos”.

Em 1978, na cidade de Alma-Ata, Cazaquistão (integrante da antiga União Soviética), acontece a


Conferência Internacional sobre Cuidados Primários, com participação de diversos países e
referendada pelo Brasil. A Conferência teve como objetivos: 1-promover o conceito de Atenção
23

Primária à Saúde (APS) em todos os países; 2-intercambiar experiências e informações sobre a


organização da APS em alguns sistemas e serviços nacionais de saúde; 3-avaliar a situação da saúde
e da assistência sanitária em todo o mundo e sua relação com a APS e o potencial de melhora dos
sistemas nacionais de saúde com o estabelecimento de uma política de APS; 4-definir os princípios
da APS e as formas operativas de superação dos problemas práticos que possam surgir; 5-definir a
função dos governos e de organizações nacionais e internacionais na cooperação técnica e na ajuda
para o desenvolvimento da APS de uma forma geral; 6-formular recomendações para esse
desenvolvimento. A Conferência enfatiza que a saúde, conforme conceituada pela OMS, é um
direito humano fundamental. Assim, reconhece como fundamental a necessidade de se desenvolver
o mais alto nível possível de saúde para uma população, além de esclarecer que os esforços para
atingir este alto nível de saúde somente é possível através de ações conjuntas dos setores saúde,
sociais e econômicos (WHO, 1978).

As discussões na Conferência de Alma-Ata alertaram para a questão da desigualdade que existe no


estado de saúde dos povos, principalmente a diferença entre os países desenvolvidos e em
desenvolvimento. Coloca a promoção de saúde como fator fundamental para o desenvolvimento
econômico e social e fator contribuinte para a manutenção da paz mundial. Alerta ainda que
participar de forma individual ou coletiva no planejamento e execução dos cuidados de saúde
constitui, ao mesmo tempo, um direito e um dever dos povos (WHO, 1978).

Com meta de garantir alto nível de saúde para os povos até o ano 2000, o documento final da
Conferência esclarece que os governos têm a responsabilidade de tomar medidas sanitárias e sociais
para tal e aponta os cuidados primários como a estratégia principal para o cumprimento desta meta.
Entende-se cuidados primários de saúde como cuidados essenciais de saúde que tem como base
métodos e tecnologias práticas, com fundamentação científica, aceitáveis pela sociedade e que
estejam ao alcance universal da comunidade, seja no âmbito individual ou coletivo como famílias.
Espera-se a participação do indivíduo neste processo e que o custo seja razoável a fim de viabilizar
a manutenção das ações. Como primeiro nível de contato da comunidade com o sistema de saúde de
um país, os cuidados primários representam um importante elemento no processo de assistência
continuada à saúde. A declaração de Alma-Ata afirma que a Atenção Básica à Saúde é “... um
reflexo e uma consequência das condições econômicas e das características socioculturais e
políticas do país e de suas comunidades...”. Para estimular e concretizar suas ações, os países
deveriam levar em conta “... a aplicação dos resultados pertinentes das investigações sociais,
24

biomédicas e sobre serviços de saúde e a experiência acumulada em matéria de saúde pública”


(WHO, 1978).

A incorporação das recomendações da Conferência de Alma-Ata na formulação e implementação


das políticas de saúde nos diferentes países gerou estratégias e resultados diversos. Em países do
Terceiro Mundo, no âmbito institucional, favoreceu mudanças no sentido da racionalização e do
surgimento de mecanismos de controle externo. A partir das especificidades da mobilização política
local e da orientação política dos governos, a implementação das recomendações foi capaz de
promover a criação de espaços de participação em que a população interferisse no controle das
burocracias e nos processos políticos. Porém, também gerou processos nos quais “a retórica da
participação cumpria papel circunscrito a contribuir com a redução de gastos, envolvendo os
participantes como cofinanciadores ou como mão de obra para construção de unidades de saúde
ou equipamentos sanitários" (RIBEIRO E RAICHELIS, 2012).

A Conferência de Alma-Ata aconteceu num cenário de crise mundial e plena vigência da disputa
ideológica entre os Estados Unidos e a União Soviética, a chamada "Guerra Fria" e, assim, há uma
evidente sintonia da declaração com as orientações políticas das agências internacionais naquele
período. Ainda que na declaração pode-se observar um destaque para a ênfase na participação da
comunidade, a estratégia dos cuidados primários é baseada na lógica de racionalização dos recursos
e diminuição de gastos com procedimentos dispendiosos (RIBEIRO E RAICHELIS, 2012).

1.3-A Conferência de Ottawa

No ano de 1986, em Ottawa, Canadá, acontece a Primeira Conferência Internacional sobre


Promoção da Saúde. Esta Conferência representa um importante marco na Promoção da Saúde ao
possibilitar que o tema seja inserido na pauta de políticas públicas para os países membros da
Organização Mundial da Saúde. A meta de Saúde para Todos no ano 2000, formulada em 1978 na
Conferência de Alma-Ata, a partir do evento em Ottawa passa a ser chamada de Saúde para Todos,
sem especificar uma data limite ou um tempo específico, configurando a partir de então em um
imperativo ético, social e político (FRANCO-GIRALDO, 2000).
25

A Conferência representou ainda uma resposta às crescentes expectativas por uma nova forma de
saúde pública e embora predominaram as discussões sobre as necessidades em saúde dos países
industrializados, pode-se considerar que necessidades semelhantes dos mais diversos locais foram
levados em conta. O produto final da Conferência foi a Carta de Ottawa, documento que, junto com
a declaração de Alma-Ata constitui elemento importante na construção da história da Promoção da
Saúde.

A Carta de Ottawa define Promoção da Saúde como “o processo de capacitação da comunidade


para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no
controle deste processo”. Ainda afirma a necessidade de indivíduos e grupos saberem “identificar
aspirações, satisfazer necessidades e modificar favoravelmente o meio ambiente”, a fim de alcançar
um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Duas implicações se deduzem a partir
disto: 1-a saúde enfatiza recursos sociais e pessoais; 2-promoção da saúde abrange responsabilidade
de outros setores além do setor saúde (CARTA DE OTTAWA, 1986).

A Carta de Ottawa apresenta alguns pré-requisitos fundamentais para a saúde como paz, habitação,
educação, alimentação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade.
A saúde é tratada como o maior recurso para o desenvolvimento social, econômico e pessoal e
diversos fatores, incluindo aqueles de ordem política, econômica, cultural, ambiental,
comportamental e biológica tem a capacidade de influenciar na saúde, seja ao favorecê-la ou
prejudicá-la. Desta forma, ações de promoção da saúde buscam fazer com que as condições de
saúde sejam favoráveis (BRASIL, 2002).

Os objetivos das ações de Promoção da Saúde descritos na Carta de Ottawa são reduzir as
diferenças no estado de saúde da população e garantir oportunidades e recursos igualitários a fim de
que todas as pessoas estejam capacitadas para realizar de forma completa seu potencial de saúde, o
que, por sua vez, requer a necessidade de controlar os fatores determinantes de sua saúde (BRASIL,
2002).

Um elemento importante da Carta de Ottawa é o fato de reconhecer que os pré-requisitos para a


saúde não são assegurados somente pelo setor saúde e que para promover saúde há a necessidade de
uma ação coordenada entre governo, setor saúde, setores econômicos e sociais, organizações
voluntárias e não governamentais, autoridades locais, indústria e mídia. Além disto, é necessário
26

levar em conta as diferentes realidades a fim de adotar estratégias e programas de promoção da


saúde (CARTA DE OTTAWA, 1986).

Na formulação de políticas, é necessário que cada decisão ou ação sejam pensadas em relação ao
seu impacto na área da saúde, ou seja para garantia da promoção da saúde deve-se colocar a saúde
na agenda de prioridades, além de uma ação coordenada que contemple políticas sociais e
assegurem bens e serviços mais seguros e saudáveis. Faz-se necessária a identificação e remoção de
obstáculos para a adoção de políticas públicas com características saudáveis, particularmente nos
setores outros além do setor saúde (BRASIL, 2002).

Outra estratégia proposta na Carta de Ottawa relaciona-se à criação de ambientes favoráveis à


saúde, através da proteção do meio ambiente e da conservação dos recursos naturais. As ações
propostas neste contexto são o monitoramento de mudanças das áreas tecnológicas, do trabalho,
produção de energia e urbanização, fatores que interferem diretamente na saúde das populações.
Encoraja-se o desenvolvimento sustentável, com objetivo de beneficiar o meio ambiente e a
conservação dos recursos naturais, o que necessita ser enfatizado como uma responsabilidade
global, e desenvolvimento de uma consciência do impacto positivo destas ações na saúde. Os
ambientes favoráveis à saúde podem ser espaços comuns como locais de trabalho, vias públicas e
escolas.

Uma outra estratégia recomenda a reorientação dos serviços de saúde para enfoque na saúde ao
invés de enfoque na doença, buscando a integralidade das ações de saúde. Torna-se necessário, para
tal, mudanças na formação dos profissionais e nas atitudes das organizações de serviços de saúde. A
Carta de Ottawa incentiva a implementação de ações e recursos da comunidade a fim de intensificar
a autoajuda e o apoio social que permitam o desenvolvimento da participação social nos temas
relacionados à saúde. Este é o denominado empowerment comunitário.

Por fim, ainda como estratégias para promoção da saúde, são preconizados o desenvolvimento
pessoal e social a partir de informação, a educação para a saúde e a intensificação das habilidades
vitais e estimula-se a criação de ambientes favoráveis para a aprendizagem de indivíduos e
comunidades, incluindo o preparo para que vivenciem cada fase da vida (HEIDEMANN et al.,
2006).
27

A Carta de Ottawa apresenta uma série de compromissos assumidos pelos participantes, conforme
descrito abaixo (CARTA DE OTTAWA, 1986).

Os participantes desta Conferência comprometem-se a:


• atuar no campo das políticas públicas saudáveis e advogar um compromisso político claro em
relação à saúde e à equidade em todos os setores;
• agir contra a produção de produtos prejudiciais à saúde, a degradação dos recursos naturais, as
condições ambientais e de vida não-saudáveis e a má-nutrição; e centrar sua atenção nos novos
temas da saúde pública, tais como a poluição, o trabalho perigoso e as questões da habitação e dos
assentamentos rurais;
• atuar pela diminuição do fosso existente, quanto às condições de saúde, entre diferentes
sociedades e distintos grupos sociais, bem como lutar contra as desigualdades em saúde
produzidas pelas regras e práticas desta mesma sociedade;
• reconhecer as pessoas como o principal recurso para a saúde; apoiá-las e capacita-las para que
se mantenham saudáveis a si próprias, às suas famílias e amigos, através de financiamentos e/ou
outras formas de apoio; e aceitar a comunidade como porta-voz essencial em matéria de saúde,
condições de vida e bem-estar;
• reorientar os serviços de saúde e os recursos disponíveis para a promoção da saúde;
• incentivar a participação e colaboração de outros setores, outras disciplinas e, mais importante,
da própria comunidade;
• reconhecer a saúde e sua manutenção como o maior desafio e o principal investimento social dos
governos; e dedicar-se ao tema da ecologia em geral e das diferentes maneiras de vida;
• a Conferência conclama a todos os interessados juntar esforços no compromisso por uma forte
aliança em torno da saúde pública.

As estratégias propostas na Carta de Ottawa foram reconhecidas em outras conferências


internacionais ocorridas nos anos seguintes como o principal marco de referência da promoção da
saúde em todo o mundo (HEIDMANN et al, 2006).
28

1.4-Outras Conferências

Em abril de 1988, em Adelaide, Austrália, foi realizada a II Conferência Internacional sobre


Promoção da Saúde, que resultou na chamada Declaração de Adelaide. O tema central foi políticas
públicas voltadas para a saúde, com discussão e apoio às linhas de ação apresentadas na Carta de
Ottawa e na Declaração de Alma Ata. A Declaração de Adelaide afirma que as políticas públicas
saudáveis "caracterizam-se pelo interesse e preocupação explícitos de todas as áreas das políticas
públicas em relação à saúde e à equidade e pelos compromissos com o impacto de tais políticas
sobre a saúde da população". Foram identificadas quatro áreas prioritárias para promover ações
imediatas em políticas públicas saudáveis: 1-apoio à saúde da mulher; 2-alimentação e nutrição; 3-
tabaco e álcool; 4-criação de ambientes favoráveis (BRASIL, 2002).

A III Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde ocorreu em Sundsval, Suécia, em 1991 e
a Declaração de Sundsval propõe a ação de diversos segmentos da sociedade para trabalhar com o
objetivo de desenvolvimento de ambientes físicos, sociais, econômicos e políticos mais favoráveis à
saúde, observando o papel fundamental que, outros setores, oriundos das comunidades, dos
governos, das ONGs e organizações internacionais, têm na criação de ambientes favoráveis e de
promoção da saúde. Ressalta que, para promover o ambiente favorável à saúde, é preciso abranger
as seguintes dimensões: a dimensão social, a dimensão política, a dimensão econômica e a
necessidade de reconhecer e utilizar a capacidade e o conhecimento das mulheres em todos os
setores, inclusive o político e o econômico (BRASIL, 2002).

A IV Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde foi realizada em Jacarta, Indonésia, em


1997, com destaque para a participação, pela primeira vez, de representantes do setor privado além
de ser a primeira conferência de Promoção da Saúde ocorrida em um país em desenvolvimento. Seu
título ("Novos protagonistas para uma nova era: orientando a promoção da saúde no século XXI")
remete a uma atualização da discussão sobre o reforço da ação comunitária, um dos campos de ação
definidos na Carta de Ottawa. Buscou-se nessa conferência refletir sobre o aprendizado de
promoção da saúde e analisar novamente os determinantes de saúde. A partir disto, procurou-se
identificar estratégias necessárias para enfrentar os desafios da promoção da saúde no século XXI
(LOPES et al., 2010).
29

Alguns pontos de destaque na Declaração de Jacarta referem-se à reafirmação em relação à


participação popular e o empowerment das pessoas através do acesso a educação e informação e a
apresentação dos fatores transnacionais, incluindo a integração da economia global, os mercados
financeiros e o comércio, o acesso aos meios de comunicação de massa e a tecnologia em
comunicação, além da degradação ambiental devido ao uso irresponsável dos recursos, como
fatores determinantes da saúde (BRASIL, 2002).

A Conferência de Jacarta reconheceu que a combinação das estratégias defendidas na Carta de


Ottawa são mais eficazes que os enfoques centrados em um único campo, a fim de viabilizar a
promoção da saúde. Também deixou claro que os mais diferentes cenários, como, por exemplo,
cidades, comunidades locais, escolas, lugares de trabalho, estabelecimento de atendimento a saúde,
oferecem oportunidades práticas para a execução de estratégias de promoção de saúde. Conclui
ainda sobre a importância da participação no processo de tomada de decisão (LOPES et al., 2010).

A V Conferência Internacional de Promoção da Saúde foi realizada na cidade do México, de 05 a


09 de junho de 2000 e resultou no documento conhecido como Declaração do México. Reafirma a
importância das ações de promoção à saúde nos programas e políticas governamentais, no nível
local, regional, nacional e internacional e confirma o valor das ações intersetoriais para garantir a
implementação das ações de promoção e ampliar as parcerias na área da saúde (HEIDMANN et al,
2006).

A VI Conferência Mundial de Promoção à Saúde aconteceu em Bangkok, Tailândia, em agosto de


2005. A Declaração de Bangkok analisa as mudanças no contexto da saúde global, como o
crescimento das doenças transmissíveis e crônicas, no qual incluem as doenças cardíacas, câncer e
diabetes. Também aponta a necessidade de nomear e controlar os efeitos da globalização na saúde
como, por exemplo, o crescimento das iniquidades, a urbanização ocorrida de forma veloz e sem
planejamento adequado, além da degradação do meio ambiente (WHO, 2005).

