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UNIVERSIDADE POSITIVO

PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO


DOUTORADO EM ADMINISTRAÇÃO
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: ESTRATÉGIA, INOVAÇÃO E
EMPREENDEDORISMO

TESE DE DOUTORADO

UM SOL PARA CADA UM: UM MODELO DE GOVERNANÇA PARA O


USO E A DISSEMINAÇÃO DA ENERGIA SOLAR NO BRASIL

DANIELLE DENES DOS SANTOS CARSTENS

CURITIBA
2016
DANIELLE DENES DOS SANTOS CARSTENS

UM SOL PARA CADA UM: UM MODELO DE GOVERNANÇA PARA


O USO E A DISSEMINAÇÃO DA ENERGIA SOLAR NO BRASIL

Tese apresentado ao Programa de


Mestrado e Doutorado em
Administração da Universidade Positivo.
Orientadora:
Prof.ª Dr.ª Sieglinde Kindl da Cunha

CURITIBA
2016

ii
Dados Internacionais de catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca da Universidade Positivo - Curitiba – PR

*** Sobrenome, Nome.


Título 1a. linha
título continuação
título continuação / Nome Sobrenome
Sobrenome. Curitiba : Universidade Positivo, ano.
***(número de páginas*** p.

Dissertação (mestrado) – Universidade Positivo – UP, ANO.


Orientador : Prof. Dr. Nome e Sobrenome

1. palavra chave. 2. palavra chave. I. Título.

CDU 65.***.*

***solicitar elaboração da ficha catalográfica à bibliotecária da universidade

iii
Aos meus queridos pais, Jaime e Ana Maria

pelo amor incondicional e por possibilitar

a minha trajetória até aqui.

Ao Luciano, meu amor, pela infinita dedicação,

compreensão e companheirismo.

Aos meus dois anjos Gabriel e Rafael, por me

permitir perceber o verdadeiro significado da vida.

iv
AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos a todos que contribuíram de alguma forma


durante os quartos anos de desenvolvimento desta tese de doutorado.
Em primeiro lugar, à Profa Dra Siegliende Kindl da Cunha por ser muito mais do
que uma orientadora. Não tenho palavras para agradecer todos os momentos que
passamos juntas nesta caminhada. Sua experiência, seriedade, sabedoria e apoio me
proporcionaram uma experiência única e inesquecível. MUITO OBRIGADA!!!
À Profa Dra Linda Kamp, por me receber tão bem na Universidade Tecnológica
de TU DELFT, na Holanda. Agradeço imensamente pelas suas contribuições durante
o período de realização do Doutorado-Sanduíche em Delft, na Holanda.
Aos professores do Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da
Universidade Positivo, ao Prof. Dr. João Carlos da Cunha, Prof. Dr. Pedro José Steiner
Neto, Prof. Dr. Dálcio Roberto dos Reis, Prof. Dr. Eloy Eros da Silva Nogueira e Profa
Dra Yara Lucia Mazziotti Bulgacov e todos os demais professores do PMDA. Ao Prof.
Dr. Carlos Eduardo Yamasaki Sato e ao Prof Dr. Jair Urbanetz Junior por suas
contribuições e participação na banca de avaliação.
Agradeço ao Dr. Carsten Tschamber por me receber pessoalmente para a
entrevista no Solar Cluster Baden-Württemberg na cidade de Stuttgart, bem como a
todas as instituições e organizações que aceitaram participar da pesquisa por meio
de seus representantes, que muito contribuíram para o desenvolvimento desta tese,
em especial à Emerson Alberti e Charles Lenzi pelas indicações dos entrevistados.
Não poderia deixar de agradecer aos amigos que me ajudaram durante este
processo de doutoramento, especialmente ao Juliano Lima Soares, que foi um
parceiro intelectual durante todo o doutorado em nossas intensas e ricas discussões
epistemológicas. A Ticiana Braga De Vincenzi, Andriele de Prá Carvalho, Andréa
Torres Barros, Eliane Fernandes Pietroviski, Marcia Bronzeri, Elton Schneider,
Cláudia Lara, Cristiane Becker, Fabricio Pupo, Gilvane Marchesi, Valéria Denes,
Maxiliano Ribeiro, Anelise Coelho e Daniel Fraxino.
Finalmente agradeço eternamente às pessoas mais importantes: meus pais
Ana Maria e Jaime, meu companheiro Luciano, por sua dedicação amorosa e apoio
incondicional para que eu pudesse completar esta tese e aos meus amores Gabriel e
Rafael. Sem vocês eu não teria alcançado este objetivo. Muito Obrigada a todos!!!

v
RESUMO:

Esta tese apresenta um modelo de governança para o uso e a disseminação da


energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil à luz da perspectiva sociotécnica da
inovação. O objetivo geral desta pesquisa foi verificar de que forma a gestão da
transição da tecnologia acontece e propor um modelo de governança para fomentar o
uso e a disseminação da energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil. Para o
cumprimento deste objetivo, inicialmente, foram revisados os aspectos fundamentais
da teoria sociotécnica da inovação, com o recorte teórico de três abordagens
complementares: sistemas de inovação, perspectiva multinível e funções do sistema
de inovação. Tais teorias permitiram a elucidação da dinâmica do sistema de
inovação, dos papéis dos atores e dos desafios e oportunidades para a emergência
desta tecnologia no contexto nacional. A metodologia qualitativa foi utilizada com a
aplicação das técnicas de análise de conteúdo, análise categorial temática e análise
documental. A coleta de dados envolveu a realização de 21 entrevistas em
profundidade com atores relevantes do Brasil e da Alemanha, bem como a análise
documental de 69 documentos nacionais e 18 documentos da Alemanha, a fim de
realizar um comparativo entre os dois países em termos de trajetória desta tecnologia.
No caso do Brasil, os aspectos históricos tiveram um papel importante na formação
da atual estrutura política e de atores, uma vez que o Estado possui um papel central
e controlador, que direciona a trajetória da tecnologia neste setor. Os resultados
mostraram que o modelo de governança para esta tecnologia aplicado ao contexto
nacional deve observar cinco dimensões: as iniciativas governamentais, a pesquisa e
o desenvolvimento, a indústria nacional, a formação de novos mercados e a tecnologia
e a inovação. Foi possível observar, a partir da experiência alemã, que as instituições
governamentais atuam como facilitadoras e não como executoras das políticas para
fomentar a tecnologia. Em termos de trajetória da tecnologia no país, pode-se dizer
que o Brasil encontra-se em um momento de transição da fase de nicho para a fase
de alinhamento e padronização, na qual a tecnologia inicia o processo de legitimação
no sistema e a estruturação de um mercado em escala, com potencial de consolidação
na matriz energética nacional.
Palavras-chaves: Energia Elétrica Solar Fotovoltaica, Teoria Sociotécnica da
Inovação, Sistema Nacional de Inovação, Governança.

vi
ABSTRACT:

This thesis presents a governance model for the emergence of Solar Photovoltaic
Electricity (PV) in Brazil from a socio-technical view of innovation. The objective of this
research was to identify how technology transition management happens and propose
a new governance model to promote the use and dissemination of PV energy in Brazil.
To reach this goal, initially, we reviewed the fundamental aspects of socio-technical
innovation theory, with the theoretical framework of three complementary approaches:
innovation systems, multilevel perspective and the functions of innovation system.
Such theories have enabled clarifying of the dynamics inside the innovation system,
the actors’ roles as well as the challenges and opportunities for the emergence of this
technology in the national context. Qualitative methodology was used with the
application of content analysis techniques, thematic category analysis and written data
analysis. Data collection involved 21 in-depth interviews with relevant stakeholders in
Brazil and Germany, as well as written data analysis of 69 national documents and 18
documents from Germany, in order to compare these two countries in terms of
technology transition. In Brazil, historical aspects played an important role in terms of
shaping the current political actors and structure, since the state has a central and
controlling role, which directs the path of technology in this sector. The results showed
that governance model for this technology applied to the national context, should
observe five dimensions: government initiatives, research and development,
technology and innovation, the domestic industry and the formation of new markets.
From the German experience, we could observe that government institutions must act
as facilitators and not as executors of policies in order to promote the technology. In
terms of technology patch in the country, it can be said that Brazil is now in a moment
of transition from niche phase to alignment and patterning phase, in which technology
starts the process of legitimation in the system and begins a market scale structure,
with potential for consolidation in the national energy matrix.

Keywords: Solar Photovoltaic Electricity (PV), Sociotechnical Theory of Innovation,


National Innovation System, Governance.

vii
Quando o sol bater
Na janela do teu quarto
Lembra e vê
Que o caminho é um só.

Por que esperar se podemos


começar tudo de novo
Agora mesmo
A humanidade é desumana
Mas ainda temos chance
O sol nasce pra todos
Só não sabe quem não quer.

Quando o sol bater


Na janela do teu quarto
Lembra e vê
Que o caminho é um só.

Até bem pouco tempo atrás


Poderíamos mudar o mundo
Quem roubou nossa coragem?
Tudo é dor
E toda dor vem do desejo
De não sentirmos dor.

Quando o sol bater


Na janela do teu quarto
Lembra e vê
Que o caminho é um só.

Renato Russo

viii
SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS .................................................................................... XII

LISTA DE QUADROS ................................................................................. XIII

LISTA DE GRÁFICOS ................................................................................ XIV

LISTA DE TABELAS ................................................................................... XV

1 INTRODUÇÃO ............................................................................... 17

REFERÊNCIAS:............................................................................................ 25

2 ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA ENERGIA FOTOVOLTAICA


NO BRASIL À LUZ DA TEORIA DA TRANSIÇÃO
SOCIOTÉCNICA DA INOVAÇÃO ................................................. 26
2.1 INTRODUÇÃO ............................................................................... 28
2.2 TEORIA DA TRANSIÇÃO SOCIOTÉCNICA DA INOVAÇÃO ....... 29
2.3 ASPECTOS DE GOVERNANÇA NO DESENVOLVIMENTO DE
NOVAS TECNOLOGIAS................................................................ 42
2.4 O SETOR DE ENERGIA ELÉTRICA SOLAR FOTOVOLTAICA NO
BRASIL .......................................................................................... 46
2.5 UNINDO OS CONCEITOS: GOVERNANÇA E A TRANSIÇÃO DA
TECNOLOGIA DE EESFV NO BRASIL......................................... 52
2.6 CONCLUSÕES .............................................................................. 60

REFERÊNCIAS:............................................................................................ 62

3 A EMERGÊNCIA DA ENERGIA FOTOVOLTAICA NO BRASIL:


DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA CRESCIMENTO .......... 66
3.1 INTRODUÇÃO: .............................................................................. 68
3.2 REFERENCIAL TEÓRICO:............................................................ 70
3.2.1 Perspectiva Multinível: ................................................................... 70
3.2.2 Funções do Sistema de Inovação: ................................................. 74
3.3 METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................... 77
3.4 ANÁLISE DOS DADOS: ................................................................ 78
3.4.1 O Setor de Eletricidade no Brasil ................................................... 79
3.4.2 O desenvolvimento da eletricidade solar fotovoltaica no Brasil ..... 81
3.4.3 Perspectiva Multinível (MLP) Aplicada a Energia Solar Fotovoltaica
no Brasil ......................................................................................... 87
3.4.4 Perspectiva das Funções do Sistema de Inovação aplicado à
energia solar fotovoltaica no Brasil ................................................ 90
3.4.5 Desafios e oportunidades para a energia para a energia solar
fotovoltaica no Brasil ...................................................................... 95

ix
3.5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES: ....................................... 97

REFERÊNCIAS:.......................................................................................... 101

REFERÊNCIAS PARA AS ENTREVISTAS: .............................................. 104

4 GOVERNANÇA E CAMINHOS PARA A ENERGIA


FOTOVOLTAICA NO BRASIL .................................................... 106
4.1 INTRODUÇÃO: ............................................................................ 108
4.2 REFERENCIAL TEÓRICO........................................................... 109
4.2.1 Transição Sociotécnica para Sistemas de inovação.................... 109
4.2.2 Sistema Nacional de Inovação..................................................... 113
4.2.3 Governança para a transição de energia renovável .................... 116
4.3 METODOLOGIA DE PESQUISA ................................................. 120
4.4 O SISTEMA NACIONAL DE INOVAÇÃO PARA A ENERGIA
SOLAR FOTOVOLTAICA NO BRASIL ........................................ 124
4.4.1 Iniciativas Governamentais .......................................................... 127
4.4.2 Pesquisa e Desenvolvimento ....................................................... 135
4.4.3 Formação de Novos Mercados (Nichos)...................................... 141
4.5 O ENERGIEWENDE – TRAJETÓRIA DAS ENERGIAS
RENOVÁVEIS NA ALEMANHA ................................................... 149
4.5.1 Comparativo Entre a Transição da Energia Elétrica Solar
Fotovoltaica no Brasil e na Alemanha.......................................... 159
4.6 CONCLUSÕES ............................................................................ 162

REFERÊNCIAS:.......................................................................................... 166

5 UM SOL PARA CADA UM: UMA PROPOSTA DE GOVERNANÇA


PARA A ENERGIA ELÉTRICA SOLAR FOTOVOLTAICA NO
BRASIL ........................................................................................ 170
5.1 INTRODUÇÃO: ............................................................................ 170
5.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS: ................................... 171
5.3 PROPOSIÇÃO DE UM MODELO DE GOVERNANÇA PARA O
USO E A DISSEMINAÇÃO DA ENERGIA FOTOVOLTAICA NO
BRASIL ........................................................................................ 173
5.4 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ...................................... 181

REFERÊNCIAS:.......................................................................................... 184

6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES...................................... 185

APÊNDICE I – ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE: ............................. 189

APÊNDICE II – RELAÇÃO DE DOCUMENTOS BRASIL:......................... 190

APÊNDICE III – RELAÇÃO DE DOCUMENTOS ALEMANHA: ................ 191

x
APÊNDICE IV: – DIMENSÕES ANALISADAS DO SETOR DE ENERGIA
ELÉTRICA FOTOVOLTAICA NOS NÍVEIS DE PAISAGEM
SOCIOTÉCNICA, REGIME SOCIOTÉCNICO E NICHOS
TECNOLÓGICOS ........................................................................ 192

APÊNDICE V – ENTREVISTA APLICADA AOS ATORES DO SISTEMA


NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA FOTOVOLTAICA .......... 196

APÊNDICE VI – ENTREVISTA APLICADA AOS ATORES DO SISTEMA


ALEMÃO DE ENERGIA ELÉTRICA FOTOVOLTAICA .............. 199

xi
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Quatro paradigmas para análise da Teoria Social ....................... 32


Figura 2 – Quatro fases da transição ............................................................ 36
Figura 3 – Emergência e maturação de um sistema tecnológico da
inovação ................................................................................... 39
Figura 4 – Declínio de um sistema tecnológico da inovação ........................ 39
Figura 5 – Perspectiva multinível (MLP) como hierarquia de ninhos ............ 40
Figura 6 – Segmentos da indústria de energia elétrica ................................. 47
Figura 7 - Atores e instituições do setor de energia elétrica brasileiro .......... 48
Figura 8 – Balanço energético do sistema atmosfera-terra .......................... 50
Figura 9 – MLP níveis e indicadores ............................................................. 74
Figura 10 – Mapa dos stakeholders para a energia fotovoltaica no Brasil
(2016) ....................................................................................... 83
Figura 11 – Radiação solar global horizontal média anual do Brasil ............ 89
Figura 12 – Desafios e oportunidades para a energia solar no Brasil
(2016) ....................................................................................... 96
Figura 13 – Transição sociotécnica para os sistemas de inovação ............ 111
Figura 14 – Categorias analíticas do SNI para energia solar fotovoltaica no
Brasil ...................................................................................... 126
Figura 15 – Categorias analíticas – iniciativas governamentais ................. 127
Figura 16 – Estados que aderiram à isenção de ICMS – geração de energia
solar ........................................... Error! Bookmark not defined.
Figura 17 – Categorias analíticas – pesquisa e desenvolvimento .............. 136
Figura 18 – Categorias analíticas – novas tecnologias e inovações ........... 139
Figura 19 – Categorias analíticas – formação de novos mercados
(nichos) .................................................................................. 141
Figura 20 – Índice de irradiação solar mundial ........................................... 145
Figura 21 – Categorias analíticas – indústria nacional ................................ 146
Figura 22 – Nuvem de temas – entrevista em profundidade Solar Cluster
Baden-Württemberg ............................................................... 150
Figura 23 – Panorama da energia solar Alemanha – 2010-2014 ............... 156
Figura 24 – Cinco principais categorias analíticas do SNI .......................... 159
Figura 25 – Framework de governança para a energia solar no Brasil ...... 177

xii
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Quatro diferentes tipos de STI em diferentes estágios de


maturidade ............................................................................... 38
Quadro 2 – Aspectos relevantes da política em diferentes dimensões e
níveis ........................................................................................ 43
Quadro 3 – Período de ocorrência das estações do ano .............................. 50
Quadro 4 – Elasticidade-renda e intensidade do consumo de energia elétrica
(2015) ....................................................................................... 55
Quadro 5 – Requisitos da capacidade do governo para uma boa gestão
ambiental e governança no setor de energia ........................... 59
Quadro 6 – Indicadores do FIS para a energia solar .................................... 77
Quadro 7 – Aspectos históricos do setor de eletricidade no Brasil ............... 80

xiii
LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Oferta interna de energia elétrica por fonte – ano 2014 ............. 56
Gráfico 2 – Número acumulado de unidades consumidoras com sistemas
fotovoltaicos no Brasil .............................................................. 85

xiv
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Composição setorial do consumo de eletricidade ....................... 58


Tabela 3 – Capacidade instalada de geração de eletricidade no Brasil
(MW) ........................................................................................ 84

xv
LISTA DE ABREVIATURAS
SIGLA SIGNIFICADO
Abradee Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ABSOLAR Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica
ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BRDES Banco Regional de Desenvolvimento Econômico e Social
CMSE Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico
CNPE Conselho Nacional de Política Energética
CPF Cadastro de Pessoa Física
EESFV Energia Elétrica Solar Fotovoltaica
EEG Eneuerbre Energien Gesetz
EFV Energia Fotovoltaica
EPE Empresa de Pesquisa Energética
FSI Funções do Sistema de Inovação
FV Fotovoltaico
GBC Green Building Council
GEI Global Eletricity Iniciative
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano
ISES International Solar Energy Society
LEED Leadership in Energy and Enviroment Design
MLP Perspectiva Multinível
MMA Ministério do Meio ambiente
MME Ministério de Minas e Energia
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PCH's Pequenas Centrais Hidrelétricas
PNE Plano Nacional de Energia
RES Renewables Energy Sources
SNI Sistema Nacional de Inovação
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UTFPR Universidade Tecnológica Federal do Paraná
USP Universidade de São Paulo
WEC World Energy Council

xvi
1 INTRODUÇÃO

A transição da energia é um tema presente no planejamento energético


mundial, cujo debate tem se intensificado a partir de vários fatores macro ambientais,
que envolvem uma maior demanda mundial por energia elétrica, a poluição ambiental
gerada pela energia elétrica de fontes não renováveis e os riscos associados à
utilização de algumas fontes de energia, tais como a energia nuclear.
Neste contexto, a energia elétrica fotovoltaica surge como uma opção
energética renovável, sustentável e de ampla aplicação, uma vez que a radiação solar
acontece em praticamente todos as localidades do planeta. Os debates em torno do
uso e a difusão da energia fotovoltaica envolvem o estabelecimento de políticas para
fomentar a disseminação desta tecnologia, a mudança cultural e estrutural necessária
para o uso da energia fotovoltaica em grande escala, bem como o desenvolvimento
de novos métodos de geração e armazenamento da energia solar, com o objetivo de
tornar esta fonte de energia competitiva perante as demais fontes de energia
renováveis, todas questões debatidas nesta tese.
A preocupação central nesta pesquisa, ao analisar o tema transição
sociotécnica do sistema de inovação de energia elétrica fotovoltaica do Brasil, é
verificar de que forma a gestão da transição desta tecnologia acontece na atividade
de energia elétrica de origem solar no Brasil e propor um modelo de governança a
partir deste contexto, com base em dados e uma análise do cenário e das políticas
nacionais e internacionais. Os aspectos fundamentais de um problema de pesquisa,
tais como viabilidade, relevância, novidade, exequibilidade e oportunidade apontados
pelas autoras Lakatos e Marconi (2003) foram cumpridos nesta etapa do estudo. Por
viabilidade entende-se algo que ser eficazmente resolvido por meio de uma pesquisa;
relevância refere-se ao fato de ser capaz de trazer conhecimentos novos; novidade
contempla a preocupação de estar adequado ao estágio atual da evolução científica;
Já exequibilidade envolve a possibilidade de se chegar a uma conclusão válida e a
oportunidade contempla o fato de atender a interesses particulares e gerais.

17
A partir destes aspectos, propõe-se o seguinte problema de pesquisa: “Quais
são os elementos fundamentais para a proposição de um modelo de governança
que fomente a energia solar fotovoltaica no Brasil?”
O objetivo geral da tese é propor um modelo de governança da transição
sociotécnica que fomente o desenvolvimento de inovações sustentáveis para o uso e
a disseminação da atividade de energia elétrica de origem fotovoltaica no contexto
nacional. Sendo assim, tal objetivo cumpre as premissas de uma declaração de
objetivo qualitativa, que segundo Creswell (2007) deve concentrar-se em um único
fenômeno, restringindo o estudo a uma ideia a ser explorada ou entendida. No caso
da presente tese, o estudo se desenvolve na descrição das relações entre os diversos
atores da relação multinível, bem como no comparativo entre os modelos de
governança brasileiro e alemão e, a partir destas informações, estabelece uma
proposta de governança para esta tecnologia.
Para cumprir o objetivo geral e construir uma proposta de modelo de
governança para fomentar a geração e da energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil,
esta tese foi dividida em quatro capítulos, cada qual em formato de artigo científico e
que, somados, atendem aos seguintes objetivos específicos:
1. Identificar de que forma a teoria sociotécnica da inovação pode ser aplicada
no setor de energia elétrica fotovoltaica do Brasil para o estabelecimento de
um modelo de governança.
2. Verificar os principais desafios e oportunidades para o crescimento da
energia solar fotovoltaica no Brasil.
3. Identificar os fatores fundamentais em termos de governança e políticas
públicas para o processo de transição tecnológica da energia elétrica
fotovoltaica no Brasil.
4. Verificar os elementos fundamentais para compor a proposição de um
modelo de governança que fomente a energia solar fotovoltaica no Brasil.
A partir dos objetivos apresentados, coloca-se a justificativa para a tese. A
justificativa consiste em uma “explicação sucinta, porém completa, das razões de
ordem teórica e dos motivos de ordem prática que tornam importante a realização da
pesquisa” (LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 219). A partir do exposto, a justificativa
teórica do presente projeto constitui-se no objetivo de apresentar um modelo de

18
governança para fomentar o uso e a disseminação da Energia Elétrica Solar
Fotovoltaica no Brasil à luz da teoria da gestão sociotécnica da inovação, abordagem
inédita da área no Brasil. O principal diferencial do estudo encontra-se no fato de
analisar a gestão da transição da tecnologia em uma visão voltada para o
desenvolvimento sustentável e propor um modelo de governança a partir deste
cenário. Além disso, a análise combinada da perspectiva multifases, multiatores e
multiníveis neste contexto traz contribuições inéditas para a atividade de energia
elétrica solar fotovoltaica no Brasil.
A teoria de sistemas sociotécnicos na perspectiva multinível é especialmente
atraente para pesquisas que buscam tecnologias sustentáveis por duas razões. A
primeira delas refere-se ao fato de que a criação e a difusão de tecnologias mais
limpas baseia-se em facilitar mudanças nos sistemas social, econômico e político de
forma ampla. Em segundo lugar, algumas metas ambientais tais como a redução
drástica das emissões de carbono não podem ser alcançadas apenas por meio do
uso de tecnologias individuais mais limpas, por exemplo, energia renovável; tais metas
demandam mudanças estruturais que abrangem sistemas sociotécnicos como, por
exemplo, infraestrutura energética (SMITH, A.; STIRLING, A., 2010). Ainda sobre a
questão da tecnologia, Nelson (2008) destaca que os economistas têm formulado
frequentemente o pressuposto teórico de que a tecnologia é um bem público latente,
no sentido de ser amplamente aplicável e cujo aprendizado e ensino não são caros
(ou até literalmente sem custos) em comparação com os custos das invenções ou
descobertas.
No que se refere a teoria da gestão da transição para a sustentabilidade,
Loorbach (2007, p. 12) a apresenta como um “novo modelo de governança que provê
uma estrutura para a pesquisa da governança genérica (científica) e os modelos de
políticas operacionais para influenciar a mudança na sociedade no longo prazo”.
A contribuição prática desta investigação reside no fato de proporcionar aos
atores participantes do Sistema de Inovação uma maior compreensão do contexto
social na qual estão inseridas. Ainda pode-se enumerar como uma contribuição
prática desta tese o fato de que a gestão da transição para um sistema de energia
elétrica sustentável é tida como vital por muitos autores e a compreensão dos
elementos fundamentais para que tal transição ocorra contribui para os atores

19
integrantes deste Sistema Sociotécnico revela-se como extremamente útil para os
mesmos.
Buscando identificar os estudos nesta área, realizou-se uma busca pela
temática no indexador Science Direct, com as palavras “sociotechnical perspective” e
“renewable energy” resultando em apenas um artigo. Porém ao realizar a mesma
busca pelos termos “multi level perspective” e “photovoltaic energy” resulta em zero
artigos. Em uma segunda investigação buscou-se no indexador EBSCO as temáticas:
“sociotechnical perspective” e “sustainable development” resultando em apenas um
artigo sobre consumo eficiente de energia no Chile. Ao buscar “sociotechnical
perspective” somado a “Governance model” o resultado foi nulo, porém ao buscar as
temáticas “multi level perspective” somada a “governance model” aparecem dois
artigos, sendo um estudo oriundo da Austrália e outro sobre a políticas de segurança
na África a partir desta perspectiva. Nenhum estudo foi encontrado nos buscadores
internacionais com escopo no contexto brasileiro. Uma das contribuições do estudo
seria inserir o Brasil no cenário internacional em estudos sobre a gestão da transição
sociotécnica da atividade de energia elétrica com uma perspectiva da análise
multinível e uma abordagem de governança.
Neste sentido, como uma das contribuições práticas pode-se destacar o
oferecimento de uma análise de diferentes atores nos níveis de nicho, regime e
paisagem da energia elétrica solar fotovoltaica do Brasil, possibilitando a estes uma
base de informações para eventuais tomadas de decisão, seja em termos de
iniciativas nos nichos tecnológicos de inovação, seja no desenvolvimento de políticas
públicas voltadas para esta tecnologia, fatores que podem impactar em mudanças no
paradigma tecnológico vigente e um nova governança neste Sistema.
A fim de contemplar os objetivos propostos por este trabalho, a estrutura da
tese foi distribuída em cinco capítulos, sendo o primeiro capítulo a presente introdução
e os demais quatro capítulos em formato de artigos científicos. Por fim, as conclusões
e recomendações finalizam a estrutura da tese.
Capítulo 2 – Elementos Fundamentais da Energia Fotovoltaica no Brasil à luz da
teoria da Transição Sociotécnica da Inovação. Este capítulo objetiva mostrar uma
visão integrada das teorias da transição sociotécnica da inovação, dos Sistemas
Nacionais, Regionais e Setoriais de inovação e do setor de energia elétrica

20
fotovoltaica no Brasil, bem como trazer um panorama do desenvolvimento desta
tecnologia no país e identificar elementos para a composição de um modelo de
governança para a energia fotovoltaica. O capítulo traz as principais perspectivas
teóricas que embasaram o presente estudo, iniciando pelas bases da teoria
sociotécnica da inovação.
Creswell (2007) destaca que, entre os vários objetivos da revisão de literatura
estão: compartilhar com os leitores os resultados de outros estudos correlatos, além
de preencher lacunas ao relacionar o estudo com a literatura sobre seu tema. Ainda
são citados pelo autor o fato de que a revisão de litaratura fornece uma estrutura para
estabelecer a importância do estudo bem como um indicador que permite
comparações com outros resultados.
Capítulo 3 – A Emergência da Energia Fotovoltaica no Brasil: Desafios e
Oportunidades para Crescimento. Este capítulo possui como objetivo investigar o
processo de transição sociotécnica no setor de energia elétrica no Brasil,
especificamente para a energia fotovoltaica e identificar desafios e oportunidades a
partir de uma perspectiva multinível e da análise das funções do sistema de inovação.
A atividade de energia elétrica possui grande impacto nas atividades
econômicas de um país. A estruturação desta atividade objetiva o fornecimento de
energia elétrica com segurança para todos os consumidores, seja industrial,
comercial, residencial ou de outros perfis de consumo e a forma como se consolida a
matriz energética depende da trajetória tecnológica e do Sistema Nacional de
Inovação do setor. Neste sentido, este capítulo descreve o cenário da atividade de
energia elétrica a nível mundial e nacional, especialmente voltada para a energia
fotovoltaica e aponta oportunidades para o Brasil neste setor.
Capítulo 4 – Governança e Caminhos para a Energia Fotovoltaica no
Brasil. Este capítulo possui como objetivo descrever o que pode ser aplicado como
um modelo de governança para o uso e a disseminação da Energia Elétrica Solar
Fotovoltaica no Brasil que aponte as necessidades de cada um dos stakeholders ao
mesmo tempo em que seja adequado às necessidades particulares do país.

Capítulo 5 – Um Sol Para cada Um: Uma Proposta de Governança para a


Energia Fotovoltaica no Brasil. Este capítulo possui como objetivo apresentar uma

21
proposta de modelo de governança que considera os fatores fundamentais para o
processo de transição sociotécnica da energia solar fotovoltaica no Brasil, tais como
a inovação, o processo de comunicação, as práticas de governança que ocorrem no
dia a dia e o processo de aprendizagem contínua, tido como um elemento central no
contexto desta tecnologia. Tal modelo se constitui como a tese deste estudo e
consolida o processo de análise dos dados.
Por fim, apresentam-se as conclusões e recomendações para estudos futuros,
explicitando as descobertas do estudo. As referências bibliográficas que serviram de
base para esta investigação estarão detalhadas na parte final do estudo, bem como
ao final de cada capítulo, seguido pelos anexos.
A pesquisa realizada nesta tese foi de natureza qualitativa, de caráter
exploratório, descritiva, com perspectiva longitudinal. Denzin e Lincoln (2006)
ressaltam que a pesquisa qualitativa não privilegia uma prática metodológica em
relação às outras, sendo assim difícil definir claramente este tipo de pesquisa como
um terreno de discussão ou de discurso. Segundo os autores, a pesquisa qualitativa
não possui uma teoria ou paradigma nitidamente próprio, pois existem múltiplos
paradigmas teóricos que alegam empregar os métodos e as estratégias da pesquisa
qualitativa, bem como muitas disciplinas distintas que fazem uso desta metodologia.
A presente investigação possui como base epistemológica o interpretativismo,
como metodologia uma abordagem qualitativa, exploratória e descritiva e como
objetivo de pesquisa a construção de um modelo de governança com base na gestão
da transição sociotécnica aplicado a energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil.
Ao escrever a metodologia de pesquisa mais adequada para a abordagem de
gestão da transição, Loorbach (2007, p. 33) comenta que “a única maneira de se
alcançar a coerência entre a teoria e a prática é por meio de aprender fazendo e fazer
aprendendo”, em um processo que combina as bases da pesquisa, o desenvolvimento
da teoria, a pesquisa participatória e a pesquisa aplicada.
O processo de amostragem envolve a seleção de um subgrupo de pessoas a
partir de uma população na qual você está interessado em pesquisar. Na pesquisa
qualitativa o tamanho da amostra, bem como a estratégia de amostragem não
possuem um papel central para a seleção da amostra, uma vez que o principal objetivo
deste tipo de abordagem é explorar a diversidade (KUMAR, 2011).

22
O ponto de saturação, neste caso, é o parâmetro que deve ser alcançado em
termos amostrais. Segundo Kumar (2011), a determinação da dimensão da amostra
deve ser dada pelo seu ponto de saturação, ou seja, ponto a partir do qual o
pesquisador identifica que os dados coletados não estão trazendo novas informações.
No presente estudo, a seleção dos entrevistados ocorreu de forma a buscar as
pessoas estratégicas nos principais atores e instituições que compõem o sistema
nacional de energia elétrica solar fotovoltaica e o processo de abordagem de novos
entrevistados foi encerrado a partir do momento no qual identificou-se o ponto de
saturação.
Ao comentar sobre a o delineamento da pesquisa, Kumar (2011) destaca que
a seleção apropriada do método de investigação direciona o investigador a chegar a
conclusões válidas, comparações pertinentes.

O delineamento da pesquisa é um plano, que envolve a estrutura e a estratégia


de investigação a ser utilizada de tal forma a conseguir obter as respostas às questões
de pesquisa levantadas. O presente estudo possui natureza exploratória e
descritiva. A pesquisa exploratória é utilizada nas situações nas quais o objetivo seja
explorar uma área na qual pouco é conhecido ou então para investigar a possibilidade
da realização de uma investigação especial. Já o estudo pode ser classificado como
descritivo ao tentar “descrever sistematicamente uma situação, um problema, um
fenômeno, um serviço ou programa, ou que fornece informações sobre as condições
de uma determinada comunidade ou ainda que descreve as atitudes em relação a um
problema” (KUMAR, 2011, p.31). O principal objetivo neste tipo de estudo é descrever
o que é predominante no que diz respeito à questão ou problema em estudo.

Os dados primários foram obtidos por meio de entrevistas em profundidade


com representantes das organizações centrais envolvidas no sistema nacional de
inovação do setor de energia elétrica solar fotovoltaica do Brasil. A seleção dos
entrevistados obedeceu aos critérios de legitimidade dentro do contexto social no qual
estão inseridos, seguindo-se o objetivo da pesquisa qualitativa, que segundo Bauer e
Gaskell (2002) é de apresentar uma amostra do espectro de todos os pontos de vista
onde o pesquisador deve utilizar sua imaginação social científica para montar a
seleção dos respondentes. Também foi realizada entrevista em profundidade em um

23
Cluster de Energia Solar localizado na cidade de Stuttgart, na Alemanha, cujo critério
de seleção passou pela questão da relevância e da legitimidade deste no cenário
global da tecnologia analisada.
As fontes de dados secundários envolveram os órgãos governamentais e
reguladores do setor, tais como o Ministério de Minas e Energia, Ministério do Meio
Ambiente, Eletrobrás, Procel, ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), ONS
(Operador Nacional do Sistema), além de agências internacionais do setor, livros e
artigos publicados sobre o tema e as mesmas fontes de informação para o cenário da
Alemanha.

Todas as entrevistas realizadas no Brasil e na Alemanha foram tratadas


mediante os pressupostos da técnica de análise de conteúdo, que segundo Bardin
(1977, p.24), “é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Não se trata
de um instrumento, mas de um leque de apetrechos, ou com maior rigor será um único
instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um
campo de aplicações muito vasto: as comunicações”.

A análise de conteúdo possui basicamente dois grandes objetivos: a superação


da incerteza e o enriquecimento da leitura. Por “superação da incerteza” entende-se
uma verificação se o que foi julgado como conteúdo da mensagem está contido
efetivamente na mesma, ou seja, identificar se o que se conclui da análise é uma visão
válida e generalizável. Já o “enriquecimento da leitura” corresponde a um
esclarecimento de elementos de significações suscetíveis de conduzir a uma
descrição de mecanismos que a priori o pesquisador não havia compreendido
(BARDIN, 1977). Foi utilizado o software de análise de dados qualitativos Atlas.ti,
versão7 para análise dos dados primários e secundários.

24
REFERÊNCIAS:

BARDIN, L.; Análise de Conteúdo. Presses universitaires de France, Edições 70,


1977.

BAUER, M.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som.


Petrópolis: Vozes, 2002.

CRESWELL, J. Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. 2ª


ed. Porto Alegre: Bookman, 2007.

DENZIN, N. K, LINCOLN, Y. O Planejamento da Pesquisa Qualitativa: Teorias e


Abordagens. Porto Alegre: Artmed Bookman, 2006

KUMAR, R. Research Methodology: a step by step guide for beginners. 3 ed.


London: SAGE Publications Ltd, 2011.

LAKATOS, E. M; MARCONI, M.A. Fundamentos de Metodologia Científica. Ed.


Atlas, 3 ed, 2000.

_____________. Fundamentos de Metodologia Científica. Ed. Atlas, 5 ed, 2003.

LOORBACH, D. Transition Management: New mode of governance for


sustainable development. UD Druck. 2007.

NELSON, R. As fontes do crescimento econômico. Campinas, São Paulo, Ed.


UNICAMP, SP. 2008.

SMITH, A.; STIRLING, A. The politics of social-ecological resilience and


sustainable socio-technical transitions. Ecology and Society, v. 15, art 11, 2010.

25
2 ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA ENERGIA FOTOVOLTAICA
NO BRASIL À LUZ DA TEORIA DA TRANSIÇÃO SOCIOTÉCNICA
DA INOVAÇÃO

Resumo: O presente estudo apresenta uma análise dos fatores fundamentais


presentes no processo de transição tecnológica da energia elétrica solar fotovoltaica
(EESFV) no Brasil a partir de uma revisão dos pressupostos presentes nas
abordagens de três recortes teóricos, a saber: a teoria da transição sociotécnica da
inovação, a abordagem dos Sistemas Nacionais, Regionais, Setoriais e Tecnológicos
da inovação e a trajetória do setor de energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil.
Foram apresentados os elementos teóricos essenciais destas abordagens a partir da
revisão da literatura, que buscou elucidar uma proposta de integração entre estas
diferentes abordagens e destacou os principais fatores de influência no Sistema de
Inovação da EESFV no Brasil. Os resultados mostraram que a tecnologia de geração
de EESFV no Brasil ainda é bastante incipiente e que a trajetória até o momento
envolveu instituições governamentais por meio de tímidas iniciativas de incentivo para
o uso e a disseminação desta tecnologia no país. O setor é bastante regulado e
controlado pelas instituições governamentais, o que faz com que todas as iniciativas
para fomento desta tecnologia tenham que, obrigatoriamente, passar por tais
instituições. Não foram encontrados nas atuais características do Sistema de
Inovação da EESFV do Brasil aspectos apontados na literatura da teoria sociotécnica
como essenciais para o desenvolvimento de uma tecnologia, tais como a troca de
informações entre os atores, o processo de aprendizado e o estabelecimento de uma
agenda comum entre os diversos atores do Sistema. Foi possível identificar que o
crescimento da tecnologia de EESFV depende da participação e do relacionamento
entre os atores em seus diversos níveis, o que possibilitaria uma co-evolução do
sistema como um todo, fazendo com que os elementos fundamentais se
desenvolvessem conjuntamente, proporcionando a emergência e a consolidação da
EESFV no cenário nacional. Palavras-chave: Energia Elétrica Solar Fotovoltaica,
Teoria Sociotécnica da inovação, Sistema Nacional de Inovação.

26
Abstract:
This Study presents an analysis of the key factors in the technological transition
process of solar photovoltaic electricity (PV) in Brazil from a review of main
assumptions in three theoretical approaches: socio-technical innovation transition
theory, National, Regional, Sectoral and Technological Innovation Systems and solar
photovoltaic electricity transition in Brazil. The main assumptions of these theoretical
approaches were presented from the literature review in order to indentify a proposal
integration between these different approaches and highlights the main influence
factors in the Innovation System for PV in Brazil. The results showed that the PV
technology generation in Brazil is still incipient and the trajectory of this technology until
now involved government institutions through timid policies incentive for the usage and
dissemination of PV energy in the country. The electricity sector is very regulated and
controlled by government institutions, which makes all initiatives to promote this
technology necessarily runs through such institutions. We could not find in the current
PV energy innovation system of Brazil aspects pointed out in the literature of socio-
technical transitions as essential for the development of a technology, such as the
information exchange between the actors, the learning process and a common agenda
establishment among the various actors in the system. The growth of PV technology
in Brazil depends on the multilevel relationship between actors, which could allow a
co-evolution of the system as a whole, making the fundamental aspects to develop
jointly and providing the emergency and the consolidation of PV energy inside the
national scene.
Keywords: Solar Energy Photovoltaics, Theory Sociotechnical innovation, national
innovation system.

27
2.1 INTRODUÇÃO

Muitos autores destacam a relação existente entre a energia, o meio ambiente


e o desenvolvimento social e econômico. O planejamento e gerenciamento da energia
tem emergido como um tema central no contexto da governança do setor. Neste
sentido, a busca por fontes de energias renováveis para a geração de eletricidade
aumenta em todo o mundo e no Brasil existe um interesse particular na tecnologia de
geração de energia elétrica solar fotovoltaica (EESFV), que se encontra no nível de
nicho tecnológico no país. Tal interesse ocorre em virtude de diversos fatores, tais
como a possibilidade da aplicação desta fonte de energia em localidades longínquas,
desconectadas à rede elétrica, ao enorme potencial desta fonte de energia em virtude
do alto índice de irradiação solar no país e da natureza renovável desta tecnologia,
que minimiza os impactos ambientais e gera energia limpa e sustentável por cerca de
25 anos, dependendo do sistema e da manutenção realizada.
O presente estudo possui como objetivo geral mostrar uma visão integrada das
teorias da transição sociotécnica da inovação, dos Sistemas Nacionais, Regionais e
Setoriais de inovação e do setor de EESFV no Brasil, trazendo um panorama para o
desenvolvimento desta tecnologia no país, bem como identificando elementos
fundamentais para a composição de um modelo de governança que fomente o uso e
a disseminação da energia solar fotovoltaica no país.
A partir da revisão dos elementos centrais destas diferentes teorias, o presente
estudo levanta a seguinte questão: “De que forma a teoria sociotécnica da
inovação pode ser aplicada no setor de energia elétrica fotovoltaica do Brasil
para o estabelecimento de um modelo de governança?”.
Em termos de metodologia, o presente estudo consiste em uma revisão
conceitual cujo propósito não é levantar resultados definitivos e conclusivos, mas sim
propor uma forma de integrar estas diferentes abordagens teóricas em torno do setor
de energia elétrica solar fotovoltaica, destacando os aspectos estruturais,
institucionais e os fatores de influência no sistema de inovação desta tecnologia.
Com um olhar pioneiro no Brasil, a presente tese analisa o setor de EESFV nacional
sob o prisma da transição sociotécnica da inovação e identifica elementos centrais no
processo de difusão desta tecnologia, bem como de consolidação de um Sistema

28
Setorial de Inovação a partir de uma proposta de governança para a transição
tecnológica e a consolidação desta tecnologia na matriz energética nacional.

2.2 TEORIA DA TRANSIÇÃO SOCIOTÉCNICA DA INOVAÇÃO

A teoria dos sistemas de inovação tem suas origens na teoria clássica de List
(1856), que descreve os Sistemas Nacionais de Política Econômica e realiza uma
análise comparativa entre diversos países, incluindo as temáticas de Sistemas
Industriais e Políticas Públicas. Mais tarde Schumpeter (1912) apresenta a figura do
empreendedor e enfatiza a difusão das inovações em diferentes regiões e indústrias.
Porém, foi a partir do seminal trabalho de Nelson (1993) que a conexão entre a
inovação e o desenvolvimento econômico foi proposta ao se estabelecer as bases
conceituais dos Sistemas Nacionais de Inovação. Em uma aplicação
contemporânea, autores da teoria moderna evolucionária exploram aspectos como o
papel dos atores dentro dos sistemas, a mobilização de recursos e a produção e
difusão de conhecimento, o que fez com que o estudo atual dos Sistemas Nacionais
de Inovação fosse constituído por uma análise histórica e sociotécnica do crescimento
e da mudança tecnológica pelos diferentes sistemas de inovação (NELSON, 2008;
LUNDVALL, 2010; SAVIOTTI, 2010; MALERBA, 1999; PEREZ, 2009).
A concepção moderna de um Sistema Nacional de Inovação destaca o papel
das instituições do Sistema para o avanço tecnológico de um país e, neste sentido,
Nelson (2004) destaca a necessidade de algumas reorientações para aplicação nos
países que precisam recuperar o atraso em termos de uma determinada tecnologia
como no caso do Brasil. O autor destaca ainda que um Sistema de Inovação pode ser
utilizado para considerar as políticas necessárias para que se recupere o atraso de
forma eficaz no novo contexto.
Um Sistema de Inovação pode ser delimitado com base em diferentes critérios,
podendo estes ser espaciais / geográficos, setoriais ou ainda de acordo com a
atividades que abarcam. Em termos geográficos, Johnson, Edquist e Lundvall (2003)
destacam que um sistema pode ser local, regional, nacional e supranacional, o que
presume que a área em questão tem um grau razoável de "coerência" ou "orientação
interior" no que diz respeito aos processos de inovação.

