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TUTELA PENAL DO MEIO AMBIENTE

INTRODUÇÃO

No Brasil, a proteção ao meio ambiente passou a ser uma preocupação a partir da


Constituição Federal de 1988 (art. 225), de modo que o direito a um meio ambiente
ecologicamente equilibrado ficou reconhecido como direito fundamental, o que justificou a
imposição de sanções penais visando protegê-lo.
A responsabilidade ambiental tem grande respaldo judicial, principalmente por
meio da Lei 9.605/98, que regula os crimes ambientais. A norma serve como instrumento de
proteção, e também de recuperação do meio ambiente, sendo assim, ela se apresenta como
uma legislação reparadora.
O Direito Penal é o “último recurso” utilizado em casos de ataque ao meio
ambiente, ou seja, apenas quando todos os outros mecanismos cíveis e administrativos não
forem suficientes para a sua proteção, o Estado está autorizado a impor sanções penais aos
infratores, nos termos da Lei 9.605/98.
Desse modo, é possível definir os crimes ambientais como todas as condutas
previamente previstas em lei que violem o meio ambiente, bem jurídico protegido pela norma.
A Lei é responsável por proteger inúmeros bens jurídicos que constituem o meio
ambiente. Por isso, existem diferentes classificações para os crimes ambientais: Crimes contra
a fauna; Crimes contra a flora; Crimes de poluição; Crimes contra o Ordenamento Urbano e o
Patrimônio Cultural; Crimes contra a Administração Ambiental.

DOS CRIMES CONTRA A FAUNA

Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em
rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou
em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas:
I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a
obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural;
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III - quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito,
utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota
migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não
autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.
§ 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção,
pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.
§ 3° São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas,
migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo
de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais
brasileiras.
§ 4º A pena é aumentada de metade, se o crime é praticado:
I - contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da
infração;
II - em período proibido à caça;
III - durante a noite;
IV - com abuso de licença;
V - em unidade de conservação;
VI - com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa.
§ 5º A pena é aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício de caça profissional.
§ 6º As disposições deste artigo não se aplicam aos atos de pesca.

A fauna é o conjunto de animais próprios de um país ou região e está intimamente


ligado com o habitat, ou seja, local onde o animal vive. Os animais brasileiros se dividem em
animais domésticos (que dependem do ser humano), animais domesticados (que se encontram
na natureza, mas que por razões especiais passaram a conviver harmoniosamente com o ser
humano) e animais silvestre (animais que possuem como habitat natural as florestas, rios,
matas ou mares e normalmente não possuem habitabilidade com o ser humano).
O artigo 29 protege todos esses tipos de fauna, e tipifica como crime, dentre
outras condutas, a guarda de animal silvestre sem a devida permissão ou autorização da
autoridade competente. Por esse motivo, há grandes discussões a respeito de animais
silvestres que convivem harmoniosamente com os humanos, e que por isso, acabaram se
tornando dependentes, como é o caso dos papagaios. Atualmente, STJ é favorável à
possibilidade de posse, a depender do caso concreto, já que em alguns casos é mais benéfico
para o animal ficar sob cuidados domésticos do que voltar para o seu habitat natural.
A pena é aumentada pela metade caso as condutas ocorram contra animais que
estão em extinção, ou correndo o risco de entrarem em extinção; se realizadas durante a noite;
com abuso de licença; em unidade de conservação ou com emprego de instrumentos que
possam levar a destruição em massa.
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O presente artigo recebe algumas críticas no que tange ao princípio da


proporcionalidade, uma vez que o verbo do tipo penal “matar” é tratado da mesma proporção
do que o verbo “caçar” e “perseguir”. Ocorre que a Lei é bastante rigorosa e é dotada de
caráter punitivo e serve como exemplo para eventuais condutas que violem o meio ambiente.

Art. 30. Exportar para o exterior peles e couros de anfíbios e répteis em bruto, sem a
autorização da autoridade ambiental competente:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

De acordo com o art. 30, constitui crime exportar para o exterior peles e couros de
anfíbios e répteis em bruto, sem a autorização da autoridade ambiental competente. Punível
com reclusão, de um a três anos, e multa.

Art. 31. Introduzir espécime animal no País, sem parecer técnico oficial favorável e licença
expedida por autoridade competente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

Também é crime introduzir espécime animal no País, sem parecer técnico oficial
favorável e licença expedida por autoridade competente, o qual é punível com detenção, de
três meses a um ano, e multa.

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo,
ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 1º-A Quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas descritas no caput deste
artigo será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

Praticar atos de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres domésticos


ou domesticados, nativos ou exóticos, constitui crime punível com detenção, de três meses a
um ano, e multa. É importante destacar que incorre nas mesmas penas quem realiza
experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos,
quando existirem recursos alternativos. Por fim, a pena é aumentada de um sexto a um terço,
se ocorre morte do animal.
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Art. 33. Provocar, pela emissão de efluentes ou carreamento de materiais, o perecimento de


espécimes da fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas
jurisdicionais brasileiras:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas:
I - quem causa degradação em viveiros, açudes ou estações de aqüicultura de domínio
público;
II - quem explora campos naturais de invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão
ou autorização da autoridade competente;
III - quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre bancos de
moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica.

De acordo com o art. 33, aquele que provocar o perecimento de espécimes da


fauna aquática existentes em rios, lagos, açudes, lagoas, baías ou águas jurisdicionais
brasileiras em razão da emissão de efluentes ou carreamento de materiais será punido com
detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas cumulativamente.
Incorrerá nas mesmas penas: a) quem causa degradação em viveiros, açudes ou
estações de aquicultura de domínio público; b) quem explora campos naturais de
invertebrados aquáticos e algas, sem licença, permissão ou autorização da autoridade
competente; c) quem fundeia embarcações ou lança detritos de qualquer natureza sobre
bancos de moluscos ou corais, devidamente demarcados em carta náutica.

Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão
competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

De acordo com o art. 34, pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em
lugares interditados por órgão competente é punível com detenção de um ano a três anos ou
multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:


I - pesca espécies que devam ser preservadas ou espécimes com tamanhos inferiores aos
permitidos;
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos,
petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
III - transporta, comercializa, beneficia ou industrializa espécimes provenientes da coleta,
apanha e pesca proibidas.

Art. 35. Pescar mediante a utilização de:


I - explosivos ou substâncias que, em contato com a água, produzam efeito semelhante;
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II - substâncias tóxicas, ou outro meio proibido pela autoridade competente:


Pena - reclusão de um ano a cinco anos.

Segundo o art. 35, a pesca mediante a utilização de explosivos ou substâncias que,


em contato com a água, produzam efeito semelhante; ou, ainda, com substâncias tóxicas, ou
outro meio proibido pela autoridade competente, é punível com reclusão de um ano a cinco
anos.

Art. 36. Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca todo ato tendente a retirar, extrair,
coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos,
moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas
as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora.

Nos termos do art. 36 da lei n. 9.605/98, a pesca está relacionada aos peixes,
crustáceos, moluscos e vegetais hidróbios, não fazendo relação aos mamíferos marinhos.
Assim, a captura sem autorização de baleias e golfinhos configuraria caça e não pesca, senão
vejamos:
Art. 36. Para os efeitos desta Lei, considera-se pesca todo ato tendente a retirar,
extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes dos grupos dos peixes, crustáceos,
moluscos e vegetais hidróbios, suscetíveis ou não de aproveitamento econômico, ressalvadas
as espécies ameaçadas de extinção, constantes nas listas oficiais da fauna e da flora. No
entanto, deve-se ressaltar que a Lei n. 7.643/87 utiliza a terminologia pesca ao tratar dos
cetáceos (mamíferos marinhos como a baleia e o golfinho). A referida lei proíbe a pesca, ou
qualquer forma de molestamento, de cetáceos nas águas jurisdicionais brasileiras.

Art. 37. Não é crime o abate de animal, quando realizado:


I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família;
II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais,
desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente;
III - (VETADO)
IV - por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente.

DOS CRIMES CONTRA A FLORA E AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em
formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
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Inicialmente, importa esclarecer que as áreas de proteção permanentes atualmente


estão determinadas pela Lei n. 12.651/12 que estejam cobertas ou não de vegetação nativa.
Tais áreas objetivam preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a
biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas. Neste contexto, o art. 38 da Lei n. 9.605/98 tipifica os atos destrutivos
contra as florestas de proteção permanentes, determinando em seu parágrafo único a redução
da pena à metade se o crime for culposo.

Art. 38-A. Destruir ou danificar vegetação primária ou secundária, em estágio avançado ou


médio de regeneração, do Bioma Mata Atlântica, ou utilizá-la com infringência das normas de
proteção:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

O art. 38-A assim como o anterior, visa a proteção da vegetação, todavia a


doutrina o compreende como um tipo especial em relação ao outro. No tipo penal,
determina-se como bem jurídico protegido vegetação primária ou secundária de regeneração
da Mata Atlântica, tratando-se da proteção da vegetação de forma ampla para o bioma.
Destaca-se ainda que o art. 38-A trata-se de norma penal em branco, tendo em vista que para
o seu pleno conhecimento e aplicação, faz-se necessário adentrar nas normas de proteção
ambiental direcionadas ao bioma objeto da tipificação, as quais encontram-se na Lei n.
11.428/2006. Neste caso, também se aplica a redução da pena para os crimes culposos.

Art. 39. Cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão da
autoridade competente:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Ainda na proteção da vegetação, o art. 39 tipifica o corte não autorizado das


árvores de florestas de proteção permanente. O referido artigo se apresenta mais delimitado
que o art. 38, o qual busca a proteção das mesmas áreas, contudo, no presente caso a
tipificação atinge um ato específico que, em casos excepcionais, pode ser autorizado pelo
poder público.

Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o
art. 27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 1º Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral as Estações Ecológicas, as
Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios de Vida
Silvestre.
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§ 2º A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades


de Conservação de Proteção Integral será considerada circunstância agravante para a fixação
da pena.
§ 3º Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.

As unidades de conservação são espaços, incluídas as águas jurisdicionais, com


características naturais relevantes. São legalmente instituídos pelo Poder Público objetivando
a conservação de seus recursos a partir do estabelecimento de limites para a sua utilização.
Além do território da área de conservação, pune-se ainda o dano às áreas circundantes num
raio de 10 km, independentemente de sua localização.
Existem dois tipos de Unidades de Conservação, as de proteção integral e as de
uso sustentável. As Unidades de Proteção Integral têm como objetivo básico a preservação da
natureza e é admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais. O parágrafo primeiro
do art. 40 qualifica como Unidades de Conservação Integral as Estações Ecológicas, as
Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais e os Refúgios de Vida
Silvestre.
Já o §2º determina uma circunstância agravante que é aplicável ao delito em tela,
ao passo que torna mais grave os danos que afetem a espécies em extinção no interior das
unidades de conservação, as quais detém especial proteção da legislação ambiental. Por fim, a
este delito também se aplica a redução da pena à metade no caso de crime culposo, conforme
determina o §3º.