Enquanto que o grande marco do evento do México foi o comprometimento dos governos em
adotarem a promoção da saúde como política pública e desenvolverem estratégias para melhorar os
determinantes da saúde e reduzir as iniquidades em seus países, em Bangkok o grande marco foi o
estabelecimento de compromissos para a promoção da saúde, como torná-la de importância central
para a agenda global de desenvolvimento, fazer dela uma responsabilidade de todos os governos,
30

adotar como foco chave as comunidades e sociedade civil e exigência de boa prática corporativa
(LOPES et al., 2010).

Na análise das conferências e eventos relacionados à promoção da Saúde, destacam-se ainda alguns
de nível regional que propuseram discutir problemas específicos dos países latino-americanos, por
exemplo.

Em 1992 foi promulgada a Declaração de Santa-Fé de Bogotá, produto de Conferência


Internacional de Promoção da Saúde realizada na capital da Colômbia em novembro daquele ano.
Neste evento foram discutidas estratégias para recriar a Promoção da Saúde na América Latina e a
transformação da cultura e do setor saúde a fim de garantir acesso universal, além de estimular o
compromisso social para assumir a vontade política de fazer da saúde uma prioridade
(HEIDMANN et al., 2006).

A I Conferência de Promoção da Saúde do Caribe, realizada no ano de 1993, em Trinidad y


Tobago, resultou na Carta do Caribe. Destaca-se neste documento a proposição de seis estratégias
fundamentais: elaboração de políticas públicas saudáveis; reorientação dos serviços de saúde;
empowerment das comunidades para alcançar o bem estar; criação de ambientes favoráveis à saúde;
desenvolvimento e implementação de habilidades pessoais para a saúde; construção de alianças com
ênfase nos meios de comunicação (HEIDMANN et al., 2006).

No ano de 1998, em Genebra, Suíça, a Organização Mundial da Saúde reuniu onze países
(Bangladesh, Brasil, China, Índia, Indonésia, Japão, México, Nigéria, Paquistão, Rússia e Estados
Unidos da América) que teriam uma população igual ou superior a 100 milhões de habitantes no
ano 2000, correspondendo a 60% da população mundial. O evento, conhecido como Rede de
Megapaíses para a Promoção da Saúde, sugeriu melhorar a base de informações da promoção,
desenvolvimento da saúde, aumento da intersetorialidade e parcerias para melhorar a distribuição
dos recursos para a saúde (HEIDMANN, 2006).
31

CAPÍTULO 2
A ORIGEM E DEFINIÇÃO DE CIDADE SAUDÁVEL

O processo que levou à estratégia das Cidades Saudáveis deve ser entendido dentro da evolução
conceitual da promoção da saúde que se desenvolveu na década de 70 e nos moldes propostos pela
Carta de Ottawa. As ações de promoção da saúde são desenvolvidas em diferentes espaços sociais,
definidas por políticas de órgãos governamentais, universidades ou outros, a partir do princípio de
fortalecer o protagonismo do nível local, com dimensão participativa e tendência a priorizar a
intersetorialidade. A necessidade de pensar em intervenções nas cidades é justificada pelo fato de
que nelas os problemas estão inter-relacionados com outros e gera desafios e novas possibilidade de
respostas para sua complexidade e diversidade (DUHL, 1993).

Como argumento para a implementação de projetos no âmbito das cidades podem ser citados a
implicação imediata da crescente urbanização e o impacto na qualidade da saúde da população, que
em contradição com a perspectiva de melhores empregos e acesso aos bens de consumo e serviços,
depara-se com problemas que se configuram como riscos à saúde, relacionados à habitação,
abastecimento de água, poluição, destino de objetos sólidos, além de marginalidade e violência
(MENDES, 2000).

O Movimento Cidades Saudáveis teve sua origem em Toronto, no Canadá, em 1984, a partir da
conferência “Beyond Health Care”, evento que discutiu a necessidade de iniciativas de políticas
públicas saudáveis, inclusive com a abordagem de novos riscos para a saúde presentes no ambiente
urbano, como violência e acidentes, temas que não eram tratados de forma adequada (TAYLOR
2010). A Conferência “Beyond Health Care” foi organizada pela Toronto Board of Health, pela
Canadian Public Health Association e pela Welfare Canada (HEALTH CANADA, 1998).

Ao longo desta conferência, que ocorreu em junho de 1984 e contou com aproximadamente 200
participantes, os delegados trabalharam em pequenos workshops com uma variedade de questões
políticas relacionadas com o tema do evento, o que levou a produção de recomendações específicas,
incluídas no relatório final. A Conferência objetivou conceituar e definir o campo da política de
saúde pública, sensibilizar os participantes para as questões de política de saúde pública, colocar a
saúde na agenda para formulação de políticas públicas e elaborar propostas e recomendações para a
32

ação. Muitas das propostas sugeridas tiveram influência da Associação Canadense de Saúde Pública
e estabeleceu-se nesta associação uma secretaria para explorar ainda mais as noções de política de
saúde pública, para monitorar as políticas públicas atuais e os seus efeitos sobre a saúde, além de
pesquisar e divulgar os resultados sobre os impactos na saúde de ordem pública. Outro detalhe
interessante em relação a esta conferência foi a recomendação para um trabalho conjunto das mais
diversas organizações nacionais, como o Instituto Canadense de Planejadores, Instituto de
Engenharia do Canadá, Instituto Real dos Arquitetos do Canadá e outros, a fim de desenvolver uma
agenda comum para lidar com questões que vão além de cuidados de saúde, e, assim, reconstruir a
coalizão de interesses necessários para criar políticas saudáveis e comunidades saudáveis (CPHA,
1984).

A partir deste evento, houve um envolvimento de pessoal da Organização Mundial da Saúde,


através do seu escritório na Europa, que tornou público em 1986 o documento “Health City
Movement”, com os seguintes objetivos, métodos e estratégias: abordar os determinantes da saúde e
os princípios de saúde para todos e desenvolvimento sustentável, integrar e promover as prioridades
de saúde ao público europeu e mundial, colocar a saúde nas agendas sociais e políticas das cidades e
promover a boa governança e parcerias baseadas no planejamento para a saúde (WHO, 2003).

O Movimento Cidades Saudáveis tornou-se, na década de 90, uma das mais importantes iniciativas
da Organização Mundial da Saúde para o desenvolvimento das condições de saúde e qualidade de
vida urbana e a adesão ao movimento cresceu de 11 cidades em 1986 para 650 cidades em mais de
100 países no ano de 1993. A importância deste debate foi reafirmada em 1991, ano em que a
Assembleia Mundial da Saúde elegeu para discussão o tema Saúde Urbana (KEINERT, 1997).

Uma primeira aproximação conceitual é apresentada na obra do professor Leonard Duhl, da


Universidade de Berkeley, em que procura delinear os elementos essenciais para uma cidade ser
considerada saudável. Neste contexto, o autor estabelece a necessidade de a cidade responder de
forma efetiva sua demanda por desenvolvimento, lidar com as diversas crises do sistema, atender às
exigências que emergem e capacitar sua população para beneficiar-se das vantagens que ela
apresenta através do processo de educação desta população. Assim, o autor deixa transparecer a
importância do papel desempenhado pela comunidade na geração de uma cidade saudável, seja ao
tratar de questões relacionadas à saúde ou a outras importantes áreas interconectadas (DUHL,
1986).
33

Pode-se conceituar uma Cidade Saudável como aquela que de maneira contínua coloca em prática a
melhoria de seu ambiente físico e social, através da utilização de recursos de sua comunidade, com
objetivo de oferecer aos seus cidadãos uma aptidão mútua em todas as atividades humanas que
levem ao seu potencial máximo (HANCOCK E DUHL, 1986).

Uma segunda definição descreve Cidade Saudável como aquela em que as autoridades políticas e
civis, as instituições e organizações públicas e privadas, proprietários, empresários e trabalhadores,
e a sociedade, dedicam esforços permanentes para melhorar as condições de vida, trabalho e cultura
da população, estabelecem uma relação harmoniosa com o meio ambiente físico e natural, e
expandem os recursos comunitários para melhorar a convivência, desenvolver a solidariedade e a
democracia (OPS, 1992).

A partir da ideia de que qualquer estado de saúde que se alcance ele pode ser aumentado, o adjetivo
saudável deixa de fazer referência a um determinado estado. Assim, mais que ações comuns a
praticamente a totalidade de municípios como promoção da integração e participação comunitária,
prestação de serviços públicos conectados com a saúde como coleta de lixo, serviços assistenciais e
outros semelhantes, o que caracteriza uma cidade como saudável passa a ser a decisão política de
direcionar as políticas sociais para a meta de saúde como qualidade de vida, com definição de
atividades e garantia de recursos para execução das ações necessárias. Soma-se a isto a necessidade
de avaliação permanente de todo o processo (ROUX, 1999).

Os documentos da Organização Mundial da Saúde (OMS) justificam a adoção de projetos no


contexto do Movimento Cidades Saudáveis a partir da análise de que, principalmente nos países em
desenvolvimento, a situação social é altamente desfavorável, com ocorrência de grandes
desigualdades geradas pelo modelo de desenvolvimento, o que aumenta a pobreza e proporciona
informalização da economia em grau elevado. Este processo é associado a cenários de instabilidade
política e dificuldades enfrentadas pelas instituições em protagonizar mudanças significativas neste
quadro. Em 1996, a OMS, a partir da constatação de que nos países em desenvolvimento milhões de
pessoas vivem em precárias condições de vida e de saúde, elegeu para o Dia Mundial da Saúde o
tema “Cidades Saudáveis” (MENDES, 2000).

Na América Latina, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), na década de 90,


considerando a estratégia de Promoção da Saúde um caminho importante para os países em
34

desenvolvimento, a coloca dentro de suas grandes linhas de política para a cooperação técnica entre
os países membros. Assim, a estratégia de municípios saudáveis é considerada uma oportunidade de
articulação de diversos setores sociais e econômicos para busca da equidade em saúde, com
objetivo final de transformar as condições de vida das pessoas através de ações intersetoriais e
participação social.

O movimento de Municípios Saudáveis surgiu na América Latina ao lado do desenvolvimento da


Promoção da Saúde ligado à Equidade, que contribuiu com metas e instrumentos operacionais para
o movimento. Outro fenômeno que influenciou o movimento foi o processo de descentralização,
que fortaleceu o desenvolvimento de ações locais nos países. A descentralização, desconcentração
de poder e fortalecimento da democracia são características das correntes de municipalização. Na
maior parte da América Latina, o município corresponde à divisão política, jurídica e administrativa
local, geralmente com governos eleitos democraticamente. Por isto, a OPAS preferiu usar o termo
Município Saudável ao invés de Cidade Saudável, o que inclui uma preocupação que ultrapassa a
abordagem das questões urbanas e considerava os problemas de carência de infraestrutura das áreas
rurais, abrangidas pelo governo municipal. Algumas adaptações foram feitas para adequar-se a
diferentes tipos de divisões jurídica-administrativas como, por exemplo, na Costa Rica, em que se
chama Cantões Saudáveis (OPS, 1995).

Para efeitos práticos, a OPAS, em documento do ano de 1995, considerava que um município
começava a ser saudável quando suas organizações locais e seus cidadãos assumissem o
compromisso e iniciassem o processo de melhorar continuamente as condições de saúde e bem-
estar de todos os seus habitantes. Destaca-se a necessidade do compromisso explícito firmado
através de lideranças do município em fazer da saúde um objetivo prioritário na agenda de trabalho
e, além disso, iniciar o processo e melhorar continuamente. Isto procura garantir que o
compromisso não seja um mero benefício político, pois passa-se a ser necessários ações e resultados
tangíveis (OPS, 1995).

A OPAS aponta o desenvolvimento da estratégia Cidades Saudáveis como geradora de grandes


benefícios em relação ao processo de democratização e descentralização do Estado, o que se
concretiza a partir da ampliação das ações intersetoriais e estímulo à participação ativa da
população que garantiriam um acesso mais equitativo ao serviço público de saúde e outros serviços.
Porém, avalia também as dificuldades enfrentadas na implementação de projetos como déficit de
35

recursos humanos, financiamento insuficiente, logística infraestrutura insuficiente e treinamento


inadequado. Soma-se ainda questão do setor saúde exercer um alto grau de controle, o que impede
ou prejudica o desenvolvimento da intersetorialidade, ponto fundamental no âmbito dos projetos da
estratégia Cidades Saudáveis (PAHO, 1999).

2.1-Os Pressupostos para os Municípios Saudáveis

A partir do conceito de Promoção de Saúde apresentado através da Carta de Ottawa, pode-se


observar que, em uma perspectiva ampliada, as ações relacionadas à melhoria da qualidade de vida
não se restringem somente ao setor saúde, mas envolvem um conjunto de ações que devem ser
organizadas através da intersetorialidade.

Assim, podem ser considerados pré-requisitos básicos para a saúde diversos elementos. Westphal
sintetiza estes elementos como se segue: a paz, que deve ser promovida através de políticas
redistributivas, de apoio à família, de orientação da mídia e da segurança pública para prevenção da
violência; habitação que atenda às necessidades básicas de abrigo, com adequações em relação às
dimensões por habitante, conforto térmico, presença de sanitários e adequado destino aos dejetos;
sistema educacional que atenda às necessidades de informação, com democratização do acesso e
processo ensino-aprendizado eficiente a fim de evitar repetências e evasões; disponibilidade de
alimentos, com políticas de produção e distribuição que garantam nutrientes adequados à
população, para suas necessidades biológicas, crescimento e desenvolvimento de crianças e
adolescentes e reposição de força de trabalho; renda suficiente para atendimento das necessidades
básicas; recursos renováveis, que devem ser garantidos através de política agrária e industrial que
leve em consideração as necessidades da população e o mercado interno; ecossistema planejado e
manejado de forma sustentável, a fim de preservar as condições atmosféricas, o ar e o solo. São pré-
requisitos que requerem políticas diversas, sejam educacionais, agrícolas, de transporte, ambientais,
voltadas para o objetivo amplo de saúde e qualidade de vida, além de que devem ser orientadas por
valores de justiça e equidade (WESTPHAL, 2000).

A Organização Mundial da Saúde, em documento do ano de 1995, descreve algumas características


que uma cidade deve buscar conseguir a fim de ser considerada saudável: 1)um ambiente físico
limpo e seguro; 2)um ecossistema estável e sustentável a longo prazo; 3)alto suporte social e sem
exploração; 4)um alto grau de participação e controle por parte do público sobre as decisões que
36

afetam suas vidas, sua saúde e bem-estar (participação social); 5)satisfação de necessidades básicas
para todos os cidadãos como alimentação, água, habitação, renda, seguridade e trabalho; 6)acesso a
experiências, contatos, recursos, interações e comunicações; 7)economia local diversificada e
inovativa; 8)orgulho e respeito pela herança biológica e cultural; 9)serviços de saúde acessíveis a
todos; 10)alto nível de saúde (OMS, 1995).

O mesmo documento aponta que o conceito de cidade saudável implica em um processo e não
apenas em um resultado. Uma cidade saudável não é necessariamente aquela que adquire uma
condição sanitária específica, mas a que busca melhoria das suas condições e está consciente da
importância da saúde como tema urbano. Assim, o primeiro passo em direção a uma cidade
saudável é o compromisso político, formalizado através da construção de planos de promoção de
saúde inetersetoriais, que envolvam as questões ambientais e com recursos garantidos para sua
aplicação (OMS, 1995).

