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ama

CASSANDRA RIOS

VENDA
PROIBIDA
AK
PARA
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DE 18 ANOS

Eiição

2 .
O PRAZER DE PECAR
CASSANDRA RIOS

0PRAZER DE PECAR

2a edição
1980

GAMA

Copyright 1979
GLOBAL EDITORA EDISTRIBUIDORA LTDA.

Revisão: Carlos Alberto Vicalvi


Capa: Carlos Clémen

N.° DE CATALOGO 1119

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Pequena. Um netro e cinqüenta e dois. Olhos grandes, cí
lios longos e recurvados, olhar
bonitas, flexíveis e lascivas nos expressivo unhas
e magnético. Mãos
movimentos,
duras, tipo bico de papagaio, assim haviam lhe dito recurvadas e
no Instituto
de Beleza que freqüentava. Cabelos de um
sos e brillhantes. Seios duros e eretos, ancas
loiro dourado, sedo
detalhes perfeitos que os apreciadores do belo harmoniosas. Enfim,
e estético não po
deriam deixar de apreciar. A simetria do desenho da boca sen
sual, prometia sorrisos ligeiros e maliciosos, lábios carnudos e um
pouco recurvados como as pétalas de um cravo oriental mal
desabrochados. As sobrancelhas de pelos castanhos
sido postas sobre a concavidade das pálpebras longaspareciam
ter
e mortiças
com o cuidado de um milagroso esteticista,
pupilas o brilho lúbrico da morbidez, suscitanto idéias eróticas,
como a fazer convites maliciosos ou desafios, impondo-se com
uma certa ironia ou até mesmo deboche, por sentir-se irresistí
vel, por saber que teria sob o seu domínio a quantos desejasse.
A graciosa e frágil silhueta que poderia ser comparada a
uma taça de cristal fácil de quebrar, pedindo cuidados especiais,
nada tinha de frágil, ao contrátio, o que logo podia se ver no
seu olhar era um espírito forte, dominador, a sinuosidade peri
gosa de uma cobra ou de algo maquiavéico.
Edde tinha na alma incertezas e conflitos e vivia perplexa
ante o mistério do seu próprio eu. Possuidora de graduada inte
ligência, raramente encontrava quem a pudesse rebater ou con
testar em qualquer assunto desenrolado, como também torna
va-se cada vez mais improvável encontrar alguém que conse
guisse compreendê-la, portanto preferia esmagar seus pensamen
tos e idéias dentro de um silêncio profundo.
Mórbida e absolutista tinha no espírito conflitos que, num
autodomínio, recalcava e combatia, conseguindo aparentar ser
indiferente e até vulgar. Raras vezes revoltava-se com o estilo
de vida que estava levando. Fechava-se no apartamento, lutando
para não largar tudo e começar nova vida, a que ela poderia ter
seguido não tivesse sido e não fosse sempre tão ambiciosa e per
dulária.
Ególatra, exigente, vaidosa, sequiosa, aventureira, incapaz de
apaixonar-se perdidamente, aponto de renunciar a si própria e
seguir sob o comando de outra pessoa, deixando todos os seus
sonhos ao largo, Edda queria para si e obrigava sutilmente quc
todas as atenções se voltassem para ela, tornando-se sempre o
alvo de todos os interesses e atração.
Qualquer pessoa tinha que se inclinar aos seus desejos para
poder se relacionar e se dar bem com ela
Intimidadora, decidida na palavra e na ação, nunca se sentia
bem ao lado de criaturas insípidas cujas palestras não conduzis
sem a nada. Paradoxalmente, incentivava com o olhar, para que
a pessoa pof quem se interessasse tomasse as atitudes que ela
queria que tivessem.

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Muito fácil de ser odiada e invejada, pelos seus
por aqueles que não
conseguiam predicados,
seus intentos, Edda nunca aproximar-se dela lucrando nos
amizades duradouras. Na demonstrava ter tido bases
sua vida agitada tudo era sólidas
de
personalidade forte e marcante fazia-atransitório
e passageiro. Sua
edesapegada, acintosa
quer materialista e dona de si.
quando percebia
desacordo em suas relações logo procurava qual
que lhe era horrível, acima de tudo, deixar dedesfazê-las, pois
qualquer situação. prevalecer em
Egocêntrica
natural de quem
e narcisista tinha
por si própria um orgulho
ela era linda. E teconhece
o que é e qual o
tica. Muito bem valor que tem. E
ao seu corpo, à sua posicionada na vida. Graças
querer. inteligência, ao seu fascínio, ao seu saber

Subira, vencera, chegara onde quisera na vida.


vaidades, luxos, tudo realizado. A casa de campo, os Caprichos,
quiosques, a piscina, o apartamento, os discos, os gramados,
de som, a banheira preta tipo aparelhos
piscina onde passava longas horas
letargicamente mergulhada na água morna,
encontrava num jato ou num
pensar, imaginar, querer e logo se
céus
navio, cortando horizontes como se a procura de outros
Ihe
e como se sob outros sÐis e luas fosse encontrar algo que
taltava para completar seu espírito e saciar sua fome e estancar
sua sequiosidade. Era aliberdade que lhe fazia mal. A liberdade
conseguida por uns momentos de prisão, em que ela deixava de
ser a Edda livre para servir alguém.
Embora tantas jóias forrando gavetas e
Não interessavam a ninguém e ela haveria de realizálos. Seu
coração não era de ninguém, por que não iria sacriticar-se p0f
idéia que justificaria sua conceituaço da vida no caminho pré
coração não era de ninguém, porque não iria sacrificat-se por
Seguira impulsos, sem medos, sem freios, sem rédeas, num
remoinho, girando, confundindo-se com o
naipes das cartas, blefando consigo mesma, embaralhamento, os
como o truntO maior nas usando a si própria
principais cartadas da vida.

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Edda estava começando a olhar para
da sua idade fitavam o trás onde outras jovens
Ela sentia-se assim com0horizonte, ambiciosas, cheias de ilusões.
se já tivesse até mesmo
arco-íris e encontrado o caldeirão de ouro
que
ultrapassado o
era
caldeirão de ouro e nada mais. somente um
Não era lá grande coisa sentir-se
o quanto almejasse. poderosa e poder ter tudo
Para esclarecer suas insatisfações
analisar e fizera sessões de psicodramaconsultara os mais famosos
e de análise, mas safra
exatamente como era, sem menos dinheiro porque isso
faltava e sem nada a acrescentar de novo em nunca Ihe
sua
permanecia uma brecha, um lado obscuro, um poço mente onde
negro, que
Para a mãe dera uma casa para morar,
conservando-a no
pròprio nome para que o padrasto não se arvorasse de
e sonhasse sequer direitos
vende-la.
As vezes sentia-se uma Casa de
que os parentes e amigos queriam
MisericÑrdia e reclamava
num Pátio de Milagres para transformarseu apartamento
conseguirem
mas acabava sempre atendendo aos com isso a sua ruína,
aumento o número de afilhados cujospedidos que lhe faziam e ia
pais interesseiros só visa
vam os bons presentes e
"dinheirinhos" que Edda em momentOS
de emoção para agradar aos outros ia
de
poupança para este e aquele.
depositando em cadernetas
Capaz de tão grandiosas coisas para o
familiares e amigos, Edda, entretanto começavabem-estar dos seus
a vergar-se numa
insatisfação doentia.
É que maior parte do
tempo, embora dispusesse e pudesse
usufruir de toda liberdade via-se farta de ficar naquele imenso
apartamento de móveis caríssimos, super-modernos, num requin
tado luxo, distraindo-se a folhear revistas,
assistindo
namorando os objetos decorativos, ora estirada sobretelevisão,
enorme
cama redonda, ota deitada nos almofadões de cores claras
sob
focos de luzes mortiças coloridas, num ambiente
agradável, sensual e luxurioso onde a música nunca romântico
e
faltava e os
perfumes estavam sempre tenovando o ar, enquanto os seus pen
samentos inventavam coisas para distraí-la, para arrancá-la da
monotonia de tanta beleza rica, mas melancólica.
As luzes suaves, a música doce, o coquetel saboroso, o
pensamento licencioso, o livro pornogrático, as cenas eróticas,
as emoções palpitando na carne. Sempre o sexo como
nota
mais ressonante e forte exigindo dela o máximo que podia vi
brar. E sonhava coisas que só uma libertina ousaria
sonhar,
haviam arrancado daquela união feita por amor; seus pais tantas
pois tinhar
vezes contavam o quanto haviam sido apaixonados,
uma
bela história de amor para lembrar, amor de gente simples,
mas honesta e decente.
Decentes até o dia em que começaram a surgir as dificul.
dades e tiveram início as primeiras brigas. Brigas violentas, de.
semprego, bebedeira. Brigas comuns e corriqueiras entre casais.
mas que foram criando, naquela menina hiper-sensivel, uma
tevolta. O pai chegando bêbado, a mãe reclamando o dinheiro
das compras, do aluguel, da luz, do carvão. Edda
Edda latrgou a revista num gesto lerdo. Que adiantava in
sistir olhando aqueles quadrinhos se as legendas eram feitas pelos
seus próprios pensamentos que a arrastavam num turbilhão de
tristezas e frustrações? Se o tédio, a monotonia e a ânsia pertur
bavam-na? Por que? Pelo que? Oihou ao redor. Tinha tudo.
Boas roupas, dinheiro patra perder no carteado, para comprar o
Tinha
que quisesse e ir aonde bem entendesse. Mas estava sÑ.
alguém que lhe pertencia, mas que podia dedicar-se a ela todo
tempo. Não viria aqualquer hora se ela precisasse. Se ela pre
cisasse m¡ndaria alguém, sempre um substituto, uma enfermeira,
um informante, alguém para servi-la, sempre um subalterno. E
a noite estava tão fria e seria longa. Longa como as noites em
que sentia solidão. º a solidão era triste demais para poder
suportá-la. Não bastava todo luxo que a cercava, precisava de
um carinho capaz de acaientar seu espírito, um carinho balså.
mico que poria fim a todos os seus desencantoS. E pegava-se

Hámais de mês e meio voltara da Europa, doente, febril,


desesperada.
Espantou os pensamentos que queriam reconstruir a passa
gem no avião em Dakar, quando desfalecera em delírio, num
estado de choque emocional, fraca,
até G
estava escoando a vida do seu corpo. Parecia
Que
fingindo não escutar, mas era que não tinha forcas a
estava amparou, olhos
responder, abandonando-se contra o peito que a
cerrados,
Aonde ia? Estaria certa? Estava agindo errado? Não
portava. Se o mal lhe trouxesse paz de espírito im
angustiante, ela abriria a porta do numa noite tão
a dentro, dando o inferno e enveredaria por ela
braço a Satanás ou
próprios chifres. despendurando-se em seus