29
Por sistema tecnológico entende-se um conjunto de instituições cujas
interações determinam o desempenho inovador, no sentido já referido, das empresas
nacionais. O conceito de “sistema” é aqui utilizado para designar um conjunto de
atores institucionais que, em conjunto, desempenha o importante papel de influenciar
uma performance inovadora (NELSON, 2008 p. 430).
Já Lundvall (2010, p. 2) define um Sistema Nacional de Inovação como
“elementos e a relação entre estes elementos que interagem na produção, difusão e
uso de conhecimentos novos e economicamente úteis” e coloca o sistema nacional
de inovação como um sistema social cuja principal atividade é a aprendizagem, sendo
também caracterizado como um sistema dinâmico composto por feedback positivo e
por reprodução. Complementarmente, causação e círculos virtuosos e viciosos fazem
parte dos sistemas e dos subsistemas de inovação.
Segundo os autores Strachman e Santos de Deus (2003), um sistema de
inovação envolve todos os fatores econômicos, políticos, sociais, institucionais e
organizacionais responsáveis pela geração, pelo uso, pela difusão, pela absorção,
pela importação ou pela modificação de conhecimentos e/ou de inovações. Tais
Sistemas de Inovação são nacionais, quando a análise abranger países inteiros, e
locais ou regionais, quando forem mais restritos, isto é, mais claramente delimitados
por certas localidades ou regiões. Já os sistemas tecnológicos envolvem sistemas
específicos dentro do conceito mais geral de sistemas de inovação, aplicados a
setores, indústrias ou tecnologias específicas. No caso do presente estudo, aplicados
especificamente ao setor de energia elétrica no Brasil. Complementar a esta questão,
Perez (2004) destaca que a implantação de cada sistema de tecnologia envolve vários
processos interligados de mudança e adaptação, tais como o desenvolvimento dos
serviços circundantes (infraestrutura necessária, fornecedores especializados,
distribuidores, serviços de manutenção, etc).
Ao definir um Sistema Setorial de Inovação Malerba (1999, p. 4) destaca:
“Um Sistema Setorial de Inovação e produção é composto por um conjunto de
agentes heterogêneos que realizam interações de mercado e não mercado
para a geração, adoção e uso de (novas e já estabelecidas) tecnologias e para
a criação, produção e uso de (novos e já estabelecidos) produtos que
pertencem a um setor (“produtos setoriais”)”.

30
Neste sentido, um Sistema Setorial de Inovação pode ser constituído por uma
diversidade de atores que envolvem desde fábricas e fornecedores, até instituições
de pesquisa, universidade, órgãos governamentais, que se relacionam por meio de
comunicação, cooperação, competição e comando e tais interações são moldadas
pelas instituições por meio de regras e regulações, o que faz com que o sistema mude
ao longo do tempo (MALERBA, 1999).
Diferentemente da definição de um Setor, um Sistema Setorial coloca a
atenção no conhecimento e na sua estrutura como um elemento central. Neste
sentido, são considerados os aspectos chave das firmas como processos de
aprendizagem, competências, comportamento e organização, bem como as ligações
e as complementariedades, que incluem interdependências entre setores
verticalmente ou horizontalmente relacionados, fazendo com que tais
interdependências definam os limites reais de um sistema setorial (MALERBA, 1999).
Além disso, Malerba (1999) também destaca a importância do papel das chamadas
“não firmas” dentro do sistema, tais como universidades, instituições financeiras e de
regulação do mercado, que afetam a atividade inovativa e produtiva das empresas.
Tais instituições interferem na natureza das relações entre os diferentes
agentes e a dinâmica de transformação setorial, enfatizando um processo co-
evolucionário que envolve organizações, conhecimento, tecnologia e demanda.
A teoria da transição social encontra-se em um estágio de desenvolvimento. Segundo
Loorbach (2007, p. 32):
“a teoria da transição social encontra-se em um estágio nascente e não é
totalmente falseada no sentido Popperiano e nunca o será, na visão das
incertezas fundamentais e na impossibilidade de se mensurar as diferentes
dimensões. A pesquisa em transições é, portanto, exploratória. Ela objetiva o
desenvolvimento e o ajuste de hipóteses de pesquisa como uma parte
integrada do processo de pesquisa”.

A hipótese básica para as abordagens de transições a ser testada e elaborada


nos estudos reside na verificação se os conceitos multi-níveis e multi-fases se
constituem como uma estrutura suficiente e adequada para descrever e explicar os
complexos e dinâmicos processos de transição (LOORBACH, 2007; GEELS, 2002).
Neste sentido, pode-se dizer que a teoria da transição busca analisar os processos

31
de mudança que acontecem ao longo do tempo e dos diferentes atores do sistema de
forma flexível, podendo ser considerada como uma meta-teoria que integra modelos
e teorias já existentes e se constitui em um solo fértil para o debate científico, ao
propor a integração de diferentes abordagens científicas.
A teoria da transição pode se posicionar como desafiadora de pressupostos
existentes em diversos paradigmas de pesquisa, naquilo que Kuhn (1970) denomina
como “revoluções científicas”, nas quais as teorias pré-existentes vão gradualmente
sendo substituídas por novas teorias ou modelos de acordo com o desenvolvimento
da ciência. Um paradigma é definido por Kuhn (1970, p. 13) como sendo “as
realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo,
fornecem problemas e soluções modelares para uma comunidade de praticantes de
uma ciência”.
Tais paradigmas são norteadores da atividade de pesquisa ao mostrar
determinada visão de mundo na qual a maneira como a realidade social é percebida
a partir dos quatro paradigmas propostos por Burrell (1979) e Morgan na Teoria das
Organizações: Funcionalismo, Interpretativismo, Humanismo Radical e
Estruturalismo. Os paradigmas são organizados em duas dimensões de acordo com
o seu grau de subjetivismo, objetivismo em um dos eixos e a sociologia da regulação
ou da mudança radical no outro, conforme ilustra a Figura 1. Morgan (2007, p. 15)
destaca que cada um dos quatro paradigmas sociológicos propostos “representa uma
rede de escolas de pensamento inter-relacionadas, diferenciadas em abordagem e
perspectiva, mas que compartilham pressupostos fundamentais sobre a natureza da
realidade que tratam”.
Sociologia da Mudança Radical

Humanismo Estruturalismo
Radical Radical
SUBJETIVO OBJETIVO
Interpretativismo Funcionalismo

Sociologia da Regulação
Figura 1 – Quatro paradigmas para análise da Teoria Social
Fonte: Burrell e Morgan (1979, p. 22)

32
A principal contribuição que os quatro paradigmas metateóricos trouxe foi fazer
com que os pesquisadores despertassem para a existência de realidades ou visões
de mundo alternativas, que incluem três aspectos essenciais sobre os fenômenos
organizacionais: os pressupostos da natureza (ontologia), a natureza do
conhecimento (epistemologia) e a maneira de se estudar (metodologia) (SILVA e
NETO, 2006).
Neste contexto, os estudos de transição são de natureza interpretativa,
predominantemente qualitativos e mostram um contínuo de interação entre a pesquisa
fundamental e a pesquisa aplicada, se constituindo como “multi e interdisciplinares
(combinando e integrando disciplinas científicas), transdisciplinar (integrando o
conhecimento tácito, leigo com conhecimento científico) e normativo” (LOORBACH,
2007, p. 33). Loorbach (2007) aponta ainda que o novo paradigma dos estudos de
transição é holístico, ao colocar o pesquisador como parte da rede social com papéis
e influências específicas, sendo também normativo em sua orientação para as
questões de sustentabilidade.

Nos estudos da teoria sociotécnica, o termo "transição" é definido por Geels,


Elzen e Green (2004, p.2) como uma “passagem de um estado, palco, assunto ou
lugar para outro ou um movimento, desenvolvimento ou evolução de uma forma,
estágio ou estilo para outro”. Os estados ou formas possuem certas características
internas que lhes dão coerência e estabilidade. A noção de uma transição também
tem a conotação de mudanças rápidas, um "salto" de um estado para outro.

Complementar a esta questão, o termo paradigma tecnológico é muito utilizado


para descrever a noção de revoluções tecnológicas no esforço neo-schumpeteriano
para entender a inovação e identificar as regularidades, continuidades e
descontinuidades no processo de inovação. Neste sentido, Perez (2009, p. 3)
descreve um paradigma tecnológico como “uma lógica compartilhada coletivamente
na convergência do potencial tecnológico, que envolve custos relativos, a aceitação
do mercado, a coerência funcional e outros fatores”. Adjacente ao conceito de
paradigma tecnológico está a revolução tecnológica, que, segundo a mesma autora
significa: “um conjunto de avanços radicais interligados, formando uma grande

33
constelação de tecnologias interdependentes, em um conjunto de aglomerados ou de
um sistema de sistemas”.
Perez (2009) menciona quais são os mecanismos que fazem com que estes
processos de revoluções tecnológica aconteçam e seu impacto sobre a economia e
as instituições, bem como sua relevância para a análise econômica. Saviotti (2010)
complementa esta visão ao trazer a ideia de que um paradigma tecnológico pode ser
considerado um conjunto de rotinas, práticas tecnológicas partilhadas por um grande
número de empresas na produção e utilização de tecnologias específicas.
Perez (2009) resgata os conceitos de inovação e invenção de Schumpeter e
destaca que o espaço tecnologicamente possível é muito maior do que aquilo que é
economicamente viável e socialmente aceitável. É com o lucro em mente que os
empresários e gestores estão constantemente transformando invenções em
inovações, a partir de possibilidades técnicas e descobertas em realidades
econômicas. Por sua vez, através de seus investimentos e decisões de financiamento
que eles também podem orientar o esforço de investigação em direções particulares.
Ao escrever sobre o conceito de trajetória, Perez (2009) destaca que o espaço
no qual a mudança técnica significativa precisa ser estudada é o da inovação, na
convergência da tecnologia, da economia e do contexto sócio-institucional, que é
essencialmente dinâmico e que representa o ritmo e a direção da mudança de uma
dada tecnologia.
Ainda sobre o conceito de trajetória tecnológica, Corazza e Fracalanza (2004,
p. 135) descrevem que esta é “determinada por um paradigma e pode ser definida
como uma atividade normal para solução de problemas”. Neste sentido, a trajetória
tecnológica pode ser representada por um movimento com base na solução de trade-
offs entre variáveis definidas como relevantes pelo paradigma.
Na visão de Perez (2009) as noções de trajetória ou paradigma tecnológico
ressaltam a importância das inovações incrementais no caminho do crescimento de
determinada tecnologia após cada inovação radical. A autora destaca que, embora
seja verdade que as grandes inovações têm um papel central na determinação de
novos investimentos e do crescimento econômico, a expansão destes depende de
inovações incrementais. As inovações incrementais, ao longo da trajetória, ao invés
de simples melhorias, se constituem em sucessivos novos produtos, serviços e até

34
mesmo em indústrias inteiras, que tomam como base o espaço inovador inaugurado
pela inovação radical inicial e ampliado pelos seguidores desta inovação.
Complementarmente ao conceito de trajetória tecnológica, Perez (2009)
apresenta o conceito de revolução tecnológica e menciona que são dois os fatores
que podem distinguir a revolução tecnológica a partir de uma coleção aleatória de
sistemas de tecnologia e justifica conceituando-a como uma revolução com duas
características básicas, a saber: a primeira consiste na forte inter-relação e
interdependência dos sistemas participantes em suas tecnologias e mercados, o que
mais visível e popularmente entendido como “a revolução”; e a segunda envolve a
capacidade de transformar profundamente os demais aspectos da economia (e,
eventualmente, da sociedade), o que o torna a chamada revolução tecnológica
realmente garantida a longo prazo.
Os processos de difusão de cada revolução tecnológica e seu paradigma
técnico-econômico são constituídos por grandes e sucessivas ondas de
desenvolvimento tecnológico que ocorrem juntamente com a sua assimilação pela
economia e pela sociedade, bem como os aumentos resultantes de produtividade e
expansão.

Dietz e O’Neil (2013) defendem um plano econômico que pode ajudar a


humanidade para um futuro melhor no qual os fatores de sustentabilidade e do
equilíbrio do ser humano sejam os objetivos e não apenas a busca pelo crescimento
econômico. Esta proposta passa por três pressupostos básicos: primeiro o
reconhecimento total de que o nosso planeta é finito, o que requer mudar a forma
como olhamos nossa relação com a natureza, especialmente dentro de instituições
econômicas; seguido por práticas de políticas para atingir um curso estável da
economia e, por fim, a vontade de agir, uma vez que as mudanças necessárias não
ocorrem por si só.

Perez (2009) destaca que, em termos de estrutura, cada revolução inclui um


número significativo de novos produtos e de tecnologias de produção inter-
relacionadas, dando origem a novas indústrias importantes e classifica em três
categorias de indústria a partir do ponto de vista do papel que desempenham na
condução de mudanças.

35
Os estudos que envolvem a análise da tecnologia e a sua transição colocam
conceitos como Sistema Nacional, Regional ou Setorial de Inovação, Sistema
Tecnológico de Inovação e a Perspectiva Multinível como elementos centrais para que
se compreenda a trajetória de determinada tecnologia ao longo do tempo. Na literatura
define-se quatro fases no processo de transição, representadas por uma curva em
formato “S” , conforme ilustra a Figura 2.
Indicador do Sistema

Estabilidade

Avanço

Decolagem

Pré Desenvolvimento
Tempo
Figura 2 – Quatro fases da transição
Fonte: LOORBACH (2007, p. 19)

A fase de Pré-desenvolvimento apresenta poucas mudanças visíveis, mas sim


muitas experimentações. Na fase de decolagem o processo de mudança entra em
curso e o estado do sistema começa a mudar. Já na fase de aceleração (avanço),
mudanças estruturais ocorrem de maneia visível por meio de aspectos sócio-culturais,
econômicos, tecnológicos e institucionais, apresentando um processo de
aprendizagem, difusão e incorporação. Por fim, a fase de estabilidade apresenta
declínio nas mudanças e um novo equilíbrio dinâmico é alcançado (LOORBACH,
2007). Apesar da curva “S” ser uma representação simplificada de um processo
altamente complexo, que envolve a dinâmica entre os diversos elementos de um
sistema, ela mostra que a mudança estrutural não se constitui como um processo
linear e gradual e sublinha a “necessidade de abordagens conceituais, cognitivas e
operacionais que sejam capazes de lidar com a não linearidade e a imprevisibilidade”
(LOORBACH, 2007, p. 20).

36
Os Sistemas de Inovação são Sistemas Complexos, compostos de estruturas
complexas de diferentes atores conectados que evoluem dinamicamente
impulsionados pela variedade de estruturas e pela heterogeneidade dos atores que
fazem parte de tais sistemas macroeconômicos (LOORBACH, 2007; KASTELLE,
POTTS E DODGSON, 2009). Os atores inovadores, tais como empreendedores e
consumidores de novidades e os sistemas de inovação co-evoluem, uma vez que os
atores podem modificar os seus sistemas de inovação e também serem modificados
pelos aspectos dos sistemas macro-econômicos (KASTELLE, POTTS E DODGSON,
2009).

Em virtude do caráter cumulativo das aprendizagens técnicas em combinação


com os aspectos de interdependências entre instituições e tecnologias, Lundvall (2010)
destaca que é provavelmente impossível encontrar um sistema institucional que pode
permanentemente garantir uma economia inovativa, uma vez que as instituições que
em um momento estimulam inovações em determinado período podem
eventualmente retardá-las em momento posterior. Neste sentido, um dado sistema de
instituições pode variar de forma muito diferente, dependendo da natureza particular
da tecnologia e do estágio de desenvolvimento da trajetória tecnológica em questão.

Os atores inovadores tendem a ser semelhantes entre e dentro dos diferentes


sistemas e podem incluir empresas, institutos de pesquisa, instituições financeiras,
universidades, ONG’s, agentes facilitadores e de fomento à inovação. Porém, Kastelle,
Potts e Dodgson (2009) destacam que, em cada um dos diferentes tipos de sistema,
a coordenação das atividades por parte dos atores é realizada de forma diferente e
isso é o que diferencia os sistemas entre si.

Markard (2016), ao abordar a importância da elucidação entre estes diferentes


conceitos, coloca que o sistema de inovação tecnológica muda conforme a tecnologia
evolui e se desenvolve. Os processos de transição não envolvem apenas o
crescimento de novas tecnologias, mas também diferentes estágios de maturidade
destas tecnologias, considerando ainda seu eventual declínio, ainda que a perspectiva
de Sistemas Tecnológicos de inovação não esteja pronta para estas tarefas.
(MARKARD, HEKKERT e JACOBSON, 2015). Para demonstrar estes diferentes

37
estágios, Markard (2016) apresenta o ciclo de vida de um Sistema Tecnológico de
Inovação em quatro fases de desenvolvimento: Nascimento, Emergência, Maturidade
e Declínio, conforme ilustra o Quadro 1.

Column1 STI Nascente STI Emergente STI Maduro STI Declínio


Mercado(s) bem
Mercado (s) Inexistentes, Mercado(s) em formação, Vendas em
1. Tamanho estabelecidos; vendas são
vendas próximas ao zero, vendas são baixas ou declínio; Médio a
(Mercado, altas; Médio número de
pequeno número de moderadas; Médio a pequeno número
Elementos) atores, poucos grandes atores
atores. grande número de atores. de atores.
podem ser dominantes.

Geração de Geração de
conhecimento; criação conhecimento; formação
Produção e manutenção do Ações defensivas;
2. Atividades de legitimidade; de mercado; construção
sistema. reconfiguração.
formação de do sistema; mundança
expectativas. institucional no contexto.

Relações dispersas; Densa rede de


Cadeias de valor Relações
muito poucas colaboração; instituições
3. Estrutura estabelecidas; padrões quebrando;
instituições, sendo específicas de tecnologias;
(Instituições estabelecidos, design estruturas
principalmente padrões emergentes,
importantes) dominante, instituições institucionais
cognitivas (ideias, aumentando a
formais rígidas. desestabilizadas.
conceitos). formalização.

Grau de
Baixo Médio Alto Médio a baixo
estruturação
4. Diversidade
Alto Médio Baixo Sem definição
Tecnológica

Muitos; prestadores de
Poucos; Integrados
Médio; diferentes tipos de serviços especializados e
verticalmente;
atores com diferentes associações, integração
Atores Universidades e Sem definição
papéis; atores vertical de média a baixa;
laboratórios de P&D
intermediários emergindo. algumas grandes empresas
privados dominantes.
dominam o mercado.

Forte crescimento; altas Crescimento estável/


Crescimento moderado, Declínio; saídas
Dinâmica taxas de entrada e de moderado; baixa taxa de
com poucos entrantes. frequentes.
saída. entrada / saída.
Quadro 1 – Quatro diferentes tipos de STI em diferentes estágios de maturidade
Fonte: Adaptado de Markard (2016, p. 13)

O ciclo de vida de um Sistema Tecnológico de Inovação pode incluir o


surgimento de uma nova tecnologia, seguido do processo de institucionalização e de
forte crescimento, sua maturidade e posterior declínio e eliminação (MARKARD,
2016). Para os dois primeiros estágios, nos quais o sistema emerge e se estabiliza,
Markard (2016) aponta uma forte dependência do contexto, uma vez que o
desenvolvimento do sistema depende da mobilização de recursos, da entrada de

38
atores e da legitimidade da tecnologia, sendo que a incorporação nas estruturas já
existentes é essencial nesta fase. Ao final destas fases, STI acumula-se em termos
de estrutura e cresce em tamanho expandindo-se de forma auto-sustentada, conforme
ilustra a Figura 3. Este desenvolvimento molda certas estruturas no contexto;
enquanto inicialmente ignoradas, as novas tecnologias podem posteriormente
competir e até mesmo substituir a tecnologia existente para o caso de tecnologias que
possuem usos semelhantes. O aspecto da complementaridade é também possível,
especialmente quando as tecnologias existentes e emergentes podem ser utilizadas
de forma combinada, reforçando-se mutuamente (MARKARD; HOFFMANN, 2016).

STI
Contexto dos sistemas STI STI

STI Nascente: STI Emergente:


Dependência do contexto é alta, Interações se multiplicam, STI Emergente / Maduro:
Incorporação é fundamental Com dependências bilaterais O STI muda o contexto -> Transformação

Figura 3 – Emergência e maturação de um sistema tecnológico da inovação


Fonte: Adaptado de Markard (2016, p. 15)

A desestabilização e declínio também são marcados por importantes mudanças


estruturais, que podem ser iniciadas por pressões sobre o STI, de forma semelhante
ao que acontece na paisagem da perspectiva multinível dos autores Geels e Schot
(2007). Como consequência deste processo, ocorre um desalinhamento institucional
e mais atores deixam o sistema, conforme ilustra a Figura 4.

Contexto dos
sistemas STI
STI

STI Declínio: STI Desaparece


STI Mudança:
Os relacionamentos se
O contexto muda, criando
reconfiguram e enfraquecem
desalinhamento e conflito

Figura 4 – Declínio de um sistema tecnológico da inovação


Fonte: Adaptado de Markard (2016, p. 16)

39
Ao revisar as bases conceituais entre diferentes tipos de sistemas de inovação,
Kastelle, Potts e Dodgson (2009) destacam alguns aspectos essenciais sobre este
conceito, a saber: os sistemas de inovação são melhor analisados quando feitos como
populações, os diferentes tipos de sistema de inovação interagem ao nível dos atores
mais inovadores, sendo que o aspecto que um determinado ator domina em uma
situação particular varia de um sistema para o outro. Existe uma co-evolução entre os
sistemas de inovação e os atores inovadores do sistema. “Ao invés de pensar que os
agentes devem estar em conformidade com as restrições dos sistemas onde se
encontram, é importante perceber que eles também podem moldar tais sistemas por
meio de uma ação inovadora” (KASTELLE, POTTS E DODGSON, 2009, p. 2).
A estruturação dos sistemas é uma das temáticas centrais da perspectiva
multinível. Ao abordar as formas de estruturação das atividades nas práticas locais,
Geels (2004) diferencia o grau de formalização de acordo com os níveis micro, meso
e macro. Segundo o autor, nos nichos tecnológicos observam-se estruturações vagas
e soltas, que aumentam o grau de formalização no nível de regime, no qual as regras
são estáveis e geram efeitos nas atividades dos atores. Este processo de estruturação
das atividades é ainda mais forte no nível de paisagem, onde as crenças, valores e
símbolos culturais são amplamente compartilhados e direcionam o padrão de ação. A
relação entre os três níveis pode ser entendida como hierarquia de ninho, ou seja,
regimes estão contidos dentro da paisagem e nichos dentro de regimes conforme
ilustra a Figura 5.

Figura 5 – Perspectiva multinível (MLP) como hierarquia de ninhos


Fonte: Adaptado de Geels (2002, p. 1261)

40
A relação entre os três níveis da MLP é conceituada da seguinte forma: 1.
Paisagem sociotécnica, a nível macro: forma o ambiente exógeno e, através de sua
influência sobre o regime sociotécnico, faz certos desenvolvimentos tecnológicos mais
fáceis do que outros; 2. Regime sociotécnico: em desenvolvimentos tecnológicos
incrementais o regime pode se constituir na trajetória da tecnologia e 3. Nível de
nicho: onde as inovações radicais se incubam e se multiplicam.
Um regime sociotécnico é composto por três elementos inter-relacionados: uma
rede de atores e grupos sociais, uma rede formal, cognitiva e de regras normativas
que norteiam as atividades dos atores, bem como o material e elementos técnicos,
como artefatos e infraestruturas.
Papachristos (2010) destaca que a resposta do regime aos aspectos de
desestabilização pode acontecer para acomodar as pressões da paisagem e absorver
as inovações desenvolvidas em nichos. Se isso não for possível, pode, sob certas
condições, causar uma transição para um novo regime. Neste caso, a dinâmica e o
ritmo de transição são modulados pelo ambiente de seleção na qual o sistema está
estabelecido.
Papachristios (2010) destaca ainda que as pressões da paisagem e a dinâmica
do regime podem modular o desenvolvimento de nicho, criando janelas de
oportunidade e, eventualmente, contribuindo para o sucesso ou o fracasso do nicho.
Uma avaliação qualitativa irá definir se um nicho está suficientemente desenvolvido
para se tornar um candidato de uma alternativa para o regime em exercício. Tal
avaliação é dada com base em quatro critérios: 1. O surgimento de um projeto
dominante, 2. O alargamento da rede de atores, 3. A melhoria na relação preço /
desempenho, e 4. A participação de mais de 5% para a nova tecnologia no mercado
cumulativo. Finalmente, uma transição termina quando um novo regime sociotécnico
surge, o que significa que os aspectos sociais e técnicos da inovação e seu uso
tornam-se incorporados na esfera institucional, na produção e nos subsistemas de
utilização do sistema sociotécnico.

Ao incorporar elementos da perspectiva STS (estudos de ciência e tecnologia),


da economia evolucionária e da sociologia, a MLP (perspectiva multinível) apresenta

41
algumas características especialmente úteis, a saber: cada nível é conceituado como
uma configuração sociotécnica heterogênea; a lógica social dos três níveis está no
sentido de apresentar diferentes tipos de coordenação e estruturação para as
atividades nas práticas locais. No nível dos nichos as redes sociais são pequenas,
instáveis e precárias, constituídas de empreendedores e inovadores que desejam ter
uma chance. Neste nível, as regras são difusas, a estruturação das atividades é
limitada, com muita incerteza e fluidez. Já os regimes sociotécnicos são mais estáveis,
as redes sociais são maiores, as configurações mais estáveis e as regras são claras,
articuladas e possuem mais efeitos na estruturação. Por fim, as paisagens
sociotécnicas envolvem estruturas de fundo que providenciam a ação (GEELS,
SCHOT, 2010).

Apesar de apresentar um escopo teórico pertinente para o objeto em estudo,


oferecendo uma visão integrativa de um processo co-evolucionário, “a gestão da
transição ainda não se encontra consolidada dentro do campo das políticas e da
ciência da governança e foi implementada e testada em uma escala limitada”
(LOORBACH, 2007, p. 27). Neste sentido, faz-se necessário a elucidação dos
aspectos de governança, detalhados na próxima seção.

2.3 ASPECTOS DE GOVERNANÇA NO DESENVOLVIMENTO DE NOVAS


TECNOLOGIAS

A literatura existente destaca os aspectos e diversidade, incerteza e


heterogeneidade da sociedade como elementos que impactam diretamente na
questão da governança. Este conceito é descrito pelos autores de muitas formas
distintas e relacionado com instituições e alguma forma de intervenção política,
reforçadas pelas iniciativas governamentais. Vale destacar que as instituições
governamentais são cruciais, porém não o único meio pelo qual se alcança a
governança ou a coordenação entre os atores (ULLI-BEER, 2013).
Diferentes tradições de pesquisa tratam do conceito de governança, tais como
ecologia, estudos de tecnologia e inovação e estudos políticos. Apesar de origens
diversas, as diferentes abordagens apresentam alguns elementos comuns que
enfatizam a participação, experimentação e o aprendizado coletivo como elementos-

42
chave do processo de governança, agrupados na chamada “governança reflexiva”,
que aborda as dimensões da políticas em termos de problemas e suas soluções,
regras e estrutura, bem como as interações e processos nos níveis micro, meso e
macro, conforme demonstra o Quadro 2 (VOß , BORNEMANN, 2011).

Níveis Políticas Políticas Políticas


(problemas e soluções) (Regras e estrutura) (interações e processos)

Micro Problemas e metas de um Regras de procedimento Luta pelo domínio entre os


(interação focal) processo específico de para um processo participantes de um processo
governança específico de governança de governança

Definição dos problemas e Arranjos institucionais Luta dos atores políticos


Meso abordagens políticas que são dentro do domínio organizados para posições
(domínio dominantes dentro do político dominantes dentro de um
político) domínio político domínio da política

Macro (sistema Discurso dos valores Regras constitucionais e Luta pelo domínio entre os
político) políticos fundamentais e cultura política grandes grupos sociais,
crenças setores, classes, ou regiões

Quadro 2 – Aspectos relevantes da política em diferentes dimensões e níveis


Fonte: VOß, J., BORNEMANN, B. (2011, p. 3)

O Quadro proposto pelos autores destaca o papel das políticas como um


elemento central no processo de governança ao moldar e promover crenças e
interesses de atores particulares dentro do sistema. Tais políticas, em um sentido
amplo, envolvem interações e o meio pelo qual o poder é adquirido e mantido, pelo
qual a autoridade é atribuída e executada, bem como as ideias e interesses são
articulados e, por isso, na visão de Voß e Bornemann (2011) a política é constitutiva
de qualquer forma de governança. “A política não pode ser eliminada, contornada ou
totalmente controlada pelos modelos de governança, mas pode ser analisada a fim de
se elaborar estratégias de design mais robustas para novas formas de governança
reflexiva” (VOß, J., BORNEMANN, B., 2011, p. 3).
Loorbach (2010) destaca que os modelos de governança precisam levar em
conta três aspectos fundamentais: 1. Todos os atores sociais influenciam e também
direcionam as mudanças da sociedade, que são moldadas por meio das redes de
interação; 2. O planejamento top-down e as dinâmicas do mercado levam em conta
apenas parte da mudança social, que deveriam incluir também as dinâmicas das redes

43
e o comportamento reflexivo; 3. O direcionamento da mudança envolve um processo
reflexivo de pesquisar, aprender e experimentar.
A sociedade se torna cada vez mais complexa, especialmente com relação à
forma de lidar com os problemas (governança), uma vez que muitos aspectos
aumentam o nível de complexidade da sociedade, tais como crescimento
demográfico, internacionalização, globalização dos mercados e produtos,
desenvolvimento tecnológico e a individualização. O desenvolvimento de longo prazo
leva em conta os efeitos secundários adversos da modernização e fundamentalmente
redefine sua própria dinâmica de funcionamento, o que não apenas implica em um
novo paradigma para o desenvolvimento econômico e tecnológico, mas também inclui
uma redefinição de como governar a sociedade (LOORBACH, 2010).
Loorbach (2010) destaca ainda que o processo de governança baseado em
gestão da transição foi desenvolvido em diversos setores e diferentes regiões, ainda
que somente o futuro poderá determinar se a gestão da transição é um sintoma da
emergência de uma nova política e um paradigma de governança ou apenas um
modismo usado para encobrir o fato de tratar-se ainda de política, como sempre. Tais
processos de governança são focados na inovação de curto prazo e na
sustentabilidade de longo prazo, vinculados às transições sociais desejadas e incluem
uma rede com uma diversidade de negócios, governo, ciência e sociedade civil
(LOORBACH, 2010).
Pode-se dizer que existe uma grande variedade de conceitos, modelos
analíticos e teorias que envolvem a temática da governança. Neste sentido, a teoria
da complexidade é apresentada como uma contribuição complementar à teoria da
transição sociotécnica e da perspectiva multinível, uma vez que tais transições do
sistema social podem ser consideradas como casos particulares dos chamados
“sistemas dinâmicos complexos” (GRIN, ROTMANS, SCHOT 2009; LOORBACH,
2010; GEELS, 2004).

Em seu estudo sobre os aspectos de governança em energia, Floriani e


Sovacool (2009, p. 5240) definem o processo de governança como sendo “qualquer
um dos inúmeros processos por meio dos quais um grupo de pessoas estabelece e
faz cumprir as regras necessárias para se atingir os resultados desejados”. Neste

44
sentido, os autores debatem sobre a chamada governança para o desenvolvimento
sustentável ao trazer aspectos de uma governança sócio-política, que envolve o
relacionamento entre atores públicos e privados para a solução de problemas da
sociedade (FLORIANI; SOVACOOL, 2009).

Ulli-Beer (2013, p. 23) utiliza o termo governança relacionado a “mecanismos


de direcionamento sociotécnico que coordenam as interações entre vários grupos de
atores ou de subsistemas”. O autor complementa, destacando o papel das
causalidades circulares no processo de controle do poder entre os grupos de atores
com crenças similares e coloca que eventuais discrepâncias entre o sistema desejado
e o efetivo criam pressões para ações corretivas dentro do sistema sociotécnico. Tais
respostas intencionais podem ser anuladas por mecanismos de direcionamento
historicamente estabelecidos por grupos de atores, o que cria uma resistência
sistêmica ao processo de mudança e resulta nos chamados “path dependencies”
(processos de auto-reforço que aceleram a direção do desenvolvimento dentro de um
sistema) e “lock-in” (estado de um sistema historicamente evoluído e que só pode ser
modificado a partir de um grande esforço) (ULLI-BEER, 2013).

Com base nas diversas complexidades já mencionadas anteriormente,


Loorbach (2007) propõe que um modelo de governança a longo prazo deve levar em
conta os fundamentos da teoria da complexidade a partir da ideia básica de
compreender a sociedade como uma miscelânea de sistemas complexos adaptativos
e coloca a gestão da transição como um elemento central neste processo. Tal
processo de governança deve observar os conflitos existentes entre as metas de
longo prazo e as dinâmicas de curto prazo, os aspectos de desenvolvimento
econômico, social e ambiental, bem como um equilíbrio entre os interesses presentes
e futuros. “Da perspectiva de sistemas complexos, as dinâmicas da sociedade são
percebidas como caóticas, complexas e impossíveis de se gerenciar no sentido
tradicional de planejamento, comando e controle” (LOORBACH, 2007, p. 80).

A partir da combinação entre a perspectiva de sistemas complexos, novas


formas de governança e a noção de desenvolvimento sustentável, pressupõe-se
influenciar, de forma organizada e estruturada, o processo de mudança social. Neste

45
sentido, a abordagem da gestão da transição oferece um framework para a
governança estruturada, que pode integrar os modelos teóricos de governança aos
modelos de gerenciamento da transição. Tais modelos prescritivos envolvem multi
atores, elaboração de políticas, adaptabilidade e flexibilidade dos processos políticos,
aprendizagem social e eficácia do planejamento de longo prazo (LOORBACH, 2007).

O autor propõe a ligação entres os elementos centrais em políticas e


governança mencionados na literatura, tais como elaboração de políticas multi-atores,
o estabelecimento e antecipação de metas coletivas de longo prazo, o
estabelecimento de uma agenda comum, o processo de experimentação e de
inovação, avaliação, adaptação e reflexividade, bem como a difusão de conhecimento
e aprendizagem para a construção de um modelo de governança sustentável. O foco
deste estudo é a ligação dos conceitos para identificar elementos essenciais para
políticas e governança no setor de energia elétrica solar fotovoltaica, detalhados na
próxima seção.

2.4 O SETOR DE ENERGIA ELÉTRICA SOLAR FOTOVOLTAICA NO BRASIL

Um aspecto importante a ser mencionado sobre a produção e o consumo de


energia elétrica é que, diferentemente de outros sistemas de redes, como saneamento
e gás, a energia elétrica não pode ser armazenada de forma economicamente viável,
e isso implica na necessidade de equilíbrio constante entre oferta e demanda.
Segundo a Abradee (Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica), toda
a energia produzida deve ser consumida instantaneamente e, quando há
desequilíbrios, mesmo que por frações de minuto, todo o sistema corre o risco de
desligamentos em cascata, os chamados “apagões” (ABRADEE, 2015).
Com relação ao aspecto técnico da atividade de energia elétrica, a Abradee
(2015) destaca que a indústria de energia elétrica possui um sistema eletricamente
conectado, que exige balanço constante entre tudo que se produz e o que será
consumido. A indústria de energia elétrica é composta por geradores espalhados pelo
país e pelas linhas de transmissão e de distribuição de energia, que compõem a
chamada “indústria de rede”. Já com relação ao aspecto regulatório da indústria de
energia elétrica, pode-se dizer que a mesma é formada por agentes independentes

46
que dedicam-se a produzir, transportar ou comercializar a energia elétrica. Neste
contexto, não se pode receber a energia diretamente de um único gerador, mas sim
de todos os geradores ao mesmo tempo, o que faz com que os fluxos financeiros
deste sistema sejam diferentes dos fluxos energéticos físicos, conforme ilustra a
Figura 6 (ABRADEE, 2015).

Figura 6 – Segmentos da indústria de energia elétrica


Fonte: Abradee (2015)

Segundo a Abradee (2015) o setor elétrico brasileiro pode ser classificado


segundo dois aspectos. O primeiro refere-se ao aspecto técnico, que envolve os
agentes governamentais, responsáveis pela política energética do setor, bem como a
sua regulação, operação e pela comercialização de energia. Neste segmento, os
agentes diretamente ligados à produção e transporte de energia elétrica são os de
geração, transmissão e distribuição. O segundo aspecto é de natureza regulatória e
de fiscalização, que envolvem as atividades governamentais exercidas pelo CNPE
(Conselho Nacional de Política Energética), MME (Ministério de Minas e Energia),
CMSE (Comitê de Monitoramento do setor Elétrico), EPE (Empresa de Pesquisa
Energética) e ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), conforme ilustra a
Figura 7.

47
Figura 7 - Atores e instituições do setor de energia elétrica brasileiro
Fonte: Abradee (2015)

O setor de energia elétrica no Brasil é altamente regulado pelo governo, que


estabelece os diferentes papéis e desenvolve o planejamento de curto e longo prazo
de forma conjunta com as instituições dos diferentes níveis do sistema. Em termos
dos estudos com base na teoria da governança, pode-se dizer que esta se debruça
muito em maneiras de se descrever e analisar e muito pouco em prescrever modelos
e formas de governança. Porém, a sociedade (e o setor de energia elétrica não é
diferente) demanda por soluções de longo prazo desenvolvidas com um propósito
sustentável.
A literatura sobre a teoria evolucionária aponta a questão da heterogeneidade
dos atores como um dos elementos centrais para o desenvolvimento de um Sistema
Setorial de Inovação ao incluir neste aspecto uma variedade de crenças e

48
expectativas, que levam a um grau de diferenciação sobre uma série de fatores tais
como a base de conhecimento, tecnologias, demandas de mercado, aspectos
históricos, bem como processos de aprendizagem e cooperação formal e informal e
os relacionamentos entre diferentes tipos de atores, como universidades, centros de
pesquisa e órgãos governamentais (MALERBA, 1999; LUNDVALL, 2010, NELSON,
1993). Para o setor de EESFV (Energia Elétrica Solar Fotovoltaica), este processo
encontra-se em fase de nicho, uma vez que a tecnologia ainda não está difundida no
país e que as diferentes instituições iniciam o processo de consolidação de um
Sistema Setorial.
De forma geral, pode-se dizer que o conhecimento sobre a tecnologia da
EESFV no país é bastante baixo, muito em virtude da mesma se constituir como um
sistema incipiente. Neste sentido, faz-se necessário um breve esclarecimento sobre o
funcionamento e os princípios desta tecnologia, que serão elucidados a seguir.
A geração de EESFV, que corresponde à conversão de luz solar diretamente
em eletricidade é uma fonte renovável e muito promissora de geração de energia.
A energia do Sol que atinge a Terra varia de 600 Btu/pé2/dia no norte da Europa
a 2.000 Btu/pé2/dia nas regiões mais próximas do Equador, sendo que o termo
“irradiação” refere-se à quantidade de radiação solar que chega à Terra. Hinrichs,
Kleinbach e Reis (2015) ressaltam que apenas 9% da radiação é ultravioleta, 40% se
localiza na região visível e 50% é infravermelha (o que significa comprimento de onda
longo). Porém, apenas cerca de metade dessa radiação atinge a superfície da Terra,
pois existe uma grande absorção na atmosfera superior do planeta. Cerca de 19% da
radiação recebida pela atmosfera do planeta são absorvidos pelas nuvens, 31%
refletido para o espaço e os restantes 50% são quase totalmente absorvidos pela
superfície terrestre, conforme ilustra a Figura 8.

49
REFLETIDA INFRAVERMELHO
23% SAINDO
60%
100%
6%

ATMOSFERA
ABSORVIDA 19%

DISPERSA
29%
DIRETA
REFLETIDA PELA 21% 33% 105%
SUPERFÍCIE 8%
113%
113%
EVAPORAÇÃO,
CONVEXÃO
ABSORÇÃO PELA PELO AR
SUPERFÍCIE
IRRADIAÇÃO
TERRESTRE
SUPERFÍCIE TERRESTRE

Figura 8 – Balanço energético do sistema atmosfera-terra


Fonte: Adaptado de HINRICHS, KLEINBACH E REIS (2015, p. 201)

Os autores destacam que o planeta recebe cerca de 50% da radiação solar


incidente, sendo 21% de radiação direta e 29% por meio das nuvens e que, para se
manter o equilíbrio térmico da superfície do planeta, é necessário que a relação entre
a entrada e a saída de energia seja igual. É importante destacar que a irradiação
recebida em um local da superfície terrestre varia de acordo com a sua latitude, com
a estação do ano, bem como do horário do dia e da quantidade de nuvens presentes
na atmosfera. Por exemplo, a ocorrência das estações no hemisfério Sul mostra uma
defasagem de seis meses em relação às mesmas estações do hemisfério norte,
conforme demonstra o Quadro 3.

Estação do Ano Período de ocorrência no hemisfério Período de ocorrência no hemisfério


norte sul
Verão 22 de junho a 21 de setembro 22 de dezembro a 21 de março
Outono 22 de setembro a 21 de dezembro 22 de março a 21 de junho
Inverno 22 de dezembro a 21 de março 22 de junho a 21 de setembro
Primavera 22 de março a 21 de junho 22 de setembro a 21 de dezembro

Quadro 3 – Período de ocorrência das estações do ano


Fonte: HINRICHS, KLEINBACH E REIS (2015, p. 243)

50
Todos estes aspectos devem ser considerados no momento da implantação de
um sistema de energia fotovoltaico (FV), que funciona basicamente a partir da geração
de energia por células solares:
A luz se comporta mais como uma partícula do que como uma onda. A energia
de cada partícula de luz, chamada fóton, depende apenas da sua
frequência...Um elétron em um átomo de metal é capaz de “capturar” um fóton
e obter energia necessária para escapar se a energia do fóton exceder a de
adesão do elétron ao metal. A maior parte das células solares é feita pelo
agrupamento de duas camadas muito finas de silício cristalino, tratadas de
maneira especial (HINRICHS, KLEINBACH E REIS, 2015, p. 482).

Considerando-se o mercado atual de sistemas Fotovoltaicos (FV), tem-se que


a maioria das células é feita a partir de silício cristalino. Como opções para substituir
o uso do silício, Hinrichs, Kleinbach e Reis (2015) apresentam o arseneto de gálio, o
telureto de cádmio, o sulfeto de cádmio e o bisseleneto de cobre, índio e gálio, muito
utilizado em filmes finos e promissores ao oferecer alto coeficientes de absorção ótica.
Para uma instalação residencial, muito aspectos devem ser levados em conta,
como por exemplo, o dimensionamento do conjunto FV e a irradiação diária.
Um dos elementos que retardam a disseminação da energia elétrica FV é o seu
custo que, apesar de já ter apresentado uma queda significativa desde o seu
surgimento nos anos de 1950, ainda possui um preço alto quando comparado com as
demais fontes geradoras de energia elétrica. Hinrichs, Kleinbach e Reis (2015)
destacam os significativos avanços sofridos por esta tecnologia em termos de
eficiência e declínio em custos e colocam que apesar dos custos ainda serem altos, o
mercado de FV continua a crescer. Os autores destacam que entre as vantagens dos
sistemas FV estão a aplicação autônoma em áreas remotas, o fato de não gerar
poluição associada ao seu uso, a rapidez de implantação do sistema e a abundância
de sua principal matéria prima, o silício no ambiente. Além disso uma mudança cultural
por parte dos consumidores em relação a preocupação com a chamada “energia
limpa” tende a trazer um fator de crescimento para as instalações fotovoltaicas.
A energia FV tem avançado muito em termos mundiais, especialmente nos
países em desenvolvimento. Estima-se que existam no mundo 1,5 bilhões de pessoas
sem acesso à energia elétrica, sendo 190 mil famílias no Brasil, segundo dados do
MME (2015), sendo a maioria na zona rural, o que mostra o enorme potencial desta

51
fonte de energia no Brasil. Para potencializar o uso e a disseminação desta fonte de
energia a próxima seção faz a conexão entre os aspectos teóricos e os elementos
essenciais do sistema desta tecnologia.