Os municípios que na década de 80 e 90 aderiram ao Movimento Cidades Saudáveis, ou, como


chamado no Brasil, Municípios Saudáveis, seguiram orientações da Organização Mundial da Saúde.
O passo inicial para a adesão ao Movimento Cidades Saudáveis requer o diagnóstico da situação em
que se encontra, de forma ampla, realizado por pessoal técnico e associado e reorientado pelo
conhecimento empírico da população. A partir deste diagnóstico, os gestores devem propor políticas
públicas integradas e de caráter intersetorial que tenham objetivo de resolver os problemas
apontados, com busca de apoio de outros níveis de governo, o que é fundamental a fim de evitar a
fragilidade das medidas, em relação ao efeito apenas imediato e eleitoreiro. A solução dos
problemas diagnosticados deve ser concretizada a partir de planos de ação, estabelecidos através de
planejamento estratégico que envolva não somente o governo, mas um amplo conjunto de
instituições que representam diversos setores da sociedade. A dificuldade em conseguir estabelecer
um processo de gestão intersetorial de tamanha proporção é minimizada com a ideia de que este
deve ser um processo gradativo (WESTPHAL E MENDES, 2000).

Um aspecto considerado fundamental na aplicação e desenvolvimento de ações dentro do contexto


das Cidades Saudáveis é a questão da participação social que deve ser realizada através de seus
grupos organizados e da sociedade civil como um todo, o que garante uma discussão aberta e
soluções mais efetivas, adequadas à realidade da população. O caminho apontado para a
participação da população é através dos Conselhos Municipais ou suas divisões como conselhos
37

distritais e locais, em que os mais diversos temas são debatidos e as decisões passam por avaliação
dos membros da sociedade (WESTPHAL, 2000).

A construção da participação da comunidade é um processo que tem início através da decisão de


grupos de pessoas em compartilhar suas necessidades, experiências, aspirações, a fim de melhorar
suas condições de vida, e, a partir daí, ocorre uma organização em que problemas são identificados
e metas e estratégias são estabelecidas. Em primeiro lugar, o governo local deve aproximar da
comunidade e identificar como ela se organiza e quais os recursos que ela dispõe. Surge, assim, a
necessidade de ajustar a visão de mundo dos membros da comunidade com aquela do governo local
e seus técnicos, de forma que se construa uma visão compartilhada por todos. Um recurso
fundamental para promover a mobilização comunitária é a utilização de recursos de comunicação
adequados aos padrões culturais desta comunidade. Por fim, faz-se necessário manter a comunidade
informada, através de esclarecimentos e permitir que ela participe das decisões. Na medida em que
a comunidade percebe e estabelece uma relação entre determinado projeto, como Cidades
Saudáveis, e suas condições de vida, incluindo saúde, educação e moradia, cria-se a possibilidade
da responsabilização por um projeto comunitário ou projeto de vida (OPAS, 2002).

Outro elemento na construção das Cidades Saudáveis é um esforço contínuo para o estabelecimento
de parcerias e consensos para a criação de ambientes saudáveis, com fortalecimento de redes e
projetos, dentro do setor saúde e outros setores. Inclui-se ainda a necessidade de liderança e plena
participação do setor saúde, formulação de políticas públicas saudáveis nos níveis local, regional e
nacional e o monitoramento e avaliação contínuos a fim de dar seguimento aos progressos já
atingidos e identificar resultados (OPAS, 2002).

Uma abordagem fundamental no Movimento Cidades Saudáveis consiste na apropriada


identificação de alianças estratégicas que já existam ou criação de novas alianças. Entende-se por
alianças estratégicas as relações e acordos que são estabelecidos entre os interlocutores de
diferentes setores e organizações, a fim de alcançar determinadas metas, sendo as mais comuns
aquelas entre agências governamentais, instituições de saúde, educação, transporte, organizações
não-governamentais, grupos religiosos e organizações públicas e privadas. A inclusão de todos os
atores como parceiros potenciais é necessária, pois estas instituições desempenham um papel
relevante na construção de uma comunidade saudável (OPAS, 2002).
38

As políticas públicas saudáveis referem-se àquelas que têm uma grande influência nas condições de
vida da população, com preocupação explícita com a saúde e a equidade, buscam criar um ambiente
de apoio a fim de permitir às pessoas a terem uma vida saudável através da transformação de
ambientes sociais e físicos. Apesar de seu caráter intersetorial, as políticas públicas saudáveis
devem ser lideradas e impulsionadas pelo setor saúde. A garantia das políticas públicas saudáveis
deve ser estabelecida através de legislação específica, que assegure a proteção dos direitos
humanos, proteção à comunidade e indivíduos dos fatores de risco e promoção de condições de
acesso à escolha de hábitos saudáveis. A legislação no nível local permite a tomada de decisões
adaptadas às necessidades e realidade de cada local (OPAS, 2002).

Westphal aborda ainda como elemento da estratégia do movimento Cidades Saudáveis a


reorientação dos serviços de saúde como ponto importante para possibilitar a nova visão de saúde
ampliada com a inclusão do conceito de promoção da saúde, fator que deve ser um critério para a
tomada de decisão. A reorientação dos serviços também refere-se à necessidade de se ter como
referência para as ações de saúde coletiva um determinado território geográfico, em que as
populações de características semelhantes se estabelecem e onde são identificados problemas e
riscos específicos (WESTPHAL, 2000).

Em documento de orientação confeccionado para os gestores do nível local, a Organização Pan-


Americana da Saúde (OPAS), no ano de 2002, estabelece três distintas fases para a estratégia do
Movimento Cidades Saudáveis. Em uma fase inicial, com previsão de um a três meses, espera-se
como resultado um plano estratégico aprovado. Para atingir tal objetivo, o município deve realizar
um diagnóstico participativo com a comunidade, criar comissão intersetorial com desenvolvimento
de uma visão comum em relação ao Município Saudável, desenvolver proposta de plano de ação,
submeter este plano de ação à aprovação do poder legislativo, assegurar a alocação de recursos para
execução do plano e discutir e disseminar a proposta aprovada por meio de fórum público.

Em seguida, em uma segunda fase ou fase de planejamento espera-se como resultado um grupo de
trabalho estabelecido e um plano de ação com detalhes. Com previsão estimada de 4 a 6 meses, o
município deve designar membros do comitê intersetorial municipal para participar de grupo de
trabalho para atividades de implementação e monitoramento, além de desenvolver um plano de
trabalho com detalhes de atividades, responsabilidades, recursos, indicadores para monitoramento e
39

avaliação. Também nesta fase deve-se identificar estratégias com finalidade de promover a
participação da comunidade, formação de parcerias e mobilização de recursos.

A fase de ação, acima dos 2 anos, caracteriza-se pela criação de políticas públicas locais e
institucionais, ações intersetoriais, desenvolvimento de uma estrutura política adequada para
implementação da estratégia, criação dos chamados espaços saudáveis e fortalecimento da
sustentabilidade e intersetorialidade da estratégia. Como resultado, espera-se um município ou
comunidade saudável. A participação comunitária, comunicação, capacitação e monitoramento e
avaliação são elementos comuns a todas as fases (OPAS, 2002).
40

CAPÍTULO 3
O CONTEXTO BRASILEIRO E O MOVIMENTO CIDADES SAUDÁVEIS

Na década de 80, devido à crise econômica, ganha mais espaço um processo de reforma da saúde,
que encontra bases em um grupo de indivíduos e instituições que promoveram a chamada Reforma
Sanitária (PAIM, 1989).

A concepção política e ideológica da Reforma Sanitária tinha como base a defesa da saúde como
uma questão social e política a ser abordada no espaço público, em contraposição a uma visão
exclusivamente biológica que deveria ser resolvida por serviços médicos (BIRMAN, 1991).

A VIII Conferência Nacional de Saúde, que aconteceu no mês de março de 1986, é marcada pela
alta representatividade de setores plurais da sociedade e o projeto democrático da Reforma Sanitária
ganha força e é sistematizado, o que constitui a base para a criação do Sistema Único de Saúde
(FLEURY, 1997).

Foi durante a VIII Conferência Nacional de Saúde que ganhou consistência e foi aprovado o
conceito de saúde como um direito do cidadão e desenvolvida estratégias de coordenação,
integração e transferência de recursos entre instituições de diferentes níveis de governo. Importante
ressaltar que a pressão dos participantes da Reforma Sanitária, que saíram vitoriosos da VIII
Conferência, continuou posteriormente durante a Assembleia Constituinte, entre 1987 e 1988, a fim
de garantir a inclusão das conquistas da conferência na nova constituição. Neste período, havia uma
oposição formada por representantes do setor privado que ameaçavam os avanços (TEIXEIRA,
1987).

No ano de 1988, o Congresso Nacional aprovou a mais nova Constituição da República Federativa
do Brasil. Chamada de Constituição Cidadã, este conjunto de leis supremas que emergia na nova
fase política do país, em pleno meados do primeiro governo democrático, após seguidos anos de
ditadura militar, apresentava uma característica peculiar. Considerada por muitos juristas um
avanço sem precedentes, a Constituição de 1988 estabelece a garantia de alguns direitos sociais,
entre eles a Saúde. Saúde passa a ser um direito de todos e um dever do Estado, que deve garantir os
meios para que todo cidadão tenha acesso a ela, através de políticas econômicas e sociais.
41

Também estabelece que o Estado deve garantir acesso universal e igualitário aos serviços e ações
que visam proteger, promover e recuperar a saúde. O texto constitucional, assim, incorpora as
principais diretrizes estabelecidas na VIII Conferência de Saúde, mas o detalhamento e a
regulamentação destas diretrizes são deixados para legislação complementar através de leis que
deveriam ser aprovadas pelo Congresso Nacional. Nos anos seguintes, foi necessária a formulação
destas leis, a fim de organizar o sistema, denominado Sistema Único de Saúde- SUS. Assim, em
1990, no governo do presidente Fernando Collor de Mello, foram publicadas duas leis importantes
para o setor saúde: a lei 8080 e a lei 8142 (BRASIL, 2006).

Observa-se na constituição que as ações e serviços de saúde integram uma rede regionalizada e
hierarquizada, além de descentralizada, com papéis bem definidos e comando único em cada esfera
de governo, ou seja, municipal, estadual e federal. Porém, fica claro também a permissão para a
execução de serviços de saúde por terceiros e a liberdade de assistência à iniciativa privada
(MENDES, 1998).

Em 1992, é realizada a IX Conferência Nacional de Saúde com o tema “A Municipalização é o


Caminho”. Esta Conferência aprofundou as discussões das diretrizes defendidas na anterior e foi
fundamental para articular estratégias de ação para envolvimento de novos atores, a fim de enfrentar
problemas como o financiamento e a gerência do SUS. Em seu relatório final, é condenada a
reforma fiscal adotada pelo governo Collor e enfatiza a democratização e fortalecimento dos
Conselhos de Saúde.

A lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, é o principal documento que norteia o funcionamento da


saúde no país. Estabelece quais são os fatores determinantes e condicionantes como alimentação,
moradia, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, transporte, lazer e acesso
aos bens e serviços essenciais. Esclarece com detalhes os objetivos do SUS e seu campo de atuação,
cuja amplitude envolve ações de vigilância epidemiológica, vigilância sanitária, vigilância
nutricional, assistência farmacêutica, desenvolvimento científico e tecnológico, ordenação e
formação de recursos humanos na área da saúde dentre outros. Ainda são destacadas nesta lei as
definições de saúde do trabalhador, considerado o conjunto de atividades que se destina promover,
proteger, recuperar e reabilitar aqueles indivíduos submetidos aos agravos ou riscos relacionados às
suas condições de trabalho.
42

Os chamados princípios do SUS constituem outro elemento básico definido na lei 8080. A
universalidade significa acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência. Com o
princípio da universalidade, deixa de haver, em relação à saúde, o chamado indigente, que não
estaria coberto por ações de saúde e dependia de trabalhos de caridade, geralmente ligados a
instituições religiosas. A integralidade refere-se ao conjunto de ações e serviços preventivos,
curativos, individuais e coletivos, de acordo com cada caso em níveis de complexidade diferentes.
Esta visão permite analisar o indivíduo como um todo ao invés de dividi-lo em partes. A
participação da comunidade, a descentralização político-administrativa e a regionalização da rede
de serviços de saúde são também princípios e diretrizes, além de outros. Por fim, esta lei dá ênfase a
alguns aspectos relacionados ao financiamento do SUS. Em seu artigo 31, está descrito que o
orçamento da seguridade social destinará recursos aos SUS necessários para realização de suas
finalidades, porém outras fontes de financiamento estão previstas como serviços prestados, doações,
taxas, multas, rendas comerciais e industriais, alienação patrimonial, rendimento de capital e outros
(BRASIL, 1990a).

A lei 8.142, de 28 de dezembro de 1990, detalha melhor a questão da participação da comunidade


na gestão do SUS e das transferências de recursos intergovernamentais. São definidas as instâncias
colegiadas, que são as Conferências de Saúde e os Conselhos de Saúde, em cada nível de governo,
ou seja, federal, estadual e municipal. As Conferências, tanto nacional, estadual ou municipal,
acontecem a cada 4 anos e tem a função de avaliar a situação de saúde e propor diretrizes para a
formulação da política de saúde em cada esfera de governo. Os Conselhos de Saúde são órgãos
permanentes e deliberativos, sendo compostos por representantes do governo, prestadores de
serviço, profissionais da saúde e usuários. Seu campo de análise inclui avaliação de aspectos
econômicos e financeiros e suas decisões devem ser homologadas pelo chefe do poder executivo,
seja municipal, estadual ou nacional. A participação dos usuários é paritária em relação aos demais
segmentos.

Outro tema de destaque na lei 8.142 é a alocação dos recursos do chamado Fundo Nacional de
Saúde. Fica determinado o uso da verba da saúde para ações de despesa de custeio e de capital do
Ministério da Saúde junto com seus órgãos e entidades, investimentos previstos em lei, cobertura de
ações e serviços de saúde para assistência ambulatorial, hospitalar e outras. A lei estabelece que
para o município receber os recursos precisa regularizar seu Fundo de Saúde, Conselho de Saúde,
43

Plano de Saúde, relatórios de gestão, contrapartida de recursos no seu orçamento e comissões para
elaborar Plano de Carreira, Cargos e Salários (BRASIL, 1990b).

O Movimento Cidades Saudáveis começa a se difundir no Brasil no final da década de 80 e início


da década de 90, com envolvimento de escolas de Saúde Pública a partir de meados da década de
90. Um marco na discussão do tema aconteceu em um encontro de secretários municipais de saúde
em Fortaleza, em 1995, em que produziu-se um documento, a Carta de Fortaleza, em que os
governos locais foram designados como responsáveis pela criação das condições que garantam a
qualidade de vida da população a partir do enfoque na produção social da saúde e construção da
cidadania (WESTPHAL E MENDES, 2000).

A Carta de Fortaleza remete à experiência do Canadá com o Movimento Cidades Saudáveis, em que
se demonstra a possibilidade de mudar o enfoque na doença e melhorar a qualidade de vida com um
processo centrado nos cidadãos e seus ecossistemas. Cita ainda o exemplo brasileiro da construção
de um novo paradigma em saúde no nível municipal a partir de um processo integrado, participativo
e criativo, em alusão ao Sistema Único de Saúde. O documento propõe que o Conselho Nacional de
Secretários Municipais de Saúde (CONASEMS) se converta em Secretaria Executiva para
coordenar e garantir as decisões daquele fórum (CARTA DE FORTALEZA, 1995).

Em 1998, na cidade de Sobral, Ceará, ocorre o I Fórum Brasileiro de Municípios Saudáveis,


organizado pela prefeitura municipal e promovido pelo CONASEMS e Conselho de Secretários
Municipais de Saúde do Ceará, com objetivo de fortalecer o trabalho intersetorial, em que todas as
políticas públicas tivessem como foco central a construção do município saudável. Dentre os
painéis apresentados destaca-se a Pertinência da Construção de Municípios Saudáveis, Estratégias
de Desenvolvimento de Municípios Saudáveis, além de relatos de experiências brasileiras
(SOBRAL, 1998).