Art. 40-A
§ 1º Entende-se por Unidades de Conservação de Uso Sustentável as Áreas de Proteção
Ambiental, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico, as Florestas Nacionais, as Reservas
Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as
Reservas Particulares do Patrimônio Natural.
§ 2º A ocorrência de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades
de Conservação de Uso Sustentável será considerada circunstância agravante para a fixação
da pena.
§ 3º Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.

Não obstante tenha sido o caput do art. 40-A vetado, os parágrafos 1º a 3º


continuam em vigor e dispõem sobre as Unidades de Conservação de Uso Sustentável.
As Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com
o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais, sendo, então, permitido o uso direto
de seus recursos. O §1º do art. 40-A caracteriza como unidades de conservação de uso
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sustentável as Áreas de Proteção Ambiental, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico, as


Florestas Nacionais, as Reservas Extrativistas, as Reservas de Fauna, as Reservas de
Desenvolvimento Sustentável e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural. Por sua vez,
os §2º e §3º admitem a aplicação da agravante e da causa de redução de pena acima descritos
nos casos de danos contra as Unidades de Conservação de Uso Sustentável.

Art. 41 Provocar incêndio em mata ou floresta.

O dispositivo supracitado tipifica a conduta de provocar incêndio em mata ou


floresta. Dessa forma, a pena cominada é de reclusão de 02 (dois) a 04 (quatro) anos, quando
na modalidade dolosa, bem como aplicação de multa. Na hipótese em que se verifique culpa,
a pena será de detenção de 06 (seis) meses a 01 (um) ano e multa.

Art. 42 Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas
florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento
humano.

Em ato contínuo, o artigo 42 prevê a conduta de fabricar, vender ou transportar


balões passíveis de provocar incêndios em quaisquer espécies de vegetação. Este delito será
punível com a detenção de 01 (um) a 03 (três) anos ou multa, podendo, ainda, serem
cumuladas tais penalidades.

Art. 43 Fazer ou usar fogo, por qualquer modo, em florestas ou nas demais formas de
vegetação, sem tomar as precauções necessárias para evitar a sua propagação (VETADO).

O dispositivo em comento foi vetado, haja vista ter sido a expressão “precauções
necessárias” considerada demasiadamente imprecisa, o que poderia dar ensejo a aplicações
abusivas ou desproporcionais e, consequentemente, causar certa insegurança jurídica.

Art. 44 Extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente,


sem prévia autorização, pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais.
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O caput deste dispositivo estabelece, como crime ambiental, a extração de


recursos das florestas de domínio público, sem que haja prévia autorização legal. A pena
cominada é de 06 (seis) meses a 01 (um) ano de detenção, bem como aplicação de multa.

Art. 45. Cortar ou transformar em carvão madeira de lei, assim classificada por ato do Poder
Público, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou
não, em desacordo com as determinações legais.

O dispositivo em comento tipifica a conduta de extrair ou transformar em carvão


madeira de lei, independentemente dos fins (sejam econômicos, ou não). A pena cominada
traduz detenção de 01 (um) a 02 (dois) anos e multa.

Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e
outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada
pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final
beneficiamento.

O art. 46 elenca a recepção ou aquisição de produtos de origem vegetal, sem a


prévia exigência de comprovação de licença para comercialização outorgadas por autoridade
competente. É mister ressaltar, que a venda, depósito ou transporte destes produtos sem o
porte de licença outorgada também incorrerá em crime ambiental. De fato, a pena cominada
para ambas as condutas será a mesma, qual seja detenção de 06 (seis) meses a 01 (um) ano e
multa.

Art. 47. Exportar espécie vegetal, germoplasma ou qualquer produto ou subproduto de


origem vegetal, sem licença da autoridade competente (VETADO).

O dispositivo mencionado foi submetido a veto, em razão da indução à


interpretação de que entidades administrativas indeterminadas teriam que fornecer licença
para a exportação de quaisquer produtos vegetais ou subprodutos de origem vegetal, ainda
que de espécies não tuteladas por legislação ambiental.
Com efeito, a biodiversidade e a proteção de espécies vegetais nativas, devido a
sua importância e amplitude, devem ser objeto de normas específicas e uniformes.
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Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de


vegetação.

Ademais, ainda de acordo com as previsões legais, impedir ou dificultar a


regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação consiste em crime ambiental
punível com detenção de 06 (seis) meses a 01 (um) ano e multa.

Art. 49. Destruir, danificar, lesar ou maltratar, por qualquer modo ou meio, plantas de
ornamentação de logradouros públicos ou em propriedade privada alheia:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. No crime culposo, a pena é de um a seis meses, ou multa.

Ao referido artigo, cabe a reflexão sobre o princípio da intervenção mínima e da


proporcionalidade. Vale refletir se os danos às plantas ornamentais privadas realmente
merecem tutela penal, à luz desses princípios.

Art. 50. Destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas,
protetora de mangues, objeto de especial preservação:
Pena - detenção, de 03 (três) meses a 01 (um) ano, e multa.

Art. 50-A. Desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em


terras de domínio público ou devolutas, sem autorização do órgão competente: (Incluído pela
Lei n.º 11.284, de 2006)
Pena - reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa. (Incluído pela Lei n.º 11.284, de 2006)
§ 1.º Não é crime a conduta praticada quando necessária à subsistência imediata pessoal do
agente ou de sua família. (Incluído pela Lei n.º 11.284, de 2006)
§ 2.º Se a área explorada for superior a 1.000 ha (mil hectares), a pena será aumentada de 1
(um) ano por milhar de hectare. (Incluído pela Lei n.º 11.284, de 2006)

É crime não só o desmatamento ou degradação da floresta, mas também a simples


exploração econômica, ainda que não gere dano ambiental algum, visto que as as terras
devem ser públicas. O §1º descreve o estado de necessidade (excludente de ilicitude) e o §2º o
aumento de pena incomum – aumenta-se 1 ano de pena por cada mil hectares explorados.