2.5 UNINDO OS CONCEITOS: GOVERNANÇA E A TRANSIÇÃO DA


TECNOLOGIA DE EESFV NO BRASIL

Os desafios políticos para o setor de energia dos países em desenvolvimento


são diversos e profundos e podem incluir aspectos que vão desde o acesso à energia
moderna de baixo carbono, a degradação ambiental associada com combustíveis de
biomassa tradicionais; a falta de oferta interna de energia elétrica confiável e estável;
até a segurança do abastecimento e os custos de importação de energia
(MATHENSON, GIROUX, 2010).

O desenvolvimento sustentável é definido abstratamente como um


desenvolvimento a longo prazo no sentido de um equilíbrio entre o bem-estar
econômico, sociocultural e qualidade de vida ambiental, o que implica em um ato de
equilíbrio entre curto e longo prazo, bem como entre domínios e entre diferentes níveis
de escala (LOORBACH, 2007).

O conceito de sustentabilidade explora a relação entre o amplamente


conhecido triple bottom line, que envolve um equilíbrio entre o desenvolvimento
econômico, a qualidade ambiental e a equidade social. Rogers, Jalal e Boyd (2008)
definem a abordagem econômica como sendo a maximização dos lucros enquanto se
mantém constante ou crescente o estoque de capital. Já a abordagem ecológica é
colocada como manter a resiliência e solidez dos sistemas biológicos e físicos. Por
fim, a abordagem sociocultural é tida como a manutenção da estabilidade dos
sistemas culturais e sociais.

Muitos estudos apontam o crescimento econômico com o acesso aos serviços


de energia e também a relação entre o crescimento da demanda de energia e do PIB
de uma mesma região e mostram que o aceso aos serviços modernos de energia é
um elemento indispensável para o chamado desenvolvimento sustentável, uma vez

52
que contribui não apenas para o crescimento econômico de um país, mas também
para o acesso aos elementos essenciais para melhoria da qualidade de vida, tais
como educação e saúde (MATHENSON, GIROUX, 2010; IEA, 2004).

Mathenson e Giroux (2010) também destacam as oportunidades para a


cooperação entre países na área de financiamento de carbono e investimentos em
tecnologias de baixa emissão, que contribuem para quebrar o ciclo de pobreza e
outros riscos associados com a dependência dos combustíveis fósseis e colocam que,
neste sentido, as energias renováveis podem atuar com um papel central para
proporcionar um suprimento de energia mais seguro e sustentável para os países em
desenvolvimento.

Ao analisar o setor de comunidade energética no Reino Unido, os autores


Hielscher, Seyfang e Smith (2013) apontam que, se por um lado a pesquisa da
transição para a sustentabilidade pode ser uma ferramenta útil para se conceitualizar
a emergência e o desenvolvimento da comunidade de energia, por outro existe uma
série de fraquezas no modelo que se tornam evidentes ao serem aplicadas ao
contexto baseado na comunidade de inovações populares. Uma das limitações que a
pesquisa procurou combater, por meio da busca de evidências para testar a teoria
nestes contextos, é a tendência para simplificar interações entre nichos e regimes,
obscurecendo a complexa pluralidade da configuração sociotécnica em uma
homogeneidade de nichos irreais em um similarmente problemático regime
homogêneo.

No setor de energia elétrica a questão da sustentabilidade está altamente


relacionada à eficiência energética. Neste sentido, a questão da necessidade da
eficiência no uso da energia elétrica é reconhecida mundialmente, seja do ponto de
vista econômico, social ou ambiental. Evidencia-se muitas medidas e políticas
governamentais na direção de maior eficiência energética, a partir da preocupação
com equipamentos, eletrodomésticos e hábitos de consumo, que são analisados sob
o ponto de vista da conservação da energia. Programas governamentais como Procel
e Reluz, além de várias iniciativas privadas se dedicam à tarefa do aumento da
eficiência energética e da redução do consumo de energia elétrica no país, sendo que

53
a integração e a cooperação entre os diversos atores institucionais do setor
mostraram-se fundamentais para os resultados alcançados até o momento em termos
da utilização da energia elétrica de forma mais eficiente.
Dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA) mostram que o Brasil possui uma
alta demanda reprimida de energia e, somado a este fato, os índices nacionais de
perda e desperdício de eletricidade também são altos. O total de energia elétrica
desperdiçado, segundo o Procel, chega a 40 milhões de kW, cerca de US$ 2,8 bilhões
por ano. Os consumidores - indústrias, residências e comércio - desperdiçam 22
milhões de kW; as concessionárias de energia, por sua vez, com perdas técnicas e
problemas na distribuição, são responsáveis pelos 18 milhões de kW restantes do
total desperdiçado (MMA, 2015).
Segundo Goldemberg (2001), devido ao rápido crescimento do consumo de
energia, os países em desenvolvimento são palcos importantes de inovações,
especialmente nas indústrias de base energointensivas (aço, produtos químicos,
cimento etc), o que torna fundamental que as tecnologias modernas sejam
incorporadas prematuramente no processo de desenvolvimento e não por meio de
readaptações, como foi o caso nos países industrializados.
Dados do MME mostram que a matriz de oferta de energia elétrica nacional
apresenta as mesmas tendências de redução na participação de petróleo e hidráulica
e de aumento da participação das demais fontes em comparação com o restante do
mundo, assim como ocorre nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) e de outros países (MME, 2015).
Ao realizar uma projeção do futuro da energia elétrica mundial o WEC (World
Energy Council) indica que, em 2050, aproximadamente 319 milhões pessoas no
mundo não terão acesso a eletricidade no melhor dos casos (Jazz Cenário) e 530
milhões (Symphony Cenário) no pior caso. Isto significa que, a lacuna da falta de
acesso à energia elétrica não se fechará rapidamente, especialmente nas regiões da
África Subsaariana e no Sul da Ásia, onde as taxas de eletrificação são 31,8% e
70,4%, respectivamente . Em outras regiões do mundo, quase todas as pessoas têm
acesso à eletricidade (GEI, 2015).
Para que se possa avançar no fornecimento de eletricidade será necessária
uma liderança forte e a concentração das prioridades em comunidades sem acesso à

54
eletricidade. Dados do GEI - Global Eletricity Iniciative (2015) apontam que, a menos
que ocorra uma ação concentrada realizada por governos e a comunidade
internacional, os 1,2 bilhão de pessoas atualmente estimados como sem acesso à
eletricidade permanecerão assim até 2030. Para viabilizar o acesso à energia elétrica
para estas pessoas será necessário o investimento de cerca de US$ 1 trilhão, o que
significa um aumento de mais de 50% nos investimentos anuais de energia em relação
a 2009 (GEI, 2015).
Ao analisar a projeção do consumo total de energia elétrica para o Brasil, a EPE
destaca que a parcela de autoprodução nacional deverá crescer a uma taxa média de
2,6% aa no período entre 2013 – 2050 enquanto que o consumo na rede, ou seja, a
demanda a ser atendida pelo Sistema Elétrico Nacional deverá aumentar a 3,2% aa.
Indicadores como elasticidade-renda e intensidade elétrica constituem-se em
importantes elementos de análise das projeções de consumo, no qual observa-se que
até 2020 o crescimento do consumo deve ser superior ao PIB nacional, porém em um
horizonte de longo prazo a intensidade elétrica declina com elasticidade inferiores ao
PIB nacional, conforme demostra o Quadro 4.
9
ANO CONSUMO (TWh) PIB (10 R$ 2010) INTENSIDADE (kWh/R$ 2010)
2013 513 4.012 0,128
2020 685 5.229 0,131
2030 965 7.815 0,123
2040 1.285 11.025 0,117
2050 1.624 14.816 0,11
PERÍODO CONSUMO (% a.a.) PIB (% a.a.) ELASTICIDADE
2013 - 2020 4,2 3,9 1,09
2020 - 2030 3,5 4,1 0,85
2030 - 2040 2,9 3,5 0,83
2040 - 2050 2,4 3,0 0,79
2013 - 2050 3,2 3,6 0,88

Quadro 4 – Elasticidade-renda e intensidade do consumo de energia elétrica (2015)


Fonte: EPE (2015)
Em 2004, o governo brasileiro, sob a inadiável necessidade de um novo
ordenamento no Setor Energético Nacional e em vistas a suprir as demandas de
energia atuais e futuras, formulou um novo modelo da atividade elétrica, resultante da
promulgação, em 15 de março de 2004, das Leis nos 10.847 e 10.848 que tratam,

55
respectivamente, da criação da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) e de um novo
arcabouço das regras de comercialização de energia elétrica (EPE, 2007).
Este novo modelo buscou conciliar pesquisa, exploração, uso e
desenvolvimento dos insumos energéticos e trouxe uma reestruturação do
planejamento e expansão dos sistemas elétricos nacionais. Este planejamento
envolve um ciclo de quatro etapas, a saber: diagnóstico, elaboração de diretrizes e
políticas, implementação e, por fim, a etapa de monitoramento, que possuem uma
natureza de estudo das análises de diagnóstico estratégico para o setor energético,
bem como de pesquisa de planos de desenvolvimento energético (EPE, 2007).
Dados do Balanço Nacional de Energia de 2016 mostram que a matriz de
energia elétrica do Brasil é predominantemente renovável, com destaque para a
geração hidráulica que representou cerca de 64% da oferta interna de energia do país
em 2015, conforme ilustra o Gráfico 1. As fontes renováveis de energia representaram
74,6% da oferta interna de eletricidade (produção nacional somada às importações)
no Brasil em 2014.

Eólica Carvão e
Nuclear 4% Derivados
Derivados de 2% 4% Solar
Petróleo 0%
5%
Gás natural
13%

Biomassa
8%
Hidráulica
64%

Gráfico 1 – Oferta interna de energia elétrica por fonte – ano 2014


Fonte: BEN (2016, p. 16)

O mesmo relatório, desenvolvido pela EPE demonstra que a geração de


energia elétrica no Brasil em centrais de serviço e autoprodutores atingiu 590,5 TWh
em 2014, resultado 3,4% superior ao de 2013. As centrais elétricas de serviço público,
com 84,1% da geração total, permanecem como principais contribuintes.

56
A principal fonte de geração de energia elétrica em 2015 segue sendo de
origem hidráulica, embora tenha apresentado uma redução de 3,7% na comparação
com 2014. Importações líquidas de 34,4 TWh, somadas à geração nacional,
asseguraram uma oferta interna de energia elétrica de 615,9 TWh, montante 1,3%
inferior a 2014. O consumo final foi de 522,8 TWh, um recuo de 1,8% em comparação
com 2014. (BEN, 2016, p. 17).
A questão tecnológica impacta significativamente na forma como a população
utiliza a energia e movimenta o paradigma tecnológico desta atividade. Segundo
Corazza e Francalanza (2004, p. 134) o paradigma tecnológico é um modelo ou um
padrão de solução de problemas tecnológicos selecionados, formulados com base em
princípios derivados das ciências naturais, por meio do emprego de tecnologias
materiais selecionadas. Especificamente na questão da geração de energia elétrica,
novas tecnologias podem contribuir significativamente para a redução de emissões de
CO2, com aumento da eficiência e a redução dos custos. Assim, o desenvolvimento
tecnológico foi um dos determinantes para a escolha das fontes que irão compor a
matriz energética nacional, no sentido de torná-la mais diversificada no horizonte do
PNE 2030 (Plano Nacional de Energia 2030) (EPE, 2007).
Ao observar os dados do Balanço Energético Nacional de 2015 percebe-se que
o consumo industrial apresentou uma queda em 2014, representando 38,8% do total
de eletricidade consumida no país, seguido pelo consumo residencial com 24,9% e
pelo setor comercial, que representou 17,1% do total de energia elétrica consumida
no país, conforme demonstra a Tabela 1 (BEN, 2015). Entre os anos 2005 e 2014 o
consumo de energia elétrica no país aumentou ais de 40%, passando de 32.267 (103
tep) para 45.655 (103 tep).
A Tabela 1 apresenta a evolução do consumo anual por setor para os últimos
10 anos e mostra a tendência de crescimento em todos os setores. O item “Outros” é
composto pela soma dos setores agropecuário, energético e transportes.

57
SETORES 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

CONSUMO FINAL 44.946


3 32.267 33.536 35.443 36829 36.638 39.964 41.363 42.861 44.373 45.782
(10 tep)
INDUSTRIAL 46,7 47,0 46,7 46,1 43,8 43,8 43,5 42,1 40,7 38,9 37,6
RESIDENCIAL 22,2 22,0 22,1 22,3 23,6 23,1 23,3 23,6 24,2 24,9 25,1
COMERCIAL 14,3 14,2 14,2 14,6 15,5 15,0 15,4 16,0 16,4 17,1 15,5
PÚBLICO 8,7 8,5 8,2 8,1 8,3 8,0 7,9 8,0 8,0 8,0 8,2
OUTROS* 8,1 8,3 8,8 8,9 8,8 10,1 9,9 10,3 10,7 11,2 13,6
TOTAL 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100 100

Tabela 1 – Composição setorial do consumo de eletricidade


Fonte: BEN (2016, p. 34)

Para o atendimento do consumo total de eletricidade tem-se dois caminhos não


excludentes a se percorrer: o gerenciamento da demanda e aumento da oferta. Do
lado do gerenciamento da demanda a questão da eficiência energética deve sempre
ser considerada (MME, 2015).
Neste sentido, Twidell e Weir (2015) destacam que a economia de energia é
um resultado de alterações de atividades que demandam produção de energia como
por exemplo, desligar as luzes quando não se está precisando, caminhar ao invés de
utilizar o carro, ajustar os controles do ar condicionado para evitar aquecimento ou
resfriamento excessivo e concluem que “a economia de energia pode ser realizada
por mudanças técnicas, organizacionais, institucionais, estruturais e
comportamentais” (TWIDELL, WEIR, 2015, p. 572).
Os aspectos regulativos, legislativos e judiciais possuem um papel fundamental
para o estabelecimento de políticas para a energia. Complementar a esta questão,
Mathenson e Giroux (2010), baseado em um trabalho da OECD (Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico), pontuam as funções ambientais
essenciais de cada um dos níveis dos ministérios setoriais de um país. Tais funções
envolvem desde a formulação de políticas ambientais para o desenvolvimento
energético até o gerenciamento dos recursos humanos e o monitoramento e
demonstração de performance, que demostram os requisitos para a governança no
setor de energia, conforme demonstra o Quadro 5.

58
Uso da Energia Descrição
Fornecimento de § capacidade para a criação e manutenção de um ambiente favorável para a
Energia: energia sustentável (políticas, legislação, regulamentação, financiamento,
promoção, etc.).
§ capacidade de planejamento de fornecimento de energia (previsão, análise
econômica custo total, avaliações técnicas, avaliação e seleção de opções,
etc.);
§ capacidade de execução do programa (implementação dos compromissos da
política energética sustentável);
§ capacidade de efetuar a supervisão ambiental do desenvolvimento de novas
fontes de energia;
§ capacidade de monitorar o desempenho ambiental do setor do
abastecimento de energia e apoiar um melhor desempenho por meio de
atividades de aplicação e cumprimento.
Uso de Energia: § capacidade para a criação e manutenção de um ambiente propício para a
eficiência energética (políticas, legislação, regulamentação, financiamento,
promoção, etc.);
§ capacidade de planejamento do lado da procura (análise de utilização final,
avaliação económica e técnica do potencial de eficiência energética, etc.);
§ capacidade de execução do programa (implementação de compromissos
políticos de eficiência energética);
§ capacidade para fornecer supervisão aos programas de gestão da procura de
energia e projetos;
§ capacidade de monitorar o desempenho técnico e ambiental da utilização final
de energia e apoiar um melhor desempenho por meio de atividades de
aplicação e cumprimento.
Transversal: § capacidade para realizar o planejamento integrado (procura e oferta);
§ capacidade para avaliação ambiental e estratégica do projeto;
§ capacidade para avaliar a vulnerabilidade climática e os riscos para a
infraestrutura energética (procura e oferta);
§ capacidade de envolver e comunicar com as partes interessadas.
Quadro 5 – Requisitos da capacidade do governo para uma boa gestão ambiental e governança no
setor de energia
Fonte: MATHENSON E GIROUX (2010, p. 37)

Os autores classificam as estratégias para o processo de governança em


quatro categorias principais:
1. Estratégias do setor de energia, que incluem estratégias nacionais em
termos de energia, de energias renováveis e de eficiência energética;
2. Demais estratégias setoriais, que incluem estratégias nacionais florestais,
estratégias nacionais de agricultura e estratégias nacionais ambientais;
3. Estratégias relacionadas à governança para o gerenciamento da economia,
que incluem estratégias relacionadas à privatização ou à liberalização dos mercados,
estratégias para a promoção de investimentos, estratégias para a reforma e

59
modernização do setor público e estratégias para o desenvolvimento da capacidade
instalada;
4. Estratégias orientadas à problemas, que incluem as estratégias nacionais
relacionadas às mudanças climáticas e as estratégias para a redução da pobreza e o
desenvolvimento rural.
Entre os aspectos essenciais para uma gestão ambiental e uma governança
para o setor de energia revisados nesta seção, pode-se apontar a capacidade de se
criar e manter um ambiente propício para o desenvolvimento da energia sustentável
em todas as suas fontes. Tal ambiente envolve elementos políticos, regulatórios,
financeiros e de planejamento voltado para eficiência energética e a gestão dos
recursos de forma otimizada e eficiente.

2.6 CONCLUSÕES

O presente estudo buscou realizar uma revisão teórica baseada em duas


teorias: a teoria sociotécnica da transição e a teoria da governança, identificando
aspectos essenciais que podem ser aplicados no setor de EESFV no Brasil. Neste
sentido, iniciou-se com a definição de Sistema Nacional de Inovação, Sistema Setorial
de Inovação e os elementos embasadores da teoria da transição sociotécnica.

O processo de inovação possui suas raízes em ambos, na estrutura e no set-


up institucional da economia e pode, basicamente, ser visto como uma atividade
coletiva, resultado da comunicação e da interação entre as pessoas (LUNDVALL,
2010). A tecnologia de geração de energia fotovoltaica ainda é muito incipiente no
Brasil e seu avanço até o momento dependeu das instituições governamentais e suas
iniciativas para fomentar esta tecnologia. Confirmando o que a autora Perez (2004)
menciona sobre o desenvolvimento dos sistemas, no caso analisado, o mesmo foi e
ainda está sendo moldado pelas instituições governamentais do setor, que possuem
um papel muito importante na difusão desta tecnologia no país.

Em termos de transformação e evolução do Sistema Setorial de Inovação,


pode-se dizer que estas envolvem não apenas um crescimento quantitativo das
variáveis que compõem o sistema, mas também em termos qualitativos, em função

60
das relações estabelecidas entre atores de diferentes naturezas e do processo de
troca e aprendizagem que estas relações desenvolvem. Neste sentido, o ingresso de
novos atores no setor de EESFV pode trazer novas competências, trocas e
potencializar o processo de aprendizado e o consequente desenvolvimento de novas
tecnologias para o Sistema Setorial.
Além disso, o relacionamento entre os atores já estabelecidos no Sistema
Setorial de Inovação desenvolve um processo de co-evolução do sistema, o que faz
com que elementos centrais do sistema tais como tecnologia, conhecimento e
demanda de mercado possam se desenvolver conjuntamente e de forma mais
dinâmica e interligada, favorecendo o processo de transição tecnológica e a
emergência desta tecnologia no setor de energia elétrica do Brasil.

61
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65
3 A EMERGÊNCIA DA ENERGIA FOTOVOLTAICA NO BRASIL:
DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA CRESCIMENTO

Resumo: O presente estudo investiga, a partir de uma perspectiva sociotécnica, a


emergência da energia elétrica solar fotovoltaica (EESFV) no Brasil e identifica os
desafios e as oportunidades para o uso e a disseminação desta fonte de energia no
país. A pesquisa é baseada principalmente em dados primários de 2015 e 2016: foram
conduzidas 20 entrevistas em profundidade com representantes de atores relevantes
do Sistema Nacional de Inovação, incluindo o Ministério de Minas e Energia (MME),
Institutos de Pesquisa governamentais, agências governamentais, companhias
concessionárias de energia elétrica, instituições bancárias de fomento ao
desenvolvimento, pequenos fabricantes, prestadores de serviços, universidades, bem
como micro geradores residenciais e comerciais. Os dados adicionais se constituem
de resoluções, regulações, políticas de incentivo ofertadas pelas agências do governo
e relatórios oficiais de instituições governamentais. Para a análise dos dados foram
utilizadas duas perspectivas teóricas embasadoras: a perspectiva multinível (MLP) e
as Funções do Sistema de Inovação (FSI). Entre os fatores necessários para a
disseminação da EESFV no Brasil estão: o estabelecimento de metas claras de longo
prazo, incentivos fiscais e financeiros, a oferta de oportunidades mais atrativas para
investidores, bem como uma formação profissional que ofereça cursos especializados
em todos os níveis. O presente estudo inclui uma revisão crítica da aplicabilidade da
perspectiva multinível para o caso de EESFV no Brasil e recomendações de
adaptação desta perspectiva para um melhor ajuste ao caso analisado. Em específico,
esta revisão observa os fatores relevantes do regime e da paisagem para o caso em
estudo e as interações entre os níveis da perspectiva multinível. O que é interessante
observar, a partir da análise dos resultados, são os impactos dos desenvolvimentos
do nicho no regime e na paisagem, especialmente na forma de estabelecimento de
uma nova indústria para o setor e do crescimento econômico nacional, local e regional
como resultados da disseminação desta tecnologia no país.
Palavras chaves: Energia Elétrica Solar Fotovoltaica no Brasil, Funções do Sistema
de Inovação e Perspectiva Multinível.

66
Abstract: This study investigates from a socio-technical perspective the emergence
of Solar Photovoltaic electricity (PV) in Brazil and identifies the challenges and
opportunities for the use and dissemination of PV energy in the country. The research
is based mainly on primary data from 2015-2016: we conducted 17 in-depth interviews
representing relevant actors from the system, including the Ministry of Energy,
governmental research institutes, governmental agencies, state energy companies,
public utilities, banks, small manufacturers and service providers, universities and
small residential and commercial generators. Additional written data involved
resolutions, regulations, incentive and financing policies offered by governmental
agencies and also reports from the official government organizations. For analysis of
the data we used the multilevel perspective and the functions of innovation systems
perspective. The needs for the dissemination of PV energy includes the establishment
of long-term clear goals, fiscal and financial incentives, more attractive opportunities
for investors as well as professional training courses at all levels. The paper includes
a critical review of the applicability of the multilevel perspective to the case of PV in
Brazil and recommendations for adapting this perspective to better fit this case. In
specific, this review looks into the relevant regime factors and landscape factors for
this case, and the interactions between the MLP levels. What is especially interesting
to derive from the analysis is the impact of the niche developments on the regime and
the landscape, especially in the form of the establishment of a new PV energy industry,
national economic growth and local and regional development that result from the
dissemination of PV.
Key words: Brazilian solar photovoltaic energy, Functions of Innovation Systems, MLP
Framework.

67
3.1 INTRODUÇÃO:

Desde que a questão ambiental se apresentou com intensidade na década de


1980, as inquietudes e os estudos sobre os problemas ambientais são crescentes em
todo o mundo, bem como as propostas nacionais e globais direcionadas à limitação e
redução dos danos ambientais, que envolvem a substituição de fontes de energia de
origem fósseis e o incremento do uso de energia renovável. A preocupação com o uso
otimizado dos recursos energéticos, sejam eles renováveis ou não, é pauta cada vez
mais frequente nos cenários ambiental, social e econômico não somente no Brasil,
mas também no mundo inteiro.
O relatório do GEI (Global Eletricity Iniciative) do ano de 2014 aponta que a
demanda por eletricidade tende a crescer fortemente em todo o mundo e espera-se
que nas próximas décadas mais de 90% deste crescimento da demanda seja
proveniente dos países em desenvolvimento. O aumento pela demanda de energia
elétrica nestes países se deve, entre outros fatores, à migração da população das
zonas rurais para as zonas urbanas, ao aumento da industrialização, aumento de
renda e crescimento da economia (GEI, 2015).
Dados do BEN (Balanço Energético Nacional) de 2015 mostram que o Brasil
dispõe de uma matriz elétrica predominantemente renovável, uma vez que as fontes
de energia renováveis representaram 74,6% da oferta interna de eletricidade no país
em 2014, cuja soma resulta da produção nacional mais as importações, sendo estas
essencialmente de origem renováveis. Estas fontes de energia renováveis consistem
principalmente de hidrelétricas de grande escala. O Balanço Energético Nacional de
2015 também demonstrou que, em 2014, a capacidade total instalada de geração
energia elétrica no Brasil atingiu 133.914 MW, o que representa um incremento de
7.171 MW comparado com os anos anteriores. As plantas hidrelétricas contribuíram
com 44,3% na expansão da capacidade instalada enquanto as térmicas contribuíram
18,1%. As fontes eólica e solar foram responsáveis por outros 37,6% de aumento na
capacidade instalada para a matriz energética de 2014 (ANEEL, 2015).
No cenário para 2050, existe a previsão de que a demanda por energia seja
triplicada no País e exista uma demanda energética mais alta por pessoa, em virtude
de vários aspectos: crescimento da população do país em mais de 30 milhões de

68
pessoas, aumento do PIB nacional, com mais domicílios por pessoa e envelhecimento
da população, todos fatores que contribuem para uma demanda maior de energia per
capita (FARIELLO, 2015). As políticas de eficiência energética e a geração distribuída
coloca o consumidor final em um papel central para contribuir com o decréscimo na
necessidade de expansão da atividade elétrica em uma perspectiva de longo prazo
(EPE, 2015).
O presente estudo investiga o processo de transição sociotécnica no setor de
energia elétrica no Brasil, especificamente para a energia fotovoltaica e identifica
desafios e oportunidades a partir de uma perspectiva multinível (MLP) e da análise
das funções do sistema de inovação (FSI). Em relação à meta nacional e global de se
conseguir atender às crescentes demandas de energia elétrica com o menor impacto
ambiental possível, fontes de energia renováveis, como a energia fotovoltaica são
destacadas com um amplo entendimento de que a fonte de energia mais importante
consiste precisamente na sua conservação.
Neste contexto, é relevante analisar como e porque as fontes de energia
renováveis surgem dentro da atividade de eletricidade e de que forma isso impacta na
transição para uma matriz energética nacional mais sustentável. Apesar de ter uma
representatividade insignificante na matriz energética nacional, a energia fotovoltaica
no Brasil apresentou um aumento substancial no ano de 2013 para 2014, passando
de 5 para 16 GWh, de acordo com o Relatório de Energia 2015, divulgado pelo
Ministério de Minas e Energia (MME).
Neste sentido, a principal questão levantada por este estudo é: "Quais são os
principais desafios e oportunidades para o crescimento da energia elétrica solar
fotovoltaica no Brasil?".
O escopo considerado no estudo envolve não somente o desenvolvimento e
lançamento de novas tecnologias, políticas governamentais e medidas para a
utilização e difusão de EESFV no Brasil, mas também o surgimento de inovações que
se originam e se desenvolvem a partir da relação entre os atores, suas práticas, suas
fontes de informação, bem como os aspectos cognitivos, normativos e regulativos
existentes na relação entre os vários níveis da atividade fotovoltaica no contexto
nacional.

69
Portanto, neste estudo, a transição sociotécnica é constituída como um processo
que ocorre em várias fases, que permeia os aspectos que compõem da paisagem, o
regime e o nicho e se consolida como uma resposta dos vários atores envolvidos no
ambiente para o desenvolvimento sustentável da atividade de EESFV no cenário
nacional.

3.2 REFERENCIAL TEÓRICO:

A perspectiva sociotécnica tem suas raízes em duas teorias principais: teoria


institucional e a teoria da economia evolucionária e argumenta que o processo de
inovação é um processo socialmente incorporado e que precisa ser compreendido no
âmbito das suas relações co-evolutivas dentro do sistema em todos os níveis (nicho,
regime e paisagem). O setor de EESFV do Brasil é analisado neste trabalho com base
na abordagem de duas teorias sociotécnicas: MLP (Perspectiva Multinível) e FSI
(Funções do Sistema de Inovação). A base teórica sociotécnica significa que o sistema
em estudo é interligado por ambos os elementos: técnico e social (KAMP; FORN,
2016).

3.2.1 Perspectiva Multinível:

A perspectiva da transição como um processo multinível surgiu a partir da


necessidade de se estabelecer uma ponte entre a percpectiva STS (estudos de
ciência e tecnologia) e a economia evolucionária em meados de 1998 (RIP; KEMP,
1998; SCHOT, 1998; GEELS 2002, 2004, 2005). De acordo com Geels (2004), a
perspectiva multinível é composta por uma combinação dos pressupostos de duas
teorias distintas: a sociologia da tecnologia e economia evolucionária, com três níveis
de análise para compreender a dinâmica complexa das mudanças sociotécnicas: O
Regime sociotécnico, a Paisagem sociotécnica e os nichos tecnológicos.
O Regime Sociotécnico envolve as práticas dominantes, as regras e
pressupostos compartilhados que norteiam a ação privada e as políticas públicas em
um determinado campo, que estruturam o comportamento dos atores e que tendem a
ser orientados para a otimização dos sistemas, em vez de sua transformação (KEMP;
ROTMANS, 2010). Um regime tecnológico contempla “um conjunto de regras

70
inseridas em um complexo sistema de engenharia, práticas, tecnologias de processo
de produção, características do produto, habilidades e procedimentos, formas de lidar
com artefatos e pessoas relevantes, bem como com a definição de problemas, os
quais são incorporados em instituições e infraestrutura” (PIR; KEMP, 1998, p 340.).
A Paisagem Sociotécnica refere-se às “variáveis embasadoras de um
sistema, tais como a infraestrutura material, a cultura política e as alianças, os valores
sociais, as visões de mundo e os paradigmas, a macroeconomia, a demografia e o
ambiente natural, que envolvem os canais dos processos de transição e mudam
lentamente e autonomamente” (KEMP; ROTMANS; 2010, p. 39).
Já os Nichos Tecnológicos são formados pelos “domínios locais, nos quais
são utilizadas tecnologias novas ou não-padrão. Os nichos pode ser de mercado,
nichos tecnológicos ou ainda locais protegidos” (KEMP; ROTMANS, 2010, p.39).
Nichos fornecem "proteção" para as novidades porque eles agem como incubadoras,
fornecendo proteção e critérios diferentes do que o habitual. Os nichos são
importantes arenas de aprendizagem, ao fornecer um ambiente que permite o
"aprender fazendo", "aprender usando" e "aprender interagindo", bem como
proporcionam um espaço para a criação de redes de apoio à inovação e o
desenvolvimento de novas tecnologias (GEELS, 2004).
Segundo Saviotti (2010), qualquer alteração no ambiente econômico induz
inovações destinadas a compensar essa mudança, que por sua vez se desdobra no
desenvolvimento de uma nova tecnologia, bem como em um conjunto de instituições
apropriados para este novo ambiente. É importante salientar que as alterações do
meio ambiente que podem induzir uma mudança nas tecnologias e nas instituições
não são necessariamente exógenas. Neste contexto, a dinâmica dos atores em redes
é, essencialmente, iniciada pelo surgimento de novas tecnologias, mas o
desenvolvimento posterior é determinado conjuntamente pelas tecnologias e pelas
instituições.
É neste contexto que surge o conceito de visão multinível da inovação ou Multi
Level Perspective (MLP) que, segundo Papachristos (2011, p. 203), pode ser
compreendida como um “framework para estudar a mudança tecnológica e a difusão
das inovações dentro de um sistema. Esta perspectiva enfatiza o papel do social
(grupo ou rede), as interligações, a dinâmica da mudança do sistema e a inércia”. O

71
alinhamento das atividades é um conceito importante no MLP, uma vez que influencia
a estabilidade do regime. Pressões que atuam sobre o regime podem reduzir o
alinhamento entre as atividades de seus grupos sociais. Este alinhamento também
pode diminuir à medida que novos grupos associados com o novo regime se tornam
ativos dentro do Sistema.
O alinhamento entre os diferentes níveis da perspectiva MLP apresenta
algumas características evolucionárias, uma vez que os nichos apresentam-se como
o foco para a geração de inovações radicais. Porém, a seleção e a difusão mais ampla
destas inovações dependem do alinhamento entre os níveis de regime e paisagem
(GEELS, SCHOT, 2010).
Os processos de transição tecnológica podem ser compreendidos a partir da
dinâmica entre os níveis de nichos, regimes e paisagem sociotécnica. Neste sentido,
as inovações radicais são mencionadas como exemplos deste processo de mudança,
uma vez que muitas vezes estas vêm de fora do sistema, porque os atores do regime
estão presos em velhos modos de pensar e velhas tecnologias, o que os leva para
melhorar as tecnologias existentes e agir de forma estratégica para combater um novo
desenvolvimento. Porém, uma vez que o regime muda, como por exemplo, quando
os atores do regime começam a ver um novo desenvolvimento como uma
oportunidade e não uma ameaça, uma inversão de estratégia pode ocorrer, os atores
do regime podem dar uma nova dinâmica de desenvolvimento por meio da aplicação
de grandes quantidades de capital, poder organizacional e marketing. Neste
momento, os modelos mentais que orientam os atores chaves mudam, os novos
desenvolvimentos obtêm impulsos e o regime pode mudar muito rapidamente (KEMP,
ROTMANS, 2010).
Para uma mudança de regime ocorrer, esta deve ser reconhecida como
necessária, viável e vantajosa por uma ampla gama de atores e instituições. Em geral,
a análise de regimes estabelecidos tende a enfatizar a estabilidade e continuidade.
Neste sentido, uma série de explicações para esses processos de canalização
tecnológica, “path dependence” (processos de auto-reforço que aceleram a direção
do desenvolvimento dentro de um sistema), 'lock in' (estado de um sistema
historicamente evoluído e que só pode ser modificado a partir de um grande esforço)
e 'lock-out' (movimentação que ocorre dentro do sistema para a substituição de

72
determinada tecnologia) têm sido propostas por vários autores da teoria sociotécnica
(GEELS, 2004; NELSON, 2008; PEREZ, 2004).
A literatura sobre mudança tecnológica de regimes estabelecidos coloca a
ênfase na persistência das mudanças incrementais ao longo de caminhos bem
definidos, porque a geração de novidades é delimitada por hipóteses de trabalho e os
procedimentos inerentes a este regime, ou porque há uma série de obstáculos
técnicos e institucionais à mudança de um regime para o outro (BERKHOUT, 2010).
Cinco características do processo de transição encontram-se na teoria, que
propõem que as transições são co-evolutiva e multi-atores, de longo prazo (40-50
anos), macroscópicas e envolvem processos radicais de mudança (GEELS; SCHOT,
2010). O estudo das transições baseado na perspectiva sociotécnica é justificado
pelos autores quando eles mencionam que a investigação deste campo envolve a
compreensão do contexto no qual a tecnologia é utilizada. Isso envolve não só o
desenvolvimento de conhecimentos e protótipos, mas também a mobilização de
recursos, a criação de redes sociais, a construção de mercados e novos quadros
regulatórios. Neste sentido, o desenvolvimento tecnológico envolve a criação de
ligações entre diferentes elementos heterogêneos. As mudanças tecnológicas exigem
que os atores combinem artefatos físicos, organizações, recursos naturais, elementos
científicos, bem como artefatos legais (GEELS; SCHOT, 2010).
Geels e Schot (2010) também apontam a importância dos aspectos históricos
para a análise sociotécnica da transição em uma perspectiva de longo prazo, uma vez
que estas permitem uma análise de multi-causalidade, co-evolução, pensamento
lateral, anti-reducionismo, padrões, contexto e o uso de diferentes escalas de tempo.
De forma resumida, o presente estudo analizou os três níveis da perspectiva multinível
por meio dos indicadores demonstrados na Figura 9.

73
Aumento da estruturação das atividades nas práticas locais

Paisagem Instabilidade Política e


Taxa de Econômica Índice de Radiação
desemprego Solar
Rating de Risco
para o setor de eletricidade fotovoltaica no Brasil

Impacto da Tecnologia na
Estratégias Globais
dinâmica do sistema
Aspectos Cognitivos, para o setor
Regime normativos e regulativos Dinâmica das mudanças Impacto das políticas e
Mudanças Estruturais Tecnológicas programas de incentivo
Políticas Governamentais

Desenvolvimento Difusão do Mobilização


Atividades do conhecimento Conhecimento de Recursos
Nichos Empreendedoras Orientação Formação de Criação de
(novidades) de Busca Mercado Legitimidade

Figura 9 – MLP níveis e indicadores


Fonte: elaboração própria a paritr de from Geels (2002) and Hekkert et al. (2007)

A EESFV no Brasil encontra-se atualmente em um estágio de desenvolvimento


da tecnologia, típica da fase de nicho. No seu processo de desenvolvimento e
maturação, uma nova tecnologia é imersa num nicho tecnológico. Para esta nova
tecnologia evoluir para um nicho de mercado é necessário que aconteça a utilização
e o reconhecimento do seu valor por parte dos utilizadores. Desta forma, ela começa
a competir com outras tecnologias já estabelecidas no sistema (KAMP, VANHEULE,
2015). A fim de melhor analisar as atividades e as dinâmicas que acontecem dentro
do sistema de inovação de energia elétrica fotovoltaica brasileira utilizou-se a literatura
das funções do sistema de inovação (FIS), como segue.

3.2.2 Funções do Sistema de Inovação:

Um sistema de inovação é uma rede de instituições cujas atividades contribuem


para o aprendizado e a transmissão de novas tecnologias favorecendo o desempenho
inovador das empresas para adquirir novas habilidades e competências através da
rede (NELSON, 1993; FREEMAN, 1987, MENDONÇA, CUNHA, 2014). O estudo da
inovação tem tomado novas perspectivas a partir da abordagem da teoria dos
sistemas que prioriza a importância da partilha de informação e a forma como as

74
empresas se relacionam com ganhos comuns (MALERBA, 2002; MENDONÇA,
CHEROBIM, CUNHA, 2014). O objetivo de um sistema de inovação pode ser descrito
como a transferência, implementação e difusão de tecnologia, que são compostas por
um processo chave para um Sistema de Inovação em bom funcionamento, chamado
na literatura como "Funções do Sistema de Inovação" (ALPHEN, HEKKERT E SARK,
2008). As atividades que acontecem dentro do Sistema de Inovação têm a função de
contribuir para o desenvolvimento do sistema, bem como propor novas formas para a
geração e difusão de inovações.
Essas atividades são chamadas na literatura como "Funções do Sistema de
Inovação", (FSI), que Hekkert el al (2007) dividem em sete atividades principais, com
base em estudos empíricos realizados na Utrecht University: (1) atividades
empreendedoras; (2) desenvolvimento de conhecimento; (3) a divulgação de
conhecimentos através de redes, (4) orientação da busca, (5) formação de mercado
(6), mobilização de recursos e (7) criação de legitimidade / neutralizar a resistência à
mudança (HEKKERT et al, 2007).
Função 1: Atividades Empreendedoras. Inovadores são essenciais para o
bom funcionamento de um sistema de inovação e podem ser caracterizados tanto
como entrantes visionários de oportunidades de negócios quanto como
diversificadores em empresas incumbentes como uma vantagem competitiva
(HEKKERT et al, 2007). Atividades empreendedoras se constituem em um indicador
chave para se analisar o desempenho de um sistema de inovação, uma vez que um
sistema que funciona bem vai levar a um clima no qual as atividades empreendedoras
ocorrem (ALPHEN, HEKKERT e SARK, 2008).
Função 2: O desenvolvimento do conhecimento envolve os chamados
"mecanismos de aprendizagem", que são a parte essencial do processo de inovação
(HEKKERT et al, 2007, p. 422). A criação da capacidade de adaptação é uma das
funções-chave do sistema de inovação e refere-se ao desenvolvimento e
fortalecimento dos recursos humanos, organizacionais e das capacidades
institucionais (ALPHEN, HEKKERT e SARK, 2008).
Função 3: Difusão do conhecimento por meio das redes: a troca de
informações é uma função essencial, que envolve o "aprender por meio da interação"
e "aprender usando" sendo ambos indicadores da atividade da rede (HEKKERT et al.,

75
2007). Esta função está relacionada com o fluxo de informações entre os stakeholders
heterogêneos do Sistema de Inovação (ALPHEN, HEKKERT e SARK, 2008). Como o
aprendizado é um processo interativo e socialmente incorporado que não pode ser
compreendido sem levar em conta seu contexto cultural e institucional, este fluxo de
informação torna-se um aspecto fundamental neste cenário. Os aspectos históricos
constituem-se como elementos necessários e como pré-requisitos do processo de
aprendizagem acelerada (LUNDVALL, 2010).
Função 4: Orientação da Busca: envolve "as atividades no âmbito do sistema
de inovação que podem afetar positivamente a visibilidade e clareza de desejos
específicos entre os usuários de tecnologia" (HEKKERT et al, 2007, p 423). Políticas
de longo prazo para a energia renovável no futuro pode trazer legitimidade ao
desenvolvimento do mercado e mais segurança para os investidores de novas
tecnologias neste setor.
Função 5: Formação de Mercado: é fundamental, uma vez que novas
tecnologias raramente encontram mercados “ready-made” e estas muitas vezes têm
dificuldade para competir com tecnologias já estabelecidas no sistema (HEKKERT et
al, 2007; ALPHEN, HEKKERT e SARK, 2008).
Função 6: Mobilização de Recursos: é um insumo básico necessário a todas
as atividades dentro do sistema e está dividido em recursos financeiros e humanos
(ALPHEN, HEKKERT E SARK, 2008).
Função 7: Criação de legitimidade / neutralizar a resistência à mudança
envolve a questão de aceitação social e conformidade com as instituições relevantes
que fazem parte do Sistema de Inovação (ALPHEN, HEKKERT e SARK, 2008).
Os nichos fornecem uma configuração de proteção que reduz a suscetibilidade
às pressões prevalecentes do mercado. Como inovações radicais sustentáveis que
carregam implicações sistêmicas, as inovações geralmente precisam deste espaço
para se desenvolver, melhorar e receber apoio e legitimidade (SMITH e STIRLING,
2010). A tecnologia ou o seu conhecimento incorporado está associado à
infraestrutura institucional em várias áreas geográficas do mundo, uma vez que a
abordagem do sistema tecnológico envolve tanto as dimensões geográficas como a
indústria. Hekkert et. al., (2007) descreveram o exemplo da difusão de células solares,
que dependem do progresso tecnológico ocorrido nos centros de pesquisa das

76
universidades em todo o mundo. Neste sentido, os autores demonstram que um
sistema inovador de célula solar se sobrepõe em partes os sistemas nacionais de
inovação de cada país. A disseminação global da célula solar depende fortemente os
incentivos de investimento nacionais e de políticas de subsídios. Além disso, outros
setores, como microeletrônica e a produção de silício também são influenciadores
para a disseminação desta tecnologia dentro do Sistema (HEKKERT et al, 2007).
No presente estudo, aplicou-se o modelo das Funções do Sistema de Inovação
(FSI) para analisar o sistema de inovação do setor de EESFV no Brasil, cumprindo o
conjunto de funções, como mostra Quadro 6.
FUNÇÕES DO SISTEMA DE INDICADORES
INOVAÇÃO
1. Atividades Empreendedoras Iniciativas de nicho para novas tecnologias
Número de organizações entrantes no negócio
Atividades de exportação
2. Desenvolvimento de Aprender fazendo e aprender usando
Conhecimento Projetos de P&D
3. Difusão do Conhecimento Interação e troca de informação
Troca de conhecimento nacional e internacional
4. Orientação da busca Expectativa de crescimento da energia solar
Políticas governamentais e metas para promover a energia solar
5. Formação de mercado Expectativa de demanda e escala (tamanho do mercado, quota de
importação)
Regulação / Incentivos financeiros
6. Mobilização de Recursos Acesso aos recursos financeiros e humanos
Investimentos estrangeiros em energia solar no Brasil
7. Criação de legitimação Atividades de lobby prós e contra a tecnologia

Quadro 6 – Indicadores do FIS para a energia solar


Fonte: elaboração própria a partir de Hekkert e Sark (2008)

Nas seções subsequentes será analisado o Sistema Nacional de Inovação (SNI)


de Energia Fotovoltaica em termos do cenário atual e da forma como o mesmo oferece
contribuições para promover esta fonte de energia localmente, bem como serão
identificados os principais desafios e oportunidades para este SNI.