Durante o I Fórum Brasileiro de Municípios Saudáveis, uma das questões debatidas foi em relação à
denominação Cidade Saudável ou Município Saudável. A denominação Cidade Saudável foi
defendida porque a palavra cidade está relacionada a polis, local onde as pessoas assumem sua
condição de cidadão e pode representar a urbanização elevada que o país apresenta e os novos
problemas de saúde consequentes do atual estágio de desenvolvimento dos aglomerados humanos.
O termo Município Saudável foi defendido porque reflete a organização de grande parte dos
44

aglomerados do Brasil, que contém núcleos habitacionais estruturados economicamente na


produção rural, localizados em torno de um núcleo principal que apresenta características urbanas
mais evidentes. A utilização das duas nomenclaturas apresenta relação com o período histórico de
aproximação das cidades com o movimento. Assim, as cidades que desenvolveram a estratégia a
partir do exemplo do governo canadense adotam o termo Cidades Saudáveis e aquelas que foram
incentivadas pela Organização Pan-Americana da Saúde utilizam a expressão Município Saudável
Para efeitos práticos, as expressões são sinônimas (AKERMAN et al., 2000).

O desenvolvimento do Movimento Cidades Saudáveis no Brasil a partir das definições do I Fórum


Brasileiro de Municípios Saudáveis encontra respaldo no texto constitucional e nas Leis 8.080 e
8.142, que abordam a saúde com uma perspectiva positiva, relacionando a qualidade de vida e
partindo do principio da necessidade de articular e criar interlocução com os mais diversificados
setores, a fim de alcançar uma integralidade da ação social.

O apoio institucional, seja da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) ou seja do setor


acadêmico enfatiza e realça a importância do município agir de forma descentralizada, com ações
que vão além da simples prestação de serviços e com atenção para que o processo como um todo
esteja sob o controle social, através dos conselhos de saúde em que o cidadão tenha
representatividade. A descentralização é a transferência de atribuições de órgãos centrais para
aqueles locais (CRETELLA JR., 1993).

A Descentralização da Saúde no Brasil se completa com a liberdade dos municípios de agirem na


organização de seus sistemas locais. O que se observa, porém é que, apesar das inúmeras vantagens
que este tipo de organização traz e suas múltiplas potencialidades de desenvolver a saúde de acordo
com a realidade local ou regional, há uma ampla dependência de vontade política dos governantes.
Diante da autonomia que existe dentro do sistema federativo, com inexistência de subordinação, o
município não pode ser obrigado a seguir determinado padrão. A atuação do cidadão através da
participação popular e até mesmo do Ministério Público podem minimizar tal problema e, desta
forma, garantir que as responsabilidades constitucionais de assegurar as ações de saúde no âmbito
do município ocorram de maneira satisfatória (GOMES, 2011).

Um ponto interessante em relação à questão da liberdade dos municípios na execução das suas
políticas de saúde baseadas no princípio da Descentralização é a geração de desigualdades ou
45

iniquidades em grande escala. Nota-se dificuldade em estabelecer planos e metas que sejam
cumpridas pelos municípios, mesmo com os incentivos financeiros que são oferecidos. Assim, há
regiões que carecem de estruturas básicas para a assistência e promoção da saúde da sua população
devido a simples decisão política de deixar de investir, às vezes em programas ou ações já
formuladas em nível central, nas Secretarias de Estado de Saúde ou Ministério da Saúde
(WAGNER, 2006).
46

CAPÍTULO 4
EXPERIÊNCIAS EM MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Na primeira metade da década de 1990, dez cidades braileiras incluíram em sua agenda os
princípios do Movimento Cidades Saudáveis: Diadema, Campinas Jundiaí e Santos (São Paulo),
Iaraquara (Bahia), Céu Azul, Chopinzinho, Curitiba e Palmeira (Paraná) e Maceió (Alagoas). Na
segunda metade da década de 1990, a partir de colaboração técnica e financeira de instituições
como universidades, Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde e da Fundação
Kellogg, foram desenvolvidos projetos em outras cidades: Vargem Grande Paulista (São Paulo),
Sobral, Crateús e Fortaleza (Ceará), Anadia, Arapiraca e Flexeiras (Alagoas), Dionísio e São José
do Goibal (Minas Gerais). Nesta década foram realizados diversos eventos com o objetivo de
compartilhar experiências e sensibilizar os municípios quanto a importância de projetos de Cidades
Saudáveis. Devido mudanças adiminstrativas, ainda na década de 1990, algumas cidades
interromperam o processo: Saõ Paulo, Santos, Campinas, Palmeira e Iraquara. As ciaddes de
Diadema e Céu azul são consideradas localidades que se aproxiamram do ideário das Cidades
Saudáveis mas não chegaram a implantar ações efetivas (MENDES, 2000).

4.1-Campinas

A cidade de Campinas, Estado de São Paulo teve uma evolução em sua população de 840.000
habitantes no início da década de 90 para acima de 1.080.000 habitantes no ano de 2010,
distribuídos em uma área aproximada de 794 Km². Está a aproximadamente 100 km da capital São
Paulo e sua economia está baseada principalmente no comércio, seguido pela indústria (IBGE,
2013a).

As atividades relacionadas com o Movimento Município Saudável em Campinas tiveram início na


primeira metade dos anos 1990, a partir de decisão política do governo municipal em promover um
amplo movimento de mudança na forma de administrar o município, com diretrizes de resgate de
cidadania, melhoria da qualidade de vida, gestão descentralizada, trabalho intersetorial, participação
47

da sociedade, incluindo organizações não-governamentais, entidades de bairro e institutos de


pesquisa, e parcerias com governo estadual, federal e com a Organização Pan-Americana da Saúde.

A iniciativa partiu da gestão do então prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, cujo mandato foi
de 1993 a 1996. Algumas ações foram tomadas a fim de permitir o processo de mudança
administrativa. Primeiramente adotou-se um novo modelo de gestão em que se destacavam a gestão
colegiada e a criação de conselhos setoriais, e ainda secretarias de ação regional com objetivo de
aproximar a administração com os munícipes e promover a integração intersetorial na prática local.
A descentralização da administração dividiu a cidade em quatro regiões (Norte, Sul, Leste, Oeste) e
criou secretarias de ação regional além de diretorias administrativa, financeira, infra estrutura e
desenvolvimento social e ainda representações regionais das secretarias de saúde, promoção, obra,
educação e transporte, para atendimento a uma população aproximada de 250.000 habitantes em
cada uma dessas regiões. Os objetivos foram integração das áreas, maior participação popular,
maior aproximação do governo ao cidadão e capacidade de definição de prioridades no nível local
regional. Houve viagem do prefeito a Washington, o que incluiu debate do projeto junto a
Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e buscas de parcerias (FSP/USP, 1997).

Houve também um investimento em recursos humanos através de cursos, seminários, programas de


alfabetização e eventos de sensibilização. Paralelamente, desenvolveu-se projetos com enfoque
multisetorial, como renda mínima e atenção integral à criança e adolescente. A Organização Pan-
Americana da Saúde (OPAS), em 1994, assinou um protocolo de intenções para a cooperação na
promoção de saúde do município e definição de linhas de ação no âmbito do projeto Campinas-
Cidade Saudável. O Conselho Comunidade Solidária de Campinas, também criado em 1994,
representou o trabalho integrado e as parcerias com entidades de pesquisa, universidades, sociedade
civil, com objetivo de combate à miséria (PARANÁ, 1996).

O convênio com a OPAS estabelecia nove linhas de ação, com atividades específicas dentro de cada
linha e envolvia um custo de 110 mil reais para fins de assessoria de imprensa, assessoria técnica,
congresso e outros itens (FSP/USP, 1997).

A partir da assinatura do acordo de cooperação com a OPAS, escolheu-se o Complexo de São


Marcos para iniciar o projeto Município Saudável, uma das regiões mais carentes da cidade na
época. O primeiro passo foi a construção de um diagnóstico a fim de reconhecer o território,
48

realizado através de estimativa rápida a partir de entrevistas com informantes chaves. Seguiu-se
uma feira de projetos, que possibilitou verificar e integrar as experiências e recursos já disponíveis
na comunidade. A partir daí foi viabilizado um encontro intersetorial com participação ampliada em
que foram definidos como prioritários dois problemas: a criança e o adolescente em situação de rua,
a falta de estrutura e saneamento nas favelas. Estes problemas guiaram a elaboração de um plano de
ação intersetorial, com mapa de soluções que apontava causas, soluções e projetos a serem
desenvolvidos (PARANÁ, 1996).

Em 1995, é lançado, com objetivo de criar bases sólidas e sustentáveis para os esforços coletivos
em relação ao projeto Campinas-Cidade Saudável, o Observatório da Qualidade de Vida da Cidade
de Campinas, com uma primeira fase que consistia na construção de um indicador de qualidade de
vida da cidade. Como objetivos do indicador pode-se citar a introdução da concepção intersetorial
da qualidade de vida, introdução e discussão sobre definição de parâmetros mínimos de qualidade
de vida, problematização de conceitos relacionados ao tema da qualidade de vida (AKERMAN et
al., 1997).

Em 1998, a Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas) criou grupos de


trabalho vinculados ao denominado Programa PUC-Campinas Cidades Saudáveis, com objetivo de
sistematizar os estudos realizados no Brasil em relação ao Movimento Cidades Saudáveis. Uma das
constatações dos grupos é que as experiências são pontuais e a maioria sem continuidade e
sustentabilidade, o que pode estar relacionado a processos políticos, ao pacto federativo, formas de
governo, processos de formulação e implementação de políticas públicas, modelo de definição de
prioridades e relacionamento entre a sociedade política, as comunidades e os setores produtivos.
Apontam ainda, dentre outros problemas, a ausência de discussões sistematizadas sobre os objetivos
do desenvolvimento socioeconômico, ausência de metas articuladas que permitam coerência entre
as Políticas Públicas formuladas e aquelas implementadas, deficiência de dados e estudos sobre o
desenvolvimento da qualidade de vida das pessoas, ausência de abordagem integrada de Políticas
Sociais nos diversos níveis de governo, pouca ênfase em ações intersetoriais, falta de divulgação de
novas experiências sobre formas alternativas de governo referente a concepções modernas em
relação a cidadania, democracia e participação, ausência de acompanhamento dos impactos das
Políticas Públicas e ausência de projetos com foco na comunicação eficaz tanto com a comunidade
quanto com indivíduos sobre o tema qualidade de vida (PUC-Campinas, 1999).
49

Após um período de estagnação do projeto, que se observou no mandato seguinte, pode-se verificar
o recrudescimento de ações a partir de parcerias que incialmente partiram de um convênio entre o
Instituto de Pesquisas Especiais para a Sociedade (IPES) e a Universidade de Campinas
(UNICAMP). Em outubro de 2000 é realizado o I Encontro Comunidade Saudável e no ano
seguinte, no Fórum Social Mundial ocorrido em Porto Alegre, em janeiro de 2001, as experiências
desenvolvidas pela Universidade são apresentadas. Nos eventos seguintes do Fórum Social Mundial
na cidade de Porto Alegre, destacam-se exposição de fotografia da região dos Amarais de autoria da
Agente Social Comunitária Lúcia Rodrigues, em 2002, e uma oficina sobre Comunidade Saudável
em 2003. A Universidade de Campinas buscou ampliar convênios e parecerias e constituir com
atores variados os chamados Núcleos de Trabalho e Pesquisa (NTPs), organizados como equipes de
pesquisa que deveriam realizar a pesquisa-ação, em que observa-se um fenômeno, formulam-se e
testam-se hipóteses a fim de identificar e remover obstáculos que limitem a melhoria na qualidade
de vida da comunidade (MARTINS E RANGEL, 2004).

Ainda no âmbito das ações da UNICAMP, foi criado o Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa e
Ação (LIPA) com objetivo de dar suporte didático para projetos desenvolvidos no escopo do
Programa Comunidade Saudável. Realizou-se ainda a atividade denominada “Jogos do Saber:
Dengue”, com participação de docentes e outros profissionais, inclusive de agentes comunitários.
Estas experiências de ações no contexto da Universidade exemplificam a predisposição para o
trabalho cooperativo em que predomina a colaboração solidária e torna indispensável uma estrutura
burocrática rígida. Com apoio do poder público, viabilizou-se, dentre outras atividades: 1- Curso de
Extensão para educação continuada dos Agentes Comunitários de Saúde; 2-Curso de Especialização
para capacitadores de Agentes Comunitários de Saúde; 3-Implantação de redes de computadores em
centros de saúde; 4-Implantação de um servidor a fim de permitir a criação de cursos à distância e
banco de dados. A UNICAMP manteve nos anos seguintes novos encontros, com destaque para o
III Encontro Comunidades Saudáveis, realizado em 2003, em que além de discutir os rumos dos
projetos desenvolvidos na Comunidade São Marcos, teve apresentações de outras experiências que
aconteciam no município e sinalizou um fortalecimento da aproximação com a comunidade ao
deliberar que o IV Encontro seria realizado fora do espaço da Universidade e no interior da própria
comunidade (MARTINS E RANGEL, 2004).

Em 2003, Campinas junta-se a outros municípios próximos e constitui a chamada Rede de


Municípios Potencialmente Saudáveis, espaço em que seus membros buscam relacionar entre si,
50

identificar objetivos e metodologias de trabalho. A justificativa para o nome Potencialmente


Saudável é o fato de estar criando um processo em que há um movimento constante de trocas de
sucessos e dificuldades, com objetivo de ser saudável, porém sem considerar um estágio final
(SPERANDIO et al., 2004).

4.2-A Experiência no Estado de Minas Gerais: Dionísio e São José do Goiabal

Através de ações protagonizadas pela Escola de Saúde Minas Gerais/Fundação Ezequiel Dias
(ESMIG/FUNED) foi desenvolvida a partir do ano de 1996 uma iniciativa caracterizada como um
projeto piloto nas cidades de Dionísio e São José do Goiabal, com objetivo de operacionalizar os
fundamentos da Promoção da Saúde conforme diretrizes da Carta de Ottawa (CONASEMS, 1998).

A motivação para o desenvolvimento do projeto piloto nas duas cidades mineiras veio da
experiência vivenciada no município de Campinas, a partir do ano de 1994, que teve participação de
técnicos da ESMIG/FUNED. A escolha do município obedeceu a critérios políticos definidos pela
direção da Fundação Ezequiel Dias (FUNED). Uma das características dos municípios de Dionísio,
na época com 9800 habitantes e São José do Goiabal, que somava 7200 habitantes, ambos situados
próximos Parque Florestal do Rio Doce, região do Vale do Aço, era o decréscimo progressivo do
número de habitantes nas últimas décadas e a diminuição da atividade agropecuária a partir do
aumento de áreas de plantação de eucalipto que ocupam quase dois terços destes municípios.
Observou-se ainda aumento no desemprego com a diminuição do ritmo da atividade siderúrgica que
havia absorvido grande parte da mão de obra local (ADRIANO et al, 2000).

O trabalho teve como eixo a construção de um chamado Plano de Ação Intersetorial e Participativo
(PAIP), a partir de um Grupo Técnico Intersetorial e outro grupo ampliado com participação de
vários setores da sociedade, denominado Comitê Diretivo ou Grupo Decisório Intersetorial. O
Comitê Diretivo constituía a instância máxima de decisão e, juntamente com o comitê técnico, com
responsabilidade de conduzir os trabalhos e discutir a metodologia de planejamento, era apoiado por
um Grupo Assessor formado por técnicos da ESMIG/FUNED.
51

A construção do PAIP envolvia períodos de concentração com oficinas e seminários e períodos de


dispersão em que tarefas eram executadas ou propostas encaminhadas. O início do processo
requereu a estratégia do método de estimativa rápida com um diagnóstico da situação inicial e
apontamento dos principais problemas que deveriam ser enfrentados. Dentre os problemas
elencados cita-se: destino inadequado do lixo e esgoto, qualidade da água para consumo,
desorganização do sistema municipal de saúde, desemprego, vias de acesso precárias. Seguiu-se
seminários com participação popular a fim de explicar os problemas e subsidiar a construção de
projetos pelo grupo técnico. Estabeleceu-se que os projetos desenvolvidos pelo grupo técnico
deveriam preferencialmente utilizar tecnologias simples e de baixo custo e a partir desta ideia
iniciou-se a construção de estações de tratamento de água, de banheiros e fossas sépticas em
residências da zona rural, ações de preservação de mananciais de água, além de atividades de
educação ambiental e sanitária para a população (CONASEMS, 1998).