Estava trêmula econfusa, como quemn sabe que está des


viando-se do
caminho, mas a emoção empurrava-a. Eta
viver aquela noite com intensidade, de
qualquer jeito, preciso
Nanci não mudaria nunca. Conservaria sem
Parecia que
jovem e despretencioso, embora já esti
pre o mesmo aspecto anos de idade. Mas,
trazia os
vesse Com osseus trinta e seis
mesmas idéias, o mesmo jeito de ser,
mesmos problemas, as
choramingona e carente.
mas não aconteceu nada
Edda estava ansiosa por revê-la, regis
imaginara. Não teve reação alguma que pudesse
do que em
trat algo diterente, como que sentira em outros tempos
o
tanto.
que estar com ela significava
Sentiu apenas a satisfação natural que se sente ao reen
amiga, nada mais do que
contrar velhos amigos. Uma velha
ela lhe representou e o seu olhat chamejante chegou até a
isso assim a seu res
incomodá-la. Não quis que Nanci se sentisse
interesse e intenção.
peito, com b mesmo visível
Entendia agora que nunca a amara. ue tora apenas entu
imaginado
siasmo, uma experiência diferente do que já havia em
influenciado verdadeiramente
da vida, nada que pudesse ter
alterações que a conse
sua personalidade ou caráter para sofrer ela exercera
Apenas
guissem reter num outro estilo de vida.
por coIsas
certa influência passageira, por emoções que provara,
que aprendera com ela, por ser uma jovem sensível e ter se
deixado levar pela constante em que Nanci vivia mergulhando,
tentando ajudá-la a vencer tanta tristeza.
Nos olhos verdes de Nanci que ela gostava tanto, na suã
maneira de falar, embriagada estava quase sempre com a
cuca cheia nos seus gestos atrevidos e relaxados, via a sau
sem nada
dade morrer, todo o passado desfazer-se sem encanto,

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de interessante a acrescentar para vivê-lo de noVO como aquele
reencontro propunha.
Ao tê-la diante de si todo encanto que
julgara existir naquela
aventura que vivera com ela se desfêz. Teve então certeza que
aquilo que acontecera entre as duas não fora nada.
Apenas ti
vera oportunidade de satisfazer seus desejos sexuais. O fato de
ter sido com uma mulher éque havia
de que existia algo enganado sua lembrança
melhor e diferente nas coisas que fizera no
passado. E alí estava Nanci, desbotando-se como figura
cada das páginas de livros com as suas arran
não podiam despertar nenhum interesse.
estórias infantís que já
Nanci elogiava-a. Dizia que estava mais bonita, mais
tazia pergunta, de como ia a vida, como mulher,
estava se sentindo, se
algum dia pensara nela, e falava de si, do que fizera durante
tantos anos em que não se viam e o quanto lutara para não
pro
curá-la antes. Teletonara porque encontrara com a
Fabiana
e
Fabi perguntara por ela. Nanci sabia como despertar o interesse
de Eddae era capaz de qualquer coisa para
arrastá-la consigo.
Fabiana?
É. A psicóloga. Lembra? Você queria conhecêla e na
última vez em que nos falamos, aliás quando você largou tudo,
ela havia ido para a Europa estudar. Toda vez
que a gente pro
gramava um encontro entre vocês acontecia um imprevisto.
E ela perguntou por mim?
Perguntou.
Nanci sempre mentindo. Sempre inventando coisas para
ludibriar Edda e carregá-la consigo para as festinhas de homos
sexuais, SÓ para ter o prazer de apresentá-la como seu "caso".
Sujeitava-se a qualquer coisa, porque sabia que Edda não sairia
com ninguém e no fim da festa que a levava sempre para
casa
era ela, que tamb¿m há muito não conseguia nada.
Como Fabi perguntou por mim? Acho estranho. Ela
mal se interessou por mim quando a ví pela primeira vez, aliás
estava sempre preocupada com alguma coisa, nem sequer olhava
na minha cara as vezes em que a
encontramos casualmente,
aliás além de tudo ela nunca teve boas
impressões a meu respeito.
Sempre foi grossa e debochada, embora tivesse seus motivos.

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Charm dela. Pode crer. Inteligente. Sabia que você
só "brincava" com a turma, que mexia com todo mundo e não
queria nada com ninguém. Jogo dela, para aparecer, oque você
poderia esperat de uma psicóloga, estudante e esperta como ela
sÐ? Que olhasse para você babando como as outras faziam?
Depois você não agiu bem com ela. Você sabe.
--Epor que perguntou por mim, então? Uma boa psi.
cóloga joga até com o tempo, guarda o trunfo, morre com ele
na mão, perguntar por mim, com a tama que eu tenho ou tinha
é o mesmo que abrir o jogo.
Aí éque está que você nem pode sequer imaginar.
Fale logo, não fique Com esse ar de mistério.
Por que você acha que eu iria me atrever a telefonar
depois de cinco anos,
aliás não estavam todos os passageiros a bordo, quando você se
sentiu nal e o homem gue estava ao seu lado deu o
alarme,
chamando a aeromoça.
E, eu soube que houve atraso na
causa disso. saída do avião por
E Fabiana, como agiu?
Ninguém pôde sair do aeroporto. Tiveram que ficar
aguardando.
Ela não fez nada a
respeito? Não se apresentou como
amiga, não se ofereceu para nada? Pelo menos só
estou
E uma cafajestada violenta. Dá até desgosto. A gente vai numa
discoteca pensando passar algumas horas agradáveis e só encon.
tra piranhas e paraibas
Não era a prineira vez que tocavam a campainha daquele
apartamento e não vinha ninguém atender. Edda olhou para
Nanci censurando-a:
Eu bemn lhe disse que não ia valer a pena perder tempo.
Fabiana nunca está. Não acredito que você tenha marcado nada
com ela. Sei lá também onde é essa festa.
Bem, eu não dei certeza que viria. Creio que ela já foi
para afesta. Você vai gostar. Afinal não custa nada rever ami
gos, né? Vamos até o apartmento de Leilá que fica aqui perto,
talvez Fabi tenha ido para lá.
Talvez, talvez, não gosto de ficar zanzando, você sabe
disso. Acho melhor agente ir logo para essa festa ou deixo
você em qualquert lugar e vou embora.
Você vai gostar de Leilá.
Quem é Leilá?
Gente fina. Não é de São Paulo, nem da velha turma.
Éde Ribeirão Preto. Está em São Paulo estagiando. Recém
formada em medicina. Hoje é dia de folga dela. Prometi passar
lá pra gente levá um papo.
- Aonde foi que você conheceu essa Leilá?
Amiga de minha irmã, da Geisa. Você sabe Leilá era
uma enrustidona, fechada, medrosa. Daí a gente começou a con
versar e ela se identificou mais comigo do gue com a minha
irmå que só fala em homem. Ficamos amigas. Ela se abriu.

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nunca transou ninguém, isto é, numa firme. Muito medroea
tava até noiva pra casar. Essas coisas que os enrustidos
por causa da sociedade. fazem
Ou seráque ela é apenas uma. ..
curiosa como eu?
Que nada. Ela é entendidona. Tem repulsa por
como um homem normal tem repulsa por outro, só homem
amizade.
E como chegou a ficar noiva?
Não entrei em detalhes.
-É. Estranho. Não acho que ela seja tão
entendidona,
como você diz. Para chegar a ficar noiva precisou dar
uns amas
sinhos, nenhum homem vai ficando noivo assim sem
mais nem
menos, sem dar uma encostadinha e gostar da coisa.
Espera pra ver a "coisa".
Sairam do edifício e entraram no
em movimento. Fez conversão à direitaautomóvel
que Edda pôs
e seguiu a direção que
Nanci indicou. Estacionaram em frente a um
nópolis.
edifício na Higie
Leilá morava num apartamento de frente, no
dar. Nanci tocou acampainha. Ouviram passos e logo segundo an
a porta. Diante de Edda apareceu uma abriram
mulher de mais ou me
nos trinta anos que a princípio Edda chegou a confundir pela
semelhança, com Fabiana. O mesmo tipo. Nem muito alta, nem
muito baixa, magra, mas esbelta. Cabelos lisos compridos até
os ombros. Boca de lábios finos e larga, nariz reto,
olhos ex
pressivos, cavos, esverdeados. Vestia slackS cor cinza e calça lee
importada, sapatos de solão Adams.
Encararam-se com simpatia. Realmente a "coisa" era mesmo
o protótipo da andrógina. Um tanto quanto parecida com Alain
Delon, como só achara Fabiana. Realmente era uma surpresa
inesperada e gostou de cara da Leilá,

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Na sala uma vitrola tocava em surdina. Reparou no con
junto de som, nos móveis, nos livros, nos tapetes, nas cortinas,
nos almofadões. Nem masculino nem feminino, neutro, confor
tável, luxuoso e agradável.
Edda sentou numa poltrona e Leilá trocou o cassete, como
se escolhesse música adequada e especial, segundo a emoção que
o conhecimento de Edda lhe causara. Aguardou a música. Ava
liou o que ela pensara a seu respeito. Percy Faith. Música
Suave. Romântica. Fora uma excelente avaliação. Simultanea
mente ao seu pensamento Leilá perguntou:
Gosta desse gênero de música? Tentei advinhar a sua
preferência.
Acertou.
Paul Muriat e Freddy Gardner serão as seleções se
guintes.
Tem bom gosto.
visita
De acordo com o que pede ou com o que a
inspira.
Obrigada. Isso é um elogio.
um copo
Leilá dirigiu-se a Nanci enquanto Ihe estendia pedras de
Com uísque puro, a0 qual Nanci actescentou umas
mesa ao lado.
gelo que tirou do baldinho na
caso éuma bela e sim
Você teve gosto, Nanci. O seu
pática mulher.
desmentiu. Rejeitou o
Nanci apenas sorriu e Edda não
uísque, mas aceitou um licor.
- Nanci falou-me de uma festa, a gente vai?
Viemos buscá-la, creio.
-E, Hoje é a noite das surpresas.
Estou feliz porque
simpatizaram uma
Edda aceitou sair comigo e feliz porque vocês seu
numa outra, sabe, não troca
com a outra, mas Edda está
novo modo de vida por coisa alguma.
-Comno sabe?
de licor na
erguntou Edda de repente. colocando o cálice
bandeja e levantando-se para que saisse.
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Eu conheço voce, Edda, mais do que você pensa.
Leilá entendeu a insinuação de Nanci e adiantOu-se para
pegar a carteira e sairem.
Melhor a gente it, senão fica muito tarde e amanh£
eu tenho plantão, não poderei ficar muito na festinha.