3.3 METODOLOGIA DE PESQUISA

Este estudo descreve a trajetória do sistema de EESFV no Brasil, identificando


as atividades e os aspectos históricos a partir de uma metodologia longitudinal,
amplamente aplicada para analisar sistemas de inovação, chamado "análise de

77
processos". Os dados do estudo de caso deste trabalho foram coletado por duas
diferentes fontes de informação: 1. Entrevistas em profundidade com 17
organizações-chave com 20 entrevistados do sistema de energia fotovoltaica (ver
Apêndice I) e 2. Revisão de dados escritos de 69 documentos, incluindo as resoluções
governamentais e políticas, bem como documentos e relatórios de projetos de
iniciativas de nichos de universidades, institutos de pesquisa e ONG’s para promover
a energia solar no Brasil (ver Apêndice II).
As entrevistas tiveram como objetivo a compreensão do estado atual da energia
fotovoltaica no Brasil e o mapeamento das suas dinâmicas, desafios e oportunidades
e seguiu um formato semi-estruturado, o que permitiu que os entrevistados pudessem
apontar livremente o seu pensamento sobre os fatores culturais, econômicos e sociais
que afetam a trajetória de inovação dessa tecnologia.
A análise documental teve como objetivo identificar os principais
impulsionadores da tecnologia da EESFV na opinião das partes interessadas, bem
como verificar o caminho seguido por estas determinações e a forma como elas
promovem o desenvolvimento e difusão da EESFV no Brasil. O objetivo do presente
estudo é desenvolver um quadro completo sobre as principais atividades que, de
alguma forma, influenciam a trajetória dessa tecnologia, baseada na descrição
histórica, na narrativa das atividades desenvolvidas e nas metas estabelecidas para o
setor, tais como resoluções de incentivo financeiros e fiscais e mudanças estruturais.

3.4 ANÁLISE DOS DADOS:

Esta seção descreve os resultados do sistema de inovação tecnológica para a


EESFV no Brasil. A análise dos dados iniciou com uma visão geral sobre o
desenvolvimento da tecnologia e seus aspectos históricos, seguido de uma aplicação
da Perspectiva Multinível e das Funções do Sistema de Inovação para o setor. Esta
seção termina com a explicação dos desafios e oportunidades para a energia FV no
Brasil.

78
3.4.1 O Setor de Eletricidade no Brasil

O setor de energia elétrica no Brasil é caracterizado pela presença forte e direta


do Estado que teve, historicamente, um papel condutor e controlador e que segrega
as atividades de energia na geração, transmissão e distribuição (ver Quadro 7).
Apesar da coexistência de empresas públicas e privadas no setor, as questões de
planejamento e de operação são centralizadas por instituições governamentais, que
regulam e controlam os leilões para a demanda de energia de alimentação
(ABRADEE, 2015). O Quadro 7 mostra as sete fases que descrevem os aspectos
históricos do setor de eletricidade no Brasil e mostram a formação deste Sistema
Nacional de Inovação.

79
Fase Descrição do Regime Aspectos do Regime
Fase 1 –
Experiência e Governo imperial leva a cabo uma série de experiências e
Monopólio
desenvolvimentos de obras públicas, incluindo bondes elétricos e a primeira
Empresas Privadas Mercado
pioneiros (1879- usina hidrelétrica na cidade de Diamantina (MG).
desregulado
1896)
Autofinanciamento
Fase 2 – Capital Pouca Competição
Predominância de capital estrangeiro e grupos privados do
estrangeiro e Taxas livremente
setor, especialmente American & Foreign Power
grupos domésticos negociadas
Company (Amforp), que trabalhou principalmente em
privados Sem planejamento
concessões municipais.
(1898-1929)
Fase 3 -
Promulgação do Código de Águas, em 1934, um marco
Regulamentação e
para o setor que estabelece regras para as concessões.
aumento da
Criação de instituições para atuar na regulação e
capacidade
supervisão das empresas de energia elétrica no país,
instalada
especialmente em usinas hidrelétricas e termelétricas.
(1931-1945) ▪ Forte presença estatal
Fundação do Banco Nacional de Desenvolvimento ▪ Nacionalização
Fase 4 - políticas Econômico (BNDE) em 1952, mais tarde Banco Nacional Mercado regulado pelo
governamentais e de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). governo
empresas públicas Criação de várias empresas estaduais de energia elétrica, ▪ Financiamento pelo
(1948-1963) subsidiárias principalmente hidrelétricas do Sistema recurso público
Eletrobrás. ▪ Competição inexistente
▪ Tarifas reguladas em todos
Privatização de empresas privadas no setor. Adoção de os segmentos
medidas por parte do governo federal para garantir a ▪Planejamento
Fase 5 -
operacionalização dos sistemas interligados, devido à determinativo
Consolidação e
grande geração prevista para a usina hidrelétrica de Itaipu,
crise do modelo de
a maior produção de energia no mundo. Criação do
Estado
Programa Nacional de Desestatização (PND), que teve
(1964-1990)
como objetivo reorganizar a posição estratégica do Estado
na economia e trazer investimentos para o setor.

▪ Mercado de livre
concorrência
Privatização de várias empresas de eletricidade. A crise
▪ Privatização
energética de 2002 requer a implementação de medidas de
▪ Financiamento utilizando
emergência para atender à demanda e fornecimento de
recursos públicos e privados
Fase 6 - electricidade. Racionamento de energia elétrica e
▪ Competição na geração e
Privatização e contratação de emergência de energia térmica – Criação
comercialização de energia
reformas do Programa Prioritário de Termelétricas (PPT).
▪ Tarifas negociadas
(1992-2009) Estabelecimento de Programa de Incentivo às Fontes
livremente para geração de
Alternativas de Energia (Proinfa), com a contratação de
energia e comercialização e
3.300 MW de energia pelo vento, biomassa e pequenas
regulados para a distribuição
centrais hidrelétricas.
e transmissão
▪ Planejamento pelo CNPE

Modelo híbrido
Estado assume o papel de coordenador de planejamento de
Etapa 7 - Estado Mercado livre e regulado
expansão, com contratos de longo prazo com os leilões de
regulador e ▪ O financiamento com
energia elétrica, que agora incluem outras fontes de
planejamento de recursos públicos e privados
energia renováveis, como a energia solar fotovoltaica,
energia em espera ▪ Competição na geração e
além das já existentes na matriz (eólica, biomassa e
(2006-2016) comercialização
hídrica).
▪ Planejamento pela EPE

Quadro 7 – Aspectos históricos do setor de eletricidade no Brasil


Fonte: Adaptada de Eletricidade (2016) e Lenzi (2015)

80
As instituições governamentais têm um papel central na história da dinâmica das
relações entre os níveis do sistema de inovação analisado, que afetam direta ou
indiretamente a trajetória da tecnologia da EESFV e determinam as ações que serão
tomadas em consideração para o futuro desta tecnologia, tanto no nível Federal,
quanto nos níveis Regional e Local.

3.4.2 O desenvolvimento da eletricidade solar fotovoltaica no Brasil

Para um melhor entendimento do funcionamento deste Sistema de Inovação no


país foi necessário a construção de um mapa descritivo dos principais atores. Este
Mapa de stakeholders para o setor de EESFV brasileira pode ser dividido em 7 grupos
diferentes de atores:
1) Indústria FV: consistindo de fabricantes de painéis fotovoltaicos (FV), sindicato
patronal e dos trabalhadores, empresários de pequenas empresas, start-ups, bem
como empresas de inovações de nicho. O ator mais importante neste grupo são as
multinacionais fabricantes de painéis fotovoltaicos, uma vez que a indústria nacional
ainda está em um estágio embrionário.
2) Instituições Governamentais: formado por Ministério de Minas e Energia
(MME), Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Agência Nacional de Energia Elétrica
(ANEEL) e Governos Estaduais como atores principais, uma vez que tais instituições
são responsáveis pelo desenvolvimento de políticas públicas e para a definição da
natureza da matriz energética nacional para os próximos anos, com a definição do
planejamento estratégico para o setor;
3) Associações e ONG’s: consiste principalmente de associações de energia
fotovoltaica, agências de cooperação e organizações não-governamentais de
natureza tecnológica e ambiental, sendo as mais relevantes a ISES (International
Solar Energy Society), ABENS (Associação Brasileira de Energia Solar) e ABSOLAR
(Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica).
4) Financiamento: inclui bancos internacionais e nacionais, cooperativas de
crédito em níveis regionais e locais, instituições financeiras, entre outros. BNDES e
alguns bancos regionais, como BRDES são considerados os mais importantes porque
possuem linhas de crédito específicas para o desenvolvimento de energias renováveis

81
com aplicação de taxas de juros muito atrativas quando comparadas à média
praticada pelo mercado financeiro.
5) Educação e formação profissional: consiste principalmente de universidades
e institutos educacionais. Algumas universidades, como a UFSC (Universidade
Federal de Santa Catarina) e USP (Universidade de São Paulo), ambas universidades
públicas, possuem laboratórios de pesquisa específicos para a energia fotovoltaica e
são reconhecidos como os atores mais importantes para este grupo.
6) Geração Centralizada: consiste de grandes empresas de energia e usinas de
energia fotovoltaica de grande porte. Para este grupo os atores mais importantes são
empresas multinacionais do setor de energia, que geralmente participam dos leilões
para implantação de novas plantas fotovoltaicas no país.
7) Geração Distribuída FV: envolve os micro geradores, especialmente
cooperativas e geradores residenciais. Os clientes residenciais são os atores mais
importantes dentro deste grupo, porque eles possuem a maior capacidade instalada
e grande potencial para geração de eletricidade em um horizonte de médio e longo
prazo.
Os atores com maior relevância em cada grupo são destacados em escuro (veja
a Figura 10) e foram selecionados de acordo com a percepção dos entrevistados, o
impacto que exercem dentro do Sistema e a força de suas relações com outras partes
interessadas.

82
INTERNACIONAL
Indústria PV Associações e ONG’s Financiamentos
Indústria de Bancos Internacionais e Fundos
Agências de
painéis solares Cooperação ISES
Centro de Geração Centralizada PV
Inovação - P&D ONG’s Outros
Grandes Org. de Energia

Instituições Governamentais ABSOLAR Grandes Plantas de


Energia Solar
MME ANEEL CMSE IDEAL
Ministério de Agência Nacional Commite de Monit Empresas de
de Energia Elétrica Transmissão de Energia
Minas e Energia do setor elétrico ABRAGEL
Empresas de
EPE ONS ABGD Distribuição de energia
Empresa de CNPE - Conselho Operador Nacional
FEDERAL

Pesquisa Energética Nac de Políticas Energia do Sistema ABENS


BNDES
Eletrobrás INMETRO Outros ABINEE Banco Nacional de
Desenvolvimento
CCEE Educação e Treinamento NGO’s Econômico e Social
Electricity
Trading Chamber
Profissional Universidades Outras Bancos Nacionais
Federais
Agências de
Universidades Grupos de Bancos Regionais
Concessionárias de cooperação
REGIONAL

Energia Elétrica Regionais Privadas Pesquisa


NGO’s Cooperativas de
crédito
Universidades Cursos
Indústria de Regionais Públicas Técnicos Outras Crédito Regional
Painéis Solares Instituições
Consultorias em Educação e Treinamento Redes de
Sindicatos Educacionais
Financiamento

Start up’s Geração Distribuída – Solar Credit Unions


LOCAL

Microgeração Consultores de
Empreendedores de Smart Grids Projetos de
Pequenas Empresas
Residencial
Energia Solar Local Credit
Pequenos Cooperativas para
Inovações de Nicho
Geradores microgeração Outros Outros

Atores mais relevantes


Figura 10 – Mapa dos stakeholders para a energia fotovoltaica no Brasil (2016)
Fonte: Elaboração própria

A energia hidrelétrica representou, em 2014, 62,8% de toda a eletricidade no


país. Para complementar o sistema nacional interligado, o Brasil usa termelétrica
(28,2%), alimentado principalmente por gás natural e carvão, em momentos nos quais
a procura de energia é maior do que a energia produzida em centrais hidroelétricas,
(ver Tabela 2) que representam a chamada “energia de reserva”. Vale destacar que o
país depende fortemente do fluxo dos rios por causa da predominância da fonte
hidrelétrica (EPE, 2015).

83
∆% Part.%
2010 2011 2012 2013 2014
(2014/2013) (2014)
Hidrelétricas 77.090 78.347 79.956 81.132 84.095 3,7 62,8
Térmicas 29.689 31.243 32.778 36.528 37.827 3,6 28,2
PCH 3.428 3.896 4.101 4.620 4.790 3,7 3,6
CHG 185 216 236 266 308 15,8 0,2
Nuclear 2.007 2.007 2.007 1.990 1.990 0,0 1,5
Eólica 927 1.426 1.894 2.202 4.888 122,0 3,7
Solar 1 1 2 5 15 200,0 0,0
Total 113.327 117.136 120.974 126.743 133.913 5,7 100

Tabela 2 – Capacidade instalada de geração de eletricidade no Brasil (MW)


Fonte: EPE (2015)

O Brasil começou o processo de análise e desenvolvimento de energia


fotovoltaica em sua matriz energética em 2011, com a chamada de P&D número 13
da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), que tinha como principal objetivo
propor modalidades técnicas e comerciais para a produção de eletricidade por meio
de EESFV, criando condições para a infraestrutura e desenvolvimento de tecnologia
para a integração de geração de energia solar fotovoltaica na matriz energética
nacional (ANEEL, 2016a). Esta chamada incluiu a instalação de uma usina com
capacidade instalada entre 0,5 MWp e 3,0 MWp, além de uma estação Solarimétrica
capaz de fornecer os dados para avaliar o desempenho técnico e econômico do
projeto. As iniciativas do governo e resoluções para a EESFV no Brasil possuem dois
objetivos principais: desenvolver uma indústria nacional de painel solar e também
aumentar a capacidade instalada de geração desta fonte de energia no país.
O projeto de chamada estratégica número 13 foi um marco na história da
energia fotovoltaica no Brasil, uma vez que permitiu uma análise das tecnologias
atuais para a geração de energia elétrica, bem como os impactos potenciais na matriz
resultante da interligação da legislação pertinente e do intercâmbio com especialistas
de países com notório conhecimento na área. Além disso, este projeto também incluiu
uma descrição dos locais mais adequados para a instalação de plantas, considerando
a radiação solar e as condições para a produção de componentes para instalação de
sistemas fotovoltaicos, problemas no mercado de equipamentos e um levantamento
do consumo do mercado de eletricidade produzida pela geração fotovoltaica com o
cenário até 2020 no Brasil (ANEEL, 2016a). Apesar da baixa representação desta

84
fonte de energia na matriz energética nacional, as expectativas para a EESFV no
Brasil são extremamente favoráveis para os próximos anos. Em novembro de 2015
ocorreu um leilão específico para esta fonte de energia, e contratou um total de 33
projetos de geração solar fotovoltaica, com 1.115 megawatts de capacidade de pico,
que deve entrar em operação a partir de Novembro de 2018, com prazo contratual de
20 anos de fornecimento de energia. Esses fatores movimentaram o setor de EESFV
no Brasil e tornaram o país mais atraente para os fabricantes multinacionais de
equipamentos (EPE, 2016).
Estimativas da EPE para o mercado de geração distribuída mostram que o
número de sistemas solares fotovoltaicos residenciais e comerciais instalados até o
ano de 2023 será de aproximadamente 161.000 unidades (ver Gráfico 2). A partir do
número de consumidores e da sua energia somando-se os projetos P&D da ANEEL,
a EPE calcula a projeção da capacidade instalada em 2023 em cerca de 835 MWp,
com base na manutenção da política de net metering (possibilidade de o uso de
energia gerada pelo consumidor a qualquer momento) sem incentivos adicionais para
o horizonte de tempo analisado (EPE, 2014).

160000

140000

120000

100000

80000

60000

40000

20000

0
2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023

Residencial Comercial

Gráfico 2 – Número acumulado de unidades consumidoras com sistemas fotovoltaicos no Brasil


Fonte: Adaptado de EPE (2014)

O ápice do consumo de energia para a fonte fotovoltaica no período de verão


acontece entre 12 e 17 horas, devido à crescente utilização de sistemas de
refrigeração, o que coincide com a geração de pico de sistemas fotovoltaicos. Neste
cenário é uma vantagem o uso do sistema fotovoltaico porque eles podem agir como
uma engrenagem de carga na rede da concessionária de energia e podem reduzir a

85
demanda para o uso de centrais térmicas (UTEs), movidas a óleo combustível, carvão
e/ou gás natural, já que o Brasil tem usado sistematicamente esta fonte de energia,
gerando custos adicionais para os consumidores brasileiros, além de emitir toneladas
de CO2 (Camargo, 2015).
O Governo Federal, a fim de aumentar a representação da energia FV na matriz
energética nacional, fez importantes mudanças na Resolução Normativa nº 482/2012,
que estabelece o Sistema de Compensação de Energia Elétrica, que passa a permitir
ao consumidor instalar painéis solares fotovoltaicos em sua propriedade e trocar a
energia com a distribuição local, a fim de reduzir o valor da sua fatura de eletricidade.
Estas alterações entraram em vigor em Março de 2016 e devem incentivar a instalação
de novos sistemas em residências e em estabelecimentos comerciais e industriais
(ANEEL, 2016b).
O registro da geração distribuída no Brasil quadruplicou entre 2014 e 2016,
passando de 424 para 1.930 conexões e a estimativa da ANEEL é de que até 2024
mais de 1,2 milhões de consumidores comecem a produzir a sua própria energia
utilizando sistemas fotovoltaicos, o que seria equivalente a 4,5 GW de potência
instalada. Este aumento ocorre devido à simplificação dos procedimentos de mudança
de registo e a facilitação da interligação com a rede distribuidora de energia elétrica
(ANEEL, 2016b).
A transição da matriz energética atual do Brasil depende fortemente de
incentivos e iniciativas do governo. Esta mudança em um país como o Brasil deve
levar em conta o impacto dos aspectos tecnológicos e também o impacto potencial
com relação aos aspectos sociais, na geração de emprego e renda para a população.
De acordo com Dolata (2013) a capacidade transformadora da tecnologia está
relacionada com o impacto potencial das novas oportunidades que determinada
tecnologia tem sobre o setor, o que envolve não só o potencial inovador da tecnologia
em si, mas também o grau de reestruturação organizacional, socioeconômico e
institucional que é necessário para realizar plenamente o seu potencial. No caso da
EESFV, promovendo incentivos para a adoção de novas tecnologias, o governo não
só está contribuindo para o meio ambiente, mas especialmente promovendo
melhorias sociais e econômicas, uma vez que o desenvolvimento desta tecnologia irá
criar novas oportunidades de emprego, renda e desenvolvimento econômico para o

86
país. Na próxima seção, serão analisados estes impactos e a maneira como a
transição desta tecnologia ocorre a partir da perspectiva multinível e das funções do
sistema de inovação.

3.4.3 Perspectiva Multinível (MLP) Aplicada a Energia Solar Fotovoltaica no Brasil

Os elementos que influenciam a transição para a mudança de paradigma


tecnológico não são originados de forma unilateral, mas sim em uma dimensão
multinível e são inevitáveis as mudanças na dimensão social, como por exemplo, nas
práticas do usuário, no processo de regulação e nas redes, a fim de se realizar uma
mudança tecnológica sustentável (Geels, 2002). Para validar esta proposta, este
estudo busca analisar todos os aspectos influenciadores dessa relação, considerando
sua natureza multinível, multiatores, multifases, multicausas e multidomínios e propõe
que o novo paradigma tecnológico para a EESFV no Brasil é o resultado de iniciativas
inovadoras de todos os aspectos que compõem esta relação, bem como do
envolvimentos dos atores nos diversos níveis do Sistema de Inovação.
A análise do regime de energia elétrica para o Brasil mostra estabilidade e
continuidade para a predominância da energia hidrelétrica na matriz energética, que
teve o seu início juntamente com o histórico do sistema e levam aos chamados “path
dependencies” (processos de auto-reforço que aceleram a direção do
desenvolvimento entro de um sistema) e “lock-in” (estado de um sistema
historicamente evoluído e que só pode ser modificado a partir de um grande esforço),
uma vez que a infraestrutura estabelecida para transmissão e distribuição de energia
elétrica são, na sua maioria, estabelecida em torno de barragens hidrelétricas.
No nível da paisagem, as principais barreiras para o uso e a disseminação da
energia fotovoltaica estão relacionadas com a instabilidade política e econômica, o
que aumenta o risco de investimento no país e desencoraja grandes investidores,
especialmente os estrangeiros. Em fevereiro de 2016, três das principais agências de
notação de crédito global (Fitch, Moody e Standard & Poors) reduziram a classificação
de risco do Brasil, da categoria de baixo grau de investimento à categoria
especulação, com expectativa negativa, o que significa que ainda há a possibilidade
de reduzir ainda mais tal classificação. A diminuição da classificação de risco foi

87
influenciada principalmente por fatores econômicos, uma vez que o país está em baixo
crescimento e a expectativa é que a dívida pública exceda 80% do produto interno
bruto (PIB) nos próximos anos, além do momento político difícil pelo qual o Brasil
passa atualmente, o que leva a preocupação com a retomada do crescimento
econômico. A atual instabilidade política que o país experimentou em 2016 tende a
agravar o cenário econômico pelos anos subsequentes.
Entre as consequências evidenciadas pelos investimentos de alto risco estão
os efeitos sobre o dólar, o financiamento empresarial do país e o nível de investimento
estrangeiro no Brasil, o que pode afetar todos os setores, incluindo o setor de
eletricidade. Historicamente, os países demoram entre 5 a 10 anos para recuperar
uma pontuação de risco, reforçando o cenário negativo para o investimento de capital
estrangeiro no país para os próximos anos (RISCO BRASIL, 2016). Este cenário
econômico reflete a pior recessão do país em 25 anos, o que levou a um quadro ainda
pior no emprego formal, renda e qualidade de vida para os brasileiros. A taxa de
desemprego no país em 2016 cresceu para 9%, sendo a maior já registrada pela
pesquisa do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Apesar de ter
diminuído ao longo dos anos, a taxa de analfabetismo no país em 2014 foi de 8,3%
da população, o que significa que 13,2 milhões de pessoas no país são incapazes de
ler ou escrever e é concentrada fortemente na região Nordeste e entre a população
mais velha do país. Os dados mostram que 73% dos brasileiros não estão plenamente
alfabetizados, significando que a educação não segue um padrão de qualidade, o que
se torna mais uma barreira para o crescimento econômico (IBGE, 2016).
Por outro lado, ainda no nível da paisagem, existe um indicador importante para
motivar o desenvolvimento de energia fotovoltaica no país, que é a taxa de irradiação
solar. O índice de radiação solar no Brasil é uma das mais altas do mundo. A maior
parte do território brasileiro está localizado relativamente perto da linha do Equador,
de modo que não há grandes variações na radiação solar durante o dia. A região
nordeste do Brasil, por ser ainda mais perto do Equador do que as outras regiões, é a
que tem maior índice de radiação solar e também onde esta radiação é mais eficaz.
Entre os esforços do país para avaliar a disponibilidade de radiação solar, destaca-se
o Atlas Solarimétrico realizado pela Universidade Federal de Pernambuco e o Atlas
Brasileiro de Energia Solar no Brasil, realizada pela Universidade Federal de Santa

88
Catarina, ambos apontam que, mesmo em regiões com níveis de radiação mais
baixos, o Brasil tem um enorme potencial para o uso desta fonte de energia (ANEEL,
2016c). A radiação solar global horizontal média anual do Brasil pode ser visualizada
na Figura 11 (PEREIRA et al, 2006).

Figura 11 – Radiação solar global horizontal média anual do Brasil


Fonte: Pereira et al (2006, p. 34)

No nível do Regime, pode-se dizer que o setor de energia elétrica do país não
sofreu qualquer grande mudança estrutural desde a criação da maioria das
concessionárias de energia do Estado e das instituições que compõem o Sistema
Eletrobrás. Há uma forte presença do Estado no setor até hoje, com políticas
governamentais de caráter regulador e taxas de mercado fixadas pelo governo. O
atual modelo híbrido (composto por empresas públicas e privadas) permite a
competitividade do mercado, embora não totalmente, uma vez que o setor é regulado
de várias maneiras por resoluções do governo. Neste sentido, a transição energética
para fonte fotovoltaica é um processo a longo prazo e que vai demorar alguns anos
para crescer e tornar-se representativa dentro da matriz energética, bem como
totalmente legitimada entre os atores relevantes deste Sistema de Inovação. Porém,

89
a primeira iniciativa para fomentar esta tecnologia foi tomada pelo governo e faz com
que esta nova tecnologia passe a ser vista como uma oportunidade e não uma
ameaça, divulgada dentro do setor, ganhando legitimidade e mudando o modelo
mental atual. A tecnologia de energia fotovoltaica está mudando gradualmente a
dinâmica do sistema, apesar do fato de que a Resolução 482, que foi criada para
promover a geração distribuída e incentivar que os consumidores se tornem geradores
de energia renovável não mostrou uma alta taxa de adesão, o que resulta em baixo
impacto das políticas e programas de incentivo do governo estabelecidos a nível de
regime.
A análise do sistema de inovação não é suficiente para entender os
determinantes da mudança, mas sim um mapa das atividades relevantes que ocorrem
dentro do sistema que pode fornecer insights na interação de forças que determinam
o lento e gradual processo de mudança (HEKKERT et al, 2007). Uma atividade
relevante é aquela que influencia (positiva ou negativamente) o desenvolvimento, a
aplicação e a difusão de um novo conhecimento tecnológico - objetivo de um sistema
de inovação.
No nível de nicho foi utilizada a análise das Funções do Sistema de Inovação
(FSI), como detalhado na próxima seção

3.4.4 Perspectiva das Funções do Sistema de Inovação aplicado à energia solar


fotovoltaica no Brasil

O sistema de inovação da EESFV no Brasil está em uma fase inicial, chamada


por alguns autores de “pré-desenvolvimento” (LOORBACH, 2007). É necessário focar
a análise no desenvolvimento do nicho e nas suas relações co-evolucionária com o
regime.
Função 1: Atividades Empresariais. Há cerca de 1.152 empresas que
trabalham com energia solar fotovoltaica no Brasil nos segmentos de desenvolvimento
de projetos, instalação de sistemas fotovoltaicos ou fornecimento de equipamentos de
geração de energia solar fotovoltaica, sendo que 73% dos quais estão localizados nas
regiões Sul e Sudeste (AMERICADOSOL, 2016).

90
Apenas 4 empresas atuam na fabricação de módulos solares fotovoltaicos no
país. A atividade empresarial para a energia solar no Brasil se desenvolve
principalmente em iniciativas de nicho, com a formação de acordos entre empresas e
instituições de pesquisa para o desenvolvimento de novas tecnologias. Essas
atividades ocorrem de forma isolada, com pequena escala e em projetos específicos.
Portanto, não há uma agenda comum entre os atores confirmada para o
desenvolvimento de atividades empresariais ou para o desenvolvimento de novas
tecnologias dentro do Sistema de Inovação e também não há nenhuma exportação
de equipamentos ou transferência de conhecimentos para outros países. As
atividades empreendedoras para EESFV enfrentam enormes barreiras para a
promoção de novas tecnologias e para a criação de um novo modelo de negócios,
uma vez que o mercado de energia elétrica no Brasil é composto por grandes
organizações já estabelecidas e com poder legitimado dentro do Sistema (ALBERTI,
2015; RODRIGO, 2015).
Função 2: Desenvolvimento do conhecimento. Hoje, o país tem uma carência
de profissionais qualificados para trabalhar no setor de energia fotovoltaica, exigindo
a criação de programas de formação profissional especializados em todos os níveis
(técnico, graduação e pós-graduação) para atuar nos diversos segmentos da cadeia
produtiva do setor.
Também faz-se necessário o desenvolvimento de competências neste setor
através da criação de redes de cooperação e pesquisa entre os países, compostas
por centros de pesquisas nacionais e internacionais, técnicos especialistas dos países
nos quais a energia fotovoltaica já está estabelecida, e por meio de associações
industriais, instituições governamentais e grupos de consumidores e entusiastas da
tecnologia, com o objetivo de se estabelecer um cronograma de implementação e
adaptação da tecnologia fotovoltaica às necessidades do país.
Em relação à capacidade de organização e infraestrutura, a maioria das
empresas regionais concessionárias de energia elétrica não estão preparadas para
instalar uma enorme quantidade de consumidores na geração distribuída e conectá-
los à rede elétrica (ALBERTI, 2015; PSCHEIDT, 2016; OMORI, 2015).
Função 3: Difusão do conhecimento através de redes. Não há transferência de
tecnologia de outros países e os poucos projetos de pesquisa e desenvolvimento

91
realizados no Brasil são feitos de forma isolada e pontual, sem a participação de
representantes de toda a cadeia produtiva do setor e tampouco com uma preocupação
de difusão do conhecimento entre os diversos níveis do Sistema de Inovação.
Embora exista uma busca de informações por agências governamentais,
universidades e institutos de pesquisa e desenvolvimento vinculados à empresas
concessionárias de energia elétrica acerca das novas tecnologias nacionais e
internacionais para a EESFV, hoje existe um reconhecimento da necessidade de se
fortalecer os laços entre os vários atores da rede em todos os níveis, variando de
instituições governamentais, educação, consumidores e associações industriais, com
o objetivo de proporcionar a troca de informações, experiências e o estabelecimento
de uma agenda comum entre as partes interessadas para promover o fluxo de
informações (BRANDÃO, 2016; ABALOS, 2015; SEVERI, 2016; MASCARI, 2015).
Função 4: Orientação de Pesquisa. Ao lançar leilões para promover a EESFV
no país, o MME possui dois objetivos principais: aumentar a capacidade instalada de
geração de energia fotovoltaica e também gerar demanda em escala suficiente para
desenvolver uma indústria nacional de módulos fotovoltaicos. A expectativa dentro da
expansão do plano nacional de energia é de que, até 2024, o país atinja cerca de 8,3
gigawatts de capacidade instalada de geração fotovoltaica, 7 gigawatts relacionadas
com a geração centralizada e 1,3 gigawatt de geração distribuída em casas, fábricas,
supermercados, entre outros (BERTOL, 2015 ).
Em abril de 2012 a ANEEL publicou a Resolução número 482, que estabeleceu
regras para net metering a partir do qual o consumidor é capaz de gerar sua própria
energia em edifícios e injetar o excedente gerado na rede de distribuição, sistema que
já é bastante utilizado no resto do mundo em termos de EESFV. Desde o lançamento
da Resolução 482 em 2012, e os seus regulamentos em início de 2013, o número de
sistemas fotovoltaicos que foram instalados no Brasil aumentou significativamente. O
eventual crédito de energia pode ser utilizado em outros lugares com o mesmo CPF
(cadastro de pessoa física) em até 60 meses (revisão realizada em novembro de
2015). Embora já exista um movimento para promover a micro geração, adaptado às
necessidades locais, ainda existe a necessidade de um plano para expandir o número
de instalações, através de incentivos fiscais, como a dedução de imposto de renda de
pessoas físicas ou a dedução do IPTU (imposto predial e territorial urbano) da

92
propriedade na qual o sistema fotovoltaico está instalado (URBANETZ, 2015,
RODRIGO, 2015).
Função 5: Formação de Mercado. O mercado de energia fotovoltaica no país
ainda é muito pequeno e não tem escala suficiente para atrair grandes investimentos
atualmente, mas quando observa-se as perspectivas futuras, pode-se dizer que o
mercado tem um cenário muito promissor e otimista, devido, entre outros fatores, à
expansão dos incentivos do governo para fontes renováveis na matriz energética
nacional, tal como 80% de desconto na tarifa de uso dos sistemas elétricos de
transmissão (TUST) e a taxa de uso dos sistemas de distribuição elétrica (TUSD) para
sistemas de geração de energia solar fotovoltaica até 30 MW. Este incentivo é válido
por 10 anos para as plantas que entram em operação até dezembro de 2017.
As plantas que entram em operação após este período terão 50% de desconto.
Com base nos dados coletados, identificou-se a necessidade de se prorrogar o prazo
para o desconto TUST e TUSD para além 2017, de preferência de forma integrada ao
contrato de fornecimento de energia com a planta. Novos mercados emergem neste
setor, especialmente em zonas rurais e isoladas, onde a geração de energia local
tende a ser mais financeiramente vantajosa quando comparada com a extensão da
rede de energia até o local, trazendo benefícios como a redução do impacto ambiental
e a geração de emprego e renda. Os chamados sistemas isolados são apontados pela
ANEEL como uma possível solução para o acesso universal à eletricidade, tendo em
vista a imensa extensão territorial do Brasil. O MME tem um papel central no
desenvolvimento deste mercado, uma vez que as suas políticas estabelecem as
condições e as necessidades de uma produção local de equipamentos para atender
a geração de EESFV oriunda dos leilões que foram criados especificamente para dar
apoio à criação de uma indústria nacional neste setor. Vale destacar que estão sendo
planejados para os próximos anos a realização de mais alguns leilões específicos para
a energia fotovoltaica, a fim de manter uma escala industrial que permita o
desenvolvimento desta indústria no Brasil (BERTOL, 2015).
Apesar do fato de não se ter hoje uma indústria consolidada nacional no setor,
algumas iniciativas podem ser percebidas com o objetivo de criar novos negócios e
trazer o interesse de empresas estrangeiras para produzir sistemas fotovoltaicos no
Brasil. Atualmente, a maioria dos sistemas fotovoltaicos instalados no Brasil são

93
importados, especialmente da Alemanha e da China. Neste sentido, as entrevistas
com os atores mostram o interesse dos investidores e do Governo Federal para criar
uma indústria nacional neste setor, que depende, em grande parte, de incentivos
fiscais para atrair novos investidores e do estabelecimento de regras claras por parte
do governo no que diz respeito ao plano de expansão para esta tecnologia, seja para
geração centralizada através do estabelecimento de leilões claros e perspicazes, seja
para micro geração, incentivando-a no país (GUERREIRO, 2016; ESPOSITO, 2016).
Função 6: Mobilização de recursos. Muitos investidores estrangeiros, como os
fabricantes multinacionais de módulos fotovoltaicos decidem não investir na abertura
de fábricas de equipamentos no Brasil devido ao alto risco, atribuído principalmente à
instabilidade política e regulamentar e, por consequência, à incerteza do mercado.
Hoje já existe no Brasil alguns incentivos para a fabricação, como PADIS - Programa
de Apoio ao Desenvolvimento da indústria de semi-condutores, mas ainda existe uma
falta de políticas dedicadas exclusivamente para o uso e a disseminação da energia
fotovoltaica e para o desenvolvimento da indústria nacional de módulos fotovoltaicos
(ABALOS, 2015, HÜBKE, 2016). Em termos de recursos humanos para atuação na
área, hoje existe uma falta de educação formal em todos os níveis. As empresas de
projetos de sistemas solares procuraram profissionais de outras áreas para atender
às suas demandas, tais como técnicos em eletrônica e eletricistas e precisam ensiná-
los a trabalhar com sistemas fotovoltaicos (MASCARI, 2015; BRANDÃO, 2015,
FRAXINO, 2015).
Função 7: Criação de legitimidade / neutralização da resistência à mudança. O
uso de sistemas de energia fotovoltaicos é considerado relevante por um número
significativo de atores dentro do sistema nacional de inovação. Para esta nova
tecnologia ser plenamente legitimada no seio do setor da eletricidade e considerada
apropriada pelos atores relevantes, são fundamentais atividades de lobby e de
conscientização em todos os níveis, sendo esta última direcionada especialmente
para usuários finais (geração distribuída) em duas maneiras muito importantes: pela
informação dessa fonte de energia e pela mobilização da indústria em todos os níveis
para a legitimação da tecnologia dentro do Sistema de Inovação (URBANETZ, 2015;
FRAXINO, 2015). Existe uma barreira cultural a ser superada com a população porque
muitas pessoas pensam que o painel fotovoltaico serve para aquecer a água, o que

94
demanda um esforço extra por parte dos fabricantes de módulos fotovoltaicos no
sentido de conscientizar sobre as aplicações da tecnologia (RODRIGO, 2015).

3.4.5 Desafios e oportunidades para a energia para a energia solar fotovoltaica no


Brasil

Com base nas sete funções do sistema de inovação para a energia FV no Brasil
foi realizada uma avaliação dos principais desafios e oportunidades (Figura 12) para
o crescimento desta fonte de energia no país e algumas reflexões sobre os aspectos
necessários para a transição tecnológica acontecer.
O estado atual desta fonte de energia mostra uma falta de informação, de
infraestrutura, recursos financeiros para a promoção, bem como para a divulgação de
informações sobre a energia solar fotovoltaica, o que retarda o processo de transição
para esta fonte de energia na matriz energética nacional. As oportunidades a serem
desenvolvidas envolvem a criação de uma comissão para a troca de informações entre
todos os intervenientes da cadeia produtiva, bem como as atividades destinadas a
aumentar a capacidade instalada e promover o desenvolvimento da indústria nacional,
com a transferência de tecnologia e formação profissional formal. Estas são algumas
das oportunidades chave para se desenvolver um mercado aberto e competitivo para
o setor de EESFV no Brasil.

95
Funções de Inovação do Sistema Desafios Oportunidades

Ausência de uma agenda Criação de uma rede para


1. Atividades comum para novas tecnologias. promover atividades
Não existe exportação de
Empreendedoras empreendedoras em todos os
equipamentos ou transferência
níveis da cadeia produtiva
de tecnologia

Ausência de profissionais Promoção de redes de


2. Desenvolvimento qualificados cooperação para pesquisa e
de Conhecimento Ausência de Redes de desenvolvimento de
Cooperação conhecimento na área.

3. Difusão de Não existe transferência de Estabelecimento de uma


Conhecimento por tecnologia e não há difusão agenda de pesquisa para
meio de redes entre atores da rede. transferência de tecnologia

Ausência de metas de longo prazo Expansão das políticas de


e de um planejamento específico
4. Orientação da incentivos fiscais para a
para a Energia solar. As iniciativas
Busca geração distribuída e
governamentais não se
centralizada
disseminaram como esperado.

Mercado pequeno, com pouca Desenvolvimento de um


5. Formação de escala para atrair grandes planejamento de longo prazo
Mercado investimentos. Poucas empresas para a indústria do setor, com
no mercado atualmente. aumento da demanda.

Recursos Financeiros limitados Criação de políticas específicas


Ausência de uma política de
6. Mobilização de para promover a energia solar
suporte específica para a energia fotovoltaica em termos de
Recursos solar. Ausência de educação recursos financeiros e humanos
formal.

Criação de um comitê para


7. Criação de Falta de conhecimento e legitimação. Atividades de
Legitimação informação sobre a tecnologia Lobby e de difusão da
informação

Figura 12 – Desafios e oportunidades para a energia solar no Brasil (2016)


Fonte: Elaboração própria

O quadro das Funções do Sistema de Inovação (FSI) aplicado aos países em


desenvolvimento tem algumas implicações, como descrito por Tigabu, Berkhout e
Beukering (2015), pois o apoio à inovação envolve não apenas os fatores tecnológicos
e econômicos, mas também elementos organizacionais, institucionais e sociais que
bloqueiam a transição de tecnologia como uma função de um ambiente desfavorável.
A análise sistêmica da questão permite não apenas identificar as tecnologias
relevantes, mas também envolver os participantes do mercado em uma abordagem
de colaboração com o objetivo de gerar capacitação para serem capazes de tomar
decisões sobre a tecnologia. O desenvolvimento de tecnologias sustentáveis em
países menos desenvolvidos deve ser orientado para as fraquezas e bloqueios e para

96
as medidas para superá-los e alcançar a difusão das novas tecnologias. Ao identificar
os desafios para o crescimento da energia FV no Brasil este estudo também indica
oportunidades e caminhos que podem ser percorridos a fim de alcançar uma
propagação dessa tecnologia no país, o que traz consigo impactos sociais e
ambientais para a sociedade.
Ao analisar a transição de uma tecnologia em um país em desenvolvimento, é
essencial observar o impacto social e econômico que esta tecnologia pode trazer para
o país. Neste sentido, sugere-se a inclusão desta dimensão de análise na perspectiva
multinível para melhor se ajustar ao caso analisado. Dados da ABSOLAR mostram
que, para cada megawatt de energia solar instalada são criados entre 20 e 30
empregos (diretos e indiretos), e espera-se uma instalação de 3,3 GW de usinas de
energia solar contratados via concurso público. Neste contexto, estima-se que o total
de empregos criados no país para atender este tipo de energia em cerca de 60 a 90
mil novos empregos até 2018 (ABSOLAR, 2016). Esta perspectiva pode trazer
enormes benefícios sociais e econômicos para o país, que atualmente, de acordo com
o IBGE, possui cerca de 9 milhões de desempregados - cerca de 9% da população
economicamente ativa (IBGE, 2016).
Levando-se em conta o fato da eletricidade no Brasil ser altamente regulada e
controlada pelo Estado, o desenvolvimento da tecnologia para EESFV é
extremamente dependente das iniciativas governamentais. Quando perguntado sobre
quais são os aspectos essenciais para o desenvolvimento da energia fotovoltaica, a
maioria dos entrevistados mencionou a questão dos incentivos e políticas públicas
para o setor, o que reforça a cultura prevalecente no país de que o governo deve ser
o estimulador destes processos de transição tecnológica.

3.5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES:

Este artigo revisa o processo de surgimento da eletricidade FV no Brasil a partir


de uma perspectiva combinada de duas abordagens principais: Perspectiva multinível
(MLP) e as Funções do Sistema de Inovação (FSI). O objetivo deste trabalho foi
descrever o estado atual desta fonte de energia e identificar oportunidades de
crescimento para o setor.

97
Todo tipo de fornecimento de energia utilizado apresenta algum impacto e
custos financeiros. Assim, usar a energia de forma mais eficiente exige menos em
termos de custos do serviço, além do fato de que o uso de menos energia para
fornecer o mesmo benefício aumenta a segurança para os indivíduos e as suas
nações. Portanto, é vital gerenciar o uso eficiente de energia, que se aplica
necessariamente a todas as formas de produção de energia. Na prática, a maioria dos
consumidores não sabem quais são as fontes primárias de energia que utilizam e
deixam a gestão de suas demandas para as agências governamentais reguladoras e
para fornecedores (TWIDELL; WEIR, 2015).
Os consumidores individuais podem e devem levar a sério a sua
responsabilidade por seu uso de energia e, neste sentido, a EESFV se apresenta
como uma alternativa ambientalmente sustentável, renovável e economicamente
viável. A EESFV atende aos princípios básicos de planos decenais de energia do
Brasil, publicados pelo MME, envolvendo sustentabilidade, redução dos custos
energéticos, bem como a diversificação da matriz energética. É importante ressaltar
que o país tem grandes reservas de silício, material indispensável para a produção de
painéis de energia solar, bem como uma grande área de terra e incidência de sol, o
que reforça a perspectiva positiva para esta tecnologia.
Considerando o vasto território e a alta radiação solar, o Brasil tem potencial
para aumentar substancialmente a geração de energia usando a energia FV, capaz
de gerar dezenas de milhares de GWh somente com esta fonte de energia.
Neste sentido, o país tem a oportunidade de promover a utilização e difusão da
energia solar fotovoltaica como fonte importante na matriz energética nacional e
desenvolver toda a cadeia produtiva, o que, conforme descrito neste estudo, inclui a
fabricação de matérias-primas, componentes, equipamentos e mão de obra
qualificada para operar neste setor. Porém, o crescimento desta fonte de energia
exige algumas políticas de ação e incentivos governamentais que envolvem o setor
privado, o desenvolvimento e as agências reguladoras, instituições bancárias e de
várias agências governamentais.
O crescimento da energia solar fotovoltaica no Brasil não só depende de
iniciativas técnico-econômicas. Pode-se concluir que o crescimento do setor depende
também de um processo de aprendizagem que inclui a educação formal, o

98
conhecimento da população sobre esta fonte de energia, uma abertura e atividade do
mercado competitivo e o desenvolvimento de uma indústria nacional com a adaptação
de tecnologia para atender às condições nacionais. Perez (2004) propõe que o
impacto generalizado de um novo sistema tecnológico vem de "ampla adaptabilidade"
das inovações contribuintes em suas múltiplas facetas. Estas contribuições não são
apenas tecnológicas. Cada sistema de tecnologia reúne inovações tecnológicas em
insumos, produtos e processos que podem resultar em inovações organizacionais e
de gestão, e pode levar a grandes mudanças nos aspectos sociais, institucionais e até
mesmo políticos.
Recomenda-se o estabelecimento de algumas prioridades e alguns
direcionadores de configuração, abordando as funções que são fundamentais neste
sistema, como atividades empresariais e legitimidade, bem como a formação de um
mercado em grande escala. Apesar da teoria lidar com instituições e organizações, é
importante destacar o papel central que os indivíduos exercem neste contexto,
especialmente em projetos de P&D e investimentos em iniciativas de nicho que
dependem da aprovação de tais pessoas, que tem o poder de escolher onde os
recursos das empresas serão implementado e quais serão os projetos de nicho
contemplados por tais recursos.
A análise mostrou que todas as funções do sistema de energia FV enfrentam
obstáculos e alguns deles são fortes. A ampliação do uso da tecnologia de EESFV
depende fortemente de incentivos governamentais, seja de origem fiscal, seja na
concessão de crédito para financiamentos. As barreiras de mercado relacionadas a
altos custos de produção de energia fotovoltaica podem ser derrubadas por meio de
políticas públicas direcionadas para o setor, tanto para o estabelecimento de uma
indústria de equipamentos domésticos quanto para cortes de impostos e a promoção
de incentivos para micro geração. Mas, nem todas as oportunidades dependem
exclusivamente de questões financeiras. A falta de profissionais especializados e
qualificados no mercado doméstico é uma barreira importante que também precisa
ser superada.
Com o aumento da produção de módulos fotovoltaicos no país juntamente com
a expansão da geração centralizada e o desenvolvimento de novas tecnologias
alternativas para sistemas solares fotovoltaicos, espera-se que aconteça um ganho

99
de escala na indústria e a consequente redução dos custos de produção para essa
fonte de energia. Ganho de escala é um fator chave para o desenvolvimento
sustentável desta fonte de energia e é o resultado da expansão da produção e da
chamada curva de experiência, que reduz os custos com o aumento da produção.
Ganhos de escala e investimento para o desenvolvimento de uma indústria
nacional requerem a quebra da barreira de instabilidade econômica no país e do risco
percebido, ambas localizadas no nível da paisagem e que geram um impacto negativo
sobre o desenvolvimento de nicho para a energia FV. Por outro lado, observou-se
também que o desenvolvimento da cadeia produtiva da energia solar no nicho tem
impactos positivos sobre os indicadores de educação, as taxas de emprego e
desempenho da economia, que são todos os indicadores de nível de paisagem.
Nesse sentido, observou-se uma relação direta entre um indicador de nível de
paisagem impactando os elementos de nível de nicho e vice-versa. A proposta que se
apresenta neste estudo em termos de contribuição teórica para a perspectiva
multinível não é apenas uma análise isolada dentro de cada nível, mas também a
análise das ligações e os impactos positivos ou negativos que podem ser observados
entre a paisagem e o nível de nicho, especialmente em termos de desenvolvimento
social, o que torna a teoria melhor ajustada para o caso em estudo.
Este estudo é o primeiro passo na análise do processo de transição tecnológica
para a EESFV no Brasil e propõe a inclusão de elementos econômicos e sociais na
perspectiva multinível - MLP para analisar o impacto social que a nova tecnologia pode
trazer para um país em desenvolvimento. No caso analisado, estima-se que o
crescimento da energia solar no país pode gerar cerca de 60.000 empregos no país
em 2018 (ABSOLAR, 2016). Para futuras pesquisas, sugere-se expandir o escopo do
estudo para outras fontes de energia renovável em um estágio inicial de
desenvolvimento, como a geotérmica e das ondas do mar com a aplicação da
perspectiva MLP e FSI.