A fim de resolver alguns pontos críticos relacionados a financiamento, os projetos foram enviados
para a Secretaria de Políticas Urbanas do Ministério do Planejamento, que com recursos do
Programa de Ação Social em Saneamento (PASS), foi favorável a aprovação desde que houvesse
contrapartida de 40%, valor que os municípios consideraram altos. Os objetivos de mobilização
social e engajamento não ocorreram conforme esperado, o que pode ser explicado pela insuficiência
da estratégia, que procurou uma mobilização ampla, mas o formalismo adotado pode ter afastado as
pessoas do processo ou na própria relação histórica entre estado e sociedade, em que predomina o
clientelismo político e consequente postura passiva da população.

O fato de que a inciativa do projeto partiu da direção da FUNED, sem uma demanda prévia das
localidades pode ter gerado expectativas diferentes nas lideranças políticas dos municípios e criado
um interesse específico em receber verbas associadas aos projetos, o que, consequentemente, gerou
conflitos com o Grupo Técnico Intersetorial e acabou por comprometer a continuidade do projeto.
A FUNED deixou de fazer o acompanhamento sistemático das ações no final de 1998 (ADRIANO
et al., 2000).
52

4.3-Crateús

O município de Crateús localiza-se na mesorregião dos Sertões Cearenses a aproximadamente 350


quilômetros da capital Fortaleza. Com uma área de 2985 Km² atualmente tem uma população de
72853 habitantes de acordo com censo de 2010 (IBGE, 2013b).

A experiência com a estratégia do Movimento Cidades Saudáveis em Crateús ocorreu a partir da


aproximação da Prefeitura Municipal com a Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE).
Inicialmente, em reunião de representantes da ESP-CE e pessoal do gabinete do prefeito, no ano de
1998, firmou-se um compromisso político de trabalho, com discussão das estratégias a serem
adotadas. A prioridade para as políticas públicas passou a ser o desenvolvimento de processos
intersetoriais e a participação popular, com uma visão da necessidade de mobilização da
comunidade através de lideranças tradicionais e de diversos outros segmentos tais como alunos,
professores e atores sociais específicos (CORDEIRO et al., 2001).

Documento da Prefeitura Municipal de Crateús aponta um panorama do município anterior ao


início do projeto. O gestor em 1999 (prefeito Paulo Nazareno Soares) apresentou números que
mostraram uma série de problemas enfrentados pelo poder público, como falta de credibilidade da
prefeitura junto à população, ao comércio local e servidores, relacionada a atraso de pagamentos,
dívidas com fornecedores e baixa arrecadação própria. Mais de 70% das famílias ganhavam até um
salário mínimo, a mortalidade infantil em 1996 era de 48 por 1000 nascidos vivos, a evasão escolar
somava 20,89% naquele ano e 18,29% das crianças e adolescentes estavam fora da escola. O
documento da prefeitura ainda aponta problemas como falta de segurança e prostituição infantil
(CRATEÚS, 1999).

O ponto de partida para o desenvolvimento das atividades no município de Crateús ocorreu em


março de 1998, quando aconteceu o “I Seminário Crateús Saudável”. Segundo documento
produzido pela escola de Saúde Publica do Ceará (ESP), participaram deste encontro
aproximadamente 350 pessoas, a partir de convocação realizada através de diversos meios de
comunicação como rádio e visitas prévias às comunidades por equipe da prefeitura. As visitas
realizadas pela equipe da prefeitura foram fundamentais para a participação popular, pois a partir de
reuniões acontecidas nos 60 dias anteriores ao evento, em distritos e bairros, pode-se apresentar o
53

projeto e ser realizada a escolha de representantes para participar do Seminário. Além da escolha
dos representantes, esta tarefa prévia permitiu o mapeamento do município que foi dividido em 21
comunidades rurais e urbanas.

O “I Seminário Crateús Saudável” procurou estruturar-se dentro dos parâmetros de planejamento


estratégico em saúde. O planejamento estratégico em saúde pode ser compreendido como um
processo em que não necessariamente haja um conjunto ordenado de procedimentos e técnicas de
intervenção em situações de conflito e valoriza o diagnóstico, que determina um quadro de análise
para a reflexão sobre os problemas de saúde (GIOVANELLA, 1990).

Destaca-se ainda em relação ao primeiro seminário a participação de representantes da Fundação


Kellogg, que trouxeram o Modelo Lógico utilizado pela fundação. Tal modelo partia da
identificação do problema e o detalhamento de um programa de intervenção com objetivos e metas,
em que o trabalho previsto requer insumos, recursos humanos, atividades e os efeitos esperados
constituem os resultados e os impactos (WK KELLOGG FOUNDATION, 2001).

A participação da Fundação W. K. Kellogg estava ligada a uma iniciativa de tal instituição


denominada “Novas Práticas e Novo Ensino em Saúde Pública”, iniciada em 1997 com objetivo de
promover a reflexão e a concepção de novas práticas de saúde pública e de renovar o seu ensino.
Para viabilizar esta iniciativa, a estratégia de Municípios Saudáveis foi elegida como linha de ação
que permitiria o desenvolvimento e experimentação das novas práticas. Importante salientar que a
Fundação Kellogg procurou parcerias com cinco instituições de ensino no estado do Ceará, uma
delas a ESP, que escolheu o município de Crateús como um dos que receberiam o projeto, tendo
sido considerado para isto o seu histórico de organização social e compromisso político, segundo
avaliação técnica da ESP (BRAGA et al., 1999).

Os principais problemas relacionados ao desenvolvimento da estratégia proposta no I Seminário


estão relacionados ao fato de que foi considerado apenas como um projeto dirigido à classe pobre e
deixaram de participar importantes setores da sociedade, como os empresários. Também deixaram
de participar representantes de Universidade, Promotoria Pública e o próprio Conselho Municipal
de Saúde. Outra linha de problemas são as dificuldades ligadas à compreensão da população sobre a
dimensão pedagógica do projeto. A espera de obras rápidas e suprimento de carências de forma
54

imediata levavam as pessoas à frustração e resistência em organizar-se para a solução dos


problemas das comunidades.

Quadro 1.1: Ações de Implementação do Projeto Crateús Saudável-Estrutura Organizacional


Ator Responsabilidades
Fundação Kellog 1-Análise do Projeto Município Saudável, aprovação e liberação de
recursos para execução e acompanhamento do mesmo.
Prefeitura Municipal de 1-Coordenação local do projeto.
Cratéus 2-Planejamento, elaboração e desenvolvimento do projeto.
3-Promoção do trabalho intersetorial das secretarias municipais, com
prioridades às demandas oriundas dos comitês comunitários.
4-Modificação do currículo das escolas municipais.
5-Liberação de recursos financeiros para agilizar os trabalhos executados
pelos comitês.
6-Fortalecimento de trabalhos realizados por instituições como
sindicatos, cooperativas e outras.
7-asseguramento da sustentabilidade do projeto Crateús Saudável.
Escola de Saúde 1-Coorrdenação geral do projeto.
Pública do Ceará 2-Planejamento Estratégico do projeto.
3-equipe técnica para acompanhamento, planejamento e capacitação de
técnicos da prefeitura e dos Comitês Comunitários.
4-Liberação e prestação de contas de recursos da Fundação Kellogg.
5-Confecçaõ de relatório final em parceria com a prefeitura, com
comparação de indicadores de 1997 e 2000.
6-Edição de livro sobre experiências vivenciadas.
7-Criação nova política de Saúde Pública para o Estado do Ceará com
implantação do projeto Município Saudável em tosos os municípios.

Comitês Comunitários 1-Mobilização da comunidade e vínculo entre a prefeitura e população,


com trabalho voluntário de 10 a 20 pessoas.
Fonte: CRATEÚS, 1999 (adaptado).
55

Em março de 1999, acontece o II Seminário Crateús Saudável”. O evento foi organizado com base
no desenvolvimento dos trabalhos realizados pelos comitês formados anteriormente. O município
recebeu consultoria do departamento de Saúde Pública de Toronto com objetivo de fortalecer a
coordenação local e a equipe ligada à ESP. A participação popular foi intensa e procurou-se retratar
as comunidades, bairros e distritos através de painéis fotográficos e encenações. A expectativa para
este evento é que fosse apresentado projetos viáveis e com determinadas características: deveriam
ter o maior número de pessoas envolvidas, garantia de percepção do trabalho realizado, baixo custo
e que pudesse ser concretizado em um período de um ano. Porém, os participantes dos comitês não
receberam capacitação específica para desenvolverem as propostas, o que resultou em apresentação
de projetos com objetivos complexos e que ultrapassavam os limites viáveis da prefeitura e da
própria comunidade. A equipe técnica procurou minimizar este problema através da proposta de
priorizar determinadas ações e levar os participantes a refletirem sobre o que a comunidade poderia
realizar sem depender da prefeitura, como a prefeitura poderia colaborar e quais parcerias poderiam
ser estabelecidas (CORDEIRO et al., 2001).

Os comitês comunitários receberam aporte financeiro da prefeitura a fim de ser utilizado na


implementação de projetos locais direcionados para fortalecer a inclusão social dos moradores, o
que permitiu a realização de eventos, cursos e iniciativas voltadas para a geração de renda, além de
promoção de atividade de cunho artístico como teatro, música e práticas esportivas como capoeira.
Conforme Brandão descreve “o mais importante não foi apenas ver jovens e adultos desenvolvendo
oficinas pedagógicas...mas o processo coletivo realizado desde a discussão das prioridades ao
momento de avaliação das iniciativas implementadas em cada uma das respectivas localidades”
(BRANDÃO, 2004).

A partir do segundo seminário, a prefeitura procurou realizar um evento denominado Seminário de


Planejamento, cujo produto final foi o Plano Estratégico da Prefeitura Municipal de Cratéus.
Baseado na concepção da estratégia de município saudável, a prefeitura procurou definir sua missão
como a de construir modelo de gestão compartilhada para o desenvolvimento local, com
empoderamento, intersetorialidade, descentralização, equidade, transparência e outras
características.

O modelo de gestão compartilhada remete à ideia de privilegiar espaços de cogestão entre a


comunidade, profissionais e gestores, organizada a partir de uma relação horizontal e com
56

correlação de forças entre os movimentos sociais e o poder instituído. O objetivo central é o


exercício da democracia, com garantia de acesso a informações, possibilidade de tomar parte nas
discussões e decisões, o que caracteriza a capacidade de exercer o poder, com fortalecimento do
sujeito e reformulação da racionalidade gerencial hegemônica (CAMPOS, 2000).

Em avaliação dos anos iniciais do projeto, pode-se verificar uma mobilização popular pontual como
caminhada da população com objetivo de despertar a consciência dos cidadãos para o problema do
lixo, e caminhadas da saúde que colocaram em pauta temas relacionados à saúde individual e as
questões urbanas. Destaca-se ainda um prêmio do UNICEF dada a uma escola no distrito de
Realejo, que conquistou o sexto lugar no âmbito nacional em desenvolvimento educacional a partir
de projeto de envolvimento da comunidade em atividades educativas (BRAGA et al., 1999).

Com a centralização e prioridade das ações focada na escola, o município de Crateús implementou
mudanças no currículo das escolas municipais de ensino fundamental e inseriu uma disciplina
transversal denominada “Município Saudável”, o que garantiu as discussões pelas crianças e jovens
de temas pertinentes relacionados à atitude pessoal diante do próprio corpo, importância da
sexualidade, a temática das drogas e da violência e o papel do cidadão diante do local onde mora. O
objetivo central desta disciplina foi chamar a atenção para as responsabilidades que cada indivíduo
tem na construção da cidade saudável. Logicamente a viabilidade desta proposta envolveu
participação ativa de profissionais da secretaria de educação municipal, em conjunto com
educadores diversos. O processo culminou na produção de um livro didático elaborado pelos
próprios professores da rede municipal, que serviu de base para as propostas da disciplina criada
(BRANDÃO, 2004).

4.4-Sobral

Sobral localiza-se na região norte do estado de Ceará e população estimada em 2010 de 188.233
habitantes. Em 1988 a população era de 150.000 habitantes. O município ocupa uma extensão de
2.122 Km² e sua economia está baseada principalmente no setor de serviços, que representa um
percentual do seu produto interno bruto mais de duas vezes maior que o setor indústria e mais de
57

quatro vezes maior que o setor da agropecuária. Encontra-se a 224 Km da capital Fortaleza (IBGE,
2013c).

O município de Sobral foi a sede do Primeiro Fórum Brasileiro de Município Saudável, ocorrido
em 1998 e que constitui um marco do movimento no Brasil (CONASEMS,1998).

Anteriormente ao fórum, os gestores municipais iniciaram diálogo com equipe da Escola de Saúde
Pública do Ceará e pessoal da Fundação Kellogg a fim de desenvolver atividades relacionadas à
estratégia de Município Saudável. Uma oficina de trabalho ocorrida em agosto de 1997 teve como
objetivos reconhecer a justificativa do projeto apresentado pela Fundação Kellogg, conhecer os
princípios e estratégias do Município Saudável, definir responsabilidades para determinadas linhas
de ação adotadas e definir as atividades e cronograma da equipe local do projeto. Além de
autoridades do executivo municipal, com destaque para o prefeito e secretários municipais,
participaram da oficina representantes da Universidade Vale do Acaraú, técnicos da ESP e uma
palestrante internacional, a doutora Sarah Atkinson, que abordou o tema “Princípios e Finalidades
do Município Saudável” (CORDEIRO et al., 2001).

Ainda no ano de 1997, uma reunião com a equipe coordenadora do projeto estabeleceu a
metodologia de planejamento que seria utilizada, com ênfase no desenho da situação desejada,
análise da ambiência externa com identificação de oportunidades e ameaças, análise da ambiência
interna com identificação de pontos fortes e fracos e a partir daí foram definidas estratégias gerais,
objetivos e diretrizes do plano.

Um dos problemas observados na fase inicial foi a falta de engajamento de pessoal medida que se
afasta do núcleo central constituído principalmente pelo prefeito e secretário de saúde. Conforme
descrito pelo próprio prefeito em 1998, “na própria administração, nos escalões inferiores, já se
começa a encontrar desconhecimento e até descompromisso com a ideia” (CORDEIRO et al.,
2001).

O documento produzido a partir das discussões definiu algumas diretrizes para a execução do
projeto: reduzir o índice de mortalidade infantil para nível do primeiro mundo; zerar o
analfabetismo; colocar todas as crianças nas salas de aula, sanear toda a cidade, criar uma política
de lazer saudável, que combata os problemas de alcoolismo e drogas entre os jovens. A partir das
58

metas traçadas, iniciou-se as reuniões com associações de bairros e secretarias municipais a fim de
estabelecer claramente as ações e montar um cronograma (CONASEMS, 1998).

Percebe-se que são metas compatíveis com a filosofia e os princípios do Movimento Cidades
Saudáveis. Portanto deve-se observar que as apenas a exposição das diretrizes é insuficiente para o
desenvolvimento do projeto e o alcance de resultados concretos. Por outro lado, um eventual
fracasso em alcançar determinada meta ou diretriz não deixa de caracterizar o município como
integrante da estratégia, desde que os compromissos estejam acompanhados de ações políticas que
garantam a sustentabilidade da proposta.