26
Assim que abriram a porta do apartamento do qual toca
ram a campainha, Edda exclamou eufórica e surpresa:
Gigi! Você aqui?
Aloira de olh0s azuis, grandes e arregalados riu de satis
fação e abraçou-a efusivamente.
Quanto tempo! Que formidável vêla novamente, Edda.
Voltou para Nanci, hem? Eu sempre disse que você não ia
ficar muito tempo naquela, a sua curtição éa nossa, quem entra
nesta náo sai.
passagemn. Saí hoje só
Não se iluda, Gigi, estou só de
como andam as coisas. Nanci telefonou e eu quis recor
pra ver
dar os velhos tempos, SÓ 1SSO.
volta,
- E assim mesmo que a gente
Encontrou velhas amigas, mas não viu Fabiana. Nanci en
tendeu o que Edda procurava com o olhar pelo apattamento que
percorreu disfarçadamente, cumprimentando uns e outros Dara
finalmente decepcionar-se. Nanci debruçou-se por trás no ombro
dela e ptrometeu:
Ela virá. Que cisma, puxa!
Ela quem?
Não disfarce.
-Gigi, que as deixara há pouco,
deja de salgadinhos e bebidas que enfiou
Frida levou Fabiana e eu fiquei com o "cacho" de
Frida, só por
vingança. Naquela época eu comia quem eu quisesse, lembra?
Todo mundo dava em cima de mim. Ainda dá,
gente não estria, éque agora eu cstou com
você sabe, a
(pôs a mão em con
cha no ouvido de Edda e
sussurrou): vinte e oito
tempo eu tinha só dezessete. E que pinta brava euanos, naquele
bra? Lembra o que a gente era! Lem
aprontava, Edda?
Eu tinha dezessete tambérn
quando conheci você.
-Ah! nesse tempo eu já estava com vinte e
biana já estava com Frida, lembra das três e Fa
confusões?
Se lembro!
-A gente até tormou e ofganizou uma
perseguir Fabiana e Frida. Puxa! As coitadas nãoquadrilha para
tinham sosse
go, masS quanto mais a gente
aprontava pra separar as duas mais
elas se uniam. A Anna
mandava carta pra Frida e a que ia en
tregar dava de propósito nas mãos de Fabiana.
Frida se defendia sei lá de que jeito. Acho que Fabiana lia e
eram só mentiras, que Frida não andava se Frida sabia que
Anna, que não pretendia voltar coisa nenhuma encontrando com
com ela, pois es
tava mesmo apaixonada por Fabiana. E
e desistiu dos recadinhos, dos quando a gente cansou
telefonemas
duas em paz, Fabiana largou Frida por anônimos e deixou as
causa de uma manequim.
lsso éque agente não esperava.
viva. Agora estámorando no Rio. Fabiana sempre foi émuito
Está com uma tal de Eliana.
Nanci disse que ela viria à festa.
-Aqui?! No meu apartamento?
puta que quando encontra comigo por Fabiana tão filha da
é
conhece. Acho que tem raiva pelas coisasacaso finge que nem me
do ela estava que eu aprontei quan
com Frida.
Essa Nanci não aprende
mesno.
Nanci mente muito! Tantas vezes ela
vitia aqui com ela, disse que você
pensei que fosse um chegava a marcar, que quando ví você mesmo
esquece. fantasma. Nanci é gamadona em você, não
de novo! Veja só, coitada, como bebe! Mas que bacana ver você

29
vez em que seguimos Pa
Você lembra, Gigi aquela bairro nos confins do In.
aquele
biana e Frida naquele táxi até faltou
Fiquei até com medo do jeito que ela nos tratou. Só
das? fingindo
quando eu desci do carro e fui falar com ela,
me bater levantou o braço e deu um
uma informação. Ela
que ia pedir um mnurro de
berro e eu saí
Já estive em Sanatório, cê soube, Edda? Fiquei meses
internada, larguei de beber, larguei mesmo, é só hoje, emoção
por ve você, se eu estivesse
pedindo-se com muita educação, mas fria feito um iceberg, com
cara de poucos amigos.
E essa aí?
Leilá?
É.
Amiga de Nanci.
Transa sua?
Não. Jádisse que estou só de passagem.
tudo.
É, mas você e Hilda quando passam arrastam
Quem é essa Hilda?
- 0 Furacão Hilda, Edda!
Ah! não liguei uma coisa à outra.
Pois é? Acha que existe alguma mulher que possa
vencer você? Só mesmo o furacão Hilda,
Besteira, foi-se o tempo.
- Parece. Veja bem. Está todo mundo indócil. Enguan
fo
to fui fazer essa bandeja pra vocês, metade das convidadas
ram atrás de mim perguntando qual é a sua, se dava pra uma
aproximação, tirar uma linhada, Edda, estão todas babando e as
adredes e "avecs"

32
Gigi e Edda riam, lembrando das confusões dos velhos
tempos, mas logo desviaram assunto por causa dos apartes de
Nanci que tentava fazer gozação, acabando por fazê-las senti.
rem-se ridículas.
Leilá prestava atenção à conversa que tomou outro rumo
sem os risos de Edda e Gigi, sem os apartes de Nanci que se
queimou com uma "chamada" de Gigi e de Edda que também
deixaram o lembra disto e daquilo.
A troca de olhares entre Edda e Leilá tornava-se cada vez
mais significativa. Edda regogizava-se com a impressão que es
tava causando naquela jovem. Era mesmo bom perceber e conS
tatar que outras também Ihe dirigiam olhares não menos con
quistadores e que como sempre ela era o centro das atrações.
Leilá demonstrava o quanto estava perturbada, nos simples
gestos, como segurava o cigarro e acendia um após outro. Edda
sabia o quanto a estava provocando e isso lhe causava imensa
satisfação. vaidosa que era. Seria interessante ver aquele senti
mento que nascia chegar ao auge, na cama.
Para Edda tudo traduzia-se em desejo e sexo. Um flert
nao passava de um convite para relações sexuais. Uma troca de
olhar selava um Comprmisso, marcava um momnento. Em geral
esses flerts não conduziam a nada, porque ela recuava, apenas
gOstava de criar situações, de deixar as pessoas borboleteardo à
sua volta aguardando que ela as premiasse com um simples
olhar ao menos.
Lelá, tinalmente teve gue trancar os seus interesses amo
sOS e retrear seus impulsos. pois teria que estar no hospital

33
onde ficaria de plantão, às cinco horas da manhá, como Edda
sugerira que saíssem no seu carro,
Falei com Fabiana hoje à tarde, ela estáem São
Paulo,
sim, sozinha, já terminou tudo com a Eliana, ela disse que iria
àfesta.
Lógico, e você acreditou, gente como Fabiana
nunca
perde tempo
coisas, enfim a gente começa a se tornar realmente inconveniente
perde-se o equilíbrio, em pé de olhos fechados, é o sinal de
Romberg e geralmente chega-se à impotência sexual.
Af sobrevem a Fase de Sono. A gente não consegue nem
ficar em pé e nem sentado, às vezes, sofre queda da pressão
sanguínea, há um desaparecimento quase completo da consciên.
acorda
cia. A gente só reage a estímulos violentos, quando se
sente-se mal-estar, cansaço, acabeça pesada, sede, gosto horrível
na boca.
Finalmente a Morte! A gente fica à disposição de quem
quer atropelar alguém, sujeito a qualquer tipo de acidente
pela
incoordenação motora. É a imprudência enfim, a indiferença e
resfri
falta de atenção total por tudo o que nos rodeia. Há o
o álcool não
mento do corpo, porque ao contrário do que se diz
pode
aquece, ele resfria o organismo ese a gente não se cuida
morrer em conseqüência do resfriamento do corpo,
se dormir
pelado, com a janela aberta, ao relento, essas coisas, enfim mor
re-se pela intoxicação alcoólica.
Fases da Em
Se eu sou capaz de dar uma aula sobre as
briaguez é sinal que eu não estou sujeita a nenhuma dessas
perturbações. Não estou excitada, nem brocha, nem confusa e
nem com sono e nada indica que estou a um passo da morte,
a menos que você meta este carro Contra uma parede,
Edda distanciou o olhar em direção ao
entrara. edifício onde Gigi
Ficaramn em silêncio alguns instantes e só
falar quando Nanci
começou a se inquietar comtecomeçaram
a demora
a
de
Gigi, pois estava
aguentava mais.
desesperada de vontade de fazer xixi, não
Aguente. Quem mandou beber tanto.
Aguento nada. Não temn ninguém na ru.
aqui mesmo. Vou fazer
No carro?!
Claro que não, não sou
nenhuma débil mental.
Disse irritada, abrindo a porta
da calça descido e do carro, já com o
agachando-se perto da zipper
tavam estacionadas "desaguou" com a árvore sob a qual es
as calças e entrou n0 maior simplicidade. Subiu
carro.
Edda ficou com nojo dela e
exclamou irritada:
Bunda suja, fedida, vou ter que mandar
banco, sentar aí com esses pelos desinfetar o
podre. molhados de xixi etílico, azedo,
Credo! Xixi etílico! Isso é de doer!
Você estádegradante.
Degradante é o vexame ao qual Gigi está nos espondo.
Deve "tá" trepando adoiadada!
Oque você quer dizer com
isso?
Esse michà está demorando muito. Isso não é coisa
que se faça a duas
seus cafetões? amigas. .. oque pensa ela que nós somos?
Edda interrompeu-a com uma
lavra quebrada escapulindo de sua exclamação
boca que
que foi uma pa
ela fechou com a
mão num gesto rápido. Acima
dos seus dedos longos que se
crispavam, viam-se dois olhos arregalados pela indignação que
Ihe caausou o comentáio de Nanci. Nanci sempre mentirosa.
Estaria caluniando Gigi?
D 1SSO mesmo, como coisa que você nunca soube o que
ela sempre fez! Ela é
leva, mas não é para ainconveniente. Você sabe a vida que ela
gente entregar a domiclio e ainda ficar
37
esperando tanto tempo como se fosse ganhar comissão. Onem
vê pensa que a gente é sócia da bu. dela.
Edda que sabia perfeitamente a respeito das "virações" de
Gigi jamais pudera supor entretanto que ela tivesse coragem de
submetê-la a tão vexatório papel.
Agora o remédio é esperar. As vezes eles gozam rápido,
outras vezes denmoram,
Gente, ainda é cedo. Nem dez ainda. Há uma festa
legal na casa de uma amiga minha, que tal a
até lá? Não é gente gente dar um pulo
borocochô como as amigas da moça com
quem divido o apartamento. A festa era dela e eu
hora de me safar, inda bem não via a
de lá. Que tal, vocês que vocês resolveram se pirulitar
topam? Tem
Vamos, vá, Edda, sÑ pra festejar estecada mulheraço lá, cada pão.
decide se quer ficar mofando, a
gente
reencontro, depois você
Nanci? Garanto que vai deixa você em paz, topa,
você lá também. ter garrafa de uísque todinha para
Nanci esperou que Edda
marcha e riu: decidisse. Edda engatos nova
OK! Hoje a noite é nossa. E
viva o passado!