100
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Setor, www.abradee.com.br/setor-eletrico/visao-geral-do-setor, acesso em 04 de
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Paraná, Curitiba, 2015, 01/12/2015.

105
4 GOVERNANÇA E CAMINHOS PARA A ENERGIA
FOTOVOLTAICA NO BRASIL

Resumo: Este estudo investiga, a partir de uma perspectiva sociotécnica, a


governança que atualmente vem sendo aplicada no setor de energia elétrica solar
fotovoltaica (EESFV) no Brasil e na Alemanha, realizando um comparativo entre os
dois países e indicando caminhos para promover esta tecnologia no Brasil. A pesquisa
foi baseada em dados de 2015 e 2016 de três diferentes fontes de informação: 1)
entrevista em profundidade com um Cluster de Energia Solar da Alemanha; 2) vinte
entrevistas em profundidade com atores do Sistema Nacional de Inovação brasileiro
de EESFV (Energia Elétrica Solar Fotovoltaica) e 3) dados secundários envolvendo
resoluções, regulamentações, incentivos e políticas de financiamento, bem como
relatórios oficiais de Instituições pertencentes ao Sistema Nacional de Inovação do
Brasil e da Alemanha. Para a análise dos dados foi utilizada a perspectiva multinível,
com a utilização de análise de conteúdo e o auxílio do software Atlas.ti, versão 7. O
estudo objetivou, como uma análise pioneira no Brasil, observar o impacto das
diferentes iniciativas dos atores nos três níveis do regime sociotécnico (nicho, regime
e paisagem) para o gerenciamento da transição tecnológica aplicada para a EESFV.
Entre os principais resultados identificados estão: a necessidade de políticas de
incentivos fiscais e outras para o desenvolvimento da indústria nacional de painéis
solares e dos componentes eletrônicos que compõem os sistemas fotovoltaicos, a
definição de políticas de encorajamento para inovação tecnológica, a formação de
redes de cooperação entre os atores do Sistema para promover e disseminar esta
fonte de energia no Brasil. O que pode ser aprendido da experiência da Alemanha é
que, mesmo com incentivos, a tecnologia atinge, a partir de um certo momento, uma
saturação de mercado, impulsionando as empresas a buscar por novos mercados,
bem como novos processos de inovação para garantir sua sustentabilidade. A
trajetória de sucesso percorrida pela Alemanha não pode apenas ser replicada no
Brasil, mas pode servir como base de aprendizado que necessita adapções ao
contexto nacional brasileiro. Palavras-chave: Energia elétrica solar fotovoltaica no
Brasil, Governança, Transição tecnológica, Perspectiva multinível.

106
Abstract: This study investigates from a socio-technical perspective the governance
actually used in the PV energy sector in Brazil and in Germany, from a comparison
between the two countries and indicates ways to promote this source of energy in
Brazil. The research was based mainly on primary data from 2015-2016 from three
different sources of information: 1) In depth interview with a German Solar Energy
Cluster, 2) 20 in-depth interviews from representatives actors of the national innovation
system of the Brazilian PV energy sector and 3) Written data involved resolutions,
regulations, incentive and financing policies offered by governmental agencies and
also reports from the official government organizations belonging to the National
Innovation System in Brazil and in Germany. For data analysis, the multilevel
perspective was used, with contente analysis methodology and Atlas.ti software,
version 7. This study aimed, as a pioneering analysis in Brazil, observing the impact of
the various actor’s initiatives between the three levels of socio-technical system (niche,
regime and landscape) for the management of the technology transition of photovoltaic
electricity activity in Brazil. Among the key finding of this research are: the need to
encourage specific tax policies for the development of a national industry, encouraging
policies for technological innovation and the establishment of cooperative networks
between the various actors of the innovation system for development of actions to
promote and disseminate this source of energy in Brazil. Regarding what can be
learned from German’s experience is the fact that even with government incentives
and policies, the technology reaches, from a certain moment on, a Market saturation,
which drives companies operating in the industry to search for new markets, to develop
new innovation process and new prospects in order to ensure sustainability. Moreover,
the German success trajectory can not be replicated in Brazil, but should serve as a
learning basis that needs some adjustments to the appropriate elements to the
Brazilian National Context.
Key words: Brazilian solar photovoltaic energy, Governance Framework, Technology
transition, multilevel perspective.

107
4.1 INTRODUÇÃO:

Nos últimos anos, inúmeras iniciativas foram tomadas para incentivar o uso e a
disseminação de energias renováveis no Brasil. Historicamente, todas as políticas
nacionais do setor relacionadas a energia são altamente centralizadas e controladas
pelo governo. As decisões relacionadas à qual fonte de energia, bem como sua
precificação e as tecnologias a serem utilizadas são orientadas e muitas vezes
determinadas por instituições governamentais, que definem as regras para a
publicação de novos leilões e o planejamento estratégico para que a chamada
“energia de reserva” comece a ser produzida.
Ao identificar políticas emergentes para promover a EESFV nos diferentes
níveis e escopos do sistema sociotécnico brasileiro, este artigo objetiva mapear o que
pode ser aplicado como um modelo de governança que concatene as necessidades
de cada um dos stakeholders ao mesmo tempo em que seja adequado às
necessidades particulares de um país em desenvolvimento como no caso do Brasil.
A questão principal a ser respondida pelo presente estudo é: “Quais são os
fatores fundamentais em termos de governança e políticas para o processo de
transição tecnológica da energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil?”
A análise se desenvolve a partir de duas bases teóricas complementares:
Transição Sóciotécnica para Sistemas de Inovação e Governança, ambos conceitos
já revisados no capítulo 2 da presente tese, e realiza um comparativo entre a trajetória
da tecnologia ocorrida na Alemanha com a que se inicia no Brasil.
A teoria sociotécnica da inovação tem suas origens no pensamento neo-
shumpeteriano, que buscava compreender o processo de inovação, analisando
regularidades, continuidades e descontinuidades. A partir desta abordagem, autores
como Perez (2009), Nelson (2008) e Soete, Vespagen e Weel (2009) trazem a noção
de que os Sistemas Nacionais de Inovação são uma base mais ampla para que as
políticas e a governança em torno da inovação possam se desenvolver. Neste sentido,
a teoria sociotécnica da inovação passou a analisar os padrões observados na
evolução do progresso técnico e as suas inter-relações com o contexto que moldam
o ritmo e a direção de determinada inovação dentro do seu contexto social, definindo
a trajetória das chamadas revoluções tecnológicas. Esta perspectiva ainda possui

108
como foco a análise da trajetória tecnológica, de sua estrutura e do papel que tais
tecnologias desempenham no rejuvenescimento da economia por meio da aplicação
do paradigma técnico-econômico que o acompanha.
Neste sentido, o estudo do setor de energia elétrica solar fotovoltaica traz uma
visão de como um Sistema Nacional de Inovação pode se constituir como uma base
para a transição tecnológica e de que forma esta transição envolve os atores das
diferentes dimensões da perspectiva multinível, assuntos a serem abordados na
sequência.

4.2 REFERENCIAL TEÓRICO

O presente estudo está estruturado a partir das seguintes teorias: transição


sociotécnica para sistemas de inovação, sistemas nacionais de inovação e
governança para a transição de energia renovável, que analisadas conjuntamente
permitiram a identificação dos elementos essenciais para o processo de transição
tecnológica para a energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil, detalhadas a seguir.

4.2.1 Transição Sociotécnica para Sistemas de inovação

O estudo das transições com base na perspectiva sociotécnica é justificado


pelos autores ao mencionar que as pesquisas nesta área envolvem o entendimento
do contexto no qual determinada tecnologia está instalada, que contempla não apenas
o desenvolvimento do conhecimento e de protótipos, mas também a mobilização de
recursos, a criação de redes sociais, a formação de novos mercados e os marcos
regulatórios. Neste sentido, o desenvolvimento tecnológico envolve a criação de
ligações entre diversos elementos heterogêneos (GEELS; SCHOT, 2010; GEELS,
2004). Tais mudanças tecnológicas requerem que os atores combinem artefatos
físicos, organizações, recursos naturais, elementos científicos e artefatos legislativos.
Geels e Schot (2010) destacam a importância dos aspectos históricos para a
análise sociotécnica da transição de longo prazo, uma vez que estas possibilitam uma
análise de multi-causalidade, de co-evolução, pensamento lateral, anti-reducionista,
de contexto e com o uso de diferentes escalas de tempo.

109
As inovações do sistema podem ser descritas como transformações em larga
escala na forma como funções sociais tais como energia, transporte, comunicação,
habitação e alimentação são ofertadas. Os artefatos sozinhos não têm poder, sendo
somente em associação com agentes humanos, estruturas sociais e organizações
instuticionais que os artefatos desempenham funções dentro dos sistemas (GEELS,
2004).
Ao descrever a perspectiva multinível para os sistemas de inovação, Geels
(2004) pontua alguns aspectos existentes na dinâmica das transições tecnológicas
tais como: as novidades emergem dos nichos tecnológicos; as difusões e rupturas de
novas tecnologias ocorrem como o resultado da ligação entre o desenvolvimento nos
múltiplos níveis; uma vez que as inovações conseguem romper e ingressar nos
mercados de massa elas começam a competir com o regime existente e podem,
eventualmente, substituir as mesmas; as inovações do sistema raramente são
impulsionadas pelo avanço da tecnologia radical, mas sim pela união e pelo
agrupamento de múltiplas tecnologias. Neste sentido, o processo de transição possui
quatro fases, sendo que nos dois primeiros estágios a ênfase é dada nas regras e
percepções e nos dois últimos estágios a ênfase se dá nos aspectos de competições
econômicas e ligações sociotécnicas, conforme ilustra a Figura 13.

110
Aumento da estruturação das
práticas de atividades

Paisagem
Sociotécnica
(contexto
Exógeno) Desenvolvimentos da paisagem
colocam pressão no regime existente,
que se abre, criando janelas de Novo Regime influencia
oportunidades e novidades
a paisagem
Mercados, preferências
do usuário
Regime Indústria
Sociotécnico Ciência

Políticas
Cultura

Tecnologia
Regime Sociotécnico é “dinamicamente estável”.
Novas configurações acontecem, tirando
Em diferentes dimensões existem processos em andamento.
vantagem da “Janela de oportunidade”.
Ajustes ocorrem no regime sociotécnico.

Influências externas nos nichos


Elementos se tornam alinhados e
(via expectativas e networks)
estabilizam em um design dominante.
Momentos internos crescem.

Nicho
Inovações
Pequenas redes de atores suportam as novidades na base das expectativas e visões.
Os processos de aprendizagem acontecem em múltiplas dimensões (co-construção).
Esforços para ligar diferentes elementos em uma rede sem costura.
Tempo
Figura 13 – Transição sociotécnica para os sistemas de inovação
Fonte: Adaptado de Geels (2002, p.1263)

A primeira fase refere-se à emergência de novidades em um contexto existente,


no qual pondera-se que uma nova tecnologia não surge no vazio, mas sim em um
regime pré-existente de nichos tecnológicos e pequenos mercados, onde existem
muitas incertezas que podem levar a mecanismos de adição tecnológica e
hibridização com o objetivo de moldar funcionalidades das novas tecnologias e gerar
a criação de simbioses entre elas. A segunda fase envolve a especialização técnica
em mercados de nicho e exploração de novas funcionalidades que surgem a partir da
socialização e institucionalização dos processos entre os atores do nicho, que
estabelecem uma agenda comum, aprimorando os processos de aprendizagem,
adoção de melhores práticas e novas tecnologias e possibilitando o início de uma
trajetória tecnológica com regras próprias.

111
A terceira fase envolve ampla difusão, avanço de novas tecnologias e
competição com o regime estabelecido. O processo de difusão proporciona à nova
tecnologia mais visibilidade e esta passa a competir com o regime já existente,
dependendo de fatores tais como economia de escala e tecnologias complementares
para se consolidar. Por fim, a fase 4 contempla a substituição gradual do regime
estabelecido, no qual as novas tecnologias substituem as antigas com transformações
mais amplas.
Berkhout (2010) comenta que uma mudança de regime tecnológico é orientada
para a inovação do sistema como um todo e normalmente é realizada em grande
escala. Quase por definição, esses processos de inovação não são susceptíveis de
surgir a partir de condições e relações de mercado existentes. Neste sentido, uma
política de inovação seria, portanto, fundamental para uma mudança de regime. O
autor caracteriza a inovação (e também o desempenho ambiental) em regimes
tecnológicos como desdobramento da dinâmica da interação e classifica em quatro
tipos de inovação: inovação abatimento (end of pipe); inovações de processo;
inovações de produto e mudanças de infraestrutura, sendo que para cada uma destas
formas existem componentes distintos em termos de sistemas de inovação, bem como
resultados e impactos ambientais diferenciados.
Perez (2009) comenta que estudos sobre inovação demonstraram que a
introdução de mudanças técnicas não é aleatória, mas sim interdependente do trajeto
de outras inovações agrupadas em sistemas, as quais são, por sua vez, interligadas
em rotações. Embora a inovação seja constante na economia de mercado, nem
sempre ela é contínua. Existem alterações no ritmo que tendem a seguir uma curva
logística e são influenciadas pelo ciclo do sistema de tecnologia no qual elas são
incorporadas. Há descontinuidades, muitas vezes estimuladas pelo esgotamento de
possibilidades ao longo de uma trajetória particular, na qual a produtividade e os
mecanismos de mercados estão se aproximando da exaustão.
Neste sentido, os ritmos de mudança, de crescimento, os processos de
mudança estrutural e o aumento de produtividade na economia podem ser entendidos
como impulsionados pela mudança técnica, como uma forma de difusão de
sucessivas revoluções tecnológicas. Tomados em conjunto, o ponto de vista micro,
meso e macro de como as tecnologias evoluem é possível reconhecer a natureza da

112
tecnologia, suas formas de evolução e suas inter-relações como um objeto de análise
das ciências sociais e como uma forma de incorporar a teoria econômica na dinâmica
de sua interação com a tecnologia e as instituições em um contexto histórico em
mudança (PEREZ, 2009).
O uso da tecnologia é fundamental no desenvolvimento de um sistema de
inovação, pois a tecnologia amplia a gama de recursos que os seres humanos podem
ter acesso. A tecnologia penetra profundamente e amplamente na sociedade,
estruturando-a e regulando-a. Sua influência é evidente em tecnologias cotidianas,
tais como equipamentos de GPS (Global Positioning System), na produção industrial
e em processos de logística que são moldados e estruturados em grande parte pelas
tecnologias em uso. Neste sentido, as novas tecnologias não apenas desempenham
um papel importante na reestruturação dos mercados existentes ou na criação de
novos mercados; elas também formam a base para grandes mudanças estruturais e
organizacionais nos processos de produção, prestação de serviços e em setores
inteiros (DOLATA, 2013; SAVIOTTI, 2010). Os sistemas de inovação são abordados
na próxima seção.

4.2.2 Sistema Nacional de Inovação

Ao conceituar um sistema nacional de inovação, Lundvall (2010, p.2) coloca


que “É um sistema social cuja atividade central consiste no aprendizado, e
aprendizado é uma atividade social que envolve interação entre as pessoas. Também
é um sistema dinâmico, caracterizado por feedback positivo e reprodução”. Nelson
(1993), por sua vez, associa o conceito com o desempenho das organizações
nacionais ao observar que um sistema de inovação pode ser um conjunto de
instituições cujas interações determinam a performance inovadora das empresas
nacionais, sendo, na visão do autor, as instituições mais significativas aquelas que
apoiam esforços em P&D. Já Freeman (1987, p.1) define um sistema nacional de
inovação como: “uma rede de instituições dos setores público e privado cujas
atividades e interações iniciam, importam, modificam e difundem novas tecnologias".

Saviotti (2010) esclarece que o estudo dos sistemas de inovação tem ocorrido
em diferentes níveis, variando de Sistemas Nacionais de Inovação para Sistemas

113
Regionais de Inovação e Sistemas Setoriais de Inovação. Segundo o autor, a
suposição comum subjacente a estas abordagens é a de que a inovação não é criada
simplesmente pela inversão de dinheiro em P&D. Pelo contrário, inovações são
criadas por um sistema constituído por diferentes partes ou componentes que
interagem e determinam o resultado final.

Soete, Vespagen e Well (2009), ao realizar uma revisão do conceito de sistema


nacional de inovação, destacam que esta abordagem possui cinco pontos principais
de análise, a saber: as fontes de informação, as instituições (e organizações), a
aprendizagem interativa, a interação e o capital social, sendo que todos eles
estimulam a inovação.

Ao abordar o processo de inovação, Geels (2004) menciona que este pode ser
entendido como uma mudança de um sistema sociotécnico para outro. Na visão do
autor, a substituição tecnológica é um dos aspectos de um Sistema de Inovação e
envolve três subprocessos: a emergência de novas tecnologias; a difusão de novas
tecnologias e a substituição de velhas tecnologias. Um segundo aspecto envolvido é
a co-evolução, que está relacionado às mudanças nos elementos tais como as
práticas, os aspectos regulativos, as redes industriais, a infraestrutura e significado da
cultura. Já o terceiro e último aspecto da inovação do sistema é a emergência de
novas funcionalidades, resultado de mudanças proporcionadas por inovações
radicais. Neste sentido, Geels (2004, p. 20) define um sistema sociotécnico como “um
conjunto de elementos, incluindo a tecnologia, regulamentação, práticas de
utilizadores e os mercados, o significado cultural, infraestrutura, bem como redes de
manutenção e redes de abastecimento”.

Já Coenen e Lopez (2012, p. 9) colocam que um sistema sociotécnico “engloba


aspectos como a produção, difusão e uso da tecnologia em relação às chamadas
funções sociais” (por exemplo, transporte, comunicação, nutrição). Os autores
destacam que em um sistema de inovação, o conhecimento é visto como o recurso
estratégico mais importante, assim como a aprendizagem é a atividade mais
fundamental e enumeram as sete dimensões que permitem uma comparação
sistemática de diversas pesquisas de sistemas de inovação, envolvendo as fronteiras

114
do sistema, os atores e redes de relacionamento, as instituições que compõe o campo
organizacional, o aprendizado e o conhecimento, as dinâmicas internas do sistema,
os resultados e a performance alcançados e a metodologia de abordagem do sistema.

Kemp e Rotmans (2010, p.35) descrevem que “uma inovação do sistema pode
consistir no desenvolvimento de um novo sistema (tal como o desenvolvimento do
sistema elétrico) e na transformação do sistema existente, tal como a emergência de
um regime de mobilidade para fora dos regimes de transporte individual e público
existente”.

Organizações, estruturas e instituições tornam-se disfuncionais, entram num


estado de crise e passam por uma mudança substancial para permanecer legítimas e
para evitar a obsolescência. Dolata (2013) destaca que uma nova tecnologia e suas
propriedades não determinam como as pressões para a mudança são tratadas nem a
forma e até que ponto as tecnologias propiciam reajuste socioeconômico e inovação.
Saviotti (2010) complementa a visão participativa das organizações neste processo
ao afirmar que uma das principais funções das instituições que co-evoluem com as
tecnologias é resolver os problemas de coordenação criados pelas próprias
tecnologias. A complementariedade também é um dos aspectos essenciais para a co-
evolução. Neste sentido o autor comenta que pode-se esperar que as interações
complementares entre os atores institucionais desempenhem um papel muito
importante no desenvolvimento de novas tecnologias.

Ao comentar sobre o que os governantes deveriam fazer para promover a


inovação, Lundvall (2010) destaca a necessidade de se conhecer as especificidades
do sistema no qual eles atuam sob o risco de ou reproduzir fraquezas do sistema
nacional ou de introduzir mecanismos incompatíveis com a lógica básica do sistema.
O autor complementa sobre a importância de se entender como os diferentes e
diversos sistemas nacionais funcionam e destaca que o processo de aprendizado a
partir da experiência de sistemas estrangeiros pode ser facilitado ao se compreender
apropriadamente o funcionamento dos demais sistemas nacionais como um todo.
“Estratégias baseadas na cópia ingênua devem ser evitadas e o aprendizado
institucional entre fronteiras estimulado” (LUNDVALL, 2010, p.5).

115
O pressuposto de que a inovação é um elemento chave para o crescimento
econômico de um país é motivo principal pelo qual instituições governamentais
propõem políticas de inovação. Neste sentido, o progresso tecnológico em si não deve
ser observado como uma meta e sim os caminhos para o crescimento por meio da
inovação (LUNDVALL, 2010).

Baseado na teoria neo-institucional, Geels (2004) divide as regras de um


regime tecnológico em três tipos: cognitivos (sistema de crenças, princípios
direcionadores, metas, agendas de inovação), regulativos (padrões regulamentados
e leis) e normativos (papel dos relacionamentos, valores e normas de
comportamentos). Estas regras, bem como seus desdobramentos são influenciadas
pelas questões de governança da atividade, que será abordada na próxima seção.

4.2.3 Governança para a transição de energia renovável

Em seu livro sobre os desafios da transição para energia limpa, Ayres (2012)
coloca como sendo dois os principais desafios ao paradigma econômico dominante:
primeiro porque a energia física possui um papel subestimado pelos economistas que
assessoram as empresas e os governos. Segundo o autor, os serviços de
fornecimento de energia não somente se constituem como parte relevante da energia,
mas também são parte considerável de tudo o que move a economia e, neste sentido,
tanto a recuperação econômica quanto a mudança da matriz energética levam muito
tempo para se concretizar. O segundo desafio apontado por Ayres (2012) está no fato
de que a economia energética do mundo industrial é altamente dependente de
combustíveis fósseis, o que implica afirmar que mesmo que ocorra um célere
crescimento de energias renováveis levar-se-ia ao menos duas décadas para que
uma mudança significativa ocorra.

O abismo econômico que necessita ser transposto para que uma mudança
efetiva aconteça, segundo Ayres (2012), é formado por duas dimensões: a amplitude
e a profundidade. Por amplitude entende-se a quantidade de tempo (em anos)
necessários para que as chamadas energias renováveis limpas estejam em condições
de substituir os combustíveis fósseis. Já a dimensão da profundidade relaciona-se a

116
depressão econômica a ser superada mediante a restauração do crescimento
econômico. O autor ainda completa questionando se haveria uma estratégia capaz de
abreviar a transição para as energias renováveis e ao mesmo tempo conseguir
estimular o crescimento econômico. Neste sentido o presente estudo apresenta uma
contribuição ao analisar a governança e propor um modelo para o setor de energia
elétrica nacional, com vistas ao desenvolvimento de inovações sustentáveis para a
atividade de EESFV e a posterior consolidação desta tecnologia na matriz energética
nacional, o que estimula a economia e o desenvolvimento do Sistema.

Adotar fontes de energia renováveis requer um comprometimento de dinheiro,


tempo e esforço. Twidwell e Weir (2015) comentam que algumas das escolhas que
necessitam ser feitas são financeiras e outras são éticas, sendo que algumas destas
decisões são tomadas pessoalmente, outras a nível de negócios e critérios políticos.
Os autores colocam ainda que indivíduos e sociedade fazem as suas escolhas
baseadas em critérios variados, podendo envolver a discussão de valores, mas
também critérios econômicos e matemáticos para quantificar a tomada de decisão.

No cenário mundial, as fontes de energia renováveis em 2012 representaram


cerca de 13% da produção de energia primária, sendo a maior parte composta por
uso tradicional da biomassa nos países desenvolvidos, seguidos por energia
hidroelétrica. O uso global de energia continua a crescer, motivado pelo aumento
populacional e o desenvolvimento econômico, especialmente nos grandes países em
desenvolvimento como China, Índia e Brasil, associados com o aumento da
industrialização (TWIDWELL, WIER, 2015).

No que se refere a teoria da gestão da transição para a sustentabilidade,


Loorbach (2007, p. 12) apresenta este conceito como um “novo modelo de
governança que provê uma estrutura para a pesquisa da governança genérica
(científica) e os modelos de políticas operacionais para influenciar a mudança na
sociedade no longo prazo”.

Em um mundo de constante mudanças o desafio em termos de governança e


política é lidar inteligentemente com todos os curtos processos de mudança no sentido

117
de acelerar e direcionar estes processos em uma determinada direção (LOORBACH,
2007). O autor destaca que nossas instituições atuais, bem como nossas políticas
estão voltadas para a resolução de problemas e em um horizonte de tempo de curto
e médio prazo. O desenvolvimento de metas de longo prazo objetivando a governança
implica no rompimento das rotinas existentes, bem como nas formas de pensar e as
barreiras mentais e físicas individuais, mas é, segundo o autor, o único caminho e
precisa estar embasado em um senso de urgência, bem como em visões de
sustentabilidade fortes e inspiradoras de longo prazo e nas estratégias de inovação
social.

Loorbach (2007) defende que os pilares para a inovação social devem estar
pautados em constructos como a sustentabilidade, igualdade social, democracia e
qualidade de vida ao invés de crescimento econômico, aumento da eficiência,
especialização contínua e fragmentação, o que envolve uma mudança nos padrões e
valores de nossa sociedade como um todo e em quais valores e qualidades se deseja
preservar e desenvolver para o futuro. Isso implica em uma mudança na sociedade
em termos de desenvolvimento sustentável, que envolve “aprender fazendo” e “fazer
aprendendo”. Neste contexto, o desenvolvimento sustentável não acontece de forma
autônoma, sendo que as inovações tecnológicas e econômicas são frequentemente
muito mais poderosas do que as inovações nas instituições, comportamentos ou
cultura.

O desenvolvimento sustentável, bem como uma sociedade responsável deve


ser pautada em uma preocupação com os problemas locais e com questões globais
e suas inter-relações. Isso somente pode ser feito por meio de uma reflexão sobre as
fundações de nossa sociedade e o seu desenvolvimento para além dos sintomas
percebidos (LOORBACH, 2007).

Impulsionado pelo progresso social, tecnológico e econômico, o mundo


industrializado tem desenvolvido uma cultura, com estruturas de apoio e práticas
individuais que juntos formam sistemas sociais com altos impactos sociais e
ambientais em uma escala cada vez mais global. Está claro que, a longo prazo, estes
sistemas precisarão de uma mudança a fim de atingir melhores níveis de performance

118
para resolver os problemas de sustentabilidade que o mundo enfrenta hoje
(LOORBACH, 2007). Porém, o autor destaca que existem diferenças fundamentais
em objetivos, interesses e estratégias que impedem o desenvolvimento de soluções
compartilhadas, consensos ou cooperação, pois os diferentes atores definem tais
problemas de forma diferenciada.

Neste contexto, surge o conceito de transições de sistemas, que podem ser


definidos como processos de transformação nos quais as estruturas existentes, as
instituições, cultura e as práticas são quebradas e vão sendo gradualmente
substituídas. Já transições sociais são definidas como processos de mudança que
estruturalmente alteram a cultura, a estrutura e as práticas de um sistema social
(LOORBACH, 2007, p. 17). Tais processos podem levar de uma a duas gerações para
se materializar. Uma mudança social é o resultado de mudanças de interação em
todos os domínios da sociedade (economia, ecologia, instituições, tecnologia e bem-
estar).

Entre as diferentes perspectivas de sistemas de transição, existem um número


de comunalidades básicas: os sistemas que são estudados são abertos e
incorporados em um ambiente exterior com o qual co-evoluem, existe uma mudança
de ambiente externo que influencia o sistema e o próprio sistema apresenta um
comportamento não linear a fim de se adaptar ao seu ambiente (LOORBACH, 2007).

O autor complementa que uma transição é um processo de mudança social


estrutural de um sistema relativamente estável para outro por meio de uma co-
evolução dos mercados, redes, instituições, tecnologias, políticas, comportamento
individuais e tendências autônomas. A complexidade de uma transição implica em
uma diversidade de fatores direcionadores e de impacto. A transição pode ser
acelerada por eventos pontuais, como um grande acidente (exemplo: Chernobyl) ou
por uma crise como a do petróleo, mas não pode ser causada apenas por estes
eventos. Mudanças lentas no ambiente externo determinam a tendência para uma
mudança fundamental; sobreposta a esta subcorrente são eventos tais como
calamidades, que podem acelerar o processo de transformação.

119
Transições são, portanto, processos multi-causas, multi-níveis, multi-domínios,
multi-atores e multi-fases. Apesar das transições serem caracterizada por um
comportamento não linear, o seu processo é gradual e elas podem ser descritas em
termos de degradação e colapso, versus construção e inovação ou ainda em termos
de destruição criativa. O pressuposto central é que estruturas sociais passem por
longos períodos de relativa estabilidade e otimização, seguido por períodos
relativamente curtos de mudança estrutural (LOORBACH, 2007).

O processo de governança passa por uma descentralização, migrando de uma


forma centralizada em instituições governamentais para o desenvolvimento de
políticas distribuídas entre os níveis e os atores do sistema de inovação, no qual
papéis, mecanismos e prestações de contas estão menos claramente definidos
(SMITH, 2007).

4.3 METODOLOGIA DE PESQUISA

A metodologia tem como objetivo esclarecer sobre qual das diversas


possibilidades de análise do fenômeno em estudo esta pesquisa será realizada.
Assim, para verificação do problema exposto, é fundamental o detalhamento dos
aspectos relacionados à especificação do problema, ao delineamento e à delimitação
da pesquisa, bem como os procedimentos de coleta e tratamento dos dados,
elaborados nesta seção.

No contexto das teorias da transição emergem metodologias de pesquisa


classificadas como híbridas, ou seja, que envolvem tanto metodologias orientadas
pela ciência, de caráter mono disciplinar e baseadas em procedimentos científicos
formais, quanto pelas metodologias orientadas pela sociedade, de caráter multi ou
transdisciplinar e baseadas em novos métodos e práticas de pesquisa. Tal
característica se deve ao fato de que na prática das pesquisas sobre transições e
gerenciamento de transições existe uma interação contínua entre investigação
fundamental e aplicada que a caracteriza como multi e interdisciplinar (combina e
integra diferentes disciplinas científicas), transdisciplinar (integra conhecimentos
tácitos e leigos com o conhecimento científico) e normativa (LOORBACH, 2007).

120
Segundo Loorbach (2007, p. 34)

o novo paradigma de pesquisa é holístico, valoriza o conhecimento tácito e


implícito de forma igualitária, enxerga os pesquisadores como parte integrante
da rede social (na qual possui papel específico e influência) e é normativo no
que se refere à orientação para a sustentabilidade. É caracterizado pelo foco
na complexidade, incertezas e no desenvolvimento não linear (também no
conhecimento).

O presente estudo busca, por meio de uma abordagem inédita no contexto


nacional, observar o impacto causado pelas iniciativas dos atores nos três níveis de
atuação (nicho, regime e paisagem) para a gestão da transição sociotécnica da
inovação na atividade de energia elétrica voltadas para o uso e a disseminação da
energia solar fotovoltaica no Brasil, realizando um comparativo entre o processo de
transição desta tecnologia já ocorrido na Alemanha e identificando pontos estratégicos
que eventualmente podem ser adaptados à realidade brasileira.

Neste sentido, a pergunta de pesquisa que norteia esta investigação consiste


em responder a seguinte questão: “Quais são os fatores fundamentais em termos
de governança e políticas públicas para o processo de transição tecnológica da
energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil?”.

Tal problema de pesquisa se debruçou sobre as seguintes questões


investigativas:

- Qual a atual trajetória tecnológica da energia elétrica solar fotovoltaica no


Brasil?

- Como se deu a transição tecnológica para a energia elétrica solar fotovoltaica


na Alemanha?

- Quais são os fatores da política alemã Energiewende que podem ser


incorporados à realidade do Brasil?

- Como seriam as eventuais adaptações na política alemã Energiewende


necessárias para aplicação no cenário brasileiro?

121
- Quais são os incentivos e políticas públicas essenciais ao desenvolvimento
da tecnologia fotovoltaica?

- Quais são os principais elementos em termos de governança e políticas


públicas necessárias para fomentar a transição tecnológica da energia elétrica solar
fotovoltaica no Brasil?

Como uma das contribuições práticas pode-se destacar o oferecimento de uma


análise de diferentes atores nos níveis de nicho, regime e paisagem da atividade de
energia elétrica do Brasil, possibilitando a estes uma base de informações para
eventuais tomadas de decisão, seja em termos de iniciativas nos nichos tecnológicos
de inovação, seja no desenvolvimento de políticas públicas voltadas para esta
atividade, fatores que podem impactar em mudanças no paradigma tecnológico
vigente e impulsionar o surgimento de um novo modelo de governança para a
atividade de energia elétrica solar fotovoltaica no contexto nacional.

Ao comentar sobre os aspectos metodológicos para os estudos nesta área,


Loorbach (2007, p. 30) destaca que “as pesquisas para a gestão da transição e o
desenvolvimento sustentável parecem quase impossíveis de serem realizadas por
meio de uma perspectiva tradicional ou mono-disciplinar”. E complementa: “o
gerenciamento da transição para o desenvolvimento sustentável é, em sua essência,
mais uma ideia do que um fato empírico ou uma hipótese que pode empiricamente
ser testada ou validada”.

Diante da complexidade do processo de transição sociotécnica da tecnologia


analisada, apresenta-se a estratégia de abordagem qualitativa como a mais adequada
ao objeto de análise em questão. A pesquisa interpretativa é a investigação que busca
trazer significado ao mundo das experiências e que depende fortemente dos
observadores em um processo de definir e redefinir os significados daquilo que
observam e ouvem em tais experiências (STAKE, 2010; DENZIN, LINCOLN, 2001).

O presente estudo é de natureza exploratória descritiva. A pesquisa


exploratória é utilizada nas situações nas quais o objetivo seja explorar uma área na
qual pouco é conhecido ou então para investigar a possibilidade da realização de uma

122
investigação especial. Já o estudo pode ser classificado como descritivo ao tentar
“descrever sistematicamente uma situação, um problema, um fenômeno, um serviço
ou programa, ou que fornece informações sobre as condições de uma determinada
comunidade ou ainda que descreve as atitudes em relação a um problema” (KUMAR,
2011, p.31). O principal objetivo neste tipo de estudo é descrever o que é
predominante no que diz respeito à questão ou problema em estudo.

A fase exploratória envolveu a coleta de dados primários por meio de 21


entrevistas em profundidade, sendo 20 realizadas no Brasil e uma na Alemanha, além
da seleção de documentos, resoluções, normativas, regulamentações, políticas de
incentivos e políticas de financiamento, bem como relatórios oficiais de instituições
relevantes do Sistema Nacional de Inovação do Brasil e da Alemanha. Já a fase
descritiva se desenvolveu por meio de análise documental e de conteúdo de todos os
dados coletados para análise das dimensões do Setor de EESFV nos níveis de
Paisagem Sociotécnica (Macro), Regime Sociotécnico (Meso) e Nichos Tecnológicos
(Micro), conforme demonstra o Apêndice III desta tese.

Para a análise do contexto nacional, foram realizadas 20 entrevistas em


profundidade com atores estratégicos do Sistema Nacional de Inovação para EESFV
no Brasil, conforme detalha o Apêndice I.

As entrevistas incluem os diferentes níveis e papéis dentro do sistema, com o


objetivo de proporcionar um completo entendimento da forma como as políticas
relacionadas com a EESFV têm sido desenvolvidas no Brasil e de que forma tais
políticas promovem a difusão desta tecnologia no país, bem como identificar
oportunidades para um modelo de governança para promover a disseminação desta
tecnologia. O roteiro das entrevistas realizadas com os principais atores do Sistema
Nacional de Inovação da Energia Solar Fotovoltaica encontra-se no Apêndice V. Já o
roteiro da entrevista em profundidade realizada no Cluster Solar Baden-Wüttenberg
na Alemanha encontra-se no Apêndice VI desta tese.

A seleção das organizações que participaram das entrevistas obedeceu aos


critérios de legitimidade dentro do contexto social no qual estão inseridas, seguindo-

123
se o objetivo da pesquisa qualitativa, que segundo Bauer e Gaskell (2002) é de
apresentar uma amostra do espectro de todos os pontos de vista no qual o
pesquisador deve utilizar sua imaginação social científica para montar a seleção dos
respondentes.

Todas as entrevistas foram tratadas mediante os pressupostos da técnica de


análise de conteúdo, elaborada com o auxílio do software de tratamento de dados
qualitativos Atlas.ti versão7 e envolveu a realização de um projeto para análise dos
dados do contexto nacional, no qual foram utilizados 69 documentos (vide Apêndice
II) somados à transcrição integral das 20 gravações de áudio das entrevistas em
profundidade, com duração total de cerca de 18 horas de áudio.

Já a análise do contexto da Alemanha envolveu a análise documental e de


conteúdo de 18 documentos, detalhados no Apêndice III, somados à transcrição
integral da entrevista em profundidade realizada pessoalmente com o CEO do Cluster
de Energia Solar – Solar Cluster Baden-Württemberg, localizado na cidade de
Stuttgart na Alemanha, com duração de 1 hora e 45 minutos, transcrita integralmente
do original em inglês e traduzida posteriormente para o português.

O objetivo central da coleta de dados e posterior análise comparativa entre o


Brasil e a Alemanha foi identificar os principais direcionadores das políticas públicas,
tanto no Brasil quanto na Alemanha, bem como mapear os elementos fundamentais
para um processo de governança para fomentar e disseminar a EESFV no Brasil que
esteja adequado à realidade nacional.

4.4 O SISTEMA NACIONAL DE INOVAÇÃO PARA A ENERGIA SOLAR


FOTOVOLTAICA NO BRASIL

A análise do contexto brasileiro foi elaborada com o auxílio do software Atlas.ti


7 explorou todos os documentos citados no Apêndice II, bem como transcrição das
entrevistas. Com isso foram assignadas 1.066 codificações, em 30 códigos diferentes,
atribuídos a partir das categorias analíticas pré-definidas como dimensões do Sistema
Nacional de Inovação de Energia Elétrica Solar Fotovoltaica nos níveis de Paisagem

124
Sociotécnica, Regime Sociotécnico e Nichos Tecnológico. O Quadro 8 mostra o total
de menções por categoria analítica. A partir da análise dos resultados, retirou-se os
códigos que possuíam menos de 15 menções cada (resultado irrelevante frente a
distribuição total dos dados), resultando em um total de 20 códigos de categorias
analíticas. Os 10 itens eliminados foram somados a outros temas correlatos,
utilizando-se o critério de aproximação semântica e de significado, com a finalidade
de auxiliar na análise de dados e eliminar os elementos sem relevância.
Categoria Analítica Total
Incentivos Financeiros e Fiscais 145
Iniciativas Governamentais 88
Políticas Governamentais 86
Indústria Nacional 83
Microgeração - geração distribuída 63
Novas Tecnologias 57
Transferência da Tecnologia 53
Formação de Novos Mercados 46
Pesquisa e Desenvolvimento 45
Potencial da Tecnologia 44
Estratégias Globais 43
Mudanças Estruturais 39
Aspectos Normativos, Cognitivos e Regulatórios 32
Demanda de Mercado 30
Produção e Difusão do Conhecimento 28
Metas do Governo 27
Feed-in 23
Profissionalização do Setor 18
Educação Formal 16
Mobilização dos Recursos 15
Radiação Solar 14
Aspectos Econômicos 13
Potencial de outras fontes de energia 13
Agenda de Pesquisa para o Setor 12
Inovação 12
Atividades Empreendedoras 5
Benefícios da Tecnologia 5
Nichos de Mercado 5
Fluxo de Informação e Cooperação entre os atores 3
Network 3

Quadro 8 – Total de codificações por categoria analítica


Fonte: Elaboração própria

Os resultados de codificação para os itens: “Agenda de Pesquisa para o Setor”,


“Fluxo de Informações e cooperação” e “Network” foram adicionados à categoria
analítica “Pesquisa e Desenvolvimento”. Os itens: “Nichos de Mercado”, “Atividades
Empreendedoras” e “Aspectos Econômicos” foram adicionados à categoria analítica
“Formação de Novos Mercados”. Os itens: “Benefícios da Tecnologia” e “Inovação”

125
foram adicionados à categoria analítica “Novas Tecnologias e Inovações”. Por fim, os
itens: “ Potencial de outras fontes de energia” e ”Radiação Solar” foram adicionados à
categoria analítica “Potencial da Tecnologia”. Com estas alterações, identificou-se as
relações entre as 20 categorias analíticas mais relevantes, com o auxílio do software
Atlas.ti 7, conforme ilustra a Figura 14.

Figura 14 – Categorias analíticas do SNI para energia solar fotovoltaica no Brasil

Fonte: Elaboração própria


A análise das relações entre as categorias analíticas dividiu-se em cinco
elementos mais centralmente conectados do sistema, ou seja, a análise foi dividida
em 5 partes, destacadas em cores na Figura 14:
1. Iniciativas Governamentais
2. Pesquisa e Desenvolvimento
3. Novas Tecnologias e Inovações
4. Formação de Novos Mercados (Nichos)
5. Indústria Nacional
Esta divisão se fez necessária tão somente para fins de análise. Vale destacar
que a maioria das categorias analíticas encontra-se conectada umas às outras e mais
de uma vez, o que reforça o caráter multi-causas, multi-níveis, multi-domínios, multi-

126
atores e multi-fases das transições tecnológicas proposto por Loorbach (2007), que
descreve tais transições como caracterizadas por um comportamento não linear. A
seguir apresenta-se cada um os recortes da análise dos dados. Importante destacar
que o fato de uma categoria analítica ser analisada em uma das cinco divisões não
significa que a mesma não possa integrar total ou parcialmente alguma outra ou ainda
todas as demais categorias, uma vez que a conexão entre elas e a densidade das
relações é bastante intensa. A seguir apresenta-se a análise das cinco categorias
mencionadas:

4.4.1 Iniciativas Governamentais

As iniciativas governamentais foram agrupadas a seis diferentes categorias


analíticas: “Aspectos Normativos, Cognitivos e Regulatórios”, “Microgeração –
Geração distribuída”, “Políticas Governamentais”, “Incentivos Financeiros e Ficais”,
“Feed-in” e “Metas do Governo”, conforme ilustra a Figura 15.