Um documento divulgado pela prefeitura municipal de Sobral, um ano após o início dos trabalhos,
ou seja, em 1998, aponta alguns avanços atribuídos ao desenvolvimento do projeto Município
Saudável. Refere que na área da educação em um ano foram construídas quatro escolas com 40
salas de aula cada, além da reforma de 22 escolas e estabelecimento de uma logística para
transporte de alunos em zona rural. Na área da saúde, mais de 20 equipes de Saúde da Família
foram implantadas em onze distritos que anteriormente não havia qualquer serviço de assistência.
Iniciou-se um processo de saneamento de favelas, além de pavimentação de vias públicas e, em
determinadas áreas de risco, foram retiradas a população para casas construídas a partir de mutirões.
Um cinema estatal foi inaugurado como estratégia para aumentar as opções de lazer saudável. Por
último a prefeitura buscava tratar a questão da humanização do trânsito com objetivo de combater
um dos principais focos de violência na cidade que convivia com excesso de carros, motos e
bicicletas em suas vias (GOMES, 1998).

Um detalhe importante na construção do projeto no município de Sobral é a própria visão dos


gestores em relação ao projeto. Conforme publicado em documento da ESP, a transcrição de
depoimento de dois integrantes da secretaria dessaúde e Ação Social do município remete a
reflexões sobre a estratégia. Segundo o secretário “a gente tem evitado usar o termo Sobral
Município Saudável, essa coisa de Município Saudável como método de cidade, como grife, porque
nós somos América Latina, sem estado de bem-estar, com muita injustiça, miséria e desigualdade
social, então, ao contrário do Canadá e de outros países, fica complicado você dizer que Sobral é
município Saudável. Temos optado por falar em Município pela Saúde”. Um técnico da mesma
secretaria apresenta a versão de que “para mim, município saudável é aquele município que está
ligado a um processo onde todas as políticas públicas tentam caminhar de forma intersetorial,
59

buscando parceiras, envolvimento da sociedade, a partir do quê se vai construindo a qualidade de


vida da população” (CONASEMS, 1998).

A evolução do projeto em Sobral permitiu o fortalecimento da ideia de que a estratégia do


Município Saudável deve ser entendida como uma força mobilizadora capaz de definir prioridades,
distribuir recursos e pactuar ações com a comunidade. Apesar da pouca absorção inicial do conceito
de Município Saudável pela população, principalmente no que concerne a responsabilidade e
inciativa da comunidade que não deve entender que toda solução de problemas obrigatoriamente
provem do setor governamental, houve exemplos explícitos de avanços na participação dos
cidadãos nos espaços de discussão pertinentes para o desenvolvimento da estratégia.

A intersetorialidade em Sobral, no contexto da estratégia Município Saudável, teve como elemento


chave o envolvimento da Secretaria de Saúde e Ação Social com a Secretaria da Educação que
desenvolveram o projeto Escola Promotora de Saúde, com envolvimento de todas as escolas do
município na discussão de temas diversos relacionados a higiene, sexualidade, prevenção do uso de
drogas, dentre outros. Esta intervenção remete à educação em saúde a partir do ambiente escolar.

A educação em saúde na escola é um processo pelo qual se pretende propiciar a consciência crítica
no aluno a fim de que ele adquira práticas que visem a promoção, manutenção e recuperação da sua
saúde assim como da saúde da comunidade em que vive. Necessita oferecer aos estudantes um
enfoque integral que considere as diferentes etapas de seu desenvolvimento, com treinamento de
hábitos e habilidades que induzem a um modo de vida mais saudável (MCKINGLAY, 1992).

A Escola Promotora da Saúde é um conceito que leva em consideração que o desenvolvimento do


escolar está ligado às condições ambientais, de convivência tanto com a família quanto com a
sociedade d qualidade da alimentação e nutrição, às oportunidades de aprendizagem de habilidades,
de construção de conhecimentos e o acesso a condições de segurança adequadas e recreação. A
iniciativa desenvolveu a partir dos anos 90 como força remodeladora, que deixa de lado a ideia de
uma escola passiva e passa ser um espaço dinâmico de oportunidades para a educação em saúde
(IEVORLINO, 2000).

Uma das ações políticas concretas tomada pela gestão que facilitaram o desenvolvimento e
aplicação da estratégia Município Saudável em Sobral foi a elaboração de um plano intersetorial,
60

que substituía o Plano Diretor que datava de 1972. O novo plano foi construído com participação de
diversos setores da sociedade com inclusão de lideranças comunitárias (CORDEIRO, 2001).

4.5-Jundiaí

Jundiaí localiza-se no estado de São Paulo, aproximadamente 65 Km da capital, e sua população


cresceu de abaixo dos 300.000 habitantes no início dos anos 1990 para mais de 370.000 habitantes
de acordo com o censo de 2010, distribuídos em uma área de aproximadamente 430 Km². Sua
economia está baseada no setor de serviços, seguido do setor de indústrias (IBGE, 2013d).

O projeto Cidade Saudável em Jundiaí teve início no ano de 1994 com objetivo de conhecer a
experiência canadense e a partir disto avaliar a possibilidade de desenvolver ações semelhantes na
cidade. Em seguida foi realizado um seminário com a participação de diversos segmentos da
sociedade, inclusive com funcionários públicos de variados setores do governo municipal para
debater a proposta de implantar no município um trabalho baseado na filosofia de Cidades
Saudáveis (CONASEMS, 1998).

A busca de uma solução integrada para os problemas da cidade foi um pressuposto para o projeto
em Jundiaí. Os primeiros problemas apontados referiram-se a questões ambientais, relacionados ao
controle da violência. Observou-se um impacto na área de educação ambiental, com sensibilização
a partir de um trabalho realizado com escolares, além de aumento da participação social, a partir do
Conselho da Cidade Saudável (MENDES, 2000).

A questão da preservação ambiental e a educação em relação ao meio ambiente foram importantes


focos ao longo do desenvolvimento das atividades. Um exemplo foi o projeto denominado “Cata-
treco” que visava o recolhimento de entulhos em residências. O projeto “Policiamento de Bairro”
consistiu em acordos da prefeitura municipal com a Polícia Militar a fim de controlar os índices de
violência no município. A fim de possibilitar uma aproximação da população com as estruturas do
poder público como serviços e equipamentos, foi elaborado um projeto que denominou-se
“Conheça seu Bairro”. Todas estas políticas foram definidas a partir de seminário que, além da
61

participação de gestores e de representantes da comunidade e outros setores locais, contou com


técnicos do Departamento de Saúde da Cidade de Toronto, no Canadá (GENTILE, 1999).

Um dos eventos produzidos pelo projeto Jundiaí Saudável envolveu a participação de mais de mais
de 60 mil estudantes de 103 escolas publicas e privadas do município. Foi realizado um concurso,
com patrocínio de empresa privada, que premiou desenhos e redações elaborados pelas crianças e
adolescentes. Foram incentivados a escrever e desenhar não somente em relação aos problemas,
mas também a buscar os pontos positivos apresentados pela cidade (JUNDIAÍ, 1995).

O seminário cidade saudável teve como eixo de discussão uma ideia de futuro, ou seja trabalhou-se
com a meta de construir uma cidade saudável em 25 anos. Para tanto alguns pressupostos deveriam
ser atingidos como uma administração pública eficiente e transparente sem rupturas que
comprometessem as políticas públicas, uma sociedade civil organizada e participativa nos espaços
de discussão e decisão, atrelamento do desenvolvimento urbano à questão da preservação
ambiental, garantia de pleno emprego além de serviços públicos com nível bom de qualidade
(JUNDIAÍ, 1994).

Ressalta-se que a participação de pessoal da cidade de Toronto no Projeto Jundiaí Saudável


constitui uma das primeiras parcerias de municípios brasileiros com o departamento de Saúde
daquela cidade canadense, que já acumulava uma expertise importante em relação ao tema das
Cidades Saudáveis e naquele momento era uma referência internacional importante no
desenvolvimento da estratégia. As discussões e apresentações do modelo canadense foram elemento
crucial para uma adaptação à realidade local de Jundiaí.

O município de Jundiaí, a partir do ano de 1997, começa a experimentar mudanças que ao longo do
tempo enfraquecem o projeto. A saída da Coordenadoria do Planejamento para centralização da
coordenação no gabinete do prefeito diminuiu os canais de interlocução dentro do próprio governo e
diminuiu a capacidade de articular a participação de diversos setores da sociedade. Em 1999, após
perda de visibilidade do projeto no ano anterior, ele volta para a Coordenadoria de Planejamento e
há mudanças no Comitê Cidade Saudável, que passa a ser coordenado por membro da sociedade
civil.
62

A Canadian International Develpment Agency (CIDA) procurou, em 1997, investir na proposta de


uma Rede de Cidades Saudáveis, a partir de experiências pilotos em Jundiaí e Fortaleza, com
transferência de tecnologia através de troca de informações e auxílio técnico, sem repasse de
recursos financeiros. Tal iniciativa ainda contava com participação de representantes técnicos da
Fundação Getúlio Vargas (FGV) e embora chegou a realizar reuniões com representantes brasileiros
no Canadá, a proposta não foi concretizada (JUNDIAÍ, 1996).

Em 1997 a cidade de Jundiaí realiza o I Encontro do projeto Jundiaí Cidade Saudável, com
apresentação de diversas experiências incluindo aquelas de outras cidades do Estado de São Paulo.
Apesar de desde 1995 o projeto ter orçamento próprio, observa-se a diminuição deste orçamento a
cada ano seguinte e enfraquecimento das atividades e contínua perda de visibilidade (MENDES,
2000).

Ao estudar o caso de Jundiaí, Mendes conclui que um conjunto de processos se somaram para a
inflexão negativa do projeto Jundiaí Saudável após 6 anos de existência. A falta de definição clara
em relação aos objetivos do projeto, a falta de compromisso político dos governantes, as
fragilidades relacionadas à questão da participação da comunidade e apoio técnico para as ações
fragmentado constituem elementos importantes que impediram o desenvolvimento do projeto,
apesar de que foi possível identificar um pequeno grupo de indivíduos que, naquele momento
continuava a tentar resgatar o projeto, revisá-lo e reformulá-lo.

4.6-Flexeiras

O município de Flexeiras atualmente tem uma população de 12.325 habitantes (estimativa em 2010)
enquanto que em 1999 este número era ligeiramente superior, com 12.843 moradores. A área total
do município é de 333 km² e a sede encontra-se 65 km da capital Maceió. Tem como principal
atividade econômica a cultura de cana-de-açúcar (IBGE, 2013e).

Flexeiras passou pelo processo de municipalização da saúde em 1994 e a partir das dificuldades do
setor para responder às demandas e abordar ao mesmo tempo as questões estruturais relacionadas às
63

condições socioeconômicas, começou-se a cogitar a ideia de desenvolver a promoção da saúde com


ações intersetoriais. Este foi o passo inicial de aproximação com a estratégia Município Saudável.

Em 1996, Flexeiras realiza a primeira Conferência Municipal de Saúde e o tema intersetorialidade é


abordado como ferramenta para atender as demandas identificadas. Posteriormente, representantes
dos trabalhadores, da comunidade e gestores tiveram a oportunidade de apresentar e discutir o
diagnóstico do município na segunda Conferência Estadual de Saúde e aprofundar ainda mais o
debate durante o I Encontro Nacional de Secretários Municipais de Saúde realizado em Fortaleza
em 1998.

O município contou com apoio e assessoria do Núcleo de Saúde Pública da Universidade Federal de
Alagoas, além de intercâmbio permanente com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS).
Com o apoio da OPAS, um dos projetos levados a diante foi o chamado “Arco-Íris no Jitituba”, em
referência à população alvo que vivia a margem do rio Jitituba, na periferia da cidade.

Como conquistas apontadas por Vasconcelos, destaca-se compromisso político e participação


popular no início do processo que levou a democratização das ações para o município. O meio
ambiente foi aprimorado com retirada de lixo que era jogado no leito e nas margens do rio Jitituba,
em ação da prefeitura que contou com forte presença da comunidade. As discussões acerca da
promoção da saúde levaram o município a aumentar para 100% a cobertura do território com o
Programa Saúde da Família, com consequente melhora de indicadores de saúde como taxa de
mortalidade infantil que caiu consideravelmente. Um convênio com o Ministério da Educação
(MEC), além de outras medidas relativas a políticas nacionais, permitiu a redução nas taxas de
analfabetismo (VASCONCELOS et al, 1999).

4.7-Maceió

Maceió, capital do Estado de Alagoas, no início dos anos 1990 apresentava uma população de mais
de 620.000 habitantes e no censo de 2010 este número já superava 930.000 habitantes, distribuídos
em um território de aproximadamente 503 Km². O pilar de sua economia é o setor de serviços, com
64

contribuição para seu Produto Interno Bruto três vezes maior que o setor industrial, sendo
insignificante o setor da agropecuária (IBGE, 2013f).

A cidade de Maceió iniciou suas atividades no contexto do Movimento Cidades Saudáveis a partir
do I Encontro dos Secretários de Saúde das Américas, ocorrido em Fortaleza em 1995. A partir do
contato com a experiência desenvolvida no Canadá, os gestores buscaram construir um projeto com
objetivo de melhorar a qualidade de vida da população, com a opção por realizar pequenas
experiências de Comunidades Saudáveis, consistindo em iniciativas piloto. Contribuiu para a
discussão e avanço das Comunidades Saudáveis algumas estratégias adotadas na administração da
cidade como o Programa Saúde da Família, distritalização do setor saúde e o Orçamento Cidadão
(MENDES, 2000).

A política de Orçamento Cidadão contribuiu com o projeto de Comunidades Saudáveis em Maceió


por ser uma ferramenta que amplia a participação da população na gestão de políticas públicas,
através da discussão de prioridades para cada região. O processo de orçamento participativo é
baseado em intercâmbio de informações, trabalha com o aprendizado da negociação e ajuda o
gestor a ser mais transparente na aplicação dos recursos do município.

O documento da Prefeitura Municipal Maceió que apresenta as diretrizes para o projeto


Comunidades Saudáveis define como meta principal dar oportunidade à população melhorar sua
qualidade de vida, o que pressupunha fortalecimento de organizações na comunidade e
implementação de ações intersetoriais. Dentre as diretrizes destaca-se fortalecimento de lideranças
com objetivo final de ampliar o exercício da cidadania, o estímulo à formação de conselho gestor,
incentivo de projetos e atividades de geração de renda, apoio a atividade recreativas, esportivas e
culturais (MACEIÓ, 1996).

As atividades foram concentradas em duas regiões distintas da cidade. O Bairro Pontal da Barra
inseriu-se no contexto de continuidade de um projeto já existente denominado “Revitalização do
Bairro Pontal”, que envolvia parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Os
bairros Grota do Arroz, Rafael e Loteamento Santo Onofre foram escolhidos devido posição
geográfica e baixa s condições socioeconômicas (MACEIÓ, 1996).
65

Um dos problemas enfrentados nos primeiros anos de desenvolvimento do projeto refere-se à pouca
participação de outros setores além da saúde no desenvolvimento das ações. Apenas a Secretaria
Municipal de Saúde assumiu o papel de conduzir o projeto, apesar de, no discurso, os gestores
apontarem para a necessidade de criar condições facilitadoras para o trabalho intersetorial. Outro
problema está relacionado à falta de parceiros fora do setor governamental. Houve uma certa
dificuldade na institucionalização efetiva do projeto e apesar do compromisso político do governo
com o desenvolvimento do projeto ser parte do discurso, ao longo do tempo, a prática mostrou não
haver consistência. Uma das razões apontadas para justificar estes problemas é o fato de dirigentes e
moradores não terem obtido informação suficiente, ou seja, desconhecerem os mecanismos de
desdobramento e de articulação para sustentabilidade do projeto e continuidade das ações.
(MENDES, 2000).