39
O carro rodou pela cidade novamente. A distância de um
apartamento até outro formava um triângulo.
Durante otrajeto Gigi foi apontando os edifícios onde mo
ravam os seus inúmeros cachos e de cada um deles tinha uma
história absurda para contar. Trágica e absurda.
Puxa, Gigi que lista! Você deve estat com a
reca" inchada! Você parece que está. "pere
- Tarada! completou Gigi soltando uma gargalhada.
Entraram pela Major Sertório. Edda viu travestis parados
nas esquinas.
Nossa, veja, cada boneca!
ÉisSo aí, São Paulo está cheio "delas, cada uma mais
linda do que a outra, num luxo só, isto é, tem algumas que
parecem espantalhos, cada queixada de burro faturando, mesmo
assim estão pondo as piranhas no chinelo. Veja, aquele aparta
mento lá, no último andar era meu.
Nanci e Edda entreolharam-se. Já estavam acostumadas
com os exageros megalomaníacos de Gigi que contava sobre
fortunas e rendimentos que jamais tivera. Gigi mentia tanto
que ela própria acabava acreditando no que dizia. Seria ela
feliz assim? Pois então que continuasse com a sua megalomania
desde que não prejudicasse ninguém e que se considerasse pro
prietária de todos os palecetes do mundo, pensou Edda que ja
mais pretendeu desmentí-la ou pôr em dúvida o que ela falava.
Que fossem todos comno gostavam de ser desde que nao
a afetasse, aí o caso tomaria outto significado e o tempo poderia
enegrecer, pois Edda não era de deixar a batata assar atéqueimar.
40
Gigi precisou comprar cigarros e Edda estacionou em frente
ao primeiro bar pelo qual passaram. Gigi
desceu e como se ti
vesse aguardado um momento em que ficassem
vez, Nanci voltou-se pata Edda com uma sozinhas outra
expressão
no rosto, como se tivesse ensaiado muito para falar: suplicante
Por que você não faz caso comigo outra
para mim, Edda.
vez? Volte
eu fui uma idiota.
Na exclamação agoniada estava o início de uma
de lamúrias e súplicas que Nanci não se fartava de nova série
fazer,
já tivessem se passado tantos anos desde que haviam tido embora
aquela
rápida aventura.
Nanci, não estrague a noite. Eu quero ficar alegre,
quero me divertir, preciso que você seja compreensiva e que me
ajude. Não toque nesse assunto que isso me aborrece. Eu quero
muito bem voc¿, muito bem mesmo, muito mais do que pode
imaginat, mas por favor não falemos sobre essas coisas, tá? Se
jamos boas amigas.
E Edda debruçou-se sobre ela com um meigo olhar, bei
jando-a de leve no rosto.
Está bem, Edda, está bem. Mas não sei como pode
pensar em divertir-se com um tipo como Gigi.
UÃ! Ouando você me convidou pata ir àfesta garan
tiu que se tratava de gente fina, agora Gigi já não égente fina,
échocante, faz michê.
Eu estava bêbada.
Ébria.
Obrigada pela correção, mas ela não serve como com
panhia para você.
Com você ao mèu lado, querida, qualquer pessoa se
torna inofensiva. ..
Gracejou Edda, encerrando o assunto
tava.
Calma, omelhor mesmo é chegar bem tarde. Já esta
rão todas lá quando chegarmos. As vedetes têm que dar uma
de estrelete, chegar quando a festa está no auge. Fica todo

Gigi demorou no orelhão. Nanci bufou, Edda estava quase


desisitindo quando ela tornou a entrar no carro.
Agora vamos de uma vez!
Era um edifício de vinte e dois andares. Subiram até o
vigésimo. Desde o elevador pela música perceberam em qual
apartamento era a festa.
O som de vozes femininas chegou até elas. Em seguida
ao primeiro toque de campainha a porta abriu e duas jovens
receberam-nas alegremente. Eram elas Gláucia e Dora.
As apresentações foram feitas e logo Edda recebia olhares
expressivos de todas as mulheres a quem foi
Era um venha a mim e afaste-se, tome e näo dou que es
tonteava. A atmosfera estava carregada de tensão. De apreen
são. De desejo. Ede inveja. Era como se de uma flor
exalando um perfume embriagante que ia intoxicando aosestivesse
A música ajudava o jogo de poucos.
olhares
aproximações. Traziam-Ihe bebida, petiscos, furtivos,
de flert e
dançar. E Edda provocando e esquivando-se.convidavam-na para
Lembrou do bilhetinho que Leilá havia Ihe passado e
ela havia enfiado na bolsa. que
Procurou-o e leu-o,
para ler outros três que havia recebido aproveitando
nessa festa.
Eram números de telefone, horário para
nomes, Leilá, Gláucia ,Cinira e Jane. telefonar e os

43
Cinira aproximou-se. Era uma jovem alta e bonita a qual
ela notara logo que havia chegado e que na primeira
dade havia lhe enviado o bilhetinho pela Gigi. oportuni.
- Vamos dançar?
Aqui só dançam blues e boleros?
oportuno.
Um discoteck sound iria bem.
Eu ponho um disco.
Não, deixa pra lá, eu danço essa tristeza com voc.
Acha esse sambinha uma tristeza?
Fossa. Não é um sambinha pejorativamente, mas é
fossa e fossa é pra amnatrar as pessoas num clima e eu não estou
a fim desse clima.
A moça passou o braço ao redot da cintura dela e aper.
tou-a levemente,

44
Você é linda.
Eu sei. À meia luz todas as
rados parecem fadas. Estou farta de mulheres de cabelos dou
ouvir essas coisas.
Cinira riu e Edda aproveitou a
música para outta no disco para passagem da faixa de uma
dela. Cinira tentou retê-la, parar de dançar e afastar-se
Edda ergueu segurando-a firme contra si.
uma sobrancelha eseus olhos
o sarcasmo que era
capaz de demonstrar. desferiram todo
Eu não quero mais
dançat, não tente forçar-me.
Cinira soltou-a, mas seguiu-a
casse um encontro. insistindo para que Edda mar
Gostaria de encontrála qualquet dia a sós
sarmos. Seria capaz de qualquer coisa por para conver
de novo. você. Quero vêla
Quer mnesmo?
Você se encontrará conmigo?
Por que não? Claro.
Quando? Onde?
- Quando você quiser.
Cinira puxou-a num abraço, aproveitando a música. Edda
espremeu-se contra o corpo da jovem que
tou-a mis empolgada pela sensação que a estremeceu e aper
atiçava
Edda insinuava-se mais, lançando-lhe olhares toda.
de gato do
mato, deliciando-se ao ver as expressões
desenhavam no rosto de Cinira, que já, numemocionadas que se
breve instante de
monstrava estar completamente apaixonada.
Afastaram-se quando a música terminou. Cinira segurou-a
pelo braço para insistir:
Quando?
Edda não respondeu. Olhou-a de alto a baixo,
C1Osamente, como se a desafiasse a ter paciência e sorriu mali
Sua boa vontade. Seus olhos esperar pela
luziram como se estivesse corres
o disco caiu no prato que continuava girando incansavel.
mente e a agulha tiscou, Osom do novo samba-canção ergueu-se
insinuante.
Três fizeram o mesmo gesto,
levantando-se
estavam sentadas, e seguiram direções
do
sofá onde
opostas quando vitam
uma mais esperta que já aguardava perto de
Edda, levála pelo
braço no compasso da música.
Gigi aproximou-se de Edda,
sava falar com ela, levou-a para o afobada,
"hall"
pediu licença, preci.
estava dançando com Edda mordiscando osdeixando
a jovem que
lábios de raiva.
Edda viu por cima do ombro de Gigi a
cumprimentando amigas. Era uma mulher dos seusrecém-chegada
anos, forte, máscula, voz grossa. Um tipo bem vinte nove
e
Gigi percebeu o olhar de Edda e olhou paramasculinizado.
trás.
ÉaSô, irm de Cinira,
Mal de família, é?
Oirmão é viado.
Puxa! Mas o que é que você quer falar comigo?
Cinira está interessadíssima em você. Ela é que
serve. Não essa cora lhe
quem você saiu dançando agora. Cinira
me pediu para marcar um encontro entre vocês duas e
pediu o
seu telefone. Preciso saber se posso dar o seu
telefone.
Claro, pode dar, pra quem você quiser, não há pro
blema.
Edda concordou como vinha

46
dera-a e ridicularizara-a. As lembranças
Edda ainda não dançata com Sô. Estavam
apenas trocanda
olhares. Cinira fazia pose e expressões de
convencida e segura
de si, que já conquistara Edda. Já vencera a parada.
Era só
aguardar mais um pouco. Que Nanci acabasse com mais algu.
mas doses de uísque entregando os pontos e a
Deus ou ao diabo, então ela entraria de sola. consciência
Edda não precisava aproximar-se para ouvir, pois sabia
bem quais eram os comentários. das rodinhas dos
naquela sala. Falavam dela, aseu respeito. homossexuais.
Jane era uma loira magra, provavelmente
descendente de
ingleses, olhinhos pequenos e muito azuis, cabelos
beça, mas não era feia, chegava atà a lembrar Miaralos na ca
Edda achava Mia Farow um tipo muito Farow
Ihe enviara dois bilhetinhcs através de interessante. Jane já
Gigi. Oprimeiro tinha
apenas o número de telefone. e o sel
nome, 0 segundo um
elogio: "Você é a noite."
Estranhas palavras, profundas. Gostou da frase.
Jane quisera dizer que ela era o tudo,
centar. nada havia a acres
Nanci não desgrudava dela e no
as coisas, Edda achou ponto em que estavau
melhot escorar-se nela, mesmo
aguentar tropeções e
os
desequilíbrios dela.

48
Edda sentiu-se de súbito como um carneirinho
estridentes. Logo um borborinho se fez.
do corredor e gritos
de dançar e corferarn para ver o que estava
Todos pararam
Por que não respeita o "marido" dos outros?
Eu não fiz nada.
Dançou com ela.
Sem maldade.
Esfregando-se daquele
anos e nunca aconteceu isso.
jeito?
Nós somos caso CNCo
Gláucia me bateu por sua causa.
porque eu disse que você não passa de uma
vocês até já se conheciam antes para ela piranha, acho que
jeito, agora está chumbada, bebeu a noite defender você desse
toda, mas não foi
por sua causa não, toi porque eu me enchi e dei
bola para
uma cara aí.
Edda passou o braço em volta do ombro de Dora que
começou a soluçar e tentou levá-la consigo para um canto vazio
da sala. Estava todo mundo
acompanhando Sô e Cinira que
carregavam o corpo inerte de Gláucia que a essa altura deveria
estar pesando mais de cem quilos.
Edda falou e falou e tanto explicou e usou da sua
tática
que convenceu Dora que ela estava enganada a seu
respeito e
para confirmar, aproximou os lábios do rosto úmido de lágrimas
da moça, qual achou aliás muito bonita, e deu-lhe um beijo de
morado no canto da boca, confessando com cinismo e com olhar
de mulher fatal que estáno auge do desejo:
Você é a mais interessante de todas, nenhuma outra po
deria despertar maior interesse do que você.
Edda levantou-se do sofá onde fizera sentar ao seu lado
e se afastou, deixando Dora a dat tratos a bola.
Puseram outro disco na vitrola, Solange voltou para a sala,
chamou Dora para que fosse fazer companhia a Gláucia que já
tomara café amargo, vomitara, limpara-se, e depois de terem
pingado três gotas de limão em seu ouvido estava pronta para
outra, mas estava envergonhada e muito fraca, por isso ficara
deitada.