Figura 15 – Categorias analíticas – iniciativas governamentais

Fonte: Elaboração própria

Aspectos Normativos, Cognitivos e Regulatórios


Entre as principais Normas e Resoluções que impactam na EESFV destacam-
se a Resolução Normativa No 482/2012 e a Resolução Normativa No 481/2012. Apesar

127
de não serem especificamente voltadas para a geração de energia elétrica solar
fotovoltaica, tais resoluções introduziram aspectos fundamentais para a instalação da
EESFV no Brasil nas áreas de Geração Centralizada e Geração Distribuída (Micro-
geração), respectivamente ao se constituir como o primeiro passo por parte de uma
instituição governamental brasileira para fomentar a geração deste tipo de energia.
Mais recentemente a Agência Nacional de Energia Elétrica publicou a
Resolução Normativa No 687/2015, que objetiva reduzir o tempo para a conexão da
Microgeração (que envolve uma potência instalada de até 75kW) e Minigeração
(potência instalada entre 75kW e 5MW).
As políticas e medidas governamentais voltadas para a eficiência energética
estão divididas em quatro áreas principais: políticas transversais, de transporte, da
indústria, de edificações e da agricultura. No que se refere às políticas transversais
destacam-se: o Plano Nacional de Eficiência Energética, o Programa Nacional de
Conservação de Energia Elétrica – PROCEL, o Reluz e o Inova Energia (PNE, 2015).
As políticas públicas cumprem um papel central para a disseminação da tecnologia,
conforme completa o entrevistado:
Políticas públicas podem ser você promovendo a competição como você fez
com os leilões de energia eólica. Pode ser você fazendo uma regulação que
permita […] que viabilize modelo de negócio, então você cria um ambiente
através de políticas públicas, não necessariamente dando incentivos.
Eventualmente, um incentivo fiscal, coisa... assim, pontual, eles podem fazer
parte da solução. Não estou querendo excluir nada [...] Por exemplo, você
precisa da escala, então você fazer os leilões é importante (Entrevista com o
Diretor de Pesquisa da EPE).

Ao estudar a governança multi-nível para a energia renovável na Inglaterra,


Smith (2007) destaca a complexidade dos sistemas de energia renováveis, que
dependem de uma negociação entre os diversos “parceiros” públicos, privados e
sociedade em termos de processos de inovação necessários, desenvolvimento de
negócios, envolvimento da comunidade, produção de conhecimento, provisão de
infraestrutura necessária, comunicação, regulamentação, criação de Mercado e o
estabelecimento de politicas para sistemas de energias sustentáveis.
Os aspectos normativos e regulatórios possuem um impacto muito grande na
velocidade e na intensidade da transição de uma tecnologia e para a EESFV este
processo não é diferente. As normas e regulamentações contribuem para a

128
padronização das atividades do setor, bem como para a profissionalização e para o
desenvolvimento da tecnologia. As principais Normas brasileiras para aplicação no
setor fotovoltaico e termossolar são provenientes da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT) e estão detalhadas no Quadro 9.

Norma Descrição

ABNT NBR Classifica os sistemas de conversão fotovoltaica de energia solar em


11704 (2008) elétrica, quanto a sua configuração (puros, só utilizam gerador fotovoltaico
ou híbridos, utilizam gerador fotovoltaico com outros tipos de geradores de
energia elétrica) e, quanto a sua interligação com o sistema público de
fornecimento de energia elétrica (podendo ser isolados ou conectados à
rede elétrica).
ABNT NBR Especifica os requisitos de durabilidade (incluindo resistência mecânica),
15747-1 (2009) confiabilidade, segurança e desempenho térmico dos coletores solares de
aquecimento de líquidos. Também inclui disposições para a avaliação das
conformidades com esses requisitos;
ABNT NBR Especifica os métodos de ensaio para a validação dos requisitos de
15747-2 (2009) durabilidade, confiabilidade, segurança e desempenho térmico dos
coletores solares de aquecimento de líquidos, conforme ABNT NBR 15747-
1.
ABNT NBR Especifica os requisitos e os critérios para aceitação de módulos
11876 (2010) fotovoltaicos para uso terrestre, de construção plana e sem
concentradores, que utilizem dispositivos fotovoltaicos como componentes
ativos, para converter diretamente a energia solar radiante em elétrica;
ABNT NBR IEC Fornece um procedimento de ensaio para avaliar o desempenho das
62116 (2012) medidas de prevenção de ilhamento utilizadas em sistemas fotovoltaicos
conectados à rede elétrica;
ABNT NBR Estabelece as recomendações específicas para a interface de conexão
16149 (2013) entre os sistemas fotovoltaicos e a rede de distribuição de energia elétrica
e estabelece seus requisitos.
ABNT NBR Especifica os procedimentos de ensaio para verificar se os equipamentos
16150 (2013) utilizados na interface de conexão entre o sistema fotovoltaico e a rede de
distribuição de energia estão em conformidade com os requisitos da ABNT
NBR 16149.

Quadro 9 – Principais normas brasileiras fotovoltaicas e termossolares


Fonte: Adaptado de Alves et al (2014)

Importante destacar o papel que as Normas Técnicas possuem no processo de


profissionalização do setor, ao regulamentar e padronizar a atividade.

129
Microgeração – Geração distribuída
A Microgeração ou geração distribuída envolve unidades de geração de até
75kW e é aplicada em pequenos sistemas residenciais ou comerciais.

O termo geração distribuída aplica-se a sistemas de pequeno porte instalados


em residências, unidades comerciais ou unidades industriais para atender
parte da demanda local. Nesta configuração, os sistemas fotovoltaicos são
usualmente instalados no telhado da unidade consumidora, reduzindo as
perdas de energia com transmissão e distribuição – pois são ligados
diretamente à rede de distribuição já existente, junto aos pontos de consumo
da energia (CAMARGO, 2015, p. 27).

No meio rural ou em locais de difícil acesso, a geração local de energia pode


trazer muitas vantagens econômicas e logísticas, comparativamente à extensão da
rede elétrica. Este tipo de sistema se constitui como soluções para fornecimentos de
energia elétrica em comunidades isoladas como por exemplo na Amazônia e podem
ser financiados pelo programa Luz para todos do Governo Federal em até 85% dos
custos (WWF BRASIL, 2016).

Foi possível verificar que a geração distribuída é entendida por atores


representantes dos três níveis do sistema nacional de inovação como um dos
elementos fundamentais para o desenvolvimento da tecnologia de EESFV no Brasil,
mencionados juntamente com a geração centralizada. Muitos mencionam a
complementariedade das duas formas de geração.

A solar vai trazer uma grande revolução na geração distribuída, no mercado


da distribuidora. Isso já está começando a acontecer. Vai tornar a rede
necessariamente mais inteligente (Entrevista Diretor de Relações
Institucionais – CPFL Renováveis).

A solar se encaixa muito bem tanto na geração centralizada quanto na geração


distribuída. Então ela tem uma tendência de crescer muito mais rapidamente.
O governo sabe que ele precisa aumentar o parque energético, se o governo
tivesse crescido o que prometeu em campanha e pelos estudos não teriam
crescido por causa da questão energética porque o crescimento econômico
tem que estar associado ao crescimento energético. Tem uma pesquisa que
fala que se você aumentar um ponto percentual de crescimento econômico
você precisa de dois a três de energia elétrica. (Entrevista com engenheiro da
Elco).

130
Políticas Governamentais

A dimensão das Políticas Governamentais foi separada das iniciativas por uma
questão de escopo e abrangência do conceito, uma vez que nem todas as iniciativas
para fomento da tecnologia referem-se à políticas elaboradas por instituições
governamentais, apesar de que toda política governamental está contida nas
iniciativas governamentais.

O que foi possível observar sobre esta questão durante a coleta de dados é
que, culturalmente, existe uma expectativa muito grande da maioria dos atores sobre
o desenvolvimento de políticas governamentais, o que chega a ser mencionado por
muitos dos entrevistados como sendo uma “obrigação” do governo e sem a qual o
desenvolvimento e a transferência da tecnologia de EESFV ficaria impossibilitado de
ocorrer:

Incentivos governamentais são essenciais. Até, pelo fato de que historicamente, os


outros países desenvolveram essas tecnologias por incentivos. Então, depois do
incentivo dos EUA, que se deu o “boom” solar. Depois do incentivo da Alemanha,
que se deu o “boom” solar. Depois o incentivo da China, que se deu o “boom” solar.
Então, os incentivos, eles acabam sendo fundamentais no processo. (Entrevista
com CEO – 3BEnergy)

As políticas governamentais tais como os programas de incentivo ao uso e


disseminação de energias renováveis trazem, como toda inovação, seus impactos no
sistema de inovação ao qual pertencem. Perez (2004) comenta que o impacto
generalizado de um novo sistema tecnológico provém da "ampla adaptabilidade" das
inovações contribuintes em suas múltiplas facetas. Estas contribuições não são
apenas tecnológicas. Cada sistema de tecnologia reúne inovações tecnológicas em
insumos, produtos e processos, que resultam em inovações organizacionais e
gerenciais, podendo induzir à mudanças importantes nas esferas social, institucional
e até mesmo política. No caso dos programas Procel (Programa Nacional de
Conservação de Energia Elétrica – promove o uso eficiente da energia elétrica) e o
Reluz (Programa Nacional de Iluminação Pública Eficiente – promove eficiência
energética na iluminação pública), pode-se dizer que os impactos foram econômicos,
comportamentais e também culturais, pois grande parte dos atores envolvidos no
sistema, incluindo os consumidores finais, tomaram conhecimento da inovação e

131
muitos passaram a tomar suas decisões de compra com base nas informações
decorrentes destas iniciativas, seguindo a orientação dos programas.

Dados da Eletrobrás destacam que somente no ano de 2014 o PROCEL


contribuiu para uma economia de 10,5 bilhões de quilowatts-hora (kWh), o equivalente
a 2,2% de todo o consumo nacional de energia elétrica do ano e que representa o
consumo anual de energia elétrica de aproximadamente 5,25 milhões de residências
brasileiras. Complementarmente, tem-se que os reflexos proporcionados pelo
programa na questão ambiental também foram significativos, pois as emissões de
gases de efeito estufa evitadas pela economia proporcionada em 2014 pelo Procel
alcançaram 1,425 milhão de toneladas de CO2 equivalentes, o que corresponde às
emissões de 489 mil veículos durante um ano (ELETROBRÁS, 2015).

Grandes obras construídas para a Copa do Mundo de 2014 tais como os


estádios Arena Fonte Nova, em Salvador (BA), a Arena Castelão, em Fortaleza (CE)
e o Estádio Mineirão (MG) receberam o reconhecimento do GBC (Green Building
Council) como edificações LEED (Leadership in Energy and Enviroment Design), que
certifica construções sustentáveis pelo fato de todas possuirem painéis fotovoltaicos
em seus projetos. Segundo Faria (2014) o Brasil é o quarto país no mundo na
quantidade de registros de certificações do GBC (ONG que promove construções
sustentáveis), entre os 143 países que participam. Cabe destacar que o efeito que as
políticas e ações governamentais para a transição da tecnologia de EESFV
apresentam incertezas quanto à sua trajetória futura, uma vez que dependem de
padrões de hábitos/usos de energia elétrica e adicionalmente é condicionada por
fatores técnicos, econômicos e regulatórios do Sistema ao qual pertencem.
Incentivos Financeiros e Fiscais - Feed-in

Um dos atores centrais no processo de oferta de incentivos financeiros para


fomento da energia elétrica fotovoltaica no Brasil é o BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social), cujo principal incentivo é o Fundo Clima, que
oferece financiamento com taxa de juros atrativas para aplicações em energias
renováveis, com prazo de amortização de até 20 anos.

132
Já entre os incentivos fiscais pode-se mencionar o CONFAZ (Conselho
Nacional de Política Fazendária) Convênio Nº 101/1997 e Convênio ICMS Nº16/2015,
ambos com objetivo de redução de ICMS para equipamentos e componentes e torna
a autogeração economicamente vantajosa para o consumidor. Ainda em termos de
incentivos fiscais pode-se citar o REIDI (Regime Especial de Incentivos para o
Desenvolvimento da Infraestrutura), voltado para pessoas jurídicas que tenham
aprovado projetos em infraestrutura e o PADIS (Programa de Apoio ao
Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores), que envolve
incentivos para equipamentos e componentes elétricos envolvidos nos sistemas
solares fotovoltaicos.

Infraestrutura de forma geral, é prioridade máxima do banco, e aí quando a


gente fala prioridade máxima do banco, em relações de financiamento, se
traduz em melhores condições financeiras. Então, são prazos mais longos de
financiamento e taxas de juros menores, e aí a gente concentra a nossa... o
nosso custo financeiro ser mais baixo que é a taxa de juros de longo prazo […]
(Entrevista com o Gerente de Energias Renováveis do BNDES).

A questão dos tributos que incidem sobre o sistema de compensação utilizado


no Brasil foi criticada por vários entrevistados, que opinam que o sistema atual não é
motivador, uma vez que, ao consumir energia da concessionária, a unidade geradora
paga impostos pela energia que ela mesma disponibilizou na rede elétrica, prática
considerada inaceitável entre os países que implantaram políticas robustas de
incentivos para o desenvolvimento da EESFV.

Existe uma grande diferença entre a política adotada no Brasil, que é o sistema
de compensação, e a política nos países que realmente alavancaram na
fotovoltaica, que utilizaram a tarifa prêmio ou feed-in. Seria aquela política de
preços diferenciados entre o custo da energia e o que o produtor de
fotovoltaica entrega. Então, Alemanha, Japão, Itália, Espanha, trabalham com
tarifa prêmio, diferente do net metering que no Brasil foi chamado de sistema
de compensação. Isso já dá uma diferença muito forte, enquanto essa é uma
política de governo para acelerar esse tipo de instalação no país […] já é uma
política menos arrojada, digamos assim. Temos ainda um agravante no Brasil:
além da gente usar o net metering, nós temos alguns tributos que incidem
sobre essa troca de energia. E isso, é um agravante bastante sério. Nós temos
a incidência de PIS, COFINS e ICMS quando você consome a energia da
concessionária, coisa que em outros países que utilizam net metering, isso é
inadmissível. Não se tem tributos sobre essa energia (Entrevista com professor
especialista da UTFPR).

133
A cobrança de 29% de ICMS sobre a energia consumida pelo usuário no
Paraná é uma das mais altas do país. O estado está fora da lista dos estados que
aderiram à isenção do imposto, o que pode fazer com que o Paraná fique fora do
“boom” nacional em termos de microgeração para a EESFV (GUADAGNIN, 2016).

O fato de não existir isenção de ICMS no Paraná para a microgeração foi


apontado como uma barreira forte para o desenvolvimento desta tecnologia no
Estado, em alguns casos podendo, inclusive, inviabilizar o projeto.

A questão dos impostos, na compensação de energia […] para projetos


residenciais chega a inviabilizar o projeto porque no setor residencial o maior
momento que você está gerando não é o momento que você está consumindo.
Grande parte da energia que você gera vai para a rede elétrica e, ao usar no
período da noite, tem a questão dos impostos, da tributação.[…] Joga o teu
retorno em um sistema residencial que às vezes está em cinco anos para dez
(Entrevista com engenheiro da ELCO).

O Feed-in Tariff (também conhecido por FITs) se constitui em uma série de


medidas de incentivos que recompensam financeiramente os usuários de energias
renováveis e se constitui em uma prática historicamente muito utilizada em países
maduros em termos de trajetória tecnológica da energia elétrica solar fotovoltaica, tais
como Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. Em virtude deste histórico, a temática
aparece com frequência entre atores dos três níveis do sistema nacional de inovação
ao se mencionar elementos de incentivo ao uso e disseminação da energia
fotovoltaica para Brasil. Vale destacar que nenhum dos entrevistados considera a
questão do Feed-in-Tariff uma medida adequada à realidade do Brasil e destacam
que esta medida faz sentido em países com baixa irradiação solar, que não é o caso
do Brasil:

É claro que a realidade é bem diferente da nossa, por exemplo o feed in, que... que
muitos países... A gente não considera uma opção factível (Entrevista com Diretor
de pesquisa da EPE)

Metas do Governo

O Programa de Desenvolvimento da Geração Distribuída de Energia Elétrica


possui duas metas relacionadas ao desenvolvimento da EESFV: 1. Na Matriz de

134
Energia Elétrica Nacional, a Meta é Alcançar 23% de participação de energias
renováveis (além da energia hídrica) no fornecimento de energia elétrica. 2. Na Matriz
Energética a meta é atingir a participação de fontes renováveis, além da energia
hídrica, de 28% a 33% até 2030 (PROGD, 2015).
As Metas estabelecidas pelo governo em termos de energias renováveis são
desafiadoras. O Profinfa (Programa de Incentivos às Fontes Renováveis possui como
meta alcançar 10% do consumo anual de energia do Brasil com fontes de origem
renováveis e já conseguiu contribuir para o avanço da implementação de tais
tecnologias no país ao criar uma demanda de mercado para as mesmas e atrair
investidores para contemplar as metas do programa de implantar 144 usinas, sendo
63 PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas), 54 usinas eólicas e 27 usinas de
biomassa que juntas somam 3,29 milhões de KW (WWF BRASIL, 2015).
O estabelecimento de metas claras em termos de aumento da EESFV na matriz
energética nacional foi apontado por muitos entrevistados como uma das formas de
se trazer segurança para futuros investidores desta tecnologia, além de estimular o
desenvolvimento da indústria nacional para este setor e por isso resultou em uma das
categorias analíticas mais citadas pelos entrevistados.
Em um horizonte de até 5 anos nós já temos contratado esta energia que foi o
leilão de 2014 e mais dois leilões em 2015. E para o horizonte do nosso PDE
– 2024 tem uma expectativa de ter instalado, a capacidade instalada, em 2024,
de 8,3 gigawatts de fotovoltaica […] A resolução 482 vai estabelecer um prazo
para que o MME juntamente com os outros órgãos mencionados na portaria
estabeleçam um plano para incentivar também a instalação de painéis
fotovoltaicos em telhados de escolas federais, hospitais, supermercados,
residências e para permitir que estes consumidores vendam este excedente de
energia no mercado livre. Deve caminhar neste sentido aí. (Entrevista com
Secretário de Planejamento do Ministério de Minas e Energia)

4.4.2 Pesquisa e Desenvolvimento

A categoria analítica Pesquisa e Desenvolvimento foi dividida em três


dimensões de análise: “Produção e difusão do conhecimento”, “Profissionalização do
Setor” e “Educação Formal”, conforme ilustra a Figura 17:

135
Figura 16 – Categorias analíticas – pesquisa e desenvolvimento
Fonte: Elaboração própria

Produção e Difusão do Conhecimento


As pesquisas para o desenvolvimento de fontes alternativas de energia, que
sejam menos poluentes, renováveis e com pouco impacto ambiental são
impulsionadas pelo constante aumento da demanda por energia, bem como pela
crescente busca pela preservação ambiental em todos os níveis da sociedade.
“Dentre as diversas fontes de energia elétrica, a energia eólica é que vem recebendo
o maior volume de investimentos por conta do Programa de Incentivo às fontes
Alternativas de Energia Elétrica, coordenado pelo Ministério de Minas e Energia”
(Pereira et al, 2006, p.10).
A questão da produção e difusão do conhecimento, apesar de ser mencionada
por muitos entrevistados como um elemento central para a disseminação da
tecnologia é apontada como um elemento fraco dentro das atividades desenvolvidas
pelos atores que integram o Sistema Nacional de Inovação, que apresenta muitas
oportunidades de integração entre os atores de diversos escopos e níveis para
produção e difusão do conhecimento. Uma das iniciativas para a difusão de
conhecimento entre os atores do setor foi mencionada pela Paraná Metrologia,
instituição ligada ao FIEP (Federação das Indústrias do Estado do Paraná):

136
O que a gente quer agora é criar esse comitê científico com eixos estruturantes,
e eixos temáticos. A gente começa lá tratando das energias, o vento, sol, água
e tal. E aí nas intersecções a gente tem já grupos como esse aqui [...] que vão
tomar, vão discutir esses temas [… ] É preciso ter um espaço onde a gente
organize e centralize informação e possa disseminar informação. Então, a ideia
é criar um portal de energias renováveis. E dentro desse portal existe um
sistema de comunicação online, aí pode ser um fórum, pode ser um outro
instrumento de software, de um software colaborativo por meio do qual os
membros do comitê gestor possam interagir e os membros do comitê científico,
também [...] (Entrevista Paraná Metrologia).

Entre as necessidades de melhorias no processo de integração entre os


diversos atores do sistema nacional de inovação destaca-se a integração entre a
academia (universidades, institutos e centros de pesquisa) com o mercado, ponto que
foi destacado por alguns entrevistados de forma explícita.
Tem pouca integração. Poucos pesquisadores nessa área. Então, na medida
que forem multiplicando os pesquisadores, isso vai ser natural. A partir do
momento em que as particulares contratam um pesquisador, um professor que
tenha essa vertente, ele vai possivelmente tentar criar um laboratório dentro da
universidade (Entrevista com Professor da UTFPR).

A integração entre os diversos atores do Sistema Nacional de Inovação com o


objetivo específico de produção e difusão do conhecimento é um dos aspectos
fundamentais para a transição da tecnologia, porém encontra algumas barreiras
significativas. Uma vez que a academia procura sempre divulgar seus achados, suas
pesquisas, as organizações que atuam neste mercado muitas vezes desejam manter
em sigilo suas tecnologias e novos projetos para não correr o risco de oferecer
informações e subsídios para seus concorrentes, o que resulta em um conflito de
interesses entre os atores, que está relacionado aos diferentes papéis e expectativas
que cada instituição possui dentro do sistema.

Profissionalização do Setor
A questão da necessidade de profissionalização do setor foi um dos elementos
apontados como muito importante, especialmente entre as organizações que atuam
com implantação de projetos de sistemas fotovoltaicos. Tais atores indicam que não
existe uma profissionalização do setor, sendo necessário muitas vezes, ao contratar
um colaborador para atuar nos projetos, escolher um profissional cuja experiência

137
esteja relacionada a instalações elétricas de uma forma mais ampla, como por
exemplo em sistemas de energia eólica e não com uma experiência específica nos
sistemas fotovoltaicos e que este profissional especializado é muito difícil de se
encontrar no mercado.
SENAI, outras instituições que tenham esse perfil de formação de mão de obra
técnica, já começam a ter profissionais que também, de alguma forma ou se
especializaram ou fizeram o mestrado, que já tem uma visão das energias
renováveis. Ele pode não olhar só para a fotovoltaica, mas ele olha para a biomassa,
para a eólica, para a PCH, para a solar, e ele começa a formar essa mão de obra
técnica, também, nessa linha. Então, eu vejo que é uma questão de tempo[...] a
formação de mão de obra tem que ser desde o instalador, do eletricista, do técnico,
do engenheiro, do pós-graduado, para atuar. Ir até a pesquisa. (Entrevista com
professor UTFPR).

Esta lacuna no Sistema Nacional de Inovação pode ser solucionada a partir da


oferta de curso específicos para a área, que ofereçam uma formação sólida e aplicada
a Sistemas elétricos solares fotovoltaicos, tanto para a geração distribuída quanto
para a geração centralizada, o que será abordado na sequência.

Educação Formal
A dificuldade encontrada para a realização de educação formal na área se
constitui na terceira e talvez mais importante lacuna em termos de movimentação do
Sistema Nacional de Inovação do setor para uma profissionalização. Atores dos três
níveis do sistema sociotécnico são unânimes em afirmar que, sem a oferta de cursos
de formação nos níveis técnicos, de graduação, especialização e de mestrado/
doutorado voltados para a tecnologia fotovoltaica, o cenário para a construção de uma
base sólida para a pesquisa e o desenvolvimento de novas tecnologias na área fica
bastante comprometido e a perspectiva de desenvolvimento profissional limitada.
Especialização, e mestrado e doutorado. Agora, quantas universidades pelo país
tem essas linhas? Poucas. Tem a PUC de Porto Alegre, tem a Federal do Rio
Grande do Sul, daí Santa Catarina, a Federal de Santa Catarina. Aqui, na UTFPR,
nós temos essas iniciativas nos últimos anos. Na USP, São Paulo, na Unicamp, na
Federal de Pernambuco e na Federal do Pará […].Eu acho que agora com a...
digamos assim, a partir da Resolução 482 de 2012, o mercado se abriu. Então, hoje
várias universidades já estão se preocupando em durante a graduação, já ofertar
alguma coisa ( Entrevista com professor UTFPR).

Você pega qualquer engenheiro formado em uma boa universidade em engenharia


elétrica o que ele aprendeu em todo o curso foi trabalhar com hidrelétrica. Então,

138
você vai para uma área que é cara, você não tem mão de obra capacitada para
trabalhar […] Na graduação não tem uma matéria para falar de energia solar. Agora
o prof Jair criou um curso de especialização, que é um opcional que eu fiz que é na
área de energias renováveis. É uma questão de momento. (Entrevista com
engenheiro da Elco).

O reconhecimento da necessidade de se estabelecer programas formais de


educação em todos os níveis é um sinal do amadurecimento do sistema em termos
de reconhecimento das lacunas e identificação de possíveis soluções. Hoje no Brasil
os cursos de curta duração voltados para a instalação de sistemas fotovoltaicos tem
se multiplicado, uma vez que a demanda por profissionais especializados também
aumenta. Porém, existe uma necessidade não atendida no setor por cursos de maior
duração, com foco em uma formação profissional mais completa e integrada e que
pudesse atender às necessidades do mercado de uma forma mais efetiva.

Novas Tecnologias e Inovações

Figura 17 – Categorias analíticas – novas tecnologias e inovações


Fonte: Elaboração própria

Segundo Dolata (2013) não é a mudança tecnológica em si que é analisada e


explicada, mas sim as transformações organizacionais, estruturais e institucionais
associadas a esta mudança. Neste sentido, o autor investiga os processos de
transformação socioeconômica acionados e significativamente moldados a partir do
surgimento de tecnologias radicalmente novas.
As motivações que levam as organizações a empreender os arriscados
processos de busca e a delinear as condições de ruptura com soluções tecnológicas
prévias envolvem uma busca pela criação de posições diferenciadas de mercado,
objetivando a busca pela valorização contínua de seus recursos. Busca-se uma
construção de diversidade e sobrevivência. A competição capitalista que fundamenta

139
a lógica do comportamento inovativo é, por sua vez, fator necessário para a operação
do mecanismo de seleção do ambiente no qual atuam (CORAZZA; FRACALANZA,
2004).
Em termos de inovação, pode-se afirmar que o Sistema Nacional de Inovação
se apresenta em fase de consolidação, sendo a política de CTI (Ciência, Tecnologia
e Inovação) uma iniciativa relevante, porém não exaustiva de desenvolvimento de
novas tecnologias para o setor de energia como um todo. Há indícios de que a
estratégia nacional desenvolvida pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
desenvolva um ambiente propício à novas tecnologias, porém a contribuição
estratégica nacional para a inovação no setor de energia não pode ser demonstrada
de forma transparente devido a ausência de um aparato institucional que favoreça a
visibilidade dos resultados (SILVEIRA, CARVALHO, KUNZLER, CAVALCANTE E
CUNHA, 2016).
Ao mencionar as barreiras para a transferência desta tecnologia, a questão
cultural surge em primeiro lugar. Isso acontece porque poucas pessoas conhecem um
sistema elétrico fotovoltaico. Além disso, muitas pessoas pensam que se trata de um
sistema para aquecimento da água, pois esta é uma aplicação da tecnologia que
historicamente e culturalmente já está mais difundida no país.

A primeira barreira acho que é cultural, o pessoal ainda não conhece. É um trabalho de
divulgação ainda. A gente participa muito de feiras, congressos e a gente vê assim que
o engenheiro eletricista não conhece. Imagine... se o engenheiro eletricista ainda não
conhece, imagina o público em geral... Então, o pessoal tem ainda aquela desconfiança
se vai funcionar, se não vai funcionar. E o segundo ponto que eu digo que dificulta
muito é a falta de linhas de financiamento […] (Entrevista com Engenheiro da empresa
ELCO).

Existe uma barreira cultural, […] tem dias que eu chego em casa sem voz, sem voz,
porque o dia inteiro, “ ó, isto não esquenta água, isto gera energia elétrica”, e é sempre
esse papo, sabe, criar cultura. Hoje, o meu trabalho, não é vender fotovoltaico, vender
renovável, é criar cultura, e essa é a função macro aqui da empresa, sabe? Então, a
dificuldade é cultural. (Entrevista com CEO da empresa Compactcia).

Esta associação do sistema de energia solar fotovoltaica a um sistema


termossolar possui suas raízes na vasta utilização de painéis solares para o
aquecimento da água, especialmente para uso residencial e se constitui uma barreira

140
cultural importante para a efetiva transferência da tecnologia. A mudança cultural é
um processo que pode levar tempo e exigir um certo esforço dos atores do sistema
em termos de divulgação e conscientização das novas tecnologias. Embora as
transições sejam caracterizadas por um comportamento não-linear, o processo de
inovação de sistema em si é gradual. Transições envolvem mudanças estruturais, mas
nem tudo muda. O que muda fundamentalmente são as premissas, práticas e regras.
As mudanças tecnológicas podem ser secundárias, o que é uma maneira diferente de
se olhar para as transições do que a forma como maioria das pessoas as observam,
especialmente os engenheiros, que estão mais inclinados a ver apenas as mudanças
tecnológicas (KEMP; ROTMANS, 2010).

4.4.3 Formação de Novos Mercados (Nichos)

Figura 18 – Categorias analíticas – formação de novos mercados (nichos)


Fonte: Elaboração própria
Apesar de receber o maior volume de investimentos, boa parte do território
nacional não apresenta condição de vento adequada para a geração de eletricidade.
Por outro lado, o país possui grande potencial para aproveitamento de energia solar,
o que viabiliza o desenvolvimento social e econômico de regiões remotas e auxiliaria
na redução das emissões de gases poluentes. Segundo Pereira et al (2006), existem
dois fatores fundamentais para o aproveitamento de todo o potencial econômico da
energia solar no país, sendo o primeiro o desenvolvimento de tecnologia competitiva
de conversão e armazenamento desta fonte de energia e segundo consiste na
consolidação de informações seguras e da política energética do país, uma vez que
grande parte dos potenciais investidores do setor energético não dispõe das

141
informações necessárias, o que faz com que eles evitem o risco.
A Formação de Novos Mercados (Nichos) foi dividida em três elementos para
fins de análise: “Estratégias Globais”, na qual se verifica as estratégias adotadas por
outros países e mercados, a “Demanda de mercado”, que identifica a atual situação
do país em termos de demanda por este tipo de tecnologia, bem como identifica novas
oportunidades e o “Potencial da tecnologia e irradiação”, que verifica em termos
técnicos o nível potencial de atingimento da tecnologia de energia elétrica fotovoltaica.

Estratégias Globais
Uma questão que muitas vezes surge nos debates da área está relacionada
aos motivos pelos quais o Brasil não desenvolveu uma base sólida para a
consolidação da EESFV, uma vez que possui ampla incidência de radiação solar e
seria um potencial mercado muito forte para esta tecnologia. Em contrapartida, países
nos quais os índices de irradiação solar são muito inferiores como por exemplo na
Alemanha, esta tecnologia se desenvolveu muito mais rapidamente. Isso acontece
porque no Brasil, a matriz energética já está amplamente estabelecida sob a energia
renovável proveniente das hidrelétricas, conforme já detalhado nos aspectos
históricos do capítulo 2, diferentemente dos EUA e muitos países da Europa, que
possuíam a sua matriz baseadas principalmente em energias não renováveis,
altamente poluentes e que demandavam um esforço muito grande em termos
ambientais e econômicos, exigindo uma tomada de decisão para a transição
energética com horizonte de longo prazo. O custo da EESFV era muito mais alto do
que da energia hidrelétrica e o Brasil não tinha uma carência de recursos em termos
de geração de energia elétrica, fato que foi apontado por vários entrevistados:
Os EUA criaram métodos e mecanismos governamentais e sempre tiveram um
mercado muito constante na área solar. A hora que os EUA implementaram o
programa de governo, deu três anos, os EUA cresceram mais de cem mil por
cento […] Ou seja, os EUA aliam um mercado crescente, mas muito constante.
E após esses incentivos governamentais, houve um “boom”. Os incentivos
surgiram justamente para isso. Primeiro pelo interesse político, depois pelas
questões de poluição. Alemanha e China tem questões muito parecidas. Mas,
aí na Alemanha, eu acrescentaria um outro ponto, que a Alemanha compra
muita energia de fora. Existe aí, uma dependência de outros países,
principalmente na Europa, porque eles não têm muitos recursos, o país é muito
pequeno (Entrevista com CEO – 3BEnergy).

142
Eu vejo assim que é muito questão de momento, eu vejo as vezes o pessoal
criticando muito que o Brasil está atrasado em relação ao fotovoltaico, eu tenho
uma opinião um pouco diferente sobre a fotovoltaica. Se você for pegar por
exemplo a Alemanha, por que ela saiu na frente? A Alemanha há 20 anos atrás
estava passando por um momento no qual o parque energético estava com
uma demanda muito grande e ela não tinha para onde correr. Ela precisava
ampliar e as alternativas seriam para questões térmicas ou nuclear, tanto é
que a Alemanha criou várias usinas nucleares, mas eles não queriam ir por
este caminho. Se você pegar o Brasil a gente tinha e ainda tem muitos rios
disponíveis então a gente começou a instalar hidrelétrica. A gente tinha muita
carga disponível, a gente tinha rios adoidado aí para instalar hidrelétrica e a
gente dominava a tecnologia. Hoje o Brasil é referência, junto com o Canadá
e a China na questão hidrelétrica. Há 5, 10 anos atrás construía-se a 70 / 80
reais o megawatt enquanto a solar passava de mil. E a gente não tinha
tecnologia para isso. Por que iríamos investir em um negócio que era mais de
10 vezes o preço se não havia falta de energia, a hidrelétrica era algo seguro
que a gente conhecia […] Então, você vai para uma área que é cara, você não
tem mão de obra capacitada para trabalhar, não era o momento do Brasil
entrar (Entrevista com engenheiro da ELCO).

A tarifa prêmio ou Feed-inTarrif já detalhada anteriormente é uma política que


foi amplamente utilizada em países nos quais a EESFV apresentou uma trajetória de
inovação completa, tais como Espanha e Alemanha. Muitos atribuem a baixa
irradiação solar destes países como um dos fatores que os “obrigaram” a adotar esta
estratégia, uma vez que a necessidade de substituição das fontes de origem fóssil era
uma prioridade em muitos países e, sem incentivos financeiros robustos, a
microgeração não teria ocorrido de forma tão intensa.
Internacionalmente, a tarifa prêmio é fundamental. A Alemanha não é líder em
instalação, só porque a população é mais amigável ambientalmente. É porque
financeiramente, é muito vantajoso. Agora, é ilusão de pensar que nós vamos
ter no Brasil, uma política de tarifa prêmio, como na Alemanha e outros países.
Porque mesmo quem iniciou com tarifa prêmio, gradativamente, eles estão
indo para o net metering […] Quando iniciou a política de tarifa prêmio, o
governo alemão tinha um alvo de quanto de fotovoltaica ele quer que instale.
A cada ano, eles vão diminuindo o valor da tarifa prêmio. Por que eu já tenho
uma massa, uma meta, aí começa a diminuir (Entrevista com professor
UTFPR).

Demanda de Mercado

A instalação de uma indústria nacional no país voltada para a produção de


sistemas fotovoltaicos depende de geração de demanda, que, por sua vez, deve ser
garantida em larga escala para que se diminuam os riscos e o mercado seja atraente

143
para o investidor. A demanda em larga escala depende essencialmente dos leilões
para fontes alternativas focadas em energia elétrica fotovoltaica e faz-se necessário o
estabelecimento de metas de expansão da tecnologia nos leilões, que apesar de
terem sido um sucesso em 2010 e 2011 não contam com um compromisso de médio
e longo prazo por parte do Ministério de Minas e Energia para continuidade no
processo de expansão desta fonte.

A lógica dos leilões é para dar a sustentação para a implantação de uma


indústria. Então, no caso da fotovoltaica, vai ter que haver outros leilões para
você manter uma indústria, uma escala industrial que você permita que a
indústria se desenvolva no Brasil. Então, já foram feitos três leilões que estão
aí com 2.600 megawatts contratados e o planejamento é manter o nível para
novos leilões para que a indústria efetivamente se estabeleça no Brasil. Nossa
perspectiva dentro do PDE – Plano Nacional de Expansão da Energia em 2024
é termos algo em torno de 8,3 gigawatts de capacidade instalada de geração
fotovoltaica[...] (Entrevista com Secretário de Planejamento do Ministério de
Minas e Energia)

A tecnologia utilizada para a produção de sistemas fotovoltaicos é muito similar


entre todos os mercados do mundo, o que oferece vantagens e desvantagens. Entre
as principais vantagens está a maior facilidade de transferência da tecnologia e a
equalização dos mercados em termos de equipamentos e sistemas fotovoltaicos. Já
as desvantagens giram em torno da dificuldade de competição em mercados nos
quais não se atingiu alta demanda de mercado e, consequentemente, larga escala de
produção. A questão da necessidade de se atingir larga escala é apontada como um
dos elementos essenciais para a instalação de uma indústria nacional no país voltada
para este setor.

O nome do jogo é escala. Na eólica a gente vê ainda que de fato, escala


também é importante, mas você tem várias tecnologias e todas elas são
competitivas. É interessante isso. Você tem, por exemplo, um fabricante que
tem uma alta tecnologia, mas o custo dele também é alto, e às vezes o seu
projeto vencedor não é esse, o seu projeto vencedor é aquele de uma empresa
que tem um equipamento de média performance, mas com um custo muito
competitivo. E aí, no balanço, ele passa a ser o vencedor. Já na solar, eu não
vejo a coisa dessa forma. A tecnologia é uma só, o painel é feito de um jeito
só no mundo inteiro... não se tem um dilema de várias tecnologias, então, a
variável de competitividade é a variável de produção, é a quantidade. Então,
você vai ter uma grande indústria... (Entrevista com o Diretor de Relações
Institucionais CPFL Renováveis).

144
Potencial da Tecnologia e Irradiação
O potencial cumulativo até 2030 para a energia fotovoltaica no Brasil é de
geração de 48 milhões de MWh, o que representa metade de Itaipu em um ano. Existe
um potencial de investimento de R$100 bilhões e adesão de 2,7 milhões de unidades
consumidoras em termos de geração distribuída, o que representa uma redução na
emissão de 29 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera (PROGD, 2015).

Para se ter uma dimensão do potencial de geração da energia solar fotovoltaica,


caso o lago de Itaipu fosse coberto com painéis fotovoltaicos (assumindo a
radiação solar da região do lago), a geração seria de 183 TWh/ano, o que
representaria aproximadamente 45% do total consumido pelo Brasil em 2008
(Rüther, 2011)

Apenas 5% da capacidade total instalada de geração de eletricidade utiliza


fontes renováveis alternativas de PCH’s, eólica, biomassa, solar, sendo que os 95%
restantes correspondem às fontes tradicionais como grandes e médias hidrelétricas,
além de nuclear, termelétricas, óleo diesel e carvão mineral (WWF BRASIL, 2016). O
Brasil possui um potencial enorme para geração de EESFV por ser um dos países
com maior índice de radiação solar mundial, conforme mostra a Figura 20.

Figura 19 – Índice de irradiação solar mundial


Fonte: Solargis (2016).

145
Além da questão da radiação solar no território nacional, o Brasil também
possui importantes reservas de silício, que é uma das matérias primas essenciais para
a produção de painéis solares fotovoltaicos.

Antes de ser utilizado nos painéis solares, o silício necessita ser purificado,
processo que poucas empresas oferecem no mundo e que faz com que esta matéria
prima esteja concentrada nas mãos de poucos fornecedores, concentrados
especialmente na China e nos Estados Unidos. A conjunção dos fatores de radiação
solar e oferta de silício se constitui como uma oportunidade de mercado a ser
explorada no Brasil e que envolve a participação de atores de todos os níveis do
Sistema de Inovação.

Indústria Nacional

Figura 20 – Categorias analíticas – indústria nacional


Fonte: Elaboração própria

A categoria de análise da Indústria Nacional foi dividida em duas dimensões de


análise: “Mudanças Estruturais”, que observa especialmente a necessidade de
mudanças no sistema para a viabilidade da transição da tecnologia e “Mobilização dos
recursos”, que objetivou identificar as diversas maneiras pelas quais os atores
integrantes do SNI utilizam os seus recursos.

Mudanças Estruturais

A criação de dimensões mais amplas nos regimes sociotécnicos leva tempo,


envolvendo novas infraestruturas, novas práticas de usos, novas políticas e novas
organizações. Por fim, os envolvidos tendem a permanecer nas tecnologias antigas

146
por interesses e investimentos já realizados e a defender a si mesmos por meio de
atividades de lobby político ou evasão para outros mercados (Geels, 2004). No caso
do Sistema Nacional de Inovação para a EESFV existem barreiras importantes a
serem transpostas, uma vez que historicamente a matriz energética nacional foi
construída baseada em hidrelétricas, conforme já detalhado nos aspectos históricos
do setor, descritos no capítulo 2.

Os autores Geels, Elzen e Green (2004) comentam que transições são


processos complexos, incertos e que envolvem múltiplos atores e grupos sociais, o
que resulta em incertezas sobre como os decisores, políticos ou não, influenciam nas
inovações do sistema e como identificar possíveis e promissoras indicações para
transições. Os decisores políticos, assim como qualquer outro ator do sistema, possui
poderes limitados, bem como recursos finitos para influenciar a dinâmica do sistema
e, por isso, a gestão da governança significa que existe direcionamento em termos de
coordenação no nível do sistema. Porém, isso ocorre em caráter emergente, surgindo
da interação entre os múltiplos atores da sociedade. “As autoridades públicas podem
tentar influenciar este surgimento, porém não podem direcioná-lo de acordo com sua
vontade” (GEELS, ELZEN e GREEN, 2004, p. 8). As mudança estruturais dependem
da forma como os atores nos diversos níveis do sistema sociotécnico conseguem
transpor a barreira cultural e de resistência tecnológica, bem como de lobby político
que as organizações já estabelecidas no regime impõem sobre os decisores,
compostos especialmente por instituições governamentais tais como a ANEEL, o
MME e a EPE, entre outros, que demonstraram interesse em fomentar a nova
tecnologia por meio de leilões específicos para a energia solar fotovoltaica. As
mudanças ambientais e regulatórias que aconteceram no contexto das hidrelétricas
também foram apontadas como um motivador para a procura por novas fontes de
energia renováveis.

Agora nós estamos com as usinas hidrelétricas e PCHs quase saturadas, as


questões ambientais ficaram muito rígidas, o que acabou encarecendo para se
montar uma PCH. Hoje para você construir uma hidrelétrica, uma PCH você
tem que manter não sei quantos anos o pessoal que está ao redor, fazer
reflorestamento, não que isso esteja errado, mas a questão ambiental ficou
muito mais rígida, comparado ao que era antigamente e está mais difícil
conseguir (Entrevista com engenheiro – ELCO).

147
Tendo em vista este cenário, o ambiente é considerado favorável para a
procura por outras fontes de energias renováveis que não seja a hidrelétrica e traz
uma perspectiva otimista com relação ao futuro desta tecnologia. Uma mudança
estrutural envolve um processo de transição de longo prazo e demanda o
envolvimento de atores estratégicos do Sistema, bem como a legitimação da
tecnologia entre os diferentes níveis do Sistema de Inovação, que passam a identificar
a EESFV como uma oportunidade a ser explorada.

Mobilização dos Recursos

No que se refere aos financiamentos para o fomento ao desenvolvimento da


indústria nacional de painéis fotovoltaicos, estes estão relacionadas a obrigatoriedade
de nacionalização do produto, que, para esta tecnologia, exige um mínimo de 60% de
nacionalização para acesso a financiamentos atrativos como por exemplo, os
ofertados pelo BNDES.