Art. 51. Comercializar motosserra ou utilizá-la em florestas e nas demais formas de


vegetação, sem licença ou registro da autoridade competente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
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Art. 52. Penetrar em Unidades de Conservação conduzindo substâncias ou instrumentos


próprios para caça ou para exploração de produtos ou subprodutos florestais, sem licença da
autoridade competente:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.

Traz um tipo penal que pune atos preparatórios (intenção de caça ou exploração),
sendo considerado crime formal (basta o ingresso nas unidades de conservação com os
instrumentos citados). O crime se consuma com o simples ingresso, independente de ocorrer a
caça ou exploração – consumação antecipada. Ocorrendo a caça ou a exploração responderá
pelo crime mais grave (de caça – Art 29 §4º inciso V e dano a unidade de conservação – Art
40), ficando este crime do art. 52 absolvido por ser crime meio.

Art. 53. Nos crimes previstos nesta Seção, a pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um
terço) se:
I - do fato resulta a diminuição de águas naturais, a erosão do solo ou a modificação do
regime climático;
II - o crime é cometido:
a) no período de queda das sementes;
b) no período de formação de vegetações;
c) contra espécies raras ou ameaçadas de extinção, ainda que a ameaça ocorra somente no
local da infração;
d) em época de seca ou inundação;
e) durante a noite, em domingo ou feriado.

Entende-se nesse artigo, as causas gerais de aumento de pena aplicáveis a todos os


crimes contra a flora e unidades de conservação. Se já houver agravantes idênticas especiais,
afasta-se as gerais devido ao princípio da especialidade.

DOS CRIMES DE POLUIÇÃO E FALTA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL

Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar
em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição
significativa da flora:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º Se o crime é culposo:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
§ 2º Se o crime:
I - tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
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II - causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos
habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III - causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de
água de uma comunidade;
IV - dificultar ou impedir o uso público das praias;
V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou
substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando
assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano
ambiental grave ou irreversível.

O delito disposto no artigo 54 possui natureza formal, sendo suficiente a


potencialidade de dano à saúde humana para configuração delitiva. Ainda, a conduta será
punível com reclusão, de um a quatro anos, e multa, e, caso seja culposo, a detenção será de
seis meses a um ano, e multa.
É importante destacar a previsão de que a poluição seja capaz de resultar danos à
saúde, visto que, como toda forma de poluição causa prejuízos à saúde de seres vivos,
demonstrou-se o interesse do legislador em punir apenas aquelas com níveis insuportáveis.
Assim, é preciso que a poluição seja capaz de causar danos à saúde de pessoas e, em relação
aos animais e vegetais, é essencial que resultem em mortandade ou destruição.
Ademais, por se tratar de uma conduta que deixa vestígios, existe a discussão se
deve ser seguida a previsão do art. 158 do Código de Processo Penal que dispõe sobre a
indispensabilidade do exame de corpo de delito. No entanto, a Terceira Turma do STJ
entendeu pela dispensa da realização de perícia por se tratar de crime formal, sendo suficiente
a potencialidade delitiva para a configuração do crime.
Por fim, ressalta-se que, conforme o parágrafo 3º, incorre nas mesmas penas quem
deixar de adotar as medidas de precaução necessárias em casos de risco de dano ambiental
grave ou irreversível quando for exigido pela autoridade competente.

Art. 55. Executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem a competente
autorização, permissão, concessão ou licença, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem deixa de recuperar a área pesquisada ou
explorada, nos termos da autorização, permissão, licença, concessão ou determinação do
órgão competente.
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Esse tipo penal busca evitar que atividades potencialmente degradadoras sejam
realizadas sem chancela estatal. Assim, o objetivo é a proteção do meio ambiente, a
preservação da natureza e o desenvolvimento sustentável, de modo a resguardar os direitos
fundamentais da pessoa humana.
O sujeito ativo dessa conduta é amplo, podendo ser pessoa física ou jurídica,
incluindo diretor, administrador, auditor, membros de conselhos e entre outros quando
puderem agir para impedir o comportamento ilícito. Já o sujeito passivo, será toda a coletiva
e, de forma indireta, o proprietário da área explorada, como a União.
Por fim, apesar do aparente conflito do artigo supramencionado com o art. 2º da
Lei nº. 8.176/91, que define crimes contra a ordem econômica e protege o patrimônio da
União, os tribunais entendem que as leis tutelam bens jurídicos distintos e, por conta disso, a
aplicação não configura bis in idem.

Art. 56. Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar,
armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva
à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis
ou nos seus regulamentos:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1o Nas mesmas penas incorre quem:
I - abandona os produtos ou substâncias referidos no caput ou os utiliza em desacordo com as
normas ambientais ou de segurança
II - manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá destinação
final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou regulamento.
§ 2º Se o produto ou a substância for nuclear ou radioativa, a pena é aumentada de um sexto a
um terço.
§ 3º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.