Maceió tornou-se assim um exemplo de que se a intersetorilidade permanecer apenas na base do


discurso os avanços são dificultados a longo prazo. Motta e Westphal analisam a fragilidade de
experiências que apresentam dificuldade em assimilar um modelo inovador de desenvolvimento em
que há participação popular e ações intersetoriais, o que resulta em uma contradição entre a
integralidade que se pretende e a fragmentação que a lógica das administrações determina (MOTTA
e WESTPHAL, 1998).

4.8-Anadia e Arapiraca

Anadia encontra-se a 88 Km de Maceió, Alagoas e possui uma população de 17.424 habitantes


(estimativa de 2010). Ocupa uma extensão de 189 Km² e seu setor agropecuário é maior que o
industrial, abaixo apenas do setor de serviços (IBGE, 2013g).

Segundo Gentile, o município de Anadia, a partir de publicação do estado do Paraná com


referências ao Movimento Cidades Saudáveis, procurou em 1997 dar início a atividades inseridas
no contexto da estratégia, o que culminou com diagnóstico de saúde do município, implantação do
Programa Saúde da Família e ações diversas intersetoriais que culminaram em resultados positivos
como redução da evasão escolar e diminuição do índice de mortalidade geral (GENTILE, 1999).
66

Arapiraca encontra-se a 124 Km de Maceió, tem uma área de 356 Km² e população de 214.006
habitantes segundo estimativa de 2010. Tema a economia baseada principalmente no setor de
serviços que supera o dobro do setor de indústrias em termos de produto interno do município. A
agropecuária tem pouca expressão em Araparica (IBGE, 2013h).

Segundo Gentile, o município de Arapiraca entrou em contato com o Movimento Cidades


Saudáveis a partir de seminário realizado no interior do estado de São Paulo, em 1997. A partir da
apresentação de projetos e discussão dos mesmos em Vargem Grande Paulista, gestores e técnicos
de Arapiraca resolveram implementar ações na área da saúde, educação e saneamento básico, além
de projeto de geração de renda e emprego entre pequenos produtores e implantação de agroindústria
(GENTILE, 1999).

4.9-Iraquara

Iraquara é um município localizado na região da Chapada Diamantina, centro-oeste do Estado da


Bahia, situado a 469 Km da capital Salvador. Possui o maior acervo espeleológico da América
Latina o que lhe confere o título de Cidade das Grutas. Em um bioma de caatinga, o município
ocupa uma área total de 1.029,4 Km² e sua população atual, de acordo com o censo de 2010, é de
22.601 habitantes. Em 1991 a população era de 17.006 habitantes. Iraquara tem a economia baseada
no setor de serviços, que corresponde a valor do Produto Interno Bruto maior que aquele
proveniente do setor de indústria e agropecuária juntos (IBGE, 2013i).

Como destaque do projeto Município Saudável em Iraquara, cita-se o trabalho desenvolvido, com
participação da Organização Pan-Americana da Saúde, na área de apoio à comunicação, que ia além
da divulgação através dos meios de comunicação convencionais e assumia o papel de englobar
atividades de educação, informação e motivação, através da busca da participação do usuário. A
ideia era ampliar e difundir as informações a fim de que as pessoas que as recebam pudessem ser
catalizadoras e disseminadoras dessa informação. Dentro deste contexto, trabalhou-se também a
troca de informação entre os agentes do projeto e a população, que valorizou a participação, o
resgate da cidadania, o saber ouvir e entender os anseios e problemas enfrentados no dia a dia pela
população (PARANÁ, 1996).
67

4.10-Palmeira

O município de Palmeira, localizado na região dos Campos Gerais, Estado do Paraná, tem uma
população, de acordo com censo de 2010, de 32.123 habitantes. No início dos anos 1990 a
população era de 29.046 habitantes. Ocupa uma área de 1457,2 Km² e grande parte de sua
população vive em zona rural. Sua economia tem com base principal o setor de serviços e o Produto
Interno Bruto proveniente do setor de agropecuária supera aquele da indústria (IBGE, 2013j).

Palmeira foi a primeira cidade do Paraná a lançar um projeto relacionado ao movimento Cidades
Saudáveis, em 1995, chamado Município Mais Saudável. O projeto iniciou com a implementação
de ações de prevenção juntamente com o que foi chamado de fase reparadora. Nesta fase, foram
introduzidos recursos adicionais na assistência à população, instituiu-se o orçamento participativo,
aumentou o valor repassado à educação, foram contratados mais médicos, cada escola ganhou um
consultório odontológico, foi organizado atendimento à saúde em zona rural e equipou-se o
laboratório municipal de análises clínicas (PARANÁ, 1996).

Nas discussões que se seguiram, foram identificados problemas relacionados à baixa qualificação
do funcionário público municipal, que dificultava o avanço das propostas, a relação precária entre
os diferentes setores da prefeitura, falta de planejamento e participação popular precária. Um
avanço registrado foi a criação do Conselho Comunitário-Comitê Cidade para a saúde, com objetivo
de discutir e apresentar ao gestor as prioridades do município a partir da visão dos moradores.

A partir das ações deste comitê, uma série de projetos começou a ser desenvolvida, envolvendo
parcerias com outras instituições e esferas de governo. Dentre eles, cita-se: controle da desnutrição,
em parceria com a Pastoral da Criança e outras associações, sendo que a prefeitura forneceu
recursos humanos (médico, psicólogo, fonoaudiólogo e nutricionista) e se comprometeu com uma
subvenção para suprimento alimentar; despoluição do rio Monjolo, que envolveu diversas
secretarias e o Instituto Ambiental do Paraná; implantação da Vila Rural, em parceria com o
governo estadual, com objetivo de reduzir o déficit habitacional; programas de geração de emprego;
soluções para o problema do destino do lixo. Quanto a este último item, destaca-se o projeto
Cidadão com Respeito, que incentivava o recolhimento de lixo reciclável nas escolas, trazido de
casa pelos alunos (PARANÁ, 1996).
68

CAPÍTULO 5
ANÁLISE E CONCLUSÕES

Este estudo permitiu analisar o marco conceitual que originou o Movimento Cidades Saudáveis, a
partir da concepção de Promoção da Saúde oriunda de importantes fóruns multilaterais, o contexto
em que se desenvolveu no Brasil. A partir deste marco referencial procurou-se analisar algumas
experiências no Brasil e o contexto em que tais iniciativas foram implantadas no país, bem como a
conjuntura atual após quase duas décadas de desenvolvimento do tema cidades saudáveis estar na
agenda do país.

Percebeu-se que o debate sobre Promoção da Saúde, ainda que tenha origens mais antigas, apenas a
partir da década de 70, com a Conferência de Alma-Ata, e na década de 80, com a Conferência de
Ottawa tornou-se pauta política dos governos e tema fundamental no que se refere a governança em
saúde exercida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e suas regionais como a Organização
Pan-Americana da Saúde (OPAS). Em conjunto com pesquisadores e gestores da saúde pública,
bem como representantes dos chamados movimentos sanitários, dentre eles o conhecido movimento
da Reforma Sanitária no Brasil, estabeleceu-se uma concepção nova sobre governança em saúde
tendo por base as cidades, relacionando saúde com condições de vida, cidadania e políticas publicas
integradas.

Conferências sobre Promoção da Saúde posteriores àquela de Ottawa serviram para fortalecer
princípios anteriormente defendidos e avançar no debate sobre o desenvolvimento ou implantação
da promoção de saúde na prática de cada país. Assim, foram identificadas ações prioritárias e
integradas para configurar políticas públicas saudáveis e fatores essenciais para promover ambiente
favorável à saúde. Os determinantes da saúde tiveram papel relevante nas reflexões estabelecidas
durante a Conferência de Jacarta, por exemplo, em 1997. Ainda nesta conferência, é dado destaque
ao papel da participação popular no planejamento e tomada de decisão nas políticas públicas para a
saúde.

Esta participação popular nas políticas públicas estende-se também para o contexto das ações
práticas da promoção da saúde, seja no âmbito individual ou coletivo. Para tal é necessário um
esforço de capacitação, conforme a Carta de Ottawa, o que depende de acesso à informação,
69

desenvolvimento de habilidades pessoais e oportunidades para a eleição daquilo que é mais


saudável.

Em relação às conferências, o grande desafio identificado foi como garantir o comprometimento


dos governos em adotarem a promoção da saúde como política pública e ainda e como tornar a
promoção da saúde um tema central para a agenda global de desenvolvimento.

As discussões em torno da Promoção da Saúde ajudaram a entender a amplitude do conceito de


saúde. Assim, atualmente a saúde envolve uma ampla concepção ampla do processo saúde–doença
e de seus determinantes e visa enfrentar diversos problemas que acometem as populações humanas
e seu ambiente (BUSS, 2000).

O conceito estabelecido de promoção da saúde constitui-se por si uma crítica ao modelo biomédico
hegemônico, ao priorizar determinadas práticas de cuidados de saúde a partir de um novo contexto
na saúde pública, em que há uma nítida limitação do impacto dos serviços na saúde. Além disto,
observa-se um redesenho das práticas e políticas que buscam a redução da desigualdade social
(CARVALHO et al., 2004).

O Movimento Cidades Saudáveis teve seu marco inicial, considerado neste trabalho, em 1984, a
partir da conferência “Beyond Health Care”, ocorrida em Toronto, Canadá, logo é uma discussão
em debate antes da realização da Conferência de Ottawa. Ao longo do seu desenvolvimento, o
movimento incorpora os princípios defendidos na Carta de Ottawa. Além disso, já comportava nesta
fase incipiente, anterior à carta de Ottawa, a influência de dois grandes marcos prévios: a
Declaração de Alma-Ata, em 1978, que discutiu a Atenção Primária à Saúde e o Relatório Lalonde,
em 1974, que ampliou a visão da saúde a partir do desenvolvimento do conceito de Campo de
Saúde.

A estratégia do Movimento Cidades Saudáveis procura viabilizar políticas públicas que facilitem o
desenvolvimento humano e incorpora a noção de promoção da saúde em um sentido ampliado, em
acordo com a evolução da discussão do tema nas conferências realizadas. Sua expansão para países
de diversos continentes permitiu um conjunto de ações práticas que pautam na análise das
condições da qualidade de vida e focalizam o bem-estar do indivíduo e da comunidade, com
70

superação de velhos paradigmas em relação à saúde, notoriamente em relação ao modelo


biomédico.

Um ponto chave e conceito central da estratégia do Movimento Cidades Saudáveis é a


intersetorialidade, considerada fundamental para que os processos de promoção da saúde se
concretizem. Constitui-se um modelo inovador de planejamento, execução, avaliação de projetos e
serviços e de governança. Sem a ação intersetorial é impossível estabelecer metas ou diretrizes
baseadas nos pressupostos para as Cidades Saudáveis, caracterizados pela Organização Mundial da
Saúde (OMS) e analisados por pesquisadores diversos, como Westphal, no Brasil, que disserta
sobre a necessidade de intervenções em políticas educacionais, agrícolas, de transporte e
ambientais, dentre outras para o desenvolvimento da estratégia Cidades Saudáveis.

A intersetorialidade deve ser entendida a partir da noção de setor. A estruturação de setores segue
uma lógica de atores que atuam em um campo de atividade específico e dedicam a um conjunto
delimitado de práticas e ideias. Obviamente, o que se pretende é o desenvolvimento de ações
integradas que ultrapassem as barreiras de atuação de cada setor. Há obstáculos e imbricações neste
processo e nem sempre é possível delinear uma agenda comum para os vários setores. A partir daí,
entende-se a intersetorialidade como um modelo de gestão que processa a relação recíproca entre os
diferentes setores (SANTOS, 2011).

Em relação à intersetorialidade afirmam MAGALHÃES E BODSTEIN (2009):

Como práticas e ações políticas as quais operam a partir de novas idéias, recursos,
atividades e mecanismos em cada contexto, os programas intersetoriais apresentam
objetivos múltiplos, variáveis ao longo de tempo nos espaços sociais em que se inserem.
Frequentemente, efeitos e resultados têm pouco ou nada a ver com os objetivos presentes
oficialmente e acordados no início da concepção do programa. Novas arenas de concertação
e significados são criados e recriados a partir das interações entre atores atuando em rede
direta ou indiretamente nas intervenções. As ações intersetoriais precisam ser entendidas
como sistemas organizacionais que mobilizam recursos humanos e não humanos e que
disponibilizam ações e serviços através de saber técnico-científico e popular, estando
permanentemente em questão a efetividade das atividades vis-à-vis sua finalidade
(MAGALHÃES E BODSTEIN, 2009)

Com base na intersetorialidade, o Movimento Cidades Saudáveis possibilita a articulação de vários


saberes técnicos, com interação das agendas de cada área e possibilidade de cooperação mútua para
atingir objetivos que incorporam uma dimensão maior que aqueles de cada setor. Assim, se ela é
desenvolvida de forma plena, a população se beneficia de forma mais completa com políticas
71

racionais, com foco ampliado e capaz de interagir diferentes forças e estratégias na solução de
problemas e construção de bem-estar, passos fundamentais para qualificar como saudável a vida dos
indivíduos e a comunidade.

Os pontos positivos analisados na estratégia Cidades Saudáveis em relação à intersetorialidade se


confrontam com um problema fundamental, que compromete o processo e pode ter sido a causa
para uma inflexão negativa observada no movimento nos últimos anos. A intersetorialidade, apesar
de todos os seus benefícios, é inviabilizada em sua forma plena por práticas tradicionais da política
como a cultura clientelista, a descontinuidade dos projetos e programas de governo, substituídos
assim que há troca de gestor, associada à falta de compromissos com políticas de longo prazo que
nem sempre rendem votos nas eleições.

A descontinuidade administrativa não necessariamente implica em algo ruim, assim como


continuidade não leva diretamente à convicção de algo positivo. A continuidade, por exemplo, pode
levar a riscos e ocorrências indesejáveis e permitir a acomodação, enquanto a descontinuidade pode
representar a possibilidade de alternância de poder e preferências (NOGUEIRA, 2006).

O ideal seria um equilíbrio entre as forças responsáveis por adotar novas ações e políticas e aquelas
que manteriam os avanços realizados. O centro da questão é que, geralmente, a descontinuidade
está vinculada a práticas políticas que enfraquecem a democracia, não abrem espaço para pleno
exercício da cidadania e servem de interesses pessoais daqueles que exercem o poder.

O clientelismo refere-se a uma atitude de troca entre sujeitos que de um lado precisam de um
serviço essencialmente público e, de outro lado, aqueles que administram ou tem acesso aos que
decidem sobre a concessão de tal serviço (SEIBEL E OLIVEIRA, 2006).

Na maior parte da Europa, assim como no Canadá e outros países considerados do primeiro mundo,
o Movimento Cidades Saudáveis representou uma nova forma de abordagem da temática da
promoção de saúde e um instrumento para aproximar os cidadãos dos mecanismos participativos da
construção de seu bem-estar e qualidade de vida.

Neste ponto, vale a pena refletir sobre a análise de Burris e Hancock, que afirmam que o melhor das
intervenções organizadas no âmbito global não terá êxito se as instituições locais de governança não
72

forem levadas em consideração ou não estiverem capacitadas para implementar de forma eficaz
seus projetos. Por outro lado, a boa governança nacional e internacional é importante porque podem
garantir recursos para uma parcela da população excluída dentro dos processos políticos locais
(BURRIS E HANCOCK, 2007).

Ao referir à governança, entende-se como uma articulação e cooperação entre diferentes atores
sociais e políticos, que vão além da máquina estatal. A governança é definida como um processo
dinâmico de tomada de decisão e do processo através do qual as decisões são ou não são
implementadas (BARTEN et al., 2011).