O que vocà quer, afinal? Não


ir embora? Isto já está
derna.
Você não vÁ como eu estou
Edda olhou para o rosto dela e viu os olhos verdes e tão
bonitos, injetados, vermelhos, congestionados, e percebeu que
n¥o era só pela bebida, mas de tanto chorar. Edda puxou-a
contra sí e abraçou-a com carinho e perguntou com ternura:
Você esteve chorando?

bargada.
Sua bolsa estava cheia de
nhos. Marcara encontros com números de telefone, de bilheti
Sô ainda não se quase todas. Quase todas porque
aproximara dela.
Incrível que
que agora a própria Dora insistisse,
para jogar buraco, para convidando-a
jantarem, para baterem um papo qual
quer dia, talvez, se ela desse umn jeito,
Nanci e ficar depois que todas poderia descartar-se de
saissem, afinal Gláucia
no son0, assimn elas
poderiam conversar um pouco mais. ferrara
Se ela
aceitasse daria fim ànoitada para que todos se
ficassemn sozinhas. Se não conseguisse fossem e elas
dia levá-la para casa e voltar descartar-se de Nanci po
depois. Ela daria uma chave do
prédio cujas portas
àquelas horas obviamente estariam fechadas.
Então? As quatro e meia aqui no meu
-As quatro e meia. apartamento?
T·o feminina, tão bela, tão
suave, tão meiga e dócil quanto
Edda, propondo algo entre as duas. Edda
estava provocando-a. Seu olhar mortiço sob ficou excitada. Dora
tiços era sensual e os longos cílios pos
siva, feminina comoconvidativo. Nunca beijara uma muJher pas
ela. Dora olhava-a com
çáveis e com jeito arrastou-a para o intenções indisfar
desse ter apenas uma ligeira banheiro, como se
conversa amistosa com ela. preten
Assim que fecharam a porta as duas num simultâneo im-
pulso abraçaram-se
braços pela fogosamente. Edda não sabia se passava os
pelo seu cinturasoltava-a
dela ao passo que Dora passava os braços
pescoço, num e bolinava seus seios, enquanto Suas
bocas se sorviam
beijo ardente.
53
Esfregatam-se e bolinatam-se até que as batidas violentas
atordoou-as.
na porta e a vOz de Gláucia
Dora levou a mão à bOca e exclamou aflita:
E agora?
Nada. Oque ela poderá desconfiar de nós duas? Oue
estávamos entrando num acordo,
mar o ambiente eespantar a impressão desconcertante que rei
nou na sala no momento seguinte em que Gláucia surpreendeu
as duas no banheiro.
Todos os olhares corriam de Gláucia para Dora e destas
para Edda que mordiscava os lábios, fingindo não entender o
motivo daquela briga, que ela era o pivô da confusão.
Nanci continuou dançando com ela. Suas primeiras pala
vtas fotam um soluço entrecortado:
Você não vÁ como eu estou
Edda riu edesprendeu-se dos braços da magrela Com cara

de saguí. Percebeu que ela estava cheia de si. Que ganhara


Edda, fácil, muito fácil. E na certa iria dar pipoca pros " mor
cegos" da praça até cansat, potque Edda não iria.
Depois veio Jane. E outra. E mais outra. E com todas ela
marcou encontros em pontos diferentes da cidade, prendendo
um sortiso irônico no canto dos lábios.
E seu olhar passeou pela sala e parou fixo no olhar de
Solange que prosseguia distante desde que chegara.
A voz de Gigi ergueu-se na sala num som estridente. Al
guém pisara-lhe no pé, coisa mal feita, pois foram despertá-la
para a agitação da sua mente que estava adormecida no enlevo
do flert que arrumara,
Edda percebeu que estava embriagada. E ão bebera quase
nada. Apenas um ou outro gole de uísque. A sensação que lhe
percorria o corpo definia bem o seu estado de espírito ansioso.
E ninguém Ihe provocava coisa aiguma, só
aguçavam a sua vai
dade, o seu orgulho, o seu desprezo por tipos como os que
estavam rodeando-a.
Não entendia como estava
no seu cotpo, algo forte, mas não seria ali que ela encontraria
0 que a satisfizesse.
E o fogo, que era apenas umn desejo imaginário ardia em
suas entranhas com ímpeto arrasador. Oque valia a pena fazer?
Solange finalmente aproximou-se dela. E o encanto que
ela procurou no flert, na demora da conquista, desfez-se, esfa

Estranhou que ela não se insinuasse tanto, que não a con


vidasse para nada, que não marcasse encontro, que prosseguisse
assim quase calada, sentindo-a, dançando com respeito ou com
indiferença ou dançando apenas, não indiferente, talvez um pouco
sentimental, não exagerada.
De longe Jane observava-as enciumada com ares de senhor.
Gláucia seguia-a com o olhar disfarçadamente e Dora suspirava
excitada, certa de que seria ela a escolhida. Nanci controlava-se
para não arrancá-la dos braços da possível rivall e,assim outras
que eram apenas olhos, palavras, insinuações e nada mais pas
savam pelo olhar de Edda que retribuia com a mesma expressão
apaixonada.
Era fácil fingir amor, porque ele estava dentro dela, so
nhando, imaginado, ansiado e ela transmitia ânsias que trans
bordavam pelas suas pupilas ardentemente. Ali, dentro dela mo
rava um amor estranho, crepitava um fogo ardente, ardia uma
vontade indômita e perigosa, uma vontade louca de pecar.
E excitava-se provocando a todas, imaginando a que ponto
seria capaz de chegar se uma delas a interessasse realmente ou
se tivesse atração por todas como estava demonstrando.
E todas estavam candidatando-se,
fazer chamadas telefônicas à procura de alguém para um bate
papo. Não, não poderia continuar enterrando-se numa rotina
chata de andar de um lado para outro do
apartamento, admi
rando seus preciosos objetos, conferindo talões de cheques,
procurar modelos de vestidos, a escolher novOs carros, inven
tando mil desejos para fazer gastos loucos, fumando de três a
quatro maços de cigarro por dia e
a cada uma delas. Depois que Edda se foi foram esperá-la, cada
uma, no lugat marcado. E ficaram a sonhar com uma deliciosa
e prometedora Edda que jamais compareceria a encontro
nenhum.
Oque ela deixou foi um imenso
tolos que não souberam ler a verdade. vazio naqueles corações

61
Edda abriu a porta e entrou no apattamento. Fora chatér.
rimo aquele fim de noite. E nem eram quatro horas ainda.
Levara Nanci até sua casa e tivera que perder bom tempo para
conseguir fazêla descer. Nanci chorara muito, como nunca a
vira chorar antes. Mas não fora para vingar-se dela que Edda
se comportara tão mal na festa, como Nanci estava pensando,
chamando-a de cruel e vingativa.
Realmente se tivesse um dia pensado em vingar-se aquela
fora a noite propícia, então eraodestino que não perdia opor
tunidade para devolver troco. E ela tinha muito para devolver
a Nanci. Lembrava tudo o que houvera entre elas e como Nanci
contribuira para as suas frustrações.
Nanci ficara num estado deplorável, humilhada,
Um borborinho de emoções quebradas se fez dentro dela,
gritou, subiu pela garganta num soluço de desespero, queimou
em sua boca.
Aquele desejo insuportável, a dor do amor inexistente, a
saudade anônima, o desejo sem um corpo sob o qual se
Murmurou umn lamento que não era onome de sacudir.
chamar um rosto e ninguém, tentou
nenhuma imagem se tez em sua mente,
queria arrancar do invisível o que
a túria sexual que necessitava tanto para aplacar
tomava conta do seu corpo. Nunca com tanto
ímpeto como nessa noite em que sÑ excitara
tolas e não excitara a si própria. Agora aquelas mulheres
estava ali,
apartamento cheio de móveis e objetos caríssimos e olhando o
tão pobre
e vazio de amor. Era
sufocante. Horrível.
Há quanto tempo vinha Ihe
zera só para aproximar-se, ao contrário deveria ter se sentido
envaidecida e admirada. Era estranho. Um dia talvez desco
brisse.
Edda apaixonara-se por Nanci naquela noite emn que ela
fora tirá-la da Delegacia do Juizado de Menores. E deixara-se
levar por um sentimento novo, por sentir-se protegida e segura
ao lado dela, mas na verdade fora ela quem acabara dando apoio,
ajudando e dando proteção a Nanci, em todos os sentidos.
Nanci estava de fossa, por causa de Malena que a deixara
por um gigolô. Malena se virava. Era uma piranha, dava tudo
para Nanci, sustentava-a. Um dia encheu-se, deu-Ihe um chute
e justamente nessa época Edda aparecera para aliviar sua dor.
Edda havia saído de casa e estava tentando acertar um
rumo na vida. Nas suas andanças pelos corredores da televisão
conhecera Gigi e tornaram-se amigas. Gigi às vezes convidava-a
para sairem com alguns "amigos", mas na hora do vamos ver,
Gigi dava um jeito de Edda tirar o corpo fora e fazia as vezes
de protetora e o ela não édisso funcionava como se ela também
não fosse, mostrando-se ofendida, não deixando que Edda ti
vesse certeza de que ela fazia a vida, acreditando que ela apenas
se divertia como podia.
Edda já se fotmara contadota e começara o curso de In
glês, não lhe fora difícil conseguir boa colocação, mas não ficara
satisteita e mudara o rumo entrando para a televisão para con
seguir ser garota propaganda e ter alguns pequenos papéis em
novelas. Mas não dera certo também, pois sua mãe vivia cho
ramingando e ela acabou desistindo.
A situação de Nanci estava mesmo feia.
rando-se, Malena apareceu. Foi um escândalo. Num segundo
Edda estava de malas prontas posta fora do
estava no nome de Malena. apartamento que
Nanci não fizera nada, absolutamente nada
que Malena pusesse Edda fora do para impedir
parecia emocionada com o seu apartamento. Ao contrário,
portava. Edda regresso e o resto pouco lhe 1m
que se danasse.
Ninguém jamais poderia avaliar o sofrimento e desespero
de Edda ao se ver na rua,
sem
ter para onde it. Não podia irdinheiro, cheia de dívidas e sem
para a casa de sua mãe. Ela
estava amigada e ela odiava aquele
tuir o lugar de seu pai. homem que tentava substi
Foi para um hotel no centro da
Não podia ficar rodando de táxi cidade. Tinha que agir.
com as malas, sem dinheiro.
Teria que enfrentar dias horríveis, de
de Nanci, teria que matar a angústia pela ingratidão
mentos e ânsias,
saudade e afogar-se nos remordi
Estava sÑ. Sem ningu¿m. Sem dinheiro. Sem
recorrer. saber a quem

65
No momento de desespero começou a lembrar-se de alguns
homens, amigos ocasionais, que estavam sempre na expectativa
de que ela viesse a precisar de algum favor. Quem sabe se ao
perceberem o seu desespero se condoessem e a ajudassem Sem
exigir nada em troca. Foi pensando assim que pediu linha à
telefonista do hotel e fez a primeira ligação.
Expôs em poucas palavras O que estava Ihe
Ele havia sido muito educado com ela e tratara-a como
um pai. Na vetdade podia até ser avô dela.
Conseguiu localizá-lo. Ele não foi como os outros. Iria
encontrá-la em seguida e quando ela perguntou onde ele res
pondeu com naturalidade:
No saguão do Hotel. Tomaremos um Suco
Qu um
drink, mas terei que deixá-la em seguida, pois tenho
sos inadiáveis. compromis