A política do Ministério estabelece condições e necessidade da produção local


dos equipamentos para atendimento a geração de energia fotovoltaica. Então
até as linhas de financiamento estabelecem níveis de conteúdo local para
poder fazer o financiamento. Isso é importante, quem quiser obter
financiamentos para instalação tem que ter um nível de conteúdo de produção
local dos equipamentos. (Entrevista com Secretario de Planejamento do
Ministério de Minas e Energia)

Como a maioria dos painéis utilizados no Brasil é de origem estrangeira,


oriundos principalmente da China e da Europa, o acesso a tais financiamentos
enfrenta uma barreira de transferência da tecnologia para o Brasil. Hoje o país possui
poucas fábricas de módulos fotovoltaicos, sendo apenas uma de porte médio e todas
as demais se caracterizam como montadoras dos sistemas e não como fabricantes,
uma vez que importam todos os componentes e apenas montam o produto no Brasil.

Este cenário tende a mudar com recentes anúncios de investimentos por parte
de investidores estrangeiros em fábricas no Brasil. Em junho de 2016, a empresa
canadense Canadian Solar anunciou a instalação de uma fábrica no Brasil, localizada
na cidade de Sorocaba – SP, com previsão de início de funcionamento em 2017

148
(COSTA, 2016). Além desta empresa, fabricantes chineses também já demonstraram
interesse em atuar no mercado nacional, o que pode modificar o atual cenário da
indústria em pouco tempo no Brasil.

4.5 O ENERGIEWENDE – TRAJETÓRIA DAS ENERGIAS RENOVÁVEIS NA


ALEMANHA

A Alemanha foi escolhida como caso de estudo nesta investigação pelo fato de
que nas últimas décadas, o país tem sido uma referência em termos de modelo de
governança e políticas para a transição de energias renováveis (Renewables Energy
Sources – RES). A política adotada no país para apoio às RES, baseada no modelo
de incentivo financeiro (feed-in tariff model) foi adotada em mais de dois terços dos
estados europeus, e a chamada Energiewende, nome dado ao sistema alemão de
transição energética, é reconhecida mundialmente como um modelo de sucesso e um
dos pioneiros nesta tecnologia.
A análise da transição energética da Alemanha se baseou nos dados coletados
presencialmente durante uma vista de campo no cluster solar Baden_Württemberg,
localizado na cidade de Stuttgard – Alemanha, realizada no dia 05 de abril de 2016,
bem como por meio de informações de dados secundários conforme detalhado na
metodologia desta tese. Para a realização da análise da entrevista, inicialmente a
mesma foi integralmente transcrita respeitando-se fielmente o áudio original em inglês.
Após a transcrição, a entrevista foi traduzida para português e somente então
analisada com o uso da técnica de análise de conteúdo.
A fim de se identificar as temáticas mais presentes durante a entrevista em
profundidade realizada com o CEO do Solar Cluster Baden_Württemberg, realizou-se
a montagem da nuvem de temas, com o auxílio da ferramenta worlde.net. Esta
ferramenta conta e organiza as palavras de um texto em uma nuvem de temas e
coloca o tamanho das palavras de acordo com a frequência de repetição da mesma
no texto. Os resultados mostram com destaque as palavras: “PV”, “energia”,
“Alemanha”, e “eletricidade” e também em uma repetição um pouco menor as palavras
“empresas”, “sistema”, “governo” e “mercado”, conforme demonstra a Figura 22.

149
Figura 21 – Nuvem de temas – entrevista em profundidade Solar Cluster Baden-Württemberg
Fonte: elaboração própria
A política alemã para a transição energética foi criada em 1970. Por volta de
1980, a chamada “Energiewende” surgiu como uma forma de protesto contra a energia
nuclear (ENERGIEWENDE, 2016). A questão do desenvolvimento e aplicação de
energias de fontes renováveis (RES – Renewable Energy Sources) vêm sendo
amplamente incentivada por meio de uma política robusta de incentivo que determina
que todo Killowatt-hora gerado a partir e energias renováveis recebe uma tarifa fixada
de “Feed-in” , bem como a preferência e a prioridade para a alimentação na rede das
fontes de origem renováveis em comparação às fontes tradicionais, além do
recebimento de 20 anos de pagamento garantido para toda a eletricidade produzida
(SÜHLSEN, K.; HISSCHEMÖLLER, M., 2014).
No início, a “Energiewende” era apenas uma visão de contraposição ao
discurso político esquerdista alemão. Porém, com o tempo, esta vertente ganhou
muita força no país e trouxe, a partir do ano 2000, políticas substanciais de apoio às
chamadas “RES”, estabelecendo ambiciosos objetivos de atingimento de 80% do
abastecimento de energia elétrica do país oriundas de fontes renováveis até o ano de
2050. Esta política ganhou mais força a partir do desastre nuclear ocorrido na cidade
de Fukushima, localizada no Japão, em março de 2011. (STRUNZ, 2014; SÜHLSEN,
K.; HISSCHEMÖLLER, M., 2014).

150
Ao analisar a transição de energia na Alemanha a partir de uma perspectiva
sistêmica, Strunz (2014), coloca o Energiewende alemão dentro da abordagem de
resiliência de Walker et al (2004) e faz um comparativo com a perspectiva multinível
de Geels e Schot (2007), conforme ilustra o Quadro 10. A situação de resiliência,
segundo o autor, desperta dois aspectos fundamentais da transição energética, que é
a interdependência mútua de persistência e mudança e a interação dinâmica dos
processos e propõe três elementos para uma transição bem-sucedida: a perda da
resistência do regime fóssil-nuclear, com a criação de um regime “RES”, uma
mudança reconhecida para o regime RES e um alto nível de resiliência do regime RES
(STRUNZ, 2014).

Quadro Conceitual Resiliência Perspectiva Multinível

Ordenamento Panarchy: conexão não linear dos Hierarquia de nichos


dos níveis níveis
Janela de Consequência da perda de resiliência Consequência dos desenvolvimentos da
Oportunidade no regime dominante e a criação do paisagem exógena e tensões dentro do
novo regime regime
Interação
esquemática dos
níveis dentro do
processo de
transição:

Características Mudança não-linear Processo gradual


da transição

Quadro 10 – Comparativo do modelo conceitual de resiliência e da perspectiva multinível


Fonte: Adaptado de Strunz (2014, p. 156)

O regime fóssil-nuclear da Alemanha surgiu na década de 1950 e era


impulsionado pincipalmente por fontes de energia de origem nuclear e fóssil,
subsidiadas pelo Estado e que ganhavam força pelo discurso público de segurança
no abastecimento de energia a um custo acessível. Uma estrutura de mercado sólida
foi construída a partir do oligopólio de quatro grandes organizações, fazendo com que
as dimensões tecnológica, política e econômica reforçassem a perpetuação do regime
fóssil nuclear por meio da produção em larga escala, a infraestrutura de transmissão
e retorno econômico-político assegurado pelo apoio político adequado (STRUNZ,

151
2014). A resiliência do regime diminuiu conforme o movimento ambiental tornou-se
tema importante na agenda política alemã. “Em 1991 políticas de RES foram iniciadas
e significativamente aumentadas em 2000” (STRUNZ, 2014, p. 152). O Quadro 11
mostra um comparativo entre os sistemas Fóssil-nuclear e fontes RES, ambas
políticas da Alemanha.

Regime Fóssil-Nuclear - Alemanha Regime RES - Alemanha


Fornecimento de energia para toda a Fornecimento de energia para toda a
Função sociedade de forma confiável e sociedade de forma confiável, acessível e
acessível. sustentável.
Capacidade de produção parcialmente
descentralizada de todas as escalas,
Capacidade de produção desde pequenas unidades residenciais
Estrutura
centralizada e rede de transmissão (por exemplo energia geotérmica e
Tecnológica
em larga escala fotovoltaica) até unidades muito grandes
(como parques eólicos offshore), com
rede de transmissão em larga escala.

Apoio do governo para a energia


Políticas voltadas para energias
Estrutura fóssil-nuclear. Narrativas destacam a
renováveis (RES), com narrativa
Política segurança de abastecimento e
Energiewende
acessibilidade.

Estrutura de geração e capacidade de


Estrutura de geração e capacidade
transmissão mistas, que envolvem desde
Estrutura de transmissão concentradas.
residências, cooperativas comunitárias
Econômica Oligopólio de quatro grandes
para fundos de pensão e grandes
empresas de serviços.
empresas de serviços.

A produção e transmissão em larga Energias renováveis (RES) de pequena e


escala requer investimentos de média escala estabelecem uma estrutura
Aspectos capital intensivo de grandes de propriedade descentralizada, que
Tecnológicos- empresas de serviços (utilities), que induz mais as RES de pequena e média
econômicos: por sua vez, favorecem projetos de escala ao mesmo tempo em que
larga escala para poder tirar proveito desencoraja investimentos em energias
de economias de escala. convencionais de larga escala.

A estrutura de propriedade
concentrada na representação dos Os beneficiários das energias renováveis
Aspectos
rendimentos dos poderosos e na (RES) apoiam as políticas pró-RES e a
Econômicos-
perpetuação das narrativas de apoio, narrativa da transição energética, que
políticos:
que contribuem para arranjos promove o apoio político para as RES.
institucionais favoráveis.

Quadro 11 – Comparativo entre os Sistemas Fóssil-Nuclear e RES - Alemanha


Fonte: Adaptado de Strunz (2014)

152
A Energiewende trouxe importantes mudanças estruturais e políticas no
Sistema Nacional de Inovação do setor de energia da Alemanha. Estas mudanças se
desdobraram nas dimensões da estrutura tecnológica, cujo marco importante
aconteceu em 2011, após o acidente de Fukushima, no Japão, por meio de uma
decisão que quebrou o caminho de dependência “path-dependecy” (processos de
auto-reforço que aceleram a direção do desenvolvimento dentro de um sistema), ao
forçar uma adaptação para energias renováveis dos provedores em um determinado
período de tempo. Já no aspecto de mudanças na estrutura política, pode-se dizer
que “uma longa e às vezes não apenas retórica batalha entre apoiadores e opositores
da energia nuclear na Alemanha foi vencida por estes últimos” (STRUNZ, 2014, p.
154).
A questão que se discute atualmente na Alemanha não gira mais em torno de
se o país deve ou não eliminar progressivamente a energia fóssil e nuclear, mas sim
em questões sobre como melhor atingir o fornecimento total de energia por fontes
RES. No momento, os planos do governo envolvem o encerramento das atividades
da última usina nuclear em 2022, o que faz com que o Energiewende se caracterize
como o maior esforço de transformação coletiva na Alemanha desde a sua
reunificação, sendo amplamente legitimado em termos de desempenho sustentável e
de credibilidade global para a transição a partir de objetivos ambiciosos: abandonar
progressivamente a energia nuclear até 2022 sem comprometer as metas das
políticas climáticas, a disposição das pessoas para pagar pela competitividade da
indústria e para manter a economia em um modo de baixo consumo de carbono
(redução de 80-95% dos gases de efeito estufa aos níveis de 1990) até 2050, com
80% de sua demanda de eletricidade gerada por energia renovável (German Federal
Chancellery, 2013), conforme ilustra o Quadro 12.
As mudanças também envolvem o plano econômico, que perpassa o fato de
que a energia nuclear foi fortemente subsidiada no país, o que trará um impacto
significativo nas “quatro grandes”, como são chamadas as empresas atuais de
provedoras de serviços. Esta transição da energia reduz substancialmente o poder de
barganha política do oligopólio fóssil-nuclear (Strunz, 2014).
A emissão de gases de efeito estufa já apresentaram uma redução significativa
na Alemanha após o início do Energiewende e a meta é chegar a uma redução de até

153
80 a 95% na emissão destes gases até 2050, conforme mostra os objetivos do Quadro
15, o que tende a ter um impacto robusto também na esfera econômica devido ao
ATS (Admission Trading System), que é um sistema utilizado entre os membros da
comunidade europeia para pagamento de cada tonelada de CO2 que você admite ter
emitido. A organização de qualquer setor da economia compra o “direito” pela emissão
do CO2.

Status Quo e as Principais


2011 2020 2030 2040 2050
Metas do Energiewende

Emissão de gases de efeito estufa


-80 to -
GHG (contra 1990) -26,4 % -40% -55% -70% 95%
Eficiência

Consumo de energia primária


(em relação a 2008) -6% -20% – – -50%

Demanda de eletricidade (em


relação a 2008) -2,1% -10% – – -25%

Calor no setor residencial n.a. -20% – – –


Energia usada no setor de
transporte (em relação a 2005) -0,5% -10% – – -40%
Energias Renováveis

Participação no consumo de
electricidade 20,3% ≥ 35% ≥ 50% ≥ 65% ≥ 80%

Participação no consumo de
energia final 12,1% 18% 30% 45% 60%
Quadro 12 – Status quo e principais metas do Energiewende
Fonte: Agora Energiewende (2013)

Em 2014 a Alemanha atingiu 1,5 milhões de sistemas solares instalados no


país, o que representa uma capacidade instalada para esta tecnologia em torno de 38
Gigawatt e um investimento de 2,3 bilhões de Euros em novos sistemas solares, com
uma representatividade de 5,2% do total da geração de energia da Matriz energética
nacional alemã, conforme ilustra a Figura 23. Por outro lado, é possível também
observar que os investimentos nesta fonte de energia diminuíram 87%, os empregos
caíram 53% e as tarifas de Feed-in tiveram uma redução de 87% entre os anos de

154
2010 e 2014, uma vez que o valor pago para os geradores da energia diminui à medida
que as metas do governo são alcançadas.

155
Figura 22 – Panorama da energia solar Alemanha – 2010-2014
Fonte: Strom Report (2015)

156
A questão das atividades de Lobby entre os atores do Sistema Nacional de
Inovação se constitui como um dos elementos centrais na Alemanha. O atingimento
das metas estabelecidas pelo Energiewende é uma questão importante no processo
de tomada de decisão política e do discurso público alemão. Neste sentido, a
governança corporativa desempenha um papel central no processo de transição da
energia. No caso da Alemanha, esta influência aconteceu a partir de ações de lobbies
para a tomada de decisão política, bem como para a definição dos valores das tarifas
de feed-in a serem praticados e envolveu não apenas as empresas com foco em
energias renováveis, mas também as principais empresas de energia elétrica do país
(as chamadas “Big Four”), que controlam cerca de 90% do mercado de eletricidade.
Todos os agentes econômicos que operam no mercado alemão de energia interagem
com o sistema político por meio de atividades de lobbying (SÜHLSEN, K.;
HISSCHEMÖLLER, M., 2014).
O que eu quero dizer é… não é tão complicado atingir os 100% renováveis. Eu
diria que por volta de 2030 ou 2040… A tecnologia está aí… nós apenas temos
que aplicá-la… mas, existem barreiras, o lobby das empresas de conexão de
serviços de energia é muito bom… Eles têm feito lobbying com o governo nos
últimos 150 anos e eles possuem dinheiro, eles possuem as pessoas nas
posições certas… Então, é muito difícil lutar contra este grupo. Eles são muito
influentes. Mas, eu acredito que no máximo em 2050 nós teremos um Sistema
de energia completamente novo, sem nenhuma fonte nuclear, sem carvão, sem
petróleo, sem diesel… (Entrevista com CEO – Solar Cluster Badden-
Württemberg – Alemanha).

De forma geral as atividades de lobby estão relacionadas aos interesses dos


grupos privados tendo em vista influenciar a tomada de decisão política e é aplicada
especialmente sobre os atores governamentais e legislativos.
Ao realizar um estudo sobre as atividades de lobby do setor e de que formas
as mesmas influenciaram a trajetória da energia na Alemanha, Sühlsen e
Hisschemöller (2014) destacam que as quatro maiores empresas do setor de energia
(conhecidas como “Big Four”), apesar de possuir uma posição forte dentro do regime
de energia, perderam muito terreno durante a primeira década do século 21 e sofrerão
os impactos da eliminação de importantes subsídios para o carvão, o que deve ocorrer
em 2018.

157
E o que está matando a maioria das grandes prestadoras de serviços hoje?
Nós tínhamos quarto grandes prestadoras de serviços de energia na Alemanha
e todas estão prestes a morrer porque elas não viram a mudança chegando. A
eletricidade não vale mais nada na Alemanha. Temos os preços mais baixos e
estão abaixo de 3 centavos por quillowatt-hora, 30 Euros por megawatt-hora…
isso é realmente um preço muito baixo, no mercado de curto prazo… Estas
grandes empresas foram ao jornal em 1994 e disseram que a energia nuclear
era uma coisa boa; que as energias renováveis também eram, mas que não
seriam capazes de fornecer mais do que 4% da eletricidade da Alemanha. Hoje
as fontes renováveis fornecem 32% da energia elétrica… É tudo por iniciativa
privada… a única coisa que o governo faz é fixar os impostos para a
eletricidade injetada na rede. Quanto é que se vai pagar por isso… e é só isso.
(Entrevista com CEO – Solar Cluster Badden-Württemberg – Alemanha).

Já com relação ao setor das energias renováveis, estas têm recebido intenso
apoio, especialmente pelo que determina a EEG (Erneuerbare Energien Gesetz), lei
alemã que busca facilitar o desenvolvimento sustentável do fornecimento de energia,
proteção do clima e do meio ambiente e a redução dos custos de fornecimento de
energia por meio da geração de energia elétrica de fontes renováveis por quaisquer
interessados no território alemão, sejam estes pessoas físicas ou jurídicas. Esta lei
inclui como “fontes de energia renováveis” as energias das marés, energia hidráulica,
energia eólica, radiação solar, energia geotérmica, biomassa, incluindo gases de
aterro sanitário e de tratamento de esgoto (RES ACT, 2014).
Não obstante os resultados impressionantes da lei EEG e do sistema de tarifa
Feed-in adotados na Alemanha para a trajetória da transição energética no país,
“existe uma consciência crescente de que o sistema se tornou caro e precisa de
revisão” (SÜHLSEN, K.; HISSCHEMÖLLER, M., 2014, p. 324). Conforme as energias
renováveis se estabelecem, se legitimam dentro do sistema de energia, as empresas
tendem a se “acomodar” devido aos incentivos e buscar poucas formas de inovação
e aumento de competitividade por si só.
O estabelecimento de metas robustas para transição da tecnologia também
traz um lado negativo, que é fazer com que alguns atores se sintam “confortáveis” ao
esperar que a política do governo impulsione, por si só, as fontes de energia
renováveis, o que pode contribuir para uma situação que promova o conservadorismo
ao invés da inovação e acaba se tornando um risco e um grande desafio ao mesmo
tempo (SÜHLSEN, K.; HISSCHEMÖLLER, M., 2014). Ao mencionar as necessidades
para o desenvolvimento das empresas que compõem o cluster de energia solar

158
Baden-Württemberg, a questão da necessidade de inovar e da atuação internacional
aparece com destaque:
Você precisa ser internacional... 10 anos atrás você não precisava porque a
Alemanha possuía de longe a maior indústria de sistemas solares [...] Hoje
você tem que ser internacional. As pessoas iniciam o processo de
internacionalização muito tarde e algumas vezes tarde demais...Existem duas
coisas que você tem que fazer: diversificar e ser internacional. As empresas
grandes fazem este processo sozinhas, mas para as pequenas empresas isso
não é tão fácil assim. Elas não possuem os recursos ou a mão de obra ou ainda
as competências linguísticas. A maior parte das pequenas empresas só
querem vender para o outro lado da rua, para o próximo bairro talvez... É mais
fácil para eles vender para alguém que eles já conhecem [...] eles vão para
Áustria porque eles costumam falar alemão, vão para Suíça...
(Entrevista com CEO – Solar Cluster Badden-Württemberg – Alemanha).

4.5.1 Comparativo Entre a Transição da Energia Elétrica Solar Fotovoltaica no


Brasil e na Alemanha

A partir da análise dos dados e do cenário para a EESFV no Brasil e na


Alemanha foi possível mapear as principais diferenças para as cinco categorias
analíticas identificadas como centrais no Sistema Nacional de Inovação brasileiro:
Iniciativas governamentais, Formação de novos mercados (nichos), Indústria nacional,
Novas tecnologias e inovações e Pesquisa e Desenvolvimento, conforme ilustra a
Figura 24.

Figura 23 – Cinco principais categorias analíticas do SNI


Fonte: elaboração própria

159
As iniciativas governamentais foram um dos elementos essenciais para que a
Alemanha conseguisse alcançar a liderança no uso de tecnologias de fontes
renováveis na Europa. A partir da elaboração de normas e leis que incentivam o uso
das fontes renováveis de energia, o país evoluiu de um patamar inicial de 3,1% de
fontes renováveis em 1991 para mais de 30% em 2015 e está previsto o patamar de
mais de 35% até 2020 (AGORA ENERGIEWENDE, 2013).
No Brasil, a Resolução Normativa No 482, de 2012, que estabelece as
condições para o acesso à geração distribuída, foi pautada especialmente sob um
Sistema de compensação de energia elétrica, permitindo que o consumidor compense
a energia produzida em até 36 meses na unidade consumidora ou em outra unidade
do mesmo CPF (Cadastro de Pessoa Física) (ANEEL, 2015). Tal resolução foi
atualizada em 2016 pela Resolução Normativa No 687 de 2015 e a compensação da
energia produzida passou de 36 para 60 meses (COPEL, 2016).
Já a principal lei alemã para desenvolvimento e disseminação de energias
renováveis – a chamada “Eneuerbre Energien Gesetz” ou EEG oferece o pagamento
de uma tarifa a todos os produtores de energia de fontes renováveis, que depende da
capacidade de produção da instalação, da quantidade de killowatts-hora (kWh), bem
como da natureza da fonte de energia fonecida, uma vez que os custos para cada
fonte são diferenciados. Ao realizar este critério de remuneração a EEG “não privilegia
apenas a fonte com a melhor relação custo-benefício, mas remunera
proporcionalmente as fontes de energia mais caras, de tal forma que possibilita seu
uso e consequente amadurecimento” (MIRANDA, 2012, p. 130).
Tanto no Brasil quanto na Alemanha os pequenos geradores pagam pelos
custos de aquisição dos equipamentos e conexão com a rede, porém a EEG garante
a aquisição da energia produzida por um período de vinte anos, o que possibilita mais
facilmente a recuperação do investimento e o eventual lucro após o pagamento dos
custos do Sistema FV. Outra diferença importante entre a legislação de fomento à
geração distribuída no Brasil e na Alemanha reside no fato de que as concessionárias
de energia alemãs são obrigadas a adquirir e distribuir a energia produzida pelos micro
geradores de forma imediata e prioritária.

160
O Quadro 13 faz um resumo das principais diferenças encontradas na
legislação de incentivo para a geração de energia de fontes renováveis no Brasil e na
Alemanha.

Característica LEI Eneuerbre Energien Gesetz” Resolução Normativa No 687/2015,


ou EEG - Alemanha ANEEL – Brasil
Energia hidrelétrica, incluindo a Energia hidráulica, solar, eólica,
Fontes de Energias energia das ondas, energia das biomassa ou cogeração qualificada,
contempladas marés, gradiente salino; energia havendo diferenciação entre a
eólica; radiação solar; energia microgeração distribuída (central
geotérmica; energia da biomassa, geradora de energia elétrica com
incluindo o biogás, gás de aterros potência instalada menor ou igual a 75
sanitários e gás de tratamento de kW) e minigeração distribuída (central
esgoto. geradora de energia elétrica com
potência instalada superior a 75 kW e
menor ou igual a 5 MW).

Compra do Sistema de Responsabilidade do micro gerador Responsabilidade do micro gerador


geração de energia
fotovoltaica
Remuneração da Energia Aquisição da Energia produzida por Sistema de compensação, a ser utilizado
excedente um período de 20 anos de forma em até 60 meses na unidade geradora
imediata e prioritária. ou em outra do mesmo CPF.
Quadro 13 – Diferenças entre a Lei EEG da Alemanha e a RN 687/2015 do Brasil
Fonte: elaboração própria

A questão tributária também apresenta uma diferença relevante entre os dois


países. Enquanto na Alemanha existem incentivos fiscais para a produção,
comercialização, instalação de sistemas FV, bem como a isenção de tributos para o
consumo da energia da rede, no Brasil os incentivos são mais modestos, conforme já
detalhados anteriormente, sendo uma das principais barreiras a cobrança do ICMS
em vários estados brasileiros, que resulta na cobrança, em media, de 27% quando o
micro gerador “puxa” a energia da rede.
Em termos de Indústria Nacional, as diferenças também são importantes. O
momento que a Alemanha se inseriu no mercado internacional como uma potência
em termos de energia solar fotovoltaica era muito diferente do mercado atual. A
trajetória seguida pela Alemanha não pode ser replicada pela indústria nacional
brasileira, uma vez que naquele momento a tecnologia não estava no nível de
desenvolvimento que se encontra hoje em termos globais, com a atuação de grandes
fabricantes chineses. A indústria nacional de painéis e componentes para sistemas

161
fotovoltaicos do Brasil se encontra em estágio inicial de desenvolvimento, com poucas
empresas atuando no mercado. Porém, mesmo que a indústria nacional se
desenvolva fortemente nos próximos anos, o cenário global em termos da tecnologia
atualmente é bem diferente de quando a Alemanha logrou a posição mundial de
destaque em EESFV.
O mercado brasileiro não possui profissionais qualificados para atuar
especificamente no mercado de sistemas de EESFV e acaba trazendo profissionais
de outras áreas, principalmente do setor elétrico e da construção civil. O país
tampouco possui cursos preparatórios e de educação formal voltados para este
segmento do mercado em todos os níveis (técnico, graduação e pós-graduação).
Já na Alemanha existe uma intensa oferta de cursos preparatórios em todos os
níveis, sendo que muitos deles são ofertados pelas grandes empresas que atuam no
setor, como por exemplo, Kyocera Solar Inc e também por associações de
organizações, como a German Academy for Renewable Energy and Environmental
Technology, além de muitas outras alternativas ofertadas por instituições de ensino
em todos os níveis de atuação.
O que se pode concluir a partir do comparativo entre o Brasil e a Alemanha é
que não é possível apenas transpor a experiência da Alemanha para o Brasil, uma
vez que o momento econômico e institucional são diferentes, as condições de
irradiação são diferentes, bem como o Sistema Nacional de Inovação de cada país é
distinto. Importante observar a trajetória de sucesso alcançadas por meio das políticas
alemãs e identificar quais destas iniciativas podem ser aplicadas à realidade do Brasil,
como por exemplo as atividades de lobby que defendem os interesses das empresas
privadas do setor, bem como a atuação do livre comércio, no qual o governo possui
um papel de facilitador e de criador de políticas e não de executor e de controlador do
setor como o que acontece no Brasil hoje.

4.6 CONCLUSÕES

O gerenciamento da transição não pode ser definido apenas como um mix das
abordagens de planejamento de longo prazo com algumas combinações que se
estabelecem simultaneamente em mercados e redes, mas sim como uma abordagem

162
diferenciada, que combina elementos chaves da elaboração de políticas tais como
redes, metas coletivas de longo prazo, inovação e aprendizado (LOORBACH, 2007).
As abordagens sobre o tema levam a uma proposta de governança que
combina elementos centrais para o desenvolvimento sustentável de políticas de
governança com uma visão estratégica das necessidades e das particularidades do
ambiente para a qual tais políticas estão sendo desenvolvidas. Neste sentido, é
fundamental destacar que o gerenciamento da transição tecnológica e seu
desenvolvimento de forma sustentável depende do estabelecimento de uma agenda
comum entre os atores da rede, de uma visão de longo prazo aplicada à realidade e
às particularidades do contexto, bem como de um processo de aprendizado voltado
para a inovação e para a solução de problemas.
Entre o comparativo de casos da política de governança para o
desenvolvimento da EESFV entre Alemanha e o Brasil realizada no presente estudo,
várias ressalvas precisam ser feitas: a primeira delas é que o comparativo entre dois
países com realidades econômicas e energéticas tão distintas devem ser elaborado
com muita parcimônia. O Brasil possui sua trajetória histórica de desenvolvimento da
matriz energética pautada especialmente sobre a energia hidrelétrica. Já a Alemanha
estava passando por uma dependência muito grande de fontes de energia de origem
fossil, o que a levou a desenvolver uma política agressiva para a transição energética
com o objetivo de mudar completamente a natureza de sua matriz, meta que será
atingida completamente em 2050. Neste sentido, não se pode comparar duas
realidades tão distintas, mas sim observar os aprendizados e as iniciativas que podem
ser aplicadas, de forma ajustada à realidade do Brasil.
No nível da paisagem, o setor de energia elétrica do Brasil não passou por
nenhuma grande mudança estrutural desde a criação da maioria das companhias
elétricas estaduais (concessionárias de energia) e do sistema Eletrobrás. Existe uma
forte presença do Estado no setor até os dias de hoje, com políticas governamentais
de caráter regulativos e com taxas e preços fixados pelo governo. O modelo de
atuação híbrida (composto por empresas públicas e privadas) possibilita uma
competitividade de mercado, embora não plena, uma vez que o mesmo é regulado
em diversos aspectos por resoluções governamentais.
O estabelecimento de um Sistema de energia renovável depende de

163
regulamentação pública e subsídios e o caso da energia elétrica solar fotovoltaica não
é diferente. O desenvolvimento e disseminação desta fonte de energia no Brasil
depende de muitos aspectos, entre eles a mudança na oferta e na demanda de
energia em termos de planejamento e controle, novas habilidades profissionais e
investimentos em infraestrutura. Uma das atividades centrais neste processo é
justamente a conscientização da população sobre a importância da EESFV para o
desenvolvimento econômico sustentável do país.

Loorbach (2007) desenvolveu uma tese baseada na teoria de gestão de


transição como um novo modo de governança, concentrando-se em processos de
interação, redes e diferentes modos de governança. Em seu estudo, o autor destaca
que tornou-se cada vez mais claro que um determinado modo de governança deve se
dar com base em uma perspectiva coerente e analítica sobre as estruturas sociais e
de mudanças sociais. Tal perspectiva integrada é necessária para se definir o ponto
de partida para a gestão da transição, mas é também ilustrativa de uma visão de
mundo que está por trás de gestão de transição: que vê a sociedade como uma colcha
de retalhos de complexos sistemas sociais com dinâmicas e padrões específicos.
Atores e elementos interagem e co-evoluem uns com os outros e com as estruturas
da sociedade produzindo mudança gradual ou radical. (LOORBACH, 2007).

O processo de gerenciamento da transição é, por essência, um processo


altamente incerto e algumas vezes caótico, no qual se tenta conectar diferentes atores,
bem como organizações com perspectivas de tempo, ambições e valores
diferenciados. Este processo é visto como o resultado da interação entre todos os
atores sociais relevantes no contexto da evolução do panorama social (LOORBACH,
2007).

O que foi possível observar a partir da análise dos cenários nacional e


internacional é que o Brasil atualmente está passando por um momento de evolução
dentro do sistema de inovação. As iniciativas governamentais para promover esta
tecnologia ainda não decolaram. Não existe transferência de tecnologia de outros
países e os poucos projetos de pesquisa e desenvolvimento desenvolvidos no país

164
são feitos de forma isolada e pontual, sem o envolvimento de representantes de todas
as empresas que atuam no setor.

Pode-se concluir que é imperativo que o governo brasileiro crie mecanismos de


incentivo específicos para o fomento e disseminação a energia elétrica solar
fotovoltaica a fim de universalizar o acesso da população à esta tecnologia bem como
promover o desenvolvimento da indústria nacional e a consequente geração de
empregos e movimentação positiva da economia neste setor, tendo em vista a
experiência já aplicada na Alemanha. Esses investimentos em políticas específicas
para a EESFV podem ser justificados pela redução da emissão de CO2, inserindo o
país na economia do baixo carbono, além da diversificação da atual matriz energética
nacional, extremamente dependente da energia hidráulica.

Em termos de pesquisas futuras, o presente estudo propõe a aplicação de


estudos similares, realizando um comparativo com outros países que possuem a
energia solar fotovoltaica desenvolvida, tais como Estados Unidos ou Japão a fim de
verificar a trajetória tecnológica desta a partir de outras fontes de energia renovável,
bem como o impacto da tecnologia em termos sociais e econômicos.

165
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169
5 UM SOL PARA CADA UM: UMA PROPOSTA DE GOVERNANÇA
PARA A ENERGIA ELÉTRICA SOLAR FOTOVOLTAICA NO
BRASIL

5.1 INTRODUÇÃO:

A literatura mostra que transições são processos que ocorrem em um horizonte de


tempo de longo prazo e, pela sua natureza complexa, não podem ser direcionados ou
controlados pelos atores que fazem parte do Sistema. Porém, autores seminais da
teoria da transição sociotécnica apontam a possibilidade de se influenciar e guiar o
processo de transição (GEELS, 2004; LOORBACH, 2007; LUNDVALL, 2010).
Loorbach (2007) destaca a necessidade do estabelecimento de um novo arranjo
inovador para o processo de governança, que possibilite e facilite as atividades do
gerenciamento da transição, cujas características fundamentais envolvem a
participação dos atores relevantes em diferentes níveis do Sistema Sociotécnico
(multi-atores), bem como o foco em inovação e aprendizagem.
Neste sentido, o presente estudo apresenta uma proposta de modelo de
governança que considera aspectos fundamentais para o processo de transição
sociotécnica da Energia Elétrica Solar Fotovoltaica (EESFV) no Brasil, tais como a
inovação, o processo de comunicação, as práticas de governança que ocorrem no dia
a dia e o processo de aprendizagem contínua, tido como um elemento central no
contexto desta tecnologia. O presente capítulo mostra, a partir dos resultados
apresentados anteriormente, uma proposta de um modelo de governança que integra
as cinco temáticas centrais do Sistema Nacional de Inovação para a EESFV no Brasil:
Iniciativas Governamentais, Indústria Nacional, Tecnologias e inovação, Formação de
novos mercados, bem como Pesquisa e Desenvolvimento.
Importante destacar que o modelo em si não pretende ser uma proposta definitiva
para o processo de transição sociotécnica desta tecnologia, mas sim um primeiro
passo para a análise e discussão que leva em conta os fatores culturais, ambientais,
econômicos, políticos e sociais de um Sistema de Inovação em fase de
desenvolvimento e que, justamente por esta característica não pretende ser um
modelo finalizado, mas sim em constante processo de transformação, assim como é

170
a natureza desta tecnologia e a dinâmica do sistema que a presente tese contempla.
O modelo aqui apresentado integra teoria e prática e é o resultado da combinação
entre os princípios teóricos da teoria sociotécnica da transição, dos aspectos de
governança, da estruturação do Sistema Setorial de Energia Elétrica do Brasil,
combinados com os resultados empíricos obtidos a partir das informações setoriais,
das entrevistas em profundidade e de dados primários da pesquisa de campo
realizada no Brasil e na Alemanha.

5.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS:

A presente Tese apresenta uma proposta para um modelo de governança para


desenvolver a EESFV no Brasil. Tal modelo é o resultado de um processo de pesquisa
realizado ao longo de mais de dois anos, entre 2014 e 2016. Tendo em vista a gestão
da transição como uma perspectiva para o processo de governança e para o
estabelecimento de políticas, apresenta-se a seguinte pergunta de pesquisa: “Quais
são os elementos fundamentais para a proposição de um modelo de governança
que fomente a energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil?”
Para responder a esta questão levou-se em conta alguns elementos centrais
presentes na teoria da transição tecnológica, na teoria da governança, bem como na
teoria de sistemas de inovação, apresentados a seguir:
- O seu caráter não prescritivo, atento sempre a um processo de revisão e
reformulação, uma vez que processos de transição são dinâmicos e
apresentam aspectos de complexidade que impossibilitam traçar resultados
prescritivos e de longo prazo.
- A questão da interdisciplinaridade, que se constitui como um elemento
essencial na formulação de tal modelo, uma vez que o processo de
governança envolve atores das mais diversas origens e interesses.
- Os aspectos históricos envolvidos no Sistema Nacional da Inovação em
estudo, que envolve questões de centralização e controle por parte do
governo, uma trajetória pautada na energia hidrelétrica e o fortalecimento
das instituições governamentais.
- As Políticas Públicas que impactam no uso e na disseminação da

171
tecnologia entre os atores do sistema, envolvendo políticas ambientais, de
incentivo ao uso de sistemas solares, incentivos fiscais e normativas que
regulam e definem os próximos passos para o desenvolvimento desta
tecnologia no Brasil.
- A relação entre os atores do Sistema setorial de inovação da energia
elétrica fotovoltaica no Brasil, uma vez que, conforme já demonstrado nos
capítulos anteriores cada um dos níveis (nicho, regime e paisagem) possui
um papel dentro do sistema e o estabelecimento de uma agenda comum
entre tais atores favorece e fomenta a dinâmica do desenvolvimento desta
tecnologia;
O objetivo do presente estudo é trazer ambos: uma contribuição teórica para a
perspectiva da gestão da transição para governança, bem como uma aplicação
empírica a partir de um estudo no setor de EESFV no Brasil.
Este processo se constitui em um esforço de consolidação entre os elementos
da teoria e da prática, que resultam em uma proposta integrada e aplicada para o
Sistema Nacional de Inovação em estudo. Tal proposta leva em consideração que o
processo de transição não é previsível e coloca alguns elementos que facilitam o
direcionamento da trajetória da tecnologia de energia elétrica fotovoltaica, por meio
do envolvimento de atores e dimensões essenciais ao uso e disseminação desta
tecnologia no país, tomados em uma visão de longo prazo.
“Um Sol Para Cada Um” se constitui em uma proposta de governança aplicada
especificamente para o setor de EESFV no Brasil com o objetivo de estimular e
coordenar o processo inovativo dentro do Sistema multi-atores, multi-níveis e multi-
fases da transição tecnológica da energia elétrica de origem fotovoltaica. Para atingir
este objetivo, levou-se em conta todos os atores pertencentes a este processo de
transição, já demonstrados no Stakeholder Map do capítulo 2, as principais barreiras
enfrentadas, bem como a perspectiva e o potencial de desenvolvimento desta
tecnologia no país, demonstrados no capítulo 3 desta tese. Pelo seu caráter
sociotécnico, este modelo também levou em conta os impactos que a tecnologia pode
trazer ao país em termos de mudança social, tais como a formação profissional, o
desenvolvimento de pesquisa e conhecimento, a geração de emprego e renda em
todos os níveis educacionais e o impacto que esta tecnologia pode trazer para a

172
indústria nacional e, futuramente, para a economia do país. Confirmando o que propõe
Loorbach (2007) no contexto de transições e de desenvolvimento sustentável, esta
proposta baseia-se na análise integrada dos atores e de seus papéis, em um esforço
de redirecionar normativamente a direção almejada do desenvolvimento tecnológico,
uma vez que os fatores de imprevisibilidade e de aleatoriedade estão presentes em
redes sociais complexas como no caso analisado nesta tese.

5.3 PROPOSIÇÃO DE UM MODELO DE GOVERNANÇA PARA O USO E A


DISSEMINAÇÃO DA ENERGIA FOTOVOLTAICA NO BRASIL

Por campo organizacional entende-se aquelas organizações que constituem uma


área reconhecida da vida institucional fornecedores-chave, recursos e produtos aos
consumidores, agências reguladoras e outras organizações que produzem serviços
ou produtos similares. “A virtude desta unidade de análise é que direciona a atenção
não apenas para as empresas concorrentes ou redes de organizações que realmente
interagem, mas para a totalidade dos atores relevantes dentro do contexto analisado”
(DOLATA, 2013, p.14).
Setores de atividade são campos socioeconômicos com regras distintas e
marcos regulatórios, configurações de atores, relações que se constituem em conjunto
como uma área distinta da atividade econômica. “Embora setores sejam sustentados
por um núcleo de estruturas econômicas, os seus atores são claramente influenciados
por atores não-econômicos também e podem ser moldados por instituições sociais,
como, por exemplo, estatutos, regulamentos, normas, convenções, rotinas de valores
e ideias predominantes” (DOLATA, 2013, p.14).
Setores empresariais, tais como as sociedades em geral, não são sistemas
baseados apenas socialmente, mas entidades sociotécnicas (Geels, 2004). Tais
setores são compostos das relações sociais, somadas às tecnologias que
desenvolvem, produzem e usam. “Qualquer setor de atividade seja automotivo,
engenharia, aeroespacial, produtos químicos, farmacêuticos, telecomunicações,
mídia, ou componentes eletrônicos possui o seu próprio perfil tecnológico específico”
(DOLATA, 2013 p. 16).

173
Mesmo que se possa identificar elementos de gestão da transição e
eventualmente até formular hipóteses acerca de como o processo de transição ocorre
e de como efetivamente operacionalizá-lo, parece ser inviável a formulação de
hipóteses que possam ser testadas por meio de estudos de casos ou de pesquisa na
literatura apenas. A natureza deste tipo de pesquisa envolve explorar um novo modelo
de governança que possa ser sustentado teoricamente e ao mesmo tempo possa
desenvolver um modelo operacional, o que requer um procedimento de pesquisa
interdisciplinar, participativo e aplicado (LOORBACH, 2007).

Um dos elementos centrais de um modelo de governança aplicado a um país


em desenvolvimento como é o caso do Brasil, deve envolver uma análise dos
impactos econômicos e sociais que a tecnologia e o seu desenvolvimento podem
trazer ao país. Neste sentido, o setor espera gerar até 60 mil novas oportunidades de
trabalho até 2018. Estima-se que para cada megawatt solar instalado em torno de 30
novos postos de trabalho (somando-se os empregos diretos e indiretos) sejam
criados, o que reforça o potencial desta tecnologia de nicho no nível da paisagem
sociotécnica (BELFORT, 2016).
Ao mencionar a questão do desenvolvimento econômico, Schumpeter (1997,
p. 64), menciona que: “O desenvolvimento econômico até agora é simplesmente o
objeto da história econômica, que por sua vez é meramente uma parte da história
universal, só separada do resto para fins de explanação. O estado econômico de um
povo não é resultado simplesmente das condições econômicas precedentes, mas sim
da somatória de todas as variáveis que formam este contexto”. Sendo assim, a análise
e a estimativa para mensuração do crescimento e desenvolvimento econômico devem
levar em conta as principais variáveis micro e macro ambientais que fazem parte do
contexto.
Além dos aspectos econômicos e dos eventuais impactos sociais que esta
proposta de governança para o desenvolvimento sustentável da EESFV pode trazer,
também foram levados em conta os aspectos culturais e de legitimidade, uma vez que
sem estar legitimado pelos atores centrais do Sistema Tecnológico de Inovação, tal
modelo não se viabiliza. Esta particularidade do modelo está diretamente relacionada
à dinâmica da perspectiva multinível, uma vez que, apesar de ser uma tecnologia do

174
nível de nicho, o processo de comunicação, cooperação e interação entre os níveis
de regime e paisagem sociotécnica são fundamentais para o estabelecimento e
consolidação da nova tecnologia dentro do Sistema Nacional de Inovação.
Vale destacar neste ponto, que a resistência ao processo de difusão de novas
tecnologias surgiu na coleta de dados do setor como uma das barreiras principais que
contribuem para o atraso no uso e na disseminação da tecnologia da energia elétrica
solar fotovoltaica. Este aspecto possui suas raízes na infraestrutura institucional já
estabelecida no regime, bem como nos aspectos históricos já mencionados no
Capítulo 2 e fazem com que o modelo proposto seja construído considerando-se a
cooperação, a transparência e a legitimação da tecnologia entre os atores como
fundamentais para o funcionamento e a aplicação do mesmo para o uso e a
disseminação da EESFV no Brasil.
Segundo o Modelo da transição sociotécnica para os sistemas de inovação
proposto por Geels (2002), a trajetória da mundança de um Sistema de Inovação se
inicia no nível do nicho, a partir da emergência de inovações. Nesta fase, podem
ocorrer hidridização entre as novidades e simbioses entre atores do Sistema. No
contexto do Sistema de Inovação para a EESFV, foi possível identificar a presença de
pequenas redes de empreendedores, que criam novidades e se esforçam para que
suas tecnologias se desenvolvam, ganhando legitimidade e mais escala de mercado.
Aos poucos, observa-se o alinhamento entre elementos essenciais para o
estabelecimento do Sistema, tais como a profissionalização do setor, normativas para
padronização dos sistemas fotovoltaicos e seus componentes, bem como processos
de pesquisa e desenvolvimento para EESFV, o que classificaria a atual situação do
Sistema Nacional de Inovação para esta tecnologia no Brasil neste estágio.
Nesta segunda fase, segundo o modelo proposto por Geels (2002) também
acontecem processos de socialização e de institucionalização entre os atores do
nicho, o que reforça a legitimação da nova tecnologia e cria uma trajetória tecnológica
com regras próprias.
A partir desta fase, o autor propõe a ampla difusão da tecnologia, que se
constitui na terceira fase, e a consequente competição com o regime que já está
estabelecido. No caso da EESFV este processo de uso e disseminação da energia
FV proporcionaria mais visibilidade à esta tecnologia no Brasil e eventualmente uma

175
consolidação dentro do Sistema. Por fim, o modelo de Geels (2002) propõe como fase
final a substituição do regime estabelecido de forma gradual, com a troca das antigas
tecnologias pela nova. Pode-se dizer que atualmente o Sistema de Inovação da EESF
no Brasil encontra-se na fase 2, com um princípio de alinhamento e consolidação das
atividades dentro do regime, conforme demonstra a Figura 25.
Aumento da
estruturação da
EESFV

Paisagem
Sociotécnica
(contexto Desenvolvimentos da paisagem colocam
pressão no regime existente, que se abre,
Exógeno) criando janelas de oportunidades e novidades Formação de um
Novo Regime para a
EESFV
Indústria de painéis FV
Tecnologia
Ciência
Políticas de
Regime incentivo a EESFV
Aspectos Culturais
Sociotécnico Novos Mercados EESFV

Regime Sociotécnico é
“dinamicamente estável”. Novas configurações acontecem,
Em diferentes dimensões tirando vantagem da “Janela de
existem processos em oportunidade”. Ajustes ocorrem no
andamento que favorecem regime sociotécnico.
a difusão da EESFV
Influências externas nos Elementos se tornam alinhados tais
nichos de países com a como profissionalização, mobilização
tecnologia de EESFV dos recursos e a formação de uma
(expectativas e networks) agenda de P&D para a EESFV
Nicho
Inovações

Pequenas redes de fabricantes de painéis solares, start-ups e


empreendedores criam as novidades e se esforçam para ligar
diferentes elementos em uma rede sem costura.
Tempo

Figura 24 – Perspectiva Multifases para o Setor de EESFV no Brasil


Fonte: Elaboração Própria a partir de Geels (2002)

A análise das Funções do Sistema de Inovação apresentada no Capítulo 2,


bem como da relação multinível a partir dos dados analisados com o apoio do software
Atlas.ti apresentado no Capítulo 3 indicam a construção do Framework de governança
baseado em cinco temáticas principais para o Sistema Tecnológico da energia elétrica
solar fotovoltaica no Brasil: 1. Indústria Nacional, 2.Formação de Novos Mercados, 3.
Iniciativas Governamentais, 4. Pesquisa e Desenvolvimento e 5. Tecnologias e
Inovação, conforme ilustra a Figura 26.