O art. 56 da Lei 9.605/98 prevê que constitui crime o armazenamento de


substância tóxica e nociva à saúde humana em desacordo com as “exigências estabelecidas
em lei ou nos seus regulamentos”. Trata-se, portanto, de norma penal em branco, a qual
necessita de um complemento em norma infraconstitucional para que se especifique o tipo
penal no que tange à “lei” ou ao “seu regulamento” aptos de serem infringidos.A interpretação
do tipo de crime deve ser restritiva, sob pena de alargamento da incriminação e a consequente
sanção por violação dos princípios da legalidade e da reserva legal. Nesse sentido, os termos
“lei” e “seus regulamentos” devem ser entendidos em sentido estrito de acordo com suas
definições constitucionais. Dessa forma, o termo “lei” deve ser interpretado como lei
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ordinária, complementar ou delegada oriunda do processo legislativo, conforme o artigo 59 da


Constituição Federal. Da mesma forma, o termo “regulamento” deve ser interpretado como
norma subordinada a uma lei, expedida para a sua efetiva execução, conforme o artigo 84 da
Constituição Federal.

Art. 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do
território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem
licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e
regulamentares pertinentes:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

No que tange o crime do artigo 60 da Lei dos Crimes Ambientais, a doutrina e a


jurisprudência divergem quanto a sua caracterização. O que prevalece, porém, é a ideia de que
se trata de um delito de mera conduta, o qual não há a necessidade de produção de resultado
naturalístico e de perigo abstrato, fato que dispensa a produção de prova pericial. No entanto,
mais recentemente diversas decisões dos tribunais vêm caracterizando o delito como de
perigo concreto ou até como crime de dano. Mais recentemente, a 5ª Turma teve oportunidade
de se manifestar sobre o tema, registrando na ementa do acórdão o caráter de perigo abstrato
do delito, verbis: VII - O crime previsto no art. 60 da Lei n. 9.605/98 é de perigo abstrato, do
qual não se exige prova do dano ambiental, sendo certo que a conduta ilícita se configura com
a mera inobservância ou descumprimento da norma, pois o dispositivo em questão pune a
conduta do agente que pratica atividades potencialmente poluidoras, sem licença ambiental.
Um dos verbos mais comuns do tipo criminal em questão é o de construir
empreendimento que seja potencialmente poluidor sem licença ambiental. Veja-se que a mera
conduta de fazer a obra sem passar anteriormente pelo processo de licenciamento já coloca o
meio ambiente em risco, e é por isso que o delito se consuma antecipadamente.
Também estamos frente a uma norma penal em branco, isto porque não é qualquer
atividade que pode configurar o ilícito. Somente devem ser consideradas aquelas que constam
em listas, tabelas, enfim, em atos administrativos ou em normas propriamente ditas que
elenquem um rol de atividades potencialmente poluidoras.
A verificação da ocorrência do crime depende apenas da verificação se a atividade
empreendida ou que tenha sido praticada em contrariedade com o regulamento está listada
como potencialmente poluidora. Grande parte delas constam da Resolução Conama 237/97,
mas esse rol não é exaustivo. Podem os estados e os municípios listar outras atividades como
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potencialmente poluidoras, dado que compete a todos os entes federados a defesa do meio
ambiente, na forma do artigo 23, VI, da CF.
Diante disso, embora as divergências existentes, defendemos, conforme a mais
moderna orientação do STJ, que o crime do artigo 60 da Lei dos Crimes Ambientais é de
mera conduta e de perigo abstrato.

Art. 61. Disseminar doença ou praga ou espécies que possam causar dano à agricultura, à
pecuária, à fauna, à flora ou aos ecossistemas:Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Nota-se a definição clara e objetiva somente da modalidade dolosa, porém


estabelecendo-se pena menor. Com relação ao bem jurídico tutelado, este se refere à
incolumidade pública; sendo o sujeito ativo desse crime, qualquer pessoa, e o sujeito ativo, a
sociedade. Admite a tentativa, mas só intencional. Assim houve a diminuição da penalidade
delimitada pelo artigo 61 da Lei dos Crimes Ambientais.
Ademais, o Código Penal traz o art. 259 que também traz tipificação do crime de
difusão de doença ou praga. Há uma definição clara e objetiva da modalidade dolosa e
culposa. Com relação ao bem jurídico tutelado, este se refere à incolumidade pública, sendo o
sujeito ativo desse crime, qualquer pessoa; e o sujeito passivo, a sociedade. Admite-se a
tentativa. Hoje praticamente não há a aplicação do artigo 259 do Código Penal devido à ideia
de condição de revogação tácita à que se submeteu esse artigo com a advinda do Art. 61 da
Lei de Crimes Ambientais.
DOS CRIMES CONTRA O ORDENAMENTO URBANO E O PATRIMÔNIO
CULTURAL

Art. 62. Destruir, inutilizar ou deteriorar: I - bem especialmente protegido por lei, ato
administrativo ou decisão judicial; II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca,
instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem
prejuízo da multa.

O crime do art. 62 possui três núcleos que seriam a destruição, inutilização ou


deterioração do bem, e se difere do art. 165 do Código Penal, o qual fora revogado, pois no
tipo penal presente a pena é mais grave e prescinde do ato formal de tombamento, que seria
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um ato administrativo que protege o interesse público a depender do valor cultural de um