Ernesto chegou na hora marcada e foi de uma gentileza


que conquistou para o resto da vida o coração e
Edda. respeito de
Ele pôs disfarçadamente em sua bolsa uma quantia mais
do que suficiente para que ela iquidasse a conta do hotel e
também pudesse fazer algumas compras que fossem
necessárias.
Tiveram novos encontros, sempre no saguão do hotel para
um ligeiro drink, quando ele Ihe deixava na bolsa algum
ro. Estava sempre com pressa, por causa de
dinhei
outros compromis
sOs, negócios. Ele era um homem
extremamente ocupado. Er
nesto agia sempre comno um perfeito cavalheiro que
era, e, não
demonstrava querer aproveitar-se da situação. Parecia tratá-la
como um pai, ou teria simplesmente pena dela? Seria
que ele não tivesse nenhum outro possível
pensamento menos
Nesse meio tempo Gigi totnara-se mais amiga respeitoso.
Edda convidava-a para sairem durante a tarde dela, pois
para fazerem com
pras, mais pelo interesse e curiosidade, para ter
Parecia que nada ia bem entre ela e Malenanotícias
de Nanci.
que
continuava
também com ogigolô.
Assim, quando se deu conta, Edda
tuação bastante conveniente, mas nem lheacomodara-se numa si
tornar-se amante de Ernesto, pois vivia passava pela cabeça
de Nanci através de Gigi para se aguardando os chamados
encontrar com ela às escondidas
87
de Malena que era de rodar a saia emandar pau. Nanci enchia
Edda de medo de Malena. Edda era jovem, inexperiente, estava
é de chupar outra coisa.
vai chutar a sorte de se
Acho que se você dormir no ponto
tornar a mulher mais bem paga do
Brasil.
Edda desferiu a bofetada na cara de
Nanci e saiu
ser sempre assim para mim? Não se
Você pretende
aqui no saguão
cansa de vir encontrar todas as tardes comigo
SÓ para tomar um uísque e ir logo embora?
Você se sente só?
Ernesto não dava respostas. Fazia perguntas. Não falava
de si. Quando ela quis saber da família dele, ele fora reticente
homens e duas
e rápido. Tinha mulher e quatro filhos. Dois
não foi
mulheres. Ela perguntou os nomnes. Ele não disse e
indelicado, apenas desviou o assunto, rindo dela, da sua cara
triste e propondo:
Está bem, Esta semana vou ter que viajar. Se quiser
poderá ir comigo. Poderá distrair-se no Rio de Janeiro. Vou a
negócios. Não vou ter muito tempo para lhe fazer companhia,
éo
mas você poderá fazer compras e curtir essa fOssa, como
termo que vocês empregam. Quem sabe isso tudo passa.

Nanci continuava perseguindo-a. E dda acabou deixan


do-se levar por _uas súplicas e foi encontrat-se com ela.
Nanci precisava de dinheiro. Fizera uma trapaça com uns
documentos e agora tinha que cobrir a importância. Tinha que
depositar no Fórum senão seria exonerada. Exonerada! Seria o
fim da sua vida. Morreria. Iria matar-se. Edda perguntou
quanto era. Nanci disse. Edda tinha mais do que a quantia
que ela precisava. Não era muito. Economizara. Há muito
não fazia compras à tarde. Gigi envolvera-se com alguém, não
sabia ao certo se com um homem ou com uma mulher. Gigi
bem que a advertia contra Nanci. Nanci não era dígna de con
fiança. Estava mal acostumada por Malena e Ernesto poderia
garantir o futuro dela, o que ela mais tinha que fazer era dar
um chute em Nanci.

70
Futuro. Edda se deu conta de que estava pensando muito
em situação. Em dinheiro. En ter um carro.
Em ter as jóias
que via expostas nas vitrinas das grandes lojas do Centro. Pre
cisava fazer algo a tespeito.
Tirou o dinheiro da bolsa e deu-o a
selou seu último encontro com ela.
Nanci e com isso

71
Divagações. Reminiscências. E a queda. A volta à solidão.
Ao vazio. À insatisfação. Quanto tempo ficara pensando en
quanto enchia a banheira? Nem queria saber. Discou entre
tanto um três zero. E a Telesp informou: Três
horas e doze
minutos. Não era tarde. A noite parecia arrastar-se. Solange
estaria dando pipoca aos pombos. À tais horas os pombos esta
riam dormindo. Que caçasse morcegos.
Otelefone tocou. Alguém reclamando pelo "cano". Quatro.
Cinco telefonaram e a todas ela disse a mesma coisa. Que es
tava de saída. Solange reclamara. Estava encharcada. Ficara
andando na praça de um lado para outto. Nem pombos nem
morcegos e nem pipoqueiro. Edda riu. Estava de saída. Solange
continuaria esperando. Novamente o telefone tocou. Era Leilá.
Lembrou de Fabiana, porque Leilá era parecida com Fabiana.
Oque está
viu Leilá na
Quando estacionou em frente do edifício não
e
janela. Ficou esperando e ela não aparecia. Desceu do carro
sorte
correu pela chuva até um orelhão para telefonar. Por
tinha uma ficha na bolsa. Leiládesculpou-se. Não acreditava
que ela fosse mesmo e tão depressa. Pensara que Edda havia
brincado.

Quando Lelládesceu para abrir a porta do prédio Edda já


estava arrependida de ter ido lá.
Por sua causa tomei chcva. Se eu ficar resfriada você
me paga.
Assim que enttaram no elevadot Leilá puxou Edda contra
sí e beijou-a violentamente na boca. Edda retraiu-se. Não havia
emoção, nem malícia, coisa alguma no beijo. Não conseguia ex
citar-se. E ela que programara uma madrugada cheia de loucura!
A noite estava indo embora e ela ficaria apenas contando com
as próprias mãos para divertir-se. E seria divertimento? Que
tristeza!
Leilá estava sôfrega. Edda indiferente. Encolheu os om
bros e semicerrou os olhos empurrando-a de leve.
Leilá abriu a porta do elevador e elas saíram.
Assim que chegaram ao apartamento Leilá preparou um
drink, ligou a vitrola e aproximou-se sem dizer palavra.
Ficou tensa. As mãos de Leilá pousaram em seus ombros,
deslizaram pelos seus braços, puxou-a para rodeá-la num abraço.
Edda teve uma contração de repulsa e empurrou-a.
- Não posso. Não posso.
Não era aquilo e nem assim que ela queria que aconte
cesse. E numa atitude inesperada afastou-se e deixou o apar
tamento sem responder aos chamados de Leilá.

73
Inédito.
Nessa noite ela queria algo violento. Algo novo.
Que estuptasse sua própria alma. E iria estuprat-se toda. Arra
Ela não era mulher de
sar com todos os escrúpulos e mnoral.
ficar sem satisfazer vontades e realizar desejos, principalmente
numa noite toda feita de arrepios, especial para aventuras pe
rigosas.
Entrou no carro. Uma mercedes esporte que chamava a
atenção de todos. Linda de morrer. E ela estava igualmente
linda e brilhando. Brilhando com o fogo do desejo arregalando
suas pupilas como se ela tivesse ingerido tóxico. Mas não pre
cisava de tóxico para excitar-se e perder a razão e noção de
tudo, deixando-se levar por impulsos.
Que direção deveria seguir? O centro ainda movimentado
da cidade? A cata de que?
Rodou. São João, Avenida Ipiranga. Viu os tipos. De to
das as classes. E muitas bichas. Piranhas nas portas dos pré
dios. E se parasse perto delas esperando alguém? Um homem
ao qual escolheria. O que fariam os dois? Para onde ele a
levaria? Oque faria se ela o levasse no seu mercedes para o
seu apartamento? Talvez fosse um cafajeste e passaria a fazer
chantagem. A idéia havia empolgado-a, mas aos poucos riscou-â.
Eteria coragem de fazer concorrência às putas da São João?
E avontade? A vontade de se dar a um desconhecido, de
ter uma aventuta diBerente, uma vez na vida ao menOs?
Seguiu em frente. Subiu a Consolação. Desceu pela Majot
Sertório, subiu pelo elevado, seguiu de novo pela Consolação,
Rebouças, Ibirapuera, Aeroporto. Voltou pela Nove de Julho.
Viu os carros estreitando passagem alinhando carros e o
comando parando para vistoria. Alguma coisa. Estrenmeceu de
medo. Mas respirou fundo, Os documentos estavam corretos
na bolsa e ninguém iria mandá-la sair do carro e abrir o longo
capote de lã. Se isso acontecesse! Se isso acontecesse!
Estavam inspecionando finais de chatba vencidos conforme
data de lacração. Fizeram sinal para que ela seguisse em trene
e rápido para dar andamento ao tr¥fego.
74
Não era mulher de medir e calcular coragem. Era de
ou não fazer. Seguia impulsos e há muito os fazer
tavam atados dentro de uma yida impulsos dela es
rotineira. Precisava satar-se
com grande estardalhaço. Estardalhaço do sangue, das
dos pensamentos. Não evitaria oque vinha agora ànente. idéias,
Coisa
absurda. Deliciosamente absurda. E seus
olhos
ruas
procura. Não achava o tipo. E tinha queperscrutaram
ser O Tipo!
as
Viu-o. Livros debaixo do braço. Jaqueta de
couro.
de brim apertada, ombros
largos, mãos metidas nos bolsosCalça
da
jaqueta, cabeça baixa, andando meio encolhido por causa
vinha fina que caia e do frio que fazia. Era da chu
bem jovem. Foi
beirando a calçada, seguindo-o
cebeu e olhou para ela temeroso.vagarosamente. rapaz per
uma mnulher Quando viu que era apena
sorriu como se estivesse aliviado. Talvez
fossem
assaltantes. Os assaltantes às vezes andavam maconhados,
estavamn sempre dopados e assaltavam até estudantes, por ou
Edda chamou-o: nada.
Por favor, moço, por favor.
Orapaz acercou-se, ressabiado, olhando
para os bancos tra
seiros.
Por favot, avise-me quando chegarmos
no retorno.
Oualquer rua que der mão à esquerda pode entrar. Eu
de Julho.
- Eu me perdi.
Descreveu um olhar malicioso e avaliador pelo rapaz e per.
guntou:
Qual é o seu nome?
Armando.
0 meu é bárbara mentiu Que noite fria, não
acha? Você está todo molhado. Coitadinho. Estuda? O que?
Já étão tarde para estar na rua com livros debaixo do braco.
Estou
Fez uma longa e expressiva pausa, passando a língua pelos
lábios e continuou:
Senti vontade. de
tade de dar uma carona para convidar vocêe. Fiquei Com Von
você. Você parece mesmo um
pintinho molhado, não se importa porque eu disse que
um "pão" molhado, tão tristinho com os livros debaixo do parece
encolhidinho, fiquei mesmo com pena. Você não braço,
medo? ficou com
Por que?
-Eu notei como inspecionou e olhou
bem para a
cara antes de subir. O que eu iria assaltar de você? Sua minha
As suas calças? jaqueta?
E Edda
desavergonhadamente,pôs a mão sobre a coxa dele,
apertando-a maliciosamente perto das virilhas.
Está assustado?
- Eu?! Eu não.
Era umn safado. Estava
entendendo tudo. Ela viu bem o
volume nas calças aumentat. Armando estava se armando. De
cotagem e de tudo, dobrou-se para trás colocou os livros no
banco traseiro.
Inda bem que não dera catona pra
nhum atrevido. Ele seguia conforme o nenhum bobão e ne
compasso da música,
sem pressa, saboreando ocomando. Ela era o comando. Edda
gostava de comandar.
Passei por você duas vezes. Notei seu jeito.
depressinha, friorento. Andando
E ficou com
pena.
Não. Fiquei com vontade de ver você de perto. De
saber o que estuda. Já sei. Pré-médico. Deve saber
Anatomia. bastante de
Sei.
Prática?
E teórica.
Onde entro para pegar a Nove de Julho? Acho que a
gente já está na Avenida Brasil. Agora mne perdi de
Orapaz olhou para a rua e ela verdade.
começou rir.
a