Já em países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, apesar de surgir como grande oportunidade


para a experiência dos mecanismos de participação social e fortalecimento da concepção de
promoção da saúde, pôde-se observar uma motivação diferente para seu desenvolvimento. A
chegada do Movimento Cidades Saudáveis no Brasil, assim como na maioria dos países da América
Latina, nos anos 90, reflete uma estratégia da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) em
abordar os grandes problemas da região como a exclusão social, má distribuição de renda, políticas
de saúde e outras políticas públicas frágeis ou comprometidas pela escassez de recursos investidos.
Associa-se o fator corrupção, enraizado na cultura política e que contribui em grande parcela para o
agravamento da desigualdade e infraestrutura precária.

A OPAS considerou o desenvolvimento da estratégia na região, que inclui o Brasil, como ponto
fundamental para fortalecer alguns processos que já vinham ocorrendo, como a descentralização e
municipalização das políticas públicas, inclusive a saúde, e a participação e controle social exercida
através de conselhos em que há representantes de trabalhadores, usuários e gestores. A
descentralização é um processo em que se redistribui o poder de decisão a partir de suas dimensões
de território e funcionais (ROFMAN, 1990).

A municipalização remete a ideia de que o município torna-se o responsável pelos seus interesses
locais e deve assumir a condução do planejamento, execução e acompanhamento de políticas
públicas que referem ao seu território. No caso do Brasil, é um processo que se desenvolveu de
forma muito heterogênea devido à complexidade e diferenças das diversas municipalidades que
compõe o país (PAIM, 1992).
73

O direito à participação popular na formulação das políticas públicas e no controle das ações do
Estado é, no Brasil um direito constitucional (BRASIL, 1988).

O controle social é fundamental para o fortalecimento da democracia e da cidadania. No


desenvolvimento da estratégia Cidades Saudáveis, o papel dos Conselhos Municipais de Saúde e
outras instâncias específicas como comitês gestores, que envolve outros atores além dos
profissionais da saúde, torna-se ponto fundamental para a própria sustentabilidade da estratégia.

A partir da dificuldade do poder público em dar continuidade a grande parte dos projetos, conforme
demonstrado nas experiências e trabalhos de analisados, a participação fortalecida da comunidade,
com reconhecimento da importância e mobilização para defender o projeto, poderia reverter o
processo de inflexão negativa que acometeu grande parte dos municípios que implantaram
iniciativas relacionadas ao ideário de Cidades Saudáveis.

As resistências observadas no aprimoramento da participação social estão ligadas a fatores


relacionados à necessidade de mudanças na estrutura social, à educação para a cidadania e
entendimento de que, na construção de políticas públicas, não cabe visualizar os interesses
imediatos e que geram benefícios limitados a um grupo específico. O cidadão precisa analisar e ter
como referência prioridades que trazem impacto social positivo para toda a comunidade, que não
resolvam apenas as pendências urgentes e necessita defender a integração do processo de forma que
as soluções não sejam paliativas, mas tenham resultado duradouro e sustentado.

As experiências no Brasil com a estratégia Cidades Saudáveis remetem às reflexões apresentadas


anteriormente. As inciativas, a maioria com apoio da OPAS, tiveram em um primeiro momento um
grande impacto na questão da mobilização e estruturação da participação comunitária. Porém, a
continuidade dos projetos, na maioria dos municípios sucumbiu devido fatores associados á
dificuldade de manter a mobilização social para interesses de longo prazo, deficiência na
capacitação de pessoas para exercer suas atividades nos comitês gestores ou espaços afins e a
questão da mudança de gestor que pode funcionar como elemento de descontinuidade das políticas
públicas.
74

Experiências analisadas: aspectos positivos e negativos

A partir dos anos 90 como vimos várias iniciativas surgem no Brasil. Em Campinas observa-se a
participação, a partir de 1998, da PUC e posteriormente da UNICAMP. O envolvimento da
academia permitiu um novo fôlego ao projeto, com reformulação de diretrizes, táticas para a
participação comunitária, viabilização de eventos de capacitação e fornecimento de suporte didático
para as ações do projeto.

A presença da Universidade possibilitou a definição, por exemplo, de metodologias e indicadores a


serem utilizados como orientadores no processo de implementação de projetos, não somente na
cidade de Campinas, mas que servisse de modelo para aplicação em outras localidades. Torna-se
importante ressaltar que, apesar da forte característica de interação técnica, o papel da Universidade
vai além e constitui-se em um processo social e político, uma vez que ao trabalhar com um recorte
da realidade, estão inseridos neste processo diferentes atores, sejam gestores, profissionais ou
membros da comunidade, assim como diversas instituições.

Em Minas Gerais, as experiências desenvolvidas na década de 90 nos municípios de Dionísio e São


José do Goiabal viabilizaram a partir de propostas criadas em instituição de pesquisa do Estado. A
participação de técnicos da Fundação Ezequiel Dias (FUNED), através do chamado Grupo
Assessor, no processo de elaboração das diretrizes e no apoio ao denominado Comitê Diretivo é um
exemplo da interação bem vinda de uma instituição que trabalha com ensino e pesquisa com o
poder público e comunidade de uma determinada localidade, a fim de compartilhar saberes e
permitir ações planejadas, com metodologias adequadas e respaldadas pelo conhecimento científico.

Por outro lado, verificou-se um simples problema nesta relação do município com a FUNED que
pode estar envolvido com a própria saída desta instituição do projeto, o que ocorreu precocemente,
em 1998. Ao nascer dentro da FUNED, sem primeiramente haver um debate ampliado sobre as
necessidades percebidas pela comunidade, caiu-se um uma armadilha em que a população deixa de
reconhecer as diretrizes como suas expectativas e assim, criou-se um ambiente desfavorável à
participação popular efetiva e desenvolvimento das ações a longo prazo.

Em Crateús e Sobral, a interatividade da Escola de Saúde Pública do Ceará (ESP-CE) com os


gestores municipais foi o elemento chave para o desenvolvimento da estratégia. Além de
75

possibilitar metodologias adequadas e oferecimento de suporte técnico acadêmico, o


aproveitamento de uma rede de contatos, com presença de participantes internacionais em eventos,
enriqueceu as discussões. Interessante salientar que a própria ESP-CE, em processo de avaliação do
projeto em Sobral, considerou a questão da participação dos gestores como fator crítico e
comprometedor do projeto, uma vez que identificou-se dificuldade dos membros do governo em
avançar no diálogo intersetorial. Ou seja, pelo menos neste caso específico, um entrave para o
desenvolvimento da estratégia é própria administração que o concebe inicialmente, mas não adota
na prática os pressupostos esperados.

Ainda em relação ao Ceará, destaca-se a abordagem da temática Cidades Saudáveis na Escola, seja
através de implantação de disciplina transversal em Crateús, denominada “Município Saudável”,
seja através do projeto Escola Promotora de Saúde, em Sobral. A escola precisa ser entendida como
um espaço de relações e de desenvolvimento crítico e político, com contribuição na construção de
valores pessoais, crenças, conceitos e formas de conhecer o mundo. Este processo interfere de
maneira direta na produção social da saúde (BRASIL, 2009).

A Promoção da Saúde na escola, com estudantes professores e funcionários deve partir daquilo que
já é de conhecimento deles e daquilo que está ao alcance deles realizarem e a partir daí desenvolve-
se a capacidade de interpretar o cotidiano e incorporar práticas, atitudes e comportamentos que são
adequados para melhorar a qualidade de vida, com autonomia no exercício da cidadania
(PORTUGAL, 2006).

A partir destas considerações, verifica-se a importância da escola no contexto da estratégia Cidades


Saudáveis. O espaço privilegiado da escola funciona como um elemento multiplicador das ações ali
desenvolvidas, cujos limites de alcance vão além dos estudantes e chegam às suas famílias,
vizinhos, o que viabiliza uma rede de fluxo de informação, conhecimento e oportunidades. Um
exemplo prático é quando a equipe de saúde discute dengue na escola. Aquela informação
repassada ao estudante é elevada para sua residência e influencia o comportamento de seus pais, que
por sua vez tem a possibilidade de repassar o conhecimento à vizinhança e quando trabalhados com
consistência e incentivo à participação nos processos, no caso de prevenção da proliferação da
doença, há um ganho social notável.
76

A formação da Rede Brasileira de Municípios Saudáveis, idealizada pelo Conselho Nacional de


Secretários Municipais de Saúde, a partir da Carta de Fortaleza, em 1995, partia da concepção de
que as grandes agendas sociais tinham a tendência de serem discutidas em fóruns ampliados e com
abrangência internacional e que os municípios brasileiros deveriam se adequar, tanto à Constituição
Federal, que estabelecia as responsabilidades na formulação de políticas de saúde, quanto às novas
demandas identificadas nestes fóruns internacionais. Assim, a estratégia da rede aponta para uma
tendência mundial, relacionada ao englobamento da saúde como qualidade de vida e ponto chave
para o desenvolvimento sustentável, em uma perspectiva intersetorial.

Atualmente, a Rede de Municípios Potencialmente Saudáveis constitui um desdobramento


importante da estratégia no Brasil, com abrangência de instituições de ensino e pesquisa e
aproximadamente 40 municípios distribuídos em 5 estados diferentes. Apesar do amplo trabalho da
rede, reconhece-se um afastamento natural da dinâmica que caracterizou os primeiros processos da
adoção da estratégia, em que se seguiam recomendações da OMS e OPAS e as discussões eram
pautadas em torno dos pressupostos estabelecidos para a cidade saudável, conforme analisado no
capítulo 2. A rede se organiza de forma que a aderência ao processo é a partir do desenvolvimento
de projetos julgados como colaboradores para a promoção da saúde e exemplos de boas práticas de
políticas públicas. Não há necessidade formal de citar ou referir-se ao Movimento Cidades
Saudáveis.

O trabalho da rede cuja missão é colaborar na construção das políticas públicas saudáveis parece
estar menos vinculado ao ideário original das Cidades Saudáveis e está centrado na questão da
produção de saúde, a partir de articulação de questões específicas de um determinado município
com um marco de interesses comuns.

Uma das características da Rede de Municípios Potencialmente Saudáveis é a ausência de estrutura


hierárquica e compromisso formal, o que lhe permite um ganho importante ao defender a
sustentabilidade das propostas e assim, tem a oportunidade de evitar o problema crucial já analisado
que é a descontinuidade de políticas públicas, pois a maioria das propostas comuns em rede é
assumida pelos gestores.

Outras experiências com o trabalho em redes, como a Rede Pernambucana de Municípios Saudáveis
teve destaque em na década passada ao confluir vários municípios do Estado na adoção de práticas
77

de políticas saudáveis, com suporte da Universidade federal de Pernambuco. Atualmente, o site da


rede encontra-se desatualizado por mais de um ano e uma análise sobre sua atuação deveria ser
empreendida em estudo com metodologia ampliada em relação à usada neste trabalho.

O papel do CONASEMS desde que propôs a Rede Brasileira de Cidades Saudáveis, qual a papel da
OPAS nos últimos anos e a participação do Ministério da Saúde na discussão da estratégia Cidades
Saudáveis são algumas das perguntas que exigirão também novos estudos com metodologias
apropriadas a fim de ouvir atores importantes na evolução da história do movimento. Isto acontece
devido a escassez de registros em documentos formais. Por exemplo, o Ministério da Saúde não
possui memória registrada das conclusões e encaminhamentos dos encontros e fóruns realizados
com a temática Cidades Saudáveis que antecederam o IV Encontro da Rede de Municípios /Cidades
Saudáveis e Sustentáveis.

Em dezembro de 2013 na ocasião do IV Encontro da Rede de Municípios /Cidades Saudáveis e


Sustentáveis, ocorrido em Brasília, verificou-se uma tendência de retomada da discussão e debate
do tema, inclusive como proposta de eixo na formulação da nova Política Nacional de Promoção da
Saúde. Neste evento, pôde-se observar a multiplicidade de experiências isoladas que o Ministério da
Saúde tenta agrupar e considerar como elemento formador de uma rede de Municípios/Cidades
Saudáveis.
78

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de desenvolvimento do Movimento Cidades Saudáveis no Brasil mostra fases distintas


ao longo do tempo, desde os fins da década de 80 até o ano de 2013, período que foi analisado. Os
elementos chave que estruturam esta estratégia são a participação social, as parcerias com os
diversos setores e instituições e a capacitação da comunidade para a prática da cidadania.

Sperandio considera que estes são elementos críticos da boa governança no âmbito dos
determinantes sociais e ambientais das desigualdades, observadas ao abordar a saúde urbana. Além
disto, eles constituem uma preocupação central da Carta de Ottawa para a Promoção da Saúde,
cujos princípios produziram uma base de valor para o Movimento Cidades Saudáveis
(SPERANDIO, 2013).

Conforme pode ser observado nas experiências apresentadas, o fator intersetorialidade exerceu
papel preponderante nas discussões da estratégia. A defesa deste pressuposto para o município
inserir-se na estratégia funcionou como elemento de garantia para o êxito de determinadas
experiências, como por exemplo, o projeto Escola Promotora de Saúde, em Sobral, fruto da
interação das secretarias municipais de Saúde e Ação Social e da Educação.

A implantação de projetos relacionados ao ideário Cidades Saudáveis, além de apoio de organismos


multilaterais, notoriamente a OPAS e OMS, constituiu uma oportunidade de ação e integração de
governos locais com instituições de ensino e pesquisa, que foram fundamentais para elaboração de
processos metodológicos e capacitação de pessoal.

O papel exercido pelas instituições de ensino e pesquisa como a PUC-Campinas, UNICAMP, ESP-
CE, ESMIG/FUNED mostram que a participação acadêmica pode facilitar os esforços
empreendidos pelos governos locais. No caso de Campinas, por exemplo, o suporte didático a
atividades ligadas à educação em saúde e o suporte técnico no processo de informatização e criação
de plataformas de ensino, tornaram a UNICAMP uma parceira essencial no âmbito da política do
Programa Comunidade Saudável.
79

A partir deste trabalho, percebeu-se que, no decorrer dos anos, o ideário do Movimento Cidades
Saudáveis teve sua força diminuída no Brasil. Isto se verificou através da escassez de trabalhos e
informações sobre o tema produzidos nos últimos anos, inclusive pela dificuldade do Ministério da
Saúde em ter registro de atividades desenvolvidas por ele próprio como os encontros da Rede de
Municípios/Cidades Saudáveis e Sustentáveis. Atualmente, como importante desmembramento do
movimento, a Rede de Municípios Potencialmente Saudáveis exerce um papel interessante ao
manter em pauta a discussão das políticas públicas saudáveis e, como colaboradora do Ministério da
Saúde, espera-se que tenha grande influência na reformulação da Política Nacional de Promoção da
Saúde, prevista para o ano de 2014.

Este assunto, parte da pauta atual do Ministério da Saúde, foi discutido no IV Encontro da Rede de
Municípios/Cidades Saudáveis e Sustentáveis, realizado em Brasília em novembro de 2013 e
considerou-se a inserção do tema ambientes urbanos saudáveis e sustentáveis na nova Política
Nacional de Promoção da Saúde.

As limitações deste trabalho foram muitas e estão relacionadas, conforme já citado, principalmente
à falta de documentos que registram a trajetória do Movimento Cidades Saudáveis, essencialmente
os caminhos que seguiram as experiências desenvolvidas na década de 90. Logicamente, a proposta
metodológica focada na revisão bibliográfica narrativa constituiu fator importante nesta limitação.
Assim, trabalhos futuros com ênfase em estudos de casos particulares e com metodologia ampliada
devem ser encorajados, para, em seguida, ser possível uma avaliação mais abrangente e com maior
riqueza de elementos para análise e discussão.
80

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