bem.
Assim, nesse tipo penal não é exigido o tombamento, pois reflete a disposição da
Constituição Federal que entende que a proteção do patrimônio cultural na verdade se dá por
meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, além de outras
formas de acautelamento e de preservação.
À luz do inciso I, o dano pode atingir bens móveis ou imóveis, públicos ou
particulares. Explicitam-se no inciso II os arquivos, registros, museus, bibliotecas,
pinacotecas, instalações científicas ou similares protegidos por lei, ato administrativo ou
decisão judicial.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, física ou jurídica, podendo o crime ser
praticado por ação ou por omissão. O dolo, na corrente tradicional, é genérico.
Na forma omissiva, relevante é acentuar que, em face da responsabilidade que tem
o proprietário de conservar o bem tombado a não realização de obras ou reparos na coisa
tombada, quando possível fazê-lo, pode levar à inutilização, total ou parcial, à deterioração
ou, até mesmo, à destruição do bem. Em tal situação, estaremos diante de um crime omissivo
impróprio ou comissivo por omissão.
O crime admite a forma culposa, sendo punível, nesse caso, com pena de detenção
de seis meses a um ano, além de multa
Art. 63. Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei,
ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico,
artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem
autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida:
Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Esse artigo prevê que a autorização para proceder a alterações é exigível não
apenas em relação aos bens tombados, levando-se em conta, também, as demais formas de
proteção já referenciadas.
A autorização a que se refere o dispositivo constitui manifestação do poder
discricionário da Administração. A negação da autorização, que, aliás, deverá ser
necessariamente motivada, poderá ser, porém, revista pelo Judiciário, o que elidirá a ilicitude
do fato, com a determinação judicial de expedição da autorização pretendida pelo particular.
Em contrapartida, a autorização do Poder Público suspensa pelo Judiciário por vício de
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ilegalidade, em sede de ação civil pública ou ação popular, p. ex., não tem o condão de afastar
a caracterização do crime, que poderá ser praticado em concurso com o delito de
desobediência à ordem judicial
O tipo penal desenhado neste artigo exige o dolo (na doutrina tradicional, dolo
genérico) para a sua caracterização. A pessoa física ou jurídica que saiba ou esteja em
condições de saber que o bem é alvo de proteção e, ainda assim, procede às alterações nele, à
revelia da autoridade administrativa, deve responder pelo crime. A consumação do delito
dá-se com a efetiva implementação da alteração sem a competente autorização administrativa
ou com a realização da modificação em desacordo com o que fora autorizado. Admite-se
tentativa.

Art. 64. Promover construção em solo não edificável, ou no seu entorno, assim considerado
em razão de seu valor paisagístico, ecológico, artístico, turístico, histórico, cultural, religioso,
arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em
desacordo com a concedida:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.

O art. 64 da Lei n. 9.605/98, à sua vez, guarda relação com o disposto no art. 18
do Decreto-Lei n. 25/37, segundo o qual, sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional (hoje IPHAN), no âmbito federal, não se poderá fazer
construção que impeça ou reduza a visibilidade da coisa tombada. Protege-se, a um só tempo,
o ordenamento urbano e o patrimônio cultural. Agora, além da multa administrativa e da
demolição da obra ali previstas, a construção em área não-edificável, em razão do rol
axiológico do art. 64, ou em seu entorno, constitui crime, se não houver autorização do órgão
incumbido da preservação do patrimônio cultural, ou se a obra for realizada em desacordo
com o que fora autorizado. Note-se que não se exige apenas a figura do tombamento. Assim, a
conduta delitiva pode pressupor tanto o tombamento como outras modalidades de proteção
referenciadas no art. 216, § 1°, da Constituição Federal. O crime pode ser praticado por
qualquer pessoa física ou jurídica, ainda que não seja a proprietária da área. O dolo é essencial
ao aperfeiçoamento do tipo penal. Não há a forma culposa. O crime do art. 64 considera-se
consumado com o mero início da construção, admitindo-se, pois, a tentativa.

Art. 65. Pichar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.
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§ 1o Se o ato for realizado em monumento ou coisa tombada em virtude do seu valor artístico,
arqueológico ou histórico, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa.
§ 2o Não constitui crime a prática de grafite realizada com o objetivo de valorizar o
patrimônio público ou privado mediante manifestação artística, desde que consentida pelo
proprietário e, quando couber, pelo locatário ou arrendatário do bem privado e, no caso de
bem público, com a autorização do órgão competente e a observância das posturas municipais
e das normas editadas pelos órgãos governamentais responsáveis pela preservação e
conservação do patrimônio histórico e artístico nacional.

Verifica-se a preocupação do legislador penal não apenas com o patrimônio


cultural, mas também com o valor estético do meio urbano. Tutela-se, pois, o ordenamento
urbano e, no caso do parágrafo único, a higidez do patrimônio cultural. Sobreleva a questão
urbanística, especialmente no que toca à preservação estética das edificações ou monumentos,
ainda que não tombados. Segundo registra José Nilo de Castro, citando Louis Jacquignon, “o
urbanismo se define como a arte de conceber a readaptação das cidades sobre dados
demográficos, econômicos, estéticos e culturais, visando o bem-estar humano e a proteção do
meio ambiente”.
A preocupação, como visto, não é somente com o embelezamento da cidade, mas,
sobretudo, com o significado disso, no contexto de uma regular urbanização, para a promoção
da sadia qualidade de vida em prol dos membros da urbe. Ao reprimir penalmente o
comportamento de grafiteiros e pichadores que, em gestos de vandalismo, se dedicam, por
estranho prazer, a sujar edificações e monumentos, a Lei aponta a importância da preservação
estética e paisagística dos espaços habitáveis, visando à garantia de um ambiente urbano
saudável. Questiona-se, porém, sob a perspectiva de um direito criminal de intervenção
mínima, a efetiva necessidade de tutela penal em se tratando de edificações e monumentos
despidos de um valor cultural subjacente. Não seria bastante a imposição de sanção de
natureza administrativa? Cremos que sim. Por outro lado, o tipo penal em tela realiza-se por
meio de três ações físicas: pichar, grafitar e conspurcar. Pichar, em sua literalidade, significa
untar com piche. Aqui, é utilizado o verbo no sentido de sujar com pinturas sobrepostas à
opção estética contida na edificação ou no monumento, pinturas estas que, por vezes,
assumem formas grotescas e ininteligíveis. Grafitar quer significar aquela ação consistente em
escrever palavras ou frases “geralmente de caráter jocoso ou informativo, contestatório ou
obsceno” (vide Dicionário Aurélio) ou, ainda, desenhar figuras com tais características. Neste
último sentido, identifica-se com o ato de pichar.
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A expressão conspurcar, mais ampla e, aliás, pouco precisa, abrange quaisquer