77
Está com Deve pensar que sou
medo de mim.
matusquela, alguma louca, uma assaltante, uma coisa alguma
tota de
série. .
Ele não fez comentário.
Então? Posso mesmo Contar coOm a sua
companhia o
prefere que eu o deixe em algum lugar? Já disse que et
me sentindo muito só, vi vocà e resolvi fazer alon
algo que rom-
pesse com todos os preconceitos e medos,
Ele respirou fundo. Retomou fôlego e deu partida.
Ela sentou de costas para a porta, encarando-o.
Sentou di
reito. Aproximou-se dele.
Você é tão jovem. Quantos anos tem?
Vinte.
Ejá está
agradasse. Pela primeira vez na vida tive que fazer isso
ia morrer de vontade.
só voc& me interessou?
Andei quase
Só você
a noite toda.
Acreditasenão
me deu vontade irresistível? que
Orapaz estava
tos resfolegando longos suspiros.
Puxou-a para beijála na boca encantado com orosto bo
nito de Edda. Ela deixOu-se agarrar, mas afastou a
boca
deixando beijar. Não queria beijos. S6 sexo. E disse-lhe:não se
Na boca não, pode sugar os mneus seios.
meu casaco, ponha a boca nos meus Desabotoe o
seios, chupe-os e meta esse
troço em mim, bem fundo, fique
Os dedos trêmulos do rapaz começaram a desabotoat o
grosso casaco de lã e logo ele viu que ela estava completamente
nua sob o abrigo. Suspirou e agarrou-a pelos seios com ner.
vosismo,
Edda acaticiaya opênis dele morosamente com as mãos sen
suais e sugava os mamilos,
Que deliciosa louca!
Os dois molhados, escorregadios, abraçados, esfregando-se
um no outro, o membro dele
tra o Corpo deles numa torrente de água que no entretanto em
vez de esfriá-los parecia aquecê-los mais,
ção deliciosa do &xtase.
aumentando a sensa
A chuva, pespegando-os. O calor dos corpos
ofrio da noite. lutando contra
Ela fizera daquele rapaz um tarado. Ele
que pudesse aqueles momentos e
queria viver o mais
fúria selvagem, com febre. agarrava-se aO corpo dela numa
Enquanto a chuva lavava o corpo dos dois, foram viran
do-se um sobre o outro como ponteiros de
os dois em sentido vertical emn relógio até ficarem
posições opostas, beijando-se,
Quando se sentiram esgotados começaram também a sentir
frio e ato simultâneo correramn para dentro do carro., Ele pegou
a camisa e começou aenxugá-la com carinho. O olhar mortiço
de Armando confirmava que ele estava perdido de amor por
ela. Um amor brutal, nascido em frações de segundo, de uma
atração sexual que o mantinha aceso e disposto, mesmo depois
de ter investido sobre ela diversas vezes e ter a impressão de
que se haviam exaurido todas as forças e rasist¿ncias do seu
Corpo porque o membro estava firme, como num desafio.
Nossa! Parece que acertei. Você não esgota?
Ele estava ofegante, o coração
Não... não dá. pare. isso me deixa nervosa.
E se você tentasse aguentar pra ver o que acontece?
Serei delicado, calmo, farei bem devagarinho, acho que são os
meus dedos.
E ele pegava-a, bolinava-lhe o sexo de todo o jeito, como
se estivesse
0s seios dela e ela com a boca
grudada na orelha dele, mor.
discando os l6bulos, enfiando a língua.
Você é bonito, é gostoso, é forte, é
gostei de você, puxa que sorte eu tive achando cheiroso
você nesta
limpo,
de chuva. . noite
Eu estava perdido, triste, de fossa, fossa por
não ter
porque ter fossa. Eu estava excitado, sabe, acho que foi Deus
que pôs um no caminho do outro, porque eu
ter uma mulher.
precisava tanto
estava pensando o que poderia fazer
Como ifla conseguir passar mais uma noite sem tazer
sexo.
por isso estava andando na chuva, para estriar a
cuca, estava
com frio, mas tudo em mim queimava, mal acreditei
quando o
seu carro foi beirando a calçada e você me chamou. Parecia
que
estava saindo de dentro da minha cabeça, tomando formas atra
vés do meu pensamento. Não foi medo o que eu
senti, toi per

Empurra um pouquinho só mais pra dentro, assim, mexe


sóum pouquinho, só pra ficar mais encaixadinho ládentro. Que
delícia, assim, assim, agora pare, pare senão eu sinto de novo
e eu quero que venha sozinho. que loucura, que loucura.
Ele lambeu opescoço dela, o queixo, a nuca,
amassando os seios dela com as mãos retesadas. mordiscando,
Desceu as mãos para as nádegas dela, tomou-as nas maos
e empurrou-as num movimento de vai e vem, os
dedos espertos
separando-as,
Para o que eu pensava no, preferível fazer um bura
quinho numa melancia, mas nem é tenpo de melancia.
Um buraquinho numa melancia?
Fiz isso quando era bem garoto. Estava louco. A me
lancia estava gelada, mas eu a aqui, foi uma coisa alucinante.
Fui o maior comprador de melancia das carrocinhas de rua,
dos
supermercados e das feiras.
Edda riu e ele perguntou se ela tamb¿m se mnasturbava.
Até hoje.
Você se masturba pra mim?
Depois da carezza, está bem? Se a gente conseguir.
Você acha que a gente consegue chegar ao fim
antes que ama
nheça? E se alguém passa e nos pega nus assim?
Puxa! Teria sido bom se eu tivesse encontrado você
Com a Caravan do meu pai ou com a Brasília. A gente podia
ficar lá dentro, com mais espaço,
Não é meu marido. Eu menti. Émeu amante, meu
"coronel", um velho, pena, é muito bom, dá no couro, mas não
é rijo, forte, capaz do que você é, de dar tantas, às vezes fico
na mão e ele gosta de me ver masturbar, me chupa, só me
chupa maioria das vezes, como uma homossexual chupa outra.
Você já andou com mulher?
Já.
Eo que achou?
Eu era adolescente, não sabia nada da vida sexual ainda.
Gostei naquela época, hoje me dá repulsa, o que eu gosto mesmo
édisso que você pôs em mim, que estáme queimando lá dentro.
Eu acho que não vou. conseguir. . . esperar vocÃ.
estou sentindo,. a coisa vem subindo.. eu vOu ejacular vou
molhar você todinha. não aguento mais. não. aguento.
Ao mesmo tempo em que a onda de gozo começou a avo
lumar-se ele perdeu completa razão e começou a meter-se nela
furioso,

90
Estácustando amanhecert. Parece que a chuva estáamar
rando o tempo para que a gente fique junto.
Dia nublado, poluição e chuva, tudo escuro, acho que
o tempo quebrou os ponteiros por nossa causa.
Mas eu tenho que ir embora antes que amanheça. Sou
uma Cinderela diferente, que precisa voltar para casa antes que
amanheça.
-Do jeito que você suga posso chamá-la de minha vam
pira da madrugada. Você é uma vampira.
Você é que é um vampiro.
Os dois riram e trocaram um beijo, ele vestindo as calças,
já com a camisa abotoada e ela abotoando o casaco de lã.
Você saiu assim, toda nua sob o casaco?
Saí. Estava louca. Saí feito uma sonâmbula. Acredita
que nunca fiz isso? E não me
chuva era perigoso
dente, mesmo àquelas horas, numa noite de
o que você estava
Edda deitou a cabeça no ombro
estava dele e disse baixinho e
Existe sim muitas .
Não como você. especial.
Porque você é especial. espadaúdo, forte, jovem,
atlético. Pratica esportes?
Quase todos. Me meto em tudo.
- É. Você mete mesmo muito bem.
Edda estava se sentindo uma verdadeira depravada, mas
não se importava absolutamente com isso. O que ela queria era
viver o máximo, explorar o máximo da vida e do seu corpo.
Não seria idiota de se prender a medos e seguir frustrada quan
do podia sair como os homens saem a cata de mulheres para
saciar seu instinto sexual, e catar seu homem, o homem que
ela escolhesse, que a atraísse, como Atmando Ihe inspirava aquela
maravilhosa aventura que acabara de realizar e viver tão inten.
samente quanto só em sonhos conseguira satisfazer, em coitos
mentais. Aquilo era viver, era vida, era ser exatamente ela,
somente ela, livre, senm freios, natural, para o que a natureza
a fizera, para sentir o prazer, para viver pelo prazer de pecar.