176
Formação
Indústria
de Novos
Nacional Mercados

UM SOL
PARA CADA
Tecnologias UM
Iniciativas

e Inovação Governamentais

Pesquisa e
Desenvolvimento

Figura 26 – Framework de governança para a energia solar no Brasil


Fonte: Elaboração Própria

As Iniciativas Governamentais se constituem como um dos elementos


estratégicos do modelo de governança proposto para a tecnologia em estudo em
virtude dos fatores históricos do setor de eletricidade do Brasil, altamente regulado
pelo Estado e determinado por instituições governamentais que realizam a pesquisa,
o planejamento e a gestão das fontes de energia que irão compor a matriz energética
nacional. Importante destacar o impacto que indicadores do nível da paisagem
possuem sobre a tecnologia do nível do nicho, reforçando as bases da perspectiva
multinível como uma metodologia adequada para o objeto em estudo.

Nesta dimensão também estão contemplados os aspectos normativos, cognitivos


e regulatórios do sistema, bem como as políticas públicas para o incentivo e o
desenvolvimento da tecnologia de geração de EESFV. As ações políticas são
avaliadas segundo dois critérios: a contribuição imediata para objetivos políticos e a

177
contribuição de tais políticas para o processo de transição global, o que significa que
nas políticas de gerenciamento da transição existe uma meta de conteúdo e uma meta
de processo. O processo de aprendizagem, mantendo a variedade e mudança
institucional são importantes objetivos da política, utilizados como instrumentos para
a mudança. A avaliação e adaptação das políticas em rodadas de desenvolvimento
traz flexibilidade para o processo, sem perder o foco no longo prazo (KEMP,
LOORBACH, 2003).

A Pesquisa e Desenvolvimento se constitui como o segundo elemento


estratégico do modelo de governança e envolve a produção e difusão do
conhecimento, a profissionalização do setor e a educação formal, considerada uma
das barreiras para o uso e a disseminação da energia fotovoltaica no Brasil.

Um dos objetivos da gestão da transição é a difusão de novos conhecimentos e


por isso o processo de trocas entre os atores deve ser intenso de tal forma a
proporcionar a aprendizagem entre os participantes, gerando novas ideias, soluções,
tecnologias e contribuindo para a consolidação de um ambiente de trocas de
conhecimentos e experiências para a produção, difusão e integração do conhecimento
dentro do Sistema (LOORBACH, 2007). A educação formal em todos os níveis é uma
necessidade do setor, que além de melhorar as condições para o processo de difusão
tecnológica também contribui para a profissionalização do setor e padronização da
atividade dos profissionais que atuam com sistemas fotovoltaicos no país.

As Novas tecnologias e Inovações se constituem como o terceiro elemento


estratégico do modelo de governança e envolve, entre outros aspectos, a
transferência de tecnologia para os atores que fazem parte do Sistema. Tais
inovações proporcionam mudanças e transformações nos aspectos estruturais,
organizacionais e até mesmo culturais do setor. Loorbach (2007) destaca que, na
gestão da transição, a inovação é ao mesmo tempo ativamente gerenciada e
indiretamente estimulada, sendo que atividades inovativas de todos os tipos são
estimuladas. “Os atuais experimentos de transição são projetados para testar,
experimentar e desenvolver inovações de todos os tipos. Pode-se dizer

178
metaforicamente que a gestão da transição tenta criar novos “lock-ins” tecnológicos
para os caminhos desejados e sustentáveis” (LOORBACH, 2007, p. 123).

O quarto elemento fundamental do modelo de governança para a energia


fotovoltaica no Brasil representa a Formação de novos mercados (nichos). O
mercado para esta tecnologia depende de uma demanda em escala para que
investidores nacionais e estrangeiros se interessem por este setor e tenham mais
segurança para investir nesta tecnologia no país. As políticas a serem estabelecidas
para o desenvolvimento desta tecnologia devem contemplar a demanda de mercado
no país, bem como o potencial de utilização desta tecnologia, uma vez que a
consolidação de uma indústria neste setor depende fundamentalmente da formação
do mercado.

O quinto e último elemento central do modelo de governança corresponde a


formação da Indústria nacional, fator tido como essencial para o estudo da transição
sociotécnica da inovação no país em virtude do potencial impacto social positivo para
a geração de emprego e renda no país em busca do desenvolvimento econômico e
social sustentável. Ao realizar uma abordagem da teoria da transição sociotécnica, as
dimensões sociais envolvidas no processo de transição de uma tecnologia são
elementos centrais e no caso da EESFV no Brasil verificou-se duas frentes
importantes neste sentido: a geração de emprego e renda em um país como o Brasil
é um fator de extrema importância e no caso analisado ele ocorre em todos os elos
da cadeia de valor, incluindo a mão de obra para as fábricas de painéis solares e de
componentes, os profissionais de desenvolvimento e dimensionamento dos projetos
e os instaladores e profissionais que realizam manutenção e assistência técnica. O
segundo fator a ser levado em conta é o custo da tecnologia, que tende a baixar de
preço conforme a indústria nacional se desenvolve e ganha escala de produção. Isso
possibilita a instalação de sistemas solares em regiões longínquas do Brasil, onde a
rede elétrica não alcança e traz a pespectiva da melhoria da qualidade de vida das
famílias que residem nestes locais, resultando em um impacto social relevante para a
região e consequentemente para o país como um todo.

179
O Modelo estruturado na presente tese, denominado “Um Sol Para Cada Um”
coloca doze fatores como essenciais ao desenvolvimento deste Sistema,
denominados fatores transversais. Tais fatores se constituem de elementos que
possuem uma aplicação transversal em todos as cinco dimensões detalhadas
anteriormente e que impactam o desenvolvimento e a consolidação de cada uma
delas.

São considerados fatores transversais para este modelo: a aprendizagem, a


legitimação, a diversidade, a cultura, a liderança, a cooperação, o relacionamento, a
radiação solar, os recursos, as políticas, a profissionalização e a visão de longo prazo.
Tais fatores estão dispostos ao redor das cinco dimensões principais porque todos
eles impactam com diferentes graus de intensidade em cada um dos cinco elementos
centrais e se interrelacionam com o objetivo de potencializar a trajetória desta
tecnologia no Brasil. Tais fatores foram obtidos de forma qualitativa, a partir da análise
dos dados primários da tese.

A perspectiva multinível foi aplicada neste modelo de governança, especialmente


pelo fato de que a tecnologia de EESFV encontra-se em estágio inicial de
desenvolvimento, porém as políticas necessárias, o desenvolvimento de novos
mercados e de novas tecnologias encontram-se no nível do regime e precisam romper
a estrutura institucional já estabelecida neste regime para que a transição desta
tecnologia consiga, de fato, ocorrer no país. Ainda pode-se considerar a apresentação
da perspectiva multinível neste modelo de governança ao considerar indicadores da
paisagem, tais como o desenvolvimento profissional, a empregabilidade e a
movimentação da economia do país sendo impactados diretamente pelos indicadores
do modelo localizados no nicho tecnológico.

A proposta do modelo “Um Sol Para Cada Um” se constitui em um instrumento


para monitoramento e gerenciamento das dimensões essenciais do processo de
transição que objetiva o atingimento de metas de difusão da tecnologia e a resolução
dos problemas enfrentados pelos atores do Sistema Tecnológico de Inovação. Pode
ser aplicado como uma ferramenta para a definição de uma visão de longo prazo e

180
um incentivador do processo de transição tecnológica e para a formulação de políticas
para a disseminação da tecnologia em todos os níveis do sistema.

Para a aplicação em outros contextos, será necessária a realização de


adequações, uma vez que cada transição tecnológica pressupõe diferentes desafios,
bem como envolvem diferentes atores e relações. Loorbach (2007) aponta tais
necessidades de adaptações de acordo com diferentes contextos e menciona que
diferentes processos de transições históricas foram influenciados por pequenos
grupos de atores inovativos de forma estratégica, mas destaca que talvez o maior
número de transições ou emergiram, como por exemplo a transição demográfica, ou
foram gerenciadas de cima para baixo (top-down), como por exemplo a transição
agrícola ocorrida após a segunda guerra mundial ou o “Welfare State”.

5.4 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

O Brasil possui a oportunidade de fomentar o uso e a disseminação da energia


solar fotovoltaica como uma fonte relevante na matriz nacional, bem como
desenvolver toda a cadeia produtiva do setor, que, conforme descrito anteriormente
inclui a fabricação de insumos, componentes, equipamentos e mão de obra
especializada para atuação neste setor. O fomento desta fonte de energia demanda
algumas medidas e políticas de governança que envolvem a iniciativa privada, as
agências de fomento e regulação, instituições bancárias e diversos órgãos
governamentais.
A questão da descentralização na distribuição de energia elétrica se constitui
como uma das únicas possibilidades de se conseguir oferecer energia elétrica para
milhões de pessoas que vivem nos rincões mais longínquos deste país continental.
Os resultados aqui apresentados não possuem a pretensão de oferecer
conclusões definitivas sobre o tema analisado, mas sim levantar aspectos chaves e
apontamentos sobre os temas emergentes para a pesquisa de gestão da transição,
oferecendo um arcabouço teórico e prático que contribui para a continuidade da
agenda de pesquisa na área e no setor.

181
As pesquisas no campo da gestão da transição apresentam três componentes
essenciais: o desenvolvimento da teoria, a interação entre a teoria e a prática e uma
contribuição para a mudança social (LOORBACH, 2007).
A análise do regime da eletricidade no Brasil mostrou uma tendência a
estabilidade e a continuidade da energia hidrelétrica na matriz energética nacional,
que teve seu início juntamente com a história do sistema, conforme demostrado no
Capítulo 2 e levou a um processo de lock-in e path dependence, uma vez que a
infraestrutura estabelecida para a transmissão e distribuição de energia são na sua
maioria constituídas em torno das barragens hidrelétricas.
A nível de regime, o processo de transição tecnológica para a energia
fotovoltaica no Brasil é um processo de longo prazo, que pode demorar muitos anos
para crescer e se consolidar dentro do Sistema Setorial. Ainda assim, é importante
destacar que as iniciativas iniciais para este processo de transição foram tomadas
pelo governo, ainda que timidamente. Atualmente a tecnologia em estudo já começa
a ser vista como uma oportunidade e não mais uma ameaça dentro do setor e começa
a ganhar legitimidade pelos atores importantes do sistema, o que leva a um processo
de mudança no modelo mental atualmente consolidado. Conforme esta tecnologia vai
ganhando mais legitimidade entre os demais atores no nível do regime, esta
tecnologia começa a ganhar força e o processo de transição tecnológica tende a se
consolidar, conforme já detalhado anteriormente no Capítulo 2 desta tese.
Uma Transição tecnológica só é possível e viável quando é legitimizada pelos
atores que compõem a estrutura institucional vigente, que passam a enxergar a nova
tecnologia não como uma ameaça, mas sim como uma necessidade e criam as
condições necessárias para que a mudança aconteça. Um dos pontos de maior
desafio neste processo é que os mesmos atores que fazem parte do nível do regime,
ou ao menos uma parte relevante destes atores, frequentemente possuem interesses
divergentes com o desenvolvimento da tecnologia, o que demanda uma proteção
contra os interesses de curto prazo e as instituições que visualizam o desenvolvimento
da nova tecnologia como uma ameaça ao sistema. No caso analisado, este processo
de legitimação passa por importantes atores do setor de energia elétrica nacional, tais
como MME, ANEEL, EPE e BNDES, que possuem muita força política e de
mobilização dentro deste sistema, porém também envolve as concessionárias de

182
energia em cada estado da federação, as usinas hidrelétricas, termelétricas e de
outras fontes de energia, bem como demais empresas de geração e distribuição de
energia elétrica, cada qual com interesses particulares.
O modelo aqui apresentado de uma forma não exaustiva, apesar de aplicado
ao setor de EESFV no Brasil, pode ser combinado e refinado para aplicação em outros
contextos e setores. Porém o seu uso, por si só, não é uma garantia do maior uso e
disseminação da tecnologia, assim como não se constitui em uma condição
necessária para que o processo da transição tecnológica aconteça de fato. A sua
aplicação pode facilitar o processo de entendimento e de difusão desta tecnologia,
bem como direcionar a trajetória da transição para os caminhos desejados e
especificados pelas políticas estabelecidas entre os atores deste sistema.

183
REFERÊNCIAS:

BELFORT, A. Energia Solar vai Gerar 60 mil Empregos até 2018.


http://jc.ne10.uol.com.br/blogs/havagas/2016/04/12/energia-solar-vai-gerar-60-mil-
empregos-ate-2018/ , acesso em 28 de setembro de 2016.

DOLATA, U. The Transformative Capacity of New Technologies: a theory of


sociothecnical change. New York: Ed. Routledge, 2013.

GEELS, F. W. Technological Transitions as evolutionary reconfiguration


process: A multi-level perspective and a case-study. Research Policy 31, 1257-
1274, 2002.

_______ , F. Understanding system innovations: a critical literature review and a


conceptual synthesis. In: ELSEN, B.; GEELS, F. W.; GREEN, K. (2004) System
Innovation and the Transition to Sustainability: Theory, Evidence and Policy.
Northampton (MA): Edward Elgar, 2004.

KEMP, R. LOORBACH, D. Governance for Sustainability Through Transition


Management. Human Dimensions of Global Environmental Change. Research
Community. Montreal, 2003.

LOORBACH, D. Transition Management: New mode of governance for


sustainable development. UD Druck. 2007.

LUNDVALL, B. A. National System of Innovation: Toward a Theory of Innovation


and Interactive Learning. Ed. Anthem Press, USA, 2010.

SCHUMPETER, J. A. Os Economistas. São Paulo: Ed Nova Cultural, 1997

184
6 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

A presente tese analisou o Sistema Nacional de Inovação da Energia Elétrica


e apresentou um modelo de governança para a transição tecnológica da Energia
Elétrica Solar Fotovoltaica aplicado ao contexto do Brasil.
O capítulo 2 trouxe uma revisão conceitual sobre principais fatores envolvidos
na teoria da transição sociotécnica da inovação, na teoria dos Sistemas Nacionais,
Regionais e Setoriais de inovação e do setor de energia elétrica fotovoltaica no Brasil,
com o objetivo de realizar uma proposição de integração entre tais abordagens
teóricas de forma não definitiva e tampouco conclusiva, uma vez que a dinâmica deste
sistema tecnológico e a complexidade das relações institucionais entre os atores e
seus diferentes papéis impossibilita a construção de um modelo estático e prescritivo.
O estudo identificou elementos fundamentais para o uso e a disseminação da EESFV
que compuseram a proposta do modelo de governança para a transição tecnológica
demonstrada nesta tese.
Esta tese permitiu identificar conceitos relevantes envolvendo Sistema
Nacional, Setorial e Regional de inovação, bem como Sistema de Inovação
Tecnológico e elucidou elementos importantes quanto ao papel dos atores nos
diferentes níveis do sistema e de que forma a tecnologia de nicho analisada é
influenciada pelas relações entre os atores, pelas atividades de lobby, regulação,
aprendizado e de legitimação no contexto setorial analisado.
A trajetória da tecnologia foi analisada com base na inter-relação e na
interdependência dos sistemas e a capacidade da nova tecnologia de realizar
transformações sociais e econômicas, o que, aplicado ao setor de energia elétrica
solar fotovoltaica apresenta uma perspectiva de mudança estrutural importante dentro
do setor, com consequências positivas para matriz energética nacional, por sua
natureza sustentável, bem como a mudança social, ao gerar emprego, renda e
formação profissional especializada para profissionais que atuam com esta tecnologia.
As instituições governamentais ocupam uma posição central, porém não
exclusiva, para a construção de um modelo de governança, uma vez que tais atores
não se constituem como a única forma pela qual se alcança a governança e se

185
desenvolvem políticas. Neste sentido, o papel das instituições governamentais na
transição tecnológica deve ser de facilitador e não de executor do processo de
transição. Esta visão ficou destacada no papel que o Governo alemão teve para a
transição energética no país e foi também apontada por alguns dos entrevistados do
Brasil como um elemento essencial ao processo de transição da tecnologia.
Porém, esta visão do papel do governo como um canal e não como o meio pelo
qual a transição tecnológica ocorre envolve uma mudança cultural importante no
Brasil, que historicamente tem o Governo como elemento central e executor de todos
os processos de governança ocorridos no país.
A política faz parte de qualquer forma de governança, assim como as relações
de poder que envolvem o processo de política. No caso analisado, verificou-se uma
forte presença histórica das instituições governamentais, que controlam e direcionam
a trajetória do setor de energia elétrica, estabelecendo prioridades e definindo, de
forma deliberada, quais serão as fontes de energia utilizadas na matriz energética
nacional em um horizonte de tempo de curto, médio e longo prazo.
O capítulo 3 apresentou uma análise do setor a partir da utilização de duas
perspectivas teóricas embasadoras: a perspectiva multinível e as funções do Sistema
de Inovação e trouxe como principal contribuição a identificação dos fatores
necessários para o uso e a disseminação da EESFV no país, que envolve o
estabelecimento de metas claras de longo prazo, incentivos fiscais e financeiros, a
oferta de oportunidades mais atraentes para investidores, bem como uma formação
profissional que ofereça cursos especializados em todos os níveis. Existe uma
necessidade de mudança do modelo mental atualmente vigente, que necessita passar
a enxergar a nova tecnologia não mais como uma ameaça, mas sim como uma
oportunidade de desenvolvimento sustentável para o setor como um todo.
Foi possível concluir que a ampla disseminação da tecnologia analisada,
depende de um processo de aprendizagem que envolve, entre outros fatores, a
educação formal, uma mudança cultural sobre a tecnologia e o desenvolvimento de
uma indústria nacional com a adaptação de tecnologia para atender às condições
nacionais.
O capítulo 4 apresentou uma análise que identificou dos fatores fundamentais
em termos de governança e políticas para o processo de transição tecnológica da

186
energia elétrica solar fotovoltaica no Brasil e identificou, entre seus principais
resultados, a necessidade do estabelecimento de políticas de incentivos fiscais e
específicos para o desenvolvimento da indústria nacional de painéis solares e dos
componentes eletrônicos que compõem os sistemas fotovoltaicos, políticas de
encorajamento para inovação tecnológica, a formação de redes de cooperação entre
os atores do Sistema para o desenvolvimento de ações para promover e disseminar
esta fonte de energia no Brasil.
Entre os aprendizados proporcionados pela experiência da Alemanha está o
uso estratégico das atividades de Looby, que no caso da Energiewende teve a
participação de atores prós e contra a transição energética no país. Tais atividades na
Alemanha estão relacionadas aos interesses dos grupos empresariais privados, que
exercem pressão sobre as instituições governamentais. Percebe-se que o papel do
governo no caso da Alemanha é de facilitador do processo, deixando o mercado da
iniciativa privada atuar em livre concorrência, o que não acontece no Brasil em virtude
das características monopolísticas do setor de energia no Brasil, que coloca as
instituições governamentais com um papel centralizador e controlador das atividades,
não permitindo a ocorrência do livre mercado em sua plenitude.
Por fim, o capítulo 5 apresentou a tese na qual este estudo se desenvolve e
propõe que um modelo de governança para a disseminação da EESFV no Brasil, que
envolve alguns elementos transversais, tais como a visão de longo prazo, a
aprendizagem, a legitimação e a cooperação entre outros. A tese propões que tais
elementos transversais impactam com diferentes graus de intensidade as cinco
dimensões do modelo de governança para o setor: as iniciativas governamentais, a
pesquisa e desenvolvimento, a tecnologia e inovação, a indústria nacional e a
formação de novos mercados.
Como contribuição teórica esta tese apresentou a geração de novos
conhecimentos teóricos a partir de uma combinação de diversos recortes da teoria
presentes na teoria sociotécnica da inovação, ao abordar o mesmo objeto de estudo
utilizando-se três abordagens distintas: a perspectiva multinível, as funções do
sistema de inovação e a abordagem de governança. Os resultados mostram a
necessidade de se observar os impactos sociais que a tecnologia pode proporcionar
em casos de estudo em países em desenvolvimento como o caso desta tese, na qual

187
se verificou-se o impacto recíproco entre o nicho e a paisagem sociotécnica, uma vez
que a tecnologia analisada pode impactar os índices de desemprego do país e a
disseminação da tecnologia depende de se romper as barreiras de instabilidade
política e econômica e do risco percebido no país por parte de investidores
extrangeiros, reforçando a interrelação entre indicadores do nicho e da paisagem para
o caso analisado.
Já com relação à contribuição prática desta investigação, pode-se destacar o
fato de proporcionar aos atores participantes uma maior compreensão do contexto
social no qual estão inseridas, especialmente em relação aos aspectos regulatórios e
legais, bem como os elementos que impactam no processo de governança para a
transição da tecnologia da EESFV, o que pode garantir sustentabilidade para as
organizações que fazem parte deste sistema.
A limitação desta tese reside no fato de não contemplar todos os elementos e
tampouco todos os atores do Sistema nacional de inovação da tecnologia analisada.
As características de multi-atores, multi-níveis, multi-fases, multi-causas e multi-
disciplinaridade dos sistemas sociotécnicos mostram a alta complexidade deste
sistema e coloca sobre o pesquisador a responsabilidade de identificar e selecionar
os elementos mais relevantes do contexto analisado, deixando fora do escopo
analisado alguns elementos do sistema. Este recorte se faz necessário a fim de
delimitar o escopo do estudo.
Apesar de ter sido desenvolvido e aplicado para o setor de energia elétrica
fotovoltaica, o modelo apresentado nesta tese pode ser aplicado para diferentes
tecnologias e setores da economia, desde que respeitando-se as particularidades e
as características inerentes ao segmento analisado. Sugere-se como pesquisas
futuras a aplicação desta mesma metodologia em outros contextos e tecnologias.

188
APÊNDICE I – ENTREVISTAS EM PROFUNDIDADE:

Número de entrevistas em profundidade com atores-chave do SNI brasileiro


Papel do ator dentro do sistema Cargo / area do entrevistado Número de respondentes
Ministério de Minas e Energia (MME) Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético 2
Empresa de Pesquisa Energética (EPE) Diretor de Pesquisa Energética 1
ABRAGEL - Ass. Bra. de Geração de Energia Limpa CEO 1
BNDES - Banco Nac. de Desenvolvimento Econômico e Social
Gerente de Estudos Setoriais - Energias renováveis 1
Renova Energia S/A Gerente de Assuntos Regulatórios 2
CPFL Renováveis Diretor de Relações Institucionais 1
COPEL - Companhia Paranaense de Energia Coodenador de implementação 1
ELEJOR - Centrais elétricas Rio Jordão S.A Engenheiro de infraestrutura 1
Paraná Metrologia Gerente Administrativo 1
UTFPR - Universidade Tecnológica Federal do Paraná Professor 1
UP - Universidade Positivo Professor 1
3B Energy CEO 1
Elco Engenheiro Especialista em PV 2
SISTECHNE Gerente Comercial 1
CompactCia CEO 1
Lubke CEO 1
Sistema Residencial Proprietário de residência com fotovoltaico 1

189
APÊNDICE II – RELAÇÃO DE DOCUMENTOS BRASIL:

Natureza do documento- Brasil Número de documentos


Normativas e resoluções 18
Notícias 13
Relatórios de Associações e ONG’s 9
Atlas Solarimético e materiais técnicos 7
Relatórios do MME / EPE 7
Publicações e relatórios da ANEEL 6
Cursos em Energia Fotovoltaica 3
Relatórios internacionais 3
Publicações do BNDES 2
Novos projetos de lei 1
TOTAL 69

190
APÊNDICE III – RELAÇÃO DE DOCUMENTOS ALEMANHA:

Natureza do documento- Alemanha Número de documentos


Artigos científicos -Energy 8
transition
Relatórios Energiewende 4
Publicações do Solar Cluster B-W 4
Notícias 2
Total 18

191
APÊNDICE IV: – DIMENSÕES ANALISADAS DO SETOR DE
ENERGIA ELÉTRICA FOTOVOLTAICA NOS NÍVEIS DE
PAISAGEM SOCIOTÉCNICA, REGIME SOCIOTÉCNICO E
NICHOS TECNOLÓGICOS

192
Dimensões do Sistema Nacional de Inovação de Energia Elétrica Fotovoltaica - Paisagem Sociotécnica (Macro)
Dimensão Escopo Autores de Base Fonte de dados Metodologia Entrevista

Estruturação do Organizações que Dados primários: entrevista Entrevista em


Campo constituem uma área Dolata (2013) em profundidade com profundidade com os
Organizacional reconhecida da vida Perez (2009) atores do Sistema Nacional atores do SNI
que influencia as institucional Coenen e Lopez de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
políticas e a fornecedores-chave, (2012) Nelson Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.1.1)
governança do recursos e produtos (1993) Freeman relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
setor de energia aos consumidores, (1987) das empresas que atuam para análise dos dados
elétrica agências reguladoras. no setor. qualitativos.

Dados primários: entrevista Entrevista em


A inovação no
em profundidade com profundidade com os
sistema ocorre pela Geels (2004)
Substituição atores do Sistema Nacional atores do SNI
emergência de novas Saviotti (2010) Apêndice 5
tecnológica de Inovação. Dados Análise documental e
tecnologias; difusão Soete, Vespagen e (Questão 4.1.1)
dentro do Campo Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização
de novas tecnologias Well (2009) Kemp (Questão 4.1.2)
Organizacional relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
e pela substituição de e Rotmans (2010)
das empresas que atuam para análise dos dados
velhas tecnologias.
no setor. qualitativos.

A Paisagem
Dados primários: entrevista Entrevista em
Sociotécnica
em profundidade com profundidade com os
pressiona e influencia Geels (2004)
atores do Sistema Nacional atores do SNI
Políticas e as mudanças no Saviotti (2010)
de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
Medidas regime sociotécnico Soete, Vespagen e
Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.1.2)
Governamentais ao estabelecer Well (2009) Kemp
relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
políticas e medidas e Rotmans (2010)
das empresas que atuam para análise dos dados
governamentais para
no setor. qualitativos.
o setor.

Dados primários: entrevista Entrevista em


em profundidade com profundidade com os
A estruturação do Geels (2004)
atores do Sistema Nacional atores do SNI
setor impacta na Saviotti (2010)
Mudanças de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
difusão de inovaçoes Soete, Vespagen e
estruturais Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.1.3)
e na forma como os Well (2009) Kemp
relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
atores se relacionam. e Rotmans (2010)
das empresas que atuam para análise dos dados
no setor. qualitativos.

Iniciativas que Dados primários: entrevista Entrevista em


buscam a otimização em profundidade com profundidade com os
Estratégias Twidwell e Weir
entre a quantidade de atores do Sistema Nacional atores do SNI
Globais para o (2015)
energia necessária de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
setor em Dietz e O’Neil
para a realização de Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.1.4)
eficiência (2013) MMA (2015)
uma atividade e a relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
energética
efetivamente das empresas que atuam para análise dos dados
empregada. no setor. qualitativos.

193
Dimensões do Sistema Nacional de Inovação de Energia Elétrica Fotovoltaica - Regime Sociotécnico (Meso)
Dimensão Escopo Autores de Base Fonte de dados Metodologia Entrevista

A mudança
A dinâmica de
tecnológica se Dados primários: entrevista Entrevista em
desenvolvimento das
desenvolve o em profundidade com profundidade com os
inovações ocorre a
obtém impulso Kemp e Rotmans atores do Sistema Nacional atores do SNI
partir da visão de Apêndice 5
dentro do regime (2010) de Inovação. Dados Análise documental e
novas oportunidades (Questão 3.2.1
sociotécnico a Berkhout (2010) Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização
por parte dos atores, Questão 3.2.2)
partir da Freeman (1987) relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
que deixam de ver as
mudança de das empresas que atuam para análise dos dados
inovações como
modelo mental no setor. qualitativos.
ameaças
dos atores

Impacto das A Paisagem


Dados primários: entrevista Entrevista em
políticas, Sociotécnica
em profundidade com profundidade com os
programas de pressiona e influencia Geels (2004)
atores do Sistema Nacional atores do SNI
incentivo e as mudanças no Saviotti (2010)
de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
medidas do nível regime sociotécnico Soete, Vespagen e
Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.1.2)
macro que ao estabelecer Well (2009) Kemp
relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
interferem na políticas e medidas e Rotmans (2010)
das empresas que atuam para análise dos dados
dinâmica do governamentais para
no setor. qualitativos.
Setor de EESFV o setor

Cognitivos (sistema
de crenças, princípios
direcionadores, Dados primários: entrevista Entrevista em
Aspectos metas, agendas de em profundidade com profundidade com os
Geels (2004)
cognitivos, inovação), atores do Sistema Nacional atores do SNI Apêndice 5
Saviotti (2010)
normativos e Regulativos (padrões de Inovação. Dados Análise documental e (Questão 3.2.3)
Soete, Vespagen e
regulativos do regulamentados e Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.2.4)
Well (2009) Kemp
regime no setor leis) e Normativos relatórios ou normativas do Software Atlas.ti (Questão 3.2.5)
e Rotmans (2010)
de EESFV (papel dos das empresas que atuam para análise dos dados
relacionamentos, no setor. qualitativos.
valores e normas de
comportamentos).

A capacidade
transformadora da
Dados primários: entrevista Entrevista em
tecnologia refere-se
em profundidade com profundidade com os
ao impacto (potencial)
atores do Sistema Nacional atores do SNI
que novas
Impacto da de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
oportunidades Dolata (2013)
Tecnologia Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.2.6)
tecnológicas têm
relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
sobre um setor (ou
das empresas que atuam para análise dos dados
em qualquer outro
no setor. qualitativos.
campo da atividade
social).

194
Dimensões do Sistema Nacional de Inovação de Energia Elétrica Fotovoltaica - Nichos Tecnológicos (Micro)
Dimensão Escopo Autores de Base Fonte de dados Metodologia Entrevista

Papachristos
(2011) Smith e Dados primários: entrevista Entrevista em
Stirling (2010) em profundidade com profundidade com os
O processo de
Rip e Kemp (1998) atores do Sistema Nacional atores do SNI
Processo de aprendizagem cria
SCHOT (1998) de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
aprendizagem e oportunidade para o
GEELS (2002, Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.3.1)
conhecimento desenvolvimento de
2004, 2005) relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
novas tecnologias.
Geels e Schot das empresas que atuam para análise dos dados
(2010) no setor. qualitativos

Papachristos
Dados primários: entrevista Entrevista em
(2011) Smith e
em profundidade com profundidade com os
O ambiente propício Stirling (2010)
atores do Sistema Nacional atores do SNI
do surgimento de Rip e Kemp (1998)
Surgimento de de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
novos projetos SCHOT (1998)
novos projetos Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.3.2)
favorece as inovações GEELS (2002,
relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
em EESFV. 2004, 2005)
das empresas que atuam para análise dos dados
Geels e Schot
no setor. qualitativos
(2010)

Papachristos
(2011) Smith e Dados primários: entrevista Entrevista em
Fontes de Stirling (2010) em profundidade com profundidade com os
informações que Rip e Kemp (1998) atores do Sistema Nacional atores do SNI
Fontes de favorecem o SCHOT (1998) de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
informação desenvolvimento de GEELS (2002, Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.3.4)
inovações entre os 2004, 2005) relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
atores. Geels e Schot das empresas que atuam para análise dos dados
(2010) no setor. qualitativos

Papachristos
(2011) Smith e Dados primários: entrevista Entrevista em
Experiências práticas Stirling (2010) em profundidade com profundidade com os
entre os atores que Rip e Kemp (1998) atores do Sistema Nacional atores do SNI
traduzem os SCHOT (1998) de Inovação. Dados Análise documental e Apêndice 5
Práticas Sociais
entendimentos e GEELS (2002, Secundários: Documentos, de conteúdo Utilização (Questão 3.3.5)
aceitações entre os 2004, 2005) relatórios ou normativas do Software Atlas.ti
participantes. Geels e Schot das empresas que atuam para análise dos dados
(2010) no setor. qualitativos

195
APÊNDICE V – ENTREVISTA APLICADA AOS ATORES DO SISTEMA
NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA FOTOVOLTAICA

Roteiro de Entrevista
Atores do Sistema Nacional de Inovação do Setor de EESFV
1. Contextualização e apresentação da pesquisa: Sistema Nacional de Inovação,
Gestão da Transição tecnológica, Governança
2. Apresentação do Entrevistado: Identificação, cargo que ocupa e tempo de empresa
3. Sistema Sociotécnico do Setor de Energia Elétrica do Brasil

3.1 Paisagem Sociotécnica (nível Macro)


3.1.1 Quais são as principais organizações (incluindo fornecedores, agências
reguladoras e empresas públicas e privadas) que possuem um papel importante de
atuação no setor de EESFV?
3.1.2 Quais foram as políticas e medidas governamentais para o setor de EESFV que
mais influenciaram mudanças? Estas medidas pressionaram ou direcionaram a
maneira como os atores agiram? Como?
3.1.3 Houve alguma mudança na estrutura do sistema nacional do setor de EESFV?
De que forma as mudanças estruturais impactaram na dinâmica do setor?
3.1.4 Existe algum fator internacional que vem influenciando na dinâmica da produção
e do consumo do setor de energia elétrica? Qual (is)?
3.1.5 E nacional? Existe algum fator que vem influenciando na dinâmica da produção
e do consumo do setor de energia elétrica? Qual (is)?
3.2 Regime Sociotécnico (nível Meso)
3.2.1 De que forma as instituições que atuam no sistema usualmente reagem ao
surgimento de novas tecnologias?
3.2.2 Como ocorre o processo de aceitação e institucionalização das inovações
dentro do setor por parte dos atores?
3.2.3 Como são os princípios direcionadores, o sistema de crenças e a agenda
de inovação dos atores do setor?
3.2.4 Como estão institucionalizados os padrões regulamentados e as leis do
setor?
3.2.5 Qual é o papel dos relacionamentos, valores e normas de comportamento
dentro deste contexto? Descreva.
3.2.6 Qual é o impacto (potencial) que as novas oportunidades tecnológicas têm
sobre o setor de energia elétrica?
3.2.7 Quais são os aspectos da infraestrutura do sistema que influenciam a
dinâmica das atividades dentro do setor? Como isso acontece?
3.2.8 Existe algum aspecto cultural que pode ser mencionado como
impulsionador das atividades no setor de energia elétrica? Quais?

196
3.3 Nichos Tecnológicos (nível Micro)
3.3.1 Existe um processo de aprendizagem entre os atores da rede de EESFV? De
que forma ele acontece e é disseminado?
3.3.2 O ambiente favorece o surgimento de inovações para o setor de EESFV? Como
isso acontece?
3.3.3 Existe uma relação de cooperação entre os atores da rede? De que forma o
relacionamento entre os integrantes se materializa na prática?
3.3.4 Quais são as principais fontes de informação entre os atores da rede? Elas
favorecem o surgimento de inovações? Como?
3.3.5 O ambiente possui práticas que estimulam a geração de ideias inovadoras?
Quais e como isso acontece?

4. Trajetória tecnológica para a Inovação Sustentável


4.1 Fase 1 – Emergência de Novidades em um contexto existente
4.1.1 Você observou a Emergência de Novas Tecnologias no setor de EESFV? Quais?
4.1.2 Quais foram as instituições / organizações que estavam envolvidas? Qual foi a
origem da inovação?
4.1.3 As inovações do setor de energia elétrica se concentram em alguma área
específica? Qual?
4.2 Fase 2 - Especialização técnica em Mercados de Nichos e Exploração de
Novas Funcionalidades
4.2.1 Existe alguma associação profissional ou algum jornal especializado do setor
com foco na difusão de inovações para o setor de EESFV? Qual (is)?
4.2.2 Entre as diversas instituições e organizações que atuam no setor de EESFV
existe uma agenda comum para o estabelecimento de busca de soluções para os
problemas do setor de energia? Como este processo acontece?
4.2.3 Os aprendizados com inovações e novas tecnologias são compartilhados entre
os atores do setor? De que forma se dá este processo?
4.3 Fase 3 - Ampla Difusão, Avanço de Novas Tecnologias e Competição com o
Regime Estabilizados
4.3.1 De que forma as novas tecnologias se difundem dentro do Campo? Comente
sobre o processo de difusão de inovações do setor.
4.3.2 Como se dá as estratégias de lançamento para novos produtos e serviços dentro
do setor?
4.3.3 De que forma acontece o processo de difusão de novas tecnologias e serviços
dentro do setor de EESFV no Brasil? Existe alguma estratégia para a difusão destas
novidades?
4.4 Fase 4 - Substituição Gradual do Regime Estabelecido, Transformações Mais
Amplas
4.4.1 Existe substituição tecnológica dentro do Setor de EESFV? Como ela ocorre?

197
4.4.2 Como acontece a substituição de velhas tecnologias e o surgimento de novas
forma de atuação?
4.4.3 Existe resistência por parte dos atores já estabelecidos com relação às novas
tecnologias para produtos e serviços no setor de EESFV? Como isso acontece?
5. Gestão da Transição Sociotécnica

5.1 Estratégica - a Arena de Transição


5.1.1 Quem são os atores pioneiros dentro do setor de EESFV?
5.1.2 Quais seriam os atores / instituições mais legitimados dentro do setor? Cite os
motivos que os levaram a ter este reconhecimento
5.1.3 Quais são os atores mais inovadores do setor de energia elétrica? O que faz
com que eles sejam assim?
5.2 Tático - a Agenda de Transição
5.2.1 Existe alguma barreira para o desenvolvimento de inovações no setor de
EESFV? Quais e Por que?
5.2.2 De que forma as condiçoes regulatórias, intitucionais e econômicas influenciam
na trajetória da transição da inovação no setor de EESFV?
5.2.3 Existe alguma barreira com relação às rotinas de consumo, à infraestrura
estabelecida ou à alguma tecnologia específica que dificultam a transição para a
inovação dentro do setor? Quais?
5.3 Operacional – Experimentos
5.3.1 Você se lembra de algum experimento que tenha trazido alguma contribuição
inovadora para o setor? Descreva
5.3.2 De modo geral o setor de energia elétrica incentiva iniciativas de experimentos
para inovações? Como isso acontece?
5.4 Reflexiva - Monitoramento e Avaliação
5.4.1 Existe algum monitoramento das iniciativas inovadoras e resultados dentro do
setor? Quem monitora e como acontece?
5.4.2 Existe alguma avaliação sobre os processos de aprendizagem social e
institucional dentro do setor de EESFV? Quais?
6. Perspectivas de Futuro para o setor

6.1 Quais são as perspectivas para o futuro das empresas que atuam no setor de
EESFV no Brasil?
6.2 O que você considera fundamental para o futuro do setor?

198
APÊNDICE VI – ENTREVISTA APLICADA AOS ATORES DO
SISTEMA ALEMÃO DE ENERGIA ELÉTRICA FOTOVOLTAICA

Interview Script – Solar Cluster Baden_Württemberg – Stuttgart – Germany - Dr


Carsten Tschambler
1. Context and research presentation: National Innovation System, technological
Transition Management, Multilevel perspective and Governance
2. Presentation of Respondent: Identification, job position and company time
Relation between the actor
1. Solar Cluster Baden-Württemberg is a composed for 40 members from trade
and industry, public organizations and research institutes. How all these
organizations relate each other?
2. Could you describe the role of the main actors inside the network?
3. Is there any kind of power relation in this context? who has greater power in
terms of decision making inside the network?
4. The cluster is formed by organizations of industry, energy supply, photovoltaic
plants, research and training. What are the advantages and disadvantages of
acting this way? Is there any result that would not be possible if the network was
not formed?
5. How is the process of acceptance and institutionalization of innovations inside
the cluster by the actors?
Policies and actions for research and development
1. Solar Cluster Baden-Württemberg has a state government support for 2020 is
reached in order to insert at least 10% of photovoltaic in the total energy supply
in the state of Baden-Württemberg. Could you describe how it Works?
2. The Solar Cluster Baden-Württemberg actively supported the development of
the legal framework conditions for the expansion of renewable energies. Could
you give some examples of how it’s been done?
3. What about ZSW? What’s ZSW role inside Solar Cluster Baden-Württemberg
and how the employees and student had contributed to PV Technologies
development and research?
4. How the legislation aspects influenced the development of photovoltaics in
Germany? Can you describe what were the legal incentives and how long they
lasted?
5. What about the fiscal and financial incentives? Could you describe them?
6. Is there any kind of financing or specific credit line for the installation of
photovoltaic systems? What are the advantages they offer over the other?

199
7. Does the BW Cluster maintain any partnership or cooperation relationship with
other solar energy clusters? Who are they and how this relationship favors the
actions in both sides?
8. What about the other organizations from PV energy sector? Is there any
partnership or cooperation? Could you describe?
Learning and technology transfer
1. Is there any learning process between the actors? How does it happen and
is broadcast?
2. Does the environment favors the emergence of innovations and new
technologies? How?
3. Is there cooperation relationship between the actors inside the network
cluster? Could you give me some example?
4. What are the main sources of information among the actors network? Do
they favor the emergence of innovations?
5. Does the environment show practices that stimulate the generation of
innovative ideas? How does this happen?
6. Are the learnings with innovations and new technologies shared among the
participants? How?
7. How does the replacement of old technologies and the emergence of new
forms of activity occurs inside the cluster?
8. Is there any resistance from actors already established in relation to new
technologies for products and services? Could you describe it?
9. Is there any innovative initiatives and results monitoring? Who monitors and
how does this process happen?
Pv energy in Germany versus Brasil
1. How is the role of the state and public policy in the spread of photovoltaics in
Germany? What would happen without these policies?
2. What are the prospects / trends for the future of companies operating in the Pv
energy sector in Germany and in Brazil?
3. What do you consider essential for the photovoltaic industry to develop in a
country like Brazil?
4. The Solar Cluster BW, in cooperation with the ZSW members, submitted in July
2013 a proposal for a feasibility study for the establishment of a fully integrated
photovoltaic production in Paraná, named Green Silicon. Could you comment
how was it and how is it now?
5. When we talk about technological transition in Brazil we think also about the
social impact and the manner in which particular technology will change the
local socio-economic scenario. How do you see the contribution of Pv
technology to Brazil and what are the main differences when it is applied in
Germany?

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