outros atos que impliquem sujar, corromper ou macular as edificações ou monumentos. A
pena, nos termos do parágrafo único, é mais severa em se tratando de dano a monumento ou
coisa tombada, em virtude do seu valor artístico, arqueológico ou histórico. Lamentavelmente,
o dispositivo restringiu a causa de aumento de pena às ações voltadas contra monumento ou
coisa tombada. Aludindo especificamente ao tombamento, a norma acaba por excluir, com
efeito, as demais formas de proteção, em evidente descompasso com o interesse maior de
tutelar o patrimônio cultural.
Ainda com relação ao parágrafo único, verifica-se nova referência a monumentos.
Distinguem-se, pois, na norma, monumentos tombados e monumentos não-tombados (caput),
conferindo-se aos primeiros proteção penal mais incisiva, demonstrável por meio da pena
mais elevada. O tipo penal em tela exige o dolo. Não há forma culposa. A tentativa é
admissível.

COMPETÊNCIA PARA JULGAR CRIMES AMBIENTAIS

Antes da edição da Lei n. 9.605/98 predominava o entendimento sintetizado na


súmula 91 do STJ: “Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados
contra a fauna”. Entendia-se, à época, que os animais silvestres incluíam-se entre os bens da
União, atraindo a competência da Justiça Federal.
Editada a referida lei, o STJ cancelou a súmula valendo-se do argumento de que a
atribuição de competência concorrente aos entes federativos para legislar e comum para
proteger o meio ambiente retirou da União a propriedade da fauna silvestre.

De fato, em sendo a proteção do meio ambiente matéria de competência comum

da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e inexistindo, quanto aos crimes
ambientais, dispositivo constitucional ou legal expresso sobre qual a Justiça competente para
o seu julgamento, tem-se que, em regra, o processo e o julgamento dos crimes contra o meio
ambiente é de competência da Justiça Comum Estadual.

A competência da Justiça Federal, no caso específico dos crimes ambientais, só se

faz presente quando existir qualquer lesão direta e imediata a bens, serviços ou interesses da
União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas (artigo 109, IV, da CF).
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Avis atrativada Justiça Federal, como já dito, exerce-se a partir dos três elementos

contidos no inc. IV, do art. 109, da CF: em detrimento de bem, serviço ou interesse da União
ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas. Não é necessário para atrair a
competência federal que os três elementos estejam presentes na mesma infração. Basta que só
um seja tocado pelo crime para a configuração da norma de fixação da competência criminal
geral da Justiça Federal.

Para a incidência da norma constitucional (art. 109, IV), basta a ofensa direta a

bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas,


não sendo necessária a ocorrência de efetivo prejuízo.

OFENSA A BEM PÚBLICO DA UNIÃO

Os bens da União estão elencados no art. 20, da Constituição Federal. Pode-se

conceituar dano ou ofensa a bem como o prejuízo (uma alteração negativa da situação
jurídica, material ou moral) causado a alguém por um terceiro. O dano ambiental, portanto, é
a ofensa jurídica, material ou moral ao titular de um meio ambiente sadio e de qualidade. Na
verdade, o conceito de dano ambiental, assim como o de meio ambiente, é aberto, ou seja,
sujeito a ser preenchido casuisticamente, de acordo com cada realidade concreta que se
apresente ao intérprete.
O conceito de bens de um ente federal transcende a noção privatística de
patrimônio, no sentido do conjunto de relações de créditos e débitos de uma determinada
pessoa. Patrimônio de um ente federal será, por conseguinte, o conjunto de todos os bens,
sejam eles de qualquer natureza, sob domínio público ou privado, afetados a seu próprio uso
ou ao uso direto ou indireto da coletividade. Na prática, pode ser atingido um número
incomensurável de objetos. É irrelevante, portanto, para a configuração do dano a bem da
União, se este é material ou imaterial, se causa ou não efetivo prejuízo.
Não se pode confundir patrimônio nacional com bem (ou patrimônio) da União. O
patrimônio nacional é algo que pertence à população de determinado país indistintamente, de
forma que todos os nacionais se identificam, querem cuidar e preservar, enquanto o
patrimônio federal é aquele atribuído à União, que assume a titularidade do bem, tendo o
dever e a responsabilidade de proteger.
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Serviços da União (ou de entidades autárquicas e empresas públicas)

Serviço é trabalho na sua acepção ampla e fundamental, podendo ser realizado


não só através dos recursos humanos (trabalho humano) como também através das máquinas e
equipamentos (trabalho mecânico) (Meirelles, 2006, p. 130).
Os serviços da União são as atribuições determinadas pela Constituição Federal,
nos arts. 21 e 22. Serviço, tal como aparece no inc. IV, do art. 109, refere-se aos encargos, às
atribuições e às finalidades conferidas à União e aos demais entes. Como os serviços
prestados pela União e os outros entes (entidades autárquicas e empresas públicas) são
enormes e variados, inúmeros são os crimes que podem ser cometidos. O dano ou prejuízo
pode ser econômico ou moral.

Interesses da União (ou de entidades autárquicas e empresas públicas)

Os interesses da União (e das entidades autárquicas e empresas públicas)


decorrem da preservação de seus bens (dever constitucional), da realização dos seus serviços
e do exercício de suas atribuições. O dano pode ser econômico ou moral.