94
Encheu a banheira de água e tomou um
As mãos de Edda demorado banho.
esfregavam
há poucos instantes. O que
com força o corpo todo. Chegara
fizera? Entregara-se a um homem
desconhecido que
que ela
ela caçara na rua.Deixara-se penetrar e fizera
coisas que nunca havia feito antes como
uma ninfôníaca de
sesperada.
Mas estava satisfeita. Empolgada. Feliz.
rapaz que a princípio julgara tímido e Realizada. Aquele
potencial fantástico, fora surpreendente einexperiente tinha um
preenchera com per
feição a silhueta que a consumia nos deleites dos seus momen
tos de ânsia sexual, quando se
masturbava. Ele usara-a comno
se ela fosse umna bonequinha, brincando com ela de todo
Sem medo,
jeito,
rítmico, forte, viril, amoroso, violento, fogoso, um
animal, um sonhador, um louco, um assustado com os seus pró
prios atos, assustado com ela, assustado com a vida,
assustado
com a noite de chuva. E
novo. E pensou em ir com ele para lugares distantes, para
motéis, em estradas, em lugares onde os dois pudessem se amar
mais, se era possível fazerem mais do que haviam feito.
Amar mais. Amar mais? Era possível surgir amor assim
de repente, num homem caçado na rua, muito mais jovem do
que ela? Só porque era bonito, forte, garanhão, fogoso, ardente,
peito másculo, fofo de pelos, axilas peludas e perfumadas, todo
cheiroso, corpo dourado de sol, membro espetado pra cima,
atrevido e grande, enchera-a toda, macio, rijo, estufando-se em
suas entranhas, as mãos grandes, gostosas, nervosas, macias, ca
riciosas, ora agarrando com força, chegando a machucá-la, hora
afagando até o máximo do arrepio, dedos
winha e não a encontrava dizia brincando que ela estava
tão perfeita como fora a dos dois, numa aventura numa noite
de chuva.
A mão estendeu-se sobre o telefone. Atà decorara o nú
mero. Parecia que ele estava esperando.
Pensei que nunca fosse teletonar e ao mesmo tempo
tinha certeza que ia ligar agora.
Ainda estou precisando de voc¿. .. isto é uma fúria
que acendeu em mim uma fogueira. Acho que estou enlouque.
Ótimo.
-Agora vá dormir. Reabilite-se. Quero você bem forte
para judiar bastante de mim.
Você élinda.
Você é lindo. Adoro os seus olhos dourados.
Dourados? Castanhos claros.
Em contraste com a pele queimada de sol são dourados,
Como a sua pele, olhar dourado, de fogo.
Você é maravilhosa. A gente vai se fazer muito.
Quero que você seja meu.
Seu amante.
Meu macho.
Minha fêmea.
Reserve um pouco pra noite.
- A gente está inventando um sonho.
- A gente está
-- ÉSobre a Fabiana.
- - ) que há?
- Ela nunca me enganou. Era uma enrustidona. Imagine
você, casou. Casou e já está viajando em lua-de-mel pela Eu
Iopa. Talvez vocês se cruzem. Não sei no que isso vai dar.
Edda emudeceu. Ficou em silêncio alguns instantes.
Casou mesmo? Com bicha? Um arranjo?
Não. Um machão. Um médico. Acho que ela deu uma
trepadinha Com ele e vai ver que gostou e 0 trouxa se amarrou,

E. Vai ver que ela gostou.


Vou desligar. Ligue pra Nanci.
Desligaram e Edda ligou para Nanci. Geisa atendeu. Es
tava chorando. Edisse sem ânimo, triste, cansada, como se há
muito esperasse isso:
Morreu. Hácinco minutos. Eu estava tentando ligar
para você, mas o seu telefone estava ocupado, acho que ela
queria despedir-se de você, me pediu que fizesse a ligação, que
ria dizer-lhe que sempre a quis muito bem e que lhe desejava
*oda a felicidade do mundo, que você merece.
Como? Como ela morreu, assim, de repente?
Assim, de repente. Já estava no fim. Havia saído do
sanatório há quinze dias, desenganada. Mas ela não sabia.
E vocês deixaram que ela saísse só?
Ela queria viver. a gente não podia Com ela.
Edda desligou. Não tinha lágrimas. Estava apática.
Estremneceu e levou as mãos ao rosto ao ver o vulto do
homem desenhar-se na porta do quarto.
Assusteia-a?
Não ouvi você. que susto! - Respondeu ofegante.
Ele aproximou-se e debruçou-se sobre ela beijou-a de leve
nos lábios.
Acaba de deitar-se pelo que vejo. ..
E acabo de receber uma notícia muito triste. Chocante.
O que?
Nanci. Morreu. Há uns guinze minutos. E eu a V
ainda há algumas horas.
Esteve lá?

100
Não. Fui jantar com ela. Saímos. Fomos a uma festa.
Ela não estava nada bem. Bebeu muito. Geisa disse
que ela
havia saído há pouco tempo do sanatório. Estava
Eu não sabia. Acho que ela me desenganada.
que estava no fim. Foi mesmo uma
procurou porque desconfiava
mal, Ernesto.
despedida. E eu a tratei
Não pense. Não se culpe em nada. A
vida é
mesmo, sinto muito por essa notícia. Eu queria bem assim
safada. Iremos ao
àquela
enterro.
Claro.
Ernesto estava com o braço passado em volta dos
dela e Edda apoiou a cabeça em seu ombro e ombros
lágrimas. Não conseguia sofrer muito. Talvezchorou. Algumas
estivesse muito
surpresa com os últinos acontecimentos.
Ernesto afagava-lhe os cabelos e tentou mudar de
para distraí-la. Não queria que ela assunto
Estava sempre empenhado em satisfazerpensasse em coisas tristes.
os
teliz e sempre se preocupava em saber se gostos dela para vê-la
do-a só para dar um jeito de havia algo aborrecen
lavras de conforto, presentes, consolá-la
passeios.
com alguma coisa, pa
Você não foi jogat então?
Ela estendeu os braços por cima das
sufocada: cobertas e exclamou
Você éque está me lembrando que existe baralho. Es.
queceu que prometi não jogar mais? E não pense que não
tenho vontade. Preciso fazer um esforço
sistir.
sobre-humano para re
Ele tirou o paletó e puxou a cinta.
Você vai ficar aqui?
Só um pouco.
- Não tenho
condições Você não vai querer. não é?
-- Puxa, Edda, eu também gostava dela, apesar de tudo,
nao sou tão cretino, aliás não sou cretino.
Otelefone tocou. Era Geisa. Estava telefonando para
aVisar a hora do enterro. Seria às cinco horas. Edda disse que

101
logo mais iria até lá com Ernesto que pegou o teletone e trocou
algumas palavras com Geisa. Em seguida ligou para uma flori.
cultura e
Edda retomou suas divagações. Reprovou-se pelo que fi
zera, pelo que pretendia fazer. Etnesto não merecia. Fora sem
pre tão bom, tão digno, fora e era o único que merecia e me
receria sempre receber dela o que de mellhor ela tivesse para
lhe dar. Se ele soubesse entretanto dos seus
desejos e da sua
loucura. Da sua vontade de rever Armando. Uma vontade que
superava a tudo, até a dor que estava sentindo pela morte de
Nanci.
Apertou-se aninhando-se contra ele. Ernesto era um homem
bacana. Pena que a deixasse tão só e demorasse tanto a ter re
lações com ela. Ela o teria amado, talvez, se ele tivesse sido
mais impetuoso, se tivesse colaborado nas loucuras dela, se ti.
vesse participado dos seus sonhos, os sonhos que ela nunca lhe
contara e que realizara todos numa noite só, nessa madrugada
nos braços de Armando.
Lembrava-se de quando tudo começara entre ela e Ernesto.
Ele semnpre tomando as iniciativas. Fora uma noite buscá-lo no
clube de jogo. Lembrava-se perfeitamente da sua decisão. A
culpa fora de Nanci. Fora ela quem a havia incitado quando
Ihe dissera que se continuasse a bancar a santinha ia
acabar per
Ele ficara deslumbrado quando a vira e perguntara aonde
ela queria ir.
Conhecer o seu apartamento. Ele não se opôs e foram
acendeu
para o apartamento dele. Assim que entraram, Ernesto
aluz. Os dedos de Edda passaramn sinuosamente perto do rosto
deie em direção ao comutador e apertou o botão para desligar.
Ele tornou a acender. Ele repetiu o gesto, olhando para ele
com uma expressão de súplica ao mesmo tempo exigente.
Ohomem controlou-se e avançou pela sala, conservando-se
dentro de uma seriedade de respeito e acendeu os abajures.
Ficou tudo em deliciosa penumbra colorida.
Edda passou na frente dele balançando-se no seu andar in
sinuante e inclinando-se perto da mesinha posta ao lado do sofá,
apagou um dos abajures. Acendeu um cigarro, soitou por entre
os lábios uma longa nuvem de fumaça. Arredondou os lábios
sensualmente. A fumaça esgarçou-se acariciando o rosto dele,
como as coisas inócuas que passam. O olhar dos dois cintilou
na penumbra, ardentemente. Sentaram um ao lado do outro no
sofá. Edda fitava-o com intenções, convidando, transmitindo o
desejo que estava de acordo com as suas intenções, chegando
até a pensar que estava começando a se apaixonar por Ernesto.
Ela esperava. Queria se dar para ele. Ele a merecia. Es
tava pagando a posse há muito tempo e a longo prazo, estava
na hora de fazer o recibo, de Ihe passar a propriedade, todos os
direitos para uso. Ela aproximou-se,
emaior era o calor que o queimava por dentro. O olhar dela
tonteava-o, arrastava-o, levava-o feito um hipnotizado para o pri
meiro beijo demorado, intenso, arrebatador. Ele estava prepa
tado.
Edda não se conformou. Como poderia ele resistir tanto?
Ele afastou-se dela e ficou sentado na extremidade do sofá.
Sobre o que começou a falar? Coisas sem importância, suando,
desapertando a gravata, tentando fugir da sensação que ela es
tava provocando, sem impedir que ela avançasse para ele, olhan
do-o com uma expresso de desejo que o aniquilava.
Precisou fazer esforbo sobre-humano para continuar falando
Como se não tivesse escutado o que ela disse, decidida e ardente:
Queto ser sua.
Não havia reticências. Nem medo. Nem pudor. Só desejo.
Havia uma determinação imperativa.
Quero que me faça.
Edda levantou e girou nos calcanhares dançando na frente
dele,
Tudo a faxineira.
Ele sentou ao lado dela. Ela levantou-se e passou para a
direita, deixando-0 entre a cabeceira da cama e a parede como
que encurralado. Debruçou-se scbre ele e começou a beijá-lo
todo, sofregamente, pedindo que ele a possuísse, depois de ter
colocado olivrinho sobre o criado-mudo, usando dessa façanha
para
deitar sobre ele. Ele estava excitado. Não podia aguentar
por mais tempo. Estava vencido pelo desejo. Não podia pensar
em mais nada. Desse no que desse. Ele queria aquela mulher.
E pensar em fazê-la, desvirginá-la, enlouqueceu-o. Prendeu-a pe
los ombros, jogando-a na cama. O homem que resistira tanto
tempo tornava-se um bicho feroz chegando à excitação máxima
do desejo.
Se ela resolvesse desistir não conseguiria escapar dele. Pren
dia-a num abraço em cimna da cama. Ergueu-Ihe a saia do vestido,
agarrou-lhe as coxas, nervoso, esfregou o membro duro nelas,
parecia querer esmagá-la sob o peso do corpo, num segundo ela
estava nua, abraçando-o,
dela comn as mãos brutais,
Edda não conseguia chorar por Nanci. Não conseguia es
quecer de Armando, mas ao rememorar tudo aquilo, a cabeça
pousada no peito de Ernesto, começou a sentir um estranho fogo
alastrando-se,
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Sensual e conquistadora,
Edda iespertava paixões
violentas - as mulheres
brigavam por ela e os
homems faziam tudo 0 que
eaa queria. Cada noite na
vida de Edda representava
avida toda.

Cassandra Rios

PRAZER
DE PEGAR
Gama)

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