Não é qualquer interesse que atrai a competência da Justiça Federal. Deve ser um
interesse federal qualificado, ou seja, direto, específico e imediato . É esse interesse jurídico
qualificado, direto ou imediato, a medida verdadeira que torna competente a Justiça Federal
para prestar a tutela penal ambiental.

ROMPIMENTO DAS BARRAGENS DE REJEITOS DA VALE S.A EM


MARIANA/MG E BRUMADINHO/MG

O dia 5 de novembro de 2015 ficou marcado na memória do país como o dia do


rompimento da Barragem da Samarco/BHP Billiton, no município de Mariana (MG), um dos
maiores crimes ambientais da História.
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O colapso ocorreu aproximadamente às 15h30, na barragem de Fundão, e liberou


imediatamente mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeito de minério de ferro, além de
outros 16 milhões de rejeitos que continuaram escoando em seguida. A onda de rejeitos
soterrou a comunidade de Bento Rodrigues, ceifando 19 vidas e desalojando centenas de
famílias. O mar de lama tóxica também atingiu outras localidades e diversas comunidades
rurais.
Sem menosprezar, ou mesmo diminuir as mortes ocorridas, há de se destacar o
impacto ambiental causado pelo despejo de minérios de ferro em toda a região de Mariana -
MG e municípios circunvizinhos. Segundo Laudo Técnico Preliminar elaborado pelo Ibama à
época, o acidente causou, dentre outras coisas:

● Destruição de 1.469 hectares ao longo de 77km de curso d'água, incluindo


áreas de preservação permanente;
● Mortandade de biodiversidade aquática e fauna terrestre;
● Assoreamento de cursos d'água;
● Perda e fragmentação de habitats naturais;
● Restrição ou enfraquecimento dos serviços ambientais dos ecossistemas;
● Alteração dos padrões de qualidade da água doce, salobra e salgada da região;

Após percorrer dezenas de quilômetros, a avalanche de rejeitos atingiu o rio Doce,


até desaguar no Oceano Atlântico. Este trajeto percorrido resultou em incontáveis danos
econômicos, sociais e ambientais gravíssimos, além das vidas perdidas. Os prejuízos,
incalculáveis, perduram até hoje, e projetam-se sobre o futuro da comunidade atingida, sem
previsão de que terão um fim próximo.
Após seis anos do crime, os responsáveis ainda não foram devidamente
responsabilizados e a população segue esperando indenização. Os atingidos não receberam
nenhuma das casas prometidas pela Renova (representante da Samarco, Vale e BHP), a justiça
segue prorrogando prazos a pedido da mineradora e o acordo de reparação foi negado pelo
Estado de Minas tendo em vista que a Vale propôs realizar o pagamento de 110 bilhões em 20
anos. O caso seguirá na Justiça.
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A tragédia ocorrida em Brumadinho, no dia 25 de janeiro de 2019, novamente


levantou a discussão sobre a validade da exploração predatória e desenfreada que causa dano
tanto às pessoas quanto à natureza e mais do que isso, por que nada é feito para evitar as
perdas humanas, da fauna e flora, mesmo sendo estes eventos totalmente previsíveis.
Apesar de todo sofrimento humano e danos ao ecossistema, como a morte de
pessoas e animais, além de alto número de desaparecidos e toneladas de rejeitos tóxicos
despejados na cidade num enorme rio de lama, a tragédia em Brumadinho parece mostrar que
nada foi feito, mudado ou aprendido e, novamente, outra barragem da Vale S.A. se rompeu.
Há de se verificar a responsabilidade dos envolvidos no ocorrido:

1. A empresa

A gigante Samarco e as corporações que a compõem devem ser responsabilizadas


pelos danos causados ao ecossistema e às pessoas, afinal, há profissionais hábeis para
determinar a segurança e viabilidade de barreiras para impedir o fluxo dos resíduos e
mantê-los represados, por isso não se pode negar que houve um grande descaso.

2. O Estado

A função do Estado, numa economia de cunho capitalista ambientada numa


Democracia é gerenciar e fiscalizar determinados setores, sejam eles públicos ou privados, o
que significa que as empresas devem operar de forma autônoma, porém sob observação
estatal, que deve visar não ao lucro, mas ao bem-estar de toda nação e suas riquezas.
Logo, ao não fiscalizar ou não punir com rigor ações que deram origem às
tragédias de Mariana e de Brumadinho, o Estado se mostra uma estrutura omissa, que não
visa à população, mas termina por conceder isenções que, por fim, podem acarretar em danos
irreparáveis, como 270 vítimas da tragédia de Brumadinho.
As discussões recentes sobre o direito a terra, a exploração de recursos naturais, a
monetização de florestas, fauna e vida humana põem em evidência a existência de uma
mentalidade predatória que transpassa não apenas a política e a economia, mas toda
população, a qual termina por crer que é melhor lucrar do que preservar.
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Um debate que não existe mais em alguns países do mundo, como a Alemanha,
que visa integrar o desenvolvimento tecnológico e industrial com a manutenção de áreas
naturais, claro que essa lição foi aprendida a duras penas, porém mostra que é uma tarefa
possível de ser cumprida, cabe às pessoas também se conscientizarem para corrigir seus
governos.
Quanto ao crime da Vale em Brumadinho, o governo de Minas firmou acordo com
a empresa no valor de 37 bilhões, sendo que não há transparência nem participação popular na
definição de destinação desse recurso, não sendo possível garantir que esses recursos serão
destinados à reparação dos danos causados pela Vale. Os recursos foram distribuídos para
todos os Municípios de Minas, em clara política eleitoreira do Zema.

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